Location via proxy:   [ UP ]  
[Report a bug]   [Manage cookies]                

Com Amor, B - Tourinho, Liz

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 378

Table of Contents

Folha de Rosto
Créditos
Dedicató ria
Epígrafe
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Capítulo 42
Capítulo 43
Capítulo 44
Capítulo 45
Epílogo
Agradecimentos
Sobre a autora
Notas
Copyright © 2024 Liz Tourinho

Capa:
Giovana Martins
@gimartins.design

Preparaçã o, Revisã o e Diagramaçã o:


Carla Santos
@carlafs_site

Obra revisada segundo o Novo Acordo Ortográ fico da Língua


Portuguesa.

Essa é uma obra de ficçã o. Nomes, personagens, organizaçõ es, lugares e


situaçõ es sã o frutos da imaginaçã o da autora. Qualquer semelhança com
a realidade ou fatos é mera coincidência.

Todos os direitos reservados.


É proibida a reproduçã o de parte ou totalidade da obra sem a
autorizaçã o prévia da autora, exceto para citaçã o.
A violaçã o dos direitos autorais é crime estabelecido pela lei nº.
9.610/98 e punida pelo artigo 184 do có digo penal brasileiro.
Capa
Folha de Rosto
Créditos
Dedicató ria

Epígrafe
Capítulo 1

Capítulo 2
Capítulo 3

Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6

Capítulo 7
Capítulo 8

Capítulo 9
Capítulo 10

Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13

Capítulo 14
Capítulo 15

Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20

Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28

Capítulo 29
Capítulo 30

Capítulo 31
Capítulo 32

Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Capítulo 42
Capítulo 43
Capítulo 44
Capítulo 45
Epílogo
Agradecimentos
Sobre a autora
Notas
Para todas as pessoas que encontraram o verdadeiro amor.
“I wanna be with you until we're old”
(I'll Be Waiting – Lenny Kravitz)
Uma temporada na Itá lia com toda a família era sempre a melhor
escolha para recarregar minhas energias, amava estar com eles
principalmente com o Enrico, meu sobrinho. Quando estávamos juntos,
ele certamente era mais adulto que eu. Entretanto, chegar ao meu
apartamento em Nova Iorque também tinha um valor incalculável para
mim.
Ainda bem que terei dois dias de descanso até retomar minha rotina no
ateliê. A nova coleçã o de joias estava praticamente pronta e o
lançamento seria no final de julho, aproveitando o verã o novaiorquino.
Estava louca por um banho demorado e comer algo urgente, atualmente
nã o conseguia comer nada em aviã o. Fiz um sanduíche e abri um vinho
para relaxar. Depois de saciar a fome, deitei-me no sofá e tentei achar
um filme para me distrair. Infelizmente, nã o me concentrei na histó ria,
como sempre meu pensamento foi para o mesmo lugar: o dia que
conheci o meu amor de infâ ncia e o tempo todo que fiquei apaixonada
por ele.
Ficou apaixonada, no passado, será?
É, acho que nunca o esqueci de verdade.

Dezesseis anos atrás…

Eu sabia que Olívia, minha melhor amiga, tinha um irmã o mais velho,
que estudava medicina em Harvard. A diferença entre eles era a mesma
entre mim e meu irmã o Matteo, ou seja, de dez anos. Mesmo andando
sempre colada com ela, tanto na escola como nos finais de semana, eu
nunca tinha cruzado com seu irmã o, já que ele só vinha para casa nas
férias e nesse mesmo período eu estava sempre viajando com meus pais.
Tinha acabado de chegar na casa de praia dos pais de Olívia para passar
o final de semana quando ela comentou que seu irmã o tinha chegado
com alguns amigos para aproveitar o feriado prolongado de Quatro de
Julho, essa informaçã o em nada me afetou, pois nó s já tínhamos
combinado nossa programaçã o com algumas amigas da escola e
estávamos animadíssimas com os nossos planos de pré-adolescentes.
Sem perder tempo corremos para colocar nosso biquíni, o dia estava
lindo nos convidando para um mergulho no mar e foi o que fizemos,
passamos mais de uma hora na á gua com nossas amigas até nossas
mã os começarem a enrugar. Decidimos entã o que estava na hora de sair
da á gua para tomar um sol, queria chegar segunda-feira na escola, com
um tom de pele mais bronzeado.
De longe avistamos um grupo de pessoas jogando vô lei e todos estavam
bem animados; era uma gritaria louca quando um lado fazia um ponto.
Logo Olívia identificou seu irmã o, gritou seu nome, fazendo-o desviar o
olhar em nossa direçã o. Alguns minutos depois, ele saiu do jogo e veio
em nossa direçã o.
Apesar de estarmos apenas com 12 anos, eu e Olívia já falávamos de
garotos, tinham alguns da escola que eram nossos paqueras, tudo muito
inocente ainda, mas meu coraçã o até entã o livre, quase parou desde o
momento que coloquei meus olhos em Blake. Me apaixonei
imediatamente por aquele sorriso largo, que me hipnotizou desde o
primeiro instante.
— Minha irmã zinha, que saudade.
Olívia levantou-se pulando no colo do irmã o, ele com seu porte atlético a
ergueu como uma boneca.
— Blake, nã o sou mais uma criancinha, me coloque no chã o.
— Você sempre será minha princesinha, Liv. — A voz de Blake entrou
nos meus ouvidos como mú sica.
Será que é possível alguém se apaixonar sem ter trocado uma palavra
sequer?
— Entã o você deve ser Bea, a quase gêmea da minha irmã zinha. — Ele
colocou Olívia no chã o e se dirigiu a mim. — Finalmente nos
conhecemos. — Ele chegou perto e beijou minha testa. Fiquei congelada
por alguns segundos, mas por milagre me recuperei rapidamente e sorri.
— Muito prazer, Blake. Pois é, finalmente conheci o famoso irmã o da
minha melhor amiga.
— Seja bem-vinda, Bea. Entã o, pequena, depois quero saber tudo de
você. Como está indo na escola, se tem algum garoto te rondando...
Tenho me exercitado bastante e vou colocar esses marmanjos pra correr
rapidinho.
Os irmã os seguiram provocando um ao outro por algum tempo, nã o
demorou e Blake nos deixou, retornando para o seu grupo e só nos
encontramos bem mais tarde, no jantar.
Depois desse dia, Blake definitivamente conquistou o meu coraçã o. Claro
que Olívia percebeu meu interesse, mas logo me desestimulou.
— Amiga, tire o meu irmã o da cabeça, ele nos vê como criancinhas
ainda. A diferença de idade entre ambos é muito grande. Além disso, ele
é um mulherengo. Toda vez que vem pra casa, sai todos os dias com uma
garota diferente. Ele jamais te notará , ele vai sempre te considerar como
uma irmã também.
— Eu sei, Liv, o problema é que eu já me apaixonei. — Gargalhamos,
claro que isso nã o era verdade, ainda.
Depois desses dias na casa de praia, com meu interesse todo voltado
para o homem mais lindo que conheci na minha vida, passei a me
programar para estar sempre em Nova Iorque quando Blake vinha para
casa. Ó bvio que nem sempre dava certo e, quando eu me desencontrava
dele, sofria por vá rios dias.
Quando Olívia fez 15 anos, um mês depois de mim, sua mã e fez uma
festa maravilhosa. Nó s passamos o dia em um spa, fizemos hidrataçã o
nos cabelos, massagem e, pela primeira vez, nossas mã es nos deixaram
pintar as unhas com uma cor clarinha, naturalmente. No final do dia
estávamos lindas, como duas princesas.
Quando cheguei na recepçã o fiquei encantada com a decoraçã o, todas
as mesas tinham arranjos magníficos de lírios rosa, uma flor que me
lembrava muito a minha nonna1. Todo ano passávamos as fé rias na
Toscana e em todos os quartos, ela sempre deixava um arranjo de flores,
principalmente de lírios, que eram os preferidos dela.
Estava me divertindo muito com os nossos amigos até ter a maior
decepçã o do dia, que até entã o estava sendo tã o maravilhoso.
Avistei quando Blake chegou na festa com sua namorada. A festa perdeu
totalmente o brilho naquele momento, as lá grimas brotaram
imediatamente, saí correndo até o banheiro para me recompor.
Fiquei pelo menos uns trinta minutos até parar de chorar, nã o estraguei
muito a maquiagem e voltei para a festa bem na hora da valsa da minha
amiga com o seu pai. Olívia estava linda com um vestido rosa, parecia
uma princesa.
Depois da primeira dança com o seu pai, para o meu desespero foi a vez
de dançar com o seu irmã o. Esse foi um momento de tortura e, ao
mesmo tempo, de deleite. Blake estava mais lindo do que nunca, seu
cabelo mais comprido, tinha um dourado acinzentado lindo. Seu sorriso
continuava má gico, seus olhos azuis praticamente desapareciam
formando somente uma linha à medida que seu sorriso se abria mais,
quando Olívia falava algo em seu ouvido. Notei que ele estava mais forte,
com certeza fazia muita musculaçã o, além de nadar, que eu sabia ser
uma paixã o dele. Perdi as contas de quantas vezes acompanhei seu
treino no mar logo cedo, só para receber o presente de vê-lo saindo da
á gua e se deitar ao sol para descansar.
Depois da dança formal da debutante, a pista foi liberada e foi a vez dos
amigos curtirem o som da boate. Mesmo fazendo um esforço danado
para me divertir, meus olhos buscavam sempre onde Blake estava e, para
a minha tristeza, o flagrei vá rias vezes aos beijos com sua namorada,
uma mulher linda, que, segundo Olívia, era colega dele e fazia medicina
também.
Sempre gostei muito de mú sicas mais antigas, meu irmã o Matteo
sempre dizia que minha alma era antiga, o que era verdade. Quando
pensei em ir embora, começou a tocar uma das minhas mú sicas
preferidas, Kiss me, de Sixpence None The Richer, entã o resolvi deixar a
tristeza de lado, fechei os olhos e comecei a dançar. Como amava essa
mú sica, me transportei-me para a letra como se estivesse cantando para
o Blake.
Como num sonho, senti dois braços fortes me enlaçando e meu coraçã o
errou uma batida, quando abri os olhos e me deparei com aqueles dois
globos azuis brilhantes tã o perto de mim.
— É um pecado muito grande uma garotinha tã o linda dançar sozinha.
Eu nã o sou essa pessoa que você estava sonhando, mas posso fazer de
conta, quem sabe ele está por aí e você pode despertar um pouco de
ciú me nesse bobã o, que deveria estar aqui dançando com você.
— Blake, você me assustou. — Quase chorei de emoçã o. Entã o ele
começou a me conduzir em uma dança leve, onde me soltava e me levava
de volta para os seus braços, ficamos assim até a mú sica acabar e no
final fez uma reverência exagerada, como se fazia nos saraus de
antigamente para agradecer a dança.
Como estávamos perto de uma das mesas, ele pegou um lírio rosa, nã o
disse nada, cheirou a flor, entregando-me em seguida. Por fim, beijou o
topo da minha cabeça, como meu irmã o sempre fazia e me deixou ali
sem chã o indo em direçã o à sua namorada e aos amigos dele.
Olívia, que acompanhou todo o desenrolar da cena, veio imediatamente
ao meu encontro e me puxou para um lugar mais reservado, onde
ninguém pudesse nos ouvir.
— Bea, você está com uma cara muito engraçada, parece que viu um
fantasma. — Minha amiga segurou meu rosto me abraçando em seguida.
— Liv, eu estou flutuando, eu nã o estou sentindo os meus pés no chã o.
— Meu Deus, amiga, você precisa acabar com essa paixã o pelo meu
irmã o, que já dura anos. Você sabe que ele te enxerga como uma irmã ,
ele acha que nó s somos criancinhas ainda e nã o quase duas mulheres.
— Liv, nó s já temos quinze anos, nã o somos mais tã o novinhas assim —
contestei.
— Olha, eu amei te ver dançando com ele, mas nã o fantasia, ele tem
namorada e, pelo que ouvi minha mã e conversando com ele hoje mais
cedo, o plano deles é, assim que terminarem a faculdade, fazer
especializaçã o em Londres, você sabe que o sonho dele é a Cardiologia.
— Eles vã o juntos? Tem certeza de que ouviu direito, Liv? — As lá grimas
já estavam rolando pelo meu rosto. Como pode, em fração de segundos,
uma pessoa ir do céu ao inferno?
— Bea, me perdoe por jogar esse balde de á gua fria no seu momento
especial, mas nã o quero que você se iluda. Acho que meu irmã o está
gostando mesmo da Margot, nã o quero que você sofra mais com isso. —
Olívia acabou de enfiar uma estaca em meu coraçã o.
— Nã o quero ouvir mais nada, vou embora. O motorista do meu pai já
está aqui pra me buscar. — Despedi-me da minha amiga-irmã e fui
chorar na minha cama.
Depois que Blake foi embora, a ú nica coisa que alegrava meus dias era
lembrar-me da nossa dança, dos seus braços fortes envolvendo minha
cintura e do seu perfume que ficou grudado no meu vestido. Minha mã e
ficou preocupada, pois eu nã o queria sair de casa, comecei a me
alimentar mal, ela queria me levar ao médico até que, um dia, me pegou
chorando e nã o teve jeito, me senti obrigada a me abrir com ela.
— Beatrice, minha querida, você precisa reagir. Eu sei como é o primeiro
amor e muitas vezes nã o somos correspondidos — disse carinhosa me
puxando para seu colo.
— Mã e, você teve sorte de se apaixonar pelo meu pai e ele sentir o
mesmo por você. Meu caso é bem diferente, o Blake acha que sou uma
menininha — choraminguei.
— Eu já tinha percebido seus olhos sempre buscando por ele em todo
canto quando vocês estavam no mesmo ambiente, mas preferi te dar um
tempo, sabia que você um dia abriria o seu coraçã o para mim. Porém,
filha, preciso ser realista com você. A diferença de idade entre vocês é
muito grande. Blake já é um homem feito, está quase se formando, entã o,
para ele, você é uma menininha como a Liv.
— Eu sei, mã e, ele mesmo fala isso sempre e, para piorar, a Liv me disse
que ele vai morar em Londres, vai fazer a especializaçã o em Cardiologia
junto com a namorada. — Caí no choro novamente.
Ficamos ali por um tempo, com minha mã e cuidando de mim; e assim
foi por vá rios dias, quando finalmente fomos para a Itá lia. Pelo menos,
as fé rias na casa do nonno2 serviu para acalmar o meu coraçã o e
esquecer um pouco aquele que, apesar do meu coraçã o dizer que tinha
chance, o meu lado racional sabia que isso era praticamente impossível.
Claro que guardei o lírio que Blake me deu, que seria para sempre o
símbolo de uma noite maravilhosa, dos poucos minutos que passei nos
braços do meu amor.
Dias atuais...

O lançamento de uma nova coleçã o de joias era sempre estressante, a


minha mania de perfeccionismo à s vezes atrapalhava a evoluçã o do
trabalho, mas no final eu ficava satisfeita, porque a margem de erros era
muito pequena e tudo saía exatamente como planejei.
Nos ú ltimos dias, estava extremamente ansiosa, isso nã o podia negar,
nem parecia que alguns anos já se passaram desde o lançamento da
minha primeira coleçã o. A ansiedade era a mesma de sempre.
O tempo todo passava um filme na minha cabeça e relembrei como tudo
começou. Minha veia criativa estava em mim desde muito nova. Para a
minha felicidade, recebi todo o apoio da minha família quando decidi
que nã o seguiria a tradiçã o, tornando-me uma advogada como meu pai e
meu irmã o, que junto com meu primo Marco, tinham uma empresa de
sucesso, a Tomarolli Law.
Achei que meu pai tentaria me convencer a desistir do sonho de ser uma
designer de joias. Muito pelo contrá rio, além de ser meu principal
incentivador, também financiou a minha primeira coleçã o.
No início foi bem difícil, meu lado criativo estava fervendo, contudo teria
que começar do zero, precisava entender como tiraria as minhas
criaçõ es dos desenhos e transformaria em objetos de desejos das
pessoas. Resolvi entã o que, antes de qualquer coisa, teria que mergulhar
no universo dos ourives e pedras preciosas.
Quando terminei a faculdade de desenho, fiz uma pó s-graduaçã o
específica para designer de joias na França, em seguida decidi que
precisava entender todo o processo, nã o somente da parte da criaçã o.
Nomes como recozimento, fundiçã o, soldagem, polimento, gemas,
passaram a fazer parte do meu vocabulá rio. Minha meta era que as
minhas joias fossem obras de arte protagonistas de histó rias que
atravessariam geraçõ es, que marcassem momentos importantes na vida
das pessoas.
Depois da teoria, o momento de colocar a mã o na massa foi bem
trabalhoso. Montei meu ateliê, contratei ourives bem-conceituados no
mercado, adquiri equipamentos de alta tecnologia para trabalharem em
harmonia com a prá tica artesanal. Mergulhei no meu sonho, desde a
criaçã o, a produçã o das peças, até a divulgaçã o delas finalizadas. O
reconhecimento do meu trabalho começou, principalmente, a partir do
momento que minhas criaçõ es caíram no gosto dos estilistas do mundo
da moda e das atrizes famosas.
Atualmente toda a minha energia estava voltada para o lançamento do
meu novo projeto. Fazia quase um ano que me dedicava a esse trabalho,
desde os primeiros esboços até finalmente ter em minhas mã os essa
coleçã o de peças delicadas e belíssimas, que seriam um sucesso.
A escolha do nome da coleçã o tinha muito significado para mim: Soul
Colors3. Foi uma inspiraçã o muito feliz, porque sim, minha alma estava
em cada peça. Tinha certeza de que agradaria tanto ao pú blico jovem
como també m aos mais tradicionais.
Sempre tive vontade de fazer algo leve, atemporal e colorido. Dessa vez,
optei por usar, sobretudo, pedras brasileiras. Consegui fornecedores de
gemas preciosíssimas, como a tã o cobiçada turmalina paraíba, além das
cores vibrantes do topá zio imperial e o brilho calmo da á gua-marinha.
Agora com tudo pronto, estava eufó rica para apresentar minhas novas
criaçõ es, inicialmente para o pú blico de Nova York. A minha marca, a
Lily Jewelry4, foi construída com base na minha histó ria de amor que
começou na adolescê ncia, mas que, apesar de nã o ter sido um romance
com final feliz, estava marcada em definitivo no meu coraçã o.
— Sonhando acordada novamente, Bea? — Helena, minha amiga e
assessora de marketing da Lily Jewelry, entrou feito um furacã o na
minha sala me tirando dos devaneios.
— Qualquer dia desses, você vai me matar do coraçã o, com essas suas
entradas nada sutis — brinquei, pois se havia uma pessoa agoniada
nesse mundo ela se chamava Helena Nevicare. Estava sempre correndo
de um lado para o outro, com o celular, fone de ouvido e tablet na mã o.
— Você reclama, mas nã o vive sem mim, Beazinha. Ok você é uma artista
muito talentosa, mas meus contatos junto à mídia ajudam bastante —
provocou enquanto se jogou na cadeira e colocou seus ó culos fashion na
ponte do nariz.
— Na verdade, Nena, formamos uma dupla e tanto. Agora chega de
descanso e me diga o que você já fechou para o lançamento da Soul
Colors.
— Pois nã o, chefinha, vamos ao trabalho, assim que gosto, sem perder
tempo. Todos os convites já foram distribuídos, tanto a mídia quanto os
artistas e os mais renomados estilistas de moda já estã o extremamente
curiosos para o novo lançamento de Beatrice Tomarolli.
— Já sabe que, a partir de agora, nã o durmo mais. Nada vai conter a
minha ansiedade, só depois que eu vir minhas joias sendo aprovadas
pelos clientes é que vou conseguir respirar com tranquilidade.
— Eu sei, Bea, por isso mesmo hoje nó s vamos sair e nos divertir muito,
você precisa circular mais, descolei para nó s convites para a
reinauguraçã o badaladíssima daquela galeria de arte na Quinta Avenida.
— Helena sempre conseguia convites para os melhores eventos e nã o
era incomum ela me arrastar para alguns deles.
— Acho que você tem razã o, preciso realmente desestressar, cheguei há
menos de uma semana da Itá lia e parece que faz anos que nã o tiro férias.
— Minha querida, você está precisando transar muito, afinal a vida nã o é
só trabalho.
Lá vem ela com essa mania de ser minha conselheira amorosa.
— Nã o começa. Da ú ltima vez que você quis me apresentar o arquiteto
que reformou seu apartamento, foi a treva. Além de ser muito chato, o
cara era o dono da verdade. Nada do que eu falava, ele concordava.
Entã o vamos só nos divertir, ok?
— Nã o se preocupe, depois daquele desastre juro que nã o vou mais me
meter a cupido, mas...
Ela não tem jeito, lá vamos nós.
— O que você está planejando, sua bruxinha malvada? Fala logo.
— Na verdade, um dos novos investidores da galeria é um espanhol
lindo demais, ele já vive aqui faz muito tempo. Eu vi uma entrevista dele
outro dia e o homem é de molhar calcinha com aquele sotaque sexy
demais, aí pensei que, talvez, você se animasse um pouco. — E aquele
sorrisinho perverso despontou no rosto da minha amiga.
— Só irei se você me prometer que nã o fará nenhum movimento para
me apresentar a esse tal espanhol.
Ela percebeu minha carranca.
— Juro que te deixarei livre, sem apresentaçõ es a ninguém, mas, por
favor, vá mais cedo para casa e se arrume bem linda, você está
merecendo pelo menos uns bons drinks.
Obedeci à s orientaçõ es da minha amiga, “sra. Helena Mandona”, focada
em me arranjar alguém. Ela fazia bem em insistir sempre, à s vezes ficava
com preguiça de sair depois de um dia inteiro de trabalho, mas ela tinha
razã o, nã o podia viver só para o trabalho ou de sonhos do passado. Hoje
eu estava especialmente animada para sair e me divertir bastante.
Quando estou me arrumando para sair, sempre me lembro da Olívia e da
bagunça que fazíamos quando tínhamos alguma festa para ir.
Normalmente essa farra era sempre na minha casa, a mamma5 sempre
gostou de nos ajudar com a produçã o, aproveitava també m para dar os
conselhos: “Não aceitem bebida de estranhos, não bebam muito, avisem
quando saírem da festa”. Dona Katie marcava em cima, mas sempre nos
dava espaço també m.
Desde que Olívia foi morar em Los Angeles dois anos atrá s, depois do
seu casamento, quase nã o nos víamos pessoalmente, entã o criamos o
“Encontro das Amigas”. Nos reuníamos semanalmente via
videochamada, onde, além de muita conversa, bebíamos vinho e nos
atualizávamos sobre a nossa vida. Ficávamos conversando por, pelo
menos, duas horas, ríamos, chorávamos, era como se realmente
estivéssemos uma na casa da outra.
Minha melhor amiga casou-se com seu grande amor, David. Eles se
conheceram na faculdade e depois de formados montaram uma empresa
alimentos saudáveis e hoje gerenciavam vá rias lojas na California.
Mesmo sendo relativamente nova, a empresa era um sucesso. Ainda nã o
decidiram sobre filhos, mas sabia que esse era um sonho da Olívia e, em
breve, ela encomendaria o meu afilhado ou afilhada, porque sim, nã o
existia a menor possibilidade de eu nã o ser a madrinha dessa criança.
Durante o nosso encontro semanal, só tinha um assunto que era
terminantemente proibido: seu irmã o Blake. Olívia sabia que poderia
passar décadas, ele sempre seria o homem dos meus sonhos e o ú nico
que nã o poderei ter. Da ú ltima vez que nos falamos, aquele grilo falante
quebrou nossa regra de ouro e acabou comentando sobre o irmã o, claro
que quis cortar o assunto imediatamente, mas ainda bem que ela
insistiu, de fato tinha razã o, eu precisava saber da novidade.
— Desculpe, Bea, você precisa me ouvir — ela insistiu. Pelo tom de voz da
minha amiga e a expressã o séria na tela, resolvi nã o ser tã o
intransigente, mas meu coraçã o começou com a taquicardia costumeira
quando o assunto era “ele”.
— Ok, Liv, mas juro que vou desligar se o que você tem a dizer sobre o
Blake nã o for realmente importante.
— Não vou dourar a pílula, então serei direta. Ele e Lucy estão voltando
para Nova Iorque.
Fiquei tã o impactada, muda na verdade, que Olívia achou que a conexã o
tinha caído e que minha imagem tinha congelado.
— Bea, caiu a chamada? — Quando ouvi sua voz novamente, respirei
fundo e voltei para a Terra.
— Acho que nã o entendi o que você falou, Olívia. — Já sentia as minhas
lá grimas brotarem.
— Você entendeu sim, amiga, sei que essa era a última coisa que você
queria ouvir, mas achei melhor te contar logo, já imaginou se você
encontra com ele de surpresa, com certeza você desabaria.
— Eu nã o posso acreditar nisso, Liv, o que ele vem fazer aqui? Nã o
estava tã o bem lá em Londres, casado, com uma carreira brilhante? Por
que caralho ele vai voltar? — perguntei descontrolada e chorando.
— Você precisa superar isso, Bea, já faz tantos anos. A última vez que
vocês se encontraram foi no meu casamento e me lembro muito bem como
você conseguiu fingir que estava ótima durante a cerimônia e a festa, mas
depois ficou dias chorando trancada em casa.
Ela tinha razã o, Blake e Lucy estavam juntos há alguns anos.
Inicialmente ele iria para Londres com uma namorada da época, mas ela
desistiu. Namoro a distâ ncia era bem complicado, entã o terminaram.
Alguns anos depois, eu soube que Blake e Lucy, que também foi sua
colega na época da faculdade, acabaram se reencontrando no final da
especializaçã o na Inglaterra e começaram a namorar, depois de um
tempo se casaram. Graças a Deus que, na época, eu estava na Itá lia e nã o
presenciei a felicidade do casal, seria demais para mim. Desde entã o,
eles viviam em Londres e praticamente nã o vinham para Nova Iorque, o
que facilitou as coisas para mim. A partir desse momento, decidi trancá -
lo em uma caixa blindada que joguei no fundo do rio Hudson.
— Você sabe que o pai de Lucy tem um hospital aqui e que o sonho dele
sempre foi que a filha assumisse a diretoria junto com ele. O velho tanto
insistiu que eles finalmente aceitaram a proposta. Meu irmão assumirá
toda a área de cirurgia cardiotorácica, será o diretor-geral. — Senti que
ela estava orgulhosa pela conquista do irmã o.
— Uau, era tudo o que ele sempre sonhou, desde que se especializou em
Cardiologia esse era seu objetivo: comandar uma equipe nessa á rea,
continuar fazendo cirurgia e desenvolver novas técnicas cirú rgicas,
deixar seu legado na medicina, como ele sempre dizia.
Lembrava-me muito bem quando ele vinha nas férias e eram os dias
mais felizes da minha vida, ficava horas ouvindo seus planos.
— Pois é, mesmo estando superbem lá em Londres, essa é a oportunidade
da vida dele. Estão chegando no próximo mês, achei melhor te contar logo,
assim você terá tempo para se acostumar com a ideia.
— Eu te agradeço por isso, você sabe que, por mais que eu tente, essa é
uma parte da minha vida que mexe muito comigo. Ainda bem que mais
do que nunca vou precisar de muito foco, afinal, em menos de dois
meses lançarei a minha nova coleçã o de joias, nã o posso deixar que nada
atrapalhe esse meu momento, trabalhei e ainda estou trabalhando muito
por isso.
Conversamos por mais uma hora depois dela ter largado essa bomba no
meu colo, a Olívia sempre me fazia enxergar que eu tinha que seguir em
frente e deixar essa parte do meu passado, bem guardada, pois nada
poderia mudar essa situaçã o.
O toque do celular me trouxe de volta para o presente. Deixei a
lembrança do ú ltimo encontro virtual com a Olívia me tomar muito
tempo, quando o assunto era o Blake era sempre assim, eu ficava no
mundo da lua. Agora estava atrasadíssima para a inauguraçã o da galeria
de arte. Helena já estava me ligando, para encher a minha paciência.
— Alô . Oi, Nena, já estou quase pronta — atendi a ligaçã o, me
explicando, antes que a estressada tivesse um ataque.
— Por que será que não acredito em você, Bea querida? — A intimidade
era uma droga, ela me conhecia bem demais.
— Mas é verdade, estou terminando a maquiagem — soltei uma
mentirinha boba. — Você já está vindo me pegar?
— Em vinte minutos passo aí com o meu Uber particular. Hoje vamos
beber, então nada de dirigir. Beijo, amiga.
Desligou, na minha cara. Ela era completamente doida.
Claro que chegamos no evento um pouco atrasadas por minha culpa,
mas Helena estava tã o animada que nem reclamou. Coisa rara. Minha
amiga era quase uma britâ nica com essa histó ria de pontualidade, nem
parecia que o sangue italiano corria em suas veias, onde um pequeno
atraso aos compromissos nã o era considerado deselegante.
— Eu te disse, Bea, olha como isso aqui está cheio de gente bonita. Para
você é uma ó tima oportunidade de divulgar o seu trabalho. Tem muita
gente aqui que é faná tica por joias e pagaria qualquer preço por uma
peça exclusiva sua. — Mesmo se divertindo, esta mulher nã o deixava de
trabalhar.
— Nã o imaginei que este espaço que estava esquecido, poderia se
transformar em algo tã o elegante. Eles fizeram um trabalho incrível
aqui.
— Ficou sensacional mesmo, outra coisa que me encanta é que a galeria
está representando artistas bem ecléticos, muitos até já sã o consagrados
e outros sã o talentos emergentes. Estã o de fato valorizando a arte
contemporâ nea de maneira brilhante. — Helena observava todo o
ambiente verdadeiramente encantada.
— Venha, Bea, vou te apresentar uma das só cias, ela está louca para te
conhecer, é uma potencial cliente para a Lily Jewelry. — E lá vamos nó s
trabalhar.
Avistamos uma mulher linda, na casa dos cinquenta anos,
impecavelmente bem-vestida, que abriu um sorriso enorme quando nos
viu.
— Helena, que prazer te ver aqui. — As duas se abraçaram
carinhosamente.
— O prazer é todo meu, Charlotte. Está tudo perfeito. Deixe-me te
apresentar Beatrice Tomarolli, minha amiga e chefinha. — Quase revirei
os olhos, com essa apresentaçã o. — Bea, esta é a pessoa que mais
entende de arte em Nova Iorque, Charlotte Miller.
— Finalmente encontrei a mais badalada designer de joias de Nova
Iorque. Beatrice, queria muito te conhecer, admiro demais o seu
trabalho. — Senti-me encabulada neste momento.
— Muito prazer, Charlotte, você sim é talentosíssima, olha o que fez aqui.
Arte da melhor qualidade. — Fui sincera e tentei tirar de mim a sua
atençã o, nã o sabia lidar muito bem com elogios.
— A Charlotte está aguardando o lançamento da sua nova coleçã o, Bea,
claro que ela foi uma das primeiras a ser convidada para o lançamento
da Soul Colors.
— Nã o se fala em outra coisa, minha querida, todos querem saber o que
a belíssima italiana está escondendo a sete chaves — brincou, mas era
verdade. Eu tinha muito cuidado para que ninguém tivesse acesso aos
meus “bebês” antes do lançamento, por isso que uma coisa que eu
valorizava nas pessoas era ser confiável. Essa era a principal qualidade
para trabalhar comigo.
— Fico muito feliz e agradecida por uma pessoa tã o elegante como você,
gostar das minhas criaçõ es. Dedico minha vida a isso. — Sempre me
emocionava quando percebia que o meu trabalho ganhava espaço e
valor a cada dia.
— Entã o, meninas, acredito que esse encontro merece ser celebrado. —
Minha amiga imediatamente chamou um garçom e cada uma de nó s
pegou uma taça de champanhe.
— Um brinde à s mulheres talentosas. — Charlotte ergueu sua taça.
— Saú de! — dissemos ao mesmo tempo.
Fechei os olhos e bebi um gole do líquido borbulhante e aromá tico.
Enquanto saboreava minha bebida, percebi um homem lindo, alto e
muito elegante, me observando de longe, mas imediatamente desviei os
olhos, no entanto, esse momento furtivo nã o passou despercebido pela
minha amada Helena. Uma á guia.
Charlotte nos acompanhou em um tour pela galeria, nos explicando
sobre os principais artistas e suas obras. A todo instante sentia um par
de olhos seguindo todos os meus movimentos. Em um determinado
momento, praticamente paramos em frente ao desconhecido stalker6 e,
para a minha surpresa, ele conhecia a Charlotte.
— Mi querido7, você precisa conhecer essas mulheres maravilhosas. —
Demonstrando intimidade, minha mais nova amiga envolveu seu braço
no belo homem, que de perto era bem mais interessante.
— Nada mais me agradaria, Char. — Seus olhos cor de whisky voaram
em minha direçã o. E o sorriso? Me perderia ali fá cil.
— Esta é Helena Nevicare, a maior especialista em marketing que
conheço.
O bonitã o segurou a mã o da minha amiga e a beijou gentilmente.
— Mucho gusto8, Miguel Ortiz.
Não é possível, será que é o tal espanhol que a Helena queria me
apresentar?
— E esta outra linda mulher é Beatrice Tomarolli. Ela é...
— A designer de joias mais comentada dos ú ltimos tempos — ele
apressou-se em dizer e segurou a minha mã o.
— Sério? Nã o sabia que estava sendo assunto em algum lugar —
brinquei enquanto ele segurava minha mã o firme, me deixando ainda
mais desconcertada.
— Meninas, o Miguel é um dos investidores da galeria, além de ser um
dos idealizadores desse projeto arrojado. Sua empresa foi responsável
por toda a reforma da galeria.
Ficamos em uma conversa superagradável, com os olhos do Miguel
sempre cravados em mim, me analisando, quase me despindo.
Quando chegou a nossa hora de irmos embora, já que amanhã teríamos
muito trabalho no ateliê, Miguel insistiu para nos acompanhar até em
casa, mas eu recusei, afinal acabamos de nos conhecer, mas ele deixou
bem claro, mesmo que de forma subliminar, seu interesse por mim. Nã o
vou negar que fiquei bem animada, ele parecia ser um homem bem
interessante.
Nos despedimos de Charlotte, já agendando um almoço comigo e Helena
na pró xima semana. Sabia que era ó timo sair, estar presente nos eventos
badalados, circular no meio da moda, dos artistas. Eram oportunidades
excelentes nã o só para conhecer pessoas, como também para ser
conhecida além de divulgar meu trabalho. Ficava atenta à s tendências da
moda, sem falar que gostava muito de observar o comportamento das
pessoas, sempre surgiam boas ideias para novos projetos. Mas confesso
que ficava exausta.
Cheguei em casa há meia hora, tomei banho e estava pronta para dormir.
Realmente estava quase desmaiada de cansaço, mas um bichinho que
me perseguia quase todas as noites começou a me infernizar, nã o dando
importâ ncia para o meu esgotamento. Normalmente era mais forte e
resistia ao impulso de pegar minha caixa secreta, que tinha relaçã o com
o Blake.
Podia até parecer meio paranoia, afinal o cara já estava casado e morava
em outro país.
Mas está voltando, esqueceu?
Verdade. Esse era um detalhe importante, que certamente acabará com
os meus dias.
O bichinho me venceu, levantei-me e fui direto ao meu closet, peguei a
minha caixa vermelha, onde guardei as minhas recordaçõ es. Havia
alguns envelopes onde guardei os lírios rosa que Blake me deu ao longo
dos anos. Cada vez que nos encontrávamos, lá estava um lírio rosa nos
observando e, invariavelmente, ele sempre pegava um e me oferecia, era
muito natural, sem programaçã o prévia, acho até que ele fazia esse gesto
sem perceber, meio no automá tico. Mal sabia ele que guardei todos
como troféus, símbolo de algum momento especial que tivemos, mesmo
que, talvez, esse momento tenha sido especial somente para mim. A
primeira vez que ele me ofereceu um lírio foi no aniversá rio de quinze
anos da Olívia. Sabia que tudo isso era loucura, mas era uma maneira de
me manter conectada com ele.
Sentei-me em minha cama e comecei a repassar alguns momentos da
minha vida, onde, de alguma forma, eu ganhei a atençã o de Blake. A
segunda vez que ganhei outro lírio rosa foi inesquecível.

Em um Natal que não fomos para a Itália, meus pais e os da Olívia


resolveram comemorar a data juntando as duas famílias. Como tanto eu
quanto a Olívia gostávamos muito de lírios, na decoração, além das
tradicionais flores vermelhas do Natal, tinha também os lírios rosa, pelo
menos em uma das mesas.
Passei todo o dia muito ansiosa na expectativa da noite de Natal, o motivo
era claro em minha cabeça, não via a hora de reencontrar Blake. No
momento do Secret Santa9, a mãe de Olívia distribuiu os presentes.
Quando peguei o que estava com o meu nome, com um cartão escrito: “Do
seu amigo secreto”. Em cima da caixa também havia um lírio rosa, que
certamente tinha sido “roubado” do arranjo da mesa. Imediatamente meu
primeiro impulso foi querer olhar na direção do Blake, mas me contive.
Não quis dar bandeira dos meus sentimentos, mas o olhar da minha mãe
denunciou que ela pensou o mesmo que eu. Coloquei o lírio na mesinha de
centro cuidadosamente, como se não tivesse sido impactada por esse
gesto.
Meu coração acelerou, faltou o ar e senti realmente o meu rosto pegar
fogo. Respirei fundo enquanto ouvia os comentários de alguns, dizendo
que eu jamais descobriria quem era o meu amigo secreto.
— Vamos, Bea, abre logo, estamos curiosos para saber o que você ganhou,
essa caixa é grande, deve ser algo muito bom. — Olívia fez graça, acho que
ela também desconfiou que seria seu irmão o responsável pelo meu
presente.
Lentamente desfiz o laço, tirei o papel de presente com cuidado. Quando
abri a embalagem por completo, meus olhos brilharam, lá estavam vários
materiais de desenho: kit de lápis de cor, lápis grafite, borrachas,
sketchbook10, carvão, canetas, enfim tudo o que uma apaixonada por
desenhos amava.
— Este é o melhor presente que poderia ganhar — disse emocionada, pois
desenhar sempre foi minha verdadeira vocação.
— Katie suspende o carro que compramos para ela — meu pai brincou,
claro, eu ainda não tinha idade para dirigir. Mas todos riram como se essa
fosse uma possibilidade.
— E então, Bea? Agora você tem que adivinhar quem te deu este presente,
minha querida. — Mamãe me desafiou.
Fiz um suspense, olhei para cada um na sala, tentei passar que estava em
dúvida, mas não aguentei e disparei:
— Dr. Blake.
Foi uma bagunça coletiva. Ele me olhou tão profundamente, mas em
seguida desviou o olhar para a baderna da nossa família. Meu coração
traidor se encheu de esperança.
Ele levantou-se, me abraçou e perguntou se eu tinha gostado.
— Eu amei, Blake, é a minha cara. Perfeito.
— Como você descobriu, Bea? — A mãe de Olívia quis saber.
— Foi somente um palpite, tia Ava — respondi, meio sem graça.
Ao mesmo tempo que respondia à pergunta, peguei de volta o lírio e olhei
discretamente para o Blake. Vi que no fundo da caixa tinha um cartão:
Você tem muito talento, princesa. Ficarei feliz em saber que este presente
te ajudará a se transformar em uma grande artista.
Com amor,
B.

Enquanto lia o cartão, ele me observava. Naquele milésimo de segundos,


tínhamos o nosso segredo ou, pelo menos, era nisso que queria acreditar.
Minha mãe deu um sorrisinho travesso em minha direção, ela não nunca
deixava passar um detalhe.
Por coincidência, depois desse episódio, todo e qualquer evento que
acontecia, a decoração era sempre feita com lírios rosa. Na comemoração
que nossa família fez quando eu e Olívia fomos aceitas na universidade, foi
outro momento inesquecível. Para a minha surpresa, ganhei meu lírio, sem
uma palavra dita. Blake simplesmente se aproximou e me deu a flor.
A parte ruim é que nessa ocasião tão importante para mim — finalmente
faria o curso dos meus sonhos — Blake estava com uma namorada. Essa
era uma situação comum na minha vida, cada vez que ele vinha para casa
trazia uma diferente. Na minha cabeça ainda tinha alguma chance, já que
não se envolvia seriamente com ninguém.
À medida que o tempo passava, nós nos tornamos mais próximos, ele me
contava como estava sua vida em Londres, do quanto amava a
Cardiologia, até comentava sobre suas namoradas. Essa era a parte que
preferia não ouvir, mas qualquer coisa vinda dele eu me derretia toda,
meu amor só aumentava.
Em um dos verões, nos Hamptons, Blake chegou de surpresa — claro que
com outra namorada —, entretanto, foi nesse dia que percebi um olhar
diferente.
Eu estava de biquíni, meu corpo já estava mais curvilíneo. Aos dezenove
anos, eu chamava a atenção dos rapazes e ele não foi uma exceção, mas,
para o meu desgosto, mesmo o flagrando me secando, continuava me
chamando de princesinha, bonequinha, da mesma forma como ele se
dirigia a irmã. Frustrante isso.
Quando finalmente saí dos meus devaneios do passado, percebi o
quanto já estava tarde, entã o guardei minhas recordaçõ es de volta na
caixa e finalmente peguei no sono.
Londres

— Atenção, dr. Blake Lancaster, por favor, dirija-se ao centro cirúrgico da


ala B.
Hoje o dia estava especialmente atribulado, mal tive tempo de almoçar e
já tinha que ir para a segunda cirurgia. Aparentemente, nã o seria muito
complicada, mas era em um bebê de dois meses que nasceu com uma
cardiopatia congênita. Era o tipo de cirurgia que já fiz inú meras vezes,
mas quando o problema era com uma criança, mexia muito comigo.
A determinaçã o era uma característica forte da minha personalidade, a
medicina foi colocada sempre em primeiro lugar, mas agora sentia que
faltava algo. Ultimamente um sonho que preferi deixar bem guardado
até que eu estivesse plenamente preparado para realizá -lo, nã o saía da
minha cabeça. Queria muito ser pai, isso nunca fez tanto sentido como
agora. Aos 38 anos, realizei todos os meus projetos, entretanto, um filho
estava acima de tudo, era o que faltava para eu me sentir um homem
inteiramente realizado.
Via os meus colegas com todo o estresse que envolvia a criaçã o de uma
criança, porém, ao invés de me desmotivar, só consolidava ainda mais o
meu desejo. O problema era que minha excelentíssima esposa nã o
queria nem ouvir falar de filhos, muito menos planejar tê-los.
Eu e Lucy nos conhecemos na época da faculdade, depois da formatura
decidimos fazer especializaçã o aqui em Londres, ela preferiu cirurgia
geral e eu segui com o meu propó sito de ser cirurgiã o cardiotorá cico.
Eventualmente nos encontrávamos durante a residência, tínhamos
amigos em comum, entretanto, só nos envolvemos vá rios anos depois
que nos mudamos para a Inglaterra. Posso dizer que aproveitei bastante
minha solteirice e, aos 32 anos, começamos a namorar. Finalmente, apó s
dois anos juntos, resolvi que estava na hora de formar minha família.
Sempre quis voltar para Nova Iorque, mas as oportunidades foram
surgindo por aqui e acabei me acomodando. Ao contrá rio de mim, já que
meu pai tinha uma construtora, a família de Lucy estava ligada à
medicina. Seu pai era só cio majoritá rio de um renomado hospital em
Manhattan. O dr. Andrew Taylor comandava tudo com mã os de ferro e
seu sonho era que a sua ú nica filha finalmente assumisse o seu legado.
Lucy quis construir sua carreira sem muita interferência do pai, mas
agora finalmente cedeu aos apelos dele e estamos voltando para a
América. Apesar dos atritos entre os dois, minha esposa estava animada
para voltar para casa depois de tantos anos.
Meu sogro, que era uma raposa, para nã o haver qualquer motivo de
recusa ao seu convite, me ofereceu em paralelo a diretoria do
Departamento de Cardiologia. Sempre foi minha meta, comandar essa
á rea em um grande hospital, participar e desenvolver pesquisas, além de
continuar fazendo minhas cirurgias, pois era aí que me desconectava de
todo mundo e me sentia privilegiado por ter mais sucesso do que ó bitos
nas intervençõ es que realizava.
— Boa tarde, Blake, dia animado hoje, nã o? — Kaleb, meu amigo desde a
faculdade, era anestesista e participou hoje também da primeira cirurgia
comigo.
— Nem brinca, Kaleb, comi algo bem rapidinho, queria tirar pelo menos
dez minutos para descansar quando ouvi o sistema de som já
anunciando a nova cirurgia. — Estávamos nos paramentando e fazendo
a assepsia. Esse era um momento que nos concentrávamos para a
intervençã o cirú rgica.
Quando entrei na sala gelada como eu gostava, o pequeno paciente já
estava devidamente preparado, pedi que ligassem o som com minhas
mú sicas clá ssicas preferidas e fiz a pergunta tradicional para a equipe,
esse era o meu ritual:
— Preparados para deixar alguém livre para viver? — Olhei para cada
um que estava na sala, fiz minha oraçã o, me concentrei e aí estava
pronto para fazer o que mais amava e sabia que fazia com maestria.
Saí cansadíssimo da cirurgia, felizmente tudo correu muito bem, a
criança precisará de cuidados inicialmente, algum acompanhamento
específico por um tempo, mas terá uma vida normal.
— Finalmente esse dia acabou, quero muito tomar um drink agora e
relaxar um pouco. Me acompanha, Blake? — Kaleb ainda era solteiro,
essas saídas dele para relaxar sempre acabavam com ele na cama de
alguém que conheceu no bar, mas eu tinha outros planos.
— Meu amigo, você sabe que depois de um dia puxado como o de hoje a
ú nica coisa que me faz relaxar, é pelo menos uma hora nadando em uma
piscina aquecida. Aí sim me transformo em um novo homem.
— Blake, você precisa aproveitar mais a vida, trabalha demais, vive
enfurnado naquela piscina. — Ele sempre insistia nesse tema.
— Você esquece que já aprontamos tudo e um pouco mais? Nã o há um
pub em Londres e arredores que nó s nã o tenhamos visitado e aprontado
horrores — ri ao me lembrar dessa época insana da minha vida.
— Depois que você se casou, parece que a Lucy te colocou um cabresto
de verdade. Sem ofensas, ok?
Ele vivia pegando no meu pé, mas a verdade era que atualmente eu
preferia ficar em casa. Nã o me animava mais passar horas num
ambiente barulhento, muita bebida, fumaça de cigarro. Essa fase já
passou.
— Entã o nos vemos amanhã , dr. Heart11 — brincou com o apelido que
ganhei das garotas que saía na é poca da residê ncia e que todos me
zoavam até hoje.
— Nã o vá ficar na farra até tarde, temos cirurgia logo cedo — brinquei,
porque sabia que, apesar dele gostar demais de se divertir, tinha o
mesmo senso de responsabilidade que eu.
— Sim, senhor. — Despediu-se com um sinal de continência para me
sacanear e entrou no seu Range Rover preto.
Minha vida sempre foi muito focada na medicina, mas hoje era
praticamente dedicaçã o exclusiva. Além da nataçã o, o que gostava
mesmo de fazer quando estava de folga era ficar em casa descansando,
estudando, assistindo filmes antigos.
No ú ltimo ano, descobri um hobby totalmente diferente e que me fazia
muito bem. Uma vez por semana participava de aulas de gastronomia.
Isso mesmo, difícil de acreditar. Por mais que fosse estranho, eu estava
me descobrindo um excelente cozinheiro.

Depois de mais de uma hora nadando praticamente sem parar, estava


renovado, porém faminto. Entrei em casa, que estava toda escura, sinal
de que Lucy ainda nã o havia chegado. Mesmo com meu estô mago
reclamando, preferi tomar logo um banho antes de mergulhar na minha
cozinha. Sim minha, porque minha mulher mal sabia fritar um ovo. Uma
caneca de café e uma torrada, já estava ó timo para ela, entã o toda essa
parte ficava sob minha responsabilidade.
Morávamos em um apartamento confortável, que tinha uma excelente
cozinha, mas queria muito morar em uma casa. Já andei até procurando
algumas em condomínios fechados, mas Lucy sempre achou mais
prá tico morar em apartamento. Agora que retornaremos para Nova
Iorque, meu sogro nos cedeu um dos seus apartamentos, entã o esse
outro objetivo de ter uma casa, com piscina e uma á rea gourmet enorme,
estava adiado temporariamente.
Hoje pela manhã , tirei o peito de frango do freezer e deixei na geladeira,
agora já estava devidamente descongelado. Sempre fazia isso quando
queria uma refeiçã o rá pida e feita por mim no final do dia. Para
acompanhar, uma salada de folhas verdes. Ficava ó timo.
Abri um vinho branco, servi uma taça, senti o aroma e a bebida desceu
suave, só entã o comecei a temperar o frango com sal, azeite, mostarda e
pimenta do reino, separei as farinhas para empanar; usei linhaça
dourada, farelo de amaranto, pá prica doce e defumada. Passei o frango
nos ovos batidos, depois mergulhei no mix de farinhas e coloquei em
uma assadeira forrada com um papel-manteiga, reguei com um fio de
azeite e levei para assar em forno pré-aquecido.
Menos de trinta minutos depois, o frango estava crocante, cobri com
muçarela e com meu molho especial de tomate, acrescentei folhinhas de
manjericã o e levei ao forno novamente para derreter o queijo. Fiz uma
salada simples e o meu jantar estava pronto.
Quando comecei a comer, a Lucy chegou.
— Uau, o cheiro está maravilhoso! O que você preparou para nó s? —
Passou por mim, beijou minha cabeça e roubou o meu garfo espetando
um pedaço do frango.
— Boa noite para você também. Chegou tarde. — No ú ltimo ano, temos
nos afastado aos poucos, o fogo dos primeiros anos de casamento estava
apagando.
— Depois do hospital fui para o pilates e acabei tomando um drink
naquele barzinho perto do estú dio. Era aniversá rio de uma das meninas,
fui rapidinho, para nã o ser indelicada, mas nã o comi nada. Estou
desmaiando de fome e nã o resisto aos dotes culiná rios do meu marido,
entã o nem vou tomar banho.
Lucy era uma mulher linda, sempre foi muito carinhosa, mas
ultimamente tem se tornado um pouco frívola, vaidosa em exagero. Acho
até que um dos motivos para nã o querer engravidar era o medo de
engordar e nã o voltar mais ao corpo que ela tanto idolatrava.
— Como foi o seu dia? Vi que tinha duas cirurgias grandes hoje, correu
tudo bem? — Ela era uma excelente cirurgiã geral, muito dedicada
também e sempre queria saber como me saí no dia.
— Foi bem cansativo hoje, mas deu tudo certo, minha maior
preocupaçã o era com um bebê, mas transcorreu tudo muito bem. No
final do dia, fui nadar, você sabe que um treino forte e a á gua morna da
piscina me fazem relaxar totalmente.
— Você é o melhor, Blake, nunca duvide disso. Quando retornarmos para
os Estados Unidos, nã o tenho dú vida de que você fará parte do rol dos
melhores cardiologistas do país. — Sabia o quanto ela me admirava
profissionalmente, mas sentia que eu nã o era mais o homem que ela
tanto se derretia de prazer. Atualmente, o sexo estava em segundo ou
terceiro plano para ela.
— Conversei hoje com papai longamente acertando os detalhes da nossa
mudança. O apartamento já está pronto, provavelmente teremos que
fazer alguns acertos na decoraçã o, dar nosso toque. Ele me disse que
combinou com você de nos mudarmos em, no má ximo, 30 dias. — Pelo
menos, essa mudança a estava deixando animada.
— Acho que esse é um tempo razoável para finalizarmos tudo por aqui,
passar os pacientes e fazermos nossa mudança, você nã o acha? — quis
saber se, para ela, esse prazo era razoável.
— Tem razã o, no hospital, da minha parte, está praticamente tudo
resolvido. Do nosso apartamento vamos levar pouca coisa, somente
objetos pessoais. Vou sentir falta daqui. — Percebi seus olhos
marejarem.
— Fui muito feliz em Londres, nã o imaginei que ficaria tanto tempo, na
verdade estava achando que nã o voltaria mais para casa. — Segurei a
mã o de Lucy e beijei com carinho verdadeiro.
— Eu também fui muito feliz aqui e essa distâ ncia do meu pai foi
importante, evoluí sem a sua ajuda e hoje ele me respeita de verdade,
finalmente entendeu que eu cresci e me tornei uma médica de respeito.
Relutei muito em aceitar a proposta de trabalhar no hospital dele, mas
acredito que esse era um caminho natural. — Parece que finalmente
Lucy e o pai superaram as diferenças, já era tempo. — Sua mã e me ligou
hoje, já está planejando uma festa para nos receber.
Ela e minha mã e sempre se deram muito bem.
— Mamã e ficou muito feliz desde que decidimos voltar. Com a mudança
de Liv, depois do casamento, tem se sentido muito sozinha.
Minha mã e nunca quis trabalhar, entã o a vida dela sempre foi cuidar dos
filhos, do meu pai e de tudo o que nos envolvia.
— Já disse a ela que nã o quero cobranças de filhos. Ainda nã o estou
preparada, principalmente agora que praticamente vamos recomeçar. —
Levantou-se retirando o seu prato da mesa, encerrando a conversa.
— Lucy, algum dia vamos ter que conversar sobre isso. Desde que nos
casamos deixei claro que queria ter filhos e você estava de acordo. —
Meu tom de voz nã o foi nada agradável.
— Filhos, Blake? Você só pode estar brincando, no má ximo consigo
pensar em apenas uma criança. Mas vamos deixar isso para depois meu
amor, ok?
Deu-me um beijo, fez um carinho no meu rosto e saiu em direçã o ao
nosso quarto. Nã o é possível que me enganei tanto com uma pessoa.
Demorei tanto tempo para me casar e, quando me decidi, tinha certeza
de que nó s tínhamos os mesmos sonhos.
Sozinho, organizei a cozinha, sentei-me no sofá com a taça de vinho e me
lembrei dela, a bela menina, a bonequinha do sorriso mais encantador
que conheci: Beatrice.
Em dois dias seria o lançamento da minha nova coleçã o. Apaixonei-me
por esse projeto desde o primeiro instante, todas as peças foram
desenhadas com muito sentimento. Trabalhava horas em cada detalhe.
Nã o me lembrava de ter realizado outro trabalho tã o delicado e, ao
mesmo tempo, cheio de personalidade. Esperava que as pessoas
percebessem diferentes emoçõ es nessas joias.
— Bom dia, chefinha, qual o nível da sua ansiedade hoje? — Helena,
como sempre, chegou cedo e extremamente animada, com sua energia
inesgotável.
— Nã o vou negar que, apesar de estar tudo sob controle, ainda fico na
expectativa, querendo saber se a Soul Colors terá o mesmo impacto nas
pessoas quanto tem em mim. Eu acho, aliá s, tenho certeza, que esse é de
longe meu melhor trabalho.
— Bea, será um sucesso estrondoso, porque está para nascer uma
pessoa mais exigente do que você.
— Você revirou os olhos, dona Helena? Confesse que te deixo de cabelo
em pé, à s vezes sou muito exigente, porém nã o tenho dú vida da sua
capacidade.
— É verdade. À s vezes você me enlouquece, contudo, sou realmente a
melhor e, para provar isso, tenho uma surpresa maravilhosa. Reservei o
dia todo no spa para nó s duas. Sairemos de lá direto para o evento, entã o
teremos que levar roupa, sapato e obviamente as joias mais lindas do
universo. — Ela tinha as melhores ideias, a abracei longamente e esse
momento fofo foi interrompido pelo toque do meu celular. Pela mú sica,
já sabia que era a Olívia.
— Já sei que é conversa longa, entã o vou trabalhar. — Helena soprou um
beijo e saiu, me dando privacidade.
— Oi, Liv, já chegou? Estou com tanta saudade de você, temos muito o
que conversar. — Disparei a falar assim que atendi, mas era a pura
verdade. Fazia muito tempo que nã o nos víamos pessoalmente.
— Xiu... Calma, amiga, já vi que está superansiosa — brincou. Ela sabia
que, por mais que tudo estivesse organizado, eu sempre estaria uma
pilha de nervos.
— Você já me conhece, nã o é? Mas assim que te abraçar, essa sua
tranquilidade passará para mim e tudo ficará bem.
— Bea, infelizmente eu vou falhar com você dessa vez. — Essa notícia foi
como jogar um balde de á gua gelada em minha cabeça.
— Nã o acredito no que você está me dizendo Olívia. Meu irmã o me ligou
ontem e disse que também nã o virá , minha cunhada está grávida e,
como a pressã o arterial dela está um pouco alta, o médico nã o
recomenda viajar de aviã o. Agora a minha melhor amiga também nã o
virá ? — Minha voz até embargou.
— Bea, não fique assim, prometo que logo que eu resolver tudo por aqui
passarei alguns dias aí, então mataremos a saudade.
— Desculpe, Liv, eu sei que você queria muito estar aqui comigo, mas é
que sem o Matteo e sem você faltará uma boa parte dos meus amores.
Ainda bem que meus pais adiaram a data da centésima lua de mel para a
pró xima semana.
— Que coisa mais linda, tia Katie e tio Vincenzo continuam a tradição de
viajarem como recém-casados. Já propus isso ao David, acho importante
para o casal.
— Eternos apaixonados, nã o tenho dú vida de que o meu irmã o seguirá o
mesmo caminho. Liv, mudando de assunto, já que sua ausência é fato
consumado, eu sei que te pedi para nã o falar sobre o assunto, mas...
— Já sei o que a senhorita quer saber. — Ela nem me deixou terminar. —
Eles já chegaram em Nova Iorque, vieram um pouco antes da data
prevista.
O sangue fugiu das minhas veias enquanto o meu coraçã o parecia que ia
parar. Por que isso não é mais simples, precisa ser essa explosão de
emoções?
— Meu Deus! Entã o, a partir de agora, tenho que estar preparada para
dar de cara com seu irmã o a qualquer momento. — Minha voz, a essa
altura, era pouco mais de um sussurro.
— Bea, sei o quanto você já sofreu com isso, mas já está na hora de você
seguir em frente, te falo isso sempre. Como está sua paquera com o
espanhol, algo aconteceu? Você não me falou mais nada.
Achei ó timo ela mencionar outra coisa, nã o adiantava ficar rodando em
um tema que já estava enterrado há anos.
— Ele é um gentleman. Depois daquele dia que nos conhecemos na
galeria, ele conseguiu meu telefone com Charlotte, uma das só cias. Um
dia desses, recebi uma ligaçã o de um nú mero desconhecido e resolvi
atender. Era o Miguel, até demorei alguns segundos para entender quem
era.
— Sério? Você está escondendo o jogo da sua melhor amiga, srta.
Tomarolli?
Olívia me incentivava muito que eu saísse e conhecesse novas pessoas,
ela dizia que um grande amor nã o batia em nossa porta.
— Nã o é nada disso, senhora sentimental ao extremo. É que, nos ú ltimos
dias, minha vida tem estado uma loucura. Mas continuando... ficamos
conversando por um bom tempo e, no final da ligaçã o, ele me convidou
para jantar.
— Já gostei dele, Bea. Não perdeu tempo, quis logo segurar a gata. E aí,
gostou dele?
— À s vezes, acho que você ainda é uma adolescente, vibra do mesmo
jeito de quando estudávamos juntas. Mas respondendo à sua pergunta,
sim gostei muito dele. Só um segundo que vou te mandar uma foto que a
Nena me enviou quando pesquisou a vida dele na internet.
— Mandaaaaa. Nena é das minhas, não podemos deixar escapar nenhum
detalhe! — vibrou a criança do outro lado da linha.
— Veja aí se a foto chegou. — Escolhi uma que ele estava de frente e de
corpo inteiro.
— Nossa Senhora dos Homens Lindos, isso sim anima qualquer mulher. Ele
lembra um pouco aquele ator espanhol, Mario Casas, só que com um
cabelo mais comprido, não é?
— Parece um pouco, também achei. — Fiquei quieta só para ver se a
curiosa perguntaria algo mais.
— Tá de brincadeira, Bea? Anda, desembucha. Como foi o jantar, ele é bom
de papo, tentou algo?
Comecei a rir, ela nã o tinha jeito.
— Você nã o cresce, né, Liv? Ele é maravilhoso, gentil, um cavalheiro. Nã o
foi atirado, conversamos até bem tarde e confesso que o papo estava tã o
bom, que nã o vi o tempo passar. Ele já estava de viagem marcada para a
Espanha no outro dia, mas me garantiu que estará aqui para o meu
evento.
— Mas não rolou nem um beijinho? — A româ ntica sonhadora estava de
plantã o.
— Na verdade, quando ele me deixou em casa e me acompanhou até a
entrada do prédio, beijou demoradamente minha mã o e entã o, quando
nossos olhos se encontraram, ele aproximou-se do meu rosto a ponto de
sentir sua respiraçã o e apenas roçou em meus lá bios, em seguida se
despediu e foi embora.
— O quê? O miserável te deixou no vácuo? — Sério, essa minha amiga nã o
cresceu! Ri demais com esse comentá rio.
— Foi exatamente isso que aconteceu. Depois desse dia, ele me enviou
algumas mensagens, respondi uma parte delas, outras só mandei um
emoji engraçado.
— Fez bem, não demonstre muito interesse. Deixe-o correr um pouco atrás
de você. Mas só um pouco, não vá fazer jogo duro demais, senão ele
desiste.
— Agora virou especialista em conseguir namorados para amigas
solteironas? Deveria abrir uma agência de encontros ou criar um
aplicativo para facilitar a vida dos solitá rios.
— Bea, você me deu uma excelente ideia. Se minha empresa não der certo,
acho que posso arriscar nesse novo nicho — brincou gargalhando.
Continuamos assim nessa conversa leve e animada por mais alguns
minutos até que nos despedimos.

Tudo pronto para amanhã . Finalmente, a Soul Colors seria apresentada


aos novaiorquinos. Combinei com minha mã e e com a Helena de
tomarmos o café da manhã juntas. Em seguida, por volta do meio-dia,
nó s três iríamos para o spa e nos aprontar para o tã o esperado evento.
Hoje, Miguel me mandou um arranjo elegantíssimo de orquídeas
brancas, me desejando sucesso e prometendo chegar a tempo do evento.
Mesmo me sentindo lisonjeada com sua atençã o, o simples ato de
receber flores, invariavelmente me fez lembrar do Blake. Mais uma vez,
me perdi em minhas memó rias e me transportei para o momento mais
especial da minha vida: Meu aniversá rio de 20 anos.
Oito anos atrás...

Como meu aniversário era apenas um mês após o da Olívia, resolvemos


comemorar juntas, entre uma data e outra, pois era um período que
estaríamos de folga da faculdade. Programamos um luau na praia, na
casa dos meus pais nos Hamptons. Todos os nossos amigos foram
convidados, tanto os da época da escola como os da faculdade.
Dessa vez, a Olívia fez o irmão prometer que estaria na nossa festa e, desde
que Blake confirmou que viria, não havia praticamente dormido direito.
Era impressionante como esse homem tirava totalmente o meu juízo.
Eu e Olívia estávamos tão felizes com esse aniversário duplo que
parecíamos duas crianças, rindo à toa. O que ela ainda não sabia era que
eu tinha planos bastante audaciosos para esta noite.
— Amiga, essa festa será um marco na minha vida, seu irmão não vai
escapar de mim. Vou dizer que sou louca por ele e que me guardei todo
esse tempo para ele.
Olívia quase se engasgou com o suco que estava bebendo.
— Como é que é? Vai dar para o Blake na festa? Com todos os nossos
convidados rondando? Não acho uma boa ideia, Beatrice. A primeira vez
precisa ser especial e no meio de uma festa não acho que seja o melhor
dia. — Senti uma certa tensão. Olívia tinha razão, mas eu já havia
planejado tudo.
— Não se preocupe, vamos ter privacidade. Conversei com minha mãe, ela
me ajudou com tudo.
Se Olívia não estivesse sentada, desabaria no chão naquele momento.
— Calma, respira. — Comecei a explicar o plano para a minha amiga
faladeira, que agora estava completamente muda.
— Só a tia Katie para participar disso. Quer dizer que do outro lado da
casa de vocês, naquele bangalô isolado, ela mandou preparar o ninho de
amor para onde você pretende levar o meu irmão, seduzi-lo e entregar o
seu “tesouro”? — Ela fez aspas com os dedos. — Você só pode estar
brincando, minha mãe jamais faria isso!
— A mamma acompanha essa história desde o começo e acha que eu
preciso, pelo menos, ter um momento especial com ele. Isso poderá definir
tudo. — Sabia que poderia dar tudo errado, mas eu queria que ele fosse o
meu primeiro, mesmo que não desse em nada. Não tinha como ser
diferente.
— Você está jogando alto, Bea, apostando todas as fichas, não quero que
se machuque. Ele ficará aqui apenas alguns dias. — Olívia tinha razão,
mas agora era tudo ou nada.
Blake chegou na véspera da festa. Quando o vi depois de tanto tempo, tive
a certeza de que nada mudou, eu continuava louca por ele e decidida a me
declarar.
Eu estava na praia com alguns amigos, quando ele me cumprimentou. Seu
abraço estava diferente, percebi que ele me olhou discretamente. Ficamos
todos conversando por um longo tempo.
Quando o pessoal resolveu mergulhar, ele se aproximou e disse com todas
as letras que eu havia crescido e estava linda.
Não me importava de ele viver em Londres, que fosse dez anos mais velho,
isso já nem representava tanto assim. Quando eu era mais novinha, a
diferença parecia grande, mas agora, sendo uma mulher, não tinha dúvida
de que queria Blake, aliás sempre quis e não deixaria passar anos da
minha vida sem que ele soubesse o quanto era importante para mim. Eu
tinha que aproveitar que ele estava sozinho, sem namorada. Blake era
muito certinho. Eu sabia que, quando estava namorando, ele era fiel.
Perfeito para mim.
Pelo fato de estar tão obcecada por Blake, eu tinha medo de estar criando
coisas na minha cabeça, mas a verdade era que, desde aquele Natal,
quando ele me deixou um lírio rosa como pista do meu amigo secreto,
percebi ele me olhando diferente.

O grande dia finalmente chegou, minha mãe e tia Ava contrataram uma
empresa para fazer o buffet, a decoração e o som, mas, ainda assim,
fizeram questão de acompanhar tudo para que nada desse errado e
realmente tudo estava maravilhoso. Nos arranjos de flores, obviamente
não faltaram os meus lírios rosa que tanto amava.
— Vamos, Bea, nós somos as aniversariantes, não podemos chegar depois
dos convidados. — Olívia me apressou, me deixando ainda mais
apreensiva.
— Calma, estou só finalizando a maquiagem. Tudo tem que estar perfeito
hoje, Liv. Pode ir na frente, não vou demorar. — Tranquilizei minha
ansiosa amiga.
Olhei-me no espelho e me senti confiante. Meu vestido era elegante, mas
com um toque sensual. O decote nas costas era bem profundo e o
comprimento um pouco acima dos joelhos deixavam minhas pernas
torneadas à vista na medida certa. Borrifei meu perfume que usava há
anos e fui ao encontro da outra aniversariante.
A festa estava simplesmente perfeita, a comida maravilhosa, os drinks do
jeito que gostávamos, enfim tudo conforme planejado. Pelo menos até
agora. Senti um frio na barriga.
“Beatrice, você não vai amarelar agora, né?” O diálogo mental estava a
todo vapor nessa noite.
— Bea, você viu quem acabou de chegar? — Olívia me alertou, mas nem
precisava, eu estava observando a entrada da festa o tempo todo e percebi
o exato momento que o homem mais lindo que meus olhos já viram
chegou, vestindo uma bermuda off-white e uma camisa de linho azul-claro
com as mangas dobradas.
— Vamos lá falar com ele. — Minha amiga nem esperou minha resposta,
saiu me puxando pela mão.
— Irmão, não é justo você estar tão lindo no dia do nosso aniversário, é
muita concorrência! — Pelo menos, ela amenizou o clima brincando,
senão juro que eu estava preste a sair correndo.
“Não posso me acovardar. Não agora, não hoje”, pensei.
— Minhas bonequinhas, vocês estão lindas demais, estão ofuscando todos
os convidados, isso sim. — Blake abraçou a irmã e, quando chegou a
minha vez, meu coração martelava tão forte no meu peito, que tive medo
dele perceber.
O abraço foi longo, para mim com muito significado. Ele beijou o meu
rosto, depois me olhou nos olhos, mas não disse nada.
— Tenho um presente para vocês.
— Um para cada eu espero. Afinal, você é um médico de sucesso, deve
estar ganhando muito bem. — Olívia não perdia a oportunidade de
pirraçar o irmão.
Blake tirou do bolso duas caixinhas de veludo e nos deu ao mesmo tempo.
— Como vocês estão sempre juntas, quase gêmeas, resolvi dar o mesmo
presente, porém com algo diferente que representa cada uma de vocês.
Quando abrimos ao mesmo tempo as caixinhas, nos deparamos com duas
pulseiras de ouro, delicadas, elegantes e o que diferenciava uma da outra
era o pingente.
— A da Liv tem um pingente de uma coroa de princesa, pois você é e
sempre será a minha princesinha. Pois é assim que te vejo desde que nossa
mãe colocou aquele pacotinho no meu colo quando eu tinha dez anos. —
Claro que minha amiga pulou no colo do irmão, quase o levando ao chão.
— Sua maluquinha, quase me derrubou. — Blake beijou o topo da cabeça
da irmã, já virando para mim.
— E o da Bea, o que é? — Óbvio que a curiosidade em pessoa se
manifestou.
— O da Beatrice é um lírio, já percebi que ela gosta muito dessa flor. Um
dos significados do lírio rosa é doçura. Combina muito com você —
respondeu olhando bem dentro dos meus olhos.
— Que delicadeza, Blake, eu amei. E o lírio, principalmente o rosa, é minha
flor preferida. — Não pulei em seu colo, mas abracei-o longamente,
deixando seu perfume me embriagar, enquanto suas mãos enlaçavam
minhas costas de maneira firme, nada angelical.
Passamos toda a noite praticamente conversando só nós dois. Às vezes, eu
me distanciava um pouco, conversava com os meus amigos, dançava, mas
sempre percebia os olhos de Blake me procurando, achei que já estava
fantasiando. A uma certa altura, fui conversar com a minha mãe, já que a
qualquer momento eu iria convidá-lo para fugir da festa.
— Mamma, acho que estou tão apaixonada e nervosa, que já estou
criando coisas na minha cabeça. Você acredita que a todo momento que
olho para o Blake, acho que ele também está me buscando com o seu
olhar.
— Filha, relaxe, você não está sonhando acordada. Eu estou de olho no
Blake desde que chegou e ele está sim vidrado em você. Lembre-se de que
estou te apoiando em tudo, sei da sua paixão desde novinha, mas, caso não
se sinta segura, não precisa dar esse passo tão importante na vida de uma
mulher.
— Dona Katie, não se preocupe, essa noite só não acontecerá nada se eu
perceber que o Blake não está na minha. Mesmo sabendo que irá embora
em poucos dias e que não nos veremos tão cedo, minha decisão está
tomada.
Minha mãe me abraçou, me desejou boa sorte e eu voltei para a pista de
dança. Depois de alguns minutos, já estava mais relaxada, fui até o bar
beber algo e logo senti o perfume marcante perto de mim, não precisava
me virar para saber de quem se tratava.
Blake passou um dedo delicadamente ao longo do meu decote das costas,
me causando um arrepio da cabeça aos pés, então sussurrou no meu
ouvido, para o meu desespero completo:
— Como seu irmão permitiu que você vestisse uma roupa dessa? — Seu
hálito morno ao pé do meu ouvido me fez paralisar imediatamente.
— Meu irmão não está aqui, mas sabe que sou bem crescidinha e confia
em mim. — Ao mesmo tempo que respondia à sua pergunta fui me virando
lentamente, até que ficamos um de frente para o outro. Nossa diferença de
altura estava menor, já que eu ostentava um salto agulha de dez
centímetros, que me deixava mais segura, então firmei meus olhos nos
dele, sem desviar como sempre fazia.
— Não tenho dúvida de que você cresceu, a cada dia que nos encontramos
você está mais linda e confesso que tenho feito um esforço muito grande
para não esquecer que você é quase uma irmã e que sua família é muito
amiga da minha.
Era agora ou nunca. Aproximei-me mais do Blake, sem vergonha alguma
fiquei a milímetros de distância dos seus lábios e olhando para eles
comecei o meu jogo de sedução.
— Prefiro que você esqueça essa história de irmãzinha. O que penso a seu
respeito, passa bem longe de um sentimento fraterno.
Blake abriu os olhos, como se tivesse sido pego de surpresa e percebi que
suas pupilas dilataram.
Foi nesse momento mágico que nossa música começou a tocar. Sim,
mesmo que ele não soubesse, nós tínhamos uma música. Então, como se
lesse meus pensamentos, ele me surpreendeu mais uma vez.
— Essa não foi a música que dançamos na festa de 15 anos da Liv?
“Alguém me belisca, só posso estar sonhando! Ele realmente lembrou? Eu
não estou acreditando nisso!”
— Sim, foi essa música.
Então sem me perguntar nada, fui guiada para a pista de dança e, ao
contrário da primeira vez que dançamos “Kiss me”, dessa vez percebi um
sentimento diferente vindo dele e eu não estava definitivamente
fantasiando.
— Bea, seu perfume, seu vestido, tudo está me tirando a razão. O que você
está fazendo comigo, princesa?
Encostei em seu ouvido para provocar:
— Eu cresci, Blake, e me tornei uma mulher interessante.
— Interessante é um eufemismo, você se tornou uma mulher linda, doce e
encantadora, que está me enfeitiçando. Não tenho o direito de ter
pensamentos impróprios com você, não é certo. — Ele vacilou um pouco,
achei até que queria encerrar a nossa dança, mas, para a minha
felicidade, ele continuou.
Continuamos neste clima tenso até o último segundo da música.
Estávamos tão grudados que não me passou despercebido a sua excitação,
o que me fez suar frio.
Logo depois da nossa dança, nos separamos e todos se reuniram em volta
da mesa, onde eu e Olívia nos posicionamos em frente aos nossos bolos –
claro que cada uma de nós tinha o seu. Em uníssono, todos cantaram os
parabéns e nossa família, após nos abraçar mais uma vez, começou a
dispersar.
Senti minha mãe me observando e de longe ela soprou um beijo. Esse gesto
me acalmou e percebi que era o momento de realizar o meu sonho: ter o
Blake todo para mim, nem que fosse somente por uma noite.
— Por que estou percebendo uma emoção diferente em seu rosto, srta.
Tomarolli? — Bem na minha frente, estava o meu primeiro amor e, para a
minha surpresa, com um lírio rosa na mão.
— O senhor continua roubando a decoração das festas, dr. Lancaster? Isso
não é um comportamento adequado para um médico renomado —
brinquei, muito feliz pelo seu gesto. Ele sempre me surpreendia me
presenteando com a flor que virou o símbolo da minha paixão por ele.
— Pois é, acho que isso está definitivamente marcado em mim, além da
música que dançamos. Invariavelmente vou me lembrar de você quando
escutá-la novamente.
— Blake, você não deveria dizer essas coisas para mim, não imagina o
efeito que suas palavras me causam. — Aproximei-me dele e senti sua mão
envolvendo minha cintura, fazendo com que nossos corpos ficassem
grudados.
— Beatrice, o que você está fazendo comigo, menina? Eu sou muito mais
velho que você e tenho certeza de que, se o Matteo estivesse aqui, já teria
pulado em meu pescoço e eu não poderia tirar a razão dele. — Segurou
meu pescoço com delicadeza e passou a língua no seu lábio inferior com os
olhos grudados nos meus.
Ainda bem que estávamos em um local mais discreto, longe dos olhos dos
curiosos, pois foi nesse momento que me enchi de coragem e aproximei da
sua boca. Dei um selinho e, como se ele estivesse esperando minha atitude,
colou sua boca na minha, sua língua pediu passagem e, claro, cedi. Senti-
me derreter em seus braços.
Ficamos assim nessa dança de línguas, respiração acelerada, por alguns
instantes que, para mim, pareceram horas. Na verdade, não queria sair
dali, era a melhor sensação da minha existência. Quando finalmente nos
afastamos, Blake estava tenso, olhando para os lados, verdadeiramente
nervoso.
— Bea, me perdoe, eu me descontrolei — sussurrou com nossas testas
grudadas.
— Blake, pelo que me consta, a iniciativa do beijo foi minha e nós dois
quisemos. Vou confessar, eu amei cada segundo. — Não era a hora de
fazer joguinhos, eu quis muito esse momento e não irei recuar.
— Eu não vou negar que me pegou de surpresa, mas Bea...
Não o deixei terminar, não hoje, não quando já chegamos tão longe. Beijei-
o novamente, sem que ele oferecesse resistência, então entendi como uma
aprovação, decidi pegar sua mão e levá-lo até o meu esconderijo.
— Para onde estamos indo, Bea? — Blake parecia assustado, mas não
recuou e continuou me acompanhando.
— Estou te sequestrando e, ao cruzar aquela porta, não quero ouvir
nenhuma palavra que faça referência à nossa diferença de idade ou sobre
nossa família ou qualquer tema que não seja a inegável atração que
estamos sentindo um pelo outro.
Paramos em frente à porta do bangalô, eu estava visivelmente nervosa e
percebi que Blake não estava diferente. Falei com tanta firmeza e
seriedade que ele até levantou as sobrancelhas em sinal de... espanto,
admiração?
Quando atravessamos a porta, eu sabia que minha vida mudaria a partir
dali. O ambiente estava delicadamente decorado. Minha mãe optou por
algo simples, mas com personalidade e, claro, não faltaram os lírios que
tanto amava. A luz âmbar deu um ar aconchegante ao ambiente, um
difusor espalhava um agradável perfume de óleo essencial de ylang ylang,
que, segundo minha cunhada, era um poderoso afrodisíaco.
Blake estacou ao entrar, ficou alguns segundos assimilando tudo o que via.
Tinha um sofá confortável, uma cama enorme forrada com lençóis de
linho, um balde de gelo com uma garrafa do meu champanhe preferido.
Tudo de muito bom gosto.
— O que está acontecendo, Beatrice, você planejou tudo isso?
Senti que eu teria que ter muito tato nesse momento ou colocaria tudo a
perder.
— Venha, Blake, sente-se, preciso conversar com você. Depois de abrir o
meu coração, a decisão de ficar ou ir embora será sua, pois minha decisão
já está tomada. — Quem me ouvisse falando com tanta segurança, jamais
imaginaria que eu estava a ponto de desistir de tudo, já que, ao olhar para
o Blake, não conseguia decifrar seu pensamento.
Agora não tinha mais como voltar atrás. Mesmo extremamente nervosa e
com medo de como Blake iria reagir, comecei a abrir o meu coração,
precisava muito que ele soubesse tudo o que eu sentia por ele, mesmo
entendendo que não ficaríamos juntos.
— Desde que te vi a primeira vez, quando tinha 12 anos, eu me apaixonei
perdidamente.
Ele tentou levantar-se, mas eu segurei suas mãos com firmeza.
— Deixe-me continuar, por favor.
Ele assentiu com a cabeça.
— Eu sei que você tem sua vida em Londres, que ainda me enxerga como
uma menina, mas eu sou uma mulher. Passei todos esses anos sonhando
com esse momento, entretanto preciso deixar claro que não te cobrarei
absolutamente nada. Seguiremos depois como se nada tivesse acontecido,
se assim você quiser, mas eu preciso te dizer o que sinto.
Blake não me deixou dizer mais nada, grudou sua boca na minha e, a
partir daí, foi uma loucura. Ele me enlouquecia com seus beijos, sua mão
que subia e descia ao longo do meu corpo até que ele se deu conta do que
estava acontecendo e parou repentinamente, como se tivesse levado um
choque.
— Bea, isso é uma loucura, minha vida é em Londres, não quero que você
se iluda comigo. Eu te vi crescer, não sou um canalha insensível, não posso
te magoar, mas confesso que já faz algum tempo que deixei de te ver como
a amiguinha da minha irmã.
Meu coração errou uma batida.
— Você se transformou em uma mulher linda, uma joia preciosa,
impossível não te notar, mas não tenho o direito de te magoar. Eu não sou
homem para você, sou dez anos mais velho e você está começando sua
vida, tem que se envolver com alguém da sua idade e que possa te dar a
atenção que você merece.
Senti verdade em suas palavras, mas eu sabia de tudo isso e estava
disposta a correr o risco.
— Blake, esqueça tudo lá fora, todas as dificuldades, pare de pensar muito,
esta noite eu só quero você. Estou à sua espera todos esses anos e não me
arrependo disso.
Blake levantou-se de súbito e bagunçou o cabelo, vi o quanto estava
duelando consigo mesmo.
Aproveitei esse momento e o abracei por trás, ele segurou e beijou minhas
mãos várias vezes.
— Bea, isso não está certo. Como vou olhar para os seus pais? Eu não sou
irresponsável a esse ponto. Volto para a Inglaterra em poucos dias, minha
vida é lá, você tem uma vida pela frente aqui e precisa focar nisso.
Percebi que ele me queria também, mas o senso de responsabilidade não o
deixava me escolher.
— Não se preocupe com a minha família, tudo isso aqui foi preparado por
minha mãe e...
— Como é? — Virou-se com os olhos quase saltando. — Quer dizer que a
Katie está sabendo que estamos aqui agora? Você está brincando comigo.
— Minha mãe não só me ajudou com tudo, como também aprova minha
decisão, ela sabe do meu sentimento por você desde sempre.
— Bea, você é doidinha demais.
Coloquei dois dedos em seus lábios, não deixando que absolutamente nada
atrapalhasse a minha decisão.
Eu me aproximei e, dessa vez, ele assumiu tudo, me beijou como um lobo
faminto. Quando sua mão subiu pela lateral do meu corpo e alcançou o
meu seio, que já estava pesado de tanto tesão, eu gemi em sua boca. Ele
me desejava, não restava dúvida.
— Bea, você está me deixando louco, seu cheiro, sua pele...
Afastei-me dele, me enchi de coragem, desci as alças do meu vestido
lentamente, que deslizou até o chão. Os olhos de Blake passearam pelo
meu corpo e, quando ele se aproximou e capturou um dos meus seios,
mordiscando o mamilo, e com a mão acariciava o outro, senti que estava
flutuando e o mundo podia parar naquele momento que eu nem
perceberia.
Meio sem jeito, desabotoei sua camisa e, quando finalmente levei minhas
mãos ao seu peitoral que tanto admirava, senti que estava completamente
perdida. Ele pegou minha mão, beijou cada um dos meus dedos e, por fim,
beijou a palma da minha mão direita. Foi um gesto simples e, ao mesmo
tempo, sensual.
Blake me pegou no colo e me levou até a cama, fiquei sentada só de
calcinha, enquanto ele me admirava ainda parcialmente vestido. Abriu o
champanhe e me serviu uma taça.
— Tá querendo me embebedar, dr. Lancaster? — Sorri e dei um gole
naquele líquido borbulhante que tanto gostava.
Blake pegou a taça da minha mão, também bebeu um gole, deixou a taça
na mesinha de cabeceira e ficou me olhando com tanta fascínio, que fiquei
até sem graça, tímida eu diria.
— Você é linda, perfeita. Tem certeza disso? Eu estou me controlando, mas
já estou à beira de um colapso, você está me matando de tanto tesão, só de
te olhar assim, com essa calcinha minúscula, não estou conseguindo
raciocinar.
— Só venha, Blake, eu quero muito você.
O que o estava segurando até então, deu passagem para um homem
ardente e, definitivamente, maravilhoso.
Com muito cuidado, Blake tirou minha calcinha, começou a beijar os meus
pés e foi subindo lentamente, deixando uma trilha de fogo em minha pele.
Toda a timidez que estava sentindo começou a desaparecer. Recebi beijos
doces, mordidas leves ao longo do corpo até o pescoço, quando alcançou
minha boca, aí sim, sem delicadeza alguma. O beijo estava urgente, ele
chupava meu lábio, mordia, era uma tortura, então ele resolveu descer a
mão até o meu centro pulsante, para o meu total desespero, pois com
certeza estava encharcada.
— Meu Deus, Bea, você está muito molhada, pronta para mim. Eu preciso
provar isso. — A essa altura, só saíam palavras desconexas da minha boca,
parecia que eu tinha me transportado para uma espécie de realidade
paralela.
Blake fez o caminho inverso, beijando-me lentamente até chegar aonde
tanto o desejava. Quando senti sua língua lentamente deslizar pelo meu
clitóris, achei que fosse morrer.
— Doce como uma iguaria rara. Você é maravilhosa, princesa. — Ficou me
torturando por alguns minutos e, quando introduziu levemente um dedo
em meu canal, eu senti uma onda se aproximando, meus quadris se
movimentando involuntariamente em sua direção e o orgasmo veio forte
me lançando ao precipício. Gritei seu nome, pedi que parasse, mas claro
que ele não obedeceu, só dizia para deixar vir, então me entreguei à
luxúria.
Quando abri meus olhos, ele estava lindo e me observando, com o cabelo
todo desalinhado.
— Acho que alguém viajou — disse e me deu seu melhor sorriso.
— Blake! Eu realmente saí do ar. Eu devo estar uma bagunça. — Um
pouco de vergonha começou a despontar.
— Você está mais linda ainda, Bea, assim entregue ao seu prazer, uma
visão que jamais sairá da minha memória. Agora que já se recuperou um
pouco, eu quero te fazer gozar mais, essa será a minha missão hoje.
— Isso não é justo, eu também preciso te ver perder o controle. — Olhei
para ele com o desejo já renovado.
Blake levantou-se, tirou a bermuda junto com a cueca boxer e me
presenteou com uma visão de um corpo perfeito, com músculos esculpidos
na medida certa e, meu Deus, aquilo sim era o paraíso, seu membro
imponente. Fiquei encantada.
— Não se preocupe que serei gentil com você, não precisa fazer essa cara
de assustada.
O safado sabia que era lindo e que seu pau impressionava qualquer
mulher. Ele pegou um preservativo na carteira, colocou devagar e me
olhou desafiadoramente, claro que me esforcei para não demonstrar o
medo que estava sentindo naquele momento. Blake era muito sensível e
certamente percebeu.
— Minha princesa, não se sinta mal, se você quiser desistir eu vou
entender. Nunca faça nada na sua vida se você não estiver à vontade ou se
não estiver muito a fim.
— Eu me preparei praticamente a vida toda para esse momento, a não ser
que você não me deseje — enfatizei. — Este é o momento mais especial da
minha vida e estou pronta para você, Blake.
— Bea, entenda uma coisa, faz muito tempo que te olho diferente, que te
desejo, mas sempre tirei isso da minha cabeça, por achar que não era
certo, afinal, te conheço desde muito novinha. Desde que dançamos pela
primeira vez, eu fiquei encantado por você, mas naquela época jamais
admitiria isso, nem para mim mesmo. Você era uma adolescente
descobrindo a vida, eu não tinha o direito sequer de imaginar qualquer
coisa com você, isso seria um crime até — falou sério.
— Estou aqui, Blake, não tenho mais quinze anos.
A partir desse momento, o homem se transformou. Distribuiu beijos por
todo o meu corpo, me adorando, dizendo palavras carinhosas até quando
percebeu que eu estava novamente me derretendo com seu toque, com
seus beijos, então, posicionou seu pau em minha entrada e foi deslizando
lentamente, me deixando acostumar com seu tamanho aos poucos.
— Está doendo? Me diga se tem algo te incomodando.
— Está doendo um pouquinho, mas acho que dá para aguentar. Não pare,
Blake, por favor.
Blake continuou fazendo movimentos lentos de vai e vem até chegar à
barreira do hímen e forçou um pouquinho. Quando viu que dei um gemido,
ele parou.
— Relaxe um pouco, não precisamos fazer isso hoje.
— Blake, eu estou bem. Está incomodando um pouco sim, mas nada muito
ruim.
O homem me beijou intensamente, saiu um pouco de dentro de mim,
desceu a mão entre nós dois, estimulou o meu clitóris até perceber que eu
estava completamente relaxada de novo. Deslizou novamente dentro de
mim com cuidado, ainda assim gemi alto de dor, mas ele foi um
gentleman, como era esperado. Beijou-me com carinho, porém, dessa vez,
ele não parou até finalmente me fazer a mulher mais feliz do mundo.
— Me perdoe, Bea, mas isso não tem como ser diferente, te machuquei?
— Não se preocupe, Blake, a dor já está passando.
Depois desse momento tenso, a dor diminuiu e a dança dos nossos corpos
recomeçou. Sentia-me plena, preenchida, ficamos assim até perceber uma
nova onda de prazer se aproximando. Blake acelerou as estocadas, focado
em meu prazer, mas também em busca do seu. Quando ele percebeu que já
estava quase gozando, começou a me incentivar com palavras, ora
carinhosas, outras vezes, para a minha surpresa, bem indecentes. Eu amei
o Blake descontrolado, absorvido pelo seu prazer. Finalmente gozamos
juntos e pude assistir ele se render plenamente, chamando o meu nome
entredentes.
— Gostosa demais. Fui muito intenso pra você, Bea? Te machuquei, meu
lírio?
Claro que me desmanchei com tanto carinho.
— Foi tudo perfeito, Blake — sussurrei.
Ficamos abraçados por algum tempo, ele deslizando seu dedo indicador
ao longo do meu corpo, mapeando minha pele, com um carinho delicado.
Depois de algum tempo curtindo o pós-sexo intenso, tomamos um banho
gostoso, onde, além de se manter extremamente atencioso, Blake me fez
gozar novamente, só que dessa vez sem penetração, ele quis me preservar,
pois estava um pouco dolorida.
Dormimos agarradinhos e, antes do dia amanhecer completamente, nos
despedimos sem nenhuma promessa, mas, no dia seguinte, ele me ligou e
passamos três dias maravilhosos juntos até ele voltar para Londres. Sem
promessas.
Como meu coração ficou? Partido e feliz ao mesmo tempo. Sabia que não
seríamos um casal, que não teríamos uma história de amor, mas tudo o
que vivemos naqueles poucos dias foi intenso demais e senti que, de uma
certa maneira, cheguei em seu coração, mas ele tinha outros planos e eu
sabia disso o tempo todo. Não fui enganada.
Chorei? Muito, claro. A mamma, como sempre maravilhosa, me apoiou
nessa fase, Olívia também não saiu de perto de mim. Mas tudo aconteceu
exatamente como eu queria. Sem arrependimentos.
Dias atuais...

O nosso retorno para Nova Iorque estava sendo tã o aguardado há tanto


tempo, que a nossa família praticamente fez uma festa para nos
recepcionar. O pai da Lucy estava transbordando de alegria, finalmente
teria sua filha ao seu lado no comando do hospital. Meus pais também
estavam radiantes com meu retorno, eles sonhavam com isso há anos.
Para a felicidade deles ficar completa, só faltava a Olívia voltar a morar
aqui também, mas isso nã o seria possível, pelo menos por um bom
tempo.
Já fazia uma semana que chegamos, eu estava totalmente adaptado à
rotina do hospital. Lucy sentia alguma dificuldade na convivência com
seu pai, como já era esperado, mas, para a minha surpresa, ela estava se
saindo muito bem.
Minha rotina era bem pesada. Além das cirurgias que nã o abria mã o em
hipó tese alguma, ainda era responsável por toda a á rea da Cardiologia,
acompanhava os residentes e ainda era o líder de vá rias pesquisas
importantíssimas. Diferente de como fazia em Londres, para tirar toda
essa carga de estresse, nadava diariamente e me matriculei em um
excelente curso de Gastronomia, que começarei na pró xima semana.
Estávamos indo para a casa dos meus pais, hoje minha mã e disse que
mandou preparar a minha comida preferida: risoto de camarã o com
queijo brie e pera. Já tentei fazer essa receita vá rias vezes, ficava muito
bom, mas minha mã e tinha algum segredinho, porque seu risoto sempre
fazia mais sucesso.
— Mã e, eu ainda vou querer saber o que você coloca nessa sua receita,
seu risoto fica muito melhor que o meu — brinquei degustando um dos
vinhos que meu pai sempre dizia que guardava para ocasiõ es especiais.
— Nã o seja modesto, meu filho, já provei o seu e é divino, nã o tenho
segredo, acho que deve ser a qualidade dos ingredientes. — Piscou para
o meu pai, seu cú mplice de anos.
— Ava, seu filho está cada dia mais especialista na arte de cozinhar. Eu
me aproveito disso obviamente, pois cozinhar nã o está nas melhores
coisas que sei fazer. — Lucy odiava tudo que tinha a ver com atividades
do lar.
— Mas, pelo menos, você sabe apreciar uma boa comida e reconhece
meu talento de chef — brinquei, segurando sua mã o.
Decidi fazer o meu casamento dar certo e convencer a minha mulher
que estava na hora de termos um filho, contudo seria uma tarefa á rdua,
Lucy nunca foi muito maternal. A maioria dos nossos amigos já tinham
filhos, mas nem isso a fazia sentir mais animada.
O jantar foi ó timo, as mulheres ficaram conversando sobre decoraçã o e
arte, enquanto eu e meu pai estávamos na biblioteca relembrando os
velhos tempos, nó s sempre fomos muito parceiros. Enquanto papai
degustava seu whisky, eu resolvi pegar um livro da sua biblioteca. O
acervo dele era impressionante, com verdadeiras relíquias.
Enquanto deslizava os dedos nas lombadas dos livros, como sempre
gostava de fazer desde criança, vi um envelope em uma bandeja de
prata. Imediatamente meus olhos foram para o selo de fechamento do
envelope, era um delicado lírio rosa. A curiosidade me dominou e peguei
o envelope, nã o demorou um segundo para saber que conhecia aquele
desenho.
— Lindo, nã o é, Blake? Abra, é o convite do lançamento da nova coleçã o
de joias da Beatrice. Eu e sua mã e iremos, se você e a Lucy quiser nos
acompanhar, a Bea vai ficar muito feliz em te reencontrar — papai
comentou enquanto preparava seu charuto, um velho há bito. Mesmo
que mamã e reclamasse do cheiro, ele dizia que era para chamar o sono.
Permaneci de costas, pois nã o queria que ele percebesse que, mesmo
todos achando que eu e a Beatrice tivemos um apenas um namorico de
férias, tudo o que aconteceu entre nó s dois naquela época, mexia comigo
até hoje. Eu só nã o deixava a saudade me dominar. A decisã o foi tomada
lá atrá s.
— Vou falar com a Lucy, mas acredito que a agenda dela esteja bem
complicada ainda, nã o sei se conseguirá comparecer. A Liv nã o virá ? Elas
sã o tã o ligadas desde crianças, imagino que ela queira estar aqui para
prestigiar a amiga.
— Ela ligou para a Bea avisando que nã o virá , mas quer fazer uma
surpresa. Como o evento será na sexta-feira, sua irmã deverá chegar
aqui na véspera. É bem a cara da Liv aprontar essas coisas.
Nem com o passar dos anos, minha irmã mudou sua personalidade, uma
eterna bagunceira, sempre aprontando com todos.
— Faz anos que nã o encontro a Bea, ela e a Liv nã o se desgrudavam. —
Nã o quis me mostrar muito interessado, mas estava curioso para saber
como ela estava.
— Continua do mesmo jeito, meu filho, a diferença é que agora sã o duas
lindas mulheres bem-sucedidas. Quando a Liv vem para cá , elas nã o se
de desgrudam, se transformam em duas adolescentes. Ficam horas na
piscina conversando, rindo, à s vezes passam a tarde toda assistindo
filmes antigos. Do mesmo jeito que faziam antigamente. É bonito de ver
uma amizade tã o grande assim, desde criança.
Dei uma olhada no convite, o coquetel seria em uma badalada joalheria
na Quinta Avenida, talvez eu fizesse uma surpresa também, fazia tanto
tempo que nã o nos víamos. Desde que estou com a Lucy, nos vimos
pouquíssimas vezes.
Depois do nosso rá pido envolvimento, eu e a Beatrice nos encontramos
em eventos das nossas famílias, ela cada dia mais linda, segura de si, em
momento algum deixou transparecer qualquer desconforto na minha
presença. Eu, ao contrá rio, ficava completamente encantado, tentava
disfarçar, mas, em uma ocasiã o, a Olívia até me chamou a atençã o.
— Se nã o vai assumir seus sentimentos, deixe minha amiga em paz,
Blake, ela já sofreu muito. — Olívia sempre saía em defesa da amiga. Eu
entendia sua posiçã o, porque eu tinha uma meta de vida e estava firme
construindo o meu futuro.
A ú ltima vez que vi Beatrice, foi quando já estava de casamento marcado
com Lucy, fizemos uma viagem a Paris para participar de um congresso.
Em uma noite, alguns médicos se reuniram para beber e relaxar, Lucy
preferiu ir para o hotel descansar, entã o acompanhei os meus colegas a
uma boate, onde ficamos em uma á rea reservada.
Em determinado momento, eu me aproximei do local, onde, de cima,
conseguia ver a pista de dança, fiquei ali observando as pessoas e, para a
minha surpresa, pisquei os meus olhos sem acreditar, mas lá estava ela,
linda, com um vestido grudado ao corpo, os cabelos soltos estavam mais
curtos na altura dos ombros. Em determinado momento, as luzes
começaram a piscar, criando uma ilusã o como se os movimentos fossem
em câ mera lenta, ela parecia flutuar. Feliz como sempre a vi. Fiquei
preso algum tempo naquela visã o, pensando em como teria sido se
tivéssemos levado em frente o nosso envolvimento. Naquele tempo, meu
ú nico propó sito era me tornar exatamente o que era hoje: um médico
reconhecido e realizado. Nã o poderia dar a Beatrice a atençã o que ela
merecia, ela sempre foi muito especial.
Em um ato totalmente impensado, pedi ao garçom uma caneta e um
guardanapo, sabia que isso era uma loucura, mas nã o me contive,
desenhei um lírio bem parecido com o que ela desenhou para mim e que
depois serviu de inspiraçã o para o pingente que a presenteei em seu
aniversá rio de vinte anos, quando tudo aconteceu. Tentei retratar
exatamente o desenho da joia e fiquei com aquele guardanapo por
vá rios minutos sem saber o que fazer. Voltei a observá -la, vidrado em
seu sorriso solto, em como seu corpo se movia, até que vi um homem
abraçá -la por trá s, depois ele a virou e trocaram um longo beijo. Eu nã o
tinha o direito de me importar com isso, afinal me casaria em breve, mas
meu sangue ferveu e sem raciocinar direito chamei o garçom
novamente, dei-lhe uma gorjeta e pedi que levasse o guardanapo até
Beatrice.
Fiquei observando, para minha sorte o cara que a acompanhava se
distraiu com as outras pessoas que estavam com eles. Quando ela
recebeu o guardanapo, ficou alguns segundos está tica, achei que ela nã o
se lembraria, entã o começou a olhar por todos os lados, ansiosa, quando
finalmente olhou para cima em minha direçã o, nossos olhos se
encontraram e foi como se todos sumissem. Congelei no seu olhar e, em
fraçã o de segundos, me transportei para aquele bangalô nos Hamptons.
Nã o fizemos nada, nenhum sorriso, nenhum aceno, absolutamente nada.
Só a energia do nosso olhar nos conectava.
Aproveitei que uma pessoa a chamou e fugi como um bandido que
cometeu o pior dos crimes. Saí imediatamente da boate com taquicardia
como um adolescente e com um sentimento de culpa enorme, afinal
Lucy estava no hotel.
— O que os meus meninos estã o fazendo aqui, reuniã o secreta dos
homens Lancaster? — A voz da minha mã e me trouxe de volta dos meus
pensamentos. Ela entrou na sala acompanhada de Lucy, que já estava
impaciente.
— Vamos, Blake, amanhã tenho uma reuniã o no primeiro horá rio e você
tem uma cirurgia importante.
— Sim, claro, você tem razã o. É que quando entro nessa biblioteca sinto
o tempo parar e me esqueço de tudo.
— Verdade, filho, você estava com esse livro na mã o e um sorriso no
rosto parecendo estar em uma viagem bem longe daqui — meu pai
brincou, mas no fundo ele estava com razã o, viajei sim, lembrando-me
da ú ltima vez que vi Beatrice.
— Meu sogro, isso agora é muito comum, Blake tem estado assim de vez
em quando, à s vezes tenho que chamá -lo vá rias vezes para trazê-lo de
volta para a Terra — Lucy alfinetou, ela ficava irada quando me pegava
em um momento “mundo da lua”.
Abracei-a e dei um beijo em seu rosto, mas esse gesto a fez se afastar
com a desculpa de se despedir dos meus pais. Acho que a cada dia nó s
estávamos sim nos afastando, mas ela nã o se abria, antes só tinha esse
tipo de comportamento quando abordava o tema de filhos, mas de uns
tempos para cá eu observei que ela estava cada dia mais distante. Até no
sexo nã o a sentia totalmente entregue como já fomos um dia, parecia
tudo muito mecâ nico, sem muita emoçã o.
Saímos da casa dos meus pais, trocamos poucas palavras no percurso
até o nosso apartamento. Assim que chegamos em casa resolvi beber
uma dose de whisky e pedi que me acompanhasse, mas Lucy disse que
estava muito cansada e preferia dormir. Me deu um beijo casto e mais
uma vez fiquei sozinho, o que me fez pensar que talvez salvar o
casamento, fosse algo que passasse somente pela minha cabeça. Talvez
para ela tudo estava assepticamente em ordem.
Acabei desistindo do whisky, peguei uma á gua com gá s com bastante
gelo e sentei-me em uma chaise12 na á rea da piscina. Ainda bem que o
meu sogro tinha esse apartamento disponível, minha prioridade
sempre foi uma cobertura com piscina, justamente para aproveitar uma
noite como a de hoje, que, apesar de ser verã o, estava com uma
temperatura agradável.
Beatrice apareceu mais uma vez em minha cabeça, aliá s, isso era uma
coisa que estava acontecendo com muita frequência, desde que me
mudei para Nova Iorque. Eu nunca esqueci aquela noite, por muito
tempo me culpei por ter cedido aos encantos daquela menina-mulher, eu
fui seu primeiro homem e sabia o quanto isso significou.
Beatrice sabia que nã o ficaríamos juntos depois de tudo. Quando me
disse na ocasiã o que estava apaixonada, fiquei lisonjeado, ela nã o sabia,
mas já era muito importante para mim. Fazia algum tempo que a olhava
diferente, percebia a mudança do seu corpo, do seu comportamento e
sua maneira leve de encarar a vida. A cada dia se transformava em uma
bela mulher, forte com um objetivo claro: sempre quis ser uma designer
de joias bem-sucedida e conseguiu. Naquela época estávamos em
momentos diferentes, ela ainda começando a realizar os seus sonhos,
entã o de forma egoísta, apó s três maravilhosos dias juntos nos curtindo,
eu a deixei, com meu coraçã o realmente triste, pois sabia que a faria
sofrer, mas nã o havia outro jeito. Fui embora sem olhar para trá s.
Quando voltei para Londres por vá rias vezes quis ligar, ouvir sua voz,
mas nã o queria dar falsas esperanças, já tinha o meu destino traçado e,
naquele momento, nã o havia espaço para o meu lírio, entã o segui minha
vida. Quando eventualmente nos encontrávamos, nos falávamos como se
nada tivesse acontecido, mas no fundo eu sabia que a histó ria toda nã o
ficou bem resolvida.
Quando a vi na boate, foi o ú nico momento que vacilei e acabei me
comportando como um cafajeste, nã o deveria ter enviado aquele bilhete,
estava noivo, de casamento marcado, mas nã o resisti. Foi realmente uma
loucura, um ato impulsivo que poderia ter gerado consequências
bastante complicadas.
No outro dia, claro que a Olívia me ligou para me passar um sermã o.
Lembrava-me de suas duras palavras até hoje. Mas realmente nada
justificava o que eu fiz, mas quer saber... Todo o risco valeu a pena
quando aqueles olhos brilhantes viraram em minha direçã o.
— Beatrice, acalme-se, você já fiscalizou os detalhes umas cinco vezes,
nã o se preocupe, está realmente tudo sob controle. Você nã o confia em
mim? — Helena aproximou-se tentando me acalmar.
— Claro que confio em você, Nena, mas ninguém nunca entenderá .
Sempre fico agoniadíssima até finalmente perceber que as minhas joias
foram bem aceitas no mercado. — Peguei uma taça de champanhe para
tentar me acalmar.
— Entã o venha comigo, vamos retocar a maquiagem, os seus convidados
chegarã o em breve. — Minha amiga tinha razã o, agora era só curtir a
festa. Alguns instantes depois, vi meus pais chegando.
— Filha, você está linda. — Meu pai, como sempre muito carinhoso, me
abraçou longamente, agora sim, estava confortável, ele tinha o poder de
me acalmar.
— Acho um absurdo o quanto que as mulheres Tomarolli sã o lindas,
estou me sentindo o patinho feio da noite.
Helena fez biquinho, querendo elogio, claro. Ela era uma mulher
belíssima.
— Minha querida, você está tã o deslumbrante quantos as minhas
meninas, esse vestido lhe caiu muito bem. — Meu pai era um
galanteador, sempre pronto para levantar o moral de qualquer mulher.
— Ok, Vincenzo, acredito em você. Entã o vamos fazer um brinde a Soul
Colors, que sem dú vida já é um sucesso. — Helena estava muito feliz com
o resultado do seu trabalho, que sempre era impecável.
Brindamos, conversamos um pouco, até que meu estresse foi sumindo à
medida que as pessoas chegavam. Em pouco tempo, a joalheria já estava
cheia de pessoas elegantes, mulheres lindas e encantadas com minhas
criaçõ es.
— Olha só quem acabou de chegar, srta. Tomarolli?! — Helena piscou
para mim com uma cara safada e todos olharam na mesma direçã o.
Lá estava Miguel, elegantíssimo com um terno sob medida, ele
impressionava por onde passava, cumprimentou algumas pessoas, mas
nã o tirava os olhos de mim. Quando aproximou do nosso grupo, o
apresentei aos meus pais, minha mã e me olhou de soslaio com ar de
aprovaçã o.
— Você está deslumbrante, Beatrice, e agora sei a quem puxou, você é a
có pia da sua mã e. — Mamã e abriu seu sorriso mais charmoso
agradecendo o elogio.
Meus pais saíram com Helena para cumprimentar algumas pessoas, me
deixando com Miguel, que nã o parava de me elogiar. Ele era um homem
interessante, educado, parecia que estava interessado em mim, talvez eu
precise seguir os conselhos da Helena e finalmente deixar o meu coraçã o
se apaixonar novamente.
— Bea, dessa vez vou ficar um bom tempo aqui em Nova Iorque e quero
muito te conhecer melhor, por favor, nã o fuja de mim. — Miguel enlaçou
minha cintura delicadamente e beijou os meus lá bios docemente.
Este homem parece ter uma boa pegada, dizem que os espanhó is têm o
sangue quente, acho que terei que fazer a minha pró pria avaliaçã o.
Estava tã o envolvida nos braços dele que nã o percebi quando tio Alex e
tia Ava se aproximaram.
— Bea querida, que festa maravilhosa. — A mã e de Olívia chamou minha
atençã o. Desvencilhei-me dos braços do espanhol e abracei a mulher
que era quase uma segunda mã e para mim.
— Que bom que vocês vieram, fiquei tã o triste quando a Liv ligou
avisando que nã o viria. Ainda estou pensando se a perdoarei por isso.
— SURPRESAAAAA!
Quando me virei, a louca da minha amiga estava atrá s de mim em carne
e osso. Nã o podia acreditar que ela pregou essa peça em mim. Já deveria
estar acostumada, Olívia sempre aprontava algo, desde novinha sempre
foi assim.
— Olívia, sua maluca! Quer me matar do coraçã o? Saiba que eu estava
seriamente chateada com você! — resmunguei abraçando a minha
melhor amiga.
— Ficou louca, Bea, você realmente achou que eu perderia algo tã o
importante como o lançamento da Soul Colors? Nunquinha! — Ficamos
alguns minutos abraçadas, dizendo palavras carinhosas, quando me dei
conta de que tinha praticamente deixado Miguel de lado.
— Que mal-educada! Me empolguei com a chegada da Liv. Deixe fazer as
apresentaçõ es, Miguel Ortiz esta é minha amiga-irmã , nos conhecemos
quando éramos crianças e nã o nos largamos mais e seus pais, Ava e Alex
Lancaster.
— Muito prazer, Miguel. Amiga, você nã o tinha comentado que o
espanhol era tã o lindo.
— Liv querida, estou aqui. — David fingiu ciú me. Nem tinha me dado
conta da presença do marido da Olívia, logo o abracei também.
— David, você é o meu amor, lindo demais também, fiz apenas um
comentá rio inocente e respeitoso. — Todos achamos graça da
espontaneidade da Olívia moleca de sempre.
— Muito prazer, Olívia e David, senhor e sra. Lancaster. Estou feliz em
conhecer vocês e, principalmente, saber que pelo menos a Beatrice falou
de mim para a sua melhor amiga.
Amei como meu nome foi dito com o sotaque espanhol, Miguel pouco à
vontade com meus amigos, ainda cheio de formalidades, segurou e
beijou a minha mã o.
A uma certa altura da festa, Helena informou que eu teria que falar algo
para os convidados. Esta era uma parte que nã o gostava muito, mas
necessá rio. Entã o ela fazia, à s vezes, de mestre de cerimô nia,
agradecendo a presença dos convidados, da imprensa e, sem muitas
delongas, me chamou até o pequeno palco montado com a logo da Lily
Jewelry ao fundo.
Mesmo já acostumada com tudo isso, ainda ficava com o coraçã o
acelerado e a boca seca. Iniciei agradecendo novamente a todos os
presentes, expliquei como essa nova coleçã o foi criada, a inspiraçã o, a
qualidade das peças, de onde vieram as pedras preciosas. Ao final, muito
aplaudida e extremamente feliz, senti-me quase totalmente realizada,
digo quase, pois ainda precisava amar e ser amada plenamente, essa era
uma parte da minha vida que estava vazia, mas esperava em breve
resolver isso.
Fiquei algum tempo sendo parabenizada pelos convidados, alguns
amigos, até que, quando cheguei ao grupo da minha família, Olívia muito
emocionada, me abraçou longamente e quase choramos.
— Filha, nó s estamos muito orgulhosos da mulher que você se tornou.
Talentosa, focada em realizar todos os seus sonhos e linda demais. —
Mamã e sempre foi uma incentivadora de tudo na minha vida. Tinha
muita sorte, meus pais eram sensacionais.
— Cariño13, você fala muito bem em pú blico, nã o sei por qual motivo
fica nervosa, foi brilhante.
— Miguel, você está sendo gentil, nã o imagina como minha mã o estava
suando.
— Mas nã o deixou transparecer nada, você é um sucesso e já quero toda
a Soul Colors para mim.
— Charlotte, que bom que você pô de vir. — Minha mais nova amiga
estava radiante em um vestido azul de dar inveja, como sempre
esfuziante.
— Jamais perderia esse evento, minha querida.
— Miguel, seu danadinho, já está aí marcando seu territó rio com a
italianinha, nã o é mesmo? — Charlotte falou baixinho, mas ainda assim
eu consegui ouvir.
— Charlotte, tenho que te agradecer até o fim dos meus dias por ter me
apresentado esta artista linda e talentosa. — Já estava ficando
encabulada com as indiretas de Miguel. Ficava um pouco tímida, quando
era elogiada.
Ficamos ali conversando, todos superintegrados, mas Miguel era o
assunto da vez. Olívia estava curiosa para saber em que pé estava o meu
flerte com Miguel, meus pais demonstravam interesse pelo trabalho
dele, principalmente quando ele comentou sobre a sociedade da galeria
junto com a Charlotte. Minha mã e era artista plá stica, entã o este era um
dos seus assuntos preferidos.
Miguel, já mais descontraído, nã o se incomodou nem um pouco em ser o
centro das atençõ es e só largava minha cintura quando Helena me
chamava para falar com um dos convidados.
Quando voltava do toalete, um garçom me abordou e me entregou um
lírio rosa. De sú bito congelei no mesmo segundo.
— Por que você está me entregando essa flor? — quis saber.
— Um cavalheiro que estava aqui, pediu que entregasse à senhora.
Agradeci com a minha respiraçã o acelerada.
Não acredito que Blake está aqui, isso só pode ser uma brincadeira de mau
gosto. Por qual motivo ele continua fazendo isso? Percorri todos os cantos
da joalheria com um “olhar de lince”, contudo nã o o encontrei. Claro que
ele não se aproximaria. Covarde. Eu estava espumando de raiva.
— Bea, o que aconteceu? Você está com o rosto em chamas. — Olívia viu
que eu estava transtornada. Quando chegou mais perto, viu o lírio em
minhas mã os e nã o foi necessá rio falar nada. — Eu nã o acredito que o
Blake veio! Ele me disse que queria vir, mas eu o proibi de aparecer. —
Olívia estava tã o irada quanto eu.
— Como sempre, ele foge. O que ele quer de mim? Ele está casado e
ainda se lembra da flor que amo, me espiona e nã o tem coragem de se
aproximar.
— Bea, ele deve ter visto Miguel com você e nã o quis criar um clima,
afinal há anos que vocês nã o se encontram. — Ela tentou me acalmar,
sem sucesso.
Voltamos ao toalete, tentei me recompor e conter as lá grimas que
teimavam em aparecer, só depois de me sentir mais calma voltamos para
o salã o. No final da noite, saímos todos para um restaurante comemorar
o sucesso da nova coleçã o. Foi a melhor coisa que fiz, inicialmente
queria ir para casa me afogar nas lembranças, mas com tantos motivos
para celebrar, nã o ia me abater.
Blake voltou, mas estava casado, eu tinha que tirá -lo do meu coraçã o
definitivamente. Miguel estava totalmente à vontade com meus pais e
com meus amigos, resolvi que, se ele realmente quisesse, estava
disposta a nos dar uma chance.
Encerramos a noite à s duas da manhã , estava morta de cansada,
sentindo muitas emoçõ es em um ú nico dia. Quando Miguel me deixou
em casa, ele me acompanhou até o elevador. Como nã o o convidei para
subir, ele se despediu com um beijo longo, invadindo de leve a minha
boca e eu correspondi.
— Você está me deixando louco, Bea. Almoça comigo amanhã ? —
sussurrou em meu ouvido. Nã o sabia o que mais me excitava, se era sua
voz meio rouca ou seu sotaque.
— Claro que sim.
— Entã o passo aqui, à s 13h, para te pegar. — Beijou-me novamente,
dessa vez ainda mais intenso, depois se foi.
Tomei um longo banho, fiz um chá de camomila e decidi que nã o
deixaria o Blake povoar os meus pensamentos. Consegui? Claro que nã o.
Demorei a pegar no sono, fiquei rolando na cama por um bom tempo.
Passei todo o dia pensando no evento da Beatrice, ao mesmo tempo que
estava louco para vê-la novamente, o bom senso sinalizava que essa
seria mais uma atitude imprudente da minha parte. Até comentei com
Lucy, achando que ela gostaria de ir, já que amava joias, mas ela nã o se
animou, disse inclusive que chegaria tarde em casa, pois tinha muita
coisa para organizar no hospital.
Na hora do almoço, aproveitei a calmaria da sala dos mé dicos, peguei
meu notebook e coloquei na pesquisa o nome de Beatrice Tomarolli,
coisa que tinha deixado de fazer há muitos anos. Em segundos, uma
enxurrada de fotos dela em vá rias ocasiõ es preencheu a tela. Vá rias
maté rias ressaltavam o seu talento, sua beleza e a rapidez como caiu no
gosto dos artistas e do mundo fashion14.
Acreditava que esse estado morno em que meu casamento se
encontrava, estava me fazendo lembrar muito daquela menina, que no
passado abalou o meu coraçã o. Sabia que nã o era correto, porque eu nã o
era esse tipo de homem, nunca traí a Lucy. Quando nos casamos, achei
que seria para sempre, mas agora estava verdadeiramente em dú vida, já
nã o tínhamos mais o mesmo entrosamento do começo do casamento.
Nã o conseguia identificar onde foi que tudo começou a mudar. Ainda
queria que desse certo, mas as lembranças da Beatrice estavam mais
vivas do que nunca.
Hoje, que consegui sair mais cedo do hospital, achei melhor nadar um
pouco, assim esfriava temporariamente essa tormenta mental. Nadei por
uns quarenta minutos e resolvi que iria ao lançamento da Soul Colors; eu
amei esse nome. Desde jovem, a intensidade era uma marca registrada
da Beatrice, sua alma estava em tudo que fazia.
Passei na casa dos meus pais, Olívia tinha chegado no dia anterior,
estava morrendo de saudades da minha irmã zinha.
— Uau, que gato! Você está lindo, meu irmã o. — Como sempre fez, Olívia
pulou em meu colo como uma menininha.
— Isso tudo é saudade, pequena?
— Muita saudade de você, dr. Lancaster, quero saber de tudo, como está
sua vida, se já se adaptou à s novas funçõ es, mas agora eu preciso me
arrumar, tenho um compromisso que nã o posso deixar de ir.
— Quer dizer que estou sendo deixado de lado? Eu nã o posso acreditar
nisso! Onde está aquela saudade toda, que nã o largaria do meu pé
quando chegasse aqui, blá -blá -blá . Tudo conversa fiada, é isso mesmo,
garota?
— Nã o, irmã o, eu realmente estou com muita vontade de me jogar no
sofá e ficar grudada em você até esgotarmos todos os assuntos, mas é
que hoje a Bea está lançando a sua nova coleçã o de joias, eu disse que
nã o viria prestigiá -la, só para ver a cara de surpresa daquela tontinha.
Claro que eu jamais deixaria de vir.
Minha irmã era a rainha da pegadinha, nã o conseguia lembrar quantas
vezes ela aprontou comigo.
— Eu já sabia, a mamã e me contou que você iria aprontar. Mas me dê
cinco minutos da sua ilustre presença, seu velho irmã o passou aqui só
para te ver. — Fiz cara de cachorro que caiu da mudança.
— Entã o vamos lá para o meu quarto. Enquanto me arrumo,
conversamos um pouco.
Olívia pegou minha mã o e saiu me puxando. Tive uma espé cie de déjà
vu15, quando ainda criança me puxava da mesma forma para brincar
com ela e suas bonecas.
Ao chegarmos em seu quarto, o caos estava formado. Como sempre
acontecia quando ela ia sair, minha irmã fazia uma bagunça espetacular
até escolher a roupa.
— Por Deus, Liv, você nã o muda! Tenho pena do David que convive com
isso diariamente. — Sentei-me em uma poltrona que, por sorte, nã o
tinha roupas em cima.
— O David me ama do jeitinho que sou. Em minha defesa, quero dizer
que nossa casa é um exemplo de organizaçã o, o problema é que, quando
decidimos vir, acabei deixando para fazer a mala no ú ltimo minuto,
entã o coloquei um monte de roupa para escolher aqui, o que ficaria
melhor para a ocasiã o.
— Tá bom, vou fingir que você é uma esposa exemplar. — Joguei uma
almofada em sua direçã o. — Liv, estou querendo dar uma passada lá na
Bea. Será que ela se incomodaria? Faz tanto tempo que nã o nos vemos
e...
— Nem termina, Blake — cortou-me bruscamente. — Acho uma
péssima ideia, por mais que tudo o que aconteceu com vocês tenha
ficado no passado, acredito que ela nã o ficará totalmente à vontade,
ainda mais que ela ainda nem conheceu a Lucy.
— A Lucy nã o vai, está com muito trabalho no hospital. — Dei de
ombros.
— Ainda assim, nã o acho uma boa ideia, principalmente agora que ela
está começando um relacionamento. Você foi seu primeiro amor, tenho
certeza de que a Bea vai ficar constrangida.
Começando um relacionamento?
Lá pela quarta troca de roupa, minha pequena bagunceira decidiu pô r
um vestido preto com dourado, que a deixou perfeita.
— Agora vou fazer a maquiagem. Mas ainda tenho tempo, David avisou
que vai demorar um pouco, está em reuniã o com alguns empresá rios e
papai ainda nã o chegou. Mas, sério, pense direitinho, é uma ocasiã o
muito importante para ela, outro dia vocês se encontram, quem sabe
mamã e faz um jantar e vocês conversam um pouco, sem a pressã o de
hoje.
— Como sempre, você está com razã o, vou para casa, estou faminto. —
Levantei-me, beijei seu rosto e fui embora, convencido a nã o atrapalhar
a noite da Beatrice.
Cheguei em casa e, antes mesmo de tomar banho, preparei uma omelete
enorme, tinha uma salada na geladeira que a nossa funcioná ria deixou
pronta e sentei-me para comer com calma. Depois do banho, escolhi um
filme para assistir, quando pensei em dar uma passadinha na tal festa.
Ficaria pouco tempo, só daria uma olhada rá pida. Que mal havia nisso?
Beatrice nã o precisava nem me ver.
Com esse pensamento martelando em minha cabeça, nã o pensei duas
vezes, pulei da cama e troquei de roupa, quando dei por mim já estava
na entrada da joalheria. Tinha muita gente circulando, um sucesso
realmente. Me posicionei estrategicamente em um local que me deu uma
boa visã o de tudo, mas de maneira que nã o ficasse exposto.
Cheguei no exato momento em que Beatrice foi chamada para falar
sobre as suas joias. Enquanto ela falava com tanto entusiasmo e emoçã o,
passava um filme em minha cabeça. Nos dias em que ficamos juntos, ela
falava com verdadeira paixã o sobre seu projeto, de ser uma designer de
joias com reconhecimento internacional. Via agora o mesmo brilho em
seus olhos daquela época.
Quando Beatrice terminou de falar, foi aplaudida e as pessoas a
cercaram parabenizando, ela estava radiante. Finalmente vi o tal cara
que ela estava namorando ou sei lá o quê, pareciam bem íntimos,
trocando carinhos, ele tocava nela com possessividade.
O que senti nã o soube explicar, mas foi um gosto amargo na boca. Eu nã o
tinha o direito de sentir nada, a opçã o de partir e deixá -la para trá s foi
minha. Nã o podia chegar agora depois de tanto tempo, aparecer em sua
vida e, pior, estando casado. Não, isso é loucura, vou embora.
Quando me virei para sair, dei de cara um arranjo de lírios rosa, claro
que seria sua escolha para a decoraçã o. Será que ela ainda tinha o
pingente que dei de presente? Fiquei alguns segundos pensando se
cometeria mais um desatino, além de ter me despencado para cá . Em um
impulso, tirei um lírio do arranjo e da mesma forma que fiz na boate há
alguns anos, chamei um garçom e pedi que entregasse a flor à dona da
festa.
Para piorar ainda toda a situaçã o, me escondi mais ainda e fiquei
observando sua reaçã o quando recebeu o lírio. Seu rosto, que estava
lindo, se transformou. Correu os olhos pelo salã o, ela obviamente
entendeu que eu estava por perto. Podia jurar que, mesmo tã o distante,
percebi seu rosto enrubescer.
Olívia se aproximou, claro já entendendo tudo, vasculhou todo o
ambiente também, em seguida as duas saíram em direçã o ao que
pareceu ser o toalete. Sabia que ainda hoje levaria outro sermã o da
minha irmã zinha. O pior que, mais uma vez, ela estaria com razã o.
Nã o sabia o que acontecia comigo quando o assunto era Beatrice, eu
perdia toda a noçã o do que era certo ou errado e metia os pés pelas
mã os sempre.
Finalmente, me movi e retornei para casa, agradeci aos céus que, quando
cheguei, nã o tinha nem sinal da Lucy. Ficaria sozinho por um tempo.
Tomei outro banho e fiz o que deveria ter feito anteriormente, escolhi
um filme para distrair os pensamentos recorrentes sobre a grande
merda que fiz hoje. O celular tocou e nem precisei olhar para saber
quem era, demorou até demais.
— Blake, você não ouviu uma palavra do que conversamos, não acha que
está atrasado pelo menos uns oito anos? Agora, do nada quer reaparecer
na vida da minha amiga. Como se isso ainda não fosse suficiente, você é
casado! — disparou berrando em meu ouvido.
— Calma, Liv, nã o aconteceu nada demais. — Quis minimizar a situaçã o
vexató ria em que me meti.
— Como é, Blake Lancaster? — Quando colocava o sobrenome junto, com
uma voz nada calma, era porque ela estava muito puta comigo. — Você
mandou entregar um lírio, o bendito lírio rosa. Você acha que isso não
mexeria com ela? Perdeu o juízo?
— Eu sei, você está coberta de razã o, foi uma grande merda mesmo. Mas
eu juro que nã o farei mais nenhuma abordagem, eu vi que ela está com
alguém e nã o tenho direito algum de atrapalhar sua vida, essa nunca foi
a minha intençã o. Acredite em mim, eu nã o sou um mau-cará ter.
— Não é, mas está se comportando como tal. Já esqueceu o episódio da
boate? Você está repetindo o mesmo padrão. Por Deus, Blake, deixe-a em
paz, ela precisa seguir a vida, sem você ficar aparecendo feito um
fantasma.
— Calma, meu amor, você vai ter um ataque. — Ouvi a voz de David ao
fundo tentando acalmá -la. Ela estava furiosa.
— Liv chega, ok? Nã o vai voltar a acontecer, nunca mais eu farei
qualquer coisa que possa atrapalhar a vida de Beatrice. Prometo. —
Passei a mã o nos cabelos, estava puto comigo, fiz papel de moleque.
— Espero que, dessa vez, você realmente cumpra o que está dizendo.
Depois nos falamos. — E assim Olívia desligou na minha cara. Eu mereci
isso.
Desisti do filme, nã o tinha cabeça para nada. Logo em seguida, Lucy
chegou uma pilha de nervos, tinha tido uma discussã o séria com o pai.
— Blake, acho que voltar para Nova Iorque talvez nã o tenha sido a
melhor decisã o, nã o sei se vou conseguir conviver com o meu pai, ele é
muito cabeça-dura, ainda está no século passado. Tudo de novo que
quero implantar, ele diz que vai pensar. Eu nã o vou aguentar isso por
muito tempo. — A mulher estava espumando de raiva.
— Calma, querida, você está muito tensa, vá tomar um banho, tente
relaxar um pouco. Quer que eu prepare algo para você comer? — Tentei
fazê-la desacelerar.
— Nã o, eu comi umas besteiras no hospital, mas agradeço se preparar
um daqueles chá s calmantes que você gosta. Eu juro que vou infartar, se
todos os dias tiver esse tipo de embate com o poderoso dr. Andrew. Vou
tomar um banho, nã o demoro. — Saiu pisando duro.
Vinte minutos depois, ela entrou na cozinha, aparentemente mais calma,
bebeu o chá e disse que precisava dormir.
Acho que hoje eu estava realmente precisando de algo mais forte do que
um chá , servi-me de um pouco de whisky e, mais uma vez, fui relaxar na
á rea da piscina. Esse lugar estava se tornando o meu local predileto na
casa.
— Bea, faz mais de duas semanas que a Soul Colors é comentada nas
principais revistas e jornais de todo país, é um sucesso estrondoso. O
pró ximo evento de celebridades promete, tenho certeza de que vá rias
famosas desfilarã o com alguma peça da Lily Jewelry.
Helena nã o cabia em si de tanta satisfaçã o com o resultado do evento,
fizemos muitos contatos, fechamos vá rias parcerias com grandes
estilistas, enfim, estávamos conseguindo o nosso espaço. O crescimento
da empresa de forma orgâ nica, só me fazia acreditar que estávamos no
caminho certo.
— À s vezes, nem acredito que tudo o que sonhei desde criança está
finalmente sendo realizado, lembro como se fosse hoje, quando passava
horas desenhando ainda sem definir qual caminho seguiria. — Recostei-
me na cadeira, colocando os pés na mesa como sempre amei fazer. “Isso
não é elegante, minha filha”, a voz da mamma veio em minha mente me
fazendo rir.
— Amanhã teremos reuniã o com o empresá rio de uma das atrizes mais
badaladas do momento, ela quer encomendar um conjunto de colar e
brincos exclusivos para usar na pró xima cerimô nia do Oscar e faz
questã o que seja algo da srta. Tomarolli. — Helena se levantou da
cadeira e saiu dançando pelo escritó rio.
— Gostaria de saber o porquê de estar sempre cercada de pessoas
completamente loucas. — Joguei uma bolinha de papel na minha amiga,
cujo juízo passou longe.
— Minha querida, esse meu lado criativo ajuda muito o seu lado
seríssimo. Formamos uma dupla e tanto. Mas agora me conta, como
anda o romance com o espanhol gato? Nunca mais você comentou nada.
— Ele viajou ontem, volta no final de semana. Está indo tudo
maravilhosamente bem, Miguel é um homem encantador, educado,
atencioso, vive fazendo minhas vontades. Estamos indo bem, tenho
tentado ser mais leve, entretanto, como você já sabe, fico ainda com o pé
atrá s.
— Beatrice, vamos ao que interessa, quero saber da performance, faz jus
à sua aparência? Vamos combinar que o homem é lindo demais. —
Revirei os olhos, lá vinha a curiosa querendo saber de todos os detalhes.
— Sério, Nena? Quer entrar nessas minú cias? — Levantei-me e fui até o
frigobar pegar uma á gua para tentar me esquivar um pouco do inquérito
da minha amiga.
— É ó bvio que é sério, Bea, você quase nunca se envolve com alguém, o
ú ltimo homem que você ficou faz mais de um ano e ele foi despachado
com menos de dois meses de namoro, entã o eu quero saber sim,
senhora, se esse será mais um na sua lista a ser dispensado tã o logo você
enjoe do coitado ou é algo mais sério?
O pior que ela tinha razã o, todos os homens que passaram na minha
vida eram sempre comparados com Blake, nenhum chegava perto do
que senti com ele, mesmo em tã o poucos dias que ficamos juntos.
— Tá bom, senhorita curiosa ao extremo. — Peguei uma xícara de café,
enrolei um pouco, mas ela estava com aqueles olhos fuzilantes em cima
de mim. Vamos lá ... — O Miguel sabe o que faz. É cuidadoso, incansável,
prioriza o meu prazer. Acho que é a primeira vez que encontro alguém
que está realmente me fazendo bem — confessei.
— Uau, subiu até um calor pelo corpo! — gargalhando, a maluquinha
levantou-se abanando e pegou um copo com á gua.
— Você é insuportável, em pleno horá rio de trabalho me obriga a ficar
falando esse tipo de assunto. Vamos acabar com essa conversa, você nã o
vai arrancar mais nada de mim. Mas te garanto que estou me dedicando
seriamente, quem sabe finalmente me apaixonarei.
— Amiga, agora falando sério, fico feliz que está cogitando a
possibilidade de continuar com o Miguel. A cada dia que passa, você está
crescendo em sua profissã o, isso já é notó rio. O coraçã o é que precisa
encontrar um lugar seguro. Seu sonho sempre foi ter sua família, filhos.
Ainda é cedo para isso, eu sei, mas viva um dia apó s o outro, se permita
ser feliz com outra pessoa.
Segurando minha mã o com carinho, Helena tocou em um tema que
sempre me pegava pensando: filhos. Em meus sonhos, eu e Blake
formaríamos uma família, com um ou dois filhos, porém esse conto de
fadas, que só existia em minha cabeça, ficou no passado e atualmente a
prioridade estava sendo a minha carreira. Também nã o serei louca de
fantasiar algo com Miguel, nos conhecemos há pouquíssimo tempo.
Meus pés agora eram bem plantados no chã o.

Fazia tempo que nã o dava uma corrida no Central Park, hoje me


organizei e consegui sair um pouco mais cedo do trabalho, antes que
Helena começasse novamente o interrogató rio sobre o Miguel. Aquela lá
só vai sossegar quando finalmente me vir casada.
O parque nessa época do ano tinha uma beleza diferente, era um
verdadeiro espetá culo, a grama muito verde com as mais variadas flores
compunham um cená rio de filme, além disso o pô r do sol era um show
imperdível.
Depois de correr por quase uma hora, parei para beber á gua, estava
exausta, mas com a cabeça mais leve. Como sempre dizia uma amiga,
que era personal trainer: “Nã o existe arrependimento pó s-treino”.
Concordava demais com ela, estava me sentindo muito melhor agora.
Depois de me alongar e descansar um pouco deitada na grama, resolvi
tomar um shake de frutas maravilhoso que tinha aqui perto. Levantei-
me calmamente, já na expectativa de me deliciar com algo bem gelado.
Aguardei o sinal abrir e, quando estava atravessando a rua, escutei um
barulho ensurdecedor de pneu freando. Tudo aconteceu muito rá pido,
em milésimo de segundos, quando só entã o percebi que tinha sido
atingida.
— Socorro, por favor, alguém me ajuda, liguem para o 911, ela está
sangrando.
Ouvi uma voz feminina extremamente nervosa, o lado direito do meu
corpo doía muito, nã o conseguia abrir os olhos, tinha certeza de que bati
minha cabeça. Meu Deus, acho que fui atropelada. Não consigo me mexer.
Ouvi a sirene de ambulâ ncia, vozes de vá rias pessoas tentando me
chamar, mas nã o conseguia dizer nada, estava em choque, tinha que
avisar Helena.
— Alguém conseguiu descobrir o nome dela? — A mesma voz da mulher
supernervosa novamente quis saber.
— Ela deve ter algum documento nessa bolsinha que está em sua
cintura, mas é melhor nã o mexermos, os paramédicos já estã o chegando.
Calma, moça, a culpa nã o foi sua, nó s vimos que a van invadiu o sinal
fazendo com que seu carro fosse jogado em cima dela.
Continuava ouvindo a conversa das pessoas, entretanto, estava imó vel.
Alguns minutos depois, senti que estavam colocando algo no meu
pescoço, em seguida percebi que fui colocada em uma maca, onde
provavelmente me colocaram na ambulâ ncia.
Que dor forte, minha cabeça vai explodir.
— Vamos para o hospital que fica aqui perto, no final de Manhattan, já
liguei para lá , eles a estã o esperando. — Mais uma vez, ouvi a voz da
mulher, que, pelo que entendi, foi quem me atropelou. A partir daí nã o
consegui entender mais nada, provavelmente me deram alguma injeçã o,
estava me sentindo sonolenta.
— Que cirurgia demorada foi essa, Blake? Achei que nã o fosse terminar
nunca. Quando olhava para você, estava tã o concentrado que nã o
parecia estar cansado.
Kaleb e eu estávamos tirando a paramentaçã o cirú rgica, depois de quase
seis horas dentro do centro cirú rgico. Ainda bem que conseguimos
trazê-lo para Nova Iorque, era um anestesista muito experiente,
formávamos uma boa dupla, ficava bem mais tranquilo com ele durante
as cirurgias.
— Ao contrá rio do que parece, meu amigo, estou destroçado. Hoje nã o
vou nadar, acho que vou entrar na piscina e relaxar, nã o aguento nada
mais hoje — reclamei verdadeiramente exausto.
— Atenção, dr. Blake Lancaster, favor comparecer à emergência, da ala
norte. — A voz no sistema de som anunciava que meu dia ainda nã o
tinha terminado. Kaleb me olhou e nó s dois começamos a rir, de
desespero, claro.
— Nã o é possível, estã o de brincadeira. Eu nã o atendo na emergência
depois de uma cirurgia desse porte, meu nome fica sempre bloqueado
no sistema. Vou ligar, deve ser algum engano.
Quando liguei para a recepçã o da emergência, fui informado que Lucy
solicitou minha presença com urgência. Nã o consegui falar com ela, mas
fui informado que ela estava bem. Nã o imaginava o que podia ter
acontecido. Avisei ao Kaleb, que resolveu me acompanhar, entã o
descemos imediatamente.
— Blake, aconteceu uma coisa horrível, eu, eu... — Lucy estava muito
nervosa, chorando, nã o conseguia nem falar.
— Calma, Lucy, venha, sente-se aqui, você precisa se controlar. — Neste
momento, meu amigo lhe entregou um copo com á gua.
Ela respirou fundo e começou a relatar o ocorrido:
— Blake, eu nã o tive culpa, você sabe que eu sou muito cuidadosa no
trâ nsito. — Ela nã o conseguia explicar o que tinha acontecido.
— Você está bem? Pelo que estou entendendo houve alguma batida de
carro, é isso? — Tentei ajudá -la.
— Pior, Blake, eu atropelei uma pessoa. O sinal abriu para mim e,
quando avancei, uma van invadiu o sinal e meu carro foi jogado para o
outro lado da pista, acabei atropelando uma mulher. Oh, meu Deus, foi
tudo muito rá pido, eu nã o sofri nenhum arranhã o, mas a mulher ficou
bem ferida.
— Calma, querida, vai ficar tudo bem, você chegou a avaliar o estado da
mulher? Os sinais vitais.
— Nã o, nã o tive condiçõ es, liguei para o meu pai resolver o problema do
carro e vim com ela na ambulâ ncia. Percebi que está com vá rias
escoriaçõ es, mas nã o sei se corre risco de morte. Preciso que você vá vê-
la, eu nã o tenho condiçõ es nenhuma de acompanhar isso.
— Kaleb, eu sei que você está cansado, já estava até indo embora, mas,
por favor, fique com a Lucy, até que eu resolva tudo isso.
— Vá sossegado, Blake, vou ficar aqui. Pode ir tranquilo. — Meu amigo
segurou meu ombro para me acalmar.
Deus, espero que essa mulher esteja viva, Lucy não vai suportar se o pior
acontecer. Depois que me informei sobre a paciente, dirigi-me ao box da
emergência, onde ela estava sendo atendida por dois médicos.
— Boa noite, dr. Lancaster — um dos plantonistas me cumprimentou.
— Por favor, me atualize o quadro da paciente.
— Como ela está com um hematoma grande na testa e outro no lado
esquerdo do abdô men, já solicitei uma tomografia. Precisamos verificar
se há risco de hemorragia interna. Ela está sedada, os paramédicos
informaram que estava muito agitada.
— Se nã o se importa, gostaria de examiná -la também. — Meu colega fez
que sim com a cabeça e fui em direçã o da maca.
Quando cheguei mais perto, estaquei no mesmo instante. Um
sentimento de horror varreu o meu corpo, minha respiraçã o cessou e o
meu coraçã o acelerou. Fiquei catatô nico por alguns segundos.
— Dr. Lancaster, está tudo bem? Parece pá lido. — Nã o respondi nada ao
médico e me aproximei dela.
Como um pesadelo, ali deitada, completamente inerte, estava Beatrice
com um curativo na testa, mas dava para perceber que foi uma pancada
bem feia, o lado esquerdo do rosto estava bem inchado.
— Bea, você consegue me ouvir? Sou eu, Blake, fique tranquila, vai ficar
tudo bem — chamei seu nome e segurei sua mã o, mas ela nã o deu
nenhum sinal.
Imediatamente comecei a examiná -la, a partir desse momento eu assumi
tudo. Gritei pedindo urgência na tomografia, solicitei que já deixassem
uma sala de cirurgia de sobreaviso, por precauçã o. Em poucos minutos,
já tinha resolvido tudo.
Enquanto Beatrice estava fazendo a Tomografia Computadorizada, voltei
para ver como estava a Lucy, além disso, precisava falar com minha mã e
para avisar os pais da Beatrice.
Que loucura, que fatalidade, uma coincidência infeliz. Ela vai ficar bem,
ela precisa ficar. Eu não posso acreditar no que está acontecendo.
Quando finalmente encontrei Lucy, ela parecia mais calma e estava
deitada em uma maca. Kaleb veio em minha direçã o, também estava
tenso.
— Blake, achei melhor dar um calmante a ela, Lucy estava abalada
demais, agora parece bem melhor. — Puxei-o para um lugar mais
reservado. — O que aconteceu? Você parece em choque.
— Você nã o vai acreditar quem a Lucy atropelou. — Ele me olhou
curioso. — Beatrice. A minha Bea.
— Nã o, você só pode estar brincando, Blake! Qual o estado dela, é grave?
Ele sabia de tudo o que aconteceu comigo e Beatrice no passado, sempre
foi a favor de que eu a procurasse, pois sempre achou que a nossa
histó ria nã o tinha sido resolvida totalmente, inclusive era contra o meu
casamento, sem que esse tema tivesse sido totalmente resolvido em
minha cabeça.
— Acho que a vida está querendo me dar alguma liçã o, mas a Bea nã o
tem culpa do meu egoísmo no passado, nã o é justo ela passar por isso
agora. — Esfreguei a mã o no rosto, nervoso, cansado. Totalmente
perdido.
— Calma, você nã o disse que ela está fazendo os exames? Vamos
aguardar, sente-se um pouco.
— Agora nã o posso. Preciso avisar minha mã e, ela precisa dar a notícia
aos pais da Bea. Vou ligar também para a Liv, elas sã o como irmã s.
Depois que falei com minha mã e, que ficou extremamente nervosa, foi a
vez de eu ligar para a Olívia.
— Blake, o que você está me dizendo? Minha amiga pode morrer? Por
favor, não me esconda nada. — Olívia em prantos, gritando, nã o parava
de falar.
— Calma, Liv, ela está fazendo alguns exames, muito provavelmente
precisará fazer uma cirurgia. Estamos suspeitando de hemorragia
interna e, nesses casos, precisamos fazer um intervençã o de urgência.
— Meu Deus, isso não está acontecendo! Por favor, irmão, salve a Bea. Ela
é muito nova, tem a vida toda pela frente.
Tentei acalmá -la, mas a ligaçã o das duas era muito forte, Olívia estava
inconsolável.
— Eu nã o farei a cirurgia caso seja necessá rio, mas estarei o tempo todo
com ela. Nã o se preocupe, te manterei informada de tudo. Beatrice é
jovem, saudável. Ficará tudo bem.
— Eu não vou desgrudar do celular até você me dizer que ela está fora de
perigo, jure por tudo o que é mais sagrado que você vai me passar todas as
informações. — Ainda inconsolável, minha irmã só encerrou a ligaçã o
quando eu fiz o juramento que a manteria informada de tudo.
Como Kaleb já tinha encerrado seu plantã o, pedi que ele levasse Lucy
para casa, achei melhor ela nã o cruzar com os pais da Beatrice, seria a
primeira vez que se encontrariam e em uma situaçã o constrangedora,
bem desagradável.
No momento que recebi o resultado de todos os exames de Beatrice, os
pais dela, junto com os meus pais, chegaram ao hospital. Queria que
tivesse um buraco ali no meio do hospital, para eu sumir e nã o ter que
conversar com Katie e Vincenzo Tomarolli neste momento.
— Meu filho, estamos muito nervosos, nos dê notícias da Bea. — Mamã e,
com o rosto em lá grimas, me abraçou nervosa.
Katie também me abraçou, querendo saber da filha e tanto o meu pai
quanto Vincenzo também estavam igualmente tensos.
— Acabei de saber que será necessá ria uma cirurgia. Houve rompimento
do baço e essa é a causa da hemorragia interna. — Minha cabeça parecia
que ia estourar. Depois de uma cirurgia longa, meu corpo já estava
dando sinais de completa exaustã o.
— Santo Deus, Vincenzo, nossa menina está sofrendo! Mas o que foi que
aconteceu? Quero vê-la.
Tinha que enfrentar essa loucura agora e explicar a Katie, que minha
mulher, mesmo sem culpa alguma, era a responsável pelo atropelamento
da filha dela.
— Infelizmente, Bea estava no lugar errado e na hora errada. Uma van
invadiu o sinal, indo de encontro ao carro de Lucy, que foi arremessado
para o lado da pista onde o sinal estava aberto para pedestre, por uma
coincidência infeliz, atingindo a Beatrice. — Respirei fundo, porque toda
a histó ria era realmente inacreditável.
— Blake, sei que nã o é sua especialidade, mas, por favor, acompanhe a
minha filha, nã o a deixe sozinha, ficaremos mais calmos com você na
sala de cirurgia. — Vincenzo segurou minha mã o firme e seus olhos
estavam cheios de emoçã o, certamente se segurando para nã o desabar.
— Evidente que acompanharei todo o procedimento. A Bea é muito
importante para a nossa família.
— Sim, é uma filha para nó s. — Por sorte, minha mã e interveio.
Como Katie sabia do meu envolvimento com sua filha, entã o, assim que
terminei de explicar como seria a cirurgia, me despedi e fui em direçã o
ao centro cirú rgico.
Depois que também atualizei minha irmã , entrei no centro cirú rgico no
instante que estavam anestesiando a Beatrice, mais uma vez tentei me
comunicar com ela, que abriu os olhos lentamente, balbuciou algo que
entendi ser o meu nome, mas logo em seguida se rendeu aos efeitos da
medicaçã o.
O médico que faria a cirurgia era um renomado cirurgiã o, Beatrice
estava em excelentes mã os. Como nas cirurgias onde eu era o
responsável, orei, pedindo toda proteçã o para o meu lírio rosa. Apesar
de ser um procedimento seguro, porém, como em qualquer cirurgia,
havia riscos e isso estava me deixando louco, toda a minha experiência
parecia ter me abandonado. Só ficaria sossegado, quando tudo isso
acabasse de vez. Ainda nã o tive tempo de pensar nessa loucura que
estava desenrolando bem diante dos meus olhos. Parecia um filme de
terror.
Depois de quase três horas de cirurgia, finalmente respirei aliviado, tudo
transcorreu como previsto. Beatrice teria que ficar alguns dias em
observaçã o no hospital, o braço esquerdo que também foi afetado
durante o impacto, ficará imobilizado em funçã o de uma luxaçã o,
felizmente nã o quebrou. A tomografia da cabeça nã o revelou nada de
grave, mas ficará com um hematoma por uns bons dias.
Assim que cheguei à sala onde meus pais e os pais da Beatrice estavam,
fui bombardeado de perguntas, todos queriam detalhes de tudo. Entã o
tive que encontrar forças para passar as informaçõ es de maneira
simples e tranquilizá -los.
— Se minha filha está bem, por qual motivo terá que ficar na UTI, Blake?
Por Deus, nã o nos esconda nada. Posso vê-la? — Katie ainda estava
muito apreensiva.
— Nã o se preocupe, Katie. É um procedimento normal do hospital para
qualquer paciente que faz esse tipo de intervençã o. Eles devem passar
um tempo na UTI. Garanto a vocês que está tudo bem. Você poderá vê-la
rapidinho. Vou pedir a uma enfermeira para te acompanhar até sua filha.
— Obrigada, Blake, foi muito bom saber que você estava lá com a nossa
menina.
Como estávamos um pouco mais afastados, confidenciei a Katie que
Beatrice era muito especial para mim. Ela sorriu e me abraçou
novamente.
Ficamos algum tempo conversando, até que me despedi de todos, que,
mesmo a contragosto, dormirã o em suas casas, mas fui informado que
voltarã o na manhã seguinte logo cedo. Já era esperado. Afinal, os
Tomarolli eram muito unidos.

Chegando em casa, fui logo saber como Lucy estava depois de toda essa
loucura. Para a minha grata surpresa, ela estava em sono profundo, nã o
estava em condiçõ es de conversar absolutamente nada. Fechei a porta
do quarto e fui para a cozinha, precisava comer algo.
Por sorte, tinha sobrado rosbife do jantar da noite passada, preparei um
sanduíche enorme, abri uma cerveja, pois estava precisando relaxar um
pouco, e fui para o meu local preferido, estava precisando me
desconectar por um tempo, mas foi uma tarefa impossível. A todo
momento, o rosto machucado de Beatrice atravessava os meus
pensamentos. Nã o sabia nem descrever como me senti no instante que a
vi. Imagens dela ainda jovem, cheia de vida em meus braços, vieram
como relâ mpagos em minha memó ria.
Como explicar o que ocorreu, isso tinha que acontecer com a Bea e
envolvendo a Lucy? Será que o universo está me enviando alguma
mensagem?
Nunca mais tinha tido uma noite tã o agitada como essa, acho que peguei
no sono quando o dia já estava começando a amanhecer. Quando
acordei, Lucy nã o estava mais na cama, espero que pelo menos ela tenha
conseguido descansar. Eu nã o tinha nenhuma cirurgia hoje pela manhã ,
mas tinha duas reuniõ es importantes, sem falar que estava louco para
saber como a Beatrice passou a noite, com certeza nã o houve nenhuma
intercorrência, deixei ordens expressas para me ligarem caso
acontecesse algo.
Depois de um banho rá pido, segui o aroma do café vindo da cozinha, que
era o que precisava neste momento. Lucy conversava calmamente com
Tereza, nossa funcioná ria, uma senhora agradável, que cuidava de nó s
como se fô ssemos adolescentes.
— Bom dia, Blake, sua vitamina já está pronta e vou preparar ovos com
torradas agora mesmo. Estou te achando um pouco pá lido, nã o deve
estar se alimentando direito lá pelo hospital, nã o é? — Era sempre
assim, para ela eu estava sempre pá lido ou magro. Parecia a minha mã e.
— Acho que vou levar você para fazer o meu almoço no hospital, o que
acha? — brinquei.
Ela riu carinhosamente e foi preparar o meu desjejum.
— Como você está , querida? — Beijei o topo da cabeça da minha esposa.
— Só consegui dormir por conta do comprimido que Kaleb me deu. Mal
tomei banho e me joguei na cama, estava totalmente grogue.
— Quando cheguei em casa percebi que você estava em um sono tã o
profundo, que achei melhor nã o te acordar. E agora, como você está se
sentindo, Lucy? — quis saber, pois vi como ela estava abalada ontem.
— Acordei melhor, mas fico revivendo o acidente a cada minuto,
tentando entender o que realmente aconteceu. Estou muito ansiosa por
notícias da moça, você acompanhou o que aconteceu depois que saí?
— Ela precisou se submeter a uma esplenectomia16 laparoscó pica, a
pancada no abdô men foi muito forte e por sorte a hemorragia foi
identificada rapidamente. O braço esquerdo precisou ser imobilizado,
mas nã o houve fratura — relatei o menos detalhado possível, mas
precisava dizer a Lucy quem era a pessoa que atropelou. — Tenho que te
dizer uma coisa importante.
Ela virou-se imediatamente assustada.
— O que foi, nã o vai me dizer que o quadro dela agravou? — Percebi
seus olhos se moverem rapidamente de um lado para o outro. Estranho
isso.
— A pessoa atropelada é Beatrice Tomarolli, amiga de infâ ncia da Liv —
revelei de vez e Lucy levantou-se tã o rapidamente que a cadeira caiu
para trá s.
— A designer de joias? Nã o é possível. Deus, isso só piora. Vocês sã o
quase parentes. Sua mã e já sabe? — Começou a andar em círculo, em um
comportamento totalmente diferente.
— Ela mesmo, a designer de joias e sim, avisei minha mã e. Ela e o papai
ficaram o tempo todo dando apoio aos pais da Bea, até o final da
cirurgia. — Tentei abraçá -la, mas Lucy se esquivou, estava totalmente
alterada. — Calma, Lucy, venha comer algo. Depois vamos juntos para o
hospital. Entenda uma coisa, foi um acidente que você nã o teve culpa
alguma com uma infeliz coincidência. Tente se acalmar. — Tentei soar
tranquilo, mas falhei miseravelmente.
Ela ficou histérica, gritando pelo apartamento:
— Eles vã o me acusar de negligente, desatenta! Com certeza devem
achar que a culpa foi minha, é capaz de moverem um processo contra
mim! — desabafou.
Respirei fundo porque, nesse momento, era minha responsabilidade
fazer com que ela voltasse ao seu estado normal, e eu precisava ir para o
hospital.
— Lucy, você precisa se controlar. — Ela me fuzilou com o olhar. Ainda
bem que Tereza percebeu a gravidade do problema e trouxe á gua com
açú car, tentando apaziguar um pouco a situaçã o.
Depois de algum tempo, Lucy começou a se recuperar do quase surto,
conseguimos comer algo e saímos em seguida para o hospital.

Quando chegamos ao hospital, Lucy preferiu passar logo no jurídico. Na


cabeça dela, os Tomarolli iriam processá -la. Um delírio obviamente. Foi
um acidente, tinha certeza de que o monitoramento de trâ nsito provaria
isso com tranquilidade, caso alguém tivesse alguma dú vida.
Já em frente ao quarto de Beatrice, encontrei com o seu irmã o Matteo ao
celular, esperei que ele desligasse, entã o nos cumprimentamos. Nó s
tínhamos a mesma idade, nunca fomos amigos, mas sempre nos demos
muito bem.
— Como vai, Blake? Que loucura tudo isso! Assim que a mamma me
ligou, eu peguei o primeiro aviã o, precisava ver a Bea. Acabei de
conversar com o plantonista, ele disse que ela está estável. — Disparou a
falar, notadamente apreensivo.
— Nã o se preocupe, Matteo, acompanhei a cirurgia ontem, tudo
transcorreu perfeitamente bem, ela terá que ficar no hospital por poucos
dias, logo estará em casa. — Tentei acalmá -lo um pouco. — Matteo,
podemos conversar depois, ok? Preciso examiná -la e ver como está se
sentindo.
Eu estava um pouco constrangido, afinal, mesmo sendo um acidente,
onde a Lucy nã o teve culpa, ela era a minha esposa. Ele acenou com a
cabeça concordando e me despedi.
Assim que entrei no quarto, nossos olhos se encontraram e senti uma
inexplicável fisgada no peito. Beatrice estava pá lida, mas, ainda assim,
linda como sempre.
— Que bom que você chegou, meu filho, vou aproveitar para tomar um
café. Chegamos muito cedo e ainda nã o comi nada. — Katie me abraçou
e nos deixou a só s.
— Pode deixar que assumo daqui. — Pisquei e ela me fez um carinho no
rosto.
Aproximei-me da cama, controlando a respiraçã o que teimava em falhar.
— E entã o, princesa, como você passou a noite?
Beatrice me olhava assustada, entã o segurei sua mã o e o tempo parou
por alguns segundos, ficamos nos olhando até que vi uma lá grima rolar
pelo seu rosto ainda com hematomas.
— O que houve, está sentindo alguma dor, tem algo incomodando,
precisa mudar de posiçã o? — Interceptei com meu dedo indicador outra
lá grima que surgiu e ela fechou os olhos lentamente, mas nã o disse
nada, só negou com a cabeça. — Nã o me diga que o gato comeu sua
língua? — brinquei e, finalmente, ela deu um sorriso fraco, mas ainda
sem dizer nada.
Comecei a checar os sinais vitais, as medicaçõ es prescritas, com seus
olhos a me analisar. Quando terminei de verificar tudo, eu me dirigi a ela
novamente:
— Você ainda nã o respondeu minha pergunta. Como passou a noite, está
sentindo alguma dor? Fale comigo, Beatrice — insisti.
— Soube que você acompanhou a cirurgia. — Sua voz era quase um
sussurro.
— Fiquei ao seu lado o tempo todo. Jamais te deixaria sozinha em um
momento desse. — Fui sincero.
— Estou bem, apenas com um pouco de dor de cabeça, meio enjoada,
mas a enfermeira disse que logo passa, pois é um efeito comum do pó s-
operató rio, por conta da anestesia.
Sentei-me na cadeira ao lado da cama segurando novamente sua mã o,
dessa vez ela correspondeu e senti um calor subir pelo meu corpo,
acredito que ela também percebeu algo e nó s simultaneamente olhamos
para as nossas mã os entrelaçadas e assim ficamos.
— Minha mã e me disse que a pessoa que dirigia o carro que me
atropelou era a Lucy.
Confirmei com a cabeça, sem saber o que dizer, me sentindo
incomodado.
— Ouça, Blake, sei que ela nã o teve culpa. Tudo aconteceu em fraçõ es de
segundos, mas vi no exato momento em que a van invadiu o sinal
colidindo com um carro branco, que foi jogado na minha direçã o —
relatou calmamente.
— Ela está preocupada e muito nervosa, principalmente depois que
soube que era você a pessoa atingida no acidente. — Fazia um carinho
lento em sua mã o com o polegar. Nã o conseguia largar sua mã o.
— Pode tranquilizá -la. Foi uma fatalidade e uma infeliz coincidência.
Nesse momento, ouvimos uma batida na porta. Uma mulher
elegantíssima entrou apressadamente parecendo bem nervosa.
— Meu Deus, Bea! O que aconteceu? Quando Katie me avisou, vim
correndo. Nã o me esconda nada, você está bem?
— Calma, Nena, agora o perigo já passou. Estou bem melhor.
— Desculpe, doutor, é que somos muito amigas e... — Ela olhou para a
Beatrice e depois me olhou novamente com os olhos assustados. — Você
é o Blake?
Concordei, estendendo a minha mã o para cumprimentá -la.
— Finalmente nos conhecemos. Muito prazer, sou Helena Nevicare,
trabalho com a Beatrice e somos muito amigas. — Ela olhou para a
Beatrice com um sorrisinho. Com certeza, ela sabia.
— Desculpe, Blake, mas essa minha amiga é assim, um furacã o. —
Beatrice olhou para a amiga e posso jurar que foi um olhar de censura.
Lembrei-me de quando ela e Olívia ficavam conversando só com os
olhos, sem dizer uma palavra.
— É um prazer te conhecer, Helena, vou deixar vocês duas sozinhas, mas
nã o deixe essa mocinha conversar demais. Nada de trabalho por aqui,
ela precisa descansar, ok? — Depois me virei para a Beatrice. — Bea,
mais tarde passo aqui, mas é sério, nã o se canse. Se precisar de algo,
peça a uma das enfermeiras para me localizar, que virei imediatamente,
combinado?
Segurei sua mã o e beijei seu dedos, foi quando vi a pulseira com o
pingente, o lírio. Ela ainda usava. Ela percebeu que eu vi, mas nã o
falamos nada.
— Helena, nos vemos depois?
— Com toda certeza, Blake, estarei por aqui até minha amiga se
recuperar.
Pisquei para a Beatrice e saí. Precisava falar com a Lucy.
Quando cheguei ao andar da diretoria do hospital, onde também ficava o
setor jurídico, avistei Lucy saindo da sala do advogado.
— Blake, você foi ver a Beatrice? Como ela está ? — Nunca a vi assim tã o
transtornada, ela mal respirava.
— Lucy, venha comigo, precisamos conversar. — Entrei em uma das
salas de reuniã o e a fiz sentar. — Você precisa realmente se controlar. A
Beatrice está bem, a cirurgia foi um sucesso e a recuperaçã o dela será
rá pida. Ela sabe que você nã o teve culpa.
— Ela te falou isso? Por favor, Blake, me diga tudo o que conversaram.
— Apesar do acidente ter acontecido muito rá pido, ela lembra da van
invadindo o sinal e colidindo com seu carro. Nã o precisa se estressar
com isso, em momento algum ela acusou você, muito pelo contrá rio, me
pediu para que conversasse com você. Sabe que foi uma fatalidade e o
ú nico culpado foi o motorista da van — esclareci de uma vez.
Lucy abaixou a cabeça na mesa, respirou fundo sentindo-se aliviada.
— Que pesadelo, como pode a vida estar toda estruturada e, em menos
de um segundo, a coisa toda desmorona. Você acha que eu deveria ir
visitá -la? — Percebi que finalmente Lucy estava voltando ao normal. Já
estava ficando preocupado.
— Acho uma ó tima ideia, podemos ir juntos, mas deixe para mais tarde,
cheguei de lá agora e uma amiga tinha acabado de chegar para visitá -la.
Além disso, tenho uma reuniã o em poucos minutos. Depois do almoço
passamos lá . O que você acha?
— Pode ser, assim terei tempo para me recuperar. Vou para a minha sala.
Almoçamos juntos entã o?
Concordei e nos despedimos.
Ainda estava em estado de choque com tudo o que aconteceu, o acidente
envolvendo Lucy, a cirurgia, porém o que mais estava me deixando
nervosa era Blake tã o presente demais, nã o imaginei que nos
encontraríamos tã o cedo, ainda mais em uma situaçã o estapafú rdia
como essa.
— Amiga, como você está se sentindo com tudo isso? Além do acidente,
encontrar Blake assim desse jeito? — Helena, com uma expressã o
totalmente tensa, leu meu pensamento.
— Estava pensando justamente isso agora. A vida nos prega cada peça,
eu ainda estou tentando assimilar os ú ltimos acontecimentos. — Fechei
os olhos, sentindo-me esgotada. — Tudo aconteceu tã o rá pido, me
lembro de segundos antes do acidente, tenho alguns flashes de quando
cheguei aqui, mas o que nã o sai da minha cabeça é o rosto de Blake, sua
preocupaçã o comigo, seu carinho. Isso nã o pode estar acontecendo.
— Quando me dei conta de que o médico era o seu Blake, eu nã o
acreditei. Amiga, vamos combinar o homem é um pedaço de mal
caminho. Lindo demais e aquela voz rouca. — Helena, como sempre
exagerada e cada dia mais teatral, começou a se abanar, como se uma
onda de calor a tivesse atingido.
— Imagine como fiquei quando o vi passar por aquela porta, ainda bem
que estava deitada, senã o tinha desabado no chã o. Levei alguns minutos
para me recuperar, até conseguir emitir uma palavra.
— No seu lugar aproveitaria que já estava no hospital e já infartaria logo.
Nã o tem como manter a sanidade em um momento como esse. —
Rainha do drama também e eu nem podia rir, porque todo o meu corpo
doía.
— Nena, por falar nisso, vou ter que ficar no hospital alguns dias e nã o
posso arriscar ficar sozinha um segundo sequer, portanto transfira o
escritó rio para cá , você ficará trabalhando aqui — falei sério, pois nã o
tinha estrutura para enfrentar o meu passado no estado em que estava.
— Mas o dr. Gostosã o deixou claro que você nã o pode se estressar, nã o
acho que ele concordará com sua ideia — Helena contestou.
— Eu nã o vou trabalhar, você vai. — Pisquei exageradamente. — O que
quero é uma companhia, nã o posso ficar sozinha. Você só precisará ficar
aqui quando a mamma precisar sair, tenho certeza de que ela nã o vai
desgrudar de mim.
— Nã o vou mesmo, minha bambina17. Demorei muito, Matteo nã o me
deixou levantar da mesa antes de fazer um desjejum completo. — Minha
mã e entrou no quarto com Matteo, bem mais animada, a coitada estava
precisando se alimentar.
— Oi, Matteo, como vai? — Helena cumprimentou Matteo. Ela sempre
teve uma quedinha pelo meu irmã o, mas hoje isso já estava superado,
afinal meu irmã o era bem-casado e muito apaixonado pela mulher.
— Olá , Helena, depois desse susto que essa mocinha nos pregou, só
agora posso dizer que voltei a respirar normalmente.
— Ela nã o entende que a amamos muito e o susto que levamos foi muito
grande. Mas me conte, Matteo, como está a família, soube que tem uma
princesinha a caminho?
O sorriso de Matteo foi de um canto a outro no rosto, ele era louco pela
família.
— Estamos na expectativa da chegada da nossa Laura, minha mulher
nã o está podendo viajar, o médico achou melhor que ela ficasse
descansando, entã o o Enrico, apesar de ser louco pela tia, disse que
ficaria tomando conta das meninas.
Nunca imaginei que o meu irmã o seria tã o feliz e apaixonado depois de
tudo que passou apó s a morte da primeira mulher. Mas hoje ele era um
rendido, apaixonado e excelente pai.
— Por falar nisso, Bea, Enrico já me ligou três vezes querendo falar com
você, mas já recomendou que tem que ser uma videochamada, ele quer
ver com os pró prios olhos como você está .
— Entã o vamos ligar logo, Matteo, nã o quero deixar meu pequeno
agoniado, mas venha para o lado direito onde tem menos hematomas,
nã o quero assustá -lo.
Ficamos uns trinta minutos conversando com Enrico, ele queria saber
todos os detalhes da cirurgia. Acho que esse garoto será médico, esse é
um tema que ele ama de verdade. Pouco depois, Helena saiu, foi até o
escritó rio ver como tudo estava andando e pegar algumas coisas para
trabalhar daqui. Meu pai e os pais da Olívia também deram uma passada
rá pida para saber como estava e logo apó s o almoço, Matteo, já se
sentindo mais tranquilo, pois eu realmente estava me recuperando bem,
retornou para Seattle.
Por volta das duas da tarde, recebi uma visita, que, se pudesse escolher,
teria até proibido, por minha sorte Helena já tinha retornado e minha
mã e tinha ido para casa descansar um pouco. Estava bem puxado para
ela.
— Podemos entrar? — Blake nã o esperou a resposta e foi entrando de
mã os dadas com sua mulher.
— Oi, Bea, viemos saber como você está se sentindo, a Lucy está
preocupada. — Blake adiantou-se, visivelmente incomodado.
— Olá , Beatrice, certamente nã o é a melhor maneira de nos
conhecermos, mas vim aqui para me desculpar e me colocar à
disposiçã o para o que precisar.
Helena levantou-se deixando o sofá livre para que se sentassem, mas o
casal permaneceu em pé.
— Finalmente nos conhecemos, Lucy, concordo que poderia ser em uma
situaçã o menos confusa, mas quero te tranquilizar, nã o há motivo para
se desculpar, vi exatamente como tudo aconteceu, foi um acidente e
infelizmente uma coincidência lamentável — disse o que realmente
pensava.
— Quando Blake me disse que era você a pessoa que tinha sido
atropelada, eu fiquei transtornada. Eu realmente sinto muito. — Senti
sinceridade em suas palavras.
— Vamos esquecer isso, ok? O que mais quero é me recuperar logo e
voltar ao trabalho. Ficar presa em uma cama é uma experiência
enlouquecedora. — Tentei tranquilizá -la. Enquanto eu e sua esposa
conversávamos, Blake nã o tirava os olhos de mim, me deixando
totalmente atordoada.
— E entã o, você almoçou, Bea? — O doutor entrou em açã o e começou a
checar os equipamentos, o soro, no final segurou minha mã o
rapidamente, acho que isso era comum entre médico e paciente, pois
Lucy nã o pareceu se incomodar, mas no momento que senti seus dedos
em minha pele, lá estava a descarga elétrica novamente.
Depois de checar tudo e atestar que estava dentro do esperado, o casal
saiu me deixando com a minha amiga, que estranhamente ficou muda o
tempo todo.
— Amiga, estou tremendo, como você consegue ser tã o controlada?
Estava aqui quase desmaiando. E essa energia toda entre você e o
bonitã o, será que a ruiva nã o percebeu nada? — Helena foi até o frigobar
e pegou uma garrafinha de á gua, estava verdadeiramente abalada.
— Você nã o imagina o esforço que estava fazendo para nã o ter um
ataque, meu medo era que os meus batimentos cardíacos me
denunciassem, tenho certeza de que Blake percebeu algo, vi quando sua
testa formou uma ruguinha, no instante que olhou para o monitor do
frequencímetro. Mas ele disfarçou bem.
— Amiga, você precisa deixar esse hospital o mais rá pido possível. Cada
minuto aqui será uma crueldade para você.
— Concordo plenamente. Seria muita bandeira da minha parte pedi-lo
para nã o vir mais me visitar?
— Ficou doida, Beatrice, aí você estaria assinando o seu atestado de
eterna apaixonada pelo dr. Mú sculos. — Cada vez que Helena se referia
ao Blake, ela mudava o adjetivo. Pelo menos, ela deixava essa novela
mexicana um pouco mais leve. — Quando fui ao escritó rio, recebi uma
ligaçã o da Charlotte querendo saber notícias suas. Parece que saiu algo
na televisã o e ela ficou muito preocupada. Me disse que o Miguel já tinha
sido informado também, parece que ele adiantou seu retorno, deve
chegar amanhã aqui.
— Esqueci completamente dele, nã o sei onde está o meu celular, ele
deve ter me ligado. Com o Blake me rondando, eu nã o consigo pensar
em mais nada. — Por alguns segundos, fechei os olhos, nã o segurei a
emoçã o me permitindo chorar finalmente, as lá grimas desceram sem
controle.
Helena levantou-se abruptamente, achando que eu estava sentindo
alguma dor, e estava sim, mas essa dor nã o tinha remédio. Nada, nem
ninguém poderia mudar o fato de que Blake ainda mexia muito comigo e
tê-lo tã o perto de mim, depois de tantos anos de distâ ncia, fez com que
todo o sentimento, que até entã o estava devidamente trancafiado no
fundo do meu coraçã o, viesse à tona de maneira cortante.
— Bea, por favor, nã o fique nervosa, você ainda está se recuperando, nã o
pode se emocionar tanto assim. Vou chamar a enfermeira para te dar um
calmante. — Neste momento, o celular da minha amiga tocou, felizmente
interrompendo meu surto. Ela olhou para a tela, com ar de interrogaçã o.
— Alô , oi Miguel, tudo bem? Sim, pois é, uma loucura, mas ela está bem.
Eu nã o estou no quarto com ela nesse momento, vim fazer um lanche,
mas, assim que subir, peço a ela para te ligar. Obrigada por ter ligado. —
Ainda bem que minha amiga me conhecia muito bem, precisava de um
tempo para me recuperar antes de falar com o meu namorado. — Achei
melhor dispensá -lo, você nã o está em condiçõ es de conversar com ele
agora. Fiz mal? — perguntou preocupada.
— De maneira alguma, você foi perfeita, eu realmente nã o teria como
falar com ele agora. Me dê uns minutinhos e já ligarei para ele. Por favor,
veja se o meu celular está nesse armá rio, nã o sei o que aconteceu com
minhas coisas. Lembro que estava com aquela bolsinha que uso quando
vou correr.
— Está tudo aqui, mas ele está descarregado. Ainda bem que trouxe o
meu carregador. Se quiser use o meu celular.
— Nã o, coloque o meu para carregar, em seguida retorno à ligaçã o do
Miguel. Estou com sede. Por favor, enfermeira Helena, me dê um copo
com á gua — brinquei tentando aliviar a minha pró pria tensã o.
— Pois nã o, srta. Tomarolli, mas acho que uma taça de vinho caberia
melhor neste momento. — Gargalhando, a louca me deu a á gua e
ficamos jogando conversa fora por um tempo.
Quando já estava me sentindo melhor, decidi ligar para o Miguel de uma
vez, ele era um homem maravilhoso e talvez fosse a minha chance de
mudar a minha sorte no amor. Fiz a ligaçã o e ele atendeu no primeiro
toque.
— Mi amor18, estava enlouquecendo sem notícias suas. Por favor, me diga
que está bem.
— Oi, Miguel. Fique tranquilo, o pior já passou, foi realmente um susto e
tanto. Segundo os médicos, apesar de precisar ficar internada por alguns
dias, minha recuperaçã o está acima do esperado. — Tentei acalmá -lo,
afinal nã o queria o homem desesperado.
— Queria muito retornar ainda hoje para Nova Iorque, mas não consegui
um voo. Devo chegar aí amanhã à noite. — Percebi que estava ansioso.
— Nã o precisa interromper sua viagem por minha causa, estou
realmente bem...
— Beatrice, eu não vou ficar tranquilo enquanto não ver com os meus
próprios olhos como você está, cariñ o. — Nem me deixou terminar.
Estava realmente preocupado. Confesso que me senti bem em saber que
aquele espanhol lindo estava mudando todos os seus planos por minha
causa.
Depois que nos despedimos, eu me senti mais calma, era disso que
estava precisando. Miguel era um homem incrível e podia sim me
apaixonar por ele, bastava esse meu coraçã o idiota nã o atrapalhar
minha vida me direcionando para um homem que nã o poderia ter.
No final do dia, minha mã e voltou para passar a noite comigo e Helena
foi liberada, me fazendo jurar que ligaria caso precisasse de algo. Como
se nã o bastasse toda a equipe do hospital me paparicando, ela ainda
queria fazer o papel de enfermeira-chefe. Apó s o jantar, quando já estava
recebendo as ú ltimas medicaçõ es e já me preparando para dormir, ouvi
uma batida na porta e, como se soubesse quem era, meu coraçã o
começou a acelerar assustadoramente.
— E entã o, srta. Tomarolli, como passou o dia?
Por qual motivo ele tem que me atormentar desse jeito?
— Oi, Blake. Estou ó tima.
— Que bom que você passou aqui, Blake, a mocinha aí nã o se alimentou
direito e passou o dia muito agitada. Será que você poderia explicá -la o
que a palavra repouso significa?
— Mamma, eu jantei, só tenho ficado um pouco sem fome, nada demais
— resmunguei olhando meio atravessado para a dona Katie.
— Bea, se quiser sair rá pido daqui, precisa se alimentar. Tem sentido
alguma dor? — Como de costume, começou a checar tudo com
seriedade, fazendo as perguntas de praxe. Quando se deu por satisfeito,
puxou uma cadeira e sentou-se bem perto de mim e, para a minha
tortura, segurou minha mã o, fazendo um carinho com o polegar. —
Entã o sua amiga te trouxe muita preocupaçã o de trabalho? — brincou
charmoso como sempre.
— Quase nada, eu só fiquei ouvindo, Helena nã o me deixou nem segurar
o notebook. — Dei um sorriso sem graça e a mã o dele ainda estava ali,
colada com a minha.
O celular da minha mã e tocou, ela pediu licença e saiu. Ficamos sozinhos
e a afliçã o cresceu mais ainda quando ele chegou mais perto e pude
sentir o seu perfume.
— Mesmo na cama de um hospital, depois de uma cirurgia, você
continua linda. — Beijou minha mã o docemente. — Notei que você
ainda usa a pulseira e o pingente que te dei.
Concordei com a cabeça sem conseguir emitir uma palavra. O que ele
quer comigo? Quando saí da cirurgia e percebi que estava sem a pulseira,
eu me senti nua, pedi que a mamma a colocasse em meu braço
imediatamente, jamais imaginei que Blake se lembraria do presente que
me deu, tantos anos atrá s.
— Já está indo embora? — Fugir era a minha escolha, o caminho mais
seguro, entã o mudei radicalmente de assunto.
— Sim, estou encerrando por hoje, mas nã o vou para casa agora. Tenho
aula.
— Aula? — Fiquei curiosa. — Mais uma especializaçã o, claro.
— Exatamente, só que dessa vez é em Gastronomia.
Acho que fiz uma cara de surpresa sem entender.
— Algum tempo atrá s, ainda em Londres, queria fazer algo que me
tirasse da zona de conforto e que fosse totalmente diferente de tudo que
eu já tivesse feito na vida, entã o me inscrevi em um curso de
Gastronomia — ele explicou com orgulho do seu novo feito.
— Sério isso ou você está tirando onda com a minha cara, Blake? — Foi
nesse momento que ele se levantou, finalmente libertando minha mã o
do tormento.
— Sem falsa modéstia, posso dizer que sou bem talentoso, tenho
algumas receitas autorais que fazem bastante sucesso. Quem sabe um
dia eu possa preparar algo para você?
O que ele está falando? O remédio deve estar fazendo efeito, acho que
estou ouvindo coisas estranhas.
— Quero dizer, quando Liv vier nos visitar, farei algo para vocês e, entã o,
provará do meu tempero inesquecível. — Acho que ele se deu conta do
que falou e se arrependeu.
— Essa é realmente uma grande novidade, o renomado cardiologista, dr.
Blake Lancaster, trocando o bisturi por tomates, cebolas e afins. Acho
que podemos marcar um jantar na casa dos seus pais e, entã o, poderá
nos mostrar suas habilidades culiná rias.
— Pronto, voltei. Era seu pai, minha querida, queria saber notícias suas.
— Senti um alívio ao ver minha mã e de volta ao quarto, já nã o estava
mais aguentando ficar com ele sozinha, tendo que controlar as minhas
emoçõ es.
Blake ficou mais alguns minutos e se despediu prometendo passar aqui
amanhã logo cedo. Já vi que meus dias neste hospital seriam como uma
prova de fogo. Ainda bem que o Miguel chegará amanhã . Precisava dele
ao meu lado, assim nã o ficaria fantasiando.
Felizmente Katie retornou ao quarto, senti que Beatrice ficou até mais
aliviada. Aproveitei e me despedi. A tensã o entre nó s dois era muito
forte. Por outro lado, nã o sabia o que estava acontecendo comigo. O que
exatamente estou querendo?
Desde que voltei para Nova Iorque, Beatrice era o meu pensamento mais
recorrente. A primeira loucura que fiz foi ir até sua festa e, pior, pedi ao
garçom que lhe entregasse um lírio rosa, pois sabia do significado que
essa flor tinha para nó s dois.
Como se nã o bastasse o acidente, ela ficar hospitalizada no meu local de
trabalho, ainda passava o dia pensando em vê-la com a desculpa de
querer saber do seu estado de saú de, o que nã o era mentira, mas
poderia fazer uma vista rá pida e pronto. Para coroar minha sandice, nã o
resistia em segurar sua mã o. Ela nã o sabia, mas sempre que estava perto
eu dava um jeito de olhar para o monitor cardíaco e lá estavam os
batimentos do coraçã o acelerados, a prova de que eu nã o era o ú nico a
ficar perturbado.
A rotina dos ú ltimos dias nã o tem sido fá cil, quando saía do hospital
evitava ir direto para casa, tinha necessidade de uma vá lvula de escape
para me colocar nos trilhos novamente. Uma das melhores decisõ es que
tomei e que me ajudava muito, foi fazer o curso de Gastronomia, me
deixava totalmente entusiasmado, sem falar que me desconectava de
tudo, nã o pensava em nada, só me concentrava e deixava a criatividade
me levar.
Hoje a aula foi sensacional, fizemos um peixe maravilhoso que
reproduzirei em breve a receita e obviamente darei o meu toque
pessoal. Por sorte, o tema “Beatrice” saiu um pouco do meu pensamento
durante a aula.
Cheguei em casa e fui direto para o banho, fiquei pelo menos uns quinze
minutos debaixo do chuveiro relaxando, coloquei um moletom e uma
camiseta confortável. Quando cheguei à sala, encontrei Lucy jogada no
sofá com um copo de whisky na mã o.
— Tudo bem? — Sentei-me no mesmo sofá pegando seus pés e
colocando no meu colo, minha intençã o era fazer uma massagem, pois
sabia que desde ontem ela estava meio atordoada, o que era normal em
funçã o do que aconteceu.
— Aham. — Essa foi sua resposta puxando os pés do meu colo.
— Você passou novamente para ver a Beatrice? — questionou, sem
olhar para mim.
— Sim, no final do dia fui vê-la. Está se recuperando bem — respondi me
levantando. Já que ela estava uma pedra de gelo, também nã o estava em
um bom momento para tentar entender o que se passava em sua cabeça.
— Já jantou, quer que eu prepare algo? — Fui gentil.
— Nã o estou com fome, quero ficar quieta um pouco se nã o se importa.
— Mais direta impossível.
— Nã o quer conversar? — insisti, sabia que ela estava sofrendo com os
ú ltimos fatos. Acho até que estava na hora dela procurar ajuda
psicoló gica. Nã o era de hoje que vinha percebendo que estava mais
introspectiva, ausente mesmo.
— Estou sem fome, obrigada. Se nã o se importa, vou tomar um banho e
dormir. Estou muito cansada. — Sem mais nenhuma palavra, Lucy
passou por mim, deu um sorriso amarelo e foi em direçã o ao nosso
quarto.
Senti-me completamente sem açã o. Nã o sabia o que fazer para trazê-la
de volta desse abismo que estava construindo entre nó s dois. Talvez eu
também nã o estivesse me esforçando muito para sair desse caos.
Para piorar a situaçã o, a proximidade de Beatrice estava mexendo muito
comigo. Na época em que nos relacionamos, eu fiquei bem balançado,
nã o tirava os nossos encontros da cabeça, mas o meu foco era me tornar
o que sou hoje, um médico de referência dentro da cardiologia. Dentro
da minha profissã o conquistei tudo o que planejei, mas nã o me sentia
completo. Quando se é muito jovem, os valores sã o bem diferentes, os
sonhos sã o mais egoístas, entretanto, quando nos damos conta disso,
muitas vezes pode ser tarde demais.

A noite foi bem agitada, Lucy estava inquieta, mexendo muito, quando
perguntei se precisava de algo, ela claramente fingiu dormir, achei
melhor respeitar e nã o insisti mais.
À s sete horas, já estava no hospital. Tinha uma cirurgia bem complicada
hoje, gostava de chegar com bastante antecedência para me preparar
com tranquilidade. Eu e a Lucy mal trocamos algumas palavras e parece
que seu dia estaria bem corrido hoje também.
Tive que me controlar para nã o passar no quarto da Beatrice assim que
cheguei, mas agora, depois da cirurgia, eu estava mais tranquilo e era o
melhor momento para vê-la. A porta estava apenas encostada e percebi
vozes no quarto, assim mesmo entrei sem bater.
— Blake, comentei agora sobre você, nã o apareceu aqui hoje? — Katie,
como sempre muito calorosa, me puxou para um abraço, mas de relance
vi que Beatrice estava com uma visita.
— Olá , Katie, só agora terminei a cirurgia, que começou cedo, mas antes
de vir para cá falei com o médico que fez a cirurgia da Beatrice, ele me
disse que a mocinha aí está ó tima. — Só nesse momento nos olhamos.
— Que notícia boa, meu filho. Blake, você já conhece o Miguel? — Ela
deve ter percebido um certo constrangimento no ar, entã o adiantou-se
em apresentar o estranho.
— Boa tarde, sou Miguel Ortiz, namorado da Beatrice. — Agora sim, me
lembrei de onde o conhecia, ele estava no evento das joias.
— Muito prazer, Blake Lancaster, sou amigo da família.
Entã o Beatrice estava namorando e, pelo sotaque, era um espanhol.
Cumprimentei e me dirigi a mulher que estava tirando o meu sossego.
— E você, Bea, como está se sentindo, alguma dor ou incô modo? —
perguntei o mais profissional que consegui. Ela estava visivelmente
incomodada.
— Estou me sentindo muito bem, nã o vejo a hora de ir para casa.
— Meu amor, nã o tenha pressa, você precisa estar totalmente
restabelecida para receber alta. Nã o estou certo, dr. Lancaster. — O tal
namorado fez um carinho em seu rosto. Claro que nã o fui com a cara
dele.
— Está conseguindo alimentar-se direito, parou o enjoo? — Continuei
no modo médico, antes que eu quebrasse a cara desse almofadinha.
— Estou comendo melhor e nã o tenho sentido enjoo — respondeu
quase monossilá bica.
Katie até tentou puxar uma conversa, mas o estresse era nítido, pelo
menos para mim, entã o achei melhor me retirar. Dei uma ú ltima olhada
em direçã o a Beatrice, mas ela já tinha voltado sua atençã o para o
namorado. Despedi-me rapidamente e Katie me acompanhou até a
porta.
— Nã o sei como vocês conseguem viver em um ambiente hospitalar
tanto tempo. Me acompanha em um café? — Katie passou a mã o em meu
braço e fomos para a lanchonete. Eu também estava precisando de uma
dose de cafeína.
— Que bom que você está sempre por aqui, fico mais tranquila. Foi um
susto muito grande, Blake, mas graças a Deus minha filha está bem. Só
realmente gostaria de levá -la para casa o mais rá pido possível.
Entendia a Katie, realmente ficar em um hospital aguardando a
recuperaçã o da filha nã o era tã o simples.
— Sua irmã ligou hoje pela manhã para a Bea, ficaram quase uma hora
conversando, nã o sei como aquelas duas tem tanto assunto. Sempre foi
assim desde que eram crianças. Mas me conte, querido, como está a sua
vida agora que voltou para casa?
— Estou me adaptando bem, morar em Londres foi uma experiência
maravilhosa, mas de fato a vida lá é bem diferente daqui onde tudo é
mais agitado, a cidade parece que nunca dorme, mas estava na hora de
voltar. — Fui sincero.
Quando chegamos à cafeteria, o cheiro gostoso me deu até â nimo.
Fizemos nosso pedido, que chegou rapidamente: dois expressos
fumegantes.
— Sua mã e está radiante, agora só está faltando um netinho para ela
ficar realizada. — Katie me olhou curiosa.
— Essa missã o vou deixar para a Liv. — Bebi um gole do meu café,
tentando disfarçar o meu desconforto com esse tema.
— Meu filho, uma criança é uma bênçã o, veja o Matteo, tã o feliz na
expectativa da chegada de uma garotinha, nã o acha que está na hora de
começar a pensar nisso? Desculpe, nã o quero ser invasiva, podemos
mudar de assunto. — Acho que ela percebeu que essa era uma questã o
que me incomodava.
— Nã o está sendo invasiva, fique tranquila, na verdade eu até quero
muito ser pai, mas isso nã o está nos planos da Lucy atualmente. —
Abaixei a cabeça tentando evitar contato visual.
— Você sabe que gosto muito de você, nossa família é tã o ligada que me
sinto quase uma tia sua, apesar de que eu preferia ser sua sogra. — Katie
abriu um sorriso envergonhado. — Nunca falamos sobre isso, Blake, mas
na época que Bea se apaixonou por você e vocês tiveram aquele rá pido
envolvimento, tive esperanças de que finalmente ficariam juntos.
Ela segurou minha mã o com carinho e eu franzi a testa sem saber o que
dizer.
— Me desculpe tocar neste assunto, afinal hoje você está casado e minha
filha parece estar em um namoro sério, mas nã o queria deixar essa
oportunidade passar. Quero que saiba que tanto você quanto a Liv sã o
família para nó s e o que você precisar estarei aqui sempre.
— Eu agradeço seu carinho, fico até sem jeito em falar sobre isso, mas a
Beatrice sempre foi muito importante para mim, confesso que cheguei a
ficar balançado na época que ficamos juntos, mas eu tinha um objetivo
traçado em minha vida e, naquela época, nã o conseguia enxergar outro
caminho. — Fui realmente honesto, essa era a mais pura verdade.
— Acredito em você. Apesar da Bea estar bastante segura do que queria,
sofreu muito na época, desde novinha se encantou com você. Ela vai me
matar se souber que estamos falando sobre isso, mas minha filha só
desistiu depois que você se casou.
— Nossa, essa é uma informaçã o surpreendente, achei que tivesse sido
uma paixã o de adolescente, imaginei que ela tinha seguido a vida,
deixando tudo o que vivemos como uma boa lembrança. — Comecei a
me sentir muito mal com essa conversa e Katie percebeu.
— Mas tudo isso é passado, meu querido, mais uma vez estou sendo
intrometida. Tome seu café tranquilamente, vou voltar para o quarto. Me
desculpe mais uma vez. — Acho que ela se arrependeu do que falou,
levantou-se rapidamente e se despediu me deixando com os meus
pensamentos mais confusos ainda.
A Olívia nunca falava da Beatrice comigo, sempre que perguntava por
ela, recebia respostas vagas, entã o achei melhor nã o insistir. Aquelas
duas eram tã o unidas, que, mesmo sendo minha irmã , Olívia jamais
trairia a confiança da amiga.
De onde surgiu aquele namorado? Por que motivo isso está me
incomodando tanto? Ele parecia bem à vontade como se fosse da família.
Tenho que tirá-la da minha cabeça. Não sou um canalha de merda, mesmo
tendo sido um covarde e egoísta no passado, agora depois de tantos anos,
casado, não posso sequer ficar pensando nela, que já está com a vida
estruturada, não é correto isso.
— Dr. Lancaster, seus residentes já o estã o aguardando para a reuniã o na
sala de treinamento do 3º andar. — Minha assistente me trouxe de volta
para a minha realidade. Precisava me concentrar no meu trabalho,
afinal, foi por ele que abandonei a ú nica mulher que realmente mexeu
comigo.
— Obrigado, Audrey, nã o sei o que seria de mim sem você. — Abracei a
senhora que, desde que cheguei aqui, era o meu braço direito,
organizava tudo facilitando assim a minha vida.
Quando entrei na sala me vi naqueles residentes do primeiro ano, loucos
para aprenderem tudo, eles tinham o mesmo brilho nos olhos que eu
tinha. Entã o, respirei fundo e deixei as minhas ú ltimas preocupaçõ es do
lado de fora concentrando-me em outra coisa que me fazia sentir vivo:
transmitir todo o meu conhecimento.
A vida só pode estar querendo brincar comigo. Agora que parecia que as
coisas estavam ficando tranquilas e conheci finalmente um homem que
me despertou interesse, vinha esse fantasma do passado para me tirar
do eixo, isso nã o era justo.
— Bea, desde que cheguei tenho notado que você está muito alheia, nã o
comentei nada porque sua mã e e o Miguel estavam aqui, mas agora que
estamos só nó s duas, vá logo desabafando, pois sei que tem algo aí te
incomodando. — Helena ajeitou meu travesseiro e puxou a cadeira
sentando-se mais perto da cama.
— Você nã o imagina o que está acontecendo em minha cabeça? — falei
muito desanimada, na verdade nem queria conversar, mas sabia que
Helena nã o ia largar do meu pé.
— Amiga, eu sei exatamente o que está acontecendo. Deve ser muito
difícil mesmo ter dois gostosõ es aos seus pés te paparicando, tadinha.
Revirei os olhos impaciente.
— Desculpe, só quero te distrair. — Piscou e jogou um beijo. — Vamos
lá , nã o me esconda nada.
— Minha vida está de cabeça para baixo presa nessa cama, cheia de
ideias para uma nova coleçã o e, para piorar a situaçã o, com o Blake por
perto o tempo todo. Eu nã o sei até quando vou aguentar essa
proximidade — desabafei quase chorando.
— Sem falar do Miguel, acho que ele ficou cismado com Blake, observei
que, quando cheguei e perguntei pela Katie, me deu uma resposta rude:
“Saiu com aquele médico amigo da família”. — Helena imitou a voz
grossa do meu namorado.
— Também notei isso, só que achei que talvez fosse coisa da minha
cabeça. Ele deve ter percebido a tensã o no ar, estávamos aqui
conversando tranquilamente, planejando uma viagem para quando eu
estiver melhor, quando Blake chegou, aí travei totalmente. Ele é um
homem experiente, certamente viu que fiquei diferente, mas inteligente
que é, nã o comentou nada. Pelo menos por enquanto. Nena, Blake já era
pá gina virada na minha vida, mas nã o posso negar que ele ainda mexe
muito comigo, isso é uma loucura sem fim nã o vou deixar que esse amor
renasça das cinzas, me impedindo de viver um novo relacionamento
com outra pessoa.
— Concordo com você e estarei sempre ao seu lado para te lembrar isso,
se essa for a sua escolha.
— Sei que posso contar com você, amiga, mas me diga, tenho outra
escolha que nã o seja a de tamponar esse sentimento que teima em
ressurgir? Nã o se esqueça de que ele é CASADO. — Dei ênfase à palavra
casado, para nã o esquecer esse detalhe definitivo.
Finalmente chegou o dia da minha alta, desde que acordei já estava
pronta aguardando o médico me liberar, precisava sair daqui. Receber
diariamente a visita de Blake fazia loucuras com o meu emocional.
— Miguel, que bom que você veio, quem sabe você consegue diminuir a
ansiedade da minha filha! — Minha mã e reclamou, mas ela também
estava louca para me levar para casa, ela sabia que a presença de Blake
nunca seria indiferente para mim.
— Eu imagino o quanto Beatrice está aguardando sair daqui, acho que
ninguém gosta de passar uma temporada em um lugar assim, mesmo
sendo um hospital tã o bom quanto esse. — Miguel, como sempre um
cavalheiro, estava me ajudando a recolher os meus pertences e
colocando na pequena mala que minha mã e trouxe.
Ouvimos uma batida na porta e meu coraçã o traiçoeiro disparou na
mesma hora, mas para minha tranquilidade nã o era ele. Antes tivesse
sido.
— Bom dia, vejo que já está pronta para partir — disse Lucy
educadamente, porém um pouco sem graça.
— Já está na hora, apesar de todo cuidado que fui tratada aqui no seu
hospital quero muito voltar para casa.
— Beatrice, mais uma vez preciso me desculpar com você. — Lucy se
aproximou com a voz um pouco embargada.
— Lucy, por favor, esqueça isso, ok? Eu já esqueci. Deixa-me te
apresentar o meu namorado. — Mudei de assunto, já nã o aguentava
mais ela sempre me pedindo desculpas. — Miguel, essa é Lucy
Lancaster, uma das diretoras do hospital.
— Muito prazer, mas esse é o sobrenome...
— Sim, ela é a esposa do Blake. — Nem o deixei terminar e já esclareci
sua dú vida para tranquilizá -lo. Afinal, se ele percebeu algo entre mim e
Blake, agora sabendo que ele era casado, talvez esquecesse o assunto. Os
dois trocaram um aperto de mã o.
— Exatamente, somos casados e ele deverá passar aqui para assinar sua
alta, já que o seu médico está em cirurgia. Fico feliz que você se
recuperou bem. — Depois de alguns minutos conversando sobre
amenidades com minha mã e, Lucy despediu-se nos deixando na
expectativa da chegada de Blake.
Algum tempo depois da saída de Lucy, minha mã e disse que precisava
comer algo. Nã o sei por qual motivo, mas achei que isso era invençã o
dela, pois nunca a vi reclamar de fome no meio da manhã .
— Miguel, me acompanha? Bea nã o vai se incomodar, nã o é, querida?
Nã o gosto de andar por aqui sozinha. — Aí está , ela tinha algum plano.
— Claro, Katie, eu também estou precisando de um café. Você ficará bem
sozinha alguns minutos, linda? — Miguel jamais recusaria um pedido da
mamma.
— Podem ir tranquilos. Estou ó tima, vou terminar com isso aqui. —
Apontei para as minhas coisas praticamente quase todas já organizadas
na mala.
Estava de costas quando percebi um movimento na porta e, claro,
percebi seu perfume de imediato.
— Vejo que a senhorita já está de malas prontas — Blake brincou, estava
com uma folha de papel em uma mã o e a outra estranhamente estava
para trá s.
— Já é tempo, nã o é? O trabalho de todos aqui do hospital é impecável,
mas, convenhamos, hospital é o ú ltimo lugar que qualquer pessoa queira
passar uns dias.
Rimos, meio sem graça e as faíscas estavam lá , deixando os pelos da
minha nuca arrepiados.
— Bem, aqui está sua alta, os medicamentos que você terá que continuar
usando por algum tempo e meu celular. Caso você tenha qualquer
problema, nã o hesite em me ligar.
Confirmei com a cabeça.
— A Lucy esteve aqui mais cedo. — Tentei quebrar o climã o trazendo a
esposa dele para o meio da nossa conversa.
— Eu sei, ela me disse que você estava agoniada para ir embora. —
Aproximou-se um pouco mais. — Trouxe isso para você.
Foi aí que entendi o motivo dele estar com a mã o para trá s, Blake estava
escondendo um lírio rosa.
Olhei para a flor e depois para ele, um misto de sentimentos me invadiu:
raiva, alegria, vontade de esmurrá -lo. Mas fiquei parada sem dizer uma
palavra.
— Eu nunca me esqueço o quanto você ama essa flor e pude notar outro
dia que você ainda usa o pingente que te dei. — Seu olhar era tã o
profundo e com um brilho diferente.
Meu Deus, esse homem quer me enlouquecer.
— Eu nunca deixei de usar o pingente, é como um amuleto para mim.
Obrigada, Blake. — Peguei o lírio e me afastei. Ainda bem, pois foi nesse
momento que minha mã e e Miguel retornaram.
Enquanto todos se cumprimentavam, eu aproveitei para guardar o
presente na mala fechando-a discretamente, nã o queria ter que explicar
nada para Miguel, mas vi o olhar da minha mã e e entendi tudo.
Quando Blake se despediu, finalmente nos dirigimos à casa dos meus
pais, já que eles nã o me deixaram nem pensar em ficar sozinha no meu
apartamento.

Quinze dias apó s deixar o hospital, tinha retomado minha rotina de


trabalho, porém com cuidado, sem exageros. Essa semana voltarei para a
minha casa, a contragosto da minha mã e que estava amando cuidar da
filhinha.
Na sexta-feira, a Olívia chegará , finalmente iremos nos encontrar
pessoalmente. Diariamente nos falávamos, mas estava louca para
abraçá -la. Nã o comentei com ela sobre o episó dio do lírio que recebi no
hospital, nã o queria que ela brigasse com o irmã o, pois tinha certeza de
que isso iria acontecer, ela sempre o condenou por estar, de certa forma,
alimentando esse sentimento dentro de mim.
O que me tirava o sono ultimamente era o jantar que a tia Ava inventou
para comemorar a chegada da Olívia e a minha recuperaçã o. As duas
famílias adoravam esses eventos em conjunto, pelo menos o Miguel iria
me acompanhar.
Desde que acordei com o telefonema da Olívia me convidando para
passar o dia no nosso spa preferido, nã o conseguia raciocinar direito,
afinal hoje era o dia do bendito jantar. Minha amiga chegou ontem tarde
da noite, entã o ainda nã o nos encontramos.
Como já era de se esperar, nosso reencontro foi cheio de risadas e
lá grimas, éramos um turbilhã o de sentimentos. Ela me atualizou sobre
seu progresso com a empresa, falamos do fatídico atropelamento, mas
quando o assunto chegou no Blake, travei completamente.
— Beatrice, o que exatamente você está escondendo de mim? O que foi
que o meu irmã o aprontou dessa vez? Achei que esse assunto já estava
superado, afinal, pelo que me falou, você e o Miguel estã o firmes. — Uma
ruga formou na testa da minha melhor amiga.
— Nã o estou escondendo nada, Liv, mas você sabe que nunca superei o
Blake. Eu simplesmente aceitei que nó s dois nã o ficaríamos juntos,
entã o guardei o sentimento lá no fundo do coraçã o, mas ele está ali
congelado apenas. A proximidade dele no tempo que passei no hospital
me deixou totalmente fora do eixo. — Como nã o conseguia esconder
nada dela, entã o abri meu coraçã o.
— Você nã o sabe como gostaria que a histó ria de vocês tivesse dado
certo, tenho certeza de que ele estaria mais feliz. Sei que meu irmã o se
sente feliz na profissã o, ele ama verdadeiramente a cardiologia e tudo o
que conquistou, mas nã o vejo o brilho em seus olhos quando o assunto é
o relacionamento dele com a Lucy. — Fiquei curiosa com essa
declaraçã o da Olívia.
— Por qual motivo você está falando isso, ele te disse algo? — Meu bobo
coraçã o bateu mais forte. Cheio de esperança, coitado.
— Na verdade, ele nã o me disse nada, mas já faz um bom tempo que o
sinto desanimado, Lucy nã o quer ter filhos e, sinceramente, eles têm
pouco tempo de casados e nã o sinto paixã o entre os dois.
— Bom, o fato é que decidi dar uma chance ao Miguel e estamos nos
dando muito bem. — Mudei de assunto, afinal Blake estava casado e isso
era algo que nã o podíamos mudar.
— Uau! Estou encantada com o espanhol, candidato sério a roubar o
coraçã o da minha melhor amiga. — Olívia entendeu que o assunto
estava encerrado e passamos a falar do meu romance com Miguel.
Depois de deixar Olívia em casa, passei na minha para pegar uma roupa
bem bonita para usar no jantar e segui para me arrumar com minha
mã e. Escolhi um vestido azul-claro fluido, sem manga e com as costas à
mostra, preferi fazer uma maquiagem leve, deixar o cabelo solto, calçar
sandá lias com salto médio e estava pronta, gostei do resultado.
Miguel passou para me pegar e fomos todos juntos, meu pai,
alinhadíssimo e minha mã e uma rainha sempre, o tempo só lhe
favorecia.
Quando chegamos à casa dos Lancaster, eu estava um pouco nervosa,
mas o braço de Miguel em volta da minha cintura era a segurança que
precisava naquele momento.
Todos estavam na á rea da piscina, onde tocava uma mú sica clá ssica ao
fundo. Apesar de tudo muito requintado, o ambiente era totalmente
familiar e descontraído. Os pais de Olívia me cumprimentaram com
alegria, o mesmo tratamento foi dado ao Miguel.
Lucy se levantou para falar com todos e em seguida foi a vez de Blake,
minha mã e o abraçou carinhosamente, ele trocou um aperto de mã o
com Miguel e meu pai o puxou para um abraço caloroso, daquele bem
barulhento.
— Você está linda, Bea. — Beijou levemente meu rosto e deu uma
piscadinha.
— Oi, Blake, obrigada. — Foi o má ximo que consegui falar e, para a
minha sorte, Olívia entrou no ambiente barulhenta como sempre.
— Finalmente chegaram. — Abraçou-me como se nã o tivéssemos
passado a tarde toda grudadas.
— Deixe de exagero, que chegamos no horá rio combinado.
— Olá , Miguel, que bom te reencontrar. Tem cuidado da minha amiga
direitinho? — Olívia abraçou meu namorado, como se já fossem muito
íntimos.
— Tenho dedicado todo o meu tempo quando nã o estou trabalhando
para cuidar da Beatrice, tenho certeza de que ela nã o tem queixas a
fazer.
— Uau, esse sotaque é de verdade ou você dá uma forçadinha quando
diz o nome da minha amiga? — As brincadeiras da Olívia eram ó timas
para descontrair o ambiente sempre pesado que se instalava quando
Blake e eu estávamos no mesmo local.
O jantar foi ó timo, com muita risada e nossos pais nos envergonhando
com as histó rias de quando eu e Olívia éramos adolescentes. Felizmente,
ninguém tocou no assunto do acidente.
Deu para perceber o pouco entrosamento entre Lucy e Blake, tinha
realmente algo estranho acontecendo entre os dois, mas procurei tirar
isso da cabeça, afinal nã o era da minha conta.
O ponto alto da noite foi uma das sobremesas servidas. Para a minha
surpresa tinha sido preparada por Blake. Um tiramissu19 maravilhoso.
Nesse momento percebi que realmente tinha talento e ele acertou na
decisã o de dedicar-se à Gastronomia como forma de diminuir o
estresse do trabalho.
Encerramos a noite sem maiores problemas, exceto no final quando me
despedi de Blake. Quando nos abraçamos ficamos um tempo a mais do
que o normal, me tirando um pouco do ar. Apenas a voz firme de Miguel
me tirou do transe.
— Vamos, Beatrice. — Quando ouvi a voz grave de Miguel, me afastei de
Blake sem dizer nada. Enquanto o espanhol se adiantou e segurou a
minha mã o, podia jurar que ele estava amuado.
— Desculpe o atraso, Liv. Depois da cirurgia fiquei em reuniã o com a
minha equipe, que está fazendo uma pesquisa importante e precisava da
minha ajuda. — Cheguei quarenta minutos atrasado ao restaurante,
onde a Olívia me aguardava para o “almoço dos irmã os”, como ela
costumava chamar.
— Sem problemas, quando você me avisou que iria atrasar, aproveitei
para passar em uma loja de lingerie que tem aqui perto, quero fazer uma
surpresinha para o meu marido, que hoje cedo me ligou cheio de
saudades. — Deu um sorrisinho safado.
— Liv, nã o quero ouvir esses detalhes íntimos, na minha cabeça você
ainda é uma adolescente, por favor, poupe seu irmã o — brinquei, afinal
ela já era uma mulher adulta.
— Blake Lancaster, você é um careta convicto, achei que com o tempo
você melhoraria, mas te entendo, nã o imagina que sua irmã zinha faz
loucuras entre quatro paredes. — A pestinha gargalhou sonoramente.
— Chega de conversa, Liv, vamos fazer nosso pedido. Estou morrendo de
fome. — Como sempre, nã o dispensamos uma boa massa.
Depois que o garçom saiu, percebi que minha irmã estava um pouco
apreensiva, alguma coisa a estava incomodando.
— Entã o, minha pequena, o que a está chateando? Sua empresa está
indo bem? Problemas com o David já vi que nã o é, depois dessa sua
declaraçã o. — Fiz careta em protesto mais uma vez pelo assunto.
— Comigo está tudo ó timo, minha preocupaçã o é com você. Desde que
cheguei em Nova Iorque, nã o escutei você dando uma gargalhada, está
sempre tenso, nã o vi um ú nico carinho feito na Lucy e nem ela em você.
Estou aqui, pode se abrir. — Olívia segurou a minha mã o com ternura, já
me senti mais calmo.
— Já faz algum tempo que eu e a Lucy estamos aos poucos nos
afastando, parecemos mais colegas de apartamento do que um casal de
verdade. Nã o sei o que está acontecendo, a cada dia nos tornamos mais
distantes. Conversamos coisas do trabalho, mas a cumplicidade que um
dia tivemos, nã o existe mais. O sexo entã o é bem sofrível, quando
acontece é quase mecâ nico.
— O que está me dizendo, Blake? Vocês estã o na flor da idade, onde o
fogo do sexo está em alta, por mais que trabalhem muito, nã o justifica
essa apatia que você está relatando. — Olívia esfregou as mã os nas
pernas notadamente nervosa.
— Princesa, eu nã o quero que você se preocupe com isso. Eu vou
resolver, nó s somos adultos e sempre nos demos bem.
— Agora é tarde, irmã o, já estou preocupada, nã o me esconda nada.
Você tentou conversar com ela? A base de um casamento feliz é o
diá logo. Nã o vê como sã o os nossos pais, podem se estressar, discordar,
até ficam emburrados um com o outro por um tempo, mas logo tudo é
resolvido com muita conversa.
— Eu sei bem disso, por diversas vezes já tentei iniciar uma conversa
com a Lucy, no primeiro momento ela sempre se esquivava quando eu
queria falar sobre filhos, agora ela foge de qualquer assunto, sempre
está cansada ou envolvida com algum problema do hospital.
— E tem outra coisa, Liv... — Abaixei a cabeça encostando a testa no
dorso das mã os.
— O que você está me escondendo, Blake, tem a ver com a Bea?
Minha irmã era uma á guia, nã o ia sossegar enquanto nã o tirasse tudo de
mim.
— Desde que retornamos, nã o paro de pensar na Beatrice. Sonho com
ela quase todos os dias, os momentos que vivemos no passado estã o
vivos demais em minha mente — falei olhando para baixo sem coragem
de encarar a pequena sargenta.
— Blake, esse trem já passou e você nã o subiu nele, esqueça isso. A Bea
finalmente está gostando de alguém, você nã o tem o direito de perturbar
a vida dela, nã o agora. Eu sabia, notei uma certa inquietude de vocês
dois no dia do jantar, mas achei que era coisa da minha cabeça.
— Você sabe que naquela época eu fiquei muito encantado com tudo o
que aconteceu entre nó s, mas eu tinha um objetivo e, infelizmente,
naquele momento eu nã o poderia dar a Beatrice o que ela realmente
merecia. Ela é muito especial, se tornou uma mulher incrível e está me
tirando do eixo.
— Me prometa que vai deixá -la em paz, ela passou toda a adolescência
sonhando com você, quando finalmente resolveu se declarar foi muito
segura, sabia que nã o o teria de verdade, mas ela pagou para ver. Ela
sempre foi louca por você desde o primeiro dia que colocou os olhos em
você.
Ainda bem que nosso almoço chegou, precisava respirar um pouco.
Enquanto o garçom nos servia ficamos em silêncio, mas, assim que se
afastou, a tortura voltou.
— Irmã o, você tem que focar em resolver os problemas do seu
casamento, talvez seja somente uma fase, avalie isso junto com a Lucy,
mas vocês precisam ser sinceros quanto aos sentimentos. Nã o confunda
sua cabeça, caso vocês cheguem à conclusã o de que a soluçã o é
realmente a separaçã o, aí sim você analisa o que realmente você sente
pela Bea. Até lá , nã o a procure em hipó tese alguma.
Confirmei com a cabeça, olhei para ela e desviei rapidamente como um
covarde.
— Tem uma coisa...
— Desembucha, dr. Lancaster, já estou perdendo a paciência. Qual foi a
parte do “não me esconda nada” que você nã o entendeu? — Pronto, lá se
foi a irmã compreensiva e paciente.
— No dia que a Bea deixou o hospital, quando fui assinar sua alta
entreguei um lírio rosa para ela.
Olívia praticamente pulou da cadeira.
— Caralho, Blake! — Pelo menos abaixou a voz quando xingou. — Onde
você está com a cabeça? Essa histó ria do lírio novamente? Nã o pode
ficar dando sinais de que a quer como se fosse um homem solteiro, agir
assim é uma irresponsabilidade e nã o é justo com a minha amiga.
— Eu sei, eu sei. — Toquei na minha aliança de casamento, ela passou a
me incomodar nos ú ltimos dias. — Eu vi que ela usa até hoje a pulseira
com o pingente que dei de presente e, quando comentei sobre isso, ela
nã o se esquivou, ao contrá rio, disse que nunca o tirou. Isso mexeu
comigo, você acha que ela ainda pensa em mim? — questionei
parecendo um adolescente.
— Isso nã o posso afirmar, já que, desde que ela se envolveu com o
Miguel, eu evito falar sobre você, aliá s, isso já é um acordo antigo entre
nó s duas, desde que você se casou. Você é um assunto proibido nas
nossas conversas. — Essa revelaçã o me pegou de surpresa.
— E esse Miguel, de onde surgiu, o que ele faz, quais sã o suas intençõ es?
Definitivamente nã o fui com a cara dele e acho que a antipatia é mú tua,
trocamos pouquíssimas palavras.
— Parece que ele é só cio em uma galeria de uma amiga da Nena, além
disso tem uma empresa de engenharia e arquitetura. Eu gostei dele e
parece que está gostando da Bea, a trata como uma rainha.
“Desnecessá ria essa ú ltima informaçã o”, pensei.
— Nã o seja um escroto, me prometa que nã o vai voltar a perturbar a
cabeça da minha amiga. Você precisa saber o que quer, decidir se vai
continuar seu casamento independente da Beatrice. — Minha irmã foi
firme e nã o pude contestar, pois ela estava coberta de razã o.
— Fique tranquila. Pelo que estou percebendo, o universo nã o quer me
unir à Beatrice, vou me afastar, pelo menos até resolver o caos que virou
a minha vida.
Terminamos nosso almoço com assuntos mais amenos e nos
despedimos, pois tinha que voltar para o hospital. Hoje terei uma
conversa séria com Lucy.

Depois de encerrar meu expediente no hospital, antes de ir embora,


tentei falar com a Lucy, mas ela ainda estava em reuniã o com o dr. Lucas
Carter, novo médico contratado e que também estudou conosco em
Londres.
Desde que decidimos voltar para a América, Lucy sugeriu o nome dele
para integrar a equipe de ginecologia e obstetrícia que meu sogro estava
formando. Particularmente, nã o achei que ele foi a melhor escolha, mas
o médico e a minha mulher eram amigos de longa data, entã o preferi
nã o me intrometer.
Por volta das oito da noite, Lucy chegou em casa. Já estava com o jantar
pronto, vinho gelado. Hoje nó s iríamos conversar de qualquer jeito.
— Oi, Blake. Demorei um pouco, a conversa com o Lucas se prolongou
mais do que o planejado. — Deu-me um beijo insosso, mal encostou seus
lá bios nos meus.
— Sem problemas. O jantar está pronto, vai tomar banho antes ou
podemos comer agora? Precisamos conversar.
Ela me olhou sem entender.
— Vou tomar um banho rá pido. — Saiu em direçã o ao nosso quarto.
Achei que Lucy estava demorando de propó sito, tentando evitar nossa
conversa, nunca vi um banho tã o longo.
— Demorei um pouquinho, meu pai ligou querendo saber como tinha
sido a reuniã o com o Lucas.
— Achei que ele também estava na reuniã o com vocês.
— Ele teve um compromisso fora do hospital, mas antes alinhamos tudo.
Entã o, o que você quer conversar?
Comecei a servir o jantar e o vinho. Brindamos e comecei a falar:
— Como você está se sentindo com relaçã o ao nosso casamento? Está
feliz?
— Blake, se você vai começar com aquela conversa de filhos novamente,
acho melhor parar. Esta é uma situaçã o que ainda nã o estou preparada
para enfrentar. — Já entrou no modo defensiva.
— Calma, Lucy, o que quero conversar tem a ver somente conosco, é
bem antes de planejarmos uma criança. O que quero saber é se a vida
que estamos levando está boa para você, se está como você planejou
quando decidimos nos casar. — Fui firme, hoje ela nã o ia se esquivar.
— É uma vida normal, muito trabalho. Sei que temos tido pouco tempo
para nó s dois, mas essas foram as nossas escolhas. Me diga você, como
está se sentindo? — Me devolveu a pergunta.
— Eu nã o estou feliz — sentenciei. — Sinto que nó s dois nã o temos mais
a mesma conexã o de antes, atualmente nã o passamos de dois colegas de
trabalho que moram juntos.
Seus olhos quase saltaram do rosto. Será possível que ela não percebia o
que estava acontecendo? Ficou parada por alguns instantes pensando.
— Acredito que seja normal depois de alguns anos de casados, o
relacionamento naturalmente cai na rotina e as coisas ficam mais
mornas mesmo. Você achou que faríamos sexo como coelhos para
sempre? — Revirou os olhos, nitidamente irritada.
— Posso até concordar com você quando as pessoas estã o juntas por
décadas, o que nã o é o nosso caso. Entretanto, temos o exemplo dos
meus pais que estã o fazendo quarenta anos de casamento e é inegável a
cumplicidade dos dois, nã o se desgrudam, sã o carinhosos e até onde eu
e a Liv sabemos, o sexo entre eles ainda é bem vigoroso.
Ela fez mençã o de levantar-se da mesa, mas segurei sua mã o. Meu
objetivo era sincero, queria muito resolver essa situaçã o. Quando a pedi
em casamento, mesmo nã o sendo muito apaixonado, era para sermos
felizes e formarmos uma família, mas, pelo que estava percebendo, esse
era um sonho só meu.
— Blake, onde exatamente você quer chegar com essa conversa?
Respirei fundo novamente, minha cabeça latejava.
— Primeiro gostaria que você respondesse à s minhas perguntas, de
forma simples e honesta. — Agora eu é quem estava irritado.
— Nã o, Blake, também nã o estou feliz. Temos objetivos conflitantes
atualmente, me acostumei com a nossa vida, mas estou disposta a tentar
recuperar o que tínhamos. Qual a sua sugestã o?
— Fico feliz que você queira fazer algo para melhorar. — Segurei sua
mã o depositando um beijo e olhando-a diretamente em seus olhos. —
Tenho uma sugestã o. — Continuei segurando sua mã o. — Estava
pensando no pró ximo final de semana irmos para os Hamptons, só nó s
dois. Você gosta tanto da casa dos meus pais. O que acha? — perguntei
animado.
— Pode ser, estou precisando descansar um pouco. Se você nã o tiver
nenhuma cirurgia programada, podemos sair logo apó s o almoço. —
Finalmente vi um sorriso em seu rosto.
Será que há uma esperança para que as coisas voltem para os trilhos?
— Nã o tenho nada além de uma reuniã o com os residentes, que posso
fazer na quinta-feira no final do dia ou na sexta logo cedo. Vou pedir
para a Audrey organizar isso.
Depois de aparentemente começarmos uma nova fase, conversamos
sobre o hospital e outras coisas triviais. Ela me ajudou com a louça do
jantar, terminamos de beber o vinho e, quando fomos para o quarto, a
envolvi em meus braços, trocamos um beijo mais acalorado, porém nã o
passou disso.
— Blake, preciso dormir. Amanhã tenho que chegar cedo ao hospital.
Você se incomoda se nã o transarmos? — Lá estava a Lucy dos ú ltimos
tempos.
— Claro que nã o. Eu também estou muito cansado. Só achei que, depois
da nossa conversa, essa seria uma etapa a ser retomada também.
— Teremos todo o final de semana para recuperarmos o tempo perdido.
— Lançou-me um sorriso amarelo e foi para o closet se trocar.
Minha vontade era de deixá -la sozinha no quarto, abrir outra garrafa de
vinho e me entorpecer com o á lcool até dormir. Mas de fato amanhã
seria um dia complicado e nã o queria dar motivo para ela me acusar de
estar interessado puramente no sexo.
O final de semana chegou rá pido, deixamos Nova Iorque por volta das
13h em direçã o aos Hamptons, mas por conta do verã o a viagem durou
mais tempo do que o normal, o trâ nsito estava bem pesado, passamos
quase três horas na estrada.
Depois da nossa conversa, no início da semana, parecia que Lucy estava
se esforçando para nos conectarmos mais, começou a enviar mensagens
de texto querendo saber quando eu iria para casa, me convidando para
almoçar, se demoraria na aula de gastronomia, enfim, parecia que a
conversa surtiu algo positivo.
Por outro lado, eu também estava me dedicando mais, sempre preparava
para o jantar pratos que sabia que ela gostava. Outro dia encomendei o
jantar e mandei entregar em sua sala, pois sabia que estaria em reuniã o
até tarde. Essa viagem seria mais uma oportunidade de nos abrirmos e
finalmente abandonar toda essa fase ruim.
Depois de nos instalarmos, fui verificar a despensa, ainda bem que me
lembrei de enviar ontem uma lista de compras para o nosso caseiro, que
providenciou tudo, entã o estávamos abastecidos.
Demos uma volta na praia, curtimos o pô r do sol e, quando a fome bateu,
eu quis preparar algo para nó s, mas Lucy preferiu sair para jantar em
um restaurante de frutos do mar que eu costumava ir com os meus
amigos nas férias.
Ao retornarmos para casa, coloquei uma mú sica româ ntica e ficamos
dançando na varanda por algum tempo, o clima estava ó timo e
finalmente fizemos sexo, sim aquilo nã o foi amor. Eu confesso que estava
empolgado, sempre soube como agradá -la, mas a apatia e a falta de
entusiasmo de Lucy quase me impediram de gozar, em determinado
momento já estava querendo que tudo acabasse logo.
Lucy sempre teve medo de engravidar, quase nunca esquecia de tomar a
pílula e, quando eventualmente nã o lembrava, ela mesma sugeria que eu
usasse o preservativo. Como hoje nã o nos protegemos, tinha certeza de
que estava fora de perigo, como ela costumava falar, entã o nã o me
preocupei.
Depois que tudo terminou, tomamos um banho separadamente, ela deu
boa noite e encerrou o dia. Simples assim.
— Lucy, vamos conversar um pouco? — Fiz uma tentativa.
— Hoje nã o, amanhã conversamos, o dia foi longo e estou exausta.
Deixei-a no quarto e fui dar uma caminhada no jardim, precisava
desestressar, conversar com alguém, essa situaçã o estava me tirando a
paz. Nã o era tã o tarde, entã o liguei para a pessoa que mais confiava no
mundo.
— Blake, o que houve, você me ligando a essa hora? Está tudo bem por aí?
— Minha irmã disparou o interrogató rio em uma ú nica respiraçã o.
— Está tudo bem, ou melhor...
— Desembucha, Blake. O que houve, onde você está, não foi para os
Hamptons?
— Na verdade estamos aqui, mas eu precisava conversar com alguém ou
ficaria louco. Liv, nã o tem jeito, nã o dá mais. — As palavras saíram da
minha boca como um pedido de socorro.
— Calma, respira, você está muito nervoso, me diga o que aconteceu?
— A tentativa de salvar o meu casamento caiu por terra. Chegamos aqui
no final da tarde, na minha cabeça estava indo tudo relativamente bem,
mas depois que fizemos um sexo meia boca, a ficha caiu. Nã o tem como
recuperar uma relaçã o somente com uma pessoa se esforçando.
— Você me falou que parecia que vocês estavam se conectando
novamente. O que foi exatamente que aconteceu?
— Acho que estava me iludindo, me agarrando a cada fagulha de um
sentimento que verdadeiramente nã o existe mais. — Eu estava triste,
frustrado e decepcionado.
— O que a Lucy disse afinal? — Minha irmã questionou, tentando me
ajudar.
— A viagem foi tranquila, o jantar foi ó timo, ainda que parecendo
amigos, mas o sexo foi um desastre. Ela estava mecâ nica, calada, sem
emoçã o. A fiz gozar, só que agora, falando com você, tenho dú vida se nã o
foi fingimento. Depois de satisfazê-la, eu me concentrei para terminar
logo e, quando tudo acabou, ela disse que estava cansada e preferiu
dormir a conversar comigo.
— Isso não faz bem a ninguém, nenhum de vocês merece uma vida assim.
— Senti a voz de Olívia meio trêmula, tive certeza de que estava
chorando.
— Nã o dá mais, nã o é só pelo sexo ou melhor pela falta dele, sou um
homem carinhoso, gosto de ter minha mulher por perto, dividindo tudo,
brincando e até brigando, mas essa coisa inerte, letá rgica, nã o é para
mim.
— Foi como te falei naquele dia quando almoçamos. Vocês são muito
jovens para ter uma vida de merda dessa. Sou testemunha de que você
tentou, mas, se chegou ao seu limite, eu lamento muito. Estou aqui para te
apoiar, caso decida se separar.
Ficamos conversando por mais uma hora. Quando nos despedimos, eu
estava mais tranquilo, entã o resolvi fazer uma das coisas que mais me
acalmava: tirei toda a roupa e nadei até a exaustã o.
Com tudo o que estava acontecendo, pelo menos consegui dormir a
noite toda. Quando acordei, Lucy estava na cozinha preparando nosso
café e ela foi a primeira a falar:
— Acho que nã o está dando certo, nã o é?
Olhei-a espantado e ela percebeu.
— Você tem razã o, eu nã o estou feliz, você também nã o. Talvez esteja na
hora de seguirmos nossos caminhos como amigos, nã o mais como
marido e mulher.
O alívio foi instantâ neo, tirei um peso das minhas costas, principalmente
porque a iniciativa partiu dela. Nã o queria magoá -la, mas a minha
decisã o também já estava tomada.
— Fale alguma coisa, Blake. Era isso que você queria, nã o é?
— Sinceramente nã o, eu queria retomar nossa vida. Mas depois de
ontem à noite entendi que o melhor a fazer é cada um seguir a sua vida,
mas confesso que você me surpreendeu. Só falaria com você quando
retorná ssemos para casa.
— Entã o foi melhor assim, nesse caso acho melhor irmos embora, assim
podemos passar o resto do dia de hoje e amanhã resolvendo as coisas
prá ticas, concorda?
Confirmei com a cabeça e dei-lhe um abraço, aliviado.

Passamos parte do domingo conversando e separando algumas coisas


para eu me mudar na segunda-feira. Almoçamos com os pais da Lucy e
resolvemos deixá -los cientes da nossa decisã o. A notícia foi recebida
com surpresa por eles, mas, depois de conversarmos bastante, eles
entenderam que esse era o melhor caminho a seguir.
Depois do almoço, as mulheres ficaram conversando e meu sogro, agora
ex-sogro, me convidou para tomarmos um café em sua biblioteca.
— Blake, eu lamento muito que você e minha filha nã o estejam mais se
entendendo, eu já tinha percebido que algo estava desandando, vocês
parecem mais colegas de trabalho do que marido e mulher. — Andrew
puxou uma cadeira e me ofereceu um charuto além do café expresso.
Aceitei somente o café, nã o gostava do cheiro do charuto.
— Eu também nã o estou nada feliz, mas a relaçã o desgastou de maneira
irreversível e essa nã o foi uma decisã o unilateral — esclareci, afinal nó s
chegamos juntos à mesma conclusã o.
— Vocês sã o jovens, podem recomeçar. Quem sabe, você ainda consiga
realizar o seu sonho de ser pai. — Ele me pareceu sincero, nã o senti que
era uma especulaçã o para saber se eu já estava com alguém. — Espero
que o término do casamento, nã o interfira no excelente trabalho que
você desenvolve no hospital. Nã o posso perder um profissional do seu
gabarito. — Olhou-me seriamente soltando aquela fumaça horrorosa na
minha direçã o.
— Isso nem passou pela minha cabeça, fique tranquilo, nada afetará
minha dedicaçã o à cardiologia e ao hospital. — Fui firme na minha
declaraçã o, pois, a partir de agora, o meu trabalho seria ainda mais a
minha prioridade.
Encerramos a nossa conversa mais aliviados, apesar de ter certeza de
que Andrew nã o confundiria as coisas.
À noite, foi a vez de darmos a notícia para os meus pais. Como já era de
se esperar, minha mã e chorou muito, perguntou se nã o poderíamos
conversar e reconsiderar, mas ao final acabou entendendo que
estávamos seguros da nossa decisã o.
A segunda-feira foi um dia bastante complicado, tinha duas cirurgias e
reuniõ es com a equipe de pesquisa, mas no final do dia estava
confortavelmente instalado em um hotel.
Acreditava que uma separaçã o nunca era fá cil para ninguém. Nã o
tivemos brigas e nem acusaçõ es, tudo aconteceu da melhor maneira que
a situaçã o permitia. Ainda assim, tive certeza de que a Lucy estava
sofrendo tanto quanto eu.
Minha irmã me ligou vá rias vezes hoje, mas nã o consegui atender.
Mesmo sendo bem mais nova, o nosso vínculo era muito só lido e sua
opiniã o era extremamente importante para mim, mesmo quando estava
puta comigo. Achei melhor enfrentar logo a fera.
— Finalmente lembrou que tem irmã? — brincou, mas sabia que ela
estava em có licas para falar comigo.
— Desculpe, Liv, o dia hoje foi bem caó tico. Só agora parei um pouco,
tomei um banho e estou largado na cama.
— Como você está se sentindo? — Senti um pouco de tristeza em sua voz.
— Nã o se preocupe comigo, estou bem apesar de tudo. — Fui sincero. —
Estou mais aliviado. Nã o tinha como ser diferente, e no fim, a sugestã o
da separaçã o inicialmente partiu da Lucy, para a minha surpresa.
— Acho que agora vocês poderão ser apenas bons amigos, afinal não é
porque um casamento não deu certo que as partes devem se tornar
inimigas, ainda mais na situação de vocês, que trabalham juntos.
— Se depender de mim, assim será . Quando virá aqui? Vou precisar de
sua ajuda para achar um apartamento do jeito que você sabe que gosto.
Olívia sempre teve muito bom gosto.
— Tá bom, lindo como você é não faltarão assanhadas para ajudar nessa
sua empreitada. — A pirralha já começou a pegar no meu pé.
— Este tema por enquanto está totalmente fora de cogitaçã o. Nã o quero
envolvimento com ninguém, preciso de um tempo sozinho para
repensar os meus objetivos de vida.
— Uau! Foi profunda essa sua declaração, querido irmão recém-solteiro.
Pronto, agora eu nã o terei sossego.
— Sério, Liv, nã o demore a vir, vou precisar muito de você. — Fiz
muxoxo para convencê-la.
— Não se preocupe, em breve chego aí, dessa vez o David também irá
comigo — prometeu.
— Bom, minha pequena, seu velho irmã o precisa finalmente dormir.
Achei que esse dia nunca teria fim, nos falamos amanhã , ok?
— Com certeza, agora vou querer um diário da sua solteirice. E Blake... —
“Lá vem ela”, pensei. — Nem seja louco de se aproximar de Beatrice, ok?
Ela está muito feliz com o Miguel — falou firme. Todo o carinho comigo
desaparecia quando o assunto era Beatrice.
— Fique tranquila, Beatrice nã o será importunada. Como você mesma
disse, esse trem eu perdi. — A verdade era que infelizmente só pensava
nela.
— Melhor assim. Durma bem, meu querido.
— Você também, princesa.
Então é isso, Blake Lancaster, agora você terá que reaprender a ser
solteiro.
Apaguei a luz do abajur e, finalmente, o sono me venceu.
As semanas pó s-cirurgia tinham sido de readaptaçã o, tentei diminuir o
ritmo de trabalho e finalmente eu e o Miguel conseguimos fazer a
viagem que ele tanto planejava.
Passamos dez dias na Espanha, ele me levou para conhecer lugares
incríveis, pude perceber que estava bem envolvido. Eu era tratada como
uma rainha e ele nã o media esforços para me agradar.
Eu estava bem confortável com nossa rotina. Agora que retornamos para
Nova Iorque, ele passava as noites em minha casa, o que nos
proporcionava momentos de muito prazer e tranquilidade. Entretanto,
posso afirmar que está longe de ser parecido com o que vivi com Blake
nos poucos dias que ficamos juntos no passado. Nunca terei algo que
chegue perto do que senti quando estive ao lado dele. Infelizmente,
acredito que meu coraçã o jamais vivenciará as emoçõ es que aqueles
olhos azuis me proporcionaram um dia, me sentia completa em seus
braços.
O sentimento nunca deixou de existir, tanto que bastava encontrá -lo,
para o meu mundo virar de cabeça para baixo. Para manter minha
cabeça no lugar, eu tentava guardá -lo bem escondido, já que resolvi
tentar algo mais sério com Miguel, contudo, nã o tinha conseguido muito
sucesso. Por mais que me esforçasse, Blake sempre estava em meus
pensamentos, era mais forte do que eu.
— Terra chamando Beatrice Tomarolli! — A engraçadinha da Helena
entrou em minha sala sorrateiramente e me pegou perdida em minhas
memó rias.
— Estava aqui pensando na pró xima coleçã o — menti descaradamente.
— Para mim, você nã o precisa fingir, já te conheço o suficiente para
saber que estava sonhando acordada e nada tem a ver com trabalho. —
Colocou dois dedos na direçã o dos seus olhos, depois apontou para os
meus.
— Pois está completamente enganada, cara amiga. Vamos almoçar? Hoje
saí atrasada, comi somente uma maçã , meu estô mago está grudando das
costas. — Levantei-me mudando de assunto.
— Passei aqui justamente para saber se você já estava pronta para
irmos. Depois do almoço temos uma reuniã o com aquele importador de
pedras do Brasil, ele me adiantou que está com um material riquíssimo.
— Ó timo, preciso mesmo de algo para me inspirar. — Peguei minha
bolsa e finalmente saímos.
Helena assumiu muito mais coisa na empresa do que apenas a parte de
marketing. Isso foi ó timo, me deixava mais livre para as criaçõ es.
Como sempre, sair com Helena era uma espécie de comédia dramá tica,
suas aventuras româ nticas poderiam gerar uma boa histó ria e quem
sabe até um filme. Ela nã o conseguia manter um relacionamento por
muito tempo. Ao contrá rio de mim, nunca se apaixonou e nã o se apegava
a ninguém.
Já tínhamos até pedido a conta quando Helena subitamente segurou
minha mã o, assustada.
— Bea, se você nã o quiser dar de cara com o seu passado nã o se mexa.
— Nem precisou me dizer a quem se referia. Obviamente meu coraçã o,
já percebendo o que estava acontecendo, disparou como um cavalo em
meio a uma corrida desenfreada.
— Você tem certeza, Helena?
— Jamais esqueceria aquele peitoral, é o seu médico gostosã o sim e
lamento informar que ele já nos viu e está vindo para cá — ela falou
entredentes com um sorriso para disfarçar.
— Que surpresa encontrar vocês por aqui! — falou já beijando o meu
rosto e, em seguida, fez o mesmo com Helena.
— Olá , Blake, pena que já estamos de saída — Helena esclareceu e ele
nem ligou.
— Como você está , Bea, tem feito as revisõ es com seu médico?
Que inferno de homem que mexe comigo.
— Estou ó tima e sim, tenho feito as revisõ es, o médico inclusive já me
liberou para uma vida normal. — Sorri meio sem graça e nossos olhos
congelaram por milésimos de segundo, mas foi o suficiente para me
abalar.
— Está bem até demais, acabou de chegar de uma viagem da Europa. —
A língua solta da minha amiga já foi dando relató rio.
— Fico mais tranquilo em saber disso. Mas nã o quero atrapalhar, estou
com algumas pessoas em outra mesa. Muito bom ver vocês. — Piscou
para Helena, beijou o meu rosto novamente e juro que ele demorou mais
do que o normal.
Pagamos a conta surpreendentemente sem emitirmos uma palavra,
como se tivéssemos feito um pacto de silêncio, até finalmente
ganharmos a calçada da rua e o ar finalmente voltar para os meus
pulmõ es. Será que isso nunca vai mudar?
“Talvez você não queira mudar, Bea”, minha consciência
inconvenientemente se manifestou.
— Por Deus, Beatrice, como você consegue sobreviver a essa tensã o?
Nã o teve uma ú nica vez que presenciei o encontro de vocês que o ar nã o
ficou denso. Até eu estou nervosa. — A exagerada começou a se abanar
com sua bolsa de grife.
— Deixe de drama, Helena, você está vendo coisa onde nã o existe. Ele foi
gentil, apenas isso. — Tentei disfarçar, mas falhei miseravelmente.
— Minha querida, posso nã o ser a melhor conselheira amorosa, aliá s,
esse posto nunca será meu, deixo para a Katie ou sua cunhada, mas que
vocês dois sã o fogo e gasolina, isso eu nã o tenho dú vida — falou como
sempre sem filtro algum.
— Acho melhor nos apressarmos, você sabe que detesto chegar atrasada
aos compromissos, principalmente quando sã o de trabalho. — Tentei
me esquivar do seu olhar inquisidor.
— Outra coisa, Bea amada, nã o sei se você percebeu, mas o dr. Mú sculos
nã o estava usando aliança. Foi a primeira coisa que reparei quando ele
se aproximou de nó s.
— Amiga, nã o viaja, provavelmente ele deve ter tirado no momento de
uma cirurgia e acabou esquecendo de colocar novamente. Que mente
criativa você tem, srta. Nevicare.
Para minha sorte, nosso Uber chegou e finalmente ela esqueceu o
assunto, pelo menos temporariamente. Mas sua observaçã o ficou
martelando em minha cabeça, ainda bem que nossa tarde seria ocupada
com muito trabalho, nã o teria tempo para divagaçõ es infundadas.
Como esperado, a reuniã o com o fornecedor foi produtiva, em breve
teríamos muito material para as minhas novas criaçõ es. Os esboços já
estavam sendo desenvolvidos com calma, ainda buscava inspiraçã o, nã o
cheguei em uma definiçã o, mas estava muito inclinada a fazer algo
ligado ao amor verdadeiro, entre casais e entre pais e filhos. Ainda tenha
um caminho longo a percorrer.
Estava tentando disfarçar desde o encontro com Blake mais cedo, mas
fiquei intrigada por ele nã o estar usando a aliança, porém, meu
argumento era plausível, ele poderia ter se esquecido de recolocá -la
depois de uma cirurgia, mas nã o podia negar que isso mexeu comigo.
Miguel avisou que hoje nã o passaria a noite aqui comigo, o que agradeci
silenciosamente, precisava colocar minha cabeça em ordem. Desde o
jantar na casa dos pais de Olívia que eu nã o encontrava com Blake. Nos
encontros virtuais com minha amiga, como fazíamos há algum tempo,
nunca falávamos do seu irmã o, mas hoje, nã o via a hora de nos
conectarmos para tentar saber algo que me tirasse dessa agonia.
Queria muito dormir cedo hoje, o sono era o melhor remédio para uma
mente sonhadora, mas precisava falar com Olívia. À s 21h, nos
conectamos, cada uma com sua taça de vinho. Nos primeiros minutos
sempre nos atropelávamos, falando tudo ao mesmo tempo, os temas
eram os mais aleató rios, uma loucura total. Se alguém observasse de
longe, certamente acharia que estávamos movidas pelo á lcool.
— Bea, agora que você já se recuperou totalmente, programe aquela visita
que você está me devendo? Já tenho uma lista enorme de restaurantes
maravilhosos que precisamos ir juntas.
— Eu sei que estou em falta com você, mas o período de repouso apó s o
acidente, em seguida, a viagem com o Miguel, estou com muita coisa
pendente, mas prometo que esse ano essa visita sairá . — Fiz um
juramento cruzando os dedos, como fazíamos quando éramos
adolescentes.
— E com o Miguel, como estão as coisas? Pelas fotos que você me enviou
da viagem, as coisas estão indo bem animadas. Finalmente, não é, amiga?!
Cinco segundos olhando para a câ mera e um suspiro sonoro foi o
suficiente para a Olívia Lancaster entender que algo nã o estava bem.
— O que está acontecendo, Beatrice? Já vou encher minha taça novamente
aguardando a explicação desse olhar disperso e essa respiração profunda
puxada de dentro da alma.
Ela entornou mais um pouco do líquido em sua taça exatamente igual a
minha, que ganhamos em uma visita a uma vinícola no Chile. Desde
entã o se tornou nosso amuleto e símbolo dos nossos encontros, nã o
eram usadas em outra ocasiã o.
— Nã o está acontecendo nada, lá vem você com suas pressuposiçõ es
infundadas. — Bebi um gole do vinho tentando ganhar um tempinho.
— Já conheço seu modus operandi20, portanto, pode disfarçar o quanto
quiser, mas não nos despediremos até você abrir seu coração, minha
querida aprendiz de Pinóquio.
— À s vezes, acho que você é meio bruxa. — Chegou a hora de finalmente
saber se Helena tinha razã o ou era mais um devaneio daquela mente
criativa.
— Nada disso, eu sou apenas a sua melhor amiga e sei ler você como
ninguém. — Nisso ela estava certíssima, além dela, só minha mã e me
conhecia tã o bem.
— Hoje eu e a Nena saímos para almoçar e, quando já estávamos
praticamente saindo do restaurante, encontramos com...
— Blake. — Nem deixou que eu completasse a frase. Bruxinha sem
dú vida. Revirei os olhos obviamente.
— Exatamente. — Houve um silêncio ensurdecedor dos dois lados.
Um gole de vinho depois, ela soltou a bomba.
— Ele e a Lucy estão separados.
Engasguei-me com o vinho, precisei beber um pouco de á gua para
finalmente me recuperar.
— Quando isso ocorreu, Olívia? O que aconteceu? — As palavras
pularam da minha boca descontroladamente.
— Já tem pelo menos uns quinze dias, não comentei nada com você, pois
estava cumprindo o nosso acordo de não tocarmos no nome do meu irmão.
Desculpe, amiga, mas você estava indo tão bem com o Miguel, não quis
atrapalhar sua vida.
— Mas agora você está autorizada a falar tudo.
Alguém lá em cima gostava de brincar comigo, agora tinha certeza disso.
Não é possível, Blake solteiro, de volta a Nova Iorque e eu comprometida?!
Isso sim é um divertimento do meu anjo da guarda.
— Então, já faz algum tempo que o Blake vem conversando comigo sobre
os problemas que eles estavam tendo, desencontros de ideias e objetivos,
na verdade. Acredito que o fator decisivo da separação foi a vontade que
ele tem de ser pai. Lucy sempre se esquivava do tema, então isso culminou
na decisão de um divórcio amigável.
— Quando encontramos com ele hoje, Helena percebeu que ele estava
sem aliança, mas acreditei que tinha sido apenas um esquecimento,
jamais imaginei que essa era a situaçã o. E como ele está ? — quis saber.
— Está bem, não foi uma decisão impensada. Desde Londres, as coisas já
não estavam bem, era questão de tempo. Ele saiu de casa, ainda está em
um hotel. Tem procurado um apartamento, mas, chato do jeito que é,
ainda não encontrou nada que o agradasse.
— Sério?! Essa novidade me surpreendeu de verdade. Como seus pais
receberam a notícia?
— Eles ficaram chocados inicialmente, mas entenderam que foi melhor
para os dois, já que não estavam felizes. — A família de Olívia era muito
unida.
Só agora as ideias estavam voltando a ser formadas em minha cabeça.
Nã o esperava por isso.
— O que você está sentindo, Bea? Está com uma cara muito assustada. Foi
uma surpresa, não é?
— Na verdade nem sei o que pensar, nã o imaginei que eles estavam
passando por problemas, mas de verdade eu sinto muito. Desfazer um
casamento nã o é algo fá cil de encarar. — Nã o estava mentido, eu
realmente lamentava a situaçã o.
— Mas foi melhor assim, eles são jovens, podem recomeçar e, quem sabe,
Blake realize o sonho de ser pai com outra pessoa.
— Outra pessoa? Ele já está com alguém? — Tum-tum-tum... o meu
coraçã o certamente estava com mais de cem batimentos por minuto.
Olívia começou a gargalhar, a bandida estava de gozaçã o comigo, eu nã o
podia acreditar nisso.
— Está rindo do que, Olívia? Só achei pouco tempo para ele já estar
namorando, nada demais.
E a outra continuava rindo.
— Bea, meu lírio, você ainda é louca por ele. — debochou e ainda usou o
apelido que Blake costumava me chamar.
— Está louca, Olívia! Nã o é nada disso! — Levei as mã os ao rosto, queria
gritar, sair correndo.
— Bea, sou eu, sua melhor amiga, não precisa esconder nada de mim, até
porque estou vendo escrito no seu rosto. Cada célula do seu corpo está em
alerta, confesse.
— Sim, sim, sim! — gritei. — Pronto, você tem razã o, eu ainda sou louca
por ele. Achei que tinha superado essa fase, mas depois que nos
reencontramos, ele nã o sai da minha cabeça. Aceitei viajar com Miguel
para me afastar um pouco daqui, até funcionou por um tempo, mas,
agora com essa notícia, meu estô mago está revirando, acho que quero
vomitar.
— Nada disso, respire fundo. Imagino como está se sentindo, mas você é
forte e não pode mudar sua vida de uma hora para a outra só porque o
gato do meu irmão está solteiro e disponível para as garras de alguma
assanhada.
A filha da mã e ainda continuava pirraçando.
— Olívia, vou desligar! — falei com raiva, ela percebeu que estava séria e
insatisfeita com sua brincadeira.
— Amiga, me perdoe, só estou querendo te distrair um pouco. Calma, já
parei. Vamos pensar em uma estratégia agora. A primeira coisa a ser feita
é avaliar os seus verdadeiros sentimentos por Miguel.
— Eu nã o o amo, isso está claro. Ele me faz bem, nos damos bem na
cama e está sempre muito empenhado em me fazer feliz.
— E você está feliz? — Cirú rgica como sempre.
— Acho que sim. — Nã o convenci nem a mim mesma, quanto mais a
minha amiga perspicaz.
— Amiga, não quero colocar caraminhola na sua cabeça, mas você precisa
decidir se quer seguir com o Miguel ou não, isso independente do meu
irmão. Não é justo com o espanhol, ele tem sido um cara bacana com você
— ponderou.
— Você tem razã o, Olívia, nã o posso criar um romance na minha cabeça
estando envolvida com Miguel, nã o é correto. Sem falar que Blake pode
nem lembrar mais da nossa histó ria. Preciso realmente entender meus
sentimentos independente dele, como você falou.
Ficamos ainda por um tempo rodando nesse assunto até esgotar, mas
uma coisa era certa: minha vida bagunçou geral, nã o tinha como fingir,
meu mundo desabou.
Nã o imaginei que teria uma noite completamente insone, mas foi isso
que aconteceu, bebi um chá , respirei, mas nada disso resolveu.
Praticamente vi o dia amanhecer, confesso que nã o fazia ideia do motivo
dessa agonia toda. Eu estava em um relacionamento com um homem
que me venerava, nos dávamos muito bem em tudo, era uma excelente
companhia, mas a verdade era que, desde que soube da separaçã o de
Blake, sentia-me incomodada.
“Será, Bea, que você já está fazendo planos, agora que seu grande amor
está livre?”, minha consciência me questionou.
Eu nã o era louca de logo agora começar a fazer planos depois de tantos
anos. Tinha que entender de uma vez por todas que Blake e Beatrice nã o
existiram, sempre foi tudo uma histó ria de amor platô nico e fim. Com
essa afirmaçã o, pulei da cama direto para um banho gelado.
O trabalho ajudava mocinhas româ nticas a caírem na realidade. Minha
agenda estava cheia hoje e nã o podia perder tempo com conjecturas
como se fosse uma adolescente.
— Bom dia, minha querida amiga, trouxe seu cappuccino no capricho. —
Helena entrou em minha sala com a animaçã o de sempre e eu mal tirei
os olhos do computador.
— Bea, o que aconteceu com você? Parece que um trem te acertou, aliá s,
Deus me livre, retiro o que disse, você já teve emoçã o demais nos
ú ltimos tempos. Mas sério, o que houve? Você está com a aparência de
quem passou a noite em claro.
— Foi exatamente isso que aconteceu — respondi completamente
desanimada. — Estou quase voltando para casa, minha vontade é de
ficar vá rios dias isolada de tudo.
— Ora, ora, temos novidades? Isso nã o é do seu feitio, querer abandonar
o trabalho no meio de uma manhã , onde temos uma agenda
apertadíssima. Você tem dez minutos para desabafar, e entã o voltaremos
a programaçã o normal. — Colocou as duas mã os em cima da mesa ainda
permanecendo de pé. Seu olhar estreitou como se quisesse adivinhar o
que estava acontecendo, entã o satisfiz sua curiosidade.
— O Blake e a Lucy se separaram.
Seus olhos quase pularam do rosto, ela puxou uma cadeira e sentou-se.
— Você está de brincadeira comigo? — Pegou o cappuccino que trouxe
para mim e tomou um gole.
— Ei! Este café é meu. — Puxei minha bebida de volta e bebi um gole
lentamente, senti o líquido quente descer pela garganta, dando um
pouquinho de alívio na minha melancolia.
— É sério? Isso é o que eu chamo de sacanagem do destino. Logo agora
que você está com o Miguel? É coisa recente? Será que tem chance de
voltarem? Como você soube disso? — Começou um interrogató rio
desenfreado.
— A Liv me contou no nosso encontro semanal. Essa novidade
aconteceu há alguns dias. Como nunca falamos sobre ele, já que é
assunto censurado, ela só me contou porque comentei que encontramos
com ele ontem no almoço — expliquei.
— Eu tinha razã o. Deveria trabalhar no FBI, lembra que comentei que
ele estava sem aliança? Eu sabia, meu instinto Sherlock Holmes nunca
falha. — Saiu andando de um lado a outro pela sala repetindo que era “A”
detetive. — Desculpe, amiga, me empolguei. Como você está com tudo
isso, pelo visto péssima, nã o é? — Voltou a sentar-se em minha frente e
afagou minha mã o.
Por que Helena é assim, sem filtro? Só balancei a cabeça concordando e
encostei minha testa em sua mã o.
— Acho que sua vida amorosa daria um bom livro, precisamos montar
uma estratégia, essa oportunidade pode nã o durar muito tempo, afinal o
dr. Barriga Sarada nã o ficará sozinho para sempre, ainda mais sabendo
que você está comprometida. — Começaram os devaneios da minha
amiga.
— Você está partindo do pressuposto que Blake estaria interessado em
mim? Você está viajando, Helena. Nã o comece a criar fantasias em sua
cabecinha criativa, ok?
— Nada disso, minha querida, se aquela inquietaçã o que presenciei no
hospital nã o significar algo, entã o eu nã o sei de mais nada nessa vida.
Aquilo é sim tesã o enrustido, e te dou um conselho: se Miguel nã o é o
amor da sua vida, tome logo uma atitude, a vida está te dando uma nova
chance e essa pode ser a ú ltima. Entã o saia do seu casulo, e agarre seu
homem de uma vez por todas — falou firme, me fuzilando com aqueles
olhos cor de mel.
Felizmente, minha secretá ria Naomi entrou na sala informando que o sr.
Bolliger, proprietá rio de uma joalheria renomada da Suíça, já estava
conectado para a videochamada na sala de reuniã o. Fechamos um bom
contrato com ele e precisamos definir agora toda as etapas dessa
parceria importante.
— Vamos lá , srta. Nevicare, deixe de conversa e vamos trabalhar. —
Levantei-me pegando todo o material para a reuniã o.
— Salva pela secretá ria, mas essa conversa nã o acabou, srta. Tomarolli.
Precisamos montar nosso plano de ataque ao dr. Gostosã o.
Meus dias de sossego acabaram, Helena não vai me deixar em paz.
Depois da reuniã o, almoçamos rapidamente e ainda bem que Helena
tinha uma reuniã o com outro cliente, eventualmente ela fazia alguns
trabalhos fora da minha empresa, estava com animaçã o zero para voltar
ao assunto que parecia tema de filme: “Blake o retorno”. Ri sozinha do
meu besteirol, mas Helena tinha razã o, minha vida amorosa daria um
romance clichê sem sombra de dú vidas.
Passei a tarde toda concentrada em novos desenhos, a reuniã o da manhã
com o sr. Bolliger me deu um novo gá s, o homem tinha uma criatividade
assombrosa, mesmo com mais de setenta anos. Além de comandar a
empresa, ainda tinha uma mente brilhante e aberta para novas ideias. A
intençã o era fazer algo clá ssico e elegante, exclusivo para as suas
joalherias. Deixei a mente viajar bastante e consegui iniciar algo bem
interessante.
— Com licença, Bea, nã o se esqueça de que, as seis e meia da noite, você
tem uma consulta com seu médico. — Minha secretá ria me tirou do
transe criativo, como minha mã e costumava falar quando eu estava
muito absorta desenhando.
— Que bom que você existe, Naomi! Tinha me esquecido
completamente. Já estou acabando aqui. — Finalizei o trabalho e saí em
direçã o ao hospital.
Que Deus me proteja, não quero cruzar com ele, não agora, preciso me
fortalecer um pouco. Pena que Miguel teve que viajar, ficaria quase duas
semanas fora. Queria muito que ele fosse comigo nessa consulta, assim
com toda certeza Blake ficaria mais distante.

Para a minha felicidade, estava tudo bem comigo, o médico me liberou


para voltar a fazer exercícios físicos, prescreveu apenas algumas
vitaminas e só precisava retornar caso sentisse algo diferente.
Apressei o passo quando saí do consultó rio, já estava me sentindo
aliviada por nã o ter me deparado com o Blake, mas quando entrei no
elevador quem estava lá ? O dr. Blake Lancaster.
Estaquei por alguns segundos, mas ele segurou o elevador e, quando
entrei, me abraçou me beijando no rosto.
— Nã o acredito que estava indo embora sem falar comigo? — brincou
colocando uma mecha do meu cabelo atrá s da orelha.
— Culpada. Estava mesmo indo embora. — Sorri brincando também. —
Nã o queria te atrapalhar na verdade.
— Você nã o atrapalha nunca. Podemos tomar um café ou você tem outra
coisa para fazer agora?
— Na verdade, eu tenho um compromisso e...
— E nada. Tenho uma ideia melhor do que um café — interrompeu-me,
sem me deixar explicar. — Você vai comigo em um lugar especial e muito
interessante. Estava agora mesmo chamando um Uber, meu carro deu
um problema no ar-condicionado, entã o você será minha motorista. Nã o
vai negar uma carona para um velho amigo, nã o é?
— Claro que levo você, mas posso saber pelo menos para onde estamos
indo? — Já chegando no estacionamento, ele segurou minha mã o e
negou com a cabeça.
— É surpresa, vou colocar o endereço no GPS para facilitar. — O local
nã o era muito distante, para o meu alívio nã o demoramos muito a
chegar no tal lugar.
— Lembra que comentei com você que estava fazendo aulas de
Gastronomia? De vez em quando, um aluno pode levar um convidado
para assistir a aula, você é a primeira pessoa que trago aqui. — Abriu
aquele sorriso lindo que me deixava sem açã o.
— Estou me sentindo honrada. — Fiz uma reverência brincando. — Vou
ter o privilégio de ver o renomado dr. Lancaster em açã o na cozinha?
— Isso mesmo, e ainda com direito a provar o prato que eu fizer. Vamos
lá , nã o gosto de chegar atrasado.
Mais uma vez, segurou minha mã o e seguimos como um casal. É claro
que fiquei em êxtase com esse gesto simples, que certamente para ele
era algo comum.
Fiquei completamente encantada, Blake era realmente muito habilidoso,
demonstrou uma desenvoltura incrível no preparo do prato,
extremamente concentrado, salvo algumas vezes que olhava em minha
direçã o e dava uma piscadinha sexy.
Nem percebi que já tinha passado mais de uma hora desde que
chegamos, achei tudo tã o interessante, algo realmente novo para mim.
Ao final da aula, os futuros chefs21 emprataram suas criaçõ es e serviram
em uma mesa enorme bem decorada. Todos os alunos, o professor e os
convidados sentaram-se em volta da mesa e, como se fô ssemos jurados,
começamos a saborear cada iguaria bem devagar.
Eu fechei os olhos degustando vagarosamente o peixe que Blake
preparou, impressionada com a explosã o de sabores em minha boca.
Quando abri os olhos, ele estava me observando com uma expressã o
engraçada.
— O que foi? — perguntei meio sem graça.
— Você parece uma jurada de verdade, ainda mais fazendo esse
suspense todo. E entã o, o que achou? Estou ansioso para saber sua
opiniã o — falou ao meu ouvido, o que me causou um arrepio
instantâ neo da cabeça aos pés.
— Mamma mia, che deliziosa22. — Fiz aquela expressã o típica dos
italianos, juntando os dedos nos lá bios e jogando um beijo para cima.
Todos que estavam à mesa aplaudiram o meu entusiasmo, me deixando
envergonhada.
— Fiquei achando que tinha dado uma bola fora, agora posso provar. —
Blake deu uma garfada e, sem modéstia, sorriu aprovando.
Depois do jantar, nos despedimos de todos e saímos conversando
animados e rindo como adolescentes.
— Blake, estou realmente impactada, você cozinha muito bem. Quando
descobriu esse seu talento? — Meu comentá rio era sincero.
— Morando muito tempo sozinho, sem ninguém para fazer minha
comida, sempre inventava algo para nã o morrer de fome, até que um dia,
uma colega, em Londres, me levou para uma aula experimental. E desde
entã o me encantei com a Gastronomia e com a possibilidade de dar asas
à s minhas invençõ es, só que com técnica, sem falar que é uma ó tima
opçã o para fugir do meu estresse do hospital.
— Isso sim foi uma bela surpresa. Bom, já está tarde. Vamos, vou te
deixar em sua casa. — Entramos no carro em silêncio, ele colocou seu
endereço no GPS, para a minha surpresa ele estava morando bem perto
de mim.
Passamos todo o percurso com ele me explicando sobre os pratos que
mais gostava de fazer, seu livro de receitas que começou a escrever, até
que finalmente estacionei em frente ao seu prédio.
— Bea, você me deixou muito feliz hoje. Quando quiser podemos repetir
essa aventura. — Segurou minha mã o e beijou lentamente, me olhando
nos olhos, fazendo os meus batimentos cardíacos acelerarem mais uma
vez.
— Obrigada, Blake, eu adorei a noite. — Demorou alguns segundos
ainda me olhando como se quisesse falar algo, mas em seguida saiu do
carro e acenou discretamente.
Já em casa, meu pensamento congelou na expressã o dele ao se despedir
de mim.
O que será que ele estava pensando naquele momento?
Abri uma garrafa de vinho da vinícola do meu nonno e liguei para a
minha mã e.
— Bea querida, está tudo bem? Está sentindo algo? — Minha mã e já ficou
preocupada, afinal estava um pouco tarde.
— Oi, mamma, está tudo bem. Liguei só para conversar um pouquinho.
— Como foi sua consulta? Está tudo bem mesmo?
— Relaxe, dona Katie, o médico até me liberou para voltar a fazer os
meus exercícios físicos. Mã e, você já está sabendo da novidade? —
Precisava conversar com ela sobre Blake.
— Do que você está falando, minha filha?
— O Blake e a Lucy se separaram — disse de uma vez sem rodeios e
senti que ela puxou o ar.
— Eu e a Ava almoçamos outro dia e ela me contou. Estava triste, porém,
conforme ela mesmo falou, foi em comum acordo. E, para ela, seu filho
está mais feliz agora. Como você ficou sabendo?
— A Liv me disse.
— Como você está se sentindo com essa informação? Isso mexeu de
alguma forma com você? — Foi direta, como sempre.
— Acho que sim e, para piorar, hoje nos encontramos no hospital e ele
me pediu para acompanhá -lo em sua aula de Gastronomia. Como estava
sem carro me pediu uma carona.
— E como foi? Não sabia que ele gostava de cozinhar.
— Foi ó timo, ele tem muito talento, a turma é bem animada e no final
degustamos os pratos que os alunos prepararam. Foi bem interessante.
— Fui pelo caminho mais fá cil, tentando despistar um pouco os meus
sentimentos.
— Você está bem com isso? Sentiu algo?
— Você sabe que o Blake nunca será um simples amigo, ele ainda mexe
comigo lamentavelmente. Quando nos despedimos, ele segurou minha
mã o e me olhou tã o profundamente, achei que queria dizer algo, sei lá .
— Bea, não crie fantasias, filha. E o Miguel? Vocês estão bem?
— Sim, está tudo bem com a gente, mas é justamente por isso que acho
tudo muito estranho, eu nã o deveria sentir nada na presença de Blake,
nã o é?
— Filha, você precisa entender seus sentimentos com relação ao Miguel,
independente do Blake, não é justo que você fique com ele se seus
sentimentos não forem verdadeiros. Isso é uma coisa a ser resolvida com
prioridade. Outra coisa é o que pode vir a acontecer entre você e Blake,
não é porque ele está solteiro agora que vocês terão finalmente uma
chance. — Minha mã e era sempre sensata e disse a mesma coisa que
Olívia.
— Minha cabeça está dando voltas desde que eu soube dessa histó ria;
por outro lado, tem o Miguel, ele é tã o maravilhoso comigo, nã o quero
magoá -lo — desabafei. — Mas você tem razã o, mamma, preciso
entender o que sinto de verdade por ele, independente do Blake.
Ficamos conversando mais um pouco, até que nos despedimos com a
promessa de passarmos o pró ximo final de semana nos Hamptons. Seria
ó timo o colo dela para me ajudar a pensar.
Já na cama, como era de se esperar, o sono nã o veio, as palavras de
minha mã e me perseguiram. Eu precisava entender os meus verdadeiros
sentimentos por Miguel, nã o podia viver nessa agonia. Preferi levantar-
me, fiz um chá e me sentei no meu cantinho de leitura. Quando os
primeiros raios do sol começaram a entrar pela janela, já tinha tomado
minha decisã o.
Nã o podia prever se eu e o Blake teríamos uma nova chance juntos, mas
a certeza que tinha era de que nã o podia mais continuar com o Miguel,
nã o era justo com ele e nem comigo. Ele era um cara legal e merecia
alguém que o amasse de verdade. Assim que ele chegasse, eu colocaria
um ponto final em nossa breve histó ria.
Estava amando minha nova rotina, totalmente dedicado a mim mesmo.
Desde que eu e a Lucy nos casamos, sempre priorizei a nossa vida
juntos, porque era assim que eu achava que deveria ser um casal,
entretanto, agora dedicava todo o tempo livre à s minhas coisas:
terminando a decoraçã o do meu apartamento, claro, com a ajuda da
minha mã e, já que a Olívia nã o apareceu conforme tinha prometido;
tenho lido mais, nã o só temas que envolvem a cardiologia, mas livros
épicos que sempre quis ler e nunca tinha tempo.
A lista das minhas receitas autorais estava crescendo bastante, quem
sabe um dia até lance realmente um livro. Tentava associar meus pratos
com o foco também na alimentaçã o saudável, já que tudo o que eu criava
pensava na qualidade dos ingredientes e nos benefícios que eles
poderiam trazer para a saú de.
O mais estranho de tudo era que achava sinceramente que sentiria falta
da minha ex, afinal ficamos um bom tempo juntos, mas a sensaçã o que
tinha era de que nos separamos há vá rios anos. Eventualmente nos
encontrávamos no hospital e nã o a sentia nem como uma amiga, mas
apenas como uma colega de trabalho. Conversávamos muito sobre o
hospital, pacientes, mas era como se nunca tivéssemos nos casado,
confesso que esse era um sentimento que nã o me agradava. Ela tinha se
distanciado bastante, mas percebia que estava mais leve, talvez até mais
feliz, brincando com os médicos, principalmente com o Lucas.
Por outro lado, tentava manter minha cabeça bastante ocupada, pois
uma certa italianinha nã o me deixava sossegado. Desde que a levei para
a minha aula de Gastronomia que estou com os dedos coçando para
convidá -la para sair, como amigos claro.
“Você está querendo enganar a quem, Blake?” Logo o pensamento me
condenou.
Não posso procurá-la, não tenho esse direito e, além de tudo isso, ela
parece estar feliz com aquele espanhol com cara de mafioso. Não posso
agora, do nada, querer retomar nossa história. Nã o seria uma atitude
correta visto que ela está comprometida.
O que mais me incomodava era que eu percebia que ainda existia algo a
ser resolvido entre nó s dois, nã o éramos indiferentes um para o outro.
Havia vá rios sinais que nã o conseguia deixar passar despercebido
quando nos encontrávamos. A respiraçã o que mudava, os batimentos
cardíacos que comprovadamente ficavam acelerados, sem falar no
pingente que ela usava até hoje. Nã o é possível que tudo isso seja coisa
da minha cabeça.
Ainda bem que na sexta-feira irei para os Hamptons. Resolvi passar o
final de semana lá sozinho, cozinhando, surfando, jogando vô lei, lá
sempre tinha uma rede armada na praia, quem sabe minha cabeça
entrava na linha e esquecia essa loucura de querer a Beatrice na minha
vida.
— Vamos lá , Blake! O dia será longo, além dessa cirurgia agora de
manhã , ainda temos mais duas na sequência depois do almoço, entã o a
previsã o é sairmos daqui bem tarde. — Kaleb entrou na sala de
descanso dos médicos me trazendo de volta dos meus devaneios.
— Já fui avisado que o paciente subiu para o centro cirú rgico, ainda bem
que meu café hoje foi reforçado, mal teremos tempo de almoçar. —
Levantei-me e dei um tapinha nas costas do meu amigo, ele era famoso
por sair esfomeado das cirurgias, quando passava do seu horá rio de
comer.
— Fale por você, bonitã o, pedi a minha assistente para providenciar o
meu almoço, caso essa cirurgia demore mais do que o previsto, tenho
hipoglicemia crô nica você sabe disso — mentiu, claro.
— Sei... — Saímos rindo, porque ele agora adotou essa desculpa para a
sua fome absurda.
Finalmente, depois de praticamente passar todo o dia em cirurgia,
encerrei meu expediente. Amanhã estará mais tranquilo, terei apenas
que acompanhar o pó s-operató rio dos pacientes. Como as três cirurgias
transcorreram dentro do esperado, acho que nã o terá nenhuma
intercorrência, sendo assim vou seguir com meus planos de deixar a
cidade na sexta-feira no final do dia.

O trâ nsito até os Hamptons estava caó tico, muito movimento na estrada.
Quando cheguei, já passava das 20h, entã o a ú nica coisa que consegui foi
tomar um longo banho, fazer um sanduíche gigantesco e beber duas
taças de vinho. Estava esgotado, nem vi quando adormeci.
Fazia tempo que nã o dormia tã o bem, talvez o vinho tenha contribuído
para me deixar relaxado, o fato é que acordei cedo e totalmente
renovado. Depois do café perfeito, coloquei minha sunga e saí em busca
da minha velha prancha de surfe, fiquei no mar por horas, encontrei
alguns caras da época que passava as férias aqui, conversamos um
pouco entre uma onda e outra, alguns deles já eram pais e estavam com
seus filhos, ensinando-os a pegar onda.
Quando já estava morto de cansado, resolvi que já era hora de preparar
algo para comer, despedi dos rapazes e saí em direçã o à minha casa e de
sú bito achei que estava tendo um déjà vu23. Quando olhei para o
sombreiro que ficava mais perto da casa dos Tomarolli, nã o acreditei no
que meus olhos viam, imediatamente uma sensaçã o de felicidade
invadiu o meu peito.
Lá estava sentada em uma espreguiçadeira a responsável pelas minhas
noites agitadas. Ela mesma, Beatrice, meu lírio. Linda como sempre, com
um biquíni branco, de rabo de cavalo, parecendo a adolescente que
sempre estava me esperando sair do mar.
Quando me aproximei, ela abriu o sorriso mais lindo do mundo, tive
certeza naquele momento que estava perdido, nã o tinha como fugir, essa
mulher mexia comigo de uma forma tã o absurda, que teria que fazer um
esforço sobrenatural para nã o passar dos limites considerando que
atualmente ela nã o era uma mulher livre.
— Nã o acredito que é a srta. Tomarolli em pessoa, aqui como nos velhos
tempos. — Nã o resisti e, quando cheguei perto, me sacudi junto dela
respingando á gua como costumava fazer antigamente sob os gritos de
protestos dela e da Olívia.
— Blake, você está molhando meu desenho, algumas coisas nunca
mudam, nã o é? — Deu um gritinho, fez cara de brava, mas sabia que
estava brincando.
— Só nos encontramos assim, por obra do destino?! — Enterrei minha
prancha na areia e me sentei na ponta da espreguiçadeira.
— Nem acreditei quando olhei para o mar e percebi que era você ali
diante dos meus olhos, surfando. Lembrei-me da Liv, ela sempre gostava
de te observar nadando ou surfando, sempre foi sua fã nú mero um.
— Até onde sei, você também era do meu fã -clube — brinquei puxando
seu desenho, esse sempre foi seu maior passatempo.
— Ora, se nã o é o velho Blake convencido! — Tentou pegar o desenho de
volta.
— Coleçã o nova, Bea? Como tudo que você desenha, está lindo.
— É uma parceria com uma joalheria suíça, eles me encomendaram uma
coleçã o de comemoraçã o do aniversá rio de 50 anos da empresa. Mas sã o
apenas os esboços iniciais.
— Estã o perfeitos, será outro sucesso da Lily Jewelry.
Claro que o nome da sua empresa tinha a ver com nossa histó ria, nã o foi
à toa que ela imediatamente desviou o olhar, focando no mar em sua
frente.
— Veio passar o final de semana aqui também? — Mudou
estrategicamente de assunto.
— Cheguei ontem à noite, decidi finalmente descansar um pouco, o
ritmo do hospital é insano sempre e nada melhor do que essa paz aqui
para recuperar as energias. E você, veio sozinha ou está com o
namorado? — quis logo saber se a sorte estava do meu lado.
— O Miguel ainda está viajando, vim com os meus pais, eu também
estava precisando descansar um pouco.
— Estou indo preparar algo para comer, quer ser minha cobaia mais
uma vez? Faço o almoço rapidinho, você pode escolher o prato, uma
massa ou um risoto. — Arrisquei o convite.
— Aí é covardia, você cozinhando e com duas sugestõ es que amo, fica
difícil de recusar. — Percebi seus olhos brilharem.
— Entã o levante-se, você será minha sous chef24.
— Estou honrada com esse cargo, dr. Lancaster. — Fez uma reverência
exagerada, vestiu o shortinho jeans, pegou seu desenho e a bolsa.
— Trouxe uns pã ezinhos de alho maravilhosos, que serã o nossa entrada
e tem também aquele vinho que você ama da vinícola do seu avô . —
Segurei sua mã o e fomos em direçã o à casa. — Bea, você conhece a casa,
entã o fique à vontade. Vou tomar um banho rapidinho e já volto. Se
quiser, pegue o vinho ali na adega.
— Vou te aguardar para abrirmos o vinho, enquanto isso vou ligar para a
mamma e avisar que nã o vou almoçar com eles. O plano era almoçarmos
no restaurante da marina, mas vou preferir a comida do renomado
cardiologista — zombou pegando o celular.
Estava me sentindo como um adolescente que levou a namorada pela
primeira vez em sua casa, ansioso demais. A visã o de Beatrice com
aquele biquíni veio na minha mente e me deixou com uma ereçã o
dolorosa, optei por um banho gelado para acalmar os â nimos, nã o podia
passar vergonha.
Quando já tinha contornado a situaçã o vexató ria em que me encontrava,
coloquei uma bermuda confortável, uma camiseta, borrifei meu perfume
que ela costumava elogiar e fui ao seu encontro para, finalmente,
preparar o almoço.
— E entã o, conseguiu falar com a Katie? — Já fui em direçã o à adega.
— Sim, eles ainda estã o se preparando para sair. Vamos abrir o vinho do
nonno? As taças ainda ficam no mesmo lugar?
— Sim, no armá rio à direita. — Me trazia uma paz e tanto vê-la
circulando pela casa com intimidade.
— Pensei bem enquanto você estava no banho, vou optar pelo risoto.
Abri o vinho, coloquei um pouco em nossas taças e fiz o movimento para
brindar.
— Ao que estamos brindando, Blake?
— Ao nosso reencontro. Que nunca mais nos percamos um do outro. —
Minha voz saiu sussurrada demais. Nã o era essa a intençã o. Ela nã o
respondeu nada, mas encostou sua taça na minha. — Por favor,
assistente, pegue os pã es de alho, que estã o no freezer, coloque-os no
forno e fique de olho para nã o deixar queimar.
— Sim senhor, chef. — Bateu continência.
— Acho que vou fazer o risoto de limã o siciliano com cubos de salmã o, o
que acha?
— Perfeito para mim. Pensei em montar uma tá bua com os queijos que
vi na geladeira, pode ser?
— Fique à vontade, assim nã o morremos de fome enquanto preparo o
prato principal. Bea, por favor, coloque uma mú sica. Escolha o que você
quiser.
— Vou colocar em modo aleató rio começando com Seal. A Liv uma vez
me disse que na sua sala de cirurgia sempre tem mú sica, qual o estilo
que você gosta para esse tipo de “evento”? — Fez aspas com o dedo.
— Para esse tipo de “evento” — fiz as mesmas aspas — prefiro mú sica
clá ssica, me deixa mais concentrado.
Depois da segunda taça de vinho, percebi que Beatrice estava bem solta,
brincando mais. Ela fez uma tá bua de queijos decorada com tomate
cereja e rú cula, regou azeite e polvilhou orégano, depois nos serviu o
pã o de alho. O clima nã o poderia ser melhor: leve, muita risada. E a
tensã o que esteve sempre presente desde que nos reencontramos,
desapareceu completamente.
Beatrice preparou uma mesa elegante para o nosso almoço e nos
deliciamos com o risoto, que modéstia à parte ficou maravilhoso.
Abrimos outra garrafa de vinho e, assim que terminamos o almoço,
fomos para a varanda e nos sentamos confortavelmente em um sofá de
frente para a piscina. A conversa fluiu naturalmente, ela me contava seus
planos para as pró ximas coleçõ es, eu comentei os meus projetos no
hospital, parecia que o tempo nã o tinha passado e estávamos novamente
naqueles dias quando só recentemente me dei conta, foram os mais
felizes da minha vida.
De repente, uma mú sica cheia de significado começou a tocar e o ar
pesou: Kiss me foi a mú sica que dançamos no aniversá rio de quinze anos
da minha irmã , só que essa era uma versã o mais lenta cantada por
Pomplamousse.
Nã o pensei duas vezes e puxei-a para dançar, para minha sorte ela nã o
resistiu. Seu corpo grudado ao meu e seu perfume me enlouqueceram.
Inicialmente achei que me controlaria, mas quando ela deitou a cabeça
em meu ombro, nã o resisti e beijei seu pescoço, uma, duas, três vezes.
Quando percebi, minhas mã os já estavam em suas costas, minha vontade
era desfazer o nó do biquíni, mas nã o queria me precipitar, precisava de
algum sinal dela.
Quando ela levantou a cabeça, nosso olhar ficou congelado por alguns
segundos, a essa altura meu coraçã o estava acelerado e sua respiraçã o
ofegante denunciava que ela também estava sentindo o mesmo que eu.
Em seguida, meus olhos desceram involuntariamente para os seus lá bios
e ela os abriu como um convite, sem pensar muito colei meus lá bios nos
dela e um beijo guardado por anos explodiu de maneira incontrolável,
ela passou as mã os na minha nuca nos grudando ainda mais e a
sensaçã o era de comportas de uma represa sendo abertas sem controle.
Levantei seu corpo como se nã o pesasse nada e ela envolveu suas pernas
em minha cintura, já estava duro e com esse contato sentia que poderia
explodir a qualquer momento. Caminhei até o sofá com ela enroscada
em mim. Deitei-a lentamente sem descolar nossas bocas e assim
ficamos, nos devorando. Estava totalmente dominado pelo seu toque,
sentia meu corpo em brasa, quando Beatrice deslizava sua mã o pelas
minhas costas.
Consegui finalmente desamarrar o maldito biquíni e aí foi a minha ruína,
ali diante dos meu olhos tive acesso aos seios mais lindos que já vi, do
tamanho certo, mamilos rosados e durinhos me aguardando,
imediatamente mordisquei, lambi e ouvi seu gemido em rendiçã o. Sua
pele arrepiou e a respiraçã o descompensada demonstrava o quanto
também estava impactada.
Beatrice começou a puxar minha camiseta, totalmente entregue. Quando
me afastei para tirá -la, algo mudou em seus olhos, como se tomasse
consciência do que estava acontecendo, imediatamente se cobriu.
— Nã o posso, Blake, isso é loucura. Eu, eu... — começou a gaguejar e
buscar o biquíni. — Eu tenho namorado, nã o sou assim, nã o posso.
Preciso ir embora.
— Calma, Bea, respire. Por favor, me desculpe, a culpa é minha, eu que
forcei a situaçã o.
— Nã o, Blake, a culpa é minha, eu me deixei levar, isso nã o está certo.
Nã o podemos nos envolver, tem o Miguel.
Ouvir o nome daquele imbecil foi uma facada no meu peito. Me obriguei
a controlar minha ansiedade. Nã o queria que ela se sentisse mal por
isso. Começou a juntar as coisas para ir embora.
— Bea, por favor, vamos conversar. Nã o saia assim, você nã o pode negar
que temos uma química, um tesã o louco um pelo outro. Precisamos
conversar, estou aqui agora, por favor, nã o nos negue isso.
Ela virou-se com os olhos cheios de lá grimas ainda nã o derramadas,
abriu a boca vá rias vezes, mas nã o conseguiu dizer nada e assim saiu
porta afora. Corri atrá s dela, gritando seu nome, mas ela nã o olhou para
trá s e se foi. Achei melhor nã o insistir, nã o naquele momento.
Daria um tempo para ela assimilar tudo, seus sentimentos, mas minha
decisã o estava tomada: eu vou lutar por ela e ninguém, irá me impedir.
Meu Deus, o que foi isso? Estava indo tudo tão bem, o almoço delicioso, o
vinho que ele lembrou que amava, aquele perfume que me entorpecia, aí
bastou tocar a nossa música para eu esquecer tudo e me deixar levar pelo
seu toque, seus beijos, aqueles olhos que me cegavam completamente.
Como deixei as coisas chegarem nesse ponto? Simplesmente nã o consegui
resistir.
Blake me tirava toda a razã o, eu nã o podia estar errada, ele me queria
tanto quanto eu, nó s dois estávamos totalmente entregues, isso nã o era
de modo algum invençã o da minha cabeça. Sua respiraçã o ofegante, seu
coraçã o tã o acelerado quanto o meu, todos os poros da sua pele
exalavam um desejo incontrolável, da mesma maneira como eu me
sentia.
Isso não pode estar acontecendo novamente. Ou pode?
Se tinha alguma incerteza quanto ao meu relacionamento com Miguel,
agora nã o restava a menor dú vida do que deveria ser feito: tinha que
colocar um ponto final nesse namoro, antes que alguém saísse muito
magoado.
Entrei no chuveiro e deixei a á gua gelada levar embora todo esse fogo
que estava me consumindo. Ao mesmo tempo que a culpa me consumia,
uma sensaçã o maravilhosa me deixava em êxtase. Ver Blake louco de
tesã o, completamente sem controle, era a materializaçã o de todos os
meus sonhos. Eu ainda o amava, por mais que tentasse negar, esse
homem era e sempre seria o amor da minha vida e nada mudaria isso.
Depois do longo banho, coloquei uma roupa confortável e me deitei na
cama na doce ilusã o de que conseguiria acalmar os meus pensamentos.
Foram anos fugindo desse sentimento, que agora sem pedir permissã o
estava minando todo o meu discernimento. As lá grimas que até entã o
estava conseguindo controlar rolaram intensamente.
Comecei a despertar, como estava escuro fiquei sem entender onde
estava, quando ouvi uma batida na porta, em seguida vi minha mã e
entrar no quarto com cuidado.
— Oi, mamma, entre, já estou acordada. — Preciso muito dela agora.
— Filha, quando cheguei, passei aqui no seu quarto, mas você estava em
um sono tã o pesado que nã o tive coragem de te acordar.
Sentou-se na minha cama com a testa franzida em sinal de preocupaçã o.
— O que aconteceu, Bea? Achei você tã o animada quando me ligou
dizendo que tinha outros planos para o almoço, agora chego aqui e você
está com o rosto todo inchado, com certeza pelo muito que chorou. —
Me puxou para um abraço.
— Encontrei com o Blake na praia e ele me convidou para almoçar. —
Funguei tentando nã o chorar mais.
— Eu sabia. Hoje cedo na praia, eu e seu pai o vimos quando estava indo
surfar. Nã o te disse nada, pois achei que seria melhor você descobrir
sozinha, e talvez até nem se encontrassem. Me conte o que aconteceu
para te deixar assim tã o abalada?
— Estava indo tudo muito bem, eu o ajudei a preparar umas comidinhas
de entrada e ele se dedicou ao prato principal, fez um risoto sensacional.
Ele serviu aquele vinho rosé do nonno que amo, inclusive ele lembrou
desse detalhe. Ficamos conversando sobre nossas vidas, de como
amamos o que fazemos... — Parei de falar e fiquei pensativa.
— Até aí nã o estou percebendo nada demais. Continue, filha.
— Depois do almoço, já estávamos na segunda garrafa de vinho, entã o
começou a tocar aquela mú sica.
— A mú sica que você dançou com ele no aniversá rio da Liv? — Mamã e
nã o esquecia um detalhe.
— Essa mesmo. Ele me puxou para dançar e claro que fui. Estava mais
solta por conta do vinho, nã o vi nenhum perigo nisso, mas nã o demorou
muito e o clima esquentou. — Me levantei e andei pelo quarto.
— Vocês transaram? — Dona Katie sempre sem rodeios.
— Nã o, mamma, claro que nã o. Mas quase aconteceu. Nos perdemos nos
beijos enlouquecedores e, quando ele se afastou um pouco para tirar a
sua camisa, a realidade mostrou a cara e eu fugi. Disse que nã o e saí
correndo.
— E ele, o que fez?
— Correu atrá s de mim querendo conversar, me pedindo desculpas, mas
saí feito uma louca, sem olhar para trá s. Ele deve ter achado melhor me
dar espaço.
Um silêncio sombrio tomou conta do quarto por alguns segundos até
que minha mã e veio com a pergunta mais difícil da minha vida:
— E o que você está pensando em fazer?
— Vou fazer o que é certo. Terminar com o Miguel, nã o posso mais
continuar com esse namoro. Definitivamente nã o o amo. Nã o sei o que
acontecerá entre mim e Blake, mas uma coisa eu tenho certeza: mesmo
que nunca fiquemos juntos, meu coraçã o é dele, talvez isso nunca mude.
— Minha filha, eu sinto tanto por você ainda nã o ter se acertado com o
Blake. O amor é mesmo cheio de mistérios, quem sabe agora é a chance
de vocês. Termine sim com o Miguel, dê um tempo para você se
organizar emocionalmente e deixe o sentimento falar mais alto, nã o
racionalize tanto.
— Eu já tinha decidido falar com o Miguel antes mesmo disso tudo
acontecer. Na segunda, ele chega de viagem e terei uma conversa
definitiva — suspirei forte e coloquei a cabeça no colo da mamma.
Passei todo o domingo em casa com meus pais, conversando à beira da
piscina. Eles eram maravilhosos, me deixaram à vontade, sem perguntar
absolutamente nada sobre o Blake. No final do dia, retornamos para
Nova Iorque. Apesar de tudo, estava me sentindo mais leve e forte ao
mesmo tempo.
Quando cheguei em casa, por volta das sete da noite, preferi fazer só um
sanduíche leve, queria dormir cedo, mas meus planos de uma noite
calma e tranquila caíram por terra quando meu celular tocou e um
nú mero desconhecido apareceu na tela.
— Alô ?
— Bea, sou eu, Blake. — Aquela voz meio rouca, sussurrada, me deixava
enfeitiçada.
— Oi, Blake, tudo bem? — Tentei soar o mais natural possível.
— Acho que precisamos conversar. Você saiu muito abalada ontem, achei
melhor não insistir.
— Foi a Liv que te deu o meu nú mero? — quis desviar do assunto.
— Nem me arrisquei em pedir, ela jamais daria. Quando você teve alta,
pensei em te ligar, então peguei seu número no cadastro do hospital. Você
não acha que precisamos conversar?
— Tem razã o, a Olívia jamais faria isso. Antes de responder à sua
pergunta, preciso me desculpar, sei que pareceu meio infantil minha
fuga, mas é que me assustei com tudo o que estava acontecendo e, aliado
ao vinho, nã o consegui raciocinar direito. — Preferi ser honesta.
— Sendo assim preciso me desculpar, eu também não me controlei, ter
você ali ao meu lado depois de tantos anos mexeu muito comigo. Mas essa
é uma conversa que precisamos ter pessoalmente.
— Blake, eu estou com o Miguel e...
— Eu sei, mas você não pode negar que existe algo entre nós. Tudo o que
aconteceu ontem não foi premeditado, foi natural e muito forte tanto da
minha parte quanto da sua.
— Blake, você está certo, precisamos sim conversar, entender os
sentimentos, mas eu ainda nã o posso, nã o estou preparada.
— Tome o tempo que você precisa, mas não me negue essa conversa. Eu
vou te esperar até quando você se sentir pronta, ok?
Ele disse isso mesmo? Vai me esperar?
— Bea, você ainda está aí?
— Sim, é que fiquei pensando no que você disse. Nos falamos depois,
quando as coisas estiverem mais claras em minha cabeça, pode ser? —
Queria encerrar a ligaçã o urgente.
— Vou te esperar, boa noite, Beatrice. Durma bem.
Como se isso fosse possível!
— Você também.
Claro que rolei na cama por horas, e na segunda-feira cedo já estava no
escritó rio com a cabeça a mil, mas definitivamente decidida quanto ao
que teria que fazer.

Recebi uma mensagem do Miguel avisando que já estava na cidade e


que, à noite, passaria na minha casa. Sabia que essa nã o seria uma
conversa fá cil, mas nã o tinha como adiar, principalmente depois do que
aconteceu entre mim e Blake no ú ltimo final de semana.
Nã o negava que Blake mexia muito comigo, e se a vida finalmente estava
nos dando uma nova chance eu ia agarrar com todas as minhas forças.
Precisávamos finalmente entender se poderíamos seguir juntos, caso
contrá rio cada um deveria seguir sua vida e eu teria que aceitar que nã o
era para ser, esquecer e seguir em frente.
Sentia uma certa culpa, talvez nã o tivesse me empenhado tanto na
relaçã o com Miguel, ele, ao contrá rio, demonstrou se dedicar mais a nó s
dois, mas o que sentia por ele nunca chegou nem perto do que a simples
presença do Blake provocava em mim. Eu tinha que descobrir até que
ponto estava disposta a me entregar, correndo o risco de me machucar
de maneira irremediável.
Era perceptível que Blake também sentia algo, a maneira como me
beijou, totalmente absorvido pelo momento, nã o foi algo só carnal, havia
sentimento. Eu também era importante para ele. Enquanto estava
casado se manteve sempre distante, mas agora era diferente. Eu nã o era
mais a amiguinha da sua irmã , éramos adultos e nada poderia impedir
que finalmente ficá ssemos juntos se essa fosse a sua vontade.
— Bea querida, estou te achando hoje muito calada, introspectiva. O que
está acontecendo? Algo no trabalho? — Lá vinha Helena com o sensor
investigativo ligado.
— Nã o está acontecendo nada em especial, esse acidente mexeu comigo,
tenho pensado muito em como estou conduzindo a minha vida. — Tentei
fugir um pouco da tormenta que se formava em minha cabeça.
— Olha só , vou fazer de conta que estou acreditando nessa sua
desculpinha, mas como Naomi acabou de me avisar, que nosso almoço já
está lá na sala de reuniã o nos esperando, será lá o lugar perfeito para
você aproveitar e abrir esse seu coraçã ozinho.
Helena me pegou pela mã o, nã o me dando possibilidade de fugir de mais
uma tortura inquisitiva.
— Entã o, agora que estamos bem alimentadas, me diga o que está
perturbando sua paz. Tem a ver com o Miguel, ele já está na cidade?
Aliá s, você nã o acha que ele fica muito tempo fora?
— Ele já chegou de viagem e ficou de passar lá em casa logo mais. Você
sabe que eu também acho um pouco esquisito essas viagens dele, nunca
falamos sobre isso, mas sempre quando ele está fora praticamente nã o
nos falamos, mal trocamos mensagens.
— Será que ele tem uma família lá na Europa, com mulher e filhos? —
Minha amiga tinha uma imaginaçã o incrível, mas podia ter razã o.
— Nena, nunca pensei nisso, talvez tenha mais relaçã o com o trabalho.
Quando a Charlotte nos apresentou ao Miguel, comentou que ele tem
uma empresa de engenharia bem-sucedida, com negó cios em vá rios
países, mas sempre quando estamos juntos e pergunto sobre os seus
projetos ele meio que se esquiva — confessei.
— Bem estranho mesmo, mas se quiser posso iniciar uma investigaçã o
hoje mesmo. — Deu uma risadinha maldosa.
— Isso é bem a sua cara, nã o é, dona Helena?! Mas agora já nã o tem
importâ ncia. — Fiz suspense.
— Como assim? O que você está me escondendo? — indagou com os
olhos brilhando de curiosidade.
— Decidi que hoje conversarei com ele e vou terminar. Nã o está dando
certo, nã o estou feliz. — Respirei profundamente tentando me acalmar.
— Tem algum motivo especial para você chegar a essa conclusã o? —
Estreitou os olhos como se já estivesse entendendo o motivo principal
da minha decisã o.
— O principal motivo é que, por mais que tenha tentado, eu nã o o amo.
Ele é muito bom para mim, mas definitivamente eu nã o me apaixonei
por ele, e... — Parei um pouco.
— E...
— Tem o Blake. Ele está solteiro e nó s nos encontramos nos Hamptons.
— Levantei-me, fui até o frigobar e peguei uma á gua. Minha garganta
estava seca.
— Desembucha, Beatrice. O que aconteceu?
— Ele me convidou para almoçar, preparou uma comida maravilhosa,
bebemos vinho e ao final nos pegamos e quase transamos.
— Eu nã o acredito! E por qual motivo nã o seguiram em frente e
transaram loucamente? Esse tesã o reprimido por anos precisa ser
finalmente aliviado! — Praticamente gritou.
— Eu fugi, Nena, saí correndo, deixei ele lá louco de tesã o e me tranquei
no meu quarto, feito uma adolescente idiota. Tive medo de me machucar,
pensei no Miguel, nã o é justo com ele.
— Bea, já está na hora de vocês viverem essa histó ria. Esse é o momento,
você nã o pode deixar passar. — Segurou meus ombros firmemente e me
obrigou a encará -la.
— Eu sei, só que antes preciso colocar um ponto final na minha histó ria
com o Miguel, e isso vou resolver hoje.
— Bea, confie em seu sentimento. Eu quis muito que você e o Miguel
dessem certo, mas falamos sobre isso outro dia, seu coraçã o já tem dono,
nã o perca tempo, amiga, e pelo que você falou, mais uma vez o Blake deu
sinais de que te quer muito. Esqueça tudo e todos e vá viver esse amor.
Helena me abraçou por alguns minutos, e me senti acolhida. A decisã o
estava tomada.
Passava das 20h quando o porteiro interfonou avisando que o Miguel
estava subindo. O jantar que encomendei já tinha chegado. Talvez,
depois da nossa conversa, ele nã o comesse nada, o que seria
compreensível.
— Mi vida25, que saudades. — Miguel entrou no apartamento, já me
agarrando sem me dar chance de falar nada. Me beijou e correspondi
sem muito entusiasmo.
— Oi, Miguel, como foi sua viagem? — Tentei disfarçar minha falta de
â nimo.
— Foi ó tima, mas preferia que você tivesse ido comigo. Senti muito a sua
falta.
Desvencilhei-me do seu abraço.
— Aceita algo para beber? Precisamos conversar. — Nã o fiz rodeios.
— Aconteceu algo? Estou te achando tensa. — Sua testa enrugou.
Servi uma taça de vinho e ofereci, ele recusou, entã o dei um gole e me
sentei no sofá , puxando sua mã o para que ele se sentasse também.
— Miguel, você é um homem maravilhoso, mas nã o está dando certo. —
Eu estava tremendo.
— Como assim? O que você está querendo dizer? Seja mais clara — soou
meio ríspido.
— Nó s dois, nã o está dando certo. Apesar de você ser tã o maravilhoso
comigo, eu nã o estou feliz, nã o podemos continuar juntos. Precisamos
terminar antes que alguém se machuque.
O homem levantou-se abruptamente andando pela sala, respirando forte
como um touro encurralado na arena. Quando se virou em minha
direçã o, seus olhos estavam quase saltando do rosto.
— Nã o estou entendendo. Quando nos despedimos alguns dias atrá s,
estava tudo bem, você parecia feliz ao meu lado. O que mudou? — Estava
claramente furioso.
— Você tem razã o, mas esse tempo que ficamos longe serviu para eu
enxergar algumas coisas da minha vida. Apesar de tudo que vivemos,
nã o me sinto plenamente feliz ao seu lado, é algo meu, nada com você.
Muito pelo contrá rio, você é um homem que qualquer mulher sonha em
ter na vida.
— Menos você. Preciso que você seja honesta comigo. — Foi firme e
marchou em minha direçã o, sentando-se ao meu lado e segurando o
meu braço de maneira grosseira. Assustei-me com essa atitude, parecia
outra pessoa.
— Miguel, você está me machucando, achei que pudéssemos ter uma
conversa civilizada. — Levantei-me me desvencilhando da sua mã o em
meu braço.
— É o médico, nã o é?
O sangue fugiu do meu corpo imediatamente.
— Do que você está falando? — Tentei encobrir o nervosismo que
tomava conta de mim.
— Nã o me prive da verdade, Beatrice. É aquele médico, o tal Blake. Nã o
pense que nã o percebia o quanto ele te deixava nervosa a cada vez que
entrava naquele quarto de hospital. — Mais direto impossível.
— Nã o tem nada a ver com ele. Estamos falando de nó s dois, de como
me sinto com relaçã o a você.
— Você está tendo um caso com ele, é isso? Você o ama? Estã o juntos?
Seja honesta comigo, Beatrice! — gritou assustadoramente.
— Miguel, acho melhor você se controlar, caso contrá rio serei obrigada a
te pedir que vá embora!
O que está acontecendo com ele? Onde está aquele homem gentil?
— Desculpe, você me pegou de surpresa. — Pegou minha taça que
estava em cima da mesinha de centro e bebeu todo o vinho de uma só
vez.
— Somos adultos, Miguel. Por favor, nã o me decepcione. Sempre o achei
um gentleman, nã o estou reconhecendo sua atitude.
— Me diga a verdade — insistiu.
— A verdade é que eu e o Blake já nos envolvemos alguns anos atrá s, foi
algo rá pido, mas nã o deu certo. Depois disso, ele se casou e nos
distanciamos.
— Mas ele ainda mexe com você? — quis saber.
— Miguel, esse nã o é o motivo da minha decisã o de terminarmos, você
precisa entender que eu nã o estou feliz. — Tentei controlar minha voz,
que a essa altura já estava trêmula.
— Responda a minha simples pergunta. Ele ainda mexe com você?
— Sim. Mexe muito comigo. Mas repito, nã o foi por esse motivo que
tomei minha decisã o. — Preferi dizer a verdade.
— Pensei que estávamos verdadeiramente envolvidos, estava disposto,
inclusive, a casar-me com você, coisa que nunca passou pela minha
cabeça.
Essa declaraçã o me surpreendeu, pois nunca me disse que me amava.
— Sinto muito, Miguel, queria muito me apaixonar por você de verdade.
Como já disse, o problema é comigo.
— Ok, Beatrice, já entendi que nã o fui capaz de te fazer se apaixonar por
mim. Espero que você seja feliz! Adeus.
Com essa frase, passou por mim como um tornado, me deixando ali em
pé e assustada com sua reaçã o. Nã o se deu o trabalho de fechar a porta.
Fiquei longos minutos parada em pé ainda sem reaçã o, até que ouvi o
toque do meu celular. Só entã o fechei a porta, peguei o aparelho e vi que
era a minha mã e. Atendi com a voz hesitante.
— Filha, está tudo bem? — Nada passava por essa mulher.
— Oi, mamma, o Miguel acabou de sair daqui enfurecido. — Servi um
pouco de vinho e bebi lentamente, na tentativa de me acalmar.
— Vocês conversaram então. Como ele reagiu?
— Conversamos e ele reagiu da pior maneira possível.
— Ele te machucou? Você está bem, minha querida? Não esconda nada.
Quer que eu vá aí?
— Nã o se preocupe, ele nã o fez nada comigo, mas foi grosseiro e quis
saber o motivo do término. Nã o aceitou minha explicaçã o que nã o estava
feliz. Inclusive, me disse que sabe que é por causa do Blake.
— Como assim? Você falou algo sobre isso com ele?
— De jeito nenhum, ele me disse que percebeu o quanto a presença de
Blake me afetava, quando ainda estava no hospital.
— E o que você respondeu?
— Eu nã o neguei que o Blake mexe comigo e até comentei vagamente do
nosso envolvimento no passado, mas deixei claro que esse nã o era o
motivo de querer colocar um ponto final no nosso namoro. — Tentei
minimizar a situaçã o.
— Filha, venha para cá, não quero que você fique aí sozinha. Ele tem a
chave do seu apartamento? Não sei se é seguro você ficar aí. — Minha
mã e já estava nervosa, criando coisas onde nã o existia.
— Acalme-se, mamma, Miguel saiu daqui puto comigo sim, mas ele nã o
fará nada contra mim.
— Proíba a entrada dele aí no seu prédio, nunca se sabe o que um homem
ferido é capaz de fazer.
— Vou ligar para a Nena vir passar a noite comigo, assim você nã o se
preocupa tanto, ok? — menti para tentar acalmá -la.
— Ficaria mais tranquila se você viesse para cá. Mas você é adulta e sabe
o que faz — aceitou resignada.
— Miguel é um homem experiente, ficou chateado porque tinha planos
para nó s dois, mas, em breve, tudo isso será passado. Vou tomar um
banho e me deitar. Amanhã nos falamos.
Encerrei a ligaçã o com minha mã e e me deitei no sofá , repassando tudo
o que aconteceu ali naquela sala. Mesmo depois de toda a tensã o da
conversa com Miguel e sua atitude grosseira, estava me sentindo
aliviada, porque tirei um peso das minhas costas.
Depois de algum tempo refletindo e praticamente sem me mover,
percebi que estava com fome, entã o me servi do jantar que tinha
encomendado no meu restaurante favorito e com minha alma mais leve,
sentei-me e jantei sozinha. O que acontecerá daqui para a frente? Nã o
sabia, mas uma coisa era certa: a prioridade era minha felicidade, com
ou sem Blake.

Acordei no outro dia mais animada, dormi toda a noite, estava me


sentindo renovada. Até caprichei mais na maquiagem, que normalmente
só usava algo bá sico. Escolhi um vestido off-white lindo que nunca tinha
usado, optei por um par de sandá lias igualmente novas, só que
vermelhas para fazer o contraste com o vestido. Para compor o look
elegante, usei minhas joias da nova coleçã o.
Gostei do resultado, e assim, confiante das minhas escolhas, fui
trabalhar. Deixaria qualquer movimento com relaçã o a Blake para outro
momento. Precisava me fortalecer antes de tomar qualquer atitude. Eu
disse que o procuraria e farei isso em breve.
— Isso sim é o que chamo de vestida para matar, srta. Tomarolli! —
Claro que Helena nã o deixava passar nenhum detalhe.
— Bom dia para você também! Animada hoje? — Passei por ela em
direçã o à minha sala, com Naomi me seguindo.
— Bea, a reuniã o com o advogado do sr. Bolliger está confirmada para as
dez horas, a sala de reuniã o já está pronta.
— Avisou também ao nosso advogado que a reuniã o está confirmada?
— Sim, o dr. Molina já chegou inclusive. — Repassamos a agenda do dia
e finalmente dei atençã o a Helena, que me aguardava com seu café
expresso na mã o. Depois que Naomi saiu da sala, ela se sentou na
cadeira em minha frente aguardando o relató rio da noite anterior.
— E entã o, Bea, acabe logo com esse suspense. Me diga como foi sua
conversa com Miguel. — Mulher curiosa essa minha amiga.
— Nã o foi como esperava. Miguel nã o reagiu muito bem. Em
determinado momento foi bem grosseiro.
— Estou impressionada, Bea, quer dizer que toda aquela pinta de bom
moço caiu por terra? — Helena fez uma careta engraçada.
— Confesso que me surpreendi negativamente, ok que ele foi pego de
surpresa, chegou cheio de carinho e recebeu minha recusa logo de cara.
Deve ter ficado com o orgulho ferido, mas, afinal, nã o somos
adolescentes, nã o esperava aquela reaçã o.
— Nã o me esconda nada, ele te agrediu ou algo assim?
Fechei os olhos tentando nã o me estressar e mexi meu pescoço de um
lado para o outro, tentando relaxar.
— Bea, o que realmente aconteceu?
Helena é uma peste mesmo, não vai me deixar trabalhar.
— Ele foi um pouco violento, segurou meu braço com força demais, até
ficou marcado. Mas nã o passou disso. Quando saiu, me olhou com tanto
ó dio que me assustou — falei de vez, ela nã o ia me deixar em paz.
— Você precisa ficar atenta, homem com orgulho ferido é uma merda.
Nã o sairá daqui sozinha tã o tarde como você gosta de fazer. Nunca se
sabe o que ele pode aprontar.
— Deixa de exagero, amiga, foi só coisa de momento. Hoje com certeza
ele já se arrependeu da idiotice que fez — tentei contemporizar.
— Nã o sei, nã o estou confortável. Nã o acha melhor pedir ao seu pai um
segurança? — Helena e os seus delírios investigativos.
— Deixa de exagero, nã o vou preocupar meus pais. Prometo se perceber
algo estranho, aí sim peço ajuda. Por enquanto vamos trabalhar, ok?
— E quanto ao dr. Mú sculos? Quando teremos um encontro de abalar os
alicerces?
— Helenaaaaa, preciso de um tempo! As coisas nã o sã o assim. Eu nã o
sou tã o prá tica como você.
— Fique facilitando, deixando aquele gostoso sozinho, nã o demora e
uma fulana o abocanha.
Revirei os olhos.
— Nã o revire os olhos nã o, pois você sabe que tenho razã o. Mas
concordo que você precisa de um tempinho, nã o pode cair na cama de
outro assim tã o rá pido. — Olhei espantada. — Amanhã você já pode
começar a agir!
Fiz uma bola de papel e joguei nela.
— Tá bom, já estou de saída. Mas escute a voz da experiência. Nã o vacile!
— Depois disso saiu da sala rebolando exageradamente.
Essa não tem jeito, sonho com o dia que alguém conquistará o seu coração
de vez, de preferência um que a domine completamente. Aí quero ver essa
praticidade toda, inteiramente dominada.
Fazia mais de uma semana que falei com a Beatrice por telefone, desde
entã o aguardava ansioso o dia em que ela finalmente daria uma chance
para nó s dois. Nosso encontro nos Hamptons foi no mínimo explosivo.
Tantos anos longe um do outro, foi como se o tempo nã o tivesse passado.
Em poucos minutos estávamos entregues ao fogo de uma paixã o até
entã o adormecida, a sensaçã o era de estar novamente no dia em que
finalmente ficamos juntos. Eu nã o queria pressioná -la, mas só Deus
sabia o quanto estava sendo difícil esse tempo sem notícias.
— Finalmente tivemos um dia tranquilo, vai nadar hoje, Blake? — Kaleb
certamente já queria me arrastar para alguma farra e era o que
realmente estava precisando.
— Nã o tenho compromisso com nada, só com vá rias rodadas de algo
bem alcoó lico. — Nem esperei ele me convidar.
— Aí você falou minha língua, dr. Heart — brincou. — Entã o vamos fazer
o seguinte, nos encontramos em uma hora naquele bar que fica no
terraço do hotel onde ficou hospedado. Além do chope ser excelente,
sempre tem alguma gata disponível para uma boa conversa.
— Boa conversa? Sei bem o teor dessa conversa. Mas eu realmente
quero só espairecer um pouco, a semana tem sido complicada e preciso
de uns conselhos. — Dei um tapinha em suas costas e saímos em direçã o
ao estacionamento.

Tomei um banho rá pido, comi algo leve, em seguida pedi um Uber, tinha
que sair logo de casa, já estava com os dedos coçando querendo ligar
para a Beatrice, mas me contive.
— Achei que você acabaria desmarcando. — Meu amigo já estava em
uma mesa estrategicamente posicionada.
— De forma alguma, hoje quero beber muito. Amanhã nã o temos
nenhuma cirurgia, só preciso ir para o hospital apó s o almoço.
— Assim que se fala, vamos pedir a primeira rodada, estou morrendo de
sede. — Kaleb pediu nossos chopes e alguns petiscos. — Me diga, Blake,
o que está te incomodando? Até onde sei, tanto você quanto a Lucy estã o
levando a separaçã o de maneira tranquila. Ou estou errado?
— Para te dizer a verdade, já estava decidido que a viagem que fizemos
para os Hamptons era a ú ltima tentativa para salvar o nosso casamento
e, como esperado, foi a gota d´á gua. Para a minha total surpresa, a ideia
da separaçã o partiu inicialmente da Lucy. — Bebi um longo gole do
chope, que desceu como uma luva.
— Encontrei com ela hoje cedo e estava ó tima, até mais sorridente, me
cumprimentou amistosamente. Estranhei, já que mal trocávamos
algumas frases ultimamente.
— Pois é, estava preparado para momentos desgastantes, onde ela se
negaria a assinar o divó rcio ou algo do gênero, mas o fato é que ela já
está providenciando tudo.
— Mas assim é bem melhor. Sua situaçã o no hospital será afetada? —
Acho que essa era a curiosidade de todos por lá .
— Continua tudo na mesma, tive uma conversa com Andrew outro dia e
ele me garantiu que nada mudará , afinal ele sempre quis que eu
assumisse a cardiologia, entã o nã o faria sentido agora que retornei de
Londres ele me dispensar.
— Ó timo, entã o um brinde aos novos tempos, à sua solteirice! —
Tocamos nossos canecos e, mais uma vez, me deliciei com a bebida
geladíssima.
— Ora se nã o é o dr. Mú sculos se divertindo um pouco! — Virei-me para
saber de quem era aquele comentá rio nada sutil.
— Helena! Que surpresa, como vai? — Levantei-me para cumprimentá -
la.
— Acho que nã o nos conhecemos — ela falou com Kaleb. Fiz as
apresentaçõ es e a convidei para sentar-se em nossa mesa.
— Vou ficar só um pouco, estou aguardando uma amiga.
Meu coraçã o errou uma batida. Será que ela estava aguardando a Bea?
— Bebe algo, Helena? — Kaleb ofereceu, já que eu emudeci com a
possibilidade de encontrar a mulher que estava me enlouquecendo com
sua distâ ncia.
— Blake, nã o precisa ficar agoniado, a pessoa que estou esperando nã o é
a Beatrice. — Bem que a fama dessa mulher era nã o ter rodeios.
— Como ela está ? Nã o nos falamos nos ú ltimos dias. — Também fui
direto sem fingimento.
— Agora está ó tima, mas você a conhece, ruminando as decisõ es, mas
tenho certeza de que ela saberá escolher o que for melhor para ela. Bom,
mas nã o vou te passar nenhuma informaçã o privilegiada, você sabe que
somos muito amigas e confidentes, entã o... — Passou a mã o na boca
como se estivesse fechando um zíper.
Ficamos os três conversando por algum tempo. Além de linda, Helena
era muito divertida, senti que Kaleb ficou bem interessado, mas, assim
que sua amiga chegou, se despediu e foi ao encontro de uma mulher
igualmente atraente.
— Entã o quer dizer que você e Beatrice finalmente darã o uma chance ao
amor do passado? — O curioso já quis saber os detalhes.
— A italianinha está me dando um chá de espera e a amiga, que poderia
me adiantar algo, você viu, um tú mulo.
Fizemos novas rodadas de chope, mas antes das 23h já estava em casa.
Eu precisava espairecer um pouco, mas nã o era de encher a cara.
Quando me preparava para dormir, meu celular vibrou. Era uma
mensagem da Olívia querendo saber se eu estava acordado.
Imediatamente fiz uma chamada para ela.
— Irmãozinho, ainda não está dormindo? — brincou, pois sabia que eu
geralmente dormia cedo.
— E aí, pequena? Já estou deitado inclusive, velhos há bitos nunca
mudam. O que houve, tudo bem com você? — Olívia me ligando assim
tã o tarde, fiquei preocupado.
— Estou com saudades, apenas isso. Quero passar uns dias aí com vocês, o
que acha?
— Notícia maravilhosa. Estou precisando mesmo de alguém para
finalizar a decoraçã o da minha nova casa.
— Como você está se saindo, o mais novo solteiro está barbarizando? —
Lá vinha as perguntas nada discretas.
— Muito trabalho, hoje consegui sair com o Kaleb e fomos beber para
distrair um pouco.
— Não acredito! Meu irmão todo certinho caindo na farra? Voltou para
casa sozinho?
— Estou fora de forma, mas nã o demora e pego o jeito, principalmente
se eu sair sempre com o Kaleb, o cara é um paquerador nato — brinquei.
— Como está a relação com Lucy? — Sua voz ficou mais séria. — Vocês
têm se encontrado?
— Surpreendentemente tranquila. Nos encontramos eventualmente no
hospital, mas a conversa gira apenas em torno de algum paciente. Nã o
imaginei que Lucy fosse ficar tã o tranquila, acho que o casamento a
estava torturando, agora está se sentindo mais livre, sorridente até. —
Senti-me tranquilo ao falar isso.
— Acho tudo muito estranho, isso não combina com ela, sempre foi muito
grudada em você, ciumenta. Tem algo aí nessa história que não está
batendo. — Percebi seus neurô nios se movimentarem.
— Pois é, mas ela já deu entrada nos papéis do divó rcio. Melhor assim,
preciso também seguir com minha vida, seu irmã o já nã o é tã o jovem,
ainda quero ter uma família, filhos.
— O que você está me escondendo, Blake? Pode começar a falar, já estou
sentada confortavelmente.
— Nã o tem nada de novo, mas decidi que quero tentar com a Bea, isso se
ela ainda me quiser.
Ficou em silêncio por alguns segundos, até que...
— Como é, Blake Lancaster? Você só pode estar louco! Beatrice está
namorando.
— Eu sei, foi uma coincidência terrível, logo agora que me separei ela
está namorando sério, mas nos encontramos casualmente outro dia e ela
percebeu claramente o quanto a quero de volta. — Fui logo franco, nã o
tinha nada a esconder.
— Na verdade, eu te liguei para te sondar — a bandida confessou. — Eu
já sei o que aconteceu nos Hamptons e que a Bea já terminou o namoro
com o espanhol.
Dei um pulo da cama, parecendo um gato assustado.
— Quando é que você iria me contar, Olívia? Por favor, nã o me deixe no
escuro, já basta a sua amiga que sumiu há mais de uma semana. —
Fiquei nervoso e feliz ao mesmo tempo. — Agora sou eu que digo, nã o
me esconda nada. O que ela te falou?
— Calma, ela está colocando a cabeça no lugar, não quer tomar nenhuma
decisão precipitada, afinal vocês dois recém-saíram de um
relacionamento. Para quem já esperou tantos anos, o que são alguns dias?
— Mas ela te disse algo? Se vai me procurar? Nã o sou nenhum menino,
nã o vou ficar como um idiota aguardando a Beatrice se decidir por mim.
— Deixe de ser esquentado. Tudo acontecerá no momento certo.
Minha irmã encheu o meu saco por mais meia hora, nã o me disse
absolutamente nada e eu fui dormir frustrado.

Acordei por volta das nove horas completamente mal-humorado, o


motivo era o sumiço de Beatrice. Para nã o estressar ainda mais, depois
do café da manhã fui nadar um pouco, só assim me senti melhor. Ainda
bem que hoje seria uma sexta-feira calma, sem cirurgia, somente meus
residentes para dar assistência e o pó s-operató rio de três pacientes.
Fiz um almoço rá pido em casa e, quando estava chegando no hospital,
recebi uma mensagem da pessoa que estava me torturando há dias,
querendo saber se podia me ligar. Nem respondi, liguei imediatamente
para ela.
— Oi, Blake. Está ocupado?
— Para você nunca estou ocupado. — Percebi uma risadinha tímida.
— Podemos nos encontrar para aquela conversa? — Nã o perdeu tempo.
Já gostei.
— Claro que sim. Se quiser posso fazer um jantar especial para você. O
que acha?
— Pode ser, eu levo o vinho.
— Combinado, você lembra o endereço, nã o é?
Ela me deu carona outro dia.
— Lembro sim. Por volta das oito da noite, você já estará livre?
— Estarei te esperando, Beatrice. — Minha voz saiu mais rouca do que o
normal.
Cheguei em casa mais cedo, adiantei o jantar, tomei um banho rá pido,
mas nã o bebi nada além de á gua com gelo e limã o, queria estar bem
lú cido para esse tã o esperado reencontro. Pontualmente, à s 20h, o
porteiro avisou que o meu lírio estava subindo.
A visã o que tive quando abri a porta me tirou o fô lego, a mulher estava
linda em um vestido elegante azul-marinho de um ombro só que
abraçava suas curvas com delicadeza. Seu perfume invadiu o ambiente
me deixando completamente em êxtase.
Abri caminho para ela entrar e, quando passou por mim, segurei seu
braço e beijei seu rosto delicadamente.
— Trouxe um vinho tinto, acho que você vai gostar. — Sua pele estava
quente, percebi imediatamente sua respiraçã o alterada.
— Você está linda. Sente-se, o jantar está quase pronto. Está com fome?
— Muita fome, nã o comi nada a tarde toda, só pensando no que você
prepararia para nó s. — Mostrou-me aquele sorriso lindo, meio tímido
que me perseguiu por muito tempo.
Servi nosso vinho em duas taças e ofereci uma a Beatrice. Brindamos
com os olhos vidrados um no outro, ficamos assim em silêncio por
alguns instantes até que ela tomou a iniciativa.
— Terminei o namoro com o Miguel.
Sem culpa alguma, abri o meu maior sorriso.
— Desculpa, Bea, mas nã o vou ser hipó crita e dizer que sinto muito.
Essa foi a melhor notícia dos ú ltimos tempos.
— Nã o posso dizer que você nã o é sincero.
Levantou-se, foi até a janela panorâ mica com vidro do chã o ao teto,
depois de alguns segundos, ainda sem olhar diretamente para mim
declarou o que mais queria ouvir.
— Nã o achei justo com ele continuar nosso relacionamento quando o
meu pensamento estava a todo momento em outra pessoa. — Só entã o
ela olhou em minha direçã o.
Levantei-me decidido a tomá -la em meus braços. Andei lentamente,
quando estávamos a poucos centímetros, peguei a taça da sua mã o,
coloquei em cima do aparador, que estava ao nosso lado, e segurei sua
mã o. Nã o pensei em mais nada, só me aproximei até nossos corpos
estarem grudados e nesse momento o tempo parou. Seu olhos desceram
até os meus lá bios, eu fiz a mesma coisa e quase em câ mera lenta
comecei a distribuir beijos por todo o seu rosto.
Beatrice derreteu em meus braços, nossas línguas se encontraram
timidamente, mas no segundo seguinte, toda a delicadeza tinha
desaparecido. Suas mã os envolveram minha nuca e eu rosnei com esse
contato, minhas mã os subiram por suas curvas até encontrar seus
cabelos macios, juntei em um rabo e puxei lentamente para ter acesso ao
seu pescoço. Meu corpo já estava em chamas, pressionei minha ereçã o
em sua barriga, queria mostrá -la o quanto estava afetado somente com o
beijo.
— Blake, achei que iríamos conversar.
— Temos a vida toda para conversar, agora eu quero matar minha
saudade, provar cada pedacinho da sua pele deliciosa.
Beatrice ofegou ruidosamente e de imediato a ergui em meus braços e
sem pensar em mais nada levei para o meu quarto. Com cuidado a
coloquei no centro da cama. Seus cabelos se espalharam pela cama e
fiquei parado, venerando aquela mulher linda que, enfim, seria minha.
Lentamente tirei a camiseta e a calça jeans que vestia, ficando só de
cueca boxer e nã o me passou ileso o olhar lascivo que a safada deu para
o volume na minha cueca. Passei a mã o lentamente em meu membro
para, mais uma vez, mostrar o quanto ela me afetava.
Beatrice levantou-se como a deusa que era, virou-se de costas, puxando
o cabelo para a frente.
— Tire o meu vestido, Blake, nã o estou mais aguentando essa tortura.
Desci lentamente o zíper do seu vestido que logo foi para o chã o, ela só
usava uma minú scula calcinha branca de renda, quando a virei de frente,
quase perdi o fô lego. Maravilhosa, como me lembrava, seios médios,
bicos rosados durinhos e claro nã o me fiz de rogado, tomei-os para mim
definitivamente. Mordisquei, chupei, me perdi neles. Enquanto isso,
Beatrice era só sussurros de palavras desconexas.
Deitamo-nos na cama e iniciei minha doce tarefa de deixá -la pronta para
mim. Beijei seu pescoço, o vale dos seios, me demorando ali por alguns
minutos, quando desci minha mã o para o meio das suas pernas a
encontrei encharcada, deliciosa. Beatrice arfou alto quando finalmente
pressionei seu clitó ris.
— Blake, nã o vou aguentar muito tempo.
— Nã o quero que se segure, Bea, só estamos começando.
Iniciei minha tortura no seu centro, que pulsava em meus dedos, desci
lentamente beijando cada pedacinho da sua pele. Quando finalmente
cheguei ao meu objetivo e pude provar seu gosto, ela se desmanchou em
um orgasmo forte, que a fez gritar meu nome. Linda, gostosa, entregue.
Quando finalmente a senti de volta do êxtase, peguei um preservativo
que estava na mesa de cabeceira e lentamente me protegi, enquanto a
mulher deliciosa me observava com os olhos em chamas.
Posicionei-me entre suas pernas me esfregando descaradamente,
sentindo sua umidade. A essa altura, nosso beijo era um devorar de
línguas, Beatrice puxava meu cabelo, fazendo minha pele se arrepiar,
entã o meu pau finalmente encontrou sua entrada apertada e foi minha
perdiçã o. Começamos em uma dança lenta, mas logo minhas investidas
passaram a ser mais fortes, o som dos nossos corpos se encontrando me
excitava ainda mais.
— Mais forte, Blake, quero tudo de você.
— Seu pedido é uma ordem, princesa, mas nã o tire seus olhos dos meus.
E como se os anos nã o tivessem passado, nos perdemos um no outro, em
um prazer tã o forte, que me fez urrar quando juntos chegamos a um
orgasmo enlouquecedor.
Definitivamente Blake era o homem da minha vida, foi com essa
conclusã o que resolvi ligar e acabar de vez com a agonia de estar longe
dele. Finalmente nó s estávamos solteiros, esse era o nosso momento e
merecíamos viver essa paixã o que ainda estava muito viva, como pude
perceber quando nos encontramos nos Hamptons.
Quando finalmente decidi que queria Blake de volta, senti um peso
enorme sair das minhas costas. No momento que ele me convidou para
jantar em sua casa, nã o tive um instante sequer de dú vida. Sabia que
seria dessa maneira: um fogo desenfreado nos consumindo e a paixã o
sem qualquer pudor.
Demoramos tempo demais longe um do outro, me rendi assim que ele
me tocou, seu beijo me enlouqueceu e nã o pensei em mais nada, só o
queria dentro de mim. O beijo dele sempre seria o melhor, o mais
quente, mais macio e mais feroz. Fazia toda a minha pele arrepiar, mas
era o meu coraçã o que parecia que nã o ia aguentar tanta emoçã o de tê-
lo novamente colado em mim.
Passamos horas nos amando, na cama, no chuveiro e, quando finalmente
nos sentimos saciados, nossa barriga deu sinal de que precisávamos
comer algo urgente.
— Preciso comer alguma coisa ou vou desmaiar em breve, certeza de
que estou quase passando mal, dr. Lancaster. — Beijei seu peito forte
pela milésima vez.
Blake se levantou, vestiu uma bermuda e me puxou para um abraço,
parecia que iríamos recomeçar, mas interrompi, nã o era mentira,
realmente precisava me alimentar. Vesti sua camiseta e fomos
finalmente jantar.
— Acho que nã o conheço ninguém que cozinhe tã o bem quanto você,
Blake, tudo o que você faz é maravilhoso — comentei saboreando o
vinho que combinou perfeitamente com o jantar, ricamente preparado
pelo médico mais delicioso desse mundo: carré de cordeiro
caramelizado com fettuccine, simplesmente sensacional.
— Que bom que você gostou, cheguei cedo do hospital, tive tempo de
preparar algo especial para a minha garota. — Piscou sexy e o “minha
garota” mexeu com o meu emocional. — Como está se sentindo depois
de finalmente saborear uma comidinha feita especialmente para você?
— Beijou minha mã o demoradamente.
— Agora sim, estou melhor. Eu disse assim que cheguei que estava com
fome e você me arrastou sem dó nem piedade para horas de sexo, como
se nã o houvesse amanhã .
— Você poderia ter negado, poderíamos ter jantado com calma e só
depois nos devoraríamos, porque foi isso que aconteceu. — Ouvi sua
risada mais gostosa. Ele estava relaxado, feliz, eu diria.
— Em nenhum momento interromperia aquele nosso fogo, estava com
tanta saudade que naquele momento eu só queria me perder nos seus
braços.
Blake me puxou para mais perto, me colocando em seu colo onde pude
perceber que ele já estava pronto mais uma vez. Que homem é esse?
— Se acalme aí, viu, doutor, pois eu quero descansar um pouco, você
está parecendo um adolescente insaciável. — Voltei para o meu lugar,
antes que o desejo tomasse conta de mim novamente.
— Você nã o sabe o quanto sonhei com isso, ver você assim, vestida com
minha roupa, despreocupada, linda. Parece que o tempo voltou para
aqueles dias que passamos juntos.
— Acho que nunca superei aquela época, foi muito intenso, verdadeiro
— confessei.
— Talvez você ache estranho te dizer que sinto da mesma forma, já que
fui embora, me casei, tive uma vida, mas sei exatamente do que você está
falando. Aqueles foram os melhores dias da minha vida e nunca esqueci
cada segundo que passamos juntos. Eu apenas decidi guardar em um
lugar especial e protegido.
— Blake, nã o se martirize, na época sabia dos riscos e dos seus planos
de morar fora, foi uma decisã o consciente.
— Bom, vamos deixar o passado em um bom lugar, temos toda a vida
pela frente e quero muito recuperar esse tempo que ficamos distantes,
vamos construir a nossa histó ria a partir de hoje, o que você me diz?
— Acho perfeito. Mas...
— Mas...?
— Por acaso nã o tem um docinho por aí? — Gargalhamos, pois amava
um chocolate e no momento era o que mais estava querendo.
— Por acaso tem sim. — Blake foi em direçã o à cozinha. — Eu me
lembrei de que você ama trufas de chocolate amargo da La Maison du
Chocolat e tenho uma caixa todinha para você.
— Uau! Você sabe que as trufas de lá sã o a minha perdiçã o, eu amo essa
loja. — Olhei para a caixa cheia de lindas trufas, que até salivei.
— Bea, você está parecendo aquela garotinha linda de antigamente, que
vivia com essa caixa de trufas pela sala da minha casa.
— Nã o acredito que você se lembra disso? — Esse homem não existe.
— Jamais esqueceria a situaçã o que presenciei tantas vezes. Recordo-
me, inclusive, como achava engraçado você e Liv contarem quantas
trufas cada uma tinha, para garantir que ninguém pudesse roubá -las de
vocês. Realmente era hilá ria a cena.
Por volta da uma da madrugada, depois de mais sexo maravilhoso, o
sono nos venceu e dormi agarrada ao meu amor, de conchinha, como
sonhei milhares de vezes.

Acordei com o cheiro do café que provavelmente meu médico gourmet


estava preparando, entã o resolvi tomar um banho rá pido, peguei uma
cueca boxer e uma camiseta de Blake e fui guiada pelo aroma agradável.
Assim que cheguei na cozinha, antes mesmo de cumprimentá -lo, Blake
se virou, parecendo pressentir minha presença. Abriu o sorriso mais
gostoso do mundo e veio ao meu encontro com uma cara sexy demais, já
senti uma agoniazinha entre as pernas. Esse homem vai me enlouquecer.
— Já percebi que alguém aqui invadiu meu closet sem timidez alguma.
— Beijou-me no pescoço, me roubando o ar.
— Nã o quis ser invasiva demais, mas depois que tomei banho quis uma
roupa limpinha e as suas estavam lá , cheirosas, macias, entã o nã o resisti.
Confisquei duas peças.
— Você fica ainda mais perfeita com minhas roupas, mas prefiro sem
nada. Venha, fiz um café completo para Vossa Alteza. — Ganhei um
tapinha na bunda e ele me levou para sentar-me à mesa que estava
repleta de gostosuras.
Era um café da manhã de hotel cinco estrelas, me senti bem-cuidada,
protegida.
— O que você quer fazer hoje? Só preciso dar uma passada no hospital,
ver alguns pacientes e o resto do dia será todo nosso.
— Vou para casa entã o. Quando você estiver livre passa lá e podemos
fazer alguma coisa.
— Te deixo na sua casa, assim finalmente descubro onde você mora, nã o
devo demorar muito no hospital, no má ximo uma hora. Mas antes de
sairmos, ainda preciso fazer uma coisinha.
Seu olhar libidinoso disse quais eram suas intençõ es e, entã o, ele me
agarrou como se nã o pesasse nada e me levou para o sofá .
— Tire as minhas roupas, Beatrice, e fique de quatro, quero essa visã o
aqui na minha sala, você completamente nua.
— Dr. Blake, você acordou bem mandã o hoje! — Comecei a tirar a
camiseta lentamente, em seguida a cueca boxer, que a essa altura já
estava ú mida por conta da minha excitaçã o.
— Nã o enrole, Beatrice, ou serei obrigado a dar umas palmadas nessa
bunda gostosa.
Depois que me despi, aproximei lentamente e apenas rocei meus lá bios
nos dele, sua respiraçã o já estava alterada. Blake segurou minhas mã os
atrá s das costas e me beijou loucamente. Fomos andando devagar até
minhas pernas encontrarem o sofá . Ele tirou do bolso da bermuda um
preservativo, mas eu o tirei da sua mã o e, antes de protegê-lo, fiz
questã o de prová -lo. Assim que meus lá bios tocaram seu membro
extremamente rígido, ele segurou meu cabelo em um rabo de cavalo,
ajudando-me no movimento, uma cena muito eró tica.
— Bea, você vai me matar assim. Venha, quero me enterrar em você. Se
continuar com essa sua boca no meu pau, em segundos eu vou sucumbir,
mas antes ainda quero te ver gritar muito meu nome.
Blake me puxou para um beijo bruto, nada gentil, cheio de tesã o. Em
seguida me colocou no sofá de quatro. Com ele nã o me sentia tímida,
nã o pensava em absolutamente nada, só nosso prazer importava nesse
momento.
Ouvi o barulho da embalagem do preservativo sendo rasgada e um
segundo depois ele já estava dentro de mim, em um misto de força e
carinho que só ele conseguia fazer.
— Mulher, você é gostosa demais. Como pude viver todos esses anos
sem a sua boceta quente, macia? Você me deixa doido, Bea.
Com investidas seguras e uma mã o habilidosa cheguei ao orgasmo
rapidamente. Depois de vá rias palavras sacanas, ele se entregou
chamando meu nome vá rias vezes.
Caímos no sofá exaustos. Depois que ele se livrou do preservativo,
ficamos um tempo abraçados, sentindo a mistura do nosso cheiro, vendo
as nossas roupas espalhadas e o ú nico sentimento era que ali era o meu
lugar. Ele envolveu seus braços no meu corpo ainda mole pelo orgasmo
arrebatador que ele me proporcionou mais uma vez e senti uma paz que
há muito tempo nã o sentia. Decretei naquele instante que lutaria com
todas as forças por esse amor que nasceu tantos anos atrá s e que
resistiu por todo esse tempo. Eu era dele e ele seria meu para sempre.
Quando estávamos quase adormecendo, a responsabilidade nos
chamou, entã o levantamos, arrumamos a cozinha, tomamos um banho
rá pido que quase virou outra pegaçã o e finalmente Blake me deixou em
casa. Nos despedimos como dois adolescentes, sem querer nos
desgrudar, mas era necessá rio.
Entrei no meu apartamento quase flutuando de felicidade, queria gritar
para o mundo que finalmente eu e o Blake estávamos juntos. Esse
homem era o meu destino, nã o deixarei nada atrapalhar dessa vez. Ele
sentia o mesmo, tinha certeza, pude perceber o quanto ele também
estava envolvido.
Tomei outro banho e escolhi uma roupa bem linda e confortável, já
percebi que Blake gostava de admirar quando estava bem arrumada, ele
sempre comentava alguma coisa. Estava praticamente pronta quando
ouvi o toque do celular e já sabia que era Helena. Ontem à noite avisei
que estava indo me encontrar com Blake.
— Oi, Helena “curiosa” Nevicare.
— Beatrice, estou esperando até agora você me ligar para me contar
como foi o seu encontro com o dr. Gostosão e nada de uma mísera ligação
sua. — A dramá tica de sempre.
— Nena querida, nã o tive tempo, a noite foi muito intensa, acabei de
chegar em casa — relatei.
— Ora, ora, ora, srta. Tomarolli! Quer dizer então que passou a noite na
volúpia. Com certeza, não deve estar conseguindo nem sentar direito, pois
sim, aquele homem parece ter um potencial absurdo. Quero saber de
tudooooo! — gritou no meu ouvido.
— Nena, foi melhor do que esperava, Blake é simplesmente maravilhoso.
Passamos quase a noite toda acordados, sem falar que ele preparou um
jantar maravilhoso para nó s. Estou nas nuvens, amiga.
— Bea, que felicidade ouvir isso, finalmente vocês se renderam. Agora
terão a oportunidade de viver toda essa paixão reprimida. Mas me conte,
ele também sente a mesma coisa, ou seja, percebeu se ele tem os mesmos
sentimentos por você? — Lá vamos nó s ao já conhecido interrogató rio.
— Ele nã o me disse com todas as letras que me ama, ou algo assim, mas
todo o carinho, a atençã o, a preocupaçã o em priorizar o meu prazer é de
quem tem um sentimento muito forte, além de deixar claro que, a partir
de agora, vamos construir a nossa histó ria.
— Estou em êxtase, imagine você. Qual a programação de hoje, vão sair ou
ficarão no quarto colocando a conversa em dia? — Ouvi logo sua risada
safada.
— Ainda nã o planejamos nada, ele foi ao hospital e daqui a pouco vem
para cá . Talvez a gente fique por aqui namorando.
— Sei bem o que é isso. Quer dizer, já até esqueci, faz tanto tempo que não
me relaciono com um homem bacana o suficiente para deixá-lo me
encarcerar na cama. Nem me lembro quando isso aconteceu.
— Você tem estado bastante seletiva ultimamente, essa é a verdade.
Abra seu coraçã o que as oportunidades surgirã o, afinal você é uma
mulher linda.
— Olha ela, já dando conselhos. Mas não vou tomar seu tempo, sei que
deve estar se embelezando para encontrar o dr. Gatão, mas, na segunda, se
prepare, vou querer a riqueza de detalhes, ok?
— Sim, senhora. Nena, preciso de contar algo estranho que está
acontecendo já faz alguns dias. — A minha voz ficou mais séria.
— O que aconteceu, Bea? Você está me assustando.
— Tenho tido a sensaçã o estranha de estar sendo seguida, pode ser
coisa da minha imaginaçã o, mas ontem, quando fui para a casa de Blake,
tinha um carro todo preto, perto daqui de casa e, quando cheguei ao
meu destino, tive a impressã o do mesmo carro estar passando por mim.
Pode ser que seja coincidência, mas fiquei assustada.
— Bea, não brinque com isso, fale logo com seu pai ou com Matteo. Será
que é o Miguel te espionando? — Helena já ligou o modo “policial
investigativo”.
— Eu sei, mas se falar isso com o Matteo ou com o papà, eles nã o me
darã o sossego.
— Sim, Beatrice, mas esse é o objetivo, sua proteção. Trave suas portas,
avise aos porteiros que só poderá subir as pessoas autorizadas e já te
aconselho a tirar o nome do Miguel dessa lista. — Minha amiga estava
verdadeiramente assustada.
— Vou fazer isso agora. Depois nos falamos entã o?
— Combinado, princesinha, vá namorar. Um beijo.
Assim que desliguei o celular, enviei uma mensagem para a central do
prédio onde morava, atualizando a lista das pessoas autorizadas a
subirem para o meu apartamento. Talvez isso fosse só uma impressã o,
mas precisava conversar com o meu pai sobre minha suspeita.
Acabei a reuniã o com os residentes e fui direto visitar os pacientes que
ainda estavam no período pó s-operató rio e, graças a Deus, todos
estavam muito bem, sem nenhuma intercorrência, felizmente parecia
que o sá bado seria tranquilo.
Já fazia uma hora que deixei Beatrice em sua casa e já estava louco para
abraçá -la, sentir seu cheiro, seu calor. Eu parecia um garoto apaixonado
pela sua primeira namorada. Nem acreditei que ela dormiu em meus
braços. Como pude nã o viver isso por tantos anos?
O meu foco na medicina nã o me deixou viver essa experiência, mas
agora depois de tudo que conquistei, pude enxergar claramente que sem
ela em minha vida, nã o conseguirei ser plenamente realizado, nada vai
nos impedir de ficarmos juntos.
— Dr. Lancaster, que bom que ainda o encontrei aqui. — Um dos
residentes com quem acabei de me reunir me abordou com cara de
quem viu um fantasma.
— O que aconteceu? Você parece assustado. Já estava quase saindo do
hospital.
— A dra. Lucy está na sala de descanso dos médicos completamente
descontrolada, nã o sabemos o que aconteceu.
Saí rapidamente com o residente me acompanhando em direçã o à sala
de descano e, quando abri a porta, Lucy estava toda descabelada
gritando com todos, só parou o escâ ndalo quando me viu.
— Blake, tire esse pessoal daqui, por favor, eu quero ficar sozinha.
Todos saíram de fininho e eu me aproximei dela com cautela, sem
entender nada.
— Lucy, o que está acontecendo? O que te fez sair do controle desse
jeito? — Estava perplexo, nunca a vi assim tã o transtornada.
— Nã o aconteceu nada, é só um dia ruim e esses residentes me tiram do
sério. Nã o precisa se preocupar comigo, já liguei para o meu pai, ele está
no hospital.
Assim que ela disse isso, Andrew entrou na sala, igualmente apavorado.
— Lucy querida, o que houve? Você está uma bagunça. — Lançou-me um
olhar interrogativo.
— Sei tanto quanto você, Andrew, acabei de encontrá -la assim e nã o faço
ideia do que aconteceu — esclareci.
— Parem vocês dois de fazer drama, nã o aconteceu absolutamente nada,
só estou em um dia ruim, já disse. Leve-me para casa, papai, nã o quero
dirigir.
— Se quiser posso levá -la, Lucy — quis ser gentil, mas ela me fuzilou
com o olhar.
— Você nã o é mais o meu marido, esqueceu, Blake? Nã o tem
responsabilidade comigo ou com o que eu faço agora.
Nã o estava entendendo essa atitude. Desde que nos separamos,
conversamos algumas vezes e em nenhum momento ela foi tã o ríspida
assim. Levantei as mã os em sinal de rendiçã o.
— Desculpe, só quis ser gentil — falei olhando para o meu ex-sogro.
— Pode deixar, Blake, assumo daqui — Andrew tentou contemporizar.
— Ok, sem problemas. Se precisar de alguma coisa me avise. — Despedi-
me dos dois e deixei o hospital imediatamente.
Que loucura foi aquela, minha ex-mulher completamente alterada e
Andrew parecia saber do que se tratava, mas preferiu esconder. Mesmo
separado da Lucy, eu tinha muito carinho por ela, nã o queria que ela
sofresse, seja por qual motivo fosse. Na segunda-feira, tiraria isso a
limpo.
Agora irei em busca da minha garota, porque estava morrendo de
saudades.

Depois que descobri que meu nome já estava na portaria como uma
pessoa autorizada a subir para o apartamento de Beatrice, entrei no
elevador rindo feito um idiota, mas encontrá -la em sua porta me
esperando linda como sempre, me fez o homem mais sortudo do mundo.
— Demorei, princesa? — Agarrei seu pescoço tomando-a em um beijo
urgente.
— Para dizer a verdade, você está anos atrasado, dr. Mú sculos, como diz
Nena — ela riu grudada em meus lá bios.
Fiz uma cara de interrogaçã o com o que ela comentou, trazendo-a ainda
mais para perto se é que isso era possível.
— Por favor, entre. Tenho uma vizinha que é uma senhorinha simpá tica,
mas acho que, talvez, ela nã o goste de nos ver assim em plena luz do dia.
A casa de Beatrice era cheia de personalidade, elegante em tons claros,
com plantas espalhadas por todo lado e obras de arte em lugares
estratégicos.
— Amei seu apartamento. Combina com você, lindo e sofisticado. —
Andei pela sala observando as fotografias da família Tomarolli,
obviamente nã o poderia faltar vá rias da Olívia e, para a minha surpresa,
havia uma minha saindo do mar com a prancha de surfe. Peguei o porta-
retratos e, quando me virei, ela estava encostada na parede com um
olhar safado e meio tímido.
— Eu tirei essa foto em uma das suas férias nos Hamptons. Sempre
esteve discretamente aí, achei até que você nem perceberia.
— Quando foi isso? Estou com um semblante tã o feliz.
— Foi durante aqueles dias que ficamos juntos e, de fato, você está mais
lindo ainda. Peguei um momento especial e essa foto é uma das minhas
preferidas.
— Como assim, uma das suas preferidas, você tem mais fotos minhas?
Nã o me lembro de ter autorizado você sair tirando fotos, nã o conhecia
esse seu lado paparazzi.
Fui em sua direçã o e a enlacei pela cintura fazendo-a perceber que a
essa altura, só de saber que ela me observava em segredo, já estava
pronto para tirar nossas roupas mais uma vez e esquecer do mundo lá
fora.
— Tenho alguns á lbuns com suas fotos ao longo dos anos, só parei
minha coleçã o quando você ficou noivo, aí desisti da loucura de agir
como uma stalker26 — assumiu que sempre estive presente em sua
vida.
— Quero ver esses á lbuns, mas antes preciso ter você em seus lençó is
que certamente sã o macios e sei que me tornarei um viciado. Me diga
onde é seu quarto, Bea, preciso de você agora.
Peguei-a no colo rapidamente enquanto ela me guiava para o meu
paraíso particular. Acho que o nosso programa seria em casa mesmo,
nã o tinha intençã o alguma de sair da cama até amanhã , no má ximo vou
preparar uma refeiçã o rá pida, afinal vamos gastar muita energia.
— Achei que fô ssemos sair, almoçar em algum lugar, aproveitar o dia
lindo que está fazendo.
Neguei com a cabeça, ao mesmo tempo que ela levantava os braços para
que eu pudesse tirar seu vestidinho minú sculo, que deixava pouco para
a imaginaçã o.
— Achei que, na sua idade, esse fogo todo estaria mais brando.
— Como é, Beatrice? Está me chamando de velho? Você está merecendo
umas palmadas e hoje é um bom dia para isso.
— Esqueceu que a nossa diferença de idade sã o dez anos? Isso pesa
muito no desempenho sexual.
A bandida virou-se de costas para eu abrir seu sutiã e, claro, levou uma
palmada naquela bunda empinada. Deitou-se na cama só de calcinha e
nã o resisti mais, rapidamente tirei toda a minha roupa, coloquei os
preservativos na cama e mergulhei entre suas pernas.
— Cheirosa demais, macia demais. Assim você vai me enlouquecer,
mulher.
— Apesar de ser mais velho, você sabe como agradar uma mulher. —
Mais uma vez, ela me provocou e ganhou uma mordida na barriga
chapada.
— Se continuar me provocando, nã o vou deixar você gozar por um bom
tempo, vou te levar ao limite e parar antes de você explodir.
— Que maldade é essa, dr. Lancaster? Estou brincando, nã o mereço esse
castigo tã o severo. Você nã o tem nada de velho, aliá s, você é maravilhoso
e o ú nico que consegue me levar verdadeiramente ao céu.
— Sou o ú nico, o primeiro e, a partir de agora, o ú ltimo. — Subi
distribuindo beijinhos na sua barriga, pescoço até chegar em sua boca,
que sem demora me devorou.
Beatrice estava completamente entregue ao nosso tesã o, envolveu suas
pernas em minha cintura, em busca de mais atrito e me fazendo seu
prisioneiro. Mordisquei seus mamilos, que apontavam para mim loucos
por atençã o. Os sons que ela fazia chegavam direto em meu pau, que já
estava rijo.
Desci minha mã o por suas curvas lentamente sentindo na ponta dos
meus dedos sua pele arrepiar instantaneamente. Ao chegar em seu
clitó ris, sem nenhuma surpresa, percebi que sua umidade denunciava o
quanto estava excitada. Pronta para me receber.
Quando a ouvia sussurrar meu nome me sentia o homem mais foda,
dando prazer a essa mulher incrível. Faço tudo por ela. Estou
completamente fascinado por Beatrice, nos amamos por longas horas
até, mais uma vez, tomarmos consciência de que estávamos ficando
famintos.
Dessa vez, Beatrice nã o me deixou preparar nada, entã o optamos por
pedir uma comida á rabe deliciosa e como sobremesa ela preparou um
docinho super-rá pido, que aprendeu com seu sobrinho Enrico. Acho que
já vou roubar a receita desse tal brigadeiro, simples e delicioso.
Depois do almoço, nos sentamos para assistir a um filme, mas o sono
nos pegou e acordamos com o celular de Beatrice tocando. De longe, ela
já viu que era uma videochamada da Olívia e me olhou, como se nã o
soubesse o que fazer.
— Esqueci completamente do nosso encontro. — Começou a arrumar o
cabelo.
— Atenda, nã o temos nada a esconder. Fale com ela primeiro, depois eu
apareço.
— Ela vai nos matar, Blake. Nã o tive tempo de falar com ela. Oiiiii! —
Beatrice atendeu animada demais e com uma cara de culpada, minha
irmã vai perceber no primeiro segundo.
— Beatrice, que cara de quem estava fazendo sacanagem é essa? —
Minha irmã e sua sutileza de um elefante de sempre.
— Sacanagem nada, peguei no sono, acordei com sua ligaçã o. Esqueci
que nosso encontro hoje tinha mudado de horá rio. — Agora que entrava
o elemento surpresa.
— Ela estava fazendo sacanagem sim, irmã zinha. E das boas — comecei
a rir da cara das duas.
O grito que Olívia deu deve ter sido ouvido por toda Nova Iorque.
— Traidores, estão se pegando na maior safadeza e eu, inocente, sem
saber de nada? Me contem quando isso aconteceu e por qual motivo não
fui comunicada? Logo eu, que sempre fui o maior cupido de vocês.
— Calma, amiga, nó s nos acertamos ontem, já estava nos planos te ligar
no má ximo amanhã . — Abracei Beatrice, sentindo o cheiro dos seus
cabelos.
— Olha a cara de apaixonado dos dois, aposto que não saíram da cama
desde então.
— Liv, você está querendo saber demais, mas posso te garantir que sua
amiga nã o pode reclamar, estamos em um processo de recuperar o
tempo perdido e em ritmo acelerado.
— Estou muito feliz por vocês. Blake, você sabe que sempre pedi que
deixasse a Bea em paz, já que você não tinha intenção de se mudar para
Nova Iorque na época que se envolveram. Depois você acabou se casando,
mas sempre soube que foram feitos um para o outro.
— Estamos nos redescobrindo novamente e nã o posso mais ficar longe
da minha princesa.
Beatrice me olhou emocionada.
— Finalmente, nã o é, Liv? Agora vamos nos priorizar.
— Quem mais está sabendo da novidade? — A minha irmã ciumenta já
indagou.
— Você é a primeira pessoa para quem contamos. Blake se separou faz
pouco tempo, eu também terminei o namoro com o Miguel
recentemente, entã o combinamos que por um tempo ficaremos mais
discretos, no má ximo falaremos com nossos pais e a Nena.
— Melhor mesmo, acredito que, quando a Lucy souber, ela não vai gostar
nada. Mulher tem uma cabeça meio doida, mesmo ela querendo a
separação vai ficar chateada, é o sentimento da posse falando mais alto.
— Por falar em Lucy, acabei me esquecendo de comentar com a Bea um
fato estranho que ocorreu hoje quando passei no hospital para ver os
pacientes.
Beatrice juntou as sobrancelhas em sinal de preocupaçã o.
— Olha aí, desde que você comentou que ela aceitou superbem a
separação e que a iniciativa foi dela de pedir o divórcio, achei bem
estranho. — O tom de voz da minha irmã já saiu de divertido para um
bem preocupado.
— Quando estava saindo do hospital, um dos residentes me abordou
informando que a Lucy estava descontrolada na sala de descanso dos
médicos. Quando a encontrei, parecia outra pessoa, desorientada, o
cabelo estava todo desarrumado, gritando com todos que estavam ao
seu redor.
— Sério? O que pode ter acontecido? — Minha garota segurou minha
mã o.
— Nã o faço a menor ideia, o pai dela chegou em seguida e disse que
estava tudo sob controle e que assumiria a partir dali. Como a pró pria
Lucy dispensou minha ajuda, me coloquei à disposiçã o e os deixei lá ,
vindo direto para cá .
— Olha, irmão, se eu fosse você ficaria em alerta, ela poderá sim tentar
atrapalhar a vida de vocês. — Olívia tinha razã o, eu precisava apurar
essa situaçã o.
— Na segunda vou dar uma investigada nisso — garanti para as minhas
meninas.
— Depois nos atualize, ok? Mas agora quero saber de vocês. Quais os
planos dos pombinhos?
— Por enquanto namorar muito, nã o vou largar essa mulher nunca mais.
Quando você vem nos visitar? Mamã e sente muito a sua falta.
— Como te falei outro dia, estou planejando passar uns dias aí, no máximo
em quinze dias chego em Nova Iorque e já adianto que quero muito tempo
sozinha com a Bea, não é porque vocês agora estão juntos que vou perder
a companhia da minha amiga-irmã.
— Fique tranquila, Liv, que você também é prioridade na nossa vida —
Beatrice a tranquilizou.
Ficamos por mais um tempo conversando animadamente até que
encerramos a ligaçã o.
Conforme já tínhamos decidido, ficamos em casa namorando o restante
do sá bado e, no domingo, Beatrice recebeu a ligaçã o da mã e pela manhã
convidando-a para o almoço. No primeiro momento, ela pensou em
recusar, mas pensou bem e acabou contando a novidade. Katie ficou
radiante, a relaçã o das duas era muito boa, ela sempre apoiou a filha em
tudo. Obviamente fui convidado para o almoço, entã o nosso domingo foi
cheio de comida saborosa, vinho e muito amor.
Quando chegamos na casa dos meus pais no domingo, Blake foi tã o bem
recebido que toda a tensã o que sentimos apó s o convite da minha mã e
se dissipou rapidamente. Já nã o era novidade para a minha família o
quanto sempre fui muito apaixonada por ele. Nã o era um assunto que
eu e o papà27 conversávamos, mas ele sempre acompanhou tudo meio
que de longe, afinal ele e a mamma nunca tiveram segredos.
— Seja bem-vindo, ficamos felizes em receber você em nossa casa,
querido, ainda mais ao lado da nossa filha. — Mamã e puxou Blake para
um abraço afetuoso. Meu pai foi mais comedido, mas igualmente
animado.
— Obrigado, Katie, sei que você aprova a nossa reaproximaçã o. — Blake
comentou retribuindo o abraço da minha mã e e cumprimentou meu pai
respeitosamente.
— A Ava já está sabendo que vocês estã o juntos?
— Ainda nã o, Katie, estamos planejando passar na casa dos meus pais
ainda essa semana para darmos a notícia.
— Mamma, estamos sendo mais reservados, afinal nó s dois saímos de
relacionamentos recentemente, achamos melhor ir com calma.
— Estã o certíssimos, curtam um ao outro primeiro, vocês têm muita
coisa para viver ainda. Mas faço questã o de fazer um jantar para as duas
famílias assim que vocês permitirem, ok? Agora vamos lá para fora, o dia
está muito agradável, precisamos brindar. Vocês nã o sabem como estou
radiante com tudo isso.
Minha mã e nos conduziu para a á rea da piscina onde uma mesa
lindamente decorada com flores e frutas estava nos aguardando. Meu
pai logo serviu uma bebida para o Blake e os dois começaram uma
conversa animada, inicialmente eu estava preocupada, acreditava que
ele nã o aprovaria o nosso relacionamento, mas agora vendo os dois tã o
entrosados, sentia-me mais tranquila.
O almoço foi servido com o requinte costumeiro da casa dos Tomarolli,
mas ao mesmo tempo deixando o convidado de honra bem à vontade.
Ele, inclusive, ajudou minha mã e com o molho das saladas, preparando
uma de suas receitas exclusivas.
— Bea, estou sinceramente encantada com o que Blake está me falando
sobre os pratos deliciosos que ele tem criado, precisamos fazer esse
livro de receitas virar realidade.
Pronto, agora a dona Katie terá um motivo para paparicar ainda mais o
Blake.
Foi um domingo maravilhoso, minha mã e estava radiante. Vá rias vezes a
flagrei nos observando e suspirando, nã o tinha dú vida de que estava tã o
feliz quanto eu. No final da tarde, voltamos ao meu apartamento e, para
fechar o dia com chave de ouro, eu e o Blake nos perdemos mais uma vez
em nossa paixã o, seus beijos eram como fagulhas que acendiam meu
desejo em segundos. No final da noite, nos despedimos, ele achou
melhor voltar para a sua casa, porque na segunda-feira logo cedo ele
teria uma cirurgia relevante e precisava descansar, pois se dormisse
mais uma noite comigo, descanso certamente seria uma palavra que nã o
estaria em nosso vocabulá rio.

Quando acordei foi impossível nã o pensar em Blake, além do seu cheiro


nos meus lençó is, meu corpo estava deliciosamente dolorido em vá rias
partes, a nossa atividade do final de semana foi de alto impacto.
“Bea, você não estava acostumada com essa maratona sexual”, minha
consciência me lembrou de que os ú ltimos dias foram realmente
intensos.
— Bom dia, srta. Tomarolli! Temos alguns assuntos bem importantes a
serem tratados esta manhã , mas saiba que você nã o se esquivará de me
contar como foi o seu final de semana com o dr. Gostosã o, com riqueza
de detalhes inclusive. — Helena nã o ia me deixar em paz hoje.
— É sério que você acha que vou te dar detalhes da minha alcova a essa
altura da nossa amizade? — Fingi estar brava.
— Alcova foi bem século XIX, amiga, entretanto, sei que seu programa
dos ú ltimos dias está mais para um bom livro para maiores de dezoito
anos e quero sim, saber tudinho!
— Você nã o vai aliviar mesmo, nã o é, Nena? Na hora do almoço
conversamos um pouco, mas já adianto que preservarei minha
privacidade da sua curiosidade desmedida — brinquei, pois sabia que
ela ia me torturar até arrancar o má ximo de informaçõ es.
A manhã passou que nem percebemos, tivemos reuniõ es importantes
com fornecedores de pedras preciosas e a finalizaçã o do planejamento
de marketing da coleçã o exclusiva para a joalheria da Suíça. Estava
extremamente feliz com esse projeto, que certamente me abriria portas
para novas parcerias na Europa.
— Pronta para nosso almoço, Bea? Quem acabou de me ligar e meio que
se convidou para almoçar conosco foi a Charlotte, algum problema para
você?
— De forma alguma, ela é um amor. Faz tempo que nã o nos encontramos
e o melhor é que ficarei livre do seu interrogató rio, já que nã o
poderemos conversar sobre Blake durante o almoço.
— Que espertinha você, me esqueci desse detalhe.
Dei um sorrisinho vitorioso, pelo menos ganhei um tempo até ela me
espremer novamente com sua curiosidade.
Nesse momento, meu celular tocou e vejo que era a minha mã e.
— Oi, mamma, que surpresa. Tudo bem?
— Oi, filha. Estou saindo da minha terapeuta aqui perto da sua empresa e
resolvi te convidar para almoçarmos, está muito ocupada?
— Excelente ideia, assim fico livre das garras de Helena, que quer saber
tudo sobre o meu reencontro com Blake. Já está vindo? — Dei uma
risadinha para Helena.
— Em dez minutos passo aí, mas, meu amor, você se livra da Nena, mas eu
vou substituí-la, pois quero sim saber de tudo. — Minha mã e gargalhou do
outro lado da linha. Nã o tinha jeito, as duas estavam de complô .
— Só vou perdoar você por desmarcar o almoço em cima da hora
porque é a Katie e nã o pense que está se livrando de mim, no final do dia
passo aqui e aí sim, você nã o terá escapató ria. Vou ouvir atentamente a
histó ria de “Blake, o retorno”. — Jogou um beijo e saiu rebolando.

— Nã o conhecia esse restaurante, mamma.


— Seu pai e eu sempre almoçamos aqui, a comida é maravilhosa, mas eu
venho mesmo pela sobremesa, é de comer rezando. Mas entã o, Bea, seus
olhinhos estã o tã o brilhantes, está estampado em seu rosto o quanto
está feliz. Me conte como você está se sentindo?
— Parece que estou flutuando, nem nos meus melhores sonhos imaginei
que um dia Blake e eu estaríamos juntos novamente. Tenho medo de que
esteja criando muita expectativa. À s vezes, me sinto insegura, mesmo
com Blake demonstrando o contrá rio em suas atitudes.
— Deixe de besteira, Beatrice. Vocês sã o adultos, têm uma histó ria.
Mesmo que tenha sido breve, foi intensa e posso te garantir que, durante
o jantar lá em casa, percebi o quanto Blake está apaixonado, ele nã o
desgrudava os olhos de você.
Minha mã e era o meu porto seguro, sempre sabia o momento certo de
dizer as coisas e agora era um daqueles momentos que eu precisava
muito da sua sabedoria. Nã o podia deixar o medo me dominar e me
impedir de viver o momento mais feliz da minha vida.
— Eu sei que é besteira da minha cabeça, mas sempre acho que algo está
prestes a acontecer e que poderá nos impedir de viver esse amor.
— Besteira mesmo, filha. Agora tire essas caraminholas da cabeça,
vamos brindar ao amor e conte-me tudo como aconteceu, contudo pode
me poupar os detalhes quentes, esses você pode deixar para Liv e Nena.
— Levantamos nossa taça e fizemos o brinde. Katie Tomarolli era uma
româ ntica inveterada.
Nosso almoço demorou um pouco mais do que o esperado. Quando
cheguei ao escritó rio, minha secretá ria avisou que Helena estava em
uma reuniã o, mas deixou o recado explícito para que eu a aguardasse,
pois precisava falar comigo com urgência. Fiquei curiosa. Será que tinha
acontecido algo?
Já estava encerrando meu dia, ansiosíssima para me encontrar com
Blake. Nos falamos rapidamente mais cedo, mas ele ainda tinha uma
cirurgia no final da tarde. Hoje, eu ia preparar o jantar, só esperava nã o o
decepcionar, afinal nã o era uma especialista na cozinha.
Peguei o celular para enviar uma mensagem para a Helena, queria saber
se demoraria a chegar, mas, antes de começar a digitar, minha amiga
entrou na sala parecendo que tinha visto um fantasma.
— Ainda bem que você me esperou, estou tã o nervosa. Durante a
reuniã o, que parecia infindável, quase pedi ao cliente á gua com açú car
para tentar me acalmar.
— Respira, amiga, entã o vou pedir para que Naomi traga uma á gua com
açú car para você.
Esperei ela respirar e depois bebeu a á gua fazendo careta e só entã o
quis saber o que aconteceu para deixá -la assim tã o fora de controle.
— Bea, sente-se porque você vai ficar tã o surpresa quanto eu com o que
vou te falar.
Fiz o que ela pediu com o coraçã o acelerado.
— Depois do almoço, quando eu e a Charlotte já estávamos saindo do
restaurante, ela viu o Miguel em uma mesa mais reservada e percebi
logo que ele estava com uma mulher.
— Mas o que isso tem demais, sra. Exagerada? Ele está livre, pode sair
com quem quiser.
— Espere e me diga se sou exagerada. Claro que Charlotte quis
cumprimentá -lo e obviamente eu a incentivei, já que fiquei realmente
curiosa para saber com quem o tã o apaixonado espanhol estava de
conversa.
Nã o fiquei nada surpresa com a atitude da minha amiga, acho mesmo
que ela deveria trabalhar no FBI.
— Para o meu total espanto, a mulher com quem seu ex estava
almoçando, era nada menos do que a ex-sra. Lancaster. — Levantei como
se minha cadeira estivesse pegando fogo, com a informaçã o jogada na
minha cara.
— Espera aí, você está me dizendo que o Miguel estava almoçando com
a Lucy? Nã o é possível, eles mal se conhecem, foram apresentados no
hospital, quando estive internada e trocaram algumas palavras naquele
jantar na casa dos pais do Blake, como pode isso? — As palmas das
minhas mã o começaram a suar e eu as esfreguei na minha roupa, já
muito nervosa.
— Querida amiga, isso nã o está me cheirando a coisa boa, esses dois
juntos estã o tramando algo, tenho certeza disso. — Helena levantou-se,
bebeu mais um gole da sua á gua açucarada e ficou dando volta nas salas.
— Dessa vez, vou ter que concordar com você, está muito estranho esses
dois almoçando juntos. Até onde sei, eles nã o se falavam, nã o tinham
qualquer contato. — Senti minha cabeça latejar.
— É claro que é estranho, Beatrice. Sugiro que você e o Blake conversem
e tentem descobrir o que esses dois estã o armando.
— O que ele disse quando vocês se aproximaram? — Agora era eu quem
queria saber dos detalhes.
— Percebi que ele ficou meio incomodado inicialmente, mas Charlotte
estava tã o animada ao encontrá -lo, que isso, de certa forma, aliviou a
tensã o. Lucy me cumprimentou friamente e ele justificou que, por
coincidência, se encontraram e, como os dois estavam sozinhos, ele a
convidou para acompanhá -lo no almoço.
— Miguel é um cavalheiro, mas muito reservado, jamais convidaria uma
pessoa para almoçar assim do nada, só por educaçã o, ainda mais sem ter
intimidade. Pelo menos é o que eu pensava, nã o é?
— Isso está me cheirando a armaçã o e das grandes. Lembra que você
comentou que tem a sensaçã o de estar sendo seguida, será que o Miguel
nã o contratou alguém para ficar no seu encalço?
— Mas com qual objetivo? Isso nã o tem cabimento. — A essa altura, já
estava bem preocupada.
— Sei lá , Bea. Pelo que você falou, Miguel nã o aceitou muito bem você
ter terminado com ele e ainda sugeriu que você tinha algum interesse no
Blake. O homem pode ter se sentido traído, colocou alguém para
descobrir se a teoria dele tinha fundamento e certamente descobriu que
tinha razã o. Entã o quis dividir a novidade com a Lucy, para, quem sabe,
tentar atrapalhar a vida de vocês.
— Nena, nã o viaja, você está lendo muito aqueles livros de suspenses, já
está criando uma teoria da conspiraçã o. Ele pode estar falando a
verdade. Talvez tenha sido uma mera coincidência mesmo.
— Você nã o é tã o ingênua assim, nã o foi coincidência. Tive até vontade
de sondar a Charlotte, mas nã o quis falar nada, pois ela poderia achar
estranho o meu interesse.
— Foi melhor mesmo, eu e o Blake estamos nos mantendo mais
discretos por enquanto, mas vou conversar com ele sobre esse fato,
quero saber sua opiniã o.
— Aproveite e comente com ele sobre essa sensaçã o de estar sendo
seguida. Nã o brinque com isso, você está demorando muito para tomar
uma atitude.
Encerramos nossa conversa e fui direto para casa. Por essa eu nã o
esperava.
Para a minha felicidade, Blake entrou em meu apartamento casualmente
vestido, tomado banho, o cabelo ainda estava ú mido e com uma mochila
no ombro. Agarrou-me assim que colocou aqueles olhos vibrantes em
mim. Derreti-me toda quando tive sua língua invadindo minha boca sem
muita delicadeza, com uma certa fome eu diria, prontamente
correspondi, pois me sentia da mesma forma, cheia de saudades.
— Ora, ora, dr. Gostosã o, estou entendendo que sentiu minha falta, esse
seu beijo praticamente levou todo o meu ar. Desse jeito vou te convidar
todos os dias para jantar comigo, sou capaz de me viciar nesse seu
cheiro maravilhoso.
— Já tem quase 24 horas desde a ú ltima vez que te vi, isso é uma
eternidade, amor.
São meus sonhos se tornado realidade? Sim. Ele me chamou de amor?
Fiquei toda boba com essa demonstraçã o simples de carinho.
— Também nã o via a hora de te encontrar novamente. E o que tem nessa
mochila?
— Nada demais, algumas roupas e objetos pessoais. Nã o tenho intençã o
alguma de te deixar hoje, essa noite vou saborear cada pedacinho da sua
pele e vou te fazer gritar meu nome tantas vezes que é bem possível que
sua vizinha faça alguma reclamaçã o.
— Vou tentar me controlar, afinal nã o podemos perturbar o sono de uma
senhora de quase 80 anos. Venha, vamos arrumar um lugar para você no
meu closet. — Puxei-o pelo có s da calça, mas Blake foi mais rá pido e me
pegou no colo me levantando com agilidade e fomos para o meu quarto,
loucos para tirar as nossas roupas.
Nó s nos amamos sem pressa, curtindo cada reaçã o dos nossos corpos.
Com sua boca macia, Blake cumpriu a promessa e distribuiu beijos por
toda a extensã o da minha pele, me levando uma e outra vez ao paraíso,
como só ele sabia fazer. Era incrível que, depois de todos esses anos,
minha reaçã o ao seu toque tinha o mesmo frisson, me deixava
completamente entorpecida e rendida.
— Acho que fui enganado — sussurrou em meu ouvido e eu o olhei sem
entender. — Fui convidado para um jantar e até agora nã o vi nenhum
movimento da dona da casa, que indicasse qualquer comida sendo
preparada. — O safado mordeu meu ombro de leve.
— Nã o crie expectativa com relaçã o a isso, meus dotes culiná rios sã o
bem bá sicos, acho melhor pedirmos uma comida em um restaurante, o
que acha?
— Nada disso, sua preguiçosa, vamos tomar uma banho que te ajudo
com o jantar. — Deu um tapa em minha bunda e me puxou para o
chuveiro.
Eu já tinha adiantado um peixe com legumes e arroz branco, precisava
apenas preparar uma salada de tomate e rú cula. Obviamente o meu
médico e chef gostoso demais, assumiu a finalizaçã o dos pratos, coube a
mim a difícil tarefa de escolher um vinho que harmonizasse com a nossa
refeiçã o.
Por fim, sentamo-nos à mesa e entre carinhos, beijos e indiretas safadas,
saboreamos um jantar delicioso. Eu vesti apenas um roupã o de seda sem
nada por baixo e Blake ficou apenas de bermuda, uma das peças que
trouxe em sua mochila.
Você amou isso, não é, Bea? O homem já trazendo roupas para a sua casa.
— Agora que já saciamos todas as nossas fomes, eu preciso conversar
com você sobre algo bem esquisito que aconteceu hoje.
Sentamo-nos em uma chaise28 na varanda com nossas taças de vinho,
aproveitei e me aninhei em seus braços confortavelmente.
— O que aconteceu, princesa? Você está tensa. Tem algo te
incomodando?
— Lembra que comentei que iria almoçar com a Nena hoje?
Ele balançou a cabeça confirmando.
— Acabei desistindo porque a mamma apareceu sem avisar querendo
almoçar comigo, entã o Nena foi almoçar com uma amiga, a mesma que
me apresentou ao Miguel. — Quando Blake ouviu o nome do meu ex,
mudou de posiçã o ficando de frente para mim.
— Estou ouvindo. — Soltou uma respiraçã o longa e profunda.
— Quando as duas estavam saindo do restaurante viram o Miguel em
uma mesa, acompanhado de uma mulher, e foram cumprimentá -lo. Para
a surpresa de Helena, a mulher que estava almoçando com o Miguel era
nada menos do que a Lucy.
Blake se levantou de sú bito, quase derramando o vinho da sua taça.
— Você está me dizendo que o seu ex estava almoçando com a minha ex-
mulher? A Helena tem certeza disso?
— Eles conversaram, o Miguel deu uma desculpa de que tinha
encontrado a Lucy por acaso e, como ela estava sozinha, a convidou para
almoçarem juntos. Nena disse que a Lucy falou com ela bem friamente.
— Mas como pode isso? Até onde sei, além do hospital e o jantar na casa
dos meus pais desconheço qualquer outro momento que eles voltaram a
se encontrar. Beatrice, isso está muito estranho.
— Eu também achei bem bizarro, a Nena já está criando mil teorias,
achou um tanto suspeito, acredita que os dois estã o conspirando contra
nó s dois. Já estou até falando como a Helena — brinquei tentando
driblar um pouco a preocupaçã o que, de repente, tomou conta de nó s.
— Com certeza uma coisa nã o tem relaçã o com a outra? Nó s ainda nã o
assumimos nada em pú blico, somente nossa família está sabendo do
nosso envolvimento.
Nesse momento, eu também me levantei e andei de um lado a outro,
admirando de longe as luzes do Central Park. Blake me abraçou por trá s,
deitei minha cabeça em seu peito me sentindo protegida.
— Acho que você tem mais alguma coisa para me dizer, estou certo?
— Na verdade, talvez seja só coisa da minha cabeça, comentei com a
Nena e ela me disse para falar com você. — Virei e ficamos de frente um
para o outro.
— Você está me deixando preocupado, Beatrice, pare de dar voltas,
como a Liv sempre fala comigo, desembucha. — Ele estava tenso.
— Já faz alguns dias, para ser mais precisa, depois que eu e o Miguel
terminamos, que tenho a sensaçã o de estar sendo seguida. Nã o vi
ninguém especificamente, talvez seja só uma impressã o...
— Por que você nã o me disse isso antes, Bea? Será que aquele espanhol
com cara de bandido está te seguindo ou colocou alguém para te seguir?
— Blake bebeu de uma só vez todo o vinho que ainda tinha na taça.
— Calma, Blake, certamente eu estou enganada. — Tentei acalmá -lo,
mas falhei.
— Amanhã mesmo vamos contratar um segurança para te acompanhar,
você nã o pode ficar exposta ao perigo dessa forma. Se realmente o
Miguel está por trá s disso, a essa altura ele já sabe que estamos juntos.
Agora, o que nã o estou entendendo é a Lucy no meio disso,
considerando que foi ela mesma que sugeriu a nossa separaçã o. Está
faltando alguma peça nesse quebra-cabeças.
— Você está indo na mesma linha fantasiosa da Nena, sinceramente nã o
acredito que tenha alguma armadilha contra nó s. Apenas algumas
coincidências.
— Beatrice, nã o podemos negligenciar nada, fique atenta, nã o saia
sozinha e nã o atenda ninguém em seu escritó rio que você nã o conheça.
— Tomara que tudo isso nã o atrapalhe minha vida.
Ficamos mais um pouco juntos abraçadinhos, terminamos nosso vinho,
mas nem assim o Blake relaxou. Quando fomos dormir, ele estava um
pouco mais calmo, mas ainda com uma ruguinha de preocupaçã o na
testa.

Depois de muito insistir, Blake acabou me convencendo a deixá -lo me


levar para o trabalho e me fez jurar que nã o sairia sozinha de forma
alguma. Ele só se acalmou um pouco quando prometi que hoje mesmo
falaria com o papà sobre a possibilidade de contratar um segurança
particular, pelo menos por um tempo.
Achava tudo isso um exagero, quando pensava que, além de Helena, teria
que conviver com outro obcecado por temas policiais e afins. Não terei
paz mesmo.
Quando cheguei ao escritó rio, liguei logo para o meu pai, que
imediatamente começou a gritar como um bom italiano que era.
— Beatrice querida, situações especiais pedem ações radicais e neste caso,
mesmo você sendo uma mulher adulta e independente, vou usar da
prerrogativa de seu pai e proibi-la terminantemente de sair sozinha até
que seja apresentada ao seu segurança. — Disparou a falar, com toda a
sua autoridade que me fez lembrar quando ainda era uma menina e
morria de medo de suas broncas. — Vou cuidar disso pessoalmente, tenho
um amigo dono de uma renomada empresa de segurança pessoal, ele
atenderá um pedido meu com a maior presteza.
— Papà, você está parecendo o Blake, hoje ele veio pessoalmente me
trazer no trabalho, sinceramente acho que vocês estã o exagerando. —
Tentei dissuadi-lo dessa ideia de colocar alguém colado comigo o tempo
todo.
— Filha, essa questão é inegociável, estamos falando da sua segurança. E
se o Blake teve a mesma ideia, isso só demonstra o quanto ele está
preocupado com você. Está decidido e não se fala mais disso, bambina. —
Determinou, nã o me deixando sequer argumentar.
No final do dia fui apresentada ao meu segurança particular, um ruivo
sisudo, de quase dois metros de altura, Nikolai Petrov, que, pelo nome,
deveria ser de origem russa. Pareceu-me uma boa pessoa, entã o fiz a
minha cara mais simpá tica ao sermos apresentados, afinal ele seria
minha sombra por um tempo.
Quando contei a novidade para o Blake, ele ficou mais tranquilo.
Diferente da noite anterior, resolvemos que eu dormiria em sua casa e,
dessa vez, fui eu quem cheguei com uma sacola com roupas, itens de
higiene pessoal, maquiagem e outras coisinhas que precisaria.
Petrov ficou com meu carro para, no outro dia, me levar ao trabalho,
assim pouparia meu namorado dessa tarefa. A partir de hoje, minha
rotina seria mudada completamente em funçã o dessas suspeitas que
poderiam nã o ser absolutamente nada, mas nesse caso era uma batalha
perdida, todos estavam convencidos de que nã o tinha outra alternativa,
entã o aceitei resignada.
Durante o restante da semana, meus dias se resumiam em trabalhar, me
exercitar na academia do meu prédio e a melhor parte era quando eu e o
Blake nos encontrávamos à noite, aí ele assumia a minha proteçã o como
gostava de dizer ao meu segurança.
— Petrov, a partir de agora pode deixar comigo, ela é minha
responsabilidade. — Blake era bem uns dez centímetros mais baixo do
que meu segurança, mas isso nã o o intimidava, se comportava como um
verdadeiro guarda-costas.
— Ok, dr. Lancaster, qualquer intercorrência pode me acionar. — Assim
era o diá logo diá rio dos dois.
Na sexta-feira, Blake tinha a aula de Gastronomia, eu o acompanhei e,
para a minha surpresa, meu médico também convidou meu segurança
para assistir a aula, aquele foi o primeiro momento que vi o russo
relaxar um pouco, até consegui ver o vislumbre de um sorriso.
Resolvemos passar o final de semana nos Hamptons, dessa vez com os
pais de Blake que ficaram muito emocionados quando finalmente
comunicamos que estávamos juntos.
— Bea, minha filha, que alegria receber você aqui em nossa casa, só que
agora como minha nora. O quarto de Blake já está pronto para recebê-
los, coloquei inclusive um arranjo de lírios rosa, pois sei que sã o suas
flores preferidas.
— Tia Ava, eu também estou muito feliz por estar aqui. — Olhei para o
Blake meio envergonhada, em um pedido de socorro.
— Mã e, assim você vai deixar a Bea sem graça. — Ele ainda piorou a
situaçã o. Ao invés de me ajudar, me tascou um beijã o na frente de sua
mã e, me deixando ainda mais constrangida.
— Parece que foi ontem que você e a Liv viviam aprontando por aí. O
tempo passou muito rá pido, olha vocês agora, duas mulheres lindas
independentes, bem-sucedidas, só nos dã o alegria.
— Principalmente agora, nã o é, mã e, que ela arrebatou o coraçã o do seu
filho lindo? — Blake abraçou e beijou sua mã e.
— Está vendo, Bea, como é convencido esse meu filho? — Ava piscou
para mim. — Eu acho a Liv muito mais linda que você.
— O que é isso, dona Ava, está começando a mentir agora? — Fez
có cegas na mã e.
— Pare de me perturbar e venha me ajudar a escolher o cardá pio do
nosso jantar, porque lá no hospital você é o respeitado cirurgiã o, mas
aqui você é o meu chef e hoje quero algo bem especial, uma comidinha
bem elaborada.
— Pronto, já começou a exploraçã o dos meus dotes culiná rios. Vou fazer
de conta que nã o estou percebendo, está bem? Eu me rendooooo! —
Blake abraçou a mã e novamente.
Seguimos os três na direçã o da cozinha, lugar onde meu amor fez sua
alquimia e nos deixou encantadas. Assim foi o clima de todo o final de
semana. Banho de mar, comida gostosa, aconchego familiar e quando
nos trancávamos no quarto, aí sim era pura paixã o por horas, até
cairmos no sono completamente acabados.
Depois de um final de semana maravilhoso, onde além de descansar,
cozinhar e curtir muito a minha garota, a segunda-feira estava no
mínimo enlouquecedora. Além de duas cirurgias complicadíssimas,
onde quase perdi um dos pacientes, acabei uma reuniã o com meus
residentes e, quando já estava me preparando para ir embora, fui
chamado para uma cirurgia de emergência. Um paciente cardiopata
acabou de dar entrada no hospital com parada cardíaca apó s um
acidente de carro.
— Parece que nã o sairemos daqui hoje, meu amigo — dirigi-me ao
Kaleb, que estava junto comigo se preparando também para entrar em
cirurgia.
— Pelo que estou vendo, a noite é uma criança. Nã o pense que estou
esquecido, vou querer um relató rio completo sobre o mais novo casal
apaixonado. — Esse meu amigo adorava uma fofoca, até tentei deixá -lo
de fora do meu relacionamento com a Bea, mas o infeliz era de uma
curiosidade absurda.
— Vamos marcar essa semana para tomarmos um chope, aí te atualizo,
mas agora se concentre, Maria Curiosa, nã o quero falar desse assunto
por aqui.
Depois que entramos no centro cirú rgico, nã o trocamos mais nenhuma
palavra que nã o fosse sobre o paciente, o caso era bem complicado,
principalmente por ser um idoso. Felizmente tivemos êxito, dessa vez foi
por pouco.
Hoje foi um dia que conseguimos salvar todos que passaram pela minha
mesa de cirurgia, mas nem todos os dias eram assim. Eu me lembro até
hoje quando perdi meu primeiro paciente, fizemos de tudo, mas, à s
vezes, precisamos entender que somos humanos e com limites. A pior
parte era dar a notícia para a família e nisso eu era muito bom. Tentava
na medida do possível, fazer com que a dor deles fosse acolhida da
melhor forma possível, à s vezes ficava horas conversando com os
familiares tentando dar algum conforto.
Quando finalmente encerrei o meu dia, já chegando perto do meu carro,
peguei o meu celular esquecido desde cedo. Precisava ligar para a
Beatrice, queria muito ouvir a sua voz, mas antes de completar a ligaçã o,
para a minha surpresa, percebi alguém se aproximando rapidamente e a
voz que ouvi foi a da minha ex-mulher.
— Blake, preciso muito falar com você. — Já estava tarde, nã o queria
passar nem mais um minuto longe da Beatrice, mas o rosto de Lucy
parecia que tinha cruzado com uma assombraçã o.
— Oi, Lucy. É muito urgente? Estou morto de cansado, quero tomar um
banho, comer algo, hoje o dia foi especialmente complicado.
— É urgente, aliá s, muito urgente, nã o posso mais adiar essa conversa.
— O que está acontecendo? — Meu Deus, esse dia não vai acabar.
Respirei fundo e tentei controlar meu cansaço.
— O assunto que tenho para conversar com você é muito delicado. Nã o
podemos ir ao café aqui do hospital mesmo? Acho bom você estar
sentado e nã o aqui em pé em um estacionamento.
— Você está me assustando. Está tudo bem? Fiquei preocupado aquele
dia, você estava muito nervosa, mas achou melhor ficar com o seu pai,
entã o...
— Vamos, Blake, preciso de um café, como nunca precisei — cortou-me
secamente e já foi em direçã o ao restaurante do hospital.
Depois que nos acomodamos, ela ainda fez suspense até seu café chegar.
Eu nã o quis nada, apenas acabar com essa expectativa.
— De antemã o, queria deixar claro que nada foi planejado,
simplesmente aconteceu e, como você é a outra parte envolvida, quis
logo finalizar essa agonia que eu estou passando desde que eu soube
dessa notícia.
Com certeza fiz uma cara de surpresa.
— Do que você está falando, Lucy? — Já estava ficando agoniado com
essa enrolaçã o.
— Estou grávida. — Assim sem rodeios, ela despejou a informaçã o.
Fiquei alguns segundos olhando para ela, tentando processar se eu
realmente tinha escutado direito. Abri a boca algumas vezes e nada saiu.
— Blake, você está bem? Esse nã o era o seu grande sonho, ser pai?
Espero que essa cara de espanto seja de felicidade.
— Você tem certeza, Lucy? Como isso aconteceu? Você nunca quis filhos.
Nã o estou entendendo. — Acho que vou precisar de um cardiologista,
estou até com dificuldade de respirar.
— Acho que você sabe como os bebês sã o feitos, nã o é, dr. Lancaster?
Como ela pode ser sarcástica em um momento como esse?
— Lucy estamos separados, essa é uma situaçã o completamente
inesperada. — Minha paciência tinha ido para o lixo a essa altura.
— Em minha defesa, preciso te lembrar que nó s nã o estávamos com
uma vida sexual ativa e sempre esquecia de tomar o anticoncepcional
algumas vezes, dada a nossa situaçã o nunca me preocupei com isso,
entretanto, quando fomos para os Hamptons naquele final de semana,
eu nã o me lembrei desse detalhe e transamos sem proteçã o.
— Sim, nã o costumávamos usar preservativo, você sempre foi muito
incisiva com relaçã o a nã o querer engravidar, entã o sempre soube que
era muito atenta, jamais esqueceu da pílula.
— Pois é, mas minha cabeça já nã o estava muito boa, realmente nã o me
lembrei de que corria o risco de engravidar. Aquele dia que você me
encontrou em pleno surto foi justamente quando tinha acabado de
receber o resultado do exame.
Levei minhas mã os à cabeça que já pulsava, anunciando um tsunami na
minha vida.
— Achei que você ficaria feliz com a notícia, mas me enganei. Precisa ver
a sua cara, está completamente transtornado.
— Como você queria que eu estivesse, Lucy? Passamos anos casados e
você se negava veementemente de tocar no assunto de filhos e agora,
quando nosso divó rcio está praticamente finalizado, você me diz que
está grávida? Nã o foi assim que planejei ser pai.
— E o que você sugere, que eu faça um aborto?
— Está louca? Jamais te pediria isso! — Praticamente gritei, ainda bem
que o local estava vazio e ninguém testemunhou o meu total
desequilíbrio. Nã o estava acreditando no que acabei de ouvir.
— Entã o finja que está feliz pelo menos. Eu também estou assustada e
ainda tentando assimilar as mudanças que vã o acontecer na minha vida,
no meu corpo.
— Você tem certeza disso? Digo, porque, se você fez somente um teste
de farmá cia, pode nã o ser fidedigno.
— Eu jamais falaria com você se nã o tivesse certeza.
Entã o minha ex-mulher tirou da bolsa um papel que vi logo do que se
tratava, o resultado do exame de sangue confirmando sua gravidez.
Ainda em estado de choque, peguei o papel e lá estava a confirmaçã o: eu
serei pai.
— Nã o se preocupe, que nã o vou desistir do nosso divó rcio, uma coisa
nada tem a ver com outra. Só espero que você seja um pai participativo,
afinal esse era o seu grande projeto depois da Cardiologia.
Enquanto ela falava, eu comecei a ficar tonto, nã o sei nem explicar o que
estava sentindo.
— Bom, preciso ir agora. Já estou começando a sentir todas aquelas
coisas que as grávidas costumam relatar: cansaço, sono, enjoo. Enfim,
preciso descansar. Depois nos falamos.
Assim ela finalizou a conversa, levantou-se e começou a andar, mas,
antes que se distanciasse muito, a chamei:
— Lucy, me ligue se precisar de alguma coisa. — Ela piscou o olho,
acenou e me deixou ali inerte.
Pelos trinta minutos seguintes, nã o consegui me movimentar, um
turbilhã o de sentimentos me invadiu. Nã o era possível que isso estava
acontecendo. Um filho sempre foi outro grande sonho, porém queria
estar com uma vida estruturada, nã o separado da mã e, esse nã o era o
plano.
Só saí desse estado catatô nico quando ouvi o meu celular vibrar.
Beatrice estava me ligando. Respirei fundo e atendi tentando manter
uma calma que nã o existia naquele momento.
— Bea, já ia te ligar. — Tentei nã o tremer a voz.
— Oi, já me esqueceu? Estou com saudades. Você vem dormir aqui? — Sua
voz me acalmou por alguns instantes.
— Oi, amor. Ainda estou no hospital. — Isso nã o era mentira. — Mas
sem hora para sair. — Isso era uma mentira.
— Sério? Achei que você já estava saindo. Muito trabalho por aí? Se quiser
vir mais tarde não tem problema.
— Hoje esse hospital ferveu, estou morto de cansado. Podemos deixar
para amanhã ? Prometo te recompensar. — Tentei disfarçar com uma voz
mais sexy, eu precisava de um tempo sozinho antes de contar para ela a
notícia de que serei pai.
— Eu entendo, meu amor. Mas se mudar de ideia venha dormir aqui, ok?
Era tudo o que mais queria nesse momento, deitar-me em seu colo e
ficar ali grudadinho com ela. Mas ainda nã o estava preparado para ter
essa conversa.
Despedimo-nos e só entã o consegui andar até o meu carro. Dirigi feito
um zumbi até o meu apartamento. Que loucura tudo isso, parece que
entrei no meio de um ciclone. A fome que estava sentindo desapareceu
completamente, ainda assim me forcei a comer algo, preparei uma
salada leve, em seguida tomei um banho demorado, mas minha cabeça
estava completamente fora de ó rbita. Nã o conseguirei dormir sem
dividir essa notícia com alguém e a melhor pessoa para conversar nesse
momento era a minha irmã , entã o fiz a ligaçã o sem mais demora.
— Blake, é muito tarde, já estava dormindo. O papai e a mamãe estão
bem?
— Desculpe, pequena, nã o queria te assustar. Nossos pais estã o bem, o
problema é comigo.
— Ai, meu Deus, Blake! Não me mate do coração, desembucha. Brigou com
a Bea?
— Nã o é nada comigo e a Bea, pelo menos por enquanto. A Lucy me
procurou agora no final do dia para me dizer que está grávida — disse
logo de uma vez.
Em seguida, houve silêncio.
— Olívia, você ainda está aí?
— Blake, agora não é hora para pregar peças, irmão, que palhaçada é
essa? — Sua voz alterou e ao fundo ouvi meu cunhado resmungar, ó bvio
que ela o acordou.
— Nã o é brincadeira, Liv, ela me mostrou o resultado do exame. —
Servi-me de uma dose de whisky, precisava de algo forte nesse
momento.
— Meu Deus, isso é uma loucura, logo agora que você e a Beatrice se
acertaram. A Lucy nunca quis engravidar, que novidade é essa? O filho é
seu?
— Claro que o filho é meu, Liv, ela nã o me procuraria se nã o fosse. Eu
também me espantei com a notícia, justamente por saber que minha ex
nunca quis ter filhos, sempre era exagerada nos cuidados.
— Então como isso aconteceu? — Minha irmã estava quase chorando e
soube que era por saber que isso poderia afetar minha vida com a sua
amiga.
— A justificativa que ela deu foi que andou esquecendo de tomar a pílula
algumas vezes e naquele dia que fomos para a praia, na tentativa
frustrada obviamente de salvar o casamento, nó s transamos sem
proteçã o, como sempre fazíamos e ela nã o se lembrou do risco que
corria de engravidar.
— E como um golpe do destino ela engravidou? — Era uma pergunta
retó rica, Olívia parecia nã o acreditar na situaçã o.
— Quando Lucy me abordou, estava indo para a casa da Bea, planejava
dormir lá , desmarquei, nã o sei como vou abordar o assunto.
— Meu irmão, eu sei que você sempre sonhou em ser pai, mas veio sem
planejamento, em uma situação inusitada. Minha amiga vai ficar
arrasada, não por você ser pai, mas pelo fato de que, a partir de agora,
você estará ligado a Lucy pelo resto da sua vida. — Essa reflexã o da Olívia
foi a mesma que a minha, isso estava me enlouquecendo. — Tente
dormir um pouco, eu sei que talvez isso seja quase impossível, mas precisa
estar bem amanhã para falar com a Bea, priorize isso. Se ela ficar sabendo
por outra pessoa, aí é que não terá salvação. — Minha irmã tinha razã o,
nã o podia adiar essa conversa por muito tempo.
Assim que nos despedimos, como já era esperado, a noite foi um caos.
Quando por fim desisti e resolvi levantar-me ainda estava escuro. Fui até
a academia do prédio, corri sete quilô metros na esteira e, quando
cheguei ao hospital, já estava decidido que a conversa com a Beatrice
nã o podia ser mais adiada, entã o fiz a ligaçã o mais adiada dos ú ltimos
tempos.
— Bom dia, meu lírio, dormiu bem? — Ela amava quando a chamava
pelo apelido antigo.
— Oi, Blake, já ia te ligar. Dormi bem apesar de sentir a falta dos seus
braços em volta do meu corpo. — Se a situaçã o fosse outra, só com essa
frase já estaria louco para me enterrar nela. Mas estava tã o nervoso que
sexo era a ú ltima coisa que pensava no momento.
— Vou resolver isso hoje, meu dia hoje está mais tranquilo e posso ir
para a sua casa cedo, o que você acha?
— Excelente ideia. Estarei te esperando. Estou morrendo de saudades.
Conversamos por mais alguns minutos, o que só me fez bem, a voz dela
foi um bá lsamo para o meu coraçã o, só assim para conseguir trabalhar o
dia inteiro.
Precisava reunir coragem para essa conversa, que nã o seria nada fá cil.
Só depois disso é que eu poderia finalmente me sentir feliz, afinal ia ser
pai.
Se eu dissesse que nã o fiquei um pouco decepcionada ontem à noite
pelo fato de Blake nã o ter ido dormir comigo, estaria mentindo, mas
essa insegurança precisava ser controlada, afinal já estávamos em outro
patamar, a cada dia percebia que estávamos mais ligados e o melhor era
que tudo estava fluindo de maneira natural, sem cobranças.
— Acho bom você abrir seu coraçã ozinho com sua amiga mais sexy, pois
essa sua carranca preocupada nã o combina com alguém que está
passando muito bem nos braços de um famoso cardiologista. — Claro
que Helena sempre fazia sua entrada radiante em minha sala logo cedo.
— Nã o tem nada me preocupando, só estava repassando a minha
agenda. — Nã o queria compartilhar esse assunto com Helena, ela com
certeza começaria a fazer milhares de conjecturas.
— Entã o já sabe que nã o teremos um dia tranquilo, nã o é? Mas, antes de
começarmos, há dias estou curiosa para saber o que Blake achou sobre a
ex dele almoçando com o seu ex, e nã o tivemos um mísero tempinho
para conversarmos sobre isso.
— Achei até estranho você nã o perguntar nada sobre esse assunto,
acreditei que você estava começando a relaxar esse seu lado 007. —
Sempre quando podia pirraçava minha amiga, afinal esse era um traço
muito forte dela, a curiosidade investigativa.
— Estou tentando controlar esse lado pulsante da minha personalidade,
mas isso é muito natural em mim, entã o estou pronta para ouvi-la. —
Gargalhei. Era muito cara de pau.
— Nesse ponto, o Blake se parece com você, ele também achou tudo
muito suspeito, afinal a Lucy e o Miguel mal se conhecem e mesmo que
tenham se encontrado casualmente, segundo ele, a ex nã o é muito
sociável a ponto de aceitar um convite apenas por educaçã o.
— Deixe comigo, eu vou investigar isso sem levantar suspeitas — falou a
agente do FBI!
— Acho melhor esquecermos isso, Nena, é uma cisma besta. — Tentei
minimizar a situaçã o, mas o fato é que eu também achei tudo muito
intrigante.
— Mudando de assunto, o seu segurança é um belo exemplo de macho
alfa, o homem é sisudo, com cara de mau. Será que tem uma boa pegada?
— A louca começou a se abanar.
— Helena, por favor, deixe o homem em paz, nã o vá assediar meu
segurança — alertei, porque a sem-noçã o era bem capaz de dar em cima
do russo sem pudor algum.
— Mas você tem que concordar comigo, ele tem cara de quem deixa uma
mulher sem andar no outro dia.
— Helenaaaaa!
— Nã o vem agora dar uma de puritana, você bem sabe do que estou
falando, nã o foi a senhorita que chegou outro dia toda dolorida, depois
de passar quase a noite toda acordada no desfrute com seu médico
insaciável? — A insuportável me pegou outro dia morta de cansada e
claro que ela nã o deixaria barato, tinha que me jogar na cara o dia que
eu e o Blake exageramos e a noite tinha sido realmente muito intensa.
— Nã o é isso, Petrov parece ser muito sério, nã o quero assustá -lo com
suas investidas.
— Vou pensar no seu caso, mas se perceber qualquer olhadinha para o
meu lado, eu acabo com aquela montanha de mú sculos em dois tempos.
— Ok, sra. Arrasa Corações, mas agora chega de conversinha, vamos
trabalhar.
Realmente o dia foi atribuladíssimo, mas cumpri toda a minha agenda e
agora estava em casa esperando o meu amor chegar. Como nã o estava
inspirada hoje, entã o encomendei o jantar: uma comidinha japonesa que
nó s amávamos.
Dei uma ú ltima olhada na mesa posta com minha louça italiana, que a
nonna me deu de presente, e para completar coloquei um arranjo de
lírios rosa, mais minha cara impossível.
Gostava dessa ansiedade de organizar a casa para receber o Blake, mas
nã o acreditava mais que viveria essa situaçã o. Quando ele se casou achei
que morreria; e se nã o fosse a minha mã e e as minhas amigas, eu teria
sucumbido em tristeza. Na época, foquei no meu trabalho, pelo menos
aquele período sombrio serviu para que eu finalmente pudesse me
dedicar e transformar em realidade meu sonho de ter uma empresa
só lida.
À s vezes, pensava estar sonhando. Quando vi o amor da minha vida
chegar em minha casa lindo, cheiroso, com um olhar apaixonado, nem
conversamos muito, nos agarramos assim que nossos olhos se cruzaram.
Como pude viver sem esse homem tantos anos?
Estávamos com muitas saudades um do outro, isso ficou claro. Só depois
de um sexo lento e gostoso é que aproveitamos o jantar.
Percebi uma certa afliçã o, ele nã o estava bem.
— Blake, estou achando você um pouquinho agoniado, aconteceu
alguma coisa?
Ele segurou minha mã o e me olhou com tanta tristeza, que senti meu
sangue gelar.
— Aconteceu. Vamos nos sentar ali no sofá , precisamos ter uma
conversa sobre um assunto bem delicado.
Pronto, agora o meu sangue congelou de vez.
— Você está me assustando. Me diga de uma vez o que está te
incomodando.
— Ontem quando nos falamos e eu disse que estava no hospital, na
verdade eu nã o fui totalmente sincero com você, por pura falta de
coragem naquele momento.
Minhas mã os começaram a suar na expectativa do que poderia estar
acontecendo.
— Continue, Blake, nã o me deixe nessa afliçã o.
Blake levantou-se, andou pela sala, passou a mã o vá rias vezes no cabelo,
nervoso demais.
— Quando já estava saindo do hospital, com o celular na mã o para te
ligar, ouvi a Lucy me chamar, queria conversar comigo.
Pronto, acabei de morrer.
— O que ela queria, tem a ver com o surto do outro dia? — Por que ele
não fala logo de uma vez? Tem merda aí.
— De certa maneira sim. — Blake sentou-se de frente para mim, segurou
minha mã o, beijou carinhosamente e vi que seus olhos antecipavam uma
tempestade. — Bea, nã o tem uma maneira sutil de te dizer isso. — Mais
uma respiraçã o profunda. — A Lucy está grávida. — Ele encostou a testa
em minhas mã os e um silêncio dolorido tomou conta da sala. Só depois
de alguns segundos percebi que estava sem respirar. Apavorada de
verdade. — Por favor, Bea, fale alguma coisa. — Blake levantou o rosto e
pude perceber lá grimas se formando.
— Estou impactada! Como você está se sentindo? Esse sempre foi um
grande desejo seu. — Tentei parecer tranquila, mas, no fundo, meu
mundo estava desabando.
— Sim, ser pai sempre esteve nos meus planos, mas a situaçã o agora é
completamente diferente. Nó s nã o estamos mais casados, ainda nã o
consegui assimilar bem essa informaçã o. Mas e você? O que está
passando por sua cabecinha nesse exato momento?
— Estou em estado de choque, sem chã o mais precisamente. Nesse
momento estou mais preocupada com você, o que vai fazer a partir de
agora? — Fui honesta, estava curiosa com o que se passava em sua
cabeça.
— Bea, nada vai mudar, a situaçã o entre mim e Lucy já está definida, nó s
estamos nos divorciando e isso nã o mudará . Vou assumir minha
responsabilidade, criar e amar o meu filho. Isso também ficou claro na
nossa conversa e, em momento algum, ela cogitou a possibilidade de
reatar o nosso casamento.
— Tenho certeza de que você será um pai maravilhoso. Nesse momento
temos que ter a cabeça fria, racionalizar e tentar nã o deixar isso nos
atrapalhar. Estou aqui para te apoiar, mas tenho certeza de que nã o será
nada fá cil.
Blake me puxou para o seu colo e choramos juntos. O sentimento nã o
era de tristeza, muito pelo contrá rio, um filho era sempre uma bê nçã o,
mas, sendo bem egoísta, eu que queria ser a mã e do filho dele. Mas a
vida nem sempre era um romance clichê e nossa histó ria daria um
daqueles livros cheios de plot twists29, que deixavam os leitores
estarrecidos.
— Bea, olhe para mim. Eu sei que o contexto parece nã o ser favorável
agora, mas uma coisa eu tenho certeza, nã o vou abrir mã o de você, nã o é
justo com a gente. — Percebi o quanto ele estava devastado. — Estou me
sentindo culpado, ainda nã o consegui ficar feliz com a notícia, me sinto
completamente perdido.
— Calma, meu amor, nó s vamos achar uma soluçã o juntos. A Lucy te
cobrou algo? Como ela está se sentindo? Já que ser mã e nunca esteve
nos planos dela. — Muitas questõ es estavam rondando a minha mente.
— O surto daquele dia foi justamente quando ela descobriu a gravidez.
Ela era muito cuidadosa, nunca me preocupei com essa parte, sempre
usou anticoncepcional, mas me disse que, como nossa vida sexual estava
cada dia mais fria, eventualmente ela acabava esquecendo de tomar a
pílula. Na minha ú ltima tentativa de salvar o casamento, transamos sem
proteçã o e aí ela acabou engravidando. Para ela também foi uma
surpresa.
— A vida da mulher muda muito com um filho. — Tentava me colocar no
lugar dela, mas estava sendo muito difícil ter empatia nesse momento.
— Bea, vamos dormir, preciso descansar, a noite passada praticamente
nã o preguei o olho. Nó s vamos superar essa situaçã o, nada vai mudar
entre a gente. Quero que você acredite nisso, ok?
Assenti com a cabeça, mas no fundo nã o estava tã o segura de que tudo
ficaria bem. Queria muito estar errada.
Tomamos um banho juntos, ficamos abraçados debaixo da á gua morna,
em uma tentativa inconsciente de nos livrar de toda essa loucura que
nossa vida se transformou em apenas um instante.

Pouco tempo depois que nos deitamos, Blake caiu em um sono


profundo, ele realmente estava muito cansado, ao contrá rio dele, nã o
preguei o olho a noite toda. Quando o despertador do celular tocou, eu
quis morrer. Blake me abraçou e perguntou como eu estava, nã o menti,
falei a verdade.
— Me perdoe, Bea, você nã o merecia passar por isso. Descanse um
pouco, vou tomar um banho e preparar o nosso café.
Nã o tive forças para dizer nada, ele beijou a minha testa e eu fechei os
olhos, queria esquecer tudo.
Peguei no sono imediatamente e quando acordei, quase duas horas mais
tarde, tinha um bilhete no travesseiro e ao lado um lírio rosa.

Meu amor,
Você estava tão linda dormindo, que não tive coragem de te acordar.
Deixei seu café pronto e suas frutas cortadas estão na geladeira.
Mandei uma mensagem para Petrov avisando-o de que você sairá mais
tarde hoje. Seu celular está no silencioso, não queria que nada te
perturbasse.
Com amor,
B.

— Como amo esse homem! — suspirei e me levantei imediatamente,


precisava reagir.
Enviei uma mensagem para Petrov avisando que estaria pronta em meia
hora. Em seguida liguei para a minha mã e, combinamos um almoço em
sua casa, claro que ela logo desconfiou que tinha algo errado, mas
contornei, esse era o tipo de assunto que tinha que ser pessoalmente;
precisava do colo dela. Ainda bem que pela manhã Helena nã o estaria no
escritó rio, minha cara estava horrível e isso nã o passaria ileso por
aquela á guia.
Quando minha mã e abriu a porta e viu meu estado, abriu os braços e
finalmente desabei. Sentamo-nos no sofá e, como se ainda fosse sua
garotinha, ela me colocou em seu colo me acolhendo como só ela
conseguia fazer. Depois que as lá grimas secaram, dei a notícia de uma só
vez.
— A Lucy está grávida.
Minha mã e abriu os olhos e a impressã o que tive é de que eles saltariam
no meu colo.
— Bea, minha querida, o que você está me dizendo?! — Colocou a mã o
na boca, totalmente chocada.
— Blake me contou ontem à noite, mamma, estou desolada. Ele disse
que nada mudará entre nó s, mas ele sempre sonhou em ser pai e agora
estará ligado a Lucy por toda sua vida. Estou me sentindo muito mal
com tudo isso. — Com minha mã e, eu podia abrir o meu coraçã o
totalmente, sem medo de julgamento.
— Mas entã o, quando eles se separaram, ela provavelmente já estava
grávida. — Houve mais choro.
Uma xícara de chá de camomila depois, deixei minha mã e a par de todos
os detalhes, de como tudo aconteceu. Com a experiência de vida de dona
Katie, seu conselho foi que eu acalmasse o meu coraçã o e que jamais
saísse do lado de Blake, esse era apenas mais um desafio que
precisávamos superar.
Apó s o almoço estava me sentindo bem melhor, entã o voltei para o
escritó rio. A vida tinha que seguir, afinal isso era apenas mais um
obstá culo que eu precisava transpor, esse meu amor por Blake nunca foi
céu de brigadeiro, eu já estava acostumada, mesmo achando que agora
tudo entraria nos eixos. Ledo engano.
Os dias apó s a revelaçã o de Lucy foram melhores do que imaginei, eu e o
Blake retomamos a nossa rotina, na maioria das vezes ele preferia que
eu dormisse em sua casa e logo cedo o Petrov passava lá e me deixava no
trabalho. Por outro lado, apesar de Blake estar se esforçando para que a
gravidez da Lucy nã o nos afetasse, percebi que ele ficava pouco à
vontade quando eu tocava no assunto. A verdade era que esse fato nunca
seria algo simples em nossa vida, tínhamos que encontrar uma maneira
de levarmos a nova realidade de maneira mais leve possível.
Reconhecia que nã o me sentia totalmente confortável, nos meus sonhos
éramos somente nó s dois, mas a vida me provava que nem tudo
acontecia como planejávamos, o mais importante era que estávamos
cada dia mais unidos.
Desde cedo desenhava a coleçã o da joalheria suíça, o trabalho estava
bem adiantado. Semanalmente nos reuníamos com o sr. Bolliger para
esclarecer alguns pontos e hoje faríamos mudanças bem interessantes, o
que me demandou muito tempo concentrada durante todo o dia.
A primeira coisa que fazia quando iniciava um novo projeto era colocar
minhas ideias no papel, eram desenhos mais rá pidos, sem muita
precisã o. Na minha formaçã o, eu aprendi três requisitos importantes
que um bom designer de joias nã o poderia esquecer, antes mesmo do
primeiro risco no papel: a funçã o da joia era o primeiro deles, e ser um
adorno, era sua funçã o principal. Em seguida preocupar com a estrutura.
Como ela ia se sustentar? Seria flexível ou rígida? Para finalizar, a
estética completava tudo, como a peça seria percebida e se era de bom
gosto. Evocaria uma resposta emocional positiva de quem a observava?
Entã o quando me trancava no estú dio, simplesmente me esquecia de
tudo.
— Bea, desculpe te incomodar, sei que, quando você está concentrada,
nã o gosta de ser interrompida, mas tem uma pessoa que insiste muito
em falar com você e disse que nã o irá embora sem que você o atenda. —
Levantei a minha cabeça, desviando a atençã o dos meus desenhos, para
encarar minha secretá ria, que estava apavorada.
— Tudo bem, Naomi, quem é que está nessa agonia para falar comigo?
— Tentei tranquilizar a pobre coitada.
— O sr. Miguel Ortiz.
Respirei fundo e tentei racionalizar uma maneira de me esquivar desse
confronto, mas achei melhor acabar logo com isso, porque fazia alguns
dias que ele vinha me ligando diariamente e nã o atendi nenhuma vez.
— Faça-o entrar, mas envie uma mensagem para Petrov e avise-o para
ficar em alerta.
— Certo, daqui uns cinco minutos, vou interromper para oferecer uma
á gua ou café. — Essa garota vai longe.
— Boa ideia, Naomi.
Fechei meu desenho, se havia uma coisa que detestava era alguém de
olho nas minhas criaçõ es antes que elas estivessem terminadas, gostava
de preservar os meus projetos.
— Mi vida, finalmente consigo falar com você. — Veio em minha direçã o
todo sorridente e eu congelei imediatamente quando beijou o meu rosto.
— Olá , Miguel, tenho estado bastante ocupada. Sente-se, por favor. —
Mostrei uma poltrona e preferi ficar sentada atrá s da minha mesa, como
se esta fosse um escudo de proteçã o.
— Pensei que estava fugindo de mim. Nã o vou fazer rodeios, Beatrice,
estou com saudades e estou aqui para pedir uma chance para nó s dois.
Acho que minha expressã o foi tã o involuntariamente forte, que ele riu e
se aproximou um pouco da mesa.
— Te assustei? Você sabe que sou um homem direto e quero muito uma
nova oportunidade para te provar que sou o homem certo para você. —
Realmente ele era bem direto, sem papas na língua eu diria.
— Miguel, na verdade achei que tivesse sido clara quando nó s
terminamos e...
— Quando você terminou comigo — interrompeu-me com rispidez.
— Sim, quando eu terminei — confirmei á spera. — Minha decisã o foi
tomada com bastante consciência e nã o vejo a menor possibilidade de
reatarmos.
— Soube que o doutor se separou da mulher, foi por sua causa? —
inquiriu sem o menor constrangimento. — Lembrei do seu almoço com
a Lucy, ela deve ter dito sobre a separaçã o.
— Sinceramente, Miguel, achei que você tinha entendido que o motivo
pelo qual eu decidi terminar o nosso namoro nã o tinha a ver com
ninguém e sim com os meus sentimentos, que, infelizmente, nã o foram
suficientes para que eu conseguisse levar o nosso relacionamento a
outro patamar.
— Com licença, vocês aceitam um café ou uma á gua? — Naomi foi
precisa na sua entrada.
— Quero um chá e uma á gua — respondi.
Miguel agradeceu e nã o quis nada. Apó s Naomi saiu da sala.
— Desculpe, Bea, nã o quero ser invasivo, mas depois que você se
reencontrou com o médico, você mudou completamente. Tudo me leva a
crer que estou certo, ele foi o motivo para você me deixar. — Baixou um
pouco a guarda, mas seus olhos o denunciavam, estava por um fio e a
qualquer momento ele perderia o controle.
Fomos interrompidos por Naomi, que voltou com o meu pedido.
— Prontinho, Bea, sua á gua e seu chá .
— Obrigada, Naomi.
— Bea, o Petrov já está te esperando — ela me avisou.
— Certo, avise que nã o vou demorar.
Assim que minha secretá ria deixou a sala, Miguel se levantou, colocou as
duas mã os em cima da mesa e, com um ó dio estampado no rosto,
começou a falar entredentes:
— Entã o é assim, você me dispensou de vez Beatrice? — disse meu
nome pausadamente, me fazendo estremecer.
— Miguel, somos adultos e livres para fazer as nossas escolhas.
Infelizmente, eu errei. Achei que poderia me apaixonar por você. O
tempo que passamos juntos foi muito bom, nos divertimos, mas o que
sentia nã o era amor. Juro que tentei dar uma chance para nó s dois, mas
nã o consegui. Por favor, entenda de uma vez por todas.
— Pois bem, essa é a ú ltima vez que insisto com você. Passar bem,
Beatrice.
Como um touro enfurecido, deu uma batida rá pida leve na mesa e saiu
apressado.
— Srta. Tomarolli, está tudo bem? — Meu segurança entrou e parecia
um pouco nervoso.
— Fique tranquilo, Petrov, o espanhol estava só um pouco nervoso, mas
consegui contornar a situaçã o. Só espero que ele me esqueça de vez. Eu
vou ficar mais um tempo por aqui, uma hora no má ximo e entã o vamos
para a minha casa. Hoje ficarei por lá e Blake deve chegar mais tarde.
— Entã o estarei a sua espera. Se precisar de algo é só me avisar. —
Impressionante como o russo era sisudo, as pessoas deveriam morrer de
medo dele.
— Obrigada, Petrov.
Bebi o chá que a Naomi preparou que, a essa altura, já estava gelado,
tentei respirar para me acalmar, mas o rosto travado de Miguel nã o saía
do meu pensamento. Somente depois de alguns minutos quieta consegui
limpar a minha mente dos ú ltimos acontecimentos.
Enviei uma mensagem para Blake, avisando-o de que estava indo para
casa, mas ele nã o visualizou, provavelmente ainda estava em cirurgia.
Com minha nova rotina, com Petrov colado comigo ao longo do dia,
algumas coisas tiveram que ser adaptadas. Uma das coisas que sempre
gostei de fazer, que além de aliviar as tensõ es do dia também ajudava a
incentivar minha criatividade, era correr no Central Park, contudo tive
que passar a correr na esteira da academia do prédio e ainda sob os
olhos de Nicolai Petrov.
Meu irmã o Matteo estava enlouquecido com essa histó ria de alguém
estar me espionando, tinha certeza de que com seu conhecimento na
polícia de Nova Iorque e FBI, já moveu céus e terra para saber se minhas
suspeitas tinham fundamento. Enquanto isso estou supercomportada
obedecendo todas as orientaçõ es do meu segurança.
Quando saí da academia, Blake avisou que já estava saindo do hospital,
entã o tomei um banho rá pido, coloquei uma roupa confortável, short
branco e uma blusinha de seda soltinha, queria colocar algo mais sexy,
mas, como Petrov estava ainda no seu plantã o e poderia precisar falar
comigo, optei pela simplicidade segura.
Já havia se passado mais de uma hora desde que meu namorado avisou
que estava vindo e até agora nã o chegou. Será que foi chamado para
alguma emergência? Tinha que me acostumar com isso, afinal a vida de
médico era sempre cheia de imprevistos. Mal terminei meu pensamento,
meu homem lindo demais entrou pela minha sala causando o mesmo
frisson costumeiro. Sempre foi assim desde a primeira vez que o vi.
— Demorou, meu amor, achei que tinha acontecido alguma emergência.
— Abracei-o e seu toque estava um pouco tenso, mas me esqueci de
tudo quando ele tomou a minha boca e nos beijamos como se
estivéssemos há dias sem nos ver.
— Hummm, como você está cheirosa! — Desceu suas mã os ao longo das
minhas costas apertando minha bunda, pressionando a minha barriga
contra seu membro, que já estava lindamente duro. — E gostosa — riu
safado grudado em minha boca. — Já percebeu o tamanho da minha
fome por você, srta. Tomarolli, mas estou louco por um banho, o dia foi
insano e, para fechar com chave de ouro, a Lucy me abordou quando já
estava de saída, estressadíssima.
— Sério, o que foi dessa vez? — A vontade que tinha era de revirar os
olhos, mas me contive.
— Nada de importante, ela fez alguns exames e a obstetra recomendou
que diminuísse um pouco o ritmo de trabalho, pelo menos até completar
os três primeiros meses de gravidez. — Blake se desvencilhou de mim,
mas pegou minha mã o já indo para o quarto, ele realmente queria um
banho com urgência.
Durante o banho fiquei aguardando do lado de fora do boxe, obviamente
queria saber toda a histó ria que ele começou a contar.
— Lucy é médica, sabe muito bem o quanto os primeiros meses sã o
importantes para a formaçã o da criança, nã o sei por qual motivo ficou
tã o estressada. — O homem era ainda mais tentador tomando banho. —
Pare de me olhar assim ou terei que te puxar para se juntar comigo e te
dar o que você está aí querendo, quase salivando. — Colocou a cabeça
para fora do boxe e estendeu a mã o com a cara mais safada do mundo.
Era realmente uma tentaçã o, mas recusei, pelo menos por enquanto.
— Será que ela nã o está meio que fazendo um pouco de manha para
chamar a sua atençã o? — perguntei exatamente o que estava passando
pela minha cabeça.
— Acredito que nã o seja isso, Lucy anda estressada mesmo, talvez sejam
os hormô nios. Um dos meus residentes comentou que logo cedo ela
estava em uma discussã o acalorada com o dr. Lucas, que é seu amigo
desde Londres, inclusive foi ela quem articulou toda a mudança dele
para Nova Iorque e, ainda assim, parece que ela perdeu a paciência com
ele hoje.
— Isso é preocupante, ela tem que se cuidar, afinal tudo o que a mã e
sente passa para o bebê. Minha cunhada sempre fala isso.
— E é verdade, mas nã o quis conversar com ela sobre isso hoje, estava
tã o cansado, minha intençã o era chegar aqui no meu paraíso.
Assim que saiu do banho enrolado na toalha, já sabíamos que o jantar
esperaria um pouquinho. Nos agarramos imediatamente e fui levada até
a cama, onde gentilmente ele tirou a minha roupa me deixando somente
de calcinha.
Blake distribuiu beijos lentamente por todo o meu corpo, demorando
algum tempo nos meus seios que estavam inchados de tanto tesã o. Fui
degustada lentamente, arfei, arranhei suas costas, mas ele estava
determinado a me fazer gozar, o que nã o demorou muito.
— Fique de quatro, amor, preciso mergulhar em você urgente.
Ainda tonta de prazer, antes de fazer o que ele pediu, como ele estava em
pé ao lado da cama, ajoelhei em sua frente, agarrei seu membro e o
chupei em uma tortura deliciosa.
— Bea, eu nã o vou aguentar muito se você continuar com sua boca
gostosa no meu pau, sério. — Sua voz estava rouca, quase nã o reconheci.
Como uma boa garota que eu era, obedeci e me coloquei na posiçã o que
ele pediu. Blake colocou o preservativo e aproximou-se de mim, que já
estava suando com a expectativa de recebê-lo.
— Menina má . Quer me enlouquecer, Beatrice? — Levei uma palmada,
que amei, e em seguida meu médico me invadiu, segurou meu cabelo e, a
partir desse momento, só ouvíamos os sons dos nossos corpos se
encontrando. Só paramos quando gozamos juntos plenamente
satisfeitos.
Desabamos na cama. Depois da minha primeira vez com Blake, nenhum
outro homem que eu me relacionei conseguiu me dar tanto prazer
quanto ele. Nunca encontrei alguém que chegasse perto do que esse
homem me fazia sentir. Eu ficava solta, sem timidez, completamente
entregue.
— No que está pensando, princesa?
— No quanto você me faz feliz e me completa. Eu te amo, Blake. — Senti
uma lá grima escorrer dos meus olhos. Acho que ele nã o esperava ouvir
essas três palavrinhas, mas achei que era o momento certo de abrir o
meu coraçã o.
— Bea, meu amor, você também me faz um homem plenamente feliz.
Nunca pensei em te dizer isso, mas acho que, desde aquele dia que
dançamos a primeira vez, você capturou meu coraçã o, mas você era
muito novinha, achava que nã o era certo. Hoje nã o tenho dú vida, você é
o meu amor. Te amo, Beatrice Tomarolli.
Emocionamo-nos de verdade, depois de tantos anos, muitas coisas
aconteceram na nossa vida, nos distanciamos, mas chegou o momento
de assumirmos nosso amor. Ficamos grudadinhos um bom tempo.
— Depois desse sexo gostoso que fizemos, esse seu sanduíche turbinado
caiu superbem, dr. Lancaster. — Gargalhamos.
Estávamos sentados no balcã o da cozinha, ele só de short e eu com uma
das suas camisetas que ficavam imensas em mim. Quem visse de longe
saberia que ali estava um casal verdadeiramente feliz.
— Sou bom na cozinha, nã o é, amor? — Balançou a cabeça, confirmando
seu comentá rio.
— Blake, me esqueci completamente do Petrov. Preciso liberar o coitado.
Nã o gosto que ele fique até tarde à minha disposiçã o, afinal ele tem
família.
— Nã o se preocupe com isso, eu mesmo o dispensei quando cheguei e
disse que amanhã eu te levaria para o trabalho, entã o ele te encontrará
lá .
Depois do nosso sanduíche gourmet, sentamo-nos no sofá para assistir
um filme, entã o achei que era um bom momento para comentar sobre a
visita de Miguel.
— Hoje recebi uma visita inesperada, Miguel apareceu sem avisar na
empresa.
Blake praticamente cuspiu o vinho que tinha acabado de beber.
— E você só me diz isso agora, Beatrice? Nã o me esconda nada. Quero
saber todos os detalhes.
De maneira resumida, deixei Blake a par de tudo, mas foi uma missã o
difícil acalmá -lo porque o homem estava espumando de raiva. Tive que
prometer que deixaria ordens expressas para que ele jamais entrasse
novamente na Lily Jewelry.
— Nã o se preocupe, meu bravinho, do jeito que ele saiu de lá , nã o
voltará nunca mais — brinquei um pouco, mas o homem estava muito
alterado.
Acabei cochilando durante o filme e só senti braços fortes me
carregando até a cama. Apaguei completamente.
Ainda nã o digeri muito bem aquela informaçã o do espanhol com cara de
bandido ter ido procurar a minha mulher. Já conversei com Petrov para
nã o tirar os olhos de cima dela. Podia estar enganado, mas tinha quase
certeza de que era a mando dele que alguém a estava seguindo. Ainda
nã o descobri qual era o objetivo disso. Ele já sabia que estávamos juntos,
entã o a melhor coisa que ele deveria fazer era se afastar, por bem ou por
mal.
— Blake, venha rá pido, Lucy está tendo um ataque e está gritando o seu
nome. — Meu amigo Kaleb entrou na sala de descanso dos médicos
como um furacã o, suando em bicas.
— Calma, respira um pouco, assim nã o demora e você será o meu
paciente. — Tentei tranquilizá -lo. Nã o é possível que durante toda a
gravidez Lucy a cada dia ia aprontar algo.
— É sério, meu amigo, sua ex está quebrando tudo. O pai dela já foi
acionado, nesse momento tem duas enfermeiras e um segurança
tentando contê-la, mas sem sucesso.
Saímos correndo pelos corredores do hospital e, antes mesmo de entrar
na sala onde Lucy estava, já se ouvia os berros de longe.
— Lucy, o que aconteceu? Acalme-se, sente aqui comigo. — Ela estava
com os olhos vidrados, fixados em mim por alguns segundos, mas pegou
minha mã o. Sentamos lado a lado, ela colocou os pés em cima do sofá ,
encostando a cabeça nos joelhos e começou a chorar copiosamente.
Pedi com um gesto que as pessoas saíssem da sala, Kaleb fez um sinal de
que estaria do lado de fora, para o caso de eu precisar de alguma ajuda.
Peguei um copo com á gua e coloquei em sua mã o. Tentei iniciar uma
conversa.
— Me diga, Lucy, o que está te incomodando? Alguma dor, enjoo? Está se
alimentando direito?
— Blake! — Praticamente gritou. — Eu nã o preciso de outro médico me
questionando e querendo saber se eu estou cumprindo minha obrigaçã o
de boa mã e. Se foi para isso que você veio, pode me deixar em paz! — A
rispidez em sua voz me assustou. Esta nã o era a mulher que convivi por
tantos anos. Parecia outra pessoa.
— Calma, querida, por que você nã o se deita para descansar? Relaxa,
daqui a pouco você estará melhor. — Tentei ser carinhoso, o que eu nã o
queria era outro surto. Meu filho ia sentir todo esse estresse.
— Blake, nã o sei se consigo levar essa gravidez sozinha, os meus
hormô nios estã o me deixando louca. Sem falar que já estou engordando,
nã o durmo direito e tudo o que faço é comer besteiras. Comida saudável
me causa â nsia de vô mito.
— Você poderia voltar para casa e cuidar de mim, pelo menos até o
nosso filho nascer. — Eu nã o estava ouvindo isso.
— Lucy, nó s já estamos separados, eu vou te dar todo o meu apoio, mas
voltarmos a viver sob o mesmo teto está totalmente fora de cogitaçã o.
Ela levantou a cabeça e vi ó dio em seus olhos.
— Por que você nã o passa um tempo na casa dos seus pais? — Dei a
sugestã o mais coerente para esse momento, que, confesso, nã o estava
sabendo lidar.
— É isso que você quer, me despachar para a casa dos meus pais? Eu nã o
fiz esse filho sozinha, eu preciso da sua ajuda! — A essa altura, ela estava
vociferando.
— Nunca disse que nã o estaria presente para te ajudar no que fosse
necessá rio, mas, convenhamos, voltarmos a viver na mesma casa por
conta da gravidez nã o faz sentido algum. Quando será sua pró xima
consulta com a obstetra? Quero estar presente. — Mudei um pouco o
assunto. A essa altura da minha vida, nã o iria aceitar qualquer
chantagem emocional, mesmo que esse cená rio inspirasse preocupaçã o
e cuidado.
— Filha, estava em uma reuniã o importante, mas deixei tudo quando
soube o que estava acontecendo. — Ainda bem que o pai dela chegou,
pelo menos por ora nã o teria que travar essa conversa descabida.
— Você precisa conversar com sua médica e saber qual calmante pode
usar, nã o é bom para o bebê passar por esses estresses, filha.
— Até você, papai? Já nã o basta o Blake, que está me deixando sozinha
com o filho dele me tirando o juízo?
A vontade que tive foi de revirar os olhos, completamente impaciente,
mas me controlei. Nã o ia cair nesse jogo.
— Andrew, tenho uma cirurgia importante agora, você pode ajudá -la? —
Precisava de alguns minutos antes de entrar no centro cirú rgico.
— Pode ir tranquilo, Blake, já liguei para a minha mulher, ela já está
chegando. Vamos levar Lucy para a nossa casa.
Respirei aliviado, eles estavam percebendo que a filha nã o podia ficar
sozinha.
— Mais tarde darei uma passada lá .
Despedi-me da Lucy, que nem olhou na minha cara, e voltei para a sala
de descanso. Tinha que esquecer os ú ltimos acontecimentos para me
concentrar para a cirurgia. Nesse momento, a melhor coisa a fazer era
ligar para a Beatrice.
— Que surpresa, dr. Lancaster, não esperava sua ligação. — A voz dela já
me levou para um lugar de paz. Ela tinha esse poder, era um bá lsamo
para a minha alma.
— Oi, amor. Estava com saudades e tenho uns minutinhos antes da
pró xima cirurgia, entã o resolvi ligar. Como estã o as coisas por aí?
— Tudo em paz, estava concentrada aqui no ateliê, mas a Nena já pediu o
nosso almoço, então só estou aguardando a doidinha invadir minha sala
com a nossa salada e muitos assuntos a serem discutidos. E com o
cirurgião mais gato da cidade, está tudo bem? Não estou gostando da sua
voz.
— Você é uma fadinha mesmo, nã o deixa passar nada. — Respirei fundo,
nã o queria deixá -la preocupada, mas nã o podia esconder o que acabou
de acontecer.
— Então me diga o que está te deixando tão tenso assim?
— Lucy teve mais um acesso de fú ria agora há pouco. — Percebi que a
Beatrice puxou longamente o ar. — Mas agora está tudo contornado,
Andrew novamente assumiu o controle da situaçã o. Ela ficará na casa
dos pais hoje e no final do dia devo passar lá , afinal nã o quero me eximir
diante do que está acontecendo. Ela está carregando o meu filho em seu
ventre.
— Entendo. Mas vocês precisam descobrir o motivo desse desequilíbrio,
isso não é normal, sem falar que pode prejudicar o bebê. — Sua
preocupaçã o era genuína eu sabia, todavia nã o era apropriado que ela
passasse por isso.
— Me perdoe, amor, nã o é justo com você, mas agora que estamos
juntos, nã o posso deixá -la de fora, afinal daqui para a frente essa criança
estará sempre presente em minha vida. Eu vou cuidar para que ela tenha
tudo, mas preciso que a mã e tenha o mínimo de sanidade.
— Não se preocupe comigo, mas fique atento se a Lucy não está fazendo
alguma chantagem. Se ela já souber que estamos juntos, poderá usar a
criança para nos separar ou atrapalhar a nossa convivência.
— Estou atento a isso, Bea. E pelo que percebi hoje, os pais dela estã o de
olho também.
— Você vai dormir lá em casa hoje? Estou com saudades. — Ainda bem
que ela mudou o assunto, mas hoje precisava ir para casa.
— Preciso preparar um material para a reuniã o amanhã com os
residentes, entã o prefiro dormir na minha casa, mas passo aí para te
pegar, pode ser?
— Ótimo então. Vou dispensar o Petrov assim que chegar em casa e
aguardo você. Combinado?
Despedimo-nos com a promessa de uma noite calma, ou talvez nem
tanto, já que meu tesã o por essa mulher era tã o grande que tornava
impossível estarmos na mesma cama e nã o nos deliciarmos por horas.

Depois da cirurgia, fui direto para a casa dos pais de Lucy conforme
tinha prometido, por sorte ela já estava dormindo, pois, sinceramente,
nã o estava disposto a retornar à quele tema de que deveríamos voltar a
morar juntos novamente. Isso nã o tinha cabimento algum.
Andrew e Sarah, meus ex-sogros, estavam me aguardando ansiosos.
Assim como eu, eles também estavam muito preocupados com a filha.
Nã o entendiam o que estava desencadeando todo esse comportamento.
— A verdade é que a gravidez foi uma surpresa muito grande para todos
nó s e principalmente para Lucy. Todos sabemos que nunca esteve em
seus planos ter filhos, está sendo um choque muito grande para ela. —
Eu realmente acreditava nisso, para a minha ex-mulher nã o estava sendo
fá cil aceitar a gravidez.
— Nó s a trouxemos para cá hoje, mas a intençã o é que ela fique conosco,
pelos menos até o bebê nascer. Amanhã vou tentar convencê-la de que
será melhor para todos. Ela nã o tem a menor condiçã o de ficar sozinha.
— Sarah sempre foi muito sensata e tinha certeza de que seu apoio
nesse momento era de suma importâ ncia para o equilíbrio da Lucy.
— Já marquei um horá rio com um psicó logo amigo meu que faz uma
trabalho bem interessante com gestantes, acredito que ele poderá
ajudar nossa filha. Ela nã o está normal, nã o podemos colocar toda a
responsabilidade na mudança hormonal. — Pelo que percebi, Andrew
estava em alerta.
— Sabemos que podem ocorrer algumas mudanças de humor,
sonolência excessiva e até alguns distú rbios emocionais, mas isso que
está acontecendo definitivamente nã o é comum. — Senti que Sarah
estava bem apreensiva.
— Quero que saibam que jamais estarei ausente, é também minha
responsabilidade manter a integridade de Lucy e do nosso filho, mas
concordo com vocês, ela precisa de ajuda profissional. — Independente
da gravidez, eu jamais abandonaria a Lucy, nã o é porque nã o estávamos
casados que deixaria de apoiá -la em qualquer situaçã o que precisasse.
— Meu filho, em algum momento da vida de vocês a Lucy demonstrou
qualquer sinal de desequilíbrio emocional? Nó s nunca percebemos
nada, mas os ú ltimos anos com ela morando em Londres a ú nica pessoa
que pode nos ajudar com alguma informaçã o é você. — Sarah estava
com a voz embargada, a pessoa alegre que sempre foi estava envolta em
uma nuvem de preocupaçã o.
— Quando ainda estávamos em Londres, nos ú ltimos tempos
eventualmente eu percebia que ela estava distante, retraída, mas nem de
longe demonstrou qualquer atitude que eu pudesse associar a qualquer
distú rbio emocional. Nã o estávamos em uma fase boa do casamento, ela
provavelmente deveria estar pensando na possibilidade de uma
separaçã o, que foi o que aconteceu e, como vocês sabem, a decisã o
inicial foi dela.
Fiquei na casa dos pais de Lucy mais tempo do que planejei, mas a
conversa com eles era necessá ria, eles entenderam que poderiam contar
comigo para o que fosse preciso. Deixei claro que eles nã o estavam
sozinhos nessa situaçã o.
Dirigi até a casa de Beatrice, com o pensamento distante, tentando
entender o que aconteceu para que Lucy mudasse tanto assim, confesso
que essa situaçã o me deixava muito triste. Precisava urgente de uma
taça de vinho e muitos beijos da minha mulher.

Assim que ela entrou no carro, senti seu perfume que tanto amava e uma
sensaçã o de paz me envolveu, definitivamente ela era o meu porto
seguro e garantirei que nada mude isso. Acharemos uma maneira de ter
a nossa vida protegida de toda e qualquer interferência externa e,
quando meu filho nascesse, tinha certeza de que ela o acolheria como se
fosse dela.
Eu sabia que nã o seria fá cil, mas a cada dia que passava percebia que
Beatrice se transformou em uma mulher cheia de personalidade e
lidaria com qualquer dificuldade que aparecesse.
— Demorei, amor? — Beijei-a com força, porque com ela nunca seria
algo leve.
— Um pouco, mas imaginei que isso aconteceria. Como está a Lucy,
melhorou? — Estava com uma ruguinha na testa, apesar de tentar
transparecer serenidade.
— Quando cheguei, ela já estava dormindo, o que foi excelente, pude ter
uma conversa bem tranquila com seus pais, me disseram que acham
melhor que a filha fique com eles pelo menos durante a gestaçã o, me
confidenciaram também que querem uma avaliaçã o mais profissional
desse comportamento que a Lucy vem apresentando, desde que soube
da gravidez e uma consulta com um psicó logo já está agendada.
— Que bom, ainda bem que sã o pais presentes. Vai ficar tudo bem, tenho
certeza disso. — Beatrice segurou minha mã o carinhosamente como
sempre, entã o dei a partida no carro, precisava chegar em casa, tomar
um banho gostoso com essa mulher linda.
Ainda nã o entendia qual liçã o a vida estava nos dando com toda essa
fase que surgiu tã o inesperadamente. O fato era que a cada dia sentia
que estava no caminho certo, e ter Beatrice ao meu lado só me fortalecia,
estava pronto para enfrentar qualquer coisa desde que estivéssemos
bem.
Quando meu filho chegasse, eu estaria preparado para ser o melhor pai
do mundo e nã o tinha dú vida de que Beatrice seria uma boadrasta
maravilhosa.
Tenho vivido essas ú ltimas semanas sempre na expectativa de Lucy ter
novas crises, sabia que tem estado mais tranquila. Blake comentou que
sempre conversava com ela no hospital e parecia que as sessõ es com o
psicó logo estavam ajudando bastante, isso era ó timo, principalmente
para o bebê, sem falar que meu namorado poderia ficar mais tranquilo.
Sentia que Blake ainda sofria com tudo o que estava acontecendo, nã o o
vi ainda completamente feliz com a chegada do filho, ele comentou que
Lucy estava entrando no terceiro mês e ela ainda nã o comprou nada
para a criança. Como amanhã era sá bado, ele queria fazer umas compras
e claro que irei com ele. Era bem desafiador para mim ter que conviver
com isso, todavia o importante era estar perto dele, tentar tornar esse
momento o mais leve possível.
— Nena, tenho uma novidade que, se fosse em outra época, iria amar,
mas na atual conjuntura vou ter que recusar o convite que acabei de
receber agora. — Deixei meus problemas um pouco de lado por ora e
entrei na sala da minha amiga, toda esbaforida.
— Ai, meu Deus, já sei que eu nã o vou gostar da novidade. Sente aí e me
conte tudo, estava mesmo precisando de uma pausa, vou preparar um
café para nó s. — Helena amava um café gourmet, sempre inventava
umas combinaçõ es exó ticas que ficavam incríveis, já fez até um curso de
barista. Na sua sala havia um armá rio cheio de especiarias, leite,
chocolate, cacau em pó que deixaria a Starbucks com inveja.
— Entã o vou querer aquele com essência de laranja e gotas de chocolate
amargo. — Era exigente na escolha e esse realmente ficava muito bom.
— Me diga o que está fazendo seus olhinhos brilharem tanto? Modo
curiosíssima ativado. — Ela mesmo reconhecia que suas anteninhas
ficavam sempre ligadas em tudo. Gargalhamos alto.
— O sr. Bolliger está muito encantado com o meu trabalho, ficou
maravilhado com os primeiros desenhos que enviei e acabou de me
fazer um convite. — Fiz suspense.
— Deixe de enrolaçã o, Bea, já estou em có licas, o que o megaempresá rio
suíço te propô s? Nã o me diga que te pediu em casamento? — Ela se
superou com esse comentá rio.
— Nena, ele é mais velho que o papà, sua louca. Nã o tem nada a ver com
isso, ele me convidou para passar uma temporada em Zurique, assim
poderia me dedicar exclusivamente à sua coleçã o de joias. Sua esposa,
que sempre está nas reuniõ es, reforçou o convite.
— Claro que você nã o aceitou, nã o é, amiga? Afinal, você nã o vai deixar o
Blake solto à mercê daquela ex-mulher louca, acertei? — Como sempre,
Helena nã o mediu o que falou. Pensou, falou o que veio na cabeça. Ainda
bem que só estávamos nó s duas agora.
— Minha recusa nã o foi exatamente por esse motivo, mas sim é por
causa do Blake, nã o quero ficar longe dele, já perdemos tempo demais.
Claro que a situaçã o com a Lucy nã o me deixa confortável, nã o por ele,
pois estou muito segura do que ele sente por mim, mas acredito que ela
pode aprontar alguma coisa na minha ausência.
— Ela já deve saber que vocês estã o juntos. — Helena tinha algo
maquinando em sua cabeça.
— Com certeza já sabe, porém Blake nã o quis abordar esse assunto
ainda, nã o vê necessidade de dar satisfaçã o da sua vida, ele já conversou
com o pai dela, que entendeu plenamente. — Bebi mais um pouco do
meu café especial, acalmando meu coraçã o.
— E ela nã o está com ninguém? Nã o é porque está grávida que nã o irá se
relacionar com alguém.
— Ele me disse outro dia que gostaria muito que Lucy refizesse a vida ao
lado de alguém bacana, que amasse seu filho, mas ele acha que ela ainda
está sozinha.
— Acabei de ter uma ideia maravilhosa, Beazinha. — Lá vem bobagem.
— Será que o sr. Bolliger nã o me aceitaria no seu lugar? Adoraria passar
uma temporada nos Alpes Suíços, colocaria minha criatividade para
trabalhar em novos cafés maravilhosos associado aos chocolates divinos,
que eles fazem por lá . — Helena fez uma cara como se estivesse de fato
sentindo o sabor dos chocolates.
— E as joias também ficariam sob sua responsabilidade, nã o é, querida?
— ri da cara de desgosto que ela fez.
— Poderíamos fazer um arranjo, você ficaria aqui desenhando em
companhia do seu médico todo músculos, me mandava tudo via e-mail e
eu apresentaria pessoalmente ao sr. Bolliger. Acho uma boa soluçã o.
— Desconfio que você colocou alguma bebida alcoó lica no seu café, já
está delirando.
— Você é muito chata, Bea, nã o sabe nem brincar — Jogou alguns post-
its em minha direçã o e sim, estávamos de volta à adolescência.
— Por falar nisso, acabou a pausa. Preciso voltar ao trabalho, hoje vou
sair mais cedo, prometi ao Blake acompanhá -lo na aula de Gastronomia.
— Amiga, já ia me esquecendo, preciso te dizer uma coisa. — Ela
levantou e seu rosto já estava sério.
— Lá vem bomba, até seu tom de voz mudou. O que foi?
— Hoje, quando cheguei, vi um carro todo preto estacionado bem aí na
frente do prédio, fiquei meio cismada, só notei porque era muito cedo,
com poucos carros estacionados na rua. Você ainda está com aquela
sensaçã o de estar sendo seguida? — Senti um calafrio percorrer todo o
meu corpo.
— Na verdade, eu me desliguei um pouco disso, já que nunca estou
sozinha. Sei que o Petrov está atento a tudo, outro dia ele achou que
estávamos sendo seguidos, aí mudou a rota e acabou chegando à
conclusã o de que poderia ter se enganado.
— De qualquer forma já avisei ao Petrov sobre minhas suspeitas, mas,
por favor, nã o vacile, ok? — Abraçou-me carinhosamente.
— Fique tranquila. Está tudo sob controle. — Abracei-a de volta e voltei
ao trabalho. Nã o podia ficar pensando nisso, ou corria o risco de ficar
neuró tica.

— Acorda, preguiçosa, seu café está pronto, princesa. — Ouvi de longe a


voz de Blake, sem querer me mexer. Depois da aula de Gastronomia,
apesar do jantar delicioso que saboreamos, quando chegamos em casa,
ele estava tã o animado com suas criaçõ es, que resolveu fazer uns
petiscos e ficamos até tarde bebendo vinho e namorando, entã o eu
estava sim com preguiça de me levantar.
— Já amanheceu? — brinquei e cobri a cabeça com o lençol.
— Vai me deixar sozinho comendo tudo o que preparei para o nosso
desjejum, srta. Tomarolli? — Ganhei uma beijo carinhoso no pescoço.
— Ok, você venceu, sabe que nã o resisto aos seus dotes culiná rios, nã o
é?
— Você nã o resiste ao meu corpinho, isso sim, acabou comigo ontem,
mulher! — Ganhei outro beijo, dessa vez no vale dos meus seios, mas
saiu do quarto em seguida. O homem realmente era uma tentaçã o.
Melhor eu me levantar logo, quem sabe ainda consiga trazê-lo de volta
para a cama antes de sairmos à s compras.
— Que exagero é esse, meu amor? Tem comida para um batalhã o.
O café da manhã era minha refeiçã o preferida e feito por essa delícia de
homem era tudo que eu precisava em uma manhã preguiçosa de sá bado.
Depois de fartamente alimentados, voltamos ao quarto e a nossa paixã o
que parecia nã o se acalmar nunca, explodiu mais uma vez, era como se
no mundo só existisse nó s dois, suspiros, pele, arrepios, beijos
infindáveis, carinho e muito, mas muito amor mesmo.
Quando finalmente nos sentimos plenamente satisfeitos, apó s um banho
demorado saímos para comprar os primeiros presentes do bebê.
Entramos em tantas lojas lindas, sentia que, à s vezes, Blake até ficava
emocionado escolhendo sapatinhos, mamadeiras e brinquedos.
Contraditoriamente, em alguns momentos também parecia constrangido
de estar ali comigo escolhendo presentes para um filho que nã o era o
nosso.
Para ser bem honesta, em alguns instantes fantasiei sim que estava ali
pelo nosso filho. Calma, Bea, esse tempo vai chegar. Mas logo tratava de
nã o fantasiar, a realidade agora era outra bem diferente, nesse momento
precisava me manter forte e apoiá -lo.
Passava das quatorze horas e, apesar do nosso café reforçado, estava
começando a ficar com fome. Decidimos almoçar em um restaurante
japonês que amávamos perto da minha casa. Estávamos chegando ao
estacionamento do shopping quando meu coraçã o quase parou, ouvimos
alguém gritando o nome de Blake.
— Blake! Como se atreve a fazer compras para o meu filho com essa
daí?! — Para o meu total constrangimento, ali na nossa frente estava
Lucy, completamente alterada. Nã o parecia a mesma pessoa, seu rosto
estava vermelho e os olhos quase saltando do rosto, era a personificaçã o
do ó dio.
— Acalme-se, Lucy, nã o estou entendendo essa sua atitude. Beatrice é
minha namorada e está me ajudando com algumas coisa para o nosso
filho, já que você, mesmo sendo a mã e, me disse que nã o tinha comprado
nada.
— Isso nã o lhe dá o direito de deixar que suas amantes escolham o que o
meu filho deverá usar. Jogue tudo no lixo, eu nã o vou aceitar
absolutamente nada que essa mulher escolheu.
Eu estava em choque, nã o conseguia emitir uma palavra sequer e
tremendo dos pés à cabeça.
— Por favor, controle-se, nã o há motivo para esse escâ ndalo todo. —
Blake também estava muito nervoso, essa situaçã o era no mínimo
esquisita. Foi entã o que Lucy pareceu titubear e fez mençã o de cair,
rapidamente Blake a segurou e evitou que ela desabasse no chã o.
O segurança do shopping aproximou-se para nos ajudar. Blake abriu a
porta de trá s do carro, colocou Lucy sentada no banco e imediatamente
ligou para a emergência. A mulher parecia ter desmaiado, ao mesmo
tempo que tentava falar alguma coisa.
Nã o demorou muito e uma ambulâ ncia chegou, os paramédicos fizeram
as primeiras avaliaçõ es e, ao que tudo indicava, ocorreu uma queda de
pressã o. Depois que a colocaram na ambulâ ncia, vi nos olhos de Blake
que ele queria ir junto, mas a dú vida o estava corroendo, nã o queria me
deixar, mas precisava seguir com a ex-mulher que carregava o seu filho
na barriga. Oh Deus, que situaçã o!
— Blake, me dê as chaves do carro, eu vou para casa, vá na ambulâ ncia,
assim você já vai monitorando tudo e certamente ficará mais tranquilo.
— Alguns segundos se passaram até ele me beijar e me pedir desculpas
e, por fim, decidir acompanhar a mã e do seu filho.
Como isso pode estar acontecendo? Um dia que começou lento, cheio de
amor, com a promessa de ser agradável, divertido, simplesmente tudo
saiu do controle num piscar de olhos. Eu fiquei ali no estacionamento
parada em pé, sem conseguir me mover, até sentir uma lá grima molhar
meu rosto. Isso não pode estar acontecendo. É um sonho, tenho certeza, eu
vou acordar desse pesadelo.
— Senhora, está tudo bem? Posso ajudá -la? — A voz do segurança do
shopping me trouxe de volta dos meus pensamentos e jogou na minha
cara a seca realidade, tudo realmente tinha acontecido e agora eu estava
completamente perdida sem saber o que fazer.
— Nã o, obrigada, está tudo bem. — Entrei rapidamente no carro, fiz
umas três respiraçõ es profundas tentando colocar meus pensamentos
nos trilhos, esforçando-me para encontrar um pouco da minha
estabilidade que a essa altura tinha desaparecido.
Saí dirigindo no automá tico, ainda sem acreditar na cena que ficava
voltando na minha cabeça a cada instante e fui ao encontro da ú nica
pessoa que certamente iria me entender sem questionamentos ou
críticas. Liguei para a minha mã e, que felizmente estava em casa e, pela
maneira que perguntei se poderia encontrá -la, percebeu que alguma
coisa tinha acontecido.
— Venha, meu amor, estou te esperando com um chá de camomila
delicioso. — Essa era a dona Katie, sempre com seus chá s para aquecer o
coraçã o e curar as dores da alma.

Quando atravessei os portõ es enormes da residência dos meus pais, já


comecei a me sentir melhor, estacionei apressadamente e, ao abrir a
porta do carro, o cheiro das flores que minha mã e cultivava ao redor da
casa invadiu meu nariz, me trazendo uma calma que só foi superada
pelo abraço que recebi quando a encontrei na porta.
— Filha, o que aconteceu?
Desabei e chorei muito, tentando aliviar a dor que rasgava meu peito.
Fomos em direçã o à biblioteca, onde já tinha uma bandeja de prata com
duas xícaras de chá e ao lado um difusor com ó leo essencial de lavanda.
Esse era o kit de primeiros socorros da minha mã e.
Depois que consegui controlar meu choro, relatei tudo o que aconteceu,
já tinha comentado outro dia por telefone sobre a gravidez, mas ela nã o
sabia sobre os ataques que Lucy estava tendo. Mamma nã o emitiu uma
palavra, nada, nenhum som, ficou ali quieta, analisando tudo o que eu
falava. Quando, enfim, terminei me abraçou mais uma vez e, quando se
afastou, foi dura.
— Beatrice, sabe que sempre apoiei você, conheço os detalhes do seu
amor pelo Blake, mas agora vocês estã o em uma situaçã o delicadíssima.
Ele é um homem sério, jamais faltará com suas obrigaçõ es com relaçã o
ao filho, que sabe Deus por qual motivo, só veio agora apó s ele já estar
separado. — Respirou fundo e continuou: — Mas vocês precisam se
sentar e conversar. Pelo que você disse, Lucy está totalmente
desequilibrada, a gravidez aflorou algo que possivelmente já existia e
que ninguém nunca percebeu. O fato é que, se nã o derem limites aos
possíveis devaneios dela, a vida de vocês será transformada em um
inferno.
— Mamma, nã o é possível que nó s nunca conseguiremos ficar juntos
plenamente, sempre aparece alguma coisa para nos atrapalhar.
— Tire isso da sua cabeça, Beatrice, a vida é assim, nem sempre segue o
curso mais tranquilo, o caminho mais florido. Nesse momento você
precisa ter maturidade para tomar as melhores decisõ es, sem falar que
Blake também pode estar sofrendo muito com tudo isso.
— Ele está sofrendo muito sim, ele me ama, nã o tenho dú vida disso,
sempre quis ser pai, nesse momento está totalmente dividido entre viver
o nosso amor e ficar feliz com a chegada do bebê.
— Você me disse que estavam indo almoçar quando tudo aconteceu, nã o
foi?
Concordei com a cabeça, sem forças para falar mais nada.
— Pois bem, minha bonequinha, vamos almoçar, de barriga cheia as
soluçõ es dos problemas chegam mais rá pido e, por sorte, tem aquele
bolo de chocolate com recheio de morangos que você ama.
E foi assim que consegui me acalmar um pouco, nos braços da minha
mã e e, claro, saboreando uma comidinha deliciosa com gosto de
infâ ncia, onde o maior problema era decidir qual boneca eu queria que
Papai Noel me enviasse no Natal.
Ainda na ambulâ ncia, depois de checar todos os sinais vitais da Lucy,
identifiquei que felizmente foi apenas uma queda de pressã o, talvez
causada pela emoçã o, já que ela estava extremamente agitada, ou talvez
uma hipoglicemia. Só Deus sabe se ela tem se alimentado corretamente.
Como um dos motivos para nã o querer engravidar era a preocupaçã o
com o corpo, o medo de engordar, nã o duvidava de que a desmiolada
estivesse fazendo restriçã o alimentar.
Quando chegamos ao hospital, já tinha uma equipe a postos para recebê-
la, sua obstetra e seu pai também já estavam no local.
— Blake, está tudo bem? — Meu ex-sogro me interpelou, assim que
entramos na emergência.
— Pelo que investiguei, nã o deve ser nada além de uma queda de
pressã o, mas é conveniente que seja feita uma bateria de exames mais
específicos, para nã o deixarmos passar nada que possa oferecer risco
para a Lucy ou o bebê. — Nesse momento já estava me direcionando
para a obstetra, que até onde apurei era muito competente.
— Deixe comigo agora, vou levá -la para a sala de ultrassom, em breve
volto aqui para passar o real estado da Lucy. Está tudo bem, querida,
vamos cuidar de você. — A médica falou com Lucy, que até aquele
momento, apesar de consciente, nã o abriu os olhos e nem pronunciou
uma palavra sequer.
Depois que a médica se despediu levando minha ex-mulher, senti meu
estô mago roncar, entã o convidei Andrew para irmos ao restaurante do
hospital, precisava comer alguma coisa.
— Minha filha nã o está em seu estado normal, Blake, nó s estamos muito
preocupados. Esses dias que ela está em nossa casa, tenho observado
um comportamento que vai da excitaçã o extrema a um estado típico de
depressã o, isso sempre acontece quando ela se tranca no quarto e fica
um bom tempo ao celular — revelou com um ar de muita preocupaçã o.
— Ela diz com quem conversa? Será que nã o é com o psicó logo? —
Fiquei um pouco cismado com o seu comentá rio.
— Com certeza nã o. Eu liguei pessoalmente para ele, que negou estar
tendo conversas com a Lucy além das sessõ es, que sã o presenciais.
Talvez seja uma amiga, mas eu realmente estou muito intrigado.
— Até quando estávamos juntos, Lucy tinha algumas amigas em Londres
e aqui também, mas o ú nico amigo que ela sempre conversava era o dr.
Lucas Carter. — Fiz uma anotaçã o mental de conversar com ele, talvez
possa me esclarecer alguma coisa.
— Eu sinto muito toda essa confusã o que ela está fazendo em sua vida,
mas quem sabe daqui algum tempo, ela se acostume com a ideia de estar
grávida e que nã o vive mais com o pai da criança. — Andrew, como
sempre, foi muito coerente.
— Fique tranquilo com relaçã o a mim. Estarei sempre aqui para o que
ela precisar, mas temos que entender os motivos desses rompantes, isso
pode prejudicar também o bebê. — Só ficarei tranquilo, depois que
entender o que está desencadeando esse comportamento da Lucy.
Depois que fiz um lanche, voltamos para a emergência. Lucy já estava
em um quarto descansando, ficaria internada em observaçã o. Sua
médica confirmou o diagnó stico inicial, como imaginei foi uma queda de
pressã o causada pela má alimentaçã o. A pró pria Lucy confirmou que
tem comido bem menos com medo de engordar.
Bem mais tarde, antes de deixar o hospital, liguei para a Beatrice. De
imediato abri um sorriso largo quando minha mulher disse que estava
em minha casa me esperando. Nã o estava sendo nada fá cil para ela, eu
sabia, mas juntos iremos atravessar mais esse desafio.
Durante o percurso até meu apartamento, encomendei o nosso jantar,
no restaurante japonês que tínhamos escolhido para almoçar antes de
toda essa confusã o acontecer. Precisava de um longo banho de banheira
com as belas pernas de Beatrice envolvendo minha cintura. Só assim
conseguiria relaxar um pouco.

Dia apó s dia, o estado emocional de Lucy regredia. Durante os dias


seguintes foram vá rias manifestaçõ es de descontrole e agressividade.
Ela estava afastada do hospital por recomendaçã o da obstetra, mas os
tais telefonemas que a deixavam fora de si continuavam. De acordo com
Andrew, ela se negava a dar qualquer informaçã o.
Percebia que toda essa agitaçã o mexia muito com Beatrice, ela tem
ficado retraída; outro dia, a ouvi chorar no banho, isso cortou meu
coraçã o. Conversamos bastante sobre tudo, ela tem sido sincera,
confessou que pode fraquejar, sem forças suficiente para nã o deixar que
sejamos afetados.
Hoje dormirei no apartamento de Beatrice, mas antes resolvi passar na
casa dos pais de Lucy para saber como ela estava. Demorei mais do que
o planejado e, quando cheguei em casa, Beatrice estava dormindo. Como
estava sem fome, tomei um banho rá pido e me deitei ao lado dela,
tentando nã o a acordar.
O despertador do celular tocou anunciando mais um dia pela frente,
quando procurei Beatrice ela nã o estava na cama e nem no banheiro. O
cheiro do café indicou sua localizaçã o. Quando cheguei na sala, ela
estava sentada à mesa com as duas mã os sustentando a cabeça,
totalmente distraída.
— Bom dia, princesa. Levantou-se cedo, dormiu bem? — Beijei sua
cabeça e ela nã o se moveu. Puxou o ar longamente e entã o me olhou.
Naquele momento eu vi o quanto estava angustiada. Senti o sangue
gelar.
— Blake, precisamos conversar. — Essa frase anunciava uma catá strofe
na minha vida, um tornado envolvia os meus pensamentos. Vi em seus
olhos uma tristeza que nunca vi antes, ela estava quebrada.
— Estou aqui, amor. O que você precisa? — Houve segundos dolorosos
de silêncio até ouvir minha sentença.
— Precisamos de um tempo.
Levantei-me bruscamente, o sangue que estava gelado acabou de
aquecer. Sua frase foi como um punhal sendo atravessado no meu peito.
— Nã o, Bea, nã o vou permitir que você se afaste de mim, nã o agora que
assumimos o nosso amor. Eu vou dar um jeito nesse tumulto que virou a
minha vida, mas jamais vou deixar que você me deixe. — Segurei seu
rosto com as duas mã os.
— Blake, eu nã o estou conseguindo. Eu me sinto derrotada, nã o posso
exigir que você me dê mais atençã o, pois sei que está também a beira de
um ataque. Entendo que a carga está muito pesada para você.
— Nã o, nã o... em hipó tese alguma, nã o vou deixá -la ir. — Comecei a
andar em círculos, servi-me um pouco do café, mas nada me acalmava.
— Blake, entenda, esse é um momento seu, pense bem, seu filho tã o
desejado está chegando. Além do que... — ela interrompeu e as lá grimas
brotaram dos seus lindos olhos verdes.
Aproximei e beijei-a loucamente, ela correspondeu, mas em seguida se
afastou um pouco.
— Blake, eu queria estar grávida de você, seu primeiro filho deveria ser
nosso. Eu nã o tenho o direito de falar isso, mas estou sim com inveja da
Lucy, que nunca quis um filho. Por toda a minha vida, o que mais quis foi
formar uma família com você. — Beatrice estava sofrendo muito. — Eu
sei, é um pensamento egoísta, mas estou sendo verdadeira. Nã o estou
feliz com a chegada do seu filho, nã o agora, me desculpe te falar essas
coisas. Minha cabeça está dando um nó com toda essa confusã o que sua
ex-mulher vem protagonizando! — ela já estava praticamente gritando.
Era quase palpável a sua dor, entristecia-me muito ver seu sofrimento e,
pior, a culpa de tudo isso era minha.
— Bea, acalme-se, vamos conversar, você está coberta de razã o, eu nã o
teria a sua paciência se a situaçã o fosse o contrá rio, mas, amor,
precisamos ficar juntos. Já perdemos muito tempo distantes um do
outro. Com o tempo, você vai aprender a amar meu filho e, quem sabe,
um dia teremos o nosso bambino. — Ganhei sua atençã o, mas os olhos
tristes continuavam ali.
— Blake, eu realmente preciso me afastar um pouco, quero também te
dar espaço para organizar sua vida. Nã o é definitivo, mas um tempo é
necessá rio nesse momento. — Ela envolveu minha mã o com a sua e me
beijou suavemente. — Eu te amo, Blake, isso nã o está em questã o, mas
eu preciso recuperar meu equilíbrio. Nã o estou me reconhecendo diante
de tantas situaçõ es completamente novas.
— Minha princesa, eu nã o quero ficar longe de você, nã o é justo com a
gente. Por favor, reconsidere. — Mas eu percebi que a decisã o estava
tomada. Tentei desfazer o bolo que se formava em minha garganta,
bebendo um pouco de á gua, mas parecia que o líquido era um á cido que
corroía minha garganta. Estava derrotado.
— Eu vou viajar, passar um tempo na Suíça. — De onde saiu essa ideia?
Nã o quis apressar sua explicaçã o, mas minha expressã o de
questionamento foi entendida. — Você sabe que estou desenhando uma
coleçã o exclusiva para uma rede de joalherias na Suíça.
Confirmei com a cabeça.
— O sr. Bolliger, dono da rede, me convidou alguns dias atrá s para que
eu finalizasse o projeto em Zurique. Na ocasiã o agradeci, mas recusei o
convite, entretanto, acredito que essa é uma oportunidade interessante
para esse momento que estamos vivendo, entã o acabei de enviar uma
mensagem querendo saber se o convite ainda estava de pé, disse que
tinha reconsiderado e estava disposta a finalizar o trabalho lá .
— O que posso fazer para tirar essa ideia da sua cabeça? Esse é o
momento de ficarmos juntos. Eu preciso de você ao meu lado, amor. —
Tentei mais uma vez demovê-la desse absurdo.
— Eu peço desculpas mais uma vez, você tem razã o, o certo seria
ficarmos juntos, mas preciso me sentir mais forte para enfrentar tudo o
que poderá acontecer apó s o nascimento do seu filho. Quero ser uma
companheira inteira ao seu lado.
— Você já é perfeita para mim, Bea, mas vou respeitar sua decisã o.
Quando você pretende partir?
— Se o convite ainda estiver de pé, no pró ximo final de semana. Preciso
apenas acertar algumas coisas com Helena, pois ela assumirá grande
parte dos meu compromissos e entã o, no domingo à noite, pego o voo
para Zurique. — Abriu uma fenda no meu peito. Ela nã o iria voltar atrá s
na sua decisã o.
— Petrov vai te acompanhar?
— Nã o é necessá rio. Estarei em outro país, apenas as pessoas mais
íntimas saberã o meu destino, realmente nã o vejo necessidade.
Beatrice me abraçou longamente, choramos juntos. Sim eu chorei muito,
principalmente na eminência de perder o amor da minha vida. O café da
manhã que ela preparou ficou praticamente intacto, nenhum dos dois
estava com apetite depois da conversa que tivemos.
Os dias até a viagem de Beatrice seriam uma tortura para nó s dois. Mas
faria o que ela quisesse para deixá -la mais feliz, mesmo que custasse a
minha felicidade.
Ela preferiu passar os ú ltimos dias até o seu embarque na sua casa,
organizando tudo e em reuniã o com Helena, mas, ainda assim,
dormimos juntos todas as noites. Talvez ela tivesse razã o, eu ia
aproveitar esse período para me preparar também para a chegada do
meu filho. Lucy teria que assumir a maternidade de maneira
responsável e para isso eu ia precisar da ajuda dos pais dela, que até
entã o se mostraram compreensivos e entenderam o meu lado da
histó ria.
Que decisã o difícil de ser tomada. Depois de tudo que passei longe do
Blake, achei que viveríamos o nosso amor de forma tranquila, mas nesse
momento precisava sair um pouco de cena. Nã o que eu tivesse dú vida
dos meus sentimentos ou do amor dele, era justamente por confiar em
nó s dois que sabia que agora o melhor a ser feito era sim, deixar a vida
entrar nos eixos, estava tudo muito confuso e nã o queria perder o que já
tínhamos.
Hoje finalmente viajarei, e apesar da convicçã o de que estava certa, meu
coraçã o parecia uma uva passa, encolhido, murcho.
Blake nã o me deixou dormir sozinha nos ú ltimos dias, se manteve
presente, mas nã o tentou me convencer de desistir da viagem.
Minha empresa estava toda organizada, Helena cuidará dos assuntos
urgentes e de qualquer forma estaremos apenas a uma ligaçã o para
resolver qualquer contratempo que surgir.
Pedi ao Blake que nã o me trouxesse ao aeroporto, nã o queria ter a
sensaçã o dolorosa da despedida. Ele concordou a contragosto, fez mil
recomendaçõ es e me entregou um envelope que, segundo ele, continha
apenas algumas palavras para eu nã o me esquecer dele – como se isso
fosse possível –, mas era para eu ler somente quando estivesse no aviã o.
— Filha, tem certeza da sua decisã o? Ainda está em tempo de desistir
dessa viagem. — Minha mã e, como sempre, me apoiando, mas, ao
mesmo tempo, me testando. Ela nã o queria que eu me arrependesse.
— Nã o se preocupe, mamma, estou muito certa do que estou fazendo. A
sra. Bolliger está ansiosa para a minha chegada, serei bem tratada por lá ,
sem falar que os Alpes Suíços serã o um refresco para a minha
criatividade, ainda falta desenhar algumas peças e com a cabeça mais
tranquila, em um lugar paradisíaco como aquele, concluirei o trabalho
lindamente.
— Tenho certeza disso, minha querida, você é brilhante no que faz e só
está começando. — Ganhei outro abraço dos meus pais e embarquei.
Apó s oito horas de um voo onde nã o preguei o olho, cheguei em Zurique,
apesar de ainda nã o ser inverno, a temperatura já estava começando a
cair, vou amar trabalhar com esse clima.
Nã o demorou muito, avistei o sr. Bolliger com sua esposa, eles me
abraçaram com tanto carinho, como se eu fosse da família. A sensaçã o
foi maravilhosa, senti-me acolhida, especialmente nesse momento da
minha vida, toda atençã o seria muito bem-vinda.
— Beatrice, você é ainda mais linda pessoalmente do que por vídeo. Que
alegria receber você aqui. Seja bem-vinda, minha querida. Fiquei muito
feliz quando você repensou e aceitou o nosso convite.
A sra. Bolliger era uma mulher linda, de estatura mediana, cabelos
loiríssimos, em um corte Chanel cuidadosamente arrumado, olhos azuis
como o céu e elegantemente vestida. O sr. Bolliger em seu terno cinza
claro, feito sob medida certamente, ostentava uma elegâ ncia que me fez
crer o quanto teria destruído coraçõ es quando jovem.
— Vocês também formam um casal lindo — elogiei com sinceridade —
Estou muito feliz de conhecê-los pessoalmente.
— Vamos para a nossa casa, preparamos para você a edícula que usamos
para receber hó spedes especiais, espero que esteja a seu gosto. —
Preferia ficar em um hotel, nã o gosto de incomodar, mas eles insistiram
em me hospedar.
O chalé onde passaria os pró ximos trinta dias era no mínimo
encantador, todo construído em madeira, a arquitetura rú stica típica do
lugar, o telhado de duas á guas de forte caimento. Com dois quartos
amplos, um deles foi completamente adaptado para o meu trabalho, com
todo material necessá rio para dar vazã o aos meus desenhos, além de
uma cozinha pequena toda equipada e dois banheiros. A sala com uma
lareira linda tinha uma decoraçã o aconchegante e as janelas enormes
proporcionavam uma visã o deslumbrante do jardim da mansã o dos
Bolliger.
Assim que saí do banho, a sra. Bolliger veio me buscar para um café
digno dos melhores hotéis, fiquei até meio sem graça com tamanha
consideraçã o. Conversamos por horas em torno da mesa
cuidadosamente preparada, me fazendo lembrar do bom gosto da
mamma.
— Sra. Bolliger, estou encantada com esse café maravilhoso, o croissant
derrete na boca, o chocolate quente está do jeito que gosto, levemente
amargo. Nã o posso exagerar, vou engordar muito se continuar nesse
ritmo. — Estávamos os três conversando e nos conhecendo melhor. Que
casal encantador.
— Minha filha, vamos acabar logo com essas formalidades, chega de
senhor e sra. Bolliger, para você somos Leon e Martina, combinado?
Olha que amor, já me apaixonei por eles.
— Só se vocês me chamarem de Bea, que é como a minha família e os
amigos me chamam. — Pisquei.
Voltei para o chalé para descansar um pouco e desarrumar as malas. Já
tinha falado com a mamma e enviei uma mensagem para o Blake
avisando que já tinha chegado.
Evitei por toda a viagem abrir o envelope que Blake me deu, mas agora,
depois de consumir tanto carboidrato, estava com minhas energias
renovadas e pronta para ler o que meu amor escreveu.

Minha princesa,
Apesar de não querer ficar distante de você, entendi que precisava de
espaço. As coisas saíram um pouco do controle e me dói muito saber o
quanto está sofrendo. Não tenha dúvidas do quanto você é importante
para mim, nossa história só está começando. Serei o homem que você
sempre sonhou e esperou.
Confio em nosso amor. Quando se sentir melhor, volte para casa. Estarei te
esperando.
P.S.: Enquanto escrevia este bilhete, estava ouvindo a música “I’ll Be
Waiting”, do Lenny Kravitz. Quando tiver um tempo, ouça. Ela diz muito o
que estou sentindo neste momento.
Com amor,
B.

Quase três semanas se passaram desde que cheguei à Suíça e estava me


sentindo cada dia melhor. Minha comunicaçã o com Blake era
basicamente via mensagem. Outro dia, ele me ligou tarde da noite por
videochamada. Ao mesmo tempo que foi reconfortante poder ver o seu
rosto, quando desligamos a tristeza me invadiu de um jeito, que chorei a
noite toda.
Quando encontrei Martina para o café da manhã apó s minha corrida
diá ria, ela me abraçou e, nesse momento, nã o aguentei e acabei me
abrindo com ela.
— Bea, meu começo com o Leon também nã o foi nada fá cil, ficamos
algum tempo longe um do outro, a família dele nã o aprovava nosso
relacionamento, nã o sou de origem rica e inicialmente eles achavam que
o primogênito e herdeiro do império Bolliger merecia casar-se com uma
mulher de sobrenome tradicional e de fato nã o era o caso. — Percebi
que essa histó ria a fez sofrer muito no passado.
— Martina querida, lamento que tenha passado por isso.
— Meu bem, estou te contando tudo isso para dizer que, assim como eu
e o Leon, vocês se amam de verdade. Todo problema que tiverem que
enfrentar em qualquer época da vida, tenham em mente que o amor é o
alicerce principal de qualquer relacionamento. Fique aqui o tempo que
precisar, mas volte para o seu médico. Um amor assim precisa ser vivido
com muita intensidade.
As palavras de Martina atingiram direto na minha alma, nos abraçamos
longamente, quase me senti como se estivesse envolvida pelos braços da
mamma. Ela era uma pessoa excepcional, com uma sabedoria incrível.
Nã o era à toa que estava casada há mais de 40 anos e ainda com a
mesma paixã o entre os dois.
Depois de quase trinta dias conhecendo todos os cantinhos de Zurique e
Lucerna, sempre na companhia afetuosa de Martina, concluí o meu
trabalho e estava pronta para voltar para casa.
A coleçã o de joias ficou simplesmente encantadora, o casal Bolliger
estava apaixonado pela minha arte. Prometi a Martina que voltaria com
o Blake para o lançamento oficial da coleçã o.
Falei com Blake ontem à noite e, assim como eu, ele está ansioso para o
nosso reencontro. Claro que o homem superprotetor já acertou tudo
com Petrov para me buscar no aeroporto, porque ele estaria em cirurgia
no momento que eu desembarcaria.
A despedida de Martina e Leon foi difícil para nó s três, porque nos
apegamos muito; ultrapassou a relaçã o de trabalho. Eles cuidaram de
mim com tanto amor, que me sentia em casa.
No salã o de embarque, eu conheci uma senhora supersimpá tica que
estava indo para Nova Iorque visitar a filha. Conversamos durante o
tempo que ficamos esperando a liberaçã o da aeronave. Ela me contou
praticamente toda a sua vida. Em alguns momentos rimos muito das
histó rias e aventuras de quando era jovem, isso me distraiu e diminuiu
um pouco a minha ansiedade. Queria muito chegar em casa e abraçar o
Blake, sonhava com isso desde que entendi que, sem ele, jamais seria
completamente realizada.
O voo foi excelente e, ao contrá rio do que aconteceu quando fui para a
Suíça, consegui dormir o tempo todo. Quando o aviã o finalmente
pousou, meu coraçã o estava aos pulos. Enviei uma mensagem para a
minha mã e e para o Blake avisando que já tinha chegado.
Peguei minhas malas e, ao sair do desembarque a senhora que conheci
no aeroporto, aproximou-se para se despedir.
— Beatrice querida foi um prazer te conhecer. Minha filha veio me
buscar, aceita uma carona? — Ofereceu educadamente.
— Obrigada, mas já tenho alguém me aguardando. — Nesse momento,
avistei de longe Petrov entrando no aeroporto apressadamente.
— Entã o me dê um abraço de despedida, espero nos encontrar
novamente.
Correspondi o abraço da pequena senhora e, no instante seguinte, senti
uma picada na altura da minha cintura como se fosse uma injeçã o.
Involuntariamente me afastei assustada, em seguida percebi algo
encostar nas minhas pernas. Uma outra pessoa me segurou e notei que
me colocaram sentada em uma cadeira de rodas, olhei novamente na
direçã o de Petrov e, em milésimos de segundos, nossos olhos se
encontraram, mas simultaneamente um tumulto se formou em torno
dele. Senti uma tontura estranha, entã o minhas vistas escureceram.
— Que cirurgia maravilhosa foi essa, dr. Heart? — Como sempre, Kaleb
se divertia à minha custa. Vivia me chamando pelo apelido que, segundo
ele, até aqui em Nova Iorque já estava conhecido pelo hospital, mais
especificamente na ala feminina. Joguei a esponja com sabã o na sua
direçã o. Acabamos de concluir uma das intervençõ es cirú rgicas mais
difíceis dos ú ltimos tempos, mas felizmente o paciente estava ó timo.
— Estou louco para ir embora, Bea já chegou faz um bom tempo e estou
louco de saudades da minha mulher, o plano é nã o sair da cama o final
de semana inteiro, temos muito o que conversar.
— Conversar? Sei bem o tipo de conversa que vocês terã o. — Nossa
amizade era de tantos anos que, à s vezes, nos comportávamos como dois
adolescentes. Acreditava que isso seguiria até ficarmos velhos e
aposentados, sentados com uma cerveja na mã o, contando nossas
histó rias para os netos.
— Deixa eu dar uma olhada no meu celular, com certeza já tem
mensagem da Bea. — Tirei o aparelho da mochila e me assustei com a
quantidade de ligaçõ es que perdi. Além de Petrov, tinha chamada da
Olívia e até de Katie, mas somente uma mensagem da Beatrice, avisando
que já tinha chegado e nada mais. Nã o tive dú vida de que aconteceu
alguma coisa.
Resolvi ligar primeiro para Petrov, pois tínhamos combinado que ele
buscaria Beatrice no aeroporto e a levaria para o seu apartamento. Mal
tocou e ele já atendeu.
— Me diga o que aconteceu. — Fui logo direto. Precisava falar com
Beatrice.
— Doutor, levaram a srta. Tomarolli. — Precisei sentar e assimilar o que
o russo tinha acabado de dizer.
— Como assim, levaram a Bea, Petrov?! — Minha voz saiu ríspida e mais
alta do que o normal, chamando a atençã o de Kaleb, que logo
aproximou-se de mim.
— Estava chegando no desembarque para buscá-la conforme
combinamos, ela já estava vindo em minha direção, mas parou para
cumprimentar uma senhora. Tudo foi muito rápido, ela deve ter sido
drogada, pois foi imediatamente colocada em uma cadeira de rodas, foi aí
que percebi o que estava acontecendo. Um grupo de pessoas começou a
fazer um tumulto em minha frente, quando consegui me desvencilhar eu já
a tinha perdido de vista. — O segurança disparou a falar e eu fui
murchando e me encolhendo na cadeira, meu mundo estava desabando.
— Estava em cirurgia, só vi agora suas ligaçõ es. Onde você está , a polícia
já foi acionada? Precisamos agir rapidamente. Por Deus, Petrov, ela é a
minha vida. — O desespero tomou conta de mim.
— O dr. Tomarolli já está à frente de tudo, a polícia já foi acionada e, nesse
momento, estamos reunidos aqui na casa dos pais da srta. Beatrice e...
Nem o deixei terminar, já avisando que estava indo para lá . Precisava me
inteirar do que estava sendo providenciado. Quando desliguei o celular,
a ú nica coisa que queria era sair correndo. Eu não posso perdê-la.
— Sequestraram a Bea, Kaleb. — Peguei minha mochila e saí feito um
louco pelo hospital. Kaleb só conseguiu me alcançar no estacionamento.
— Acalme-se, Blake, eu te levo, você nã o tem condiçõ es de dirigir
nervoso assim, pode causar um acidente. Nã o vou te deixar sozinho
nessa, meu amigo.
O tempo que Kaleb levou dirigindo entre o hospital e a casa dos pais de
Beatrice pareceu uma eternidade, ainda bem que ele se ofereceu para
me trazer, estava com os nervos à flor da pele. Desesperado, eu diria.
Liguei para a Katie avisando que estava chegando e ela me recebeu na
porta, com os olhos inchados de tanto chorar certamente.
— Blake, levaram a minha filha. Quem poderia querer fazer mal a ela? —
Abraçou-me chorando compulsivamente. Tentei acalmá -la, mas naquele
momento nã o era a melhor pessoa para essa tarefa. — Liguei para a sua
mã e, pena que ela está viajando. Queria muito a minha amiga comigo
nesse momento tã o difícil.
Eu também queria que a mamã e estivesse aqui para apoiá -la.
Entrando na sala, eu me assustei com a quantidade de pessoas que
estavam lá , um aparato de equipamento estava montado e vá rios
policiais conversavam com o meu sogro, que veio me cumprimentar
assim que me viu.
Petrov estava conversando com um homem alto, que parecia ser o chefe
de toda essa operaçã o organizada.
— Blake, venha. Vou lhe apresentar o agente especial do FBI que
assumiu o caso, ele foi colega do Matteo em Harvard, está coletando toda
e qualquer informaçã o que possa nos ajudar a identificar o local onde a
Bea possa estar. — Vincenzo estava visivelmente destroçado.
— Daniel, este é Blake Lancaster, namorado da Beatrice.
— Daniel Mackenzie, por favor, sente-se, preciso fazer algumas
perguntas. — Sem demora, nos sentamos em volta de uma mesa com
vá rios mapas e inú meras anotaçõ es. Petrov também aproximou-se
cumprimentando apenas com a cabeça, certamente estava tã o nervoso
quanto todos nessa sala, principalmente por ter sido a ú ltima pessoa a
colocar os olhos em Beatrice.
Daniel me relatou tudo o que já tinham evoluído até aquele momento.
Pelas câ meras do aeroporto identificaram que a senhora que Beatrice
estava conversando, era ninguém menos do que uma das chefes da
quadrilha de contrabando de pedras preciosas, entã o a investigaçã o
estava indo nessa direçã o.
O FBI nã o estava envolvido apenas pelo fato de o Daniel ser amigo de
Matteo, mas por já existir uma investigaçã o estruturada há algum tempo
com o objetivo de prender toda a corja envolvida no tal trá fico espalhada
em diversos países.
— Depois que Matteo nos pediu uma ajuda em funçã o da desconfiança
de alguém estar seguindo sua irmã , começamos a investigar
detalhadamente, e o nome do ex-namorado dela apareceu como sendo
uma das pessoas que o FBI está investigando há quase um ano por
suspeita de possível envolvimento no contrabando de pedras preciosas.
— Quanto mais o agente relatava, mais eu ficava perplexo com tudo o
que estava ouvindo, parecia um enredo de um filme policial e nã o sobre
a vida da minha Beatrice.
Passamos algum tempo conversando, tentando nã o deixar passar
nenhum detalhe que poderia ajudar a polícia, Petrov, mesmo
extremamente constrangido, se sentindo culpado até pelo que
aconteceu, estava o tempo todo discorrendo sobre tudo, desde o
primeiro dia que foi designado para cuidar da segurança de Beatrice.
Percebi uma movimentaçã o na porta de entrada, uma conversa nervosa.
Quando me virei, eu dei de cara com Helena, que veio desesperada falar
comigo.
— Blake, que loucura é essa, o que aconteceu com a minha amiga? —
Abraçou-me, tremendo. — Precisamos fazer alguma coisa, as primeiras
horas de um sequestro sã o as mais importantes para pegarmos alguma
falha dos bandidos, nã o podemos ficar aqui parados. — A mulher
parecia um trem desgovernado, nem conseguiu sentar-se.
— Helena, tente se acalmar um pouco, respire. O agente do FBI deve
querer conversar com você. Tenta lembrar de algo que possa ajudar na
investigaçã o.
— Nã o consigo me acalmar, Blake, minha amiga corre risco de vida, nã o
posso ficar aqui parada esperando uma notícia.
— A senhorita é da polícia? — Ouvi a voz nada calma de Daniel, já de
prontidã o ao meu lado.
— Daniel, deixe-me apresentar Helena Nevicare, amiga de Beatrice que,
durante o ú ltimo mês enquanto ela estava na Suíça, ficou na direçã o da
empresa. Talvez ela possa contribuir com algo.
— Muito prazer, Daniel Mackenzie, agente especial do FBI. Sugiro que a
senhorita controle a sua ansiedade, precisamos que todos estejam
calmos para, juntos, tentarmos fechar alguma linha de investigaçã o que
possa ajudar a polícia.
— Muito prazer, Daniel Mackenzie, agente especial do FBI — repetiu toda
a frase de forma irô nica —, mas nã o tenho intençã o nenhuma de ficar
calma, precisamos agir o mais rá pido possível. — Percebi uma certa
animosidade instantâ nea entre os dois.
— Bom, seja como for, vou precisar que tente lembrar-se de qualquer
coisa que possa nos ajudar e agradeço por nã o atrapalhar o nosso
trabalho. — Daniel deu as costas para Helena e saiu em direçã o aos
policiais.
— Blake, quem esse imbecil pensa que é? — bradou, baixinho.
— Nena, por favor, todos estamos muito nervosos, nesse momento
precisamos unir forças para resgatarmos Bea o mais rá pido possível.
Daniel está focado nisso. — Tentei amenizar o clima que ficou bem
pesado depois que os dois se conheceram.
— Nã o fui com a cara dele, mas ok, você tem razã o. Acabei de me
lembrar de algo que pode ajudar, já faz algum tempo que eu e a Bea
compartilhamos a nossa localizaçã o através do celular. Será que eles nã o
conseguem rastrear pelo menos a direçã o para onde ela pode ter sido
levada?
— Com certeza pode ajudar. — Chamei Daniel observando Helena
retesar o corpo, mas fingi que nã o percebi. — Helena acabou de
informar que ela e a Beatrice têm o há bito de compartilhar a localizaçã o
através do celular, talvez isso possa ajudar.
Helena entregou o celular ao Daniel com um olhar de desdém, que
certamente foi percebido pelo homem.
— Qual a senha? — perguntou secamente.
— Lá no FBI eles nã o ensinam o bá sico da educaçã o? Um por favor seria
conveniente.
— Helena — guinchei sem paciência com essa provocaçã o descabida,
principalmente em um momento como esse.
Minha cara de poucos amigos certamente a fez recuar com sua
implicâ ncia. Na sequência, apó s digitar a senha fornecida por Helena,
Daniel voltou para a mesa cheia de computadores e equipamentos para
tentar conseguir alguma pista da minha mulher.
Percorri os olhos pela sala, estava tudo muito tenso, vi Katie e Vincenzo
em um canto completamente inconsoláveis, Helena se juntou a eles. Um
batalhã o de homens andando de um lado para o outro me deixava ainda
mais nervoso, estava me sentindo totalmente impotente. Kaleb acabou
ficando comigo mais um tempo, caso eu precisasse sair. No meu estado
nã o teria condiçã o de dirigir.
— Conseguimos identificar através da localizaçã o do celular que
Beatrice foi levada em direçã o a Nova Jersey, já acionamos a polícia de lá
e vamos fazer buscas por locais suspeitos, fá bricas, galpõ es
abandonados que podem estar sendo usados para o cativeiro. O
problema é que esse sinal a certa altura foi perdido, provavelmente os
bandidos se desfizeram do aparelho justamente para nos impedir de
rastrear tudo — Daniel anunciou.
A noite caiu e minha angú stia aumentou a níveis estratosféricos. Onde
está Beatrice? Nã o conseguia entender a motivaçã o para essa
barbaridade. Será que realmente tem relação com o contrabando de
pedras preciosas? Mas o que isso tem a ver com Bea? Ela só tinha
fornecedores idô neos, nã o conseguia identificar a correlaçã o das
suspeitas de Daniel com o trabalho dela.
— Matteo, meu querido, que bom que você chegou. — Katie abraçou o
filho que acabava de chegar e, pelo cabelo totalmente desalinhado, seu
emocional nã o estava diferente de nenhum de nó s. Cumprimentou-me
rapidamente e foi direto falar com Daniel. Nesse momento, meu celular
vibrou e por um instante pensei que poderia ser a Beatrice, mas era a
minha irmã .
— Liv — falei desanimado e com vontade de chorar.
— Blake, me diga que já localizaram a minha amiga! — berrou no meu
ouvido, ela sim, já estava aos prantos.
— Ainda nenhuma informaçã o, eu já estou desesperado. Tem uma
equipe de policiais cuidando do caso, mas ainda sem nenhuma novidade.
Irmã , eu nã o posso perdê-la. — Minha voz era só um chiado. Estava
tentando me manter estável, mas o fato é que estava quase desabando.
— Vamos ter pensamento positivo, ela será encontrada logo, estou aqui
rezando por isso. Eles já têm algum suspeito?
— A suspeita é que possa ter relaçã o com o contrabando de pedras
preciosas e há fortes indícios de que aquele Miguel possa estar
envolvido. Eu nunca fui com a cara daquele sujeito.
— Meu Deus, Blake, não é possível, ele parecia ser um homem sério. —
Minha irmã era muito ingênua à s vezes.
— Pois é, mas parece que ele estava sendo investigado há algum tempo.
Tem um agente do FBI, amigo do Matteo, que está à frente de toda
operaçã o e está seguindo nessa linha de investigaçã o. O pior é que os
sequestradores ainda nã o entraram em contato, nã o houve pedido de
resgate, toda essa espera está corroendo minha alma. Fico só pensando
nas condiçõ es que ela pode estar nesse momento: se a machucaram, se
está ferida.
— Não fique pensando essas coisas, Blake, isso vai te deixar mais nervoso
ainda — Olívia tentou me acalmar, sem sucesso.
— O segurança dela, que estava chegando no aeroporto quando tudo
aconteceu, ainda conseguiu ver que eles a colocaram em uma cadeira de
rodas para facilitar o deslocamento, e pela falta de atitude de Bea, ele
afirma que ela pode ter sido dopada. Só de pensar nisso, eu quero matar
com minhas pró prias mã os esses filhos da puta que levaram a minha
mulher.
— Queria muito estar aí com você e tia Katie, principalmente porque a
mamãe está fora. Ela está nervosíssima também, me ligando a cada
instante.
— Liv, vou ter que desligar. Matteo está me chamando. Se tiver alguma
novidade, eu te aviso.
Despedi-me de Olívia e fui ao encontro de Matteo, que conversava com
Daniel e na minha cola estava Helena, pelo menos dessa vez permaneceu
de boca fechada, nã o estava com paciência para novos embates entre ela
e o FBI.
— Blake, Daniel quer saber quem tinha conhecimento da viagem de Bea
para a Suíça, pois me lembro de que, quando nos despedimos por
telefone, uma das coisas que ela comentou foi que em funçã o da suspeita
de estar sendo seguida, sua viagem ficaria mais discreta — Matteo
inquiriu algo que ainda nã o tinha pensado.
Como os bandidos descobriram que a Bea chegaria naquele momento?
— De fato, nó s mantivemos essa viagem em segredo. Além da sua
família, minha irmã sabia, a pró pria Bea foi quem comentou, a Helena
que ficou tomando conta da empresa dela, nem meus pais ficaram
sabendo.
— Você comentou com alguém? — Daniel direcionou a pergunta para
Helena, que o fuzilou com os olhos.
— É ó bvio que nã o comentei com ninguém, nos falávamos diariamente e
nossas reuniõ es eram de portas fechadas. Nem Petrov sabia o destino de
Bea.
— O que foi, Blake? Você ficou estranho de repente, lembrou-se de mais
alguém que poderia saber o destino da minha irmã ?
— Lembrei, Matteo, mas acho que é loucura da minha cabeça. Estou tã o
cansado e nervoso, que já estou até criando coisas. — Estava me
sentindo o pior dos homens naquele momento.
— Blake, se lembrou algum fato novo, nos diga, nada pode ser
desconsiderado nesse momento — Daniel alertou.
— Eu e a Bea sempre nos falávamos por mensagem. Um dia estava na
sala de descanso dos médicos e comecei a ouvir uma mensagem dela,
onde, entre outras coisas, dizia que os Alpes estavam começando a
esfriar e que naquele momento estava bebendo uma caneca de chocolate
quente.
Parei pensativo por alguns segundos quando a impaciente Helena se
manifestou:
— E daí, Blake? Continue.
Daniel a olhou censurando.
— Foi nesse momento que Lucy, minha ex-mulher, entrou na sala e ouviu
o final da gravaçã o. Até fiquei surpreso por ela estar ali naquele instante,
pois até onde sabia, tinha sido afastada do trabalho por recomendaçã o
médica.
— Ela falou algo que o levou a pensar na possibilidade de sua ex
identificar onde a Beatrice estava? — Daniel quis saber, sua cabeça já
maquinava algo.
— Ela disse: “A sua namoradinha vai perder aquele corpinho com tanto
chocolate quente, em breve estará rolando de gorda”. Eu fingi que ela
nã o disse nada e apenas mudei de assunto.
— Resolvido, já sabemos como os bandidos descobriram que Bea estava
na Suíça — Helena falou eufó rica, ganhando a nossa atençã o,
principalmente de Daniel, que a olhou furioso.
— Posso saber como a ilustríssima detetive chegou a essa conclusã o? —
Claro que o agente do FBI a alfinetou.
— Blake, lembra que algum tempo atrá s eu encontrei Lucy almoçando
com Miguel, achamos muito estranho, até porque eles mal se
conheciam?
Confirmei com a cabeça.
— Conclua seu raciocínio, srta. Sherlock. — Daniel estava brincando
com fogo.
— Algo me diz que eles estã o em algum tipo de complô e a Lucy pode ter
comentado esse episó dio dos Alpes com Miguel, a partir daí foi fá cil. Ele
sabia que a Bea estava fazendo uma coleçã o nova para uma joalheria
suíça e, entã o, concluiu que ela só poderia estar lá .
— Faz sentido — Daniel finalmente concordou com Helena, que lhe
lançou um olhar de superioridade o desafiando ainda mais. — Me passe
o nú mero do celular da Lucy, vou pedir a autorizaçã o para quebra de
sigilo, pois suspeito que, se a abordarmos, será mais difícil saber se
existe uma conexã o entre ela e o tal Miguel. Você tem a data exata que
isso aconteceu, Blake?
— Tenho sim, é só olhar aqui no aplicativo de mensagens. Do jeito que a
Lucy vem se comportando nos ú ltimos tempos, eu nã o duvido de mais
nada.
A dor de cabeça que sentia nã o era normal, meu corpo estava pesado,
nã o conseguia abrir os olhos. Onde estou? Parecia que estava em um
carro em movimento. Escutava vozes bem longe. Estava com muito sono.
Ouvi um barulho forte, tentei abrir os olhos, mas era impossível, nã o
conseguia me mexer direito porque o espaço era pequeno. Meus pulsos
estão amarrados? O que está acontecendo? Estou enjoada.
Parecia que alguém me pegou no colo. Nã o tinha controle dos meus
movimentos. Precisava ligar para Blake. Sentia cheiro de cigarro. Que
sono é esse?
Havia um barulho de á gua gotejando, era uma tortura esse som. Que
cheiro horrível é esse? Algo ú mido, mofo, nã o sabia. Ainda estava meio
atordoada, minha pele estava em algo grosso, me espetando, nã o estava
na minha cama. Meu corpo todo doía, meu olhos estavam muito pesados.
Sede, tinha muita sede. Onde estou? Tentei mudar de posiçã o, mas nã o
obtive sucesso. Parecia que alguém estava falando comigo. Que diabos
está acontecendo?
— Senhorita riquinha, acorde. Seu jantar cinco estrelas acabou de
chegar. — Senti mã os grosseiras me sacudir.
Aos poucos abri os olhos, que ardiam intensamente. Estava toda
encolhida, o lugar era frio e cheirava mal. A luz do ambiente era precá ria,
vi o vulto de um homem magro, com um cigarro na mã o, nã o consegui
ver seu rosto.
— Vamos, acorde, você já dormiu demais, está pensando que isso aqui é
um resort, e você está de férias, minha querida?
Consegui finalmente me sentar, meu enjoo era muito forte, precisava
beber á gua.
— Á gua. — Minha voz saiu quase como um lamento. — Onde estou? O
que aconteceu?
— Aqui está á gua e um pã o, sinta-se privilegiada, pois normalmente só
liberamos á gua, mas, como sou bonzinho, resolvi te dar esse pã ozinho.
Nã o está fresquinho, como normalmente a riquinha está acostumada,
mas por ora vai servir.
— Quem é você? Por que estou aqui? — A consciência estava voltando e
junto com ela o pavor percorrendo todo o meu corpo. Puxei as minhas
pernas para junto do corpo e me encostei na parede gelada atrá s das
minhas costas.
— Você vai passar uma temporada aqui junto comigo e com meu amigo
que está lá fora, podemos nos divertir bastante se você prometer se
comportar.
Meu sangue gelou.
Meu Deus, fui sequestrada! Imediatamente me veio a lembrança de estar
chegando no aeroporto. Recordei-me do rosto de Petrov, logo depois a
picada na minha cintura. Eu fui dopada.
— Por que fui sequestrada, quem está por trá s disso? O que querem de
mim? — As lá grimas desceram pelo meu rosto, sem que eu conseguisse
controlar.
— Chega de drama, nã o gosto de mulher fresca. Pelo que estou vendo,
você é uma daquelas riquinhas que nasceram em berço de ouro. Sinto te
dizer que por aqui este será o melhor tratamento que você terá e fique
agradecida por eu nã o te deixar amarrada e amordaçada.
O infeliz jogou o cigarro no chã o, pisou em cima para apagar e saiu em
seguida me deixando ali, amedrontada e sem saber por qual motivo tudo
isso estava acontecendo.
Bebi a garrafa de á gua quase toda, estava com muita sede, olhei para o
pã o seco, mas nã o comi, nã o sentia fome, só um enjoo insuportável.
Provavelmente efeito da droga que eles me deram. Tentei me levantar,
mas nã o consegui me erguer, sentia-me muito fraca.
Tentei recapitular tudo o que aconteceu até o momento que senti a
tontura. No aeroporto de Zurique encontrei aquela senhora simpá tica,
ficamos conversando até o embarque. O voo foi tranquilo, dormi o
tempo todo. Quando cheguei em Nova Iorque, lembrei-me de que
mandei mensagem para a mamma e para o Blake.
Depois que peguei as malas, já no saguã o do aeroporto, vi Petrov
chegando apressado e foi nesse momento que a senhora simpá tica me
abordou para se despedir, foi exatamente nesse instante que fui dopada.
A picada que senti deve ter sido de uma agulha. Maldita, aquela bandida
com cara de santa deve estar envolvida nisso. Mas por qual motivo me
sequestraram? Aquela sensaçã o de estar sendo seguida algum tempo
atrá s fez todo o sentido agora, eu realmente era um alvo. Mas como
descobriram que eu estava fora do país e, pior, sabiam o dia exato do meu
retorno, mas espera... raciocina Beatrice. Encontrei a tal senhora
dissimulada ainda na Suíça, entã o seja lá quem esteja por trá s disso,
sabia onde eu estava e certamente, acompanhava todos os meus passos.
A essa altura, minhas lá grimas secaram, eu só pensava em bolar algo que
me livrasse desses bandidos. Com certeza, Petrov viu tudo o que
aconteceu, lembrei-me perfeitamente do seu olhar apreensivo, foi a
ú ltima coisa que me recordei antes de apagar. Minha família já deve estar
atrás de mim. Será que os bandidos já pediram resgate?
Respirando fundo, buscando me controlar, tentei levantar-me uma e
outra vez, mas nã o conseguia me manter em pé, caindo na superfície
dura que eu estava deitada. Fiquei quieta com a intençã o de ouvir
alguma conversa, algum ruído que pudesse me dar pistas, mas estava
tudo muito silencioso, o lugar onde estava tinha apenas uma janela que
estava fechada e protegida por uma grade, a porta por onde o maldito
saiu e outra porta que imaginei ser um banheiro. Estava quase
totalmente no escuro, a claridade vinha apenas dos buracos na janela
indicando que ainda era dia e a parca luz que entrava por baixo da porta.
Depois de algum tempo, eu me forcei a levantar novamente, dessa vez
firmei o corpo e consegui dar alguns passos. Precisava ir ao banheiro. O
lugar nã o era dos piores e, como tinha uma janelinha de vidro, nã o era
totalmente escuro e tinha até papel higiênico. Consegui fazer xixi me
equilibrando, segurando na pequena pia e obviamente evitando sentar-
me no vaso. O fio de á gua que saía da torneira me ajudou a acordar,
molhei o rosto e o pescoço. Precisava ficar acordada e em alerta.
Andei devagar até a porta colando meu ouvido nela, tentando
desesperadamente descobrir qualquer coisa, escutei um celular tocando
e uma voz que nã o foi a mesma do homem que me trouxe a á gua,
quando começou a falar. Parecia que ele chegou mais perto de onde eu
estava, pois consegui ouvir melhor a conversa.
— Sim, ela acordou, mas ainda está grogue. Parece que a parada que
deram a ela foi das boas, a riquinha só acordou depois de uns bons
solavancos. Não tocamos nela, já sei que é mercadoria da boa. A
desgraçada é bonita demais, tô doido pra mostrar a ela como o papai aqui
sabe fazer uma mulher gritar.
Escutar essa conversa só me deixou mais nervosa e com medo, mas nã o
podia fraquejar agora. Precisava continuar ouvindo.
— E o doutor, vem aqui? A madame vem também? Pode deixar. Daqui a
pouco vou lá dar uma olhada nela.
O desgraçado se distanciou e eu acabei nã o ouvindo o final da conversa.
Mas deu para entender que havia um cara envolvido, que ele chamou de
doutor, a tal madame devia ser a pilantra que me abordou no aeroporto.
Minha cabeça latejava, achei que era fome. Terei que comer aquele pã o
seco, afinal, se tiver oportunidade de fugir, precisava ter forças para
correr.
Voltei para a superfície dura que provavelmente eles achavam que era
uma cama, bebi um pouco mais de á gua e comecei a comer o pã o bem
devagar. Depois de algum tempo, a porta se abriu e dessa vez foi um
homem de estatura mediana e bem corpulento que entrou, usava um
lenço na altura do nariz, para esconder o rosto, só consegui ver seus
olhos. Maldito!
— Mandaram te dar essas frutas, nunca vi um tratamento VIP desse por
aqui, a riquinha deve ser bem valiosa. Trata de comer, nã o quero
reclamaçã o depois.
Colocou no chã o um prato com algumas bananas e mais uma garrafa de
á gua. Depois que ele saiu trancando a porta, peguei as bananas e
finalmente comi com gosto, devorei duas, ao contrá rio do pã o horroroso,
a fruta estava ó tima.
Precisava raciocinar. Pense, Bea. Esse local deve ser onde eles
normalmente deixam as pessoas que são sequestradas, então será que é
uma quadrilha de tráfico de pessoas? Preciso fugir daqui.
Depois que deixaram as frutas, ninguém mais apareceu e acabei
pegando no sono. Estava exausta.
Finalmente conseguirei o dinheiro para pagar a minha dívida com a
maldita quadrilha. Se Beatrice nã o tivesse terminado comigo, a essa
altura nó s já estaríamos casados e o plano da Madame em me
transformar no seu homem de confiança já estaria em andamento, já
que eu teria mais uma á rea de contrabando de pedras preciosas na
minha mã o e tudo através dos contatos da italianinha. Tã o ingênua e
sonhadora, jamais perceberia que montaria minha rede de distribuiçã o
através da sua empresa idô nea, ninguém desconfiaria.
Aquele maldito agente do FBI, o tal Mackenzie, foi mais á gil e conseguiu
interceptar a operaçã o mais valiosa dos ú ltimos tempos e que estava sob
minha responsabilidade. Um lote gigantesco de belas pedras estava
sendo trazido da América do Sul e seriam distribuídas na Europa.
Desgraçado, isso quase custou a minha vida.
A ideia de sequestrar Beatrice e pedir um resgate milioná rio para a sua
família foi brilhante e ainda tive uma ajudinha extra da tonta da Lucy,
que nã o percebeu absolutamente nada. Foi totalmente envolvida na
minha conversa de homem apaixonado querendo reconquistar o amor
da sua vida. Suas intençõ es também nã o foram nada nobres. Quando
soube que o ex-marido estava envolvido com a Beatrice, a pilantra nã o
poupou esforços para atrapalhar a vida do casal feliz.
Agora tudo teria que ser milimetricamente calculado, nã o gostaria de ter
que eliminar Beatrice, mas, se algo desse errado, ela nã o seria poupada.
Eu nã o serei mais uma vez prejudicado, tinha que assumir o meu posto
ao lado da chefona.
A minha vida estava em jogo, agora era tudo ou nada. Nã o terei uma
nova chance. Dessa vez, a Madame quis lidar pessoalmente com o
sequestro de Beatrice, disse que sua cara de senhora inocente seria um
trunfo e nã o levantaria suspeitas. A mulher era uma raposa mesmo,
conseguiu enredar a doce Beatrice em uma conversa bonita sem
levantar nenhuma suspeita.
A partir do momento que Lucy me passou a informaçã o de que Beatrice
estava na Suíça, o plano começou a ser desenhado. Nã o foi difícil
descobrir onde ela estava hospedada, só que dessa vez o hijo de puta30
que foi designado para ficar em seu encalço, era mais ardiloso e nã o
deixou que ela percebesse que estava sendo vigiada o tempo todo.
Quase que aquele russo conseguiu atrapalhar toda a açã o, ainda bem
que já previa que ele estaria de prontidã o no aeroporto e uma equipe foi
incumbida de atrapalhar a vida dele, impedindo que ele protegesse sua
patroa.
O fato é que teríamos que colocar a segunda parte do plano em açã o.
Beatrice estava bem escondida e nã o poderia reclamar que estava sendo
maltratada, autorizei pequenas regalias que estava fora do nosso escopo
normal de atuaçã o, mas abri essa exceçã o em nome dos bons tempos
que passamos juntos. Todo o esquema de contato para solicitar o resgate
já estava pronto. Agora precisávamos agir.
Passamos toda a noite reunidos na casa da família Tomarolli, todos
estavam muito ansiosos por notícias, aguardando algum contato dos
sequestradores. Esse silêncio estava nos matando, mas Daniel disse que
era comum nesses casos, a intençã o era deixar a família da vítima
completamente sem notícias, a tensã o ia piorando a cada hora e, quando
eles finalmente faziam contato, a família já estava totalmente
desesperada, cedia a tudo que eles pediam. A ú nica coisa que precisava
era a Beatrice de volta ao meu lado, para sempre.
Durante a madrugada, precisei medicar a Katie, a pressã o arterial dela
subiu muito, pelo menos agora conseguimos que ela dormisse um
pouco, até Helena que era elétrica estava desolada em um canto da sala,
rezando sem parar, seus olhos estavam vermelhos pela noite perdida e
de tanto que chorou.
— Blake, nossas suspeitas se confirmaram. — Daniel veio ao meu
encontro, chamando a atençã o de Matteo e Helena, que se aproximaram
também. — Foi a sua ex-mulher que deu a localizaçã o de Beatrice para
Miguel. Conseguimos identificar a mensagem que ela enviou para ele,
inclusive com a resposta dele quando confirma que sabia o que ela foi
fazer na Suíça.
— Desgraçado, eu vou acabar com esse infeliz! — Matteo esbravejou e
foi contido pelo seu pai.
— Calma, filho, precisamos ter a cabeça fria neste momento. E agora,
Daniel, qual o pró ximo passo? — Meu sogro era o ú nico que
demonstrava ter um pouco de sanidade.
— Gostaria de conversar com a Lucy o mais urgente possível, talvez ela
possa nos dar alguma pista de onde o Miguel possa estar agora, já que o
celular que ele usou para trocar mensagens com ela nã o está mais ativo.
Ele seguramente deve ter vá rios nú meros, dificultando assim de rastreá -
lo.
— Eu vou ligar para o pai dela, explicar toda a situaçã o, ele nos ajudará
sem dú vida alguma. Só temos que ter um certo tato para falar com ela,
pois está grávida. — Claro que Daniel se espantou com a informaçã o,
contudo foi discreto e nã o emitiu nenhuma palavra.
Nã o acreditava que a Lucy se envolveu com esse bandido, e ainda
facilitou toda essa crueldade contra a Beatrice. Distanciei-me do grupo e
liguei para o Andrew, que me atendeu no primeiro toque.
— Blake, aconteceu algo? Você nunca me liga tão cedo. — Sua voz era de
sono, mas percebi que ficou preocupado.
— Andrew, me desculpe, sei que é ainda muito cedo, mas é uma
emergência. A Beatrice foi sequestrada — falei sem rodeios, ao mesmo
tempo que ouvi um ruído que parecia ser o farfalhar de um lençol, ele
realmente ainda estava deitado.
— Que loucura é essa que você está me dizendo, em que posso te ajudar?
— A situaçã o ainda é mais delicada e vou precisar muito da sua ajuda. —
Passei os minutos seguintes dando uma versã o resumida do cená rio e,
quando informei que o FBI já tinha confirmado que foi a Lucy quem deu
a localizaçã o da Beatrice, meu ex-sogro ficou chocado, mas informou que
Lucy estava em casa e ele se responsabilizaria por ela até que
chegá ssemos para confrontá -la.
Passei a informaçã o para Daniel, já avisando que eu o acompanharia, eu
precisava olhar dentro dos olhos da Lucy, saberia se ela tentasse
esconder algo, além disso, queria entender o motivo que a levou a
participar de toda essa loucura.
Antes de sairmos, Helena nos trouxe um café forte, que chegou em boa
hora, só me dei conta nesse momento que minha ú ltima refeiçã o foi
ontem antes da cirurgia.

Como avisei ao Andrew por mensagem que já estávamos chegando, foi o


pró prio que abriu a porta. Estava com uma expressã o tensa, mas
imediatamente nos guiou até o local onde Lucy estava degustando seu
café da manhã alheia a tudo. Quando me viu, assustou-se quase
cuspindo o suco que estava bebendo.
— Blake, o que faz aqui a essa hora da manhã ? — Seus olhos vagaram de
mim para Daniel de maneira curiosa.
— Como vai, Lucy? Viemos aqui conversar com você, esse é Daniel
Mackenzie, agente especial do FBI.
— Agente do FBI? Nã o estou entendendo, o que vocês têm para
conversar comigo?
— Nã o vou fazer rodeios, serei direto. Beatrice foi sequestrada ontem,
temos fortes indícios de que o Miguel está por trá s disso e já temos a
confirmaçã o que foi você que o avisou onde ela estava.
Sabia que ela estava grávida de um filho meu, poderia até abordá -la de
maneira mais delicada, mas ela estava diante de dois médicos. Caso
sentisse algo, agiríamos imediatamente. Como eu acompanhava sua
gravidez de perto, sabia que ela estava saudável. Só seu psicoló gico que
merecia ser observado.
— Que maluquice é essa, Blake? Você está me acusando de estar
envolvida no sequestro da sua namoradinha? — A ironia estava clara em
sua voz e no comentá rio.
— Minha filha, ninguém está a acusando de nada, queremos apenas que
você explique o motivo pelo qual você informou ao tal Miguel que a
Beatrice estava na Suíça. — Paciência nunca foi uma característica do
pai da Lucy e deu para perceber que ele estava se segurando para nã o
explodir com sua filha, que insistia em se fazer de sonsa.
— Pai, sou completamente inocente, meu ú nico erro foi sim informar ao
Miguel o paradeiro da Beatrice. O homem estava nervoso, me disse estar
disposto a tudo para tê-la de volta, passou dias praticamente chorando,
implorando por notícias dela.
— Mas você sabia que eu e a Bea estávamos juntos. — Alterei a voz
pronto para explodir, mas Daniel sabiamente interveio me impedindo de
colocar tudo a perder, afinal ela poderia se fechar e nã o nos esclarecer
nada.
— Senhora, cada minuto que permanecemos conversando aqui, estamos
perdendo tempo, a vida da srta. Tomarolli está em perigo e gostaríamos
que nos passasse toda e qualquer informaçã o que possa nos ajudar a
descobrir para onde a levaram.
— Eu e o Miguel nos tornamos amigos, faz pouco tempo, nos
encontramos casualmente em um restaurante e, a partir daquele dia,
eventualmente ele me ligava, saímos algumas vezes para jantar, mas sua
intençã o sempre foi de reconquistar a Beatrice, foi ele quem me disse
que ela e o Blake estavam juntos. — Finalmente Lucy resolveu colaborar.
— Qual foi a ú ltima vez que vocês se conversaram? Ele deixou escapar
alguma coisa? — questionei, agora tentando parecer mais calmo.
— Faz uns dois dias que ele me ligou me convidando para jantar, mas eu
estava indisposta e recusei o convite. Ontem tentei falar com ele, mas o
nú mero do seu celular estava fora de á rea ou algo assim.
— Maldito, ele armou tudo direitinho. — Nesse momento, o celular de
Daniel vibrou, depois que ele atendeu, nos disse que precisava ir e eu
entendi que poderia ser alguma notícia da Beatrice.
— Lucy, se você se lembrar de algo, qualquer coisa que seja, por favor,
me ligue. Estamos correndo contra o tempo.
Ela nã o disse nada, mas confirmou com a cabeça, parece que enfim
entendeu o quã o grave era o momento.
Nos despedimos e saímos apressadamente em direçã o à casa dos pais da
Beatrice. A ligaçã o que Daniel recebeu informava que a polícia de Nova
Jersey percebeu algumas atividades suspeitas em um galpã o
abandonado a mais ou menos 80 quilô metros de Nova Iorque.
Enquanto eu dirigia feito um louco o carro de Vincenzo, pois o meu tinha
deixado no hospital no dia anterior, Daniel fazia inú meras ligaçõ es. Eles
estavam tentando mapear toda a á rea e cercar tudo, para evitar
qualquer fuga inesperada.
— Daniel, ainda bem que você chegou, precisamos agir rá pido antes que
os bandidos percebam que já sabemos a localizaçã o e fujam com minha
irmã . — Matteo mal respirava.
— Pessoal, por favor, gostaria de pedir um pouco de calma. Sei que isso é
quase impossível, mas precisamos de tranquilidade agora, vamos definir
a melhor estratégia de abordagem, sem colocarmos a Beatrice em risco.
— Estou ficando louca com essa espera, minha amiga deve estar
sofrendo muito. Por favor, me deixem ajudar — Helena se manifestou
profundamente abalada.
— O melhor que pode fazer é acalmar-se e nos deixar fazer o nosso
trabalho, tenha certeza de que eu só sossegarei quando resgatar
Beatrice, sã e salva — Daniel praticamente rosnou, em seguida deu as
costas e foi encontrar sua equipe que já estava se aprontando para sair.
— Mas é muito grosso esse Daniel, eu poderia sim ajudar.
— Nena, minha querida, sente-se aqui comigo, você precisa comer algo.
Todos estamos muito nervosos, mas Deus protegerá a minha filha, tenho
fé de que nã o demora e ela cruzará aquela porta.
Katie sempre muito sensata, já recuperada do pico de pressã o, pegou
Helena pela mã o levando-a para outro ambiente. As farpas que ela e
Daniel trocavam quando estavam juntos eram impressionantes, foi ó dio
à primeira vista.
No final da tarde, o celular do pai da Beatrice tocou e foi aquela tensã o.
Já estávamos na expectativa dos sequestradores ligarem, todos os
celulares estavam grampeados com o objetivo de identificar a origem da
ligaçã o.
A sala ficou em um silêncio sepulcral. No terceiro toque, Vincenzo
atendeu.
— Alô !
— Ouça com atenção. — Uma voz metalizada estourou no viva-voz. —
Estamos com sua filha, se quiser que ela volte para casa, será necessário o
pagamento do resgate no valor de vinte milhões de dólares. Você tem até
amanhã no final do dia para providenciar o dinheiro. Hoje à noite, ligarei
novamente para dar as instruções de como esse dinheiro será entregue.
Entendido?
— Entendido, mas preciso de uma prova que minha filha está viva. Por
favor, nã o a machuque — Vincenzo estava muito nervoso, mas sua voz
foi firme.
— Não se preocupe que a riquinha está sendo bem tratada. Vou
providenciar a prova solicitada, mas adianto que, se a polícia estiver
envolvida, você receberá sua filha em pequenos pedacinhos. Não tente nos
enganar.
E assim o desgraçado desligou. O FBI identificou que a ligaçã o foi feita
da Alemanha. Eles tinham uma estrutura bem montada para despistar a
polícia. Katie voltou a chorar e foi amparada por Helena, que a tirou da
sala. Ela nã o precisava participar dessa confusã o toda, principalmente
depois de ter se sentido mal durante a madrugada.
Imediatamente Matteo e seu pai acionaram o banco da família.
Conforme Daniel explicou, a partir deste momento, nos dividiremos em
duas frentes: a família providenciando o valor para pagar o resgate e o
FBI correndo contra o tempo para descobrir onde a Beatrice estava.
Toda a atençã o estava voltada para a equipe que traçava um plano
estratégico para o resgate da minha mulher. Ao mesmo tempo que se
comunicava com a equipe que já estava em campo, Daniel orientava o
pessoal que partiria com ele. Foi aí que decidi que também estaria com
eles e que ninguém tentasse me dissuadir do meu propó sito.
Quando todos estavam prontos para partir, armados até os dentes,
apressei-me para acompanhá -los, mas Daniel percebeu de imediato
minha intençã o e quis me barrar.
— Sinto muito, doutor, essa é uma operaçã o arriscada e você nã o poderá
nos acompanhar. O foco é resgatar Beatrice e você estando lá pode nos
atrapalhar, eu os manterei informados de tudo.
— Daniel, você pode falar o que você quiser. Se você nã o me levar junto,
eu o seguirei, ninguém me impedirá de ir ao encontro da Beatrice.
— Blake, é muito arriscado, pode haver troca de tiros, nã o sabemos
quantos deles estarã o lá . Nã o acho que seja uma boa ideia.
— Daniel, é melhor você levá -lo. Se fosse a minha mulher faria a mesma
coisa.
— Obrigado, Matteo, eu nã o vou me colocar em risco e nem vou
atrapalhar a operaçã o, mas quero estar lá quando resgatarem a Bea —
argumentei mais uma vez.
— Ok, Blake, mas você terá que ficar no carro e, se quiser dar uma de
heró i, lembre-se de que você poderá colocar tudo a perder. Petrov ficará
com você, assim ele garante que você nã o fará nenhuma besteira.
— Pode deixar. Ficarei no meu canto. — Despedi-me dos pais de
Beatrice e de Helena e parti com Daniel, sua equipe e Petrov, que já
estava totalmente integrado com o FBI.
Quando estava entrando no carro recebi uma ligaçã o de Andrew
informando que, depois que saímos da sua casa, a Lucy ficou catatô nica,
dizendo coisas sem sentido. Entã o ele a levou para o hospital, mas me
tranquilizou informando que ela já tinha sido medicada e que estava
tudo bem com o bebê.
Meu Deus, quando tudo isso vai acabar?
Fizemos o percurso até pró ximo do local onde supostamente seria o
cativeiro em tempo recorde, aproveitei esse intervalo para mandar uma
mensagem para a Olívia e para a minha mã e, que nã o paravam de ligar
para saber notícias. Obviamente escondi o fato de estar em diligência
com o FBI indo resgatar Beatrice, elas surtariam e tentariam me impedir
a todo custo.
Daniel me disse que identificaram também, através da companhia
telefô nica, vá rias ligaçõ es de celular registradas na regiã o onde o galpã o
suspeito estava localizado. Já tinha mais de uma hora que tínhamos
chegado ao lugar e todos estavam taticamente posicionados, só
aguardando o momento certo de invadir o galpã o.
Horas já tinham passado e eu já estava ficando desesperado, quando
finalmente Daniel recebeu alguma informaçã o pela escuta e me avisou
que tinha chegado a hora.
— Blake, você ficará aqui, por favor, se mantenha invisível, vamos trazer
sua mulher em breve. Você sabe usar uma arma?
Mesmo que nã o soubesse, naquele momento responderia que sim.
— Sei sim, tenho porte de arma e já fiz vá rios treinamentos — afirmei,
entã o ele colocou em minha mã o uma Glock 43X.
— Blake, só use caso tenha que defender a sua vida, isso aqui nã o é um
filme, nã o poderá refazer a cena, se algo nã o der certo.
Confirmei com a cabeça e ele deixou o carro junto com seus homens.
O sol já estava quase se pondo, minha adrenalina estava em um nível
inimaginável, nenhuma movimentaçã o, tudo extremamente silencioso,
isso nã o poderia ser um bom sinal. Minha cabeça já estava presumindo o
pior.
Estava tentando me acalmar, caso contrá rio nã o levaria em consideraçã o
as recomendaçõ es de Daniel e iria pessoalmente arrancar Beatrice das
garras desses malditos. Ainda nã o fiz isso por medo de colocar toda a
execuçã o do plano em risco.
Depois que a ligaçã o foi feita para o pai de Beatrice, eu resolvi ir no
mesmo instante para o cativeiro produzir a tal prova de vida, para a
minha surpresa a Madame resolveu ir junto.
— Madame, nã o precisa se arriscar indo ao cativeiro comigo, pode
deixar que resolvo tudo.
— Miguel, nã o confio em você, a cada dia que passa só enxergo sua
incompetência. A operaçã o só está tendo sucesso porque eu me envolvi
pessoalmente, já tive muito prejuízo com seus vacilos, tenho que
garantir que nada dê errado. O dinheiro do italiano vai cobrir o rombo
que você deixou com aquela açã o malsucedida, que estava sob sua
responsabilidade.
— Já conversamos sobre isso, as coisas nã o deram certo por conta do
FBI estar na nossa cola, tudo o que eu fiz estava dentro no planejado —
contra-argumentei. Essa bandida nã o ia me humilhar mais uma vez.
— Mas você foi incapaz de prever os riscos, muito amadorismo.
Maldita velha, depois que me livrar dessa dívida, essa desgraçada ainda
vai me jogar isso na cara eternamente.
— Chega de conversa, Miguel, nã o temos o dia todo. Apresse-se.
Entramos no carro com os seguranças e saímos em direçã o ao maldito
cativeiro.
Parecia que eu passaria mais uma noite nessa tortura. Tinha certeza de
que estava acontecendo alguma coisa, os celulares dos homens lá fora
tocavam a todo instante e eles falavam alto como se estivessem
discutindo com alguém, mas nã o conseguia entender o que estavam
falando, a ú nica coisa que ficou claro era que algumas pessoas estavam
vindo para cá , provavelmente os mandantes do sequestro.
Minha mãe deveria estar destruída, coitada. Será que já pediram algum
resgate? Eu nã o aguentava mais, estava fraca, a comida que eles
trouxeram mais cedo tinha um cheiro horrível, possivelmente colocaram
algo para me deixar dopada. Achei melhor nã o comer nada, joguei tudo
no vaso sanitá rio e dei descarga. Fingirei que nã o estou bem, entã o serei
uma vítima inofensiva.
Como estavam vindo para cá , achei melhor começar minha encenaçã o.
— E aí, riquinha? Pelo visto, já está se acostumando com a comida do
nosso chef francês, comeu tudo. Que beleza.
Olhei para o infeliz que estava com o lenço protegendo o rosto, mal abri
os meus olhos, seguindo com o meu plano de sobrevivência. Nã o dei
uma palavra e me encolhi em posiçã o fetal.
— Tá tudo bem aí, dona? — insistiu. Mas permaneci quieta.
Passado algum tempo, horas talvez, ouvi de longe o barulho de um carro
se aproximando, portas batendo e mais conversas, sem conseguir
identificar nada.
A porta foi aberta inesperadamente e pude ver a silhueta de um homem
alto, que usava uma espécie de má scara de esqui que cobria toda a
cabeça e o rosto, deixando só os olhos à mostra. O medo me consumiu
naquele instante. Um dos homens que sempre estava aqui, entrou
também na sala e me deu um jornal.
— Segure o jornal e leia o que está escrito aqui. Você está meio
sonolenta, mas tenho certeza de que consegue. — Mostrou-me uma
folha de papel com algumas frases. Imediatamente entendi do que se
tratava. — Leia devagar, vamos fazer um filminho para a sua rede social.
— O desgraçado ainda debochou.
O homem que entrou primeiro, pegou uma lanterna e mirou no meu
rosto, e na outra mã o ligou a câ mera do celular. Fiz os movimentos
lentos, para eles acharem que de fato eu continuava meio sedada, entã o
comecei a ler o que estava escrito no papel imundo.
— Papà, por favor, pague o valor que eles pediram. Me tirem daqui, nã o
aguento mais. O local onde estou está totalmente protegido, nã o acione a
polícia. Eles vã o me matar se nã o pagar o resgate.
Que estranho, eles sabem que sou de origem italiana, mas como sabem que
eu chamo o meu pai de papà ? Antes de sair, o homem de má scara, olhou
nos meus olhos e senti um arrepio. Vi algo familiar, mas nã o consegui
identificar o que exatamente me chamou a atençã o.
Alguns minutos depois começou uma movimentaçã o estranha, ouvi um
estrondo forte, depois vá rios tiros, gritos e passos apressados. De
repente, a porta se abriu e o homem mascarado me pegou pelo braço,
me puxando violentamente. Obrigou-me a correr e saímos passando por
uma espécie de galpã o, com inú meras caixas, de longe continuava
ouvindo vá rios tiros.
O homem amarrou uma corda nos meus pulsos com uma habilidade
impressionante e começou a me puxar bruscamente. Cruzamos uma
porta que deu para um matagal, ele começou a correr e eu resolvi gritar,
assim alguém poderia identificar onde eu estaria.
— Cale essa maldita boca ou acabo com você aqui mesmo.
Eu conheço essa voz... Não pode ser. Meu Deus, é o Miguel!
— Socorro! — berrei mais uma vez.
Entã o ouvi um estampido e, quando olhei para o lado, o infeliz tinha sido
atingido na perna, mas continuava me puxando. Aproveitei que ele
estava se contorcendo de dor e dei um solavanco na corda, fazendo-o
cambalear.
— Hija de puta. Eu ainda quero o dinheiro do seu papà. Se nã o fosse isso,
te apagava agora mesmo.
— BEATRICEEEEE! — Ouvi de longe alguém gritando o meu nome.
Parecia a voz de Blake. Não é possível, ou é?
— Abaixe-se, e, se der um pio, te garanto que será a ú ltima coisa que
você fará .
Nã o tinha mais dú vida, esse bandido era o Miguel. Nos escondemos
atrá s de uns arbustos e pude ver claramente Blake com uma arma na
mã o, gritando desesperadamente meu nome e, ao lado dele, estavam
mais dois policiais.
— O doutor é corajoso, veio salvar a namoradinha. Mas ele acabou de
assinar sua sentença de morte. Diga adeus ao seu grande amor, Beatrice.
Em fraçã o de segundos, Miguel se levantou com arma em punho
mirando na direçã o de Blake, gritei a plenos pulmõ es tentando chamar
sua atençã o, naquele momento era a ú nica arma que tinha. Miguel atirou
e de longe vi Blake caindo. No mesmo instante fui agarrada pelas costas
e vi quando Miguel foi rendido por um policial.
— Blake, Blake! — berrava desesperada, precisava vê-lo. — Me solte! —
gritava e tentava escapulir dos braços que me seguravam fortemente.
— Calma, Beatrice. Já está terminando, em breve você estará em casa. —
Uma voz firme falou atrá s de mim.
— Por favor, me leve até Blake — protestei novamente.
— Ainda nã o, precisamos ficar aqui até recebermos a informaçã o de que
está tudo liberado. Veja você mesma, já estã o cuidando dele, parece que
o tiro pegou no braço.
Vi quando alguns homens, junto com o meu segurança, levaram Blake.
Quando a cena saiu do meu campo de visã o comecei a chorar. Será que
estava muito ferido? Meu Deus, preciso encontrá-lo!
— Pronto, Bea, está tudo limpo. Todos os bandidos que ficaram vivos
estã o nas mã os da polícia.
Quando ouvi o meu apelido, olhei para trá s e só entã o reconheci o
homem que estava me protegendo. Daniel, amigo de Matteo e agente do
FBI. Nã o deu tempo nem de falar nada, ele me ergueu e fomos em
direçã o onde estavam os outros policiais. Precisava saber de Blake.
Quando avistei Blake deitado no chã o, com o braço ensanguentado,
achei que morreria naquele instante.
— Blake, meu amor! — Joguei-me ao seu lado e, quando nossos olhos se
encontraram, percebi que minha vida só tinha sentido se ele estivesse
comigo.
— Bea, você está ferida? — perguntou com dificuldade, certamente
sentindo muita dor.
— Xiu... nã o fale nada. Alguém nos ajude, precisamos de uma
ambulâ ncia, urgente! — gritei desesperada.
— Calma, amor, já conseguimos falar com o hospital e Andrew está
mandando o helicó ptero vir nos pegar. — Mesmo ferido, Blake tentou
me tranquilizar.
Pouco tempo depois, o helicó ptero chegou, nã o desgrudei de Blake um
só segundo durante o percurso. Os médicos fizeram os primeiros
atendimentos e já identificaram que a bala transfixou, ou seja, nã o ficou
alojada no corpo de Blake, seria necessá rio um pequeno procedimento,
mas, graças a Deus, sem consequências graves.
Quando pousamos no heliponto do hospital, minha família já estava nos
aguardando. O abraço dos meus pais, do Matteo e, em seguida, da
Helena, foi como se eu tivesse renascido. Por vá rias vezes, achei que nã o
sairia viva daquele terror. Choramos todos juntos, só que agora de
alegria.
Blake foi imediatamente encaminhado para o centro cirú rgico, o
ferimento nã o foi grave, mas precisava de uma sutura e alguns cuidados.
Fui praticamente arrastada para a minha casa, meus pais nem sequer
me deixaram contestar, aproveitaria esse tempo que Blake estava sendo
atendido para tomar um banho e comer uma comida decente.
Quando saí do banho, tinha uma ligaçã o perdida de Kaleb, retornei
imediatamente, já com medo de ter acontecido algum problema.
— Kaleb, estava no banho, quando você me ligou. — Ele era um bom
amigo, e junto com Blake formavam uma dupla e tanto.
— Oi, Bea, te liguei para dar notícias do bonitão. Acalme seu coração, seu
namorado está ótimo, o procedimento foi simples e transcorreu tudo
dentro do esperado.
— Eu nã o vou demorar, daqui a pouco chego aí. — Estava muito ansiosa,
queria ficar ao lado dele.
— Bea, você precisa relaxar um pouco. Demos um sossega-leão para ele
descansar, esses últimos dias foram muito tensos para vocês, sem falar que
o meu amigo já não é mais tão novinho — brincou, tentando me acalmar.
— Kaleb, você jura que está tudo bem mesmo?
— Jamais te esconderia qualquer coisa, Bea. Ele está ótimo. Agora se
alimente, curta o carinho dos seus pais e amanhã cedo venha para cá. Se
ele acordar e não te vir aqui, vai fazer uma confusão.
— Entã o até amanhã . Obrigada por tudo. — Nos despedimos no instante
que minha mã e entrou no quarto, ela também tomou banho, estava com
um semblante mais tranquilo, nem queria imaginar o que ela e meu pai
passaram nessas horas em que eu estava na mã o dos bandidos.
— Filha, fiz uma comidinha bem gostosa para você. — Mamma me
abraçou forte e tive que me segurar para nã o chorar mais uma vez.
Precisava esquecer essa loucura toda.
Sentamo-nos em volta da mesa junto com papà, Helena e Matteo, que
estavam nos aguardando. O jantar obviamente foi uma bela massa,
acompanhada pelo meu vinho preferido. Contei a eles como foram as
horas que passei no cativeiro e como tudo aconteceu no momento do
meu resgate.
Claro que Helena queria saber todos os detalhes, afinal, como ela mesma
dizia, seu lado investigativo sempre estava em alerta.
— Desde o momento que você achou que estava sendo seguida algum
tempo atrá s que comecei a desconfiar do Miguel, mas jamais imaginei
que teria esse desfecho. Sinceramente, achei que era apenas um ex-
namorado ciumento, que levou o pé na bunda e queria saber o motivo de
ter sido dispensado. — Helena lembrou bem, os dias em que comecei a
ficar com medo de estar sendo seguida, foram assustadores.
Ficamos conversando por um tempo, mas todos nó s estávamos
precisando de uma boa noite de sono. Matteo voltaria para Seattle no dia
seguinte cedo. Helena também foi embora descansar, ela estava tomando
conta da minha empresa praticamente sozinha todo esse tempo em que
estive na Suíça, deveria estar exausta também.
Minha mã e fez um chá que me fez dormir como um anjo, acordei ainda
assustada, mas logo agradeci por tudo ter terminado bem. Arrumei-me
com capricho precisava ver com meus pró prios olhos como meu amor
estava.

Quando cheguei perto do quarto onde Blake estava, ouvi a voz de Olívia,
entã o entrei de vez no quarto, queria muito abraçá -la.
— Festinha com meu namorado enfermo na minha ausência, dona
Olívia?
— Beatrice Tomarolli, nã o apronte mais outra dessa, nã o tenho coraçã o
para tanta emoçã o. — Nos abraçamos longamente emocionadas, soube
que ela também sofreu com os ú ltimos acontecimentos.
— Ei, vocês duas, o doente aqui sou eu. Podem, por favor, me dar
atençã o? — meu médico enciumado reclamou.
— Oi, amor, como você está ? Quis vir ficar com você ontem, mas Kaleb
me disse que você estava medicado e dormiria toda a noite...
— Venha aqui me dar um beijo, princesa, estou louco de saudade.
Como senti falta disso, um beijo quente do meu homem.
— Por favor, vocês dois se segurem aí, estamos em um hospital — Olívia
reclamou.
— Sente-se aqui, amiga, estou com tanta saudade de você. No auge do
meu desespero, achei que nunca mais nos encontraríamos. — As
lá grimas começaram a se formar, mas respirei fundo e me controlei, o
momento agora era de comemorar e nã o de tristeza.
Mesmo na cama de um hospital, mas com a Olívia e a Beatrice ao meu
lado, jogando conversa fora, era tudo o que eu precisava para aliviar o
estresse que passei.
Quando vi Beatrice nas mã os daquele bandido, perdi o controle,
abandonei todas as recomendaçõ es de Daniel; nã o conseguiria ficar
aguardando, tinha que agir. Felizmente tudo deu certo e estamos aqui, os
três grudadinhos, conversando, falando besteira.
Perto do almoço, Daniel chegou para fazer uma visita e nos atualizar de
como foi o desfecho de toda a operaçã o.
— Já estou percebendo que o doutor super-heró i já está ó timo e sendo
mimado — Daniel brincou, mas sei que ele nã o gostou da minha atitude.
Ele era um profissional e tanto, sua perspicá cia foi fundamental e
realmente meu desespero poderia ter prejudicado todo o planejamento.
— Lembra da Olívia, Dani? E que histó ria é essa de heró i? — Claro que
Beatrice nã o deixaria passar o comentá rio.
— Claro que me lembro. Nã o esqueço do quanto vocês duas aprontavam
nos Hamptons. — Daniel abraçou Olívia carinhosamente, notei um olhar
trocado entre as duas amigas. Depois saberei o que isso significa, essas
duas tinham tantos segredos. — Respondendo à sua pergunta, Bea, seu
namorado queria participar do seu resgate. Tive que praticamente
amarrá -lo para que nã o me seguisse. O coitado do Petrov suou para
mantê-lo controlado e, ainda assim, aconteceu tudo isso aí.
— Daniel, você nã o imagina o quanto essa mulher é importante para
mim, se acontecesse o pior, certamente eu me tornaria um morto-vivo.
— Segurei a mã o de Beatrice emocionado.
— Pare com esse dramalhã o. O pior já passou, agora é seguir em frente.
— Como sempre, Olívia nos puxou para o lado bom da vida.
— Exatamente, Liv. Bom, passei aqui para informá -los que conseguimos
desbaratar toda a quadrilha que estava no comando do contrabando de
pedras preciosas, ou pelo menos grande parte dela — Daniel começou a
relatar o desenrolar do caso.
— Só me diga que aquele desgraçado do espanhol foi preso ou está
morto — rosnei com ó dio.
— Ele está no hospital, sob custó dia, mas, assim que se recuperar, será
encaminhado para a detençã o e nã o sairá tã o cedo. Pessoalmente me
empenharei para que ele apodreça na cadeia.
— E a velha bandida que se passou por boa senhora no aeroporto?
Quando me lembro da carinha de inocente que ela fazia ao contar as
histó rias da falsa família, fico para explodir de raiva. — Beatrice ficou
com a voz trêmula, nã o gostava nem de pensar nos momentos de terror
que passou.
— Parece que já existia algum problema no “paraíso” — fez sinal de
aspas quando falou a ú ltima palavra. — Quando chegamos no local onde
você estava Bea, ficamos um bom tempo na tocaia aguardando o melhor
momento para agir e observamos uma longa discussã o entre a famosa
Madame e o Miguel. A coisa foi ficando feia, até que em certa altura ele
disparou dois tiros à queima-roupa na líder do bando, inclusive foi a
nossa oportunidade de ouro para fazer a abordagem, atacamos no
momento certo. Pegamos eles de surpresa.
— Meu Deus! Inacreditável que convivi com um bandido sem ter
percebido nada.
— Esqueça isso, amiga, nã o tinha como você saber. Eles sã o ardilosos,
até a Lucy caiu na conversa dele.
— Como assim, Olívia? — Beatrice estranhou o comentá rio da amiga.
— Isso mesmo, amor, a Lucy ouviu um á udio que você me enviou
dizendo alguma coisa sobre a Suíça e, segundo ela, passou essa
informaçã o para o safado, pois ele estava sofrendo com seu
distanciamento e queria te reconquistar — esclareci.
— Passou a informaçã o para o Miguel porque também queria nos
separar com certeza, pois já sabia que estávamos juntos. Nã o tenho
dú vida disso. Mas pelo bem do seu filho, Blake, eu vou fingir que ela nã o
quis nos prejudicar.
Esse tema ainda fazia minha mulher sofrer muito, mas a temporada na
Suíça, longe de mim, só confirmava que o mais importante era que
ficá ssemos juntos e o meu filho que estava chegando seria muito amado
por ela. A Lucy nã o ia conseguir usar a criança para nos separar.
— Para finalizar, como Miguel agora também vai responder por
homicídio doloso, acabou aceitando, depois de alguma pressã o, entregar
todos os membros da robusta organizaçã o criminosa. — Nem queria
pensar na frase “alguma pressã o” que Daniel acabou de falar. — O fato é
que o FBI estava atrá s dessa corja há algum tempo, agora finalmente
conseguimos desmanchar esse covil — Daniel finalizou.
— Assim que me recuperar, eu vou preparar um jantar para comemorar
a nossa vida e todo esse resultado. Você já é nosso convidado, Daniel. —
Comecei a me animar, em breve voltaria para as minhas aulas de
gastronomia.
— A Sherlock nervosinha estará lá com certeza, nã o é? — Senti um ar de
provocaçã o. Beatrice me olhou sem entender nada, nã o aguentei e
gargalhei em seguida.
— Amor, você perdeu as farpas e alfinetadas que Daniel e Helena
trocaram. Se o momento nã o fosse tã o tenso, juro que poderia ter me
divertido assistindo as provocaçõ es dos dois.
— Blake, ela que é muito intrometida, achando que podia dar sugestõ es
no meu trabalho em meio a um caso gravíssimo. Bea, sua amiga tem
muito topete. — Daniel já parecia irritado, só em falar sobre o que
aconteceu.
— Nã o me diga que a Nena tirou o compenetrado agente especial do FBI
do sério? Como perdi essa cena? — Beatrice começou a rir e a Olívia
acompanhou.
— Nada disso, ela se acha a detetive. Atrevida isso sim, ela é demais da
conta. — Daniel estava quase espumando de raiva.
Ficamos tirando sarro dele por um bom tempo, tinha certeza de que
Beatrice ia querer saber essa histó ria direitinho, só que na versã o da
amiga. Helena seguramente esculacharia o pobre coitado.

Minha vida voltou à rotina que tanto amava, o estresse do hospital, as


longas cirurgias, minhas aulas de gastronomia, a nataçã o que estava
impossibilitado de fazer até entã o e a melhor parte: Beatrice
praticamente se mudou para a minha casa, tomando conta inclusive de
quase todo o meu closet sem vergonha alguma, me deixando cada dia
mais feliz com essa convivência.
O Andrew praticamente me obrigou a tirar uns dias de férias, entã o eu e
a Beatrice ficamos uma semana nos Hamptons de pernas para cima,
cozinhando, nadando e transando como coelhos. O susto que passamos
só nos fez enxergar que nosso destino já estava traçado há muitos anos.
Para minha felicidade ficar completa, eu precisava apenas que Lucy se
encontrasse novamente. Já fazia algum tempo que comecei a observar
um comportamento estranho e que havia acentuado bastante depois da
gravidez. As sessõ es com o psicó logo estavam tendo um efeito positivo
no início, mas, depois do acontecido com a Beatrice, tinha percebido que
ela estava mais introspectiva e, de certa maneira, negligenciando a
gravidez.
Ontem Lucy fez um ultrassom e descobrimos que era um menino, me
emocionei muito ao ver o meu bebê crescendo saudável apesar de tudo,
mas a mã e estava completamente apá tica, sem demonstrar qualquer
sentimento de carinho pelo filho.
Percebia o meu ex-sogro muito nervoso, ansioso até. Nã o deveria ser
fá cil para ele acompanhar toda essa distâ ncia da filha, ele sempre quis
que ela assumisse o hospital, afinal era a ú nica herdeira.
Ontem, quando cheguei no trabalho, ele estava em uma discussã o
bastante acalorada no estacionamento com o dr. Lucas. Na distâ ncia que
eu estava, nã o consegui ouvir nada, mas ficou claro a animosidade entre
os dois.
— E aí, dr. Blake, finalmente finalizamos nosso dia? — Kaleb, como
sempre, já estava pronto para uma noite animada, ele nã o mudava
nunca.
— Estou cansado demais hoje, desde cedo em pé no centro cirú rgico. É
nessa hora que sinto que o tempo está passando rá pido demais.
— Você tem que melhorar seu condicionamento, imagine quando o
moleque quiser jogar bola daqui alguns anos? — Kaleb nã o perdia a
oportunidade de me sacanear, até parecia que era mais novo que eu.
— Pelo menos, meu filho já está a caminho. Quando o seu chegar, você
estará de bengala na mã o se depender dessa sua intençã o de formar
uma família.
— Atenção, dr. Blake Lancaster, favor comparecer à sala do dr. Andrew
Taylor.
Eu e meu amigo explodimos em uma risada, que deve ter sido ouvida na
sala do Andrew.
— Nã o é possível uma coisa dessa, já estava sonhando com um banho de
banheira e minha mulher fazendo uma massagem nas minhas costas,
que estã o travadas. Será que aconteceu alguma coisa com a Lucy? —
Senti um frio na espinha.
— Vai lá , Blake, se precisar de alguma coisa me chame. Vou ficar por
aqui, meu encontro é com a nova médica da pediatria e ela só sairá
daqui uns quarenta minutos. — Despedi-me de Kaleb, porém com uma
sensaçã o iminente de que algo ruim estava para acontecer. Tentei limpar
minha mente, mas o frio na barriga estava instalado.

Minha ansiedade estava tã o grande que percorri a distâ ncia até a sala do
Andrew em segundos.
— Oi, Blake, por favor, sente-se. Precisamos conversar. — Nunca vi o
Andrew tã o perturbado.
— O que aconteceu, está tudo bem com a Lucy? — Nesse momento, a
pró pria saiu do toalete, que ficava no fundo da sala. — Lucy, está tudo
bem?
Ela só balançou a cabeça em afirmaçã o.
— Blake, quero que você saiba que sempre confiei em você e te
considero como um filho, mesmo hoje você nã o estando mais casado
com a minha filha, mas adianto que essa nã o será uma conversa fá cil.
Ainda assim, você sempre terá o meu apoio.
— Por Deus, Andrew, chega de rodeios, o que está acontecendo? Lucy,
está tudo bem com o nosso filho? Nã o me esconda nada.
— Lucy, por favor, sente-se. Você precisa fazer isso, filha, é o certo.
— Blake, eu sei que talvez, depois do que eu te falar, você nunca mais
queira olhar na minha cara. Eu vou entender, mas depois de tudo o que
aconteceu, de certa maneira, reconheço que tive indiretamente uma
parcela de culpa no sequestro da Beatrice...
— Lucy, nó s já conversamos sobre isso, já entendemos que aquele patife
te envolveu de uma forma, ficando difícil você se dar conta da real
intençã o do bandido. Esqueça isso e foque na gravidez, nosso filho está
crescendo saudável. Eu e a Bea já viramos essa pá gina.
Lucy olhou para o pai, que a incentivou ir em frente com um gesto. Que
diabos estava acontecendo?
— O problema é justamente esse, Blake. Esta criança nã o é sua. Você nã o
é o pai.
O ar fugiu dos meus pulmõ es, meus batimentos cardíacos aceleraram,
minha visã o ficou embaçada. Que diabos estava acontecendo?!
— Acho que nã o entendi. Como assim, nã o é meu filho? Nó s nã o usamos
proteçã o da ú ltima vez que ficamos juntos, já tivemos essa conversa. Que
histó ria é essa agora, Lucy?
Levantei-me abruptamente e senti uma leve tontura. Andrew percebeu e
me ajudou a sentar novamente.
— Acalme-se, Blake, beba um pouco de á gua. Continue, Lucy, esclareça
tudo. Você deve isso a ele.
— Me perdoe, Blake, eu sei que nã o tinha o direito de fazer isso com
você, mas aquele dia que fomos para os Hamptons, com a intençã o de
tentar salvar o nosso casamento, eu... — ela hesitou um pouco, mas
continuou: — Bem, nã o há outra maneira de te dizer isso. Eu menti, eu já
estava grávida, eu tinha descoberto poucos dias antes e estava
desesperada, nã o pensei direito, entã o achei que seria um bom plano,
tinha certeza de que acabaríamos transando, entã o só precisei dar um
tempo para comunicar a gravidez.
Quem é essa mulher que está aqui na minha frente? Eu já amo essa
criança. Como ela pôde ser tão ardilosa?
— Entã o, enquanto estávamos casados, você me traía descaradamente?
Por que você nã o foi honesta comigo? Quem é o pai dessa criança?
Houve nova troca de olhares entre ela e o pai. Eu vivia em um casamento
de mentiras, essa era a verdade nua e crua.
— O pai do meu filho é o Lucas.
A sensaçã o que tive foi de ter levado um direto de esquerda bem no
meio da cara e sem esperar.
— Dr. Lucas Carter? Seu amigo de longa data, que você se empenhou em
colocá -lo para trabalhar aqui no hospital do seu pai? — esbravejei sem
respeitar a presença de Andrew. — Olhe para mim, Lucy, eu quero saber
tudo. Isso já acontecia desde que morávamos em Londres? Você já me
traía pelas costas, enquanto eu lutava pelo nosso casamento, achando
que tinha que empenhar mais?
— Você nunca me amou, Blake, você sempre foi apaixonado pela italiana,
eu sempre soube disso! — Ela, enfim, demonstrou alguma emoçã o. —
Eu era apaixonada por você quando nos casamos e acreditava que você
também gostava de mim. Mas, no fundo, você se acostumou com a minha
companhia. A medicina era a sua razã o de viver, eu sempre estava em
segundo plano. Entã o acabei encontrando no Lucas o que você nã o
conseguia me dar.
— E por que raios você inventou essa histó ria de que eu era o pai do seu
filho? Desembucha, Lucy! Já que chegou até aqui, quero saber todos os
detalhes dessa histó ria só rdida. — Sentia meu rosto pegar fogo, certeza
de que minha pressã o arterial deu um salto.
— O Lucas sempre foi como eu, nunca quis ter filhos. Quando revelei que
estava grávida, ele nã o quis saber. Disse que nã o estava preparado para
ser pai.
— Era por esse motivo que você estava aos berros com Lucas no
estacionamento ontem? — inquiri Andrew, que me olhava
envergonhado.
— Exatamente, Blake. Eu ouvi a Lucy discutindo com ele. Quando a
interpelei, ela nã o teve como negar, pois tinha escutado tudo claramente.
Entã o naquele momento que você nos viu, estava chamando o dr. Lucas
à sua responsabilidade, o malandro nã o negou que é o pai do meu neto,
mas afirmou categoricamente que poderá assumir a paternidade, mas
nã o participará da criaçã o da criança.
— Você nã o podia ter feito isso comigo, nã o estou falando da traiçã o,
isso agora nã o importa, mas me deixar pensar que seria pai, foi muito
cruel. Nunca neguei que esse era outro sonho meu e que você sempre se
negou a realizar. Essa sim foi a verdadeira traiçã o.
Neste momento, uma lá grima escorreu pelo meu rosto. Eu já amava este
bebê. Um menino como sempre quis. Levantei-me devagar, precisava
sair da sala. Nã o estava mais conseguindo respirar.
— Espero que seja feliz com suas escolhas, Lucy. — Minha voz saiu
embargada, o sentimento era de perda.
— Blake, eu lamento muito. Sei que está sofrendo. Mas se precisar de
mim, estarei aqui para o que você precisar. — Andrew levantou-se e me
deu um abraço sincero. Em seguida, saí daquela maldita sala, totalmente
destruído.
A minha melhor terapia era entrar no ateliê e passar horas desenhando,
isso me renovava a cada dia. Especialmente hoje, com este novo projeto:
a criaçã o de anéis de noivado. Passava muito tempo pensando em todos
os detalhes de cada peça e, principalmente, na reaçã o da pessoa que
receberia esse símbolo do amor, ficava verdadeiramente emocionada.
Reconectar-me com o trabalho logo depois do sequestro foi a melhor
decisã o, sentia-me segura e sabia que aquela afliçã o ficou no passado,
mesmo que ainda tivesse o Petrov me acompanhando, por
recomendaçã o do Daniel.
— Amiga, você passou o dia todo trancada nesta sala gelada, estou
sentindo falta da nossa conversinha de fim de tarde e, por conta disso,
estou encerrando seu expediente com essa surpresinha aqui.
Minha amiga Helena tem sido um grande suporte, tanto na minha vida
quanto no trabalho, a Olívia ficava até um pouco enciumada, mas eram
duas personalidades completamente diferentes e eu amava as duas.
— Espero que nessa sacola tenha o que estou pensando, estou faminta e
vou te amar ainda mais por esse agrado. — Almocei super-rá pido
somente uma salada, nã o queria perder tempo, entã o agora o meu
estô mago já estava roncando de fome.
— Pedi a Naomi para comprar nossas tortas preferidas, a minha de
limã o e a sua, claro, de chocolate amargo, para acompanhar aquele café
expresso sensacional. — Helena rodopiou na sala com a sacola na mã o
feito uma criança que ganhou seu doce preferido.
Fechei o notebook, guardei todo o material de trabalho e nos
entregamos ao prazer que só um bom doce proporcionava.
— Isto é o paraíso, srta. Nevicare, você nã o me decepciona nunca. —
Coloquei uma fatia enorme da minha torta preferida na boca. — Tudo
bem que teremos que dobrar nosso tempo na esteira, mas, como esse
tipo de extravagâ ncia nã o faz parte da nossa rotina, estamos perdoadas.
— Bea, você é disciplinada demais, um pouquinho de carboidrato nã o
vai aumentar sua bunda, que já está bem trabalhada no agachamento
diá rio, me causando inveja como sempre. — Nó s rimos como garotinhas
falando besteira no intervalo da aula. — Mudando de assunto, estou
curiosa. Agora que vocês já sabem que o filho de Blake é um menino,
como está sua cabeça com relaçã o a tudo isso?
— Já esteve pior, atualmente já estou mais acostumada com a ideia de
que nã o serei eu a realizar esse sonho, dar a ele o primeiro filho, mas
vamos ter o nosso bebê, aí sim minha felicidade estará completa.
— Nã o me diga que vocês já estã o providenciando meu sobrinho? —
Helena quase deu um pulo da cadeira.
— Calma, apressada, está nos nossos planos sim, mas ainda nã o
decidimos quando. Por falar em planos, no sá bado vamos fazer o jantar
que Blake prometeu ainda quando estava no hospital, ele está
entusiasmado para mostrar suas novas receitas criadas com alimentos
funcionais, afinal, um cardiologista nã o pode esquecer essa parte, nã o é?
— Uau, já estou com á gua na boca. Só nã o me diga que aquele agente do
FBI insuportável foi convidado também? — Minha amiga fez uma cara
de nojo horrenda.
— Evidentemente que ele foi convidado e já confirmou presença. Estou
muito animada para ver vocês dois juntos, até hoje você nã o conseguiu
me explicar de onde surgiu essa antipatia gratuita pelo pobre coitado. —
Cutuquei um pouquinho a onça.
— Ele é muito arrogante, dono de si. Nã o sei te explicar, mas nã o fui com
a cara dele. Só isso. — Foi evasiva demais.
Aí tem coisa, conheço essa mulher.
— Daniel é um homem lindo, alto, forte, do jeito que você gosta —
continuei a instigá -la.
— Ok, ele é bem gostoso, cheiroso também, mas é um grosso. Eu vou ao
jantar, mas, se ele me perturbar, eu nã o respondo por meus atos. —
Levantou-se de supetã o e colocou as duas mã os na minha mesa. —
Agora, srta. Tomarolli, chega dessa conversa, porque você nã o vai me
juntar com esse troglodita, entendeu?
Levantei as mã os em rendiçã o e passei o indicador e o polegar nos
lá bios, como se estivesse fechando com um zíper.
Tentei arrancar da minha amiga o que de fato acontecia quando ela e
Daniel estavam no mesmo ambiente, mas me frustrei porque a
sabidinha se fechou como uma ostra, entã o encerrei meu dia e fui para
casa.
Prometi ao Blake que faria uma massagem, prepararia um banho com
sais relaxantes, meu amor devia estar esgotado, tinha duas cirurgias
enormes hoje.
Tudo pronto e Blake ainda nã o chegou, até mandei mensagem, mas ele
nem visualizou. Pouco tempo depois, estava na cozinha finalizando a
sobremesa e ouvi a porta bater. Lavei as mã os e fui correndo encontrar
meu médico gato e quase caí de susto.
— Meu Deus, amor, o que aconteceu?!
Seu rosto estava inchado, seus olhos pareciam duas bolas vermelhas,
uma bagunça de homem. Blake me abraçou e, sem dizer nada, chorou
como uma criança. Nã o perguntei nada, deixei ele à vontade, esvaziando
seja lá o que estivesse causando tanta dor.
Alguns minutos depois, ele começou a se acalmar, respirou fundo,
levantou-se, serviu um pouco de whisky e bebeu de vez. Só entã o eu
resolvi me pronunciar:
— Está melhor?
Ele só balançou a cabeça confirmando.
— Estou pronta para te ouvir, me diga o que de tã o grave aconteceu para
te deixar assim?
Blake sentou-se de frente para mim, segurou e beijou cada uma das
minhas mã os, seu olhar era de pura tristeza, cortava meu coraçã o vê-lo
dessa forma.
— Eu nã o sou o pai do filho que a Lucy está esperando. — Foi direto.
Fiquei alguns segundos tentando assimilar o que ele acabou de falar
com uma voz tã o sombria, que senti um arrepio subir por meu corpo.
— Como assim, nã o é seu filho? Como você descobriu isso? — Senti
minha cabeça pesar, acho que o ar até sumiu dos meus pulmõ es.
— Quando estava saindo do hospital, Andrew me chamou em sua sala,
Lucy também estava lá e ele praticamente a forçou para me contar toda
a verdade.
Eu fiquei sem açã o, só levei a mã o à boca, agora ficou claro o motivo dele
estar assim tã o quebrado.
— Ela já me traía desde Londres, com seu amigo, era assim que ela se
referia a ele, o dr. Lucas Carter. Resumindo: ela engravidou, ele nã o quis
assumir o filho e a infeliz achou que a melhor soluçã o seria dizer que eu
era o pai do filho de outro homem.
— Que loucura, essa mulher é doente. Imagino a dor que você está
sentindo, amor.
— Você sabe que, no começo, essa gravidez me tirou do prumo, mas
agora já estava curtindo, principalmente quando descobri que seria um
menino. Estou arrasado, Bea, essa traiçã o eu nã o vou perdoar nunca. Eu
juro que saber da infidelidade da Lucy, nã o me atingiu tanto quanto
saber que o filho que eu já amava nã o é meu. É inacreditável isso!
Ficamos conversando por quase uma hora, esgotamos todo o assunto,
ele me contou todos os detalhes da conversa com a ex, inclusive o
quanto ficou surpreso com o apoio recebido do pai dela.
Quando jantamos, depois de algumas taças de vinho, Blake já estava
mais relaxado, até brincou um pouco. Depois do jantar decidimos tomar
o banho de banheira que tínhamos programado. Apó s o longo banho, fiz
uma massagem com ó leo essencial de lavanda para acalmá -lo e acho que
consegui, pouco tempo depois percebi sua respiraçã o mais pesada, já
estava dormindo.

Acordei com o barulho do chuveiro, Blake se mexeu muito durante a


noite, mas acho que conseguiu descansar. Quando estava quase me
levantando, a porta do banheiro abriu e meu namorado lindo demais
estava enrolado apenas em uma toalha, parecendo um modelo da Calvin
Klein, todos os gominhos da sua barriga saltando e coberto por gotinhas
de á gua, simplesmente uma tentaçã o. Olhei-o com o desejo tomando
conta do meu corpo.
— Se você continuar me comendo com os olhos, eu juro que nã o
sairemos dessa cama tã o cedo, ainda mais hoje que nã o tenho cirurgia
pela manhã .
— Entã o venha logo aqui, meu tesã o acordou hoje em alta e você só
piorou a situaçã o com esse seu corpo delicioso pronto para mim.
— Beatrice, nã o me provoque. Você sabe que sou louco por você e nã o
aguento ouvir você me dizer essas coisas. — O safado deixou a toalha
cair e claro ele já estava preparado para a açã o.
Veio bem devagar, quando chegou junto da cama ordenou:
— Tire essa camisola, ela é linda, mas nada supera a visã o de te ver
completamente nua, com o cabelo bagunçado de quem acabou de
acordar e com esse olhar pidã o.
Como uma boa garota que era, tirei minha camisola bem devagar, joguei
para ele, que a cheirou e colocou delicadamente na poltrona ao seu lado.
Quando ele viu que eu já estava sem calcinha, nã o perdeu tempo,
avançou como um lobo, devorando cada centímetro da minha pele.
— Você é a minha vida, Bea, e te ver assim, me faz entender que o meu
lugar é e sempre será aqui com você, dentro de você mais precisamente.
Te amo, princesa.
O amor entre nó s dois era muito grande, isso era inegável, mas o sexo
era espetacular. Blake conhecia o meu corpo, sabia o que fazer para me
deixar perfeitamente rendida.
— Amor, você é muito linda, gostosa demais e me deixa louco de tesã o.
Monte em mim, quero te ver no comando enquanto me cavalga — falou
o homem mais sexy e carinhoso do meu mundo.
Como se eu nã o pesasse nada, ele mudou a posiçã o me colocando por
cima. Posicionei seu membro super-rígido na minha entrada, ansiosa
por recebê-lo e a conexã o foi má gica. Blake provocava meus seios,
mordiscando, chupando e me fazendo gritar de prazer. Os sons que
ouvíamos no quarto eram os nossos gemidos, as juras de amor e o atrito
do nosso corpo.
Apó s um sexo matinal que nos deixou exaustos, tomamos um banho
demorado, com mais provocaçõ es, e meu homem ajoelhado me levou ao
paraíso mais uma vez. Preparamos nosso café da manhã caprichado,
afinal muita energia foi gasta.
— Até que, para um homem da sua idade, você é bem-disposto —
provoquei e a olhada que recebi me fez ficar excitada novamente. Muito
sexy.
— Você gosta de me chamar de velho, mas sou melhor que muito jovem
por aí. — Puxou-me para o seu colo e me beijou ardentemente.
— Estava brincando, nã o vamos começar novamente, tenho uma reuniã o
daqui a pouco. — Retribuí o beijo, mas tive que sair do seu abraço.
— Que fique registrado que foi a senhorita que correu, pois estou aqui a
postos. — Apontou para o meio das pernas.
Céus, esse homem é insaciável!
Arrumei-me em tempo recorde, com ele deitado na cama só de cueca
boxer branca me observando, uma tentaçã o. Mas nã o poderia adiar a
reuniã o com a Suíça em cima da hora. Blake estava mais tranquilo, nã o
tocou no assunto do filho de Lucy e, quando me despedi dele, tive que
reunir forças para nã o me render ao seu charme.

Depois que voltei da Suíça, as reuniõ es com Leon Bolliger passaram a


ser bem mais animadas. Era comum fugirmos da pauta, principalmente
quando Martina aparecia para colocarmos as novidades em dia. Eles
ficaram muito consternados com o que aconteceu e ainda lamentavam o
ocorrido, nó s nos afeiçoamos muito.
— Bea, agora que o lançamento da coleção das nossas joias já está
marcado, estou animada para te rever pessoalmente, faço questão que
traga o Blake, vocês poderão ficar aqui conosco na mesma casa que você
gostou tanto.
— Que maravilha, Martina! Vamos amar. Vou organizar tudo e daqui a
dois meses nos veremos. Esse lugar é má gico e o tempo que passei aí
com vocês foi muito importante para mim.
Nos despedimos e fiquei pensando como era bonito ver um casal tã o
unido depois de anos juntos, era nítido o amor, a paixã o e a
cumplicidade dos dois. Vou me dedicar para que o meu relacionamento
com Blake, seja assim como o deles, me fez lembrar também do
casamento dos meus pais.
Minha manhã nã o poderia ter começado de um jeito melhor. Beatrice
era o meu amor, o meu “para sempre”. Ela me deixava louco e se me
olhava daquele jeito me devorando, aí nã o resistia mesmo. É ramos
muito bons juntos e o sexo fenomenal.
Ontem à noite, quando cheguei em casa, estava me sentindo
completamente sem direçã o, com uma dor imensa quase rasgando o
meu peito, mas abraçar minha mulher, chorar até nã o ter mais lá grimas
me fez bem. Eu e ela tínhamos uma vida pela frente, entã o decidi que, a
partir de agora, ela era a minha prioridade. Vamos planejar nosso futuro
juntos e esquecer esses ú ltimos dias que foram bem complicados.
— Blake, vamos almoçar aqui no hospital mesmo, nossa cirurgia é só
mais tarde, entã o hoje podemos aproveitar e comer com calma. O que
acha? — Precisava atualizar Kaleb dos ú ltimos acontecimentos.
— Acho ó timo, além disso você tem muita novidade, quero saber como
foi sua saída ontem com a pediatra. — Hoje, eu que serei o curioso. Pela
animaçã o dele, certamente a noite teve um final feliz.
— Foi maravilhoso, nos demos tã o bem que já marcamos um segundo
encontro para o sá bado.
Será que, dessa vez, meu amigo foi fisgado?
— Nã o acredito nisso! Você, o rei dos encontros ú nicos? Estou achando
que meu amigo foi laçado e com nó de marinheiro — provoquei.
— Mas você também está todo sorrisos, Bea fez a tal massagem que você
tanto queria? — Ele ainda nã o sabia a reviravolta que a minha vida deu,
desde que nos vimos ontem.
— Ela fez massagem e muito mais. — Levantei as sobrancelhas
rapidamente, indicando que fui muito bem tratado. — Mas vamos pedir
o nosso almoço. O que tenho para te contar, pode causar uma indigestã o
tã o grande, que é bem provável que você tenha que encontrar alguém
para te substituir na cirurgia.
Kaleb franziu a testa e disse a palavra que era a cara da minha irmã :
— Desembucha!
A cada frase que eu emitia relatando a tramoia criada pela minha ex-
mulher, Kaleb se encolhia na cadeira. Achei até que, em algum momento,
ele acabaria caindo no chã o, de tã o chocado que ficou com tudo o que
revelei.
Ao final da histó ria, os olhos de Kaleb estavam marejados,
demonstrando o quanto ficou afetado com o absurdo que acabei de
contar.
— Blake, me desculpe, mas essa sua ex é uma bandida da pior espécie.
Vocês podem nã o ter sido o casal mais apaixonado do mundo, mas você
sempre a respeitou. Fez tudo para salvar o casamento. Isso é
imperdoável.
— Você pode imaginar como saí daqui ontem?! Mas já virei a pá gina.
Vamos esquecer esse assunto, é o melhor a ser feito. Daqui a dois meses,
Bea voltará à Suíça para o lançamento da coleçã o que ela fez para as
joalherias Bolliger e vou me organizar para acompanhá -la. Preciso de
umas férias longe de tudo e grudado com minha princesa.
Passado todo o desconforto da nossa conversa, voltamos à nossa
camaradagem de sempre, discutimos também sobre a cirurgia de logo
mais, estava tudo tranquilo até que Kaleb, apenas com um olhar, me
indicou que alguma merda estava acontecendo.
— Blake, é melhor você nem olhar, mas o doutorzinho e Lucy acabaram
de entrar no restaurante. Foram para aquela mesa do canto perto da
janela e posso jurar que o clima está bem pesado. — Meu amigo parecia
um ventríloquo falando, mal mexia os lá bios.
— Ainda bem que já acabamos nosso almoço, a ú ltima coisa que quero é
cruzar com esses dois.
Quando já estávamos nos levantando para deixar o restaurante, ouvimos
um arrastar de cadeiras e uma gritaria que chamou a atençã o de todos.
A voz de Lucy estava descontrolada. Ela gritava, xingava e batia na mesa.
Resolvi que isso nã o era da minha conta, estava pronto para deixar o
local com Kaleb ao meu lado, quando ouvi o berro de Lucy:
— Você vai ter que assumir esse filho, Lucas. Nã o vou criar essa criança
sozinha!
— Fale baixe, Lucy, você está nos expondo para todo o hospital. Cale a
sua maldita boca.
Foi nesse momento que me virei na direçã o deles e, como se estivesse
em câ mera lenta, vi minha ex-mulher, com quem vivi por tantos anos,
tirar de dentro do jaleco um objeto que parecia ser um bisturi e partir
para cima do amante. Ela o acertou na altura do ombro esquerdo e
puxou o objeto de volta, mantendo-o na sua mã o.
— Desgraçado, eu vou te matar! — A mulher estava completamente
desorientada.
Por instinto corri para impedir que Lucy fizesse mais besteira, o ó dio
que ela estava deixando transparecer era assustador e poderia até matá -
lo. Consegui imobilizá -la, enquanto Kaleb foi em direçã o do Lucas, já
tentando conter o sangramento, dando os primeiros socorros.
O tumulto se formou em fraçã o de segundos. Lucy continuava histérica.
— Me solte, Blake, esse canalha nã o merece viver. — Precisava fazer com
que ela se acalmasse, isso nã o era bom para a criança.
Um dos meus residentes trouxe um copo com á gua e açú car, ela bebeu
lentamente e já parecia outra pessoa, o olhar estava totalmente distante,
congelado. Sentei-me ao seu lado, segurando sua mã o, e liguei para o
Andrew.
— Blake, fique com ela, estou chegando. — Desligou, certamente alguém
já o tinha avisado.
Dez minutos depois, Andrew entrou no restaurante como um furacã o,
acompanhado de dois enfermeiros.
— Lucy, querida, como você está ? — Seu pai a chamou, mas ela
continuava imó vel. Ele balançou a cabeça dando uma espécie de sinal e
um dos enfermeiros aplicou uma injeçã o em Lucy, que continuava inerte.
O tranquilizante aplicado começou a fazer efeito, logo em seguida
Andrew a colocou em uma maca e saímos da bagunça do restaurante.
Deixei Kaleb cuidando do imbecil do Lucas. Quando chegamos no
quarto, Lucy já estava adormecida.
— Blake, muito obrigado por cuidar da minha filha, sei que depois de
tudo o que ela fez com você, entenderia perfeitamente se você se
afastasse dessa confusã o toda. — Andrew podia até se fazer de forte,
mas sabia que ele estava bastante abalado.
— Nã o vou ser hipó crita, confesso que preferiria estar bem longe de
tudo isso, mas jamais deixaria de ajudar a Lucy. Ela está doente, precisa
de tratamento urgente, pode se prejudicar e a criança poderá ser afetada
também.
— Já providenciei uma clínica especializada, farei sua transferência
ainda hoje. Só espero que o desgraçado do Lucas nã o abra um processo
contra ela. Minha filha pode nã o se recuperar nunca mais, ela está com
todo o quadro de esquizofrenia e a gravidez indesejada pode ter
agravado os sintomas.
— Nem sei o que te dizer, mas o que precisar, pode contar comigo. —
Nã o conseguia ser indiferente, nã o seria agora que começaria a me
comportar como um canalha. Minha consciência estava tranquila.
Com a situaçã o contornada, eu e Kaleb começamos a nos preparar para a
cirurgia com bastante antecedência, porém, em total silêncio, nenhum
de nó s dois estava no clima para qualquer conversa. Todo o ambiente do
hospital estava tenso, percebi até algumas pessoas me olhando, acho
que tentando entender como eu estava me sentindo diante de toda essa
tragédia.
Quando saí do hospital, fui direto para a aula de gastronomia que tinha
retomado desde a semana passada. Beatrice se encontrou comigo lá e
nos divertimos muito, cada aluno apresentou uma nova receita, entã o a
noite foi regada com bons vinhos e comida da melhor qualidade.
Somente quando chegamos em casa, contei a Beatrice o que tinha
acontecido no hospital, que ficou claramente chocada, lamentou o
destino triste que estava sendo desenhado para Lucy e, principalmente,
para essa criança que estava vindo.
Meu coraçã o ficava muito dividido quando pensava na criança, sabia que
ele nã o era o meu filho, mas ouvir seu coraçã ozinho batendo me deixou
impactado. Seria muito difícil daqui para a frente, mas tinha que
entender que ele tinha um pai e que nã o era eu.

— Amor, nem acredito que conseguimos organizar o jantar que prometi


há tanto tempo. Hoje eu me superei! — Nada modesto meu comentá rio.
— Blake, todos estamos merecendo uma noite assim, com diversã o e
boa comida, hoje finalmente nossa família e nossos amigos conhecerã o o
quanto meu namorado é um homem maravilhoso, além de um médico
excepcional. — Beatrice era só elogios para as minhas criaçõ es na
cozinha, mas ela era suspeita. Hoje tiraremos a prova se eu era tudo isso
que ela cantava em verso e prosa. Helena com certeza, se nã o gostasse
de alguma coisa, falaria na minha cara, aquela lá nã o tinha papas na
língua.
— Tudo pronto, os pratos principais já estã o no forno, as entradas estã o
no balcã o da cozinha, o vinho gelado e a sobremesa no freezer. Acho que
vou tomar um banho. Me acompanha, amor? — Tentei persuadi-la para
uma rapidinha no chuveiro.
— Nem vem com esse seu charme, dr. Heart, estou percebendo suas
intençõ es nada inocentes, mas eu já estou prontinha e nã o podemos
deixar os convidados esperando enquanto ficamos no desfrute.
Puxei-a para um abraço, para que percebesse o quanto eu precisava dos
seus cuidados, mas nã o tive sucesso.
— Blake, seu safado, vá tomar um banho gelado, mais tarde eu cuido de
você. — Ganhei apenas um sorriso devasso e uma promessa subliminar
que o final da noite seria bastante quente.
Quando retornei para a sala, todos os convidados já tinham chegado,
meus pais, os pais da Beatrice, Daniel e Kaleb acompanhado de Celine, a
pediatra que ele estava saindo. Faltava apenas Helena, que certamente
queria fazer uma entrada triunfal, como sempre.
Kaleb me chamou no canto e me informou que Lucas deixou o hospital
hoje no final do dia, foi demitido sumariamente, particularmente achei
ó timo, afinal ele estava correndo um grande risco de ter a cara partida.
Aquele patife nã o merecia nenhum respeito.
Com quase trinta minutos de atraso, a srta. Nevicare chegou
extremamente elegante e esbaforida como sempre, já pegou uma taça de
vinho, cumprimentou a todos, mas, quando chegou perto do Daniel, eu e
Beatrice ficamos observando a interaçã o dos dois e foi no mínimo
engraçada.
— Nã o é que o agente especial do FBI veio mesmo, achei que você
estaria correndo atrá s de algum bandido — falou com certo desdém.
— Boa noite, Helena, pois é, eu também tenho vida social como qualquer
pessoa. A propó sito, achei o seu atraso uma indelicadeza com os donos
da casa.
— Você percebeu que me atrasei? Estava sentindo a minha falta? — ela
alfinetou e Daniel revirou os olhos.
— Com licença, vou servir-me de um pouco mais de vinho. — Helena
ficou com a taça de vinho parada no ar, totalmente desconfortável.
Daniel conseguiu deixá -la ser açã o.
— Idiota. — Foi a ú nica palavra que ela conseguiu pronunciar.
Minha mulher, que era um amor de pessoa, aproximou-se da amiga,
tentando disfarçar a saia justa.
O jantar foi um sucesso, todos ficaram surpresos com os pratos servidos,
ainda tive que ouvir uma piada de Kaleb, dizendo que nã o acreditava
que realmente eu tinha talento na cozinha. O fato era que estava bem
inclinado a lançar um livro de receitas, precisava deixar registrado tudo
o que havia criado.
Durante a sobremesa, Beatrice fez um agradecimento emocionado,
afinal nossa vida ultimamente daria um bom filme de açã o. Nossos pais
estavam muito felizes com nossa uniã o, já nos cobrando o casamento,
mas essa era uma surpresa para outro dia.
Ligamos para o Matteo, depois para a Olívia. Eles nã o puderam vir, mas
já ficou combinado um encontro de toda a família na Itá lia, logo apó s a
nossa temporada na Suíça. Os avó s de Beatrice faziam questã o da
presença de todos.
Encerramos a noite do jeito que amávamos, rolando nos lençó is e, no
fim, exauridos de tanto prazer.

Na segunda-feira, avisei a Beatrice que chegaria mais tarde em casa, pois


teria uma cirurgia de ú ltima hora, uma pequena mentira por um bom
motivo. A verdade era que combinei com Vincenzo e Katie que passaria
na casa deles no início da noite.
O objetivo da minha visita foi pedir oficialmente a mã o de Beatrice em
casamento.
— Blake, meu querido, você nã o imagina como estou feliz. Depois de
tantos anos, vocês estã o juntos. Beatrice é louca por você desde muito
novinha, vocês estavam predestinados a serem felizes para sempre,
como num conto de fadas.
— Minha mulher é uma româ ntica, mas devo dizer que ela sempre
acreditou nesse desfecho. Eu também confio no amor de vocês, nã o
tenho dú vida de que você dedicará a sua vida para fazer a minha filha
feliz. — Vincenzo, sempre muito sério, estava emocionado.
— Eu tenho uma surpresa para você, desde que vocês se reencontraram,
eu sabia que um dia você estaria aqui para pedir a mã o da minha filha. A
Bea nã o sabe, mas, como ela é a ú nica neta, a nonna Fiorella guardou seu
anel de noivado para ser entregue ao escolhido de Beatrice. Minha filha
sempre foi apaixonada por essa joia.
Minha sogra olhou para o marido e sorriu comovida.
— Ainda criança, Bea sempre dizia que este anel era o mais lindo da
vida. Bom, eu falei com a nonna, ela nos enviou o anel e, quando você
falou que queria conversar comigo e com o Vincenzo, nó s sabíamos qual
era o assunto. Aqui está , é uma joia que está na família há muitos anos e
nó s te entregamos porque temos certeza de que você é a melhor pessoa
para a nossa Bea.
Depois dessa surpresa e da emoçã o, disse aos pais de Beatrice qual era o
meu plano e que precisaria da ajuda da Katie, pois só ela conseguiria
realizar o que eu tinha em mente.

As coisas tinham voltado à rotina no hospital, ninguém mais falava do


que aconteceu outro dia. Na sexta-feira antes de sair para o trabalho,
combinei com a Beatrice que passaríamos o final de semana nos
Hamptons, na casa dos meus pais. Lá era o nosso lugar, foi naquela praia
que nos conhecemos, entã o todo o meu plano seria perfeito.
Chegamos no final da tarde, a casa seria só nossa todo o final de semana.
Depois de desarrumar as malas, Beatrice quis tomar um banho. Antes
que me convidasse para me juntar a ela, avisei que queria fazer um
jantar especial e que estaria aguardando com tudo pronto. Ela fez
beicinho e, pelo beijo que me deu, já queria uma agrado antes do jantar.
Tudo estava a meu favor, entã o segui para a segunda parte do plano.
Chegar nesse lugar com Blake parecia um sonho, passei praticamente a
minha adolescência toda planejando e imaginando que um dia
ficaríamos juntos e agora aqui estávamos, mais uma vez. Ele devia estar
preparando um jantar especial para nó s dois, pois recusou meu convite
nada sutil para tomarmos banho juntos. Quando saí do banho, notei que
em cima da cama havia um ú nico lírio rosa e um bilhete.

Princesa,
Faz alguns dias que estou planejando essa viagem para o nosso paraíso
particular. Confesso que não foi uma tarefa fácil guardar um segredo de
você, mas necessário.
Infelizmente não jantaremos aqui, você terá que andar um pouquinho até
o local onde tudo foi especialmente preparado para você. Tenho certeza de
que gostará da surpresa. Não demore. Como você mesma diz, sou quase
um idoso, então esse velho coração já está bastante ansioso. Te espero no
local onde nos amamos a primeira vez.
Com amor,
B.

O meu coraçã o estava ansioso agora. O que será que Blake está
preparando? Coloquei um vestido bem lindo, passei apenas um gloss nos
lá bios, borrifei o perfume que ele tanto amava e fui em direçã o ao
bangalô , que ficava no terreno da casa dos meus pais, onde nos amamos
pela primeira vez, há quase nove anos.
Quando cheguei ao bangalô , ouvi a nossa mú sica, a mesma que estava
tocando naquele dia. Abri a porta bem devagar e foi como se eu estivesse
em uma má quina do tempo, a decoraçã o era praticamente a mesma, a
diferença era que o amor da minha vida estava me esperando. Lindo
com um lírio rosa na mã o.
Eu já queria chorar. Ele se aproximou lentamente, me entregou a flor.
Percebi que ele também estava se segurando para nã o chorar e recebi o
beijo mais doce de toda a minha existência. Nã o contive a emoçã o e uma
lá grima desceu pelo meu rosto. A essa altura, eu já estava
completamente em êxtase. Blake se afastou um pouco e pude ver seu
rosto tomado pela emoçã o também.
— Minha Bea, eu fui um idiota e egoísta quando fugi de você, estava cego
pelo meu desejo de ser um médico de sucesso. Depois de tantos anos,
entendi, enfim, que a minha felicidade só seria plena se você estivesse ao
meu lado. Eu te amo e quero passar o resto da minha vida me
redimindo, pedindo perdã o por nã o ter enxergado lá atrá s, que só você
me completa.
Blake tirou uma caixinha do bolso da sua bermuda e ajoelhou-se.
— Beatrice Tomarolli, aqui nesse lugar com tanto significado para nó s,
peço que aceite ser a minha mulher, a mã e dos nossos filhos, até o fim
dos nossos dias.
— Meu amor, é claro que aceito. Te amo, Blake, sempre te amei e assim
será até o fim.
Quando Blake colocou o anel no meu dedo, meu coraçã o errou uma
batida.
— Eu nã o acredito! O anel da nonna, que eu sempre amei. — Choramos
juntos, dessa vez de alegria.
Meu ú nico pensamento era que durante todos esses anos estávamos
sendo preparados, retornamos ao ponto de partida, para o lugar onde
tudo começou, onde nosso amor nasceu. Parece que o tempo nã o
passou.
Nos recuperamos da emoçã o e finalmente jantamos, rimos muito
quando me contou como estava nervoso no momento que pediu
permissã o aos meus pais para nos casarmos. Para coroar a nossa
felicidade, ainda teve o anel da nonna, lindo e carregado de muito amor.
— Blake, você sabe que estou fazendo uma coleçã o de anel de noivado e
toda vez que desenho algo é nesse anel que me inspiro, você me fez a
mulher mais feliz hoje.
Agarrei meu amor e o resto da noite foi coroada com um jantar divino
preparado pelo meu noivo, depois dançamos mais uma vez a nossa
mú sica e, para finalizar, fizemos amor com calma e, ao mesmo tempo,
com muita paixã o.
Três anos depois...

— Meu irmã o, acho que a beleza de toda a família foi direcionada para
você. Isso nã o é justo, o tempo passa e você fica mais gato.
— Você está querendo elogio, irmã zinha? Você sempre foi linda e agora
com esse barrigã o está maravilhosa. Venha aqui me acalmar, estou tã o
nervoso que nã o consigo dar o nó nesta bendita gravata.
— Vocês homens sã o previsíveis demais, está parecendo o dia do seu
casamento, lembro-me de que, na ocasiã o, a Bea me pediu para te ajudar,
pois tinha certeza de que você estaria todo atrapalhado.
— Pois é, ela me conhece bem e logo hoje, no dia do lançamento do meu
livro, ela vai se atrasar. Quero a Beatrice aqui com urgência, ela é a
verdadeira responsável por eu estar realizando esse sonho. Tomara que
nã o demore.
— Acalme-se que sua princesa já chegou. O problema é que a designer
de joias mais badalada de Nova Iorque nã o pode chegar em um local
pú blico, os fotó grafos nã o a deixam em paz.
A Rizzoli Bookstore foi a livraria escolhida para lançar o meu livro de
receitas tã o planejado. Além de elegante, era uma verdadeira
preciosidade que reunia livros de arte, moda, design e mais uma
variedade imensa de gêneros. Claro que todo esse evento foi preparado
em todos os detalhes por Helena. Como era de se esperar, tudo está
perfeito. A nata da sociedade foi convidada, além da nossa família e
amigos.
Nã o precisei nem me virar, pois já senti a presença da minha mulher no
ambiente, era impressionante que, quanto mais os anos passavam, mais
apaixonado eu ficava. Ela estava deslumbrante. Perdi o ar quando se
aproximou, com meu filho em seu ventre, mais linda do que nunca. Isso
mesmo, Beatrice estava grávida de sete meses, o mesmo tempo de
gravidez da Olívia. Teríamos uma nova dupla de amigos para sempre, só
que na versã o masculina, porque nã o tinha dú vida de que essas crianças
seriam tã o unidas quanto a Beatrice e a Olívia eram.
— Blake, você está de tirar o fô lego. — Recebi um beijo com gosto de
promessa. Os hormô nios estavam fazendo loucuras com o apetite sexual
da minha rainha.
— Tio Blake, aviã ozinho! — Ouvi um gritinho e passos apressado em
minha direçã o, Noah correu e praticamente se jogou em cima de mim.
— Campeã o, você está muito pesado, daqui um tempo eu nã o
conseguirei te levantar mais. — Fiz cara de quem estava sofrendo para
levantar o pingo de gente.
Desde que o filho de Lucy nasceu, nem eu e nem a Beatrice conseguimos
nos desgrudar dele. Minha ex-mulher continuava internada, a
esquizofrenia avançou, mas ela tinha o melhor tratamento do país e
seguia no seu mundo particular.
Para a nossa alegria, Lucas voltou para Londres e abriu mã o da guarda
do filho em favor dos pais da Lucy. Desde entã o, tanto eu quanto a
Beatrice naturalmente resolvemos ser presentes na vida do Noah, nó s
éramos os seus tios do coraçã o e juntos com os avó s, o cercávamos de
amor. Formávamos uma grande família, que estava prestes a ganhar dois
novos membros. O fruto do meu amor com a Beatrice foi muito
planejado e já era a razã o da nossa vida.

Dois meses depois...

— Blake, ele é lindo, mas considero nã o ser muito justo, afinal carreguei
por nove meses, o protegi de tudo, para, no final, ser exatamente
igualzinho a você — brinquei com meu marido, mas achava ó timo que o
nosso pequeno Dylan fosse a có pia perfeita do homem mais lindo que já
coloquei os olhos em toda a minha vida.
— Em breve providenciaremos uma garotinha, que tenho certeza de que
será uma mini Bea. Pensando bem... talvez nã o seja uma boa ideia.
Prevejo que isso seja o início dos meus maiores problemas, já imaginou
o quanto vou sofrer com o marmanjos na minha porta? Nã o, acho
melhor ficar só com o Dylan.
— Venha aqui, seu bobo, com tantos homens na família acho que minha
versã o mirim nã o conseguirá sair de casa sem ter alguém no seu pé. —
Lembrei-me de quando era menina, que os meus primos e o Matteo nã o
me deixavam em paz.
— Bea, nunca vou cansar de repetir o quanto sou feliz ao seu lado, agora
sou um homem completamente realizado. Te amo até o fim.
— Quando te vi pela primeira vez, ainda uma garotinha de apenas doze
anos, eu me apaixonei irremediavelmente. Todos esses anos era com
isso que sonhava: formar uma família com você. Te amo, para sempre.
Fico muito emocionada ao finalizar um livro, confesso que choro mesmo.
Sã o meses “conversando” com os personagens, a sensaçã o que tenho é
de que eles estã o literalmente ao meu lado, escrevendo a histó ria junto
comigo. Entretanto, chega um momento que tenho que deixá -los ir. Já
tem gente nova querendo chegar.
Preciso muito agradecer a todas as pessoas que me incentivam, que
torcem por mim, em especial à s minhas queridas “leitoras beta”, elas sã o
os primeiros crivos e sã o três leitoras completamente diferentes e
igualmente essenciais: Obrigada, Gal Bittencourt, minha irmã , que me
conhece bem e já sabe quando estou com preguiça e me obriga a refazer
tudo. Minha leitora beta emoçã o, Telma Torres. Essa eu sei que chora
como eu, seu abraço no final é fundamental. A mais nova integrante da
equipe, a minha beta mais exigente, que quase me enlouqueceu: Patrícia
Coelho, você foi cirú rgica. A histó ria de Beatrice e Blake é de vocês
também.
Obrigada, VP Assessoria Literá ria, Vanessa Pavan e Giovana Martins.
Vocês fazem a diferença, de verdade.
Obrigada a todas as pessoas que leram os meus livros, estarei sempre
buscando melhorar a cada dia.
Mais uma vez, obrigada, meu amor. Cacá , você é o meu maior
incentivador e quero ficar velhinha ao seu lado.
Com amor,
Liz.
LIZ TOURINHO é baiana de Vitó ria da Conquista, mas mora há anos em
Salvador, onde trabalha como Nutricionista. Seu amor pela leitura a fez
despertar de um antigo sonho: escrever suas pró prias histó rias.
Em seus livros, nunca faltarã o romances, emoçõ es intensas, surpresas e
temas que possam atrair, encantar e surpreender o leitor.

Se quiser saber mais, siga a autora, clicando no link do Instagram abaixo


e fique por dentro de todas as novidades:

@liztourinho.autora
1)
Avó em italiano.

2)
Avô em italiano.

3)
Cores da alma em inglê s.

4)
Lírio Joias em inglê s.

5)
Mamã e em italiano.

6)
Perseguidor em inglê s.

7)
Meu querido em espanhol.

8)
Muito prazer em espanhol.

9)
Parece o amigo secreto do Brasil, a diferença é que a pessoa que organiza a
brincadeira distribui os presentes e cada um tem que adivinhar quem o tirou.

10)
Caderno ou bloco com pá ginas em branco para desenhar.

11)
Doutor Coraçã o em inglê s.

12)
Espreguiçadeira em francê s.

13)
Querida em espanhol.

14)
Referente ao mundo da moda.

15)
Sensaçã o de já ter visto ou vivido uma situaçã o.

16)
Cirurgia para retirada do baço.

17)
Criança ou menina em italiano.

18)
Meu amor em espanhol.

19)
Sobremesa italiana.

20)
Expressã o que determina a maneira que uma pessoa trabalha ou age.

21)
Chefe de cozinha, cozinheiro

22)
Minha nossa, que delícia em italiano.

23)
Termo em francê s usado quando temos a sensaçã o de já ter presenciado ou
vivenciado algo.

24)
Expressã o francesa. É o subchefe, o segundo no comando de uma cozinha
profissional e, portanto, responde apenas ao chef.

25)
Minha vida em espanhol.

26)
Perseguidora

27)
Papai em italiano.

28)
Palavra em francê s que caracteriza um tipo de assento estofado, onde nos
sentamos e podemos ficar com as pernas esticadas.

29)
Reviravolta do enredo, mudança radical no rumo da histó ria.

30)
Filho da puta em espanhol.

Você também pode gostar