Location via proxy:   [ UP ]  
[Report a bug]   [Manage cookies]                

M Que Consiste A Identidade Linguística Ma Questão Saussuriana

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 12

que consiste a Em

identidade linguística?
Uma questão saussuriana
1
Maria Fausta Pereira de Castro*
https://orcid.org/0000-0003-1420-6096

Como citar este artigo: PEREIRA DE CASTRO, M. F. Em que consiste a identidade


linguística? Uma questão saussuriana. Todas as Letras – Revista de Língua e Literatura,
São Paulo, v. 22, n. 2, p. 1-12, maio/ago. 2020. DOI 10.5935/1980-6914/eLETDO
2013432

Submissão: maio de 2020. Aceite: julho de 2020.

Resumo: Este trabalho propõe uma reflexão sobre o conceito saussuriano de


identidade linguística. O Índice Analítico do Curso de Linguística Geral (2018
[1916]) nos mostra que o termo identidade recebe apenas duas entradas: um
capítulo sobre a identidade sincrônica e outro sobre identidade diacrônica, mas
esses dois tópicos abrem um universo de grande alcance teórico. Com o auxílio
de outras fontes de consulta, nosso objetivo é refletir sobre os caminhos apon-
tados por Saussure para o enfrentamento do problema da identidade linguísti-
ca, isto é, a questão do ponto de vista que a define e a consideração de um tipo
de entidade que rompe com a tradição filosófica.

Palavras-chave: Identidade. Diferença. Valor. Ponto de vista. Sincronia/diacronia.

* Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, SP, Brasil. E-mail: fausta@uol.com.br

Este artigo está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial 4.0 Internacional 1
MARIA FAUSTA PEREIRA DE CASTRO

DOSSIÊ

A identidade linguística1

O
■ tema da identidade linguística está presente em vários momentos da
reflexão de Saussure: no Curso de Linguística Geral (2018 [1916])2 e
suas edições críticas – por Engler (SAUSSURE, 1989 [1968]) e De
Mauro (SAUSSURE, 2005 [1967]) –, nos cursos II (1908-1909) e III (1910-1911),
oferecidos por Saussure na Universidade de Genebra, com notas dos alunos e
cujos cadernos foram posteriormente publicados e, ainda, em manuscritos que
se encontram arquivados na Biblioteca de Genebra (BGE) e que serão mencio-
nados ao longo deste trabalho.
Essa apresentação, em nada exaustiva, apenas oferece uma primeira medida
do espraiamento do tema da identidade ao longo dos textos saussurianos e dos
cursos.
Para Saussure (2004, p. 34) a identidade é a base necessária e absoluta para
o trabalho do linguista: “[...] é só por ela e com relação a ela que se chega a de-
terminar, depois, as entidades de cada ordem, os termos primeiros que o lin-
guista pode, legitimamente, acreditar ter diante de si”.
A anterioridade lógica atribuída à identidade e seu consequente papel na
constituição das entidades linguísticas podem esclarecer, pelo menos em parte,
o fato de Saussure atribuir à questão um alcance filosófico, termo pouco usado
por ele. Em outras palavras, podemos nos perguntar com o título deste trabalho
e adiantando o que leremos no próprio Saussure: em que consiste a identidade
de um signo em um sistema semiológico?
Trazemos aqui um excerto do manuscrito Ms. fr. 3951, fol. 1v (SAUSSURE,
1894), também nomeado por alguns pesquisadores como “Notas para um artigo
sobre Whitney” (cf. GODEL, 1969, p. 43). A folha em questão (1v) se abre em duas
páginas do caderno. Como se pode ver, à esquerda uma página quase em bran-
co, em que podemos ler no alto uma frase em diagonal: “x ou uma convenção
inicial”. Mais abaixo – ainda em diagonal –, um borrão ilegível com uma escrita
em espelho, provavelmente marca de tinta da página ao lado.
Na página à direita e na sua margem esquerda, está marcado outro x. Se-
guindo um critério do próprio Saussure, inserimos o trecho da página anterior
sobrescrito na linha assinalada. Segue então o texto objeto de nossa atenção:

1 Os textos deste trabalho que não foram publicados em português foram traduzidos pela autora.
2 De agora em diante, CLG.

2 Todas as Letras, São Paulo, v. 22, n. 2, p. 1-12, maio/ago. 2020


DOI 10.5935/1980-6914/eLETDO2013432
EM QUE CONSISTE A IDENTIDADE LINGUÍSTICA? UMA QUESTÃO SAUSSURIANA

DOSSIÊ

Figura 1 – Excerto do manuscrito Ms. fr. 3951

O objeto que serve de signo não é jamais o mesmo duas vezes: é preciso desde o pri-
meiro momento um exame, ou uma convenção inicial para saber dentro de quais limites em nome do que
temos o direito de chamá-lo o mesmo; é essa a diferença fundamental com um objeto
qualquer, e a primeira fonte muito simples.
Por ex., a mesa que tenho diante de mim é materialmente a mesma hoje e amanhã, xx3
e a letra b que escrevo é tão material como a mesa. mas4 ela não é [ ]5
Fonte: Genève, Bibliothèque de Genève, Ms. fr. 3951, fol. 1v.

Este é o início de um trabalho que começou a ser escrito porque Saussure


fora encarregado de escrever o obituário de Whitney, morto em 1894. Mas até
um obituário se transformou em um texto teórico; teórico demais para o seu
primeiro objetivo e Saussure desiste da tarefa, já que suas elaborações se enca-
minhariam para uma crítica a certos pontos de vista do colega.
A nota condensa várias questões presentes também em outros momentos da
reflexão do genebrino, como por exemplo, nos cursos II e III, como assinalou
Godel (1969, p. 136), e no próprio CLG. Saussure abre o texto tratando da ques-
tão da identidade pela formulação de um axioma: “O objeto que serve de signo
não é jamais o mesmo duas vezes” e, para ilustrá-lo, toma como exemplo um par
de objetos – a mesa que está diante dele e uma letra do alfabeto, a letra b; a
mesa é materialmente a mesma de um dia para o outro, e a letra b, “tão material
como a mesa, mas ela não é [ ]”; surge o branco, o silêncio, nenhuma pontuação.

3 Esta sequência de dois ou mais xx indica um trecho ilegível e tachado pelo autor.
4 Em letra minúscula no manuscrito.
5 Os colchetes vazios indicam um branco; nada escrito e nenhuma pontuação.

Todas as Letras, São Paulo, v. 22, n. 2, p. 1-12, maio/ago. 2020 3


DOI 10.5935/1980-6914/eLETDO2013432
MARIA FAUSTA PEREIRA DE CASTRO

DOSSIÊ

Turra (2018, p. 173-174)6 arremata assim esse trecho:


Corte onde suporíamos um “a mesma hoje e amanhã” [...]. Saussure busca es-
tabelecer uma relação entre identidade e materialidade, o que funciona para a
mesa. Ao propor uma analogia com a letra b, a fim de evidenciar a radical dife-
rença entre um objeto “no mundo” e o signo de um sistema semiológico, o impasse
se estabelece e se mostra no branco da página.
E a seguir estende sua reflexão, insistindo na especificidade do signo: há algo
na letra que é “tão material quanto a mesa”, mas por outro lado há “algo de ma-
terial’ que se inscreve ‘no jogo da língua’, fazendo com que sua identidade não
seja estabelecida isoladamente” (TURRA, 2018, p. 174).
No jogo da língua, está também outra questão: Saussure não deixa mencio-
nar no manuscrito um problema que tem amplo desenvolvimento no decorrer da
sua teorização, isto é, a noção de ponto de vista: é preciso determinar com que
critérios, dentro de quais limites, de que ponto de vista se tem o direito de con-
siderar um objeto que serve de signo, isto é, que está no sistema da língua, como
“o mesmo”. A asserção saussuriana a esse respeito é abrangente e diz respeito
tanto à sincronia como à diacronia, à oralidade e à escrita.
Entre tantas outras passagens em que Saussure discute fatos que dizem
respeito à identidade, é a partir de um fato sincrônico, relatado no CLG, que
o citamos a seguir. O problema foi tratado no decorrer dos cursos II e III: a
identidade da palavra “Senhores”7 e suas diversas ocorrências em uma
conferência. É algo na corrente da fala que está em questão.
Quando, numa conferência, ouvimos repetir diversas vezes a palavra Senhores!
temos o sentimento de que se trata, toda vez, da mesma expressão, e, no en-
tanto, as variações do volume de sopro e da entonação a apresentam, nas di-
versas passagens, com diferenças fônicas assaz apreciáveis – tão apreciáveis
como as que servem, aliás, para distinguir palavras diferentes (cf. fr. pomme,
“maçã”, e paume, “palma”, goute, “gota”, e je goute “eu gosto”, fuir, “fugir” e
fouir “cavar” etc.); ademais, esse sentimento de identidade persiste, se bem
que do ponto de vista semântico não haja tampouco identidade absoluta entre
um Senhores! e outro, da mesma maneira por que uma palavra pode exprimir
ideias bastante diferentes sem que sua identidade fique seriamente comprome-
tida (cf. “adotar uma moda” e adotar uma criança”, a flor da macieira e “a flor
da nobreza etc.).
O mecanismo linguístico gira todo ele sobre identidades e diferenças, não sendo
estas mais que a contraparte daquelas (SAUSSURE, 2018 [1916], p. 153-154).
Trata-se aqui de um fenômeno diverso daquele discutido a partir do manus-
crito. Se lá o impasse se estabelece e surge o branco na escrita, aqui o texto
ganha até mesmo contornos didáticos – inseridos pelos editores –, como se pode
constatar ao ler a edição crítica de Engler (SAUSSURE, 1989 [1968], p. 243-verso)
e compará-la com o texto do CLG.
As observações acrescentadas são de interesse; as variações de sopro, ento-
nação ou mesmo do ponto de vista semântico não impedem o sentimento de
identidade. Os exemplos são significativos tanto mais porque tocam também em

6 Este trabalho está no prelo e será publicado pela Mercado de Letras, Campinas.
7 No curso III, a palavra trabalhada foi “guerra”, mas a questão é a mesma.

4 Todas as Letras, São Paulo, v. 22, n. 2, p. 1-12, maio/ago. 2020


DOI 10.5935/1980-6914/eLETDO2013432
EM QUE CONSISTE A IDENTIDADE LINGUÍSTICA? UMA QUESTÃO SAUSSURIANA

DOSSIÊ

um ponto caro a Saussure, isto é, a relação entre sentido próprio e sentido figu-
rado. Para ele, “não há diferença entre o sentido próprio e o sentido figurado das
palavras – porque o sentido das palavras é uma coisa essencialmente negativa”
(SAUSSURE, 2004, p. 73).
Entende-se assim o modo como a citação é fechada, dando destaque ao jogo
de contrapartes que caracteriza o mecanismo da língua: “O mecanismo linguís-
tico gira [...]”.
O capítulo III da segunda parte do CLG – “Identidades, realidades, valores”
– é objeto de inúmeros comentários por parte de De Mauro na sua edição crítica
(SAUSSURE, 2005 [1967]).
Atento ao que os alunos registraram em notas do início do curso II8, De Mauro
observa que Saussure trata do problema da identidade, tanto do ponto de vista
das questões relativas à diacronia como à sincronia (cf. SAUSSURE, 2005 [1967]).
Na essência, trata-se “das razões que permitem identificar dois fatos como
duas manifestações de uma coisa que permanece idêntica” (cf. SAUSSURE,
2005, p. 459). O problema se impôs a Saussure, enquanto um linguista do sé-
culo XIX, “nos seus termos diacrônicos: o que permite identificar o francês
chaud ao latim calidus?” (p. 460). Entretanto, por decisão dos editores, essa
questão e a discussão que a ela se refere foram levadas para o capítulo VIII9,
quando na verdade Saussure tratou-as “em relação com a questão mais radical
da identidade sincrônica10, reduzindo o problema diacrônico ao sincrônico”
(p. 460). Essa crítica pode, aliás, ser confirmada pelo o que lemos no próprio
capítulo VIII, que é concluído convergindo para o que diz De Mauro.
“Ora, a identidade diacrônica de duas palavras tão diferentes quanto calidum
e chaud significa simplesmente que se passou de uma a outra por meio de uma
série de identidades sincrônicas na fala, sem que jamais o vínculo que as une
tenha sido rompido pelas transformações fonéticas sucessivas” [...] Eis porque
pudemos dizer, nas páginas 153-154, que é tão interessante saber como Senho-
res! repetido diversas vezes em seguida num discurso é idêntico a si mesmo,
quanto saber por que, em francês, pas (negação) é idêntico a pas (substantivo)
ou, o que vem a dar na mesma, por que chaud é idêntico a calidum. O segundo
problema não é, com efeito, mais que um prolongamento e uma complicação do
primeiro (SAUSSURE, 2005 [1967], p. 250).
O alcance teórico e epistemológico do capítulo III é mais uma vez comentado
por De Mauro na breve citação a seguir. Momento em que Saussure interroga as
categorizações vigentes na linguística. Unde exoriar?11, pergunta-se ainda em
outro momento de sua reflexão.
Neste capítulo igualmente, a intenção de Saussure é destruens12, tendendo a
lançar dúvida sobre o conjunto das categorizações e das definições de base
ontológico-universalista que as gramáticas modernas herdaram da tradição
aristotélico-racionalista (SAUSSURE, 2005 [1916], p. 460).

8 30 de novembro e 3 de dezembro de 1908.


9 Capítulo VIII da segunda parte do CLG.
10 De Mauro indica, entre parênteses, a passagem 1759 e seguintes da edição crítica do CLG, Saussure (1989 [1968]). Trecho em que
Saussure trata da questão.
11 De onde devo partir? Por onde começar?
12 Essa expressão remonta a Francis Bacon (2011 [1905]).

Todas as Letras, São Paulo, v. 22, n. 2, p. 1-12, maio/ago. 2020 5


DOI 10.5935/1980-6914/eLETDO2013432
MARIA FAUSTA PEREIRA DE CASTRO

DOSSIÊ

Saussure caminha em direção a um procedimento de desnaturalização da


distinção entre as palavras, entre as partes do discurso: substantivos, verbos,
adjetivos etc. são postos sob a sombra da dúvida. A distinção entre eles não é
tomada como uma “realidade linguística inegável [...]: e se forem fantasmas, que
realidade opor-lhes?” (SAUSSURE, 2018 [1916], p. 156).
A pergunta não cai no silêncio: para escapar às ilusões, diz ele, é preciso par-
tir da premissa de que as “entidades concretas da língua” não se mostram por si
mesmas. Mas se procurarmos apreendê-las “tomaremos contato com o real”; a
base para as classificações de que precisa a linguística para pensar o seu campo.
Com a menção ao valor linguístico, Saussure (2018 [1916], p. 156) parece
elaborar uma síntese do que disse, das formulações apresentadas, dos conceitos
com que trabalhou e tudo se resume a “valor”: “Por fim todas as noções versadas
não diferem daquilo chamamos valores”.
A equiparação entre valor e tantos outros termos da teorização saussuriana
estava também presente em aula do curso II, como nota Riedlinger:
Voltamos a um ponto que <já> abordamos. Para simplificar, M. de Saussure não
faz diferença fundamental entre <essas cinco coisas>: um valor, uma identida-
de, uma unidade, uma realidade (no sentido linguístico, realidade linguística) e
um elemento concreto linguístico (cf. SAUSSURE, 1997, p. 29).
O que está em questão é uma relação entre elementos de um sistema; se
isolamos este ou aquele não significa que os outros estejam fora do jogo das
identidades e das diferenças. Falar de unidade e identidade é, nesse sentido, tam-
bém falar de valor.

Ponto de vista, identidade e diferença

No contexto epistemológico reinante 80 anos depois da publicação do Curso


de Linguística Geral, foi encontrada em 1996, na estufa da casa da família
Saussure em Genebra, uma mala com vários documentos familiares, entre os
quais, manuscritos do próprio Saussure. Esses últimos foram doados à Biblio-
teca de Genebra, arquivados e catalogados por Rudolf Engler sob a cota “Arch.
de Saussure 372”.
Ainda que o tempo tenha passado, o material encontrado mantinha certa
ordem: envolvidos por um papel de embalagem, em que Saussure escreveu
Science du langage, estavam 12 envelopes e em cada um alternavam-se os títu-
los: ora “De l’essence double /à remarquer”, ora “De l’essence double” ou ainda
“De la double essence du (langage)”13.
Apesar do grande interesse do material, Saussure dá mostra de considerar os
fragmentos do Essence Double como um projeto de “opúsculo” de linguística
geral (cf. BÉGUELIN, 2016), que ele começou a elaborar a partir de 1891.
Já em 1997, Engler lança a primeira publicação de um excerto do arquivo
nos Cahiers Ferdinand de Saussure (CFS), n. 50. É parte das “Notas pessoais de
Ferdinand de Saussure sobre a linguística geral”. Depois, em 2002, é publicado
por Simon Bouquet e Rudolf Engler o Escritos de Linguística Geral, traduzido no
Brasil em 2004.

13 “Da essência dupla/a notar”; “Da essência dupla”; “Da dupla essência da (linguagem)”.

6 Todas as Letras, São Paulo, v. 22, n. 2, p. 1-12, maio/ago. 2020


DOI 10.5935/1980-6914/eLETDO2013432
EM QUE CONSISTE A IDENTIDADE LINGUÍSTICA? UMA QUESTÃO SAUSSURIANA

DOSSIÊ

Uma edição crítica dos Escritos é publicada em 2011, pela editora Droz, em
Genebra, ainda sem tradução brasileira. Seu editor, René Amacker (2011), um
dos primeiros pesquisadores a tomar conhecimento dos documentos encon­
trados em 1996, insatisfeito com o trabalho realizado por Bouquet e Engler
(cf. SAUSSURE, 2004 [2002]), lança esse novo trabalho. O título escolhido pro-
cura acolher as variadas anotações de Saussure no arquivo de que falamos:
Science du langage: de la double essence du langage. Édition des Écrits de lin-
guistique générale.
A edição, preparada então sob novas condições, até mesmo com inclusão de
novos itens e levando em consideração as edições alemã e italiana, passou a re-
presentar um instrumento de trabalho mais rico e mais seguro para os estudio-
sos. “Graças a uma contextualização pensada com maturidade, cada fragmento
se encontra assim esclarecido por seus vizinhos” (BÉGUELIN, 2016, p. 129-130).
Dadas as qualidades estruturais e filológicas da nova versão, trabalharemos
no trecho a seguir com a transcrição de Amacker (2011), traduzindo-a14. Ao
apresentar as convenções seguidas na edição, o linguista segue os critérios edi-
toriais elaborados por Marchese (1995) e parte do princípio de que o texto deve
ser “legível sem esforço”. Todas as indicações sobre a sua constituição são dadas
em notas, salvo os seguintes indicadores: ‘[’ (seguido de um fim de linha) = texto
inacabado; ‘[ ]’ = lacuna deixada pelo autor no texto; ‘<...>’ = integração neces­
sária (palavra acrescida ou eventualmente palavra completada pelo editor). De
nossa parte, recorreremos às notas de rodapé, quando necessário.
O manuscrito Ciência da linguagem inclui vários fragmentos que abordam a
questão da identidade linguística, mas pela pertinência às nossas indagações
e propostas em debate, tomamos do manuscrito 372 o fragmento 41 [2.12-14].
Trata-se de um documento extenso em que Saussure extrai as consequências
teóricas e epistemológicas de um projeto de estudo sobre a identidade linguísti-
ca que contemple sincronia e diacronia. Há tanto uma reflexão sobre o momen-
to em que se encontra o trabalho investigativo, assim como o encaminhamento
dos expedientes necessários dali para a frente, sem deixar de exprimir seu ceti-
cismo sobre o futuro.

[2.14] No canto superior do manuscrito, está a nota l: “ler na ordem 14-13-12”.


I Ponto de vista do estado de língua em si mesmo.
Não diferente do ponto de vista instantâneo.
Não diferente do ponto de vista voluntariamente anti-histórico.
Não diferente do ponto de vista semiológico (ou do ponto de vista signo-ideia).
Não diferente do ponto de vista morfológico ou gramatical.
Não diferente dos elementos combinados.
As identidades nesse domínio são fixadas pela relação da significação e do
signo, ou pela relação dos signos entre eles, o que não é diferente.
II Ponto de vista das identidades transversais.
Não diferente do ponto de vista diacrônico.
Não diferente do ponto de vista fonético (ou da figura vocal separada da ideia e
separada da função de signo, o que é a mesma coisa em virtude de I).
Não diferente também do ponto de vista dos elementos isolados.

14 Nos Escritos de Linguística Geral, o excerto escolhido está nas páginas 24 e 25.

Todas as Letras, São Paulo, v. 22, n. 2, p. 1-12, maio/ago. 2020 7


DOI 10.5935/1980-6914/eLETDO2013432
MARIA FAUSTA PEREIRA DE CASTRO

DOSSIÊ

III Ponto de vista cientificamente artificial15


(As identidades desse domínio são dadas, antes de tudo, necessariamente por
aquelas do precedente; mas depois disso elas se tornam a segunda ordem de
identidades linguísticas, irredutível à precedente).
[2.13] III Ponto de vista artificial, voluntário, e puramente didático da PROJE-
ÇÃO de uma morfologia (ou de um “estado de língua” antigo) sobre uma morfo-
logia (ou sobre um outro “estado de língua” posterior).
(O meio pelo qual pode-se operar essa projeção é a consideração das identidades
transversais, II, combinada à consideração morfológica do primeiro estado, –
conforme I).
Não diferente do ponto de vista ANACRÔNICO {RETROSPECTIVO}.
Este ponto de vista é o ponto de vista ETIMOLÓGICO, compreendendo outras
coisas além do que chamamos comumente de etimologia. Uma de suas caracte-
rísticas em relação a IV é de não levar em conta a época B em si mesma.16
IV Ponto de vista HISTÓRICO da fixação de dois estados de língua sucessivos
tomados cada um em si mesmo, em primeiro lugar, e sem subordinação de um
ao outro, seguido de explicação [17
[2.14, margem superior] I e II resultam da natureza dos próprios fatos de
linguagem.
[2.14, margem superior] III e IV resultam das maneiras legítimas de considerar [18
[2.12] Desses quatro pontos de vista legítimos (além dos quais confessamos
nada reconhecer), quase que só o segundo e o terceiro são cultivados. De fato, o
quarto só poderá sê-lo proveitosamente no dia em que o primeiro...[19
Em compensação, é vivamente cultivada a confusão lamentável entre esses di-
ferentes pontos de vista, até mesmo nas obras sustentando as mais altas pre-
tensões científicas. Há, certamente, com muita frequência, uma verdadeira au-
sência de reflexão por parte dos autores. Mas acrescentemos desde já uma
profissão de fé: assim como estamos convencidos, com ou sem razão, que final-
mente será preciso chegar ao ponto de tudo reduzir, teoricamente, aos nossos
quatro pontos de vista legítimos repousando sobre dois pontos de vista neces-
sários, assim também duvidamos que venha a ser possível estabelecer, com
pureza, a quádrupla ou somente a dupla terminologia que seria necessária
(AMACKER, 2011, p. 94-97).
Este manuscrito, na sua transcrição rigorosa, mostra toda a complexidade
de uma operação que vise discernir a identidade de um objeto que serve de sig-
no. Além da minuciosa apresentação de cada ponto de vista e seu escopo de
atuação nessa operação, Saussure procura traçar as linhas de relação entre os
pontos de vista – todos legítimos –, mas nem todos presentes na quádrupla ou,
quando presentes, os autores que se empenharam nessa tarefa são duramente
criticados. Se quase sempre só o segundo e o terceiro são cultivados, Saussure
não deixa de mencionar a relação necessária entre o quarto e o primeiro ponto

15 Item que ainda diz respeito a II, mas acompanhamos a disposição da transcrição de Amacker. Na edição dos Escritos não há o
algarismo romano.
16 Nota de Amacker: esta última frase é um acréscimo parcialmente interlinear, provavelmente posterior à redação do ponto IV.
17 Nota de Amacker: duas linhas e meia em branco.
18 Nota de Amacker: essas adições (posteriores, na minha opinião, ao resto do texto), anotadas no alto das páginas 13 e 14, resu-
mem o exposto ao mesmo tempo que poderiam servir de baliza para os desenvolvimentos previstos, mas não redigidos.
19 Nota de Amacker: há uma linha e meia em branco. Os pontos estão afastados uns dos outros.

8 Todas as Letras, São Paulo, v. 22, n. 2, p. 1-12, maio/ago. 2020


DOI 10.5935/1980-6914/eLETDO2013432
EM QUE CONSISTE A IDENTIDADE LINGUÍSTICA? UMA QUESTÃO SAUSSURIANA

DOSSIÊ

de vista, mas essa dependência não chega a ser totalmente explicitada: “[...] de
fato, o quarto só poderá sê-lo (cultivado) no dia em que o primeiro [...]”.
Seguem duas linhas em branco antes do novo parágrafo. O branco do texto
não deixa de ecoar as palavras de De Mauro sobre o pensamento de Saussure a
respeito do problema da identidade no eixo diacrônico tal como foi relatado na
primeira parte deste trabalho. Entretanto, agora não se trata mais da diacronia
– de identificar o francês chaud ao latim calidus –, a situação é outra: no ponto
de vista histórico, inicialmente, dois estados de língua sucessivos – dois siste-
mas – são tomados cada um em si mesmo, sem subordinação de um ao outro,
“seguido de explicação [”.
E mais uma vez seguem duas linhas e meia em branco. Se o ponto de vista I
é de algum modo essencial na relação com o IV – isto é, para que o IV seja cul-
tivado –, a tarefa de explicitar essa relação, ainda que necessária, não era for-
mulável nos seus termos.
Na sua “profissão de fé”, Saussure enfrenta sem ilusão a tarefa do linguista
ao abordar o seu objeto: declara ter certeza do que deve ser feito e, na mesma
medida, duvida que se possa fazê-lo.
À complexidade da identidade linguística, considerada a partir dos pontos de
vista, acresce-se outra quando o mestre se volta para a perspectiva da identidade
do signo e de sua contraparte, a diferença.
Retomamos neste momento o episódio em que Saussure, ao tratar das diferen-
tes ocorrências da palavra Senhores em uma conferência, afirma que o senti-
mento de identidade persiste apesar das diferenças fônicas facilmente reconhe-
cíveis e conclui com um axioma: “O mecanismo linguístico gira todo ele sobre
identidades e diferenças, não sendo estas mais que a contraparte daquelas”
(SAUSSURE, 2018 [1916], p. 154). A identidade é, nesse caso, assegurada pelo
mesmo valor. Por outro lado, em “son violon a le même son”20, a homofonia não
é suficiente como critério de identidade. Os signos homófonos não são idênticos
se os valores são diferentes.
O termo diferença na formulação saussuriana merece atenção. Se na relação
entre identidades e diferenças estas não são mais do que a contraparte das identi-
dades, qual o modo de relação entre esses dois termos na teorização saussuriana?
Jean Claude Milner (2002), em uma leitura sobre o conceito de diferença no
CLG, mostra em que medida o pensamento saussuriano rompe com as concep-
ções então sustentadas pela filosofia. Acompanhamos Milner.
A lógica escolástica já distinguia entre o próprio e a diferença e, de acordo
com Edmond Globot (1901, p. 408):
O próprio é uma característica que pertence a uma espécie ou indivíduo, e não
se encontra em nenhuma outra espécie ou indivíduo do mesmo gênero. O pró-
prio é, portanto, suficiente para caracterizar a espécie. Entretanto, o distingui-
mos da diferença. A diferença é uma característica ao mesmo tempo própria e
essencial. Uma característica essencial é permanente, ao passo que o próprio
pode ser acidental ou passageiro.
É a partir dessa distinção que Milner encaminha sua reflexão sobre a diferen-
ça no CLG. Ao afirmar que “na língua só existem diferenças” (SAUSSURE, 2018
[1916], p. 167), Saussure assume que as entidades linguísticas devem reter

20 “Seu violão tem o mesmo som”. A homofonia só pode ser escutada em francês.

Todas as Letras, São Paulo, v. 22, n. 2, p. 1-12, maio/ago. 2020 9


DOI 10.5935/1980-6914/eLETDO2013432
MARIA FAUSTA PEREIRA DE CASTRO

DOSSIÊ

apenas as características próprias e essenciais. A ilustração escolhida é dada


pela fonologia de Troubetzkoy: “do fonema, só se retém entre os traços próprios,
os traços essenciais (as diferenças)” (MILNER, 2002, p. 36).
Para compreender todo o alcance da palavra diferença, é preciso acompanhar
Saussure na continuidade do pequeno trecho citado há pouco, quando a ques-
tão do negativo vem se acrescentar ao que se disse sobre a diferença: “na língua
só existem diferenças. E mais ainda: uma diferença supõe em geral termos posi-
tivos entre os quais ela se estabelece; mas na língua há apenas diferenças sem
termos positivos” (SAUSSURE, 2018 [1916], p. 167). Como observa Milner, é aí
que a diferença em linguística “acrescenta à diferença clássica sua própria dife-
rença específica” (MILNER, 2002, p. 36).
Para designar esse modo de funcionamento linguístico específico, Saussure
propõe o nome de valor, que concebemos como o ponto de soldagem entre as
identidades e as diferenças como sua contraparte, pois se o valor é o lugar da
identidade sincrônica, é também o valor que determina o jogo das diferenças
entre os termos que “seriam vazios e indeterminados sem essas diferenças”
(SAUSSURE, 2004, p. 60).
Eis ainda por que as identidades são formuladas como uma complicação fe-
cunda das entidades e das unidades. A teorização saussuriana sobre identida-
des e diferenças introduziu um novo tipo de entidades; se antes, na filosofia, “ser
e ser um, eram propriedades ligadas” (MILNER, 2002, p. 37), para Saussure
“nada é, pelo menos nada é absolutamente (no domínio linguístico)” (SAUSSURE,
2004, p. 74).
A entidade linguística como Saussure a define só existe pelas suas diferen-
ças, sendo assim atravessada por todas as outras entidades da língua, e a uni-
cidade não é mais uma unicidade centrada em torno de um ponto íntimo de
identidade a si; ela passa a ser definida pelo “entrecruzamento de determinações
múltiplas” (MILNER, 2002, p. 37).
Conhecemos a novidade saussuriana: uma entidade pode permanecer idên-
tica mesmo se sua substância material mudou (como o caso das variações da
palavra Senhores) e, inversamente, é possível ver mudar a identidade de uma
entidade cuja substância material permanece a mesma (como os casos de ho-
mofonia, com valores diferentes).
Saussure estava ciente dos passos que deu em direção à ruptura com a tra-
dição filosófica; sua tese pode ser resumida pela fórmula “há disjunção entre
identidade e semelhança” (MILNER, 2002, p. 38).
Acompanhamos, para encerrar, a conclusão de Milner sobre o alcance do
movimento gerado pelo pensamento saussuriano, que afetou o panorama das
ciências humanas, da cultura, da psicanálise à filosofia.

Não se pode imaginar ruptura mais profunda do ponto de vista da tradição filo-
sófica. Quer seja ela idealista ou empirista, esta última com certeza distinguiu
radicalmente entre identidade e semelhança. Mas admitia-se que uma relação
devia subsistir entre as duas: que a semelhança material era um índice – even-
tualmente enganador, mas sempre digno de consideração – de identidade; que
a identidade acontecia de certo modo naturalmente pelas semelhanças. Daqui
por diante, a relação está rompida. Pode-se adiantar que todo o Curso se propõe
a resolver o problema que foi assim formulado. O estruturalismo generalizado,
no que ele tinha de melhor, consistiu em levar a sério essa solução, para explorar

10 Todas as Letras, São Paulo, v. 22, n. 2, p. 1-12, maio/ago. 2020


DOI 10.5935/1980-6914/eLETDO2013432
EM QUE CONSISTE A IDENTIDADE LINGUÍSTICA? UMA QUESTÃO SAUSSURIANA

DOSSIÊ

as diversas possibilidades. Tomado em extensão, o programa poderia se apli-


car a toda espécie de realidade, se se admite (hipótese estruturalista forte) que
toda realidade pode ser considerada do único ponto de vista de suas relações
sistêmicas. Levado ao seu limite extremo, ele conduzia a um novo tipo de onto-
logia (MILNER, 2002, p. 38).

What does linguistic identity consist of? A Saussurean question

Abstract: This work proposes a reflection on the Saussurean concept of linguistic


identity. The Analytical Index of the Cours de Linguistique Générale (2018
[1916]) shows us that the term identity receives only two entries: a chapter on
synchronic identity and another on diachronic identity. Those two topics, however,
open up a universe of great theoretical scope. With the help of other sources of
consultation, our objective is to reflect on the paths pointed out by Saussure to
face the problem of linguistic identity, namely, the issue of the point of view
and the consideration of an entity type that breaks up with the philosophical
tradition.

Keywords: Identity. Difference. Value. Point of view. Synchrony/diachrony.

Referências

AMACKER, R. Science du langage: de la double essence du langage. Genève:


Librairie Droz, 2011.
BACON, F. The philosophical works of Francis Bacon. New York, 2011 [1905].
BÉGUELIN, M. J. Opérer hors de toute étymologie. La diachronie dans L’Essence
double de Ferdinand de Saussure. In: RASTIER, F. De l’essence double et le
renouveau du saussurisme. Limoges: Lambert-Lucas, 2016. p. 123-143.
GODEL, R. Les sources manuscrites du Cours de Linguistique Générale de F. de
Saussure. Genève: Librairie Droz, 1969.
GLOBOT, E. Le vocabulaire philosophique. Paris: Armand Colin, 1901.
MARCHESE, M. P. Ferdinand de Saussure. Phonétique. Il manoscritto di Harvard
Houghton Library bMS Fr 266(8). Firenze: Unipress, 1995.
MILNER, J. C. Le périple structural: figures et paradigme. Paris: Seuil, 2002.
SAUSSURE, F. Ms. fr. 3951, fol. 1v. Bibliothèque de Genève, 1894.
SAUSSURE, F. Cours de Linguistique Générale. Édition critique par Rudolf
Engler. Wiesbaden: Otto Harrassowitz, 1989 [1968].
SAUSSURE, F. Deuxième cours de linguistique générale (1908-1909). Cahiers de
A. Riedlinger e C. Patois. Oxford: Pergamon Press, 1997.
SAUSSURE, F. Escritos de Linguística Geral. São Paulo: Cultrix, 2004.
SAUSSURE, F. Cours de Linguistique Générale. Édition critique par Tullio De
Mauro. Paris: Payot, 2005 [1967].
SAUSSURE, F. Curso de Linguística Geral. São Paulo: Cultrix, 2018 [1916].
SAUSSURE, F. Troisième cours de linguistique général (1910-1911). Cahiers
d’Emile Constantin. Oxford: Pergamon Press, 1993.

Todas as Letras, São Paulo, v. 22, n. 2, p. 1-12, maio/ago. 2020 11


DOI 10.5935/1980-6914/eLETDO2013432
MARIA FAUSTA PEREIRA DE CASTRO

DOSSIÊ

TURRA, M. B. Ferdinand de Saussure e seu saber fazer com a escrita, ou do que


se circunscreve de um enigma. 2018. 205 f. Tese (Doutorado em Linguística) –
Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2018.

TURRA, M. B. Ferdinand de Saussure e seu saber fazer com a escrita, ou do que se


circunscreve de um enigma. 2018. 205 f. Tese (Doutorado em Linguística) –
Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2018.
Anexo
Anexo
Autorização do uso do manuscrito:
Autorização do uso do manuscrito:
Nous vous
Nous vous autorisons
autorisons volontiersvolontiers à publier
à publier cet extrait cetdeextrait
de notes dedenotes de linguistique de
linguistique
Ferdinand de Saussure. Nous vous prions de mentionner
Ferdinand de Saussure. Nous vous prions de mentionner la source de l'image de la
la source de l’image de
la manière suivante: Genève, Bibliothèque de Genève, Ms. fr. 3951, fol. 1v.
manière suivante: Genève, Bibliothèque de Genève, Ms. fr. 3951, fol. 1v.
Vous pouvez vous adresser à notre service de reprographie si vous avez besoin
Vous pouvez vous adresser à notre service de reprographie si vous avez besoin
d’une image au format tiff. Je leur transmettrai le cas échéant votre demande. En
d'une image au format tiff. Je leur transmettrai le cas échéant votre demande. En vous
vous souhaitant franc succès dans votre publication, je vous adresse mes meilleu-
souhaitant franc succès dans votre publication, je vous adresse mes meilleures
res salutations.
salutations.
Paule Hochuli Dubuis
Paule Hochuli Dubuis
Conservatrice
Conservatrice

Département
Département des
des manuscrits manuscrits
mss.bge@ville-ge.ch
mss.bge@ville-ge.ch

Todas as Letras, São Paulo, v. 22, n. 2, p. 1-XX, maio/ago. 2020


DOI 10.5935/1980-6914/eLETDO2013432

12 Todas as Letras, São Paulo, v. 22, n. 2, p. 1-12, maio/ago. 2020


DOI 10.5935/1980-6914/eLETDO2013432

Você também pode gostar