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Monique Rodrigues Oliveira Silva Ensp Mest 2022

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Monique Rodrigues de Oliveira Silva

A saúde da população negra frente ao racismo institucional: um estudo de avaliabilidade


da política nacional de saúde integral da população negra no município do Rio de Janeiro

Rio de Janeiro
2022
Monique Rodrigues de Oliveira Silva

A saúde da população negra frente ao racismo institucional: um estudo de avaliabilidade


da política nacional de saúde integral da população negra no município do Rio de Janeiro

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Saúde Pública da Escola
Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, na
Fundação Oswaldo Cruz, como requisito
parcial para a obtenção do título de Mestre em
Saúde Pública. Área de Concentração:
Determinação dos Processos Saúde-Doença:
Produção/Trabalho, Território e Direitos
Humanos.

Orientadora: Prof.ª Dra. Marly Marques da


Cruz.

Coorientadora: Prof.ª Dra. Roberta Gondim de


Oliveira.

Rio de Janeiro
2022
Título do trabalho em inglês: The health of the black population in the face of institutional
racism: an evaluability study of the National Policy for Comprehensive Health of the Black
Population in the city of Rio de Janeiro.

S586s Silva, Monique Rodrigues de Oliveira.


A saúde da população negra frente ao racismo institucional: um estudo de
avaliabilidade da política nacional de saúde integral da população negra no
município do Rio de Janeiro / Monique Rodrigues de Oliveira Silva. -- 2022.
151 f. : il.color.

Orientadora: Marly Marques da Cruz.


Coorientadora: Roberta Gondim de Oliveira.
Dissertação (Mestrado Acadêmico em Saúde Pública) - Fundação Oswaldo
Cruz, Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Rio de Janeiro, 2022.
Bibliografia: f. 106-120.

1. Racismo. 2. Racismo Sistêmico. 3. Iniquidade Étnica. 4. Política de


Saúde. 5. Estudos de Viabilidade. I. Título.
CDD 305.8

Elaborada pelo Sistema de Geração Automática de Ficha Catalográfica da Rede de Bibliotecas da Fiocruz com os dados fornecidos
pelo(a) autor(a).
Bibliotecário responsável pela elaboração da ficha catalográfica: Cláudia Menezes Freitas - CRB-7-5348
Biblioteca de Saúde Pública
Monique Rodrigues de Oliveira Silva

A saúde da população negra frente ao racismo institucional: um estudo de avaliabilidade


da política nacional de saúde integral da população negra no município do Rio de Janeiro

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Saúde Pública da Escola
Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, na
Fundação Oswaldo Cruz, como requisito
parcial para a obtenção do título de Mestre em
Saúde Pública. Área de Concentração:
Determinação dos Processos Saúde-Doença:
Produção/Trabalho, Território e Direitos
Humanos.

Aprovada em: 25 de agosto de 2022.

Banca Examinadora

Prof.ª Dra. Márcia Pereira Alves dos Santos


Universidade Federal do Rio de Janeiro

Prof. Dr. Luís Eduardo Batista


Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo

Prof.ª Dra. Rosely Magalhães de Oliveira


Fundação Oswaldo Cruz – Escola Nacional de Saúde Púbica Sérgio Arouca

Prof.ª Dra. Roberta Gondim de Oliveira (Coorientadora)


Fundação Oswaldo Cruz – Escola Nacional de Saúde Púbica Sérgio Arouca

Prof.ª Dra. Marly Marques da Cruz (Orientadora)


Fundação Oswaldo Cruz – Escola Nacional de Saúde Púbica Sérgio Arouca

Rio de Janeiro
2022
À minha mãe, Antônia Rodrigues de Brito. Ao meu pai, Atenor de Oliveira: um singelo
reconhecimento à tamanha entrega.
AGRADECIMENTOS

Toda produção se dá no encontro, na sua capacidade de mobilizar ponderações, afetos,


mudanças. Agradeço a quem contribuiu com o processo de reflexão desse trabalho.
Ao Deus disruptivo, negro e favelado: companheiro na utopia da equidade.
À família: Antônia Rodrigues e Atenor de Oliveira. Mãe e Pai! Oportunizaram a relação
afetuosa com o saber, a despeito das barreiras de acesso de suas trajetórias educacionais. Rafael
Rodrigues, irmão, amigo e debatedor. Enessandro e Lucas Silva, esposo e filho: apoiadores
constantes.
Ao Pequeno quilombo “Enegrecer a ENSP”: Lidiane da Silva Bravo e Márcia Mirandela
Teixeira, vocês refletem a irmandade ubuntu. Sigamos, juntas, nesse desafio de enegrecer,
epistemologicamente, a Academia.
Às queridas e queridos: Matheus da Hora, Rita Marcos, Gilney Costa, Michelle Ribeiro,
Aglaísse Abrahão, Viviane Bakita, Maria Carolina Costa, Allessandra Falconi, Mônica Castro
Gabriele Martins, Aline Soares, Maria Catarina de Paula, Denise Risso, Elaine Lopes, Cristiane
Furriel, Denise Carvalhal, Michele Costa, Edith França, Joyce Nahoum, Elisabeth Oliveira,
Leandro Rocha, Dayane Salazar, Alana Peixoto, Gabriela Fresen, Geórgia Lau, Leandro Rocha,
Maria do Livramento (in memoriam)
Às Coordenadoras do Serviço Social do Hospital Federal Cardoso Fontes, dos últimos
dois anos, Mariana Calhau, Débora Sendra, Erika Ximenes, Gabriele Martins, que
oportunizaram uma dinâmica de trabalho compatível com a dedicação para o Mestrado. Às
Diretoras Geral e Administrativa do Hospital Federal Cardoso Fontes, até 2021, Ana Paula
Fernandes e Fabiana Fernandes, companheiras de luta na Saúde Federal.
Ao grupo de estudos “Nossos passos vêm de longe”, coordenado pela Dra. Roberta
Gondim de Oliveira. Ao grupo de estudos, coordenado pela Dra. Marly Marques da Cruz, “GE
Marlyzetes”.
À Orientadora Marly Marques da Cruz. Foram dois anos intensos em aprendizado, em
sofrimento decorrentes das crises sanitária e humanitária disparadas pela Pandemia COVID-
19. Consequentemente, não foram poucas as vezes em que considerei interromper o curso. Mas
ela, uma Intelectual fora da curva, foi capaz de compartilhar saberes, se permitir aprender com
as suas orientandas e, sobretudo, enxergá-las para além da formatação acadêmica. Sou,
imensamente, grata por esse encontro afetuoso, respeitoso, enriquecedor.
À Coorientadora Roberta Gondim de Oliveira, igualmente responsável pelo fechamento
desse ciclo, presente na minha trajetória acadêmica desde à Especialização em Saúde Pública,
quando minha orientadora. Por quem tenho um respeito e admiração ímpares, principalmente
pela escuta, respeito e a capacidade de mobilizar reflexões desgastantes de maneira singular.
Meu maior respeito à querida Roberta Gondim.
À Professora Doutora Rosa Rocha. Foi a minha orientadora e, também, coordenadora
da Especialização em Promoção da Saúde e Desenvolvimento Social. Grande mobilizadora do
meu investimento na vida acadêmica e por quem tenho profunda gratidão.
À Professora Doutora Tatiana Wargas, por todo apoio e inspiração, a quem tive o prazer
de conhecer no CESP/FIOCRUZ.
Às Professoras e Professores que, também, compuseram o processo, em especial: Rita
Borret, Ana Barbosa, Roberta Ribeiro, Sandra Regis, Márcia Teixeira, Gilney Costa, Rosely
Magalhães, Gisela Cardoso, Weslen Padilha, Santuzza Vitorino, Daniele Moraes, Renato
Bonfatti (in memoriam).
Às Bancas examinadoras, da Qualificação à Defesa: Prof.ª Dra. Márcia Pereira Alves
dos Santos; Prof.ª Dra. Tatiana Wargas Baptista; Prof.ª Dra. Rosely Magalhães de Oliveira e
Prof. Dr. Luís Eduardo Batista.
Ao corpo profissional administrativo e terceirizado da ENSP.
À Terapeuta Thayná de Andrade, implicada com a clínica antirracista: caminhou
comigo na busca pelo equilíbrio necessário para estar de pé em meio à asfixia social produzida
pelo racismo.
E, finalmente, porém não menos importante: a todas as pessoas que pavimentaram o
caminho por uma sociedade equânime, agregadora, livre da “mal querência”, do acúmulo
obstinado e deletério para a coletividade. Esse projeto societário é possível! Em nome dele,
sigo.
“Esse ato de fala, de “erguer a voz”, não é um mero gesto de palavras
vazias: é uma expressão de nossa transição de objeto para sujeito –
a voz liberta!”.
(HOOKS, 2019, p. 34).
RESUMO

A Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN) é um marco


legal para o enfrentamento do racismo institucional. Seu caráter transversal vislumbra a
superação das iniquidades raciais para além do setor Saúde. Como fruto da mobilização dos
movimentos sociais de mulheres negras, foi instituída, em 2009, pelo Ministério da Saúde, e
regulamentada, em 2010, pelo Estatuto da Igualdade Racial. O Município do Rio de Janeiro
adotou uma série de medidas que acenavam para a implantação da Saúde da População Negra,
antes mesmo da regulamentação nacional. Ao longo da pesquisa, porém, identificamos grande
fragilidade, local, no cumprimento da Política. Este trabalho objetivou realizar um estudo de
avaliabilidade da PNSIPN, no Município do Rio de Janeiro, considerando o contexto político-
organizacional de 2007 a 2021. Para tanto, o Comitê Técnico da Saúde da População Negra
(CTSPN), enquanto espaço de controle social e gestão participativa, foi o local privilegiado
para a pesquisa. Analisamos os relatórios das reuniões extraordinárias do CTSPN, de 2007 a
2021, bem como a documentação oficial que conta a história da institucionalização da
PNSIPN no Município do Rio de Janeiro. Os critérios observados, durante a análise
documental, foram: o contexto; o autor; a natureza do texto; os conceitos chave. Como
resultado, constatamos que o Município do Rio de Janeiro não incluiu, efetivamente, a Saúde
da População negra na sua agenda. Conforme pontuado pelo CTSPN, a ausência sistemática
das metas referentes à saúde da população negra - nos Planos Plurianuais, Municipais de
Saúde e Leis Orçamentárias - é indicativa da falta de vontade política em relação ao
enfrentamento da iniquidade racial oportunizada pelo racismo institucional. Ao longo dos
últimos quatorze anos, os movimentos sociais negros organizados, em articulação com
Institutos de Pesquisa e Ensino, desempenharam um papel de destaque na correlação de forças
com o Poder Municipal, sem os quais seriam impensáveis avanços como: a regulamentação
da obrigatoriedade do preenchimento do quesito raça/cor nos formulários municipais ou a
inclusão de submetas da Saúde da População Negra no Plano Municipal de Saúde (2009-
2013). Esperamos que este estudo auxilie na compreensão sobre a situação da PNSIPN no
Município do Rio de Janeiro. Almejamos, ainda, contribuir para a operacionalização do
Programa Municipal de Saúde Integral da População Negra e da Área Técnica da Saúde da
População Negra no Município do Rio de Janeiro.

Palavras-chave: racismo; racismo sistêmico; iniquidade étnica; política de saúde; estudo de


viabilidade.
ABSTRACT

The National Policy for Comprehensive Health of the Black Population (PNSIPN) is a legal
framework for confronting institutional racism. Its transversal nature envisages overcoming
racial inequalities beyond the Health sector. As a result of the mobilization of black women's
social movements, it was instituted in 2009 by the Ministry of Health and regulated in 2010 by
the Statute of Racial Equality. The Municipality of Rio de Janeiro adopted a series of measures
that pointed to the implementation of the Health of the Black Population, even before the
national regulation. Throughout the research, however, we identified great weakness, locally,
in compliance with the Policy. This work aimed to carry out an evaluability study of the
PNSIPN, in the city of Rio de Janeiro, considering the political-organizational context from
2007 to 2021. For this purpose, the Technical Committee for the Health of the Black Population
(CTSPN), as a space for social control and participatory management, was the privileged
location for the research. We analyzed the reports of the extraordinary meetings of the CTSPN,
from 2007 to 2021, as well as the official documentation that tells the history of the
institutionalization of the PNSIPN in the Municipality of Rio de Janeiro. The criteria observed
during the document analysis were: context; the author; the nature of the text; the key concepts.
As a result, we found that the Municipality of Rio de Janeiro did not effectively include the
Health of the Black Population in its agenda. As pointed out by the CTSPN, the systematic
absence of goals related to the health of the black population - in the Multi-Year Plans,
Municipal Health Plans and Budgetary Laws - is indicative of the lack of political will in
relation to confronting the racial inequity made possible by institutional racism. Over the last
fourteen years, organized black social movements, in articulation with Research and Teaching
Institutes, have played a prominent role in the correlation of forces with the Municipal Power,
without which advances such as: the regulation of mandatory filling out would be unthinkable
of the race/color item in municipal forms or the inclusion of Black Population Health sub-goals
in the Municipal Health Plan (2009-2013). We hope that this study helps in understanding the
situation of the PNSIPN in the city of Rio de Janeiro. We also aim to contribute to the
operationalization of the Municipal Program for Comprehensive Health of the Black
Population and the Technical Area of Health for the Black Population in the Municipality of
Rio de Janeiro.
Keywords: racism; systemic racism; ethnic inequality; health policy; viability study.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1- Ocupações informais por cor ou raça - 2012-2020................................... 27

Figura 2- Óbitos (COVID-19) por gênero e raça/cor: Brasil - 2020........................ 30

Figura 3- Antecedentes da PNSIPN: anos 80/90...................................................... 38

Figura 4- Antecedentes PNSIPN: anos 2000........................................................... 46

Figura 5- Implantação da PNSIPN no MRJ............................................................. 61

Quadro 1- Quadro metodológico .............................................................................. 84

Figura 6- A Saúde da População Negra no MRJ .................................................... 87

Figura 7- Ações do MRJ: Saúde da População Negra............................................. 91

Quadro 2- CTSPN no MRJ (2007-2021) .................................................................. 92


LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABRASCO Associação Brasileira de Saúde Coletiva


CAP Caixa de Aposentadoria e Pensão
CGGAP Coordenação-Geral de Garantia dos Atributos da Atenção
CIB Comissão Intergestores Bipartite
CIT Comissão Intergestores Tripartite
CNAR Consultório na Rua
CNS Conselho Nacional de Saúde
COGE Coordenação de Garantia da Equidade
CPI Comissão Parlamentar de Inquérito
CTSPN Comitê Técnico de Saúde da População Negra
DAGEP Departamento de Apoio à Gestão Participativa
DFID Departamento Britânico para o Desenvolvimento
Internacional e Redução da Pobreza
DNV Declaração de Nascido Vivo
DO Diário oficial
EA Estudo de Avaliabilidade
ENSP Escola Nacional de Saúde Pública
ESF Estratégia de Saúde da Família
FAPERJ Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro
FIOCRUZ Fundação Oswaldo Cruz
GTI Grupo de Trabalho Interministerial
IAP Instituto de Aposentadoria e Pensão
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
LGBTQIAP+ Lésbicas, Gays, Bi, Trans, Queer, Intersexo,
Assexuais/Agênero, Pan/Poli, Não-binárias e mais
MNU Movimento Negro Unificado
MS Ministério da Saúde
MRJ Município do Rio de Janeiro
OMS Organização Mundial de Saúde
ONG Organização Não Governamental
PAISM Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher
PCD Pessoa com deficiência
PCRJ Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro
PNS Política Nacional de Saúde
PNSIPN Política Nacional de Saúde da População Negra
PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PPA Plano Plurianual
SPPIR Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial
SIM Sistema de Informação sobre Mortalidade
SINASC Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos
SAS Secretaria de Assistência Social
SGEP Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa
SGP Secretaria de Gestão Participativa
SAPS Secretaria de Atenção Primária de Saúde
SUS Sistema Único de Saúde
UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro
VIGITEL Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças
Crônicas por Inquérito Telefônico
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................... 13
2 PERGUNTA DE INVESTIGAÇÃO................................................................... 24
3 JUSTIFICATIVA ................................................................................................. 25
3.1 A SAÚDE DA POPULAÇÃO NEGRA NA COVID-19........................................ 26
4 REFERENCIAL TEÓRICO-CONCEITUAL.................................................. 37
4.1 ANTECEDENTES PARA A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA PNSIPN.............. 37
4.1.1 A contribuição dos movimentos sociais negros para a SPN............................. 47
4.1.1.1 A implantação da PNSIPN no município do Rio de Janeiro.................................. 54
4.1.1.1.1 O racismo na determinação social da saúde.......................................................... 62
4.1.1.1.1.1 Avaliação em Saúde: o estudo de avaliabilidade como pré-avaliação................... 73
5 OBJETIVOS ........................................................................................................ 81
5.1 OBJETIVO GERAL.............................................................................................. 81
5.1.1 Objetivos Específicos ........................................................................................... 81
6 MÉTODO............................................................................................................. 82
6.1 PERCURSO METODOLÓGICO.......................................................................... 84
7 RESULTADOS..................................................................................................... 86
8 DISCUSSÃO......................................................................................................... 98
9 CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................. 104
REFERÊNCIAS.................................................................................................. 106
APÊNDICE – ANÁLISE DAS REUNIÕES CTSPN (2007-2021) ................... 121
ANEXO A – RESOLUÇÃO DE CRIAÇÃO DO CTSPN/MRJ ...................... 131
ANEXO B – IMPLANTAÇÃO DA PNSIPN NO MRJ..................................... 134
ANEXO C – PROJETO DE LEI Nº 873/2021 ................................................. 143
13

1. INTRODUÇÃO
A localização social é um aspecto revelador do discurso, das leituras de mundo. Por
isso, é interessante falar dos pontos de partida: sou uma mulher racializada como negra. A
armadilha do colorismo (DEVULSKY, 2021) nomeou-me “morena clara, dos traços finos”!
Crescer em Laranjeiras, bairro de classe média alta da zona Sul do Rio de Janeiro, filha de
trabalhadores subalternizados pelas métricas- xenofóbica, classista, racista, patriarcal-
burguesas, foi uma experiência paradoxal: por um lado, as melhores lembranças afetivas do
bairro arborizado, das inúmeras possibilidades de Serviços e lazer ao ar livre. Em contrapartida,
as vivências indigestas que buscavam impor o “meu lugar” inferiorizado. A despeito das
mensagens venenosas acerca do “meu lugar”, existe uma cena que ilustra a insurgência: meu
pai, o Porteiro, contando aos “doutores” sobre a aprovação dos filhos para a Universidade
Pública, onde parte deles lecionava! A alegria paternal contrastava com o choque daqueles que,
a partir do pacto narcísico do racismo (BENTO, 2022), não concebiam a novidade,
principalmente porque não existiam as políticas afirmativas de cotas. Somente hoje, consigo
reconhecer a dinâmica social que nos cercava: ainda bem! O letramento racial me acompanha
há pouco tempo, como disse, minha imagem recebeu o eufemismo racista” morena clara dos
traços finos”. Provavelmente, motivo que me levou a jamais questionar o fato da graduação em
Serviço Social da UFRJ, de 2001 a 2006, ignorar o debate racial, estando ele, curiosamente, na
coluna vertebral da luta de classes. A formação universitária destituída do debate racial teve um
preço: o fazer profissional, também, insatisfatório, sob o ponto de vista da iniquidade racial
que vulnerabiliza a população atendida pelas políticas públicas das quais sou agente. Nesse
sentido, a formação profissional antirracista é crucial, pelo potencial de gerar repercussões não
somente para as beneficiárias, como para as operadoras das políticas sociais. A mudança de
rota aconteceu na pós-graduação, quando experimentei um mergulho sobre a história da
formação social brasileira a partir do olhar da intelectualidade negra. Esse movimento trouxe
novas perspectivas e chaves de leitura que repercutiram na percepção analítica, no
redirecionamento da conduta profissional. Fechando a apresentação dos meus lugares de
partida: sou uma mulher que se tornou negra, mãe de um adolescente promissor, esposa de um
homem negro com letramento racial. Sou funcionária de carreira do Ministério da Saúde desde
2009. Por fim, e não menos importante, sou a síntese dos melhores sonhos ancestrais, pisando
onde a sua presença foi rechaçada, abrindo caminho para as novas gerações negras que
conhecem o seu lugar: onde quiserem estar.
14

Em 2019, ingressei no curso de Especialização em Saúde Pública da Escola Nacional


de Saúde Pública (ENSP/ FIOCRUZ), onde o interesse pela Saúde da População Negra (SPN)
ficou evidente. O projeto de pesquisa realizado no Mestrado foi o trabalho final da referida
Especialização.
O tema da pesquisa também se relaciona à inserção profissional como Assistente Social
da Rede Federal de Saúde e as inquietações oriundas dessa experiência: as expressões do
racismo estrutural (ALMEIDA, 2019; RIBEIRO, 2019) no cotidiano institucional.
Nesse sentido, a saúde da população negra (SPN) é o tema mobilizador da pesquisa.
Este trabalho abarca o entendimento de raça como uma construção social, uma convenção
reatualizada na modernidade (MOORE, 2009), a serviço da acumulação de riquezas e do
domínio europeu sobre as populações desumanizadas/ outremizadas (CARNEIRO, 2005;
MORRISON, 2019).
O imaginário colonial caracterizou o povo negro de maneira primária e repulsiva. A
utilização social da raça e do negro integraram o núcleo complexo a partir do qual o projeto
moderno de conhecimento e dominação se estabeleceu (MBEMBE, 2014). Ambos, raça e
negro, “figuras gêmeas, do delírio que a modernidade produziu” (Idem).
Nesse sentido, é interessante entender o desafio que se coloca para as pesquisadoras
negras, uma vez que a pesquisa atravessa essa vivência. Mais do que um objeto de estudo, a
problemática a ser estudada toca na contradição entre a intelectual racializada (KILOMBA,
2019), sujeito da pesquisa, e, em contrapartida, objetificada pelo racismo (MOORE, 2009;
CARNEIRO, 2011; ALMEIDA, 2019; BENTO, 2022). Seria ingenuidade ignorar os
desdobramentos da contradição entre ocupar o lugar de quem fala - enquanto mulher, negra e
pesquisadora - em uma sociedade sustentada pelo racismo (Idem).
De acordo com Souza (2021), a estrutura das relações raciais brasileiras é sustentada
pelo seguinte tripé: o contínuo de cor, a ideologia do embranquecimento e a democracia racial.
O contínuo de cor, grosso modo, significa a maior aceitabilidade social, conforme mais clara
for a cor da pele; a ideologia do embranquecimento, disseminada a partir da ruptura do sistema
escravocrata, buscou, de forma explícita, embranquecer a população brasileira (CARNEIRO,
2011; NASCIMENTO, A. 2016); a democracia racial consistiu no aparato ideológico voltado
à naturalização da condição degradante da população negra brasileira, a qual, segundo tal
narrativa, estaria integrada, harmoniosamente, à sociedade (idem).
É evidente que o contexto histórico e social brasileiro (CARNEIRO, 2011;
NASCIMENTO, B, 2021) é o responsável pela determinação racial dos papeis sociais que
15

perpetuam as iniquidades raciais (LOPES, 2005), como mola motora da acumulação


capitalista (MBEMBE, 2014; CÉSAIRE, 2020).
Nesse sentido, estar no impasse epistemológico, entre o negro-tema e o negro-vida,
segue como um desafio para a intelectualidade negra. Existe uma distinção entre a vida do
negro e o tema negro (RAMOS, 1995). O negro-tema é objetificado, alvo da “escalpelação
perpetrada por “literários” e “sociólogos” (...) visto, ora como ser mumificado, ora como um
risco” (Idem, p.215). Por sua vez, o negro-vida, “vem assumindo o seu destino (...) do qual
não se pode dar versão definitiva, pois é hoje o que não era ontem” (Idem, p.215).
É dado que existem lugares determinados, segundo o pertencimento étnico-racial,
especialmente no âmbito da produção acadêmica: é usual que sujeitos da raça/cor branca1
produzam conhecimento acerca do objeto negro. Sob a métrica unilateral, do norte global e,
portanto, epistemicida (NASCIMENTO, G., 2019; CARNEIRO, 2005a). Esse é o terreno
acadêmico, do qual sou integrante e, ainda, profundamente crítica, corroborando com as
análises de Carlos Moore (2009):
Não por acaso, precisamente nos meios acadêmicos – onde, do século XVII ao
Século XX, foram gestadas e organizadas ideologicamente as noções raciais que
predominam até os dias de hoje – incubam-se, atualmente, teses revisionistas, os
posicionamentos “teórico-científicos” capazes de promover a banalização e a
trivialização da escravidão racial e do racismo em geral. As elucubrações sobre a
“democracia racial”, a “raça cósmica”, as “relações plásticas” e a “mestiçagem
generalizada” surgiram justamente no mundo acadêmico- intelectual (IDEM, p.29)

São esses, até hoje, os lugares cristalizados, no processo de produção do conhecimento


ocidental: revelam um fortíssimo traço do racismo institucional (WERNECK, 2016;
ALMEIDA, 2019; BENTO, 2022) a partir do qual somos constituídos e o qual precisaremos
problematizar.
Integrar o campo acadêmico em um contexto originário de pensamento social
formado por elites intelectuais, cuja dimensão sociocultural e econômica vêm da
própria história desigual e combinada que ergueu o nosso Brasil, é o mesmo que
percorrer campos de disputa e segregação acionados por marcadores sociais da
diferença. Nessa geopolítica acadêmica um(a) intelectual negro(a) será, em algum
momento, cerceado(a) pelas próprias cercas epistêmicas de pensar, produzir e,
sobretudo, se posicionar. O preço que se paga por tentar balançar ou cortar esses
arames, que delimitam simbolicamente o saber fazer de um conhecimento que vai
na contra hegemonia dessa estrutura interseccional muito bem estabelecida nos seus
modus operandi, é o valor dos efeitos (ir)reparáveis do epistemicídio
(KATHYUSCIA, 2022, p.1).

1
Utilizo as expressões “étnico-racial negra/ étnico-racial branca/” no exercício crítico de racializar a população
branca, lida como universal (MORRISON, 2019; RIBEIRO, 2019 ALMEIDA, 2019) em sociedades nas quais
a lógica colonial ainda é dominante (CÉSAIRE, 2020). Nesse estudo, voltarei o olhar, prioritariamente, para a
saúde da população negra, sem ignorar, contudo, que a iniquidade racial também desumaniza a população
representada pelos povos originários dessa nação.
16

A partir de Jones (2002), Werneck (2016) analisa o racismo sob três dimensões
relacionais, a saber: pessoal, interpessoal e institucional A primeira diz respeito ao racismo
internalizado, expresso pela aceitação dos padrões racistas sob os quais a sociedade se ancora;
a segunda dimensão está presente no racismo interpessoal, mediado por atitudes
preconceituosas, com ou sem intencionalidade; a última dimensão, representada pelo racismo
institucional, manifesta-se por meio das políticas, práticas e normas que reforçam tratamentos
diferentes e resultados iníquos.
Nessa perspectiva, a intelectualidade negra (WERNECK, 2016; SANTOS, M. ET
AL., 2020; OLIVEIRA ET AL, 2020, BORRET ET AL., 2021) identifica o racismo
institucional materializado, cotidianamente, pelos apagamentos injustificados. Tal
identificação evidencia-se no site da Fundação Nacional de Saúde (FUNASA) 2 , quando, em
uma matéria sobre a linha do tempo da saúde pública brasileira, os marcos históricos da
PNSIPN - aprovação pelo Conselho Nacional de Saúde (2006), a publicação em Portaria do
Ministério da Saúde (2009) e a regulamentação através do Estatuto da Igualdade Racial
(2010) – são ignorados/ apagados.
Ainda que abordasse uma temática de outra natureza, no âmbito da saúde pública,
seria improvável ignorar o racismo como eixo de análise, uma vez que o “problema do negro”
(RAMOS, 1995) é, por sua vez, uma questão estrutural/estruturante, e, consequentemente,
responsabilidade da sociedade brasileira (ALMEIDA, 2019). O racismo, no marco temporal
do capitalismo, compõe as tecituras das instituições, revelando-se nos indicadores de saúde,
segundo raça/cor (CUNHA, 2012; WERNECK, 2016; BRAVO, 2018).
Nessa trama, a relevância da saúde da população negra é alvo de opiniões divergentes
(MATOS; TOURINHO, 2018), apesar da notória sub-representação no mercado formal de
trabalho, em espaços de tomada de decisões e da precarização das condições sociais (IBGE,
2019; BRASIL, 2021).
Existe um certo consenso quanto à vulnerabilização étnico-racial negra. Entretanto, as
explicações conflitantes acerca da raiz da questão demonstram, por um lado, o grau de
letramento racial (BRITO ET AL. 2018; PEREIRA; LACERDA, 2019) ou, por outra via, a
reprodução acrítica da ideologia dominante.

2
Ver em: “Cronologia Histórica da Saúde Pública: uma visão histórica da saúde brasileira”, disponível em:
http://www.funasa.gov.br/cronologia-historica-da-saude-publica Acesso: 27/04/2021
17

Trabalho com a acepção de ideologia (CHAUÍ, 2008) como um ideário construído


histórica, social e politicamente, com a finalidade de ocultar a realidade, a serviço da
manutenção da exploração econômica, da desigualdade social e da dominação política
(GONZALEZ, 2018).
Conforme Moore (2009), a banalização das expressões do racismo vem de uma
necessidade estritamente ideológica: reafirmar e consolidar a posição do segmento racial
dominante, além de deslegitimar e enfraquecer a luta reivindicatória das populações
vulnerabilizadas pelo do racismo.
Ao refletir sobre o Racismo, Sexismo e Desigualdade no Brasil, Sueli Carneiro (2011)
evoca a percepção de Joaquim Nabuco3 quanto à permanência das marcas escravocratas, no
pós- “abolição”, em razão da ausência de medidas sociais de reparação para a população
negra. Nesse sentido, a autora chama a atenção para a permanência de uma questão
importante, no âmbito dos direitos humanos: a perpetuação da ideia, originária do racismo
científico (MOORE, 2009; MORRISON, 2019; SOUZA, 2021), de que determinados seres
humanos são mais humanos do que outros, o que justificaria/ naturalizaria a desigualdade no
acesso aos direitos sociais.
A esse respeito, inclusive, são problematizadas as razões pelas quais a mobilização
planetária pelos direitos humanos foi parcial. A crítica repousa na percepção de que a violação
da dignidade humana, sofrida por povos da raça/cor branca, desencadearam, no pós-guerra,
um movimento de recusa ao horror do holocausto branco. Por sua vez, os séculos de
escravização dos povos negros, amarelos e vermelhos não despertaram tamanha “civilidade”
mundial. Algo que remete ao que Césaire (2020) nomeou, precisamente, de hipocrisia
coletiva. A comoção seletiva também é apontada por Moore (2009) ao afirmar que o racismo
é produtor de insensibilidade, na medida em que uma pessoa com capacidade de sensibilizar-
se com seus familiares, amigos e animais de estimação é, contraditoriamente, capaz de
trivializar, sem culpas, a miserabilidade de um grupo social, por ela considerado, “outro”
(MORRISON, 2019; KILOMBA, 2019).
É possível inferir sobre a passividade a respeito dos débeis índices sociais da
população negra (IBGE, 2019), que repousaria na imagética, alimentada pela ideologia
(CHAUÍ, 2008; MOORE, 2009), da sub-humanidade da raça/cor negra e do mito negro
(SOUZA, 2021).

3
Parlamentar que defendia, durante o período pré- abolicionista, a promoção de medidas reparatórias básicas,
que oportunizariam condições mínimas de sobrevivência para as pessoas que seriam retiradas da escravização
(CARNEIRO, 2011).
18

Além de procurar fixar seu modo de sociabilidade através de instituições


determinadas, os homens produzem ideias ou representações pelas quais procuram
explicar e compreender sua própria vida individual, suas relações com a natureza e
o sobrenatural. Em sociedades divididas em classes (e em castas), nas quais uma
das classes explora e domina as outras, essas explicações ou essas explicações ou
essas ideias e representações serão produzidas e reproduzidas pela classe dominante
para legitimar e assegurar o seu poder econômico, social e político (CHAUÍ, 2008,
p.24).

Por sua vez, o imaginário social coletivo precisa ser familiarizado com o fio condutor
da iniquidade racial brasileira (IPEA et al., 2014), como passo anterior à formulação de
políticas de mitigação das iniquidades raciais. Uma façanha utópica, considerando a mídia e
as instituições como veículos de manutenção do capitalismo e de seus dispositivos de
sustentação, como o racismo.
Na contramão desse cenário, o movimento negro4, com destaque para o feminismo
negro (CARNEIRO, 2003; CARNEIRO, 2011; WERNECK, 2010; RIBEIRO, 2016;
GONZALEZ, 2018), tem assumido um papel primordial para o avanço por direitos de
equidade racial. Dentre as suas frentes de atuação, está a disseminação da história social
brasileira, sob o ponto de vista dos povos vulnerabilizados (GOMES, N. 2018), além do
combate ao mito da democracia racial (MOORE, 2009).
Encontra, todavia, uma correlação de forças desfavorável ao reconhecimento da
humanidade da maioria minorizada brasileira (SANTOS, R. 2021), sob a forte influência da
ideologia dominante.
Alguns estudiosos renomados se aproveitam da falta de informação e do pouco
esclarecimento da população e do lugar de privilégio que ocupam na academia e na
imprensa para produzir discursos perversos acerca do racismo. Esses discursos
reciclam e exploram ideias e teorias superadas como as da “mistura de sangue” de
Gilberto Freire, que estão na base da criação da ideologia da democracia racial
brasileira, e as descobertas da genética humana do meio do século passado sobre a
inexistência biológica ou científica de raça. O objetivo é persuadir a população
brasileira de que a política de ação afirmativa em benefício dos negros e dos índios
vá trazer de volta a raça, como se esta já tivesse desaparecido, e vai colocar fim ao
equilíbrio, à paz social garantidos pela mistura racial (...) É interessante como eles
conseguem, pelo jogo das palavras e dos exemplos propositalmente escolhidos,
agradar a inteligência e inverter a lógica, transformando a busca pelo caminho e das
soluções em fatores causadores do problema (MUNANGA 2007, p.15-16).

A maioria minorizada (SANTOS, R, 2021) consiste no grupo social - formado por


pessoas pretas e pardas (GOMES, I.; MARLI, M., 2018). Esse agrupamento vive experiências
sociais similares: representam a maioria demográfica da população brasileira,

4
Nesse estudo, utilizo a acepção mais abrangente para “movimento negro”, composto por todas as mobilizações
coletivas, pró- equidade racial, constituídas desde à invasão europeia ao que convencionou-se chamar de Brasil
(SANTOS, J., 1985; GOMES, N.,2017).
19

em contraposição à sub-representação no acesso aos direitos básicos e à consequente


inferiorização racial. A população negra é “minoria” em relação ao acesso aos direitos básicos
de cidadania.
Nos programas de entretenimento, conversas informais ou em discursos de
representantes políticos tornou-se usual ouvir a expressão “as minorias”, “menos
favorecidos”. Não seria um problema falar em minorias se existisse a ampla circulação da
informação sobre um sistema econômico, político e social que tem como missão a
concentração da renda. Sim, o capitalismo, que produz a enorme desigualdade social e racial
do tempo presente, fornece, ainda, mitos capazes de convencer a classe trabalhadora de que
essa realidade é natural: o culto ao individualismo, à meritocracia e à democracia racial são
suficientes para a confusão que se faz em torno das ditas “minorias”. A partir dessa lógica
capitalista, as pessoas mais assoladas pela pobreza seriam as responsáveis pelas próprias
condições, uma vez que não tiveram a determinação suficiente para superar os reveses da
vida. Sob o mito da democracia racial, desconsideram os pontos de partida distintos,
determinados pela herança escravocrata que continua a distribuir as vantagens sociais por
raça/cor. O mito da democracia racial, a partir do qual, não existiria mais notícias de
diferenças entre negros e brancos no Brasil, contribui para a paralização coletiva, frente à
necessidade de enfrentamento das iniquidades raciais. A partir do mito do individualismo, o
sucesso seria pessoal e, portanto, fruto do esforço individual. Está fechado o pensamento de
criminalização e de responsabilização individual da pobreza.
Nessa perspectiva, o projeto de apagamento histórico (NASCIMENTO, G., 2019) tem
um papel central para a manutenção do árido cenário para a problematização crítica das
iniquidades raciais. Desse modo, são engendrados espaços sociais e estigmas determinados
segundo a raça/cor (CARNEIRO, 2011), a partir dos quais tornou-se palatável testemunhar a
transmissão geracional da pobreza (MOTA; PARENTE, 2018) negra.
O epistemicídio (NASCIMENTO, G.,2019; CARNEIRO, 2005a) é parte fundante do
processo de aniquilação e do apagamento da contribuição social, científica e intelectual da
população negra (ANI, 1994; JERI, 2019).
O conceito do letramento racial crítico, (PEREIRA; LACERDA, 2019) se coloca a
entender os mecanismos pelos quais as relações de poder são formadas e determinam as
identidades de raça e seus lugares sociais. Nesse sentido, a compreensão crítica a respeito da
questão racial – não identitária, mas estrutural (MACHADO, 2018) - requer um olhar
aprofundado.
20

Para tanto, é inegociável considerar a contribuição dos fatores históricos, políticos e


sociais para a formatação da sociedade contemporânea, bem como dos lugares sociais
historicamente produzidos para a manutenção/ concentração do poder da classe dominante
(Idem).
Nessa perspectiva, Oliveira (2018) afirma que a compreensão das vulnerabilidades, a
partir dos contextos histórico, político e institucional, converge com o pensamento social
latino-americano, sob o qual a Saúde Coletiva brasileira é ancorada. Assim:
O marco da saúde coletiva pode ser entendido em um enquadramento teórico-
metodológico no qual os elementos individuais e grupais são referenciados a partir
do contexto, em uma relação com a determinação social da Saúde (...) essa noção
tem por categorias analíticas a reprodução social a produção econômica e de classes.
Numa ampliação dos seus marcos analíticos, incorpora outras dimensões, como de
identidade de gênero, desigualdade ambiental, discriminações raciais (...) revisitar
o campo da saúde coletiva também pressupõe ressuscitar o sujeito do conhecimento,
implicando na inclusão de outros sujeitos do saber, não previstos na matriz da
ciência moderna, enfrentando as contradições embutidas na estrutura do saber
enquanto poder (OLIVEIRA, 2018, p.4)

Em suma, tratar da saúde da população negra, ignorando os fatores subjacentes à sua


constituição, é danoso para a construção de uma sociedade equânime, porque viabiliza
respostas simplistas, frente a problemáticas complexas: narrativas higienistas e/ou
culpabilizadoras, frente à vulnerabilização social, inclusive, oriundas de gestores das políticas
públicas (CARNEIRO, 2011; GONZALEZ, 2018).
A conduta institucional - que responsabiliza o indivíduo pela condição de pobreza -
funciona como uma cortina de fumaça para o modo de acumulação capitalista, do qual advém
a transmissão geracional da pobreza: a concentração de renda, a priorização da agenda do
mercado, os cortes orçamentários para as políticas sociais e a retirada de direitos básicos.
Sendo a população negra, historicamente, vulnerabilizada pela ausência de políticas sociais
afirmativas, a retirada de direitos sociais básicos tem repercussões ainda mais nefastas; nesse
sentido, no Brasil, classe informa cor (CARNEIRO, 2022). Essa dinâmica é ainda mais
perversa quando, no imaginário social, é trabalhada a ideia de que os investimentos sociais
destinados à população mais vulnerabilizada são benesses governamentais para pessoas que
não se esforçaram o suficiente. Em contrapartida, sob à imagem do mérito, os mega-
benefícios prestados ao alto escalão do funcionalismo público, bem como aos representantes
políticos são tolerados: faces do pacto narcísico do racismo, que normatiza as estruturas do
poder sob o domínio da branquitude (BENTO, 2022).
21

Na contramão da deliberada inércia governamental com relação à saúde da população


negra, e sob o protagonismo do movimento social negro (BRASIL; TRAD, 2012), a Política
Nacional de Saúde integral da População Negra (PNSIPN) foi regulamentada.
A título de recuperação histórica, vale pontuar que, uma vez superado o período da
escravização e instaurada a República (NASCIMENTO, A. 2016), a meta governamental não
abarcava medidas reparatórias para a população negra. Por sua vez, amparada pelo racismo
científico, buscava o embranquecimento populacional (NASCIMENTO, G. 2016;
CARNEIRO, 2011; GOES; SANTOS, 2014), através de medidas de incentivo à imigração
europeia.
No caminho para a limpeza das raças, com a eliminação dos indesejados e
degenerados e a permanência dos aptos, a sociedade brasileira utilizou de vários
caminhos para atingir este objetivo, a partir da tese do embranquecimento e pureza
racial, contando principalmente com o campo da saúde para este fim,
especificamente foram utilizadas três áreas dentro da saúde, a medicina legal,
eugenia e o higienismo (GÓES; SANTOS, 2014, p.2532)

Durante a primeira República, através da lei Elói Chaves, de 1923, a iniciativa privada
instituiu as Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAP’S), com o intuito de garantir amparos
(saúde e previdência) à uma pequena parcela de trabalhadores formais, os ferroviários.
Posteriormente, já no Estado Novo/ Era Vargas, os Institutos de Aposentadoria e Pensão
(IAP’s), sob a iniciativa governamental, abrangeram uma gama maior de trabalhadores
formais, contudo, a população negra não seria destinatária da referida proteção social, sendo
excluída das medidas governamentais de promoção do desenvolvimento social. Em
contrapartida, perpetuando, acriticamente, os estigmas depreciativos sobre a referida
população, as ações higienistas involuntárias, promovidas pelos sanitaristas da época, tinham
a população negra como público prioritário.
Não há dúvidas de que, diante de contextos endêmicos, as medidas governamentais de
mitigação são aconselháveis. Entretanto, é preciso evidenciar as motivações que priorizaram
o pleno funcionamento das atividades industriais e sua mão-de obra, em detrimento do
investimento em políticas estruturais, de grande relevância para as populações
vulnerabilizadas e para o desenvolvimento do país. Certamente, as lógicas do mercado, da
acumulação de riquezas foram, literalmente, o norte das medidas governamentais dos pós
“abolição”.
Na saúde pública, médicos sanitaristas, sob os interesses das classes dominantes
concerniam no controle de determinadas epidemias, ao mesmo tempo em que
realizavam a dicotomia racializada no enfretamento das epidemias, como no
22

combate à febre amarela, doença que incidia entre os imigrantes, mão de obra
estratégica na expansão econômica da virada do século XIX para o século XX, em
detrimento do enfrentamento do problema da tuberculose que atingiria a população
pobre das grandes cidades, pois a luta contra a febre amarela tinha um aspecto racial
(GOES; SANTOS, 2014, p.2534).

No tocante à PNSIPN, é inegável o avanço no que se refere à consistência da proposta,


fruto da articulação, repito, dos movimentos sociais negros com a gestão governamental. A
PNSIPN foi aprovada, em 2006, pelo Conselho Nacional de Saúde; posteriormente, pactuada
pela Comissão Intergestores Tripartite, em 2008, e publicada como Portaria do Ministério da
Saúde no ano seguinte. Finalmente, em 2010, regulamentada por meio do Estatuto da
Igualdade Racial (BATISTA; BARROS, 2017).
Ainda que não seja o foco desse estudo, é importante salientar que, anteriormente à
institucionalização formal da PNSIPN, e na lacuna deixada pelos serviços filantrópicos,
existia uma tradição do cuidado “nós por nós”, uma confluência de conhecimentos ancestrais
voltada à sobrevivência e à mitigação das dores causadas pela tortura colonial (WERNECK;
LOPES, 2013).
“(...) no amplo rol de práticas e crenças que compunham as ações terapêuticas dos
calundus 5 (...) Enfim, uma vez mais sublinho o mosaico de crenças, artefatos e
recursos terapêuticos que se imbricavam entre o replicar dos tambores, cânticos,
danças e estados de transe dos calundus mineiros capitaneados, principalmente por
curadores negros de origem africana” (NOGUEIRA, 2016, p.31)

No município do Rio de Janeiro, o processo de implantação da PNSIPN se deu a partir


de 2006. A interlocução entre a, então, Secretaria de Promoção da Saúde com a ONG Criola
propiciou o II Seminário de Promoção da Saúde: Equidade em Saúde da População Negra,
que objetivava a sensibilização de gestores e profissionais da Saúde, bem como a definição
de estratégias para a implantação da PNSIPN no município do Rio de Janeiro. No ano
seguinte, o Comitê Técnico da Saúde da População Negra (CTSPN) foi instituído no âmbito
da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) (RIO DE JANEIRO, 2008).
O contexto da implantação da PNSIPN, no município do Rio de Janeiro, suscita
algumas questões para a pesquisa: quais os movimentos técnico-políticos impetrados no
sentido da implementação da PNSIPN? Como a PNSIPN foi sendo configurada no município
do Rio de Janeiro? Qual o contexto político-organizacional de implementação da PNSIPN?
Qual a participação do CTSPN na operacionalização da política?
23

Quais os principais avanços e dificuldades quanto à implementação da PNSIPN no município


do Rio de Janeiro a partir de 2006?
Assim, importa entender a PNSIPN no município do Rio de Janeiro, por meio do
estudo de avaliabilidade. Para tanto, o Comitê Técnico da Saúde da População Negra,
enquanto órgão consultivo, de assessoria da gestão, será o local privilegiado para a pesquisa.
O EA é caracterizado como uma etapa anterior à avaliação e, por isso, capaz de imprimir
maior credibilidade aos resultados das avaliações posteriores. (LEVITON et al., 2010).
Também descrito como um agrupamento de dispositivos anteriores à avaliação, com vistas à
identificação da necessidade de uma avaliação extensa, à delimitação dos objetivos do
programa e ao apontamento dos pontos deficientes (SOUZA et al,2017).
O interesse pelo tema relaciona-se, também, com a minha inserção profissional, no
Ministério da Saúde, bem como com as problematizações oriundas dessa experiência:
expressões do racismo institucional (WERNECK, 2016) face à vulnerabilização (OLIVEIRA,
R, 2018a) sistemática da população negra (IBGE, 2019).
A pesquisa vincula-se ao projeto maior, sob a coordenação da Prof.ª Dr.ª Cristiani
Vieira Machado: “Políticas de Atenção Primária, Regionalização e Regulação do Setor
Privado em Saúde: mudanças recentes e repercussões sobre as desigualdades no Brasil e no
estado do Rio de Janeiro”. Aloca-se no eixo de “Determinação sócio racial de saúde da
população negra”, que busca analisar a implantação da PNSIPN no estado e município do Rio
de Janeiro.
24

2. PERGUNTA DE INVESTIGAÇÃO
A Política de Saúde da População Negra, no município do Rio de janeiro, pode ser
avaliada em qual extensão e sob quais aspectos?
25

3.JUSTIFICATIVA
A PNSIPN foi uma resposta institucional à mobilização dos movimentos sociais
negros, que já pautavam o racismo como determinante social da saúde durante o processo de
redemocratização do país (GOMES, N., 2017; SILVA, 2021). Nessa perspectiva, os
indicadores sociais atinentes à população negra (IBGE, 2019 IBGE, 2021) são produto das
iniquidades raciais mobilizadas pelo racismo estrutural (WERNECK, 2016, ABRASCO,
2021).
Dados publicizados pelo Ministério da Saúde (MS), em 2017, apontavam que 69,5%
das pessoas da raça/cor negra tiveram acesso à uma consulta de saúde no último ano; por sua
vez, 74,8% da raça/cor branca acessaram o mesmo serviço. Com relação ao serviço
odontológico, 38,2% das consultas foram para a raça/cor negra e 50,4% para a raça cor branca
(ABRASCO, 2021). A iniquidade racial é evidenciada no acesso, ao passo que, a despeito da
população atendida pelo SUS ser prevalentemente negra (MATOS ;TOURINHO, 2018), o
acesso aos serviços mostra-se maior entre a raça/cor branca.
Entendendo que o racismo estrutura a sociedade brasileira, produzindo a
aceitabilidade quanto à vulnerabilização das condições de saúde da população negra
(CARNEIRO, 2011), faz-se oportuna a avaliação permanente da PNSIPN (WERNECK,
2010), no sentido de produzir informações consistentes - que respaldem as gestões
governamentais na tomada de decisões - e de viabilizar a ampla informação da coletividade.
Apesar dos indicadores sociais acerca da saúde da população negra, (IBGE, 2019b) as
pesquisas, nesse campo, revelam-se incipientes (WERNECK, 2016), em decorrência,
também, da negação do racismo (CUNHA, 2012):
É preciso começar salientando que a importância de enfocar a dimensão étnico-
racial nos estudos da saúde se originam no reconhecimento da discriminação
histórica que a população negra sofreu no Brasil e a consequente vivência de
condições de marginalidade e vulnerabilidade que se estende desde a abolição da
escravatura até a atualidade. Porém, apesar de ser amplamente conhecida esta
constatação, a abordagem em pesquisas desta dimensão enfrentou e enfrenta até
hoje várias resistências. Acredito que isto seja devido tanto à crença da ausência de
racismo na sociedade brasileira, como em posições políticas abertamente contrárias
a incorporá-la fundamentadas na opinião de que se no Brasil se vive una
“democracia racial” dar ênfase neste recorte analítico estaria fomentando um
racismo inexistente (IDEM, 2012, p.37).

O racismo institucional é um eixo de análise importante para essa problemática.


Relaciona-se, também, à incidência de uma pequena parcela de pesquisadoras negras nos
espaços acadêmicos (IPEA; ONU MULHER; SPM, 2017; FIOCRUZ, 2021). Esse é um
reflexo de um sistema de proteção social incapaz de estabelecer oportunidades horizontais
entre os filhos da pobreza e dos privilégios.
26

3.1. A SAÚDE DA POPULAÇÃO NEGRA MEDIANTE À COVID-19


O mundo viveu, desde o final de 2019, a pandemia causada pelo coronavírus (Sars-
CoV-2). É sabido que os impactos sobre as condições sociais e econômicas recaíram,
principalmente, sobre as populações historicamente vulnerabilizadas (OLIVEIRA et al,
2020). De acordo com a Síntese de Indicadores Sociais (IBGE, 2021), no tocante ao mercado
de trabalho, os grupos mais afetados foram os, há muito, vulnerabilizados e com a menor
escolaridade: as mulheres e as pessoas da raça/cor negra. Com relação à informalidade, atingiu
a cerca de 44,7% da população da raça/cor negra, frente a 31,8% da população da raça/cor
branca. Em números absolutos, são 12,5 milhões da raça/cor branca, frente a 20,7 milhões da
raça/cor negra na informalidade (Figura 1)
Em relação à extrema pobreza e à pobreza, as taxas relacionadas às pessoas da raça/cor
negra (7,4% e 31,0%, respectivamente) eram mais do que o dobro das taxas da raça/cor branca
(3,5% e 15,1%). As mulheres da raça/cor negra apresentavam as maiores incidências de
pobreza (31,9%) e extrema pobreza (7,5%). Consequentemente, as famílias chefiadas por
mulheres da raça/cor negra, sem cônjuge e com filhos menores de 14 anos, concentraram a
maior incidência de pobreza. Caso não existissem os programas sociais, a renda da população
mais pobre decresceria em 75, 9% no ano de 2020 (IBGE, 2021).
Apesar do contexto, os aspectos institucionais que retroalimentam a precarização da
SPN seguiram presentes nas respostas do governo federal brasileiro perante à crise sanitária.
Para além do descaso com a SPN, o governo federal representou uma verdadeira frente de
promoção ao Coronavírus, motivo pelo qual foi instalada a Comissão Parlamentar de Inquérito
do Senado Federal.
O resultado ruim no enfrentamento à pandemia e os pífios resultados econômicos
motivaram o Senado Federal a aprovar a instalação dessa comissão parlamentar de
inquérito, que tem como objetivo apurar ações e omissões do governo federal no
combate a COVID-19 no Brasil e, em especial, no agravamento da crise sanitária no
Amazonas com a ausência de oxigênio para pacientes internados, bem como a
fiscalização dos recursos repassados para os demais entes federados para ações de
prevenção e combate à COVID-19 (BRASIL, 2021, p.14).
27

Figura 1 – Ocupações informais por cor ou raça – 2012-2020.

Fonte: IBGE (2021)

De acordo com o relatório final da CPI da Covid, ao longo dos anos de 2020 e 2021, o
Presidente Jair Messias Bolsonaro manteve um grupo de assessoria extraordinária, composto
por médicos, políticos e empresários. O gabinete paralelo prestava orientações, ao Presidente
da República, sobre as medidas de enfrentamento à pandemia, com destaque para fato de não
terem investidura formal para tal responsabilidade. O direcionamento, do referido gabinete
paralelo, seguiu a perspectiva da contaminação generalizada, com o objetivo da aquisição da
imunidade de rebanho (BRASIL, 2021), somada à inércia do Governo Federal frente às
medidas sanitárias, econômicas e sociais de enfrentamento ao Corona Vírus.
Ao longo do relatório, verificamos que tal estratégia motivou o Presidente Jair Messias
Bolsonaro a se opor às medidas de enfrentamento não farmacológicas (o uso de máscaras, o
distanciamento social, a rapidez na implementação de uma renda emergencial) e
farmacológicas com respaldo científico (a aquisição célere da vacina). Em contrapartida, deu
ênfase ao uso de medicamentos comprovadamente ineficazes para o tratamento da Covid-19,
repercutindo na propagação do vírus (BRASI, 2021) e no desalento coletivo.
28

O que decorre, desse marco inicial da promoção governamental do vírus, são desfechos
inimagináveis da morbimortalidade da covid-19, regados à dor, a sofrimento (BARROS et
al.,2020) e à tortura psicológica frente à zombaria presidencial veiculada em Rede Nacional.
É no contexto das injustiças que ainda pesam sobre a população negra, que a pandemia
Covid-19 se abateu sobre o Brasil. Ainda no ano Passado, o então Prefeito, de São
Paulo, alertava que “a população preta tem 37,5% mais chances de óbito do que a
população branca na cidade de São Paulo”. Segundo o Dossiê da Coalisão Negra por
Direitos, esse impacto se relaciona com a privação histórica de direitos básicos à
população negra, dentre eles o direito à saúde, alimentação adequada, moradia e
saneamento básico, possibilitando que sejam os negros e negras alvos principais da
negligência de enfrentamento ao vírus (BRASIL, 2021, p. 656).

No tocante à saúde da população negra, o relatório final da CPI da Covid endossou o


conceito do racismo estrutural (Almeida, 2019): basilar das relações sociais brasileiras, a partir
das quais são determinados os lugares sociais segundo raça/cor. A Comissão reconheceu que
o governo federal ignorou “o efeito mais agudo da pandemia sobre a população negra”
(BRASIL, 2021, p.656) ao definir os critérios prioritários para o Programa Nacional de
Vacinação, a saber: critérios etários, comorbidades, determinadas profissões. A Coalizão Negra
por Direitos ressaltou que a decisão por ignorar a iniquidade racial – expressa pelas
disparidades demográficas raciais, além dos maiores riscos de exposição aos quais a raça/cor
negra esteve exposta- foi determinante para que, nos dois primeiros meses de imunização,
fossem vacinadas duas vezes mais pessoas da raça/cor branca, em relação à raça/cor negra.
A Coalisão Negra por Direitos, em documento encaminhado a essa Comissão, avalia
que isso evidencia uma política que, ao excluir o elemento racial corrobora em si com
o racismo estrutural e a continuidade das mortes por Covid-19, que se concentram na
população negra. Atendendo ao pleito contido nesse documento, a Comissão frisa que
a população negra brasileira foi a que mais morreu em decorrência da má gestão da
pandemia. Assim, a indiferença do governo, dissimula sob a forma de neutralidade e
isonomia, concretizou, mais uma vez, os danos propiciados pelo racismo estrutural
(BRASIL, 2021, p.657-658)

Ao tratarem das questões atinentes ao racismo e à saúde da população negra durante a


Pandemia, Santos et al. (2020) publicizaram as ações do Grupo de Trabalho (GT) Racismo e
Saúde da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO)6.
Durante a crise sanitária inaugurada pela pandemia Covid-19 não foi diferente. Nesse
sentido, Oliveira et al (2020) ressaltam:

6
O GT Racismo e Saúde da ABRASCO mobiliza ampla discussão das questões relacionadas ao racismo na saúde,
a partir da concepção interseccional. Para tanto, viabiliza atividades problematizadoras, articula a bagagem dos
movimentos sociais negros, no campo das relações raciais em saúde, a experiência do corpo docente que racializa
a sua atuação acadêmica, além da gestão do Sistema Único de Saúde, sobretudo no tocante à implementação da
(PNSIPN) (SANTOS et al, 2020).
29

Foi baseando-se em pressões como o posicionamento de um conjunto de atores sociais


(lideranças de favelas e político-partidárias progressistas) de atores do campo da saúde
(acadêmicos, profissionais de saúde, gestores) parte da mídia e,
fundamentalmente, com o desenrolar da pandemia já com o evidente comportamento
desigual que vem escancarando os marcadores sociais de desigualdades,
principalmente o de raça, que esta passa a compor a preocupação e a agenda de alguns
atores sociais e governamentais (Idem, p.14)

Nessa perspectiva, o GT Racismo e Saúde tem trabalhado pela implicação das gestões
governamentais, por meio da problematização da realidade social e econômica das populações
vulnerabilizadas, bem como da proposição de medidas governamentais que respondam aos
efeitos da pandemia sobre o público prevalente da mortalidade da COVID-19 (Figura 2).
A partir da tabela sobre o número de óbitos por infecção por coronavírus de localização
não especificada por sexo e raça/cor, segundo grupos de idade (Figura 2), verifica-se que o
quantitativo de mortes entre pessoas da raça/cor preta e parda foi superior ao das pessoas da
raça/cor branca em todas as faixas etárias abaixo dos 70 anos: 24,9% (raça/cor preta e parda)
contra 20,7% (raça/cor branca). Nos grupos etários de 0 a 4 anos, morreram duas vezes mais
crianças pretas ou pardas do que crianças brancas. Entre a população com 70 anos ou mais,
houve uma inversão no percentual de óbitos, sendo mais elevado para a população da raça/cor
branca (30,1%) em relação aos representantes da raça/cor preta e parda (24,3%). Nessa faixa
etária, especificamente, os dados revelam aspectos cruéis, atinentes à vulnerabilização da saúde
da população da raça/cor negra. Demonstram que a expectativa de vida das pessoas da raça/cor
negra é menor frente às pessoas da raça/cor branca. Por isso, identificamos a maior letalidade
entre idosos da raça/cor branca (IBGE, 2021).
No ano de 2020, os primeiros boletins epidemiológicos da COVID-19 não apresentaram
os dados por raça/cor (SANTOS et al., 2020), a despeito da obrigatoriedade de que os
formulários dos Sistemas de Informação do SUS fossem preenchidos considerando a referida
variável (Brasil, 2017). Tal conduta é grave, considerando os indicadores de saúde da
população negra e, ainda, que essa população foi a mais vulnerabilizada pela COVID-19
((OLIVEIRA ET AL, 2018; BATISTA; PROENÇA; SILVA, 2021).
Apesar desse contexto, o quesito raça/cor não foi elegível para análise de situação
epidemiológica da Covid-19 nos primeiros boletins epidemiológicos, ainda que
constasse nas fichas de notificação para Síndrome Gripal e para Síndrome
Respiratória Aguda Grave (SRAG), ambas utilizadas como instrumentos de registro,
monitoramento e avaliação dos casos suspeitos leves e graves da Covid-19,
respectivamente, na rede de atenção básica, nos centros de triagem, nas unidades de
pronto-atendimento e na rede hospitalar, assim como no formSUs inicialmente
elaborado para registros da Covid-19. A incorporação do quesito raça/cor como
categoria de análise (Brasil, 2020b) se deu após posicionamentos do GT Racismo e
Saúde, da Coalizão Negra e da Sociedade Brasileira de Médicos de Família e
Comunidade (SANTOS et al, 2020, p 228).
30

Figura 2 – Óbitos (COVID-19) por gênero e raça/cor: Brasil – 2020


Número de óbitos por (CID 10 B34.2) Infecção por coronavírus de localização não
especificada por sexo e cor/raça, segundo grupos de idade - Brasil - 2020

Número de óbitos por (CID 10 B34.2) Infecção por coronavírus de


Grupos de localização não especificada
idade Homens Mulheres Homens Mulheres
brancos brancas pretos ou pardos pretas ou pardas

Total 56.942 45.020 57.681 40.984

Infantil 39 32 89 69

01 a 04 anos 18 27 51 51

05 a 09 anos 20 14 33 27

10 a 14 anos 20 23 38 30

15 a 19 anos 60 56 102 107

20 a 29 anos 382 325 601 424

30 a 39 anos 1.394 897 2.113 1.290

40 a 49 anos 3.189 2.065 4.776 2.770

50 a 59 anos 6.875 4.275 8.648 5.308

60 a 69 anos 13.291 8.594 14.062 9.336

70 a 79 anos 15.935 11.595 14.787 10.421

80 anos ou
15.715 17.117 12.368 11.150
mais

Branco/Ignorado 4 0 13 1

Vale ressaltar que a inclusão do quesito raça/cor nos Sistemas de Informação não é um
preciosismo, mas uma estratégia de qualificação das informações com vistas ao enfrentamento
das iniquidades raciais em saúde (CUNHA, 2012; FILHO, 2012) A desagregação das
informações por raça/ cor possibilita o conhecimento da proporção da iniquidade racial
brasileira (IBGE, 2019), imprescindível para a tomada de decisões, no âmbito das políticas
sociais.
31

Não obstante ao apagamento dos dados racializados no sistema de informação, a


literatura recente vem demonstrando (OLIVEIRA et al. 2020; GOES et al., 2020) que a
população negra é a mais afetada pelo contexto da Pandemia no Brasil, sobretudo pela pobreza
(e a precarização da vida) como comorbidade. Nesse sentido, Santos et al (2020) chamam a
atenção para os rebatimentos da policrise tangenciada pelo racismo:
Os desdobramentos da pandemia da Covid-19 numa sociedade estruturada pelo
racismo penalizam grupos vulneráveis, especialmente entre pessoas negras, está
diretamente relacionado à policrise sanitária, social, política, econômica, moral, crise
na globalização e os fluxos migratórios etc. Essa conjuntura influencia e direciona as
decisões políticas e a elaboração de estratégias de proteção social, como políticas
públicas na área social e da saúde (Idem, p.229-230).

Pensando nas ações de enfrentamento da Covid-19 para a população negra, seria


imprescindível considerar as condições socioeconômicas que inviabilizam, por exemplo, o
trabalho em casa (home office), a adoção do distanciamento social e das medidas não
farmacológicas, frente à realidade residencial adversa ou à falta de saneamento básico
(OLIVEIRA et al, 2020).
Os dados referentes às internações e óbitos, por ocupação, revelam os desfechos da
Covid-19 em uma sociedade constituída sob as bases coloniais: há um maior número de
internações e óbitos por Covid-19 entre faxineiras (os) e auxiliares de limpeza (62%);
aposentados (as) (30%); empregadas domésticas (6,5%); diaristas e cozinheiras (6,5%);
técnicos e profissionais de saúde de nível médio (0,3%); vendedores (as) (0,3%); caminhoneiros
(0,3%); entregadores de mercadorias (0,3%); auxiliares de produção (0,3%); e outros (0,3%) (
IBGE, 2021)
No tocante à conduta do governo federal frente à pandemia, percebemos a inépcia
gerencial e humanitária, a qual fragilizou, prioritariamente, a população vulnerabilizada e SUS-
dependente: a população da raça/cor negra.
Diferentemente de outros países do mundo, o Brasil não acatou estratégias
emergenciais para mitigar a transmissão do vírus, e as consequências dessa
negligência foram a superlotação de hospitais públicos, a falta de insumos
hospitalares, incluindo respiradores e oxigênio, nos levando, em julho de 2021, a um
vergonhoso segundo lugar de total de mortes no mundo: mais de 520 mil vidas
perdidas Parte significativa dessas mortes poderia ter sido evitada se as decisões do
governo federal não estivessem nos interesses econômicos e privados em detrimento
da vida, ou se houvesse uma estruturação dos serviços públicos de saúde e um
aumento da sua capilaridade para o atendimento primário de qualidade. Indo mais a
fundo, se houvesse uma gestão adequada para atender os cidadãos e as cidadãs em
maior situação de vulnerabilidade social que, em sua maioria, é negra. Em suma, a
população negra, presente nos mais precários territórios, atividades laborais e
desproteção social, segue negligenciada, desamparada e ainda mais suscetível à morte
pela Covid-19 (BATISTA; PROENÇA, 2021, p.2)
32

Na contramão do racismo institucional da Saúde, o Conselho Nacional de Saúde (CNS)


publicou a carta nº 29, de 27 de abril de 2020, onde recomendou o combate ao racismo
institucional nos serviços de saúde no contexto da pandemia da Covid-19. O documento
advertiu que a Portaria nº 639/MS, de 31 de março de 2020 - que instituiu a ação de capacitação
profissional para o enfrentamento da COVID-19- não abordou questões ligadas à população
mais vulnerabilizada. A despeito do balanço do Ministério da Saúde (que apontava a
prevalência de pessoas negras em hospitalizações (23,1%) e na letalidade (32,8%) pela
Síndrome Respiratória Aguda Grave), a racialização na coleta dos dados foi negligenciada
(BRASIL, 2020).
Em 2020, o Ministério da Saúde retirou do ar o Sistema de Vigilância de Fatores de
Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico 2018 População Negra
(VIGITEL). O estudo (BRASIL, 2018) representou a primeira versão, desde 2006, com dados
desagregados por raça cor. Cinquenta e duas mil pessoas foram entrevistadas. Em convergência
com a PNSIPN, trouxe a desagregação dos dados segundo raça/ cor, como informa o
documento:
A raça/cor como um elemento que contribui para a vulnerabilização da população
negra, é salutar a construção de um recorte que demonstre as particularidades deste
grupo populacional no monitoramento de indicadores de saúde. Os determinantes de
saúde para a população negra expressam as vulnerabilidades desse grupo populacional
a diversas doenças e agravos, especificamente, neste caso às DCNT. Os objetivos
específicos da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra contemplam
impulsionar análises desagregadas por raça/cor a fim de gerar informações
representativas desse grupo populacional, identificando suas necessidades de saúde
para o planejamento e priorização de serviços e ações (BRASIL, 2019:13).

Nesse sentido, chama atenção a ingerência arbitrária do Executivo sobre a área técnica
da Secretaria de Vigilância em Saúde, ao passo que interferiu, ainda, na metodologia dos
cálculos das mortes relacionadas à COVID-19, fato corroborado pela CPI da Pandemia
(BRASIL, 2021).
Trata-se de um contexto de crise sanitária e humanitária no Brasil, onde é possível
observar, a priorização da agenda do mercado em detrimento do investimento efetivo em
medidas de proteção à vida da população, amparadas pelo conhecimento técnico e científico
(DUARTE ET AL., 2020; BRASIL, 2021).
33

É curioso observar a reatualização do mito da democracia racial7 , sob a máxima do


“estamos todos no mesmo barco”8.Diante da precarização das condições de vida (a despeito da
narrativa de que as reformas neoliberais - Previdência e Trabalhista - equilibrariam a economia),
o governo de Bolsonaro dificultou a transparência e a circulação da informação. A esse respeito,
a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO) pontuou:
(...) o corte orçamentário imposto ao IBGE não é condizente com o processo
democrático de gestão para a construção da cidadania. O uso da informação vem
sendo continuamente dificultado pelo governo federal em diversos setores, incluindo
a economia, a educação e a saúde. Nosso repúdio, portanto, se estende à lógica de que
a gestão pública não precisa de dados (RADIS, 2021, p. 13).

Ao abordar a SPN sob a perspectiva da equidade, Faustino (2017) aponta três desafios.
O primeiro refere-se à pouca familiaridade da literatura especializada com o debate
racializado da saúde, apesar da relevância da cultura africana para o país.
É mister lembrar que o nosso país foi largamente influenciado pelas diversas culturas
trazidas pelos povos africanos. A coletânea “Religiões Afro-brasileiras, Políticas de
Saúde e a Resposta à Epidemia de HIV/Aids”, organizada por Celso Ricardo et. al, é
bastante didática ao evidenciar que o maior sequestro coletivo da história resultou,
não apenas na importação compulsória de mão de obra, mas também na recepção –
nem sempre assumida– de um infinito repertório de saberes, práticas e técnicas de
trabalho, sobretudo em saúde (FAUSTINO, 2017, p.3835)

O segundo desafio tem relação com os entraves institucionais à saúde da população


negra, no tocante aos meios acadêmicos e políticos. Faustino (2017) conclui que a formalização
legal de uma política pública não repercute em sua automática operacionalização. Ressalta a
dificuldade operacional, seja pelo desconhecimento dos gestores e profissionais da saúde
quanto à PNSIPN, seja pela não utilização dos indicadores e metas lançados pela política. Nesse
sentido, o racismo institucional (WERNECK, 2016) tem influência no processo de
invisibilização social das demandas atinentes à saúde da população negra.
O terceiro desafio ao campo da saúde da população negra diz respeito às correntes
contrárias à “focalização” e ao reconhecimento da centralidade do racismo na determinação
social da saúde.

7
Abdias Nascimento (2016) trabalha com o conceito em sua obra “O Genocídio do Negro Brasileiro: processo de
um racismo mascarado: “(...) erigiu-se, no Brasil, o conceito de democracia racial; segundo esta, pretos e brancos
convivem harmoniosamente, desfrutando de iguais oportunidades de existência. (...) existência dessa pretendida
igualdade racial constitui o 'maior motivo de orgulho nacional’ (NASCIMENTO, 2016:13)".
8
Ver matérias do Jornal Liberal e da Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (FIESC),
respectivamente: https://site.jornaloliberal.net/noticia/5814/estamos-todos-no-mesmo-barco-xciv;
https://fiesc.com.br/pt-br/imprensa/estamos-todos-no-mesmo-barco .
34

De acordo com Batista e Monteiro (2012), a PNSIPN, no âmbito do SUS, ao voltar-se


à população negra, repercutiria no aperfeiçoamento do SUS, diferentemente das políticas
sociais focalizadas. Assim, a PNSIPN responde ao princípio da equidade do SUS, o qual, de
forma alguma, compete com o princípio da universalidade.
A política de saúde no contexto do SUS implica ter uma visão integral e universal,
sem perder a noção de que é necessário estar atento às determinações que interferem
na saúde e, principalmente, incluindo as necessidades específicas de regiões do país,
sexo, raça, etnia, religião, ciclos de vida e/'ou geraçã0_ Os marcos conceituais e as
normatizações do SUS sinalizam para a necessária interface entre género, geração,
raça/etnia e classe social e que estas interferem no processo saúde, doença e morte, o
que coloca a necessidade de políticas para grupos prioritários e ações específicas, sem
perder a noção do todo universalidade, com integralidade e equidade (BATISTA;
MONTEIRO, 2012, p. 175).

Até década de 70 do século passado, a democracia racial era a ideologia oficial do


Estado, a partir da qual não haveria lugar para o racismo no Brasil (BERNARDINO, 2002). Os
movimentos progressistas brasileiros compartilharam do mito da harmonia das raças,
disseminando a narrativa de que a luta pelo fim do racismo traria divisão à luta de classes. Sob
este aspecto, Bento (2002) chama a atenção para algo curioso: a convergência entre dois
projetos, a saber: o progressismo e o liberalismo, os quais estão de acordo quanto à
secundarização das discussões que trazem a interseccionalidade 9 entre a raça, o gênero e a
classe para o centro da contradição capital/trabalho.
Há um contraditório entre o reconhecimento do racismo como estrutural e estruturante
da sociedade brasileira (ALMEIDA, 2019) e a alocação do antirracismo na prateleira
identitária, supondo a concorrência com a luta de classes. Considerando que o mercantilismo e
o capitalismo não teriam sustentabilidade sem a escravização colonial sua reatualização
moderna, o enfrentamento do racismo atende à uma necessidade estrutural e, ainda, à superação
da ordem social capitalista. A secundarização da questão racial é deletéria para a instauração
de uma sociabilidade sob as bases da equidade e da justiça social.
Assim, a discussão sobre as barreiras institucionais que inviabilizam a
operacionalização da PNSIPN é urgente. Nesse caminho, repensar o perfil hegemônico de
quem ocupa os espaços decisórios de poder é recomendável (RIBEIRO, 2012; BENTO, 2022).

9
A discussão acerca da tríade raça, gênero e classe como centrais para o modus operandi capitalista está presente
nas reflexões de intelectuais brasileiras como Lélia Gonzalez e Sueli Carneiro. Nos Estados Unidos da América,
a Pensadora Kimberlé Crenshaw cunhou o conceito de Interseccionalidade, assumindo a concepção do
entrelaçamento de três eixos de opressão (racismo, patriarcalismo, opressão de classe) dos quais a mulher negra
é o principal alvo. O conceito vem com a crítica ao racismo do feminismo branco, ao rejeitar as pautas das
mulheres negras, bem como ao machismo dos movimentos negros. Patrícia Hill Collins, Intelectual
estadunidense, vai caracterizar a interseccionalidade como um sistema interligado de opressões (AKOTIRENE,
2019).
35

Nesse sentido, a proporcionalidade, segundo as características da população brasileira,


poderá ser um indicador do processo de mudança. Afinal, o país vai além do perfil branco,
masculino, heteronormativo.
Na esteira do pacto narcísico do racismo (BENTO, 2022), são formatados os quadros
das instituições de prestígio, dentre as quais os espaços acadêmicos. Fóruns privilegiados da
construção do conhecimento, compostos, majoritariamente, por pessoas da raça/cor branca,
cujas lentes analíticas têm o norte global como a verdade universal. A partir da naturalização
da Academia embranquecida, são nutridas algumas das engrenagens da iniquidade: a) o
epistemicídio (CARNEIRO, 2011; Teixeira, 2021), a partir do qual a produção acadêmica
contra-hegemônica é irrelevante ou alegórica; b) as violências simbólicas (NASCIMENTO,
G, 2019) traduzidas pelos constrangimentos imputados aos discentes da raça/cor negra que se
tornam “o outro” (CARNEIRO, 2005): - precisamos ter cuidado para não denegrir o autor10
e sua obra; c) o esvaziamento de pesquisas que reconheçam o racismo na determinação social
da saúde, bem como a contribuição dos movimentos sociais negros como intelectuais
orgânicos: - o movimento negro é coisa de estética, turbante11. A discriminação institucional
no Brasil é uma constante que independe da intencionalidade, conforme discorre Bento
(2002):
A discriminação institucional é aquela que ocorre independentemente do fato de a
pessoa ter preconceito aberto ou a intenção de discriminar. O conceito se forma a
partir da ideia de que o racismo subjacente aos comportamentos individuais,
coletivos ou institucionais, faz parte da lógica das sociedades racistas, nas quais
comportamentos aparentemente livres de preconceitos podem gerar consequências
negativas para os membros de grupos sociais discriminados (Idem, p.21).

Assim, reiteramos que o racismo institucional contribui, sobremaneira, para o


ambiente acadêmico prevalentemente refratário (RAMOS, 1995; Nascimento, B., 2021) à
discussão racializada; ora pela deficiência epistemológica afro-referenciada, ora pelas
violências simbólicas oriundas dessa lacuna. A compartimentalização das pesquisas
racializadas, majoritariamente mobilizadas por pesquisadoras negras, também é uma prática
indicativa de que a concepção do “problema do negro” ultrapassa o senso comum, ocupando
os departamentos acadêmicos (Nascimento, B.2021; Santos, 2021).
O estudo justifica-se por voltar-se para uma política pública de vanguarda,
contraposta ao racismo institucional na saúde (BRASIL, 2017).

10
Fala docente, da Pós-graduação Stricto Sensu, quando a estudante questionou a proeminência de Boa Ventura
de Souza Santos, nos estudos decoloniais, considerando a interlocução do autor com uma gama de intelectuais
da América Latina.
11
Fala de professor da Pós-graduação Stricto-sensu, ao discorrer sobre movimentos sociais negros.
36

Responde, ainda, a um dos maiores desafios dos movimentos sociais negros, referentes
à implementação e qualificação da PNSIPN, através da atuação consistente e do
desenvolvimento de mecanismos de negociação e avaliação (WERNECK, 2010).
Considerando a importância da implementação de processos avaliativos para a
qualificação das informações concernentes à operacionalização da PNSIPN; as diretrizes
gerais da referida política, que versam sobre o processo de monitoramento e avaliação das
ações pertinentes ao combate do racismo institucional e à redução das desigualdades étnico
raciais, no campo da saúde; a potencialidade dos estudos avaliativos em saúde quanto à
instrumentalização da gestão para a tomada de decisões acuradas, faz-se oportuna a realização
do estudo de avaliabilidade (EA) da Política de Saúde Integral da População Negra no
município do Rio de Janeiro.
37

4.REFERENCIAL TEÓRICO-CONCEITUAL
4.1 ANTECEDENTES PARA A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA PNSIPN
Ao abordar as iniquidades raciais em saúde, Batista et al (2013) asseveram que, no
Brasil, existem espaços sociais diferentes segundo raça/cor. Os piores indicadores sociais
(IBGE, 2019) quanto à escolaridade, inserção nos postos de trabalho e acesso aos bens e
serviços relacionam-se às populações cujos espaços sociais são vulnerabilizados.
Nesse sentido, os movimentos sociais têm importância singular na correlação de forças
pela defesa da equidade social. No que se refere aos movimentos sociais negros, essa
negociação ocorre, ora pelo embate, ora pela participação na máquina governamental
(MILANEZI, 2020).
Anteriormente à institucionalização da PNSIPN, o Governo brasileiro adotou medidas
referentes à Saúde da População Negra (SPN). A articulação dos movimentos de mulheres
negras (COUTO, 2012; MILANEZI, 2020; RODRIGUES; FREITAS, 2021) teve relação direta
com tais medidas. Atualmente, a SPN é orientada por leis, portarias, resoluções e planos
operativos – o terceiro e último plano operativo caducou em 2019, não havendo pactuação
subsequente. Por sua vez, nas décadas de 80 e 90, houve alguns marcos federais (Figura 3) que
deram início ao campo da SPN (MILANEZI, 2020; RODRIGUES; FREITAS, 2021).
38

Figura 3 – Antecedentes da PNSIPN: anos 80/90

Fonte: elaborado pela autora (MILANEZI, 2020).


39

Na década de 80, o PAISM (Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher)


significou um marco, a partir do qual o Estado responsabilizou-se pela saúde da mulher,
assumindo, contudo, uma concepção integral, avessa à prática da esterilização, amplamente
utilizada naquele contexto social, sobretudo em relação às mulheres negras (DAMASCO ET
AL, 2012; WERNECK, 2012; MILANEZI, 2020).
As ações previam o alcance nacional, pelos equipamentos do sistema básico de saúde e
a oferta de consultas ginecológicas, da educação em saúde reprodutiva, bem como de métodos
contraceptivos (DAMASCO et al, 2012). A influência das mulheres, na mobilização dos
direitos sexuais e reprodutivos, sob a leitura interseccional, foi decisiva para as conquistas das
décadas seguintes (MILANEZI, 2020). O 3º Encontro Feminista Latino-Americano e
Caribenho, realizado no período de pré-redemocratização, representou o momento da
consolidação do movimento de mulheres negras e da visibilidade para a realidade da mulher
negra (PIEDADE, 2017; RODRIGUES; FREITAS, 2021).
Na década de 90, a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Esterilização,
mobilizada pela, então, Deputada Benedita da Silva (PT-RJ) e pelo, então, Senador Eduardo
Suplicy (PT-SP) teve a finalidade de investigar as causas das esterilizações em massa e se as
mulheres da raça/cor negra eram o alvo prevalente. O relatório final evidenciou a inexistência
de uma política voltada à saúde das mulheres, bem como a inépcia do Estado na definição de
critérios para a prática da esterilização no país. Quanto à denúncia de que as mulheres da
raça/cor negra eram o alvo prioritário das esterilizações, a CPI não pôde comprová-la, em
decorrência da ausência da variável cor nos sistemas de informação de então.
A maior incidência de esterilização em mulheres da raça negra foi denunciada pelo
movimento negro, como um aspecto do racismo praticado no Brasil. Os dados
levantados pelo IBGE, na PNAD de 1986, não confirmam a denúncia, mas é fato
notório a dificuldade de se apurar com precisão a informação relativa à cor da pele
dos brasileiros (MILANEZI, 2020, p.1).

Apesar do desfecho inconclusivo, a CPI teve produtos relevantes para a saúde


reprodutiva das mulheres: a ampla mobilização social com relação aos direitos das mulheres
e, como consequência, a Lei n. 9.263, de 1996, que trouxe implicações legais aos profissionais
que se utilizassem das esterilizações irregulares (MILANEZI, 2020). Ainda na década de 90, a
Declaração de Itapecerica da Serra das Mulheres Negras Brasileiras, durante um seminário
realizado pelo Géledes12, demarcou pontos importantes como a recusa à posição patriarcal da

12
“Geledés – Instituto da Mulher Negra foi criado em 30 de abril de 1988. É uma organização política de
mulheres negras que tem por missão institucional a luta contra o racismo e o sexismo, a valorização e promoção
das mulheres negras, em particular, e da comunidade negra em geral. Geledé é originalmente uma forma de
40

corrente neomalthusiana13 e o posicionamento crítico quanto à concentração de renda e da terra


como responsável pelo crescimento da pobreza nacional.
Além de reivindicar políticas públicas globais de emprego, abastecimento, saúde,
saneamento básico, educação e habitação, consideradas pressuposto para o exercício
de direitos amplos de cidadania, as mulheres negras propugnaram a implantação do
PAISM, bem como a implementação no sistema público de saúde de programas de
prevenção e tratamento de doenças de alta incidência na população negra que têm
sérias repercussões na saúde reprodutiva, tais como a hipertensão, a anemia falciforme
e as miomatoses (ROLAND, 2009, p.1)

A década de 90 é marcada por avanços relacionados ao campo da SPN, no tocante à


implantação da variável raça/cor: SIM (Sistema de Informação sobre Mortalidade); sistemas
de informação do SUS (DNV (Declaração de Nascidos Vivos) e DO (Declaração de Óbitos);
SINASC (Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos). Observou-se, ainda, a instituição do
Grupo de Trabalho Interministerial (GTI – Decreto Presidencial de 20 de novembro de 1995)14
para a Valorização da População Negra, como rebatimento da Marcha de Zumbi dos Palmares
(1995).
No tocante ao GTI, cabe destacar a infelicidade do decreto Presidencial de Jair Messias
Bolsonaro (Decreto Nº 10.087 de 05 de novembro de 2019) que revogou o Grupo de Trabalho
Interministerial para a valorização da população negra. A referida normativa deu fim ao bloco
de comissões e grupos de trabalhos interministeriais que caracterizavam a participação e o
controle social, enquanto uma cultura de gestão conquistada durante o período de
redemocratização do país. De acordo com o Governo ultraliberal brasileiro, as revogações de
1564 atos subscritos por gestões anteriores, no primeiro ano do mandato, seriam justificadas
por serem “não eficazes ou de validade prejudicada” 15 . O rompimento da parceria
Governo/sociedade civil é um indicativo do retrocesso aos tempos pré-constitucionais, onde a
gestão da política pública centralizava-se no governo federal – no marco histórico da ditatura
militar - refratária à efetiva participação da sociedade civil no que dizia respeito à ampla
discussão social acerca da pactuação das políticas e do controle social.

sociedade secreta feminina de caráter religioso existente nas sociedades tradicionais yorubás” (GELEDÉS, 2009,
p.1).
13
Pensamento que atribuía o crescimento da pobreza, da fome e do desequilíbrio ambiental ao crescimento
populacional desordenado, ocultando a responsabilidade central do sistema capitalista, no tocante à produção
da pobreza e da concentração de renda.
14
Ver em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/dnn/anterior_a_2000/1995/dnn3531.htm. Acesso: 10/03/2021.
15
Ver em http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2019-2022/2019/Decreto/D10087.htm#art1 Acesso:
10/03/2021.
41

Conforme assinala o documento orientador da 5ª Conferência Nacional de Saúde


Mental (BRASIL, 2021), o contexto sócio-político mundial, desde a última crise financeira do
capitalismo, foi palco da agudização do projeto neoliberal . Grosso modo, vem operando por
meio da desresponsabilização dos Governos com os gastos em políticas sociais, em prol do
acúmulo e concentração de riquezas. Assim, os interesses financeiros são viabilizados por meio
de um conjunto de estratégias que dão viabilidade ao cenário de Estado mínimo para a
população e máximo para a minoria maiorizada pelo capital, a saber: a) destruição dos pilares
democráticos; b) centralização do poder; c) desestruturação e redução, ao máximo, do
financiamento de políticas públicas ambientais, de direitos humanos, de proteção social, da
ciência e da tecnologia.
Diante da enxurrada de ataques aos direitos sociais dos últimos anos (OLIVEIRA, R,
2018; CONH, 2020), não restam dúvidas de que a prioridade do governo Bolsonaro, assim
como no início da República, responde aos interesses financeiros/ mercadológicos. E a lógica
liberal, agudizada pelo neoliberalismo, fomenta a cortina de fumaça do mérito, da
responsabilização individual frente à perversa produção das desigualdades sociais (FRANCO,
2017; ALMEIDA, 2018).
Retomando à construção coletiva da PNSIPN, em 2001, foi lançado o Programa de
Combate ao Racismo Institucional (PCRI), em decorrência da parceria da Prefeitura de
Salvador e o Programa das Nações Unidas pelo Desenvolvimento (PNUD). Provando a
pertinência do combate ao racismo institucional, Ribeiro (2012) pontua:
Entretanto, o setor público não disponibilizava de capacidade técnica para o
desenvolvimento das ações de combate ao racismo, recorrendo, para tanto, à parceria
com especialistas dos movimentos negros que contribuíram como consultores em todo
o processo de implantação do PCRI, na Secretaria Municipal de Saúde (Idem, 2012,
p. 131).

Em 2002, o II Congresso Brasileiro de Pesquisadores Negros foi marcado pela


realização de minicursos e sessões temáticas que mobilizaram a reflexão sobre a Saúde e
Relações raciais, bem como sobre doenças prevalentes em pessoas da raça/cor negra.
Grande parte das proposições do II Congresso de Pesquisadores Negros estiveram
presentes nas propostas da XXII Conferência Nacional de Saúde de 2003, sob a influência da
Secretaria de Políticas para a Promoção das Igualdades Raciais (SEPPIR), criada nesse mesmo
ano. A SEPPIR tinha como objetivo articular e coordenar as políticas públicas voltadas à
construção da igualdade de oportunidades entre negros e não-negros (ARAÚJO, 2018).
42

Por isso, viabilizou a representatividade dos intelectuais negros na referida Conferência


de Saúde, repercutindo na aprovação de uma série de diretrizes atinentes à saúde da população
negra, uma exceção, até então, em Conferências Nacionais de Saúde (BATISTA, 2012) O I
Seminário Nacional de Saúde da População Negra foi realizado em 2004, sob o comando da
SEPPIR e do Ministério da Saúde (MS); nesse mesmo ano, é instituído o Comitê Técnico de
Saúde da População Negra do Ministério da Saúde (Portaria Nº 1.678, de agosto e Nº 2.632, de
dezembro de 2004).
A criação do Comitê foi acompanhada da realização do I Seminário de Saúde da
População Negra, que ratificou as propostas contidas no documento Política
Nacional de Saúde da População Negra: uma questão de equidade, elaborado por
ativistas e pesquisadores negros durante o Workshop Interagência de Saúde da
População Negra, realizado em 2001 (PNUD et al., 2001). Nele ressalta-se a
necessidade de se expandir o acesso da população negra ao sistema público de
saúde, a importância da implantação do quesito raça/cor nos formulários oficiais de
Declaração de Nascidos Vivos e de Declaração de Óbitos e a necessidade de se
desenvolver políticas que atendam às especificidades de saúde dos grupos étnico-
raciais (BRASIL, 2009).

Curioso o fato de que o regimento interno do referido comitê foi aprovado onze anos
mais tarde, o que denota o padrão do racismo institucional na máquina pública e a indiferença
com a qual assuntos prioritários para a população vulnerabilizada são tratados (WERNECK,
2016; BORRET ET AL, 2020; BATISTA, 2021). São atribuições do Comitê:
O Comitê Técnico de Saúde da População Negra (CTSPN) tem por finalidade
assessorar tecnicamente o Ministério da Saúde dentro das seguintes atribuições – I-
Acompanhar a implementação da Política Nacional de Saúde Integral da População
Negra, com vistas a garantir a equidade na atenção à saúde para negras e negros ;II_
- Apresentar subsídios técnicos e políticos voltados para a atenção à saúde da
população negra no processo de elaboração, implementação e acompanhamento do
Plano Nacional de Saúde, Plano Plurianual, Plano Operativo, dentre outros; III -
colaborar para a pactuação de propostas de intervenção com foco na promoção da
equidade racial em saúde nas diversas instâncias e órgãos do Sistema Único de
Saúde (SUS);IV - Participar de iniciativas intersetoriais relacionadas com a saúde
da população negra; V - Participar do acompanhamento e avaliação das ações
programáticas e das políticas emanadas do Ministério da Saúde no que se refere à
promoção da igualdade racial, segundo as estratégias propostas pela Política
Nacional de Saúde Integral da População Negra (BRASIL, 2015).

O III Congresso Brasileiro de Pesquisadores Negros, ocorreu ainda em 2004, tendo


como desdobramento a resposta à reinvindicação, dos movimentos sociais negros, em prol da
assistência às pessoas acometidas pela doença falciforme: a Política Nacional de Atenção
Integral às Pessoas com Doença Falciforme e outras Hemoglobinopatias - Portaria GM/MS
1.391, de 16 ago. 2005.
O projeto “Saúde da População Negra no Brasil: contribuições para promoção da
equidade” viabilizou a produção de monografias com temas relevantes à saúde da população
negra, no ano de 2005.
43

No ano seguinte, o Comitê Técnico de Saúde da População Negra participou da


“Oficina de Prioridades de Pesquisa em Saúde − Editais 2006”, onde foram escolhidos os
temas do Edital Temático Saúde da População Negra (Departamento de Ciência e Tecnologia
do Ministério da Saúde) “Aids e Saúde da População Negra” (Programa Nacional de DST e
Aids (BATISTA, 2012). O IV Congresso Brasileiro de Pesquisadores Negros ocorreu nesse
mesmo ano, quando o CNS aprovou o texto da PNSIPN. Contudo, conforme salienta Batista
(2012), passaram-se dois anos até a pactuação na Comissão Intergestores Tripartite (CIT) e
três anos para ser publicada pelo MS, em 2009 - Portaria 992 de 13 maio 2009).
Em 2009, aconteceu o V Congresso Brasileiro de Pesquisadores Negros, mesmo ano
da publicação da PNSIPN (Portaria do MS). Em 2010, acorreram o I Seminário Internacional
de Saúde da População Negra e Indígena e o VI Congresso Brasileiro de Pesquisadores
Negros, ficando evidente o avanço da produção intelectual negra, no que diz respeito à
diversidade, quantitativo e qualidade das pesquisas. Nesse sentido, as Políticas Nacionais de
Triagem Neonatal, de Atenção Integral às Pessoas com Doença Falciforme e outras
Hemoglobinopatias, de Saúde Integral da População Negra representam o protagonismo desse
grupo de pesquisadores negros no assessoramento do SUS (BATISTA, 2012).
Diante dos antecedentes históricos relacionados à PNSIPN, é possível identificar o
papel singular dos movimentos sociais negros em prol da institucionalização da SPN. Para
cada avanço institucional, existiram mobilizações anteriores, seja na produção de
conhecimento racializado, seja por meio da negociação /mobilização (CARNEIRO, 2011
(BATISTA, 2012; WERNECK, 2016; GOMES, N, 2017; MILANEZI, 2020).
Notamos, ainda, a capilaridade da ideologia dominante no imaginário social. Ideários
eugenistas, chancelados pelo racismo científico, têm considerável solidez no desenrolar das
relações sociais brasileiras (SOUZA, 1983; RAMOS, 1995; NASCIMENTO, A, 2016). De
forma que o racismo - internalizado e interpessoal - alcança, também, a máquina institucional
(WERNECK, 2016). Assim, os arranjos familiares e as instituições (como as escolas) operam
como mantenedores do delírio moderno (MBEMBE, 2014): a hierarquização das pessoas
segundo raça/cor, numa escala onde, quanto mais próximo da raça/cor branca, mais humano
e digno de direitos (SOUZA, 1983).
Nessa perspectiva, explicam-se não só as lacunas referentes à promulgação da
PNSIPN, como a resistência institucional (BENTO, 2002; WERNECK, 2016) quanto à
operacionalização da política. No tocante à promulgação em legislação específica: da
primeira proposta de uma política específica da SPN (1997), passaram-se treze anos, até a
instituição do Estatuto da Igualdade Racial (2010), onde está prevista a PNSIPN como parte
44

da Rede de proteção à população negra (BRASIL, 2010). Em 1997, o governo federal


formulou o Programa para Saúde da População Negra. “No entanto, o programa não foi
implementado, pois não houve alocação de recursos, tampouco definição de um conjunto de
diretrizes” (RODRIGUES; FREITAS, 2021, p.18).
Com relação aos indicadores da SPN, a Pesquisa Nacional de Saúde (FIOCRUZ,
2021), revelou, por exemplo, a autoavaliação da condição de saúde: 37,8% da população
adulta negra avaliou sua saúde como regular, ruim ou muito ruim; 29,7% da população branca
considerou a sua saúde como regular, ruim ou muito ruim.
Na publicação anterior, em 2013, a PNS já evidenciava a iniquidade racial quanto ao
acesso à saúde, tomando como principais indicadores, as consultas médicas, odontológicas e
as internações. Verificou-se, também, que a população negra tinha menor acesso à saúde, a
despeito de ser o público prevalente do SUS. Tal constatação pode ser correlacionada ao
racismo institucional, como reflexo da falha na oferta de serviços equânimes (BORRET et al,
2020). E, para além do racismo institucional, podemos relacioná-la ao racismo estrutural, na
medida em que este delimita as condições precarizadas de inserção no trabalho, da mobilidade
urbana, que afetam as condições materiais de acesso aos serviços de saúde (MILANEZI,
2020)
Pesquisas mais recentes sobre segregação racial no país argumenta que é preciso
ampliar a compreensão da segregação para além da separação residencial dos
grupos racializados (...) a segregação racial é tripla: residencial, de redes pessoais e
de locais frequentados. Nesse sentido, brancos e negros, ao viverem, socializarem-
se e frequentarem espaços urbanos distintos, são alocados a diferentes circuitos e
oportunidades, o que inclui os serviços de saúde (Idem, p.124).

Assim, caberia, por exemplo, a ampliação dos turnos de atendimentos na Atenção


básica de Saúde; oportunizando que a classe trabalhadora, submetida a precários vínculos de
trabalho, pudesse acessar os serviços públicos sem o risco de perder benefícios ou o próprio
trabalho. Batista (2002) correlaciona a iniquidade étnico-racial, evidenciada pelo acesso
precário aos bens e serviços, aos piores indicadores de mortalidade. Em outra publicação,
Batista e colaboradores (2004) nomeiam a morte negra como uma morte desgraçada. E, ao
contrário do que poderiam imaginar as mentes mais elementares, o centro da questão são as
condições sob as quais se dão a morte negra, numa complexa teia de desumanizações que
incidem sobre o desfazer da vida negra, na alienação da existência, na aniquilação das
múltiplas potencialidades. Retomando Mbembe (2014) para a reflexão, a desgraçada morte
negra é um produto do delírio da modernidade
Há uma morte branca que tem como causa as doenças, as quais, embora de
diferentes tipos, não são mais que doenças, essas coisas que se opõem à saúde até
um dia sobrepujá-la num fim inexorável: a morte que encerra a vida. A morte branca
45

é uma “morte morrida”. Há uma morte negra que não tem causa em doenças;
decorre de infortúnio. É uma morte insensata, que bule com as coisas da vida, como
a gravidez e o parto. É uma morte insana, que aliena a existência em transtornos
mentais. É uma morte de vítima, em agressões de doenças infecciosas ou de
violência de causas externas. É uma morte que não é morte, é mal definida. A morte
negra não é um fim de vida, é uma vida desfeita, é uma Átropos ensandecida que
corta o fio da vida sem que Cloto o teça ou que Láquesis o meça. A morte negra é
uma morte desgraçada (BATISTA et al, 2004, p.635).

Percebemos a permanência da iniquidade racial em saúde, também, por meio do


acesso desproporcional aos serviços de saúde (BRASIL, 2013). As iniquidades sociais por
raça/cor encontram respaldo no racismo institucional (WERNECK, 2016; ALMEIDA, 2019;
BORRET et al, 2020), ao passo que produz a desvantagem de um determinado grupo social
em relação ao outro, inclusive quanto ao acesso a bens e serviços (GÓES; NASCIMENTO,
2013).
46

Figura 4 – Antecedentes PNSIPN: anos 2000

Fonte: Elaborado pela autora (Batista et al., 2012).


47

4.1.1 A contribuição dos movimentos sociais negros para a saúde da população negra
Com pouco mais de um século de atraso, o governo brasileiro instituiu uma agenda
atinente à Saúde da População Negra. A implantação das variáveis raça/cor, nos sistemas de
informação, foi um ponto-chave para a publicização de dados censitários e epidemiológicos
racializados, de modo que as iniquidades raciais brasileiras ganharam visibilidade. A partir de
então, o Poder Público passou a ser cada vez mais pressionado a enfrentar a iniquidade racial
por meio de uma política social que estivesse em sintonia com o Sistema Único de Saúde, a
saber: a PNSIPN (BRASIL; TRAD, 2012).
Na escala mundial, uma série de acordos multilaterais em prol do combate às
desigualdades raciais, significou o compromisso formal dos seus signatários, dentre os quais
Brasil (CARNEIRO, 2011).
Conforme, insistentemente, pontuado, a PNSIPN é um construto coletivo, paulatino,
alvo da permanente resistência das instituições brasileiras (ARAÚJO; TEIXEIRA, 2016;
MILANEZI, 2020; SILVA, 2021). Mas é, sobretudo, um legado dos movimentos sociais negros
(com destaque para os movimentos de mulheres negras) na correlação de forças com as gestões
governamentais, desde a redemocratização desse país (CARNEIRO, 2011; BATISTA, 2012;
ABRASCO, 2021).
É curioso pensar que setores da sociedade civil, cujos projetos societários pretendem-se
democráticos, sejam reticentes quanto à urgência da equidade racial. Nesse sentido:
Elas [lideranças do movimento negro] têm de enfrentar, além disso, o reducionismo
sociológico do pensamento de esquerda, que só esporadicamente admite as interações
raciais e étnicas - o que lança luz, aliás, sobre a dificuldade dos movimentos negros
em forjar alianças com agrupamentos marxistas, especialmente nos anos de pós-
guerra. (Esse reducionismo, aliado à visão do "preconceito racial como resquício da
escravidão" e à expectativa de que o desenvolvimento econômico tende a neutralizar
o fator raça/cor, se encaixa perfeitamente no arcabouço do mito da democracia racial,
comprovando-lhe a consensualidade e a eficácia. A democracia racial é, basicamente,
o pacto nacional, supra ideológico, de não considerar a interação racial como
significativa. O movimento negro como tal é a ruptura deste pacto) (SANTOS, J.,
1985, p.1).

Por mais contraditório que pareça, alas progressistas e liberais vêm convergindo na
rejeição da discussão racial como uma prioridade governamental (CARNEIRO, 2011; BENTO,
2022). Imbuídos do ideário da democracia racial, apelam para a retórica das políticas
universalizantes, a despeito das pesquisas técnicas demonstrarem que a universalidade,
instaurada a partir da Constituição Federal do 1988, não incidiu sobre a iniquidade racial (IPEA,
2008; IPEA, 2019), uma vez que a população da raça/cor negra permanece com os piores
indicadores sociais (IBGE, 2019).
48

Essas concepções conformam as duas matrizes teóricas e/ou ideológicas em disputa


na sociedade. De um lado, o mito da democracia racial ao desracializar a sociedade
por meio da apologética da miscigenação que se presta historicamente a ocultar as
desigualdades raciais. Como afirma o sociólogo Carlos Hasenbalg, esse mito resulta
em uma “poderosa construção ideológica, cujo principal efeito tem sido manter as
diferenças inter-raciais fora da arena política (...) De outro lado, a força do pensamento
de esquerda, que, ao privilegiar a perspectiva analítica da luta de classes para a
compreensão de nossas contradições sociais, põe as desigualdades raciais de lado,
obscurecendo o fato de que a raça social e culturalmente construída ser determinante
na configuração da estrutura de classes em nosso país ( CARNEIRO, 2011, p 18).

Ao discorrer sobre “o movimento negro brasileiro”, Gomes, N. (2017) chama a atenção


para a sua capacidade afirmativa. Destaca, ainda, a sua potencialidade para ressignificar e
politizar o termo “raça”, na medida em que trouxe o debate sobre o racismo para a esfera
pública.
Ao ressignificar a raça, esse movimento social indaga a própria história do Brasil e da
população negra em nosso país, constrói novos enunciados e instrumentos teóricos,
ideológicos, políticos e analíticos para explicar como o racismo brasileiro opera não
somente na estrutura do Estado, mas também na vida cotidiana das suas próprias
vítimas (Idem, p.21).

Os movimentos negros não só politizaram o conceito de raça, como explicitaram a quem


serviria a sua construção social. Trouxeram à cena pública o contrapondo, frente à imagética
distorcida sobre a população da raça/cor negra e seu modo de relacionar-se com o mundo.
Assim, de acordo com Gomes, N. (2017), o movimento negro é um conjunto de organizações
e articulações de mulheres e homens da raça/cor negra, politicamente posicionados, de encontro
ao racismo, com vistas à sua superação. Nesse meio, estão os grupos políticos, acadêmicos,
culturais, religiosos e artísticos (GOMES, N. 2017). É bem verdade que a conceituação mais
ampliada, no tocante ao movimento negro, não é um consenso. Domingues (2007), por
exemplo, o delimita como um movimento político de mobilização racial. Nesse sentido, Santos,
J. (1985) assevera:
Há, na pauta do movimento negro brasileiro contemporâneo, a seguinte controvérsia:
deve-se considerar movimento negro exclusivamente o conjunto de entidades e ações
dos últimos cinquenta anos, consagrados explicitamente à luta contra o racismo,
ornando-se as lutas do passado escravista e a fase de "marginalização" que se lhe
seguiu, como mero antecedente; ou deve-se considerar como tal todas as entidades,
de qualquer natureza, e todas as ações, de qualquer tempo (aí compreendidas mesmo
aquelas que visavam à autodefesa física e cultural do negro). Tomando-se a luta atual
contra o racismo como um simples prolongamento? (SANTOS, J., 1985, p.1).

Santos, J. (1985) informa que, no sentido estrito, o movimento negro foi instituído na
Era Vargas, com a criação da Frente Negra Brasileira, que convergiria numa gama de
mobilizações, com forte cunho jornalístico, no combate à subalternização da população da
raça/cor negra e do mito da democracia racial.
49

Sob pressão arbitrária, a partir de 1937, transfigurou-se em ações com menor teor de
combatividade, porém não menos importantes, como os clubes, entidades recreativas,
assistencialistas e culturais. Já em 1978, a fundação do Movimento Negro Unificado (MNU)
representou o caminho natural de uma trajetória que oportunizou o florescer de uma
organização político-ideológica, capaz de atuar na correlação de forças político-institucionais,
conforme pontua o autor:
Não é difícil ver que o movimento negro, no sentido estrito, foi uma resposta, em
condições históricas dadas, ao mito da democracia racial. Esse conjunto de imagens
idealizadas, consensual e bastante eficaz, que convencionamos chamar mito da
democracia racial, elaborou-se, com efeito, no bojo da Revolução de Trinta - e é,
portanto, uma das intuições reflexas da sociedade brasileira contemporânea. Nem
importa a identificação dos diversos intelectuais - Gilberto Freyre à frente - que lhe
deram acabamento científico e literário: a crença na democracia racial decorria do
senso-comum brasileiro, naquelas circunstâncias históricas; e, ao mesmo tempo,
estava entretecida a outros conjuntos de imagens idealizadas, como o da história
incruenta, o da benignidade da nossa escravidão, o da cordialidade inata do brasileiro,
o do destino manifesto etc. (SANTOS, J., 1985, p.1).

Nesse estudo, acolhemos a acepção mais abrangente de movimento negro, considerando


todas as ações coletivas de combate ao racismo, entendendo, ainda, as distintas nuances
segundo o contexto histórico e social. Na sociedade contemporânea, a discussão sobre do
racismo, na esfera pública, foi impulsionada pelas ativistas negras, que inauguraram o campo
da Saúde da População Negra. No contexto internacional, os acordos multilaterais16, dos quais
o Brasil é signatário, repercutiram na amplificação da pressão social desempenhada pelas
ativistas negras. Inicialmente, suas ações tiveram como foco: a saúde reprodutiva da mulher
negra e a produção governamental de informações sociais desagregadas por raça/cor
(MILANEZI, 2020; RODRIGUES; FREITAS, 2021).
Carneiro (2011) chama a atenção para a ampla mobilização do movimento de mulheres
negras em torno da III Conferência Mundial Contra o Racismo, em 2001, em Durban, África
do Sul. A despeito do silenciamento da imprensa nacional, o protagonismo das ativistas negras
foi registrado na imprensa internacional e reconhecido pelo alto comissariado da ONU
(CARNEIRO, 2011).
De 1 a 3 de setembro reuniram-se na cidade do Rio de Janeiro, 13 organizações de
mulheres negras brasileiras para deliberar sobre a participação das mulheres negras
na III Conferência Mundial Contra o Racismo, Xenofobia e Formas Correlatas de
Intolerância (...) dessa reunião nacional, organizada pelas ONG’s Geledés Instituto
da Mulher Negra, de São Paulo, Criola, do Rio de Janeiro, e Maria Mulher, do Rio
Grande do Sul.

16
Convenção Internacional sobre a eliminação de todas as formas de discriminação racial 1969; Década
Internacional da mulher (70/80); III Encontro Feminista da América Latina e do Caribe (1985); V Conferência
Mundial sobre a população e desenvolvimento (Cairo/ Egito – 1994); IV Confência Mundial da Mulher
(Pequim, 1995) (MILANEZI, 2020).
50

Resultou em uma declaração pró-conferência de Racismo, que configura o


matriarcado da miséria que caracteriza as condições de vida das mulheres negras do
Brasil (Idem, p. 127).

Nessa perspectiva, o racismo, conjugado ao sexismo, repercute na asfixia social da


mulher negra brasileira, contraditoriamente abafada pelo feminismo branco que se pretende
universal. Para além dos impasses singulares à sociedade brasileira, a Conferência de Durban
repercutiu em avanços significativos para a equidade racial, instando os Estados a implementar
os respectivos Planos Nacionais de Combate ao Racismo e à Discriminação, sobretudo no
tocante às políticas direcionadas ao público vulnerabilizado pelo racismo. Cabe ressaltar,
entretanto, a necessidade de que os compromissos firmados, pelo governo brasileiro frente a
ONU, estejam especificados nos Planos Plurianuais. (CARNEIRO, 2011).
Batista et al (2020), ao discutirem os indicadores de monitoramento da PNSIPN,
lembram-nos da mobilização dos movimentos sociais em direção à institucionalização de uma
política pública voltada à saúde integral da população negra. Pontuam, ainda, a Assembleia
Nacional Constituinte (1987/1988) como um momento histórico, protagonizado por distintos
movimentos sociais que lutavam pela defesa da redemocratização do país. Nesse contexto, os
movimentos sociais negros reivindicavam por políticas governamentais de enfrentamento ao
racismo. Quanto às principais conquistas, dos movimentos negros, em relação à saúde da
população negra, destacam: a) em 1995, a apresentação, ao, então, Presidente Fernando
Henrique Cardoso, de um conjunto de demandas relacionadas às políticas públicas transversais
de enfrentamento ao racismo; b) a criação do grupo de trabalho interministerial (GTI), com o
intuito de valorizar a população negra; c) a inclusão do quesito “cor” no Sistema de
Informações sobre Mortalidade (SIM) e no Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos
(SINASC); d) criação da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR),
em 2003; e) realização, em 2004, do I Seminário Nacional de Saúde da População Negra e
criação Comitê Técnico de Saúde da População Negra; f) aprovação, em 2006, do texto da
PNSIPN pelo Conselho Nacional de Saúde; g) instituição da PNSIPN, no Diário Oficial da
União, através da portaria Nº 992 de maio de 2009; h) regulamentação da PNSIPN, por meio
do Estatuto da Igualdade Racial ( Lei Nº 12.288, de 20 de julho de 2010); i) pactuação do Plano
Operativo.
Ao analisarem as organizações do Movimento Negro e o processo de implementação da
Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (2006-2014), Araújo e Teixeira (2016)
pontuam que a heterogeneidade das entidades integrantes do movimento negro brasileiro não é
51

impeditiva para a convergência quanto ao ponto central, a saber: o combate à precarização das
condições sociais e de saúde da população da raça/cor negra. Nesse sentido, fazem alusão às
principais organizações, majoritariamente coordenadas por mulheres negras, que
protagonizaram o processo de negociação e implantação da PSIPN: a Associação Cultural de
Mulheres Negras (ACMUN), o Instituto da Mulher Negra (Geledés), a Organização da
Sociedade Civil Criola; a Federação Nacional de Associações das Pessoas com Doença
Falciforme (FENAFAL); a União dos Negros pela Igualdade (UNEGRO); a Rede Nacional de
Religiões Afro-Brasileiras e Saúde (RENAFRO). Destacam, ainda, o consenso sobre alguns
aspectos da SPN no Brasil. Têm o entendimento quanto aos avanços empreendidos a partir de
1995, rechaçando, contudo, a insuficiência das ações governamentais referentes à dotação
orçamentária. Com relação às políticas de saúde do Governo Federal, apontam a inépcia para a
mudança do perfil de morbimortalidade da população da raça/cor negra, novamente, atrelando
a problemática à pífia destinação de recursos, além da priorização das ações curativas em
detrimento das preventivas de promoção da saúde (ARAÚJO; TEIXEIRA, 2016).
Em suma, apontam para uma situação social de agudização dos problemas, tanto do
fortalecimento do racismo quanto da privatização do sistema público de saúde, demonstrando
o complexo entrelaçamento dessas duas problemáticas no Brasil. Porém, reconhecem certo
avanço nas ações do governo, no âmbito do executivo, um pouco mais nas questões diretamente
vinculada ao tema racial do que nas questões da saúde.
No tocante à ocupação das instâncias de gestão participativa e comissões técnicas, são
as principais estratégias para o acompanhamento da implementação da PNSIPN., a despeito do
esvaziamento governamental desses espaços.
O Conselho Nacional de Saúde tem 64 anos. Tem apenas dois mandatos do conselho
que tem a representação do movimento negro... nunca teve... (UNEGRO) ter uma
vaga no conselho nacional de saúde significa dizer que tem uma comissão no conselho
nacional de saúde dedicada a monitorar pelo lado de dentro o funcionamento, a
implementação da política. (CRIOLA) ... nosso principal espaço para a
implementação dessa política né?! É estar no conselho nacional de saúde. Eu acho que
a gente avança, quando a gente consegue ampliar essa participação no conselho
nacional de saúde [...] (ACMUN). Dentro do comitê [técnico de saúde da população
negra] a gente participa de todo processo de sugestões, de encaminhamentos, da
discussão, de como que deve fazer, do que deve mudar, aquilo que deu certo como
que tem que incentivar mais a participação dos municípios e dos estados que a missão
do comitê né?! [mas] reconhecemos que houve ‘um retrocesso’, uns dois anos, teve
aquele avanço aquele, deu uma parada e que teve uma retomada agora! (FENAFAL)
(ARAÚJO; TEIXEIRA, 2016, P.201-202).

Um ponto crucial, na discussão das estratégias de ocupação dos espaços de gestão


participativa, relaciona-se ao racismo institucional, que opera por meio de mecanismos de
52

naturalização das iniquidades raciais na saúde, gerando desvantagens à população da raça/cor


negra, em relação à raça/cor branca. Os indicadores de saúde mostram, por exemplo, que, apesar
do público prioritário do SUS ser da raça/cor negra, a população da raça/cor branca tem maior
acesso às consultas médicas e odontológicas; são as pessoas da raça/cor negra que têm as piores
autoavaliações do estado geral de saúde (FIOCRUZ, 2021) Nessa perspectiva, representantes
dos movimentos negros relatam a resistência de alguns espaços quanto à SPN, sob a justificativa
da defesa da universalidade do SUS, negam a equidade, ambos princípios de tamanha
importância e não concorrentes.
Nesse particular, afirmam encontrar resistências em alguns espaços do MS e até
mesmo no CNS em relação à temática, sendo acusadas diversas vezes de negarem o
princípio da universalidade do SUS em detrimento de uma pauta corporativa. Para as
lideranças, fica claro que a intensidade da disputa ideológica no campo da saúde
acerca das relações entre o racismo e suas implicações no quadro socio sanitário da
população brasileira tem implicações diretas no processo político, delineando a
correlação de forças nas decisões acerca da implementação da Política dizem que] a
gente fica insistindo em falar coisa de negro e falar de raça quando não tem nada a
ver, o SUS é universal, o SUS é pra todo mundo, que a gente tá defendendo uma
bandeira particular. (CRIOLA) existem pessoas que estão dentro...que poderiam
contribuir e que não contribui por não acreditar que existe o racismo e achar que a
gente quer um SUS separado (FENAFAL). Esse é o debate que a gente vai para cima
mesmo e eles mantêm. “Mas eu não sou racista, acho que não cabe, vai dividir o SUS”
e quem mais divide são eles quando eles ele aprova determinadas políticas de
pesquisa, inclusive, pra determinadas patologias e nunca prevalece a doença
falciforme nessa política (UNEGRO) (ARAÚJO; TEIXEIRA, 2016, p.203).

Com base nos relatos, fica evidente que a aprovação do texto da PNSIPN, em 2006, teve
relação direta com o cenário da inserção do movimento negro no CNS e dos acordos
multilaterais. É nítida, ainda, a relevância do Comitê Técnico de Saúde da População Negra
(CTSIPN), instituído em 2004, com o propósito principal de formular o texto da PNSIPN
(BATISTA; BARROS, 2017).
Nessa perspectiva, Ribeiro (2012) pontua a necessidade da qualificação das equipes
técnicas à frente da SPN. A autora chama a atenção para a renovação desses quadros, com
técnicos, minimamente, aptos para as discussões que demandam uma capacidade analítica que
ultrapasse o pensamento colonial.
É notório que a hipocrisia coletiva (CÉSAIRE, 2020), remanescente do colonialismo,
é corrente nas instituições da sociedade brasileira, sobretudo nas camadas sociais privilegiadas
pelo racismo. É sabida, ainda, a cor das pessoas que ocupam carreiras de gerência, de
representação política e que tomam as decisões de gestão, pelos Estados e Municípios desse
país (BENTO, 2022). Aquelas que, do alto da conveniente superficialidade analítica quanto à
capilaridade do racismo, decidem, a despeito dos indicadores sociais, que as “pautas
individuais” não merecem a mobilização governamental ou a dotação orçamentária expressiva.
53

Na contramão dessa perspectiva, o estudo sobre as políticas sociais e as desigualdades


raciais (IPEA, 2008) conclui:
O Estado tergiversa, afirmando a existência da desigualdade racial, ao mesmo tempo
em que não prioriza programas e ações nesse domínio. Além disso, uma parcela da
sociedade insiste em não identificar essa temática como um problema, e a parte que o
faz, mantém-se dividida entre aqueles que advogam pela necessidade da ação do
Estado e o reconhecimento da questão racial, e os que, de outro lado, postulam, ao
que se entende, equivocadamente, a suficiência da perspectiva universalista e do
tratamento igualitário para o enfrentamento das desigualdades e para a própria
estabilidade da democracia. O recente debate sobre as cotas para negros nas
universidades, em sua forma e conteúdo, é o exemplo mais emblemático de tal embate
(Idem, p. 169).

Assim, uma acepção equivocada de universalidade, distante do princípio da equidade,


tornou-se o mantra dos discursos gerenciais, justificando a secundarização, o apagamento da
SPN nos Planos de Saúde dos entes federativos, os contingenciamentos orçamentários, além de
toda sorte de empecilhos para a operacionalização da PNSIPN:
O que acontece que a gente vem acompanhando por um balanço feito inclusive pelo
Ministério da Saúde, é que são ações isoladas e descontínuas. E ação isolada e
descontinua não chega a lugar nenhum. (RENAFRO) Tem ações que quando o
Ministério da Saúde quer, ou a secretaria quer, eles fazem de um dia para o outro,
basta um telefonema e as coisas acontecem (GELEDES). Eu acho que a política não
tem sido implementada, não tem havido nenhum investimento. (FENAFAL) Afinal o
SUS, cujo universo com que trabalha é basicamente pessoas negras né?! Então já está
na disputa, de que não querem oferecer grande coisa pra ‘essa gente’ né?! Que eu
imagino que é o que deve ser que passar na cabeça daquelas pessoas[gestores].
(CRIOLA) com o sistema de informação do Ministério da Saúde, eles não provocam
em nome da independência federativa da autonomia federativa – não é nem
independente, autonomia federativa – “mas não posso intervir no estado”, mas quando
eles querem eles podem.(UNEGRO). Então precisa maior investimento financeiro no
mecanismo de gestão competente pra gestão do antirracismo no SUS, o SUS
garantindo que o financiamento não seja uma partição do SUS, mas que altere a lógica
do SUS, pra ele poder ser acolhido, pra política nacional de saúde da população negra
ser bem-sucedida. (CRIOLA) (ARAÚJO, TEIXEIRA, 2016: 204)

Em contextos não-pandêmicos, os indicadores sociais já demonstravam a fragilização


da população da raça/cor negra (IBGE, 2019). A partir de 2020, quando a população mais
atingida pela pandemia foi, também, a mais exposta aos trabalhos precarizados, ao desemprego,
à insegurança alimentar (OLIVEIRA ET AL, 2020; SANTOS ET AL, 2021; BATISTA;
PROENÇA; SILVA, 2021), os movimentos sociais negros protagonizaram a mobilização de
uma rede de cuidados não-governamentais17, conforme sinaliza a matéria do Portal Geledés
(MELLO, 2021)
O Brasil agoniza com sério risco de voltar ao mapa da fome, depois de décadas! Aos
brancos e brancas que se perguntam como podem ajudar é hora de colocar a mão no
bolso e doar para a campanha “Tem Gente com Fome, dá de comer” protagonizada

17
Ver no portal Geledés, a campanha “Tem gente com fome”: https://www.geledes.org.br/campanha-tem-gente-
com-fome-beneficia-220-mil-familias-em-2021/; https://www.geledes.org.br/organizacao-social-de-beyonce-
anuncia-nas-redes-apoio-a-campanha-tem-gente-com-fome/ . Acesso: 17/04/2022.
54

pela Coalizão Negra por Direitos, da qual Geledés faz parte entre as 200 organizações
do movimento negro, em parceria com a Anistia Internacional, Oxfam Brasil, Redes
da Maré, 342 Artes, ABCD – Ação Brasileira de Combate às Desigualdades, Nossas
– Rede de Ativismo, Instituto Ethos, Orgânico Solidário e Grupo Prerrogativas. O
objetivo principal é distribuir alimentos e produtos de higiene e limpeza para 222.895
famílias em situação de vulnerabilidade, mapeadas em todas as regiões do Brasil. A
meta é alta mesmo, daí a necessidade de tantas contribuições (Idem, p.1).

Conforme vimos na sessão sobre a SPN e a COVID-19, na medida em que o Presidente


Jair Messias Bolsonaro utilizava a máquina pública para desacreditar a gravidade da crise
sanitária que se desenharia durante 2020 e 2021, os movimentos sociais negros mobilizavam a
cobrança por medidas não farmacológicas e sociais, bem como articulavam a mobilização
social para campanhas solidárias com o objetivo de prover itens de higiene, proteção, bem como
de ordem alimentar.
Os esforços se desdobraram para a ampla divulgação e mapeamento das condições
epidemiológicas das favelas. Nesse sentido, o Radar da Favela Covid-1918, produzido a partir
da vigilância dos dados fornecidos pelos coletivos e movimentos sociais das favelas em parceria
com a FIOCRUZ foi um exemplo emblemático.
Em acordo com Gomes (2017), o movimento negro tem figurado o protagonismo na
mediação das demandas sociais da população da raça/cor negra frente às demais camadas da
sociedade e frente às gestões governamentais. Tal protagonismo vem repercutindo nos levantes
conservadores (CARNEIRO, 2011), mas, ainda, no tensionamento capaz de mobilizar respostas
governamentais e a adesão de setores da sociedade, como vimos durante os anos de 2020 e
2021, em meio à crise humanitária e sanitária decorrentes da pandemia e da má gestão de Jair
Messias Bolsonaro.

4.1.1.1. A implantação da PNSIPN no Município do Rio de Janeiro


A Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN) converge com a
superação do racismo institucional no âmbito da Saúde. Instituída pelo Ministério da Saúde em
2009 (Portaria Nº 992, de 13/05/09), não só visibilizou os agravos raciais em saúde (BRASIL,
2019), como imputou ao Estado a responsabilidade quanto ao seu enfrentamento.
Figueiredo et al (2009) ressaltam que, na década de 90, as pressões empreendidas pelos
movimentos sociais negros, bem como os rebatimentos dos acordos multilaterais, como o da

18
Desde o início da pandemia, o Observatório Covid-19/ FIOCRUZ, em parceria com os coletivos de favelas,
produziu quinze edições do informativo. Disponível:
https://portal.fiocruz.br/sites/portal.fiocruz.br/files/documentos_2/boletim-covid-favelas-15_arquivo_final.pdf.
Acesso: 14/02/2022.
55

III Conferência Mundial de Durban (BAIRROS, 2002) resultaram em mudanças institucionais.


A esse respeito, Faustino (2017) assevera:
Entretanto, é somente após a mobilização nacional em torno da III Conferência
Internacional contra o Racismo, Homofobia e as Intolerâncias Correlatas, realizada
em 2001, em Durban, África do Sul, e a resultante criação, em 2003, da Secretaria
Especial para a Promoção da Igualdade Racial, que o Ministério da Saúde criou um
Comitê Técnico de Saúde da População Negra, com o objetivo de promover a
equidade racial em saúde. É verdade que essa mobilização só foi possível mediante
um histórico de articulações, estudos e advocacy que remontam às décadas e governos
anteriores. Mas neste contexto, as articulações avançaram rapidamente para o
reconhecimento institucional de um conjunto de disparidades raciais em saúde e,
consequentemente, na pactuação de uma resposta programática ao cenário
identificado (Idem, p.3835).

Antecedendo a regulamentação da PNSIPN, em 2004, o Ministério da Saúde e a


Secretaria de Promoção de Políticas pela Igualdade Racial (SEPPIR) assinaram o termo de
compromisso com e equidade racial no SUS. No mesmo ano, foi criado o Comitê Técnico de
Saúde da População Negra (CTSPN), através da Portaria nº 1678, de 16 de agosto. Os Comitês
Técnicos são descentralizados, para cada esfera de governo, e têm como atribuição assessorar
as políticas, no âmbito do Ministério da Saúde, na perspectiva da equidade racial.
A PNSIPN é uma política transversal - porque não se restringe ao setor saúde- e
descentralizada para as três esferas de gestão do SUS. Possui uma série de objetivos, princípios,
marcas e diretrizes em convergência para o enfrentamento das iniquidades raciais em saúde.
(BRASIL, 2017)). Em consonância com a Constituição Federal de 1988, pauta os seus
princípios e objetivos na cidadania, na dignidade humana e no repúdio ao racismo. Tais
princípios também dialogam com o SUS, na defesa da universalidade do acesso, da
integralidade e da equidade da atenção à saúde.
A Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PSPN) fundamenta-se nos
mesmos princípios e objetivos postos pela Constituição Federal de 1988, ou seja, tem
como referências a cidadania, a dignidade da pessoa humana, o repúdio ao racismo e
a igualdade. Desse modo, mantém coerência com o objetivo fundamental da
República Federativa do Brasil de “promover o bem de todos, sem preconceitos de
origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (art. 3o,
inciso IV) (GOULART; TANUS 2007:25).

A marca da política a coloca na contramão da institucionalidade brasileira, porque


demarca o reconhecimento do racismo como determinante social da saúde, ou seja, como
parte da produção das parcas condições de saúde da população da raça/cor negra. Em
decorrência, a PNSIPN tem como objetivo geral promover a saúde integral da população
negra, priorizando a redução das desigualdades étnico-raciais, o combate ao racismo e à
discriminação nas instituições e serviços do SUS (BRASIL, 2017).
O racismo é um conjunto de crenças e valores alimentado pela tradição e pela cultura
que atribui características negativas a determinados padrões de diversidade e
significados sociais negativos aos grupos que os detêm. Os significados sociais
56

negativos atribuídos a estas características são utilizados para justificar o tratamento


desigual. Não é uma questão de opinião pessoal, o racismo está ligado à necessidade
e aos interesses, de um grupo social conferir-se uma imagem e representar-se. Ele
se reafirma no dia a dia pela linguagem comum, se mantém e se alimenta pela
tradição e pela cultura, submete a todos e todas; influencia as relações estabelecidas
entre as pessoas, as regras de convivência, a socialização de conhecimentos, a
transferência de tecnologias, a organização e o funcionamento das instituições e, por
consequência, a qualidade do serviço prestado (GOULART; TANUS, 2007, p.25)

Nogueira (2018) identifica três dimensões estratégicas e interdependentes: gestão,


ensino e assistência. A gestão tem o foco no controle social e na participação social. Tal
dimensão dialoga com as recomendações da 12ª Conferência Nacional de Saúde, no tocante
às comissões técnicas para o controle social da PNSIPN.
Os Comitês Técnicos de Saúde da População Negra e as Áreas Temáticas de Saúde
da População Negra tornaram-se os lócus de gestão participativa nos serviços de
saúde, revelando-se como colegiados consultivos mais apropriados para elaboração
de propostas de ações, intervenções e estratégias intra e intersetoriais referentes à
questão da equidade étnico-racial, com o propósito de auxiliar a gestão na
implementação e monitoramento das ações da PNSIPN (NOGUEIRA, 2018, P.29).

A dimensão do ensino tem por objetivo qualificar a gestão, as equipes técnicas em


relação à saúde da população negra.
Ao incluir temas referentes à saúde da população negra nos Planos Estaduais e
Municipais de Saúde, nas agendas dos serviços e unidades do sistema nacional de
saúde, nos processos de formação profissional e nas ações de informações aos
usuários do SUS, se aposta na possibilidade de mudanças no comportamento de
todos: gestores, burocracia implementadora e usuários do sistema (NOGUEIRA,
2018, p30).

A última dimensão, referente à assistência, baseia-se no reconhecimento do racismo na


determinação social da saúde. Justificando, assim, políticas sociais de mitigação das
desvantagens coletivas impostas pelo racismo institucional. Desde à promulgação, a PNSIPN
teve três planos operativos pactuados pelas Comissões Intergestores Tripartite (CIT), onde
foram estabelecidos os indicadores, estratégias e metas a serem atingidos pelo SUS.
O primeiro plano operativo, vigente de 2008 a 2011, propôs a operacionalização da
PNSIPN através de duas fases, a partir de dois problemas prioritários e com a indicação das
respectivas ações, estratégias operacionais, recursos financeiros, indicadores e metas para o
período. Os dois problemas prioritários eram: 1) Raça Negra e Racismo como Determinantes
Sociais das Condições de Saúde: acesso, discriminação e exclusão social; 2) Morbidade e
Mortalidade na População Negra. As ações possuíam os respectivos recursos financeiros
definidos no Plano Plurianual de 2008-2011, no âmbito dos programas e ações dos respectivos
órgãos e secretarias do Ministério da Saúde. Nesse sentido, sendo um programa descentralizado
para cada esfera de governo, o incentivo financeiro aconteceu por meio do repasse para os
57

fundos Estaduais, do Distrito Federal, Municipais. No que se refere às responsabilidades de


gestão do SUS e ao monitoramento e avaliação da das ações:
As três esferas de gestão do SUS têm como responsabilidades precípuas para
implementação do Plano: a definição do financiamento, a priorização de ações e o
monitoramento e avaliação que devem ser incluídos nos seus respectivos Planos de
Saúde. O monitoramento e a avaliação das ações deste Plano devem considerar os
problemas priorizados, assim como, os objetivos, as estratégias e os indicadores
propostos para o cumprimento das metas a serem pactuadas (Brasil, 2008, p.4).

O II Plano Operativo (2013- 2015) da PNSIPN foi instituído pelo MS, por meio da
Resolução nº 2, de 2 de setembro de 2014. Chama a atenção a lacuna dentre o I e o II Planos
Operativos. São dois anos de intervalo, o que denota a ausência da PNSIPN nos planos de saúde
e planos plurianuais durante o período. A ausência da SPN nos planos de saúde (Federal,
estaduais e Municipais) significa a não alocação de recursos para as ações em defesa da
equidade racial na saúde. Aqui está um ponto-chave para a operacionalização da PNSIPN.
Nessa linha de pensamento, a Resolução nº2, que regulamentou o II Plano Operacional
da PNSIPN, foi subscrita em 2014, fazendo referência ao Plano Operacional com validade a
partir de 2013. É muito provável que esse descompasso tenha repercutido no sub-financiamento
da PNSIPN nesse período. O II Plano Operacional da PNSIPN foi estruturado com foco na
dificuldade do acesso da população da raça/cor negra aos serviços de saúde, tendo como eixos
estratégicos: I - Acesso da População Negra às Redes de Atenção à Saúde; II - Promoção e
Vigilância em Saúde; III Educação Permanente em Saúde e Produção do Conhecimento em
Saúde da População Negra; IV - Fortalecimento da Participação e do Controle Social; e V -
Monitoramento e Avaliação das Ações de Saúde para a População Negra. Cada eixo estratégico
tinha uma série de ações estratégicas apontadas pela normativa.
O III Plano Operativo da PNSIPN foi instituído por meio da Resolução nº 16 de 30 de
março de 2017, do Ministério da Saúde. Estruturado pelos seguintes eixos estratégicos: I -
Acesso da População Negra às Redes de Atenção à Saúde; II - Promoção e Vigilância em Saúde;
III -Educação Permanente em Saúde e Produção do Conhecimento em Saúde da População
Negra; IV - Fortalecimento da Participação e do Controle Social; V - Monitoramento e
Avaliação das Ações de Saúde para a População Negra. Ao Ministério da Saúde, foram
atribuídas as seguintes responsabilidades: I - apoiar a implementação do III Plano Operativo
(2017/2019) da PNSIPN nos Estados, Distrito Federal e Municípios; II - estabelecer
instrumentos e indicadores para acompanhamento, monitoramento e avaliação da Política
Nacional de Saúde Integral da População Negra; III - publicar Relatório Anual Sistematizado
acerca da situação de saúde da população negra no Brasil. Aos Estados e Municípios, cabendo
58

a elaboração de planos de ações, a inclusão do III Plano Operativo da PNSIPN nos respectivos
Planos de Saúde e Planos Plurianuais.
No tocante à gestão do SUS para a implementação da PNSIPN, a Secretaria de Gestão
Estratégica e Participativa (SGEP/MS) assumiu a coordenação das diversas Secretarias
estaduais e municipais na elaboração de instrumentos normativos. Sendo responsável pela
capilarização nacional da política, a capacitação técnica de profissionais e gestores por meio do
apoio técnico às Secretarias, monitoramento e avaliação. Mas, a partir de 2019, as políticas de
promoção da equidade em saúde, como a PNSIPN, alocaram-se na SAPS -Secretaria de
Atenção Primária em Saúde – ( decreto MS/ n. 9.795, de maio de 2019). Nesse contexto, a
SGEP (Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa) foi extinta. Atualmente, a gestão da
PNSIPN está na COGE (Coordenação de Garantia da Equidade) da CGGAP (Coordenação-
Geral de Garantia dos Atributos da Atenção Primária) do DESF (Departamento de Saúde da
Família) da SAPS (MILANEZI, 2020).
À gestão Estadual do SUS caberia a definição de planos de ações para a implementação
do II Plano Operativo da PNSIPN, conduzindo à pactuação na Comissão Intergestores Bipartite
(CIB) e promovendo a inclusão do II Plano Operativo no Plano Estadual de Saúde e no Plano
Plurianual (PPA)19. À gestão municipal do SUS, caberia a definição de um plano de ação para
a implementação do II Plano Operativo da PNSIPN em âmbito municipal, bem como a inclusão
do II Plano Operativo da PNSIPN no Plano Municipal de Saúde e no PPA setorial (Brasil,
2014).
A implantação descentralizada (Governo Federal, Estados e Municípios) dos Comitês
Técnicos de Saúde da População Negra (CTSPN) foi uma estratégia singular para a
operacionalização da política. Os Comitês têm a incumbência de assessorar a gestão. Para
tanto, atuam no controle social e, ainda, no planejamento, acompanhamento, avaliação da
eficácia da política.
Outro aspecto de vital importância para o campo da SPN foi a obrigatoriedade do
quesito raça/cor nos sistemas de informação, permitindo a visibilidade das iniquidades das
quais os movimentos sociais negros e a população da raça/cor negra falavam há muito tempo.

19
Conforme o Ministério da Economia, “O principal instrumento de planejamento orçamentário de médio prazo
do Governo Federal é o Plano Plurianual (PPA). Ele define as diretrizes, os objetivos e as metas da administração
pública federal, contemplando as despesas de capital (como, por exemplo, os investimentos) e outras delas
decorrentes, além daquelas relativas aos programas de duração continuada. O PPA é estabelecido por lei, com
vigência de quatro anos. Ele se inicia no segundo ano de mandato de um presidente e se prolonga até o final do
primeiro ano do mandato de seu sucessor” (Disponível: https://www.gov.br/economia/pt-
br/assuntos/planejamento-e-orcamento/plano-plurianual-ppa . Acesso: 12/05/2022).
59

O terceiro plano operativo da PNSIPN (Resolução Nº 16, de 30 de março de 2017)


esteve vigente até o ano de 2019. Porém, a destinação de recursos vem decrescendo
(GÉLEDES, 2022). Em 2018, 6 milhões de Reais foram cortados (BATISTA et al, 2020).
Em 2021, o governo Bolsonaro investiu menos em ações diretas para o fortalecimento
das populações indígenas e quilombolas, além de diminuir o orçamento para a
promoção da igualdade racial, aponta o Balanço do Orçamento Geral da União 2021,
realizado pelo INESC (Instituto de Estudos Socioeconômicos).O Estudo mostra que,
em 2021, foram autorizados R$ 746,34 milhões para o orçamento da Funai (Fundação
Nacional do Índio), mas apenas R$ 139,80 milhões foram destinados para ações
finalísticas do órgão, ou seja, aquelas cujos impactos são sentidos diretamente pelas
comunidades indígenas, como a proteção e promoção dos direitos dos povos
indígenas, gestão ambiental e territorial, incentivo à sustentabilidade das comunidades
de acordo com seus modos de vida, ações de caráter de assistencial, como distribuição
de cestas básicas (GÉLEDES, 2022, p1).

Tendo em vista que o orçamento público é um dos principais viabilizadores das ações
governamentais, é necessário analisar a dotação orçamentária para a SPN, a partir da
argumentação da PNSIPN. Nesse sentido, Pereira e Rodrigues (2021) pontuam que as
prioridades governamentais são identificadas a partir da alocação orçamentária. A autora
acrescenta que o Plano Plurianual (PPA) do Governo Federal, do período compreendido entre
os anos de 2016 e 2019, continha apenas um programa específico, atinente à equidade racial: o
Programa 2034 – Promoção da Igualdade Racial e Superação do Racismo, que tinha como uma
das metas “Contribuir para a implementação da Política Nacional de Saúde Integral da
População Negra, incluindo a atualização do seu Plano Operativo”. Entretanto, no PPA atual,
compreendido entre 2020 e 2023, temos o apagamento da SPN. A negação dos indicadores
raciais em saúde, é evidenciada pela ausência de programas, objetivos ou metas relacionadas à
população da raça/cor negra (PEREIRA; RODRIGUES, 2021). Com relação à Lei
Orçamentária Anual (LOA)20:
(...) os recursos são, na maioria das vezes, alocados em ações genéricas, com o
objetivo de facilitar o desembolso daqueles. No entanto, essa prática dificulta
sobremaneira o controle social, pois impossibilita que sejam acompanhadas as
despesas por recortes de gênero, raça, faixa etária e orientação sexual. No Ministério
da Saúde, esse fenômeno (as ações genéricas) é recorrente, sendo difícil até mesmo
obter a localização geográfica do gasto (Idem, p.1)

Pereira e Rodrigues (2021) acrescentam que, até 2020, havia uma tímida movimentação
governamental por meio da ação orçamentária 20YM/ “Implementação de Políticas de

20
Conforme a Câmara dos Deputados, “O Orçamento da União é um planejamento que indica quanto e onde
gastar o dinheiro público federal no período de um ano, com base no valor total arrecadado pelos impostos. O
Poder Executivo é o autor da proposta, e o Poder Legislativo precisa transformá-la em lei” ( Disponível:
https://www2.camara.leg.br/orcamento-da-uniao/leis-orcamentarias/loa/lei-orcamentaria-anual-loa . Acesso:
12/05/2022)
60

Promoção da Equidade em Saúde”, voltada às populações vulnerabilizadas, como a


cigana, LGBTQIA+, população negra e outras. Em 2016, com R$46,5 milhões de Reais; em
2018, com R$ 8,8 milhões; em 2020, contudo, chegou a R$28 milhões. Entretanto, em 2021, a
ação foi extinta do respectivo Projeto de Lei Orçamentária (PLOA), seguindo a perspectiva da
eliminação da SPN do PPA de 2020 a 2023. Importa ressaltar que a eliminação da SPN das
previsões orçamentárias da União ocorre no período de maior vulnerabilização da população
da raça/cor negra, em decorrência da COVID-19. Assim, é necessário estar em alerta, uma vez
que:
Qualquer tentativa de assegurar o direito à saúde da maior parte da população
brasileira que não observe a implementação da Política Nacional de Saúde Integral da
População Negra conjugada à consignação de recursos no orçamento estará
condenada ao questionamento de sempre: será mesmo que o Estado brasileiro está
comprometido com o atendimento igualitário no Sistema Único de Saúde (SUS)?
Hoje, infelizmente parece que a resposta é “Não”. Fazer mais do mesmo apenas trará
mais mortes e iniquidades (PEREIRA; RODRIGUES, 2021, p. 1).

A despeito das narrativas governamentais, da legislação vigente, da opinião pública, a


implementação da PNSIPN está condicionada à dotação orçamentária que viabilize as ações
referentes à população negra. Discursos sobre intenções, quando destituídos de orçamento
público, não passam de retórica.
A instituição do Comitê Técnico de Saúde da População Negra, no município do Rio de
Janeiro, foi um marco para a mobilização de estratégias voltadas à implantação local da
PNSIPN. Diante do perfil epidemiológico municipal por raça/cor e a evidente iniquidade racial
em saúde, justificaram-se as ações da SMS para a SPN (RIO DE JANEIRO, 2020). Em 2006,
a articulação da, então, Secretaria de Promoção da Saúde com a ONG Criola promoveu o II
Seminário de Promoção da Saúde: Equidade em Saúde da População Negra. Tinha como
objetivos centrais a sensibilização de gestores e profissionais da Saúde, bem como a definição
de estratégias para a implantação da PNSIPN no município do Rio de Janeiro. Vale destacar
que esse movimento se deu anteriormente à pactuação da PNSIPN, em 2008, pela Comissão
Intergestores Tripartite. A partir de então, foram estabelecidas estratégias para a promoção da
equidade racial em saúde no município do rio de Janeiro (Figura 5), dentre as quais destacam-
se a instituição do CTSPN/RJ e a dotação orçamentária para as ações relacionadas ao campo da
Saúde da População Negra.
61
Figura 5 – Implantação da PNSIPN
no Município do Rio de Janeiro
62

Em 2007, a SMS/RJ priorizou a sensibilização de gestores, coordenadores de Áreas


Programáticas e diretores das Unidades de Saúde. Em 10 de setembro desse ano, por meio da
Resolução/SMS-Rio nº 1298, o Comitê Técnico da Saúde da População Negra do Município
do Rio de Janeiro (CTSPN) foi instituído. A Resolução SMS Nº 1368, de 25 de julho de 2008,
reconheceu a institucionalidade do CTSPN, aprovando o Regimento Interno. Registra que o
Comitê tem composição paritária, com representantes da sociedade civil e da Secretaria
Municipal de Saúde 21 (dezesseis no total). Serão observados os seguintes objetivos: I)
sistematizar propostas de equidade racial, II) apresentar subsídios técnicos e políticos à
melhoria da saúde de negros, III) elaborar plano de ação, IV) fomentar ações intersetoriais,
V) implantar, acompanhar e avaliar ações de equidade racial em saúde. São atribuições do
Comitê: I- apresentar subsídios técnicos e políticos voltados para a atenção à saúde da
população negra no processo de elaboração, implementação e acompanhamento do Plano
Municipal de Saúde; II – elaborar propostas de intervenção e contribuir para a sua pactuação
nas diversas instâncias da saúde e órgãos da Prefeitura; III – sistematizar propostas que visem
a promoção da equidade racial na atenção à saúde; IV – participar da elaboração, do
acompanhamento e avaliação das ações programáticas e das políticas emanadas pela
Secretaria de Saúde no que se refere à promoção da igualdade, segundo as estratégias
propostas pelo Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial - CNPIR, criado pela leiº
10.678, de 22 de maio de 2006.
4.1.1.1.1. O racismo na determinação social da saúde
O racismo, enquanto estrutura sistemática de discriminação, expressa-se por meio de
atitudes conscientes ou não, tendo na raça -socialmente produzida - a sua fundamentação. As
desvantagens e privilégios individuais, segundo o grupo racial de pertença, são oportunizados
pelo racismo (WERNECK, 2016; ALMEIDA, 2019; CARNEIRO, 2019). Ainda que não haja
consenso em torno da etimologia do termo raça, seu significado esteve associado, ao longo
da história, à classificação de seres vivos.

21
No tocante à composição, as seguintes representatividades da sociedade civil foram convidadas: Criola - ONG
de Mulheres Negras; Rede de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde; Conselho Municipal de Defesa dos Direitos
do Negro Titular - COMDEDINE; Instituições e Entidades de Estudo e Pesquisa; Fórum Estadual de População
Negra; - Fórum Estadual de Mulheres Negras; - Associação Brasileira de Aids- ABIA; - Instituto de
Psicossomática Psicanalítica - Ori- Aperê. Quanto à SMS/RJ: Assessoria de Promoção da Saúde;
Superintendência de Vigilância em Saúde; Superintendência de Atenção Especializada; Superintendência de
Atenção Básica; Conselho Municipal de Saúde; Coordenação de Saúde Mental; Representantes das
Coordenações de Área Programática de Saúde por área de afinidade; Técnicos especialistas da SMS/Rio das
áreas de emergências, maternidades, casa de parto, saúde mental e atenção básica. (Rio de Janeiro, 2008).
63

Assim, relaciona-se ao contexto histórico, acompanhado, frequentemente, por conflito, poder,


e a indissociabilidade com as circunstâncias históricas (ALMEIDA, 2019; MOORE, 2009).
Foram, portanto, as circunstâncias históricas de meados do século XVI que
forneceram um sentido específico à ideia de raça. A expansão econômica
mercantilista e a descoberta do novo mundo forjaram a base material a partir da qual
a cultura renascentista iria refletir sobre a unidade e a multiplicidade da existência
humana. Se antes desse período ser humano relacionava-se ao pertencimento a uma
classe política ou religiosa, o contexto da expansão comercial burguesa e da cultura
renascentista abriu as portas para a construção do moderno ideário filosófico que
mais tarde transformaria o europeu no homem universal (atentar ao gênero aqui é
importante) e todos os povos e culturas não condizentes com os sistemas culturais
europeus em variações menos evoluídas (ALMEIDA, 2019, p. 25).

A sociedade brasileira foi gerada nos horrores da colonização europeia: o genocídio dos
povos originários, o sequestro e escravização de um contingente da população africana
(NASCIMENTO, 2016). A hierarquização racial justificou os processos desumanizadores,
característicos do sistema escravagista. Mesmo que relacionado às diferenças fenotípicas entre
colonizadores e colonizados, o racismo colonial serviu a uma estratégia complexa de
dominação interessada, principalmente, nas questões econômicas (FANON, 2008). Estava
configurado o que viria a ser um projeto maior de dominação capitalista. Nesse sentido,
Faustino (2015) assevera:
Diante da situação colonial, a violência dispensa a necessidade de legitimação, já que
o Outro – este objeto que não é mais visto nem tratado como extensão do Eu – só
aparece como predicado dos desejos e gozos do colonizador (...) Assim, o racismo
para Fanon é tanto um produto quanto um processo pelo qual o grupo dominante
lança mão para desarticular as possíveis linhas de força do dominado, destruindo seus
valores, sistemas de referência e panorama social, pois, uma vez “desmoronadas, as
linhas de força já não ordenam. Frente a elas, um “novo conjunto imposto, não
proposto, é afirmado com todo o seu peso de canhões e de sabres” (Idem, p. 52).

Segundo Quijano (2005), o continente europeu foi o primeiro espaço/tempo em que se


instaurou uma modalidade de poder de proporção universal, a partir de dois processos históricos
convergentes e fundamentais, a saber: a) a superioridade racial dos colonizadores, em relação
aos colonizados; b) a formatação do controle do trabalho, recursos e produtos em volta do
capital e do mercado mundial.
Na América, a ideia de raça foi uma maneira de outorgar legitimidade às relações de
dominação impostas pela conquista. A posterior constituição da Europa como nova
identidade depois da América e a expansão do colonialismo europeu ao resto do
mundo conduziram à elaboração da perspectiva eurocêntrica do conhecimento e com
ela à elaboração teórica da ideia de raça como naturalização dessas relações coloniais
de dominação entre europeus e não-europeus. Historicamente, isso significou uma
nova maneira de legitimar as já antigas ideias e práticas de relações de
superioridade/inferioridade entre dominantes e dominados. Desde então demonstrou
ser o mais eficaz e durável instrumento de dominação social universal (Quijano, 2005,
p.117).
64

Por sua vez, Moore (2009) convida-nos para uma reorientação epistemológica. Afirma
que o racismo colonial não foi o marco zero. Apesar dos estudos acadêmicos sobre o racismo,
no século XX, serem orientados por dois grandes desastres humanitários - a escravização negra-
africana e o holocausto judeu – o autor chama atenção para o compromisso com a realidade
histórica.
Não se trata aqui de desvalorizar a importância do surgimento da categoria raça como
um condicionante relativo das possíveis intepretações contemporâneas do racismo,
mas de observar que o projeto científico moderno de uma compreensão sistemática e
racializada da diversidade humana, operada nos séculos XVIII e XIX, apenas foi
possível em função do critério fenotípico em escala planetária (...) Com isso, a visão
de que o racismo seja uma experiência da contemporaneidade, cujas raízes se inserem
na escravização dos povos africanos pelos europeus, a partir do século XVI, não é
consistente historicamente ( MOORE, 2009, p.22).
No tocante à sociedade moderna, o projeto de transformação social iluminista e o
século XVIII mobilizaram a produção de um saber filosófico, cuja centralidade era o homem
em suas múltiplas versões (vida, trabalho construção de afeto). Do ponto de vista intelectual,
o iluminismo instrumentalizou a classificação dos diversos grupos humanos, a partir de suas
características físicas e culturais. Desse movimento, surgiu a distinção filosófico-
antropológica entre civilizado e selvagem (século XVIII) e entre civilizado e primitivo (século
XIX). O iluminismo foi o fundamento filosófico das revoluções liberais e da transição das
sociedades feudais para as capitalistas. Nesse contexto, inscreveu-se a sustentação filosófica
do homem universal, dos direitos universais, além dos benefícios da liberdade, da igualdade,
do Estado de direito e do mercado (ALMEIDA, 2019). Contudo, a revolução Haitiana 22
demonstrou que os pressupostos fraternais da liberdade e igualdade não se aplicavam a todos
(MBEMBE, 2014; ALMEIDA, 2019).
No século XIX, o positivismo levou as questões sobre as diferenças humanas ao
campo científico. Entendendo que nem toda teoria é emancipadora e libertária (HOOKS,
2017), a ciência positivista se debruçou a explicar as diferenças morais, psicológicas e
intelectuais através do determinismo biológico e geográfico. Nessa perspectiva, tomando o
homem europeu como ser universal, a pele negra e o clima tropical seriam fatores
determinantes para a formação de pessoas pouco inteligentes, imorais e violentas. Por isso,
cientistas da época23 recomendavam a recusa por relacionamentos interraciais (ALMEIDA,
2019; MORRISON, 2019). Arthur de Gobineau, filósofo e diplomata francês, foi um
precursor do racismo científico.

22
Em 1791, o Haiti insurgiu-se contra os seus escravizadores franceses, colocando em evidência que os valores
fraternais da sociedade iluminista eram circunscritos à população europeia (ALMEIDA, 2019).
23
Os brasileiros Silvio Romero e Raimundo Nina Rodrigues retratam, por meio de seus trabalhos, o racismo
científico amplamente difundido nos tratados médicos do século XIX (Almeida, 2019; Morrison, 2019).
65

Sua obra mais conhecida, Ensaio sobre as Desigualdades das Raças Humanas, influenciou o
pensamento social brasileiro. Em 1869, durante uma viagem diplomática ao Brasil,
surpreendeu-se com uma população “feia” e “degenerada” pela miscigenação, sendo fadada
a desaparecer, segundo o medíocre pensador, nos duzentos anos seguintes, em razão da
degeneração genética (CÉSAIRE, 2020). Em contraposição ao delírio da modernidade
(MBEMBE, 2014), que segue animalizando tudo o que não é espelho para a branquitude,
somos alertados sobre o processo de embrutecimento e degradação das sociedades
escravagistas. De sorte que todo o histórico de tortura e espólio dos povos escravizados, tem
denotado um processo irreversível de asselvajamento do continente europeu (CÉSAIRE,
2020).
Sim, valeria a pena estudar, clinicamente, em detalhes, os passos de Hitler e do
hitlerismo e revelar ao burguês muito distinto, muito humanista e muito cristão do
século XX que ele carrega consigo um Hitler sem saber, que Hitler vive nele, que
Hitler é seu demônio, que se ele o vitupera é por falta de lógica e, no fundo, o que
não perdoa em Hitler não é o crime em si, o crime contra o homem, não é a
humilhação do homem em si, é o crime contra o homem branco, é a humilhação do
homem branco, é de haver aplicado à Europa os procedimentos colonialistas que
atingiam até então apenas os árabes da Argélia, os coolies da Índia e os negros da
África ( CÉSAIRE, 2020, p. 18).

O século XX inaugurou uma linha antropológica em busca da demonstração da


inaplicabilidade do conceito de raça, do ponto de vista biológico. Todavia, ainda que as
ciências biológicas tenham demonstrado a invariabilidade da raça humana, a concepção
política de raça permanece como um fator importante para a naturalização de desigualdades,
segregação e do genocídio de grupos minorizados (ALMEIDA, 2019; SANTOS, R., 2021).
Nessa trama, o racismo tem um caráter sistêmico, que responde a uma estrutura social
na qual privilégios e condições de subalternidade são determinados segundo o pertencimento
racial e replicados nas esferas política, econômica e das relações do dia a dia (ALMEIDA,
2019).
O racismo articula-se com a segregação racial, ou seja, a divisão espacial de raças
em localidades específicas – bairros, guetos, bantustões, periferias, etc.- e/ou à
definição de estabelecimentos comerciais e serviços públicos – como escolas e
hospitais- como de frequência exclusiva para membros de determinados grupos
raciais, como são exemplos os grupos segregacionistas dos Estados Unidos, o
Apartheid sul-africano e, para autoras como Michelle Alexander e Ângela Davis, o
atual sistema carcerário estadunidense ( ALMEIDA, 2019, p.34).

O pensamento social brasileiro tem voltado o olhar para a discussão acerca da questão
racial desde o período escravocrata. É notória, nos círculos intelectuais de grande circulação,
a negação da continuidade da cultura discriminatória, a partir da dita abolição da escravatura
e da sociedade republicana.
66

Seguindo a trilha da já nomeada hipocrisia coletiva (CÉSAIRE, 2020), o pensamento


social migrou do pessimismo relacionado à miscigenação brasileira – racismo científico de
Nina Rodrigues – para a fábula das relações cordiais – democracia racial de Gilberto Freire.
Um ponto de inflexão, contudo, adveio do pensamento de Carlos Hasenbalg, por meio da
abordagem das desigualdades raciais como produto do racismo (CARNEIRO, 2011).
Na sociedade brasileira, a recusa à ideia da permanência do racismo e a ideologia da
democracia racial são reforçadas pelo discurso meritocrático. A partir dessa vertente, uma vez
que não exista mais racismo, as condições sociais de negros e brancos são fruto dos próprios
esforços, capacidades intelectuais e mérito. As pessoas que não alcançam um lugar de
destaque social não tiveram a garra necessária para vencer os obstáculos comuns a todos
(ALMEIDA, 2019; BENTO, 2022). Afirmações como essas denotam duas possibilidades:
privilégio branco e a necessidade de manter o que está bom para poucos ou alienação,
tristemente reproduzida, inclusive pela massa usurpada pelo racismo. Em contraposição ao
ideário idílico de Gilberto Freire, Césaire (2020) chama atenção para o que pode ser gerado
da relação entre escravizador e escravizado: o trabalho forçado, a intimidação, a pressão, o
roubo, a violência sexual, o desprezo, o necrotério, as elites descerebradas, as massas aviltadas
(Idem, p.24). Renunciando ao cinismo colonial, evidencia-se à familiaridade entre o
colonialismo e a coisificação.
Falam-se de progresso, das “realizações”, das doenças curadas e dos níveis de vida
elevados além de si mesmos. Mas eu falo de sociedades esvaziadas de si mesmas,
culturas pisoteadas, instituições solapadas, terras coisificadas, religiões
assassinadas, magnificências artísticas destruídas, possibilidades extraordinárias
destruídas (CÉSAIRE, 2020, p.24-25).

A partir da década de 60 do século passado, em decorrência da mobilização do


movimento negro, sobretudo feminino, a problematização do racismo tem trazido uma certa
consciência à Nação. Nesse sentido, os estudos sobre as desigualdades socio-raciais (ONU,
OBGE, IPEA) corroboram, estatisticamente, com as denúncias elaboradas pela elite
intelectual negra, desde a década de 30.
Moore (2009) chama atenção para o conceito de Nação, remetendo-nos à ideia de
unidade. A constatação das disparidades socioeconômicas e raciais que permanecem
orgânicas à sociedade brasileira, causa desconforto e deflagra a polaridade existencial de seus
cidadãos. Desde o final da década de 80, o governo brasileiro vem adotando políticas com a
finalidade de mitigar das disparidades raciais. Foram políticas públicas de ação afirmativa
com recorte sócio racial em 2000; em 2003, a obrigatoriedade do ensino da história da África
e dos Afrodescendentes; a PNSIPN, em 2009.
67

Essas medidas não foram isentas dos impactos na consciência social, por meio da
incompreensão acrítica ou do apoio entusiasta (MOORE, 2009).
O apoio e os efeitos das medidas do Estado, a partir de 2003, em prol da
incorporação da metade afrodescendente do país tem possibilitado, pela primeira
vez, um debate aberto sobre uma realidade mantida, até então, sob o manto do
silêncio e da denegação. Essas medidas, que anunciam de forma simbólica, o fim
da proverbial omissão dos poderes públicos ante o fenomenal descompasso
sociorracial brasileiro, criam, potencialmente, as condições psicológicas para o
progressivo empoderamento da metade da população. Pouco a pouco, chega à
consciência de todos a realidade de que manter essa enorme parte da Nação relegada
à tamanha marginalização socioeconômica e cultural faz com que haja um enorme
risco à própria coesão nacional (Idem, 2020, p.20-21).

Diante da movimentação governamental pelas, ainda, tímidas medidas de reparação e


equidade sociorracial, na elite do atraso (SOUZA, 2017), instaurou-se o receio quanto à
inviabilidade da manutenção do status quo. Assim, fugindo do embate legal, são articuladas
estratégicas de desarticulação e descrédito da pauta da equidade racial mediante à opinião
pública (MOORE, 2009). A trivialização do racismo compreende uma das estratégias para a
manutenção da ordem social racista, sem perder likes nos stories da consciência coletiva. Os
meios acadêmicos, responsáveis pela elaboração da ideologia racial predominante na
atualidade, seguem na mobilização de revisionismos e posicionamentos capazes de promover
a banalização da escravização negra e seus revezes sociais, principalmente para a população
negra. Simultaneamente às políticas afirmativas e ao ingresso de estudantes negros nos
espaços, até então, majoritariamente brancos, circulam ideários cujo objetivo é o da
deslegitimação de qualquer “ofensiva contra o edifício globalizado da opressão racial”
(MOORE, 2009, p.29).
Conforme a filósofa Sueli Carneiro (2011), no imaginário social brasileiro, encontram-
se em disputa duas matrizes teóricas e/ou ideológicas: a) A democracia racial, tendo como
principal objetivo o distanciamento das disparidades raciais do espaço político, reproduzindo,
assim, o silêncio governamental em torno das demandas por equidade racial; b) O pensamento
progressista, sob a perspectiva da luta de classes, que secundariza as desigualdades raciais,
ignorando a centralidade da raça - socialmente construída – na estruturação de classes no
Brasil (CARNEIRO, 2011).
O racista nega esse quadro [das desigualdades raciais] e pior, o justifica. Ele
combate de maneira ferrenha qualquer proposta tendente a mudar o status quo
sociorracial, usando dos mais variados argumentos universalistas, integracionistas
e republicanos. Todos os argumentos apresentados no sentido inverso, todas as
estatísticas aduzidas para demonstrar a prevalência, na América Latina, de um
espantoso quadro de opressão racial são insuficientes; o racista é imune a tudo
quanto não sejam as razões para a manutenção dos privilégios unilaterais que
desfruta a sociedade. O racismo retira a sensibilidade dos seres humanos para
perceber o sofrimento alheio, conduzindo-os inevitavelmente à trivialização e à
banalização. Essa barreira de insensibilidade, incompreensão, e rejeição ontológicas
68

do Outro, encontrou na América Latina, a sua mais elaborada formulação no mito-


ideologia da “democracia racial” (MOORE, 2009, p.23).

Existe, no Brasil, um longo caminho a ser percorrido. Mesmo a ala progressista, sob
o mote da democratização do que é coletivamente produzido, relega à população negra a
condição periférica, quando, na realidade, o domínio escravagista e a inércia governamental
republicana, deram as bases materiais para a conformação da sociedade capitalista. Não se
trata de uma dificuldade de entendimento da esquerda quanto à centralidade do racismo no
sistema capitalista, mas de uma opção pela rejeição o “Outro” (MORRISON, 2019).
Por sua vez, a intelectualidade negra, ainda que interditada pela “métrica universal”,
tem produzido uma teoria insubmissa há muito tempo. E a nova geração acadêmica negra
coloca os referidos intelectuais no centro do debate. No tocante à discussão acerca do racismo,
pode-se classificá-lo em três concepções (ALMEIDA, 2019) relacionais, porém com aspectos
singulares: a) individualista (racismo e subjetividade); b) institucional (racismo e Estado); c)
estrutural (racismo e Economia). A concepção individualista volta-se a um fenômeno
individual ou coletivo, atinente a grupos isolados. Sob essa perspectiva, o racismo estaria
circunscrito ao indivíduo e não às instituições ou às sociedades. Assim, a educação e a
conscientização serão as formas de combate ao problema. A concepção individualista, por
sua limitação, tem encontrado abrigo em análises superficiais acerca do tema, que não levam
em consideração a historicidade das relações mediadas pelo racismo.
É uma concepção que insiste em flutuar sobre uma fraseologia moralista (...)
“racismo é errado”, “somos todos humanos” (...) no fim das contas, quando se limita
o olhar sobre o racismo a aspectos comportamentais, deixa-se de considerar o fato
de que as maiores desgraças produzidas pelo racismo foram feitas sob o abrigo da
legalidade e com o apoio moral de líderes políticos, líderes religiosos e dos
considerados “homens de bem” (ALMEIDA, 2019, p.37)

A concepção institucional representou um ganho teórico para os estudos das relações


raciais no Brasil. Nessa dimensão, o racismo é visualizado como o resultado da forma de
funcionamento das instituições que distribuem, mesmo que indiretamente, privilégios e
desvantagens segundo a raça. No racismo institucional, as desvantagens ocorrem por meio de
regras discriminatórias baseadas na raça, como ferramenta de manutenção do grupo social
dominante no poder. Nesse sentido, a cultura, padrões e estética de um determinado grupo
passam a ser o modelo “civilizatório”.
Assim, o domínio de homens brancos em instituições públicas – o legislativo,
judiciário, o ministério público, reitorias de universidades, etc. – e instituições
privadas- por exemplo, diretoria de empresas – depende, em primeiro lugar, da
existência de regras e padrões que direta ou indiretamente dificultem a ascensão de
negros e/ou mulheres, e, em segundo lugar, da inexistência de espaços em que se
discuta a desigualdade racial e de gênero, naturalizando, assim, o domínio do grupo
formado por homens brancos ( ALMEIDA, 2019, p.41).
69

O racismo institucional, diferentemente do individual, é sutil, indireto em sua


manifestação, contudo infinitamente mais deletério para a coletividade. Assistir à humilhação
de um atleta negro em Rede Nacional (quando os seus companheiros comparam a sua cor ao
saco de lixo) é violento e condenável pela opinião pública (racismo individual). Entretanto, a
superioridade da morbimortalidade de gestantes e crianças da raça/cor negra em relação à
raça/cor branca, no município do Rio de Janeiro, assim como a falta de acesso da população
da raça/cor negra aos Centros de Tratamento Intensivo durante a Pandemia COVID-19 (com
o agravante do referido segmento ser o mais afetado pelo desfecho morte) são indicadores do
racismo institucional e do seu poder deletério para a coletividade.
Conforme Almeida (2019), o racismo institucional transita na operação de forças
estabelecidas, respeitadas socialmente. Consequentemente, é alvo de menor condenação
pública. Um ponto importante acerca das instituições repousa no fato destas serem
imprescindíveis para a manutenção da supremacia branca, na medida em que foram instituídas
nos marcos republicanos e sob a perspectiva dos interesses econômicos das chamadas elites
brancas.
Nesse sentido, as instituições exercem um papel central na formulação de regras e
padrões sociais que direcionam privilégios à população branca (ALMEIDA, 2019;
CARNEIRO, 2019; BENTO, 2022). Operam na manutenção de uma ordem social que se
pretende resguardar. O racismo institucional é parte de uma estrutura social pré-existente, atua
na materialização de um modo de socialização que encontra no racismo uma das suas bases
orgânicas (ALMEIDA, 2019). Grosso modo, “as instituições são racistas porque a sociedade
é racista” (ALMEIDA, 2019, p. 47). As estruturas sociais seriam constituídas por inúmeros
conflitos – raça, classe, gênero – dando margem para que as instituições se posicionem a partir
da disputa de narrativas. Os espaços institucionais que se colocam alheios à criação de
mecanismos para tratar dos conflitos de raça, classe e gênero serão reprodutores de práticas
racistas, discriminatórias e misóginas. Sendo o racismo orgânico à ordem social, a medida de
enfrentamento demandará a implantação de práticas antirracistas efetivas. A promoção da
igualdade e da diversidade em suas relações internas e externas deverão ser alcançadas através
de políticas para: a) a ascensão da maioria minorizada (SANTOS, R., 2021) à condição de
gestão; b) promoção de fóruns permanentes para debates e mudança de práticas; c) trabalho
pelo acolhimento de possíveis conflitos de ordem racial, de classe e de gênero.
70

A inclusão da maioria minorizada (idem) nos espaços de gestão institucional não serão
suficientes para que uma instituição deixe de reproduzir a cultura racista. Ou seja, a
representatividade não é o bastante, tendo em vista que os princípios estruturais da sociedade
modulam os posicionamentos institucionais. Ainda que a presença de pessoas negras em
espaços de poder institucional seja urgente, é preciso avançar em mecanismos institucionais
efetivos para a promoção da igualdade. Além disso, a liderança institucional negra precisa
estar investida de poder de decisão real, no tocante a iniciativas que representem respostas
frente a questões estruturais (ALMEIDA, 2019; BENTO, 2022).
Avançando na análise sobre as relações raciais, a concepção estrutural do racismo o
inscreve como decorrente das relações políticas, econômicas, jurídicas. Não se trata de
patologia ou desajuste, mas da expressão do “normal” e socialmente reproduzido. Como
processo histórico e político, o racismo viabiliza as condições para que grupos sejam
racialmente discriminados de modo sistemático. A ideologia, a economia e direito e a política
são os quatro elementos considerados o cerne da manifestação estrutural do racismo
(ALMEIDA, 2019).
A III Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia
e Intolerância Correlata (ONU, 2001) corroborou com marcos anteriores na luta mundial
antirracista, a saber: a luta sul-africana contra o Apartheid, a favor da igualdade e dos direitos
humanos; a Declaração de Viena, oriunda da Conferência Mundial de Direitos Humanos em
1993, onde clamou-se pela rápida e abrangente eliminação de todas as modalidades de racismo;
as duas Conferências Mundiais de Combate ao Racismo e à Discriminação Racial, em Genebra
em 1978 e 1983, respectivamente. Conforme assinala Moore (2009), Durban representou o
reacender da discussão e o revelar da seriedade do racismo em âmbito mundial, como uma
grave ameaça à paz planetária e elemento desagregador da coesão social das diferentes Nações.
Durban ressaltou, assim, a urgência da adoção de medidas de combate ao racismo e suas
consequências, pelas esferas públicas/governamentais. Assim, o enfrentamento do racismo foi
estabelecido como objetivo internacional.
A Declaração de Durban (ONU, 2001) assinalou que, apesar dos compromissos
firmados pela comunidade internacional, o enfrentamento da discriminação racial teria um
longo caminho a percorrer. Ressaltou a importância da adesão mundial à Convenção
Internacional sobre todas as formas de Discriminação Racial, da qual o Brasil é signatário. Um
fato curioso, foi a recusa, por parte de países historicamente escravocratas, de discutir acordos
reparatórios para os povos aviltados pelo colonialismo.
71

Não ao acaso, a lucidez sarcástica de Aimé Césaire é convocada em vários momentos


desse trabalho: “A Europa é indefensável” (CÉSAIRE, 2020, p.9). Vale lembrar que, três dias
após à conferência, os Estados Unidos da América, que não participaram ativamente do
encontro, sofreram o atentado que colocou em questão o comprometimento global pela
eliminação de todas as formas de racismo (Alves, 2002).
No que se refere às medidas de enfrentamento à discriminação racial, a Conferência de
Durban instou aos Estados quanto aos compromissos atinentes a garantias legais, seguidas da
construção e operacionalização de políticas públicas afirmativas. No Brasil, como assinala
Faustino (2017), uma robusta movimentação institucional em resposta à discriminação racial
se deu em consequência da pressão social inspirada pela Conferência de Durban. O autor
ressalta, ainda, a importância histórica dos movimentos sociais na correlação de forças.
“Entretanto, é somente após a mobilização nacional em torno da III Conferência
Internacional contra o Racismo, Homofobia e as Intolerâncias Correlatas, realizada
em 2001, em Durban, África do Sul, e a resultante criação, em 2003, da Secretaria
Especial para a Promoção da Igualdade Racial, que o Ministério da Saúde criou um
Comitê Técnico de Saúde da População Negra, com o objetivo de promover a
equidade racial em saúde. É verdade que essa mobilização só foi possível mediante
um histórico de articulações, estudos e advocacy que remontam às décadas e governos
anteriores. Mas neste contexto, as articulações avançaram rapidamente para o
reconhecimento institucional de um conjunto de disparidades raciais em saúde e,
consequentemente, na pactuação de uma resposta programática ao cenário
identificado” (p.3835).

Lopez (2013) pontua que, após a Conferência de Durban, a pauta do enfrentamento


governamental do racismo, tornou-se evidente nas agendas nacionais e internacionais. A autora
identifica, porém, a dificuldade das instituições brasileiras quanto à operacionalização dessas
políticas, uma vez que significaria reconhecer a prática do racismo institucional.
Por sua vez, o Programa de Combate ao Racismo Institucional (PCRI), implementado
a partir de 2005, evidenciou o comprometimento governamental com a agenda
antidiscriminatória. Financiado pelo Departamento Britânico para o Desenvolvimento
Internacional e Redução da Pobreza (DFID) e tendo o Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD) como responsável pela administração dos recursos, o programa
assumiu a seguinte conceituação sobre o racismo institucional.
“(...) o fracasso das instituições e organizações em prover um serviço profissional e
adequado às pessoas de sua cor, cultura, origem racial ou étnica. Ele se manifesta em
normas, práticas e comportamentos discriminatórios adotados no cotidiano do
trabalho, os quais são resultantes do preconceito racial, uma atitude que combina
estereótipos racistas, falta de atenção e ignorância. Em qualquer caso, o racismo
institucional sempre coloca pessoas de grupos raciais ou étnicos discriminados em
situação de desvantagem no acesso a benefícios gerados pelo Estado e por demais
instituições e organizações (PCRI, 2005, p. 22).
72

Voltando à história da formação social do Brasil, veremos que as políticas públicas


reparatórias não aconteceram simultaneamente ao processo que teria colocado um ponto final
na escravização brasileira (MOURA, 2019; NASCIMENTO, 2016). É possível inferir que a
ausência de políticas afirmativas (ALMEIDA, 2019), no pós-abolicionismo, constituiu-se na
continuidade da desumanização da população negra. Sobre o pensamento abissal, que dividiu
o mundo entre sociedades metropolitanas e a coloniais, Santos (2018) pontua que, longe de
superado, temos em curso a sua reatualização, expressa no neocolonialismo, racismo,
xenofobia: todos agudizados nos países do Hemisfério Sul.
Nessa linha de pensamento, Moore (2009) classifica a insensibilidade - frente à falta de
acesso da população negra aos direitos sociais básicos como educação, alimentação e saúde -
como um produto do racismo. No tocante ao poder representativo, as casas Legislativas,
Judiciárias e do Executivo são compostas, majoritariamente, por homens brancos. Como uma
resposta à desmistificação do mito da democracia racial, correntes neorracistas passam a se
disseminar no Brasil, a partir dos anos 2000, concomitantemente ao período em que o Estado
reconheceu o racismo na determinação social da saúde. Nesse sentido, há uma tentativa
persistente de trivializar o racismo, ora por meio do seu encerramento em atitudes individuais,
ora naturalizando-o na ótica dos preconceitos inerentes à sociedade. O século XXI é palco da
ampla aceitação e difusão das correntes racistas, inscritas nas estruturas do dito Estado
Democrático de Direito: dos partidos políticos liberais e progressistas às agências de
comunicação em massa, que replicam estereótipos que modulam o imaginário social (MOORE,
2009).
Ao longo dessa sessão, trabalhamos com a ideia dos produtos sociais do racismo,
enquanto processo sistemático de vulnerabilização da população negra. Abordamos acordos
internacionais, como o de Durban, que pautaram o racismo na determinação social da saúde e,
portanto, a necessidade de seu enfrentamento por meio de políticas governamentais efetivas e
antirracistas. Nessa perspectiva, a PNSIPN representa um marco institucional não só pelo
reconhecimento Estatal do racismo na determinação social do processo saúde-doença, como
pela responsabilização governamental no seu enfrentamento. Não podemos ignorar o avanço
analítico com relação à mobilização de repostas estatais frente à produção social do racismo no
atual sistema capitalista de acumulação, o que nos remete à criticidade do campo da saúde
coletiva no tocante às condições sociais da população brasileira.
73

O campo da Saúde Coletiva nasceu no Brasil nos anos setenta do século passado,
agregando diferentes saberes, a fim de analisar o processo saúde doença enquanto uma via
relacional entre o biológico, o social e o histórico. Apartando-se da leitura restrita do modelo
biomédico, a saúde coletiva avançou na construção de uma criticidade que evidenciasse o papel
das instituições da sociedade capitalista e sua produção na saúde da população (BAPTISTA;
AZEVEDO; MACHADO, 2015). A intelectualidade e militância da saúde coletiva está
diretamente ligada ao movimento da Reforma Sanitária, da democratização do país e à
construção do Sistema Único de Saúde (SUS).
O que chamamos de saúde coletiva é, portanto, um campo de investigação e produção
de conhecimento que dialoga com diversas disciplinas na constituição de um objeto
complexo, a saúde em sua dimensão social. Mas é, também, um campo de intervenção
sobre esse mesmo objeto que emerge de um conjunto de ideais ético-normativos de
equidade e bem-estar (CAMARGO, 2015: 12).

A Portaria do Ministério da Saúde - GM/MS nº 992/2009 - que versa sobre a PNSIPN


justificou-se pelo reconhecimento do racismo como determinante social da saúde e,
consequentemente, das condições de vulnerabilidade direcionadas à população negra. Sua
marca expressa-se no “reconhecimento do racismo, das desigualdades étnico-raciais e do
racismo institucional como determinantes sociais e condições de saúde, com vistas à promoção
da equidade em saúde” (BRASIL, 2016, p.8). Segundo a OPAS (BRASIL, 2016), o
reconhecimento do racismo brasileiro é um salto essencial para a promoção da igualdade racial.
Representa um ponto de inflexão inédito para as instituições brasileiras, que, até um passado
próximo, recorriam ao universalismo estéril, ao mito da democracia racial, como justificativas
para a inércia frente à necessidade de políticas afirmativas.
A Constituição Federal de 1988 e as leis complementares da Saúde trouxeram uma nova
roupagem às responsabilidades do Estado quanto aos princípios da universalidade e da
equidade. Ainda assim, desde então, os dados relacionados às condições de vida da população
negra denotam a necessidade de medidas públicas mais contundentes quanto à equidade étnico
racial. Faz-se necessária a incorporação das políticas afirmativas nos Programas de Governo e,
sobretudo, nos Planos Plurianuais e nas Leis Orçamentárias (CARNEIRO, 2011), medidas que
darão viabilidade concreta aos acordos multilaterais e às retóricas de campanha, onde a prática
do racismo é veementemente repudiada.
4.1.1.1.1.1 Avaliação em Saúde: o estudo de avaliabilidade como pré-avaliação
Em escala mundial, a partir de década de 60, a avaliação vem se solidificando por meio
da institucionalização da prática de julgamento das políticas públicas, principalmente quanto à
prestação de contas.
74

Na década de 90, na América Latina, inscreveu-se o interesse pela introdução dos


processos avaliativos na gestão governamental, sendo adotados os sistemas de avaliação das
políticas públicas como meio de instrumentalização em processos decisórios (CRUZ, 2015).
Por sua vez, as recomendações da OMS pela adesão às práticas avaliativas em saúde,
da Conferência de Alma Ata, foram tardiamente acolhidas pelo governo brasileiro em razão da
ditadura militar: pela inaptidão governamental para o bem público, nesse período, além da
gestão arbitrária que impedia a população de cobrar por qualquer direito social (FURTADO,
SILVA, 2014). No Brasil, a construção de uma cultura de avaliação incorporada à gestão
governamental é recente e com traços que oportunizam abordagens fragmentadas e
conservadoras. No tocante ao setor da saúde, evidencia-se a incapacidade organizacional e
funcional. A institucionalização do processo de monitoramento e avaliação foi reflexo do
processo de descentralização político-administrativa das políticas sociais, com a promulgação
da Constituição Federal de 1988. No tocante à saúde, a implantação e consolidação do SUS
pressupunham a regionalização, atores e realidades locais diversas, além da reorganização dos
serviços e do processo decisório (CRUZ, 2015). A demanda pela eficiência e a valorização do
planejamento em saúde por meio dos Programas de Extensão de Cobertura (PEC’s) denotaram
maior preocupação com o campo avaliativo (Idem). A avaliação em saúde ultrapassou o
interesse acadêmico, na medida em que as gestões adotaram o entendimento da necessidade da
operacionalização de políticas de saúde de maneira informada, sob o respaldo técnico e
científico (PAIM, 2011).
Apesar da história moderna da avaliação iniciar-se no século XVIII, o processo
avaliativo foi introduzido como ferramenta de gestão governamental no século XX, durante o
período compreendido entre a grande depressão financeira dos Estados Unidos e a segunda
Guerra Mundial. Nesse período, a avaliação tinha a finalidade de acompanhar as políticas
públicas e mitigar os problemas sociais. Os momentos-chave da linha do tempo da avaliação
são ordenados, de acordo com Guba e Lincon (1989), conforme suas características singulares,
correspondendo ao que nomearam de “gerações” (CRUZ, 2015).
Esses autores reconheceram nesta diversidade a configuração de, pelo menos, quatro
gerações de estudos de avaliação: a primeira, que tem como ênfase a construção e a
aplicação de instrumentos de medidas para avaliar os beneficiários de uma
intervenção; a segunda, centrada na descrição da intervenção, que marca o surgimento
da avaliação de programas; a terceira, apoiada no julgamento de mérito e no valor de
uma intervenção para ajudar na tomada de decisões; e a quarta, que se refere à
negociação entre os atores envolvidos na avaliação (Cruz, 2015, p.288).

Conhecer a linha do tempo do campo da avaliação é uma etapa importante para a


compreensão da sua complexidade, uma vez que as descobertas teóricas e metodológicas
75

propiciaram processos avaliativos mais refinados e completos. Tomando como referência a


perspectiva de Guba e Lincon, Dubois, et al. (2011) discorrem sobre os processos e momentos
históricos da avaliação: a) 1ªgeração, caracterizada pelos períodos do reformismo (1800-1900)
e da eficiência e testagem (1900-1930); 2ª geração, com o período da idade da inocência (1930-
1960); 3ª geração , caracterizada pelos períodos da Expansão (1960-1973) e do
Profissionalismo e institucionalização ( 1973-1990); 4ª geração, que abarca o período das
Dúvidas (1990 até o presente).
O período reformista (1800/1900) é caracterizado pelo contexto europeu de
institucionalização de políticas sociais. Em contraposição à desumanização imposta aos
“Outros” (MORRISON, 2019) escravizados, o ideário de dignidade direcionava a construção
de uma infraestrutura de cuidados no âmbito educacional, de saúde e urbana, nos moldes das
políticas de bem-estar alemãs (DUBOIS, et al., 2011). Nesse contexto, a avaliação tinha a
utilidade de responder em qual medida os empreendimentos em curso trariam ganhos para vida
da sociedade e resultava no desenvolvimento de testes padronizados, com mecanismos de
coleta sistemática de dados. Os reformadores (gestores, parlamentares, funcionários públicos)
tinham o protagonismo na condução da avaliação. No período da Eficiência e testagem (1900-
1930), os instrumentos de medida são aperfeiçoados, contudo a cultura reformista é uma
característica presente nesse segundo período da primeira geração da avaliação. Nessa
perspectiva, o processo avaliativo segue normativo, ainda restrito a um apanhado de práticas
de medida, coleta sistemática de dados e análises quantitativas (DUBOIS, et al., 2011). No
âmbito da saúde, são utilizadas a coleta de estatísticas sanitárias, a comparação de grupos da
população e a medida da carga social das doenças e em decorrência das más condições de
moradia. Os sujeitos da avaliação são especialistas, psicólogos, engenheiros, médicos,
matemáticos, biólogos, estatísticos.
A nova abordagem do campo avaliativo, chamada de segunda geração, é caracterizada
pelo período da Inocência (1930-1957). As transformações do sistema educacional de então são
o pano de fundo da nova abordagem avaliativa, na qual o avaliador passa a ser mais do que um
técnico. Além de coletar e sistematizar os dados, o avaliador precisará descrever e compreender
a estrutura, conteúdo, forças e fragilidades dos programas. Entender se eles atendem aos
objetivos e, ainda, propor saídas que qualifiquem as suas ações.
A terceira geração congrega os períodos da Expansão (1957-1972) e o da
Profissionalização de Institucionalização da Disciplina (1973-1989). No período da Expansão,
assiste-se a renovação e aumento dos processos avaliativos na Educação.
76

Nesse momento, a avaliação deve ser útil para criar os programas, além de racionalizar o
planejamento e a dotação de recursos públicos. Os avaliadores passam a ter protagonismo na
tomada de decisão política, por meio da assessoria a parlamentares. Esse período confere maior
legitimidade à avaliação, evidenciada pelos investimentos que lhe são direcionados. A
conjuntura do intervencionismo social dos governos, do desenvolvimento da pesquisa social e
da liberalidade dos recursos financeiros foram determinantes para a institucionalização da
avaliação. O período seguinte é caracterizado pelo amadurecimento rumo à profissionalização
da avaliação. Os métodos configuram-se na abordagem de terceira geração, mas os critérios de
julgamentos são expandidos no intuito de abarcar as limitações de recursos dos programas. Os
avaliadores passam a focar no pragmatismo, considerando as demandas dos clientes e do
público usuário da avaliação.
A quarta geração, marcada pelo período das Dúvidas (1990 até o presente) reflete a
problematização quanto às certezas imputadas ao método científico positivista. Os autores
Guba e Lincon são precursores da discussão dessa nova abordagem avaliativa, cuja crítica
perpassou três aspectos cruciais: a) os processos avaliativos são reduzidos, pelos
administradores, à uma ferramenta em prol das estratégias políticas; b) a objetividade dos
julgamentos é inviabilizada ao considerar-se a infinidade de valores que permeiam os sistemas
de ação e sua influência quanto a adoção de determinadas questões e métodos, bem como os
julgamentos dos avaliadores e, consequentemente, os resultados da avaliação; c) A maciça
utilização do método experimental e da abordagem positivista, nos processos avaliativos,
privilegiam as medidas quantitativas, além das relações diretas de causalidade, em detrimento
do apagamento dos elementos contextuais, políticos, culturais, por natureza imensuráveis.
A avaliação de quarta geração leva sempre em conta abordagens e métodos elaborados
precedentemente, mas permite, ao mesmo tempo, preencher suas lacunas e alcançar
um grau de complexidade superior. Ela se torna, desse modo, um instrumento de
negociação e de fortalecimento do poder (empowerment) (...) a forma da avaliação e
seu desenrolar decorrem de um processo de negociação em que os diferentes grupos
têm a oportunidade não somente de fazer valer suas reinvindicações e seus interesses,
como de influenciar na escolha das perguntas que serão feitas e dos meios de tratá-
las. Nessa nova abordagem, a avaliação não é um espaço fechado ao especialista. Pelo
contrário, ela é aberta a todos os participantes da ação social, inclusive aos grupos
marginalizados (DUBOIS, et al., 2011, p.36).
O contexto de mudanças da década compreendida entre 1990/2000 oportunizou novas
possibilidades ao campo da avaliação: a) a expansão da comunicação, com a internet, repercutiu
na maior interação entre os atores sociais; b) a mundialização das trocas e a demanda por
respostas globais aos problemas sociais mundialmente difundidos ocasionaram a prática
internacionalizada da avaliação; c) o papel crucial da avaliação diante da racionalização de
recursos em contraposição à agudização dos problemas sociais em decorrência do modo de
77

produção capitalista. Nesse sentido, a prática avaliativa de quarta geração ganha contornos
emancipatórios, para além de técnicos, devendo oportunizar uma melhor compreensão do
contexto no qual a intervenção é operacionalizada, além da participação ativa em seu
melhoramento (DUBOIS, et al., 2011).
A leitura do campo da avaliação a partir das gerações propostas por Guba e Lincon
(1989) não significa uma relação estanque entre elas, já que as abordagens de cada geração
coexistem em diversos estudos do presente (CRUZ, 2015). Todavia, há um divisor de águas
entre as gerações e quanto ao papel do avaliador: a conclusão de que o processo avaliativo
repercute, necessariamente, no julgamento, na atribuição de valor ou mérito, “uma medida de
sucesso ou não de uma política ou programa público, de acordo com atributos de qualidade
determinados ou pactuados” (CRUZ, 2015, p 290).
Em qualquer estudo de avaliação haverá a necessidade de explicitação clara dos
critérios e parâmetros utilizados para a emissão do julgamento, conforme ressaltam
Worthen, Sanders e Fritzpatrick (2004, p35), ao considerarem que a avaliação
corresponde à identificação, esclarecimento e aplicação de critérios defensáveis para
determinar o valor ou mérito, a qualidade, a utilidade, a eficácia ou a importância do
objeto a ser avaliado em relação a esses critérios (CRUZ, 2015, p.290)

No campo da saúde, a demanda pela avaliação deu-se no contexto de proeminência das


políticas neoliberais de enxugamento da máquina pública, momento em que a eficiência ganhou
excepcional destaque. Tem-se, assim, a dupla exigência pelo controle do crescimento dos
custos e a garantia do acesso universal à saúde (CHAMPAGNE, et al., 2011).
Com relação à prática avaliativa no Brasil, a literatura especializada é mais recente e
responde à urgência pela efetividade do Estado frente às inflexões econômicas neoliberais,
bem como à narrativa da crise do Estado, nas décadas 80 e 90 respectivamente (ANTERO,
2008). Nessa perspectiva, Faria (2005) pontua
Diga-se, logo de início, o essencial: nas décadas de 1980 e 1990 a avaliação de
políticas públicas foi posta a serviço da reforma do Estado.1 Se parece haver
consenso quanto a essa questão, há, contudo, uma diversidade de maneiras de se
pensar a evolução do papel atribuído à pesquisa avaliativa desde o início do boom
da avaliação de políticas e programas públicos, ocorrido nos Estados Unidos na
década de 1960 (p.98).

Consolidada como uma prática de intervenção política do Estado, a avaliação tornou-


se, também, um campo de conhecimento que congregou influências de diferentes campos do
saber: as ciências sociais, o direito, a economia, a pesquisa clínica e epidemiológica (CRUZ,
2015). Os avanços trazidos pelos processos avaliativos das políticas públicas de saúde são
uma realidade.
78

Com relação aos desafios da avaliação em saúde, Cruz (2015) chama atenção para
algumas lacunas como a adesão de processos avaliativos, no âmbito do SUS, de maneira
descontextualizada; a falta de prioridade por respostas das questões avaliativas dos usuários
ou da sociedade civil organizada.
Uma das maiores dificuldades para se imprimir novas mentalidades em avaliação
tem a ver com a lógica de programas verticalizados, a não cultura de planejamentos
estratégicos, a precária capacidade técnica dos profissionais de saúde e a participação
efetiva dos usuários no processo decisório (CRUZ; REIS, 2011, p. 424)
Nesse sentido, Cruz (2015) identifica a necessidade da incorporação de uma prática
avaliativa que privilegie o diálogo e a participação, além do investimento na elaboração de
uma cultura de avaliação implicada com interesses de fortalecimento do SUS. É importante
salientar que, a despeito do compromisso com a tomada de decisão, a avaliação de políticas e
programas não é dotada de neutralidade ou isenta de valores, mas se insere no debate político.
Conforme Souza, Guimaraes e Silva (2017), na área da saúde pública, é interessante a
realização de um estudo exploratório da situação, como uma prévia da avaliação de uma dada
política pública. Nesse sentido, o Estudo de Avaliabilidade (EA) responde a tal interesse. Souza,
Guimarães e Silva (2017) classificam o EA como um conjunto de procedimentos que precedem
a avaliação, utilizado para determinar se há justificativa para uma avaliação extensa,
objetivando a delimitação dos objetivos do programa, bem como a identificação de pontos
críticos, carentes de atenção. O foco do EA traz elementos da análise estratégica e lógica, como:
1) a identificação quanto à formulação coesa dos objetivos do programa; 2) a análise da relação
entre os problemas, os objetivos e as atividades. Nesse sentido, o EA tem a potencialidade de
facilitar a avaliação subsequente, inclusive por favorecer a racionalização dos recursos.
De acordo com Trevisan e Walser (2015), o EA é uma ferramenta da avaliação, também
utilizada como uma etapa pré-avaliativa de um programa. Podendo ser aplicado em diferentes
fases do programa (TREVISAN; WALSER, 2015; BARATIERI ET AL., 201).
Ao realizar uma revisão integrativa sobre os estudos de avaliabilidade na área da saúde,
Baratieri et al. (2019) demonstram que o EA passou por uma certa evolução ao longo dos anos.
No início, concebido por Wholen como uma ação pré-avaliativa, para entender se o programa
estaria apto para a avaliação. Assim, qualificaria o custo-efetividade da avaliação e
instrumentalizaria a gestão no tocante ao aprimoramento do programa (TREVISAN;
WALSER, 2015). Sofrendo a primeira adaptação na década de 1980, Rutman identificou duas
propostas intrínsecas ao EA: a) a análise das características de um programa; b) a avaliação da
viabilidade do alcance da proposta da avaliação. Nesse sentido, o EA seria a primeira etapa
para identificar os empecilhos tanto para a avaliação da eficácia, quanto para a identificação
79

de meios para qualificar a avaliação do programa. Rutman também apostava na possibilidade


de avaliar os componentes do programa e não em sua totalidade (BARATIERI et al.,2019)
No final dos anos 1980, Smith inovou com a proposta do envolvimento dos atores-chave
durante o EA. Nos anos 90, é registrada a capilaridade do EA e, nos anos 2000, a qualificação
no âmbito teórica, a partir do modelo de Thurston e Potvin (2003). Nessa perspectiva, o EA
passou a ser utilizado como uma avaliação participativa contínua, viabilizada por um sistema
composto por sete elementos. Ainda que sejam estabelecidas as etapas do EA, Baratieri et al.
(2019) lembram que não é interessante cristalizar o estudo como uma dinâmica enrigecida, em
razão de ser um estudo cíclico, com etapas que poderão se sobrepor. Seguindo, em 2015, temos
a proposição de um novo desenho de EA, através de quatro componentes que não se
assemelham a passos ou a etapas (TREVISAN; WALSER, 2015): 1) foco no EA; 2) elaboração
da teoria inicial do programa; 3) compilação do feedback da teoria do programa; 4) uso do EA.
Conforme Natal et al. (2010) o EA pressupõe um conjunto de procedimentos anteriores
à avaliação, cujos produtos demonstrarão a utilidade e a oportunidade de uma avaliação
subsequente. O EA evidenciará se o programa em questão é avaliável, na medida em que
demonstrará os propósitos e o foco da avaliação, oportunizando o entendimento aprofundado
sobre o programa e a apreciação prévia sobre as potencialidades da avaliação (THURSTON E
RAMALIU, 2005). Nesse sentido, salientam a proposta de EA, de Thurston e Ramaliu, a partir
de sete elementos a serem descritos:
(a)descrição do programa identificando as metas, os objetivos e as atividades que o
constituem; (b) identificar e rever os documentos disponíveis no programa; (c)
modelagem (modelo lógico do programa – MLP) dos recursos disponíveis, programa
de atividades pretendidas, impactos esperados e conexões causais presumidas; (d)
supervisão do programa, ou obtenção de um entendimento preliminar de como o
programa opera; (e) desenvolvimento de um modelo teórico da avaliação (MTA); (f)
identificação de usuários da avaliação e outros principais envolvidos; e (g) obtenção
de um acordo quanto ao procedimento de uma avaliação (NATAL et al., 2010, p.
562).

Assim, salientam que os produtos esperados para um EA são a descrição completa do


programa e um plano de avaliação com o consenso entre o grupo de interesse. O modelo teórico
da avaliação trata da representação da realidade, enquanto o modelo lógico do programa diz
respeito à dinâmica, metas de produção, atividades, produtos e recursos (NATAL et al., 2010)
No campo da saúde, a incorporação do EA ao processo avaliativo é recente e oportuna
sob os aspectos de:
(a) fornecer à equipe do programa comentários rápidos e construtivos sobre operações
do programa; (b) auxiliar as principais funções de planejamento e contribuir para a
viabilidade das ações propostas no âmbito da saúde pública, ajudando a desenvolver
objetivos realistas e fornecer feedback rápido e de baixo custo sobre a
implementação; (c) traduzir a pesquisa na prática, examinando a viabilidade,
80

aceitabilidade e adaptação de práticas baseadas em evidências em novos contextos e


populações; e (d) traduzir a prática na pesquisa, identificando novas abordagens
promissoras para alcançar objetivos de saúde pública (BARATIERI, et al.,2019, p.
241).

Espera-se que o produto de um EA seja: a) a descrição integral do programa; b) as


questões-chave a serem trabalhadas pela avaliação; c) um plano de avaliação; d) um acordo
com os atores-chave sobre o processo. A condução de um EA repercute, assim, na avaliação
e crítica, até que a descrição do projeto do programa tenha coerência. Nesse aspecto, não é
rara a necessidade de modificar as descrições e atividades do programa. Assim, é de tamanha
importância compreender a aplicação do EA em programas de saúde, no sentido de evidenciar
a importância dessa etapa pré-avaliativa, bem como de apontar lacunas a serem trabalhadas
em estudos subsequentes (BARATIERI et al., 2019)
De acordo com as diretrizes gerais e objetivos da PNSIPN, a implementação do processo
de monitoramento e avaliação das ações relacionadas ao combate ao racismo são essenciais
para a operacionalização da referida política (BRASIL, 2017). Assim, o estudo de
avaliabilidade da SPN, no município do Rio de Janeiro, é oportuno pela potencialidade de
qualificar as futuras pesquisas relacionadas à intervenção.
81

5.OBJETIVOS
5.1. OBJETIVO GERAL
Realizar um estudo de avaliabilidade da Política Nacional de Saúde Integral da
População Negra (PNSIPN), no município do Rio de Janeiro considerando o contexto político-
organizacional de 2007 a 2021.
5.1.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
• Elaborar um modelo lógico da PNSIPN no município do Rio de Janeiro;
• Descrever quem são os principais atores envolvidos com a PNSIPN no município do
Rio de Janeiro;
• Caracterizar o contexto político-organizacional de implementação da PNSIPN/RJ
82

6. MÉTODO
Esse estudo se configura como pesquisa avaliativa do tipo Estudo de Avaliabilidade
(EA) da PNSIPN no município do Rio de Janeiro, com uma abordagem qualitativa, em
conformidade com os pressupostos de Thurston e Ramaliu (2005).
Os passos metodológicos abarcaram o estudo de caso, com foco na análise descritiva
e exploratória das características operacionais da PNSIPN no município do Rio de Janeiro e
do contexto no qual a política se dá.
A construção do modelo lógico da PNSIPN no município do Rio de Janeiro foi
viabilizada pela análise documental em sites oficiaisl, tais como: Ministério da Saúde,
Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, Drive do CTSPN. O estudo foi realizado considerando
o período compreendido entre 2007 e 2021, no município do Rio de Janeiro.
A abordagem qualitativa justifica-se pela complexidade e natureza social do problema
Gil (2007), além da finalidade de explicar e descrever o contexto em que a PNSIPN se insere
(Idem). Toda e qualquer pesquisa que produza resultados não obtidos por meio de ferramentas
estatísticas ou quantificáveis é caracterizada como qualitativa (STRAUSS, 2008). De acordo
com Godoy (1995) o principal objetivo da abordagem qualitativa é a interpretação do
fenômeno social sob investigação. Segundo Minayo (2008), o foco da pesquisa qualitativa não
é a quantidade de vezes em que uma determinada variável aparece, porém, a qualidade, o
contexto em que elas se dão.
Importante salientar que a avaliação qualitativa não deve ser reduzida a um conjunto
de técnicas da pesquisa social ou à utilização de abordagens participativas (DESLANDES,
2015). Assim, o fim das metodologias qualitativas aplicadas à avaliação, teriam o propósito
equivalente de analisar os significados, atribuídos pelos sujeitos, aos fatos relacionados ao
programa que se pretende avaliar.
A estratégia de pesquisa (HARTLEY, 1994) a ser adotada será a do estudo de caso,
amplamente utilizada nas ciências sociais (GIL, 2007). Pode ser traduzida como um estudo
aprofundado acerca de um ou mais objetos, permitindo o seu amplo conhecimento. Contudo,
é necessário que a pesquisa conte com determinados cuidados preventivos aos vieses, por meio
da consistência no planejamento, coleta e análise dos dados (Idem).
Nesse estudo de caso, a PNSIPN, no município do Rio de Janeiro, será o caso. A
definição do caso se deu a partir do levantamento bibliográfico e documental acercada saúde
da população negra.
83

Essa estratégia se justifica por oportunizar a reunião de informações aprofundadas e


sistemáticas (STRAUS, 2008) acerca da PNSIPN no Rio de Janeiro, considerando a dinâmica,
o contexto, além do detalhado conhecimento sobre o “objeto” do estudo (GIL, 2007).
Segundo Yin (2005), o estudo de caso seria adequado para a investigação de dinâmicas
sociais complexas, por investigar o fenômeno inserido no contexto da vida real. Martins
(2008) destaca que essa estratégica metodológica permite a penetração em uma dada realidade
social, diferentemente do que acontece nas avaliações exclusivamente quantitativas.
A avaliação, como conhecemos hoje, é resultante de um processo histórico, com
avanços teóricos somados à adoção de novos métodos que tornaram os processos avaliativos
mais completos (DUBOIS, et al.2011). As quatro gerações da avaliação comunicam essa
trajetória evolutiva, salientando as características de cada uma, a saber: a eficiência e testagem
a descrição, o julgamento e a negociação, respectivamente (Idem). Para essa pesquisa,
interessa atentar para os estudos de quarta geração, por sua peculiaridade participativa,
expressa pelos atores sociais que desempenham um papel importante ao longo do processo
avaliativo.
Vimos que o estudo de avaliabilidade pode abarcar um conjunto de etapas anteriores à
avaliação, com a finalidade de delineá-la e evidenciar a sua utilidade (Thurston e Ramaliu,
2005). Seguindo os seus pressupostos (Idem), o presente estudo atenderá às seguintes etapas:
a modelização da PNSIPN no município do Rio de Janeiro; a caracterização do contexto
sociopolítico da implementação da PNSIPN no município do Rio de Janeiro e a devolução dos
achados.
Buscando a viabilidade dos passos metodológicos realizamos a revisão da literatura,
por meio da pesquisa bibliográfica de artigos científicos, livros, Dissertações e Teses, na
plataforma Scielo, com os descritores Racismo, Iniquidade Étnica, Avaliação em Saúde A
pesquisa bibliográfica se faz indispensável para que tenhamos acesso aos aspectos históricos
referentes à pesquisa (GIL, 2002). Por outro lado, os riscos em relação à credibilidade dos
dados secundários estabelecem a necessidade da análise aprofundada das informações, a fim
de descartar possíveis inconsistências.
Além da pesquisa bibliográfica, seguimos com a análise documental dos dispositivos
legais relacionados à saúde da população negra. Quanto à análise documental, Yin (2005)
afirma que pode corroborar, além de qualificar as evidências provenientes de outras fontes.
Nesse sentido, Godoy (2005) assegura que a análise documental poderá munir a pesquisa com
dados complementares que auxiliarão a compreensão do problema investigado.
84

6.1 PERCURSO METODOLÓGICO


Quadro 1- Quadro Metodológico
Objetivo geral: Realizar um estudo de avaliabilidade da Política Nacional de Saúde Integral da
População Negra (PNSIPN), no município do Rio de Janeiro, considerando o contexto político-organizacional
de 2007 a 2021.

Perguntas de Objetivos Técnica de Coleta Finalidade Fontes


Pesquisa específicos

Quais os Elaborar um Levantamento e Identificar a Documentos do


movimentos modelo lógico da análise documental movimentação CTSIPN/SMS
técnico-políticos PNSIPN no institucional em prol
impetrados no município do Rio da SPN
sentido da de Janeiro Compreender e
implementação da analisar os achados Bibliografia:
PNSIPN? sobre o contexto artigos,
municipal dissertações, teses
correlacionando à e publicações
literatura disponíveis na
especializada Plataforma Scielo
e
ABPN
Levantamento e
análise bibliográfica

Qual a Descrever quem Levantamento e Identificar os atores Documentos


participação do são os principais análise documental implicados com a CTSPN/SMS
CTSPN na atores envolvidos SPN no MRJ
operacionalização com a PNSIPN no
da política? município do Rio
de Janeiro
Como a PNSIPN Caracterizar o Levantamento e Identificar o contexto Documentos
foi sendo contexto político- análise documental da implantação da CTSPN/ SMS
configurada no organizacional de SPN no MRJ, bem
município do Rio implementação da como os avanços e os
de Janeiro? PNSIPN/RJ entraves para a sua
operacionalização
Qual o contexto
político-
organizacional de
implementação da
PNSIPN?

Quais os
principais
avanços e
dificuldades
quanto à
implementação da
PNSIPN no
município do Rio
de Janeiro a partir
de 2007?
Fonte: Elaboração da autora.
85

Utilizamos os seguintes passos metodológicos a fim de alcançar os objetivos da


pesquisa: Com relação ao objetivo específico referente à modelização da PNSIPN no
município do Rio de Janeiro, utilizamos a análise documental em arquivos governamentais
públicos, de fonte primária. (MARCONI; LAKATOS, 2003).
A análise documental é uma ferramenta potencialmente eficaz para diminuir a
influência da pesquisadora, ainda que, por vezes, os documentos sejam evasivos, parciais.
Cabendo, à pesquisadora, a busca por material pertinente e de credibilidade (CELLARD,
2012). Nessa pesquisa, recorri ao drive do CTSPN, onde estão disponíveis as relatorias das
reuniões extraordinárias (de 2007 a 2021), bem como a documentação oficial que conta a
história da institucionalização da PNSIPN no município do Rio de Janeiro. Nesse sentido,
foram estabelecidos os seguintes critérios a serem observados: a) o contexto; b) o autor; c) a
natureza do texto; d) os conceitos chave (SILVA; ALMEIDA; GUINDANE, 2009).
A caracterização do contexto sociopolítico da implementação da PNSIPN no
município do Rio de Janeiro também teve como estratégia metodológica a análise documental
(em sites oficiais como do Ministério da Saúde, da Prefeitura do Rio de Janeiro e do CTSPN)
e a revisão bibliográfica de artigos, publicações e trabalhos relacionados à saúde da população
negra e ao contexto social e histórico brasileiro. Para tanto, foram realizadas buscas na
plataforma Scielo, no banco de dados da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros
(ABPN) (ENSP, 2021).
Essa pesquisa (vinculada à pesquisa Políticas de Atenção Primária, Regionalização e
Regulação do Setor Privado em Saúde: mudanças recentes e repercussões sobre as
desigualdades no Brasil e no estado do Rio de Janeiro, sob coordenação da Prof.ª Dr.ª Cristiani
Vieira Machado) foi submetido e aprovado (CAAE Nº: 21404619.8.0000.5240) pelo Comitê
de Ética da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) e da Prefeitura da Cidade do Rio de
Janeiro, baseado pelas resoluções nº 466/2012 e 510/2016.
86

7.RESULTADOS
O município do Rio de Janeiro foi um dos primeiros a adotar medidas institucionais que
acenavam para a implantação da Saúde da População Negra no âmbito da SMS. Em 2006, antes
mesmo da promulgação da PNSIPN, iniciou-se um movimento de problematização da
iniquidade racial em saúde, expresso no II Seminário de Promoção da Saúde: equidade em
SPN, onde foram tiradas as ações estratégicas com a finalidade da implantação da SPN no
município do Rio de Janeiro (RIO DE JANEIRO, 2020):
• a) Criação de um Comitê Técnico de Saúde da População Negra;
• b) Implantação do registro da variável raça/cor nos impressos oficiais da SMS;
• c) Diagnóstico epidemiológico da saúde da população negra;
• d) Formulação e estabelecimento de indicadores;
• e) Enfrentamento ao racismo institucional;
• f) Valorização das religiões de matriz africana;
• g) Institucionalização de recurso para a implantação da política;
• h) Fomento da participação do controle social e o fortalecimento de articulações
intersetoriais
A SPN, no Município do Rio de Janeiro, foi esquematizada a partir do modelo lógico
expresso na Figura 6. Sob a gestão da SMS, a Coordenadoria Técnica da Promoção da Saúde
tem a responsabilidade da operacionalização da PNSIPN.
O problema que justificou a implementação da PNSIPN foi a identificação da
morbimortalidade de gestantes e crianças negras no município do Rio de Janeiro. A incipiente
desagregação dos dados por raça/cor conseguiu demonstrar a disparidade da morbimortalidade
materna e infantil negras, se comparadas à raça/cor branca. Em decorrência da constatação,
foram elencadas as estratégias de gestão responsáveis pela implantação da PNSIPN em âmbito
local.
O CTSPN foi apontado como uma das primeiras estratégias a serem operacionalizadas,
com a expectativa de operar como uma ferramenta da gestão.
87

Figura 6 – A Saúde da População Negra no Município do Rio de Janeiro

Fonte: Elaborado pela autora ( Rio de Janeiro, 2020).


88

Estabelecendo uma linha cronológica do período compreendido entre os anos de 2007


e 2021 (Rio de janeiro, 2020) destacam-se as seguintes ações locais no âmbito da SPN (Figura
7).
a) Criação de Comitê Técnico de Saúde da População Negra - Resolução SMS
no 1298 de 10 de setembro de 2007.
b) Realização de 03 Seminários de Saúde da População Negra abrangendo
cerca de 800 participantes representantes da gestão, profissionais e sociedade civil
– 2006, 2008 e 2011.
c) Recursos orçamentários e financeiros incluídos no PPA 2011-2013.
d) Inclusão de meta específica relativa à saúde da população negra no Plano
Municipal de Saúde (2009- 2012).
e) Desenvolvimento de estratégias de sensibilização e divulgação da
PNSIPN:1)Oficinas de sensibilização de gestores do nível central da SMS sobre
saúde da população negra; 2) 02 Seminários de Saúde Mental da População
Negra- 2009 / 2010; 3)Apresentação da PNSIPN e realização de Oficina sobre o
quesito raça/cor em 05 Seminários Regionais de Promoção da Saúde – 2008; 4)
Formulação de submetas específicas à população negra pelo CTSPN, a serem
inclusas no PPA e no Plano Municipal de Saúde - 2010/2013; 5) Visita aos
Conselhos Distritais de Saúde para apresentação da PNSIPN;
f) Implantação da coleta qualificada do quesito raça/cor: - Divulgação da Lei
n° 4930 de 22 de outubro de 2008, que dispõe sobre a inclusão do quesito raça nos
formulários de informações em saúde do município do Rio de Janeiro: 1))
Levantamento, revisão e adequação do quesito raça/cor nos impressos oficiais e
nos Sistema de Informação de Saúde utilizados pela SMS; 2)Produção de
relatórios (SIM/SINASC) com recorte étnico racial; 3)Oficinas de sensibilização
e instrumentalização dos profissionais da SMS para o preenchimento do quesito
raça/cor; 4)Certificação de Reconhecimento ao Cuidado de Qualidade “Unidade
Parceira do Rio sem Preconceito” como incentivo ao preenchimento do quesito
raça/cor.
g) Valorização das religiões de matriz africana: - Parceria com a Rede Nacional
de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde (RENAFRO24):

24
“A Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde (RENAFRO) nasceu em 2003, durante o II Seminário
Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde (São Luís – MA) sendo uma instância de articulação da
sociedade civil que envolve adeptas da tradição religiosa afro-brasileira, gestoras e profissionais de saúde,
89

1) Lançamento da Caravana do Axé: projeto em parceria com a RENAFRO para


realização de ações de promoção da saúde nos terreiros de matriz africana- 2008;
2) Realização de fóruns e ciclo de debates para sensibilização e discussão sobre
interreligiosidade e espiritualidade- 2010, 2016.
h) Informação e Comunicação: 1) Produção de material educativo com a
representação da identidade étnico-racial da população carioca (postais colecione
saúde, cartazes, panfletos); 2) Reprodução gráfica e distribuição de publicações
sobre a saúde da população negra em parceria com a sociedade civil; 3)Produção
de quatro vídeos com temáticas sobre: saúde mental, saúde da população negra,
variável raça/cor, religiosidade e saúde.
i) Outras ações: 1)Rolezinho da Diversidade (2015): Ação no Dia Internacional
de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial -21 de março, em parceria com
a CEPPIR; 2)Roda de conversa sobre a PNSIPN no Quilombo Cafundá Astrogilda
(CAP 4.0) e articulação para implementação de equipe ESF no Quilombo (2016);
3)Realização de atividades no dia de Mobilização Nacional Pró Saúde da
População Negra- 27 de outubro; 4) Participação na elaboração do Plano
Municipal de Promoção da Igualdade Racial da cidade do Rio de Janeiro- 2014;
5) Representação do CTSPN no Comitê Estadual de Saúde da População Negra-
RJ;
j) Ações estratégicas para a Política Municipal de Saúde da População Negra:
1) Evento de celebração pelo DIA DE MOBILIZAÇÃO PRÓ-SAÚDE DA
POPULAÇÃO NEGRA (2020), com o lançamento da carta-compromisso com a

integrantes de organizações não-governamentais, pesquisadoras e lideranças do movimento negro. São seus


objetivos: valorizar o saber dos terreiros em relação à saúde; estimular práticas de promoção da saúde; monitorar
e intervir nas políticas públicas de saúde exercendo o controle social; legitimar as lideranças dos terreiros
enquanto detentores de saberes e poderes para exigir das autoridades locais um atendimento de qualidade, onde
a cultura do terreiro seja reconhecida e respeitada; reforçar a importância de interligar as práticas de saúde
realizadas nos terreiros com as práticas de saúde no SUS; contribuir para uma reflexão sobre diferentes aspectos
da saúde da população dos terreiros; estabelecer um canal de comunicação entre os adeptos da tradição religiosa
afro-brasileira, os gestores, profissionais de saúde e os conselheiros de saúde” (Disponível em:
https://prosas.com.br/empreendedores/1185-renafro-rede-nacional-de-religioes-afrobrasileiras-esaude).Marmo
Silva (in memoriam) era o representante da RENAFRO no CTSPN, ator de grande importância para a
mobilização da SPN e que recebeu homenagens diversas, destacando-se a do Comitê, da Alerj (( Disponível:
https://www.alerj.rj.gov.br/Visualizar/Noticia/43485#:~:text=Em%20mem%C3%B3ria%20ao%20legado%20
da,uma%20Medalha%20Tiradentes%20post%20mortem) e do ICICT/ FIOCRUZ
(https://www.icict.fiocruz.br/content/exposi%C3%A7%C3%A3o-no-icict-apresenta-o-trabalho-de-
jos%C3%A9-marmo-destaque-na-luta-pela-sa%C3%BAde-da).; Acesso 19/05/2022)
90

reivindicação da criação de uma Área Técnica da SPN no âmbito da SMS (2019);


2) Reunião Durban + 20 (2021): Homenagem a Lucia Xavier e Edna Roland,
dois ícones da luta pela SPN, ativamente presentes nos encontros preparatórios e
na Conferência de Durban contra o Racismo (2001); articulação com os
parlamentares da Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, com o intuito da
construção coletiva da PMSIPN/RJ, tendo como inspiração a experiência de São
Paulo; 3) Mobilização Pró-Saúde da População Negra (2021): Apresentação
dos dados GT Dados de Cidadania (UNIRIO) com foco na saúde materna;
apresentação ONG Criola sobre a carta de mobilização pró equidade racial na
atenção à saúde materna entregue ao Secretário da SMS; debate sobre o projeto
de lei apresentado pelo Legislativo para o enfrentamento do racismo institucional
na saúde por meio de uma Política Municipal de Saúde da População Negra.

Na linha do tempo das ações do MRJ (Figura 7), fica evidente o papel articulador dos
movimentos sociais negros que também integraram o CTSPN, desde a sua criação, em 2007.
Nos últimos quatorze anos, independentemente do Prefeito em exercício, o protagonismo -
pelo controle social, pela busca de transparência e da inclusão da SPN na agenda
governamental – deve ser atribuído ao CTSPN.
91
Figura 7 - Ações do MPJ: Saúde da População
Negra

Fonte: Elaborado pela autora ( Rio de Janeiro, 2020).


92

No quadro 2, a seguir, temos a retrospectiva, de 2007 a 2021, dos principais conteúdos


presentes nas reuniões extraordinárias do CTSIPN:
Quadro 2- CTSPN no MRJ (2007- 2021)
SEQUÊNCIA HISTÓRICA DO CTSPN NO MUNICÍPIO
DO RIO DE JANEIRO (2007-2021)
ANO DESTAQUES Nº
REUNIÕES
Prefeito
2007 Trabalhar a equidade racial em saúde; implantação do quesito raça/cor; 1

(César Maia) capacitação de gestores, equipes técnicas; pesquisa sobre o quesito raça/cor.

2008 Seminário Municipal de SPN; treinamento quesito raça/cor; Seminário Rede 9


(César Maia) Saúde; Seminário sobre a juventude; Seminário sobre saúde da mulher. Em
relação à informação: PSF perfil de morbimortalidade.
2009 Prioridades: mortalidade materna, anemia falciforme e DST/AIDS; 7
(Eduardo Paes) implantação do quesito raça/cor.
2011 Elaboração das submetas relacionadas a SPN, com finalidade de incluí-las 4
(Eduardo Paes) na agenda da SMS

2012 Desafios para o CTSPN: participação dos integrantes e interlocução com a 3


Eduardo Paes) SMS (submetas da SPN).
2013 Debate sobre o enfraquecimento do CTSPN, contexto de enfraquecimento 1
Eduardo Paes) dos movimentos sociais. Necessidade de trabalhar com a instrumentalização
dos integrantes, comunicação e informação.
2016 Proposição pela elaboração de relatório, com um balanço da SPN no 1
Eduardo Paes) município do Rio de Janeiro. Preocupação com o apagamento dos dados por
raça/cor, antes presentes no site da SMS: “há racismo onde a raça não
aparece” (Ata da única reunião de 2016). Apontado o racismo institucional
como grande dificultador da implementação da SPN (1)
2017 Eixos principais: racismo institucional; implantação do quesito raça/cor 3
(Crivella)
93

2018 Verificação de que o Plano Municipal de Saúde ignorou a SPN; os únicos 8


(Crivella) dados racializados, no site da PCRJ são relacionados à violência.
Apontou-se a necessidade do CTSPN participar da formulação dos
Planos Municipais de Saúde
2019 Formação dos GT’s (Doença Falciforme e Racismo; Mortalidade Materna 10
(Crivella) das Mulheres Negras e Racismo; População Privada de Liberdade e
Racismo; Saúde Mental e Racismo). DISCUSSÃO SOBRE AS
ATRIBUIÇÕES DO COMITÊ E DA NECESSIDADE DE SUA
PARTICIPAÇÃO EFETIVA NOS PROCESSOS DE GESTÃO E
EXECUÇÃO DA POLÍTICA

2020 Falta de interlocução do CTSPN com a SMS; identificação da maior 9


(Crivella) vulnerabilidade da população negra frente à pandemia COVID/19 em
contraposição da ausência de medidas governamentais voltadas a SPN;
primeiros boletins epidemiológicos da COVID-19 não trouxeram
informações segundo raça/cor. REIVINDICAÇÃO PELA ÁREA
TÉCNICA DA SPN NA SMS.
2021 MOBILIZAÇÃO PELO PROJETO DE LEI DO PROGRAMA 2
MUNICIPAL DA SAÚDE DA POPULAÇÃO NEGRA, COM
(Eduardo Paes)
PARLAMENTARES, REPRESENTANTES DE INSTITUTOS DE
PESQUISA, MOVIMENTOS SOCIAIS.

Fonte: Elaboração da autora (Apêndice).

De 2007 a 2021, identificamos o registo de 58 reuniões ordinárias. Nos anos de 2010,


2014 e 2015 não constam relatorias de encontros, o que sugere a paralização do CTSPN nesses
períodos. Desde a primeira reunião, em 2007, são pontuadas prioridades, ações estratégicas
para a mobilização da PNSIPN no município do Rio de Janeiro, a saber: a) a implantação do
quesito raça cor; b) a capacitação de gestores e equipe técnica; c) fomento da pesquisa sobre o
quesito raça/cor.
No ano de 2008, os principais pontos levantados ao longo das nove reuniões ordinárias
disseram respeito à formação em saúde, sobretudo por meio da capacitação da gestão e das
equipes técnicas em relação à Saúde da População Negra. Ressaltou-se, ainda, a necessidade
de os dados sobre a morbimortalidade materna e infantil serem desagregados por raça/cor.
Durante o ano de 2009 aconteceram sete encontros, onde foram levantadas as
prioridades de ação, relacionadas a mortalidade materna, anemia falciforme e DST/AIDS e à
implantação do quesito raça/cor. No ano seguinte não há registros de reuniões.
94

Em 2011, foram discutidas, ao longo das quatro reuniões, as submetas relacionadas à


saúde da população negra, com o intuito de incluí-as no Plano de Saúde Municipal. No ano
seguinte, vemos a preocupação com o quórum dos encontros, bem como com a interlocução do
CTSPN com a Secretaria Municipal de Saúde e a inclusão das submetas da SPN.
Em 2013, aconteceu uma única reunião, em que a pauta sobre a desmobilização dos
membros do Comitê foi abordada. Nos anos seguintes, 2014 e 2015, não constam registros de
reuniões ordinárias. E, no ao de 2016, uma única reunião ordinária tratou do apagamento dos
dados desagregados por raça/cor nas Redes da Prefeitura do Rio de Janeiro. As dificuldades
relacionadas ao avanço da SPN, no município do Rio de Janeiro, foram correlacionadas ao
racismo institucional.
Em 2017, ao longo das três reuniões ordinárias, a discussão seguiu centrada no racismo
institucional enquanto principal dificultador para a implementação da PNSIPN no município
do Rio de Janeiro, bem como para a implantação do quesito raça/cor, fundamental para a
consolidação dos dados epidemiológicos da população negra e, consequentemente, da
implementação de programas de saúde voltados à mitigação das iniquidades em saúde por
raça/cor.
Em 2018, houve um aumento do quantitativo de reuniões ordinárias. De sorte que, ao
longo das oitos reuniões, constatou-se a permanência de um contexto institucional árido quanto
à Saúde da População Negra. Os principais indicativos desse contexto foram a ausência da SPN
no, então, Plano Municipal de Saúde, a escassez de dados desagregados por raça/cor no site da
Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro. Nesse sentido, destacou-se a urgência do CTSPN
participar da formulação dos Planos Municipais de Saúde. Tal constatação se faz contraditória,
uma vez que o CTSPN, enquanto braço da gestão, deveria assessorar a SMS no tocante aos
programas voltados à SPN. Entretanto, é possível inferir que a SMS tem se valido do CTSPN
como uma instância mais alegórica do que propositiva, com livre acesso à mesa de decisão
sobre os Planos de Saúde Municipais.
Em 2019, ao longo das dez reuniões ordinárias, houve a discussão e constituição dos
grupos de trabalho temáticos, como uma estratégia de fortalecimento da atuação do Comitê.
São eles: GT Doença Falciforme e Racismo; Mortalidade Materna das Mulheres Negras e
Racismo; População Privada de Liberdade e Racismo; Saúde Mental e Racismo. Voltou-se a
pontuar, ainda, a urgência da efetiva participação desse Comitê nos processos de gestão e
operacionalização da Política.
95

Nos anos de 2020 e 2021, notamos uma certa inflexão no CTSPN, no sentido de inserir-
se nos processos decisórios da gestão municipal., por meio da articulação intersetorial. O
contexto da fraca interlocução com a SMS, a vulnerabilização da população negra frente à
pandemia COVID/19 e a ausência de medidas governamentais voltadas à SPN (primeiros
boletins epidemiológicos da pandemia ignoraram a desagregação dos dados por raça/cor) foram
determinantes o movimento de reivindicação de uma área técnica da PNSIPN no âmbito da
SMS. Em decorrência desse movimento, foi mobilizada uma ampla articulação com a sociedade
civil, Universidades e Parlamentares para a proposição de um Projeto de Lei que versa sobre a
instituição do Programa Municipal da Saúde da População Negra. No tocante aos principais
atores para a mobilização da SPN no Rio de Janeiro, nota-se o protagonismo dos movimentos
sociais negros do CTSPN, dentre os quais a ONG CRIOLA e a RENAFRO. Com base na
análise das relatorias das reuniões ordinárias do CTSIPN, de 2007 a 2021, chama a atenção o
esforço pela sistematização e produção da memória do CTSIPN. Sobressai, ainda, o empenho,
sobretudo, de mulheres negras vinculadas aos movimentos sociais, às Instituições de Ensino e
Pesquisa e à Secretaria Municipal de Saúde (SMS), o que não difere do histórico social
brasileiro referente à luta pela equidade racial.
A criação do Comitê Técnico de Saúde da População Negra (CTSPN) na SMS-RJ,
resultante do Grupo de Trabalho, composto por profissionais da gestão e pela
sociedade civil, foi o embrião para impulsionar a PNSIPN e conduzir as demais
estratégias elencadas no seminário. Cabe destacar o protagonismo de duas mulheres
negras: uma enfermeira, ocupando um cargo de gestão na APS e a outra médica
atuando em um Centro Municipal de Saúde (CMS), ambas idealizaram e incitaram
a discussão sobre saúde da população negra e sobre a política no contexto carioca
(Rio de Janeiro, 2020, p.2)

Ao longo dos últimos quatorze anos, entretanto, é recorrente, na fala das integrantes
do CTSPN, a problematização relacionada ao esvaziamento do Comitê. Esse movimento viria
tanto de alguns atores da sociedade civil, como da própria SMS. Nesse sentido, por muitas
vezes, a discussão de se aplicar o regimento interno e de se repensar nos integrantes do Comitê
foi trazida à tona. Nos anos de 2010, 2014 e 2015, não existem registros das reuniões
ordinárias, o que indicaria a paralização das atividades nesses períodos. Fica evidente, nas
discussões ordinárias, os fortes indícios do racismo institucional no nível local de poder,
expresso por meio da dificuldade, por exemplo, do CTSPN conseguir estabelecer um diálogo
permanente e direto com a gestão máxima da Secretaria de Saúde. Essa situação é curiosa,
sendo o CTSPN uma instância de assessoria da Gestão Municipal da Saúde, no tocante a SPN.
Em decorrência do distanciamento, nota-se o mesmo padrão com relação à capilaridade do
Comitê com os gestores, equipes técnicas e assistenciais.
96

Cabe destacar os desafios permanentes com relação ao preenchimento e implantação


do quesito raça/cor nos Sistemas de Informação e Instrumentos da SMS; a Saúde Mental tem
se mostrado um campo resistente à efetiva implantação do quesito raça/cor.
A não implantação do quesito raça/cor, na SMS, recai negativamente sob a população
que já era a mais vulnerabilizada antes mesmo da Pandemia (Rio de Janeiro, 2018).
Os dados epidemiológicos desagregados por raça/cor são primordiais para a
consolidação dos indicadores raciais em saúde. Por meio dos indicadores, as Gestões terão
menos chances de errar na tomada de decisões, ao estabelecer as prioridades e ao incluir o
campo da SPN nas metas específicas dos Planos Municipais de Saúde. Vale lembrar que a
dotação orçamentária, a viabilização das ações previstas pela PNSIPN dependem da inclusão
da SPN nos Planos Plurianuais, Planos Municipais de Saúde, Lei de Diretrizes Orçamentárias
e Lei Orçamentária anual.
Nesse sentido, o CTSIPN destaca os principais desafios para a SPN em nível local
(Rio de Janeiro, 2020): a) Ampliação da parceria com as entidades da sociedade civil e
instituições acadêmicas e de pesquisa; b) Fortalecimento do Comitê Técnico de Saúde da
População Negra da SMS Rio; c)Implementação e adequação do preenchimento do quesito
raça/cor nos SIS e impressos da SMS-Rio com a sua utilização no planejamento, avaliação e
tomadas de decisão da gestão; c) Combate ao Racismo Institucional; e) Incorporação das
temáticas relacionadas à PNSIPN nos processos de educação permanente dos profissionais;
f) Transversalização e capilarização da PNSIPN nas áreas técnicas da SMS Rio e nas unidades
de saúde em todos os níveis de complexidade.
A partir do ano de 2020, identificados os mecanismos dificultadores para a
implementação da PNSIPN no município do Rio de Janeiro, o CTSPN iniciou um movimento
para a discussão coletiva25 de uma proposta que contemplasse a promulgação do Programa
Municipal de Saúde integral da População Negra.
No ano de 2021, completando dois anos de pandemia e, sendo reafirmadas as lacunas
históricas na saúde da população negra, o movimento de aproximação com parlamentares da
Câmara Municipal dos Vereadores26 do Rio de Janeiro teve como produto o projeto de lei que
segue em votação.

25
Em 27 de outubro de 2020, foi realizado o evento de celebração ao dia de mobilização nacional em prol da
SPN, onde lançou-se uma carta-compromisso com a proposição de que a SPN tivesse uma área técnica ligada
diretamente à Secretaria Municipal de Saúde. Durante o evento, intelectuais que discutem a SPN, enriqueceram
o debate, a saber: Drª. Jaciane Milanezzi e Drª. Maria Inês da Silva Barbosa.
26
Aderiram ao movimento de promulgação da PMSIPN as Vereadoras Tainá de Paula, Thaís Ferreira, Mônica
Benício. Os vereadores, Reimont, Lindeberg. Cabe destacar a contribuição do Gabinete da Deputada Estadual
97

Ainda em 2021, a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro instituiu a Coordenadoria


Executiva pela Igualdade Racial (CEPIR), ligada à Secretaria Municipal de Governo e
Integridade Pública. A missão da CEPIR converge com a construção de uma cidade
antirracista, com a proposição da Política Municipal da Igualdade Racial. Nos registros das
reuniões do CTSPN não há menção da sua participação nesse movimento. Desde então, foram
realizadas uma série de atividades ligadas à promoção de uma cidade antirracista.
A criação de um novo braço de gestão em prol do enfrentamento da iniquidade racial
carioca seria um ganho para a população carioca. Contudo, torna-se questionável quando o
processo prescinde da ampla discussão, do controle e da participação social.
O CTSPN, enquanto órgão que congrega representantes qualificados para o
apontamento das lacunas em relação à busca da equidade racial- não foi convidado para a
mesa de discussão. Sabemos que a PNSIPN pressupõe a transversalidade e a implicação de
todas as Secretarias no combate ao racismo institucional. Contudo, a decisão vertical, da
Prefeitura, endossou o histórico de esvaziamento sistemático do CTSPN enquanto espaço de
gestão e assessoria. Criou, ainda, a sobreposição de ações, encerradas em Secretarias
diferentes, com a ausência de diálogo entre si ou de um comando único na estrutura local.

Mônica Francisco e da Defensoria Pública/ Núcleo Contra a Desigualdade Racial (NUCORA). Dos
representantes da sociedade civil, compuseram os trabalhos de formulação do projeto de lei: Instituto Luiza
Mahim, Associação de Médicas e Medicos Negros/ Grupo de Trabalho Racismo e Saúde/ABRASCO, a
Pesquisadora Drª Roberta Gondim (FIOCRUZ). Os Comitês Técnicos Estadual e de São Gonçalo.
98

8.DISCUSSÃO
Esse trabalho buscou compreender como se deu a implantação da PNSIPN, no MRJ,
durante o período compreendido entre 2007 e 2021. Almejou identificar como a SPN foi
configurada, tendo em vista o contexto político-organizacional, a participação do CTSPN na
operacionalização da política, os principais avanços e dificuldades quanto à implementação
da PNSIPN no MRJ.
A elaboração do Modelo Lógico da SPN do MRJ demonstrou que a Secretaria
Municipal de Saúde, através da Coordenação Técnica de Promoção da Saúde, foi a
responsável pela gestão das ações relacionadas à SPN. Vimos que a morbimortalidade da
população negra carioca foi o problema que justificou a implantação da SPN municipal.
No tocante às ações estratégicas para o enfrentamento da iniquidade racial carioca,
foram elencadas: a) a criação do CTSPN; b) a implantação do quesito raça/cor; c) elaboração
permanente do diagnóstico epidemiológico da SPN; d) formulação e estabelecimento de
indicadores; e)valorização das religiões de matriz africana; f) enfrentamento ao racismo
institucional; g) institucionalização orçamentária para a operacionalização da Política; h)
fomento da participação, controle social e ações intersetoriais.
Com relação aos aspectos político-institucionais e às estratégias da SMS, vimos um
contexto inicial, a partir de 2007 - gestão do Prefeito César Maia - que indicava o movimento
institucional de enfrentamento da iniquidade racial na Saúde.
Dentre as estratégias de gestão, a criação do CTSPN teve destaque, por caracterizar-se
como um braço da gestão responsável por: a) assessorar a SMS com dados e informações
racializadas; b) promover a transparência e o controle social da SPN, por meio de sua
composição paritária entre sociedade civil e governo local.
Em 2008, com a regulamentação da implantação do quesito raça/cor, havia a
expectativa, a partir de então, pela viabilidade da elaboração do diagnóstico epidemiológico
permanente da SPN, bem como da formulação de indicadores da SPN, necessários para o
planejamento da política pública.
Os documentos que contam a história da SPN no MRJ destacam o papel singular dos
movimentos sociais negros, bem como de Profissionais de carreira como a Psiquiatra Lenora
Mendes Louro. É importante indicar os referidos atores na correlação de forças com a ala
governamental, historicamente refratária ao enfrentamento do racismo institucional por meio
da máquina pública.
Observamos a inclusão parcial de duas submetas da SPN, no Plano Municipal de Saúde
(2009-2012), já durante a gestão do Prefeito Eduardo Paes. O CTSPN apresentou sete submetas
99

relacionadas ao enfrentamento da iniquidade racial na saúde do MRJ. As submetas foram


pensadas a partir do III Seminário de Equidade Em Saúde da População Negra, considerando a
exposição da população negra à maior vulnerabilidade, aos piores indicadores de saúde, bem
como à falta de resolutividade por parte do poder público. A maioria foi rejeitada. As duas
submetas aprovadas não o foram na sua integralidade, o que demonstra o esvaziamento do
CTSPN no que se refere à interlocução e escuta da SMS.
No tocante aos dados epidemiológicos da saúde da população negra, verificamos a
insatisfatória movimentação da SMS. Em decorrência da atuação do CTSPN, houve a
inclusão de uma meta específica da SPN no Plano Municipal de Saúde de 2009. Como
consequência, houve destinação orçamentária registrada no plano operativo (2011/2013). O
CTSPN apresentou sete submetas da SPN para a gestão da SMS. Desse total, as duas que
diziam respeito à redução da morbimortalidade negra - materna e infantil -foram incorporadas
ao PPA (2011-2013).
Em relação ao Plano Municipal de Saúde desse período, foram contempladas,
parcialmente, as submetas que versavam sobre o acompanhamento de crianças e adolescentes
com doença falciforme de baixa, média e alta complexidade em polos regionais, com
atendimento ambulatorial e de emergência e a garantia da distribuição de medicamentos
específicos; foi inclusa, ainda, a submeta atinente à redução da morbidade e mortalidade por
violência e acidentes dos jovens negros.
As submetas relacionadas à implantação do quesito raça/cor, instrumentalização e
capacitação de 80% dos profissionais de saúde e a redução da morbimortalidade negra por
HIV, Tuberculose e Sífilis não foram inclusas na agenda de Saúde do município do Rio de
Janeiro (Rio de Janeiro, 2011).
A ausência da SPN nos Planos Municipais, Plurianuais e no orçamento local nos leva a
afirmar que a prioridade da SMS, ao longo dos últimos dez anos, esteve longe do enfrentamento
das iniquidades raciais em saúde. O que pode ser explicado pela capilaridade do racismo
institucional (WERNECK, 2016; ALMEIDA, 2019), expresso pela pouca familiaridade da
literatura especializada acerca da SPN; no desconhecimento dos gestores e a não utilização de
indicadores sociais desagregados por raça/cor; além da resistência à falaciosa focalização do
SUS (BFAUSTINO, 2017).
É importante lembrar que o CTSPN não deveria exercer um papel secundário ou
figurativo no processo de tomada de decisões locais referentes à SPN. Sendo um braço da gestão
(cuja composição congrega, para além das secretarias de governo, representantes de
movimentos sociais e de Instituições de Ensino históricos para a garantia de direitos da
100

população negra) deveria ser investido de poder de gestão e controle social para o qual foi
criado.
Ao longo da análise dos registros das reuniões do CTSPN, a fala dos seus representantes
aponta o esvaziamento do CTSPN pela SMS, expresso pela baixa interlocução com os
Secretários de Saúde. Notamos que, por inúmeras vezes, as reuniões com os Secretários foram
desmarcadas. Em outros momentos, assessores de gabinete, que não demostravam, sequer,
proximidade em relação à SPN, substituíram o Secretário. Ao longo da Pandemia, sob a gestão
do Prefeito Crivella, o isolamento do CTSPN foi ainda mais gritante. Apesar das tentativas de
aproximação e cobrança acerca da SPN durante a Pandemia, o Comitê não participou do grupo
de crise da COVID-19. Também não teve acesso aos dados epidemiológicos desse período. Foi
necessário articular-se com pesquisadores da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
(UNIRIO), os quais disponibilizaram as informações.
Ainda nos registros do CTSPN, o racismo institucional foi, por incontáveis vezes,
correlacionado aos desafios para o avanço da SPN no município do Rio de Janeiro. Assim,
voltamos à discussão acerca da composição das Secretarias Municipais, dos órgãos de gestão:
majoritariamente masculina e branca. Ao longo das discussões teóricas, ficou evidente que o
pacto narcísico do racismo corrobora com o racismo institucional presente na composição dos
quadros do governo local. Para além da falta de proporcionalidade em relação à população
brasileira, a ausência de gestores tecnicamente competentes, capazes de lidar com a iniquidade
racial de maneira qualificada, repercute na paralisia governamental no tocante à SPN.
O racismo institucional explicaria, por exemplo, os primeiros boletins epidemiológicos
da COVID-19. Apesar da população negra ser exposta aos piores indicadores de saúde, os
técnicos da SMS foram incapazes de avaliar a importância da desagregação dos dados por
raça/cor. Nesse sentido, é possível asseverar a urgência da recomposição da gestão municipal,
no sentido de que seja proporcional à realidade da população brasileira, e, sobretudo, capacitada
tecnicamente, para lidar com a gestão da saúde da população negra.
A instituição de ações estratégicas, como a criação do CTSPN, as ações de capacitação
de gestores, equipes técnicas, e os esforços para a implantação do quesito raça/cor não tiveram
a sustentabilidade orçamentária nos PPA’s subsequentes a 2013, evidenciando a prática
institucional brasileira, de reiterada invisibilização da Saúde da População Negra (CARNEIRO,
2011; ARAÚJO; TEIXEIRA, 2016; BATISTA ET AL.,2020).
Ao longo da discussão sobre o papel dos movimentos sociais negros para a SPN, foi
identificada a crítica contundente, dos referidos movimentos, em relação à dotação
orçamentária insuficiente (ARAÚJO; TEIXEIRA, 2016).
101

Diante dessa problemática, fica evidente a necessidade de recompor e superar,


conforme aponta a literatura (RIBEIRO, 2012; CARNEIRO, 2011; BENTO, 2022), um quadro
de gestão tradicional, qual seja, majoritariamente masculino, hétero e branco. É importante
salientar que tal discussão não se restringe à representatividade ou ao senso mínimo de equidade
racial na divisão social e racial do trabalho (GONZALEZ, 2018). O ponto central é a melhoria
da acurácia governamental no tocante à sua capacidade de resposta às demandas sociais, na
medida o alto escalão da gestão tenha a capacidade técnica necessária para a mobilização de
políticas sociais com vistas a equidade racial. Assim, é de singular importância, para além da
retórica, enriquecer os quadros técnicos da Gestão da SMS, com pessoas que agreguem o
letramento racial e de gênero como ferramenta de gestão.
Ao traçar uma linha do tempo da SPN, no MRJ, vimos que o CTSPN teve um papel
primordial no tensionamento em prol da SPN. Identificamos, até aqui, as dificuldades
relacionadas à dotação orçamentária e ao racismo institucional da Prefeitura do Rio de Janeiro.
Identificamos, ainda, que os avanços iniciais - criação do CTSPN, à regulamentação do
quesito raça/cor, à inclusão de submetas no PPA e PMS, capacitação das equipes técnicas,
caravanas contra o racismo religioso- se deveram à participação e pressão dos movimentos
sociais negros, Institutos de Ensino e Pesquisa que compõem o CTSPN.
Entendemos, assim, que os principais atores envolvidos na implantação da SPN, no
MRJ, foram os movimentos negros organizados, somados aos Institutos de Pesquisa e Ensino,
bem como a um número reduzido de funcionárias públicas de carreira com profundo
compromisso com o enfrentamento do racismo institucional na Saúde.
Desse modo, não vislumbramos outro caminho para o êxito da PNSIPN no MRJ senão
pela via da gestão participativa, do controle social e da transparência. Reiteramos, ainda, a
necessidade da reformulação dos quadros da Prefeitura do Rio de Janeiro. As Secretarias, fóruns
de gestão e áreas técnicas precisam refletir a realidade proporcional da população brasileira. É
necessário que tenhamos uma gestão representativa da parcela negra, feminina LGBTQIAP+,
PCD. Essa mudança de paradigma impactará, efetivamente, as respostas governamentais às
iniquidades raciais e sociais presentes no MRJ.
Destacamos, como na história de mobilização pró saúde da população negra, a presença
dos movimentos sociais negros de mulheres, além da necessária articulação com as
Universidades e Institutos de produção de conhecimento e defesa da equidade racial. Sem essas
atrizes e atores sociais, seria impensável resistir ao silêncio institucional (Rio de Janeiro, 2021).
O município do Rio de Janeiro instituiu a implantação da SPN anteriormente à
pactuação da PNSIPN, o que poderia sugerir avanços significativos para a SPN carioca.
102

Contudo, o processo de descontinuidade e esvaziamento da gestão local, repercutiu em


agravos para a população historicamente vulnerabilizada pelo racismo institucional na saúde.
O perfil epidemiológico (Rio de Janeiro, 2018) da população carioca não deixa dúvidas
de que o município do Rio de Janeiro está em falta, há muito, com a população da raça/cor
negra.
Nesse sentido, a proposta pela promulgação do Programa Municipal da Saúde Integral
da População Negra, com a instituição de uma área técnica da SPN, garantirá a efetividade não
percebida ao longo dos últimos anos, apesar da retórica do reconhecimento das iniquidades
raciais em saúde.
O MRJ adotou ações voltadas à saúde da população negra, antes mesmo da promulgação
da PNSIPN, em 2009. Entretanto, ao longo dos últimos quatorze anos, não identificamos a
inclusão sistemática da SPN na agenda municipal. Para tanto, conforme mobilização do
CTSPN, seria necessária a regulamentação do Programa Municipal da Saúde Integral da
População negra, com a criação de uma área técnica, com a alocação permanente de recursos
orçamentários.
A análise documental apontou o papel primordial dos movimentos sociais negros e de
profissionais de saúde para a mobilização da SPN no MRJ. Conforme sinalizado no Projeto de
Lei da PMSIPN, o trabalho realizado pela Médica, Dra. Lenora Mendes Louro, por meio do
aprofundamento de temas como o racismo, o machismo e a violência, a levou ao Centro de
Estudos da SMS para colaborar com a implantação da PNSIPN no MRJ. Assim, em parceria
com a ONG Criola, foi realizado o primeiro Seminário de Saúde da População Negra do MRJ,
tendo como um de seus desdobramentos, a instituição do CTSPN.
A despeito da importância das profissionais de saúde implicadas com a equidade racial
no SUS, bem como do papel singular do movimento social negro, chamamos atenção para a
urgência da implementação da PNSIPN como política de Estado e transversal às demais
políticas.
A composição dos quadros governamentais tem relação direta com equidade racial. Na
medida em que a composição dos cargos comissionados permanecerem ignorando o pré-
requisito da capacidade técnica para a discussão racial, seguiremos com a inépcia institucional
para o avanço na SPN. O caso dos primeiros boletins epidemiológicos da COVID-19, em que
os dados não foram desagregados por raça/cor, ilustra essa análise. Temos uma Lei municipal,
de 2008, que institui o quesito raça/cor nos instrumentos da SMS com o objetivo de mitigar a
iniquidade racial na Saúde.
103

Ainda na Pandemia COVID-19, as relatorias das reuniões ordinárias do CTSPN


evidenciaram a lacuna entre o Comitê e a SMS. Ainda que o CTSPN seja, em tese, uma
ferramenta de gestão da SMS, ao longo da crise sanitária desencadeada pela Pandemia, não foi
possível estabelecer o diálogo com a SMS e não por falta de tentativas do Comitê.
No tocante às atribuições do CTSPN - relacionadas à apresentação de propostas,
subsídios técnicos e planos de ação para a implementação e monitoramento das ações
relacionadas à equidade racial na saúde - percebemos a tentativa permanente de interlocução
com a gestão da SMS. Contudo, não foi identificado o mesmo empenho com relação às gestões
municipais dos últimos anos.
De 2007 a 2021, notamos, ainda, o esvaziamento das reuniões ordinárias do Comitê,
repercutindo na falta de encontros por três anos (2010, 2014 e 2015). Durante a Pandemia,
porém, as reuniões ordinárias não deixaram de acontecer e foi perceptível o aumento do
quórum, talvez pela modalidade on-line permitir maior flexibilidade. Talvez seja uma estratégia
interessante a ser mantida no pós- pandemia.
Atribuímos as resistências institucionais quanto à SPN ao olhar viciado, relacionado ao
nosso processo de formação social. Esse olhar que naturaliza as iniquidades raciais, também é
responsável pela manutenção da ocupação dos espaços sociais segundo raça/cor, em uma escala
onde a brancura é sinônimo de qualificação, enquanto a negritude, sinônimo de menos-valia. O
mito da democracia racial procura apagar a vulnerabilização da saúde da população negra como
um processo coletivo, uma produção histórica e social que respondeu a um determinado projeto
de desenvolvimento: restrito às classes privilegiadas pelo racismo. É fundamental ter essa
leitura crítica e contextualizada, para que não se recorra à culpabilização individual das pessoas
vulnerabilizadas por uma dinâmica social excludente.
Entendemos que existe uma relação direta entre a resistência de gestores, gerentes e
equipes técnicas de saúde, quanto à importância da implementação da PNSIPN e os mitos da
democracia racial e da meritocracia. Nesse sentido, reforçamos a urgência da formação de uma
área técnica da SPN, bem como da recomposição dos quadros da Prefeitura do Rio de Janeiro,
de modo que haja diversidade e proporcionalidade, considerando a população brasileira.
Diferentemente do Município de São Paulo, onde foram adotadas medidas mais
contundentes no tocante à saúde da população negra – Área técnica da SPN (2003), Política
Municipal da Saúde da População Negra (2016); Programa Municipal de Saúde da População
Negra (2020) – o município do Rio de Janeiro não instaurou medidas que viabilizassem a
criação de uma área técnica da SPN ou a promulgação da Política Municipal da SPN, o que
daria sustentabilidade às ações em prol da equidade racial em saúde.
104

9.CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo de avaliabilidade revelou a pertinência de uma avaliação posterior,
da PNSIPN no MRJ, a partir das seguintes lacunas: a) a necessidade da inclusão da saúde da
população negra no orçamento municipal (PPA, PMS, LDO): b) a urgência do enfrentamento
do racismo institucional expresso pela composição do quadro municipal de gestão; c) a
promoção da gestão participativa das ações voltadas à SPN.
A questão orçamentária merece singular atenção, por ser determinante para a execução
das demais ações estratégicas, como a criação de uma área técnica da SPN, a operacionalização
do Programa Municipal da Saúde Integral da População Negra, além dos desafios relacionados
à efetiva implantação do quesito raça/cor.
Um segundo aspecto que merecerá atenção do processo avaliativo diz respeito ao
racismo institucional que, ainda em 2021, é evidente, por exemplo, na composição dos quadros
de gestão do MRJ: majoritariamente branca e masculina. O racismo institucional é deletério
para a população negra porque repercute, para além das violências cotidianas, nos espaços de
assistência à saúde, na paralisia governamental quanto à SPN. Como consequência, temos, por
exemplo, a sua inviabilização nos planos municipais de saúde, planos plurianuais e leis
orçamentárias.
A terceira questão que precisará estar sob o olhar da avaliação é o processo de gestão
participativa, transparência e controle social, funções centrais do Comitê Técnico da Saúde da
População Negra. Ao longo do estudo, identificamos lacunas com relação ao papel de gestão
do CTSPN, em decorrência do esvaziamento e distanciamento promovidos pela SMS.
Com relação às limitações do estudo, não foi possível introduzir a participação dos
grupos interessados (Oficinas com integrantes do CTSPN) ao longo do processo de pesquisa.
O contexto da pandemia, somado os adoecimentos de ordem pessoal, tornou essa etapa
primordial da pesquisa inviável. Essa lacuna representa, certamente, uma limitação do estudo.
Em relação aos principais mobilizadores em prol da Saúde da População Negra no
Município do Rio de Janeiro, não restam dúvidas sobre o protagonismo do CTSPN, sobretudo
no que tange aos componentes representativos da sociedade civil: movimentos sociais negros,
em articulação com Institutos de Ensino e Pesquisa como a FIOCRUZ, UERJ, UNIRIO.
A partir da articulação intersetorial entre o CTSPN e os Parlamentares da Câmara
Municipal do MRJ, foi construído o projeto de Lei que cria o Programa Municipal da Saúde
Integral da População Negra.
105

A SMS estabeleceu uma relação distante com o CTSPN, durante todas as gestões
analisadas (Prefeitos Cesar Maia, Eduardo Paes, Crivella). Porém, consideramos a gestão do
Prefeito Crivella como a que mais destituiu o Comitê do seu lugar de controle social,
principalmente porque foi o governo que deveria ter gerenciado a crise sanitária deflagrada pela
Pandemia COVID-19, incluindo o CTSPN no grupo de crise da SMS, criando para o
enfrentamento da pandemia em âmbito local.
É sabido que o Comitê tem a função de assessorar a gestão, além de facilitar a
transparência e o controle social da PNSIPN. Entretanto, as gestões municipais foram
resistentes ao potencial de gestão do CTSPN. A construção dos Planos Municipais de Saúde,
bem como dos Planos Plurianuais não tiveram a participação do CTSPN na última década.
Apesar dos desafios para o enfrentamento do racismo institucional no SUS, o CTSPN
foi primordial para pressionar a SMS/RJ no tocante à coleta de dados desagregados por
raça/cor, quanto à capacitação continuada de gestores e técnicos da Saúde, bem como pela
inclusão parcial de metas da Saúde da População Negra nos Plano Municipal de Saúde (2009-
2013) e Plano Plurianual (2011-2013). Ainda assim, existe um longo caminho para a efetivação
da PNSIPN no MRJ.
A partir e 2020, assistimos a ampla mobilização social pelo Projeto de Lei 873/ 2021,
que corre na Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Propõe a criação do Programa de Saúde da
População Negra e da Área Técnica da Saúde da População Negra no município do Rio de
Janeiro. Essa será uma via potente para a alocação orçamentária à efetiva operacionalização da
PNSIPN em âmbito local.
Esperamos que esse trabalho contribua com o MRJ no sentido de provocar reflexões
mobilizadoras e tomadas de decisões que voltem a acenar para a efetiva inclusão da SPN na
agenda e orçamento. A nossa expectativa é a de que esse trabalho seja parte do respaldo técnico
e científico para a implantação do Programa Municipal de Saúde Integral da População Negra
no MRJ, bem como a Área Técnica da SPN, no âmbito da SMS.
No tocante à Saúde Coletiva – que faz frente ao modelo biomédico, propondo a
correlação das esferas biológica, social e histórica em busca da compreensão dos processos
de saúde-doença – almejamos que o estudo contribua para o alargar da discussão, ainda,
centrada na dicotomização entre raça e classe. A aposta é a de que as reflexões aqui presentes,
sob a perspectiva interseccional, dialoguem - para além dos muros da gestão -com a população
usuária, profissionais da saúde, movimentos sociais negros e o setor acadêmico, com destaque
para o GT Racismo e Saúde da ABRASCO.
106

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oprimido-enquanto-o-brasil-nao-se-assumir-racista-dizem-especialistas. Acesso em: agosto de
2021.
121

APÊNDICE:
1. LEVANTAMENTO DAS REUNIÕES ORDINÁRIAS DO CTSPN NO
MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO – 2007/2021

ANO MÊS PRINCIPAIS PONTOS


2007 OUTUBRO Dados da saúde carioca, por raça/cor, referentes a 2005: chances de morrer
maior para pessoas negras, em relação às brancas; mortalidade infantil
maior entre pessoas negras; acesso à consulta pré-natal maior entre as
mulheres brancas.
Apresentação da trajetória da saúde da população negra na SMS. Desafios
e recomendações a partir do II Seminário de Promoção da Saúde: Equidade
em Saúde da População Negra: implantação do quesito raça/cor.
Estabelecimento de indicadores; orçamento/financiamento; religiões de
matriz africana; comunicação; implantação da PNSIPN no município do
Rio de Janeiro.
Estratégias: capacitação de gestores, equipes técnicas; pesquisa sobre o
quesito raça/cor, formalização do Comitê (SMS); impressão de cartilhas da
ONG Criola
2008 FEVEREIRO Baixa frequência dos gestores nas reuniões
Adiamento do seminário municipal da população negra por motivos
estruturais e a importância do lançamento oficial do Comitê antes do
seminário.
Leitura e aprovação do Regimento
Estratégias para dar maior visibilidade e autonomia ao CTSPN: folder,
homepage
Prioridades para 2008: 1 -Seminário Municipal, Treinamento quesito
raça/cor, Seminário Rede Saúde, Seminário sobre a juventude,
Seminário sobre saúde da mulher. Em relação a informação: PSF
perfl\ de morbimortalidade. Na próxima reunião será apresentado o
esqueleto de Seminário Municipal.

JUNHO Retirada de cerca de 35 milhões SPN


Estados estão implantando a PNSIPN , em sua grande maioria ficando esta
ação ligada ao gabinete do Secretário
Fechar nomes dos membros faltosos para retirada/mudança de entidades
Seminário: email de divulgação, nomes para a mesa, data
Folder do Comitê

JULHO Mobilização/estratégias para divulgação e adesão ao Seminário municipal


da população negra: PCRJ, Página da Prefeitura Universidades,
movimentos sociais.
AGOSTO
Reunião com SEGESP para discutir o recurso destinado a SPN aúde da
População Negra, enviar carta cobrando dos setores pertinentes, Marmo
enviará carta para todos reenviem

12/08 Sr. Silva levantou a questão do que fazer com os participantes do Comitê
que não estiverem na posse
Rosana ressaltou a necessidade de se organizar os grupos temáticos para
discussão de estratégias de ação
Correlação do Comitê com outros Comitês da SMS

Diagnóstico epidemiológico da SPN no município do Rio


Sugerir a ASCOM para novembro fazer um Rio Estudos, junto com o
COMDEDINE, Conselho Municipal, Aps, etc
122

26/08 Solicitação padrão de liberação para participação no Comitê


Demonstração do Plano Municipal 2005-2008
SETEMBRO Reunião da Comissão Intersetorial do Conselho Nacional de Saúde para
discutir a Saúde da População Negra
Reunião do Conselho municipal de saúde — apresentação da Política
Nacional de Saúde da
População Negra (PNSPN), dia 29/1 às 13 horas no CIAD
Retomar reuniões do Fórum Estadual de Saúde com as secretarias,
Conselhos e Entidades
Discutida estratégia para a reunião com a SES no dia 11/10; Quais ações
desenvolvidas pela SES em relação a SPN como está sendo implantada a
Política Nacional de saúde da População negra, Comitê Técnico e recursos
Criação de um e-mail oficial do Comitê
Solicitar pauta nos conselhos distritais para apresentação da PNSPN
Divulgação na prefeitura do dia de mobilização nacional pró-saúde da
população negra
Passa para a lista do Comitê o material que irá construir a fala nos conselhos
distritais. Nas apresentações incorporar o CTSPN Pedir ao Fórum de Saúde
Mental

NOVEMBRO Divulgado lançamento do livro de Criola


Divulgado o Seminário do Fórum Estadual de Saúde da População Negra,
em São João de Meriti, em outubro
Manual de Políticas Públicas e Controle Social de Criola
Apresentação do Comitê aos Conselhos distritais: organização, distribuição
dos integrantes pelas áreas programáticas, conteúdos a serem tratados;
04/11 ênfase inicial à identidade e ao mito da democracia racial
Visto pelo Comitê a necessidade de preparar documento sobre a situação
da saúde da população negra no Município do Rio de Janeiro (MRJ), com
ações desenvolvidas e proposta a serem entregues ao novo prefeito e
secretário. A base para a formulação deste documento será a proposta que
foi incluída no plano municipal de saúde, os textos enviados pelo marco
Antonio e as recomendações do 1º Seminário Municipal de Equidade em
Saúde da População Negra(dez-2006).
123

11/11 Fechada a agenda do Conselho Municipal de Saúde das CAPs 3.2 e 3.3
para 2008.
Em março avaliar a participação dos membros do Comitê
Pesquisar quais outros comitês existem no Estados do Rio de Janeiro
Pensar com Cláudia a notícia para publicação no Diário Oficial sobre o Dia
da Consciência Negra
Prioridade - preparar o documento a ser entregue aos gestores. Agendada
reunião extraordinária para o dia 2 de dezembro e reunião aberta do Comitê
com mesa redonda com a participação de Rosana Iozzi, representante da
sociedade civil e da APS para o dia 9 de dezembro das 14 às 17 horas
Apresentação pelo Comitê, dos dados da Rosana, no auditório do CASS.
Também incluir a questão da violência contra a mulher e um membro do
Comitê. Ressaltar a questão do preenchimento do quesito raça/ cor

ANO MÊS PRINCIPAIS PONTOS


2009 ABRIL Prioridades para 2009: mortalidade materna, anemia falciforme e
DST/AIDS
14 Apresentação do Dr. Carlos Alberto Medeiros, gestor da Coordenadoria
de Promoção da Igualdade Racial e equipe. Inscrição da CEPPIR na
SEPPIR: tornando apta a concorrer a financiamentos de projetos.
Organização de reunião preparatória para a reunião com o secretário de
saúde: necessária a presença de Jurema Werneck e Marmo para apresentar
a PNSIPN, Louise para tratar das atribuições do comitê e a Vigilâcia para
trazer os dados epidemiológicos. Além de figuras públicas como Zezé
Mota
Proposta de encaminhamento de documento ao Conselho Municipal de
Saúde, o qual aprovou as propostas do Comitê para o período de 2009-
2012
Retomada das visitas aos conselhos distritais.

28 Preparatória para a reunião com o Secretário de Saúde, com a participação


de Jurema Werneck discorrendo sobre a PNSIPN
MAIO Secretário de Saúde não estava presente; representado por chefia de
gabinete
Apresentação dos dados epidemiológicos por raça cor (vigilância)
Mencionada a importância das áreas técnicas receberem esses dados, para
que se deem conta do tamanho da iniquidade racial em saúde
Jurema Werneck presente, afirmando o absurdo demostrado pelos dados
em pleno século XXI
Propostas: convidar os gestores para trazerem ações concretas na próxima
reunião
Cronograma de visitas aos conselhos distritais de saúde
JUNHO Discussão sobre o Plano Estadual sobre a Saúde da População Negra
Diálogo sobre aumentar a executica do Comitê, de maneira que seus
membros se articulem com Universidades, movimentos sociais; sobre a
obtenção de carteiras de identificação para que os membros tenham acesso
aos equipamentos da prefeitura; necessidade de convênio dom centro de
saúde coletiva, para a obtenção dos dados epidemiológicos racializados.
Necessidade da confecção de um projeto para ser divulgado para a
população
OUTUBRO Organização da capacitação do Comitê
Discutido a organização do lançamento da “Caravana do Axé”
124

NOVEMBRO Informadas as representantes do CTSPN no Comitê de morte materna da


SMS
Proposição e disponibilização (Vila) para criar um material com
informações sobre o CTSPN
Informe sobre o primeiro Seminário sobre população negra e saúde
mental, dia 07/12/2009. Nesse dia, o coletivo de mulheres negras fará um
encontro no SINDSPREV, sobre mulheres negras, saúde e trabalho
DEZEMBRO Informe sobre a reunião do Conselho Municipal de Saúde, com a inclusão
no Plano Municipal de Saúde (na diretriz estratégica 3, no eixo da
promoção da qualidade de vida) o item (5) sobre a ampliação da equidade
no SUS, com especial atenção à população negra e dos povos originários.
Proposição de quatro seminários municipais, tratando da saúde desses
povos vulnerabilizados. O Comitê discute sobre a representação dos povos
originários nesses seminários, além da sustentabilidade de dar conta de
mais essa frente, enquanto Comitê.
Consenso de que será encaminhada, para a publicação em DO, a nova
estrutura do Comitê. Em 2010, o regimento será cumprido, em relação às
ausências constantes.

2010
ANO MÊS PONTOS PRINCIPAIS
2011 FEVEREIRO Apresentadas as ações a serem cumpridas pela Coordenação de Educação
em saúde: oficinas raça/cor nas CAP’s; articulação com a vigilância para
obtenção da análise dos dados por raça cor; acompanhamento da inclusão
do quesito R/C nos impressos da SMSDC; continuidade da caravana do
Axé; III Seminário Municipal da SPN
Proposta a revisão do Comitê, em razão da baixa em 2010.

MARÇO A representante do Comitê informou que, após a primeira participação do


Comitê Central de morte materna, não recebeu notificação da reunião
seguinte ou informes sobre o grupo. A vigilância de saúde será
questionada a respeito da falha na comunicação.

Contextualização sobre o esvaziamento do Comitê desde 2010, com


dúvidas sobre os próximos passos. Não existe assessoria técnica acerca da
saúde da população negra, sendo o Comitê a única instância legal na
SMSDC. Apesar do agendamento de reunião com o Secretário de Saúde
no final de 2010, precisou ser cancelada por falta de quórum dos
integrantes do Comitê
Necessidade de oxigenação do Comitê, criação de informativo para a
publicização
III Seminário da Saúde da População Negra (anteriores: 2006 e 2008)
Necessidade do Secretário legitimar o Comitê junto aos gestores;
Agendada audiência com o Secretário para março
ABRIL Discussão sobre a organização do Seminário; sinalizada a necessidade do
comitê estar à frente da infraestrutura do evento;
Consenso de que todas as reuniões do Comitê terão uma área técnica da
SMSDC, seguindo o debate com os membros do comitê.
Discutida a audiência com o secretário, além da necessidade de incluir
alguns pontos a serem levantados ao mesmo: capacitação de gestores e
equipes técnicas sobre doença falciforme; investimento na qualificação da
equipe técnica em relação à saúde da população negra
Produto da reunião: organização de oficina sobre submetas (pedida pelo
Secretário);
MAIO Oficina para confecção das submetas a serem apresentadas à gestão,
contudo o baixo quórum e o atraso foram determinantes para a remarcação
da oficina.
ANO MÊS PONTOS PRINCIPAIS
125

2012 FEVEREIRO Reflexão sobre o esvaziamento do Comitê


Informes de que as oficinas raça cor foram inclusas nos relatórios da ONU
MAIO Audiência com o Secretário (submetas) foi adiada em razão da baixa
participação dos integrantes do Comitê
Proposta de confecção de material onde contenha as informações sobre o
Comitê, bem como sobre as submetas da SPN, entregues ao gabinete do
Secretário
Discussão sobre a aplicação do regimento. Falas recorrentes
DEZEMBRO Informe sobre grupo “Homens de Axé” (médicos q discutem a DF/SP) e
a Associação médica Renascer, com a mesma finalidade.
Ressaltam a importância da articulação com essas entidades.
Apresentação do processo de certificação das unidades de saúde da
SMSDC para obtenção do CRCQ Rio sem preconceito 2012.
Ressaltada a importância do registro da raça/cor no GIL, SINAN e
prontuário eletrônico para a obtenção do certificado.
Apresentado o processo de Inter religiosidade no Hospital da Piedade e
Salgado Filho
Necessidade de recomposição dos membros do comitê, pelo número de
faltosos.
2013: reuniões trimestrais

2013 JUNHO Apresentação das ações do Comitê


Assessoria Cooperação Social – ENSP/FIOCRUZ

CMS – Dificuldade da participação dos movimentos sociais

Permanência do racismo institucional como um dificultador para a SPN


Enfraquecimento do Comitê
CRIOLA - Necessidade de instrumentalização dos movimentos sociais; o
campo da saúde exige a atuação da militância, enfraquecida pela onda de
conservadorismo. O comitê precisa de estudo, instrumentalização.
Dimensão técnica exige estudo, capacitação, reflexão, estratégias.

Mortes maternas, onde 50% das fichas de APS não são preenchidas

FIOCRUZ: sugestão, trabalhar com informação e comunicação: o que o


comitê faz, encaminhamentos, planos de trabalho, novos atores
CRIOLA Papel do comitê, agenda

2014
2015

2016 ABRIL Marmo/ RENAFRO: Sugestão da realização do balanço da SPN na


SMS/RJ; Monique e Louise fizeram o relato das ações desde o I Seminário
em Equidade em SPN (2006). Proposta de atualização dos dados da SPN.
Proposta de elaboração de publicação com relação ao que foi executado
na SPN; preocupação com a nova gestão municipal; colocações sobre o
apagamento dos dados por raça/cor, antes disponibilizados na página da
SMS.
Urgência da utilização do quesito raça/cor para a consolidação dos dados
epidemiológicos, mas o racismo institucional ainda se faz presente. A
retirada da questão racial da social é sintomática: há racismo onde a raça
não aparece.
Sugestão de discussões sistemáticas sobre a SPN nos espaços
institucionais.
Proposta de infográfico da SPN/ SMS.
Proposta 2016: retomar as reuniões por CAP
126

2017 SETEMBRO Homenagem ao Marmo (RENAFRO), fundamental para a constituição do


Comitê; grande mobilizador da SPN/RJ.
Apresentação dados epidemiológicos sobre morte materna: mulher negra
3,2 mais chances de morrer do que a branca; fundamental, com3,4 mais
chances de morte do que quem tem ensino médio. CAPs 3.3. 5.1, 5.2, 5.3
são as que apresentam maior vulnerabilidade. Aumento de óbitos por
causas obstétricas indiretas (hipertensão, diabetes. Mencionado o
programa Risco Reprodutivo, a partir do qual mulheres em
vulnerabilidade tem o DIU colocado no pós-parto imediato.
Discussões sobre a mortalidade materna e a necessidade da articulação
com a sociedade civil para o controle social. Destaque para o trabalho do
gabinete da Vereadora Marielle Franco, Presidente da Comissão da
Mulher.
Importância do posicionamento do secretário de saúde para a mobilização
dos profissionais quanto ao preenchimento do quesito raça/cor. Quando o
secretário Hans apontou essa necessidade, observou-se maior mobilização
dos equipamentos nesse sentido. Em relação às metas de redução da
mortalidade materna, destacam-se, tb, as submetas relacionadas à mulher
negra. Necessário que o secretário estabeleça a meta relacionada à
diminuição das mortes maternas negras: é uma meta política e não de
responsabilidade da Superintendência de Vigilância em Saúde, mas do
Gabinete.
Discussão de caso em que uma gestante negra chegou ao óbito, depois de
passar por inúmeros profissionais: “A menina foi tratada por todos e por
nenhum; o plantão foi passado sem intercorrências e a menina estava
morrendo(...) os protocolos estão aí, o que falta? (...) os profissionais têm
que saber que as mulheres negras e pardas são as que mais morrem”.
Problematização sobre a desumanização presente na constituição da
população negra.
OUTUBRO Repasse da reunião do Comitê de Prevenção e Controle da Morte Materna
(CPCMM) com o Secretário de Saúde: firmado o compromisso com a
redução da mortalidade materna (será publicado resolução/ SMS com os
membros do CPCMM. A metas relativas à população negra foram
discutidas com o Secretário, sendo solicitada a formulação de meta
específica para a redução da mortalidade materna negra. Secretário
menciona a prioridade para a criação de um aplicativo para o
acompanhamento de gestante na rede municipal.
Discutidos os impactos do racismo na SPN. Necessidade de capacitação
profissional
Ressaltados os eixos prioritários do Comitê: Quem somos; Racismo
institucional; introdução da variável raça/cor
DEZEMBRO Discutida a proposta de oficina com os gestores da SMS sobre o racismo
institucional
ANO MÊS PRINCIPAIS PONTOS
2018 Volta da discussão sobre as oficinas para os gestores: RI
Resistência da Saúde mental com relação a SPN
MARÇO Falta de dados racializados na Superintendência de Saúde Mental;
Reunião do CMS com apresentação do Plano Municipal de Saúde, onde
ignora-se a variável raça/cor, bem como as metas específicas para a SPN.
No site da PC/RJ, os dados da violência são os únicos racializados.
Necessidade do Comitê participar da formulação dos Planos de Saúde
127

MAIO Instrumentalização do Comitê


Apresentação da PNSIPN, do III Plano operativo e das 7 submetas para a
SPN.
Encaminhamentos: levantamento dos dados da SPN, em comparação com
o período em que foram implantadas metas da SPN no PPA. Verificar se
houve mudanças positivas para a SPN. Documento amparará a discussão,
junto ao Secretário, da repactuação das 7 submetas (reapresentar a
proposta na CMS de 2019)
JUNHO Apresentação dos dados epidemiológicos da população negra no MRJ
(Superintendência de Vigilância de Saúde)
AGOSTO Propostas paralelas a SMS em relação à mortalidade materna negra
(CRIOLA/ DEFESORIA/ INSTITUIÇÕES DE ENSINO
Ausência de dados racializados na saúde mental.
SETEMBRO Informe sobre o planejamento do Curso da ENSP “Expressões Racismo
na Saúde” (ENSP – Dra. Roberta Gondim).
Apontamentos relacionados a SPN no município do Rj, a partir da
apresentação do trabalho de pesquisa coordenado pela Dra. Ana Paula
Procópio (UERJ): Planos Municipais de Saúde que ignoram a racialização
dos dados; proposição de metas de saúde, ignorando a necessidade da
equidade racial em saúde.
Invisibilização da mortalidade materna negra, por parte da SMS
OUTUBRO Discussão sobre a crise da saúde municipal: nenhum serviço de Saúde,
demissão em massa da APS, assédio moral, salários atrasados, incitação
da população contra os profissionais da saúde; indicadores de saúde
piorando – aumento da mortalidade infantil na CAP 5.3.
Proposta de organização do III Seminário Municipal da População Negra
e Saúde Mental (apoio do núcleo de direitos humanos da DF/RJ, veiculado
ao CTSPN)
Documento sobre a SPN, a ser entregue à Secretária de Saúde
DEZEMBRO Avaliação da SPN/2018: dificuldade na execução de propostas diante da
oscilação dos trabalhadores em seus cargos; reuniões mensais agregaram
novas parcerias e fortaleceram antigas. Participação de diferentes atores,
porém sem continuidade.
ANO MÊS PRINCIPAIS PONTOS
2019 MARÇO Reunião ampliada: Formação dos Grupos de Trabalho (Doença
Falciforme e Racismo; Mortalidade Materna das Mulheres Negras e
Racismo; População Privada de Liberdade e Racismo; Saúde Mental e
Racismo)
ABRIL Discussão sobre as atribuições do Comitê e da necessidade de sua
participação efetiva nos processos de gestão e execução da política
Estratégias de visibilização e mobilização da participação dos
movimentos sociais no Comitê
Apresentação dos dados da SPN à Secretária de Saúde
Apresentação de proposta de regimento dos GT’s
Agendar a entrega do documento sobre a SPN à secretária
Cada GT agendará o primeiro encontro via grupo específico
MAIO Discussão sobre a mortalidade materna negra: foram apresentados dados
da Vigilância, sobre o perfil da mortalidade materna no município do Rio
de Janeiro;
Pesquisadora da ENSP abordou a violência obstétrica a partir da
Residência multiprofissional, além da contribuição da militância de
mulheres negras no enfrentamento da violência obstétrica.
Propostas: capacitação dos trabalhadores na perspectiva da desconstrução
do racismo; treinamentos para o enfrentamento do racismo institucional;
articulação com conselhos profissionais e sindicatos no intuito de
implementar a PNSIPN; articulação com os Programas de Residência;
aproximação com Associação Brasileira de Obstetrizes e Enfermeiros
Obstetras do Rio de Janeiro (ABENFO/RJ)
128

JUNHO
JULHO Pauta: devolutiva da reunião c SMS (8 de julho). As sete submetas
elaboradas pelo Comitê foi o direcionador da reunião: identificação de
possíveis atores, dentro da SMS, que poderiam contribuir com a
efetivação das metas; questionamento da incompatibilidade da agenda
municipal frente às metas da SPN; implementação do E-SUS como um
caminho para qualificar o preenchimento raça/cor; capacitação
profissional para o preenchimento do quesito raça/cor; a criação de uma
área técnica da SPN, dentre outras reivindicações.
Não foram evidenciadas pactuações fruto desse encontro.
AGOSTO Apresentação dos dados sobre direitos sexuais e reprodutivos da mulher
no município do Rio de Janeiro pela Gerência da Mulher. Discutidas
questões como a necessidade de se considerar a desagregação dos dados
por raça/cor, uma vez que a mulher negra é o “outro do outro”
(Kilomba,2019).
SETEMBRO A Superintendência de Promoção da Saúde passou a ser Coordenadoria
Técnica de Promoção da Saúde. O Comitê está incluído nas competências
da Coordenadoria como estratégia viabilizada por meio do controle social
para a implementação da PNSIPN no município do Rio de Janeiro.
Proposta sobre o evento “10 anos de PNSIPN”
Apresentação do perfil da doença falciforme no município do Rio de
Janeiro (GT doença falciforme).
OUTUBRO Discussão sobre o histórico da saúde do trabalhador. Atualmente, a
Atenção Primária de Saúde é responsável por esse campo nas AP’s. Temos
três Centros de Referência da Saúde do Trabalhador no município do RJ;
há subnotificação dos acidentes envolvendo a saúde do trabalhador;
ausência do debate racializado.
NOVEMBRO Seminário 10 anos de implementação da PNSIPN no município do Rio de
Janeiro, com a participação de vinte pessoas. A maior parte das presentes
eram da PCRJ. Da sociedade civil, estavam presentes o movimento de
médicas negras ( NEGREX-RJ), o movimento de mulheres encarceradas
(Elas existem), além de representantes do Instituto Fernandes Figueira
(Fiocruz) e da Universidade Federal Fluminense.
DEZEMBRO Apresentação do planejamento para 2019 e o que foi realizado: criação
dos GT’s do Comitê; participação das áreas técnicas no Comitê; diálogo
do Comitê com áreas jurídicas; capacitar os membros do Comitê;
diagnóstico epidemiológico; secretaria executiva.
Os grupos de trabalho foram criados, sendo que o andamento tem se dado
de forma diversa. São eles: GT Doença Falciforme e racismo; GT Privados
de Liberdade e racismo; GT Saúde Mental e Racismo; GT Mortalidade
Materna e Racismo;
Foram três participações da Gerência da Mulher; Superintendência de
Vigilância da Saúde (1);
Relatório epidemiológico: relatório da SPN, entregue à Secretária de
Saúde em julho
As reuniões de 2020 serão mensais

ANO MÊS PRINCIPAIS PONTOS


2020 JANEIRO Apresentação do trabalho sobre a interlocução do CTSPN e a Gerência da
área técnica de Hipertensão e Diabetes, onde foi observada a prevalência
de pessoas negras com o quadro hipertensivo no município do Rio de
Janeiro.
129

FEVEREIRO Discussão sobre a população em situação de rua: cuidado em saúde,


estigmatização, despreparo dos profissionais da saúde para o acolhimento
e cuidado desse público;
Propostas: incluir a discussão do racismo nas capacitações dos
profissionais da saúde; instrumentação dos profissionais da saúde para o
atendimento; criar um GT da saúde da população em situação de rua e
racismo
MARÇO Cancelada em razão da Pandemia
ABRIL (virtual) Como manter as ações do Comitê durante a pandemia, considerando a
pouca governabilidade dos membros do CTSPN.
Encaminhamento: reunião do Comitê com o gabinete da SMS
MAIO
JUNHO (virtual) On line. Apresentação do histórico do Comitê.
Proposta de carta aberta sobre a SPN e suas vulnerabilidades em tempos
de Pandemia, a ser encaminhada para a SMS
Necessidade de qualificar o preenchimento do quesito raça/cor nesse
contexto.
ENSP está elaborando um estudo sobre a SPN e a COVID-19, com base
em dados epidemiológicos do MS: analisam a tendência do aumento da
doença entre a população negra em contraposição à prevalência de pessoas
nos Centros de Terapia Intensiva, o que denotaria a barreira de acesso para
a população negra.
Defensoria Pública acionou a SMS e o MS com relação ao preenchimento
do quesito raça/cor, solicitando o fornecimento dos dados desagregados
nos boletins epidemiológicos da COVID19
CTSPN não obteve retorno do Gabinete da SMS, diante da tentativa de
articulação
Leitura e ajustes da carta a ser entregue a SMS, no tocante à saúde da
população negra durante a pandemia
JULHO (virtual) Retorno sobre a entrega da carta sobre a SPN durante a COVID-19 para a
SMS
Apresentação do trabalho de pesquisa “ A COVID-19 e a SPN no
município do Rio de Janeiro” ( Thainá Guerra) no qual foi evidenciada a
menor notificação da doença nas favelas; organização da própria
população para lidar com as difuculdades ( “Voz das Comunidades”); a
segregação espacial que aglomera a população negra em regiões
vulnerabilizadas; a COVID tem acometido, prevalentemente, pretos e
pardos, inclusive em territórios embranquecidos; maior prevalência da
doença em bairros da zona oeste; prevalência de pessoas diagnosticadas
na zona Sul e de desfecho morte na zona oeste; maior letalidade na zona
oeste, onde prevalecem residentes negros; a taxa de recuperados é menor
entre a população negra, ainda que seja o público mais acometido; o
extermínio da juventude negra também se apresenta por meio da COVID-
19; desigualdades espaciais e o território como ferramenta do necro-poder;
morte social mediada pela falta de acesso a direitos básicos como saúde,
lazer, saneamento.
A Superintendência de Vigilância em Saúde apresentou “Informações
Epidemiológicas COVID-19”: SIVEP/ Gripe e E-SUS são as fontes para
os dados de COVID19 e de SRAG, ambos com variável raça/cor (a
inclusão do quesito raça/cor aconteceu em abril no ESUS VE); curva
epidemiológica e mudança no perfil; preenchimento do quesito raça/cor
precisa de aprimoramento; média de internações menor entre pretos e
pardos;
Discussão: dificuldade de avaliação fidedigna do perfil epidemiológico, já
que não testagem suficientes, sobretudo nas regiões
130

AGOSTO (virtual) O gabinete não deu retorno à carta entregue pelo CTSPN, sobre a SPN
durante a pandemia
Esposições sobre a saúde materna em tempos de COVID-19.
Discussão sobre os impactos do racismo institucional para o não
preenchimento do quesito raça/cor durante a pandemia; lembrança sobre
as capacitações realizadas em 2008
Encaminhamentos: Mobilização em torno da resposta da SMS à carta
apresentada pelo CTSPN; resgate das metas de saúde em relação com o
Plano Municipal de Saúde
SETEMBRO APRESENTAÇÃO DO DOCUMENTO DAS SUBMETAS PARA A
(virtual) IMPLEMENTAÇÃO DA PNSIPN
APRESENTAÇÃO DA CARTA REIVINDICATÓRIA PARA A
CRIAÇÃO DE UMA ÁREA TÉCNICA DA SPN NO MUNICÍPIO
DO RIO DE JANEIRO

OUTUBRO Evento pró-saúde da população negra: homenagem a José Marmo da


(virtual) Silva/RENAFRO (in memoriam); apresentação da Tese de Doutorado
“Silêncios e Confrontos: a saúde da população negra em Burocracias do
SUS” (MILANEZI, 2020); apresentação “PNSIPN: onde estamos e para
onde devemos ir”
LEITURA CARTA DE PETIÇÃO DE ÁREA TÉCNICA DA SPN
NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO.
ANO MÊS PRINCIPAIS PONTOS
2021 AGOSTO (virtual) Evento on line “20 ANOS DE DURBAN”: Homenagem a Lúcia Xavier
e Edna Roland, mulheres ativistas que estão na luta em prol da saúde da
população negra há anos.
DEBATE SOBRE O PROJETO DE LEI DO PROGRAMA
MUNICIPAL DA SAÚDE DA POPULAÇÃO NEGRA, COM
PARLAMENTARES, REPRESENTANTES DE INSTITUTOS DE
PESQUISA, MOVIMENTOS SOCIAIS.

OUTUBRO Evento pró mobilização da SPN, com a apresentação do GT dados da


(virtual) cidadania com foco na saúde materna e considerando o quesito raça/cor.
DEBATE SOBRE O PROJETO DE LEI DO PROGRAMA
MUNICIPAL DA SAÚDE DA POPULAÇÃO NEGRA, COM
PARLAMENTARES, REPRESENTANTES DE INSTITUTOS DE
PESQUISA, MOVIMENTOS SOCIAIS.
131

ANEXO A: RESOLUÇÃO/ SMS DE CRIAÇÃO DO CTSPN

CRIAÇÃO DO COMITÊ TÉCNICO DE SAÚDE DA POPULAÇÃO NEGRA

DIARIO OFICIAL DO MUNICIPIO DO RIO DE JANEIRO, DO DIA 14 DE


SETEMBRO DE 2007, PÁGINAS 17 E 18, ANO XXI, N° 124.

ATOS DO SECRETARIO

RESOLUÇÃO SMS Nº 1298 DE 10 DE SETEMBRO DE 2007

O SECRETÁRIO MUNICIPAL DE SAÚDE, no uso das atribuições que lhe são conferidas
pela legislação em vigor,

CONSIDERANDO que os dados epidemiológicos do Município do Rio de Janeiro apontam


maior vulnerabilidade da população negra aos agravos à saúde;

CONSIDERANDO que a 11º e a 12º Conferência Nacional de Saúde e o Plano Nacional de


Saúde definiram que o Ministério da Saúde e as Secretarias Estaduais e as Municipais de Saúde
devem criar comissões técnicas para estudo e avaliação da população negra com a participação
da sociedade civil;

CONSIDERANDO a necessidade de implantar a Política de Saúde da População Negra,


articulando as ações promovidas pela Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro -
SMS/Rio com as demais instâncias da Prefeitura;

CONSIDERANDO a necessidade de envolver diferentes atores sociais na definição de


estratégias para intervenção;

CONSIDERANDO a necessidade de formulação de políticas municipais e a definição de


protocolos básicos de ação.

RESOLVE

Art. 1º Constituir, no âmbito da SMS – Rio, o Comitê Técnico de Saúde da População Negra -
CTSPN, com as seguintes atribuições:

I - sistematizar propostas que visem à promoção da equidade racial na atenção à saúde da


população negra;

II – apresentar subsídios técnicos e políticos voltados à melhoria da atenção à saúde da


população negra;

III - elaborar e implementar um plano de ação e monitoramento para intervenção pelas diversas
instâncias e órgãos do Sistema Único de Saúde;

IV – fomentar e participar de iniciativas intersetoriais relacionadas com a saúde da população


negra;
132

V - atuar na implantação, acompanhamento e avaliação das ações programáticas e políticas


referentes à promoção da equidade em saúde da população negra na SMS/Rio, baseando-se na
Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Decreto nº 4.886 de 20 de novembro de
2003 da Presidência da República), no Plano Nacional de Saúde e na Política de Promoção da
Saúde.

Art. 2º Designar representantes das seguintes instituições para comporem o CTSPN:

Instituições convidadas:

- Criola - ONG de Mulheres Negras;

- Rede de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde;

- Conselho Municipal de Defesa dos Direitos do Negro Titular - COMDEDINE;

- Instituições e Entidades de Estudo e Pesquisa;

- Fórum Estadual de População Negra;

- Fórum Estadual de Mulheres Negras;

- Associação Brasileira de Aids- ABIA;

- Instituto de Psicossomática Psicanalítica - Ori- Aperê.

Secretaria Municipal de Saúde:

- Assessoria de Promoção da Saúde;

- Superintendência de Vigilância em Saúde;

- Superintendência de Atenção Especializada;

- Superintendência de Atenção Básica;

- Conselho Municipal de Saúde;

- Coordenação de Saúde Mental;

- Representantes das Coordenações de Área Programática de Saúde por área de afinidade;

- Técnicos especialistas da SMS/Rio das áreas de emergências, maternidades, casa de parto,


saúde mental e atenção básica.

Parágrafo único. A coordenação do Comitê Técnico será exercida durante dois anos pelo
representante da Assessoria de Promoção da Saúde. Após este período será escolhida pelo
próprio comitê a nova coordenação.
133

Art. 3º Os membros do Comitê Técnico de que trata esta Resolução não receberão nenhuma
gratificação para o seu exercício, sendo considerado trabalho de relevância pública.

Art. 4º O comitê poderá solicitar, quando necessário, o parecer técnico de outras instituições e
especialistas, internos e externo a SMS/Rio.

Art. 5º As propostas do comitê, antes de serem viabilizadas, deverão ser aprovadas pelo
Secretário Municipal de Saúde.

Art. 6º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

Rio de Janeiro, 10 de setembro de 2007.

JACOB KLIGERMAN
134

ANEXO B: IMPLANTAÇÃO DA PNSIPN NO MRJ

Implantação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra no


município do Rio de Janeiro
Autor: Comitê Técnico de Saúde da População Negra – SMS-RJ
Introdução
A institucionalização do debate sobre a saúde da população negra na Secretaria Municipal de Saúde
do Rio de Janeiro (SMS-RJ) teve início em 2006. Antes desse ano, do que se tem ciência, apenas
profissionais do Centro de Treinamento em Atenção Integral à Saúde da Mulher, vinculado à
Gerência de Saúde da Mulher, abordavam conteúdos relativos à saúde da mulher negra, em aula
específica, dos cursos regulares voltados para o treinamento dos profissionais da SMS-RJ, na área
de saúde da mulher.
No âmbito interno da SMS-RJ o desencadear do processo de implantação da política, entre 2006 e
2009, foi por meio de iniciativa da Assessoria de Promoção da Saúde (APS), atual Coordenadoria
Técnica de Promoção da Saúde, em consonância com a Política Nacional de Promoção da Saúde 1,
que entende o processo de saúde-adoecimento a partir dos Determinantes Sociais da Saúde,
considerando a saúde como resultante dos modos de organização da produção, do trabalho e da
sociedade em determinado contexto histórico.
Nessa direção, e tendo como alicerce o documento preliminar da Política Nacional de Saúde Integral
da População Negra (PNSIPN) e os dados iniciais da morbimortalidade da população negra no
município, a APS reconhece a necessidade de construir um espaço de diálogo com diversos atores
de representação governamental e da sociedade civil, no intuito de elaborar estratégias para iniciar
o processo de implantação da política na secretaria.
A realização do “II Seminário de Promoção da Saúde: Equidade em Saúde da População Negra”,
em dezembro de 2006, foi o marco principal, abordando a saúde da população negra no contexto
carioca. Organizado pela então APS em parceria com a Ong Criola de Mulheres Negras do Rio de
Janeiro. Esse seminário teve como intuito sensibilizar profissionais, gestores da saúde e definir
estratégias para a implantação da PNSIPN no município. Estavam presentes aproximadamente 300
participantes: gestores e profissionais de saúde, ativistas do movimento negro e de mulheres negras,
sociedade civil, lideranças comunitárias e representantes das religiões afro-brasileiras.
A PNSIPN, aprovada em 13 de maio de 2009, pelo Conselho Nacional de Saúde, tem caráter
transversal, como marca o “reconhecimento do racismo, das desigualdades étnico-raciais e do
135

racismo institucional como determinantes sociais das condições de saúde, com vistas à promoção
da equidade em saúde."2
Processo de implantação da política
Para fomentar e articular o processo de implantação da política foram arroladas as seguintes
propostas no seminário:
1. Criação de um Comitê Técnico de Saúde da População Negra;
DOCUMENTO Implantação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra no município do Rio de Janeiro
© REVSF. Rev. Saúde em Foco Rio de Janeiro, RJ v.5 n.1 p. 66-74 jan./jun. 2020

2. Implantação do registro da variável raça/cor nos impressos oficiais da SMS;


3. Diagnóstico epidemiológico da saúde da população negra;
4. Formulação e estabelecimento de indicadores;
5. Enfrentamento ao racismo institucional;
6. Valorização das religiões de matriz africana;
7. Institucionalização de recurso para a implantação da política;
8. Fomento da participação do controle social e o fortalecimento de articulações intersetoriais.
Todas essas ações serão detalhadas no decorrer do texto.
A criação do Comitê Técnico de Saúde da População Negra (CTSPN) na SMS-RJ, resultante do
Grupo de Trabalho, composto por profissionais da gestão e pela sociedade civil, foi o embrião para
impulsionar a PNSIPN e conduzir as demais estratégias elencadas no seminário. Cabe destacar o
protagonismo de duas mulheres negras: uma enfermeira, ocupando um cargo de gestão na APS e a
outra médica atuando em um Centro Municipal de Saúde (CMS), ambas idealizaram e incitaram a
discussão sobre saúde da população negra e sobre a política no contexto carioca.
A visão dos profissionais e representantes da sociedade civil envolvidos com o início da discussão
da PNSIPN era de que seria estratégico impulsionar a transversalização dessa em todas as áreas
técnicas da Secretaria de Saúde, com o monitoramento sendo feito pelo CTSPN.
As representantes da APS no CTSPN assumiram a Secretaria Executiva e concomitantemente, em
2009, com o processo de transformação da APS em nova área técnica (Superintendência de
Promoção da Saúde-SPS), foi incluída como uma das frentes de trabalho as questões relativas à
saúde da população negra.
O próximo passo, foi a realização de oficinas de sensibilização com gestores do nível central,
coordenadores de área central sobre a saúde da população negra e a PNSIPN, também realizada
pelo representante do Ministério da Saúde. Na ocasião o Secretário Municipal de Saúde firma o
compromisso público com a implantação da política no município.
A produção de informação em saúde com recorte racial também acompanhou esses processos, em
2008, o relatório “Alguns Indicadores de Saúde da Cidade do Rio de Janeiro segundo a variável
136

raça/cor” produzido pela Vigilância em Saúde, foi o pioneiro, proporcionando a comparação dos
indicadores entre as categorias pretos, pardos e brancos. As desigualdades em saúde e iniquidades
sociais da população negra no munícipio são reveladas no documento, em que também são feitas
críticas às práticas racistas inclusas no modelo de saúde.
No que tange a recursos financeiros para a implantação da política, em 2009 foi criada uma meta
orçamentária específica, destinada às ações e atividades de equidade em saúde da população negra,
apesar de reduzido, com o recurso foi possível viabilizar algumas estratégias. No entanto a partir
do ano de 2014, com orçamento contingenciado, perde-se a governabilidade sobre esse orçamento
e em 2018 a meta é extinta. DOCUMENTO Implantação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra no município
do Rio de Janeiro
© REVSF. Rev. Saúde em Foco Rio de Janeiro, RJ v.5 n.1 p. 66-74 jan./jun. 2020

Estratégias de implementação da PNSIPN


Criação do Comitê Técnico de Saúde da População Negra no Município do Rio de Janeiro
Sendo o principal mecanismo no processo de implementação da PNSIPN no âmbito municipal, o
comitê é um espaço para propor, formular, monitorar e avaliar ações de atenção à saúde da
população negra. Conta com a participação de representantes da sociedade civil, instituições de
pesquisa, universidade, gestores da Secretaria Municipal de Saúde e técnicos do Rio de Janeiro e
foi oficializado pela resolução SMS-RJ Nº 1298 de 10 de setembro de 2007 e tem as seguintes
atribuições:
Sistematizar propostas que visem à promoção da equidade racial na atenção à saúde da população
negra;
Apresentar subsídios técnicos e políticos voltados à melhoria da atenção à saúde da população
negra;
137

Elaborar e implementar um plano de ação e monitoramento para intervenção pelas diversas


instâncias e órgãos do Sistema Único de Saúde;
Fomentar e participar de iniciativas intersetoriais relacionadas com a saúde da população negra;
Atuar na implantação, acompanhamento e avaliação das ações programáticas e políticas
referentes à promoção da equidade em saúde da população negra na SMS/Rio, baseando-se na
Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Decreto nº 4.886 de 20 de novembro de 2003
da Presidência da República), no Plano Nacional de Saúde e na Política de Promoção da Saúde.3

A participação e o controle social contribuem para a democratização da gestão pública, sobretudo


na PNSIPN, sendo essa uma política que visa a redução das desigualdades historicamente
construídas da população negra e à promoção da equidade.
O acompanhamento dos processos de formulação, execução, monitoramento e avaliação das ações
e da aplicação de recursos destinados para a implementação de uma política são mecanismo
desempenhados também pela sociedade civil, o que é viabilizado nos encontros mensais do CTSPN.
Implantação da variável raça/cor
Embora já existisse o campo cor nos impressos de matrícula e atendimento dos usuários, seu
preenchimento era deficitário e em formato não padronizado. Em levantamento realizado em 2008,
nos CMS do município, verificou-se que no impresso denominado “Ficha Central”, utilizado nas
matrículas dos pacientes nas unidades, 49% não apresentavam o campo cor preenchido, sendo que
o espaço desse campo era aberto e sem o padrão do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), constituído por cinco categorias (preto, pardo, branco, amarelo e indígena).4
Em 2018 foi promulgada a Lei Municipal nº. 4930, de 22 de outubro de 20085, dispondo sobre a
obrigatoriedade de preenchimento do campo raça formulários de informação em saúde, conforme
o padrão do IBGE. Esta legislação foi de extrema importância pois reforçou o arcabouço legal para
a implantação da variável raça/cor. DOCUMENTO Implantação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra

no município do Rio de Janeiro


© REVSF. Rev. Saúde em Foco Rio de Janeiro, RJ v.5 n.1 p. 66-74 jan./jun. 2020

Nos anos de 2009 e 2010 decorreu o processo de inclusão do campo raça/cor e do campo nome
social nos prontuários e fichas utilizadas nas unidades de atenção primária no município. Os
técnicos responsáveis pela coordenação do CTSPN procederam o levantamento, revisão e
adequação da variável raça/cor nos formulários eletrônicos e impressos oficiais, e foi feita também
a interlocução e pactuação com gestores, no sentido de sensibilizá-los para a importância da coleta
da variável na produção de estratégias de gestão.
A expansão da Estratégia de Saúde da Família (ESF) e a implantação dos prontuários eletrônicos
também estavam em curso. Quanto às unidades hospitalares foi incluído o campo raça/cor na ficha
138

central dos prontuários, no boletim de emergência e na ficha de pronto atendimento. A reformulação


desses impressos foi mais rápida e direta do que as da atenção primária.
O processo de inclusão da variável ocorreu lentamente, secundarizado, com alguns entraves
burocráticos e questionamentos por parte de alguns gestores sobre a sua real necessidade.
Entendemos que a forma como se desenvolveu este processo até finalmente haver a consecução da
implantação da variável raça/cor transparece um forte sintoma do racismo institucional.
A utilização do quesito raça/cor no cotidiano dos serviços de saúde é uma questão complexa, que
carreia suscetibilidades e subjetividades pessoais e institucionais. Demandando o desvelar das
representações individuais sobre raça/cor e a busca de outras áreas de conhecimento para sua
compreensão e debate.
Lopes6 recomenda que a implantação do quesito cor seja acompanhada da capacitação dos
profissionais, elaboração de materiais informativos específicos e mobilização de toda sociedade.
Giovanetti7 discute a compreensão da identificação racial como medida discriminatória e a
interpretação de que os piores indicadores da população negra são causados pela questão
econômica, sem relação com a cor/raça. O autor considera ambas as ideias equivocadas e refere que
estas prejudicam a implantação e análise do quesito raça/cor nos serviços de saúde.
Na SMS-RJ foi realizado a sensibilização/treinamento dos profissionais das unidades de saúde. A
estratégia foi fundamental para inserir o debate sobre a importância do registro da variável raça/cor
e sobre o racismo e suas expressões na saúde.
Foram realizadas as primeiras oficinas sobre a capacitação do preenchimento da variável raça/cor
em 2008, no formato de Seminários Regionais de Promoção da Saúde tendo como público alvo os
profissionais da rede municipal de saúde.
No período de 2012 à 2015, a SMS, no âmbito da Atenção Primária à Saúde criou um processo de
certificação das unidades de saúde abarcando alguns temas, dentre eles foi criada a “Certificação
de Reconhecimento ao Cuidado de Qualidade: Unidade Parceira do Rio sem Preconceito”, medida
que estimulou o aumento no preenchimento do campo raça/cor nos prontuários e impressos das
unidades de atenção primária.
Valorização das religiões de matriz africana nas ações de saúde DOCUMENTO Implantação da Política

Nacional de Saúde Integral da População Negra no município do Rio de Janeiro


© REVSF. Rev. Saúde em Foco Rio de Janeiro, RJ v.5 n.1 p. 66-74 jan./jun. 2020

A PNSIPN traz dentre suas diretrizes a de “promoção do reconhecimento dos saberes e práticas
populares de saúde, incluindo aqueles preservados pelas religiões de matrizes africanas” tema que
também foi explorado no processo de disseminação da política nos territórios.
Em 2007 aconteceu o “I Encontro do Núcleo Rio de Janeiro da Rede Nacional de Religiões Afro-
Brasileiras e Saúde” evento concebido a partir da denúncia dos Yalorixás e Babalorixás frente a
situações de exclusão e discriminações sofridas pelos seguidores das religiões afro-brasileiras,
139

quando buscavam os serviços de saúde para atendimento e também com os sacerdotes, no cuidado
aos seus fiéis.
Do encontro, originou-se o projeto “Caravana do Axé - Terreiros de Portas abertas para a Promoção
da Saúde, Cultura e Cidadania”, iniciativa que contou com a participação da Rede Nacional de
Religiões Afro-Brasileiras e Saúde (RENAFRO), da Secretaria Municipal de Cultura e da
Coordenadoria Especial de Igualdade Racial.
O projeto teve como objetivo central fortalecer o reconhecimento dos terreiros como espaços
tradicionais de proteção e promoção de saúde. A identificação desses locais como promotores de
saúde é um fator fundamental na integração desses com a comunidade do entorno, na ampliação da
interlocução com os serviços de saúde do território, possibilitando assim a criação de espaços
privilegiados de trocas de saberes, de promoção da saúde e sobretudo de combate ao racismo
religioso. Os territórios mais vulneráveis da cidade e com comunidades de terreiros foram os
priorizados para o início do projeto.
Em uma outra vertente, mas ainda dentro da proposta “Caravana do Axé” adveio o movimento de
construção de um plano para a implantação de espaços de acolhimento espiritual e religioso em
unidades hospitalares do município, com intuito de ampliar e garantir que os sacerdotes e
sacerdotisas das religiões afro brasileiras conseguissem o livre acesso a essas unidades como já
ocorria para outras religiões.
Uma outra ação realizada a partir das conexões estabelecidas no “I Encontro do Núcleo Rio de
Janeiro da Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde” foi o projeto Ilê Aye yaya ilera
(Saúde Plena para a Casa desta Existência), uma parceria estabelecida pela Coordenação de Área
Programática 3.2 com o terreiro Ilê Axé Ya Manjeleô.
Esse projeto construído nos anos de 2006 e 2007, tinha como objetivo principal planejar e organizar
o acesso de mulheres negras, pobres e vinculadas à religião de matriz afro-brasileira em situação de
exclusão social, de modo a viabilizar o atendimento das necessidades de saúde dessa população,
promover ações que se destinem à promoção de saúde, prevenção e controle de doenças
infectocontagiosas e/ou crônicas e à inclusão de forma resolutiva na rede de serviços de saúde
existente.
Apesar de todo investimento no combate ao racismo religioso, com seminários, oficinas regionais,
produção de materiais educativos, atualmente percebe-se que não há nenhum estímulo por parte da
instituição em dar continuidade a esse movimento.
Ações voltadas para a Juventude Negra DOCUMENTO Implantação da Política Nacional de Saúde Integral da População
Negra no município do Rio de Janeiro
© REVSF. Rev. Saúde em Foco Rio de Janeiro, RJ v.5 n.1 p. 66-74 jan./jun. 2020
140

O Plano Juventude Viva (PJV) elaborado pelas Secretaria Nacional de Juventude e Secretaria de
Políticas de Promoção da Igualdade Racial do governo federal tem como foco o enfrentamento à
violência contra o jovem negro.
O fomento ao debate sobre o extermínio da juventude negra na cidade, já com o intuito de adesão
ao PJV e com a proposta de articular na SMS-RJ estratégias e ações de cunho intersetorial visando
a redução dos índices de morbimortalidade por causas externas, mais especificamente as violências,
partiu da iniciativa da Comissão Executiva do CTSPN.
No processo de implantação do PJV no município foi instituído em 2013 e 2014, dois espaços para
a articulação de diferentes atores (intra e intersetorial) e construção do plano operacional, o Fórum
Juventude Viva e o Fórum Juventude e Comunicação. As estratégias foram traçadas e firmadas
parcerias com o Fórum Estadual de Juventude, com representantes do Canal Futura, do Instituto
Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas, com o movimento de mães de jovens vítimas da
violência do Estado, com a Rede de Adolescentes e Jovens Promotores da Saúde e profissionais
técnicos e gestores da rede de saúde municipal.
Atividades educativas, sensibilização e criação de materiais
A elaboração e divulgação de materiais educativos com a representação da identidade étnico-racial
da população carioca (postais, cartazes, panfletos, vídeos), destacou-se como poderosa estratégia
nas capacitações dos profissionais da rede e na divulgação da importância da identificação raça/cor
junto aos usuários das unidades de saúde.
A produção dos relatórios técnicos com recorte étnico-racial ainda é incipiente nas áreas técnicas,
no entanto cabe destacar a divulgação dos dados relativos ao Sistema de Vigilância de Violências
e Acidentes (VIVA), (único que consta no site da prefeitura) e a informação referente à mortalidade
materna, ambos trazem a informação da raça/cor desagregadas.
Outros relatórios que incluem a variável raça/cor são elaborados de forma ocasional, não periódica.
É importante também que sejam divulgados e disponibilizados de forma ampla e sistemática os
dados epidemiológicos com recorte racial junto à população em geral.
Proposições de submetas para o município do Rio de Janeiro
Em 2011, o CTSPN construiu o documento de submetas elaborado a partir das propostas retiradas
do “III Seminário de Equidade em Saúde da População Negra” com enfoque na saúde do povo
negro, tendo em vista a situação de maior vulnerabilidade instaurada, os piores indicadores da saúde
e baixa resolubilidade dessas questões ao longo dos anos, apesar de todos os avanços observados
na rede de saúde.
Propõe-se, no documento 7 submetas:
1. Implementação do quesito raça/cor, com a qualificação de sua coleta, processamento, análise e
disseminação para embasar as decisões políticas em saúde;
141

DOCUMENTO Implantação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra no município do Rio de Janeiro
© REVSF. Rev. Saúde em Foco Rio de Janeiro, RJ v.5 n.1 p. 66-74 jan./jun. 2020

2. Redução da mortalidade materna de mulheres negras;


3. Redução da mortalidade infantil de crianças negras;
4. Acompanhamento de pessoas adultas com doença falciforme;
5. Educação permanente dos profissionais das unidades de saúde, com foco no enfretamento do
racismo institucional;
6. Redução da morbidade e mortalidade por violência e acidentes dos jovens negros;
7. Redução da morbidade e mortalidade por tuberculose, HIV/AIDS e sífilis na população negra.

Outras estratégias, como a Sala de Situação para Mortalidade Materna, inclusão da variável raça/cor
no acolhimento com classificação de risco em obstetrícia, horários alternativos de atendimento nas
Clínicas da Família de modo a garantir o acesso, são ferramentas que possibilitam o cuidado da
população negra, considerando as vulnerabilidades existentes, as submetas vão no sentido de
garantia da equidade, com acesso a saúde de qualidade em suas diversas possibilidades.
Interface do comitê com as instâncias de gestão da Secretaria Municipal de Saúde
A pactuação de estratégias para implementação da PNSIPN se deu principalmente via CTSPN,
houve sempre a necessidade de se tensionar a gestão para a inclusão de ações direcionadas para
redução das iniquidades em saúde da população negra nos planejamentos.
Um dos mecanismos para a difundir a política foi a apresentação dessa aos secretários de saúde,
superintendentes, coordenadores e gerentes responsáveis pela gestão, no primeiro momento. E na
etapa seguinte: educação permanente nas 10 Coordenações de Área Programática do município,
para os profissionais do nível local.
Reuniões ordinárias regionais organizadas para discutir localmente as questões relacionadas às
inequidades na atenção à saúde da população negra nos territórios, também foi uma estratégia
relevante para avançar com o tema.
A explanação de aspectos da saúde da população negra, bem como a PNSIPN aos Conselhos
Distritais de Saúde foi realizado em meados de 2013. O intuito era divulgar a política e estimular
que o tema fosse incorporado nas propostas para a conferência municipal, tendo em vista que nos
documentos precedentes não havia nenhuma proposição que considerasse a dimensão étnico-racial.
A apresentação da PNSIPN e do CTSPN é feito de modo sistemático a cada troca de gestão,
principalmente para o(a) secretario(a) municipal de saúde, incluindo também um relatório com
dados demográficos e epidemiológicos por raça/cor com informações atualizadas da cidade.
No ano de 2019 o documento foi entregue a atual Secretaria de Saúde, que recebeu membros do
CTSPN para a discussão das 7 submetas que também foram incluídas no relatório e modo de
operacionalizá-las. Dessa reunião foi possível estabelecer um canal de comunicação e pactuação
142

direto com o gabinete, em que o propósito é formular de modo articulado com representantes do
CTSPN, profissionais técnicos e gestores da SMS-RJ estratégias para execução política no âmbito
da gestão. DOCUMENTO Implantação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra no município do Rio de Janeiro
© REVSF. Rev. Saúde em Foco Rio de Janeiro, RJ v.5 n.1 p. 66-74 jan./jun. 2020

Em 2019, considerando a potência do CTSPN e a possibilidade de capilarizar a construção de


estratégias de enfrentamento do racismo para diferentes aspectos do processo de saúde e doença da
população negra, foi proposto a formação de 4 Grupos de Trabalho (GT) que funcionam de modo
autônomo, embora subordinado a instância.
Nesse sentido e considerando as temáticas mais debatidas nas reuniões mensais do Comitê foram
criados no final de 2018, com início em 2019, os GTs de Doença Falciforme e Racismo, Privados
de Liberdade e Racismo, Mortalidade Materna e Racismo e Saúde Mental e Racismo, sendo que
desse último além do GT, teve a formação de um Grupo de Autocuidado, funcionando de modo
paralelo ao GT.
Cabe destacar que a participação desses GTs não se limita a SMS-RJ, ou quaisquer outras
instituições, qualquer indivíduo que tenha interesse em contribuir com a formulação de estratégias
pode compor o grupo.
O objetivo dos GTs, entendendo que nos espaços de encontro do CTSPN não era possível formalizar as
propostas, por conta do tempo reduzido, é desenvolver propostas de trabalho sustentável, considerando o
contexto atual, para o enfrentamento do racismo no Sistema Único de Saúde (SUS) Carioca dentro dos temas
levantados e com base em evidências cientificas e de experiências externas exitosas. Data de submissão: 10-01-2020
Data de aceite: 14-01-2020
143

ANEXO C: PROJETO DE LEI QUE INSTITUI O PMSIPN


PROJETO DE LEI Nº 873/2021
EMENTA:
INSTITUI O PROGRAMA MUNICIPAL DE
SAÚDE INTEGRAL PARA A POPULAÇÃO
NEGRA E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.
Autor(es): VEREADORA TAINÁ DE PAULA,
VEREADORA THAIS FERREIRA, VEREADORA
MONICA BENICIO, VEREADOR LINDBERGH
FARIAS, VEREADOR REIMONT

A CÂMARA MUNICIPAL DO RIO DE JANEIRO

D E C R E T A:
Art. 1º Fica instituído o Programa Municipal de Saúde Integral para a População Negra, com o
objetivo de desenvolver, de forma integral, ações de promoção, prevenção, assistência e
recuperação da saúde da população negra e dos afrodescendentes, em conformidade com a
Portaria GM/MS nº 992, de 13 de maio de 2009, que institui a Política Nacional de Saúde
Integral da População Negra - PNSIPN.

Art. 2º O Programa Municipal de Saúde Integral para a População Negra será regido pelas
seguintes diretrizes:
I - garantia da inclusão deste programa no Plano Municipal de Saúde e no Plano Plurianual
setorial, em consonância com as realidades e necessidades locais, do monitoramento,
fiscalização e avaliação pelos conselheiros de saúde de distritais, conforme a Resolução CNS
nº 453, de 10 de maio de 2012, itens IV, V, VI, VII, VIII, IX e X;
II - identificação das necessidades de saúde da população negra no âmbito municipal,
considerando as oportunidades e recursos;
III - promoção de ações que garantam a equidade em saúde da população negra;
IV - criação de instrumentos de gestão e indicadores para monitorar e avaliar o impacto da
execução deste programa;
V - garantia de ações voltadas para a formação profissional e educação permanente dos
trabalhadores da saúde e dos conselheiros municipais e distritais de saúde, em articulação com
a Política Nacional de Educação Permanente em Saúde, instituída pela Portaria GM/MS nº
1.996, de 20 de agosto de 2007;
VI - articulação intersetorial, incluindo parcerias com instituições governamentais e não
governamentais, com vistas a contribuir para a promoção da saúde integral da população negra;
144

VII - fortalecimento da gestão participativa, com incentivo à participação popular e ao controle


social;
VIII - elaboração de materiais de divulgação visando a socialização da informação e das ações
de promoção da saúde integral da população negra;
IX - apoio aos processos de educação popular em saúdes pertinentes às ações de promoção da
saúde integral da população negra; e
X - instituição de mecanismos de fomento à produção de conhecimentos sobre racismo e suas
diferentes manifestações e a saúde da população negra.

Art. 3º O Poder Executivo, em articulação com o Comitê Técnico de Saúde da População Negra
- CTSPN, desenvolverá ações sistematizadas de qualificação profissional dos trabalhadores da
atenção primária, hospitalar, gestão e funcionários de programas de saúde, considerando a
vulnerabilidade dos agravos à saúde à população negra.

Art. 4º As questões de ordem étnico-raciais deverão percorrer transversalmente todos os


projetos e ações desenvolvidos pelo programa.
Parágrafo único. A coleta do quesito cor em todos os formulários obedecerá a classificação do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE que define as categorias branco, preto,
pardo, amarelo e indígena, sendo respeitada a autoclassificação, nos sistemas de informação do
Município;

Art. 5º O Poder Executivo disporá de órgão técnico competente que implante, monitore e avalie
a execução do Programa Municipal de Saúde Integral da População Negra, com vistas à
superação de barreiras estruturais e cotidianas que incidem na saúde dessa população.
Parágrafo único. O Comitê Técnico de Saúde da População Negra - CTSPN atuará em conjunto
com o órgão técnico a que se refere o caput a partir das atribuições elencadas na Resolução
SMS nº 1298, de 10 de setembro de 2007.

Art. 6º As despesas decorrentes desta Lei ocorrerão por conta de dotações orçamentárias
próprias, suplementadas se necessário.
Parágrafo único. O Poder Executivo poderá celebrar convênios, acordos, ajustes e outros
instrumentos congêneres com órgãos e entidades públicas ou privadas, objetivando a
operacionalização das ações previstas nesta Lei.
145

Art. 7º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.


Plenário Teotônio Villela, 9 de novembro de 2021.

JUSTIFICATIVA
O presente Projeto de Lei tem como objetivo garantir não só a aplicação da Política Nacional
de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN), mas a continuidade de atividades já realizadas
em gestões anteriores, especificamente no período de 2012 a 2015, quando a Secretária
Municipal de Saúde, no âmbito da Atenção Primária à Saúde, criou processo de certificação
das unidades de saúde abarcando temas como o “Reconhecimento ao Cuidado de Qualidade:
Unidade parceira do Rio sem Preconceito”, medida que estimulou a ampliação no
preenchimento do campo raça/cor nos prontuários e impressos das unidades de Atenção
Primária.
Nesse sentido, cumpre destacar que no município do Rio de Janeiro 51,3% da população carioca
é constituída de pessoas pretas e pardas - negros (IBGE, 2010) e que apresentam maior
vulnerabilidade aos agravos à saúde. Esse fato pode ser comprovado através dos indicadores
com recorte por raça/cor no município, o impacto das ações não atinge a população negra de
forma equânime. Dos óbitos infantis, a maioria (55,9%) é da raça/cor negra; a razão de
mortalidade materna para as mulheres pardas foi de 61,8% e para as pretas 143,6%; estas
também são as que têm menor acesso a consultas de pré-natal, 76.8% fizeram menos de sete
consultas; as causas externas estão entre as três principais causas de morte, incidindo
principalmente nos homens negros (80,3%) três vezes mais se comparado aos brancos (19,7%),
as mortes por homicídios são mais que o dobro, 30% na população branca e 70% para negros.
Ademais, pode-se dizer que algumas doenças incidem mais na
população negra por conta de fatores genéticos, biológicos, sociais e
econômicos, como anemia falciforme, doença hipertensiva da gravidez,
hipertensão arterial, diabetes mellitus e outras.
Na mesma medida, contamos com vasto regramento nacional que
justifica a implantação da Política Nacional de Saúde Integral da
População Negra (PNSIPN) no âmbito municipal, são elas:
· Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Decreto nº 4.886
de 20 de novembro de 2003);
· Política Nacional de Promoção da Saúde (Portaria MS/GM nº 687, de
30 de março de 2006);
· Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN)
146

publicada através da Portaria GM/MS nº 992, de 13 de maio de 2009,


pelo Ministério da Saúde (MS)
· Estatuto da Igualdade Racial (Lei nº 12.288, de 20 de julho de 2010),
no qual está inserido a PNSIPN.
· Resolução SMS nº 1298 de 10 de setembro de 2007, que institui
o Comitê Técnico da Saúde da População Negra do Município do Rio
de Janeiro (CTSPN)³. O CTSPN é constituído por representantes da
sociedade civil, instituições de pesquisa, universidade, técnicos e
gestores da SMSDC/RJ.
· Lei n. º 4.930 de 22 de outubro de 2008, que dispõe sobre a inclusão
do quesito raça nos formulários de informações em saúde do Município
do Rio de Janeiro e dá outras providências.
· Portaria nº 399, de 22 de fevereiro de 2006, que divulga o Pacto pela
Saúde 2006 – Consolidação do SUS e aprova as Diretrizes Operacionais
do Referido Pacto.
Nessa conjuntura, destaca-se o exemplo potente da carioca Lenora Mendes Louro (1968-
2007), médica psiquiatra, que atuou muitos anos no Hospital Estadual Pedro Ernesto,
defendendo firmemente a incorporação do serviço de psiquiatria na Central de Internação
gerenciada pelo SUS. A sua iniciativa colaborou com a democratização do acesso ao serviço
de Saúde Mental do hospital.
Na Secretaria Municipal de Saúde, atuou no Posto Belizário Penna, em Campo Grande,
trabalhou no abrigo Cristo Redentor e no Centro de Atendimento Psicossocial Fernando Diniz
onde iniciou o processo de organização da equipe e do atendimento, embora os recursos e os
apoios institucionais não fossem proporcionais à demanda que o local apresentava.
Em 2002, deixou a direção do Fernando Diniz e vai para o PAM Rodolpho Rocco em Del
Castilho, começando a desenvolver grupos de desmedicalização com mulheres negras,
moradores de comunidades carentes, com história de uso crônico de benzodiazepínicos.
Lenora Mendes Louro aprofundou o debate de temas como racismo, machismo e violência
como forma de problematizar o uso de tais remédios e participou da organização de Centro de
Estudos na Secretaria Municipal de Saúde para discutir a implementação das diretrizes ligadas
à saúde da população negra e, após algumas conversas e articulações, a iniciativa ganha corpo
e o grupo decide organizar o Primeiro Seminário de Saúde da População Negra do Município
do Rio de Janeiro, em parceria com a Organização Social Mulheres Negras Criola. Destaca-se
como um dos desdobramentos a criação de Grupo de Trabalho para a organização de Comitê
147

Técnico para implementação de diretrizes das políticas de saúde da população negra, que foi
criado no ano de 2007, como técnica especialista da área de saúde mental. A partir daí,
protagonizaram a criação de diversos grupos de estudos sobre mulheres negras e saúde mental,
participando dos momentos embrionários como uma das fundadoras da CONEI - Comunidade
Negra do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais – IFCS, da Universidade Federal do Rio de
Janeiro.
Lenora Mendes Louro teve vários artigos publicados na imprensa, criticando as políticas de
segurança do governo do Estado do Rio de Janeiro, bem como o genocídio da população negra
carioca. Participou intensamente dos movimentos e atos promovidos pelo movimento negro e
foi incansável na luta antimanicomial e na defesa de um atendimento digno e de qualidade a
todos os usuários do serviço público. Lenora Louro nos deixou no ano de 2007.
Por fim, faz-se importante salientar que o presente Projeto de Lei se constituiu a partir do debate
com profissionais e gestores de saúde e assistência social, lideranças religiosas, quilombolas e
do movimento negro e as vereadoras e vereadores que o subscreveram o apresentam como
vultoso instrumento de garantia de direitos à população negra da cidade do Rio de Janeiro.
Legislação Citada
PORTARIA Nº 992, DE 13 DE MAIO DE 2009
Institui a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra
(...)
RESOLUÇÃO Nº 453, DE 10 DE MAIO DE 2012
(...)
Aprovar as seguintes diretrizes para instituição, reformulação,
reestruturação e funcionamento dos Conselhos de Saúde:
(...)
IV - As entidades, movimentos e instituições eleitas no Conselho de
Saúde terão os conselheiros indicados, por escrito, conforme processos
estabelecidos pelas respectivas entidades, movimentos e instituições e
de acordo com a sua organização, com a recomendação de que ocorra
renovação de seus representantes.
V - Recomenda-se que, a cada eleição, os segmentos de representações
de usuários, trabalhadores e prestadores de serviços, ao seu critério,
promovam a renovação de, no mínimo, 30% de suas entidades
representativas.
148

VI - A representação nos segmentos deve ser distinta e autônoma em


relação aos demais segmentos que compõem o Conselho, por isso, um
profissional com cargo de direção ou de confiança na gestão do SUS,
ou como prestador de serviços de saúde não pode ser representante
dos(as) Usuários(as) ou de Trabalhadores(as).
VII - A ocupação de funções na área da saúde que interfiram na
autonomia representativa do Conselheiro(a) deve ser avaliada como
possível impedimento da representação de Usuário(a) e Trabalhador(a),
e, a juízo da entidade, indicativo de substituição do Conselheiro(a).
VIII - A participação dos membros eleitos do Poder Legislativo,
representação do Poder Judiciário e do Ministério Público, como
conselheiros, não é permitida nos Conselhos de Saúde.
IX - Quando não houver Conselho de Saúde constituído ou em atividade
no Município, caberá ao Conselho Estadual de Saúde assumir, junto ao
executivo municipal, a convocação e realização da Conferência
Municipal de Saúde, que terá como um de seus objetivos a estruturação
e composição do Conselho Municipal. O mesmo será atribuído ao
Conselho Nacional de Saúde, quando não houver Conselho
Estadual de Saúde constituído ou em funcionamento.
X - As funções, como membro do Conselho de Saúde, não serão
remuneradas, considerando-se o seu exercício de relevância pública e,
portanto, garante a dispensa do trabalho sem prejuízo para o
conselheiro. Para fins de justificativa junto aos órgãos, entidades
competentes e instituições, o Conselho de Saúde emitirá declaração de
participação de seus membros durante o período das reuniões,
representações, capacitações e outras atividades específicas.
(...)
Resolução SMS nº 1298 de 10 de setembro de 2007

Institui o Comitê Técnico da Saúde da População Negra do Município


do Rio de Janeiro (CTSPN)

(...)
149

Atalho para outros documentos


PORTARIA Nº 992, DE 13 DE MAIO DE 2009
O MINISTRO DE ESTADO DA SAÚDE, no uso das atribuições que lhe conferem os incisos
I e II do parágrafo único do art. 87 da Constituição, e
Considerando a diretriz do Governo Federal de reduzir as iniquidades por meio da execução de
políticas de inclusão social;
Considerando os compromissos sanitários prioritários nos Pactos pela Vida, em Defesa do SUS
e de Gestão, pactuados entre as esferas de governo na consolidação do SUS, visando qualificar
a gestão e as ações e serviços do sistema de saúde;
Considerando o caráter transversal das ações de saúde da população negra e o processo de
articulação entre as Secretarias e órgãos vinculados ao Ministério da Saúde e as instâncias do
Sistema Único de Saúde - SUS, com vistas à promoção de equidade;
Considerando que esta Política foi aprovada no Conselho Nacional de Saúde - CNS e pactuada
na Reunião da Comissão Intergestores Tripartite - CIT;
Considerando a instituição do Comitê Técnico de Saúde da População Negra pelo Ministério
da Saúde, por meio da Portaria n° 1.678/GM, de 13 de agosto de 2004, que tem a finalidade de
promover a equidade e igualdade racial voltada ao acesso e à qualidade nos serviços de saúde,
à redução da morbimortalidade, à produção de conhecimento e ao fortalecimento da consciência
sanitária e da participação da população negra nas instâncias de controle social no SUS; e
Considerando o Decreto n° 4.887, de 20 de novembro de 2003, que cria o Programa Brasil
Quilombola, com o objetivo de garantir o desenvolvimento social, político, econômico e
cultural dessas comunidades, e conforme preconizado nos arts. 215 e 216 da Constituição, no
art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - ADCT e na Convenção 169 da
Organização Internacional do Trabalho - OIT, resolve:
Art. 1º Instituir a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra.
Art. 2º A Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa SGEP articulará no âmbito do
Ministério Saúde, junto às suas Secretarias e seus órgãos vinculados, a elaboração de
instrumentos com orientações específicas, que se fizerem necessários à implementação desta
Política.
Art. 3° Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.
JOSÉ GOMES TEMPORÃO

POLÍTICA NACIONAL DE SAÚDE INTEGRAL DA POPULAÇÃO NEGRA


CAPÍTULO I
150

DOS PRINCÍPIOS GERAIS


1. Princípios Gerais
A Constituição de 1988 assumiu o caráter de Constituição Cidadã, em virtude de seu
compromisso com a criação de uma nova ordem social. Essa nova ordem tem a seguridade
social como "um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade,
destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social"
(BRASIL, 1988, art. 194).
Esta Política está embasada nos princípios constitucionais de cidadania e dignidade da pessoa
humana (BRASIL, 1988, art. 1o, inc. II e III), do repúdio ao racismo (BRASIL, 1988, art. 4o,
inc. VIII), e da igualdade (BRASIL, art. 5o, caput). É igualmente coerente com o objetivo
fundamental da República Federativa do Brasil de "promover o bem de todos, sem preconceitos
de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação" (BRASIL, 1988,
art. 3o, inc. IV).
Reafirma os princípios do Sistema Único de Saúde - SUS, constantes da Lei no 8.080, de 19 de
setembro de 1990, a saber: a) a universalidade do acesso, compreendido como o "acesso
garantido aos serviços de saúde para toda população, em todos os níveis de assistência, sem
preconceitos ou privilégios de qualquer espécie"; b) a integralidade da atenção, "entendida
como um conjunto articulado e contínuo de ações e serviços preventivos e curativos, individuais
e coletivos, exigido para cada caso, em todos os níveis de complexidade do sistema"; c) a
igualdade da atenção à saúde; e d) a descentralização político-administrativa, com direção única
em cada esfera de governo (BRASIL, 1990a, art. 7o, inc. I, II, IV IX).
A esses vêm juntar-se os da participação popular e do controle social, instrumentos
fundamentais para a formulação, execução, avaliação e eventuais redirecionamentos das
políticas públicas de saúde. Constituem desdobramentos do princípio da "participação da
comunidade" (BRASIL, 1990a, art. 7o, inciso VIII) e principal objeto da Lei no 8.142, de 28
de dezembro de 1990, que instituiu as conferências e conselhos de saúde como órgãos
colegiados de gestão do SUS, com garantia de participação da comunidade (BRASIL, 1990b).
Igualmente importante é o princípio da equidade. A iniquidade racial, como fenômeno social
amplo, vem sendo combatida pelas políticas de promoção da igualdade racial, regidas pela Lei
no 10.678/03, que criou a SEPPIR. Coerente com isso, o princípio da igualdade, associado ao
objetivo fundamental de conquistar uma sociedade livre de preconceitos na qual a diversidade
seja um valor, deve desdobrar-se no princípio da equidade, como aquele que embasa a
promoção da igualdade a partir do reconhecimento das desigualdades e da ação estratégica para
superá-las. Em saúde, a atenção deve ser entendida como ações e serviços priorizados em razão
151

de situações de risco e condições de vida e saúde de determinados indivíduos e grupos de


população.
O SUS, como um sistema em constante processo de aperfeiçoamento, na implantação e
implementação do Pacto pela Saúde, instituído por meio da Portaria no 399, de 22 de fevereiro
de 2006, compromete-se com o combate às iniquidades de ordem socioeconômica e cultural
que atingem a população negra brasileira (BRASIL, 2006).
Cabe ainda destacar o fato de que esta Política apresenta como princípio organizativo a
transversalidade, caracterizada pela complementaridade, confluência e reforço recíproco de
diferentes políticas de saúde. Assim, contempla um conjunto de estratégias que resgatam a visão
integral do sujeito, considerando a sua participação no processo de construção das respostas
para as suas necessidades, bem como apresenta fundamentos nos quais estão incluídas as várias
fases do ciclo de vida, as demandas de gênero e as questões relativas à orientação sexual, à vida
com patologia e ao porte de deficiência temporária ou permanente.

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