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GR. A Beleza Da Ginastica Ritmica

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
NÚCLEO DE ESTUDOS E PESQUISAS EM EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E
TECNOLOGIA

LLoorreettaa M
Meelloo B
Beezzeerrrraa C
Caavvaallccaannttii

Beleza e Poder na Ginástica Rítmica:


reflexões para a Educação Física

Natal, RN
2008
Livros Grátis
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Milhares de livros grátis para download.
1

Loreta Melo Bezerra Cavalcanti

Beleza e Poder na Ginástica Rítmica:


reflexões para a Educação Física

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Educação da UFRN, linha de pesquisa
“Estratégia de pensamento e produção do
conhecimento”, como requisito para obtenção do
título de mestre.
Orientadora: Profa. Dra. Karenine de Oliveira
Porpino.

Natal – RN
Março de 2008
2

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE


CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
NÚCLEO DE ESTUDOS E PESQUISAS EM EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E
TECNOLOGIA

A comissão abaixo-assinada aprova a dissertação intitulada

Beleza e Poder na Ginástica Rítmica:


reflexões para a Educação Física
Elaborada por

Loreta Melo Bezerra Cavalcanti

Banca examinadora

___________________________________
Profa. Dra. Karenine de Oliveira Porpino (UFRN) - Orientadora

___________________________________
Profa. Dra. Elaine Melo de Brito Costa Lemos (UEPB)

___________________________________
Profa. Dra. Terezinha Petrucia da Nóbrega (UFRN)

___________________________________
Profa. Dra. Larissa Kelly de Oliveira Marques Tibúrcio (UFRN)
Suplente

Natal – RN
Março de 2008
3

Ao meu vovô querido, Pedro Freire (in


memorian), pela vivacidade e amor pela
cultura que o acompanhou até o último
suspiro. Ele se eternizou em nossos
corações e em seus escritos tão sábios.
4

“Depois de algum tempo você descobre


que as pessoas com quem você mais se
importa na vida são tomadas de você
muito depressa (...) Por isto, sempre
devemos deixar as pessoas que amamos
com palavras amorosas, pode ser a última
vez que as vejamos.”
Wiliam Shaekespeare
5

AGRADECIMENTOS

“Os homens esqueceram a verdade,


disse a raposa.
Mas tu não a deves esquecer.
Tu te tornas eternamente responsável
por aquilo que cativas".
Antoine de Saint-Exupéry

Ao longo do processo de elaboração deste trabalho cativei e fui cativada.

Acredito que muitas dessas linhas foram inspiradas por relações e distâncias, casos e

acasos, discussões e silêncios, ambigüidades que se entrelaçaram para

posteriormente nortear nossas reflexões.

No entanto, desde os primeiros traçados, o sentido propulsionador deste

trabalho foi o de compreender o fenômeno da beleza. Esse sentido se projetou como

um filme nos meus pensamentos quando resolvi agradecer às pessoas que me

cativaram, pessoas que comportam o significado deste fenômeno, pessoas belas,

presentes em cada etapa de um dos percursos mais envolventes da minha existência.

A criação e recriação do texto me remetia a vocês, que estiveram comigo nesse

momento tão importante: a gestação dupla, de um filho, Davi, e desta minha filha.

Primeiramente, agradeço a Deus pela força nos momentos difíceis, pelas

alegrias nos momentos de realização, pelas dádivas da vida.

A toda minha família, todos aqueles com os quais mantenho laços de sangue

ou de união, sem exceção, em nome dos meus pais Lourival e Tânia.

Aos meus dois amores: meu pequenino Davi e meu companheiro Alexsandro.

Vocês são meu “porto-seguro”, meu tudo, meu horizonte.

À orientadora querida, Karenine Porpino. Se pudesse resumi-la em uma só

palavra seria: SENSIBILIDADE. Espero compartilhar muitos outros momentos com

você, na Academia, na maternidade, na vida! Muito obrigada por tudo, sobretudo


6

pelo carinho nas nossas conversas, por todas as sábias palavras que acalmavam meu

coração em tempos difíceis e fizeram-me aprender muito.

Agradeço às professoras leitoras Petrucia e Larissa pelas contribuições atentas

e desveladoras nos seminários de dissertação, sem seus olhares este trabalho não

teria o mesmo significado. Além disso, não perderei a oportunidade se expressar o

meu carinho e admiração profissional e humana, pois, enquanto uma me inspira

fortaleza, outra me inspira compreensão.

Ao Grupo de Estudos Corpo e Cultura de Movimentos, pela aprendizagem,

amizades, ampliação de olhares, pelo orgulho de participar de um grupo tão

envolvente, comprometido e competente.

Aos amigos da Licenciatura em Educação Física, dignos dessa formação, com

quem compartilho, desde a primeira aula de anatomia, vivências extremamente

significantes da formação acadêmica: Anna Paulla, Analwik, Allyson, Augusto,

Laíse e João Carlos.

Às amigas de infância, as irmãs que escolhi, por toda força, por me provarem,

mesmo sem que eu pedisse, disponibilidade, companheirismo, preocupação, afeto,

carinho, abrigo, respeito, coisas do coração que jamais esquecerei: Aline e família,

Alinne, Andréa, Jeane, Isabelle e Karine.

Ao Grupo Parafolclórico da UFRN, em nome da professora Rita Luzia, pelas

experiências maravilhosas, que se processaram tanto no dia-a-dia com bailarinos e

professores quanto nos palcos. Agradeço também a amizade firmada com alguns

bailarinos, em especial: Rosie Marie, Raquel, Paula, Gevaldo, Molusco e Acácia.

Ao programa de Pós-Graduação em Educação da UFRN, em nome de todos

os professores e funcionários.

A todos aqueles que de forma direta e indireta contribuíram para a minha

formação e para as idéias deste trabalho.


7

RESUMO

A beleza na Ginástica Rítmica (GR) se esboçou como condição de sua

existência. Para indagá-la tomamos o discurso sobre poder de Foucault (1971, 1979,

1987, 1988, 1997, 2003) e sua relação com a produção de saberes. Com base nessa

compreensão refletimos sobre as relações de poder na GR que se mediaram e

consolidaram pela regulamentação de sua prática, cujo Código de Pontuação tem

papel preponderante. Sendo assim, a GR construiu sua beleza através dos tempos

por meio de jogos de forças em que preponderaram a gestualidade de corpos

performáticos, através da disciplina. Esta configurou sentidos atrelados à coerção-

resistência dos corpos: a produção de discursos. Por isso, pensando a beleza como

uma trama de discursos construídos por essas relações de poder-saber dos

investimentos do corpo na Ginástica Rítmica questionamos: Como o Código de

Pontuação regulamenta a Ginástica Rítmica para a construção da beleza? Qual a

relação entre poderes e saberes implicados nessa regulamentação? Para tanto, temos

como objetivos: Investigar a beleza na Ginástica Rítmica como saber produzido a

partir das relações de poder circunscritas nas regras da modalidade; e, Discutir a

beleza a partir da relação poder/saber como reflexão para o âmbito da Educação

Física. Como recurso metodológico utilizamos a técnica de Análise de Conteúdo

(BARDIN, 1977) para analisar o Código de Pontuação de GR na versão 2005-2008.

Também fizemos uso de imagens de ginastas como recurso analógico para ampliar o

sentido das discussões. A leitura flutuante nos permitiu selecionar unidades

significativas e pautar nossas discussões em três eixos temáticos que compõem o

primeiro capítulo intitulado “A beleza regulamentada”. Neste, discutimos as

especificidades da GR, as prescrições dos usos do tempo e espaço e a configuração

do gesto técnico a partir da análise do Código. No segundo capítulo “O corpo belo

transcende a regra” realizamos algumas reflexões relacionadas à Educação Física,


8

partindo da discussão do capítulo anterior, com enfoque em três tópicos: Poderes e

Saberes, Técnica e Estilo e Beleza e Educação. Constatamos assim, que a beleza da

Ginástica Rítmica contemporânea é permeada pelas suas regulamentações, mas foi e

continua sendo desenhada por mecanismos de poder-saber ao longo de sua

trajetória histórica. Mesmo o Código de Pontuação ditando condições para a beleza

na GR, esta se dá na possibilidade da criação do estilo próprio pela ginasta, na

possibilidade de viver o improviso e o imprevisto, de sensibilizar o público – porque

o poder cria saberes e o corpo como suplantador, sempre criará novas formas de ser

belo. A constatação de que o Código de Pontuação produz a beleza e a ginasta a

reconstrói, continuamente, reatualizando as regras é uma reflexão importante para a

Educação Física no sentido de reafirmar que o corpo nunca é somente submisso,

pois mesmo na submissão é capaz de produzir saber, ser belo e criar novos sentidos

para a Cultura de Movimento.

Palavras-chave: Ginástica Rítmica, beleza, poder, Educação Física.


9

RÉSUMÉ

La beauté dans la Gymnastique Rythmique (GR) s’est esquissée comme

condition de son existence. Pour son analyse, nous avons eu recourt au discours sur

le pouvoir de Foucault (1971, 1979, 1987, 1988, 1997, 2003) et à sa relation avec la

production de savoirs. Basés sur cette compréhension, nous avons réfléchi sur les

relations de pouvoir dans la GR qui se sont établies et consolidées grâce à la

réglementation de sa pratique, dans lequel le Code de Pointage a un rôle

prépondérant. Ainsi, la GR a construit sa beauté à travers les temps au moyen de

jeux de force où la gestualité de corps performatiques, à travers la discipline, a été

prépondérant. Cette dernière a configuré des sens attelés à la coercition-résistence

des corps: la production de discours. C’est en pensant à une beauté comme ume

trame de discours construits par ces relations de pouvoir-savoir des investissements

du corps dans la Gymanstique Rythmique que nous nous posons les questions :

Comment le Code de Pointage réglemente la gymanstique rythmique et sportive au

sujet de la construction de la beauté ? Quelle est la relation entre les pouvoirs et les

savoirs impliqués dans cette réglementation ? Nous avons donc pour objectifs de

rechercher la beauté dans la Gymnastique Rythmique comme savoir produit à partir

des relations du pouvoir circonscrites dans les règles de la modalité et de discuter la

beauté à partir de la relation pouvoir/savoir comme réflexion pour le milieu de

l’éducation physique. Nous avons utilisé comme méthodologie la technique de

l’analyse de contenu (Bardin, 1977) afin d’analyser le Code de Pointage de la GR

dans sa version 2005-2008. Nous avons également fait usage des images de

gymnastes comme moyen analogique pour amplifier le sens des discussions. La

lecture fluctuante nous a permis de sélectionner des unités significatives et

d’organiser nos discussions en trois axes thématiques qui composent le premier

chapitre intitulé « La beauté réglementée ». Dans ce chapitre, nous discutons les


10

spécificités de la GR, la prescription de l’utilisation du temps et de l’espace et la

configuration du geste technique à partir de l’analyse de son code de ponctuation.

Dans le deuxième chapitre, « Le corps beau transcende la règle », nous réalisons

quelques réflexions destinées à l’éducation physique à partir de la discussion du

chapitre antérieur en prenant pour cible trois sujets : Pouvoirs et Savoirs, Technique

et Style, Beauté et Éducation. Nous avons ainsi constaté que la beauté de la

Gymnastique Rythmique contemporaine est entourée par sa réglementation, mais a

été et continue à être dessinée par des mécanismes de pouvoir-savoir tout au long de

sa trajectoire historique. Malgré l’existence de conditions pour la beauté dans le

Code de Pointage de la GR, il existe la possibilité de la création du propre style par

la gymnaste, par la possibilité de vivre l’improvisé et l’imprévu, de sensibiliser le

public, parce que le pouvoir crée des savoirs et le corps, qui se dépasse, créera

toujours de nouvelles formes d’être beau. La constatation que le Code de Pointage

produit une beauté et que la gymnaste la reconstruit continuellement en en

réactualisant les règles est une réflexion importante pour l’éducation physique : elle

réaffirme que le corps n’est jamais seulement soumis, que même dans la soumission

il est capable de produir du savoir, d’ être beau et de créer de nouveaux sens pour la

Culture de Mouvements.

Mot-clef : la Gymnastique Rythmique, la beauté, le pouvoir, l’éducation physique.


11

SUMÁRIO

Lista de imagens 12

Motivações e intenções 15

1 Introdução 19

2 A beleza regulamentada 31

3 O corpo belo transcende a regra 72

4 Considerações finais 103

Referências bibliográficas ___________ 108

Glossário __________ 114

Anexos _________________ _________ 117


12

LISTA DE IMAGENS

Imagem 1 – Seleção brasileira de conjuntos de Ginástica Rítmica, série de 3 arcos

e 2 bolas, Jogos Olímpicos de Athenas, 2004, capa.

Imagem 2 – Ginasta russa Alina Kabaeva, série de corda, Campeonato Mundial

de Paris 2000, p. 14.

Imagem 3 – Ginasta bielorussa Larissa Lukyanenko, série de maças – Olimpíadas

de Atlanta, 2000, p. 18.

Imagem 4 – Ginasta russa Alina Kabaeva, série de bola, Gran prix de Moscou,

2006, p. 30.

Imagem 5, 6 e 7 – Ginasta brasileira Vera Miranda, série com arco, 1972. Ginasta

russa Amina Zaripova. Ginasta russa Olga Kapranova, série de corda,

Campeonato mundial de Patras, 2007, p. 35.

Imagem 8 e 9 – Conjunto de arcos, Grupo Unido de Ginastas, 1972. Seleção

brasileira de conjunto de GR, Pan-americano do Rio de Janeiro, 2007, p. 37.

Imagem 10 e 11 - Artista do Cirque du Soleil com fita, espetáculo Alegria, ginasta

russa Alina Kabaeva com fita no mundial de Budapeste, 2003, p. 40.

Imagem 12 – Ginasta brasileira Larissa Barata, série de fita no Pan-americano de

Santo Domingo, 2005, p. 43.

Imagem 13 – Conjunto ucraniano, série de cinco pares de maças, Campeonato

Europeu, 2001. p. 45.

Imagem 14 - Conjunto de Fitas, China, p. 46.

Imagem 15 – Seleção brasileira de conjunto, série de arco e maças no Campeonato

mundial de Patras, 2007, p. 47.

Imagem 16 e 17 – Seleções ucranianas de conjunto, série de 5 cordas e série de 5

arcos nos campeonatos europeus de 2001 e 2003, respectivamente, p. 50.


13

Imagem 18 – Ginasta búlgara Maria Petrova, série de arco, Campeonato Mundial

de Paris, 1994, p. 54.

Imagem 19 – Ginasta russa Irina Tchachina – série de arco, 2004, p. 56.

Imagem 20 e 21 – GUG, conjunto de bola, Rio de Janeiro, 1972, e, Seleção

brasileira de conjunto, série de arco e maças, Campeonato Mundial de Baku.

2005, p. 58.

Imagem 22 – Ginasta com fita, p. 60.

Imagens 23 e 24 – Bailarina de Ballet Clássico executando um grand jeté e ginasta,

série de bola, p. 61.

Imagem 25 – Ginasta ucraniana Elena Vitrichenko, série de bola, Jogos Olímpicos

de Atlanta, 1996, p. 62.

Imagem 26 – Ginasta búlgara Teodora Alexandrova, série de bola, Campeonato

Mundial de Osaka, 1999, p. 67.

Imagem 27 - Seleção brasileira de conjunto, série de 5 fitas, Jogos Olímpicos de

Sydney, 2000, p. 69.

Imagem 28 – Ginasta espanhola Almudena Cid, série de maças, p. 71.

Imagens 29 e 30 – Ginasta, série de bola. Ginasta ucraniana Anna Bessonova,

série de fita, 2006, p. 76.

Imagens 31 e 32 – Ginasta soviética Marina Lobatch, série de fita. Ginasta búlgara

Iliana Raéva, série de bola. Década de 1980, p. 81.

Imagem 33 – Ginasta ucraniana Ana Bessonova, série de arco no mundial de

Budapeste em 2003, p. 84.

Imagem 34 – Ginasta russa Alina Kabaeva, série de arco, mundial de Budapeste,

2003, p. 85.

Imagem 35 – Seleção brasileira de conjunto, série de 5 pares de

maças,Campeonato dos 4 continentes, Curitiba, 2003, p. 98.

Imagem 36 – Ginasta russa Amina Zaripova, série de bola, p. 103.


14

MOTIVAÇÕES E
INTENÇÕES
15

Construir essa dissertação significou mais que a escrita de um trabalho


acadêmico, trata-se da expressão de muitos sentidos no percurso de uma vida, pois

para mim, a Ginástica Rítmica (GR) exprime algo que determinou grande parcela de

minhas escolhas.

Na infância vivi a GR sem esse nome, nas brincadeiras de corda, bola,

bambolê, nas brincadeiras com um corpo coincidentemente flexível, nas

apresentações com minhas amigas. Não havia preocupação em denominar aquela

prática, nem precisava ter, ora era circo, ora era dança, ora era ginástica.

O início da adolescência foi marcado pela prática da Ginástica Rítmica

Desportiva1, que definitivamente me enfeitiçou. Seria possível que algo pudesse

resumir tão bem todos os meus sonhos, todos os meus brinquedos? Parecia que ia

transbordar de tanto encantamento, eu não pensava em mais nada! Treinava GR na

escola, mas brincava em casa e na rua, qualquer objeto se transformava em aparelho,

qualquer música servia para montar apresentações.

Porém, o meu prazer esvaía-se na medida em que a competitividade aparecia.

Enquanto as apresentações eram motivadoras, as competições eram catastróficas. Os

conflitos de um corpo de ginasta que jamais chegaria ao podium eram cruéis. Os

traumas passaram e foram se transformando numa enorme vontade de buscar. Hoje,

adulta, sinto o desejo de resgatar os primeiros sentidos da GR em minha vida e de

repensar os sentidos seguintes.

Entretanto, tenho consciência de que os acontecimentos nos contextos citados

é que geraram pensamentos de busca por outras significações na GR, e vieram como

1
Nomenclatura da Ginástica Rítmica até a década de 1990.
16

tentativa de sobrepujar as angústias (paradoxalmente não maiores que as alegrias)

diante das vivências nos mais diferentes setores da modalidade: ginasta na escola,

árbitra de linha, secretária de arbitragem, árbitra regional e nacional, chefe de

delegação em equipe de campeonato brasileiro, técnica esportiva, professora da rede

particular de ensino, diretora técnica da Federação Norte-riograndense de Ginástica

e, finalmente, pesquisadora e professora da rede estadual de ensino. Além da

pretensão de verticalizar estudos propulsionados pelo trabalho final da licenciatura

em Educação Física, a monografia intitulada: Ginástica Rítmica, Corpo e Estética:

elementos para pensar o esporte na escola, orientada pela professora Dra Petrucia

Nóbrega. Naquela oportunidade, investigamos as compreensões sobre corpo e

estética na GR, bem como, suas implicações em âmbito escolar, partindo da análise

de imagens e de entrevistas de ginastas escolares, refletindo acerca dessas

implicações e buscando articular alternativas pedagógicas para a abordagem do

corpo e da estética na GR enquanto conteúdo da Educação Física Escolar

(CAVALCANTI, 2005).

As angústias, suscitadas anteriormente, maquiaram-se de esperanças, e

depois, metamorfosearam-se em vontades, em perspectivas, em pensamentos, em

buscas e em esperanças ainda maiores. A paixão arrebatadora que cultivo pela

Ginástica Rítmica obriga-me a pensá-la numa grandeza maior do que a da simples

apreciação de um espetáculo ou a cópia desse espetáculo para quaisquer contexto.

Creio nessa manifestação como capaz de prover intensas contribuições à Educação

Física. Educação para o desafio, a criatividade, a beleza, a emoção, a sensibilidade,

para o ser humano que sente, quer sentir, atribui importância a esse sentir, e que

pode ser capaz de mirar criticamente o dilúvio de dados que chega a ele numa

contemporaneidade abarrotada de informações.

Mais do que a pretensão de firmar um projeto de vida, a pós-graduação em

Educação nos faz nadar contentemente contra uma maré de ressaca, nos faz sonhar,

sonhar com o dia em que as pesquisas realizadas na academia chegarão à escola, e


17

mesmo não havendo uma semente efetivamente plantada, que se prepare a terra!

Para que, dali a alguns anos, esta possa estar fértil ao invés de desértica, revigorada

e acreditada para já se permitir receber mudas.

Mudas de uma Educação que assuma sua condição de ordem perceptiva, cuja

é matriz corporal, una nas linguagens racionais e sensíveis (NÓBREGA, 2000)

almejamos regar para a Educação Física, sementes plantadas por inúmeros

estudiosos da área, mas que neste estudo enfoca a análise da percepção da beleza na

GR, motivo pelo qual dedicamos esse trabalho, norteado para um acesso vivo ao

nosso sonho maior: uma Educação crítica e justa para todos.


18

1INTRODUÇÃO
19

Ginástica: denominação primeira das práticas corporais sistematizadas,

desvelou-se em gestos e apropriou-se de linguagens, passando a intitular-se

Educação Física, aos tempos e aos poucos desenhou seus próprios feitios.

Abarcando uma enorme gama de práticas corporais, o termo


Ginástica, pertence ao gênero feminino, de designação feminina, e
historicamente se constrói a partir de atributos culturalmente
definidos como masculinos: força, agilidade, virilidade,
energia/têmpera de caráter, entre outros, passa a compreender
diferentes práticas corporais. São exercícios militares de preparação
para a guerra, são jogos populares e da nobreza, acrobacias, saltos,
corridas, equitação, esgrima, danças e canto (SOARES, 1998, p. 20).

Com trajetória histórica plantada no Movimento Ginástico Europeu do século

XIX e alicerces delineados de forma complexa, assim como o curso de qualquer

conhecimento produzido pelo ser humano através dos tempos, a ginástica criou

galhos, folhas e floresceu. A prática ginástica criada no intuito de ser a mais bela das

flores denominou-se Ginástica Moderna (GM), depois Ginástica Rítmica Desportiva

(GRD), hoje, Ginástica Rítmica. Essa “orquídea” germinou como um presente às

mulheres, buscando enaltecer seus valores tidos como mais femininos, sua

gestualidade, seus movimentos “naturais2”. Conforme o desenrolar do século XX,

2 Os movimentos naturais desconsideram os aspectos histórico-culturais inerentes ao se


movimentar. A concepção positivista da ciência do século XVII ao XIX tinha o homem como
ser biológico, produtivo para as forças de trabalho. Essas concepções influenciaram e
influenciam a Educação Física até hoje (SOARES, 2001). Por sua vez, também são alvo de
críticas em diversas abordagens históricas e pedagógicas da nossa área (SOARES, 1998;
2001;COLETIVO DE AUTORES, 1992; KUNZ, 2004 etc.).
20

essa prática necessitava de adornos que exaltassem seus movimentos e admitissem

novas propriedades para ilustrar o seu surgimento. E, surgem os aparelhos

portáteis, apanhados das brincadeiras de rua: corda, arco e bola, seguidos dos pares

de maças e da etérea fita, enquanto continua a galante caminhada. Que sinuosidades

percorreriam a Ginástica Rítmica?

A preocupação outrora centrada na formação educativa de mulheres

delicadas e procriadoras, adjetivadas como “naturalmente” belas, transformou-se,

no percorrer do século XX, numa busca multifacetada pela perfeição técnica. A

construção de qualidades como exuberância, graciosidade e provocações de encanto

dos corpos e movimentos formativos das moças desbravadoras da Ginástica

Moderna seriam, em porções dosadas inicialmente (até meados da década de 1950),

e em tempestades de mudanças conforme a esportivização, sendo permutados pela

construção de mais exuberâncias, mais graciosidades, e de ainda mais encantos,

associados desta vez a específicos padrões corporais e de movimento pautados pelas

performances dos corpos. A beleza da GR teimou em quantificar-se, categorizar-se,

pormenorizar-se em décimos e centésimos de pontos impreteríveis para o sonho da

medalha dourada. A beleza preexistente, objetivo primeiro a ser contemplado nesta

prática, persistiu, tornando-se critério de julgamento.

Nessa perspectiva de transformações, consideramos que os caminhos da

beleza na GR esboçaram uma construção de relações de poder-saber, pois se

constituíram a partir dos mecanismos de coerção-resistência dos corpos ante os

objetivos pedagógicos e militares primordiais e as regulamentações esportivas. É

preciso então refletirmos sobre a forma com que incidem-se essas relações de poder-

saber que balizam a compreensão da GR como prática fadada à beleza e quais os

discursos que enxertam e constroem esse entendimento.

Tomamos algumas das reflexões sobre poder de Foucault (1971, 1979, 1987,

1988, 1997, 2003) e sua relação com a produção de saberes, pois acreditamos na

perspectiva de uma intervenção corporal que não acontece flutuando em um plano


21

ideológico, que o poder não é dado em hierarquia, de cima para baixo, do detentor

para os detentos, pois todos somos ao mesmo tempo “vítimas” e “réus” das relações

de poder, delas nos inteiramos em proporções diferenciadas. Ou seja, o poder se

inscreve no corpo, que o denuncia e ao mesmo tempo o exerce.

Tecendo uma crítica às análises marxistas, cujo entendimento do poder

privilegia sua condição ideológica, Foucault (1979, p. 147-148) esclarece:

Na verdade, nada é mais material, nada é mais físico, mais corporal


que o exercício do poder... Qual é o tipo de investimento do corpo
que é necessário e suficiente ao funcionamento de uma sociedade
capitalista como a nossa? Eu penso que, do século XVII ao início do
século XIX, acreditou-se que o investimento do corpo pelo poder
devia ser denso, rígido, constante, meticuloso. Daí esses terríveis
regimes disciplinares que se encontram nas escolas, nos hospitais,
nas casernas, nas oficinas, nas cidades, nos edifícios, nas famílias...

Foucault (1979) nos clarifica, explicitando que o poder está disseminado na

sociedade, nas várias relações, pois quem se sujeita não é sempre submisso, produz

poder também. Ressalvamos que as observações sobre poder foucaultianas, não são

argüidas de concepções maniqueístas, ocorrem em uma rede complexa nas relações

sociais, não sendo possível aferir com nitidez seus benefícios ou malefícios.

É no corpo onde ocorrem os controles da sociedade, as relações de poder, não

por ideologias “sobrevoantes” (FOUCAULT, 1979), mas por um discurso visceral,

que adequa, expande, endireita, amplia, poda e produz conhecimento.

O corpo, tornando-se alvo dos novos mecanismos de poder, oferece-


se a novas formas de saber. Corpo do exercício mais do que da física
especulativa; corpo manipulado pela autoridade mais do que
atravessado pelos espíritos animais; corpo de treinamento útil e não
da mecânica racional, mas no qual por essa mesma razão se
anunciará um certo número de exigências de natureza e de
limitações regionais (FOUCAULT, 1987, p. 132).
22

Portanto, o campo de incidência e projeção do poder é o corpo. As pedagogias

corporais, por sua vez, são as práticas sociais, históricas e datadas que são

responsáveis por produzir os sentimentos, as aparências e a fisiologia dos nossos

corpos.

O corpo é resultado provisório de diversas pedagogias que o


conformam em determinadas épocas. É marcado e distinto muito
mais pela cultura do que por uma presumível essência natural.
Adquire diferentes sentidos no momento em que é investido por um
poder regulador que o ajusta em seus menores detalhes, impondo
limitações, autorizações e obrigações, para além de sua condição
fisiológica, um poder que não emana de nenhuma instituição ou
indivíduo ou muito menos se estabelece pelo uso da força, mas sim
pela sutileza de sua presença nas práticas corporais da vida
cotidiana (FRAGA, 1999, p. 213).

Assim, as pedagogias corporais correspondem às formas com que os seres

humanos paulatinamente esculpem os gestos através dos tempos, culminando numa

composição constante e inacabada da cultura de movimento. Tomamos aqui o termo

Cultura de Movimento como “conceito que expressa diferentes compreensões e usos

do corpo em uma determinada cultura ou sociedade” (NÓBREGA, 2003, p. 134), e

como forma de entendermos a Ginástica Rítmica em suas interconexões com a

história, os costumes, as necessidades humanas e as crenças de um determinado

povo.

As técnicas de exercício do poder que nortearam os conhecimentos do corpo

voltado a si mesmo foram as disciplinas (FOUCAULT, 1987). Estas configuraram

sentidos atrelados à coerção-resistência dos corpos: a produção de discursos.

Pensamos a beleza a partir da trama de discursos construídos pelas relações de

saber-poder dos investimentos do corpo na ginástica.

Para aferir o quão um discurso é penetrado na vida social é preciso observar a

naturalidade com que ocorre sua inscrição nos corpos, pois quanto mais natural,

mais seus efeitos são imperceptíveis e maior é sua força do ponto de vista do
23

mecanismo de poder que o induziu (FRAGA, 2000). Tal fato abre a perspectiva para

pensarmos os efeitos do poder na forma com que percebemos a beleza, pois há

concepções que norteiam nossos “gostos” e não nos damos conta disso. A GR, por

exemplo, é uma modalidade que nasceu para ser bela, beleza pré-concebida, e assim

segue seu dever. A beleza é uma condição, está posta, é “natural” à GR, mesmo que

o termo nem sempre esteja explicitado nos seus diversos discursos.

Consideramos que o exercício notoriamente corporal do poder é evidenciado

de forma material pela constituição das regulamentações esportivas. No âmbito da

Ginástica Rítmica, a construção do Código de Pontuação, documento que determina

as regras da modalidade no mundo, procede de uma observação minuciosa de um

grupo de sete senhoras (denominadas madames), dedicadas à ginástica,

componentes do comitê técnico da Federação Internacional de Ginástica (FIG). Estas

o revisam periodicamente avaliando e reatualizando as regras da modalidade de

acordo com as necessidades e níveis das performances das ginastas.

Com base na compreensão de poder foucaultiana passamos a refletir sobre as

relações de poder na GR, sendo estas mediadas e consolidadas pela regulamentação

de sua prática. E, imersa nessas relações de poder, cujo Código de Pontuação tem

papel preponderante, a GR, através dos tempos, legitimou a beleza como resultado

de jogos de forças em que preponderam os corpos performáticos, corpos que podem

sempre mais.

A partir dessas compreensões, questionamos: Como o Código de Pontuação

regulamenta a Ginástica Rítmica para a construção da beleza? Qual a relação entre

poderes e saberes implicados nessa regulamentação?

Com base nas questões supracitadas temos como objetivos investigar a beleza

na Ginástica Rítmica a partir das relações de poder circunscritas nas regras da

modalidade, refletir sobre as relações entre poderes e saberes na GR, tendo o corpo

como produto e produtor da beleza, bem como, discutir implicações dessas reflexões

para o âmbito da Educação Física.


24

A tarefa de nos determos a este âmbito da GR, em que buscamos desvendar e

questionar a sua constituição estética com fins de reflexões para a Educação Física é

algo recente para as produções que versam sobre essa manifestação. Buscamos, nas

linhas que se seguem, situar algumas dessas referências da GR no Brasil.

As primeiras obras que versam sobre a Ginástica Feminina Moderna no Brasil

datam da década de 70, e uniformemente expressam preocupações com os aspectos

formativos da mulher da época: Saur (1970), Peuker (1974 e 1976), Pallarés (1979).

Constatamos a preocupação com o belo nessas referências, entretanto, a beleza

evidenciada não continha o caráter útil da técnica esportivizada, visava sim, o

desenvolvimento do corpo da mulher a partir de seus movimentos belos

“naturalmente”.

Na década de 80 as obras de GR, respaldadas pela esportivização da

Educação Física vigente no Brasil, assumem características de “manuais de

exercícios”, submissas às regras determinadas pelos Códigos de Pontuação: Vieira

(1972), São Paulo (1980), Bizzochi e Guimarães (1985), Bott (1986), Róbeva (1981).

Com este fenômeno, inicia-se a evocação do belo útil, quantitativo. Executa-se

determinado movimento para atingir, de forma laqueada, um padrão de

movimento, que por sua vez é belo, porque alcança um modelo pré-estabelecido, e

que é quantificado.

A GR da década de 90, em suas produções, permanece com as características

da década anterior, com algumas expansões voltadas à ginástica escolar, a exemplo

das obras de Gaio (1996) e de Pereira (1999). Todavia, com espectros evidentes do

Código de Pontuação como basilar referência.

Uma das mais importantes obras nacionais trata sobre o treinamento de alto

rendimento da GR. Em Laffranchi (2001) a beleza utilitarista não se basta, os

exercícios, além de se encaixarem em moldes, precisam ser executados sem falhas. O

belo atrela-se a todo o processo de treinamento, ou seja, aos usos do corpo neste

esporte, da coreografia às preparações. A autora arquiteta o caminho da beleza,


25

conseqüentemente do sucesso, nos campeonatos, através de vias metrificadas, nas

quais todos os domínios (cognitivo, motor, afetivo etc) e preparações (física, técnica,

tática e psicológica) devem estar milimetricamente previstos. A beleza é produto de

um trabalho árduo.

Diante da reflexão sobre as referências3 supracitadas, nos colocamos o desafio

de ampliar as produções que versam sobre GR para além das abordagens que

enfocam o aperfeiçoamento técnico centrados nos modelos de beleza pré-codificados

no âmbito do esporte de alto rendimento.

Nessa perspectiva evidenciamos outras publicações, a exemplo dos estudos

de Porpino (2003, 2004) que em um dos seus artigos realça a estética através de uma

abordagem epistemológica, discutindo as interfaces entre corpo e estética no

contexto da Educação Física; e refletindo sobre a estética no treinamento da GR,

enquanto produto e processo através da análise de um vídeo que retrata a rotina

diária de treinamento da Seleção brasileira de conjuntos em outro artigo.

A investigação proposta neste trabalho questiona algo que se supõe inerente à

GR – a beleza – para desvendar algumas das implicações que se escondem nesse

conceito e possibilitar sua crítica. No sentido de ampliar os estudos que investigam

Investigamos o Núcleo Brasileiro de Teses e Dissertações (NUTESES), ambicionando


3

localizar mais publicações que abordassem a Ginástica Rítmica. Encontramos onze


dissertações, das quais, quatro tratam da GR em sua abordagem pedagógica: Antunes
(1991), Alonso (1990), Tibeau (1988) e Pereira (2003), enquanto que as demais tratam dos
aspectos técnicos e performáticos. Contudo, Vieira (1989) trata da expressão, enfatizando o
caráter cênico da GR, sendo assim, a única das onze que trata a GR considerando sua
abordagem artística. No Banco de teses da CAPES, encontramos quinze dissertações, e uma
tese sobre GR, as que tratavam da perspectiva pedagógica somavam cinco, incluindo a tese:
Alonso (1990), Pereira (2003), Segura (2004), Gaio (1994) e Alonso (2003). Das outras, oito
tratavam de aspectos técnicos, tais como performance, música-movimento, julgamento etc,
duas tratavam de aspectos históricos e uma refletia sobre a GR no ensino superior. Em
relação aos aspectos estéticos da modalidade, Santos (2004) faz um estudo sobre os
processos de composição coreográfica na GR, da importância do respeito à individualidade
da atleta, através do trabalho em conjunto: técnica e ginasta. Já Rossete, em sua dissertação
sobre o julgamento da GR, aponta para o fato de que os problemas de julgamento são dados
pela subjetividade do esporte, pelo seu forte ligamento a arte.
26

especificidades estéticas, a exemplo das referências citadas anteriormente, pensamos

que podemos contribuir para fomentar reflexões dessa natureza não somente com

relação à GR, mas na Educação Física, campo de intervenção pedagógica tão

representativo no que se refere à valorização de modelos de rendimento e de beleza

nem sempre questionados e contextualizados.

Com efeito, esta pesquisa dá continuidade a outras pesquisas que já têm como

enfoque Foucault e sua compreensão de intervenção corporal do poder. Portanto,

contribui para uma reflexão sobre o corpo não apenas submisso, que não só

sucumbe à regra, mas é capaz de recriá-la, de produzir saberes a partir dela.

Partimos, agora, para o nosso percurso metodológico, ou seja, os caminhos de

elaboração do nosso trabalho.

PERCURSO METODOLÓGICO

Com a ânsia de entremear os sentidos requeridos pelas linhas anteriores: as

relações saber-poder que definem a construção da beleza na GR, buscamos

inaugurar nosso olhar mais atento, desbravando sentidos e entrelinhas através da

análise das regulamentações da Ginástica Rítmica contemporânea.

Trilhar caminhos para discutir o belo nessa manifestação ginástica nos

motivou a analisar o instrumento mais emblemático de persuasão do corpo da

ginasta: o Código de Pontuação. Assim, o delimitamos como corpus de análise em

sua última versão referente ao período mais atual, o ciclo 2005 – 2008, o qual recebeu

a última revisão no início de 2007.

O Código de Pontuação acompanhou a esportivização da GR no início da

década de 1970, quando a FIG publicou sua primeira versão. A segunda só foi

revisada em 1977, vigorando em 1978, e foi revisada mais uma vez em 1982. Em

1984, o esporte foi incluso nos Jogos Olímpicos de em Seul, dessa forma, a cada ciclo
27

olímpico (Llobet, 1996), as regras da Ginástica Rítmica são (re) visitadas na íntegra,

acometendo por vezes em mudanças estruturais tão abruptas que modificam não só

as composições das coreografias, mas também a estrutura de treinamento de todas

as equipes do mundo.

Na versão atual, o Código, em suas mais de cem páginas, subdivide-se em

quatro partes principais: As Generalidades, parte na qual as regras da GR

sistematizam elementos gerais de uma competição de GR; Os Exercícios Individuais,

compreendem as definições dos parâmetros Execução, Artístico e Dificuldade; A

terceira parte discorre sobre os Exercícios de Conjunto, englobando todos os aspectos

abordados anteriormente acrescidos das particularidades dessa vertente da GR; e a

última diz respeito à simbologia necessária ao julgamento.

Optamos por compreender os mecanismos que balizam a constituição da

beleza na GR através de Análise de Conteúdo (BARDIN, 1977), que se caracteriza

como uma técnica na qual retiram-se indicadores e fazem-se inferências, buscando o

não-dito, o latente, o aparente e não aparente nas mensagens, supondo elementos

objetivos e subjetivos. Consideramos esse não-dito a forma com que o Código é

capaz de interferir na construção da beleza, embora não encontremos essa palavra

nas regras impressas, o Código é capaz de garantir muitos ajustamentos estéticos na

GR.

A Análise de Conteúdo é aplicável a discursos diversificados, uma

hermenêutica controlada baseada na dedução, sua interpretação deve oscilar entre o

rigor da objetividade e a fertilidade da subjetividade. Apelar para esta técnica de

análise é ao mesmo tempo negar as transparências dos fatos sociais e afastar-se das

compreensões espontâneas, perpassando dois pólos: a ultrapassagem da incerteza,

numa verificação prudente e o enriquecimento da leitura, numa interpretação

cuidadosa (BARDIN, 1977). Nas palavras da autora, a Análise de Conteúdo consiste

em:
28

Um conjunto de técnicas de análise visando obter, por


procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo
das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam
inferências de conhecimentos relativos às condições de
produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens
(BARDIN, 1977, p. 42).

A leitura flutuante nos permitiu perceber os ditames da beleza em diversas

partes do Código e intuir que seria possível praticar uma análise temática. O passo

seguinte foi a seleção de trechos que contivessem prescrições diretas ou indiretas

sobre elementos que caracterizassem a beleza na GR, apesar de reconhecermos que

as partes analisadas não se referem diretamente à beleza. A partir dos trechos

contemplados, as unidades de registro temático, elaboramos os núcleos de sentido,

ou seja, interpretações que justificam, explicam e identificam mais claramente a

utilização dos trechos. Para organizar essa análise, elaboramos fichas de conteúdo

subdivididas de acordo com as partes do próprio Código, considerando a presença

dessas prescrições no texto.

Durante esse processo, agrupamos núcleos de sentido em três eixos temáticos:

“As especificidades da ginástica”, “Os usos do tempo e espaço” e “A configuração

do gesto técnico”. A partir desses eixos buscamos conduzir toda a análise sobre a

beleza na GR, pautando-nos nas relações de poder-saber. Porém, é preciso explicitar

que a separação dos eixos ocorre apenas do ponto de vista didático, para facilitar e

tornar mais compreensível as análises, pois encontramos diversas intersecções e

pontos em comum, discutíveis por mais de um eixo.

Complementamos a análise do Código com o recurso analógico das imagens

de ginastas, a fim de buscar dados que pudessem descortinar significados estéticos.

Ao mencionarmos a apreciação estética das fotografias, nos ativemos ao olhar da

experiência estética que compõe inevitavelmente essa ação. Pensamos ainda na

extração de significados, num olhar minucioso e entrelaçado às palavras dos textos.

Uma apreciação imbuída de uma concepção de mundo, interpretação do objeto


29

sensível no contexto dos tempos atuais, capaz de se (re) significar no presente

(VIEIRA, 2005).

As imagens serviram para municiar-nos com maiores perspectivas – contatos

sensíveis – com nossos estudos. Analisamos as fotografias buscando um olhar que

abarcasse não só o mais apariscente, mas tentando extrair significados expressos nos

textos do Código. Após uma apreciação inicial, uma leitura de exercício de

identificação, a fotografia admite a interpretação resultante de um esforço analítico,

dedutivo e comparativo. “O texto verbal e o visual são polissêmicos e

complementares, sendo cada um mais adequado a determinadas utilizações”

(LEITE, 1998, p. 43). Assim, foi possível vislumbrar a materialização das regras e

suas rupturas pelo entrecruzamento das informações textuais e imagéticas.

A dissertação está estruturada em dois capítulos: no primeiro intitulado “A

beleza regulamentada” discutimos as especificidades da GR, as prescrições dos usos

do tempo e espaço e a configuração do gesto técnico a partir da análise do Código de

Pontuação da Ginástica Rítmica. No segundo capítulo “O corpo belo transcende a

regra” realizamos algumas reflexões relacionadas à Educação Física, partindo da

discussão do capítulo anterior com enfoque em três tópicos: Saberes e Poderes,

Técnica e Estilo e Beleza e Educação.


30

2A BELEZA
REGULAMENTADA
31

AS ESPECIFICIDADES DA GINÁSTICA RÍTMICA

Na Análise de Conteúdo do Código de Pontuação, compreendemos como

aspecto marcante as delimitações sobre suas especificidades, aspectos que fazem a

GR ser GR e não outra prática.

Tomamos como especificidades alguns elementos aparentes no texto do

Código de Pontuação que a caracterizam como essa manifestação que conhecemos e

compactuam para garantir sua beleza. Características próprias que guardam em si

algumas afinidades com a dança e outras manifestações ginásticas, mas não se

confundem com ela. Assim destacamos: o julgamento, os aparelhos, a música, a

vestimenta, a eminente espetacularização, o princípio de coletividade dos conjuntos,

os movimentos autorizados e não-autorizados do corpo e dos aparelhos, a constante

recriação, o discurso motor unitário do exercício, a criação coreográfica direcionada.

Para que os aspectos apresentados fossem se constituindo, a Ginástica

Rítmica percorreu uma trilha norteada pela sua mais emblemática vertente: a

estética. Esta, sempre foi contemplada na ginástica, carregada pela disciplina

coercitiva dos corpos (FOUCAULT, 1979), pela retidão, pela higiene, pela harmonia

de formas, pela simetria. Por um conjunto de prescrições necessárias para se extrair

um resultado esperado, para produzir, através do corpo um conhecimento sobre ele

mesmo. A produção da beleza teve, sobretudo, a ingerência artística como

fundamento para sua criação, a exemplo da dança, do teatro e da música.

Com isso, temos uma ginástica que se pauta no modelo, mas se afirmou nas

concepções da Arte Moderna, movimento em que os modelos são criticados; se


32

pautou na expressão do sexo feminino, mas procria diferenciações entre os sexos; se

pautou na beleza dos movimentos naturais, mas se afirma na performance enquanto

categoria dessa beleza. Caráter ambíguo, como o poder expresso por Foucault

(1979), que ao mesmo tempo em que se exerce, cria mecanismos de fuga, cria um

contra-poder.

Esse caráter ambíguo do poder pode ser percebido na organização do

julgamento da GR, que é um ponto que especifica sua prática e garante sua beleza. O

julgamento ocorre da seguinte maneira: dois grupos de juízes avaliam a Composição

do exercício, vislumbrando a forma com que a coreografia da ginasta foi construída,

tanto de maneira mais quantitativa, no caso do parâmetro Dificuldade, quanto de

forma mais quantitativa e qualitativa, no caso do Artístico. O terceiro parâmetro, a

Execução, avalia a qualidade com que a ginasta demonstra a sua composição, embora

o aspecto qualitativo seja extremamente preponderante nos três parâmetros (FIG,

2007).

Apesar de a banca de Execução julgar através de um grupo de quatro árbitros

e a banca de Composição julgar através de dois grupos (Artístico e Dificuldade), os

pesos são iguais. Isso ocorre pela dificuldade que é apresentada em se julgar

parâmetros dependentes da subjetividade humana, tais como a criação e a beleza

coreográfica, a interpretação da série pela ginasta, e a identidade fornecida pelo

gesto. Por isso, oito árbitros se preocupam com uma metade da nota, enquanto

apenas quatro com a outra metade.

Nos Torneios internacionais, deve haver um juiz superior que não participa

efetivamente do júri para esclarecer possíveis dúvidas de julgamento (FIG, 2007).

Isso mostra que mesmo o olhar direcionado de 13 pessoas atentas pode não dar

conta de um julgamento “justo”, sendo necessária a presença de um árbitro

renomado e experiente que possui uma sensibilidade mais “trabalhada” e que

enxergue com mais afinco a performance ginástica.


33

Da pontuação do parâmetro Artístico, que pode atingir até 10 pontos, 7 são

destinados às Características Artísticas Particulares (CAPs), bonificações específicas

que devem ser prescritas numa ficha através de símbolos para que o árbitro possa

verificar e avaliar as CAPs válidas (FIG, 2007). Há de se observar que mesmo os

árbitros de Artístico, realizam seu julgamento da série por padrões

predominantemente fechados. A subjetividade do olhar parece perpassar somente a

validez do exercício que especifica a beleza de tal, já que a relação de reciprocidade

entre sujeito e objeto é impossível de ser prescrita em um código de 100 páginas.

Entretanto, o julgamento fundamentado na modelização não é uma

característica que decorre só o momento competitivo, ocorre em todo processo de

aquisição da forma esportiva, em todo o processo de inserção da menina ao universo

ginástico, através de uma sistematização própria. O olhar que julga, surge na escolha

de campeãs, perpassa as quadras de treino e culmina nos campeonatos. O primeiro

se dá através da adequação ao modelo, o segundo pela disciplinarização desse

corpo, o olhar que cobra e molda e o terceiro por uma infinidade de olhares,

apreciadores e julgadores.

Essa trama de inspeções nos remete ao sistema de registros permanentes

exposto por Foucault (1987), os quais alicerçavam o controle das cidades

pestinolentas no fim do século XVII. Uma vigilância constante, medida e obstinada

que compreendia todos os espaços das cidades, do micro ao macro, das casas às

ruas, determinações e isolamentos determinados de cima para baixo.

Esse espaço fechado, recortado, vigiado em todos os seus pontos,


onde os indivíduos estão inseridos num lugar fixo, onde os menores
movimentos são controlados, onde todos os acontecimentos são
registrados, onde um trabalho ininterrupto de escrita liga o centro e
a periferia, onde o poder é exercido sem divisão, segundo uma
figura hierárquica e contínua, onde cada indivíduo é constantemente
localizado, examinado e distribuído entre os vivos, os doentes e os
mortos – isso tudo constitui um modelo compacto do dispositivo
disciplinar (FOUCAULT, 1987, p. 163).
34

Esse dispositivo disciplinar é caracterizado por Foucault (1987, p. 169) como

nicho onde o poder se torna presente e visível em toda parte “inventa novas

engrenagens; compartimenta, imobiliza, quadricula”.

O processo pelo qual a ginasta é julgada passa pela semelhança do dispositivo

disciplinar assinalado por Foucault, por compreender justamente duas das

características básicas do mecanismo disciplinar: a vigilância e o registro

(FOUCAULT, 1979).

A disciplina é o conjunto de técnicas pelas quais os sistemas de


poder vão ter por alvo e resultado os indivíduos em sua
singularidade. É o poder de individualização que tem o exame como
instrumento fundamental. O exame é a vigilância permanente,
classificatória, que permite distribuir os indivíduos, julgá-los, medi-
los, localizá-los e, por conseguinte, utilizá-los ao máximo
(FOUCAULT , 1979, p. 107).

A Ciência do Treinamento Esportivo compele uma periodização do

treinamento da ginasta determinando períodos, ciclos, horários, quantidades,

intensidades, testes e intervalos (LAFFRANCHI, 2001), que são devidamente

registrados a cada dia e avaliados através de gráficos. Sendo assim, ao passar do

estado de treinamento para o competitivo, os registros continuam, e, ao sair da

quadra após uma apresentação, a ginasta terá todo o mapeamento dos seus

movimentos descritos nas fichas de avaliação da arbitragem.

Outro aspecto que caracteriza a GR são as relações corpo/aparelhos. A ligação

entre estes e a ginasta deve expressar-se desde a posição de início do exercício,

evitando ao máximo que corpo e objeto, foco da série, estejam separados. O sentido

de uma coreografia de GR só é dado pela íntima junção música/ginasta/aparelho,

portanto, é preciso que o público e, principalmente, os árbitros possam enxergar um

só (FIG, 2007).

Essa dependência com a música distingue a GR, e a diferencia das outras

modalidades ginásticas. É bela a ginasta e a série que conseguem conciliar


35

perfeitamente música e movimentos, visto que, os movimentos de um exercício de

GR estão presos aos ditames da rítmica e a ginasta só pode se expressar a partir de

sua música. Diferente de alguns espetáculos de Dança Contemporânea, por

exemplo, em que a música pode servir apenas como “pano de fundo” ou inexistir.

As malhas ginásticas também delimitam características próprias, dependentes

do vislumbre dos exercícios pelos árbitros e público, como também das

possibilidades de variação criativa das formas. É possível adequar uma infinidade

de modelos e cores ao gosto e às características da coreografia. As transformações

das vestimentas ginásticas denunciam a espetacularização dos exercícios, que cada

vez mais solicitam a atenção do público. Acreditamos que a otimização dos

ornamentos (lantejoulas, paetês, vidrilhos, strass etc), inserção da saia e permissão

de tecidos brilhosos, transparentes e de várias texturas, corroboraram para uma

maior visibilidade da GR, inclusive nos meios de comunicação, com o passar dos

tempos.

Nas fotografias a seguir temos ginastas das décadas de 1970, 1990 e 2000. A

utilização da malha tradicional com pernas à mostra e mangas compridas expandiu

para utilização de malhas compridas e depois com a superlativação de enfeites nas

malhas, bordadas e brilhosas; maquiagens e aparelhos mais enfeitados, fatores que

também exprimem a espetacularização da GR.

Imagens 5, 6 e 7 - As transformações das malhas ginásticas – Décadas de 1970, 1990 e 2000.


36

Apesar da espetacularização da GR na atualidade alcançar maiores

proporções, o cunho espetacular desta manifestação da cultura de movimento não é

algo recente e pode ser exemplificado tomando o contexto brasileiro. O Brasil

manteve esse espírito espetacular pelo constante intercâmbio de professoras

européias em meados da década de 1950, estando assim em consonância com os

acontecimentos mundiais da modalidade.

No período do surgimento da GR no Brasil, se manifestava uma tendência

pedagogicista suscitadora de uma nova forma de a sociedade encarar a Educação

Física, com uma visão de prática voltada à Educação (ROMERO, 1994).

Aliada à perdura firme da concepção biológica já mencionada, “baseada na

abordagem positivista de ciência e no seu método de observação e comparação de

resultados” previsto concomitantemente pelo ideário escolanovista (SOARES, p. 132,

2001), a concepção pedagogicista tomava a Educação Física como algo útil e bom

para a sociedade, o que atribuía uma nova importância ao professor desta disciplina,

que teria agora o papel de organizar a espetacularização das práticas corporais em

eventos que culminavam, conseqüentemente, na propaganda da escola (ROMERO,

1994).

Tal contexto faz com que a Romero (1994) reporte-se ao Grupo Unido de

Ginastas (GUG), quando este divulgou a GR, até então GM, através de

apresentações em eventos cívicos e esportivos.

Assim, é possível ousar algumas reflexões no sentido de que a


propaganda desta modalidade, voltada, essencialmente, para o
“aspecto espetáculo”, induziu falsos conceitos, distanciando-a da
visão pedagógica favorável à escolarização (ROMERO, 1994, p. 185).

Esses preceitos são fundamentais para compreender a espetacularização da

GR, os quais implicaram na busca insistente das performances, pois era necessário

prover visibilidade a uma prática que continha tantas significações voltadas às


37

características de uma época. Dessa forma, a intensa visibilidade da GR no Brasil se

repetia mais densamente fora do país.

No contexto mundial, as regras foram se constituindo e admitindo

perspectivas que congregassem uma gama maior de possibilidades coreográficas, e

portanto, um perfil mais voltado para o espetáculo. As imagens a seguir são de

conjuntos, do Grupo Unido de Ginastas em 1972, apresentando uma coreografia

com arcos, e na seqüência a série da Seleção Brasileira de conjuntos nos Jogos Pan-

americanos do Rio de Janeiro em 2007. Observamos a diferenciação tanto no

aprimoramento das posições corporais e das regras, conforme o número de ginastas

e o objetivo competitivo, quanto à atenção dada aos figurinos.

Imagens 8 e 9 - Conjuntos brasileiros, 1972 e 2007.

A diferenciação das modalidades de GR (individual e conjunto) também pode

ser tomada como exemplo deste processo de reelaboração para o espetáculo, pois
38

cada uma dessas vertentes se expressa com especificidades próprias que se notam

imediatamente ao folhear o Código de Pontuação, já que suas regulamentações

encontram-se separadas.

O foco das séries individuais, como dito anteriormente, se dá nas qualidades da

ginasta, suas performances corporais com aparelhos em consonância com a música,

já as séries de conjunto guardam essas características, mas, acima de todas, guardam

princípios de cooperação, para que a elaboração coreográfica se dê pelas qualidades

do todo, pela interação entre ginastas e aparelhos. Ao contrário das séries

individuais, tolera-se que a ginasta inicie e/ou possa ter momentos em que fique sem

aparelho, ou que uma ou mais ginastas portem mais de um aparelho, desde que

sejam momentos passageiros que realcem a colaboração entre as atletas. A

preocupação em delimitar os movimentos específicos da Ginástica Rítmica ocorre

inúmeras vezes no texto do Código. E, mesmo que estes possam significar princípios

de trabalho coletivo, tais como apregoados no conjunto, alguns são proibidos, por

exemplo, carregar uma ginasta, caminhar sobre uma ou várias ginastas que são

considerados elementos mais característicos da Ginástica Geral ou da Dança. Ainda

assim, autorizam-se elementos em que as ginastas dêem um impulso inicial e

passageiro a suas companheiras. Dessa forma, as acrobacias, que não caracterizam

esta modalidade, são parcialmente autorizadas, para realçar ainda mais o teor

espetacular da série (FIG, 2007).

Contudo, os novos exercícios ginásticos exprimem a capacidade das ginastas

de transgredir as delimitações das formas de movimento descritas pelas regras, e

suscitam caracterizações que nos remetem ao grotesco através da alusão ao circo.

Porém, a alusão não é aos espetáculos populares retomados e rejuntados embaixo da

velha lona do circo que ronda as cidades, e sim às perspectivas estéticas constituídas

a exemplo das concepções propagadas pelo “Cirque du Soleil”, que vem se

difundindo pelo mundo com sucesso absoluto nestes últimos anos. Mas, a

apropriação é mútua. Do mesmo modo que enxergamos ginastas da GR nos


39

espetáculos do Cirque du Soleil, observamos músicas, figurinos e movimentos

dignos dos mais “dobráveis” contorcionistas e dos mais bem-preparados

malabaristas e acrobatas nas quadras de GR mundo afora.

Soares (2001) apresenta reflexões pertinentes acerca dessa temática,

intersecções circo/ginástica. Ela caracteriza o acrobata como um ser compreendido

dentro do sutil limite entre o grotesco e o sublime, pois brinca com o nosso medo e

extrapola as condições de um corpo “reto”. A ginasta de GR também situa-se nesse

limiar, quando lança-se ao ar, ao chão, à troca de eixos, dobra seu corpo, arremessa

seu aparelho e o recupera de diversas formas num tempo exato. “E o espectador vê

então um misto de tensão e equilíbrio, de balanceamento e alternância, contraste,

variação, encantamento, desprendimento, solução” (SOARES, 2001, p. 35). Dessa

maneira, ao nosso ver, a ginasta da GR também transcorre o grotesco do acrobata,

quando expõe movimentos que deixam a duvidar qualidades humanas, contornos

que oscilam entre uma normalidade e anormalidade anatômica, quando enxergamos

corpos dotados de uma precariedade de formas, corpos insustentáveis,

assombrosamente magros e flexíveis.

As imagens a seguir são de uma artista circense e de uma ginasta

internacional, a semelhança não é mera coincidência e se mostra aos nossos olhos

como uma assimilação recíproca dessas práticas corporais: movimentos, corpos e

utilização de aparelhos.
40

Imagens 10 e 11 - Uso da fita, artista do Cirque du Soleil e ginasta da GR.

A necessidade de se garantir uma manifestação ginástica que exale beleza,

consequentemente arte, é uma das razões das inumeráveis e velozes produções de

saberes na GR, pois a criação configura-se como fator condicionante para o

progresso dessa prática. É ainda mais bela a ginasta que consegue se diferenciar de

todas as outras, que consegue criar novas possibilidades de movimento.

Ressaltamos que a composição dos exercícios na GR, as séries, o formato com

que são criados, também são elementos que permitem caracterizar suas

especificidades, pois ao observar as nuances dos movimentos e da criação destes,

somos capazes de identificá-la.

Para incitar nossa discussão acerca da criação coreográfica na GR,

apresentamos um trecho da biografia da percussora dessa modalidade no Brasil,

Ilona Peuker, retirado da página da internet que descreve sua trajetória. O texto se

refere à importância da criação nos processos de ensino da Ginástica Moderna, que

se iniciou conforme sua chegada ao Brasil em meados da década de 1950.

Sua trajetória profissional foi determinada por seu amor ao


movimento e à expressão artística. Suas alunas tiveram o privilégio
41

de dividir com ela o mágico momento da criação de suas


coreografias. Dona Ilona foi antes de tudo uma arquiteta do
movimento. Seu processo de criação era determinado por uma rara
noção e visão espaciais. No espaço, ela esboçava o trajeto de suas
coreografias. Suas alunas preenchiam esse trajeto imaginário com
movimentos que eram selecionados por ela, dentre os tantos
realizados pelas ginastas. Para as ginastas, esses momentos de
criação eram inigualáveis, elas tinham contato com um prazer único
(FROSSARD, [2005?]).

Na atualidade, o Código de GR permite perspectivas para a criação de

movimentos e de nuances coreográficas, porém uma criação completamente

direcionada. A elaboração de uma série de Ginástica Rítmica deve atender às

características técnicas e artísticas dessa manifestação congregada à utilização

correta dos movimentos corporais e com aparelhos e a escolha do tema da

coreografia, expresso pela música.

Uma série de GR deve ser pensada a partir de um discurso motor unitário: o

encadeamento de movimentos do início ao fim (FIG, 2007). Cada movimento é

dependente do seu antecessor e sucessor, e a idéia-guia é a história que a ginasta

conta, sem interrupções. Ao mesmo tempo em que o Código exerce a “poda” de

tudo aquilo que é excessivo, exige que o exercício da ginasta contenha variações de

diversas naturezas, convidando à criação. Sendo assim, a criação de movimentos

também é condicionada a relações de poder-saber, ou seja, o Código que determina

e a ginasta que transcende.

O corpo na GR é regulado pelo Código, disciplinado pelo treinamento, mas é

criativo, uma criação pautada em um fim pré-determinado. Não deve exceder gestos

inúteis à série, com esse pensamento podemos nos remeter ao princípio de utilidade

das primeiras manifestações ginásticas européias. Porém, a utilidade que permanece

não é mais a mesma, não se pauta somente na potencialização das forças dos corpos

para fins de saúde, militares, de qualidade de vida etc., o corpo útil contemporâneo

serve para a melhoria dos desempenhos esportivos. Com efeito, a ginástica atual
42

vem assumidamente se apropriando de outras práticas para moldar sua finalidade

utilitária.

Os Movimentos Ginásticos europeus no final do século XIX caracterizaram-se

por sistematizações das relações cotidianas: festas e divertimentos de rua e da

aristocracia, circo e exercícios militares. Gradativamente, os princípios de ordem e

disciplina coletiva iam sendo incorporados. Porém, o cerne das manifestações

primeiras, contido na diversão deveria ser abandonado, pois era necessário que se

reconhecesse a ginástica como prática útil e potencializadora segundo uma nova

mentalidade científica construída a partir do século XIX, baseada na ciência e na

técnica como saberes específicos (SOARES, 1998). A ginástica contemporânea, em

detrimento daquela do século XIX, circunda, por exemplo, os saberes do circo

porque atualmente este é performático também, ambos buscam o espetáculo, a

extrapolação dos limites corpóreos, a perfeição do gesto e ambos transgridem muito

os objetivos de suas origens.

As forças que esboçaram a ginástica, atual Educação Física, desembocaram na

Europa ao longo do século XIX em países como Alemanha, Suécia, Inglaterra e

França e corroboraram para a visualização de um modelo que detinha a idéia de

aquisição de saúde e moral, de formação estética e formação do soldado (SOARES,

1998). Ou seja, um conjunto de atributos conseguidos pelo estudo meticuloso do

corpo pelas ciências médicas, com estimulações previamente dosadas, com a

finalidade de lapidar e potencializar os gestos de forma mais econômica possível.

Tal condição desconsiderava e excluía as manifestações artísticas populares tidas

como dispendiosas e inúteis. Atualmente, a estética ginástica pode apropriar-se de

outras práticas, porém a forma ginástica precisa ser resguardada. Por exemplo, um

determinado salto característico da capoeira pode ser utilizado num exercício de GR

desde que as características de base do elemento salto estejam presentes: um salto

precisa ter altura, forma definida e fixada durante o vôo, amplitude na forma (FIG,

2007).
43

Seguindo veementemente as tendências ginásticas dos últimos dois séculos, a

criação de elementos com o corpo e os aparelhos na GR é pré-determinada por

técnicas que lhe são específicas. A ginasta deve saber dominá-las para que a

coreografia possa conter uma gama ampla de movimentações que ao mesmo tempo

sejam criativas e corretas. O Código de Pontuação até permite a criação de elementos

não-técnicos com os aparelhos, porém essa situação deve ser passageira, pois cada

aparelho deve ser caracterizado segundo uma natureza técnica própria (FIG, 2007).

Numa série de fita4, por exemplo, o aparelho deve ser “desenhado” pela ginasta a

todo tempo, pois situações em que este aparelho permaneça parado ou enrolado por

um tempo prolongado diminuem o valor do exercício. Da mesma maneira, arco,

bola, maças e corda têm seus movimentos específicos, os grupos técnicos, de acordo

com as formas desses aparelhos.

Imagem 12 - Coreografia com fita

4 Os Grupos técnicos da fita são os espirais (desenhos de pequenos círculos), as serpentinas


(desenhos de pequenas ondas), os lançamentos e recuperações, as passagens por dentro do
desenho, as escapadas (pequenos lançamentos em que o estilete dá uma volta completa no
ar), os lançamentos boomerangs (em que se segura a ponta da fita para o estilete, vara que a
segura, retornar) e os manejos (circunduções, movimentos em oito, balanceios e impulsos).
44

O Código de Pontuação prescreve todos os elementos possíveis com os

aparelhos, novos manejos ou devem ser contabilizados como originalidade, ou

devem aparecer de forma restrita na série. Dessa forma, as possibilidades de criação

são sempre originadas por elementos já existentes, o novo se dá pelas possibilidades

de extrapolar a prescrição, guardado seus limites.

Além dos Grupos Técnicos, de cada aparelho, há Elementos Corporais específicos

das quais as coreografias devem sucumbir, sendo a criação da série refém do Grupo

Corporal Obrigatório. Nas séries com bola devem aparecer mais flexibilidades e

ondas, nas de corda os saltos, nas de maças os equilíbrios, nas de fita os pivots e nas

de arco todos os grupos equilibradamente (FIG,2007).

A abertura para o novo, para o original até existe no atual Código de

Pontuação, porém restrita e só pontuada quando se tratam de novos elementos que

se consideram Dificuldades ou novas relações com os aparelhos ou novas relações

entre as ginastas e aparelhos do conjunto. Ou seja, elementos originais que não se

enquadrem nos quatro Grupos Fundamentais ou em novos movimentos e relações

entre ginastas e aparelhos não são originalidades contabilizáveis.

Apesar dessas restrições, podemos observar séries em que se instituem novas

formas de se utilizar os aparelhos. A imagem, a seguir, mostra o conjunto da

Ucrânia no Campeonato Europeu de 2001. Com inspiração no tema do filme

“Matrix”, a maneira com a qual a ginasta do centro segura todos os pares de maças

nos parece inusitada, dado que não é um novo manejo, portanto não recebe

pontuação de movimento original.


45

Imagem 13 - Novos usos dos aparelhos.

Nos Exercícios de conjunto a idéia-guia da série, a história que deve ser

contada, parte da união das cinco ginastas e de todas as relações possíveis entre elas

e entre os aparelhos. Essa perspectiva prediz uma nova perspectiva para o

julgamento das séries e uma nova perspectiva para a beleza destas, que não está

somente nas proezas que uma ginasta é capaz de realizar com o seu aparelho, mas

também, e principalmente, na capacidade de o conjunto realizar um espetáculo

dependente do papel de cada uma que expressa um todo, ou seja, maneiras novas

de uso de cinco corpos e cinco aparelhos nos conjuntos. Corpos e aparelhos que se

projetam nos espaços do tablado competitivo e criam uma matriz do belo que

concebe um deslumbre coletivo, como na imagem do conjunto de fitas das chinesas

a seguir.
46

Imagem 14 - Corpos que desenham figuras

A imagem anterior nos alerta para o fato de que não é mais a performance de

um só corpo que impressiona, pois pouco importa qual a ginasta que eleva mais a

perna. A figura que se forma com a variação das alturas das pernas das cinco

ginastas é que determina a beleza do movimento. Dessa forma, pensamos que as

séries de conjunto instituem uma beleza que difere das composições individuais.

A beleza de uma série de Conjunto é dada, sobretudo, pela maneira com que

as ginastas elaboram o trabalho coletivo, além do virtuosismo que cada ginasta deve

apresentar tal qual nos exercícios individuais. Na imagem a seguir visualizamos o

caráter coletivo, a dependência de cada ginasta para o funcionamento da

coreografia, fator que atribui beleza aos conjuntos de GR.


47

Imagem 15 - Salto por cima das companheiras do conjunto.

Esse caráter coletivo do Conjunto implica na utilização de duas denominações:

as relações e as colaborações entre as ginastas. As relações são as formas com que os

movimentos corporais e do aparelho são organizados: sincronismo, cânon, sub-

grupos, coral etc. e as colaborações são as ações que só são possíveis pelo empenho

de cada ginasta: passar por dentro dos aparelhos de outras ginastas passar por cima

de outra ginasta saltando etc., como na imagem. Do princípio ao fim do exercício, a

todo momento, as ginastas do conjunto precisam caracterizar relações e colaborações

(FIG, 2007).

Porém, a margem criativa que se ascende com a perspectiva do trabalho em

grupo também é direcionada, razão pela qual se faz necessário resguardá-la de

elementos que fujam dos manejos característicos dos aparelhos e das características

da GR, que expressem manifestações notoriamente divergentes (ex: demonstrar um

jogo de futebol com as bolas, construir pirâmides humanas etc).

Essas são algumas das especificidades que tratamos nesse estudo,

especificidades que se recriam a todo tempo através dos saberes produzidos pelos

corpos e que são registradas e (re) configuradas conforme a transcendência das

necessidades de verdade da GR, porém, é importante reconhecer que não se


48

esgotam nos aspectos abordados. Adentraremos, a seguir, na verificação das

regulações do tempo e dos espaços que também implicam na caracterização da

beleza da Ginástica Rítmica.

OS USOS DO TEMPO E ESPAÇO

Partimos para uma análise do tempo e espaço no Código de Pontuação de

Ginástica Rítmica norteando-nos pelo elenco de pontos da disciplina5 apresentados

por Foucault (1987). Ainda que nesta oportunidade o autor foque suas reflexões para

o contexto das práticas punitivas em Vigiar e Punir, ele deixa claro que,

similarmente, outras instituições se pautavam nas características das instituições

penais, tais como escolas, hospitais, quartéis, pois coligavam entre si as relações de

poder sobre os corpos.

Um capítulo da história do corpo foi constituído junto à história da

penalidade do século XIX, retratada pela interrogação das idéias morais, pela

história da moral. “O corpo não precisa mais ser marcado; deve ser adestrado,

formado e reformado; seu tempo deve ser medido e plenamente utilizado; suas

forças devem ser continuamente aplicadas ao trabalho” (FOUCAULT, 1997, p. 42).

Além da história dos corpos, alia-se a história das relações entre os corpos e o

poder político, controle, sujeição, poder direto ou indireto. Cria-se uma nova ótica,

mecânica, fisiológica, disciplinadora e normalizadora (FOUCAULT, 1997).

Na GR, as técnicas de disciplinarização do corpo belo seguiram as

normatizações do tempo e dos espaços do treinamento, além da normatização de

suas especificidades como vimos anteriormente e da normatização dos gestos como

veremos mais tarde.

5 A disciplina controla, por princípios, a produção dos discursos. Fixa-lhe limites e


reatualiza permanentemente suas regras (FOUCAULT, 1971).
49

Os espaços de treinamento simulam os espaços competitivos, registrados no

código como um quadrado de 13m², os deslocamentos para além da área permitida -

o tablado - são vetados desde as sessões diárias. Em uma quadra de treino é possível

observar a cerca, um lugar heterogêneo, com várias funções (FOUCAULT, 1987), o

âmbito do clube, mas fechado em si mesmo, e as localizações funcionais

(FOUCAULT, 1987), com lugares isolados e utilitários, ou seja, local para as aulas de

Ballet, local para o treino de flexibilidade, local para treinamento de força etc. O

corpo, durante o treinamento, sofre quadriculamento (FOUCAULT, 1987) numa área

de 13 x13 metros, e não extrapola esses limites. Nas competições ocorre o mesmo,

sendo que desta vez o corpo já adestrado não se permite passar do quadrado, a não

ser por um erro imprevisto. Corpo e o aparelho não devem, sob nenhuma hipótese,

ultrapassar os limites regulamentares, sendo que essa ultrapassagem só é validada

ao tocar o solo, porque o corpo da ginasta é treinado, desde a elaboração do seu

exercício, para não exceder as normatizações dos espaços.

Os espaços do corpo, prescritos pelos movimentos, obedecem à classificação

da variabilidade, incorporados pela técnica característica. O Código reza que os

movimentos precisam ser em diferentes níveis (alto, médio e baixo), diferentes

trajetórias (reta, curva), diferentes planos (frontal, transversal e sagital) e diferentes

modalidades (formas de deslocamento) (FIG, 2007).

Nas Séries de Conjunto as variações espaciais são inúmeras, as cinco ginastas

compõem figuras, desenhos e formas em todos os momentos do exercício. No

entanto, essa caracterização espacial precisa ser nítida. Por exemplo, em uma reta

formada pelas ginastas deve ser resguardada a forma exata de uma reta com

distâncias iguais entre as ginastas. Nas imagens a seguir, visualizamos figuras

definidas.
50

.
Imagem 16 - Figura em V.

Imagem 17 - Cada corpo em seu lugar determinado no tablado competitivo.

O cerne do espaço competitivo, a área de competição, é reservada para as

ginastas em competição, portanto estas não podem se atrasar nem se adiantar, nem

permanecer antes nem depois de competir em suas proximidades (FIG, 2007). Os

horários precisam ser respeitados a todo o tempo pois na ginástica existe tempo e

local para tudo. E, para que não ocorra veiculação do exercício antes do momento

propriamente dito da série, já que o julgamento ocorre estritamente durante os dois


51

minutos e meio da série de conjunto, a entrada no tablado competitivo não pode ser

coreografada. Aquele espaço e aquele tempo devem ser resguardados até o

momento da competição propriamente dita.

Porém, não basta a ginasta demonstrar-se virtuosa apenas durante seu

exercício na área regulamentar, outros fatores, que podem ocorrer inclusive em

outros momentos ou que independam do seu domínio também podem interferir no

seu julgamento, tais como suas condutas ou de sua equipe fora do tablado. Por

exemplo, as ginastas numa prova de conjunto não devem se comunicar entre si, nem

com a técnica, nem com os membros da arbitragem durante o exercício (FIG, 2007).

O tempo e a regulamentação da série é que determinam o tempo de

amoldamento da ginasta. Os horários são previstos para atividades das sessões de

treinamento e para além deste. A vida da ginasta é um ciclo rotineiro regrado pelo

tempo, que é controlado para garantir a qualidade da sua profissão, e inclui treino,

alimentação, sono, estudos e tempo livre. Este último serve para realizar todas as

outras atividades da vida de uma jovem normal, namoros, amizades, passeios,

família etc. Porém, mesmo no tempo livre não é permitido se exceder, a fim de que o

corpo esteja pronto para produzir bem nos momentos “úteis” da vida da ginasta.

A estética da performance sobrepuja a estética da vida. Ou seja, há “a negação

de outras estéticas corporais e vivências estéticas da própria ginasta, presentes por

exemplo nas ações cotidianas relativas à alimentação, ao convívio familiar, às formas

de perceber e aceitar o próprio corpo” (PORPINO, 2004, p. 129). É o que reflete esta

autora em artigo que disserta sobre as concepções estéticas do treinamento esportivo

da GR. E complementa referindo-se à relação paradoxal entre essas estéticas, pois,

“ao mesmo tempo em que o sacrifício é justificado pela concretização de uma

estética esperada é na negação de uma estética de vida que esse sacrifício é

realizado” (PORPINO, 2004, p. 128). A ginasta “abandona” sua vida para garantir

sua (re) significação por meio da dor, do uso de um corpo constantemente utilitário

em prol do sonho de se tornar uma campeã.


52

Sobre o tempo útil, Foucault (1987, p. 129), ilustra o controle do tempo dos

funcionários de uma indústria no início do século XIX: “O tempo medido e pago

deve ser também um tempo sem impureza nem defeito, um tempo de boa

qualidade, e durante todo o seu transcurso, o corpo deve ficar aplicado a seu

exercício”.

A repetição da seqüência coreográfica de um minuto e quinze segundos a um

minuto e meio da GR acaba sendo a própria medição temporal dos movimentos e

que determina todo o processo de treinamento. Um movimento, seqüenciado pelo

outro recebe uma interpelação determinada pelo corpo e pela métrica musical, que

se (re) significa conforme a melhoria da performance, pois em um intervalo musical

é possível executar um maior número de movimentos com o decorrer do processo

de treinamento. “O tempo penetra o corpo, e com ele todos os controles minuciosos

do poder” (FOUCAULT, 1987, p.129).

Quanto mais se fraciona o tempo, mais é possível extrair mais tarefas dele.

Antes e após a duração regulamentar da série, o corpo da ginasta deve apresentar

imobilização completa para que se possa enxergar a duração exata do exercício (FIG,

2007). Nesses segundos a ginasta ou conjunto de ginastas devem manifestar o

melhor de suas virtudes corporais mais excepcionais. Um minuto e trinta segundos,

dois minutos e trinta segundos, tempo máximo regulamentado para que uma

ginasta em séries individual e de conjunto apresentem o melhor, a seleção dos

melhores movimentos com o corpo e aparelhos, melhor música e coreografia, a mais

bela, a mais original, o encadeamento mais perfeito das composições. Inversamente

proporcional ao tempo cronometricamente contado da série é o tempo dos

treinamentos, também contados, mas se valendo da extensão: horas, horas e horas

que se resumirão a um minuto e meio, uma previsão intensa e detalhada de como o

corpo irá responder no momento e no tempo exato da competição.

Outra perspectiva do aspecto temporal está em executar certo número de

vezes a série sem erros, que pode ter uma duração de quinze minutos ou de várias
53

horas. Isso só vai depender do aperfeiçoamento dos gestos. Essa é uma fase do

treinamento em que infere-se que a ginasta, já adequada àqueles gestos, seja capaz

de executar seus exercícios sem falha (LAFFRANCHI, 2002). “Um corpo

disciplinado é a base de um gesto eficiente” (FOUCAULT, 1987, p.130). Ou seja,

eficiência e rapidez precisam caminhar juntas, o gesto disciplinado confere à ginasta

uma atitude corporal voltada ao movimento eficiente.

Dessa forma, o tempo determina a construção do corpo belo ou da beleza na

Ginástica Rítmica quando é proveitoso, não só enquanto a ginasta projeta os

movimentos mais belos em um minuto e meio de exercício, mas quando o faz em

razão de um processo árduo, útil e meticuloso, um tempo capitalizado, como diria

Foucault (1987, p. 133):

Como capitalizar o tempo dos indivíduos, acumulá-lo em cada um


deles, em seus corpos, em suas forças e capacidades, e de uma
maneira que seja susceptível de utilização e de controle? Como
organizar durações rentáveis? As disciplinas, que analisam o espaço,
que decompõem e recompõem as atividades, devem ser também
compreendidas como aparelhos para adicionar e capitalizar o tempo.

Porpino (2004, p. 127) demonstra que na preparação técnica “além da

obtenção da maior eficiência do movimento ginástico com o mínimo de esforço,

objetiva-se também o virtuosismo dos movimentos realizados”. Dessa forma, as 200

repetições dos exercícios de conjunto descritos por Porpino (2004), do vídeo que

narra o dia-a-dia das ginastas da seleção brasileira, resultam de ciclos diários,

sacrificantes, porém necessariamente virtuosos das sessões de treino.

Outro elemento que dita o tempo e a forma do gesto é a música. A perda de

ritmo prejudicial à ginasta é ocasionada tanto pela montagem de sua série em um

tempo equivocado ao da música como por erros que interfiram no encadeamento da

coreografia. Por exemplo, a ginasta que perde um aparelho e sai correndo, ou que

demora mais num determinado Elemento Corporal perde várias vezes o ritmo da
54

coreografia. Contudo, existe ainda uma penalização de discordância entre música e

movimento no fim do exercício, que demonstra o controle do tempo da coreografia

determinado pelo tempo de música, qualquer imprevisto pode levar ao erro (FIG,

2007).

Uma das séries mais lembradas da GR mundial é o exercício com arco da

ginasta búlgara Maria Petrova no Campeonato Mundial de Paris em 1994. Naquela

competição, Petrova parecia desafiar o tempo e o espaço requerido para uma

coreografia de Ginástica Rítmica, pois, após marcar cada batida da música com

precisão minuciosa através de seus movimentos, Petrova, na fase final, na apoteose

dos segundos anteriores ao fechamento da série, empenha uma movimentação

extremamente lenta, que empreende longos doze segundos da sua coreografia, que

por sua vez, dá um belo efeito ao som da cantata Carmina Burana.

Imagem 18 - A “câmera lenta” que estabelece novos sentidos de tempo e espaço.

Guardadas as exceções, a exemplo de Petrova, observamos que o tempo e o

espaço na GR obedecem estritamente os controles estabelecidos pelo Código, sendo

considerados durante todo o processo de formação e preparação da ginasta,


55

determinando inclusive a conformação da regulação do gesto, a qual, discutiremos a

seguir.

A CONFIGURAÇÃO DO GESTO TÉCNICO

É possível, através da leitura do gesto perceber diferentes formas de


controle, proibições e interdições. Nesse sentido, o conjunto de
normas, a instituição de pedagogias corporais fortificadoras da alma
e a elaboração de estratégias coercitivas e disciplinadoras do corpo
surgidas na época renascentista que formam o ideal do corpo
moderno tendem a desenhar um corpo ideal, reto, sóbrio, moderado,
assexuado, impassível. Esse modelo de corpo revela-se nos
comportamentos sociais de cortesia e de etiqueta, regularizando as
aparências e o pertencimento a uma determinada classe social,
nobre, aristocrática (NÓBREGA, 2003, p. 135).

Movimentos resguardados em retidão de segmentos e extremamente amplos,

grandiosos em relação aos ângulos articulares. As pernas atingem alturas

inacreditáveis. Joelhos, pés, quadril concentram-se no mais puro alinhamento. Cada

movimento é gesto porque implica num envolvimento de todo o organismo sempre,

e expressam um significado, e exprimem linguagem (NÓBREGA, 2000), uma vez

que todas as partes compõem e determinam a ação. A ginasta não realizará um

exímio salto se seu olhar ou mãos se direcionam ou se posicionam em locais não

determinados. Saltar, em Ginástica Rítmica é mais que uma explosão de força dos

membros inferiores, tal ação não se basta, porque todo o corpo precisa estar belo

durante todas as fases do salto: na partida, vôo e chegada.


56

Imagem 19 - As partes que embelezam o todo.

É nos gestos realizados pelos corpos na ginástica que se incidem as operações

mais ferrenhas. O caminho perseguido por uma ginasta, da preparação à

apresentação, é bombardeado por minúcias capazes de podar milimetricamente os

movimentos em nome da beleza prevista e almejada, em nome do primeiro lugar ao

pódio.

Ressalvamos o fato de a regulação das minúcias dos gestos da GR

contemporânea terem se originado de uma prática que teve suporte nos movimentos

femininos “naturais” da Ginástica Moderna ligados às nuances rítmicas, artísticas e

pedagógicas. Pressupomos com isso que as transcendências dos gestos dos corpos

caracterizaram essa modalidade ginástica desde as primeiras demonstrações,

principalmente no que concerne aos objetivos que a ginástica apresentava na sua

origem, um corpo não-performático, mas que permaneceu naturalizado até hoje.

Uma naturalização que não engloba apenas a caracterização das nuances

expressivas do movimento, mas a potencialização dos movimentos através de

investimentos em forma de intervenções corporais no âmbito do mais alto

rendimento esportivo.
57

A naturalização de outrora implicava numa forte atribuição aos movimentos

do corpo na GM como sendo orgânicos ou naturais, que mantinham viva a ligação

da ginástica às ciências biológicas, e reforçava a reflexão de movimento inerente,

pré-idealizado, conseqüentemente adequado a um modelo.

Fruto da biologização e naturalização que dirige a construção da


nova sociedade a Educação Física foi utilizada pelos médicos
higienistas como instrumento de aprimoramento da saúde física e
moral, acoplada aos ideais eugênicos de regeneração e purificação
da raça. Ela se fez protagonista de um corpo saudável, robusto,
disciplinado, e de uma sociedade asséptica, limpa, ordenada e
moralizada, enquadrada, enfim, nos padrões higiênicos de conteúdo
burguês. Podia ser a “receita” e o “remédio” da cura de todos os
males que afligiam a caótica sociedade brasileira capitalista em
formação (SOARES, 2001, p. 136).

Laffranchi (2001), ressalva a forma de trabalho com base nos movimentos

orgânicos e naturais da Ginástica Moderna no Brasil, que procurava explorar as

qualidades estéticas e rítmicas da mulher. Observamos que essas observações,

mesmo que atuais, acerca da Ginástica Moderna não problematizam os aspectos

naturais dos movimentos chamados “orgânicos”, nem se referem aos seus aspectos

culturais.

Nas referências do surgimento da GM, expressas na introdução desta

pesquisa, encontramos a utilização dessas expressões (movimentos orgânicos e

naturais) com freqüência. Esses dois termos referem-se à concepção biológica,

evidente na época, que proclamava uma naturalização dos movimentos, ou seja,

estes eram considerados inatos e precisavam ser trabalhados para fins utilitários

determinados. A GR convive com a configuração de gestos retidos na naturalização

performática e imersos na criação, sendo admissível enxergar essa convivência

conceitual entre natural e artístico desde as primeiras manifestações da Ginástica

Moderna em nosso país. Ilustramos essas evidências com uma imagem do GUG

seguida por uma da atual Seleção.


58

Imagem 20 - Movimentos naturalizados.

Imagem 21 - Corpos naturalmente espetaculares.

A imagem da Seleção Brasileira de conjuntos apesar de também caracterizar

padrões de movimento e de corpo, institui outros modelos pautados nas

performances de corpos flexíveis, longilíneos, potentes e idênticos. E, talvez, menos

“livres” tais como os modelos apregoados nas primeiras referências brasileiras6.

O belo, sempre contemplado nesta prática, persiste veementemente em

arquétipos estipulados pelas próprias ginastas através dos tempos, tornando-se,

após a esportivização, critério de julgamento, que por sua vez é firmado pelo Código

de Pontuação. Os corpos e gestos das ginastas revelam as concepções estéticas da

6 Peuker (1974 e 1976).


59

GR, incorporando mecanismos de poder e saber. E ainda, o gesto tão evidenciado

como natural assume a qualidade de excepcional.

A ginasta obedece a sua tarefa de ser bela, ajustada às formas requeridas pelo

Código. Mas, a beleza do gesto não se basta, este precisa parecer fácil, perfeito, sem

necessidade de retoque. A beleza envolve todo o corpo, dos cabelos às pontas dos

pés, é preciso que tudo esteja envolto harmonicamente, que cada segmento

evidencie intensamente o gesto.

Não basta ter um corpo perfeito ou esteticamente apropriado para a


modalidade. É preciso submeter esse corpo ao treinamento, para
que a ginasta seja capaz de realizar as proezas mais difíceis e
também mais belas. As preocupações estéticas estão presentes no
treinamento da GR desde a escolha das atletas para a composição
das equipes, até o momento em que a atleta se apresenta. Tais
preocupações mantêm-se presentes durante as diversas fases do
treinamento (PORPINO, 2004, p. 125).

Dessa forma, o Código de Pontuação veta todos os movimentos que

desarmonizem o exercício, sobretudo os erros. São considerados erros tudo aquilo

que pressuponha o imprevisto, que não se enquadre nos padrões exatos, portanto,

devem ser penalizados a cada vez que ocorram, para que as notas de Execução da

ginasta que menos erre sejam as mais altas. O olhar do árbitro que observa este

parâmetro precisa ser minucioso e calculista para julgar a mínima falha, perceptível

ou imperceptível aos olhos do espectador comum, pois nesse esporte de alto nível, o

que diferencia a Execução de uma ginasta para outra é a minúcia, pois quanto mais

perceptível ao público não-especialista maior o grau de falta. As partes do Código

que concernem à Execução do exercício são as principais responsáveis pela regulação

da qualidade do gesto, tanto da ginasta como na manipulação com os aparelhos.

O parâmetro de julgamento Execução pauta-se nos mínimos desvios dos

padrões requeridos pelo Código através da apropriação de modelos. Os modelos,

provavelmente, se estabeleceram a partir das experimentações expressivas de


60

movimento, afirmando moldes estéticos que, posteriormente, foram refinados e

reformulados.

Para argumentar as fundamentações dos modelos, temos que, na década de

1960, com os primeiros campeonatos mundiais, a Ginástica Rítmica acabou por

render-se à técnica do Ballet Clássico apesar da forte vinculação à Dança Moderna, já

tradicional na Europa. O Ballet trouxe para a GR técnicas já emancipadas, maneiras

de uso do corpo na dança “fechadas” em movimentações firmemente estipuladas.

Imagem 22 - Arabesque: movimento em comum da GR e do Ballet.

Constatamos a forte influência do Ballet Clássico ao observar que os mesmos

desequilíbrios e faltas de amplitudes dos gestos a serem corrigidos no Ballet são

condenados pelo Código de Pontuação. Por exemplo, para que uma ginasta possa

executar um pivot, giro de 360 graus ou mais na meia-ponta7 de um dos pés, com

uma das pernas sem contato com o solo, exige-se o mesmo tônus do corpo vertical

de uma bailarina que executa uma pirueta, movimento do Ballet análogo ao pivot.

Então, qualquer “frouxidão” na musculatura do abdome, qualquer inclinação

desnecessária do tronco condena esses movimentos em ambas manifestações, sendo

7 Flexão dorsal do pé, associada à flexão do metatarso.


61

que na GR o Código classifica como pivot sem forma definida e fixada. Na imagem

anterior a ginasta executa um movimento comum entre a GR e o Ballet, o arabesque.

Consideramos também as semelhanças na exímia técnica de bailarinas e

ginastas ao longo da trajetória da GR, bem como, a postura exigida para a ginasta

atual que muitas vezes retoma a postura da bailarina clássica.

Imagens 23 e 24 - Saltos que denunciam referenciações.

As harmonias simetrificadas do Ballet Clássico emergem na Ginástica

Rítmica, dissimulando, através das levezas e supostas facilidades das

bailarinas/ginastas na execução das coreografias/séries, aspectos de usos do corpo

moderados pela disciplinarização, enrijecimento, ajustes e uniformização de

movimentos, de formas corporais, de performances metrificadas. Como reflete

Foucault (1987), reflexos residuais da docilidade de um corpo imerso na

disciplinarização, nas relações de poder.

No entanto, é preciso considerar que a apropriação da técnica do Ballet

contribuiu para construir a GR, porém os movimentos livres e expressivos

suscitados por outras danças não foram completamente extintos. Numa série de GR

ainda deparamo-nos com mobilidades do tronco, ondulações, passagens pelo solo,

contrações e solturas, formas de exercícios equivalentes aos da Dança Moderna8.

Essa manifestação não contradizia frontalmente os vocabulários já estipuladas pelo

8“a dança moderna reflete o contexto histórico que a gerou: a de um mundo governado por
máquinas, no qual o ser humano se debate em busca de novas relações consigo mesmo e
com a sociedade” (PORTINARI, 1989, p. 133).
62

Ballet, e sim os (re) configuravam em nuances mais expressivas de movimentos,

libertando a dança dos maneirismos exagerados (PORTINARI, 1989).

Essas movimentações mais “onduladas” são consideradas, inclusive, parte

dos Grupos Fundamentais: as ondas e as flexibilidades, que por sua vez, são os

movimentos mais exigidos para as séries com bola, como na imagem a seguir.

Imagem 25 - Ginasta ao solo.

A partir dessas evidências, refletimos que o gesto técnico da GR, tal qual

evidenciado pelas ginastas que seguem o Código, parecem ser fruto de uma hibridez

de referências, tendo inicialmente a Dança Moderna como foco e, posteriormente,

incorporando as minúcias técnicas do Ballet Clássico, elementos das danças

populares, arte circense e outras manifestações ginásticas.

Essa hibridez parece garantir uma preocupação com o caráter expressivo e

técnico do gesto, bem como sua especificidade que caracteriza a executante como

ginasta de GR e não como bailarina ou ginasta de outra modalidade. Esses pontos

são fundamentais na construção da beleza do gesto técnico da GR.

Segundo o Código de Pontuação os gestos na GR podem ser classificados,

quanto ao seu julgamento, de forma qualitativa ou quantitativa. Quando nos


63

remetemos aos aspectos qualitativos do movimento nos referimos a como esses

movimentos ocorrem segundo os modelos especificados pelo Código. Já os aspectos

quantitativos do julgamento são aqueles em que os árbitros contam, somam ou

diminuem os valores totais dos elementos, se tal movimento é válido ou não.

Exemplificando: se quantifica um movimento quando este atende ou não

determinado parâmetro, e se qualifica quando se observa se o movimento ou a

coreografia se aproximam ou se distanciam dos parâmetros determinados pelo

Código. Essa separação ocorre apenas nas divisões da banca de árbitros, pois

enquanto os árbitros de Dificuldade avaliam a quantidade, os árbitros do Artístico

avaliam quantidade e qualidade, e os árbitros de Execução avaliam a qualidade dos

movimentos.

A regulação dos gestos, segundo sua qualidade e para sua quantificação,

aproxima-se do padrão de movimento e distancia-se do “erro”. Dentre os erros mais

perceptíveis em GR temos a perda de aparelhos pela ginasta, causada por uma

imprecisão qualquer do movimento. Aparelho perdido demonstra claramente o erro

da ginasta e desqualifica a beleza do seu exercício. A perda do aparelho durante uma

série de Ginástica Rítmica é considerada uma falta grave em qualquer circunstância

porque é uma falha perceptível ao espectador comum. Sendo assim, é necessário

diferenciar bem a execução de uma atleta que perde o aparelho de outra que não o

perde.

Ainda que a ginasta recupere seu aparelho, este deve ter um tempo certo de

ação de vôo que não permita que esta dê um passo sequer para a sua recuperação.

Por ser elemento menos perceptível, as penalizações de trajetória imprecisa são

menores que as de perda (FIG, 2007).

A manipulação de aparelhos na GR nos evoca os sentidos da beleza

conseguida através dos instrumentos em diversas épocas, tendo este tema da

instrumentalização do corpo sido abordado por Vigarello (1995), ou seja, a maneira

como se processou a regulação dos gestos: primeiro os aparelhos exercendo forças


64

sobre o corpo, depois o corpo exercendo um conjunto de forças sobre aparelhos,

sobre ele mesmo, e dessa forma obtendo os resultados requeridos e, por último, o

corpo trabalhado por técnicas detalhistas a manipular aparelhos e com a aquisição

dessas habilidades ser considerado belo. Com isso, observamos que a regulação dos

gestos na GR segue a normatização dos aparelhos, ou seja, manipulá-los de acordo

com as especificidades estipuladas e com destreza, é o gesto eficiente que interessa à

beleza do movimento.

Além de eficiente, o corpo da ginasta na Ginástica Rítmica é

instrumentalizado por si próprio, pois se utiliza de suas próprias forças para

alcançar performances, ou para exprimir esse controle pode fazer uso de outros

instrumentos. Nessa forma de pensar, o poder incide na operacionalização

instrumental, não apenas na visibilidade do produto. Visualizando este ponto na

Ginástica Rítmica seria fátuo pensar apenas nos aparelhos portáteis, pois eles já

implicam um manusear codificado que brinca de manipulado e manipulador com a

ginasta no momento da competição e nos treinamentos. Aparelhos como plintos,

colchonetes, bancos suecos, espaldares, barras e o próprio tablado expõem melhor

essa operacionalização pois é preciso manejar com propriedade e método esses

objetos em situação de treinamento (LLOBET, 1996) para se conseguir o

desempenho desejado.

Cada aparelho específico da GR possui mais que características específicas,

também assinalam um Grupo Corporal Obrigatório. Dessa forma, cada série tem um

formato diferenciado e uma concepção que deve permear os usos de determinado

aparelho (FIG, 2007). A ginasta excepcional do rendimento esportivo de GR precisa

executar bem todos os grupos corporais dessa modalidade, para ser exímia nas séries

com todos os aparelhos.

Os Grupos Fundamentais ou Dificuldades (saltos, equilíbrios, pivots,

flexibilidades e ondas) de forma geral, são aqueles que contam pontos num exercício

de GR, são os movimentos mais codificados, mais exatos, mais padronizados. Caso
65

não se enquadrem em qualquer característica de base, serão desconsiderados. São

principalmente esses movimentos que determinam o desempenho da ginasta, por

isso a maior parte do treinamento esportivo em GR é direcionado para o alcance das

dificuldades em consonância com os aparelhos. Sobre esse aspecto, Laffranchi (2001)

atenta para as bases do treino de Ginástica Rítmica, que é a excelente execução da

série.

Para uma ginasta, não é satisfatório que só apreenda as formas dos

movimentos corporais, é preciso fazê-lo executando os movimentos dos Grupos

Técnicos dos aparelhos, uma vez que o domínio do corpo confunde-se com o domínio

de implementos. Para tanto, os gestos da série têm um ritmo, uma forma, um tempo,

um espaço e uma intencionalidade de acordo com a coreografia, que devem ser

treinados.

A tríade ginasta, aparelho e música, conciliados, caracterizam os gestos e

qualificam a beleza do exercício. Desse modo, é preciso que estejam enquadrados

em pré-definições com alinhamentos de alta precisão, pois é possível, em uma só

ação motora da ginasta, penalizá-la por faltas do corpo e dos aparelhos. Portanto, é

necessário que a ginasta esteja “consciente” da posição de cada segmento corporal e

do aparelho na hora do exercício. Além disso, o árbitro, com seu olhar clínico, pesa,

a cada segundo, a forma adequada do corpo para cada ação, sendo possível

penalizar a ginasta por várias falhas ao mesmo tempo. Por exemplo, uma mínima

falha com o aparelho ou com um segmento corporal deve ser notada pelo árbitro de

Execução que deduzirá as devidas penalizações (FIG, 2007).

Também consideradas graves são as falhas por perda de equilíbrio, que

sofrem penalizações ascendentes, desde as menos perceptíveis sem deslocamento do

corpo, expressas por uma mínima imprecisão do eixo corporal, até o desequilíbrio

total finalizado pela queda (FIG, 2007). Essas faltas podem ser minimizadas através

de um extremo controle dos movimentos, de todos os músculos, de todo corpo, que

se envolvem na ação.
66

Um controle minucioso do movimento executado sobre uma parte reduzida

de apoio ou sobre a recuperação do apoio de movimentos dinâmicos como saltos,

acrobacias e giros são de suma importância. Para esses elementos específicos são

previstas penalizações maiores que as prescritas para os elementos corporais em

geral, pois as ações de saltar, girar e girar através do eixo vertical (elementos

acrobáticos), são de categoria mais dinâmica e as recuperações do equilíbrio durante

e após esses movimentos são mais passíveis de erros visíveis pelo público não

especialista, pois distinguem uma quase queda.

A ginasta búlgara Teodora Alexandrova marcou época na GR, por chegar aos

pódios nos campeonatos internacionais apresentando movimentos com limites de

flexibilidade bastante modestos em relação às concorrentes. No entanto, suas

coreografias eram assinaladas com um manejo de aparelhos e movimentações de

giros com alto grau de dinamismo, fatores que sanavam suas possíveis limitações.

Na série de bola do campeonato mundial de Osaka, em 1999, a ginasta apresenta

quatro seqüências de pivots, uma com duas voltas completas, outra com cinco, outra

com seis voltas e a última com dez giros completos. No Código atual isso não seria

permitido, pois os grupos corporais obrigatórios da bola são as flexibilidades e ondas, e

só se permite a utilização de outros grupos por, no máximo, duas vezes.


67

Imagem 26 - Qualidades que superam os limites.

Com essa tática, Teodora sempre utilizou na série seus melhores movimentos,

transgredindo as tendências de hiper-flexibilidade da GR da década de 1990.

O erro apariscente, causado tanto por uma série composta por movimentos

inadequados ao melhor desempenho da ginasta, tanto por erros ocasionais e

momentâneos, desvaloriza mais a Execução do exercício. Entretanto, a ginasta não só

perde pontos por errar, perde por deixar de ganhar. Enquanto um árbitro penaliza a

ginasta por uma eventual queda, o outro desconsidera um elemento corporal não

executado por causa da queda, nesse caso, a ginasta perde pela qualidade e

quantidade.

O Código de Pontuação, além de regular os movimentos, determina quais

podem ser utilizados numa série, a qual deve conter até 18 que contam pontos: as

dificuldades ou grupos fundamentais (FIG, 2007). A escolha dessas dificuldades e a ordem

com que aparecem na série são fundamentais para a performance da ginasta e para o
68

desenrolar do exercício. O Código determina uma longa lista, e a escolha desses

elementos deve ser ajustadas às possibilidades corporais da ginasta, ou seja,

suficiente para minimizar a possibilidade de erros.

A ordem dos elementos de uma série de GR devem ser descritos numa ficha

de julgamento através de uma simbologia própria que ilustra todo o exercício

ginástico. Deve ser respeitada a sucessão dos movimentos e suas formas (FIG, 2007),

mais uma vez encontramos a técnica disciplinar do registro (FOUCAULT, 1987).

Uma série de GR não permite improviso que não seja ocasionado pelo erro. O bom

improviso, tido como um atributo de inteligência necessário à ginasta, é aquele que

minimiza ao máximo o erro ou a perda de pontos. Numa fração de segundos,

quando a ginasta perde o aparelho, por exemplo, as decisões precisam ser tomadas

rapidamente para que os árbitros e o público fiquem com a sensação de que nada

aconteceu, sem alterar a ordem da série.

Nos Exercícios de Conjunto, as falhas concernentes à técnica corporal, aparelho

e música, idênticas aos Exercícios Individuais, são penalizadas à medida que

aparecem na série, sendo as pequenas falhas a cada vez, e as grandes falhas a cada

vez e somadas a cada ginasta (FIG, 2007). Complementar a essas falhas são as falhas

próprias do conjunto. São erros que ocorrem a partir da desarmonização do todo,

mesmo que o erro não seja uma falta técnica. Por exemplo, a altura aceitável de uma

perna em determinado exercício: se uma ginasta mais flexível eleva ainda mais essa

perna, o exercício será penalizado porque sofre de falta de sincronismo na

amplitude do movimento, como podemos observar na próxima imagem. A

incidência do controle se dá também pela igualdade de corpos, de aparelhos, e até

pela diferença nas expressões faciais das ginastas.


69

Imagem 27 - Pernas em diferentes alturas.

Há a obrigatoriedade de todas as ginastas do conjunto executarem bem os

grupos corporais. Caso uma ou mais delas não atenda os critérios necessários para

expressar a dificuldade tal qual o Código anuncia, esta será invalidada para todo o

grupo. Ao mesmo tempo em que no conjunto o senso coletivo é valorizado, o erro

individual também é tido como erro coletivo. Ou seja, todas as ginastas comemoram

juntas suas virtudes e pagam juntas pelas suas falhas.

Outra particularidade da regulação do gesto no Código que nos chamou

atenção foi o controle do corpo numa série de GR que incide, inclusive, na

habilidade com ambas as mãos, aguçando ainda mais a sua técnica. Neste caso, é

preciso que todas as ginastas submetidas ao Código sejam praticamente

ambidestras.

Percebemos que a regulação dos gestos na GR ocorre de forma a vetar a

expressão do movimento que vá além dos seus ditames, porém a ginasta o subverte.

Visualizar o código unilateralmente é pensar que só a ginasta de alto rendimento

pode ser capaz de exprimir os sentidos artísticos de uma coreografia, resguardando

as linearidades do julgamento aos movimentos da técnica específica. Nesta linha de


70

pensamento, só as mais espetaculares ginastas seriam aptas a atravessar as

regulamentações e produzir mais. Entretanto, para transpor nossos pensamentos

para a GR na Educação é preciso ampliar essa visão constatando que o corpo é

sempre capaz de produzir saber a partir das relações de poder, neste caso, não um

saber que suplante às performances, mas um saber que as transcenda, um saber que

considere os elementos mais importantes da GR para a Educação Física. E é sob essa

ótica que trabalhamos no capítulo seguinte.


71

3O CORPO BELO
TRANSCENDE A REGRA
72

Reflexão 1 – PODERES E SABERES

Transcender é ultrapassar a capacidade de conhecer, extrapolar a norma,

exceder, ir além. Tal conceito nos leva a intuir que as transcendências alcançadas

pelas ginastas instituíram novos conhecimentos sobre o corpo na GR.

A rede de relações que perpetua os conhecimentos do corpo não dimensiona

um sistema desencadeante linear entre saberes e poderes, mas sim um inacabamento

caótico de arrolamentos passíveis de serem lidos – leitura multidimensional - por

meio das escrituras do corpo e dos saberes produzidos por este. Um caos ordenado,

uma totalidade corporal capaz de expressar, transcender, mascarar, simular e

maquiar sentidos que se revelam em saberes. Sentidos que se constroem e se

reconstroem, pois aliam-se constantemente a outros sentidos. Uns perduram, uns

resistem, estes para (re) significar os que perduraram e para transcrever

modestamente - não invisivelmente – suas pequenas, mas legíveis marcas sempre

consideradas nos textos da construção do conhecimento.

Os conhecimentos da ginástica configuram claramente as relações de poder

focadas nos próprios corpos. A denominação “corpos dóceis” de Foucault (1987) é

adequada para expressar essa condição do corpo da ginasta. Conforme tal autor,

durante a época clássica, a partir da segunda metade do século XVIII, o corpo foi

descoberto como alvo do poder, dos regulamentos, treinamentos e inúmeros tipos

de amoldamentos expressos pelos preceitos escolares, hospitalares, militares e

outros procedimentos que cuidavam de controlar e corrigir as operações corporais.

Não seria a primeira vez que o corpo era alvo de investimentos, no entanto, em tal
73

oportunidade, o corpo foi controlado por um poder invisível, detalhado, sem folga,

nas minúcias, como uma máquina: exímia economia e máxima eficácia.

Nesse período do século XVIII houve uma inversão das técnicas de

intervenção corporal, já que os instrumentos ortopédicos externos, tais como

espartilhos, tutores etc., submeteram-se à utilização do próprio arcabouço muscular

como instrumento de correção (VIGARELLO apud FRAGA, 1999). É a partir dessa

pedagogia que ocorre a estruturação da ginástica, racionalizando os movimentos e

compreendendo uma regulação moral dos mesmos em virtude de “benefícios e

malefícios” ao organismo (FRAGA, 1999).

Essa regulação, por sua vez, não era idêntica aos sexos. Para os meninos era

preciso preservar a virilidade e os corpos robustos. “Às meninas, o vigor necessário

para superar os obstáculos impostos pela maternidade, mas sem perder o ‘encanto’

feminino: ser forte em sua ‘missão’, mas, ao mesmo tempo, graciosa em seus gestos”

(FRAGA, 1999, p. 215).

A atenção dispensada à educação física feminina não representava


nenhum tipo de privilégio social para as mulheres daquele tempo;
pelo contrário, esses cuidados se justificavam em razão dos alegados
benefícios sanitários transmitidos à prole masculina. De certa forma,
defender os exercícios como meio de fortalecer os corpos femininos
significava muito mais um aprofundamento da subordinação das
mulheres a um modo masculino de se movimentar que qualquer
tipo de emancipação social (SOARES, 2003, p.83).

A Ginástica Moderna, herdeira dessa forma de pensar o corpo e a mulher,

nasceu no início do século XX, envolvida tanto pelos alinhamentos corporais, quanto

pelas particularidades da representação do sexo feminino na sociedade (LLOBET,

1996). Talvez a GR ainda seja uma das maiores expressões caricaturadas da

representação da mulher: o sexo belo. Isso se torna evidente nos regulamentos, que

se referem sempre a uma ginasta, nunca a um ginasta, pois, a GR prevalece até hoje

como um esporte que não admite a prática masculina.


74

A beleza, segundo esses preceitos, torna-se imprescindível à educação da

mulher, resultando de esforços, de uma pré-disposição a torturas (SOARES, 2003).

Compreendemos o poder na ginástica, com fins de definição de

conformações, inerentes ao “desenvolvimento” da própria manifestação, com isso,

Foucault (1987) nos esclarece que as estruturas de poder balizaram toda a formação

do conhecimento e que a disciplina, na medida em que aumenta as forças dos

corpos, em sua utilidade e economia, diminui em termos políticos de obediência.

Esse brilhante pensamento nos faz avançar e refletir que as transformações do

Código de Pontuação que desembocaram em sua versão atual alavancaram

exercícios ginásticos muito mais complexos e milimetrados, iniciando um processo

de laqueadura de técnicas que canalizaram as variantes criativas de movimento, o

que forçou e força a recriação constante de movimentos e de formas de pensar os

aspectos que definem a beleza da GR, como visto no capítulo anterior. Desse modo,

os corpos das ginastas revelam sentidos da beleza da GR, incorporando, através do

Código, mecanismos de poder que se propagaram nessa constituição através dos

tempos.

Pensar sempre em sujeitos como pólos excludentes constituintes da trama

histórica torna-se um equívoco quando falamos da produção de discursos, cabe, de

acordo com Foucault (1997), livrar-nos desta crença, porque o sujeito seria

constituído pela trama histórica. Ou seja, vale focar uma análise histórica que possa,

sem ter de se referir a um sujeito, dar conta das constituições dos saberes, dos

discursos e dos domínios de objeto, o que dimensiona o conceito de genealogia dado

por este autor.

As práticas discursivas caracterizam-se pelo recorte de um campo de


projetos, pela definição de uma perspectiva legítima para o sujeito de
conhecimento, pela fixação de normas para a elaboração de conceitos
e teorias, cada uma delas supõe, então, um jogo de prescrições que
determinam exclusões e escolhas (FOUCAULT, 1997, p.11).
75

Importante compreender o corpo como construção discursiva, que vem sendo

vivido através de investimentos vários: tecnologias, meios de controle, produção e

consumo, prazer e dor (GALLAGHER e LAQUER apud FRAGA, 2000). O corpo no

esporte de rendimento, inclusive na GR, é produto dessas intervenções, que no

nosso caso, dimensionam a compreensão da beleza que faz ganhar títulos.

Sendo um desporto que objetiva alcançar, dia a dia, a perfeição


técnica, horas de treinamento são utilizadas para a formação de uma
ginasta. E todos os esforços despendidos dentro de uma estrutura de
treinamento são dirigidos praticamente para um único fim: a vitória
em competições, a formação de ginastas capazes de performances até
então consideradas inatingíveis (LAFFRANCHI, 2001, p.3).

A ginástica perpassou e perpassa discursos vários (médicos, pedagógicos,

artísticos), e produz através destes, os seus. O Treinamento Esportivo, ciência

comum a todas as práticas competitivas, principalmente olímpicas, se afina às

particularidades da Ginástica Rítmica, que o toma como referência produzindo

especialidades que procuram reduzir as possibilidades de imprevisão ocasionada

pela técnica que se funda na criação subjetiva. Dessa forma, o mesmo leque aberto

que sucumbe a GR a uma prática artística e expressiva, filtra saberes necessários e

determina outros, direciona as imensas possibilidades de movimento à medição

matemática das performances dos corpos, como percebemos na análise das

especificidades da GR e da configuração do gesto técnico.

Conforme o desenvolvimento da nossa análise, conjecturamos que os

discursos dos corpos das ginastas são permeados por relações de poder, as quais

foram constituindo saberes do corpo através da ginástica, da exaltação do corpo

belo, que conduziram ao desejo do próprio corpo por uma cautela obstinada,

insistente e meticulosa (Foucault, 1979).

O poder, longe de impedir o saber, o produz. Se foi possível


constituir um saber sobre o corpo, foi através de um conjunto de
76

disciplinas militares e escolares. É a partir de um poder sobre o


corpo que foi possível um saber fisiológico, orgânico. O
enraizamento do poder, as dificuldades que se enfrenta para se
desprender dele vem de todos esses vínculos. É por isso que a noção
de repressão, à qual geralmente se reduzem os mecanismos do
poder, me parece muito insuficiente, e talvez até perigosa
(FOUCAULT, 1979, p. 148-149).

Constatamos ainda que a resistência é uma condição essencial para que o

poder possa existir e, principalmente para que, em contrapartida, haja a construção

de conhecimento. Na GR, por exemplo, os movimentos extremamente difíceis

requeridos pelas mudanças do Código encontram resistências corporais por parte

das ginastas, resistências que por vezes são vencidas, e por vezes são resignificadas,

instituindo novas formas de saber. As ginastas das próximas fotos, por exemplo,

estão executando o mesmo salto, no entanto, a da direita estabelece uma forma de

saltar que extrapola bastante os 180 graus de angulação das pernas requeridos pelo

Código de Pontuação.

Imagens 29 e 30 - Classificação igual para movimentos com diferentes limites.

Vale ressaltar, tal como reflete Foucault (1979), que a resistência não resulta

da repressão, pois o poder não é absolutamente repressivo, pois seria impossível

aceitar somente a negação. O que faz com que o poder seja aceito é sua

permissividade, sua produção de discursos, sua indução ao prazer. “Deve-se

considerá-lo como uma rede produtiva que atravessa todo o corpo social muito mais

do que uma instância negativa que tem por função reprimir” (FOUCAULT, 1979,

p.8). Por isso, compreendemos o Código de Pontuação da GR como um documento


77

que não só reprime, mas que produz o corpo belo da ginasta, possibilita a

construção de uma gestualidade bela.

Até se considerarmos a consolidação mais contemporânea das relações de

poder na Ginástica Rítmica, que é o esporte performance, existem muitas

justificativas prazerosas que fazem com que praticantes destinem grande parte de

suas vidas à dedicação nessa atividade. Não nos referimos necessariamente à

ascendência da vida profissional, mas a um aspecto maior que faz até um atleta

amador se doar completamente àquela causa: o esporte, o desafio. Sobre essa relação

prazer-poder Foucault (1988, p. 48) reflete: “Prazer e poder não se anulam; não se

voltam um contra o outro; seguem-se, entrelaçam e relançam. Encadeiam-se através

de mecanismos complexos e positivos de excitação e incitação”.

A plasticidade do corpo o faz, em razão da resistência, produzir mais. Ao

folhear o atual Código de Pontuação de Ginástica Rítmica, encontramos inumeráveis

mudanças nas regras desde a versão publicada no Brasil em 1978 pela Confederação

Brasileira de Desportos. A começar pelos níveis de dificuldades dos exercícios que

na década de 1970 recebiam duas graduações: nível médio e superior, e que

atualmente têm dez graduações: dificuldades de A a J. Em vários pontos da

trajetória de revisão do Código este se tornou obsoleto pela produção do corpo

através da adequação nele mesmo. É assim que as vias do poder brotam

materializadas aos nossos olhos: o Código constrói e reconstrói a ginasta e a ginasta

constrói e reconstrói o Código.

Segundo Foucault (1997), o sistema de comunicação, registro, acumulação e

deslocamento, que são formas de poder, são essenciais para a formação de saberes.

Nessa perspectiva, nenhum poder se pratica sem o acúmulo, apropriação e

distribuição de um saber, existindo, dessa maneira, formas do poder-saber. Dessa

forma, compreendemos que da versão de 1978 à versão de 2005 – 2008 dos Códigos

de Pontuação, muitos registros, acumulações e formações de saberes foram

compartilhados. Basta expor que o número de páginas na primeira versão não


78

passava de 53 e que na última passa das 132 sem contar os anexos e erratas

explicativas, documentos rotineiros que esclarecem o texto do Código.

A constante superação das linhas escritas do Código de GR compõe sua

trajetória estética de acordo com a necessidade de reafirmação desta prática. A

vontade de saber surge de acordo com as necessidades de verdade de cada época

(FOUCAULT, 1971), e os discursos são originários dessa vontade. Vontade de reaver

ou romper, os discursos surgem de forma a contestar ou complementar o

conhecimento preexistente.

Foucault (1971), no texto supracitado, “A ordem do discurso” supõe que a

produção do discurso em toda sociedade é construída por diversos procedimentos

que têm o papel de amenizar perigos e poderes e disfarçar sua materialidade,

refreando o acontecimento aleatório.

Os discursos são produzidos por mecanismos de controle, que fixam-lhe

limites pelo jogo de uma identidade que reatualiza permanentemente as regras

(FOUCAULT, 1971). Esses mecanismos, intitulados por Foucault (2003) como poder,

estão imbricados a todo o processo de construção do conhecimento: dos discursos à

verdade.

Produz-se verdade. Essas produções de verdades não podem ser


dissociadas do poder e dos mecanismos de poder, ao mesmo tempo
porque esses mecanismos de poder tornam possíveis, induzem
essas produções de verdades, e porque essas produções de verdades
têm, elas próprias, efeitos de poder que nos unem, nos atam
(FOUCAULT, 2003, p. 229).

As concepções estéticas da GR foram sendo constituídas por diversos

discursos ao longo dos tempos, dos quais, elegemos os que consideramos os mais

emblemáticos no Código de Pontuação, considerado por nós como um dos mais

influentes discursos do corpo da Ginástica Rítmica contemporânea, para explicitar

as relações poderes saberes existentes nesse contexto.


79

Reflexão 2 – A TÉCNICA E O ESTILO

Reconhecemos o legado das técnicas corporais, compreendidas por Mauss

(2003) pelos usos do corpo das sociedades. A leitura dessas técnicas torna possível

uma análise estética a partir da historicidade, pois são adequadas aos contextos das

sociedades e às épocas em que se expressam. Portanto, enxergamos uma relação de

análise permissiva pela via da historicidade que remete às técnicas, e pelas técnicas

que evocam a historicidade.

Sendo assim, a leitura dos gestos, tidos como impreteríveis na história da

humanidade (MAUSS, 2003) nos coligam à essencialidade de se compreender a

ginástica, pois, os hábitos, movimentos e posições variam não somente com os

indivíduos e imitações, mas com “as sociedades, as educações, as conveniências, as

modas, os prestígios” (MAUSS, 2003, p. 404). Ler os gestos na ginástica, assim como

o texto do Código que os determinam, é mais que fazer análise de movimento ou da

gramática textual, é compreender sua construção, sobretudo estética. Visto que,

“gestos aparentemente insignificantes, transmitidos de geração em geração, e

protegidos por sua insignificância mesma são testemunhos geralmente melhores que

jazidas arqueológicas ou monumentos figurados” (MAUSS, 2003, p. 15).

O termo técnica é compulsivamente utilizado no universo das práticas

corporais, sobretudo dos esportes institucionalizados, pois engloba todos os

movimentos, suas formas específicas e todo o processo de obtenção do gesto de uma

determinada manifestação. Esses modos acabam por se universalizarem e

aperfeiçoarem, conforme se dá a disseminação da prática. Embora, segundo os

argumentos de Mauss (2003), no mundo, sempre ocorram contribuições originais de

se empreender possibilidades e métodos de construção de técnicas corporais,

compreendidos por nós como os enriquecimentos dados pelas peculiaridades das

culturas. A análise dos gestos poderia, então, ser um patrimônio comum e acessível

à humanidade.
80

A técnica, em Ginástica Rítmica, também recebe conceituação própria,

agregada à realização do movimento ginástico com o máximo de economia e

eficiência, e o mínimo de esforço, expressos pelo virtuosismo corporal na execução

das séries (LAFFRANCHI, 2001). Enxergamos esta compreensão nas entrelinhas do

texto do Código de Pontuação.

Para se alcançar a perfeição do gesto desportivo e o automatismo


correto da execução dos movimentos, a ginasta tem que passar por
um caminho de infindáveis repetições durante sua preparação e
suportar extenuantes e exigentes correções detalhadas de cada
movimento (LAFFRANCHI, 2001, p.85).

O conceito de técnica na GR, como visto anteriormente, ainda permeia-se

pelos preceitos positivistas da disciplina pautados na utilidade e economia dos

gestos, como nos mostrou Foucault (1979).

Compuseram a emancipação e universalização das técnicas corporais de

Ginástica Rítmica, diversos contextos de países, situados, em sua maioria, na

Europa. Tal fato forneceu à região propriedades pioneiras dos gestos mais

significativos dessa modalidade ginástica. Duas nações, todavia, sobrepuseram-se: a

Rússia e a Bulgária, constituindo duas vertentes com características bem definidas

da GR.

A escola russa exibia uma forma de trabalho toda fundamentada pelo Ballet

Clássico, familiar às suas tradições, o que imprimia aos movimentos uma grande

amplitude no espaço e expressividade. Já a escola búlgara caracterizou-se por uma

forma de trabalho que explorava a originalidade, a variedade de elementos, o

dinamismo e a estonteante expressividade de suas ginastas. Embora divergentes no

que chamamos de estilo, os pódios das décadas de 1970 e 1980 de competições de

Ginástica Rítmica foram compartilhados por esses países. Um terceiro estilo se

mostrou (década de 1960, primeiras competições internacionais), dotado de


81

acrobacias, a Coréia que foi vetada por esboçar uma ginástica mais acrobática

(LLOBET, 1996).

Imagens 31 e 32 - Estilos divergentes que culminaram numa mesma manifestação,


ginasta russa e búlgara.

As escolas búlgara e russa estruturaram-se por caminhos divergentes, mas

que culminaram numa manifestação única, consideradas irretocáveis e

imprescindíveis na escultura da GR. Esses dois estilos nos interligam ao pensamento

de Merleau-Ponty (2002), na Prosa do Mundo, sobre a arte clássica e moderna, pois

estamos compreendendo estes dois movimentos como íntimos às expressões da GR.

Nas palavras do filósofo: “Enquanto os clássicos eram eles próprios sem que o

soubessem, os pintores modernos procuram primeiro ser originais, e seu poder de

expressão confunde-se com sua diferença individual” (MERLEAU-PONTY, 2002,

p.80). Esse filósofo da fenomenologia, embora exemplifique na obra citada sua

análise através das pinturas, refere-se às diferenciações das artes clássica e moderna

como dois mundos percebidos em que constavam pintores, escritores, filósofos e

pesquisadores (MERLEAU-PONTY, 2004), ou seja, os personagens que pronunciam

uma época.
82

Constatamos as aproximações da escola russa com a arte clássica, dotada de

segurança e dogmatismo (MERLEAU-PONTY, 2004), pautada pela

proporcionalidade, harmonia de formas, perfeição técnica, predizendo uma

utilização do corpo voltada à repetição extenuante de gestos, comum ao Ballet

clássico, a fim de se chegar a um objetivo pré-determinado. A escola búlgara,

todavia, caminhou por outros rumos, da originalidade, criatividade, desbravando

riscos e desafios, explorando as qualidades individuais do sujeito, características que

se coligam às ambigüidades e incompletudes da arte moderna (MERLEAU-PONTY,

2004).

Considerando que a GR é uma manifestação que se originou por cunhos

pedagógicos e artísticos nos movimentos ginásticos europeus, e reconhecida como

Ginástica Moderna, compactuaremos, pela aproximação de raízes, aos movimentos

artísticos suscitados pelo filósofo Merleau-Ponty (2002), que tão bem conceitua o

termo anteriormente referendado: estilo.

O estilo é o que torna possível toda a significação. Antes do


momento em que os signos ou emblemas serão em cada um e no
artista mesmo o simples índice de significações que ali já estão, é
preciso que haja este momento fecundo em que eles deram forma à
experiência, em que um sentido que era apenas operante ou latente
encontrou os emblemas que haveriam de liberá-lo e torná-lo
manejável para o artista e acessível aos outros. Se quisermos
realmente compreender a origem da significação - e se não o
fizermos, não compreenderemos nenhuma criação, nenhuma
cultura, voltaremos à suposição de um mundo inteligível onde tudo
está significado de antemão -, precisamos aqui nos privar de toda
significação já instituída e voltar à situação de partida de um
mundo não significante que é sempre o do criador, pelo menos no
que toca àquilo justamente que ele vai dizer (MERLEAU-PONTY,
2002, p. 84-85).

A obra artística referendada pelo presente estudo é o próprio corpo em

movimento, que constitui sua atmosfera pelas suas formas, aparências, oscilações no

espaço e implementos. A ginasta em seu exercício é objeto estético, fundada pela


83

concepção de sua coreografia entremeada a sua expressão. Porém, vale considerar

que a ginasta pendula entre dois extremos, o da expressão pessoal e o da técnica

inerente à GR, ao mesmo tempo em que não pode se desviar da técnica pode criar e

se expressar dentro desta. Os estilos constituídos pelos países, técnicas e ginastas, se

expressam como os modos com que os moldes da GR foram transgredidos e

transformados, o que por sua vez caracterizaram a constituição da própria GR. Esse

fenômeno é comum a outras práticas corporais sistematizadas, como os esportes, e

se constitui como de suma importância para o enriquecimento da Cultura de

Movimentos e produção saberes na área da Educação Física.

A ex-técnica da seleção campeã mundial búlgara das décadas de 1980 e 1990,

e fundadora de um estilo inventivo e inédito que fez história, Róbeva (1981), nos

esclarece que cada ginasta tem seu estilo próprio, e que as músicas, as coreografias,

as aparências (roupas e adornos) devem necessariamente respeitar essa linguagem,

pois são capazes de potencializar o seu talento. As ginastas da Bulgária apareciam

como “caixinhas de surpresa” aos campeonatos mundiais, chegavam às competições

com novidades que garantiam as primeiras colocações e mobilizavam o público,

considerado por Róbeva como o árbitro número um.

Rússia e Bulgária carimbaram suas marcas nos anos 80 e 90, mas após a

aposentadoria de Róbeva e da presença ordinária das ginastas russas nos pódios

europeus, mundiais e olímpicos, o estilo búlgaro perdeu forças e o estilo russo se

redesenhou.

Nossa apreciação nos permite identificar outros estilos de GR que se

conformam atualmente: os estilos alegres e plásticos grego e bielo-russo, o estilo

clássico ucraniano, o estilo circense russo etc. Tomaremos os dois últimos para

descrevê-los pelo exame de duas ginastas.

A ginasta ucraniana Anna Bessonova, apresenta movimentos virtuosíssimos,

sem falhas, sem sobressaltos, saltos de amplitudes inacreditáveis, movimentos e

manejos com aparelhos milimetrados, execução exímia dos exercícios, interpretação


84

e ritmo marcado conforme a música. Bessonova parece ter saído dos palcos dos

grandes balés de repertório, é uma ginasta bailarina que impressiona pela sua

precisão e pela bela história que conta durante a série pelos movimentos do seu

corpo.

Imagem 33 - O cisne.

A série de arco com a música do espetáculo Lago dos Cisnes apresentada no

campeonato mundial de Budapeste em 2003 transcende o tempo e espaço quando

lentamente a ginasta executa uma seqüência de movimentos de braços sem se

deslocar para ilustrar o tema da coreografia, conforme o cisne interpretado pela

personagem principal desse Ballet de repertório, Odete. Esse exercício exprime o

teor clássico dessa ginasta.

Outra ginasta que destacamos é a russa Alina Kabaeva. Seus movimentos são

marcos para a Ginástica Rítmica contemporânea. É uma ginasta de tamanha ousadia

corporal, tanto que isso lhe rendeu um mundo de críticas ao estilo considerado

circense, mas simultaneamente, lhe garantiu as primeiras colocações nos

campeonatos em que participou. Kabaeva realiza proezas com os aparelhos e

contorcionismos com o corpo exibindo um largo sorriso de facilidade. Seu corpo

hiperflexível parece incontrolável. Não bastasse a amplitude absurda dos


85

movimentos de pernas e tronco, sua potência para saltos a eleva a alturas e ângulos

espetaculares. Destacamos as performances de Kabaeva como rupturas nos

movimentos da GR, sobretudo do ponto de vista estético.

Ilustramos a série do aparelho arco do Campeonato mundial de Budapeste

em 2003, interpretação de uma música espanhola, trazendo movimentos

impressionantes de plasticidade e vigor.

Imagem 34 - A circense.

As atletas de Ginástica Rítmica de cada país imprimem estilos peculiares às

suas coreografias. Esses estilos resultam de maneiras próprias de usos do corpo, as

pedagogias de movimento, inerentes à manifestação e contornadas por cada cultura.

Os limiares de excitabilidade, os limites de resistência são diferentes


em cada cultura. O esforço “irrealizável”, a dor “intolerável”, o
prazer “extraordinário” são menos função de particularidades
individuais que de critérios sancionados pela aprovação ou
desaprovação coletiva do que função de particularidades
individuais. Cada técnica, cada conduta, tradicionalmente
aprendida e transmitida, funda-se em certas sinergias nervosas e
musculares que constituem verdadeiros sistemas, solidários com
todo um contexto sociológico (LÉVI-STRAUSS, 2003, p. 14).
86

Os dizeres de Lévi-Strauss, na introdução da obra de Mauss, reforçam a idéia

de que a beleza na GR, ou seja, as concepções estéticas predominantes são balizadas

por mecanismos sociais construídos culturalmente. Isso não impede, ao nosso ver,

ocasiões de transcendência, do despertar para categorias estéticas como o feio ou o

grotesco durante a apreciação de uma série por um espectador, provocado pela

busca de movimentos que desafiam a normalidade instituída pelas formas dos

corpos. Ao mesmo tempo, tem-se a impressão de que a GR se reaproxima dos

espetáculos circenses, como já mencionado, desde o rompimento das origens

ginásticas com as práticas populares, no século XIX, quando necessita do elemento

surpresa, além dos prescritos pelo Código, para transcender a normatização, para

despertar no público novas sensações.

Reflexão 3 – BELEZA E EDUCAÇÃO

Ao avaliar o traçado estético da GR percebemos alguns discursos fundantes,

outros que sofreram rupturas. Discursos provenientes da arte, desde suas origens,

que tratavam de estabelecer a estética da beleza, e, concomitantemente, uma

padronização disciplinar, semente da criação da ginástica, mas que também

objetivava o belo, pelo corte dos excessos, pela medida. Discursos provenientes da

pedagogia que imitava a ciência, pela nova forma de se pensar o homem,

naturalizado, biologizado, do qual se extrairia o máximo de produção com o mínimo

de esforço: a economia (SOARES, 1998). Discursos da nova medicina, empírica, que

se preocupava com a visibilidade das doenças, “ver para crer” (FOUCAULT, 2001),

dissociando-se das analogias criativas para centrar-se num estudo aprofundado

sobre o corpo, para conhecê-lo mais. Discursos sobre a condição natural da mulher:

a reprodução. Discursos do treinamento esportivo, no qual existe a preocupação em

espetacularizar esse corpo e dele arrancar as melhores performances. Enfim, as

conformações estéticas das especificidades, do tempo e espaços e dos gestos da


87

Ginástica Rítmica foram construídas sob uma trama complexa de relações de

poderes durante todo o seu curso.

Fica, portanto, o desafio da transcendência do gesto controlado, do tempo e

espaço regulado e de características fechadas. O corpo sempre nos diz algo, desafio

maior é dizer além da beleza de um exercício dentro de padrões, comunicar mais

que o movimento virtuoso. Feito possível para ginastas e coreografias campeãs do

mundo, corpos que tudo podem, e também possível para corpos menos agraciados

pelas qualidades de movimento requeridas pelo alto rendimento da GR, pois a

transcendência acaba por ser uma condição da prática dessa modalidade, é preciso

transcender para se apropriar da GR e poder identificá-la em outros contextos.

Vimos então que a amplitude estética da GR, formada pelas transcendências

dos corpos e imposições do código, é demasiadamente grande. A Ginástica Rítmica

é uma modalidade que propõe diversas facetas que extrapolam as fechadas formas

de movimento requeridas pelas regulamentações, capaz de estar sempre se

transformando, seja pela transcendência, seja pela retomada das idéias que a

constituíram.

Por isso, consideramos que a abordagem de nuances educacionais nessa

modalidade seja possível, reconhecendo a prioritária fixação da GR ao Código de

Pontuação, mas enxergando sempre a possibilidade de fazer diferente nos pequenos

espaços da originalidade dos gestos, inovações e transformações.

Vale ressaltar que a experiência da beleza ou experiência estética configura-se

como uma porta aberta à possibilidade de ampliação do olhar estético, para um

transcender do corpo na GR, isso considerando que essa manifestação ginástica

fundou-se à luz da estética, à luz da beleza.

Durante os primeiros encaminhamentos, no final do século XIX, início do

século XX, as orientações daquilo que chamamos hoje de Ginástica Rítmica

engatinhavam à procura de uma identificação estética frente às demais

manifestações surgidas em movimentos e momentos cronológicos próximos (Dança


88

Moderna, por exemplo), desse modo, pensamos sobre o que fez com que esta viesse

a tomar o rumo do objetivismo estético e da performance em detrimento das suas

características subjetivamente rítmicas, artísticas e pedagógicas da origem. Quando

denunciamos o objetivismo estético, nos referimos ao enquadramento da GR ao

ideal clássico de beleza, evidenciado pelas performances dos corpos e,

principalmente, ao observarmos, a partir das análises, que o belo na Ginástica

Rítmica tem seus padrões regulados pelo Código de Pontuação.

A concepção clássica do belo, pautada na proporcionalidade, na


medida, na simetria e na harmonia de formas, está relacionada a um
modelo de beleza preconcebido ou a um princípio supremo. A
beleza está nos objetos belos, e para serem considerados belos, estes
devem se enquadrar em predefinições (PORPINO, 2003, p. 148-149).

Porpino (2003), aliada às idéias de Nietzsche, aprovisiona ao deus grego

Apolo a representação da beleza clássica, da medida, da ordem, da proporção, da

simetria, do equilíbrio e da harmonia de formas tão preponderantes na maneira de

se perceber o corpo e a beleza na Educação Física.

O ideal apolíneo encontra-se no cerne das preocupações com o corpo


na Educação Física, que, imbuída deste pensamento, procura beleza
nas simetrias, nas proporcionalidades e nas medidas atribuídas a
modelos de performance e a modelos corporais, ambos articulados,
gerando novos Apolos. (...) A beleza, em sua concepção clássica,
propicia-nos a experiências estéticas significativas. Basta que
lembremos dos muitos corpos "esculpidos" pelo fitness ou pelas
práticas esportivas à incrível semelhança de Apolo (...) Também
poderíamos lembrar uma série de Ginástica Rítmica Desportiva cujos
gestos nos propiciam uma experiência indescritível em que o
movimento realizado pode ser apreciado em sua mais exuberante
harmonia, amplitude e graça, em sua meticulosa e minuciosa
capacidade de desafiar a lei da gravidade com sua leveza, deixando-
nos ciente de que só um corpo metodicamente treinado é capaz de
tal realização (PORPINO, 2003, p. 149 /151-152).
89

Entretanto a autora contrapõe, mostrando que na percepção da beleza as

verdades apolíneas não reinam sozinhas, opostas e complementares a elas há as

dionisíacas: Dionísio, deus do vinho, que desafia o belo posto pela representação de

Apolo através das emoções, da embriaguez dos sentidos. Dionísio é suscitado por

Isadora Duncan, personagem influente no movimento da Ginástica Moderna em

suas danças, em seu rompimento com as “rígidas convenções de uma época em que

a dança teatral era apreciada pelo seu virtuosismo técnico (...) Fez da dança o êxtase

dionisíaco, dissipado pelas verdades apolíneas do balé clássico” (PORPINO, 2002, p.

2).

Para além dessa concepção objetivista clássica, já desafiada pelo duplo caráter

da arte retomado por Porpino (2003), temos a concepção genuinamente subjetivista.

Nesta perspectiva, o olhar é voltado para o sujeito, exclusivamente para o seu gosto

próprio. Porém, alicerçamos nossos pensamentos acreditando que beleza não está

situada no objeto, nem no sujeito, mas é gerada a partir da reciprocidade entre os

dois, pela mobilização dos sentidos, através do conhecimento de outros códigos e,

principalmente, no caráter de inacabamento da leitura estética (PORPINO, 2006).

De acordo com Dufrenne (2004), o belo não pode ser considerado somente

como uma idéia ou um modelo, é a singularidade de certos objetos que nos são

dados à percepção, traduz-se em plenitude, mesmo que para perceber o objeto

estético se necessite de longa aprendizagem e familiaridade. Qualquer idéia de

retoque é desencorajada, pois a perfeição do sensível é uma necessidade.

O objeto belo me fala e ele só é belo se for verdadeiro. Mas o que me


diz? Ele não se dirige à inteligência, como objeto conceitual –
algoritmo lógico ou raciocínio -, nem à vontade prática como objeto
de uso – sinal ou ferramenta -, nem à afetividade como objeto
prático ou amável: primeiramente ele solicita a sensibilidade para
arrebatá-la. E o sentido que ele propõe também não pode ser
justificado nem por uma verificação lógica nem por uma verificação
prática; é suficiente que ele seja experimentado, como presente e
urgente, pelo sentimento. Esse sentido é a sugestão de um mundo.
Um mundo que não pode ser definido nem em termos de coisa,
90

nem em termos de promessa de alma, mas promessa de ambos; e


que só pode ser nomeado pelo mundo de seu autor: o mundo de
Maczart ou de Cézanne (DUFRENNE, 2004, p. 45 – 46).

Dufrenne (2004) pauta sua compreensão do belo, a partir da estética

fenomenológica, considerada, na introdução da edição brasileira de sua obra, como

uma das correntes de maior consistência no âmbito da Estética. A partir dessa

fundamentação nos congregamos aos pensamentos de Porpino (2002; 2003; 2004;

2006) e Nóbrega (2003), autoras em quem nos fundamentamos para pensar a

experiência estética na Educação Física.

Algumas práticas corporais, a exemplo da Ginástica Rítmica, cravaram suas

concepções de beleza em modelos pré-concebidos. A leitura do Código de

Pontuação nos traz essa compreensão. Porém, refletimos que a beleza pode ser

pensada também como experiência do ser no mundo, pois, a partir desta o indivíduo

é capaz de transfigurar o Código, (re) significá-lo, fazendo fluir conhecimentos e

repensar arquétipos, sobretudo no âmbito da Educação.

Compactuamos com Porpino (2004) quando se refere ao enquadramento da

GR a técnicas e padrões como aspecto que contribui para o ajuste da Ginástica

Rítmica ao protótipo de estética objetivista já mencionado, que veio e continua sendo

edificado. Isso se comprovou nos resultados da nossa análise, quando vimos que o

texto do Código de Pontuação delimita claramente a GR enquanto prática que

possui uma sistematização própria que permite um julgamento quantificável e

qualificável. Pensamos que a GR tomada desta forma, além de canalizar por demais

nosso modo de percebê-la, faz com que tenhamos um deslumbre de prática

fantástica, inatingível, predestinada a seres privilegiados com dotes corporais

especiais, e com o acesso restrito a um tipo privativo e “alucinado” de treinamento.

O que por sua vez, não se traduz como uma visão distorcida, considerando os

exemplos mais recentes, os de índice olímpico da GR. Distorção seria crer na

imobilidade desses padrões quando a tomamos para outros contextos, quando não
91

admitimos suas reconfigurações, adequações que não descaracterizem suas

particularidades estéticas, ou mesmo apropriação de alguns de seus elementos.

Pensamos que a GR é pautada por concepções estéticas constituídas por

mecanismos de poder-saber preponderantes em toda sua historicidade, que

definiram e, principalmente, transformaram seus devaneios artísticos em podas. Ao

mesmo tempo em que foi possível criar, as originalidades mais emblemáticas se

transmutaram em restrições. Um movimento idealizado por uma ginasta, por

exemplo, deixa de ser criação e passa a ter normatizações próprias para que possa se

adequar a essa modalidade ginástica.

Cada vez que se atingem índices extraordinários, estes são tomados como

parâmetro para o alto rendimento, e posteriormente, para o âmbito da escola ou de

qualquer outro. O fenômeno ocorre da seguinte forma: se uma ginasta realiza as

mais formidáveis proezas em uma olimpíada, dali a quatro anos todas as outras

também o farão, e assim, as tendências temporárias ou permanentes de movimentos,

figurinos, acompanhamentos musicais, vão preponderando até rechear os mais

diferentes níveis e contextos de prática da Ginástica Rítmica.

Entretanto, de acordo com Campelo (1996), o ser humano possui uma

comunicação gestual própria, que esculpe sua identidade através dos textos dos seus

movimentos. Esse esculpir é aquilo que já denominamos de estilo e que a autora

ressalta como “todo quadro de referência corporal que compõe determinada pessoa”

(CAMPELO, 1996, p. 78). A ginasta, quando se apresenta, comunica aos

espectadores, aos árbitros e às outras ginastas através de seu corpo, movimentos,

adereços e música, uma mensagem estética única imbuída de relações de poder,

configurações próprias das especificidades da ginástica, dos usos do tempo e do

espaço, e dos gestos técnicos. A ginasta transcende o Código, que em hipótese

nenhuma é capaz de regulamentar seu estilo pessoal.

Embora a GR, como visto no decorrer das análises, exiba seus contornos

estéticos com propriedade, suas concepções precisam ser ponderadas em outros


92

contextos, levando em conta que ao nos referirmos a esta modalidade pensamos no

seu patamar mais expressivo: o esporte de alto rendimento. É preciso lembrar que

essa maneira de pensar a estética, a concepção de beleza pré-concebida, é particular

à GR, constitui-se como a possibilidade mais forte de idealizá-la, mas que não é a

exclusiva. Pensar a beleza em sua perspectiva objetivista no âmbito da Educação

pode significar uma atitude não inclusiva que define e valoriza padrões de gosto e

de gesto em detrimento de outros (PORPINO, 2003).

Portanto, pensarmos a GR no contexto educacional implica redimensionar as

concepções estéticas retratadas pelos modelos olímpicos e considerar que mesmo a

mais prodigiosa ginasta é capaz de vivenciar a experiência da beleza como uma

vivência sensível em que todo o indivíduo encontra-se engajado com sua história,

seu contexto social e suas predileções pessoais (PORPINO, 2003).

Cabe, para tanto, discutirmos as configurações da beleza universalizada pela

vertente olímpica da GR para pensá-la como experiência do vivido, uma vez que, ao

apreciarmos uma ginasta olímpica somos tomados pelo seu deslumbramento

porque essa experiência, para nós, transcende a ditadura do modelo da ginasta

perfeita para se ancorar no nosso mundo sensível. Retomamos aqui uma concepção

fenomenológica do belo, já explicitada anteriormente.

O belo, não sendo idéia ou modelo, precisa ser experimentado,


vivido, solicitando assim, a sensibilidade, como convite à
contemplação. Na descrição fenomenológica, o belo não é uma forma
idealizada ou uma redução ao gosto exclusivo do sujeito, mas uma
articulação que acontece na percepção como interpretação dos
sentidos proporcionados pelos jogos expressivos do corpo. Realiza-se,
pelo logos estético, a leitura da dimensão poética e plástica do gesto
(NÓBREGA, 2003, p. 139-140).

Consideramos, antes de tudo, que os conteúdos da cultura de movimento

devem passar por transformações, críticas e reflexões antes e durante sua

permanência no contexto educacional “O estético é útil enquanto, na relação sujeito-


93

objeto, corresponde, satisfaz necessidades profundamente humanas” (VÁSQUEZ,

1999, p.165).

As exacerbações retratadas na técnica e na padronização dos gestos ainda não

foram capazes de extrair o brilho do olhar de quem experiencia, ou até mesmo

aprecia a GR na contemporaneidade, pois a beleza, reproduzida, arquitetada ou não,

construiu-se como fundamento dessa manifestação, e, porque a experiência estética,

experiência que se dá exclusivamente no corpo, ocorre “a partir de uma relação de

imanência entre sujeito e objeto” (PORPINO, 2003 p. 145). Dessa forma, o olhar do

sujeito é fruto de sua existência, que, tatuada de significações de sua historicidade,

cultura e vivências sensíveis, estabelece suas próprias relações estéticas.

Ao identificarmos na GR um cunho estético pautado no objetivismo do ideal

clássico de beleza, mesmo acreditando que a experiência estética, a experiência da

beleza ocorra de forma muito mais ampla, e, considerando concomitantemente sua

inserção em nosso país, onde a cultura do povo é extremamente polissêmica, mesmo

não compartilhando sempre com a semelhança com os caracteres fundamentalmente

definidos que acompanharam o desenvolvimento da ginástica, pensaremos em

inumeráveis possibilidades de problematizar e questionar os padrões estéticos da

Ginástica Rítmica no contexto educacional, além de enriquecê-la com elementos da

nossa cultura. Desta forma, é possível intuir que a GR pode contribuir para

viabilizar uma educação que alargue compreensões estéticas, olhares e vivências

nessa manifestação.

Também foi possível perceber, através de nossas análises, que as concepções

estéticas construídas a partir da historicidade de uma prática corporal consideram as

incidências culturais. Para tanto, nos utilizamos do conceito, anteriormente

referendado, de técnicas corporais de Mauss (2003, p.401) visando reafirmar essa

idéia: “maneiras pelas quais os homens, de sociedade a sociedade, de uma forma

tradicional, sabem servir-se de seu corpo”. Sendo as técnicas reluzidas pelas

culturas, como definir padrões iguais para sociedades diferentes? Não estamos aqui
94

para discutir a universalização do fenômeno esportivo, mas para problematizar a

criação desses padrões, para pensar nessa racionalização do sensível. Pois, sendo a

GR um esporte-performance dominado pelas européias, é recriado e reinventado

pelo resto do mundo com identidades variadas para que essa universalização

ocorra, porque é preciso transcender e transformar o repertório gestual de cada

cultura para adequar-se à GR estereotipada e emancipada.

Acreditamos que refletir sobre a beleza da GR possa contribuir para

aprofundar nossos pensamentos, ansiar significações e repensar e/ou retomar

objetivos na Educação Física. O pensamento de questionar as concepções estéticas de

uma manifestação que, de forma generalizada, possui delimitações firmemente

torneadas, mas pouco protestadas, é, a priori, um desafio. Porém, esse diálogo crítico

torna-se urgente aos questionamentos e reflexões sobre as transposições de

experiências do esporte de alto rendimento para o contexto educacional.

Nós compreendemos o Código de Pontuação de Ginástica Rítmica como a

materialização das relações de poder que adequam os corpos, mas que foram

produzidos por estes. E mais, responsabilizamos essa produção pela busca

incessante do belo embasado pelas performances desses corpos. Nessa perspectiva, é

possível perceber também que essa beleza é conquistada cada vez mais a partir da

técnica criada através dos tempos que é pormenorizada pela capacidade das

próprias ginastas.

Mais uma vez citamos Foucault (2003, p. 25), quando este parece nos dizer da

necessidade de se experimentar o novo, as novas experiências estéticas para além

das previsões da metrificação da beleza.

Devemos nos liberar desse conservantismo cultural, tal como


devemos nos liberar do conservantismo político. Devemos
desmascarar nossos rituais e fazê-los aparecer como são: coisas
puramente arbitrárias, ligadas ao nosso modo de vida burguês. É
bom – e isso é o verdadeiro teatro – transcendê-los através do modo
do jogo, através de um modo lúdico e irônico; é bom ser sujo e
barbudo, ter cabelos compridos, parecer uma moça quando se é um
95

rapaz (e vice-versa). É preciso pôr “em cena”, exibir, transformar e


derrubar os sistemas que nos ordenam pacificamente.

Mas, como lançar um olhar crítico ao padrão a partir do próprio padrão? Para

desmistificar padrões é preciso desencarná-los. Foucault (1987) afirma que quanto

menos perceptível for a incidência do poder mais encarnado ele estará. Educar o

olhar é enxergar onde não se explicitam evidências, para que não tomemos uma

escolha desconhecendo as demais possibilidades. Talvez apenas conhecer não basta,

é preciso apaixonar-se, desapaixonar-se, aprofundar-se nos sentidos, corporificar de

uma vez por todas a aprendizagem, pois vivenciar é a chave.

O exemplo das produções de performances em larga escala criadas no esporte

de rendimento é que fazem com que as práticas institucionalizadas sejam recriadas a

partir dos padrões, a exemplo da GR, e são uma expressão do contra-poder

apresentado por Foucault (1979). A Educação Física precisa se referenciar nesse

aspecto e não tomar as práticas de alta performance como modelo único, sem

reconstituí-las, deve sim, criar sentidos próprios adequados a cada contexto. No

entanto, não estamos expressando que essa “cópia” do esporte de rendimento no

âmbito educacional ocorre em total igualdade, pois, naturalmente, nos parece

improvável reproduzir tais e quais todas as intervenções corporais do rendimento

na escola. É certo que já existe uma adequação, porém, esta não tem sido eficiente na

GR brasileira, basta observar o grande número de equipes escolares inscritas em

campeonatos brasileiros, eventos que guardam os maiores desempenhos ginásticos

do nosso país.

Cabe ressaltar que as vivências dos movimentos específicos da GR podem

significar alternativas de reluzir sua transcendência, tanto nas especificidades,

quanto nos gestos.

As formas de movimentos específicos da GR constituem duas terminações: os

Grupos Fundamentais que são os saltos, equilíbrios, pivots, flexibilidades e ondas, e os


96

outros grupos que servem de ligação para esses movimentos: os deslocamentos,

corridas, caminhadas, saltitos, passos rítmicos e giros (FIG, 2007).

Apesar de alguns desses movimentos9 coincidirem as habilidades motoras

básicas, na GR eles predizem formas próprias que supõem maneiras codificadas de

se executarem, ou seja, não se corre na prática da GR como se corre na rua para

alcançar um veículo em movimento, nem se salta na GR como se pula qualquer

objeto, ambos são praticados a partir de uma postura e de um controle minucioso de

todo o corpo, como visto em nossas análises. Destacamos aqui, a compreensão das

dinâmicas e movimentos que sustentam as ações motoras, pois antes de caminhar ou

equilibrar de tal forma é preciso entender o que fundamenta esses gestos.

Dessa forma, acreditamos que a compreensão do movimento pela descoberta

deve preceder a aprendizagem da forma, através de pequenos desafios, pois a

exigência da forma a qualquer custo implica em adestramento, ocasionando uma

aprendizagem limitada.

Importante destacar que, assim como na dança, campo pesquisado por

Porpino (2006), a apreensão da GR implica na aquisição de técnicas, de formas de

movimentos, através de repetições e do treinamento, para que os movimentos

possam se mostrar como expressão do estético, que não descaracterizem a ginástica,

nem neguem o Código.

Porpino (2006) também afirma que a dicotomia entre forma e sentimento é

inexistente, pois mesmo que uma dança seja extremamente codificada, numa

situação de um Ballet de repertório, por exemplo, a interpretação e a forma da

bailarina é que expressarão o sentido coreográfico adequado. “A dança é um ir e vir

Pudemos vivenciar os Grupos Fundamentais e os outros grupos sob esse aspecto na


9

disciplina de GR da licenciatura em Educação Física, no primeiro semestre de 2004 e na


docência assistida em 2006. Nas duas oportunidades experenciamos os movimentos a partir
de situações cotidianas, da variabilidade, segundo os espaços, os ritmos etc. para depois
experimentarmos movimentos específicos da GR.
97

de formas impregnadas de sentidos e sentidos impregnados de formas que são

recriados a cada momento de sua realização” (PORPINO, 2006, p. 106).

Dessa maneira somos capazes de enxergar beleza e reconhecer outras

manifestações e outras linguagens que extrapolam as decodificações da GR, a

exemplo do maracatu, forró e frevo numa série de GR, como na série de maças

apresentada pela Seleção Brasileira de conjuntos nos Jogos Olímpicos de Sydney em

2000.

Imagem 35 - Maracatu, frevo e forró.

Frisamos que, na imagem anterior, além de compreender elementos de

manifestações culturais populares pelas quais as ginastas coligam bem os sentidos

requeridos à série ginástica, esta é bem delimitada no que concerne às formas

exigidas pelo Código.

Contudo, exprimimos que a busca das formas de movimento em si não

anulam a condição educacional da GR, porém, a negação destas a descaracterizam.

Portanto, torna-se necessário dosar as vertentes forma e expressão

concomitantemente, aprovisionando à prática pedagógica liberdade de expressão


98

aos educandos e uso de outras linguagens de movimento que possam dialogar com

a GR, permitindo que a aprendizagem seja mais envolvente e prazerosa.

Já a transcendência do olhar sob modelos pré-concebidos na Educação Física

pode ser alcançado através da apreciação de práticas corporais, nesse caso, da

Ginástica Rítmica.

O olhar em si, imbuído de concepções já nos diz muito. No entanto, devemos

compreender que não há alunos tipo “páginas vazias”. Muitas vezes os vídeos de

alto rendimento da GR causam diversas sensações que atravessam a estranheza, a

experiência da beleza, o incômodo ou até mesmo o desinteresse. As intervenções

podem partir das sensações e do debate destas, do questionamento das

compreensões que estaremos assumindo.

Nesse sentido, a observação direcionada ao contexto espacial, gestos, cores,

sons e formas nos fazem conhecer um pouco mais sobre as linguagens pelas quais a

GR opera. Por outro lado, a decodificação dos movimentos tanto pode abrir margem

para a mais sutil leitura dos gestos quanto para a análise do julgamento da

modalidade.

De qualquer forma, a apreciação com enfoque na aprendizagem necessita de

suportes diretivos. Precisamos de um vislumbre que busque extrair algo mais do

espetáculo, um olhar de criticidade que pode variar e se aproximar segundo um

contexto determinado, pois, a maneira com que uma turma de Educação Física

escolar, ou uma equipe de GR, ou escolinha de GR, ou até mesmo uma turma da

graduação em Educação Física da universidade enxergam o mesmo vídeo será

muito divergente, e essa diversidade se ramificará ainda mais entre cada uma das

pessoas.

Uma Educação que reafirme a experiência estética na realidade da Educação

Física escolar é de tamanha significância, que deve pretender afrouxar uma

Educação que desconsidera o corpo, pois quando esta reafirmação é negada, ao

mesmo tempo em que busca consolidar os cuidados com um corpo físico, biológico,
99

natural, higiênico e disciplinado, abandona-o nas práticas ditas como

exclusivamente cognitivas. A tarefa é árdua e o desafio gigante, porém, a partir do

momento em que as práticas corporais puderem ser tomadas pelas suas nuances

mais ricas, como a vivência crítica dos seus mais diversificados conteúdos, as

relações estéticas se efetivarão de forma mais ampla e as amarras dissipar-se-ão.

Nóbrega (2000) nos aponta a ação motora do ser humano como linguagem

que se apreende invariavelmente por ordem perceptiva cuja matriz é corporal,

independente da predominância sensível ou lógica. Ela justifica que “essa percepção

revela-se na contemplação estética, onde o todo é apreendido de forma una, não

havendo cisão na apreensão da linguagem racional ou sensível” (NÓBREGA, 2000,

p. 76). A abordagem do sentido estético dessa autora nos reporta a algo mais

aprofundado que a contemplação de um objeto estético, revelando o envolvimento

mais perceptivo, uma ação corporal que solicita os sentidos e que diz respeito à ação

motora.

Do mesmo modo, a solicitação dos sentidos permeia a criação e transgride as

imposições de tempos e espaços e as imposições gestuais do Código de Pontuação.

Róbeva (1981), em sua obra Escola de Campeãs, destina um capítulo para a

criação do novo na GR, pois, para garantir uma composição que fosse original e que

conseguisse chamar à atenção do público as ginastas deveriam realizar façanhas

singulares com seus corpos e aparelhos, sendo essas façanhas buscadas por elas

mesmas. Naquela época, década de 1980, isso ainda seria válido porque a

coreografia não era toda quantificada, e mesmo no rendimento esportivo havia a

possibilidade de as ginastas intervirem nas suas séries.

A composição de séries prevista pelo Código segue agora uma normatização

tão rígida que impossibilita às ginastas participarem da composição de seus

exercícios - a não ser que estas busquem um conhecimento aprofundado de

arbitragem - fazendo com que a tarefa das técnicas esteja muito além de nuances

“estratégicas” da beleza, ou seja, estas não podem escolher os movimentos


100

simplesmente porque são os mais belos executados pela ginasta, é necessário que

esses movimentos sejam validados e somem pontos, numa complicada operação

matemática.

Pensamos na validade deste processo no meio educacional, que consegue ser

ainda mais difícil. Por exemplo, eleger os melhores, mais belos e mais valiosos

movimentos de uma ginasta com possibilidades corporais múltiplas já se mostra

como uma tarefa árdua, imagine ter que arrancar movimentos que somem pontos

suficientes para uma série competitiva de meninas que vivenciam a GR

despretensiosamente no ambiente escolar?

No entanto, cair no espontaneísmo também seria um erro, seria como

fornecer brinquedos para crianças e pedi-las para fazer qualquer coisa. Acreditamos

que para garantir a apropriação de características estéticas da GR o processo de

composição de séries precisa de direcionamento.

Situações bastante significativas vivenciamos na docência assistida da

disciplina de GR, quando solicitamos aos alunos a criação de uma série de conjunto

e listamos os movimentos e critérios de julgamento para as coreografias, que

coincidiam com os conteúdos trabalhados nas aulas até então. Dessa forma,

estipulamos a duração do exercício, as variações espaciais de figuras, planos,

direções e trajetórias, os movimentos específicos dos grupos fundamentais e não-

fundamentais (saltos, equilíbrios, pivots, acrobáticos, caminhadas, saltitos, corridas,

passos rítmicos, movimentos em 8, circunduções e balanceios), a organização dos

movimentos (sincronizado, cânom, em espelho, em contraste, subgrupos e coral), a

relação e a colaboração entre eles durante o exercício e a utilização das variáveis

rítmicas (lento, rápido etc.). Esses parâmetros foram estipulados segundo as

possibilidades corporais heterogêneas da turma. O resultado foi surpreendente!

Além de todos os grupos terem contemplado as exigências apontadas por nós, eles

surpreenderam em outros aspectos como figurino, maquiagem, cabelos,

estabeleceram temas para suas composições, sugeridos pelas músicas, colocaram


101

passos de dança e ainda foram cuidadosos com o momento da apresentação

procurando manter posturas e expressões ginásticas.

Sendo assim, pensamos que para serem significativas para os alunos, as

vivências e composições da GR na Educação devem adequar-se às suas

possibilidades corporais, garantirem íntima identificação e compreenderem teores

de desafio. Entretanto, a possibilidade de efetivação desse processo é mais viável nas

composições não-competitivas10.

Esse tipo de evento em que a GR pode ser abordada através da participação

de todos e por meio do qual o público pode apreciar outras possibilidades de

movimento e de composição, nós destacamos como extremamente ricos para a

perspectiva da criação.

Portanto, concluímos com a pretensão de acreditarmos que é preciso

reconhecer a manifestação no alto nível sim, pois é lá onde se guarda a mais pura

caracterização estética da modalidade, e onde se definem os padrões de beleza, e

que problematizá-la é elaborar maneiras de ampliar o leque de possibilidades de

vivências estéticas na Educação Física, é reconhecer o corpo como território crítico

capaz de transcender as amarras de uma Educação que o desconsidera.

10
Os momentos mais significativos da minha trajetória como professora de Ginástica
Rítmica na escola, foram a criação de apresentações de grandes grupos, com a participação
de todas as meninas que praticavam GR. Partíamos de um tema, e a partir dele
desenvolvíamos uma estória. Mesclávamos os aparelhos oficiais a aparelhos construídos por
nós. Eram nesses momentos que a participação de todas se efetivava, cada ginasta tinha um
papel muito importante na coreografia, mesmo as menos agraciadas com flexibilidade,
graça, magreza, protótipos típicos da GR. Meninas com deficiência auditiva também
participaram das apresentações.
102

4CONSIDERAÇÕES
FINAIS
103

Mergulhar nas águas da Educação é labuta de eterno recomeço, eterno


recriar. São caminhos que nutrem o educador e que mesclam o cotidiano escolar aos

pontos de interrogação no enclausuramento solitário do pesquisador, porém, para

que os avanços aconteçam, essas vertentes devem caminhar juntas.

Nessa perspectiva entendemos que interrogar a beleza é mexer com a

sensibilidade, com a inerência humana de apreender as coisas do mundo através dos

sentidos e com a necessidade genuína de se emocionar, e, discutir acerca da beleza

da Ginástica Rítmica é provocar seus ditames, transcorrer uma infinidade de pontos

históricos, pedagógicos, estéticos e sociais no decorrer de sua prática através dos

tempos.

Constatamos, com esse estudo, que a beleza da Ginástica Rítmica

contemporânea é permeada pelas suas regulamentações, sendo desenhada por

mecanismos de poder-saber ao longo de sua trajetória histórica. Um poder que se

impõe e se inscreve nos corpos das ginastas, que por sua vez, também exercem

poder, pois instituem permanentemente novos saberes. Essa circularidade

caracteriza a produção de novos conhecimentos acerca dessa prática ginástica, e se

expressa com força nas suas regulamentações.

Vale ressaltar que a caracterização da beleza espetacular na GR é capaz de

provocar apreciações arrebatadoras no público que, admirado, passa a não aceitar

algo menor que o virtuoso, simétrico, harmônico, predicados comuns à Estética

Clássica, pautada em modelos pré-concebidos, como vimos, tão presente na GR.

A constante produção de conhecimentos no âmbito do alto rendimento

esportivo da GR tem afirmado uma prática voltada à sua espetacularização. Esse


104

fenômeno implica numa corrida incessante pela busca de padrões de movimento

demasiadamente precisos. São as vias do poder produzido pelos corpos das ginastas

e que incidem sobre eles mesmos. O Código de Pontuação produz a ginasta, e a

ginasta o constrói, pensamento em consonância com as idéias de Foucault (1979),

expressas por Roberto Machado na introdução da Microfísica do poder:

De fato o poder produz; ele produz real; produz domínios de


objetos e rituais de verdade. O poder possui uma eficácia produtiva,
uma riqueza estratégica, uma positividade. E é justamente esse
aspecto que explica o fato de que tem como alvo o corpo humano,
não para supliciá-lo, mutilá-lo, mas para aprimorá-lo, adestrá-lo
(MACHADO, 1979, p. XVI)

Todavia, o poder que incide e é representado pelos corpos das ginastas não se

observa integralmente no texto do Código, uma vez que a disciplina perpassa o

silêncio das linhas e das entrelinhas, dessa forma, as relações de poder estão

disseminadas em todas as instâncias da ginástica. Entretanto, apontamos o discurso

da GR demonstrado pelo Código como o que melhor retrata as redes de poder

materializadas nessa manifestação.

Consideramos, a partir da nossa Análise de Conteúdo do Código de

Pontuação, que as normas contidas no seu texto constituem a GR como uma

modalidade ginástica que se diferencia de todas as outras, apesar de se apropriar de

gestos e técnicas de outras práticas dando-lhes uma qualificação que a caracteriza

como prática bela. Constatamos também que as prescrições sobre o tempo e os

espaços afunilam uma técnica pautada nas minúcias e na utilidade, ou seja, tempo e

espaços regularmente medidos e quantificados pelos preceitos do dispositivo

disciplinar.

Ressaltamos ainda que as configurações dos gestos da GR ocorreram e

ocorrem através de uma hibridação de técnicas que especificam gestos pautados nas

performances, na extrapolação de limites corporais de flexibilidade, potência,


105

habilidade corporal e com aparelhos, e, que por esses aspectos a GR se constitui

como uma prática que se diferencia de todas as outras.

Por último, constatamos que as formas de controle, regulamentações,

descritos no texto do Código são extrapoladas de diversas maneiras pelas

praticantes, em estilos e instituição de novas técnicas, e que, por vezes, essas

transgressões implicam numa potencialização dos graus de dificuldade e na

exacerbação das técnicas existentes. Entretanto, as transcendências não ocorrem

somente na linha da acentuação do alto rendimento esportivo. As ginastas

conseguem estilizar seus movimentos e exercícios tornando o Código insipiente

quanto à capacidade de aferir a qualidade das apresentações de ginastas e conjuntos.

Sendo assim, o Código contém elementos que delimitam a beleza na GR,

elementos que se instituem a partir das realizações corporais das ginastas, no

sentido da espetacularização que dá visibilidade a essa manifestação, um saber

produzido pelas intervenções corporais, corpos que produzem saberes. Mesmo

assim, o Código jamais dará conta de mensurar a totalidade da beleza de uma

apresentação de Ginástica Rítmica, isso porque a beleza não é apenas qualidade que

se constitui pela modelação de um objeto, e sim provém da relação de reciprocidade

entre sujeito e objeto.

A Educação Física, enquanto área na qual a Estética Clássica impera, carece

de indagações dos modelos vigentes e das formas pelas quais a beleza é

compreendida. Essas reflexões evitariam certamente os fracassos da busca incessante

de padrões corporais inatingíveis para a maioria; evitariam provavelmente a

marginalização da cultura popular, exemplo de manifestação em que não se

prepondera os ideais clássicos de beleza, evitariam possivelmente os usos e abusos

dos corpos tidos como extensão dos laboratórios de performance humana,

principalmente corpos distantes das práticas esportivas institucionalizadas, corpos

adolescentes em prol de modelos improfícuos.


106

Mesmo o Código ditando condições para a beleza na GR, esta se dá na

possibilidade da criação do estilo próprio, na possibilidade de viver o improviso e o

imprevisto, na possibilidade de ser original, de sensibilizar o público – porque o

poder cria saberes e o corpo como extrapolador sempre criará novas formas de ser

belo. Isso implica dizer que, mesmo regrada, a ginasta pode criar, ser original e bela

à sua maneira, e mostra que a Educação Física, campo de intervenção pedagógica,

pode conviver com essas regulamentações, pois o corpo nunca é somente submisso.

A beleza do alto rendimento encanta e suscita a produção de novos encantos.

Entretanto, para a Educação Física não é possível transplantar os modelos, mas

aprender com o corpo que recria, subverte, faz diferente, é original apesar da regra.

Portanto, é preciso lidar com o determinado e com ele produzir outros saberes.

Transcender é uma necessidade da Educação. O incidir do poder sobre o

corpo arranca frutos que transcendem essa incidência, dessa forma, saberes são

produzidos. Por isso, acreditamos que as contribuições da ginástica, Ginástica

Rítmica no nosso caso, para a Educação Física, ocorram a partir dessa linha de

pensamento. Na ginástica aprendemos pela ultrapassagem de limites, pela aceitação

de desafios, somos convocados a suplantar sempre aquilo que já fomos capazes de

produzir. A perfeição é uma qualidade requerida, mas não é condição para a prática

da GR. É presumível que, com a ampliação do olhar sobre essa modalidade,

proposta por este trabalho, qualquer um, numa intervenção pedagógica, possa

apreendê-la a partir de suas próprias possibilidades, a partir dos seus alcances.

Dada a impossibilidade de uma pesquisa incluir a totalidade de um objeto,

lembramos que há uma infinidade de aspectos que, propulsionados por este

trabalho, poderão ser analisados ou revisitados em outros momentos: aspectos da

intervenção pedagógica da GR, da Educação Estética na GR e na Educação Física, da

reformulação de regras que considerassem as oficiais, mas fossem mais adequadas

ao contexto educacional, aspectos de uma GR que pudesse abordar suas inerências

mais expressivas, mais ricas no âmbito da escola.


107

Importante afirmar que a beleza na GR não se esgota nas possibilidades

abordadas, pois as relações de poder-saber que a garantem ocorrem numa

complexidade indizível numa só dissertação. Com isso, ressalvamos o nosso intuito

de exemplificar o fenômeno da beleza, não de abarcar sua totalidade, pois isto seria

impossível, dado que beleza é movimento, é construção e reconstrução.

Finalmente, cabe ressaltar que as esperanças de uma educadora do ensino

público não se exaurem nas perspectivas desse trabalho, recomeçam e se expandem

para a atuação na Academia, na formação de professores também sonhadores. Que a

problematização da GR possa alavancar este ideal. Que por este viés estes

professores sonhadores possam, um dia, se dedicar com afinco à formação de seus

alunos e transformar a Educação Física numa área mais acreditada.


108

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114

GLOSSÁRIO

Aparelhos portáteis – Objetos oficiais específicos da Ginástica Rítmica: bola, corda,

arco, maças e fita.

Artístico – Critério de julgamento que avalia o valor artístico da composição:

acompanhamento musical e coreografia (escolha dos elementos corporais e com

aparelhos, manejo com aparelhos, utilização do corpo, maestria e originalidades)

(FIG, 2007).

Banca de arbitragem – Júri responsável pela avaliação das séries de exercícios,

subdividido em três grupos: execução, artístico e dificuldade, sendo assistidos por

um juiz coordenador que controla o funcionamento da área de competição e o

julgamento dos três grupos de juízes (FIG, 2007).

Características Artísticas Particulares (CAP’s) – São as bonificações que somam até

7,00 pontos no parâmetro Artístico, subdivididos em utilização dos aparelhos,

maestrias e originalidades, nos conjuntos também existem bonificações para

colaborações entre ginastas. Essas bonificações são descritas previamente ema fichas

de julgamento, cabendo aos árbitros validá-las ou não conforme o desempenho das

ginastas ou conjuntos (FIG, 2007).

Características de base – Critérios primordiais para que elementos corporais

específicos da Ginástica Rítmica sejam validados. Por exemplo, um equilíbrio só é

considerado dificuldade se for executado sobre meia-ponta ou joelho, for mantido

por um tempo prolongado, tiver uma forma definida, fixada e ampla e for

coordenado com dois movimentos do aparelho.

Composição – É a coreografia que a ginasta traz pronta para a competição,

compreendendo o julgamento das Dificuldades que a ginasta ou conjunto executam,

e do Artístico.
115

Dificuldade – Critério de julgamento que avalia o valor técnico da composição

(número e nível das dificuldades do grupo corporal obrigatório e dos outros

grupos). Os movimentos específicos da Ginástica Rítmica que contam pontos numa

série também são chamados dificuldades.

Discurso motor unitário – É a linha de movimentos representados pela ginasta no

momento da série. Cada movimento é dependente do seu antecessor e determina o

seu sucessor.

Elementos Acrobáticos – Elementos corporais em que há inversões do centro de

gravidade corporal (anterior, posterior ou lateral), sem tempo de suspensão, parada

na vertical ou perda de contato com o solo (FIG, 2007).

Elementos corporais – Qualquer movimento intencional e aparente do corpo que

componha parte de um exercício de Ginástica Rítmica.

Execução – Critério de julgamento que avalia as faltas técnicas (FIG, 2007).

Exercícios de conjunto – São as séries de Ginástica Rítmica apresentadas

oficialmente por cinco ginastas e que possuem regulamentação própria.

Exercícios individuais – Exercícios de solo apresentados segundo as regras oficiais

da Ginástica Rítmica.

Grupo Corporal Obrigatório – São grupos de movimentos que devem caracterizar

cada um dos aparelhos oficiais. Nas séries de corda devem aparecer mais saltos, nas

de bola, flexibilidades e ondas, nas de maças, equilíbrios, nas de fita, pivots, e nas de

arco devem aparecer todos esses grupos de forma equilibrada (FIG, 2007).

Grupos fundamentais – Saltos, equilíbrios, pivots, flexibilidades e ondas.

Grupos Técnicos dos aparelhos – São grupos de movimentos específicos de cada

aparelho. Por exemplo, nos exercícios com bola a ginasta deve executar quicadas,

lançamentos e recuperações, rolamentos pelo corpo e pelo solo, impulsos, inversões,

movimentos em oito, circunduções e balanceios (FIG, 2007).

Série ou exercício – Coreografia da ginasta ou conjunto, seqüência de movimentos

ginásticos com acompanhamento musical e aparelhos oficiais.


116

Trajetória imprecisa – Ocorre quando o aparelho é lançado de forma incorreta

impedindo a recuperação no local e tempo preciso.


117

ANEXOS

Fichas de conteúdo – Código de Pontuação 2005 – 2008 (versão 2007)

LEGENDA:
As especificidades da GR
Os usos do tempo e espaço
A configuração do gesto técnico

PARTE 1 -
GENERALIDA
DES
Subtítulos Unidades de registro temático Núcleos de sentido
Títulos

1. Concursos y 1.3 – Programa para “La duración de cada ejercicio es de 1’15’’ a A duração total da seqüência de
programa las gimnastas 1’30’’.” movimentos não deve ser
individuales. extrapolar nem não atingir a
margem de tempo regulamentar.

1.4 – Programa para “La duración de cada ejercicio es de 2’15’’ a Antes e após a duração
los conjuntos 2’30’’.” regulamentar, o corpo da ginasta
deve apresentar imobilização
completa para que se possa
enxergar a duração exata do
exercício.

1.5 – Cronometraje “El cronômetro es activado com la puesta Nesses segundos a ginasta ou
em moviemento de la gimnasta o la primera conjunto devem manifestar o
ginmnasta del conjunto y parado com la melhor de suas virtudes
inmovilización completa de la gimnasta o de corporais mais excepcionais.
la última gimnasta del conjunto”

2. Jurados 2.1 Composición de “Cada jurado, de individuales y conjunto 12 pessoas subdivididas em 3


los jurados – será compuesto de 3 grupos de jueces: grupos, 1 para cada parâmetro
Campeonatos y Ejecución (4 jueces) (...); Artístico (4 jueces) de julgamento, de 4 observam
competiciones (...) e Dificuldade (4 jueces)” atentamente o exercício da
oficiales ginasta ou conjunto. Além desses
“Cada jurado es asistido por uma juez (Juez grupos de juízes um juiz
Coordinador) que aplica las penalizaciones coordenador vai avaliar tudo o
relativas a salidas del praticable, duración que ocorre fora dos limites do
del ejercicio e todas las demás tablado.
penalizaciones que respectam a la disciplina 2 grupos de juízes avaliam a
(aparato, maillot, colocacíon em la pista composição do exercício,
etc.)” vislumbrando a forma com que a
coreografia da ginasta foi
construída, tanto de maneira
118

mais quantitativa, no caso da


Dificuldade, quanto de forma
mais qualitativa, no caso do
conjunto. O terceiro parâmetro, a
execução, avalia a qualidade com
que a ginasta demonstra a sua
composição. Embora o aspecto
qualitativo seja extremamente
preponderante nos 3 parâmetros.
Porém, não basta a ginasta
demonstrar-se virtuosa apenas
durante seu exercício na área
regulamentar, outros fatores, que
podem ocorrer inclusive em
outros momentos ou que
independam do seu domínio
também podem interferir no seu
julgamento, tais como suas
condutas ou de sua equipe.

2.2 Torneos “La presencia de uma juez neutra com la Nos Torneios internacionais,
internacionales función de jurado superior es obligatoria” deve existir um juiz superior que
não participa efetivamente do
júri para esclarecer possíveis
dúvidas de julgamento.
Isso reflete que mesmo o olhar
direcionado de 13 pessoas
atentas pode não dar conta de
um julgamento “justo”, sendo
necessária a presença de um
árbitro renomado e experiente.

2.4 Instrución de las “Antes de cada compeonato e competición O código supõe que o olhar de
jueces oficial FIG, será organizada uma reunión julgamento da arbitragem seja
por el Comitê Técnico com el fin de informar todo embasado pelo seu texto, o
a las jueces participantes sobre la que já afirmaria uma avaliação
organización del juicio. Antes de cada igual, não necessitando de outras
torneo, uma reuníon análoga será reuniões de discussão.
organizada por el comitê de organización”

3. Modalidades 3.2 Distribución e e “La nota viene dada por: 1. La nota de Embora a execução julgue
de pontuación calculo de las notas execución: nota media de las 2 notas através de 1 grupo de árbitros e a
centrales (...) – máximo 10 puntos; 2. Más la composição por 2 grupos, os
nota final de composición (A+D) dividida pesos são iguais. Isso ocorre pela
por 2” dificuldade que é apresentada
em se julgar parâmetros
dependentes da subjetividade
humana, tais como a criação e a
beleza coreográfica, a
interpretação da série pela
ginasta, e a identidade cultural
fornecida pelo gesto. Por isso que
8 árbitros se preocupam com
uma metade da nota, enquanto
apenas 4 com a outra metade.
119

4. Praticable 4.1 Salidas de “todo rebasamento del praticable com uno o O corpo e o aparelho não devem,
Praticable dos pies o com outra parte do cualquiera del sob nenhuma hipótese,
corpo que se apoye más allá de los limites ultrapassar os limites
reglamentarios será penalizado” regulamentares durante o
exercício. Sendo que essa
“todo aparato que toque el solo fuera do los ultrapassagem só é validada ao
limites reglamentarios o que salga fuera del tocar o solo.
praticable y vueva por si mesmo, será
penalizado” O corpo da ginasta é treinado,
desde a elaboração do seu
“Cada ejercicio debe ser realizado, em su exercício, para não exceder esses
totalidad, sobre el mismo praticable” limites.

5. Aparatos 5.1 Normas – “Todos los aparatos utilizados por um Os aparelhos não podem
control conjunto deben ser idênticos (peso, expressar diferenças entre si no
dimensión y forma); solo su cor puede ser conjunto, pois a diferença entre
diferente”. os aparelhos desarmoniza a
coreografia de conjunto.

5.3 Perdidas e “Toda caída involuntária del aparato será O aparelho não pode ser perdido
recuperaciones del penalizada” durante o desenrolar do
aparato exercício. Aparelho perdido
demonstra claramente o erro da
ginasta e desqualifica de beleza o
seu exercício.

5.4 Aparato roto o “Ninguna gimnasta o conjunto estará Caso o aparelho quebre a ginasta
aparato colgado em autorizado a continuar su ejercicio com um pode cessar seu exercício ou
las vigas del techo aparato roto. De lo contrario el valor es 0,00” utilizar um aparelho reserva que
estará, caso opte por isso, situado
nos limites do tablado.
O aparelho quebrado altera sua
forma e impede os movimentos
da série, tornando impossível o
julgamento de seus movimentos
específicos.

6. Atuendo de 6.1 Gimnastas “Maillot de gimnasta correcto y no Os figurinos devem ser,


las gimnastas individuales y de transparente” sobretudo, compostos por todo o
conjunto “El escote de delante e de la espalda del tronco, e aderentes.
maillot debe ser correcto” A vestimenta da ginasta de GR
“Los maillots de danza de tirantes finos non apresenta características próprias
están autorizados” dependentes do vislumbre dos
“La escotadura del maillot arriba de las exercícios pelos árbitros e
piernas no debe sobrepasar el pliegue de la também das possibilidades de
ingle” variação criativa das formas. É
“El maillot debe amoldarse bien al cuerpo possível adequar uma infinidade
para dar la possibilidad a las jueces de de modelos e cores ao gosto e as
evaluar la posición correcta de todas las características da coreografia.
partes diferentes del cuerpo”

7. Disciplina 7.1 Disciplinas de “Las gimnastas individuales y de conjunto A área de competição é


120

las gimnastas deben presentarse em el área de competición reservada para as ginastas em


solamente trás haber sido llamadas, o por competição, portanto estas não
médio del microfono, o por la Juez podem se atrasar nem se
Cordinador o al acenderse la luz verde” adiantar, nem permanecer antes
nem depois de competir em suas
proximidades.
“Las gimnastas del conjunto no están Os horários precisam ser
autorizadas a comunicarse verbalmente respeitados a todo o tempo pois
entre ellas durante la ejecución del ejercicio” na ginástica existe tempo e local
para tudo.

7.2 Disciplinas de “Durante la ejecución de um ejercicio, el A comunicação entre as ginastas


los entrenadores entrenador (...) de la gimnasta o del conjunto do conjunto é considerada uma
o el músico no está autorizado a falta de disciplina. O exercício de
comunicarse com la gimnasta o el conjunto o conjunto tem a característica
el músico de cualquiera de las maneras que principal de colaboração, e essa
fuera” característica deve ser expressa
através de toda a coreografia,
não pela fala.
A comunicação entre os outros
membros da equipe e as ginastas
é considerada uma falta de
disciplina.
A comunicação com os outros
membros da equipe durante o
exercício jamais poderá ser feita,
pois todas as possibilidades de
erro deverão ser estudadas
durante o treinamento.

PARTE 2-
EJERCICIOS
INDIVIDUAL
ES
Subtítulos Unidades de registro temático Núcleos de sentido
Títulos

1. Ejecución del Nota “Las faltas de ejecución se deben penalizar São considerados erros tudo
ejercicio cada vez y por cada elemento em falta, salvo aquilo que pressuponha o
em caso de penalizaciones globales.” imprevisto, que não se enquadre
nos padrões exatos, portanto,
devem ser penalizados a cada
vez para que a nota de execução
da ginasta que menos erre seja
mais alta. O olhar do árbitro que
observa esse parâmetro precisa
ser minucioso e calculista para
que julgar a mínima falha,
imperceptível aos olhos do
espectador comum, pois no alto
nível, o que diferencia a execução
de uma ginasta para outra é a
minúcia.
121

1 – Técnica com el Perdida del aparato A perda do aparelho durante


aparato. Penalizacione: 0,30 – “Perdida y uma série de Ginástica Rítmica é
recuperación inmediata o trás pequeno considerada uma falta grave em
desplazamiento (1 paso)”. qualquer caso porque é uma
Penalizacione: 0,50 – “Perdida y falha perceptível a qualquer
recuperación trás desplazamiento (más de 1 espectador. Sendo assim é
paso) o salida del praticable”. necessário diferenciar a execução
Penalizacione: 0,50 – “Perdida del aparato al de uma atleta que perde o
final del ejercicio”. aparelho de outra que não perde.

Técnica com el aparato Mesmo que a ginasta recupere


Penalizacione: 0,20 – “Trayectoria imprecisa seu aparelho, este deve ter um
y recuperación al vuelo com 1 paso”. tempo certo de ação de vôo que
Penalizacione: 0,30 – “Trayectoria imprecisa não permita que se dê sequer um
y recuperación al vuelo com 2-3 pasos” passo para a sua recuperação.
Por ser elemento menos
perceptível, as penalizações de
trajetória imprecisa são menores
que as de perda.

2 – Técnica corporal Generalidades É possível, em uma só ação


Penalizacione: 0,10 – “Movimiento motora da ginasta, penaliza-la
incompleto” por todas essas faltas. É preciso
Técnica de base que a ginasta esteja “consciente”
Penalizacione: 0,10 – “Postura incorreta de da posição de cada segmento
um segmento durante un movimiento”. corporal na hora do exercício,
Penalizacione: 0,10 – “Forma no definida e além disso, o árbitro, com seu
fijada durante las dificultades”. olhar clínico, pesa, a cada
Penalizacione: 0,10 – “Falta de amplitude em segundo a forma adequada do
la forma”. corpo para cada ação.

Penalizacione: 0,20 – “Pérdida de equilíbrio: As perdas de equilíbrio são faltas


movimiento suplementario sin que, dependendo da gravidade,
desplazamiento”. sofrem penalizações ascendentes,
Penalizacione: 0,30 – “Pérdida de equilíbrio: desde as menos perceptíveis sem
movimiento suplementario 121ãs deslocamento do corpo, expressa
desplazamiento”. por uma mínima imprecisão do
Penalizacione: 0,40 – “Pérdida de eixo corporal, até o desequilíbrio
equilíbriocon apoyo de uma o dos manos o total finalizado pela queda. Essas
apoyo sobre el aparato”. faltas podem ser minimizadas
Penalizacione: 0,50 – “Pérdida total del através de um extremo controle
equilíbrio com caída”. dos movimentos, de todos os
músculos, de todo corpo, que se
envolve na ação.
Saltos
Penalizacione: 0,20 – “Pequena falta de Para esses elementos específicos
elevación”. (saltos, giros e elementos
Penalizacione: 0,20 – “Llegada pesada al acrobáticos) não bastam as
suelo”. penalizações previstas para os
Giros elementos corporais em geral
Penalizacione: 0,20 – “Apoyo del talón pela técnica de base, pois as
durante la rotación”. ações de saltar, girar e girar
Penalizacione: 0,30 – “Eje del cuerpo no através do eixo vertical
vertical y terminar trás um paso”. (elementos acrobáticos), são de
Elementos acrobáticos natureza mais dinâmica e as
Penalizacione: 0,20 – “Imprecisión en el recuperações do equilíbrio
122

plano o direción”. durante e após esses movimentos


Penalizacione: 0,20 – “Técnica de ejecución são mais passíveis de erro.
incorrecta”.
Penalizacione: 0,20 – “Llegada pesada al
suelo”.

3 – Musica e Penalizacione: 0,10 – “Pérdida del ritmo A perda de ritmo neste caso é
movimiento durante la ejecución”. ocasionada por erros que
Penalizacione: 0,30 – “Falta de concordância interfiram no encadeamento da
entre música-movimiento al final del coreografia, por exemplo, a
ejercicio ”. ginasta que perde um aparelho e
sai correndo atrás dele, perde
várias vezes o ritmo da
coreografia.

Essa penalização de discordância


entre música e movimento no
fim do exercício demonstra mais
uma vez o controle do tempo da
coreografia determinado pelo
tempo de música, qualquer
imprevisto interfere nesse tempo
de série e leva ao erro.

2. Artístico 1 – Música “Todos los ejercicios deben ser ejecutados Uma coreografia de GR tem
em su totalidad com acompañamiento todos os movimentos
musical. Se permitem paradas voluntárias acompanhados pela música.
muy breves, motivadas por la composicion”.

“Es obrigatória uma harmonia muy estricta Essa dependência com a música
entre el carácter y el ritmo de la musica e los é o que caracteriza a GR, e a
del ejercicio y de sus movimientos” diferencia das outras
modalidades ginásticas. É bela a
ginasta e série que consegue
harmonizar perfeitamente
música e movimentos. Os
movimentos de um exercício de
GR estão presos aos ditames da
rítmica, a ginasta só pode se
expressar a partir de sua música.

2 – Coreografia Composición de base O discurso motor unitário


“La coreografia está caracterizada por uma denuncia o encadeamento de
‘idea-guia’ realizada por um discurso motor movimentos de uma série de GR,
unitário de principio a fin, com la utilización cada movimento é dependente
de todos los movimientos posibles del do seu antecessor e sucessor, a
cuerpo y del aparato” idéia guia é a história que a
ginasta conta, sem interrupções.

Elección de los elementos aparato As técnicas de utilização com


“Deben ser elegidos, equilibradamente, cada aparelho são pré-
entre todos los grupos de elementos técnicos determinadas, chamadas de
de cada aparato...” grupos técnicos. A ginasta deve
saber domina-las para que a
coreografia possa conter uma
123

“El aparato debe estar siempre em gama ampla de movimentações


movimiento durante el ejercicio: que ao mesmo tempo sejam
movimientos técnicos com uma gran criativas e tecnicamente corretas.
variedade de formas, de amplitudes, de
direcciones, de planos, de velocidades. Si la
gimnasta utiliza varias veces el aparato
simplesmente apoyado em el suelo o sobre
uma parte del cuerpo excepto em los casos
tolerados por el código (2 ó 3 veces según la
duración de la parada del aparato), el
manejo del aparato se considera
insuficiente”.

“Los aparatos no serán utilizados como O código “abre” a perspectiva da


decoración sino que, al contrario, deberán criação de elementos não
estar integrados a los movimientos del técnicos com os aparelhos,
cuerpo: la relación entre la gimnasta y el porém essa situação deve ser
aparato debe ser constante. Sin enbargo, passageira, pois cada aparelho
también es possible efectuar elementos deve ser caracterizado segundo
originales, estéticos e coreográficos sua natureza técnica.
diferentes hasta 2 veces como máximo para
cada composición, com la condición que
estos elementos tengan uma duración muy
breve y que no conlleven uma interrupción
em la continuidad de los movimientos de lo
aparato”.

“El aparato no podrá estar sujeto por más de Em todo momento da série a
um movimiento sin que ejecute um ginasta deve manipular o
movimiento próprio o sin estar em aparelho, pois o sentido de uma
equilíbrio inestable nin dejarse posarse coreografia de GR só é dado pela
inmóvil sobre el suelo. (estatismo)”. íntima junção
música/ginasta/aparelho, é
preciso que o público e,
principalmente, os árbitros
possam enxergar um só.

Elección de los elementos corporales Para cada aparelho há um


“Ningún grupo corporal diferente del grupo elemento corporal específico da
obrigatório del aparato debe ser qual a coreografia deve
predominante em la composición (abuso de sucumbir, a criação da série é
um grupo corporal no obrigatório)”. refém de tal grupo obrigatório.

“La composición debe ter um carácter Significa que outras


gimnástico”. manifestações não podem
caracterizar um exercício de GR,
por exemplo, uma série jamais se
assemelhará aos movimentos de
um espetáculo de Ballet Clássico,
mesmo contendo elementos
iguais, porque a ginástica tem
sua delimitação própria.

“La posición del comienzo del ejercicio debe A ligação entre ginasta e
124

estar justificada e ser utilizada para los aparelho deve expressar-se


movimientos iniciales del aparato” desde a pose de início, evitando
ao máximo que o foco da série
esteja separado, o sentido da
coreografia deve ser sempre
ginasta/aparelho/música.

Equilíbrio entre el trabajo mano O controle do corpo numa série


izquierda/derecha de GR intercede inclusive na
“Cada ejercicio debe comportar um habilidade com ambas as mãos,
equilíbrio entre el trabajo de la mano aguçando ainda mais a técnica.
izquierda e de la mano derecha”.

Elementos acrobáticos As acrobacias não caracterizam


“Todos los grupos de elementos acrobáticos esta modalidade ginástica, sendo
autorizados, e los elementos que no se autorizadas apenas para
consideran como acrobáticos, pueden valorizar a série.
formar parte del ejercicio com la condición
de: que se ejecutem de forma pasajera, sin
parada em la posición y sin interrupción em
la continuidad del ejercicio, que se realicen
em la relación com um elemento técnico del
aparato”.

Variedad
“La variedad debe incluir también todos los Ao mesmo tempo em que o
aspectos seguientes: a. El dinamismo código exerce a “poda” de tudo
(velocidad e intensidad de los movimientos) aquilo que é excessivo,
. b. La utilización del espacio: direcciones, consequentemente erro, exige
trayectorias, niveles, modalidades”. que o exercício da ginasta
contenha variações de diversas
naturezas, convidando à criação.

Características Artísticas Particulares (CAPs) Da pontuação do parâmetro


“(...) 7,00 puntos, (...) Utilización de los Artístico, que pode atingir até 10
aparatos,(...) Maestria, (...) Originalidad”. pontos, 7 são destinados às
características artísticas
particulares, bonificações
específicas que devem ser
prescritas numa ficha através de
símbolos para que o árbitro
possa verificar e avaliar as CAPs
válidas. Há de se observar que
mesmo os árbitros de Artístico,
realizam seu julgamento da série
por padrões predominantemente
fechados. A subjetividade do
olhar deve perpassar somente a
validez do exercício e não a
beleza de tal, já que essa relação
de imanência entre sujeito e
objeto é impossível de ser
125

prescrita em um código de 100


páginas.

Critério de maestria A cada ginasta um julgamento


“(...) La gran altura debe tener más o menos diferente, do mesmo modo que
el doble de la estatura de la gimnasta um grande lançamento de 3
medida a partir de su cabeza”. metros acima da cabeça de uma
ginasta de 1,50m seria validado,
não seria (literalmente) validado
para outra de 1,60m. A medida é
exata, individualizada, mas
exata. Esse critério implica num
afiamento absurdo do olhar do
árbitro e na justa medida no
treinamento de uma ginasta.

Originalidad A abertura para o novo, para o


“Por cada nueva dificultad aislada (um solo original existe no atual código de
impulso inicial y movimientos originais pontuação, porém restritos e só
hasta el final, ejecutados al miesmo tiempo): pontuados quando se tratam de
0,30; Por cada nueva relación gimnasta- novos elementos que se
aparato: 0,10”. consideram dificuldades ou
novas relações com o aparelho.
Ou seja, elementos originais que
não se enquadrem nos quatro
grupos fundamentais (saltos,
equilíbrios, pivots e
flexibilidades/ondas) não são
originalidades contabilizáveis.

3. Aparatos Nota válida para “2. Todos los elementos que no se dan por el O código prescreve todos os
todos los aparatos CODIGO 2005 e 2007 no tienen ningún valor elementos possíveis com os
para el Artístico” aparelhos, novas possibilidades
ou devem ser utilizadas como
originalidade, ou devem
aparecer de forma restrita na
série. Dessa forma, as
possibilidades de criação são
sempre originadas por elementos
já existentes. O novo se dá pelas
possibilidades de extrapolar a
prescrição.
126

4. Dificuldad 1 – Generalidades ”Cada ejercicio individual puede tener 18 Uma série de GR deve conter até
dificultades como máximo para um valor de 18 movimentos que contam
10,00 puntos”. pontos, a escolha dessas
“Cada dificultad debe ser escrita sobre la dificuldades e a ordem com que
ficha en su casilla según el orden de elas aparecem na série são
sucesión”. fundamentais para a
performance da ginasta e para o
desenrolar do exercício. O código
determina uma longa lista e a
escolha desses elementos deve
ser adequada as possibilidades
corporais da ginasta, ou seja,
suficientes para que os erros não
aconteçam.

2 – Valor de las “El valor total de las dificultades corporales Cada aparelho guarda, além de
dificultades es dado por la suma del valor de las suas características específicas
dificultades pertenecientes al grupo um grupo corporal próprio.
corporal obrigatório (6 como mínimo) del Dessa forma cada série tem um
aparato utilizado, más eventualmente el formato próprio, e uma
valor de 2 dificultades, como máximo, por concepção diferente. A grande
cada grupo corporal no obrigatório, si los ginasta de GR precisa executar
hay”. bem todos os grupos corporais.
“Los grupos obligatorios de cada aparato
son: Cuerda: saltos, Aro: 4 grupos, Pelota:
flexibilidad y ondas, Mazas: Equilíbrios,
Cinta: giros”.

“El valor de la dificultad viene dado por el Não basta apreender as formas
elemento corporal. Sin embargo, todas las dos movimentos corporais, é
dificultades corporales realizadas sin preciso faze-los executando os
relación con el aparato no cuentan como movimentos dos grupos técnicos
dificultades”. dos aparelhos. O domínio do
corpo confunde-se com o
“Una dificultad es válida com la condición domínio de implementos.
de que sea ejecutada sin las faltas técnicas
seguientes: grave alteración de 126ãs O erro apariscente desvaloriza
características de base propias de cada muito mais que a execução do
grupo corporal; Pérdida del aparato durante exercício, a ginasta não só perde
la dificultad (...); Pérdida de equilíbrio por errar, mas perde por deixar
durante la dificultad, com apoyo de uma o de ganhar. Enquanto um árbitro
dos manos sobre el suelo o sobre el aparato, estará penalizando a ginasta por
o caída”. uma eventual queda, o outro
“Uma dificultad que no se realiza tal y como estará desconsiderando uma
se anuncia em la ficha, em lo que respecta al dificuldade.
elemento corporal, debe ser registrada e A ficha contém a descrição de
evaluada por la juez según el orden de todo o exercício ginástico, e deve
ejecución. Las dificultades que son ser respeitada sua ordem e forma
ejecutadas con un valor más bajo que o das dificuldades. Uma série de
anunciado em la ficha no cuentan; Las GR não permite improviso que
dificultades ejecutadas con un valor major não seja ocasionado pelo erro.
guardan el valor declarado em la ficha”. A série de GR é prevista, pois
todos os seus movimentos são
direcionados pelo código.
127

5 – Grupos de Grupos fundamentales (válidos para las Os Grupos fundamentais, de


elementos dificultades) forma geral, são aqueles que
corporales “saltos, equilíbrios, giros, contam pontos num exercício de
flexibilidade/ondas” GR, e por isso são os
movimentos mais codificados,
Otros grupos (válidos para os enlaces) mais exatos, mais padronizados.
“desplazamientos, saltitos, balanceos y Caso não se enquadrem em
circunducciones, vueltas, pasos rítmicos” qualquer característica de base,
serão desconsiderados. São
principalmente esses
6 – Saltos “Todas las dificultades de saltos deben tener movimentos que determinam o
las características de base siguientes: una desempenho da ginasta, por isso
buena altura (elevación) de salto; una forma que a maior parte do
definida y fijada durante el vuelo; uma treinamento esportivo em GR é
buena amplitud em la propia forma”. direcionado para o alcance
7 – Equilíbrios “Todas las dificultades de equilíbrio deben desses movimentos em
tener las características de base siguientes: consonância com os aparelhos.
ser ejecutado sobre media-punta o sobre
una rodilla; ser mantenida larga e
claramente; tener una forma bien definida y
fijada (sin movimientos de la pierna em
suspensión o del pie de apoyo, durante la
dificultad); tener uma forma amplia; ser
coordinado, trás haber tomado la posición
del equilíbrio, com dos movimientos del
aparato, como mínimo”.

8 – Giros “Todas los giros deben tener Las


características de base siguientes: ser
ejecutado sobre media-punta (talón bien
levantado); tener una forma bien definida
y fijada durante la rotación hasta el final;
tener uma forma amplia”.

9 – Flexibilidades y “Todas las dificultades de flexibilidad y


ondas ondas deben tener Las características de
base siguientes: ser ejecutadas em apoyo
sobre uno o dos pies o sobre outra parte del
cuerpo; tener una forma bien definida y
fijada (com parada visible em la posición);
tener uma forma amplia”.

PARTE 3 –
EJERCÍCIOS
DE
CONJUNTOS
Subtítulos Unidades de registro temático Núcleos de sentido
Títulos

GENERALIDA 1.2 Gimnastas de “Si um el transcurso del ejercicio uma Esse é o paradoxo do código de
DES reserva gimnasta abandona el conjunto por um pontuação. A situação é prevista,
motivo válido: la gimnasta puede ser mas ao mesmo tempo é
1. Gimnastas
128

reemplezada por uma gimnasta de reserva desencorajada para que não se


(...)” abra margem de se acontecer em
“La presencia de las gimnastas de reserva campeonatos oficiais, já que a
em la sala de competición durante la desistência de uma ginasta no
ejecución del ejercicio sin embargo no está decorrer do exercício abalaria a
autorizada” harmonia deste.

2. Entrada 2.1 Colocación “La colocación sobre el praticable debe Para que não ocorra
sobre el praticable hacerse: rapidamente e sin acompañamiento espetacularização do exercício
musical; Las 5 gimnastas em posesión cada antes do momento propriamente
um um aparato, o uma o varias gimnastas dito da série, já que o julgamento
sujetando los 5 aparatos”. ocorre estritamente durante os
dois minutos e meio da série de
conjunto, a entrada no tablado
competitivo não pode ser
coreografado.

3. Aparatos 3.1 Contactos com el Principio del ejercicio Aqui começa a alusão ao
aparatos “Al principio del ejercicio, cada gimnasta princípio de cooperação
puede tener um aparato y estar em contato priorizado nas séries de
com él, o bien uma o varias gimnastas conjunto. Ao contrário das séries
pueden tener los 5 aparatos que enviarán o individuais tolera-se que a
darán a sus compañeras” ginasta inicie e/ou possa ter
momentos em que fique sem
Durante el ejercicio aparelho, desde que sejam
“Salvo indicación particular, la composición momentos passageiros que
conllevará um solo aparato por gimnasta. realcem a colaboração entre as
Em el curso del ejercicio, se tolera que um o atletas. A beleza de uma série de
varias gimnastas estén em posesión de 2 conjunto é dada, sobretudo pela
aparatos o más, quedando sus compañeras maneira com que as ginastas
desprovidas de ellos, siempre y quando: esta elaboram o trabalho coletivo no
situación sea pasajera; que los aparatos sean momento da apresentação, além
realmente manejados por las gimnastas que do vistuosismo individual que
los posean y no simplemente sujeto” cada ginasta deve apresentar tal
qual nos exercícios individuais.
Al final del ejercicio
“Cada gimnasta debe obligatoriamente
sujetar o estar em contato com uno de los 5
aparatos; está permitido que um aparato sea
sujetado por várias gimnastas o que uma
gimnasta sujete o este em contato com vários
aparatos”

EJECUCIÓN
DEL
EJERCICIO

Sincronización y “Falta de sincronización um la velocidad o Além das falhas concernentes à


1. Faltas de armonia la amplitud o la intensidad de la expresión, técnica corporal, aparelho e
conjunto penalizacione: 0,20”. música que são idênticas aos
exercícios individuais que são
Formaciones e “Alteración de la formación, penalizacione: penalizadas a medida que
desplazamientos 0,10” aparecem na série, sendo as
129

“Imprecisión em la forma de los pequenas falhas a cada vez e as


desplazamientos, penalizacione: 0,10” grandes falhas por cada ginasta,
“Colisión entre las gimnastas (más 129ãs o conjunto tem essa característica
consecuencias) penalizacione: 0,30” de possuir falhas próprias. São
erros amplos que ocorrem a
Nota “La ausência de amplitud de um elemento partir da desarmonização do
corporal o la diferencia um la forma de um todo. Mesmo que o erro não seja
movimiento del aparato de um o varias uma falta técnica, como, por
gimnastas causa um alteración em la exemplo, a altura aceitável de
arminia general o em la sincronización. De uma perna em determinado
modo que, indepiendentemente de uma exercício, se uma ginasta mais
falta técnica o no, hay uma penalización” flexível eleva ainda mais essa
perna o exercício será penalizado
porque sofre de uma
desigualdade.

ARTÍSTICO 2.1 Composición de “La coreografia está caracterizada por um A história que deve ser contada
2. Coreografia base ‘idea-guia’ realizada por um discurso motor agora parte da união das 5
unitário de principio a fin, con la utilización ginastas e de todas as relações
de todos los movimientos posibles del possíveis entre elas e entre os
cuerpo y del aparato y todas las relaciones aparelhos. Essa perspectiva
posibles entre las gimnastas, las gimnastas e prediz uma nova perspectiva
los aparatos, entre los aparatos”. para o julgamento das séries de
conjunto e uma nova perspectiva
Relación e colaboración entre las gimnastas para a beleza da série, que agora
El caráter típico del ejercicio de conjunto es não está somente nas proezas
la participación de cada gimnasta em el que a ginasta é capaz de realizar
trabajo del conjunto de manera homogênea com o seu aparelho, mas também
y um espíritu de coletividad. La e principalmente na capacidade
composición debe ser concebida de um do conjunto realizar um
modo tal que la idea de colaboración de espetáculo dependente do papel
todas las gimnastas, um todas las partes del de cada uma que expressa um
ejercicio sean bien visible”. todo.

“Cada composición debe tener diferentes O caráter coletivo do conjunto


elementos de relación entre las gimnastas y implica na utilização de duas
trabajo de grupo además de la relación el denominações: as relações entre
intercâmbio de aparato, e diferentes tipos de ginastas e as colaborações entre
organización de trabajo colectivo” as ginastas. As relações das
formas com que os movimentos
“Los elementos que conlleven uma relación corporais e do aparelho são
entre la gimnasta deben elegirse respetando organizados: sincronismo, canon,
las características esenciales de la Gimnasia sub-grupos, coral etc. e as
Rítmica, a saber: el manejo de los aparatos; colaborações são as ações
la estética gimnástica”. dependentes de cada ginasta
para que possam ocorrer: passar
por cima de outra ginasta
saltando, passar por dentro dos
aparelhos de outras ginastas etc.
Do princípio ao fim do exercício,
a todo momento, as ginastas do
conjunto precisam caracterizar
relações e colaborações.

Critérios generales para juzgar elementos Porém, a margem criativa que se


proibidos abre com a perspectiva do
130

“Todas las aciones ejecutadas o las trabalho em grupo também é


posiciones mantenidas em apoyo sobre um direcionada, é necessário
o varias compañeras, sin contacto um el resguarda-la de elementos que
suelo por um tiempo prolongado”. fujam dos manejos característicos
dos aparelhos e das
características da GR, que
expressem manifestações
notoriamente divergentes (ex:
fazer a corda de cabo de guerra,
demonstrar um jogo de futebol
com as bolas etc).

“Sin enbargo están autorizados: a) Los Há sempre no código essa


elementos de colaboración donde uma o preocupação de delimitar os
varias gimnastas dan, directamente o por movimentos específicos da
médio de los aparatos, el impulso inicial al Ginástica Rítmica, mesmo que
movimiento de um o de varias compañeras signifiquem princípios de
(movimiento de rotaciones, saltos etc)”. trabalho coletivo, tais como
apregoados no conjunto.
Carregar uma ginasta, caminhar
em uma ou várias ginastas,
construir pirâmides, por
exemplo, são elementos que
caracterizam mais a Ginástica
Geral ou a dança que a GR.
Mesmo assim, autoriza-se
elementos em que as ginastas
dêem um impulso inicial e
passageiro a suas companheiras.

Formaciones As formações são as maneiras


“Cada ejercicio de conjunto debe comportar com que as ginastas se colocam
6 formaciones diferentes, mínimo”. na quadra e sua utilização
variada também compõem as
“La composición del ejercício de conjunto características dos exercícios de
debe utilizar toda la superfície del praticable conjunto.
com la variedade de las formaciones, com su
diferencia de amplitud (formaciones
cerradas e formaciones amplias), com su
emplazamiento sobre el praticable, um la
utilizacion de las diversas direcciones”.

Elección de los elementos aparatos A parada momentânea de


“Los aparatos no podrán utilizarse como ginastas ou de aparelhos no
decoración sino que al contrario, deben ser conjunto só é permitida caso
integrados a los movimientos del cuerpo: los explicitem o trabalho do grupo, e
elementos no técnicos y de decoración reduzida a 3 vezes. Aqui a
autorizados para las gimnastas individuales palavra estética é utilizada como
no están autorizados para el conjunto. Sin sinônima de beleza.
enbargo es possible efectuar elementos
originales, estéticos e coreográficos
diferentes, um la condición de que estos
elementos tengan uma duración breve, um
um eventual estatismo de las gimnastas o de
los aparatos com uma duración de no más
de 3 movimientos y que se coordinen um
131

um trabajo de grupo e de colaboración”.

Elección de los elementos corporales Como visto nos exercícios


“El grupo corporal obligatorio no es exigido individuais, cada aparelho
para el ejercicio de conjunto” possui um grupo corporal
obrigatório, no conjunto isso não
se aplica por possuir suas
delimitações, e permitir melhores
condições na composição das
séries.

2.2 Características “Utilización de los aparatos, colaboración As colaborações entre as ginastas


Artísticas entre las gimnastas, maestria, originalidad” são as bonificações que
Particulares valorizam o conjunto em relação
aos exercícios individuais.

2.4 Utilización de “Definición de la colaboración: Gimnastas, A definição de colaboração não


los aparatos em su totalidad o em parte, em contacto expressa a totalidade de ações
directo o por médio de los aparatos, se em que uma ginasta precise da
desplazan em direcciones, formaciones o outra para que determinada ação
diferentes tipos de desplazamientos”. ocorra.

Originalidad “Por cada nueva dificultad, com o sin As originalidades do conjunto


intercambio: 0,30” divergem das séries individuais
“Por cada nueva relación y colaboración pois priorizam o trabalho
gimnasta-aparato y entre lãs gimnastas: 0,10 coletivo.
ó 0,20/0,30)”
“Por cada nueva manera de se organizar um
intercambio: 0,10”

DIFICULTAD “Cada ejercicio de conjunto puede tener 18 Na dificuldade o trabalho


1. Generalida dificultades como máximo, para um valor coletivo também é valorizado,
de 10,00 puntos” por isso o enfoque da pontuação
des
“Este debe contener como mínimo 6 de exercícios sai especificamente
dificultades de intercambio” dos grupos corporais para as
“Los grupos corporales obligatorios para los trocas de aparelhos por
aparatos de las gimnastas individuales no lançamentos.
son obligatorios para el conjunto”.

2. Valor de la “Si todas las 5 gimnastas no realizan uma Porém, além do risco da
dificultad dificultad, sea cual sea el motivo, la dificuldade ser invalidada por
dificultad no cuenta” não atender as especificidades de
“Las dificultades pueden ser del mismo tipo cada grupo obrigatório, há a
y del mismo nível para las 5 gimnastas o de obrigatoriedade de todas as
tipo y nível diferentes. Sin enbargo, es la ginastas executarem as
gimnasta que ejecuta a dificuldad más fácil, dificuldades. Caso uma ou mais
la que determina el valor de la dificultad del delas não atenda os critérios
conjunto”. necessários para expressar a
dificuldade tal qual o código
anuncia, esta será invalidada
para todo o grupo.

2.2 Nivel y valor de “Solamiente los intercambios por Trocas de dificuldade são trocas
las dificultades com lanzamientos son considerados dificultades realizadas por lançamentos em
132

intercambio de intercambio”. que todas as ginastas executam


as ações de lançar seu aparelho e
“Um intercambio puede ser ejecutado por receber o aparelho de outra
subgrupos y por 5 gimnastas, pero se ginasta. Caso um dos aparelhos
considera como tal solamente si todas las seja perdido durante este
gimnastas participan em las 2 acciones de processo toda a troca é
um intercambio, es decir: lanzar su aparato, invalidada. Ao mesmo tempo em
recibir el aparato de uma compañera” que no conjunto o senso coletivo
“Si uno o vários aparatos caem durante um é valorizado, o erro individual
intercambio, el intercambio ya no es valido y também é tido como erro
hay, además, la o las penalizaciones de coletivo. Ou seja, todas as
ejecución”. ginastas pagam juntas pelas suas
virtudes e pelas suas falhas.
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