AV1 - Dietoterapia II
AV1 - Dietoterapia II
AV1 - Dietoterapia II
Paciente P.C.S., sexo masculino, 42 anos, natural de São Paulo e procedente de Florianópolis.
Funcionário público, reside com a esposa e duas filhas em casa própria, provida de luz e água encanada.
Não fuma e não ingere bebidas alcoólicas. Não pratica atividade física. Diagnóstico de Diabetes Mellitus
(DM) há 10 anos e Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) há 8 anos. Nunca realizou tratamento dietoterápico
anteriormente. Diagnóstico de Doença Renal Crônica (DRC) no momento da internação no HU-UFSC,
apresentando: ureia: 145 mg/dL (ref.: 15-39 mg/dL), creatinina: 7,8 mg/dL (0,8-1,3 mg/dL), glicemia de
jejum: 183 mg/dL (<100 mg/dL), altura: 1,72m, peso atual: 117 kg e Taxa de Filtração Glomerular: 30 ml/min/
1,732 (Estágio 3B da DRC).
DIÁRIO ALIMENTAR:
- Desjejum (8 horas):
"Steak" de frango frito, almôndegas fritas, bife à milanesa ou frango frito (2 unidades) ou 6
almôndegas
Arroz branco ou macarrão (6 colheres de sopa/ 4 pegadores)
Feijão com bacon e carne seca (5 vezes na semana- 2 conchas cheias)
Farofa de ovo (2 colheres)
Alface ou rúcula (4 folhas)
Pepino em conserva (3 unidades)
Refrigerante (2 copos)
Pastéis de carne moída ou frango desfiado com ovo (4 unidades) ou X-salada com hambúrguer frito
(1 unidade) ou cachorro-quente (2 unidades) ou pizza de calabresa (4 fatias)
Refrigerante (2 copos)
O tratamento dietoterápico para um paciente na fase pré-dialítica da Doença Renal Crônica (DRC)
objetiva retardar a progressão da doença, controlar os sintomas e evitar complicações. Dado a história
pregressa do paciente, com diagnóstico de DM, HAS e DRC, a abordagem nutricional deve ser
cuidadosamente planejada.
Conforme as Diretrizes de Terapia Nutricional para DRC, a recomendação de energia para pacientes
estáveis varia de 25-35 kcal/kg/dia e leva em consideração fatores como idade, sexo, atividade física,
estado nutricional, estágio da doença renal e comorbidades. (ZAMBELLI, 2021)
Dado o diagnóstico de Diabetes Mellitus, o controle da glicemia é crucial para a saúde do paciente.
Recomenda-se distribuir os carboidratos ao longo das refeições para manter a estabilidade glicêmica. Optar
por carboidratos de baixo índice glicêmico, como grãos integrais, frutas e vegetais, podem ajudar a controlar
a glicemia sanguínea. Alimentos ricos em carboidratos não disponíveis têm baixo índice glicêmico (IG) e
carga glicêmica (CG), resultando em menor aumento de glicose e insulina após refeições ricas em
carboidratos. Isso pode reduzir o apetite e manter níveis saudáveis de glicose, insulina e lipídios no sangue.
Em contraste, carboidratos disponíveis, como açúcares e amido em doces, batatas e refrigerantes, têm alto
IG e CG, levando a maiores picos de glicose e insulina. Ademais, o fracionamento das refeições é
importante para manter os níveis de glicose no sangue estáveis e evitar a sobrecarga renal. Recomenda-se
realizar cerca de 5-6 refeições por dia, incluindo lanches saudáveis entre as principais refeições. (TBCA,
2019)
Sabendo que as diretrizes energéticas para terapia Nutricional da DRC, variam de 25-35 kcal/kg/dia e
tendo mente que o indivíduo encontra-se em obesidade grau 2, utilizarei a faixa inferior sugerida:
GEB = 25 kcal/kg × P
GEB = 25 × 117
GEB = 2925 kcal/dia
Dados referentes a sua ocupação/profissão não foram fornecidos em enunciado, no entanto, tendo
em mente a classificação de IMC do paciente, que o Fator Atividade subdivide-se em dois componentes e
que é sabido que o paciente não pratica atividade física, assumirei FA = 1 — Caracterizando um quadro de
sedentarismo e atividades diárias leves ou muito leves.
FA = GEF + NEAT
FA = 0 + 1
FA = 1
FA = Fator atividade;
GEF = Gasto energético do exercício físico;
NEAT = Non-exercise activity thermogenesis (Termogênese de atividades que não exercícios).
Logo, temos que:
GET = GEB × FA
GET = 2925 kcal/dia × 1
GET = 2925 kcal/dia
A título de curiosidade, utilizando a fórmula Estimated Energy Requirement (IOM, 2005) temos que o
valor de kcal/kg/dia pouco varia — em azul na imagem a seguir.
Na hipótese do paciente encontrar-se num quadro de saúde instável, o foco no atendimento seria
estabilizá-lo — por via medicamentosa — almejando que a internação seja a mais breve possível,
permitindo que o paciente receba alta para casa ou para outra instituição de cuidados médicos. Em primeira
instância, a indução de um balanço energético negativo estaria fora de cogitação.
VET = GET
VET = 2925 Kcal/dia
Todavia, na hipótese do indivíduo encontrar-se num quadro de estabilidade — NÃO injúria renal
aguda, portanto — discreta passagem pela hospitalização e célere retorno ao lar, acredito que seria cabível
o ajuste do aporte energético, compelindo um estado de balanço energético negativo objetivando a perda
ponderal, melhora dos sintomas e biomarcadores associados à HAS e DM, não deixando de levar em conta
o estágio 3B da DRC.
Acredito que alguns profissionais optariam pela prescrição de uma dieta normocalórica ou com déficit
calórico inferior ao proposto por mim, no entanto, existe boa evidência de que uma perda de peso de 5-7%
já pode levar a uma redução na resistência à insulina e, consequentemente, uma redução na glicemia,
triglicerídeos, pressão arterial e deposição de gordura ectópica, como a gordura no fígado. Uma perda de
peso de 10% pode representar um efeito dramático na fibrose hepática em pacientes com doença hepática
não alcoólica e em vários outros marcadores de risco. Ainda, a evidência sugere que a perda de peso
superior a 10% pode reduzir significativamente os riscos gerais à saúde, independentemente do IMC final.
(HALPERN; MANCINI, 2021; LOOK AHEAD RESEARCH GROUP et al., 2016; MAGKOS et al., 2016)
Além disso, penso que questionamentos relacionando o déficit escolhido com a redução de massa
muscular do paciente podem existir, e para esses, replico argumentando o seguinte: Apesar do estágio da
DRC apresentada pelo indivíduo demandar uma ingestão proteica reduzida (0,6-0,8 g/kg/dia), as
recomendações para indivíduos eutróficos, baseadas em estudos que avaliam o balanço nitrogenado, giram
em torno de 0,8 g/kg/dia, então, o mesmo encontra-se na faixa de distribuição eutrófica prevista nas DRI’s
— RDA = 0,8 g/kg/dia e AMDR = 10-35%. Considerando que a distribuição de carboidratos, apesar do
quadro de DM, não se encontrará expressivamente inferior à faixa de distribuição eutrófica prevista nas
DRI’s — AMDR = 45-65%; e tendo em mente que o “efeito poupador de proteínas” conferido aos hidratos de
carbono minimizam o catabolismo proteico, levando em consideração o FA, e sabendo do grau 2 de
obesidade — parecido com os carboidratos, em balanço energético negativo, a adiposidade parece
apresentar efeito poupador de proteínas endógenas — do indivíduo em questão, acredito ter a anuência
necessária para aplicar um déficit mais “agressivo” à um moderado, pensando no remodelamento do quadro
metabólico do indivíduo mais rapidamente, tendo em mente que quanto maior a restrição calórica menores
são as chances da adesão ao planejamento. (COZZOLINO, 2013, 2016; HALUCH, 2019)
O tempo necessário para alcançar uma perda de peso importante — 5-10% — pode variar de pessoa
para pessoa e depende de vários fatores, como a quantidade de peso a ser perdida, a dieta adotada, o nível
de atividade física e outros fatores individuais. Pensando nisso, resolvi utilizar a ferramenta “Body Weight
Planner” do National Institute of Diabetes and Digestive and Kidney Diseases - NIDDK para avaliar a
viabilidade de meu raciocínio e utilizando os dados fornecidos em enunciado associado a uma perda de
peso dentro da faixa importante sugerida, obtive o seguinte resultado:
Portanto, considerando tanto a relação déficit-adesão quanto a perda de peso esperada, considero
clinicamente viável a conduta escolhida.
PLANEJAMENTO ALIMENTAR DO PACIENTE:
OBS: Podem ser utilizados 2,5g de Sal nas preparações do dia (02 + 1/2 sachês de 01 g/dia).
Hidratação: Consumir 03 L/dia de água (Já considerando a ingesta do planejamento alimentar).
c) Caso ocorra uma progressão da DRC e o paciente evolua com redução da TFG para <15 ml/min/
1,732 (estágio 5 da DRC), sendo necessário iniciar o tratamento de hemodiálise, qual a conduta
dietoterápica a ser adotada no tratamento do paciente? Descreva e justifique as características
da dieta considerando a prescrição de energia, macronutrientes (proteínas, lipídeos e
carboidratos) e micronutrientes, fracionamento da dieta e prescrição da ingestão hídrica para a
fase hemodialítica. (0,5 pontos)
Conforme as Diretrizes de Terapia Nutricional para DRC, a recomendação de energia para pacientes
estáveis varia de 25-35 kcal/kg/dia e leva em consideração fatores como idade, sexo, atividade física,
estado nutricional, estágio da doença renal e comorbidades. Irá variar conforme a necessidade individual e
o estado nutricional do paciente. Manter uma ingestão calórica adequada é importante para evitar a perda
excessiva de peso e a desnutrição.(ZAMBELLI, 2021)
A dieta deve equilibrar sódio, potássio, cálcio e fósforo. Limitar alimentos ricos em potássio e fósforo,
como bananas, laranjas, batatas e laticínios, é recomendado. Monitorar regularmente os níveis sanguíneos
desses eletrólitos é essencial. (SBN, 2023)
A ingestão de líquidos deve ser adaptada à capacidade de diurese residual e à remoção de líquidos
durante a hemodiálise, com o objetivo de evitar sobrecarga hídrica. Geralmente, é necessário limitar a
ingestão de líquidos. De acordo com a Sociedade Brasileira de Nefrologia (2023), para controlar a ingestão
de líquidos, você pode usar uma fórmula simples: 500 mL + volume de urina em 24 horas. Por exemplo, se
urinar 300 mL em 24 horas, pode beber até 800 mL. Se não urinar mais, limite-se a 500 mL por dia. Lembre-
se, líquidos incluem água, leite, sucos, chá, café e alimentos com alta quantidade de água, como frutas e
vegetais. Dicas para controlar a sede: Evite alimentos muito salgados e doces, pois aumentam a sede. Opte
por bebidas e frutas geladas para saciedade. Evite sopas e caldos, que têm muito líquido. Separe a
quantidade recomendada de líquidos, incluindo água, em uma garrafa para controle. Siga as restrições
rigorosamente para colher benefícios.
É aconselhável fazer refeições menores ao longo do dia para evitar o estresse digestivo e controlar os
eletrólitos. O fracionamento das refeições é importante para manter os níveis de glicose no sangue estáveis
FÓSFORO
ALTO TEOR
CARNES
Peixe, frango, porco, boi, sardinha, frutos do mar, miúdos, linguiça, salsicha, presunto, mortadela, salame, peito de
peru.
LEITES E DERIVADOS
GRÃOS
ORIENTAÇÕES NUTRICIONAIS
Nesse estágio da doença renal crônica, o controle dos nutrientes, como potássio, fósforo, sódio e
cálcio, é especialmente importante para prevenir complicações e manter o equilíbrio eletrolítico.
Tratando-se da ingestão de potássio, monitore seu consumo, opte por preparar verduras e legumes
cozidos, descartando a água do cozimento. Dê preferência a frutas e vegetais com menor teor desse
mineral, bem como limite o consumo de sucos de frutas e evite substitutos do sal que contenham potássio.
POTÁSSIO
FRUTAS FRUTAS
VEGETAIS GRÃOS
LEGUMES OLEAGINOSAS
Tratando-se da ingestão de fósforo, reduza o consumo de alimentos ricos desse mineral, como
produtos lácteos, frutos do mar, nozes e alimentos processados. Opte por laticínios de baixo teor de fósforo,
como leite e queijo desnatados. Evite aditivos fosfatados presentes em alimentos processados e bebidas
carbonatadas — refrigerantes a base de cola, principalmente.
Tratando-se da ingestão de sódio, reduza a ingestão de sal (cloreto de sódio) na dieta. Evite
alimentos enlatados, processados, embutidos e fast-foods, esses tendem a ser ricos em sódio. Utilize ervas
e temperos naturais para dar sabor aos alimentos em vez de sal — Alho, cebola, orégano, manjericão, alho-
poró, alecrim, tomilho, louro, especiarias e etc.
Tratando-se da ingestão de cálcio, mantenha o consumo desse mineral conforme orientação do
profissional de saúde, pois pode ser necessário monitorar os níveis de cálcio no sangue. Opte por alimentos
de fontes de cálcio não lácteas, como brócolis, couve, tofu e sardinha enlatada.
Deve-se evitar alguns alimentos — queijos, miúdos, embutidos, oleaginosas, alimentos ricos em
açúcar, refrigerantes, bebidas alcóolicas, frutos do mar, gema de ovo, alimentos industrializados com
aditivos excessivos e ricos em potássio e fósforo, enlatados em conserva e temperos ricos em sódio. Ainda,
pacientes com DRC devem evitar o consumo de carambola e qualquer alimento preparado com a fruta,
como suco, geleia, doce, sorvete e bolo. A carambola contém caramboxina, uma toxina normalmente filtrada
pelos rins. No entanto, devido à disfunção renal, essa neurotoxina pode acumular-se no corpo devido a um
mecanismo não totalmente compreendido. Isso pode resultar em uma série de sintomas, — soluços
persistentes, vômitos, confusão mental, agitação, fadiga muscular até mesmo convulsões e óbito. (SBN,
2023)
REFERÊNCIAS
Body Weight Planner - NIDDK. Disponível em: <https://www.niddk.nih.gov/bwp>. Acesso em: 30 ago. 2023.
COZZOLINO, S. M. F.; COMINETTI, C. Bases bioquímicas e fisiológicas da nutrição. Barueri-SP, Manole, 2013.
HALPERN, B.; MANCINI, M. C. Controlled obesity status: a rarely used concept, but with particular importance in the
COVID-19 pandemic and beyond. Journal of Endocrinological Investigation, v. 44, n. 4, p. 877–880, 1 abr. 2021.
HALUCH, D.Estratégias nutricionais para definição muscular: Cutting/Pré-Contest [recurso eletrônico] Curitiba, PR. Ed.
Do Autor, 2019.
KRITCHEVSKY, S. B. et al. Intentional weight loss and all-cause mortality: a meta-analysis of randomized clinical trials.
PloS One, v. 10, n. 3, p. e0121993, 2015.
KUNEN, S. C. Obesidade como fator de risco de doenças crônicas não transmissíveis em uma Unidade Básica de
Saúde de Pinhais-PR: estudo transversal e intervenções educativas. 2016.
LOOK AHEAD RESEARCH GROUP et al. Association of the magnitude of weight loss and changes in physical fitness
with long-term cardiovascular disease outcomes in overweight or obese people with type 2 diabetes: a post-hoc analysis
of the Look AHEAD randomised clinical trial. The Lancet. Diabetes & Endocrinology, v. 4, n. 11, p. 913–921, nov. 2016.
MAGKOS, F. et al. Effects of Moderate and Subsequent Progressive Weight Loss on Metabolic Function and Adipose
Tissue Biology in Humans with Obesity. Cell Metabolism, v. 23, n. 4, p. 591–601, 12 abr. 2016.
NATIONAL KIDNEY FOUNDATION. K/DOQI clinical practice guidelines for chronic kidney disease: evaluation,
classification, and stratification. American Journal of Kidney Diseases: The Official Journal of the National Kidney
Foundation, v. 39, n. 2 Suppl 1, p. S1-266, fev. 2002.
PADOVANI, R. M. et al. Dietary reference intakes: aplicabilidade das tabelas em estudos nutricionais. Revista de
Nutrição, v. 19, n. 6, p. 741–760, dez. 2006.
RYAN, D. H.; YOCKEY, S. R. Weight Loss and Improvement in Comorbidity: Differences at 5%, 10%, 15%, and Over.
Current Obesity Reports, v. 6, n. 2, p. 187–194, jun. 2017.
ZAMBELLI, C. M. S. F.; GONÇALVES, R. C.; ALVES, J. T. M. Diretriz BRASPEN de Terapia Nutricional no Paciente com
Doença Renal. Braspen Journal, v. Supl2, n. 2, 15 jul. 2021.