Dissertacao DepositoAuriferoPiaba
Dissertacao DepositoAuriferoPiaba
Dissertacao DepositoAuriferoPiaba
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOLOGIA E GEOQUÍMICA
___________________________________________________________________________
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
BELÉM
2012
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
Biblioteca Geólogo Raimundo Montenegro Garcia de Montalvão
À minha família:
Sávio, filho.
Amanda, esposa.
Maria Deuzarina, mãe.
v
AGRADECIMENTOS
Faço aqui os meus sinceros agradecimentos a todos aqueles que deram alguns minutos
e dias de suas vidas para que eu pudesse desenvolver e terminar esta dissertação.
À Universidade Federal do Pará – Instituto de Geociências, em especial ao Programa
de Pós-Graduação em Geologia e Geoquímica, que forneceu todas as condições técnicas e
estruturais para a confecção deste trabalho.
Ao CNPq, pela concessão da bolsa de estudo.
À Luna Gold, detentora da permissão de lavra do Depósito Piaba, pela permissão e
fornecimento de amostras de testemunhos, assim como as valiosas informações fornecidas
gentilmente pelo Dr. Titus Haggan.
Ao Prof. Dr. Evandro Luiz Klein, paciente e atencioso orientador, que vem me
assistindo desde meu último ano de graduação em 2008 e do qual tive a honra de receber um
pouco de seu grande conhecimento geológico.
Aos Profs. Drs. Cláudio Lamarão, Netuno Villas, Rômulo Angélica e Hilton Túlio,
pela ajuda prestada nas análises das amostras nos laboratórios (MEV, Raios – X e
Microtermometria).
Ao Dr. Kazuo Fuzikawa (CDTN/CNEN) e Dra. Maria Sylvia Dantas (UFMG) pelo
apoio com as análises Raman.
Aos meus colegas de graduação e pós-graduação Williams, Luís Daniel, Lívio, Ana
Tayla e Gilberto, que foram bons companheiros ao longo desses anos de Universidade e
continuam sendo ótimos colegas de profissão.
A toda minha família, especialmente minha esposa Amanda, meu filho Sávio, minha
mãe Maria Deuzarina, minha tia Teresinha e meus irmãos Sandro, Sidney e Saulo, que são
meus grandes amigos e incentivadores.
vi
RESUMO
O depósito aurífero Piaba tornou-se, em 2010, a primeira mina em operação no
Fragmento Cratônico São Luís, noroeste do Maranhão. Seu ambiente geológico compreende
rochas metavulcanossedimentares do Grupo Aurizona e granitoides da Suíte Tromaí, entre
outras unidades menores, formadas em ambiente orogênico, de arcos de ilhas entre 2240 e
2056 Ma. A mineralização em Piaba se hospedou em um granodiorito granofírico fino
(Granófiro Piaba) e em rocha subvulcânica andesítica do Grupo Aurizona. Os corpos de
minério estão encaixados na falha Piaba de orientação ENE-WSW rúptil-dúctil e consistem
em uma trama stockwork de veios e vênulas de quartzo com seus halos de alteração
hidrotermal. O estudo petrográfico realizado em amostras obtidas em testemunhos de
sondagem na zona mineralizada mostrou que as rochas hospedeiras do minério foram afetadas
por intensa alteração hidrotermal, que provocou a transformação quase que por completo
dessas rochas. Os produtos dessas modificações são minerais micáceos formados durante a
sericitização e cloritização do granodiorito granofírico e da rocha andesítica, as quais
ocorreram de forma pervasiva e fissural. Além disso, carbonatação, silicificação e sulfetação
ocorreram em consequência da percolação de fluidos em condutos (fratura e falhas) ao longo
da falha Piaba, formando as venulações. Esses últimos tipos aparentam estar associados com a
precipitação do ouro. Estudos petrográficos, microtermométricos e por espectroscopia
microRaman em grãos de quartzo das vênulas de uma zona stockwork definiram inclusões
aquo-carbônicas bifásicas e trifásicas, produzidas por aprisionamento heterogêneo durante
separação de fases, e fluidos aquosos tardios. O fluido aquo-carbônico, responsável pela
mineralização, é composto por CO2 (5 – 24 mol %, densidade de 0,96-0,99 g/cm3), H2O (74 –
93 mol%), N2 (≤1 mol%), CH4 (≤1mol%) e 5,5% em peso equivalente de NaCl. O minério
depositou a 267-302ºC e 1,25-2,08 kbar, correspondendo a profundidades de 4 a 7 km. A
composição e intervalo de P-T de atuação do fluido mineralizador, combinadas com o caráter
redutor (log ƒO2 -31,3 a -34,3) e a sulfetação das rochas hospedeiras, sugerem que o ouro foi
transportado como um complexo sulfetado e que foi depositado em consequência da
separação de fases, redução da atividade de enxofre e da ƒO2 por interação fluido-rocha. Essas
condições são consistentes com a formação do depósito em regime rúptil, portando em
condições mesozonais a epizonais. Por comparação com outras ocorrências auríferas similares
já estudadas na região, as características geológicas e do fluido permitem atribuir a classe de
depósitos de ouro orogênico para Piaba.
Palavras – chave: Ouro – minerais e mineração, Jazidas – Maranhão, Petrologia, Depósito
aurífero Piaba.
vii
ABSTRACT
The Piaba gold deposit became, in 2010, the first gold mine in operation in the São
Luís Cratonic Fragment, northwestern of the State of Maranhão, Brazil. The tectonic setting
comprises the metavolcano-sedimentary rocks of the Aurizona Group and the granitoids of
the Tromaí Intrusive Suite, along with minor units. All these rocks formed in island arc
setting between 2240 and 2056 Ma. Gold mineralization at Piaba is hosted in a fine-grained
granophyric granodiorite (Piaba Granophyre) and in a subvolcanic andesitic rock belonging to
the Aurizona Group. The ore bodies are hosted in the Piaba fault, which is an ENE-WSW-
trending brittle-ductile structure. These ore bodies consist of stockwork veins and veinlets and
their hydrothermal haloes. The petrographic study was undertaken in drill cores of the
mineralized zone. This study has shown that the host rocks have been affected by strong
hydrothermal alteration that provoked intense mineralogical transformations of the rocks. The
most prominent alteration processes have been the sericitization and chloritization of the host
rocks, occurring in pervasive and fissure-filling modes. In addition, carbonatization,
silicification and sulfidation occurred in response to fluid flow and veining along fractures
and small faults associated with the Piaba fault. These latter types of alteration appear to be
associated with gold precipitation. Petrographic, microthermometric and Raman
microspectroscopic studies have been undertaken in quartz from mineralized veins from a
stockwork zone. These studies identified two and three phase aqueous-carbonic fluid
inclusions that have been interpreted as produced by heterogeneous trapping during
immiscible phase separation. Late aqueous inclusions have also been identified. The
mineralizing aqueous-carbonic fluid is composed of CO2 (5 – 24 mol%, density of 0.96-0.99
g/cm3), H2O (74 – 93 mol%), N2 (≤1 mol%), CH4 (≤1mol%), and has 5.5 wt. % NaCl
equivalent. The gold ore deposited at 267-302ºC and 1.25-2.08 kbar, corresponding to depths
of 4 to 7 km. Fluid composition and the P-T interval of the mineralizing fluid, its relatively
reduced character (log ƒO2 -31.3 to -34.3), and the strong sulfidation of the host rocks indicate
that gold has been transported as a sulfur complex and was deposited in response to phase
separation and lowering of ƒO2 and of the sulfur activity during fluid-rock interaction. These
conditions are consistent with the brittle regime and mesozonal to hypozonal conditions.
Comparing the geological and fluid P-T-X characteristics of Piaba with those of other gold
prospects already investigated in the same region, it is possible to define Piaba as an orogenic
gold deposit.
Key words: Gold – minerals and mining, Maranhão, Petrology, Piaba auriferous deposit.
viii
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1.2 - Mapa geológico simplificado do Cráton São Luís e do Cinturão Gurupi. A
geologia do polígono que contém a vila de Aurizona é detalhada na Figura 1.3...................... 4
Figura 1.3 - Mapa geológico da Folha Cândido Mendes, na porção central do Fragmento
Cratônico São Luís. (As unidades Diabásio Laranjal e as Formações Superficiais Intempéricas
não estão representadas). A Suíte Tracuateua aflora a oeste desta área (vide Fig. 1.2)........... 12
Figura 1.4 – Sumário das idades de cristalização (barras brancas) e idades modelo Sm-Nd
(barras pretas) dos eventos magmáticos reconhecidos no Fragmento Cratônico São Luís..... 14
Figura 1.5 – Modelo evolutivo esquemático para as rochas do Fragmento Cratônico São Luís
e borda retrabalhada do Cinturão do Gurupi.............................................................................15
Figura 1.6 – Mapa geológico simplificado da porção norte do Fragmento Cratônico São Luís
e localização dos depósitos e ocorrências minerais da região, incluindo Piaba. ..................... 17
Figura 2.1 – Localização do depósito Piaba e demais jazimentos auríferos, em relação à falha
Piaba......................................................................................................................................... 22
Figura 2.2 – geológica do depósito Piaba, mostrando a localização de furos de sonda e seus
teores médios............................................................................................................................ 23
Figura 2.4 – Fotomicrografias da rocha hospedeira, com porção menos alterada (A) com
textura granofírica preservada presente em algumas amostras (B e D); em (C) ilmenita em
treliça.........................................................................................................................................25
ix
Figura 2.5 – (A) Testemunho de sondagem de possível andesito basáltico muito alterado,
recortado por fraturas preenchidas por material carbonoso (a porção brilhante no centro da
foto é reflexo do flash da câmera fotográfica). (B) Rocha laminada, possível tufito.............. 26
Figura 2.6 – Exemplos da silicificação no depósito Piaba. (A) Veio de quartzo leitoso com
aglomerado de pirita grossa. (B) Veio centimétrico cortando zona sulfetada. (C) Bolsões de
quartzo em rocha alterada fina. (D) Veios e vênulas de quartzo em trama stockwork em
afloramento (Klein et al. 2008a). (E e F) Testemunhos de sondagem com veios de quartzo e
pirita; (G) vênula de quartzo com textura em pente e fratura preenchida por mica branca; (H)
veio de quartzo fraturado com cristais de pirita. qtz: quartzo – py: pirita – ms: mica branca
(sericita)....................................................................................................................................28
Figura 2.7 – Formas texturais dos sulfetos: (A) cristais de pirita aglomerados em veio de
quartzo; (B e C) preenchendo fraturas da rocha hospedeira; (D) cristais euédricos e subédricos
de pirita disseminados e em fratura; (E) pirita substituindo ilmenita; e (F) cristais compostos
de calcopirita e pirita disseminados na rocha hospedeira, juntamente com ilmenita.
Abreviaturas: qtz: quartzo – py: pirita – ccp: calcopirita; ilm: ilmenita.................................. 30
Figura 2.9 – Fotomicrografias sob luz refletida NC// mostrando a associação mineral pirita
(py), carbonato (cb) e ouro (Au).............................................................................................. 32
Figura 2.10 – Imagem de elétrons retroespalhados mostrando grande grão de pirita com
disseminações de ouro (Tabela 1) e três grãos de ouro (branco). 1 – Pirita; 2 – Pirita; 3 –
Calcopirita e 4 – Ouro ............................................................................................................. 33
Figura 4.1 - A) Mapa de localização e (B) mapa geológico simplificado da porção norte do
Fragmento Cratônico São Luís com localização das principais ocorrências auríferas e do
depósito de Piaba .................................................................................................................... 42
x
Figura 4.2 – (A) Mapa geológico simplificado do depósito Piaba, com a locação do furo 204,
abordado neste estudo. (B) Seção geológica do depósito (localização na figura A) mostrando a
localização de furos de sonda e teores médios de interseções mineralizadas ......................... 44
Figura 4.3 – Testemunhos de sondagem e fotomicrografias das rochas hospedeiras. (A) Rocha
vulcânica cloritizada e (B) Granodiorito granofírico, com porção menos alterada, onde maclas
de feldspatos se encontram preservadas (C) e textura granofírica preservada em alguns pontos
em amostras brechadas (D). qtz: quartzo; fds: feldspato e ser: sericita .................................. 46
Figura 4.4 – Aspecto macroscópico do tufito (A) sem alteração hidrotermal e (B) com vênulas
de carbonato. Detalhe microscópico com sulfetos e carbonatos ocupando fraturas e espaços
entre as camadas (C e D). ccp: calcopirita; ilm: ilmenita; cb: carbonato; qtz: quartzo; py:
pirita ........................................................................................................................................ 47
Figura 4.6 – Imagens mostrando tipos de inclusões fluidas em veios de quartzo (A) com suas
diversas formas, tamanhos e modos de distribuição. Inclusões tipo I (D), tipo II (B, E e F) e
III (C) ...................................................................................................................................... 52
Figura 4.8 – Histogramas de frequência mostrando a relação das temperaturas de fusão (A) e
homogeneização (B) do CO2 em inclusões aquo-carbônicas .................................................. 54
Figura 4.9 – Histogramas de frequência mostrando relação e distribuição das inclusões aquo-
carbônicas. (A) temperaturas de homogeneização final e temperaturas de fusão do clatrato nas
IFs tipo I e II ............................................................................................................................ 54
Figura 4.12 – Diagrama mostrando a estimada condição de P-T para mineralização em Piaba.
A curva tracejada do solvus para os sistema CO2-H2O-NaCl (10 mol % CO2 e 6% NaCl) é de
Bowers e Helgeson (1983) ...................................................................................................... 59
Figura 4.13 – Diagrama T-ƒO2 mostrando a condição redox estimada para a mineralização
em Piaba em relação aos tampões sólidos e líquidos (referências em Ohmoto e Goldhaber
1997). Py = pirita, Po = pirrotita, H = hematita, M = magnetita ............................................. 59
xii
LISTA DE TABELAS
Tabela 2.1 – Resultados obtidos por análise pontual semi-quantitativa (MEV/EDS) ............ 33
Tabela 4.1. Composição das fases voláteis de inclusões Tipo I do depósito Piaba, com base
em análises microtermométricas e por microespectrometria Raman ...................................... 58
Tabela 4.2 – Relação dos depósitos auríferos do Fragmento Cratônico São Luís (Klein et al.
2005b*) ................................................................................................................................... 61
xiii
SUMÁRIO
DEDICATÓRIA ..................................................................................................................... iv
AGRADECIMENTOS ............................................................................................................ v
RESUMO ................................................................................................................................ vi
ABSTRACT ........................................................................................................................... vii
LISTA DE FIGURAS .......................................................................................................... viii
LISTA DE TABELAS .......................................................................................................... xii
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 1
1.1 LOCALIZAÇÃO E ACESSO À ÁREA DE ESTUDO ..................................................... 1
1.2 OBJETIVOS ....................................................................................................................... 2
1.3 ESTADO DA ARTE ........................................................................................................... 3
1.3.1 Contexto geotectônico .................................................................................................... 3
1.3.2 Litoestratigrafia do Fragmento Cratônico São Luís .................................................. 5
1.3.3 Aspectos estruturais do Fragmento Cratônico São Luís .......................................... 13
1.3.4 Evolução geológica do Fragmento Cratônico São Luís ............................................ 14
1.3.5 Metalogênese do ouro no Fragmento Cratônico São Luís ....................................... 16
1.3.5.1 Modelo metalogenético vigente .................................................................................. 21
2 DEPÓSITO PIABA ............................................................................................................ 22
2.1 ESTRUTURA ................................................................................................................... 22
2.2 ROCHAS HOSPEDEIRAS .............................................................................................. 24
2.3 ALTERAÇÃO HIDROTERMAL E MINERALIZAÇÃO ............................................... 27
3 METODOLOGIA .............................................................................................................. 34
3.1 PESQUISA BIBLIOGRÁFICA ........................................................................................ 34
3.2 MATERIAIS E MÉTODOS UTILIZADOS .................................................................... 34
3.3 PETROGRAFIA ............................................................................................................... 35
3.4 ESTUDO DE INCLUSÕES FLUIDAS ............................................................................ 35
3.4.1 Petrografia .................................................................................................................... 35
3.4.2 Microtermometria ........................................................................................................ 36
3.4.3 Microespectroscopia Raman ....................................................................................... 36
3.4.4 Redução, integração e interpretação dos dados ........................................................ 37
4 ARTIGO CIENTÍFICO .................................................................................................... 38
4.1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 40
4.2 CONTEXTO GEOTECTÔNICO ..................................................................................... 41
4.3 GEOLOGIA DO DEPÓSITO PIABA .............................................................................. 43
xiv
1 INTRODUÇÃO
O depósito Piaba está localizado na porção norte do Fragmento Cratônico São Luís,
nas adjacências da vila de Aurizona, município de Godofredo Viana-MA. O acesso rodoviário
à área, a partir de Belém, é feito pela rodovia BR316 até a localidade de Quatro Bocas no
Maranhão, a partir de onde, ruma-se para o norte pela rodovia MA206 até Luís Domingues e,
então, pela MA101 até Godofredo Viana (Fig. 1.1).
2
Figura 1.1 – Localização da vila de Aurizona no Município de Godofredo Viana - Maranhão, onde se localiza o
depósito Piaba e os principais acessos rodoviários à área.
1.2 OBJETIVOS
A área de estudo está localizada na província estrutural do Parnaíba (Hasui et al. 1984)
e se concentra na porção norte do Fragmento Cratônico São Luís, que é margeado ao sul e
sudoeste pelo Cinturão do Gurupi (Fig. 1.2). Esses dois domínios geotectônicos foram
definidos a partir de estudos geocronológicos baseados nos métodos Rb-Sr (idade
convencional) e K-Ar em minerais (Hurley et al. 1967; Almeida et al. 1976) que mostraram a
existência de dois domínios distintos, um com rochas paleoproterozoicas e outro com rochas
cujos sistemas isotópicos Rb-Sr e K-Ar refletem imposição de evento(s) no Neoproterozoico.
Os domínios foram definidos como Cráton São Luís e Cinturão Gurupi, respectivamente, por
Almeida et al. (1976). Posteriormente, considerando que São Luís é na verdade um fragmento
do Cráton Oeste Africano que permaneceu no continente Sul-americano após a quebra do
supercontinente Pangea (Torquato e Cordani, 1981; Lesquer et al. 1984; Klein & Moura
2008), passou a ser utilizada a denominação Fragmento Cratônico São Luís (Klein et al.
2008b; Vasquez et al. 2008).
O Fragmento Cratônico São Luís e o Cinturão Gurupi são limitados pela zona de
cisalhamento Tentugal (Hasui et al. 1984), além dos outros limites encobertos por
sedimentação fanerozoica (Fig.1.2). O Fragmento Cratônico São Luís é tido como parte de
um orógeno maior, predominantemente acrescionário, com evolução no Riaciano entre 2240 e
2056 Ma (Klein et al. 2008b), mas com uma fase colisional desenvolvida há 2100 Ma (Klein
et al. 2005a; Palheta et al. 2001).
O Cinturão do Gurupi corresponde a uma faixa alongada segundo a direção NW-SE,
com extensão aflorante aproximada de 160 km de comprimento e 50 km de largura, que
ocorre a sudoeste da zona de cisalhamento Tentugal. É um cinturão plutônico-metamórfico
composto por sequências metassedimentares e metavulcanossedimentares, gnaisses e várias
gerações de granitoides. Os litotipos presentes neste cinturão incluem unidades de
4
Figura 1.2 - Mapa geológico simplificado do Cráton São Luís e do Cinturão Gurupi. A geologia do polígono que
contém a vila de Aurizona é detalhada na Figura 1.3.
Fonte: Adaptado de (Pastana, 1995; Almeida et al. 2000; Klein et al. 2005c)
5
Grupo Aurizona
Formação Matará: segundo Klein et al. (2008a), são rochas vulcânicas básicas e ultrabásicas,
nas quais são verificados anfibolitos, metabasaltos, tremolita xisto e talco-tremolita xisto. São
rochas de coloração cinza-escura a preta, com porções esverdeadas frequentes, de granulação
fina e com xistosidade característica.
Os metabasaltos são xistos de matriz fina rica em actinolita e actinolita-tremolita. Essa
matriz possui manchas brancas compostas por clorita, epidoto, zoisita e em menor quantidade
sericita.
6
Granófiro Piaba
Para este granitóide foi determinada idade de 2214 ± 3 Ma (Klein et al. 2008a) pelo
método da evaporação de chumbo em zircão. Esta idade concorda com o seu caráter intrusivo
na sequência metavulcanossedimentar do Grupo Aurizona com idade de 2240 Ma.
Segundo Klein et al. (2008a), esta unidade (Fig. 1.3) corresponde às rochas vulcânicas
e subordinadamente vulcanoclásticas de composições ácidas, intermediárias e básicas. É
composta pelos seguintes litotipos: dacito pórfiro, andesito/basalto, tufo e brecha vulcânica.
Essas rochas possuem coloração variando do cinza claro ao cinza escuro e
macroscopicamente não estão deformadas.
Os dacitos possuem textura porfirítica, com fenocristais de quartzo e plagioclásio
dispersos em matriz quartzo-feldspática fina a microcristalina. Já os dacitos/andesitos
apresentam também fragmentos líticos ao lado de fenocristais de plagioclásio e, em menores
quantidades, de quartzo com formas cuspidadas.
Os tufos líticos e brechas são compostos por fragmentos angulosos de dacito
porfirítico e, subordinadamente, de tufo, em meio a uma matriz quartzo-feldspática rica em
clorita e calcita.
Para esta unidade foi determinada uma idade de 2164 ± 3 Ma, obtida pelo método da
evaporação de Pb em cristais de zircão (Klein et al. 2009). As rochas tholeiíticas andesíticas
são rochas cálcico-alcalina de médio e alto-K. Com base nos dados químicos e em isótopos de
Nd, Klein et al. (2009) interpretaram a unidade como formada em arco maduro ou margem
continental ativa a partir de protólitos juvenis com alguma contribuição de material
paleoproterozoico mais antigo.
De distribuição limitada (Fig. 1.3), foi definida por Klein et al. (2008a) e é composta
por rochas vulcânicas ácidas que formam predominantemente derrames e, em menor
quantidade, depósitos vulcanoclásticos. Ocorrem como rochas maciças, mas pontualmente
mostram estruturas de fluxo sub-horizontais, que são realçadas nas porções mais
intemperizadas. Fraturas e zonas de cisalhamento rúptil são bastante comuns nos
afloramentos.
São rochas de coloração cinza-escura, com tonalidades esverdeadas a azuladas e
texturalmente são porfiríticas. Com base na composição dos fenocristais, essas rochas foram
classificadas como riolitos e dacitos, além de tufos dacíticos.
Dados geocronológicos obtidos em zircão de dacito pórfiro desta formação,
forneceram idade de cristalização de 2160 ± 7 Ma e os dados de isótopos de Nd indicam
protólitos paleoproterozoicos com mínima contribuição arqueana na geração dos magmas da
unidade (Klein et al. 2009). Os mesmos autores determinaram uma assinatura química
cálcico-alcalina metaluminosa de médio-K e interpretaram o ambiente tectônico de formação
como sendo margem continental.
A Suíte Intrusiva Tracuateua (Lowell, 1985; Costa, 2000; Palheta, 2001) aflora em
pequena janela entre coberturas fanerozoicas na porção oeste do Fragmento Cratônico São
Luís (Fig. 1.2). Consiste em sienogranitos e monzogranitos de granulação variada e seriada,
maciços a foliados quando cortados por zonas de cisalhamento. São constituídos por quartzo,
microclínio, plagioclásio, muscovita e biotita, tendo minerais opacos, zircão, apatita, rutilo e
granada como fases acessórias. Os granitoides apresentam enclaves de xistos, gnaisses e
migmatitos e são cortados por aplitos e pegmatitos com quartzo, muscovita, albita, turmalina,
berilo e molibdenita (Lowell, 1985).
10
Corresponde a dois corpos graníticos (Fig. 1.3) com rochas de coloração rósea a
acinzentada, textura porfirítica e granulação média a grossa que eram, anteriormente,
englobados no Granito Areal, mas que apresentam características petrográficas, assinatura
geoquímica e idades entre 2056 e 2076 Ma (Klein et al. 2008b) distintas da Suíte Intrusiva
Tromaí.
A composição monzogranítica é predominante, também ocorrendo a sienogranítica e
quartzo-monzonítica. Os minerais essenciais são: feldspato alcalino (30-45%), plagioclásio
(25-35%) e quartzo (20-25%). A biotita e o anfibólio são os máficos mais abundantes, ambos
em quantidades inferiores a 10%.
O Granito Negra Velha apresenta assinatura fortemente evoluída, alcalina, com
enriquecimentos em Rb-Ba-Sr que lembram as associações shoshoníticas, o que, juntamente
com a idade, levou Klein et al. (2008b) a interpretar a unidade como pós-orogênica.
Unidades Fanerozoicas
Figura 1.3 - Mapa geológico da Folha Cândido Mendes, na porção central do Fragmento Cratônico São Luís. (As unidades Diabásio Laranjal e as Formações Superficiais
Intempéricas não estão representadas). A Suíte Tracuateua aflora a oeste desta área (vide Fig. 1.2).
Fonte: Adaptado de (Klein et al. 2008a).
13
A região exposta do Fragmento Cratônico São Luís é uma área na qual as feições
estruturais não estão bem evidentes, assim como não possuem domínios bem estruturados,
quando comparados ao Cinturão Gurupi, que possui forte orientação estrutural e dos corpos
litológicos (Figs. 1.2 e 1.3). No entanto estruturas com direções principais NE-SW e NW-SE
são razoavelmente bem marcadas tanto em caráter rúptil quanto dúctil (Pastana 1995, Klein et
al. 2008a).
Segundo Klein et al. (2008a), essas estruturas são representadas principalmente pela
xistosidade, que ocorre na maior parte das rochas metavulcanossedimentares, foliações
miloníticas e lineações de estiramento associadas às zonas de cisalhamento dúctil-rúptil de
pequeno porte, bandamentos ígneos, falhas e fraturas diversas.
Nas rochas do Grupo Aurizona, por exemplo, a xistosidade tem direção dominante
NW-SE com mergulhos variando de 30º a 70º para NE e SW, com variação para NE-SW,
também com mergulhos variáveis para os quadrantes NW e SE. Estas últimas são bem
evidenciadas pela falha Piaba. Esta falha corta as rochas do Grupo Aurizona e o Granófiro
Piaba, com direção principal N70°E, passando pelos depósitos auríferos Piaba e Tatajuba. De
acordo com a Mineração Aurizona S/A (1995), esta estrutura desenvolveu uma movimentação
sinistral e sua direção principal é cortada por pequenas estruturas rúpteis oblíquas de
orientação NNW-SSE.
Outro lineamento importante é a zona de cisalhamento Caxias com atitude dominante
N15-25ºE; 75ºSE e aproximadamente 12 km de extensão, desde o Garimpo Areal, até o
Garimpo Pedra de Fogo. Esta estrutura geológica possui uma idade máxima estimada de 1985
± 4 Ma (Klein et al. 2002), visto que provocou modificações no Microtonalito Caxias.
14
Estudos recentes a respeito do Fragmento Cratônico São Luís mostram, com base em
associações de rocha, dados geoquímicos, isotópicos e geocronológicos, que sua evolução
ocorreu a partir de movimentações tectônicas com a geração de bacias oceânicas, zonas de
subducção, arcos de ilhas e possível colisão continental ocorridas no Riaciano, mais ou menos
entre 2260 e 2056 Ma (Klein et al. 2005a, 2005b, 2008b, 2009). Segundo estes autores, vários
estágios magmáticos marcam as diferentes fases evolutivas dessa evolução, conforme sumário
da Figura 1.4. Num estágio inicial, precoce, anterior a 2260 Ma, após abertura de bacia
oceânica (ou margem continental) arcos de ilha teriam se formado, o que é materializado pela
sequência metavulcanossedimentar do Grupo Aurizona, de 2240 Ma. Após essa fase, grandes
massas de granitoides cálcico-alcalinos juvenis (Suíte Intrusiva Tromaí, 2167 a 2147 Ma)
formaram-se em resposta à subducção de placa oceânica, provavelmente em ambiente
intraoceânico. A esse estágio principal de arco, associam-se rochas vulcânicas félsicas a
intermediárias da Unidade Vulcânica Serra do Jacaré (2164 Ma) e félsicas da Formação Rio
Diamante (2160 Ma), já denunciando possível transição para sistema de arco maduro ou arco
continental. Esses eventos magmáticos caracterizam a fase acrescionária da orogenia riaciana.
O próximo estágio magmático identificado é o peraluminoso, materializado nos
granitos com duas micas da Suíte Tracuateua (~2100 Ma), que indica possível fase colisional.
Por fim, um estágio pós-orogênico/pós-colisional se reflete na intrusão do Granito Negra
Velha e extrusão das rochas vulcânicas félsicas da unidade Rosilha, ambas com características
crustais, entre 2056 e 2076 Ma (Fig. 1.5).
Rochas vulcânicas
magmatismo
félsicas Rosilha tardi- a pós-
orogênico
Granito Negra Velha
magmatismo
Suíte Tracuateua peraluminoso
colisional
Vulcânicas Serra do magmatismo
Jacaré e Rio Diamante cálcico-alcalino
(e tholeiitico)
Suíte Tromaí de arco
2500 2450 2400 2350 2300 2250 2200 2150 2100 2050 2000 1950
idade (Ma)
Figura 1.4 – Sumário das idades de cristalização (barras brancas) e idades modelo Sm-Nd (barras pretas) dos
eventos magmáticos reconhecidos no Fragmento Cratônico São Luís.
Fonte: Adaptado de (Klein et al. 2008b).
15
Figura 1.5 – Modelo evolutivo esquemático para as rochas do Fragmento Cratônico São Luís e borda
retrabalhada do Cinturão do Gurupi.
Fonte: Adaptado de (Klein et al. 2005a, 2008a).
16
Ocorrências auríferas são conhecidas no Fragmento Cratônico São Luís desde o século
XVII. Desde aquela época, a região é foco de garimpagem nas ocorrências aluvionares e
supergênicas e, mais recentemente, no final do século 20, porções oxidadas e até frescas do
minério primário passaram a ser explotadas de forma rudimentar. Também trabalhos
exploratórios de companhias de mineração permitiram a descoberta de alguns depósitos (ou
transformação de ocorrências em depósitos, pelo maior conhecimento das características
geológicas e aspectos econômicos dessas ocorrências), como Piaba e Tatajuba, melhoria no
conhecimento de alguns garimpos, como Areal, e geração de novos prospectos, como Ônix.
No total, cerca de quatro dezenas de jazimentos são conhecidas (Klein et al. 2008a; Luna
Gold, 2012).
Algumas dezenas de jazimentos foram cadastrados por Klein et al. (2008a) (Fig. 1.6).
Alguns possuem características similares no que diz respeito ao seu modo de ocorrência e
rochas hospedeiras. Estes depósitos ocorrem hospedados nas rochas paleoproterozoicas da
Suíte Intrusiva Tromaí e, principalmente, nas rochas do Grupo Aurizona, em que se têm como
principais exemplos os seguintes depósitos.
Depósito Piaba
Corresponde ao mais importante depósito de ouro na região (Fig. 1.6). Tornou-se mina
em 2010 e atualmente o minério está sendo lavrado a céu aberto. As reservas totalizam 52,6 t
de Au contido, sendo 22,6 t de Au as reservas provadas e prováveis (Lopes 2000, Mach et al.
2010, Luna Gold, 2012). Sendo este depósito o objeto deste trabalho, seu detalhamento
ocorrerá mais abaixo, no Capítulo 2.
Depósito Tatajuba
Figura 1.6 – Mapa geológico simplificado da porção norte do Fragmento Cratônico São Luís e localização dos
depósitos e ocorrências minerais da região, incluindo Piaba.
Fonte: Klein et al. (2008a).
18
Garimpo Caxias
Assim como o depósito Piaba, o garimpo Caxias (Fig. 1.6) possui elevada importância
na região, pois é lavrado pela atividade garimpeira há quase um século. A porção supergênica
está associada a um platô laterítico, com aproximadamente 30 m de espessura.
A atividade garimpeira secular revelou a zona onde se pode observar estrutura dúctil-
rúptil destral, de atitude N15ºE/75ºSE, que hospeda o minério primário e corta o
Microtonalito Caxias, xistos máficos e pelitos do Grupo Aurizona. Ao longo desta estrutura,
hospedam-se veios e vênulas de quartzo, em zonas altamente hidrotermalizadas com efeitos
de cloritização, sulfetação (pirita e esfalerita) e subordinadas sericitização e carbonatação.
O ouro ocorre disseminado nas rochas alteradas, associado a sulfetos (pirita e
esfalerita) e clorita, e no estado livre em veios de quartzo leitoso. Teores de ouro nesses veios
variam entre 3 e 369 ppb, localmente atingindo 2000 ppb. As e Sb são elementos químicos
associados, embora em baixos teores, enquanto que altos valores de Ni, Co, V e Cr estão
relacionados a teores maiores de Au e As, quando o minério está hospedado em xistos
máficos (Klein et al. 2002).
Estudos de inclusões fluidas realizados por Klein et al. (2000) mostraram a presença
de três tipos principais de inclusões em cristais de quartzo. São inclusões carbônicas (tipo I),
aquo-carbônicas (tipo II) e aquosas (tipo III), dentre estas, as dos tipos I e II são as mais
representativas e consideradas como inclusões primárias.
Os resultados microtermométricos revelaram temperaturas de fusão do CO2, em
grande parte próximo ao ponto tríplice (-56,6ºC), com poucos resultados abaixo de -57,5ºC. A
homogeneização da fase carbônica, sempre para o estado líquido, ocorre entre -3,2 e 27,7ºC e
7,9 e 30,9ºC para inclusões dos tipos I e II, respectivamente. Nas inclusões do tipo II a fusão
do clatrato ficou em torno de 7,5ºC, com pequenas variações próximas a este valor. Os
valores de densidades se situam entre 0,7 e 1,0 g/cm3 e a salinidade média é de 4,5% em peso
19
Garimpo Areal
Pedra de Fogo (Fig. 1.6) é um pequeno garimpo com atividade intermitente que ocorre
em área de poucos afloramentos de rochas do Grupo Aurizona, como xistos, rochas
piroclásticas, rochas metavulcânicas, metarenitos e quartzitos. A xistosidade impressa nos
xistos é orientada segundo N15º-75ºW/50º-70ºNE (Klein & Fuzikawa, 2005).
O minério aflorante consiste em veios de quartzo leitoso aurífero com 20 a 50 cm de
espessura, subvertical e orientado segundo N45ºW, margeado por estreita faixa de alteração
potássica. As rochas hospedeiras dos veios mineralizados são aglomerado vulcânico e
metadacito, ambos foliados, com vênulas submilimétricas e disseminações de pirita,
calcopirita e magnetita (Klein & Fuzikawa, 2005). Análises geoquímicas em veios de quartzo
mineralizados mostraram associação entre ouro e arsênio (Klein et al. 2005d).
Estudos de inclusões fluidas realizados no referido depósito revelaram a presença de
quatro tipos principais. 1 – Inclusões monofásicas carbônicas; 2 – bifásicas aquo-carbônicas
(CO2-H2O-sais), com salinidade < 15% em peso equivalente de NaCl e homogeneização final
entre 330º e 400ªC; 3 – bifásicas compostas por CH4±(N2)-H2O, com homogeneização final
entre 430º e 497ºC; 4 – bifásicas (H2O-sais) e bifásicas ± monofásicas subdividas em três
gerações com salinidade variável, todas com homogeneização final em temperaturas
inferiores às dos tipos portadores de CO2 e CH4 , que, segundo Klein & Fuzikawa (2005), não
possuem relação com a mineralização.
Dados obtidos a partir do estudo de isótopos estáveis mostraram valores de δ18O do
quartzo de +16,2 ‰, δ18D do fluido -70 ‰, δ13C no fluido -3,1 ‰ e δ34S em pirita -2,8 ‰
(Klein et al. 2005d). Além dos resultados microtermométricos e de isótopos estáveis, dados
obtidos com estudos de geotermômetro da clorita, que teve temperatura média de formação de
334 ± 8ºC (Klein & Fuzikawa, 2005), levaram Klein et al. (2005d) a atribuir uma fonte
metamórfica, em que o aprisionamento ocorreu sob condições de temperatura entre 330°-
380°C e pressões entre 1,2 e 3,5 kb, assumidas como o intervalo mais provável para a
deposição do ouro.
21
2 DEPÓSITO PIABA
2.1 ESTRUTURA
Figura 2.1 – Localização do depósito Piaba e demais jazimentos auríferos, em relação à falha Piaba.
Fonte: Luna Gold, 2012.
Figura 2.2 – Seção geológica do depósito Piaba, mostrando a localização de furos de sonda e seus teores médios.
Fonte: Modificado de (Luna Gold, 2009).
Figura 2.3 – Fragmentos de testemunhos de sondagem da rocha hospedeira menos alterada (A) e porção cinza
com presença de sulfetos (B).
preservados já mostram pequenas lamelas de sericita, sendo este um dos principais minerais
de alteração dessa rocha. Pirita é mineral comum de alteração hidrotermal e a ilmenita se
apresenta nas amostras menos alteradas com sua textura em treliça (Fig. 2.4 C). Os dados
texturais e a composição mineralógica indicam tratar-se de um granodiorito fino. Entretanto,
na maioria dos casos, as amostras encontram-se muito alteradas ao ponto de não ser possível a
distinção entre feldspato alcalino e plagioclásio (Fig. 2.4 B), não permitindo a sua
classificação petrográfica.
Figura 2.4 – Fotomicrografias da rocha hospedeira, com porção menos alterada (A) com textura granofírica
preservada presente em algumas amostras (B e D); em (C) ilmenita em treliça.
(clorita), indicam tratar-se de dacito ou andesito. Análise química em rocha total, baseada em
elementos traços imóveis, mostrou que são andesitos basálticos (E.L. Klein, dados inéditos,
comunicação verbal).
Figura 2.5 – (A) Testemunho de sondagem de possível andesito basáltico muito alterado, recortado por fraturas
preenchidas por material carbonoso (A porção brilhante no centro da foto é reflexo do flash da câmera
fotográfica). (B) Rocha laminada, possível tufito.
A terceira rocha ocorre na parte mais profunda da seção estudada e está apenas
fracamente mineralizada. Possui coloração cinza clara, estrutura caracterizada por alternância
de lâminas finas e muito finas (Fig. 2.5 B), localmente perturbadas por pequenas fraturas
preenchidas por quartzo e sulfetos e até carbonato (Fig. 4.4 B no artigo científico – Capítulo
4).
Microscopicamente, a rocha é composta por porções formadas essencialmente por
quartzo microcristalino, situados em meio a camadas de uma rocha foliada, muito fina,
formada por plagioclásio, clorita, sericita e raro quartzo.
Carbonato ocorre disseminado, em finos leitos paralelos à estratificação e em vênulas
discordantes. As vênulas contêm, além de carbonato, quartzo, clorita, turmalina marrom,
pirita e calcopirita (Fig. 4.4 C, no artigo científico). Além dos minerais citados acima, uma
poeira escura, talvez de material carbonoso, impregna a rocha. O caráter extremamente fino
da rocha também dificulta sua correta classificação, mas o nível de quartzo pode ser
interpretado como chert ou pode ser um tufito depositado em ambiente subaquoso, que se
misturou com material epiclástico.
27
- Silicificação
Dentre os diversos tipos de alteração, a silicificação é mais volumosa e evidente no
depósito. É representada por veios e vênulas de quartzo (Fig. 2.6 A e B), que são os principais
hospedeiros de grande parte do minério, e por bolsões milimétricos a centimétricos (Fig. 2.6
C). Os veios possuem espessuras que variam de milimétricas (vênulas) a centimétricas,
atingindo até 4 cm. Em muitos locais são orientados em várias direções, formando stockworks
(Fig. 2.6 D). A ocorrência de veios mais espessos (5-15 cm) com ouro visível foi mostrada
por Klein et al. (2008a).
Na apreciação microscópica, os cristais de quartzo estão geralmente associados a
preenchimento de fraturas na rocha hospedeira, possuem formas anédricas e subédricas, são
pouco a moderadamente fraturados e associados com sulfetos (Fig. 2.6 E e F) e são levemente
deformados, com alguma extinção ondulante. É possível que haja distintas gerações de
quartzo ou, pelo menos, que a precipitação do quartzo de deu de forma sequencial, pois há
cruzamento entre algumas vênulas (Fig. 2.6 E). Essas possíveis gerações diferem
principalmente pelas formas dos cristais, ora anédricos preenchendo fraturas milimétricas, ora
subédricos em veios mais espessos. Diferem também pelas relações de cruzamento das
gerações de veios e vênulas. Localmente, vênulas de quartzo mostram textura em pente (Fig.
2.6 G), indicando, possivelmente, formação em condições não muito profundas (Dowling e
Morrison, 1989), o que será discutido juntamente com os dados de inclusões fluidas (vide
capítulo 4).
28
Figura 2.6 – Exemplos da silicificação no depósito Piaba. (A) Veio de quartzo leitoso com aglomerado de pirita
grossa. (B) Veio centimétrico cortando zona sulfetada. (C) Bolsões de quartzo em rocha alterada fina. (D) Veios
e vênulas de quartzo em trama stockwork em afloramento (Klein et al. 2008a). (E e F) Testemunhos de
sondagem com veios de quartzo e pirita; (G) vênula de quartzo com textura em pente e fratura preenchida por
mica branca; (H) veio de quartzo fraturado com cristais de pirita. qtz: quartzo – py: pirita – ms: mica branca
(sericita).
29
- Sulfetação
Este tipo de alteração é observado ao longo de todo perfil estudado, porém com
diferentes quantidades e formas de ocorrência. O principal sulfeto é a pirita e,
minoritariamente, ocorre a calcopirita. A pirita ocorre predominantemente na forma de
agregados preenchendo fraturas em veios de quartzo e ocupam em média 3% destes veios
(Figs. 2.7 A e B). Outro modo de ocorrência se dá na forma de disseminação na rocha
hospedeira, onde atinge até 2% do volume total da rocha (Figs. 2.7 D, E e F).
Ao microscópio, sob luz refletida, os cristais de pirita se mostram em formas
subédricas e euédricas (Fig. 2.7 C e D) e ocorrem, também, substituindo a ilmenita e
intercrescidos com calcopirita na parte mais profunda da seção estudada (Fig. 2.7 E).
Em pequenas quantidades, a calcopirita foi observada em associação com pirita,
carbonato, quartzo e ouro (Fig. 2.10). Nos níveis mais profundos do perfil estudado há um
aumento no percentual de calcopirita, onde a mesma deixa de ocorrer como pequenas
inclusões em cristais de pirita e ilmenita, e passa a se apresentar principalmente na forma
disseminada e intercrescida com pirita e ilmenita na rocha hospedeira (Fig. 2.7 F).
- Sericitização e Cloritização
Mica branca (sericita) e clorita são minerais que ocorrem na maioria das vezes em
associação. Estes minerais de alteração são observados lado a lado, e são responsáveis pelos
tons em cinza e esverdeado que as rochas hospedeiras apresentam. Os tons em cinza estão em
menores quantidades em relação aos tons esverdeados, correspondem às porções da rocha em
que a sericita é dominante, e também ocorrem nas porções menos alteradas e deformadas da
seção (Fig. 2.8 A). Por outro lado, a cloritização é o tipo de alteração hidrotermal mais
volumosa em profundidades mais rasas, que estão relacionas às áreas mais fraturadas e com
maiores teores de sulfetos (pirita) do depósito. Esta elevada quantidade de clorita em várias
porções da rocha alterada é bem mostrada pela coloração esverdeada na mesma (Fig. 2.8 B).
Microscopicamente, a clorita se encontra principalmente nas formas disseminadas e em
lamelas orientadas bordejando cristais de pirita, ilmenita e veios de quartzo, e também como
materiais de preenchimentos de fraturas em espaços intergranulares na rocha hospedeira (Fig.
2.8 D, E e F). Este mineral perfaz em média 6% da rocha hospedeira alterada. Já a sericita é
observada, na maioria das vezes, como mineral de substituição do feldspato e em menores
proporções é vista em microbandas de cisalhamento e no preenchimento de fraturas
juntamente com quartzo, clorita e pirita (Fig. 2.8 C, E e F).
30
Figura 2.7 – Formas texturais dos sulfetos: (A) cristais de pirita aglomerados em veio de quartzo; (B e C)
preenchendo fraturas da rocha hospedeira; (D) cristais euédricos e subédricos de pirita disseminados e em
fratura; (E) pirita substituindo ilmenita; e (F) cristais compostos de calcopirita e pirita disseminados na rocha
hospedeira, juntamente com ilmenita. Abreviaturas: qtz: quartzo – py: pirita – ccp: calcopirita; ilm: ilmenita.
31
Figura 2.8 – Amostras de mão (A e B) e Fotomicrografias (C-F) mostrando produtos e aspectos texturais
provocados pela alteração sofrida pelas rochas hospedeiras. (A e C) granodiorito granofírico com forte
sericitização; (B) cloritização, tons esverdeados; (D, E e F) ocorrência lado a lado de grãos de clorita, sericita e
pirita em porção alterada py – pirita, qtz – quarto, cl – clorita e ms – mica branca (sericita).
Além de clorita e sericita, outros minerais micáceos como a paragonita, chamosita, flogopita e
vermiculita foram identificados pelo método da difração de raios-X, mas em quantidades
traço.
32
- Carbonatação
A precipitação de calcita é comumente associada com a presença de sulfetos.
Localmente, a calcita substitui a pirita e está espacialmente associada com a precipitação de
ouro (Fig. 2.9 A).
Na parte mais profunda do depósito, o carbonato ocorre de duas maneiras: (1) como
disseminações no tufito e (2) vênulas de carbonato-quartzo-sulfeto-clorita-turmalina paralelas
à, ou cortando a laminação do tufito fracamente mineralizado (Fig. 4.4B – vide capítulo 4).
- Ouro
Segundo Luna Gold (2009), o minério com maiores teores está contido em veios de
quartzo nas partes mais rasas do depósito Piaba (Fig. 2.9 e Tabela 2.1). Com as observações
microscópicas efetuadas neste estudo, pôde-se constatar que a principal associação mineral
com o ouro é composta por quartzo + pirita + carbonato. O ouro é observado em associação
com pirita e carbonato (Fig. 2.9) e é muito provável que a precipitação do ouro esteja
relacionada com a carbonatação. Como alternativa, a carbonatação seria tardia e substituiria a
pirita, sem afetar, obviamente, as partículas de ouro.
Poucas análises semi-quantitativas por MEV (microscopia eletrônica de varredura) e
EDS (espectroscopia por energia dispersiva) foram efetuadas de modo a investigar a presença
de outros elementos metálicos associados ao ouro e verificar a presença, ou não, de ouro nos
sulfetos (Fig. 2.10). As análises pontuais nos grãos de pirita confirmaram a existência de
quantidades traços de Au (1,6 a 2,5%) nesses grãos (Tabela 2.1). Em associação com a pirita,
partículas de ouro revelaram teores inferiores a 5% de Ag, Bi e Pb (Tabela 2.1).
Figura 2.9 – Fotomicrografias sob luz refletida NC// mostrando a associação mineral pirita (py), carbonato (cb) e
ouro (Au).
33
Figura 2.10 – Imagem de elétrons retroespalhados mostrando grande grão de pirita com disseminações de ouro
(Tabela 1) e três grãos de ouro (branco). 1 – Pirita; 2 – Pirita; 3 – Calcopirita e 4 – Ouro.
34
3 METODOLOGIA
Esta fase do trabalho se primou pela pesquisa e leitura de obras que discorrem sobre
estudos metalogenéticos de depósitos auríferos em zonas de cisalhamento em geral, mas
pontualmente sobre as ocorrências do Fragmento Cratônico São Luís, onde o depósito
estudado se localiza. Além da metalogenia, também foi feito um levantamento bibliográfico
sobre geologia básica regional e local da área, de modo a entender as suas relações com o
depósito de Piaba. Também foram enfatizados estudos sobre os métodos analíticos aqui
empregados, como o estudo petrográfico e microtermométrico das inclusões fluidas e da
identificação das fases gasosas, por meio da espectroscopia microRaman.
A área enfocada foi fortemente afetada por intemperismo laterítico, de modo que
afloramentos são raros na região. Por esse motivo, apenas testemunhos de sondagem efetuada
em zona mineralizada e cedidos pela empresa proprietária dos direitos minerários do depósito
(Luna Gold), contendo somente rochas não intemperizadas, foram utilizados no trabalho. Os
materiais analisados foram retirados de testemunhos relativos ao furo de sonda BRAZ-D-204,
que cobre o minério primário aproximadamente entre 99 m e 170 m de profundidade. A partir
destes, foram confeccionadas seções polidas e bipolidas usadas, respectivamente, para estudos
petrográficos e de inclusões fluidas.
35
3.3 PETROGRAFIA
3.4.1 Petrografia
hospedeiro foi avaliado, para observação da forma e dimensão dos cristais e, principalmente,
de seus aspectos deformacionais, como presença ou não de extinção ondulante, lamelas de
deformação e formação de subgrãos. As inclusões fluidas foram então identificadas e
descritas quanto às seguintes características: número (e, quando possível, tipo – líquido, gás,
vapor, sólido) de fases presentes em temperatura ambiente e sob leve resfriamento,
frequência, morfologia, dimensões, e suas possíveis relações temporais em relação ao cristal
hospedeiro (associação ou não com fraturas, posição relativa ao cristal etc.) e também entre os
diferentes tipos.
3.4.2 Microtermometria
fatores de quantificação relativos aos perfis de espalhamento Raman, de 1,21 para CO2, 8,7
para CH4 e 1 para N2 (Burke, 2001), que consiste na comparação entre as áreas dos picos
(intensidades integradas), por meio da equação (modificada):
Xa= (Aa/Fa) / (Ai/Fi) (1)
onde Xa, Aa e Fa, são respectivamente, fração molar, área do pico e fator de quantificação do
componente a; Ai e Fi são, respectivamente, área do pico e fator de quantificação para todos
os componentes presentes; Ʃ é a soma.
4 ARTIGO CIENTÍFICO:
SANEY C. F. DE FREITAS
Programa de Pós-Graduação em Geologia e Geoquímica – Universidade Federal do Pará
(UFPA)
Caixa postal 8608. Belém-PA. CEP: 66075-110
saney.freitas@vale.com
EVANDRO L. KLEIN
CPRM/Serviço Geológico do Brasil. Av. Dr. Freitas, 3645, Belém-PA, CEP: 66095-110
Programa de Pós-Graduação em Geologia e Geoquímica – Universidade Federal do Pará
(UFPA)
evandro.klein@cprm.gov.br
ABSTRACT THE MINERALIZING FLUID IN THE PIABA GOLD DEPOSIT, SÃO LUÍS
CRATONIC FRAGMENT (NW-MARANHÃO), BASED ON FLUID INCLUSION STUDIES
OF QUARTZ
Piaba is the first gold mine to operate in the São Luís Cratonic Fragment, NW-Maranhão,
northern Brazil. The geological setting comprises chiefly metavolcano-sedimentary sequences
(Aurizona Group) and subduction-related granitoids (Tromaí Intrusive Suite), formed in
island arc between 2240 and 2150 Ma. Gold mineralization is hosted in a fine-grained
granophyric granodiorite (Piaba Granophyre) and in a subvolcanic andesite of the Aurizona
Group. The mineralized zone is limited by an ENE-WSW-trending brittle-ductile shear zone
and consists of quartz veins and veinlets and accompanying hydrothermal haloes (chlorite +
muscovite + carbonate + pyrite + chalcopyrite + gold) disposed in a stockwork geometry.
Petrographyc, microthermometric and microRaman studies of quartz have defined two- and
three-phase aqueous-carbonic fluid inclusions produced by heterogeneous trapping during
phase separation, in addition to late aqueous fluids. The mineralizing low salinity (5.5 wt.%
39
RESUMO
O depósito aurífero de Piaba tornou-se a primeira mina em operação no Fragmento Cratônico
São Luís, noroeste do Maranhão. Seu ambiente geológico compreende rochas
metavulcanossedimentares do Grupo Aurizona e granitoides da Suíte Tromaí, entre outras
unidades menores, formadas em ambiente de arcos de ilhas entre 2240 e 2150 Ma. A
mineralização em Piaba se hospedou em um granodiorito granofírico fino (Granófiro Piaba) e
em rocha subvulcânica andesítica do Grupo Aurizona encaixadas em zona de cisalhamento
ENE-WSW rúptil-dúctil e é composta por uma trama stockwork de veios e vênulas de quartzo
com seus halos de alteração (clorita + muscovita + carbonato + pirita + calcopirita e ouro).
Estudos petrográficos, microtermométricos e por espectroscopia microRaman no quartzo
definiram inclusões aquo-carbônicas bifásicas e trifásicas, produzidas por aprisionamento
heterogêneo durante separação de fases, e fluidos aquosos tardios. O fluido aquo-carbônico,
responsável pela mineralização, é composto por CO2 (5 – 24 mol %, densidade de 0,96-0,99
g/cm3), H2O (74 – 93 mol%), N2 (≤1 mol%), CH4 (≤1mol%) e 5,5 % em peso NaCl
equivalente. O minério depositou a 267-302 ºC e 1,25-2,08 kbar, correspondendo a
profundidades de 4 a 7 km, em consonância com o regime estrutural. A composição e
intervalo de P-T do fluido mineralizador, combinadas com o caráter redutor (log ƒO2 -31,3 a -
34,3) e a sulfetação da rocha hospedeira, sugerem que o ouro foi transportado como um
complexo sulfetado. O minério foi depositado em consequência da separação de fase, redução
da atividade de enxofre e da ƒO2 pela interação fluido-rocha.
Palavras chave: inclusões fluidas, ouro, Cráton São Luís, metalogênese, CO2
40
4.1 INTRODUÇÃO
A área de estudo está localizada na porção norte do Fragmento Cratônico São Luís
(Fig. 4.1). Nesta área cratônica, as rochas mais antigas são representadas pelo Grupo Aurizona
(2240 ± 5 Ma, Klein & Moura, 2001), composto por uma sequência metavulcanossedimentar
constituída por xistos diversos, rochas metavulcânicas ácidas a básicas, filitos, quartzitos e
metachert (Pastana, 1995; Klein et al. 2005b). Dados geoquímicos e isotópicos levaram Klein
et al. (2009) a interpretar a sequência como relacionada a ambiente de arco de ilhas e/ou bacia
do tipo retroarco.
Esta sequência foi intrudida pelos granitóides (predominantemente tonalitos,
granodioritos e monzogranitos) da Suíte Intrusiva Tromaí. Esta suíte possui natureza cálcico-
alcalina, metaluminosa a fracamente peraluminosa, de baixo a alto K e assinatura isotópica
juvenil, interpretada como relacionada a arcos de ilha e formada entre 2168 ± 4 Ma e 2149 ± 4
Ma (Klein et al. 2005a, 2008a, 2008b). Unidades vulcânicas contemporâneas à Suíte Intrusiva
Tromaí e de menor expressão aflorante englobam basaltos tholeiíticos e andesitos cálcico-
alcalinos da unidade Serra do Jacaré e riolitos e dacitos cálcico-alcalinos da Formação Rio
Diamante, representantes de magmatismo de arco maturo a continental (Klein et al. 2009).
Outros granitóides afloram na porção oeste do fragmento cratônico e são atribuídos à Suíte
Intrusiva Tracuateua, constituída por granitos peraluminosos a duas micas, de 2080 ± 2 Ma a
2091 ± 5 Ma, interpretados como de natureza colisional (Costa, 2000; Palheta, 2001). As
unidades mais jovens do Fragmento Cratônico São Luís consistem no Granito Negra Velha,
shoshonítico, com idade entre 2076 e 2056 Ma (Klein et al. 2008b) e a Unidade Vulcânica
Rosilha, composta por dacitos e tufos formados em torno de 2068 Ma (Klein et al. 2009).
O Fragmento Cratônico São Luís é interpretado como parte de um orógeno riaciano
maior, que envolveria também o Cráton Oeste Africano (Klein & Moura, 2008). Sua evolução
envolveria uma fase acrescionária entre 2240 e 2140 Ma, materializada principalmente pelo
Grupo Aurizona e pela Suíte Intrusiva Tromaí, e uma fase colisional peraluminosa em torno
de 2100 Ma, representada pela Suíte Tracuateua. As unidades Negra Velha e Rosilha estariam
relacionadas a evento tardi a pós-orogênico (Klein et al. 2008b, 2009 e suas referências).
42
Figura 4.1 - (A) Mapa de localização e (B) mapa geológico simplificado da porção norte do Fragmento
Cratônico São Luís com localização das principais ocorrências auríferas e do depósito de Piaba.
Fonte: Adaptado de (Klein et al. 2008a).
43
A região em que se localiza o depósito Piaba foi fortemente afetada por intemperismo
laterítico, de modo que exposições de rocha são raras e informações geológicas são mais
facilmente obtidas por testemunhos de sondagem. Segundo a Mineração Aurizona (relatório
inédito 2000), na área do depósito ocorreria uma sequência metavulcanossedimentar (o Grupo
Aurizona, segundo Pastana, 1995 e Klein et al. (2008a) composta por xistos e metacherts
grafitosos, tufos, quartzo-sericita-clorita xistos e rochas máficas e ultramáficas. Essa
sequência seria intrudida por corpos de granófiro de granulação fina e composição tonalítica a
granodiorítica (Fig. 4.2 B). A essa suposta intrusão, Klein et al. (2008a) denominaram
informalmente de Granófiro Piaba, e determinaram sua idade de colocação em 2214 ± 3Ma
(evaporação de Pb em zircão). Essas rochas finas seriam as principais hospedeiras do minério
(Relatório inédito de Mineração Aurizona 2000). Em descrição mais recente, contudo, Mach
& Clarke (relatório inédito 2008) não fazem referência a esses corpos granofíricos, mas
interpretam as rochas hospedeiras como andesitos e basaltos.
O estilo principal da mineralização é do tipo stockwork, em que veios e vênulas de
quartzo concentram os maiores teores do minério e ocupam as porções mais fraturadas das
rochas hospedeiras. Outra forma de ocorrência, menos observada, apresenta-se disseminada e
associada a sulfetos localizados nos halos de alteração hidrotermal nas rochas hospedeiras. Os
corpos de minério, com ambas as formas de ocorrência do minério, estão contidos em uma
zona de cisalhamento rúptil (Falha Piaba – Fig. 4.1). Esta falha é subvertical, de direção N70E
e possui aproximadamente 300 m de largura (Fig. 4.2). Ainda de acordo com Mineração
Aurizona (relatório inédito 2000), a falha seria seccionada por estruturas rúpteis menores, de
orientação NNW-SSE, materializadas por veios de quartzo cisalhados, brechados e estéreis.
Em escala macroscópica a estruturação das rochas hospedeiras é de caráter rúptil,
geralmente apresentando fraturas de dimensões milimétricas a centimétricas, na maioria das
vezes com veios de sericita e quartzo mineralizados. Existem vários padrões de fraturas, mas
dentre esses padrões dois são bem marcantes. O primeiro é caracterizado por grupos de
fraturas verticalizadas ou de alto ângulo de mergulho, e o segundo se mostra com fraturas
sub-horizontais. Esses dois grupos ocorrem geralmente truncando uns aos outros.
Neste trabalho foram examinadas amostras de testemunhos de sondagem de zona
mineralizada, numa tentativa de melhor caracterizar as rochas hospedeiras. Fato é, entretanto,
44
Figura 4.2 – (A) Mapa geológico simplificado do depósito Piaba, com a locação do furo 204, abordado neste
estudo. (B) Seção geológica do depósito (localização na figura A) mostrando a localização de furos de sonda e
teores médios de interseções mineralizadas.
Fonte: Modificado de (Luna Gold, 2011).
45
O estudo microscópico feito nas porções menos alteradas dessa rocha permitiu
observar que os minerais essenciais são quartzo (25-35%), feldspato alcalino (25%) e
plagioclásio (40%), arranjados em textura granular alotriomórfica (Fig. 4.3 C e D).
Intercrescimento granofírico é também bem expressivo (Fig. 4.3 D), donde vem,
provavelmente, a denominação granófiro, empregada por Mineração Aurizona (relatório
inédito 2000). A ilmenita se apresenta nas amostras menos alteradas com sua textura em
treliça, enquanto apatita e zircão ocorrem como minerais acessórios. Os grãos de quartzo são
anédricos, pouco deformados, mas ocorrem localmente com extinção ondulante e na forma de
subgrãos. Possuem contatos curvos com os minerais adjacentes. Os cristais de feldspato são
subédricos e apresentam contos retos entre si; os cristais mais preservados já mostram
pequenas lamelas de sericita.
Levando-se em consideração os dados texturais e mineralógicos mais ou menos
preservados, e assumindo-se que sejam representativos do litotipo estudado, este pode ser
caracterizado como um granodiorito de granulação fina. Entretanto, na maioria dos casos, as
amostras se encontram muito alteradas ao ponto de não ser possível fazer a distinção entre
feldspato alcalino e plagioclásio (Fig. 4.3 B, C e D), não permitindo assim a sua correta
classificação petrográfica.
O segundo tipo de rocha está muito alterado hidrotermalmente. Possui coloração
verde, produzida por cloritização e possível alteração de feldspatos, e é recortado por fraturas
preenchidas por material escuro (Fig. 4.3 A), que corresponde a carbono amorfo. Ao
microscópio, quartzo e plagioclásio são visíveis, além de clorita, que provavelmente é produto
de alteração de mineral máfico. A granulação fina e a predominância de plagioclásio e quartzo
sugerem tratar-se de dacito ou andesito (vulcânico ou subvulcânico).
46
Figura 4.3 – Testemunhos de sondagem e fotomicrografias das rochas hospedeiras. (A) Rocha vulcânica
cloritizada e (B) Granodiorito granofírico, com porção menos alterada, onde maclas de feldspatos se encontram
preservadas (C) e textura granofírica preservada em alguns pontos em amostras brechadas (D). qtz: quartzo; fds:
feldspato e ser: sericita.
Figura 4.4 – Aspecto macroscópico do tufito (A) sem alteração hidrotermal e (B) com vênulas de carbonato.
Detalhe microscópico com sulfetos e carbonatos ocupando fraturas e espaços entre as camadas (C e D). ccp:
calcopirita; ilm: ilmenita; cb: carbonato; qtz: quartzo; py: pirita.
Figura 4.5 – Imagens macro e microscópicas mostrando forma, modo de ocorrência e associação mineral no
depósito de Piaba. (A e B) Veios de quartzo com sulfetos; (C e D) ouro em associação: Au + py + cb; (E e F)
Associação de alteração: sulfetação + cloritização. Au: ouro; qtz: quartzo; py: pirita; ms: muscovita; cl: clorita e
cb: carbonato.
50
O estudo de inclusões fluidas foi efetuado em cristais de quartzo das vênulas e veios
associados ao minério. A preparação das amostras e as análises microtermométricas foram
executadas tomando como orientação as recomendações de Roedder (1984) e Shepherd et al.
(1985). A petrografia e a microtermometria foram desenvolvidas, respectivamente, nos
laboratórios de petrografia e microtermometria no Instituto de Geociências da Universidade
Federal do Pará, em Belém. Uma platina modelo THMSG 600 da marca Linkham foi o
equipamento utilizado para o resfriamento e aquecimento. A calibração foi efetuada com
padrões sintéticos de CO2 puro (-56,6ºC) e água pura (0ºC). A precisão das medidas é
estimada em ± 0,3°C para temperaturas tomadas abaixo de 30ºC e ± 5ºC para aquelas acima
de 100ºC.
A microespectroscopia Raman foi utilizada com o objetivo de identificar a
composição das fases voláteis nas inclusões. Para isso, foi utilizado o espectrômeto XY Dilor
com multicanais da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em Belo Horizonte. A
fonte é um laser a argônio com comprimento de onda de 514,53 nm e potência de 700 mW.
As proporções molares foram calculadas usando a equação de Plackzek (equação 1) e os
fatores de quantificação relativos aos perfis de espalhamento Raman, de 1,21 para CO2, 8,7
para CH4 e 1 para N2 (Burke, 2001), que consiste na comparação entre as áreas dos picos
(intensidades integradas), com base na equação (modificada):
Xa= (Aa/Fa) / (Ai/Fi) (1)
onde Xa, Aa e Fa, são respectivamente, fração molar, área do pico e fator de quantificação do
componente a; Ai e Fi são, respectivamente, área do pico e fator de quantificação para todos
os componentes presentes; Ʃ é a soma.
Nos estudos foram utilizadas oito seções bipolidas (de um total de 16 seções
previamente avaliadas), cobrindo aproximadamente 68 m em profundidade da zona
mineralizada, e cerca de 380 inclusões fluidas foram examinadas microtermometricamente. A
redução dos dados e cálculos composicionais e de densidades, bem como pressão e
temperatura e determinação de isócoras foram efetuadas com auxílio do aplicativo Flincor
(Brown, 1989). As seguintes abreviaturas são utilizadas no texto, tabelas e figuras: TFCO2:
Temperatura de fusão do CO2; TFCLAT: Temperatura de fusão do clatrato; THP:
Temperatura de homogeneização parcial do CO2; THF: Temperatura de
51
Tipo IV – inclusões bifásicas, com fase líquida de tonalidade bastante clara, contendo
bolhas mais escuras (vapor). Possuem dimensões inferiores a 10 µm, estão geralmente
dispostas em trilhas, que na maioria das vezes bordejam microfraturas no quartzo. São
inclusões aquosas com grau de preenchimento em torno de 90-95%.
Figura 4.6 – Imagens mostrando tipos de inclusões fluidas em veios de quartzo (A) com suas diversas formas,
tamanhos e modos de distribuição. Inclusões tipo I (D), tipo II (B, E e F) e III (C).
53
CO2 600
1800
CO2 campo3 IF1 campo2 IF3
1600
500 N2 CH4
intensidade Raman(u.a.)
intensidade Raman(u.a.)
1400
1200
400
1000
800
CH4 300
600
400
200
200
1000 1500 2000 2500 3000 3500 1800 2000 2200 2400 2600 2800 3000 3200 3400 3600
número de onda (cm-1) número de onda (cm-1)
Figura 4.7 – Espectro obtido a partir de espectroscopia microRaman mostrando a presença de CH4 e N2 nas fases
voláteis das inclusões.
também entre 250 e 300 ºC (Fig. 4.9 B), ambas com homogeneização sempre no estado
líquido.
Figura 4.8 – Histogramas de frequência mostrando a relação das temperaturas de fusão (A) e homogeneização
(B) do CO2 em inclusões aquo-carbônicas.
Figura 4.9 – Histogramas de frequência mostrando relação e distribuição das inclusões aquo-carbônicas. (A)
temperaturas de homogeneização final e temperaturas de fusão do clatrato nas IFs tipo I e II.
55
Figura 4.10 - Histogramas de freqüência mostrando a distribuição e variações nas medidas microtermométricas
da fusão do eutético (A) e fusão do gelo (B), nas inclusões aquosas.
56
Composição, densidade e isócoras foram determinadas a partir dos dados obtidos pela
microtermometria e pela análise microRaman com a utilização do programa Flincor (Brown,
1989). Os cálculos foram feitos com uso da equação de Bowers & Helgeson (1983) para
fluidos aquo-carbônicos, que são os mais expressivos e os que mais provavelmente atuaram
no transporte e precipitação do minério.
Foram obtidos os seguintes valores composicionais: XCO2: 5 – 24 mol%, com
intervalo dominante de 10 – 20 mol%; XH2O: 74 – 93 mol%, com intervalo dominante de 80
– 90 mol%; XNaCl: 0 – 1 mol%; XN2: máximo de 1 mol% e XCH4: máximo de 1 mol%, estes
dois últimos na fase volátil das inclusões. As densidades de CO2 variaram de 0,63 a 0,88
g/cm3, com dominância entre 0,81 a 0,88 g/cm3; as densidades globais se distribuem no
intervalo de 0,82 – 1,00 g/cm3, com dominância no intervalo de 0,96 – 0,99 g/cm3. Para estas
inclusões, a salinidade média foi de 5,5 % peso NaCl equivalente.
No estudo petrográfico das inclusões fluidas foi possível identificar em alguns cristais
de quartzo feições deformacionais produzidas principalmente em regime rúptil-dúctil, tais
como fraturas, extinção ondulante, formação de subgrãos, as quais poderiam propiciar
mudanças significativas nas características físico-químicas originais das inclusões fluidas.
Procurou-se, portanto, analisar as inclusões em domínios microscópicos onde processos pós-
aprisionamentos não fossem intensos a ponto de modificar essas características, o que é
reforçado pelo gráfico THF x Salinidade (Fig. 4.11), que geralmente mostra casos em que
ocorreram estrangulamento e vazamento sob aquecimento (Shepherd et al. 1985). Além destas
observações, as inclusões que poderiam ou mostraram algum tipo de modificações pós-
aprisionamento foram descartadas no momento de compor os dados estatísticos deste
trabalho.
57
Figura 4.11 – Diagrama mostrando ausências de correlação entre temperatura de homogeneização final (THF) e
salinidade das inclusões aquo-carbônicas dos tipos I (Bifásicas) e II (Trifásicas).
Tabela 4.1. Composição das fases voláteis de inclusões Tipo I do depósito Piaba, com base em
análises microtermométricas e por microespectrometria Raman.
Amostra Tipo VCO2 TFCO2 THP TFCLAT THF CO2 CH4 N2
(%) (ºC) (ºC) (ºC) (ºC) (%) (%) (%)
1022 B - 1 I 30 -57,5 8,5 7,0 274 99 ≤1 -
4.5.4 P-T-ƒO2
Figura 4.12 – Diagrama mostrando a estimada condição de P-T para mineralização em Piaba. A curva tracejada
do solvus para os sistema CO2-H2O-NaCl (10 mol % CO2 e 6% NaCl) é de Bowers & Helgeson (1983).
Figura 4.13 – Diagrama T-ƒO2 mostrando a condição redox estimada para a mineralização em Piaba em relação
aos tampões sólidos e líquidos (referências em Ohmoto & Goldhaber 1997). Py = pirita, Po = pirrotita, H =
hematita, M = magnetita.
60
Tabela 4.2 – Relação dos depósitos auríferos do Fragmento Cratônico São Luís (Klein et al. 2005b*).
Comp. Pressão Temperatura
Depósito Ass. Mineral ƒO2
Fluidos (Kbar) ºC
Qtz + Cb + Cl +
CO2 + H2O + - 31.3 a -
Piaba Ser + Py + Ccp + 1,25 – 2,08 267 – 302
N2 + CH4 34,3
Au
Qtz +Cb + Cl +
CO2 + H2O + -29,8 a -
Areal* Ser + Sph + Ep + 1.6 – 3,7 262 – 307
N2 34,2
Py + Au
Qtz +Cb + Cl +
CO2 + H2O + -29,8 a -
Caxias* Ser + Sph + Ep + 2,4 – 4,6 262 – 307
N2 + CH4 34,2
Py + Au
Pedra de Qtz + Cl + Ser + CO2 + H2O +
2 n.d 330 - 400
Fogo* Py + As + Au N2 + CH4
Legendas: n.d = não determinado; Cb = carbonato; Cl = clorita; Ser = sericita; Ep = epidoto; Sph = esfalerita, Py
= pirita; Ccp = calcopirita e Au = ouro.
4.7 AGRADECIMENTOS
Este trabalho foi tornado possível pelo acesso aos testemunhos de sondagem do
depósito Piaba, gentilmente fornecidos pelo Dr. Titus Haggan (Luna Gold) e pelo apoio
financeiro do CNPq (Edital Universal, MCT/CNPq 14/2009, processo 481.189/2009-2). Dr.
Kazuo Fuzikawa (CDTN/CNEN) e Dra. Maria Sylvia Dantas (UFMG) são agradecidos pelo
apoio com as análises Raman. SCFF agradece ao CNPq pela bolsa de estudos durante o
desenvolvimento de dissertação de Mestrado. ELK agradece ao CNPq pela bolsa de
produtividade em pesquisa.
62
4.8 REFERÊNCIAS
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