Jogos de Conquista - Lovely Loser - Nodrm
Jogos de Conquista - Lovely Loser - Nodrm
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JOGOS DE CONQUISTA
1ª Edição
— O pequeno príncipe.
prólogo
ESTOU SENDO TRAÍDA. É tudo o que penso enquanto dirijo até uma
das fraternidades do campus. Recebi uma foto de um número desconhecido
há cerca de vinte minutos, de um casal se beijando em uma jacuzzi.
Demorou para que eu percebesse que o cara de costas na imagem tremida
era, na verdade, meu namorado.
O reconheci pelo cordão que dei para ele no verão passado, no nosso
aniversário de namoro. Isso só aumenta minha raiva — como se fosse
possível. Meu queixo treme e meus dentes rangem quando travo o maxilar,
os deslizando uns contra os outros. Eu poderia jogar o carro em cima de
uma das latas de lixo na rua, imaginando o rosto de Logan nelas. Como
aquele babaca teve coragem?
Estou em Crystalville há apenas três semanas. Não sou daqui, nem ele.
Logan veio primeiro na promessa que deixaria tudo pronto para nós. Eu só
não imaginei que esse nós envolvia uma outra mulher e um belo par de
chifres enfeitando minha testa. Planejamos esse momento por anos. Ele iria
conseguir a bolsa por conta do futebol americano, enquanto eu teria ajuda
dos meus pais para pagar o resto da mensalidade que não foi abatido no
desconto que consegui para estudar na CVU. Tudo uma grande ilusão.
Desço do carro e ignoro Cam, batendo a porta com força, o que atrai
alguns olhares em minha direção. A música continua a todo vapor lá dentro,
mas alguns estudantes já saíram para o deck de madeira para ver o que está
acontecendo. Começo a marchar em direção aos fundos.
Que engraçado.
— Fazê-lo se arrepender.
Logan odeia esse tipo de coisa. Sempre foi alguém muito reservado e
contido, exceto para beijar mulheres em jacuzzi, pelo visto.
Com isso, começo a andar para longe. Logan tenta segurar meu
cotovelo, mas, num impulso, me viro e acerto seu maxilar com um soco.
Uma dor lancinante me atinge, e eu mordo o lábio inferior com força. Acho
que torci o pulso.
Ele sinaliza para uma cadeira atrás de mim, que eu não havia
percebido, e me sento. Cameron limpa a garganta e aponta com o polegar
sobre o ombro.
O tom de voz dele é tão calmo quanto sua expressão. Os olhos, sérios,
revelam uma mistura de cores nas íris. O cinza ônix tem nuances de um
azul pálido, como um prelúdio de uma tempestade.
— Vinho ou cerveja?
— Tequila.
Posso jurar que uma sombra de sorriso atravessa seu rosto, mas talvez
seja só minha imaginação fértil. Há uma garrafa de tequila em cima do
balcão, junto a outras inúmeras bebidas. Depois de despejar um pouco em
um copo plástico, ele a estende em minha direção. Não hesito em beber
como se fosse água. Um filete escorre pelo meu queixo e o seco com a
manga do cardigan, deixando de lado os bons modos.
— E quando é necessário?
— É. Estou acostumado.
Linda, do tipo que faz homens quererem escrever poesia ruim e cantar
serenatas sob peitoris de janelas.
Isso me faz voltar a olhá-la, intrigado. Seu corpo está virado em minha
direção, e ela ainda segura o pulso machucado e o saco de ervilhas que, a
esta altura, já descongelou. Seus olhos verdes piscam inocentemente, os
cílios claros e longos roçando no topo das bochechas no processo.
Acho que ela nem percebe que falou sobre algo que disse que não
queria conversar. Espero em silêncio que se sinta confortável o suficiente
para continuar o assunto.
— Ele pedia para eu rir mais baixo e, quando íamos jantar com sua
família, fazia eu cobrir as sardas com maquiagem. — Um riso fraco escapa
de seus lábios. — Meu Deus. Como eu sou burra! Os sinais estavam todos
lá.
— Não é culpa sua. Acho que pessoas apaixonadas, muitas vezes, não
querem ver o óbvio.
Percebo que ela está pronta para me dar outra de suas respostas
espertas, mas o toque de um celular atravessa o ambiente. Ela tira o
aparelho do bolso do cardigan e apoia o telefone contra a orelha.
— Ainda estou aqui. — Uma longa pausa e alguns ruídos de uma voz
incompreensível. — Ok. Te encontro do lado de fora. Tchau.
Percebo duas coisas quando ela some do meu campo de visão: não
perguntei seu nome e, provavelmente, nunca mais vamos nos ver.
O barulho do vômito preenche toda a sala enquanto assisto ao jogo dos
Lakers na televisão. Meu prato cheio de torradas, bacon e ovos parece
menos atrativo com a trilha sonora de Lionel vomitando no fundo. Aumento
o volume da TV, tentando não pensar sobre isso.
Basta olhar para Hunter para saber que é mentira. Seu rosto está
pálido, e ele parece estar se esforçando muito para manter o café da manhã
no estômago. Outro arquejo de Lionel nos atinge, e Ferrari murmura um
"droga" antes de correr em direção ao banheiro do segundo andar.
Não costumo falar sobre minha vida íntima, nem compartilho detalhes
de sexo, algo comum entre a maioria dos caras do time. Hunter sempre quer
me dar detalhes de suas noites de diversão, mas dispenso. Não tenho
interesse em saber sobre esse tipo de coisa.
— Hum. Então tá. — Dá para ver que ele não está nada convencido,
porém, não me importo. — Vai aparecer no evento beneficente da CVU
amanhã?
— Não, obrigado.
— A Emery não vai estar lá? Achei que você apoiava sua irmãzinha.
— É necessário?
Antes que eu possa dizer algo, minha irmã encerra a chamada. Hunter
está debruçado na ilha, observando cada movimento meu. Quando olho
para ele, desvia o olhar e finge que não estava xeretando minha conversa.
Nunca tivemos uma conversa normal desde que cheguei. Essa foi a
maior quantidade de palavras que já trocamos sem que ela demonstrasse o
desprezo habitual.
— Sei lá. Ocupar a mente com outras coisas. O idiota apenas revelou a
verdadeira natureza e te poupou de continuar convivendo com as intenções
traiçoeiras dele. Agora, o resto é com você. Vai permitir que ele te atinja e
faça com que perca mais tempo do que já perdeu se envolvendo com ele, ou
vai recomeçar deste ponto e ganhar tempo para você mesma? São as únicas
opções.
É tudo o que diz antes que eu feche a porta e a tranque. Espero que ele
a esmurre, mas os passos se afastam do outro lado. Finalmente solto o ar,
percebendo que havia prendido a respiração nos últimos segundos.
Meus pais moram em outra cidade, o que é uma droga. Para voltar para
casa, são necessárias sete longas horas de estrada, e para piorar, eu nem
tenho carro.
— Mais ou menos…
— Logan?
O radar de Lily nunca falha. Na verdade, ela nunca gostou de Logan
ou de sua família. Os pais dele administram um pequeno negócio local, e
minha mãe sempre dizia que eles agiam como se tivessem inventado algo
revolucionário. Apesar disso, eu nunca tive a mesma percepção que ela,
ainda que meu ex-namorado sempre me exibisse como seu troféu. Exceto, é
claro, quando o assunto era minhas sardas.
— Ele me traiu.
— Que desgraçado.
Xingar.
Não consigo segurar a risada quando ouço a voz de meu pai ao fundo,
dizendo:
Não sei como ela sabe de tudo isso, talvez eu tenha subestimado seus
dons de percepção.
Bom, não importa mais. Foi o fim. Retiro algumas notas da carteira e
as jogo sobre o balcão antes de pegar meu café. O calor do copo de isopor
aquece minhas palmas.
Seguro o copo de café com firmeza. Seus olhos, daquela cor linda de
ônix, estão fixos em mim.
Eu o encaro. Observo seu porte físico, o cabelo preto que cai sobre a
testa e os olhos cinzentos indecifráveis. Monitores são inteligentes. Tento
encontrar o papel no bolso, me atrapalhando um pouco, e leio o nome em
voz alta.
— Evan Sutton.
— Não faço a mínima ideia. — Enterro o rosto nas palmas das minhas
mãos, não me importando se pareço patética.
Alguns momentos se passam e ele não diz nada, apenas espera que eu
reúna ânimo o suficiente para me endireitar na cadeira. Tiro a tampa de
isopor do café — que, nesta altura, está morno — e dou um gole, olhando
para Evan sobre a borda.
Seu olhar não revela nada, nenhuma emoção ou o que ele possa pensar
de mim.
— Ok, então acho que pode ser cálculo. Não sou uma pessoa de
números.
— Eu tô super focada.
Relaxo um pouco.
— Legal, então vamos fugir dos cálculos até que seja inevitável —
fala, a voz e o rosto sérios.
Não falo com meus pais por chamada de vídeo há alguns dias, então
não posso adiar mais esse momento, mesmo que não esteja sozinha no
quarto. Sei que minha mãe pode lidar com isso, diferentemente do meu pai.
Dos dois, ele é o mais sensível. O que é engraçado, às vezes. Mamãe
sempre conta como ele chorou no meu nascimento, enquanto ela
resmungava palavrões fazendo força para que eu viesse ao mundo.
— Bem, mas queremos saber sobre você — meu pai fala, com o tom
de voz relaxado, mas a preocupação velada em seus olhos não passa
despercebida por mim.
Desde que terminei com Logan, eles têm me tratado como se eu fosse
beber uma garrafa de desinfetante a qualquer momento.
Não costumo esconder deles quando algo não vai bem na minha vida.
Meu pai parece preocupado, enquanto minha mãe, se está, não demonstra.
— Quão ruim?
— Que foi? Só estou perguntando, Lily. Nossa filha não liga. Não é,
Scar?
— Se está fugindo dessa forma, deve ser porque ele é super gato.
Aí está uma desvantagem de se ter pais jovens. Eles acham que são
descolados. Cubro o rosto com as mãos, numa tentativa de esconder o
quanto fiquei vermelha pelo comentário.
— Você não vai fugir de mim para sempre! — é o que ela diz antes
que eu encerre a chamada.
Tento não pensar nisso enquanto começo a fazer a lista que ele pediu.
04
Alguém toca meu braço, o que me faz olhar para o lado. Encontro
Ginger, com os olhos castanhos fixos em mim e um sorriso estampado no
rosto. Desde o verão passado, eu e ela temos nos envolvido casualmente. Só
que, no último mês, ela começou a agir como se tivéssemos algo, então eu
me distanciei. Relacionamentos não são o meu foco.
Acho que ninguém reveza halteres, e duvido que ela aguente o mesmo
peso que eu. Não sendo babaca, apenas realista. Levei dois anos para
alcançar a carga em que estou. Ginger, com os braços finos e sem
experiência, não vai conseguir tirar os pesos do chão.
— Acho melhor não. Você pode acabar se lesionando. — Aponto para
os pesos coloridos e leves do outro lado da academia. — Aqueles devem ser
ideais.
Quando termino a série, vou até a única esteira livre, mas alguém
chega primeiro.
Meus olhos vagueiam por seu rosto bonito, porém, dessa vez, não vejo
as sardas. Acho que ela está usando corretivo, o que me deixa irritado por
algum motivo inexplicável. Não acho que deveria escondê-las, mas fico em
silêncio. Scarlet usa um top que expõe bastante da pele branca e uma calça
legging. Não observo o suficiente para deixá-la desconfortável. No entanto,
noto que as bochechas estão rubras quando desvio o olhar de volta para o
seu.
— Você que está me seguindo, já que nunca te vi aqui antes de hoje.
— Ah. Como sou caloura, só vim aqui uma vez para explorar. Agora
decidi que vou me exercitar mais, sabe? Estou muito sedentária.
Isso me deixa intrigado. Com uma aparência como a dela, duvido que
não esteja acostumada a receber elogios. Inclusive, no último treino de
hóquei, escutei a conversa de dois caras falando sobre a ruiva gostosa —
como a apelidaram — que tinha chegado no campus. Não dá para ignorar
um rosto desses.
É uma ironia do universo que ela tenha sido jogada no meu caminho,
considerando que eu achei que não a veria nunca mais depois daquela festa.
Comecei a monitoria pois estou focado em ganhar alguns pontos, vez que
me inscrever em uma matéria extra demandaria muito esforço. Acho melhor
ajudar alguém a revisar conteúdo do que fazer provas e entregar artigos.
Li sua ficha. Ela está com notas muito baixas. Lembro de ter achado
seu nome engraçado. E, depois que sua aparência se encaixou nele, acho
genial.
Isso faz com que os cantos de minha boca queiram se mover para
cima.
— Só se você quiser.
— É um tempo bom.
— Por que eu tenho que ter feito algo? — Não consigo conter a
irritação.
Ver Emery é como olhar para minha versão feminina. Ela tem os
mesmos fios negros, olhos cinzentos e a pele branca pálida que eu. No
entanto, apesar de sermos gêmeos, nossas semelhanças se limitam ao físico
e, é claro, ao amor incondicional que nutrimos um pelo outro.
— Por quê?
— Desde que começamos a nos envolver, deixei claro que não queria
encontros ou um relacionamento sério. Ela disse que não era um problema e
que também não estava procurando isso. O que posso fazer se Ginger
ignorou os fatos?
Minha irmã fica em silêncio e solta um suspiro alto, e sei que é o jeito
dela de concordar comigo. Não posso fingir ter sentimentos por alguém só
para não magoar essa pessoa. Sou honesto.
— Oi, Emery.
— Sai.
— Tudo bem.
Emery e nosso pai têm uma relação conturbada devido às escolhas dela
em relação à carreira e ao futuro. Minha irmã deseja ser uma cheerleader,
enquanto Phillip Sutton impõe que ela deveria focar no curso de Direito e
arranjar um emprego no ramo, assim como ele e nossa mãe.
Minha irmã não diz mais nada, contudo, consigo ver a apreensão
tomando conta de cada traço de seu rosto. Começo a preparar um chá de
camomila, um dos seus favoritos. Quando está pronto, o sirvo em uma
caneca e entrego em suas mãos. Emery bebe enquanto comenta sobre um
dos professores de seu curso ter pego no seu pé pelos atrasos. Conversamos
mais algumas amenidades até que ela se despede e vai embora.
Hunter ainda está jogando na sala quando começo a subir as escadas
até o andar de cima. No meu quarto, ligo o computador e checo os meus e-
mails. A grade de horários que enviei para Scarlet está com uma nova
atualização. Eu o abro.
Atenciosamente,
Scarlet.
Evan.
Quando Cam bate na porta do meu dormitório, estou com três velas
acesas. Abro para ela, e seus olhos vão das chamas alaranjadas para o meu
rosto. Sem a presença de Viper, aproveitei para relaxar e organizar a mente,
enquanto todas as questões da faculdade me sufocam. Cameron acha isso
esquisito, mas sei que ela não tem coragem de admitir em voz alta.
Fecho a porta e me viro para Cam. Ela começa a farejar o ar, passando
os dedos nos potes de vidro onde estão as ceras das velas.
— Claro que gostei! Inclusive, não tem nenhuma sobrando para mim?
Foi o único horário que consegui conciliar com Evan para os estudos.
Agora não são nem três da tarde, então tenho um tempo livre até lá. Talvez
dê para ensinar algumas técnicas de yoga para Cameron. Contei a ela sobre
o monitor, excluindo a parte de sua identidade.
— Acho que vou embora. Nos falamos depois, ok? Vou deixar seu
burrito aqui.
— Espera.
De pé, pego uma vela no armário e entrego para Cameron. Assim que
minha amiga fecha a porta, indo embora, Viper sai do banheiro. O rímel e o
lápis preto estão borrados, criando rastros assustadores em volta dos olhos.
Quando percebe que estou a inspecionando, o rosto se contorce em uma
expressão de ódio.
— Quer? — ofereço.
— O que é isso?
— É um burrito de frango.
Como sempre, seu rosto bonito parece sério. Os cabelos pretos estão
bagunçados de um jeito charmoso, e ele veste uma jaqueta de couro preta,
com uma camiseta branca por baixo. O cara cheira à limpeza; alguma
colônia masculina, prestobarba e o característico aroma de lavanda daquele
sabonete genérico de supermercado que todo mundo compra.
Solto uma risadinha, aliviada que ele não considerou tudo uma grande
estupidez.
— Mas como irei fazer dar certo? Quem vai querer se juntar a mim?
— Bom, pode ser uma forma de promover algum comércio local para
os universitários. Tenho certeza de que alguém irá aceitar a oferta. Há várias
lojas sustentáveis no centro de Crystalville. Só precisa ir lá em algum final
de semana e divulgar sua proposta.
— Verdade, irei fazer isso. Bom, obrigada. Foi você quem sugeriu o
projeto. Não sei o que eu faria sem… tudo isso. — Me refiro à parte da
monitoria no geral, não apenas a ideia isolada de Evan.
— Sem problemas. É o seu cérebro que está formulando todo o resto.
Aceite os créditos, Scarlet.
ACHO QUE FOI uma péssima ideia ter aceitado o convite de Cameron
para sair na sexta-feira. O Blizzard, pub universitário para onde viemos,
ironicamente, está cheio de universitários. Fico num canto, com uma
garrafa de cerveja que já está esquentando contra a palma de minha mão,
enquanto Cam e seu pessoal estão entretidos na pista de dança.
Não conheço ninguém aqui, exceto ela. Por mais que Cameron tenha
tentado me convencer de dançar, não estou no clima. Na verdade, tenho
estado muito estressada ultimamente por conta das aulas e todo o restante.
Ela havia se dado conta, vez que me persuadiu a vir para cá dizendo que eu
precisava relaxar, embora tivéssemos conceitos diferentes dessa palavra.
O rosto dela está corado e, pelo novo brilho no olhar, sei que ela deve
estar meio bêbada.
Essa parte do Blizzard está mais calma. Não há tanta gente aqui atrás,
apenas dois jogadores. Demoro para perceber que um deles é Evan. Ele está
curvado sobre o feltro verde, segurando um taco. Quando faz sua jogada, as
bolas tilintam umas contra as outras e uma delas é encaçapada. Assim que
se ergue, percebo o cigarro preso entre os dentes. Com a mão livre, ele dá
uma tragada, solta a fumaça e bate as cinzas no chão.
Como um ímã, seu olhar encontra o meu. Fico parada, a apenas alguns
passos de distância. Evan usa uma jaqueta de couro marrom, já que a outra
está comigo. Não tive oportunidade de devolvê-la. Já faz sete dias desde a
última vez que nos vimos, por conta de sua agenda apertada.
O seu oponente, Dan, olha para mim e para Evan com os olhos
semicerrados, mas não diz nada. Em seguida, entrega seu taco em minhas
mãos e some pelo espaço. Outra onda de gritos atravessa o ambiente,
fazendo meus tímpanos doerem. Esboço uma careta.
Ok. Eu tenho o fator surpresa, vez que desde pirralha jogo com meu
pai e meus tios. Aguardo enquanto Sutton prepara a jogada, lançando as
bolas brancas sobre as outras, que se dispersam em uma dança frenética
pelo feltro.
— Nem eu.
— O Valhalla.
Arqueio as sobrancelhas.
— Não exatamente. Valhalla quer dizer “sala dos mortos”. É para onde
as Valquírias levavam os melhores guerreiros que morriam em campos de
batalha, escolhidos por Odin. Tem uma bebida com esse nome aqui no
Blizzard. Se conseguir bebê-la até o fim, você ganha um elmo viking.
— Nossa, você parece meio nerd agora — falo, em meio à uma risada.
Posso jurar que ele demora um pouco mais nos meus lábios, mas
provavelmente estou imaginando coisas.
— Sobre você. É injusto que tenha recebido uma ficha sobre mim e eu
só saiba seu nome.
— Eu sou original.
— Isso é mentira.
Evan apenas solta um risinho grave e faz um sinal com a mão para um
dos bartenders que circulam pelo bar. O rapaz se apressa, como se já o
conhecesse. Depois de fazer o pedido, demora alguns minutos para que o
Valhalla chegue.
Com uma taça longa de cristal nas mãos, o bartender atrai a atenção
das pessoas ao nosso redor ao colocá-la na mesa de sinuca. Outro
funcionário do pub se aproxima com os ingredientes. Uma garrafa de
absinto, vodka e tequila. Em seguida, uma gota controlada do que Evan
sussurra para mim ser pimenta habanero é adicionada.
Agora, temos uma pequena plateia nos observando. Dou alguns passos
para frente, colocando as mãos ao redor da taça. Então, sem hesitar, começo
a entorná-la. Meus olhos lacrimejam e a garganta arde. Consigo beber
metade antes que meu estômago dê uma volta violenta, fazendo-me parar e
abrir caminho pela multidão.
— Sem problemas.
Antes que eu possa chamá-la de volta, olho para o jogador, que está
com as sobrancelhas ligeiramente levantadas.
— Posso ir de táxi.
Sutton sinaliza para um táxi que passa pela rua. Meus pensamentos se
dissipam quando ele coloca a mão na base de minha coluna, me guiando
para entrar no veículo. Estou usando uma camiseta de mangas longas com
as costas abertas, o que significa que os dedos ásperos e quentes estão em
contato com minha pele. Sinto arrepios e tento me convencer de que é por
conta do vento gélido que chicoteia meu rosto e cabelos, mas, no fundo, sei
que não.
Sutton não diz nada até que cheguemos em frente ao alojamento. Olho
para ele e, surpreendendo nós dois, dou um beijo em sua bochecha. Com o
rosto enrubescido, saio do carro antes de esperar sua reação e fecho a porta
depressa, sem olhar para trás.
07
Josh: Você sabia que um polvo tem três corações? Sério. TRÊS. O que
será que acontece se um deles parar? Os outros param também?
Scarlet: Ah, e não fale sobre a Peppa na frente da Daisy. Ela pode
ficar magoada. Seja bonzinho.
— Bom dia.
Percebo que o olhar dele está fixo nos meus óculos, e me pergunto o
que pode estar passando pela sua mente. Meu rosto está sem maquiagem,
deixando em evidência as sardas e as bolsas escuras abaixo dos olhos. Os
fios alaranjados presos em um coque desleixado, com duas mechas caídas
nas laterais. Um moletom verde gigante completa o visual improvisado.
— Sim.
Uma resposta sem detalhes e direta. Pela forma que ele sai, é óbvio
que não está tudo bem. Contudo, não digo nada quando o jogador pega as
chaves do carro na mesa e murmura um “até mais” antes de sair da
biblioteca.
— Espere aqui fora. Tenho certeza de que não vai demorar muito.
— Posso ajudar?
Pisco.
Solto um suspiro. Bom, pelo menos não foi uma completa rejeição.
Posso fazê-la mudar de ideia.
Entendo como minha deixa para ir embora, antes que ela mude de
ideia e me expulse com um severo “não”. Cam ainda está na calçada
quando saio. Minha amiga parece um pouco cautelosa ao me analisar.
— Tá tudo bem?
Ela olha para mim com raiva.
— Foi mal — minha colega de quarto diz assim que abre a porta, me
surpreendendo.
— Todo mundo tem dias ruins. Você podia tentar só… não projetar
isso em outras pessoas. Que tal yoga para desestressar? — Não fico nem
um pouco surpresa quando ela esboça uma careta.
— Tudo bem, nada de yoga então. Mas o que você costuma fazer para
relaxar?
Não sei como alguém consegue relaxar escutando rock, mas não
retruco.
— Sim.
Me sinto enjoada.
Dou alguns passos para trás, a fim de sair do seu campo de visão.
Porém, tropeço nos meus próprios pés e, de repente, sinto mãos grandes e
quentes segurando meus ombros, evitando que eu me estatele no chão.
Apesar dele não ter nada a ver com isso, estou muito irritada, então
dou de ombros.
— Logan estava com uma garota e daí? Não é o fim do mundo. Foi
por isso que vocês terminaram, a propósito.
— Acho que você tá muito tensa com os estudos. Por que não sai com
alguém? Sem compromisso, sabe. Apenas diversão.
— Porque é.
Scarlet: Desculpa. Fui meio babaca hoje. Não tinha nada a ver com
você.
Começo a rir, mas então me dou conta de que… Merda, isso foi um
flerte? Cameron me encara através do espelho, com uma das sobrancelhas
arqueadas. Paro de sorrir e olho para a tela do celular, refletindo se devo
acrescentar algo. Quando ele também não diz mais nada, pergunto para
Cam, quebrando o silêncio:
Franzo o cenho.
— Como não? Foi ele quem colocou gelo na sua mão aquele dia,
depois vocês dois estavam juntos no bar…
Congelo. Evan é capitão do time de hóquei? Ok, isso definitivamente é
uma informação inesperada. Achei que ele só fizesse parte do time, não que
fosse uma peça fundamental dele. Agora está explicado por que todo
mundo parece respeitá-lo dentro e fora da CVU.
— Duas vezes. Não gosto do esporte, mas o hóquei dos Frozen Fury
vale a pena. — Cameron interrompe a fala para passar o batom vermelho
nos lábios. Ao terminar, prossegue: — Enfim, você devia transar com ele.
— Meu Deus! Será que dá para parar de falar nisso? — Enterro o rosto
em um travesseiro, sentindo minhas bochechas pegarem fogo. — Não tô a
fim, tá legal? — As palavras soam abafadas.
— Ok, mas acho que uma hora você vai mudar de ideia. — Há uma
pequena pausa. — Tô pronta.
— Bom encontro.
Não estou conseguindo relaxar. Nem mesmo as velas e o yoga limpam
minha mente como o esperado. Largo a caneta de maneira brusca,
ignorando os cálculos que precisam ser revisados. Eu devia ter combinado
um novo horário com Evan, mas deixei que meu orgulho interferisse até
nisso.
Ergo o olhar e vejo Evan parado diante de mim. Ele joga alguns livros
na mesa e puxa a cadeira à minha frente. Fico sem reação. Deveria existir
um manual com instruções de como agir quando alguém que você está
evitando aparece de repente.
Que droga foi essa? Olho para o jogador, que parece tão surpreso
quanto eu.
Eu sei que NHL significa National Hockey League, mas não faço ideia
de como funciona os bastidores, nem o processo de seleção. Começo a
riscar a margem do livro, alternando o olhar entre as nuvens que estou
desenhando e o escrutínio de Evan.
A frase dele faz com que a caneta escape dos meus dedos.
É claro que ele não estaria sugerindo outras coisas. Pego a caneta outra
vez e falo:
— Gosto da biblioteca.
Faz tempo desde que não os coloco. Desde o acidente, prometi a mim
mesma que não me arriscaria no mundo da patinação artística.
Fico sem fôlego. De repente, parece difícil até respirar. Fecho a caixa
depressa e a empurro para debaixo da cama, na tentativa de afastar todas as
memórias que querem me inundar. Essa é uma parte do meu passado que
prefiro manter nas sombras. Quando me recomponho, pego o celular e
digito uma mensagem para Evan.
Está frio no campus, então visto um casaco antes de sair. O táxi que
pedi me espera na frente do alojamento. São poucos minutos daqui até o
casarão onde Evan mora. Assim que o carro para no meio-fio, agradeço ao
motorista e desço, atravessando o gramado até a porta da frente.
Antes que eu possa dizer qualquer coisa, Evan aparece atrás dele. Com
o rosto sério, diz:
Sigo Sutton até entrarmos em uma das portas do corredor. Não consigo
evitar meu escrutínio. Examino desde as paredes brancas até a prateleira de
livros metodicamente organizada por cores e tamanhos. O quarto não diz
nada sobre Evan, apenas deixa claro seu pragmatismo e disciplina. Os
lençóis na cama estão impecáveis, sem uma única dobra.
Antes que eu possa dizer qualquer coisa, Evan se levanta e vai até o
armário. Seu corpo está coberto em questão de segundos. Ignoro o
comentário e o impacto que teve em mim, focada em começar a revisão.
Depois de alguns momentos, estou fazendo um resumo com sua supervisão.
Não sei quanto tempo passa, mas começo a sentir fome e minhas
costas doem. Estico o corpo na cadeira, estendendo os braços acima da
cabeça. Demoro a perceber que minha blusa subiu com o movimento e
expôs minhas costelas, e sinto o olhar dele queimar neste ponto.
Envergonhada, deixo as mãos caírem sobre o colo.
— A não ser que você seja uma daquelas pessoas que não comem
carne.
— Scar.
Ai, meu Deus. O que foi que eu acabei de dizer? Minhas bochechas
esquentam.
Engulo em seco.
— Sim.
— Boa escolha.
— Se importa?
— Não — respondo, já que estamos na sua casa. Não cabe a mim ditar
para ele se fumar ou não é apropriado.
— Pontos extras.
Sinto que há mais por trás dessa resposta monótona, então insisto:
— Só isso?
Reparo que existem diversas nuances de Evan que ele não permite que
as pessoas vejam. Olhando de forma supérflua, qualquer um presume que
ele é apenas um cara bonito e fútil. Eu fui uma dessas pessoas. Agora, noto
que me equivoquei. Esse outro lado de Sutton me hipnotiza, como se
houvesse um campo magnético que me atrai em sua direção. Passo a ponta
da língua entre os lábios, umedecendo-os, e solto uma respiração pesada
perto da taça de vinho. Então, tenho a constatação de algo: quero conhecê-
lo melhor, entendê-lo…
— Eu amo o hóquei. — Sutton continua tragando o cigarro, vez ou
outra suas palavras saem envoltas de fumaça. — Mas, às vezes, não parece
o suficiente.
— Entende mesmo?
Sua resposta final faz com que eu ria. O jogador ergue as sobrancelhas
em minha direção e mantém um breve contato visual. Logo em seguida,
volta sua atenção para o painel. Fico observando-o de perfil, o cabelo
bagunçado, os músculos de seu braço contraindo conforme ele se mexe e as
mãos firmes ao redor do volante. Reparo em seus dedos longos e, quando
pensamentos inapropriados começam a me bombardear, viro o rosto para a
janela, envergonhada.
Que merda tem de errado comigo hoje? Acho que Cam tem razão.
Estou muito pilhada ultimamente, louca para liberar essa tensão de alguma
forma. Para a minha sorte, não demora muito até que o dormitório surja no
campo de visão. Quando Evan estaciona, praticamente me jogo para fora do
carro, tropeçando no gramado.
— Ferrari, é bom que você esteja sóbrio — sr. Wilson, nosso treinador,
fala alto o suficiente para que sua voz alcance todos nós no gelo.
— Acho que não vai dar. Estou aguardando resposta para uma
monitoria hoje.
Hunter me olha com curiosidade, mas não diz nada. Sei que para ele,
ser monitor é uma burrice, mas não me importo. É algo que faz sentido para
mim. Ele se despede e vai até os chuveiros. Antes de segui-lo, checo as
notificações do meu celular. Scarlet ainda não respondeu, então apenas vou
até o vestiário.
Fico olhando para a tela enquanto os três pontinhos que indicam que
ela está digitando continuam a aparecer. Então, o celular vibra contra a
minha palma.
Scarlet: :)
Caminho até ele, que está sentado sozinho perto das janelas com
óculos escuros. Arqueio as sobrancelhas em sua direção e tomo um assento
à sua frente.
— Nada — é tudo o que digo para não admitir em voz alta que estou
tomando um gelo de uma garota. — Por que está usando óculos aqui
dentro?
— Fiquei com alguém sexta, mas não sabia que a garota tinha
namorado. Ele me pegou desprevenido, foi um gancho esquerdo e tanto.
— Ela?
— Emery — esclareço.
Ignoro a rixa infantil que eles têm um com o outro e termino de engolir
uma garfada das panquecas com bastante xarope de bordo antes de dizer:
— Bom, posso dar um jeito nisso, mas vocês dois ficam me devendo
uma. — Minha irmã devolve os óculos para o rosto dele depois de analisar
o estrago feito.
— Vou ter uma conversa com ele, mas não se intromete. A Emy vai
ficar furiosa se souber que visitei o babaca e ainda levei você comigo.
Jones parece surpreso enquanto seu olhar alterna entre mim e Hunter.
O choque logo é substituído por desconfiança. Ele passa uma das mãos pelo
cabelo bagunçado e trava o maxilar coberto por uma sombra de barba. Não
sou alguém que cria estereótipos, mas não entendo como Emery se
apaixonou por esse cara.
— Aposto que sim, mas acho que você vem se auto sabotando e
colocando defeitos superficiais em todo potencial cara só porque está com
medo.
— Acho que ele está vindo até aqui… Bom, preciso encontrar alguns
amigos para revisar um tópico chato. Depois te mando mensagem, ok?
Antes que eu possa segurar seu braço e implorar para que não vá, ela já
está de pé ajeitando a bolsa no ombro. Solto um suspiro quando Cameron
pisca em minha direção e se distancia. Afundo no assento e mantenho o
olhar preso em meus tênis. Vou matá-la por isso!
Solto uma risadinha sem graça antes de reunir coragem e olhar para
cima. Ele está certo, estou encurralada e não adianta mais tentar fugir. Evan
se senta à minha frente, sem qualquer hesitação em seus movimentos. Ele
cruza os braços fortes em frente ao peitoral largo e me olha, sério. Ai, meu
Deus. Por que acho isso sexy? Tento colocar a culpa nos hormônios, mas
nem estou perto do meu período fértil. É mais fácil admitir para mim
mesma que Evan é muito atraente, principalmente quando não tem
nenhuma pretensão de ser.
— Você vai?
— Quero ir, mas não sei se irei conseguir. Então, prometo tentar.
Enquanto fixo meus olhos em suas costas largas, meu celular vibra em
cima da mesa. Baixo o olhar e vejo que são notificações de Josh, um dos
meus irmãos caçula.
Josh: Espero que você tenha uma desculpa boa para estar ignorando
minhas mensagens.
Josh: O papai disse que na época que fazia faculdade, estava cheio de
mauricinhos tentando roubar a nossa mãe dele. É isso que estão fazendo?
Tentando roubar minha irmã de mim?
Josh me manda diversos emojis que não sei decifrar o que significam e
enfio o celular no bolso. Me levanto da mesa da cafeteria e suspiro antes de
começar outro dia de estudos na CVU.
— Você podia não ter feito isso.
Por que é que não fico surpresa? Consigo imaginar Viper abrindo
corpos com naturalidade enquanto escuta Elvis Presley ou algo do tipo.
A CASA DOS meus pais fica situada em um dos bairros mais nobres de
Crystalville. Evito fazer muitas visitas, já que elas sempre vêm carregadas
com uma dose extra de tensão. Além do peso que Phillip e Abigail
carregam por serem considerados os melhores advogados da cidade, há
também as expectativas criadas em relação ao meu futuro e o de Emery.
Não sei o motivo de meu pai ter me ligado durante a semana, exigindo
que eu estivesse aqui na manhã de um sábado. Deveria estar no campus da
CVU. A palestra da Scarlet deve ter começado neste momento, então me
apresso para ao menos ter tempo de encontrá-la durante a feira orgânica.
Desço do carro e enfio as mãos dentro do bolso de minha jaqueta, uma
tentativa inútil de conter a ansiedade.
— Trouxe da última visita que fiz na Índia, seu pai surtou pelo valor,
então tire os sapatos.
Quando entro no escritório, meu pai está sentado atrás de uma grande
mesa de madeira. Ele termina a conversa no telefone e me analisa. Não sei
o que Phillip está pensando, mas movo a cabeça respeitosamente ao
cumprimentá-lo.
— Pai.
— Estou dizendo que o senhor devia deixar que nós façamos nossas
próprias escolhas. Sou grato por tudo o que você me permitiu e me permite
até hoje, mas não vou me tornar um jogador de hóquei profissional se não
tiver certeza de que é o que quero fazer.
Sinto raiva por meu pai usar isso contra mim. O apoio financeiro dele
e de minha mãe não deveria ser como um balde de água fria. Não espero
que ele continue me fornecendo dinheiro para sempre. Depois que me
estabelecer em alguma carreira, farei questão de devolver cada centavo que
Phillip investiu na minha educação.
— Isso é tudo? — questiono, depois de alguns momentos de silêncio.
— Por que não vai a um dos jogos da CVU? A Emery abre as partidas
com a equipe.
Mamãe não diz nada. Nós dois sabemos que meu pai nunca iria à CVU
para um simples jogo, já que sua agenda lotada de compromissos
importantes não o permitiria. Me despeço de Abigail com outro abraço
longo. Desta vez, reparo no quanto ela parece frágil. Ou talvez, eu tenha
crescido mais do que o esperado.
— Envia o endereço.
Hunter tem uma relação conturbada com Hanna. Ela é uma mãe
ausente, que só aparece para tornar a vida dele mais difícil. Desde sempre,
Ferrari e seus pais cuidaram de Bella. As únicas vezes que ouvi falar de
Hanna foram em conversas desagradáveis, como essa.
Solto uma risada baixa ao lembrar das vezes em que imploramos para
ela preparar os Cannolis. É tentador entrar, mas estou ficando sem tempo.
Prometi a Scarlet que faria o possível para estar lá.
Bella fala durante todo o trajeto até a casa de Hunter, contando o que
fez durante a semana. Alterno minha atenção entre o trânsito e sua voz
infantil até que ela canse e adormeça. Quando chegamos, Hunter já está em
pé na entrada. Ele mal espera eu parar o carro para abrir a porta e
desafivelar o cinto de Bella no banco de trás.
— Sim.
— Olhe o celular. Acho que ela vai precisar de apoio depois dessa.
— Tá legal! Tem uma foto sua circulando pelo campus… Achei que
você fosse querer saber da forma menos agressiva possível.
— Ei, sei que é uma situação péssima, mas não permita que ele faça
isso com você…
— Você não pode fazer isso! Não pode deixar ele vencer!
— Um pouco.
Quando acordo, não sei que horas são e minha cabeça dói. Tento
alongar as pernas, mas acabo chutando algo. Confusa, abro os olhos. Tenho
que piscar algumas vezes para assimilar a imagem à minha frente: Evan
Sutton sentado na ponta da minha cama com um livro aberto nas mãos.
Assim que nota minha agitação, olha para mim. Me sento com uma rapidez
que faz minha mente girar.
Antes que eu possa questionar o que ele está fazendo no meu quarto,
Evan esclarece:
— Sua colega de quarto me deixou entrar. Ela teve que sair outra vez.
O tom de voz é muito calmo, assim como sua expressão. Parece até
que fazemos isso o tempo todo. Eu nem sabia que ele conhecia o número do
meu dormitório, mas lembro de quem ele é: capitão do time de hóquei,
bonito, popular... Conseguir esse tipo de informação deve ser fácil para
Sutton. Meu rosto cora ao imaginar se Evan viu a foto. No entanto, um
balde de água fria recai sobre mim. As chances dele não ter visto são
praticamente nulas.
Agora que meu sono passa, absorvo a imagem de Evan. Ele está
usando uma jaqueta esportiva e um boné de beisebol, segurando um livro na
palma. Percebo que é um dos meus romances.
Sua resposta quase me faz rir, porque é uma grande mentira. Sutton
está aqui porque acha que eu preciso de ajuda depois da foto que está
circulando. Talvez um ombro para chorar seja realmente uma boa ideia.
Peço um minuto e vou até o banheiro. Me olho no espelho e contenho um
gemido de frustração. Desembaraço o cabelo, escovo os dentes e passo um
pouco de desodorante. Quando volto para lá, Evan me fita.
— Eu gostei do seu lado do quarto. Não sabia que tinha tantas pedras
da lua.
— Me mostra a aromaterapia.
— Tudo bem?
O silêncio paira no ar, e desvio o olhar para longe. Evan sabe do que
estou falando, é por isso que ele está aqui, tentando me fazer sentir melhor.
Esse seria o papel que Cameron desempenharia, se não estivesse longe, na
casa de seus pais.
— O quê?
— Por quê?
Quando ele volta, com as caixas empilhadas nos braços, o cheiro faz
minha barriga roncar. Teoricamente, Sutton sequer poderia estar aqui, no
alojamento feminino. Mas é sábado e o movimento é quase deserto, o que
deve ter facilitado a entrada dele.
Ele fecha a porta e senta ao meu lado na cama. Enrijeço assim que seu
ombro toca o meu.
— Ele foi embora assim que eu voltei. Você estava dormindo feito
uma pedra.
Não sei o porquê, mas sinto como se tivesse perdido algo importante.
— Entendi…
14
EU ME LEMBRO da primeira vez que pedi aos meus pais que me
levassem para patinar. De início, eles acharam que seria apenas mais um
programa de domingo em família. Fomos até o centro de Green Lake,
alugamos os patins e entramos na pista comunitária. Era Natal, então uma
boa parte da população estava lá, tentando se equilibrar no gelo sobre duas
lâminas. Mas, em meio àquela confusão de gente desajeitada, havia uma
mulher que patinava graciosamente.
Na minha cabeça, para ela, parecia tão fácil quanto respirar. Quando a
mulher deu um salto que desafiava as leis da física para a mini eu de apenas
dez anos, decidi que seria tão boa quanto ela. Foi então que comecei a
trabalhar com minha mãe no negócio da família. Eu ficava no hortifruti
durante a semana inteira, depois da escola, ajudando os clientes a empacotar
as compras. Recebia três dólares por dia e algumas gorjetas. Em poucas
semanas, consegui comprar meus próprios patins.
Ele dá de ombros.
— Fala sério, Scar! Não pode deixar a faculdade para trás por causa do
seu ex-namorado babaca.
Antes que eu possa respondê-la, Cam e eu recebemos mensagens ao
mesmo tempo. Nossos telefones bipam em sincronia diversas vezes e até
paro de chorar. Trocamos um olhar significativo, em silêncio. Sinto meu
coração disparar. Quando isso acontece, é porque algum boato está se
espalhando pelo campus.
Pego meu telefone e vejo que só estão falando sobre Evan agora, em
todos os grupos da universidade. É como um vírus se espalhando
rapidamente. Meu celular vibra contra a palma e uma notificação nova
chega.
Assim como eu, ele não parece se importar com o fato de que a chuva
está o encharcando. Sua beleza é avassaladora.
Quero beijá-lo.
Então, é o que faço no próximo segundo. Colo minha boca na sua sem
dá-lo a chance de reagir. De súbito, nossas respirações quentes se misturam.
Evan enlaça o braço ao redor da minha cintura, esmagando meu corpo
contra o seu. Me levanto na ponta dos pés para alcançá-lo melhor quando o
beijo se aprofunda.
— Nada.
15
NÃO CONSIGO PARAR de pensar em Scarlet e no beijo que ela me deu.
Tenho que admitir que é a primeira vez que sou pego de surpresa dessa
forma por uma garota. Enquanto ergo os halteres e começo uma nova série
de exercícios para os ombros, tento me concentrar, mas toda vez que lembro
da maciez de seus lábios e do jeito como seu corpo se pressionou contra o
meu, sinto o fluxo de sangue ser direcionado para uma parte muito
específica do meu corpo.
Faz quanto tempo que não tenho relações sexuais? Desde que me
tornei monitor não transei com ninguém. Ao contrário dos meus amigos,
não acho interessante ter várias mulheres ao mesmo tempo. Ao longo dos
anos, sempre me envolvi com garotas que me atraíam além do físico. O
sexo casual se estendia por meses, até que elas finalmente desistiam de
tentar mudar minha opinião sobre relacionamentos.
Sempre deixei claro que, para mim, o romance está fora de cogitação.
Não tenho tempo para lidar com uma namorada e nunca senti que gostava
de nenhuma delas o suficiente para isso. Largo os pesos no chão, com a
respiração pesada, e aumento o volume da música nos fones. Paradise City
do Guns N' Roses explode nos meus ouvidos enquanto tento acalmar o
ritmo dos batimentos cardíacos.
— Você fica.
Alguns dos meus colegas de equipe passam por mim, dando tapinhas
nos meus ombros, como se me desejassem boa sorte. Espero até que o gelo
esteja livre e pergunto:
— O que houve?
Ah, se trata disso. Desde que espalhei aquela foto ridícula há quatro
dias, virei alvo de piadas no campus inteiro. Hunter riu por mais de cinco
minutos quando me viu pela primeira vez. Lionel e Dan fizeram um quadro
e penduraram no hall da nossa casa. Para completar, teve um episódio novo
no podcast dos alunos de jornalismo da CVU sobre a minha sunga.
Ignoro-o. Talvez assim ele cale a boca. No entanto, não poderia estar
mais errado. Isso parece diverti-lo e motivá-lo ainda mais.
Depois que envio, olho fixamente para a tela. Não costumo ter
encontros. Na verdade, acho que a última vez que levei alguém para sair
ainda estava no colégio. Quando entrei na faculdade, a ordem das coisas
pareceu ficar estreita: estudar, praticar hóquei e sexo, sendo o último item
da lista opcional.
— Vai ter que superar uma hora — retruco, fazendo ela soltar um
grunhido.
— Sinto muito.
— Sinto muito que você esteja sofrendo por alguém que não vale
nenhuma das suas lágrimas. Isso me deixa triste para caralho.
Começo a respondê-la.
Evan: Sim. É um encontro.
Não faço questão de dizer a ela que será algo diferente disso. Não
gosto de jogos. Estou interessado em Scarlet. Espero pela resposta, mas,
aparentemente, Scar já largou o celular. Como perdi o interesse no filme,
resolvo buscar algo para beber.
— Não dá. Elas estão em três. — Lion bufa. — Quebra essa, Evan.
Você sabe como funciona. Dan e eu pegamos as morenas e você fica com a
loira.
— Faz parte — é tudo que digo. Como capitão, preciso exigir o melhor
desempenho da equipe, mas, acima de tudo, apoiá-los na derrota e ser o
líder que eles esperam. — Vamos conversar melhor na segunda-feira, agora
preciso ir.
Scarlet aparece alguns minutos depois. Ela corre até meu carro, que já
está com as portas destravadas, e entra apressadamente por conta da chuva.
Inspeciono-a da cabeça aos pés. Scar usa um pouco de maquiagem, com um
esfumado marrom que destaca as íris verdes, tornando-as ainda maiores e
mais vibrantes. O rosto está corado, e os lábios brilham com uma camada
de gloss. O cabelo ruivo está solto, e quando ela se move para colocar o
cinto, o cheiro de frutas vermelhas que exala das madeixas me atinge. O
decote em sua blusa não passa despercebido por mim, mas mantenho o
olhar fixo em seu rosto.
— Oi.
A voz sai baixa e rouca, e eu me esforço para não beijá-la com tanta
força que ela me acharia um filho da puta louco.
— É legal.
— Podemos ir?
— Claro — respondo.
Fico confuso. Isso quer dizer que Scarlet odiou o nosso encontro? Não
sei o que pensar enquanto andamos em direção ao carro. Não quero que ela
lembre desta noite como qualquer outra. Então, deslizo uma de minhas
mãos em sua cintura quando nos aproximamos da picape, prensando-a
contra a lateral do carro no estacionamento deserto e escuro.
Como está usando uma saia, tudo o que precisa fazer é tirar a calcinha.
Quando ela faz isso, volta a me beijar. É urgente. Acho que vou morrer se
não entrar dentro dela o mais rápido possível.
Abro a porta do banco de trás e espero que Scarlet desça para fechar a
porta e abrir a do passageiro. Outra vez, não consigo decifrar o olhar em seu
rosto. Durante o trajeto até o alojamento, ficamos em silêncio, mas é
estranho. Assim que estaciono, ela tira o cinto e começa a abrir a porta.
Contudo, seguro seu braço.
— Scarlet, eu…
NÃO ACREDITO QUE transei com Evan na sexta-feira. Toda vez que me
lembro disso, me sinto estranha, como uma impostora. Tá legal, talvez seja
um exagero, mas Logan é o único com quem fiz sexo. Correção: Logan e
Evan, a partir de agora. Acho que estou estranhando porque foi algo casual
e, para mim, o sexo só rola dentro de um relacionamento. Meu Deus, onde
eu estava com a cabeça?
Em contrapartida, vou ser uma mentirosa se disser que não gostei. Foi
incrível. O físico de Evan é… nossa. Toda vez que lembro dele embaixo de
mim, o corpo forte e cheio de músculos vibrando em um orgasmo, me sinto
uma pervertida, vez que automaticamente tenho vontade de repetir a dose.
É loucura, certo? Caras como Evan Sutton nem devem repetir a mesma
garota. Estremeço só de pensar que fui apenas mais uma com quem ele
transou, mas deixo o pensamento de lado. Preciso da minha mente limpa
enquanto pratico yoga, caso contrário, não vou conseguir relaxar o
suficiente.
Minha concentração dura por um minuto, até que meu celular comece
a tocar e eu abra os olhos, bufando. Apanho o aparelho e vejo que é uma
chamada de minha mãe. Desde que minha foto vazou, tenho medo de que,
de alguma forma, meus pais tenham ficado sabendo, o que me levou a
evitá-los. No entanto, é impossível fugir do radar das mães, especialmente
de Lily. É como uma espécie de superpoder.
— Oi, querida. Está tudo bem? Faz tempo que você não liga.
— Desculpa, estava concentrada com o prazo final do projeto.
Consegui recuperar as notas.
Estou muito ansiosa para ir para casa e ver meus irmãos caçulas.
Tenho medo de que eles me esqueçam.
— E daí?
— E daí que você tem que parar com isso. Tenho uma fantasia
sobrando, vamos para uma festa na maior fraternidade do campus.
Sua presença é impactante o suficiente para que eu olhe para ele por
alguns segundos. Volto-me para Viper e percebo que seu rosto está branco
feito papel, como se ela tivesse visto um fantasma. Abro a boca para
perguntá-la o que aconteceu, mas uma voz grave atrás de nós me
interrompe:
— Achei você.
Ele ri.
— Não quero que as coisas fiquem estranhas entre nós — diz, com
sinceridade nos olhos cinzentos. — Não pretendo te tratar diferente, Scar.
— Ah, é? — indago. — Então você não vai dar um chute na minha
bunda e nem falar que não repete a transa?
— Não sei como funciona. Nunca fiz desta forma antes… me assustou
um pouco — admito, me sentindo patética. Dou um gole na cerveja ruim,
numa tentativa de que o álcool amenize um pouco do meu embaraço.
— Claro que entendo. A maioria das pessoas também acha que sou um
otário, e nem culpo ninguém por isso. É como os caras do time se
comportam, tenho que admitir. — Dá de ombros. — Mas, já que estamos
nesse assunto… Quero que você seja minha amiga colorida.
Arregalo os olhos, surpresa. Uma parte minha quer aceitar, mas a outra
está receosa demais, temendo que tudo isso não passe de um jogo e que
Evan seja um idiota. Limpo a garganta e, com calma, respondo:
— Não.
Sutton mal esboça reação. Ele se aproxima, tirando uma mecha de
cabelo ruivo que cai sobre meu olhar. O simples toque de seus dedos contra
minha pele desencadeia uma onda de arrepios pelo meu corpo. Que merda é
essa?
Droga, talvez ele esteja certo, mas não irei dar o braço a torcer.
— Vai ter que desistir, capitão. Essa é minha resposta final. Inclusive,
fiquei sabendo que o time da CVU não vai bem. — Desvio o foco do
assunto. — Não devia estar concentrado em nos trazer orgulho ao invés
disso?
— O quê?
— Vou vencer cinco jogos seguidos, então você será toda minha.
Merda.
Quero fazer isso, já que o sexo foi incrível e, além do mais, não
precisarei estar presa a um relacionamento. No entanto, não quero parecer
desesperada, então respondo:
— Com regras.
— Sem regras.
— Apenas sincero.
Na verdade, já tive uma amostra no carro, mas não quero dá-lo pontos.
Sutton sorri ladino, como se estivesse pensando a mesma coisa que eu.
— Cinco jogos e você vai ser a nova extensão da minha cama, porque
nunca mais vai querer sair dela.
Como Viper parece bem, respeito o espaço que ela impõe. Não quero
me intrometer e afastá-la agora que estamos ficando próximas. Se um dia
ela quiser compartilhar algo comigo, serei todo ouvidos. Mas, por enquanto,
tenho que respeitar seus limites.
— Você é impressionante.
— Não vou atacar você, relaxa. Não tem ninguém lá, mas prometo me
comportar. É claro que, se você quiser, eu não irei ser contra.
— Sinto muito, mas vou ter que negar. Boa noite. Até mais.
Sem lhe dar tempo para contrariar, começo a me enfiar entre os corpos,
indo até a frente da casa para chamar um táxi. Deixo Sutton para trás, assim
como fiz no dia do cinema.
18
— AINDA NÃO SEI como você convenceu nossa mãe a vir no jogo de
hoje.
Emery parece impressionada com este fato, mas a verdade é que nunca
convidamos Abigail antes. Minha irmã gêmea e sua equipe de cheerleaders
já estão prontas para a abertura da conferência. Jogamos em casa, o que é
uma vantagem sobre o time adversário. No entanto, isso não significa que
podemos vacilar. Já avisei todo mundo para manter a cabeça na porra do
gelo, até porque preciso que todas as próximas cinco partidas sejam dos
Frozen Fury. Estou muito perto de colocar as mãos em Scarlet outra vez,
que é a única coisa que consegui pensar durante a semana inteira.
— Nossa, isso foi intenso. Não entendi nada do que houve no jogo,
mas estou orgulhosa de você, Evan.
As palavras significam muito para mim. Acho que faz mais de sete
anos desde que minha mãe me viu jogar. Agora, posso dizer que estou no
nível profissional.
— Obrigado, mãe.
— Onde está a Emery?
— Acho que ela não saiu do vestiário feminino ainda. Vai esperar?
— Entendi.
Scarlet: Parabéns :)
É o que Cameron diz depois que desabafo sobre meu encontro. Claro,
distorci algumas coisas. Não contei para ela que “Alfredo” é, na verdade, o
Evan. Em minha defesa, foi o primeiro nome que me veio à mente depois
que ela me jogou contra a parede e viu a caixa de preservativos que comprei
na noite passada em cima da cômoda. Por que diabos comprei
preservativos? Nem comecei a transar oficialmente com o jogador e já estou
fazendo um estoque.
Óbvio, também não falei que já transei com o Evan-Alfredo para Cam.
Ela acha que fomos ao cinema e demos alguns amassos no carro.
— Claro que está. Se quer saber o que eu acho, dá logo para o cara.
Não tem nada de errado nisso. Você tá a fim e ele também. Nossa, que
crime praticar sexo casual! — Rola os olhos, impaciente.
Franzo o cenho.
— Como assim matar essa parte minha? Não é assim que as coisas
funcionam, Cam.
— Cria um alter ego, sei lá. Uma Scarlet que não ligue para isso, que
seja livre e queira apenas se divertir e ter orgasmos. Ative o alter ego toda
vez que for transar e separe sua versão de acadêmica romântica da versão
que tá pronta para explorar novos territórios.
Por mais loucura que pareça, acho que Cam está certa, e o Evan
também. Como foi que ele disse? Adiar o inevitável. Sei que provavelmente
ele dará tudo de si para vencer os cinco jogos. Droga, quem eu tô querendo
enganar? Quero tanto o Evan quanto ele me quer. Só sou medrosa demais
para admitir ou aceitar isso.
Evan: Oi, cenourinha. Vou ficar sozinho em casa hoje. Se quiser vir
para cá, você é bem-vinda.
Evan: E relaxa, não vamos fazer nada que você não queira.
Acho fofo como Evan sempre deixa claro que as coisas só vão
acontecer quando eu quiser e nunca me trata como se eu fosse apenas o
disque-foda dele. Rapidamente, digito uma resposta e envio, antes que
mude de ideia.
Quando Cam vai embora do meu dormitório, já são quase cinco horas,
então começo a me arrumar. Tomo banho, lavo o cabelo e o seco com o
secador. Depois, visto uma blusa floral que realça meus seios e uma calça
jeans apertada. Quando estou pronta, passo um perfume suave com cheiro
de morango. Me olho no espelho, constatando que está bom. Talvez só falte
um pouco de rímel. Depois, aviso para Evan que estou a caminho e peço o
táxi.
— Não sei por que você tem que agir como se nós fôssemos inimigos.
Eu rio.
Rolo os olhos tão forte que me surpreende que eles não tenham dado
uma volta completa no meu crânio. Ignoro Logan, agradecendo ao universo
assim que o táxi estaciona em frente ao alojamento. Caminho em direção ao
carro, deixando meu ex babaca parado em frente aos dormitórios. Assim
que entro no automóvel, bato a porta e dou o endereço para o motorista.
No trajeto até a casa de Evan, começo a sentir cólica e conto nos dedos
quando foi a última vez que menstruei.
Já faz quase trinta dias, o que significa que posso estar prestes a
começar a sangrar. Entro em pânico e quase peço para que o taxista dê meia
volta, mas já estamos parados em frente ao casarão, e Evan se encontra de
pé na calçada. Ele abre a porta para mim e paga o motorista.
Entro antes que Evan possa dizer qualquer coisa. Me sinto meio
constrangida por ele ter ido comprar absorvente para mim, mas esse tipo de
coisa acontece, certo? Seguro o riso quando vejo a foto de Sutton pendurada
no hall. Fico no banheiro por cerca de quinze minutos, até que ouça o carro
do capitão estacionar do lado de fora. O motor da picape é inconfundível.
Duas batidas ressoam na porta.
— Olha só, cenourinha, comprei outras coisas para você. — Ele joga
outra sacola em cima do estofado.
Ele dá de ombros.
Eu rio.
É exatamente isso, mas não quero dar o braço a torcer. Jogo uma
almofada em sua direção, fazendo-o rir.
— Ah, fala sério! Como é que você descobriu? Eu não desconfiei nem
um pouco.
O jogador dá uma piscadela em minha direção. Não sei como, mas nos
aproximamos um pouco nos últimos momentos. Agora, há dois palmos de
distância entre nossos corpos. Por uma fração de segundos, meus olhos
caem para seus lábios e minha boca fica seca. Ai, que merda. Preciso parar
de encará-lo, então alcanço a sacola e pego o pacote de M&M’s. Enfio um
punhado na boca e começo a mastigar.
Percebo que foi uma péssima pergunta só depois que ela deixa minha
boca. Evan se aproxima um pouco mais, até que nossos braços estejam se
tocando. Não vire o maldito rosto, Scarlet. No entanto, contrariando o lado
racional, eu me viro, encarando-o fixamente. Agora, nossas respirações se
misturam e meu olhar encontra o seu. As íris cinzentas parecem prata
líquida.
— Vou mentir se disser que não, mas não foi por isso que te chamei
para cá. Gosto da sua companhia.
Sutton se afasta.
Evan mantém o olhar sério no rosto. Não sei a razão de ter citado
Logan, para falar a verdade. Foi meio automático.
Rio, mas fico um pouco surpresa. Pensei que Evan nunca tivesse
namorado antes. Talvez ele seja um cara que prefere relações casuais do que
estar “preso” a alguém. Deve ser bom viver assim.
— Ele tem uma filha? — Tento não parecer chocada, mas falho
miseravelmente. Minha boca está escancarada neste momento. Evan solta
uma risada baixa.
— É, a Bella. Acho que ela não vai se importar. Qual dessas cores
você acha melhor?
— Pode ser o verde. — Estendo minha mão esquerda para Evan, meio
desconfiada. — Você sabe o que tá fazendo, pelo menos? — Estou me
esforçando muito para não rir quando ele começa a abrir o vidro do esmalte.
— Foi por isso que você não topou sair com o resto dos caras? Sem
querer ofender — acrescenta, me fitando.
— Me diz, não é genial? O Evan não sabe de nada. Vou dar isso para
as garotas que eu achar interessante. Otimiza o tempo.
— É ótimo.
— Sim, senhora.
20
— Ah, sei lá, você tem passado menos tempo no dormitório e teve
aquele cara estranho na festa…
Sei que Viper provavelmente só fez essa pergunta para não falar sobre
si mesma, vez que ela nunca demonstrou interesse sobre a minha vida. Ok,
recado captado. Vou parar de xeretar.
— Vou à biblioteca.
— Obrigada.
Mesmo que tenha dito as palavras num tom de voz baixo, arregalo os
olhos e o repreendo, batendo o livro contra o seu peito. Evan ri baixo, e o
som grave é sensual para caramba.
— Vai ter que esperar um pouco, capitão. E para de falar sobre isso em
público.
É a minha vez de rir. Olho ao redor, não há ninguém perto desta seção.
— Acho que é melhor dessa forma. Eu não quero que você me entenda
mal, mas…
— Cinquenta e seis.
Evan ri de escárnio.
— Vou colocar na elevação pélvica. Consigo ter um controle melhor
do movimento com esse peso. Faço mais cadenciado. Seria bem legal…
— O quê?
— Scarlet… faz tempo que não te vejo — fala, incerta. — Não sabia
que você estava estudando na CVU.
Pisco, em choque.
— Entendo.
Agora, a feição dela evidencia pena. Odeio esse olhar. Invento uma
desculpa qualquer sobre um compromisso e me despeço, apertando o livro
com tanta força que os nós ficam esbranquiçados. É a primeira vez que
encontro alguém de Green Lake aqui em Crystalville, com exceção, é claro,
de Logan. Piper também era próxima de Lila e ficou tão arrasada quanto eu
quando ela se foi.
— Ainda não. Acho que vou passar o final de semana com ele. — Me
sento na sua cama. — Tô procurando um emprego. Mandei meu currículo
para alguns lugares ontem à noite.
— Seria ótimo.
— Desculpa. Eu e seu pai achamos que era melhor que você não
soubesse.
Não sei o que estou fazendo quando visto um casaco grosso e botas,
mas sei que preciso de uma distração. Pego minhas chaves e começo a
caminhada pelo campus em direção à arena, para me encontrar com Evan.
21
ESTOU TODO SUADO quando Scarlet anuncia que está vindo para cá
inesperadamente. Em vez de ir para o vestiário, decido esperá-la dentro do
rinque. Ainda uso os patins, já que estava reforçando o meu preparo junto
com o treinador Wilson. Algumas pessoas podem classificar isso como
loucura, mas para um atleta, o esporte é levado a sério mesmo fora dos
treinos e jogos oficiais. Todo o meu tempo gira em torno do hóquei
atualmente. Por isso, sempre estou me esforçando para aprimorar minha
força com treinos na academia e uma alimentação regrada.
— Do que é que você tem medo? Não vou te deixar cair, se essa é sua
preocupação.
Hesito.
— Tem certeza?
— Tenho.
— O quê?
— Talvez você esteja certo, mas mais do que ninguém, sei que nem
tudo o que amamos nos faz bem. Posso amar a patinação, porém, não é
para mim. E eu não quero falar sobre isso.
Seus olhos são direcionados para minha calça com a braguilha aberta.
Mesmo com a iluminação baixa, noto que o rosto de Scar adquire um tom
rosado.
As três palavras são o suficiente para meu pau pulsar. Agarro a parte
da frente do seu pescoço e a puxo contra mim, devorando-a em um beijo
faminto. Estou com tanto tesão que acho que irei explodir a qualquer
momento. Scarlet enfia a mão dentro da minha cueca, e estremeço quando
ela toca a glande.
— O quê?
— Isso que você fez agora há pouco. De movimentar o quadril.
— Não machucou?
Gozo tão violentamente que meu corpo inteiro estremece, e tenho que
apoiar uma das mãos na parede ao meu lado. A ruiva engole cada gota,
depois lambe os lábios inchados. Ela se levanta e eu a beijo outra vez,
puxando-a em direção aos chuveiros. Scarlet ri e se afasta.
Porra. Ela só pode estar brincando comigo. Não gosto da ideia de não
fazê-la gozar também.
— Scarlet… — aviso.
— Saí correndo antes que o Ev… Alfredo pudesse fazer mais alguma
coisa. — Dou de ombros, disfarçando por quase ter dito o nome do jogador
de hóquei em voz alta.
— Por quê?
Para ser honesta, nem mesmo eu sei explicar o motivo. Acho que
fiquei com medo de alguém nos encontrar lá. Não quero ser expulsa da
faculdade por atentado ao pudor.
— O Alfredo me convidou.
Acho que essa é a primeira vez que ela tenta puxar assunto comigo.
Acho que ela nem percebe, mas acaba de jogar aleatoriamente uma
informação no meio de nossa conversa. Como não faço ideia de quem é
Margaret, pergunto de maneira descontraída:
Arrisco olhar para ela, que tirou os fones, mas ainda está com as íris
presas na tela do notebook.
Ok, não posso forçá-la a falar, isso é algo que aprendi há muito tempo.
Quando encontro as polainas, pego uma calça legging preta e uma camiseta
de um time que eu nem sei qual é. Era do meu pai, e peguei para mim
quando me mudei para o campus. Acho que ele nunca percebeu isso.
Arqueio as sobrancelhas.
— Barbie?
— É, você seria uma Barbie botânica, algo assim. Você é tipo uma
daquelas garotas populares do ensino médio que tem interesse em ginástica
ou aquela merda de líder de torcida.
Não sei por que fico surpresa ao ver a quantidade de pessoas que tem
aqui. É muita gente. O som ao meu redor fica ensurdecedor conforme as
líderes de torcida entram no gelo e derrapam sobre as lâminas. A morena
que lidera a equipe é deslumbrante. Cabelo preto e sedoso, pele pálida e um
olhar que me parece familiar. Fico com a sensação de que já a vi em algum
lugar.
Entro na onda e coloco os dois dedos na boca para assobiar alto. Como
se estivesse procurando por algo ou alguém, Evan, o número nove, como
me informou outro dia, dispara os olhos na multidão. Prendo a respiração
quando ele foca o olhar em minha direção.
— Ok.
Percebo que é um erro assim que sinto sua ereção roçar no final das
minhas costas. Ai, meu Deus. Evan e eu estamos excitados no meio de seus
três amigos e sua irmã. Fico quieta durante o trajeto, que parece uma
eternidade, até a lanchonete. Quando Dan estaciona, praticamente salto do
carro, apressada.
Por outro lado, dá para notar que ela se dá muito bem com Evan e o
restante dos garotos, exceto Hunter. Sinto que estamos no mesmo barco.
Não sei qual é o problema, mas fico na minha.
— Tudo bem.
Pedi um hambúrguer com bastante batata frita. Evan está com uma
pilha de panquecas, dois pedaços de cheesecakes e três sanduíches, além de
uma vitamina. Não sei para onde vai tanta comida, mas, na verdade, é só
dar uma olhada para ele para entender que tudo isso é transformado em
puro músculo.
Ele começa a fazer círculos em minha pele por cima da calça jeans, de
um jeito ainda mais enervante do que fez no carro. Acho que vou
enlouquecer a qualquer segundo se ele continuar brincando comigo desta
forma.
— Tudo bem, Scarlet? — Dan pergunta. Ele está sentado bem à minha
frente.
Evan: Ou seja, uma tortura. Mas tudo bem, prometo que vou me
comportar. Agora volta para cá, cenourinha.
Quando volto para a mesa, todo mundo já terminou de comer. Para ser
honesta, perdi o apetite com Evan me tocando. Agora não consigo mais
pensar na comida e, sim, na forma como minha pele ainda arde, o que é
ridículo por diversos motivos, mas principalmente porque estou vestindo
calça! Nem foi um contato pele contra pele e já estou em chamas.
— Você não sabe o que você faz comigo, Scarlet. — O tom de voz
ressoa mais grave que o habitual. — Se soubesse tudo o que penso em fazer
com você…
Ok, agora estou surpresa. Não foi isso que imaginei quando falamos
sobre eu vir para cá. Na verdade, acho um pouco gentil da parte de Evan
por não vir para cima de mim sem ao menos dizer oi, mas, neste caso, eu
não me importaria nem um pouco. Na minha imaginação fértil, iríamos
começar a nos beijar no hall, derrubando os quadros das paredes enquanto
deixávamos o rastro de nossas roupas pelo carpete até o andar de cima,
onde transaríamos que nem coelhos.
Nós nos sentamos no sofá lado a lado e nego quando ele me oferece a
pipoca, porque não quero ficar com gosto de sal e manteiga quando formos
nos beijar. Evan despausa o seriado no episódio em que paramos e não
deixo de notar a distância que ele deixa entre nós dois. Franzo o cenho, mas
não digo nada. Será que estou cheirando mal ou algo do tipo? Não, isso é
improvável. Tomei banho antes de vir para cá, passei desodorante e o
perfume caro que meus pais me deram no ano passado que eu só usava para
circunstâncias especiais.
— Ele traiu mesmo a namorada dele com a melhor amiga dela? Parece
uma novela mexicana teen — Evan resmunga, fazendo-me pegar o controle
e pausar a série.
Quer saber? Que se dane. Corto a distância entre nós e subo no seu
colo, apoiando-me nos joelhos. Evan relaxa contra o sofá e coloca as mãos
na minha cintura, começando a fazer carícias em minha pele por baixo do
tecido da blusa. Sem conseguir conter a excitação, eu me esfrego contra ele
que nem um gato de rua no cio. O período fértil está me deixando maluca.
Espero que ele me leve para o seu quarto, mas me surpreendo assim
que chegamos no banheiro. Ao invés de ligar o interruptor, Evan pega o
isqueiro no bolso traseiro e acende uma vela em cima da pia de mármore.
Depois, ele volta a me beijar, segurando os dois lados no meu rosto entre as
mãos.
— Trouxe um brinquedo para você mas tem que prometer que vai ficar
quietinha, Scar.
Ai, merda, Acho que se ele continuar falando coisas assim, vou gozar
antes da penetração. Evan não tira minha calcinha, apenas a puxa para o
lado e eu gemo alto quando ele coloca o dedo indicador dentro de mim.
Meu corpo inteiro começa a arder quando ele começa a fazer o movimento
de vaivém. Começo a mexer os quadris, me contorcendo quando ele esfrega
o polegar no meu clítoris, que a este ponto já está úmido e inchado.
Então, ele puxa o meu cabelo com força e eu gemo quando minha
cabeça é jogada para trás enquanto ele começa a aumentar o ritmo de suas
estocadas. Tenho que enterrar as unhas nas palmas de minhas mãos, já que
não consigo fazer muita coisa com elas. Evan me empurra contra a bancada
do banheiro. Agora estou debruçada sobre a pia fria e ele dá um tapa tão
forte em minha bunda que sinto meus olhos arderem.
— Porra, Scarlet. Fala o meu nome de novo, por favor — implora e ele
nem precisa pedir isso, porque começa a esfregar o meu clítoris com força e
é o suficiente para que eu comece a repetir o nome dele diversas vezes.
Evan, Evan, Evan. É tudo o que consigo pensar e falar enquanto ele
está me preenchendo, cada vez mais forte, rápido e desesperado. Quando
não estou aguentando mais, estremeço em um orgasmo, sentindo minhas
pernas vacilarem. Evan me segura e, num movimento ágil, me vira e me
coloca sentada em cima da pia antes de voltar a me penetrar. Uma trilha de
suor escorre entre nós enquanto nossos corpos se encontram. Ele dá mais
três estocadas antes de se desfazer.
Murmuro contra seu corpo, ainda não tivemos força para nos
desvencilhar um do outro. Somos um emaranhado de pernas, braços e suor.
— Tem razão.
24
— Que merda foi essa, Sutton? — Wilson grita, enquanto todo mundo
me olha abismado.
Por mais idiota que seja a analogia de Hunter, tenho que admitir que
essa merda faz sentido, o que dá razão a ele outra vez: estou fodido.
Hunter ri, e algo brilha nos seus olhos, como se soubesse exatamente
o que estou passando.
— Cara, tem certos tipos de drogas que nunca saem do nosso sistema.
O que você faz é aprender a lidar com a abstinência. Tipo, contemplar o que
não se pode ter, algo coisa assim.
— O que foi?
— Estou normal.
— Desde que você começou a ser monitor, nunca mais fizemos algo
juntos. Acho que você nem se deu conta disso.
Minha irmã se distancia sem olhar para trás, e eu vou para o vestiário,
mais irritado do que eu gostaria.
Além do mais, ainda não sei o que vou fazer depois do possível draft.
Sou um dos jogadores universitários de hóquei mais cotados do país e ainda
não tenho um plano definido. É claro, eu amo jogar, mas não sei se é o que
eu quero fazer para sempre. Fama. Dinheiro. Holofotes. Mulheres. Parece
superficial.
— Sem exageros mesmo, ou vou matar todos vocês — aviso, num tom
de voz sério. — E vai ser só por uma hora. No máximo.
Merda, eu sabia que era uma péssima ideia essa coisa de sexo casual.
Acho que não sirvo para isso. Meu celular vibra, e é patético a velocidade
com que eu murcho ao ver que a nova mensagem não é de Evan.
— É esse o objetivo.
Entro no carro assim que ela destrava a porta. Cam liga o carro e dá
partida.
— Sério? Isso quer dizer que as coisas com o Alfredo estão ruins? —
indaga.
— Que droga, amiga. Mas não fica assim! Você consegue coisa melhor
esta noite.
Não sei se quero me entregar dessa forma à outra pessoa, mas estou
aberta para uma distração hoje. Assim que chegamos no Blizzard, me
surpreendo com a quantidade de pessoas no pub. Cam estava certa, parece
que todo mundo já quer descontar o início da semana no álcool.
Nós nos esquivamos até o bar entre o mar de corpos, e eu não posso
deixar de notar os olhares lançados em nossa direção. Meu cabelo está mais
longo que o habitual por conta da prancha e as pontas roçam na base de
minhas costas a cada vez que dou um passo, me fazendo cócegas. Jogo ele
sobre o ombro, dando uma olhada ao redor quando uma vaia de gritos cruza
o ar.
Sei que posso estar precipitando as coisas. Evan não me deve nada,
afinal. Não é como se ele fosse obrigado a ser fiel a mim ou qualquer merda
do tipo, mas, caramba, achei que seríamos exclusivos. Eu devia ter deixado
isso claro desde o primeiro momento em que topamos fazer sexo.
Assim que o barman volta com nossas bebidas, não hesito antes de
espalhar o sal pelo dorso da mão, lambê-lo, virar a dose de tequila e sugar o
pedaço de limão. Sinto a garganta arder e os olhos umedecerem.
Cam puxa meu braço assim que bato o copo vazio no tampo do balcão.
Antes que eu possa protestar, ela nos leva até a pista de dança. Dou o braço
a torcer e começo a me mover junto com ela ao som da música sensual.
Agora, definitivamente, tem muita gente olhando para cá. Não sei se é
o álcool começando a fazer efeito, mas me sinto como se estivesse livre.
Meus quadris se movem no ritmo da música e eu desço lentamente até o
chão. Quando subo, um olhar em específico queimar sobre mim.
Antes que eu possa alcançar, sinto uma mão se fechar ao redor do meu
braço e me puxar bruscamente. Congelo assim que vejo o rosto de Logan.
Ele parece meio bêbado, eu diria, pela sua voz arrastada quando diz as
palavras que são como um tapa na minha cara:
— Você tá vestida que nem uma vagabunda.
Meu corpo começa a tremer, mas não sei se é por conta do frio ou dos
últimos acontecimentos.
Ótimo, sou mais patética do que eu esperava. Imaginei algo que não
estava acontecendo e agora estou aqui, com um corte no joelho, fedendo a
cerveja e sendo chamada de vagabunda pelo meu ex-namorado que, a
propósito, é um traidor. As lágrimas começam a cair, e meu corpo
estremece com o primeiro soluço enquanto tento me esconder atrás das
minhas mãos.
Evan não espera por uma reação minha antes de me abraçar, puxando-
me contra seu peitoral largo, o que me faz chorar ainda mais. Só quero ir
para o alojamento o mais rápido possível e esquecer o dia de hoje, junto
com tudo o que vem me pressionando ultimamente. Meus pais. A
faculdade. O memorial de Lila que tive que assistir pela internet já que
ninguém achou que seria uma boa ideia me contar…
O capitão ajeita o meu cabelo, que deve estar uma bagunça a esta
altura do campeonato.
— O que ele disse para você? — Não consigo ficar em silêncio. — Foi
ele quem te empurrou?
— Acho que sim. Por qual outro motivo ele teria me traído e feito tudo
o que fez? Tem pessoas que têm uma natureza ruim. Só nos resta aprender a
lidar com isso.
— É, você pode ter razão. — Faço uma pausa. — Eu não acho que
meu pai seja um homem ruim, apesar disso. Ele só…
Scarlet: Bom dia! Joelho está ótimo hoje, obrigada por perguntar.
Scarlet: Quer dormir aqui à noite? Minha colega de quarto vai estar
fora.
Estou pronto para retaliar qualquer coisa que Logan faça, mas, feito
um covarde, ele não avança outra vez. Pelo menos o idiota reconhece que
não tem a menor chance contra mim. Logan fica em silêncio, o rosto
vermelho e o olhar cheio de ódio.
— Entendeu? Qualquer coisa que você tiver que resolver com ela a
partir de agora, vai tratar comigo. Não vai olhar errado para ela, muito
menos abrir a sua boca para insultá-la outra vez. Se não, juro para você,
Hall, acabo com a sua vida na CVU.
Como ele não diz nada, volto para o meu carro e saio dali, indo para a
primeira aula do dia como se nada tivesse acontecido.
Quando entro no vestiário depois de um treino intenso, sinto alguns
olhares em minha direção. Hoje treinamos para valer e sei que as palavras
de incentivo que falei inspiraram os caras, porque depois disso todo mundo
está esperançoso em relação ao Frozen Four. Hunter dá um tapinha nas
minhas costas quando me aproximo dos armários para guardar o
equipamento.
Dou de ombros.
Ele ri.
Lionel, como sempre, enfiando o nariz em assuntos que não são da sua
conta. Aparentemente, as notícias se espalhavam rápido pelo campus. Sei
que ele ligou os pontos e presumiu que fui eu quem fiz o estrago todo e,
para ser honesto, não dou a mínima.
DEPOIS QUE FUI vetado do jogo de sexta-feira, nem tentei discutir com
o treinador. Não pensei nas consequências antes de socar o ex-namorado
babaca da Scarlet e ameaçá-lo. Eu devia saber que ele não deixaria isso para
lá. Agora, além de não participar da conferência, vou ser obrigado a limpar
o vestiário durante uma semana junto com os faxineiros da CVU.
Os olhos verdes correm pelo meu corpo estirado em sua cama até
pararem em meu rosto.
— O que houve?
— Que droga, Evan. Sinto muito. Sei o quanto o hóquei significa para
você. — Há uma pausa. — Tem algo que eu possa fazer para que se sinta
melhor?
— Por que a gente não faz sem camisinha hoje? Comecei a tomar o
contraceptivo. — A frase de Scarlet quase faz o meu coração sair pela
boca. Ela se aproxima, arrastando as unhas compridas pelo meu peitoral e
batendo os cílios inocentemente. — Sabe, acho que você precisa ser
consolado do jeito correto…
— Perfeito então, nem eu. Acho que estamos prontos para dar esse
passo…
Estou impaciente para estar dentro dela, mas não quero apressar as
coisas. Beijo seu pescoço, descendo até a linha de seu umbigo, e então a
ajudo a tirar o resto das roupas. Quando Scar está completamente nua na
minha frente, paro um momento para contemplá-la antes de posicionar meu
rosto entre suas pernas.
Então, começo a comê-la com força. Me apoio nos meus braços a cada
investida, ouvindo seus gemidos. Scar morde o travesseiro, e eu enrolo um
braço ao redor de sua cintura, sentando-me e a puxando contra mim. Agora,
ela assume os movimentos, cavalgando no meu pau no ritmo em que
estabeleceu. Seguro um de seus seios com firmeza, sentindo a pressão do
orgasmo crescer.
— Goza pra mim — digo em seu ouvido, com a voz rouca e baixa. —
Deixa todo mundo no alojamento ouvir o quanto você é uma safada.
Acabaria com toda a minha reputação. Não acredito que estou fazendo
esse tipo de coisa, mas, de repente, quero me envolver com tudo que esteja
dentro do mundo de Scar. Quero entender suas manias, a aromaterapia, a
porra do yoga e até as séries de menininha que ela gosta. Quero fazer parte
de tudo.
— Que análise crua, não gostei. Quem faria o seu tipo, então?
— Você.
Scarlet ri.
— Da série.
Não vejo a resposta de Emery, porque sei que ela deve estar irritada.
Me desvencilho de Scarlet suavemente para não acordá-la e desligo o
notebook. Então, começo a me vestir. Coloco a calça e a camiseta antes que
a porta seja aberta.
Antes que eu possa desejar boa noite, ela fecha a porta na minha cara.
Ignoro a alfinetada, vez que já percebi que seu humor está azedo.
Talvez seja porque não conversamos desde o treino. Estou dando espaço
para minha irmã entender suas próprias emoções. Se eu ficar em cima dela
nos momentos críticos de chatice, vamos acabar brigando como
costumávamos fazer quando éramos crianças. Temos vinte e três anos
agora, as coisas são diferentes.
Minha irmã analisa meu rosto com calma. Sei que mentir para ela é
impossível, talvez seja o sensor dos gêmeos. Solto um suspiro, porque não
quero falar sobre essa merda. Até agora, estava evitando pensar nisso, mas
Emery resolveu que vai se meter na minha vida hoje, e também não posso
ser grosseiro com ela.
Emy morde os lábios, parecendo hesitar. Minha irmã pode ser muito
orgulhosa, até mais do que eu. É difícil fazê-la dar o braço a torcer e admitir
quando está errada. Só eu e poucas pessoas sabemos que ela não é nem um
pouco durona como aparenta ser. Por trás disso, há um coração feito de
gelatina.
Eu rio.
Com nada demais quero dizer que estou fazendo muito sexo e o vendo
quase toda semana.
Minha mãe não parece convencida com a resposta, mas não insiste.
Nós nos despedimos e desligamos. Mal posso acreditar que faltam apenas
alguns dias para eu ir para Green Lake. Checo as mensagens no meu celular
e me surpreendo ao ver que Sutton me mandou algumas enquanto eu estava
na ligação. Abro nosso chat para dar uma espiada.
— Acho que ele vai colocar Adele para tocar — Hunter acrescenta.
— Bom, a gente devia jogar MTG para a Scar poder participar. — Dan
olha em minha direção.
Acho que Evan nem percebe que, toda vez que estamos próximos, ele
começa a me tocar de forma natural. Acho isso um tanto fofo quanto
curioso. As íris cinzentas estão fixas nas minhas quando ele pergunta:
— O tapete.
— Ah, não. Dá para usar um tapete normal por enquanto. Esse da sala
serve. — Faço uma pausa. — Por que você decidiu que quer fazer yoga?
Antes que eu possa esboçar qualquer reação, Hunter surge atrás de nós.
Não sei como ele se aproximou tão silenciosamente, então levo um susto
quando ele pula por cima do sofá e força espaço para se sentar entre mim e
Evan. Chego mais para o lado.
— Não estou, mas queria você só para mim por um tempo. Sou
egoísta. — Evan me empurra em direção à cama. Caio no colchão e ele
invade meu espaço, posicionando-se entre minhas pernas. — Quero te
devorar — admite, a voz baixa e rouca.
— Acho que você devia tentar controlar um pouco esse desejo —
sugiro, aos risos. — Ou vai se transformar em um ninfomaníaco.
Ele sorri, provocativo.
— Me mostra o yoga, então.
— Ok.
— É, seria legal.
— Sério? Onde?
— Bom, acho que está na hora de eu ir. —Me levanto e o capitão imita
o meu movimento, ficando de frente para mim. Observo seu rosto calmo. —
Vou pedir um táxi.
— Tenho. Acho que você devia ficar e dar apoio para seus amigos,
especialmente pelo jogo de amanhã. — Fico na ponta dos pés e dou um
beijo no seu rosto. Evan parece meio atordoado, como se tivesse lembrado
desse fato apenas agora. Solto um riso baixo. — Boa noite, capitão.
— Boa noite, Scar — é tudo o que ele diz antes de eu me virar e sair
pela porta.
29
Emery solta uma bufada alta e cutuca o meu ombro. Decidimos assistir
ao jogo juntos esta tarde, já que como a partida será fora de Crystalville, as
cheerleaders não vão se apresentar. Mas, acima de tudo, minha irmã sabe
que eu estou uma pilha de nervos, por isso veio me apoiar.
Ela está certa, tenho que confiar na minha equipe, mas, porra, é quase
impossível conter a ansiedade. Estou aqui, sentado neste bar, enquanto eles
estão em outra cidade, prestes a enfrentar um time com um desempenho
incrível, sem o capitão titular. Escalamos um jogador adicional e temos os
capitães alternativos. Contudo, não é a mesma coisa.
— Então você devia pensar melhor antes de sair socando quem te irrita
por aí. — Ela rola os olhos. — Não pensou em como sua atitude egoísta
poderia afetar você e as pessoas ao seu redor? Lembre-se que esse não é
apenas o seu sonho. Há vários outros caras na equipe que desejam o mesmo
que você.
Franzo o cenho. Quando é que minha irmã ficou tão sábia e aprendeu a
usar palavras tão duras? Solto uma respiração brusca e viro a caneca de
cerveja. Acho que preciso de algo mais forte, na verdade.
Ergo o braço para chamar o barman que está circulando entre as mesas
do pub, mas Emery segura minha mão e a puxa com força para baixo.
Estou mais determinado do que nunca a ser o líder que eles merecem.
Não posso mais pensar só em mim a partir de agora. Todas as decisões fora
do rinque também afetam meus companheiros.
— Por que você não foi para a conferência? — Phillip Sutton quebra o
silêncio.
Noto que Emery fica um pouco tensa ao meu lado, e minha mãe me
lança um olhar indecifrável por cima da borda da taça de vinho. Eu, no
entanto, continuo relaxado. Não há nada que possa estragar o meu humor
depois da vitória de hoje.
Mentir não é para mim. Sou honesto em tudo o que faço. Vejo os nós
dos dedos do meu pai ficarem esbranquiçados conforme ele segura os
talheres. Philip não consegue disfarçar o temperamento quando algo o
desagrada.
— Que ótimo! Fico surpreso que você tenha virado um delinquente.
— Cometi um erro e aprendi com ele — respondo, na tentativa de
evitar que essa noite se transforme em uma grande confusão. — O
importante é que o time conseguiu vencer mesmo sem mim.
Meu pai bufa, mas se contém. Acho que o comentário da minha mãe é
o que o impede de explodir por completo. Ao meu lado, ouço Emery soltar
a respiração.
— Vamos fazer algo no dia de Ação de Graças? — minha irmã
pergunta.
Nisso, nós dois concordamos. Meu celular vibra com uma mensagem
de Scarlet, mas eu enfio o aparelho no bolso antes que Emery possa dar
uma espiada na tela. Minha irmã semicerra os olhos, cruzando os braços em
frente ao peito.
— Quer dizer, sim. Eu te conheço e sei que agora tem alguma coisa
diferente. — Há uma pausa. — E aposto que a briga que você se meteu tem
a ver com aquela garota.
— Não, mas acho que devia tomar cuidado para não se meter em mais
problemas. Foi por causa disso que você deixou a equipe na mão. Só espero
que seja racional daqui para frente.
São as últimas palavras que ela diz antes de sair da sala e me deixar
sozinho para trás.
30
Com o emprego novo, meu tempo ficou limitado, e eu soube que ele
estava ajudando com a limpeza dos vestiários depois dos treinos de hóquei
para compensar, além de treinar o dobro. Apesar disso, trocamos algumas
mensagens ontem à noite, mas não foi nada demais.
Estou tão perdida nos meus próprios pensamentos que mal percebo
quando os três pontos que indicam que ele está digitando aparecem na tela.
Me assusto quando o celular bipa contra a palma da minha mão.
Scarlet: Não precisa. Não quero atrapalhar. Você tem que aproveitar o
feriado com a sua família.
Evan: Meus pais foram viajar, minha irmã está com as amigas e meus
colegas de equipe foram para casa. Estou sozinho na fraternidade,
cenourinha.
Droga. Será que ele está achando que quero precipitar as coisas?
Solto um suspiro. Como é que vou explicar tudo isso para meus pais?
Na verdade, o único problema é que eles vão achar que estou namorando de
novo. Principalmente a minha mãe. Afundo a cabeça no travesseiro e solto
um gemido abafado, depois ligo para o telefone de casa.
— Não — minto por algum motivo. — Enfim, avisei para vocês não
serem pegos de surpresa. Até depois, mãe.
Antes que ela possa dizer algo, desligo a chamada. O dormitório está
silencioso, como o habitual. Viper vai passar o feriado fora, assim como
Cameron e a maioria dos universitários. Mais um motivo para Evan não
ficar para trás. Amanhã, no dia de Ação de Graças, isso aqui vai estar
parecendo uma cidade fantasma.
— Não imaginei que você ouvia esse tipo de coisa. — Esboço uma
careta.
— Preconceitos, cenourinha?
— De forma alguma.
— Que droga.
— Tudo bem.
A casa dos meus pais entra no meu campo de vista alguns momentos
mais tarde. Evan diminui a velocidade do carro conforme nos
aproximamos. Ele estaciona onde indico, perto da cerca branca que ladeia a
propriedade. Aqui, os vizinhos mais próximos ficam a uns trezentos metros
de distância, então tudo está silencioso quando descemos na estrada de
terra.
— Vai se ferrar.
Dito isso, ela sorri para nós e vai para a cozinha. Agora, somos só eu e
Evan na sala. Me viro para ele, que parece deslocado.
— Não fala isso na frente dela ou ela vai se gabar para sempre.
Não é uma pergunta, mas sim uma afirmação. Solto um suspiro, caindo
sentada na minha cama. Em seguida, o colchão se afunda ao meu lado. O
calor corporal de Evan me envolve antes mesmo que eu processe a sua
aproximação repentina.
— Eu era — corrijo, erguendo os olhos em sua direção.
— É complicado.
Com a resposta breve, Evan entende o recado. Ele ajeita uma mecha
do meu cabelo de forma tão natural que nem reajo mais. É quase como se
tivesse se tornado o nosso normal.
Agora, vendo a cena se desenrolar bem diante dos meus olhos, chego a
conclusão de que a vida é imprevisível.
Não que eu esteja reclamando, longe disso. Sou grata por ter
conhecido Sutton, por ele ter me ajudado com a monitoria e tantas outras
coisas. Aprendi com ele mais do que eu achei possível. Sei que fui uma
idiota por acreditar em estereótipos, porém, o importante é que aprendi a
moral da história.
É claro que ela tinha que usar o meu apelido de infância. Josh me
chamava de Scarls quando era pequeno demais para conseguir pronunciar
Scarlet. Acabou pegando entre a gente.
— Achamos que ele vai ficar mais alto que seu pai.
Por falar nisso, meu pai entra na cozinha no próximo momento, com
Daisy em seu encalço. Minha irmã caçula de seis anos está com um ar de
acadêmica, como se ela estivesse voltando de férias da faculdade e não eu.
O cabelo ruivo está preso em um rabo de cavalo, e ela empurra as armações
dos óculos para cima. Daisy parece feliz quando me vê e me dá um abraço
curto, mas logo sai correndo antes que eu possa dizer qualquer outra coisa
para praticar violino.
Meu pai sai da cozinha, deixando apenas eu, mamãe, Josh e Evan.
Meu irmão resolve tomar uma atitude. Ele dá um passo para a frente e
estende a mão em direção ao jogador, sem esconder a desconfiança.
— E como tem todos esses músculos? Você é tipo aquele cara do clã
Zenin superforte que deixa todos os feiticeiros impressionados por não
fazer uso de energia amaldiçoada?
— Por que você não leva as nossas bagagens lá para cima? Estão no
hall. Aproveita e testa sua força. Quem sabe um dia você não fique que nem
o Evan?
Contrariado, meu irmão sai da cozinha para fazer o que pedi. Lanço
para Sutton um olhar de fala sério. Ele dá de ombros, como se respondesse,
esse é o efeito que eu causo nas pessoas, não me culpe.
— Vocês querem algo para beber? — Lily abre a geladeira, mas nós
dois negamos.
Evan solta um riso baixo e grave que sempre causa o mesmo efeito em
mim: arrepios e coração disparado.
Evan gargalha mais uma vez. Meu Deus, gosto tanto desse som que me
assusta. Quero continuar fazendo-o rir.
Estremeço.
Limpo a garganta.
— Eu sei.
Uma parte minha quer dizer que não se importa, que não estou nem aí
para o que meus pais irão pensar disso tudo, mas não quero me precipitar e
ter que rotular o que temos. Meus pais nunca vão entender o que é uma
amizade com benefícios e, para ser sincera, nem sei se essa merda existe
mesmo. Talvez seja só uma forma de se entregar sem peso na consciência.
Sei que ele fez questão de se sentar entre nós dois propositalmente, e
nem posso culpá-lo. Na verdade, admiro o esforço que ele está fazendo para
protegê-la. Sou o estranho aqui, no meio de sua família. Não dá para culpá-
lo por essa reação, já agi da mesma forma com a minha irmã gêmea.
Não posso deixar de soltar uma risada baixa, que disfarço dando um
gole na minha cerveja. Scarlet lança um olhar repreensivo para o pai.
E Josh? Não sei o que ele acha de hóquei, mas pelo foco em jogar
Mario Bros em seu videogame portátil, concluo que ele também não se
importa.
A ruiva solta uma bufada alta. O sr. Evergarden olha para ela com um
tipo de carinho que não consigo compreender. Meu pai nunca olhou assim
para nenhum de nós. Era como se ele esperasse que os filhos tivessem sido
fabricados para seguir uma ordem cronológica para o sucesso e um futuro
perfeito, assim como provavelmente o meu avô o ensinou. De repente,
começo a entender o conceito de uma família verdadeira. O que Scarlet tem
aqui é inestimável.
Thomas ri.
— Pegue leve com sua mãe, querida. Ninguém aqui mentiu. Você é,
sim, linda. Temos que reconhecer os fatos. — Ele se levanta, ajeitando o
suéter gasto. — Agora, se me dão licença, vou dormir. Acho que já está
tarde. — Aponta para o filho caçula, tão quieto que por um momento me
esqueci que ele estava aqui o tempo todo. — Josh, larga esse videogame e
vai tomar banho.
— O quê? — Scar questiona, confusa. — O que tem a ver não ser dia
de Ação de Graças?
— Não tem uma ocasião especial para eu tomar banho. Posso tomar
amanhã cedo, aí vai fazer sentido porque será dia de Ação de Graças — diz
com tanta convicção que quase compro o seu argumento.
— Josh, estou falando sério — Thomas volta a dizer, com tom de voz
mais firme. — Suba e tome um banho. E não esqueça de escovar os dentes.
Scar se põe de pé, parecendo meio sem jeito diante do meu escrutínio.
— Eu?
A verdade é que não sei ainda o que estou fazendo, mas quero passar a
noite com ele, ainda que seja arriscado fazer isso na casa dos meus pais.
Demorei mais que o previsto já que precisei esperar que Daisy pegasse
no sono. Para completar, tive que sair na ponta dos pés para evitar que ela
acordasse no meio do percurso.
— Scar…
Acho que nunca senti tanto desejo quanto agora e mal nos tocamos
ainda. Evan respira pesadamente contra a curva do meu pescoço e então
diz, num tom de voz quase inaudível:
— Levanta a perna.
— Fica quietinha.
Como algo pode ser tão bom? Evan mexe os quadris, me penetrando
por trás. Não há nenhuma barreira entre nós, o que percebo tardiamente ser
um erro, já que estou cada vez mais viciada no seu toque. Nunca mais quero
transar com ele de camisinha. Isso aqui ultrapassa todos os níveis. Achei
que eu sabia o que era sentir prazer antes de transar com Evan, mas percebo
que estava completamente enganada.
O som da pele batendo contra a pele é abafado. Sutton mete lento e
preguiçoso, segurando meu joelho com força naquele ângulo em que
permite que ele me penetre mais fundo. Segurando meu queixo, ele vira
meu rosto em sua direção e me beija.
Abro a boca para gemer seu nome, mas tudo o que sai é algo
ininteligível. A sensação começa a se arrastar pelo meu corpo. O
formigamento invade meu ventre, minhas pernas começam a tremer e sinto
o estremecer familiar antes do orgasmo. Meus lábios se abrem em um grito
mudo e eu espasmo violentamente sob Evan, pulsando ao redor do seu
membro enquanto mordo o ombro dele com força.
Evan me acorda pouco antes dos meus pais despertarem, já que acabei
adormecendo nos braços dele. Enquanto os jatos de água do chuveiro
escorrem pelo meu corpo, sou invadida pelas memórias da noite passada.
A pergunta parece inofensiva, mas sei que Thomas entrou no seu modo
de análise. Ele fez a mesma coisa com o Logan quando começamos a
namorar oficialmente, questionando a ele sobre para o futuro e seu
desempenho acadêmico. Tenho vontade de rolar os olhos.
— Sério? Que fantástico! Você devia ter dito ontem. Teria te mostrado
o disco exclusivo de 1999 dos Bruins que comprei no eBay.
— Acho que não sou boa o suficiente. Não estou conseguindo tocar a
música nova que a professora passou na semana passada.
— Acha mesmo?
— Isso é constrangedor!
— Você tá estranha.
— Por quê?
Arrisco olhar para Sutton. O rosto dele está mais sério e intimidador do
que nunca. Limpo a garganta, me sentindo patética.
— Não sei. Pareceu…. que estávamos cruzando algo. Alguma barreira
invisível.
— Scarlet, nós fizemos sexo como sempre. Não precisa ficar com
medo. É normal sentir receio porque nós não temos uma relação. Se quiser
parar, vou entender.
— Não.
— Tudo bem. — Solto o ar que nem sabia que estava prendendo nos
pulmões. — Não vamos parar.
O LUGAR QUE Scarlet me mostra fica longe de sua casa, então saímos
com a BMW.
Fico com a sensação de que ela está tentando me mostrar algo, então
apenas sigo para o endereço que ela passou sem nem pestanejar. Quero
conhecê-la de verdade, não apenas o seu corpo.
Paro o carro em uma rua pouco movimentada assim que o GPS indica
que chegamos. Olho para Scarlet, que está mordendo o lábio inferior
nervosamente. Estamos em frente a um prédio velho e gasto. Na fachada, dá
para ler os dizeres “rinque e centro de patinação”. Surpreso, espero que a
ruiva diga algo.
— Sabia que um dia você voltaria para cá. — Semicerra os olhos para
Scarlet, que cora. — Por algum motivo, você é a única que sempre
acreditou nesse lugar. — Ele desliza uma chave pelo balcão. — Podem
abrir o armário.
— Obrigada.
Quero beijá-la.
Que se foda!
Corto a distância entre nós conforme patino até ela e seguro seu rosto
com as mãos. Ela mal tem tempo de reagir antes que eu comece a beijá-la.
Minha boca se move contra a sua em um desejo sem fim.
Inclino mais o meu corpo em sua direção, sentindo seu corpo pequeno
se derreter com meu toque. Nossas línguas se chocam, assim como nossos
torsos. Quero beijá-la para sempre.
Scarlet ri de novo. Meu novo som preferido. Mas, de repente, ela fica
séria e solta um dos seus suspiros longos.
Ela me ignora.
passado
— NÃO ACREDITO QUE você ainda não beijou ele! — A voz indignada
de Lila me faz desviar o olhar para longe.
Já temos quase dezesseis anos e ainda não dei o meu primeiro beijo,
mas planejo mudar isso esta noite, no baile de inverno. Por isso, aceitei o
convite de Logan, um cara fofo da nossa turma. Para Lila, essas coisas
sempre foram mais fáceis. Ela já namorou antes e vai para o baile com o
Anthony, que é quase dois anos mais velho e o cara mais popular do
colégio.
Lila é linda, o tipo de beleza que para o trânsito. Seu cabelo castanho
longo, cortado na altura dos ombros, e os olhos azuis escuros lhe dão um ar
de mistério, como uma atriz de Hollywood. Além disso, os seios dela são
três vezes maiores que os de qualquer garota do primeiro ano. Nos
conhecemos desde os dez anos, quando começamos na escola de patinação
artística.
— E daí? Vai ser só por alguns minutos. Aliás, a espera vai valer a
pena.
Quando falei sobre isso com minha mãe, ela disse que eu
provavelmente estava nervosa com a noite do baile. E é verdade. No
entanto, o tipo de incômodo que sinto não tem nada a ver com isso.
— Meu Deus, vocês estão lindas! Deixa eu tirar uma foto, façam poses
legais e sorriam.
No próximo momento, ela já está com a câmera em cima da gente, e
Lila entra na onda. Ela me puxa para perto de forma que nossos ombros se
tocam e coloca a mão na cintura com a maior naturalidade. Sorrio e tento
não parecer sem jeito ao seu lado. Os flashes disparam diversas vezes antes
que eu murmure para que mamãe se controle.
Meu pai já está no carro com o motor ligado. Minha mãe vai ficar para
não deixar meus irmãos mais novos sozinhos, e por isso nos deseja um
ótimo baile antes de sairmos. Nós nos agasalhamos porque faz bastante frio,
mas vamos tirar os casacos assim que chegarmos à escola. Papai liga o
rádio, e Hey Jude do The Beatles explode no automóvel enquanto observo
as ruas desertas. O céu de Green Lake aparenta mais escuro que o normal e
a temperatura mais baixa que o comum.
— Você está linda — diz, o tom de voz tão baixo que quase não
escuto. Então, ele limpa a garganta e cora, ajeitando o cabelo loiro que já
está cheio de gel para mantê-lo no lugar. — Vamos?
Quando ele estende o braço para mim, aceito. Nós andamos por um
extenso corredor até entrarmos na quadra, que foi decorada especialmente
para o baile de inverno. A iluminação está baixa, com projetores que
lançam feixes de luz que dançam pelo espaço.
Meus olhos se deslocam para a banda da escola, que toca em cima do
palco montado. A pista de dança está um pouco cheia, mas não me importo
com isso. A hora da valsa ainda deve estar longe de acontecer. Logan me
fita para mim, parecendo nervoso.
— Seria bom.
Então, ele me pede para esperar um pouco e vai atrás da bebida. Fico
parada no meio do salão e começo a procurar por Lila e Anthony. Não
demoro muito até achá-los. Os dois estão no meio da pista, aos risos, muito
próximos um do outro. Acho que ela nem percebe o efeito que surte nas
outras pessoas. A maioria dos estudantes os observam, vidrados. Tenho
certeza de que Lila será coroada a rainha do baile, e tenho muito orgulho
dela por conta disso.
Alguns minutos se passam e Logan retorna, me entregando um copo.
Eu agradeço e, em seguida, dou um gole no ponche de frutas.
— Por quê?
— Você é a garota mais linda da escola, Scarlet. Pelo menos para mim.
E sei que outros caras te convidaram e você recusou… Fiquei tomando
coragem o mês inteiro.
— Estou contente por ter vindo com você — digo, sendo honesta.
— Quer dançar?
Estou pronta para responder que não sei dançar esse tipo de música
quando a faixa é substituída por uma batida lenta e romântica. Sem fugir,
deixo com que ele me guie até a pista, uma das mãos apoiada na base de
minha coluna. Logan e eu começamos a dançar e, em um determinado
momento, ele se curva e sela nossos lábios. Segundos se passam até que o
garoto volte a me beijar, pedindo passagem para sua língua.
Tudo dá certo, para minha surpresa. A boca de Logan não fica presa no
meu aparelho e não paramos no hospital. Ao invés disso, deixo o medo de
lado e me entrego enquanto continuamos a dançar, vez ou outra nos
beijando.
Não sei explicar exatamente o que sinto, mas é novo. Agora entendo
aquela coisa que as pessoas dizem sobre borboletas no estômago.
— Não acho uma boa ideia, Lila. Já liguei para meu pai vir buscar a
gente daqui meia hora. O que vou dizer para ele? E você nem esperou a
coroação…
Então, ela perde o equilíbrio e cai. Os três gargalham, mas eu não vejo
graça na situação. Preciso tirar Lila de lá, então decido me aventurar,
tentando me equilibrar nos saltos, mas é quase impossível. Lila está um
pouco longe de mim, no meio do lago congelado. Ela tenta se levantar
novamente, e uma rachadura se espalha ao nosso redor. O estalo do gelo é
tão alto que faz com que todos fiquem em silêncio.
— Devagar — falo para Lila, que não parece mais tão feliz assim.
O gelo vacila outra vez e Lila cai de joelhos quando seu salto fica
preso. Sinto tudo estremecer abaixo de mim e ignoro Dylan e Anthony
falando ao fundo, porque só consigo ouvir meu coração retumbando. Então,
tudo acontece rápido demais. Um buraco se abre debaixo de minha amiga e
seu corpo some na água.
Eu estava caindo esse tempo todo, quero dizer a Evan, e você foi a
primeira pessoa que se ofereceu para me segurar.
Meus olhos ardem e evito olhar para o rosto do jogador, com medo do
que ele deve estar pensando.
Agora, parece que um enorme peso está saindo dos meus ombros.
Nunca falei tão abertamente sobre a morte de Lila antes, nem me senti
segura o suficiente para isso. Mesmo com meus pais, eles só sabiam que eu
estava sofrendo, mas nunca souberam como poderiam tirar um pouco desse
sentimento.
Aceitei que Lila não voltaria e que ficaria triste se eu não tentasse
seguir em frente. Não precisava esquecê-la, e nunca poderia. Apenas
precisava encontrar um caminho.
Ao fim do dia, ajudo minha mãe com a bagunça que resta na cozinha
enquanto os homens estão na sala e Daisy toca violino em seu quarto.
— Por quê?
— Contei o que Logan fez. Disseram que vão dar um jeito dele te
deixar em paz
Uau, que situação. Não imaginei que seria necessário até mesmo a
intervenção dos pais do meu ex-namorado para que ele parasse de ser uma
pedra no meu sapato. Mas, de qualquer forma, estou começando a me
acostumar com a imprevisibilidade da vida.
Pelo visto, vamos retornar para Crystalville mais cedo que o esperado.
37
— Eu disse para você não contar para ele — Abigail murmura para
minha irmã. — Não precisava sair de onde estava para vir para cá, Evan.
— Você fez o melhor que podia. Estamos aqui porque queremos estar.
— Ela teve que fazer uma cirurgia no joelho, mas já está bem. Vou te
levar para o campus.
— Você não precisa me levar. Fica com a sua mãe e irei chamar um
táxi.
— Aqui estamos. Obrigado por ter me deixado ir com você para Green
Lake. Sua família é incrível.
Agora, estou de volta ao treino com os Frozen Fury. Vamos para outras
conferências em breve, e mal posso esperar para dividir o rinque outra vez
com meus amigos. Porra, senti falta desses idiotas. Ficar fora por um jogo
me ensinou para caralho. Acho que aquela coisa que dizem que há males
que vêm para o bem é verdade.
Volto a focar na pista, ajustando a posição dos meus pés nos patins.
Meus músculos protestam, mas ignoro a dor. O suor começa a se misturar
ao ar gelado, e a adrenalina é lançada nas minhas veias. Estamos fazendo
um exercício de passes rápidos, com o disco sendo lançado de taco em taco,
ganhando velocidade na hora da troca.
— Sim, treinador.
Acho que o mínimo que posso fazer para me redimir é voltar com
tudo. Não posso me manter fora de forma. Caminho até o vestiário, o corpo
doendo de uma forma satisfatória. Começo a tirar a roupa encharcada de
suor em um dos bancos. Hunter logo desaba ao meu lado, com os cabelos
úmidos e o rosto corado do esforço.
— Claro que não. Passei o dia todo com a Bella. Ela mal me deixou
dormir, cara. Ficamos ensaiando a coreografia daquele desenho de pôneis
coloridos. Juro, vou ter pesadelo com essa droga.
Não consigo conter o riso baixo que escapa pela minha boca. Hunter
pode ser um babaca irresponsável às vezes, mas é um exemplo quando se
trata da sua filha. Isso é uma das principais coisas que me faz respeitá-lo.
— Apaixonado?
Dou de ombros.
— Somos amigos.
— Você não é só amigo dela. Amigos não fazem o que vocês fazem,
cara. É mais fácil aceitar que você está completamente dominado pela
garota.
Ignoro Hunter.
Scarlet está usando um moletom que bate até os seus joelhos, e meias
longas cobrem suas pernas. O cabelo ruivo está solto, as mechas sedosas
parecendo mais macias que o habitual. Os olhos verdes-floresta com pingos
dourados me devolvem o escrutínio, e eu fixo meu olhar nas sardas que
salpicam o seu nariz. Eu a observo corar lentamente e é lindo para caralho.
— Estou focando nas plantas nativas da nossa região. Sabia que aqui
em Crystalville tem uma enorme concentração de arnica? Além de ser
usada para tratar contusões e dores musculares, ela possui compostos com
propriedades anti-inflamatórias.
— Não sabia disso. — Me sento na cama. — Você já encontrou algo
que se destaque?
— Ainda estou tentando descobrir isso. Acho que vou começar com
uma introdução sobre a importância das plantas medicinais e passar para
uma revisão da literatura sobre os compostos e, enfim, apresentar estudos
de casos específicos.
Scarlet sorri, e sinto algo se contorcer no meu peito. Nunca senti isso
antes, o que me deixa alarmado por um momento. O que há de errado
comigo hoje?
— Justo. Tem algo que pode te interessar. Você sabia que na Idade
Média as plantas medicinais eram associadas a superstições e magia?
Meus olhos caem para seus lábios. Sinto a visão ficar turva.
Suas palavras são o suficiente para que eu fique duro feito pedra.
Scarlet solta uma risadinha, provavelmente se dando conta disso.
— É mesmo? — Solto o pescoço dela e seguro seu rosto entre as
mãos. Scarlet respira fundo, a diversão sendo substituída por desejo. O
mesmo desejo que sei que deve estar refletido no meu olhar.
Mesmo quando entro e deslizo para fora dela e ela se agarra a mim
como se dependesse disso, como se nós dois fossemos algo certo,
predestinado, só consigo pensar nisso. Suas unhas arranham minha pele e
ela morde o meu ombro, gemendo o meu nome enquanto enterro o meu
rosto na curva de seu pescoço e inspiro o seu cheiro enquanto. Obcecado,
eu estou completamente obcecado.
Tremo em cima de Scarlet e olho para ela. Seus dedos finos passeiam
ao longo da linha do meu maxilar e eu me abaixo para beijá-la outra vez.
Sinto meu coração bater tão forte que parece que vai explodir. Desabo ao
lado dela, puxando o seu corpo para se alinhar ao meu. Como algo que se
completa. Como duas metades. Como o encaixe perfeito.
Até lá, preciso de um plano que faça sentido. É por isso que estou aqui
pedindo ajuda para as pessoas mais improváveis de todas.
— Você tem certeza de que quer se declarar para ela? Já pensou no que
vai vir depois?
— Como assim?
— Esperei muito tempo para ver o dia em que o grande Evan Sutton se
acovardaria por causa de uma garota.
Então, minha irmã se vira e sai antes que eu possa dizer qualquer
coisa. Hunter bufa.
Vim sozinho para cá, já que meus amigos se recusaram a acordar antes
do meio-dia de um sábado, mas estou esperando por Scarlet. Combinamos
de nos encontrarmos no festival. Inclusive, confiro as horas.
— Desculpa, não resisti. Você está muito fofa com essa coisa na
cabeça.
— Não sei como você não está morrendo de frio usando só essa
camada leve de roupas.
Andamos até a área em que a corrida irá acontecer, que é uma colina
íngreme na base de uma montanha. Diversas duplas já estão posicionadas
ao nosso redor, incluindo crianças. A energia é contagiante, e meu espírito
competitivo está mais aflorado do que nunca. Geralmente, alterno os anos
entre fazer dupla com Hunter e Emery. Contudo, desta vez, vou competir ao
lado de Scarlet.
Durante a corrida, dou uma olhada para a ruiva e noto seu rosto
iluminado de alegria. É um daqueles momentos que quero guardar para
sempre. Nos aproximamos da linha de chegada, e com um último esforço,
cruzamos, cheios de adrenalina.
Ela não é muito velha, deve ter uns trinta e poucos anos, mas é tão
rígida que suas íris impenetráveis me fazem desviar o olhar na maior parte
das vezes. Sério, tenho um pouco de medo dela. Amy solta um suspiro alto
quando Megan, uma garota adorável de nove anos, erra a primeira etapa de
um axel.
— Eu? — Olho para trás e para os lados para ter certeza de que ela
está mesmo falando comigo.
Congelo no lugar.
— Te mostrar algo?
O comando me deixa tão intimidada que não sei o que fazer, mas
acabo cedendo vez que não quero perder o emprego. Respirando fundo,
começo a patinar, permitindo que os movimentos fluam de forma natural.
Quando chego no dormitório, estou mais feliz do que nunca. Viper está
sentada em sua cama e até tira os fones dos ouvidos quando me aproximo,
fazendo uma espécie de dança da vitória. Ela arqueia as sobrancelhas.
— Parece que você ficou maluca de vez. Sabia que essa coisa de
pedras da lua era furada.
Ignoro a alfinetada.
Ignorando-a, pego meu celular e envio uma mensagem para meus pais,
informando sobre a novidade. Depois, abro o chat de Evan.
Por algum motivo, fico com a sensação inquietante de que é sobre isso
que ele vai falar. A verdade é que não estou pronta para me despedir, nem
dizer adeus. Quando entro na picape, usando roupas de frio como o jogador
instruiu, o aquecedor ligado me atinge, começando a descongelar minhas
bochechas que ficaram rígidas enquanto eu esperava do lado de fora do
alojamento.
— É surpresa, cenourinha.
Evan olha para mim, e há algo estranho na maneira como ele se move.
Mesmo por baixo da jaqueta de inverno, noto como os ombros estão
rígidos.
Ai, meu Deus. Não acredito que vou mesmo levar um fora. Antes que
eu possa me controlar, meus lábios começam a tremer. Ele arregala os olhos
assim que as lágrimas embaçam minha visão. Que droga está acontecendo
comigo? Desvio o olhar, tamanho constrangimento.
Sinto a mão de Evan tocar o meu rosto e, então, com gentileza, ele vira
o meu queixo em sua direção. O jogador seca minhas lágrimas com a
manga de sua jaqueta.
Pisco, surpresa.
Fico confusa.
— Os patins?
Evan aponta para o banco de trás, onde há uma bolsa que eu não havia
me dado conta antes.
Olho para Evan e vejo todo o brilho refletido em seu rosto. Ele segura
minha mão para me girar, e meu riso corta o silêncio da noite enquanto me
derreto em seus braços. Eu estava caindo esse tempo todo, mas agora estou
flutuando. O jogador me acompanha, guiando meus movimentos conforme
dançamos sob o lago junto com a aurora.
— É a coisa mais bonita que já vi. — Olho para o céu.
— Eu amei… é perfeito.
AS PALMAS DAS minhas mãos estão suadas enquanto meu coração bate
acelerado.
Coloco a mão no bolso da calça, tateando para ter certeza de que o anel
ainda está aqui e não voou durante o jogo. Me desvencilho de toda a
confusão do rinque e patino até as extremidades, parando em frente à
Scarlet. Ela me olha com surpresa através do vidro, as íris verde-florestas
que eu tanto amo, estão com um brilho diferente.
— Sim! Mil vezes sim! Eu quero me casar com você, Evan Sutton.
FIM.
agradecimentos
Em primeiro lugar, agradeço a Deus por me dar inspiração sempre. Em
segundo, a todas minhas amigas e leitoras maravilhosas que me apoiaram e
incentivaram durante essa nova jornada de escrever Jogos de Conquista.
Com amor,
Lovely.