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Chama Negra - Alyson Noel

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Sinopse

Ever está ajudando sua amiga Haven na transição de vida para imortal.

Porém, Haven está intoxicada com seus novos poderes e, descuidadamenéa

colocando todos em risco, a amizade delas esta cada vez mais ten a. Ao mesmo

tempo, Hver eeuamot mizm es ad


Ela rola os olhos e se encosta suas costas em seu acento, murmurando

baixinho enquanto eu tomo um momento para estudá-la de perto, consternada

com os sinais já presentes: sua pele pálida e luminosa, limpa, assim como

praticamente sem poros, seus cabelos castanhos ondulados, com uma mecha loura

na frente tão brilhante e lustrosa que serviria para um comercial de shampoo.

Mesmo seus dentes ficaram retos, brancos, eu não posso evitar, mas fico me

perguntando como isso aconteceu tão rápido, só com alguns goles de elixir,

quando levou muito mais tempo para mim.

Meus olhos ainda estão nela enquanto eu tomo um longo fôlego e desisto.

Esquecendo minha promessa de não usar meus poderes para investigar os

pensamentos mais íntimos dos meus amigos, enquanto eu o uso para obter uma

melhor aparência, um vislumbre de sua energia, as palavras que ela não

compartilha – com certeza espionar nunca foi uma boa justificativa, é agora.

Mas ao invés do meu acento na primeira fileira como de costume, eu estou

satisfeita em ficar junto à parede dura dos fundos do bar. Mesmo depois que eu

casualmente deslizo minha mão para frente e toco meus dedos contra os dela,

fingindo interesse no anel de caveira de prata que ela usa, eu não pego nada.

Seu futuro está escondido de mim.

— É tudo tão — Ela engole duro e olha em volta, olha!é


o m ara a fonte

borbulhante, a jovems e empurrando um carrinho enquanto goina ei lavdo i o


celular, as meninas saindo de uma loja de natação com os braços cheios de sacolas

– olhando para qualquer lugar menos para mim.

— Eu sei que é muito para absorver – mas mesmo assim — Eu dei de

ombros, sabendo tenho que fazer melhor, mas não sabendo como.

— Muito para absorver? É assim que você vê?— Ela balança a cabeça e bate

com os dedos no braço de metal da cadeira verde enquanto seu olhar me varre

lentamente.

Eu suspiro, desejando que eu fazer isso melhor, desejando que eu pudesse

fazer algo mudar tudo, mas é tarde demais para isso. Eu não tenho escolha, a não

ser lidar com a bagunça que eu fiz, — Eu acho que eu estava esperando que você

visse isso.— Eu dou de ombros. — Loucura. Eu sei.

Ela toma um longo fôlego, seu rosto tão estável, tão calmo, é impossível de

se ler, eu estou prestes a começar a pedir perdão, quando ela diz, — Sério? Você

me fez imortal? Como – sério mesmo?

Eu aceno com a cabeça, meu estômago com um nó de nervos enquanto

sento-me reta e puxo meus ombros para trás, me preparando para o golpe que

certamente estava vindo na minha direção. Sabendo que seja lá o que ela dê, seja

verbal ou psíquico, eu não tenho escolha a não ser aceitar. Eu não mereço nada

menos por destruir a vida dela, como ela sabe disso.

— Eu só — Ela suga o ar e pisca várias de vezes, sua aura invisível, que não
reagir. Isto não é o que eu esperava. Não era para isso que eu estava preparada.

Pensando que era exatamente sobre isso que Damen me alertou.

Damen – meu melhor amigo – minha alma gêmea – o amor de todas as

minhas vidas. Meu incrivelmente lindo, sexy, esperto, talentoso, e compreensível

namorado quem sabia que isso ia acontecer e implorou pra vir junto exatamente

por essa razão. Mas eu fui muito teimosa. Insistir em vir sozinha. Foi eu que fiz

isso com ela – eu que fiz ela tomar o elixir – então sou eu quem tem que explicar.

Só que não está acontecendo da forma que eu pensava. Nem perto disso.

— Eu quero dizer, é como ser um vampiro, certo? Menos os

sanguessugas?— Seus olhos brilhantes ansiosamente buscando os meus. — Oh, e

sem os caixões e não se expor ao sol também!— Sua voz se elevando em alegria.

— Isso é tão maravilhoso – como um sonho se tornando realidade! Tudo o que eu

sempre quis finalmente esta acontecendo! Eu sou uma vampira! Uma linda

vampira – mas sem os horríveis efeitos colaterais!

— Voc is e
e
serem alérgicos a alho.— Eu me inclino para ela. — Isso tudo foi adicionado para

dar um drama extra.

— Interessante.— Ela concorda, mas sua mente está claramente em outro

lugar.

— Eu ainda vou poder comer bolinhos?— Ela se movimenta em direção a

bagunça de morango amassado, uns dos lados cederam, achatados contra o seu

recipiente de papelão, enquanto o outro permanece macio, implorando para ser

comido. — Ou tem alguma outra coisa que eu supostamente deveria — Seus olhos

ampliam de tamanho, ela nem me da tempo de responder antes dela bater na

mesa e gritar. — Oh Meu Deus – é aquele suco, não é? Aquela coisa vermelha que

você e Damen vivem bebendo! É isso, não é? Então o que você está esperando! Me

dê um desses, vamos fazer isso oficial – eu mal posso esperar para começar!

— Eu não trouxe nenhum— eu digo, vendo o rosto dela cair em decepção

enquanto eu me apresso para explicar. — Escuta, eu sei que você pensa que tudo

isso é muito legal e tudo – e algumas dessas coisas são mesmo, não há duvida

sobre isso. Eu quero dizer você nunca vai envelhecer, não vai ter espinhas ou

rugas, você nunca vai ter que trabalhar fora, e você pode até crescer mais um

pouco – quem vai saber? Mas tem outras coisas também – coisas que você precisa

saber – coisas que eu tenho que explicar a fim de — Minhas palavras foram

interrompidas com a visão dela pulando para fora da cadeira de uma forma
rápida e graciosa, como se ela fosse um gato – ainda outro efeito colateral da

imortalidade.

Mudando de um pé para outro enquanto ela diz, — Por favor. O que há

para saber? Se eu posso pular mais alto, se eu posso correr mais rápido, nunca

envelhecer ou morrer – o que mais possivelmente eu vou precisar? Parece que eu

sou boa para ir por toda a eternidade.

Eu olho ao redor nervosamente, determinada a encobrir o entusiasmo dela

antes que ela faça alguma besteira – alguma besteira que vai chamar o tipo de

atenção que não queremos. — Haven, por favor. Sente-se. Isso é sério. Há mais

coisas a serem explicadas. Muito mais,— eu sussurro com palavras firmes e

brutais, mas que não surtem nenhum efeito. Ela apenas está lá diante de mim,

sacudindo a cabeça e recusando a ceder. Então, bêbada com seu novo poder

imortal, ela salta desafiadoramente e deliberadamente.

— Tudo é sério com você Ever. Até mesmo cada coisa que você diz ou faz é

tudo uma droga de grave. Eu quero dizer, sério, você me dá as chaves do reino,

em seguida, quando eu começar a colocar a chave lá você vem e me fala do lado

negro disso? Quão loucura isso é?— Ela rola os olhos. — Vamos lá, libera um

pouco, sim? Me deixe sair, fazer um teste drive, ver do que eu sou capaz. Eu vou

apostar uma corrida com você! A primeira que chegar ao meio fio ganha a

liberdade!
Eu balanço minha cabeça e suspiro, desejando que eu não precisasse fazer

isso, mas sabendo um pouco de força psíquica está em ordem. É a única coisa que

eu tenho para colocar um fim a tudo isso e mostrar-lhe quem realmente é

responsável por aqui. Estreitando os olhos, me concentro rígida em sua cadeira,

dirigi-la através do chão tão rápido, que força seus joelhos a cederem, fazendo-a

se sentar novamente.

— Hei – isso dói!— Ela massageia a perna e me olha.

Mas eu simplesmente dou de ombros. Ela é imortal, não é como se ela fosse

se machucar. Alem disso, há muito mais a se explicar e não vai sobrar muito

tempo se ela ficar agindo assim, então eu me inclino para ela, tendo a certeza que

eu tenho toda a sua atenção enquanto eu digo, — Confie em mim, você não pode

jogar o jogo se você não conhece as regras. E se você não conhece as regras,

alguém obrigatoriamente vai se machucar.

Capítulo 2

Haven atirou-se em meu carro, lançando seu corpo com força contra a

porta e apoiando seus pés. Franzindo as sobrancelhas, olhando furiosa e

murmurando uma lista de reclamações para mim, enquanto eu saía para a rua.

— Regra número um— eu olhei para ela, tirando meu longo cabelo loiro do

meu rosto, determinada a ignorar ela abertamente com um olhar hostil — Você

não pode contar para ninguém— eu pauso, permitindo as palavras perfurarem,


pelo menos fingir que você está comendo.

— Oh, como você?— ela olha para mim, sobrancelha arqueada, lábios

enrolados em um sorriso falso — Você sabe, quando você senta ali no almoço,

rasgando seu sanduíche em pedaços e esfarelando sua batata frita em pedacinhos

pensando que ninguém percebe? É aquilo que você tem feito todo esse tempo?

Preservando aparências? Cruzes, Miles e eu pensamos que você tinha apenas uma

desordem alimentar!

Eu tomo uma profunda respiração e focalizo em dirigir, mantendo minha

velocidade da luz, recusando deixá-la chegar a mim. Como o karma de Damen

sempre continua reivindicando que toda ação causa uma reação, isso é onde

minha ação tem me levado. Além do mais, se eu pudesse voltar no tempo de

novo, eu não iria mudar qualquer coisa. Eu faria exatamente a mesma escolha

como antes, por que não importa quão complicado esse momento possa ser, é

ainda melhor que estar presente ao seu funeral algum dia da semana.

— Oh meu Deus— ela olha para mim, sua boca aberta, olhos arregalados,

voz alta e estridente quando ela diz — Eu acho, eu acho que escutei isso!

Meus olhos encontram os dela, e apesar do fato dela estar abaixada, apesar

do fato de que o sol do verão do sul da Califórnia está batendo diretamente sobre

nós, minha pele fica instantaneamente resfriada.

— Isso não é legal, isso não é nada legal!

— Seus pensamentos! Você estava pensando algo sobre estar feliz por não

ir ao meu funeral, certo? Quer dizer, eu realmente escutei suas palavras em minha

cabeça. Isso é tão legal!


Eu imediatamente levanto meu escudo, barrando todo o acesso à minha

mente, minha completa energia, e tudo. Mais um pouco assustada pelo fato que

ela era capaz de fazer aquilo quando eu não podia ler a sua, e eu nem tinha tido a

chance de mostrar para ela como fazer seu escudo ainda.

— Então vocês caras não estavam zombando, vocês estavam? Sobre toda a

coisa de telepatia? Você e Damen realmente lêem a mente um do outro.

Eu acenei, devagar, relutantemente enquanto ela me analisava com seus

olhos que brilhavam mais do que nunca. O que uma vez foi um comum,

basicamente uma sombra marrom, freqüentemente escondida com loucas lentes

de contato, é agora uma brilhante redev o nha eo ma o, vo, a m


elbris
M
indicador enquanto uma Bentley1 preta pára ao nosso lado com um garoto de

nossa escola atrás do volante.

— Tudo bem, tudo bem, eu não irei contar para ele. Chillax ali, você viu?—

ela olhou nosso colega de classe, sorrindo, flertando e acenando, até ficar distante

enquanto ela soprava uma serie de beijos para ele, sorrindo quando ele fez o

dobro — A chave do segredo. Eu apenas costumo conversar com ele quando

coisas excitantes acontecem. Isso é tudo, é um hábito, eu tenho certeza que irei me

restabelecer, mas ainda, você tem que admitir, isso é uma maldição tão legal! Quer

1 Marca no segmento de carros luxuosos


(http://mundodasmarcas.blogspot.com/2006/09/bentley-

luxo-exclusivo.html)

dizer, como você reagiu quando você descobriu? Você não ficou completamente

empolgada?

Ela olha para mim, sorrindo quando ela acrescenta — Sem trocadilhos

Eu amarro a cara, empurrando o acelerador, mais do severamente que eu

pretendia. O carro balança para frente enquanto minha mente viaja de volta a

àquele primeiro dia, ou na última primeira vez que Damen tentou interromper a

vida, alterando as novidades no estacionamento lotado da escola. Mas eu não

estava pronta para escutar, e eu estava muito bonita, longe de estar animada com

isso. Então, pela segunda vez, ele insistiu em explicar nosso passado longo e
enrolado passado, eu ainda estava com dúvidas. Quero dizer, por um lado eu

achava que era muito legal que nós finalmente pudéssemos ficar juntos depois

séculos mantidos separa don-


a s or ur poo dado eua muito ara é
e tender,muits
para você?

— Haven, não é todo o divertimento e jogos, isso é...

— Sim, sim— ela rola seus olhos e bate na cadeira puxando os joelhos ao

peito enquanto ela envolve seus braços firmemente em torno deles — Há regras,

uma desvantagem, ouvi isso auto e claro— ela franze as sobrancelhas, pegando o

cabelo ao seu lado e torcendo em um brilhante cacho castanho.

— Mas Jesus, você nunca se cansa disso, de sempre estar tão

sobrecarregada, tão sobrecarregada no mundo? Quero dizer, você tem a melhor

vida! Você é loira, olhos azuis, alta, está em forma, é talentosa, oh, e ainda por

cima, o cara mais sexy do planeta acontece de ser loucamente apaixonado por

você!— ela suspira, perguntando como eu posso possivelmente ser tão cega à sua

verdade. — Quero dizer, vamos reconhecer, você tem o tipo de vida que as outras

pessoas só podem sonhar e ainda, você faz com que pareça o caminho para a

‗Cidade Porcaria‘. E honestamente, eu sinto muito dizer isso, mas acho que isso é

loucura. Porque a verdade é que me sinto fantástica! Eletrificada! Como um raio

passando pelo meu corpo da minha cabeça até os meus pés e de nenhum jeito eu

estou me juntando a você e sua jornada a ‗Ilha da Tristeza‘. De nenhum jeito eu

vou escapulir pelo campus com horrorosos capuzes e óculos com um ipod

praticamente estourando em minha cabeça como você costumava fazer. Quer

dizer, pelo menos agora eu sei porquê você fez isso, para evitar todas as vozes e

pensamentos, certo? Mas, ainda assim, de maneira nenhuma vou viver assim. Eu

quero abraçar isso, com ambos os braços, e também planejo chutar seriamente os

traseiros de Stacia, Honor e Craig se eles incomodarem a mim e meus amigos!—

ela se inclina para frente, braços nos joelhos e estreita seu olhar — Quando eu
completa irá trazer?

— Eu não sei— eu dou de ombros — Algumas coisas aconteceram por eu

morrer e parar em...— Seus olhos estreitaram esforçando-se para ler os meus

pensamentos, mas não ficando muito distante, graças ao escudo que eu construi.

— Bem, vamos apenas dizer que tive uma experiência de quase-morte. Isso

tende a mudar as coisas.

Eu viro em sua rua. Ela olha para mim, olhar fixo, intenso, dedos

vagarosamente tocando em um pequeno rasgo em sua legue enquanto ela diz —

Parece que você é o tipo que escolhe as coisas que você quer que eu saiba— ela

levanta sua sobrancelha, desafiando-me a negar. Mas eu não faço, apenas fecho

meus olhos e aceno. Então cansada de mentir e encobrir todo o tempo, é bom

admitir algumas coisas para uma mudança — Posso perguntar por que?

Eu levanto meus ombros e respiro fundo, forçando meu olhar a encontrar o

dela — É muito para pegar de uma vez. Algumas coisas precisam ser

experimentadas para entender enquanto outras coisas... bem, um monte disso

pode esperar, embora ainda há um par de coisas que você precisa saber.

Eu estaciono e remexo pela minha bolsa, dando uma pequena bolsa de

seda, que Damen me deu.

— O que é isso?— ela puxa o barbante, e coloca seu dedo dentro, soltando

um pequeno grupo de coloridas pedras preciosas unidas por fios de ouro fino, e
pendurado em um cordão de seda preta.

— Isso é um amuleto— eu aceno — É importante você usar isso todo o

tempo, todo dia de agora em diante.— Ela pisca os olhos, balançando para trás e

para frente, observando como as pedras capturam e refletem na luz do sol.

— Eu tenho um também— eu puxo a minha, revelando o meu próprio

cacho de pedras.

— Por que o meu é diferente?— ela dá uma olhada entre os dois,

comparando, tentando decidir qual é o melhor.

— Por que os dois não são o mesmo, nós todos temos diferentes...

necessidades, e usar estes irá nos manter a salvo

Ela olha para mim — Eles tem qualidades protetoras— eu dou de ombros,

sabendo que estou pisando em águas escuras. A parte que eu e Damen

discordamos.

Ela inclina sua cabeça e enruga sua face, incapaz de ler meus pensamentos,

mas sabendo que eu estou protegendo eles — Proteger de que exatamente? Quer

dizer, nós somos imortais, certo? Se eu não estou enganada isso significa que nós

iremos viver para sempre, e você está me falando que eu preciso de proteção?

Para me manter a salvo?— ela balança sua cabeça — Desculpa, Ever! Mas isso não

está fazendo nenhum sentido. De quem, ou do que eu deveria estar protegida?

Eu tomo uma respiração, assegurando-me que estou fazendo a coisa certa,

a única coisa na qual Damen consegue pensar. Esperando que ele perdoe o que

irei dizer — Você precisa estar protegida de Roman.


Ela balança sua cabeça e cruza os braços, se reusando a acreditar —

Roman? Isso é ridículo, Roman nunca iria me machucar.

Eu pasmo, mal acreditando nos meus ouvidos, especialmente depois de

tudo o que eu disse a ela.

— Desculpa, Ever, mas Roman é meu amigo,e não que isso seja da sua

conta, mas nós atualmente, bem, estamos no caminho de nos tornar mais do que

amigos! E uma vez que não é nenhum segredo que você o odiou desde o primeiro

dia, realmente não é tão surpreendente ouvir você dizer isso agora. É triste, mas

não me surpreendente.

— Eu não estou inventando.— eu encolho os ombros, aspirando por calma que

eu nem sequer posso invocar. Sabendo que levantando minha voz, tentando

forçar ela a ver as coisas do meu jeito, nunca irá uncionar com al ém
g teimosa

como ela.

— mM
— Não importa! O ponto é que você diz que ele estava tentando me matar,

mas ao invés de você ligar para o 190 você apenas ficou para ver por você mesma?

Quer dizer, e aí com isso? Obviamente você não levou isso muito a sério, então

por que eu deveria?

— Eu tentei ligar, mas isso era... complicado— eu balancei minha cabeça

— Isso era uma escolha entre... entre... alguma coisa que eu realmente preciso, e

como você pode ver, eu escolhi você.

2 Planta ornamental e de uso medicinal

Ela olha para mim, olhos arregalados, mente calculando, não dizendo uma

palavra.

— Roman prometeu me dar o que eu precisava se eu apenas deixasse você

morrer, mas eu não pude fazer isso, e então...— eu gesticulei para ela — Agora

você é imortal!

Ela balança a cabeça e olha em volta, se focando em um grupo de crianças

vizinhas dirigindo um carrinho de golfe para cima e para baixo na rua.

Permanecendo quieta por um longo tempo que eu estou prestes a falar quando ela

diz — Desculpe se você não conseguiu o que você queria Ever, realmente eu sinto,

mas você está errada sobre Roman! Não! De maneira alguma ele me deixaria

morrer! Sobre o que você disse, ele tinha o elixir pronto para mim caso você

escolhe-se diferente. Além do mais, eu acho que conheço Roman um pouco


melhor que você, e o fato é. . Ele sabe como eu estava infeliz com as coisas que

estavam acontecendo com minha família— Ela encolheu os ombros — Ele

provavelmente apenas queria me fazer imortal para me tirar dali, mas não queria

ser o responsável por isso, pois há um monte de encargos (ou obrigações) que

vem com isso. E eu não tenho dúvida que se você não tivesse me feito beber ele

teria interferido. Seja realista, Ever, você fez a escolha errada, você deveria apenas

ter chamado de blefe.

— Ele não é responsável por nada!— Eu murmuro, interiormente rolando

os olhos, tirando toda essa ladainha. Que escolha eu teria? Eu balanço minha

cabeça e começo de novo — Não é assim, ainda não terminei... é...— Minha voz

desvanece enquanto ela olha para longe, plenamente convencida de que ela está

certa e eu estou errada; e, já que eu tentei avisá-la sobre todo o perigo, sobre ele,

Damen provavelmente vai me culpar pelo o que eu direi em seguida.

— Bem, acredite no que você quiser, apenas me faça um favor. Se você vai

insistir em sair com Roman, então tudo que eu peço é que você sempre use o seu

amuleto. Sério, nunca tire ele! Para nada! ...E...

Ela olha para mim, sobrancelha levantada, porta entreaberta, desesperada

para sair do carro e ir pra longe de mim.

— E se você estiver realmente retribuindo a gentileza por eu fazer você

imortal...— nossos olhos se encontram — Então Roman tem algo que eu realmente
preciso ter de volta!

Capítulo 3

— Como foi?

Damen abre a porta antes que eu possa bater. Seu olhar profundo e intenso

me segue enquanto entro e caio em seu sofá de veludo de pelúcia e chuto meus

chinelos. Cuido para evitar olhar em seus olhos quando ele senta na almofada ao

meu lado, geralmente muito ansiosa para passar o resto da eternidade só olhando

para ele – tendo os melhores planos na sua face – suas bochechas altas esculpidas,

seu cabelo escuro ondulado e a franja grossa de cílios, mas não hoje.

Hoje eu prefiro olhar apenas para qualquer outro lugar.

— Então, você disse a ela?— seus dedos trilham ao longo do lado do meu

rosto, a curva da minha orelha, seu toque enchendo-me com ardor e calor, apesar

do véu de energia sempre presente que paira entre nós

— Será que o bolinho forneceu a distração que você esperava ? — seus

lábios beliscam o lóbulo da minha orelha, antes de trabalharem em seu caminho

para baixo do meu pescoço.

Eu me inclino para trás contra as almofadas, fecho os meus olhos em um

ataque simulado de fadiga. Mas a verdade é que eu não quero que ele me veja, me

observe muito de perto. Não quero que ele sinta meus pensamentos, minha

essência, a minha energia – a estranha vibração que está mexendo dentro de mim
nos últimos dias.

— Dificilmente— Suspiro — Ela praticamente me ignorou! Acho que ela é

como nós agora, em mais de uma maneira.

Sentindo o peso de seu olhar enquanto ele me estuda intensamente.

— Cuidado para elaborar?

Eu baixo o ruído ainda mais baixo e coloco a perna sobre a sua, a minha

respiração abranda como se eu acomodasse o calor da sua energia — Ela está

apenas tão avançada! Quero dizer, ela tem toda a aparência, sabe? Aquela

estranha aparência impecável, imortal. Ela ainda ouviu os meus pensamentos, até

os bloqueados.— eu fecho a cara e agito a minha cabeça.

— Estranho? É assim que você vê isso? Assim que nos vê? — claramente

incomodado com as minhas palavras.

— Bem, não é realmente estranho — Faço uma pausa, perguntando por

que eu me expressei assim — Mais como ‗não normal‘. Eu quero dizer, eu duvido

mesmo que até as super-modelos tenham aquele olhar perfeito o tempo todo. Sem

mencionar, o que vamos fazer, se ela crescer quatro centímetros praticamente

durante a noite como eu fiz? Como nós vamos possivelmente explicar isso?

— Da mesma maneira que fizemos com você — diz ele, os olhos apertados,

cautelosos, mais interessado nas palavras que eu não estou dizendo do que nas

que eu estou — Vamos chamá-lo de um surto de crescimento! Eles não são


incomuns entre os mortais, você sabe. — levanta sua voz em uma fraca tentativa

de leveza que não funciona muito bem.

Eu viro o meu olhar em direção às estantes lotadas, preenchidas com capa

de couro de primeiras edições, pinturas a óleo abstratas, a maioria delas originais

de valor inestimável, sabendo que é para mim. Ele sabe alguma coisa, mas eu

estou esperando que ele não possa perceber o quão longe ele vai. Que eu só estou

dizendo as palavras: atravessando os movimentos, realmente não investi em nada

disso.

— E então, ela te odeia como você temia?— pergunta ele, voz firme,

profundo, numa pequena sondagem.

Eu me igualo a ele, essa criatura maravilhosa que é glorioso me amou

durante os últimos quatrocentos anos e continua a fazê-lo, não importa quantos

erros que eu cometa, não importa quantas vidas eu bagunce.

Suspirando eu fecho meus olhos e manifesto uma única tulipa vermelha

que eu prontamente entrego. Serve não apenas como o símbolo do nosso amor

eterno, mas também como a aposta vencedora, uma aposta que fizemos.

— Você estava certo. Você ganhou— balanço a cabeça, lembrando de

como ela reagiu exatamente como ele disse.

— Ela está entusiasmada para além do que se pode crer! Não pode

agradecer-me o bastante! Ela se sente como se fosse uma estrela do rock! Não,
arrisco que melhor que uma estrela de rock! Ela se sente como uma estrela do rock

de vampiros! Mas, você sabe, o tipo novo e melhorado, sem todos os

sanguessugas desagradáveis e sem ter que dormir em um caixão. — balanço a

cabeça e sorrio, com ódio de mim mesma.

— Um membro do mítico mundo das criaturas?— Damen se encolhe, não

gostando nem um pouquinho da analogia. — Eu não tenho certeza sobre como

me sinto sobre isso.

— Oh, eu tenho certeza que é apenas um efeito colateral da sua recente fase

gótica. A emoção vai morrer desanimada eventualmente. Você sabe, uma vez que

a realidade se revele.

— É assim que é para você?— pergunta ele, apenas o dedo sob o queixo,

fazendo-me olhar para ele novamente — É a emoção de acabar morrendo, ou

talvez esteja mesmo sem esperança?

Seu olhar é profundo, sei que ele está em sintonia com cada mudança do

meu humor — É por isso que acha tão difícil olhar para mim agora?

— Não!— eu balanço a cabeça, consciente de que eu fui pega e desesperada

para refutá-lo — Eu só estou cansada. Eu estou me sentindo um pouco

sobrecarregada ultimamente, isso é tudo. — Eu me aconchego nele, enterrando o

meu rosto em seu pescoço, ao lado de onde o cordão do seu amuleto descansa.

Nos últimos dias eu vim a desenvolver um sentimento de irritável sobrecarga. —


como se fusão fosse o principal ingrediente em mim, enquanto inspiro seu cheiro

almiscarado e quente outra vez. — Por que cada momento não pode ser como

este?— eu suspiro, sabendo que o que eu realmente quero dizer é: ‗Por que não

posso ser sempre assim, ou me sentir assim?‘

Porque é que tudo está mudando?

— Pode— ele dá de ombros — Não há realmente nenhuma razão para que

não possa!

Eu me afasto e satisfaço o seu olhar — Oh, eu posso pensar em pelo menos

duas razões muito boas.

Apontando para Romy e Rayne, as gêmeas terríveis pelas quais agora

somos responsáveis, elas estão juntas embaixo das escadas. Idênticas em seus

cabelos escuros em linha reta com franja cortada com navalha, pele pálida, escura

e com seus grandes olhos, mas completamente opostas em suas roupas. Romy

usando um vestido de verão Terry cor de rosa com chinelos. Rayne vestida de

preto com os pés descalços, com Luna, seu gatinho preto minúsculo, viajando alto

em seu ombro. As duas tiram de Damen um sorriso feliz, quente e então olham

para mim, como de costume, praticamente a única coisa que não mudou por aqui.

— Elas virão por aí— diz ele, querendo acreditar e desejando que eu

também.

— Não, não.— suspiro, tentando encontrar meus chinelos — Mas, então,

não é como se elas não tivessem razões. — Eu deslizo sobre os meus sapatos e

olho para ele.

— Me deixando tão cedo?

Aceno, evitando seu olhar.


— Sabine está fazendo o jantar, Munoz está vindo, é um conjunto de coisas!

Ela quer que a gente se conheça melhor um ao outro. Você sabe, professor de

aluno menor, mais futuro nas relações sem sangue. — eu dou ombros, percebendo

o instante em que deveria ter convidado ele. É incrivelmente rude para mim não

incluí-lo. Mas a presença de Damen vai bagunçar os meus planos em outra noite.

Em uma que ele possa suspeitar, mas possivelmente não possa testemunhar.

Especialmente depois de deixar os seus sentimentos na minha incursão em magia

tão claros. Aderindo em uma embaraçosa: — Então, você sabe. . . — e deixar isso

ali, pairando entre nós, já que eu não tenho idéia de para onde levá-la de lá.

— E Roman?

Eu respiro fundo e meus olhos encontram os dele. O momento que eu

tenho evitado já esta aqui.

— Você quis alertar Haven? Disse a ela o que ele fez?

Eu aceno. Recordando o discurso que eu pratiquei no carro durante todo o

caminho, sobre como Haven poderia ser a nossa melhor oportunidade para

conseguir o que precisamos de Roman. Esperando que isso vá soar melhor aos

seus ouvidos do que ele fez a mim.

— E?

Eu limpo minha garganta, permitindo-me isso, mas nada mais.

Ele espera que eu continue, a paciência de seiscentos anos estampada em


seu rosto, ele espera eu abrir a minha boca para começar o meu discurso, mas não

posso. Ele me conhece muito bem. Então, ao invés disso, eu elevo meus ombros e

suspiro, sabendo que as palavras são desnecessárias, a resposta é exibida no meu

olhar.

— Eu vejo.— ele concorda, num tom suave, até mesmo sem um traço de

julgamento, o que causa um tipo de desilusão para mim.

Quer dizer, eu estou me julgando, então porque ele não estaria?

— Mas, na verdade não é como você pensa,— eu digo — Não é como se eu

não tentasse avisá-la, mas ela não ouviu! Assim eu pensei: maldição! Se ela vai

insistir em sair com Roman, então qual é o dano em tentar conseguir de Roman o

antídoto enquanto ela está com ele? E eu sei que você acha que é errado, acredite

em mim, nós já passamos por isso, mas eu ainda não acho que isso tudo não possa

ser um grande negócio.

Ele olha para mim, rosto calmo, ainda sem se trair de forma alguma.

— Além disso, não é como se nós realmente não tivéssemos nenhuma

prova concreta de que ele a deixaria morrer. Quero dizer, ele tinha o antídoto o

tempo todo, ele sabia o que eu escolheria. Mas mesmo se eu provar que ele estava

errado, como nós poderíamos saber se ele não teria dado o elixir a ela ele mesmo?

— eu respiro profundamente, mal acreditando que eu estou pegando emprestado

o argumento da Haven, o mesmo que recusei a apenas alguns momentos antes —


E então talvez ele ainda teria tentado virar a coisa toda a seu favor! Você sabe, ter

dito a ela que estávamos preparados para deixá-la morrer e acabar virando-a

contra nós! Você já pensou nisso?

— Não. Acho que não!— diz ele, estreitando as pálpebras, com a

preocupação nublando seu rosto — E não é que eu não vá acompanhar a situação,

porque eu estou totalmente. Eu vou me certificar que ela está segura. Mas ela tem

livre arbítrio, você sabe, não é como se nós pudéssemos escolher os amigos para

ela, então eu percebi, você sabe, quanto a Roman. . . e tudo mais. . . por assim

dizer. . .

— E sobre os sentimentos românticos que Haven tem com Roman? Você

considerou isso?

Eu dou de ombros, minhas palavras contendo uma convicção que eu

realmente não sinto quando eu digo: — Ela costumava ter sentimentos por você

também se você se lembrar. Ela parece ter superado tudo muito rapidamente. E

não se esqueça de Josh, o cara que ela estava convencida que era sua alma gêmea,

que foi arrancado por um gatinho. E agora que ela está em posição de ter muito

bem o que ou quem ela quer...— faço uma pausa, mas só por um momento, não

há tempo suficiente para ele responder— Tenho certeza de Roman perderá seu

fascínio e o modo slide vai continuar na sua lista. Quer dizer, eu sei que ela pode

parecer o tipo frágil, mas ela é realmente muito mais difícil do que você pensa.
Eu fico sinalizando um fim a esta conversa. O que está feito está feito e eu

não quero que ele diga ou faça qualquer coisa que me faça duvidar de minha

posição em relação à Haven e Roman mais do que eu já fiz.

Ele hesita, seus olhos se deslocam para mim, me levando, em seguida se

levanta rápido, e me move lentamente enquanto ele agarra a minha mão e me leva

a porta, onde ele pressiona os lábios contra os meus. Remanescentes, fundidos,

atrevidos, uma completa fusão. Nós dois estamos dispostos a fazer este beijo

durar enquanto nós pudermos, nem um de nós dois está disposto a romper

primeiro.

Eu me pressiono com força contra ele, nossos corpos perdem a força por

essa energia sempre presente, como um véu que paira entre nós. A vasta extensão

do seu peito, o vale de seu torso a cada polegada dele se encaixa tão bem em mim

que é quase impossível dizer onde ele termina e eu começo. Desejando que este

beijo pudesse fazer o impossível, banir os meus erros, esta forma estranha como

me sinto e afugentar a escuridão da nuvem de raiva que me segue por toda parte

estes dias.

— Eu deveria ir— eu sussurro, a primeira a quebrar a magia, consciente do

calor crescente entre nós, que puxa um incêndio. Uma lembrança dolorosa que,

por agora de qualquer maneira, isto é o máximo onde podemos chegar!

E quando eu já estou dentro do meu carro e Damen já voltou para dentro,

aparece Rayne, com Luna ainda empoleirada em seu ombro, Romy a irmã gêmea

ao seu lado.

— Esta é a noite em que a Lua passa para uma nova fase! — diz ela, os

olhos apertados, lábios desagradáveis. Sem outras palavras necessárias, todas nós
sabemos o que isso significa.

Aceno, deslocando em marcha ré, pronta para voltar a dirigir, quando ela

acrescenta — Você sabe o que fazer, certo? Você se lembra o nosso plano?

Aceno de novo, odiando o fato de que eu estou nesta posição, sabendo que

isso está longe do que elas estão interessadas, nunca vou viver nesta para baixo.

Volto a me dirigir para a rua, perseguindo os pensamentos delas atrás de

mim, em minha mente investigativa, enquanto elas pensam: ‗ É errado usar a magia

para o egoísmo, por razões nefastas. Não há karma para pagar, e ele vai voltar três vezes.‟

Capítulo 4

A primeira coisa que eu vejo quando eu paro na entrada é o Prius prata do

Munoz, o que, pra ser bem honesta, basicamente me faz querer dar meia volta e ir

pra qualquer outro lugar, mas eu não vou, só suspiro e entro na garagem, sabendo

que eu não tenho escolha a não ser encarar.

Encarar o fato que minha tia/ guardiã legal está se apaixonando sério pelo

meu professor de história. Encarar o fato que é um milhão de vezes melhor sentar

em volta da mesa de jantar do que da mesa de café da manhã, se as coisas


continuarem a progredir no ritmo rápido que estão, é apenas uma questão de

tempo antes de dizer adeus Senhor Munoz e olá Tio Paul.

Eu previ isso e é certo, agora estou apenas esperando que eles se dêem

conta.

Eu entro pela porta ao lado levemente na ponta dos pés esperando passar

pelo cômodo sem ser vista para que eu possa ter um tempo pra mim mesma,

tempo que eu preciso desesperadamente, para colocar algumas coisas em ordem.

Preparada e pronta pra arrancar lá pra cima, quando Sabine enfia a cabeça

no canto e diz — Oh bom, eu pensei ter ouvido seu carro na garagem, nós vamos

comer daqui a mais ou menos meia hora, mas porque você não vem aqui e nos faz

uma visita um pouco antes?

Eu olho por cima do ombro dela procurando pelo Munoz, mas graças à

parede que nos separa da sala de estar, tudo o que eu consigo ver é um par de

sandálias de couro masculinas empoleiradas sob a super cheia, poltrona

parecendo relaxadas e casuais como se não pertencessem a outro lugar se não

neste mesmo lugar. Mudando meu olhar pra ela e vendo a vassoura de cabelos

loiros que vão até os ombros, suas bochechas coradas e olhos azuis brilhantes e

renovando meu voto de ficar feliz por ela estar feliz, apesar de não estar

exatamente excitada pela razão por trás disso.

— Eu... eu já vou descer em um minuto.— Eu digo forçando um sorriso, —


Eu só vou me lavar e tal— meu olhar passa para Munoz incapaz de se afastar, não

importa o quão perturbadora é a visão, quer dizer, sério apenas porque é verão

não significa que eu deva ver os pés de membros do corpo docente na minha

própria casa.

— Okay, bem não demore — ela começa a virar com o cabelo balançando

sob os ombros, e ela acrescenta — Eu quase me esqueci, isso chegou do correio

pra você.

Ela pega um envelope da cor creme da mesa do lado e oferece pra mim, as

palavras impressas em roxo no canto esquerdo e, acima, meu nome e endereço

escritos nos garranchos angulares de Jude na parte da frente.

— Mystics & Moonbeans.

Eu fico parada lá encarando sabendo que eu podia agarrar, pôr minha mão

na frente, e intuir o conteúdo sem nem mesmo ter que retirar o lacre, mas o

negócio é o seguinte, eu não quero tocar, eu não quero ter nada haver com o

emprego que eu tinha antes ou Jude, o chefe que aparentemente teve um papel

significativo em basicamente todas as minhas vidas, reaparecendo de novo e de

novo sempre tendo a minha afeição, até Damen aparecer em cena e me carregar

pra longe. Um triângulo amoroso de séculos que terminou no segundo em que eu

vi a tatuagem de Ouroboros dele, na última quinta-feira.

E, apesar de Damen dizer que várias pessoas as possuem, e que a original

não era má de forma nenhuma, e que Roman e Drina apenas a fizeram assim, eu
não posso arriscar a chance de ele estar errado. Não posso arriscar a chance de

Jude não ser um deles, quando eu estou bem certa de que ele é.

— Ever?— Sabine entorta a cabeça e lança um olhar comum que diz: Não

importa quantos livros eu leia sobre o assunto, adolescentes poderiam ser aliens.

Um olhar que eu conheço muito bem.

Um olhar que me impulsion a eegar o envelope d e ão


M del M

cuid osamente
M elas
e pontas enr uantoM
eu dou m e
r o
coreografia de voltas e círculos no local perfeito na forma de oito, antes de cair

com uma pancada leve e vou em direção ao meu closet grande onde eu pego uma

caixa na prateleira de cima, aquela em que guardo os meus suprimentos, tudo o

que eu preciso pra desfazer o que eu fiz.

O tempo está correto, provendo um começo novo, a oportunidade perfeita

(a única oportunidade, segundo Romy e Rayne) de quebrar o feitiço que eu fiz

sem vontade quando acidentalmente chamei os poderes da escuridão para me

ajudar. A lua está crescendo agora o que significa que a Deusa está levantando,

fazendo a sua ascensão enquanto Hécate, a que eu equivocadamente chamei

antes, cai para o submundo onde ela marcará seu tempo até um mês a partir de

agora quando voltará o círculo cheio novamente.

Eu alcanço dentro da caixa retirando as velas, cristais, ervas, óleos e

incenso que eu vou precisar, usando o momento para organizá-los e colocando-os

na ordem em que eles serão usados, então eu tiro a roupa e me abaixo na banheira

para o banho ritual, trazendo junto um sachê cheio de angélica para proteção e

remoção de feitiços, junípero para banir entidades negativas e arruda, que ajuda

na cura de poderes mentais e quebra as maldições, junto com algumas gotas de

óleo de laranja, que promete banir o mal e remover toda a negatividade.

Afundando até o fim até meus pés atingirem a ponta e a água preencher ao

meu redor, pegando alguns cristais de quartzo claros e mergulhando eles


enquanto eu canto:

“Eu limpo e exijo esse meu corpo

Para que minha mágica possa se atar apropriadamente

Meu espírito renascido e pronto para voar

Permitindo que minha mágica tome posse esta noite”

Mas, ao contrário da última vez em que eu cedo ao banho e eu não

visualizo Roman na minha frente, eu não quero vê-lo até que eu esteja pronta, até

que seja absolutamente necessário, até que seja verdadeiramente a hora de

desfazer o que eu fiz. E mais cedo é um risco que eu não posso correr, desde que

os sonhos começaram eu não consigo confiar em mim mesma.

A primeira noite que eu acordei naquele suor frio e pegajoso com as

imagens de Roman ainda dançando na minha cabeça, eu estava certa de que era

resultado de uma noite horrível que eu havia tido, conhecer a verdade sobre Jude,

transformar a Haven dando o suco pra ela, mas o fato é que eles retornaram todas

as noites desde então, o fato de que ele se intromete não só nos meus sonhos de

noite, mas também de dia, o fato de que eles vêm acompanhados desse estranho

impulso estrangeiro que fica tocando constantemente dentro de mim, bem,

basicamente, me convenceu que Romy e Rayne estão certas.

Apesar de me sentir perfeitamente bem logo após o feitiço estar completo,

depois, quando tudo começou a se desenrolar, ficou bem claro que o dano que eu
havia causado era muito grande. Ao invés de ligar Roman a mim, eu me atei a ele.

Ao invés de me procurar para atender minha vontade, eu estou

procurando por ele vergonhosamente, desesperadamente. O que é algo que

Damen não pode saber nunca, ninguém pode saber. Não apenas prova o aviso

que ele deu mais cedo sobre o lado negativo da mágica, insistindo que não é algo

que devemos brincar, e que, amadores que imergem a si mesmos muito rápido,

freqüentemente acabam além de suas cabeças, e pode ser o fim de sua paciência

comigo, pode ser a última gota.

Eu respiro fundo e afundo mais pra baixo, gostando do jeito que a água

bate no meu queixo, enquanto eu me encharco de todas as energias de cura que as

pedras e ervas são feitas pra prover, sabendo que é apenas uma questão de tempo

antes de eu me livrar dessa não sagrada obsessão, e colocar tudo certo. E quando a

água começa a esfriar eu esfrego cada centímetro de pele esperando lavar embora

essa nova versão corrompida de mim para poder recuperar a velha, então eu saio

da banheira d ritma ds! nheirqu


a
me fazer de boba mais uma vez, quer dizer, se o problema real, como elas

afirmam, foi eu tecer um feitiço na noite da Lua Negra, então que diferença uma

simples faca faz?

Mas dessa vez, apenas pra me certificar, eu adiciono algumas pedras a

mais no seu cabo, adornando com Lágrima Apache, para proteção e sorte (o que

as gêmeas parecem convencidas que eu preciso muito), plasma para coragem,

força e vitória (sempre uma boa combinação) e turquesa para cura e

fortalecimento dos chakras (aparentemente o meu chakra da garganta, o centro do

discernimento, sempre foi um problema para mim). Então, salpicando a lâmina

com sal antes de corrê-la através da chama de três velas brancas, eu chamo os

elementos de fogo, ar, água e terra para mandar embora toda a escuridão e

permitir somente a luz, para empurrar todo o mal e apenas chamar o bem,

repetindo o canto três vezes antes de convidar o maior dos poderes mágicos para

ver que está feito, dessa vez, certa de que estou convidando o poder mágico certo,

intimando a Deusa ao invés de Hécate, a rainha do submundo, com três cabeças e

cabelos de cobra.

Limpando o espaço enquanto eu caminho três vezes ao redor dele,

segurando o incenso alto em uma das mãos e a adaga na outra, entrando no

círculo mágico e visualizando uma luz branca fluindo através de mim, começando

do topo da minha cabeça e descendo pelo meu corpo, pelos meus braços até a
adaga e pelo chão, tecendo círculos e descendo em volta, encorajando finas cordas

da mais brilhante das luzes brancas se enroscarem e crescerem se juntando até

formar uma, até que eu esteja embrulhada em um casulo prateado, uma rede

complexa da mais brilhante e cintilante luz que me sela completamente.

Eu me ajoelho no chão do meu limpo espaço sagrado, seguro minha mão

esquerda na minha frente enquanto eu traço a lamina ao longo da minha linha da

vida sugando uma afiada ingestão de respiração enquanto eu enterro a ponta

profundamente na minha carne e uma grande onda de sangue corre pra fora.

Fechando os olhos e rapidamente manifestando Roman sentado de pernas

cruzadas na minha frente, me tentando com seus irresistíveis olhos azuis e um

convidativo e largo sorriso, me esforçando para passar pela sua beleza fascinante

e apelo inegável e direto para o cordão encharcado de sangue amarrado no

pescoço dele. Um cordão encharcado com o meu sangue.

O mesmo cordão que eu coloquei lá na ultima quinta-feira à noite quando

eu criei um ritual similar, um que parecia funcionar até que tudo deu

tragicamente errado, mas dessa vez, tudo é diferente, minha intenção é diferente,

eu quero meu sangue de volta, eu tenho a intenção de me desvincular.

Eu me apresso pelo canto, antes que ele desapareça, cantando:

“Com esse nó que eu desfaço

Banindo a mágica diante dos meus olhos finos


Quando uma vez esse cordão esteve amarrado e apertado

Eu agora reverto pra acertar as coisas

Sua influência não mais potente agora de desprende de mim

Eu desato esse cordão e me liberto

Não permita que faça mal a ninguém enquanto eu mando embora

Essa mesma mudança terá influência hoje

Essa é minha vontade, minha palavra e meu desejo, que assim seja.”

Apertando meus olhos contra a força do vento do vendaval que gira

através do meu círculo, empurrando as paredes da minha teia até o limite delas

enquanto um flash de raios e trovões faz barulhos altos que são ouvidos por alto.

Minha palma direita erguida aberta preparada, meu olhar se tranca ao dele

enquanto eu mentalmente desfaço o nó no pescoço dele e chamo o sangue de

volta pra mim.

De volta pra onde se originou, onde pertencem, olhos se abrindo

excitadamente enquanto se forma um arco direto na direção do centro da minha

palma ferida, o cordão em volta do pescoço dele ascendendo, clareando até ficar

limpo e puro como o dia que começa.

Mas, assim que eu estou pronta pra bani-lo pra sempre, me libertar dessa

ligação profana, aquele estranho pulso estrangeiro, aquele odioso intruso

serpenteia dentro de mim com tanta força e determinação, me ultrapassando tão

rapidamente que eu não consigo parar.


O monstro dentro de mim acordado totalmente agora, ascendendo, se

esticando, com a sua fome pulsante demandando ser conhecido, causando um

colapso no meu coração tão violento que meu corpo treme, e mão importa o

quanta força eu lute contra ele, não adianta. Eu sou refém da cobiça dele, cativa de

seus desejos, eu sou inconseqüente, meu único propósito é conhecer todas as suas

necessidades, pra me certificar que sejam satisfeitas.

Assistindo desesperadamente enquanto o ciclo se repete novamente, meu

sangue diante, encharcando o cordão no pescoço de Roman até sucumbir

vermelho e pesado pingando um grosso traçado abaixo que vai até o peito dele e

não importa o que eu faça, não importa o quanto eu tente, não tenho como parar.

Não tem como parar a inegável atração do seu olhar, meus membros se

projetando na direção dele, não tem como parar o feitiço que me ata a ele.

O corpo dele é como um imã que procura somente por mim, fechando o

pequeno espaço entre nós em menos de um segundo e agora com os nossos

joelhos pressionados levemente juntos, nossas testas niveladas. Eu estou sem

defesas, impotente incapaz de conter esse insuportável desejo por ele. Ele é tudo o

que eu consigo ver, é tudo o que eu necessito.

Todo meu mundo reduzido ao espaço entre seus olhos e os meus. Seus

lábios convidativos a apenas na largura de uma lâmina de distancia, enquanto

esse atrevido, estranho, pulso estrangeiro me encoraja a ir em frente e nos unir


como apenas um.

Meus lábios se empurram a frente na direção dos lábios dele, se movendo

cada vez mais perto. Quando de algum lugar profundo que eu não consigo

alcançar exatamente, a memória de Damen, seu cheiro, sua imagem treme por

dentro, nada além de um breve flash de luz no meio dessa escuridão, mas ainda

sim o suficiente pra me lembrar de quem eu sou, o que eu sou e a razão pela qual

eu estou aqui. Apenas o suficiente pra me libertar desse cenário de pesadelo

horrível e gritar — NÃO!—

Eu salto pra trás me removendo dele... disso, movendo tão rápido e

violentamente que a rede a meu redor entra em colapso, enquanto as velas se

extinguem e Roman se dissolve da minha vista. O único sinal do que acabou de

acontecer é meu coração batendo, roupão manchado de sangue e as palavras

reverberando na minha garganta.

Não, não, não, Deus, por favor, não!

— Ever?

Eu olho ao redor do closet, meus dedos freneticamente apertando meu

roupão de seda agora manchado de sangue além de reparo, esperando que ela

apenas vá embora, me dê algum espaço, ou pelo menos tempo suficiente pra

descobrir isso.

— Ever, você está bem ai? O jantar está quase pronto, é melhor você
qualquer um que possa ver.

Foi muito ruim ter que explicar isso para Sabine. Especialmente depois de

ter engolido apenas três quartos de um peito de frango grelhado, uma porção de

salada de batata, o milho na espiga inteira e uma taça e meia de nenhum

refrigerante de que eu estava nem um pouco interessada, e que, no fim, só

pareceu levantar uma nova suspeita.

Sua voz totalmente alterada e esganiçada ficou completamente alerta

quando ela disse:

— Agora? Mas logo vai estar escuro. E você nem comeu direito!—

Seu olhar sempre atento pairando sobre mim, uma nova possibilidade

formada em sua cabeça – prática de bulimia!

Tendo descartado a anorexia e a bulimia claramente velha para explicar o

meu comportamento estranho e ainda mais estranho os meus hábitos alimentares

– Ela está em algo novo agora, não deixando nenhuma dúvida de que uma visita

para os corredores da nossa livraria local de auto-ajuda vai ser exprimida em sua

agenda no fim de semana.

E eu desejo que eu possa explicar isso para ela, sentar-se ao seu lado e

dizer: ‗Relaxe. Não é nada do que você pensa. Eu sou imortal. O suco é tudo que

eu preciso para sobreviver. Mas agora eu tenho um pequeno problema com

feitiços para resolver – não espere!‘


Mas isso nunca vai acontecer. Isso não pode acontecer. Damen foi claro

sobre como manter nossa imortalidade em segredo. E depois de ver o que

aconteceu quando ele deu isto em mãos erradas, eu tenho que dizer que concordo

cem por cento com ele.

Mas manter isso em segredo tem sido um dos meus maiores desafios, e é aí

que entra a corrida. Eu sou agora, oficialmente (ou pelo menos onde Sabine e

Munoz estão preocupados) uma pessoa que coloca uma camiseta, tênis e shorts e

vai para uma corrida á noite.

Uma boa desculpa saudável para ficar fora de casa e longe de Munoz, que

eu não posso ajudar, mas como uma pessoa, apesar de que eu nunca quis

conhecê-lo como uma pessoa.

Uma boa desculpa saudável para ficar longe de uma tia que é tão gentil,

atenciosa e prestativa para mim que eu não posso ajudar, mas me sinto a pior

sobrinha do mundo pelos problemas que causei.

Uma boa desculpa saudável para fugir de duas maravilhosas pessoas de

bom coração para que eu possa satisfazer uma mais escura, nada saudável,

obsessão.

Alguém que tem um poder sobre mim.

Alguém que eu estou determinada a derrotar.

Faço uma rápida curva a esquerda para próxima rua, observando como os

carros, o asfalto, as calçadas, as janelas estão todas salpicadas com o ouro polido

que o fim da tarde traz — o resultado da primeira e última luz do sol quando

tudo parece mais suave, mais quente, banhado pela névoa avermelhada do sol.

Meus músculos bombeando, os pés se movendo mais rápido, aumentando


a velocidade, apesar de eu conhecer melhor, apesar de eu tentar desacelerar — É

muito perigoso, arriscado demais, alguém poderia ver — e ainda sim eu continuo

indo. Incapaz de parar. Eu não me controlo mais.

Apontando para o meu destino como uma flecha de uma bússola, todo o

meu ser esta focalizado em um único ponto.

Carros, casas, pessoas — tudo ao meu redor é reduzido a um único borrão

alaranjado – eu passo rua após rua. Meu coração batendo com força contra meu

peito — mas não por causa da corrida ou esforço, porque a verdade é que eu mal

suo.

Este fio vivo dentro de mim está ansioso sobre a proximidade.

O simples fato de que eu estou quase perto- Quase lá.

Como um canto de uma sereia me impulsionando para a ruína incerta, e eu

não posso tentar obter com muita rapidez.

No segundo que o vejo, eu paro. Meu olhar estreita e tudo à minha volta

deixa de existir. Olhando para porta de Roman como uma besta, tento recuar.

Renovando a minha vontade de superar este estranho, estrangeiro pulso agora

batendo em mim, querendo apenas escorregar para dentro, casualmente,

facilmente, e confrontá-lo de uma vez por todas para que possamos pôr fim a tudo

isso.

Forçando-me a tomar respirações longas, profundas como eu chamo a


força que eu preciso. Só para ter que o primeiro passo quando ouço alguém

chamar meu nome, uma voz que eu nunca esperava ouvir de novo.

Ele vem em minha direção, cabeça inclinada para o lado, tão fria e casual

como uma brisa de verão. Seu braço esquerdo enfaixado e fortemente envolvido

em um sling azul marinho, parando desconfiado perto de mim, propositalmente

posicionando-se fora do meu alcance, quando ele diz, — O que você está fazendo?

Eu engoli seco, aliviada ao sentir a diminuição da pulsação, recuando, e

ainda me assusto percebendo que o meu primeiro instinto não seria com
*!
puserroacer
estar muito bem...

Eu balanço minha cabeça e rolo os olhos, — Boa tentativa Jude. Eu te dou

crédito pó isso!— babaca o que diabos você está falando com o olhar — Sério!

Fingindo preocupação por mim, fingindo uma lesão, você está preparado para ir

até o fim com isso, não é?

Ele franze a testa, cabeça inclinada de um modo que permite que alguns

pedaços de dreads castanho dourado caíssem sobre o ombro e as terras a poucos

centímetros, tímido de sua cintura. Seu rosto enganosamente bonito e amigável

todo enrugado e sério quando ele diz

— Acredite em mim, eu não estou fingindo. Eu queria que estivesse.

Lembra quando você me pegou como se eu fosse algum tipo de Frisbee e me

atirou para fora do seu quintal?— ele se movimenta em direção ao seu braço —

Este foi o resultado. Uma boa carga de contusões, uma fratura no rádio, e algumas

falanges seriamente contundidas – ou ao menos foi isso o que o doutor me disse.

Eu suspiro e balanço a cabeça. Não tendo tempo para esse tipo de charada.

Eu preciso encontrar Roman e mostrar a ele que ele não pode me controlar – não

significa nada para mim – mostrar para ele quem é o chefe por aqui. Claro que ele

que de alguma forma, ele é responsável por parte pelo que está acontecendo

comigo, e precisando convencê-lo a dar-me o antídoto e pôr fim a este jogo.

— Embora eu tenha certeza que todos os olhares e os sons muito


acreditáveis para a maioria das pessoas, infelizmente para você, eu não sou como

a maioria das pessoas. Eu sei mais. E o fato é você sabe que eu sei mais. Então

vamos só parar com essa perseguição, ok? Rogues3 não podem se machucar. Não

por muito tempo de qualquer jeito. Eles têm habilidades de cura instantânea, mas

então você já sabia disso, não é?

Ele olha para mim, as sobrancelhas se franzindo em confusão, enquanto ele

dá um passo para trás. E a verdade é que ele realmente ficou com o olhar

perplexo, devo dizer.

— Do que você está falando?— ele olhou ao redor, depois voltou a olhar

para mim — Rogues? Você está falando sério?

Eu suspiro, meus dedos batendo forte contra o meu quadril quando eu

digo, — Hum, O-lá? Os membros malvados da tribo de Roman? Anel de alguma

coisa?— eu balanço a cabeça e rolo os olhos — Não finja que você não é um

deles... Eu vi sua tatuagem.—

Ele continuou parado, aquela mesma confusão, uma expressão confusa

ainda estampada em seu rosto. E tudo o que eu pude pensar foi: ‗Boa coisa ele não

ser um ator, ele era péssimo. ‘

— Hum, O-lá! O Ouroboros? Nas suas costas?— eu rolo meus olhos — Eu

vi! Eu sei o que eu vi. Você provavelmente quis que eu visse, ou que outro motivo

teria para você me convencer a entrar no Jacuzzi com...— eu balanço minha

cabeça — Tanto faz, vamos apenas dizer que aquilo tudo me disse tudo o que eu

precisava saber. Tudo o que aparentemente você queria que eu soubesse. Então se

sinta livre para parar com o jogo a qualquer momento, eu já entendi tudo.

Ele está diante de mim, com a mão boa esfregando o queixo com seus olhos
vagando pelos lados como se estivesse procurando por ajuda. Como se isso fosse

ajudá-lo.

— Ever, eu tenho essa tatuagem há anos. De fato, eu...

3 Numa tradução livre, seria vampiros.

— Oh, eu aposto!— eu aceno, recusando-me a deixá-lo terminar — Então

me conte, há quanto tempo Roman transformou você? Que século terá sido?

Dezoito ou dezenove? Qual é, pode me falar. Apesar de ter sido há muito tempo,

eu tenho certeza que você nunca se esqueça de um momento como aquele.

Ele esfrega os lábios, incentivando as ondulações correspondentes a

primavera em vista, mas isso não me distrai; esse tipo de coisa não funciona mais.

Não que realmente tenha funcionado.

— Escute— diz ele, lutando para manter sua voz baixa e firme, apesar de

sua aura dizer tudo, tendo uma súbita mudança na direção obscura e

fragmentada, revelando toda a extensão de seu nervosismo — Honestamente, eu

não tenho idéia do que você está falando! Sério, Ever, no caso de você não ter

ouvido, isso está saindo um pouco da sanidade. E a verdade é, apesar de tudo

isso, apesar de todo este...— ele respira fundo — Eu realmente gostaria de ajudar

você , mas, bem ... Você parece bem apesar de todo esse negócio de rogues e tudo

mais— ele balança a cabeça — Mas me deixa perguntar uma coisa: se esse cara,

Roman é tão ruim quanto você diz, então porque você esta escondida do lado de
fora da loja dele procurando por todos os lados e aquecida como um cão à espera

de seu dono?

Eu olho entre ele e a porta, as bochecha ruborizadas, pulso acelerado,

sabendo que fui pega no ato, mas sem intenção de admitir.

— Eu não estou espreitando , eu estou...— eu aperto meus lábios juntos,

perguntando por que na terra estou me defendendo quando é ele que claramente

é o único que não é bom — Além disso, não é como se eu pudesse fazer a mesma

pergunta desde que, eu odeio quebrar isso, mas você está parado aqui também.—

meus olhos se estreitam para ele, tomando a sua pele bronzeada, os dentes da

frente ligeiramente tortos – provavelmente manteve assim de propósito, para

manter as pessoas afastadas – pessoas como eu. E aqueles olhos – aqueles incríveis

olhos azuis/verdes – os mesmos olhos que eu olhava há quatrocentos anos atrás.

Mas não mais. Não desde que eu descobri que ele é um deles. Agora nós estamos

oficialmente separados.

Ele encolhe os ombros e esfrega a tipóia protetora. — Nada sinistro, só indo

para casa, é tudo. Se você ainda se lembra, nós fechamos cedo nos sábados.

Eu estreito meus olhos, não acreditando nele nem por um segundo. É tudo

muito plausível. Quase acreditável. Mas não o bastante.

— Eu moro na rua.— ele se movimenta em direção a algum lugar

desconhecido ao longe, um lugar que provavelmente nem sequer existe. Mas eu


não o sigo. Meus olhos continuam nele. Eu não posso baixar minha guarda. Nem

por um segundo. Ele pode ter me enganado antes, mas eu sei melhor. Agora eu

sei o que ele é.

Ele dá um passo mais perto, devagar, com cautela, o cuidado de manter

uma distância segura, ainda assim fora do meu alcance. — Talvez nós possamos ir

tomar um café ou algo assim? Ir a algum lugar calmo, onde nós possamos sentar e

conversar? Você parece que precisa de uma pausa. O que você me diz?

Eu continuou estudando ele. Ele é persistente, vou dar esse crédito a ele —

Claro.— eu sorri, balançando a cabeça em assentimento. — Eu amaria ir a algum

lugar calmo, sentar, beber alguma coisa, e aproveitar um legal, e longo papo; mas

primeiro, eu preciso que você me prove algo.

Seu corpo fica tenso e sua aura – sua falsa aura – oscila, mas eu não compro

isso.

— Eu preciso que você prove que não é um deles.

Ele pisca, o rosto em uma nuvem de preocupação — Ever, eu não sei do

que você ...

Suas palavras cortadas pela visão do athame4 agora segurava na minha

mão. Incrustado de pedras preciosas, lidar com uma réplica exata do que eu usei

apenas algumas horas antes, imaginando que vou precisar de toda a sorte e

proteção das pedras pode proporcionar, especialmente se isso vai do jeito que eu

penso.

4 Athame: uma arma, faca, adaga. http://violetfairy.altervista.org/Athame1.jpg


— Há apenas uma maneira de provar isso,— eu digo, a voz baixa, olhar

fixo sobre o seu, dando um pequeno passo em frente que é logo seguido por

outro. — E eu vou saber se você me enganar, então nem tente! Oh, e eu

provavelmente deveria te alertar: eu não posso ser responsável por aquilo que vai

acontecer depois que eu provar que você esta mentindo. Mas não se preocupe,

como você sabe, isso só vai doer por um segundo ..

Ele me vê em movimento, indo direto para ele, e mesmo que ele tente o seu

melhor para sair do meu caminho, eu sou muito rápida, e eu estou perto dele

muito antes que ele mesmo perceba.

Aproveitando o braço bom e corto com meu athame através de sua pele,

sabendo que é apenas uma questão de segundos antes de o sangue parar de jorrar

e as beiradas da ferida se juntar novamente.

É só uma questão de tempo até que –

— Oh Deus!— eu sussurro, os olhos arregalados, a garganta seca,

observando quando ele vacila, tropeça e quase perde o seu equilíbrio.

Seus olhos viajam de mim e o corte em seu braço, ambos observando

enquanto o sangue escoa através de sua roupa e escorre para o chão, formando

uma piscina crescente e vermelha.

— Você é louca?— ele grita — Que diabos você fez?

— Eu...— minha boca aberta em choque, incapaz de formar qualquer


palavra, incapaz de desviar o olhar do horrendo corte que eu fiz.

Porque não cura? Porque continua a sangrar? Oh, merda!

— Eu... Eu sinto muito! Eu posso explicar... Eu...— eu chego mais perto

dele, mas ele se afasta, desajeitado, trêmulo, querendo não ter mais nada haver

comigo.

— Escute,— ele disse, pressionando a tipóia na ferida, tentando parar o

fluxo do sangramento, mas ele só está fazendo uma bagunça maior ainda. — Eu

não sei qual é a sua idéia, ou o que está acontecendo com você, Ever, mas nós

terminamos por aqui. Você precisa se afastar. Agora!

Eu balanço minha cabeça. — Deixe-me levá-lo ao hospital. Tem um posto

de emergência logo na rua de baixo... E eu vou...

Eu fecho meus olhos, manifestando uma toalha para prender contra a

ferida até que possamos obter alguma ajuda profissional. Observando enquanto

ele fica pálido e vacilante, sabendo que não temos mais tempo a perder.

Ignorando seus protestos, eu passo meu braço ao redor dele e o guio até o

carro que eu acabei de manifestar. Aquela estranha pulsação insistente acalmou

por agora, mas ainda me forçando a olhar por cima do meu ombro bem a tempo

de ver Roman observando através da janela, com os olhos brilhando, rosto

enrugado com uma risada, enquanto ele vira a placa da porta do ABERTO para o

FECHADO.
Capítulo 6

— Como ele está?

Eu atirei minha revista sobre a pequena mesa ao meu lado e me levantei.

Cuidadosamente abordando a enfermeira ao invés de Jude, desde que uma

simples olhada foi tudo que levou para perceber que ambos de seus braços

estavam agora pesadamente enfaixados, sua aura vermelha com fúria e suponho

raiva, e o olhar cruel nos seus olhos estreitos é de algum modo um indício. Ele

claramente não quer mais nada comigo.

A enfermeira parou, seu olhar percorrendo os sessenta e oito centímetros

entre minha cabeça e meus dedos.

Examinando-me tão de perto que eu não posso evitar me aninhar com

medo—não posso evitar imaginar o que exatamente Jude disse a ela.

— Ele vai conseguir.— ela diz, voz firme, eficiente, mas nem um pouco

amigável -— O corte percorreu todo caminho até o osso, chegando até a entalhá-

lo, mas estava limpo. E se ele tomar seus antibióticos vai continuar dessa maneira.

Ele sentirá uma boa quantidade de dor, mesmo com os remédios que dei a ele,

mas se ele tornar mais fácil, tendo um bom descanso, vai estar melhor em

algumas semanas.

Seu olhar se moveu até a porta e eu o segui. Bem a tempo de ver dois

membros uniformizados de Laguna Beach na minha direção, seus olhos passando


entre mim e Jude e parando quando a enfermeira acenou afirmativamente.

Eu a n e er aen nevdo a a uraao q aen e im an er er te enf uandr a ev ana


pedaço de papel, a ponto de entregá-lo para mim, até que ela pensou melhor e o

arrancou de volta. — Nós queremos evitar qualquer chance de infecção, mas a

melhor coisa que ele pode fazer agora é ir para casa e descansar — Ele

provavelmente vai cair no sono logo, então eu espero que você o deixe sozinho e o

deixe fazer apenas isso.— ela franze a testa seu olhar como um desafio.

— Eu vou,— mas eu estou tão assustada por seu jeito, pela polícia e pelas

palavras de Jude me defendendo que as palavras saem como um chiado.

Sua boca estava inclinada para o lado em desagrado, obviamente relutante

em deixar Jude sob meus cuidados ou a prescrição, mas ela tinha pouca escolha.

Eu segui Jude até lá fora, até o meu manifestado Miata, uma replica exata

do que eu costumava dirigir.

Sentindo-me estranha, nervosa, dificilmente capaz de olhar em seus olhos.

— Apenas saia e vire a direita. — ele diz, voz baixa, grogue, não dando

nenhuma indicação sobre o que ele estaria verdadeiramente pensando ou como

está se sentindo sobre mim. E apesar de sua aura ter amenizado aparentemente,

havia ainda um pouco de vermelho em suas bordas, um fato que apenas fala por

ele mesmo. — Você pode me deixar na praia Main. Eu me viro a partir dali.

— Eu não vou te deixar na praia Main.— eu digo, aproveitando um fleche

de luz para estudá-lo. E mesmo que esteja escuro lá fora, não havia maneira de

não perceber a cavidade sob seus olhos, o brilho do suor em sua testa, dois
inegáveis sinais de que ele estava sofrendo uma grande quantidade de dor -

graças a mim.

— Sério, isso é só, ridículo. — eu balancei minha cabeça — Só me diga

onde você mora e eu prometo te levar pra casa em segurança.

— Segurança?

Ele riu, uma espécie de riso irônico que vêm de algum lugar lá no fundo,

seus braços machucados descansando em seu colo quando ele diz — Engraçado,

você usou essa palavra duas vezes nos últimos cinco minutos, e para ser honesto,

eu estou me sentindo tudo, menos seguro perto de você.

Eu suspiro, olhando para o céu sem estrelas, acelerando pouco deixando de

lado meu pé de chumbo5 habitual de lado já que eu não quero assustá-lo mais do

que eu já o tinha feito.

— Ouça,— eu digo, — Eu... Eu sinto muito! Realmente e

verdadeiramente... sinto!— olhando para ele por tanto tempo, que ele acenou

nervosamente para a rua.

— Uh, tráfego?— ele balança a cabeça — Ou você controla isso também?

Eu desviei o olhar e tentei pensar no que dizer.

— É aqui em cima, à esquerda. A de portão verde. Só estacione aqui e eu

estou bem para seguir.

Eu faço como ele diz, parando perto de uma porta de garagem com o tom

de verde igual ao do portão, desligando imediatamente o motor, o que o leva a

dizer — Oh não. — Ele olha para mim. — Não tem necessidade disso, acredite em

mim, você não está entrando.

Eu dou de ombros, olhando através dele, querendo abrir a porta de


maneira antiga, ao invés da forma tele cinética, percebendo como ele estremece

quando meu braço vira muito perto dele.

5 Por acelerar demais, ir muito rápido

— Ouça,— eu digo, de volta ao meu lugar — Eu sei que você está cansado,

e eu sei que você quer ficar mais longe de mim possível, o mais rápido que puder,

e eu não posso dizer que te culpo, se eu fosse você , eu me sentiria da mesma

maneira. Mas ainda sim, se você pudesse me dar apenas mais alguns segundos do

seu tempo, eu realmente gostaria de uma chance para explicar.

Ele balbuciou sobre sua respiração, olhando pela janela até que se virou

para mim de um jeito que me dirigia sua total e indivisível atenção.

E sabendo que eu tinha que ir rápido, que ele me daria apenas alguns

segundos e nada mais, eu digo — Ouça, é que... Eu quero dizer, eu sei que isso vai

soar como loucura e eu realmente não posso entrar em detalhes, mas você tem

que acreditar em mim quando eu digo que eu tinha realmente bons motivos para

pensar que você era um deles.

Ele fechou seus olhos por um momento, sobrancelhas torcidas em dor,

olhando para mim quando ele diz, — Um trapaceiro. Sim. Você fez o seu ponto,

Ever. O fez abundantemente claro, se lembra?— ele olhou entre seus braços

machucados e eu.

Franzi meu nariz e friccionei meus lábios juntos, sabendo que a próxima
parte não seria mais fácil, mas seguindo em frente quando digo — É, bem, veja, a

coisa é que eu pensei que você era mal. Sério. É o único motivo que eu fiz o que eu

fiz. Quero dizer, eu vi sua tatuagem e tenho que dizer que foi muito convincente.

Bem, exceto pelo fato de que não se mexeu ou tremeu ou algo assim, mas ainda

sim, isso, e o fato de que Ava ligou, e, bem algumas outras coisas que eu não

posso explicar, mas mesmo assim, tudo isso me fez pensar que você... — eu

balancei minha cabeça, sabendo que não estava chegando em lugar nenhum com

isso e escolhendo apenas pular isso, indo para um assunto que me intrigava desde

que deixamos o hospital — Sabe, se você está tão furioso comigo, se você me

odeia tanto, porque você me ajudou lá? Por que você mentiu para os policiais e

levou toda a culpa? Quero dizer, fui eu que machuquei, nós dois sabemos disso,

até eles sabem que eu fiz isso. Mas mesmo assim, você arruinou sua chance de me

ver algemada e arrastada para longe e jogou isso fora quando mentiu em meu

nome. E para ser sincera, eu não entendi isso.

Ele fecha os olhos e inclina sua cabeça para trás, sua dor fática é tão

palpável, que eu estou a ponto de deixar isso de lado, dizer a ele que não importa,

apenas vá para dentro e descanse, quando ele eleva seus incríveis olhos verdes

diretamente nos meus e diz — Ouça, Ever, aqui está a coisa... Por mais louco que

isso soe eu estou pouco interessado no porque você fez isso, mas sim em como

você fez.
Eu olho para ele, dedos segurando o volante, incapaz de falar.

— Como você me atirou como um Frisbee através do seu quintal...

Eu engulo duro, olhos fixados a frente, sem dizer uma palavra.

— E como em um momento você está parada na minha frente, de mãos

vazias, nenhum bolso a vista e a próxima coisa que eu sei é que você está

segurando uma faca de dois gumes, com jóias no cabo, que por sinal, desapareceu

da mesma maneira depois que você me atacou. Estou certo?

Eu respirei fundo e acenei. Não havia porque mentir agora.

— E então tem o pequeno fato de que você ligou seu carro sem uma chave,

e nós dois sabemos que esse tipo de carro, esse modelo em particular

definitivamente precisa de uma. E não se esqueça do primeiro dia quando te achei

na loja, apesar de que a porta estava trancada, sem contar o quão rápido você

achou O Livro das Sombras, que estava protegido por um bloqueio. Então,

esqueça todo o resto, esqueça as desculpas e explicações e todas as coisas sem

sentido, o que está feito está feito, não tem volta. Tudo o que eu quero é a

explicação de como. É nisso que eu estou realmente interessado.

Eu olho para ele, engolindo duro, insegura de como continuar. Tentando

uma piada fraca quando eu digo — Ok, mas primeiro, me diga, esses remédios

para dor não te chutaram ainda?— dando essa horrível risada que só serve para

deixá-lo furioso.

— Ouça, Ever, se você decidir ser honesta, você sabe onde eu moro. Caso

contrário...— ele tentou abrir a porta, tentou uma grande e corajosa saída
dramática, mas com ambos os braços enfaixados, isso não é tão simples quanto

parece.

Então eu salto do meu lado para o dele, aparecendo ao seu lado antes que

ele possa ao menos piscar e esperando que ele não veja isso como uma ameaça a

sua masculinidade quando eu digo — Aqui, permita-me.

Mas ele apenas continua sentado, suspirando e balançando sua cabeça

quando ele diz — E então é claro, tem essa...

Nossos olhos se encontrando e eu segurei a respiração.

— O jeito que você se move rápida e graciosamente como um gato

selvagem.

Eu fiquei parada lá, em silencio e ainda sem saber o que vinha em seguida.

— Então, você vai me ajudar ou não?

— Claro. — eu acenei, olhando para ele — Só me dê as chaves.

Seu olhar em mim — Desde quando você precisa de chaves?

Eu dou de ombros, descendo através do estreito caminho, levemente

iluminado que leva até a sua porta, tendo uma incrível variedade de peônias

vibrantes de rosa e roxo quando eu digo — Eu não tinha idéia que você era um

amante da natureza.

— Eu não sou. Bem, não realmente. Lina plantou tudo. Eu apenas mantive

isso. Nós cultivamos as maiorias das ervas da loja aqui.— ele faz menção à porta,
obviamente cansado disso, cansado de mim, louco para entrar e acabar com tudo

isso.

Então eu fechei meus olhos, vendo a porta aberta até escutar um click

inconfundível e o levei para dentro. Então eu fiquei parada lá, feito uma idiota,

fazendo isso como se só tivesse vindo deixá-lo após um agradável picnic.

Relutante em me mover até mesmo depois que ele balançou a cabeça e fez menção

para eu entrar, obrigando um firme convite verbal antes de me atrever a ir mais

longe.

— Você vai me atacar novamente?— seu olhar navegando por mim,

enchendo-me com uma onda de calma.

— Só se você sair da mão. — dou de ombros.

— Isso foi um trocadilho?— ele pisca os olhos, seus lábios se curvando

levemente.

Eu ri — Sim, e um realmente ruim.

Ele se inclina sobre o batente da porta, olhando-me devagar, sem pressa, e

tomando uma longa e profunda respiração antes de dizer - — Ouça, eu odeio

admitir, especialmente para você de todas as pessoas, desde que você já me

afeminou o suficiente por uma vida toda, mas eu talvez vá precisar de uma

ajudinha. Os remédios estão me pegando e eu não sou muito bom quando sóbrio

e com apenas uma mão, então eu mal posso imaginar fazer isso agora. Isso só vai
levar um minuto, dois no máximo, e então você pode voltar para o Damen e para

sua própria noite.

Eu franzi a testa, imaginando porque ele disse isso. Ligando as luzes e

fechando a porta atrás de mim enquanto eu o seguia para dentro, olhando ao

redor do pequeno acolhedor espaço, espantada de encontrar-me dentro dessa real,

autêntica casa de Laguna Beach. As lareiras de tijolos antigos e grandes janelas

panorâmicas. O tipo que você não vê mais nessas partes.

— Legal, não é mesmo?— ele acenou, lendo meu rosto — Foi construído

em1958, Lina pagou barato aqui, a um longo tempo atrás, depois de muito

dinheiro investido e reality shows rodados aqui.

Vou em direção da porta de vidro deslizante que dava a visão de um

agradável pátio de tijolos que conduz a uma encosta gramada, um conjunto de

escadas e a visão de um oceano iluminado pelo luar.

— Ela aluga para mim por uma merreca, mas meu sonho é comprá-la

algum dia. Ela diz que só vai me vender se eu prometer não transformar num

duplex toscano. Como se eu fosse fazê-lo.— ele ri.

Afasto-me da janela e passeio por sua cozinha, ligando uma luz e abrindo

alguns armários até achar um que tivesse um conjunto de copos. Olhando em

volta, procurando por uma garrafa d‘água, apenas para encontrá-lo tão perto que

eu posso ver cada mancha individual de seus olhos.


— Não seria mais fácil só manifestar isso?— ele diz, sua voz áspera, baixa e

intensa.

Eu olho para ele, incerta sobre o que mais me incomodava, a proximidade

dele, o desejo em sua voz ou a forma que ele foi capaz de deslocar-se sobre mim.

— Eu... Eu pensei que apenas podia fazer isso da velha maneira... Está

bem? Garanto que vai ter o mesmo gosto. — eu murmurei, as palavras

desajeitadas em meus lábios, esperando que ele estivesse mergulhado em seus

remédios para dor, para que não percebesse como sua presença me afeta.

Ele continuou parado lá, olhar firme, não indo nem um passo para longe.

Voz grogue e profunda quando ele diz, — Ever... O que você é?

Eu congelei, os dedos tão firmes ao redor do copo que eu estava com medo

de que talvez quebrasse em minha mão. Concentrando-me no piso frio, na

pequena mesa à direita, o espaço profundo do outro lado, qualquer lugar menos

nele. O silêncio ficando grossamente palpável entre nós e eu só queria quebrar

isso quando digo — Eu... Eu não posso te contar.

— Então, não é apenas o livro, tem algo... Mais.

Meus olhos encontraram com os dele, imediatamente reconhecendo meu

erro, como eu basicamente acabei de admitir que não sou totalmente normal

quando eu poderia apenas ter culpado a mágica instantânea. Mas a verdade é que

ele não teria comprado essa. Ele sabia que havia algo mais desde o dia em que nos

conhecemos, muito antes de me emprestar aquele livro.

— Porque você não me disse que O Livro das Sombras era escrito em

código?— eu digo, olhos estreitos, o colocando de volta na defensiva.

— Eu disse— ele desviou o olhar e se afastou, aborrecimento estampado


em seu rosto.

— Não, você me disse que estava escrito no código de Theban, que tinha de

ser intuído para ser entendido. Mas você falhou em mencionar que estava na

verdade protegido por um código... Um código que tem que ser quebrado para

assim poder ver o que realmente contém. Então, o que há? Porque você não me

disse nada a respeito? Esse é um detalhe grande demais para ser deixado de fora,

você não acha?

Ele inclina-se sobre o balcão de azulejos, sacudindo a cabeça quando ele diz

— Com licença, mas eu estou sob suspeita de novo? Porque me corrija se eu

estiver errado, pois eu estava com a impressão de que quando você me cortou,

você ficou determinada que eu era um dos bonzinhos.

Eu cruzei meus braços e semicerrei os olhos.

— Não, eu determinei que você não era um trapaceiro. Eu nunca disse que

você era bom.

Ele olhou para mim, buscando por paciência, mas eu ainda estava longe de

terminar — E você também falhou em mencionar como você conseguiu o livro,

como acabou em suas mãos.

Ele dá de ombros, olhar fixo, voz firme, controlada, quando ele diz — Eu

lhe disse. Eu consegui com um amigo, alguns anos atrás.

— E esse amigo tem um nome, como talvez Roman, a propósito?


Ele ri, mas sai mais parecido com um grunhido. Seu aborrecimento soando

alto e claro quando ele diz — Oh, você vê, você ainda acha que eu faço parte de

tudo isso. Bem, me desculpe por dizer isso então Ever, mas eu achei que

estávamos claros com relação a isso?

Eu entrelacei meus braços sobre meu peito, permitindo que o copo

balançasse por meus dedos.

— Ouça, Jude, eu gostaria de poder confiar em você, sério eu deveria. Mas

na outra noite quando... — eu parei, me dando conta que não poderia continuar

nessa direção — Bem, de qualquer maneira, Roman disse algo sobre esse livro

uma vez tivesse pertencido a ele, e eu realmente preciso saber se foi dele que você

o conseguiu; se ele de alguma maneira ele o vendeu para você.

Ele me alcança, os poucos dedos que ainda estavam funcionando tiraram o

copo de meu alcance.

— Minha única conexão com Roman é por você. Eu não sei mais o que te

dizer, Ever.

Eu estreitei os olhos, analisando sua aura, sua energia, sua linguagem

corporal, somando tudo isso em quanto ele vai em direção a pia, chegando à

conclusão de que ele está dizendo a verdade, não escondendo nenhuma coisa.

— Torneira?— eu perguntei, vendo-o olhar sob seu ombro para mim — Já

ée um tempo de e que vi alguém fmendo isso, de e que deixei Ore ra


— Eu sou um cara simples, o que eu posso dizer?— ele toma um gole

generoso, acabando rapidamente antes de se virar e encher o copo novamente.

— Então é serio, você não sabia sobre os livros?— eu o sigo, vendo como

ele se dirige a um antigo sofá marrom e prontamente se despenca sobre ele.

— Para ser honesto praticamente tudo que você falou desde que eu corri

para você tem sido um mistério. Nada disso faz sentido. Normalmente, eu apenas

te dou o benefício da dúvida e culpo os remédios, mas eu me lembro de você

falando disso loucamente pouco antes de resultar nisso.

Eu franzi, me sentando na cadeira oposta a ele sustentando meus pés sobre

uma elaboradamente talhada porta antiga que ele usa como mesa de café. — Eu

sou... Eu queria poder explicar isso... Eu sinto como se eu te devesse isso tudo.

Mas eu não posso. É... É complicado. Coisas que envolvem...

— Roman e Damen?

Eu semicerro os olhos, imaginando porque ele disse isso.

— Só um palpite. — ele dá de ombros — Mas pelo olhar no seu rosto, um

bem sucedido.

Eu pressiono meus lábios juntos e olho através da sala, tendo em vista altas

prateleiras de livros, um velho som, e algumas artes interessantes, mas sem TV.

Não confirmando nem negando sua declaração ao dizer — Eu tenho esses

poderes. Coisas além das psíquicas que você já sabe a respeito. Eu posso fazer as
coisas se moverem...

— Telequinesia.— ele acena, olhos fechados agora.

— Posso fazer coisas aparecerem.

— Manifestação, mas no seu caso instantânea. — Ele abre apenas um olho

para espreitar para mim — O que me faz imaginar... Porque o livro? Você tem o

mundo a seus pés. Você é bonita, inteligente, abençoada com todos os tipos de

poderes, e eu posso apostar que seu namorado esconde alguns dons também...

Eu olho para ele. Essa é a terceira vez que ele o mencionava, e isso me

incomodou tanto quanto da primeira vez — Qual é o seu problema com

Damen?— eu pergunto, imaginando se ele está entre nós, se de alguma maneira

ele sente algo sobre o longo e conturbado passado que nós três dividimos.

Ele se ajeita, colocando seus pés sobre o acolchoado e uma almofada por

baixo da cabeça — O que eu posso dizer? Eu não gosto dele. Tem apenas... Algo

sobre ele. Só não colocaria meu dedo nisso.

Virando sua cabeça para olhar para mim quando ele adiciona — Isso não é

um trocadilho, e você pediu por isso. E se há algo mais que você queria saber, essa

é a sua chance. Esses medicamentos realmente estão me pegando e me deixando

alto, então você pode querer aproveitar em quanto eu não sou derrubado,

enquanto eu ainda estou disposto a falar fácil e rapidamente.

Eu balancei minha cabeça, já tento tido todas as respostas que eu precisava

quando o peguei na calçada algumas horas atrás. Mas agora talvez fosse a hora de

eu mesma compartilhar algumas verdades — ou pelo menos levá-lo até a verdade

para ver se ele percebe.


cadeira e fui em sua direção, agarrando a coberta sobre seus pés e

cuidadosamente a arrumando para que o cobrisse completamente.

— Durma um pouco, — eu murmurei — Eu vou achar sua prescrição

amanhã, não se preocupe. Apenas fique aqui e descanse.

Sabendo que ele deveria, ir para algum outro lugar mas querendo

assegurá-lo e nada mais.

6 São formações rochosas que ocorrem em rochas sedimentares e certas rochas vulcânicas.
São essencialmente cavidades que se formam nas rochas, apresentando-se revestidas por
formações cristalinas

Aconchegando o cobertor sob seus pés quando ele diz — Ei, Ever! Você

nunca me respondeu, sobre o livro. Por que você queria esse livro quando você já

tem tudo que você possivelmente poderia querer?

Eu congelei, contemplando o cara que eu conheci por tantos séculos, tantas

vidas, que surgiu mais uma vez. Sabendo que deveria ter uma razão, para tudo

isso que eu tenho visto e experimentado até agora, o universo não é tão aleatório

quanto parece. Mas a coisa é, eu não sei a razão. De fato, eu não sei mais de nada.

Tudo que eu sei é que eles não poderiam ser mais diferentes. A presença calma de

Jude é exatamente o oposto da mistura de formigamento e calor de Damen. Como

yin e yang. Opostos no mais puro grau.

Eu terminei de ajeitá-lo, esperando que ele adormecesse novamente antes

de me dirigir até a porta, dizendo — Porque eu não tenho tudo que eu quero.
Nem de perto.

Capítulo 7

— Eu sabia que havia alguma coisa com vocês o tempo todo.

Especialmente você. — ela aponta para Damen — Desculpe, mas ninguém é

perfeito.

Damen sorri, abrindo a porta e apontando-nos para dentro, seu olhar

profundo escuro me cercando como um abraço de amante, me regando com um

dilúvio telepático de tulipas vermelhas pretendendo fornecer a coragem e a força

que eu, obviamente, irei precisar.

— E só assim você sabe, eu vi isso. — Diz Haven, fortemente cercando os

dedos agarrando seus quadris com roupas de couro, os olhos dardejando entre

nós, antes de balançar a cabeça e carregando no hall de entrada.

Damen olhou para mim, levantou as sobrancelhas, mas eu simplesmente dei de

ombros. Presentes da Haven estão apenas começando a vir à tona.

A leitura da mente é apenas o começo.

— Uau, eu não posso acreditar que você vive assim!— ela gira ao redor e

em torno de como ela recebia tudo em geral, elaborar o lustre pendurado no teto,

altas cúpulas, o tapete persa de pelúcia a seus pés, duas antiguidades inestimáveis

que remonta vários séculos que quase foram perdidos para sempre quando

Damen atravessou o que eu hoje me refiro como sua ―fase mongeǁ , começou
quando ele teve certeza que seu extravagante, vão, narcisista passado foi

diretamente responsável por todos os problemas que enfrentamos. Determinado a

se livrar de todos os bens materiais, até que as gêmeas vieram para ficar e o sinal

de venda desceu, querendo oferecer-las todo o conforto e espaço extra que podia.

— Você pode jogar a maioria dos bons partidos só aqui na entrada!— ela ri

— Isso é parte de ser imortal? Viver em escavações de fantasia como esta? Porque

se assim for, quero me inscrever!

— Damen tem sido por um bom tempo— digo, sem saber como explicar

sua mansão multimilionária, uma vez que eu ainda tenho que chegar à parte

sobre a arte antiga de manifestação imediata, juntamente com a escolha de todos

os pôneis à direita na via, e eu não tenho a certeza de que eu vou.

— Bem, quanto tempo Roman tem sido, porque o lugar é bonito e tudo,

mas não é nada assim.

Damen e eu nos entreolhamos, incapaz de nos comunicar com a nossa

telepatia usual agora que sabemos que ela pode ouvir, mas ainda mutuamente

decidindo ignorar a questão. Determinado a munte, us ce


sentadas em cada extremidade do sofá. Cada uma delas lendo o seu próprio

exemplar do mesmo livro, com Rayne mastigando uma barra de chocolate,

enquanto Romy mergulha em uma tigela grande, de pipoca amanteigada.

— Então, vocês são imortais também?— ela pergunta, fazendo Rayne e

Romy olhar para cima, Rayne com sua habitual carranca, enquanto Romy apenas

balança a cabeça e volta para onde ela parou.

— Não, elas são.. hum— eu olho para Damen, os olhos implorando por

ajuda. Sem ter idéia de como explicar o fato de que enquanto elas não são

tecnicamente imortais, elas foram penduradas em uma dimensão alternativa

durante os últimos trezentos anos, e agora, graças a mim, não conseguem voltar.

— Elas são da família. — Damen acena, atirando-me um olhar que me diz

para apenas jogar bem e seguir a sua liderança.

Haven fica no meio da sala, testa levantada, rosto enrugado, obviamente,

não acreditando em uma palavra disto.

— Então, você está tentando me dizer que você manteve contato com sua

família para— ela restringe o seu olhar, olhando-o, tentando determinar o quão

velho ele é, então encolhendo na derrota quando ela diz — Enfim, isto deve fazer

alguns encontros muito interessantes, para dizer o mínimo.

Eu olhei para Damen, vendo que ele está totalmente preparado para deixar

que se vá, mas ainda esperando para salvá-lo, eu pulo para dentro e digo: — O
que ele quer dizer é que eles são como uma família. Eles são...

— Oh, por favor!— Rayne lança o seu livro sobre a mesa e crava os olhos,

em mim, em Haven, mas não em Damen, é claro — Nós não somos uma família, e

nós não somos imortais, ok? Nós somos as bruxas. Refugiadas bruxa de Salem. E

não faça mais perguntas, porque não vamos respondê-las. Isso é mais do que você

precisa saber de qualquer maneira.

Haven olha para nós, um olhar mais amplo do que eu jamais teria

imaginado possível, olhando para todos os quatro de nós de maneira esquisita

quando ela diz — Caramba. Quer dizer, isso pode ficar mais estranho?

Eu dou de ombros, trocando um olhar com Rayne, deixando claro que ela

deveria ter mantido aquilo em segredo, e vendo como Haven se estabelece em

uma cadeira estofada, olhando ansiosamente entre nós como se antecipasse algum

tipo de senha confidencial se revelar, uma grande doutrinação, uma iniciação

secreta de algum tipo, e nem sequer tenta esconder o seu desapontamento quando

Damen segue para cozinha, só para sair um pouco mais tarde, com uma pequena

caixa cheia de elixir ele prontamente passa para as mãos dela.

Ela olha dentro da caixa, batendo na tampa de cada frasco com a ponta de

sua unha pintada de preto, olhando-nos confusa quando ela diz: — Que é isso?

Seven? Suprimento para uma semana apenas? Quero dizer, você não está falando

sério, não é? Como devo sobreviver com apenas isso? Você está tentando me

matar antes mesmo de eu ter a chance de começar?


— Duh, você é imortal, eles não podem te matar.— Rayne sacode a cabeça

e revira os olhos.

— Duh, sim, eles podem. É por isso que Ever me faz usar isso — Haven

sacode o amuleto debaixo de seu top com ondas de renda preta na frente do rosto

de Rayne.

Mas Rayne apenas geme, atravessando os seus magros e pálidos braços

sobre o peito afundado quando ela diz: — Por favor, eu sei tudo sobre isso. Retire-

o, leve um soco no chakra errado e você está frito. Deixe-o sobre você e vivera

feliz para sempre e depois e depois. Não é ciência de foguetes, você sabe.

— Puxa, ela está sempre ranzinza?— Haven pergunta, rindo e sacudindo a

cabeça.

E assim quando eu começo a dizer sim, feliz por ter um aliado para uma

mudança, sem nada mais, eu vejo como ela se levanta de sua cadeira e estatela-se

ao lado Rayne, desarrumando seus cabelos e fazendo cócegas em seus pés uma

maneira que as torna melhores amigas instantaneamente. E assim mesmo, estou

de volta para ser o novo proscrito.

— Você não precisa beber todos os dias, — diz Damen, determinado a

colocar isso de volta nos trilhos — Na verdade, você poderia durar os próximos

cento e cinqüenta anos sem sequer um gole só, talvez até mais, quem sabe?

— Bem, se esse for o caso, então por que você o bebe como se sua vida
dependesse disso?— Haven pergunta, removendo os pés de Rayne de seu colo

enquanto ela nos leva a sério.

Damen encolhe os ombros. — Acho que é porque de certo modo preciso

neste momento. Eu estive por aí por algum tempo, você sabe. Um longo tempo.

— Quanto tempo?— Haven se inclina para frente, empurrando sua

platinada e listradas franja do rosto e fitando-o com dois olhos muito maquiados.

— Muito. Enfim, essa é a questão.

— Espere você tá brincando, certo? Quero dizer, sério, você não vai me

dizer sua idade real? O que você está, como um dos trinta e poucos anos que se

acumulam nos vigésimo nono aniversários, bem em seus oitenta? Quer dizer,

desculpe, Damen, mas quão velho é você? — ela ri e balança a cabeça. — Confie

em mim, quando estiver velha, eu pretendo gritar de cima dos telhados. Eu não

posso esperar até eu estar com uma pele de porcelana aos 182.

— Não é vaidade, é praticidade —, Damen encaixa, e quando eu olho para

ele, eu percebo que ele está confuso, mas provavelmente só porque ele tem um

pouco de vaidade, ele só não quer admitir isso. Tanto quanto ele tenta para se

livrar de todas as roupas extravagantes, produtos de cabelo, e botas de couro

artesanal italiano, uma pitada de vaidade permanece. — Além disso, você não

pode ostentá-la, você não pode contar a ninguém. Eu pensei que vocês já tivessem

falado sobre isso sobre isso?


— Nós fizemos, — Haven e eu falamos, nossas vozes misturando-se como

uma.

— Então, deve não haver nenhuma pergunta. Você acabou de furar a sua

rotina normal, comendo bolinho, mantendo o seu comportamento tão normal

quanto possível, o cuidado de não tirar nenhuma...

— Atenção desnecessária para mim. — Haven sacode a cabeça e revira os

olhos da forma mais exagerada — Confie em mim, Ever me deu todo os fatos,

alertou-me para o lado negro, do monstro debaixo da cama, um no armário, para

não mencionar o bicho-papão que mora embaixo da escada, e eu odeio quebrar

isso, mas eu realmente não estou interessada em nada disso. Eu tenho toda a

minha vida normal até agora. Ignorada, esquecida, praticamente me misturando

com as paredes e tratada como se eu fosse invisível, não importa o quão louca eu

tentei agir e me vestir, e eu estou lhe dizendo, esse tipo de anonimato é

superestimado. Estou totalmente e completamente sobre ele. Então, se agora é a

minha chance de realmente chutar isso, para realmente me destacar e ser vista por

uma mudança, tudo bem, eu não vou segurar. Eu pretendo adotá-la com tudo o

que eu tenho! Então, com isso em mente, eu estou pensando que você pode fazer

um pouco melhor do que isto. — ela bate na lateral da caixa.

— Venha, me divirta, entregue o suco para que eu possa dar a todos o

choque de uma vida quando começarmos o último ano.


Damen olha para mim, alarmado, mudo-me atirando um olhar que diz:

„Ela é sua criação, seu Frankenstein, faça alguma coisa!‟

Então eu limpo minha garganta e volto para ela, as pernas cruzadas, mãos

entrelaçadas, reorganizando o meu rosto em uma expressão agradável, apesar do

fato de que eu estou tão assustada quanto ele. — Haven, por favor— , eu digo,

cuidando para manter minha voz firme e baixa - — Nós conversamos sobre isso,

nós..

Mas não ficando muito longe antes que ela corta rapidamente — Você bebe

o tempo todo, então porque eu não posso?— ela tamborila os dedos contra a

caixa e restringe o seu olhar.

Faço uma pausa, sem saber como explicar que o suco aumenta meus

poderes, poderes eu prefiro que ela não tenha, em torno de atrapalhar as palavras

certas quando eu digo: — Embora possa parecer de uma maneira, a coisa é, eu

realmente não preciso disto, não como Damen não de qualquer maneira. Eu

apenas tomo esta bebida, porque, bem, porque eu estou acostumada a isso. E

mesmo que não seja minha bebida favorita, eu meio que gosto disso. Mas confie

em mim, não é realmente necessário beber todos os dias, nem mesmo toda

semana ou a cada ano, para esse assunto. Como disse Damen, você pode ir de

uma centena de anos, talvez duzentos, sem um só gole. — aceno, esperando que

ela compreenda, não querendo que ela saiba sobre o aumento da potência e

velocidade e habilidades mágicas que o consumo regular pode trazer. Isso só iria

fazê-la querer mais.

— Está bem— ela concorda — Acho que vou ter que conversar com

Roman, então. Tenho certeza que ele ficaria feliz em me dar.


Eu engoli duramente, sem dizer uma palavra, sabendo bem que ela está me

desafiando. Observando como Luna pula em seu colo e Haven começa a acariciá-

la.

— Ei, gatinha! Você deveria ser minha? É por isso que você está aqui

agora? Como você sente o seu verdadeiro dono? — ela levanta a alto e fuça o

queixo, rindo quando Romy salta de sua ponta do sofá e a leva embora.

— Relax— Haven ri — Não é como se eu fosse roubar ela ou nada

parecido.

— Você não pode roubá-la. — Romy encara, levantando Luna em seu

ombro, seu lugar favorito para poleiro — Ninguém pode. Animais de estimação

não são posses, eles não são acessórios que você descarta quando você decidir que

não quer mais. Eles são seres vivos que partilham as nossas vidas. — ela olha para

sua irmã, e sinaliza para que ela a siga, elas saem como tempestades fora do

quarto.

— Eita irritada!— Haven olha por cima do ombro, vendo-as sair.

Mas eu não estou prestes a deixá-la varrer isto fora, ela é a única que colocou lá

fora, agora estou apenas acompanhando. — Falando disso - como está Romam?—

eu pergunto, tentando sair da conversação, apenas vagamente interessada,

esperando que ninguém notasse a maneira como minha voz tremeu quando seu

nome saiu dos meus lábios.


Ela encolhe os ombros, sentindo exatamente onde eu estou indo com isso

quando ela diz: — Ótimo. Ele está muito bem, obrigado por perguntar. Mas eu

não tenho nada a relatar. Ou pelo menos nada que possa interessá-la. — ela olhou

entre Damen e eu, os lábios enrolando nos cantos como se fosse tudo uma grande

brincadeira, um jogo que não foi totalmente comprometida a jogar, apesar da

garantia que deu. Mudando seu foco para as unhas, quando ela diz: — Eita, faz

suas unhas crescerem tão rápido também? Quer dizer, eu apenas cortei-as esta

manhã e olhe, elas já estão muito longas de novo! — ela ergueu suas mãos, para

que pudéssemos ver — E o meu cabelo, eu juro que minha franja cresceu um

centímetro completo em poucos dias!

Damen e eu trocamos um rápido olhar, nós dois pensando a mesma coisa:

tudo isso em apenas um frasco de elixir? E sabendo que eu não tenho escolha, mas

para dizer a ela, e esperando que eu possa retirá-lo de forma convincente, eu digo,

— Ouça, sobre Roman...

Ela desceu as mãos no colo, embalando a caixa enquanto ela olha para

mim.

— Eu estive pensando— eu pauso, ciente do olhar profundo, intenso, de

Damen bem chato nos meus, querendo saber onde eu estou indo com isso, já que

certamente eu não discuti com ele. Mas a verdade é que é uma conclusão que

apenas veio a mim, um resultado de todas as coisas assustadoras que aconteceram


nas últimas vinte e quatro horas — Eu acho que você precisa evitá-lo a todo

custo— , disse, olhando para ela com atenção — Sério. Se é dinheiro que você

precisa, eu posso totalmente ajudar até você encontrar outro emprego, mas eu não

acho que você deveria estar trabalhando lá. Não é seguro. E mesmo que eu sei que

você não acredita em mim, mesmo que você acha que eu estou toda errada, a

coisa é, eu não estou. Damen também estava lá, ele pode lhe dizer. — eu olho para

Damen, vendo-o acenar de acordo, mas Haven permanece inalterada, seu rosto

tão plácido, parece que ela ainda não tinha ouvido. — Eu não posso expressar isto

o suficiente, — eu desejo — Sério. Ele é perigoso. Uma ameaça completa e total.

Sem mencionar que ele é.. — mau e terrível, e devastadoramente irresistível,

sedutor, a sua voz na minha cabeça, o rosto em meus sonhos, sempre lá, sempre

presente e não importa quanto eu tente, eu não posso pará-lo, não posso parar de

pensar sobre ele, não posso parar de querer ele, parar de sonhar com o ele — E,

hum, de qualquer maneira, eu odiaria ver você se machucar.

Eu engulo duro, o meu corpo tão escorregadio com apenas o pensamento

dele, com aquele estranho, estrangeiro pulso excitante mexendo dentro de mim,

isto chegando perto de me encher até explodir.

Mas quando ela olha para mim, levanta as sobrancelhas como se tivesse

ouvido as palavras na minha cabeça, vê o que eu realmente sou, até, eu entrar em

pânico. Pânico privado e silencioso. Até me lembrar que meu escudo está em

vigor. E não importa o quão poderosa ela possa ser, se Damen não podia me

ouvir, então ela não poderia.

— Ouça, Ever, foi clara, e agora você só está sendo redundante. Ouvi o que

disse no primeiro tempo, apenas como eu ouvi o que você disse neste momento. E
se você lembrar, nós concordamos em discordar. Além disso, como você vai

conseguir o que quer, se eu não agradar a ele? — ela olhou entre nós, os olhos

apertados, como um gato.

— Confie em mim, Roman dificilmente é uma ameaça, pelo menos não

para mim. Ele é tão incrivelmente doce e amável, e amoroso, ele não é nada como

você pensa. Então, se vocês dois querem ficar juntos — , ela sacode o dedo entre

Damen e eu — então você provavelmente vai querer ficar do meu lado bom.

Tanto quanto eu posso dizer, penso que sou sua única chance neste momento,

não?

Damen deu passos a frente, seus olhos saindo faíscas, irritado, voz baixa e

ameaçadora, quando diz: — É um jogo perigoso que você está jogando. E posso

perceber que você está animada sobre a sua perspectiva, entusiasmada com esse

novo poder, com fúria dentro de você, é tudo muito fácil ficar em cima da cabeça.

Eu sei, porque eu era como você. Na verdade, eu era o primeiro. E apesar de ter

sido há muito tempo atrás, eu me lembro como ontem. Lembro-me também a

longa lista de erros que cometi, os arrependimentos acumulados quando eu deixei

a minha fome de poder substituir o meu bom senso e decência humana. Não seja

como eu, Haven. Não cometa esse erro. E você não pense sequer em ameaçar Ever

ou eu de alguma forma. Nós temos uma abundância de opções, uma abundância

de meios, e não precisamos de você.


— Já Basta!— Haven sacode a cabeça como um dardo olhando entre nós —

Eu estou cansada de tanto você falar baixo para mim o tempo todo. Você já parou

para pensar que talvez eu possa ensinar a vocês uma coisa ou duas sobre como

usar todo esse poder? — ela revira os olhos e faz uma carranca, respondendo à

sua própria pergunta quando ela diz: — Claro que não! É apenas: ‗Faça isso,

Haven, faça aquilo, Haven, estamos racionando seu elixir, porque não confiamos

em você, Haven.‘ Quero dizer, vamos lá. Se você se recusa a confiar em mim,

então por que eu deveria confiar em você?

— Não é que nós não confiamos— eu digo, ansiosa para neutralizar isso,

para as coisas se acalmarem antes que fique mais aquecido — É Roman. Eu sei

que você não quer ver, mas ele está usando você. Você é apenas um peão nesse

pequeno jogo distorcido que ele joga. Ele vê todos os seus pontos fracos e ele a

está usando para puxar as cordas como uma marionete.

— E o que são os pontos fracos?— ela tamborila os dedos contra a caixa e

pressiona os lábios em uma linha fina e desagradável.

Mas antes que isso fosse ir mais longe, e se transformar em algo que todos

nós certamente lamentaríamos, Damen levanta a mão e pula dentro — Nós não

estamos tentando brigar com você, Haven. Nós estamos tentando protegê-la. É

para o seu próprio bem.

— Porque eu preciso de proteção? Porque eu sou burra demais para


manifestar coisas para mim? — seu olhar dardeja, entre nós, e quando Damen

suspira com frustração, seus olhos se tornam frios. Em seguida, ela balança a

cabeça, pega a caixa mais apertado, e levanta — Eu queria poder acreditar em

você, mas a coisa é, eu não posso. Porque você é o único que possui algo do

passado, Ever - eu posso sentir isso. E mesmo que eu não tenha nenhuma idéia do

que é, uma coisa é pateticmente claro, você é ciumenta. — seus lábios curvados

quando ela acrescenta: — Sim, acredite ou não, a perfeita Ever Bloom tem ciúmes

de mim, pequena Haven Turner — . Ela sacode a cabeça — Como é isso para uma

mudança de eventos?
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"Quando o mundo estiver unido na busca do conhecimento, e não mais lutando por
dinheiro e poder, então nossa sociedade poderá enfim evoluir a um novo nível."
Eu endureci, mas continuei a estar lá, sem dizer uma palavra.

— Você está acostumada a ser a top por aqui. A mais esperta, a mais

bonita, a mais perfeita em tudo, com o mais perfeito, inteligente, e sexy namorado

— ela sorri para Damen, em seguida, encolhe os ombros e ri quando ele não

consegue retornar o seu sorriso — E agora que eu sou imortal como você, é

apenas uma questão de tempo até te alcançar, até eu ser perfeita também. E o fato

é, você não pode suportar isso! Não pode suportar este pensamento. Mas a parte

engraçada, a parte irônica é, no final, você tem apenas que culpar a si mesma, pois

você é a única que me fez desse jeito. E mesmo que você diga que você faria a

mesma decisão novamente, eu não posso ajudar, mas acho que você gostava mais

de mim antes. Voltar quando eu era uma patética, pequena, a fominha de atenção

que eu era - perdedora que comia biscoitos demais e inventando coisas em

encontros anônimos. — ela encolhe os ombros, os ombros subindo e descendo

com tanta confiança, tanta arrogância, é claro que ela não é mais aquela garota —

Não se preocupe em negar, eu sei que esses são os pontos fracos que você estava

se referindo. É bastante óbvio quanto superior você sempre se sentiu sobre Miles e

eu. Como você se dignou a se prender com a gente até que algo melhor surgiu o

seu caminho.

— Isso não é verdade, vocês são meus melhores amigos, meus...

— Por favor. — ela revira os olhos, estala* sua língua contra a bochecha
dela da mesma forma que Roman faz — Me poupe de suas declarações sinceras.

— No momento em que o garanhão italiano veio junto— ela acena para Damen —

nós praticamente só víamos você na hora do almoço, e às vezes nem assim, pois o

pequeno casal perfeito estava muito ocupado com sua vidinha perfeita, e seu

pequeno amor perfeito, para se pendurar com tais nerds imperfeitos como nós.

Nós éramos apenas os perdedores que você tem mantido em reserva, somente no

caso de você poder precisar de nós algum dia. Mas agora parece que você está em

um longo e solitário verão porque Miles é chefiado para Florença, e eu fiz alguns

novos amigos que não são nem um pouco intimidados por esse novo eu.

— Haven, isso é loucura! Como você pode até mesmo dizer estas coisas? —

eu pergunto, com os meus olhos desagradáveis sobre ela, olhando-a

profundamente. Mesmo que ela seja tão pequenina como sempre, mesmo que ela

não cresceu, mesmo minimamente, é como ela é com baixa estatura e de algum

modo mais pronunciada, mais tonificada, mais vigorosa, como ela é uma pequena

pantera negra em leggings de couro preta, camisa preta rendada, e botas pretas

com salto agulha altíssimos. E embora ela tenha começado com raiva de mim

antes, desta vez é diferente, ela é diferente. Agora ela é perigosa, e sabe disso e

gosta de ser desse jeito.

— Como eu posso dizer? —, ela zomba, seus olhos se estreitaram em

fendas — Porque é verdade, é assim!— ela despeja a caixa nos braços de Damen,

assumindo que ele vai pegá-lo enquanto ela se dirige para a porta, olhando por

cima do ombro para dizer: — Você pode ficar com o seu elixir. Eu tenho minha

própria fonte. E confie em mim, ele vai ser mais do que feliz para me ensinar

todas as coisas que você não vai.


Capítulo 8

Damen virou-se para mim, a palavra ‗problema‘ passou de sua mente para

a minha.

Mas eu só fico ali, tão atordoada que eu não tenho idéia do que fazer.

— Eu sabia que ela seria um problema. — ele balança a cabeça e cai no sofá.

— Ela é muito frágil, muito volátil, ela não será capaz de lidar com nada disso.

Com o tempo ela será consumida pela fome de poder, apenas espere.

— Esperar?— me sento no braço do sofá ao seu lado. — Você esta falando

sério? Esperar pelo que? Você realmente acha que vai ficar pior do que acabamos

de ver?

Ele balança a cabeça, fazendo um grande esforço para reter o que eu

percebi do seu olhar. Mas não importa. Ambos sabemos que eu sou a única

responsável por essa bagunça.

Deslizei do braço do sofá e me apoiei nele. Sabendo que eu tinha coisas a

fazer — tomar o controle da situação antes que fique pior – mas não tendo idéia

do que essa coisa é. Cada decisão que eu fiz até este ponto só fez tudo piorar. E eu

estou tão cansada, tão drenada! Tudo que eu quero fazer é tirar uma longa soneca

agradável e pacífica, onde Roman não pode entrar no meu sonho.

Roman.

O nome passa da minha mente para a dele, e quando ele olha para mim, eu
prometo que vou!

— Nós vamos?— eu olho para ele, meus olhos se alargam quando percebo

o que eu disse, com a intenção de dizer ‗nós vamos‘; pretendia questionar a parte

de encontrar uma maneira, e não parte de nós.

Ele olha para mim, claramente perturbado com as minhas palavras — Eu

pensei que fosse uma entrega. Eu estava errado?

Eu engulo duro e alcanço sua mão, observando como o véu fino de danças

de energia entre a palma da sua mão e a minha, engolindo as palavras até que eu

possa confiar na minha voz novamente. — Você não esta errado, — eu sussurro —

Você é a melhor coisa da minha vida! A única coisa que realmente importa. —

Repetindo as palavras que eu sei com certeza que são verdadeiras, apenas

desejando que eu me sinta da mesma maneira que eu costumava me sentir.

Mas Damen não compra, ele me conhece bem demais; tendo testemunhado

um milhão de humores diferentes, um zilhão diferentes inflexões de voz e técnicas

de prevenção ao longo dos últimos quatrocentos anos – e essa é apenas a minha

contagem.

— Ever, têm algo de errado? Você tem agido estranhamente desde...

Olho para ele, a minha voz aguda, nervosa, cortante quando eu digo, —

Desde quando eu te fiz beber o elixir que nos fez letal um para o outro?

Ele balança a cabeça.


— Desde quando eu fiz da Haven uma imortal?

Ele balança a cabeça novamente, desta vez pressionando o dedo nos lábios,

me acalmando quando ele diz, — Eu não estava me referindo a nenhuma dessas

coisas. Você fez as melhores decisões que pôde sob as circunstâncias em que você

se encontrou. Eu não tenho direito de criticá-la por isso! O que eu ia dizer é que

você está agindo estranha desde que você começou a se aprofundar em magia.

Você parece preocupada, distraída, você nunca esta realmente presente. E eu

estou preocupado com você, perguntando se foi demais pra sua cabeça, e em caso

afirmativo, como eu poderia ajudar.

Eu olho nos olhos dele, e há tanta esperança e ternura lá que eu não posso

fazer-me confessar o que eu tenho sentido por Roman. O pensamento é

demasiado horrível. — Eu admito que estive um pouco desligada. E por enquanto

eu prefiro não entrar em todos os detalhes, é o melhor agora. Romy e Rayne me

mostraram como desfazê-lo e é tudo. Bom, você apenas tem que confiar em mim.

Ele olha para mim, sua preocupação se aprofundando, mas ainda assim ele

apenas balança a cabeça e diz, — Se você está me dizendo para confiar em você,

então em confio. Mas me deixe saber se você precisar da minha ajuda.

Eu me aconchego perto dele – meu namorado, minha alma gêmea, meu

parceiro para toda vida. Sabendo que essa é a forma como tem que ser ; que tudo

pelo o que eu estou passando agora é só uma rude interrupção, uma dificuldade
técnica, uma breve falha na tela das nossas infinitas vidas. Ciente de que um

insistente zunido horrível se aproxima, tocando no fundo, ameaçando tomar

conta mais uma vez, olho-o bem nos olhos e digo — O que você me diz de

sairmos daqui?

Ele olha para mim, o rosto amolecendo, sempre pronto para uma boa

aventura. — Algum lugar em particular?— ele pergunta, não tendo idéia do que

eu tenho em mente, mas é evidente a cumplicidade em seu olhar.

Eu aceno, apertando sua mão e calmamente pedindo-lhe para fechar os

olhos, enquanto eu digo — Me segue!

Capítulo 9

Nós estamos outra vez na ilha, nós dois caímos lado a lado na grama, sinto-

me melhor. Um milhão, trilhão, zilhão de vezes melhor. Saltando com meus pés e

pulando pelo campo, livre daquela horrível invasão energética — aquele estranho

batimento interno e os pensamentos sobre Roman. Tudo isso se reduziu a nada

mais que uma vaga e distante memória, com essa grama flutuando abaixo dos

meus pés e as flores perfumadas se movendo sob as pontas dos meus dedos.

Olhando por cima do ombro, aceno para que Damen se junte a mim, e um

verdadeiro sorriso ilumina meu rosto como a pela primeira vez em dias.

Estou regenerada, renovada, capaz de começar tudo de novo.

Ele vem em minha direção, parando tímido em meu alcance enquanto ele
fecha os olhos e imediatamente transforma os vastos campos perfumados de

Summerland em uma réplica exata de Château de Versailles. Colocando-nos no

meio de uma sala tão grande e opulenta que tira o meu folego.

Os pisos são feitos de tacos polidos, enquanto a cor creme da parede brilha

com os batentes dourados. E o teto – aqueles insanamente altos que são decorados

por uma sucessão de lustres brilhantes, seus cristais finamente cortados pelo

brilho e cintilar das chamas das velas queimando, enchendo a sala com um

caleidoscópio de luz suave e brilhante. E quando eu acho que não pode ficar

melhor, o som de uma majestosa sinfonia começa e Damen para diante de mim

oferecendo sua mão.

Eu abaixo meu olhar, rapidamente, aproveitando a oportunidade para

olhar o corpete do meu vestido — um corpete apertado e baixo, derramando em

suaves dobras soltas da mais brilhante seda azul que percorre girando até o chão.

Levantando meus olhos e encontro ele retirando uma caixa de fino veludo do

casaco, prendo a respiração de excitação quando ele abre para revelar um

requintado colar de safiras com diamantes encrustados que ele cola em torno do

meu pescoço.

Dirijo-me, espiando entre uma longa fila uma de espelhos que estão

fixados em cada lado do salão, contemplando nós dois juntos, ele de calça, blazer

e bota, eu na minha elegância opulenta, cabelos trançados enrolados da maneira


mais complicada de se fazer no mundo – e eu sei exatamente o que ele está

fazendo – ele está me dando o feliz para sempre que Drina roubou de mim.

Eu olho ao redor do salão do baile meio temerosa, mal acreditando que eu

poderia ter tido isso, que poderia ter sido parte desse mundo, seu mundo. Se meu

final de Cinderela não tivesse sido rasgado diante de mim, tirando a minha

chance de experimentar meu sapatinho de cristal.

Se eu tivesse tido a chance de viver, ele poderia ter me dado o elixir e

imediatamente me transformado de uma humilde serva francesa chamada

Evangeline neste – neste ser radiante que está me olhando atrás do espelho. E

cento e alguns anos mais tarde, nós poderíamos ter dançado juntos aqui,

partilhando esta noite bonita, vestidos com nossas melhores roupas e jóias, bem

ao lado de Maria Antonieta e Luís XVI. Mais isso não ocorreu. Em vez disso,

Drina me matou, forçando a mim e a Damen a continuar nossa busca um pelo

outro, novamente e novamente.

Eu olho para ele, limpando as lágrimas, colocando minha mão em seu

ombro e ele seu braço confortavelmente em torno da minha cintura, me rodando

em toda a pista de dança, nossos pés se movendo habilmente, minha saia rodando

em um enlaçamento estonteante de azul. Assim, envolvidos pela beleza que ele

mesmo criou, replicada apenas para mim, eu pressiono firmemente contra ele,

meus lábios em seu ouvido e pergunto se há mais quarto para ver.


E antes que eu perceba sou levada a um confuso labirinto de salas, para o

mais fino, mais grandioso quarto que já vi.

— Agora, está concedido— ele sorri parando na porta enquanto eu tento

não ficar de boca aberta em ter tudo isso em... — este não é o quarto do Royal

chambre – Maria Antonieta e eu nunca estivemos tão perto. Embora esse seja o

quarto que eu fiquei em minhas numerosas visitas – então, o que você acha?

Eu faço o meu caminho através de grande tapete de tecido, passado por

cadeiras revestidas de seda, a abundância das velas, o uso abundante de cristal e

ouro, tornando tudo tão excessivamente luxuoso, a camadossel ricamente coberta,

e eu acariciando o espaço ao meu lado como se eu tivesse nenhum outro desejo no

mundo.

Porque eu não tenho.

Eu estou em Summerland agora.

Roman não pode me alcançar.

— Então o que você acha?— ele se inclina sobre mim, seu olhar varrendo o

rosto.

Eu me aproximo, com os dedos traçando suas elevadas maçãs do rosto, a

acentuada linha do queixo, quando eu digo, — O que eu acho?— eu balancei a

cabeça e ri, a iluminação do som, alegre, do jeito que costumava ser — Eu acho

que você é o namorado mais incrível do mundo inteiro. Não. Deixe-me voltar

atrás no que eu disse. .

Ele olha pra mim, fingindo apreensão em seu olhar.

— Eu acho que você é o namorado mais maravilhoso do planeta, do

universo!— eu sorrio. — Sério. Quem não gostaria de uma época como essa?
— Tem certeza que você gosta?— ele pergunta, com uma real preocupação

se movendo dentro dele.

Eu levanto os meus braços, o cerco em torno de seu pescoço enquanto eu o

puxo para mim. Ciente do véu de energia que paira entre seus lábios e os meus —

me permitindo a começar a pensar em como estamos parados aqui, quase nos

beijando. Mas ainda sim feliz por me apegar até onde posso chegar.

— Esses foram tempos tão inebriantes— diz ele afastando-se e apoiando a

cabeça sobre a mão dele para me ver melhor — Eu apenas queria que você

experimentasse, sentir o gostinho de como era. Eu senti muito sua falta, Ever, nós

deveriamos ter tido tal divertimento. Você teria sido a bela da vez, a mais

bonita— ele aperta os olhos — não, um segundo pensamento, Maria talvez não

tivesse gostado disso.— Ele sacode a cabeça e ri.

— Porque?— meus dedos jogados nos babados cobrindo a frente da sua

camisa, no meio do caminho entre os botões para imensidão do peito quente por

baixo — Ela tinha planos para você, como eles diziam? E isso foi antes ou depois

do Conde Fersen dividir a cena?

Ele ri. — Antes, durante e depois. Foi definitivamente o lugar para se estar,

ou pelo menos por algum tempo de qualquer maneira. — ele sacode a cabeça — E

não, para sua informação, nós éramos apenas bons amigos, não tinha nenhum

plano para mim, ou nenhum que eu notei, pelo menos. Eu estava pensando mais
nos termos de que algumas mulheres bonitas nem sempre estão contentes quando

outra entra em cena.

Eu olhei para ele, visualizando a elegância do seu rosto, a madeixa do seu

cabelo escuro e brilhante que cai sobre seus olhos, pesando em como ele tem um

olhar galante, quão nobre é, como esse olhar realmente lhe convém, diz quem

realmente ele é muito mais do que o jeans desbotado e as botas de motoqueiro já

disseram.

— Então, o que Maria Antonieta pensou de Drina?— eu pergunto, me

lembrando dela e de como sua pele era cremosa, seus olhos de esmeralda,

gloriosamente ruiva – uma beleza tão grande que me roubou a respiração.

Percebendo, logo em seguida, que eu estou realmente tendo uma conversa sobre

Damen e sua malvada ex-mulher e não senti ainda a menor pontinha do meu

ciúme habitual. E não é só por causa da magia de Summerland, mas porque eu

realmente estou em paz com isso agora.

Apesar de, infelizmente, Damen não ter tomado conhecimento da minha

nova perspectiva, o que provavelmente explica porque sua testa ficou enrugada e

sua boca sombria. Querendo saber se eu realmente iria começar com isso de novo,

depois de tudo que ele enfrentou por mim.

Mas eu só sorrio, convidando-o a olhar para dentro da minha mente e ver

por si mesmo. Perguntei só porque eu estou curiosa, nada mais. Não há uma
pitada de inveja para ser encontrada.

— Drina e Maria não chegaram a conhecer uma a outra— disse ele,

visivelmente aliviado com a mudança do meu coração — Eu, inúmeras vezes, vim

por mim mesmo.—

Eu olhei para ele, imaginando todas as belas mulheres solteiras, que

possivelmente desmaiaram no segundo em que ele entrou naquela sala sem uma

acompanhante ao seu lado e, novamente, como antes, eu não sinto nada.

Todos têm um passado. Ao que parece pra mim, é que a única coisa que

realmente importa é que ele me ama, sempre me amou. Passou os últimos 400

anos procurando por mim. Eu acho que finalmente consegui tratar isso como um

grande acordo, o que realmente isso é.

— Vamos ficar aqui para sempre— eu sussurro, puxando-o para mim e

cobrindo seu rosto com meu beijo — Vamos passar a morar nesse lugar

maravilhoso, e quando ficarmos cansados – se nós ficarmos cansados disso- nós

precisaremos apenas manifestar algum outro lugar para viver.

— Nós podemos fazer isso em casa, você sabe. — Ele olhou para mim, com

um olhar terno e profundo, enterrando sua mão no fundo do meu cabelo, alisando

os fios — Nós podemos viver em qualquer lugar que quisermos – ter qualquer

coisa que queiramos – ir onde nós quisemos – tão logo nós graduemos no ensino

médio e nos afastarmos de Sabine — Ele ri.

E mesmo que eu sorria junto com ele, eu sei melhor que ele.

Eu realmente não posso ter isso em casa.

Não depois do feitiço que eu lancei.


E até que eu possa achar uma maneira de quebrá-lo, esse é o único lugar

que eu posso gostar disso, sentir isso.

A magia vai se dissolver assim que eu faça o meu caminho de volta através

do portal.

— Mas, entretanto, não há nenhuma razão para apressar a volta – existe?—

Ele sorri, inclinando seu queixo até encontrar meus lábios junto aos dele.

Ele me aperta contra ele novamente, seu corpo cobrindo o meu, posso

quase sentir suas mãos na minha pele me enchendo com formigamento e calor.

Nós dois nos rendendo ao momento, entregando-se aos limites que não temos

escolhas a não ser aceitar. Meus lábios em seu ouvido enquanto murmuro —

Nenhum motivo no qual eu possa pensar. Nenhuma razão.

Capítulo 10

— Ever... Ever... acorda! Nós temos que voltar logo!

Eu rolo e me estico, estendendo meus braços para o alto sobre minha

cabeça, enquanto arqueio minhas costas e flexiono meus dedos, movendo

devagar, tranqüila, sem pressa, como um vagaroso calor, tentando apenas rolar de
depois de tudo que aconteceu na semana passada.

Ele levanta-se da cama, me ajudando a ficar de pé enquanto ele diz — Não

fique, não se desculpe ou fique com vergonha. Você sabe que de certa forma foi

meio que bonito. Eu não recordo nunca o que acontece antes e você não consegue

realmente experimentar muitas primeiras vezes após hum... centenas de anos—

Ele ri me puxando para ele com seus braços enrolados ao redor da minha cintura

— Sentindo-se melhor?

Eu aceno. Esse é o primeiro sono decente que eu dormi desde... bem, desde

que você sabe quem começou a invadir meus sonhos, E mesmo eu não tendo

nenhuma idéia de quanto tempo eu estive fora, eu me sinto muito melhor agora,

como estar pronta para voltar para o plano terrestre e enfrentar todos os meus

demônios, ou pelo menos o ultimo em particular.

— Vamos?— Ele levanta a sobrancelha.

Ele está fechando os olhos e fazendo o véu quando eu digo — Mas e sobre

essa cidade? O que aconteceu quando nós partirmos?

Ele dá de ombros — Bem, eu estava deixando-a ir, já que eu você sempre

pode manifesta outra vez, você sabe isso certo?— Ele me dar um estranho olhar.

E apesar de saber que isso é fácil para ele recriar exatamente como é, de

alguma forma eu quero que isso fique. Eu quero saber que isso é sólido e

duradouro. Um lugar que eu posso retornar por capricho e não apenas alguma

confusa lembrança de um dia muito bom.

Ele sorri, inclinando-se enquanto ele responde meus pensamentos — Então

é isso— Ele pega minha mão — Versailles fica

— E isso— Eu dou risada, mexendo nos babados em sua camisa cor de


creme, fazendo-o rir de uma maneira que eu não ouvi o suficiente mais.

— Bem, eu pensei que eu mudaria na viagem de volta para casa, tudo bem

para você?— Eu inclino minha cabeça e contraio meus lábios para o lado,

cuidadosamente olhando para ele como se estivesse considerando — Mas eu

gosto de como você está. Você está tão lindo, tão galante, majestoso... realmente

isso me faz sentir como olhar para você real, vestido no período que você parece

ter gostado mais.

Ele dá de ombros — Eu gostei de todos eles, alguns melhores que outros

mais, mais em retrospectiva eles todos tinham algo a oferecer. E você, por outro

lado, parece impressionante também— Ele trilha seus dedos encima de minhas

jóias e para baixo no corpete do confortável encaixe do meu vestido — Mas ainda

assim, se você quer voltar para casa, uma mudança de trajes tem que ocorrer.

Eu suspiro triste ao ver nossa elegância do século XVIII substituir nosso

usual estilo Laguna Beach.

— E agora...— Ele acena, enfiando meu amuleto de volta abaixo do

pescoço do vestido — O que você diz: minha casa ou sua?

— Nenhum dos dois— Eu pressiono meu lábios juntos, sabendo que ele

não irá gostar do que virá em seguida mas comprometida em ser completamente

honesta durante as poucas vezes que eu posso — Eu preciso ver Jude

Ele hesita, o mínimo, pouco visível a um olho destreinado, mas ainda


assim, eu vejo isso, e eu preciso que ele saiba que Jude já sabe, que não há

competição. Nunca realmente houve. Damen ganhou meu coração centenas de

anos atrás. E tem desde então.

— Houve um acidente— Eu assinalo, determinada a manter minha voz

calma, mesmo, e apenas me ater aos fatos não importando quão horrível. E

embora eu pudesse apenas deixar a cena fluir de minha cabeça para a dele, eu não

faço.

Há muitas partes que eu não quero que ele veja, coisas que ele poderia

levar para o lado errado, então ao invés disso eu digo — Eu... eu meio que ataquei

ele.

— Ever — ele hesita. Sua expressão tão chocada que tudo o que posso fazer

é não desviar o olhar.

— Eu sei — eu balanço minha cabeça, pausando para tomar uma

respiração — Eu sei como isso soa, mas isso não é o que você pensa. Eu estava

tentando provar que ele era do mal, mas, bem, quando eu percebi que ele não era,

eu corri para o pronto-socorro.

— E você me deixou de contar isso por que... ? — ele olha para mim,

obviamente machucado com minha negligência.

Eu suspiro, olhando bem para ele quando eu digo — Por que eu estava

envergonhada, por que eu pisei na bola o tempo todo e eu não queria que você
perdesse a paciência comigo, quer dizer, não que eu deva culpar você, mas

ainda... — eu dou de ombros, arranhando meu braço, já sabendo que isso não é

uma coceira, mas outro habito nervoso meu.

Ele coloca suas mãos em meus ombros, olhando bem nos meus olhos

quando ele diz — Meus sentimentos por você não são condicionais. Eu não jugo

você. Eu não perco a paciência com você. Eu não puno você. Eu apenas amo você,

isso é tudo! Puro e simples! — Seus olhos buscam meu rosto, seu olhar tão quente,

tão amoroso, claramente defendendo a promessa em suas palavras — Você não

tem razão para esconder qualquer coisa de mim Ever, entendeu? Eu não irei a

nenhum lugar. Eu irei estar sempre aqui para você, e se você precisar de qualquer

coisa, se encontrar em um beco sem saída, ou sobre sua cabeça, tudo que você tem

que fazer é pedir e eu irei estar ali para socorrer você!

Eu aceno incapaz de falar, eu estou tão miserável por minha incrivelmente

boa sorte, me sentindo tão incrivelmente sortuda por ser amada por alguém como

ele, que pensei que não era merecedora disso.

— Então você vai cuidar de seu amigo, e eu vou cuidar das gêmeas e nós

iremos nos encontrar amanhã ok?

Eu me inclino para beijá-lo, rapidamente, cautelosa de largar sua mão já

que iríamos a direções diferentes, fechando meus olhos por tempo suficiente para

vislumbrar o portal atrás de mim, aquele dourado véu que irá me conduzir de
volta para casa.

Eu paro na porta de Jude, levando um tempo para bater umas poucas

vezes, dando tempo suficiente para ele responder antes de desistir e entrar sem

ser convidada, procurando em cada último quarto de sua pequena casa de praia,

incluindo a garagem e o jardim antes de olhar diretamente para a loja. Mas no

meu caminho eu passo por Roman e tudo que eu levo é um olhar para a janela em

exposição, um olhar para a assinatura no alto, lendo-se: RENASCIMENTO... Um

olhar para abrir à porta a frente que leva diretamente para ele, e apenas assim a

mágica de Summerland vai embora e este estranho pulso invasor, retoma

novamente.

Eu vou em frente, convocando toda última gota de minha força para

superá-lo, mas minhas pernas estão tão pesadas, relutante em colaborar, e minha

rápida respiração entrando muito superficial e saindo muito rapidamente.

Eu estou enraizada, incapaz de fugir, superada por esta horrível

necessidade de encontrá-lo, de vê-lo, de estar com ele. Este terrível invasor

assumindo como se a minha noite de encantamento nunca tivesse ocorrido. Como

se eu nunca estivesse em paz.

A fera acordou agora, exigindo ser alimentada e apesar dos meus

melhores esforços para sair disso antes que seja tarde, antes que seja tarde demais.

Ele está vindo me encontrar — Bem, imaginei encontrar você aqui.

Roman se inclina no vão da porta, todo o cabelo dourado e brilhantes

dentes, seus olhos azuis fixados diretamente em mim — Você está olhando

irritada, está tudo bem?

Seu artificial sotaque britânico fazendo sua voz levantar de uma forma que
normalmente me irrita, mas agora... Agora tão sedutora, trazendo aquele

estranho... Estranho pulso contra mim.

Ele ri, jogando a cabeça para trás de um jeito que claramente mostra a

tatuagem de Ouroboros em seu pescoço, a serpente em espiral, enrolando, seus

olhos redondos buscando a mim, com a língua magra acenando para me

aproximar.

E apesar de tudo o que eu sei sobre o bem e o mal, o certo e o errado,

imortais e perversos, eu dou um passo a frente, dando um pequeno passo em

direção a derrota, que é rapidamente seguido de outro, e outro, meu olhar fixo em

Roman, maravilhoso, glorioso Roman. Ele é tudo o que eu posso ver, tudo que eu

preciso! Somente vagamente consciente de um pequeno pedaço de mim, ainda lá

em algum lugar, esforçando-se, gritando, exigindo ser ouvido, mas isso não

consegue competir, e não é muito antes de ser silenciado por um único-

concentrado pulso agora residindo dentro de mim, sua vista em somente uma

coisa.

Seu nome preenche meus lábios, enquanto eu estou ali diante dele, tão

próxima que posso dizer sobre cada mancha em seus olhos, e sentir o agradável

frio que emana de sua pele. O mesmo frio que eu uma vez detestei, repudiei, mas

não mais! Agora ele é bem vindo, me chamando para casa.

— Sempre soube que você iria voltar a si — ele ri, seu olhar devagar,
tendo-me enquanto ele enterra seus dedos no emaranhado dos meus cabelos —

Bem vinda ao lado negro Ever, eu acho que você irá ser bastante feliz aqui— ele ri,

o som disso me envolvendo em um delicioso abraço gelado — Não estou surpreso

que você ignorou aquele velho, idiota Damen, figura que você deveria ficar

cansada dele eventualmente. Toda a espera, a angústia, a terrível procura da alma,

sem mencionar o ‗se fazendo de santinho‘

Ele balança sua cabeça e faz careta como se o pensamento causa-se dor nele

— Eu não sei como você agüentou todo esse tempo. E pelo o que? Eu me

pergunto. Por que eu odeio quebrar isso querida, mas não há recompensas futuras

quando seu futuro certamente esta aqui — ele bate seu pé no chão — Um

desperdício sangrento de tempo, na verdade, sem utilizar a atrasada gratificação

quanto um tipo instantaneamente funciona melhor. Há prazeres que você terá

Ever, prazeres de uma magnitude que você não pode começar a entender. Mas

para sua sorte, eu sou do tipo que perdoa, eu estou mais do que disposto a servir

como seu guia! Então me diga, por onde nós deveríamos começar, querida? Sua

casa ou a minha?

Seus dedos trilham pelo meu rosto, meu ombro, trabalhando a seu modo

abaixando até frouxa gola do meu vestido. E mesmo que a sensação gelada,

estimulante, no sentido forte da palavra, eu não posso deixar de me inclinar para

isso, não posso deixar de fechar meus olhos e mergulhar na sensação disso,
instigada por ele a ir mais longe, explorar ainda mais, preparada para ir aonde

quer que ele me leve.

— Ever, é você? Você está brincando comigo?

Abro meus olhos para encontrar Haven em pé atrás de nós, seus olhos

estreitados, brilhando com raiva enquanto eles disparam entre Roman e eu. Não

deixando passar nada quando ele ri e me empurra para longe, descartando-me

rapidamente e facilmente como se isso não significasse nada para ele.

— Disse-lhe que ela iria voltar, querida — seu olhar atravessa meu

trêmulo, suado corpo, superado por um desejo não correspondido, dói vê-lo

deslizar os braços em torno dela. Os dois virando as costas para mim, dirigindo-se

para dentro enquanto ele diz — Você sabe Ever, ela apenas não pode ficar longe.

Capítulo 11

Eu corro, cobrindo os blocos em uma questão de segundos, aparecendo

como um borrão que se move rápido para todos os quais eu passo, mas eu não me

importo com isso, não me importo com o que eles pensam, com o que eles vêem.

Eu apenas me importo com uma coisa: livrar-me desse horrível invasor, esse

intruso místico para que meu antigo eu retorne.

Correndo através da porta enquanto Jude está prestes a trancar, quase

derrubando ele, apesar dele rapidamente pular fora do meu caminho. — Eu

preciso de ajuda. — Eu paro na frente dele ofegante, chiando irremediavelmente


— Eu... eu não sei onde mais eu posso ir.

Ele me olha, olhos apertados, sobrancelha junta com preocupação, me

levando na direção da sala dos fundos, onde ele puxa uma cadeira com o pé e faz

um movimento para eu me sentar.

— Calma— ele murmura, — respira fundo, sério Ever, o que quer que seja

eu tenho certeza que tem conserto.

Eu chacoalho a cabeça e me inclino em direção a ele, agarrando os braços

da cadeira, lutando pra me manter plantada, pra não voltar lá. — E se você estiver

errado?— eu digo com os olhos selvagens, bochechas vermelhas, voz aguda e

tremendo, — E se não puder ser concertado? E se... E se eu tiver me quebrado pra

sempre?

Ele se move em volta da mesa dele e cai na cadeira dele girando pra frente

e pra trás, enquanto ele me olha, o rosto parado, plácido, impossível de ler. Mas

algo sobre o movimento, aquele giro constante gentil e imediato me acalma,

permitindo que eu me acomode no meu acento e diminua a respiração e me

concentre na forma que os dreadlocks dele se espalhem pela foto de Ganesh que

está estampada na camiseta dele.

— Olha só— eu digo finalmente, começando a me sentir melhor, quase

humana de novo, — Eu... eu sinto muito ter vindo aqui desse jeito, eu estava no

caminho pra te entregar isso.— Eu alcanço na minha bolsa procurando pelo


pequeno pacote branco e então entrego a ele, assistindo ele dar uma espiada no

conteúdo enquanto eu digo — É sua receita, eu peguei mais cedo e eu tinha a

intenção de deixar na sua mesa, mas aí eu esqueci sobre isso, até agora.— Ele

chacoalha a cabeça em silêncio por um momento me estudando com cuidado

enquanto ele diz, — Ever, isso é sobre o que quer realmente? Claramente você não

está aqui pra falar sobre os meus remédios. — Ele empurra as pílulas pro lado,

com o seu gesso, pegando meu olhar quando ele acrescenta — Confie em mim, eu

não tenho nenhum plano de tomá-las, analgésicos e eu não são uma boa mistura,

como eu tenho certeza que você testemunhou.

E quando ele olha pra mim, eu sei que ele se lembra de tudo, confissão total

que ele fez. Eu pressiono meus lábios juntos e abaixo o olhar brincando com a

barra do meu vestido, sabendo que estou apenas enrolando quando eu digo —

Bom, você poderia tomar os antibióticos pelo menos, tipo pra evitar infecções e

tal.

Ele se encosta de volta na cadeira e coloca os pés em cima da mesa,

cruzando as pernas nos tornozelos e os incríveis olhos verdes dele se encolhem

em mim — O que você acha da gente pular essa parte e ir direto ao ponto, o que

realmente está acontecendo com você?

Eu respiro fundo alisando meu vestido sobre os joelhos, antes de tentar

encontrar seus olhos — eu vim aqui realmente pra te entregar seus remédios, mas

no caminho pra cá aconteceu alguma coisa e —, eu olho pra ele sabendo que eu

preciso ir ao ponto e falar logo antes que ele perca a paciência comigo — eu

acidentalmente prendi Roman a mim.


Ele olha pra mim tentando, se esforçando pra não hesitar, mas ele meio que

hesita.

— Ou melhor, eu me prendi ao Roman. Mas, não foi de propósito, foi um

acidente, eu queria fazer exatamente o contrário, mas ai quando eu tentei desfazer

eu piorei as coisas e apesar de você não ter absolutamente razão nenhuma pra me

ajudar acredite ou não eu não tenho nenhum lugar pra recorrer.

— Nenhum lugar? Você tem certeza sobre isso?— Ele levanta a

sobrancelha falhada dele.

Juntando as minhas palavras, esperando que elas funcionem em convencê-

lo, eu dou um suspiro audível quando eu digo — Eu sei o que você está

pensando, mas é melhor você esquecer, eu não posso contar a Damen, ele não

pode saber nunca, ele não trabalha com magia e não confia de qualquer forma,

então não é como se ele pudesse fazer alguma coisa para ajudar, eu só vou magoá-

lo e desapontá-lo sem nenhuma razão boa pra isso, mas você é diferente você sabe

o jeito para se trabalhar com um feitiço e como eu preciso de ajuda com alguém

que está familiarizado com esse tipo de coisa, bem, eu pensei que você poderia me

ajudar a acertar as coisas.

— Parece que você está colocando muita fé em mim. — Ele joga os

dreadlocks dele sobre os ombros e descansa os braços no colo dele.

— Talvez— eu dou de ombros, — Mas também eu verdadeiramente


acredito que é garantido, quer dizer, agora que você provou que não é mau— eu

sacudo a cabeça na direção dos braços dele, a visão deles me deu uma idéia, algo

que eu posso abordar em algum ponto, e que pode ser a maneira perfeita para

compensá-lo, mas só no futuro, não agora, primeiro eu tenho que passar por isso,

me esforçando pra engolir enquanto eu abaixo meu olhar horrorizada por ter que

admitir isso, de ter que falar essas palavras em voz alta, mas sabendo que é a

única forma. — É como se eu estivesse obcecada pelo Roman. — Eu olho

rapidamente pra ele, vejo ele ficar levemente pálido e sou grata pelo esforço de se

conter. — Eu estou totalmente fixada nele, é tudo que eu consigo pensar, sonhar e

não importa o que eu faça eu não sou capaz de parar.

Ele chacoalha a cabeça balançando levemente como se estivesse

contemplando profundamente, tipo como se ele estivesse consultando

mentalmente o livro de reversão de feitiços procurando pela cura certa. — Essa é

difícil, Ever.— Ele respira fundo e nivela o olhar ao meu. — É complicado.

Eu aceno com a cabeça, mãos cruzadas no meu colo, já dolorosamente

ciente disso.

— Feitiços de ligação. — Ele esfrega o gesso no queixo. — bem, eles nem

sempre podem ser desfeitos.

Eu inclino pra frente, lutando pra manter a calma e falar além da minha

respiração agitada. — Mas, eu pensei que tudo pode ser desfeito, você só tem que
fazer o feitiço certo na hora certa, certo?

Os ombros dele sobem e descem num movimento que faz meu estomago

mergulhar, com olhar dele no meu ele diz — Desculpa, eu só estou dizendo o que

eu aprendi com os meus anos de estudo e prática dessas coisas, mas você tem o

livro, e você tem esse suposto código que passa o código, então você pode me

dizer.

Eu suspiro me reclinando de volta ao meu acento, dedos mexendo com a

barra do meu vestido. — O livro não é de muita ajuda, quer dizer eu basicamente

fiz exatamente o que Romy e Rayne disseram, usei os mesmo elementos, e ...

Ele olha pra mim. — Os exatos mesmos elementos?

— Bem, sim. — Eu dou de ombros. — Na maioria das partes, quer dizer,

em ordem de reverter o feitiço, você precisa repetir os mesmos passos de antes, é

o que diz no livro e Romy e Rayne confirmaram.

Ele acena, não diz uma palavra, só acena, mas suas tentativas pra se conter

são bem claras.

— Então, eu consigo imaginar o que deu errado, a princípio eu pensei que

havia acertado, mas então escapou de mim completamente e começou a se

reverter por si só de novo, repetindo a mesma seqüência de eventos de antes.

— Ever, eu sei que você repetiu seus passos, mas você usou as mesmas

ferramentas? As mesmas ervas? Os mesmos cristais e qualquer outra coisa que


você tenha usado?

— Alguns novos, alguns velhos. — Eu dou de ombros sem exatamente

entender qual é o ponto dele.

— Qual a principal ferramenta que você utilizou, a que realmente faz o

feitiço funcionar?

— Bem depois que eu me banhei, eu— Eu cerro os olhos e penso, a

resposta vindo instantaneamente. — A adaga, eu olho para ele, nós dois já

sabendo aonde eu errei. — Eu usei para a troca de sangue, e...

Os olhos dele se abrem, as bochechas ficam pálidas e a aura dele treme de

um jeito meio assustador. — Foi a mesma adaga que você usou em mim?— ele

pergunta e a preocupação fica clara.

Eu sacudo a minha cabeça vendo o rosto dele se inundar com alívio. —

Não, aquela foi uma réplica manifestada rapidamente. A verdadeira está em casa.

Ele acena obviamente contente de saber, mas determinado a seguir em

frente. — Bem eu odeio dizer, mas aquela era a única coisa que você devia ter

renovado, você necessita oferecer a Deusa algo novo e puro e sem uso. Você não

pode servi-la com as mesmas ferramentas maculadas que você usou para servir

para a rainha do submundo.

Oh.

Ele olha pro mim, olhar entristecido, olhos puxados para baixo nos cantos,

quando ele diz. — Eu gostaria de te ajudar, eu realmente gostaria, mas esse tipo

de coisa vai além dos meus conhecimentos, talvez você deva consultar Romy e

Rayne, elas parecem saber o que estão fazendo.

— Mas, será que elas sabem mesmo?— eu espremo os olhos, incerta de


onde estou indo com isso — Porque o negócio é o seguinte, eu ouvi a elas, eu fiz o

que elas disseram, tipo eu dou um desconto porque elas não gostaram da adaga,

disseram que eu fiz errado e queriam que eu derretesse em um bloco, mesmo

assim quando eu me recusei elas não ligaram, em nenhum momento elas me

disseram que eu não podia usá-la novamente ou que eu deveria usar um novo

conjunto de ferramentas em ordem de reverter o feitiço, de alguma forma elas

falharam em me compartilhar isso comigo.

Nossos olhos se encontraram, ambos imaginando a mesma coisa. Porque

elas fariam isso? Foi de propósito? Elas realmente não gostam de mim a esse

ponto? Jude desconsiderou isso antes de mim, mas também ele não conhece nosso

histórico, nossa história é tão complicada e volátil que eu não consigo deixar pra

lá.

— Tipo, elas são extremamente próximas a Damen, elas o amam na mesma

medida que me odeiam, sério. — Eu balanço a cabeça sabendo que não é um

exagero, é completamente verdadeiro. — E apesar do fato delas supostamente

serem bruxas boas, eu não acho que isso seria difícil acreditar que elas fizeram

isso para me dar uma lição, ou tipo até mesmo pra manter Damen e eu separados,

quem sabe o que elas podem ter planejado? Mas, que não tenha sido intencional,

mesmo se elas simplesmente não sabiam melhor que isso, não tem a menor

possibilidade de eu abordá-las, porque se elas fizeram de propósito elas contaram


para Damen e ele não pode saber disso sob nenhuma circunstancia, eu não posso

magoá-lo dessa forma e ,se elas não sabiam, eu apenas vou dar mais munição para

o arsenal de coisas que elas tem para me ridicularizar.

Jude se inclina na minha direção quando diz. — Ever, eu entendo seu

dilema, realmente, mas você não acha que está sendo um pouco paranóica, esses

dias?

Eu cerro meus olhos e me inclino na minha cadeira imaginando se ele

ouviu alguma palavra do que eu acabei de dizer.

— Tipo, primeiro você me acusa de ser um traidor, o que a propósito, eu

ainda não sei o que você quis dizer, a não ser que isso tem alguma coisa a ver com

Roman, o que não apenas, bem de acordo com você, é o chefe de sua própria tribo

de malfeitores, e o qual você parece detestar e cobiçar devido a um feitiço de

ligação que deu errado. E apesar de você não poder ter certeza é bem provável,

pelo menos na sua mente, que Romy e Rayne querem te pegar, e por isso elas

omitiram um detalhe crucial propositalmente nas instruções delas, para você

bagunçar tudo e manter você e Damen separados, e por falar no Damen você

também está convencida de que ele jamais te perdoará dessa bagunça que você

fez...— ,ele sacode a cabeça, — Você vê onde eu estou querendo chegar?

Eu franzo a testa, braços cruzados e olhos apertados me recuso a

reconhecer isso, além disso, não é tão simples, vai muito além disso.
abraço de urso. Espiando por cima do meu ombro a Damen e olhou para ele com

muito cuidado quando sussurrou: — Fico feliz em ver que vocês estão juntos

novamente.

Eu me afasto e lanço um olhar duvidoso. Lembrando da última vez que eu

vi Miles, lá na festa de despedida que eu fiz para ele na semana passada, e como

ele me pediu para esquecer de Damen e encontrar a felicidade junto a Jude.

Ele lê o meu olhar como se estivesse lendo minha mente, os lábios

curvados em um sorriso quando ele diz, — Eu só quero ver você feliz – isto é tão

mal assim?— ele se vira, dando um pequeno aceno a Damen, quando acrescenta,

— Putz7, eu quero ver todo mundo feliz – é por isso que eu quero limpar todos os

quartos dessa casa, excerto um, o que você está agora.

Damen apertou seu braço em torno de mim, me puxando para um abraço

protetor, e eu senti em sua voz um tom de preocupação enquanto ele dizia: —

Então, existe alguém na lista de convidados que pode nos fazer infelizes?—

Eu olho de relance entre eles, já sabendo a resposta. Eu sabia no instante

em que nós saímos do carro e caminhamos em direção à porta. No momento em

que um esquisito batimento despertou dentro de mim, me alertando para uma

coisa, a única coisa que eu realmente precisava saber:

7 Heack é uma gíria, podendo ser traduzido como poxa vida, putz, caramba...é mais ou
menos por ai.
Roman está aqui.

O resto é apenas detalhe.

Miles apertou a boca de lado e correu os dedos em seu curto cabelo escuro.

— Oh não, não tem lista de convidados – apenas um grupo aleatório de pessoas

que começaram a chegar em torno de meio-dia e que ainda não pararam de

chegar. E só para você saber, eu sei tudo sobre você e Haven, então...

— Como?— Eu o estudei cautelosamente, analisando sua aura, geralmente

amarela, mas que agora estava tingida de uma cor cinzenta conflituosa.

Ele olha para mim, franzindo os lábios e balançando a cabeça quando diz:

— Ouça, eu sei tudo a respeito disso, ela me disse. E embora eu deseje ficar por

aqui e ajudar vocês duas a trabalhar nisso...

— O que ela disse? Quais foram exatamente suas palavras?— Eu perguntei,

meu olhar fixo em Miles assim como Damen mantinha minha cintura ainda mais

apertada junto a ele, ambos em estado de alerta, observado como ele balança a

cabeça e imita um zíper sendo puxado através de sua boca.

— Oh não, não fui a fundo. Sério, Ever, nem sequer tentei. Tudo o que sei é

vocês não estão mais se falando. Quanto ao resto eu sou a Suíça. Totalmente

neutro. Eu me recuso a me envolver. Porque a verdade é que eu realmente não

desejo ficar aqui para ajudar a solucionar isso. Eu estava apenas sendo simpático.

Eu mal posso esperar para chegar a Florença e deixar vocês aqui para resolver isso

em seu próprio país. E é melhor você começar a trabalhar nisso logo, porque eu

não quero ser forçado a escolher um lado quando eu voltar. Quer dizer, talvez

você leve alguma vantagem desde que você me dê carona para ir a escola e tudo

mais, mais ainda assim, eu conheço a Haven a mais tempo e isso tem que contar
para alguma coisa, né?— ele fecha os olhos e balança a cabeça, como se toda a

confusão fosse demais para processar.

— Miles, quanto a isso está tudo bem, mas eu receio que é indispensável

nós sabermos exatamente o que a Haven te disse.— A voz de Damen era baixa,

urgente, repleta de intenções, totalmente clara, ou pelo menos pra mim de

qualquer maneira, que se Miles não se confessasse, ele estaria a poucos passos de

quebrar nossa promessa de nunca espionar os pensamentos privados de nossos

amigos e colegas e começar a olhar dentro da cabeça de Miles para ver por sí

mesmo. — Ele não vai contar para ela se isso é o que está preocupando você, mas

eu temo que nós precisamos saber de tudo.

Miles olha para ele, soltando um suspiro dramático e revirando os olhos —

Até tu, Damen?— 8, Diz ele, olhando entre nós, claramente descontente com a

pressão que estamos fazendo em cima dele. — Está bem, eu vou te dizer, mas

apenas porque amanhã a esta hora já estarei fora daqui – voando através da

nuvens a trinta mil pés de altura, assistindo filmes que eu já vi e me enchendo

com comida de alto teor de sódio que certamente vão me servir. Mas lembre-se,

não importa o quão feio for, você pediu por isto. — E ele olha pra nós, fazendo

uma pausa dramática, sua face ficando completamente seria quando ele diz: —

Ela me disse que vocês estão determinados a mantê-la afastada de Roman ,

porque, lembrem-se, estas são palavras delas e não minhas , então não matem o
mensageiro, mas basicamente ela acha que você está com ciúmes. Bem, não é

realmente você, Damen, mas a Ever pra ser mais sincero. Ela acha que Ever tem

ciúmes, porque, são palavras dela novamente... — Ele a n !


encontrá-lo. Roman. Eu tenho uma fome incontrolável que precisa ser alimentada,

não importando o que isso possa custar a mim ou a meus amigos.

Eu engulo duramente, contraindo lentamente à medida que luto para me

equilibrar. Apegando-me ao pequeno lampejo de sanidade que consigo manter

apesar da batalha que travo dentro de mim.

— Então ai está você. Uma boa luta a moda antiga. — Miles dá de ombros.

— Pena que eu não faço o gênero que aprecia esse tipo de coisa – embora você

possa fazer.

Ele se movimenta em direção a Damen, mas Damen rapidamente o

dispensa. — Eu asseguro a você, eu deixei esse tipo de coisa a muito tempo

atrás.— Ele assente , um breve flash de tristeza atravessa seu rosto, uma memória

de Drina e eu transpareceu e se foi antes que eu pudesse piscar.

Miles concorda, olhando ente nós, quando ele acrescenta: — Embora ela

esteja certa sobre uma coisa... — Damen já mudou lentamente, em estado de

alerta para o que quer que seja, enquanto eu estou ao lado dele, nervosa, inquieta,

desejando apenas que ele venha para mim.

— Ela realmente está escutando muito ‗Smokin‘ 9estes dias. Quer dizer, eu

realmente não sei qual é a nova onda dela, pós-apocalipce, qual rock e roll cigano

que ela está indo, ou o que. Mas é como se ela finalmente tivesse se encontrando,

entrando dentro dela mesma igual ela disse, sabia? E depois de estar perdida por

tanto tempo, ela tem a sensação de ter um pouco de poder próprio, então tente

ignorar a negligencia dela, ok? Isso vai está ao redor dela eventualmente. Mas por

agora, eu acho que nós devemos ter calma10 e tentar não levar para o lado pessoal.

Ou pelo menos vocês deveriam, pessoal; porque eu — eu estou indo para Florença
— eu mencionei isso?

9 É uma banda de punk( www.roquebrio.blogspost.com/2010/08/smoking-popes-discografia-


basica.html ) 10 Sit back-seria esperar sentado, mas achei que ficaria melhor ter calma.

Eu aceno, automaticamente, roboticamente, reorganizando meu rosto

esperando que minha expressão seja agradável. Esperando que tudo me pareça

agradável, porque dentro de mim, eu estou mexida, ardendo, e não existe

nenhuma maneira nesse inferno de deixar ela se divertir com esse passeio,

trazendo Roman envolvido junto a ela.

Nenhum jeito.

Mas eu não disse isso. Eu não disse uma palavra, eu apenas dei de ombros

como se eu mal me preocupasse com isso, como se eu continuasse a inspecionar a

sala. Apenas esperando até a hora em que meu garoto preferido, de olhos azuis e

cabelo loiro dourado aparece.

— Então eu acho que o que eu estou tentando dizer é que não importa o

que está acontecendo entre vocês, eu não estou escolhendo lados, o que significa

que todos são igualmente bem vindos aqui. Mas isso não quer dizer que eu

convidei toda a comitiva dela para vir aqui – Haven veio com todos por conta

própria. Porque honestamente, não diga a ela que eu disse isso, mas há algo sobre

Roman — Ele franziu a testa e olhou para o espaço, buscando a palavra certa,

antes de balançar a cabeça e começar novamente. — Bem – que seja – vamos


apenas dizer que há algo — escondido sobre ele — alguma coisa – estranha. Eu

realmente não sei como explicar isso, mas é a mesma coisa que eu senti em relação

à Drina.

Ele move o olhar entre nós, buscando a confirmação que realmente há algo,

mas apesar de minhas atenções estarem em outro lugar, Damen e eu estamos

unidos nesta, parados lado a lado, uma parede de indiferença que ele não pode

penetrar.

— Que seja. — Ele dá de ombros. — Ele a faz feliz, e isso é tudo que

importa. Quer dizer, não é como se pudéssemos impedi-la, certo?

— Quero dizer, sério..

Miles não parava de falar e eu aproveitei a oportunidade para espiar

dentro de sua cabeça. Mergulhando superficialmente e dando uma leve espiada

ao redor, sentido a excitação dele para sua viagem, sua ansiedade em sair de Holt,

e absolutamente nenhum conhecimento sobre qualquer desonestidade, imortais,

ou qualquer outra coisa do tipo.

—... Então, basicamente, você tem oito semanas e dois meses inteiros para

resolver tudo. E eu estou contando com você, Ever, pois todos nós sabemos como

Haven pode ser teimosa. Quer dizer, eu a amo e tudo, mas vamos encarar, ela

ama estar certa mais do que qualquer coisa, eu sei – e vai lutar até a morte para

defender suas idéias – mesmo quando ela está absolutamente errada.


Aceno, saindo de sua cabeça e renovando meu voto de nunca voltar a fazê-

lo novamente.

Assisto a Damen enfiar a mão no bolso e retirar um papel dobrado em

pequenos quadrados – uma nota que ele provavelmente manifestou apenas um

segundo antes.

— Eu fiz pra você esta lista da qual nós falamos. — Ele acena,

respondendo com olhar em branco para Miles quando ele acrescenta, — A lista de

lugares que você deveria ver em Firenze – lugares que você não vai querer deixar

de conhecer. É uma lista bem longa. — Ele dá de ombros. — deve manter você

ocupado durante as próximas semanas. — O olhar dele encontra o de Miles,

olhando para ele de uma forma calma, serena, desprovido de qualquer sugestão

com segundas intenções, fazendo-se convincente. Mas eu consigo ver além disso.

Sabendo, mesmo sem ser dito, que ele está empenhado em manter Miles longe do

caminho da lista que Roman lhe deu algumas semanas antes – mas eu não sei bem

o porquê disso.

A última vez que eu perguntei, ele ficou completamente frio e se recusou a

falar sobre isso.

Tudo o que sei é que Roman está incentivando Miles para visitar algum

lugar fora-do-caminho que sedia algumas raras antiguidades e isso tem deixado

Damen preocupado. Embora eu não possa imaginar porque, uma vez que todas as

suas pinturas morreram no incêndio que ele mesmo provocou há mais de 400

anos atrás — um incêndio que destruiu toda a sua coleção, incluindo — para

todos os efeitos — ele mesmo.


Miles olha o bilhete, os olhos varrendo de cima para baixo antes de dobrar

de volta e colocá-lo no bolso da camisa. — Confie em mim, depois de ver a

exaustiva programação que eles me enviaram ontem, eu terei sorte de encontrar

tempo para dormi. Eles são muito sérios sobre como gastar cada segundo extra

para melhorar nossas habilidades, você sabe, como um verdadeiro campo de

concentração, e não exatamente as férias italianas com aquela liberdade que eu

estava esperando.

Damen acena, um flash de socorro passa no seu rosto tão rapidamente que

se piscar o olho não seria possível observar. Mas eu não pisquei. E eu vi. E se eu

não estava tão preocupada viajando com meus pensamentos lá em Omã11, eu

poderia ter puxado ele de lado para perguntar o motivo. Mas em vez disso eu

fiquei parada, incapaz de ignorar o fato o habitual formigamento que sinto por ele

é completamente substituído pelo pulsar insistente que agora palpita em seu

lugar.

Um pulsar que não é nem um pouco intimidado com a visão de Jude vindo

em nossa direção.

Ele faz uma pausa, me concedendo um breve aceno de reconhecimento

antes de se concentrar em Damen. Os dois estão enrijecidos, parados, com os

ombros altivos, e expandindo o peito para frente de um jeito tão primitivo que eu

11 Omã é um país situado na Arábia, mais especificamente na extremidade oriental da


Península Arábica.

Capital: Mascate.

O país é constituído por três territórios descontínuos. Os dois territórios menores estão

encravados nos Emirados Árabes Unidos, sendo constituídos pelo Enclave de Madha e pela
Península de

Musandam e territórios adjacentes, no Estreito de Ormuzque separa o Golfo Pérsico do


Golfo de Omã. O

território maior limita a norte com oGolfo de Omã (do outro lado do qual se estendem as
costas do Irão e Paquistão) , a leste e sul com o Mar da Arábia e a oeste com o Iémen, com
a Arábia Saudita e com os Emirados Árabes Unidos.

Até 1958, o enclave de Gwadar na costa norte do golfo de Omã, Baluchistão, Paquistão,
dependia do sultanato de Omã.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Om%C3%A3

até me lembrei do que Jude me disse em outra noite – sobre os dois estarem

destinados em competir por mim.

Dois maravilhosos, inteligentes e talentosos caras competindo por mim. E

tudo o que posso pensar é no cara que está na sala do lado. O namorado da minha

amiga. O único que é tão mal como é irresistível. Damen aponta em direção ao

braço enfaixado de Jude, e diz — Isso deve doer.

E o jeito que ele diz, o tom de sua voz, junto com o olhar do seu rosto, bem,

eu não posso saber ao certo, mais me pergunto se ele quis dizer isso de uma

maneira física ou de uma maneira emocional, já que nós todos sabemos que fui eu
quem o machucou desse jeito.

Jude encolhe os ombros, um casual aumento e queda dos seus ombros

fazem com que ele se entregue, colocando as armas de lado, olhando para mim

quando diz — Eu já estive melhor. Mas a Ever está fazendo o seu melhor para

compensar isso.

Miles olha entre a gente, com sua testa e nariz todo enrugado, quando diz:

— Espera – você está dizendo que a Ever fez isso com você?— Eu olho para Jude,

não tendo idéia de como ele poderia responder, apenas parando um suspiro de

alivio audível quando ele balança a cabeça e ri. — Ela me socorreu na loja. — –

Ele dá de ombros. — Isso é tudo que tenho para dizer – nada sinistro – nada perto

de como seria embaraçador quanto apanhar de uma mulher.

E a segunda vez eu te arrebento, eu ri. Parcialmente porque todo mundo

está em um silencio mortal, apanhados em uma grossa teia de tensão que você

teria que cortar com um machado – e parte porque ainda estou muito ferida, de

modo traiçoeiro e nervoso, eu não consigo pensar em outra forma de contornar.

Mas infelizmente aconteceu de ser uma daquelas risadas horríveis, do tipo alta,

terrivelmente berrante e desesperadora que só consegue ampliar o quão

verdadeiramente estranho o momento é.

Damen está ao meu lado, moralista, em conflito, determinado a fazer o que

é certo para nós – para mim – embora nem sempre faça o certo. E eu me sinto tão

mal por causa dessa confusão, por ser uma terrível namorada, por sentir falta da
única pessoa que tornou nossa vida nada mais do que muito difícil, que eu fecho

meus olhos por breves instantes e mando para ele uma avalanche telepática de

tulipas vermelhas em uma tentativa de compensar isso. Mas em vez das flores que

eu pretendia, ele recebe uma pulverização caótica, mal formada, de um borrão

vermelho por cima de uns emaranhados verdes. O mais lamentável buque que já

foi criado.

Ele se vira me olhando com preocupação quando Jude toma o momento

para dizer: — Eu estou indo – vamanos12. Então, Miles— Ele bate no centro da

palma de Miles, resultando em algo entre um tapa e um aperto. — E, Ever— Ele

se vira para mim, com um olhar demorando por uns longos segundos, tempo

suficiente para me fazer sofrer, tempo suficiente para que todos possam perceber.

E eu não posso disfarçar, mas me pergunto se ele fez isso de propósito, assim

Damen poderia descobrir que escolhi a Jude ao invés dele na hora que eu precisei,

ou se ele é realmente um mentiroso tão ruim que está se esforçando pra esconder

o segredo que partilhamos. Ele mudou o olhar para Damen, um olhar tão

carregado entre eles que nem mesmo eu sou capaz de ler, virando-se apenas

quando Miles o conduz para porta da frente. E isso é tudo o que preciso pra me

convencer a fazer a coisa certa. Para parar de empurrar Damen para longe, ficar

neutra e, finalmente, aceitar a ajuda que ele já havia oferecido para mim.

Dirijo-me, agarrando seu braço enquanto meus olhos procuram os seus,


pronto para derramar toda a história sórdida, mas sinto um forte aperto na minha

garganta, me fazendo engolir minhas palavras e cortando todo meu suprimento

de ar, transformando o que era para ser uma confissão em uma faceta vermelha,

uma sufocada tosse.

E quando Damen passa seu braço em volta de mim e pergunta se eu estou

bem, tudo o que posso fazer é não afastá-lo de mim. Eu reúno todas as minhas

forças para puxá-lo para junto mim da melhor maneira possível. Curvando minha

cabeça, fechando meus olhos, esperado a explosão morrer dentro de mim.

Sabendo que eu não estou mais no comando, nem de mim, nem de nada. O

monstro está assumindo agora, está acordado agora, e se trata de não deixar

Damen e ir ao encontro de Roman.

12 Vamanos „vamos‟ em espanhol

Miles abre a porta para Jude e se vira para nós e diz: — Não, nada de

estranho isso.

Olhando entre nós, ele suspira e balança a cabeça. Eu abro minha bolsa,

procurando freneticamente, até que eu encontro o que eu quero. A pequena parte

sã de mim sabe que eu preciso ir para longe, entregar meu presente e cair fora

antes que seja tarde demais, antes que esta estranha magia tome conta de tudo e

me obrigue a fazer algo que com certeza me arrependerei. Roman está se

aproximando. Eu posso sentir a sua presença cada vez mais perto. Eu preciso sair
daqui enquanto eu ainda posso.

— Não podemos ficar muito tempo, mais eu queria te dar isto. — , Eu digo,

esperando que ele não perceba o tremor de minhas mãos quando eu entrego o

caderno com capa de couro que eu peguei na loja. Concentrando em respirar

profundo e lentamente, determinada a manter o animal acuado, vendo como ele

passa a mão na frente da revista antes de folhear as grossas paginas de dentro.

Tentando esconder o nervosismo da minha voz quando eu digo: — Quer dizer, eu

sei que você provavelmente vai colocar tudo sobre a viagem no seu blog, mas

para o caso de você não ter acesso a internet, ou se quiser manter alguma coisa

privada, pensei que você podia escrevê-lo ai.

Miles ri, olhando pra mim, quando diz: — Primeiro uma festa e agora um

presente? Você está me estragando, Ever!

E embora eu responda com um sorriso, a verdade é que mal registro suas

palavras. Tudo é ofuscado pelo simples fato de que Roman está aqui.

No segundo que eu o vejo, o invasor assume, sufocando qualquer pequeno

controle que eu consegui segurar por algum tempo, e imediatamente é substituído

por um Tum13 insistente que cresce cada vez mais ousado.

Um tum que não vai parar até que eu e Roman sejamos um só.

Damen aperta o braço em volta de mim, ciente da mudança da minha

energia, bem na borda. Preparados e prontos para qualquer coisa, com Misa vindo

primeiro, seguida por Marco e Rafe, disseram adeus a Miles, assim como a

13 Tum = barulho, batidas


Haven,vestida com um vestido de veludo púrpura, que trás o brilho da sua pele,

perfeitamente pálida, observo. Seus olhos brilhando pairaram sobre mim, com os

seus dedos fortemente tocando ameaçadoramente seus quadris. E se ela ainda

tivesse uma aura para se ver, não tenho duvidas que eu estaria olhando para uma

parede sólida do vermelho mais escuro, o mais ardente.

Mas eu não precisaria nem ler a sua energia para saber como ela está se

sentindo ou o que ela está pensando. Ela é exatamente como eu agora – imortal –

míope – com apenas um objetivo em vista – Roman. Disposta a fazer o que for

preciso para deixar claro sua reivindicação. Seu olhar sobre mim, percorrendo

desde minha cabeça até os meus pés. Tão certa de seus poderes, tão confiante em

suas inexperientes habilidades, eu me despeço rapidamente com um encolher de

ombros casual.

Ela se inclina em direção a Miles, dando-lhe um breve abraço de

despedida, deslizando rapidamente para fora quando Roman o agarra em um

desses breves abraços de homens com tapinhas nas costas, a mão ainda segurando

seu ombro quando ele diz, — Agora, não se esqueça, logo depois de ter

atravessado a Ponte Vecchio, desça no beco, vire a esquerda duas vezes, é a

terceira porta a direita. Uma GRANDE PORTA VERMELHA – é imperdível. —

Com olhos brilhando em um turbilhão de pontos de luz, quando ele olha para

Damen e vê a forma como a cor é drenada do seu rosto. — Vale à pena a viagem,
companheiro, confie em mim. — Ele se vira para Miles novamente

— Inferno, pergunte a Damen – você não diria que vale a pena a viagem?

Certamente você conhece o lugar?

Damen olha para Roman, com a mandíbula apertada, com os lábios

estreitados, esforçando-se para manter a calma, com o tom de sempre quando diz,

— não posso dizer que eu fui.

Mas Roman se finge de sonso, a cabeça inclinada para o lado enquanto ele

fala em um sotaque londrino. — Você tem certeza disso, colega? Poderia jurar que

já tinha visto você lá!

— Duvido—, Damen fala, a palavra duramente, no final, visivelmente

desafiando com seu olhar.

Mas Roman apenas ri, com as mãos erguidas em sinal de rendição e

virando-se para mim quando ele diz, — Ever.

Isso é tudo que eu preciso. A simples menção do meu nome em seus lábios

e eu sou líquido puro.

Líquido puramente derretido.

Disposta a segui-lo aonde ele me levar.

Eu passo em direção a ele, atraída pelo seu olhar azul aço. Cada pequeno

passo me trás para as imagens que estão se desenrolando em sua cabeça – aquela

que ele colocou lá pra mim. O tipo exato de coisa que me dava nojo antes – que
me fazia querer socar o seu chakras e acabar com tudo isso. Mas não agora. Agora

eu estou tão ofegante e aquecida, que eu nem poderia chegar lá com a rapidez

necessária.

Damen tenta vir até mim – tanto fisicamente como mentalmente – tentando

me enviar uma mensagem, tentando me puxar de volta para ele, mas não adianta.

Seus pensamentos estão confusos, atrapalhados, não fazem nenhum sentido.

Apenas uma longa seqüência de palavras que eu não tenho nenhum interesse em

prestar atenção.

Roman é a única coisa que me interessa agora. Ele é o meu sol, minha lua e

as estrelas e eu estou feliz por girar em torno dele.

Dou mais um passo, minhas mãos tremulas, corpo dolorido, ansiando o

frio do seu toque na minha pele.

Não me importo mais com que está vendo – o que eles estão pensando – eu

só quero alimentar o monstro faminto dentro de mim.

E eu estou preste a fazê-lo, a ponto de dar o último passo para frente,

quando ele corta pela direita e caminha até seu carro. Me deixando insegura,

incerta, sem fôlego, e confusa – Miles ficou parado, sem saber o que fazer – o olhar

de Damen reflete preocupação. Está presente, e voltando o assunto aonde

paramos, quando diz: — O gosto de Roman na arte é trivial, na melhor das

hipóteses. Grude na minha lista e você vai se dar bem. — Seu rosto parecendo
composto, relaxado, mais eu sei que é tudo menos isso. A energia que emana dele,

conta uma história totalmente diferente.

E eu desejo poder me comportar da maneira que eu suponho – da maneira

que eu eventualmente costumo, uma vez que este pulsar estranho começa a

desaparecer e o impacto que eu acabei de fazer vem cambaleando de volta para

mim. Mas é um momento horrível reservado para o futuro. Certa de que agora,

tudo que eu posso pensar é nele.

Onde ele está indo.

Se ela está com ele.

E o que eu posso fazer para detê-los.

Miles lança olhares entre nós, desejando pular a bordo do avião e apenas

deixar tudo isso pra trás. Nervosamente ele limpa a garganta, quando diz: —

Então, agora que eles foram embora você quer se juntar ao resto da festa? O elenco

está na sala de jogos e estamos prestes a eleger os destaques das melhores músicas

em breve.

Damen começa a sacudir a cabeça com um não, mas eu o interrompo.

Mesmo que eu prefira fazer qualquer outra coisa, mas eu preciso participar de um

show músicas para cantar junto, se eu tenho alguma esperança de salvação, eu

preciso ficar aqui.

Bem aqui nesta casa onde é seguro. Se eu sair, eu vou atrás dele, e daquele

momento em diante, não haverá mais volta.

Além disso, eu preciso de distração. Eu não posso suportar ver o olhar

questionador de Damen, o olhar de mágoa no rosto. Preciso de um tempo para

acalmar e concentrar-me, para que eu possa, eventualmente, explicar a verdade


estranha e terrível do que está acontecendo comigo.

Eu aperto a mão com força e o levo lá para cima, esperando que o véu de

energia que paira entre nós mascare a minha pele fria e pegajosa, que eu entre na

sala de jogo com um sorriso.

Lembrando o segredo que Miles uma vez me contou sobre como atuar –

que é tudo sobre projeção – projetar – projetar – se você acreditar na mentira tão

fervorosamente o público comprará isso também.

Capítulo 13

— Damen... Eu — eu tento dizer a ele, tento forçar as palavras dos meus

lábios, mas elas não vinham. Minha garganta fica toda quente, apertada e lotada

novamente. Como se fosse uma estúpida de uma agenda que se recusasse a

cumprir seus deveres.

Damen olha para mim, a sua crescente preocupação estampada no rosto.

— Vamos... Vamos para Summerland—, eu tento, espantada como se eu

ainda pudesse dizer isso. — Voltar para Versailles.— Eu aceno com a cabeça,

girando em meu lugar até que eu estou totalmente de frente para ele, implorando-
lhe com os meus olhos para ir junto com o meu plano.

— Agora?— Ele freia em uma luz e me olha, seus olhos se estreitaram, testa

franzida – o evidente sinal de que estou sendo examinada.

Eu pressiono meus lábios e ombros, me esforçando para parecer

descontraída, indiferente, como se eu realmente não estivesse sentindo nada,

quando a verdade é que eu comecei a ter contrações musculares e coceiras a partir

do momento que nós estivemos com Miles até o momento de sairmos, e a única

coisa que vai curá-lo, a única coisa que vai permitir-me confiar em Damen e pedir

a ajuda que eu preciso é chegar o mais rápido possível Summerland. Aqui no

plano da Terra, eu não estou mais no controle de mim.

— Eu pensei que você gostava de lá—, eu digo, cuidadosamente, evitando

seu olhar. — Quero dizer, afinal, você é o único que o criou.

Ele acena tentando o caminho que alguém faz quando não está apenas

lutando por paciência, mas também tentando esconder o que está pensando. E a

verdade é que eu não agüento. Eu sinceramente não agüento mais. Eu só quero ir

- Agora. Antes desse invasor estranho tomar conta de tudo.

— Eu gosto— ele diz, voz baixa, controlada. — Como você apontou, eu sou

o único que fez isso. E enquanto eu estou muito feliz por você ter gostado de lá

também - Eu também estou interessado.

Eu tiro o meu cabelo do meu rosto e meus braços cruzados diante de mim,
fazendo o meu melhor para transmitir o meu aborrecimento. Quero dizer, não é

como se eu tivesse um monte de tempo a perder aqui.

— Ever eu,

Ele chega a mim, mas rapidamente se contorce fora do seu caminho. No

entanto, outro sintoma do meu terrível vício, e é completamente involuntário. A

razão pela qual eu preciso para sair deste lugar.

Ele sacode a cabeça e começa outra vez, com um olhar profundamente

triste quando ele diz: — O que está acontecendo com você? Você não tem sido a

mesma por dias. — E só agora, de volta em Miles, ele lança olhares por sobre o

ombro, como ele muda rapidamente da pistas - — Bem, eu odeio dizer isso, mas

no momento que você viu Jude, assim, digamos apenas que houve uma mudança

definitiva em sua energia, e, em seguida, quando Roman entrou na sala— Ele

engole duro e aperta o queixo, tendo um momento para puxá-lo antes que ele diz,

— Depois, o que aconteceu com você?

Eu inclino a minha cabeça, consciente da picada na parte de trás dos meus

olhos para que eu tente mais uma vez lhe dizer, mas eu não posso. A magia não

vai me deixar. Então, ao invés disso, eu olho para ele e escolho uma luta, sabendo

que o animal não tem problema com isso, e disposta a fazer de tudo para

convencê-lo a seguir-me, para ir embora comigo.

— Isso é ridículo!— Eu digo de imediato, me odiando, mas sem ter

nenhuma outra escolha. — Sério. Eu não posso acreditar que você está dizendo

isso! Caso você não tenha notado, meu sonho de verão deitado na praia com você
não parece que vai vir a ser concretizado em breve, assim queira me desculpar por

querer alguns poucos momentos que posso aliviar isso indo para Summerland! —

Eu balanço minha cabeça e olho para longe, atravessando meus braços ainda mais

apertados, mas principalmente para esconder o fato de que eles estão tremendo

tanto que mal consigo controlar eles. Sabendo que eu estou sendo injusta,

completamente irracional, mas se ele tivesse acabado de vir comigo, se eu pudesse

apenas levá-lo lá, então eu poderia explicar tudo.

Ciente do peso de seu olhar na minha cara, do jeito que ele está formando

círculos recém-escuros logo abaixo dos meus olhos, a aspersão fresca da acne

cobrindo meu queixo, o modo como as minhas roupas estão começando a cair

sobre mim tudo caído e solto, com o peso que perdi. Quer saber o que trouxe

sobre isso, porque eu pareço estar falhando em quase tudo. Então, realmente

preocupada com o que faz meu coração doer.

E quando ele restringe seu olhar ainda mais longe, eu sei que ele está

tentando alcançar-me telepaticamente, a comunicar de uma forma que não é mais

uma opção, ou pelo menos não aqui de qualquer maneira.

Então eu me viro, viro para a janela, desesperada para protegê-lo da

terrível verdade de que eu não posso mais ouvi-lo. Deixara de ter acesso aos seus

pensamentos, sua energia, ou mesmo o formigar e sensação de aquecimento ao

seu toque.
Tudo isso acabou. Erradicada. A besta tomou de mim.

Mas só aqui. Em Summerland eu estarei descansada, de pele clara, assim

como o antigo eu. E nós dois juntos seremos tudo que nós estávamos sempre

querendo ser.

— Venha comigo—, eu imploro, minha voz rouca e fraca. — Eu posso

explicar, mas só lá, não aqui. Por favor?

Ele me olha e suspira. Dividido entre o desejo de me agradar e fazer o que

ele acha melhor.

— Não—, ele diz de uma forma tão inequívoca, de forma inegociável, não

há dúvidas que isso significa.

Não só é um não à Summerland, é um não para mim. Um — não— à uma

e única coisa que eu preciso.

Ele balança a cabeça, o rosto pesado, com pesar, quando ele acrescenta, —

Nunca, me desculpe, realmente sou eu, mas não.

Nós não estamos indo. Eu acho que é melhor voltar para casa, de volta à

minha casa, onde podemos sentar e ter uma conversa longa e agradável, chegar ao

fundo de saber o que exatamente está acontecendo com você.

Estávamos juntos, ele faz uma longa lista de preocupações verbais. Como

eu não tenho sido eu mesma ultimamente, como eu não pareço mais comigo, o

quanto eu mudei em todos os sentidos. Nenhuma dessas mudanças para melhor.


Mas a verdade é que as palavras passam direito sobre mim, como uma vaga e

distante zumbido. Eu estou indo para Summerland, com ou sem ele, não há

realmente nenhuma escolha na matéria.

— Você está bebendo o seu elixir? Você precisa de uma fonte nova? Ever,

por favor, fale comigo - o que está acontecendo?

Eu fecho meus olhos e abano a cabeça, piscando os olhos colocando para

trás a ameaça de lágrimas, incapaz de explicar que eu não posso parar este trem

desgovernado. Não sou mais o condutor responsável por esta coisa.

Ele restringe o seu olhar, fazendo uma última tentativa de chegar a mim por

telepatia, mas não adianta. Eu não poderia saber a mensagem mesmo se eu

tentasse. Meu sistema é frito.

— Você não pode nem ouvir falar mais de mim, pode?

Ele para em uma faixa de pedestres iluminada, e chega até mim de novo,

mas sem nada mais eu ainda tenho a luz sob meus pés e saio rapidamente do

carro. Meus braços em volta de mim com tanta força que eles estão prestes a ficar

entorpecidos. Meus dedos se contorcendo, corpo vibrando, sabendo que se eu não

sair daqui, eu não tenho escolha, mas para ir encontrá-lo. Roman. Sem nenhuma

escolha.

— Ouça— digo, a voz trêmula, completamente desequilibrada, mas

sabendo o que eu preciso para obter isso liquidado. Assim, eu estou para baixo ao
fio, eu não tenho tempo a perder. — Eu vou explicar quando chegarmos lá, eu

juro. Apenas temos que estar lá, não aqui. Então, você vem ou não?— Eu aperto

minha mandíbula e cerro os dentes, tentando impedi-los da tagarelice, guardando

os meus lábios trêmulos de uma maneira que não pode falar.

Ele engole rígido, a testa inclinada, olhos tristes, a palavra que exige um

grande esforço quando ele diz: — Não— , tão silenciosamente que eu quase

perco. Em seguida, repete novamente quando ele acrescenta: — Eu prefiro ficar

aqui e te dar alguma ajuda.

Eu olhei para ele, olho para ele enquanto eu posso ficar, que, verdade seja

dita, não é longe de tudo. Querendo tanto subir de volta em seu carro quentinho e

abraçá-lo da maneira que eu costumava fazer, sentir seus braços embalados em

torno de mim, para ser acalmada pelo seu formigamento e calor, e confessar todos

os meus pecados — até que sejam lavados me deixando limpa. Mas, infelizmente,

esse sentimento vem da menor parte de mim, os pequenos lampejos de sanidade

mental que rapidamente são esmagados pela parte que prefere o fruto sujo, mau,

e o mais proibido.

Assim, em vez disso, eu apenas aceno, vendo o seu olhar de espanto

quando eu fecho meus olhos e tento imaginar o portal, esse portal, glorioso

cintilante. Reforço para a direita enquanto eu digo, — Oh, bem, acho que eu vou

sozinha então.
Capítulo 14

Eu bati na terra com a minha bunda. Bati ali na frente dessa bela réplica de

um palácio do século XVIII. Palácio onde viveu a realeza francesa. Mas eu não

vou para dentro. Mesmo que eu pedi muito para vir a este lugar, eu não posso

suportar entrar sem Damen. É o nosso lugar. Um lugar que compartilhamos. Um

lugar onde algumas das minhas melhores lembranças estão. E não há nenhuma

maneira que eu vá lá sem ele.

Eu levanto a meus pés e marcho para frente, olhando em volta enquanto eu

tento me orientar e determinar o meu paradeiro. Sabendo que eu podia imaginar

um destino e encontrar-me magicamente lá, mas eu preferia andar, passear no

meu lazer e tomar meu tempo doce. Aproveite o fato de que estou livre da besta,

ainda que ela esteja, provavelmente, apenas enrolada em algum lugar, apenas

esperando o tempo até eu sair. Mas, por agora estou determinada a aproveitar

algum alívio.

Eu levanto minhas mãos antes de mim, acenando através da névoa

cintilante, o brilho nebuloso que origina de todos os lugares e em lugar nenhum.

Acalmada pelo ar confortavelmente fresco que sopra sobre a minha pele,

confiando que vou finalmente acabar em algum lugar grande, em algum lugar

que eu realmente quero estar. Essa é a beleza de Summerland, todos os caminhos

levam ao bem.

Parando para interromper o fluxo de arco-íris que atravessa o vasto campo

perfumado, eu rapidamente manifesto um pequeno espelho de mão para verificar

a minha aparência. Aliviada por ver que meus olhos, agora, haviam retornado ao

seu azul brilhante normal, meu cabelo havia voltado à brilhar, brilhar uma luz
dourada loira, e minha pele, minha pele está clara e praticamente sem poros,

enquanto que os círculos que viviam sob os meus olhos estão indo agora. Eu

queria que Damen pudesse me ver assim - parecendo o meu velho eu - Como eu

costumava ser. Entristecida de pensar que sua última lembrança é desta criação

monstruosa - a besta da minha decisão. Se ele tivesse apenas concordado em vir,

eu poderia ter explicado tudo.

Ando pelo campo de árvores tremendo e flores pulsantes, o perfume das

pétalas vibrantes seguindo-me até eu tropeçar na familiar estrada pavimentada

que leva para a cidade e as grandes salas de Aprendizagem, onde eu decidi tentar

a sorte mais uma vez. E mesmo que não tenha ajudado nas últimas épocas, eu

estava lá, é um novo dia, uma nova eu, e tenho todos os motivos para acreditar de

que dessa vez será diferente.

Eu faço meu caminho passado por uma coleção de boutiques da moda, um

cinema e um salão de cabeleireiro, atravessando a rua em frente à Galeria de Artes

e passa um cara vendendo doces, flores e pequenos brinquedos de madeira. Eu

apenas faço meu caminho através de multidões de pessoas, todas cuidando de

seus negócios, uma interessante mistura de vivos e mortos. Voltando para o

corredor vazio que me leva à tranqüila avenida que me traz para a faixa íngreme

das escadas. Eu rapidamente as subo. Meu olhar fixo em frente as

impressionantes portas, sabendo que ainda há mais um passo que deve ser
concluída.

Estou diante dos Grandes Salões, que tem seus entalhes elaborados,

impondo colunas e o teto grande inclinado - contemplando um templo construído

puramente de amor, conhecimento, e tudo de bom. Antecipando a usual oscilação

normal de imagens: do Parthenon, para o Taj Mahal, para o Templo de Lotus,

para as grandes pirâmides de Gizé e assim por diante - todos os lugares do

mundo mais belos e sagrados uma suave mistura, remodelando e reformando de

um para o outro, mas ele não vem. Eu não vejo nada. Nada, mas o edifício em

mármore impressionante está orgulhoso diante de mim. As imagens necessárias

para a entrada, estão invisíveis para mim.

Eu estou na lista negra.

Condenada.

Impedida de entrar no único lugar que pode me ajudar a consertar essa

bagunça que eu estou vivendo.

Mesmo depois de eu tentar falsificá-lo, forçando-me a reproduzir as

imagens na ordem que eu me lembro, eles não vão ceder. Os grandes Salões de

aprendizagem não serão enganados por gente humilde como eu.

Eu afundo sobre os passos e coloco as mãos em minha cabeça, mal

acreditando no que me tornei, o quão baixo eu afundei. Querendo saber se este é o

fundo do poço parece que, com certeza ser uma rejeitada em Summerland rejeição
é tão ruim quanto ele ganhar.

— Sinto muito!

Eu fujo para o lado e abraço minas pernas e me pergunto por que a

Senhora Bossy Boots não pode simplesmente passar em torno de mim. Quero

dizer, seriamente, ''I may be five eight— , mas não é como se eu estivesse

ocupando todo o espaço. Meu rosto ainda escondido pelas palmas das minhas

mãos, não quer ser visto por algum superior como a intrusa Summerland quem

tem acesso a todos os grandes edifícios, quando:

— Espera, Ever?

Eu congelo. Eu conheço essa voz. Sei muito bem.

— Ever, é você mesma?

Eu ergo minha cabeça lentamente, relutam em atender o olhar de Ava. A

simples visão de seu cabelo castanho espesso e seus grandes olhos castanhos

espionando algo - algo na periferia que não consigo entender - não faz muito

sentido. Mas não é como se não me importasse, porque na verdade é que ela é a

última pessoa que eu queria ver hoje, ou qualquer outro dia, não importa. Mas,

ainda assim, por que aqui, por que agora, não fui punida o suficiente?

— Tentando encontrar o seu caminho? — Pergunto, a voz gotejando com

sarcasmo como se eu pudesse olhá-la mais duramente. Percebendo logo após, que

isso é muito bonito o que eu estava apenas tentando fazer um pouco mais cedo, e
horrorizada ao perceber que eu havia descido tão baixo que agora, estou de igual

a ela.

Ela se ajoelha ao meu lado, a cabeça inclinada, olhando-me atentamente

quando ela diz: — Você está bem?— Seu olhar se deslocando em mim com

cuidado, com atenção, quase como se ela realmente se importasse.

Mas eu sei melhor. Ava só cuida de uma pessoa, dela mesma essa é Ava.

Para ela, ninguém vale à pena e ela me provou isso quando ela deixou Damen

morrer, depois de prometer-me que ela ia ajudá-lo.

Olhando-a por baixo, surpresa ao ver como ela não parece tão diferente do

que ela era antes de fugir com o elixir, mas, novamente, ela está em um lugar

muito bom, talvez por isso ela não exige que toda uma grande mudança.

— Você está bem?— Eu a imito, falando de um jeito doce, com tom de

preocupação. Sorrindo debochadamente, quando acrescento: — Bem, suponho

que eu estou. Acho que eu estou realmente e verdadeiramente bem.

Considerando todas as coisas. Embora eu tenha certeza que eu não estou bem

como você. — Dou de ombros. — Mas, novamente, quem é?

Meus olhos viajam pelo o pescoço dela, em busca de uma tatuagem de

Ouroboros indicando ou algum sinal de seu novo status como uma imortal.

Surpresa ao ver que não só ela está livre de todas as marcas, mas também que seu

habitual emaranhado de jóias, altivo foi reduzido a um citrino14, único pendurado

a partir de uma corrente de prata simples. Vesgo, me esforçando para lembrar o

que eu aprendi sobre essa particular pedra - algo sobre isso promover a

abundância e a alegria e - oh, sim, protegendo todos os sete chakras - Bem, não

admira que ela está usando.


Pressiono meus lábios juntos e suspiro, atirando-lhe um olhar que não

deixa espaço para dúvidas sobre o que eu sinto por ela. — Quero dizer, agora que

você tem o mundo inteiro aos seus pés, ninguém é melhor do que você, certo?

14 http://pt.wikipedia.org/wiki/Citrino_(mineral)

Então me diga Ava, como se sente? Como é a sensação de ser a nova e melhorada

você? Valeu à pena trair seus amigos?

Ela olha para mim, os olhos puxados para baixo nos cantos, a preocupação

nublando seu rosto. — Você entendeu tudo errado —, diz ela. — Não é nada do

que você pensa!

Me levanto, me sentindo trema, desligada, mas fazendo o meu melhor

para esconder isso dela. Determinado a deixá-la para trás, indisposta a ouvir mais

mentiras.

— Eu não tomei o elixir, Ever. Eu ...

Viro-me, piscando os olhos com raiva quando eu digo: — Você é

inacreditável! Claro que você tomou o elixir! O-l-á, eu voltei. — Puxo minha

camiseta e balanço a minha cabeça. ''Como se vê, nada Ava, foi como havíamos

planejado. Não, corrigindo, ele pode não ter ido como eu planejei, mas certamente

foi como você havia planejado. Você deixou Damen sozinho, fraco e indefeso,

assim como você tinha planejado o tempo todo. Você o deixou só ali, vulnerável,

morrendo, exatamente onde Roman podia chegar até ele. E então, como se isso
não fosse o suficiente, você emparelhada novamente naquela noite com Haven,

preparou uma bela xícara de chá de beladona e a fez beber. — Eu balancei minha

cabeça, me perguntando porque eu estou mesmo me preocupar com isso, me

preocupando com ela. Ela já tirou o suficiente de mim já. Eu não deveria dar-lhe

mais.

Desço as escadas, pernas pesadas, como chumbo, como se elas estivessem

relutantes em cooperar com os sinais que meu cérebro envia claramente.

Esforçando-se para colocar um pé diante do outro, quando ela diz: — Eu

desejo que você não faça isso. Desejo que você me dê uma chance para explicar.

Mas eu simplesmente encolho os ombros e continuo no meu caminho,

falando por cima do meu ombro, — Sim, bem, você não pode ter sempre o que

você quer? - Você se lembra dessa música, certo?

Ela está atrás de mim, tão quieta e eu ainda não posso ajudar mas olhar

sobre meu ombro para ver o que ela está tramando. Meus músculos tensos e

prontos, para o caso de ela estar planejando para o ataque, e surpreso ao encontrá-

la com as palmas das mãos juntas, curvando-se diante de mim quando ela move

os lábios em um sussurrado — Namastê.

Parando brevemente antes de virar em direção ao prédio, deixando-me

pasma, sem palavras, enquanto as grandes portas abertas à sua frente imponente

e recebê-la dentro.
Capítulo 15

— Hei.

Eu olho para cima, surpresa por ver Jude bem atrás de mim, tão absorta em

meu serviço que nem o tinha ouvido entrar.

— Como você faz isso?— eu o olho, me focando em sua aura, agora ficando

em um belo tom de azul.

— Faço o que?— Ele se inclina no balcão e me olha.

— Sempre consegue andar silenciosamente perto de mim assim?— Meu

olhar repousa em sua camisa preta, curiosa para ver o que ele esta vestindo hoje.

— O que é isso?— eu movimento a cabeça em direção a ela.

Ele fecha os olhos e levanta as mãos, tentando juntar seus dedos polegares

com os indicadores, mas tentando por muito tempo antes de desistir e começar a

cantar, — Ommmmmmmmm,— o som vem de dentro do seu diafragma.

Espreitando-me quando ele diz, — É o som da existência – o som do universo.

Eu enrugo meu nariz, sem ter idéia de onde ele esta tentando chegar.

— O universo é feito de vibrações, energias pulsantes, certo?

Eu aceno. — É o que tenho dito.

— OK, o — Om— é o som usado para ser o som da energia – esta vasta,

energia cômica. Você nunca ouviu falar disso antes? Você nunca meditou?
Eu dou de ombros. Eu costumava meditar. Eu costumava limpar minha

alma. Finja que raízes cresciam desde a sola dos meus pés de profundidade no

centro da terra e todo tipo de bobagem para sentir-se bem assim. Mas não mais.

Quero dizer, não é como se eu tivesse tempo de sentar, regular minhas respirações

enquanto o mundo esta desmoronando ao meu redor.

— Você realmente deveria voltar a fazer isso, sabe. Isso realmente ajuda e

equilibrar e a curar, para não falar como isso –

— E isso cura você?— Eu olho incisivamente em seus braços, ainda

discutindo se devo ou não agir sobre a idéia que eu tive na outra noite, somando

os prós e contras e ainda não chegando nem perto de uma decisão.

— Vou fazer uma consulta com um médico um pouco mais tarde, então

acho que poderemos descobrir. — Ele dá de ombros, os olhos cheios de cobiça

para cima de mim quando ele adiciona, — E falando sobre –— Nossos olhares se

encontram. — Eu queria saber se você poderia me dar uma corona. Eu poderia

pegar um onibus, mas então vou ter faltar a minha aula e eu nao quero fazer isso,

sabe?

— Aula?— Olhou para ele, o rosto em branco.

— É, você sabe, Desenvolvimento Psíquico 101 com ênfase em auto-

capacitação e bruxaria – com certeza você se lembra?— ele ri.

Eu aceno, saindo do banco, dando uma boa olhada nele. — Como é que
vai, afinal?— Eu faço meu caminho ao redor do balcão dando o meu lugar para

ele.

— Ok. — Ele acena. — Sua amiga, Honor, parecer ter um talento nato para

isso.

Eu paro. Paro tudo. Ele conseguiu minha total atenção agora. — Honor?

Ele da de ombros. — Sim, você sabe. Eu pensei que vocês fossem amigas?

Eu balanço minha cabeça, me lembrando do último dia de aula, os planos

que Honor tem para sua melhor amiga, Stacia. — Nós somos colegas de classe. —

Dou de ombros, me pressionando na parede para que ele passe. — Não somos

amigas de verdade. Acredite em mim, tem uma diferença.

Ele para – para quando ele deveria continuar andando. Para de uma

maneira que ele está praticamente colado em mim.

Seus olhos procurando meu rosto de uma foram que nunca deixa de me

enviar um imediato fluxo de calma por todo o meu sistema – a primeira calma

que sinto em – dias. Não desde que sai de Summerland. Após Summerland, tudo

o que pude pensar foi sobre Ava e como ela conseguiu entrar lá. E mesmo que

dure somente alguns segundos, mesmo que ele logo se afastou para perto do

balcão, o impacto da calmante carga de sua presença ainda persiste.

— Ela quer muito aprender, ou ela tem um talento nato para mágica,— ele

diz, pegando a caixa de recibos com dois dedos bons e folheia-os bem
desajeitadamente. — Embora pareça bem devotada, então meu palpite é que seja a

primeira opção.

Eu pisco, tentando lembrar o que sei sobre Honor, mas não muito fora ela

ser a namorada de Crag e BFF15 de Stacia, não é muita coisa.

Eu olho para Jude, me perguntando se devo ou não contar sobre o que eu

vi naquele dia quando espreitei dentro da cabeça de sua cabeça e que as inteções

de Honor não são muito – honraveis16. Mas não é como se Stacia devesse alguma

coisa a mim (ou para qualquer outra pessoa) um favor, então quem sou eu para

me envolver?

— Então, que horas começa a aula?— Eu pergunto, decidindo me manter

prática enquanto faço meu caminho para o escritório dos fundos.

— Em uma hora. Por que?— Ele olha por cima do ombro.

— Eu estarei lá nos fundos se você precisar de mim, — Eu falo, me

esgueirando para o escritório dos fundos e fechando a porta atrás de mim.

Recuperando O Livro do seu esconderijo e batendo com ele na mesa de madeira

15 BFF = Best Friend Forever, que seria Melhor Amiga para Sempre. Achei que fica mais
legal deixar do

jeito original.

16 Aqui a Ever faz um trocadilho, ja que honor é — honra— em português

antiga. Tomando um momento para uma profunda e limpa respiração antes que
eu o abra, traçando meu dedo pela elaborada inscrição de ouro na capa, me

decidindo se eu devo ou não fazer isso.

Da última vez que eu visitei esse capítulo, as coisas não foram muito bem.

E agora que eu sei sobre a conexão de Roman com ele – bem, eu já não estou certa

se posso confiar nele. Porque se ele for mesmo o responsável por ele ter caído em

minhas mãos então minha leitura agora só me faz (novamente!) uma peça em seu

plano. Mas então, se ele tem influência sobre essas páginas, então talvez haja uma

pista escondida em algum lugar, uma idéia de como terminar com esse jogo, ou

como ele planeja ganhar.

Talvez, assim como os registros akáshicos em Summerland, é tudo sobre

fazer o tipo certo de pergunta.

Mas enquanto os registros akáshicos permitem que somente os dignos

entrem em seus enormes salões, O Livro das Sombras apenas requer um código,

seguido por uma questão codificada, de preferência em rima.

Então depois de cantar baixinho como Romy e Rayne me ensinaram:

Dentro de um mundo de magia – reside dentro dessa pagina muito

Para que eu sou escolhida – retorne para minha casa

Dentro do reino dos místicos – vou agora residir

Permitir vislumbrar sobre esse livro – e ver quais são as mentiras dentro

Sento-me lá, febrilmente tentando pensar em alguma pergunta inteligente

em rima para decifrar o código de Roman – mas, minha mente está em branco e O

Livro continua lá, suas páginas se recusando a me mostrar algo de novo.

Eu suspiro e me inclino para trás da cadeira, girando de um lado para o

outro enquanto eu olho a sala, os diversos tons e figuras que revestem as paredes,
os livros miríade 17 empilhados nas prateleiras, uma sala transbordando com tanto

potencial, mantendo todos os ingredientes necessários para todos os tipos de

1717 http://pt.wikipedia.org/wiki/Mir%C3%ADade

feitiços mágicos, mas nenhum deles me inspira, nada disse oferece qualquer tipo

de ajuda. E a verdade é, não há mais tempo a perder. O verão esta acabando

rápido e eu preciso achar uma solução, pois não ha mais nenhuma maneira de

continuar evitando Damen.

Damen.

Eu pressiono meu rosto em minhas mãos, determinada a manter as

lágrimas á distância. Forçar esse gosto salgado de volta para a minha garganta.

Eu não o tenho visto desde a festa de Miles quando eu pulei para fora de

seu carro e fui para Summerland. Não atendei suas ligações. Não atendia a porta.

Quase nem ligava para os inúmeros buques de tulipas vermelhas que agora

enchem meu quarto. Sabendo que eu não o mereço — não o mereço — ate que eu

encontre uma forma de nos tirar disso — encontrar um jeito de pedir a ajuda dele

— ou até mesmo encontrar um jeito de pedir a Jude que pergunte a ele. Mas toda

vez que eu começo, a besta interfere — recusando-se a permitir que algo interfira

entre Roman e eu. E a verdade é, eu sei que eu não estou apenas correndo contra o

tempo, mas sim ficando sem lugares para procurar. As buscas de Jude não

resultaram em nada, e tudo o que eu tenho tentado ate agora somente resultou em
um completo e absoluto fracasso. E se a noite passa for somente uma indicação,

vai somente piorar.

Eu abro meus olhos para um quarto escuro, o nevoeiro costeiro recusa-se

até a sair para dar lugar para a lua sair completamente. Mas ainda assim, saio da

cama e vou para fora da casa, meus pés descalços, vestindo apenas uma camisola

de algodão puro, com apenas um destino em mente. Atraída para a casa de

Roman como uma sonâmbula — como uma das noivas de Drácula.

Movo-me rapidamente, sem esforço, através do silêncio, ruas vazias,

parando apenas fora de sua janela, enquanto em me abaixo e espio através da

brecha da cortina. Imediatamente sinto a presença dela, sabendo que ela esta ali —

em algum lugar — apreciando a única coisa que serve para ser minha.

Minha mente girando, enrolando, como se meu corpo doesse por uma

fome não satisfeita. A besta em fúria dentro de mim, pedindo para eu parar de

pensar e agir – somente quebrar a porta e eliminá-la agora. E eu estava prestes a

fazer isso, somente prestes a fazer o movimento, quando ela me sente também.

Atacando em direção a janela, com um olhar tão temperado, tão ameaçador que

foi um tapa na minha sanidade – um lembrete de quem eu sou — de quem é ela

— e o que estaremos a perder se a besta me vencer.

E antes que eu tenha uma chance de reconsiderar, eu corro. Todo o

caminha de volta para casa e para minha cama, onde eu estou suando, tremendo,
fazendo o meu melhor para acabar com a necessidade eminente — para extinguir

a chama negra em mim.

Uma chama que queima mais brilhante, mais quente e mais forte a cada

dia.

Um fogo tão insaciável que vai me consumir por todo o seu caminho — o

meu pequeno lampejo de sanidade – minha frágil conexão com o futuro que eu

quero – a tudo mais que ficar entre mim e Roman.

E pouco antes de finalmente se apagar, eu me dou conta da pior parte de

tudo — no momento em que tudo acontecer eu vou estar tão longe, que eu nem

vou me dar conta da minha queda.

Jude entra pela porta e cai pesadamente em uma cadeira—

propositalmente, de forma significativa, claramente querendo ser notado.

— Como foi?— Eu murmuro, levantado a cabeça da mesa de onde ela

esteve descansando na ultima hora. Minhas mãos tremem, minhas pernas ainda

tremendo, ainda lutando para suprimir o impulso irresistível que veio definir-me.

— Eu poderia perguntar a mesma coisa, — ele me olha devagar. — Algum

progresso?

Dou de ombros. Na verdade, eu dei de ombro e gemi. Que, de tanto que eu

estou estressada, deve ser resposta suficiente. Cuidando para que minhas mãos

fiquem no meu colo, fora da vista dele, para que ele não as veja tremendo.

— Ainda tentando quebrar o código?


Eu olho para ele brevemente, então fecho meus olhos e balanço a cabeça.

Eu desisti do livro. Quanto mais eu sei, pior as coisas ficam.

— Eu não consegui encontra nada também, mas ainda. Estou feliz de tentar

outra quebra se você ainda quiser a minha ajuda.

Em uma palavra — sim. Eu quero a sua ajuda. Eu quero toda ajuda que eu

conseguir. Mas com a besta tentando tomar o controle agora, as palavras

simplesmente não saem. Minha garganta esta tão quente e apertada que somente

o silêncio vai acamá-la.

— É uma coisa que rima?— ele pergunta, recusando a deixar passar.

Eu balanço minha cabeça, ainda não conseguindo falar.

Mas ele dá de ombros, nem um pouco assustado com a minha falta de

interesse no jogo. — Eu sou muito bom em cânticos se eu falar para mim mesmo –

muito bom em persistir nesse assunto – quer ouvir um?

Eu fecho meus olhos, desejando que ele siga em frente.

— Sábia decisão. — Ele sorri, alheio ao que estou passando. Fingindo

limpar o suor imaginário da testa com a mão enfaixada fortemente, o que só me

lembra aquele passeio que ele me perguntou.

Eu levanto, esperando que ele me siga, mas ele continua sentado ali, me

olhando de uma forma tão intensa, tão insistente, que eu não posso evitar

resmungar, — O que? O que é? Riley está aqui?


Ele balança a cabeça, balançando suas tranças de seus ombros e suas costas,

enquanto seus olhos azul-esmeralda abaixam para as laterais. — Não a vejo a um

tempo,— ele diz, sua cabeça inclinada, seu olhar focado em mim. — Eu admito,

eu tento de tempos em tempos, mas eu sempre vejo o vazio. — Ele dá de ombros.

— Eu acho que ela não quer ser vista agora.

Eu enrugo a minha testa, não tenho certeza se concordo. Riley têm me

mandado bastantes mensagens enigmáticas ultimamente que me fez duvidar

disso, para me fazer sentir como se ela não quisesse ser vista.

— Você acha que talvez — Eu faço uma pausa, não querendo parecer

ridicula, mas depois decido que não importa. Já me fiz bastante ridicula na frente

de Judes antes, o que é mais uma vez? — Você acha que talvez não é que talvez

ela não queria ser vista, mas sim que ela não pode aparecer?— Ele olha para mim,

prestes a falar, mas eu levanto meu dedo e digo, — E não me refiro a não poder

ou não ser capaz de encontrar uma maneira de vir, mas mais como, eu nao sei,

como se talvez ela não tivesse permissão para vir? Talvez alguém ou alguma coisa

a esteja impedindo?

— Pode ser. — Ele dá de ombros, os ombros descendo e subindo de forma

tão casual, tão facilmente que eu não tenho certeza se ele realmente acredita em

mim ou se está brincando com a minha cara. Querendo polpar meus sentimentos

da fria, dura, inevitável verdade que minha irmã fantasmagórica esta aos pouco
desistindo de mim – que ela está muito ocupada com seus afazeres da vida pós-

morte para vir e brincar. — Ela não apareceu em mais nenhum sonho?— ele

acrescenta, sua voz mais que curiosa, beirando a fronteira da esperança.

— Não, — eu digo, sem nenhuma hesitação, sem querer pensar no sonho

perturbardor que eu tive, onde Damen está preso atrás de uma parede de vidro e

Riley fica do outro lado, me incentivando a ficar atenta, para não desviar o olhar.

— Quer tentar alcançá-la agora?— Ele olha para mim a cabeça inclinada

para o lado.

Mas eu simplesmente balanço a cabeça e suspiro. Quero dizer, claro que eu

gostaria de alcançá-la agora – eu gostaria muito. Quem não gostaria de ver sua

adorável irmã menor morta? Mas quando eu penso no estado em que estou, não

há nenhuma maneira de que eu possa fazê-lo. Mesmo se ela pudesse ajudar de

alguma forma, eu duvido seriamente que possa, mas ainda assim, mesmo se

pudesse, eu não posso suportar que ela me veja assim. Eu não quero que ela saiba

o que eu fiz. O que eu me tornei.

— Eu estou — Eu não estou realmente pronta para isso agora,— eu digo,

limpando minha garganta.

Jude se recosta na cadeira, pés apoiados no joelho, olhar implacável, jamais

se afastar de mim. — O que exatamente você está procurando?— ele pergunta,

sua testa enrugada, como se ele estivesse realmente se concentrando. — Tudo o


que você tem feito esses dias é trabalhar. — Ele desce o pé para o chão e se inclina

para mim, apoiando seus braços na mesa enquanto ele acrescenta, — Você nem

percebe que o verão está lá fora? Verão em Laguna Beach! Metade da população

sonha com um doce lugar como esse e você mal toma conhecimento. Acredite em

mim, se eu não estivesse tão machucado, estaria lá fora surfando e curtindo cada

momento livre que eu tivesse. Sem mensionar, me corrija se eu estiver errado, mas

esse não é o seu primeiro verão aqui?

Eu tomo um logo fôlego, me lembrando como no último verão me

encontrava machucada, hospitalizada, recém – órfã, e sobrecarregada com

poderes psíquicos que eu não conseguia suportar, ingenuamente pensando que as

coisas não poderiam ficar tão ruins e estranhas quanto jamais poderia ficar. Mal

conseguindo acreditar que já tinha passado um ano desde que minha vida toda

mudou.

— Eu posso lidar com a loja. Inferno, eu posso ir sozinho ao médico, quem

liga se eu chegar atrasado? Mas, por favor, faça um favor a você mesma, e dê uma

folga. Têm um mundo inteiro lá fora esperando para ser explorado e com o tempo

que você passa aqui dentro —bem, não é saudável.

Estou diante dele, uma confusão de apertar a mão, corpo tremendo,

respiração irregular – um outdoor ambulante de vida não saudável, desesperada

scaneando a sala procurando pela saída mais próxima.

— Ever? Você está bem?— Ele se inclina na minha direção.

Eu balanço a minha cabeça, incapacitada de responder, incapacitada de

falar. Roman está lá fora. Eu posso senti-lo por perto. Tendo acabado de sair da

loja e estava vagando pelas ruas, vindo direto na minha direção. E eu sei que é só
uma questão de tempo, talvez mais um minuto, dois no máximo, e a velha eu vai

ter ido, completamente sucumbida ao monstro dentro de mim.

Eu aperto a borda da mesa, juntas apertadas e brancas, tentando me

equilibrar, horrorizada em ser vista dessa forma, e precisando fugir antes que seja

tarde demais –

Correndo em torno da mesa tão rapidamente que já estou ao lado de Jude

antes mesmo que ele possa piscar. Meus dedos agarrando o gesso branco ao redor

de seu braço, não tendo outra escolha a não ser dizer, — Se você quer me levar,

nós temos que fazer agora – eu não posso esperar!

Ele se força a ficar com uma expressão preocupada que estragava seu rosto

enquanto ele me olhava e dizia, — Ever, sem ofensas, mas eu não tenho certeza se

quero entrar em um carro com você. Você parece um pouco – nervosa – para dizer

no minimo.— Ele esfrega os lábios e balança a cabeça, nivelamento os olhos

verde-mar direto nos meus olhos em uma tentativa de contato, mas não adianta.

Eu estou perdida, drenada, quase perdida – — Sério, eu acho que você deveria ir

lá fora e, tomar um pouco de ar fresco, e tomar algumas longas respirações –

verdade, você vai se surpreender do quanto bem você vai se sentir.

E por mais legal que possa soar, por mais bem intencionado ele esteja

tentando ser, eu sei mais. Lá fora é o último lugar que eu deveria estar. Lá é onde

Roman está perigosamente próximo, mais perto a cada segundo. Além disso, isso
foi exatamente o que eu quis dizer, quando eu disse que nós deveríamos ir. E

mesmo que eu realmente não tenha parado para pensar nisso, realmente não

considerou a lista completa dos prós e contras desde que eu tive a idéia há alguns

dias, não há tempo a perder, nós vamos, nós dois, porque não importa o que

acontecer lá, ficar aqui vai ser pior.

Com o coração batendo, meu pulso vibrando, e Roman estando tão perto –

eu aperto o braço de Jude, esperando com toda esperança que eu ainda possa nos

puxar para fora agora que tudo está falhando comigo.

Esperando que eu ainda possa alcançar o único lugar onde eu ainda posso

ser eu.

Pegando sua expressão alarmada, perplexa e sabendo que se não fizer isso

rápido, vai ser tarde demais.

Muito tarde para nós.

Eu estarei com Roman.

A mágica negra vai ganhar.

A voz tremula e insegura, enquanto eu digo, — Eu sei que parece loucura,

mas eu preciso que você feche os olhos e imagine um portal de luzes douradas

logo a sua frente. Concentre-se com todo o seu poder e não me faça qualquer

pergunta. Apenas confie em mim nisso.


Capítulo 16

Tropeçamos através do portal, nós dois, lado a lado, caindo sobre o capim

maravilhosamente alegre antes de saltar levemente para os nossos pés. E a

primeira coisa que faço é voltar-me para Judas, apontando para seus braços

quando eu digo: — Olha!— Ele olha para baixo, olhos amplos como se olhasse

entre os seus braços nus e eu não muito compreensiva. — Certamente, no decorrer

de seus estudos metafísicos você já se deparou com a menção de Summerland?—

Eu sorrio, meu rosto e levantando os ombros - levantando tudo - liberta do

monstro dentro de mim - não importa quanto temporária.

Ele olha em volta, olhando através da névoa, nebulosas brilhantes as

árvores tremendo, ramos sobrecarregados com frutos suculentos madura, as

flores grandes com pétalas coloridas pulsante, e o córrego fluindo rapidamente

arco-íris um pouco além. — É isso?—, Pergunta ele, o rosto carimbado com

reverência. — Isto realmente existe?

Eu aceno, qualquer apreensão que eu tinha em trazê-lo aqui de repente,

desapareceu. Só porque ele era uma má idéia para arrastar ao longo de Ava, não

significa a mesma coisa vai acontecer com Jude. Eles são totalmente diferentes. Ele

é diferente. Caminho mais evoluído que Ava poderia esperar ser. — Por que me

trouxe aqui?— Eu ri de imediato, lendo a pergunta que ele supostamente não fala.

Ainda não manifestadas. Enviando a resposta telepaticamente quando eu penso:


A fim de curá-lo, é claro!

Cuidado para editar os outros, a razão mais premente, que é para que eu

pudesse me curar.

Os pensamentos são energia, acrescento eu, vendo o olhar surpreso no

rosto. Você pode senti-los, ouvi-los, até mesmo, criar com eles. Mas, se você

preferir, voltamos para o hospital, então eu ficarei feliz em fazer o novo portal. Ele

olha para mim, afim de falar quando ele muda de idéia e pensa no lugar onde

está. Primeiro, fechando os olhos como se tentasse se concentrar, mas logo

percebeu o quão fácil tudo é , ele olha bem para mim e permite um fluxo direto de

palavras para minha cabeça:

Eu não posso acreditar que você esperou tanto tempo para me trazer até aqui. Eu

não posso acreditar que você me deixe sofrer assim! Eu ri, concordando com a cabeça e

sabendo que a melhor maneira de compensar isso é para mostrar a ele o que mais

é possível aqui. — Feche os olhos— , eu digo, vendo como ele obedece sem

hesitação, a sua confiança em mim tão completo, eu não posso ajudar, mas

descargo. — Agora pense o que quiser — qualquer coisa — e certifique-se que

você realmente quer, porque em um instante, ele vai ser seu — está pronto?

E eu mal tive a chance de terminar e já estou sentada em uma praia de areia

rosa, observando como ele rema em um oceano composto da mais bela água azul

e surfando em uma série de ondas perfeitas. — Você viu os barris?— Ele


pergunta, prancha debaixo do braço, fazendo o seu caminho até a mim.

— Incrível! Tem certeza que não estou sonhando?

Eu sorrio, lembrando da minha primeira viagem à Terra do Verão e como

eu estava encantado. E não importa quantas vezes eu voltar, a magia de se

manifestar em uma escala tão grande nunca fica velho. — Não é um sonho. — Eu

sorrio, ao ver a maneira como seus dreads trilham o gotejamento de água salgada

e clara no seu peito e na cintura, no cós do seu short de surfar preto e cinza. De

repente, superado pela tranqüilidade que lânguido sentir sua proximidade traz e,

rapidamente, evitando o meu olhar quando eu digo, — Confie em mim, é muito

melhor do que um sonho.

Pensando em como ultimamente a maioria dos meus sonhos se tornaram

pesadelos.

Então, qual é o próximo? Ele joga sua prancha na areia e olha para mim.

Dou de ombros. É o seu momento, por isso é realmente só você. Tudo o que você

quer tentar a seguinte está bem, por mim. Tentando parecer útil, solidária, quando

a verdade é que, quanto mais tempo ele fica, mais eu tenho uma desculpa para

evitar o plano da terra, onde todos os meus problemas estão à espreita.

Ele respira fundo e fecha os olhos, fazendo com que a prancha e a praia

desaparecessem em favor da Indy 500 racetrack18. Navegando pelo curso no

momento da morte perto - desafiando velocidades altas quando eu me sento na


arquibancada, guiando-o. E justo quando eu tenho certeza que não pode tomar

outra volta monótona, ele muda a cena para um charmoso café no porto de

Sydney, com uma visão de primeira classe da ponte, a água, e que vão além da

casa de ópera.

Levantado seu copo até o meu, eu digo: — Eu não sabia que você era do

tipo de Indy. — (não sei que foi isso msm que ela quis dizer, mas foi o melhor que

consegui) Ele dá de ombros. — Eu não sou. Mas hey, você tem que tentar isso

enquanto pode, né? — Tomo um gole da minha soda, fazendo uma careta ao seu

sabor doce, tendo me acostumado a preferir a amargura do elixir. Observando

como a visão de repente muda a partir do brilhante das águas australianas para

um dos moinhos de vento, tulipas e canais — uma visão que só podia significar

uma coisa.

— Amsterdam?— A palavra estremece em minha garganta, me lembrando

da nossa história comum, quando ele foi Bastiaan de Kool e eu era a sua musa e

eu não posso deixar de perguntar se ele de alguma forma sente isso também.

Como agora que estamos aqui, essas memórias há muito tempo são de algum

modo restaurado, embora nunca funcionasse assim para mim.

Ele dá de ombros, surpreso com minha reação quando ele diz: — Eu nunca

estive aqui. Eu pensei que seria legal. Mas se você prefere que eu faça outra coisa

18 A Indy 500 ou o 500, é uma corrida automobilística americana, que acontece anualmente
no final de

semana do Memorial Day no Indianapolis Motor Speedway, em Speedway, Indiana.


E antes que eu possa objetivar, digo-lhe desfrutar da fantasia durante o

tempo que ele quiser, eu estou sentado em uma gôndola em Veneza, vestida em

um vestido elaborado rosa e creme, um emaranhado de jóias no meu pescoço.

Descansando contra uma pilha de almofadas de veludo vermelho

enquanto contemplo os magníficos edifícios forrando nosso caminho, roubando o

olhar ocasional de Jude, agora vestido com uma calça preta, camisa listrada e

chapéu de palha de um gondoleiro veneziano tradicional, observando enquanto

ele dirige-nos através das águas calmas e ainda.

— Ei, você é muito bom nisso. — Dou risada, determinado a mudar o meu

passado assustador em Holanda um momento atrás e para onde estamos agora.

Fechando os olhos para adicionar apenas um toque leve de uma brisa - uma brisa

que envia o seu chapéu de palha direto para a água.

— Isso é tão natural—, diz ele, de imediato, manifestando um novo chapéu

para a cabeça sem perder a batida. — Eu devo ter sido um desses caras em uma

vida passada um que deixou alguns negócios inacabados para trás. — Ele pára de

remar e se apóia em seu remo. — Quero dizer, se realmente nascemos para

corrigir os erros do nosso passado e seguir em direção à iluminação, então talvez,

uma vez, muito tempo atrás, eu estava dirigindo uma linda donzela justo como a

si mesmo e fiquei tão distraído com sua beleza e encanto que eu derrubei essa

coisa e afogou.
— Quem se afogou?— Pergunto, a voz nervosa, muito mais grave do que

eu pretendia.

— Eu—. Ele suspira dramaticamente, rindo como ele acrescenta: — O que

há de novo? A donzela, como se vê, foi rapidamente resgatada por um nobre, alto,

moreno, bonito e jovem de grande posição e riqueza que, como estas tantas coisas

podem ser, só passou a possuir um barco muito maior. E depois de puxá-la

rapidamente a bordo, ele aqueceu-a e enxugou-a, inferno, provavelmente ele

mesmo ressuscitou-a com um perfeito boca-a-boca, depois que ele regou-a com

não apenas sua indivisa atenção, mas uma sucessão de presentes, um mais

impressionante do que o outro, até que ela finalmente parou de jogar duro para

conseguir e concordou em casar com ele. E você sabe como termina, né?

Eu balancei minha cabeça, a garganta quente e apertada, incapaz de falar.

Bem consciente de que em sua mente, ele é criação de um conto de fadas

inofensivo, mas não consegui evitar a sensação de que este conto em particular só

pode ir um conjunto muito mais profundo do que ele pensa.

— Bem, os dois desfrutaram de uma vida longa, luxuosa e delirantemente

feliz, até que ambos morreram da velhice e da reencarnação para que eles possam

ter o prazer de encontrar um ao outro e fazê-lo todo novamente.

— E o gondoleiro? O que aconteceu com ele? — Eu pergunto, sem saber se

eu realmente queria ouvir. — Quero dizer com certeza que há uma recompensa
para a interposição de duas almas gêmeas juntas?— Ele dá de ombros, desviando

o olhar, de volta a remar novamente. — O gondoleiro está destinado a repetir a

mesma cena patética outras vezes, sempre ansiando após o que é claramente

destinado a outra pessoa. Mesmo script, tempo e espaço diferentes. História da

minha vida - ou vidas, como o caso —. E mesmo que ele ri, não é um convite para

me juntar dentro. É solitário, pouco atrativo, muito sobrecarregado com a verdade

de deixar qualquer espaço para o humor. Sua história pouco virando tão

incrivelmente perto da verdade dele e de mim, eu não consigo nem falar.

O meu olhar viaja em cima dele, perguntando se eu deveria dizer a ele —

sobre mim — sobre nós - mas que bom ele faria? Talvez Damen estivesse certo

quando disse que nós não fomos feitos para lembrar nossas vidas passadas, que a

vida não é para ser um teste de livro aberto. Todos nós temos nosso próprio

carma, nossos obstáculos próprios superadas, e, aparentemente, gostemos ou não,

talvez eu seja uma dos Jude.

Eu limpo minha garganta, decidindo pôr um fim a tudo isso e chegar à

terceira razão de virmos para cá. O que eu realmente não tinha pensado até agora.

Esperando que vá beneficiar tanto de nós, e orando eu não estou fazendo ainda

outro erro colossal quando eu digo, — O que você acha que vala deste lugar? Há

outra coisa que eu quero que você veja.

— Em algum lugar melhor que isso?— Ele puxa o remo fora da água e as

ondas ao redor. Eu aceno a cabeça, fechando os olhos por breves instantes e

rapidamente voltando-nos para o vasto campo perfumado, onde Jude voltou para
o sua roupa normal de jeans desbotada, camiseta símbolo Om, e os flip-flops 19e

eu me livrar de meu vestido, o elaborado espartilho em favor de cortes, para uma

camiseta regata e sandálias, antes de conduzi-lo ao longo do córrego, ao longo da

estrada, na travessa, e para a avenida onde as grandes salas de Aprendizagem

podem ser encontradas.

Virando-se para ele e digo, — Eu tenho uma confissão a fazer. — Ele olha

para mim, levantando as sobrancelhas unidas com ar de expectativa. — Eu não

trouxe você aqui só para te curar. — Ele pára, me olhando de uma forma que me

faz parar também. Respirando fundo, sabendo que esta é a minha chance, o único

lugar que eu vou ser capaz de dizer isso, eu enquadro meus ombros, levanto o

queixo, e digo: — Eu realmente preciso de você para fazer alguma coisa. - Algo

por mim—. — Okay... — Ele aperta os olhos, amáveis olhos, paciente, esperando

por mim para chegar continuar.

— Você vê — a coisa é — eu torço meu bracelete de cristal de ferradura ao

redor e ao redor, dificilmente capazes de olhar nos olhos dele. — Bem,

ultimamente, a magia que lhe falei. É tudo bem, como quando eu estou aqui, mas

voltando no plano terrestre — Eu sou um bonito naufrágio. É como uma doença.

Eu estou consumido com pensamentos de Roman, e no caso de você não ter

notado como é o meu estado exterior está começando a refletir o meu estado

interior. Estou perdendo peso, perdendo o sono, e não há nenhuma obtenção em


torno dela — de volta para casa, no plano da Terra, eu pareço uma porcaria. Mas

cada vez que eu tento confiar em Damen ou pedir-lhe ajuda — mesmo quando eu

tento pedir-lhe para pedir ajuda - é como a magia toma conta —a magia escura —

ou a besta, como eu vim parar, pense nisso — não me deixa falar. É como se ele

não quer que nada se interponha entre Romam e eu.

Mas aqui em Summerland, ele não pode me parar. É o único lugar onde eu

sou a minha habitual eu novamente. E assim, eu pensei que talvez por trazer você

aqui, você pode -

— Então por que você não apenas trazer a Damen Summerland, então? Eu

não entendo. — Ele torneia sua cabeça para o lado e me leva para dentro. —
19 chinelos

Porque ele não virá. — Suspiro, olhando para os meus pés. — Ele sabe que algo

está errado, sabe que algo está acontecendo comigo, mas ele acha que é porque eu

sou viciado nesse lugar, ou - ou algo parecido. De qualquer forma, ele se recusa a

se juntar a mim, e desde que eu sou incapaz de lhe dizer a verdade, ele ficou

firme, se recusa a ceder. E por causa disso, bem, vamos apenas dizer que foi um

caminho muito longo desde que eu vi mesmo ele. — Eu engulo em seco,

estremecendo com a forma como a minha voz apenas racha.

— E então? - Onde posso entrar— Ele olha para mim. — Você quer que eu

voar de volta para o plano da terra para que eu possa dizer Damen? — Não— , eu

digo, levantando os ombros quando eu adiciono: — Ou pelo menos não ainda.

Primeiro eu vou te levar em algum lugar, e se você é capaz de entrar — Eu olhei

para ele, na esperança de que ele pode. — Então eu quero que você procure ajuda

em meu nome - encontrar uma solução para meu problema. E eu sei que isso soa

louco, mas confia em mim quando digo que tudo que você precisa fazer é desejar

a resposta e ele vai vir. Eu faria isso se eu pudesse - mas eu - eu não sou - bem-

vinda lá .

Ele balança a cabeça, volta a andar ao meu lado quando ele diz: — Então,

onde é esse lugar?— Sua expressão transformando de temor que ele segue na
ponta do meu dedo indicador todo o caminho até o bonito, grandioso edifício de

idade, sussurrando: — Então é verdade!— Seus olhos se iluminando levando-o a

íngreme escadaria de mármore em um punhado de saltos. Deixando-me ali, de

queixo caído, como a mola. As portas abertas e varrendo-o para dentro antes que

eu possa piscar. As mesmas duas portas que batem fechada em mim.

Eu caí nos degraus, bloqueada novamente. Querendo saber por quanto

tempo eu vou ser obrigada a esperar do lado de fora até ele fazer tudo - bem,

qualquer que seja que ele planeja fazer lá dentro. Sabendo que isso poderia ser um

tempo muito longo, pois, para um novato em especial, as grandes salas de

Aprendizagem são bons demais para resistir. Eu salto para fora das escadas,

recusando-se a sentar-se fora como a perdedora que sou, decidindo a olhar em

volta um pouco, talvez fazer alguns passeios.Eu sou sempre tão sincera quando

eu venho aqui, eu raramente, ou nunca, tenho tempo para simplesmente passear.

Sabendo que eu possa viajar por qualquer método que eu escolher - metrô,

Vespa, Parreira, mesmo montada em um grande elefante pintado desde há

realmente nenhum limite ao que você pode fazer aqui - eu escolho ir a cavalo, em

vez disso. Re-criar uma montagem semelhante a um eu andava com Damen,

quando ele me atraiu aqui para a primeira vez, somente este é uma égua. Eu

monto em suas costas e resolvo na sela, passando minhas mãos sobre sua juba

sedosa e para baixo ao lado de seu pescoço. Arrulhando baixinho no ouvido dela
que eu dê um pequeno empurrão em seu intestino e partimos em um passeio sem

destino real na mente. Lembrando que as gêmeas me disseram uma vez que

Summerland é construída de desejos. Que, a fim de ver alguma coisa, fazer

alguma coisa, ter alguma coisa, alguma coisa da experiência, ou algo em vista,

primeiro você deve desejá-lo. Eu paro rapidamente e fecho os olhos, tentando

desejar as respostas que procuro.

Mas, como se vê, Summerland é mais esperto do que isso, então nada

acontece além do fato de que o meu cavalo se cansa e começa a bufar, gemer,

bater a cauda, e pisotear o chão com seus cascos. Então eu respiro fundo e tento

algo diferente, penso fora de tudo aqui, fora de todos os cinemas, galerias, salões

de beleza, os prédios grandes e maravilhosos, qual é a única coisa que eu ainda

não vi que eu deveria? Qual é o único lugar que eu realmente preciso conhecer?

E antes que eu perceba, meu cavalo tira a galope - juba, balançando a

cauda, orelhas dobradas para trás com força, como se eu pegasse as rédeas e

pendurasse sua preciosa vida. O cenário de indefinição e zumbido direito passou

por mim, eu abaixei contra o vendaval. Cobrindo uma grande distância da terra

estranha, em questão de segundos, até que pára o meu cavalo tão de repente, tão

inesperadamente, eu salto por cima de sua cabeça e na lama.

Ela relincha alto, erguendo-se sobre as patas traseiras antes de bater para

baixo em todos os fours, resmungando e bufando e afastando-se lentamente,

como eu luto para os meus pés, devagar, com cuidado, não querendo fazer nada

repentino que pode assustar ainda mais. Mais acostumado a lidar com cães do

que os cavalos, eu abaixo a minha voz, mantendo-a firme e constante como eu

apontar o dedo e dizer, — Fique.


Ela olha para mim, orelhas presas para trás, claramente não gostar do meu

plano. Eu engulo em seco, engulo o meu medo, quando eu acrescento, — Não vá.

Fique onde está. — Sabendo que ela não pode ser de grande ajuda se eu estava

ameaçada de alguma forma real, mas ainda relutante em ficar sozinha neste lugar,

escuro e assustador.

Eu olho para o meu short, agora coberto de lama, e mesmo depois de eu

fechar os olhos e tentar substituí-los, tentar limpar até mim, eu continuo

exatamente a mesma. Manifestação instantânea não funciona nestas partes.

Eu respiro fundo e luto para me equilibrar, tão ansiosa para deixar o meu

cavalo, mas sabendo que eu fui mandada aqui por uma razão, que há algo que eu

devia ver, eu resolvi ficar um pouco mais. Olhar de soslaio para o cenário antes de

mim, e percebendo que, em vez dos habituais, brilho suave e dourado, o céu por

estas bandas é todo turvo e cinzento. Em vez da névoa brilhante que eu estou

acostumada, há uma chuva torrencial, que deixa o chão tão enlameado e molhado,

parece que nunca cessa, mas se as plantas estéreis e as árvores são alguma

indicação, aparecendo tão rachado e seco é como se não ter sido regado por anos,

não é exatamente uma chuva nutritiva.

Eu dou um passo em frente, determinada a decifrar a mensagem, saber por

que estou aqui, mas quando afundo o pé na lama tão profundo, até os meus

joelhos, eu decidi deixar o meu cavalo de assumir a liderança. Mas não importa o
que eu cochicho em seu ouvido, o que os comandos que eu dou, ela se recusa a

explorar ainda mais. Ela tem um destino em mente e que está de volta para onde

viemos, para que eu finalmente desistir e dar-lhe a rédea cheia.

Olhando por cima do meu ombro, como nós sairemos e lembrando que as

gêmeas disseram uma vez:

— Summerland contém a possibilidade de todas as coisas.

E me perguntando se eu tropecei em cima de alguma forma seu outro lado.

Capítulo 17

— O que aconteceu com você?

Eu pisco, sem ter idéia do que ele está falando até seguir seu dedo que está

apontando para a barra da minha calça que está cheia de lama, e os meus chinelos

de dedos que costumavam ser bonitos com sua cor de ouro metálico, mas agora

estão tão com uma crosta de sujeira tão grande que estão tingidos de marrom.

Eu franzi a testa, instantaneamente trocando eles por uma melhor, nova e

limpa versão da mesma coisa, feliz em saber que eu estou de volta a magia de

Summerland, o que é bem melhor do que a No-Man‘sland que eu visitei mais

cedo. Levo um momento para me envolver no macio casaco lilás que eu também

manifestei, colocando ele firmemente ao meu redor quando digo:

— Eu me cansei de esperar. Eu não sabia quanto tempo você ia levar, então

eu saí em uma pequena –uh- viajem de campo— eu dei de ombros como se não
fosse grande coisa, como se fosse uma coisa do dia-a-dia, andar no jardim, tarde

da noite – quando a verdade é que com a estranha chuva implacável, aquelas

árvores sem graça e a determinação do meu cavalo de sair daquele lugar – foi

tudo menos isso. Porém Jude já tem o suficiente para processar sem adicionar

mais um território confuso a isso, e eu já estou morrendo para saber o que ele viu.

— -Mais importante de saber o que aconteceu comigo, é saber o que

aconteceu com você?— eu olho ele, desde o seus dreds marrons, até a sola dos seu

chinelos, notando como ele continua bonito por fora, exatamente como eu o

deixei, mas por dentro, alguma coisa definitivamente mudou. Há uma mudança

em sua energia, no seu comportamento. Em uma mão ele parece mais leve,

brilhante, cheio de confiança, porém ele parece muito delicado para alguém que

acabou de visitar uma das maiores maravilhas do universo.

— Bem, isso foi – interessante— ele balança a cabeça, seu olhar encontra o

meu, mas só por um instante antes de ele desviá-lo rapidamente. E eu não

acredito que ele acha que pode escapar com isso, quero dizer, eu acho que eu

mereço um pouco mais que isso depois de trazê-lo aqui.

— Hum, se importa de elaborar?— eu levanto minha sobrancelha. —

Exatamente, o quanto isso foi interessante? O que você viu, ouviu, aprendeu? O

que você fez a partir do momento em que eu te deixei? Você conseguiu as

respostas que eu precisava?— sabendo que eu estou a um segundo se espiar em


sua cabeça e ver por eu mesma se ele não começar a falar logo.

Ele respira fundo e vira, dando alguns passos até finalmente encontrar o

meu olhar e diz:

— Eu não tenho certeza se quero falar isso agora – é muito pra processar –

eu ainda preciso dar um sentido a isso. Tudo isso é um pouco – complicado.

Eu fecho os olhos, determinada a ver por mim mesma. Existem só alguns

segredos em Summerland, especialmente para um novato como ele que não tem

nem uma pista de como isso funciona, mas no momento em que eu dou de cara

com uma parede mental, eu sei onde ele esteve.

Os registros Akashic.

Lembro quando Romy disse uma vez. ‗Nem todos os pensamentos podem

ser lidos, só aqueles que você tem permissão para ver. O que quer que seja que

você viu nos registros Akashic te pertencem, e são seus para guardar.

Eu estreito meus olhos, precisando saber mais do que nunca, eu chego mais

perto dele, sendo parada quando eu sinto aquele calor e o formigamento que sua

presença traz. Virando-me para encontrar Damen, descendo pelos degraus de

mármore antes de vê-lo parar — tudo pára — e nossos olhos se encontram. Eu

estou a segundos de chamá-lo – precisando que ele se junte a mim, sabendo que

essa é a chance de me explicar – quando eu vejo o que ele vê. Eu e Jude, juntos,

aproveitando uma bela viajem a Summerland – o lugar especial para Damen e eu.
Antes de eu poder fazer alguma coisa, falar alguma coisa, ele se foi. Num piscar

de olhos ele sumiu, como se nunca estivesse lá.

Exceto que ele esteve.

Eu posso ver a linha da sua energia. Eu posso senti-lo na minha pele.

Uma olhada em Jude é tudo o que eu preciso para confirmar isso. Vendo o

jeito que seus olhos se arregalam, o modo como seus lábios se separam – o jeito

que ele se aproxima de mim, querendo me confortar, mas eu o empurro para

longe rápido, ciente do que Damen deve ter pensado – o jeito que nós devemos

parecer ao seu olhar.

—Você deveria ir— eu digo, virando minhas costas para ele, minha voz

forte e nítida — Só feche os olhos, faça o portal e vá. Por favor.

— Ever… — ele diz, buscando por mim, mas eu já tinha ido, me mandando

para outro lugar.

Capítulo 18

Eu ando até não ter idéia de quão longe eu fui, ando até ter certeza de que

Damen não pode mais me ver. Determinada a me afastar de meus problemas, mas

sem conseguir ir muito longe deles, finalmente eu entendo aquele velho ditado

que eu li numa xícara de café que uma professora de inglês da minha escola

costumava ter: Onde quer que você vá, aí você está.

Você não pode caminhar pra superar seus problemas, não pode correr
rápido o bastante pra esquecê-los completamente. Essa é a minha jornada e não

tem jeito de escapar.

E apesar de Summerland prover um glorioso e doce escape o seu efeito é

apenas temporário no máximo. Não importa o quanto eu dê um jeito de

permanecer aqui, eu tenho certeza que as coisas vão voltar a ser como antes no

segundo que eu voltar ao plano terrestre.

Eu vago para mais longe tentando decidir entre passar pelo cinema e ver

um filme antigo ou talvez até ir para Paris pra fazer uma caminhada relaxante

pelo Rio Sena, ou até mesmo uma rápida escalada pelas ruínas de Machu Picchu,

ou uma corrida até o Coliseu Romano, quando eu me deparo com uma vila de

chalés que me faz parar abruptamente.

Por fora é simples e modesto, composto por telhas de madeira, janelas

pequenas e pontiagudas triangulares e telhados, mas apesar de não ter nada

aparentemente especial sobre nenhum deles, tem um em particular que chama

minha atenção brilhando de uma forma que me atrai por um caminho estreito e

sujo até eu ficar parada em frente a uma porta, sem ter nenhuma idéia porque eu

estou aqui ainda debatendo comigo mesma se devo entrar ou não.

— Não tenho visto elas por perto, nas últimas semanas.

Eu viro para encontrar um homem velho parado na ponta do caminho,

vestido conservadoramente em uma camisa branca, suéter preto e calças pretas


com alguns fios de cabelo branco penteados de lado em sua cabeça careca

brilhante, apoiado em uma bengala elaborada que parece ser prova de sua

dedicação como marceneiro mais do que sua deficiência física.

Eu aceno incerta do que dizer, eu nem mesmo sei por que estou aqui,

muito menos a quem ele se refere.

— As duas meninas de cabelos escuros, as gêmeas, eu mal podia distingui-

las, apesar da minha senhora dizer que a boazinha gostava muito de chocolate. —

Ele diz sorrindo com a memória. — E a outra, a teimosa quieta, preferia pipoca,

não parava de comer, ela não gostava das pipocas manifestadas. — Ele acena

olhando pra mim, realmente me olhando, sem estar nem um pouco chocado pelas

minhas roupas modernas nessas partes. — A minha senhora fazia a vontade

delas, ela sentia pena delas, se preocupava um bocado com elas, ai depois de tudo

isso e de todos esses anos, elas simplesmente se levantaram e foram embora sem

dizer uma palavra. — Ele chacoalha a cabeça de novo só que dessa vez ele não

sorri, apenas me dá um olhar perplexo esperando que eu possa ajudá-lo a achar

um sentido nisso.

Eu engulo com dificuldade, meu olhar variando entre a porta da frente e

ele, com o pulso acelerando, coração batendo, sabendo dentro de mim que esse é o

lugar que elas ficavam, esse é o lugar onde Romy e Rayne viveram nos últimos

trezentos e poucos anos.

Mas, ainda sim eu necessito de uma confirmação verbal apenas para ter

certeza. — Você disse... disse as gêmeas?— Minha mente se enrolando enquanto

eu encaro a casinha simples e familiar que eu vi na visão que eu tive no primeiro

dia que eu encontrei as duas agachadas na casa da Ava quando eu agarrei o braço
de Romy e assisti toda sua vida se desdobrar em uma confusão de imagens, essa

casa, a tia delas, o julgamento das bruxas de Salem que ela estava determinada a

proteger as meninas, tudo que as levou pra isso.

— Romy e Rayne.— Ele acena me olhando com bochechas tão vermelhas,

um nariz tão bulboso, e olhos tão gentis que ele parece uma manifestação falsa,

uma réplica realista de um alegre senhor inglês no caminho de sua casa vindo de

um Pub, mas como ele não treme e nem some, como ele permanece bem ali na

minha frente com aquele sorriso amigável em seu rosto, eu sei que ele é real.

Talvez vivo, talvez morto, não tenho certeza sobre isso, mas definitivamente e

positivamente ele é de verdade. — Elas mesmas, aquelas que você procura, certo?

Eu chacoalho a cabeça apesar de não estar certa. Eu estava procurando por

elas? É por isso que eu estava aqui? Eu olho de relance pra ele estremecendo

quando ele me dá um olhar tão estranho que eu não posso evitar soltar uma

risada nervosa. Limpo minha garganta em uma tentativa de me recompor,

quando eu acrescento. — Eu só lamento saber que elas não estão mais por perto,

eu estava esperando pegá-las.

Ele acena com a cabeça como se ele me entendesse completamente e se

simpatizasse com a minha situação, inclinando suas duas mãos na bengala

quando ele diz: — Minha senhora e eu nos afeiçoamos muito a elas, uma vez que

nós chegamos aqui na mesma época, o que não conseguimos decidir é se


cruzamos a ponte e terminamos isso ou se fazemos a viagem de volta, o que você

acha?

Eu pressiono meus lábios juntos e dou de ombros sem querer dizer que eu

já sei a resposta pra isso, e fico aliviada quando ele não me pressiona pela

resposta, apenas acena e dá de ombros.

— A senhora jura que elas cruzaram a ponte e diz que as pequeninas

ficaram cansadas de esperar quem quer que seja que elas estavam esperando. Mas

eu digo que é diferente Rayne pode ter ido, mas ela jamais conseguiria convencer

aquela irmã dela, a Romy, ela é uma teimosa com certeza.

Eu cerro os olhos, certa de que eu entendi errado, sacudindo a cabeça

quando eu digo. — Perai, você quer dizer que Rayne é a teimosa e Romy e a mais

gentil, certo?— Eu aceno esperando que ele acene também, mas ele só me dá

aquele olhar estranho e cava mais fundo com a sua bengala. — Eu quis dizer o

que eu disse, bem, bom dia pra senhorita.

Eu fico parada lá, assistindo ele ir embora, cabeça erguida, espinha reta,

dificilmente acreditando que ele tenha escolhido ir embora assim, aquela

hesitação da minha pergunta deve ter ofendido a ele de alguma forma.

Tipo ele é meio velho, e as gêmeas se parecem exatamente, ou pelo menos

elas se pareciam quando elas viviam por aqui e usavam aquele uniforme de escola

particular todos os dias, e eu só posso imaginar como elas se vestiam antes da


Riley pegá-las, mas algo na forma como ele disse, com tanta certeza e confiança eu

não posso evitar imaginar que talvez eu tenha entendido tudo errado ou que

talvez aquele lado petulante e ressentido da Rayne seja reservado somente pra

mim.

Esperando que ele possa me ouvir antes que ele vá para longe eu o chamo.

— Senhor, com licença, mas o senhor acha que há algum problema se eu entrar e

der uma olhada? Eu prometo que não vou incomodar em nada.

Ele se vira balançando sua bengala alegremente enquanto ele diz. — Fique

a vontade, não tem problema, não há nada lá dentro que não possa ser

substituído.

Ele se vira e continua seu caminho enquanto eu empurro a porta e entro, e

encontro um tapete vermelho simples que suaviza o barulho dos meu peso contra

o velho chão de madeira, pausando tempo suficiente para meus olhos se

ajustarem para a luz fraca enquanto eu olho para uma grande sala quadrada com

uns móveis de madeira que parecem desconfortáveis. Cadeiras retas pretas, uma

mesa de tamanho médio, uma cadeira de balanço grande ao lado de uma lareira

de pedra cheia de cinzas de um fogo recentemente queimado, eu sei que acabei de

entrar em uma réplica do mundo onde Romy e Rayne escaparam em 1962, apenas

para recriar aqui, tirando a hipocrisia, mentiras e crueldade, é claro.

Eu caminho pela sala observando o forro de madeira, pesadas vigas do

teto, meus dedos trilham as planícies das paredes ásperas, as mesas cheias com

pilhas altas de livros de capa de couro junto com uma variedade de velas e

lamparinas a óleo usadas para fornecer uma luz para leitura, eu sou incapaz de

sacudir esse sentimento de culpa, eu sinto que estou me metendo em algo, para
descobrir uma vida privada que eu não tenho certeza que eu deveria saber.

Mas ao mesmo tempo, eu sei que não estou aqui por acidente, eu devia ter

descoberto isso, disso eu não tenho dúvidas, porque de uma coisa eu sei, se eu

conheço bem Summerland para saber que os eventos aqui não são aleatórios, tem

algo aqui nessas paredes, algo que eu devia ver, e eu vago para um quarto

pequeno e simples e reconheço imediatamente que é uma réplica do quarto onde

a tia delas, aquela que incentivou elas a se esconderem aqui em Summerland para

que elas fossem poupadas do julgamento das bruxas de Salem, a cruel fonte do

próprio desaparecimento delas. A cama é estreita e parece desconfortável, tem

uma mesa pequena e quadrada em cima da mesa tem um livro com capa de

couro, flores secas e ervas, outro tapete trançado e um pequeno guarda-roupa no

canto com as portas entreabertas revelam um vestido de algodão marrom

pendurado lá dentro e o resto do quarto é vazio.

E eu não posso deixar de imaginar se Romy e Rayne manifestaram a

existência de sua Tia, como eu fiz uma vez com Damen, não posso evitar imaginar

quanto tempo elas lutaram para se segurar na vida que elas conheciam até

finalmente desistirem e se conformarem com isso, uma imitação do que era.

Eu fecho a porta atrás de mim e vou à direção a pequena escada que vai

para o loft, desviando a minha cabeça contra o teto dramaticamente inclinado e

faço uma careta enquanto a madeira faz um barulho alto debaixo dos meus pés,
vou para uma área onde o teto é mais alto me endireito e observo duas camas

gêmeas e estreitas e uma mesa de madeira pequena entre elas com uma pilha de

livros e uma velha lamparina a óleo, praticamente é a mesma configuração da tia

delas, exceto para as paredes que estão cheias de referências da cultura pop do

novo milênio, que só poderia ser resultado da influência da Riley. Cada

centímetro do espaço coberto com uma colagem dos favoritos de Riley, pois

conhecendo ela as gêmeas não tiveram opção senão comprometer sua fidelidade a

ela.

Meus olhos correram pelo quarto cercado de rostos felizes e brilhantes de

antigos astros da Disney que viraram sensações adolescentes, o lineup do

American Idol e apenas todo mundo que saiu na capa da revista Teen Beat. E

quando eu vejo um pedaço de papel de caderno preso na porta eu não consigo

evitar o riso sabendo que esse horário de aulas, essa lista de eventos da escola

particular manifestada delas, só podia ser invenção da minha irmãzinha

fantasmagórica.

1º Tempo: Moda Para Iniciantes: Certo & Errado & Jamais de forma

nenhuma.

2º Tempo: Técnicas Básicas de Arrumação de Cabelo (Pré-requisito para

Cabelos 102)

Tempo livre de 10 minutos (Deve ser utilizado para fofocas e arrumação)


3º Tempo: Celebridades Básico: Quem é legal, quem não é e quem não é

nada como eles querem que você pense que eles são.

4º Tempo: Popularidade: Um curso compreensivo de como alcançar e

manter sem se perder no processo.

Almoço (Para ser utilizado com fofocas, arrumação e comer se você

precisar)

5º Tempo: Beijando e Fazendo a Maquiagem: Tudo o que você sempre quis

saber sobre lip gloss, mas estava com medo de perguntar

6º Tempo: Beijando 101: O que é nojento, o que é doentio e o que faz ele se

ligar

Uma lista completa das obsessões normais de Riley, a última e uma das

quais eu tenho certeza que ela nunca teve a chance de experimentar.

E assim que eu estou prestes a ir embora certa de que não tem mais nada

pra eu ver eu vejo um lindo porta retrato redondo cheio de jóias empoleirado em

cima do armário, eu fico na ponta dos pés pra conseguir alcançar, sabendo que

não podia pertencer a Romy e Rayne, porque a fotografia não havia sido

inventada até bem depois de elas terem deixado Salém e eu me engasgo quando

eu vejo uma foto nossa.

Eu, Riley e nossa doce cadelinha Labrador Buttercup.

A simples visão da foto desencadeia uma memória tão clara, tão palpável
que bate como um soco no estômago. Forçando-me ficar de joelhos no chão sem

prestar atenção na madeira áspera arranhando minha pele, sem notar as lágrimas

que caem sobre meu rosto sobre o vidro deixando embaçado. Mas eu não estou

mais olhando a foto, estou assistindo o evento na minha cabeça, repassando o

momento em Riley e eu nos inclinamos uma sobre a outra, sorrindo e

gargalhando enquanto Buttercup latia e corria em círculos ao nosso redor. Tudo

isso momentos antes do acidente, nossa última foto.

Uma foto que eu me esqueci desde que Riley morreu antes que ela tivesse a

chance de fazer o download dela.

Eu olho em volta do quarto com a visão embaçada pelas lágrimas, minha

tentativa de voz estridente, ao chamar — Riley?— Você está vendo isso?—

imaginado se ela está aqui e se ela armou essa coisa toda, se ela está em um canto

em algum lugar me observando.

Eu uso a barra do meu sweater pra limpar as lágrimas do meu rosto e o

vidro, sabendo que apesar dela falhar em me responder, apesar de eu não ter mais

acesso a ela isso é obra dela. Ela recriou essa foto, ela queria que eu tivesse outro

lembrete do que um dia compartilhamos e o que eu já fui uma vez, apenas um

ano atrás. É uma coisa de Summerland que nunca sobreviverá se eu tentar levar

pra casa além disso, por alguma razão estranha eu gosto de saber que está aqui.

Eu desço a escada de volta pra sala certa de que eu vi tudo que tinha pra

ser visto e me preparo pra ir embora, quase na porta da frente eu noto uma

pintura que eu não vi quando entrei, a moldura é simples, preta, feita de algumas

tiras de madeira simplesmente trabalhada, mas o assunto me deixa interessada.

Um retrato de uma mulher finamente afiado e ainda de alguma forma simples,


pelo menos para os dias de hoje. A pele pálida, lábios finos, cabelos castanhos

escuros presos longe de seu rosto em um coque apertado. Mas não importa a pose

séria e a expressão séria, tem algo muito claro brilhando em seus olhos, ela está

meramente encenando o papel de uma mulher subjugada e adequada do seu

tempo, posando dessa forma para ser apropriada enquanto por dentro se esconde

uma chama que poucas pessoas poderiam adivinhar.

E eu paro de encarar aqueles olhos quanto eu tenho mais certeza, apesar de

me dizer o contrário, me dizer que não é possível, sem a menor possibilidade

remota, a dica subliminar está me levando a persistir por diversas semanas agora

tem uma prova manifestada de uma forma tão clara que eu não consigo ignorar.

Dou um suspiro sussurrado que ecoa pela sala, mas só eu consigo ouvir,

então eu vôo pela porta para o plano terrestre. Ansiosa pra me afastar do rosto

que aparece diante de mim, longe de um passado que apenas seguiu seu curso

por inteiro, de forma notável, novamente.

Capítulo 19

Eu nem penso nisso. Nem paro para pensar duas vezes. Apenas
materializo o portal, aterrisso de volta no plano terreno e corro para a casa de

Damen.

Mas, então, quando estou chegando ao portão, penso melhor.

As gêmeas estarão lá.

As gêmeas sempre estão lá.

E esse assunto, definitivamente, não deve ser discutido na presença delas.

Como os portões já estão em movimento, e Sheila esta alegremente fazendo

sinal para que eu entre, passo e sigo para o parque. Estaciono o carro e vou direto

para os balanços, sento-me em um deles e me impulsiono para frente com tanta

força que me pergunto se não darei uma volta completa antes de descer. Mas isso

não acontece, só balanço para frente e para trás, sentindo o vento no rosto

enquanto voo cada vez mais alto e um leve frio na barriga quando volto depressa

para baixo. Fecho os olhos e chamo Damen até mim, usando os poderes que ainda

restaram antes que o monstro acorde e dê início a seu passatempo favorito: me

sabotar. Começo a contar os segundos, mas não chego nem ao dez e o vejo parado

à minha frente.

O ar mudou, inflamado por sua presença, seu olhar enviando

formigamento delicioso e quente por toda a minha pele. E quando abro os olhos

para olhar nos dele, é como a primeira vez em que nos encontramos, no

estacionamento da escola: hipnotizante, mágico, um momento de rendição total e


completa. O sol atrás dele o envolve em um resplendor laranja, dourado e

vermelho tão brilhante que é como se os raios estivessem emanando de seu corpo.

Fico presa ao momento, seguro-o o máximo que posso, ciente de que é apenas

uma questão de tempo até que eu fique entorpecida e insensível a ele novamente.

Ele se senta no balanço ao meu lado, embalando bem alto e

instantaneamente pegando meu ritmo. Nós dois atingimos alturas tão delirantes e

maravilhosas, apenas para mergulhar novamente para baixo — uma analogia a

nosso relacionamento nos últimos quatrocentos anos.

E quando ele olha para mim com expectativa no rosto, sei que estou prestes

a decepcioná-lo. Não estou aqui pelo motivo que ele pensa.

Respiro fundo, engolindo o nó preso na garganta e digo:

— Damen — eu me viro para ele —, eu sei que as coisas estão meio...

tensas... — Faço uma pausa, sabendo que essa palavra mas consegue descrever o

que estamos passando, mas continuo: —Mas, bem, depois que você foi embora,

dei de cara com algo tão extraordinário que corri até aqui para contar. E se

pudermos deixar essas outras questões de lado, pelo menos por enquanto, acho

que você vai gostar de ouvir isso.

Ele inclina a cabeça e me absorve com os sentidos. Seu olhar é tão

profundo, escuro e intenso que as palavras param bem no meio de minha

garganta. Forçando-me a olhar para baixo, fazendo uma série de pequenos

círculos na terra com o pé, empurro as palavras e digo:

— Sei que deve parecer maluquice, tanto que acho que você nem vai

acreditar, mas estou dizendo, não importa o quanto possa parecer absurdo, é

completamente real, eu vi com meus próprios olhos. — Faço uma pausa, dando
uma espiada e vendo-o com a cabeça daquele seu jeito encorajador e paciente.

Então limpo a garganta e recomeço, perguntando-me por que estou tão nervosa

quando ele provavelmente é a única pessoa que sei que entenderia de fato. —

Sabe, você sempre diz que os olhos são as janelas da alma, o espelho do passado e

tudo mais. E que é possível reconhecer alguém de suas vidas passadas

simplesmente olhando nos olhos dessa pessoa.

Ele faz um gesto afirmativo, lento, reservado, como se tivesse todos o

tempo do mundo para ver aonde isso vai levar.

— Bem, o que estou querendo dizer é... — Respiro fundo, esperando que

ele não ache que sou ainda mais louca do que já acha, e revelo: — Ava-é-a-tia-de-

Romy-e-de-Rayne! — A frase escapa tão rapidamente que parece apenas uma

palavra muito longa, e ele apenas fica ali sentado, olhando, calmo e sossegado. —

Lembra quando eu disse que havia tido aquela visão em que a vida das duas se

revelou e eu vi a tia delas? Então, por mais estranho que pareça, essa tia hoje é a

Ava. Ela morreu durante os Julgamentos das Bruxas de Salém e voltou nesta vida

como Ava. — Encolho os ombros, sem saber ao certo o que dizer depois de uma

afirmação dessas.

Seus lábios se curvam de leve, os olhos iluminam, e ele empurra o balanço

lentamente para frente e para trás enquanto diz:

— Eu sei.
Estreito meus olhos, sem saber se ouvi direito.

Ele se movimenta, mudando de direção e chegando tão perto que nossos

joelhos quase se tocam. Depois, olha para mim e diz:

— Ava me contou.

Pulo do balanço tão rápido que as correntes se chocam e se enrolam uma

na outra, indo até em cima, e depois se desenrolam novamente, girando varias

vezes em um movimento furioso que emite um som metálico terrível. Meus

joelhos vacilaram, instáveis, enquanto aperto os olhos e tento entendê-lo

lentamente, imaginando como esse cara que diz ser o amor de minhas vidas pôde

ficar amigo dela, colocar as gêmeas em perigo e me trair desse jeito.

Mas ele apenas olha para mim sem um pingo de preocupação.

— Ever, por favor. — Ele balança a cabeça. — Não é o que você está

pensando.

Aperto os lábios e desvio o olhar, pensando em onde ouvi isso antes. Ah,

certo, Ava. É praticamente sua frase favorita, a que ela mais repete, e não acredito

que ele tenha caído nessa.

— Ela viu em uma visita aos registros akáshicos. E hoje, quando eu não

conseguia encontrar nenhum jeito de ajudar você, confirmei. Ela está arrumando a

casa, tentando encontrar o melhor momento para contas a elas, e, bem, embora

tenha acredito nela, não estava muito certo se seria realmente o melhor para as
meninas. Então, hoje quando pedi orientação sobre qual seria o melhor caminho

para elas, a história se revelou. Na verdade, elas estão com Ava agora mesmo.

— Então é isso. — Olho para ele. —Ava não é mais má, fica com as gêmeas,

e nós retornamos nossa vida. —Tento rir, mas não sai bem do jeito de que eu

gostaria.

— É? Retomamos a nossa vida? — Ele inclina a cabeça e olha para mim.

Eu suspiro, sei que não tenho escolha a não ser explicar. É o mínimo que

posso fazer.

Sento-me no balanço, segurando as grossas correntes de metal, enquanto

olho para ele e digo:

— Hoje... em Summerland... apesar do que pareceu, não era nada daquilo.

E eu ia explicar... Explicar tudo o que está acontecendo... mas quando você

desapareceu tão rápido, eu... —Aperto os lábios e desvio olhar.

— E então por que não explica agora? — ele pergunta, olhando-me de

perto. —Estou bem aqui. Tem toda minha atenção. —Sua voz está tão dura e

formal que meu coração se parte, esfarela-se em milhões de pedacinhos enquanto

ele continua sentado ao meu lado, tão lindo, tão forte, tão bem intencionado,

querendo apenas fazer o certo, não importa o quanto lhe custe.

E eu quero tanto abraçá-lo com força, encontrar um jeito de explicar tudo.

Mas não consigo, as palavras são prisioneiras do monstro dentro de mim.


Então, apenas dou de ombros e me ouço dizer:

— Foi... Foi completamente inocente. É serio. Fiz aquilo por nós, apesar do

que possa parecer.

Damen me olha com tanta paciência e amor que só consigo me sentir

culpada.

—Então me diga, encontrou o que procurava? — Ele questiona. A pergunta

é tão carregada que apenas imagino a verdadeira intenção por trás dela.

Faço uma pausa, tentando não recuar diante de seu olhar misterioso e

inquisitivo. Com as palmas das mãos de suor, digo:

— Você sabe como eu estava me sentindo mal por ter atacado Jude... então

pensei que se o levasse para Summerland talvez ele pudesse ser curado e...

—E...? — ele pergunta, coma paciência de seiscentos anos na voz, e eu fico

imaginando se ele nunca se cansa disso... de ser tão tolerante, tão resignado...

especialmente quando se trata de lidar comigo.

—E... — tento dizer, tento contar a ele o que está acontecendo comigo, mas

não consigo. A fera está acordada, a magia negra começa a assumir o controle, e

eu mal consigo suportar. Balanço a cabeça. Nervosa, fico mexendo com os botões

de imitação de casco de tartaruga em meu suéter e digo:

— E... nada. É sério. É isso. Só achei que Summerland curaria Jude, e

aparentemente curou.

Damen me analisa, o rosto contigo, relaxado, como se me entendesse

completamente. E, na verdade, ele entende. Ele entende muito além de minhas

palavras desajeitadas. Entende muito bem.

—Então, como já estávamos lá, pensei em mostrar o lugar, e assim que viu
os Salões, bem ele correu lá para dentro... e o restante... como dizem... é história.

— Nossos olhares se encontram, a ironia da palavra não passou despercebida por

nenhum de nós dois.

— E você entrou com ele.. nos Salões?

— Seus olhos quase se fecharam, olhando para mim como se ele já

soubesse... soubesse que não sou mais bem vinda lá... mas quisesse ouvir isso de

mim. Quisesse a confissão completa de como me tornei sombria e perversa...

Respiro fundo e tiro os cabelos dos olhos.

—Não, eu... Hesito, pensando se devo ou não contar sobre o meu passeio a

cavalo até a terra de ninguém, mas rapidamente decido não dizer nada,

imaginando que o que eu testemunhei seja mais um reflexo de mim, de meu

estado interior, do que um lugar de verdade. — Eu, hum, eu fiquei no lado de

fora, à toa, esperando. — Dou de ombros. — Bem, fiquei um pouco entediada e

pensei em ir embora, mas também queria garantir que ele encontrasse o caminho

de volta para casa, então, eu... hum... fiquei esperando. — Confirmo, de modo um

pouco exagerado, nem perto de ser convincente.

Trocamos um olhar longo e doloroso; ambos sabemos que estou

mentindo... que acabei de desempenhar, provavelmente, minha pior atuação de

todos os tempos. E por algum motivo estranho e desconhecido ele dá de ombros

no final, tão indiferente que chego a ficar decepcionada. A pequena centelha de


sanidade que me resta deseja que ele encontre um modo de tirar isso de mim,

para podermos colocar um fim nisso tudo. Mas ele apenas continua me olhando,

até que viro e digo.

— É bom saber que você ainda visita Summerland sozinho, mesmo se

recusando a ir comigo. — Sei que ele não merece essa observação, mas falo

mesmo assim.

Ele agarra meu balanço e me puxa para perto dele, trincando o maxilar, os

dedos esmagando as correntes, deixando as palavras saírem por entre os dentes

cerrados:

—Ever, eu não fui até lá por mim... fui até lá por você.

Engulo em seco e, por mais que queira desviar ao olhos, não consigo. Meu

olhar está preso ao dele.

—Tentei encontrar um jeito de chegar até você... de ajudar. Você tem

estado tão distante... nem um pouco parecida com o que é, e há dias não passamos

tempo algum juntos. Está bem claro que está fazendo o melhor que pode para me

evitar, nunca mais quis ficar comigo, pelo menos não no plano terreno.

—Isso não é verdade! — As palavras saem agudas e trêmulas demais para

soarem críveis, mas eu continuo mesmo assim. —Bem, talvez você não tenha

notado, mas tenho trabalhado muito ultimamente. Até agora, passei o verão todo

arrumando livros em prateleiras, cuidando do caixa e fazendo leituras mediúnicas


como Avalon. Então, sim, talvez eu queira passar meu tempo livre me dando de

presente umas escapadas... isso á tão ruim assim? —Aperto os lábios e olho

diretamente nos olhos dele, sabendo que a maior parte do que eu disse é verdade

imaginando se ele vai me fazer alguma pergunta sobre as partes que não são.

Mas ele apenas balança a cabeça, recusando-se a ser influenciado.

— E agora que Jude está melhor... agora que o curou com uma viagem a

Summerland... não consigo deixar de imaginar qual vai ser a próxima desculpa.

Suspiro e desvio o olhar, surpresa por ouvi-lo responder dessa forma, e a

verdade é que não tenho ideia de como responder, não tenho ideia do que fazer

em seguida. Chuto uma pedrinha com o bico do sapato, incapaz de contar a ele,

cansada e arrasada demais para inventar qualquer outra historia.

—Sabe, você costumava ser tão brilhante aqui no plano terreno quanto em

Summerland. —Engulo em seco e abaixo a cabeça, mal acreditando em meus

ouvidos quando ele continua: — Eu sei sobre a magia, Ever. —Sua voz é grave,

quase um sussurro, embora as palavras reverberem como um grito. — Sei que

você não pode fazer nada. E gostaria que me deixasse ajudar.

Fico tensa. Todo o meu corpo endurece e meu coração bate violentamente.

—Conheço os sintomas: a ansiedade, as mentiras, a perda de peso, a...

aparência debilitada. Você está viciada, Ever. Está viciada no lado negro da

magia. Jude nunca deveria ter colocado você nessa. —Ele balança a cabeça, sem

deixar por um segundo de olhar em meus olhos. —Quanto antes admitir, mais

rápido poderei ajudar você a se sentir melhor.


—Não foi... —Esforço-me para falar, mas as palavras não saem. O monstro

está no controle, decidido a nos separar. —Não foi esse o motivo de você ter ido

aos Grandes Salões do Conhecimento? Para me ajudar? —Olho para ele, vendo

como sua expressão muda e ele fica magoado e surpresa. Mas não é o suficiente

para conter a fera, não, nem chega perto. Esse trem acabou de sair da estação e

tem um logo caminho a percorrer. —Então, me diga, o que você viu? O que os

poderosos registros akáshicos compartilharam com você?

— Nada — ele diz com a voz cansada, derrotada. —Não descobri nada.

Aparentemente, quando o problema é causado pela própria pessoa, o

acesso é vedado a outras. Estou impedido de interferir de qualquer modo. — Ele

dá de ombros. — Acho que tudo faz parte da jornada. Mas ainda assim uma coisa

ficou clara, Ever: na ultima quinta-feira à noite, Roman mencionou um feitiço, e

desde que Jude deu aquele livro a você, tudo mudou... com você... entre nós...

nada está como antes. —Ele olha para mim, esperando por uma confirmação, mas

ela não vem, não pode vir. —Vocês dois compartilham uma historia complicada,

e é obvio que ele ainda não esqueceu você. E não consigo evitar a sensação de que

ele está no caminho... de que aquela magia está no caminho. E, Ever, ela vai

destruir você se não tomar cuidado... já vi isso acontecer.

Meus olhos procuram seu rosto, ciente de que ele está tentando me enviar

uma imagem, algum tipo de mensagem, mas o pulso estranho e exótico está a
todo vapor, a chama negra está queimando, enfraquecendo meus poderes de

modo que não consigo mais acessar os pensamentos de Damen, a energia, o

formigamento e o calor — nada.

Ele vem em minha direção, pega em meu ombro antes que eu consiga

piscar e me encara com determinação e intenção, totalmente decidido a lidar com

isso de uma vez por todas. No entanto, por mais que eu queira, não posso contar a

ele, não posso deixá-lo me ver assim. A repulsa que Damen verá em meus olhos

não está vindo de mim, vem da fera, mas ele não saberá reconhecer a diferença.

Mesmo odiando ter de agir assim, mesmo que isso apenas prove que ele

está certo, que sou imprudente e estou perigosamente fora de controle, balanço a

cabeça e ando até o meio-fio, onde meu carro está estacionado.

Olhando para trás digo:

— Desculpe Damen, mas você está enganado. Redondamente enganado.

Estou apenas trabalhando demais, cansada demais, como acabei de dizer. E se um

dia quiser dar o braço a torcer.. bem, sabe onde me encontrar.

Capítulo 20
Nem consigo chegar ao portão e meu carro já sumiu. Caio sentada no

asfalto com tanta força que levo algum tempo para perceber que o veiculo

desapareceu bem debaixo de mim. Olho em volta, atordoada, tentando entender

como isso pode acontecido, quando um Mercedes vem a toda velocidade em

minha direção, quase me atropelando, o motorista buzina, mostra o dedo médio e

grita uma serie de palavrões.

Arrasto-me para o lado e fecho bem os olhos, determinada a materializar

um novo carro, algum mais potente e rápido desta vez. Imagino um Lamborghini

vermelho, vejo-o tão claramente diante de mim que fico chocada ao abrir os olhos

e descobrir que não está lá. Respiro fundo e tento de novo, primeiro pensando em

um Porsche, depois em um Miata como o que tenho em casa, e também não

funciona. Então, tento um Prius prateado como o de Munoz, seguido de um

Smart, mas nada acontece. Nada. Estou tão desesperado por um transporte que,

essa altura, eu me contentaria com uma lambreta, mas quando nem isso consigo

materializar, tento, meio de brincadeira, criar um par de patins. Descubro como a

situação está ruim quando acabo calçando um par de botas brancas de couro com

duas lâminas de metal onde deveriam ser as rodas. E é então que decido desistir e

correr. Fico feliz em saber que pelo menos ainda tenho minha força e minha

velocidade.

Meus pés golpeiam o asfalto, os calcanhares batem com facilidade, sem

esforço, enquanto sigo pelas subidas e descidas sinuosas da Coast Highway com a

intenção de ir direto para casa, mas dou a volta e vou para outro lugar. Um lugar
melhor. Um lugar onde há tudo que preciso, tudo o que poderia desejar. Estou tão

obstinada, tão determinada a chegar a meu destino, custe o que custar, que corro

mais rápido e chego em pouco tempo.

Bem em frente à porta de Roman.

Meu corpo está tremendo de desejo, ansiedade, e a chama negra dentro de

mim brilha tanto que ameaça me incinerar por dentro. Fecho os olhos e percebo-o,

sinto-o.

Roman está lá dentro.

Tudo o que preciso fazer é abrir a porta, e ele será meu.

Em apenas um movimento rápido, a porta bate com tanta força na parede

que o barulho ecoa por toda a casa enquanto eu me esgueiro silenciosamente pelo

corredor. Encontro Roman na saleta, jogado no sofá, com os braços abertos,

expectativa no rosto, como se estivesse me esperando.

—Ever. — Ele faz um gesto de reconhecimento com a cabeça, nem um

pouco surpreso, sem perder um segundo. — Você tem mesmo um problema com

portas, não é? Preciso substituir mais essa?

Sigo em sua direção sem hesitar e murmuro seu nome enquanto meu corpo

antecipa a frieza de seu olhar.

Ele acena com a cabeça, lenta e repetidamente, como se ouvisse um ritmo

percebido apenas por ele. Permitindo que a tatuagem de Ouroboros apareça e


desapareça de minha vista, sua voz é grave e comedida quando diz:

— Que gentileza sua passar por aqui, gata. Mas, para dizer a verdade,

gostei mais da ultima vez em que esteve aqui. Você sabe... quando ficou parada na

janela usando aquela camisolinha transparente. — Seus lábios esboçam um sorriso

enquanto ele pega um cigarro, acende e dá uma tragada longa e pensada. Sopra

cuidadosamente uma sucessão de anéis de fumaça perfeitamente calculados e

continua: — Como está agora, bem, não é a sua melhor forma. Na verdade, você

parece um tanto faminta, está?

Esfrego os lábios, umedecendo-os com a língua, e tento pentear meus

cabelos embaraçados com os dedos. O que costumava ser uma cabeleira brilhante

e abundante, da qual eu tinha bastante orgulho, ficou reduzido a um ninho opaco

cheio de pontas duplas. Eu deveria ter feito mais, deveria ter feito algum tipo de

esforço, usado um pouco de perfume, um corretivo, reservado um tempo para

materializar roupas que realmente servissem em minha forma recém-diminuída.

Contraio os músculos sob o peso de seu olhar, a maneira como ele examina meu

corpo enfraquecido, claramente nem um pouco impressionado com o que tenho a

oferecer.

—É serio gata, se vai invadir desse jeito, então precisa estar um pouco mais

apresentável. Não sou Damen, querida. Não transo com qualquer uma. Tenho

meus padrões, sabe?


Fecho os olhos, disposta a fazer o que for preciso para agradá-lo, para estar

com ele, e sei que fui bem sucedida quando vejo seu olhar vidrado.

— Drina! —ele sussurra, deixando o cigarro cair dos lábios e fazendo um

buraco no tapete enquanto me absorve com os olhos. Ele vê a pele sedosa, os

lábios rosados e os cabelos acobreados que caem sobre meus ombros enquanto me

ajoelho diante dele, apago o cigarro com meus dedos longos e finos e coloco as

mãos sobre seus joelhos.

— Meu Deus... não... não pode ser... é isso mesmo...? — Ele balança a

cabeça e esfrega os olhos, fixando-se em meus olhos cor de esmeralda e querendo

acreditar em sua visão com todas as forças.

Fecho os olhos, desfrutando de seu toque frio, escorregando minhas mãos

por seus joelhos, até suas coxas, tão perto de conseguir o que desejo, indo mais

fundo, até que...

Haven está atrás de mim, com os olhos em chamas e os punhos cerrados.

Pergunto-me há quanto tempo ela está ali assistindo, já que nem a ouvi chegar,

nem a senti, aliás. Mas e daí, Haven não tem importância aqui. Ela é apenas uma

barreira irritante que tem o péssimo habito de se meter em meu caminho e que

posso eliminas facilmente.

— O que você pensa que está fazendo, Ever? — Ela vem em minha direção,

varrendo-me com seu olhar hostil, na intenção de me intimidar. Mas não


funciona, não pode funcionar, só que ela ainda não sabe.

— Ever? — Roman estreita os olhos, alternando o olhar entre nós, incapaz

de enxergar o mesmo que ela. —Do que você está falando, gata? Essa não é Ever...

é...

Mas basta a mera sugestão das palavras dela e ele é capaz de me ver, ver

através da fachada que criei.

—Maldição! — ele grita, e me empurra com tanta força que eu vôo pela

sala sobre uma mesa e depois sobre uma cadeira, antes de cair perto de onde

Haven está. —Que tipo de truque é esse? — Ele faz cara feia, furioso por ter sido

enganado.

Engulo em seco, sem deixar de fitar seus olhos, enquanto Haven vem para

cima de mim como um furacão vestindo couro preto e renda, seu hálito gelado

batendo em meu rosto enquanto as pontas das unhas cortam meu pulso:

— Não tinha que estar em outro lugar? —ela indaga, com os dentes

cerrados. —Sério, Ever, Damen sabe que está aqui?

Damen.

O nome mexe com alguma coisa. Alguma coisa bem enterrada. Algo que

faz minha mão agarrar meu amuleto enquanto dou um pequeno passo para trás.

Seu olhar é mordaz e o rosto curioso quando ela diz:

— Você não consegue mesmo suportar, não é? Não suporta que eu tenha

algo e você, não. — Ela balança a cabeça. — Ficou me alertando contra Roman,

tentando me assustar, para ficar com ele para você. Bem, tenho novidades, Ever...

eu mudei. Mudei de forma que você nem pode imaginar.

Embora eu tente puxar a mão, afastar-me e me libertar, sua pegada é muito


forte, muito determinada, e se depender do que dizem seus olhos, ela está farta de

mim.

— Não há nada para você aqui. Não devia ter vindo. Não quero você aqui,

Roman não quer você aqui... não consegue perceber que se transformou em uma

piada? — Ela olha para meu queixo cheio de acne, meu peito afundado, o extremo

oposto de sua pele perfeita de porcelana e suas curvas bem-definidas. - Por que

não dá meia-volta e vai embora? Vivo pelas minhas próprias regras agora, e o

negócio é o seguinte: se você não der o fora, se você tentar prolongar sua visita e

fizer alguma loucura, é você quem vai sair machucada. - Seus dedos apertam o

meu pulso, e ela continua olhando em meus olhos. - Você está um lixo. Uma pilha

de cabelos embaraçados e espinhas. — Haven balança os cabelos brilhantes,

negros e ondulados, e a franja com a mecha platinada. — O que aconteceu, Ever?

Damen mudou de ideia a respeito de passar toda a eternidade com você e cortou

seu suprimento de elixir?

Abro a boca, tentando falar, mas as palavras não saem. Então me concentro

em Roman, implorando, suplicando que ele interceda e me ajude, mas ele apenas

ignora, sinalizando com os olhos que está cansado de mim. Agora que ele sabe

que eu não sou Drina, estou sozinha.

Sem escolha, ergo o pulso que Haven está segurando com tanta força que já

o deixou pálido e dormente, e a giro tão inesperadamente que suas costas vêm
parar em meu peito antes que ela possa reagir.

Meus lábios encostam em seu ouvido e digo:

—Sinto muito, mas simplesmente não vou tolerar esse tipo de conversa.

—Sinto-a lutar contra mim, tentar se libertar, mas é inútil, ninguém derrota

o monstro, ninguém além...

Olho para o espelho na moldura dourada pendurada na parede diante de

nós e fico impressionada com nossa imagem: o olhar cheio de ódio de Haven

combina perfeitamente com o meu. Meu próprio rosto demonstra tanta raiva, está

tão distorcido, tão monstruoso, que mal o reconheço. Finalmente, consigo ver o

que os outros têm visto esse tempo todo: a degradação completa em que me

transformei.

Afrouxo os dedos, o suficiente para deixá-la se soltar. Ela se vira sobre

mim, furiosa, com o punho levantado e um mapa dos sete chacras em mente.

Mas, antes que ela possa completar o movimento, não estou mais lá. Ouço

o barulho a empurro e saio correndo para a rua.

Sei que ela ficará bem, os imortais sempre se curam.

Porém, não tenho mais certeza se eu ficarei.


Capítulo 21

Quando chego à loja, espero encontrar Jude, mas a porta está trancada e a

placa diz FECHADO. Depois de tentar, sem êxito, abrir a porta com o poder da

mente, enfio a mão na bolsa e procuro minha chave com dedos tão trêmulos que

acabo deixando-a cair duas vezes antes de finalmente conseguir entrar.

Passo voando pelas estantes de livros e prateleiras de CDs, esquecendo

completamente o mostruário de estatuetas de anjo à direita, no qual esbarro com

tanta força que elas se espatifam no chão, formando uma pilha de peças

quebradas e cacos de vidro. Mas não paro para consertar. Nem sequer olho duas

vezes. Apenas continuo seguindo em frente, na direção da sala dos fundos, onde

puxo uma cadeira diante da mesa e desabo.

Fico debruçada sobre a mesa, tom a testa pressionada contra a madeira,

enquanto luto para estabilizar meu pulso e desacelerar a respiração. Estou ater-

rorizada com minhas ações, com o modo como afundei. A cena que aconteceu dez

minutos atrás não para de se repetir em minha cabeça.

Fico assim por algum tempo, até minha pele começar a esfriar e minha

mente clarear, e quando finalmente levanto a cabeça e dou uma boa olhada em

volta, percebo que o calendário foi tirado da parede e está apoiado na mesa,

diante de mim. A data de hoje está circulada em vermelho, junto com um ponto

de interrogação, meu nome sublinhado bem abaixo dele e as palavras talvez


funcione escritas com os garranchos de Jude.

De repente, entendo. A solução pela qual esperava está, graças a Jude, a

meu alcance, agora. E é tão inacreditavelmente óbvio que não acredito que não

pensei nisso antes. Fico boquiaberta olhando para o círculo torto de Jude e para o

círculo menor, impresso, que ilustra a lua e suas fases. O fato de este último estar

completamente preenchido assinala que hoje é dia de lua negra.

Hécate está ascendendo novamente.

E, de uma hora para outra, sei exatamente o que fazer.

Em vez de esperar que a lua fique iluminada e pedir que a deusa anule a

rainha, como as gêmeas me disseram (o que, por sinal, provavelmente só serviu

para irritar a rainha e por isso deu completamente errado), eu deveria ter

esperado pelo dia de hoje, quando a lua ficará negra novamente, para ir direto à

fonte, recomeçar de onde parei, com Hécate, rainha do mundo inferior, e fazer

uma aliança com ela.

Abro a gaveta, ignoro o Livro das sombras e procuro alguns materiais de

que precisarei. Prometo a mim mesma compensar Jude depois, enquanto reúno

uma série de cristais, ervas e velas, coloco na bolsa e sigo para a praia - o único

lugar que me vem à mente e que pode me proporcionar não apenas a privacidade

que busco, como também a quantidade de água necessária para o banho ritual que

preciso fazer.
Logo estou parada na beira do penhasco, com os pés sobre as rochas,

olhando para um oceano tão escuro que se confunde com o céu. Lembro-me do

mesmo tipo de noite que vivenciei há um mês, quando vim até aqui com Damen,

certa de que não poderia acontecer nada pior do que transformar minha melhor

amiga em imortal, completamente alheia ao fato de que estava prestes a me

afundar cada vez mais.

Desço pela trilha, ansiosa para começar. Escolho o caminho com cuidado,

desviando de pedras pontiagudas e pisos irregulares, o coração batendo forte

enquanto meu corpo fica molhado de suor, ciente daquela sensação que cresce

dentro de mim e de que preciso começar antes que a fera assuma o controle

novamente. Afundo os pés na areia e sigo para a caverna, confiando que estará

vazia, do jeito que a deixamos, sabendo que é exatamente como Damen disse:

— As pessoas raramente veem o que está diante delas.— E, certamente,

nunca veem a caverna.

Jogo a bolsa no chão e pego uma vela fina e comprida e uma caixa de fósfo-

ros. O chiado do palito riscando a caixa é o único ruído que acompanha o som

tranquilo das ondas. Finco a vela acesa na areia e começo a organizar as demais

ferramentas sobre um cobertor. Demoro um instante para arrumar tudo antes de

tirar a roupa e sair.

Aperto os braços com força ao redor do corpo, protegendo-me do frio que


corta minha pele e tentando me aquecer. Decido ignorar a fileira de costelas

salientes que espetam meus dedos e os ossos protuberantes de meu quadril, di-

zendo a mim mesma que agora tudo acabou, a cura está próxima, e ninguém, nem

mesmo o monstro, pode me impedir de me recuperar.

Corro na direção das rajadas de espuma branca, rangendo os dentes por

causa do choque gélido, e mergulho sob uma série de ondas, com os olhos bem

fechados para evitar o sal que arde, e os ouvidos ficam tomados por aquele chiado

estrondoso. Viro-me de costas assim que termina o ataque de ondas e o oceano se

acalma. Meu cabelo está todo bagunçado, o corpo não tem peso, está

descarregado. Levo os joelhos ao peito e olho para cima, para um céu tão escuro,

tão nítido, tão vasto e misterioso que não consigo compreendê-lo. Agarro o

amuleto que Damen colocou em meu pescoço e evoco a série de cristais para

auxiliar e proteger, manter o monstro acuado por tempo suficiente para que eu

possa fazer o que precisa ser feito. Coloco meu destino nas mãos de Hécate,

acreditando que, assim como. o yin e o yang, toda escuridão tem sua luz.

Afundo repetidas vezes, até estar purificada, renovada e pronta para come-

çar. Ando até a areia com o corpo molhado, pingando, mal sentindo a pele

arrepiada. O frio é contido pela confiança calorosa, a certeza total de que estou a

apenas alguns segundos de distância de matar a fera e me salvar.

As paredes da caverna brilham com a luz da vela, gerando uma sucessão


de sombras escuras e claras. Depois de limpar meu athame e passá-lo três vezes

pela chama, ajoelho-me no centro do círculo mágico que fiz. Incenso em uma das

mãos, athame na outra, recrio um ritual similar ao anterior, só que desta vez

acrescento:

Apelo a Hécate, rainha do mundo inferior, da magia e da mais negra lua

Por favor, desfaça esse feitiço, essa amarração, e apague essa chama negra

que aqui atua

Oh, grande protetora das bruxas, mãe amada, donzela e anciã Esse é meu

desejo, meu pedido

Que se faça o amanhã!

Fico surpresa quando uma rajada de vento começa a girar a meu redor e

um trovão ressoa no alto. Sua força causa uma vibração tão potente que derruba a

pilha de cadeiras enquanto o chão começa a se mover. Um tremor sísmico

ritmado, um pulso originado em algum lugar bem profundo, que vai ficando mais

forte, mais violento, aumentando seu raio, fazendo camadas de rochas se soltarem

das paredes e desmoronarem sobre mim.

Tudo desaba, desintegra-se, até que não sobra nada além do chão sobre o

qual estou ajoelhada, uma montanha de escombros e a vastidão do céu noturno.

A terra ainda está se ajustando, ainda está se movendo quando levanto e

agradeço. Faço o caminho de volta pela fumaça e pelas ruínas, passo as mãos nos

cabelos volumosos e brilhantes e materializo roupas limpas com tanta facilidade

que não tenho dúvidas de que meu desejo foi atendido.


Capítulo 22

— Já chegamos?

Passo os dedos na venda macia e sedosa que Damen usou para cobrir meus

olhos. Uma formalidade boba, já que ambos sabemos que não preciso olhar para

ver, mas, ainda assim, ele está tão decidido a manter segredo que prefere se cercar

por todos os lados, seja ou não necessário.

Ele ri, e o som é tão melódico que faz meu coração se encher. Pega minha

mão e entrelaça os dedos nos meus. A quase sensação de seu toque provoca o

mais vivo e mais delicioso formigamento e calor do mundo, uma sensação que

aprendi a valorizar, especialmente depois de saber como é perdê-la por completo.

— Pronta? — ele pergunta, posicionando-se atrás de mim e desatando o nó

atrás de minha cabeça, tirando a venda e aproveitando para alisar meu cabelo

antes de me girar e dizer:

— Feliz aniversário!

Eu sorrio antes mesmo de ter a chance de abrir os olhos, já convencida de

que será bom, não importa o quê.

No segundo em que vejo, suspiro, boquiaberta e com a mão no peito um

cenário tão impressionante que quase não parece possível. Até mesmo para

Summerland.

— Quando você fez isso? — pergunto, esforçando-me para assimilar tudo.


Observo uma ilusão delicada, um campo aparentemente infinito de tulipas

vermelhas resplandecentes com um pavilhão requintado bem no centro. -

Certamente não criou isso agora, não é?

Ele dá de ombros, fitando meu rosto de um modo que faz meu corpo todo

ficar quente.

— Venho planejando há algum tempo e, embora o pavilhão não seja obra

totalmente minha, fiz algumas alterações. As tulipas foram um toque que

acrescentei para você. — Ele olha para mim, puxa-me para perto e diz: - Eu só

queria que você melhorasse para podermos aproveitar isso juntos. Só nós dois,

sabe?

Confirmo com a cabeça. Seu olhar amoroso e agradecido faz minhas bo-

chechas corarem, e sou tomada por uma timidez inexplicável.

— Só nós dois? — Inclino a cabeça e olho para ele. — Quer dizer que não

precisamos voltar correndo para minha festa surpresa?

Damen ri e me acompanha por um campo vermelho muito brilhante e

resplandecente.

— Eles ainda estão arrumando tudo... eu prometi que chegaríamos um

pouco mais tarde. Mas, por enquanto, o que acha?

Pisco várias vezes rapidamente, já que não quero chorar. Não aqui. Não

agora. Não neste campo magnífico, feito para representar nosso amor eterno.
Engulo o nó na garganta e digo:

— Eu acho... eu acho que você é a pessoa mais incrível do mundo... e acho

que tenho tanta sorte de conhecer e amar você... e acho... acho que não tenho ideia

do que faria sem você ... e também acho que estou muito agradecida por não ter

desistido de mim.

— Eu nunca desistiria de você ele diz, ficando sério de repente,

procurando meus olhos.

— Bem, deve ter ficado com vontade. — Eu me viro, lembrando como as

coisas ficaram sinistras, como fui longe demais, e fazendo um agradecimento

silencioso a Hêcate por realizar meu desejo e me devolver tudo o que mais me

importa no mundo.

— Nem por um segundo — ele diz, com a mão em meu queixo, virando

meu rosto para seu lado novamente. — Nem uma vez sequer.

— Você estava certo, sabia? Sobre a magia... — Mordo os lábios e olho para

ele, constrangida. Mas ele apenas confirma com a cabeça, é como se eu tivesse

admitido algo que ele já soubesse. — Eu... eu fiz um feitiço... um feitiço de

amarração... e, bem, meio que teve o efeito oposto. Eu me amarrei acidentalmente

a Roman. — Engulo em seco, vendo-o olhar para mim sem expressão alguma no

rosto, tornando impossível tentar decifrar o que está pensando. E... primeiro, não

contei nada porque ... bem... porque fiquei muito envergonhada. É como... como
se eu estivesse obcecada por ele e ... — Balanço a cabeça, fazendo cara feia ao me

lembrar do que fiz e disse. — Bem, de qualquer modo, o único lugar onde eu

ficava saudável era aqui em Summerland. Por isso eu implorava para vir. Em

parte, para que eu pudesse me sentir inteira novamente, e em parte porque o

monstro, a magia, não me deixava contar nada no plano terreno. Sempre que eu

tentava, as palavras eram silenciadas e não conseguiam sair... e tudo isso é para

dizer...

Ele coloca a mão em meu rosto e olha para mim.

— Ever — sussurra —, tudo bem.

— Eu sinto muito — murmuro, sentindo seus braços à minha volta

enquanto ele me puxa para mais perto. — Sinto tanto, tanto.

— E está tudo acabado agora? Você consertou? — Ele se afasta e inclina a

cabeça, observando-me.

— Consertei— confirmo, secando os olhos com as costas da mão. — Está

tudo bem agora... estou melhor. .. e minha obsessão por Roman acabou. Eu... eu só

achei que você deveria saber. Odiei esconder isso de você.

Ele se inclina em minha direção e pressiona os lábios em minha testa, olha

para mim e diz:

— E agora, mademoiselle, gostaria de começar? — Ele levanta o braço, for-

mando um arco, e faz uma reverência.


Sorrio, de mãos dadas com ele enquanto me conduz pelo campo e entra-

mos naquele lindo pavilhão, um edificio tão lindo, tão bem trabalhado, que não

consigo deixar de suspirar novamente.

— Que lugar é este? — pergunto, observando o piso de mármore polido, o

teto abobadado repleto de afrescos maravilhosos de querubins iluminados de

bochechas rosadas, além de outros seres celestiais.

Ele sorri, levando-me até um sofá creme tão macio e confortável que parece

uma gigantesca nuvem de marshmallow.

— É seu presente de aniversário. E, coincidentemente, não apenas ani-

versário de nascimento.

Aperto os olhos, pensando, vasculhando uma série de lembranças, sem

conseguir chegar a uma conclusão. Ainda não faz um ano que estamos juntos -

pelo menos não nesta vida, então realmente não tenho ideia de que outro —

aniversário— ele está falando.

— Oito de agosto — ele diz, vendo a expressão confusa em meu rosto.

— Oito de agosto de 1608, para ser mais exato, foi o dia em que nos

encontramos pela primeira vez.

— É sério? — Tudo o que consigo fazer é respirar fundo, de tão chocada

que fico com a informação.

— Sério. — Ele sorri, recostando-se na nuvem de almofadas e me puxando

para mais perto. — Mas não precisa acreditar em minha palavra. Veja com seus

próprios olhos. — Ele pega um controle remoto na mesa à nossa frente e aponta

para a grande tela circular que cobre toda a parede da sala.


— Na verdade, não está limitada a ver, pode até vivenciar, se quiser,

depende de você.

Olho de soslaio, sem saber aonde ele quer chegar, sem ter idéia do que está

acontecendo aqui.

— Trabalhei nisso por muito tempo e acho que finalmente está pronto.

Pense em minha pequena invenção como um tipo de teatro interativo. Em

que você pode ficar sentada, aproveitando a apresentação, ou entrar e participar.

Você escolhe. Mas antes há algumas coisas que deve saber. Primeiro você não

pode mudar o resultado, o roteiro é predeterminado, e, segundo... - Ele chega

perto de mim e passa o dedo pelo meu rosto. _ ...aqui em Summerland todos os

finais são felizes. Tudo o que foi até mesmo só um pouco trágico ou perturbador

foi cuidadosamente omitido, então não se preocupe. Pode ter inclusive algumas

surpresas. Eu tive.

— São surpresas reais ou foram criadas por você? — indago, aninhada em

seus braços.

Ele rapidamente nega com a cabeça.

— Reais. Total e completamente reais. Minhas lembranças, como você bem

sabe, são de muito tempo atrás, tanto que às vezes, bem, elas se misturam um

pouco. Então decidi pesquisar um pouco nos Grandes Salões do Conhecimento,

um tipo de curso de atualização, por assim dizer. E relembrei algumas coisas que
tinha esquecido.

— Como, por exemplo...? — Olho brevemente para ele, antes de pressionar

os lábios naquela região maravilhosa onde seu ombro encontra o pescoço,

tranquilizada imediatamente pela quase sensação de sua pele e pelo perfume

almiscarado.

— Como isso — ele sussurra, virando-me de forma que eu olhe para a tela,

e não para ele. Nós nos aninhamos enquanto ele aperta um botão no controle e

vemos a tela se iluminar, enchendo-se com imagens tão grandes, tão

multidimensionais, que parece que estamos dentro dela.

E no momento em que vejo aquela praça movimentada, com as ruas de

pedra e multidões de pessoas atarantadas como hoje em dia, como se todas ti-

vessem de estar em algum lugar importante, sei exatamente onde estamos. Pode

haver cavalos e carruagens no lugar dos carros, os trajes podem ser mais formais

quando comparados às nossas roupas modernas e casuais, mas, pela enorme

quantidade de vendedores anunciando mercadorias aos berros, as semelhanças

são surpreendentes: estou olhando para um minishopping do século XVII.

Olho para Damen, com uma pergunta estampada nos olhos, e vejo ele

sorrir em resposta, enquanto me ajuda a me levantar. Ele me leva na direção da

tela com tanta rapidez que sou obrigada a parar, convencida de que vou esmagar

meu nariz contra ela. Mas ele se aproxima de mim e sussurra:


— Acredite.

E é o que eu faço.

Mergulho no escuro e continuo andando, diretamente para dentro da tela

de cristal, que instantaneamente suaviza, cede e nos dá as boas-vindas. E não

somos apenas coadjuvantes com roupas estranhas, mas, com vestes apropriadas à

época, nós dois chegamos para assumir os papéis principais.

Olho para minhas mãos, surpresa por estarem tão ásperas e calejadas, em-

bora as reconheça imediatamente de minha vida parisiense, quando era Evaline,

uma simples criada com uma vida monótona de trabalho manual até Damen

aparecer.

Passo os olhos pela frente de meu vestido, sentindo a coceira provocada

pelo tecido, observando o corte modesto e sério que resulta em um caimento nem

um pouco lisonjeiro. Mas está limpo e bem-passado, então tento me orgulhar um

pouco dele. E mesmo que meus cabelos louros estejam trançados, enrolados e

presos, um ou dois cachos ainda escapam.

O vendedor fala comigo em francês, e, embora eu saiba que estou apenas

representando um papel, que não falo essa língua, de alguma forma consigo não

apenas entender, como também responder. Reconhecendo-me como uma de suas

clientes mais exigentes, ele me entrega um tomate vermelho e diz que é o melhor

que tem. E observa enquanto o viro várias vezes na palma da mão, inspecionando
a cor e a firmeza. Confirmo minha aprovação e procuro o dinheiro na bolsinha

quando alguém tromba em mim de forma tão abrupta que o tomate escorrega de

minha mão e cai no chão.

Olho para meus pés com dor no coração quando vejo aquela meleca

vermelha toda espalhada. Sabendo que me custará muito, que os funcionários da

cozinha nunca concordarão em encobrir o fato de que desperdicei um tomate,

viro-me para dizer uma palavra de reprovação e vejo que é ele.

Aquele dos cabelos escuros e brilhosos, do olhar luminoso e penetrante,

das roupas maravilhosamente bem-cortadas e da melhor carruagem que já passou

por essas partes, exceto a da rainha. Aquele que chamam de Damen... Damen

Auguste. Aquele com quem aparentemente tenho dado de cara muitas vezes nos

últimos tempos.

Levanto minhas saias e me ajoelho no chão, esperando salvar o que puder,

mas logo sou impedida por sua mão em meu braço, um toque que envia uma

onda de formigamento e calor até meus ossos.

— Pardon— ele murmura, inclinando-se diante de mim, e cuida para que o

vendedor seja reembolsado pela perda.

Mesmo intrigada, mesmo com o coração batendo loucamente, pulsando

contra o peito, mesmo com aquela sensação estranha de formigamento e calor

persistente, viro-me e vou embora. Estou certa de que ele está apenas brincando

comigo, dolorosamente consciente de que é bom demais para mim. Mas ele me

alcança e diz:

— Evaline... espere!

Eu me viro e olho em seus olhos, sabendo que continuaremos neste jogo de


gato e rato, pelo menos devido às convenções sociais. Mas também sei que uma

hora, se ele continuar, se não ficar entediado ou perder o interesse, ficarei feliz em

me render, não há dúvida quanto a isso.

Ele sorri e coloca a mão em meu braço, pensando: Foi assim que

começamos, e assim continuamos por algum tempo. Podemos adiantar para as

partes boas?

Digo que sim e, quando vejo, estou diante de um grande espelho com

moldura dourada, olhando para a imagem refletida diante de mim. Noto que meu

vestido simples e feio foi trocado por um de tecido tão rico, tão macio e sedoso

que praticamente desliza por meu corpo. Seu decote profundo é a vitrine perfeita

para minha pele pálida e uma quantidade generosa de joias tão brilhantes que mal

consigo ver outra coisa.

Ele está atrás de mim, chamando minha atenção e sorrindo em tom de

aprovação. Não consigo deixar de pensar em como cheguei até aqui, como uma

empregada pobre e órfã como eu acabou em um lugar tão grandioso, com um

homem tão lindo, tão.. mágico.. que é quase bom demais para ser verdade.

Ele me estende a mão e me conduz até uma mesa para dois, arrumada com

extravagância. O tipo de mesa que estou mais acostumada a servir. Mas, agora,

com Damen a meu lado, e seus empregados dispensados, vejo-o erguer uma jarra

de cristal lentamente, com tanta hesitação, com a mão tão trêmula, que fica claro
que há uma batalha interna sendo travada ali.

Ele olha, desconcertado, em meus olhos. Franze ligeiramente a testa, coloca

a jarra de volta na mesa e então escolhe a garrafa de vinho.

Fico ofegante, com os olhos arregalados, a boca aberta, mas as palavras não

saem... a compreensão daquele mero ato faz com que de repente eu me dê conta.

Você quase fez! Chegou tão perto. Por que parou? Sei que se ele tivesse ido em

frente, se tivesse me servido o elixir no início... tudo teria sido diferente.

Cada. Único. Detalhe.

Drina nunca teria me matado, Roman nunca teria me enganado e Damen e

eu teríamos vivido felizes para todo o sempre. Praticamente o oposto do que

vivemos agora.

Seus olhos buscam os meus, o olhar é inquisitivo e penetrante. Ele balança

a cabeça e pensa: Eu estava tão inseguro... não sabia se você aceitaria... não achei

que tinha o direito de obrigá-la. Mas não foi por isso que trouxe você aqui. Minha

única intenção era mostrar que sua vida em Paris, por mais dura que tenha sido,

não era só sofrimento. Tivemos nossa cota de momentos mágicos... momentos

como esse. . e teríamos mais, se não fosse por...

Ele deixa essa parte no ar. Ambos sabemos como termina. Antes mesmo

que possa erguer minha taça para brindar, o jantar acabou e ele me acompanha

até em casa. Levando-me pelos fundos, paramos um pouco antes da entrada dos
empregados, onde passa os braços ao redor de minha cintura e me puxa para mais

perto, beijando-me com tanta paixão, tanta profundidade, que não quero que

acabe nunca. A sensação de seus lábios nos meus é tão suave e insistente, tão

calorosa e convidativa, que mexe com algo dentro de mim... algo tão familiar...

algo tão... real..

Eu me afasto com os olhos arregalados, mirando os dele enquanto passo os

dedos por meus lábios macios e exuberantes, pela parte de meu rosto arranhada

por sua barba por fazer. Não há campo de energia entre nós, nenhum véu

protetor. Nada além da gloriosa sensação de sua pele na minha.

Ele sorri, tocando em minhas bochechas, descendo pelo pescoço, pela

clavícula, e rapidamente substitui os dedos pelos lábios. É real, ele pensa. Não é

necessário nenhum escudo. Não há perigo aqui.

Olho para ele, minha mente cheia de possibilidades. É... é realmente

possível ficarmos juntos. . agora... aqui? Fico esperançosa.

Mas ele respira fundo e entrelaça os dedos nos meus, tocando-me de um

jeito que não vivenciávamos há meses, e pensa: Acho que isso é apenas uma

encenação do passado. É possível editar o roteiro, mas não mudá-lo, improvisar

ou acrescentar experiências que nunca aconteceram.

Faço um gesto indicando que entendi, triste com a informação, mas ávida

por começar de novo, puxando-o de volta para perto de mim e pressionando


meus lábios contra os dele, determinada a ser feliz com o que nos é permitido,

pelo tempo que restar.

Então nos beijamos na porta de serviço... ele vestindo um colete de tecido

fino, e eu, minha roupa simples de empregada.

Nós nos beijamos nos estábulos. Ele com a vestimenta inglesa completa de

caça, e eu, com calças justas de montaria, um casaco vermelho bem-ajustado e

botas pretas e lustradas.

Nós nos beijamos à beira do rio. Ele vestindo camisa branca lisa e calças

pretas, e eu, uma roupa nem um pouco lisonjeira de puritana.

Nós nos beijamos em um campo de tulipas tão vermelhas que combinam

quase perfeitamente com meus cabelos de fogo ondulados. Ele vestindo uma ca-

misa fina branca e calças largas, e eu, um lençol de seda rosado, estrategicamente

amarrado. Fazemos um intervalo antes que ele continue a me pintar, acrescen-

tando um toque aqui e uma pincelada ali. Ele larga o pincel, puxa-me para perto

dele e me beija novamente.

Todas as minhas vidas são tão diferentes e, ainda assim, terminam quase

do mesmo jeito: nós dois nos encontramos e nos apaixonamos rapidamente,

apenas para Damen, determinado a não agir por impulso e a conquistar minha

confiança antes de me oferecer o elixir, hesitar por tempo demais e dar

oportunidade a Drina para tomar conhecimento da situação e me eliminar.

Por isso você não perdeu tempo quando me encontrou depois do acidente,

penso.

Envolvida no calor de seus braços, apertando o rosto contra seu peito,

vendo o momento de sua perspectiva - como ele me descobriu aos dez anos (gra-
ças a uma ajudinha de Rorny; Rayne e Summerland) e como viveu os anos

seguintes, esperando que passasse tempo suficiente, e se mudou para Eugene, no

Oregon. Havia acabado de se matricular em minha escola quando aconteceu o

acidente que destruiu todos os seus planos.

Vejo-o naquela cena. Vejo como hesita, aflito, implorando por uma

orientação, em pânico quando o cordão prateado que liga o corpo à alma ficou tão

tenso, tão fino, que se rompeu, fazendo-o tomar instantaneamente a decisão de

colocar a garrafa em meus lábios e me forçar a tomar, a voltar à vida, a me tornar

imortal como ele.

Algum arrependimento? Ele olha para mim, insistindo para que eu seja sin-

cera, independentemente da resposta.

Mas eu faço que não, sorrindo e puxando-o de volta para perto de mim, de

volta para perto de mim, de volta para aquele campo vermelho e resplandecente

de um dia muito tempo atrás.

Capítulo 23

— Está pronta?
Damen passa os dedos por meus lábios. A quase sensação de seu toque me

traz a lembrança de um beijo tão real, tão tangível, que me sinto tentada arrastá-lo

de volta para Summerland e começar tudo de novo.

Só que não podemos. Já nos comprometemos. E, embora nem se compare à

comemoração de aniversário que Damen acabou de me dar, todo mundo está

esperando, não tem jeito.

Respiro fundo e olho para a casa diante de nós. A fachada é simples, sim-

pática, de um jeito aconchegante e acolhedor, apesar do fato de ter abrigado

algumas das piores cenas de meu passado não tão distante.

— Vamos voltar para Paris — murmuro, brincando apenas em parte. — -

Você não precisa nem editar as partes ruins. É sério. Preferia colocar aquele

vestido marrom e esfregar latrinas... ou qualquer que seja a palavra que usavam

naquela época... do que enfrentar isso.

— Latrinas? — Ele olha para mim e balança a cabeça, o som doce de sua

risada flui até mim enquanto seus olhos escuros brilham. — Desculpe Ever, mas

não tinha latrina naquele tempo. Nem banheiros, toaletes ou lavabos. As pessoas

usavam penicos. Um tipo, bem, de vasilha de cerâmica mantida debaixo da cama.

E, acredite, esse é o tipo de lembrança que eu não quero reviver,

Faço cara feia, incapaz de imaginar como deve ter sido nojento usar tal

apetrecho, mais nojento ainda esvaziá-lo. Contraio-me visivelmente quando digo:


— Está vendo? Se eu pudesse pelo menos explicar ao Munoz que o ver-

dadeiro motivo por eu não frequentar a aula dele é o fato de a história perder o

atrativo para aqueles que realmente foram forçados a vivê-la...

Damen ri, jogando a cabeça para trás de um modo que faz seu pescoço ficar

tão convidativo, tão atraente, que me seguro para não beijá-lo.

— Acredite, todos nós passamos por isso. A maioria apenas não tem a o

unidade de lembrar, muito menos de reviver. - Ele olha para mim com o sério e

diz: - E, então, está pronta? Sei que é estranho, e sei que você vai demorar muito

para confiar nela novamente, mas eles estão esperando, então vamos pelo menos

entrar e deixar que tenham o prazer de gritar Aniversário, certo?

Ele olha para mim com o olhar caloroso, aberto, e sei que se eu falasse que

não, se demonstrasse uma resistência mínima, ele concordaria comigo. Mas não

farei isso. Porque a verdade é que ele está certo. Em algum momento devo

enfrentá-la novamente. Sem contar como eu gostaria que ela olhasse em meus

olhos enquanto tenta me convencer de sua extremamente improvável versão da

história.

Faço que sim, relutante, caminhando na direção da porta quando ele diz: -

Não esqueça... aja como se estivesse surpresa. - Ele bate à porta uma vez, duas

vezes, e depois faz cara de preocupação por ninguém ter vindo abrir com um

bem-ensaiado coro de — Surpresa!

Ele abre a porta, levando-me pelo corredor até a cozinha amarela, onde

encontramos Ava usando um vestido marrom tomara que caia e sandálias dou-

radas, servindo-se com naturalidade de uma bebida suspeitamente vermelha. -

Sangria - diz ela, balançando a cabeça e rindo ao acrescentar: - É sério, Ever.


Quanto tempo vai levar para você confiar em mim de novo?

Aperto os lábios e dou de ombros, duvidando que seja capaz de confiar

nela novamente algum dia, apesar do que Damen me disse. Preciso ouvir de sua

boca, e só então decidirei.

— Todo mundo está lá nos fundos. — Ela diz, olhando para mim, e acres-

centa: - E, então, ficou surpresa?

— Só com a falta de surpresa. — Dou um meio sorriso, que é o melhor que

posso fazer, e ela tem sorte até mesmo de conseguir isso, o que tem muito menos a

ver com o que acho dela pessoalmente e muito mais com o fato de ela ter

assumido com prazer os cuidados com as gêmeas, permitindo que Damen e eu

tenhamos nossa privacidade de volta.

— Então funcionou! — Ela ri, acompanhando nós dois até os fundos, onde

todos estão reunidos. — Imaginamos que o único jeito de despistar seria fazer o

oposto do que você esperava.

Vou até o quintal e vejo Romy e Rayne deitadas na grama, fazendo colares

com cristais e contas que estão em uma tigela e depois enrolando-os ao redor da

estátua de pedra de Buda, enquanto Jude fica recostado ao lado delas, os olhos

fechados, o rosto virado para o sol, os braços novos em folha, cortesia de

Summerland. E, apesar da onda de calor, amor e segurança que lateja em mim

quando Damen se inclina sobre meus ombros e aperta minha mão, não consigo
deixar de ficar um pouco triste ao olhar para meu suposto grupo de amigos.

Uma mulher de quem não gosto e em quem não confio; gêmeas que

guardam rancor de mim, uma mais do que a outra, mas mesmo assim... e uma

evidente atração amorosa do passado que, por acaso, é rival de longa data de

minha alma gêmea. Só quem me faz sentir um pouquinho melhor é Miles e o fato

de saber que se ele não estivesse em Florença certamente estaria aqui comigo.

Mas não Haven.

Depois que me tornei eu mesma novamente e tentei explicar o que acon-

teceu, ela continuou furiosa demais para fazer qualquer coisa que não fosse gritar

comigo. Então praticamente não tive escolha além de lhe dar um tempo para se

acalmar. Só espero que em algum momento ela caia em si e veja quem Roman

realmente é.

E ali, parada, com minha triste festinha de aniversário acontecendo diante

de meus olhos... bem, apenas me convenço de tê-la perdido. Sua confiança, sua

amizade... e não tenho a mínima ideia de que conseguirei reavê-Ia. Justamente

quando temos mais em comum do que nunca, quando, por fim, compartilho o

segredo que vinha escondendo desde que a conheci, estrago tudo de tal forma que

ela me troca por meu inimigo imortal.

Suspiro baixinho, certa de que não poderia me sentir pior, quando Honor

se espreme pelo vão da porta francesa e vai direto até Jude, senta-se ao lado dele e
arruma o vestido de modo tão confortável e casual que fico boquiaberta. Não

consigo esconder minha supressa quando ela se vira para mim e sacode a mão

para a frente e para trás, em um cumprimento estranho e fugaz.

Aceno de volta com a cabeça, incapaz de desfazer o nó na garganta e en-

tender aquela cena.

Eles estão namorando? Ou apenas saindo juntos por compartilharem o

interesse por magia? Ele realmente não entendeu quando expliquei que éramos

apenas colegas de classe, e não amigas, e a enorme diferença entre as duas coisas?

Enquanto passo os olhos por eles, todos eles, não acredito que seja isso.

Que seja esse o resultado. Que depois de quase um ano nesta cidade,

tentando formar algum tipo de vida, meu único relacionamento realmente

duradouro seja com Damen, que, verdade seja dita, consegui pressionar além de

qualquer limite razoável.

Ava limpa a garganta e nos oferece uma bebida, no que acredito ser uma

tentativa de simular um pouco de normalidade, pelo bem de Honor e de Jude, já

que eles são os únicos aqui que não sabem a verdade sobre Damen e sobre mim...

ou pelo menos não toda a verdade.

Mas balanço a cabeça e recuso, convencendo-me de que é melhor assim, de

que é realmente o único jeito. Quanto menos vínculos eu estabelecer, de menos

gente precisarei me despedir. Mas, mesmo sabendo que essa é a verdade, não

serve muito para preencher o grande vazio dentro de mim.

Aperto a mão de Damen, garantindo telepaticamente que ele não precisa se

preocupar, só precisa ficar ali, que voltarei logo. Então entro, pensando, a
princípio, em ir até o banheiro, jogar um pouco de água fria no rosto para tentar

voltar a me sentir bem, mas, quando vejo aberta a porta do — espaço sagrado—

de Ava, mudo de ideia e entro. Fico surpresa ao ver que as paredes roxas e a porta

índigo foram transformadas em um refúgio em tons pastel e decoração pré-

adolescente. Deve ser o quarto de Romy, já que Rayne nunca escolheria esse estilo.

Sento-me na beirada da cama, passo a mão pelo edredom verde-claro

enquanto olho para o chão, lembrando o dia em que tudo mudou. O dia em que

eu disse adeus a Damen, o dia em que fui tola o suficiente para confiá-lo aos

cuidados de Ava. Estava tão convencida de que era o certo a fazer, a única coisa a

fazer, que não podia imaginar que aquela pequena escolha teria repercussões tão

grandes, com impacto no restante de minha vida... no restante da eternidade.

Respiro fundo e apoio a cabeça entre as mãos, dizendo a mim mesma para

me levantar, voltar lá fora, tentar puxar conversa e depois encontrar uma des-

culpa para ir embora. Esfrego os olhos e passo os dedos pelos cabelos, depois

pelas roupas, prestes a fazer exatamente o que pensei quando Ava entra e diz:

— Ah, que bom! Estava esperando para falar em particular com você.

Aperto os lábios, lutando contra um ímpeto irresistível de correr em sua direção e

socar todos os seus chacras, nem que seja apenas para ver, de uma vez por todas,

de que lado ela realmente está. Mas nada faço. Apenas permaneço exatamente

onde estou, esperando que ela comece.


— Sabe, você está certa sobre mim. — Ela faz que sim com a cabeça,

encostando-se na cômoda de Romy, tornozelos cruzados, mas os braços abertos e

soltos. — Eu realmente fugi com o elixir. E deixei Damen exposto e indefeso. Não

posso negar.

Olho para ela com o coração batendo freneticamente; mesmo já sabendo,

mesmo que Damen já tenha explicado, é totalmente diferente ouvi-la admitir isso.

— Mas, antes que tire conclusões precipitadas, acho que preciso explicar

um pouco mais. Apesar do que possa estar pensando, nunca me aliei a Roman.

Não estava mancomunada com ele, não era amiga dele, nem trabalhei com ele, de

nenhum modo. Ele apareceu para uma leitura uma vez, sim, na época em que eu

comecei. E, para ser sincera, a energia dele era tão fechada... tão desconcertante...

que o abençoei silenciosamente e o mandei seguir seu caminho. Mas o motivo

pelo qual agi assim, o motivo pelo qual não cuidei de Damen, bem... é

complicado...

— Aposto que sim. — Arqueio as sobrancelhas/e balanço a cabeça. Não

pretendo dar nenhum desconto nem deixá-la me enrolar com alguma explicação

complexa.

Ela faz um gesto afirmativo com a cabeça, determinada a continuar.

Condizente com seu jeito de ser, não se deixa perturbar por minha explosão.

— A princípio, admito, fiquei um pouco absorta com as possibilidades de


Summerland, com todos os dons maravilhosos que aquele lugar oferecia. Você

precisa entender que vivi sozinha por muito tempo, tendo que me sustentar e

trabalhar duro para conseguir tudo o que tenho sem a ajuda de ninguém e, muitas

vezes, sem que ninguém se importasse...

— Está realmente esperando que eu sinta pena de você? Porque, se for

isso... nem se dê o trabalho. É sério. Não vai funcionar. — Balanço a cabeça e

reviro os olhos .

— Só estou tentando mostrar a você um pouco do contexto. — Ela dá de

ombros, cruzando as mãos na frente do corpo e contraindo os dedos. Não estou

pedindo compaixão, pode acreditar. No mínimo, acho que aprendi uma lição

importante sobre me responsabilizar pela minha própria vida. Só estou tentando

explicar minha reação inicial a Summerland, como fiquei fascinada pela

possibilidade de materializar qualquer tipo de coisa que eu quisesse. Sei que

ultrapassei um pouco o limite e sei como isso irritou você. Depois de algum

tempo, porém, percebi que poderia construir uma mansão cheia de tesouros em

Summerland, mas isso não me faria mais feliz... Nem lá, nem no plano terreno. E

foi quando decidi ir um pouco mais fundo, me aperfeiçoar de modos que nunca

havia tentado. Claro, eu tinha meu espaço sagrado e as meditações, mas, quando

me concentrei em obter acesso aos Grandes Salões do Conhecimento, bem, então

fui forçada a colocar em prática todas aquelas coisas sobre as quais falava havia
anos. Então, desisti de todo o restante e me concentrei somente nisso. Não levei

muito tempo para conseguir entrar, e nunca olhei para trás.

Olho para ela com os olhos reduzidos a duas frestas e só consigo pensar:

Bem, parabéns pra você, Ava. Bravo!

— Sei o que você é, Ever. E Damen também. Embora não concorde

necessariamente com isso, não tenho o direito de interferir.

— Por isso abandonou Damen à beira da morte? É assim que lida com o

que não aprova? Soa como interferência para mim. - Olho para ela com cara feia,

afundando bem o pé no tapete.

Ela balança a cabeça, a voz calma e o olhar fixo no meu.

— Eu não sabia de nada disso quando deixei Damen sozinho naquele dia.

Eu pensei que tudo seria revertido... como você também acreditava.

Você voltaria no tempo, Damen voltaria também, e, embora eu não tivesse

certeza do que era o elixir, eu tinha minhas suspeitas, e pretendia tomá-lo. Mas

então, por alguma razão, quando estava prestes a bebê-lo... eu parei.

Simplesmente não consegui continuar, Acho que me dei conta da grandeza... da

grandeza de viver para sempre. - Ela olha para mim. - É muito sério, não acha?

Dou de ombros. Dou de ombros e reviro os olhos. Até agora, ela não disse

nada que mudasse minha opinião a seu respeito. E, por sinal, ainda não estou

convencida de que ela não o bebeu.

— Então, no fim das contas, eu o joguei fora, materializei o portal para

Summerland e comecei a procurar respostas... e paz.

— E encontrou alguma das duas? — pergunto, deixando claro em meu tom

de voz que não me importo.


— Encontrei. — Ela sorri. — Minha paz está em saber que todos nós temos

nossa própria jornada... nosso próprio destino a cumprir. E agora finalmente sei

qual é o meu. — Olho para ela, vendo corno seu rosto se ilumina quando

acrescenta: — Estou aqui para usar meus dons a fim de ajudar quem necessita,

para viver sem medo, para confiar que sempre terei o suficiente para sobreviver e

para criar as gêmeas de um modo que não consegui fazer antes. — Ela me olha

como se quisesse se aproximar e me abraçar, mas felizmente se contenta em

passar as mãos nos cabelos e ficar bem onde está. - Sinto muito pelo que

aconteceu, Ever. Nunca pensei que acabaria desse jeito. E embora não aprove o

que você e Damen são, realmente não cabe a mim julgar. Vocês têm a própria

jornada a seguir.

— Jura? E qual é? — pergunto, olhando em seus olhos, surpresa pela

intensidade da angústia em minha voz, esperando que ela tenha algum tipo de

pista sobre o motivo de eu estar aqui. Porque até agora não tenho minima ideia.

Mas Ava apenas dá de ombros. Seus olhos castanhos brilham olhando nos

meus quando ela diz:

— Ah, não. — Ela sorri e balança a cabeça. — Acho que deve descobrir por

si mesma. Mas, acredite, Ever, não tenho dúvidas de que será algo grandioso.

Quando chego em casa, já é tarde. Embora Damen se ofereça para ajudar a

carregar meus presentes até o quarto, embora parte de mim fique tentada a deixá-
lo fazer isso, apenas dou um beijo rápido em seu rosto e entro sozinha. Tudo o

que quero é mergulhar no casulo acolhedor que é minha cama e ter a última hora

do meu aniversário só para mim.

Capítulo 24

Sigo para as escadas, com cuidado, em silêncio, sem querer chamar a aten-

ção de Sabine, que está com a luz do quarto dela acesa, pelo que vejo por baixo da

porta. Quando deixo os presentes sobre a escrivaninha, ela aparece no corredor e

vem para o meu quarto.

— Feliz aniversário! — Ela sorri, enrolada em um robe tão macio que

parece uma nuvem de chantili. Olhando para o relógio em meu criado-mudo, diz:

— Ainda é seu aniversário, certo?

— Dezessete anos — confirmo. — Nem um dia a mais. — Ela se apóia na

beirada de minha cama, olhando para a pilha de presentes: alguns livros meta-

fisicos que ganhei de Ava, que praticamente — li— assim que toquei neles, um

geodo de ametista de Jude, uma camiseta que diz NUNCA PEÇA NADA DE QUE

NÃO POSSA SE LIVRAR DEPOIS, de Rayne (rá-rá), e outra com um símbolo em

espiral colorido, de Romy, qtle provavelmente veio da mesma loja wiccana, além

de um vale-presente da loja do iTunes, de Honor, que me entregou e murmurou:

— Hum, porque você parece gostar muito de música, porque está sempre, sabe,

conectada e tudo mais.— Ah, e vários vasos de tulipas vermelhas que Damen
deve ter materializado assim que me deixou em casa.

— Você ganhou bastante coisa — diz ela enquanto eu olho tudo, tentando

ver do mesmo jeito que ela, mais como uma celebração de minha existência e

menos como uma lembrança daqueles que não estavam presentes.

Jogo-me na cadeira da escrivaninha e chuto minhas sandálias, sentindo que

ela está aqui por um motivo, e espero que vá direto ao ponto.

— Não vou demorar... é tarde, e você deve estar cansada — ela diz, lendo

direitinho meu estado de espírito.

Começo a negar, apenas por educação, mas não me empenho muito e logo

paro. Por mais que seja bom ficar sozinha com ela, situação cada vez mais rara nos

últimos tempos, realmente gostaria que pudéssemos adiar até amanhã. Não estou

muito a fim de escutar uma de suas longas conversas cheias de rodeios.

Mas é claro que ela não percebe esse estado de espírito em particular,

apenas me olha com os olhos semicerrados e pergunta:

— Então, como estão as coisas? O emprego, Damen? Quase não vi você

esses dias.

Faço um gesto positivo com a cabeça, garantindo que está tudo bem, to-

mando cuidado para acrescentar um pouco de entusiasmo, esperando que seja

suficiente para convencê-la.

Seus olhos se iluminam de alívio, e ela continua:


— Você parece bem. Ficou tão magrinha por um tempo que eu... — Ela

balança a cabeça, mostrando no olhar um traço de como estava preocupada e

fazendo eu me sentir péssima. — Mas parece que está ganhando peso novamente.

A pele está mais limpa também... o que é bom ... — Ela aperta os lábios, como se

pesasse cuidadosamente o que está prestes a dizer, e continua: — Sabe, Ever,

quando eu disse que queria que você trabalhasse no verão, não imaginei que seria

da forma como você entendeu. Estava me referindo mais a uma ocupação de meio

período, algo para manter você ocupada por algumas horas por dia. Mas o modo

como vem trabalhando... — Ela interrompe e balança a cabeça. — Bem, tenho

quase certeza de que está trabalhando mais horas do que eu. E agora, faltando

apenas algumas semanas para as aulas recomeçarem... bem, acho que deveria

considerar pedir demissão, para aproveitar um pouco a praia, passar algum

tempo corn seus amigos.

— Que amigos? — Dou de ombros, sentindo meus olhos arderem e meu

estômago afundar. Mas eu já disse. Admiti uma verdade tão dolorosa que ela não

consegue evitar virar o rosto e olhar para o chão, Ela leva um momento para se

recompor antes de levantar os olhos e olhar nos meus, apontando com a cabeça

para a pilha de presentes de aniversário.

— Bem, lamento dizer, mas acho que há provas que dizem o contrário.

Fecho os olhos e balanço a cabeça, batendo de leve em minhas bochechas


enquanto me viro rapidamente, pensando na única amiga que não estava lá hoje e

que provavelmente nunca mais estará, graças ao monstro e a mim.

— Ei, você está bem? — Ela se aproxima, querendo apenas me confortar,

mas logo se afasta, lembrando-se de como fico temperamental quando sou tocada.

Respiro fundo e faço que sim, sabendo o quanto ela se preocupa e desejan-

do que não a tivesse arrastado até esse ponto. Porque a verdade é que eu estou

bem. Como ela disse, minhas roupas não caem mais, minha pele está limpa, meu

relacionamento está nos eixos novamente e aquela fera horrível, aquele pulso

estranho que me controlava, não é visto nem ouvido desde a noite na praia. E

mesmo com o grande buraco deixado pela ausência de minha família, mesmo

tendo de dizer adeus a Sabine em algum momento não muito distante, Damen

sempre estará aqui. Se ele provou algo neste ano que passou, foi que está

totalmente comprometido comigo ... conosco. Não importa o quanto as coisas

piorem, ele nunca mudará de ideia. E, no fim das contas, isso é tudo o que posso

pedir. O restante, bem, é o restante.

Olho para Sabine e faço um gesto afirmativo, Com mais firmeza dessa vez,

como se realmente acreditasse nisso. Tomei minha decisão há meses, comprometi-

me com a imortalidade, e agora não tem volta. Agora é uma longa marcha

adiante, pelo infinito.

— É só um pequeno caso de depressão de aniversário, eu acho. — Olho

para ela e continuo: — Sei que está familiarizada com a dor de ficar mais velha. —

Sorrio de um modo que começa nos lábios, mas sobe até os olhos. Um sorriso que

a estimula a sorrir também.


— É, você tem minha solidariedade. — Ela ri. — Mas terá ainda mais

quando for a sua vez de fazer quarenta anos. — Ela se levanta da cama, segue

para a porta com as mãos nos bolsos do robe e diz: — Ah, quase esqueci, deixei

umas coisinhas ali na sua cômoda. — Ela aponta com a cabeça. — Um é meu.

Bem, acho que vai ficar surpresa quando vir. Eu fiquei quando encontrei, mas,

além disso, estava esperando que pudéssemos encontrar um tempo em sua

agenda lotada para almoçar e fazer compras.

Faço um gesto afirmativo.

— Eu gostaria muito — digo, percebendo logo em seguida que eu real-

mente gostaria. Faz tempo que não nos divertimos com coisas de menina.

— Ah, e o outro... o cartão... — Ela dá de ombros. — Chegou hoje, en-

contrei na frente da porta quando cheguei em casa. Não tenho ideia de quem seja,

mas está aos seus cuidados.

Olho para a cômoda e vejo um pacote retangular ao lado de um grande

envelope cor-de-rosa que parece quase... brilhar... só que de um jeito sinistro e

ameaçador.

— Bem, só queria desejar feliz aniversário. — Ela olha para o relógio. —

Você ainda tem uns minutos, então aproveite!

Assim que Sabine fecha a porta, vou até a cômoda e pego a caixa. Seu

conteúdo se revela no instante em que a toco.


Rasgo o papel o mais rápido que posso, deixando os pedaços caírem no

chão, e levanto a tampa, o que revela o álbum de fotos encadernado com couro

roxo no qual estão todas as fotos que Riley tirou em nossa viagem fatídica ao lago,

incluindo a que vi em Summerland. Enquanto viro as páginas, não posso deixar

de imaginar se ela não foi, de algum modo, responsável por isso. Será que ela

pode vê-lo, ver a mim? Mas não chamo por ela novamente, isso nunca mais deu

certo. Apenas seco as lágrimas do rosto e sussurro um obrigada bem baixinho.

Coloco o álbum no criado-mudo, sabendo que quero deixá-lo perto de mim, onde

possa olhá-lo várias vezes. Depois, pego o envelope com meu nome escrito na

frente em uma caligrafia extremamente formal. Fico sem ar quando ele brilha em

minha mão e, pela fôrma como todo o meu corpo estremece, sei que é dele.

Levanto a aba com a unha, determinada a acabar logo com isso. Olho para

o cartão cor-de-rosa, coberto de purpurina, antes de abri-lo, passo os olhos na

mensagem que já vem impressa e depois vejo, no canto inferior esquerdo, um

recado que Roman escreveu com sua letra cheia de floreios:

É hora de reivindicar aquilo que mais deseja

Hoje é seu aniversário, e uma trégua lhe darei de bandeja Em minha casa hoje,

antes da meia-noite, deve estar.

Um segundo de atraso, e a oferta vou retirar

Espero em breve vê-la chegar!


Bjs,

Roman

Capítulo 25

Quando chego à casa de Roman, faltam apenas alguns minutos. Dois, para

ser mais exata, e espero que seu relógio esteja batendo o mesmo horário.

Mas, desta vez, em vez de derrubar a porta como sempre faço, bato e

espero.

Porque, se realmente daremos uma trégua, como ele disse, não custa

mostrar boas maneiras.

Espero, olhando para o relógio e contando os segundos. O som leve de seus

passos se aproximando sinaliza que chegou meu momento. A magia deu certo.

A porta se abre e ele fica ali parado diante de mim, olhos azuis brilhantes,

dentes brancos e pele bronzeada, usando um robe preto de seda, solto nos

ombros, expondo uma boa área de seu peito desnudo, abdômen notavelmente

definido e jeans desbotados de cintura baixa.

E não preciso de mais nada. Uma olhada rápida naquela dádiva e meu

corpo começa a tremer, os joelhos perdem a firmeza e meu pulso acelera de um

modo tão terrivelmente familiar que uma nova percepção lentamente toma conta

de meu ser:

O monstro não está morto! Não foi expulso! Simplesmente se retirou,


escondeu-se em algum lugar profundo aguardando sua hora e recobrando as

forças até poder emergir novamente...

Engulo em seco, obrigando-me a acenar com a cabeça como se tudo

estivesse bem. Percebo que ele está me varrendo com os olhos, sem deixar escapar

nada, e sei que preciso acabar com isso. Custe o que custar, não posso fracassar

quando tudo de que preciso está tão ao meu alcance.

Com a cabeça inclinada para o lado, ele faz um sinal para que eu entre.

— Fico feliz em ver que chegou a tempo — ele diz, observando-me

cuidadosamente.

Eu me viro e não chego nem a metade do corredor antes de parar e

reconsiderar. Vejo o olhar de divertimento que passa por seu rosto enquanto a cor

some do meu.

—A tempo para quê, exatamente? —Estreito os olhos, espremendo-me

contra a parede enquanto ele passa e faz sinal para eu segui-lo.

—Para seu aniversário, É claro! —Ele ri, olhando para trás e balançando a

cabeça. — Aquele Damen é um idiota sentimental. Sei que ele fez de tudo para

tornar seu dia especial. Mas, ouso dizer, não tão especial quanto o que estou

prestes a fazer.

Fico parada, recusando-me a me mover. Apesar de minhas mãos e pernas

estarem tão trêmulas que parece que as juntas vão se soltar, minha voz permanece
controlada, comedida, sem deixar nada transparecer.

—Cumprir sua promessa e me entregar o que eu quero tornaria meu dia

especial o suficiente. Não precisa nem me convidar para me sentar nem me

oferecer Luna bebida. Por que não aceleramos e vamos direto ao ponto?

Ele olha para mim, rindo com os olhos e com um sorriso também nos

lábios.

— Uau, esse Damen é mesmo um cara de sorte. —Ele balança a cabeça e

passa os dedos pelos cabelos dourados. — Nada de perder tempo com

preliminares. Parece que nossa pequena Ever aqui prefere ignorar a entrada e ir

direto ao prato principal... e, gata, preciso aplaudi-la por isso.

Obrigo meu rosto a permanecer neutro, impassível, apesar do tanto que

suas palavras me perturbaram. Sinto a dor de saber que essa chama negra queima

cada vez mais forte dentro de mim, agora agitada pela presença dele.

—Você pode não querer se sentar, nem tomar uma bebida, mas eu quero.

E, como sou o anfitrião esta noite, acho que você vai ter que fazer minha vontade.

Ele segue na direção da saleta como um turbilhão de seda preta, vai até o

bar e enche uma pesada taça de cristal com uma boa dose de líquido vermelho.

Balança a taça diante de mim, fazendo o líquido opaco borbulhar e brilhar

enquanto corre no interior da taça, fazendo eu me lembrar de Haven uma vez ter

dito que o elixir de Roman era mais potente do que o de Damen.


Fico imaginando se é verdade, se lhes da algum tipo de vantagem... se

funcionaria assim para mim também ou se acabaria me deixando louca e perigosa

como eles.

Aperto os lábios e luto para me manter serena. Meus dedos começam a

ficar inquietos, nervosos, e sei que não vai demorar muito até que eu perca o

controle por completo.

— Sinto muito sobre seu probleminha com Haven — diz Roman, levan-

tando a taça e tomando um longo gole. — Mas as pessoas mudam, sabe? Nem

toda amizade é feita para durar.

— Eu não desisti. — Dou de ombros. As palavras saem com muito mais

segurança do que sinto. — Tenho certeza de que vamos conseguir resolver tudo

— acrescento, com o pulso estranho batendo dentro de mim quando ele inclina a

cabeça e permite que a tatuagem de Ouroboros apareça e desapareça.

— Tem certeza disso, gata? — Ele me olha, passando o dedo na haste da

taça enquanto seu olhar se move sobre mim daquele modo lento, vagaroso, íntimo

que ele faz. Ele escolhe fixar o olhar no decote profundo em v de meu vestido e

diz: - Sem querer ofender, mas preciso discordar. Minha experiência diz que

quando duas garotas querem a mesma coisa... bem, alguém corre o risco de se

ferir... ou algo pior, como você bem sabe.

Aproximo-me dele. Não o monstro, mas eu (embora o monstro certamente


não se oponha) olho em seus olhos e digo:

— Mas Haven e eu não queremos a mesma coisa. Ela quer você e eu quero

algo totalmente diferente.

Ele olha para mim por cima da taça, que cobre todo o seu rosto, menos o

olhar azul-metálico.

— Ah, sim, e o que seria isso, gata?

— Você sabe muito bem. — Dou de ombros, tirando a mão da cintura e

colocando-a para trás, para que ele não veja como treme. — Não foi para isso que

me chamou aqui?

Ele confirma com a cabeça, apoiando a bebida no descanso dourado.

— Mas eu queria ouvir você dizer. Amo ouvir as palavras ditas em voz

alta... dos seus lábios para meus ouvidos. — Respiro fundo, observando seu olhar

fechado, os lábios grandes e sedutores, o peito largo. Meus olhos são atraídos para

seu abdômen, e ainda mais abaixo, quando digo:

— O antídoto. — Empurro as palavras para fora, imaginando se ele tem

alguma ideia da batalha travada dentro de mim. — Eu quero o antídoto repito,

com mais firmeza desta vez. — Como você já está cansado de saber.

Antes que eu possa impedir, ele já está parado diante de mim. Rosto con-

tido, mãos relaxadas na lateral do corpo. O frio de sua pele emana em minha

direção uma onda de alívio refrescante e doce quando ele diz:

— Quero que saiba que trouxe você aqui com a mais pura intenção. Depois

de ver como sofreu nos últimos meses, estou totalmente preparado para colocar

um ponto final nisso e entregar o que você quer. Mesmo tendo sido bastante

divertido, pelo menos para mim. — Ele dá de ombros. — Assim como você, Ever,
estou pronto para seguir em frente. Vou voltar para Londres. Esta cidade aqui é

muito devagar para o meu gosto. Preciso de um pouco mais de ação.

— Você vai embora? — deixo escapar, e as palavras vêm tão depressa que

não sei quem foi responsável por dizê-las.

— Isso a incomoda? — Ele sorri, olhando para mim.

— Nem um pouco. — Faço cara feia, revirando os olhos e desviando o

olhar, esperando disfarçar o temor em minha voz...

— Tentarei não levar para o lado pessoal. — Ele sorri, e a tatuagem de uró-

boro aparece e desaparece, os pequenos olhos brilhantes da serpente procurando

os meus enquanto desliza a língua para fora. — Mas, antes de ir, pensei em

amarrar algumas pontas soltas. E, já que é seu aniversário, pensei em começar por

você. Oferecer o presente que mais deseja. Aquilo que quer mais do que tudo no

mundo e que nenhuma outra pessoa, viva ou morta, poderia lhe dar... - Ele passa

o dedo de leve e rapidamente em meu braço, e a lembrança de seu toque

permanece por um bom tempo depois que ele se afasta.

Olho para suas costas, ciente de que não posso arriscar, não posso ter uma

recaída. Lembro-me da sensação mágica dos lábios de Damen há apenas algumas

horas e de como estou perto de poder senti-la novamente... mas só se conseguir

me conter.

Roman se vira, sinaliza com o dedo para que eu o siga, solta um muxoxo
de reprovação à minha resistência e diz:

— Confie em mim, gata, não pretendo enganar nem arrastar você para meu

quarto. — Ele balança a cabeça e ri. — Teremos muito tempo para isso depois, se

quiser. Mas, por enquanto, tenho algo um pouco mais técnico planejado. Falando

nisso, já fez algum teste com detector de mentiras?

Estreito os olhos, sem saber o que ele quer dizer, mas tenho certeza de que

é uma armadilha. Sigo-o pelo corredor e pela cozinha, saímos pela porta dos

fundos, passamos por um ofurô na lateral da varanda e entramos em um cômodo

que parece uma garagem metade transformada em loja de antiguidades, a outra

metade em laboratório de cientista louco.

— Odeio precisar dizer isso, gata, e, acredite, não quero ofender, mas você

tem fama de mentir de vez em quando... principalmente em ocasiões que a

beneficiem. E como sou um homem íntegro, já que prometi dar o que realmente

quer mais do que qualquer outra coisa no mundo, sinto que o certo é ambos

sabermos exatamente o que é. Com certeza tem alguma coisa muito estranha

acontecendo entre nós. Preciso lembrar a você como se jogou em cima de mim da

última vez em que esteve aqui?

— Não foi... — começo a falar, mas logo paro quando vejo ele levantar a

mão.

— Por favor. — Ele dá um sorriso falso. — Poupe-me das desculpas. Tenho


um modo muito mais direto de conseguir as respostas que quero.

Franzo os lábios. Já vi seriados de crime na TV o suficiente para reconhecer

a aparelhagem para a qual ele está me levando. E ele está muito enganado se acha

que vou me ligar naquilo e consentir em passar por um teste de polígrafo. —

Esqueça — digo, dando meia-volta, pronta para sair. — Vai ter que aceitar minha

palavra, ou não tem acordo.

Já estou na porta quando ele diz:

— Bem, existe outra coisinha que posso tentar. — Eu paro. — E, acredite,

não há como trapacear, especialmente com pessoas como nós. E por acaso tem

tudo a ver com essas baboseiras metafísicas de tudo é energia e unidos em um só

de que você tanto gosta.

Respiro fundo e alto, batendo o pé no chão, esperando liberar um pouco

dessa energia que se forma dentro de mim, e também mostrar a ele como estou

ficando impaciente.

Mas Roman não é de correr, ou se apressar, ou agir em qualquer outro

ritmo que não seja o dele. Ele se distrai tirando um fio solto do robe, olha para

mim e diz:

— Sabe, Ever, acontece que está provado cientificamente que a verdade

sempre, sempre é mais forte do que a mentira. Que se ambas forem medidas lado

a lado, uma contra a outra, por assim dizer, a verdade sempre vence. O que acha?
Reviro os olhos, o que por si só já mostra o que acho de tudo isso e de tudo

o que virá em seguida.

Mas Roman está impassível, determinado a jogar do modo dele, e com-

pleta:

— Bem, há um jeito muito fácil de testar essa teoria, um jeito que não pode

ser manipulado e não exige nada além de seu próprio organismo. Gostaria de

tentar?

Hum, acho que não!, começo a dizer, quero dizer, mas o monstro está acor-

dado e não me deixa falar, O que só estimula Roman a continuar.

— Então, você diria que nós dois temos a mesma força? Que no caso de

pessoas como nós não há diferenças fisicas em termos de força entre homens e

mulheres?

Dou de ombros. Nunca parei para pensar sobre isso e não estou nem um

pouco interessada em começar agora.

— Então, levando isso em consideração, gostaria de demonstrar algo que

você vai achar muito interessante. E, diga-se de passagem, garanto que não estou

tentando enganá-la, não é um jogo e ninguém vai sair machucado. Estou sendo

sincero ao dizer que vou lhe dar aquilo que mais quer, e essa é a melhor forma

que conheço para determinar o que seria isso. Posso até ir primeiro, para você ver

que não tenho nenhum truque na manga.

Ele fica parado diante de mim, com os braços abertos ao lado do corpo,

paralelos ao chão de concreto. Faz um gesto afirmativo com a cabeça e diz: -

Agora, vamos, coloque dois dedos sobre meu braço e empurre de leve para baixo,

enquanto eu resisto e empurro para cima. Não é brincadeira nenhuma, eu juro.


Você vai ver.

Olho em seus olhos, vendo seu olhar desafiador e ciente de que não tenho

escolha além de ir em frente, já que ele é o único que tem a chave. Tenho que jogar

seu jogo, com suas regras, a seu modo.

Olho para seu braço suspenso diante de mim, bronzeado, forte, implo-

rando para ser tocado. Mesmo sabendo que não posso fazer isso, que não consigo

me conter, ainda assim cerro os dentes e tento. Pressiono meus dedos contra ele,

sentindo o frio de sua pele emanar através do tecido macio do robe, fazendo com

que a chama negra que está dentro de mim fique agitada e resplandecente.

— Está sentindo? — A voz de Roman é um sussurro macio e grave em meu

ouvido.

Olho para ele, ciente apenas do pulso insistente que bate dentro de mim

enquanto meu corpo se enche de calor. Calor que não busca nada além de seu

alívio doce e refrescante.

— Certo, agora quero que me faça uma pergunta, uma pergunta simples,

para a qual já saiba a resposta, e me dê um momento para eu pensar na resposta,

tanto mental quanto verbalmente, enquanto você tenta empurrar meu braço para

baixo com os dois dedos.

Olho para o relógio e para ele, com os joelhos tremendo, sabendo que não

tenho muito tempo.


Mas ele apenas faz um gesto positivo com a cabeça, encarando-me com um

olhar encorajador.

— A verdade fortalece, a mentira enfraquece. Agora é a sua chance de

testar essa teoria em mim, para depois podermos testar em você. É o único jeito de

provar o que realmente quer, Ever. Então, vá em frente, faça uma pergunta, a que

quiser. Vou inclusive baixar meu escudo para você poder ler meus pensamentos e

ver que não estou trapaceando.

Ele olha para mim, e o peso de seu olhar faz com que meu pulso acelere e

meu coração dispare até que eu não... não consiga...

— Faça uma pergunta, Ever. — Ele olha para mim atentamente. — Per-

gunte o que quiser. Quanto mais cedo terminarmos minha parte, mais cedo

poderemos determinar o que é que você mais deseja.

Fico a seu lado, lutando para me manter estável, centrada, mas é inútil, não

consigo, não posso mais participar de seu jogo.

— Prefere seguir adiante? — ele pergunta, os olhos passando por mim

lenta e atentamente. — Prefere que eu teste você primeiro?

Ele espera, dando-me um tempo para me recompor, respirar fundo e fazer

uma súplica silenciosa para Hécate, pedindo-lhe forças para passar por isso, para

obter o que vim buscar. Mas, quando olho novamente para Roman, percebo que

Hécate me deixou, estou por conta própria.


— É o antídoto que você quer, certo? — ele pergunta, virando-se para mim,

tão perto que posso sentir seu hálito em meu rosto, os lábios apenas a alguns

centímetros dos meus. — É essa a única coisa que você deseja, mais que qualquer

outra?

É!, eu grito. A palavra vem das profundezas e minha mente a repete com

tanta força que tenho certeza de que ele pôde escutar.

Só que não escutou. Porque nunca foi dito.

É apenas um som vazio t que fica ecoando em minha mente até que final-

mente se extingue.

E no instante em que seus olhos encontram os meus, estou perdida.

O fogo ruge dentro de mim, deixando meu corpo em chamas enquanto

meus dedos, ávidos por sentir sua pele, agarram e arranham seu peito macio e

bronzeado.

— Cuidado, gata. — Roman agarra meus pulsos e me puxa para perto dele,

com os olhos semicerrados, os lábios úmidos. — Nunca fui fã de marcas de unha,

não importa se vão desaparecer rápido. — Ele me afasta e me olha de cima a

baixo, faminto, predatório. Sou seu banquete. — Além disso, não vamos usar

essas baboseiras. — Ele ri, desamarrando o amuleto de meu pescoço e jogando-o

do outro lado do cômodo, onde rola, quica e bate no chão.

Mas eu não me importo, não me importo com nada além da sensação de


seus dedos descendo por minhas costas, o modo como ele afunda o rosto em

meus cabelos e pressiona o nariz em meu pescoço, inspirando profundamente,

enchendo-se de meu cheiro. Seus olhos ardentes fitam os meus quando ele me

levanta e me coloca no sofá. Ele se livra do robe e desabotoa os jeans enquanto

passo as mãos por suas costas e o puxo para mais perto, ávida por sentir seu beijo,

seus lábios nos meus.

Respiro fundo quando ele me afasta, tira minhas mãos de seu pescoço e

diz: - Pegue leve, gata. É você que não gosta de preliminares, lembra? Teremos

muito tempo para isso depois, mas, primeiro, vamos logo ao que interessa. Afinal,

você esperou por.. quanto tempo? Quatrocentos anos?

Puxo-o de volta para mim, sedenta por mais - mais de sua pele, mais de seu

gosto. Meu corpo se contorce, arqueia, desesperado por encontrar o dele, meus

lábios voluptuosos, vorazes por tudo que ele possa me dar. Quero que ele me

queira do mesmo modo que eu o quero, e estou disposta a fazer o que for preciso

para conseguir que ele me beije. De repente, eu me lembro do que preciso fazer...

Ele encaixa o joelho entre os meus, tirando as calças e acomodando os

quadris, posicionando-se enquanto diz:

— Vai doer só um pouquinho, gata, e depois...

E então ele olha para mim e tudo para - seus olhos vidrados de desejo, os

lábios entreabertos de espanto, enquanto aquele olhar, o olhar que eu estava

esperando, que eu desejava, assume o controle.

O olhar que mostra que ele me quer, que precisa de mim, do mesmo jeito

que eu o quero e preciso dele.

Puxo-o para perto, desesperada para finalmente sentir a pressão de seus


lábios, quando ele se inclina em minha direção e sussurra uma reverência abafada:

— Drina...

Recuo, confusa, olhando em seus olhos e vendo- o que ele vê - cabelos

vermelhos reluzentes, pele de porcelana, olhos verde-esmeralda -, um reflexo que

não pertence a mim.

— Drina... — ele murmura. —- Drina, eu...

E enquanto meu corpo ainda está respondendo, estimulando seu toque e as

carícias em minha pele, meu coração recua, recusando-se a representar. Há algo

errado, algo muito, muito errado. Algo atrapalhando, começando a tomar forma

quando ele puxa meu vestido, que logo escorrega.

Quando olho para ele e vejo aquele olhar vidrado em seus olhos, sei que

está quase aqui. Meu presente de aniversário, a coisa que eu mais queria está

prestes a ser minha.

Tenho uma pequena noção de que de agora em diante nada mais será

igual.

Nada.

Nunca mais.

Ele afasta minhas pernas enquanto me preparo para aquele breve instante

de dor. Viro-me e vejo o espelho na outra parede, mas a imagem é a de uma

garota de cabelos vermelhos, pele clara e luminosa, olhos verde-esmeralda e um


sorriso tão selvagem que o reconheço imediatamente.

A mesma imagem que ele vê quando olha para mim. Só que não sou eu.

Não sou eu mesmo!

— Está preparada, gata? — Roman me olha com expectativa.

Embora minha cabeça diga que sim e meu corpo se levante para encontrar

o dele, não sou eu de verdade quem está respondendo. O monstro pode controlar

meu corpo, mas não tem nada a ver com meu coração ou minha alma.

Como Roman disse antes: — No final, a verdade sempre vence. — Por

sorte, minha alma sabe o que está acontecendo.

Fecho os olhos e me concentro em meu chacra do coração, e vejo aquele

círculo de energia verde emanar bem do centro de meu peito, estimulando-a a

crescer, expandir-se, ficar cada vez maior, até...

Roman murmura meu nome, só que não é meu nome de fato, é o nome

dela, com a voz cheia de expectativa, ansioso para começar, sem ideia do que sou

capaz, de que, pelo menos por um instante, consegui ganhar.

Levanto o joelho e o acerto diretamente lá. Meus ouvidos zunem com o

som de seu grito de agonia, enquanto leva as mãos ao meio das pernas e revira os

olhos. Escapo de baixo dele, movendo-me apressadamente, sabendo que é apenas

uma questão de segundos até que ele se cure e volte com força total.

— Onde você escondeu? — pergunto enquanto pego freneticamente


minhas roupas e coloco o amuleto de volta no pescoço, sabendo que ele já me vê

novamente como uma loura de olhos azuis. — Onde está? — exijo, olhando ao

redor do pequeno e ordenado laboratório.

Ele abaixa a cabeça, examinando a si mesmo cuidadosamente, enquanto

resmunga:

— Droga, Ever...

Mas eu não tenho tempo para isso.

— Onde está, diga logo! — grito, lutando para me concentrar no chacra do

coração enquanto seguro o amuleto bem perto do peito.

— Está louca? — Ele dá de ombros e faz cara feia. — Você me apronta uma

sacanagem dessa e ainda espera que eu a ajude? — Ele balança a cabeça.

— Esqueça. Você poderia estar com esse antídoto, poderia ter saído com ele

há dez minutos, mas fez sua escolha, Ever. Foi justo, como nós dois sabemos. Eu

estava preparado para lhe entregar, e não, não está aqui. Então não precisa se dar

o trabalho de saquear o lugar em busca dele. É sério. Acha que sou idiota? - Ele

veste o robe e o fecha no peito, como se quisesse impedir que eu fique tentada

novamente. Mas, apesar de o monstro ainda vociferar dentro de mim, não estou

mais interessada. A fera pode estar viva e bem, mas minha alma e meu coração

agora comandam. - Eu estava preparado para levá-la até ele, mas você fez outra

escolha. E só porque se arrependeu na última hora e resolveu seguir seu coração...


— Ele franze a testa de modo que me diz que conhece a fonte de minha força. —

Isso não muda nada. Você me escolheu, Ever. Eu era o que você mais queria. Mas

agora, depois desse golpe, não vai ganhar nenhum dos dois. — Ele balança a

cabeça. — Não tem segunda chance depois de uma sacanagem dessas.

Fico parada diante dele, a chama negra enfurecendo-se por dentro, esti-

mulando-me a partir para cima daqueles olhos da cor do oceano, dos cabelos

dourados, dos lábios úmidos, dos quadris bem-desenhados...

— Não — resmungo, dando um passo para trás. — Eu não quero você.

Eu nunca quis. Não sou eu... é... é outra coisa. Não é culpa minha, não

estou no controle!

Aperto os lábios, sabendo que há apenas um modo de sair daqui, mas que

não deveria fazê-lo na frente dele, não deveria levantar suspeitas desse jeito. Só

que não tem outro jeito, não posso confiar em minhas pernas para me levarem a

outro lugar além de sua cama.

Aperto o amuleto junto ao peito e me concentro no véu brilhante e dou-

rado. Visualizo o portal para Summerland e o vejo se abrir diante de mim. Estou

prestes a entrar quando ele diz:

— Bobagem, Ever. Não percebe que não há mais diferença entre você e

seu... monstro? Você é o monstro. É seu lado negro, sua eu-sombra, e agora vocês

se transformaram em um só.
Capítulo 26

Aterrisso naquele grande campo perfumado. Relutante, sinto-me culpada

por saber que não devia ter feito isso. Nunca devia ter deixado Roman me ver

desaparecer. Mas que escolha eu tinha?

Minha determinação estava se esgotando, reduzida paulatinamente pelo

monstro interior, e apenas mais alguns segundos na presença dele certamente

teriam representado o fim. O fim de mim. O fim de tudo o que estimo.

Porque Roman está certo. Total e completamente certo. O único motivo

pelo qual perdi, pelo qual não consegui o que queria, é o fato de o monstro ser eu,

não há diferença entre nós. Ele é responsável por toda a ação, por todas as

decisões, enquanto eu apenas acompanho, sem saber como pisar no freio ou dar o

fora. Estou' sem opções. Não tenho idéia do que fazer. Tudo o que sei é:

O feitiço de reversão falhou, assim como o pedido a Hécate. E Damen, bem,

Damen não pode me salvar.

Jamais pode ficar sabendo da coisa repugnante que quase fiz.

Não pode passar as próximas centenas de anos me salvando de mim

mesma. Afundei tanto, caí tanto, que não há como me levantar. Não há como

colocar minha vida de volta nos eixos. Não posso, de jeito algum, voltar ao plano

terreno e pôr tudo em risco.

Então fico vagando, sem destino em mente e nenhuma ideia do que farei

quando chegar. Ando ao longo do riacho que reflete as cores do arco-íris,


vagarosamente, sem pressa, apenas caminhando, sem prestar atenção quando o

riacho termina e o chão sob meus pés começa a ficar escorregadio, encharcado,

molhado.

Mal noto que o ar esfria vários graus e que o brilho dourado fica mais

turvo, denso, difícil de penetrar.

Talvez isso explique meu choque quando vejo. Quando percebo que sem

querer cheguei ao lugar onde a névoa é sempre mais pesada, onde é fãcil se

perder e chegar a um ponto do qual não há mais volta. Observo os familiares

contornos em declive, as cordas gastas e desfiadas, as tábuas de madeira lascadas,

a forma entrando e saindo de foco, obscurecida pela neblina, mas ainda assim não

há como negar o que é.

Sem dúvida, é a ponte que leva ao outro lado.

A Ponte das Almas.

Ajoelho-me ao lado, afundando na terra úmida, imaginando se é algum

tipo de sinal, se fui levada até ali de propósito, se devo finalmente cruzá-la.

E se a oportunidade que recusei antes estiver sendo oferecida a mim

novamente? Uma oferta especial do tipo — não-faça-perguntas— para clientes

fiéis como eu.

Pego no corrimão, uma corda velha desfiada que parece que vai se romper

a qualquer momento, e percebo que a neblina fica cada vez mais densa lá pelo
meio, tão pesada que o destino final é um mistério coberto de branco. Lembro a

mim mesma que essa é a ponte que incentivei Riley a cruzar, a mesma que meus

pais e Buttercup usaram para chegar ao outro lado. E se eles conseguiram cruzar e

chegar bem, então não deve ser tão ruim assim.

E se eu simplesmente me levantasse, limpasse a sujeira do corpo, respirasse

fundo e a cruzasse?

E se o necessário para resolver meus problemas, livrar-me do monstro,

apagar essa chama e ver minha família novamente é apenas um pequeno passo,

seguido de outro?

Alguns passos na direção de seus braços acolhedores e calorosos.

Alguns passos para longe de Roman, Haven, as gêmeas, Ava e essa

confusão terrível que criei.

Alguns passos na direção da paz que procuro.

É sério. Que mal pode haver? Certamente encontrarei minha família toda

esperando por mim — como vemos naqueles programas de TV sobre a vida após

a morte.

Agarro a corda com força. Minhas pernas estão trêmulas, instáveis,

enquanto me levanto e me estico para tentar ver melhor. Pergunto-me até onde

precisarei ir para chegar ao ponto do qual não há mais volta. Lembro-me de Riley

dizendo que chegou à metade e, então, voltou para me procurar, a névoa


deixando-a tão confusa que não conseguiu mais encontrar a ponte ... pelo menos

por algum tempo.

Mas se eu decidisse continuar, cruzar para o outro lado, meu de tino seria o

mesmo que o deles? Ou seria como um trem de carga mudando repentinamente

de trilhos, levando-me para o abismo de Shadowland, e não para o paraíso?

Respiro fundo e começo a me movimentar, levantando os pés do solo

úmido e encharcado, prestes a agir quando de repente sou tomada por uma leve

onda de calma, um impulso tranquilo que só pode ter um significado, que apenas

uma pessoa pode provocar em mim. Uma calma tão oposta ao formigamento e ao

calor provocado por Damen que não fico nem um pouco surpresa quando me viro

e encontro Jude a meu lado.

— Sabe até onde isso leva, certo? — Ele aponta para a ponte que balança,

esforçando-se para manter a voz áspera, clara; mas o tremor de nervoso o entrega.

— Sei até onde leva as outras pessoas. — Dou de ombros, olhando para ele

e para a ponte. — Mas não sei aonde pode me levar.

Ele estreita os olhos, inclina a cabeça e me observa com calma e atenção,

dizendo com cuidado:

— Leva ao outro lado. Vale para todos. Não há filas separadas. Segregação

de nenhum tipo. Deixe esse tipo de julgamento para o plano terreno.

Encolho os ombros, nem um pouco convencida. Ele não sabe o que eu sei.
Não viu o que eu vi. Como poderia saber o que se aplica ou não a mim?

— Mesmo assim — ele diz, ouvindo meus pensamentos em alto e bom

som. — Não acho que seja hora de considerar a travessia. A vida já é curta demais,

sabe? Mesmo nos dias em que parece muito, muito longa. Quando tudo acabar,

será apenas um piscar de olhos, um lampejo para a eternidade, pode acreditar.

— Talvez para você, mas não para mim — digo, olhando em seus olhos de

um modo tão aberto e sincero que fica evidente que o estou convidando a entrar.

Estou pronta para falar, contar toda a história sórdida, colocar as cartas na mesa,

tudo o que escondi até agora. Tudo o que ele precisa fazer é pedir, e confessarei

tudo. - No meu caso, não se pode chamar de lampejo.

Ele coça o queixo e franze as sobrancelhas, claramente tentando ver algum

sentido no que eu disse.

E isso basta. Seu desejo de entender, e tudo cai sobre ele. Tudo. Tudinho.

Um trasbordamento de palavras que vêm com tanta força e fúria que saem todas

misturadas: o primeiro dia, no local do acidente, quando Damen me deu o elixir

pela primeira vez e me transformou no que sou hoje; a verdade sobre Roman,

quem ele é realmente e as providências que tomou para que Damen e eu não

pudéssemos mais ficar juntos; Ava e as gêmeas, e o estranho passado que as

conecta; como transformei Haven em uma aberração como eu; chacras e como

mirar em nossas fraquezas é o único meio de nos eliminar e, é claro, Shadowland,

o eterno abismo para onde vão todos os imortais única coisa que está me

mantendo deste lado da ponte. As palavras são cuspidas com tanta rapidez que

mal posso interrompê-las. Nem tento. Fico tão alivia por desabafar, encorajada

por seus esforços em se manter calmo e não surtar totalmente, apenas deixando
eu esperava. — É sério. Não fui eu que chamei você para me fazer companhia.

Você simplesmente apareceu.

Ele olha para mim, sem desanimar com minha mudança de humor,

esboçando um sorriso nos lábios e dizendo: — Bem, não exatamente...

Olho para ele, imaginando o que quer dizer.

— Ouvi seu pedido de ajuda e vim averiguar. Estava procurando por você,

não ... não por isso.

Estreito os olhos, prestes a contestar quando me lembro de meu primeiro

encontro com as gêmeas, um encontro que aconteceu do mesmo jeito.

— Eu não ia atravessar — digo, com a face corada de vergonha. talvez

tenha considerado, mas apenas por um segundo e não a sério, pelo nos não muito.

Estava apenas curiosa... só isso. Além do mais, conheço algumas pessoas que

vivem lá e, bem, às vezes sinto falta delas.

— E achou que poderia fazer uma visita rápida? — Seu tom é leve, mas

palavras saem pesadas, mais do que ele imagina. Balanço a cabeça e olho para

meus pés cobertos de lama. — Bem... e então? O que a impediu, Ever?

Fui eu?

Respiro fundo, e mais uma vez preciso de um instante antes de olhar para

ele.

— Eu... eu ia atravessar — digo. — Bem, fiquei um pouco tentada e tudo,


mas eu teria parado mesmo se você não tivesse aparecido. - Dou de ombros,

procurando seus olhos. — Em parte, porque não é certo deixar tanto por fazer,

tantos erros para os outros consertarem. E, em parte, porque pelo que eu sei sobre

a alma de um imortal e para onde ela vai, bem, por mais que eu ache que mereça,

não posso correr na direção desse fim. Eu vi o outro lado, ou pelo menos o outro

lado reservado a mim. E sinto muito dizer, mas provavelmente não é o lugar para

onde foi minha família. Receio que, se quiser ver meus pais e minha irmã

novamente, vou ter muito mais sorte usando você como intermediário do que

cruzando aquela ponte, sem contar...

Ele olha para mim, esperando.

Eu suspiro e chuto o chão, determinada a confessar o motivo mais impor-

tante de todos, não importa o quanto faça Jude se sentir mal. Olho nos olhos dele,

endireito os ombros e digo:

— Sem contar o fato de que nunca poderia fazer isso com Damen. Meus

olhos encontram os de Jude, e rapidamente desvio o olhar para o outro lado. —

Nunca poderia abandonar Damen assim. Não depois de... — Faço uma pausa,

tentando desfazer o nó na garganta— Não depois de tudo o que ele fez por mim.

— Esfrego os braços para me aquecer, embora não esteja com frio. Apenas

constrangida. Constrangida e desconfortável, com certeza.

Mas Jude apenas faz um gesto positivo com a cabeça, garantindo-me que
tudo ficará bem. Ele coloca a mão em minhas costas e me conduz calmamente

para longe da ponte, da longa fileira de almas que saltam alegremente para o

outro lado, e me leva de volta para o plano terreno.

Estou ansiosa para me afastar do rosto que paira diante de mim, para me

afastar de um passado que acabou, de maneira notável, por completar seu ciclo

novamente.

Capítulo 27

— Vou dizer o que você vai fazer. — Ele desliga o motor e se vira para

mim. — Primeiro, entre e diga a verdade. — Levanta o dedo para me silenciar

assim que tento interrompê-lo. — Apenas sente e conte a ela toda a história, sem

deixar nada de fora. Apesar da experiência anterior que teve com ela, pelo que vi

e aprendi, está em boas mãos. É sério. Ela é mais esperta do que parece, e vem

fazendo esse tipo de coisa por muitas vidas. Sem contar que é praticamente a

única pessoa que conheço que realmente pode oferecer alguma ajuda verdadeira e

imparcial.

— Como sabe sobre as vidas passadas dela? — pergunto, sentindo um

arrepio repentino. — Quero dizer, além do que eu contei a você?

Jude olha para mim, prolongando tanto o momento que estou prestes a

interromper quando ele diz:

— Estive nos Grandes Salões do Conhecimento. Sei de praticamente tudo


agora.

Faço que sim, engolindo em seco, tentando não surtar. Porque, mesmo

tendo acabado de fazer a maior confissão de todos os tempos, eu ainda não disse

tudo.

Mas ele me ignora, sem intenção de mudar de assunto:

— Então, quando terminar aqui, precisa falar com Damen. Não me importa

o que vai dizer, isso é problema seu. Mas você tem dificultado as coisas para ele

ultimamente, e não importa o que eu sinto em relação a você... — Ele para e

balança a cabeça. — Bem, apenas faça o que estou pedindo, certo? Você ainda não

está bem. Provou isso nesta noite, e precisa dele a seu lado para superar isso. É o

certo a fazer. E dê um tempo no trabalho enquanto estiver resolvendo isso. Sem

brincadeira, eu consigo me virar. Além disso, Honor se ofereceu para me dar uma

ajuda, então talvez dê uma oportunidade a ela.


Concordo com a cabeça, impressionada com sua nobreza, com o modo

como está sendo superior e me jogando nos braços de seu rival dos últimos

séculos. Estou segurando a maçaneta, certa de que terminamos e prestes a sair do

carro, quando ele coloca a mão em minha perna, inclina-se em minha direção e

diz:

— Tem mais uma coisa.

Eu me viro, vendo como ele está sério enquanto seus dedos longos e frios

apertam meu joelho.

— Embora prometa não interferir em seu relacionamento com Damen,

também não pretendo me afastar. Passar quatrocentos anos perdendo a garota dos

meus sonhos não tem me feito muito bem ultimamente.

— Você... você sabe sobre isso? — Fico sem ar e levo as mãos à garganta

enquanto minha voz some.

— Você está falando do cavalariço parisiense, do conde inglês, do

paroquiano da Nova Inglaterra e do artista conhecido como Bastiaan de Kool? —

Seus olhos encontram os meus, dois lagos azuis queimando com o desejo de

quatrocentos anos. — Sei — ele diz. — Sei tudo sobre isso. E mais.

Balanço a cabeça, sem saber o que dizer, como continuar. Seus dedos

passam do joelho para meu rosto quando ele diz:

— Não me diga que não sente. Sei que sente. Posso ver em seu olhar, no

modo como responde ao meu toque. Droga, inclusive percebi como reagiu
quando me viu com Honor... hoje... ! — Ele olha para o pulso, mas, como não está

usando relógio apenas dá de ombros e ignora. — Não importa, não estou a fim da

Honor, não como você pensa. É apenas uma coisa de aluna e professor... amizade,

nada mais. — Ele inclina a cabeça enquanto seus dedos, as pontas macias de seus

dedos, escorregam gentilmente por meu rosto de modo tão suave e sedutor que

nem se quisesse eu poderia ter me afastado. — Não tenho interesse em mais

ninguém. Sempre foi só você. Embora possa não sentir o mesmo agora, quero que

saiba que não temos restrições, nada que nos separe. Nada além de você. É você

quem decide no final. — Ele se afasta, mas a lembrança de seu toque permanece e

seu olhar queima dentro do meu. — Mas não importa o que decidir, não há como

negar que isso — ele se aproxima novamente de mim — existe.

Quando olha para mim, com a cabeça inclinada de um jeito que permite

que parte dos dreadlocks caía sobre o rosto e os ombros; quando levanta de leve

as sobrancelhas; quando seu sorriso faz as covinhas aparecerem, quando ele me

olha assim - realmente não posso negar.

Sim, eu sinto algo quando nos tocamos. Sim, ele é inegavelmente sexy,

bonito e alguém com quem posso contar. Sim, em mais de uma ocasião percebi

que me sentia um pouquinho envolvida por ele. Mas, mesmo assim, não se iguala

ao que sinto por Damen. Nunca se igualou. Damen é o único para mim. E, mesmo

sem ter conseguido nada neste dia insano, pelo menos serei sincera com Jude, não
importa o quanto ele fique magoado...

— Jude... - começo a falar, mas ele coloca o dedo em meus lábios,

impedindo que as palavras saiam.

— Entre, Ever — ele diz, tirando meu cabelo do rosto e colocando-o atrás

da orelha, permanecendo com os dedos ali por um pouco mais de tempo,

relutando em me deixar. — Conserte as coisas, reverta o feitiço, encontre um

antídoto do antídoto, faça tudo o que for necessário. Não importa como se sinta

em relação a mim, não importa sua escolha, no fim das contas, só quero que seja

feliz. Mas também quero que saiba que não desisti e que não pretendo desistir tão

cedo. Já estou nessa há quatrocentos anos, então também posso completar o

percurso. Embora nos últimos séculos não tenha ocorrido uma briga muito justa,

pelo menos agora, com a ajuda de Summerland, tenho alguns recursos em quase

condição de igualdade. Posso não ser imortal, provavelmente não escolheria esse

caminho por conta própria, mas é como dizem por aí, conhecimento é poder,

certo? Agora, graças a você e aos Grandes Salões do Conhecimento, tenho isso em

grande quantidade.

Respiro fundo, abro a porta do carro e entro na casa sem nem bater.

Mesmo não tendo avisado que estava a caminho, mesmo que os ponteiros

do relógio apontem para uma hora muito além do horário de visitas, não fico nem

um pouco surpresa ao encontrar Ava na cozinha, preparando um bule de chá e


sorrindo ao dizer:

— Ei, Ever, estava esperando você. Estou feliz por ter vindo.

Capítulo 28

Ela empurra o prato de biscoitos em minha direção, por força do hábito,

sem pensar. Depois balança a cabeça e ri baixinho enquanto tenta pegá-lo de

volta, mas não vai muito longe, pois estico a mão e apanho um do fundo.

Redondo, com a cor creme, macio e decorado com quadrados de açúcar. Quebro

um pedaço da ponta e o coloco na boca, lembrando que esse era meu tipo prefe-

rido e desejando poder desfrutar dos doces, de qualquer comida, na verdade,

como antes.

— Não precisa comer por minha causa – diz ela, levando a xícara aos lábios

e soprando o chá uma, duas vezes, antes de tomar um gole. — Acredite, as

gêmeas já gostam deles o suficiente, então eu não vou ficar ofendida se não quiser.

Encolho os ombros, querendo contar a ela que às vezes, quando sinto falta

de ser normal, começo a comer, beber e comprar coisas em lojas, em vez de

materializá-las, só para provar que ainda posso. Mas em geral não dura muito, e

ultimamente só acontece quando é tarde e estou cansada, e mais do que apenas

um pouco perdida, como é o caso agora. Nos outros momentos, nem consigo

pensar em querer ser de novo normal daquele jeito.

Em vez disso, porém, apenas olho para ela e pergunto:


— Como estão as gêmeas? — Parto outro pedaço de biscoito, lembrando-

me de como o sabor costumava ser doce, saboroso, delicioso, nem um pouco

insosso e parecido com papelão como estou sentindo, mas sei que fui eu que

mudei, não a receita.

— Sabe é engraçado... — Ela coloca a xicara na mesa e se inclina em minha

direção, movendo os dedos sobre a toalha verde de tecido como se a passasse com

as mãos. — Nós nos demos tão bem e tão rápido que é como se o tempo não

tivesse passado. Quem poderia imaginar? — Ela dá um sorriso tímido e balança a

cabeça ao pensar. — Sei que a reencarnação trata principalmente do carma e de

questões não resolvidas no passado, mas nunca imaginei que fosse tão... literal...

no meu caso.

— E a magia delas? Está voltando?

Ela respira lenta e profundamente, aproxima os dedos da xícara

novamente, pega com firmeza na asa, mas para antes de levantá-la e diz:

— Não. Ainda não. Mas talvez isso não seja ruim. — Ela sacode os ombros.

Olho para ela, confusa com o que pode estar querendo dizer.

— Bem, parece não ter dado muito certo com você, não é?

Deixo as mãos caírem sobre o colo, apertando, torcendo, puxando meus

dedos. Ver-me curvada e nervosa basicamente responde a sua pergunta.

— E embora eu costumasse praticar magia também... bem, obviamente.


— Ela coloca a língua para fora e simula que está puxando uma corda para

enforcar, depois cai no riso e aponta o dedo para mim quando me espane — Ah,

relaxe. — Ela abre um sorriso rapidamente. — Não adianta chora por um passado

que não posso mudar. Cada passo que damos nos leva a próximo, e pela atual

conjuntura, o próximo passo está bem aqui. — Ela dá um tapa na mesa. — Por

causa das minhas experiências nas vidas passada. Porque você me ajudou a ter

acesso a Summerland, onde, depois de um tempo, tive acesso aos Grandes Salões

do Conhecimento, sou muito mais capaz de entender coisas que antes só podia

imaginar.

— É? Como o quê? — Estreito os olhos, retomando meu antigo modo

agressivo de não deixá-la dizer nada sem interrompê-la rudemente.

Mas Ava, como sempre, resolve ignorar meu comportamento e prossegue

como se eu nada tivesse dito.

— Aprendi que a magia, como a materialização, é apenas a simples

manipulação da energia. Mas, enquanto a materialização normalmente é

reservada à manipulação da matéria, a magia, pelo menos em mãos errada... —

Ela faz uma pausa e olha para mim, gritando com os olhos — nas suas mãos!—,

ou pelo menos foi o que me pareceu. - Bem, se não for praticada corretamente,

com a intenção adequada, tende a manipular pessoas, e é aí que começam os

problemas.
— Queria que as gêmeas tivessem me alertado a esse respeito — resmungo,

mal podendo acreditar que coloquei a culpa nelas.

— Talvez elas tenham se esquecido de mencionar, mas certamente Damen

não esqueceu. — Ela olha para mim, obviamente incrédula, como mostram o arco

de sua sobrancelha e o ângulo de seu queixo. — Ever, se veio aqui em busca de

ajuda, pois considerando a hora e as circunstâncias é o que suponho que tenha

vindo fazer, então, por favor, deixe eu ajudar. Não precisa inventar desculpas, não

estou aqui para julgar você, de modo algum. Cometeu um erro, não é a primeira

pessoa e certamente não será a última. Embora eu tenha certeza de que você sente

que seu erro é extraordinariamente grande, incomensurável, ao contrário do que

pode pensar, esse tipo de coisa sempre pode ser desfeita, e a maioria das vezes

não chega nem perto de ser tão letal quanto imaginamos. Ou, devo dizer, quanto

permitimos que seja.

— Ah, então agora sou eu que estou permitindo? — começo, e a

argumentação vem com bastante prontidão, bastante facilidade. Mas não vem do

coração, então rapidamente levanto a palma das mãos em um gesto de rendição.

Suspiro, e acrescento: — Sabe, para alguém que precisa de ajuda com tanta

frequência quanto eu, deveria ser mais fácil aceitar. — Reviro os olhos e balanço a

cabeça, dirigindo os gestos a mim mesma, não a ela.

Ela dá de ombros, tira um biscoito de aveia da pilha e coloca uma uva-


passa na boca.

— Nunca é fácil para os teimosos. — Ela sorri, olhando-me nos olhos. —

Mas acho que já superamos isso, certo? — Vendo meu gesto de concordância, ela

continua: — Acontece, Ever, que tanto com magia quanto com materialização, a

intenção é o que mais importa, o resultado em que está focando. Sua intenção é a

ferramenta mais importante que tem à disposição. Conhece a lei da atração, certo?

— Ela olha para mim, passando a mão na manga de seda da camisa. — Sabe que

atraímos aquilo em que estamos focados? Bem, não tem diferença aqui. Quando

você foca no que teme, atrai mais daquilo que teme. Quando foca no que não

quer, atrai mais daquilo que não quer. Quando foca em tentar controlar os outros,

acaba sendo controlada. Sua concentração em algo traz mais disso e mais coisas

como isso para sua vida. Impor sua vontade aos outros, para persuadi-los a fazer

algo que normalmente não fariam... bem, isso não apenas não funciona, como

também acaba voltando diretamente para você. E resulta em carma, assim como

todas as ações, só que não é do tipo que age a seu favor, a não ser que esteja

disposta a aprender algumas lições muito importantes, ou seja...

Ela continua falando, mas minha mente ainda está presa àquela parte do

carrna, sobre voltar para mim. Lembro-me de ouvir as gêmeas dizerem algo

parecido, como: — É errado usar magia para fins egoístas e desprezíveis. Há um

carma a pagar, e isso voltará para você multiplicado por três.

Engulo em seco e pego meu chá. Suas palavras parecem me olhar quando

ela diz:

— Ever, você precisa entender que esse tempo todo tem resistido da pior

forma possível. Resistindo a mim quando tentei ajudar, resistindo a Damen


quando ele ficou preocupado com você, resistindo a Roman e às coisas horríveis

que ele fez com você ... — Ela levanta a mão, vendo que estou prestes a refutar a

última afirmação, e com o dedo erguido para me silenciar, diz: — E a ironia da

resistência é que você acaba perdendo tanto tempo e energia concentrada nas

coisas às quais está resistindo, nas coisas que não quer, que acaba atraindo

exatamente essas coisas.

Olho para ela, sem saber se entendi. Não devo resistir a Roman? Bem... veja

o que aconteceu, ou quase aconteceu, quando cheguei perto de me render a ele.

Ela endireita os ombros, coloca as mãos dos dois lados da xícara, olha em

meus olhos e começa de novo. — Tudo energia, certo? Foi o que me disseram.

— Se seus pensamentos são energia, e a energia atrai, então, todos os seus

pensamentos sobre todas as coisas que mais teme... bem, na verdade você está

fazendo com que elas aconteçam. Está materializando a existência delas sim-

plesmente por ficar obcecada. Ou, colocando de maneira mais simples, como

disseram os alquimistas: — O que está em cima é como o que está embaixo, o que

está dentro é como o que está fora.

— É isso que chama de colocar de maneira mais simples? - Balanço a

cabeça e fico rodando a xícara de chá. Para mim, é como se ela estivesse falando

grego.

Ela sorri, os olhos pacientes, calmos.


— Significa que o que está dentro de nós também pode ser encontrado fora

de nós. Que nosso estado interior de consciência, os pensamentos nos quais

focamos sempre se refletem em nossa vida exterior. Não há escapatória, Ever, é

assim. Mas o que você não percebeu é que a magia não está lá fora. Não está nas

mãos da deusa ou da rainha. Está aqui dentro. — Ela aponta o polegar para o

peito, olhando para mim enquanto todo o seu rosto se eleva. — Roman só tem

poder sobre você porque você concedeu, entregou de bandeja! Sim, eu sei que ele

a enganou, e sim, eu sei que ele está impedindo você de ficar de verdade com

Damen, e sim, isso deve ser inimaginavelmente horrível. Mas se você parar de

resistir ao que já está Jeito, se parar de focar em Roman e nas coisas podres que ele

fez, poderá romper esse terrível laço que está unindo você a ele. E então, depois

de um bom tempo de meditação e purificação, ele não vai mais incomodar... não

mesmo.

— Mas ele ainda terá o antídoto... ele ainda... — começo, mas não adianta.

Ava está embalada e ainda não terminou.

— Você está certa. Ele ainda terá o antídoto, e provavelmente vai relutar

em entregar a você. Mas essa é uma situação que você não pode mudar. E ficar

obcecada com isso, tentar todos os tipos de feitiço, também não vai mudar nada.

Na verdade, só vai piorar. Ao fazer isso você permitiu que ele se tornasse o foco

de seu universo, exatamente o que você não queria, e, acredite, Roman sabe muito
bem disso. Ele faz de tudo para roubar sua concentração, é o que todo narcisista

quer. Então, se realmente quer resolver isso e colocar sua vida de volta nos eixos,

pare. Pare de focar sua energia no que não quer. Pare de colocar sua energia em

Roman. Recuse-se a ir até lá e veja o que acontece.

Ela se inclina em minha direção, ajeitando os cabelos castanhos e

ondulados atrás da orelha.

— Pelo meu palpite, assim que ele perceber que vocês estão se adaptando

alegremente à situação, vivendo e desfrutando da companhia um do outro, apesar

das limitações, ele vai se cansar do jogo e ceder. Mas assim, do jeito como você

está se comportando agora, está oferecendo filé-mignon a um tigre, está apenas

satisfazendo as necessidades mais primitivas dele. A fera está dentro de você,

Ever, porque você a colocou aí dentro. Mas, acredite, pode se livrar dela com a

mesma facilidade.

— Como? — Encolho os ombros, entendendo tudo o que ela acabou de

dizer. Bem, depois que ela explicou, tudo começou a fazer sentido. Ainda posso

sentir aquele pulso horrível e insistente agindo dentro de mim, e é um pouco

difícil acreditar que é apenas uma questão de mudar meu foco. - Quando tentei

reverter o feitiço, a situação só ficou pior. Então, quando apelei a Hécate por aju-

da, pareceu funcionar por um tempo, mas depois, quando vi Rornan novamente...

- A cor desaparece de meu rosto e meu corpo inteiro esquenta, horrorizada ao

lembrar o que quase aconteceu comigo. - Bem, digamos apenas que descobri que a

fera não tinha ido a lugar algum, estava bem viva, pronta para festejar. Embora eu

entenda o que está dizendo, ou pelo menos ache que entendo, não vejo como o

simples fato de mudar meus pensamentos vai ajudar. Quer dizer... Hécate está no
comando, não eu, não tenho idéia do que fazer para ela ir embora.

Mas Ava apenas olha para mim e diz baixinho:

— Aí é que se engana. Hécate não está no comando, você está. Você esteve

no comando todo o tempo. Embora odeie ter que dizer, porque sei como as

pessoas ficam incomodadas ao ouvir, o monstro não é um ser externo que

encontrou um jeito de entrar em você, não é uma possessão demoníaca, nem nada

desse tipo. É você. O monstro é o seu lado negro.

Encosto na cadeira e balanço a cabeça:

— Ah, que ótimo! Ótimo. Então você está dizendo que minha atração por

Roman é real? Que bom, Ava, muito obrigada por isso. — Suspiro alto e reviro os

olhos de forma dramática.

— Eu disse que nem sempre dá certo. — Ela dá de ombros, provando que a

esta altura já está praticamente imune às minhas reações insolentes. — Mas você

deve admitir que, falando superficialmente, ele é estonteante, muito bonito... - Ela

sorri, praticamente me implorando para concordar. Mas quando não digo nada,

apenas sacode os ombros novamente e diz: — Mas não foi isso que eu quis dizer.

Conhece o símbolo yin-yang, certo?

Faço que sim com a cabeça.

— O círculo de fora representa tudo, enquanto as áreas branca e preta

representam duas energias que fazem tudo acontecer. — Ergo os ombros. Ah, e
cada um deles contém uma pequena semente do outro... — Estreito os olhos,

sentindo de repente no que isso vai dar, sem saber se estou pronta para

acompanhar.

— Exatamente — ela confirma. — E as pessoas não são diferentes dele.

Por exemplo, digamos que você tenha uma melhor amiga, ela cometeu

alguns erros... — ela olha em meus olhos - e está sendo tão crítica consigo mesma,

se sentindo tão indigna de todo o amor e o apoio que está sendo oferecido, tão

certa de que precisa passar por isso sozinha, consertar as coisas do próprio jeito e,

no fim, tão obcecada com aquele que a atormenta que acaba se desligando de

todos ao redor para ter mais tempo para se concentrar naquela pessoa que mais

despreza, canalizando toda a atenção da pessoa para ela, até que, bem, obvia-

mente estou falando de você, e você :abe como essa história termina... O que estou

tentando deixar claro é que cada um de nós tem um lado sombrio, todos nós, sem

exceção. Mas quando você se concentra tanto no lado negro, bem, voltamos à lei

da atração, gostar atrai gostar, daí sua atração monstruosa por Roman.

— Um lado sombrio? - Olho para ela, lembrando-me de ter ouvido algo

similar há algumas horas. — Você quer dizer, como... um eu-sombra? — Agora

você está citando Jung? — Ela ri.

Franzo o cenho, sem ter ideia de quem é.

— Dr. Carl Jung. — Ela continua rindo. — Ele escreveu tudo sobre o eu-
sombra, basicamente dizendo que é nossa parte inconsciente e reprimida, as

partes que nos esforçamos para negar. Onde escutou isso?

— Roman. — Fecho os olhos e balanço a cabeça. — Ele sempre está dez

passos à minha frente e basicamente disse a mesma coisa que você, que o monstro

era eu. Foi a última provocação dele antes de eu fugir de lá.

Ela faz um gesto positivo com a cabeça, levanta o dedo e fecha os olhos. —

Deixe-me ver se eu consigo...

E, quando vejo, ela está balançando um livro antigo de couro.

— Como você...? — Olho para ela com os olhos arregalados, boquiaberta,

mas ela apenas sorri.

— Tudo o que se pode fazer em Summerland também pode ser feito aqui,

sabia? Não foi você mesma que me disse isso? Mas não foi materialização

instantânea como está pensando, foi simplesmente telecinese... Eu evoquei o livro

que estava na estante da sala ao lado.

— Mesmo assim... — Olho embasbacada para o livro, surpresa pela ve-

locidade com que ela conseguiu pegá-lo. Surpresa ao ver que ela dominou tantas

coisas e ainda assim escolheu viver desse jeito: bem, confortável, mas com

bastante simplicidade para os padrões opulentos de Orange County. Estreito os

olhos e a observo novamente, vendo que continua usando um pedaço de citrino

bruto em uma corrente prateada simples, em vez das jóias douradas e sofisticadas

que sempre usou em Summerland, apesar de agora poder ter o que quiser. Não
consigo parar de pensar se ela realmente mudou ou se continua sendo a velha

Ava que eu conheci.

Ela se ajeita na cadeira, apóia o livro na mesa e vai diretamente à página

certa, acompanhando as linhas com o dedo enquanto lê;

— Todos carregam uma sombra, e quanto menos ela estiver incorporada na

vida consciente do indivíduo mais negra e densa ela será (...) A psicologia diz que

quando uma situação interna não se torna consciente, acontece externamente

como destino, forma uma barreira inconsciente, anulando nossas melhores

intenções.— E assim por diante. — Ela fecha o livro, olha para mim e acrescenta;

— Foi o que disse o Dr. Carl G. Jung, e quem somos nós para desmentir? — Ela

sorri. — Ever, conseguir ou não atingir nosso potencial completo ou cumprir

nossos verdadeiros destinos depende de nós. É uma realização totalmente nossa.

Lembra o que eu disse antes? O que está dentro é como o que está fora? Aquilo no

que pensamos, no que nos concentramos, sempre, sempre se reflete no exterior.

Então eu pergunto; no que quer se concentrar? Quem você quer se tornar daqui

em diante? Como quer que seu destino se desdobre? Você tem um caminho, um

propósito, e embora eu não saiba qual é, tenho a estranha sensação de que é algo

poderoso e gigantesco. Embora tenha se desviado um pouco do curso, se me

permitir, posso ajudar você a voltar para o caminho. Tudo que precisa fazer é

dizer a palavra.
Olho para minha xícara de chá, para os pedaços do biscoito, ciente de que

tudo o que fiz até agora, todas as minhas ações vergonhosas e imprudentes,

trouxeram-me de volta para cá. De volta para a cozinha de Ava. O último lugar

para o qual eu retornaria.

Passo o dedo várias vezes pela borda do pires, pesando minhas opções,

que reconheço serem poucas, levanto a cabeça, olho para ela, sorrio e digo: —

Palavra.

Capítulo 29

Antes mesmo de eu bater, Damen já está de prontidão. Mas, bem, ele

sempre esteve. Tanto literalmente quanto no sentido figurado. Ele esteve de

prontidão nos últimos quatrocentos anos, do mesmo jeito que está agora: pés

descalços, robe meio aberto, cabelo despenteado de um modo extremamente

charmoso, olhando para mim com os olhos semifechados, sonolento.

— Oi — ele diz, com a voz áspera, grossa, como se tivesse acabado de

acordar.

— Oi para você também. — Sorrio, passo por ele e começo a subir as

escadas, pegando sua mão e puxando-o para vir junto. — Você não estava mesmo

brincando quando disse que sempre é capaz de sentir quando eu estou por perto,

não é?

Ele aperta meus dedos e passa a outra mão no cabelo, tentando domá-lo,
arrumá-lo, mas eu apenas sorrio e digo para deixar como está. É tão raro vê-lo

assim, sonolento, desarrumado, um pouco desgrenhado, e devo admitir que até

gosto disso.

— E então, o que está acontecendo? Ele me acompanha até seu quarto

especial, coçando o queixo enquanto me vê admirar sua coleção de objetos muito

antigos.

— Bem, para começar, estou melhor. — Dou as costas para uma versão

dele muito sério, pintada por Picasso, preferindo olhar para a versão real, muito

mais bonita e sexy. Olho em seus olhos e digo: — Hum, posso não estar cem por

cento ainda, mas definitivamente estou na direção certa. Se seguir o programa

direitinho, não deve demorar.

— Programa? — Ele se apóia no canapé antigo de veludo e olha para mim,

analisando-me tão cuidadosamente que acabo passando as mãos no vestido

rápida e timidamente, pensando que deveria pelo menos ter reservado um tempo

para materializar algo menos amarrotado, algo novo e gracioso, antes de vir

correndo, como eu fiz.

Mas fiquei tão empolgada com minha conversa com Ava e com a série de

meditações para cura e purificação a que ela me submeteu, que não podia esperar.

Não podia esperar para contar a ele, para estar com ele novamente.

— Ava me arranjou um tipo de... purificação rápida. — Sorrio. — Só que


do tipo mental, não aquela coisa de chá verde e ramos. Ela disse que me deixaria...

bem... — Dou de ombros. — Melhor, inteira novamente, renovada e aperfeiçoada.

— Mas... eu pensei que você estivesse melhor ontem. Ou pelo menos foi o

que me disse em Summerland. — Ele inclina a cabeça.

Faço um gesto positivo, determinada a focar na viagem que fiz com ele, e

não naquela em que encontrei Jude, após a cena horrível com Roman.

— É, mas... agora eu me sinto ainda melhor... mais forte... como a antiga

Ever. — Olho para ele, ciente de que preciso admitir que a próxima etapa faz

parte do ritual de purificação: confessar, reparar. Não é muito diferente do típico

programa dos doze passos, mas eu também não sou muito diferente de outro

qualquer viciado lutando contra uma terrível dependência.

— Ava disse que eu sou viciada em negatividade. — Engulo em seco e olho

para ele, forçando-me a não desviar o olhar. — Não era apenas a magia de

Roman. Segundo ela, eu estava viciada em pensar em meus medos. em aspectos

ruins da minha vida, como ... você sabe, como minhas decisões erradas e o fato de

não podermos ficar juntos de verdade e, bem, coisas desse tipo. E que, ao fazer

isso, ao me concentrar em tudo isso, na verdade acabava atraindo... hum, todo

tipo de obscuridade e tristeza e... bem... Roman, e como resultado, excluí as

pessoas que mais amo. Como você, por exemplo.

Engulo em seco e me aproximo dele. Parte de meu cérebro grita: Conte a


ele! Conte a ele o que realmente a levou a chegar a essa conclusão. O que

aconteceu com Roman... como você ficou sombria e distorcida!

Enquanto a outra parte, a que optei por escutar, diz: Você já falou demais...

é hora de mudar de assunto! A última coisa que ele gostaria de saber são os

detalhes repugnantes.

Ele vem em minha direção, pega minhas mãos e me puxa para mais perto

respondendo à pergunta em meus olhos ao dizer:

— Eu perdôo você, Ever. Sempre vou perdoar. Sei que admitir to a essas

coisas não foi fácil, mas eu achei bom ter feito isso.

Engulo em seco, sabendo que agora é minha chance, minha última chance

que é melhor que ele ouça de minha boca do que saiba por intermédio mano Mas,

quando estou prestes a revelar, ele passa as mãos por minhas costas e o

pensamento se esvai, e só consigo me concentrar em seu toque, no calor do seu

hálito em meu rosto, na quase sensação de seus lábios em minha orelha, o

formigamento quente que percorre meu corpo, da cabeça até os dedos os pés.

Seus lábios encontram os meus, apertando, pressionando, enquanto campo

constante permanece entre nós. Mas cansei de ficar me ressentindo por isso,

cansei de não dar atenção. Estou determinada a aproveitar as coisas jeito como

elas são.

— Quer namorar lá em Summerland? — ele sussurra, brincando apenas em

parte. — Você pode ser a musa e eu posso ser o artista e...

— E você pode me beijar tanto que nunca vai terminar de pintar aquele

quadro? — Eu me afasto e rio, mas ele apenas me puxa de volta para perto.

— Mas... eu já pintei você. — Ele sorri. — Minha única pintura que irnporta
de verdade. — Depois, vendo meu olhar curioso, ele acrescenta: — Lembra?

Aquela que está em algum lugar do Getty Center neste exato momento.

— Ah, verdade. — Eu rio, lembrando-me daquela noite mágica, quando ele

pintou uma versão de mim tão bela, tão angelical que tive certeza de que não

merecia. Mas cansei de pensar assim. Se o que Ava diz está certo, se gostar atrai

gostar, e a máxima — Diz-me com quem andas que te direi quem és —se aplica,

então é melhor eu andar com Damen, não com Roman, e é melhor começar agora.

- Provavelmente está em algum porão sem janelas, bem-escondido, onde centenas

de historiadores da arte estão reunidos apenas para estudá-lo, tentando

determinar quem o pintou e de onde pode ter vindo.

— Você acha? — Ele olha para o nada, obviamente gostando da idéia.

— E então — murmuro, pressionando meus lábios em seu queixo, en-

quanto meus dedos brincam com a gola de 'seda de seu robe — quando vamos

comemorar o seu aniversário? E como vou conseguir superar o presente que você

me deu?

Ele vira a cabeça e suspira, o tipo de suspiro que vem de um lugar lá no

fundo, não fisica, mas emocionalmente. É um suspiro cheio de tristeza e

arrependimento. É o som da melancolia.

— Ever, não precisa se preocupar com meu aniversário. Eu não comemoro

desde...
Desde os dez anos. É claro! Aquele dia horrível que começou tão bem e

terminou com Damen sendo forçado a ver seus pais serem assassinados. Como eu

poderia esquecer?

— Damen, eu...

Começo a me desculpar, mas ele faz um gesto com a mão de que é des-

necessário, vira de costas e vai na direção de seu retrato sobre o cavalo branco

com a crina grossa pintado por Velásquez. Passa os dedos no canto da enorme

moldura dourada, como se precisasse ser ajustada, mesmo sendo óbvio que não.

— Não precisa se desculpar — ele diz, ainda sem querer olhar para mim.

— É sério. Acho que contar os anos não parece tão importante depois de

viver tanto.

— Será que vai ser assim para mim também? — pergunto, com dificuldade

em não ligar para um aniversário ou, até pior, esquecer qual é o dia.

— Não vou deixar que seja assim para você. — Ele se vira e seu rosto se

ilumina ao olhar para mim. — Cada dia será uma celebração... a partir de agora.

Eu prometo.

Mas mesmo que esteja sendo sincero, mesmo que tenha a intenção de fazer

exatamente aquilo, ainda olho para ele e balanço a cabeça. Porque a verdade é

que, por mais que eu esteja comprometida em limpar minhas energias e me

concentrar apenas nas coisas boas e positivas, a vida ainda é a vida. Ainda é dura,
complicada e um tanto confusa: são lições a serem aprendidas, erros a serem

cometidos, triunfos e decepções, e nem todo dia foi feito para ser uma festa. E

acho que finalmente percebi, finalmente aceitei que tudo bem em ser assim. Pelo

que vi, até Summerland tem seu lado negro, sua própria versão do eu-sombra, um

pequeno canto escuro no meio de toda a luz... ou, pelo menos para mim, foi o que

pareceu.

Olho para ele, sabendo que preciso contar, perguntando-me por que não

mencionei ainda, quando meu telefone toca. Olhamos um para o outro e gritamos:

— Adivinha!

É um jogo que fazemos para ver quem tem os poderes paranormais mais

fortes e rápidos, e só temos um segundo para responder.

— Sabine! — digo, presumindo que ela tenha acordado, encontrado minha

cama vazia e agora esteja calmamente tentando descobrir se fui sequestrada ou se

saí por vontade própria.

Menos de uma fração de segundo depois, Damen diz:

— Miles. — Mas sua voz não está nem um pouco descontraída, e seu olhar

fica tenso e preocupado.

Pego o telefone na bolsa e, é claro, aparece a foto que tirei de Miles usando

a roupa de drag queen de Tracy Turnblad, fazendo pose e sorrindo para num.

— Oi, Miles — digo, ouvindo uma série de zumbidos, zunidos e estática a


trilha sonora normal das ligações transatlânticas.

— Acordei você? — ele pergunta com a voz baixa, distante. — Se acordei,

bem, fique feliz por você não ser eu. Meu relógio biológico ficou confuso por dias.

Dormi quando deveria estar comendo, comi quando deveria estar... Bem, esqueça

isso, já que estou na Itália e a comida é incrível, praticamente como o tempo todo.

É sério. Não sei como as pessoas aqui fazem isso e continuam tão lindas. Não é

justo. Alguns dias de dolce vita e já estou gordo e inchado... mas, mesmo assim,

estou amando. Estou falando super seério. Tudo aqui é incrível! Bem, e que horas

são aí?

Olho em volta e não encontro um relógio, então apenas dou de ombros e

digo:

— Cedo. E aí?

— Não tenho idéia, mas deve ser de tarde. Fui a uma discoteca incrível

ontem à noite ... Sabia que não é preciso ter vinte e um anos para entrar em casas

noturnas ou beber aqui? Quer dizer, Ever, isso é que é vida. Esses italianos

realmente sabem viver! Bem, vou guardar tudo isso para depois... para quando eu

voltar... até enceno para você e tudo, prometo. Por enquanto, o custo desta ligação

já está provocando uma trombose em meu pai, com certeza, então deixe eu e dizer

logo que você precisa contar a Damen que eu passei naquele lugar que Roman

falou e... ala? Está me ouvindo.. está aí?

— Hum, estou, ainda estou aqui. A ligação está um pouco ruim, mas dá

para escutar. — Viro as costas para Damen e me afasto alguns passos,

principalmente porque não quero que ele testemunhe a horrível cara de terror que

estou fazendo.
— Certo, bom, passei naquele lugar do qual Roman ficou falando. Na

verdade, acabei de sair de lá... e, bem, preciso dizer, Ever, tem umas coisas muito

estranhas lá. Muito estranhas. Tipo... alguém vai ter que me dar muitas

explicações quando eu voltar.

— Estranhas... como? — pergunto, sentindo a presença de Damen bem

atrás de mim, sua energia mudando de relaxada para extremamente alerta.

— Apenas... estranhas. Vou dizer apenas isso, mas... droga... está me

ouvindo? Está falhando de novo. Ouça, apenas... ugh... bom, eu mandei algumas

fotos por e-rnail, então, haja o que houver, não apague sem olhar. Certo?

Ever? Ever! Maldito... te1efo...

Engulo em seco e desligo, sentindo a mão de Damen em meu braço,

enquanto ele pergunta:

— O que ele queria?

— Ele me mandou umas fotos — digo com a voz grave, olhando direta-

mente em seus olhos. — Algo que ele realmente quer que a gente veja.

Damen faz um gesto positivo com a cabeça, com uma expressão de acei-

tação determinada, como se o momento pelo qual esperava tivesse chegado, e ele

agora se preparasse para a queda, para ver como reajo, para ver quanto dano foi

causado.

Clico na home page, depois no e-mail, e observo a rodinha da conexão


girar e girar, até que a mensagem de Miles aparece. E assim que abre, perco o

fôlego... meus joelhos vacilam no segundo em que vejo.

A foto.

Ou melhor, a foto da pintura. A fotografia ainda não havia sido inventada

naquela época, não seria inventada por várias centenas de 'anos. Mas, ainda

assim, lá estava, exposta diante de mim, e sem dúvida era ele. Eram eles. Posando

juntos.

— É muito ruim? — ele pergunta, com o corpo totalmente paralisado,

olhando para mim. — Tão ruim quanto eu esperava?

Olho para ele, mas apenas por um segundo antes de voltar a olhar para a

tela do celular, sem querer desviar os olhos.

— Depende do que você estava esperando — murmuro, lembrando-me de

como me senti naquele dia em Summerland, quando espionei seu passado. Como

fiquei doente e completamente louca de ciúmes quando chegou a parte em que ele

se casava com Drina. Mas isso... isso nem se compara. Na verdade, nem chega

perto. Ah, claro, Drina é estonteante... Drina sempre foi estonteante, mesmo em

seus piores e mais cruéis momentos, ela era de tirar o fôlego. Pelo menos por fora.

E tenho certeza de que, não importa a década em que estivesse, fosse a época dos

saiotes ou das saias rodadas com um poodle estampado, ela também era

estonteante. Mas acontece que Drina se foi. Tanto que pensar nela ou vê-la não me
incomoda mais. Na verdade, não me incomoda nem um pouco.

O que me incomoda é Damen. O modo como está parado, como olha para

o artista e como ... como é arrogante e vaidoso e, bem, cheio de si. E mesmo tendo

um quê de fora da lei que me agrada, não é divertido, como estou acostumada. É

muito menos vamos-matar-aula-e-apostar-nos-cavalos e muito mais esse-é-meu-

mundo-e-você- tem- sorte-de-eu- deixá-lo-entrar.

Então, olho mais para os dois: Drina sentada discretamente em urna

cadeira, com as costas eretas, as mãos dobradas harmoniosamente sobre o colo, o

vestido e os cabelos adornados com tantas joias e laços e coisas brilhantes que

ficariam ridículos em qualquer outra pessoa... enquanto Damen está parado atrás

dela, com uma das mãos na cadeira, a outra ao lado do corpo, o queixo inclinado a

sobrancelha arqueada como a de uma pessoa esnobe. Bem, há algo nele, algo no

visual, no olhar... quase cruel, até mesmo brutal. Como se estivesse disposto a

fazer o necessário, de qualquer jeito, para ter o que queria.

E mesmo que ele tenha feito muitas menções à sua personalidade anterior,

a seu ex-modo narcisista de ser, sedento de poder... uma coisa é ouvir, outra é ver

nitidamente.

Mesmo havendo mais arquivos anexados, apenas olho por alto. Miles só

está interessado no fato de Damen e Drina terem sido pintados há centenas de

anos, de que em cada retrato, alguns pintados com séculos de diferença, segundo

as placas, eles de alguma forma tenham permanecido jovens, bonitos e


misteriosamente inalterados. Ele não liga nem um pouco para a conduta de

Damen, para o modo como se coloca, para seu olhar... não, essa surpresa é minha.

Entrego o telefone a Damen, vendo como seus dedos tremem ligeiramente

quando o pega, e ele olha rapidamente as imagens antes de me devolver. Sua voz

é grave e firme quando diz:

— Já passei por isso uma vez e realmente não preciso ver de novo.

Concordo com a cabeça e guardo o telefone na bolsa, demorando um pouco

demais, obviamente evitando seu olhar.

— Então, agora já viu. O monstro que eu costumava ser — ele diz, e suas

palavras atingem diretamente meu âmago.

Engulo em seco e deixo a bolsa cair no tapete de lã grossa, uma

antiguidade de valor inestimável que deverias estar em um museu, não sendo

usada diariamente. Sua estranha escolha de palavras me faz lembrar a conversa

que tive com Ava: todos têm um monstro, um lado negro, sem exceção. E mesmo

que a maioria das pessoas passe a vida toda determinada a enterrá-lo, forçá-lo a

ficar escondido lá no fundo, acho que se tivessem vivido tantos anos quanto

Damen seriam obrigadas a confrontá-lo de tempos em tempos.

— Sinto muito — digo, percebendo de repente que sinto mesmo. Não

importa muito onde estivemos. É onde estamos agora que conta mais. Eu... eu

acho que não estava esperando por isso e fiquei um pouco surpresa. Eu nunca vi
você desse jeito.

— Nem em Summerland? — Ele olha para mim. — Nem nos Grandes

Salões do Conhecimento?

Faço que não com a cabeça.

— Não, eu adiantei o filme nessas partes. Não suportava ver você com

Drina.

— E agora?

— Agora... — Suspiro. — Drina não me incomoda mais... só você. -

Tento rir, tento deixar o clima mais leve, mas não funciona muito.

— Bem, se não estiver enganado, acho que isso é o que se chamaria de

progresso. — Ele sorri, puxando-me para seus braços e apertando-me contra o

peito.

— E Miles? — Olho para seu rosto, para a inclinação de sua sobrancelha, o

ângulo de seu queixo, passando os dedos nos pelos eriçados que surgem ali. — O

que vamos dizer a ele? Como vamos explicar isso? — Minha hesitação, minha

rejeição ao antigo Damen já desapareceu para sempre. Nosso passado pode fazer

parte de quem somos, mas não define quem vamos nos tornar.

— Vamos contar a verdade — ele diz com a voz firme, como se realmente

estivesse pensando em fazer isso. — Quando chegar a hora, vamos contar a

verdade. E do jeito como as coisas vão, não vai demorar muito.


Capítulo 30

— Certo, agora quero que se concentre em alimentar sua energia. Purificar,

elevar, acelerar a velocidades cada vez maiores. Acha que pode fazer isso?

Fecho bem os olhos e me concentro. A parte da aceleração é sempre a mais

difícil para mim. Lembro-me de quando Jude tentou me ensinar para que eu

pudesse ver Riley novamente. Mas não importa o quanto tentasse, minha energia

continuava muito estagnada, muito entorpecida, muito confusa, e eu acabava

sintonizando com entidades terrenas, e não com aquelas que haviam cruzado para

o outro lado, as que eu queria ver.

— A cada inspiração, quero que imagine uma luz branca bonita, curativa,

brilhante, enchendo você, começando no alto da cabeça e descendo até os dedos

dos pés. Depois, a cada expiração, quero que imagine toda a negatividade que

restou, qualquer dúvida, tudo que se associe à expressão não posso indo embora

para sempre. Encare isso como um trabalho árduo, sujo, e pesado, se quiser.

Sempre funciona para mim. — Ela ri. Sua voz é como um sorriso.

Faço que sim com a cabeça, e, como meus olhos estão fechados, só consigo

imaginar que as gêmeas estejam concordando também. A relação delas com Ava é

praticamente a mesma que têm com Damen - idolatria total e completa e

disposição para fazer tudo o que ela diz. E embora não tenham ficado tão

animadas com o fato do Livro das sombras ter sido banido de seu plano de
estudos, mesmo depois que contei meu próprio caso de magia que deu errado,

mostrando como as coisas podem se desviar quando a intenção é um pouco

obscura e o bom senso é vencido pela obsessão, não perderam tempo em dizer

que elas nunca seriam tão burras quanto eu. Nunca realizariam nenhum tipo de

ritual na lua negra. Tentariam manipular apenas matéria, nunca as ações de outro

ser humano. Mas Ava foi firme, e é por isso que estamos de volta à purificação da

energia e à meditação.

Mesmo seguindo com o plano, imaginando o fluxo de luz branca passando

por mim enquanto expulso a crosta negativa que tende a se formar do lado de

dentro, mesmo que depois de apenas algumas semanas fazendo isso eu já tenha

notado uma tremenda diferença em minha aparência, na maneira como me sinto

e, mais importante, no modo como voltei a materializar e me comunicar

telepaticamente com Damen, mesmo sabendo que participar dessa meditação em

grupo é bom para mim e vai me ajudar a alcançar o destino que quero... apesar de

tudo isso, minha mente não para de pensar no dia anterior, na praia, quando tirei

folga do trabalho para ficar com Damen.

Estendemos nossas toalhas lado a lado, tão próximas que as bordas ficaram

sobrepostas. Além disso, havia uma pilha de revistas a meu lado, uma prancha de

surfe personalizada, recém-materializada, ao lado dele ( já que a antiga se partira

no infeliz desmoronamento da caverna alguns dias antes), junto com algumas


garrafas de elixir gelado e um iPod que passávamos de um para o outro, mas que

eu usei na maior parte do tempo. Nós dois determinados a aproveitar o verão que

havíamos planejado, mas ainda não tínhamos vivenciado. Nós dois buscando um

dia longo e relaxante na praia, como qualquer outro casal.

— Quer surfar? — perguntou ele, levantando-se e pegando a prancha. Mas

eu fiz que não com a cabeça. No que diz respeito a surfe, é melhor para todos que

eu fique onde estou e assista de longe.

E foi o que eu fiz. Vendo-o caminhar para a água, erguendo os ombros e

deslocando o peso para os cotovelos enquanto ele se movia pela areia de forma

tão ligeira, fiquei me perguntando se mais alguém estava tão hipnotizado por

aquela visão quanto eu.

Meu olhar ainda estava em Damen quando ele jogou a prancha no mar e

começou a remar, transformando o que antes eram ondas pequenas em uma

sucessão de tubos quase perfeitos. Ignorei com prazer minhas revistas e o iPod

para ficar contemplando, até que Stacia apareceu a meu lado, colocou os cabelos

longos, com luzes recém-feitas, atrás da orelha, ajeitou a bolsa de marca no ombro,

abaixou os óculos de sol e disse:

— Nossa, Ever, que branquela!

Engoli em seco, respirei fundo, pisquei algumas vezes, mas foi só isso. Não

demonstrei tê-la escutado. Estava determinada a ignorá-la, a agir como se ela


fosse invisível, e me concentrar em Damen.

Ela ficou parada, fazendo um som de reprovação com a boca enquanto me

olhava de cara feia, mas não demorou muito para se cansar do jogo e ir embora,

arrastando os pés na areia e escolhendo um lugar perto da água, onde eu ainda

podia vê-la.

E foi quando me deixei levar. Quando fui contra tudo o que Ava havia me

ensinado sobre me fortalecer e não dar ouvidos a Stacia e a todas as outras

pessoas como ela, dando preferência à minha própria, e mais positiva, trilha

sonora. Foi quando deixei suas palavras se repetirem em minha cabeça, olhei para

meu corpo e concordei com ela. Mesmo que alguns minutos antes eu estivesse me

sentindo bem em relação à minha aparência, empolgada porque meu corpo

enfraquecido e doente já estava mais cheio novamente, não havia como negar o

fato de que eu estava branca - ofuscantemente branca -, um branco que

definitivamente exigia o uso de óculos escuros e que só podia ser descrito como

pálido. E quando se somava isso aos cabelos claros e ao biquíni branco... a

verdade é que não era nada bonito. Eu podia perfeitamente ser confundida com

um fantasma.

Naquele ponto eu já estava tão arrasada, tão convencida de sua visão ne-

gativa a meu respeito, que para me livrar dela precisei de uma longa sessão da-

quelas respirações purificadoras de que Ava tanto gosta. E ainda assim eu não

consegui esquecê-la totalmente e fiquei observando-a cochichar com Honor, rir

alto, jogar os cabelos para trás de modo teatral e virar a cabeça de um lado para o
outro, observando o tempo todo para ver se alguém a notava, mas sempre

voltando a olhar para mim, com um sorrisinho falso, revirando os olhos,

balançando a cabeça indignada, praticamente fazendo todo o possível para me

mostrar como me achava revoltante. Embora tivesse sido mais fácil sintonizar

meu controle remoto quântico e ouvir tudo o que elas estavam ou não dizendo,

resolvi parar.

Mesmo tendo ficado tentada, principalmente depois de saber todo o plano

de Honor para derrubar Stacia e estrelar seu próprio golpe social no último ano de

escola - sem mencionar seu — extraordinário— , bem, pelo menos segundo Jude,

progresso nas aulas de Desenvolvimento Mediúnico nível 1, aprendendo tão

rapidamente e com tanta facilidade, dominando tantas técnicas que ele passou a

lhe dar aulas particulares. Apesar de tudo isso, não fiz nada. Não escutei a

conversa delas às escondidas. Já sei que vou passar por isso muitas vezes quando

as aulas voltarem. Em vez disso, mudei o foco para Damen, apreciando como ele

se movia na água com tanta graça e elegância. O modo como ele praticamente

brilhava ao sol. Uma combinação surpreendente de pele bronzeada, músculos

trabalhados e uma beleza de deixar qualquer um de queixo caído quando saiu da

água com a prancha debaixo do braço, caminhando em minha direção.

Ele passou imune ao olhar duro e brilhante e ao cumprimento meloso de

Stacia, e largou a prancha na areia, deixando cair gotas de água salgada em minha
barriga enquanto se inclinava para me beijar, ignorando o olhar atento dela, que

nada deixou escapar, e sentou-se a meu lado e beijou-me novamente com o véu de

energia entre nós, mantendo-nos a salvo, mas invisível para elas.

Ou pelo menos foi o que pensei, até que levantei a cabeça e percebi como

Honor estava olhando para nós, principalmente para ele. Seu olhar me lembrava o

de Stacia: prolongado, ansioso, mas também, pelo menos em seu caso, cheio de

uma grande dose de percepção e visão.

E quando ela me encarou, vi o sorriso em seus lábios. Um sorriso que

apareceu e desapareceu tão rapidamente que cheguei a me perguntar se de fato

existira. Depois, fiquei apenas com uma sensação prolongada de terror, virei-me e

voltei para Damen...

— Ever? Olá-á! — Ava me chama enquanto Romy ri e Rayne resmunga

baixinho. - Ainda está aqui conosco? Ainda está fazendo suas respirações

purificadoras?

E, de uma hora para outra, minha lembrança da praia se desfaz e volto à

casa de Ava.

Balanço a cabeça e meu olhar encontra o dela enquanto digo:

— Hum... não, eu me distraí um pouco.

Mas Ava mexe os ombros, ela é uma daquelas professoras boazinhas, não

há demérito em suas aulas.


— Acontece — diz ela. — Podemos ajudar?

Olho para Romy e Rayne, balanço a cabeça e digo: — Não. Está tudo bem.

Observo enquanto ela levanta as mãos sobre a cabeça, alongando-se de um

lado para o outro, lenta e languidamente, e depois olha para mim e pergunta: —

O que acha? Quer tentar?

Aperto os lábios e dou de ombros. Não sei bem no que vai dar, mas estou

pronta para fazer uma tentativa.

— Que bom. Acho que já é hora. — Ela sorri. — Quer companhia ou

prefere ir sozinha?

Olho para as gêmeas, vendo o modo como olham para os pés, para os

quadros na parede, para a barra de seus vestidos, para tudo, menos para mim. As

últimas tentativas de levá-las para Summerland deram errado e, sem querer

correr o risco de deixá-las mal novamente, digo:

— Hum, acho que vou sozinha, se estiver tudo bem para vocês.

Ava olha em meus olhos, fixando-se neles por um instante antes de juntar

as palmas das mãos, abaixar a cabeça e dizer:

— Faça uma boa viagem, Ever. Boa sorte.

Suas palavras ainda ecoam em minha cabeça enquanto atravesso o grande

campo perfumado e caio bem em frente aos Grandes Salões do Conhecimento.

Limpo-me ao ficar de pé, sentindo-me pronta, purificada, total e completamente


inteira de novo, esperando que o responsável por permitir as entradas concorde

comigo.

Espero que a fachada mutável fique visível para mim Subo as escadas, sem

querer perder um segundo, sem querer deixar tempo para dúvida. Olho para a

grandiosa construção diante de mim, as colunas imponentes, o grande teto

inclinado, e respiro aliviada quando começa a piscar e mudar. Transformando-se

em todas as maiores belezas do mundo, nos lugares sagrados, enquanto a porta se

abre diante de mim.

Estou dentro! Estou de volta.

Sigo pelo piso de mármore brilhante, passo pela longa fileira de mesas e

bancos em que várias pessoas buscam alento espiritual. Cada uma delas com suas

placas de cristal, cada uma delas procurando respostas. De repente, percebo que

não sou muito diferente delas, estamos todos aqui pelos mesmos motivos:

estamos todos em algum tipo de busca.

Então fecho os olhos e penso:

Primeiro, obrigada por me dar uma segunda chance e permitir que eu entre

aqui novamente. Sei que fiz umas bobagens e saí um pouco dos eixos, mas agora

que aprendi algumas lições prometo que não vou estragar tudo novamente - pelo

menos não do mesmo jeito. A verdade é que minha busca não mudou. Ainda

preciso pegar o antídoto com Roman para que Damen e eu possamos... bem... ficar

juntos E já que Roman é a chave, o único que tem acesso ao antídoto, preciso saber

como lidar com ele, como me aproximar dele de um modo que consiga o que

preciso mas sem... sem manipulá-lo ou... fazer feitiços, ou me deixar enganar

daquele jeito de novo. Então, acho que o que estou tentando dizer é que preciso
saber como abordá-lo. Não sei muito bem como agir agora, e se puder me ajudar

com isso, dar algum tipo de dica, mostrar o que acha que eu preciso saber para

lidar com ele da maneira certa... bem, eu ficarei muito agradecida.

Respiro fundo e fico parada, ciente de um zumbido distante que sibila à

minha volta, e quando abro os olhos vejo que estou em um salão. Não o mesmo

de antes, com o corredor infinito e as inscrições hieroglíficas na parede; este salão

é mais largo e menos comprido, mais como um corredor que leva às fileiras de

assentos em um estádio fechado ou em uma casa de shows. Quando chego lá,

quando chego à outra extremidade, vejo que estou em um estádio, tipo um

coliseu, só que particular. Há apenas um assento, e está reservado para mim.

Eu me acomodo, desdobro o cobertor que está a meu lado e o coloco no

colo. Olho para as paredes, as colunas... tudo parece velho, rachado, como se fosse

construído há muito tempo, na Antiguidade. Fico imaginando se devo fazer

alguma coisa, dar o primeiro passo, quando um holograma colorido aparece bem

diante de mim.

Eu me inclino naquela direção, olhando com os olhos semicerrados para a

visão quase alucinatória de uma família. A mãe está pálida, febril, deitada de

costas, sentindo muita dor, gritando de agonia, implorando para Deus levá-la,

sem nem mesmo ter a chance de segurar o filho que nasceu um pouco antes de

seu desejo ser atendido. Ela dá um último suspiro e se vai. Sua alma ascende
enquanto o bebê, o pequeno recém-nascido, é limpo, envolvido em um pano e

entregue a um pai muito ocupado, chorando por sua mulher morta, para lhe dar

qualquer atenção.

Um pai que nunca para de chorar pela esposa e que culpa o filho por sua

perda.

Um pai que recorre à bebida para anestesiar a dor, e depois à violência,

quando a bebida não funciona.

Um pai que bate no pobre filho desde que ele começa a engatinhar até o dia

em que, em um estupor bêbado, começa uma briga com alguém muito maior e

mais forte, uma briga que não pode vencer. Seu corpo surrado e ensanguentado é

deixado em uma viela, sem chance de restabelecer, mas ainda dando os últimos

suspiros, quando o doce alívio que ele buscou o tempo todo finalmente chega. Ele

deixa para trás uma criança faminta e abandonada, que logo passa à guarda da

Igreja.

Uma criança com pele morena, grandes olhos azuis e cachos dourados que

só podem pertencer a Roman.

Só podem pertencer a meu rival, meu inimigo, meu eterno antagonista, a

quem não posso mais odiar. De quem apenas sinto pena depois de ver a maneira

como ele, mais novo que os outros e pequeno para sua idade, luta para se

encaixar, para agradar, para ser notado e amado, mas apenas passa de filho
negligenciado, ignorado e maltratado a empregado de alguém, a flagelado

favorito de alguém.

E mesmo quando Damen prepara o elixir e manda todos beberem, para

que não sejam levados pela peste negra, Roman é o último a ser servido. Estava

sendo completamente ignorado até que Drina chamou a atenção para ele, in-

sistindo que as últimas gotas fossem dadas ao menino.

Embora me obrigue a ficar até o final, assistindo a centenas de anos de seu

ressentimento cada vez maior em relação à Damen, centenas de anos de amor a

Drina sendo negado várias vezes, centenas de anos de Roman ficando tão forte e

tão perfeito a ponto de ter qualquer coisa ou pessoa que quisesse, menos aquela

que queria mais - aquela que roubei dele para sempre -, mesmo assistindo a tudo

isso, eu não precisava.

A fera nasceu há seiscentos anos, quando o pai o espancou, quando Damen

o negligenciou, quando Drina foi gentil com ele. Certamente ele poderia ter vivido

de outra forma, feito escolhas melhores, se pelo menos alguém tivesse lhe

mostrado o caminho. Mas ninguém pode dar o que não tem.

Quando o holograma termina, quando as imagens desaparecem e as luzes

se apagam, sei o que fazer. Mesmo sem me dizerem, sei exatamente como

proceder.

Então eu me levanto do assento, agradeço em silêncio e retorno ao plano

terreno.
Capítulo 31

Quando paro na entrada e estaciono, admito sentir uma apreensão rápida,

porém intensa. Minha mente gira, cheia de perguntas: Eu deveria mesmo fazer

isso? Será que terei chance de fazer isso? Ela me expulsará logo, como fez com o

visual emo do ano passado?

Percebo que nunca saberei se não tentar, então aguardo um momento para

me acalmar, me concentrar, reunir forças lá de dentro e me encher daquela luz

brilhante, radiante, curativa, como Ava me ensinou. Passo a mão no amuleto sob o

vestido apenas para ter certeza, desço do carro e sigo para a porta. Nem sei se ela

ainda mora aqui, agora que está poderosa, ilimitada, com o mundo todo a seus

pés, mas imagino que seja o melhor lugar para começar.

— Oi. — Sorrio, tentando olhar por cima do ombro da empregada, aliviada

em ver que, daqui, tudo parece igual, o que significa que está em seu estado

normal de caos e desordem. — Haven está? — continuo, com a voz esperançosa,

ansiosa para que ela diga sim.

Ela confirma com a cabeça, abre mais a porta e aponta para o quarto de

Haven enquanto subo as escadas, seguindo a direção de seus dedos e sem me dar

tempo para mudar de idéia. Paro na frente do quarto e bato duas vezes.

— Quem é? — ela grita, claramente irritada, como se a última coisa que

quisesse fosse uma visita. E quando digo que sou eu, bem, imagine a reação. —
Ora, ora — ela ronrona, abrindo apenas uma fresta da porta para confirmar,

olhando-me de cima a baixo, sem me de— Bem, na verdade eu ia dizer seduzir

meu namorado, mas, é, pensando bem o único contato fisico que teve foi comigo.

Ela sorri, mas não de um jeito bom e alegre, não, não, longe disso. — E então,

Ever, o que traz você aqui? Veio terminar o serviço?

Olho para ela, mantendo o olhar o mais aberto, sincero e direto que posso,

e digo:

— Não, nada disso. Na verdade vim aqui com a esperança de colocar um

ponto final nisso tudo... explicar e pedir uma trégua. — Contraio-me ao usar essa

palavra, lembrando a última vez que a usei com Roman e como as coisas não

acabaram muito bem.

— Uma trégua? — Ela levanta a sobrancelha e inclina a cabeça. — Você?

Ever Bloom? A menina que fingiu ser minha melhor amiga, roubou o cara

por quem eu tinha uma queda bem debaixo de meu nariz... hum, lembra o

Damen? — ela diz, balançando a cabeça em resposta à minha expressão confusa.

— Se não lembra, eu falei que estava a fim dele bem antes de você, mas mesmo

assim foi lá e o tirou de mim, tudo bem, que seja, no final deu tudo certo, acho,

mas mesmo assim. E então, mesmo depois disso tudo, mesmo aparentemente

tendo tudo o que uma pessoa pode querer, parece que não é o suficiente para

você, então decide ir atrás de Roman também, porque só um imortal gostoso não
é o bastante. Ah, e você é tão obcecada em sua busca que decide tentar me matar

se isso for necessário para conseguir ficar com ele. Mas agora, de repente, mudou

drasticamente de idéia e aparece em minha porta pedindo uma trégua. É isso

mesmo? É isso que está realmente acontecendo aqui?

Faço que sim com a cabeça.

— Basicamente, mas há muito mais do que isso, algo de que precisa saber.

A verdade é que tentei enfeitiçar Roman, com um feitiço que o faria ficar

amarrado a mim e me dar o que quero. Só que o tiro saiu pela culatra, e eu acabei

me amarrando a ele de um modo que... bem, de um modo que ainda não entendo

totalmente. — Torço o nariz e balanço a cabeça só de lembrar. — Mas foi só por

isso que agi assim. Eu juro. A magia assumiu o controle, e eu não estava em meu

juízo perfeito. Não era bem eu que estava fazendo aquelas coisas, pelo menos não

totalmente. - Balanço a cabeça. - Sei que parece loucura, e não é tão facil explicar,

mas é como se eu tivesse sido obrigada por uma força externa a mim. - Olho para

ela, querendo que acredite. - Eu não estava no comando.

Ela olha para mim com a cabeça inclinada, apenas uma sobrancelha levan-

tada, dá um

— Um feitiço? Espera mesmo que eu acredite nisso?

Faço que sim com a cabeça, olhando atentamente em seus olhos. Quero

confessar toda a história sórdida, o que for preciso para que ela confie em mim de
novo. Mas não aqui. Não no corredor.

— Ouça, acha que eu poderia... ? — Aponto para dentro do quarto.

Ela franze a testa, os olhos são duas frestas, e pensa por um minuto. Abre a

porta apenas o suficiente para eu poder me espremer para entrar e diz:

— Já vou avisando que se fizer alguma coisa que não me agrade, Deus me

ajude, porque vou acabar com você tão rápido que nem vai saber o que a

acertou...

— Relaxe — digo, jogando-me em sua cama como nos velhos tempos, só

que não é como nos velhos tempos, nem perto. — Não estou me sentindo violenta

hoje, garanto. Na verdade, não vou mais me tornar violenta basicamente todos os

dias a partir de agora, e não tenho intenção de perseguir você, de modo algum.

Tudo que eu quero é paz, e nossa amizade de volta. Mas, se isso não for possível,

posso me conformar com uma trégua.

Ela se apóia na cômoda, braços cruzados sobre o espartilho de couro preto

apertado que veste sobre um vestido rendado de época.

— Sinto muito, Ever, mas depois de tudo que passamos não é assim tão

fácil. Não tenho motivo algum para confiar em você, e vou precisar de um pouco

mais de garantia do que isso.

Respiro fundo e passo a mão em sua antiga colcha florida, surpresa por ela

não tê-la trocado ainda.


— Acredite — digo, olhando para ela , — eu entendo, entendo de verdade.

Mas, Haven. — Faço uma pausa, balanço a cabeça e começo de novo: — A

verdade é que não suporto o que aconteceu com a gente. Sinto sua falta. Sinto falta

da nossa amizade. E odeio saber que, em parte, a culpa é minha.

— Em parte? — ela grita, revirando os olhos e balançando a cabeça. -

Lamento dizer, mas não acha que essa afirmação poderia ser um pouco mais

precisa se admitisse que foi tudo culpa sua?

Olho para ela, diretamente em seus olhos, e digo:

— Certo, admito a maior parte, mas certamente não tudo. Haven, a questão

é... mesmo não gostando de Roman, e, acredite, tenho meus motivos, entendo que

ele seja seu namorado, e entendo que não importa o que eu disser sobre ele, não

posso fazer você mudar de idéia, então, nem vou tentar. E sei que pode achar

difícil acreditar, principalmente depois do que viu naquela noite... mas acontece

que, bem, como eu disse antes, não era exatamente eu.

— Ah, claro. . era o importuno feitiço do mal. — Ela balança a cabeça e re-

vira os olhos, mas não a deixo me interromper.

— Ouça, sei que não acredita em mim e que devo estar parecendo maluca

agora, mas acho que, considerando as circunstâncias, você deveria saber que as

coisas mais loucas muitas vezes são verdade.

Ela olha para mim com a boca torcida para o lado, um sinal claro de ue não

está descartando, de que na verdade está levando minhas palavras m

consideração.

— Estamos do mesmo lado, você e eu... e espero que com o tempo pereba

isso também. Acredite... não estou tentando atrapalhar sua felicidade. E nunca
tentaria roubar ninguém de você... apesar do que possa ter parecido.

Eu só... bem, só espero que ainda exista algum jeito de sermos amigas

novamente, um jeito de consertar nossa amizade, apesar de tudo o que aconteceu.

Quer dizer... sei que não será como antes. Nem espero que seja, depois de do o

que passamos, e sei que está bastante ocupada com o trabalho, saindo com

aqueles... hum, outros imortais... — digo, esquecendo temporariamente — nomes

deles.

— Rafe, Misa e Marco — ela murmura, claramente irritada.

— Isso, eles. Mesmo assim. As aulas vão começar em algumas semanas, e

1iles logo estará de volta, e pensei que talvez, bem, não todos os dias, se você não

quiser, mas talvez de vez em quando poderíamos nos sentar juntas na hora

almoço. Sabe? Como fazíamos antes.

— Então é uma trégua para a hora do almoço? — ela pergunta. Seus olhos

ão uma carapaça multicolorida, firmemente fixos nos meus.

— Não - balanço a cabeça. — É uma trégua para todas as horas. Só estou

esperando que se estenda a um almoço ou outro também.

Ela franze a testa, cutucando as cutículas, que eu sei que não estão irregu-

lares, já que os imortais não têm pedaços de pele solta. Também sei que é uma

desculpa para me evitar, evitar meu olhar, fazer com que eu pense e espere

enquanto ela reflete sobre minhas palavras.


— Nunca mais vai ser como antes — ela diz finalmente, levantando os

olhos. — E não só por causa de tudo o que aconteceu com Rornan, o que foi um

grande erro, por sinal. Mas o verdadeiro motivo de não podermos voltar é o fato

de que eu estou diferente agora... e acontece que eu gosto de estar diferente. Não

quero voltar a ser como antes. Nunca mais quero ser aquela fracassada triste e

patética.

— Você nunca foi patética, nem fracassada... apenas um pouco triste algu-

mas vezes — digo, mas ela ignora.

— Além disso, tanta coisa mudou... talvez até demais... que não sei se vou

conseguir superar.

Faço um gesto positivo com a cabeça. Também percebi isso, mas ainda

espero que ela supere.

— E, sim, Misa, Rafe e Marco são legais e tudo, não me entenda mal, mas,

além da imortalidade e de trabalharmos na loja, na verdade não temos muito em

comum, sabe? Temos históricos totalmente diferentes, referências totalmente

diferentes, eles nunca ouviram falar da maioria das minhas bandas favoritas, o

que me incomoda um pouco.

Dou de ombros e reconheço com a cabeça, entendendo completamente. —

E mesmo que nunca tenha me sentido como você— e que também não tivéssemos

tanto em comum, sempre senti que você me entendia, sabe? Como se talvez não
pudesse se identificar exatamente, mas ainda assim me aceitasse, não me julgasse

e, bem, isso significava muito ... ou significava algo, não importa.

Aperto os lábios e espero pelo restante, sei que ela ainda não terminou.

— Está bem, eu também senti sua falta. — Ela olha para mim, levantando

os ombros, e acrescenta: - Seria legal manter pelo menos uma amiga pelo restante

da eternidade. Mas tem certeza de que não podemos transformar Miles também?

— Não! — solto, antes de me dar conta de que ela estava brincando.

— Nossa, você nunca relaxa? — Ela ri, descruza os braços e se joga na

cadeira com estampa de leopardo, formando uma pilha de couro e renda, e

arruma o vestido em volta dela antes de descansar a cabeça na mão. — Pode, ria

ajudar na carreira de ator... ele certamente conseguiria todos os melhores papéis.

— E isso é bom por quanto tempo? — Olho para ela. — Até em Hollywood

as pessoas iam começar a reparar no fato de ele nunca passar dos dezoito anos. —

Não pareceu ser ruim para Dick Clark.

Aperto os olhos, sem idéia de quem é Dick Clark.

— America‘s Oldest Teenager? New year‘s Rocking Eve? Dou de ombros,

ainda sem saber.

— Deixa pra lá. — Ela ri e balança a cabeça. — Bem, eu tenho esta teoria de

que há muito mais gente igual a nós do que pensamos. Atores, top models... É

sério. Como explicar alguns deles?


Balanço os ombros.

— Sorte, genes bons, cirurgia plástica e muito, muito Photoshop. — Rio.

— É assim que explica.

— Bem, cá entre nós, Roman nem sempre libera os detalhes. Ele costuma

esconder muita coisa.

Jura?

— Uma vez, perguntei quantos de nós havia por aí e quantos ele mesmo

tinha transformado, e ele murmurou alguma frase sem sentido, tipo eu que sei, o

mundo que descubra, ou algo assim. E não importa o quanto eu tenha perturbado,

ele só disse isso. Repetiu várias vezes, até que fiquei tão irritada que desisti.

— Foi isso que ele disse? — pergunto, tentando esconder o alarme em

minha voz, mas não sendo muito bem-sucedida. — Ele disse — eu que sei, o

mundo que descubra? — Respiro fundo; não gosto de como soa sinistro. Não

gosto nem um pouco.

Haven olha para mim, tentando recuar quando vê minha expressão, ouve o

jeito como minha voz se eleva e percebe que pode ter ido um pouco longe demais.

Que sua lealdade não se estende mais a mim, e, definitivamente, equilibra-se a

favor de Roman.

— Ou talvez tenha dito para eu descobrir... — Ela levanta os ombros e fica

mexendo na renda da manga. — Bem, não importa, talvez seja melhor não

falarmos de Roman, já que eu o amo e você o odeia, então, se quisermos ser

amigas, teremos que coexistir em uma zona livre de Roman, certo? Teremos que

concordar em discordar.

— Você ama Roman?


Ela olha para mim por um bom tempo, depois abaixa a cabeça e diz: —

Amo. Amo muito, muito.

— E é... recíproco? - pergunto, duvidando que Roman seja capaz de amar

alguém, especialmente depois de saber que esse sentimento nunca foi mostra- -do

a ele, nunca foi oferecido a ele de forma real ou duradoura, baseada no que vi. É

muito difícil dar algo que nunca se vivenciou. Até mesmo o que ele sentia por

Drina não era amor. Era mais uma obsessão por algo fora de seu alcance, como

um objeto brilhante que você deseja, mas não pode tocar. Exatamente a mesma

sensação que ele está tentando reproduzir com Damen e comigo. Só que não vai

funcionar. Com ou sem o antídoto, ele nunca ganhará essa. O que Damen e eu

temos é muito mais profundo do que isso.

— Sinceramente — ela olha para mim, — na verdade eu não sei. Mas, se

tivesse que chutar, diria que não, não é recíproco. Ele não... não me ama nem um

pouco. Bem, mesmo mantendo os sentimentos escondidos, muitas vezes fingindo

que não tem nenhum... às vezes ... às vezes ele foge deles. Eu chamo de lapso

obscuro quando ele se tranca no quarto, não quer falar com ninguém, nem sair

por horas. . e, bem, não tenho ideia do que ele faz lá dentro. Mesmo tentando

respeitar, tentando deixar que ele tenha o espaço dele, fico muito curiosa. Mas

acho que, se eu ficar bastante com ele, finalmente vai confiar em mim, deixar eu

entrar e... — ela dá de ombros — mudar tudo.


Olho para ela, surpresa por estar tão comedida, agindo com mais seguran-

ça do que nunca.

Ela olha para baixo, para a calça legging estrategicamente rasgada que usa

sob o vestido, passa o dedo em um dos buracos e diz:

— Sabe, Ever, em todo relacionamento sempre tem um que ama mais, não

é?

Da última vez, com Josh, era ele. Com certeza ele me amava mais' do que

eu o amava. Sabia que Josh até escreveu urna música sobre mim depois que

terminamos, tentando me reconquistar? — Ela ergue as sobrancelhas e balança a

cabeça. — Era muito boa, e fiquei lisonjeada, mas era tarde demais, eu já estava a

fim de Roman, que eu com certeza amava mais. Ele apenas concorda em passar

um tempo comigo, nós nos divertimos, e não tem nenhuma outra garota na

jogada... bem, fora você.. — Ela olha para mim, com os olhos semicerrados de um

modo que me faz contrair os músculos, mas rapidamente começa a rir e faz um

gesto indicando que não é sério. — O que estou querendo dizer é que, não

importa o que você pense, não importa o que possa parecer quando visto de fora,

a verdade é que nunca é igual. Não funciona assim. Sempre há o caçador e a caça,

o gato e o rato, é assim que as coisas são. Conte para mim, Ever, quem ama mais

em seu relacionamento.. você ou Damen?

A pergunta me pega desprevenida, mesmo sabendo que viria. Mas,


quando vejo a forma como ela para, com a cabeça inclinada, os dedos enrolando

uma mecha de cabelo, esperando pacientemente minha resposta, acabo

murmurando um monte de bobagens aleatórias, que finalmente resultam em:

— Ah, não sei. Acho que nunca parei para pensar no assunto. Eu nunca

nem notei, por sinal...

— Sério? — Ela se vira e olha para cima, para o teto cheio de estrelas que

brilham no escuro. — Bem, eu notei — ela diz, ainda concentrada nas conste-

lações. — E acho que é Damen, não você. É Damen que ama mais. Ele faria tudo

por você. Você só está curtindo.

Capítulo 32

Queria poder dizer que as palavras de Haven não me incomodaram. Que

fui capaz não só de refutá-las, mas também de contra-argumentar de forma tão

convincente que ela imediatamente ficou do meu lado. Mas a verdade é que não

fiz nem disse muita coisa. Só dei de ombros, fingindo não dar importância, e ela

tocou um monte de músicas que tinha no iPod e que eu nunca tinha ouvido, de

bandas que eu nem sabia que existiam, e folheamos uma pilha de revistas. Nós

duas passando o tempo juntas do mesmo jeito que costumávamos fazer. Como

nos velhos tempos. Mas isso era o que parecia superficialmente. No fundo, ambas

sabíamos que tudo era, agora, completamente diferente.

Depois que fui embora, enquanto estava na casa de Damen, as palavras de


Haven continuaram ecoando em minha mente, e fiquei me perguntando qual de

nós dois amava mais o outro. E, para ser sincera, as palavras continuam comigo

até hoje. Durante todo o café da manhã com Sabine fiquei imaginando; durante

toda a reposição das prateleiras, com todo o tilintar da caixa registradora na loja,

perguntei a mim mesma: era eu ou ele? Mesmo depois de todas as leituras que

estavam agendadas para — Avalon—, incluindo a que estou terminando agora, a

pergunta continuou ecoando em minha mente.

— Uau, isso foi... — Ela olha para mim com os olhos arregalados de

surpresa. — Isso foi extraordinário mesmo, mesmo, mesmo. — Balança a cabeça e

tateia a bolsa, no rosto uma mistura de empolgação, dúvida e vontade de

acreditar, o olhar que vejo habitualmente depois das leituras.

Concordo com a cabeça, sorrindo educadamente enquanto recolho as

cartas de tarô que havia espalhado só para disfarçar, mas que não uso de fato. É

mais fácil simplesmente ter algum tipo de objeto ou ferramenta... fica mais dis-

tante e impessoal desse jeito. A maioria das pessoas surta com a ideia de alguém

ser capaz de espiar sua cabeça e ouvir todos os seus pensamentos e sentimentos

mais profundos, ainda mais se souber que um breve toque pode revelar uma

longa e complexa sequência de eventos.

— É que... você é tão mais Jovem do que eu esperava. Há quanto tempo faz

isso? — ela pergunta, pendurando a bolsa no ombro enquanto continua a me


analisar com os olhos.

— Ser médium é um dom — digo, embora Jude tenha me pedido especi-

ficamente para não dizer isso, imaginando que desestimularia eventuais alunos a

se matricularem em sua aula de desenvolvimento mediúnico. Mas, já que o curso

ficou praticamente reduzido a ele e a Honor, realmente não vejo que mal isso

pode causar. — Não tem limite de idade — continuo, apressando-a mentalmente

para que pare com o deslumbramento e vá embora. Tenho planos, outro lugar

para ir. Minha noite está cuidadosamente planejada, tim-tim por tim-tim, e se ela

ficar por muito mais tempo vai bagunçar completamente minha agenda. Mas, ao

ver um olhar de ceticismo começando a se formar, digo: — É por isso que para as

crianças é tão natural, elas estão abertas a todas as possibilidades. Só mais tarde,

ao descobrir como a sociedade franze a testa para esse tipo de dom, é que o desejo

de ser aceito toma conta e as pessoas passam a esconder. E você? Não tinha um

amigo imaginário quando era criança? — Volto meu olhar para ela, sabendo que

teve, porque vi no momento que a toquei.

— Tommy! — diz ofegante, colocando a mão sobre a boca, surpresa por ter

deixado escapar.

Sorrio, pois eu mesma já havia visto.

— Ele era real para você, certo? Ajudou a enfrentar momentos difíceis? Ela

olha para mim com os olhos arregalados, balança a cabeça e diz:


— Sim... ele.. bem... eu costumava ter pesadelos, — Ela levanta os ombros

e olha em volta como se estivesse constrangida pela confissão. — Quando meus

pais estavam se divorciando, bem, tudo era tão instável, financeira e

emocionalmente, e foi aí que Tommy apareceu. Ele prometeu que me ajudaria a

superar, a manter todos os monstros longe, e foi o que fez. Acho que parei de ver

Tommy na época em que completei...

— Dez anos. — Levanto-me da cadeira, uma indicação de que a sessão

terminou e de que ela deve fazer o mesmo. — O que, para ser sincera, é uma

idade mais avançada do que a maioria das pessoas, mas, ainda assim, você não

precisava mais dele e então ele... partiu. — Balanço a cabeça, abrindo a porta e

levando-a para o salão, onde, espero, seguirá para o caixa para fazer o pagamento.

O problema é que ela não vai até o caixa. Em vez disso, vira-se para mim e

diz: — Você tem que conhecer minha amiga. É sério. Ela vai pirar. Ela não acre-

dita mesmo nessas coisas, na verdade, até fez piada por eu ter vindo, mas vamos

jantar mais tarde, um encontro de casais, e, bem... — Ela faz uma pausa para

espiar o relógio, dá um riso forçado para mim e diz: — Bem, na verdade, ela deve

estar chegando agora, ou daqui a pouco.

— Eu adoraria. — Sorrio, como se realmente estivesse disposta. — Mas

preciso ir a um lugar e...

— Oh, é ela chegando ali! Perfeito!

Suspiro e olho para baixo, desejando que fosse possível usar minhas habi-

lidades de materialização para fazer as pessoas pagarem e desaparecerem... ou

pelo menos desta vez, que seja.

Sinto que meus planos estão prestes a ser adiados por mais tempo ainda,
mas não tenho ideia do quanto até que ela, com as mãos em concha ao redor da

boca, chama:

— Sabine! Ei, aqui. Tem alguém aqui comigo que você precisa conhecer!

Meu corpo inteiro fica gelado. Paralisado, rígido e gelado. Gelado tipo: Oi,

iceberg, apresento-lhe o Titanic.

E antes que possa impedi-la, antes que possa fazer qualquer coisa, Sabine

está vindo em minha direção. Não me reconhece de cara, e não é por eu estar

usando uma peruca preta, porque não estou, desisti dela há muito tempo, quando

concluí que fazia Avalon parecer uma louca, mas porque sou a última pessoa que

ela esperava encontrar. Na verdade, ela ainda estreita os olhos e pisca, mesmo

estando parada bem na minha frente, com Munoz a seu lado, que, aliás, parece

estar tão desesperado quanto eu.

— Ever? — Sabine olha para mim fixamente, como se tivesse acabado de

despertar de um sono profundo. — Que... — Ela balança a cabeça, como se

estivesse se livrando de teias de aranha, e começa tudo de novo. — O que diabos

está acontecendo aqui? Eu não entendo.

— Ever? — A amiga dela olha para nós, apertando os olhos, desconfiada.

— Mas... mas achei que tinha dito que seu nome era Avalon!

Respiro fundo e concordo com a cabeça, sabendo que agora está tudo aca-

bado. Minha cuidadosamente elaborada vida de mentiras, evasivas e segredos


deu nisso.

— É Avalon — confirmo com a cabeça, evitando o olhar de Sabine. -

Mas também é Ever... depende.

— Depende de quê? — minha cliente grita, como se estivesse pessoal e

profundamente ofendida, sentindo-se enganada. Sua aura se incendeia subita-

mente, estremece, como se duvidasse não só de mim, mas de tudo que passei a

última hora lhe dizendo, não importa o quanto minhas previsões foram precisas.

— Quem diabos é você, afinal? — pergunta, olhando para mim como se fosse me

denunciar para... bem, ela não havia decidido ainda... mas para alguém. Alguém

aceitaria a denúncia, com certeza.

Mas Sabine voltou a si e, com a voz calma, contida e parecendo um pouco

uma advogada, diz:

— Ever é minha sobrinha. E, aparentemente, tem muito a explicar.

E quando estou prestes a fazer isso... bem, não exatamente explicar, pelo

menos não do jeito de que ela gostaria... mas, ainda assim, quando estou prestes a

dizer alguma coisa que com alguma sorte acalmará todo mundo e esclarecerá a

situação, Jude aparece e diz:

— Tudo certo com a leitura?

Dou uma espiada em minha cliente, a amiga de Sabine, e sei que minha

energia está tão aperfeiçoada, tão aumentada com as meditações de purificação e


cura a que Ava tem me submetido, que foi uma das melhores leituras que fiz na

vida ... mas mesmo assim não consegui prever esta situação. Também vejo como

ela se mostra relutante em pagar, agora que me reconhece como a jovem sobrinha

delinquente de sua amiga, que faz um bico como Avalon, a Médium Duvidosa,

mas não lhe dou chance de reagir. Apenas me intrometo e digo:

— Não se preocupe, essa é por minha conta. — Jude estreita os olhos,

alternando o olhar entre nós, mas apenas confirmo com firmeza: — É sério. Não se

preocupe. Estou cuidando de tudo.

Enquanto isso parece ter acalmado a cliente, e talvez também Jude, não

ajudou muito com Sabine. Sua aura está extremamente agitada e os olhos fixos

nos meus. — Ever? Não tem algo a dizer em sua defesa?

Respiro fundo e olho em seus olhos. Sim, tenho muito a dizer, mas não

aqui, nem agora. 'Tenho um compromisso!

Estou prestes a dizer isso, só que de um modo mais agradável e gentil, para

não deixar Sabine ainda mais irritada, quando Munoz vem em meu socorro e diz:

— Vocês podem discutir isso amanhã de manhã, mas agora acho melhor nos

apressarmos. Não queremos correr o risco de perder nossa reserva depois do

trabalho que tivemos para consegui-la.

Sabine suspira, cedendo à sabedoria do argumento de Munoz, mas ainda

não está disposta a me deixar escapar tão facilmente. Suas palavras vêm entre-

dentes quando diz:


— Amanhã de manhã, Ever. Espero ver você assim que acordar. — Depois,

vendo a expressão em meu rosto, completa: — Sem ―masǁ.

Concordo, mesmo não planejando comparecer ao compromisso. Se tudo

funcionar como estou pretendendo, amanhã de manhã estarei o mais longe

possível da mesa daquela cozinha. Em vez disso, estarei esparramada em uma

suíte no Montage, com Damen a meu lado, finalmente pondo em prática aqueles

planos feitos há muito tempo...

Mas é claro que não vou contar isso a ela, então apenas concordo com a

cabeça e digo:

— Hum, certo. — Sei que ela, como advogada, sempre insiste em uma

resposta verbal, de modo que o significado não possa ser distorcido ou des-

construído. E quando eu acho que o pior já passou, pelo menos por enquanto, ela

insiste que eu me desculpe com sua amiga, como se eu tivesse cometido algum

tipo de crime contra ela. Mas, mesmo sabendo que pagarei depois, não farei isso.

Em vez de me desculpar, apenas olho para ela e digo:

— Nada disso muda o que falei lá dentro. — Aponto para a sala dos fun-

dos. — Seu passado, Tommy, seu futuro... sabe que o que eu disse é verdade. Ah,

e sobre aquela escolha que terá que fazer? - Alterno o olhar entre ela e seu

acompanhante. — Bem, por mais que possa duvidar de mim agora, ainda será

sábia o suficiente para seguir meu conselho.


Olho para Sabine, sua aura irrompendo em uma onda de raiva que só é um

pouco contida pela presença do braço de Munoz abraçando-a com força. Ele pisca

para mim e a faz virar para o outro lado e eles caminham para a porta, seguidos

por seus amigos.

Assim que os quatro saem, Jude olha para mim e diz:

— Cara, que azar você deu. Acho que vou defumar o local com um pouco

de sálvia, para ajudar a purificar. — Ele balança a cabeça. — O que aconteceu?

Achei que já tivesse contado para ela.

Olho para ele.

— Está brincando? Você viu o que acabou de acontecer. Aquele tipo de

cena é exatamente o que eu queria evitar.

Ele dá de ombros, contando o dinheiro na gaveta enquanto diz:

— Bem, talvez fosse melhor se você tivesse avisado, se ela não estivesse se

sentindo tão enganada quando entrou e viu que estava trabalhando aqui...

fazendo leituras.

Faço cara feia, procurando em minha carteira o dinheiro que devo pela

leitura grátis que fiz involuntariamente.

— Tem certeza de que quer pagar por isso? — ele pergunta, recusando-se a

pegar o dinheiro.

— Por favor. — Eu entrego as notas para ele, vejo suas sobrancelhas se


levantarem e percebo que está prestes a insistir novamente, então continuo: — E

fique com o troco. Considere como pagamento pelo azar que eu trouxe. É sério.

Se isso não tivesse acontecido, talvez ela se tornasse cliente regular, então

encare como pagamento por toda a renda perdida.

— Não tenho tanta certeza de que perdeu a cliente — ele diz, enfiando o

dinheiro no caixa e fechando a gaveta. — Se fez uma boa leitura, como eu acho

que fez, ela vai voltar, ou pelo menos vai recomendar a algumas amigas, que

virão nem que seja apenas por curiosidade. É muito difícil para muita gente re-

sistir a esse tipo de coisa. Você sabe, advogada séria surpreende sobrinha golpista

que, sem seu conhecimento, passa o tempo livre trabalhando como médium cuja

precisão é incrível... poderia ser um livro, ou pelo menos um filme.

Dou de ombros, aproveitando para retocar a pouca maquiagem que uso,

olhando em meu pequeno espelho de mão, e digo:

— Sobre isso... — Ele olha para mim. — Acho que meus dias de Avalon

estão acabados. — Ele suspira, claramente desapontado. — Não me entenda mal,

eu gostei muito, e hoje, bem, antes de acontecer esse fiasco, senti que realmente

estava ficando boa nisso... como se fosse capaz de entender as pessoas, ajudar.

Mas agora... bem, talvez seja hora de trazer Ava de volta. Além disso, as aulas

estão prestes a recomeçar e...

— Está pedindo demissão? — Ele franze a testa, nem um pouco animado


com a ideia.

— Não. — Nego com a cabeça. — Não, só preciso diminuir o ritmo, e não

quero causar mais problemas do que você já tem.

— Não se preocupe. — Ele dá de ombros. — Já coloquei Ava de volta na

programação, imaginei que precisaria diminuir suas horas de qualquer jeito, mas,

Ever, pode recomeçar quando quiser, os clientes adoram você, e eu... bem... — Seu

rosto Cora. — Fiquei muito impressionado com seu desempenho também. Como

funcionária. — Ele aperta a ponte do nariz, balança a cabeça e acrescenta: - Cara,

eu não sou nem um pouco sutil.

Apenas ignoro, imaginando quem se sente mais desconfortável, ele ou eu.

— E então, alguma ideia do que vai dizer a ela amanhã? — ele pergunta,

desesperado para mudar de assunto.

— Não. — Jogo o gloss labial na bolsa e a fecho. — Nem imagino.

— E não acha que deve pensar a respeito? Bolar algum tipo de plano? Não

quer ser surpreendida antes de tomar sua primeira xícara de café, não é? — Não

tomo café. — Dou de ombros.

— Certo, de elixir, que seja... — Ele ri. — Você entendeu o que eu quis

dizer.

Coloco a bolsa no ombro e olho para ele.

— Olhe, não me leve a mal, eu amo Sabine. Ela me acolheu quando eu

perdi tudo, e não fiz nada para retribuir além de transformar a vida dela em um

inferno permanente. Embora eu deseje ser sincera, no mínimo porque, depois

disso tudo, ela merece saber a verdade, ou pelo menos algo parecido com a ver-

dade, não vou dizer nada amanhã de manhã. — Mesmo tentando não sorrir ao
dizer, não consigo me conter. Quando penso em meu plano, meu plano à prova

de defeitos, todo o meu rosto se ilumina.

Por enquanto, toda a minha energia, toda a minha luz, toda a minha sorte,

como diz Jude, precisa ser poupada e canalizada exclusivamente para Roman.

Preciso estender meu amor, minha paz e minha boa vontade a ele, porque me

aproximar dele desse modo é a única forma de vencer. A única forma de

conseguir o que eu quero.

Se aprendi alguma lição com tudo isso, é que a resistência nunca funciona.

Combater o que eu não quero serve apenas para materializar exatamente

isso. E foi por esse motivo que o poder de Roman sobre mim enfraqueceu quando

apelei a Hécate... porque parei de ficar obcecada por ele por cinco minutos, e,

então, ele começou a se deteriorar. Com tudo isso em mente, acho que é seguro

presumir que, colocando minhas energias naquilo que quero - paz entre nós e os

imortais perigosos, além do antídoto do antídoto -, bem, só pode resultar na

vitória.

Então, quando for até ele esta noite, não será como inimiga, como alguém

que planeja conspirar e brigar para conseguir o que quer. Em vez disso, vou

abordá-lo como um ser superior, a forma mais pura e clara de mim.

E darei a ele a oportunidade de sair das profundezas e me encontrar no

mesmo nível.
Estou tão perdida em meus pensamentos, tão perdida na empolgação de

meu plano, que nem escuto Jude quando pergunta:

— Aonde você vai? — E olha para mim com seu radar mediúnico bem

alerta.

Eu apenas olho para ele, incapaz de não sorrir, e digo:

— Estou indo fazer algo que deveria ter feito há muito tempo. — Faço uma

pausa quando vejo como ele inclina a cabeça e enruga a testa, como sua aura se

movimenta e brilha. Queria poder ficar aqui e garantir a ele que ficarei bem. Mas

não posso, já perdi muito tempo. Então, apenas olho para ele e digo: Não se

preocupe. Desta vez, sei o que estou fazendo. Desta vez, tudo vai ser diferente.

Você vai ver.

— Ever... — Ele tenta me alcançar, esticando a mão no ar e pegando o

vazio.

— Não se preocupe. — Dou de ombros. — Sei exatamente o que fazer.

Sei como lidar com Roman agora. — Faço um gesto positivo com a cabeça,

olhando para seu grosso emaranhado de dreadlocks, vendo como as últimas

semanas de surfe os deixaram mais claros, com um tom de louro desbotado pelo

sol. — Sei exatamente como consertar tudo isso, exatamente como agir —

acrescento, vendo como ele inclina a cabeça, apoia-se no banco e coça o queixo,

pensativo. Seu anel de malaquita brilha diante de mim, quase no mesmo tom de
verde de seu olhar tropical, agora concentrado, analítico, cheio de preocupação.

Mas eu ignoro. Pela primeira vez em muito tempo, finalmente me sinto poderosa,

segura de mim, e não darei espaço para ninguém plantar nem uma sementinha de

dúvida. — Fui aos Grandes Salões do Conhecimento... — Faço uma pausa,

sabendo que ele precisa de algo mais convincente do que apenas minha palavra.

— E... bem, digamos que tive uma boa orientação. Uma orientação muito boa. -

Aperto os lábios e jogo a bolsa no ombro, sabendo que devo interromper a

conversa.

Ele olha para mim, esfregando as mãos na frente da camiseta, passando os

dedos no símbolo yin-yang branco e preto enquanto inclina a cabeça e diz:

— Ever... não estou tão certo de que deva ir por esse caminho novamente.

Quer dizer, se você se lembra, da última vez que ficou cara a cara com Roman, as

coisas não acabaram muito bem, e realmente não acho que tenha passado tempo

suficiente para tentar de novo. Pelo menos não tão cedo.

Levanto os ombros, as palavras dele me atingem como água encontrando

óleo, sem produzir efeito algum, o que, pela expressão em seu rosto, parece

apenas preocupá-lo mais.

— Anotado — digo, pondo os cabelos atrás da orelha. — Mas aí é que

está... vou fazer, de qualquer jeito. Vou tentar. Uma última vez, por assim dizer.

— Quando? Agora? Está falando sério? — Ele me encara, juntando as so-

brancelhas, com o olhar fixo no meu de um jeito que me deixa preocupada.


Alinho os ombros, cruzo os braços sobre o peito e, olhando em seus olhos,

indago:

— Por quê? Está planejando me seguir, para tentar me impedir?

— Talvez. — Ele dá de ombros e imediatamente continua: — Eu vou fazer

o que for preciso.

— O que for preciso para... o quê exatamente? — Ergo a cabeça,

desafiando-o com meu olhar.

— Manter você a salvo. Proteger você dele.

Respiro fundo e olho para ele, e quero dizer que olho para ele de verdade.

Começo pela parte de cima daqueles dreadlocks e desço até a cintura,

onde, por causa do balcão, minha visão é interrompida.

— E por que faria isso? — finalmente pergunto, voltando os olhos para os

dele. — Por que pensaria em tentar interferir em meu plano? Achei que quisesse

que eu fosse feliz, mesmo que isso queira dizer que eu fique com Damen. Pelo

menos foi o que me disse.

Ele aperta os lábios e se ajeita na cadeira, um movimento tão esquisito, tão

claramente desconfortável, que me sinto mal por ter dito isso. Fui longe demais.

Só porque abrimos nosso coração no passado, compartilhando mais do que

provavelmente deveríamos, não significa que eu tenho o direito de questioná-lo

ou de usar o que me contou. Não significa que devo insistir em ter uma resposta
quando a pergunta obviamente o magoa. Mas, ainda assim, algo sobre o jeito

como se moveu, não só física, mas energicamente, faz com que eu me pergunte,

tente adivinhar... faz com que eu me sinta um pouquinho insegura...

Eu me viro e caminho para a porta, e ele me segue até a viela atrás da loja

onde ambos estacionamos os carros.

— Devo me encontrar com Honor mais tarde... quer passar lá? Pode levar

Damen se quiser, não me importo.

Eu paro e olho para ele.

— Bem, até me importo, mas disfarço bem... palavra de escoteiro. — Ele

levanta a mão direita.

— Então você está saindo com Honor? — pergunto, observando enquanto

ele abre a porta de seu jipe preto antigo e entra.

— É, você sabe, sua amiga da escola, aquela que foi à sua festa de

aniversário. Começo a dizer que ela não é minha amiga, que pelo que eu vi outro

dia na praia, pela energia que ela emitiu, provavelmente é tudo, menos isso... mas

quando vejo a expressão em seu rosto, a alegria que enruga sua testa, decido

guardar para mim mesma.

— Honor não é tão ruim assim, sabe?'— Ele coloca a chave na ignição e liga

o motor, fazendo muito barulho. — Talvez devesse dar uma chance a ela.

Olho para ele, lembrando-me do que disse naquele primeiro dia, quando
nem o conhecia direito, muito antes de saber sobre nós, algo sobre ele sempre se

apaixonar pela garota errada, e fico imaginando se não aconteceu de novo. Mas

quando vejo como seu olhar muda, sua aura brilha e se inflama, sei que a garota

errada ainda sou eu. Honor nem está na jogada. E não sei o que me incomoda

mais: perceber isso ou o alívio repentino que me invade.

— Ever...

Ele me olha de um jeito que me faz perder o fôlego. Sua expressão é tão

conflituosa que fica claro que ele está lutando contra o que vem em seguida, mas

no fim apenas estreita os olhos, aperta os lábios, respira fundo e indaga: — Você

vai ficar bem? Tem certeza de que sabe o que está fazendo?

Faço que sim com a cabeça e entro no carro sentindo-me mais confiante e

poderosa do que nunca. A escuridão se foi, derrotada pela luz, e não há como isso

dar errado. Fecho os olhos, ligo o motor, olho para Jude e digo:

— Não se preocupe. Desta vez eu sei o que estou fazendo. Desta vez, tudo

vai ser diferente. Você vai ver.

Capítulo 33

Quando chego à casa de Roman, tudo está tranqüilo.

Exatamente como eu esperava. Exatamente como eu havia planejado.

Quando Haven me contou que ia a um show com Misa, Marco e Rafe, eu

soube que era a oportunidade perfeita para pegar Roman sozinho, sem nada para
nos perturbar, para poder me aproximar dele de uma forma pacífica, razoável, e

calmamente defender minha causa.

Fico parada na porta e por um momento fecho os olhos e fico em silêncio.

Volto a atenção para o fundo do meu ser e não encontro nem mesmo o

menor sinal de um monstro ali. É como se ao abandonar toda a raiva e todo o ódio

que sentia por Roman eu tivesse privado a chama negra do oxigênio de que ela

precisava para sobreviver... e eu fiquei em seu lugar.

Só depois de bater algumas vezes, e mesmo assim ele não atender, permito-

me entrar. Sei que ele está ali, não apenas porque seu Aston Martin vermelho-

cereja está estacionado na rua, más também porque posso percebê-lo, sentir sua

presença. Mas, por mais estranho que pareça, ele não parece perceber ou sentir a

minha, ou certamente já estaria aqui.

Atravesso o corredor, dou uma espiada na sala, na cozinha, através da

janela vejo a garagem atrás da casa, e quando percebo que está escuro, que não há

sinal dele, caminho na direção do quarto, chamando seu nome e fazendo muito

mais barulho do que o necessário ao me mover, pois prefiro não surpreendê-lo

nem pegá-lo no meio de uma situação constrangedora.

Encontro-o deitado no meio de uma cama com dossel enorme e cheia de

detalhes, com tantas cortinas e franjas que lembra uma daquelas que Damen e eu

temos em nossa versão de Versalhes em Summerland. Ele veste uma camisa de


linho branca desabotoada e jeans velhos e desbotados, está com os olhos bem

fechados, tem um par de fones de ouvido pendurados na cabeça e segura,

apertado contra o peito, um porta-retratos com uma foto de Drina. Eu paro,

imaginando se talvez não devesse apenas dar meia-volta e ir embora, encontrá-lo

em outro momento, quando:

— Ah, pelamordedeus, Ever, não me diga que derrubou a maldita porta de

novo. — Ele se senta, jogando os fones para o lado e devolvendo cuidadosamente

o porta-retratos na gaveta do criado-mudo. Parece não estar nem um pouco

constrangido por ter sido pego em um momento tão íntimo e sentimental. — Toda

essa sua cena está ficando meio exagerada, não acha? — Balança a cabeça e passa

os dedos por aqueles cachos dourados, colocando-os no lugar. — Sério, é possível

que um cara tenha um pouco de privacidade aqui? Entre Haven e você... — Ele

suspira e balança os pés descalços em direção ao chão como se fosse se levantar,

só que não se levanta, permanece sentado. — Bem, estou ficando meio cansado...

entende o que quero dizer?

Olho para ele, sabendo que provavelmente não deveria dizer isto, mas

estou curiosa demais para ignorar.

— Você estava... estava meditando? — Olho de soslaio, por nunca tê-lo

imaginado como o tipo que vai fundo e tenta se conectar com a força universal.

— E se eu estivesse, gata? E se eu estivesse? — Ele esfrega as mãos na testa,

então se vira para mim e diz: — Se quer saber, estava tentando encontrar Drina.

Sabe que não é a única por aqui que tem... poderes.

Engulo em seco, já bastante ciente daquilo, tentando adivinhar a resposta

para minha próxima pergunta quando pergunto:


— E... você a viu? — Aposto que não, especialmente pelo que sei sobre

Shadowland.

Ele olha para mim, seu rosto carrega uma fugaz expressão de dor quando

diz: — Não. Não vi. Certo? Satisfeita? Mas algum dia verei. Não pode nos manter

separados para sempre, sabia? Apesar do que você fez... pretendo encontrar

Drina.

Respiro fundo, pensando: Ah, espero que não. Você não vai gostar daquele

lugar. E sinto-me péssima pelas vezes que o enganei fingindo ser ela, mesmo não

sendo eu quem estava no comando quando tudo aconteceu.

Mas não digo isso. Na verdade, não digo nada. Só fico lá, parada, recom-

pondo meus pensamentos, minhas palavras, a mim mesma, esperando pelo

momento certo para começar.

— Roman, escute, eu... — Balanço a cabeça e começo novamente, dizendo a

mim mesma que consigo fazê-lo, reunindo forças de algum lugar lá no fundo.

Então, olho direto para ele e digo: - Não é o que está pensando. Não estou aqui

para seduzir, brincar, provocar nem tentar conseguir algo de você pelo menos não

do jeito que pensa. Estou aqui para...

— Pegar o antídoto. — Ele levanta os pés e os coloca de volta na cama

amarrotada. Cruza os braços, protegendo o peito, encosta na cabeceira revestida

de seda e me olha com os olhos semicerrados. — Vou dizer uma coisa, Ever, você
é no mínimo persistente. Quantas vezes planeja fazer isso? Toda vez que vem

aqui, tem um novo plano de ataque, um novo projeto em mente, e ainda assim

todas as vezes fracassa, apesar de eu dar grandes oportunidades para você

conseguir o que quer. Isso me faz pensar se você realmente quer isso. Talvez só

pense que quer, mas seu subconsciente não permite, já que conhece a verdade

sobre si mesma. A verdade profunda... sombria. — Seus olhos brilham, querendo

que eu reconheça que ele sabe sobre o monstro e como considera tudo divertido.

— E desculpe, gata, mas preciso perguntar: como Damen se sente a respeito

dessas suas visitinhas? Suponho que não fique muito satisfeito com isso, ou com o

fato de que Miles está prestes a desvendar mais um dos seus segredos. Ele tem

muitos, sabe. Segredos que você ainda mal começou a descobrir... histórias que

nem pode imaginar ...

Concordo com a cabeça, calma, com sinceridade, recusando-me a deixar

que suas palavras me atinjam. Simplesmente não sou mais aquela garota.

— Então me diga, ele sabe que está aqui agora?

— Não. — Dou de ombros. — Não sabe. — E quando lembro a mensagem

de texto que mandei para ele pouco antes de sair do carro e entrar aqui, sei que

não vai demorar muito até que saiba. Assim que sair da sessão do filme que foi

ver com Ava e as gêmeas, vai checar as mensagens e tomar conhecimento de

meus planos de encontrá-lo no Montage, então vai saber. Mas, por enquanto, não,
não faz ideia.

— Sei. — Ele sacode a cabeça, seus olhos sobre mim. — Bem, pelo menos

tirou o tempo para se purificar. Na verdade, está melhor do que nunca... ra-

diante... até meio incandescente. Diga, Ever, qual é seu segredo?

— Meditação. — Sorrio. — Você sabe, purificação, foco, concentração no

que é positivo.. coisas desse tipo. — Sacudo os ombros e continuo firme,

enquanto ele irrompe em uma gargalhada de chacoalhar os ombros e fecha os

olhos.

Parando com a histeria, ele diz:

— O velho Damen também fez você escalar o Himalaia, é? — Ele reclina a

cabeça e olha para mim. - Aquele grande pentelho nunca aprende. E isso faz um

bem danado para ele.

— Bem, lamento dizer, mas não era você que estava meditando?

— Não desse jeito, gata. Não, não desse jeito. Não estava... - E balança a

cabeça. — Sabe, meu jeito é diferente. Estava procurando uma pessoa em par-

ticular... não apelando para uma dessas baboseiras sem sentido do tipo ―tudo é

uma coisa sóǁ. Não entende, Ever? É assim. Aqui e agora. — Ele dá tapinhas no

lençol amarrotado a seu lado. — Este é o nosso paraíso, nosso céu, nosso nirvana,

nosso Shangri-La ... como quiser chamar. — Levanta as sobrancelhas e umedece

os lábios com a língua. — Isso é tudo. E quero dizer tanto no sentido figurado
quanto literalmente. É tudo que temos, e está perdendo seu tempo procurando

por algo mais. Agora, é verdade, tem muito tempo para desperdiçar, devo

admitir, mas mesmo assim é uma pena ver como pretende passar a eternidade.

Aquele Damen é má influência, devo lhe dizer. — Ele faz uma pausa, como se

parasse um pouco para pensar melhor. — Então, o que me diz? Vamos tentar de

novo? Quer dizer, você vem aqui desse jeito, e, bem, como me curo rapidamente e

tal, estou pronto para perdoar o que fez da última vez, o que passou, passou, e

tudo o mais. Só não tente fazer nenhum movimento repentino ou se passar por

Drina novamente e está tudo certo. Você aprontou algumas das últimas vezes,

mas, engraçado, acho que só me fez gostar mais de você. Então, o que me diz? —

Ele sorri, joga um travesseiro para o lado, para abrir espaço para mim, vira a

cabeça mostrando sua tatuagem e me olha daquele jeito hipnotizante.

Mas desta vez não funciona. Apesar de me mover em sua direção, na di-

reção do brilho esperançoso em seus olhos, não é pelo motivo que ele pensa. —

Não estou aqui para isso — digo, e vejo ele dar de ombros, como se de qualquer

forma não se importasse.

Inclino a cabeça para a frente e vejo suas unhas perfeitamente cortadas e

lixadas, quando ele diz:

— Então por que está aqui? Vamos, vamos logo com isso. Haven vai acabar

passando por aqui assim que o show acabar, e acho que nenhum de nós dois

precisa de uma cena daquelas de novo.

— Não quero magoar Haven. — Dou de ombros. — Não quero magoar

você também. Só estou aqui para apelar ao seu eu superior, só isso.

Ele fica boquiaberto e olha para mim, esperando a pegadinha que acha que
estou preparando.

— Sei que você tem um. Um eu superior. Na verdade, sei tudo a seu res-

peito. Sei tudo sobre seu passado, que sua mãe morreu no parto, que seu pai

bateu em você e depois o abandonou... sei tudo... eu...

— Espere aí... — ele diz, com os olhos azuis arregalados, a voz tão suave,

tão abalada que quase não ouço. — Ninguém sabe disso... como diabos você... ?

Mas apenas dou de ombros: o como não importa.

— E depois de descobrir tudo isso, percebi que não consigo mais odiar

você. Simplesmente não consigo. Não é do meu feitio.

Ele olha fixamente para mim, com os olhos semicerrados, cético. Mas sua

insolência habitual retoma quando ele diz:

— Claro que odeia, meu bem, ama me odiar, é só o que faz. Na verdade,

ama tanto me odiar que só consegue pensar em mim.

Ele sorri, concordando com a cabeça, como se estivesse dentro de mim,

como se soubesse disso o tempo todo.

Mas apenas balanço a cabeça, sento-me na beirada da cama e digo:

— Embora isso fosse a verdade, não é mais. E a única razão de ter vindo

aqui foi para dizer que sinto muito pelo que aconteceu com você. Sinto mesmo, de

verdade.

Ele desvia o olhar, range os dentes, chuta o cobertor e diz:


— Bem, nem deveria sentir nada! Só tem uma coisa pela qual deve se sentir

culpada, gata, e é pelo que fez com Drina. Pode me poupar de todo o restante.

Não estou nem um pouco interessado nas dádivas que equivocadamente

concedeu aos pobres, destituídos e oprimidos. Não preciso de sua compaixão. Se

não percebeu, não sou mais aquele menino. Tenho certeza que pode ver isso.

Ever, olhe para mim. — Ele sorri e abre bem os braços, convidando-me a prestar

bastante atenção em sua inegável boa forma. — Estou melhor do que nunca. Estou

assim há séculos.

— E é isso. — Inclino-me em sua direção. — Você vê tudo como um grande

jogo, como se a vida fosse um tabuleiro, e você, a peça que tem sempre que estar

três passos à frente de todas as outras. Nunca baixa a guarda, nunca se permite

ficar próximo de alguém... e não faz ideia de como é amar ou ser amado, já que

nunca recebeu amor de ninguém. Quer dizer, claro que poderia ter feito escolhas

diferentes, e não há dúvida de que deveria ter feito, mas ainda assim é um pouco

difícil oferecer o que nunca teve, o que nunca experimentou, e eu o perdoo por

isso.

— O que é isso? — Ele olha para mim, furioso. - Show de talentos? Vai

cobrar alguma coisa por essas psicobaboseiras ridículas? É isso?

— Não — digo, com a voz calma, olhos fixos nos dele. —- Só estou tentan-

do dizer que acabou. Eu me recuso a continuar lutando contra você. Escolho, em


vez disso, amar e aceitar quem você é. Goste ou não.

— Mostre — ele diz, voltando a alisar a cama. — Por que não sobe aqui e

me mostra esse amor, Ever?

— Não é esse tipo de amor. É amor real. Incondicional. Sem críticas ao

amor físico. Amo você como uma alma semelhante a mim, que habita este mundo.

Amo você como outro imortal. Amo você porque estou cansada de odiar, e me

recuso a continuar fazendo isso. Amo você porque finalmente entendi o que

tornou você quem é. E, se pudesse mudar isso, mudaria. Mas não posso ... então,

em vez disso, escolho amar. E minha esperança é que, ao aceitar você como é, eu o

estimule a fazer algo de bom também, mas se não acontecer ... — Dou de ombros.

— Ao menos posso dizer que tentei.

— Nossa — ele resmunga, revirando os olhos como se minhas palavras não

fizessem nada além de lhe causar dor. — Alguém andou bebendo suco hippie! —

Ele balança a cabeça e ri, e ao se acalmar olha para mim e diz: — Tudo bem, Ever,

você me ama e me perdoa. Bravo. Muito bem. Mas, para sua informação, ainda

não vai ganhar o antídoto, certo? Ainda me ama? Ou voltou a me odiar? Quão

profundo é seu amor, Ever... citando o verso de uma música dos anos setenta que

tenho certeza de que você nunca ouviu. — E solta as mãos sobre o colo, deixando-

as abertas, relaxadas. — Tenho pena da sua geração. Todo esse lixo de música que

escutam. Devia ouvir a banda que Haven foi ver... os Mighty Hooligans? Que tipo

de nome imbecil é esse?


Apenas dou de ombros. Sei quando está usando uma tática de fuga, mas

não importa o quanto tente, recuso-me a ser jogada para fora da pista como ele

quer fazer.

— A escolha é sua — digo. — Não estou aqui para pedir nada a você.

— Então está aqui para fazer o quê? Qual é a intenção desta sua visitinha?

De acordo com o que diz, não está atrás do antídoto, não está atrás de uma

transa, embora me pareça bem óbvio que precisa desesperadamente de uma. Só

entrou aqui e invadiu minha privacidade para poder dizer que me ama? É sério,

Ever? Porque, lamento informar, mas acho isso tudo meio difícil de engolir.

— Claro que acha — digo, completamente inabalada. Isso é bem o que eu

esperava, tudo está caminhando exatamente como eu havia planejado. — Mas só é

assim porque nunca experimentou isso. Seiscentos anos e nunca teve um

momento de amor real e verdadeiro. É triste. Trágico mesmo. Mas a culpa não é

sua. Então, só para ficar registrado, é isso o que se sente, Roman. É com isso que

se parece. Só quero que saiba que, apesar de tudo o que fez, eu o perdoo. E porque

eu o perdoo, porque liberto você, não consegue me atingir nem me machucar

novamente. Se nunca me der o antídoto... bem, Damen e eu daremos um jeito de

superar, porque é o que as almas gêmeas fazem. O amor real é assim. Não pode

ser destruído, não pode ser enfraquecido, é eterno, perene, e capaz de suportar

qualquer tempestade. Então, se está determinado a continuar desse jeito, só quero


que saiba que não vai sofrer oposição de minha parte. Cansei disso tudo. Tenho

uma vida para viver... e você?

Ele olha para mim e, por um breve momento, sei que o convenci. Vejo o

lampejo em seus olhos, uma pontinha de compreensão de que o jogo terminou.

Que são necessários dois jogadores, e um acabou de se retirar. Mas então, quase

tão rápido quanto veio, foi embora, e o velho Roman retoma, dizendo:

— Fale a verdade, gata... tudo isso é sério? Está querendo me dizer que pla-

neja passar o restante de sua vida imortal conformada em apenas andar de mãos

dadas? Bem, nem isso você pode fazer... mesmo com a camisinha de energia que

criou... não tem nada a ver com o contato de verdade, não é? Nada parecido com

isso.

E antes que eu perceba, ele está a meu lado, agarrando minha perna, com o

olhar penetrante, intenso, direto em meus olhos, e diz:

— Talvez eu nunca tenha conhecido o tipo de amor de que está

tagarelando a respeito, mas tive muito do outro tipo, deste tipo. - E move os dedos

mais para cima. — E estou dizendo, gata, como substituto é tão bom quanto, se

não for melhor. E não consigo aceitar a idéia de que você possa perder a chance de

ter isso.

— Então me dê o antídoto e não terei que perder — digo, sorrindo com

doçura, sem tentar tirar seus dedos de minha pele. É o que ele quer que eu faça.
Quer que eu me desespere e resista. Que o arremesse contra a parede. Que me

torne uma ameaça. A rotina habitual. Mas não desta vez. Não mesmo. Desta vez

tenho muito a provar. Muito a perder. Além disso, estou prestes a mostrar a ele

como o jogo pode ser chato quando só uma pessoa decide jogar.

— Gostaria disto, não? De vencer esta?

— É um ganho mútuo, não acha? Você faz algo de bom, algo de bom será

feito para você.. é carma. É um efeito cascata. Não falha.

— Ah, voltamos para aquilo, não é? — Ele revira os olhos. — Eu disse,

Damen realmente estragou você.

— Talvez. — Sorrio, recusando-me a morder a isca. — Ou talvez não.

Nunca se sabe como é até experimentar, certo? — O quê? Acha que nunca

fiz nada de bom?

— Acho que já tem um tempo que não faz. Deve estar meio enferrujado.

Ele joga a cabeça para trás e ri, mas não afasta a mão, não, ela permanece

bem ali, alisando minha coxa.

— Tudo bem, Ever, falando hipoteticamente, digamos que eu faça uma

coisinha por você. Digamos que eu lhe dê o antídoto que permitirá que você e

Damen transem até cansar. E então o quê? Quanto tempo vou ter que esperar até

esse suposto carma bom voltar para mim? Pode me dizer?

Dou de ombros.
— Pelo que vi, não pode forçar o carma. Ele funciona em seus próprios

termos. Tudo que sei é que funciona.

— Então eu devo simplesmente entregar uma coisa a você, algo que quer

desesperadamente, e arriscar não ganhar nada em troca? Isso não parece justo,

gata, então talvez deva reconsiderar, talvez haja algo que possa me dar. — Ele

sorri, escorregando as mãos mais para cima, muito mais para cima, para cima

demais. E quando olha fixamente em meus olhos e tenta me dominar, atrair-me

para dentro de sua mente como costumava fazer ... não funciona. Permaneço

exatamente onde estou, parada no lugar.

E esse simples ato faz brotar uma ideia, que pode fazer as coisas acontece-

rem mais rápido do que eu esperava e me levar para o Montage, onde disse a

Damen que nos encontraríamos.

— Bem — digo, fazendo o melhor que posso para ignorar a sensação de

seus dedos em minha coxa. — Se não acredita no carma, pelo menos acredita em

mim?

Ele olha para mim com a cabeça virada, a tatuagem de Ouroboros

aparecendo e sumindo.

— Porque, pense nisto, eu tenho algo para dar a você. Algo que tenho

certeza de que quer. Algo que só eu posso oferecer.

— Finalmente! — Ele sorri. — Agora, sim. Sabia que uma hora ia mudar de

ideia, sabia que veria a luz. — E salta para ainda mais perto, apertando minha

perna com mais força.

Mas permaneço sentada, respirando de maneira firme e calma, ciente da

luz que ainda brilha dentro de mim, e digo:


— Não é isso... é. . é algo bem melhor. Ele estreita os olhos.

— Não seja tão exigente consigo mesma, Ever. A primeira vez sempre é

uma droga. Prometo que vamos ter muitas oportunidades para você aperfeiçoar

suas habilidades e melhorar.

E, embora ele ria enquanto diz isso, obviamente esperando que eu ria

também, não o faço. Ainda estou pensando a respeito do que acabei de dizer, um

novo plano se formando em minha mente. Sei que não vai ser exatamente o que

ele espera, e talvez faça com que me odeie mais ainda, mas, mesmo assim, é a

única forma que consigo imaginar para que ele se conecte... bem, se é que alguém

pode mesmo se conectar com uma alma perdida, quer dizer...

— Solte minha perna. — Meus olhos estão fixos nos dele.

— Ah, droga! — Ele balança a cabeça. — Está vendo, eu sabia que você era

cheia de... você não faz nada além de provocar, Ever, sabia disso? Nada além de...

— Solte minha perna e segure minhas mãos — digo com a voz calma e

determinada. — Confie em mim, não tem nada a perder, prometo.

Ele hesita, mas só por um instante, e faz o que pedi. Nós dois nos sentamos

na cama com as pernas cruzadas, meus joelhos nus encostados nos dele, suas

mãos segurando as minhas, toda a cena me lembrando vagamente do feitiço de

amarração que deu início a toda essa confusão.

Só que não é nada parecido com aquilo.


Nada mesmo.

Eu prestes a dar um enorme salto de fé. Estou prestes a compartilhar =:

Rornan algo que, definitivamente, vai fazê-lo me dar o antídoto. Olho bem nos

olhos dele e digo:

— Seu argumento é falho.

Ela aperta os olhos.

— Seu argumento. Sobre não haver nada além do aqui e agora. Se acredi-

tasse mesmo nisso, por que estaria tentando se conectar com Drina? Se realmente

acreditasse que não há nada além disso, do plano terreno onde estamos agora,

então com o que exatamente está tentando se conectar?

Ele olha para mim, evidentemente desnorteado, e diz:

— A essência dela... a... — Ele balança a cabeça, tenta largar minhas mãos,

mas eu as seguro com mais força. — Que diabos é isso? — ele pergunta,

claramente aborrecido comigo.

— Não termina aqui, Roman. Há mais, muito mais. Mais do que poderia

imaginar. O que você vê aqui... é apenas um pontinho minúsculo em uma tela

muito maior. Mas tenho a sensação de que, não importa o que eu diga, você já

sente isso. E por já sentir, está aberto à ideia. E então, com isso em mente, imagino

que possamos fazer algum tipo de acordo.

— Eu sabia! — Ele ri e balança a cabeça. — Sabia que não havia desistido.


Nunca diga nunca, certo, Ever?

Mas apenas ignoro e sigo em frente, dizendo:

— Se eu levar você até Drina, se mostrar onde ela está, você me dá o

antídoto? Ele larga minhas mãos, fica com o rosto pálido, surpreso, claramente

lutando para continuar firme. — Está me sacaneando?

— Não. — Balanço a cabeça. — Não estou. Mesmo. Juro.

— Então por que está fazendo isso?

— Só porque parece justo. Você me dá o que eu mais quero e eu dou a você

o que mais quer. Pode não gostar do que vai ver, é até provável que acabe me

odiando... mas estou determinada a tentar a sorte. E prometo que darei uma visão

completa, sem obstáculos. Não esconderei nada.

— E... e se você me der o que quero e mesmo assim eu não lhe der o an-

tídoto? E aí?

— Mostrará que o julguei mal. — Dou de ombros. - Então vou embora sem

nada. E não vou odiá-lo, não o perturbarei outra vez. Mas acho que você

definitivamente vai acreditar em carma depois de experimentar os efeitos de um

ato como esse. Então... está pronto?

Ele olha para mim por um longo momento, pesando as possibilidades,

refletindo, até que finalmente concorda e, olhando fixamente em meus olhos, diz:

— Quer saber onde guardo?


Engulo em seco. Minha respiração acelera.

— Bem aqui. — Ele vai até o criado-mudo, abre a gaveta, puxa uma pe-

quena caixa revestida de veludo, incrustada de pedras preciosas, e retira dali um

pequeno frasco cheio de um líquido opaco que parece bastante com elixir, só que

verde.

Observo enquanto ele o agita na minha frente, vejo o líquido borbulhar e

brilhar, e mal posso acreditar que a solução de todos os meus problemas é tão

pequena e contida.

— Achei que tinha dito que não o guardava aqui — digo, e minha boca

seca de repente enquanto assimilo o que vejo, o brilho suave do antídoto bem à

minha frente.

— E não guardava. Não até aquela noite. Antes disso, guardava na loja.

Mas é isso, gata, uma única dose sem receita conhecida, a lista completa

dos ingredientes existe apenas aqui. — Ele aponta para sua cabeça e me olha com

cuidado. - Então temos um acordo, certo? Mostre o que tem... e eu lhe dou o que

tenho. — Ele sorri, colocando o antídoto no bolso da camisa, e olha fixamente para

mim enquanto diz: — Mas você primeiro. Cumpra sua parte do acordo. Leve-me

até ela ... e o ―felizes para sempreǁ será seu.

Capítulo 34

— Feche os olhos — sussurro, segurando as mãos geladas de Roman entre


as minhas, nossos joelhos colados, nosso rosto tão perto um do outro que posso

sentir sua respiração fria. — E agora abra sua mente. Livre-a o máximo que puder

de todos os pensamentos externos. Apenas a esvazie, deixe-a em branco, livre-se

de tudo e apenas... seja. Entendeu?

Ele confirma com a cabeça, apertando mais ainda meus dedos. Está tão

concentrado nisso, quer tanto saber onde Drina vive agora, que é de partir o

coração.

— Agora, quero que entre em minha mente. Vou abaixar meu escudo e

permitir que entre, e.. estou avisando, Roman... pode não gostar do que vai ver,

pode ficar com muita raiva de mim, mas quero que se lembre que estou honrando

minha parte do trato, certo? Nunca disse que você iria gostar, só que eu o levaria

até onde ela está. — Abro um dos olhos e vejo ele confirmar com a cabeça mais

uma vez. — Certo, então, agora... venha ... encontre devagar um caminho... está

me acompanhando?

— Estou — ele sussurra. — Estou... é tão escuro... tão... não consigo

enxergar nada... e estou caindo... tão rápido... tão onde?

— Logo vai acabar... apenas aguente firme — tento convencê-lo.

Sua respiração fica mais rápida, e a frieza de sua expiração, uma nuvem

gélida de fumaça, atinge meu rosto.

— Parou a queda... mas ainda está tão escuro... e tão... estou... suspenso...
e... sozinho tão sozinho... mas não estou há mais alguém aqui... ela está aqui... e...

oh, Deus... Drina... onde você está... — Ele agarra minhas mãos com força, aperta

tanto que ficam quase dormentes, sua respiração se torna mais curta, irregular,

seu corpo ensopado pelo suor devido ao esforço, e então ele desaba sobre mim,

levado pelos eventos que se desenrolam em minha mente...

Na mente dele... uma excursão sem paradas por Shadowland, o abismo

infinito, o lugar de descanso final para todas as almas imortais... incluindo a

nossa.

Ele resmunga uma sequência de palavras tão baixo que não consigo enten-

der, só noto pelo tom que são agitadas, perturbadas, infelizes. Roman paira na

escuridão, movendo-se com dificuldade e se agarrando, procurando desespe-

radamente por ela. Pressiona a testa contra a minha, com o nariz apoiado em

minha bochecha, os lábios tão próximos, toda a sua energia e força concentradas

nela.

E é desse jeito que Jude nos encontra.

É isso o que ele vê.

Roman e eu juntos, suando nos lençóis dele, nosso corpo bem juntinho,

agarrado um ao outro, ambos tão concentrados na visão que não notamos Jude,

não o ouvimos, até que seja tarde demais.

Tarde demais para impedi-lo.

Tarde demais para desfazer o que ele faz.

Tarde demais para recuar no tempo e voltar atrás... voltar para o que era

antes... quando estava tão perto. . tão perto de conseguir o que eu queria.

Antes que eu perceba, sou arrancada dos braços de Roman, e Jude vai para
cima dele, o punho direcionado para o centro de seu tronco, e não consegue ouvir

meu grito.

Meu grito cheio de agonia:

— Nããããão!

O som enche o quarto e ecoa de novo e de novo.

Esforço-me para me levantar... para tirá-lo de lá... para impedi-lo de levar

aquilo adiante... mas é tarde demais. Por mais rápida que eu seja, não consigo

acertá-lo... demorei demais para reagir... fui posta fora de combate... e Jude já está

lá.

Já está em cima de Roman.

Já está acertando um soco em seu centro sacral. Seu chacra mais fraco.

Seu calcanhar de aquiles.

O centro do ciúme, da inveja e do desejo irracional de possuir.

O conjunto de necessidades que dirigiu as ações de Roman nos últimos

seiscentos anos.

O maravilhoso garoto dourado se transforma imediatamente em uma pilha

de poeira.

Pulo sobre Jude, agarro-o pelos ombros e o arremesso do outro lado do

quarto, ouvindo um som fraco de algo quebrando quando ele aterrissa sobre a

cômoda, mas não me preocupo em olhar para trás. Concentro-me apenas em uma
coisa, a camisa de linho branca de Roman cintilando com os pequenos cacos de

vidro enquanto uma escura mancha verde se espalha por ela.

O antídoto.

O frasco do antídoto foi quebrado... destruído na briga... levando embora

minhas esperanças.

E agora que Roman se foi, que sua alma partiu para Shadowland, não há

mais jeito de recuperá-lo, nunca mais.

— Como pôde? — Eu me viro para Jude com os olhos em chamas. -

Como pôde Jazer algo assim? — Vejo que ele tem dificuldade para se

levantar, o rosto pálido, esfregando as costas. — Você destruiu tudo. Tudo! Estava

tão perto ... tão perto de conseguir o antídoto ... e você o destruiu! Para sempre!

Jude olha para mim com as mãos nos joelhos, as sobrancelhas unidas,

lutando para recuperar o fôlego, e diz:

— Ever... eu... eu não pretendia... — Ele balança a cabeça. — Precisa

acreditar em mim. Pensei que você estivesse com problemas... parecia que estava

com problemas! Não viu o que eu vi... você estava... ele estava em cima de você...

— E balança a cabeça. — E parecia que você estava lutando... por dentro, como se

não conseguisse lidar com aquilo, não conseguisse combater a atração que sentia

por ele. E foi por isso que vim. Foi o único motivo de eu estar aqui. Sabia para

onde você estava indo quando saiu da loja e não achei que estivesse pronta para
tentar isso novamente. E quando cheguei aqui ainda agora ... e vi você daquele

jeito... bem, não queria que terminasse como da última vez e então... eu só... eu...

— Então você o matou? — Arregalo os olhos e minha garganta seca. Usou

tudo que compartilhei com você contra mim e o matou?

Ele balança a cabeça e fica parado na minha frente. Está com a camiseta ras-

gada por eu tê-lo agarrado e jogado do outro lado da sala, a aura tremulando de

angústia enquanto ele não para de mexer no anel de malaquita verde que tem na

mão que usou para matar Roman.

— Você sempre vive falando sobre como ele é mau... diabólico... que lidera

uma tribo de imortais perigosos ... e que, por culpa do encanto que lançou, parece

não ter como resistir a ele. Você pediu ajuda a mim. Confiou primeiro em mim...

não em Damen. Escolheu a mim, Ever, goste ou não disso! E tudo que eu quis

fazer foi salvar você... de Roman... de si mesma. Minha única intenção era... cuidar

de você... proteger você!

— Era? — Estreito o olhar, uma nova ideia começando a tomar forma. - Era

mesmo sua única intenção? De verdade?

— Do que está falando? — Ele revira os olhos, apertando os lábios e

tentando entender minhas palavras.

— Sabe exatamente do que estou falando — digo, o corpo tremendo de

raiva, revolta e frustração, agarrada à camisa de Roman, a camisa manchada de


antídoto. - Fez isso de propósito. — Olho para ele, sem ter uma prova real de que

seja verdade, mas, ainda assim, depois de ter dito as palavras em voz alta, a ideia

começa a ganhar força e corpo, tanto que eu rapidamente as repito, arriscando-me

mais ainda ao continuar: — Fez isso de propósito. Não foi um engano. Sabia exa-

tamente o que estava fazendo quando veio para cá. Então é assim? É assim que

acha que vai ganhar um jogo de quatrocentos anos? Essa é sua grande jogada?

Tirar de mim, da garota que supostamente ama, aquilo que eu mais quero neste

mundo? Assegurando-se de que eu nunca, nunca mais possa ficar com Damen? É

desse jeito que está jogando, Jude? Realmente acha que isso vai fazer com que eu

desista de minha alma gêmea e escolha você?

Balanço a cabeça e olho para a camisa de Roman, e meu coração quase para

quando vejo a mancha que se espalha por ela, quando penso na vida triste e

patética de Roman e no que agora aconteceu com sua alma. Sei que estava perto,

tão perto de estabelecer uma conexão com ele, de fazer a diferença, de conseguir o

que quero... e agora isso.

Tudo perdido em um instante.

— Ever... — Jude implora, a dureza de minhas palavras refletida em sua

voz, em seus olhos, quando ele caminha em minha direção. Seus braços buscam

por mim, mas não o deixo chegar perto, não deixo que me toque. — Como pode

dizer isso? — ele pergunta, finalmente parando, reconhecendo a derrota. — Eu

amo mesmo você. Sabe disso. Amei você por séculos, é verdade. Mas não armei a

situação intencionalmente, para afastar você desse jeito de Damen. Você é

importante demais para mim para eu fazer isso, e eu valorizo sua felicidade, como

já disse antes. E quando você finalmente fizer sua escolha, quando escolher entre
nós dois, quero que seja justo. Desta vez, estou determinado a fazer com que seja

justo.

— Mas eu já escolhi — digo, minha voz agora um sussurro. Não desejo

mais brigar. Estou me levantando da cama, ainda agarrada à camisa, quando

Haven chega e me pega ali.

Seus olhos ardem enquanto ela observa a cena, imediatamente

preenchendo as lacunas e juntando as peças quando vê a camisa de Roman em

minhas mãos. — O que você fez? — diz, com a voz tão grave, tão ameaçadora,

que um arrepio percorre minha espinha. — O que diabos você fez?

Ela puxa a camisa e a aperta contra seu peito coberto de renda enquanto

seu olhar me avalia, presumindo que eu seja a culpada e ignorando quando Jude

tenta sé aproximar e assumir toda a responsabilidade.

— Eu devia ter percebido. — Ela balança a cabeça, os olhos quase comple-

tamente cerrados. — Devia ter percebido o tempo todo... quando foi à minha casa

e tentou ser gentil.. não estava sendo nem um pouco sincera... estava me usando,

brincando comigo, tentando extrair informações ... tentando perceber quando eu

ia sair para poder pegar Roman sozinho e então... então matá-lo.

— Não é o que está pensando! — grito. — Não é nada disso! — Mas não

importa quantas vezes eu repita, ela não aceita. Já formou sua opinião sobre mim,

sobre Jude, sobre tudo o que acaba de acontecer.


— Ah, é exatamente o que estou pensando. — Ela me fuzila com os olhos,

as mãos segurando os quadris cobertos de couro brilhante. — Exatamente. E

acredite em mim, Ever, não vai se safar desta. Não desta vez. Não vai mais

interferir em minha vida. Não vai mais tirar de mim as pessoas de quem eu gosto.

Isto é guerra. Uma guerra definitiva. Vou fazer com que sua vida seja tão infeliz

que vai desejar que seu único problema fosse não poder tocar em seu namorado.

Não se engane: nunca viu algo como o que eu pretendo fazer com você. — Ela

ergue a sobrancelha e mostra os dentes. — E Jude? — Sem perder tempo, ela se

dirige a ele pela primeira vez desde que chegou. — Vai lamentar não ser imortal,

porque, depois desta noite, não vai ser capaz de suportar o que está prestes a

acontecer com você.

Capítulo 35

— Então funcionou — diz Damen, com a voz suave, distante. — Realmente

existia.

Eu respiro fundo e olho para meus joelhos, meus pés enroscados em cima

do banco macio de couro do carro, lembrando como ele me encontrou justamente

quando eu estava deixando a casa de Roman, Jude atrás de mim, enquanto Haven

continuava a gritar toda uma lista de ameaças parada na porta. Chegou apenas

segundos depois de o filme acabar. Nem se deu o trabalho de passar no Montage,

onde eu planejara nosso encontro, sentindo que havia algum problema no


momento em que leu minha mensagem.

Olho em direção à minha casa, lembrando aquele momento de triunfo,

quando tudo se resolveu, quando o antídoto estava praticamente comigo. Apenas

para dar tudo errado em seguida.

Nossos sonhos foram arrancados de nossas mãos naquele horrível instante.

Balanço a cabeça e suspiro, ciente de que amanhã de manhã terei de

encarar Sabine. Vou precisar falar a verdade sobre meu emprego, minhas

habilidades paranormais, meu bico como Avalon... e pensar em como algumas

horas antes eu achava que esse seria o pior de meus problemas.

— Funcionou mesmo, de verdade — digo, encontrando o olhar de Damen,

não só querendo, mas precisando que ele acredite. — Ele tinha o antídoto,

mostrou para mim e tudo mais. Era tão, tão pequeno... só um minúsculo frasco

cheio de um líquido verde e borbulhante. — Dou de ombros. — E então ele

colocou o vidrinho no bolso e.. — Engulo em seco, sem querer viver aquilo outra

vez. Pelo menos não verbalmente. Não quando a cena continua se repetindo

várias vezes em minha cabeça.

Ele franze a sobrancelha, pois já viu o que aconteceu quase tantas vezes

quanto eu.

— Então Jude apareceu... — Ele suspira e balança a cabeça. Olha para mim

com desgosto, dentes cerrados de um jeito que nunca vi. — Por que confiou nele?
Por que revelou a ele nossas fraquezas... nossos chacras... como nos derrotar? Por

que você faria uma coisa dessas? — E olha para mim, desesperado para entender.

Engulo em seco, tentando desfazer o grande nó em minha garganta, e

penso:

Bem, aí está... a culpa que estive procurando todo esse tempo. Ele

finalmente está me julgando... mas desta vez mais pelo que Jude fez do que pelo

que eu fiz.

E quando olho para ele de novo, vejo que não é isso. Ele está simplesmente

tentando encontrar um sentido em tudo. Ainda assim, apenas dou de ombros e

digo:

— É meu quinto chacra. Meu ponto fraco. Sou péssima para discernir, uso

as informações do jeito errado e, aparentemente, confio em todas as pessoas

erradas em vez de confiar naquelas que foram leais o tempo todo. — Olho de lado

para Damen, sei que ele precisa de mais, merece mais, então abaixo a cabeça e

continuo: - A verdade é que ele me pegou em um momento de fraqueza... — Faço

uma pausa, lembrando o quanto aquele era mesmo um momento de fraqueza...

como cheguei perto de cruzar a ponte que leva para o outro lado. E embora tenha

contado a Damen tudo sobre a magia e sobre ter procurado Jude antes de

procurar por ele, não consegui contar aquela parte, principalmente por estar

muito envergonhada. — Um momento de incrível fraqueza. — Suspiro. — O que

posso dizer?

Damen se vira, fazendo ranger o assento de couro, e olha para mim.


— E eu aqui torcendo para que você tivesse aprendido a confiar em mim o

suficiente para me procurar nos momentos de fraqueza, e não Jude. — Sua voz é

tão tranquila, tão solene, que parte meu coração ouvir as palavras sendo ditas em

alto e bom som.

Fecho os olhos e me recosto no assento, sinto as lágrimas que ameaçam

aparecer e sussurro:

— Eu sei. Devia ter contado a você. Mas apesar de todas as garantias que

me deu, apesar do que me disse, eu simplesmente não acreditei... não pude

acreditar. Não achava que merecia isso. E, Damen, se acha que sabe a pior parte,

bem, pense novamente. Receio que as coisas tenham ficado ainda piores...

Eu me viro até ficar cara a cara com ele e pressiono as mãos contra suas

bochechas. Ciente do véu de energia que agora paira entre nós, permitindo que eu

quase sinta sua pele, e sabendo que é isso mesmo - isso é o máximo que

conseguiremos ter. Não tenho opções... nós não temos opções. Roman está morto

e levou o antídoto consigo. Então respiro fundo, fecho os olhos e compartilho

tudo. Cada um dos momentos horríveis e humilhantes é revelado, fluindo de

minha mente para a dele. Passo a versão sem cortes, aquela noite terrível com

Roman, em que quase perdi minha virgindade, seguida da cena na Ponte das

Almas - cada horrível segundo revelado em alta definição, em sua degradante

glória. Sei que ele merece saber a verdade sobre mim: o que eu fui, onde estive e
quem sou agora. Toda a sórdida jornada.

E quando termina, ele apenas dá de ombros, segura minhas mãos e diz: -

Nada disso muda minha opinião sobre você. Nem um detalhe sequer. Concordo

com a cabeça, ciente de que é verdade. Finalmente entendo o que é realmente um

amor verdadeiro e incondicional.

— Ever — ele diz, com urgência na voz, o olhar fixo no meu. — Você

precisa repensar o jeito como vê a si mesma e as escolhas que fez.

Reviro os olhos, sem entender muito bem.

— O que você vê como erros enormes, gritantes... bem, não são erros, de

modo algum. A realidade nada tem a ver com o jeito como escolheu enxergá-la.

Você acha que fez uma coisa horrível ao me dar o elixir de Roman para beber,

quando a verdade é que salvou minha vida! Evitou que eu fosse para

Shadowland! Não teria resistido até Romy voltar, mesmo com o círculo mágico

que Rayne havia feito. Estava perdendo e retomando a consciência. Nem aqui,

nem lá, e se você não tivesse feito o que fez, quando fez... se tivesse se recusado a

me deixar beber... bem, eu teria morrido, e minha alma teria sido perdida,

abandonada, deixada à deriva no escuro e na solidão por toda a eternidade.

Olho para ele com os olhos arregalados por nunca ter pensado nisso. Estive

tão ocupada me autoflagelando, concentrada em como não podíamos mais tocar

um no outro da forma que queríamos, que deixei de perceber que, na verdade,


impedi que sua alma fosse parar naquele abismo para todo o sempre.

— E tem mais. — Ele leva a mão até meu queixo, o quase toque de seus

dedos causa uma onda quente de formigamento. — Você conseguiu falar com

Roman de verdade! E teve sucesso sem trapacear e sem usar uma esperteza

calculada, mas recorrendo ao mais profundo senso de humanidade que havia

nele... uma humanidade que o restante de nós não conseguiu enxergar e que

tínhamos certeza de que nem existia. Mas você foi capaz de ir mais fundo que isso

e enxergou o que não conseguimos. Você viu potencial na pessoa que todos nós

desprezamos. Tem idéia de como isso é fantástico... de como isso me deixa

orgulhoso?

— Mas e a transformação de Haven? — sussurro, lembrando-me da amea-

ça que ela fez e sem ter dúvida de que pretende cumpri-la.

— Não fiz a mesma escolha quando salvei você? — ele pergunta, os lábios

ao pé de minha orelha.

— Mas você não sabia sobre Shadowland. Eu sabia, e condenei a alma dela.

— Dou de ombros, distanciando-me para ter uma visão melhor de seu

rosto.

Mas Damen apenas balança a cabeça e me puxa de volta para perto dele. —

Sei que disse para você agir de outra forma, mas se estivesse em seu lugar teria

feito o mesmo. Onde há vida há esperança, certo? Pelo menos esse tem sido meu
lema nos últimos seiscentos anos.

Encosto-me nele, coloco minha cabeça no vão de seu ombro enquanto olho

na direção da casa e vejo a luz do quarto de Sabine se apagar. Aperto a mão de

Damen e digo:

— Romy e Rayne estavam certas, sabe? Sobre a magia. Se for usada por

motivos egoístas e malignos, termina em um carma que volta triplicado.

Mudamos de posição, nossos olhares se encontram enquanto o ar se torna

pesado entre nós.

— O primeiro foi quando fui obrigada a ficar naquela situação com Haven

e a mudei, transformei minha melhor amiga em uma adversária determinada a

me destruir. O segundo foi minha atração por Roman, a chama negra que

queimou dentro de mim. E agora... e agora isso... Roman... a morte da alma dele e,

junto com ela, a destruição do antídoto. — Olho para ele. — Quer dizer, esse é o

terceiro, certo? Ou minha atração por ele era uma coisa só minha? Um monstro

que eu mesma criei, uma sombra de mim que já existia, e agora ainda há mais um

carma por aí, em algum lugar, esperando apenas pelo momento certo para nos

atacar de volta? Alguma fatalidade que não notaremos até que seja tarde demais?

Luto para recuperar o fôlego, subitamente tomada pelo pânico, o mau pres-

sentimento de que ainda não acabou, de que há mais a caminho, e que está vindo

em nossa direção.

Logo sou confortada pela sensação de seus braços fortes me segurando

com força, o formigamento e o calor, e por saber que agora há uma luz branca e

brilhante acesa dentro de mim. E por isso, por tudo que passei, agora sou forte o

bastante para enfrentá-lo... meu carma, meu destino, em qualquer forma que
possa tomar ...

Sinto o hálito quente de Damen em minha orelha, ecoando meus

pensamentos ao dizer:

— De qualquer forma, enfrentaremos isso juntos. É assim que funciona

com as almas gêmeas. É o que elas fazem.

FIM

A série Os Imortais continua em: Night Star

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