A Psicoterapia Socio-Histà Rica  - Lima e Carvalho
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A Psicoterapia
Socio-Histórica
The Socio-Historical Psychotherapy
Faculdade de
Americana
Artigo
Resumo: Este trabalho teve como objetivo desvelar a possibilidade da aplicação da abordagem socio-
histórica à psicoterapia, e foi realizado através de um ensaio teórico a partir de uma pesquisa bibliográfica
e da análise de publicações de estudiosos da teoria socio-histórica, que compreende o homem a partir da
teoria marxista de que o homem constrói e é construído nas relações sociais. A análise fenomenológica
corroborou a dinâmica da internalização dos conceitos pela pesquisadora, possibilitando a expressão do
que foi entendido ao longo de todo o trabalho através das diferentes categorias em diferentes momentos:
imersão, que é o momento da leitura, discriminação e atribuição de sentidos, referente ao momento de
organização do material de forma subjetiva e singular, e, finalmente, a síntese, que busca a compreensão
geral obtida através das etapas anteriores. Assim, a possibilidade de uma psicoterapia socio-histórica foi
identificada na literatura estudada e analisada pela pesquisadora.
Palavras-chave: Psicologia. Psicoterapia. Fenomenologia. Vygotsky, Lev Semenovich, 1896-1934.
Abstract: This article is the result of a psychology course paper that proposed to reveal the possibility of
applying the socio-historical approach to psychotherapy, since we observed the lack of publications in socio-
historical psychotherapy, for most publications refer only to the educational applications of this theory. The
socio-historical psychology understands man from the marxist dialectic, that assumes that man is constructed
and constituted in social relations. Written as a theoretical essay, we used the method of bibliographical
survey of books and journals produced in Brazil and the analysis of scholar publications on the subject. The
chosen method of analysis was the phenomenological, allowed by the categories: immersion (for the time
of reading), discrimination and assignment senses (regarding the subjective organization of the material) and
synthesis (that seeks general understanding), internalizing the concepts read. This way, the possibility of a
socio-historical approach in psychotherapy was identified and analyzed in the literature.
Keywords: Psychology. Psychotherapy. Phenomelogy. Vygotsky, Lev Semenovich, 1896-1934.
Resumen : Este trabajo tuvo como objetivo desvelar la posibilidad de la aplicación del abordaje socio
histórico a la psicoterapia, y fue realizado a través de un ensayo teórico a partir una investigación bibliográfica
y del análisis de publicaciones de estudiosos de la teoría socio histórica, que comprende el hombre
a partir de la teoría marxista de que el hombre construye y es construido en las relaciones sociales. El
análisis fenomenológico corroboró la dinámica de la internalización de los conceptos por la investigadora,
posibilitando la expresión de lo que fue entendido a lo largo de todo el trabajo a través de las diferentes
categorías en diferentes momentos: inmersión, que es el momento de la lectura, discriminación y atribución
de sentidos, referente al momento de la organización del material de forma subjetiva y singular, y, finalmente,
la síntesis, que busca la comprensión general obtenida a través de las etapas anteriores. Así, la posibilidad de
una psicoterapia socio histórica fue identificada en la literatura estudiada y analizada por la investigadora.
Palabras clave: Psicología. Psicoterapia. Fenomelogía. Vygotsky, Lev Semenovich, 1896-1934
Este trabalho visa a estudar a aplicação da de conclusão de curso (TCC), discutir a teoria
abordagem socio-histórica como psicoterapia socio-histórica, abordagem da Psicologia em
bem como entender a abordagem criada que o homem é compreendido como um
por Vygotsky, uma vez que parte não só do ser ativo no mundo, ou seja, o constitui e
materialismo histórico dialético de Marx e é constituído por ele, dentro de um campo
de conceitos como filogênese, sociogênese pouco divulgado, ou que, pelo menos, possui
e ontogênese, mas apresenta-nos também pouco material científico publicado no que
os conceitos de processos psicológicos se refere ao trabalho clínico, ou psicoterapia.
elementares para explicar que é deles
que descendem os processos psicológicos A Psicologia socio-histórica foi criada em
superiores, e que estes só são possíveis no meio à Revolução Russa. Com base na
momento em que existem os instrumentos teoria marxista, podemos entender isso
e, em consequência, os signos para que ao quando Veer e Valsiner (2001) afirmam que,
mesmo tempo produzam a mediação e, em como aspecto fundamental, Vygotsky usa o
seguida, a internalização. pensamento marxista para dizer que os seres
humanos diferem dos animais no momento
Assim, o presente estudo busca, através de em que têm uma história social e coletiva,
um ensaio teórico inserido em um trabalho não se adaptando passivamente à natureza,
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de significados a partir de suas concepções do diálogo é tão importante; por ser único em
teóricas e subjetivas; por último, o momento cada relação, o terapêutica é quem determina
de síntese, que consiste no mapeamento das os processos de sentido e de significado para a
unidades de sentido obtidas, objetivando produção de novos sentidos de subjetivação),
alcançar a compreensão geral do fenômeno e o objetivo de descobrir as configurações
pesquisado, que parte da própria consciência do sujeito, seguindo hipóteses que só terão
da pesquisadora. sentido através da abertura de zonas de
diálogo, que vão além de histórias narradas
Análise e discussão pelo sujeito.
A partir da análise fenomenológica, foi possível Bock (2007) afirma que os psicólogos que
atribuir sentido aos seguintes conceitos: atuam nessa vertente trabalham para romper
de acordo com Rego (1995), o intuito de os processos de fragilização no sujeito, já
Vygotsky não era apenas desenvolver uma que a saúde psicológica do sujeito está na
teoria sobre o desenvolvimento infantil, mas possibilidade de enfrentar cotidianamente
sobre o desenvolvimento humano, por isso seu contexto, interferindo nele, construindo
recorre à infância, e justifica sua posição soluções para os conflitos que se apresentam.
dizendo que o estudo da criança reside no O psicólogo, por exemplo, intervém na
fato de ela estar no centro da pré-história busca da construção de sentidos, isto é, nos
do desenvolvimento, principalmente pelo registros que o sujeito faz do seu contexto,
surgimento de instrumentos e da fala. registros esses que podem ser as fontes de
sua fragilidade.
Sendo assim, Marangoni (2006) afirma que
a psicoterapia socio-histórica atua a partir Gonzáles-Rey (2007) acrescenta que o
da compreensão do contexto social dos psicoterapeuta deve ser um facilitador de
sujeitos, da interação de acontecimentos novas produções subjetivas alternativas que
sociais, econômicos e políticos bem como permitam novos processos de subjetivação.
constitutivos, e, de modo dialético, também Essa subjetivação deve transformar-se
constituintes dos sujeitos; assim, retira em ações pelas quais o sujeito se torne
do sujeito o prognóstico de que suas responsável, produzindo ele mesmo novos
dificuldades são causas intrínsecas e isoladas espaços de sentido subjetivo.
em si mesmas.
Para tanto, é preciso levar em consideração
Nesse sentido, a psicoterapia socio-histórica o estilo de vida dos sujeitos da psicoterapia,
é também interação social. Gonzáles- entendendo seu estilo de vida como um
Rey (2001) acrescenta a isso pontos que “sistema de atividades que configuram a
influenciam a prática nessa perspectiva, como organização da vida cotidiana, o que constitui
a subjetividade construída historicamente, a uma fonte relevante na configuração dos
ênfase no caráter singular, a consideração sentidos subjetivos das pessoas e dos espaços
da subjetivação bem como dos sentidos de relação” (Gonzáles-Rey, 2007, p.172).
e dos significados gerados nas relações, o
reconhecimento do caráter constitutivo das Dias e Gonzáles-Rey concordam quando
patologias, a dúvida que o psicoterapeuta dizem que o psicólogo faz o papel de
detém o poder supremo, isso porque a mediador, dando sentido ao problema do
psicoterapia é um processo dialógico para paciente, nomeando sentimentos, auxiliando
que surjam mudanças produzidas a partir de na identificação de sentidos subjetivados e
uma relação dialógica (por isso a qualidade trabalhando junto na construção de novos
Psicólogo como mediador
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J
e do mundo, nomeação, que consiste em
a importância dos conceitos de Vygotsky,
descrever e nomear o acontecer referido,
como, por exemplo, a internalização, ou
repetição, que tem o objetivo de produzir
seja, através da mediação do psicoterapeuta,
maior verbalização, ou mesmo para o
significados antes interpsicológicos passam a
sujeito perceber sua fala através do outro,
ser intrapsicológicos. Técnic
marcação, que tem o intuito de não deixar as
verbai
1“Um dos três no vazio a palavra do outro, ou seja, apoia
Com isso, seguem algumas técnicas usadas s
modelos de conduta o diálogo, mas sem interromper o fala do em
do Dasein: Eigenwelt. na psicoterapia socio-histórica: França (s/d) psicot
sujeito, generalização, que procura reduzir erapia
É o mundo-do- também considera importante observar a
si-mesmo. O a ansiedade, demonstrando semelhança
autoconhecimento
realidade do sujeito e a forma como ele
de determinada ação em outros humanos,
é uma qualidade percebe suas experiências, para que, a
eco-emocional, que auxilia o sujeito a dar
-
=
usado com crianças).
ser-em-si-mesmo. pelo sujeito ao longo de sua vida, e a
O Eigenwelt, ou
mundo-do-si-mesmo, despotencialização, relativa à diminuição
Dias contribui com o modelo relacional
tem também duas da potência de comportamentos ideais e
formas possíveis: (a) -
dialógico, que trata do privilégio do acesso
a forma singular, e (b)
fossilizados.
- à pessoa total em um sentido psico-
a forma anônima” (cf.
Sá,2008). socio-emocional, e ainda integrando o
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sua experiência, para que tenha, assim, a que usam os conceitos criados por Vygotsky e
capacidade de produzir sentidos subjetivos aplicam-nos em seu trabalho clínico. Temos,
alternativos àqueles relacionados ao seu portanto, a resposta para nossa pergunta
sofrimento. inicial: Sim, é possível a psicoterapia socio-
histórica, porque, na literatura pesquisada,
Ratner (1995) concorda com Gonzáles- encontramos psicólogos que trabalham com
Rey acrescentando que a Psicologia socio- essa temática, apresentando os procedimentos
histórica é capaz de explicar a loucura e embasando-se teoricamente na abordagem
ou psique geradora de danos bem como socio-histórica.
os outros fenômenos psicológicos, pois
entende-se que o funcionamento gerador Mas também foi encontrada uma escassez
de danos segue os mesmos princípios socio- de material sobre o tema separadamente,
históricos do funcionamento saudável. ou seja, encontra-se o tema em meio a
outros conceitos de Vygotsky, explicando
Gonzáles-Rey (2011) acrescenta que o seu trabalho da forma como é utilizado
transtorno mental não é uma doença de fato, na Psicologia social ou na Psicologia
no sentido biológico, mas é, na verdade, uma educacional, o que nos remete a outra
configuração subjetiva em processos da vida questão deste trabalho: talvez alguns
atual do sujeito, e que vão sendo acrescidos profissionais que trabalhem com essa
sentidos subjetivos a esses processos. Assim, abordagem não divulgam seus métodos ou
nessa perspectiva, toma-se o cuidado de não produzem artigos científicos.
ir além das classificações centradas apenas
nas patologias, dando ênfase ao trabalho
psicoterapêutico, isso porque se reconhece
que as atividades e as relações do sujeito
sempre encontrarão formas de subjetivação,
ou de capacidade geradora. De acordo
com Gonzáles-Rey, “a capacidade geradora
do sujeito é inseparável da produção de
novos sentidos subjetivos de novas práticas.
Esse processo é essencial na definição da
psicoterapia e geral a todos os campos de
práticas humanas” (2007, p.199).
Considerações finais
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