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Acordão STJ Clausula Penal e Não Astreintes

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Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 1.999.836 - MG (2021/0379867-1)

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI


RECORRENTE : RIWA EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA
ADVOGADOS : RENATO RATTIS PÁDUA - MG052331
PAULO SÉRGIO RABELLO - MG077709
RECORRIDO : ANTONIO GILBERTO DELFANTE
RECORRIDO : APARECIDO DONIZETE DE LIMA
RECORRIDO : CARLOS EDUARDO VANZELLA MISSIATTO
RECORRIDO : CLÁUDIA PIZOL MARTINS RODRIGUES
RECORRIDO : JOSÉ HÉLIO DE ARAÚJO
RECORRIDO : PAULO DAHER JUNIOR
RECORRIDO : RICARDO FERNANDES DA SILVA
RECORRIDO : WALBERT DONIZETTI DUQUE
ADVOGADO : DONIZETE BUENO DOS SANTOS - MG073406
INTERES. : RICARDO RIBEIRO MAIA
INTERES. : ISABEL ALVES MAIA DE OLIVEIRA
EMENTA
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE
FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS.
TRANSAÇÃO HOMOLOGADA JUDICIALMENTE. CUMPRIMENTO DE
SENTENÇA. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015. OMISSÃO,
CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. VIOLAÇÃO DOS ARTS.
632 E 633 DO CPC/1973. RECONHECIMENTO DA PRECLUSÃO PELO
ACÓRDÃO RECORRIDO. FUNDAMENTO NÃO IMPUGNADO. SÚMULA 283/STF.
MULTA CONVENCIONADA PELAS PARTES EM TRANSAÇÃO JUDICIAL. NÃO
CARACTERIZAÇÃO DE ASTREINTE. NATUREZA JURÍDICA DE CLÁUSULA
PENAL. REDUÇÃO A QUALQUER TEMPO. DEVER DO JUIZ. ART. 413 DO
CC/2002. NORMA COGENTE E DE ORDEM PÚBLICA. DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL. SIMILITUDE FÁTICA E JURÍDICA. AUSÊNCIA.
1. Ação de obrigação de fazer, cumulada com pedido de compensação por
danos morais, ajuizada em 7/1/2010, na qual houve homologação judicial de
transação formulada entre as partes, atualmente em fase de cumprimento
de sentença, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em
7/6/2021 e concluso ao gabinete em 24/3/2022.
2. O propósito recursal é decidir (I) qual é a natureza jurídica da multa
convencionada pelas partes em transação homologada judicialmente; e (II)
se é possível reduzir o seu valor a qualquer tempo.
3. A astreinte não deriva de convenção entre as partes, mas sim de
imposição pelo Juízo, independentemente da vontade daquelas, a fim de
assegurar o cumprimento de uma determinada ordem judicial.
4. A transação, mesmo quando homologada judicialmente, é um contrato
típico (arts. 840 e 842 do CC/2002) e a fixação de multa em contratos é
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expressamente regulamentada pelo Código Civil, que prevê a possibilidade
de se estipular cláusula penal conjuntamente com a obrigação ou em ato
posterior, referindo-se à inexecução completa desta, à alguma cláusula
especial ou à mora (art. 409).
5. A multa prevista em transação homologada judicialmente tem natureza
jurídica de multa contratual (cláusula penal) e não de astreinte, porquanto
esta tem caráter processual e decorre de imposição pelo Judiciário e aquela
configura instituto de direito material e tem origem na vontade das partes.
6. Nas hipóteses do art. 413 do CC/2002, o abrandamento do valor da
cláusula penal é norma cogente e de ordem pública, consistindo em dever
do juiz e direito do devedor que lhe sejam aplicados os princípios da boa-fé
contratual e da função social do contrato. Precedentes.
7. Assim, a despeito da formação de coisa julgada pela decisão que
homologa a transação entabulada entre as partes, a cláusula penal nela
prevista deve ser reduzida pelo juiz, mediante o princípio da equidade, se a
obrigação tiver sido parcialmente cumprida ou se o valor for
manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do
negócio, por força do art. 413 do CC/2002, bem como em observância à
origem eminentemente contratual da transação.
8. A conclusão de que a multa é manifestamente excessiva não decorre do
simples fato de seu valor ser elevado, mas do cotejo entre o seu montante e
as circunstâncias da hipótese concreta, de modo que a análise de eventual
desproporcionalidade na cláusula penal fixada entre as partes tem caráter
excepcional em sede de recurso especial, diante da incidência das Súmulas 5
e7 do STJ.
9. Hipótese em que (I) a recorrente sustenta a possibilidade de redução da
multa exclusivamente sob o fundamento de que se trata de astreinte,
incidindo, segundo alega, o art. 537, § 1º, do CPC/2015; (II) todavia, a multa
foi pactuada pelas partes em transação homologada judicialmente, de modo
que tem natureza jurídica de cláusula penal e não de astreinte, sendo suas
hipóteses de redução aquelas previstas no CC/2002; (III) ademais, no
particular, o mero fato de a multa ter ultrapassado R$ 85.000,00 não
demonstra a sua excessividade, sobretudo considerando que o
descumprimento da obrigação foi reconhecido por decisão transitada em
julgado.
10. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.
ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira


Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso
especial e, nessa extensão, negar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra
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Relatora. Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura
Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino.

Brasília (DF), 27 de setembro de 2022(Data do Julgamento)

MINISTRA NANCY ANDRIGHI


Relatora

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RECURSO ESPECIAL Nº 1.999.836 - MG (2021/0379867-1)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : RIWA EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA
ADVOGADOS : RENATO RATTIS PÁDUA - MG052331
PAULO SÉRGIO RABELLO - MG077709
RECORRIDO : ANTONIO GILBERTO DELFANTE
RECORRIDO : APARECIDO DONIZETE DE LIMA
RECORRIDO : CARLOS EDUARDO VANZELLA MISSIATTO
RECORRIDO : CLÁUDIA PIZOL MARTINS RODRIGUES
RECORRIDO : JOSÉ HÉLIO DE ARAÚJO
RECORRIDO : PAULO DAHER JUNIOR
RECORRIDO : RICARDO FERNANDES DA SILVA
RECORRIDO : WALBERT DONIZETTI DUQUE
ADVOGADO : DONIZETE BUENO DOS SANTOS - MG073406
INTERES. : RICARDO RIBEIRO MAIA
INTERES. : ISABEL ALVES MAIA DE OLIVEIRA

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora) :

Cuida-se de recurso especial interposto por RIWA


EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA, fundamentado nas alíneas “a” e “c” do
permissivo constitucional, contra acórdão do TJ/MG.
Recurso especial interposto e m : 7/6/2021.
Concluso ao gabinete e m : 24/3/2022.
Ação: de obrigação de fazer, cumulada com pedido de compensação
por danos morais, ajuizada por ANTONIO GILBERTO DELFANTE e OUTROS contra
RIWA EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA, RICARDO RIBEIRO MAIA e ISABEL
ALVES MAIA DE OLIVEIRA, na qual as partes formalizaram transação homologada
judicialmente. O processo se encontra na fase de cumprimento de sentença
movida pelos recorridos (autores), diante do descumprimento do acordo pela
recorrente.
Decisão interlocutória: o Juízo de primeiro grau rejeitou a

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impugnação ao cumprimento de sentença apresentada por RIWA
EMPREENDIMENTOS.
Acórdão: o TJ/MG negou provimento ao agravo de instrumento
interposto por RIWA EMPREENDIMENTOS, nos termos da seguinte ementa:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE


SENTENÇA – ALEGAÇÃO DE NULIDADE PROCESSUAL – PRECLUSÃO – MULTA
FIXADA EM ACORDO HOMOLOGADO POR SENTENÇA – REDUÇÃO –
IMPOSSIBILIDADE – COISA JULGADA – RECURSO DESPROVIDO. Tendo a parte
executada sido intimada para pagamento do débito e apresentado
impugnação ao cumprimento de sentença em que não discutida a nulidade
suscitada neste momento processual, resta configurada a preclusão da
matéria, nos termos do disposto no art. 278 do CPC/15. Em se tratando de
acordo livremente pactuado entre as partes e homologado em juízo, não há
que se falar em redução ou modificação da multa nele fixada, porquanto
operam os efeitos da coisa julgada. Recurso desprovido.
(e-STJ fl. 984)

Embargos de Declaração: opostos por RIWA EMPREENDIMENTOS,


foram rejeitados.
Recurso especial: alega violação dos arts. 536, 537 e 1.022 do
CPC/2015; e 632 e 633 do CPC/1973, além de dissídio jurisprudencial.
Sustenta que o procedimento utilizado pelos recorridos é equivocado,
pois não poderiam ter exigido o pagamento da multa diária sem antes ter intimado
a recorrente para cumprir a obrigação de fazer, em observância dos arts. 632 e 633
do CPC/1973.
Alega que a multa discutida pode ser reduzida, uma vez que a revisão
de astreinte não se submete aos efeitos da preclusão e da coisa julgada. Assim, o
acórdão recorrido “fez letra morta do disposto no art. 537 do CPC”, contrariando o
dispositivo uma vez que a “recorrente, tem sim, o direito de ver reanalisado seu
pleito de redução da multa diária” (e-STJ fl. 1.072)
Aduz, ainda, que o acórdão foi omisso em relação à necessidade de

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citação do devedor para cumprir a obrigação de fazer, na forma dos arts. 632 e 633
do CPC/1973 e quanto ao fato de que a obrigação foi cumprida.
Juízo prévio de admissibilidade: o TJ/MG inadmitiu o recurso,
dando azo à interposição do AREsp 2.035.320/MG, provido para determinar a
conversão em recurso especial (e-STJ fl. 1.194).
É o relatório.

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RECURSO ESPECIAL Nº 1.999.836 - MG (2021/0379867-1)
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RECORRENTE : RIWA EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA
ADVOGADOS : RENATO RATTIS PÁDUA - MG052331
PAULO SÉRGIO RABELLO - MG077709
RECORRIDO : ANTONIO GILBERTO DELFANTE
RECORRIDO : APARECIDO DONIZETE DE LIMA
RECORRIDO : CARLOS EDUARDO VANZELLA MISSIATTO
RECORRIDO : CLÁUDIA PIZOL MARTINS RODRIGUES
RECORRIDO : JOSÉ HÉLIO DE ARAÚJO
RECORRIDO : PAULO DAHER JUNIOR
RECORRIDO : RICARDO FERNANDES DA SILVA
RECORRIDO : WALBERT DONIZETTI DUQUE
ADVOGADO : DONIZETE BUENO DOS SANTOS - MG073406
INTERES. : RICARDO RIBEIRO MAIA
INTERES. : ISABEL ALVES MAIA DE OLIVEIRA
EMENTA
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE
FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS.
TRANSAÇÃO HOMOLOGADA JUDICIALMENTE. CUMPRIMENTO DE
SENTENÇA. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015. OMISSÃO,
CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. VIOLAÇÃO DOS ARTS.
632 E 633 DO CPC/1973. RECONHECIMENTO DA PRECLUSÃO PELO
ACÓRDÃO RECORRIDO. FUNDAMENTO NÃO IMPUGNADO. SÚMULA 283/STF.
MULTA CONVENCIONADA PELAS PARTES EM TRANSAÇÃO JUDICIAL. NÃO
CARACTERIZAÇÃO DE ASTREINTE. NATUREZA JURÍDICA DE CLÁUSULA
PENAL. REDUÇÃO A QUALQUER TEMPO. DEVER DO JUIZ. ART. 413 DO
CC/2002. NORMA COGENTE E DE ORDEM PÚBLICA. DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL. SIMILITUDE FÁTICA E JURÍDICA. AUSÊNCIA.
1. Ação de obrigação de fazer, cumulada com pedido de compensação por
danos morais, ajuizada em 7/1/2010, na qual houve homologação judicial de
transação formulada entre as partes, atualmente em fase de cumprimento
de sentença, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em
7/6/2021 e concluso ao gabinete em 24/3/2022.
2. O propósito recursal é decidir (I) qual é a natureza jurídica da multa
convencionada pelas partes em transação homologada judicialmente; e (II)
se é possível reduzir o seu valor a qualquer tempo.
3. A astreinte não deriva de convenção entre as partes, mas sim de
imposição pelo Juízo, independentemente da vontade daquelas, a fim de
assegurar o cumprimento de uma determinada ordem judicial.
4. A transação, mesmo quando homologada judicialmente, é um contrato
típico (arts. 840 e 842 do CC/2002) e a fixação de multa em contratos é
expressamente regulamentada pelo Código Civil, que prevê a possibilidade
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de se estipular cláusula penal conjuntamente com a obrigação ou em ato
posterior, referindo-se à inexecução completa desta, à alguma cláusula
especial ou à mora (art. 409).
5. A multa prevista em transação homologada judicialmente tem natureza
jurídica de multa contratual (cláusula penal) e não de astreinte, porquanto
esta tem caráter processual e decorre de imposição pelo Judiciário e aquela
configura instituto de direito material e tem origem na vontade das partes.
6. Nas hipóteses do art. 413 do CC/2002, o abrandamento do valor da
cláusula penal é norma cogente e de ordem pública, consistindo em dever
do juiz e direito do devedor que lhe sejam aplicados os princípios da boa-fé
contratual e da função social do contrato. Precedentes.
7. Assim, a despeito da formação de coisa julgada pela decisão que
homologa a transação entabulada entre as partes, a cláusula penal nela
prevista deve ser reduzida pelo juiz, mediante o princípio da equidade, se a
obrigação tiver sido parcialmente cumprida ou se o valor for
manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do
negócio, por força do art. 413 do CC/2002, bem como em observância à
origem eminentemente contratual da transação.
8. A conclusão de que a multa é manifestamente excessiva não decorre do
simples fato de seu valor ser elevado, mas do cotejo entre o seu montante e
as circunstâncias da hipótese concreta, de modo que a análise de eventual
desproporcionalidade na cláusula penal fixada entre as partes tem caráter
excepcional em sede de recurso especial, diante da incidência das Súmulas 5
e7 do STJ.
9. Hipótese em que (I) a recorrente sustenta a possibilidade de redução da
multa exclusivamente sob o fundamento de que se trata de astreinte,
incidindo, segundo alega, o art. 537, § 1º, do CPC/2015; (II) todavia, a multa
foi pactuada pelas partes em transação homologada judicialmente, de modo
que tem natureza jurídica de cláusula penal e não de astreinte, sendo suas
hipóteses de redução aquelas previstas no CC/2002; (III) ademais, no
particular, o mero fato de a multa ter ultrapassado R$ 85.000,00 não
demonstra a sua excessividade, sobretudo considerando que o
descumprimento da obrigação foi reconhecido por decisão transitada em
julgado.
10. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.

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Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.999.836 - MG (2021/0379867-1)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : RIWA EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA
ADVOGADOS : RENATO RATTIS PÁDUA - MG052331
PAULO SÉRGIO RABELLO - MG077709
RECORRIDO : ANTONIO GILBERTO DELFANTE
RECORRIDO : APARECIDO DONIZETE DE LIMA
RECORRIDO : CARLOS EDUARDO VANZELLA MISSIATTO
RECORRIDO : CLÁUDIA PIZOL MARTINS RODRIGUES
RECORRIDO : JOSÉ HÉLIO DE ARAÚJO
RECORRIDO : PAULO DAHER JUNIOR
RECORRIDO : RICARDO FERNANDES DA SILVA
RECORRIDO : WALBERT DONIZETTI DUQUE
ADVOGADO : DONIZETE BUENO DOS SANTOS - MG073406
INTERES. : RICARDO RIBEIRO MAIA
INTERES. : ISABEL ALVES MAIA DE OLIVEIRA

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora) :

O propósito recursal é decidir (I) qual é a natureza jurídica da multa


convencionada pelas partes em transação homologada judicialmente; e (II) se é
possível reduzir o seu valor a qualquer tempo.

1. DA NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL


1. É firme a jurisprudência do STJ no sentido de que não há ofensa ao
art. 1.022 do CPC/2015 quando o Tribunal de origem, aplicando o direito que
entende cabível à hipótese soluciona integralmente a controvérsia submetida à
sua apreciação, ainda que de forma diversa daquela pretendida pela parte.
2. Nesse sentido: AgInt nos EDcl no AREsp 1.094.857/SC, 3ª Turma,
DJe 02/02/2018 e AgInt no AREsp 1.089.677/AM, 4ª Turma, DJe 16/02/2018.
3. No particular, a recorrente alega que o Tribunal de origem negou a

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prestação jurisdicional por deixar de analisar as teses de que (I) “a citação prévia
do devedor é condição necessária para a verificação da mora e, somente a partir
daí, ou seja, de verificada a mora, é que deve fazer incidir a multa astreinte”; e (II) a
obrigação de fazer foi cumprida, não devendo incidir a multa.
4. Todavia, o acórdão recorrido decidiu, fundamentada e
expressamente, sobre os referidos temas, consignando que a nulidade pela
ausência de citação para cumprimento da obrigação de fazer antes da incidência da
multa está preclusa, porque, nos termos do art. 278 do CPC/2015 (art. 245 do
CPC/1973), não foi alegada na primeira oportunidade, uma vez que “a parte
executada [recorrente] foi intimada para pagamento do débito, tendo, inclusive,
apresentado impugnação ao cumprimento de sentença às fls. 149/152, na qual não
suscitou a nulidade agora discutida” (e-STJ fl. 988).
5. Ainda, quanto à alegada inexistência de mora por cumprimento da
obrigação de fazer, decidiu o Tribunal de origem que “a matéria se encontra
preclusa, porquanto foi enfrentada na ocasião do julgamento do agravo de
instrumento nº 1.0479.10.000633-3/001, em que decidido pelo descumprimento
do acordo por parte da agravante, motivo pelo qual descabida se mostra qualquer
discussão nesta oportunidade acerca da matéria” (e-STJ fl. 987).
6. Assim, ausente omissão, contradição, obscuridade ou erro material
no acórdão recorrido, não há que se falar em violação do art. 1.022 do CPC/2015.

2. DA VIOLAÇÃO DOS ARTS. 632 E 633 DO CPC/1973


7. Dispõe o art. 632 do CPC/1973 que “quando o objeto da execução
for obrigação de fazer, o devedor será citado para satisfazê-la no prazo que o juiz
Ihe assinar, se outro não estiver determinado no título executivo”.
8. Por sua vez, o art. 633 do CPC/1973 prevê que “se, no prazo fixado,
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o devedor não satisfizer a obrigação, é lícito ao credor, nos próprios autos do
processo, requerer que ela seja executada à custa do devedor, ou haver perdas e
danos; caso em que ela se converte em indenização”.
9. A recorrente alega que os recorridos adotaram o procedimento
equivocado, porquanto “haveriam de citar [a] recorrente para cumprir a obrigação
[de fazer] e, ao contrário, simplesmente promoveram o cumprimento de sentença
para pagamento de quantia certa” (e-STJ fl. 1.070).
10. No entanto, o Tribunal de origem decidiu que a matéria se
encontra preclusa, porquanto deixou de ser alegada pela recorrente na primeira
oportunidade em que se manifestou nos autos, isto é, quando apresentou a
impugnação de sentença. Confiram-se os termos do acórdão recorrido:

Ademais, também deve ser refutada a alegação de nulidade do cumprimento


de sentença por error in procedendo decorrente da ausência da intimação
pessoal do devedor para cumprimento da obrigação de fazer antes da
incidência da multa cominatória. Isso porque, como bem fundamentado pelo
magistrado singular na decisão agravada, tal questão também se encontra
acobertada pela preclusão.

Ora, em se tratando de alegação de nulidade, o art. 278 do CPC/15, o qual,


diga-se, reproduziu a redação contida no art. 245 do CPC/73, assim prevê:
[...]
E, na hipótese vertente, às fls. 145, a parte executada foi intimada para
pagamento do débito, tendo, inclusive, apresentado impugnação ao
cumprimento de sentença às fls. 149/152, na qual não suscitou a nulidade
agora discutida.
Logo, não tendo a parte levantado o vício na primeira oportunidade que lhe
coube falar nos autos, resta inviabilizado o seu exame nesta oportunidade,
posto que configurada a preclusão.

11. Nas razões do recurso especial, a recorrente, contudo, não


impugnou o fundamento do acórdão recorrido de que está preclusa a alegada
nulidade por violação dos arts. 632 e 633 do CPC/1973.
12. De fato, a recorrente limita-se a reiterar a suposta ofensa a esses

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dispositivos e a aduzir que estaria comprovado o cumprimento da obrigação (o
que, ademais, poderia atrair a incidência da Súmula 7/STJ), sem, todavia,
demonstrar se a suposta nulidade foi alegada na primeira oportunidade de se
manifestar nos autos, a fim de afastar a aplicação do art. 245 do CPC/1973 (art. 278
do CPC/2015) pelo Tribunal a quo.
13. Logo, no ponto, o recurso é inadmissível, por força da Súmula
283/STF, aplicada por analogia.
14. Ainda que assim não fosse, o acórdão recorrido menciona que o
valor executado decorre de “multa fixada em acordo homologado judicialmente”
(e-STJ fl. 990), logo, não haveria óbice para a parte executar a obrigação de pagar
quantia certa (valor decorrente da multa contratual), independentemente da
execução da obrigação de fazer. Isso decorre, outrossim, da multa aqui discutida
ser caracterizada como contratual e não como astreintes, diferentemente do
alegado pela recorrente, como se verá adiante.

3. DA MULTA CONVENCIONADA PELAS PARTES EM


TRANSAÇÃO HOMOLOGADA JUDICIALMENTE
3.1. Da natureza jurídica de cláusula penal
15. A recorrente sustenta que a multa por atraso no cumprimento de
obrigação, pactuada em transação homologada judicialmente, caracteriza
astreinte, e, por essa razão, pode ser revisada a qualquer tempo, por força do art.
537, § 1º, do CPC/2015, a partir da interpretação conferida a esse dispositivo pela
jurisprudência do STJ.
16. No entanto, a astreinte, como leciona a doutrina, “consiste na
imposição ao obrigado ao pagamento de uma quantia, de regra por cada dia de
atraso, mas que pode ser por outro interregno (semana, quinzena ou mês), como

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se infere do uso da palavra periodicidade no art. 537, § 1.°, e da expressão 'por
período de atraso' no art. 814, caput, no cumprimento da obrigação, livremente
fixada pelo juiz e sem relação objetiva alguma com a importância econômica da
obrigação ou da ordem judicial” (ASSIS, Araken de. Comentários ao Código de
Processo Civil, volume XIII. 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, [III.3]).
17. Com efeito, “as astreintes sancionam a parte pela sua
recalcitrância em acatar uma determinação judicial. Objetivam assegurar a
efetividade das decisões emanadas do Poder Judiciário, salvaguardando sua
imagem e o respeito que todos devem ter pelo órgão, detentor do monopólio da
jurisdição” (Rcl 5.072/AC, Segunda Seção, DJe 4/6/2014).
18. Essa espécie de multa, portanto, não é fixada pelas partes, mas
sim imposta pelo Juízo, independentemente da vontade daquelas, a fim de
assegurar o cumprimento de uma determinada ordem judicial.
19. Dito isso, ressalta-se que a transação é um contrato típico, sendo,
na hipótese de recair sobre direitos contestados em juízo, o negócio por meio da
qual as partes podem terminar o litígio mediante concessões mútuas, a ser
formalizado por escritura pública ou termo nos autos homologado judicialmente,
tudo como prevê os arts. 840 e 842 do CC/2002.
20. Portanto, as cláusulas previstas na transação e as respectivas
obrigações, mesmo quando houver homologação judicial, decorrem
exclusivamente da vontade das partes. Por essa razão que, segundo as lições de
Pontes de Miranda, “a transação judicial tem conteúdo de direito material e só é
processual o efeito de pôr têrmo ao processo” (Tratado de direito privado: parte
especial, tomo XXV. Atualizado por Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 200).
21. A partir desse raciocínio, a previsão na transação entabulada pelas
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partes e homologada judicialmente de incidência de multa na hipótese de
descumprimento ou atraso no cumprimento da obrigação principal tem natureza
jurídica de multa contratual, também denominada de cláusula penal.
22. Isso porque a fixação de multa em contratos é expressamente
regulamentada pelo Código Civil, o qual prevê, em seu art. 409, que “a cláusula
penal estipulada conjuntamente com a obrigação, ou em ato posterior, pode
referir-se à inexecução completa da obrigação, à de alguma cláusula especial ou
simplesmente à mora”.
23. A cláusula penal constitui, assim, pacto acessório, de natureza
pessoal, por meio do qual as partes contratantes, com o objetivo de estimular o
integral cumprimento da avença, determinam previamente uma penalidade a ser
imposta ao devedor na hipótese de inexecução total ou parcial da obrigação, ou de
cumprimento desta em tempo e modo diverso do pactuado.
24. Com efeito, conforme a jurisprudência desta Corte, “a cláusula
penal, também chamada de pena convencional ou simplesmente multa contratual,
pode ser classificada em duas espécies: (i) a cláusula penal compensatória, que se
refere à inexecução da obrigação, no todo ou em parte; e (ii) a cláusula penal
moratória, que se destina a evitar retardamento no cumprimento da obrigação, ou
o seu cumprimento de forma diversa da convencionada, quando a obrigação ainda
for possível e útil ao credor” (REsp 1.736.452/SP, 3ª Turma, DJe 1/12/2020). Na
mesma linha: REsp 1.466.177/SP, 4ª Turma, DJe 1/8/2017).
25. Desse modo, a multa prevista em transação homologada
judicialmente tem natureza jurídica de multa contratual (cláusula penal) e não de
astreinte, porque esta tem caráter processual e decorre de imposição pelo
Judiciário e aquela configura instituto de direito material e tem origem na vontade
das partes.
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26. Essa orientação já foi adotada por esta Corte nos seguintes
precedentes: REsp 169.057/RS, 4ª Turma, DJ 16/8/1999, p. 74; REsp 191.959/SC,
3ª Turma, DJ de 19/6/2000, p. 142; REsp n. 422.966/SP, 4ª Turma, DJ de 1/3/2004,
p. 186).

3.2. Da possibilidade de revisão judicial


27. De fato, como alegado pela recorrente, a jurisprudência desta
Corte firmou-se no sentido de ser possível a revisão do valor da astreinte a
qualquer tempo, a teor do art. 537, § 1º, do CPC/2015, porquanto a decisão que a
impõe não preclui, nem faz coisa julgada (EAREsp 650.536/RJ, Corte Especial, DJe
3/8/2021; REsp 1.333.988/SP, Segunda Seção, DJe 11/4/2014, Tema 706).
28. No entanto, o art. 537, § 1º, do CPC/2015 não pode ser usado para
fundamentar a revisão judicial do valor da multa fixada pelas partes em transação,
ainda que homologada judicialmente, uma vez que a cláusula penal não se
confunde com astreinte.
29. Como visto, a multa de natureza contratual tem regulamentação
específica no Código Civil, o qual autoriza e define critérios para a sua redução,
impedindo, por exemplo, que ultrapasse o valor da obrigação principal (art. 412) e
prevendo a redução equitativa (I) se a obrigação tiver sido cumprida em parte ou
(II) se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista
a natureza e a finalidade do negócio (art. 413).
30. Trata-se, assim, da conciliação entre os princípios da função social
do contrato, da boa-fé objetiva e do equilíbrio econômico entre as prestações com
a autonomia da vontade e com o princípio pacta sunt servanda (REsp
1.641.131/SP, 3ª Turma, DJe 23/2/2017).
31. Sob esse enfoque, na linha da jurisprudência desta Corte, “é
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possível a redução judicial da cláusula penal estabelecida em contrato ou acordo
firmado pelas partes, quando ficar demonstrado o excesso do valor arbitrado
inicialmente, observando-se os princípios da proporcionalidade e da equidade”
(REsp 1.736.452/SP, 3ª Turma, DJe 1/12/2020). No mesmo sentido: REsp
1.466.177/SP, 4ª Turma, DJe 1/8/2017).
32. Destaca-se que, nessas hipóteses, o art. 413 do CC/2002 dispôs
expressamente que a multa deve ser reduzida pelo juiz, observado o critério da
equidade, assim, “enquanto na vigência do ordenamento civil anterior a redução
da multa contratual era uma faculdade do magistrado – o que era justificado pela
utilização da expressão 'poderá o juiz' e pela valorização da autonomia da vontade,
característica marcante de referida legislação –, no atual Código o abrandamento
do valor da cláusula penal é norma cogente e de ordem pública, consistindo em
dever do juiz e direito do devedor que lhe sejam aplicados os princípios da boa-fé
contratual e da função social do contrato” (REsp 1.641.131/SP, 3ª Turma, DJe
23/2/2017).
33. Nessa linha de raciocínio, a despeito da formação de coisa julgada
pela decisão que homologa a transação entabulada entre as partes, a cláusula
penal nela prevista deve ser reduzida pelo juiz, mediante o princípio da equidade,
se a obrigação tiver sido parcialmente cumprida ou se o valor for manifestamente
excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio, por força do art.
413 do CC/2002, norma cogente e de ordem pública.
34. Ademais, esse raciocínio decorre também da origem
eminentemente contratual da transação, ainda que homologada judicialmente.
Como ensina Pontes de Miranda, “se houve homologação da transação, feita por
têrmo nos autos, ou por escritura pública, há sentença integrativa do negócio
jurídico; porém essa sentença é sem fundo sentencial: o fundo, que há, é negocial,
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o fundo do negócio jurídico da transação” (Tratado de direito privado: parte
especial, tomo XXV. Atualizado por Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 239).

4. DA HIPÓTESE DOS AUTOS


35. Trata-se, na origem, de ação de obrigação de fazer com pedido de
compensação por danos morais, em que as partes formalizaram transação
homologada judicialmente em 7/11/2012, por meio da qual, em síntese, (I) a
recorrente – RIWA EMPREENDIMENTOS – ficou obrigada a promover os atos
tendentes à instituição do condomínio, com apresentação de minuta da
convenção; e (II) foi fixada multa diária pelo descumprimento.
36. Em 9/6/2015, os recorridos deram início à fase de cumprimento
de sentença, em razão do descumprimento do acordo pela recorrente,
requerendo, inclusive, o pagamento do valor devido a título de multa.
37. A recorrente, naquela oportunidade, apresentou impugnação,
alegando o cumprimento da obrigação, que foi acolhido pelo Juízo de primeiro
grau, mas afastado por acórdão proferido pelo Tribunal de origem, contra o qual foi
interposto recurso especial, que foi conhecido e desprovido pelo STJ, conforme
decisão unipessoal por mim proferida no AgInt no AREsp 1.261.695/MG, transitada
em julgado em 24/5/2019 (e-STJ fls. 799 e 804).
38. No ponto destaca-se que o acórdão recorrido decidiu que o
descumprimento da obrigação foi reconhecido por decisão transitada em julgado,
operando-se, assim, os efeitos da preclusão consumativa sobre essa matéria.
Ademais, no particular, alterar a conclusão a respeito do referido descumprimento,
seria inviável por força da Súmula 7/STJ.
39. Em sequência, os recorridos deram prosseguimento no
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cumprimento de sentença e a recorrente apresentou nova impugnação,
pleiteando – além de outras questões já aqui afastadas – a redução do valor da
multa, alegando se tratar de astreintes, podendo ser revisada a qualquer tempo.
40. O Juízo de primeiro grau rejeitou a impugnação, sob o fundamento
de que não se trata de multa fixada pelo Juízo, mas de multa contratual, além de
entender que a quantia (R$ 85.000,00) não é abusiva (e-STJ fls. 24-26).
41. No acórdão recorrido, o Tribunal de origem decidiu que “em se
tratando de acordo livremente pactuado entre as partes e homologado em juízo,
não há que se falar em redução ou modificação da multa nele fixada, porquanto
operam os efeitos da coisa julgada” (e-STJ fl. 984).
42. Ademais, a Corte local decidiu “não incidir no caso em tela a
disposição contida no art. 537, §1º, do CPC/15, porquanto se trata de hipótese
distinta, em que debatida a possibilidade de redução de multa fixada em acordo
homologado judicialmente” (e-STJ fl. 990).
43. Com efeito, como mencionado, a transação é um contrato típico
(arts. 840 e 842 do CC/2002), de modo que a multa discutida na presente
hipótese, por decorrer de previsão em transação formulada entre as partes, tem
natureza jurídica de multa contratual, também denominada cláusula penal,
regulamentada nos arts. 408 a 416 do CC/2002.
44. Entretanto, em que pese não incida o art. 537, § 1º, do CPC/2015,
por não se tratar de astreinte, o art. 413 do CC/2002 prevê expressamente que
“deve ser reduzida eqüitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido
cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente
excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio”.
45. Como visto, trata-se de norma cogente e de ordem pública, de
modo que, a despeito da formação de coisa julgada pela decisão que homologa a
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transação entabulada entre as partes, a cláusula penal nela prevista deve ser
reduzida pelo juiz se caracterizada uma das hipóteses do art. 413 do CC/2002.
46. Na hipótese em julgamento, todavia, a recorrente, nas razões de
seu recurso especial, alegou, no ponto, apenas violação do art. 537, § 1º, do
CPC/2015, sustentando que a multa discutida consiste em astreinte, situação que,
por si só, impediria a admissão do presente recurso, por incidência da Súmula
284/STF.
47. Além disso, a análise de eventual desproporcionalidade na cláusula
penal fixada entre as partes tem caráter excepcional em sede de recurso especial,
diante da incidência das Súmulas 5 e7 do STJ. Confira-se, nesse sentido: AgInt no
AREsp 1.471.006/RS, 3ª Turma, DJe 30/8/2019; AgInt no REsp 1.595.386/SP, 4ª
Turma, DJe 2/12/2020; AgInt no AREsp 2.062.795/MG, 4ª Turma, DJe 24/6/2022.
48. Ainda que assim não fosse, na hipótese em julgamento, não se
verifica flagrante ilegalidade, a fim de aplicar o art. 413 do CC/2002, sobretudo
tendo em vista que o descumprimento da obrigação de fazer foi reconhecido por
decisão transitada em julgado e o valor devido pela multa não se mostra
manifestamente excessivo apenas por ter ultrapassado o valor de R$ 85.000,00.
49. A título de exemplo, já decidiu esta Terceira Turma que “o simples
fato de a multa ter atingido cifra milionária é insuficiente a ilustrar sua
excessividade” (REsp 1.736.452/SP, 3ª Turma, DJe 1/12/2020).
50. Destaca-se, outrossim, constar na decisão de primeiro grau,
mantida pelo acórdão recorrido, que “a quantia não se mostra abusiva, embora já
tenha ultrapassado o montante de R$ 85.000,00, uma vez que envolve questão
complexa, com vários autores, sendo que o descumprimento vem causando danos
a várias pessoas. Além do mais, a devedora é empresa atuante no mercado de
empreendimentos, sendo que a limitação da multa em valores menores não
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surtiria o efeito esperado” (e-STJ fl. 26).
51. Portanto, o presente recurso não merece ser provido.

5. DO DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL
52. A recorrente aduz a existência de dissenso jurisprudencial entre o
acórdão recorrido e o acórdão proferido pela Segunda Seção do STJ no REsp
1.333.988/SP, DJe 11/4/2014, Tema 706.
53. O acórdão paradigma, todavia, versa sobre a possibilidade de
redução das astreintes, enquanto na presente hipótese a discussão é sobre a
possibilidade de redução de multa contratual (cláusula penal) convencionada pelas
partes em transação homologada judicialmente, que, como visto, não se confunde
com astreinte.
54. Diante desse cenário, não há exata similitude fática e jurídica
entre a situação versada no acórdão paradigma e a aqui discutida, elemento
indispensável à demonstração da divergência, conforme os arts. 1029, § 1º, do
CPC/2015 e 255, § 1º, do RISTJ, restando, assim, inviável o conhecimento do
recurso especial pela alínea “c” do permissivo constitucional. Nesse sentido: AgInt
no AREsp 1927367/RJ, 3ª Turma, DJe 16/12/2021; AgInt no AREsp 1834427/SP, 4ª
Turma, DJe 25/11/2021; AgInt no AREsp 1894157/DF, 4ª Turma, DJe 28/10/2021;
e AgInt no REsp 1891973/RJ, 3ª Turma, DJe 23/09/2021.

6. DISPOSITIVO
Forte nessas razões, CONHEÇO PARCIALMENTE do recurso especial e,
nessa extensão, NEGO-LHE PROVIMENTO.
Deixo de majorar honorários advocatícios, em virtude da ausência de
condenação na instância de origem.
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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA

Número Registro: 2021/0379867-1 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.999.836 /


MG

Números Origem: 10479100006333 10479100006333005 10479100006333008

EM MESA JULGADO: 27/09/2022

Relatora
Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. ROGÉRIO DE PAIVA NAVARRO
Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

AUTUAÇÃO
RECORRENTE : RIWA EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA
ADVOGADOS : RENATO RATTIS PÁDUA - MG052331
PAULO SÉRGIO RABELLO - MG077709
RECORRIDO : ANTONIO GILBERTO DELFANTE
RECORRIDO : APARECIDO DONIZETE DE LIMA
RECORRIDO : CARLOS EDUARDO VANZELLA MISSIATTO
RECORRIDO : CLÁUDIA PIZOL MARTINS RODRIGUES
RECORRIDO : JOSÉ HÉLIO DE ARAÚJO
RECORRIDO : PAULO DAHER JUNIOR
RECORRIDO : RICARDO FERNANDES DA SILVA
RECORRIDO : WALBERT DONIZETTI DUQUE
ADVOGADO : DONIZETE BUENO DOS SANTOS - MG073406
INTERES. : RICARDO RIBEIRO MAIA
INTERES. : ISABEL ALVES MAIA DE OLIVEIRA

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Obrigações - Espécies de Contratos - Compromisso

CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Terceira Turma, por unanimidade, conheceu em parte do recurso especial e, nessa
extensão, negou-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora.
Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva (Presidente), Marco Aurélio Bellizze e
Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino.

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