04 - Gêneros Literários Do Antigo Testamento
04 - Gêneros Literários Do Antigo Testamento
04 - Gêneros Literários Do Antigo Testamento
TESTAMENTO1
por GARY LIGHT
1 O presente texto está contido em CARRO, Daniel; POE, José Tomas; ZORZOLI, Ruben. Comentario
Biblico Mundo Hispano, Tomo 9: Proverbios,, Eclesiastes e Cantares. El Paso, TX: Casa Bautista de
Publicaciones, 2005, pp. 8-16.
preservadas, e assim, estabelecer uniformidade nas tradições do povo e para
formar uma grande obra utilizando várias tradições que se aplicam ao tema.
A história das formas é o estudo do desenvolvimento das formas literárias
breves do Antigo Testamento. Tem como objetivo fixar cada forma distinta em
seu contexto sócio-histórico original. Assim se explica melhor sua significação e
esclarece a vida social e cultural de Israel. Os gêneros literários do Antigo
Testamento se dividem em seis classes gerais de literatura: Poesia cultual,
escritos legais, e as literaturas históricas, proféticas, sapiencial e apocalíptica.
Dentro de cada classe se identificam vários gêneros específicos que se
originaram em situações distintas.
POESIA CULTUAL
A poesia cultual do Antigo Testamento se encontra majoritariamente no
livro de Salmos, porém não se limita a este livro. Por exemplo, há poemas
semelhantes em Lamentações, Jeremias, Jonas, Isaías 40-66 e Jó. Estes textos
mostram que o culto de Israel tinha várias cerimônias que utilizaram linguagem
poética para expressar a comunhão entre o adorador e Deus. Algumas
cerimônias se fixaram em certos tempos do ano quando todo o povo celebrou
um evento histórico ou uma festa agrária. Outros ritos do culto mostraram fases
diferentes da vida humana: nascimento, circuncisão, matrimônio e morte. Outros
se observaram em momentos de crise do individuo (enfermidades, dúvidas, etc.)
ou da comunidade (seca, invasão, etc.)
Cada evento no culto tinha seus próprios gêneros poéticos. No entanto,
não temos uma liturgia completa do culto de Israel. O livro de Salmos é mais um
depósito de textos cultuais preservados para estudos e devoções. Podemos
encontrar Salmos que se originaram nos tempos do segundo templo, outros que
vieram da época anterior ao primeiro templo e outros que são de datas
intermediárias entre os dois. O livro de Salmos mostra uma longa história em sua
composição e sua coleção, porém, em cada coleção aparecem todos os
gêneros.
Em um estudo importante, Herman Gunkel identificou as formas básicas
da literatura poética. Segundo ele, todos os gêneros se apresentam no culto do
primeiro templo. No entanto, muitos destes salmos se perderam com a
destruição do primeiro templo. Escreveram novos salmos durante o exílio para
expressar a piedade e devoção individual aparte de um culto. Logo com a
construção do segundo templo, os antigos salmos cultuais e os salmos não
cultuais se uniram com os novos salmos pra o novo culto. Outros eruditos,
Sigmund Mowinckel, crêem que o livro de Salmos preserva muitos salmos pré-
exílicos. Estes eruditos no separam a devoção individual e o culto do primeiro
templo. Crêem que os salmos que expressam a piedade individual, igual aos que
contém elementos proféticos, sempre têm estado no culto de Israel. O exílio pode
haver sido o impulso escrever, e o livro de Salmos recebeu sua forma final como
o “hinário” ou “devocionário” do segundo tempo.
Queixas
Gerstenberger prefere nomear os textos como o Salmo 22 ou Jeremias
20.7-13queixas em vez de lamentos. Esses poemas expressam um súplica
antes de que caírem a catástrofe final. Eles refletem a dor que sofre o indivíduo
e a esperança com que ainda pode dirigir-se para Deus que ele responderá com
liberação de doenças, inimigos ou outras aflições pessoais. Toda a comunidade
pode utilizar a queixa ante a ameaça de seca, invasão, praga ou alguma
maldade que sofre o povo em geral (por exemplo, Salmos 25). Assim a
comunidade consulta a Deus pedindo sua ajuda e espera sua ação salvadora.
Os elementos deste Gênero são: 1) A invocação a Deus (Salmos 22.1a);
2) a queixa que descreve ou pede (Salmo 22.1b,2); 3) A confissão de pecado ou
protesto de inocência (Salmos 51.3-5; 59.3,4); 4) A declaração de confiança
(Salmos 22.4,5,9,10); 5) A súplica de ajuda (Salmo 22.19,20); 6) A imprecação
contra os inimigos (Salmos 59.5, 10-13); 7) O reconhecimento da resposta divina
(Salmo 22.21:dos chifres dos búfalos; sim, tu me respondes.); 8) o voto (Salmos
22.22; 56.12); 9) A benção ou elementos hínicos (Salmos 22.3; 57.11); 10) A
antecipação da ação de graças (Salmo 22.22-27).
Os elementos mais importantes deste gênero são a súplica e a imprecação
contra aos inimigos. Há vários eruditos que sugerem que o Gêneros chama-se
“orações de súblicas”. Contudo, Gerstenberg tem razão em dizer que as súplicas
deste textos “sempre tratam de mudar uma situação de injustiça e miséria para
uma melhor”. Por isso, o nome queixa descreve bem o gênero. Entre as queixas
do Saltério estão os Salmos 3-7, 9-13,17,22,25-28, 35-36,54-57,59,69-
71,120,130 e 140-143.
Dentro do Saltério há alguns textos em que um elemento da queixa domina
todo o Salmo. “A confissão de pecado” domina o Salmo 51 e o Salmo 26 se
compõe do “protesto de inocência”. Há tantos salmos que consistem da
“declaração de confiança” que quase forma um gênero próprio, Hinos de
Confiança. Entre esta classe se encontram os Salmos 23,4,11,16,62 e 131.
Hinos de Adoração
Os hinos de adoração celebram a Deus por várias causas: seu papel como
criador, seu senhorio sobre a história, sua superioridade de poder e sua
excelência em todas as coisas. Estes temas diversos expressam-se mediante
uma forma que mostra elementos comuns: 1) Invocação a Deus (Salmo 8.1); 2)
Chamado para adorar (Salmos 115.18; 117.1); 3) Louvores a Deus por suas
qualidades, obras ou feitos (Salmos 115.1,15,16); 4) Bençãos ou desejos
(Salmos 115.12-14).
Os hinos babilônicos usavam muitas vezes umas invocações longas e
artísticas para impressionar aos deuses a fim de que escutem. É interessante
que no Saltério muitos hinos não contém a invocação. As invocações que
aparecem são simples. A invocação do Salmo 18.1-3 é a mais ostentosa dos
Salmos, porém não é como os da Babilônia. A maioria dos hinos no Saltério
inicia-se com um chamado a adorar. É possível que um coro ou o dirigente do
culto o proclamou e as pessoas da congregação participaram ao cantar os
louvores. Talvez a melhor maneira de compreender os chamados que ocorrem
no final de um salmo é que devem ser vistos como um sinal para que o povo
continue cantando mais outros hinos.
Estes hinos eram utilizados nas festas anuais de Israel. Dentro destes
próprios salmos se encontram detalhes da música e a liturgia. Sua estrutura é
de uma apresentação antífona. Neste gênero se incluem os Salmos 8, 29, 33,
77, 103-104, 111, 139 e 145-150.
ESCRITOS LEGAIS
Os escritos legais do Antigo Testamento se encontram no Pentateuco.
Ainda que nos tempos mais tardios, Israel tinha que basear qualquer modificação
de suas leis na autoridade e nos ensinos de Moisés. Na realidade, vários códigos
legais se incorporam na narrativa da história de Israel sob Moisés: 1) Os dez
mandamentos (Êxodo 20.1-17; Deuteronômio 5.6-21); 2 ) O código do pacto
(Êxodo 20.22-23:19); 3) Leis deuteronômicas (Deuteronômio 12-26); e 4) O
código de santidade (Levítico 17-24). Estas coleções de leis mostram os vários
gêneros dos escritos legais.
A maioria das leis foram escritas na forma casuística. Uma lei casuística é
uma que descreve um caso específico, o distingue dos casos semelhantes e
especifica as conseqüências (Êxodo 21.18-19). O comentarista Patrick propõe
uma divisão deste gênero. A lei casuística primária é aquela que descreve uma
relação legal entre pessoas e os direitos e deveres na relação antes que ocorra
alguma violação (Êxodo 22.25). Esta forma é mais pessoal que a lei casuística
remediadora que descreve uma violação de direito e seu remédio legal (Êxodo
22.5)
As leis casuísticas do Antigo Testamento, tanto na sua forma como em seu
conteúdo, tem muito em comum com as leis dos códigos reais do Antigo Oriente,
por exemplo o Código de Hamurabi. Alguns sugerem que Israel adotou estas leis
da cultura de Canaã. É melhor reconhecer que os clãs de Israel compartilharam
de um ambiente cultural semelhante ao dos patriarcas e estas leis são partes
desse mundo sociológico.
Entre as leis do Antigo Testamento estão as da forma apodítica, que afirma
incondicional e categoricamente uma asserção do bem e o mal. É uma lei
absoluta que não depende de condições ou casos. Este gênero se divide em três
classes: 1)mandamento, que proíbe na forma absoluta sem especificar o castigo
pela desobediência (“Não furtarás”, Êxodo 20.15); 2) Leis de morte, que afirmam
que certas ações trazem a morte como conseqüência (“o que maldisser a seu
pai e a sua mãe morrerá irremediavelmente”, Êxodo 21.7); e 3) a maldição, que
pronuncia uma maldição sobre a pessoa que faz certa ação. Este juízo recebe o
apoio do povo que responde:Amém! (Deuteronômio 27.15-26)
Albrecht Alt foi quem primeiro fez a distinção entre leis casuísticas e leis
apodidícas, ele acreditava que as leis apodidícas eram distintivamente israelitas.
No entanto, hoje se reconhece que outras culturas também tiveram leis absolutas
que sãs paralelas com os mandamentos. É discutível se as leis apodidícas tem
sua origem na autoridade do clã e da tribo ou na autoridade do culto. Pelo menos
Israel utilizou esta forma de instrução religiosa e moral conhecida no Antigo
Oriente para expressar a vontade de Deus.
Estas coleções de leis expressam como Israel deve viver sob a vontade de
Deus. Por isso, o conteúdo destas leis toca não somente a vida religiosa, mas
também a vida secular. Toda a vida é dedicada a Yahweh, então não há
distinções entre o sagrado e o secular. Também estas coleções apresentam-se
como uma parte integral de uma tradição maior, o pacto entre Yahweh e Israel.
Colocar os códigos legais na estrutura do pacto acentua que a natureza
dos escritos legais é expressar a vontade de Deus de uma forma pessoal:
Yahweh (ou seu porta-voz) se dirige ao seu povo que o escuta.
LITERATURA HISTÓRICA
Muito do Antigo Testamento é narração da história de Israel desde sua
origem como família e clã até as épocas das tribos, monarquia, cativeiro e
restauração. A definição de “história” para o estudo literário da Bíblia não é a da
ciência moderna porque o propósito do Antigo Testamento não é apresentar uma
“exposição sistemática dos acontecimentos” de Israel. Todos os livros da Lei
(Torah) e os livros dos profetas anteriores tem um
propósito kerigmático, proclamar a palavra de Deus mediante eventos seletivos,
interpretados e ordenados da história de Israel.
Encontram-se distintas formas na apresentação desta história. Os autores,
ou redatores das narrativas usaram muitas tradições, escritas e orais, para
relatar os atos de Deus na história de seu povo. Por sua natureza, a narrativa
histórica contém exemplos de discurso formal (2 Reis 18.17-35) e de uma carta (
2 Reis 5.5-6). Também, se preservaram listas em contar a história de Israel como
a lista do saque em números 31.32-40. As Genealogias (Gênesis 10.1-32)
e itinerários (Números 33.5-37) são tipos especiais de listas. As formas
de informes e etiologias preservaram tradições dos nascimentos (Gênesis
25.19-26), batalhas (Gênesis 14.1-24) ou a origem do nome de alguma coisa,
prática ou lugar (Gênesis 32.30-32).
Os nomes de outras formas que compõe a narrativa histórica do Antigo
Testamento podem ser mal compreendidos. Estes nomes se originam no estudo
da literatura folclórica da Alemanha. Deve-se lembrar que estes termos
descrevem uma forma literária e não fazem juízo quanto ao valor histórico do
conteúdo da forma. As narrativas de Gênesis são descritas com o
termo saga. A saga é uma larga narrativa tradicional em prosa, que pode ser
primitiva (Gênesis 1-11), familiar (Gênesis 12-26) ou heróica (Êxodo 2-14). A
própria saga se compõe de uma coleção de outros tipos de relatos mais breves.
Uma tradição histórica pode preservar-se na forma de uma lenda. Vale salientar
que a palavra lenda não questiona nada do valor histórico da tradição. É um
termo que descreve um relato cuja narrativa põe ênfase em uma característica
de herói, especialmente uma de suas virtudes. Distingue-se da fábula, que narra
um relato que inclui figuras humanas e animais. É típico da fábula ensinar uma
moral ou corrigir o egoísmo de uma pessoa (Números 22.31-35). Não
existem mitos no Antigo Testamento porque o mito se define como uma
narrativa fantástica que explica o mundo humano pelas atividades dos deuses
no mundo celestial. O Antigo Testamento não conhece nenhum Deus fora do
Deus vivo e verdadeiro, Yahweh. As vezes um escritor pode utilizar uns temas
de mitos ou aludir a eles em sua descrição de um evento ou de uma pessoa
histórica, porém não devemos dizer que há mitos no Antigo Testamento.
Estes elementos das sagas refletem uma transmissão oral até, e inclusive,
a formação de uma longa narrativa. Do outro lado a novela é uma narrativa
complexa que se originou como um relato escrito. Muitas vezes inclui com sua
história principal várias histórias subordinadas (Gênesis 37.1-47:27, Rute e
Ester).
LITERATURA PROFÉTICA
Os livros proféticos se compõem de uma coleção de oráculos dos profetas
LITERATURA SAPIENCIAL
A Bíblia contém uma classe de literatura que se distingue por sua ocupação
do tema da sabedoria (Hokmah). Esta classe exibe temas e gêneros
característicos, porém não podemos designar todos os textos que utilizam os
gêneros como literatura sapiencial. É possível encontra uma parábola
na literatura profética (Ezequiel 15) ou uma fábula na literatura histórica (Juízes
9.8-15), porém, Ezequiel não é um sábio e nem o livro de Juízes é um exemplo
de literatura sapiencial. As tradições sapienciais da Bíblia consistem em
Provérbios, Jó e Eclesiastes.
Disputa-se a origem das tradições sapienciais de Israel. Vários provérbios
e admoestações bíblicas sugerem que o lar servia como primeiro centro de
instrução; a sabedoria se iniciou como uma função das famílias ou clãs. As
responsabilidades de instruções se compartilhavam ente o Pai e a mãe
(Provérbios 6.20) e não prestar atenção resultaria em castigo (Provérbio
1o.24). Que a sabedoria tem uma origem popular se vê nas semelhanças que
comparam várias tribos com animais (Gênesis 49.8,9,14 e 17), No entanto,
alguns provérbios se entendem melhor como produtos da corte (Provérbios
16.12-15). Por isso, sugere-se que a sabedoria de Israel tem sua origem em
uma escola da corte para instruir aos príncipes. Não é estranho chama ao
mestre “pai” e há suficientes modelos de tais escolas no Antigo Oriente como
no Egito e Mesopotâmia.
As duas teorias não são mutuamente exclusivas. O lar tem de ser um lugar
de instrução, especialmente dos jovens. Este tipo de instrução utilizou ditos
memoráveis por séculos na em uma forma oral. Logo, com estabelecimento de
escolas na corte, se colecionaram os aforismos, provérbios e ditos populares
juntamente com a sabedoria de outras culturas (compare Provérbios 22.17-24:22
com a sabedoria de Amenemope). Este processo de coleção se iniciou no reino
de Salomão, porém, durou por séculos (Veja Provérbios 25.1;30.1; 24.23). Por
fim, no tempo do cativeiro formou-se uma escola de escribas religiosos que
preservou a sabedoria “secular” da corte porque era uma expressão da
sabedoria de Deus e a estimou como torah, “instrução”, igual como a Lei. Esta
escola que deu a Jó, Provérbios e Eclesiastes sua forma canônica.
Na literatura sapiencial encontra-se uma quantidade de formas. O
aforismo,mashal, pode distinguir-se entre: 1) O Provébio, que é um aforismo
popular baseado na experiência e na observação (Provérbio 11.24; 2) o dito
sábio, que é um dito didático que infunde um valor ou uma lição (Provérbio
16.20); e 3) o dito numérico, que é um aforismo caracterizado por uma forma
numérica que consiste em um título e uma lista (Provérbios 30.18,19). Não é
necessário que o dito sábio seja bem conhecido pelo povo. O mestre pode
formar um exemplo para ensinar uma lição específica. A sabedoria usa
também admoestações (Provérbios 16.3), mandatos (Provérbios 8.33)
e proibições(provérbios 22.24,25). Segundo Provérbios 1.6 os sábios
usaram enigmas para instruir, porém o único exemplo completo no Antigo
Testamento se encontra em Juízes 4.10-18.
Também, os sábios empregaram formas mais extensas em suas
instruções. Usa-se a alegoria, um conto cujos detalhes representam outras
coisas na interpretação (Provérbio 5.15-23). Existe o conto exemplar que é um
relato concreto para ilustrar um ponto de ensino (Provérbios 7.6-23). A narrativa
autobiográfica, seja confissão ou reflexão pessoal, compartilha a experiência rica
do sábio com o aluno (Eclesiástes 1.12-2:26). Finalmente, os sábios ainda
utilizam hinos para descrever a sabedoria. Se personificou a sabedoria e
o hino louva esta personificação (Jó 28)]
LITERATURA APOCALÍPTICA
Friedrich Lücke reconheceu a literatura apocalíptica como uma classe
distinta no século XIX. No entanto, pouco se tem feito para analisar as formas do
gênero. As causas desta carência inclui o uso múltiplo do
termo apocalíptico para descrever elementos sociológicos e filosóficos tanto
como literários e o fato que o gênero apocalíptico usa muitas formas literárias
que se encontram na literatura profética. Na realidade muitos querem classificar
a literatura apocalíptica como uma classe de literatura profética. No entanto,
parece melhor reconhecer que a diversidade de formas componentes e as
semelhanças delas com outros gêneros não escondem a consistência que
a literatura apocalíptica tem em si.
A literatura apocalíptica é um gênero de literatura que narra a revelação de
uma realidade transcendente por parte de um ser sobrenatural. Esta realidade
tem aspectos temporais e especiais, a saber, que tem a ver com uma salvação
final na história (escatologia)e um novo mundo sobrenatural. Há duas divisões
neste gênero: umapocalipse com viagem ao outro mundo e um apocalipse
histórico que não inclui uma viagem ao mundo sobrenatural. Exemplos de livros
apocalípticos judaicos do primeiro subgênero são 1 Enoque 1-36; 2 Enoque e 3
Baruque. Os livros canônicos (Apocalipse do Novo Testamento e Daniel do
Antigo Testamento) são exemplos do subgêneroapocalíptico histórico. A função
deste gênero literário é prover uma visão do mundo que consola a comunidade
de fé em tempos de crise e opressão. Sua revelação da vontade de Deus e sua
última vitória apóiam as pessoas a manter-se fiel sob a autoridade divina que é
maior que a autoridade opressiva que se lhes opõem.
A forma mais comum da literatura apocalíptica é a visão (ou sonho)
simbólica(Daniel 7-8). Esta narrativa se compõe de uma indicação das
circunstâncias, uma descrição da visão ou sonho, uma petição por uma
interpretação (muitas vezes uma oração e se faz por medo), a interpretação
alegórica por um anjo (porém em 2 Baruque 39 é o próprio Deus quem interpreta)
e uma conclusão que conta a reação do vidente ou inclui mais instruções do
anjo.
A epifania(Daniel 10.1-9) também é uma narração de uma visão. Contudo,
esta visão é menos compreensiva que a visão simbólica e consiste em uma
revelação da vontade divina por parte de uma anjo sem elementos visuais.
Relacionada com esta forma é o diálogo revelador. É uma conversação entre o
recipiente e um ser celestial que revela (um anjo ou o próprio Deus).
Este diálogo pode ocorrer em uma visão ou independente dela.
Daniel é o único livro apocalíptico no Antigo Testamento com sua visão do
fim decisivo da história. Há outras obras proféticas que tem um interesse
escatológico, contudo se mantém firmemente dentro da história deste
mundo. Por isso, Isaías 24-27, 55-66 e Zacarias 9-14 podem ser descritos
como literatura proto-apocaliptica. Zacarias 1-8 e Ezequiel também
são protoapocalipticos quanto ao seu simbolismo, visões e uso de um anjo como
intérprete. O desenvolvimento completo do gênero apocalíptico estava no
período inter-testamentário como O testamento de Levi, Apocalipse de
Sofonias,Apocalipse de Abraão e Similitudes de Enoque, entre outros. Este
Gênero se usava não somente no Novo Testamento (Apocalipse), mas também
na criação de livros apocalípticos dos gnósticos.
OS GÊNEROS E OS NOVOS MÉTODOS DE
INTERPRETAÇÃO
Não é suficiente simplesmente identificar os gêneros ou as formas do
Antigo Testamento e buscar a situação na qual o povo vivia (Sitz im Leben) na
qual se originou cada forma. Estas tradições se formavam com formas orais e
escritas. Originalmente elas se preservaram por diferentes grupos em Israel,
uma independente da outra. No entanto, agora não existem mais como formas
isoladas, mas como elementos integrados no contexto de um livro (e no contexto
mais amplo do Antigo Testamento como uma totalidade). Por isso, é imperativo
estudar os textos do Antigo Testamento em sua forma final; estudá-los como
escritura e como literatura.
O estudo da história das formas trata de penetrar por detrás do texto bíblico
para reconstruir a situação sócio-histórica de cada texto. A crítica canônica não
usa o texto como uma fonte de um significado que está detrás do texto, mas
reconhece que o significado do texto bíblico para comunidade da fé tem raízes
no próprio texto. Enfoca-se no que o texto diz ao crente. Para descobrir o que o
texto diz, o leitor deve apreciar não somente o processo da composição literária
do texto, mas também deve considerar como a comunidade da fé o tem
compreendido em cada geração.
As comunidades de fé que aceitam o Antigo Testamento como escritura (a
Comunidade judaica e a cristã) tem adotado textos completos, não somente
partes de textos. Tem adotado estes textos durante as mudanças em suas
situações históricas. Por exemplo, as leis cerimoniais de sacrifícios no livro de
Levítico não tinham o mesmo significado para o Israel pré-exílico como o que
tinha para os judeus da diáspora ou o que tinha para os primeiros cristãos. A
crítica canônica, então, reconhece que o texto sagrado pode ter uma pluralidade
de significado dentro de uma comunidade de fé.
O estudo da Bíblia como literatura é a inda mais amplo porque uma
interpretação autêntica do texto não depende que o intérprete seja membro da
comunidade da fé. O texto bíblico analisa-se com obra literária com uma ênfase
nas estratégicas artísticas do texto. Os libros da Bíblia são obras literárias em si
mesmas. As tradições que se preservam nestas obras agora perdem sua
independência e se desligam de seu Sitz im Leben social. Formam parte de um
texto que cria seu próprio “mundo”. É trabalho do intérprete apreciar este “mundo
do texto” e realizar claras conexões entre este mundo e o mundo do leitor.
Os métodos da nova crítica literária se centralizam no texto como uma
totalidade. É importante ler a obra como novela ou poesia ou ainda como obra
didática. Busca-se não somente o gênero de uma seção da obra, mas também
se quer identificar o gênero da obra completa que causa a coesão de todas as
partes em formar algo maior que simplesmente a soma das partes, que é o texto.
Outros métodos literários se centralizam no leitor como quem produz o
significado da obra. Nestas teorias da resposta do leitor o significado se encontra
na interpretação entre o texto e o leitor. Todavia, para chega a uma interpretação
autêntica, o leitor tem de reconhecer a coerência da obra total, as saber tem que
reconhecer o gênero que oferece à obra sua unidade.
O estudo dos Gêneros do Antigo Testamento se iniciou na tentativa de
identificarmicro-gêneros, formas breves e reconstruir a situação sócio-histórica
de sua origem. No entanto, esta identificação de um evento por detrás do texto
como nós o temos não é o fim da interpretação Bíblica. Há também a
necessidade de reconhecer o gênero da obra completa, o macro-gênero,
apreciar sua arte literária no uso de formas, micro-gêneros, e descobrir os
significados para a comunidade da fé que existem, na conexão entre o “mundo
do texto” e o mundo da comunidade. Dominar os gêneros do Antigo Testamento
nos ajudará a entender o significado do texto da Bíblia, a Palavra de Deus.