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3 - Portal TBC

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INSTITUTO

FEDERAL
BAHIA

PROGRAMA DE DOUTORADO MULTI-INSTITUCIONAL E MULTIDISCIPLINAR


EM DIFUSÃO DO CONHECIMENTO

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA – UFBA


INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIENCIA E TECNOLOGIA DA BAHIA – IFBA
LABORATÓRIO NACIONAL DE COMPUTAÇÃO CIENTÍFICA – LNCC/MCT
UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA – UEFS
CENTRO UNIVERSITÁRIO SENAI CIMATEC

IVANA CAROLINA ALVES DA SILVA SOUZA

DESIGN COGNITIVO COLABORATIVO PARA AMBIENTES


VIRTUAIS: O CASO DO PORTAL TBC CABULA

Salvador, Bahia
Março/2018
IVANA CAROLINA ALVES DA SILVA SOUZA

DESIGN COGNITIVO COLABORATIVO PARA AMBIENTES


VIRTUAIS: O CASO DO PORTAL TBC CABULA

Tese apresentada ao Programa de Doutorado


Multidisciplinar e Multi-Institucional em
Difusão do Conhecimento, como requisito
para a obtenção do grau de doutora.

Orientadora: Profª Drª Francisca de Paula


Santos da Silva
Co-Orientador: Profº Drº Alfredo Eurico
Rodrigues Matta

Salvador, Bahia
Março/2018
SIBI/UFBA/Faculdade de Educação – Biblioteca Anísio Teixeira

Souza, Ivana Carolina Alves da Silva.


Design cognitivo colaborativo para ambientes virtuais [recurso eletrônico] :
o caso do Portal TBC Cabula / Ivana Carolina Alves da Silva Souza. - Dados
eletrônicos. - 2018.
1 CD-ROM : il. ; 4 ¾ pol.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Francisca de Paula Santos da Silva.


Coorientador: Prof. Dr. Alfredo Eurico Rodrigues Matta.
Tese (Doutorado Multi-institucional e Multidisciplinar em Difusão do
Conhecimento) – Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Educação,
Salvador, 2018.

1. Portais da Web. 2. Design. 3. Portal TBC - Cabula (Salvador, BA). 4.


Comunidades de prática. 5. Ambientes virtuais compartilhados. 6. Cabula
(Salvador, BA) – Aspectos sociais. I. Silva, Francisca de Paula Santos da. II.
Matta, Alfredo Eurico Rodrigues. III. Universidade Federal da Bahia.
Faculdade de Educação. Programa de Doutorado Multi-institucional e
Multidisciplinar em Difusão do Conhecimento. IV. Título.

CDD 004.65 - 23. ed.


DESIGN COGNITIVO COLABORATIVO PARA AMBIENTES
VIRTUAIS: O CASO DO PORTAL TBC CABULA

IVANA CAROLINA ALVES DA SILVA SOUZA

Tese apresentada ao Programa de Doutorado Multi-institucional e Multidisciplinar em


Difusão do Conhecimento, da Universidade Federal da Bahia, como pré-requisito para
obtenção do título de Doutora em Difusão do Conhecimento.

Aprovada em ___ de _______ de______

Banca Examinadora

_______________________________________________________________________
Francisca de Paula Santos da Silva – Orientadora (UNEB)
Doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia, Brasil.

_______________________________________________________________________
Alfredo Eurico Rodrigues Matta - Co-orientador (UNEB)
Doutor em Educação pela Universidade Federal da Bahia, Brasil.

_______________________________________________________________________
António Manuel Quintas Mendes - Membro externo (UAB Portugal)
Doutor em Educação pela Universidade Aberta de Portugal, Portugal.

_______________________________________________________________________
Lynn Rosalina Gama Alves - Membro externo (UFBA)
Doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia, Brasil.

_______________________________________________________________________
Tereza Kelly Gomes Carneiro - Membro externo (Uncisal)
Doutora em Difusão do Conhecimento pela Universidade Federal da Bahia, Brasil.

_________________________________________________________________________
Hugo Saba Pereira Cardoso - Membro interno (UNEB)
Doutor em Difusão do Conhecimento pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), Brasil.
Dedico este trabalho à comunidade do Cabula e
entorno, Salvador-Ba, em especial, aqueles que,
gentilmente, compartilharam seu tempo, suas
ideias e seus sonhos na busca por valorização da
dos saberes e fazeres produzidos nessa localidade
remanescente de quilombo.
AGRADECIMENTOS

E a travessia chegou ao seu fim. Não poderia concluí-la sem agradecer a todos e todas que
vieram comigo nessa embarcação. Parceiros e colaboradores com os quais desfrutei de bons
momentos, mas que também foram apoio para superar as tantas tempestades e os mares
revoltos navegados nesse período.

Começo agradecendo a Deus, força maior que me sustenta e me faz acreditar na vida a cada
amanhecer. Sopro que me impulsionou sempre quando desistir era o caminho mais
convidativo.

Ao mestre Jesus e aos amigos espirituais, mãos invisíveis que me conduziram e inspiraram
boas ideias.

À minha avó Andrelina Silva (Andi) in memorian, que apesar da distância física esteve
ativamente presente em minhas lembranças, meus pensamentos e sonhos. Obrigada pela
grande referência que é na minha vida. Tenho certeza que independente de onde esteja está
feliz por essa conquista.

À Maria Amélia Silva e Isvan Souza, por terem aceitado a missão de serem meus pais.
Obrigada pelo esforço e anos devotados à mim e à minha irmã Daniele Souza. Hoje colhemos
os bons frutos da nossa formação moral e intelectual. Agradeço pela mulher e profissional que
vocês ajudaram a esculpir. Nada seria possível sem a dedicação, o incentivo e a fé que
depositaram em mim.

Ao meu marido Eliezer Pereira, meu grande consolador, que com sua paciência e escuta
amorosa esteve sempre presente nas horas mais difíceis, enxugando as minhas lágrimas,
compreendendo as minhas constantes ausências ainda que tenham sido tão recorrentes.

Às amigas do coração, Débora Benvenutti, Janaína Amorin e Vanessa Meneghetti. Amigas


fiéis nas alegrias e nas tristezas. Agradeço por serem responsáveis por sinalizar sempre que é
possível existir vida social no doutorado, ainda que nem sempre eu tenha me rendido a esse
prazer. Do mesmo modo, agradeço pelas palavras de incentivo e pelos momentos de
refazimento das energias.

Também agradeço ao Centro de Pesquisa e Desenvolvimento Comunidades Virtuais (CV),


espaço que me acolheu e me iniciou para a vida acadêmica e me proporcionou experiências
profissionais e afetivas memoráveis, as quais levo sempre no meu coração e no meu ser
acadêmico.

À Tatiana Paz, uma grande amiga que apesar da distância geográfica sempre arranja um jeito
de estar presente, seja nos telefonemas ou mensagens instantâneas, com conselhos
providenciais.

À Isa Coutinho pelas importantes colaborações sobre a escala de likert e pela escuta
consoladora já nos últimos momentos de finalização da tese.
Às amigas do SSEETU, Katiane Alves, Helaine Pereira, Luciana Martins e Iala Queiroz, que
de modo solidário e colaborativo foram essenciais nesse estudo. Agradeço pela partilha nos
momentos de descontração, nas atividades de extensão e nas construções acadêmicas. Não
poderia deixar de agradecer também ao querido Caio Vilas Bôas, figura inteligente com quem
eu muito aprendi sobre TBC e trabalho com comunidade, obrigada pelas conversas filosóficas
e interrogações provocativas, e, também, pela companhia divertida nas andanças pelo Cabula.

Aproveito também para agradecer àqueles com os quais convivi na sala de pesquisa,
compartilhando conhecimentos, mas, também, almoços coletivos e momentos agradáveis.
Deixo aqui meus agradecimentos à Joelma Cerqueira, Josenilda Mesquita, Kelly Ornellas,
Ana Carla Santos, Lázaro Souza e Ivandson Macedo.

Aos bolsistas e monitores de extensão que direta ou indiretamente colaboraram com esta
pesquisa. Em especial, Douglas Pena e Luana Assis.

Agradeço ao CNPQ pelo financiamento a este estudo e à Capes pela bolsa usufruída até o
segundo ano do doutorado, incentivos fundamentais para o desenvolvimento desta tese.

A todos os desenvolvedores que colaboraram nos distintos momentos deste estudo, Gesoaldo
Alves, Thiago Nunes, Marcel Souza e, em especial, à equipe da Soterotech, nas pessoas de
Mariano Maia e Fernando Cruz, por finalizarem o protótipo em acordo com as nossas
demandas com muita disponibilidade e profissionalismo.

Aos companheiros da turma do DMMDC 2014.1, Amanaiara Miranda, Dilson Rapkiewicz,


Angela Ribeiro, Adelmo Xavier, Adilson da Paz, o “Peixinho”, Ana Lúcia, Cinara Meireles,
Jéssica Andrade e Joabson Guimarães pelas lutas compartilhadas nos desafios apresentados
nas disciplinas.

Um agradecimento especial à Hildete Costa, por quem nutri carinho e admiração. Agradeço
pelos seus conselhos, pelo seu conhecimento compartilhado sobre a pesquisa em arquivos, a
ancestralidade africana e pela figura doce e cuidadosa que és.

Agradeço também à querida Cristina Santigo, pessoa alto astral e super prestativa,
companheira de caronas e orientações providenciais sobre a DBR e a vida.

Aos professores Terezinha Fróes Burnham, Dante Galeffi e Eduardo Oliveira, exemplos de
humildade e inspiração para um fazer acadêmico humano.

A todos e todas colaboradores (as) desta pesquisa, que em diferentes ciclos compartilharam de
maneira voluntária suas ideias e desejos para a maior visibilidade cultural do Cabula e
entorno. Agradeço, especialmente, ao colaborador Enéas Andrade, mobilizador nato, sempre
disponível desde o princípio deste estudo e, ao professor Antonio Jorge Nascimento, figura de
relevância local, obrigada por partilhar a sua motivação e sabedoria.

Aos membros da banca, professores, António Manuel Quintas, Tereza Kelly Carneiro e Hugo
Saba, por aceitarem avaliar esse trabalho trazendo ponderações valiosas. Um carinhoso
agradecimento a professora Lynn Alves, grande amiga e mãe acadêmica que me acompanha
desde a iniciação científica, motivando e inspirando pela sua competência e humildade,
obrigada pelo apoio constante e pelo aceite em participar da banca.

Ao co-orientador, professor Alfredo Matta, pelas conversas provocativas e as tantas


interrogações que, por vezes, me desconsertaram mas me levaram a importantes avanços e
descobertas nesse percurso. Obrigada pelas ideias e pelo diálogo sempre otimista.

Agradeço imensamente à minha orientadora Francisca de Paula Silva, primeiro por ter
acreditado em mim desde a graduação em turismo, me incentivando a trilhar o caminho
acadêmico. Obrigada por me acolher novamente enquanto orientanda e compartilhar comigo a
sua grande paixão que é o TBC no Cabula e entorno. Agradeço pela confiança e as
importantes contribuições para o desenvolvimento deste trabalho e para a minha formação
acadêmica.
SOUZA. Ivana Carolina Alves da Silva. Design Cognitivo Colaborativo para Ambientes Virtuais:
o caso do Portal TBC Cabula. 264 f. il. 2018. Tese (Doutorado) – Faculdade de Educação, Doutorado
Multidisciplinar e Multi-institucional em Difusão do Conhecimento. Universidade Federal da Bahia,
Salvador, 2018.

RESUMO

Esta tese apresenta o estudo e o aprofundamento acerca de soluções de design cognitivo


aplicáveis em ambientes virtuais que primam por processos de conhecimento. Para efeitos
desta pesquisa utilizou-se como caso de aplicação o Portal Turismo de Base Comunitária –
TBC Cabula, ambiente virtual que busca dar visibilidade às produções da comunidade do
Cabula e entorno, de modo a favorecer a valorização comunitária e a mobilização para o
turismo de base comunitária nessa localidade. Diante desse contexto, o objetivo da tese foi
construir e aplicar um design cognitivo colaborativo ao Portal TBC Cabula, a fim de analisar
o seu potencial de socialização de saberes e fazeres da/sobre essa localidade. A pesquisa situa-
se no campo interdisciplinar, estabelecendo interface com áreas das ciências humanas e
ciências sociais aplicadas, pois agrega a) visão aprofundada sobre as formas de produção de
conhecimento e aprendizagem estabelecidas nas comunidades de prática; b) princípios
teórico-práticos para o desenvolvimento de sistemas e ambientes virtuais cognitivos; c)
formas de colaboração entre os saberes populares e os saberes acadêmicos. A metodologia
adotada tomou como inspiração a abordagem Design Based Research (DBR), cuja natureza
processual e colaborativa favorece o desenvolvimento de soluções tecnológicas adequadas a
problemas reais. Os resultados apresentados demonstram que as soluções de Design
Cognitivo Colaborativo desenvolvidas e aplicadas ao Portal TBC Cabula, potencializam a
socialização de saberes e fazeres do Cabula e entorno ao agregar a esse ambiente virtual uma
estrutura de interação e informação flexível, contextualizada e atenta às demandas da
comunidade, que ancora-se nos princípios de comunicação comunitária, participação criativa
e interatividade.

Palavras-chaves: Design Cognitivo Colaborativo. Portal TBC Cabula. Comunidades de


prática. Cabula e entorno.
SOUZA. Ivana Carolina Alves da Silva. Design Cognitivo Colaborativo para Ambientes Virtuais:
o caso do Portal TBC Cabula. 264 f. il. 2018. Tese (Doutorado) – Faculdade de Educação, Doutorado
Multidisciplinar e Multi-institucional em Difusão do Conhecimento. Universidade Federal da Bahia,
Salvador, 2017.

ABSTRACT

The present thesis seeks the study and the deepening on solutions of cognitive design
applicable in virtual environments that excel by processes of knowledge. For the purposes of
this research, the Community Based Tourism Portal - TBC Cabula, a virtual environment that
seeks to give visibility to the production of the community of Cabula and its surroundings,
was used as an application case in order to favor community appreciation and mobilization for
tourism. community base in that locality. In view of this context, the objective of the thesis
was to construct and apply a collaborative cognitive design to the TBC Cabula Portal, in order
to analyze its potential to socialize knowledge and actions of / about this locality. The
research is located in the interdisciplinary field, establishing an interface with areas of human
sciences and applied social sciences, since it adds a) an in-depth view on the forms of
production of knowledge and learning established in the communities of practice; b)
theoretical-practical principles for the development of systems and virtual cognitive
environments; c) forms of collaboration between popular knowledge and academic
knowledge. The methodology adopted was Design Based Research (DBR), whose procedural
and collaborative nature favors the development of technological solutions appropriate to real
problems. The results presented demonstrate that the Cognitive Collaborative Design
solutions developed and applied to the Cabula TBC Portal, enhance the socialization of
Cabula knowledge and practices and surroundings by adding to this virtual environment a
structure of interaction and information that is flexible, contextualized and attentive to the
demands of the community, which is anchored in the principles of community
communication, creative participation and interactivity.

Palavras-chaves: Design Cognitivo Colaborativo. Portal TBC Cabula. Comunidades de


prática. Cabula e entorno.
SUMÁRIO

1 Introdução 19
1.1 Memórias formativas 20
1.2 Delimitação da pesquisa 24
1.2.1 Abordagem metodológica 25
1.2.2 O locus e os colaboradores 28
1.2.3 Instrumentos de pesquisa 32

2 Contexto sócio-histórico 37
2.1 Cabula e entorno: uma delimitação espacial 38
2.2 Um legado tupinambá? 42
2.3 As contribuições étnicas dos povos bantos e sudaneses 48
2.4 Heranças quilombolas: vestígios dos séculos XVIII e XIX 52
2.5 Cabula rural: apogeu e declínio 58
2.6 Ecos da urbanização 64
2.7 De quilombo à zona de especulação imobiliária 70

3 Cabula, uma comunidade em movimento 76


3.1 Produção sócio-cognitiva entre emergências e rupturas 83
3.2 Comunidade: um conceito polissêmico 87
3.3 Comunidades de prática 91
3.4 Um olhar sobre a práxis nas comunidades prática 94
3.5 Diálogos em ensino, pesquisa e extensão 98

4 Princípios teóricos de um portal web comunitário 105


4.1 O portal web como mediador de informação e Conhecimento 106
4.1.1 O Portal TBC Cabula 110
4.2 Por um design cognitivo de base colaborativa 117
4.3· Comunicação comunitária 121
4.4 Participação criativa: interfaces entre: a participação, colaboração 126
e cooperação
4.5 Interatividade 130

5 Mapeando um processo de construção colaborativa 139


5.1 Análise contextual 140
5.2 Design 143
5.2.1 Comunidades de prática acadêmicas 147
5.2.2 Comunidades de prática locais 159
5.3 Prototipagem 176
5.3.1 Um modelo construído à várias mãos 184

6. Percursos avaliativos 194


6.1 Procedimentos de avaliação 194
6.2 1º Ciclo de avaliação 196
6.3 2º Ciclo de avaliação 200
6.3.1 Perfil dos avaliadores 202
6.3.2 Categoria Comunicação Comunitária 205
6.3.3 Categoria interatividade 212
6.3.4 Categoria participação criativa 217
6.4 Design Cognitivo Colaborativo: limites e potencialidades à sua 222
aplicação ao Portal TBC Cabula

Conclusão 233
Referências 240
Anexo A – Parecer Consubstanciado do Comitê de Ética 248

Apêndice A - Termo de consentimento livre e esclarecido 249

Apêndice B – Questionário de Avaliação do Portal TBC Cabula 252


LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

19 BC 19º Batalhão de Caçadores do Exército

ANAÍ-BA Associação Nacional de Apoio ao Índio, capítulo Bahia

AVA Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA);

BCZB Biblioteca Comunitária Zeferina-Beiru (BCZB)

BNH Banco Nacional de Habitação

CDI Centro de Documentação e Informação Luiz Henrique Dias Tavares

CdP Comunidades de Prática

CEP Comitê de Ética em Pesquisa envolvendo seres humanos

CHACM Conjunto Habitacional Antonio Carlos Magalhães

CHOPM Cooperativa Habitacional dos Oficiais da Polícia Militar

CMA Comunicação , militância e atitude

CNPq Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento Científico

COAPPES Núcleo de Cooperação e Ações em Políticas Públicas e Economia


Solidária

COELBA Companhia de Eletricidade do Estado da Bahia

Conder Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia

COOFE Cooperativa Múltiplas Fontes da Engomadeira

CSU/Narandiba Centro Social Urbano de Narandiba

Cultarte Coletivo Arte e Cultura do Cabula

DBR Design Based Research

DC Design Cognitivo
DCC Design Cognitivo Colaborativo

DT Design Thinking (DT),

EAD Educação à distância


EBA Escola de Belas Artes

ECT Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos

EMBASA Empresa Baiana de Águas e Saneamento

EPUCS Escritório de Planejamento e Urbanismo da Cidade de Salvador

ETBCES Encontro de Turismo de Base Comunitária e Economia Solidária

FANKEP Fanfarra Kleber Pacheco

FAPESB Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia


GICDL Gestão da Informação para a Cidadania e Desenvolvimento Local
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IBOPE Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística

IHAC Instituto de Humanidades, Artes e Ciências

IHC Interação Humano Computador

INOCOOP Instituto Nacional de Orientação às Cooperativas Habitacionais

ITCP Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares

ITCP/COAPPES) Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares/Núcleo de


Cooperação e Ações em Políticas Públicas e Economia Solidária

MCTI Ministério da Ciência Tecnologia e Informação


NUPE Núcleo de Pesquisa e Extensão

ONG´s Organizações Não Governamentais

PDDU Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano

PGDR Programa de Mestrado em Políticas Públicas, Gestão do Conhecimento


e Desenvolvimento Regional

PLANDURB Plano de Desenvolvimento Urbano para Salvador

PNAD Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio

PPG Pró-Reitoria de Pesquisa e Ensino de Pós-Graduação

PPGAV Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais

PPGEduC Programa de Pós-Graduação em Educação e Contemporaneidade

PROEX/UNEB Pró Reitoria de Extensão da Universidade do Estado da Bahia


RA Regiões Administrativas

Rede Educa Sociedade em Rede Pluralidade Cultural e Conteúdos Digitais


Educacionais

RPG Role Playing Game

RTUARSS Roteiros Turísticos Alternativos, Responsáveis, Sustentáveis e


Solidários

SBDI Sociedade Brasileira de Design da Informação

SIM Sistema Municipal de Informação de Salvador

SSEETU Sociedade Solidária, Educação, Espaço e Turismo

SSP-BA Secretaria de Segurança Pública do Estado da Bahia

TBC Cabula Turismo de Base Comunitária no Cabula e entorno

TBC Turismo de Base Comunitária

TELEBAHIA Telecomunicações da Bahia

TIC Tecnologias de Informação e Comunicação

UATI Universidade Aberta à Terceira Idade

UFBA Universidade Federal da Bahia

UNEB Universidade do Estado da Bahia

URBIS Habitação e Urbanização da Bahia S. A

ZDP Zona de Desenvolvimento Proximal


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Ciclos iterativos da DBR 28


Figura 2 Locus da pesquisa 30
Figura 3 Demarcação oficial dos bairros da poligonal de estudos do 40
Projeto TBC Cabula
Figura 4 Localidades do Ciclo da Mina, Século XIX 52
Figura 5 Cabula e áreas circunvizinhas 56
Figura 6 Bairro de Sussuarana (1974) 68
Figura 7 Bairros Pernambués e Fazenda Grande do Retiro 69
(respectivamente) entre os anos 1970 e 1980
Figura 8 Bairro do Cabula em 1959 71
Figura 9 Vista aérea do Cabula, em 2016 71
Figura 10 Produção da aprendizagem e conhecimento em 93
comunidades de prática
Figura 11 Construção do conhecimento numa perspectiva praxiológica 97
Figura 12 Estrutura básica de um portal web 108
Figura 13 Home Page do blog TBC 111
Figura 14 Primeira versão do Portal TBC Cabula 111
Figura 15 Mapa conceitual / Design cognitivo 118
Figura 16 Interatividade segundo a concepção dialética/dialógica 134
Figura 17 Design da tese 136
Figura 18 Problemas na interação com o Portal TBC Cabula 148
Figura 19 Sugestões de solução acadêmico-comunitárias 150
Figura 20 Convite às colaboradoras SSEETU 152
Figura 21 Resumo da reunião com as colaboradoras SSEETU 154
Figura 22 Roda interativa com estudantes de turismo e hotelaria da 156
UNEB, 2016
Figura 23 Soluções construídas pelos estudantes de turismo e 157
hotelaria da UNEB
Figura 24 Banners de divulgação do Domingo Alternativo 163
Figura 25 Banners de mutirões e ações da biblioteca Zeferina-Beiru 167
Figura 26 Primeiro diálogo via web com a BCZB 168
Figura 27: Segundo diálogo via web com a BCZB 169
Figura 28: Roda de Conversa com com o Coletivo Cultarte 173
Figura 29 Proposta colaborativa do Cultarte 174
Figura 30 Programação visual do Portal TBC Cabula – dez de 2015 179
Figura 31 Telas do Portal TBC Cabula disponível em setembro de 2016 180
Figura 32 Mapa de interação do Portal TBC Cabula 190
Figura 33 Portal TBC Cabula versão 2017 191
Figura 34 Convite Whatsapp 197
Figura 35 Conversas no Whatsapp grupo TBC Cabula 197
Figura 36 Prints do Grupo do Whatsapp 198
Figura 37 Prints do Grupo do Whatsapp 198
Figura 38 Espaço Colabore com a sua informação 219
Figura 39 Espaço Fala Comunidade 220
Figura 40 Pontos fortes e sugestões de melhoria para o Portal TBC Cabula 221
Figura 41 Representação do DCC 223
Figura 42 Potencialidades das soluções de DCC para o Portal TBC Cabula 225
Figura 43 Projeções futuras para o Portal TBC Cabula 227
LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Características da DBR 26


Quadro 2 Ciclos de desenvolvimento da pesquisa 27
Quadro 3 Colaboradores da pesquisa x ciclos da pesquisa 30
Quadro 4 Bairros mais populosos da localidade do Cabula e entorno 39
Quadro 5 As fases de ocupação urbana do Cabula e entorno 41
Quadro 6 Ciclos do tráfico na Bahia 48
Quadro 7 Conjuntos Habitacionais construídos pela URBIS na área do Cabula 65
Quadro 8 Estatísticas do Cabula e entorno 76
Quadro 9 Comunidades de práticas do Cabula e entorno por bairros 78
Quadro 10 Principais tipologias de portais web 109
Quadro 11 Formulário de diagnóstico do Portal TBC Cabula 2014/2015 114
Quadro 12 Quadro comparativo entre interação reativa/mútua 132
Quadro 13 Colaboradores do ciclo de design 145
Quadro 14 Roteiro das rodas de conversa 146
Quadro 15 Resumo Roda de conversa – SSEETU e Rede Educa 151
Quadro 16 Resumo Roda de conversa – Orientandas do Grupo de Pesquisa SEETU 154
Quadro 17 Resumo Roda de conversa – Estudantes do curso de Turismo e 158
Hotelaria da UNEB
Quadro 18 Quadro resumo – Roda de Conversa com o Projeto Cidadão 162
Quadro 19 Quadro resumo – Roda de Conversa com o Projeto Domingo 166
Alternativo
Quadro 20 Quadro resumo roda de conversa com o Coletivo Cultarte 175
Quadro 21 Ideias construídas nas rodas de conversa 182
Quadro 22 Soluções de DCC para o Portal TBC Cabula 185
Quadro 23 Matriz central para análise dos dados 195
Quadro 24 Comunicação Comunitária – soluções x sub-categorias de análise 206
Quadro 25 Interatividade – soluções x sub-categorias de análise 213
Quadro 26 Participação Criativa – soluções x sub-categorias de análise 218
Quadro 27 Outras soluções propostas 230
LISTA DE TABELAS E GRÁFICOS

Tabela 1 Escala de avaliação 201


Gráfico 1 Bairros dos avaliadores residentes do Cabula e entorno 203
Gráfico 2 Nível de escolaridade dos avaliadores que moram no Cabula e entorno 204
Gráfico 3 Profissões dos avaliadores 204
Gráfico 4 Avaliação dos itens relacionadas ao princípio comunicação comunitária 207
Tabela 2 Pontos fortes relacionados ao princípio comunicação comunitária 208
Tabela 3 Pontos a melhorar relacionados ao princípio comunicação comunitária 210
Gráfico 5 Avaliação dos itens relacionadas ao princípio interatividade 214
Tabela 4 Pontos fortes relacionados ao princípio interatividade 215
Gráfico 6 Avaliação dos itens relacionadas ao princípio participação criativa 218
Tabela 5 Pontos a melhorar relacionados ao princípio participação criativa 220
“O PRINCÍPIO”

“‘O escrevente escreve antes, o leitor lê depois’. ‘Não!’, lhe respondo, ‘Não consigo escrever
sem pensar você por perto, espiando o que escrevo. Não me deixe falando sozinho’. Pois é;
escrever é isso aí: iniciar uma conversa com interlocutores invisíveis, imprevisíveis, virtuais
apenas, sequer imaginados de carne e osso, mas sempre ativamente presentes. Depois é
espichar conversas e novos interlocutores surgem, entram na roda, puxam outros assuntos.
Termina-se sabe Deus onde.”

“Se esse é agora meu ponto de partida, como cheguei a ele? Há aqui toda uma história [...]”

Mário Osório Marques (2008, p.15 e p.19)


19

CAPÍTULO I

1 Introdução

Compreender a pesquisa acadêmica como um ato aberto e polifônico é,


primeiramente, uma atitude desafiadora diante de um sistema acadêmico que ainda legitima o
clássico modus operandi de se fazer pesquisa, no qual, pesquisadores e pesquisados devem
estabelecer relações de neutralidade. Buscando construir uma via alternativa a esse cenário,
em que a pesquisa desponta como tarefa predominantemente solitária e introspectiva, este
estudo foi construído tomando como referência a metáfora da conversa.
Nesse sentido, parafraseando Marques (2008), no decurso desses 4 anos de pesquisa
doutoral, puxamos conversa fora com variados interlocutores. Andamos por caminhos que
nos conduziram a leituras, reescritas e (in) conclusões, afinal, o ato de pesquisar é tarefa
nunca conclusa. É estado latente de refazimento e interlocução.
Portanto, considerando a natureza da caminhada que culmina nesta tese, pedimos
licença ao caro leitor para desenvolvermos este texto na primeira pessoa do plural. Não adotar
essa escolha seria o mesmo que se contrapor aos caminhos até aqui percorridos, os quais
firmaram compromisso com o trabalho colaborativo, a valorização e o reconhecimento das
distintas vozes interlocutoras.
O presente estudo nasce de uma trajetória de quase 9 anos de investigação na área de
educação, tecnologias e cultura digital, por isso, se faz importante, em princípio, compreender
o lugar em que se situa a pesquisadora que ora escreve, quem mediou os diálogos e teceu as
tramas entre as distintas vozes partícipes do processo investigativo. Tal posicionamento, diz
respeito aos aspectos gnosiológicos da pesquisa, isto é, as implicações e relações existentes
entre o sujeito cognoscente - quem busca conhecer -, e o objeto cognoscível – o que pode ser
conhecido.
Partindo desse pressuposto, seguiremos às primeiras conversas revisitando os
percursos de formação que aproximaram esta pesquisadora do objeto investigado: o design
cognitivo colaborativo que foi desenvolvido e aplicado ao Portal TBC Cabula.
20

1.1 Memórias Formativas

Imergir no universo das práticas comunitárias significa desvendar as conexões


existentes entre distintos fenômenos sociais e humanos. Nesses enredamentos, figuram as
matizes do cotidiano que trazem “à baila” histórias e marcas de pessoas, comunidades,
contextos e iniciativas, geralmente invisíveis ao reconhecimento oficial. Muito embora,
exalem uma significativa força criativa e um conhecimento autêntico, capazes de engendrar
processos cognitivos tão ricos quanto aqueles desenvolvidos nos espaços formais de
aprendizagem e construção do conhecimento.
Esse olhar nasce das andanças acadêmicas realizadas na Universidade do Estado da
Bahia (UNEB), no período de 2006 à 2013, entre a graduação em Turismo e Hotelaria e o
Mestrado em Educação e Contemporaneidade. Nessa trajetória, a área do Cabula e entorno,
além de ser parte da paisagem cotidiana, lugar de trânsito e vivência diário; por vezes, foi
palco de importantes descobertas pessoais e profissionais. Realizadas por meio de práticas de
pesquisa e extensão desenvolvidas por docentes e discentes; e, também, pelos movimentos
sociais, educativos e culturais que adentravam os muros da referida instituição.
Momentos como esses mobilizaram o desejo de imergir nesse locus e revelaram que
além do receio e dos muros existentes entre a UNEB e a sua vizinhança, se configura uma
rede dinâmica, ainda invisível ao olhar da comunidade ampliada, embora impregnada de
iniciativas e produções relevantes, nas quais estão enlaçados conhecimentos de distintas
naturezas e modos de organização peculiares de uma localidade onde diferentes bairros estão
conectados.
Situada na periferia urbana de Salvador, entre a BR- 324 e a Avenida Paralela, a área
do Cabula e entorno, cuja história de ocupação urbana é marcada pela segregação
socioespacial, possui um extenso território (FERNANDES, 2000). Tal amplitude, inclusive,
gera controvérsias quando se trata de sua delimitação. A referida área será compreendida
nesse estudo, como uma localidade que engloba dezessete bairros vinculados, histórica e
culturalmente, a saber: 1) Arenoso; 2) Arraial do Retiro; 3) Beiru-Tancredo Neves; 4) Cabula;
5) Doron; 6) Engomadeira; 7) Estrada das Barreiras; 8) Fazenda Grande do Retiro; 9) Mata
Escura; 10) Narandiba; 11) Novo Horizonte; 12) Resgate; 13) Saboeiro; 14) São Gonçalo; 15)
Saramandaia; 16) Sussuarana e 17) Pernambués.
São comunidades populosas, que embora fragilizadas pelos problemas oriundos da
ausência/limitação de serviços públicos básicos, dispõem de um valioso acervo de práticas
sócio-culturais, as quais exprimem histórias negadas e exteriorizam valores, subjetividades,
21

conceitos de caráter religioso, político, cultural e social. Tal dinâmica confirma o que Fróes
Burnham (2000) diz sobre a articulação existente entre sujeitos de diferentes comunidades
para a criação de alternativas de formação e aprendizagem de seus membros, que ajudam a
socializar o saber historicamente produzido, a construção pessoal do conhecimento e a
produção de identidades coletivas.
Tais pressupostos nos permitem compreender os saberes e fazeres dos moradores do
Cabula e entorno como interfaces que definem novas formas de conhecimento, estabelecidas
mediante as relações de interação entre os sujeitos, organizações, comunidades de prática e o
ambiente que compõe a referida localidade. Essa dinâmica produtiva, além de fazer sentido na
vida dos moradores locais se constitui em importante conexão para edificarmos a nossa
realidade e motivo para reconhecermos nesse movimento outras formas de produção
cognitiva, que continuam à margem dos saberes instituídos. Por isso, a necessidade de
pensarmos em mecanismos de difusão desse contexto de produção emergente em
comunidades como o Cabula e entorno.
A consolidação desse olhar provém da imersão nas leituras e práticas realizadas no
âmbito da cultura digital no Mestrado em Educação e Contemporaneidade (UNEB), linha de
pesquisa currículo e processos tecnológicos. As bases da educação, que foram posteriormente
aprofundadas na licenciatura em pedagogia, contribuíram para ampliar as percepções tecidas
na graduação em turismo e hotelaria e sinalizaram a cultura digital como um possível ponto
de conexão entre esses campos do conhecimento.
Observamos assim, que os movimentos culturais, as histórias de pessoas comuns, o
conhecimento do cotidiano, as expressões artísticas e toda aquela gama de elementos que
mobilizaram a construção de uma ponte entre o turismo e a educação, agora também
encontravam no ciberespaço e nas interfaces da cultura digital um ambiente de atuação e
propagação. Museus virtuais, aplicativos mobile, redes sociais digitais, portais web, dentre
outras aplicações tem legitimado esse movimento cultural e inventivo escondido no calor do
dia a dia; privilegiando autores e artistas anônimos; histórias e pessoas comuns e estruturando
uma dinâmica instituinte em constante ebulição na rede.
Esses horizontes construídos no intervalo entre a graduação em Turismo e Hotelaria e
o Mestrado em Educação encontraram vazão na proposta do Doutorado Multidisciplinar e
Multi-Institucional em Difusão do Conhecimento, em vista das afinidades identificadas.
Assim sendo, o projeto de pesquisa construído revelou os interesses delineados no decorrer
desse percurso e o desejo em trabalhar com a comunidade do Cabula e entorno numa
perspectiva de difusão de suas produções, práticas e experiências por meio da web.
22

Com o ingresso no doutorado e a partir da imersão no grupo de pesquisa Sociedade


Solidária, Educação, Espaço e Turismo (SSEETU), em 2014, a proposta inicialmente
aprovada foi reconfigurada e ampliada, adequando-se às intenções do macro projeto Turismo
de Base Comunitária (TBC) no Cabula e entorno, que conduz as atividades de pesquisa,
ensino e extensão do mencionado grupo. Esse projeto compreende o TBC como uma nova
forma de conceber a atividade turística, que respeita e valoriza o patrimônio da comunidade
receptora, tornando-a protagonista na gestão dos bens e lucros gerados de maneira
colaborativa e visando o desenvolvimento sustentável. Seria, portanto, uma proposta que
encontraria solo fértil na referida localidade, em vista de seu potencial cultural.
A fim de fortalecer o processo de implantação dessa forma de planejar o turismo, nas
imediações da UNEB, o Portal TBC Cabula apresenta como uma das suas principais frentes
de atuação, a socialização dos saberes e fazeres produzidos pela comunidade do Cabula e
entorno, bem como as iniciativas de pesquisa e extensão que tomam essa localidade como
locus de produção de conhecimentos, a exemplo daquelas desenvolvidas nos 14 eixos de
atuação do mencionado projeto:

1. Meio Ambiente, Ecologia Social e Ecoturismo;


2. Políticas Públicas, Desenvolvimento Local e Regional;
3. Educação Formação e Cidadania;
4. Comunicação Comunitária;
5. Memória, História, Patrimônio e Cultura;
6. Lazer, Esporte e Entretenimento;
7. Tecnologias Educativas;
8. Inclusão Sóciodigital;
9. Cooperativismo, Economia Solidária, Tecnologia Social e Inovação;
10. Turismo de Base Comunitária;
11. Território e Espaço Urbano;
12. Design e Sustentabilidade;
13. Saúde Coletiva;
14. Linguagem e Culturas Afro e Afrobrasileiras.

Diante desse contexto, esta pesquisa busca contribuir para que o Portal TBC Cabula
seja um vetor de mobilização do Turismo de Base Comunitária na referida localidade ao
desenvolver os primeiros contornos de um design cognitivo, capaz de potencializar um
23

ambiente de interação, colaboração e socialização dos saberes e fazeres da/sobre o Cabula e


seu entorno.
Ao imergir nas comunidades parceiras do projeto TBC Cabula, ambientando-se com
as ações já desenvolvidas pelo grupo de pesquisa, seguido da realização de diagnóstico do
ambiente virtual pesquisado, ficou patente a percepção do mencionado portal enquanto um
espaço com potencial colaborativo, implícito nas operações em curso, mas que não atingia
plenamente os objetivos traçados pelo TBC Cabula. Embora julguemos relevantes as
intervenções que vinham sendo realizadas no sentido de divulgar as produções comunitárias e
acadêmicas, o diagnóstico indicou algumas carências que impossibilitavam o pleno
funcionamento do ambiente; aspectos como a limitada estrutura interativa e informativa; a
ausência de uma equipe multidisciplinar de gerenciamento e as mínimas fontes de
financiamento, repercutiam negativamente nas estratégias de gestão, relacionamento e
inclusão da comunidade no processo de construção da informação veiculada, dentre outros
fatores que serão arrolados no decorrer do texto.
O diagnóstico realizado permitiu o melhor delineamento do problema dessa pesquisa,
e nos conduziu a perceber a inexistência de um design cognitivo capaz de potencializar o
referido ambiente como vetor de mobilização do TBC no Cabula e entorno e a socialização de
saberes e fazeres locais. O design cognitivo é um mecanismo que possibilita planejar,
organizar e desenhar processos de aprendizagem, construção, socialização, difusão do
conhecimento e demais processos cognitivos que se queira implementar.
Pensando no potencial dessa especialidade pretendemos conceber um design cognitivo
construído com representantes do Cabula e entorno, o que inclui moradores, produtores locais
e demais agentes afinados à causa do turismo de base comunitária nessa localidade, a fim de
gerarmos soluções contextualizadas e sintonizadas aos interesses coletivos. A relevância
científica e social desta pesquisa garantiu a aquisição de fonte de financiamento por meio de
edital de nº 25/2015 Ciências Humanas e Ciências Sociais Aplicadas lançada em parceria com
o Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento Científico (CNPq) e o Ministério da
Ciência Tecnologia e Informação (MCTI).
Importante ressaltar que as demandas apresentadas não se sustentam com soluções
pautadas na replicação de modelos de similares de sucesso ou apenas com intervenções
técnicas uma vez que requerem intervenções pautadas em um olhar científico e sistêmico,
amparado por um planejamento de pesquisa coerente e delimitado como demostraremos
adiante.
24

1.2 Delimitação da Pesquisa

Considerando o cenário apresentado, esta pesquisa busca trazer soluções para a


seguinte pergunta investigativa: como um design cognitivo colaborativo (DCC) aplicado ao
Portal TBC Cabula, pode potencializar a socialização de saberes e fazeres da/sobre essa
localidade? Nesse sentido, com o intuito de apontar possibilidades a esse problema, traçamos
como objetivo geral: construir e aplicar um design cognitivo colaborativo ao Portal TBC
Cabula, a fim de analisar o seu potencial de socialização de saberes e fazeres da/sobre essa
localidade.
O alcance desse objetivo se estabeleceu mediante a execução dos seguintes objetivos
específicos:
a) Investigar princípios que orientem a construção de um design cognitivo colaborativo para
o Portal TBC Cabula, sintonizado ao contexto da localidade estudada;
b) Elaborar mecanismos que favoreçam a participação dos colaboradores na construção de
soluções para o Portal TBC Cabula;
c) Modelar as soluções cognitivas construídas, aplicá-las ao Portal TBC Cabula e validá-las
junto aos colaboradores do processo;
d) Analisar as possibilidades geradas para potencializar a socialização de saberes da/sobre
essa localidade.
As diretrizes definidas para estruturarmos o design cognitivo do Portal TBC Cabula,
além de atender aos objetivos apresentados estão coerentemente sintonizadas às bases
epistemológicas desta pesquisa, a praxiologia. Tal perspectiva é orientada por uma linha
humanista, social e ética de valorização das construções, experiências e contextos populares.
Nesse sentido, o compromisso do pesquisador, embora imerso em um contexto do qual não é
pertencente, é despir-se dos trajes de estrangeiro, que apenas observa e descreve o desenrolar
dos fatos e apreender o cenário da pesquisa, interagindo com os sujeitos e objetos que dele
fazem parte; de modo a estabelecer uma relação ética e potencializadora da mudança
(NETTO, 2011).
Tal posicionamento implica em compreender a pesquisa não enquanto a produção
isolada do pesquisador com a sua consciência ou fruto de operações “iluminadas”
parafraseando Netto (2011), mas trata-se de valorizar pressupostos reais, forjados na ação
recíproca, intersubjetiva e intercontextual, focada na construção de um conhecimento que se
dá na relação entre a reflexão, a tomada de consciência e a transformação de realidades.
25

Em coerência com esses princípios, o argumento da tese foi desenvolvido a partir dos
diálogos tecidos com as obras de Freire (1986), Castells (1998, 2000), Wenger (1998), Santos
(2001), Vygotsky (2008), Fróes Burnham (2012) e outros autores que centram seus estudos
nas práticas e contextos de produção populares. Desse modo, optamos pela escolha de autores
que consideram as interações e práticas dos sujeitos envolvidos, a construção e o intercâmbio
de conhecimento entre contextos. Como reflexo desses parâmetros, construímos conexões e
argumentos que sinalizaram a abordagem metodológica aplicada como um cenário coerente e
afinado aos nossos propósitos.

1.2.1 Abordagem metodológica

Considerando a sua natureza aplicada, interessada no desenvolvimento de soluções


para contextos reais, cabe destacar a relevância social deste estudo, já que intenta deixar uma
contribuição para a comunidade do entorno da Universidade onde a pesquisa se realiza, bem
como visa a aproximação entre os saberes acadêmicos e aqueles forjados na vida prática. Do
mesmo modo, ressaltamos a sua relevância científica, pois favorece o desenvolvimento de
outras formas de se fazer pesquisa, ao adotar uma postura metodológica contra-hegemônica e
de natureza aplicada, extrapolando a análise teórica e propondo uma articulação entre a
prática e a teoria no campo das ciências sociais aplicadas e ciências humanas.
Nesse sentido, o desenvolvimento metodológico da presente tese tomou como
inspiração a abordagem metodológica também conhecida como Design Based Research
(DBR). De acordo com Matta, Silva e Boaventura (2014), esse termo criado por Kelly (2003)
está relacionado a outras denominações em inglês, bem como, Formative Research,
(NEWMAN, 1990); Design Experiments (BROWN, 1992); Development Research (VAN
DEN AKKER, 1999); Design Research (REEVES; HERRINGTON; OLIVER, 2005) e
Developmental Research (MCKENNEY; VAN DEN AKKER, 2005). Ainda segundo esses
autores, tais termos são usados para designar uma maneira alternativa de se fazer pesquisa
aplicada; necessidade que surge a partir da inadequação dos modelos de pesquisa aplicada
típicos das ciências naturais e exatas ao campo da ciências humanas e sociais.
A DBR se apresenta como uma inovadora abordagem de investigação que reúne as
vantagens das metodologias qualitativas e quantitativas focalizando no desenvolvimento de
aplicações que possam ser realizadas e, de fato, integradas às práticas sociais comunitárias,
considerando sempre sua diversidade e propriedades específicas. (MATTA; SILVA;
26

BOAVENTURA, 2014). De maneira semelhante, Amiel e Reeves (2008), concebem tal


abordagem como uma metodologia apta a mobilizar problemas complexos de contextos reais,
em colaboração com diferentes atores engajados; para isso, integra princípios de design
hipotético no desenvolvimento de soluções tecnológicas adequadas aos problemas
investigados.
Essa abordagem metodológica conduz um processo de pesquisa rigoroso e reflexivo
fundamentado em testes e aperfeiçoamentos contínuos voltados para a elaboração de
ambientes cognitivos inovadores, bem como a definição de novos princípios para o projeto
em desenvolvimento. Nesse sentido, podemos relacionar tais características ao foco central
dessa tese: a construção de uma solução tecnológica adequada (design cognitivo colaborativo
aplicado ao Portal TBC Cabula) às demandas (socialização de saberes, fazeres locais e ações
do TBC Cabula) apresentadas pela comunidade (agentes do Cabula e entorno)
Importante salientar que a DBR tem seus estudos originais voltados à inovação
tecnológica no campo educacional, fato perceptível nos trabalhos que a tomam como norte
metodológico, a exemplo das contribuições dos autores anteriormente mencionados. No
entanto, aqui propusemos uma adaptação ao campo interdisciplinar, no qual se situa a
presente pesquisa, mais especificamente em diálogo com disciplinas inseridas na área das
ciências humanas e ciências sociais aplicadas, a exemplo da pedagogia; tecnologias de
informação e comunicação aplicadas à educação, comunicação, design, ciências sociais e
turismo. Essa adaptação foi feita considerando as características da DBR elencadas no quadro
a seguir, as quais afinizam com os pressupostos orientadores deste estudo.

Quadro 1: Características da DBR

Teoricamente Utiliza a teoria como fundamento para a construção do design ou


orientada da proposta prática sugerida, mas também é estudada,
retroalimentada e melhorada à medida que os resultados vão
sendo obtidos.

Intervencionista Busca o diálogo com o contexto de aplicação para se construir o


produto ou proposta da pesquisa. Começa, portanto, mediante a
identificação de uma situação contextual, que necessita de uma
intervenção e resultados práticos.

Colaborativa Requer a colaboração de todos os envolvidos na pesquisa:


investigador, comunidade e pessoas que se relacionam à ideia.
Assim, para que os resultados sejam validados e reconstruídos,
27

todos os envolvidos, de maneira colaborativa precisam estar


engajados no problema e no contexto.

Fundamentalmente Necessita do diálogo entre o conhecimento teórico, o saber


responsiva prático dos sujeitos envolvidos no processo investigativo e as
validações diversas realizadas no campo.

Iterativa Propõe uma abordagem baseada em ciclos, assim, cada


desenvolvimento será produto de uma etapa, de um processo e,
necessariamente, será o início do próximo momento de
aperfeiçoamento e refinamento das soluções construídas, o que
lhe confere caráter formativo.

Fonte: a autora, a partir dos estudos de Van der Akker et al (2006) citado por Matta; Silva e Boaventura (2014)

As características apresentadas no quadro 1 permitem à DBR estabelecer uma


articulação com outros métodos investigativos. Dessa forma nos interessam as técnicas
comuns à pesquisa ação participante, pois inspiram uma perspectiva crítica e uma ideia de
intervenção social, dando outro sentido à pesquisa acadêmica puramente analítica, além de
permitir o desenvolvimento de uma ação sobre a realidade, ao incitar nos sujeitos envolvidos
– inclusive o pesquisador – a auto descoberta e a descoberta dos outros, através de um
processo coletivo de ressignificações (BRANDÃO, 1981, 2006). Ainda segundo tal autor,
esse tipo de movimento investigativo condiz a um repertório múltiplo de experiências de
criação coletiva e que supõe o rompimento da relação sujeito-objeto no interior de processos
que engendram saberes e conhecimentos e aspiram transformações a partir destes, tal como
preconiza a DBR.
Outro aspecto relevante da abordagem metodológica adotada é a sua forma de
aplicação que obedece à etapas cíclicas, isto é, baseada na contínua reconfiguração dos
caminhos adotados na pesquisa. Logo, os ciclos de análise, design, prototipagem, avaliação e
revisão são iterados até que se chegue a um equilíbrio adequado às condições e necessidades
da pesquisa, conforme dinâmica representada a seguir.
28

Figura 1: Ciclos iterativos da DBR

Fonte: Plomp (2006)

Segundo Plomp (2006) existem variações entre os autores quanto ao detalhamento do


que consiste cada uma das etapas da DBR, contudo, há uma concordância geral de que nessa
metodologia o processo é fundamentado em ciclos que se retroalimentam. Abordagens dessa
natureza oferecem flexibilidade aos procedimentos de investigação, pois permitem a
adequação às variadas situações que a pesquisa revela. A sequência cíclica representada na
figura 1 demonstra a emergência dos desenhos investigativos da DBR, pois vão se elaborando
à medida que a pesquisa avança; os questionamentos e as reconstruções são permanentes e
ocorrem em função da descoberta de elementos e interpretações novas.
Com base nos estudos de Wademan (2005), Reeves (2006), Van der Akker et al
(2006); Matta, Silva e Boaventura (2014), apresentamos no quadro 2, o detalhamento dos
ciclos e a síntese das ações metodológicas que efetivamos para o desenvolvimento da
pesquisa.
29

Quadro 2: Ciclos de desenvolvimento da pesquisa

CICLOS DA AÇÕES REALIZADAS / INSTRUMENTOS DE CAPÍTULOS


OBJETIVOS
DBR PESQUISA DA TESE
1ª Análise -Analisar o contexto em que a -Pesquisa bibliográfica sobre as bases teóricas do 2E3
Contextual problemática da pesquisa se estudo;
insere, -Pesquisa documental em fontes como inventários,
certidões, escrituras e outros documentos sobre a
-Realizar diagnóstico do Portal localidade do Cabula e entorno;
TBC Cabula; -Levantamento da história oral com moradores
antigos da comunidade.
-Desenvolver articulação teórica -Observação direta do Portal TBC Cabula e registro
contextual; em ficha de diagnóstico.
-Interação e registro do processo de desenvolvimento
do Portal TBC Cabula

2ª Design/ -Definir os princípios de design -Pesquisa bibliográfica sobre os princípios de design 4, 5 e 6


Prototipagem para o Portal TBC Cabula adequados ao contexto e as pretensões da pesquisa
-Rodas de conversa com os colaboradores do estudo
-Consultar os sujeitos situados para validação da proposta inicial e construção
no contexto, para colaboração colaborativa;
com o design cognitivo do Portal -Análise teórico-contextual para a elaboração do
TBC Cabula projeto de design a partir das sugestões escutadas.

-Elaborar o projeto de design


cognitivo do Portal TBC Cabula
3ª Aplicação/ -Implementar o projeto de -Implementação tecnológica do projeto de design 6
Avaliação design cognitivo. cognitivo construído;
-Acompanhamento e registro sistemático das
-Acompanhar, registrar e evoluções do portal.
30

analisar as possíveis mudanças, -Análise do feed back dos colaboradores e interatores


permanências e dificuldades do Portal TBC Cabula, por meio de formulário de
geradas pelo novo design avaliação online.
cognitivo.

-Verificar e analisar o feed back


dos colaboradores e interatores
do Portal TBC Cabula sobre o
novo design cognitivo

4ª Revisão -Refinar os resultados obtidos -Revisão e refinamento do design cognitivo a partir 6E


pós-implementação do novo das sugestões dos colaboradores e interatores do CONCLUSÃO
design cognitivo Portal TBC Cabula.

-Refletir e documentar os -Registro e documentação dos avanços obtidos e das


avanços obtidos no decorrer do demandas não atendidas com vistas à produção de
processo de elaboração do novas práticas, aplicações e teorias
design cognitivo

Fonte: a autora, a partir dos estudos de Wademan (2005), Reeves (2006), Van der Akker et al (2006); Matta, Silva e Boaventura (2014)
31

Para chegarmos à configuração de pesquisa apresentada no decorrer desse intertítulo e


sintetizada no quadro 2, utilizamos um desenho metodológico aberto, que adquiriu distintos
traçados à medida que o estudo foi sendo desenvolvido, isto é, a partir das contribuições dos
interlocutores, das discussões teórico-práticas, dos refazimentos necessários, assim como das
possibilidades e limitações impostas pelo contexto e pelas condições da pesquisa. As
aberturas que a DBR oferece compreendem um diferencial deste processo investigativo,
especialmente, quando se insere em um locus de pesquisa tão multifacetado quanto ao deste
estudo.
Desenvolver um processo de escuta e co-construção com sujeitos tão diversos, imersos
em campos de atuação variados foi uma missão desafiadora, que nos exigiu um olhar sensível
e o exercício de transmutar-se sem perder de vista o foco da pesquisa. De que maneira
escutar, registrar e sistematizar vozes com tons tão distintos sem perder a harmonia dos
princípios da pesquisa? Isso implicou em tentativas, refinamentos e recomeços permitidos
graças às características da DBR, mas também do esforço de reconhecer os co-autores do
Design Cognitivo Colaborativo (DCC), compreendendo onde se situam do ponto de vista
prático, em qual campo atuam, dentre outros aspectos, que apontaram o caminho mais
adequado para identificarmos as ideias/sugestões dos colaboradores.

1.2.2 O locus e os colaboradores

O locus da pesquisa representa o espaço onde a ação investigativa se desenvolve. É


nesse ambiente que pesquisadores e colaboradores interagem, trocam questionamentos,
contribuições e se engajam visando a elaboração de soluções para o problema investigativo.
No caso deste estudo, consideramos a existência de dois locus de pesquisa interligados: um
macro e um micro locus.
O macro locus compreende o Cabula e entorno bem como, os espaços de atuação dos
diferentes agentes que constituem e constroem essa localidade, a exemplo de moradores,
instituições, coletivos de produção e, também, o Projeto TBC Cabula. Já o micro locus
representa o espaço interativo do Portal TBC Cabula validado pelos colaboradores e
interatores, cujas contribuições foram analisadas com vistas ao desenvolvimento de novas
intervenções. Trata-se, portanto de locus interdependentes, bem como representado na figura
2.
32

Figura 2: Locus da pesquisa

Fonte: a autora

É válido esclarecer que a presente pesquisa de doutorado está vinculada ao Projeto de


Pesquisa e Extensão Turismo de Base Comunitária na Região do Cabula e entorno, submetido
à Plataforma Brasil e cumpre, portanto, os requisitos estabelecidos pelo Comitê de Ética em
Pesquisa envolvendo seres humanos (CEP), conforme parecer disposto em anexo.
Em vista da necessidade de preservar a diversidade característica do locus da pesquisa
e, simultaneamente, delimitar um recorte capaz de favorecer a sua viabilidade, organizamos
os colaboradores do estudo por grupos de afinidade, considerando os seus potenciais de
colaboração. Desse modo, cada grupo, com sua peculiaridade, colaborou em ciclos
específicos da investigação, através da mediação de distintos instrumentos de pesquisa bem
como sistematizado no quadro a seguir.

Quadro 3: Colaboradores da pesquisa x ciclos da pesquisa

GRUPOS CICLOS DA INSTRUMENTOS


PESQUISA DE PESQUISA
G1 Antigos Moradores com faixa Análise
moradores da etária entre 40 e 70 anos contextual
localidade que tiveram suas
identidades preservadas.

G2 Comunidades de Coletivos de produção Design /


prática locais engajados nas causas Prototipagem
locais e na proposta do e Avaliação
TBC no Cabula
-Projeto Domingo
Alternativo (Beiru)
-Biblioteca Zeferina- Rodas de conversa
Beiru (Arenoso)
33

-Coletivo Cultarte
(Pernambués)
-Projeto Cidadão (Cabula
I)

G3 Comunidades de Professores, estudantes, Design /


prática técnicos e representantes Prototipagem
acadêmicas da comunidade e Avaliação
responsáveis pela
pesquisa e
desenvolvimento do
Projeto TBC Cabula

Estudantes do curso de
turismo e hotelaria da
UNEB
G4 Profissionais de Profissionais liberais da Aplicação / Reuniões sistemáticas e
desenvolvimento área de design e Revisão registro e
tecnologia da
informação, que
colaboraram no
desenvolvimento e
aplicação do protótipo.

G5 Colaboradores do -Biblioteca Zeferina- Avaliação Questionário de


ciclo de Beiru (Arenoso) avaliação online
design/prototipag -Coletivo Cultarte
em (Pernambués)
-Projeto Cidadão (Cabula
Interatores do I)
Portal TBC
Cabula Interatores do Portal
TBC Cabula, vinculados
ou não ao contexto da
pesquisa.
Fonte: a autora

Importante esclarecer que as contribuições dadas por cada grupo de colaboradores


estão em conformidade com as suas vivências, assim como o raio de atuação em que se
inserem. Nesse sentido, importante esclarecer, que o grupo 1, formado por antigos moradores
locais colaboraram, com o compartilhamento da história oral da localidade, informações não
encontradas em registros documentais e que foram fundantes para compreendermos o
contexto da pesquisa e entendermos a atual situação dessas dezessete comunidades. Não
participaram, portanto, dos demais ciclos da pesquisa.
34

A opção por reunir, no grupo 2, comunidades de prática locais engajadas no


atendimento às demandas comunitárias e no processo de implementação do TBC no Cabula se
justifica, pela capacidade de agregação e mobilização que esses grupos mantém em suas
comunidades, sendo, portanto, potenciais mobilizadores da causa TBC e, consequentemente,
importantes interlocutores para o portal ora investigado. Do mesmo modo, foi necessário
incluir no processo investigativo, o grupo 3, formado pelos pesquisadores e técnicos
vinculados ao projeto TBC Cabula, a fim de construirmos outras vias de articulação
comunidade-academia com vistas à popularização da proposta de TBC por meio do Portal. Os
grupos 2 e 3, portanto, ofereceram informações relevantes nos ciclos de design/prototipagem
e avaliação.
Os profissionais de desenvolvimento, organizados no grupo 4, assumiram papel ativo
no ciclo de aplicação do projeto de design cognitivo e se responsabilizaram pela elaboração e
refinamento do protótipo, ou seja, traduzir em linguagem de programação visual o projeto
construído com os colaboradores. Já o grupo 5 teve característica mista, ou seja, reuniu além
de alguns colaboradores do ciclo de design e prototipagem, moradores do Cabula e entorno e,
também, de outras localidades da cidade de Salvador, que se dispuseram a interagir e avaliar o
Portal TBC Cabula por meio de questionário online divulgado no ambiente e em distintas
redes sociais digitais.
A escolha pela formação desse último grupo nasceu do desejo de atingirmos sujeitos
que não participaram do ciclo de design/prototipagem, fossem eles moradores ou não. A
intenção foi de ampliarmos o raio de avaliação do Portal, especialmente, por ser este ambiente
virtual um pretenso canal de comunicação do Cabula e entorno com a comunidade ampliada,
por isso, a importância de escutarmos também a perspectiva do visitante virtual, potencial
visitante da comunidade do Cabula e entorno. A colaboração dos sujeitos foi viabilizada
mediante a aplicação de diferentes instrumentos de pesquisa, bem como apresentaremos
adiante

1.2.3 Instrumentos de pesquisa

Conforme elucidamos no quadro 3, para cada grupo de sujeitos foram utilizados


instrumentos de pesquisa específicos, que atenderam às características de cada coletivo, a
saber:
35

a) Rodas de conversa

As rodas de conversa foram o principal instrumento de pesquisa utilizado no


desenvolvimento do presente estudo. Seguindo a linha de atuação do projeto TBC Cabula que
adota desde 2010 esse instrumento de interação e compartilhamento com as comunidades do
Cabula e entorno, replicamos essa técnica e incluímos novos elementos, quando se fez
necessário em algumas ocasiões do ciclo de design/prototipagem, o que rendeu a algumas
rodas realizadas o caráter de oficina temática.
Esse tipo de instrumento, comum nas metodologias participativas permite que os
sujeitos engajados no processo investigativo expressem, de maneira democrática, suas
impressões, conceitos, opiniões e concepções sobre o tema proposto, além de favorecer o
trabalho reflexivo sobre as ideias apresentadas pelo grupo, por meio de uma atmosfera de
informalidade e descontração. (MELO; CRUZ, 2014).
Afonso e Abade (2008) destacam que as rodas de conversa possuem seu referencial
teórico ancorado em áreas como a psicologia social, a educação e a psicanálise, tendo por
objetivo a constituição de um espaço onde seus participantes reflitam acerca de suas vivências
e relações com o mundo, seu trabalho e projetos de vida. Para que isso ocorra, os autores
enfatizam a necessidade de proporcionar um clima confortável e de acolhimento aos
participantes, para isso, é possível utilizar recursos lúdicos, técnicas de dinamização e outros
elementos. Atentos a esses aspectos, realizamos as rodas de conversa na própria comunidade,
mais especificamente, no âmbito em que eram desenvolvidas as práticas dos colaboradores do
estudo, utilizando, primordialmente, o recurso da oralidade e o registro em áudio e fotografia,
apenas quando autorizado.
Importante destacar que também utilizamos como técnica de pesquisa, a observação
assistemática, seja nas ocasiões de roda de conversa ou quando da participação em
eventos/atividades realizadas nas comunidades, que oportunizaram maior aproximação com
os colaboradores e vivências em locus. A imprevisão e o desconhecimento sobre as
características da dinâmica estabelecida nas situações com os colaboradores, nos levaram a
optar por esse tipo de observação, a qual não dispõe de planejamento ou controle previamente
elaborados, conforme sinaliza Rampazzo (2005). O referido autor ainda salienta que a
observação assistemática exige uma atitude de prontidão do pesquisador que precisa estar
atento aos detalhes e preparado para os imprevistos da situação de pesquisa.
36

b) Questionário de avaliação

Outro instrumento adotado foi o questionário de avaliação, aplicado com o intuito de


permitir que os interatores do Portal TBC Cabula avaliassem as soluções implementadas.
Nesse sentido, elaboramos um questionário misto com perguntas de múltipla escolha,
perguntas abertas e outras seguindo a escala de likert com 5 níveis.
O questionário (ver apêndice A) foi desenvolvido por meio da plataforma Google
Drive e organizado em cinco blocos. No primeiro bloco estão perguntas de múltipla escolha e
de respostas curtas sobre os dados pessoais do avaliador e demais informações que nos
permitiram traçar um breve perfil de conexão destes. Do bloco 2 ao 4 foram elaboradas
perguntas conforme modelo de escala likert, com o objetivo de verificar junto aos avaliadores
as aplicações relacionadas aos princípios de design definidos: comunicação comunitária,
interatividade e participação criativa, princípios estes que se constituem em categorias de
análise da tese. O quinto e último bloco corresponde às perguntas abertas nas quais, o
avaliador apontou os aspectos positivos e pontos a melhorar identificados no Portal TBC
Cabula, assim como dar sugestões de aperfeiçoamento para o ambiente.
Considerando o escopo apresentado, a tese está organizada em seis capítulos e uma
conclusão. O presente capítulo – Introdução, apresenta ao leitor as memórias formativas
desta autora e sua relação com o objeto estudado, além de elucidar o escopo da pesquisa,
incluindo o desenvolvimento da problemática, objetivos, escolha epistemológica e
metodológica.
No Capítulo 2 – Contexto sócio-histórico, iniciamos o ciclo de análise contextual, ao
desvendarmos a trajetória de constituição sócio-histórica do Cabula e entorno, a fim de
compreender a essência inerente à tal localidade e como essas bases refletem na dinâmica de
produção das comunidades de prática locais. Dessa forma, estabelecemos interlocução com
autores como Fernandes (2003); Reis (2003) (2008); Nicolin (2007) e Martins (2013) (2017);
Fechando o ciclo de análise contextual, no Capítulo 3 – Cabula, uma comunidade em
movimento, imergimos no contexto de produção atual do Cabula e entorno, centrando-se no
esforço de análise teórica sobre as dinâmicas produtivas impulsionadas pelas comunidades de
prática locais. Os conceitos desse capítulo foram elucidados a partir das contribuições de
Castells (1998, 2000), Wenger (1998), Santos (2001), Vygotsky (2008), Fróes Burnham
(2012) e outros.
No Capítulo 4 – Princípios teóricos de um portal web comunitário, definimos os
princípios teóricos que orientaram o design cognitivo do Portal TBC Cabula, baseando-se nos
37

resultados da análise contextual e focando na elaboração de conceitos de sustentação do


design cognitivo colaborativo. Nesse sentido, dialogamos com Machado (1997), Primo
(2000), Matta e Carvalho (2008); Ramal (2003); Alves, Japiassu e Hetkowski (2006) como
exemplos.
O ciclo de design e prototipagem inicia no Capítulo 5 – Mapeando um processo de
construção colaborativa, quando descrevemos de maneira pormenorizada o desenho e os
procedimentos metodológicos aplicados para a construção das soluções de pesquisa com base
nas referências de autores como Van den Akker (1999); Plomp (2003) e Reeves (2005); e
culmina com o Capítulo 6 – Percursos avaliativos – no qual apresentamos o processo de
avaliação do modelo, a análise das colaborações avaliativas e a discussão sobre os limites e
potencialidades do Design Cognitivo Colaborativo. Esse capítulo foi seguido da Conclusão
da tese.
38

“A COMPREENSÃO”

“[...] Uma comunidade de moradores, uma escola, uma empresa, qualquer instituição, e
também os objetos com que lidamos, tanto quanto os costumes, os hábitos sociais: tudo tem
sua história no entrecruzamento de um passado, de um presente e de um futuro em
perspectiva e só nessa história se constituem em objetos do campo empírico[...] Relações
sociais sempre existiram entre os homens, mas só a partir de quando eles se interrogaram
sobre elas se constituíram no campo da experiência histórica [...]”

(MARQUES, 2008, p.19)


39

CAPÍTULO II

2 Contexto Sócio-Histórico

Desenvolver uma pesquisa científica de natureza aplicada, que pretende dialogar com a
realidade social requer como princípio fundamental a compreensão do contexto sócio
histórico do locus no qual se tenciona imergir. Esse princípio é uma premissa basilar para o
presente estudo, cujo propósito central é a interlocução entre comunidades de prática
presentes no Cabula e entorno com vistas à construção de um design cognitivo a ser aplicado
a um portal web que se pretende colaborativo, o Portal TBC Cabula.
Sendo assim, o contexto compreende a matéria-prima que nos dará subsídios para
descortinar a pluralidade dessa comunidade e construir a nossa compreensão da mesma. Dessa
forma, o construto contextual não pode ser compreendido de maneira isolada como a
cronologia dos fatos históricos que forjaram a dinâmica de determinado espaço social. Afinal,
no contexto estão reunidos os elementos, as práticas e os vínculos historicamente construídos,
os quais revelam as relações de poder e dominação; as tensões e resistências; as referências
sociais, culturais, políticas e ideológicas, que condicionam a dinâmica socioexistencial do
campo investigado.
A apreensão de tais elementos nos possibilitou estabelecer com essa comunidade, uma
relação de parceria e colaboração na construção de conhecimentos por meio da pesquisa
científica aplicada. Portanto, ao desvendarmos a história e as bases sociais que forjaram o
Cabula e entorno nos tornamos coerentemente aptos a perceber essa localidade, os sujeitos e
coletivos que dela fazem parte, de maneira crítica e consciente; compreendendo as conexões
com as circunstâncias atuais e reconhecendo os seus elementos fundantes, que nos deram
suporte para elaborar a nossa interpretação dos fatos, bem como definir as abordagens, a
mediação das relações e das práticas investigativas desenvolvidas.
Desse modo, se pretendemos com este estudo construir com a comunidade do Cabula
e entorno, um design cognitivo aplicável a um ambiente web colaborativo, capaz de
potencializar a socialização dos seus saberes e fazeres, as premissas aqui apresentadas
justificam a necessidade de apreendermos a essência inerente a tal localidade. Seja por
estarmos legitimando os sujeitos a ela vinculados como interlocutores e parceiros do processo
investigativo, mas, principalmente, por almejarmos contribuir para a elaboração de uma rede
de compartilhamento das práticas por eles desenvolvidas e a eles pertencentes. Logo, diz
40

respeito a um compromisso ético que devemos assumir enquanto pesquisadores e mediadores


desse movimento de construção de conhecimentos.
O diálogo com moradores e representantes das comunidades de prática do Cabula e
entorno, nos ajudou a compreender a dinâmica das relações estabelecidas no contexto
pesquisado, a partir de um olhar reflexivo, que não se respaldou, exclusivamente, nas
referências teóricas, mas, também, a partir do olhar implicado de quem compartilhou das
vivências dos sujeitos que constroem a realidade do Cabula e entorno. Esses pressupostos
contribuíram para o nosso posicionamento perante essa comunidade, nos fortalecendo na
mediação de um processo coletivo, validado pelos participantes e, também, por eles
produzido.
O construto contextual é, portanto, a bússola que orientou a compreensão das
dinâmicas internas existentes no Cabula e entorno, bem como as características, os traços
sociais e culturais manifestos no modo de organização e nas práticas dessa comunidade, as
quais refletem heranças ancestrais e processos históricos peculiares que configuraram a
identidade dos moradores locais.
Nesse sentido, buscaremos nas linhas a seguir elaborar uma reflexão sobre a formação
sócio-histórica do Cabula e entorno, não no sentido de esgotar os referenciais já disseminados
sobre tal aspecto, ou explicar a cronologia dos fatos históricos que a caracterizam, de maneira
absoluta. O propósito é construir a nossa concepção/compreensão dessa localidade, a partir
dos referenciais analisados criticamente e das relações de implicação que estabelecemos na e
com a comunidade no decorrer do processo investigativo.

2.1 Cabula e entorno: uma delimitação espacial

Para iniciarmos a tecitura contextual desta pesquisa é importante, a princípio,


situarmos o leitor sobre o recorte espacial que aqui denominamos por Cabula e entorno. Esse
esclarecimento se faz indispensável, pois existem muitas incertezas sobre as fronteiras que
definem essa localidade; que se justificam pela carência de uma delimitação oficial dos
bairros de Salvador, Bahia, segundo nos aponta Fernandes (2003).
Na verdade, o que existem são variadas tentativas de zoneamento e subdivisões
realizadas de maneira desarticulada por empresas e órgãos públicos e privados (VEIGA,
2012). Dessas tentativas, destacamos como um dos mais citados, o zoneamento por regiões
administrativas, definido em 1987, em decorrência dos estudos do Plano de Desenvolvimento
41

Urbano para Salvador (PLANDURB), que divide a cidade em 17 Regiões Administrativas


(RA). Esse plano foi retificado pela Lei Municipal nº 6586/2004, Plano Diretor de
Desenvolvimento Urbano (PDDU), de 2004 e nela o Cabula é classificado como Região
Administrativa XI. (GOUVEIA, 2010). Há também o recente projeto de lei sancionado pelo
prefeito de Salvador em 20 de setembro de 2017 e em tramitação na Câmara de vereadores
que modifica a divisão territorial da cidade e atualiza a lei de Bairros do município, que data
da década de 1960
No entanto, para efeitos do presente estudo, utilizamos como referência espacial a área
de atuação do Projeto Turismo de Base Comunitária no Cabula e entorno (TBC/Cabula), que
é composta por dezessete bairros situados nos arredores da Avenida Silveira Martins, a saber:
1) Arenoso; 2) Arraial do Retiro; 3) Beiru-Tancredo Neves; 4) Cabula; 5) Doron; 6)
Engomadeira; 7) Estrada das Barreiras; 8) Fazenda Grande do Retiro; 9) Mata Escura; 10)
Narandiba; 11) Novo Horizonte; 12) Resgate; 13) Saboeiro; 14) São Gonçalo; 15)
Saramandaia; 16) Sussuarana e 17) Pernambués.
Considerando os dados de 2010, disponibilizados no Sistema de Informação
Municipal de Salvador (SIM), que revelam o número total de habitantes por bairro, o Cabula e
entorno abrange uma população total de 386.919 habitantes. Sendo que os bairros do
Beiru/Tancredo Neves; Cabula; Fazenda Grande do Retiro, Mata Escura, Pernambués e
Sussuarana são os mais populosos da localidade, ultrapassando um total de mais de 20.000
habitantes cada bairro, conforme elucidado no quadro 4.

Quadro 4: Bairros mais populosos da localidade do Cabula e entorno


Bairro Nº de habitantes
Beiru/Tancredo Neves 50.416
Cabula 23.869
Fazenda Grande do Retiro 53.806
Mata Escura 32.349
Pernambués 64.983
Sussuarana 29.181
Fonte: a autora a partir de dados do SIM (2010)

Importante ressaltar que, segundo alguns moradores mais antigos, essas dezessete
localidades compreendem uma área conhecida entre os séculos XVII e XIX, como Antigo
Quilombo Cabula; local onde escravos fugidos, índios e pessoas das classes economicamente
42

desfavorecidas da época, se refugiavam e encorpavam movimentos de contestação da ordem


então vigente. Essa demarcação espacial, reconhecida por alguns membros da comunidade foi
identificada por meio das ações de inventariação participativa realizadas pelo Projeto Turismo
de Base Comunitária no Cabula e entorno, no ano de 2010 e estão expressas na poligonal a
seguir apresentada:

Figura 3: Demarcação oficial dos bairros da poligonal de estudos do Projeto TBC


Cabula

Fonte: João Pena, 2016

Estudos realizados por Reis (2003), Nicolin (2007), Martins e Souza (2013) e Martins
(2017), confirmam a relevância histórica de tal localidade nas lutas contra a escravidão em
Salvador, muito embora, não tragam evidências concretas e/ou documentais que comprovem,
cientificamente, a delimitação exata do quilombo conforme versão da comunidade. Mas, as
pesquisas dos referidos autores revelam que o Cabula era concebido como uma grande
extensão rural, marcada por pontos de confluências e habitações dos quilombolas, que se
constituíam em arraiais de resistência. Dessa forma, ainda que reconheçamos o valor histórico
dessa localidade e suas heranças quilombolas, aqui optamos pelo uso da denominação Cabula
e entorno para nos referirmos à área do estudo.
A configuração espacial que atualmente, no século XXI, caracteriza tal área é
resultante de variados processos de ocupação urbana desenvolvidos graças à atuação de
43

distintos agentes sociais em diferentes momentos históricos. Dessa forma, consideramos a


existência de cinco fases significativas, as quais compuseram o processo de caracterização do
Cabula e seu entorno, implicando em modificações de sua paisagem, do modus vivendi e do
modus operandi de sua população.
Tais fases são delimitadas, a partir de marcos históricos e características de fases
temporais aproximadas, interpretadas a partir dos estudos de Fernandes (2003) e Gouveia
(2010), conforme apresentado no Quadro 5.

Quadro 5: As fases de ocupação urbana do Cabula e entorno

FASES PERÍODO CARACTERÍSTICA


HISTÓRICO
1ª Até o século XVII Habitações dos índios, provavelmente de etnia
Tupinambá e início da colonização portuguesa.

2ª Século XVII a XIX Constituição dos núcleos quilombolas, presença de


levantes e lutas contra o regime escravocrata.

3ª Final do Século XIX Expansão das chácaras e fazendas de laranja que


ao Século XX (até a atendiam a produção agroexportadora da Bahia até
década de 1940) meados do século XX.

4ª Século XX (a partir Ocupação urbana por meio do crescimento dos


do final da década de conjuntos habitacionais, distribuição de lotes
1940) promovida pelo governo do estado da Bahia e
formação de aglomerados urbanos.

5ª Século XX - XXI (a Atuação do capital imobiliário, verticalização dos


partir da década de bairros, desapropriação de terrenos e casas, além da
1990 aos dias descaracterização de áreas verdes remanescentes.
atuais.)
Fonte: a autora, a partir dos estudos de Fernandes (2003) e Gouveia (2010)

Assim como afirmam Martins e Souza (2013), falar sobre a história do Cabula é uma
atitude desafiadora, pois se trata de evidenciar contextos sócio-históricos que durante séculos
ficaram à margem da historiografia vigente, interessada em disseminar os feitos e os
acontecimentos da elite dominante, em detrimento das construções e histórias da população
economicamente desfavorecida. Essas autoras ainda reiteram que as comunidades populares
sempre assumiram posição secundária nas narrativas históricas, como é o caso da localidade
ora investigada; área de significativa importância e ricas contribuições para o patrimônio
44

histórico e cultural brasileiro, porém, negligenciadas no contexto da História da Bahia,


socialmente difundida.
Nesse sentido, buscaremos ao longo deste capítulo compreender as marcas históricas e
culturais que contribuíram para a configuração do Cabula e entorno, as quais se manifestam
nas práticas de sua comunidade na atualidade. Para isso, delineamos um percurso histórico
sintonizado às fases estabelecidas no quadro 5. Portanto, com o intuito de entendermos essas
tramas buscaremos, primeiramente, investigar o legado dos principais grupos étnicos
responsáveis pela formação da cidade de Salvador e, consequentemente, dessa localidade.
Começamos então, pelos povos indígenas.

2.2 Um legado Tupinambá?

A cidade de Salvador apresenta em sua matriz social e cultural a contribuição de três


grupos étnicos principais, que denominamos de maneira geral como: indígenas, africanos e
europeus. Esses grupos não conviveram isoladamente durante a ocupação e formação da
cidade, afinal, foram variadas as circunstâncias que ocasionaram a interação e a miscigenação
entre esses povos desde o século XVI. (TAVARES, 2000)
Desse entroncamento étnico nasce a variedade colorida e pluricultural, característica
da identidade e do modus vivendi soteropolitano, perpetuado e resignificado ao longo desses
quinhentos anos de história, como afirma Tavares (2000). Dessas três referências étnicas, a
indígena é a mais antiga. Os europeus e africanos, embora tenham chegado ao Brasil apenas a
partir do século XVI, deixaram traços históricos e culturais que hoje são mais evidenciados na
memória e na identidade da população de Salvador, se comparado às marcas deixadas pelos
nossos primeiros habitantes, os índios; as quais continuaram em diversos aspectos de nossa
cultura, mesmo pouco reconhecidas. Trata-se de um apagamento cultural que se intensifica,
dentre outros fatores, graças à existência física, quase nula, de povos indígenas nos domínios
soteropolitanos.
No caso do Cabula e entorno, por exemplo, a presença da cultura africana se destaca
em diferentes dimensões e, praticamente, delineia a identidade dos moradores do atual século
XXI. Assim, podemos citar as histórias dos feitos de negros africanos do Antigo Quilombo do
Cabula, disseminadas por meio da história oral da comunidade; também destacam-se, as
práticas ancestrais e religiosas realizadas nos terreiros de candomblé remanescentes, que
ajudam a vivificar o legado da África nessa localidade.
45

Além disso, o levantamento historiográfico realizado para esta pesquisa revelou que a
história mais longínqua do Cabula que vem sendo difundida, está vinculada,
majoritariamente, ao final do século XVIII e aos séculos posteriores, além de ser articulada,
especialmente, à presença dos africanos nesse território. Outro aspecto relevante é a
dificuldade em localizar fontes documentais que comprovem a presença do índio nessa área,
sobretudo no período colonial. Tornando esse grupo étnico e suas contribuições para o Cabula
e entorno ainda pouco conhecidas para a comunidade ampliada.
Entretanto, qual seria a configuração social do Cabula e seu entorno antes da ocupação
dos povos de matriz africana? Não seriam os índios os primeiros habitantes de tal localidade,
pois se constituem no grupo étnico mais antigo de Salvador? Encontrar respostas para esses
questionamentos requer um esforço de reflexão sobre o processo de apropriação e domínio da
cidade pelos portugueses no início do período colonial, a fim de identificarmos pistas que nos
levem às possíveis contribuições dos povos indígenas na constituição dessa área de Salvador.
Para autores como Mattoso (1992) e Tavares (2000), os índios encontrados pelos
portugueses no litoral brasileiro, eram Tupis, das tribos Tupiniquins e Tupinambás, sendo
esses últimos encontrados em maioria no litoral de Salvador. As práticas desses povos, seus
costumes, crenças, sua forma de guerrear e relacionar-se social e espiritualmente eram vistas,
pelo colonizador português, como primitivas e culturalmente atrasadas, especialmente,
quando comparadas àquelas realizadas pelos europeus, povos africanos e, também, pelos
índios de outras terras recém conquistadas no continente sulamericano (TAVARES, 2000).
Os Tupinambás, por exemplo, são descritos no Tratado de Sousa e Santos, como
povos hostis, que viviam em constante estado de guerra com outras tribos, submetendo-as a
terríveis castigos, além da marcante prática de canibalismo entre os índios dessa etnia
(OLIVEIRA; FREIRE, 2006). A imagem de selvageria construída pelo europeu foi
justificativa para a estratégia de dominação e indução dos povos nativos ao trabalho escravo;
a qual se travestia de catequização, segundo afirmam Oliveira e Freire (2006).
O processo de catequização dos índios foi iniciado com a criação dos núcleos urbanos
nas terras brasileiras, que para Mattoso (1992) somente ocorreu a partir de 1534, quando D.
João III decidiu oficialmente colonizar o Brasil, instituindo o sistema de capitanias
hereditárias. Com essa nova política, foi promovida a construção de aldeamentos
missionários. Os indígenas convertidos e conquistados pelos colonos, serviam de mão-de-obra
escrava, empregados na defesa de território, na construção de prédios, igrejas, vilas e nos
engenhos da nascente cultura da cana-de-açúcar. (SCHWARTZ, 1988; MATTOSO, 1992).
46

Esse contexto contribuiu para a expansão dos negócios e da cidade e demandava cada
vez mais a mão-de-obra indígena escrava para retroalimentar o sistema colonial. O resultado
de tal relação de dependência e exploração foi a revolta e a resistência dos povos nativos ao
trabalho forçado, o que culminou em rebeliões e fugas constantes dos canaviais, para áreas
menos povoadas da Colônia. As incursões e o combate direto para a captura dos índios
fugidos, junto a disseminação de doenças trazidas pelos imigrantes europeus, acabaram
dizimando milhares de indígenas em toda a Colônia, massacre perceptível desde o século
XVII (OLIVEIRA; FREIRE, 2006).
Atualmente, no século XXI, vivenciamos a intensificação do apagamento histórico e
cultural desse grupo étnico, a começar pela dificuldade em localizar fontes históricas e
documentais sobre os índios na cidade de Salvador. Verificamos durante o levantamento de
tais fontes que as informações a respeito da população indígena no século XVI, se restringem,
em sua maioria, ao litoral e ao centro antigo de Salvador. Desse modo, os mapas, tratados e
outros documentos oficiais consultados não revelaram com precisão a ocupação dos índios em
outras áreas da cidade, como o miolo e o subúrbio.
No entanto, estudos de autores como Mattoso (1992), nos dão pistas sobre a ocupação
do Cabula desde o início da colonização. A referida autora revela que ainda no século XVI, a
cidade de Salvador ultrapassou os seus limites primitivos, espalhando-se sobre os morros e os
vales das cercanias, nos levando a deduzir que a montanhosa região do Cabula e entorno,
provavelmente inexplorada economicamente na época, tenha sido um dos possíveis lugares de
acolhida dessa população que se expandia pelos domínios de Salvador; e, também, refúgio
imediato para os índios do litoral que tentavam escapar da sujeição dos colonos.
De acordo com Vasconcelos (2006), os mapas de Salvador, entre os anos de 1549 e
1650, demonstram que a cidade possuía uma população estimada em 10.000 pessoas entre
portugueses, índios e negros da Guiné, e teve os seus domínios extrapolados, com avanços em
direção ao Norte, Carmo, e ao Sul, São Bento. Graças à expansão da Colônia os índios foram
concentrados em aldeias ao redor da cidade. Quanto aos negros da África, o referido autor
relata a existência de quilombos desde 1575, na Orla Atlântica, e outro destruído em 1632.
Com o prolongamento dos domínios da cidade entre os séculos XVI e XIX, Salvador
passou a ser dividida em freguesias ou paróquias, as quais eram delimitadas pela Igreja
Católica, instituição de forte presença na colonização brasileira (FERNANDES, 2003). Nesse
cenário, o Cabula e áreas do entorno como o Resgate, São Gonçalo, Pernambués e Mata
Escura pertenciam ao segundo distrito da Freguesia do Santo Antonio Além do Carmo,
conforme aponta Martins (2017).
47

Outra hipótese que justifica a presença indígena em tal área é o fato de serem esses
povos, nômades por natureza e quase sempre forçados a ir em busca de melhor campo de caça
e de pesca (TAVARES, 2000), o que demonstra a improbabilidade dos índios habitarem
apenas o litoral de Salvador. Sendo assim, a fauna e a flora presentes no Cabula, bem como
seus rios, pântanos e vegetação de Mata Atlântica, descritos desde as produções dos séculos
XVII e XVIII, ajudavam a constituir um lugar propício para a habitação desses povos naquela
época.
Essa suposição, ainda encontra respaldo nos relatos de antigos moradores do Cabula e
entorno que revelam a presença de vestígios da cultura indígena na localidade, encontrados
nas escavações realizadas em seus terrenos particulares, conforme destacado por um antigo
comerciante do bairro de Pernambués em roda de conversa realizada em novembro de 20151.
A possibilidade de ocupação indígena no Cabula e entorno no período colonial,
também é ratificada pelos estudos de Martins e Souza (2013); as autoras acreditam que o fato
dessa localidade estar situada a pouco mais de cinco quilômetros do primeiro núcleo urbano
de Salvador, e mais ou menos a mesma distância da Baía, são pontos potencialmente
favoráveis ao deslocamento dos habitantes do Litoral para essa área da cidade. Tal análise,
sintoniza com as ideias de Fernandes (2003), essa autora supõe a existência de povos
Tupinambás no período pré-colonial na área do Cabula e defende que a sua localização
estratégica, tornou-se elemento fundamental nas fugas investidas pelos escravos africanos ao
longo do período colonial; as quais, provavelmente, tenham sido acobertadas e/ou facilitadas
pelos indígenas remanescentes da Costa de Salvador, se mostrando como ponto importante
para a formação de quilombos na localidade.
A integração entre índios e africanos pode ser evidenciada em variados aspectos, como
a geração de novas referências culturais surgidas a partir do convívio entre eles, a exemplo do
candomblé de caboclo, que revela a afinidade existente entre as práticas espirituais cultivadas
por esses povos. Nesse tipo de candomblé, abre-se espaço ao culto aos índios, caboclas e
caboclos, pretos velhos, dentre outras entidades, resguardando assim, semelhanças e
diferenças em relação ao candomblé original, a exemplo dos rituais, cânticos, danças, toque
dos atabaques, dentre outros aspectos.
Nos terreiros que cultuam os caboclos, a principal festa é realizada no dia 2 de Julho,
dia da Independência da Bahia, como uma maneira de homenagear a participação dos índios

1
Informação verbal obtida por meio de roda de conversa em ação do projeto de extensão Turismo de Base
Comunitária nas escolas do Cabula e entorno.
48

na luta contra os portugueses, relacionando assim, a data histórica ao culto do candomblé.


(RIBEIRO, 1983). Um fato interessante é que tal festa, também fazia parte do calendário
comemorativo do Cabula, assim revela Mesquita (2016).
Para Ribeiro (1983), o candomblé de caboclo apresenta variadas semelhanças com o
candomblé de Angola, provavelmente, por causa do convívio mais prolongado entre o índio e
o nativo dessa localidade. De acordo com essa autora, dentre todas as nações que vieram para
o Brasil, o povo Banto, natural de Angola, foi quem mais gozou da amizade do índio.
Entretanto, não se sabe de maneira definida, quando e como houve esse processo de
aculturação, tornando o índio figura ativa dentro do culto do candomblé.
É válido ressaltar que o culto ao índio se faz presente não somente nos rituais do
Candomblé de Caboclo e do Candomblé Banto, mas também em casas de Candomblé das
nações Keto e Jeje, por exemplo. Nos diálogos realizados com moradores do Cabula e
entorno, identificamos a realização desses cultos nos terreiros Viva Deus, na Estrada das
Barreiras; Viva Deus Filho e Kafunji Odé L´Funji, localizados na Engomadeira, dentre outros.
A propósito, o Cabula pode ser considerado um território predominantemente, Keto/Angola,
tendo em vista a supremacia das casas de candomblé dessas etnias em toda extensão da
localidade, conforme levantamento das casas de Candomblé locais apresentado por Reis,
Matta e Silva (2016).
Do mesmo modo, existiu uma apropriação das entidades indígenas nos cultos
realizados na Umbanda, religião originada no Brasil, no início do século XX e que apresenta
elementos sincréticos referentes à religião católica, o candomblé, religiões orientais e o
espiritismo. Na Umbanda, os caboclos e pretos velhos manifestam-se e realizam trabalhos de
caridade para a comunidade. A Casa da Lua Cheia, por exemplo, é uma das principais casas
religiosas do Cabula e realiza não somente trabalhos espirituais na linha da Umbanda, mas
possui um compromisso social com a comunidade, presente na oferta de cursos
profissionalizantes realizados em parceria com projetos, órgãos e instituições governamentais,
assim nos disse o entrevistado número 5, chefe religioso da casa.
Além da influência religiosa é importante mencionar outras características culturais
dos povos indígenas de origem Tupinambá, que possivelmente tenham contribuído para gerar
práticas integradas com os africanos, favorecendo assim, a expansão quilombola no Cabula e
entorno no período de resistência. Nesse sentido, citamos Tavares (2000), que inclui como
referências culturais desse grupo étnico: as táticas de guerra; o uso de instrumentos como o
arco e a flecha para a caça e a pesca; técnicas de agricultura e os hábitos alimentares como o
49

uso de raízes e sementes, dentre outras práticas que também são compartilhadas pelos povos
africanos.
Diante desse rico legado, perguntamos: o que ficou da cultura indígena na vida
soteropolitana e, em especial na comunidade do Cabula e entorno? São vários os traços da
cultura material indígena presentes no cotidiano dos moradores da Salvador de hoje, porém
são pouco reconhecidos ou reportados, quase sempre à cultura africana. Até mesmo, por que,
a presença de descendentes indígenas na Salvador, do período atual, que ainda preservem a
cultura de seus ancestrais é praticamente nula se comparada à presença desses povos em
outras áreas do território baiano, como Porto Seguro, Ilhéus, Santa Cruz Cabrália, Bom Jesus
da Lapa, dentre outros locais registrados pela Associação Nacional de Apoio ao Índio, Seção
Bahia (ANAI-BA).
Evidente que a cultura material indígena apresenta várias semelhanças com a cultura
trazida pelos africanos. A prova disso é a fusão de ambos os sistemas culturais, a ponto de
haver algumas indefinições sobre o que é específico de cada cultura.

Negros e índios: impossível pensar o Brasil sem essas duas origens. Suas marcas
estão na constituição física do brasileiro e também na sua cultura, sobressaindo-se a
música e a religião, mas incluindo também dimensões como língua, culinária,
estética, valores sociais e estruturas mentais (PRANDI, 2015, p.16)

Embora saibamos que outros grupos étnicos também deixaram o seu legado para a
formação da cultura soteropolitana, a exemplo dos povos ibéricos; os índios Tupinambás e o
povo Banto, juntamente com outras nações africanas, apresentam contribuições que se
sobressaem na formação étnica do Cabula e entorno. Os traços desses grupos estão presentes
no modo de produzir, nas crenças, nos costumes, nas manifestações culturais e artísticas e
movimentos sociais hoje presentes na referida comunidade remanescente de quilombo.
A história desses dois grupos étnicos se cruzou ainda no período colonial. Com o
declínio da mão-de-obra nativa, no final do século XVI e o crescimento cada vez mais
significativo da indústria açucareira, o trabalho do escravo africano surgiu como mão de obra
substituta para manter engenhos de cana em franca produção, os quais vinham sofrendo várias
baixas com as constantes fugas e a postura de resistência dos índios escravizados.
(TAVARES, 2000). Inicia-se com esse novo cenário, uma importante fase da história de
Salvador e, consequentemente, dessa localidade aqui investigada, graças à chegada de dois
grupos étnicos africanos em terras brasileiras.
50

2.3 As contribuições étnicas dos povos bantos e sudaneses

Do século XVI ao século XIX, a Bahia despontou como um importante pólo


exportador de açúcar, produto que consistia na mola propulsora da economia brasileira da
época (RISÉRIO, 2004). De acordo com esse autor, tal fato repercutiu no rápido crescimento
da população da Bahia nesse período, tanto pela atração de imigrantes portugueses, quanto
pelas contínuas levas de escravizados trazidos do continente africano.
A economia da Bahia no período colonial era dependente do trabalho escravo. Foi
através da importação de negros da África que os portugueses conseguiram ocupar e explorar
as riquezas aqui encontradas, afinal, foram os africanos e seus descendentes, juntamente com
os indígenas escravizados, os responsáveis por desbravar matas, erguer cidades e portos, abrir
estradas que conduziam aos locais mais remotos do território brasileiro. (OLIVEIRA;
FREIRE, 2006)
Segundo Tavares (2000) o designativo africano é muito vago e extensivo e está longe
de determinar um tipo físico ou uma só cultura, pois a África é um continente de muitos
povos, de muitos falares e diversificadas etnias e culturas. Para esse autor, as áreas da África
vinculadas ao tráfico de escravos para o Brasil foram a Costa Ocidental, do atual Senegal à
Angola da atualidade, e o profundo interior, vales e terras das bacias dos rios Congo, Níger e
Benin; e a Costa Oriental, do Moçambique à atual Etiópia.
De acordo com Vilhena (1946), durante os séculos em que existiu, o tráfico variou a
sua direção, oscilando entre uma região e outra, se processando em quatro ciclos distintos
assim resumidos:

Quadro 6: Ciclos do tráfico na Bahia


CICLOS SÉCULO
I. Guiné XVI
II. Angola XVII
III. Costa da Mina XVIII
IV. Última fase (ilegalidade) XIX
Fonte: a autora a partir dos estudos de Vilhena (1946)

Em contrapartida, a metrópole portuguesa adotou a política de misturar escravos de


diferentes regiões e etnias do continente africano, a fim de impedir a concentração de
africanos da mesma origem na Colônia e a consequente articulação para rebeliões. Tal
51

política, no entanto, nem sempre foi seguida à risca, uma vez que dependendo das relações
comerciais estabelecidas na África, os traficantes tendiam a transportar escravos oriundos de
uma mesma região (TAVARES, 2000). Esse desvio político fica evidente na sistematização
apresentada no Quadro 6, a concentração do tráfico em determinadas regiões da África em
períodos específicos.
Dessa forma, duas etnias se destacaram no território baiano: os bantos e os sudaneses.
Esses últimos, segundo Prandi (2000), formam os variados grupos linguísticos e culturais
traficados para o Brasil; especialmente, os localizados na região do Golfo da Guiné,
conhecidos, genericamente, por nagôs ou iorubás, os quais englobam povos como os oyó,
ijexá, ketu, ijebu, egbá ifé, oxogbó, os daomeanos, os mahi, e os haussás, de religião islâmica,
esses últimos, ficaram famosos na Bahia por participarem da Revolta dos Malês, dentre outros
grupos.
Já os Bantos, um dos primeiros povos a desembarcarem em terras brasileiras como
escravos, dividiam-se em angola-congoleses e moçambiques. De acordo com autores como
Prandi (2000) e Silva (2011) o termo Banto, significa povo e foi usado pela primeira vez em
1862 por Willelm Bleek, para designar as diversas línguas dos povos situados logo abaixo dos
limites Sudaneses, compreendendo as terras que vão do Atlântico ao Índico, até o Cabo da
Boa Esperança.
As contribuições dos povos Bantos se fazem presentes na cultura brasileira em
variados aspectos, bem como salienta Prandi (2000, p.54):

Em anos recentes, estudos lingüísticos demonstraram a sobrevivência no Brasil de


elementos originários principalmente do quicongo, quimbundo e umbundo, o que
nos dá uma boa pista da superioridade demográfica, entre os Bantos no Brasil, dos
africanos provenientes do Congo e de Angola, onde estas línguas são faladas. De
fato, reminiscências culturais desses grupos são conhecidas entre nós como congo,
angola e cabinda, hoje usando-se genericamente o termo angola para todos os
Bantos, sobretudo quando se trata da designação de religião afro-brasileira de
origem Banto ou de outra modalidade cultural, como a capoeira, luta marcial afro-
brasileira.

O nome Cabula, a propósito, tem origem Banto. De acordo com Silva (2011), esse
termo significa mistério, culto religioso, secreto, escondido e, provavelmente, foi atribuído ao
locus desta pesquisa, para destacar a existência de vários quilombos, os quais tornaram o
candomblé tão famoso em tal área.
A forte presença dos Bantos, em todo território baiano, até o início do século XVIII se
deve ao fato desses povos formarem a primeira entrada em massa de escravos na Bahia no
século XVII. A preferência dada nesse período aos africanos dessa etnia deve-se a alguns
52

fatores. Eram considerados, segundo autores, como Vilhena (1946), excelentes agricultores e
mais adaptáveis ao duro trabalho forçado, do que os Sudaneses, evitados na época como
forma de evitar resistências e levantes entre os cativos, embora haja controvérsias quanto a
essa perspectiva. Tais características justificam, para esse autor, os intensos deslocamentos
comerciais entre Brasil e Angola, observados com mais detalhes nos relatos destacados:

Os [escravos] d'Angola, criados em Loanda, são os mais capazes de aprender ofícios


mecânicos, que os das outras partes já nomeadas. Entre os Congos há também
alguns bastantemente industriosos e bons não só para o serviço de cana, para as
oficinas, e para o Meneo de casa".

[...] Barleus, também, forma ao lado dos que proclamaram a superioridade dos
Angolas: "A terceira classe [da população] é dos escravos africanos, sendo os mais
trabalhadores de todos eles os naturais de Angola'. Ao negro da Guiné, "rixoso,
cabeçudo, preguiçoso, difícil de se acostumar à obediência e ao trabalho'* opunha-se
o de Angola, que "revelava muita disposição para o trabalho, e podia facilmente ser
ensinado pelos escravos antigos". (VILHENA, 1946, p.53)

Os estudos de Silva (2011) retratam a cultura material desenvolvida por esses povos
ao longo de sua expansão e formação no Continente africano, evidenciando que a adesão e
destreza dos africanos oriundos de Angola nas atividades descritas acima estão relacionadas
às práticas culturais que esses povos desenvolviam antes mesmo de chegarem a terras
brasileiras.
Nos diferentes estágios culturais e linguísticos caracterizados por Silva (2011), é
possível encontrar a participação dos bantos em práticas diversificadas com destaque para a
agricultura; pesca e atividades aquáticas; criação de animais; produção de objetos em
cerâmica e fibra de vegetal; ferramentas de caça e pesca, como cestos, anzol, canoa, remo,
dentre outras que demandavam o trato do ferro, cobre e marfim, como a ponta da lança, a
faca, o machado (SILVA, 2011). A propósito, há notícias de alguns agrupamentos em que a
mineração e a metalurgia parecem ter sido o centro da vida econômica, conforme sinaliza esse
autor.
Ao contrário do que foi propagado, equivocadamente, pelo colonizador português, os
povos de origem africana não eram povos culturalmente atrasados. Diferentemente do índio,
os africanos traficados, já conheciam e utilizavam a escravidão há séculos, evidentemente
que, o escravo não tinha na África a mesma condição que teve o escravo, no Brasil; afinal, lá
poderia ser incorporado à tribo que o aprisionara em guerra ou o escravizara por dívida.
(TAVARES, 2000)
Outro equívoco histórico é a noção de passividade dos negros da África perante a
escravidão, como se fez supor com os bantos, por exemplo, caracterizados por Vilhena
53

(1946), como dóceis e trabalhadores. Afinal, tanto o indígena quanto o africano se mostraram
resistentes ao regime de servidão. A insatisfação dos cativos foi crescendo à mesma
proporção que o regime escravocrata se expandia insaciavelmente, aumentando assim, a
demanda por mais escravos, inclusive aptos a realizar outras atividades, fazendo com que os
Bantos deixassem de ser supremacia em território baiano.
A substituição de Angola pela Costa do Marfim no suprimento do mercado de
escravos baianos foi motivada por questões políticas e econômicas. Dentre os motivos
podemos destacar: a epidemia de bexiga que assolou Angola no final do século XVII,
afugentando os traficantes receosos de uma contaminação em massa e a descoberta das minas
de ouro em território brasileiro, que aguçou a cobiça e a ambição dos portugueses; por isso,
seria preciso mais escravos para atender a nova empreitada (VILHENA, 1946).
O Ciclo da Mina que se estendeu do século XVII até meados do século XIX mobilizou
francos deslocamentos de senhores e seus escravos para desbravarem terras desconhecidas no
território brasileiro em busca de ouro. Portanto, seria necessário buscar negros considerados
aptos ao serviço, nesse caso, os Sudaneses, vistos como mais fortes e perspicazes, passaram a
ser a oferta cobiçada no mercado escravo:

Representavam todos êles culturas já aproximadas na África e que aqui ainda mais
se integrariam confundindo-se em tôrno a cultos religiosos, onde buscariam as
energias necessárias para resistirem e reagirem contra a dispersão e a assimilação.
Formariam um grande núcleo negro de reação. Por muito tempo permaneceriam
isolados, preparando-se para a luta religiosa e animados por um grande espírito de
fé. Num século já teriam chegado à Bahia aproximadamente 350.000. Uma grande
parte fôra para as Minas. Mas, a fração que ficara era bastante para modificar o
ambiente social do negro na Bahia. A cidade e o recôncavo haviam perdido a
tranqüilidade que lhe dera o bântu [...] Uma nova religião negra, mais forte, e que se
praticava não mais a céu aberto, mas em interiores fechados, seria oponto de partida
para as revoluções negras da Bahia [...] A Costa da Mina não nos mandara apenas
negros escravos. Com estes exportara uma fé. (VILHENA, 1946, p.77).

Os africanos da Costa da Mina, atual Costa do Marfim, que desembarcaram na Bahia


entre o fim do século XVIII e o início do século XIX eram comumente chamados de
sudaneses, por que oriundos das localidades situadas ao norte do Congo e de Angola,
representadas no mapa a seguir:
54

Figura 4: Localidades do Ciclo da Mina, Século XIX

Fonte: Reis (2003, p.113)

A predominância de Sudaneses daria à cidade de Salvador outra dinâmica. Iorubas,


haussás, bambarras, jejes, mandigas e outros, formariam assim, o grupo africano mais
numeroso em terras locais. A interação dos sudaneses com os povos de outras etnias,
inclusive os bantos, representaria uma iminente ameaça ao regime escravocrata, que se
expandiu por toda a Colônia. Dessa forma, novas configurações tomaram corpo e visibilidade
na cidade de Salvador entre os séculos XVIII e XIX, especialmente, no Cabula e entorno,
cenário quilombola cujas lutas retrataremos a seguir.

2.4 Heranças quilombolas: vestígios dos séculos XVIII e XIX

Conforme acompanhamos até aqui, o regime escravocrata marcou a dinâmica sócio-


econômica da província baiana; em especial, da capital soteropolitana, que possuía um dos
portos mais movimentados do Brasil entre os séculos XVII e XIX, impactando,
positivamente, no crescimento da economia brasileira da época (MATTOSO, 1992;
RISÉRIO, 2004). No final do século XVIII e início do século XIX, período conhecido como
Ciclo da Mina, os africanos sudaneses foram trazidos para a Colônia, por serem considerados
os mais aptos a trabalharem nas emergentes minas de ouro. De acordo com Vilhena (1969)
70% dos negros importados pela Bahia, no século XVIII eram sudaneses, os outros 30%
seriam Bantos.
55

Embora o crescimento econômico sugerisse um tempo de abundância e fartura,


contraditoriamente, se convivia com a escassez de suprimentos, sobretudo para a população
cativa e as classes economicamente desfavorecidas. (RISÉRIO, 2004). Essa desigualdade
acabava motivando o agravamento das tensões sociais e a mobilização de movimentos de
resistência dos negros cativos; os quais se rebelavam e resistiam contra os abusos servis, ao
manifestarem livremente as suas práticas tradicionais em praça pública, além das constantes
investidas de fugas que culminaram na organização de quilombos em distintas localidades da
província (RISÉRIO, 2004; MARTINS, SOUZA, 2013).
Esses atos, considerados afrontosos pela elite eram vistos com desprezo e repulsa
pelos colonos e nobres da alta sociedade soteropolitana da época, assim como destaca Vilhena
(1969, p.134) no excerto abaixo:

Não parece ser muito acêrto em política, o tolerar que pelas ruas, e terreiros da
cidade façam multidões de negros de um, e outro sexo, os seus batuques bárbaros a
toque de muitos, e horrorosos atabaques, dançando desonestamente, e cantando
canções gentílicas, falando línguas diversas, e isto com alaridos tão horrendos, e
dissonantes que causam mêdo, e estranheza, ainda aos mais afoitos, na ponderação
de consequências que dali podem provir, atendendo ao já referido número de
escravos que há na Bahia [...]

Fica evidente na fala do autor, além do repúdio dos nobres da época aos escravizados,
a atmosfera de terror que circundava as elites locais entre os séculos XVIII e XIX, receosas
com possíveis levantes e ataques dos cativos, os quais compreendiam uma população cada
vez mais numerosa, alimentada pelo incessante tráfico escravocrata. Em verdade, a
predominância dos sudaneses na capital baiana proporcionou à cidade um novo clima,
deixando as autoridades locais em constante estado de alerta.
Vilhena (1946), afirma que os escravos assumiam postura altiva perante os brancos,
sugerindo, por parte das autoridades locais, ações mais ríspidas. As sugestões explícitas na
fala desse autor parecem ter sido atendidas, graças aos preparativos do desembarque da corte
portuguesa no Brasil. A chegada do novo governador da Província da Bahia, D. João de
Saldanha da Gama Mello e Torres Guedes de Brito, 6º Conde da Ponte, se explica pela
necessidade de conter as constantes tensões sociais que assolavam o território baiano de
maneira endêmica.
Segundo Reis (2008, p.108), o Conde da Ponte instituiu medidas severas bem como
“ataques e destruição de quilombos; a perseguição de práticas tidas por ‘supersticiosas’ (ou
feitiçaria), a proibição de batuques de qualquer ordem e o controle da circulação de escravos
56

nas cidades, vilas e caminhos em horas aprazadas”. Entretanto, as investidas desse


representante militar encontraram vários entraves, sobretudo, em relação à estrutura complexa
dos quilombos que proliferavam pela província, os quais se manifestavam como sólidas redes
de resistência, articuladas aos setores livres da sociedade, a exemplo de lavradores e
comerciantes que recrutavam os escravos fugidos para trabalharem em suas terras (REIS,
2008).
Outro entrave apontado por esse autor é que a familiaridade dos escravos com os
territórios da Colônia e os anos de cativeiro não implicaram em passividade, pelo contrário, os
tinha ensinado a burlá-la com mais eficiência e não combatê-la. A desenvoltura dos escravos
ao embrenhar-se pelas matas contribuía para as frequentes fugas bem sucedidas e na busca
constante pelos abrigos nos quilombos.
As cartas trocadas entre o Conde da Ponte e o Visconde de Anadia, Ministro de
Negócios Ultramarinos, em 7 de abril de 1807 revelam informações que retratavam o
contexto de alguns quilombos localizados em Salvador:

Nos subúrbios dessa Capital, e dentro do mato de que toda ela é cercada, eram
inumeráveis os ajuntamentos dessa qualidade de gente, os quais dirigidos por mãos
de industriosos impostores aliciavam os crédulos, os vadios, os supersticiosos, os
roubadores, os criminosos, e os adoentados, e em uma liberdade absoluta, danças,
vestuários caprichosos, remédios fingidos, bênçãos e orações fanáticas, folgavam e
comiam, e se regalavam com a mais escandalosa ofensa de todos os direitos, Leis,
Ordens e pública quietação. (REIS, 2003, p.111)

Observamos, a partir dessas colocações, que em Salvador também crescia,


vertiginosamente, assentamentos resistentes. As colinas, matas, lagoas e rios localizados nos
arredores da capital davam suporte a um sistema comunitário independente e clandestino;
eram comunidades transitórias que eram destruídas aqui, para reaparecerem adiante, assim
afirma Reis (2003). Nesse sentido, o Cabula e entorno reunia características que favoreciam a
implantação de quilombos, primeiro pela sua localização um pouco afastada do centro da
província e, principalmente, por ser uma localidade formada por pântanos, rios, muitas
colinas, morros elevados e depressões que serviam de esconderijos, bem como uma densa
vegetação de Mata Atlântica, que dificultava as investidas da polícia e capitães do mato na
captura dos quilombolas (MARTINS; SOUZA, 2013).
A composição diversificada desses agrupamentos sociais envolvia uma diversidade de
gente, tanto para se esconder das autoridades, quanto por força de obrigações ligadas ao culto
africano que eram livres e começavam a ganhar força entre os quilombolas (REIS, 2003;
RISÉRIO, 2004). Na área do Cabula, por exemplo, os cultos religiosos de origem africana
57

eram práticas comuns; a propósito, o primeiro registro baiano da palavra Candomblé,


designando um local de culto africano foi em 1826, em um documento policial que se referia
precisamente a um Terreiro no Cabula (FERNANDES, 2003).
A presença quilombola e a efervescência religiosa remontam às diferentes localidades,
na época conhecidas como Estrada do Cabula, Estrada de São Gonçalo, Pernambués e Mata
Escura. Áreas mencionadas nos mapas antigos e fontes documentais analisadas e que, ainda
existem atualmente sendo pertencentes ao recorte espacial aqui denominado por Cabula e
entorno. Essas informações vão ao encontro das colocações de Reis (2008), esse autor salienta
que os redutos quilombolas em Salvador concentravam-se basicamente em dois locais, o
bairro de Nossa Senhora dos Mares, para dentro da Baía de Todos os Santos e o Cabula, a
nordeste do núcleo urbano. Outros pontos identificados pelo referido autor nas
correspondências trocadas pelo Conde da Ponte são: Saboeiro e Barreiras, hoje bairros
vizinhos ao Cabula.
A centralização do Cabula tornou essa localidade privilegiada nos períodos de
resistência, pois ao fazer fronteira com diferentes áreas da cidade; ao Norte com Pirajá, ao Sul
com Brotas e Rio Vermelho, ao Leste com a Orla Marítima e a Oeste com Mares e Calçada,
proporcionava vias de acesso dos quilombolas a outros lugares de Salvador (NICOLIN,
2007). A geografia privilegiada é corroborada pelos relatos de Vilhena (1969, p.226):

Três são as estradas, que dão entrada na cidade; e vem a ser a das Boiadas, a das
Brotas, em que se incorpora a do Cabula, e a do Rio Vermelho. Todas elas vêm
saindo a cada passo em gargantas, sem desvio para um ou outro lado [...].

O mapa a seguir retrata tanto os locais mencionados por Vilhena (1969), quanto as
outras áreas de Salvador que fazem fronteira com o Cabula.
58

Figura 5: Cabula e áreas circunvizinhas

Fonte: Reis (2003, p.90)

Essa localização estratégica permitia, inclusive, a articulação dos arraiais quilombolas


do Cabula com outros quilombos instalados na cidade de Salvador e em suas imediações,
como o Buraco do Tatu e o Quilombo do Urubu, mencionados nas cartas trocadas entre o
Conde da Ponte e o Visconde de Anadia. Segundo Risério (2004), o Buraco do Tatu situava-
se às margens da atual estrada que liga Campinas a Santo Amaro de Ipitanga, atual Lauro de
Freitas, próxima ao aeroporto de Salvador. De acordo com Martins e Souza (2013), suspeita-
se que esse assentamento tenha mantido relações com os quilombos situados no Cabula. Já o
Quilombo do Urubu, que trazia como referência de liderança a negra Zeferina, localizava-se
em Cajazeiras, distrito de Pirajá e parecia manter estreita relação com o Cabula,
especialmente, pelas práticas de resistência relatadas nos estudos de Reis (2003).
Os assentamentos quilombolas situados no Cabula sucumbiram em 30 de março de
1807 por ordem do Conde da Ponte, que organizou com a ajuda do Sr. Severino da Silva
Lessa, capitão mor de Entradas e Assaltos da Cidade, uma operação que contou com o apoio
do exército; dentre os presos se destacou a sacerdotisa Nicácia, importante liderança feminina
e referência religiosa no referido quilombo. (REIS, 2008).
59

Martins e Souza (2013) analisam que a preocupação com os quilombos urbanos está
expressa nas inúmeras ordens régias que refletiam o medo e a insegurança nos principais
centros urbanos brasileiros, que se viam ameaçados por constantes levantes de escravizados e
homens livres insatisfeitos com o regime colonial. A área do Cabula, era uma das mais
temidas de Salvador, pela sua crescente expansão e a sua resistência às diversas investidas
articuladas pelo Conde da Ponte. O medo que circundava essa localidade, atualmente, ainda
permanece, só que agora sob outras justificativas: os elevados índices de violência e
criminalidade que assolam a população local.
Mesmo pouco difundidos na historiografia oficial, como é o caso da história dos
assentamentos quilombolas do Cabula, desconhecido até mesmo por parcela considerável dos
moradores locais da atualidade, os quilombos urbanos tiveram preponderante importância na
história social do Brasil e nas lutas pela Independência e o fim do regime de servidão, uma
vez que os embates e a organização dos quilombolas foram elementos precursores de
movimentos que se sucederam posteriormente como a Revolta dos Malês em 1835.
Portanto, faz-se necessário enaltecer esse importante capítulo da história
soteropolitana, ainda pouco difundida e reconhecida pela comunidade ampliada, bem como
ressaltar a relevância histórica dessa localidade periférica que traz as nuances dos três grupos
étnicos que conformam a nossa identidade soteropolitana. Delinear o contexto do Cabula e
das comunidades do seu entorno é colaborar para difundir as contribuições de brancos, negros
e índios para a construção das raízes dessas localidades, reconhecendo as características que
ainda hoje estão presentes no cotidiano e nas práticas desenvolvidas por sua comunidade que
ganharam novos contornos com o avançar dos anos.
Após o término do regime de escravidão no Brasil, o Cabula já não era mais visto
como uma franca ameaça para a ordem e a paz das elites da capital baiana, como foi no
Império. Entretanto, vale ressaltar que as fontes históricas levantadas para essa pesquisa não
sinalizam com concretude, a conjuntura dessa localidade após a devassa orquestrada pelo
Conde da Ponte em 1807, evidenciando assim, um hiato na história difundida sobre tal
localidade.
Considerando as adversidades às quais eram submetidos os escravos libertos, em
especial, a dificuldade de se firmarem enquanto homens livres assalariados, supomos que os
quilombolas do Cabula e seus descendentes ali permaneceram e fincaram as suas raízes,
dividindo espaço com herdeiros de terras doadas pela coroa portuguesa e, posteriormente,
com os imigrantes que para lá se deslocaram, ainda no século XIX, graças ao êxodo rural.
60

Importante destacar que as terras do Cabula foram doadas desde o século XVI a
Antonio de Ataíde, o conde Castanheira, sendo arrendadas, em seguida, ao Natal Cascão,
quem construiu a Capela de Nossa Senhora do Resgate, atualmente conhecida por Igreja de
Assunção, ao redor da qual se formou um pequeno povoado, hoje, bairro do Resgate.
(SANTOS et al 2010).
Nesse fluxo de arrendamentos e doações de terras, pequenos povoados foram,
gradativamente, surgindo; dando novos contornos à paisagem do Cabula e adjacências, suas
chácaras, sítios, roças e pequenos arraiais, por vezes, esparsos em meio à imensa área verde
muito presente nessa localidade até meados do século XX.

2.5 Cabula rural: apogeu e declínio

Com o término do regime escravocrata a sociedade brasileira passou por algumas


mudanças em sua estrutura social, política e econômica. Em termos políticos vivemos um
período de transição com a implantação de um novo modelo governamental, a República. Já
em termos econômicos, Tavares (2000), sinaliza que comparada com o período colonial e o
Império, a grande diferença é a inexistência de escravos. No entanto, esse autor ressalta que a
abolição da escravatura não foi acompanhada de medidas práticas que garantissem o trabalho
assalariado em todos os níveis, assim, o trabalho semi-escravo prevaleceu associado às velhas
práticas adotadas no período escravocrata.
O forte da economia brasileira continuou a ser a exportação de produtos primários,
dentre eles o açúcar, que continuava ocupando lugares importantes na economia da Bahia,
embora não com a mesma supremacia de outrora; bem como o café; o fumo; pedras preciosas;
madeira e o cacau, que possuía destaque no Sul do estado; além disso, na capital baiana,
despontava o fortalecimento das indústrias têxteis e as usinas de açúcar. (TAVARES, 2000).
Segundo esse autor, no decurso da primeira guerra mundial, havia nove fábricas de tecidos e
doze usinas de açúcar na cidade de Salvador, o que atraía moradores da zona rural para
trabalhar no setor industrial.
Embora a industrialização já começasse a trazer outros modos de produzir e
características urbanas à capital, Salvador ainda preservava fortes características rurais,
sobretudo, nas áreas mais afastadas do centro, como o Cabula e entorno. Fernandes (2003), já
sinalizava que o segundo distrito da Freguesia de Santo Antonio, ao qual pertencia o Cabula,
abrigava uma população que se dedicava, principalmente, a pequenos trabalhos rurais de
61

subsistência, que, posteriormente, foram ampliados a ponto de participarem dos ciclos de


exportação baianos.
Necessário salientar que o Cabula não acompanhou o mesmo ritmo de expansão e
urbanização que outros bairros de Salvador viveram logo nas primeiras décadas do século
XX. Desse modo, a localidade cultivou as suas características originais e, inclusive, era vista
pelo restante da população soteropolitana da época, como uma espécie de interior dentro da
cidade, até a década de 1980, conforme relatado pelos antigos moradores entrevistados.
Essas características podem ser confirmadas nos estudos de Souza (2008, p.95), que ao
retratar a cidade de Salvador do final do século XIX e início do século XX, faz as seguintes
pontuações:

Assim, as formas de habitação até então se constituíam basicamente em sobrados,


solares e cortiços, além dos agrupamentos de casas geminadas [...]. Somavam-se a
essas: as casas isoladas, construídas nos arredores imediatos que eram as sedes de
fazendas e chácaras em bairros como Federação, Garcia, Brotas e Cabula[...]
(SOUZA, 2008, p. 95)

A fama de área rural com ares bucólicos fazia jus ao que se encontrava de fato
naquelas localidades. Dessa maneira, podemos citar aspectos que remontam à mata habitada
pelos quilombolas, como a presença de fontes, lagos e riachos; reservas de Mata Atlântica
intocadas e a vasta diversidade de árvores frutíferas. Mangueiras, mangabeiras, jambeiros e
laranjeiras, são exemplos de tantas outras espécies de árvores que davam composição à
paisagem local também formada por habitações típicas da época:

[...] Aqui tinha a chácara dos “La Roche”, aqui nesse shopping, o Master [...] Tinha
a chácara de Clodoaldo Campos, o deputado estadual [...] Depois tinha a chácara de
Sr. Durval Marques da Silva, conhecido como Dudu, ele tinha essa chácara onde tá
esse Conjunto Vale das Árvores. (Entrevista n. 5 – Morador do Cabula, 70
anos)

Os sítios, chácaras e roças, junto às casas de taipa e palha das comunidades nativas,
remanescentes dos arraiais quilombolas, representavam as primeiras ocupações no final do
século XIX e início do século XX, naquela localidade:

A maioria das casas era taipa. De D. Alzira, a de Negão era taipa [...] Acho que até
90 ainda existia casa de taipa. Eu lembro das casas de taipa, por que a galera quando
tava fazendo, pegava aquele barro bem vermelho e começava a pisar[...].
(Entrevista n. 1 – Morador da Estrada das Barreiras, 39 anos)

Esses relatos além de retratarem as características da paisagem local da época, também


62

revelam as discrepâncias sociais que marcaram o Cabula e entorno no decorrer do século XX.
Assim, de um lado, temos os sítios e chácaras de médio e grande porte em áreas que hoje se
situam os bairros do Cabula, Narandiba e Saboeiro; e do outro lado, à margem da Silveira
Martins, em bairros como Beiru, Pernambués, Engomadeira, Estrada das Barreiras e outros, as
roças, casas de taipa e pequenos arraiais que foram germinando e formando os aglomerados
periféricos de hoje.
Apesar das diferenças sociais já evidentes na primeira metade do século XX, essas
áreas apresentavam em comum uma destacada oferta de árvores frutíferas. A variedade e a
quantidade de frutas presentes nas chácaras e arredores do Cabula eram tão significativas que
até os anos 1970, o local era considerado um pólo de atração de comerciantes.

O forte das pessoas aqui era vender frutas. Vendia nas fazendas e ía para a Sete
Portas vender [...] Muitos vinham de longe buscar, aqui no Cabula, laranja, manga,
fruta pão, jaca e mangaba. No tempo da mangaba, ave maria, era mangaba! Cajá,
cajarana [...] As mulheres botavam nos balaios e se mandavam pra Sete Portas pra
vender. Passavam o dia lá vendendo.(Entrevista n. 4 – Morador da
Engomadeira, 63 anos)

Desse modo, as frutas eram revendidas para os moradores das pequenas comunidades
que já começavam a se constituir e, também, nas feiras livres de Salvador. Movimentando
assim o comércio da cidade.

[...] só passavam nativos, com “os barão” na cabeça, que levava de manhã para a
Água de Meninos para vender, era cajá, era mangaba, era laranja, jambo,
pitanga[...](Entrevista n. 5 – Morador do Cabula, 72 anos)

Um fato curioso nessas falas não é somente o comércio de frutas que tal localidade
alimentava, mas, também, a variedade de espécies, que hoje, além de praticamente não
existirem mais nessa área, são escassas no comércio de frutas de Salvador ou bastante
inacessíveis pelos altos preços, como as citadas no depoimento a seguir:

As frutas saíam daqui para a cidade, as melhores frutas eram daqui, do Cabula.
Tinha de tudo, mangaba, sapoti, abiu, ingá, fruta do conde. Tinha de tudo aqui sô.
Hoje eu vejo “os povo” chegar do interior (risos) [...] Ah! Por que é do interior. [...]
Minha mãe tirava banana verde pra gente do quintal(risos) (Entrevista n. 4 –
Morador da Estrada das Barreiras, 70 anos).

. Atualmente, no século XXI, das árvores nativas mais facilmente encontradas no


Cabula restaram as jaqueiras e mangueiras. Presentes em quase toda a extensão da Avenida
Silveira Martins, evidentemente, que em número muito reduzido se comparado às décadas
anteriores. Ainda assim, é fácil encontrá-las carregadas de frutos, nos domínios da
63

Universidade do Estado da Bahia (UNEB), nas áreas dos condomínios, casas e outros
estabelecimentos presentes em tal avenida.
A propósito, as mangueiras foram lembradas por uma antiga moradora da Estrada das
Barreiras, nascida e criada no bairro de São Gonçalo do Retiro, que recorda saudosa da
natureza do Cabula de outrora.

A coisa foi degradando né, a verdade é essa [...] Ali onde é hoje a Embasa, na
entrada de São Gonçalo, aquelas árvores, todas ali são nativas [...] Aquelas
mangueiras, tem até nomes que hoje eu não me lembro mais, mas tinha manga [...]
manga itiúba, manga espada [...] Essas árvores ainda existem (Entrevista n. 2
Moradora da Estrada das Barreiras, 71 anos).

Mesmo que a presença das mangas tivesse sido imponente, outra espécie, no entanto,
se destacou no Cabula, durante a primeira metade do século XX. Lembrada nos textos de
poetas, escritores e levada para cultivo em outros estados brasileiros e países, a laranja,
ocupou espaço de evidência na história dessa localidade.
De acordo com Carvalho (1997), a laranja Baía, produzida no Cabula, chegou a ser a
mais comercializada no mundo, sendo que esse bairro, junto com Brotas, foi um dos mais
conhecidos produtores de tal fruto durante muitos anos. O referido autor, ainda faz o seguinte
registro de suas recordações do Cabula: “Sítios e chácaras um tanto afastados do centro da
capital que muito conheci quando menino e rapaz, pois frequentava as tradicionais festas de
São João e São Pedro lá realizadas no mês de junho” (CARVALHO, 1997, p.133-134). Festas
em que, por sinal, a laranja figura como alimento típico.
Enquanto as mangas, jacas e outras frutas dominavam os territórios dos atuais bairros
da Engomadeira, Beiru, Estrada das Barreiras, São Gonçalo do Retiro e outros bairros
situados à margem da Silveira Martins, como nos contaram os moradores mais antigos; os
laranjais ocupavam, predominantemente, a área do Cabula, Narandiba e Saboeiro. Isso ficou
perceptível quando questionamos alguns moradores sobre a localização dos antigos laranjais.
Nos relatos destacou-se uma propriedade que ficava localizada no terreno em que hoje
funciona o supermercado Hiper Bom Preço, na Avenida Silveira Martins.

Muita laranja, muita fruta[...] no Saboeiro e Cabula. Onde é o Hiper Bom Preço, ali
era uma chácara. Ainda me lembro o nome da dona, era uma senhora [...] A senhora
Suzan. Era uma chácara cheia de frutas mesmo. Laranja, tudo o que você imaginar.
Essa memória eu tenho bem gravada, por que a gente saía pra roubar frutas (risos)
ou ía fazer uma visita à ela de vez em quando (Entrevista n. 2 Moradora da
Estrada das Barreiras, 71 anos).
64

Outro morador também destaca a imponência das fazendas e chácaras locais, dando
ênfase à referida Chácara, que antes se localizava na atual área do supermercado Hiper
Bompreço:
O forte da laranja era o Saboeiro[...] Dali do 19 BC até a entrada do Pernambués era
tudo Fazenda[...] Aqueles casarões com aqueles baluartes. Ali onde era o Bom Preço
era uma fazenda, por sinal eram clientes meus. Me fizeram até proposta pra que eu
comprasse ali para ser uma roça, mas na época eu não tinha o cacife[...] Era clientes
meus falidos [...] aí venderam ao Bom Preço, à Mamede, por que era Paes
Mendonça. (sic) (Entrevista n. 4 – Morador da Engomadeira, 63 anos)

Pertencente à família das Rutáceas, variedade brasiliensis, a laranja Baía, ou


simplesmente laranja do Cabula tornou-se notável pela doçura dos frutos, também conhecidos
como laranja de umbigo sem caroço. (CARVALHO, 1997). Vendidas em todos os cantos da
cidade, as laranjas eram ofertadas de casa em casa pelos mercadores ambulantes, “que
percorriam as ruas da velha cidade debaixo de uma cantoria típica que ressoava nos bairros
antigos, nas praças e ladeiras durante o dia todo: ‘laranja, laranjinha doce’” (CARVALHO,
1997).
O referido autor, também afirma que as laranjas eram vendidas a preços acessíveis e
em todos os níveis sociais havia a espera do folclórico personagem do vendedor de laranjas. O
pregão ao ar livre era hábito tradicional dessa Salvador de paisagem campestre; hábito que já
não acontece mais na atualidade, com essa mesma naturalidade e rotina. Na época das boas
safras, o comércio de porta em porta se intensificava e abastecia a população da cidade. A
colheita era grande, a ponto das laranjas serem exportadas para todo o Brasil, com destaque
para São Paulo e também outros países (CARVALHO, 1997).
De acordo com Peixoto (1945), essa espécie foi levada ainda em 1873 para a
Califórnia, nos Estados Unidos da América e foi por muito tempo fonte de riqueza nesse país.
O autor revela que na referida data, William Sanders enviou mudas de laranjeira da Bahia
para sua amiga Elisa Tibbets, em Washington; uma delas seguiu para a Califórnia, onde foi
plantada. É, portanto, dessa muda, que procedem os laranjais da Califórnia, que hoje rendem
aos Estados Unidos, cerca de 100 milhões de dólares, ou seja, metade do orçamento do Brasil,
segundo apontou Peixoto (1945).
A importação da fruta resultou em um negócio rentável para os americanos, tanto que,
na cidade de Riverside, ao Sul da Califórnia, aos pés de uma das árvores remanescentes, foi
posta em 1943, uma placa que homenageia a Sr Tibbets pela plantação das mudas de laranja e
ainda qualifica essa importação como “a mais valiosa importação de fruto jamais feita”. Essa
informação, assim como a representatividade econômica da laranja nos Estados Unidos estão
65

registradas no Jornal The Milwaukee Sentinel de 21 de fev de 19432, conforme trechos


destacados a seguir:

[...] Other citrus orchadists in The Riverside area immediately recognized the great
commercial value of the new variety and a huge demand developed for its buds. The
first bud cuttings from the trees, about a quarter of an a inch long, sold for from $1to
$5 each. It is estimated by te California Fruit Growers Exchange officials that the
groves which stemmed from these two parent trees already havy returned a yield of
one billions dollars [...]The on remaining original orange tree was given to the City
of Riverside in the settlement of the Tibbets estates and was transplanted to small
parked area acros the street from the Tibbets homestead. There it still stands today,
healthy and bearing fruit, beside a bronze tablet that commends Mrs. Tibbets for her
good work and describes the tree as “the most valuable fruit introduction yet made
by the United States Departament of Agriculture”.

Ainda hoje, no atual século XXI, as laranjas possuem uma alta representatividade na
economia americana e continuam a render importantes lucros. Mas, e na Bahia? O Cabula
ainda continua como um pólo exportador do fruto? Diferentemente do que ocorreu nos
Estados Unidos que continuaram numa crescente produção, o apogeu das laranjas no Cabula
durou até os anos 1950. Antigos moradores contam que uma praga se espalhou pelos laranjais
e arrasou todas as plantações, a tal ponto de levá-las à extinção.
Dos laranjais restaram a história de uma época áurea e representativa para o bairro,
que sobrevive dos escritos de pesquisadores, das narrativas orais dos moradores que tiveram a
oportunidade de viver nesse tempo e daqueles residentes mais engajados, representantes de
uma frente de resistência pelo patrimônio da localidade. Como é o caso dos moradores do
Cabula I (Conjunto ACM – Estrada das Barreiras), que em homenagem a esse período
histórico, colocaram como símbolo da Associação de Moradores, uma laranja, assim nos
contou um morador local:

Lá no conjunto, a bandeira da Sede do Conselho de Moradores, o símbolo é uma


laranja. Infelizmente, hoje, eu acho que não existe assim nenhum lugar que tenha
uma laranjeira. Assim [...] talvez, uma chácara dessas ainda antigas de repente ainda
pode encontrar algum pezinho de laranja, dessa que foi símbolo do Cabula aqui
todo, mas é muito difícil.(Entrevista n. 6, Morador do Cabula I, 50 anos)

Além dessa homenagem da comunidade, mais nada de monumentos; placas de bronze,


como a encontrada em Riverside nos Estados Unidos, ou qualquer outra reverência que

2
Disponível em:
https://news.google.com/newspapers?nid=1368&dat=19430221&id=f1NQAAAAIBAJ&sjid=Nw4EAAAAIBAJ
&pg=4906,5202425&hl=pt-BR. Acesso em: 15 Jan. 2016.
66

inspire a valorização e a difusão de tão importante capítulo da história desse local. Os


laranjais se esvaíram e junto com eles, o ar bucólico e interiorano característico dessa época
do Cabula. Seus vendedores de laranja e suas chácaras repletas de árvores frutíferas,
gradativamente, foram perdendo espaço para a urbanização.

2.6 Ecos da Urbanização

O aspecto rural foi uma característica que perdurou no Cabula e entorno por muito
tempo, uma vez que as transformações da paisagem dessa localidade aconteceram de maneira
gradativa. Até o final dos anos 1980, ainda eram percebidos resquícios interioranos no bairro
e nas localidades adjacentes, conforme relatado pelos antigos moradores entrevistados. Trata-
se de uma urbanização tardia, mas que começa a despontar ainda na década de 1930 com as
intervenções realizadas pelo Estado, como exemplo, a implantação da linha de bondes.
Porém, a intensificação do processo de urbanização tem o seu marco na década de
1940. De acordo com Souza (2008), no final de 1943, o Escritório de Planejamento e
Urbanismo da Cidade do Salvador (EPUCS) instituiu variadas medidas para uma nova
concepção urbana da cidade, a exemplo da elaboração de diretrizes para a localização e
construção de habitações populares.
As pesquisas de Fernandes (2003) e Gouveia (2010) também nos mostram que outros
marcos foram indicativos da intensificação urbana nos bairros do chamado, miolo de
Salvador, no decorrer do século XX, como a instalação de uma unidade do exército, o 19º
Batalhão de Caçadores (19 BC) em 1943, e o desenvolvimento dos meios de transportes
urbanos que contribuíram para alterar as dinâmicas de ocupação da área, assim como: a
criação da Avenida Silveira Martins, entre os anos de 1965 e 1966 e a criação da Avenida
Luiz Viana Filho, em 1970, conhecida como Avenida Paralela, o que direcionou os fluxos de
ocupação, gerando um espaço dinâmico no que se refere a habitação e a expansão do setor de
serviços no seu entorno.
Essas intervenções favoreceram a migração de sujeitos de diferentes bairros de
Salvador e do interior da Bahia para o Cabula e entorno, os quais tiveram o seu processo de
ocupação caracterizado por loteamentos populares, alguns desses, originados de
arrendamentos e doações de terras. Era comum, donos de fazendas e chácaras, especialmente,
com o término do apogeu da laranja, doarem/arrendarem partes de suas terras, para os
67

caseiros – moradores da localidade que tomavam conta das propriedades. Desse modo, muitas
famílias estabeleceram a sua morada nesses arredores por meio dessas práticas.

[...] Quem tinha sítio trabalhava em casa mesmo. A maioria “desses pessoal”, seu Otávio (morador antigo da
Estrada das Barreiras) [...] Eles tomavam conta de fazenda. Aí os donos doavam uma parte para a pessoa que
tomava conta. (Entrevista n. 1 – Morador da Estrada das Barreiras, 39 anos)

Por outro lado, a povoação do Cabula também foi marcada pela ilegalidade. Invasões e
disputas de terras deram a tônica aos processos de ocupação vividos em quase todos os
dezessete bairros que compõem o locus dessa pesquisa, sobretudo, os bairros da Fazenda
Grande do Retiro, Arraial do Retiro, Engomadeira, Beiru, Pernambués, e outros, como
Saramandaia e Arenoso, por exemplo.
Nesse contexto se acirravam as intervenções urbanas capitaneadas pelo Estado e a
necessidade de sobrevivência dos que moravam na localidade de maneira irregular. Um
processo que se intensificou, quando o Cabula e entorno passou a ser considerada a partir da
legislação do Projeto Narandiba, como área de interesse social para fins de desapropriação
pelo decreto estadual nº 25.144, de 12 de março de 1976. Esse projeto do Estado desapropriou
muitas terras irregularmente ocupadas, para fins de moradia da classe média, por meio da
URBIS (Habitação e Urbanização da Bahia). Assim, procedeu-se a construção de conjuntos
habitacionais variados entre os anos de 1964 e 1986 (GOUVEIA, 2010; MOTTA; FREITAS,
2014), alguns dos quais podem ser observados no quadro 7.

Quadro 7: Conjuntos Habitacionais construídos pela URBIS na área do Cabula


Nome atribuído Nome dos Número total de Ano de entrega
pela URBIS logradouros unidades
Cabula III Conjunto 52 1977
Habitacional
Otaviano Rodrigues
Pimenta
Cabula IV Conjunto 290 1978
Governador José
Marcelino
Cabula IX Saboeiro 684 1982
Cabula X Doron 1.288 1983
Florestal Ville 96 2000
Fonte: Gouveia (2010)

Fernandes (2003), também destaca o papel do Instituto de Orientação às Cooperativas


Habitacionais – (INOCOOP), que era vinculado ao Banco Nacional de Habitação (BNH),
atuante entre os anos de 1964 e 1986. Entre as cooperativas habitacionais realizadas no
68

Cabula pelo INOCOOP, podemos citar o Conjunto CHOPM-1 (Cooperativa Habitacional dos
Oficiais da Polícia Militar), ou conjunto Bahia de Todos os Santos, composto por 880
unidades e entregue no ano de 1980; Conjunto Chácara do Cabula, resultado de três
cooperativas voltadas a metalúrgicos e operários telefônicos, composto no total por 408
unidades entregues em 1976; e o Conjunto Pomar do Cabula composto por 320 unidades
entregues no ano de 1992. (FERNANDES, 2003).
De maneira simultânea à expansão dos conjuntos habitacionais, o Estado realizou
outras intervenções urbanas, que visavam atender a demanda de serviços da população do
Cabula e entorno, cada vez mais crescente. Entre elas, estão: a implantação da Companhia de
Eletricidade do Estado da Bahia – COELBA em 1970; da Empresa Baiana de Águas e
Saneamento – EMBASA em 1976; das Telecomunicações da Bahia - TELEBAHIA (hoje
empresa OI S.A. Telecomunicações) e do Hospital Geral Roberto Santos, ambos no ano 1978;
a implantação da Universidade do Estado da Bahia - UNEB em 1979; a implantação hospital
Psiquiátrico Juliano Moreira em 1982 e da Telebahia Celular na década de 1990, onde
atualmente encontra-se a empresa de Telefonia VIVO) (GOUVEIA, 2010).
Observamos que entre as décadas de 1940 e 1990, o Cabula e entorno, ficou marcado
pelas constantes iniciativas urbanas capitaneadas pelo Estado, que contribuíram para as
profundas alterações da paisagem local. Contudo, ao analisar o local onde tais intervenções
foram realizadas, fica evidente que esse processo não atingiu de maneira homogênea toda a
localidade, foram chegando gradativamente aos demais bairros e se concentraram
majoritariamente no bairro do Cabula, o qual ainda hoje se destaca em relação aos demais
bairros, se constituindo em ponto central no que se refere à infraestrutura urbana e de
serviços.
No entanto, os impactos sociais e ambientais causados pela urbanização ecoaram por
toda a extensão da localidade. Da ocupação ilegal da terra, que permaneceu mesmo com as
desapropriações forçadas, originaram-se os aglomerados urbanos que cresceram
desorganizadamente, sob as depressões e vales típicos do terreno acidentado dessa área,
dando contorno à paisagem de muitos bairros da atualidade. As casas de taipa e palha foram
uma constante nos agrupamentos sociais formados até a década de 1980, os quais acolhiam a
crescente população de imigrantes excluída dos programas de habitação financiados pelo
estado.
A maneira desassistida de formação dos bairros dessa localidade também representa
um marcador social, que revela a diferença de classe presente em bairros como o Resgate,
Cabula VI, Saboeiro e Cabula, por exemplo, os quais, possuem um processo resultante das
69

intervenções do Escritório de Planejamento e Urbanismo da Cidade do Salvador e da URBIS,


nas demais localidades. Dentre as diferenças sociais, podemos destacar o acesso limitado aos
serviços públicos básicos pelos moradores de localidades situadas a margem da Avenida
Silveira Martins, como foi o caso do acesso ao sistema de transporte entre as décadas de 1960
e 1980. Cenário explicitado na seguinte fala:

Só tinha uma condução, que vinha do Tancredo Neves, de não sei quantas em
quantas horas. A maioria do povo ía pegar carro no São Gonçalo, eu mesmo, tinha
que sair de madrugada pra ir trabalhar e pegar ônibus no São Gonçalo.(Entrevista
n. 4 – Morador da Engomadeira, 63 anos)

E não somente o sistema de transporte era insuficiente, mas também os serviços de


energia elétrica, água encanada e pavimentação, os quais eram oferecidos à parcela muito
reduzida da população local. As dificuldades geradas por essas limitações de serviços básicos
são expressas nos relatos a seguir.

Era um lugar super atrasado [...] A rua principal, como a Silveira Martins, e só aí em
cima, mais ou menos, algum lugarzinho do fim de linha, que tinha energia e água.
Esses lados de cá, pelo menos quando eu cheguei aqui, não tinha nada. Eu sou
fundador dessa daqui. Era só mato, mato, escuridão, atraso. Depois com o tempo foi
evoluindo [...] A gente se divertia à noite, fazia fogueira, batia papo, contava história
[...] Não tinha energia [...] depois que veio o progresso.

[...]

Quando eu vim era barro até o 19 BC. Do 19 BC pra lá já era asfaltado. Já tinha
asfalto, não como agora. Era aquele asfaltozinho grosseiro, até o 19 BC, quando
chegava o 19 BC aí acabava, era barro. Até pra cá pra Tancredo Neves, tudo era
barro (Entrevista n. 4 – morador da Engomadeira, 63 anos)

Esses relatos retratam o período entre as décadas de 1960 e 1980 no Cabula e entorno.
Época em que determinadas áreas da localidade apresentavam situação precária quanto a
infraestrutura, desses bairros situados à periferia do Cabula. Uma reportagem do jornal A
Tarde de 1974, denuncia as difíceis condições de vida que enfrentavam os moradores do
bairro de Sussuarana, por exemplo.
70

Figura 6: Bairro de Sussuarana (1974)

Fonte: A Tarde

Transporte, água, escola, iluminação, policiamento quase tudo está faltando em


Suçuarana um bairro em franca expansão localizado nas proximidades do 19BC.As
ruas sem pavimentação com muita poeira nos dias secos ou transformadas em
lamaçal quando ocorrem chuvas, tornam difícil o transporte o que contribui mais
ainda para a revolta dos moradores. Conseguir gêneros alimentícios é um problema
já que não existe armazém em Suçuarana. Os moradores fazem suas compras em
Pau da Lima ou em Barreiras.

[...]

D. Maria dos Reis uma das mais antigas moradoras da Suçuarana é quem afirma:
"Aqui para se tomar um ônibus é o maior sacrifício. O pessoal é obrigado a andar a
pé até o Jardim Guiomar e quando está chovendo é muito penoso". Escola não existe
para os meninos que são forçados a um deslocamento grande até Mata Escura para
frequentarem uma, que nem sempre tem vaga para as crianças em idade escolar.
Em Suçuarana não tem posto médico, nem farmácia. As condições sanitárias
precárias do bairro sempre provocam enfermidades que na maioria das vezes são
mal curadas o que determina o aumento de doentes. (A TARDE, 1974, p.5)

A carência de uma infraestrutura de serviços, a paisagem rural debilitada presente na


Sussuarana da década de 1970 são apenas uma amostra de uma conjuntura semelhante a dos
bairros vizinhos que também tiveram uma urbanização tardia, como Engomadeira, Beiru,
Arenoso, Arraial do Retiro, Estrada das Barreiras, Fazenda Grande do Retiro e Pernambués,
por exemplo. Esses últimos, destacados nas fotografias abaixo. Bairros que fizeram valer a
previsão exposta na reportagem: tornaram-se favelas.
71

Figura 7: Bairros Pernambués e Fazenda Grande do Retiro (respectivamente) entre os anos


1970 e 1980

Fonte: (CASTRO; GABRIEL, 2013)

Desse modo, a oferta escassa de serviços públicos, junto às migrações constantes de


moradores do Centro da cidade e do interior para o Cabula e entorno contribuíram para a
periferização dessa localidade. Fernandes (1993) caracteriza esse processo como mecanismo
de expulsão dos pobres citadinos ou imigrantes, dos centros urbanos para as áreas mais
distantes da cidade, como se configurava o Cabula no início do século XX. A autora ainda
reitera que são as dificuldades para satisfazer a necessidade habitacional num local próximo
ao centro urbano que causam o processo de periferização urbana em Salvador.
Atualmente, no século XXI, a localidade do Cabula e entorno, em especial os bairros
que estão à margem da Avenida Silveira Martins, ainda sofrem com a carência de
infraestrutura de serviços públicos. Transporte, segurança, pavimentação, saúde, dentre outros
itens básicos à dignidade humana ainda são lacunas visíveis no contexto local. A aridez dos
problemas sociais e a necessidade de sobrevivência diante das adversidades incutiram nessas
comunidades uma característica peculiar: o engajamento na luta por direitos sociais.
Os levantamentos historiográficos realizados, o convívio e o compartilhamento com
grupos locais do Cabula e entorno, nos permitiram constatar que a luta por melhores
condições de vida, nessas comunidades, não se restringe ao período dos arraiais quilombolas,
pelo contrário, o quilombo resistiu e ainda resiste. As práticas de solidariedade entre os
moradores, a exemplo dos mutirões para a construção das casas de taipa, as reivindicações por
asfalto, energia elétrica e outros serviços, prática comum nesses bairros até a década de 1990,
ainda hoje são realizadas e tomam perspectivas mais ampliadas.
Assim, podemos citar as parcerias e as articulações com grupos presentes na
comunidade, a exemplo de associação de moradores, igrejas, terreiros, dentre outros espaços,
72

constituídos enquanto mecanismos que contribuem para mitigar as mazelas geradas pela falta
de assistência do poder público. Nesse cenário de descompasso social e enfrentamento que
vemos emergir iniciativas como a construção de cooperativas e outros arranjos sócio-
produtivos locais; a fundação de creches e escolas comunitárias, cursos e oficinas de
formação a custos acessíveis à comunidade, por vezes, desenvolvidos pelos próprios
moradores, assim como a elaboração de alternativas de arte, cultura e lazer, dentre outras
soluções criadas na tentativa de suprir as lacunas deixadas pelo Estado.
Ainda que as discrepâncias sociais sejam evidentes entre os bairros do Cabula e
entorno, as iniciativas de urbanização que se intensificaram ao longo da segunda metade do
século XX, contribuíram para tornar essa localidade periférica de Salvador, de uma maneira
geral, uma das mais atraentes do ponto de vista habitacional, por ser uma área centralizada,
próxima às saídas importantes da cidade e bem estruturada de serviços. Em contrapartida,
houve um prejuízo significativo do ponto de vista do uso inapropriado do solo; a severa
devastação das áreas verdes, o aterramento e ou poluição das diversas fontes, riachos e lagos
daquela paisagem bucólica tão característica do Cabula interiorano.
Esse quadro continuou se agravando com a entrada de mais um agente de
transformações do Cabula. Desde a década de 1990, até os dias atuais, o capital imobiliário,
atraído pela crescente valorização da área, vem atuando massivamente na compra e
desapropriação de antigas chácaras, casas e áreas verdes remanescentes, as quais têm sido
gradativamente, substituídas por grandes empreendimentos e condomínios luxuosos. É sobre
os impactos que o mercado imobiliário vem causando nas áreas do Cabula e entorno que
discorreremos no próximo intertítulo.

2.7 De quilombo à zona de especulação imobiliária

Os processos de ocupação vividos pelo Cabula e o seu entorno deram origem a uma
área de características multifacetadas. Seja pela peculiaridade cultural de sua comunidade e as
raízes ancestrais que fundamentam a história dessa localidade, mas, também, pela diversidade
de suas paisagens, as quais foram transformadas no decorrer do processo histórico.
Destacamos, nesse sentido, as profundas alterações realizadas nos anos 1990 até os dias
atuais, sobretudo, a partir dos empreendimentos realizados pelas grandes construtoras.
Segundo Gouveia (2010), essa localidade é marcada pela heterogeneidade e possui
basicamente quatro tipos de paisagens: 1) conjuntos residenciais com casas bem estruturadas;
2) conjuntos habitacionais antigos; 3) áreas periféricas de ocupação irregular; e 4) novos
73

condomínios fechados com ampla infraestrutura. Esses quatro tipos de paisagem são
ilustrados a partir de fotografias aéreas, utilizadas por Gouveia (2010):

Figura 8: Bairro do Cabula em 1959

LEGENDA

1-Futura BR 324

2-Futura Avenida
Silveira Martins

3- 19 Batalhão de
Caçadores (19 BC)

Fonte: CONDER utilizado por Gouveia (2010)

Na figura 8 é possível observar os reflexos das primeiras intervenções realizadas pelo


estado, a partir da década de 1940, como o 19º Batalhão de Caçadores, o 19º BC, e os
primeiros conjuntos habitacionais. É possível identificar também, algumas residências antigas
que são mínimas diante do predomínio quase absoluto das áreas verdes.

Figura 9: Vista aérea do Cabula, em 2016

Fonte: Google Maps

Quando comparamos a figura 8, que retrata o ano de 1959, com a figura 9, que ilustra
a paisagem do Cabula no ano de 2016, fica nítida a completa reconfiguração daquela
74

paisagem rural e verde, para uma paisagem com construções adensadas que mais se
assemelha a um conglomerado urbano. Das áreas verdes que até a década de 1970
predominavam nesse território, restam apenas as áreas protegidas pelo 19º BC (1) e os trechos
do Horto do Cabula nas imediações da Estrada das Barreiras (2), que vem sofrendo severo
processo de degradação. As demais áreas verdes remanescentes aparecem pulverizadas no
mapa perdendo cada vez mais espaço para a expansão de prédios.
De acordo com Fernandes (2003), entre 1976 e 2000 foram construídos 34 conjuntos
habitacionais/condomínios no Cabula, totalizando 9.935 unidades residenciais. Esses
empreendimentos, no entanto, eram voltados às classes populares, com renda entre 3 e 5
salários mínimos, no caso dos construídos pela URBIS, e entre 6 a 10 salários mínimos
quando se tratava de empreendimentos feitos pelo INOCOOP. Contudo, esse tipo de
construção passou a perder espaço para outra tipologia habitacional, empreendida pelas
grandes construtoras (PENA; LIMA; FERNANDES 2011, p.10).
Segundo esses autores, o Cabula passou a experimentar um novo modelo de moradia,
caracterizado pela verticalização imobiliária e a construção de condomínios fechados. Assim,
essa localidade, onde antes havia conjuntos habitacionais horizontais, passou a abrigar
empreendimentos que chegam a alcançar 24 andares. Pena, Lima e Fernandes (2011), ainda
salientam que, geralmente, a verticalização aparece em áreas bem equipadas em infraestrutura
e acessibilidade, e, por isso, possuem elevados valores relativos e relacionais, áreas com
“status” como o Centro de Salvador e o seu entorno. Contrariando a lógica convencional, a
verticalização vem atingindo áreas como o Cabula, que embora tidas como periféricas passam
a ser preferência da classe média.
O que diferencia os novos condomínios do Cabula, dos antigos conjuntos
habitacionais é a infraestrutura oferecida, como os itens de lazer e a estética dos edifícios que
se assemelha a de construções típicas das áreas historicamente valorizadas da cidade, como
Pituba, Centro e entorno. Outros aspectos importantes, também destacados por Pena, Lima e
Fernandes (2011) são a localização estratégica desses empreendimentos, geralmente situados
nas áreas de maior valor relacional da localidade, onde se concentram as melhores
infraestruturas e serviços, e, também, o apelo midiático das peças promocionais desses
condomínios, que enfatizam a presença de uma Reserva de Mata Atlântica no Cabula para
agregar valor ao empreendimento.
Esse último aspecto acaba sendo uma grande contradição, pois, o saldo apresentado
após a implantação dos mais de 23 (vinte e três) empreendimentos construídos no Cabula ao
longo dos anos 2000, dados trazidos por Gouveia (2010) é, além da profunda
75

descaracterização dessa localidade, o severo desmatamento de áreas verdes nativas, cuja


preservação é defendida por grupos locais. Lutas, que infelizmente, por vezes, sucumbem
diante da força e influência do capital imobiliário da cidade, como ocorreu com a implantação
do luxuoso empreendimento, complexo Horto Belo Vista, que hoje em 2016, já instalado,
funciona a contragosto de representantes da comunidade e à custa de uma significativa área
verde e histórica desmatada.
Tanto a expansão da infraestrutura de serviços, quanto a construção de novas vias de
acesso ao Cabula, como a Via Expressa Baía de Todos os Santos, que liga o Cabula ao Porto
de Salvador, a proximidade com estações do Metrô e o Complexo Viário Imbuí-Narandiba,
continuam a agregar valor relacional à essa localidade, que tem suas áreas ainda não
ocupadas, cada vez mais assediadas pelas construtoras imobiliárias (GOUVEIA, 2010). Nesse
fluxo, observamos florescer um Cabula altamente elitizado com condomínios bem
estruturados e altos edifícios luxuosos, que disputam espaço com os conjuntos habitacionais e
os aglomerados urbanos, cujas residências de arquitetura precária se expandem à periferia da
Avenida Silveira Martins, evidenciando uma segregação social cada vez mais latente nessa
localidade de Salvador.
A desigualdade explícita entre essas formas de ocupação revela a complexidade que
reveste essa localidade. De um lado a aclamada “modernidade”, a suposta valorização local
gerada pelo progresso capitaneado pela especulação imobiliária; do outro, o viver comunitário
forjado na história dessa comunidade e que ainda sobrevive, resistentemente, nas práticas
cotidianas de seus moradores. Os assentamentos quilombolas de outrora, embora
imperceptíveis na paisagem atual, ainda se fazem vivos na gente do Cabula, nos seus traços,
nas suas cores e nos seus saberes, que mobilizam práticas sociais impregnadas da
ancestralidade, dando corpo à identidade local e ao rico legado cultural dessa antiga e
multifacetada área remanescente de quilombo.
Assim como afirma Nicolin (2007) e conforme demonstramos no decorrer deste
capítulo, o Cabula e entorno resguardam o legado da ancestralidade africana e indígena e os
valores da vida comunal, mas, também, tentam unir a tradição à contemporaneidade
anunciada pela urbanização e a especulação imobiliária. Podemos falar, portanto, de um
legado que resiste e se renova diante dos avanços tecnológicos, das mudanças da paisagem e
do modo de vida de seus moradores, mas que como mecanismo de sobrevivência se
resignifica nas rupturas e nas alternativas construídas pela comunidade e os grupos locais.
Essas alternativas se manifestam nas práticas sociais dos moradores, se originam das
necessidades cotidianas e mobilizam diálogos históricos e interculturais.
76

A trajetória sócio-histórica do Cabula e entorno, percorrida até aqui, revela um


contexto onde tradição e progresso se entrelaçam, mas que, também se apresenta fragilizado
pelas mazelas sociais. Ainda assim, nesse cenário de paradoxos vemos eclodir movimentos
que revelam um dos aspectos mais valorosos dessas comunidades: as produções realizadas
pelas pessoas e coletivos locais no que se refere à cultura e ao engajamento político e social.
A razão de ser do Portal TBC Cabula é, justamente, essa dinâmica produtiva
efervescente, base valiosa para a implantação de práticas de turismo de base comunitária e
que torna o Cabula e entorno uma comunidade em movimento, da sua gênese aos dias atuais.
77

“A IMERSÃO”

“[...] As práticas por mais concretas e simples, não existem soltas e desgarradas. São sempre
práticas situadas entre as de determinados(s) sujeito(s) e num dado contexto onde se
relacionam com práticas outras. Por trás, por isso, de qualquer prática existe uma teoria ou
concepção dela, sem a qual não seria ela uma prática humana, muito menos social. Explicitar
essas teorias ou explicações, escondidas nas práticas que se relatam, referi-las umas às outras
e inseri-las num universo mais amplo de práticas correlacionadas, essa a função do discurso
teórico”.

(MARQUES, 2008, p.103)


78

CAPÍTULO III

3 Cabula, uma comunidade em movimento

Os processos de formação sócio-histórica do Cabula e entorno, apresentados no


capítulo anterior, imprimiram múltiplas características a essa localidade no que se refere aos
modos de ser, produzir e viver dos moradores. Nessa conjuntura está refletida a
interculturalidade nascida do convívio entre indígenas, africanos e europeus. Heranças cujos
traços resistem ao tempo se fundindo às transformações urbanas ainda latentes.
Atualmente, podemos inferir que as dezessete comunidades hoje pertencentes ao
Cabula e entorno são bairros populares de comércio intenso e produtivo, que enfrentam os
problemas causados pela limitação e ou ausência de serviços públicos básicos, a exemplo dos
serviços de saúde; infraestrutura urbana; emprego; educação de qualidade, dentre outros itens
básicos ao convívio e bem estar social. Dados sobre alguns desses aspectos foram obtidos por
meio do último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) realizado no
ano de 2010 e resumidos no quadro a seguir:

Quadro 8: Estatísticas do Cabula e entorno

Lixo Esgotamento
jogado em sanitário Responsáveis por
terreno inadequada Analfabetismo Índice de domicílios sem
Bairros baldio(%) (%) (%) pobreza (%) rendimento (%)
SALVADOR 2,8 6,46 3,97 5,57 13,43
Arenoso 8,42 4,21 7,26 9,08 16,8
Arraial do Retiro 4,78 4,33 6,14 7,47 13,92
Beiru/T. Neves 5,36 2,38 5,7 6,08 14,63
Cabula 1,85 1,04 5,83 1,18 8,2
Doron 0,09 1,38 1,01 0,68 11,34
Engomadeira 1,73 2,12 5,59 6,97 14,13
Est. das Barreiras 1,64 4,05 4,33 3,57 11,2
Faz. Gde do Retiro 2,38 1.27 4,12 5,32 12,9
Mata Escura 3,02 3,42 6,28 7,03 15,24
Narandiba 2,02 20,01 5,93 6,32 11,11
Novo Horizonte 4,59 4,02 3,8 5,44 15,79
Pernambués 1,37 2,61 3,71 3,38 11,8
Resgate 0 0,13 0,59 0,61 6,88
Saboeiro 0,13 2,95 1,43 1,28 7,54
S. Gonç. do Retiro 11,35 4,13 5,32 6,77 16,1
79

Saramandaia 8,67 3,91 10,21 11,17 15,18


Sussuarana 8,58 3,13 6,38 7,59 17,34

Fonte: a autora a partir de dados do IBGE (2010) (grifo nosso)

Analisando o quadro 8 é possível inferir que em relação à média obtida para a cidade
de Salvador, Bahia, os bairros pertencentes ao Cabula e entorno, ainda apresentam um
número significativo de domicílios que realizam coleta de lixo inadequada. Oito dos dezessete
bairros possuem índice superior à média soteropolitana, no que se refere ao descarte de lixo
em terrenos baldios, destacando-se, negativamente, o bairro do São Gonçalo do Retiro com
11,35%.
O mesmo ocorre para o quesito pobreza, no qual, o bairro da Saramandaia desponta
com 11,17%, ou seja, quase seis pontos percentuais acima da média de Salvador que foi de
5,57%. Esse aspecto reverbera em outros índices, como os números de responsáveis por
domicílios que não possuem rendimento e o analfabetismo. Nove dos dezessete bairros
apresentaram um quantitativo de responsáveis por domicílio sem rendimento, acima da média
da capital.
Quanto à taxa de analfabetismo, apenas três bairros obtiveram índices inferiores
àqueles verificados na cidade de Salvador, a saber: Doron, Resgate e Saboeiro, a justificativa
para esses resultados pode se estabelecer tanto pelo fato desses bairros serem menos
populosos, se comparados aos demais bairros da localidade do Cabula e entorno, quanto pelo
processo de configuração sócio-espacial desses bairros, historicamente, habitados pela classe
média e, também, mais assistidos pelo poder público em termos de infra-estrutura urbana,
serviços, etc.
Embora os dados analisados evidenciem as dificuldades sociais enfrentadas por esses
bairros, no centro desses problemas prospera um dos aspectos que mais engrandecem as
comunidades ora estudadas: as ações de seus sujeitos e coletivos, os quais na busca pela
inclusão social, afirmação e fortalecimento de valores étnicos e comunitários contribuem para
a reconfiguração de concepções, conceitos, modos de vida e produção, ao forjarem novas
dimensões para os processos de construção, socialização e difusão de “saberes instituintes”
(CASTORÍADIS, 1982).
Tal dinâmica ajuda a manter viva uma história negada e ações que exprimem
identidades e práticas de caráter religioso, político, cultural e social, que emergem do
cotidiano dos moradores e são reflexo do contexto histórico que sedimenta as raízes dessa
localidade. Trata-se, portanto, de construções relevantes, nas quais estão enlaçados modos de
80

organização comunitária peculiares, que conferem a essa localidade uma condição latente de
produção criativa. São organizações religiosas; Organizações Não Governamentais (ONG´s);
associações, escolas e creches comunitárias; cooperativas; grupos artísticos e culturais;
mutirões comunitários; dentre outras variadas ações e ambientes criativos, que remontam à
gênese histórica e social do Cabula e entorno.
Em levantamento iniciado pelo Projeto Turismo de Base Comunitária no Cabula e
entorno, em 2010, e atualizado a partir de nova coleta e sistematização de dados feita para fins
desta pesquisa, constatamos a existência de 132 produtores e coletivos de produção com
propósitos diversificados. Considerando o interesse deste estudo, em atuar com a produção
coletiva, selecionamos deste total, 88 grupos, que denominaremos no decorrer da escrita desta
tese por comunidades de prática. Salientamos que a escolha por essa denominação será
elucidada no decorrer deste capítulo.
As 88 comunidades de prática selecionadas atuam em âmbitos como: educação
comunitária, produção cultural e artística, que inclui música, dança, teatro, poesia, artes
plásticas e visuais em suas diferentes manifestações; projetos sociais e cooperativismo. Tal
escolha se justifica, primeiramente, pela necessidade de mantermos um recorte para fins dessa
pesquisa, e, também, por serem os grupos atuantes nessas áreas, aqueles que tem contribuído
mais ativamente nas comunidades do Cabula e entorno, pois funcionam como pólos
agregadores e mobilizadores de pessoas e ações que beneficiam as comunidades; aspecto que
favorece a continuidade de ações nessa localidade.
Nesse sentido, organizamos no quadro a seguir, o quantitativo de comunidades de
prática presentes no Cabula e entorno, disposto por bairro.

Quadro 9: Comunidades de práticas do Cabula e entorno por bairros

Bairro Comunidades de prática locais Total


03
1- Biblioteca Comunitária Zeferina/Beiru
ARENOSO 2- Associação Desportiva do Arenoso
3- Cia Calhandra de Teatro

03
1- Aliança dos Cegos
ARRAIAL DO
2- Grupo de Capoeira Maré
RETIRO
3- Grupo de Samba Chula
81

1- Projeto Domingo Alternativo 25


2- Grupo de Resistência e Diversidade do Beiru
3- Negranna Turbantes
4- Cooperativa Espalha Fatos
5- Grupo de Escritores do Beiru
6- Grupo de skatistas Beiru Skate Plaza
7- Associação Comunitária e Carnavalesca Mundo
Negro
8- Coletivo Beiru em Movimento
9- Grupo de Capoeira Unicar
10- Grupo de música ICIMA
11- Cooperativa Coopertane
BEIRU/TANCREDO 12 Galeria Nildon Ribeiro
NEVES 13- Movimento Beiru Sustentável
14- Grupo musical Edifica Rap
15- Companhia de Dança Patrícia Viana
16- Grupo de teatro os mentirosos
17- Rádio Hits
18- Rádio Nova Onda
19- Jornal do Beiru
20- Dança de rua Caíque e Daiara
21- Grupo de hip hop Hardstyle Crew
22- Valsa expressartes (dança)
23-Jovens talentos do Helena
24-Grupo Breaking Nois
25- Grupo de teatro Veja
04
1- Rádio Web Juventude
CABULA 2- Grupo de Capoeira Angola Mestre Pelé
3- Grupo de Capoeira Guerreiro de São Jorge
4- Centro Cultural do Cabula
01
DORON
1- Movimento Muda Doron
04
1- Grupo Arca do Axé
2- Escola Comunitária da Engomadeira
ENGOMADEIRA
3- Cooperativa COOFE
4- Grupo de Hip Hop Rapaziada da Baixa Fria

05
1- Escola de Educação Percussiva
2- ArtBagaço Ode Art
ESTRADA DAS
3- Projeto Cidadão
BARREIRAS
4- Denissena operário cultural
5- Clube de Mães
82

12
1- Núcleo de Arte Espírita Ivone do Amaral
2- Grupo Gay da Fazenda Grande do Retiro
3- Esporte Galícia
4- Grupo de Teatro A Pombagem
FAZENDA 5- Grupo de Mulheres do Calafate
GRANDE DO 6- Projeto Música no Final de Linha
RETIRO 7- Grupo artístico primeiro de maio
8- Artes manuais Casal de vidr
9- Mestre Zé do Lenço – Instrumentos musicais
10- Zé Grilo e Trio Lampião
11- Cia da Dança
12- Filhos da Regional
07
1 Grupo Raízes da Palavra
2 ACOPAMEC
3 Cooperativa Flor da Mata
MATA ESCURA
4 Grupo Cultarte
5 Cia Elementhos
6 CIA. Juntando os cacos
7 ACOMARTE
Durante a pesquisa não foram identificadas 00
NARANDIBA comunidades de prática com as características do
recorte utilizado para este estudo.
NOVO 01
HORIZONTE 1 Sarau da Onça
14
1 Terno de Reis Rosa Menina
2 Grupo BBG
3 Negro Davi e banda
4 Concurso Beleza Negra de Pernambués
5 Cultarte
6 Fanfarra Kleber Pacheco – FANKEP
7 Fanfarra Ministro Aliomar Baleeiro
PERNAMBUÉS
8 Grupo Linha de Frente.
9 Comunicação , militância e atitude (CMA)
10 Banda Sfonia
11 Samba da Ladainha
12 Grupo de Teatro CTSD
13 RÁDIO WD.
14 Coral de Jovens de Pernambués.

Durante a pesquisa não foram identificadas 00


comunidades de prática com as características do
RESGATE
recorte utilizado para este estudo.

01
SABOEIRO
1-Associação de Moradores do Saboeiro
83

SÃO GONÇALO 01
1- Circo Maravilha
DO RETIRO
03
1- Grupo de Teatro da Saramandaia
SARAMANDAIA
2- Projeto Ruas de Lazer
3- Grupo Cultural Balanço das Latas Brasil
04
1 Grupo Motumbaxé
SUSSUARANA 2 Concurso Beleza Negra de Sussuarana
3 Projeto Mãos do Axé
4 TRIO BOSSAMBÁ.

TOTAL 88 COMUNIDADES DE PRÁTICA LOCAIS


Fonte: a autora

Observamos que os bairros do Beiru Tancredo Neves, Pernambués e Fazenda Grande


do Retiro foram os que apresentaram maior número de comunidades de prática com as
características delimitadas no recorte deste estudo. Esse quantitativo também repercute no
nível de atuação e engajamento desses grupos em suas comunidades, inclusive, nas parcerias
já estabelecidas com o Projeto TBC Cabula. Salientamos, também, que o fato de Narandiba e
Resgate não possuírem comunidades de prática registradas no quadro, não representa um
indicativo de falta de produção, afinal, nesses bairros se encontram comunidades de prática
atuantes em outros segmentos não considerados em nosso recorte, como alimentos e bebidas,
por exemplo; além de produtores individuais.
Ainda que tenhamos observado um número significativo de comunidades de prática,
bem como elucidado nesse levantamento, é importante ressaltar que, de modo geral, esses
grupos convivem à margem de seus potenciais; asfixiados pelo estigma da violência,
veiculado na mídia de massa; pelas dificuldades estruturais de seus bairros; pela escassez de
recursos para o desenvolvimento de seus trabalhos e, também, pela desvalorização local que
parte, por vezes, de alguns moradores, que mostram desconhecer as diversas ações
desenvolvidas em sua própria comunidade. Assim observamos, durante a aplicação de
questionários pilotos com moradores locais, aleatoriamente abordados e, também nas
experiências de extensão com estudantes do ensino médio de escolas da localidade
capitaneadas pelo Projeto TBC Cabula.
Tal realidade, comumente circunda as comunidades populares e contribui para a
geração de estereótipos, preconceitos e a reprodução do quadro de desvalorização local por
parte dos próprios moradores, que imersos nas mazelas sociais, por vezes, não percebem as
84

qualidades presentes em seus bairros. Esses aspectos fomentam, um ciclo de marginalização


de variados circuitos de produção de conhecimento alternativo oriundos de periferias como o
Cabula e entorno.
As comunidades de prática do Cabula e entorno, de uma maneira geral, desenvolvem
uma produção concentrada nos bairros aos quais pertencem, mas que atrai participantes tanto
de alguns bairros vizinhos, quanto de outras localidades de Salvador. Além disso, foi possível
constatar que existem relações de parceria entre determinadas comunidades de prática e
produtores locais, sobretudo, aquelas situadas no mesmo bairro ou em bairros próximos,
conforme mencionado por alguns grupos colaboradores nos bairros do Beiru, Engomadeira e
Estrada das Barreiras. O que acontece ainda em uma micro esfera se compararmos a
expressiva quantidade de comunidades de prática existentes no locus investigado.
Embora possamos considerar essa conjuntura como indício de uma rede de articulação
e produção comunitária, a mesma ainda não explora a sua potencialidade. Necessário se faz,
portanto, robustece-la potencializando assim, as relações entre os sujeitos e comunidades que
dela fazem parte, no intuito de otimizar e fortalecer o compartilhamento das práticas já
realizadas, além de agregar outros grupos do Cabula e entorno.
Outro aspecto que, por vezes, inviabiliza a expansão do raio de atuação e das
possibilidades desses grupos são os entraves político-partidários. A marcante presença da
vinculação partidária nessas comunidades, por vezes, colabora para transformar os interesses
da comunidade em relações clientelistas, baseadas no voto e no assistencialismo como
moedas de troca. Além de favorecer o aparecimento de conflitos entre os líderes locais e
moradores, alguns dos quais deixam de lutar pelos anseios comunitários para atender a
anseios individuais e bandeiras partidárias.
Esse cenário evidenciado exprime o que Fróes Burnham (2012) chama de segregação
sócio-cognitiva, ou seja, quando os conhecimentos construídos nas e pelas diferentes
comunidades de produção de conhecimentos não são reconhecidos e ou valorizados pela
comunidade ampliada, a qual se constitui segundo a referida autora, como o grande público
que desfruta das produções de outras comunidades que nela própria estão incluídas.
Na contramão da segregação sócio-cognitiva e da banalização da violência propagada
pelos veículos de comunicação de massa, que o Portal TBC Cabula pretende se constituir, a
médio e longo prazo, em um ambiente engajado em contribuir para a interação das
comunidades de prática do Cabula e entorno e a socialização de saberes da/sobre essa
localidade. A intenção é potencializar diálogos intercomunitários entre os praticantes locais,
85

moradores, pesquisadores e o público em geral, com vistas à valorização local e a mobilização


do TBC nessa área.
Tal propósito se mostra sintonizado ao fluxo de produção cognitiva característico do
momento contemporâneo, o qual faz sobressair perspectivas, práticas e contextos antes
ignorados e hoje, gradativamente valorizados e potencializados, inclusive, pelas interfaces
midiáticas alternativas. É nesse contexto de aberturas e construções que coletivos diversos,
como os presentes no locus desta pesquisa, encontram espaço para mobilizar-se, expandir e
consolidar seus princípios e ações, instituindo redes de saberes e práticas de maneira
democrática e colaborativa.
Tomando como referência esse cenário emergente este capítulo busca analisar o
movimento cognitivo e cultural gerado pelas comunidades de prática. Para isso
apresentaremos as suas nuances de modo contextualizado às bases teóricas que o legitimam e
ao macro contexto social que também o influencia.

3.1 Produção sócio cognitiva: entre emergências e aberturas

O movimento que as comunidades de prática do Cabula e entorno realizam, embora


seja marcadamente influenciado pelas contingências locais é também reflexo de um macro
contexto de transição, característico do momento contemporâneo. A contemporaneidade tem
mobilizado a geração de novas perspectivas acerca dos princípios, valores, estruturas sociais e
modelos de ciência e conhecimento, até então orientados pelo racionalismo moderno e por um
modo de pensar eurocêntrico.
Nesse cenário de emergências e aberturas estão se delineando transformações que
interferem, significativamente, nos modos de vida, produção social e cognitiva, que colocam
em revisão o pensamento científico e enfatizam a necessidade de reconhecer as alternativas de
concepção de mundo e construção do conhecimento historicamente situadas à margem do
cartesianismo. Acompanhamos nesse trânsito, a abertura de distintas frentes de pensamento e
interpretações humanas, que valorizam o tempo histórico e o homem enquanto produtor de
cultura e saber.
Essa valorização permite a emersão dos movimentos sociais, das lutas de classes, a
desconstrução da hierarquia entre saberes e cultura, além da busca por um mundo mais
solidário e respeitoso (QUEIROZ, 2007). Também, nesse sentido, Mota (2007) enfatiza que a
86

contemporaneidade exige diálogo, interatividade, participação e outras ações que requerem a


competência comunicativa, de maneira a associar os processos formativos ao fortalecimento
das identidades plurais no sujeito contemporâneo, integrar o homem simples ao meio social,
dar voz ao silenciados, bem como compreender novos saberes.
Dessa forma, podemos incluir como alternativas geradas nesse movimento: a
possibilidade de intercâmbio entre diferentes leituras de mundo; o diálogo entre o saber
científico e o saber tradicional; o reconhecimento de saberes outros, que não foram forjados
nas bases da ciência e outras concepções acerca da construção-difusão do conhecimento que
passam a envolver, além do aspecto científico, os aspectos históricos, culturais, cognitivos,
subjetivos e comunicativos.
As tendências que emergem na contemporaneidade também apontam para a
necessidade de novos espaços sócio culturais, políticos e econômicos, de modo a avançar na
reflexão sobre as diferentes inteligibilidades e múltiplas referências de conhecimento (FRÓES
BURNHAM, 2000; 2012). Dessa forma, tal autora compreende que o conhecimento vai se
estender para além dos espaços formais de aprendizagem e das comunidades epistêmicas
legitimadas pelo crivo da ciência moderna, contribuindo assim para fortalecer e impulsionar a
articulação de diferentes âmbitos de construção e socialização do conhecimento.
A prova disso é que cada vez mais, espaços não convencionais de aprendizagem,
trabalho, lazer e outros, começam a se impor como socialmente relevantes e responsáveis pela
formação de sujeitos em diferentes sociedades (FRÓES BURNHAM, 2000). Podemos
acompanhar, desse modo, a multiplicação de distintas alternativas de vida, produção, arte e
educação criadas por variados segmentos da sociedade, não pertencentes aos circuitos oficiais
de produção do conhecimento, mas que elaboram novas dimensões para os processos
cognitivos, à medida que constróem e difundem conhecimentos basilares para a formação de
diferentes sujeitos sociais, como nos aponta a referida autora.
Fróes Burnham (2012) também frisa que a relevância dessas comunidades de
produção criativa não se localiza na existência do espaço em si, mas, fundamentalmente, nas
redes interacionais produzidas entre as pessoas ali envolvidas, que permanecem interligadas
ao compartilharem suas vidas, experiências, saberes e práticas, e assim, aprendem a partir da
convivência com diferentes referenciais de leitura da realidade, ao eleger e criar tecnologias
de suporte apropriadas, instituindo éticas e estéticas próprias.
Nessa dinâmica em rede emergem práticas e processos instituintes de “ensinar-
aprender-construir-traduzir-socializar-difundir” conhecimento, que revelam diversas facetas
epistemológicas e evidenciam demandas individuais e coletivas até então relegadas pelos
87

circuitos oficiais de produção. Tal como evidenciamos nas dinâmicas estabelecidas pelos
grupos do Cabula e entorno.
Indo ao encontro dessas perspectivas, Santos (2001) corrobora essas emergências ao
sustentar a proposta de uma “outra globalização”. O referido autor esclarece que existe uma
tendência em compreender o fenômeno da globalização associado à compreensão do mundo
como uma aldeia global; onde o limite entre as distâncias se dissolve, graças à contração do
tempo e do espaço fazendo as informações circularem instantâneamente, num movimento de
unificação do mundo.
Santos (2001) revela que esse mundo das “fabulações”, além de reforçar o discurso
político, econômico e midiático, nos dá a impressão de que o mundo, para todos está ao
alcance das mãos. O autor salienta que se quisermos admitir a permanência dessa percepção
enganosa, devemos considerar a existência de pelo menos três mundos num só: “O primeiro
seria o mundo tal como nos fazem vê-lo: a globalização como fábula; o segundo seria o
mundo tal como ele é: a globalização como perversidade; e o terceiro, o mundo como ele
pode ser: uma outra globalização” (SANTOS, 2001, p.18).
No primeiro mundo regido pelo mito da aldeia global, de acordo com esse estudioso,
impera o culto ao consumo, a reificação e fortalecimento dos interesses financeiros, além da
busca por uma uniformidade global, que contraditoriamente, acirram as diferenças locais ao
preterir interesses específicos de atores hegemônicos. No segundo mundo, comparado por
Santos (2001, p.19) a uma “fábrica de perversidades”, acompanhamos a eclosão das mazelas
sociais: desemprego, pobreza, corrupção, baixos índices de educação e qualidade de vida,
mortalidade infantil, dentre outros males materiais, espirituais e morais ampliados em razão
da adesão desenfreada aos comportamentos competitivos, característicos das ações
hegemônicas.
Mas, em contrapartida, é possível pensar a construção de um mundo mediante uma
globalização mais humana, a partir das mesmas bases materiais instituídas pelo capital, no
entanto, servindo a outros objetivos, fundamentos sociais e políticos; seria este, portanto, o
terceiro mundo, que segundo Santos (2001), já vem se delineando a partir dos progressos da
informação, da comunicação e da tecnologia. A globalização a partir dessa ótica favorece a
construção de uma sociodiversidade e a emergência de uma cultura popular, que se serve dos
meios técnicos antes exclusivos da cultura de massa, permitindo-lhe exercer sobre esta última
uma verdadeira revanche (SANTOS, 2001).
Tal fato também decorre da forma de organização das sociedades atuais, que tem
impulsionado a produção de uma população aglomerada, como já sugeria Castells (1999).
88

Essa nova estrutura social viabiliza a fluência e o dinamismo entre os seus membros e
constitui uma das bases de reconstrução e de sobrevivência das relações locais, ao abrir a
possibilidade de utilização a serviço da população em geral.
Partindo desse prisma, a sociedade onde antes não existia uma demarcação entre
produtores e consumidores do conhecimento vai ficando dividida em comunidades, de acordo
com as relações que seus membros, coletivamente, estabelecem com o conhecimento (FRÓES
BURNHAM, 2012). A autora esclarece que esse processo, não implica, entretanto, em um
movimento separatista entre os coletivos de produção, pelo contrário, entre esses grupos,
podemos identificar mecanismos de articulação e interação capazes de promover um
“intercâmbio intra, inter e transcomunitário”, que, inclusive, é perceptível entre comunidades
de prática presentes no Cabula e entorno.
Não estamos falando, portanto, de um processo unilateral, mas de um movimento
complexo e instituinte, que se aproveita das brechas apresentadas pela própria racionalidade
técnica, científica e capitalista característica do dito momento global. Aberturas essas, que
possibilitam a assunção das massas, de suas formas de organizar e produzir, fundamentadas
no trabalho, no cotidiano, na solidariedade e na vizinhança, que vão engendrando o
“movimento dos de baixo” anunciado por Santos (2001, p.68).
Se pensarmos na perspectiva dessa globalização mais humana e possível, proposta
pelo referido autor, a qual já apresenta evidências do ponto de vista local e regional, podemos
identificar um retorno à comunidade não como uma espécie de corpo uno e homogêneo, aos
moldes tradicionais, mas no sentido da constituição de uma rede de articulação entre o local e
o global, em um processo de revitalização do apreço pelo local e pelas raízes, fundamentadas
no diálogo e na interação entre sujeitos, grupos, perspectivas e conhecimentos que se
harmonizam pelo seu caráter diverso.
Castells (1999, p.58) define esse transcurso como uma reação defensiva à
massificação imposta pelo movimento global: “quando o mundo se torna grande demais para
ser controlado, os atores sociais passam a ter como objetivo fazê-lo retornar ao tamanho
compatível com o que podem conceber”. Aglomerar-se, instituir redes de relações e
agrupamentos sociais fundamentados em bases como harmonia, solidariedade e colaboração
são alternativas para enfrentar as turbulências da vida e as contradições que afloram com um
sistema internacionalizado, mas é, sobretudo, um caminho para instituir novas maneiras de
criar identidades locais e globais, sobreviver e construir essa outra globalização (CASTELLS,
1999; SANTOS, 2001).
89

Essas tendências que emergem com os fluxos internacionalizados, especialmente, o


despertar do sentido comunitário, da ideia de colaboração e participação, nos convidam a
refletir sobre o que o termo comunidade efetivamente sugere diante dos contornos da
sociedade global e os sujeitos que a constróem. Tal reflexão é indispensável, tendo em vista a
necessidade de situarmos o leitor sobre o conceito de comunidade que estamos arrolando
desde o princípio desta tese, em especial, as comunidades de prática.

3.2 Comunidade: um conceito polissêmico

Comunidade é um dos conceitos que não apresentam um sentido consensual, afinal é


concebido através de diferentes perspectivas e critérios específicos, que lhe dão um caráter
polissêmico. Se por um lado verificamos a variedade de significados em torno de tal termo, de
outro, a imprecisão conceitual e o seu uso indiscriminado se apresentam como uma realidade,
que por vezes, acarreta no empobrecimento do sentido comunitário.
Qualquer agrupamento social tem sido chamado de comunidade: bairros; vilas;
cidades; segmentos religiosos; segmentos sociais e, mais recentemente, os grupos de sujeitos
que se organizam mediante as interfaces de comunicação e informação digitais (PERUZZO;
VOLPATO, 2009). Tal fato demonstra que poderia até mesmo ser pretensiosa uma unificação
conceitual, pois, cada área do conhecimento tem se apropriado do conceito de comunidade a
partir do seu referencial. É nesse sentido que intentamos nos aproximar do lastro teórico que
sustenta essa tese para delinearmos a nossa concepção.
Existe uma diversidade de autores que se ocuparam e se ocupam de teorizar sobre
comunidade. Dentre os clássicos da sociologia podemos destacar Ferdinand Tönnies (1995),
Max Weber (1973) e Martin Buber (1987), além de contribuições mais recentes como as de
Manuel Castells (1999), Zygmunt Bauman (2003) e Michel Maffesoli (2006). Entre outros,
que procuram relacionar os conceitos de comunidade às Tecnologias de Comunicação e
Informação (TIC), a exemplo de Howard Rheingold (1996), Marcos Palácios (2001) e Raquel
Recuero (2003).
Importante esclarecer que cada um desses autores, parte de um referencial específico
para discorrer a sua concepção de comunidade, o que implica em afinidades e
dessemelhanças. Contudo, não é o intento desta tese aprofundar as contribuições de cada um
desses teóricos, individualmente; tampouco delimitar as fronteiras epistemológicas que
limitam as suas produções. O propósito é construir uma fundamentação capaz de orientar o
90

nosso entendimento de comunidade, o que requer um diálogo sintonizado à base


epistemológica deste trabalho, a praxiologia.
Do ponto de vista teórico, para Mocellin (2011, p.109), “[...] é bastante comum a
conceituação de comunidade em oposição à de sociedade. Enquanto a comunidade é
tradicional, a sociedade é moderna; enquanto a comunidade agrega, a sociedade desagrega”.
Essa perspectiva comum na sociologia clássica foi fortemente disseminada nos estudos de
Ferdinand Tönnies (1995), segundo o qual, as relações na comunidade seriam estabelecidas
de uma forma íntima, próxima, privada e exclusiva, como numa espécie de vida real,
orgânica, espontânea, semelhante à metáfora de um organismo vivo. Diferentemente das
relações em sociedade, que seriam mais racionais e artificiais, estabelecidas mediante leis e
contratos.
Sendo assim, na perspectiva desse autor, teremos de um lado a Gemeinschaft, que
compreende os grupos comunitários demarcados espacialmente e com alto nível de
homogeneidade, coesão social, integração afetiva e o compartilhamento de práticas e
tradições; como nos grupos familiares e nas aldeias tradicionais. E, de outro lado, a
Gesellschaf, os grupos societários, que de maneira oposta às comunidades, não são,
necessariamente, demarcados espacialmente e apresentam como principais características, a
diferenciação, a heterogeneidade e o baixo grau de intimidade, interação afetiva e
compartilhamento, por exemplo.
Essa concepção também afiniza com as visões de outros clássicos da sociologia como
Max Weber (1973), que concebe a comunidade enquanto espaço de relações, inspiradas na
ação social e no sentimento de subjetivo dos partícipes da constituição de um todo. Dando
continuidade à essa linha epistemológica, Buber (1987, p.34), acrescenta a perspectiva de que
“comunidade e vida são uma coisa só”:

a comunidade que imaginamos é somente uma expressão de transbordante anseio


pela Vida em sua totalidade. Toda Vida nasce de comunidades e aspira a
comunidades. A comunidade é fim e fonte de Vida. Nossos sentimentos de vida, os
que nos mostram o parentesco e a comunidade de toda a vida do mundo, não podem
ser exercitados totalmente a não ser em comunidade. E, em uma comunidade pura
nada podemos criar que não intensifique o poder, o sentido e o valor da Vida. Vida e
comunidade são os dois lados de um mesmo ser. E temos o privilégio de tomar e
oferecer a ambos de modo claro: vida por anseio à vida, comunidade por anseio à
comunidade.

É possível notar que definições clássicas de comunidade, como as apresentadas,


embora carreguem cada uma a sua peculiaridade, transparecem de maneira geral, um juízo
pautado nos pressupostos de bondade, pureza, unicidade, que nos reportam à ideia de
91

comunidade tradicional nos moldes do período pré-moderno. Aquela comunidade


territorialmente fixa, de número restrito, formada por um núcleo familiar centralizado, onde
os sujeitos convivem harmonicamente, compartilhando das mesmas ideias e valores.
Tal conotação, que sugere um equilíbrio simétrico entre os sujeitos da comuna reflete
o contexto da pré-modernidade e as características dos grupos tradicionais de tal período, no
entanto, não contempla com fidelidade os agrupamentos comunitários característicos do
século XXI. Nesse sentido, podemos citar como exemplo as comunidades virtuais que
emergem no ciberespaço, as quais não ocupam um espaço físico delimitado e, especialmente,
os coletivos de produção emergentes nos contextos urbanos contemporâneos, como os do
Cabula e entorno, os quais não apresentam uma característica homogênea, não são movidos,
exclusivamente, por laços familiares, nem são obrigatoriamente duráveis.
Essa incompatibilidade se justifica, segundo Mocellin (2011), pelas profundas
alterações que sofreram as bases das relações sociais comunitárias com a instituição da
modernidade e, mais ainda, graças ao advento da globalização, uma vez que o deslocamento
de tempo e espaço inviabiliza a demarcação clara dos limites de uma comunidade, de certa
forma, dificultando a localização das relações e sua durabilidade ao longo do tempo.
O referido autor ainda acrescenta outros aspectos, frequentemente afiliados à
sociedade global contemporânea e que reverberam no modo como nos agrupamos no
momento atual, a exemplo da mutabilidade de valores; a individualização dos sujeitos; a
descentralização das identidades; a fluidez dos limites temporais e das relações sociais e
afetivas. Ou seja, elementos que, em determinados aspectos, destoam dos princípios que
orientam a comunidade concebida pelos clássicos.
Como alternativa à polarização teórica existente entre as concepções de comunidade-
sociedade, Maffesoli (2006) apresenta uma contribuição teórica que cabe um olhar reflexivo.
Esse autor não compreende a dissolução da comunidade em si, mas, também, não admite a
total reconstrução dos moldes que forjaram as comunidades pré-modernas, fundamentando-se,
assim, na concepção de um neotribalismo. Seria, portanto, uma condição de vivência e
socialização híbrida, em que os estilos de vida tribais são adaptados ao contexto social do
presente século, rompendo com o individualismo e a impessoalidade da estrutura urbanizada
concebida, muitas vezes, de modo apocalíptico.
Na tribo urbana, ao contrário das comunidades tradicionais, o participante não é
obrigado a fixar-se em um grupo determinado e converter-se às suas regras e doutrinas, afinal,
a vivência plural é um dos elementos que caracterizam a proposta do neotribalismo.
Participando de uma multiplicidade de tribos, as quais se situam umas em relação às outras,
92

cada pessoa poderá viver sua pluralidade intrínseca; seus diferentes papéis sociais se
ordenando de maneira mais ou menos conflitual e ajustando-se com as outras facetas que a
circundam (MAFFESOLI, 2006, p. 238).
Dessa maneira, os sujeitos têm abertura para transitar entre os grupos, o que viabiliza,
por consequência, uma relação intergrupos, bem como o compartilhamento de produções,
valores e estilos de vida:

A necessidade metropolitana de integrar vários ambientes diversos, com seus


códigos específicos e separados no tempo e no espaço, permite a criação de uma
identidade diversa, que é composta por várias tribos. Escolas, empresas, bares,
restaurantes, pontos de encontro, todos os lugares frequentados contam com seus
grupos tribais, e a necessidade de transitar por todos os lugares permite uma
identidade híbrida, fruto de um cruzamento de tribos e estilos de vida. É nesse
sentido que a metáfora da rede, ultimamente muito utilizada nas ciências sociais, faz
sentido. Entender a sociedade como rede permite enxergar esses cruzamentos de
indivíduos e grupos, essas múltiplas associações. (MOCELLIN, 2011, p.9)

Esse fluxo interativo gerado pelas tribos urbanas sinaliza a possibilidade de integração
nas sociedades contemporâneas e lança outra perspectiva às premissas de heterogeneidade,
separatividade e isolamento social, constantemente associadas ao espaço urbano. Ainda que
tais tribos sejam distintas das tribos pré-modernas, sobretudo, por se constituírem a partir de
outros propósitos, é possível identificar nesses agrupamentos um sentido comum e um
redesenho da vida comunitária, mesmo que tenham uma configuração flexível.
Necessário esclarecer que, embora Maffesoli (2006) transite por territórios
epistemológicos distintos, encontramos ressonância do seu neotribalismo nas concepções de
Castells (1999) sobre a Sociedade em Rede; no movimento dos de baixo e as aglomerações
urbanas defendidas por Santos (2001) e, também, na produção democrática do conhecimento
de Fróes Burnham (2000; 2012). O diálogo entre esses pontos de vista orienta a nossa
compreensão de comunidade, enquanto um agrupamento social que pode ser localizado
simbólica ou territorialmente, no qual sujeitos vinculam-se e compartilham seus múltiplos
repertórios, interesses, valores e identidades em prol de um projeto em comum.
Compreender a comunidade a partir desse viés é coadunar com a existência de
distintos perfis comunitários, uma vez que os projetos de interesse que unem os sujeitos em
grupos, não mais se restringem a um ponto de vista unificado, à sobrevivência, laços
familiares ou a uma tradição. A prova disso está na multiplicidade de comunidades, que
brotam nas abordagens teóricas e no cotidiano dos sujeitos, exprimindo uma variedade de
repertórios e finalidades que permeiam os agrupamentos sociais contemporâneos. Nesse
sentido, podemos citar como exemplos, as comunidades virtuais; as comunidades de produção
93

como os arranjos sócio-produtivos e cooperativas; as comunidades epistêmicas e


profissionais, as comunidades de aprendizagem, os coletivos criativos, dentre outras variações
que figuram na vida teórica e prática.
Nesse leque de variedades também se apresentam as comunidades de prática, as quais
escolhemos para nominar os coletivos de produção presentes no Cabula e entorno. Essa
denominação sintoniza com o aporte epistemológico adotado, à medida que adiciona ao
conceito de comunidade um novo elemento: a prática.

3.3 Comunidades de prática

Ao acrescentar no repertório dos conceitos de comunidade, a prática, Wenger (1998;


2000) enaltece esse elemento como uma das bases de sustentação do ser-fazer comunitário.
Nesse sentido, as comunidades dessa natureza irão se caracterizar por atividades ou práticas
específicas que definem limites de pertencimento e identidades, as quais são cunhadas por
esse autor como comunidades de prática (CdP).
Nessa perspectiva, as CdP compreendem um conjunto de pessoas ligadas
informalmente pelo conhecimento especializado, compartilhado e pela paixão por um
empreendimento conjunto; são configurações sociais, que se estabelecem independentemente
de uma estrutura física, nas quais os empreendimentos de seus integrantes são valorizados e
sua participação é reconhecida como competência, ou seja, quem pertence à comunidade é
competente para ter acesso a seu repertório e usá-lo de maneira considerada adequada
(WENGER, 1998).
Os participantes de uma CdP compartilham experiências e conhecimentos com
liberdade e criatividade, incentivando novas abordagens para os problemas. Assim, essas
pessoas são ligadas umas às outras pelo desenvolvimento concreto em atividades ou práticas
comuns, engajadas mutuamente numa iniciativa coletiva, orientadas por um senso de
propósito comum (KIMBLE, HILDRETH, 2004).
Dessa maneira, podem ser consideradas comunidades de prática, uma tribo que
necessita desenvolver mecanismos de aprendizagem para sobreviver; uma banda de artistas
que buscam novas formas de expressão ou arranjos musicais; um grupo de engenheiros que
juntos constroem soluções para determinados problemas; cirurgiões que se reúnem para
desenvolver novas técnicas; grupos de alunos que se esforçam para recuperar a matéria
(WENGER, 2015), dentre uma infinidade de outros propósitos coletivos centrados na solução
de problemas.
94

No entanto, se faz necessário esclarecer que nem toda comunidade pode ser
considerada uma CdP. Moradores de uma Vila podem ser considerados uma comunidade, mas
não necessariamente uma CdP. Para Wenger (2015), uma comunidade de prática se constitui a
partir da integração de três elementos cruciais: a) o domínio; b) a comunidade; e c) a prática.
O domínio corresponde às afinidades entre participantes sobre determinado âmbito do
conhecimento é o que identifica e justifica a existência da comunidade de prática, a qual não é
um simples clube de fãs ou uma rede de pessoas conectadas. Se não existir o domínio que
conecte os participantes e seja a razão de ser do grupo não há uma CdP. A comunidade deve
pressupor a existência de sujeitos que se reúnem e interagem para aprender e compartilhar
conhecimentos, o que não implica que esses sujeitos precisem se reunir diariamente para
manter-se em comunidade. Já a prática é um elemento fundante na CdP e a diferencia de um
grupo de fãs, por exemplo. Membros de uma CdP são praticantes, compartilham seus
repertórios individuais e se engajam na elaboração de soluções para problemas, envolvendo a
geração de conhecimentos.
A partir dessa referência conceitual que nominamos os grupos parceiros dessa
pesquisa e os demais coletivos de produção identificados no Cabula e entorno, como
comunidades de prática, tendo em vista as suas especificidades afinadas à concepção de
Wenger (1998) (2015). Em seus distintos domínios e com propósitos variados temos inseridas
no Cabula e entorno, variadas comunidades de prática engajadas em soluções de melhorias
para demandas locais como: o acesso à arte, cultura e educação; valorização do patrimônio
local; desenvolvimento de tecnologias sociais; mecanismos de produção comunitária, dentre
outros domínios, como os explicitados no mapa a seguir
Outro aspecto relevante acerca das CdP é que a dinâmica gerada por seus praticantes
engendra o que Wenger (1998) chama de aprendizagem social. Para esse autor, o engajamento
na prática social é o processo pelo qual nós aprendemos e nos tornamos quem somos. Essa
teoria explora um modo sistemático de intersecção-interação entre as questões que permeiam
a comunidade, a prática social, o significado e a identidade; elementos que entrelaçados
caracterizam a ideia de participação social como um processo de aprendizagem e de
conhecimento, conforme representado na figura 10.
95

Figura.10: Produção da aprendizagem e conhecimento em comunidades de prática

Aprendizagem e
conhecimento como
pertencimento
Comunidade
Aprendizagem e
conhecimento
como prática
APRENDIZAGEM E
Prática CONHECIMENTO Identidade
Aprendizagem e
conhecimento como
construção de si
Significado
Aprendizagem e
conhecimento como
experiência

Fonte: adaptado de Wenger, 1998

Diferentemente das teorias não críticas da aprendizagem, que consideram os atos de


aprender e conhecer como processos individuais, desvinculados das atividades cotidianas ou
como resultado exclusivo do ato de ensinar formalmente; Wenger (1998) defende que a
aprendizagem e o conhecimento também estão situados em nossas experiências de vida e
participação no mundo, uma vez que aprender e conhecer compreendem fenômenos
essencialmente sociais. Portanto, não consistem em processos estáticos e descontextualizados;
logo, não podem se situar, exclusivamente, no campo da contemplação e do abstracionismo,
sem se permitirem a um diálogo com a vida, com o contexto e com as realizações.
As contribuições de Freire (1987) (1971) (2015) sintonizam com o entendimento de
Wenger (1998), na medida em que valoriza a construção do saber a partir das experiências
dos sujeitos em diálogo com o mundo. O diálogo como afirmou Freire (1987, p. 79) é uma
exigência existencial: "é o encontro de homens que pronunciam o mundo", conjuntamente, e
não "doação do pronunciar de uns a outros”. É no mundo que se solidarizam o refletir e o agir
de todos os participantes envolvidos empenhados em construir um mundo mais humanizado
e, por isso, mais solidário, mais fraterno, mais digno.
A multiplicação de diferentes CdP evidencia a influência que esses ambientes
articulados, exercem sobre a vida dos sujeitos que delas fazem parte. Também podemos
identificar nessa proliferação, a relevância que a práxis assume nos processos cognitivos, à
medida que oferece outras nuances aos atos de aprender e conhecer.
96

De acordo com Wenger (1998), o conhecimento concebido na perspectiva das CdP


desloca o olhar saturado e equivocado da prática enquanto campo utilitarista, instrumental ou
simplesmente, menos relevante do que a teoria ao demonstrar que uma comunidade de prática
não se reduz a propósitos instrumentais. O sujeito que faz parte de uma CdP encontra nesses
ambientes a oportunidade de desenvolver laços de amizade, dividir experiências ou elaborar
coletivamente possíveis soluções para os problemas do cotidiano. Isto é, implica em conhecer,
mas também a estar junto, dando significado à vida e às ações de cada membro,
desenvolvendo identidade (WENGER, 1998).
Ainda que o termo práxis não esteja explícito nos escritos desse autor é possível
identificar nessas contribuições uma perspectiva genuinamente praxiológica. Essa
característica fortalece os atributos das comunidades de prática e a potencialidade dos
processos desencadeados nelas e por elas. Mais do que comunidades de prática, poderíamos
falar, portanto, de comunidades de práxis.

3.4 Um olhar sobre a práxis nas comunidades de prática

A palavra práxis é um termo que provém do grego antigo. Originalmente, não se


tratava de um termo muito preciso e comumente concebido enquanto a ação que se
estabelecia nas relações entre as pessoas, isto é, a ação intersubjetiva e moral, própria dos
cidadãos (KONDER, 2006). Utilizada, frequentemente, por Aristóteles como atividade ética e
política, a práxis, era considerada como o oposto da poiésis - atividade produtiva (KONDER,
2006).
Esse autor, ainda afirma que tanto a práxis como a poiésis exigiam conhecimentos
especiais, adequados à efetivação de cada uma delas, mas esses conhecimentos permaneciam
presos aos objetivos de suas respectivas atividades e, portanto, limitados. Por isso, segundo
Konder (2006), Aristóteles, foi levado a conceber um terceiro elemento: a theoria, cujo
objetivo era, exclusivamente, a busca pela verdade.
Desde então, sobretudo a partir do surgimento da burguesia, tem sido desenvolvidas
inúmeras contraposições entre theoria e práxis, que colocam a theoria em um patamar de
superioridade em relação à práxis, sem identificar a possibilidade e a necessidade de diálogo
entre ambos os campos. “[...] quando a ênfase era posta na poiésis, a práxis (atividade
política) era desprezada; e, quando se reconhecia a significação humana da práxis (o poder da
cidadania), isso se dava em detrimento da poiésis (KONDER, 2006, p.102).
97

Somente a partir das contribuições de Karl Marx, houve um deslocamento da


concepção entre esses três conceitos, ao repensar a relação entre a práxis e a poiésis, na
perspectiva do trabalhador. Dessa forma, a abordagem marxista visa superar a unilateralidade,
propondo uma interação dialética entre os campos considerados opostos – idealismo/
materialismo; teoria/prática. Nessa intervenção, a práxis se caracteriza como atividade
concreta, crítico e prática, através da qual os homens podem modificar a realidade objetiva e,
nesse processo alterá-la, transformando-se a si mesmos (FREIRE, 1971, 1987).
No sentido atribuído pelo marxismo de Marx, a práxis diz respeito à “atividade livre,
universal, criativa e auto-criativa, por meio da qual o homem cria (faz, produz) e transforma
(conforma) seu mundo humano e histórico a si mesmo” (BOTTOMORE, 1997). Konder
(2006, p.115) a compreende como “a ação que, para se aprofundar de maneira mais
consequente, precisa da reflexão, do autoquestionamento, da teoria; e é a teoria que remete à
ação, que enfrenta o desafio de verificar seus acertos e desacertos, cotejando-os com a
prática”.
Nesses moldes epistemológicos, a práxis se apresenta como ponto de partida para o
conhecimento, já que é através dela, que o conhecimento se transforma, progride, amplia e se
reconstrói, numa dinâmica dialética, dialógica e contextualizada de tomada de consciência.
Coadunando com a visão marxista, Freire (1987), entende a práxis como combinação entre
ação e reflexão realizada pelos homens sobre o mundo para transformá-lo, numa perspectiva
libertadora; os homens se fazem pela ação e reflexão e a palavra, enquanto ação e reflexão
resulta na práxis. (FREIRE, 1971, 1987).
Portanto, é no campo das experiências concretas, na interlocução crítica com a cultura
e a realidade que se chega à compreensão de si e do mundo e, consequentemente, nos
tornamos aptos a agir sobre os nossos contextos de vida transformando-os. (SEMERARO,
2000). Partindo desse pressuposto, é a ação sobre o meio que põe em movimento o
pensamento e cria as condições propícias para a formação de conceitos mais precisos, ao
longo do processo histórico.
Contudo, não se trata em absoluto, de propor um conhecimento baseado de caráter
mecânico e utilitarista, até porque, prática e práxis embora comumente sejam abordadas como
sinônimos são conceitos distintos, embora interdependentes. Essa diferenciação conceitual se
justifica pela interação dialética que a práxis exige, para que se constitua como tal. “A teoria é
um momento necessário da práxis; e essa necessidade não é um luxo: é uma característica que
distingue a práxis das atividades meramente repetitivas, cegas, mecânicas e abstratas”
(KONDER, 2006, p.116).
98

A visão da filosofia da práxis está na realidade, que não separa o homem da natureza,
a atividade da matéria, o sujeito do objeto, a teoria da prática. Conforme afirma Vázquez
(1968, p.185), “toda práxis é atividade, mas nem toda atividade é práxis”, já que o princípio
praxiológico não é a atividade prática em si, mas sim a reflexão sobre a prática, a tomada de
consciência a partir da prática, com vistas à transformação de si e do meio. Portanto, a prática
compreende uma dimensão da práxis.
Do mesmo modo, importante salientar que a práxis não se constitui apenas em
atividade social transformadora, no sentido da transformação da natureza, da criação de
objetos, de instrumentos, de tecnologias; é atividade transformadora também com relação ao
próprio homem que, na mesma medida em que atua sobre a natureza, transformando-a,
produz e transforma a si mesmo. O processo de engajamento na prática envolve a pessoa
como um todo, afinal, a atividade mental não é desincorporada, e a atividade manual não
prescinde de reflexão (SHOMER, 2005). Ambas coexistem e se retroalimentam.
Nesse sentido, consideramos que as comunidades de prática do Cabula e entorno, se
constituem em ambientes de elaboração da práxis, uma vez que as atividades realizadas
nesses ambientes não possuem um caráter meramente instrumental, tampouco se
fundamentam na prática pela prática. Os repertórios compartilhados entre os praticantes se
articulam no sentido de atender a demandas coletivas e, consequentemente, mobilizar a
transformação dos contextos em que estão inseridos esses praticantes e as pessoas que são
envolvidas ou se beneficiam dessas práticas. As quais nascem no seio de movimentos
pautados no engajamento político social e na superação das adversidades que circundam as
realidades desses grupos.
Conforme a representação expressa na Figura 11, a seguir, a práxis se processa no
núcleo das interações estabelecidas pelos sujeitos que são mediadas pelo contexto real. Nessa
relação, teoria e prática se apresentam como facetas que se interconectam e dialogam, de
maneira a mobilizar a construção de conhecimentos de distintas naturezas e referências, sejam
concretas ou abstratas. Em uma dinâmica capaz de favorecer a modificação dos sujeitos e dos
contextos envolvidos.
99

Figura 11: Construção do conhecimento numa perspectiva praxiológica

Conhecimentos

Teoria

Conhecimentos Conhecimentos
Práxis

Prática

Conhecimentos

Fonte: A autora

Desse modo, a práxis implica em um movimento dialético-dialógico, teórico-prático e


gerador de conhecimentos, que se realiza em um determinado contexto permeado de relações
e experiências sociais. “Não há, pois, conhecimento sem práticas e actores sociais”
(SANTOS; MENEZES, 2009, p.9). E não há práxis desvinculada da rede de elementos que
dão sentido aos contextos: as tensões sociais e políticas, a diversidade cultural, as questões e
conflitos de identidade, as contradições do capital, os domínios da subjetividade, os saberes
ancestrais, e mais uma gama de dimensões que conformam uma rede de conhecimentos
originadas no seio das práticas sociais.
A prática elaborada nessa perspectiva lembra fazer, agir, não apenas em si mesma,
mas num contexto histórico e social que se baseia numa estrutura e confere sentido ao que é
feito. Essa concepção de prática inclui tanto o conhecimento explícito quanto o tácito, ambos
definidos socialmente. Inclui linguagem, ferramentas, documentos, imagens, símbolos, regras
definidas, critérios específicos, procedimentos codificados, regulamentos e contratos, relações
e convenções implícitas, pistas sutis, regras não evidentes, intuições, pressupostos e visões de
mundo compartilhadas, que vão tornando-se explícitas pelas práticas. (WENGER, 1998).
Ou seja, elementos que ajudam a constituir comunidades de práticas e,
consequentemente, forjar uma práxis compromissada com uma transformação de natureza
100

dialética e dialógica dos sujeitos e de seus contextos. Através dessa lente que concebemos as
comunidades de prática do locus pesquisado, as quais contribuem para levar aos moradores
outras perspectivas de formação, valorização de suas múltiplas identidades e, sobretudo,
novos horizontes diante da aridez dos variados problemas sociais que os afligem.
O reconhecimento dessas comunidades de prática e da dinâmica produtiva que as
mesmas desenvolvem no locus ora pesquisado se deu, inicialmente, em 2010, a partir das
ações de inventariação participativa realizadas pelo Projeto de Pesquisa, Ensino e Extensão
Turismo de Base Comunitária no Cabula e entorno (TBC Cabula), vinculado à Universidade
do Estado da Bahia (UNEB) e cujas ações também são geradas em comunidade, ou melhor,
em comunidades de prática. É, portanto, das experiências de convívio e compartilhamento
com as comunidades do entorno da Universidade que surge a iniciativa de construção do
Portal aqui investigado, como meio de articulação e visibilidade para as práticas realizadas
pelos moradores e grupos locais e, conseqüente mobilização do TBC nessa localidade.
Funcionando como um macro projeto, o TBC Cabula abastece e é abastecido por
ações de extensão, além de pesquisas de iniciação científica, mestrado e doutorado, que tem a
comunidade do Cabula e entorno como locus investigativo, como esta que apresentamos ao
caro leitor. Nesse sentido, é importante salientarmos a natureza desse projeto matriz, bem
como a sua proposta de interação e construção colaborativa com o entorno da Universidade,
que apresenta uma perspectiva multidisciplinar, dialógica e aplicada.

3.4 Diálogos em ensino, pesquisa e extensão

O TBC Cabula é um projeto que surge da tentativa de fomentar o tripé ensino,


pesquisa e extensão em uma perspectiva de diálogo e colaboração com a comunidade do
entorno da UNEB. A proposta é transcender o discurso de compromisso da universidade com
a comunidade, efetivando uma prática de construção de conhecimento que se contraponha às
ações pautadas na transferência de teoria e desconexão com a realidade, muito comuns no
âmbito acadêmico.
A própria construção do projeto em si, já manifesta o seu caráter colaborativo. O seu
embrião está nas práticas de ensino que começaram a ser realizadas no ano de 2006, nas
turmas das disciplinas Planejamento e Organização de Eventos e Marketing Aplicado ao
Turismo e à Hotelaria, do curso de Turismo e Hotelaria e da disciplina Administração de
Empreendimentos Turísticos, do curso de Administração; ambos, pertencentes ao
Departamento de Ciências Humanas do Campus I da UNEB, em Salvador (SILVA, 2014).
101

Nessas experiências foram desenvolvidas ações de ensino, pesquisa e extensão que


incitaram a identificação de problemas nos contextos vividos pelos estudantes, incluindo o
entorno da Universidade. Dentre as ações desenvolvidas por estudantes e professores dos
referidos cursos estão, de acordo com Silva (2014): a) levantamento dos projetos de extensão
na Pró-Reitoria de Extensão (PROEX) e nos Núcleos de Pesquisa e Extensão (NUPE) dos
Departamentos do Campus I e na Pró-Reitoria de Pesquisa e Ensino de Pós-Graduação (PPG),
que tinham como campo empírico os bairros do entorno da UNEB; b] participação em
eventos internos e externos; c] conversas informais com funcionários e técnicos; d] busca de
teses, dissertações e monografias no Centro de Documentação e Informação (CDI) Luiz
Henrique Dias Tavares; dentre outras fontes.
Os resultados desse levantamento revelaram iniciativas que já vinham sendo realizadas
pela UNEB, na comunidade do entorno, como a parceria com o Projeto Cidadão, que
desenvolve atividades formativas no âmbito da cidadania e educação ambiental para a
comunidade e a Cooperativa Múltiplas Fontes da Engomadeira (COOFE) assessorada pela
Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares/Núcleo de Cooperação e Ações em
Políticas Públicas e Economia Solidária (ITCP/COAPPES), cujo foco era a produção de
alimentos baseada no aproveitamento de sementes de frutas, verduras e legumes, sendo o pão
de sementes de abóbora o seu carro-chefe.
Após o mapeamento desses e de outros projetos ficou notável que as iniciativas
existentes eram realizadas de maneira independente e desarticulada. Assim, havia casos de
distintos projetos da UNEB em uma mesma localidade, que não dialogavam entre si, gerando
confusão, incômodo e até desconfiança por parte de alguns moradores. Essa conjuntura
sinalizou a possibilidade de congregar essas iniciativas, a fim de articulá-las, fortalecendo, por
conseguinte, o vínculo entre a Universidade e a comunidade do entorno.
Consequentemente, por meio de diálogo estabelecido com os coordenadores dos
projetos que já vinham sendo desenvolvidos, representantes de instituições públicas; privadas
e de organizações da sociedade civil do Cabula e entorno, visando parcerias, a exemplo do
Centro Social Urbano de Narandiba (CSU-Narandiba); o bloco de carnaval Mundo Negro, do
Beiru; e outros, o projeto TBC Cabula foi sendo construído por meio de elaboração coletiva e
colaborativa.
Também participaram desse processo conjunto, de acordo com Silva (2014),
estudantes e professores do Programa de Mestrado em Políticas Públicas, Gestão do
Conhecimento e Desenvolvimento Regional (PGDR), e de Pós-Graduação em Educação e
102

Contemporaneidade (PPGEduC) da UNEB, no âmbito da disciplina Gestão da Informação


para a Cidadania e Desenvolvimento Local (GICDL).
A partir dessa interlocução entre distintos autores, ocorrida entre 2008 e 2010, nasce o
“Projeto Turismo de Base Comunitária na Região do Cabula e entorno: processo de Incubação
de Operadora de Receptivos Populares Especializada em Roteiros Turísticos Alternativos,
Responsáveis, Sustentáveis e Solidários (RTUARSS)”, mais conhecido por TBC Cabula,
aprovado pelo edital 021/2010 da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia
(FAPESB) (SILVA, 2010). A proposta aprovada tinha como objetivo mobilizar as
comunidades do Cabula e entorno para o turismo de base comunitária por meio de incubação
de operadora de receptivos populares especializada em RTUARSS. Para esse fim foi
considerado o potencial cultural da localidade e a necessidade de ampliação e diversificação
de roteiros turísticos em Salvador.
Necessário enfatizar que o TBC não é uma criação originada e exclusiva do Cabula,
mas trata-se de um modo de pensar e fazer turismo que se apresenta como uma alternativa ao
modelo convencional de desenvolvimento dessa atividade, atualmente em vigor, que se pauta
na exploração e mercadização dos recursos ambientais e do patrimônio histórico e cultural das
comunidades receptoras (SILVA, 2014). Inclusive, existem no Brasil e em outros países,
variadas iniciativas de TBC já consolidadas, destacando-se, nesse âmbito, as comunidades
rurais.
Por se tratar de um caminho relativamente recente no campo turístico, a concepção de
TBC vem agregando diferentes pontos de vistas de pesquisadores e gestores dos órgãos
oficiais que planejam e organizam a atividade turística. De acordo com Irving (2009), o TBC
é uma modalidade de turismo que busca desenvolver o local de maneira sustentável,
respeitando os costumes da comunidade receptora, a sua cultura, os modos de vida, sua
identidade e, sobretudo, concebendo a comunidade enquanto protagonista nos bens e serviços
gerados, por meio de rede e autogestão, solidária, coletiva e colaborativa.
Entretanto, mais do que uma modalidade turística, Silva et al (2012) amplia esse
conceito ao considerá-lo como:

[...] uma forma de planejamento, organização, autogestão e controle participativo,


colaborativo, cooperativo e solidário da atividade turística por parte das
comunidades, que deverão estar articuladas e em diálogo com os setores público e
privado, do terceiro setor e outros elos da cadeia produtiva do turismo, primando
pelo benefício social, cultural, ambiental, econômico e político das próprias
comunidades (SILVA et al 2012, p.11).
103

Essa definição, portanto, que norteia as práticas desenvolvidas pelo projeto TBC
Cabula. Assim sendo, Silva (2014, p.10) defende que um processo de implementação do TBC
precisa considerar os seguintes aspectos:

a] identificação, pelas comunidades, do potencial cultural, ambiental, social,


tecnológico, político e econômico dos contextos onde habitam; b] o desejo de
perpetuação das heranças e legados dos seus antepassados como hospitalidade,
crenças, valores, saberes, sabores e fazeres; c] na valorização de suas práticas; d] na
ampliação de suas rendas por meio de produção associada; e] na participação
popular por meio de comitês, câmaras, comissões, associações, centros
comunitários, fóruns, conselhos, cooperativas, sindicatos, entidades de classe,
organizações não-governamentais, fundações, institutos e outras, em plenárias,
conferências, audiências públicas, reuniões sobre temas correlatos às necessidades
das comunidades como saúde, educação, saneamento, transporte, por exemplo, e à
atividade turística como infraestrutura, serviços, legislação, orçamentos; e f] na
busca de melhoria de condições de vida.

Tais princípios associados aos fundamentos da ecossocioeconomia, metodologia


participativa sustentada na praxiologia, pesquisa-ação e em pesquisa de desenvolvimento
Design Based Research (DBR) balizam as ações de mobilização e formação para o TBC,
realizadas desde 2010, nas dezessete comunidades que compõem o locus deste estudo.
Importante destacar que a escolha definitiva desses bairros, deu-se a partir da referência que
os moradores tinham sobre a localidade, reconhecida por eles como área do antigo Quilombo
Cabula. Delimitação espacial que passou a ser acolhida pelo projeto TBC Cabula, que
inicialmente adentrou nas comunidades tomando como referência espacial aquela determinada
por Fernandes (2003) aos moldes acadêmicos e oficiais.
Essa mudança é um exemplo de outras adequações que precisam ser implementadas
quando se propõe o trabalho participativo com comunidades populares. A propósito, a
metodologia adotada pelo projeto em questão, que se fundamenta na aplicação de rodas de
conversa, nasce, justamente, da necessidade de modificar os instrumentos de pesquisa em
razão de experiências mal sucedidas com procedimentos metodológicos acadêmicos de uso
convencional.
A roda de conversa se apresenta como uma metodologia mais humana e sensível, além
de transformar o trabalho de pesquisa e extensão com comunidades populares em uma
experiência de vida que enriquece todos os envolvidos (SILVA, 2014). É, portanto, um modo
de acolher e escutar aqueles que, em geral, tem o seu direito de expressão cerceado, seja pela
falta de oportunidade; pelo sentimento de auto negação ou, simplesmente, pelo não
reconhecimento de suas ideias.
104

Desse modo, o projeto em questão, alicerçado nos princípios elucidados por Freire
(1983) busca desenvolver práticas de extensão pautadas na construção coletiva e colaborativa,
uma vez que considera a comunidade como parceira de um processo de aprendizagem mútua
e não como espaço para a transferência de saberes acadêmicos instituídos, conforme realizado
por variados projetos de extensão universitários.
Importante esclarecer que, embora se constitua em um projeto inserido no campo do
turismo, a natureza multifacetada de tal campo exige a interação com referenciais de outras
áreas do conhecimento. Por isso, o projeto TBC Cabula tem as suas ações articuladas por
meio de 14 eixos temáticos multidisciplinares, a saber: 1. Território e Espaço Urbano; 2. Meio
Ambiente, Ecologia Social e Ecoturismo; 3. Lazer, Esporte e Entretenimento; 4. Educação,
Formação e Cidadania; 5. Comunicação Comunitária; 6. Memória, História, Patrimônio e
Cultura; 7. Tecnologias Educativas; 8. Inclusão Sociodigital; 9. Cooperativismo, Economia
Solidária, Tecnologia Social e Inovação; 10. Design e Sustentabilidade; 11. Turismo de Base
Comunitária; 12. Saúde Coletiva; 13. Políticas Públicas, Desenvolvimento Local e Regional;
e 14. Linguagem e Culturas Afro e Afrobrasileiras.
Os quatorze eixos mencionados são coordenados por professores dos departamentos
do Campus I da UNEB e reúnem voluntários; moradores das comunidades envolvidas;
técnicos; estudantes de ensino médio das escolas da redondeza e estudantes do ensino superior
em nível de graduação e pós-graduação, que atuam em regime de parceria e participação nas
atividades de formação, pesquisa e extensão desenvolvidas pelos eixos.
Esse processo é conduzido no sentido de contribuir para a formação e auto-gestão de
redes sociais cooperadas e colaborativas nos dezessete bairros envolvidos. Com destaque para
a produção de soluções criativas e inovadoras baseadas no contexto dos bairros; processos
formativos para a valorização do patrimônio material e imaterial; elaboração de conhecimento
e tecnologias sociais tendo como referência os saberes e práticas de povos de etnias indígenas,
afro-brasileiros e de origens africana presentes nos bairros; convivência e hospitalidade
(SILVA, 2014).
O Portal TBC Cabula, dessa forma, se constitui em produto originado das atividades
realizadas pelo eixo de tecnologias educativas. No entanto, tal ambiente web, transversaliza
com as produções dos demais eixos, na medida em que também foi concebido para agregar
informações e resultados de pesquisas geradas pelos demais eixos do projeto.
É necessário esclarecer que desde 2010, o projeto TBC Cabula tem se configurado em
importante vetor de articulação entre as comunidades presentes no locus desta pesquisa. Os
quase dez anos de atuação do projeto no entorno da UNEB, em âmbito de ensino, pesquisa e
105

extensão evidenciaram que essas comunidades são ambientes fecundos de produção, mas,
também, ambientes marcados por contradições e variadas problemáticas, como sinalizam
Vilas Bôas e Silva (2013, p.102) ao relatarem experiências vivenciadas na comunidade no
decorrer desse processo.

[...] a aprendizagem da equipe foi um ganho, e pensa-se que para as comunidades,


também, a partir do conhecimento adquirido sobre as comunidades: o que elas
produzem; os saberes populares passados de geração em geração; as iniciativas
comunitárias para driblar as adversidades geradas pela má gestão pública destes
lugares; o domínio exercido por políticos sobre alguns grupos transformando o
bairro em curral eleitoral; os limites impostos pelo tráfico de influências e outras
drogas; os dramas pessoais e sociais vividos por elas; as tradições; a resistência à
padronização imposta pelo capitalismo e pela sociedade de consumo, gerando
estratégias inusitadas, criativas e diferenciadas, dentre outras práticas.

É esse contexto de produção cognitiva legítima, que inspira a existência do Portal TBC
Cabula e nos mobiliza a construir um Design Cognitivo (DC) capaz de potencializar esse
ambiente e as relações de interação, socialização comunitária e mobilização do TBC que
podem ser estabelecidas por meio deste.
Neste capítulo finalizamos a primeira etapa de elaboração do DC proposto: a
compreensão do contexto do Cabula e entorno, a imersão nesse locus, bem como a
sistematização das bases teóricas que legitimam a produção cognitiva desenvolvida pelas
comunidades de práticas presentes nessa localidade.
Partiremos a seguir para a segunda etapa desse processo, a qual consiste em traduzir os
aspectos analisados em um esboço conceitual da nossa proposta de DCC para o Portal TBC
Cabula. Quais princípios devem fundamentar um ambiente web que esteja sintonizado às
pretensões e necessidades das comunidades de prática do Cabula e entorno? Com a intenção
de definir tais princípios, os quais conduzirão a nossa proposta inicial, que seguiremos ao
capítulo 4 do presente estudo.
106

“A DEFINIÇÃO”

O campo teórico não baixa das nuvens. Brota ele do chão das práticas; não espontaneamente
mas sob o acicate da interrogação, da reflexão, da pesquisa em nosso caso. ‘A teoria se
constrói através da pesquisa’, ensina mestre Florestan Fernandes (1978, p.11). Surge ela
como explicação, que se quer provisoriamente válida para determinado sistema de relações.
Estabelece-se, por isso a teoria num nível relativamente complexo sobre o qual possa operar
por sucessivas abstrações. Como requer Bachelard (1977, p.10): “Nem um empirismo
desconexo, nem uma racionalidade no vazio”

(MARQUES, 2008, p.103)


107

4 Princípios teóricos de um portal web comunitário:

Os processos de produção, disseminação e apropriação de informação vêm


desempenhando um papel central no século XXI, especialmente, a partir do desenvolvimento
dos aplicativos e sistemas de base digital/virtual. Trata-se da constituição de uma estrutura
cada vez mais sofisticada de redes informativas e de conhecimento que se destaca na
complexificação dos softwares e hardwares utilizados no desenvolvimento de ambientes e
sistemas computacionais interativos com distintos propósitos.
Nesse contexto, ressaltamos os dispositivos que apresentam finalidades cognitivas
intencionais, a exemplo dos ambientes virtuais de aprendizagem (AVA); jogos eletrônicos
com fins educacionais ou de treinamento; redes de compartilhamento de informações e
sociabilidade; sites e aplicativos mobile; dentre outros mecanismos digitais, que conseguem
agregar múltiplas interfaces dentro de um único sistema, como os portais web, que nos
interessam especialmente.
O crescimento exponencial de ambientes e dispositivos para tais fins acompanha o
intenso fluxo de demandas cognitivas que surgem cada vez mais complexas na atualidade.
Essa emergência tem mobilizado a geração de mudanças significativas nos processos de
concepção desses artefatos tecnológicos, os quais deixaram de ser de responsabilidade
exclusiva dos setores de desenvolvimento da ciência e da computação e passaram a ser
desenvolvidos em uma perspectiva integrada, multi e interdisciplinar ao agregar profissionais
de distintas áreas do conhecimento no processo de elaboração, e, até mesmo, o usuário final,
que passa também a desfrutar da possibilidade de ter as suas expectativas apreciadas e
atendidas.
Tal compreensão ratifica que o processo de desenvolvimento de objetos, sistemas e
conteúdos digitais e interativos, sobretudo aqueles que medeiam processos de informação e
conhecimento, precisa ser conduzido por etapas coerentemente fundamentadas não apenas em
um molde metodológico e técnico coeso, mas, sobretudo, por princípios teóricos, que sejam
capazes de conduzir o projeto aos fins cognitivos planejados.
No caso do DCC, a definição de tais princípios compreende uma etapa substancial,
pois junto ao contexto sócio-histórico, os princípios teóricos conformam a base de sustentação
da nossa proposta. O contexto, se apresentando como a lente através da qual compreendemos
a comunidade que compõe o locus da pesquisa, ou seja colaboradores e potenciais
interatores/usuários do Portal TBC Cabula; e o alicerce teórico a ser construído enquanto
108

eixos condutores, que buscarão traduzir as demandas identificadas no locus da pesquisa a


partir de um viés científico, os quais orientarão o desenvolvimento da solução de pesquisa.
Sendo assim, é importante esclarecermos que os princípios elencados nesse capítulo
não devem ser compreendidos apenas como um quadro de revisão bibliográfica, ou como
encaminhamentos fechados, afinal, serão passíveis de modificação. O nosso intento é delinear
as diretrizes teóricas mais afinadas com a realidade pesquisada até o momento, isto é,
construir o arcabouço necessário para projetarmos as ações metodológicas voltadas à
resolução do problema de pesquisa. Essas definições nos ajudarão a compor um design
cognitivo capaz de potencializar o Portal TBC Cabula.

4.1 O portal web como mediador da informação e do conhecimento

O processamento básico dos sistemas sofreu importantes interferências a partir do


fenômeno da digitalização/virtualização. Além da incorporação ao ambiente web, podemos
citar: a especialização da informação e a variação de tipologias de usuários. Como reflexos
das novas demandas foram surgindo diferentes sistemas de disponibilização da informação e
produção de conhecimentos, com destaque para as chamadas portas de entrada, as quais se
tornaram conhecidas, posteriormente, como portais web (ÂNGULO; ALBERTIN, 2000).
Originalmente, em meados da década de 1990, os portais funcionavam,
exclusivamente, como máquinas de busca simples, que tinham o propósito de facilitar a vida
desse usuário multifacetado e emergente, no rastreio de informações na internet (REEDY,
2001). Posteriormente, os portais inovaram ao disponibilizar informações organizadas por
área de interesse em ambientes específicos (ÂNGULO; ALBERTIN, 2000; REEDY, 2001).
Dias (2001) explica que, essas novidades visavam a redução do tempo de busca do usuário;
diante disso, os portais começaram a apresentar como principal serviço a categorização e
filtro de sites e documentos em grupos pré-configurados de acordo com o seu conteúdo:
esportes, meteorologia, turismo, finanças, humor, notícias, lazer, cultura, dentre outros
interesses.
A referida autora também sinaliza que somente a partir da década de 2000 houve a
integração de outras funções a esse tipo de sistema web, bem como, a inclusão de
comunidades virtuais, chats em tempo real, listas de discussão, possibilidade de
personalização, acesso a conteúdos especializados e comerciais, por exemplo. Essa nova
concepção de máquina de busca que foi popularizada como portal web.
109

As principais mudanças nas configurações de um portal web são categorizadas por


Sousa (2004), em três gerações, assim resumidas:
 1ª - Caracteriza-se por disponibilizar essencialmente conteúdos estáticos e
documentos, bem como disponibilizar um local único onde se pode encontrar
informação sobre a organização, tal como dados dos colaboradores, notícias,
documentos como as políticas da organização, links chave, dentre outros;
 2ª – Orientada para o desenvolvimento de conteúdos específicos e aplicações.
Também assume como característica principal a colaboração permitindo assim, a
constituição de um escritório virtual, aliando, além de serviços e conteúdos, a
interação entre os membros da equipe por meio de aplicações como e-mail, chat,
calendários comuns e comunidades de usuários;
 3ª - Inclui soluções caracterizadas por conceitos de e-business, para que sejam
disponibilizadas para funcionários, fornecedores e clientes. Tem como uma das
principais características a integração de conteúdos e aplicações, assim como serviços
colaborativos. Permitem ainda acesso a partir de vários tipos de dispositivos, de modo
a englobar diversas comunidades de usuários. Os portais dessa geração caracterizam-
se por oferecer os conteúdos mais ricos em informação e uma ampla gama de
aplicações que o usuário pode escolher.

Essa última fase compreende o ponto de partida para a popularização dos portais web,
lhes conferindo como indica Reedy (2001) o status de metasites, isto é, pontos de entrada que
oferecem variadas aplicações, recursos e serviços, como e-mail, fóruns, sites de pesquisa,
notícias, páginas pessoais, shopping centers online e outros. Atualmente, é importante incluir
nessa lista de aplicações, a conexão com as redes sociais digitais, que apresentam grande
domínio de público na web e se constituem em elementos importantes para a sobrevivência
dos portais web.
Portanto, podemos compreender esses ambientes virtuais como sendo “aplicações web
que integram informação, interatividade e serviços permitindo a sua personalização”
(SOUSA, 2004, p.5). Via de regra, os portais web representam uma incorporação das ideias
de internet e intranet, cujo principal objetivo é integrar as aplicações da organização em uma
só plataforma, ou seja, vincular diversas iniciativas de criação e sistemas de informação em
um local, de modo a viabilizar o acesso de todos (CARVALHO, 2006).
Importante esclarecer que embora seja recorrente a compreensão de um portal web
enquanto um site, existem diferenças entre ambos ambientes. Em geral, os sites cumprem a
110

função de folhetos informativos ao disponibilizar conteúdos estáticos, por vezes, de caráter


institucional e/ou ilustrativo. Já os portais web, além da amplitude e da capacidade de agregar
links para outros sites, daí o seu status de met
asite, não se restringem ao caráter informativo.
Ao contrário dos sites, os portais web, segundo Sousa (2004) conseguem se constituir
em um único ponto de acesso a todos os recursos disponíveis em seu domínio; tem como um
dos seus objetivos proporcionar interação personalizada ao usuário; disponibilizar o acesso
autorizado a inúmeros dados bem como repositórios, ambos agregados e categorizados; além
de oferecer aplicações que favorecem a colaboração, a interatividade e a integração entre seus
usuários, bem como apresentamos no esquema a seguir.

Figura 12: Estrutura básica de um portal web

Fonte: a autora com base em Sousa (2004)

Com a oferta dessas distintas funcionalidades, os portais web foram deslocados da


condição de meros buscadores de informação e tornaram-se ambientes diferenciados, à
medida que começaram a disponibilizar ao visitante uma experiência interativa de acesso à
informação, entretenimento, comunicação, educação, dentre outras possibilidades que variam
conforme seus objetivos. Dessa forma, gradativamente, esses dispositivos foram absorvidos
por distintos setores, assumindo múltiplas facetas e tipologias.
Dependendo dos processos que se pretenda implementar, esses ambientes podem ser
classificados conforme duas categorias principais: portais colaborativos e portais de negócios
(SOUSA, 2004). Contudo, o referido autor enfatiza que, devido às exigências do mercado,
bem como a variedade de demandas dos usuários, essas duas vertentes têm originado distintas
subcategorias e, consequentemente, portais mais complexos. Em vista da diversidade
111

tipológica existente entre os portais web, destacamos de Gouveia et al (2007), o que


consideramos como as principais tipologias desse tipo de ambiente:
Quadro 10: Principais tipologias de portais web
TIPO CARACTERÍSTICAS
Transacionais Ofertam produtos e/ou serviços para venda online. Integra
diferentes sistemas com o intuito de facilitar as transações e a
divulgação dos diferenciais.

Informativos Disponibilizam informações e conteúdos de fácil acesso aos


usuários, bem como conteúdos relevantes para diversos públicos,
como notícias, entretenimento, lazer, cultura e outros.

Públicos Podem reunir as funções de outros tipos de portal, contudo, as


informações disponibilizadas não são restritas a um público
específico e os usuários não são selecionados, já que o objetivo é
atingir grande audiência.

Privados São restritos a um grupo de usuários, que pode ser uma rede de
sócios, funcionários de uma empresa ou assinantes que terão
acesso a conteúdos especializados, a exemplo dos portais
corporativos, que agregam funções de intranet e internet.

Horizontais Geralmente são divididos por categorias, a fim de abranger a maior


quantidade de público e destacam-se pela variedade de serviços e
funções agregadas que oferece ao usuário de maneira aberta.

Verticais Os conteúdos e serviços são personalizados podendo focar em


comunidades específicas ou grupos de interesses em comum. O
conteúdo é mais especializado, visto que o público é segmentado.

Fonte: a autora com base em Sousa (2004) e Gouveia (2007)

Embora sejam perceptíveis as diferenças entre essas tipologias, autores como Sousa
(2004) e Gouveia (2007) salientam que essas classificações, podem, no entanto, dialogar.
Afinal, é comum se apresentarem mescladas entre si. Por isso, é possível desenvolver portais
verticais/informativos; privados/verticais; horizontais com elementos de portal vertical;
transacionais/informativos dentre outras combinações.
Compreender essas tipologias é ponto fundante para o momento de definição do que
se quer propor com um portal web. No caso do Portal TBC Cabula, a compreensão de tais
tipologias se faz necessária por que, tal portal, que se constitui em um caso de aplicação desta
pesquisa é um tipo de portal web que não se encaixa, exclusivamente, em uma tipologia; pelo
contrário, apresenta uma demanda multifacetada e objetivos que vão além da ideia
112

convencional, típica dos portais já consolidados. Portanto, ao construirmos o DCC será


necessário conceber os moldes mais adequados às condições materiais, aos interesses das
comunidades colaboradoras, às necessidades e propósitos do nosso campo de atuação e
pesquisa.
Essa variedade de possibilidades oferecidas pelos portais web, para a socialização da
informação, interatividade e, também, a colaboração dos usuários, que influenciou a escolha
desse tipo de aplicação web para ser agregada às ações do Projeto TBC Cabula. O processo de
desenvolvimento do portal do referido projeto, assim como as intervenções e projeções
desenvolvidas são assunto do próximo intertítulo.

4.1.1 O Portal TBC Cabula

Logo no início das atividades, em 2010, o projeto TBC Cabula demandava um


conteúdo digital capaz de articular os diversos sujeitos, potencialmente envolvidos nas ações
realizadas por meio da rede web (MATTA, 2014). Essa necessidade foi revelada a partir das
práticas de pesquisa e extensão empreendidas, as quais manifestaram a existência de
comunidades com valioso acervo histórico-cultural e rico patrimônio social pouco
disseminados para a comunidade ampliada, bem como a necessidade de
articulação/comunicação entre os grupos presentes nas comunidades e destes, com os
pesquisadores e colaboradores do projeto.
Em vista disso, o Portal TBC Cabula foi tomando forma, a princípio, em estrutura de
blog. De acordo com Piñeiro (2013, p. 196-197), “a proposta do blog era servir como veículo
de diálogo com as comunidades, por meio de notícias e imagens de cada bairro ou a região,
atentando-se para seus respectivos roteiros e atrativos turísticos [...] deveria abrigar também, o
perfil dos pesquisadores envolvidos e a inventariação do projeto”
A autora esclarece que o primeiro blog foi criado em janeiro de 2011 e possuía o
endereço <rtuarss.wordpress.com>, sigla que significa Roteiros Turísticos Alternativos,
Responsáveis, Sociais e Solidários. Posteriormente, esse endereço foi atualizado para
<turismodebasecomunitária.wordpress.com> e funcionou de maio de 2011 a outubro de 2012,
divulgando notícias relacionadas a eventos nas comunidades, cultura afro, cooperativismo e
atividades sobre o turismo em Salvador.
113

Figura 13: home Page do blog TBC

Fonte: Piñeiro (2013)

O referido blog foi construído e alimentado por colaboradores do projeto e estudantes


da UNEB que atuavam na época como bolsistas de iniciação científica. Com o lançamento do
portal em janeiro de 2013, a página foi desativada, impossibilitando assim, nosso acesso para
fins de análise e coleta de informações que servissem à tese.
A ideia de transformar o blog em portal surge da necessidade de ampliar o
atendimento à demanda de comunicação web do projeto, utilizando para esse fim
financiamento adquirido por meio de edital público da Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado da Bahia (FAPESB), o que originou a primeira versão do Portal TBC Cabula

Figura 14: Primeira versão do Portal TBC Cabula

Fonte: Matta (2013)


114

De 2013 aos dias atuais o Portal TBC Cabula vem sendo estruturado, para se tornar
um ambiente de interação, colaboração e compartilhamento de saberes e fazeres da/sobre a
comunidade do Cabula e entorno, favorecendo assim a visibilidade das comunidades, a
valorização local e, consequentemente, a mobilização do turismo de base comunitária nessa
localidade.
O desafio que se apresenta, desde então, é agregar, no mesmo ambiente web,
mecanismos de socialização das produções acadêmicas geradas a partir do projeto, que tem o
Cabula como âmbito investigativo, e, também, as produções dos moradores. Nesse sentido,
esse portal busca atender a três frentes de atuação: a) socialização das iniciativas de pesquisa,
ensino e extensão que tomam essa localidade como locus de produção de conhecimentos
científicos; b) interação e colaboração entre os moradores e comunidades de prática do Cabula
e entorno; c) rede de compartilhamento de saberes e fazeres da comunidade.
Sobre a primeira frente de atuação, destacamos as produções que vem sendo
desenvolvidas nos 14 eixos de atuação do projeto TBC Cabula, o qual está vinculado ao grupo
de pesquisa Sociedade Solidária, Educação, Espaço, e Turismo (SSEETU). As produções
técnicas e científicas já elaboradas incluem materiais informativos, trabalhos técnicos, cursos
de extensão, resultados de pesquisas apresentados em relatórios, artigos científicos,
monografias, dissertações e teses.
Também devem agregar o Portal TBC Cabula, os conteúdos interativos originados de
pesquisas acadêmicas, com destaque para os produtos de estudos doutorais, como o Museu
Virtual do Antigo Quilombo Cabula (MARTINS, 2017); o Mapa cultural interativo das
mulheres do Antigo Quilombo Cabula (SOUZA, 2018); o Museu Digital do Terreiro
Tumbenci localizado no bairro do Beiru/Tancredo Neves (COSTA, 2017); a Rádio Web
Juventude, iniciativa desenvolvida no Colégio Estadual Roberto Santos, Cabula (LIMA,
2016), assim como o produto da pesquisa de mestrado de Alves (2017), o Role Playing Game
(RPG) para o Turismo de Base Comunitária no Cabula e entorno.
De 2010 até os dias atuais essa proposta de comunicação comunitária via web vem se
configurando em um projeto em permanente processo, pois tem buscado se adequar aos
avanços efetivados pelo Projeto TBC Cabula e seus eixos. Isso vem trazendo várias
implicações para o Portal, refletidas em demandas tais como: alterações de seu layout;
necessidade de produzir conteúdos informativos e interativos, articulação com as mídias
sociais e escolha de tecnologia colaborativa mais adequada para a sua estrutura.
Essas demandas foram levantadas a partir de diagnóstico do Portal TBC Cabula, que
elaboramos no início dessa pesquisa doutoral. O diagnóstico revela assim uma análise de duas
115

versões desse ambiente, que nos permitiu construir uma percepção global do seu
funcionamento, desde as suas potencialidades às suas lacunas. Nesse sentido foi possível
identificar o status do referido portal, bem como, as implementações em curso, entre os anos
de 2014 e 2015, que já sinalizavam demandas da comunidade e, em especial dos grupos de
pesquisa colaboradores deste estudo. O diagnóstico foi feito mediante interação sistemática
com o portal e com base nas vivências e diálogos estabelecidos com os profissionais de
desenvolvimento nos processos de gerenciamento de conteúdos, dos quais participei, desde o
ingresso no doutorado em 2014.
Os itens de composição do diagnóstico favoreceram uma análise técnica do problema
investigativo apresentado, o qual sinaliza a inexistência de um design cognitivo capaz de
potencializar interações colaborativas no Portal TBC Cabula. Nesse sentido, o plano de
diagnóstico traçado, além de nos permitir uma análise mais criteriosa do problema e do caso
de aplicação deste estudo, contribuiu para ampliar o nosso raio de possibilidades a serem
aplicadas, pois evidenciou aspectos de distintas naturezas, tais como: concepção do ambiente,
modo de gerenciamento e tipo de conteúdo publicado. Aspectos fundamentais para iniciar
qualquer plano de intervenção tecnológico, os quais descrevemos e justificamos a seguir a
seguir:
116

Quadro 11: Formulário de diagnóstico do Portal TBC Cabula 2014/2015

ASPECTOS QUESTÃO RESULTADOS


OBSERVADOS ORIENTADORA VERSÃO 1 VERSÃO 2
Objetivos do Portal O Portal TBC Cabula foi Servir como “vitrine” dos bairros situados na área do Cabula e entorno, ambiente de
TBC Cabula construído para atender a qual (is) colaboração das comunidades locais e socialização das produções desenvolvidas
objetivo (s)? pelo projeto TBC Cabula, com vistas à mobilização do turismo de base comunitária
nessa localidade.

Histórico de Como se deu o processo de Inicialmente foi elaborado um blog A fim de flexibilizar a gestão dos
desenvolvimento das desenvolvimento das versões gerido por pesquisadores e bolsistas conteúdos do portal houve a migração de
antigas versões anteriores do Portal TBC Cabula? vinculados ao Projeto TBC Cabula parte das informações da primeira versão
com o intuito de divulgar as ações do para a plataforma wordpress e a mudança
projeto nas comunidades. da equipe responsável por fazer tais
Posteriormente, a partir de modificações.
financiamento público adquirido via O portal adquiriu flexibilidade em sua
edital, uma empresa de soluções estrutura, mas perdeu em termos de
digitais foi contratada para a programação visual, gerenciamento dos
elaboração de um portal web que conteúdos e na organização informativa.
reunia as sugestões dos pesquisadores
do grupo a partir das visitações nas
comunidades.

Conteúdos sobre a Que tipo de conteúdo sobre as Produções científicas e técnicas desenvolvidas pelos pesquisadores do projeto TBC
comunidade comunidades do Cabula e entorno na localidade; além de eventos realizados na comunidade, conforme sugestão de
é veiculado no Portal TBC alguns moradores que estabeleciam contato com os organizadores do projeto.
Cabula? As duas versões também apresentavam uma aba intitulada localidades, com
informações breves sobre: histórico dos bairros, grupos culturais, dentre outras, cuja
maioria ainda estava em fase de elaboração.
117

Conteúdos De que maneira os conteúdos Ambas as versões se sustentavam a partir da geração dos seguintes conteúdos:
acadêmicos acadêmicos são abordados no postagens de notícias de eventos acadêmicos de natureza local, nacional e
Portal TBC Cabula? internacional, sobre o turismo de base comunitária e temáticas correlatas. Assim
como postagens aleatórias das produções científicas e técnicas dos grupos de
pesquisa envolvidos no projeto.

Conteúdos e Quais conteúdos e ambientes O portal apresentava uma estrutura Foi iniciada a implementação de
ambientes interativos estão disponíveis no predominantemente informativa, com aplicações como um canal youtube
interativos Portal TBC Cabula? links que remetiam o visitante para incorporado à página, em que os visitantes
páginas das redes sociais do projeto. poderiam enviar suas sugestões de vídeo;
Apresentava uma proposta de fórum de a aba de comentários e compartilhamento
discussão, mas que não funcionava por das postagens em variadas redes sociais; o
problemas técnicos. Não possuía, mapa cultural interativo com
portanto, ambientes que permitissem o equipamentos culturais da localidade;
engajamento dos visitantes na aplicativo de postagens de notícias curtas
realização de alguma atividade, debate, a partir da adaptação de um plug-in do
produção de conteúdos, outros. twitter, intitulado Divulgaê.

Estratégias de Quais estratégias de Ambas as versões não dispunham de um plano estratégico para gerenciamento do
sustentabilidade e sustentabilidade e alimentação de portal, especialmente pela ausência de recursos humanos e financeiros que
gerenciamento do conteúdos são utilizadas no Portal garantissem a sustentabilidade das ações realizadas. Isso implicou na rotatividade de
Portal TBC Cabula. colaboradores técnicos e, consequentemente, na morosidade para implementar as
soluções construídas.

Navegabilidade O Portal TBC Cabula permite que A rotatividade de demandas, bem A versão 2 propôs uma solução para esses
o visitante acesse as informações como a diversidade de assuntos que problemas como a organização da home
de forma intuitiva? permeiam o portal TBC Cabula do Portal. Nesse sentido foi desenvolvido
contribuíram para que a primeira um slide show para as notícias recentes, a
versão apresenta-se como uma de suas categorização de postagens por tags e a
principais fragilidades a organização de sub menus a fim de
desorganização das informações. Isso ordenar as informações já existentes no
se justifica pelo fato de conteúdos de portal em categorias. Entretanto, essas
118

distintas naturezas (artigos, vídeos, implementações, executadas parcialmente,


fotografias, banners de eventos e apresentaram limitações técnicas que
outros) serem publicados implicavam em falhas, interferindo na
aleatoriamente. Sem tags e qualidade da experiência do usuário.
redirecionamento para ambientes
específicos, as informações se perdiam
e comprometiam a qualidade da
navegação do usuário que não
conseguia localizar com precisão
determinadas informações de seu
interesse.

Usabilidade A interface gráfica do Portal TBC Não possuía interface gráfica Possuía interface gráfica responsiva, com
Cabula permite que o usuário responsiva. Em contrapartida, elementos gráficos de interação mais
desenvolva tarefas com sucesso? apresentava uma programação visual simples e limpos, mas que foram
de alta qualidade, mas que já não se implementados parcialmente, isso
adequava às novas necessidades do inviabilizava o desenvolvimento de tarefas
portal que estavam emergindo, no ambiente, as quais se restringiam ao
consequentemente, prejudicava o consumo de informação.
desenvolvimento das tarefas no
ambiente, restringindo o usuário ao
consumo de informação.
Fonte: a autora
119

Com base no que apresentamos no formulário de diagnóstico, notamos que o Portal


TBC Cabula já vinha ao longo desses anos realizando variadas intervenções no sentido de
divulgar as produções comunitárias e acadêmicas relacionadas e pertencentes ao Cabula e
entorno. Mas, encontra-se em contínuo processo de reconstrução, por isso, o mesmo ainda não
funciona plenamente, conforme o idealizado em 2010.
Destacamos como uma das principais limitações identificadas a forma de intervir
assistemática e a reduzida participação dos moradores/grupos locais nesse processo. Sendo
assim, podemos inferir que o Portal TBC Cabula funcionou, desde então, de maneira intuitiva
sem a existência de um projeto de design capaz de organizar e conduzir a sua
intencionalidade. Isso tem causado um hiato entre o idealizado para esse ambiente e o que
efetivamente ele proporciona. Vislumbrar possibilidades para estreitar essa lacuna é, portanto,
um dos desafios que norteiam os objetivos da presente pesquisa.
Diante de tal pretensão defendemos que o (re) design desse ambiente, especialmente
quanto ao aspecto cognitivo, precisa ser orientado por proposta alicerçada em uma
metodologia científica aplicada, com foco na comunidade, que vislumbre a sua participação
no decorrer do processo. Isso significa, primordialmente, superarmos a concepção de um
ambiente construído para a comunidade, mas, fundamentalmente, construírmos um ambiente
que tenha a assinatura da comunidade.
Tais aspectos compreendem o ponto de partida para respondermos à seguinte questão:
que tipo de design cognitivo se adéqua às necessidades e interesses do Portal TBC Cabula?
Apresentar possibilidades a esse questionamento é, portanto, o primeiro passo rumo ao
desenvolvimento de uma proposta colaborativa.

4.2 Por um Design Cognitivo de base colaborativa

O design cognitivo é um campo de estudos multidisciplinar que vem sendo apropriado


por diferentes áreas do conhecimento. Designers em suas distintas especialidades; psicólogos;
arquitetos; mercadólogos; administradores; educadores; programadores e demais especialistas
em desenvolvimento de ambientes distintos ou sistemas de informação, buscam por meio
desse campo, mecanismos capazes de orientar a criação de produtos e serviços que favoreçam
o desenvolvimento de tarefas variadas, dentro das melhores condições e interesse dos
usuários.
120

Matta (2012) compreende o design cognitivo como uma concepção sistêmica de


determinado produto ou processo que se pretende implementar, o que implica na elaboração
de “arquiteturas cognitivas” cuidadosamente desenhadas, aptas a respaldar os objetivos
propostos e conduzir os sujeitos participantes do processo ou usuários do produto a ser
desenvolvido aos propósitos cognitivos planejados.

Figura 15: Mapa conceitual / Design cognitivo

Fonte: a autora

Em sintonia com Matta (2012) e conforme elucidado na figura 15, compreendemos o


design cognitivo como um mecanismo que busca planejar, organizar e desenhar soluções
capazes de potencializar processos cognitivos em geral, tais como a aprendizagem,
compreensão, avaliação, planejamento, decisão, construção e difusão de conhecimento, etc.
No que tange a esta pesquisa, propomos um design cognitivo que conduza o desenvolvimento
de soluções digitais, as quais serão aplicadas ao Portal TBC Cabula, visando potencializar a
socialização de saberes e fazeres da/sobre essa localidade.
Com potencial para articular-se a disciplinas como a ergonomia cognitiva, psicologia,
cognição situada, interação humano-computador (IHC) e ciência da informação, por exemplo,
o design cognitivo, considera as estruturas cognitivas, mecanismos e estratégias necessárias
121

ao uso de determinado produto/ambiente. Para isso, analisa os aspectos fundamentais à


interação que sejam compatíveis às demandas dos usuários, com o intuito de torná-los
compatíveis às soluções implementadas.
Nesse sentido, a construção de um design cognitivo poderá envolver aspectos
variados, desde que estejam sintonizados às intencionalidades do projeto almejado. Dentre os
quais, podemos citar: as diferenças individuais em tipos de personalidade e estilos de
aprendizagem; limitações de memória; percepção; conhecimento social; diferenças culturais;
estilos de raciocínio; estratégias de categorização e controles de atenção e outros aspectos
que, de acordo com Werby (2008) podem ser incluídos como variáveis do desenvolvimento.
O levantamento de referências sobre design cognitivo também nos indicou a existência
de mecanismos correlatos como o design instrucional (FILATRO, 2008), o design pedagógico
(MATTA, 2012) e o design educacional (MATTAR, 2014). O ponto de contato entre essas
três modalidades reside no desenvolvimento de ambientes mediadores da educação à distância
(EAD), isto é, referem-se a mecanismos de planejamento, organização e desenho de soluções
para ambientes formais de aprendizagem online, o que não condiz diretamente aos propósitos
do Portal TBC Cabula.
Adotamos o referencial do design cognitivo por percebermos a sua flexibilidade e
capilaridade, uma vez que abrange em seu conceito diferentes tipos de processos cognitivos
concernentes às variadas áreas do conhecimento, inclusive a EAD. Pensando no potencial
dessa especialidade, assim como o seu caráter multidisciplinar, para efeitos da presente
pesquisa, optamos por construir uma proposta de design cognitivo ancorada nas áreas de
conhecimento próximas ao referencial epistemológico do qual estamos nos apropriando, que
inclui as ciências humanas e as ciências sociais aplicadas, especialmente, a educação, a
comunicação, o design e suas aplicações às Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC).
Campos do conhecimento disseminados no corpus da pesquisa e nas discussões teórico-
práticas sustentatórias deste estudo.
Pretendemos, dessa forma, conceber um design cognitivo que seja construído em
colaboração com representantes inseridos e/ou vinculados à comunidade do Cabula e entorno
e ao Projeto TBC Cabula, o que inclui produtores locais, moradores, pesquisadores,
estudantes e profissionais de design e Tecnologia da Informação. O intuito é favorecer o
desenvolvimento de uma ambiência de pertencimento a esses colaboradores, para que sintam-
se não apenas usuários, mas também co-responsáveis pelo Portal TBC Cabula.
A elaboração de um design cognitivo deve considerar aspectos epistemológicos e
conceituais consistentes e coerentes com a proposta almejada. Isso requer do designer
122

cognitivo responsável, um olhar global, interdisciplinar e habilidades específicas, algumas das


quais é possível destacar de Matta (2011): a] aplicar teorias e abordagens epistemológicas à
prática do design; b] conduzir levantamento de contexto e necessidades do design; c]
identificar e descrever necessidades dos sujeitos envolvidos no processo; d] promover
colaboração, parcerias e relacionamentos entre participantes do projeto de design; e] refletir e
decidir sobre as estratégias do design.
Para que as etapas apontadas por Matta (2011), as quais possuem um caráter
metodológico, sejam efetivamente realizadas, é necessário, a priori, definirmos uma linha de
condução teórica flexível capaz de orientar o processo de desenvolvimento de nossa proposta
de design cognitivo colaborativo (DCC). Tal proposta estará sintonizada a uma perspectiva
epistêmica que considera as interações e práticas dos sujeitos envolvidos e o
compartilhamento de conhecimento entre contextos distintos.
A partir desse viés e com base na primeira etapa de análise contextual e imersão nas
comunidades, chegamos à delimitação dos seguintes princípios teóricos para o Portal ora
estudado: 1) comunicação comunitária; 2) participação criativa; e; 3) interatividade. Esses
princípios serão encaminhados pelos seguintes questionamentos, apresentados no diagrama a
seguir e abordados nos intertítulos que seguem.
Importante ressaltar que delinearemos a seguir o caminho teórico que nos dará
subsídios para elaborarmos a proposta de design cognitivo que será apresentada aos
colaboradores da pesquisa. Assim sendo, traçaremos os princípios básicos, para que sejam,
validados e aplicados, posteriormente, na construção do protótipo do DCC.

4.3 Comunicação Comunitária

O TBC Cabula é um projeto desenvolvido, prioritariamente, a partir do engajamento


de sujeitos individuais ou comunitários interessados no desenvolvimento de uma prática
sustentável de atividade rentável e, ao mesmo tempo, promotora da cultura, dos valores e da
auto estima local (MATTA, 2013; SILVA, 2013).
Por conseguinte, o Portal TBC Cabula, enquanto canal de comunicação entre os
moradores locais e os sujeitos envolvidos nas ações mediadas por esse projeto, necessita
estabelecer práticas comunicativas alicerçadas nos propósitos que o orientam, a exemplo da
colaboração, solidariedade, sustentabilidade e valorização local, e que atendam,
123

consequentemente, ao perfil e às demandas apresentadas pelos seus participantes e potenciais


usuários desse portal.
Nesse sentido, por se configurar em uma prática comunicativa contra-hegemônica, a
comunicação comunitária reúne características que favorecem o alcance dos objetivos
traçados para esse ambiente web; que se propõe comunitário ao tencionar a criação de um
espaço de comunicação alternativo construído com os agentes locais e interessado nas
necessidades também oriundas do cotidiano da comunidade.
A comunicação comunitária instaura uma via alternativa aos meios midiáticos
massivos e seus procedimentos verticalizados e particulares. Seu propósito é valorizar as
potencialidades e demandas dos próprios moradores locais, os quais devem participar
ativamente de todo o processo comunicativo. Miani (2011) considera a comunicação
comunitária mais do que uma prática comunicativa, mas, especialmente, uma prática social
engajada na conquista da cidadania e que através da participação, possibilita aos sujeitos
interagentes a construção de uma nova sociabilidade.
Essa participação, para Paiva (1998) é o elemento que irá distinguir um veículo
comunitário de um veículo massivo. A autora destaca que o envolvimento do grupo social é
fundamental, isso, no entanto, não exclui a presença de outros sujeitos, como aqueles
responsáveis pela montagem do veículo, por exemplo. A relação de produção apresentada por
Paiva (1998) é a que se espera estabelecer no âmbito de desenvolvimento do Portal TBC
Cabula, o qual deve dispor da colaboração, não somente, dos moradores locais, mas também,
de pesquisadores, estudantes e técnicos, todos engajados e vinculados direta ou indiretamente
com a localidade estudada.
Miani (2011), também enfatiza que toda a potencialidade crítica da comunicação
comunitária está na sua capacidade de mobilizar processos participativos de valorização às
subjetividades em um contexto de coletividade. Tal fato conduz ao processo de desalienação,
por possibilitar uma melhor compreensão dos sujeitos sobre sua realidade concreta, e,
consequentemente, a autonomia e a consciência nas proposições relacionadas ao bem estar da
comunidade. Esses aspectos coadunam com as intenções do Portal TBC Cabula, que a médio
e longo prazo visa contribuir para que a comunidade reconheça e valorize as suas produções,
de maneira a favorecer a construção de uma rede de colaboração e compartilhamento de
conhecimentos entre os sujeitos que interagem e produzem nessas comunidades.
O que torna tais práticas de comunicação uma alternativa adequada ao âmbito
comunitário são as suas bases de sustentação, orientadas por:
124

[...] princípios público-democráticos, de pluralidade, originados de motivações


diferentes em relação às da mídia comercial – que tem suas motivações instituídas
no lucro, promoção de interesses particulares, promoções políticas, etc. – pois possui
proposta social, de mobilizar para mudar, está antenada à realidade local,
preocupada em fomentar a cidadania, a educação e o desenvolvimento local,
cultural, social e humano. (VOLPATO, 2014, p.8)

Nesses moldes, a comunicação comunitária provoca uma ruptura no sistema clássico


de emissor e receptor, característico do modelo comunicacional utilizado pelas corporações
midiáticas, nas quais, o processo comunicativo se estabelece de modo unilateral e pouco
interativo. Distintamente, o sistema comunicativo comunitário tem caráter multidirecional,
acrescentamos ainda, pluridirecional, pois ao viabilizar a presença de variados canais de
interação/comunicação, propicia, por vezes, a diluição de fronteiras entre emissores e
receptores, supondo uma quebra dessa hierarquia, afinal, se permite o acesso e a interação dos
cidadãos envolvidos no processo comunicativo. Logo, essa forma de comunicar pode se
constituir em um espaço público de debates que veicula conteúdos críticos sobre a realidade
dos moradores, gerando uma comunicação contra-hegemônica, contestadora do status quo, ao
expressar visões alternativas às políticas e prioridades hegemônicas (VOLPATO, 2014).
Seguindo esses propósitos, a comunicação comunitária, tem sido promovida por
diversos segmentos da sociedade, como grupos, associações, cidadãos ligados às entidades
coletivas de filantropia e de promoção humana, geralmente relacionadas à mobilizações e
agregações sociais de caráter reivindicatório, na busca pela participação, pela livre expressão,
por melhorias socio-humanas, dentre outras causas similares. (MIANI, 2011; VOLPATO,
2014).
A adesão dos grupos populares a esse formato de comunicação também se justifica
pelo fato de, ao abordar temas locais ou específicos, contribuir para despertar o interesse por
parte da audiência, pois o conteúdo e os personagens têm relação mais direta com as pessoas.
“Os programas não são espetáculos a que se assiste, mas dos quais se participa, o que leva a
incrementar o processo de construção das identidades e de cultivo dos valores históricos e
culturais” (PERUZZO, 1998, p. 157).
No Cabula e entorno foram identificadas variadas iniciativas de comunicação
capitaneadas pelos produtores locais, com presença destacada para as moto rádios, cuja
função é basicamente anunciar os serviços do comércio local e eventos da comunidade e as
chamadas rádios comunitárias. Importante destacar essas últimas, as quais, historicamente,
apresentam um papel significativo, em especial, para as comunidades periféricas e que, por
vezes, sobrevivem à sombra da clandestinidade.
125

A pesquisa de levantamento que realizamos identificou a existência de 4 rádios


comunitárias, inseridas nas localidades do Beiru/Tancredo Neves, Engomadeira e
Pernambués. Além das rádios, do mesmo modo, destacamos a força das redes sociais digitais,
que vem sendo apropriadas pelas comunidades e seus coletivos locais para o
compartilhamento de suas ações, em especial, o facebook, o youtube e o whatsapp.
A existência desses veículos e espaços de comunicação comumente intitulados como
comunitários e de outros que vem sendo utilizados para tal fim, nos convida a refletir sobre o
que se caracteriza como mídia local e mídia comunitária. Peruzzo (2013 a, p.2) sinaliza que
há uma relação entre ambas as mídias, a ponto de existir dificuldade em delimitar esses
conceitos. Segundo a autora, a tendência é que a mídia local se ocupe de assuntos mais gerais,
como violência urbana, tragédias, problemas da cidade, culinária regional, dentre outros; já a
mídia comunitária direciona a sua pauta para interesses mais específicos de segmentos sociais,
como assuntos do bairro, movimentos sociais, questões de violência, oportunidades de
trabalho, lazer e educação, por exemplo.
O que verificamos na prática, de uma maneira geral, é o predomínio da nomenclatura
mídia comunitária e uma mescla nas pautas de comunicação, evidenciando o trânsito entre
assuntos gerais e comunitários. Mas, independente das ambiguidades conceituais,
identificamos, a partir de autores como Peruzzo (1998), Miani (2011) e Volpato (2014), três
elementos básicos que legitimam uma mídia comunitária independente da sua nomenclatura
explícita. Primeiramente, ela precisa ter a sua finalidade comunitária reconhecida pelos
moradores; necessita, também, ser desenvolvida com a comunidade e para a comunidade
incluindo as reclamações, requerimentos e demandas dos moradores e, por fim; deve atuar
como um meio de utilidade pública, divulgando a cultura e os eventos locais, além de
promover atividades educacionais e sociais que favoreçam o desenvolvimento de melhorias
para a população.
Ao seguir tais propósitos, esse modelo de comunicação assume um papel importante
nas comunidades, sobretudo, as menos favorecidas, ao permitir que os interesses dos
moradores sejam postos como prioridade. Do contrário teremos um completo desvio da
finalidade comunitária. Situação que, infelizmente, acomete muitas localidades periféricas,
cujos veículos de comunicação, alguns dos quais, ditos comunitários, passam a agregar um
papel político partidário servindo como meio de propaganda com fins eleitoreiros e ou
individuais.
Haja vista o caráter mobilizador e emancipatório das práticas comunicativas
comunitárias é importante também ressaltar que, para além da veiculação da informação de
126

interesse comunitário é possível identificar o caráter educacional no processo estabelecido por


essa forma de comunicação, se considerarmos os argumentos apontados por Volpato (2014,
p.227):

A comunicação comunitária possui, então, como fim o processo e não a recepção do


conteúdo. É o processo de fazer-comunicação que proporciona a relação entre a
população, o aprendizado, a conscientização, a mobilização, o autorreconhecimento,
o reconhecimento da realidade local, dentre outros. Atuam como espaço de
encontro, de comunhão, de interação e integração popular, e também de tensões e
conflitos, porque são estes últimos que fazem as experiências de comunicação
comunitária avançar, aperfeiçoando-se, cada vez mais, em um processo gradativo.

Observamos, portanto, a correspondência das bases norteadoras da comunicação


comunitária com a perspectiva de educação transformadora e libertadora defendida por Freire
(1987). Na ótica desse autor, a prática educativa precisa ser orientada para o desenvolvimento
de uma práxis conscientizadora, interessada na vivência e valorização das disposições
identitárias do sujeito. Freire (1987) ressalta a necessidade de se valorizar o homem enquanto
sujeito da história, indo na contramão da sociedade opressora que o concebe enquanto objeto
e não sujeito da produção de conhecimentos e da realidade.
Segundo a perspectiva freireana, a educação transformadora e libertadora aponta
caminhos para a superação da opressão e possibilita a experiência de liberdade nos sujeitos
envolvidos na prática educativa, uma vez que instiga os sujeitos à transformação de si e das
suas realidades. Desse modo, Freire (1987) concebe a educação como um processo: dialógico,
que encoraja a problematização e a criticidade; voltado à responsabilidade social e política; e
focado nas relações entre ação e reflexão, na práxis educativa.
A comunicação comunitária ao focar numa produção midiática que empodera a
comunidade, por meio de construção participativa voltada para a valorização local, o
fortalecimento identitário e a melhoria das condições de vida da comunidade; replica o
conceito de práxis, defendido por Freire (1987), no campo comunicacional. Pois favorece o
desenvolvimento de um processo que se dá na relação entre a reflexão do mundo e a ação
transformadora do homem. Nesse caso, tendo a comunicação como meio de articulação.
Dessa forma é possível compreender a prática de comunicação comunitária como um
processo pensado e refletido pelos sujeitos que interagem na produção do canal comunicativo
e das peças midiáticas veiculadas, mas, também, por aqueles que irão consumir o produto
final e o resignificar/transformar. Nesse sentido, inspirados no referencial freireano,
concebemos a comunicação comunitária como uma prática educativa e social, orientada para
127

a participação e tomada de consciência comunitária que usa a comunicação como meio de


atuação.
Os elementos que aqui discorremos, os quais caracterizam a comunicação comunitária,
justificam a nossa escolha por esse pilar teórico de sustentação para o DCC que será aplicado
ao Portal TBC Cabula. Conforme retratamos, essa forma de comunicação está afinada com as
pretensões do presente objeto de estudo e traz no seu bojo, diretrizes que ajudarão a nortear o
desenvolvimento do design cognitivo a ser construído e validado no processo investigativo.
Compreendemos, desse modo, que a participação dos sujeitos da comunidade ocupa
papel de destaque na composição de um processo comunicativo comunitário. Sem a prática
participativa a comunicação comunitária contraria os seus princípios e retorna ao modo de
comunicação hegemônica e unilateral.
Entretanto, além da participação, importante destacar, também, o papel da colaboração
e da cooperação no design que aqui construímos, por entendermos que são processos
interligados. Faz-se necessário, assim, identificarmos as relações existentes entre esses
princípios, quase sempre, utilizadas como sinônimas; as quais, embora não estejam de
maneira explicita nos referenciais da comunicação comunitária, estão presentes nas práticas
que requerem participação e engajamento para a solução de problemas coletivos.

4.4 Participação criativa: interfaces entre a colaboração, a cooperação e a participação

O conceito de participação está frequentemente associado à ideia de participação


política dos indivíduos na produção da vida em sociedade. A sua origem, segundo Teixeira
(2001), remonta à pólis grega, onde tinha sentido decisional e restringia-se ao processo de
eleição que, por sua vez, era exclusivo daqueles que dispusessem de patrimônio, o chamado
voto censitário. Mais recentemente, a participação vem traduzindo novos conteúdos e
sentidos, que encontram divergências, mas também pontos em comum.
A convergência de percepções em torno de tal termo pode ser observada nas
nominações a ele associadas, seja no discurso vulgar do cotidiano, seja nos dicionários de
língua portuguesa: a) ter ou tomar parte de; b) tomar parte em, compartilhar; c) informar ou
dar ciência de, comunicar ou anunciar; d) ter natureza ou qualidades comuns e; e) associar-se
pelo pensamento ou sentimento (AURÉLIO, 2002).
Sintonizado a algumas dessas percepções, Teixeira (2001), considera que a
participação significa “fazer parte”, “tomar parte”, “ser parte” de um ato ou processo, de uma
128

atividade pública ou de ações coletivas, independentemente da forma que se apresente. O


referido autor ainda esclarece que, atualmente, esse fenômeno apresenta-se como um processo
manifesto a partir de formas diferenciadas de expressão e ações coletivas, com ou sem
conteúdo político explícito, a depender dos seus objetivos e contextos.
Nesse sentido, considera-se como formas de participação, desde o comparecimento a
reuniões de partidos, comícios, grupos de difusão da informação, até a inscrição em
associações culturais, recreativas, religiosas ou, ainda, realizar protestos, marchas, ocupações
de prédios, entre outros. (TEIXEIRA, 2001)
Importante destacar também como elemento fundamental no processo de participação,
a identidade. Participar é um processo social de partilha e envolvimento dos sujeitos em uma
comunidade. Quando participamos, nos tornamos pertencentes ao processo e dele nos
apropriamos e esse movimento fica explícito nas práticas comunicativas comunitárias, por
exemplo. Se não há identificação e pertencimento dos sujeitos partícipes para com a causa,
inevitavelmente, o engajamento estará comprometido. Por isso, o nível de identificação e
pertencimento dos participantes refletirá na qualidade do processo participativo, e
consequentemente, do engajamento e criação de alternativas para a resolução dos problemas
identificados no coletivo.
Destacar essa relação é indispensável para o entendimento do que chamamos de
participação criativa, a qual evidencia os fatores identidade/pertencimento/apropriação como
alguns dos elementos chaves para os processos que pretendemos desencadear para a
construção do design cognitivo do portal TBC Cabula, bem como nas interações e
desdobramentos futuros que o mesmo possa potencializar.
Outro ponto que justifica a necessidade de elaborarmos uma via alternativa, nesse
caso, a participação criativa, é que conforme apontado por Teixeira (2001), o ato de participar
apresenta-se em distintas camadas, isto implica em dizer que estar presente nas ações de um
grupo pode ser considerada uma forma de participação, mas não, necessariamente, a presença
do sujeito participante é indicativo de engajamento/produção. Por isso, se faz importante
agregar outros elementos que realcem o caráter de trabalho coletivo, que ansiamos
potencializar no Portal, a exemplo da colaboração.
Nos processos e estratégias colaborativas, os participantes são encorajados a trabalhar
em conjunto na construção de aprendizagens e na solução de problemas, por meio de saberes,
práticas e conhecimentos variados. O modelo colaborativo contribui para que os sujeitos
envolvidos participem dinamicamente nas atividades e definam objetivos comuns do grupo
(DIAS, 2004). Para esse autor, o potencial dos grupos colaborativos se explica pelos
129

processos de conversação, múltiplas perspectivas e argumentação que são desenvolvidos


pelos sujeitos; os quais se engajam num esforço de participação, partilha e construção
conjunta.
Essa forma de produzir pode favorecer a emancipação do sujeito, uma vez que o
engaja em um processo de construção autônoma de conhecimentos. Ao se inserir em um
coletivo que esteja aberto à participação horizontal e democrática, o sujeito ativa o seu
potencial de respeito às divergências e diferenças experimentando assim, a alteridade
(ALVES; HETKOWISKI; JAPIASSU, 2006). Os referidos autores ainda enfatizam que os
sujeitos imersos em um ambiente colaborativo são potencialmente pares, co-autores e co-
construtores de variados processos de criação, atuação e significação.
Pensando nessa perspectiva, que intentamos ao criar um design cognitivo colaborativo
favorecer o desenvolvimento de um ambiente propício para a interação, o compartilhamento e
a colaboração dos interagentes. Por meio da implantação de estruturas/aplicações que
possibilitem o envolvimento de distintos atores com vistas ao alcance de objetivos comuns.
Sobre esse aspecto, Damiani (2008), argumenta que nos grupos colaborativos os componentes
compartilham as decisões tomadas e são responsáveis pela qualidade do que é produzido
coletivamente, conforme suas possibilidades e interesses.
Importante esclarecer, entretanto, que há divergências quanto ao conceito de
colaboração, por vezes visto como sinônimo, mas também como o oposto à cooperação.
Autores como Piaget (1973, p.105), por exemplo, consideram que cooperar é o mesmo que
operar em comum, isto é: “ajustar por meio de novas operações (qualitativas ou métricas) de
correspondências, reciprocidade ou complementaridade, as operações executadas por cada um
dos parceiros”. Colaborar, por sua vez, compreende a “reunião das ações que são realizadas,
isoladamente, pelos parceiros, mesmo quando o fazem na direção de um objetivo” (PIAGET,
1973, p.81).
A partir do ponto de vista piagetiano, a cooperação é apresentada como uma ação mais
complexa e que engloba o ato de colaborar, ou seja, para cooperar é necessário colaborar. Já
em outro sentido, Damiani (2008, p.215) argumenta que:

embora tenham o mesmo prefixo (co), que significa ação conjunta, os termos se
diferenciam porque o verbo cooperar é derivado da palavra operare – que, em latim,
quer dizer operar, executar, fazer funcionar de acordo com o sistema – enquanto o
verbo colaborar é derivado de laborare – trabalhar, produzir, desenvolver atividades
tendo em vista determinado fim.
130

Assim, na visão dessa autora, a qual afiniza com a nossa compreensão, na cooperação,
a execução de tarefas é feita mutuamente, ainda que os fins não sejam alcançados sob fruto de
negociação, podendo assim, existir relações hierárquicas entre os seus membros. Na
colaboração, por outro lado, ao trabalharem juntos, os membros de um grupo se apóiam,
visando atingir objetivos comuns mediante negociação com o coletivo, de modo a estabelecer
relações que tendem à não-hierarquização, liderança compartilhada, confiança mútua e co-
responsabilidade pela condução das ações.
É possível notar uma inversão conceitual na perspectiva de Piaget, se comparada à
escolha teórica que fizemos para abordar a colaboração. Afinal, entendemos a cooperação
como um processo hierarquizado que pressupõe a divisão de tarefas para a realização dos
objetivos, contrariamente à colaboração, que já supõe uma produção autônoma, não linear e
em fluxo, condizente à lógica dos ambientes conectados à rede web.
Não estamos, contudo, desconsiderando, a cooperação, afinal, ambos modelos,
cooperativo e colaborativo, geralmente, dialogam e apresentam-se hibridamente nas
comunidades de prática e nas relações coletivas de produção. Sobre esse ponto, Ramal (2002),
afirma que a parceria e o trabalho conjunto revelam situações de intersubjetividade, em que a
colaboração e/ou cooperação possibilitam a aprendizagem de todos e de cada um em
particular, respeitando as características individuais dos mesmos.
Coadunamos com a referida autora e esclarecemos que a escolha pelo conceito de
colaboração não se justifica como uma oposição às práticas cooperativas, tampouco à
exclusão da possibilidade de considerar as relações cooperadas em nossa proposta. Até por
que, o aspecto cooperativo poderá emergir, no decorrer do processo de construção do design
do referido ambiente, afinal, entendemos que esse tipo de relação pode se apresentar como
necessária ou um estágio prévio para a constituição de grupos colaborativos, posteriormente.
Além disso, é importante destacar que estamos desenvolvendo uma pesquisa que
pressupõe a interlocução entre distintas vozes, o que só poderemos constatar ao longo do
processo investigativo. O fator cooperativo poderá também se fazer presente nos
desdobramentos futuros que a interação no Portal TBC Cabula proporcionará. Isso vai
depender do quanto o design cognitivo implementado será capaz de potencializar, e, também
da qualidade da interação promovida pelos usuários, o que só poderá ser analisado em outras
situações investigativas.
Diante dessas aberturas que adotaremos o termo participação criativa como uma
interface entre os conceitos de participação, colaboração e cooperação. Usando essa
denominação escolhemos deixar latentes os caminhos que podem ser abertos por mecanismos
131

participativos, colaborativos e cooperativos aplicados ao Portal TBC Cabula. O que ficará


mais evidente nos processos que desenvolveremos com os parceiros da pesquisa. Isso justifica
o fato de optarmos por uma categoria hibrida, bem como sugere a estrutura interativa de um
portal web, o qual poderá dispor de aplicações mais colaborativas e outras de aspectos mais
cooperativos, sobretudo o portal em questão, o qual tenta agregar aspectos acadêmicos e
comunitários em um só espaço.
Atividades participativas, colaborativas e cooperativas, mediadas pelos dispositivos
web, só poderão ocorrer a partir da premissa da interatividade, que precisa ser entendida de
modo a ultrapassar a relação solitária do sujeito com as interfaces e seus agentes humanos e
artificiais (ALVES; HETKOWISKI; JAPIASSU, 2006). Tais autores ressaltam que somente a
partir da interatividade é gerada a participação criativa dos usuários nos sistemas e,
consequentemente, a interação e o compartilhamento entre os membros de uma comunidade.
Considerando essa perspectiva que trataremos a seguir da interatividade,
compreendendo-a como importante pilar teórico e um potencial desencadeador de práticas de
comunicação comunitária pautadas na participação criativa almejadas para o Portal TBC
Cabula.

4.5 Interatividade

A interatividade é um termo constantemente associado ao advento das redes


telemáticas e dos computadores digitais. Trata-se de uma relação tão intrínseca, na
perspectiva convencional, a ponto de ser comum a suposição de que a natureza interativa é
desencadeada apenas pelos sistemas informáticos.
Entretanto, essa denominação ao mesmo tempo em que, comumente assume um ar de
novidade com o desenvolvimento constante de dispositivos digitais diversos, também é
extrapolada, atingindo como argumenta Machado (1997), os usos mais descabidos e
excêntricos, ao abranger um campo semântico tão elástico ameaçado de não conseguir
exprimir nenhum sentido.
A ideia de interatividade tem sido propagada com muita veemência em nosso
cotidiano. Está em todas as partes. A TV é interativa, assim como o brinquedo, o rádio, o
tênis, o aparelho eletrônico, dentre outros elementos. Como se o que não fosse interativo
carecesse de um valor agregado. É um slogan, que funciona tanto na indústria quanto na
academia. (PRIMO, 2000)
132

Mas, ao contrário do que transparece, o caráter interativo não representa uma


novidade. Machado (1997) argumenta que ainda na década de 1930, Bertold Brecht, já falava
sobre a interatividade ao discutir sobre a necessidade de participação direta e democrática dos
cidadãos alemães no sistema radiofônico nacional. Nos anos 1970, Enzenberger pensou a
interatividade como um mecanismo de troca permanente, de conversação e de feedback entre
os implicados no processo de comunicação; assim como Raymond Williams que, na mesma
época, já criticava o caráter reativo das tecnologias vendidas com o slogan interativo
(MACHADO, 1997).
A história da arte também revela um rico percurso em experiências interativas. De
acordo com Oliveira (1997), variados movimentos artísticos exploraram a interatividade
mediante a construção de ambientes abertos, mesmo antes das inovações introduzidas pelas
tecnologias digitais; destacando-se, nesse âmbito, os impressionistas e os cubistas, os quais,
em suas obras virtualmente abertas, envolviam e mobilizavam o espectador a realizar leituras
infinitas, estabelecendo uma relação fruitiva.
Essas expressões ganharam a partir da década de 1960, autonomia considerável no
intento de converter os receptores em participantes e co-criadores da obra. Resultando em um
número importante de representantes da arte e da literatura interativa, cujas produções
invocam o sentido semiótico do termo interatividade, algumas das quais são citadas por
Machado (1997, p. 145):

Os móbiles de Calder; os espetáculos coletivos do Living Theatre; os happenings do


grupo Fluxus; as instalações e ambientes imaginados por artistas como Donald Judd,
Richard Serra ou Robert Morris; os poemas desmontáveis de Raymond Queneau; os
bichos de Lygia Clarck e os parangolés de Hélio Oiticica são apenas alguns dentre
milhares de outros, de obras que pressupõem a intervenção ativa do leitor/espectador
para a sua plena realização, que solicitam da audiência resposta autônoma e não
prevista, abolindo, pelo menos nas experiências mais radicais, as fronteiras entre
autor e fruidor, palco e plateia, produtor e consumidor.

As argumentações apresentadas até o presente momento corroboram que a


interatividade não foi introduzida pela informática, afinal, fora do âmbito computacional, já
concentrou genuínas possibilidades, nos campos social, comunicacional, artístico e literário.
Não obstante, é importante elucidar os avanços trazidos pelos dispositivos digitais e
telemáticos ao instaurar novos suportes para práticas interativas. Mas, sem negligenciar o fato
de que o duo tecnologias digitais / interatividade não se constitui em uma relação
determinante. Nem, tampouco, argumentar que somente as tecnologias digitais potencializam
a interatividade em seu nível mais complexo, afinal, nem toda tecnologia digital é de fato
interativa.
133

A propósito é comum encontrarmos o slogan interativo utilizado para a venda de


produtos, sobretudo os digitais, que são na verdade reativos. Primo e Cassol (2000) trazem
críticas contundentes, nos levando a compreender a interatividade aplicada a ambientes
mediados por computador, a partir da diferença entre sistemas reativos e sistemas interativos.
Para tais autores, a interação reativa compreende um sistema fechado baseado em
relações unidimensionais e lineares, conforme dispõe a própria natureza digital, que expressa
um modo de ser previamente definido e programável. Sendo assim, os dispositivos
computacionais, conectados à internet, sob forma de informação – textos, imagens, sons
digitais -, quando funcionam sozinhos são fechados, não problematizáveis. São, portanto, para
esses autores, reativos, à medida que oferecem ao interagente um grupo restrito de escolhas
acionadas por meio de clicks, caracterizando-se em uma ação binária de estímulo e resposta.
Nesse tipo de interação, emissores e receptores assumem papéis definidos e estáticos
com limitada possibilidade de co-criação. Interagimos desse modo, ao consumirmos
informações unilaterais em sites; ao navegarmos em passeios ou simuladores virtuais restritos
aos roteiros previamente definidos e tantos outros caminhos do mundo digital que não nos
possibilitam intervir, trocar, criar e nos engajar na solução de problemas.
Em contraposição a tal forma de interagir, Primo e Cassol (2000) apresentam a
interação mútua, que se caracteriza pela interconexão dos sistemas envolvidos. As relações
estabelecidas nesse tipo de sistema são transformadas permanentemente e pautadas na
autonomia, uma vez que os participantes envolvidos têm domínio sobre o sistema seja parcial
ou totalmente. Na interação mútua, o foco não é um participante em especial, mas sim o
relacionamento que pode ser estabelecido entre os pares engajados no processo interativo
(PRIMO; CASSOL 2000).
Podemos inferir, portanto, que ao contrário do controle que fundamenta os sistemas
reativos, nos sistemas pautados na interação mútua, a comunicação baseia-se no
compartilhamento, no diálogo e no relacionamento entre os participantes. O
compartilhamento é potencializado uma vez que os participantes têm autonomia sobre o
sistema, o qual oferece dimensões de interação mais amplas, a exemplo dos meios de
conversação com seus pares; manuseio de configurações; personalização e construção de
interfaces; construção e compartilhamento de informações, dentre outras possibilidades
perceptíveis em ambientes web como as redes sociais e os aplicativos mobile, que como
exemplo, permitem ao usuário elaborar e remixar informações em imagem, áudio e vídeo.
Para definir e diferenciar os conceitos de interação reativa e interação mútua, Primo
(2000) utilizou os seguintes parâmetros:
134

a) sistema: um conjunto de objetos ou entidades que se inter-relacionam


entre si formando um todo; b) processo: acontecimentos que apresentam
mudanças no tempo; c) operação: a produção de um trabalho ou a relação
entre a ação e a transformação; d) fluxo: curso ou sequência da relação; e)
throughput: os que se passa entre a decodificação e a codificação, inputs e
outputs (para usar termos comuns no jargão tecnicista); f) relação: o
encontro, a conexão, as trocas entre elementos ou subsistemas; g)
interface: superfície de contato, agenciamentos de articulação,
interpretação e tradução. (PRIMO, 2000, grifo do autor)

O quadro 13 foi elaborado a partir das contribuições desse autor e resume as


dimensões utilizadas para caracterizar e diferenciar a interação mútua e a interação reativa, na
perspectiva dos sistemas computadorizados.

Quadro 12: Quadro comparativo entre interação reativa/mútua

Dimensões Interação reativa Interação mútua


Sistema Fechado, previsível, estático e Aberto e autônomo, influenciado
descontextualizado. Focado em pelo contexto e focado no
produzir relações lineares e engajamento de agentes
unidimensionais. inteligentes.

Processo Dá-se por meio de estímulo- Dá-se por meio de negociação.


resposta. Cada estímulo acarretará Sendo assim, os resultados não são
a mesma resposta ao se repetir a previstos e evoluem/transformam
interação, quantas vezes ocorrer e conforme a negociação dos agentes
de maneira definida. engajados.

Operação Mediante ação e reação. Um pólo Mediante ações interdependentes.


age e outro reage a partir de uma Cada agente ativo e criativo
relação hierárquica. O usuário influencia o comportamento do
pode apenas intervir na sequência outro e também tem seu
programada previamente pelo pólo comportamento influenciado pelo
emissor. meio.

Fluxo Linear e pré-determinado em Dinâmico e em desenvolvimento.


eventos isolados. O usuário O usuário assume postura pró-ativa
interage dentro dos limites e tem maior controle sobre o fluxo
programados. das informações.

Throughpout Os processos de codificação e Cada mensagem recebida, de outro


decodificação se ligam por interagente ou do ambiente, é
programação. O computador decodificada e interpretada,
oferece uma falsa aparência podendo então gerar uma nova
interpretativa baseada em codificação, baseada na
possibilidades combinatórias. complexidade cognitiva do
135

interagente.

Relação Causal, lógica, objetiva e pré- Negociada, interpretativa, relativa e


determinada. emergente.

Interface É determinada pelo interagente pró Permite que os interagentes


ativo (programador), enquanto o modifiquem os roteiros em curso,
interagente reativo deve se há ocorrência de problemática e
adequar ao molde que foi definido atualizações mediante negociação.
antes que ele se engajasse no
sistema.
Fonte: a autora com base em Primo (2000)

Ao propor o estudo da interatividade mediada por computador, a partir dessas duas


categorias, Primo e Cassol (2000) e Primo (2000), defendem que os sistemas reativos não
podem ser considerados os exemplos fundamentais de interatividade, tal como comercializa a
indústria da informática. Por isso, os autores apresentam a interação mútua como um
horizonte que, ainda hoje, necessita ser pensado para o desenvolvimento de ambientes
interativos, criativos, abertos e virtuais. Interagir mutuamente, nessa perspectiva é ir além de
uma relação de troca de inputs e outputs, pois considera a complexidade global de
comportamentos intencionais ou não, verbais ou não, bem como os contextos sociais, físicos,
culturais e temporais, assim sinalizam esses autores.
Tais características contribuem para deslocar o usuário/consumidor de sua condição
passiva, para o status de interagente/pró-ativo, o qual envolvido com outros pares do processo
interativo consegue engajar-se para intervir, criar e atualizar o sistema. Decorridos quase 20
anos desses estudos, é possível identificar avanços importantes no desenvolvimento de
dispositivos digitais, especialmente com a diversidade de aplicativos mobile em circulação,
mas, ainda assim, os sistemas reativos continuam a ser uma realidade por traz do slogan
interativo.
O que nos chama atenção nessa compreensão e a aproxima do nosso ponto de vista
sobre a interatividade, ainda que Primo e Cassol (2000) e Primo (2000) utilizem o termo
interação mútua, é o olhar que extrapola a linear interação clássica, baseada na troca entre
emissores e receptores. Pensamos que a interatividade, mais do que uma relação de troca e
interrelação pressupõe uma ambiência de compartilhamento e engajamento com vistas à
solução de problemas, mediante tecnologias digitais ou não, como sugerem Matta e Carvalho
(2008, p.5) ao defini-la como “a intersecção entre as práticas sociais de sujeitos engajados na
136

resolução e compartilhamento, de construção de conhecimento e de prática de vida


compartilhada”.
Nessa perspectiva, os referidos autores defendem que a interatividade deixa de ser um
conjunto de feixes de emissão e recepção e se constitui em um conjunto complexo de
interações mediadas por ambientes técnicos, contextos e sistemas de signos. O processo
interativo nesses moldes é ilustrado na figura 16, na qual cada círculo representa a prática
sociometabólica de cada sujeito pertencente a um coletivo, nesse exemplo, formado por
quatro pessoas; a parte pintada de preto representa a intersecção entre as práticas sociais de
sujeitos, ou seja, a interatividade (MATTA; CARVALHO 2008).

Figura 16: Interatividade segundo a concepção dialética/dialógica

Fonte: Matta e Carvalho (2008)

A partir da ótica desses autores, embasada no materialismo histórico e dialético, a


interatividade condizente às possibilidades e práticas sociais concretas precisa ser concebida
em interlocução com o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) cunhada por
Vygotsky (2008), que compreende o intermédio entre o nível real e o nível potencial do
desenvolvimento cognitivo. A ZDP pressupõe a interação social entre o sujeito aprendiz e o
sujeito mais experiente, em práticas de compartilhamento, cooperação e colaboração, de
maneira a conduzir o sujeito aprendiz a um nível de desenvolvimento real. Essa zona se
constitui, segundo Matta e Carvalho (2008), em palco da interatividade, pois tenciona o
compartilhamento de práxis e vivências entre sujeitos aprendizes, que colaboram na
construção de alguma demanda comum.
137

As contribuições apresentadas nos convidam a refletir sobre a experiência interativa


que os sistemas digitais e telemáticos têm nos proporcionado, bem como, nos instigam a
pensar a interatividade que o DCC pretende proporcionar ao Portal TBC Cabula. Embora a
proposta de interatividade defendida por Matta e Carvalho (2008) ressoe no referencial
teórico e epistemológico deste estudo, julgamos necessário o trânsito por essas distintas
abordagens interativas apresentadas, especialmente, por serem os portais ambientes
desenvolvidos em distintas camadas e agregadores de variadas possibilidades interativas. Não
se constituem, portanto, em ambientes homogêneos que proporcionarão ao interator uma
experiência focada no alcance de apenas um objetivo comum, tal como acontece em um jogo
digital. Pelo contrário, a multiplicidade de aplicações que constituem um portal web oferece
experiências de naturezas diferenciadas, atendendo a sujeitos e interesses distintos. Podendo
variar desde aquela de natureza mais reativa elucidada por Primo e Cassol (2000) e Primo
(2000), até a mais aberta e engajadora forma de interagir apresentada por Matta e Carvalho
(2008).
Diante do exposto nesse intertítulo, constatamos que compreender essa categoria, em
vista da existência de um portal web, exige lançar um olhar ampliado, em razão das diferentes
maneiras que o campo tem sido apropriado e, consequentemente, das possibilidades
oferecidas por esse universo. Os informatas considerarão o campo interativo a partir da ótica
da navegabilidade/usabilidade do dispositivo mediador; artistas e literatos darão ênfase à
fruição e à livre expressão proporcionada pelos meios interativos; os comunicólogos
verificarão os níveis de interação e troca entre emissores e receptores no processo
comunicativo; os sociólogos trarão como enfoque a interação nas relações e nas práticas
sociais, e assim sucessivamente.
Cada uma das áreas nos oferece horizontes para construir o design e as aplicações
interativas para o portal ora investigado. Assim, é imprescindível: considerarmos o caráter
digital/virtual do Portal TBC Cabula, mas com uma percepção crítica sobre a reatividade e o
determinismo tecnológico; compreendermos as possibilidades de construções abertas
instauradas pelo campo das artes e da literatura; nos atentarmos às discussões que a
comunicação tece sobre os processos emissivos e receptivos, sobretudo, para construirmos
alternativas para os modelos lineares de comunicação; além de dialogarmos com a perspectiva
sociológica, pois a interatividade se desenvolve dentro de um contexto histórico, social E
cultural, no nosso caso, o Cabula e seu entorno.
Em vista das definições alcançadas sobre o contexto; o corpus da pesquisa e os
princípios de design que nortearão a próxima etapa deste estudo, a figura 17 sintetiza e
138

representa o design da tese, uma vez que indica os caminhos que orientam a argumentação
central da pesquisa e, consequentemente as etapas do trabalho colaborativo para a construção
da solução que atenderá o problema investigativo.

Figura 17: Design da tese

Fonte: a autora

Importante ressaltar que os pilares teóricos que definimos neste capítulo foram aqui
postos como princípios orientadores para a construção da proposta inicial apresentada aos
colaboradores do estudo para validação e o posterior desenvolvimento e aplicação técnica do
que estamos denominando por DCC. Desse modo, fundamentados nos princípios da
comunicação comunitária, participação criativa e da interatividade, fomos a campo para
validarmos nossa proposta e iniciarmos o processo de elaboração técnica do referido design,
139

que foi ganhando forma mediante uma metodologia de trabalho colaborativa, baseada em
processo e em redesenhos: design based research (DBR).
O percurso da pesquisa revelou, assim, afinidades com a proposta conceitual que
elaboramos, mas também apontou novos horizontes a partir das contribuições apresentadas
pelos colaboradores. Nesse sentido, o próximo capítulo apresentará as etapas desse processo
colaborativo que deu origem a um design cognitivo produzido a várias mãos.
140

“A EXPERIMENTAÇÃO”

“[...] Quais os interlocutores nesse ato aparentemente tão pessoal, solitário, reservado,
silencioso? Os possíveis leitores que, parecendo tão distantes, já me estão espionando,
indiscretos [...]; os amigos a quem vou mostrando o que escrevo; os muitos autores que vão
enriquecendo a listagem de minhas referências bibliográficas; os que estão com a mão na
massa das práticas que busco entender. Por fim, porque influenciado por todos os demais, eu,
escrevente em diálogo comigo mesmo[...]”

Mário Osório Marques (2008, p. 26-27)


141

CAPÍTULO V

5 Mapeando um processo de construção colaborativa

A metodologia que adotamos visou o alcance do objetivo geral traçado para esta
pesquisa: construir e aplicar um design cognitivo colaborativo ao Portal TBC Cabula, a fim de
analisar o seu potencial de socialização de saberes e fazeres da/sobre essa localidade. Para
isso, desenvolvemos um planejamento metodológico ancorado na base epistêmica que viemos
defendendo no decurso da escrita, pautada por uma lógica humanista, social e ética de
valorização das construções, experiências e contextos populares.
Diante dessas características, julgamos por necessária a aplicação de procedimentos e
técnicas que extrapolassem a concepção de uma pesquisa qualitativa tradicional amparada
restritamente ao plano teórico. Sendo assim, a pesquisa aplicada, especificamente, a
abordagem metodológica DBR foi a responsável por nortear o processo colaborativo gerado
neste estudo.
A escolha pela referida abordagem metodológica se justifica pela afinidade com os
pressupostos epistemológicos que lastreiam a tese, bem como o seu compromisso social; o
foco no desenvolvimento de soluções tecnológicas e o seu caráter aberto e colaborativo.
Nesse sentido, consideramos a DBR como uma abordagem de natureza qualitativa pois,
focaliza a realidade de maneira complexa e contextualizada, envolvendo elementos de
natureza social e cultural; alteridades e participação, além de possuir um plano aberto e
flexível (MACEDO, 2002; LUDKE; ANDRÉ, 1986). E aplicada, pois está compromissada
com o desenvolvimento de soluções para problemas presentes em contextos reais, mediante
uma perspectiva científica.
Ressaltamos também, o caráter híbrido da DBR, que nos permitiu transitar entre
procedimentos de pesquisa de distintas naturezas. Por isso, o DCC construído para este estudo
também toma como inspiração os princípios de co-design. Esse termo tem sido utilizado pela
comunidade de designers, como abreviação para “community design, collaborative design,
cooperative design”, significando um conjunto de ferramentas utilizadas por designers para
engajar não apenas esses profissionais no processo de elaboração dos processos, mas também
envolver os usuários na criação de soluções; empregando assim, uma maneira de fazer o
design de uma solução para uma comunidade com aquela comunidade (BARANAUSKAS et
al, 2013).
142

O codesign como construção conjunta é um processo ativo e receptivo; é


principalmente sobre como fazer, escutando, aprendendo e comunicando tudo em
um processo; o codesign tem o potencial de promover mudanças uma vez que é um
fazer com, não fazer para; nesse sentido, aproxima-se do conceito de design
participativo (BARANAUSKAS et al, 2013, p.33).

Essa perspectiva de produção de design, por estar enlaçada aos pressupostos


epistemológicos e metodológicos que adotamos, trouxe contribuições significativas ao modo
como estabelecemos a interação com os colaboradores da pesquisa. Importante ressaltar que
entendemos o codesign como um conjunto de ferramentas que orientam o desenvolvimento de
soluções de design, isto é, de natureza mais técnica, o que inclui elementos como
programação visual, layout, tipografias, design digital, dentre outros. Embora também
envolva tais aspectos, o design cognitivo extrapola esse foco centrando-se nas arquiteturas e
estratégias capazes de orientar os processos cognitivos pretensos. Desse modo, esclarecemos
que ao nos apropriarmos do codesign estamos forjando uma adaptação desse ferramental.
Amparados nos princípios da DBR e do codesign construímos o DCC do Portal TBC
Cabula, mediante um processo colaborativo. O presente capítulo tem, portanto, o objetivo de
mapear os caminhos percorridos em cada um dos ciclos sugeridos pela DBR e aplicados nesta
investigação. Nesse sentido, é importante esclarecer que a seguir apresentaremos as
construções, os avanços e, também, os entraves e informações que nos conduziram a
mudanças de estratégias, considerando que a abordagem metodológica adotada prioriza não
apenas os resultados da pesquisa, mas, especialmente, o processo desenvolvido.

5.1 Análise contextual

Em afinidade com o que preconiza a praxiologia, o primeiro passo para o


desenvolvimento da pesquisa DBR é a apropriação do contexto sócio-histórico em que o
estudo se insere. Por isso, foi necessário, em princípio, compreender a comunidade parceira
do processo colaborativo, suas características, demandas e anseios, realizando para isso uma
imersão que partiu das suas bases históricas, afinal, é o entendimento da história que nos dá
subsídios para compreender as relações atuais.
Matta, Silva e Boaventura (2014, p.31) defendem que a etapa de contextualização da
DBR se aproxima dos pressupostos praxiológicos de Gramsci (1995, 2009), uma vez que
extrapola a visão tradicional de revisão de literatura ao se apresentar como uma prática
colaborativa de compreensão e construção de conhecimento e práxis das comunidades. O ciclo de
143

análise contextual desta tese, cujas elaborações foram apresentadas no capítulo 2, iniciou
desde a primeira aproximação desta pesquisadora com o locus da investigação, logo no
período de ingresso no doutorado. Esse momento envolveu a participação nas atividades de
pesquisa e extensão desenvolvidas pelo projeto TBC Cabula, as quais, favoreceram a entrada
no contexto e as primeiras aproximações com a comunidade e os parceiros desta pesquisa.
Nesse sentido, importante destacar a participação nas atividades promovidas pelos
projetos de extensão TBC e Conteúdos digitais nas escolas, realizado pelos grupos de
pesquisa SSEETU e Rede Educa, que articularam práticas formativas dialógicas com
estudantes e professores da rede pública municipal e estadual de educação, situadas na
localidade do Cabula e entorno, como o Colégio Estadual Roberto Santos (Cabula); o Colégio
Estadual Helena Magalhães (Beiru); o Colégio Estadual Ministro Aliomar Baleeiro e a Escola
Estadual Zumbi dos Palmares. As atividades desenvolvidas incluíram oficinas temáticas,
pautadas em metodologia ativa que permitiram aos participantes construir roteiros de
visitação às suas comunidades, além de colaborar no desenvolvimento de jogos Role Playing
Game (RPG) que tinham o Cabula e entorno como campo.
Também ressaltamos os momentos de organização do Encontro de Turismo de Base
Comunitária e Economia Solidária3 (ETBCES), que acontece anualmente e de modo
itinerante nas comunidades do Cabula e entorno, tendo como princípio a construção
colaborativa com a comunidade anfitriã. A participação na comissão organizadora das edições
de 2014 e 2015 do ETBCES foi uma oportunidade de vivenciar a dinâmica de comunidades
como Pernambués e Beiru Tancredo Neves, perceber o seu potencial expresso nas práticas
dos produtores e artistas locais e nos demais sujeitos que ajudam a fazer a comunidade.
As experiências acima relatadas foram fundamentais para estabelecermos contato mais
direto com os parceiros desta pesquisa e permitir que outras oportunidades de interlocução
fossem possibilitadas. Assim, nas circunstâncias estabelecidas fomos reunindo sujeitos
interessados em colaborar com o redesign do Portal TBC Cabula, o que incluía professores,
estudantes das escolas locais, produtores culturais, representantes da comunidade, além das
antigas figuras da comunidade, que nos ajudaram a reconstituir a história do Cabula, ainda
pouco explorada nas referências bibliográficas.
Para esse ciclo contamos com a colaboração de antigos moradores, cuja localização só
foi possível a partir de uma rede de contatos tecida mediante a técnica do snowball4, que

3
Informações disponíveis em: <http://etbces.net.br/>
4
Técnica que segundo Velasco e Díaz de Rada (1997) favorece o levantamento de dados, informações, objetos,
imagens, utensílios e outros, é uma forma de amostra não probabilística utilizada em pesquisas sociais onde os
144

favoreceu o acesso a 5 colaboradores com faixa etária entre 40 e 72 anos, sendo 1 mulher e 4
homens. Dois desses colaboradores foram nascidos e criados no Cabula e entorno, os demais
migraram nos anos 1960, período em que a localidade iniciou o seu processo de expansão
populacional.
As rodas de conversa foram realizadas nas residências desses colaboradores com a
participação de outros membros do grupo de pesquisa, também interessados em investigar a
história do Cabula. Importante salientar que não utilizamos roteiro de perguntas previamente
elaborado, já que as indagações eram feitas conforme os participantes apresentavam seus
relatos espontaneamente. Sendo assim, realizamos cinco rodas de conversas, nos bairros da
Engomadeira, Estrada das Barreiras e Beiru-Tancredo Neves. Os relatos obtidos foram
registrados em áudio conforme autorização dos colaboradores, cujas identidades estão
preservadas, por isso não houve registros fotográficos.
Os fatos relatados pelos antigos moradores foram confrontados com os dados obtidos
no levantamento bibliográfico e documental, que incluiu fontes documentais sobre o Cabula e
entorno, tais como inventários, certidões, mapas e fotografias, disponíveis nos arquivos e
bibliotecas públicas de Salvador, Bahia. O cruzamento entre a história oral e as fontes
bibliográficas nos permitiu caracterizar o Cabula desde o período colonial até a atualidade.
Concatenar as fontes bibliográficas às fontes orais é um trabalho necessário, seja pelo fato de
ampliar a nossa percepção sobre a história da comunidade, pois acessamos distintas versões
dos fatos, seja por permitir a valorização dos moradores e de uma história oral que é carente
de registro, sobretudo, por serem os porta vozes desses fatos orais, pessoas de idade avançada.
Nesse sentido, o contexto foi delineado a partir das fontes históricas mencionadas e,
também, das informações obtidas por meio de observação assistemática realizada nos
momentos de interação com a comunidade. O construto contextual possibilitou, assim,
perceber/apreender o locus da pesquisa a partir de um olhar ampliado, o que incluiu a
comunidade do Cabula e entorno e as relações desta com o Projeto TBC Cabula. Isso
consequentemente, respaldou a análise do Portal TBC Cabula, realizada em conformidade
com as características e demandas dessa comunidade
É válido ressaltar que a análise contextual foi um ciclo intenso que não se restringiu
apenas a um momento, afinal, durante todo o transcurso da pesquisa necessitamos
reconfigurar e revisitar elementos analisados no contexto, em virtude das novas informações

participantes iniciais de um estudo indicam novos participantes que, por sua vez, indicam outros participantes e
assim sucessivamente, até que seja alcançado o objetivo proposto que é o mapeamento participativo e
colaborativo.
145

que imergiam no desenrolar do processo investigativo. A análise contextual compreendeu


assim, o ponto de partida para situarmos a problemática da pesquisa aos objetivos traçados, e,
consequentemente, nortear os ciclos posteriores, especialmente o ciclo de design e
prototipagem. Embora, neste estudo, estejamos considerando as etapas de design e
prototipagem como interdependentes, optamos, apenas para fins de melhor compreensão dos
processos estabelecidos, segmentar esse ciclo, bem como apresentamos a seguir.

5.2 Design

O ciclo de design é uma etapa central no processo de pesquisa DBR. Para iniciar esse
ciclo é necessário, de acordo com Matta, Silva e Boaventura (2004), assumir uma posição
teórica e comunitária interessada no engajamento dos sujeitos envolvidos no problema de
pesquisa. Ou seja, os caminhos construídos no ciclo de análise contextual para a elaboração
do problema de pesquisa, precisam ser primeiramente analisados segundo princípios teóricos.
O conjunto desses princípios que servirá de base para a elaboração da proposta de aplicação,
mediante o refinamento da teoria, a consulta e a colaboração entre os pesquisadores, gerando
assim uma primeira versão de modelagem (MATTA; SILVA; BOAVENTURA; 2004).
Sendo assim, em sintonia com os pressupostos da pesquisa, assim como dos resultados
obtidos com a análise contextual, definimos 3 princípios design para o portal ora estudado:
comunicação comunitária, participação criativa e interatividade, os quais foram abordados no
capítulo 4, com as devidas justificativas e referenciais. Esses princípios compreendem a base
conceitual do DCC e orientaram o plano de construção colaborativa.
O primeiro desafio apresentado nesse ciclo foi definir quem seriam os colaboradores
desse processo e como a comunidade do Cabula e entorno poderia participar nesse momento
construtivo, tendo em vista o público multifacetado que o Portal TBC Cabula busca atingir.
Assim, inicialmente, pensamos em envolver nesse processo membros do projeto TBC Cabula
representando a comunidade acadêmica, além dos moradores locais. Para isso, realizamos a
aplicações pilotos de dois instrumentos de pesquisa, a saber: rodas de conversa voltadas à
comunidade acadêmica e questionários de opinião padronizados direcionados aos moradores
locais.
As aplicações indicaram que a roda de conversa, instrumento típico das intervenções
realizadas pelo Projeto TBC Cabula cumpriu com o seu propósito quando aplicamos com os
grupos de pesquisa SSEETU e Rede Educa. Desenvolvemos, desse modo, um diálogo aberto
146

e todas as sugestões e pontos observados pelos participantes da roda de conversa foram


registrados em documento.
Já os questionários de opinião padronizados, que seriam, a princípio, direcionados
apenas aos moradores locais não cumpriram com êxito o propósito idealizado.
Desenvolvemos a aplicação piloto em duas etapas, ambas focadas na escolha aleatória de
moradores locais. A primeira etapa com aplicação de 30 questionários em pontos estratégicos
de grande movimentação de residentes do Cabula e entorno, a exemplo de pontos comerciais.
Na segunda etapa aplicamos 30 questionários com estudantes do Colégio Estadual Roberto
Santos nas dependências escolares, por ser uma instituição cujo público, além de jovem, é
oriundo de distintas localidades que compõem o locus da pesquisa.
As duas ocasiões revelaram que esse instrumento não favoreceria a um processo de
construção colaborativa. Para a nossa surpresa, nos sujeitos mais se sobressaíram olhares
perdidos, desconhecimento e desdém sobre as suas comunidades. Na primeira etapa, que teve
um público com uma faixa etária variada, indo de 20 a 65 anos, as sugestões dadas se
restringiram às dicas informativas para o portal. Ou seja, apontaram a necessidade de o portal
disponibilizar informações sobre os espaços de lazer e cultura locais, datas de eventos locais,
serviços gratuitos oferecidos pela UNEB e a Escola Baiana de Medicina e cursos
profissionalizantes, dentre outras informações de utilidade pública, mas sem sugerir espaços,
serviços e outras informações já existentes nas comunidades.
Ainda que tenhamos percebido aspectos positivos nessas sugestões, as quais foram,
inclusive, consideradas, elas não atenderam suficientemente ao que objetivamos. De modo
semelhante aconteceu na segunda etapa. Dos 30 questionários aplicados na escola com
estudantes na faixa etária entre 15 e 18 anos, apenas 7 implicaram em sugestões efetivas de
grupos e ações locais, os demais se resumiram a discursos vazios ou restritos à Rádio Web
Juventude que funciona na escola.
Dessa forma, os resultados obtidos com os testes, assim como o desenrolar da
pesquisa, sinalizaram a necessidade de reconfigurar o plano de construção do design, desde os
instrumentos utilizados até a definição dos colaboradores. O primeiro ponto que modificamos
foi convidar para o processo colaborativo as comunidades de prática locais, por considerar
que as contribuições desses sujeitos engajados em seus contextos apresentariam maior
representatividade no que tange às demandas sócio culturais do Cabula e entorno, em vista de
suas percepções mais amplas, contextualizadas e críticas sobre a realidade local. Nesse
sentido, o público geral foi agregado apenas no ciclo de avaliação do portal.
147

Também agregamos nesse processo os graduandos em turismo e hotelaria da UNEB,


como representantes da comunidade acadêmica, a fim de incluir o olhar de jovens
profissionais da área à nossa proposta de Portal TBC. Para esses últimos consideramos a
necessidade de criar um ambiente de colaboração mais adequado e atraente ao perfil juvenil,
em razão das experiências obtidas com os estudantes do ensino médio.
Importante ressaltar que as aplicações pilotos também apontaram acertos, a exemplo
da roda de conversa, mantida como instrumento central nesse ciclo, incluindo nela, quando
necessário, elementos interativos a fim de engajar os sujeitos, não apenas no diálogo, mas que
os mobilizasse a tangibilizar suas ideias, tal como realizado nas oficinas desenvolvidas nas
escolas em práticas de extensão do projeto TBC Cabula. Assim, os colaboradores do ciclo de
design foram organizados em três grupos, conforme o quadro a seguir.

Quadro 13: Colaboradores do ciclo de design


Grupos Componentes
Comunidades de prática acadêmicas Grupo de Pesquisa SEETU
Grupo de Pesquisa Rede Educa
Estudantes do curso de Turismo e Hotelaria da UNEB
Estudantes do curso de Pós Graduação em Design e
Inovação Social (UFBA)
Comunidades de prática locais Projeto Cidadão
Projeto Domingo Alternativo
Coletivo Cultarte
Biblioteca Comunitária Zeferina Beiru
Profissionais de design e tecnologia Profissionais liberais da área TI
da informação
Bolsista de design
Empresa Soterotech
Fonte: a autora

Foram realizadas com esses colaboradores rodas de conversa e encontros sistemáticos


de acompanhamento com os profissionais de design e tecnologia da informação e
comunicação, ao longo de todo o desenvolvimento da pesquisa, para fins de design,
prototipagem e revisão das soluções elaboradas. As rodas de conversa foram realizadas
conforme um roteiro básico e flexível que foi se adaptando às circunstâncias de cada encontro
e o perfil dos sujeitos colaboradores.
148

Quadro 14: Roteiro das rodas de conversa

ETAPAS DA RODA DE OBJETIVOS


CONVERSA

1)Apresentação dos Conhecer os sujeitos que integram a comunidade de prática


colaboradora, bem como os propósitos e ações;
participantes
2)Apresentação do Portal Situar os colaboradores sobre os objetivos e princípios do
portal em questão e da presente pesquisa para que os sujeitos
TBC Cabula
a validem ou não;

3) Acolhida de dúvidas Sanar possíveis dúvidas quanto ao objetivo, estrutura e


funcionalidades de um portal web, por meio de telas ou
similares, quando necessário e/ou o que ocorrer;

3) Roda de diálogos Dialogar sobre as potencialidades/fragilidades identificadas


no portal e coletar sugestões de melhorias, no que tange à
socialização de saberes e fazeres da comunidade;

4) Registro Registrar coletivamente as ideias dos colaboradores a medida


que forem sugestionadas e disponibilizar o registro a todos
presentes.

5) Assinatura do termo de Assinar o termo de compromisso e cessão de divulgação dos


compromisso seus dados para pesquisa.
Fonte: a autora

Nesse sentido, as comunidades de prática, cujos membros já interagiam em ambientes


como os portais web e o próprio portal TBC Cabula, dialogaram com maior fluidez a respeito
da proposta. A exceção a essa regra foi o coletivo Cultarte, formado por senhoras na faixa
etária entre 30 e 60 anos, que demandaram ações mais específicas para que compreendessem
as funcionalidades de um portal, a partir de exemplos, similares de portais, assim como
referenciais de interação digital que elas já possuíam, como o whatsapp, o facebook e sites
com informações televisivas e de receitas. O que favoreceu a construção de um canal de
comunicação e participação efetivo com o Cultarte.
As sugestões apresentadas nas rodas de conversa foram registradas em documento e,
posteriormente, lançadas na ferramenta de tipografia online word clouds5, que organiza

5
Disponível em: https://www.wordclouds.com/
149

visualmente nuvens de palavras, conforme a sua frequência. O desenrolar desses processos


será apresentado a seguir, com ênfase para os momentos de consulta colaborativa realizados
com cada um dos grupos anteriormente mencionados.

5.2.1 Comunidades de prática acadêmicas

As comunidades de prática acadêmicas que colaboraram com esta pesquisa estão


agrupadas em dois segmentos: I) professores, estudantes, voluntários e representantes da
comunidade que atuam em grupos de pesquisa vinculados à Universidade do Estado da Bahia,
investigando e/ou desenvolvendo ações de pesquisa, ensino e extensão na localidade do
Cabula e entorno, a saber: a) Grupo de Estudos Sociedade Solidária, Educação, Espaço e
Turismo (SSEETU); b) Sociedade em Rede Pluralidade Cultural e Conteúdos Digitais
Educacionais (Rede Educa) e; II) Estudantes do curso de Turismo e Hotelaria que
participaram da disciplina Marketing Aplicado ao Turismo e à Hotelaria no período 2016.1.

a) Roda de conversa – SSEETU e Rede Educa

A primeira roda de conversa com representantes das comunidades acadêmicas ocorreu


com componentes dos grupos de pesquisa SSEETU e Rede Educa, em 15 de Junho de 2015,
no Auditório Ivete Sacramento, Departamento de Ciências Humanas – Campus I / UNEB,
turno vespertino. Participaram nessa roda os líderes dos referidos grupos, seus orientandos,
entre doutorandos, mestrandos e graduandos; pesquisadores voluntários e membros da
comunidade local, na ocasião representada pelos professores e gestores da Escola Estadual
Zumbi dos Palmares (Beiru-Tancredo Neves).
Essa roda de conversa foi agendada com 15 dias de antecedência, após uma reunião
realizada com a equipe de desenvolvimento e aconteceu no espaço reservado aos encontros de
estudo dos referidos grupos de pesquisa. Nesse período que antecedeu a roda de conversa foi
solicitado aos participantes que interagissem com o Portal TBC Cabula, que na época, estava
hospedado no domínio da UNEB, no endereço <www.tbcuneb.br>, passando por um processo
de migração de plataforma. A intenção dessa interação prévia era que os membros do grupo
levassem para o encontro suas primeiras impressões sobre o ambiente, a fim de trazer maior
precisão e abrangência ao diálogo.
A roda de conversa iniciou com a apresentação dos colaboradores presentes. Esse foi
um momento importante, especialmente, pelo fato de termos nesse dia, o encontro entre os
150

dois grupos de pesquisa e a presença de membros da comunidade. Assim, colaboraram


pesquisadores e profissionais de diferentes áreas como o turismo, pedagogia, história,
sistemas de informação, artes e biologia. Em seguida foi feita a apresentação do Portal TBC
Cabula utilizando para isso um projetor multimídia. Buscamos nesse momento, apresentar a
finalidade do portal TBC Cabula; a proposta e os princípios que norteiam a presente pesquisa;
o processo de desenvolvimento em curso, assim como exploramos visualmente as abas e
setores do portal.
Finalizada a apresentação foi aberta a roda de diálogos, sendo que para essa ocasião
utilizamos apenas o registro escrito, dispensando o uso de gravador de áudio. Os
participantes, voluntariamente, se revezaram em mostrar as suas impressões e sugestões de
melhorias para o ambiente, as quais foram registradas em tempo real e projetadas
visualmente. De modo geral, os participantes reafirmaram a importância do portal para a
comunidade do Cabula, como meio de visibilidade e valorização local, mas ressalvaram a
necessidade de se realizar reparos com vistas ao alcance desses propósitos.
Assim sendo, as informações obtidas na roda de conversa foram sistematizadas em
dois blocos: 1-problemas e 2-soluções. Posteriormente foi feito o tratamento dessas
informações a fim de gerar palavras/expressões chaves, as quais foram lançadas na ferramenta
Word Clouds, que dispõe as palavras de modo a enfatizar aquelas mais freqüentes, conforme
configuração a seguir apresentada.

Figura 18: Problemas na interação com o Portal TBC Cabula

Fonte: a autora

A partir do número de ocorrências registrado distribuímos essas expressões chaves em


categorias. A respeito dos problemas mencionados pelos colaboradores na interação com o
151

Portal TBC Cabula, dispostos na Figura 18, chegamos às seguintes categorias: a) carência de
informações; b) baixa freqüência na atualização; e c) dificuldade de interação no ambiente.
A carência de informações foi a expressão que utilizamos para agregar falas como:
“tem poucas informações disponíveis”; “tem muitos espaços vazios no Portal”, “precisa de
mais informações sobre a comunidade”, ou ainda, “tem muitos resultados de pesquisa que
ainda não estão lá”. Em relação à baixa freqüência na atualização, os colaboradores
sinalizaram a existência majoritária de informações antigas, que demonstravam a baixa
rotatividade informacional nesse ambiente. Já a dificuldade de interação foi outro aspecto
refletido em falas como: “as informações estão misturadas”, “tive dificuldade em encontrar
algumas informações que eu gostaria” e “meus alunos tiveram dificuldade em encontrar
informações sobre os bairros”, falas que sinalizaram a necessidade de reorganização de
elementos como design e layout do portal.
Esses pontos foram acompanhados de sugestões de melhorias e também de dúvidas,
por parte de alguns presentes interessados em conhecer as possibilidades de funcionamento do
portal. Nesse sentido, agregamos tais sugestões de melhorias em cinco categorias: a)
participação autônoma; b) produções da comunidade; c) colaboração e; d) produção de
conteúdos. A categoria que agregou o maior número de sugestões foi a participação
autônoma, que começou a ser delineada a partir de perguntas do tipo: “como a comunidade
pode participar?” e “como faço para divulgar os trabalhos lá da escola?”. Até então, a forma
como a comunidade estabelecia contato com os desenvolvedores do portal para divulgação de
eventos e notícias era via e-mail e posterior postagem, o que era feito apenas por um número
reduzido de moradores que possuía o e-mail do projeto e/ou de seus coordenadores. Sobre
esse aspecto, o grupo demonstrou um consenso ao sinalizar a necessidade de criar recursos
capazes de favorecer a participação livre da comunidade nesse ambiente.
Esse ponto, em especial, levou a questionamentos em torno do nível de liberdade
dessas postagens, afinal, a livre interação poderia dar margem às informações externas alheias
aos objetivos do portal e, até mesmo, a presença de conteúdos proibidos. Assim, considerando
o caráter do projeto TBC Cabula, bem como a sua vinculação à uma instituição de ensino
superior pública, o diálogo apontou a necessidade de abrir o portal TBC Cabula para a
comunidade, sob a condição de haver moderação das publicações. Os pontos elencados nessa
categoria dialogaram com as categorias colaboração e produção de conteúdos, uma vez que a
discussão em torno da forma de interação da comunidade recaiu sobre a forma de produzir
conteúdos com essa comunidade no Portal TBC Cabula. Os mecanismos sugeridos para esse
fim incluíram: a criação de um canal de vídeos do Youtube para postagens da comunidade e
152

dos artistas locais, sob moderação, por ser uma forma gratuita, simples e popular entre os
sujeitos locais.
Dois colaboradores apontaram para a necessidade de construir um espaço no Portal
TBC Cabula, para que a comunidade divulgasse as suas produções, sendo que um desses
colaboradores enfatizou a necessidade de dar espaço para as escolas mostrarem seus trabalhos
e iniciativas, ficando os gestores responsáveis por gerir tal espaço. O uso de wikis para a
construção de conteúdos colaborativos foi uma alternativa sugerida pelos profissionais de
sistemas de informação e reforçada por uma das professoras de história presentes no encontro,
a qual propôs a construção da história oral do Cabula e entorno por meio desse tipo de
recurso.
Figura 19: Sugestões de solução acadêmico-comunitárias

Fonte: a autora

Além de exaltarem a importância do processo de participação/colaboração da


comunidade local na elaboração de conteúdos para o portal, os sujeitos presentes nesse
encontro sinalizaram a necessidade de construir conteúdos acadêmicos para socialização no
Portal TBC Cabula. Em especial, sistematizar as informações das pesquisas já realizadas
pelos professores e estudantes vinculados aos grupos SSEETU e Rede Educa, assim como, de
outros grupos e/ou instituições de ensino superior produtores de pesquisa nesse locus. Trata-
se de uma importante contribuição para a vertente acadêmica do ambiente e o seu
compromisso com a divulgação científica. Para alcançar esse fim foi sugerido por alguns
presentes a realização de um trabalho de divisão de tarefas entre alguns pesquisadores do
grupo presente, que foi organizado na segunda roda de conversa.
153

Quadro 15 – Resumo Roda de conversa – SSEETU e Rede Educa


Princípios da Sugestões de solução Encaminhamentos
pesquisa atendidos
Comunicação -Incluir a comunidade em um processo Sistematizado e
comunitária colaborativo de construção de encaminhado para o grupo
conteúdos sob moderação. de desenvolvimento para
Participação criativa -Criação de espaço de divulgação dos análise de viabilidade
trabalhos de produtores locais e técnica
escolas;
-Criação de canal TBC no youtube;
-Utilização de mecanismo wiki para
construção de conteúdos
colaborativos, como a história local.

Participação criativa -Elaboração de um grupo de Proposta a ser discutida em


cooperação/ colaboração para a outra roda de conversa.
produção de conteúdos acadêmicos.

Interatividade -Reorganização de elementos como Encaminhado para o grupo


design e layout do portal de desenvolvimento para
análise de viabilidade
técnica
Fonte: a autora

As diretrizes construídas nesta roda de conversa foram encaminhadas para as etapas


posteriores, com vistas à análise e implementação. Nesse sentido, considerando como pauta a
elaboração de um grupo de cooperação/colaboração para a produção de conteúdos acadêmicos
surgiu como demanda o convite para uma nova roda de conversa.

b) Roda de conversa – Orientandas do Grupo de Pesquisa SSEETU

A segunda roda de conversa com a comunidade acadêmica ocorreu após um intervalo


de seis meses. Considerando a demanda identificada na roda de conversa anterior, bem como
a saída do servidor da UNEB, mudança da equipe de desenvolvimento, dentre outras questões
que serão devidamente apresentadas no ciclo de prototipagem, uma das orientandas do
SSEETU mobilizou um grupo de mestrandas e doutorandas para a organização de uma força
tarefa visando a construção de conteúdos de pesquisa para o Portal TBC Cabula.
154

Figura 20: Convite às colaboradoras SSEETU

Fonte: a autora

A reunião foi realizada em 21 de dezembro de 2015, às 15h, na sala do grupo de


pesquisa e contou com a presença de cinco orientandas, sendo três doutorandas e duas
mestrandas. Iniciamos o diálogo realizando um balanço das ações já desenvolvidas pelo Portal
TBC Cabula até o momento e pensando nas possibilidades de atuação desse grupo de
orientandas para atender a uma das demandas emergentes na última roda de conversas:
inexistência de uma equipe de produção de conteúdos. Importante salientar que, mesmo tendo
a proposta de construção colaborativa com a comunidade, o Portal TBC Cabula também traz
como uma de suas frentes de atuação a socialização de conteúdos científicos, que mostrava-se
incipiente nesse ambiente.
Nesse sentido, um dos primeiros pontos da discussão foi a necessidade de ampliar o
acesso à informação científica sobre os bairros do Cabula e entorno. Sobre esse aspecto, a
orientanda e professora L.M sinalizou a dificuldade de seus discentes na busca de
informações sobre os bairros do Cabula e entorno, a exemplo da história, características
geográficas e culturais. A sugestão dada para mitigar esse problema foi a construção de uma
biblioteca digital com disponibilização de links de fontes confiáveis sobre tal localidade,
assim como divulgação dos artigos, livros e materiais técnicos já produzidos pelos grupos
SSEETU, Rede Educa e de outras instituições do ensino superior. A fim de viabilizar esse
intento a orientanda ainda sugeriu que o grupo iniciasse com o levantamento e socialização de
links de fontes de pesquisa, para posterior aplicação no ambiente.
155

Para além das fontes científicas, a orientanda H.P ressaltou a importância de


ampliarmos a socialização de informação sobre essas comunidades utilizando para isso uma
linguagem mais acessível e menos respaldada nos jargões acadêmicos, por vezes,
desinteressantes para o público comunitário. Sugeriu para isso, a construção de colunas
informativas semanais, que poderia solucionar o problema da baixa rotatividade
informacional do portal deixando-o sempre atualizado. Dessa forma, cada orientanda ficaria
responsável por um tema relacionado à sua pesquisa e aos interesses da comunidade local.
Nesse sentido, coletivamente, discutimos a configuração de cada uma das colunas e
chegamos à uma definição. A coluna #ficadica com o propósito de oferecer dicas culturais
que incluem cinema, literatura, artes em geral e eventos realizados na localidade ou que
versem sobre interesses comunitários. Histórias do Cabula cuja intenção seria divulgar por
meio de textos breves, informações e curiosidades históricas sobre a localidade do Cabula e
entorno, especialmente, aquelas defendidas na tese História Pública do Quilombo do Cabula:
representações de resistências em museu virtual 3D aplicada à mobilização do turismo de base
comunitária. A terceira coluna intitulada “Giros Educacionais” seria responsável por dar
enfoque aos trabalhos produzidos pelas escolas locais, a exemplo de resultados de projetos e
ações realizadas por essas instituições em parceria com as comunidades. A coluna Cabula em
foco buscaria apresentar os trabalhos realizados pelos produtores locais por meio de
entrevistas; e a última coluna, intitulada “sextou”, daria ênfase aos espaços de lazer e cultura
do Cabula e entorno, a exemplo de restaurantes e espaços de eventos, a partir da ótica de um
consumidor desses locais.
A orientanda H.P também frisou a necessidade de atualizar o calendário de eventos
nacionais do Portal, dando destaque para datas relevantes para a comunidade do Cabula e
entorno, como o dia da Consciência Negra. Já a orientanda I.Q abriu a possibilidade de
investir em campanhas de cunho sócio-ambiental via Portal TBC Cabula e suas redes sociais,
trazendo propostas como: plante uma árvore; doe um livro; adote um idoso no natal, etc.
156

Figura 21: Resumo da reunião com as colaboradoras SSEETU

Fonte: a autora

As ideias geradas apresentadas no sentido de proporcionar movimento informacional


acessível no Portal TBC Cabula foram registradas e compartilhadas via e-mail com as
colaboradoras no momento posterior à roda de conversa. Assim como estão resumidas no
quadro 16.

Quadro 16 – Resumo Roda de conversa – Orientandas do Grupo de Pesquisa SSEETU


Princípios da Sugestões de solução Encaminhamentos
pesquisa atendidos
Comunicação Biblioteca digital para a Sistematizado e
comunitária disponibilização de fontes de pesquisa encaminhado para o grupo
sobre o Cabula e entorno; de desenvolvimento para
análise de viabilidade
técnica

Comunicação Colunas informativas com linguagem Apresentação da proposta à


157

comunitária acessível, temáticas contextualizadas, equipe de


área para comentários e desenvolvimento.
Interatividade compartilhamentos ; Produção de textos das
Calendário de eventos nacionais; colunas
Participação criativa Campanhas de cunho sócio-ambiental
via Portal TBC Cabula

Fonte: a autora

Dando continuidade a essa fase de levantamento de sugestões que foram delineando o


redesign do Portal TBC Cabula, partimos para a terceira roda de conversa da pesquisa ainda
no âmbito das comunidades acadêmicas.

c) Roda de conversa – Estudantes do curso de Turismo e Hotelaria da UNEB

A terceira roda de conversa realizada foi com o grupo dos estudantes do 5º semestre
do curso de turismo e hotelaria, que participaram da disciplina Marketing aplicado ao turismo
e à hotelaria, na qual realizei estágio docente. Importante salientar que esse grupo de
estudantes não mantinha vinculação com o projeto TBC Cabula, alguns já conheciam o
trabalho do referido projeto uma vez que pertence ao departamento do curso de turismo e
hotelaria.
Por se tratar de um ambiente formativo, isto é, as aulas do estágio docente, e
considerando o perfil dos sujeitos, com faixa etária entre 18 e 35 anos, realizamos algumas
modificações no roteiro da roda de conversa ao incluir elementos mais práticos e interativos.
Assim, diferente da metodologia já realizada até o momento, a proposta de roda de conversa
interativa foi a atividade de culminância das aulas realizadas, as quais versaram sobre temas
que envolviam as tecnologias digitais como elementos potencializadores do marketing
turístico.
Nesse sentido, após trabalharmos os conteúdos da disciplina no decorrer do semestre,
na aula do dia 17 de maio de 2016 realizamos a roda de conversa, que durou 4h. Nesse
sentido, iniciamos o diálogo apresentando o Portal TBC Cabula e dialogamos sobre quais
intervenções poderiam ser realizadas para que o referido portal atendesse aos seus objetivos,
sendo que as ideias apresentadas foram registradas na lousa. Após o diálogo solicitamos que
os estudantes organizados em grupos expusessem de modo livre suas sugestões para o portal,
para isso foram disponibilizados recursos como: cartolina, lápis de cor e canetas coloridas. E,
superando as expectativas, os grupos construíram protótipos de portal web, com riqueza de
158

detalhes e criatividade. Durante o processo observamos o engajamento e o prazer dos


discentes ao colocar na prática os conceitos construídos na disciplina, assim como expor suas
ideias baseadas nas suas vivências pessoais e profissionais.

Figura 22: Roda interativa com estudantes de turismo e hotelaria da UNEB, 2016

Fonte: a autora

Na interação e diálogo estabelecido nos grupos observamos a atenção dos estudantes


em buscar referências de portais de turismo para construir suas propostas. Dessa forma, itens
comuns a portais dessa natureza ficaram perceptíveis nos protótipos construídos, a exemplo
de mapas do local; galeria de fotos dos atrativos e atrações turísticas; a tradução do portal para
outros idiomas; calendário de eventos locais; links para redes sociais digitais; informações e
serviços turísticos como gastronomia, passeios, trilhas e outros elementos também necessários
ao Portal TBC Cabula.
Os resultados, posteriormente apresentados pelos grupos, também revelaram
afinidades com a proposta do Portal estudado e indicaram o cuidado que os estudantes
tiveram em adequar as suas concepções convencionais de turismo à idéia de TBC. Nos quatro
protótipos desenvolvidos ficaram impressas marcas e sugestões que enalteciam as
comunidades locais seus atrativos e atrações e, também, o pretenso caráter colaborativo do
Portal TBC Cabula.
159

Figura 23: Soluções construídas pelos estudantes de turismo e hotelaria da UNEB

Fonte: a autora

Ainda que as propostas apresentadas possuíssem semelhanças é importante destacar as


contribuições inovadoras. Assim, um dos grupos sugeriu em seu protótipo um espaço
intitulado “colabore conosco” cujo intuito seria o envio de textos, fotos, vídeos, sugestões de
reportagens, artigos acadêmicos e críticas sobre o Portal TBC Cabula feitas pelo interator, seja
morador da comunidade ou não. A inclusão de login e senha do usuário e o tópico
“recomende o portal” também foram sugestões dadas com a intenção de permitir a fidelização
dos visitantes, deixando-os cientes das atualizações feitas, assim como, proporcionar um
conteúdo mais especializado e favorecer a ampla divulgação do ambiente feita pelo próprio
visitante do Portal. Dentre as sugestões dadas, destaco como as mais originais, a criação de
um chat para bate papo com pessoas da comunidade; a visita virtual dos bairros e; o setor de
trocas de serviços, no qual o visitante do portal poderia oferecer um serviço recebendo em
troca outro que atendesse a alguma necessidade sua.
As ideias apresentadas pelos discentes afinizaram com os princípios delineados para a
pesquisa, algumas já estavam em curso no processo de desenvolvimento, outras careceram de
análise de viabilidade técnica da equipe de desenvolvimento para uma possível aplicação. As
160

sugestões estão resumidas no quadro 17, no qual relacionamos a sugestão de solução ao


princípio da pesquisa, bem como os encaminhamentos realizados.

Quadro 17– Resumo Roda de conversa – Estudantes do curso de Turismo e Hotelaria da


UNEB
Princípios da Sugestões de solução Encaminhamentos
pesquisa atendidos
Comunicação -Informações turísticas sobre o bairro Sistematizado e
comunitária (gastronomia, passeios, trilhas, galeria encaminhado para o grupo
de fotos de atrativos e atrações; mapas de desenvolvimento para
dos bairros, etc.) análise de viabilidade
técnica
Interatividade -Espaço para login e senha do usuário
-Recomende o portal
-Espaço para envio de conteúdos
Participação criativa (colabore conosco)
-Visita virtual das comunidades
-Chat com a comunidade
-Setor de troca de serviços online
Fonte: a autora

Nas rodas de conversas até o momento relatadas, os grupos envolvidos apresentaram


contribuições que potencializaram o eixo acadêmico do Portal TBC Cabula, bem como a
articulação academia-comunidade. Assim, trouxeram sugestões situadas nos campos do
planejamento e organização do turismo de base comunitária, cultura popular, produção de
conteúdos digitais em uma perspectiva de aplicação científica, assim como, aplicações do
marketing digital para destinos turísticos, por meio do Portal TBC Cabula.
Finalizada a etapa de escuta colaborativa às comunidades de prática acadêmicas
iniciamos o processo construtivo com as comunidades de prática locais que se dispuseram a
colaborar com esta pesquisa. É válido ressaltar que um dos principais desafios da investigação
pautada nos princípios da DBR, do codesign e aplicada em contexto comunitário, reside na
necessidade de destreza e equilíbrio, para afinizar os interesses de todos os envolvidos no
processo de pesquisa, especialmente, quando se propõe a interlocução e um consenso entre
saberes acadêmicos e saberes comunitários. Destacamos esse fato por ter sido recorrente em
toda a trajetória de construção do DCC, uma vez que o Portal TBC Cabula tem sua origem
nesse propósito, atender aos anseios do projeto TBC no Cabula e entorno e a comunidade
pertencente a essa localidade.
161

Desse modo, demos continuidade ao ciclo de design com a escuta colaborativa dos
representes das comunidades de prática locais que estabeleceram parceria com esta pesquisa.

5.2.2 Comunidades de prática locais

Consideramos como comunidades de prática locais os coletivos de produção situados


no Cabula e entorno. Esses grupos são formados por moradores atuantes no desenvolvimento
de práticas voltadas à melhoria de suas comunidades. Necessário esclarecer novamente que,
para efeitos desta pesquisa, priorizamos os coletivos locais que atuam no âmbito da educação,
cultura, lazer e bem estar social.
No decorrer desses quase dez anos de execução de TBC Cabula, alguns bairros
situados no entorno da UNEB se destacaram pelo engajamento de seus coletivos em parcerias
e ações realizadas pelo projeto. Podemos citar, nesse caso, as comunidades de prática
localizadas nos bairros do Beiru/Tancredo Neves, Mata Escura, Pernambués e Estrada das
Barreiras.
Em vista do amplo contexto da pesquisa, assim como o notável número de
comunidades de prática locais levantadas e que poderiam contribuir com este estudo,
definimos como principal critério de escolha dos colaboradores, o grau de proximidade e
engajamento nas ações de pesquisa e extensão que já vinham sendo realizadas pelo TBC
Cabula. Importante salientar, que tal critério visa, além de otimizar o tempo para a elaboração
da tese, assegurar o efetivo desenvolvimento do processo colaborativo, afinal, a experiência já
realizada pelo projeto, com comunidades de prática do Cabula e entorno revelam a
necessidade de uma disposição de tempo e recursos para mobilização desses, que superariam
o cronograma traçado. Afinal, o tempo da academia é distinto do tempo que comunidade
necessita para amadurecer e engajar-se nas relações acadêmico-comunitárias.
Nesse sentido, dos sete convites realizados às comunidades de prática parceiras
localizadas nos bairros anteriormente mencionados, obtivemos êxito com quatro grupos, a
saber: a) Projeto Cidadão; b) Projeto Cultural Domingo Alternativo; c) Biblioteca
Comunitária Zeferina-Beiru e; d) Coletivo Cultarte. Esses representantes apresentaram
colaborações centrais no processo de construção do DCC, especialmente por que falaram do
lugar de quem convive, atua no contexto investigado e vislumbra possibilidades para o
reconhecimento de seus trabalhos e, também, das comunidades de prática do Cabula e
entorno, por meio do Portal TBC Cabula.
162

A primeira roda de conversa, no âmbito das comunidades de prática locais foi


realizada com o Projeto Cidadão, um dos primeiros e mais atuantes parceiros do projeto TBC
Cabula.

a) Roda de Conversa - Projeto Cidadão:

O Instituto para Educação, Cultura e Desenvolvimento – Projeto Cidadão, localizado


no Conjunto Habitacional Antonio Carlos Magalhães (ACM), bairro Cabula I6 é uma
iniciativa sócio-educativa que busca oferecer às crianças, adolescentes e jovens da
comunidade formação educacional, cultural e social no turno oposto ao da escola. Esse
projeto iniciou suas atividades no ano de 2000, sob a liderança do professor e funcionário da
UNEB, Antonio Jorge Nascimento.
Desde a sua criação, o Projeto Cidadão já atendeu mais de 1500 educandos em
oficinas como dança de salão, teatro, artesanato, desenho artístico, bombeiro juvenil, futebol,
reforço escolar, dentre outras. Atualmente, o projeto sobrevive de parcerias realizadas com
institutos, a exemplo da Bamberg Cia de Dança; educadores sociais como o grafiteiro
Denissena, o operário cultural; voluntários; ativistas; escolas da comunidade; a associação de
moradores do bairro; além de contar com o apoio de projetos da UNEB, como a Universidade
Aberta à Terceira Idade (UATI) e o projeto TBC Cabula.
O orçamento limitado e as dificuldades enfrentadas para continuar movimentando a
comunidade no sentido do seu desenvolvimento intelectual, crítico e social, não são
empecilhos para as realizações do Projeto Cidadão, que vem desenvolvendo, na atualidade,
duas ações, cujo propósito principal é oferecer alimento cultural e intelectual à comunidade.
Foi justamente o interesse pela valorização e a exaltação das heranças históricas e culturais do
Cabula e entorno e a prática de suas comunidades que sacramentaram a parceria entre os
representantes do projeto cidadão e esta pesquisa.
Assim, a roda de conversa foi agendada para o dia 6 de janeiro de 2016 às 9h da
manhã na sede da Universidade Aberta à Terceira Idade (UATI) com os dois representantes
do referido projeto, o coordenador e o vice-coordenador. Nessa ocasião, um imprevisto
ocorreu e o vice-coordenador não pôde se fazer presente, no entanto, mantivemos o
compromisso e seguimos com a conversa, registrada em áudio conforme autorizado pelo
colaborador.

6
O Cabula I está inserido nos domínios do bairro Estrada das Barreiras, que compõe o macro locus desta
pesquisa..
163

O diálogo iniciou com os relatos de A.J sobre a sua vinculação com a comunidade,
dessa forma, sua fala trouxe importantes elementos de ambientação histórica do Cabula e seu
entorno, que se entrelaçam com suas memórias individuais e coletivas, especialmente as
relacionadas ao Cabula I, bairro em que reside e atua como mobilizador cultural. Aspecto
importante da conversa foi o vínculo profissional que A.J estabeleceu com a UNEB em 1982,
no início de sua juventude, ponto de partida para a sua trajetória com o Projeto Cidadão.

[...]Eu fui muito agraciado por conseguir entrar aqui na UNEB através de um projeto [...] em
1982[...] O PRODASEC, que era o Pro Jardim e o Pro Carteira, onde ele pegava os jovens
da vizinhança para ensinar esse ofício, então, o pessoal do Pro Jardim, cuidava da parte
paisagística da UNEB. A gente aprendia tudo sobre plantas, adubação, poda [...] e tinha o
outro grupo, o chamado Pro carteira, onde tinha dois mestres de carpintaria[...] Então, o que
que se fazia: as carteiras das escolas eram todas de madeira, armário, mesa, e aí a ideia do
professor Valentim era [...] pegar o material quebrado, botava esses adolescentes para
consertar, como ofício, e depois devolvia para a escola. Então, eles aprenderam muito, todos
eles tiveram essa profissão [...] E eu, como fui o beneficiado aqui com o Pro Jardim, eu
comecei a fazer trabalhos na comunidade. Assim, até para retribuir aquilo que eu recebi
aqui[...] Eram sempre trabalhos pequenos com grupos[...] Fui tomando gosto, eu já fiz 50 e
continuo com esse trabalho.

A partir das relações estabelecidas com a UNEB, o Projeto Cidadão nasce com a
intenção de oferecer à comunidade do Cabula I o acesso à cultura e ao conhecimento. AJ
deixa evidente em sua fala o seu compromisso com a formação intelectual da comunidade,
bem como a sua responsabilidade enquanto educador de uma localidade carente como o
Cabula I:

[...] Eu acho que ele (o projeto) é importante, primeiro por que eu acredito no trabalho [...]
Quando eu faço o projeto hoje, na comunidade, eu vejo que muitas vezes uma criança ela não
tem uma referência do pai, ela tem a referência do professor [...] Então, a gente tem que ter
essa responsabilidade, adquirindo essa responsabilidade de tá se fiscalizando por que elas
estão olhando pra gente [...]

O compromisso social e a valorização comunitária são pontos de encontro entre o


projeto cidadão e a proposta do Portal TBC Cabula, especialmente, pelo fato desse ambiente,
também visar à atração do público infanto-juvenil, cujo perfil afiniza com as interações
digitais. A propósito, a responsabilidade com o público infanto-juvenil, majoritariamente
atendido pelo projeto, fica evidente em sua principal sugestão para o Portal TBC Cabula.

[...] uma coisa que eu acho interessante assim, é colocar um espaço[...] ou para criança, ou
para adolescente, um espaço específico para eles, pra que essas pessoas também se
164

manifestem[...] Pra eles mostrarem o seu potencial[...] Dar visibilidade, dar vez às pessoas
que estão produzindo coisas interessantes, coisa boas[...]

Quando questionado sobre a natureza dessas produções, A.J reforça o fato de que há
muita produção interessante sendo realizada por jovens da periferia, no âmbito da música e da
arte em geral, mas que perde espaço para produções de baixa qualidade capitaneadas pela
indústria da mídia. O colaborador também salienta a necessidade de maior divulgação do
portal, para que os propósitos desse ambiente sejam efetivamente alcançados.

[...] o portal precisa assim, digamos que de uma divulgação. Ele precisa de ter os espaços
pra que as pessoas tenham informação, mas que também elas possam contribuir com alguma
coisa, não que seja assim, como um facebook, que todo mundo coloca tudo e qualquer coisa.
Eu acho que não, acho que precisa de um certo cuidado, para não banalizar[...] não ficar um
bombardeio de informações de coisas repetitivas e que não tem nada a ver. Mas, que as
pessoas possam contribuir de fato.

Notamos que a sugestão de espaços de colaboração com moderação sintoniza com as


ideias apresentadas nas rodas de conversa acadêmicas. Outro elemento importante nessa fala é
o cuidado em se propor um ambiente de construção colaborativo que não se assemelhe aos
moldes das redes sociais digitais, considerando assim, os reais interesses do Portal TBC
Cabula, um espaço de informação, comunicação e, também construção de conhecimento e
valorização local.

Quadro 18 Quadro resumo – Roda de Conversa com o Projeto Cidadão


Princípios da Sugestões de solução Encaminhamentos
pesquisa atendidos
Comunicação -Espaço de informações sobre a Sistematizado e
comunitária comunidade. encaminhado para o grupo
Divulgação do Portal TBC Cabula na de desenvolvimento para
comunidade. análise de viabilidade
Interatividade Espaço para divulgação de produções técnica
infanto-juvenis.

Participação criativa Espaço de construção colaborativa de


conhecimento sob mediação.
Fonte: a autora

Continuando as incursões nas comunidades de práticas locais, no Beiru/Tancredo


Neves, tivemos o apoio de um projeto que viabiliza a integração entre distintas iniciativas
artísticas e culturais dentro desse bairro: o projeto domingo alternativo.
165

b) Projeto Domingo Alternativo

O Domingo Alternativo é uma iniciativa realizada por moradores da comunidade do


Beiru/Tancredo Neves. O projeto surgiu da necessidade de reacender a cena cultural do
bairro, o qual apresenta uma significância histórica em termos de produção de arte e cultura,
além de oferecer um espaço de lazer aos moradores locais e das adjacências.
Tal projeto tem como base a música popular brasileira, que se apresenta como eixo de
interlocução com variadas manifestações, a exemplo do teatro, poesia, malabares, dança, artes
plásticas, dentre outras, que possuem representantes no bairro. Por isso, importante ressaltar
que são os próprios músicos e artistas locais que organizam e executam as atividades culturais
realizadas no evento, com o apoio de representantes de bairros vizinhos, comerciantes locais e
órgãos públicos municipais.
A primeira edição do Domingo Alternativo aconteceu no ano de 2015 e, desde então,
já foram realizadas 4 edições. A intenção do grupo organizador é que o evento pertença a um
calendário fixo. No entanto, nem sempre o apoio e financiamento de recursos materiais para a
realização do evento obedece a datas tão previamente determinadas, fazendo com que os
organizadores, na última edição de 2016, lançassem uma edição usando a estratégia da
“vaquinha virtual”, para atender aos custos da organização.

Figura 24: banners de divulgação do Domingo Alternativo

Fonte:

Fonte: Pagina do Domingo Alternativo no Facebook

O Domingo Alternativo é uma iniciativa que se revela enquanto ponto de partida para
a concretização de um desejo antigo dos produtores de arte e cultura do Beiru/Tancredo
Neves: a construção de um Centro Cultural no bairro, tal como acontece em Plataforma,
bairro do subúrbio ferroviário de Salvador. Ainda que seja cotidiana a realização de ações,
que envolvem as distintas manifestações no bairro, de forma independente, esse projeto
avança no sentido de articular variados atores locais que contribuem para manter a
166

comunidade em movimento, mesmo diante das adversidades e limitações de recursos


presentes no cotidiano desses grupos.
O convite para colaborar com a pesquisa foi prontamente aceito pelos membros desse
projeto. Parceiros de outras ações do TBC Cabula, com destaque para a organização da 5ª
edição do ETBCES realizada no Beiru/Tancredo Neves, parte dos representantes do domingo
alternativo já tinham conhecimento prévio do Portal TBC Cabula, alguns dos quais, inclusive,
já participaram de reuniões do grupo de pesquisa SSEETU, em que o referido ambiente
virtual foi ponto de discussão.
O encontro foi agendado após variadas tentativas de conciliação de horários entre os
representantes do grupo e, também, de colaboradores convidados do curso de pós-graduação
em Design e Inovação Social da UFBA, que iniciavam a sua imersão no campo do Cabula e
entorno e a parceria com este estudo, conforme explicaremos em momento oportuno. Após 1
mês e 15 dias de negociações via whatsapp, a roda de conversa foi agendada para o dia 20 de
abril de 2016, no turno da tarde, na sala de artes visuais da Escola Estadual Zumbi dos
Palmares, localizada no bairro do Beiru/Tancredo Neves.
Nesse dia, estiveram presentes, cinco representantes do Projeto Domingo Alternativo,
3 estudantes da pós graduação em Design e um representante do Projeto TBC Cabula. A roda
de conversa, registrada em áudio, iniciou com as devidas apresentações, especialmente, dos
estudantes, ainda desconhecidos pelos presentes. Um aspecto interessante a se ressaltar é que
com exceção dos pós-graduandos mencionados, os demais presentes apresentavam trânsito
em produções comunitárias e também acadêmicas, seja por estarem inseridos enquanto
estudantes de graduação ou já graduados, assim como partícipes de movimentos políticos
partidários.
Dessa forma, após as devidas apresentações a conversa versou sobre as lutas e
conquistas do bairro e, até mesmo sobre a história do Negro Beiru, perpetuada entre os mais
velhos da localidade, o que foi instigado pela curiosidade dos pós-graduandos, que ensejavam
conhecer mais sobre comunidade. Foram citados, assim, os personagens históricos como o
Negro Beiru, Miguel Arcanjo, Manuel Rufino e Manuel Cyriaco, que conectam a
ancestralidade local ao movimento do candomblé e os avanços até então vividos no que se
refere ao movimento social e cultural da comunidade, a exemplo do Fórum Social do Beiru e
as ações do Projeto Domingo Alternativo. Tal assunto desembocou nas formas de
comunicação utilizadas pelos moradores para divulgar tais ações, o que evidenciou o uso de
mecanismos locais como carros de som e, também redes sociais como o facebook e o
whatsapp, assuntos que nos conduziram à proposta do Portal TBC Cabula.
167

Como os participantes envolvidos já conheciam o ambiente virtual, sua


intencionalidade, assim como experiência de interação. Os pontos discutidos se sustentaram
nas fragilidades apresentadas pelo ambiente, a começar pelo quesito divulgação.

Acho que o que falta no portal é uma divulgação. A comunidade não conhece o portal. Como
é que eu vou divulgar o meu trabalho no portal se eu não conheço ele?Sei lá, acho que
precisa divulgar mais (C.B).

O trabalho de marketing e divulgação tem sido um aspecto recorrente no discurso dos


colaboradores, ponto de reflexão fundamental para se pensar o raio de abrangência e
efetividade do novo design cognitivo. Além desse quesito, um dos membros do projeto
Domingo Alternativo mostrou olhar atento quanto ao tipo de linguagem a ser utilizada no
Portal TBC Cabula, assim como a moderação das postagens.

Na verdade a gente tem que ter a preocupação pelas duas coisas né? Primeiro a vigilância
no conteúdo. O conteúdo, que nós estamos discutindo aqui, já sabemos qual é [...]. Mas,
quem ta lá fora que vai acessar esse portal, pode postar qualquer coisa. E aí essa já é uma
preocupação. Segundo, uma coisa é a questão das palavras, às vezes muito acadêmica e a
comunidade não sabe o que significa, aí às vezes a comunidade deixa de entrar no processo
por que não consegue entender a palavra.(I.S)

A moderação foi um consenso no grupo, pois, segundo afirmaram é uma medida


necessária para evitar conteúdos proibidos e/ou mal intencionados. Em contrapartida, não
observamos tal concordância em relação à adoção de palavras mais “simples” nos textos do
portal, o que gerou uma discussão polarizada.

Simplificar também não é o caminho, simplificar demais [...] Eu não gosto dessa ideia de
reduzir [...] Ah! Por que para a comunidade tem que escrever um texto mais simples pra todo
mundo entender. Assim, nivela por baixo[...] O Wikipédia, o que o Wikipedia faz?O texto ta
lá, em algumas palavras ou nome de alguns personagens estão em azul, se você não sabe o
que é ou você clica ou passa o mouse por cima aí aparece o significado. Em vez de você
reduzir, você faz com o leitor, no momento em que ele não entendeu, ele tenha alternativas
para saber o que é aquilo. Você dá uma ajuda a ele para um outro nível de compreensão,
acima daquele que ele provavelmente já tava[...] O hiperlink é que proporciona isso[...]Ele
resolve essa questão sem empobrecer [...] (E.A)

Interessante observar que a adoção de uma linguagem tida como mais adequada para o
acesso à comunidade foi uma preocupação sempre sinalizada no âmbito das comunidades
acadêmicas. O fato dessa demanda partir da comunidade do projeto Domingo Alternativo e,
ainda, trazer a abertura de outras perspectivas foi muito positivo, pois levantou reflexões e
desconstruções importantes sobre o que se produz na academia pensando nas comunidades
168

populares. Nesse sentido, quanto a esse aspecto, julgamos o merecimento de uma intervenção
híbrida, a ponto de não tornar o Portal TBC Cabula uma tese virtual, respeitando assim a
característica de uma linguagem específica do âmbito digital, mas sem negar a possibilidade
de descoberta e ampliação de vocabulário como permitido pelos hiperlinks.
Outro ponto importante que surgiu durante a conversa foi sobre o acesso da
comunidade à internet, nesse sentido, um dos colaboradores trouxe como sugestão o
desenvolvimento de um aplicativo mobile offline, a fim de ampliar o acesso ao portal aqueles
que não possuem conexão com a internet
As contribuições apresentadas nessa roda de conversa estão resumidas no quadro a
seguir.

Quadro 19: Quadro resumo – Roda de Conversa com o Projeto Domingo Alternativo
Princípios da Sugestões de solução Encaminhamentos
pesquisa atendidos
Comunicação Ampliar a divulgação do Portal TBC Sistematizado e
comunitária Cabula na comunidade, a partir dos encaminhado para o grupo
meios de comunicação já usados pela de desenvolvimento para
comunidade, análise de viabilidade
técnica
Uso de linguagem acessível associada
à adoção de hiperlinks
Fonte: a autora

Na fronteira do Beiru/Tancredo Neves, mais precisamente no bairro do Arenoso, outra


comunidade de prática local aceitou colaborar com nosso estudo e de maneira semelhante ao
Domingo Alternativo, também realizam trabalhos de relevância social em seus contextos de
vivência: a Biblioteca Comunitária Zeferina –Beiru.

c) Biblioteca Comunitária Zeferina-Beiru

Localizada no Arenoso, bairro que faz fronteira com o Beiru/Tancredo Neves, a


Biblioteca Comunitária Zeferina-Beiru (BCZB) iniciou as suas atividades também no ano de
2015, graças à mobilização de um grupo de jovens, em sua maioria, estudantes universitários,
moradores locais e ativistas deste e de outros bairros de Salvador.
A referida biblioteca traz em seu nome, a alcunha de duas importantes personalidades
das lutas ancestrais do povo baiano, a negra Zeferina, líder do quilombo do Urubu (subúrbio
de Salvador) e o negro Beiru, figura que marca a memória social dos moradores beiruenses,
169

que como homenagem, nomearam o bairro com o nome de tal líder negro. Essas lideranças
representativas na luta pela liberdade inspiraram os jovens envolvidos na causa da biblioteca,
idealizada para se tornar um centro comunitário com o intuito de promover ações de
fortalecimento da identidade ancestral da localidade, lazer, cultura e educação para crianças e
jovens do bairro, que viviam sem ocupação no turno oposto da escola.
Desde 2015, a biblioteca Zeferina-Beiru sobrevive de doações realizadas por
moradores e comerciantes locais; de fundos arrecadados pelos bazares, rifas e eventos que são
realizados regularmente, além de mutirões organizados pelos jovens engajados na causa e
moradores. Com esses movimentos, aos poucos, o antigo Cine teatro do Arenoso, local onde
funciona a biblioteca e que estava em completo estado de abandono, começa a ganhar outras
estruturas com os trabalhos de reboco, capinagem, limpeza, instalação elétrica, doação de
móveis e livros. Ou seja, tudo construído em processo, à base de mutirões.

Figura 25: Banners de mutirões e ações da biblioteca Zeferina-Beiru

Fonte: página do facebook biblioteca Zeferina-Beiru

Importante ressaltar que todas as ações educativas da biblioteca e os materiais


necessários à realização dessas, a exemplo de aulas de violão, futebol, capoeira e reforço
escolar, além do lanche e/ou almoço servido às crianças e jovens que frequentam o espaço
são, segundo os seus idealizadores, fruto de trabalhos voluntários, que não correspondem a
parcerias político-partidárias, condição básica enfatizada pelos responsáveis pela biblioteca,
para se tornar um parceiro ou colaborador do grupo. As demandas são de variadas naturezas,
desde materiais de construção a recursos humanos para a realização de oficinas educativas e
trabalho nos mutirões, o que vem garantindo a sobrevivência da biblioteca e dos sonhos que
ela abriga.
170

Ao contrário dos demais parceiros, a Biblioteca Comunitária Zeferina-Beiru não


mantinha relações com o Projeto TBC Cabula, até mesmo por sua atuação recente. Tivemos
conhecimento do trabalho realizado na biblioteca por meio das redes sociais digitais, pois esse
grupo obtinha apoio de pessoas e grupos parceiros do TBC Cabula. A relevância da causa e o
modo de trabalho dos responsáveis pela biblioteca despertou além da admiração, o interesse
em convidá-los a colaborar com a pesquisa, aproximando-os do portal.
Assim, mantivemos o primeiro contato por meio de mensagem deixada na página do
facebook da biblioteca, no dia 10 de maio de 2016. Tivemos resposta imediata e a primeira
impressão obtida foi de que o grupo tomava decisões de forma democrática, pois a aceitação
ou não do nosso convite foi condicionada a uma reunião com os membros da biblioteca,
conforme explicitado no diálogo abaixo.

Figura 26: Primeiro diálogo via web com a BCZB

Fonte: facebook.com

A devolutiva com o aceite foi dada cerca de 15 dias após o primeiro contato, quando,
inclusive, já se esperava um retorno negativo. Assim, o encontro foi agendado para o dia 29
de maio de 2016, um domingo, às 9h da manhã, ocasião em que a maioria dos componentes
do grupo estaria presente, afinal, se tratava de um dia de mutirão.
171

Figura 27: Segundo diálogo via web com a BCZB

Fonte: facebook.com

A ida a esse encontro levantou expectativas acerca dos trabalhos realizados pelos
colaboradores na biblioteca, mas, também, quanto ao acesso a essa localidade até então, por
mim desconhecida. Junto com um dos pesquisadores do projeto TBC Cabula chegamos ao
local com a ajuda de alguns moradores. Fomos bem recebidos por um dos líderes do grupo,
que nos mostrou as dependências da biblioteca e conversou sobre como surgiu essa iniciativa
e os trabalhos até então realizados. Surpresos com a ampla área disponível e abandonada pelo
poder público, notamos que ainda tratava-se de uma empreitada embrionária, embora
benfeitorias já haviam sido feitas tanto para melhoria da infra-estrutura, a exemplo da
construção de uma horta, pintura de algumas paredes e montagem de alguns espaços com
recursos e livros doados pela comunidade, quanto para as ações educativas que já estavam em
andamento como o curso de violão, capoeira e o reforço escolar.
Gradativamente, outros membros do grupo foram chegando e, também, as crianças da
localidade para desfrutar do café da manhã organizado coletivamente. Iniciamos assim, a roda
de conversa, com as apresentações dos presentes. Percebemos, nesse momento, o receio de
alguns dos ali envolvidos em relação à nossa presença, o que não nos encorajou a solicitar
autorização para registros em áudio e/ou fotográficos de nossa visita, embora o grupo
disponibilize registros de suas ações em sua página e perfil no facebook7. As resistências só
foram parcialmente rompidas, a partir do momento em que deixamos clara a nossa
intencionalidade e o grupo comunicou sobre a estratégia de proteção adotada contra os
constantes assédios de grupos políticos interessados em adotar a causa da BCZB para

7
Informações sobre a Biblioteca Zeferina-Beiru disponível em:
https://www.facebook.com/profile.php?id=100008861028900
172

possíveis fins eleitoreiros, o que vai de encontro aos propósitos de seus membros. Tal fato
justificou os olhares desconfiados com a nossa presença.
A conversa se alongou em torno das ações já realizadas pelo grupo, assim como os
ideais que sustentam a causa e as relações estabelecidas com alguns grupos e ativistas da
circunvizinhança. Ao relatarmos sobre as intencionalidades da pesquisa, as ações já realizadas
pelo Projeto TBC e seu respectivo Portal, bem como as razões de sua existência, um dos
líderes do grupo demonstrou curiosidade em conhecer as realizações das outras comunidades
de prática presentes no Cabula e entorno, até mesmo a ponto de estabelecer parcerias com a
biblioteca. Nesse sentido, que o diálogo acerca das sugestões para o portal transitaram, ou
seja, como esse ambiente virtual poderia se transformar em um canal de articulação entre os
grupos do Cabula e entorno?
Algumas ideias foram lançadas para atender a esse propósito, a exemplo da
implementação de fóruns e a construção de uma rede social aos moldes do facebook dentro do
Portal, reforçadas por alguns presentes. Até que um dos representantes apresentou a sua
proposta, mencionando a importância de um canal que facilitasse o diálogo entre as
comunidades de prática locais e, especialmente, o conhecimento das datas de seus eventos e
intervenções como reuniões, mutirões, entre outros, especialmente, por não possuírem redes
relacionais com a maioria dos outros bairros do eixo Cabula e entorno. Assim, a sugestão foi
construir um calendário interativo aberto para que os grupos divulguem seus eventos no portal
e possam trocar maiores informações nesse mesmo espaço, como uma espécie de fórum de
discussão.
Para além dos argumentos de como concretizar tal idéia que foi consensual entre os
demais presentes, as contribuições cessaram nesse ponto, após cerca de 2h de diálogo. A
justificativa para essa parada foi o fato de que o grupo precisava dar continuidade ao mutirão
agendado para aquela manhã. Dessa forma, a proposta apresentada pelos representantes da
Biblioteca Comunitária Zeferina Beiru ficou assim definida:

Princípios da Sugestões de solução Encaminhamentos


pesquisa atendidos
Comunicação Calendário interativo livre para Sistematizado e
comunitária postagens do usuário e espaço de encaminhado para o grupo
discussão sobre o evento postado. de desenvolvimento para
análise de viabilidade
técnica

Fonte: a autora
173

Também na base da coletividade, trabalham mulheres moradoras de distintas


localidades do Cabula e entorno, que possuem como elo de ligação a necessidade de manter a
renda familiar equilibrada e a habilidade para o trabalho manual. Desses vínculos que surge o
Cultarte, a próxima comunidade de prática local parceira de nossa pesquisa.

d) Coletivo Arte e Cultura do Cabula (Cultarte)

O Cultarte é uma cooperativa de mulheres, artistas e artesãs residentes do Cabula e


entorno, que surgiu como desdobramento da I Mostra de Cultura e Produção Associada ao
Turismo de Base Comunitária e à Economia Solidária realizada no II Encontro de Turismo de
Base Comunitária e Economia Solidária (ETBCES), que ocorreu na UNEB de 3 a 8 de Julho
de 2012 (SILVA, 2013).
O interesse das artistas e artesãs em organizar uma cooperativa foi acolhido pelo
Projeto TBC Cabula, que as encaminhou à equipe da Incubadora Tecnológica de Cooperativa
Populares da UNEB (ITCP) e ao Núcleo de Cooperação e Ações em Políticas Públicas e
Economia Solidária (COAPPES). Desse modo, com o apoio da Pró-Reitoria de Extensão da
gestão vigente em 2012, o Cultarte foi se delineando, a partir da formação oferecida pela
ITCP/UNEB, que as capacitou para o desenvolvimento de um fundo rotativo solidário com a
metodologia do GOL-D, promovido pela Visão Mundial, conforme afirma Silva (2013)
citando o documento da referida incubadora, o qual define o Projeto da Feira Cultarte.
Desde então, o coletivo Cultarte realiza feiras de artesanato em eventos da cidade de
Salvador e no Campus I da UNEB, esta última ocorre mensalmente. Para a realização dessas
feiras e a estruturação da cooperativa, as artesãs recebem o apoio de pesquisadores e
colaboradores do Projeto TBC Cabula, com destaque para as ações do eixo Design e
sustentabilidade coordenado pela professora doutora Ana Beatriz Simon, que desde 2012
mobiliza estudantes da graduação em Design da UNEB e pós-graduandos, para oferecer
suporte no que se refere à elaboração de estratégias de marketing e vendas, para o grupo.
Dentre os resultados construídos pelos discentes em parceria com o Cultarte, destacam-se: a
criação de identidade visual, peças gráficas, projeto para embalagem, mobiliário, cartão de
visita, adesivos e técnicas de reaproveitamento de retalhos.
Outra contribuição relevante é da pesquisa de doutorado de Souza (2018), cujo
produto consiste em um mapa cultural construído para dar maior visibilidade às produções das
artesãs, considerando as demandas por elas apresentadas. Esse mapa encontra-se disponível
174

no Portal TBC Cabula e oferece informações sobre os produtos comercializados pelas artesãs,
assim como contatos para venda.
Importante ressaltar também as contribuições dadas em 2016, pelos pós-graduandos da
disciplina em Design para Inovação Social do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais
(PPGAV) da Escola de Belas Artes (EBA) da Universidade Federal da Bahia (UFBA), alunos
da professora Ana Beatriz Simon, os quais também participaram de outras rodas de conversa
anteriormente mencionados. Esses pós-graduandos realizaram trabalho específico com o
Cultarte, para cumprir requisito avaliativo da disciplina. Dessa forma, atuaram em regime de
colaboração com esta pesquisa, que tornou-se canal de acesso ao coletivo Cultarte, nosso
parceiro.
A roda de conversa com o Coletivo Cultarte foi realizada no dia 6 de junho de 2016, às
9h, em uma das salas do curso de Design, vinculado ao Departamento de Ciências Exatas e da
Terral, local em que semanalmente o coletivo se reunia para elaborar o seu regimento e
definir suas ações. Estiveram presentes nessa ocasião, além dos três pós-graduandos da UFBA
que conseguiram concluir o componente curricular, oito componentes do coletivo.
Considerando as características desse grupo de mulheres com pouca imersão digital
elaboramos uma estratégia diferenciada das dos demais grupos, que tencionou agregá-las ao
processo de forma leve e inclusiva.
Dessa forma, procedemos inicialmente com as apresentações de todos os envolvidos,
em seguida, partimos para a exposição de slides com os propósitos do Portal TBC Cabula, já
experimentado por algumas das senhoras presentes. Em seguida, explicamos de forma breve
em que consiste um portal web, suas características e usos, partindo, posteriormente, para a
análise de alguns similares que atendiam a objetivos distintos, o iBahia obedecendo a fins
jornalísticos; o portal do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências (IHAC/UFBA) de
natureza acadêmica; e o portal A Voz da Comunidade do Complexo do Alemão, no Rio de
Janeiro, de característica comunitária.
Importante ressaltar que todas as etapas mencionadas foram intercaladas com as
dúvidas e contribuições das senhoras presentes, de maneira a gerar um diálogo fluido e,
consequentemente, aproveitar ao máximo a etapa posterior de natureza colaborativa,
momento central de nossa reunião. Desse modo, quando dialogamos sobre os objetivos de um
portal web, especialmente, o Portal TBC Cabula, abrimos espaço para avaliar as estratégias
utilizadas pelas comunidades para comunicar as suas ações.
175

Com relação ao que acontece na comunidade, acho que a gente não tem nenhum canal de
informação assim via internet né? [...] Quer ver um exemplo? Teve um Fórum de [...] Um
Fórum que Neto (prefeito da cidade) promove para ouvir a comunidade, aí eu sempre
participo né?Nessa semana, eu vejo a notícia no jornal, no face, aliás, dizendo que o fórum
aconteceu em Pernambués e eu não fui por que não fiquei sabendo. (N.S).

Apesar de não ter atendido precisamente a necessidade da senhora N.S na ocasião


mencionada, é possível observar que a rede social facebook é um mecanismo popular nas
comunidades e, em até certa medida, cumpre com o seu papel de difundir ações realizadas nas
localidades periféricas, especialmente, por seu caráter público e gratuito. Outra perspectiva
trazida ainda com o tema comunicação comunitária é a qualidade dos conteúdos divulgados
sobre as comunidades populares.

No caso, Sussuarana [...] sempre tá na Internet por que teve uma certa época que eu tava
organizando lá pequenas feiras, então, tinha que colocar alguma coisa sobre o bairro né?O
que que o bairro oferece. E quando eu fui ver eu me assustei por que só tinha tragédia, só
tinha coisas ruins, coisas assim [...] marginalizando o bairro. Não tinha assim, os projetos
que os meninos fazem lá [...], como a percussão, por exemplo. (F.C)

Figura 28: Roda de Conversa com com o Coletivo Cultarte

Fonte: Edson Souza (2016)

O posicionamento da senhora F.C vai ao encontro das perspectivas defendidas pelo


Portal TBC Cabula em relação à grande mídia que, cotidianamente, macula a imagem das
comunidades populares ao supervalorizar seus problemas estruturais, sobretudo, no âmbito da
segurança pública, em detrimento de suas ações, produções de cultura e conhecimento, por
exemplo. Nesse sentido, houve a abertura para outros pontos de vista que revelaram os
anseios desse grupo de senhoras desejosas por canais de comunicação mais efetivos, seja para
176

divulgar seus artesanatos, seja para ter acesso e conhecimento sobre serviços de utilidade
pública, por vezes, disponibilizados em seus bairros, mas sem a devida divulgação.
Para que as informações fossem sistematizadas procedemos a sessão colaborativa,
implementando na roda de conversa elementos do Design Thinking (DT), conforme proposta
apresentada pelos pós-graduandos que também atuaram nesse dia. O Design Thinking é uma
metodologia de inovação que tem se popularizado como um caminho para orientar pessoas e
organizações na resolução de problemas complexos. Brown (2010, p. 6), define essa
metodologia como “um conjunto de princípios que podem ser aplicados por diversas pessoas
a uma ampla variedade de problemas”.
A ambiência colaborativa que o DT pressupõe coaduna com os pressupostos
metodológicos da DBR. Desse modo, acolhemos as contribuições dos estudantes de pós-
graduação também participantes do processo colaborativo. Contudo, salientamos, que para
essa roda de conversa apenas nos detemos a utilização de elementos interativos típicos dos
processos de DT, que facilitassem a apreensão dos problemas apresentados pelas
colaboradoras e o acesso às suas sugestões. Sendo assim, na etapa de construção colaborativa,
as componentes do grupo registraram em post-its suas sugestões para o Portal TBC Cabula à
medida que colavam nos layouts genéricos de sites, impressos em papel A2. Nessa dinâmica
as sugestões eram organizadas da forma em que as colaboradoras gostariam que ficasse
evidente no portal.

Figura 29: Proposta colaborativa do Cultarte

Fonte: Edson Souza (2016)


177

A proposta apresentada pelo Cultarte ficou organizada da seguinte maneira: uma


página inicial do portal, composta pelos seguintes tópicos: 1) TBC Acontece – notícias
edificantes sobre a comunidade sem pauta de violência, aspecto frisado pelas colaboradoras;
2) Sobre o TBC – Informações gerais de cada bairro; 3) Agenda de eventos – eventos
ocorridos nas comunidades; 4) Serviços – Lista de serviços de utilidade pública oferecidos no
Cabula e entorno; 5) Vídeos – representações culturais e tutorias de como usar o Portal; 6)
Contato do TBC; 7) Destaques – notícias mais recentes e alerta para inscrições de cursos; 7)
Enquetes sobre a comunidade; 8) Ícones de compartilhamento das publicações.
O grupo também projetou uma página do coletivo dentro do Portal intitulada Cultarte
em Foco, na qual seriam apresentadas uma descrição do coletivo com sua história; propósitos
e ações realizadas; Galeria de fotos das integrantes e seus produtos, com uma categorização
de produtos por natureza; Espaço para contato e troca de informações e; contato para aqueles
que queiram também integrar o coletivo.
Notamos que a proximidade desse coletivo, que nasce das ações do projeto TBC
Cabula, bem como o conhecimento prévio de algumas componentes sobre o portal, tornaram a
proposta apresentada bastante sintonizada às versões anteriores do referido ambiente web.
Contudo, importante ressaltar as novas demandas expostas pelas colaboradoras como os
serviços de utilidade pública; o anseio por uma página exclusiva do Cultarte e mecanismos
interativos como enquetes. Essas e as demais informações anteriormente listadas estão
resumidas no quadro a seguir.

Quadro 20 – Quadro resumo roda de conversa com o Coletivo Cultarte


Princípios da Sugestões de solução Encaminhamentos
pesquisa atendidos
Comunicação Notícias edificantes sobre a Sistematizado e
comunitária comunidade. encaminhado para o grupo
Informações de utilidade pública no de desenvolvimento para
Cabula e entorno análise de viabilidade
Informações sobre cada comunidade técnica
vinculada ao TBC Cabula
Agenda de eventos locais

Interatividade Enquetes sobre a comunidade


Espaço para contato do Cultarte
Espaço para inscrição no Coletivo
Vídeos com tutorias de uso do Portal
TBC Cabula
178

Mecanismo de compartilhamento das


informações publicadas
Fonte: a autora

Os quatro coletivos aqui apresentados englobam o grupo das comunidades de prática


locais inseridas no Cabula e entorno. Apresentaram assim, contribuições e olhares que
partiram de vivências reais e localizadas, as quais compuseram o ciclo de design, detalhado
neste intertítulo.
Sistematizadas as informações elaboradas no coletivo finalizamos o ciclo de design e
seguimos ao ciclo de prototipagem que consiste na aplicação/implementação das soluções
geradas nas rodas de conversa.

5.3 Prototipagem

No ciclo de prototipagem ficam evidentes os limites e as possibilidades rumo à


concretização das soluções dadas pelos colaboradores da investigação, por isso, é fundante
observar itens como a viabilidade técnica das soluções; a retomada dos princípios e objetivos
da pesquisa; conciliação entre o tempo de desenvolvimento e o tempo de pesquisa, e, também,
a margem de financiamento disponível.
Para este ciclo, colaboraram estudantes e profissionais liberais da área de design e
desenvolvimento de sistemas da informação. Os momentos de interação com esses
profissionais ocorreram desde a gestação da proposta de pesquisa, se estendendo rumo ao
ajuste e revisão das soluções construídas no coletivo a uma perspectiva de viabilidade e
aplicação tecnológica. Para isso, foram realizadas reuniões sistemáticas de alinhamento com
fins de análise, discussão, registro e implementação das soluções desenvolvidas.
Importante ressaltar que a prototipagem tecnológica constituiu-se em ponto complexo
no quadro de desenvolvimento deste estudo, fundamentalmente, em razão do limitado
financiamento da pesquisa, frente às demandas e possibilidades que emergiram no decorrer do
processo. Tal fato impactou, na estabilidade dos processos desenvolvidos, sobretudo, por
conta da rotatividade dos profissionais que atuaram nessa etapa, o que trouxe conseqüências
aos demais ciclos de pesquisa, seja em termos de prototipagem das soluções geradas, seja
pelos possíveis desdobramentos das implementações.
179

Nesse sentido, a fim de favorecer a melhor visualização das ações de desenvolvimento


que culminaram na geração do protótipo tecnológico de DCC, organizamos esse ciclo em 4
sub-ciclos a seguir caracterizadas.
a) Ciclo 1: Diagnóstico

Classificamos como ciclo de diagnóstico, o momento de gestação desta pesquisa, que


ocorreu no primeiro semestre do ano de 2014, quando houve as primeiras interlocuções com
os profissionais de desenvolvimento. Desse modo, a partir das ações de observação,
acompanhamento e participação na alimentação de conteúdos do portal, nas quais atuei, foi
gerado um diagnóstico do ambiente.
Nessa ocasião, o Portal TBC Cabula encontrava-se disponível no endereço
<www.tbcuneb.br>, hospedado no servidor da UNEB e possuía programação visual
desenvolvida pela empresa de soluções digitais Virtualize no ano de 2013. Apesar de sua
programação visual esteticamente atraente e harmoniosa, desde então, ficava patente a
necessidade de inclusão de novas abas informacionais e outros elementos ao portal, visando
atender as necessidades que emergiam, das outras pesquisas de mestrandos e doutorandos, de
sugestões de colaboradores e representantes da comunidade atuantes no Projeto TBC Cabula.
O Portal funcionava assim, sob o gerenciamento de dois prestadores de serviço, recém
formados do curso de sistemas de informação da universidade ficavam encarregados, dentre
outras responsabilidades no grupo de pesquisa, pela manutenção do Portal, dando suporte aos
bolsistas e orientandos que se revezavam na alimentação de conteúdos do ambiente e,
também, solucionando possíveis problemas de rede com o setor de informática da UNEB.
Esses profissionais sinalizavam, desde o princípio das interações, a impossibilidade de
implementar alterações no layout do portal, uma vez que tais mudanças demandariam novos
custos com a empresa desenvolvedora.
Entrave esse que impossibilitava o pleno atendimento às demandas sinalizadas e
tornava o Portal TBC Cabula um ambiente estático, restrito à postagens de textos e imagens
em uma estrutura que limitava a interação do usuário e a navegabilidade. Além dessa questão,
o cotidiano evidenciou outros impasses como a dificuldade de atualização das postagens em
termos de design e precisão da informação postada, afinal, eram feitas por estudantes e
pesquisadores que não detinham domínio técnico e atuavam sem um plano de trabalho
específico, além dos constantes problemas de rede detectados no servidor da UNEB como
ataques de vírus, internet instável e burocracia no atendimento aos chamados. Essas
180

ocorrências registradas no diagnóstico apresentado no capítulo 3 ofereceram subsídios para a


elaboração do problema de pesquisa, que começava a se delinear.
Nesse sentido, a fim de suavizar os impasses e manter o portal no ar, fidelizando
assim, o público que já o acompanhava, os profissionais envolvidos junto a coordenação do
TBC decidiram iniciar em dezembro de 2014, o processo de migração do portal para a
plataforma wordpress. A expectativa era que, por ser uma plataforma gratuita e intuitiva o
trabalho dos estudantes e bolsistas que se revezavam na atualização do ambiente seria
facilitado, trazendo assim, maior fluidez em relação às mudanças que se buscava implementar
com o avançar desta pesquisa.
Contudo, esse processo de migração foi retardado. Sendo retomado, posteriormente,
em fevereiro de 2015, estendendo-se até abril de 2015 sem avanços importantes, em razão de
impasses técnicos ocorridos nesse intervalo. A migração de plataforma precisou ser concluída
por outro profissional que assumiu a função em maio de 2015, executando, assim, os ajustes
necessários na versão anteriormente apresentada.

b) Ciclo 2: Migração

A conclusão da migração do portal TBC Cabula para a plataforma wordpress ficou


sob a responsabilidade de outro profissional de TI, que já estava a cargo de um dos recursos
interativos do ambiente. O processo, supostamente simples, demorou além do previsto em
razão das permissões negadas pelo setor de informática da UNEB, o que forçava a realização
de qualquer alteração no sistema do portal, apenas no computador central da sala de pesquisa.
Depois de estabelecidos os acordos com o setor de informática, uma primeira versão
do Portal TBC Cabula foi divulgada ao grupo de pesquisa. O feed back dado nesse encontro
indicou a necessidade de iniciarmos o processo de construção coletiva, levando essa versão
para as comunidades de prática colaboradoras. A fim de otimizarmos o tempo de
desenvolvimento, iniciamos a escuta com as comunidades de prática acadêmicas, afinal,
reunir as comunidades de prática locais, demandaria um tempo maior para a conciliação de
agendas.
Assim, a primeira roda de conversa ocorreu em julho de 2015. As sugestões de
melhoria a exemplo de ajustes na programação visual e layout demandaram os serviços de um
designer. Diante da escassez de recursos financeiros a alternativa possível para essa situação
foi a contratação de um estudante de design da UNEB para atuar como estagiário, o que só foi
possível acontecer no mês de setembro de 2015. A dificuldade ocorreu desde a seleção tendo
181

em vista o valor disponibilizado para atuar na vaga, ocupada por um estudante do penúltimo
semestre, que apesar de não possuir experiência de design web aceitou a proposta. Esse
contexto de limitação financeira mobilizou a submissão do projeto de pesquisa a editais de
financiamento visando a busca de recursos para continuidade da investigação.
Entre setembro e dezembro de 2015, foram realizadas reuniões e implementações
sistemáticas, tanto nas tentativas de aplicações das soluções sugeridas pelos colaboradores,
quanto no novo layout programado visualmente pelo estagiário. Contudo, esse layout não
conseguiu ser implementado tal como sugerido na programação visual, em decorrência de
bugs e falhas técnicas dos plug-ins do wordpress utilizados.

Figura 30: Programação visual do Portal TBC Cabula – dez de 2015

Fonte: PENA, Douglas

O término do recurso financeiro disponível ao pagamento do desenvolvedor culminou


no seu afastamento e a conseqüente paralisação das aplicações. Em contrapartida, a aprovação
do projeto de tese na Chamada do Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento
tecnológico (CNPq) e do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação MCTI Nº 25/2015 -
Ciências Humanas, Sociais e Sociais Aplicadas, divulgada em dezembro de 2015, garantiu a
continuidade do processo que já adentrava em outra fase.

c) Ciclo 3: Redesign

O trabalho seguiu pós recesso, em fevereiro de 2016, com outro programador que
possuía também expertise de webdesigner. O acordo estabelecido foi além de ajustar a
situação do layout e programação visual do portal implementar as soluções interativas que
182

vinham sendo sugestionadas pelos colaboradores. Nesse período as soluções coletadas já em


três rodas de conversa começavam a dar forma a um novo conceito para o portal, mas, as
aplicações continuavam estagnadas em razão dos entraves de desenvolvimento.
Apesar de jovem, o novo desenvolvedor trouxe expectativas positivas em razão de sua
experiência com desenvolvimento de sites, apresentou assim, implementações importantes
como desenvolvimento de uma plataforma de gerenciamento do portal intuitiva e de fácil
interação, além de tornar o Portal TBC Cabula um ambiente responsivo, acessível em
dispositivos móveis. Em contrapartida, as aplicações foram desenvolvidas em um contexto de
ataques de vírus, dentre outras falhas técnicas geradas pelo servidor ineficiente e o modo
como o desenvolvimento vinha sendo gerenciado, pontos que culminaram na frustração de ver
o Portal TBC Cabula constantemente fora do ar, perfazendo, assim, um total de cinco meses
de trabalho concluído parcialmente, ainda entre bugs e limitações interativas.
Em julho de 2016, já caminhávamos para o término das sessões colaborativas do ciclo
de design e, para o último ano de doutorado, com a prototipagem ainda inacabada e sem
perspectivas de quando iniciar o ciclo de avaliação. O cenário instável, que além de prejudicar
as sessões colaborativas, pois a interação prévia de alguns colaboradores com o portal foi
impossibilitada, indicava a necessidade de medidas decisivas para a conclusão da pesquisa.
Desse modo, optamos pela saída do servidor da UNEB e a hospedagem do portal em um
servidor privado, acessível no endereço <http://matta.pro.br/tbc/> até o início de 2017, com o
último layout desenvolvido.

Figura 31: Telas do Portal TBC Cabula disponíveis em setembro de 2016


183

Fonte: http://matta.pro.br/tbc/. Acesso em setembro de 2016

Buscando otimizar o tempo e implementar estratégias mais assertivas no processo de


desenvolvimento, em dezembro de 2016 utilizamos como última estratégia a contratação de
uma empresa especializada no desenvolvimento de soluções digitais, a Soterotech, utilizando
para isso financiamento adquirido no edital do CNPQ/MCTI. Iniciamos então, o que
consideramos como fase de consolidação do protótipo.

d) Ciclo 4: Estabilização

As diferentes iterações realizadas desde o ciclo de análise contextual ao ciclo de


design, se configuraram em tentativas, aprendizagens e reconstruções que nos conduziram à
geração e aplicação do protótipo ocorrido nesta fase que intitulamos de estabilização. Desse
modo, os processos de prototipagem do novo design cognitivo do portal foram retomados a
partir de dezembro de 2016 como o novo grupo desenvolvedor.
A primeira reunião com os profissionais de desenvolvimento teve como objetivo
apresentar um panorama geral da pesquisa, ou seja, suas intenções; a metodologia de
colaboração adotada e os sujeitos envolvidos; os avanços alcançados; as limitações
identificadas, bem como as sugestões de melhoria. Desse modo, elucidamos que se tratava de
um desenvolvimento com soluções construídas em colaboração, podendo assim, ter projeções
de curto, médio ou longo prazo. Com a finalização do ciclo de design as ideias sugestionadas
desde o princípio da pesquisa foram organizadas por grupo colaborador, a fim de percebermos
a natureza das proposições apresentadas pelos parceiros da pesquisa.
184

Quadro 21: ideias construídas nas rodas de conversa

COLABORADORES IDEIAS
COMUNIDADES DE PRÁTICA ACADÊMICAS

SSEETU -Colunas informativas com textos rápidos de interesse da


Rede Educa comunidade: dicas culturais, ações locais, dentre outros;
-Espaço para a comunidade divulgar suas produções de maneira
mais autônoma;
-Informações de utilidade pública, tais como: obtenção de
documentos a exemplo de RG, CPF, Título de eleitor e outros;
-Divulgação dos trabalhos e ações realizadas pelas escolas das
comunidades locais;
-Biblioteca digital para publicação das produções realizadas pelo
projeto TBC Cabula;
-Informações e produções científicas sobre o TBC no Brasil e no
mundo;
-Layout, cores e tipografias que remetam às referências étnicas das
comunidades pesquisadas;
-Criação de um canal de vídeos conectado ao youtube, para que os
usuários possam enviar sugestões e links de vídeos;
-Programa interativo para o canal TBC: “Cara na tela”- Divulgação
de vídeos curtos para que os sujeitos expressem opiniões sobre
determinados temas locais.
-Ações de mobilização e promoções via canal TBC, a exemplo de
campanhas e concursos;
-Integração dos conteúdos interativos originados de dissertações e
teses sobre o Cabula e entorno.

Estudantes de turismo -Canal de informações turísticas;


e hotelaria -Agenda cultural;
-Chat ;
-Fóruns de discussão
-Tradução do portal para outros idiomas;
-Canal de troca de serviços colaborativos entre os usuários;
-Visita virtual nas comunidades

COMUNIDADES DE PRÁTICA LOCAIS


Projeto Cidadão -Espaço para divulgação de talentos artísticos mirins da
comunidade;
-Informações aprofundadas sobre as comunidades locais (história,
grupos culturais e outros)
185

Projeto Domingo -Divulgação do portal na comunidade, para maior familiaridade


alternativo com o ambiente;
-Textos menos acadêmicos, a fim de atrair a comunidade para o
portal;
-Recurso de hiperlink para termos acadêmicos pouco populares;
-Aplicativo off-line do portal

Biblioteca Zeferina- -Calendário interativo para que os produtores locais divulguem os


Beiru eventos a serem realizados na comunidade;
-Canal de interação entre os grupos locais para difusão de ações,
troca de ideias e mobilização para a solução de problemas via web;

Coletivo Cultarte -Espaço para divulgação de informações sobre o coletivo Cultarte e


os produtos das artesãs;
-Informações de utilidade pública, especialmente aquelas
relacionadas às comunidades do Cabula e entorno, a exemplo de
oferta de cursos e serviços diversos;

PROFISSIONAIS DE DESIGN E TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO E


COMUNICAÇÃO

Profissionais liberais -Migração do portal para o sistema wordpress;


de design e TI -Criação de uma rede social comunitária dentro do portal, por meio
de plug-ins wordpress;
-Plataforma wiki para a comunidade construir textos de seu
interesse;
-Newsletter para a fidelização dos usuários;
-Tornar o portal um ambiente responsivo (acessível em dispositivos
móveis).

Sotero Tech soluções -Implementação de programação visual funcional;


digitais -Canal direto para os usuários divulgarem suas postagens sob
aprovação da equipe.
-Programação das soluções construídas no wordpress
-Formação da equipe TBC para gerenciamento dos conteúdos do
Portal.
Fonte: a autora

Essa sistematização subsidiou o conceito do protótipo aplicado pelos desenvolvedores,


cujos processos serão apresentados no capítulo a seguir. Mas antes é importante elucidar que
até chegar nesse ciclo, buscamos respeitar o posicionamento e as ideias apresentadas pelos
colaboradores. Por isso, a intenção das rodas de conversa foi criar um ambiente de interação
aberto, dialógico e acolhedor, independentemente do nível de imersão e/ou conhecimento dos
sujeitos envolvidos sobre ambientes web, tecnologias digitais e afins.
186

Desse modo, cada grupo colaborou para o projeto do DCC, a seu modo e em
conformidade com suas bagagens cognitiva e cultural, o que enriqueceu, significativamente, o
processo colaborativo mediado. Algumas ideias se repetiram entre distintos grupos, outras já
possuíam praticamente um caráter de solução a ser implementada, mas também identificamos
aquelas que precisaram ser refinadas e/ou associadas às outras que possuíam afinidade.
Cada profissional envolvido, seja estágiário, desenvolvedor autônomo ou vinculado a
empresa, precisou se adequar à metodologia adotada, tendo liberdade para também sugerir
modificações, sempre bem vindas, especialmente, pela natureza do campo ao qual pertencem,
mas, tomando como premissas centrais a valorização do trabalho colaborativo
contextualizado, a perspectiva cíclica e o caráter de reconstrução cadenciado pela DBR.
Desse modo, a versão final apresentada compreende um produto de todos os ciclos
anteriores, o que revela as elaborações feitas desde o princípio do processo investigativo, ou
seja, as ideias das comunidades de práticas colaboradores e dos profissionais que iniciaram o
desenvolvimento, seus avanços e soluções para os problemas apresentados. Configurando
assim um modelo construído a várias mãos, conforme veremos a seguir.

5.3.1 Um modelo construído a várias mãos

A variedade dos campos de atuação dos grupos colaboradores refletiu na geração de


ideias que atenderam a distintos aspectos do Portal TBC Cabula. Indo desde sugestões
tipográficas, layout e design, até aquelas relacionadas a conteúdos interativos, informativos e
estratégias de mobilização e marketing do ambiente.
Evidente que em todo processo construtivo de natureza dialógica e colaborativa é
comum existir perspectivas que destoem ou ultrapassem o propósito comum a ser alcançado,
seja por possuírem concepções diferentes do plano norteador, seja pela impossibilidade de
concretizar a ideia sugerida. Sendo assim, algumas sugestões apresentadas ainda que tivessem
afinidade com os objetivos da pesquisa precisaram ser redirecionadas para a posteridade, em
razão da impossibilidade de aplicá-las no tempo desta pesquisa, assim como extrapolar os
recursos financeiros captados. Também notamos que outras ideias sugestionadas não se
relacionaram à prototipagem do ambiente estudado, mas são fundantes para potencializar o
seu alcance, assim como as estratégias de marketing e promoção do portal, lacunas
evidenciadas e que exigem outros momentos de pesquisa.
Esses, dentre outros aspectos foram identificados a partir de um detalhado processo de
filtragem das ideias sugeridas tendo em vista da natureza dos objetivos do estudo, o tempo de
187

duração do mesmo, assim como a urgência em adequar os custos com o orçamento


disponível. Para gerarmos o modelo conceitual de DCC, realizamos a análise qualitativa dos
dados obtidos, os quais foram categorizados com base nos princípios da pesquisa e
transformadas em soluções para o Portal TBC Cabula.
As soluções foram organizadas em um documento conceitual, posteriormente
compartilhado com os desenvolvedores para aplicação. A fim de facilitar a visualização do
conceito de DCC elaborado estruturamos um quadro que relaciona as soluções geradas aos
princípios da pesquisa e o status em relação à aplicação, que obedece a uma legenda por
cores: verde (aplicado); amarelo (em desenvolvimento); laranja (a desenvolver); vermelho
(inviável)

Quadro 22: Soluções de DCC para o Portal TBC Cabula

Princípio 1 - Comunicação comunitária


Aspectos relacionados SOLUÇÕES
à comunicação
comunitária Status

Conteúdos de interesse Colunas informativas “Cabula Acontece”:


comunitário.

-Histórias do Cabula
Fragmentos científicos e curiosidades sobre a
história do Cabula e entorno.

-Cabula em foco
Valorização e Divulgação de ações comunitárias e entrevistas com
fortalecimento da produtores/ativistas de representatividade local.
identidade local;

-#FicaDica
Dicas de livros, filmes, peças teatrais e outros
conteúdos culturais.

-Sextou
Dicas de espaços de arte, lazer, gastronomia e
cultura dentro das comunidades do Cabula e entorno;

Conteúdos de interesse -Giros educacionais


comunitário. Divulgação de ações realizadas pelas escolas do
Cabula e entorno
188

Bairros

Páginas sobre os dezessete bairros contendo


Valorização e informações como: história, localização, grupos
fortalecimento da culturais, gastronomia, curiosidade, organizações
identidade local; populares e outros;

Informações de utilidade pública, especialmente aquelas


presentes nas comunidades do Cabula e entorno, a
exemplo de oferta de cursos e serviços diversos;

Informações sobre o Cultarte


Página sobre o Coletivo Cultarte dando ênfase à sua
história, ações desenvolvidas, as cooperadas e seus
produtos para comercialização

Socialização de Biblioteca digital


práticas de ensino, Ambiente de difusão de produções técnicas e
pesquisa e extensão acadêmicas envolvendo o TBC e temas correlatos no
realizadas no Cabula e âmbito local, nacional e internacional;
entorno;
Quem somos
Ambiente de difusão do histórico, objetivos, parcerias,
ações e produções do projeto TBC Cabula;

Escuta e comunicação Contato


com a comunidade Canal de comunicação direto com os coordenadores do
projeto TBC Cabula;

Conexão com as redes sociais digitais


Vinculação com o facebook, twitter e youtube

Princípio 2 – Participação criativa


Aspectos relacionados
à participação SOLUÇÕES Status
criativa
Fala Comunidade
Participação da Espaço para a comunidade divulgar sugestões de
comunidade no conteúdos e pautas para publicação no portal ou
processo de construção colaborar com conteúdos já publicados no ambiente;
da informação;
Contato
189

Desenvolvimento de Programas interativos - Canal TBC:


ações colaborativas e “Cara na tela”- Divulgação de vídeos curtos para que os
cooperativas entre os sujeitos expressem opiniões sobre determinados temas
interatores locais.
Ações de mobilização e promoções via canal TBC, a
exemplo de campanhas e concursos;
Uso de textos menos acadêmicos a fim de atrair a
comunidade para o portal e recurso de hiperlink para
termos científicos pouco popularizados;

Princípio 3 – Interatividade
Aspectos relacionados SOLUÇÕES Status
à interatividade

-Conteúdos interativos Canal TBC


inovadores e atraentes; Criação de um canal de vídeos conectado ao youtube,
que permita ao usuário enviar seu próprio vídeo e/ou
sugestões de outros;

Conteúdos interativos
Espaço de integração dos conteúdos interativos
originados de dissertações e teses sobre o Cabula e
entorno.

-Museu Virtual do Quilombo do Cabula


Museu virtual 3D do quilombo do Cabula séculos
XVIII e XIX.

-Mapa cultural
Mapa interativo para divulgação de produtos e
equipamentos culturais do Cabula e entorno

-Rádio Web Juventude


Rádio web gerida por estudantes e professores do
Colégio Estadual Roberto Santos (Cabula)

-RPG para o TBC


Jogo Role Play Game que objetiva a mobilização da
comunidade do Cabula e entorno para o Turismo de
Base Comunitária.
190

-Museu digital do Terreiro Tumbenci


Museu digital que visa a difusão e valorização do
terreiro Tumbenci, terreiro de nação angola mais antigo
do Brasil

Fala Comunidade
Espaço de interação e compartilhamento da comunidade
constituído das seguintes aplicações:

Calendário interativo
O participante poderá enviar para publicação datas de
eventos locais, que ficarão disponíveis nesse espaço.

Enquetes
Enquetes sobre temáticas relacionadas direta ou
indiretamente ao cotidiano das comunidades;

Posts
Postagens de vídeos, fotos, informações e discussões
que o participante queira levantar no ambiente, com
possibilidade de compartilhamento nas redes sociais
digitais

Navegação intuitiva; Plataforma wordpress


Migração do portal para o sistema wordpress, a fim de
facilitar as alterações que sejam necessárias realizar,
como exemplo: mudança de layout e postagem de
Execução de tarefas conteúdos sem a presença de um especialista;
com eficiência

Tecnologia responsiva
Tornar o portal um ambiente responsivo, acessível em
dispositivos móveis, ampliando assim as formas de
acesso ao esse ambiente.

Design contextualizado
Uso de layout, cores e tipografias que remetam às
referências étnicas das comunidades pesquisadas;
191

Idiomas estrangeiros
Tradução do portal para outros idiomas: inglês, espanhol
e francês, a fim de favorecer a atração de público de
outros países interessados em TBC e áreas correlatas.

Textos com linguagem acessível


Implementação de linguagem textual acessível que não
se restrinja ao formato acadêmico.

Hiperlinks
Implementação de recurso de hiperlink para termos
científicos pouco populares;

Programação visual
Adoção de programação visual funcional e layout que
permita a setorização da informação.

Fonte: a autora

Devidamente caracterizadas as soluções de DCC iniciamos a modelagem de um


protótipo para a fase de implementação. Nesse sentido, tais soluções foram traduzidas em
soluções técnicas, obedecendo as configurações esperadas de um portal web. Para isso
elaboramos um mapa de interação do Portal TBC Cabula que apresenta o conceito e o modo
como as aplicações estão organizadas. Foi esse modelo, portanto, que serviu de parâmetro
para a equipe de desenvolvimento gerar as aplicações necessárias.
192

Figura 32: Mapa de interação do Portal TBC Cabula


Fonte: a autora
193

O primeiro procedimento realizado pela equipe de desenvolvimento foi elaborar a


programação visual conforme as especificações apresentadas no modelo conceitual. Definidos
o layout, as cores, tipografia e demais elementos da programação visual, baseadas no contexto
da pesquisa, avaliamos e ajustamos a proposta apresentada, a fim de mantê-la com o máximo
de fidelidade em relação às contribuições dos colaboradores. A partir de então, foi iniciado o
processo de programação propriamente dito.
Algumas modificações técnicas também foram sugeridas, a começar pela mudança de
sistema de hospedagem e gerenciamento do ambiente, que foi incorporado ao sistema
Joomla8, a fim de superar as dificuldades enfrentadas com o wordpress. O Portal TBC Cabula
manteve-se em servidor privado, mas foi registrado em outro domínio o <www.tbccabula.br>,
com o intuito de fortalecer a sua identidade enquanto ambiente acadêmico-comunitário. A
versão apresentada pela equipe de desenvolvimento foi ao ar em março de 2017 e permaneceu
até o ciclo de avaliação.

Figura 33: Portal TBC Cabula versão 2017

8
Maiores informações em: https://www.joomla.org/
194

Fonte: a autora

Ressaltamos que as aplicações técnicas estão coerentes com os princípios teóricos


definidos: comunicação comunitária, participação criativa e interatividade. Também julgamos
que o ponto de contato entre esses três princípios reside nas intenções de participação e
engajamento da comunidade no processo comunicativo que se almeja estabelecer via portal.
Isso implica em tornar os usuários e colaboradores desse ambiente web autores e/ou co-
autores das informações veiculadas. Contudo, é importante esclarecer que determinados
conteúdos e propostas sugeridas, no entanto, continuarão em processo de desenvolvimento
mesmo com o término desta pesquisa, atendendo, assim, ao caráter processual e colaborativo
do design cognitivo elaborado
Portanto, para findar o ciclo desta pesquisa é necessário observar e avaliar as
impressões e a receptividade dos colaboradores do estudo e demais interatores do portal
diante das soluções implementadas, bem como acolher sugestões de melhorias aos processos
já implementado. Esse momento de feed back permitirá identificar as fragilidades e as
potencialidades do DCC e projetar os ajustes adequados para futuras aplicações. O que será
feito no próximo capítulo.
195

“A AVALIAÇÃO”

“Construção de novos saberes, a partir de saberes anteriores, na verdade, uma reconstrução


deles, no sentido de desmontagem e recuperação de modo novo. Os saberes de cada
interlocutor – confidentes, leitores, autores convocados com suas obras, sujeitos de práticas
sociais a quem ouvi, entrevistei, interpelei – e os meus saberes se fundem e se transformam,
reformulam-se. De maneira muito especial, meus saberes anteriores se configuram agora
outros. A isso chamamos de aprendizagem. Por que não de pesquisa?”

Mário Osório Marques (2008, p. 28)


196

6 Percursos avaliativos

A avaliação é o momento em que se busca o aperfeiçoamento das soluções aplicadas.


Nesse ciclo estão envolvidas ações como a escuta ao feed back dos colaboradores da pesquisa;
registro e análise de suas impressões sobre as soluções implementadas, e, também, a abertura
para possíveis refinamentos e refacções do protótipo construído. É necessário, portanto,
realizar um trabalho de acompanhamento sistemático, identificando a existência ou não de
avanços, bem como desenvolver meios para a avaliação daqueles que colaboraram com o
processo e/ou demais usuários da solução construída.
Importante esclarecer que nessa etapa também foram incluídos os visitantes do Portal
TBC Cabula, que, voluntariamente, se dispuseram a participar da investigação. A intenção foi
acolher outras perspectivas, além daquelas cedidas pelos colaboradores do estudo, que estão
direta ou indiretamente vinculados ao locus da pesquisa. Ter acesso a outras visões foi uma
medida necessária, afinal, o Portal TBC Cabula tem como, dentre outros propósitos, servir
como cartão de visita da comunidade do Cabula e entorno, estando, portanto, disponível a
distintos públicos. Nesse sentido, a seguir apresentaremos os procedimentos e
desdobramentos sucedidos na presente etapa da pesquisa.

6.1 Procedimentos de avaliação

O ciclo de avaliação teve como propósito principal analisar os dados do Portal TBC
Cabula que após a aplicação das soluções, a partir das respostas apresentadas pelos
avaliadores em um questionário de avaliação online e dos dados de acesso do referido
ambiente. Nesse questionário (ver apêndice B) foi permitido ao colaborador avaliar aspectos
relacionados às soluções aplicadas mediante escala de likert, assim como, fazer registros
acerca dos pontos fortes e os pontos a melhorar no Portal TBC Cabula e apresentar sugestões
de aperfeiçoamento para o ambiente. As informações obtidas no questionário online foram
consideradas em atenção às categorias dispostas na matriz central de análise de dados.
197

Quadro 23: Matriz central para análise dos dados

CATEGORIA DE ANÁLISE DEPENDENTE


-Home
-Quem somos
-Bairros
-Cabula acontece
PORTAL TBC CABULA -Conteúdos interativos
-Fala comunidade
-ETBCES
-Biblioteca digital

CATEGORIAS DE ANÁLISE INDEPENDENTE


-Conteúdos de interesse comunitário, que
visem a valorização local;
-Canal de escuta e comunicação com a
COMUNICAÇÃO COMUNITÁRIA comunidade;
-Socialização de práticas de ensino, pesquisa
e extensão realizadas no Cabula;

-Participação da comunidade no processo de


construção da informação;
-Desenvolvimento de ações colaborativas e
PARTICIPAÇÃO CRIATIVA cooperativas entre os interatores;

-Conteúdos interativos inovadores e


atraentes;
-Engajamento do interator de forma
autônoma e criativa;
-Layout responsivo;
INTERATIVIDADE
-Navegação intuitiva.
-Execução de tarefas com eficiência.

Fonte: a autora

Após a realização de dois ciclos avaliativos, os resultados apontaram sugestões de


soluções concatenadas aos princípios do Portal TBC Cabula e passíveis de aplicação em um
período de médio a longo prazo, que poderá ser definido apenas sob a condição das
circunstâncias de apoio e financiamento. Tais soluções foram sistematizadas em uma proposta
de refinamento do Portal TBC Cabula, que poderá ser implementada em situações futuras de
198

pesquisa, especialmente por que o design cognitivo aqui desenvolvido constitui-se em uma
proposta aberta e permanentemente colaborativa.
Importante salientar que a fim de preservar a identidade dos colaboradores desta etapa,
utilizamos as iniciais de nomes fictícios para nos referir às suas contribuições. Assim como
realizamos a transcrição literal dos textos registrados no questionário e/ou extraídos dos
diálogos sem fazer uso de correções ortográficas.

6.2 1º Ciclo de avaliação

O planejamento inicial para o momento de avaliação com os colaboradores almejava a


realização de rodas de conversa com as comunidades de prática que participaram no ciclo
anterior de design. Sendo assim, em março de 2017, pós finalização do protótipo web,
formalizamos os convites com as comunidades de prática colaboradoras.
Após três meses de tentativas e contatos, identificamos um contexto instável, marcado
pela desarticulação do projeto Domingo Alternativo que, até então, havia encerrado suas
atividades e o não retorno dos colaboradores da Biblioteca Comunitária Zeferina-Beiru e do
Coletivo Cultarte. Obtivemos êxito apenas com o Projeto Cidadão, que se manteve disposto a
continuar no processo colaborativo. Por conseguinte, agendamos roda de conversa com
representantes do referido grupo, para o dia 09 de junho de 2017, às 14h, na sala do grupo de
pesquisa SSEETU.
A presença solitária do coordenador do projeto no dia agendado e o tempo já avançado
para a conclusão da pesquisa indicavam a necessidade de mudar a estratégia escolhida para
esse ciclo. O diálogo, ainda assim, ocorreu com o coordenador, que dentre suas ponderações
sobre o portal demonstrou pesar ao sinalizar a dificuldade de reunir as pessoas da comunidade
para a realização de trabalhos acadêmicos oferecendo a seguinte sugestão:

Não teria assim [...] um espaço no próprio portal? Algo como um questionário para que as
pessoas preenchessem? Assim ficaria mais fácil, as pessoas poderiam fazer isso de casa,
ainda mais que agora tudo se faz do celular, com o whatsapp mesmo.

A estratégia de usar um questionário online havia sido planejada apenas para os


visitantes do portal. Essa não era a ideia mais apreciada para os anseios de avaliação
colaborativa, porém, o contexto adverso nos fez acolher a sugestão do colaborador, alterando
assim o instrumento de pesquisa. Dessa forma, ainda na tentativa de preservar um espaço de
diálogo, junto ao questionário online, incluímos em um grupo do aplicativo WhatsApp,
199

representantes dos coletivos que colaboraram no design do Portal, que não haviam dado
retorno efetivo até o momento, e outros representantes locais. O link com os convites foi
lançado em 30 de junho de 2017 e chegamos a um total de 40 colaboradores reunidos no
grupo intitulado: Portal TBC Cabula.

Figura 34: Convite Whatsapp

Fonte: a autora

Aguardamos um prazo de 15 dias, a fim de obtermos o máximo de retornos dos


convites enviados. Nesse intervalo de tempo, contudo, a primeira impressão foi a de que seria
difícil engajar os sujeitos ali envolvidos em um diálogo de avaliação do portal; afinal, as
justificativas de tempo reduzido para participar; as promessas não cumpridas e as mensagens
privadas que mostravam a insegurança sobre o que postar no grupo foram uma constante.
200

Figura 35: Conversas no Whatsapp grupo TBC Cabula

Fonte: a autora

Diariamente eram divulgadas mensagens de mobilização para dar início aos diálogos.
O avanço negativo nos levou a compartilhar o questionário de avaliação com os membros ali
reunidos, na tentativa de pelo menos, aqueles que tinham receio em interagir no espaço
coletivo, pudessem participar de forma individual no processo. Constatamos poucas adesões
dos membros do grupo ao questionário de avaliação; dos 40 registrados apenas 5 preencheram
o instrumento. De modo semelhante ocorreu no grupo do WhatsApp, em vez de críticas e
sugestões eram postadas, diariamente, mensagens que destoavam do propósito do grupo,
como as de cunho motivacional, afetivo, político partidário e religioso, levando, inclusive, a
saída de alguns membros. Por isso, foi necessário estabelecer algumas regras para que o
objetivo fosse mantido.

Figura 36: Prints do Grupo do Whatsapp

Fonte: a autora

A exceção nesse contexto foi um dos participantes vinculados ao Projeto Cidadão que,
por vezes mobilizava os participantes do grupo, para dialogar, mas, sem sucesso.
Estabelecemos uma conversa no grupo, na expectativa de que os demais também
201

dialogassem, e, mesmo sem a participação dos demais, o colaborador deixou evidente tanto o
seu sentimento pela comunidade do Cabula, onde reside, quanto a sua expectativa de ter os
seus trabalhos e de outros produtores/artistas locais mais valorizados e divulgados,
vislumbrando assim, o portal, como uma oportunidade.

Figura 37: Prints do Grupo do Whatsapp

Fonte: a autora

Esse depoimento revela o olhar de quem convive com carências básicas e anseia por
oportunidades melhores de crescimento e valorização pessoais e da sua comunidade. Uma
perspectiva que se apresentou por distintas vezes nas experiências extensionistas vividas com
as comunidades do Cabula e entorno no decurso do doutoramento. Existe uma crescente
demanda das populações locais por direitos e serviços públicos como esgoto e saneamento;
pavimentação; segurança; iluminação pública; equipamentos de lazer e empregos, por
exemplo. Por isso, a entrada dos grupos de pesquisa nas comunidades populares, como o
Cabula e entorno, gera nos moradores uma grande expectativa de ter atendidas essas
demandas, geralmente localizadas no âmbito das políticas públicas, como observamos no
registro do colaborador do grupo.
Além desse aspecto, outro ponto de discussão que emergiu graças à conjuntura de
pouca interação e diálogo no grupo do WhatsApp é a possibilidade dos canais de comunicação
digitais para fins de construção do conhecimento. Sobre essa rede social, o estudo
“CONECTAí Express”, realizado pela plataforma de pesquisas online do Instituto Brasileiro
de Opinião Pública e Estatística (IBOPE) chamada CONECTA, em junho de 2017, apontou
que o WhatsApp é a rede social mais utilizada pelos brasileiros, com 91% de penetração na
202

população que possui acesso à internet no país9. A sua popularização, no entanto, nos faz
questionar a maneira como essa rede tem sido utilizada.
De certo que o WhatsApp, tem sido utilizado, satisfatoriamente, por grupos engajados
em estabelecer relações de aprendizagem, se constituindo, inclusive, em interface mediadora
de práticas de ensino formal. Em contrapartida, quando utilizado de forma alienada pode nos
conduzir a hábitos de vida e relacionamento questionáveis, uma vez que potencializa a
tendência contemporânea de velocidade e superfluidez das informações, exemplificando
assim, a orientação da atualidade que é valorizar a mensagem curta e objetiva, em vista da
grande concorrência informacional.
Assim como nos diz Sibilia (2012), estamos vivendo sob o poder dissolvente da lógica
mercantil e informacional, que vem diluindo a solidez da temporalidade regular em que as
mensagens eram transmitidas, metabolizadas e deixavam marcas e se reproduziam. E, do
mesmo modo nos deparamos no grupo do WhatsApp utilizado nessa pesquisa, com a
banalização e a saturação imagética, isto é, a massiva reprodução de memes, textos e
informações prontas, compartilhadas sem a devida reflexão, que revela mais uma necessidade
desses sujeitos em estar nesse oceano de informações, sem ponderar sobre o por quê e o para
quê fazer parte desse lugar, propagando, por vezes, discursos pouco reflexivos. Ou seja,
sendo, literalmente, conduzidos pela maré informacional. Tal fenômeno é assim descrito por
Sibilia (2012, p.86):

Se as figuras resvalam e não deixam traços nos olhos empanturrados da atualidade,


algo semelhante costuma acontecer com a palavra: ela se torna supérflua, flui, não
refere, não marca, não indaga [...] as palavras também não amarram nem decantam,
não chegam a consolidar significados em quem as profere nem em quem as escuta:
em vez de ancorar experiências com seu peso capaz de marcar corpos e
subjetividades, elas patinam ou deslizam sem se prender a nada, como opiniões
intercambiáveis que se somam à maré e desaparecem, em vez de lhe dar espessura
fazendo-a se deter ou interrompendo seu devir. Em seu excesso sem densidade, tanto
as imagens como as palavras se mostram impotentes para desacelerar esse fluxo ou
para lhe dar coesão: não conseguem se condensar em diálogo nem em pensamento.

O grupo permaneceu ativo até a finalização desta pesquisa com a saída progressiva de
seus membros, alguns dos quais esporadicamente compartilhavam informações que
desvirtuavam o propósito do grupo. 17 participantes continuaram vinculados e mantiveram a
mesma postura desde o início da proposta, nos levando a refletir sobre a necessidade de outros
mecanismos de engajamento desses sujeitos, inclusive, de natureza presencial, a fim de

9
Disponível em: https://www.tecmundo.com.br/internet/120938-whatsapp-rede-social-usada-brasileiros-afirma-
pesquisa.htm. Acesso em: 08 jan. 2018
203

concretizar os objetivos do Portal TBC Cabula. Além de evidenciar os tantos desafios que
ainda permeiam as relações dialógicas entre comunidades populares e a academia. Uma vez
que essa experiência não atingiu plenamente o seu objetivo: geração de diálogo avaliativo,
demos continuidade ao processo com o desenvolvimento de um segundo ciclo de avaliação
mediante a adoção de outra estratégia.

6.3 2º Ciclo de avaliação

O segundo ciclo de avaliação do DCC corresponde ao momento de aplicação do


questionário online (ver apêndice B). Tal instrumento foi organizado em cinco blocos. No
primeiro estão perguntas de múltipla escolha e de respostas curtas sobre dados pessoais do
avaliador e demais informações que nos permitiram traçar um breve perfil de conexão destes.
Do bloco 2 ao 4 foram elaboradas perguntas conforme modelo de escala likert com o objetivo
de permitir ao colaborador avaliar as soluções aplicadas, as quais estão relacionadas aos
princípios de design definidos: comunicação comunitária, interatividade e participação
criativa. Princípios estes que se constituem em categorias de análise da tese.
A escala de likert é um tipo de escala utilizada em questionários para verificar atitudes
e opiniões, permitindo assim, conhecer o nível de concordância ou não do entrevistado em
relação a uma determinada afirmação ou questionamento. De uma maneira geral esse tipo de
escala varia de 5 a 7 pontos que podem indicar critérios de concordância e discordância
mediados por um ponto neutro (PASQUALI, 1996). Considerando que o questionário online
visou a avaliação de um portal web colaborativo, portanto, em constante processo de
elaboração, cujo preenchimento dependia da interação do visitante com esse ambiente,
buscamos definir itens a partir de expressões que sugerissem “processo”: sempre; na maioria
das vezes; às vezes; raramente e Não se aplica; obedecendo a escala de 5 níveis abaixo
representada.

Tabela 1: Escala de avaliação


5 4 3 2 1
Sempre Na maioria das Às vezes Raramente Não se aplica
vezes
Fonte: a autora
204

Ressaltamos que ao utilizar esse mecanismo para avaliar o Portal TBC Cabula não
buscamos apresentar atribuições numéricas ou mensurações exatas. Até mesmo por que a
característica processual do referido ambiente e as lacunas ainda apresentadas, não nos
permitiriam verificar tal fato, apenas analisar alguns limites e potencialidades. Além disso, a
modalidade de questionário online não nos garante controle sobre a navegação dos interatores
no Portal, tampouco atestar a qualidade dessa interação.
O intento foi elaborar um mecanismo de avaliação, que permitisse aos avaliadores
emitir suas opiniões e percepções acerca das soluções implementadas mediante as questões
presentes no instrumento. Nesse sentido, a escala de likert se apresentou como um mecanismo
capaz de gerar dados objetivos, que aliados às outras questões presentes no instrumento
facilitaram a tomada de decisões acerca do DCC.
O quinto e último bloco do questionário online corresponde às perguntas abertas, nas
quais, os avaliadores sinalizaram os pontos fortes e pontos a melhorar no Portal TBC Cabula,
assim como apresentaram sugestões de aperfeiçoamento para o ambiente.
É fundamental esclarecer que a versão do Portal TBC Cabula avaliada neste ciclo
representa a aplicação das soluções de DCC elaboradas no processo desta pesquisa. Sendo
assim, aspectos lacunares sinalizados pelos avaliadores, a exemplo da insuficiência de
conteúdos informativos e a necessidade de se aplicar estratégias de marketing e divulgação do
ambiente, por exemplo, foram considerados como elementos de análise, uma vez que
tangenciaram as soluções desenvolvidas e discussões tecidas no decorrer da tese. Contudo,
trata-se de lacunas que emergiram de demandas da comunidade, portanto, podem se constituir
em pontos de partida para investigações futuras com objetivos diferentes dos propostos nesta
pesquisa, a qual se comprometeu com a elaboração de um design cognitivo colaborativo, isto
é, o processo de concepção, organização e implementação de soluções colaborativas que
visam otimizar processos cognitivos em ambientes virtuais, sendo, neste estudo, o Portal TBC
Cabula como caso de aplicação.
Também ressaltamos que não constam dentre os objetivos desta tese construir
conteúdos para o portal, nem realizar ações de marketing para o mesmo, muito embora,
algumas soluções para estes fins foram postas em curso e/ou projetadas a partir das sugestões
dadas pelos colaboradores. No entanto, reafirmamos que, especialmente, os conteúdos de
natureza/origem comunitária, precisam ser elaborados mediante consentimento e participação
criativa da comunidade do Cabula e entorno, obedecendo metodologia colaborativa
específica, do contrário seria romper com a proposta defendida nesta tese, a qual confirma o
caráter de permanente processo do Portal TBC Cabula.
205

Assim, dando continuidade ao segundo ciclo de avaliação da pesquisa, ampliamos o


convite de colaboração para outros sujeitos coletivos que não estavam incluídos no grupo do
WhatsApp criado anteriormente. Com essa estratégia buscamos atender um público
diversificado de avaliadores incluindo moradores do Cabula e entorno e, também, de outras
localidades que tiveram a oportunidade de interagir com o Portal, conforme o breve perfil
traçado.

6.3.1 Perfil dos avaliadores

Disponível na rede web entre os meses de julho e setembro de 2017, o questionário foi
preenchido por 39 avaliadores que aceitaram os convites enviados. Esses colaboradores
apresentaram faixa etária entre 21 e 52 anos, sendo o grupo majoritário com idade entre 21 e
35 anos ocupando um percentual de 59%.
Desses 39 avaliadores, 54% são moradores da localidade do Cabula e entorno, sendo
que desses 54%, 21% são, além de moradores, também atuantes em comunidades de prática
na localidade. Alcançamos desse modo, representantes de quatro bairros da localidade
investigada, a saber: Beiru Tancredo Neves, Cabula, Fazenda Grande do Retiro e
Pernambués, conforme explicitado no gráfico a seguir.

Gráfico 1: Bairros dos avaliadores residentes do Cabula e entorno

Fonte: Dados da pesquisa


206

Nos percentuais destacados no gráfico 1 estão incluídos representantes das


comunidades de prática colaboradoras no ciclo de design, com exceção dos membros da
Biblioteca Comunitária Zeferina-Beiru, que não retornaram os contatos. O que demonstra
maior adesão a essa estratégia de avaliação, do que a utilizada no primeiro ciclo avaliativo.
Observamos também o maior percentual para o bairro da Fazenda Grande do Retiro, o que se
justifica pela rede de relações construída com um grupo de jovens do bairro, pertencentes ao
Núcleo de Arte Yvone do Amaral Pereira vinculada ao Núcleo Espírita Telles de Menezes
localidade durante o primeiro ciclo de avaliação.
Em referência ao nível de escolaridade dos avaliadores que moram no Cabula e
entorno, 88% já tiveram experiência no ensino acadêmico, uma vez que desse total, 58% já
possuem nível superior completo e 30% possuem nível superior incompleto. Um dado
significativo, que revela o progressivo ingresso dos moradores de comunidades populares no
ensino superior. Tal característica, provavelmente, influenciou os avaliadores em aceitar o
convite para participar dessa pesquisa. Proporção semelhante observamos entre os demais
colaboradores que avaliaram o portal, 9 possuem nível superior completo; 8 possuem nível
superior incompleto e apenas 4 possuem nível médio de ensino.

Gráfico 2: Nível de escolaridade dos avaliadores que moram no Cabula e entorno

Fonte: Dados da pesquisa

As áreas profissionais dos avaliadores foram bastante diversificadas, sendo que


sobressaíram as participações de professores totalizando 9 avaliadores e estudantes de
licenciatura com 8 representantes dos cursos na área de humanidades, evidenciando o
interesse de profissionais e estudantes da área por temas relacionados à comunidades
207

populares e a difusão de sua cultura. O turismo foi a segunda área mais representada com a
participação de 4 bacharéis e 4 estudantes, seguida das áreas de design com 3 profissionais e
comércio informal que teve a participação de 3 vendedores.

Gráfico 3: Profissões dos avaliadores

Fonte: Dados da pesquisa

Os avaliadores também demonstraram conhecer as ações do projeto TBC Cabula, pois,


a maioria que engloba 43% do total, declarou ter tido conhecimento da pesquisa no ambiente
acadêmico, por meio de alguma experiência vinculada ao projeto, a exemplo de aulas ou
oficinas. As redes sociais foram o segundo meio de acesso a esta pesquisa alcançando 31%
dos avaliadores e os 26% restantes souberam por amigos e vizinhos. Esse aspecto é
importante salientar, pois os dados indicam que a comunicação “boca a boca” possui tanta
efetividade quanto as redes sociais digitais.
Também buscamos identificar um breve perfil de conexão dos avaliadores, a fim de
perceber a forma como estabelecem relações com a internet. Sendo assim, 86,8% afirmaram
possuir internet banda larga, dados que sintonizam com o nível de freqüência com que
costumam acessar a internet; 12,8% afirmaram conectar-se de 3 a 5 vezes por semana, mas a
ampla maioria, formada por 87,2% dos avaliadores, declararam que se mantém conectada
diariamente. Esse tempo de conexão está relacionado ao uso de dispositivos móveis conforme
afirmado por 64,1%. O segundo lugar mais acessado pelos colaboradores é o trabalho,
assumindo 20,5% do total, seguido da casa de vizinhos e parentes, com 10,34% e a residência
própria, com 5,1%. Essas informações evidenciam que os avaliadores acessam regularmente
conteúdos web, o que favorece uma interação no mínimo razoável com o Portal TBC Cabula.
Após análise dos dados de conexão, realizamos o tratamento das informações obtidas
por categoria, observando as respostas dadas aos itens de likert e associando-as aos dados de
208

interação do Portal TBC Cabula, aos pontos fortes e pontos a melhorar indicados pelos
avaliadores, bem como, suas sugestões de aperfeiçoamento para o ambiente em questão.

6.3.2 Categoria comunicação comunitária

A intenção de se estabelecer enquanto canal de comunicação contra-hegemônico


justifica a utilização dessa categoria teórica como a estrutura central de sustentação do DCC
do Portal TBC Cabula. São, portanto, os princípios da comunicação comunitária condutores
do DCC elaborado, especialmente, por estarem contidos nas demais categorias utilizadas: a
interatividade e a participação criativa.
Dessa maneira, amparados pelas discussões tecidas por autores como Miani (2001) e
Peruzzo (2013), desenvolvemos com os colaboradores do estudo soluções capazes de
potencializar práticas comunicativas inclusivas, mediadoras, sintonizadas aos interesses da
comunidade local, interessadas na valorização da história e da cultura do Cabula e entorno,
bem como no fortalecimento da identidade local. As soluções aplicadas e os critérios de
análise utilizados encontram-se no quadro a seguir.

Quadro 24: Comunicação Comunitária – soluções x sub-categorias de análise


Soluções aplicadas Sub-categorias de análise
Colunas informativas “Cabula Acontece”: 1.1. Visibilidade à cultura, às produções da
-Histórias do Cabula: Fragmentos científicos e comunidade do Cabula e entorno e fortalecimento
curiosidades sobre a história do Cabula e da identidade local
entorno.

-Cabula em Foco: Divulgação de ações 1.2. Informações de utilidade para a comunidade


comunitárias e entrevistas com do Cabula e entorno
produtores/ativistas de representatividade local.
Comunicação Comunitária
CATEGORIA

-#Ficadica: Dicas de livros, filmes, peças 1.3. Linguagem acessível e de fácil entendimento
teatrais e outros conteúdos culturais

Bairros 1.4. Acessibilidade e eficiência dos canais de


Estrutura de páginas sobre os dezessete bairros comunicação com os administradores do Portal
contendo os seguintes tópicos a serem TBC Cabula
construídos colaborativamente: história,
1.

localização, grupos culturais, gastronomia,


curiosidade, organizações populares e outros; 1.5. Disseminação das práticas de ensino, pesquisa
e extensão realizadas no Cabula e entorno
Informações sobre o Cultarte
Página sobre o Coletivo Cultarte dando ênfase à
sua história, ações desenvolvidas, as cooperadas
e seus produtos para comercialização

Biblioteca digital
Ambiente de difusão de produções técnicas e
209

acadêmicas envolvendo o TBC e temas


correlatos no âmbito local, nacional e
internacional;

Quem somos
Ambiente de difusão do histórico, objetivos,
parcerias, ações e produções do projeto TBC
Cabula;

Contato
Canal de comunicação direto com os
coordenadores do projeto TBC Cabula;
Fonte: a autora

Em relação ao item visibilidade à cultura, às produções da comunidade do Cabula e


entorno e fortalecimento da identidade local, 56,4% dos avaliadores indicaram o item
“sempre”, que representa o ponto máximo da escala e; 25,6% responderam o item “na maioria
das vezes”, que ocupa a posição (4) da escala. Esses percentuais totalizam cerca de 80% dos
avaliadores, demonstrando assim, que para os avaliadores, as soluções aplicadas transparecem
a intencionalidade do Portal TBC Cabula de ser um canal de comunicação compromissado
com a comunidade, sua gente, seus valores e seu legado cultural, ainda que estejamos em
caráter embrionário.
Essa perspectiva sintoniza com as respostas obtidas acerca da utilidade das
informações veiculadas no portal e da linguagem utilizada nesse ambiente, que também
atingiram o nível máximo da escala, com 61,5% e 71,8%, respectivamente; igualmente
evidenciado no gráfico a seguir.

Gráfico 4: Avaliação dos itens relacionadas ao princípio comunicação comunitária


210

Tabela 2: Pontos fortes relacionados ao princípio comunicação comunitária

Pontos fortes Ocorrências Percentual


Dar visibilidade às ações e a cultura da comunidade 7 30%
Possibilidade de comunicação da comunidade no Portal 5 22%
Informações sobre a comunidade 3 13%

Fonte: Dados da pesquisa

A visão geral positiva, representada nos dados do gráfico também se manifestou nos registros
relacionados aos pontos fortes identificados pelos avaliadores. Nesse sentido, aspectos como:
dar visibilidade às ações e a cultura da comunidade e a possibilidade de comunicação da
comunidade no Portal foram os pontos que obtiveram maior número de ocorrências.
211

Linguagem fácil e acessível 3 13% E


Informações úteis 2 9%
ssas
Informações sobre o projeto TBC Cabula 2 9%
Material da biblioteca de qualidade 1 4% ocorrê
TOTAL 18 100% ncias
Fonte: a autora
estão
diretamente relacionadas às sub-categorias de análise apresentadas no quadro 24. Seja por
enaltecer a proposta do portal: “Evidencia e potencializa a cultura do bairro Cabula e seu
entorno. (S.A)”. Seja por destacar as potencialidades desse ambiente em termos de
fortalecimento da identidade dos moradores e atores locais: “Esse tipo de ferramenta, dá
visibilidade as ações da comunidade que são importantes para seus pares. (J.O).
Observamos também o anseio em estabelecer um vínculo mais efetivo e democrático
entre a comunidade e a UNEB, ao vislumbrar o Portal TBC Cabula como um espaço de
mediação potencial: “um canal que pode se transformar em um elo entre as comunidades e a
instituição Uneb de forma mais democrática (A.J). Esse relato tem uma importância peculiar,
pois denota o interesse da comunidade em aproximar-se do ambiente acadêmico, além de
revelar que ainda há necessidade de se discutir e implementar vias de articulação mais
democráticas entre a UNEB e o seu entorno, cumprindo assim, um dos objetivos da
universidade que é servir a sua comunidade.
E, não somente a interação comunidade-academia foi uma demanda emergente, mas,
também, a interação comunidade-comunidade, ponto vislumbrado por um dos avaliadores que
considerou o Portal TBC Cabula: “Um forte meio de interação e integração entre a
comunidade do Cabula, seu cotidiano e as tecnologias.” (C.O). Compreendemos que ampliar
os vínculos entre os pares da comunidade é ponto de partida para se construir uma ambiência
de fortalecimento identitário, valorização local e engajamento da comunidade com vistas ao
atendimento de seus anseios e a superação das dificuldades coletivas. O Portal TBC Cabula,
nesse sentido, busca se estabelecer enquanto uma via possível a esses encontros comunidade-
academia e comunidade-comunidade, de certo que para atender a fins específicos.
A propósito, suas implementações, ainda que iniciais, foram percebidas de forma
positiva, de modo mais particular quanto a seu intento de comunicar com a comunidade, que,
para a avaliadora A.P, evidencia: “fácil acessibilidade, escuta sensível de seus
administradores, ‘ultilização’ de ‘sujestões’ de moradores e estudantes do Cabula e seu
entorno. Além de ser, segundo o avaliador A.P, um: espaço para participação da
comunidade”. (C.S)
212

Em contrapartida, é necessário também refletir quanto à sub-categoria de análise:


disseminação das práticas de ensino, pesquisa e extensão realizadas no Cabula e entorno. De
todos os itens avaliados acerca do princípio comunicação comunitária foi o que obteve
percentual mais baixo na posição cinco da escala, com pouco mais de 40% das indicações;
assim como, junto à sub-categoria acessibilidade e eficiência dos canais de comunicação com
os administradores do Portal TBC Cabula figura com o maior percentual no nível mais baixo
da escala, que representa o item “não se aplica” nas opções. Esse resultado talvez evidencie
que as soluções desenvolvidas para atender a essas sub-categorias ainda careçam de ajustes,
mas, também podem indicar que tais soluções tenham sido desinteressantes ou não visitadas
por essa parcela dos avaliadores.
A solução das colunas foi aplicada como um mecanismo de transformação dos dados e
informações das pesquisas relacionadas ao Cabula e entorno em informação acessível e
contextualizada para a comunidade ampliada e, especialmente, a comunidade local. Sobre
essa solução, uma das avaliadoras fez a seguinte ponderação: “Poderiam ter mais postagens
das colunistas, em sentido de vivência nas realizações de pesquisa (por exemplo) nos bairros.
Ou alguma opinião, crítica etc, que tenha a ver com o bairro” (F.M). Esse registro demonstra
que soluções como a coluna tiveram boa receptividade, indicando o anseio pela produção de
mais textos como os produzidos até o momento.
Junto a esse indicativo de melhorias outros pontos foram mencionados e
sistematizados na tabela 3 a seguir. Vale ressaltar que pontos a melhorar são tão importantes
quanto os pontos fortes, pois motiva a continuidade do trabalho colaborativo, premissa do
Portal TBC Cabula.
213

Tabela 3: Pontos a melhorar relacionados ao princípio comunicação comunitária

Pontos a melhorar Ocorrências Percentual


Atualização das informações sobre os bairros 21 49%
Mais divulgação 10 23%
Informações insuficientes 7 16%
Incluir mais notícias locais 1 3%
Linguagem pouco acessível 1 3%
Ausência de parceria com as escolas 2 6%
TOTAL 42 100%
Fonte: a autora

Nesse sentido, apesar do baixo índice de ocorrências, destacamos a falta de parceria


com as escolas como um ponto que merece atenção. Especialmente, por que associar-se com
mais afinco ao público estudantil pode se tornar um futuro e promissor campo de aplicação
para o Portal TBC Cabula, no que concerne a aspectos como a construção de informações
sobre os bairros, não apenas numa perspectiva de colaboração voluntária, conforme tentamos
no decorrer da pesquisa, mas, sobretudo numa perspectiva de (in) formação desses estudantes.
Aspectos como a necessidade de atualização das informações sobre os bairros; mais
divulgação do ambiente e; a insuficiência de informações no Portal TBC Cabula foram as
ocorrências mais registradas, requerendo assim, a elaboração de soluções colaborativas para
suprir tais demandas. Alguns dos pontos mencionados na tabela 3 sintonizaram com as
sugestões de melhoria declaradas pelos colaboradores, as quais foram organizadas em
categorias e que merecem atenção e análise para continuidade das atividades do Portal:

a) Lazer, Cultura e Turismo

 Inclusão cultural das atividades que existem no cabula (A.S);


 As diversas formas de expressão cultural e religiosa, eventos esportivos e artísticos
(Y.S);
 Mapear todas as atividades relacionadas ao TBC do Cabula (A.N);
 Indicar Roteiros Turísticos e Gastronômicos na Região. (A.N);
 Lazer e entretenimento diversificado. (V.F);

b) História local

 Relatos da história e transformações locais ocorridas ao longo dos anos, bem como as
figuras peculiares que aqui vivem ou viveram. (A.P);
 Fotos, depoimentos de moradores sobre a evolução do bairro. (F.M)
 Perfil dos moradores mais antigos, historia deles no bairro (V.F);

c) Serviços
214

 Informações sobre os serviços/infraestrutura disponíveis nos bairros (ex: Posto de


saúde, Cras, Delegacia, linhas de ônibus...) (C.S)
 Informações sobre saúde, segurança e educação (F.N)
 Indicação de Serviços para Comunidade (F.N)

d) Cotidiano

 Fotos e depoimentos dos moradores locais, divulgação de serviços e eventos do bairro


(C.S);
 Mapa. Foto e release dos protagonistas que fazem a diferença na comunidade (D.R)
 Fotos e vídeos das pessoas desse bairro e do cotidiano do mesmo (G.A)
 Um pouco desse cotidiano e as ações que vem sendo feitas em prol dele, pois tende a
agregar valor cultural, de pertencimento, vivendo e sendo parte desse contexto. (J.O);

d) Marketing / Divulgação

 Maior divulgação, manutenção e atualização do portal (F.N)


 Estar mais divulgado em portais/redes e com isso vir a melhoria. (V.S)
 Estar constantemente em atualização dos eventos (J.L);
 Designar pessoal com comprometimento, a fim de intermediar essas informações.
(M.D);
 As escolas precisam de cartazes informando o site no sentido de convidar os
moradores para dar sua contribuição. (S.O)
 Julgo importante, uma maior divulgação nas escolas, pois a educação como é o nosso
foco. A valorização e destaque do que se tem feito nesses espaços, contribui
significativamente para a auto estima desses estudantes e da comunidade como um
todo. (J.O)

As informações obtidas nos conduziram aos dois pontos mais recorrentes em todo o
processo da pesquisa. Primeiro, a carência de conteúdos do portal e segundo, como suprir essa
carência? As sugestões apresentadas condizem aos princípios aqui estudados e cabem no
âmbito do Portal TBC Cabula. Entretanto, para suprir essas carências não se trata apenas de
designar pessoal comprometido para elaborar os conteúdos conforme sugestionado por uma
das avaliadoras, mas, sobretudo, engajar a comunidade nesse processo que precisa ocorrer de
forma colaborativa, aplicando assim os princípios da comunicação comunitária, que ganharão
contorno no Portal TBC Cabula mediante os princípios da interatividade.

6.3.3 Categoria interatividade


215

As características e intencionalidades do Portal TBC Cabula o tornam um portal web


peculiar. As soluções aplicadas para fins de interatividade foram concebidas para
proporcionar ao usuário experiências de interação que vão desde ações mais reativas, pautadas
em inputs e outputs, a exemplo do canal de vídeos e as enquetes, até aquelas que pressupõem
uma ambiência de compartilhamento entre os sujeitos conectados, como o calendário
interativo; os espaços para comentários nas postagens e as possibilidades oferecidas pelos
conteúdos interativos agregados ao Portal.
Ressaltamos que a opção por um formato interativo híbrido, que possui determinadas
soluções pautadas em sistema de moderação resulta das indicações dadas pelos próprios
representantes locais. Além de denotarem o compromisso do DCC em contribuir para que o
Portal TBC Cabula torne-se, posteriormente, uma referência de fortalecimento identitário e
valorização da comunidade do Cabula e entorno, por meio da difusão de sua cultura e dos
saberes que são sedimentados no legado das pessoas que fazem essa localidade, por isso, a
necessidade de maior atenção aos conteúdos que são difundidos.
Em contrapartida, também reconhecemos que as soluções aplicadas representam o
atual momento do Portal TBC Cabula, que vive uma etapa de reformulação dos seus
propósitos, na expectativa de estabelecer relações mais colaborativas com a comunidade local
com vistas a ampliação e sustentabilidade de suas ações e isso se dará de forma gradativa,
respeitando o tempo da comunidade. Assim, não descartamos a possibilidade futura de
implementar soluções interativas mais abertas, contudo, tal possibilidade precisará ser
proporcional ao nível de engajamento e interesse da comunidade local em ocupar e apropriar-
se desse ambiente interativo.

Quadro 25: Interatividade – soluções x sub-categorias de análise


216

Soluções aplicadas Sub-categorias de análise


Canal TBC 3.1. Conteúdos interativos inovadores e atraentes;
Criação de um canal de vídeos conectado ao
youtube, com temas relacionados ao Cabula e 3.1.2. Navegação intuitiva;
entorno e temáticas de interesse da comunidade.
3.1.3. Execução de tarefas com eficiência
Conteúdos interativos
Espaço de integração dos conteúdos interativos 3.1.4. Layout responsivo
originados de dissertações e teses sobre o
Cabula e entorno
-Museu Virtual do Quilombo do Cabula
Museu virtual 3D do quilombo do Cabula
séculos XVIII e XIX.
-Mapa cultural
Mapa interativo para divulgação de
produtos e equipamentos culturais do Cabula e
entorno
3. CATEGORIA

-Rádio Web Juventude


Interatividade

Rádio web gerida por estudantes e


professores do Colégio Estadual Roberto
Santos (Cabula)

Calendário interativo
O participante poderá enviar para publicação
datas de eventos locais, que ficarão disponíveis
nesse espaço

Enquetes
Enquetes sobre temáticas relacionadas direta ou
indiretamente ao cotidiano das comunidades;

Tecnologia responsiva
Tornar o portal um ambiente responsivo,
acessível em dispositivos móveis, ampliando
assim as formas de acesso ao esse ambiente.

Programação visual
Adoção de programação visual funcional e
layout que permita a setorização da informação.

Fonte: a autora

No ciclo de design uma das recorrentes fragilidades apontadas pelos colaboradores foi
em relação à organização das informações disponíveis no Portal TBC Cabula, que dificultava
a busca e o acesso a conteúdos de interesse do visitante, em razão, especialmente, da poluição
visual. Nesse sentido, ao design cognitivo proposto agregamos elementos relacionados ao
campo do design da informação. Para Lipton (2007) esse tipo de design é uma área de estudo
teórica e prática interessada na clareza e compreensibilidade dos produtos visuais com fins de
orientação, ensino, explicação ou informação. Seria, portanto, segundo a Sociedade Brasileira
de Design da Informação (SBDI):

[...] uma área do design gráfico que objetiva equacionar os aspectos sintáticos,
semânticos e pragmáticos que envolvem os sistemas de informação através da
contextualização, planejamento, produção e interface gráfica de informação junto ao
217

seu público alvo. Seu princípio básico é o de otimizar o processo de aquisição da


informação efetivado nos sistemas de comunicação analógicos e digitais (SBDI,
2008)

O intuito de selecionar, organizar e apresentar a informação para uma determinada


audiência, de forma adequada, parafraseando Wildbur e Burke (1998), repercutiu
positivamente nos pontos fortes indicados pelos avaliadores. Os resultados da avaliação
representados no gráfico 5 demonstram assim, que o trabalho de aplicação realizado com a
equipe de desenvolvimento agradou aos colaboradores dessa etapa de pesquisa.

Gráfico 5: Avaliação dos itens relacionadas ao princípio interatividade

Fonte: Dados da pesquisa

A navegação fácil, intuitiva e elementos como cores, interface e layout foram


indicados no nível 5 da escala, por mais de 60% dos avaliadores. Revelando que a maioria
não apresentou dificuldade de navegação e compreensão da sequência informativa do Portal
TBC Cabula. Essa avaliação foi endossada nos registros dos pontos fortes sistematizados na
tabela 4.
218

Tabela 4: Pontos fortes relacionados ao princípio interatividade


Pontos fortes Ocorrências Percentual
Fácil de usar / Intuitivo 8 36%
Layout bonito / atraente 5 24%
Bem organizado / Claro 7 32%
Cores presentes na comunidade 1 4%
Conteúdo interativo 1 4%
TOTAL 22 100%
Fonte: Dados da pesquisa

Esses registros foram acompanhados de relatos que exprimiram a facilidade em


navegar e interagir com o Portal TBC Cabula: “Fácil de usar, direto e prático” (R.F); “Fácil
acesso e compreensão” (A.T); “Conteúdo interativo de fácil entendimento e interessante”
(F.M). Do mesmo modo, os avaliadores salientaram como pontos fortes, a estética visual
agradável do ambiente e conteúdos interativos atraentes: “Muito bonito, linguagem acessível,
informações úteis!” (A.N); “O conteúdo e a estética visual do portal” (G.A). “O uso das
cores como elemento visual. Cores presentes na comunidade. Conteúdo interativo que busca
atrair a atenção do usuário”. (D.P). O tipo de linguagem utilizada e o design da informação
também foram aspectos apontados pelos avaliadores como pontos fortes: “Linguagem
objetiva” (R.C); “Bem organizado, com informações claras sobre o projeto” (C.S); “Design,
qualidade das informações” (C.S).
Contudo, é importante também salientar os pontos de melhoria indicados e que estão
relacionados aos pontos fortes que tiveram maior ocorrência. O avaliador F.N sugeriu reparos
na usabilidade do portal ao fazer a seguinte afirmação: “Precisa trabalhar melhor a
usabilidade no que diz respeito a visibilidade. Tomar cuidado com a barra de rolagem, não
obrigue o usuário a rolar até o fim da página para achar o que precisa” (F.N).
A visão apresentada tem se configurado em uma tendência no desenvolvimento web
na atualidade, que preza pela redução do uso das barras de rolagens verticais, com o intuito de
tornar mais fluida e intuitiva a navegação nos sites e portais. De acordo com Sousa (2002,
p.6), o layout de um site:
[...] deve ser planejado para que seja líquido. Isso significa que o site deve
atender a configuração padrão de tela sem barras de rolagem e se expandir
nos monitores com resoluções maiores de forma que não deixe espaços sem
uso. Atenção redobrada deve se ter com a altura das páginas. Páginas muito
longas tornam a leitura muito cansativa. Entretanto, páginas muito curtas
onde são necessários vários cliques para uma leitura completa do conteúdo
tornam-se desestimulantes. Portanto, o que vale é alcançar um meio termo
[...]
219

Outra sugestão interessante foi apresentada pelo avaliador D.P, que recomendou a
inclusão de “Elementos icônicos que representem aquela comunidade”. Trata-se de um
recurso gráfico que poderá contribuir para a identificação da comunidade do Cabula e entorno
com o Portal, ao representar elementos ou figuras peculiares dessa localidade. Assim é
possível pensar em ícones que representem as famosas laranjas do Cabula; a Mata Atlântica
ainda presente na vegetação local, ou as tradições da cultura afro-indígena presentes nos
terreiros e centros religiosos da localidade.
A reunião dos conteúdos interativos oriundos das dissertações e teses de pesquisadores
do SEETU e Rede Educa foi uma das soluções aplicadas para atender ao princípio
interatividade. A propósito, o Museu Virtual do Cabula e o Mapa Cultural do Cabula oriundos
das pesquisas de Martins (2017) e Souza (2018) foram, depois da home, os itens mais
visitados no Portal TBC Cabula, com 278 e 233 acessos, respectivamente. Outros itens que se
destacaram em relação ao número de acessos foram: o canal de comunicação entre a equipe
gestora do Portal TBC Cabula e o visitante, que recebeu 153 acessos e 35 mensagens enviadas
com sucesso; a enquete sobre o novo visual do Portal, com participação de 79 visitantes e o
calendário interativo, que obteve 69 acessos e dois envios de eventos.
Destacamos como espaço que necessita melhorias, o Canal de Vídeos, que registrou
após a implementação do novo DCC, apenas cinco visualizações. Esse dado reflete nas
sugestões dadas por dois avaliadores, que recomendaram: “implantar recursos como vídeos e
fotos produzidos pelos moradores dos bairros.” (G.A) e a “construir espaço para
carregamento de vídeos” (A.G). Essas sugestões sintonizam com as soluções projetadas no
ciclo de design, mas que ainda não foram aplicadas, em razão do tempo desta pesquisa, a
exemplo da implementação de programas interativos no canal com a comunidade, assim como
o mecanismo para carregar vídeos enviados pelo público externo no Canal, o que é possível
apenas na página colabore com a sua informação.
Nessa mesma situação destacamos a sugestão de desenvolvimento de um aplicativo
mobile para o Portal, conforme recomendado por A.J: Não sei da viabilidade técnica, mas se
pudesse ser também um aplicativo para celular. Soluções, que conforme sinalizado pelo
avaliador necessita de estudos de viabilidade técnica, adicionamos também, financiamento.
Na contramão dessa sugestão, o avaliador T.M, morador da comunidade do Beiru/Tancredo
Neves, faz o seguinte relato “A iniciativa já é um grande começo. A manutenção e
democratização quanto ao acesso é vital. É necessário expandir o alcance nas comunidades.
Muitas pessoas não possuem ou não sabem manusear aparelhos telemóveis. Pensar numa
220

alternativa de interação com as comunidades que possa "precarizar" a dependencia


demasiada nesses aparelhos, afim de atender esse publico no contato com eles e divulgação
dos conteudos do portal.” (T.M).
O avaliador TM levanta em seu relato pontos que reverberam diretamente no alcance
do Portal TBC Cabula. De acordo com a Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio
(PNAD), a internet está presente em 63,6% dos lares brasileiros e em 94,8% deles havia
celulares sendo usados para se conectar à rede. Sobre o uso de celulares, os menores
percentuais, no entanto, foram observados no Norte (88,1%) e Nordeste (88,2%). Observa-se
que a internet e o uso de aparelhos digitais como os smartphones crescem de maneira
exponencial no mundo, e, também nas camadas populares. Mas, paradoxalmente, esse
crescimento ainda continua a refletir desigualdades sociais, pois adquirir um smartphone não
se configura em demonstrativo para a inclusão sócio-digital, especialmente, quando se tem em
bairros como Arenoso e Saramandaia, localizados no Cabula e entorno, taxas de
analfabetismo e pobreza que superam em mais de 100% a média obtida para a cidade de
Salvador, conforme dados do IBGE.
Reconhecemos, portanto, que as perspectivas e proposições apresentadas pelos
avaliadores em relação às soluções de interatividade aplicadas ao Portal TBC Cabula, apesar
de validadas indicaram necessidades de aperfeiçoamentos que favorecem a retroalimentação
dos ciclos de construção colaborativa do referido ambiente, assim como ressoam
decisivamente nas possibilidades de participação criativa do ambiente virtual estudado.

6.3.4 Categoria participação criativa

Por participação criativa compreendemos uma forma de participação que pressupõe


ações interativas de colaboração e cooperação. Defendemos nesta tese que participar é mais
do que estar presente. A propósito, o primeiro ciclo de avaliação sinalizou que participar
criativamente, isto é, engajar-se, cooperar e colaborar em um contexto de compartilhamento e
colaboração entre academia e comunidade, é um desafio significativo, em vista dos limites e
das especificidades que revestem essa relação. Assim como sinaliza Fróes Burnham (2012),
as fronteiras epistêmicas e as barreiras lingüísticas são as circunstâncias basilares para a
dificuldade de diálogos entre as comunidades de conhecimento e a comunidade ampliada,
muito embora, o que se discute e produz nessas comunidades tenha implicações fundamentais
para a vida das populações em geral.
221

Nesse sentido, ainda que diante desse desafio, buscamos desenvolver


colaborativamente soluções que vislumbrassem o compartilhamento, colaboração e
cooperação da comunidade do Cabula e entorno por meio do Portal TBC Cabula. As soluções
desenvolvidas estão dispostas no quadro 26

Quadro 26: Participação Criativa – soluções x sub-categorias de análise


Soluções aplicadas Sub-categorias de análise
Fala Comunidade 2.1. Participação da comunidade no processo de
Espaço interativo em que a comunidade pode construção da informação;
participar de enquetes, postar comentários, gerar
debates e cadastrar eventos locais para 2.2. Desenvolvimento de ações colaborativas e
Participação Criativa

divulgação. cooperativas entre os interatores


2. CATEGORIA

Colabore com a sua informação


Ficha online para divulgar sugestões de
conteúdos e pautas para publicação no portal ou
colaborar com conteúdos já publicados no
ambiente;

Fonte: a autora

Em relação ao princípio da participação criativa, o item consulta pública e escuta de


sugestões e melhorias para o ambiente foi o que obteve o maior índice de avaliação, com
74,4% de indicações para a opção “sempre”, seguido do item participação do visitante do
portal e a comunidade local na construção da informação veiculada, indicado no nível 5 da
escala por 69,2% dos avaliadores, bem como observamos no gráfico 6

Gráfico 6: Avaliação dos itens relacionadas ao princípio participação criativa


222

Fonte: a autora

As evidências do gráfico foram corroboradas pelos pontos fortes indicados pelos


avaliadores, que enalteceram a proposta colaborativa do Portal TBC Cabula, ao indicarem os
seguintes pontos fortes: “Um ponto só fala muito para ´me` so em vocês trabalharem com a
comunidade e a mesma fazer parte dessa construção é simplesmente maravilhoso” (A.S); “A
possibilidade de construção colaborativa dos conteúdos digitais do portal”(A.G) e a
“Socialização com líderes comunitários”, conforme registrado pelo avaliador (D.S).
A justificativa para os percentuais do gráfico e os registros feitos, provavelmente,
sofreram influência da chamada permanente que encontra-se na home (página inicial) do
Portal TBC Cabula, desde março de 2017, área do portal que obteve até janeiro de 2018,
1.680 acessos. Tal chamada convida a comunidade e visitantes para colaborar na construção
de conteúdos, mediante o preenchimento de um formulário padronizado, no qual podem ser
enviados vídeos, áudios e arquivos com extensão Word, pdf, JPEG ou PNG.

Figura 38: Espaço Colabore com a sua informação

Fonte: a autora

Essa página obteve, no período anteriormente mencionado, um total de 231 acessos


por meio da home e 200 acessos por meio do espaço Fala Comunidade, o qual também
despontou como um dos locais mais acessados do Portal atingindo um total de 129 visitas.
Nesse espaço, o visitante pode curtir e comentar as postagens do portal; participar de enquetes
e divulgar o seu evento no calendário interativo, que funciona sob moderação.
223

Figura 39: Espaço Fala Comunidade

Fonte: a autora

Assim, podemos inferir, que as soluções de DCC desenvolvidas para os fins de


participação criativa foram validadas e receberam um feed back positivo dos avaliadores,
entretanto, não obtivemos uma adesão significativa dos visitantes aos espaços participativos
do Portal TBC Cabula, bem como evidenciamos na discrepância entre os números de acesso e
os indícios de participação dos visitantes. Nesse sentido, que os avaliadores indicaram pontos
de melhoria organizados na tabela 5.

Tabela 5: Pontos a melhorar relacionados ao princípio participação criativa

Pontos a melhorar Ocorrências Percentual


Mobilização / engajamento da comunidade 12 86%
Ampliar o alcance da comunidade 1 7%
Metodologia para a construção colaborativa dos conteúdos 1 7%
TOTAL 14 100%
Fonte: a autora

A tabela 5 revela que a necessidade de maior mobilização e engajamento da


comunidade no Portal TBC Cabula teve indicação majoritária ultrapassando 80% das
ocorrências. Essa lacuna fica perceptível, na até então, baixa adesão participativa da
comunidade nas soluções construídas, conforme os seguintes relatos: “Ainda não consegui
perceber o envolvimento da comunidade do Cabula com o portal.” (A.B) e “Ainda é pouco
explorado pela comunidade do Cabula”. (C.O). Sugestões também foram dadas a fim de
superar esse impasse, tais como o desenvolvimento de: “Fóruns de debates, mediados, com a
comunidade” (C.O) e “atividades nos bairros, para que a população conheça os integrantes
do portal e saibam qual a finalidade maior” (A.S).
224

Observamos que, assim como nos demais princípios, as análises realizadas sobre as
soluções de participação criativa, indicaram aspectos emergentes que extrapolam as fronteiras
do DCC elaborado, mas, em contrapartida, evidenciam aberturas que potencializam a sua
funcionalidade, quando aplicado ao Portal TBC Cabula

Figura 40: Pontos fortes e sugestões de melhoria para o Portal TBC Cabula

Fonte: a autora

Diante do exposto, julgamos necessário refletir sobre essas emergências, as quais


indicam os limites e potencialidades do DCC, a fim de aperfeiçoá-lo, ampliando assim, o seu
alcance e aplicabilidade diante dos objetivos do Portal TBC Cabula.
225

6.4 Design Cognitivo Colaborativo: limites e potencialidades de sua aplicação ao Portal


TBC Cabula

O Design Cognitivo é uma área de conhecimento que busca desenvolver e aplicar


soluções compatíveis às características e demandas apresentadas pelos interatores de
determinado ambiente, processo ou produto, gerando assim, melhores condições de interação
e uso. Nesta pesquisa, desenvolvemos um design cognitivo de natureza colaborativa, aplicável
a ambientes virtuais focados na socialização da informação e conhecimentos, tomando como
caso de aplicação, o Portal TBC Cabula.
Nesse sentido, consideramos por Design Cognitivo Colaborativo (DCC) um
mecanismo de concepção sistêmica colaborativa voltada para ambientes virtuais, que visa
planejar, organizar e desenhar soluções digitais com fins cognitivos. A sua característica
interdisciplinar lhe possibilita transversalizar com distintas áreas do conhecimento, sendo
escolhidas aquelas que possuem maior afinidade com o contexto de aplicação.
Para elaborar o DCC, é necessário tomar como ponto de partida, a análise do contexto
de aplicação, isto é, a apropriação das intenções cognitivas do ambiente; as demandas dos
interatores e a identificação do problema. O estudo desses três aspectos oferecerá subsídios
para definir a base epistemológica e os princípios de design mais adequados à demanda
verificada, os quais nortearão os processos subsequentes. As fases posteriores de design,
aplicação e avaliação das soluções precisa ocorrer em regime de colaboração. Isso pressupõe
a implementação de procedimentos e instrumentos de pesquisa inclusivos, capazes de tornar
os sujeitos do estudo, colaboradores ativos e co-autores das soluções construídas, fazendo-os
avançar da condição de usuários para a condição de produsuários.
Esclarecemos que o DCC representado na figura 41, que se constitui em objeto de
estudo desta tese pode ser aplicado em outros contextos e ambientes virtuais. Para isso é
necessário, considerar em princípio, o caráter de permanente colaboração e abertura a
refinamentos e aperfeiçoamentos que esse mecanismo pressupõe.
226

Figura 41: Representação do DCC

Fonte: a autora
227

Para fins deste estudo, aplicamos o DCC tomando como contexto de aplicação o Portal
TBC Cabula. Esse portal web foi concebido com a intenção de se tornar um ambiente de
colaboração científico-comunitária, capaz de favorecer a socialização de saberes e fazeres da
comunidade do Cabula e entorno, atendendo assim, a demandas relacionadas ao Projeto de
Pesquisa e Extensão TBC Cabula. Contudo, o referido portal apresentava carências de
diferentes naturezas que impossibilitavam a concretização desse ideal, bem como detalhamos
no capítulo 4 desta tese.
Nesse sentido, a fim de atender aos objetivos da pesquisa construímos e aplicamos o
DCC em regime de colaboração com representantes de comunidades de prática presentes no
Cabula e entorno, com o propósito de desenvolver soluções capazes de potencializar a
socialização de saberes e fazeres da/sobre a referida localidade.
Conforme elucidamos no presente capítulo e no anterior, que descrevem/analisam os
processos de design, aplicação e avaliação do DCC, para cada princípio norteador foram
desenvolvidas e implementadas soluções que potencializam as intencionalidades cognitivas
do Portal TBC Cabula. Desse modo, na figura 42, especificamos as potencialidades das
soluções desenvolvidas considerando as características/funções projetadas e/ou aplicadas com
base nos princípios de design.
228

Figura 42: Potencialidades das soluções de DCC para o Portal TBC Cabula

Fonte: a autora

As soluções aplicadas ao Portal TBC Cabula foram validadas e apresentaram um feed


back positivo dos avaliadores, o que evidencia a aceitação desse grupo de sujeitos diante da
estrutura desenvolvida e suas possibilidades, bem como revela o cumprimento da proposta do
DCC: organizar, desenvolver e aplicar ao Portal TBC soluções sintonizadas às demandas do
Cabula e entorno e do Projeto TBC Cabula, que potencializassem a socialização de saberes e
fazeres da/sobre essa localidade.
229

Entretanto, as críticas e sugestões apresentadas no decorrer da pesquisa, nos


convidaram a refletir sobre a amplitude das soluções desenvolvidas e, consequentemente, as
intenções do Portal TBC Cabula. Assim, percebemos que as soluções de DCC aqui
implementadas, potencializam a socialização de saberes e fazeres do Cabula e entorno, ao
conferir a esse ambiente web uma estrutura de interação organizada, coerente e amparada em
soluções validadas pela comunidade. Contudo, tais soluções apenas irão adquirir
funcionalidade e movimento efetivo se conjugadas a aplicações em outros setores
relacionados ao portal. Setores estes que foram tencionados pelo DCC ao longo do curso
investigativo, mas que extrapolam o seu propósito, o tempo e as condições desta pesquisa.
Desse modo, a partir das especificidades evidenciadas pelos colaboradores do estudo
nos diferentes ciclos realizados, bem como as análises realizadas e as lacunas ainda
percebidas no Portal TBC Cabula, consideramos a necessidade de perceber o DCC como o
ponto de partida para futuras projeções desse ambiente web. Nesse sentido, em resposta ao
problema da pesquisa: como um design cognitivo colaborativo (DCC) aplicado ao Portal TBC
Cabula, pode potencializar a socialização de saberes e fazeres da/sobre essa localidade?
Consideramos que os alicerces sedimentados nos princípios da comunicação comunitária, da
interatividade e da participação criativa, conferem ao DCC a condição de estrutura nuclear
para o alcance dos objetivos do Portal TBC Cabula, mas que ainda encontra-se em estado de
amadurecimento, tendo em vista as lacunas presentes em outros setores do referido Portal,
bem como identificamos no decurso da pesquisa.
Nesse sentido, para que o DCC atinja maturidade e consolide seu propósito de
potencializar a socialização de saberes e fazeres da localidade do Cabula e entorno, se faz
necessária a interlocução mais incisiva com soluções de outros âmbitos, que foram
tencionados no processo de construção colaborativa, a saber: a) design da participação; b)
design da informação e c) design da interação. Assim, o DCC se configuraria em centro
mobilizador e núcleo de articulação entre os referidos setores, tal como representado no
diagrama a seguir.
230

Figura 43: Solução projetiva para o Portal TBC Cabula

Fonte: a autora

Esse diagrama representa uma solução projetiva aplicável ao Portal TBC Cabula, que
tem como foco de alcance as lacunas identificadas nesse processo investigativo que
tencionaram o DCC. Trata-se, desse modo, de um esquema em projeção que pode ser
aperfeiçoado em ciclos de pesquisa e desenvolvimento futuros. Assim, na figura representada,
o DCC atua como núcleo central que se completa em interação com os demais núcleos,
escolhidos conforme as seguintes justificativas.

a) Design da participação

Após a aplicação das soluções de DCC, em especial, o baixo envolvimento da


comunidade nas soluções do Portal TBC Cabula, ficou patente a necessidade de conceber
soluções que conduzam a comunidade ao referido portal, não apenas o desenho soluções de
participação no Portal, como proposto nesta pesquisa. Percebemos a necessidade de
estabelecer mecanismos de atração da comunidade para posterior participação e colaboração
no ambiente, de modo a conferir funcionalidade às soluções de DCC implementadas.
Essa talvez seja a tarefa mais complexa diante do amplo número de comunidades
diretamente ligadas ao Portal TBC Cabula, especialmente por que identificamos nas sugestões
do colaboradores demandas por ações de mobilização presenciais, que venham,
231

posteriormente, expandir para o ambiente do Portal TBC Cabula, de modo a incitar um ciclo
entre comunidade-Portal TBC Cabula-comunidade, contribuindo, consequentemente, para o
conhecimento e popularização da comunidade para com esse ambiente web
Necessário enfatizar, entretanto, que incitar esse movimento requer trabalho
minucioso, pautado em uma metodologia colaborativa consentida e construída com os atores
locais, que respeite o seu tempo e as suas especificidades. Afinal, estamos falando de 17
bairros que, apesar de histórico e socialmente vinculados, possuem suas peculiaridades
manifestas nas suas geografias, nas suas populações, nos seus enfrentamentos diários e,
especialmente, nos seus anseios e relações políticas. Há também o interesse de escolas da
localidade em disseminar suas ações formativas, podendo assim desencadear práticas
formativas e construção de conteúdos que podem ficar disponíveis no ambiente.
Nesse sentido, o design da participação poderá ser delineado a partir de ações de
pesquisa e extensão setorizadas por bairro. Dessa forma, poderia ser desenvolvido um projeto
de mobilização, aplicável em cada bairro, por um período determinado. O propósito do
projeto seria realizar ações de popularização/divulgação do Portal, suas intenções e formas de
participação da comunidade; práticas formativas com as escolas voltadas para a sensibilização
comunitária, construção de conteúdos digitais sobre a comunidade e o uso do portal;
levantamento sistematizado que serviria como base a elaboração de conteúdos pela equipe de
gerenciamento; além da eleição de representantes da comunidade para atuar como
mobilizador/multiplicador do Portal TBC Cabula.
Esses mecanismos participativos coadunam com o princípio de participação criativa,
um dos pilares de sustentação do DCC, que pressupõe além da participação, a colaboração e a
cooperação. A intenção é retroalimentar o fluxo interativo e a permanente construção
colaborativa do Portal TBC Cabula. Sendo assim, as ações relacionadas ao núcleo de design
da participação irão ressoar diretamente em outro núcleo: o design da informação.

b) Design da informação

A demanda por mais conteúdos e informações foi um dos aspectos recorrentes nos
resultados desta pesquisa. Tal carência perpassa tanto pelas estratégias de design da
participação que estarão interessadas em engajar os interatores na produção desses conteúdos,
bem como elucidamos anteriormente, mas, também, exige a presença de um plano de design
da informação, executado por equipe interdisciplinar.
232

Esse núcleo teria como propósito a produção/redesenho de conteúdos e interfaces


gráficas que tornem a informação disponível no portal acessível à comunidade ampliada,
podendo, para isso, incluir estratégias de divulgação via redes sociais digitais. Desenvolver
conteúdos que fidelizem a comunidade/visitante do Portal TBC Cabula, levando notas e
informações de interesse do público, a exemplo do gerenciamento das colunas, dos conteúdos
interativos e outras soluções já implementadas por meio do DCC, e outras que não foram
possíveis de implementar a exemplo dos programas interativos para o canal web, bem como
apresentado no capítulo 5.
Importante ressaltar que, embora o propósito maior seja a construção de conteúdos
pela comunidade do Cabula e entorno, é necessária a existência de equipe responsável pela
escuta permanente à comunidade e suas demandas; contínua atualização dos conteúdos,
especialmente, os de natureza acadêmica. Essa foi uma lacuna também evidenciada nos
resultados da pesquisa. A comunidade/visitante precisa ter motivação em colaborar com o
Portal TBC Cabula, mas ao acessar esse ambiente ele também deseja encontrar informações
sobre a sua comunidade. Por isso, um ambiente com uma estrutura informacional consistente
contribui para fidelizar o interator e atraí-lo para estabelecer práticas de participação criativa.
Para que as ações dos núcleos de design da participação e design da informação se
consolidem é importante articular o terceiro núcleo: design da interação.

c) Design da interação

O design de interação seria o setor responsável por avaliar, permanentemente, a


experiência do usuário, a fim de implementar soluções inovadoras e revisar aquelas já
implementadas. Caberia, nesse âmbito, o desenvolvimento de aplicativo mobile para o Portal
TBC, conforme sugestionado pelos avaliadores do DCC. Assim como, a aplicação de testes
para refinamento da usabilidade.
Nesse sentido, tal núcleo buscaria observar as experiências da comunidade e dos
visitantes no Portal TBC Cabula, a fim de prevenir os possíveis erros do sistema e estabelecer
o equilíbrio entre os anseios dos usuários e as possibilidades do ambiente. Além disso, a
atuação desse núcleo seria fundamental para o desenvolvimento do aplicativo móbile offline,
uma estratégia interessante para ampliar o raio de alcance do Portal TBC Cabula.
As soluções aqui apresentadas, as quais estão articuladas aos núcleos de interlocução
com o DCC, estão sintetizadas no quadro 27. Salientamos que tais soluções foram postas a
233

partir da análise das sugestões dadas pelos colaboradores deste estudo, as quais em articulação
com as soluções de DCC podem potencializar a sua funcionalidade e raio de alcance

Quadro 27 - Outras soluções propostas

Setores Soluções propostas

DESIGN DA -Eleição de representantes da comunidade para atuarem como


PARTICIPAÇÃO mobilizadores/multiplicadores do Portal TBC Cabula;

-Sala interativa do Portal TBC Cabula nas edições do ETBCES;

-Desenvolvimento de projetos de extensão por bairro visando a


popularização do Portal na comunidade, pesquisa e a construção de
conteúdos;

-Práticas formativas nas escolas do Cabula e entorno voltadas para


sensibilização comunitária e a construção de conteúdos para o portal;

DESIGN DA -Mobilização de equipe para a produção de conteúdos e interfaces


INFORMAÇÃO gráficas, que tornem os resultados da pesquisa mais acessíveis a
comunidade ampliada;

-Escuta permanente às demandas informacionais da comunidade;

-Desenvolvimento de estratégias de gerenciamento do portal, e


disseminação das informações por meio das redes sociais digitais.

DESIGN DA -Aplicação de testes de usabilidade e revisão das soluções


INTERAÇÃO implementadas;

-Desenvolvimento de aplicativo mobile para o Portal TBC Cabula.

Fonte: a autora

Este capítulo teve como propósito analisar os aspectos evidenciados pelos avaliadores
do Portal TBC Cabula, identificando os avanços obtidos, as lacunas apresentadas, os limites e
as potencialidades do DCC elaborado. Nesse sentido, evidenciamos que o DCC cumpre com
o seu papel de núcleo central de orientação do Portal TBC Cabula, visto que confere a esse
ambiente uma estrutura interativa organizada, amparada em soluções que potencializam as
finalidades desse ambiente web. Contudo, evidenciamos que o DCC aqui construído e
234

aplicado irá adquirir maturidade e funcionalidade quando articulado com soluções de outros
núcleos a ele vinculados, se constituindo, portanto em centro mobilizador e também
mobilizado por outros setores tencionados no processo investigativo: o design da
participação; o design da informação e o design da interação.
Ademais, organizar o ambiente interativo, adequando os princípios e soluções digitais
ao contexto de aplicação não pressupõe, contudo, ponto final para os anseios do Portal TBC
Cabula, que é a socialização de saberes e fazeres da/sobre a comunidade do Cabula e entorno,
mas se constitui em condição necessária para atender as emergências que despontaram do
processo desta pesquisa.
Desse modo, as aberturas e tensões que emergiram a partir das soluções aplicadas
sinalizam um importante repertório para futuras pesquisas de natureza aplicada. Estudos
esses, que podem indicar não apenas o refinamento das soluções já existentes, aqui aplicadas
e/ou sugestionadas, mas o design de outras propostas que, possivelmente, serão
desencadeadas com a apropriação do DCC objeto desta tese.
235

UMA PAUSA...

Inventei de mexer com quem estava quieto, puxei conversa, dei-me ao atrevimento de cutucar
onças com vara curta. Agora aqui estou, desejoso de trazer mais vozes à mesa de nossa
interlocução. Estou consciente de que a folha que dá suporte ao escrever o dará também a
muitas leituras, divergentes, diferentes, isto é, que levem a muitos sentidos, contraditórios
até. Em todo caso, divertidos, na dupla acepção que o Aurélio me autoriza. Do texto escrito
cada leitor prazerosamente poderá fazer as leituras que quiser, as suas leituras, outras, tanto
das do escrevente, quanto das dos demais leitores.

Mário Osório Marques (2008, p.27)


236

Conclusão

O diálogo foi a bússola que orientou a caminhada desta tese, aqui construída entre
prosas e conversas puxadas com nossos interlocutores. Os caminhos percorridos, no entanto,
não nos conduziram ao fim da estrada, apenas indicaram a existência de outros horizontes à
espera de travessias. Evidenciando, assim, que o encerramento de ciclos pressupõe a abertura
para outros recomeços, que tornam o ato de pesquisar tarefa nunca conclusa, estado de
latência e vir a ser.
Esse sentido de virtualidade indica que ainda existem perguntas a se fazer e respostas a
serem descobertas, pois, o processo de construção de conhecimento, na acepção defendida
neste estudo, é calcado na incompletude que constitui a pesquisa e no inacabamento dos
sujeitos que nela colaboram; tal como os ciclos vivenciados e percorridos ao ritmo da DBR.
Não há, portanto, a pretensão de esgotar os diálogos tecidos, há aqui apenas um ponto de
continuação, uma pausa para assentar as ideias, que anuncia um estado de espera. Afinal, as
interrogações e os pontos lacunares sempre serão pretexto para o início de outras conversas,
desdobramentos e/ou refinamentos dos processos iniciados nesta tese.
Embora este estudo tenha se apropriado de um modus operandi considerado
alternativo e contra-hegemônico, quando comparamos ao convencional modo de se fazer
pesquisa, a escrita desta tese constituiu-se sob o controle do tempo e os ritos protocolares que
margeiam as relações acadêmicas. Entretanto, vale esclarecer que a continuidade do itinerário
que iniciamos, não precisará ter como limite uma conclusão, pelo contrário, aos potenciais
leitores desta tese e colaboradores do Portal TBC Cabula fica o convite a percorrer caminhos
outros, até mesmo aqueles não acessados em razão dos limites que impõe a escrita acadêmica.
A propósito, quando projetei o desejo de pesquisar a comunidade do Cabula e entorno,
enxerguei esse locus, a princípio, através das lentes de quem se apropriou dessa localidade
enquanto residente, transeunte e simpatizante que observava a dinâmica emergente dos fluxos
comunitários; mas, por vezes, a lente da pesquisadora predominou perante as leituras
realizadas. Assim, cultivei a ilusão de estar certa sobre as minhas perspectivas e escolhas
teórico-metodológicas, agarrada à zona de conforto que me oferecia proteção e tranquilidade.
Até que as prescrições e fórmulas adotadas nas situações de pesquisa anteriores mostraram-se
insuficientes, falhas, diante das novas demandas, do novo contexto de estudo e, sobretudo, do
desafio de conceber o objeto de pesquisa, não apenas sob o parâmetro da educação, mas a
partir de um olhar múltiplo, tal como sugere o doutorado multidisciplinar em curso.
237

A imersão no campo da pesquisa e as interlocuções estabelecidas com os


colaboradores ajustaram o meu olhar, me permitindo enxergar a dinâmica da comunidade com
base em outras perspectivas. Encontrei, assim, algumas respostas para as tantas dúvidas e
dificuldades apresentadas. Foi quando percebi o tamanho da minha incompletude diante dos
desafios descortinados pela pesquisa. Precisei sublimar a sensação de fraqueza e a impressão
de mediocridade que essa constatação me causava e compreendê-la não como uma debilidade,
mas como ponto de partida para amadurecer enquanto pesquisadora. Isso só foi possível
quando agreguei às minhas andanças, até então solitárias, as figuras e vozes que emergiam
dos fluxos da pesquisa, as quais me acompanharam nessa busca pela compreensão do objeto
ora estudado, me levando a reconhecer o eu coletivo e plural que assumiu a escrita desta tese.
Essa percepção, contudo, não foi garantia de que o processo seria desprovido de
dificuldades. A cada conversa estabelecida com os interlocutores, a cada nova informação
acessada, as certezas eram desfeitas, nos convidando a rever a escrita do contexto, a
entrecruzar os fatos históricos com a história oral, a fim de desvendar a identidade da
comunidade do Cabula e entorno. O contexto sócio-histórico construído orientou a análise do
Portal TBC Cabula, nos permitindo, assim, perceber as lacunas presentes e projetar os
princípios de design do DCC, mediante as necessidades e características da localidade que se
constitui em principal público do referido ambiente web.
O contexto e os princípios conduziram os rumos posteriores, nos oferecendo subsídios
para iniciar o processo de validação da solução conceitual, que se pautou nos princípios de
comunicação comunitária, interatividade e participação criativa. Nesse sentido, buscamos
construir uma proposta de DCC que fosse capaz de conferir ao Portal TBC Cabula uma
estrutura interativa organizada fundamentada em soluções digitais capazes de potencializar a
socialização de saberes e fazeres da/sobre a comunidade do Cabula e entorno, principal mote
desse ambiente e do projeto de pesquisa e extensão a ele associado, o TBC Cabula.
Assim, para iniciarmos o ciclo de design, primeiramente, adentramos no cenário
acadêmico, com as colaborações de professores, graduandos e pós-graduandos que pesquisam
a localidade do Cabula e entorno e, posteriormente, no entorno da universidade. Um dos
principais desafios dessa fase da pesquisa foi como mediar esse processo de colaboração com
grupos tão distintos em seus interesses e especificidades. Nesse sentido, buscamos utilizar um
repertório de instrumentos de pesquisa flexíveis, à medida em que agregamos e/ou retiramos
elementos conforme as circunstâncias e as características dos grupos colaboradores.
Nas incursões com as comunidades de prática locais pude adentrar em bairros do
Cabula e entorno, até então desconhecidos, bem como interagir com grupos que ainda não
238

haviam estabelecido parceria com o projeto TBC Cabula. A experiência direta com os grupos
locais nos ensinou que o trabalho com comunidades populares requer paciência e
sensibilidade, foi necessário, assim, negociar a minha presença nesses espaços em que eu
figurava como uma acadêmica, estrangeira aos olhos de alguns.
Desconfiança, por sinal, é um sentimento que, geralmente, permeia as relações do
público externo estabelecidas com as comunidades populares. Tal fato ocorre mais como um
mecanismo de defesa ativado pelas adversidades que acometem os moradores, a exemplo dos
engodos político-partidários; a privação aos direitos sociais; a falta de oportunidades de
melhorias, etc, o que percebemos ao longo das vivências e diálogos estabelecidos. Nesse
contexto, o sentimento de comunidade e apoio mútuo surge como um alento aos sujeitos que
fazem parte dessa realidade. Uma alternativa de proteção, mas, sobretudo de sobrevivência.
Testemunhamos também a expectativa que alguns moradores constroem com a entrada
de representantes da universidade nessas localidades. A esperança em ter as suas necessidades
básicas atendidas de imediato, logo é depositada nas ações de pesquisa e extensão. Por isso,
há que se ter cuidado ao conduzir práticas de pesquisa aplicada com comunidades populares, a
fim de deixar evidentes as regras, os limites que demarcam o alcance da pesquisa e a
perspectiva de que não se trata de trabalho assistencialista, mas de uma construção com a
comunidade, visando o crescimento e fortalecimento de ambos os setores sociais.
Por isso, apreendemos o quão imprescindível é, nas relações acadêmico-comunitárias,
respeitar o tempo dessas comunidades, suas peculiaridades, entendendo que, quase sempre os
acordos e estratégias acadêmicas são incompatíveis às suas demandas. Daí a necessidade real
de se construir vias alternativas a esse encontro. A DBR favoreceu, assim, cadenciarmos o
ritmo adequado ao contexto da investigação, pois nos permitiu percorrer uma trajetória
flexível, aberta às inclusões e refazimentos, sintonizadas aos pontos que foram emergindo
com o avançar das relações colaborativas.
Chegamos ao término da validação com um repertório amplo de ideias e sugestões que
foram filtradas e deram contorno a proposta conceitual de DCC. Entretanto, os desafios
naturais do percurso foram acentuados com o início da aplicação das soluções construídas
com os colaboradores. O ciclo de prototipagem apresentou-se como uma fase intensa, na qual
experimentamos o duplo desafio de se desenvolver uma pesquisa que agrega os desejos e
especificidades de grupos comunitários com naturezas e propósitos distintos e, ainda, possui
natureza aplicada.
Sobre esse último aspecto é importante frisar a escassez de recursos para
investimentos e financiamentos a pesquisas que propõem a solução de problemas reais, bem
239

como o preconceito que a academia ainda lança sobre esse tipo de investigação. Assim, apesar
do compromisso social e o retorno de utilidade pública que as pesquisas aplicadas visam
alcançar, estas ainda são vistas com receio e implicância por grupos mais conservadores das
pós-graduações stricto sensu, uma vez que sugerem metodologias e procedimentos que
extrapolam aquelas legitimadas pelos cânones acadêmicos, ainda pautados nas pesquisas de
análise e levantamento bibliográficos.
O reflexo desse contexto é o número ainda baixo de pesquisas aplicadas sendo
desenvolvidas em âmbito de mestrado e doutorado, sobretudo, nos cursos que envolvem as
áreas de ciências humanas, que tradicionalmente, optam pelas pesquisas de análise. Ao tecer
esta crítica, não estamos desconsiderando a relevância dos estudos analíticos, apenas
sinalizando, a necessidade de avançarmos em discussões que apresentem soluções de
utilidade pública, de modo a aproximar a academia dos problemas reais e necessidades
cotidianas.
Outro aspecto que emerge desse contexto é o baixo número de editais para fomento de
pesquisas aplicadas de pós-graduandos, assim como os valores disponíveis para
financiamento. O valor recebido para o financiamento desta tese foi ponto decisivo para o
processo de prototipagem. A fim de aplicar o máximo de soluções sugeridas pelos
colaboradores foi necessário lançar mão de ciclos de refinamento que superaram as
expectativas projetadas. Convivemos com a rotatividade de profissionais; com os problemas
técnicos para a implementação das soluções e com uma infra-estrutura tecnológica limitada
que acarretou na morosidade dos processos de prototipagem. Adversidades que foram
reflexos das tentativas de conciliar altos custos com financiamento reduzido.
Tais entraves evidenciaram a necessidade de remodelarmos a nossa metodologia, que
viu enfraquecido o seu caráter cíclico tal como preconiza a DBR, em razão do tempo limitado
para os feed backs e implementação de novas aplicações necessárias. Apesar dos percalços
chegamos à definição do protótipo tecnológico já com o tempo de pesquisa avançado,
sinalizando a necessidade de seguirmos com a fase de avaliação. Entretanto, inevitavelmente,
o tempo alongado no ciclo anterior, trouxe como consequência a desarticulação com alguns
grupos colaboradores, que questionavam, frequentemente, sobre o destino do Portal, na
expectativa de datas e desfechos. Precisamos, desse modo, retomar diálogos e lidar com essa
situação inesperada, que foi superada mediante a mudança das estratégias de avaliação, mas
que assumiu novos arranjos.
Os resultados dos ciclos de avaliação indicaram que as soluções de DCC aplicadas ao
Portal TBC Cabula apresentaram um bom nível de avaliação por parte dos colaboradores
240

deste ciclo. Evidente que as circunstâncias de aplicação do questionário online não podem se
configurar em parâmetros definitivos para a análise das soluções aplicadas, especialmente,
pelo fato de não termos usado mecanismos de controle da interação dos colaboradores.
Entretanto, os pontos fortes e pontos a melhorar registrados, assim como as ideias
sugestionadas evidenciaram coerência e sintonia aos propósitos do Portal TBC Cabula, nos
permitindo alcançar informações relevantes para a revisão do DCC.
Ainda que a maioria dos dados obtidos tenha evidenciado, positivamente, as
características e potencialidades das soluções de DCC aplicadas, é importante destacarmos
que os pontos de melhoria indicados foram tão importantes quanto os pontos fortes
sinalizados, afinal, eles mobilizam a continuidade dos ciclos de aperfeiçoamento do protótipo
construído, o qual foi concebido para se tornar um ambiente de permanente construção
colaborativa. Salientamos, também, que as sugestões dadas, nos permitiram perceber outros
aspectos relacionados ao objeto da pesquisa e possibilidades para a ampliação de suas
funcionalidades e, consequentemente, melhorias para o Portal TBC.
Nesse sentido, ao responder o problema desta pesquisa, consideramos que as soluções
de DCC aplicadas, potencializam a socialização de saberes e fazeres do Cabula e entorno via
Portal TBC Cabula, pois, estão amparadas nos princípios de comunicação comunitária,
interatividade e participação criativa. Sendo assim, tais soluções agregam a esse ambiente
web uma estrutura de interação e informação, contextualizada, sintonizada aos interesses da
comunidade local e que possibilita a visibilidade de sua cultura e produções locais, além de
prover mecanismos de escuta e participação criativa, que potencializam práticas de
cooperação e colaboração por meio do referido ambiente.
Em contrapartida, vale ressaltar que não foi possível explorar com mais profundidade
as potencialidades do DCC, em vista das lacunas ainda evidenciadas no Portal TBC Cabula,
em especial, o número reduzido de conteúdos informativos e o baixo nível de apropriação da
comunidade às soluções aplicadas, que indicaram a necessidade de intervenções como ações
de marketing e metodologia colaborativa para a construção de conteúdos para o portal.
Embora escapem do raio de alcance desta pesquisa, tais lacunas atingem diretamente a
proposta aqui defendida, uma vez que a soluções de DCC elaboradas apenas irão adquirir
funcionalidade e movimento se conjugadas a aplicações em outros setores relacionados ao
portal.
Nesse sentido, o DCC se estabelece como uma estrutura nuclear para o alcance dos
objetivos do Portal TBC Cabula, mas que ainda encontra-se em estado de amadurecimento,
tendo em vista as lacunas presentes em outros setores do referido Portal, bem como
241

identificamos no decurso da pesquisa. Nesse sentido, para que o DCC atinja maturidade e
consolide o seu propósito de potencializar a socialização de saberes e fazeres da localidade do
Cabula e entorno, se faz necessária a interlocução mais incisiva com soluções de outros
âmbitos, que foram tencionados no processo de construção colaborativa, a saber: a) design da
participação; b) design da informação e c) design da interação.
Diante do exposto, compreendemos que o DCC cumpre com a sua função ao oferecer
novo sentido de orientação informativa e interativa ao Portal TBC Cabula, proporcionando a
esse ambiente a abertura para novos fluxos que venham a permitir o alcance de sua principal
pretensão: tornar-se um ambiente colaborativo de socialização científico-comunitária. Dessa
maneira, podemos considerar o DCC como ponto de partida para futuras projeções deste
ambiente, centro mobilizador e também mobilizado por áreas do Portal que ainda carecem de
intervenções, bem como evidenciamos no capítulo 6 desta tese. Lacunas, que a propósito,
podem se configurar em pretexto para espichar novas conversas.
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252

Anexo A – Parecer Consubstanciado do Comitê de Ética


253

Apêndice A – Termo de consentimento livre e esclarecido

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA (UFBA)


UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA (UNEB)
INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO CIÊNCIA E TECNOLOGIA DA BAHIA (IFBA)
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA (UEFS)
SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL (SENAI)

TERMO DE CONSENTIMENTOLIVRE E ESCLARECIDO


O
ESTAPESQUISASEGUIRÁOSCRITÉRIOSDAÉTICAEMPESQUISACOMSERESHUMANOS CONFORME RESOLUÇÃO N 466/12 DO CONSELHO
NACIONAL DESAÚDE.

I – DADOS DE IDENTIFICAÇÃO
Nome do Participante:
__________________________________________________________
Documento deIdentidadeno: ___________________________ Sexo: F ( ) M ( )
Data de Nascimento: / /
Endereço:
_____________________________________________Complemento:__________
Bairro: ___________ Cidade: __ CEP:
Telefone: () /() ___ /

II -DADOS SOBRE A PESQUISA CIENTÍFICA:

TÍTULODOPROTOCOLODEPESQUISA: DESIGN COGNITIVO DO PORTAL


TURISMO DE BASE COMUNITÁRIA (TBC):construindo práticas de difusão de saberes e
fazeres com a comunidade doAntigo Quilombo Cabula.

1. PESQUISADORA RESPONSÁVEL: Francisca de Paula Santos da Silva


Cargo/Função: Professora

III - EXPLICAÇÕES DO PESQUISADOR AO PARTICIPANTE SOBRE A


PESQUISA:
254

O (a) senhor (a) está sendo convidado (a) para participar da pesquisa: DESIGN COGNITIVO
DO PORTAL TURISMO DE BASE COMUNITÁRIA (TBC):construindo práticas de difusão
de saberes e fazeres com a comunidade do Antigo Quilombo Cabula, de responsabilidade da
pesquisadora Francisca de Paula Santos da Silva, docente da Universidade do Estado da Bahia
que tem como objetivomodelar um design cognitivo participativo que favoreça o engajamento
da comunidade do Antigo Quilombo Cabula em práticas de difusão dos saberes e fazeres
locais mediadas pelo Portal TBC.A realização desta pesquisa trará ou poderá trazer
oportunidades para a troca de múltiplos saberes entre a comunidade, a universidade, a
pesquisadora e demais atores que se disponham a participar do projeto de forma voluntária e
que tenham interesse na divulgação de saberes e fazeres da referida comunidade. Caso aceite
o senhor(a)seráentrevistado e responderá um questionário dadopela aluna Ivana Carolina
Alves da Silva Souza, do curso de Doutorado em Difusão do Conhecimento. Sua participação
é voluntária e não haverá nenhum gasto ou remuneração resultante dela. Garantimos que sua
identidade será tratada com sigilo e, portanto, o senhor (a) não será identificado.Caso queira
(a) senhor(a) poderá, a qualquer momento, desistir de participar e retirar sua autorização. Sua
recusa não trará nenhum prejuízo em sua relação com a pesquisadora ou com a instituição.
Quaisquer dúvidas que o (a) senhor (a) apresentar serão esclarecidas pela pesquisadora e o
senhor, caso queira, poderá entrar em contato também com o Comitê de Ética da
Universidade do Estado da Bahia. Esclareço ainda que de acordo com as leis brasileira o
senhor (a) tem direito a indenização caso seja prejudicado por esta pesquisa. O (a) senhor (a)
receberá uma cópia deste termo onde consta o contato dos pesquisadores, que poderão tirar
suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, agora ou a qualquer momento.

V. INFORMAÇÕES DE NOMES, ENDEREÇOS E TELEFONES DOS


RESPONSÁVEIS PELO ACOMPANHAMENTO DA PESQUISA, PARA CONTATO
EM CASO DE DÚVIDAS

PESQUISADORA RESPONSÁVEL: Ivana Carolina Alves da Silva Souza


Endereço: Rua Silveira Martins, 2555, Cabula. Salvador-BA. CEP: 41.150-000
Telefone: (71) 9404-0045, E-mail: ivanacarolina.souza@gmail.com

Comitê de Ética em Pesquisa- CEP/UNEB Rua Silveira Martins, 2555, Cabula. Salvador-
BA. CEP: 41.150-000. Tel.: 71 3117-2445 e-mail: cepuneb@uneb.br
255

Comissão Nacional de Ética em Pesquisa – CONEP SEPN 510 NORTE, BLOCO A 1º


SUBSOLO, Edifício Ex-INAN - Unidade II - Ministério da Saúde CEP: 70750-521 - Brasília-
DF

V. CONSENTIMENTO PÓS-ESCLARECIDO

2. Declaro que, após ter sido devidamente esclarecido pelo pesquisador(a) sobre os
objetivos benefícios da pesquisa e riscos de minha participação na pesquisa DESIGN
COGNITIVO DO PORTAL TURISMO DE BASE COMUNITÁRIA (TBC):construindo
práticas de difusão de saberes e fazeres com a comunidade do Antigo Quilombo Cabulae ter
entendido o que me foi explicado, concordo em participar sob livre e espontânea vontade,
como voluntário, consinto que os resultados obtidos sejam apresentados e publicados em
eventos e artigos científicos desde que a minha identificação não seja realizada e assinarei
este documento em duas vias sendo uma destinada ao pesquisador e outra a via que a mim.

________, ______ de _________________ de _________.

_____________________________________
Assinatura do participante da pesquisa

______________________________ ______________________________
Assinatura do pesquisador discente Assinatura do professor responsável
(orientando) (orientador)
256

Apêndice B – Questionário de avaliação do Portal TBC Cabula


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