Caso 14
Caso 14
Caso 14
1ª QUESTÃO:
Flávio propõe demanda para obtenção da curatela de José Maria, seu sobrinho. Alega, em síntese que,
o jovem é pessoa com deficiência - esquizofrenia - e, portanto, não possui capacidade de fato para
gerir os atos da vida civil. O autor junta documentos que comprovam os fatos alegados
Em defesa, o demandado arguiu a ilegitimidade ativa do demandante. José Maria sustenta que
somente na falta ou na impossibilidade dos pais é que a lei confere ao cônjuge ou outro parente a
legitimidade para a propositura de ação de natureza tão grave. Dessa forma, como seus ascendentes,
cônjuge, e seus descendentes não propuseram a demanda, não caberia a seu tio, parente de terceiro
grau, com quem inclusive não possui laços de afinidade ou proximidade, propor a referida demanda.
Decida, fundamentadamente, a demanda.
RESPOSTA:
Segundo o professor J. M. Leoni, a legitimação para requerer a curatela vem regulamentada nos arts.
747 e 748 do CPC42.
A curatela pode ser promovida: a) pelo cônjuge ou companheiro; b) pelos parentes ou tutores; c) pelo
representante da entidade em que se encontra abrigado o interditando; d) pelo Ministério Público.
A norma deve ser interpretada restritivamente, isto é, não se deve aumentar o rol dos legitimados para
demandarem a curatela. Logo, não se deve estender essa legitimidade aos amigos, credores etc.
Atualmente, tendo em vista que o STF considerou a união homoafetiva como entidade familiar
equiparada à união estável, penso que também o companheiro de união homoafetiva possui
legitimidade para requerer a curatela do outro companheiro. A legitimidade do cônjuge para requerer
a curatela está condicionada à subsistência da sociedade conjugal. Como consequência, não terá
legitimidade o separado judicialmente nem o divorciado.
Porém, a norma não estabelece uma ordem a ser seguida, com exceção do Ministério Público. Nada
impede que qualquer dos legitimados previstos no dispositivo legal requeira a curatela. Nesse sentido,
posiciona-se José Olympio de Castro Filho, forte na lição de Estêvão de Almeida e Odilon de
Andrade, ensinando que a ordem é meramente metodológica, não existindo prioridade entre as
pessoas indicadas.
A curatela pode ser requerida tanto pelo pai como pela mãe, sem que exista preferência daquele sobre
esta, em face do princípio da isonomia entre os sexos estabelecido na CR/198846. Nada impede que
ambos os genitores requeiram em conjunto (curatela compartilhada) a curatela do filho.
Sobre a legitimidade do parente, o CPC (art. 747, II) optou por termo mais técnico e genérico em
substituição à designação de parente próximo que existia no CPC/1973, onde pairava a divergência
sobre o que seria um parente próximo.
Finalmente, temos a legitimidade do Ministério Público, estabelecida pelo CPC, apesar de o Estatuto
da Pessoa com Deficiência ter revogado o art. 1.769, do CC que dispunha sobre a legitimidade do
Ministério Público para requerer a curatela. A primeira hipótese vem esclarecida no art. 748, I, do
CPC. O art. 748 do CPC autoriza a legitimidade do Ministério Público para requerer a curatela no
caso de "doença mental grave".
Direito Civil - Família, Rio de Janeiro: forense, 2019, pag 712
Por outro lado sustenta Silvio Venosa que ao descrever os legitimados para pedir a curatela, o Código
não esta belece uma ordem, no sentido de que os parentes mais próximos excluem os mais remotos,
embora deva ser levado em conta que, por exemplo, tendo o incapaz cônjuge, não será dado ao irmão
intentar a curatela. Quando isso ocorrer, sempre será exigível a cautela do juiz para examinar, no caso
concreto, a legitimidade do requerente e a razão da inércia do cônjuge ou do parente mais próximo.
Também não deve ser entendido que necessariamente ambos os pais devam requerer a curatela,
embora essa conclusão possa decorrer da inter pretação literal do texto. Ocorrerá apenas maior
cuidado do julgador quando houver omissão ou oposição de um dos genitores. O bom senso do
magistrado, em cada caso, definirá aquestão a respeito da curatela, cuja sentença sempre tem sérias
consequências.
Direito Civil: família e sucessões / Sílvio de Salvo Venosa. - 19. ed. - São Paulo:Atlas, 2019.
2ª QUESTÃO:
Diante da omissão legislativa sobre a extensão do pedido de tomada de decisão apoiada, poderia os
apoiadores arrolados pela pessoa com deficiência realizar atos existenciais privativos da pessoa
beneficiária, tais como reconhecer um filho ou até mesmo consentir na prática de tratamentos
médicos?
Ou ainda, diante da mesma omissão, poderia magistrado, constatando nos autos do pedido de tomada
de decisão apoiada que o requerente é portador de doença irreversível e que o impede de compreender
o sentido de seus atos, converter de ofício o pedido de tomada de decisão apoiada em curatela e ainda
nomear curador ao incapaz?
Responda fundamentadamente a pergunta.
RESPOSTA:
Acerca do primeiro questionamento, em artigo publicado no site do IBDFAM, explica o professor
Nelson Rosenvald que "a resposta será negativa se entendermos que até mesmo a tradicional curatela
"afetará tão somente os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial" (art. 85, Lei
n. 13.146/15). Todavia, em uma reflexão mais apurada, podemos legitimar uma excepcional forma de
restrição de direitos da personalidade, pela transferência de poder decisório aos apoiadores sobre
aspectos da intimidade da pessoa apoiada, sendo o ato decisório digno de proteção pelo ordenamento
quando promova a dignidade do beneficiário, não se convertendo em uma renúncia a direitos
fundamentais, pela faculdade de a pessoa apoiada revogar os poderes dos apoiadores a qualquer
tempo.
Flávio Tartuce em seu manual de Direito de Família não enfrenta diretamente a questão, mas deixa
claro que a tomada de decisão apoiada deverá ser para atos mais complexos, como, por exemplo, os
contratos.
"A categoria visa ao auxílio da pessoa com deficiência para a celebração de atos mais complexos,
caso dos contratos. Foi ela inspirada na amministratore di sostegno, da Itália, e na Betreuung, da
Alemanha." Direito civil : direito de família – v. 5 / Flávio Tartuce. – 14. ed. – Rio de Janeiro:
Forense, 2019.
Quanto ao segundo questionamento, não há sobre o tema uma discussão acadêmica; todavia,
entendemos pela possibilidade, tão somente, se o magistrado ouvir previamente o Ministério Público,
tendo em vista não ter o juiz, à luz do artigo 747 do CPC, legitimidade ativa para tanto, por mais que
se busque uma proteção à dignidade da pessoa.
Tal raciocínio pode ser extraído ainda do Enunciado 640 do CJF, que assim dispõe: "A tomada de
decisão apoiada não é cabível, se a condição da pessoa exigir aplicação da curatela", sendo certo
ainda que em ambos os casos a jurisdição é voluntária.
Fontede p
esquisa: http://www.ibdfam.org.br/assets/upload/anais/253.pdf