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AULA 1

INTELIGÊNCIA PSICOMOTORA:
A COMPREENSÃO DA RELAÇÃO
CORPO/MENTE NA
APRENDIZAGEM

Prof. Marcos Aurélio Iubel


SOBRE A RELAÇÃO CORPO/MENTE

INTRODUÇÃO

Cérebro. Muitas pessoas podem sentir-se desafiadas por uma simples


palavra, pela complexidade existente por trás dela, das sinapses, dos neurônios,
das regiões cerebrais e suas funções, de toda a estrutura complexa que emana
do cérebro. Hoje sabemos muito das suas características e especificidades e
podemos associar a maioria das nossas ações ao controle que o cérebro impõe
ao nosso corpo. Em um plano anatômico, ele pesa em média 1,36 kg e tem em
torno de 100.000.000.000 (cem bilhões) de neurônios. Cada um desses neurônios
pode ter até algo em torno de 10.000 (dez mil) entradas sinápticas de outros
neurônios, formando uma interconexão neural, ou seja, temos aí
1.000.000.000.000.000 (um quatrilhão) de sinapses. Toda essa atividade que
ocorre dentro das nossas cabeças pode consumir até 20% do nosso metabolismo,
mesmo o cérebro representando, na média de um adulto com o peso adequado,
apenas 5% da massa corporal total (Amthor, 2017).
O cérebro conseguiu chegar a esta estrutura após bilhões de anos de
evolução. Quando o nosso planeta ainda era tomado completamente pela água,
as primeiras formas de vida eram as unicelulares procarióticas, células que não
tinham um núcleo celular; que posteriormente formaram as células eucarióticas,
que têm um núcleo; e que, mais tarde, seguindo a teoria dos biólogos
evolucionistas, formariam a vida multicelular, que culminariam nas formas de
vida que conhecemos hoje (Amthor, 2017).
O Sistema Nervoso Central (SNC), formado pelo cérebro, medula espinhal
e retina ocular, é o carro-chefe para interpretarmos o mundo que nos cerca.
Todavia, seria ineficiente sem os outros sistemas que formam uma rede inter-
relacionada com órgãos, músculos e receptores existentes no Sistemas Nervoso
Periférico (SNP), que são alimentados de informações pelos axônios sensoriais e
motores. Outro sistema existente é o autônomo, responsável pela regulação da
digestão e também pela manutenção da frequência cardíaca. Já o sistema
nervoso entérico controla todo o processo gastrointestinal (Amthor, 2017).
Neurônios, segundo a definição de Frank Amthor (2017), são ‘’células
especializadas que processam informação’’, ou seja, são as responsáveis por
esmiuçar o tipo de informação recebida e processar/interpretar para o cérebro
executar a ação correta e necessária.
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Existem quatro tipos de neurônios: os sensoriais, os motores, os de
comunicação e os de associação. Os neurônios sensoriais são responsáveis por
informar ao cérebro sobre os acontecimentos ao seu redor, como a percepção de
se está dia ou noite, calor ou frio, e interpretar as informações externas e internas.
Os neurônios motores são responsáveis pela contração e relaxamento muscular
e por mediar comportamentos; também são incumbidos de estimularem glândulas
e órgãos. Os neurônios de comunicação, como o próprio nome sugere, levam os
sinais de uma área do cérebro para outra. Os neurônios de associação interpretam
os estímulos que vêm através dos sentidos, confrontam com o que está na
memória e utilizam o mesmo padrão para planejar e executar um comportamento.
Se escutamos um barulho muito alto, podemos ter sempre a intenção de colocar
as mãos no ouvido para abafar o som ou, ainda, falar mais alto para que nossa
voz possa ser melhor compreendida (Amthor, 2017).

Figura 1 – Cérebro

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Créditos: Sebastian Kaulitzki / Shutterstock.

Quando observamos um cérebro pela vista lateral, podemos identificar


algumas estruturas básicas, como o lóbulo frontal (1), lóbulo parietal (2), lóbulo
occipital (3), lóbulo temporal (4) e cerebelo (5). Os lóbulos formam o neocórtex,
estrutura que é mais desenvolvida nos mamíferos e que pode distinguir a nossa
maior capacidade de processamento de informações (Amthor, 2017).
O cerebelo (5) é definido por Frank Amthor (2017) como ‘’uma estrutura de
coordenação motora complexa que, segundo algumas estimativas, contém tantos
neurônios quanto o resto do sistema nervoso’’, sendo parte fundamental para os
movimentos que dominamos ou ainda poderemos aprender. Danos a esta
estrutura acarretam movimentos lentos e descoordenados, com imprecisão e
pouca força, muitas vezes lembrando um robô (Amthor, 2017).

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O movimento, componente importante do nosso dia a dia, é essencial para
qualquer atividade recreativa, profissional ou laboral. Ele começa no cérebro,
passa pela medula espinhal, chega aos músculos e gera a ação necessária.
Quanto mais repetimos um mesmo movimento, mais ele torna-se eficiente,
preciso, com menos gasto energético.
Ao longo desta aula, poderemos aprender mais sobre a neurofisiologia do
comportamento motor, como um estímulo pode ser respondido com um
movimento e todas as suas possíveis ações (Amthor, 2017).

TEMA 1 – O MOVIMENTO É NECESSÁRIO

Os movimentos que fazemos ao longo do nosso dia foram aprendidos em


algum momento de nossas vidas. A caminhada, a preensão de um lápis, o corte
de um legume na cozinha, tudo teve o seu tempo e seu momento para ser
aprendido. Por mais específicos que sejam estes exemplos, podemos analisar
que nunca é tarde para aprendermos alguma habilidade nova, porém a nossa
estrutura, corporal e cognitiva, deve estar pronta para receber estes novos
estímulos (Oliveira, 2015).
Esta estimulação provocará novas reações e respostas, que precisarão de
novas sinapses, descritas como uma conexão entre um neurônio e outro, para
transmitir estas novas informações. Oliveira (2015) define que o aprender
“significa usar sinapses normalmente não usadas. O uso, de maior ou menor
número de sinapses é o que condiciona uma aprendizagem no sentido
neurológico”.
Por isso, o movimento é tão necessário desde os primeiros meses de vida,
pois a cada desafio superado pelos bebês, mais eles conseguem desenvolver o
cérebro para novos desafios, lembrando sempre de respeitar o processo de
maturação e não exceder estes estímulos, pois o sistema nervoso não se
desenvolve de uma vez e segue uma sequência.
Lourenço Filho (1964, p. 35) citado por Oliveira (2015) aponta que “a
aprendizagem supõe um mínimo de maturidade de onde possa partir qualquer
que seja o comportamento considerado”.
A teoria das fases do desenvolvimento motor de Gallahue e Ozmun (2005)
corrobora essa ideia de um sistema cognitivo maduro ser necessário para o
aprendizado de uma habilidade motora. Por exemplo, uma criança que está na
fase motora fundamental, no estágio inicial, terá entre dois e três anos, as

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atividades propostas a ela, uma brincadeira que seja, devem estar condizentes
com o seu nível de compreensão cognitiva e motora (Oliveira, 2015).
Entretanto, não somente a maturação é importante para a aprendizagem,
outros fatores como a condição social, a interação com o meio ambiente, a
experimentação de novas atividades e exercícios são aspectos muito importantes
para um bom desenvolvimento mental. Para tal afirmação, Oliveira (2015)
concorda com Bee e Mitchell (1984) quando eles dizem que “o desenvolvimento
motor é afetado pela oportunidade de praticar e pelas variações ambientais mais
importantes. [...] o ritmo pode ser retardado pela ausência de pratica ou
experiências adequadas”.
Podemos pensar em um grupo de alunos que começaram juntos em uma
escola de natação, fazendo aula com o mesmo professor, sendo que nenhum
deles havia frequentado a estas aulas anteriormente. Este professor, no caso, não
sabe ensinar o nado costas para os seus alunos e também não deixa que eles
tentem por si aprender tal estilo, priorizando os outros três estilos: borboleta, peito
e crawl. Ao final de um trimestre de aulas, devemos considerar a evolução destes
alunos como satisfatória ou não para o ensino da natação? Nas habilidades de
deslocamento e mergulho de frente, eles conseguem realizar as atividades, mas
quando mudamos o decúbito, as coisas já não saem de uma maneira positiva,
pois os alunos não tiveram aquela vivência de deitar na água, deslizar, fazer um
nado elementar de costas até o padrão do movimento do nado completo.
Por mais que um aluno tenha o espaço adequado (uma piscina) e um
intermediador (o professor), ele só consegue alcançar o máximo da sua eficiência
motora quando é estimulado a experimentar os mais variados movimentos e
diferentes formas de se realizar um mesmo objetivo. Se a ideia é atravessar a
piscina sem colocar o pé no chão, o aluno pode ir nadando um dos quatros estilos,
mas também pode ir nadando de “cachorrinho” ou, ainda, intercalando um estilo
de nado com mergulho, enfim, da maneira que quiser experimentar o seu corpo
no meio, adotando a maneira mais eficiente que ele encontrar. As crianças que
não têm uma maturação suficiente para criar um movimento ou pensar na melhor
forma de transpor um desafio, geralmente copiam aquelas que já conseguiram,
parecendo pequenos robôs copiando o movimento dos outros.
Crianças que vivem em um ambiente pouco encorajador, como famílias
superprotetoras, ou ambiente que tenham pouco espaço para a recreação,
acabam tendo pouca experiência motora e apresentam uma desvantagem no

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desenvolvimento motor global, comparado com outras crianças da mesma idade
(Oliveira,2015).
Por isso, Oliveira (2015) afirma que a psicomotricidade pode auxiliar as
crianças a alcançarem um desenvolvimento integral, o que propiciará uma
melhora na aprendizagem, não somente na área motora, mas também, em
consequência, nas cognitivas.

TEMA 2 – NEUROFISIOLOGIA DO COMPORTAMENTO MOTOR

Segundo a definição de Krebs et al. (2013), a neurofisiologia “é o estudo


dos movimentos de íons através de uma membrana. Estes movimentos podem
iniciar a transdução de sinal e a geração de potenciais de ação”. Estes potenciais
de ação também podem ser denominados como impulsos elétricos, que ocorrem
ao longo da superfície dos neurônios. São eles que, por meio de sinapses, levam
a informação correta para o local certo (Krebs et al., 2013).
Por exemplo, se estamos praticando tênis de mesa, devemos caracterizar
o nosso padrão de movimento para esta atividade. Com um padrão correto de
movimento e força, analisamos o tamanho do local de jogo, a velocidade da bola,
a área da raquete, entre outros componentes (Gallahue; Ozmun, 2005).
A área do comportamento motor pode ser dividida em outra três, com
denominações diferentes, porém interligadas: a aprendizagem motora, o controle
motor e o desenvolvimento motor (Tani et al., 2010).
Essas áreas de estudo podem abranger pesquisadores que estudam a
neurociência cognitiva, a neurofisiologia, a bioengenharia, a educação física, entre
outras, que têm o movimento como objeto de estudo. Quando aprendemos um
novo padrão motor, devemos passar por uma sequência pré-existente de
aquisição de movimento. Primeiro nós aprendemos para depois controlarmos
melhor as ações e, assim, desenvolvê-las. Já os interesses de estudo da
neurofisiologia estão integrados com a neurociência, que interagem também com
os campos dos estudos comportamentais; e as últimas pesquisas mostram que o
comportamento motor se mostra cada vez mais relacionado com a biomecânica e
a neurofisiologia (Tani et al., 2010).
Nos últimos anos, duas teorias foram mais difundidas dentro da literatura
sobre o comportamento motor, conforme Meijer e Roth (1998), citados por Tani et
al. (2010): a teoria de perspectiva dos sistemas motores (teoria motora), que
enfatiza o Sistema Nervoso Central como controlador dos movimentos, e a

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perspectiva dos sistemas de ação (teoria de ação), que denota a interação do
corpo com o ambiente. A teoria motora diz que os movimentos realizados copiam
padrões já existentes na nossa memória cerebral e que os músculos servem como
um “servomecanismo” do SNC (Tani et al., 2010).
Em contraposição, a teoria de ação enfatiza a troca de informações entre o
corpo e o ambiente, as respostas que recebemos dos órgãos sensoriais para
planejar e executar uma resposta ao estímulo recebido. Quando um skatista
começa a andar pelas ruas, deve absorver várias informações, como o tipo de
piso, se existe algum obstáculo, como uma escada, se ele deve transpor este
obstáculo, quais ações ele deve tomar – flexionar os joelhos, abaixar o centro de
gravidade para um melhor controle, afastar mais os braços para melhorar o
equilíbrio, entre outras ações (Tani et al., 2010).
Retomando as definições neurais, entendemos que a função principal do
Sistema Nervoso Central é controlar o movimento, e são os neurônios motores
que conduzem a contração e o relaxamento dos músculos, que, junto com as
células musculares são concebidos como efetivadores do sistema motor. Saindo
da medula espinhal para controlar os braços e pernas, temos os neurônios
motores (Amthor, 2017).
Os movimentos existentes no corpo humano podem ser separados
basicamente em voluntários e involuntários, porém, dentro destas distinções,
podemos caracterizar um pouco mais cada tipo. O autor Frank Amthor (2017)
disserta sobre estes tipos: (A) movimentos que regulam funções corporais
internas, (B) movimentos reflexivos, (C) movimentos voluntários totalmente
conscientes.

A. O sistema nervoso autônomo, que acaba controlando as funções corporais,


regula as contrações estomacais e intestinais, frequência cardíaca e
respiração. Normalmente não estamos conscientes da respiração, contudo
podemos controlá-la, fazendo um exercício físico por exemplo, dentro ou
fora d’água.
B. São o resultado de um estímulo sensorial, como o afastamento da mão de
uma ação dolorida e o reflexo de engasgo.
C. Os humanos conseguem realizar uma sequência aprimorada de
movimentos, pois proporcionalmente temos cérebros grandes,
comparados ao tamanho médio do corpo. Assim, temos uma grande área
de lobo frontal, responsável pela representação do movimento, ou seja,

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podemos realizar um planejamento melhor de um movimento, aumentando
sua qualidade (Amthor, 2017).

2.1 Controle do movimento

Os tipos de contrações musculares podem variar de ações automáticas,


reflexivas e planejadas, cada qual com uma exigência diferente.

2.1.1 Movimentos involuntários

Ainda para definir a representação dos tipos de músculos e tecidos, Frank


Amthor (2017) define que “movimento que não são controlados voluntariamente
são normalmente realizadas por músculos lisos [...] nas paredes dos vasos
capilares, permitem que os vasos contraiam e dilatem para ajudar o coração a
movimentar o sangue”. As células musculares lisas se contraem de maneira
espontânea, pois elas próprias produzem os seus potenciais de ação, intestino e
sistema digestivo, por exemplo.

2.1.2 Movimento de reflexo

Quando conciliamos uma ação motora e uma sensorial, temos o reflexo,


isto é, o movimento que é originário depois de passarmos por uma sensação
desagradável (colocar a mão numa superfície muito quente) ou inesperada (som
de um pneu de caminhão estourando). Frank Amthor (2017) explicou esta ação
usando como exemplo o momento em que colocamos o dedo em uma tachinha.

1. A ponta penetra a pele e ativa os receptores de terminações nervosas [...];


2. Os receptores de dor enviam suas mensagens através dos potenciais de
ação por seus axônios, [...] para o gânglio da raiz dorsal que recebe a
informação de toque do dedo;
3. O axônio do receptor de dor libera o glutamato neurotransmissor na área
cinzenta espinhal para interneurônios da medula espinhal;
4. Os interneurônios espinhais contatam neurônios motores para o bíceps e
tríceps;
5. Os axônios do neurônio motor deixam a parte ventral da medula espinhal e
entram e viajam no mesmo nervo que a entrada sensorial em direção ao
gânglio da raiz dorsal;

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6. O resultado final: o tríceps relaxa enquanto o bíceps flexiona, fazendo o
braço se afastar da tachinha.

Este movimento não depende de uma ação cerebral, ele ocorre


diretamente na medula espinhal, ou seja, os sinais sensoriais não têm tempo de
chegar ao cérebro para que ele possa planejar uma ação motora.

2.1.3 Locomoção

Quando caminhamos, estamos realizando uma atividade coordenada,


controlada na medula espinhal e diversificada com segmentos, interagindo os dois
braços e as duas pernas basicamente. Os circuitos neurais que existem na medula
espinhal, conhecidos como gerador de padrão central, podem alternar o controle
do movimento, assim sendo, nós não controlamos um estilo de caminhada,
simplesmente realizamos este padrão motor. Podemos até andar de uma maneira
diferente a que estamos acostumados, porém precisamos recrutar uma parte do
lobo frontal para tal ação. A existência de um controle hierárquico serve para
direcionar o processo geral, para definir um “rumo”, não havendo preocupação
com ações específicas de cada membro (Amthor, 2017).
Como os níveis mais baixos da medula espinhal é que cuidam dos detalhes
da caminhada, o nosso cérebro não precisa focar em cada contração realizada,
aumentando a eficiência. Como os detalhes são feitos nos circuitos espinhais
locais, que ficam mais próximos que o cérebro, este pode monitorar o progresso
geral, pois, se as transmissões dependessem de os receptores articulares irem e
voltarem do cérebro, levaríamos mais tempo para sair do lugar. Existe uma
sequência pré-determinada pelo cérebro para andar, porém, se tropeçamos, o
reflexo espinhal aprende a tomar uma ação imediata para corrigir este “erro”, ou
seja, existe uma flexibilidade na ação tomada (Amthor, 2017).
Temos a impressão, com essas informações, de que não precisamos de
um cérebro, porém ele é fundamental para a tomada de decisões, por exemplo:
andar ou não, correr ou caminhar, para onde ir. Atividades como dançar, brincar,
pular, saltitar, rolar e girar exigem sequências complexas, requerem mais do que
a medula espinhal pode realizar. Para aprendermos estas ações, precisamos
observar um padrão correto, pensar em como executar tal movimento, realizar um
feedback do erro, ou seja, atos que acontecem dentro do cérebro (Amthor, 2017).

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2.1.4 Comportamento motor complexo

O cérebro pode controlar diretamente os músculos da medula espinhal.


Estas ações são mais complexas, pois envolvem adaptabilidade, planejamento e
conhecimento das situações que provocaram uma mudança. Se pensarmos em
um carro que anda por uma estrada sozinho, ele pode manter o controle por vários
quilômetros, entretanto, se passa por um local de um acidente, onde uma pista
está bloqueada, o motorista deve assumir o comando, passar pelo caminho
correto, dirigindo mais devagar e com mais atenção. Este seria o papel do cérebro
e da medula espinhal, esta pode assumir o caminhar, contudo, quando
precisamos tomar decisões mais concisas, precisamos do cérebro (Amthor,
2017).

2.2 As células musculares

Os músculos são formados por grupos de células musculares que se


contraem por conta da contração das células localizadas ao longo do seu
comprimento. O nosso corpo tem dois tipos de músculo: o liso e o estriado. Os
estriados são os responsáveis pelas ações voluntárias, controladas pelo sistema
nervoso. Estas células musculares formam as fibras musculares, e um conjunto
de fibras forma um músculo. De acordo com Frank Amthor (2017), “o número de
células musculares contraídas ao longo de uma fibra determina seu encurtamento,
que, por sua vez, é controlado pelo número de células musculares ativadas”; e,
ainda, define que a força de contração é determinada pelo número de fibras
musculares.
Quanto mais neurônios motores ativados controlam um grupo muscular,
mais precisão de contração teremos, isso é visto, por exemplo, quando uma
criança usa muita força para abrir uma garrafa e acaba derrubando-a. Por mais
que ela consiga abrir uma garrafa, pois tem força para tal, não consegue definir o
quanto é necessário para romper a inércia da tampa. Acabamos desenvolvendo
mais controle motor e mais neurônios motores ativados com a maturação do SN
(Amthor, 2017) (Gallahue; Ozmun, 2005).

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Figura 2 – Criança

Crédito: DenisNata / Shutterstock.

TEMA 3 – PLANEJANDO AS AÇÕES

O ser humano é movido por ações, sejam estas de caráter recreativo ou


laboral. Estamos nos movimentando na maior parte do tempo, isso inclui coisas
que gostamos ou não de realizar. A sociedade opera por meio das habilidades de
escolhas, que são direcionadas pelos pensamentos e pela racionalidade, na
maioria das vezes. Somos livres para determinar as nossas escolhas e como
iremos executá-las, trata-se do chamado livre arbítrio, contudo, qual região do
cérebro é responsável por estas escolhas? (Amthor, 2017).
Já vimos que o nosso corpo realiza diferentes tipos de movimentos, ações
reflexas, movimentos involuntários e movimentos planejados, cada um controlado
por um tipo determinado de circuito neural. Voltando ao exemplo da caminhada,
em que os músculos comandados pela medula espinhal são os executantes da
ação, é preciso sinalizar, contudo, que o cérebro, utilizando o córtex motor
primário, pode assumir o controle muscular, caso seja necessário executar
alguma ação diferente durante a trajetória, não precisando contar unicamente com
os reflexos. Se pensarmos em uma queda, temos a ação de colocar as mãos para
frente, a fim de evitar um ferimento maior, que pode ser evitado se, antes de isso
acontecer, o cérebro enviar o comando de corrigir a ação passada; ou, ainda, em
pular um buraco, antes de cair no chão (Amthor, 2017).

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Figura 3 – Córtex motor primário e córtex somestésico primário

Crédito: Alila Medical Media / Shutterstock.

O controle motor cortical é que permite esta flexibilidade e adaptação no


padrão do comportamento motor, o que não é possível apenas com a medula
espinhal. Os neurônios motores que estão no córtex motor primário acabam
mandando seus axônios através da medula espinhal, chegando nos neurônios
alfa, que comandam os músculos do tronco (Amthor, 2017).
Mas como o nosso cérebro sabe quais funções e em qual ordem ele deve
executá-las? Quais metas o córtex motor primário deve estabelecer para
determinar, planejar e executar um plano motor? Para cumprir um mesmo
objetivo, você pode ter alternativas diferentes. Se estamos em um shopping e
queremos ir até o cinema, existem vários caminhos que levam ao mesmo lugar.
Podemos ir de elevador ou escada rolante, passar por um corredor ou por outro.
A maneira (programa motor) deve ser selecionada por nós. Cada um desses
caminhos pode ter uma distância diferente, uma escada, que engloba outros tipos
de músculos e uma outra sequência motora (Amthor, 2017).
Um córtex pré-frontal grande e desenvolvido (característico do homo
sapiens) permite que possamos ter estes planos em vários níveis e
complexidades. Frank Amthor (2017) define que “planos complexos requerem
memórias de longo prazo que possam acessar subplanos como a forma de
encontrar uma loja, como dirigir um carro e como pagar por um CD [...]”. Fazendo
uma ponte com o exemplo do cinema, nós temos como objetivo final chegar ao
local desejado, entretanto, antes de entrarmos para assistir a um filme, nada nos
impede de comprarmos uma água ou uma pipoca nem de utilizarmos o banheiro.
Nenhuma destas ações nos faz esquecer que o nosso objetivo principal é ir ao

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cinema, elas apenas fazem parte do nosso programa motor e foram executadas
na sequência correta. Primeiro compramos algo, depois fomos fazer as
necessidades fisiológicas e, em seguida, sentamos para assistir ao filme – pois
não faria sentido que, depois de iniciada a sessão, fôssemos comprar uma pipoca
ou um doce (Amthor, 2017).
Outro exemplo bem simples é quando vamos viajar de carro e, antes de
partir, precisamos ir ao banheiro. Isso só ocorre porque, provavelmente, já tivemos
a experiência de no meio de uma viagem precisar parar o carro, procurar um local
adequado para então atender às nossas necessidades. O cérebro aprende com
os acontecimentos passados, ele sabe organizar as ações para otimizar o tempo,
colocar as tarefas em linearidade para que possam ser mais facilmente
executadas.
Se nós aprendemos a cumprir uma sequência de tarefas, a memória é
imprescindível para tal. Frank Amthor (2017) fala sobre a memória operacional: “É
mais como uma manutenção temporária de um padrão dinâmico de disparos
neurais. Cada ideia de meta [...] é um conjunto de representações neurais
relacionadas espalhadas pelo cérebro”, ela é criada no lobo pré-frontal, serve
como um script de um circuito temporário. A memória operacional pode armazenar
até sete conceitos diferentes e, dentro destes conceitos, podem existir ainda mais
outras especificações. Todo este processo decorre da interação do neurônios
corticais pré-frontais com o hipocampo e a amígdala. E é esta quem decodifica os
riscos e benefícios dos subplanos das metas; por exemplo, se eu vou pegar um
ônibus à noite e tenho um caminho mais perigoso para atravessar e outro mais
tranquilo, o córtex orbitofrontal interagindo com a amígdala avaliam se este risco
vale a pena ou se devo tomar outro caminho (Amthor, 2017).
Já os gânglios basais também interagem com o córtex pré-frontal, incidindo
em dois aspectos diferentes para alcançar as metas: a seleção e a troca. As
ações que planejamos podem ser executadas sim ou não, ou seja, nós pensamos
em várias alternativas, como escolher o caminho para ir até a sala de cinema do
shopping, assim que saímos do carro. Podemos selecionar (escolher) ir por um
caminho e passar à frente de uma loja de que gostamos muito ou até evitar outra
loja, ou qualquer outra coisa no caminho; é a interação da atividade pré-frontal e
os gânglios basais que faz um caminho ser escolhido e o outro inibido. Assim que
escolhemos um caminho e vamos percorrendo um corredor no shopping,
deparamo-nos com uma parte interditada, sem acesso, então precisamos trocar

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de caminho e subplanejar novamente várias ações: se vamos ter de usar uma
escada, que antes não estava no caminho, ou um elevador, por exemplo. Parte
deste processamento é feito entre os gânglios e o tálamo (Amthor, 2017).
A capacidade que temos de estipular metas complexas, que precisarão de
um longo prazo para serem concluídas, como um Trabalho de Conclusão de
Curso, a escrita de um livro ou a fabricação de um móvel, é inerente
exclusivamente ao ser humano, que, através do córtex pré-frontal, “adiciona
sutileza, complexidade, adaptabilidade e perseverança na busca de metas [...]”,
mencionou Frank Amthor (2017).
O cerebelo consiste em uma área de aprendizado e coordenação, contém
também os receptores sensoriais periféricos, bem como a entrada de receptores
sensoriais vindos de inervações periféricas, áreas pré-frontais e outras
associações corticais, que acabam enviando estas informações para o córtex
motor primário. Ele tem papel fundamental quando executamos alguma tarefa
difícil pela primeira vez, como dirigir um carro, em que podemos cometer erros e
não fazer os movimentos com uma velocidade correta, como tirar o pé da
embreagem. Quando fazemos um feedback da ação, podemos melhorar com a
prática e integrar o que vemos com o que fazemos. Ele pode ser dividido em três
áreas: (A) vestíbulo-cerebral, (B) espinocerebelo e (C) neocerebelo, que seguem
as definições de Frank Amthor (2017).

A. “Executa correção de erros e aprendizado motor para equilíbrio, usando


entradas dos canais semicirculares e do sistema visual”;
B. “Coordena o tempo de locomoção e a atividade do tronco”;
C. “Interage com a área pré-frontal e outras áreas corticais para aprender
sequências gerais do plano”.

Figura 4 – Cerebelo

Crédito: Sebastian Kaulitzki/ Shutterstock.

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Então, pode-se concluir que, por mais opções que o nosso cérebro nos
apresente para evitar “trabalhar desnecessariamente”, somos nós quem
planejamos as ações que ele vai realizar. Se escolhemos um caminho mais longo
para ir ao trabalho, evitando pegar um fluxo maior de carros, sabemos que o gasto
com gasolina vai ser maior (quando tomamos esta decisão, já prevemos esta
consequência) ou poderíamos fazer um trajeto mais curto, com um possível
engarrafamento, gastando mais tempo para ir trabalhar. O “livre arbítrio” nos
permite fazer estas escolhas e assumir as consequências, isso aumenta o
histórico de nossas experiências e memórias.

TEMA 4 – AÇÃO E RESULTADO

O termo psicomotricidade foi descrito pela primeira vez em 1920 por Dupré.
Seguindo a sua definição, era o “entrelaçamento entre o movimento e o
pensamento” (Oliveira, 2015, p. 28). Segundo a autora, já em 1909, Dupré falava
em uma preocupação relacionada a defeitos psicológicos e motores, fato que o
levou a desenvolver o termo psicomotricidade.
Vonèche e Stoltz (2007, p. 28), após analisarem um trabalho de Piaget
(1950), citaram que “a ação não é somente movimento corporal, mas também
intenção mental, também é a origem do movimento, pelo menos em termos de
sua planificação por animais e humanos”.
Podemos pensar em duas situações distintas, porém que se assemelham
em busca do resultado. Uma criança com dois anos completos, brincando em
casa, depara-se com uma caixa de papelão, que nunca havia visto. Ela pode
explorar o objeto de várias maneiras, e uma delas é entrando nela. Para isso, ela
deverá planejar a ação, por exemplo, pensando em como cada membro irá se
comportar para que ocorra da maneira esperada. Primeiro ela se apoiará em
algum lugar para depois conseguir elevar uma das pernas para entrar na caixa e
alcançar o resultado esperado. Piaget (1961) fala “que a percepção visual é uma
forma de ação pela qual o olho e o cérebro ‘imitam’ a forma do objeto percebido”
(Vonèche; Stoltz, 2007).
Vonèche e Stoltz (2007) citam que Piaget ainda propôs que “as imagens
mentais de uma ação eram similares à ação real”, seguindo assim para o nosso
segundo exemplo. Um atleta de salto em distância, pronto para realizar o seu salto
em uma competição, está posicionado na pista aguardando o sinal da arbitragem

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para poder iniciar o seu movimento. Neste momento, ele acaba “visualizando” o
seu movimento, desde a corrida, passando pela aproximação na tábua de
impulsão, pela fase do voo e, por fim, até a aterrissagem. Toda esta ação, antes
de ser executada naquele momento, já foi treinada várias vezes em um ambiente
mais tranquilo, sem a pressão dos adversários e da torcida e sem toda a
responsabilidade imbuída naquele momento. O atleta sabe exatamente o que
deve fazer em cada fase, mas mesmo assim ainda mantém uma concentração
elevada e “visualiza” todo o movimento antes de ele acontecer.
Além desta internalização do movimento, da ação proposta, Oliveira (2015)
diz que Piaget (1987) enfatiza a importância de dois períodos, o sensório-motor e
o da motricidade, que precedem a aquisição de linguagem. Este desenvolvimento
ocorre por conta de uma “equilibração progressiva”, em que uma ação provoca o
desequilíbrio do meio, o corpo tende a voltar ao equilíbrio buscando adaptar-se
da melhor forma possível.
Oliveira (2015) ainda cita que “a inteligência é uma adaptação ao meio
ambiente, e, para que isso possa ocorrer, necessita inicialmente da manipulação
pelo indivíduo dos objetos do meio com a modificação dos reflexos primários”. E
esta manipulação é responsável também pela assimilação, que é “o processo de
incorporação dos objetos e informações [...] já existentes, e a acomodação, a
transformação dessas estruturas mentais a partir das informações sobre os
objetos” (Oliveira, 2015).
Ressaltando que inteligência e cognição não são resumidas apenas a estes
termos, contudo, podemos relacioná-las com a psicomotricidade. Assim, quando
existe a vivência de diferentes experiências motoras, a criança tem a chance de
desenvolver mais as suas funções intelectuais; e quando esta inteligência alcança
um determinado patamar, ela poderá comparar, classificar, distinguir objetos,
entrando nos méritos também da psicomotricidade (Oliveira, 2015).
Nos primeiros meses de vida, o movimento, a ação, ocorre de maneira
desordenada e indefinida, até que o controle corporal começa a ocorrer fazendo
com que os movimentos reflexos passem a ser organizados. Então, assumimos
um controle do centro para as extremidades, dominando por completo o nosso
corpo. Os primeiros sinais de interação do bebê são os movimentos que ele faz e,
mais tarde, esses sinais são expressos em palavras, até o ponto de autonomia
dele (Oliveira, 2015).

16
Para tal definição, Oliveira (2015, p. 33) cita Wallon (citado por Fonseca,
2015), o qual diz que “movimento (ação), pensamento e linguagem são uma
unidade inseparável. O movimento é o pensamento em ato, e o pensamento é o
movimento sem ato”.
Ação e resultado irão sempre nortear os nossos movimentos, sejam eles
os mais básicos, desde escrever em um papel, para criar um texto qualquer, sejam
“visualizar” um movimento mesmo antes de ele acontecer, como um nadador em
cima do bloco de partida, que irá fazer a sua ação motora buscando como
resultado alcançar o primeiro lugar na competição.

TEMA 5 – DISFUNÇÕES QUE PREJUDICAM O CÉREBRO

O avanço da medicina ao longo dos últimos séculos tem sido extraordinário.


Vacinas foram criadas para eliminar doenças, como sarampo, rubéola, paralisia
infantil; o câncer passou a ser combatido com vários tratamentos, como
radioterapia e quimioterapia, que auxiliam no processo de cura; o HIV, que surgiu
como uma nova peste negra no final dos anos 80, tem sido cada vez mais
combatido, e os seus portadores, que antes tinham baixas expectativas de vida,
passaram a levar uma vida mais tranquila com a ajuda de remédios – os quais
podem ser substituídos até por uma vacina no futuro. Contudo, as doenças que
ficam cada vez mais em evidência no século XXI são as doenças mentais. Essa
definição corrobora com o dado de que 5,8% da população brasileira hoje tem
depressão, e 9,3%, algum tipo de ansiedade, que pode ser fobia, TOC, estresse
pós-traumático ou ataque de pânico (Graciolli, 2018).
Entretanto, não são apenas as doenças que podem afetar a população,
alguns distúrbios de aprendizagem, síndromes e outras disfunções também
acabam desafiando os profissionais da saúde, que devem promover os melhores
tratamentos. Muitas dessas doenças estão ligadas à anomalia nos
neurotransmissores, que podem ter sofrido uma mutação genética ou alguma
experiência vivida. A trissomia 21, ou Síndrome de Down, é um exemplo de uma
falha genética, já o TEPT, transtorno de estresse pós-traumático, é desenvolvido
pelo ambiente (Amthor, 2017).
De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais
– 5ª edição (DSM-5), que é a base para o diagnóstico de várias doenças, podemos
contar mais de vinte tipos de transtornos mentais e suas ramificações. Entre eles,

17
o transtorno de neurodesenvolvimento, bipolar, de ansiedade, dissociativo,
alimentar, neurocognitivo, de personalidade, depressivo, entre outros.

Figura 5 – Doenças cerebrais

Créditos: Puwadol Jaturawutthichai / Shutterstock.

5.1 Danos genéticos

No momento da fecundação, espermatozoide e óvulos carregam consigo


23 cromossomos, que irão se unir e formar um novo ser, com 23 novos pares
carregados geneticamente das informações paterna e materna. Com a
multiplicação celular ocorrendo, alguma falha durante este processo pode
ocasionar um tipo de distúrbio genético, que poderá afetar ou não a parte cognitiva
ou neurológica
A Síndrome de Down afeta um em cada mil nascimentos e pode afetar o
aprendizado de maneira moderada a grave, como as comorbidades que afetam
outros sistemas. A Síndrome do X Frágil é o resultado da mutação no
cromossomo X e tem como característica a deficiência na aprendizagem e
alterações tanto no comportamento quanto para lidar com as emoções. Tônus
muscular baixo, orelhas grandes, rosto alongado e pés chatos são as
características físicas perceptíveis. Ela é associada à baixa funcionalidade das
regiões pré-frontais do cérebro. A Síndrome de Rett afeta na maioria dos casos
as mulheres, que têm um distúrbio neuronal anormal, e os neurotransmissores,
norepinefrina e dopamina estão abaixo da normalidade (Amthor, 2017).

18
O Transtorno do Espectro Autismo (TEA), seguindo a definição do DSM-5,
é “diagnosticado quando os déficits característicos de comunicação social são
acompanhados por comportamentos excessivamente repetitivos, interesses
restritos e insistência nas mesmas coisas”. Por mais que se encontrem as causas
genéticas pela hereditariedade, ainda não se pode afirmar com precisão.

5.2 Doenças afetadas pelo ambiente

Pelo DSM-5, os transtornos por trauma ou estressores são aqueles que


têm relação com a exposição a um evento traumático ou estressante; são critérios
para um diagnóstico: uma morte, guerra, ameaça à integridade física, sexual ou
psicológica. Segundo Frank Amthor (2017), o TEPT tem com uma de suas
características a secreção desregulada do cortisol e da catecolamina, presentes
em ações de defesa, como lutar ou correr de uma eminente agressão.
O ambiente fetal pode influenciar diretamente o bebê. Uma mãe que passa
por altas cargas de estresse durante a gestação pode gerar uma criança que
tenha no futuro dificuldades cognitivas e emocionais, hiperatividade e déficit de
atenção, ansiedade e atraso de linguagem. A secreção de cortisol, o hormônio do
estresse, provoca efeitos insalubres no feto. Assim como a ingestão indevida de
álcool. Um em cada mil nascimentos acaba afetado pelas moléculas de álcool que
cruzam a placenta e acabam comprometendo os neurônios e suas estruturas
cerebrais.

5.3 Componentes genéticos e ambientais

Algumas doenças acabam combinando os fatores genéticos com gatilhos


ambientais, como a depressão ou a esquizofrenia. A depressão, por exemplo,
pode ser de ordem genética ou não. Se levarmos em conta uma pessoa que nunca
apresentou nenhum sinal ou sintoma da doença, mas acaba vivenciando uma
experiência traumática, como uma morte, ela pode evidenciar esta característica
que estava “adormecida” e, através deste insight, ser diagnosticada com
depressão. Já a epilepsia é marcada pela convulsão cerebral, que são incidentes
de “atividade neural hiper-síncrona durante os quais funções cerebrais
controladas e normais são severamente comprometidas”, definiu Frak Amthor
(2017). Ela tem causas genéticas e contribuições ambientais, como uma foto-
exposição excessiva, tanto é que pessoas propensas a epilepsias não devem

19
assistir a alguns filmes nem fazerem uso de jogos eletrônicos. Remédios
anticonvulsionantes que atuam como transmissores do GABA (neurotransmissor
inibitório) funcionam em cerca de 70% dos pacientes, outra opção é a cirurgia para
a remoção da área cerebral que desencadeia as convulsões, porém, em muitos
casos, esta opção não é possível (Amthor, 2017).
A esquizofrenia é caracterizada por ser uma doença que começa na fase
adulta, após a mielinização completa do lobo frontal. O pensamento desordenado
não apresenta a realidade, sendo encaminhada para sintomas positivos
(percebem vozes ou pessoas imaginárias as perseguindo) que acabam ativando
o córtex auditivo que interage com o cérebro, ou sintomas negativos (isolamento
social), em que o afeto, emoção e prazer parecem inexistir (Amthor, 2017).
O transtorno obsessivo-compulsivo é “um distúrbio da ansiedade [...] que
leva a comportamentos repetitivos para aliviar a ansiedade relacionada ao
pensamento”, definido deste modo por Frank Amthor (2017). Nesse transtorno, os
afetados, conscientes de suas ações, realizam rituais em certos procedimentos e
têm preocupação excessiva com a higiene pessoal e, às vezes, do ambiente. Uma
anormalidade no sistema de transmissão da serotonina foi associada ao TOC, e
alguns genes ligados a ela também foram identificados, porém nenhuma ligação
genética foi encontrada, reforçando o papel ambiental como desencadeador do
transtorno (Amthor, 2017).
De acordo com o DSM-5, a listagem de diagnósticos de transtorno,
condição ou problema somam um total de 20 páginas com 759 tipificações
diferentes. Isso nos demonstra o quanto o nosso cérebro pode ser afetado por
condições adversas de ordem genética ou ambiental. Manter um cérebro ativo e
saudável é tão fundamental quanto uma musculatura forte e ativada.

20
REFERÊNCIAS

AMTHOR, F. Neurociência para leigos. Rio de Janeiro: Alta Books, 2017.

FONSECA, V. Cognição, neuropsicologia e aprendizagem: abordagem


neuropsicológica e psicopedagógica. 7. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2015.

KREBS, C. et al. Neurociências ilustrada. Porto Alegre: Artmed, 2013.

TANI, G. et al. Pesquisa na área de comportamento motor: modelos teóricos,


métodos de investigação, instrumentos de análise, desafios, tendências e
perspectivas. Revista da Educação Física, Maringá, PR, 3. trim. 2010.
Disponível em: <https://repositorio.usp.br/item/002145213>. Acesso em: 15 set.
2019.

21
AULA 2

PSICOMOTORA: A
COMPREENSÃO DA RELAÇÃO
CORPO/MENTE NA
APRENDIZAGEM

Prof. Marcos Aurélio Iubel


CONVERSA INICIAL

O corpo humano é o produto final da existência harmônica de vários


sistemas, o respiratório, muscular, circulatório, digestivo, esquelético e o nervoso.
Essa integração permite ao ser humano interagir com o ambiente e com as
pessoas que nele vivem. Assim, a integração das funções motoras e do processo
cognitivo, nos permitem aprender movimentos, padrões e habilidades únicas.
Somente é possível o aprendizado desses movimentos por meio da
memória, em concepção motora, o engrama motor, então quando aprendemos
um padrão de movimento e nunca mais esquecemos é “culpa” do engrama motor,
que acaba estabelecendo uma sequência ordenada de movimentos que
repetimos várias vezes, tornando-o automatizado. Então quando vamos aprender
um movimento novo, nós acabamos pensando muito e executando com pouca
eficiência, já quando temos um padrão estabelecido, o cérebro acaba trabalhando
menos com maior eficiência do movimento, pensando menos no movimento,
porém executando com grande eficiência.
Crianças que apresentam dificuldades em algum aspecto cognitivo
(atenção, percepção, emoção, memória, motivação, integração, processamento
sequencial e simultâneo, planificação, resolução dos problemas, expressão e
comunicação) acabam apresentando também dificuldades motoras, as quais
acabam refletindo nas debilidades existentes. Se uma criança tem dificuldade em
memorizar uma sequência numérica, por exemplo, isso vai acabar refletindo em
uma dificuldade de aprender uma habilidade esportiva, como a rebatida no
beisebol, que exige uma sequência correta de movimentos, realizados em um
momento certo, entre o arremesso e a rebatida.
As condições do ambiente, somadas com os objetivos da tarefa, e
canalizadas no indivíduo, buscam trazer o resultado esperado, então se algo não
evolui de forma típica, seja na área motora ou cognitiva, é provável que o resultado
não seja o esperado. Sendo o adulto um produto final da evolução da mente e do
corpo, passando pela aquisição de habilidades motoras rudimentares,
fundamentais, padrão de linguagem, escrita e leitura, alguns detalhes podem
acabar afetando-nos mais à frente.

2
TEMA 1 – REGIÕES CEREBRAIS E SUAS FUNÇÕES, ABORDAGEM LURIANA

“A aprendizagem no modelo luriano resulta da criação de conexões entre


muitos grupos de células que se encontram frequentemente localizadas em
distantes áreas (unidades funcionais) do cérebro” (Fonseca, 2015). Prosseguindo
com esta definição, temos três regiões, uma de alerta e atenção, outra de
codificação e outra de planificação.

1.1 1ª unidade

Esta primeira unidade é responsável pelo alerta e a atenção que o nosso


cérebro mantém. Fazem parte desta unidade as estruturas subcorticais e axiais
dos dois lados do cérebro, que são encarregados pelas funções de sobrevivência
e alerta cortical, e ainda acabam filtrando os inputs sensoriais. Em termos
anatômicos acaba abrangendo a medula, o tronco cerebral, o cerebelo, o sistema
límbico e o tálamo, e sem essa região o nosso cérebro não conseguiria
corresponder aos estímulos externos, prejudicando a interação intrassomática
(corpo-cérebro) e também a extrassomática (interação sensorial do indivíduo com
o ambiente) (Fonseca, 2015).
Como esta unidade filtra os estímulos externos, ela é essencial para que
não sejamos imersos desnecessariamente em informações irrelevantes, que
venham para atrapalhar o nosso foco e atenção em determinadas tarefas
cognitivas mais elaboradas, como fazer uma prova em um vestibular. A atenção
e o alerta funcionam em parceria, deixando o nosso corpo sempre preparado para
algo que possa acontecer, por isso o nosso grau de alerta mantém um estado de
vigilância e uns tônus postural e cortical (Fonseca, 2015).

1.2 2ª unidade

A segunda unidade é incumbida do processamento sensorial, desde a


recepção, passando pela integração e principalmente a codificação, culminando
nas aprendizagens precoces, tônico-emocionais, posturas-motoras e incluindo as
fazes de aprendizagem na pré-escola. Ela é formada pelos lobos occipitais,
temporais e parietais (Fonseca, 2015).
Esta unidade é dividida em outras três áreas: 1ª, 2ª e 3ª. A primeira área é
de “recepção sensorial que estão em estreita conexão com a periferia corporal e
com os órgãos sensoriais”, estabeleceu Vitor da Fonseca (2015). Já a segunda,
3
analisa, sintetiza, retêm, e integra as informações intrassensoriais recebidas nas
primeiras áreas, nas quais é possível identificar vários processos que discriminam
e identificam, associam e organizam dados intra e intersensoriais, para vários
subprocessos acústicos, de coordenação visuomotora, de forma, espessura e
tamanho (Fonseca, 1992).

1.3 3ª unidade

Por fim, temos a terceira unidade que tem como norte a execução motora,
planificação e avaliação, consiste no lobo frontal do cérebro, nível mais elaborado
do desenvolvimento. Ela também é dividida em três áreas, as primeiras, local onde
ocorrem a execução dos movimentos, a segunda área, onde se organiza a
sequência e tempo dos movimentos, que recebem o feedback proprioceptivo, e
integram também o centro de planificação, as terceiras áreas, em que ocorre as
atividades cognitivas que antecipam as ações ou condutas. Para que as ações
motoras (motricidade) aconteçam de maneira correta, as três áreas devem
contribuir de maneira combinada (Fonseca, 2015).
A planificação (planejamento de ação) envolve uma sequência de ações,
procedimentos para atingir um fim, e seguindo as definições de Vitor da Fonseca
(2015), implica em cinco dimensões:

1) Identificar a ação desejada;


2) Sequencializar procedimentos;
3) Recuperar dados relevantes;
4) Alocar recursos cognitivos;
5) Decidir e executar.

1.4 Desenvolvimento neuropsicológico

Luria (1990, citado por Fonseca, 2015), definiu cinco “estádios” evolutivos
fundamentais, que podem abranger a aprendizagem:

1) Desenvolvimento da unidade de vigilância (atenção), na área


tronco-cerebral e ocorre entre os 0 e 12 meses;
2) Desenvolvimento das áreas motoras e sensoriais primárias
(integração), nas áreas cerebrais calcarina, superior temporal, pré e pós-
rolândica, que ocorre também entre os 0 e 12 meses;
3) Desenvolvimento das áreas motoras e sensoriais secundárias
(processamento), nas áreas cerebrais periestriada, parietal temporal e
pré-motora, e ocorre entre os 0 e 5 anos;
4) Desenvolvimento das áreas sensoriais terciárias de input
(elaboração), nos lobos parietais, e ocorre entre os 5 e 8 anos;

4
5) Desenvolvimento das áreas de planificação e de output terciárias
(qualificação), nos lobos pré-frontais e desenvolve entre os 12 e 24 anos.

TEMA 2 – COGNIÇÃO

Quando falamos de cognição, podemos interpretar como uma


“propensibilidade para a resolução de problemas”, definiu Vitor da Fonseca
(2015). Os movimentos intencionais, aquele que desejamos fazer, daquela
maneira especifica, é primeiro planificada motoramente, ou seja, pensamos como
iremos executar aquela ação, quais membros teremos que usar, e com isso as
áreas pré-frontais ficam encarregadas de encaminhar os impulsos necessários
para as células musculares, que irão movimentar os grupos musculares, e
consequentemente os membros. A execução é feita pelos sistemas motores
descendentes simultaneamente. Essa fusão entre planejamento e execução leva
algum tempo para ser formada, basta analisarmos quanto tempo um bebê leva
para aprender a andar. Luria (1980, 1979, 1977, 1973, citado por Fonseca, 2015)
denomina como funções executivas estas que comandam a performance motora.
Como o nosso cérebro consegue se adaptar a várias situações, e
sequências, de forma psicomotora, conseguimos planejar com precisão e
exatidão vários movimentos que ainda serão executados, sobretudo nas
extremidades do pé, da mão e da boca (Fonseca, 2015).
Vitor da Fonseca (2015) enumera três itens que são essenciais para a
resolução dos problemas, sejam eles cognitivos ou motores:

1. Receber e interpretar dados e produzir procedimentos para lidar com o


problema (fase input);
2. Criar operações e processos relacionados com as tarefas inerentes ao
problema (fase de integração e planificação);
3. Aquisição de competências para solucionar o problema (fase de output).

Por meio da evolução do córtex pré-frontal, os seres humanos conseguiram


planejar e regular as suas ações, separando a motricidade da psicomotricidade,
permitindo pensar nas nossas ações, tornando os humanos capazes de implantar
uma civilização, algo impensável para outras espécies, que convivem somente
com as ações de motricidade ativas. (Fonseca, 2015).
O autor ainda cita que a praxia e a linguagem desenvolveram a espécie de
maneira significativa, resolvendo os problemas de “adaptação e sobrevivência, de
caça e de recolecção de alimentos, de comunicação e de cooperação”. Contudo,

5
a sequência rápida e o planejamento das ações futuras só são imagináveis se,
‘’metacoordenação cerebral, integrando substratos subcorticais [...] e substratos
corticais [...]’’, isto é, integrando várias áreas do cérebro (Fonseca, 2015).
“A cognição por definição é sinônimo de ‘ato ou processo de
conhecimento’‘’ (Flavell, 1993, citado por Fonseca, 2015). Ela acaba sendo
integrada por vários componentes como a atenção, percepção, emoção, memória,
motivação, integração, processamento sequencial e simultâneo, planificação,
resolução dos problemas, expressão e comunicação. Diferente das características
físicas como a cor dos olhos, altura, cor dos cabelos, a cognição não pode ser
definida hereditariamente, podendo ser expandida e flexibilizada, adaptando-se a
novas condições de maturação e ambiente (Fonseca, 2015).
A cognição não segue um padrão, uma receita de bolo, ela se molda por
meio das ações tomadas pelo indivíduo, que faz do cérebro um órgão único que
pode armazenar uma coleção infinita de informações, e são essas especificidades
que tornam o ser humano único, pois a plasticidade cerebral permite o
aprendizado, um grande volume de informações que nós processamos e filtramos
para aprendermos alguma coisa. E por meio dos receptores sensoriais auditivo,
olfativo, visual, tátil e gustativo, que alimentamos o nosso cérebro com
informações que fazem o nosso cérebro sentir, integrar, pensar, comunicar e agir,
em respostas aos estímulos recebidos (Fonseca, 2015).
Portanto, devemos caracterizar o cérebro como o órgão mais organizado e
onde se forma a cognição, no qual interagem o cérebro, o corpo e o ambiente,
que processamos e solucionamos os problemas apresentados, planificando
soluções e agindo de maneira racional e medida, utilizando sistema de
sobrevivência, prazer e aprendizagem que interagem com os sistemas de
linguagem corporal, falada ou escrita, a final de contas somos o produto final de
uma evolução de quatro bilhões de anos (Fonseca, 2015).

TEMA 3 – O CÉREBRO E A APRENDIZAGEM

Esta massa que pesa em média 1,3 kg comanda as nossas ações


voluntárias e involuntárias com vários sistemas que trabalham interligados ou não.
A teoria evolucionista mostrou que o nossos ancestrais tinham crânios menores e
mais alongados, muito semelhante aos símios de hoje. No reino animal, o homo
sapiens não se destaca em nenhum aspecto físico, perdendo para vários outros
animais em força, velocidade, altura, e para outros caçadores que tem melhor

6
visão, audição e olfato. Contudo, a evolução nos proporcionou um cérebro capaz
de driblar todos esses empecilhos, e nos tornarmos uma raça dominante sobre as
outras, bem ou mal. Com o passar dos milhares de anos, o homo sapiens foi
aprendendo várias formas de comunicação. Fosse para contar fatos ocorridos ou
comunicar-se com outras tribos por meio das pinturas rupestres, presentes até
hoje em vários locais. Esta evolução da comunicação é constante e exponencial,
prova-se isto com os vários aplicativos de mensagens existentes e a facilidade
para usar outros meios de comunicação também. Neste contexto nós devemos
aprender a ler e a escrever para nos comunicarmos com outras pessoas, aprender
a utilizar o código da escrita, com suas letras e números, e mais recentemente os
emojis, podendo assim transmitir e receber mais informações (Oliveira, 2015).
Desde o nosso nascimento somos abastecidos de estímulos sensoriais,
seja audição, olfato, tato, paladar, aprendemos a reconhecer cada uma dessas
informações e a compreender como cada uma delas vai agir sobre nós. Tendo
como exemplo, uma fruta qualquer, que tem uma cor, um cheiro, uma textura e
uma sabor característico, se pensarmos na maçã, ela não é a única fruta vermelha
que existe, mas que reúne aquelas sensações uniformemente, sim. O nosso
cérebro aprende a “montar códigos” assim que deixa o ventre materno e passa a
ser acolhido pelo mundo. Seguindo a linha de aprendizagem motora de Gallahue
& Ozmun (2005), eles descrevem que na fase motora reflexa (do nascimento até
um ano) existem dois estágios importantes, o de codificação (nascimento até
quatro meses) e o de decodificação (dos cinco até doze meses). Nesta idade o
bebê vai adquirir com o tempo (meses) a capacidade de ser estimulado e dar uma
resposta adequada. Por exemplo, segundo Gallahue e Ozmun, o reflexo de busca
e sucção é “estimulação ao redor da boca (reflexo de busca) faz o bebê voltar a
sua cabeça em direção à fonte da estimulação”, com o passar do tempo este
reflexo é inibido, e o controle que a criança tem da cabeça faz ela permanecer em
posição ereta e abrir voluntariamente a boca para comer ou beber (Gallahue;
Ozmun, 2005).
O nosso cérebro é capaz de inibir os reflexos primitivos, sobrepondo-os
com movimentos rudimentares, que serão cada vez mais desenvolvidos e
explorados, chegando a movimentos fundamentais que podem ser treinados e
aprimorados para movimentos especializados. Todavia, nenhum ensinamento é
possível sem a interação com seres experientes, sejam os pais, os professores
ou outros formadores (Oliveira, 2015).

7
Oliveira (2015) em referência a aprendizagem, cita que “a experiência de
aprendizagem mediatizada é uma interação na qual o mediatizador se situa entre
o organismo do indivíduo mediatizado e os estímulos [...]”. Nessa linha de
pensamento que faz o papel de mediatizador, são os pais e professores, que
auxiliam os seus filhos ou estudantes (indivíduo mediatizado) a interpretar,
resolver, diferentes situações que ocorrem no âmbito familiar e escolar. Quando
um aluno não consegue solucionar uma questão de álgebra, cabe ao professor
buscar uma solução, tentando ampliar o conhecimento sobre o assunto,
interpretando de uma maneira que seja de fácil compreensão para aquele aluno.
Oliveira (2015) termina concluindo que “o mediatizador deve proporcionar e
promover situações onde o sujeito mediatizado interaja com elas de forma
dinâmica e de modo a valorizar os seus processos e suas estruturas cognitivas”.
Como a informação chega ao cérebro (input), como ela é processada
(integração-elaboração) e como ela sai (output), deve ser tratada de forma
individual, pois nenhuma pessoa teve os mesmos estímulos, de maneira
quantitativa ou qualitativa, que façam existir um único caminho para a
aprendizagem. Sem um mediador, a experiência pode ser absorvida de maneira
confusa e fragmentada, sendo assimilada de forma parcial (Oliveira, 2015).
Podemos pensar em um grupo de crianças e o professor deixa uma bola
no meio da quadra e coloca uma única regra, que elas não podem sair da quadra.
Cada criança ali poderia ter uma ideia de brincadeira diferente, com regras
diferentes, com objetivos diferentes, então, se as regras da brincadeira não forem
estabelecidas previamente, elas não irão saber o que fazer, receberão um input,
entretanto sem saber como devem agir. Neste caso cabe ao professor esclarecer
as dúvidas, estabelecer regras e comportamentos adequados, para que o output
das informações transmitidas possa ocorrer.

TEMA 4 – CONTROLE MOTOR E SUAS IMPLICAÇÕES NA APRENDIZAGEM

As crianças desde o nascimento utilizam a expressão corporal como parte


da comunicação, um choro, uma birra, entre outras ações, serve para mostrar aos
adultos que alguma coisa está acontecendo. Quando ela consegue reunir
palavras e frases, a comunicação deixa de ser exclusivamente corporal e passa
para verbal. O controle das ações motoras exerce primeiramente um meio de
comunicação, e depois uma forma de interação com os pares por meio da
interação em jogos e brincadeiras. Gallahue e Ozmun (2005) dividiram o

8
desenvolvimento motor em quatro fases e dez estágios. Se tomarmos como
exemplo uma criança de dois anos que vai à escola, ela está na fase de
desenvolvimento dos movimentos fundamentais (dos dois aos sete anos) que tem
dois estágios, o elementar e o maduro (Oliveira et al., 2017).
Aquino et al. (2012, citado por Oliveira et al., 2017) dissertaram que “o
desenvolvimento motor na infância ocorre de forma gradativa e se caracteriza pela
aquisição de habilidades motoras em respostas as adaptações da criança as suas
necessidades”. Podendo interpretar como, se uma criança não passa por desafios
e não é estimulada, não consegue ter um desenvolvimento dentro das
expectativas para a idade. Quanto mais estímulos a criança recebe, ela tende a
colocar o que foi aprendido em prática, e as habilidades motoras devem passar
por um processo de instrução e prática, possibilitando que elas se tornem
habilidades plenas. (Oliveira et al., 2017).
Uma criança que consegue explorar o ambiente e criar soluções diversas
para várias situações, acaba criando um maior número de sinapses no cérebro,
pois cada movimento segue um mesmo padrão de planificação. Se uma criança
é colocada dentro de uma caixa de madeira que é da altura da sua perna, ou seja,
ela simplesmente não pode levantar um pouco a perna para sair. Ela primeiro é
estimulada visualmente pelo local que está, a área de alerta e atenção identifica
o local, para então a codificar a situação e depois planejar como sair daquele
lugar, usando as pernas, os braços, realizando uma sucessão de movimentos
para chegar ao objetivo final (Fonseca, 2015).
Oliveira et al. (2017) citou oito elementos da psicomotricidade específicos
e interdependentes:

1. Coordenação motora ampla;


2. Coordenação motora fina;
3. Lateralidade;
4. Equilíbrio;
5. Estruturação espacial;
6. Orientação espacial;
7. Ritmo;
8. Esquema corporal.

“O trabalho com esses elementos psicomotores, além de promover amplo


desenvolvimento da motricidade, são determinantes para a aprendizagem da
leitura, da escrita e de habilidades cognitivas” (Oliveira et al., 2017, p. 56).
9
Sendo mais específico em alguns termos, a coordenação motora ampla,
define uma atividade com os grandes grupos musculares, como braços e pernas
e está relacionada com o equilíbrio postural. O rastejar, engatinhar e caminhar
envolvem os Membros Superiores (MMSS) e os Membros Inferiores (MMII). A
coordenação motora fina, é a capacidade de controle de pequenos grupos
musculares, como mãos e pés. Fundamental para a habilidade de destreza
manual, iniciando com rabisco, atingindo um padrão básico de formas e objetos
para culminar na escrita. Entretanto, o controle ocular, ou seja, o
acompanhamento da visão e os gestos da mão, é necessário também, para
visualizar o que estamos fazendo (Oliveira, 2015, p. 42).
A lateralidade é “a propensão [...] de utilizar preferencialmente mais um
lado do corpo do que o outro em três níveis: mão, olho e pé” (Oliveira, 2015).
Todos têm um lado de preferência para a escrita, seja destro ou canhoto, e se
estende também para o pé, para chutar uma bola ou para “pular amarelinha”. A
falta de dominância de lateralidade dificulta a compreensão da escrita, que segue
o padrão da esquerda para direita (Oliveira, 2015).
A estruturação espacial é “essencial para que vivamos em sociedade [...]
estabelecemos relações entre as coisas [...] comparando-as, combinando-as
vendo as semelhanças e diferenças entre elas” (Oliveira, 2015, p. 74). Uma
criança percebe como o seu corpo se comporta no espaço, para então interagir
com os objetos que estão nele, como uma cadeira, por exemplo, assim não
adianta ela querer ficar em pé na cadeira, pois ela não foi pensada para tal, e
concluímos que a estruturação espacial não vem do útero, ela deve ser
desenvolvida da relação de seus movimentos e os objetos ao seu redor (Oliveira,
2015).
Oliveira (2015) cita que “quando uma criança consegue se orientar em seu
meio ambiente, estará mais capacitada a assimilar a orientação espacial no
papel”, ou seja, seguindo o padrão de direção gráfica, da esquerda para direita e
de cima para baixo. Ela associa os movimentos que aprendeu nas brincadeiras
para o papel, então, antes de cobrar um padrão de direção gráfica, ela deve
compreender qual a direção esquerda para direita e cima para baixo, pois somente
assim ela vai poder reproduzir o que aprendeu, não apenas copiando um modelo
pré-determinado pelos professores (Oliveira, 2015).

10
TEMA 5 – MOVIMENTO E APRENDIZAGEM

O ser humano é marcado pelo movimento, seja ele recreativo, como a


prática esportiva, ou laboral, como os garis, empregados da indústria de
automóveis, e entre várias outras profissões, que precisam se mexer para exercer
as suas funções. O desenvolvimento motor acontece desde o momento da
concepção até a morte do indivíduo, e assim Gallahue e Ozmun (2005) o definem:
“o desenvolvimento motor é contínua alteração no comportamento motor ao longo
do ciclo da vida, proporcionada pela interação entre as necessidades da tarefa, a
biologia do indivíduo e as condições do ambiente”. Assim sendo, temos o
movimento presente em todas as nossas atividades e interações com o ambiente
desde cedo, seja na fase motora reflexa (zero a um ano) ou na fase motora
rudimentar (um a dois anos) (Gallahue; Ozmun, 2005).
Sabe-se que experiências motoras positivas, em quantidade ou qualidade,
afetam a atividade cerebral também de maneira favorável, pois quanto maior for
o engrama motor (memória motora), mais trocas de informações (sinapses) os
nossos neurônios deverão fazer, para gravar um novo movimento fundamental,
que engloba apenas os elementos básicos de um movimento em particular, por
exemplo, arremesso no basquete, ele pode ser feito de várias maneiras,
entretanto, para se chegar a uma precisão e estabilização de movimento, você
deve desenvolver um padrão de movimento, “desenvolvimento de níveis
aceitáveis de habilidades e uma mecânica corporal eficiente para uma grande
variedade de situações motoras” (Gallahue; Ozmun, 2005, p. 220).
Segundo estudo feito por Okuda et al (2011); apud Tavares; Cardoso
(2016), 50% dos alunos que apresentavam dificuldades de aprendizagem,
também tinham dificuldades no desenvolvimento motor. Corroborando com esta
análise feita em Londrina por Okuda et al (2011), a Associação Americana de
Psiquiatria mostra que cerca de 5% a 8% das crianças em idade escolar tem
algum tipo de dificuldade motora. E desta porcentagem, entre 30% a 50%
apresentam também dificuldades de aprendizagem (Tavares; Cardoso, 2016).
Oliveira (2015) destrincha o movimento em três vertentes, o movimento
voluntário, o movimento reflexo e o movimento automático.

11
5.1 Movimento voluntário

Ele depende apenas da nossa vontade, como levantar do sofá e pegar um


copo d’água. Houve a intenção de pegar esse copo, o movimento foi planejado
primeiramente, para depois ser executado. “O ato voluntario é sempre aprendido
e constituído por diversas ações encadeadas” (Oliveira, 2015, p. 24).

5.2 Movimento reflexo

Ele não precisa ser planejado e executado, normalmente somente depois


que acontece, é que temos a percepção que algo aconteceu. Gallahue e Ozmun
(2005) definem que “os movimentos reflexos são reações involuntárias do corpo
a várias formas de estímulo externo”. Se colocamos a mão em uma panela quente,
não temos, às vezes, nem a percepção que estava quente, porém os receptores
sensoriais trabalham tão rápido que provocam uma contração muscular, que
acaba afastando a nossa mão de perto (Oliveira, 2015).

5.3 Movimento automáticos

Esses movimentos dependem de um aprendizado, e com treino, prática e


repetição acabam se tornando automáticos. Movimentos neste padrão servem
para diminuir o esforço e o tempo, e a sua eficiência depende “dos hábitos e das
habilidades mentais e motoras” (Oliveira, 2015, p. 25). Para quem dirige um
automóvel há muito tempo, este é um movimento automático, trocar a marcha,
acelerar, frear, pisar na embreagem, são ações feitas inúmeras vezes, que
seguem uma sequência, e acaba se tornando automático.
Qualquer tipo de movimento exige uma ação de aprendizagem (exceto os
reflexos), um tempo discorrido para visualizar um padrão correto, fazer uma
retroalimentação (feedback) do movimento e tentar copiar o padrão mais correto
possível em busca de economia de energia e tempo. Todavia, quando um
movimento é feito de qualquer jeito, ele não leva a nenhuma aprendizagem, então
precisamos que eles estejam motivados a aprender, para que possam refletir e
analisar os movimentos realizados (Oliveira, 2015).

12
REFERÊNCIAS

AMTHOR, F. Neurociência Para Leigos. Rio de Janeiro: Alta Books, 2017.

BRETAS, J. R. da S. et al. Avaliação de funções psicomotoras de crianças entre


6 e 10 anos de idade. Acta paul. enferm., São Paulo, v. 18, n. 4, p. 403-
412, Dez. 2005. Disponível em:
<https://www.scielo.br/j/jsbf/a/vWQQrWVZdzgvngzjZ3fmKLg/?lang=pt>. Acesso
em: 10 set. 2019.

CHIVIACOWSKY, S.; GODINHO, M. Aprendizagem de Habilidades Motoras em


Crianças: Algumas Diferenças na Capacidade de Processar
Informações. Boletim Sociedade Portuguesa de Educação Física, [S.l.], n. 15-
16, p. 39-47, jun. 2017. ISSN 2184-1594. Disponível em:
<https://boletim.spef.pt/index.php/spef/article/view/188>. Acesso em: 10 set.
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FONSECA, V. da. Cognição, neuropsicologia e aprendizagem: abordagem


neuropsicológica e psicopedagógica. 7. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2015.

GALLAHUE, D. L.; OZMUN, J. Compreendendo o desenvolvimento motor:


bebês, crianças, adolescentes e adultos. 3. ed. São Paulo: Phorte, 2005;

KREBS, C.; WEINBERG, J.; AKESSON, E. Neurociências ilustrada. Porto


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OKUDA, P. M. M. et al. Função motora fina, sensorial e perceptiva de escolares


com transtorno do déficit de atenção com hiperatividade. J. Soc. Bras.
Fonoaudiol., São Paulo, v. 23, n. 4, p. 351-357, Dez. 2011. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S217964912011000400010&script=sci_abs
tract&tlng=pt>. Acesso em: 10 set. 2019.

OLIVIER, L. de. Distúrbios de Aprendizagem e de Comportamento. 7. ed. Rio


de Janeiro: WAK, 2018.

OLIVEIRA, G. de C. Psicomotricidade: Educação e reeducação num enfoque


psicopedagógico. 20. ed. Petrópolis: Vozes, 2015.

OLIVEIRA, M. C. N. de et al. Terapia neuromotora intensiva promove ganhos de


habilidades motoras grossas e manutenção da composição corporal em crianças
com paralisia cerebral. Revista Brasileira de Obesidade, Nutrição e
Emagrecimento, São Paulo, v. 12, n. 73, p. 598-606, set./out. 2018. Disponível
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da Biologia, São Paulo, 2013. Disponível em:
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TAVARES, A.; CARDOSO, A. Inter-relações entre o desempenho no processo de


aprendizagem escolar e o desenvolvimento das capacidades motoras: revisão da
literatura. Revista de Terapia Ocupacional da Universidade de São Paulo, v.
27, n. 1, p. 88-93, 1 jul. 2016.

14
AULA 3

INTELIGÊNCIA PSICOMOTORA:
A COMPREENSÃO DA RELAÇÃO
CORPO/MENTE NA
APRENDIZAGEM

Prof. Marcos Aurélio Iubel


DIFICULDADES MOTORAS E SUA RELAÇÃO COM A APRENDIZAGEM

Segundo o Art. 6º da Constituição Federal, todas as crianças têm o direito


à educação e, assim, a frequentar a escola e aprender conceitos de matemática,
português, história, ciências, geografia, entre outras matérias. Todavia, esse
conteúdo só poderá ser aprendido de maneira satisfatória se a criança tiver as
condições necessárias para tal aprendizado, e essas condições vão desde um
professor (facilitador) adequado, um conteúdo (currículo) abrangente e um
estudante motivado.
No entanto, não basta o aluno querer aprender, afinal, algumas dificuldades
motoras podem acabar atrapalhando o processo. Para Johnson e Myklebust
(1983) citados por Oliveira (2015), uma das razões para a dificuldade de
aprendizagem são as deficiências não verbais, englobando as dificuldades de
“orientação espacial, lateralidade, orientação temporal, especificadamente o
ritmo, o significado das expressões faciais, limitações de percepção social”.
Uma área que estuda esses tipos de deficiência é a psicomotricidade, que
tem como definição “concepção de movimento organizado e integrado, em função
das experiências vividas pelo sujeito cuja ação é resultante de sua individualidade,
sua linguagem e sua socialização” (Associação Brasileira de Psicomotricidade).
Nela podemos avaliar e melhorar os aspectos da coordenação motora global e
fina, o esquema corporal, lateralidade, estruturação espacial, estruturação
temporal e discriminação visual e auditiva (Oliveira, 2015).

TEMA 1 – AS UNIDADES FUNCIONAIS DE LURIA

O nome do psicólogo russo Alexander Luria (1902-1977) está associado


por alguns autores ao início do estudo da neuropsicologia, creditando ao
estudioso russo a chancela de “pai” desta área de pesquisa. Juntamente com
outro destacado autor, Lev Vygotsky (1896-1934), deram início aos trabalhos no
Instituto de Psicologia Experimental de Moscou e ainda fizeram estudos na Ásia
Central, mais especificamente no Uzbequistão (parte da URSS), que
posteriormente levaram à formulação da teoria histórico-cultural (Costa, 2017).
Luria, em suas pesquisas, acreditava que o cérebro humano era um
produto final, resultado da filogenética (evolução da espécie) e da ontogenética
(evolução do ser), de funções adquiridas com os milhões de anos de evolução da
espécie humana. Os sistemas funcionais são definidos como uma coordenação

2
de áreas cerebrais, e quando chegamos a um resultado final, um ato concreto,
este se forma por meio de um processo cognitivo complexo. A aprendizagem para
Luria era o resultado da interligação entre diferentes grupos celulares, que ficam
em áreas diferentes (unidades funcionais) do cérebro (Fonseca, 2015).
Ainda em uma prévia definição das funções de cada área, o pensamento
luriano entende que o cérebro não trabalha apenas uma área de cada vez. Se
fizermos um movimento, por exemplo, de chutar uma bola, não é somente a área
responsável pelo movimento (motor) que vai funcionar. A perspectiva do
movimento passa pela percepção visual, para enxergar a bola, e imaginar no
tempo-espaço onde ela vai estar dali um ou dois segundos depois que o
movimento é iniciado. Nenhuma dessas áreas pode assumir o protagonismo
solitário por um movimento voluntário ou complexo; é, então, a junção dessas
unidades cerebrais que forma um equivalente funcional (Fonseca, 2015).
Quando estamos envolvidos em algum comportamento específico, como a
resolução de um problema matemático, segundo a teoria luriana, o cérebro vai
ativar apenas algumas áreas, e cada uma delas terá papel específico dentro desse
sistema funcional, para atingir o resultado final, que seria a resolução do problema.
Se o sistema funcional está danificado, toda a cadeia operacional também será
afetada, inclusive o resultado final. Podemos imaginar uma pessoa com agnosia
(incapacidade de reconhecer pessoas ou objetos), porém com a visão preservada;
ela consegue enxergar o que ou quem está à sua frente, mas no momento em
que precisa fazer o reconhecimento facial, a informação acaba entrando (input)
no cérebro de maneira incorreta, e todo o sistema funcional de reconhecimento,
neste caso, acaba prejudicado (Fonseca, 2015).
Fonseca (2015) cita ainda que “Luria propõe igualmente a noção de
pluripotencialidades, reforçando a ideia de que qualquer área específica do
cérebro pode participar em inúmeros sistemas funcionais ao mesmo tempo’’, ou
seja, o cérebro se organiza para executar não somente uma ação, quando
treinado, exemplo de vários artistas que tocam piano e cantam ao mesmo tempo
– duas funções diferentes –, utilizando as mesmas áreas cerebrais ao executar
uma música com maestria. Tais sistemas funcionais podem ser aprendidos ou
repetidos por outros sistemas alternativos, que irão trabalhar de forma similar a
fim de atingir o objetivo. Vide o exemplo de pessoas que sofrem algum tipo de
lesão cerebral, como em um acidente de carro ou a retirada de parte do cérebro
em decorrência de um câncer, e acabam levando uma vida normal, mesmo com

3
a lesão ou retirada de uma área. Isso reforça a capacidade de aprendizado do
cérebro, a plasticidade que ele tem, não se baseando em um sistema funcional
fixo (Fonseca, 2015).
Em condições normais de aprendizagem, o cérebro é capaz de aprender
coisas novas, ser mutável, um órgão plástico. E se nos deparamos com algum
tipo de problema ou dificuldade para aprender, podemos alterar o tipo de estímulo
(condições externas à tarefa), passando de um auditivo para um visual ou também
alterando a forma como recebemos (condição interna) as informações, integrando
diferentes sistemas funcionais para a compreensão, racionalização e associação
de elementos (input, elaboração e output). Como quando um professor de química
começa a explicar as cadeias de carbono, se ele somente explicar lendo, os
alunos poderão entender de uma maneira, contudo, se elaborar um desenho ou
exemplificar com um vídeo, a absorção do conteúdo pelos alunos irá ocorrer de
maneira diferente, ativando diferentes sistemas funcionais para a compreensão
da matéria (Fonseca, 2015).
Além da divisão de unidades cerebrais, Luria (1990) cita cinco estágios
evolutivos do desenvolvimento neuropsicológico, organizados de maneira vertical,
que compreendem a ontogênese (desenvolvimento do indivíduo) da
aprendizagem (Fonseca, 2015).

1. Desenvolvimento da unidade de vigilância (atenção) → 0-12 meses, ocorre


na substância reticulada tronco cerebral.
2. Desenvolvimento das áreas motoras e sensoriais primárias (integração) →
0-12 meses, ocorre nas áreas calcarina, superior temporal, pré e pós-
rolândica.
3. Desenvolvimento das áreas motoras e sensoriais secundárias
(processamento) → 0-5 anos, ocorre nas áreas periestriada, parietal,
temporal e pré-motora.
4. Desenvolvimento das áreas sensoriais terciárias de input (elaboração) →
5-8 anos, ocorre nos lobos parietais.
5. Desenvolvimento das áreas de planificação e de output terciárias
(qualificação) → 12-24 anos, ocorre nos lobos pré-frontais.

Quais seriam então essas unidades esplanadas por Alexander Luria? A


primeira é de alerta e atenção; a segunda se refere à recepção, integração,
codificação e processamento sensorial; e a terceira unidade, à execução motora,
planificação e avaliação. Cada uma delas será tratada nos temas a seguir.
4
TEMA 2 – PRIMEIRA UNIDADE: ALERTA E ATENÇÃO

A primeira unidade de Luria controla as ações primitivas do cérebro, como


o estado permanente de alerta e a atenção aos fatos que ocorrem ao nosso redor,
isto é, a filtragem dos estímulos sensoriais que recebemos. Por exemplo, quando
vamos atravessar uma rua e vemos vários carros vindo de um lado, sabemos que
se eles continuarem em suas faixas de rolamento nada vai nos acontecer,
entretanto, se iniciamos a travessia e um carro troca de faixa, esta informação é
processada na primeira unidade, nos deixando em atenção aos movimentos que
aquele carro está fazendo (Fonseca, 2015).
Esta unidade engloba a medula, tronco cerebral, cerebelo, sistema límbico
e tálamo, estruturas subcorticais e axiais existentes no cérebro que fazem parte
do sistema de ativação reticular ascendente (SARA), responsável também pela
modulação do alerta cortical e funções básica de sobrevivência (Fonseca, 2015).
Fonseca (2015) ainda resumiu esta unidade em:

Substrato = substância reticulada e cerebelo


A função de alerta consiste na atividade que ocorre dentro do cérebro e
que é responsável pela manutenção de um estado de vigilância.
A atenção está interligada com o hipotálamo, que mantém o nível optimo
do metabolismo fisiológico (exemplo: bem-estar, fadiga, motivação),
componente crucial no desempenho de qualquer atividade.
A mesma função está relacionada com o reflexo de orientação que
emerge no confronto com um novo estímulo (sistema de alarme).
A função de alerta, estreitamente relacionada com a atenção, gera o
tônus postural e cortical, mas a atenção envolve a seletividade e a
sustentação modulada das atividades cognitivas superiores.
Alerta e atenção são funcionalmente independentes, selecionam, filtram,
focalizam, alocam e refinam a integração de estímulos.
A sua disfunção pode gerar hiperatividade, implicando problemas de
processamento (percepção + memória) e de planificação.

Além da hiperatividade, as desordens que ocorrem nesta unidade podem


indicar o aparecimento da narcolepsia (sonolência excessiva), insônia e também
desordens de atenção, como a hiperatividade e a hipoatividade em crianças com
distúrbios de aprendizagem (Fonseca, 2015).
A filtragem na integração sensorial “impede que o cérebro seja inundado
desnecessariamente com informação sensorial irrelevante que possa interferir
negativamente com o processo cognitivo mais elaborado” (Fonseca, 2015, p. 48).
Se analisarmos um vestibulando em dia de prova, ele traz consigo uma grande
carga emocional, acúmulo de conhecimento e alta expectativa para a realização
da prova. Durante aquelas mais de quatro horas que ele fica concentrado tentando
resolver os problemas do caderno de questões, várias situações externas podem

5
acontecer, como outro aluno ir ao banheiro, começar a chover, o aplicador de
prova se movimentar pelo ambiente, enfim, situações que fogem ao seu controle,
mas acabam ocorrendo. Nessas situações, a primeira unidade filtra os estímulos
visuais e auditivos e não deixa que o processo cognitivo executado acabe sendo
dispersado por uma ou outra situação adversa.

TEMA 3 – SEGUNDA UNIDADE: CODIFICAÇÃO

A segunda unidade de Luria é responsável pela recepção, integração,


codificação e processamento sensorial. Nela ocorre também a maioria das
aprendizagens na primeira infância, sejam elas posturo-motoras, como o controle
da cabeça e do tronco, e o domínio em manter-se sentado com apoio. É nela ainda
que temos as ações tônico-emocionais, descritas por Corraze (2009), citado por
Martins (2015), como a “criação dos primeiros esquemas afetivos por associação
com as reações tônicas trocadas durante as primeiras interações’’. Podemos
exemplificar essa citação com a imagem de um bebê no colo da mãe, tendo as
primeiras sensações motoras, como balançar ou girar, e reagindo positivamente
à ativação sensorial (Martins, 2015).
Esta segunda unidade é subdivida em três áreas, e para uma definição
mais específica, Fonseca (2015) cita que ‘’por mais estranho que possa parecer,
na divisão do cérebro humano se diz: áreas 1ª, áreas 2ª e áreas 3ª, formadas
pelos lobos occipital, temporal e parietal” (Fonseca, 2015).

3.1 Áreas 1ª

As áreas 1ª se encarregam da recepção sensorial, que está em “estreita


conexão com a periferia corporal e órgãos sensoriais (próprios e exteroceptivos)”,
sendo estes órgãos a pele, olhos, língua e nariz (Fonseca, 2015).

3.2 Áreas 2ª

As áreas 2ª são incumbidas da análise, síntese, retenção e integração das


informações recebidas das áreas 1ª, embasadas nos processos perceptivos que
ocorrem em um dos hemisférios cerebrais. Nelas acontecem etapas de
discriminação e identificação, associação e categorização dos dados intra ou
intersensoriais. Por exemplo, por meio do aparelho auditivo, podemos distinguir
timbres e ritmos diferentes, essenciais para um exercício de cópia de palavras.

6
Fonseca (2015, p. 50) fala em “coordenação visuomotora, da figura-fundo, da cor,
da forma, da espessura, do tamanho” quando analisamos os sentidos da visão. O
autor fala ainda em sentido táctilo-quinestésico para definir “subprocessamentos
das posturas e das práxias globais e finas, da análise, síntese e localização tátil e
quinestésica do corpo e da sua integração emocional e experiencial de gestos e
de ações” (Fonseca, 2015, p. 50).
A união harmônica dessas funções faz emergir na criança a linguagem e o
grafismo, por meio da fragmentação e sequencialização dos fonemas para a
formação de palavras e frases, bem como a manipulação de traços, ângulos e
figuras para a execução das letras. É preciso existir uma complexa coordenação
inter-hemisférica processada pelo corpo caloso para a eficácia no comportamento
e na aprendizagem (Fonseca, 2015).

3.3 Áreas 3ª

Localizadas no lobo parietal dos dois hemisférios cerebrais, essas áreas


correspondem à integração sensorial e exercem oposição simultânea à integração
sequencial, foco das áreas 2ª. Fonseca (2015) diz que “esta integração simultânea
auditivo-visual (...) completa a análise sequencial daquelas mesmas áreas,
envolvendo processos cognitivos de descodificação-codificação necessários para
a leitura, a escrita, a aritmética”, funções exclusivas das áreas 3ª.
Fonseca (2015, p. 52) resume as áreas 3ª como:

Substrato – lobos occipital, temporal e parietal


O termo ‘’codificação’’ refere-se à análise, à síntese, ao armazenamento
e à recuperação da informação envolvendo a significação e a relação
com a base de dados já integrada no cérebro.
A informação é codificada de forma simultânea e sucessiva (sequencial).
O processamento simultâneo ocorre quando a informação é sintetizada
em unidades espaciais ou relacionais, quando todas as partes surgem
ao mesmo tempo. Em contrapartida, o processamento sucessivo ocorre
quando a informação é fornecida numa unidade de cada vez (número de
telefone). Aqui o cérebro segura ativamente cada elemento até que os
outros sejam apresentados, no fim do qual emerge o seu significado.
O processamento da informação, quer no seu conteúdo, quer nas suas
modalidades, quer nos seus níveis, requer a combinação sistêmica dos
dois tipos de processamento (cognição = processo simultâneo +
processo sucessivo).

Como consequência de disfunções nas áreas da 2ª unidade, pode-se ter


pessoas com “taxonomia das dificuldades de aprendizagem, disnomias, disfasias,
disartrias, no caso da linguagem falada, ou dislexias, disortografias, disgrafias, no
caso da linguagem escrita” (Fonseca, 2015, p. 53).

7
TEMA 4 – TERCEIRA UNIDADE: EXECUÇÃO MOTORA, PLANIFICAÇÃO E
AVALIAÇÃO

A terceira e última unidade de Luria é encarregada da execução motora,


planificação e avaliação, é o output motor cerebral, localizado no lobo frontal. É
do lobo frontal que partem as informações que chegam até os grupos musculares,
os quais transformam o estímulo em movimento (Fonseca, 2015).
Assim como a segunda unidade, também é dividida em três áreas. A 1ª
engloba unidades motoras de output, lugar onde é desencadeada a execução
motora. Nas áreas 2ª, existem os “centros de organização sequencial e temporal
de condutas dependentes de retroinformações quinestésicas e proprioceptivas,
donde surgem os centros de planificação” (Fonseca (2015, p. 53). Já nas áreas 3ª
estão os centros de antecipação, regulação, superfocagem da atenção e outras
distinções correspondentes à atividade cognitiva que precede ações ou condutas.
Por exemplo, se estamos caminhando e pisamos em um buraco, esta área acaba
respondendo rapidamente para que possamos evitar uma queda (Fonseca, 2015).
A evolução motora-cognitiva somente é possível por conta da maturação
do cérebro e, assim como na 2ª unidade, acaba passando pelas áreas 1ª, 2ª,
chegando às áreas 3ª, onde efetivamente ocorrerá a organização funcional, de
forma interligada e sistêmica. Com as três áreas trabalhando harmoniosamente,
a motricidade acontece de forma adequada, isto é, partindo dos músculos, as
conexões entre as áreas motoras 1ª e as áreas sensoriais 1ª e 2ª municiam de
informações o cérebro e, pelo engrama motor (memória motora), culminam na
intencionalidade do movimento (Fonseca, 2015).
Fonseca (2015) ainda traz que “nas áreas pré-frontais, também designadas
psicomotoras, emergem as funções de planificação, de suporte à decisão, de
avaliação, de continuidade temporal, de controle emocional”. Além disso, para ele,

a função de planificação antecipada da ‘performance’ motora ou


linguística é obviamente responsável pela evolução humana e pela
evolução dos processos de aprendizagem. Ou seja, o Homo sapiens
conseguiu evoluir mais que outras espécies pela sua capacidade em
planejar uma ação, seja ela de curta duração, como caçar uma presa,
ou de longa duração, plantar várias sementes de milho, para que depois
de 160 dias possam ser colhidas. (Fonseca, 2015)

Vygotsky (1986) definiu o cérebro como o órgão da civilização, já Luria


(1990) dispôs que ele é o órgão da aprendizagem, pois ‘’transforma
precocemente a ação em pensamento e, posteriormente, o pensamento em ação’’

8
(Fonseca, 2015, p. 57). As ações planejadas e pensadas foram as responsáveis
pela evolução e maturação do homem versus a natureza da sua espécie,
moldando uma série de comportamento e condutas que direcionaram nossas
ações desde os primórdios da evolução.
A evolução da aprendizagem nas crianças passa por um processo
maturacional: imaturidade, desmaturidade e, por fim, maturidade
neuropsicológica. Esse processo de alteração e desenvolvimento ocorre entre as
três unidades e expõe a evolução do indivíduo nas definições de ecossistemas de
Bronfenbrenner (1977): micro, meso, exo e macrossistema. Um microssistema
seria a escola; mesossistema é a interação entre microssistemas, por exemplo, a
escola, os colegas e a família; o exossistema refere-se aos ambientes sociais que
influenciam indiretamente o sujeito, como religião, crenças e fé individual; e, por
último, o macrossistema é o meio cultural no qual o indivíduo está inserido, com
suas tradições e costumes. Toda essa teoria ecológica acaba influenciando as
percepções individuais em relação ao ambiente e como se comportar em cada um
(Gallahue; Ozmun, 2005; Fonseca, 2015).
Fonseca (2015, p. 56) definiu a 3ª unidade como:

Substrato - lobo frontal


O termo ‘planificação’ envolve o desenvolvimento de uma sequência de
ações ou uma série de manobras e procedimentos para atingir um fim
(objetivo → fim).
A planificação põe em marcha um sistema de organização que inclui
estratégias, metaplanos e programas de elaboração, regulação,
execução, controle e monitorização de ações com validade ecológica,
i.e., resolução de problemas com soluções adaptadas.
Implica em cinco dimensões: 1) identificar a ação desejada; 2)
sequencializar procedimentos; 3) recuperar dados relevantes; 4) alocar
recursos cognitivos; 5) decidir e executar.
Recorre a uma internalização verbal autocontrolada, uma atenção
voluntaria construída, testada e refinada.
Trata-se de uma cognição da cognição (metacognição), pondo em jogo
uma tomada de consciência.

TEMA 5 – CAMPOS PSICOMOTORES

Ao compararmos a evolução das unidades de Luria com as fases de


desenvolvimento motor de Gallahue e Ozmun (2005), veremos que
concomitantemente ocorrem a maturação cognitiva e a motora. Enquanto as
crianças desenvolvem a unidade de vigilância e os sistemas motor e sensorial (0-
12 meses), encontram-se também na fase motora reflexa (0-12 meses), na qual
as informações são obtidas sensorialmente em estágio de codificação das
informações e, posteriormente, por volta dos 5 meses, ocorre o estágio de

9
decodificação de informações. Isto é, no primeiro ano de vida, passamos por uma
série de processos que irão desenvolver e amadurecer os campos motores e
cognitivos ao mesmo tempo, trabalhando interligados (Gallahue; Ozmun, 2005).
Pensando nas dificuldades de aprendizagem relacionadas às funções
motoras, as crianças podem encontrar dificuldade no desempenho escolar,
gerando ansiedade e problemas emocionais. Oliveira (2015, p. 124) cita Johnson
e Myklebust (1983) quando eles definem deficiências não verbais que acabam
prejudicando significativamente o desempenho escolar: “dificuldades em
orientação espacial, lateralidade, orientação temporal, especificadamente o ritmo,
o significado das expressões faciais, limitações de percepção espacial”. Tal
afirmação reforça as perspectivas que devem ser aprimoradas com as crianças
que têm algum tipo de déficit motor.
Oliveira (2015) dividiu os campos da psicomotricidade em cinco áreas, que
iremos discorrer brevemente para conhecer as alterações que acabam afetando
diretamente a aprendizagem.

5.1 Coordenação global e fina

A capacidade de movimentar grandes grupos musculares em harmonia, de


maneira sucinta e precisa, é chamada de coordenação global. Movimentos como
pular, saltar, rolar, rastejar, andar de bicicleta etc. dependem de uma boa
coordenação, e também de um equilíbrio estático e dinâmico apropriado. Já a
coordenação fina se concentra na “habilidade e destreza manual e constitui um
aspecto particular da coordenação global” (Oliveira, 2015, p. 42). Quando uma
criança desenvolve com destreza as habilidades manuais, a aquisição de novos
conhecimentos fica facilitada, porém não basta saber segurar de maneira correta
um lápis, deve-se analisar a coordenação visomotora, ou seja, uma base de
domínio em que a criança observa o que está desenhando e consegue executar
em gestos precisos (Oliveira, 2015).
Um fator que pode prejudicar a escrita é a dificuldade na pega do lápis, seja
com pegas anormais ou quando se coloca muita força para manter o lápis de
maneira correta na mão, precisando, portanto, desenvolver um padrão correto de
movimento. Outro aspecto que pode prejudicar a capacidade da escrita é a falta
de planejamento da ação, uma pré-execução interiorizada que antecipa o que irá
ser feito no papel (Oliveira, 2015).

10
5.2 Esquema corporal

A explanação do termo esquema corporal pode acabar se diferenciando


entre um autor e outro, entretanto, podemos delimitá-lo como a experimentação
do ambiente pela criança, isto é, a interação do seu corpo com os objetos e locais
ao redor. As crianças que se dispõem a subir em árvores, rolar por um barranco,
descer de maneira não convencional um escorregador, enfim, aquelas que
exploram o mundo conseguem desenvolver melhor o esquema corporal. Oliveira
(2015, p. 51) aponta que “um esquema corporal bem organizado permite uma
criança se sentir bem, na medida em que seu corpo lhe obedece, em que tem
domínio sobre ele, em que o conhece bem (...) um maior poder cognitivo”.
A falta de um esquema corporal bem definido e diversificado pode levar a
prejuízos na escrita e leitura. Quando a criança não tem a noção de cima,
embaixo, lado, horizonte e vertical, pode prejudicar a compreensão das letras.
Assim, “uma perturbação do esquema corporal, portanto, pode levar a uma
impossibilidade de se adquirir os esquemas dinâmicos que correspondem ao
hábito visomotor e também intervém na leitura e escrita” (Oliveira, 2015, p. 62).

5.3 Lateralidade

A lateralidade é a capacidade que um lado do corpo possui em comandar


as tarefas, em três distinções: mão, olho e pé. Existe por esse pressuposto uma
dominância de um lado sobre o outro, e este que é o dominante, quando em
comparação com o outro, tende a ser mais forte, preciso e veloz. Todavia,
podemos notar que se uma mão comanda a atividade, como cozinhar, a outra
mão serve de auxiliar, por exemplo, uma mão segura a colher, a outra, o cabo da
panela. Essa elucidação pode ser feita para o ambiente escolar, se utilizamos a
mão direita para escrever, a mão esquerda irá segurar o caderno (Gabriel, 2008).
Quando uma pessoa apresenta uma lateralidade mal definida, ela pode
apresentar dificuldades em aprender a direção gráfica, os conceitos de direita e
esquerda, tanto para a leitura como para a escrita (Oliveira, 2015).

5.4. Estruturação espacial

Segundo a definição de Oliveira (2015), a estruturação espacial “é


essencial para que vivamos em sociedade. É através do espaço e das relações
espaciais que nos situamos no meio em que vivemos”. Por meio da observação
11
do ambiente, podemos selecionar, comparar, agrupar e classificar objetos que
tenham algo em comum. Para Ajuriguerra (1988) citado por Oliveira (2015),

A escrita é uma atividade motora que obedece a exigências muito


precisas de estruturação espacial. A criança deve compor sinais
orientados e reunidos de acordo com as leis; deve, em seguida, respeitar
as leis de sucessão que fazem destes sinais palavras e frase. A escrita
é, pois, uma atividade espaçotemporal muito complexa.

Com o desenvolvimento da estruturação espacial, a criança consegue


compreender a posição de seu corpo no espaço e a relação com os objetos, e,
por fim, aprender a se relacionar com eles. E assim como o esquema corporal, a
estruturação não é congênita, não pode ser ensinada, e cada sujeito terá a sua
percepção com relação ao mesmo objeto. À medida que a maturação dos
sistemas motores e cognitivo acontece, a percepção das sensações visuais,
táteis, auditivas e cinestésicas é aprimorada (Oliveira, 2015).

5.5 Estruturação temporal

O domínio da estruturação temporal é a capacidade de compreender a


passagem do tempo, em dias, semanas, meses etc., mas não somente isso.
Quando escutamos uma música e queremos aprender sua coreografia, pode ficar
mais fácil identificar os tempos musicais por meio do célebre ‘5,6,7,8’. Essa
contagem de ritmo é essencial para aprender a ler, pois, com a sucessão de sons
em tempos diferentes e a memorização auditiva, compreendemos a diferença nas
acentuações silábicas.
Os principais conceitos que a criança precisa entender são a
simultaneidade, a ordem e sequência, a duração de intervalos, a renovação cíclica
em certos períodos e o ritmo. Cada um desses conceitos pode interferir
diretamente no momento da leitura e da escrita, quando ocorrer a troca ou
supressão de letras ou sílabas e erros de acentuação e pontuação (Oliveira,
2015).

12
REFERÊNCIAS

FONSECA, V. da. Cognição, neuropsicologia e aprendizagem: abordagem


neuropsicológica e psicopedagógica. 7. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2015.

GABRIEL, R. A compreensão em leitura enquanto processo cognitivo. Signo,


Santa Cruz do Sul, 2008 Disponível em:
<https://online.unisc.br/seer/index.php/signo/article/view/44>. Acesso em: 12 set.
2019.

GALLAHUE, D. L.; OZMUN, J. Compreendendo o desenvolvimento motor:


bebês, crianças, adolescentes e adultos. 3. ed. São Paulo: Phorte, 2005.

OLIVEIRA, G. de C. Psicomotricidade: educação e reeducação num enfoque


psicopedagógico. 20. ed. Petrópolis: Vozes, 2015.

13
AULA 4

INTELIGÊNCIA PSICOMOTORA
– A COMPREENSÃO DA
RELAÇÃO CORPO/MENTE NA
APRENDIZAGEM

Prof. Marcos Aurélio Iubel


INTRODUÇÃO

Para esta aula, vamos aprender mais sobre o controle motor, um dos
elementos do desenvolvimento motor. É por meio dele que conseguimos
desenvolver nossas habilidades motoras rudimentares e fundamentais,
necessárias para a aquisição do engatinhar, do andar, do correr, do manipular
objetos, entre outras habilidades. Gallahue, Ozmun e Goodway interpretam que
“o controle motor é um aspecto do aprendizado e desenvolvimento que lida com
o estudo de tarefas isoladas em condições específicas” (2013, p. 33). O controle
motor, em uma tarefa específica, passa por uma série de avanços, desde as fases
motoras iniciais até a fase madura, influenciadas pelo ambiente (local, incentivo,
motivação e expectativas extrínsecas) e, em parte, pela hereditariedade.
A aquisição das habilidades motoras rudimentar e fundamental afeta o nível
de desenvolvimento dos indivíduos. Vamos aprender mais sobre cada uma
dessas fases e seus atributos particulares.
A motricidade está diretamente relacionada com o aprendizado, ainda mais
com a escrita, habilidade da coordenação fina que é desenvolvida desde a fase
motora rudimentar, mas com maior refinamento na fase fundamental.

TEMA 1 – ASPECTOS DE ESTUDO E AUTORES

Os aspectos de estudo do desenvolvimento motor remetem ao início do


século XX, com vários pesquisadores que seguiram suas linhas de estudo de
acordo com a população a que tinham acesso e ao ambiente a que pertenciam.
O estudo do desenvolvimento motor pode ser desmembrado em algumas áreas,
conforme abordaremos adiante: fisiologia do exercício, biomecânica, aprendizado
motor, e o tema da nossa aula, o controle motor.
O biólogo e psicólogo suíço Jean Piaget, o professor e psicanalista alemão
naturalizado norte-americano Erik Erikson e o professor norte-americano Robert
Havighurst estão entre os principais nomes que pesquisaram o desenvolvimento
motor, desde o nascimento até a velhice. Nenhuma teoria trazida por eles pode
ser considerada totalmente completa e sem incisões de outros estudos. Por isso,
um conhecimento amplo de seus estudos, e de outras pesquisas, é essencial para
discernir os aspectos que se encaixam na área em que queremos trabalhar.

2
1.1 Nomenclatura habitual no desenvolvimento motor

Para seguirmos adiante no estudo do desenvolvimento motor, precisamos


elucidar algumas nomenclaturas que são usualmente empregadas nas literaturas
habituais para estudos e pesquisas. Muitas vezes, os termos crescimento e
desenvolvimento são usados para passar o mesmo conceito, de que o sujeito está
evoluindo nas tarefas motoras e cognitivas.
Entretanto, Gallahue, Ozmun e Goodway (2013, p. 30) trazem conceitos
distintos para essas duas palavras. Segundo os autores, “crescimento físico
refere-se ao aumento do tamanho do corpo de um indivíduo ou de suas partes
durante a maturação’’; já a palavra desenvolvimento refere-se a alterações no
nível de funcionamento de um indivíduo ao longo do tempo.
Devemos levar em conta que o processo de desenvolvimento acontece
desde o nascimento do sujeito até a sua morte. Por isso, é correto afirmar que até
mesmo os adultos passam por esse processo de alteração funcional com o passar
de anos, ao terem que se adaptar à falta de mobilidade de membros inferiores,
por exemplo. Em contrapartida, quando pensamos nos bebês e nos desafios que
enfrentam a cada dia, as alterações do desenvolvimento precisam ser ajustadas
o mais rápido possível.
Maturação refere-se a alterações qualitativas que capacitam o indivíduo a
progredir para níveis mais altos de funcionamento (Gallahue; Ozmun, 2005). Esse
processo é marcado pela progressão previsível dos aparecimentos de habilidades
motoras, contudo o ritmo de aparecimento dessas especificidades pode variar por
inúmeras características ambientais e individuas que serão abordadas mais à
frente. Para os autores, outra característica importante, a experiência, “refere-se
a fatores do ambiente que podem alterar o aparecimento de várias características
desenvolvimentistas ao longo do processo de aprendizado’’ (Gallahue; Ozmun;
Goodway, 2013, p. 30).

1.2 As definições do desenvolvimento motor

Dentro das referências buscadas para os estudos do desenvolvimento


motor, existem termos que se parecem em terminologia, como aprendizado motor,
comportamento motor e controle motor, porém trazem significados diferentes.
Faremos uma breve explanação desses três termos.

3
Seguindo as definições de Gallahue e Ozmun (2005), o comportamento
motor envolve mudanças no aprendizado e no desenvolvimento. O aprendizado
motor corresponde a somente um aspecto no qual o movimento desempenha
parte fundamental, o que significa que, em função de práticas realizadas
anteriormente, existem algumas mudanças relativas. Já o controle motor é um
aspecto do aprendizado e do desenvolvimento que lida com o estudo de tarefas
isoladas em determinadas condições.

1.3 Autores e seus estudos

Os estudos e as teorias do desenvolvimento motor se iniciaram ainda no


século XX com diferentes pesquisadores. Arnold Gesell publicou sobre a teoria
maturacional e como o sistema nervoso comandava tanto aspectos motores
quantos físicos no comportamento motor. O desenvolvedor da psicanálise,
Sigmund Freud, também chegou a publicar sobre o comportamento humano,
concentrando-se na personalidade e na sua anormalidade. Um de seus alunos,
Erik Erikson, também realizou estudos no campo do desenvolvimento e
apresentou sua teoria na linha psicossocial.
Robert Havighurst explanou sobre a sua teoria ambiental, na qual existe
uma estrutura de tempo, e o indivíduo deve segui-la para caracterizar o
desenvolvimento adequado. Havighurst dividiu o seu estudo em oito estágios e
dizia que o desenvolvimento psicossocial recebia influências diretas da parte
motora, fosse o desenvolvimento ou a educação motora. Um dos autores mais
influentes e marcantes do desenvolvimento é, sem dúvida, o psicólogo suíço Jean
Piaget. A sua teoria do desenvolvimento cognitivo teve como uma das principais
características a grande observância de bebês e crianças e a compreensão de
que, por mais sutis que fossem as mudanças no comportamento das crianças
observadas no seu estudo, o funcionamento cognitivo estava em pleno
desenvolvimento. As fases do desenvolvimento cognitivo foram divididas em
quatro, sensório-motora (0 a 2 anos), pensamento pré-operacional (2 a 7 anos),
operações concretas (7 a 11 anos) e operações formais (12 anos em diante).
A acomodação (processo pelo qual passa a criança quando começa a
receber novas informações do ambiente em que está e precisa acrescentá-las ao
seu engrama motor) e a assimilação (interpretação das novas informações)
baseiam o processo de adaptação.

4
O desenvolvimento motor é um campo de amplos estudos, e suas
estruturas teóricas passam pelos bebês, pelas crianças, pelos jovens e pelos
adultos. Devemos considerar, entretanto, que nenhuma das teorias apresentadas,
caso sejam estudadas mais a fundo, pode ser descrita como modelo fechado, em
que nada pode ser acrescentado às suas linhas de pensamento. Por isso, os
estudos dessas teorias de desenvolvimento mostram-se importantes para
esclarecer dúvidas e poder reunir o máximo de informações necessárias.

TEMA 2 – FASES MOTORAS REFLEXA E RUDIMENTAR

Diversas teorias vêm tentando explicar como decorre o desenvolvimento


motor e quais aspectos estão diretamente ligados a ele. O conceito de teoria,
segundo Gallahue e Ozmun (2005), é um grupo de afirmações e de conceitos que
integram fatos existentes e levam à geração de novos fatos. Como foi abordado
no Tema 1 da nossa aula, alguns autores se destacaram mais pelas suas teorias
criadas para explicar o desenvolvimento humano. Devemos lembrar também que
nenhuma teoria sozinha é completa, pois carece de argumentação em certos
pontos. Piaget, Erikson e Havighurst são alguns exemplos de teóricos
desenvolvimentistas. Gallahue e Ozmun (2005) desenvolveram uma teoria que
utiliza uma ampulheta para explicar e diferenciar as fases do desenvolvimento
motor e abordar, por meio de estágios, em qual nível de maturação uma criança
com o seu desempenho normal está. O modelo apresentado é enquadrado como
heurístico, ou seja, conceitua um modelo que dispõe das orientações gerais para
assim descrever e analisar o comportamento motor.
Uma ressalva importante dos autores é que, por mais que as fases estejam
separadas por um marco cronológico, isso é, a idade expressa em meses e anos
da criança não significa que ela deva estar única e exclusivamente naquela fase
do desenvolvimento, elas são fluidas e, por meio da influência ambiental e das
suas experiências, podem estar em fases diferentes.
Os dois aspectos importantes para tal progressão motora são a
hereditariedade e o ambiente. Gallahue, Ozmun e Goodway (2013, p. 75)
descrevem que

[...] para entender esse modelo, imagine uma ampulheta. Nessa


ampulheta, precisamos colocar a substância da vida: “a areia”. Nesse
caso, a areia vem de dois recipientes diferentes. Um é o recipiente
hereditário; o outro, o ambiental. O recipiente hereditário tem uma tampa.
No momento da concepção, determina-se a nossa constituição genética
e fixa-se a quantidade de areia desse recipiente. Entretanto, o recipiente
5
ambiental não tem tampa, portanto mais areia pode ser acrescentada
nesse recipiente e em sua ampulheta. É possível ir ao “monte de areia”
(i.e., ao ambiente) para pegar mais areia e colocá-la em nossa
ampulheta.

Portanto, nossa estrutura genética é determinada, e a quantidade de areia


é fixa. Já o outro fator, o ambiente, pode ser manipulado para levar desafios e
diferentes estímulos. Então, podemos concluir que os fatores externos têm grande
influência sobre as fases motoras, em especial na fase fundamental e
especializada.
Ainda que seja uma abordagem completa em termos motores, a ampulheta,
da maneira que é apresentada, deixa duas áreas do desenvolvimento global de
lado: os aspectos cognitivos e afetivos, muito importantes para a maturação de
qualquer pessoa. É preciso levar em conta que cada pessoa tem a sua ampulheta,
que é preenchida de maneira única e afetada pelas experiências vividas ao longo
dos anos. Gallahue e Ozmun (2005) dizem que as ampulhetas reais têm altura,
largura e profundidade e devem ter algum tipo de apoio para permanecerem em
pé. E eles ainda completam que o desenvolvimento motor influencia grande
variedade de fatores cognitivos e afetivos e é influenciado por eles.
Como toda ampulheta uma hora tem que virar, e toda a areia
(hereditariedade e ambiente) que colocamos na nossa ampulheta começa a
escorrer, esse processo é o envelhecimento. Gallahue e Ozmun (2005) falam que
a areia agora deve passar por dois filtros: um é o filtro hereditário, e, para os
autores, não existe muito a ser feito sobre ele; o outro é o filtro do estilo de vida,
tomado diretamente pelas influências ambientais, como a prática de exercícios, a
dieta, o estado nutricional e o bem-estar social e espiritual. Citam ainda que,
mesmo com a ampulheta virada, ainda é possível adicionar areia nela,
acrescentar novas experiências motoras e melhorar o estilo de vida, para que o
processo de envelhecimento possa ocorrer da maneira mais lenta possível.

2.1 Fase motora reflexa (do nascimento até 1 ano)

Os primeiros tipos de movimentos intrauterino são reflexos, que podem ser


descritos como “movimentos involuntários, controlados subcorticalmente, que
formam a base para as fases do desenvolvimento motor” (Gallahue; Ozmun;
Goodway, 2013, p. 68). Os reflexos são desencadeados por estímulos, sejam eles
visuais, auditivos ou táteis, que podem ser primitivos (proteção, busca de
alimentos e informação) e também posturais (reflexo de caminhar e rastejar). Um

6
reflexo de fácil observação é quando passamos o dedo perto da boca do bebê e
ele vira a cabeça em busca do alimento. Nessa fase, temos dois estágios, o de
codificação de informações e o de decodificação de informações.

2.1.1 Estágio de codificação de informações (do nascimento até 4 meses)

É caracterizado por atividade motora involuntária observável no período


fetal até aproximadamente o quarto mês do período pós-natal (Gallahue; Ozmun;
Goodway, 2013, p. 69). Os autores explicam também que nesse estágio, “os
centros cerebrais inferiores são mais altamente desenvolvidos do que o córtex
motor e, em essência, comandam o movimento fetal e neonatal.”

2.1.2 Estágios de decodificação de informações (dos 4 meses até 1 ano)

Com a continuada evolução dos centros superiores cerebrais, vai


ocorrendo uma inibição nos reflexos, e, gradativamente, os movimentos
voluntários, que são controlados pela região motora do córtex cerebral, vão
tomando conta da maioria dos movimentos (Gallahue; Ozmun, 2005).

2.2 Fase motora rudimentar (de 1 a 2 anos)

Os primeiros movimentos voluntários, que acontecem de maneira


rudimentar e com pouco controle, estão presentes desde o nascimento até por
volta dos dois anos de idade. Eles são determinados pela maturação e sempre
aparecem em sequência previsível, contudo esse ritmo (velocidade) varia de uma
criança para outra. A diferença está ligada diretamente aos estímulos ambientais,
aos fatores biológicos e ao tipo da tarefa ao qual é submetido o indivíduo
(Gallahue; Ozmun, 2005).
Assim como na fase motora reflexa, dois estágios dividem esta fase e
demonstram a rápida adaptação que as crianças precisam fazer para dominar de
maneira segura o ambiente que as cerca.

2.2.1 Estágio de inibição de reflexos (do nascimento até um ano)

Os reflexos primitivos de proteção, busca por alimento e informação (saber


o que acontece ao seu redor) vão desaparecendo e sendo preenchidos por
movimentos voluntários cada vez mais organizados. O controle do córtex cerebral
fica mais evidente com o passar do tempo. Gallahue e Ozmun (2005) falam que
7
os movimentos, embora intencionais, parecem descontrolados e grosseiros.
Como exemplo, os autores citam um bebê que já consegue ficar sentado, tentando
alcançar um objeto que está próximo. Ele não vai simplesmente estender o braço
e pegar: vai existir toda uma atividade de tronco, braço, pulso e mão para, então,
pegar o que deseja.

2.2.2 Estágio de pré-controle (de 1 a 2 anos)

É nesta fase que se aprende a ter o controle do equilíbrio, a manipular


objetos com maior destreza e usar a locomoção de forma mais consciente e com
maior proficiência motora. O processo de maturação pode explicar parcialmente
a rapidez e a extensão do desenvolvimento do controle dos movimentos
(Gallahue; Ozmun, 2005).

TEMA 3 – FASES MOTORAS FUNDAMENTAL E ESPECIALIZADA

Prosseguindo na evolução motora das crianças, chegamos a uma parte dita


por muitos especialistas do movimento como uma das mais fundamentais para
todo o desenvolvimento motor. É a partir dos dois anos, em média, que a criança
tem um bom controle corporal, uma área cognitiva mais desenvolvida, e
compreende que o mundo não gira à sua volta, e por isso deve buscar autonomia
para cumprir os desafios encontrados pelo caminho.
Assim como definido no tema anterior, uma série de fatores sociais e
ambientais podem alavancar ou prejudicar motoramente os bebês, e decisões
precipitadas tomadas em fases anteriores podem aparecer somente agora,
quando a criança tenta fazer algo sozinha e não está motoramente preparada.

3.1 Fase motora fundamental (de 2 a 7 anos)

As crianças dos 2 aos 7 anos são naturalmente ativas e gostam de explorar


o ambiente que as cerca. Habilidades desenvolvidas na fase motora rudimentar
são refletidas agora, quando uma maior variedade de movimentos combinados e
isolados são exigidos para cumprir determinadas tarefas motoras.
Gallahue e Ozmun (2005) ratificam que a maturação não é a única
influenciadora do desempenho motor: o ambiente, composto pelas oportunidades
de prática, instrução e encorajamento, são importantes para que se atinjam
desempenhos máximos para os padrões fundamentais. Os padrões básicos de

8
movimento, como pular e correr, estão associados à locomoção; arremessar e
apanhar, a manipulação e o ato de andar e correr com bom equilíbrio e firmeza, à
estabilização.
É importante expor que, por mais que pareça que as crianças simplesmente
aprendem as coisas naturalmente, elas necessitam de estímulos e encorajamento
para sobrepujar essas barreiras. Os meios de instrução e um ambiente acolhedor,
onde ela sabe que pode cometer erros e vai receber ainda assim um feedback
positivo, já mostraram que são benéficos para os indivíduos. Os autores colocam
que dentro desta fase existem três estágios, que são distintos, porém às vezes
sobrepostos: inicial, elementar e maduro (Gallahue; Ozmun, 2005).

3.1.1 Estágio inicial (de 2 a 3 anos)

Segundo Gallahue, Ozmun e Goodway (2013, p. 72), o estágio inicial


“representa as primeiras tentativas infantis orientadas para o objetivo de executar
uma habilidade fundamental”. Os movimentos apresentam sequências nem
sempre corretas ou padronizadas, e as crianças ainda acabam realizando
movimentos de maneira exagerada (Gallahue; Ozmun, 2005).

3.1.2 Estágio elementar (de 4 a 5 anos)

De acordo com Gallahue e Ozmun (2005), no estágio elementar os


movimentos já têm maior controle e coordenação. Melhoram também as noções
de espaço e tempo do movimento, contudo elas ainda podem ser ora exageradas,
ora mais contidas. Com a observação de crianças de adultos, pode-se concluir
que muitos apresentam o estágio elementar em alguns tipos de movimento.

3.1.3 Estágio maduro (de 6 a 7 anos)

A sua característica principal é a maior eficiência mecânica, com


movimentos mais controlados e coordenados. As habilidades motoras
fundamentais podem e devem atingir o padrão maduro até os 5 ou 6 anos. As
tarefas de apanhar e rebater, que exigem maior coordenação óculo-manual, ainda
estão em aprimoramento (Gallahue; Ozmun, 2005).

9
3.2 Fase motora especializada (de sete anos em diante)

A terceira e última fase do desenvolvimento motor abrange uma idade


maior que as outras, pois agora são mais necessários os aprimoramentos de
movimentos e habilidades já aprendidos do que a aprendizagem de novas
capacidades motoras. Esta fase depende muito de como ocorreram as outras,
como os aspectos socioambientais interferiram de maneira positiva ou negativa
nas experiências vividas. As habilidades adquiridas até aqui não somente
satisfazem os desafios esportivos, mas também os do dia a dia. Colocar e tirar
uma roupa, amarrar os cadarços dos calçados, andar de bicicleta sem o auxílio
de rodinhas e até a facilidade ou dificuldade para aprender a dirigir são quase que
os pontos finais de toda a base de aprendizagem.
Voltando à teoria da ampulheta de Gallahue e Ozmun, podemos
compreender que esta fase culmina ainda mais na relação do ambiente com a
aprendizagem, reforçando a importância de práticas positivistas, encorajadoras,
que possam apontar os erros e corrigi-los, e que o bom desempenho nas fases
anteriores determina o bom aproveitando nos estágios transitório, de aplicação e
de utilização permanente.
Para os autores, esta fase é dividida em outros três estágios conforme
veremos a seguir.

3.2.1 Estágio transitório

Segundo expôs Gallahue e Ozmun (2005), os indivíduos podem combinar


e aplicar certas habilidades motoras, tanto para valências esportivas como
recreacionistas. Para eles, “as habilidades de movimento de transição contêm os
mesmos elementos dos movimentos fundamentais, mas com maior forma,
precisão e controle’’ (Gallahue; Ozmun; Goodway, 2013, p. 73). A progressão do
movimento de chutar uma bola aos 5 anos e aos 8 é parecida. Entretanto, quando
realizamos uma observação mais criteriosa dessa habilidade fundamental em dois
momentos distintos, podemos notar que aos 8 anos o movimento é mais refinado,
maduro e conta não somente com a vontade de chutar a bola, mas com a intenção
de acertá-la em algum lugar, como o gol.

10
3.2.2 Estágio de aplicação

É especialmente neste estágio que podemos detectar a aptidão para um


esporte ou outro. “O indivíduo começa a tomar decisões conscientes a favor de
várias atividades ou contra elas [...] maior ênfase é colocada na forma, na
habilidade, na precisão e nos aspectos quantitativos de performance de
movimento (Gallahue; Ozmun; Goodway, 2013, p. 74). Os sujeitos se predispõem
às atividades que têm maior facilidade e se veem exercendo tal habilidade
esportiva de uma maneira mais proveitosa. Contudo, é um erro deixar que essa
aproximação com um esporte ou outra habilidade esportiva acabe se tornando a
única tarefa motora relevante e desafiante para o seu histórico motor. Já foi
afirmado aqui por quanto mais práticas e vivências motoras os indivíduos passam,
com mais maneiras eles vão poder lidar com situações adversas.
Não é difícil encontrar atletas que se destacaram por muito tempo em uma
modalidade e, quando se aposentam ou estão de férias das suas principais
competições, arriscam-se em outros esportes. Isso pode ser explicado por meio
dos ganhos motores nas fases fundamentais e especializadas. Por mais que um
atleta de surf tenha um ambiente completamente estável, que é a água, ao seu
redor ele vai ter controle de habilidades estabilizadoras muito maiores e, se puder
experimentar outras atividades que exijam uma base estabilizadora sólida, como
o skate ou snowboard, tem grandes possibilidades de se sair muito bem nessas
atividades.

3.2.3 Estágio de utilização permanente

Para Gallahue, Ozmun e Goodway (2013, p. 74), o estágio de utilização


permanente “representa o ápice do processo de desenvolvimento motor e é
caracterizado pelo uso do repertório de movimento adquirido pelo indivíduo ao
longo da vida’’. Fatores extrínsecos ao indivíduo também fazem diferença nesta
etapa. Fatores econômicos, estruturas físicas e outras limitações podem interferir
diretamente na participação em atividades recreativas e esportivas. O estágio de
utilização pode ser considerado o auge de toda a etapa de aprendizagem, todavia
ele faz parte de um processo que segue pela vida (Gallahue; Ozmun, 2005). Afinal
de contas, mesmo quando estamos na fase adulta, podemos aprender novos
padrões motores, como dirigir, uma tarefa motora complexa, que exige alto grau
de maturação dos movimentos dissociados e atenção visual e auditiva, a qual

11
demanda também que nos mantenhamos sempre atentos às regras (leis de
trânsito), que se impõem ao sair habilitado.
Podemos concluir que todo o processo do desenvolvimento motor é longo.
Ele se inicia na formação do embrião, com os primeiros reflexos, e termina nas
habilidades adquiridas com o passar dos anos. Essas habilidades são
determinadas pelos fatores hereditários e ambientais. Os reflexos aparecem e
desaparecem de maneira ordenada e são substituídos aos poucos por
movimentos voluntários, inicialmente mais grosseiros e desajeitados e que, de
acordo com a maturação, vão se organizando para que possam cumprir
determinadas tarefas motoras. As habilidades motoras podem ser divididas
basicamente em três grupos: locomotoras, manipulativas e estabilizadoras. O que
o ser humano faz é combinar duas ou as três habilidades para cumprir as
exigências de uma tarefa. Essa organização se dá por meio de experiências que
ele pode vivenciar ao longo dessas fases.

TEMA 4 – HABILIDADES MOTORAS RUDIMENTARES

Os primeiros estudos das habilidades iniciais em bebês ocorreram por volta


dos anos 1930 e 1940, com os pesquisadores H. Halverson, Mary Shirley, Nancy
Bayley e Arnold Gesell (Gallahue; Ozmun, 2005). Por mais que esses estudos
pareçam que estão distantes no tempo, eles foram cuidadosamente controlados.
Sabemos que a aquisição de habilidades motoras é, na maioria das vezes,
imutável, ou seja, segue sempre o mesmo padrão de aparecimento em crianças
que tenham um desenvolvimento normal, podendo variar o ritmo (tempo) que
demoram a aparecer. Com isso, podemos entender que as pesquisa feitas ainda
na metade do século XX são transcendentais.
Gallahue e Ozmun (2005) afirmam que o ambiente em que estamos
inseridos, e as cobranças específicas de certas tarefas motoras que são
apresentadas, consistem na capacidade de moldar a aquisição das habilidades
motoras rudimentares. Podemos citar o modelo de desenvolvimento da
ampulheta, que caracterizava o fator hereditário como limitado, pois era somente
o que carregamos dos nossos ancestrais na nossa carga genética, e o fator
ambiental, esse, sim, ilimitado, basta que tenhamos várias experiências motoras
ao longo dos anos inicias para podermos melhorar a aquisição de novas
habilidades. Se voltarmos e lembrarmos da fase motora inicial, mais
especificadamente do estágio de inibição de reflexos, poderemos analisar que,

12
enquanto os reflexos vão sendo inibidos, os movimentos voluntários acabam
aparecendo e tomando o controle dos movimentos por meio dos centros cerebrais
superiores, que assumem as funções musculoesqueléticas. Esses movimentos,
que antes eram exagerados, sem um propósito definido, e por vezes
descontrolados, vão demonstrando um progresso evidente e também um
determinado controle quando se chega perto dos 12 meses de vida (Gallahue;
Ozmun, 2005).
O outro estágio dessa fase é o de pré-controle, que se delimita entre os 12
e 24 meses. Nesse período, os movimentos estão cada vez mais dominados, e o
incentivo para a realização de diversas tarefas motoras deve ser grande. Por mais
que eles aconteçam de maneira rudimentar, vão acabar aumentando o
desenvolvimento de tarefas locomotoras, manipulativas e estabilizadoras. Essas
três áreas citadas são determinantes para a interação entre bebê e ambiente.

4.1 Estabilidade

Para Gallahue e Ozmun (2005), a estabilidade é a relação do corpo com a


gravidade, com o objetivo de atingir uma postura firme e ereta, estando sentado
ou em pé. Na aquisição da estabilidade, podemos notar o progresso do
amadurecimento céfalo-caudal, que envolve o controle da cabeça, já no 1°mês de
vida; o controle do tronco, no 2°mês; a estabilização para se sentar com apoio, no
3° mês; e conseguir se manter em pé com apoio a partir do 10° mês.

4.2 Locomoção

A locomoção está diretamente ligada à estabilidade. É impossível para o


bebê conseguir se locomover sem que as tarefas de estabilidade sejam superadas
e dominadas. Uma das primeiras maneiras de se locomover voluntariamente é
arrastar-se. Esse movimento é caracterizado nos momentos iniciais apenas pelas
ações dos braços, e, posteriormente, e entram em conjunto os movimentos das
pernas, evoluindo para o engatinhar. Em direção à maturação do engatinhar, os
bebês usam o padrão contralateral (braço oposto da perna), tornando o
movimento mais padronizado e rápido (Gallahue; Ozmun, 2005).
O objetivo principal da locomoção é o padrão da caminhada independente,
sem apoio nenhum. As primeiras tentativas podem acontecer entre o 10° e o 15°
mês de vida, em padrões desajeitados, com o corpo rígido, os olhos sempre

13
focados nos pés, os braços com os cotovelos flexionados e, por vezes, procurando
um apoio. Quanto maior o número dos estímulos ambientais (encorajamento,
assistências dos responsáveis e até o apoio de brinquedos e móveis), mais rápida
é a ascensão até a caminhada independente. Chegando em um estágio mais
maduro, a velocidade da caminhada aumenta, e os pés, que antes ficavam virados
para fora como uma maneira de aumentar a base de apoio, agora estão
posicionados para frente (Gallahue; Ozmun, 2005).

4.3 Manipulação

Gallahue e Ozmun (2005) definem que o desenvolvimento de habilidades


manipulativas rudimentares coloca o bebê em contato significativo com os objetos
do ambiente imediato. Os atos de segurar, soltar e alcançar são as primeiras
aquisições motoras rudimentares. Os primeiros movimentos de alcançar são
lentos e desajeitados e seguem os padrões de desenvolvimento do centro para
as extremidades, isto é, os ombros e cotovelos tendem a realizar os primeiros
movimentos e já aos seis meses estão mais controlados e apurados, passando o
controle para as mãos. Já a tarefa de segurar/pegar se dá de maneira reflexa com
poucos dias de vida e se estende normalmente até o quarto mês. Por volta do
quinto mês, a criança consegue segurar um objeto voluntariamente, porém não
realiza a preensão suficiente para mantê-lo na sua mão. Finalmente, aos nove
meses, a pegadura de pinça aparece, permitindo aos bebês segurar objetos
pequenos.
O bebê de cerca de seis meses já consegue se sentar sozinho, alcançar e
segurar objetos. Contudo, ainda falta maturidade para soltar conscientemente o
que ele pegou. Por isso, não é difícil vê-lo em um instante brincando com algum
objeto e, momentos depois, continuar balançando o objeto, mas de maneira
irritada. Como ele ainda não tem o controle dos flexores dos dedos, não consegue
soltar quando quer o brinquedo. Brincadeiras que o fazem segurar e soltar, como
empilhar blocos e arremessar bolas, são atividades que podem desenvolver de
maneira significativa essa habilidade (Gallahue; Ozmun, 2005).
Portanto, conseguimos afirmar que o desenvolvimento se define de
maneira previsível em domínio céfalo-caudal e do centro para as extremidades.
Primeiro os bebês controlam a cabeça para, então, dominar o tronco e as pernas.
Os braços se movimentam de maneira desordenada, e as mãos mantêm os
reflexos de preensão até por volta dos quatro meses. Relembrando que os

14
ambientes que promovem a exploração e as oportunidades, facilitam para a
aquisição dos padrões motores mais cedo (Gallahue; Ozmun, 2005).

TEMA 5 – HABILIDADES MOTORAS FUNDAMENTAIS

Dando continuidade à aquisição de habilidades motoras, as crianças


chegam à fase motora fundamental (2 a 7 anos), agora com a necessidade de
desenvolver habilidades que, combinadas e aprimoradas, tornam-se habilidades
recreativas e esportivas. Elas agora são capazes de se movimentar (locomoção)
de maneira livre e independente, conseguem controlar melhor a musculatura
contra a gravidade (estabilidade) e manusear (manipulação) objetos de maneira
mais fácil.
Gallahue e Ozmun (2005) determinam que apesar de a aquisição de
habilidades motoras fundamentais maduras ser relacionada à idade, não é
dependente dela, devido a numerosos fatores inerentes à tarefa em si, ao
indivíduo e ao ambiente.
Gallahue e Ozmun (2005) ainda conceituam o padrão de movimento como
desenvolvimento de níveis aceitáveis de habilidade e uma mecânica corporal
eficiente para uma grande variedade de situações motoras. Já o movimento
fundamental diz respeito somente aos elementos básicos daquele movimento em
particular. Podemos usar como exemplo o movimento de arremesso. Quando
ensinamos uma criança, pelo modelo de repetição, ela vai visualizar um modelo e
tentar, dentro dos limites dela, imitar o movimento. Ela vai aprender assim o
movimento fundamental de arremesso. Porém, quando refinamos o movimento e
passamos para um estágio maduro, em que precisamos colocar o braço inclinado
para trás, o cotovelo de arremesso para frente em extensão, o antebraço girando
e apontando o polegar para baixo, entre outras especificidades, temos um padrão
de movimento.

5.1 Condições motoras

As crianças têm potencial de desenvolvimento para atingir o estágio


maduro da maior parte das habilidades motoras fundamentais por volta dos seis
anos de idade (Gallahue; Ozmun, 2005).
O aprendizado dos movimentos fundamentais está diretamente
relacionado com a fase de desenvolvimento motor em que a criança se encontra.

15
Dentro de uma determinada habilidade motora, estão os estágios inicial,
elementar e maduro do mesmo movimento. Logo, podemos concluir que essas
habilidades começam a ser aprendidas assim que as habilidades motoras
rudimentares estão bem fixadas. Os estágios não são determinados pelo
praticante, mas, sim, por quem está observando a atividade. Devemos esclarecer
que o sujeito, o ambiente e os objetivos a serem alcançados podem afetar a
maturidade aparente de um movimento. Utilizamos como exemplo um jogador de
futebol: se ele usa uma bola diferente daquela a que está acostumado, se ele tem
a pressão de fazer um gol para eliminar o time adversário ou se está lesionado,
esses fatores afetam o movimento, apesar de ele saber que é capaz de realizar
um chute preciso ou um passe certo.
Gallahue e Ozmun (2005) explicam que o resultado de uma tarefa motora
passa pelas condições ambientais, pelos objetivos a serem atingidos e pelo
indivíduo e ainda dizem que as diferenças que existem entre as crianças remetem
ao princípio de individualidade de todo aprendizado, pois o fato de uma criança
atingir ou não o estágio maduro depende basicamente do ensino, do
encorajamento e das oportunidades para a prática.
Uma mesma criança pode estar em estágios diferentes, em várias
habilidades. Por exemplo, se ela tem uma experiência com bolas, pode estar em
um estágio maduro para o chute, entretanto, para a habilidade de rebater, devido
à falta de experiências, no estágio inicial. Isso é normal e pode progredir da
infância até a vida adulta. Outra possibilidade é que dentro de uma habilidade
podem existir diferentes padrões. Assim, Gallahue e Ozmun (2005) exemplificam
o padrão do arremesso, quando o braço está no estágio elementar, o giro do
tronco, no estágio elementar, e as pernas, no estágio maduro, por isso um ensino
que priorize o equilíbrio no desenvolvimento motor é sempre bem-vindo.
Quando o controle motor está estabelecido, esses padrões podem ser mais
bem refinados, em termos de produção de força e de precisão, na fase motora
especializada’ (Gallahue; Ozmun, 2005).

5.2 Movimentos estabilizadores fundamentais

Gallahue e Ozmun (2005) consideram que a estabilidade é o aspecto mais


fundamental do aprendizado de movimentar-se, uma vez que todo movimento
envolve um elemento de estabilidade. Para desenvolver uma estabilidade
eficiente, o indivíduo deve ter a capacidade de perceber as mais variadas

16
mudanças que alterem o seu equilíbrio e, como resposta, recompensar essas
mudanças com movimentos adequados. São exemplos de movimentos
estabilizadores fundamentais: movimentos axiais, giro corporal, desvio, equilibrar-
se em um só pé, caminhada direcionada e apoios invertidos.

5.3 Movimentos locomotores fundamentais

A locomoção é um aspecto primordial na aprendizagem da movimentação,


efetiva e eficientemente, pelo ambiente. Os movimentos devem ser eficientes e
efetivos, adaptados às necessidades e ao ambiente em que são realizados
(Gallahue; Ozmun, 2005).
Os movimentos a serem aprendidos pelas crianças na fase motora
fundamental consistem em: caminhada, corrida, salto em determinada altura, salto
vertical, salto em distância, saltito, galope e deslizamento, pulo e salto misto.

5.4 Movimentos manipulativos fundamentais

O conceito de movimentos manipulativos fundamentais é explicado por


Gallahue e Ozmun: “envolvem a aplicação de força a um objeto ou a recepção de
força de um objeto” (2005, p. 296). Eles são muitas vezes empregados com outras
habilidades para formar um conjunto que satisfaça os desafios impostos por uma
certa atividade motora. Devemos entender que em determinadas fases do
desenvolvimento, as crianças podem estar em diferentes estágios das
habilidades, e isso pode acabar prejudicando a realização de determinadas
tarefas. Por mais que uma criança seja a mais veloz da sua turma, isso não
significa que na tarefa de correr e quicar uma bola ela vai ser a mais rápida, visto
que a sua habilidade manipulativa pode não estar tão madura quanto outras de
locomoção. Algumas habilidades manipulativas descritas por Gallahue e Ozmun
(2005) são: rolamento de bola, arremesso por cima, ato de recepcionar, chute, ato
de aparar, ato de rebater, ato de quicar e voleio.
Assim como nas fases motoras iniciais e na aquisição das habilidades
motoras rudimentares, nas habilidades motoras fundamentais, a progressão
segue uma sequência determinada. Os movimentos são influenciados por
condições ambientais, objetivos da tarefa e forma como o indivíduo responde a
todas essas informações. As habilidades fundamentais passam pelas ações
manipulativas, locomotoras e estabilizadoras, que, combinadas, devem cumprir

17
as mais variadas exigências, tanto esportivas e recreacionistas quanto do nosso
dia a dia.

18
REFERÊNCIAS

GALLAHUE, D. L.; OZMUN, J. Compreendendo o desenvolvimento motor:


bebês, crianças, adolescentes e adultos. 3. ed. São Paulo: Phorte, 2005.

GALLAHUE, D. L.; OZMUN, J.; GOODWAY, J. D. Compreendendo o


desenvolvimento motor: bebês, crianças, adolescentes e adultos. 7. ed. Porto
Alegre: McGraw-Hill, 2013.
AULA 5

INTELIGÊNCIA PSICOMOTORA:
A COMPREENSÃO DA RELAÇÃO
CORPO/MENTE NA
APRENDIZAGEM

Prof. Marcos Aurélio Iubel


CONVERSA INICIAL

O desenvolvimento infantil é uma das vertentes da linha de estudo do


desenvolvimento humano, focado desde o momento da concepção até o final da
infância, por volta dos 10 anos, dependendo do autor a ser avaliado. Para Souza
e Veríssimo (2015), o desenvolvimento infantil é influenciado pela carga genética
e pela convivência social.
Ele é influenciado pelos aspectos pré-natais, como doenças, tanto na mãe
quanto alguma má-formação no bebê, no uso de drogas, álcool ou outras
substâncias ilícitas. Os fatores nutricionais também podem acarretar déficits
nessa etapa do desenvolvimento, causando a prematuridade ou o baixo peso no
nascimento. A situação ambiental que ela está inserida também acarreta
benefícios ou malefícios, seja a interação com os pais ou responsáveis, violência,
e, em alguns casos, a necessidade por outros motivos de uma intervenção
profissional (Souza; Veríssimo, 2015).
Algumas habilidades a serem desenvolvidas na primeira e segunda infância
são pré-requisitos essenciais para outras etapas da vida. A habilidade motora
consiste no movimento, na capacidade de se deslocar de um ponto a outro com
maior destreza e economia de energia, incluindo também as habilidades
manipulativas, imprescindíveis para quem precisar manusear qualquer objeto, e
ainda, as habilidades de equilíbrio (Gallahue; Ozmun, 2005).
As habilidades cognitivas, que são constituídas pela inteligência e
raciocínio, crescem em um ritmo muito acelerado nesse período. Se levarmos em
conta que, quando nascemos, somos seres capacitados apenas de reflexos
primitivos, que buscam manter a nossa sobrevivência, e após um ano,
controlamos esses reflexos, passamos a coordenar movimentos rudimentares e
também desenvolvemos conceitos elementares de comunicação. São por meio
da nossa capacidade de comunicação, gestual ou balbuciando alguns fonemas,
que podemos interagir com o meio que vivemos (Souza; Veríssimo, 2015).
Segundo Souza e Veríssimo (2015), quando temos um desenvolvimento
infantil adequado, temos um melhor desempenho acadêmico e cognitivo,
podemos ter melhores condições socioeconômicas, e ainda adquirimos uma
facilidade de relações interpessoais. Em contrapartida, quando esse
desenvolvimento é prejudicado, podem aparecer problemas de linguagem,

2
cognição e motricidade, no desempenho escolar e na capacidade de se relacionar
com outras pessoas, e ainda afetar as condições socioeconômicas.
Como conclusão de seu estudo, Souza e Veríssimo (2015) concluíram que

O desenvolvimento infantil é parte fundamental do desenvolvimento


humano, um processo ativo e único de cada criança, expresso por
continuidade e mudanças nas habilidades motoras, cognitivas,
psicossociais e de linguagem, com aquisições progressivamente mais
complexas nas funções da vida diária e no exercício de seu papel social
[...] o alcance do potencial de cada criança depende do cuidado
responsivo às suas necessidades de desenvolvimento.

A interação do indivíduo com o ambiente, com base nos estudos de


Brofenbrenner (citado por Gallahue; Ozmun, 2005) e Souza e Veríssimo (2015),
denotam que, muito mais importante que o ambiente em si, a interpretação dele é
que vai prejudicar ou alavancar o desenvolvimento infantil. Esses ambientes foram
divididos em quatro: microssistema, que engloba os familiares e pessoas
próximas ao seu convívio, como na escola e no bairro em que ela mora;
mesossistema, que é a interação desses microssistemas; exossistema, que são
as interações dos seus familiares em outros sistemas, as quais pode afetar o seu
microssistema – por exemplo, a mãe acaba tendo um problema no trabalho, que
acaba levando para casa, afetando o indivíduo; macrossistema, relacionado ao
tipo de cultura/sociedade que ele pertence e também as condições
socioeconômicas da família (Gallahue; Ozmun, 2005; Souza; Veríssimo, 2015).
Com esses conceitos definidos, poderemos aprender mais sobre como o
desenvolvimento infantil ocorre nos primeiros anos de vida, com seus reflexos,
movimentos e a interação das crianças com os objetos que a cercam.

TEMA 1 – FATORES PRÉ-NATAIS QUE AFETAM O DESENVOLVIMENTO

Com o passar dos anos, a taxa de mortalidade no Brasil vem caindo ano
após ano. Se, em 2000, essa taxa era de 29,02 a cada mil nascidos vivos, em
2015 esse índice caiu para 13,82 a cada mil nascidos vivos, o que representa uma
queda de mais de 47% na taxa de mortalidade infantil. Por mais que esses
números sejam animadores, ainda poderiam ser melhores, caso as famílias
tivessem acesso à medicina preventiva para cuidar do bebê ainda na fase
intrauterina (IBGE, 2013).
Muitos fatores pré-natais podem afetar o desenvolvimento normal, porém,
sabe-se que alguns destes poderiam ser controlados, o que acarretaria uma boa
fase gestacional. As consequências de um pré-natal mal feito, ou inexistente, são
3
as anomalias cardíacas, deformidades ósseas e desequilíbrios químicos. Esses
defeitos podem resultar em incapacidades mentais e físicas, podendo variar na
intensidade (Gallahue; Ozmun, 2005).

1.1 Fatores nutritivos e químicos

Alguns fatores nutricionais e químicos podem influenciar direta ou


indiretamente o desenvolvimento fetal. A quantidade ou a dosagem dessas
substâncias são aspectos importantes nessa fase. Um termo utilizado nesse caso
é teratogênio, definido como “qualquer substância que possa fazer o bebê
desenvolver-se de maneira anormal” (Gallahue; Ozmun, 2005).
A má nutrição no período pré-natal pode afetar a gravidez em três aspectos
diferentes: placentário, fetal e maternal. Quando a má nutrição é placentária,
existe uma deficiência no transporte dos nutrientes da placenta até o feto, que é
alimentado pelo processo de osmose da placenta e do cordão umbilical. A má
nutrição fetal é quando o bebê, por mais que tenha disponível os nutrientes
necessários para o seu crescimento, não consegue utilizá-los, em decorrência de
alterações metabólicas. Já a má nutrição materna acontece porque a mãe
consome de maneira inadequada, seja em qualidade ou quantidade, os nutrientes
imprescindíveis para o desenvolvimento normal do seu filho. Devemos considerar
que hábitos alimentares, pobreza, ansiedade, estresse e traumas podem afetar a
nutrição materna. A causa mais comum para um bebê nascer com peso abaixo
do ideal é a má nutrição materna (Gallahue; Ozmun, 2005).
O uso de drogas lícitas e/ou ilícitas pode afetar o crescimento dos órgãos
e também a altercação celular e, como resultado, gerar anomalias no
desenvolvimento típico (normal). Todas essas substâncias, nutricionais ou
químicas, acabam passando pelos poros da placenta, chegando até o feto, que
pode desenvolver tais anomalias. Esses efeitos posteriores devem ser analisados
em decorrência do período em que foi usada a droga, a dosagem que foi ingerida
ou aplicada, quanto tempo a droga é consumida e a predisposição genética para
os efeitos (Rocha; Rocha, 2018).
Rocha e Rocha (2018) afirmam que o bebê pode carregar as
consequências da dependia para a vida fora no ventre, como a síndrome de
abstinência, sintomas encontrados na mãe e problemas graves no
desenvolvimento motor e cognitivo.

4
1.2 Hereditariedade

O processo de crescimento e desenvolvimento de um feto ocorre no


momento da fecundação, quando 23 cromossomos que estão dentro do
espermatozoide encontram outros 23 cromossomos maternos que estão no óvulo.
Esse novo ser, o feto, carrega a informação de 46 cromossomos, formando assim
23 novos pares. A união desses cromossomos determinará os nossos fatores
biológicos, como sexo, cor do cabelo, os olhos e da pele (Gallahue; Ozmun, 2005),
Nesse processo, podem acontecer algumas variações cromossômicas que
acarretam o aparecimento de algumas síndromes e condições genéticas. Trentin
e Santos (2013) esclarecem que a palavra síndrome “significa um conjunto de
sinais e sintomas que são determinados por um gene, um cromossomo ou pela
interação desses com o ambiente”. Podemos citar as mais comuns como a
síndrome de Down, ou trissomia 21, já que a parte vinte e um carrega três genes,
podendo ser dois do pai ou da mãe. Outra trissomia conhecida é a síndrome de
Patau, que é a consequência de três cromossomos 13. Ela pode acarretar a fenda
palato labial, polidactilia (presença maior de dedos na mão ou no pé) e pode afetar
quase todos os órgãos. Em média, 70% dos seus portadores não chegam a
completar um ano de vida (Souza et al., 2010).
As desordens genéticas podem variar muito em sua causa e consequência;
os genes mutantes podem estar tanto no autossomo quanto no cromossomo.
Essas prevalências podem ser dominantes ou recessivas. Exemplos mais comuns
desse tipo de alteração genética são a anemia falciforme, daltonismo e os pés
disformes (Gallahue; Ozmun, 2005). A anemia falciforme, que é a mutação do
cromossomo 11, faz com que a hemoglobina se pareça com o formato de uma
foice. Ela está presente em 2% a 6% da população do Brasil segundo o Ministério
da saúde, por esse motivo o diagnóstico passou a ser obrigatório desde 2001 por
meio do Programa Nacional de Triagem Neonatal (Ferras; Mirão, 2007, citado por
Silva et al., 2017).

1.3 Problemas médicos

Muitas mães, quando entram no período gestacional, podem carregar


consigo algumas doenças, infecções e DSTs que são capazes de afetar o seu
filho. O vírus da imunodeficiência humana (HIV), por exemplo, pode passar de
mãe para filho em diferentes épocas. Souza et al. (2010) pontuam que “o contágio

5
também pode ocorrer da mãe soropositiva para o bebê, durante a gravidez, o parto
ou a amamentação, sendo que a esse tipo de transmissão dá-se o nome de
transmissão vertical”. A transmissão do HIV para os bebês é a mais conhecida
entre a população, entretanto, existem outras DSTs que podem ser transmitidas,
como a herpes genital, a gonorreia e a sífilis.
As infecções são igualmente propícias para a transmissão de defeitos
congênitos; a rubéola, se adquirida ainda no primeiro trimestre, pode causar
cegueira, surdez e/ou retardo mental. O citomegalovírus (CMV) pode ficar no
corpo da mãe sem que ela saiba, e sem o seu sistema imunológico combatê-lo,
porém, assim que a proteção diminui, ele pode entrar em ação originando diversas
doenças que, segundo Couto et al. (2003, citado por Câmara, 2014), são
pneumonia, esofagite, encefalite, hepatite, pancreatite, gastrite, enterocolite,
retinite. A infecção pelo CMV pode ocorrer tanto no momento do parto, por meio
do contato da criança com o sangue ou secreções genitais, como no período pós-
parto, durante o aleitamento materno.
O desequilíbrio hormonal e a eritroblastose fetal (incompatibilidade de Rh),
também estão presentes no período da gestação, contudo, são problemas
pormenores apresentados nesse período de tantas mudanças e que exigem
muitos cuidados da futura mãe.
Podemos constatar que existem muitos fatores prejudiciais ao crescimento
e desenvolvimento do feto, este podendo sofrer alterações devido às insurgências
nutritivas, genéticas e patológicas. Após todo esse processo de evolução
intrauterino, a criança está pronta para nascer e crescer, progredindo física,
cognitiva e socialmente.

TEMA 2 – CRESCIMENTO PRÉ-NATAL E INFANTIL

Quando comentamos sobre o crescimento e desenvolvimento motor,


cognitivo e afetivo das crianças, eles têm um início pré-definido, um marco que
define o ponto de partida para essas áreas estudadas, e que ocorre quando o
espermatozoide consegue penetrar o óvulo gerando um novo ser. Uma das
características que modulam fisicamente o indivíduo é a sua carga genética. Os
genes do pai e da mãe definem a cor do nosso cabelo, cor dos olhos, estatura,
propensão a doenças, alguns tipos de síndrome, enfim, todo um biótipo. Tanto o
óvulo quanto o espermatozoide carregam informações genéticas em
23 cromossomos distintos, que unidos vão constituir todos esses atributos citados.

6
2.1 Crescimento pré-natal

Por meio do processo da mitose (divisão celular), o zigoto, como é definido


o óvulo fertilizado que carrega 46 cromossomos, passa a se multiplicar até tornar-
se um embrião. O período zigótico estende-se por uma semana, é nesse período,
entre o terceiro e quarto dia, que ele desce até a trompa de Falópio e prende-se
à parede uterina, formalizando a gravidez (Gallahue; Ozmun, 2005).
O período embriônico, que compreende da segunda até a nona semana de
gestação, é marcado pela distinção de três camadas de células, que formarão
nossos sistemas, órgãos e demais aspectos físicos. Essas camadas celulares são
conhecidas como endoderme, mesoderme e ectoderme.

• Endoderme: camada mais interna que vai desenvolver os sistemas


digestivo, respiratório e glandular.
• Mesoderme: camada medial que vai desenvolver os sistemas muscular,
esquelético, circulatório e reprodutor.
• Ectoderme: camada mais externa que vai desenvolver os sistemas nervoso
central e periférico, além dos órgãos sensoriais terminais e da nossa pele,
unha e cabelo.

Como as formações ocorrem de maneira acelerada e vulneráveis a


variações externas e à composição genética, é nesse período que a maioria das
anomalias genéticas pode acontecer.
Após a implantação do embrião na parede uterina, ele começa a receber
os nutrientes necessários através da placenta e do cordão umbilical, marcando o
início do período fetal.
Para Malina e Bouchard (1991, citados por Silva, 2010, p. 73), “o
crescimento depende de processos de a) hiperplasia: aumento do número de
células; b) hipertrofia: aumento do tamanho das células; e c) agregação aumento
na capacidade das substâncias intracelulares em agregar células”. Agora com
cerca de 8 cm, os movimentos reflexos começam a aparecer, e abrem caminho
para o aparecimento da estrutura óssea, transparente e cartilaginosa, atingindo
peso próximo a 170 g (Gallahue; Ozmun, 2005).
Pele, cabelo e unha surgem no quinto mês, assim como o crescimento e o
posicionamento de cada órgão, que inclusive chegou na metade do seu
comprimento; entretanto, ainda pesa 10% do seu peso final. O sexto mês é
distinguido pela abertura dos olhos e a presença das papilas gustativas. Em casos
7
de nascimento espontâneo ou por algum trauma, o bebê tem a possibilidade de
sobreviver, embora possa sofrer alguns danos motores ou cerebrais, pois a função
da respiração espontânea e a termorregulação ainda não estão completamente
desenvolvidas. Tendo o seu peso praticamente triplicado no sétimo mês, os bebês
passam por períodos longos de inércia, aparentemente, desenvolvendo um maior
controle cerebral. Agora encaminhando para os dois últimos meses, eles se
tornam mais ativos, com menos espaço para se mexerem, e com o cérebro
tentando assumir o controle dos sistemas corporais (Gallahue; Ozmun, 2005).

2.2 Crescimento infantil

O tempo entre o nascimento e o final do primeiro mês é conhecido como


neonatal, fase que eles precisam de uma alimentação adequada, um bom estado
de saúde e um ambiente que promova a sua estimulação. Por vezes, existem
crianças que não têm todas as suas necessidades supridas, mas mesmo assim
conseguem alcançar o nível de crescimento mais adequando ao final do período
inicial da infância (Gallahue; Ozmun, 2005).
O início da infância é denominado por Gallahue e Ozmun (2005) como
“rápido crescimento no comprimento e substanciais aumentos no tecido
subcutâneo”. O ganho de peso pode ser comparado quando o bebê chega ao seu
primeiro aniversário com quase o triplo de peso do seu nascimento e ganhos na
média de 25 cm de estatura.
Entre os 12 e os 24 meses, o crescimento se mantém, contudo, de maneira
menos expressiva do que antes, agora seguindo um aumento da proporção
corporal, mas podemos notar que mãos e pés tem um crescimento mais rápido,
assim como em comparação do braço e do antebraço (Gallahue; Ozmun, 2005).
Silva (2010) demostrou utilizando as tabelas de Malina e Bouchard (1991),
que até o primeiro ano o ganho médio de estatura chega a ser de 25 cm, já do
primeiro ao segundo ano, esse ganho passa para 9 cm, e assim segue diminuindo
ano após ano, até o chamado “surto de crescimento adolescente”, que se inicia
nas meninas aos 9 anos e nos meninos aos 11.

TEMA 3 – REFLEXOS INFANTIS E ESTEREOTIPIAS RÍTMICAS

O termo reflexo é muitas vezes divulgado erroneamente, atrelando o seu


uso ao conceito que na verdade é da velocidade de reação. Quantas vezes não

8
assistimos a uma partida de futebol, e em um momento de rápida defesa, o
narrador disse que o goleiro defendeu “no reflexo”? A etimologia da palavra está
parcialmente fora de contexto. Entenda-se por um movimento rápido uma ação
imediata logo após um estímulo visual, auditivo ou tátil, como tempo de reação
(TR), em que, em milésimos de segundo, o goleiro move-se para tentar defender
uma bola chutada ou cabeceada estando muita próxima a ele. Outro exemplo que
podemos pensar é na defesa de um ataque no voleibol. O jogador se posiciona
na quadra para fazer a defesa com a mão, entretanto, acaba utilizando o pé como
o único recurso possível no momento.
Segundo Schimdt e Wrisberg (2010, citados por Marques Junior, 2011), o
tempo de reação “é definido como o índice de preparação necessária para
produzir movimento, ou seja, o TR é o tempo antes de iniciar a ação”. Ainda,
afirmam que o TR referente ao estímulo tátil é sucedido em velocidade pelo
estímulo auditivo, e posteriormente pelo visual. Agora com a definição clara de
velocidade de reação, podemos discorrer sobre o que realmente significa a
palavra “reflexo”, quando nos referimos à motricidade.
Acompanhando a definição de Gallahue e Ozmun (2005), podemos
constatar que “os movimentos reflexos são reações involuntárias do corpo a várias
formas de estímulos externos”. Eles constatam, além disso, que a grande parte
dos reflexos ocorre na camada subcortical, que também é responsável pelos
processos involuntários, como a respiração. Quando pensamos nos movimentos
dos bebês, desde o quarto mês fetal (dentro da barriga) até o quarto mês de vida
pós-natal, eles são basicamente em decorrências de reflexos. Reiterando que
este é o estágio de codificação, da fase motora reflexa.
Já os reflexos primitivos de sobrevivência têm duas funções principais,
alimentação e busca de proteção (Gallahue; Ozmun, 2005). Com o estudo dos
reflexos por pesquisadores, eles puderam notar uma correlação entre os
comportamentos reflexos precoces, como os de nadar e caminhar, que aparecem
desde o nascimento e acabam por desaparecer em torno do 4.º mês de vida, e os
movimentos voluntários.
Existem duas teorias que tentam elucidar as ações reflexas existentes nas
crianças recém-nascidas.

9
3.1 Teoria neuromaturacional

A teoria desenvolvida por Helen Eckert (1987) afirmava que “à medida que
o córtex se desenvolve, ele inibe algumas das funções das camadas subcorticais
e assume sempre crescente controle neuromuscular [...]”. Assim que o bebê
passa a controlar mais os movimentos voluntários, os reflexos vão se extinguindo.
Com o processo de mielinização, que é, o revestimento das fibras nervosas pela
bainha de mielina, as informações chegam mais rápido a mais neurônios.
Oliveira et al. (2017) afirma que “o período mais crítico para a mielinização
e o desenvolvimento neural se dá entre o 6.º mês de gestação até mais ou menos
os seis anos de idade da criança”.

3.1.2 Teoria dos sistemas dinâmicos

De acordo com Thelen et al. (1986, 1987, 1991, citado por Gallahue;
Ozmun, 2005, p. 148), a neuromaturação “serve como restrição ao
desenvolvimento e é apenas um dos muitos limitadores de ritmo que influenciam
o aparecimento do movimento voluntário controlado”. Gonçalves et al. (1995)
explicam que essa teoria se baseia na “mudança e a auto-organização como
elementos básicos para o desenvolvimento do sistema”. Podemos entender que,
segundo os autores, o processo de desenvolvimento é afetado pelo ambiente que
cerca os indivíduos.

3.2 Sistema nervoso central e desordens

O sistema nervoso central é encarregado pela coordenação e controle das


atividades promovidas pelo nosso corpo, sejam as contrações musculares, a ação
dos órgãos e até a produção hormonal (Oliveira et al., 2017). Ele é responsável
também pela seleção e processamento de informações, devendo enviá-las às
regiões cerebrais correspondentes e dar a resposta adequada conforme as
experiências e vivencias já ocorridas.
Assim que os bebês fazem as primeiras visitas ao pediatra, eles
comumente provocam estímulos para perceber em que etapa estão os reflexos
que devem aparecer conforme a idade cronológica e as fases motoras. Caso
sejam percebidas ausência, irregularidade ou diferente intensidade de um lado
para o outro, pode-se levar à possibilidade de uma disfunção neurológica
(Gallahue; Ozmun, 2005).
10
3.3. Reflexos primitivos

Conforme a elucidação de Gallahue e Ozmun (2005), os reflexos primitivos


estão diretamente “associados à obtenção de alimento e à proteção do bebê”.
Esses reflexos acompanham as crianças até o primeiro aniversário, e devem
surgir e apagar-se em um período determinado “tanto em ritmo quanto de
sequência”.
Os reflexos serão denominados e exemplificados a seguir.

3.3.1 Reflexo de moro e reflexo de choque

No reflexo de Moro, o bebê é deitado de barriga para cima (supinação), e


quando uma leve batida é realizada no seu abdômen, ocorre uma inesperada
extensão e flexão dos braços e das pernas. Após a ocorrência do reflexo, os
membros voltam a posição usual, fletidos próximos ao corpo (Gallahue; Ozmun,
2005). O reflexo de choque é parecido, com exceção de que não existe distensão
prévia. O reflexo de Moro tende a desaparecer até os seis meses, já o reflexo de
choque aparece por volta dos sete meses e vai até o décimo mês.

3.3.2 Reflexos de busca e sucção

Os reflexos de busca ou descoberta e de sucção permitem ao recém-


nascido a obtenção de nutrição da mãe. Em resultado da estimulação da área em
torno da boca (reflexo de busca), o bebê vira a cabeça na direção da fonte da
estimulação. O reflexo de busca é mais forte nas três primeiras semanas e,
gradualmente, cede espaço à resposta de virar a cabeça de modo direcionado,
que se toma refinada e parece um comportamento com o propósito de colocar a
boca em contato com o estímulo. É mais fácil obter o reflexo de busca quando o
bebê está com fome, dormindo ou na posição normal de amamentação. A
estimulação dos lábios, gengivas, língua ou palato duro provoca um movimento
de sucção (reflexo de sucção) na tentativa de receber nutrição. Geral- mente, a
ação de sucção é ritmicamente repetitiva. Se isso não acontecer, a movimentação
leve do objeto dentro da boca irá produzir a sucção. O reflexo de sucção tem duas
fases - expressiva e de sucção. Durante a fase expressiva, o mamilo é apertado
entre a língua e o palato. Durante a fase de sução, é produzida pressão negativa
na cavidade bucal. Esse reflexo é provocado diariamente nos horários da
amamentação no caso do neonato saudável. Além disso, a estimulação de recém-
11
-nascidos de alto risco para geração de reflexos de sucção e deglutição tem se
mostrado benéfica na redução da necessidade de alimentação intravenosa. Esses
dois reflexos estão presentes em todos os recém-nascidos com desenvolvimento
típico. O reflexo de busca pode persistir até o final do primeiro ano; o movimento
de sucção em geral desaparece como reflexo no final do terceiro mês, mas
persiste como resposta voluntária.

3.3.3 Reflexos buco-manuais

Existem dois reflexos buco-manuais encontrados nos neonatais. O reflexo


palmar-mental faz com que a criança erga o queixo quando tem a base da palma
da mão coçada, porém não dura muito, algo em torno dos 3 meses. O reflexo de
Babkin, ou reflexo palmar-mandibular, é o estímulo de compressão na palma da
mão, que acarretam uma série de movimentos: abertura da boca, olhos fechados
e flexão da cabeça para frente (Gallahue; Ozmun, 2005). Os dois tipos de reflexo
surgem com o bebê ainda no primeiro mês, e desaparecem por volta dos quatro
meses.

3.3.4 Reflexo de preensão palmar

O estímulo da palma da mão com um objeto faz com que a criança o agarre
fortemente sem o auxílio do polegar. Ele pode durar até o quarto mês (Gallahue;
Ozmun, 2005).

3.3.5 Reflexo de preensão plantar e de Babinski

Podemos provocar a reflexo de Babinski, quando damos uma leve batida


na sola do pé, e como reação ele distende os dedos. Com o amadurecimento do
sistema neuromuscular, o mesmo estímulo ocasiona a contração dos dedos do
pé (Gallahue; Ozmun, 2005).

3.3.6 Reflexos tônicos assimétrico e simétrico do pescoço

O reflexo tônico assimétrico é o resultado de quando colocamos o bebê de


barriga para cima (posição supinada) e viramos a cabeça dele para um dos lados,
o que acarreta duas ações distintas tomadas pelo braço. Se caso tenhamos virado
a cabeça para o lado direito, o braço direito vai se estender como se estivesse

12
apontando para lado que a cabeça foi virada e o esquerdo vai flexionar próximo
ao tronco.

3.4 Reflexos posturais

De acordo com Gallahue e Ozmun (2005), “os reflexos posturais


automaticamente fornecem para um indivíduo a manutenção, de uma posição
ereta em relação ao seu ambiente”. Com essa definição, os autores esclarecem
que os reflexos posturais servem tanto para mantem a posição espacial como
para reorganizar depois de um estímulo. Em uma criança com o desenvolvimento
típico (normal), esses reflexos podem acompanhar até o primeiro ano de vida.
Os reflexos a seguir competem as questões posturais dos bebês.

3.4.1 Reflexos corretivos labirínticos e posturais

Esses reflexos surgem em torno dos dois meses, e são estimulados quando
seguramos o bebê no colo e inclinamos ele para os lados, para frente ou para trás.
Ele vai tentar corrigir esse movimento, tentando manter a cabeça levantada para
frente. A parte visual vai começar a aflorar após os seis meses, assim ela (a visão)
passa a controlar mais o que estamos a ver (Gallahue; Ozmun, 2005).

3.4.2 Reflexo de levantamento

Quando o bebê já consegue se manter sentado, por volta dos três meses,
com apoio (encostado em uma almofada, ou no carrinho para bebês), dos seis
meses, com apoio próprio (procurar manter o equilíbrio utilizando as mãos) e aos
oito meses sem apoio nenhum, ele acaba desenvolvendo o reflexo do
levantamento, que é tentar manter a posição ereta involuntariamente. Devemos
pensar no bebê sentado; quando pegamos as suas mãos e empurramos ele
levemente para trás, o reflexo vai fazer com que ele flexione os cotovelos contra
o seu corpo para manter a posição que estava antes. Essa ação involuntária pode
ocorrer até os doze meses (Gallahue; Ozmun, 2005).

3.4.3 Reflexo de amortecimento e de apoio

Assim que a criança começa no aprendizado de caminhar, uma das coisas


que ela mais acaba fazendo é cair. A maturação para manter o controle do centro
de gravidade varia de um indivíduo para o outro. Mesmo que exista essa variação,
13
todos tendem a se defender dessas quedas da mesma maneira, estendendo os
braços em direção ao solo. Desse modo, conseguimos explicar o reflexo de
amortecimento, que acontece quando seguramos um bebê com o polegar nas
costas e ele com a barriga voltada para baixo (posição de pronação) e fazemos
um movimento em direção ao solo: prontamente a crianças vai estender os braços
para amortecer a queda (Gallahue; Ozmun, 2005).

3.4.4 Reflexos corretivos do pescoço e do corpo

Segundo a definição de Gallahue e Ozmun (2005), o reflexo do pescoço


“pode ser observado quando o bebê é colocado em posição supina (barriga para
cima) com a cabeça voltada para um lado. O restante do corpo move-se
reflexamente na mesma direção da cabeça”. Podemos entender que a criança vai
procurar sempre manter o alinhamento do corpo, e assim, funciona também para
o reflexo corretivo do corpo: caso ela seja colocada de lado, com o corpo apontado
sempre uma direção, a sua cabeça também vai seguir para o mesmo lado
(Gallahue; Ozmun, 2005). Esses reflexos são o ponto inicial para a habilidade de
rolar, desenvolvida por volta dos cincos meses.

3.4.5 Reflexo de engatinhar

“Pode ser observado quando o bebê é colocado em posição inclinada e


aplica-se pressão à sola de um de seus pés”. (Gallahue; Ozmun, 2005). É
presente desde o nascimento e estende-se até os três meses. Devemos elucidar
que não será com o fim desse reflexo, que ele estará maduro o suficiente para
fazer o engatinhar voluntário, com controle dos braços e das pernas; isso deverá
ocorrer por volta dos sete meses. Esse reflexo pode mostrar o quanto esse tipo
de movimentação está enraizada no nosso subconsciente.

3.4.6 Reflexo primário de andar

Para iniciarmos esse reflexo, devemos colocar um bebê que tenha entre
um e quatro meses em pé, em uma superfície plana, para observarmos ele
“andar”. Salientando que não é um ato voluntário, porém, pesquisas da década
de 1980 sugeriram que, quanto mais esse reflexo foi estimulado, melhor foi a força
dos membros inferiores (Gallahue; Ozmun, 2005).

14
3.4.7 Reflexo de nadar

Que a vida intrauterina é desenvolvida boa parte dentro da água, todos


sabemos, e pensando nisso, Myrtle McGraw fez um grande estudo na década de
1930 filmando várias crianças dentro de uma piscina para poder analisar o padrão
de seus movimentos. Como queria observar uma grande faixa etária, as mais
novas tinham cerca de dez dias e as mais velhas, quase um ano. Por meio da
análise do material, McGraw (1939) constatou uma coordenação de braços e
pernas quando elas eram colocadas em decúbito ventral (barriga para baixo)
dentro da água. Esses padrões desapareciam em torno do quarto mês (Filho;
Manoel, 2014).

3.5 Estereotipias

As estereotipias são descritas por Estre Thelen, pesquisadora que tentou


elucidar esses movimentos, como “comportamentos rítmicos desempenhados
continuamente de forma automática”. Avaliamos então que, para caracterizar uma
estereotipia, o movimento deve conter três elementos: ritmo, continuidade e
automação. Se analisarmos crianças e adultos, esses comportamentos não
precisam existir; caso ocorram, devem ser interpretados como um comportamento
anormal do desenvolvimento.
Ao longo da década de 1980, Thelen conseguiu diferenciar em torno de
47 comportamentos estereotipados. Eles foram divididos, para que fossem
estudados e analisados de maneira separada em quatro categorias: os
movimentos das pernas e pés; os movimentos dos braços, mãos e dedos; o
movimento do tronco e o movimento da cabeça e rosto. Ainda, no decorrer do seu
estudo, Thelen notou que, pouco tempo antes de os bebês terem o controle de
certos sistemas corporais, este passava a ter muito movimento.
Tomamos como exemplo um bebê de seis meses, o Joaquim. É
completamente normal, em certas ocasiões, ele ficar movimentando as pernas,
como se estivesse pedalando uma bicicleta enquanto está deitado. Esses
movimentos estão interligados ao controle maior das pernas que as crianças
passam a ter quando conseguem sentar e ficar em pé com apoio.
Com essa idade, ele já consegue sentar com apoio e está rumo ao controle
total dessa habilidade, passando para próxima etapa, que é sentar sem apoio
algum. Mesmo já estando sentado, Joaquim continua a experimentar como o seu

15
corpo pode reagir aos movimentos. Assim que ele aprendeu a sentar, uma das
suas brincadeiras favoritas era ficar se balançando, mesmo que sentado, para
frente e para trás. Ele fazia isso diversas vezes, quase sempre sem ter recebido
algum estímulo e com um movimento constante, atingindo os três princípios
básicos da estereotipia: ritmo, continuidade e automação.
Poderíamos pensar em vários outros exemplos que se encaixam nesses
pré-requisitos, sejam para braços, tronco e cabeça.

TEMA 4 – CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO NA INFÂNCIA

Logo após um período de crescimento vertiginoso, que pode ser


enquadrado do nascimento até os dois anos, entramos em um período de ganho
de estatura e massa, teoricamente estável. A primeira infância (0 a 2 anos) tem
como aspecto o surgimento e desaparecimento dos reflexos, a aquisição das
habilidades motoras rudimentares e o início do controle das habilidades
fundamentais. Devemos lembrar, entretanto, que como citado anteriormente, as
crianças não deixam uma fase ou estágio motor simplesmente quando completam
mais um aniversário. Esse resultado ocorre com a maturação do sistema nervoso
central (SNC), influências ambientais (responsáveis, escola, alimentação) e das
experiências adquiridas com o passar do tempo.
Precisamos relembrar que as crianças transitam nos estágios do
desenvolvimento motor de acordo com a tarefa designada, por exemplo, uma
criança submetida ao estímulo diário de jogar basquete tem como consequência
um bom controle motor do arremesso, um movimento já no estágio maduro. Em
contrapartida, essa mesma criança desenvolveu pouco a habilidade do chute,
estando essa tarefa no estágio inicial.
O período dos dois aos 10/12 anos é apontado por diferentes terminologias,
isso depende em qual linha de estudos sem baseiam as informações. Gallahue e
Ozmun (2005) denominam o período entre dois e seis anos como o período
inicial da infância, e dos seis aos 10 anos como período posterior da infância.
Autores como Eckert (1993) e Barbanti (2003) trazem outros nomes, mas os
períodos são parecidos.

16
4.1 Crescimento e desenvolvimento no período inicial da infância (segunda
infância)

Por mais que já tenhamos denominado o termo “crescimento” dentro do


estudo do desenvolvimento motor, podemos reforçar que este é empregado para
nomear o “aumento no tamanho do corpo de um indivíduo na maturação”
(Gallahue; Ozmun, 2005, p. 14).
Em um ganho normal de massa e estatura, as crianças,
independentemente do sexo, chegam aos quatro anos com o dobro do tamanho
de quando nasceram; já o ganho de massa corporal (músculo, vísceras e ossos)
entre os dois e os cincos anos, é menor que na primeira infância (do zero aos dois
anos) (Gallahue; Ozmun, 2005).
Até chegarem ao período da puberdade, cerca dos 12 anos, os ganhos de
massa e estatura tendem a se manter na média de 5 cm e 2,3 kg respectivamente.
Todavia, esses números são equivalentes a estudos que servem de
referência para pais e pediatras; a realidade pode ser outra de acordo com o tipo
de ambiente e as experiências que crianças e pré-puberes podem passar. As
diferenças físicas entre meninos e meninas são muito pequenas, sendo os
meninos um pouco mais altos e pesados.
Os ganhos cognitivos desenvolvidos no período inicial da infância são
enormes: o crescimento do cérebro chega perto do 75% do peso final, aos três
anos; aos quatro anos, o córtex cerebral está todo desenvolvido; e por volta dos
6 anos, o cérebro já chega aos 90% do seu tamanho adulto (Gallahue; Ozmun,
2005). Com o passar do tempo, o cérebro da criança passa pelo processo de
mielinização (revestimento dos axônios pela bainha de mielina), que permite a
transferência dos impulsos nervosos pelo sistema nervoso (Rosa; Reis, 2017).
Somente aos doze anos é que o globo ocular atinge o seu tamanho total,
por consequência, a retina das crianças não está completamente desenvolvida
até essa idade, assim elas podem ter hipermetropia (Gallahue; Ozmun, 2005).
Os anos inicias são muitos suscetíveis aos mais variados tipos de estímulo,
sejam eles visuais, auditivos, táteis, manipulativos, locomotores etc. Piaget
nomeou esse período como “fase do raciocínio pré-operacional”. Parte desses
estímulos vem das brincadeiras responsáveis pelo desenvolvimento das
habilidades motoras rudimentar e fundamental, das habilidades sociais, como
comunicação, cooperação, e relações interpessoais (Gallahue; Ozmun, 2005).

17
Gallahue e Ozmun (2005) ainda aponta que “nessa fase pré-conceitual de
desenvolvimento cognitivo, ver é, literalmente, acreditar”. Entre os dois e cinco
anos, elas têm a necessidade da autoafirmação, o poder de sentirem-se
autônomas em algumas tarefas, e também o sentido da iniciativa para algumas
outras. O autor ainda define que “o estabelecimento de um autoconceito estável
é crucial para o desenvolvimento afetivo apropriado da criança pequena porque
ele tem efeito tanto sobre a função cognitiva como sobre a função psicomotora.
As crianças desenvolvem muito rapidamente várias habilidades motoras
fundamentais, entretanto, ainda podem ocorrer alguma confusão corporal,
direcional, temporal ou espacial (Gallahue; Ozmun, 2005).

4.2.1 Crescimento e desenvolvimento no período no final da infância


(terceira infância)

O crescimento nessa fase, dos seis aos 10 anos, é lento, porém estável, e
se mantém dessa forma até o surto de crescimento adolescente. Esse surto
pode ser dividido em três fases: aceleração, velocidade pico e desaceleração. Nas
meninas, o pico de velocidade ocorre em torno dos onze anos, e, nos meninos,
aos treze (Silva, 2010).
Como já afirmado, o crescimento nessa fase é mais lento e gradual, e essa
particularidade ajuda na aquisição de novas habilidades fundamentais, que
poderão sair dos estágios elementares e atingir os estágios maduros, por meio da
prática. A descoberta de novas experiências motoras auxilia no processo de
maturação e integração sistêmica (Gallahue; Ozmun, 2005).
Essa idade é marcada também pelo ganho médio de cinco a sete
centímetros por ano, e de 1,5 a 3 kg por ano. Os grandes músculos tornam-se
mais desenvolvidos; tanto meninos quanto meninas podem apresentar uma baixa
resistência cardiorrespiratória, entretanto, essa debilidade pode ser contornada
com o início do treinamento esportivo fora do contexto escolar; as habilidades
começam a ser ajustadas e pressupostas, podendo desenvolver as habilidades
esportivas (Gallahue; Ozmun, 2005).
Uma das principais marcas no desenvolvimento do período final da infância
é quando a criança consegue compreender as letras, seus fonemas e suas
ligações para começar a ler e escrever com certa compreensão. Consegue
também decifrar os números e seus mais diferentes contextos, como o valor do
dinheiro e compreender o tempo.
18
4.3 Motricidade e aprendizado

Nessa faixa etária, as crianças passam por várias fases de


desenvolvimento intelectual e motor, e quando algum desses aspectos não se
desenvolve de maneira esperada, pode acabar atingindo outros pontos. As
dificuldades de aprendizagem podem ser de ordem acadêmica, que afetam a
aprendizagem de escrita e leitura, e também de ordem psicomotora, afetando
habilidades motoras rudimentares e básicas, e consequentemente todas as
etapas que viriam a seguir.
Uma brincadeira bem direcionada, e com um significado intrínseco junto,
pode ser a chave do sucesso para que os bebês possam se desenvolver de
acordo com as expectativas para a idade, respeitando todas as fases e estágios
de desenvolvimento, não superestimando demais as suas capacidades motora e
intelectual, e também não as subestimando, facilitando mais que o necessário.
Toda criança que não seja afetada por desordens de desenvolvimento, com
algum tipo de síndrome ou doença, e que tenha uma estrutura social adequada,
tem capacidade de se desenvolver dentro das expectativas apontadas para a sua
idade; caso um aspecto mais específico não ocorra dentro da normalidade, um
sinal de alerta pode ser “acionado” para que se possa entender o que pode estar
acontecendo. Os profissionais que trabalham com essa criança, como as
pedagogas, que passam algumas horas da semana com os pequenos, devem ser
capazes de distinguir possíveis alterações motoras e cognitivas no brincar
direcionado e livre. É nesse período de “brincar livre” que muitas delas vão mostrar
o seu verdadeiro interesse e também as suas dificuldades, pois, somente quando
estão em uma livre demanda de exploração de ambiente, sejam os brinquedos ou
os seus pares, é que podem demonstrar a sua verdadeira motivação para brincar.

TEMA 5 – DESENVOLVIMENTO PERCEPTIVO-MOTOR

Como já foi abordado nos temas anteriores, todo o processo de


desenvolvimento e crescimento humano começa na fecundação do óvulo pelo
espermatozoide. Na terceira semana gestacional, ocorre a formação cerebral por
meio das células da ectoderme, camada mais interna do zigoto, que após toda a
sua mutação vai se transformar em um embrião. Por meio da formação cerebral,
ocorrem diversas interações com o ambiente que fazem o nosso cérebro

19
permanecer em constante aprendizado, ainda na barriga da mãe (Gallahue;
Ozmun, 2005).
A definição de perceptivo-motor para Gallahue e Ozmun (2005) pode ser
descrita em duas partes. Primeiro, de que “todo movimento voluntário envolve um
elemento de ‘consciência’ perceptiva que resulta em algum tipo de estímulo
sensorial”. Ele ainda completa dizendo que “o desenvolvimento das habilidades
perceptivas em um indivíduo depende, em parte, da atividade motora”.
Seguindo essa definição, podemos reconhecer que, por meio da nossa
percepção espacial, ou seja, do que está acontecendo naquele momento,
desenvolvemos todo um aparato motor para responder objetivamente aos
estímulos que recebemos. Podemos exemplificar quando um atleta vai chutar um
pênalti em uma partida de futebol em dois momentos distintos. Na sua primeira
tentativa, a sua chance de marcar o gol ocorre quando o jogo está em andamento
e o placar está 0x0. Quando ele está na posição determinada pelo árbitro, seus
adversários e companheiros de equipe estão ao seu lado, uns incentivando,
outros tentando atrapalhar a sua concentração. Se um jogador do outro time grita
com ele, ou faz algum outro barulho, a percepção auditiva recebe esse estímulo,
podendo atrapalhar ou não o cobrador. O goleiro fica posicionado em cima da
linha e movimenta-se de um lado para o outro, tentando passar a impressão de
que consegue defender o chute em qualquer lugar do gol; a percepção visual entra
em ação neste momento. O jogador deve assimilar todas essas informações
sensoriais e fazer a cobrança da melhor maneira possível.
Outro momento no jogo que é acrescido por parte desses elementos é se
o jogo termina empatado, e a disputa para saber quem vai ser o vencedor vai para
os pênaltis. O mesmo jogador que cobrou durante a partida agora vai tomar a
mesma posição, entretanto, adversários e colegas de equipe ficam na metade do
campo. As informações sensoriais agora são outras, dentro da grande área
somente estão ele e o goleiro do outro time; pode ser que, nessa segunda chance,
até mesmo o padrão motor do movimento seja diferente. Todo esse exemplo nos
faz pensar que os movimentos voluntários são tomados por decisões que
abrangem vários tipos se estímulos sensoriais, em maior ou menor importância.
Desse modo, quando interpretamos a palavra “percepção”, ela carrega em
si o significado de conhecer, de interpretar as informações. Os atributos que
formam o desenvolvimento perceptivo-motor podem ser diferenciados em a.
informações sensoriais, quando recebemos diversos estímulos ao mesmo tempo,

20
e o interpretamos no nosso cérebro; b. integração sensorial, quando esses novos
estímulos chegam ao cérebro, e se unem as informações já processadas em
outras experiências; c. interpretação motora, quando essas informações novas
fazem com que o padrão motor já aprendido sofra algumas adaptações para
serem executadas no ato; d. ativação motora, quando realizamos o movimento; e
e. a retroalimentação, quando avaliamos o nosso desempenho motor mediante
das informações sensoriais (visual, auditiva, tátil ou cinestésica) (Gallahue;
Ozmun, 2005).
Luria (1966, citado por Freitas, 2006), afirma que a nossa evolução só pode
acontecer se o nosso cérebro estiver organizado para receber e perceber todas
essas informações sensoriais, e que, como respostas dessas sensações do nosso
corpo e do ambiente, podemos corresponder motoramente de maneira eficaz. “A
percepção atua em várias sessões do cérebro e permite que a pessoa estabeleça
significado aos dados sensoriais (Winnick, 2000, citado por Gallahue; Ozmun,
2005). Esses campos cerebrais, de maneira resumida, são: lobo frontal,
responsável pelo movimento voluntário; lobo parietal, designado pela percepção
das sensações corporais; lobo occipital, pela visão; lobo temporal, audição e o
cerebelo, responsável pelo equilíbrio e coordenação.

5.1 Percepção visual

Para a criança, a percepção do que é verdade ou não passa diretamente


pelo campo visual. Tudo o que o seu olho vê acaba concretizando-se como
verdadeiro. Entretanto, para uma percepção visual mais acurada, existe também
o processo de maturação, lembrando que, fisiologicamente falando, é somente
aos doze anos que o globo ocular vai estar completamente formado. Algumas
características da visão vão ser expostas a seguir.
A acuidade visual é a capacidade de especificar detalhes em objetos.
Quanto mais detalhes conseguimos observar, maior é a nossa acuidade visual.
Ela ainda pode ser distinguida por estática, quando o objeto e o observador estão
parados, e dinâmica, quando o objeto está em movimento (Gallahue; Ozmun,
2005). Já a percepção de nível plano é quando conseguimos distinguir um objeto
específico do que está à sua volta, como identificar um super-herói em um cartaz
de cinema. Outro exemplo é quando jogamos qualquer esporte que envolva uma
bola, e quando esta é arremessada, ou passada para nós, devemos reconhecer

21
onde ela está no espaço, e executar os movimentos certos para poder
aparar/segurar ela.
Outro aspecto da visão é a percepção de profundidade, habilidade em
julgar a distância relativa a si mesmo, e também conseguir identificar tamanho,
sobreposição e proporção dos objetos vistos. O último fator que é relacionado à
visão é a coordenação visual-motora, capacidade de acompanhar um objeto em
trajetória horizontal ou vertical, e poder interceptar sua trajetória. Alguns esportes
exigem que essa capacidade seja bem desenvolvida, como o tênis, o vôlei e o
beisebol, esportes que mantêm a bola no ar na sua maior parte do tempo.

5.2 Percepção motora

Nas aulas de educação física, as crianças podem desenvolver as mais


variadas habilidades motoras, e se estruturarem para os mais variados esportes
e atividades recreativas. Essas atividades físicas cumprem, na sua maioria, uma
boa parte das necessidades e demandas que as crianças têm a cumprir em
relação aos padrões motores. Para poder brincar e desempenhar boas práticas
esportivas, as crianças devem adquirir algumas percepções que podem melhorar
a relação corpo e mente (Gallahue; Ozmun, 2005).

5.2.1 Esquema corporal

O esquema corporal é a capacidade de denominar cada parte do corpo,


sabendo localizar cada segmento em si e no outro, saber o que cada membro
pode e consegue fazer, além de aprender a utilizá-las com maior eficiência
(Gallahue; Ozmun, 2005).

5.2.2 Imagem corporal

É a capacidade em reconhecer como é o nosso corpo, se somos altos ou


baixos, gordos ou magros, enfim, reconhecer as nossas especificidades corporais.
Uma disfunção dessa percepção pode ocasionar a anorexia e bulimia, duas
doenças que distorcem a compreensão da nossa imagem (Gallahue; Ozmun,
2005).

22
5.2.3 Estruturação espacial

Devemos reconhecer o espaço que o nosso corpo ocupa e como podemos


deslocá-lo pelo espaço, reconhecendo onde ele alcança estando parado ou em
movimento (Gallahue; Ozmun, 2005).

5.2.4 Orientação direcional

Outro fator que deve progredir juntamente com as nossas percepções


corporais são as relacionadas com a orientação espacial. Por meio da lateralidade
e direcionalidade, elas podem reconhecer direita/esquerda, frente/trás, baixo/cima
e dentro/fora (Gallahue; Ozmun, 2005).
Todas essas percepções-motoras podem se desenvolver ainda mais com
a prática, ou seja, criança que brinca se desenvolve mais e melhor. Essas
capacidades devem ser todas atingidas de forma madura até a fase motora
especializada (de sete a quatorze anos). Esse ritmo de desenvolvimento é
percebido em crianças que estão em um crescimento e desenvolvimento médio,
que não sofrerão nenhuma mazela grave que pudessem acarretar em alterações.

23
REFERÊNCIAS

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AULA 6

INTELIGÊNCIA PSICOMOTORA
– A COMPREENSÃO DA
RELAÇÃO CORPO/MENTE NA
APRENDIZAGEM

Prof. Marcos Aurélio Iubel


INTRODUÇÃO

Os desafios encarados pelas crianças e jovens que têm algum tipo de


debilidade nos campos psicomotores são bem variados. Como já vimos
anteriormente, cada indivíduo é único em suas habilidades e debilidades, e novas
experiências motoras podem enriquecer ainda mais um histórico motor já
desenvolvido. Uma vez que essa habilidade esteja aprendida e treinada várias
vezes, ela entra como uma memória permanente. Mesmo que fiquemos muito
tempo sem acessar essa memória, como andar de bicicleta, por exemplo, assim
que tivermos a oportunidade lembraremos de como fazer.
Os três estágios próprios da fase motora especializada são: estágio de
transição, estágio de aplicação e estágio de utilização permanente. Estágio de
transição é quando o indivíduo começa a aprender as primeiras tentativas em
combinar padrões motores diferentes para um movimento específico. Ex.:
arremesso de uma bola de basquete no aro. Estágio de aplicação ocorre quando
o indivíduo passa a dar ênfase em melhorar uma habilidade já conhecida. Nessa
fase, o treinamento é fundamental para atingir níveis superiores de habilidade.
Ex.: realizar uma bandeja no basquete, na qual deve se misturar a passada
específica mais o arremesso na tabela. Estágio de utilização permanente é
quando o indivíduo passa a escolher somente algumas atividades nas quais ele
tem mais habilidade, ele pode participar de modo competitivo ou recreativo.
A intervenção nos campos psicomotores, descritos por Vitor da Fonseca,
pode influenciar positivamente as áreas cognitivas e comportamentais deficitárias.
Esses campos podem ser separados em coordenação global e fina, esquema
corporal, lateralidade, estruturação espacial e estruturação temporal (Oliveira,
2015).
Poderemos ver à frente como as brincadeiras e vivencias motoras podem
modificar tais condições, fazendo com que os indivíduos reproduzam os
comportamentos positivos não somente no ambiente controlado, mas também
quando não estão em uma terapia ou atividade dirigida.
A brincadeira não pode ser encarada somente como um momento de
diversão e descontração das crianças, pois é por meio dela que podemos observar
uma postura madura ou não para aquela atividade. Por exemplo, ao introduzimos
um tipo de exercício de futsal, há alunos que executam de maneira correta e
ordenada aquele movimento, mas no momento do jogo em si não conseguem

2
executar o mesmo movimento. Isso indica que pode estar ocorrendo uma resposta
errada para o mesmo estímulo, uma ideia de que ele sabe realizar o movimento,
mas não no momento correto. Isso também ocorre com uma criança com um
desenvolvimento atípico, que sabe ordenar as letras de maneira correta para
escrever o seu nome, mas tem dificuldade em achar as mesmas letras se estas
estiverem em uma caixa com outras letras aleatórias.
A resposta pode nem sempre ser a que esperamos, e por isso devemos
auxiliar para que os desafios possam ser cumpridos de maneira positiva, e dentro
dos jogos e brincadeiras, podemos ensinar algo para as crianças, contudo de
forma mais lúdica, com brincadeiras, mas sem perder a essência da
aprendizagem.

TEMA 1 – BRINCADEIRAS PARA COORDENAÇÃO MOTORA

O termo coordenação motora é muito difundido para representar qualquer


tipo de habilidade que nós temos, entretanto, a literatura apresenta duas
especificidades relevantes para o assunto, a coordenação motora global,
referente à ação dos grandes grupos musculares, como correr, pular, saltar,
caminhar sobre um local estreito etc. Já o termo coordenação motora fina refere-
se a uma habilidade manual, a coordenação dos dedos e das mãos (Oliveira,
2015).
Uma criança que experimenta o ambiente em que está inserida, seja em
casa, na escola ou em um parque, vai desenvolver um maior repertório motor,
uma gama diferenciada de movimentos para superar uma variedade de desafios
motores, por exemplo, subir em uma árvore, descer de um lugar alto, pular
amarelinha de frete ou de costas, enfim, uma variedade enorme de movimentos.
Quanto mais ela tem a disponibilidades de experimentar novos movimentos, mais
ela consegue uma dissociação de movimentos, ou seja, cada membro consegue
realizar um movimento diferente. O nado de crawl, por exemplo, em que um braço
está na fase submersa, realizando a propulsão, e o outro está fora d’água,
realizando a fase de recuperação, sendo os membros superiores cada qual
realizando um movimento diferente (Massaud; Corrêa, 2008).

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1.1 Pique nas alturas

Essa brincadeira será direcionada para o desenvolvimento da coordenação


motora ampla, ativação de grandes grupos musculares.

 Objetivo: coordenação motora ampla;


 Espaço: pré-determinado pelo professor (quadra ou sala);
 Material: dois caixotes baixos;
 Número de participantes: mínimo de quatro;
 Desenvolvimento: um aluno deverá correr atrás dos outros participantes e
tentar encostar neles, que poderão correr pelo espaço livremente, e quanto
quiserem fugir do pegador, podem subir nos caixotes. O pegador irá mudar
quando este tocar no corpo de outra pessoa.

A brincadeira de pique nas alturas é muito parecida com um pega-pega,


porém, para fugir do “pegador”, a criança terá que subir no caixote. Como é uma
brincadeira que envolve a corrida, agilidade e desvio (troca rápida de direção),
acaba desenvolvendo muito as grades cadeias musculares e também a
capacidade de equilíbrio dinâmico do indivíduo. Oliveira (2015) cita que, ‘’através
da movimentação e da experimentação, o indivíduo procura o seu eixo corporal,
vai se adaptando e buscando um equilíbrio cada vez melhor”.

1.2 Desenho com fita

A segunda brincadeira vai ser direcionada para o desenvolvimento da


coordenação motora fina, habilidade manual.

 Objetivo: coordenação motora fina;


 Espaço: lugar amplo para que as crianças se movimentem;
 Material: fita de ginástica rítmica, ou material alternativo;
 Número de participantes: indeterminado;
 Desenvolvimento: realizar formas e desenhos com a fita.

O objetivo dessa brincadeira é que as crianças reproduzam as formas


solicitadas pelo professor, como um quadrado, círculo, triangulo, podendo solicitar
também algumas letras do alfabeto, ou qualquer outro tipo de desenho possível.
Para realizarem essa brincadeira, elas podem ficar paradas em um local

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determinado ou também, para dificultar um pouco mais, podem ir se deslocando
pelo espaço e realizando a tarefa solicitada.

1.3 Amarelinha no alvo

 Objetivo: desenvolver a coordenação motora global e fina;


 Espaço: desenho de uma amarelinha no chão e um alvo a 1,5 m de
distância;
 Material: giz, arco, pedra;
 Número de participantes: mínimo dois;
 Desenvolvimento: jogar a pedra dentro de uma das casas da amarelinha;
pular com um pé até o local onde foi lançada a pedra; ir até o final da
amarelinha e jogar a pedra no alvo, que pode ter uma marcação de
pontuação.

A brincadeira mistura tanto as habilidades de coordenação global quanto


as de coordenação fina, culminando em um estágio final de controle da
coordenação. Já o começo da atividade encaminha para o uso consciente da mão,
de modo que o sujeito deverá arremessar a pedra em um lugar delimitado. Em
seguida, pular até chegar na pedra, e depois arremessá-la dentro do alvo. Uma
combinação de diferentes habilidades como o pulo, arremesso, equilíbrio e uma
noção de força serão necessárias para a realização desta atividade.

TEMA 2 – BRINCADEIRAS PARA ESQUEMA CORPORAL

Oliveira (2017, p. 18) define o esquema corporal como “reconhecimento do


próprio corpo e suas partes, por meio do qual se consegue relacionar com o meio
ambiente. Permite que a criança conheça seus domínios e sinta suas
possibilidades de ação”. A criança deve saber como as partes do corpo interagem
com o meio ambiente. Por exemplo: se a criança quer entrar em uma caixa de
papelão, ela deve colocar qual parte do corpo primeiro? Em uma fase de
experimentação, ela tentará de qualquer jeito, primeiro a cabeça, ou uma perna
ou até mesmo os braços, contudo, a experiência de sucessivas tentativas indicará
a melhor maneira de realizar aquela tarefa, colocando primeiro uma das pernas,
segurando com as mãos na caixa e trazendo a outra perna para dentro da caixa.
Essa noção de esquema corporal só é desenvolvida com a maturação dos campos
psicomotores dela e de diversas outras experiências.

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2.1 Cabeça, mão e pé

 Objetivo: reconhecer as partes do corpo;


 Espaço: qualquer local;
 Material: nenhum;
 Número de participantes: mínimo três;
 Desenvolvimento: sendo uma brincadeira cantada, as crianças devem
estar dispostas em um círculo e o professor deverá ensinar primeiramente
a letra da música, e cada vez que uma parte do corpo for mencionada,
deverá ser tocada pelas crianças. A letra da música é: “Cabeça, mão e pé;
Joelho e nariz; Ombros, cotovelos e a barriga fica aqui!’’. A única exceção
é o “pé”, que deveremos bater no chão, ao invés de tocá-lo. Assim que
termina uma rodada, o professor escolhe uma parte do corpo que não
poderá ser mencionada na canção, mas deverá ser encostada, e quando
alguém errar a música e falar a parte escolhida, poderá tirar outra parte, e
assim por diante.

Dar nome às partes do corpo e dizer a sua função para alguma atividade
pode ser um exemplo de interação das crianças com a noção do esquema
corporal, assim como solicitar para que todas achem no seu corpo aquele lugar
específico, e no corpo dos outros colegas. Oportunizar para que todos possam
dar ao menos um exemplo de ação daquela parte escolhida.

2.2 Caça-corpo

 Objetivo: montar um corpo humano com todas as partes;


 Espaço: quadra ou sala de aula;
 Material: cartolina, lápis ou caneta hidrográfica;
 Número de participantes: mínimo dois;
 Desenvolvimento: as crianças deverão desenhar em uma cartolina um
corpo humano. Após isso, o professor irá recortar as partes e colocar em
um lado da sala. Ao comando do professor, os alunos, um de cada equipe,
deverão correr e procurar as partes do corpo recortada e montar um novo
corpo com as partes encontradas, não necessariamente a que eles fizeram,
sem faltar nenhuma parte.

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2.3. Gato mia

 Objetivo: reconhecer o amigo pela parte do corpo;


 Espaço: quadra ou sala;
 Material: venda para os olhos;
 Número de participantes: mínimo três;
 Desenvolvimento: um dos participantes vai ficar vendado em um canto da
sala, enquanto isso, os outros vão se espalhar e ficar em qualquer posição,
mas não podem mais se mexer; ao comando do professor, quem estiver
vendado vai andar pela sala procurando os amigos, e para facilitar a sua
busca, ele poderá falar: GATO MIA! Os outros colegas devem fazer um
miado igual um gato, permanecendo no mesmo lugar. Assim, quem estiver
vendado tentará descobrir quem é o colega que ele encontrou apenas
tateando o corpo.

As brincadeiras que envolvem o esquema corporal estão diretamente


ligadas à localização das partes do corpo no espaço, tanto do seu corpo, quanto
dos colegas, trabalhando aspectos proprioceptivos que serão desenvolvidos nas
atividades, assim como os lobos parietais e o córtex sensitivo, que processam os
estímulos sensoriais recebidos pelo cérebro (Oliveira, 2017).

TEMA 3 – BRINCADEIRAS PARA LATERALIDADE

Oliveira (2017) definiu a lateralidade tomando como base uma série de


estudos nos campos da psicomotricidade, conseguindo definir que:

Compreende a dominância lateral de um lado em relação ao outro,


quando a criança reconhece qual lado está sendo trabalhado durante
uma atividade de deslocamento, por exemplo. É a aquisição da noção
de direita e esquerda. Contribui na direção da grafia iniciando a escrita
da esquerda para a direita.

Além do mais, Oliveira (2015) também cita que, ‘’o lado dominante
apresenta maior força muscular, mais precisão e mais rapidez’’. Entretanto
nenhum lado trabalha de forma isolada, sempre usamos um lado como um
comando principal e o outro lado como coadjuvante. Várias ações do dia a dia
utilizam esse esquema, por exemplo, se uma mão escreve com a caneta, a outra
segura o papel; se uma mão usa a tesoura para recortar, a outra segura o objeto
com firmeza, e assim por diante, então é correto afirmar que, por mais que

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tenhamos um lado dominante, ele quase sempre vai precisar de uma ação
conjunta com o outro membro (Oliveira, 2015).

3.1 Boliche

 Objetivo: derrubar o maior número de pinos;


 Espaço: quadra ou sala;
 Material: pinos de boliche ou similar e bola;
 Número de participantes: mínimo dois;
 Desenvolvimento: os participantes devem ficar atrás de uma marcação e
lançar a bola até os pinos para derrubar o maior número possível. Como o
foco da brincadeira é a lateralidade, pode-se fazer uma variação de
lançamentos com a mão, uma vez com a direita e outra com a esquerda, e
também podemos chutar a bola, alternado as pernas. Assim como um jogo
de boliche convencional, pode-se fazer uma somatória de pontos e
estabelecer quem consegue fazer mais pontos com a mão dominante e a
não dominante, essa comparação pode ser feita com os pés também.

3.2 Cão de guarda

 Objetivo: reconhecer de qual direção o colega está vindo;


 Espaço: um círculo no chão;
 Material: apito, venda, tesouro;
 Número de participantes: mínimo quatro;
 Desenvolvimento: as crianças ficarão dispostas em um círculo, e uma delas
ficará no centro, vendada, cuidando do ‘’tesouro’’; as outras crianças, uma
de cada vez, tentarão pegar o tesouro do centro do círculo, caso o cão de
guarda ouça algum barulho, deverá assoprar o apito e apontar de qual
direção ele escutou o barulho. Caso alguém consiga pegar o tesouro, sem
fazer nenhum barulho, ele passará a ser o cão de guarda.

3.3 Brincadeiras cantadas

 Objetivo: trabalhar as noções de direita e esquerda;


 Espaço: qualquer lugar;
 Material: nenhum;

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 Número de participantes: mínimo três;
 Desenvolvimento: exemplos de brincadeiras cantadas: Ciranda Cirandinha,
Roda Cotia, A Canoa Virou etc. Todas essas brincadeiras envolvem música
e trocas de direção, que podem ser destacadas com mais ou menos
ênfase, dependendo da faixa estaria do público-alvo. Crianças de até mais
ou menos cinco anos ainda não conseguem diferenciar o que é esquerda
de direita, por isso podemos reforçar essa troca de lado de maneira lúdica,
com comando simples e diretos, como ‘’para o outro lado’’, ‘’trocou’’ ou
qualquer outro comando que elas estejam familiarizadas.

A preferência pelo uso de uma das mãos deve surgir naturalmente. Por
meio de ações proprioceptivas, a criança vai escolher qual lado irá usar mais, e
está dominância pode ter traços de hereditariedade, dominância cerebral ou a
influência do meio psicossocial que ela está inserida (Oliveira, 2015).
Independentemente de uma das hipóteses, um bom domínio da
lateralidade irá facilitar o aprendizado da direção gráfica, a compreensão na leitura
e na escrita, auxiliar no desenvolvimento da coordenação motora fina, melhorar a
discriminação visual na escrita, não confundindo as letras d, b, p ou q, por
exemplo. ‘’A lateralização é a base da estruturação espacial e é através dela que
uma criança se orienta no mundo que a rodeia’’ (Oliveira, 2015, p. 74).

TEMA 4 – BRINCADEIRAS PARA ESTRUTURAÇÃO ESPACIAL

O conceito de estruturação espacial descrito por Oliveira (2017) é a


“capacidade de movimentar-se em determinado lugar adaptando-se as limitações
do espaço. É essencial para que o indivíduo se situe no ambiente em que vive e
realize observações sobre ele’’. Além disso, é por meio da estruturação espacial
que temos a capacidade de observar objetos distintos e podemos comparar,
combinar e verificar se existem semelhanças ou diferenças entre eles (Oliveira,
2015). Por meio das experiências motoras, as crianças conseguem adquirir uma
melhor percepção espacial, de como o corpo delas se encontra no ambiente, e
como esse corpo pode interagir com os objetos que a cercam.

4.1 Corrida dos arcos

 Objetivo: chegar primeiro ao final do espaço determinado;


 Espaço: quadra ou sala de aula;

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 Material: dois arcos para cada participante;
 Número de participantes: mínimo dois;
 Desenvolvimento: cada aluno deverá começar dentro de um arco, e ter
outro arco à sua frente no chão; ao sinal do professor, ele deverá pegar o
arco que está dentro, passar pelo corpo, posicionar à frente do outro arco
e pular para o arco da frente, e assim sucessivamente até a linha de
chegada. Pode-se modificar a regra colocando mais arcos para cada
participante, alterando também a distância, que ao invés de uma ida para
o outro lado, pode ser de ida e volta. Enfim, quem está comandando a
brincadeira deve analisar o feedback dos participantes para realizar as
alterações necessárias.

4.2 Zerinho

 Objetivo: chegar até o final da contagem sem recomeçar;


 Espaço: quadra ou sala;
 Material: corda;
 Número de participantes: mínimo três;
 Desenvolvimento: as crianças devem formar uma fila para que cada uma
tenha a sua vez; quem estiver posicionada na frente da fila deverá “entrar”
na corda com ela em movimento; na primeira vez, ela deverá apenas
passar pela corda, sem pular; nas próximas vezes, ela deve repetir sempre
a contagem anterior, fazer mais um pulo e “sair” da corda sem encostar,
caso ela encoste na corda, recomeça a contagem do zero. Por exemplo, se
a criança passa a primeira vez, conta-se “zero”, depois, ela pula uma vez e
sai da corda, depois pula duas vezes e sai, fazendo os pulos necessários
até chegar à contagem estabelecida, que pode ser dez, quinze ou vinte,
dependendo do nível de habilidade da turma.

4.3 Oca do cacique

 Objetivo: pegar todos os participantes e trazer para a “oca”;


 Espaço: quadra;
 Material: arco, corda;
 Número de participantes: mínimo cinco;

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 Desenvolvimento: a corda deve ficar no meio da quadra e ela será a “oca”
do cacique. Os dois arcos devem ficar na ponta da quadra e seguro do
“pique” dos fugitivos. Uma criança será o primeiro cacique, que deverá
permanecer sentada dentro dos limites da corda; as outras crianças vão
ficar andando em círculo, por volta da corda, até que o cacique decida se
levantar e correr atrás delas, que devem fugir para os arcos que estão
espalhados pela quadra. Quem não conseguir entrar do arco, não terá
como se proteger; quando quiser, o “cacique” levanta e corre atrás das
outras crianças para trazer à sua tribo, e quem for encostada pelo “cacique”
deve se juntar a ele dentro da corda; quando todas as crianças forem
pegas, escolhe-se um novo cacique.

O desenvolvimento da estruturação espacial está relacionado às


experiências motoras, mas também à maturação do sistema nervoso, que tem a
capacidade de coordenar e perceber estímulos táteis, visuais, auditivos e
cinestésicos. Ela ainda vai conseguir desenvolver as noções de situações (dentro,
fora, longe, perto), tamanho (pequeno, médio, grande), posição (em pé, deitado,
ajoelhado), movimento (levantar, abaixar, rolar, subir, descer), formas (quadrado,
círculo, retângulo), quantidade (cheio, vazio, metade) e de superfícies (Oliveira,
2015). Ainda de acordo com o autor (2015, p. 80), “Quando uma criança consegue
se orientar em seu meio ambiente, estará mais capacitada a assimilar a orientação
espacial no papel’’.

TEMA 5 – BRINCADEIRAS PARA ESTRUTURAÇÃO TEMPORAL

Para direcionar a noção de tempo e sua implicação no movimento, Oliveira


(2015) cita Piaget (s/d), que diz: ‘’o tempo é a coordenação dos movimentos: quer
se trate dos deslocamentos físicos [...] quer se trate destes movimentos internos’’.
Já Oliveira (2017) definiu a orientação temporal como ‘’ capacidade de situar-se
no tempo dentro da ação, relacionando o presente, o antes, o depois e seus
intervalos. É a compreensão da sucessão de acontecimentos e a distinção do
rápido e do lento durante o movimento”. Essas definições auxiliam no
entendimento do movimento associado ao tempo, realizar movimentos mais
rápidos ou mais lentos com um propósito.
Podemos imaginar um atacante de ponta de rede do vôlei, que estava
esperando um levantamento mais rápido em sua direção, entretanto, o levantador

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não conseguiu se posicionar há tempo para realizar um bom levantamento, então
o atacante já tinha iniciado o seu movimento de ataque, identifica que a bola vai
demorar mais para chegar até ele, e muda a velocidade do seu movimento, mas
sem mudar o padrão do movimento para conseguir realizar um ataque. Essa
noção de estruturação temporal que pode diferenciar os atletas amadores dos
profissionais, e também as crianças que conseguem se sobressair em uma
brincadeira ou nos esportes.

5.1 Balão no chão

 Objetivo: não deixar a bexiga cair no chão;


 Espaço: preferência por sala, sem interferência do vento;
 Material: bexigas;
 Número de participantes: mínimo três;
 Desenvolvimento: cada pessoa deverá estar com uma bexiga cheia e todas
com mais ou menos o mesmo tamanho; ao comando do professor, elas não
poderão mais segurar a bexiga, e devem manter ela no alto. Se a bexiga
cair no chão, deverá sair da brincadeira e esperar a próxima rodada. Caso
esteja fácil, o professor pode pedir para utilizar somente uma parte
específica do corpo, somente a mão esquerda e a cabeça, ou somente o
pé direito e a barriga, por exemplo, ficando livre a escolha de cada um.

5.2 Bola ao alto

 Objetivo: trabalhar a noção de “tempo de bola”;


 Espaço: quadra, espaço amplo;
 Material: bola, uma para cada participante;
 Número de participantes: indeterminado;
 Desenvolvimento: ao comando do professor, os alunos deverão realizar os
desafios pedidos, como jogar a bola para o alto e bater três palmas; jogar
a bola para o alto e encostar a mão no chão etc. Para cada desafio
cumprido, o professor pode deixar mais difícil.

5.3 Jogo da memória

 Objetivo: tentar memorizar o maior número de objetos;

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 Espaço: sala com objetos diversos;
 Material: corda;
 Número de participantes: mínimo três;
 Desenvolvimento: as crianças deverão ficar dentro de um círculo formado
pela corda no meio da sala, e definir a sequência dos participantes. Definido
quem será o primeiro, e assim sucessivamente, ele deverá encostar em
qualquer objeto presente na sala, mostrando para os outros colegas em
qual objeto encostou e sua cor, falando em voz alta, por exemplo, “Janela
branca!” e voltar para o círculo; o próximo da sequência deve falar e
encostar no objeto anterior e escolher um novo objeto, fazendo o mesmo
ritual, algo como, ‘’Janela branca”, “porta amarela!” e retornando para o
círculo, da mesma forma os outros participantes fazem o mesmo até
alguém errar a sequência.

O domínio da estruturação temporal fará com que a criança possa aprender


a ler e escrever com maior facilidade, dominando o ritmo dos sons, tendo uma boa
memória auditiva, distinção dos sons, e reconhecer a frequência e a duração dos
sons nas palavras, diferenciando, por exemplo, um ‘m’ de um ‘n’, ‘ss’ de ‘s’. Por
fim, a criança desenvolve a estruturação espacial e a simultaneidade de
movimento, ordem e sequência de acontecimentos, duração dos intervalos,
renovação de períodos e ritmo.

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