Vibrações Mecânicas e Eléctricas: Gazeta de Física
Vibrações Mecânicas e Eléctricas: Gazeta de Física
Vibrações Mecânicas e Eléctricas: Gazeta de Física
O que se segue tem por objectivo pôr cial da corrente, ou da carga de um conden-
mais uma vez em evidência a profunda ana- sador inserido num circuito eléctrico de
logia existente entre os fenómenos vibra- características L, R, C, no qual existe tam-
tórios, mecânicos ou acústicos, e o carácter bém uma f. e. m. aplicada do tipo
sinusoidal de certos fenómenos eléctricos,
como seja, por exemplo, o caso da corrente ε ε0 cos ωt
alternada.
Estas considerações terão a vantagem
de nos conduzir a uma visão de conjunto isto é, que varia sinusoidalmente com o
destes fenómenos, com o consequente e útil tempo. Sabemos que é
aprofundamento dos conceitos, quer da
Mecânica, quer da Electricidade, que forem
di q
postos em jogo. L Ri ε0 cos ωt
dt c
Limitar-nos-emos, neste estudo, ao caso
de vibrações harmónicas simples, quer do
ponto de vista mecânico, quer eléctrico, que exprime, afinal, ser nula, em cada ins-
isto é, representadas analìticamente por tante, a tensão ao longo de todo o circuito
uma função sinusoidal simples do tempo. fechado (como exige o princípio da conser-
Seja uma partícula material, de massa vação da energia em regime quase estacio-
m, sujeita a uma força elástica de chamada nário).
proporcional à elongação da partícula x em Podemos escrever ainda
cada instante, a uma força de atrito que
supomos proporcional à velocidade da par-
1
tícula, e ainda a uma força exterior, apli- Lq Rq q ε0 cos ωt (2)
c
cada, de direcção constante e cujo módulo
varia sinusoidalmente com o tempo, com
frequência angular ω. O movimento da par- Também aqui as três tensões do primeiro
tícula será representado evidentemente pela membro são tensões de reacção do circuito
equação diferencial, à f. e. m. aplicada, que figura no segundo
membro.
Deixando de lado a interpretação destas
mx βx Kx F0 cos ωt (1)
tensões à luz da equação (1), a flagrante
analogia entre as equações (1) e (2) está
cujo integral geral, em ordem ao tempo, longe de ser meramente formal, e sugere
mostra que ela executa, em regime perma- que se faça a seguinte correspondência de
nente, um movimento vibratório sinusoidal. coeficientes
Notemos, desde já, que, no primeiro mem-
bro desta equação, a primeira parcela repre-
1
senta a força de inércia, a segunda parcela L m R β K
C
a força de atrito, e a terceira a força elás-
tica, todas de reacção ao movimento, e por
isso mesmo opostas à força aplicada F, que a qual arrasta a correspondência da carga
figura isolada no segundo membro. q do condensador a uma elongação x, o que
Escrevamos também a equação diferen- é perfeitamente justificável, deste ponto de
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vista analógico, dado que as derivadas em Com efeito, os primeiros integrais gerais
ordem ao tempo são respectivamente das equações (1) e (2) seriam então respec-
tivamente:
q i
x v
1 x2
mv 2 K const. M1 (3)
e a intensidade de uma corrente eléctrica 2 2
pode ser tratada como uma velocidade de 1 2 1 q2
uma partícula material. Mais precisamente, Li const. E1 (4)
2 2c
a intensidade da corrente eléctrica terá o ca-
rácter de uma vazão, na analogia hidrodinâ-
em perfeita correspondência simbólica, e
mica, o vector correspondente à velocidade
que traduziam, no mov. mecânico, a con-
num ponto de um meio fluído sendo rigoro-
servação da soma das energias potencial e
samente a densidade de corrente. Mas, do
cinética da partícula, e na corrente alter-
ponto de vista de dimensões, as duas grande-
nada, a conservação da soma das energias
zas diferem apenas por um factor área que não
magnética da self, e electrostática do con-
interessa considerar agora aqui. Notemos
densador, e, em ambos os casos, a conser-
que as equações (1) pressupõem ser a trajec-
vação de toda a energia inicialmente posta
tória da partícula rectilínia, o que permite abs-
em jogo, mecânica em (3), electro-magné-
trair do carácter vectorial da sua velocidade.
tica em (4).
Sabido que os nomes das grandezas eléc-
A analogia formal das expressões 1/2 mv2
tricas, força electromotriz, tensão, resistên-
e 1/2 Li2 lembra, com efeito, o carácter
cia, e outras, não engeitam a sua primi-
cinético da energia magnética, justificado
tiva concepção mecânica, vemos agora a
pelas condições do equilíbrio electro-dinâ-
justeza dessas denominações, à luz da ana-
mico, em que se verifica um máximo de
logia indicada.
energia magnética para condição de equilí-
Com efeito a parcela R q R i da equa-
brio estável. O carácter potencial da ener-
ção (2) representa fundamentalmente, no
gia armazenada no condensador, também
circuito da corrente alternada, o mesmo
fica sobejamente demonstrado.
papel que o atrito no movimento mecânico
Lembremos apenas que as trocas de
em meio fluido: Só que aqui se sabe cal-
energia electro-magnética se dariam exclu-
cular rigorosamente a dissipação da energia
sivamente entre o condensador e a self, à
por efeito Joule, correspondente ao desen-
semelhança das trocas de energia potencial
volvimento de calor por atrito no movimento
em cinética da partícula oscilatória, ou de
mecânico, calor este mais difícil de calcular,
um sistema pendular livre, sem atrito.
ao menos em função só das características
É interessante notar que esta conserva-
intrínsecas do sistema.
ção de energia eléctrica, representada pela
Se não houver resistência no circuito
troca, sem perdas,
(caso ideal, correspondente à não existência
de atrito mecânico) não haverá dissipação
da energia e o movimento ou a corrente, energia eléctrica do condensador
permaneceriam indefinidamente, sem con- energia magnética da self,
sumo de energia, àparte a inicialmente for-
necida; mesmo sem existência de força está ligada ao facto da corrente na self,
exterior aplicada (1). ou na capacidade, não estar em fase com
a tensão nos seus extremos, mas em qua-
(1) Voltarei adiante a este assunto, no caso de dratura, e assim poder ser armazenada a
existência de força aplicada. potência desenvolvida.
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1 T
1 K β2
VI
T
0 2
sen 2ωt dt 0 ω
m 4m 2
F0
a (6)
m 2ω20 ω2 β2ω2
2
por ser nulo, em cada período, o valor mé-
dio da função seno. βω
ω ctg (7)
A identificação dos coeficientes L m, m ω02 ω2
faz pensar na existência de uma inércia dos
circuitos eléctricos, que a lei de Ohm da e C e ψ são as duas constantes arbitrárias
corrente contínua exclui (1), mas que vem a de integração, a determinar em cada caso
aparecer com os fenómenos de indução elec- concreto, pelas condições iniciais de posição
tro-magnética; enquanto que a correspon- e velocidade, ou de carga e intensidade (1).
dência Como se vê o movimento da partícula,
ou a corrente no circuito, são compostos
K 1/ C de duas partes: a primeira representa o
regime livre, regime transitório que tende
nos convida a ver a capacidade sob um ràpidamente para zero; a segunda o regime
aspecto mecânico, qualquer coisa, que, no forçado, regime sinusoidal com a frequên-
sistema, variaria na razão inversa de reac- cia imposta — no caso eléctrico, a corrente
ção elástica, da rigidez duma mola, por alternada.
exemplo, e que, no sistema pendular, esta- Atentemos no que se passa, com a pul-
ria na razão directa do momento de inércia sação, por exemplo. A pulsação própria do
e na inversa do comprimento (distância d). sistema mecânico, isto é, a pulsação do sis-
É evidente que a analogia apontada se vai tema livre, e sem amortecimento, é
verificar «ipso facto» nos integrais gerais
das equações (1) e (2), e ainda, em todas as 0 K
ωm
m
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enquanto que a pulsação do movimento menor for a pulsação própria, sempre finita;
amortecido é, no primeiro caso e, em todo o caso, sempre maior que a
amplitude imposta F0 ou ε0. Perto da res-
K β2 sonância mecânica, a amplitude do movi-
ωm ωm
m 4m 2
0 mento cresce ràpidamente com grande
amplificação em relação à amplitude da
e no segundo força aplicada, o que traz como conse-
quência o aparecimento de grandes forças
1 R2 de chamada elástica, que podem, como
ωe 2 ωe0 sabemos, destruir o objecto vibrante. (Veja
LC 4L
equação 1).
de acordo com a correspondência dos coe- Do mesmo modo, perto da ressonância
ficientes posta inicialmente, como era de eléctrica, aparecem perigosas sobretensões
esperar. Ainda aqui, a resistência, ou a nos circuitos, muito superiores às aplicadas,
self, têm, sobre a pulsação eléctrica, o fenómeno sobejamente conhecido dos elec-
mesmo efeito que o atrito, ou a massa da troctécnicos. E o teorema das bandas de
partícula sobre a pulsação do movimento passagem, zona em que se aproveita a
mecânico. amplificação, base da selectividade acús-
As variações de amplitude a e da fase Φ tica, é também a base da selectividade
do regime forçado com a frequência imposta, eléctrica, tão aproveitada na recepção em
podem também ser estudadas num parale- T. S. F.
lismo absoluto. A amplificação na ressonância entre a
Nomeadamente, a ressonância eléctrica tensão nos pratos do condensador e a f. e. m.
corresponde à ressonância mecânica ou acús- aplicada vale, como é facil de calcular Lω/R
tica, e os efeitos são absolutamente para- que se chama factor de sobretensão do cir-
lelos. Como se sabe, a curva da ressonância cuito.
é da forma Basta notar que, no simbolismo imagi-
nário, se tem, na ressonância
ε V
i j C ωV
R j
Cω
Mas
1
L ω0
Cω
e portanto
com um máximo muito acentuado para V L ω0
ω = ω0. Este máximo vale, como se vê da
ε R
expressão de a, F0/βω0 e torna-se infinito
quando β = 0 (quando não há amorteci- como se queria demonstrar. É de prever
mento, ou resistência), e é tanto maior quanto que, a este factor de sobretensão nos cir-
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cuitos eléctricos, corresponda, nas vibrações É o que pode deduzir-se também da equa-
mecânicas, o factor mω0/β. Ora, esta expres- ção (8), se nos lembrarmos de que, por ser
são, à parte o factor 1/π, representa o quo- ω pequeno, o termo mx mω2x pode
ciente da constante de tempo do circuito, desprezar-se por conter o quadrado de ω.
pelo período próprio: Fìsicamente, isto quer dizer que a força de
inércia se pode desprezar e o movimento do
2m 2π m ω0 sistema será «controlado pela elasticidade».
β ω0 π β A equação (8) pode então escrever-se,
com a aproximação referida,
Quer dizer, se pudéssemos falar da sobre-
tensão acústica, ela representaria, medido F0
x cos ωt
em períodos próprios do objecto vibrante, K
o tempo que a amplitude da vibração, leva-
ria, em regime livre, a reduzir-se a 1/e de e a amplitude é independente da frequência
seu valor inicial. imposta.
Os valores desta sobretensão acústica, Pelo contrário, se a frequência ω imposta
são, em geral, muito superiores, aos das cresce muito além de ω0, vê-se da mesma
sobretensões das bobinas eléctricas. Assim expressão (6) que a amplitude do movimento
é que, para um diapasão, de 64 vibrações forçado tende para zero, o mesmo sucedendo
por segundo, posto em vibração, esta perdu- portanto à elongação x e ao termo Kx da
rará cerca de 1 minuto. Tomando metade equação (8) que representa a força elástica.
deste valor para constante de tempo, obte- E assim chegamos nesta hipótese, à equação
mos para factor de sobretensão um valor
de cerca de 2.000, enquanto que, em bobi- mx F0 cos ωt
nas para alta frequência, usadas nos recep-
tores de T. S. F., raramente se atinge um que representa um movimento apenas «con-
coeficiente de sobretensão superior a 200. trolado pela inércia».
(V. Dynamique Géneral des Vibrations, Y. (V. Dynamique Géneral des Vibrations,
Rocard. Pag. 64). Pag. 9),
Atentemos ainda, e para terminar, no Tudo se passa semelhantemente nos cir-
caso interessante do circuito self-capacidade, cuitos eléctricos correspondentes.
ou de um sistema pendular sem amorteci- Para pequena frequência da f. e. m. im-
mento, em regime forçado, isto é, com uma posta, a equação toma a forma
força aplicada, mecânica ou eléctrica, sinu-
soidal. 1
Num tal sistema, representado pela equa- q ε0 cos ωt
C
ção
q ε0 C cos ωt
mx Kx F0 cos ωt (8)
i ω ε0 sen ωt
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ε
i (para a bobina)
jLω Em próximo artigo procurarei tratar
i jωC.ε (para o condensador) alguns casos interessantes de acopulamen-
tos de sistemas vibrantes mecânicos e eléc-
tricos, considerados deste mesmo ponto de
Se ω tende para
zero
ii 0 (no
(na bobina)
condensador)
vista.
LÍBANO MONTEIRO
2.º Assistente da F. C. L.
Se ω tende para i 0 (na bobina)
infinito i (no condensado r)
BIBLIOGRAFIA
ou mais sugestivamente ainda do gráfiico Y. ROCARD — Dynamique Géneral des Vibrations.
da variação da amplitude com a frequência YOOS — Theoretical Physics.
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