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Regional e Urbano Pós-80

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NOVAS DETERMINAÇÕES SOBRE

AS QUESTÕES REGIONAL E
URBANA APÓS 1980* * Agradeço os comentários
e sugestões de meus cole-
gas do IE, Professores Fer-
nando M. Mota e Humberto
M. Nascimento, que me per-
Wilson Cano mitiram esclarecer melhor
algumas questões cruciais
que envolvem o momento
Resumo Entre 1930 e 1980 as principais determinações sobre nossa urbanização, atual.
integração do mercado nacional e desenvolvimento regional decorreram basicamente da indus-
trialização, da política macroeconômica e de políticas de desenvolvimento regional. Após 1980,
com a “Década perdida” e as políticas neoliberais, aquelas determinações foram em grande
parte modificadas pelas novas formas de nossa inserção externa, pelo câmbio apreciado e juro
alto, e pela Guerra Fiscal. Assim, além dos determinantes anteriores – enfraquecidos –, há os
novos, de sentido nacional, sendo alguns específicos a cada região. Em que pese as mudanças,
os efeitos nocivos de nossa forma de crescer e de nossa urbanização se transmitiram a todo o
território nacional. O artigo se encerra com uma proposta de Agenda de Pesquisa sobre os
temas regional e urbano para o período 1980-2010, com intuito de entender melhor aquelas
determinações e efeitos desses processos.

Palavras-chave Questão regional; urbanização; novos determinantes;


guerra fiscal; fronteira agro-mineral; inserção externa.

Este texto visa um exame e reflexão sobre os principais efeitos das mudanças
mais relevantes sofridas pelo padrão de crescimento vigente após 1980, que causaram
profundas alterações sobre as determinações mais gerais que agem sobre os processos
de desenvolvimento regional e de urbanização brasileiros. Esse período de análise se
situa entre 1980, com a “Crise da Dívida” e a posterior adoção de políticas neoliberais,
estendendo-se até 2010.
No primeiro tópico, e para comparação com o restante do texto, farei breve síntese
sobre as anteriores determinações, as ocorridas entre 1930 e 1980, destacando, contu-
do o transcurso da década de 1970. No segundo tópico o objetivo central é desenhar
e justificar uma agenda de pesquisa para o período 1980-2010, indagando as novas
determinações mais gerais daqueles processos. Para tanto, se fará um esforço teórico e
metodológico que possa dar conta da realidade do período. Desde já tenho consciência
do tamanho da tarefa e que sua realização só será possível com um grande esforço co-
letivo de pesquisa.
Obviamente, ao longo de todo esse processo, a questão ambiental ganhou relevância
no debate nacional, face à degradação que ocorre, principalmente, no período pós 1980,
seja pela extensão do desmatamento ou pela contaminação das principais bacias hidrográ-
ficas, seja pelas várias formas degradantes que se multiplicam no processo de urbanização
(lixo, água, esgoto, ar, paisagem, enchentes etc.). Contudo, dada a dimensão e escopo des-
te artigo e, principalmente, a complexidade envolvida nesse tema, não tratarei do referido
processo, embora o entenda como uma das questões prioritárias a examinar nos temas da
questão regional e da urbanização.

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N O V A S D E T E R M I N A Ç Õ E S

AS PRINCIPAIS DETERMINAÇÕES NO PADRÃO


1 Para este tópico, apóio- ANTERIOR (1930 A 1970 E 1970 A 1980)1
me basicamente em Cano
(2007a, b).
A ruptura política e econômica desencadeada pela “Crise de 29” e pela Revolução
de 1930, fez a economia do Brasil transitar do antigo modelo “primário exportador” (de
crescimento para fora), para o da industrialização (crescimento para dentro), mudando o
“centro dinâmico da economia”, e alterando as bases do antigo padrão de acumulação,
que passa a ter no investimento autônomo sua principal determinação.
Isto reforçou a internalização de tomada de decisões, notadamente na órbita do
Estado, que implantou, gradativamente, uma Política Nacional de Desenvolvimento, am-
pliando sobremodo suas funções de estímulo, indução e ação diretas, com forte ampliação
do gasto e do investimento públicos.
A despeito da Depressão e da II Guerra, o novo padrão acelerou o crescimento do
PIB, cuja taxa média anual, entre 1930 e 1970, atingiu 6%, ou seja, bem acima dos 4,3%
da média 1900-1930. O PIB da indústria de transformação cresceu ainda mais, entre 1930
e 1970, a 8,2% com o que a participação desse setor no PIB saltou, de cerca de 12,5%
para 29,3% em 1970.
A política econômica reforçou sobremodo o inexorável processo de integração do
mercado nacional, que a industrialização desencadearia. Para isso muito colaboraram,
além de outras medidas, os investimentos públicos em infraestrutura, que estreitaram a
enorme dispersão territorial do país. Os investimentos industriais, públicos e privados,
além de elevar a capacidade produtiva do setor, diversificaram-na, com a implantação da
indústria de bens de produção e de consumo durável. A expansão regional, no período,
caracterizou-se por uma forma de complementaridade com a economia de São Paulo,
intensificando-se bastante o comércio inter-regional do país.
Embora tenha ocorrido enorme concentração da produção da indústria de transfor-
mação em São Paulo – que passa de 40,7% para 58,2% do total nacional entre 1939 e
1970 –, isso não causou qualquer perda absoluta a nenhuma das demais regiões do país.
Com efeito, enquanto esse setor cresceu, entre 1939 e 1970, à taxa média nacional de
8,1%, a de São Paulo foi de 9,3% e a do agregado Brasil-SP, de 6,9%. Mesmo o Nordeste,
a região que mais perdeu participação relativa, obteve a elevada taxa de 5,9%.
A produção agropecuária do país também cresceu satisfatoriamente, em torno de
3,7% anuais, intensificando-se também as trocas de várias regiões com São Paulo. Os
destaques maiores para esse setor, no período, foram:
s a profunda transformação, modernização e diversificação do agro paulista, reduzindo
a cafeicultura e expandindo, notadamente, a cana de açúcar e o algodão, que inibi-
riam, a longo prazo, essas culturas no NE. Isto provocou um grande fluxo de saída de
pequenos produtores e trabalhadores rurais que migrariam, fundamentalmente, para
a agricultura do Paraná e Centro-Oeste, e em parte, para a economia urbana de SP,
que crescia com a industrialização. A partir da “Crise de 29”, o agro paulista atraiu
importantes fluxos de trabalhadores rurais de Minas Gerais e do Nordeste. Entre 1940
e 1970, migraram para o estado de São Paulo, 2,5 milhões de brasileiros não paulistas
(81% dos quais, de MG e do NE), consolidando o Estado como principal receptor da
emigração nacional;
s a colonização do norte do Paraná e do oeste de Santa Catarina, que se estende até a
década de 1960, com base em agropecuária diversificada e caracterizada pela pequena
e média propriedade;

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s fato semelhante, mas de menor impacto, ocorreu com o sul de Goiás e ainda em menor
escala no sul do atual Mato Grosso do Sul, para o que contribuiu a política federal da
“Marcha para o Oeste” e mais tarde a construção de Brasília e da Belém-Brasília.
Esses novos espaços – no CO, no PR e em SC – que constituíram uma “fronteira
exuberante”, com produção eficiente e melhor distribuição de renda, receberam grandes
fluxos migratórios de habitantes do NE, de MG, do Rio Grande do Sul e de São Paulo:
os que se dirigiram ao Sul somaram (em 1.000 pessoas), respectivamente, cerca de 400,
500, 450 e 700; os fluxos em direção ao CO foram ainda modestos, predominando os de
paulistas (cerca de 200).
s a grande ocupação no Maranhão e no norte de Goías (atual norte do Tocantins), e
mais ao fim deste período, no sudeste do Pará, que se pode caracterizar como uma
“fronteira de pobres”, dada a questão fundiária local, a precariedade de sua agricultura
e as perversas relações sociais de produção. Este espaço constituiu, claramente, uma
perversa manifestação do fenômeno da agricultura itinerante de que falou Furtado
(1972). Para esta fronteira acorreram grandes fluxos de nordestinos não residentes (cer-
ca de 400.000) no MA. Com a continuidade da itinerância dessa agricultura, as levas
de nordestinos (maranhenses ou não) migraram também para o atual norte do TO e o
sudeste do PA; foram cerca de 100.000 pessoas.
Há que ter presente, no caso da agropecuária, que, à medida que ela se moderniza
e cresce, embora expulse parte de seu emprego direto, gera outros empregos indiretos
urbanos, seja na agroindustrialização ou na indústria que lhe fornece bens de produção,
seja em várias atividades produtoras de serviços. É isto que explica, por exemplo, a notável
rede urbana gerada pela cafeicultura paulista antes de 1929, e a do norte do PR, durante a
“colonização” agropecuária que ali se deu entre 1925 e fins da década de 1960.2 O oposto 2 Sobre as redes urbanas do
Brasil até a década de 1950,
disso se deu na ocupação do MA, do antigo norte de GO (atual TO) e do sudeste do PA, ver o excelente trabalho de
no período posterior à década de 1940. Geiger (1963).

Em termos regionais, a demografia sofreu forte influência dos fluxos migratórios, cujo
total nacional passa de 2,7 milhões em 1940 para 11,9 milhões em 1970.3 Entre 1940 e 3 Cifras calculadas com eli-
minação das migrações en-
1970 (em 1.000 pessoas), as entradas acumuladas em São Paulo passaram de 726 para tre as UFs das regiões NO,
3.185; no Paraná, passaram de 214 para 2.467 e no Rio de Janeiro, de 602 para 2009. NE e CO.

A população brasileira, que entre 1920 e 1940 crescera à modesta taxa média anual
de 1,5%, com as transformações econômicas e sociais que ocorreram após 1930, acelera
seu crescimento, para 2,3% em 1940-1950 e para cerca de 3% em 1950-1970. Mas a
população urbana cresceria muito mais: 3,8% em 1949-1950, 5,3% em 1950-1960 e
5,1% em 1960-1970.
Durante todo esse período, as taxas nacionais foram ligeiramente superadas pelas
paulistas. Contudo, a urbanização gerada pela cafeicultura em São Paulo – e sua notável
rede urbana – era relativamente maior do que a nacional: foi acelerada com o aumento
de seus fluxos imigratórios e com parte de seu próprio êxodo rural, com o que, em 1940,
as taxas de urbanização do Brasil e de São Paulo eram respectivamente 31% e 44%, dis-
tância que aumenta em 1970, para 56% e 80%. Cabe ainda apontar que, se excluirmos
São Paulo e o Rio de Janeiro, o restante do Brasil apresentaria, naqueles anos, as taxas de
25% e 45% apenas.
A estratificação das cidades, por tamanho, também é útil para examinarmos essa evo-
lução. Em 1920, o país tinha apenas uma cidade com mais de um milhão de habitantes,
o Rio de Janeiro, e uma com mais de 500 mil, São Paulo, que só em 1940 figuraria com
mais de um milhão. Em meados dos anos 1950, São Paulo (e o aglomerado que viria a

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ser sua região metropolitana) ultrapassavam o Rio de Janeiro e sua futura RM. Na escala
de 500 mil, só em 1950 teríamos uma – Recife –; em 1960 seriam cinco e seis em 1970,
com o surgimento de Brasília.
Se baixada a escala para cidades entre 250.000 e 500.000, também seria escasso seu
número: apenas Salvador em 1920; mais duas (Recife e Porto Alegre) em 1940; mas em
1970 já figuravam 14, das quais 9 sediadas em SP e no RJ. Tínhamos em 1920, na escala
de 100.000 a 250.000, 10 cidades (3 em São Paulo); em 1940, 18 (2 em São Paulo e 4
no Rio de Janeiro) e em 1970 elas seriam 66 (17 em São Paulo e 5 no Rio de Janeiro).
Assim, a maior concentração urbana no período se restringe a São Paulo, Rio de
Janeiro, Brasília e a algumas capitais estaduais. Nova Iguaçu, na baixada fluminense, mu-
nicípio agrícola até meados da II Guerra e depois, predominantemente, cidade-dormitório
do Rio de Janeiro, fazia parte desse grupo, com seus 727.000 habitantes.
Contudo, o que predomina em todos os estados brasileiros é a grande presença de
cidades menores, notadamente abaixo de 100.000 habitantes. Mas isso, longe de repre-
sentar uma identidade, oculta, na verdade, uma dura realidade de diferenciação regional
de crescimento, renda, ocupação e melhor nível de vida.
O exame da estrutura do emprego mostra o mesmo processo: em 1940, Brasil e São
Paulo empregavam, respectivamente, 67% e 58% da População Economicamente Ativa
(PEA), nas atividades primárias, 13% e 17% na indústria e os serviços ocupavam apenas
20% e 25%. Em 1970, os mesmos dados eram de 44% e 20%, 18% e 31% e 38% e
49%, mostrando o grande distanciamento entre aquelas estruturas ocupacionais. Con-
tudo, o agregado Brasil – (São Paulo + Rio de Janeiro) em 1970 tinha ainda a seguinte
estrutura: 57% em primários, 12,5% no setor industrial e apenas 30,5% em serviços. O
país estava se transformando e urbanizando em “alta velocidade”, contudo, as reduzidas
bases periféricas de industrialização e urbanização impediam que a evolução regional
fosse tão avançada quanto a que se dava em São Paulo.
Concluindo este subperíodo, cabe dizer que, a despeito da velocidade do processo
de urbanização, notadamente nos estados mais industrializados, há que entendê-lo co-
mo de uma urbanização suportável, dada a existência de mecanismos de assentamento
e acomodação das camadas de baixa renda, em termos de possibilidade de uma perife-
rização ainda próxima aos centros urbanos, acesso a lotes baratos ou ocupação de áreas
até então não disputadas com o capital mercantil, como morros, alagados e outras áreas
ruins ou inapropriadas.
Por outro lado, e a despeito dessa velocidade de crescimento, como o emprego ur-
bano cresceu aceleradamente, a fiscalidade estadual e municipal também cresceu, não na
mesma proporção da expansão urbana, mas mesmo que de forma ainda parcial elevou o
gasto público urbano e a oferta de serviços sociais, amenizando o drama social que em
um futuro próximo surgiria.

4 Como base deste tópico A Década de 19704


temos Cano (2008).

Contudo, a velocidade e o adensamento urbano – notadamente em São Paulo e no


Rio de Janeiro –, amplificaram as tensões sociais, desencadeando, no plano político, uma
crescente massa de reivindicações que se consubstanciaram nas chamadas “Reformas de
Base” (agrária, urbana, tributária, financeira, educacional, da saúde e outras), com fortes
conteúdos de justiça social e nacionalismo. Essa efervescência, entretanto, atemorizou suas
conservadoras elites, conduzindo esse caudal para o golpe militar de abril de 1964.

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A ditadura fez algumas das reformas, não como as sonhávamos, e sim com um estrito
sentido capitalista praticamente desprovido do social. Destaquemos as duas principais
reformas econômicas:
s a tributária, que modernizou a estrutura fiscal ao mesmo tempo em que centralizou,
na órbita do governo federal, uma massa crescente de recursos diminuindo a partici-
pação dos estados e municípios, o que afetaria sobremodo seus potenciais de gastos e,
portanto, de atendimento das crescentes demandas sociais;
s a financeira, instituindo a correção monetária, ampliando os canais de financiamento
para os segmentos de bens de consumo duráveis e de capital e para a modernização da
agricultura de exportação.
Essas duas reformas ampliaram muito a capacidade federal de gasto e investimento
público, com o que a política macroeconômica, a partir de 1966-67 pode retomar e
acelerar o crescimento e a diversificação da economia. As novas bases de financiamento
de médio e longo prazos deram maior apoio ao investimento e à produção privada. O
investimento total, como porcentagem do Produto Interno Bruto (PIB), atingiria no auge
do período (1970-74) cerca de 25%.
As políticas sociais foram em certa medida negligenciadas, principalmente, a do salá-
rio mínimo, que continuaria a sofrer maiores quedas reais. A agrária foi transformada em
um simulacro, para, justamente, não fazê-la. Exemplo notável foi a construção da Rodovia
Transamazônica, instrumento para agilizar as migrações nordestinas rumo ao Noroeste,
com o que se esvaziava a pressão fundiária no Nordeste. A política urbana limitou-se às
novas formas de financiamento de habitação e saneamento básico (Poupança, Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço e Banco Nacional de Habitação), com o que a política
habitacional expandiu sobremodo a construção residencial, e isto acomodava o problema
do emprego e cooptava politicamente a população beneficiada com esse programa.
A questão regional, para a qual havia sido implantada em 1960 uma Política de
Desenvolvimento Regional com incentivos econômicos para o Nordeste, teve, a partir
de 1967, seus recursos direcionados também para o Noroeste e, em seguida, dispersados
pelo surgimento de novos programas, a maior parte dos quais para todo o território na-
cional, como os investimentos em turismo, pesca, reflorestamento, mercado de capitais e
indústria aeronáutica.
A intensidade do crescimento entre 1967 e 1980 “compensou” esses constrangimen-
tos: a queda do salário mínimo foi atenuada pelo excepcional crescimento do emprego
urbano, que elevou o salário médio e dispersou a estrutura salarial. A dispersão dos recur-
sos financeiros regionais do Noroeste e Nordeste foi compensada pela desconcentração
regional do investimento, pois o aprofundamento e diversificação imprimidos à industria-
lização obrigavam a uma utilização mais intensa das bases regionais de recursos naturais
(terras, água e minérios).5 Isso também obrigou a uma forte desconcentração regional da 5 Implantação ou expansão
de celulose e papel, metais
infraestrutura energética, de comunicações e de transporte. não ferrosos, química, ál-
A taxa média anual do PIB entre 1970-1980 foi de 8,7% para o Brasil (8,2% para cool de cana, petroquímica
e outros.
São Paulo). A agropecuária cresceu a 3,8%, alta, se confrontada com a demográfica, que
foi de 2,5%. Os serviços, impulsionados pela industrialização, cresceram a 8% e a indús-
tria de transformação a 9% (8,1% em São Paulo e 10,2% no agregado Brasil-São Paulo).
A participação da periferia nacional aumentou a desconcentração industrial, passan-
do de 0,8% para 2,4% no Noroeste, basicamente explicada pela implantação da Zona
Franca de Manaus; o Nordeste saltou de 5,7% para 8,1%, recuperando parte das perdas
sofridas no período anterior; Minas Gerais, foi de 6,5% para 6,7% e o Espírito Santo,

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de 0,5% para 0,9%, foram os principais beneficiados. Os maiores perdedores foram São
Paulo (cai de 58,1% para 53,4%) e o Rio de Janeiro (de 15,7% para 10,6%). A des-
concentração industrial em São Paulo também teve um vetor interno: a participação da
Região Metropolitana de São Paulo no total nacional cai de 43,5% para 33,6% enquanto
a do interior sobe de 14,7% para 19,8%, desenvolvendo, também nesse espaço estadual,
a urbanização e a produção de serviços.
A modernização e expansão da agropecuária se concentraram mais em São Paulo e
região Sul, e em menor escala no Centro-Oeste. Seus principais produtos foram a soja, o
trigo, a laranja, a cana-de-açúcar e as carnes. Ressalte-se que a expansão no Paraná deu-se
nas áreas em que antes predominava a pequena e média propriedade, transformando as es-
truturas produtivas e da propriedade, resultando na expulsão, nessa década, de paranaenses
(predominantemente rurais), do equivalente a 22,8% de sua população de 1970. A ocu-
pação do Noroeste se iniciava, notadamente no Pará, em pecuária e cultivos tradicionais.
Os fluxos migratórios inter-regionais saltaram de 12 milhões de pessoas em 1970
para 16,5 milhões em 1980. As maiores saídas continuaram a ser de nordestinos (2,3
milhões), paranaenses (1,6 milhões) e mineiros (800 mil). A principal área receptora foi
São Paulo, com o recorde de 2,8 milhões de pessoas (cerca de 1,5 de nordestinos, 0,6 de
mineiros e 0,55 de paranaenses, além de outros). O Rio de Janeiro diminuía sua recepção,
para cerca de 500 mil, mas aumentava sua própria expulsão, para cerca de 180 mil.
A fronteira Noroeste receberia 650 mil pessoas (260 mil do Nordeste; de Minas
Gerais, Paraná e Centro-Oeste-DF, 90 mil de cada e outros). A do Centro-Oeste-Distrito
Federal, recebeu 500 mil: 180 mil do Paraná; do Nordeste e de São Paulo, 100 mil de
cada, além de outros. Brasília continuou sendo importante receptor, acusando entrada de
380 mil pessoas.
A taxa média anual de crescimento demográfico caíra de 2,9% nos anos 1960 para
2,5% nos 1970, mas o acréscimo absoluto da população foi maior: (23 milhões contra
26). A da população rural, que já fora pequena nos anos 1960 (0,7%), torna-se negativa
nos 1970 (-0,5%). A taxa de crescimento da população urbana também caiu nos mesmos
períodos de 5,2% para 4,4%, mas o acréscimo absoluto foi ainda maior: 28 milhões nos
anos 1970 contra 21 nos anos 1960.
A taxa de urbanização para o total do Brasil sobe de 55,9 % em 1970 para 67,3%
em 1980, mas enquanto as áreas mais industrializadas (SP e RJ) apresentavam cifras que
ultrapassaram os 80% para cerca de 90%; o NO (51,7%), NE (50,6%) e CO-DF (pouco
mais de 60%) eram as áreas menos urbanizadas do país.
A aceleração do crescimento industrial, induzindo fortemente a expansão diversifi-
cada dos serviços fez com que, pela primeira vez na história recente do país, a taxa média
anual de crescimento do emprego da PEA não agrícola (6,16%, contra 4,62% na década
anterior) superasse a taxa de crescimento da população urbana (4,4% contra 5,2% da
década anterior). Isso certamente representou um enorme amortecedor de tensões sociais
e possibilitou ganhos reais nos salários médios, dada a grande pressão no mercado urbano
de trabalho.
A estrutura da PEA empregada mostra o positivo efeito da industrialização: para o
Brasil, o emprego agrícola cai de 44% para 30%, o industrial sobe de 18% para 25% e o
de serviços, de 38% para 44,5%; para SP, as cifras correspondentes foram de 20% para
11,5%, de 31% para 39% e de 49% para 49,5%. O agregado Brasil (SP+RJ) mostrava
ainda elevado emprego agrícola (41,3%) e baixo terciário (apenas 38,7%) embora tivesse
duplicado a participação do industrial que passa de 12,5% a 20%.

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Em termos de tamanho de cidades, a urbanização do período concentrou-se um pou-


co mais, embora com menor intensidade. Na década de 1960, a população total cresceu
33%, mas as 10 maiores cidades (7 delas com mais de 500 mil habitantes) cresceram em
média 54%, e o conjunto das demais cresceu apenas 29%, as quais perfaziam 84% da
população. Na década de 1970, enquanto a população total cresceu 27,8%, as 11 maiores
cidades (aquelas 10 mais Brasília), cresceram em média 39,5% e a média das demais 25%,
perfazendo agora 79% da população total.
De 2 cidades com mais de 1 milhão de habitantes em 1960, passamos a contar com
5 em 1970 e com 10 em 1980. Esse movimento intensificou ainda a conurbação com mu-
nicípios vizinhos, que seria o processo de transmissão intermunicipal de todas as mazelas
e efeitos nocivos dessa descontrolada urbanização (a urbanização explosiva). O aumento
dessas aglomerações urbanas ensejou sua transformação em regiões metropolitanas, insti-
tucionalizadas a partir da década de 1970, mas sem contar com fiscalidade própria. Em
1970, as 9 RMs (São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Salvador, Fortaleza,
Belém, Porto Alegre e Curitiba) perfaziam 23,7 milhões de habitantes e em 1980, 34,4
milhões ou o equivalente a 28,8% da população total do país.
A urbanização acelerada gerou uma série de efeitos complexos. A periferização de
populações de média e baixa renda foi a tônica desse processo, para o que muito contri-
buiu a própria política habitacional do regime militar. Esse efeito estimulou o aumento da
especulação imobiliária, encareceu sobremodo os custos da infraestrutura urbana e piorou
a qualidade de vida urbana.6 Além disso, o elevado encarecimento da moradia e a omis- 6 Sobre os efeitos da urbani-
zação do período, ver Cano
são e corrupção política dos órgãos públicos amplificou também a ocupação de espaços (2011).
impróprios para assentamentos humanos, como morros, encostas, alagadiços e outros.
Por outro lado, conurbação, aglomeração e metropolização superdimensionaram
vários problemas de ordem municipal e de solução local, multiplicando seus tamanhos e
custos, tornando-os, assim, problemas regionais, estaduais ou mesmo federais. Isso agra-
varia ainda mais essa situação, diante da concentração de receita fiscal na órbita federal
e do aumento desses problemas. É o que passou a ocorrer com o tratamento do lixo, da
questão da água e do esgoto, do transporte coletivo etc.

O PERÍODO PÓS 1980: NOVAS DETERMINAÇÕES


SOBRE OS PROCESSOS DE DESENVOLVIMENTO
REGIONAL E DE URBANIZAÇÃO7 7 Para este tópico, no que
tange à questão regional no
período 1980-2003, usei lar-
As principais mudanças, em seu patamar mais geral, ocorreram a partir das novas gamente a pesquisa que fiz
para o período 1970-2003,
bases da Política Econômica Nacional, resultando em alterações radicais no ritmo e na editada em Cano (2008).
forma de crescimento econômico do país, mudando significativamente nossas estruturas Por isso, poupei o leitor com
reduzido número de notas
produtivas, de emprego e de relações internacionais. Elas também impactaram sobre as de rodapé.
estruturas sociais e políticas, e causaram importantes alterações no processo de integração
e desenvolvimento regional e no próprio processo de urbanização.
Não tratarei aqui da questão macroeconômica nacional, já examinada pela am-
pla literatura atual, mas embora não vá tratar dela, adianto que sua análise geral está
hoje parcialmente comprometida pelas muitas mudanças espaciais que ocorreram na
economia. Dito de outra forma, essas mudanças mais gerais e de caráter nacional ge-
raram efeitos espacialmente muito diferenciados. Corre-se hoje o risco de falarmos em
“Brasil”, tomando como dados para análise, simples médias estatísticas nacionais, que

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encobrem movimentos e determinações espaciais muito mais diversos do que os que se


observavam antes de 1980.
Como primeiro ponto para essa Agenda de Pesquisa, cabe estabelecer uma perio-
dização, de caráter nacional, que distinga as grandes linhas do período e suas maiores
modificações. Assim, o período como um todo será seccionado em três: o da década de
1980; o do período 1989-2003 e o de 2003-2010. Vejamos os principais fatos marcantes
de cada subperíodo.

1980-1989: A “Década Perdida”

A crise, que vinha desde 1976, se agrava a partir de 1979, devido à brutal elevação
internacional dos juros, tornando a dívida externa impagável, desestruturando as finanças
públicas, desencadeando um processo inflacionário e de estagnação. A crise só não foi pior
graças à forte expansão das exportações, que cresceram 71% entre 1980 e 1989, em que
pese a queda dos preços internacionais de produtos básicos.
A recessão conteve as importações, que cresceram apenas 24%, com o que geramos na
década, US$97 bilhões de saldos comerciais, incapazes, contudo – frente ao que remetemos
de juros (US$87 bilhões) além de outros pagamentos –, de evitar o aumento da dívida
externa, a qual, entre o início e o fim da década saltou de 64 para 115 bilhões de dólares.
O elevado impacto orçamentário dos juros da dívida pública contaminou também os
governos subnacionais, que exacerbaram suas dívidas e também sofreriam os percalços de-
correntes de seu crescente serviço. Esse forte desequilíbrio financeiro do estado restringiu
suas ações no plano nacional e regional debilitando não só o gasto público, mas também
o investimento privado, notadamente o industrial, atingindo, principalmente, o núcleo
da dinâmica industrial – o parque produtivo de São Paulo –, que estagnou, diminuindo
os efeitos dinâmicos para a desconcentração industrial regional.
O crescimento médio anual do PIB foi medíocre, tanto para o Brasil (2,2%) como
para São Paulo (1,5%). O setor agropecuário continuou obtendo taxas (3,2%) de cres-
cimento em torno de sua trajetória anterior, graças ao programa energético do álcool de
cana e à expansão das exportações agrícolas e agroindustriais, em parte decorrentes da
expansão da fronteira no CO.
A indústria de transformação, o setor antes mais dinâmico, teve desempenho ainda
pior, pífio, de 0,9% para o Brasil e ainda mais baixo para SP (0,2%), sendo de 1,6%
para o agregado Brasil-SP. A continuidade da diversificação industrial parou, com sua
estrutura regredindo, pois os segmentos de bens de produção e de consumo durável
foram mais afetados do que os de bens de consumo não durável. Demos um passo atrás
na evolução industrial, em um período em que o capitalismo mundial acelerava sua
reestruturação produtiva.
A crise industrial só não foi pior graças aos segmentos mais vinculados às exportações
agroindustriais, minerais e de insumos básicos, além dos vinculados à questão energética,
como álcool de cana-de-açúcar e petróleo, este decorrente da forte expansão da extração
na Bacia de Campos, no RJ.
A desconcentração industrial prosseguiu, com SP perdendo 3,2 pontos percentuais
na produção nacional do setor. Adverte-se, porém, que se no período 1980-1985, a par-
ticipação paulista caiu de 53,4% para 51,9% isso se deu mais porque a taxa negativa de
crescimento de SP foi maior do que a do Brasil. Em 1989 a participação cairia um pouco
mais, para 50,2%, não por um crescimento satisfatório da periferia, mas sim porque a

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taxa positiva de crescimento de SP foi medíocre, e abaixo da reles taxa verificada para o
conjunto do país. Desconcentração espacial, em tempo de crise profunda, tem sentido
muito diverso da que ocorre quando se dá crescimento normal ou alto. No período, ela
foi espúria, um resultado meramente estatístico.
Até mesmo o setor de serviços cresceu pouco (médias anuais de 3,1% para o Brasil
e 2,2% para SP) e sua expansão nesse período decorre não só da continuidade da des-
concentração dos outros setores produtivos. Uma explicação para isso é a de que o êxodo
rural cresceu muito, diminuindo a população rural, entre 1980 e 1991, em 2,8 milhões
de habitantes. Mas o fraco desempenho industrial fez com que seu emprego aumentasse
apenas 19%, enquanto a população urbana aumentava 38%, pressionando pelo aumento
da oferta de vários serviços.
O Censo de 1991 mostra que a diferença entre a PEA total e a ocupada atingiu 3,2
milhões de pessoas, cifra muito acima da verificada pelo Censo de 1980, no qual a não
ocupação era de 964 mil pessoas. Assim, além do aumento da desocupação aberta, também
aumentou o desemprego urbano oculto. A “válvula de escape” foi, como de costume, o
emprego do terciário, que passou de 18,8 milhões em 1980 para 29,7 milhões em 1991, já
dando mostras de precarização do mercado de trabalho e expansão da economia informal.
O setor de serviços, entre 1980 e 1991, foi responsável por 83% do aumento do
emprego, gerando 10,9 milhões de novas ocupações, das quais sobressaíam 1,2 milhões de
empregados domésticos remunerados e 1,7 milhões de outros empregos com predomínio de
autônomos e outros serviços precários e forte queda do rendimento médio do trabalhador.
A crise afetou profundamente o fluxo migratório inter-regional: a média anual entre
os Censos de 1980 e 1991 diminuiu 40% em relação à da década de 1970 e as entradas
médias em SP sofreram queda de 65%. O que atenuou esse movimento foi a continuida-
de da expansão da fronteira agrícola no NO e CO, o melhor desempenho da agricultura
nordestina e a forte expansão urbana ocorrida nessas três regiões.
A taxa média anual (1980-1991) do crescimento populacional caiu ainda mais, dos
2,48% da década anterior para 1,93%, mas as regiões NO e CO-DF apresentavam taxas
pouco acima de 3%, graças à atração da fronteira agropecuária. A da população urbana
também caiu de 4,44% para 2,97%, em proporção similar nas demais regiões, salvo no
NO (5,4%) e no CO-DF (4,8%). Mesmo assim, a taxa de urbanização subiu expressiva-
mente, de 67,3% para 75,6%, com um grande diferencial entre o NO e NE (com cerca
de 60%) e SP, RJ e DF (acima de 93%).
O número de cidades acima de um milhão de habitantes passou de 10 para 12 (com
a inclusão de Belém e Manaus), enquanto o das acima de 500.000 e abaixo de um milhão
passaram de 8 para 13 (das quais 6 fora de SP e RJ), e as de mais de 250.000 e menos de
500.000, de 24 para 40 (das quais, 23 fora de SP e RJ).

Período 1989-2003

Na década de 1990, o receituário neoliberal implicou na submissão consentida


dos países subdesenvolvidos à Nova Ordem, representada pelos preceitos contidos no
chamado Consenso de Washington, com o que abdicamos de nossa soberania nacional, no 8 Para uma descrição des-
desenho, implementação e manejo da política econômica.8 sas reformas e a análise
de seus efeitos na América
Esse Consenso está assentado para atender a duas ordens de questões: a financeira e a Latina e Brasil, ver Cano
(2000), que apresenta, inclu-
produtiva. A primeira, dada a crise financeira internacional, que explicitou a supremacia sive ampla bibliografia sobre
do capital financeiro (financeirização da economia) sobre as outras formas de capital, o tema nessa região.

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impondo a quebra da soberania nacional de nossos países, para liberar seu movimento
internacional na busca incessante da valorização. A segunda, da reestruturação produtiva
e comercial feita pelas grandes empresas transnacionais (ETs), em suas bases localizadas
nos países desenvolvidos, que também exigiria, na década de 1990, reestruturações seme-
lhantes em suas bases localizadas nos subdesenvolvidos. Isto foi reforçado pela voracidade
do capital estrangeiro na compra de empresas públicas e privadas nacionais, debilitando
ainda mais nossa já precária soberania nacional.
Destas duas ordens derivaram os objetivos para impor um conjunto de reformas
institucionais liberais, que constituem um todo articulado para permitir a funcionalidade
do modelo neoliberal. Elas, resumidamente, compreendem:
s desregulamentação dos fluxos financeiros internacionais, para adequar nossa economia
aos interesses do capital financeiro internacional;
s a reforma do sistema financeiro nacional para compatibilizá-lo com o sistema inter-
nacional;
s a abertura comercial, potenciada pela grande valorização do câmbio, reduziu fortemen-
te os custos dos importados, debilitou as exportações, e gerou grandes deficits comer-
ciais e de serviços. Constituiu ainda forte apoio à política anti-inflacionária;
s flexibilização das relações trabalho-capital, para diminuir ainda mais o custo do tra-
balho, adequar contratos ao novo timing da tecnologia e debilitar estruturas sindicais;
s reformas previdenciárias, para criar mais um importante segmento para o mercado
financeiro e abrir maior espaço no orçamento público para os juros das dívidas públicas
interna e externa;
s reforma do estado nacional, para desmantelar suas estruturas, diminuir seu tamanho
e sua ação, eliminar vários órgãos públicos, dispensar funcionários e reduzir seus salá-
9 Várias antigas estatais – rios reais, privatizar ativos públicos9 e desmantelar os sistemas de planejamento e de
como a Companhia Vale do
Rio Doce – tinham positiva
regulamentação;
ação sobre diversas partes s os estados subnacionais (governos estaduais e prefeituras) que também estavam com
do território nacional, agindo
muitas vezes como verdadei- sua fiscalidade debilitada e fortemente endividados, foram obrigados a negociar suas
ros agentes de desenvolvi- dívidas com o governo federal, entre 1996 e 1998, comprometendo por 30 anos parte
mento regional. Com a priva-
tização essas atitudes foram de suas receitas com o pagamento compulsório de amortizações e juros, reduzindo
sumariamente reduzidas. fortemente suas capacidades de gasto, em especial de investimentos.
Esse quadro foi complementado pela nova política de estabilização, implantada en-
tre fins de 1993 e junho de 1994, bem-sucedida, mas que teve como lastro uma elevada
valorização da moeda nacional ante o dólar e um ciclópico crescimento da dívida pública
interna, inflada por elevados juros reais.
Ocorre que a dinâmica de funcionamento desse novo “modelo”, à medida que o PIB
cresce, aumenta aceleradamente as importações e outros gastos externos, exigindo altos,
crescentes e persistentes fluxos de capital estrangeiro, forte aumento das dívidas externa e
10 O gasto com juros pas- interna, contaminando as contas públicas, dados os elevados juros.10
sou a ser de cerca de 8%
a 9% do PIB, estrangulando
É fato que houve importante entrada de capitais como Investimento Direto Estran-
as finanças públicas e res- geiro (IDE), mas a maior fração dele destinou-se a comprar empresas públicas e privadas
tringindo o crédito ao setor
privado, que se reduziu, até nacionais, predominantemente na área de serviços (distribuição de energia, transportes,
2003, a um volume em torno telecomunicações, instituições financeiras etc.). Com isso, tais empresas passaram a re-
de apenas 22% do PIB.
meter juros e lucros ao exterior, tornando-se consumidoras líquidas de divisas e o país
ampliou sobremodo seus gastos com serviços importados.
Contudo, a provável deterioração do balanço de pagamentos e das contas públicas,
sensibiliza as finanças internacionais, freando a entrada de capital, e com isso gerando uma

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crise cambial e uma recessão.11 Com isto, o câmbio se desvaloriza, as importações se con- 11 De 1995 a 2002, o de-
ficit em transações corren-
traem e as exportações crescem. Porém, a taxa de crescimento do PIB cai, só retomando tes acumulou a fantástica
patamares mais altos, quando a “festa” de gastos internacionais pôde ser reiniciada. cifra de US$199 bilhões;
nossa dívida externa saltou
Dessa forma, o crescimento só pode ser ciclotímico e baixo, resultando em uma taxa de US$150 bilhões para
média anual tão medíocre quanto a observada na década anterior: entre 1989 e 2003 a US$235 bilhões e nosso
passivo externo atingiu cer-
taxa do PIB foi 2,3% para o Brasil e 1,5% para SP. O investimento despencou, de cerca ca de US$400 bilhões. Isso
de 25% no final da década de 1970, para cerca de 18%: 1) o público, porque não há nos levou às crises cambiais
de 1999 e 2003.
nem política de desenvolvimento, nem, muito menos, recursos no orçamento público;
2) o privado, dada a incerteza do movimento da economia e os elevados juros internos.
Também a estrutura do investimento mudou com predomínio do setor de serviços e de
construção civil, e em detrimento da indústria.
A estrutura produtiva também mostra fortes danos: diminuiu o peso da indústria de
transformação, que cai, para o Brasil, de 30,8% em 1989 para 18,1% e em SP de 40,9%
para 35,0%; a agropecuária passaria, para o Brasil, de 9,1% para 7,4% (em SP, subiria de
3,5% para 7,7%); o setor de serviços aumentaria, no Brasil, de 50,3% para 64,8% e em
SP, de 48,2% para 48,5%.12 12 Os dados de SP são os
das Contas Regionais, na
Assim, as restrições externas e internas ao crescimento foram aumentando ao longo base de 1985. Se mudadas
do período inibindo o investimento, pelas razões já apontadas. É preciso também lembrar para a nova metodologia
com a base em 2002, as
que a crescente contaminação dos juros no orçamento público leva a novos e crescentes cifras resultantes para 2003
cortes do gasto corrente, inclusive em áreas sociais. são simplesmente incompre-
ensíveis, principalmente a da
Ainda assim, após 1999, graças à desvalorização cambial e ao início do “efeito China” agropecuária, que passa a
as exportações (principalmente de commodities) cresceram mais e as importações se contra- ser de apenas 2,2%, enquan-
to a da indústria de transfor-
íram, fazendo com que exportações e consumo liderassem o pífio crescimento do período. mação passava a 23,9% e
os serviços a 65,9%.
Vale notar que em 2003, a despeito da negociação e em que pese o elevado com-
prometimento compulsório (de 9% a 13%) da receita corrente líquida, dos 27 estados, a
relação dívida líquida/receita líquida corrente era pouco menor que 1 em apenas três deles.
No entanto, em quinze deles, ela era superior a 1 e em oito, superior a 2, mostrando a
enorme dificuldade de sua liquidação na maioria das unidades federadas.

A QUESTÃO REGIONAL NO PERÍODO


13 Entre os principais tra-
O período foi fértil em discussões sobre a questão regional brasileira, em especial balhos publicados sobre o
assunto, cabe citar: Affonso
frente às vicissitudes da crise do Estado, da globalização e dos efeitos das políticas neoli- e Silva (1995), Araújo (1999
berais.13 Com a deterioração fiscal e financeira dos entes públicos subnacionais, os investi- e 2000), Cano (2007b) e
Diniz (2005). Nos aspectos
mentos públicos estaduais e municipais também caíram. Com a crise federal, feneceram as da inovação frente à questão
regional, Galvão (2004) faz
políticas nacionais e regionais de desenvolvimento, crescendo então a famigerada Guerra uma profícua discussão so-
Fiscal envolvendo praticamente todas as UFs e muitos municípios de um mesmo estado, bre as políticas regionais da
União Europeia.
com intuito de atrair investimentos de uma área para outra.14 Lembremos, porém, que a
Guerra Fiscal já se inicia em fins da década de 1970, sendo seus dois mais notáveis casos 14 Sobre a Guerra Fiscal,
ver Cavalcanti e Prado
a transferência de grande parte da produção de aparelhos de “som e imagem” para a Zona (1998) e Silva (2001); e prin-
Franca de Manaus (ZFM) e da implantação da Fiat em Minas Gerais. cipalmente a pesquisa mais
atual, a tese de doutorado
Ao longo desse processo, aumentou também a deterioração técnica, política e econô- de Cardoso (2010).
mica dos órgãos regionais de fomento (Sudam e Sudene) que acabaram por ser extintos
15 Para uma crítica à polí-
em 2001 e só recriados em 2007, porém em bases precárias. tica dos Grandes Eixos, ver
Galvão e Brandão (2003).
Abandonando a opção de uma verdadeira Política de Desenvolvimento Regional, Para a questão do Poder
o governo federal criou em 1995, a política dos Grandes Eixos,15 os quais seriam vetores Local, ver Brandão (2003).

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ligando zonas produtivas a portos de exportação, e receberiam grandes investimentos


para aumentar a eficiência e competitividade exportadora. Contudo, eles apenas ligariam
pontos de origem-destino, e pouco ou nada fariam em prol dos maiores espaços regionais
em que estivessem inseridos, e nem tratavam dos problemas urbanos e sociais das cidades
maiores por eles envolvidas. Mais de dois terços desses investimentos viriam do setor pri-
vado, mas, dados os juros escorchantes e a incerteza pelo pífio crescimento, “ficaram ao
largo”, retardados e aguardando dias melhores.
Esse esvaziamento das políticas e dos recursos para o desenvolvimento regional deu
azo à disseminação, junto à Academia e aos órgãos públicos que tratam da matéria, “novas
e modernas” ideias, como as do poder local, da região (ou cidade) competitiva, submetendo-
se a verdadeiros leilões de localização industrial promovidos por empresas de grande
porte (geralmente transnacionais), transferindo dinheiro de pobres para milionários, e
fomentando a localização pelo subsídio e pelo trabalho periférico ainda mais precarizado
e mais barato. Cabe acrescentar que, nesse movimento, as antigas ideias de planejamen-
to e desenvolvimento foram substituídas pelas políticas dos APLs (Arranjos Produtivos
Locais), nome inventado no Brasil, para substituir, com fragilidade, os de cluster ou dos
verdadeiros distritos industriais.
No que se refere aos recursos públicos constitucionais, eles foram restaurados pela
16 Eles foram suspensos Constituição de 1988 (A 159), porém em outros níveis:16 3% não sobre a arrecadação
pelas Constituições de 1937
e de 1967, ambas em pe-
total, como antes, mas apenas sobre o Imposto de Renda (IR) e Imposto de Produtos In-
ríodos ditatoriais, que além dustrializados (IPI); criou, para isso, Fundos Constitucionais para as três regiões beneficia-
disso recentralizaram na
União a maior parte da recei- das: Fundo Constitucional de Financiamento do Centro-Oeste (FCO), com 0,6%, Fundo
ta fiscal do país. Constitucional de Financiamento do Norte (FNO) com 0,6% e Fundo Constitucional
17 Além da criação desses de Financiamento do Nordeste (FNE) com 1,8%.17 Essas dotações representavam muito
Fundos, foi também incluída pouco, se comparadas com os respectivos PIBs regionais: em 2003, equivaliam a 0,5% pa-
na Carta, a obrigatoriedade
da distribuição regionalizada ra o CO e 0,8% para o NO e para o NE. Se tivesse sido mantido o que dizia a Constituição
dos recursos alocados no
Plano Plurianual de Investi-
de 1946, essas cifras seriam muito maiores, de 11,2% para o NO e de 5,4% para o NE.
mentos. Quanto aos incentivos fiscais, que consistem em isenções parciais de imposto de
renda, para aplicação em investimentos privados regionais aprovados pela Sudene ou pela
Sudam, exigiam uma contraparte de recursos pelo investidor privado. Esse subsídio perfa-
zia cerca de 40% do investimento entre 1965 e 1970, baixando depois para cerca de 25%.
Para o NO, os incentivos representaram cerca de 5,7% do PIB médio regional do período
1963-1970, caindo para 4,8% na média de 1971-1975. Para o NE, embora os valores
absolutos tivessem sido em média o dobro dos alocados na região NO, as cifras represen-
taram apenas 2,1% do PIB do NE para o período 1965-1970 e 1,8% para 1971-1975.
Além disso, os percentuais de incentivos foram sendo reduzidos, tanto em termos
de captação quanto de aplicação, com o que em 2000 seus repasses representavam, em
18 Ver legislação específica termos dos PIBs regionais, tão somente 1,2% para o NO e 0,3% para o NE.18 Em 1997
nos sites da Receita Federal
(IR) e do Ministério da Inte-
pela Lei 9532, os fundos de incentivos fiscais (Finam e Finor) tiveram sua permanência
gração Nacional. Da ampla limitada ao ano de 2013, com redução gradativa dos percentuais do incentivo.
bibliografia sobre a matéria,
ver: Bercovici (2003), Carva- Em 2001, foram criados dois novos Fundos de Desenvolvimento Regional (não
lho (2001), Mahar (1978) e substitutivos dos existentes), o FDA e o FDNE, com recursos orçamentários que comple-
PIMES (1984, v. 3).
mentariam os demais fundos. Contudo, o FDA só começou a operar em 2007 e o FDNE
em 2009. O montante de recursos liberados em 2007 e 2008 para o FDA representou tão
somente 0,28% e 0,16% do PIB regional, e as cifras de 2009 e 2010 foram ainda mais
baixas. Para o FDNE, em 2009 e 2010 as cifras são também baixas e representariam algo
como 0,07% e 0,33% do PIB do NE. Essa demora decorreu de problemas burocráticos,

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de alto custo de seus financiamentos e dos drásticos contingenciamentos e cortes orça-


mentários, em parte hoje atenuados.
Entretanto, a diminuição dos prazos, dos percentuais e dos recursos desses fundos
foi em parte compensada graças às alterações constitucionais que reverteram parte da con-
centração fiscal exercida pela União. Na década de 1970, dos recursos fiscais, deduzidas
e somadas as transferências intergovernamentais, a União ficava com 69%, os estados
com 22% e os municípios com 9%; ao final da década de 1990, as cifras respectivas eram
de cerca de 56%, 27% e 17%. Mas boa parte desse acréscimo aos entes subnacionais
consiste em recursos vinculados (notadamente para a saúde e educação) e mais de caráter
corrente e redistributivo que, se bem sejam sumamente necessários, limitam a capacidade
de investimento.
Em termos regionais, o NO, que tinha receitas próprias mais transferências federais
líquidas de cerca de 21% de seu PIB em 1970, e que havia baixado para 8% em 1980,
obteria 18% em 2000; o NE, nas mesmas datas, passou de 11%, para 8% e saltou para
22% e o CO, de 30%, para 16% e para 21%. O Sul e o Sudeste são regiões perdedoras
líquidas, redistribuindo frações elevadas de suas rendas tributárias paras as demais. Entre
seus estados, SP é o campeão das perdas, com -17% em 1970, -11% em 1980 e -14%
em 2000.19 Contudo, a reformulação das dividas estaduais e municipais, imposta pelo 19 Essas cifras e informa-
ções estão na Tese Doutoral
governo federal a partir de 1995, comprometeu cerca de 13% da receita líquida corrente de Monteiro Neto (2005,
dos entes endividados, fazendo com que, mesmo as regiões ganhadoras tivessem dimi- cap. 3). Ver ainda, Afonso
e Varsano (2004) e Prado
nuído seus ganhos, e as perdedoras aumentado suas perdas, com o pagamento anual de (2003). Sobre o endivida-
amortizações e juros: o NO, que em 2000 recebera 17,7% do equivalente de seu PIB, tem mento estadual ver Lopreato
(2002), Pinto, Cintra e Ca-
a cifra reduzida para 16,4%; o NE, de 22,2% para 20,5%; o CO, de 21% para 19,9%; valcanti (2006) e Cavalcanti,
SP, de -14,3% para -15,2%.20 Novais e Bonini (2007).

Há um complexo conjunto de fatos e ações que permitiram a continuidade da 20 Ver o citado trabalho de
Monteiro Neto (2005).
desconcentração produtiva regional, como as políticas de incentivo às exportações, nota-
damente de commodities agropecuárias, agroindustriais e minerais; à Guerra Fiscal, princi-
palmente em termos da indústria de transformação; a execução de alguns investimentos de
infraestrutura descentralizados; e os efeitos estatísticos da desconcentração industrial espú-
ria, de que já tratei. Os resultados mais flagrantes desse processo foram, resumidamente:
s EM TERMOS DE PIB total, embora todas as Unidades Federativas tenham tido taxas mé-
dias anuais positivas, o RJ (1,2%) foi o maior perdedor, seguido por SP (1,5%); NE,
MG e RS (os três com 2,2%) cresceram pouco abaixo da média nacional e os demais
estados acima, com as maiores taxas no NO, MS e MT (os três em torno de 5%);
s NA IND¢STRIA EXTRATIVA MINERAL POR SUA ESPECIFICIDADE S˜ CABE APONTAR OS GRANDES GA-
nhadores: com petróleo, o RJ, NE e ES ou com minérios metálicos, o NO;
s NA AGROPECUÕRIA O 3UDESTE PERDE PONTOS PRINCIPALMENTE MAIS PARA O NO e CO-DF e
um pouco para o Sul;
s NA IND¢STRIA DE TRANSFORMA½áO EMBORA TODOS CRESCESSEM S˜ PERDERAM PARTICIPA½áO NO
total nacional, PE, RJ e SP (a maior perda: cai de 50% para 41%). A dinâmica expor-
tadora fez com que MG e ES transformassem suas estruturas produtivas predominan-
temente na produção de commodities industriais;
s NOS SERVI½OS TANTO A DESCONCENTRA½áO PRODUTIVA MATERIAL QUANTO A CRESCENTE URBANI-
zação, somente RJ e SP perdem alguns pontos. Pela óptica da renda, a diversificação
estrutural do setor continuou, diminuindo o peso dos segmentos mais tradicionais,
como o comércio e domésticos remunerados. Contudo, pela óptica do emprego, estes
segmentos estão entre os que mais cresceram, e a queda de seus pesos se deve à grande

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precarização do trabalho no período e ao rebaixamento dos salários ocorridos nesses


segmentos. Aliás, o Brasil ostenta hoje uma das mais altas taxas de participação do em-
prego doméstico no total da PEA não agrícola, de 9,8% mas uma taxa de participação
na renda não agrícola, de irrisórios 0,57%!
Seria de esperar um aumento da desconcentração produtiva agropecuária e da mi-
neração, dada a expansão territorial do uso de recursos naturais para aquela produção,
notadamente no NO e no CO-DF. Isto e mais a expansão territorial da urbanização, fez
também com que houvesse uma importante desconcentração dos serviços, pelo menos
dos mais comuns.
Contudo, no caso da indústria de transformação, a Guerra Fiscal, a abertura co-
mercial e a valorização cambial enfraqueceram sobremodo a articulação da periferia com
SP, a despeito de que se criaram fluxos de comércio de insumos produzidos em SP, para
fornecimento às plantas desconcentradas. Mas também foram criados fluxos que subs-
tituíram a produção nacional (antes concentrada em SP) por importações, ampliando a
quebra de cadeias produtivas e debilitando importantes segmentos da indústria paulista,
21 Os absurdos incentivos notadamente nos setores automobilístico e no eletrônico.21
recentemente criados para
desconcentrar espacial-
Esses fatos levaram alguns autores, em meados da década de 1990, a formularem
mente a indústria automo- a hipótese de que estaria ocorrendo uma fragmentação da economia nacional tanto pela
bilística são exemplo disso.
Essas plantas montadoras quebra de alguns encadeamentos industriais intrassetoriais e intrarregionais, como pela so-
foram beneficiadas pelas bredeterminação que as novas exportações causavam a grande parte da periferia nacional.22
Leis 9440/97 e 9826/99
que concediam isenção de Seria desnecessário dizer que a fragmentação, se continuada e aprofundada, causaria, a
impostos federais ao setor. longo prazo, um sério debilitamento na ordenação do desenvolvimento nacional e regio-
Entre os casos mais conhe-
cidos, instalaram-se, entre nal do país, constrangendo, inclusive, suas tomadas de decisões. Voltarei a esse assunto no
1998 e 2002, as seguintes
plantas: Ford na BA; GM no
tópico referente ao período posterior a 2003.
RS; Mitsubishi em GO; Mer-
cedes-Benz em MG; Peugeot-
Citroen no RJ; e Peugeot,
Renault, Audi e Volvo no PR. A QUESTÃO URBANA NO PERÍODO
22 As principais discussões
sobre o tema são as de Entre 1991 e 2000, os Censos Demográficos mostram que a população cresceu
Pacheco (1998, cap. 5) e
Guimarães Neto (1997). à média anual de 1,6%, menor do que a anterior, com o que o crescimento da renda
média por habitante (0,8%) só não foi pior do que o da década anterior. Em SP, (cuja
taxa demográfica caiu de 2,1% para 1,8%), o crescimento da renda por habitante, que
foi negativo no primeiro período passou a ser nulo no segundo. As taxas demográficas do
NO (2,8%) e do CO-DF (2,3%) continuaram sendo as mais altas, contendo assim parte
do crescimento de suas rendas médias por habitante.
As diferenças regionais de renda por habitante diminuíram, mas há que repetir a
forte influência da queda do crescimento demográfico regional, diferenciado, e do desem-
penho econômico pior de vários estados, como mostrei acima. Como a taxa demográfica
do NE (1,3%) foi ainda menor do que a do país, sua renda média ganhou alguns pontos,
atingindo o nível equivalente a 47% da renda média nacional.
Enfim, os dados mostram que o tema da convergência/divergência em termos regio-
nais, não pode ser analisado apenas pelos dados da renda média, salvo quando a economia
cresce vigorosamente por todo o território nacional, e não como tem ocorrido nestas
últimas décadas de crise.
Quanto ao movimento migratório inter-regional, analisado entre 1991 e 2000, seus
dados são muito preocupantes. O fluxo do período somou 4 milhões de pessoas, média
anual 66% maior do que no período anterior. Por outro lado:

40 R . B . E S T U D O S U R B A N O S E R E G I O N A I S V. 1 3 , N . 2 / N OV E M B RO 2 0 1 1
W I L S O N C A N O

s para a região NO rumaram apenas 255 mil, o que causou surpresa, contra 832 mil do
período anterior, e suas saídas aumentaram 50%, ameaçando converter a região, de
receptora em expulsora;
s no CO-DF, entraram 507 mil contra 636 mil no período anterior e suas saídas cres-
ceram 10%;
s para SP, que se pensava como uma área que não permitiria maiores fluxos entraram 1,7
milhão, cuja média anual é o dobro da verificada no período anterior;
s o NE continuou a ser o maior expulsador, dele emigrando 2,3 milhões, 1,3 milhões
para SP, 246 mil para o NO e 232 mil para o CO-DF;
s o PR continuou a “limpeza” de seu campo, expulsando mais 232 mil pessoas e MG
126 mil.
Resultou assim que ao final do período, praticamente apenas SP – com todos os seus
graves problemas urbanos e sociais – permanecia como o grande receptor da migração na-
cional, e as demais regiões (além do NO e CO) ou se tornaram expulsadoras ou reduziram
drasticamente suas capacidades de recepção.
Enquanto a população rural diminuía (de 35,8 milhões para 31,9 milhões), a urbana
crescia à media anual de 2,44% abaixo da taxa da década anterior (2,97%). Cresceram
abaixo da média nacional: SP, RJ, RS, RN, PB e PE; o NO teve a mais alta (4,8%), seguido
pelo CO-DF (3,2%). Desconcentração produtiva, expansão da fronteira agro-mineral e
fluxos migratórios ampliaram e desconcentraram a urbanização. A taxa de urbanização do
Brasil passou a 81,2%, sendo as do NO e NE as menores, pouco acima de 69% e SP, RJ
e DF as maiores, acima de 93%. A do CO-DF foi a quarta maior (84,8%), resultado da
transformação de sua moderna agropecuária e da agroindustrialização.
A PEA total cresceu à média anual de 2,98% mas a PEA ocupada só de 1,92%,
mostrando cerca de 12 milhões de pessoas desocupadas. A PEA agrícola diminuiu de 12
milhões para 11,8 milhões e a não agrícola, aumentou de 43,3 milhões para 53,9 milhões.
Dados da PEA mostram a grave situação do emprego.23 Os censos de 1991 e 2000 23 Estou usando os dados
da chamada PEA restrita,
mostram forte redução de 30% na PEA agrícola ocupada do Brasil; no NO e CO-DF, as ou seja, estimada pela mes-
reduções respectivas foram de 22% e 20%, em que pese o forte aumento de seus PIBs ma metodologia do Censo
de 1991, dado que a PEA,
agrícolas (32%) e de suas áreas plantadas (53%). É óbvio que os efeitos mais perversos dis- na metodologia do Censo
so atingem mais os trabalhadores de baixa renda. Trabalho recente, abarcando as PNADs de 2000, não é diretamen-
te comparável à de 1991.
de 1999 a 2003, mostra a continuidade do fenômeno: forte aumento da área plantada e Os dados foram gentilmen-
redução do emprego em 5,5%.24 É ainda mais grave que a proporção dos trabalhadores te cedidos por meu colega
professor Cláudio Dedecca.
rurais sem remuneração (mais de 15 horas semanais trabalhadas) na PEA, só diminuiu um Para essa discussão me-
todológica. ver Dedecca e
pouco para o agregado Brasil (de 3,2% para 3,1%), no Sul e CO-DF, aumentando nas Rosandiski (2003).
demais regiões. Em termos absolutos, essa categoria só diminuiu em SP e no Sul.
24 O texto é o de Balsadi
Na indústria não foi melhor: a criação de 575 mil empregos na construção civil não (2005). Ver também Belik e
pode compensar os 1.109 mil desempregados nos outros setores industriais, restringindo- outros (2003).

se a criação de empregos urbanos praticamente ao setor de serviços. Porém, o que cresceu


mais no urbano foi o grupo dos sem remuneração (mais de 15 horas semanais trabalhadas),
em todas as regiões, crescendo 166% no Brasil; em segundo, o de empregado doméstico re-
munerado, com 36% e em terceiro os autônomos (onde predomina o trabalho precarizado
e informal) com 19%. Se “tudo ou mais ficasse constante”, a situação dos trabalhadores
de baixa renda teria piorado, em consequência do forte aumento da informalidade e pre-
carização no trabalho urbano.
Mas os números mascaram um mero efeito estatístico de “melhoria distributiva”,
uma vez que grande parte desses novos empregos está na verdade substituindo outros

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N O V A S D E T E R M I N A Ç Õ E S

tipos de trabalho (menos precários), anteriormente exercidos por essas pessoas, nos quais
seus rendimentos eram maiores. Baltar, em trabalho recente, já havia mostrado isso,
analisando as PNADs de 1989 e 1999. Nele se vê que os aumentos mais expressivos no
mercado de trabalho urbano foram os mais precarizados e informais, notadamente de
emprego domiciliar, limpeza, segurança e serviços auxiliares. O emprego urbano, naquele
período, cresceu apenas 16,8% ao passo que o dos autônomos aumentou 42,3% e dos
domésticos 37,7%.
O DIEESE confirma esses fatos. Entre 1991 e 2000, para a RMSP, a taxa de desem-
prego aberto saltou de 7,9% para 11% e a do desemprego total de 11,7% para 17,6%.
O rendimento real médio anual do total dos trabalhadores assalariados do setor privado
caiu 26,2%, o dos com carteira assinada caiu 25,3% mas o dos sem carteira caiu apenas
2,1%. Esta última cifra esconde o citado “efeito estatístico de melhoria”, que pode ser
melhor observado na relação entre o rendimento médio dos sem carteira e o dos com
carteira assinada: era de 48,4% em 1991, subindo para 70,7% em 2000. Em que pese
isso, entre 1980 e 2000, o número de famílias ricas no Estado de São Paulo passou de
192 mil para 674 mil, ou 58% do total nacional. Só na cidade de São Paulo residem 40%
do total estadual. Isso se deve, em grande medida, ao rentismo que crassa nas famílias de
25 Cf. Pochmann (2006). alta renda no Brasil.25
Como essa dinâmica afetou mais seriamente RJ e SP, e dada a situação prévia em
que se encontrava o problema social nessas áreas, não é difícil entender as razões básicas
que explicam o extraordinário aumento da violência nesses dois estados, agora já não
mais radicada apenas em suas duas maiores cidades, mas já espraiada em quase todas as
cidades de médio e grande porte do país. Entre 1985 e 2005, o emprego formal ligado à
segurança pessoal e pública na cidade de São Paulo passou de 95,6 mil pessoas para 446
mil, ou seja, 366% de aumento, enquanto o dos professores aumentou apenas 38%. Na
cidade do Rio de Janeiro, os números passaram de 67,8 mil pessoas para 245 mil, ou
26 Dados contidos em ma- 270% de aumento.26
téria do jornalista Fernando
Dantas, publicada no Estado
Por tamanho de cidade, as maiores de 1 milhão de habitantes incorporam Guarulhos
de São Paulo, em 9-4-2007, (SP), passando a 13 e as maiores de 500 mil e menores de 1 milhão passam de 13 a 18,
Caderno Metrópole.
das quais faziam parte 6 do NE, 6 de SP e 3 do RJ. As cidades médias, que já vinham
crescendo mais do que as RMs na década anterior, continuaram a fazê-lo, assimilando não
só os efeitos positivos da expansão urbana, mas, principalmente, os nocivos: conurbação,
periferização, favelização; insuficiência de recursos públicos, insegurança, degradação
27 Sobre o tema das cida- ambiental e outros males.27
des médias, ver Andrade e
Serra (2002).
O Período 2003-2010

Neste tópico, as principais questões macroeconômicas nacionais serão tratadas mais


resumidamente do que nos anteriores. Os temas da questão regional e da urbanização, por
terem sido muito menos pesquisados, serão aqui apontados em suas linhas muito gerais, e
deverão, portanto, receber atenção mais detalhada nas proposições que faço para a pesquisa.
Nos dois mandatos do governo Lula, as linhas mais gerais da política macroeconô-
mica seguiram praticamente a mesma orientação neoliberal do governo anterior: câmbio
valorizado, abertura comercial, maior desregulamentação financeira, juros reais elevados,
superávit fiscal primário, investimento público baixo e crédito (menos) contido.
No segundo mandato houve um abrandamento do crédito: seu provimento ao setor
privado passou de 25% para cerca de 45% do PIB; aumento de prazos de financiamento

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W I L S O N C A N O

ao consumo e forte expansão dos limites do BNDES. As políticas sociais foram positivas,
com o Bolsa Família e recuperação parcial do salário mínimo e das aposentadorias. Isto
reativou o crescimento do consumo, mas a taxa de investimento, embora crescesse, os-
cilou entre os 18%-19% do PIB. A partir de 2003-2004 os estímulos internacionais da
elevada expansão da China (“efeito China”) e os decorrentes da aceleração da especulação
financeira internacional elevaram sobremodo os preços de quase todas as commodities,
beneficiando extraordinariamente nossas exportações primárias.
O dólar barato constrangeu as exportações de manufaturados e alargou o deficit comer-
cial nesses bens, diminuindo nossa competitividade externa e a participação desses produtos
na pauta exportadora. Esse debilitamento e mais a guerra fiscal entre as UFs, tem desestru-
turado nosso parque industrial, avançando o processo de desindustrialização. A participação
da indústria de transformação no PIB caiu ainda mais, atingindo 15,7% em 2010!
Ao mesmo tempo o forte aumento dos gastos externos pessoais e de remessas de em-
presas privadas provocaram crescentes deficits em transações correntes. Dada a elevada taxa
real de juros e a situação internacional, o buraco de nossas contas externas foi coberto por
uma enxurrada de dólares, com grandes sobras, aumentando nossas reservas, diminuindo
a dívida externa pública e criando a ilusão de que “nossa vulnerabilidade externa agora é
baixa”. Os otimistas “esqueceram” de analisar com mais responsabilidade nossos passivos
externos, e mais precisamente, os enormes investimentos externos em carteira. Pior ainda,
que o dólar barato também estimula a saída de capital nacional, atitude que também tem
sido apoiada pelo crédito do BNDES.
A crise internacional também nos pegou em 2008-2009, mas graças às políticas
“anticíclicas” implementadas – principalmente as grandes isenções e os largos prazos de
financiamento ao setor automobilístico e a expansão do crédito público para o setor habi-
tacional –, nos recuperamos a partir de fins de 2009.
O crescimento médio anual (2003-2010) do PIB foi de 4,4%, graças às taxas mais
altas da mineração (5,5%) e dos serviços (4,5%), dado que a agropecuária (2,2%) e a
indústria de transformação (2,8%) sentiram mais os efeitos da crise. Ainda assim, a ex-
pansão do consumo e das exportações primárias está criando a ilusão do crescimento, e da
hipótese de que a situação excepcional do mercado internacional perdure a longo prazo.
Chegamos, portanto, a um ponto de saturação desse modelo, mas “ninguém quer pôr o
guizo no gato”, ou “tirar o bode da sala”.
A boa média anual do crescimento do PIB entre 2003 e 2010 (salvo 2009) suscitou
no governo, nos economistas conservadores e nas elites, uma euforia, anunciando que a
“recuperação dos fundamentos” – o deficit público, o do comércio exterior e o menor ní-
vel de inflação –, nos levara ao crescimento “sustentado” (no sentido econômico, não no
ambiental). Que não teríamos mais nosso conhecido “voo da galinha”. Recusam-se a ver
que os “bons fundamentos” e os “maus e escorchantes juros” não recuperaram a estrutura
e o volume dos investimentos – notadamente do industrial –, e que nos mantemos em
crescimento, graças à excepcional situação do mercado internacional de commodities e à
ameaça de quebra de certos “fundamentos”, como o crédito contido e o gasto social e do
aumento do salário mínimo, do que às virtudes de nossa política econômica.
Não é preciso repisar os males sociais advindos da dinâmica do modelo neoliberal:
aumento do desemprego, queda dos salários reais, corte dos gastos sociais e aumento da
violência, hoje presentes em todas as nossas regiões e cidades. Assim, é inerente a essa
dinâmica, a corrosão (e não o equilíbrio) dos chamados fundamentos da economia, que,
fatalmente, a conduz a um desastre cambial e financeiro.

R . B . E S T U D O S U R B A N O S E R E G I O N A I S V. 1 3 , N . 2 / N OV E M B RO 2 0 1 1 43
N O V A S D E T E R M I N A Ç Õ E S

28 Em Cano (2010) apresen- Existem alternativas a esse modelo.28 Mas é preciso que se entenda que é impossível,
to as linhas gerais do que
seria um Projeto Alternativo
imediatamente, fazermos a reestruturação produtiva e da infraestrutura, dada a enorme
para o Brasil, com o vetor massa de recursos para isso exigidos. Assim, é preciso estabelecer prioridades nacionais;
principal do crescimento
voltado para a distribuição uma nova política de crescimento e um maior controle dos capitais e do comércio exterior,
de renda e de ativos e a ex- e um radical enfrentamento da questão social do país.
pansão do mercado interno,
não descurando contudo de Para tanto, necessitamos de muito tempo para fazê-lo, e de muita negociação polí-
retomar a atualização tec- tica. Acima de tudo, necessitamos reconstruir o estado e dotá-lo de recursos compatíveis,
nológica imprescindível para
recuperarmos e ampliarmos tanto para o saneamento estrutural fiscal quanto para a retomada do investimento públi-
nossas exportações de ma-
nufaturados.
co. Somente em uma alternativa como esta é que se pode pensar seriamente no trinômio
estabilidade, retomada do crescimento e resgate da dívida social. Somente com ela é que
se pode repensar a questão regional e a urbana em termos produtivos e sociais.

A Questão Regional no Período

Em termos regionais, continuou a ausência de Políticas de Desenvolvimento Re-


gional e os recursos públicos minguados, a despeito de que o principal órgão do desen-
volvimento regional – o Ministério da Integração Nacional – tenha se empenhado desde
2004 na formulação de planos regionais de desenvolvimento, os quais, apesar de sua boa
qualidade, não têm sustentação do contexto macro nacional, pela ausência de uma política
29 Para uma síntese crítica nacional de desenvolvimento.29
desses Planos, ver Guima-
rães (2006).
Contrapondo-se a essa crescente omissão do Estado, aumentou em muito o efetivo
poder político e econômico de grandes grupos privados, nacionais ou não, sobre alguns
importantes espaços do território nacional, mormente no NO, CO-DF e em algumas par-
tes do NE. Contudo, há que examinar o quanto suas ações se prendem fundamentalmente
ao objetivo de lucro e quanto delas resulta em benefícios para o desenvolvimento da região
em que atuam. O desmatamento do NO e do CO-DF, a precariedade do emprego urbano
e disseminação de centros urbanos de baixo padrão de qualidade, se não superam os efei-
tos positivos daquelas ações, é evidente que anulam boa parte deles.
Pelas Contas Regionais (CRs), o PIB do Brasil, entre 2003 e 2008 teria crescido à
média anual de 4,5% e o de SP 5,1%. Contudo, as mesmas CRs mostram que a partici-
pação de SP no total nacional cai de 33,8% para 32,0%. O mesmo ocorre na indústria de
transformação, em que a taxa do país foi de 3,8% e a de SP 4,7%, caindo de novo – sem
que se saiba a causa – a participação paulista, de 44,1% para 43,7%. Idêntico fato no
setor de serviços, com as respectivas taxas de crescimento de 4,8% e 5,5%, mas caindo a
participação paulista de 33,8% para 33,4%.
Um rápido exame das participações de cada região e Unidade da Federação (UF)
no total nacional mostra muitas outras contradições ou dados surpreendentes, como por
exemplo, o insignificante aumento da participação do CO-DF no PIB total (de 5,4% para
5,5%) e no da agropecuária (de 17,4% para 17,5%). Evidentemente há que examinar
cuidadosamente as CRs, comparar as mudanças entre as metodologias 1985 e 2002 e
compará-las com outras informações.
É evidente que a desconcentração produtiva continuou em todos os grandes seto-
res: é a consolidação da fronteira agropecuária do NO e do CO-DF – e do aumento da
ocupação dos cerrados da BA, PI e MA pelas commodities exportáveis, da consolidação da
província mineral de Carajás, da grande expansão do petróleo no RJ, ES e RN. Mesmo
porque a guerra fiscal continuou a funcionar a todo vapor. É preciso advertir que essa
“nova economia” tem sido equivocadamente chamada de especializações regionais, quando

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W I L S O N C A N O

na verdade se trata das conhecidas bases produtivas de recursos naturais. O termo especiali-
zação em economia tem um sentido claro como algo que decorre de um aprofundamento
da divisão social do trabalho, de algo não comum, como é uma commodity.
Por outro lado, precisamos entender que mesmo que venhamos a ter no futuro
longos períodos de firme crescimento, a expansão da periferia estará atrelada, em grande
medida, à região de São Paulo. Tanto porque não há sentido teórico nem prático em se
pensar em uma “industrialização autônoma” para o resto do Brasil. A exceção a esse pro-
cesso reside na “autonomia” regional ganha por algumas áreas do país, com a expansão de
produção destinada a exportações (notadamente de commodities) e à produção energética,
como o álcool de cana, o petróleo e a hidroeletricidade.
Contudo, à medida que o mercado interno cresça espacialmente e possa ser ampara-
do por uma infraestrutura adequada e dissemine economias de escala e externas – ambas
no sentido produtivo e tecnológico – para a industrialização, esta seguirá se desconcen-
trando. Pistas para essas possibilidades podem e devem ser buscadas por meio da análise
dos dados do comércio inter-regional e das estruturas produtivas regionais. Os últimos
dados que pude acessar sobre esse comércio são para 1999 e eles mostram que suas expor-
tações para o restante do país equivaliam a 45% do PIB paulista e as importações a 34%,
afluxos que representavam o dobro de seus fluxos de comércio exterior.
Isto não elimina a necessidade de se discutir e implantar medidas específicas de
crescimento ou que possam atenuar ou corrigir os desequilíbrios regionais e sociais mais
gritantes existentes no país. É óbvio que esforços no sentido de alocação de projetos em
outras áreas do país devem e podem ser feitos por meio de programas e projetos de im-
pacto detalhados de forma “mais fina”. Os de recursos privados, contudo, em sua busca
por maiores “vantagens locacionais”, ajudaram a aumentar a suicida “guerra fiscal” entre
estados brasileiros, promovendo verdadeiros leilões de localização.
A desconcentração no sentido São Paulo para o restante do país, se mantida a política
neoliberal, continuará tendo um alto componente espúrio, e padecerá, crescentemente,
dos efeitos perversos que a desestruturação industrial está causando. Tais efeitos não só
têm prejudicado ainda mais a economia paulista, como também afetam o parque indus-
trial nacional, destruindo cadeias produtivas e inibindo economias de escala e externas.

A Questão Urbana no Período

A taxa de crescimento da população total caiu fortemente entre os períodos 1991-


2000, quando foi 1,61% e o de 2000 e 2010, quando atingiu 1,18%. Redução ainda
mais drástica deu-se na taxa de crescimento da população urbana, caiu de 2,44% para
1,57%. Enquanto nossa população rural diminuía em 2 milhões, a urbana crescia mais 23
milhões. A redução daquelas taxas se deu em todas as regiões e UFs, sendo as taxas mais
altas, respectivamente a total e a urbana, as do NO (2% e 2,6%) e CO-DF (1,8% e 2,1%).
Por corte de tamanhos de cidades, Campinas-SP e São Luis-MA aumentam para 15
o número de cidades milionárias e o de cidades entre 500 mil e 1 milhão passa de 18
para 23, das quais estão 7 no NE e 6 em SP. Contudo, a expansão foi maior no número
de cidades médias e pequenas, pelo fato de seu crescimento demográfico continuar a ser
maior do que nas grandes, e ainda devido à criação de 58 municípios na década.
Cabe aqui repisar uma questão importante, mas que tem sido menos considerada
nos estudos propositivos para as cidades médias e pequenas, em termos de políticas so-
ciais. Não se pode esquecer que suas dinâmicas de crescimento e a forma que ele assume

R . B . E S T U D O S U R B A N O S E R E G I O N A I S V. 1 3 , N . 2 / N OV E M B RO 2 0 1 1 45
N O V A S D E T E R M I N A Ç Õ E S

decorrem de suas inserções nas redes urbanas principais ou mais relevantes de que fazem
parte. O que se pode ver nos dados existentes, é que as cidades de porte médio e grande
têm assimilado os efeitos perversos das maiores e das RMs, muitas vezes sem assimilar
seus principais efeitos positivos. Assim, o sentido dessas propostas de políticas públicas
é parcial, aparentemente esquecendo que a massa maior daqueles problemas se encontra
nas maiores.
A taxa de urbanização atingiu 84,4% para o Brasil, próxima à do Sul (84,9%). As
do NO e NE subiram, de cerca de 69% para 73% tornando territorialmente menos con-
centrado o processo de urbanização.
Até agora (junho de 2011) foram poucos os dados divulgados do Censo de 2011,
razão pela qual o tema urbano, neste tópico, será bem menos tratado. Para as migrações,
usei provisoriamente os dados de várias PNADs (de 1999 a 2009) apenas para ter algumas
informações que me possibilitassem conhecer pelo menos a “tendência” ao longo do pe-
ríodo. Com esses dados, pude fazer o seguinte resumo, que deverá ser confrontado pelos
dados do Censo:
s as entradas no NO e no CO-DF devem ter se mantido em torno de, respectivamente,
300 mil e 500 mil pessoas, com pequena diminuição no NO. As saídas do CO-DF
tiveram pequeno aumento, mas as do NO aumentaram em 100 mil, diminuindo sua
capacidade receptora;
s as entradas em SP teriam sido fortemente reduzidas, de 1,7 milhões na década anterior,
para cerca de 650 mil nesta, também diminuindo a capacidade receptora. Os imigran-
tes do NE teriam somado 330 mil e os de MG, 200 mil;
s as saídas do NE tiveram forte redução, caindo de 2,3 milhões para 1,1 milhão nos
mesmos períodos. Esse fluxo teria um destino majoritário para o NO, CO-DF e SP,
distribuído em proporções semelhantes pelas três regiões;
s de MG, as saídas aumentaram muito, passando de 127 mil para 350 mil;
s as do PR caem, de 366 mil para 150 mil, dando a entender que sua reestruturação
agrícola e agrária tenha sido concluída.
Aparentemente, os fluxos neste período, teriam tido um destino muito mais urbano
do que rural, mas isto requer o exame aprofundado dos dados censitários de 2010, tanto
os migratórios quanto os de emprego. Vejamos dois fatos. O maior fluxo de emigrantes
nordestinos se dirigiu a SP, onde a população rural diminuiu em 760 mil pessoas, número
maior do que o total de imigrantes do estado e o dobro do de nordestinos. Em GO tam-
bém diminuiu a população rural (menos 23 mil pessoas), mas o fluxo de nordestinos teria
sido em torno de 180 mil. Em MS e MT a população rural aumentou pouco mais de 6%
com números absolutos bem próximos aos dos imigrantes.
Já na região NO, em que a população rural aumentou 8% (309 mil pessoas) o fluxo
nordestino (cerca de 300 mil pessoas) distribuiu-se entre todos os estados que também
ampliaram a população rural, e se concentraram no PA (cerca de 180 mil). Neste estado,
fiz um teste sobre a região Sudeste, que foi a que mais cresceu – em termos econômicos
e demográficos – mas que se caracterizou pela forte presença da mineração em Carajás,
da pecuária latifundiária e da subsistência rural. Dado o pouco emprego gerado pela
mineração e pela pecuária, é surpreendente que 90% do crescimento da população total
foi urbano.
Estes fatos apontam para a grande diversidade das determinações regional e urbana
que ocorreu nos últimos períodos, tanto em termos econômicos, quanto ocupacionais e
demográficos, o que está exigindo uma série de pesquisas específicas para tentar explicar

46 R . B . E S T U D O S U R B A N O S E R E G I O N A I S V. 1 3 , N . 2 / N OV E M B RO 2 0 1 1
W I L S O N C A N O

esses fatos e, quiçá, poder estimular a elaboração e posta em prática de políticas públicas
para enfrentar os graves problemas regionais e urbanos do país.
É sabido que vários indicadores sociais no Brasil têm melhorado, mas não se sabe o
quanto dessa melhora se deve à efetividade de políticas públicas e quanto ao fato de que
nossa estrutura etária mudou muito, diminuindo fortemente certas demandas sociais. Por
exemplo, quanto da “melhoria” do grau de atendimento educacional nos últimos 20 anos
se deve à política educacional e quanto se deve ao simples fato de que entre 1991 e 2010
o número de crianças com menos de 10 anos de idade se reduziu em 15%, ou seja, porque
temos hoje 5,2 milhões delas a menos.
Contudo, e pensando no futuro, já ingressamos, há vários anos, em um processo que
nos está conduzindo a um expressivo amadurecimento e envelhecimento da população bra-
sileira, e isto nos traz a certeza de que no futuro teremos duas questões muito importantes
que deveriam, desde já, ser analisadas:
s as demandas sociais estão crescendo e vão crescer ainda mais, pois o grupo etário maior
de 60 anos dobrou, aumentando em 10 milhões de pessoas, e isto pressiona fortemente
os gastos com saúde, assistência social e previdência, muito mais do que se fossem 10
milhões de crianças;
s o grupo entre 14 e 65 anos cresceu 46% ou 39 milhões de pessoas em idade de traba-
lhar, e também crescerá ainda mais nos próximos anos, pressionando energicamente o
mercado de trabalho.

PROPOSTAS DE INVESTIGAÇÃO

As propostas de pesquisa que seguem terão a periodização aqui anunciada, ou, quan-
do for o caso, terão uma periodização específica.

As Questões de Ordem Geral

Em termos macroeconômicos, há uma questão central que decorre da sustentabilida-


de econômica do atual modelo, à qual já me referi. Ou seja, é preciso fazer uma reflexão
crítica sobre as circunstâncias atuais da economia internacional e sobre as condições inter-
nas. A médio prazo, que desfecho ou que rumos poderão ter a crise financeira internacio-
nal? Qual a duração provável do extraordinário boom dos preços das commodities? Idem,
quanto ao chamado “efeito China”? Creio que enquanto essas questões não sofrerem
alterações profundas, tampouco será possível repensar sobre a integração sul-americana.
Não se trata aqui de fazer pesquisa propriamente dita, mas sim de refletir sobre os
caminhos e cenários mais prováveis e, daí, pesquisar os efeitos que deles emanariam sobre
as dinâmicas de crescimento nacional e regional e do processo de urbanização.
Arrisco um exercício de simulação: que diferenças substanciais teríamos naquelas
dinâmicas, se fizéssemos uma radical mudança em direção mais ao mercado interno e à
redistribuição de renda, e menos à manutenção da abertura comercial e financeira?
Mas há ainda pesquisas que tanto cabem em termos nacionais quanto regionais, por
exemplo, a da desindustrialização e a guerra fiscal, às quais voltarei no item seguinte. Será
útil um mapeamento das principais políticas públicas criadas ao longo dos períodos de
análise, em especial as de infraestrutura geral e urbana, as principais políticas sociais e as
poucas medidas de caráter regional ou urbano.

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Sobre a Questão Regional

30 Cano (2008). A pesquisa a que me referi30 e que estou usando largamente neste texto, informa
várias questões sobre as novas determinações, particularmente as emanadas do aparelho
produtivo, que vem sofrendo alterações estruturais ao longo do período 1970-2003. Con-
tudo, é preciso examinar outras, que não foram objeto daquela pesquisa ou que, por suas
especificidades, foram tratadas de modo parcial ou pouco detalhado.
A guerra fiscal e a desindustrialização, embora já tenham sido objeto de vários es-
tudos e pesquisas, se ressentem ainda da falta de dados concretos sobre seus efeitos. São
exemplos: que fins esses processos têm sobre os custos de inversão e de produção e da
rentabilidade privada? Eles seriam rentáveis e competitivos sem os incentivos recebidos?
Em que medida estes investimentos incentivados pela guerra fiscal são do tipo footloose,
e, portanto podem ter uma temporalidade mais curta? As destruições causadas por esse
processo e pela desindustrialização são reversíveis? Sob que condições? Lideranças empre-
sariais desaparecidas, empresas falidas ou alienadas, elos eliminados de cadeias produtivas,
mercados externos perdidos, podem ser facilmente recriados?
Ainda, pode-se especular sobre a Zona Franca de Manaus, instituição peculiar, pois
que, como Zona Franca, deveria ser exportadora líquida para o exterior, mas que na
realidade é deficitária, desde sua origem. Se o modelo macroeconômico nacional fosse
alterado, diminuindo drasticamente a abertura e desvalorizando o câmbio, haveria condi-
ções para sua reversão?
Os dados do comércio interestadual depois de 1985 ficaram ainda mais precários
propositadamente ocultos ou de pobre informação, face aos problemas políticos gerados
por sua divulgação, frente à guerra fiscal. Os do comércio exterior de cada UF são for-
necidos pelo Ministério do Desenvolvimento, para o período posterior a 1989 e foram
objeto de recente pesquisa que analisou seus impactos estruturais sobre a economia e a
urbanização das várias UFs, mas requerem ainda um aprofundamento analítico sobre o
emprego e a renda, e, no período posterior a 2003, sobre o efeito negativo do crescimento
31 A pesquisa referida é desproporcional das importações.31
a da Tese de Livre Docên-
cia de Fernando M. Mota
Essa pesquisa mostra, por exemplo, que as exportações do PA representam 90%
(2010) que mostra forte das do NO, mas as importações do Amazonas (ZFM) totalizam cerca de 90% da região,
elevação dos coeficientes
de exportação e de importa- mostrando impactos distintos nesses dois estados. Indica ainda que as exportações de pro-
ção. Contudo, as mudanças dutos básicos em recursos naturais têm elevado peso no total exportado pelo NO (80%),
metodológicas das CRs, al-
terando valores e estrutu- NE (60%) e CO-DF (905%). Já os produtos industriais predominam nas exportações do
ras dos PIBs regionais e a Sul e SP, e as importações de manufaturados estão fortemente presentes em praticamente
valorização cambial podem
distorcer muito os valores todas as UFs.
desses coeficientes. Os da-
dos anteriores a 1989 estão
Essas e as questões abaixo devem constituir uma pesquisa sobre as determinações do
contidos em antigas publica- crescimento regional:
ções do IBGE ou do Banco
Central, mas envolvem pro-
s principalmente para o período mais recente, analisar as mudanças nas estruturas pro-
blemas metodológicos sobre dutivas e de emprego das regiões;
a origem estadual de várias
dessas exportações. s a expansão da produção nas áreas de fronteira agropecuária e mineral: regiões NO,
CO-DF e os cerrados da BA, PI e MA;
s a forma e os resultados da profunda reestruturação agrária e agrícola que se verificou
nos estados do PR e RS, com a implantação e expansão do complexo soja-trigo;
s surgimento ou expansão de novos pontos de concentração de atividades que não
existiam em seus respectivos novos espaços. São exemplos: a forte expansão da ativi-
dade petrolífera nas regiões norte fluminense, sul do ES, e litoral de SE e do RN; a

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maturação da fábrica da Fiat em MG, os novos polos automobilísticos do RS, PR, BA


e GO; a fruticultura de Petrolina-Juazeiro; o polo calçadista do CE; perspectivas para
o polo de Suape (PE). Examinar ainda os investimentos no RN, CE e PE da ordem de
25 bilhões para energia eólica, aumentando a participação dela na matriz energética
de 1,3% para 5,3% até 2014;32 32 Valor Econômico,
28/04/2011.
s pesquisar a articulação de novos investimentos em minérios e para além dos mi-
nérios pela Vale na região Norte, provocando efeitos espacialmente diferenciados;
retomada dos grandes projetos hidrelétricos; expansão das usinas de biocombustí-
veis (etanol);
s estudo especial deve ser feito sobre e Zona Franca de Manaus, implantada em 1967
e que vai amadurecendo a partir da década de 1980;
s aprofundar estudo dos principais impactos espaciais da expansão do comércio exte-
rior na década, notadamente de commodities (soja, carnes e minérios);
s idem quanto ao comércio inter-regional, cujos dados são muito precários para esse
período;
s principais efeitos da guerra fiscal sobre as estruturas de custos de produção e compe-
titividade com empresas que não foram incentivadas. Sua continuidade será capaz de
confirmar as teses sobre fragmentação da economia nacional? ;
s idem quanto à desindustrialização e principais efeitos destrutivos de cadeias produtivas,
mormente nos setores automobilísticos e de eletrônica.

Sobre a Questão Urbana

Existem muitos trabalhos publicados sobre essas questões, mas é indispensável


a realização (ou aprofundamento) de análises de vários problemas que ocorreram no
período.33 As dificuldades com o necessário processamento dos Censos Demográficos 33 Dos trabalhos mais ge-
rais cabe citar: IPEA-NESUR
de 1980 e de 1991 constituem sérios obstáculos, alguns dos quais talvez possam ser (2001), IBGE (2008) e IPEA
solucionados com o uso de fontes alternativas, usadas com muita cautela. Como prin- (2011).

cipais fatos a pesquisar:


s a expansão, extensão e o aumento da densidade da urbanização foram espacialmente
diferenciados, e, portanto é preciso fazer um mapeamento dos principais focos de
expansão e tentar, com o auxílio das pesquisas aqui apontadas, esclarecer suas deter-
minações. Como exemplos disto: a forte expansão e concentração urbana em Manaus;
a elevada expulsão de trabalhadores e pequenos proprietários rurais do PR; o início da
ocupação rural e mineral no Sudeste do PA, e outros;
s as principais mudanças na estrutura do emprego regional (se necessário, com recortes
sub-regionais) emanadas das transformações produtivas tratadas neste tópico;
s examinar as mudanças da estrutura espacial da distribuição de renda;
s aprofundar a análise do setor de serviços (via Censo Demográfico), e a interdepen-
dência direta e indireta deste fato com as mudanças produtivas. Em outras palavras:
indagar que mudanças no emprego – especialmente do urbano – e na oferta/demanda
de serviços, que foram geradas pela expansão da fronteira agropecuária ou pelos fatos
especiais ocorridos na década (Zona Franca de Manaus, petróleo no RJ, ES, SE e RN;
principais polos automobilísticos etc.);
s aprofundar os estudos das migrações inter-regionais para poder relacioná-las com as
grandes mudanças produtivas acima referidas. Em alguns estados – como no PA, exa-
minar as migrações intrarregionais recentes;

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s fazer um mapeamento dos assentamentos de reforma agrária para entendê-los como


novos componentes desses movimentos demográficos regionais;
s utilizar as pesquisas disponíveis sobre rede urbana, para localizar e separar, nas UFs, os
efeitos decorrentes de metropolização, aglomeração, conurbação e periferização;
s confrontar via Censos e outras fontes, indicadores sociais urbanos nos espaços das UFs
e em seus respectivos espaços realçados nestas pesquisas, em especial os indicadores
vinculados ao tema do saneamento básico (água, esgoto, lixo e meio ambiente);
s exame sumário da situação das finanças públicas municipais: capitais, RMs e cidades de
maior relevância para a urbanização do período;
s exame circunstanciado da expansão do setor imobiliário e estudos sobre a questão
habitacional (questão fundiária: produção e uso de solo urbano).

ALGUNS PROBLEMAS METODOLÓGICOS


Por último, cabe advertir que existem vários problemas de ordem metodológica e de
informação, para os quais devemos estar alertas e tentar, na medida do possível, contorná-
los. Entre os principais, cabe destacar os seguintes:
s a difícil e, em alguns casos impossível compatibilização (não só de caráter espacial)
entre as PNADs e os Censos Demográficos;
s idem, quanto às Contas Regionais e os Censos Agrícolas, as PIAs e as PINPFs no pe-
ríodo pós 1985, que comumente apresentam dados controvertidos entre essas fontes,
especialmente com relação à desconcentração produtiva regional;
s o fato de que as PNADs só a partir de 2004 apresentam dados sobre a zona rural da
região Norte;
s o fato de que os dados do comércio inter-regional têm divulgação precária e muito
interrupta, embora os dados primários estejam centralizados no Confaz;
s para o movimento e estrutura do emprego, embora a RAIS seja anual, só abarca o
emprego formal; para o emprego total praticamente só contamos com os Censos De-
mográficos (decenais), dados os problemas de compatibilidade já apontados para com
as PNADs;
s as Contas Nacionais e as Regionais têm sofrido recentemente várias mudanças metodo-
lógicas que muitas vezes alteram fortemente dados passados já divulgados e analisados.
Por outro lado, a forte valorização cambial que padecemos desde 1994 certamente
alterou muitos preços relativos e os próprios coeficientes de comércio exterior;
34 Sempre que não existam,
naquele recorte espacial, s com relação às PIAs, embora o IBGE proporcione tabulações especiais (nacionais ou
pelo menos três estabeleci-
mentos do mesmo segmen-
regionais) detalhando os dados a 3 ou mais dígitos, ele não evita o problema do sigilo
to produtivo. estatístico,34 tornando, em muitos casos, inviável o uso daqueles dados.

Wilson Cano é professor ti-


tular do Centro de Estudos de REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Desenvolvimento Econômico
do Instituto de Economia/Uni-
camp. Email: wcano@eco. ANDRADE, T.; SERRA, R. “Notas sobre a experiência de crescimento recente das Ci-
unicamp.br dades Médias Brasileiras”. In: KON, A. Unidade e Fragmentação: a questão regional no
Artigo recebido em agosto Brasil. São Paulo: Perspectiva, 2002.
de 2011 e aprovado para
publicação em outubro de
AFFONSO, R.B.A.; SILVA, P.B. (Orgs.) Federalismo no Brasil – desigualdades regionais
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Abstract Between 1930 and 1980, urbanization process, domestic market in-
tegration and regional development in Brazil were basically determined by the combination
of industrialization process, macroeconomic and regional development policies. After 1980,

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as a result of the so called “Lost decade” and the implementation of neoliberal policies, those
determinants were significantly modified by the new paths of external insertion, overvalued
exchange rate, high interest rates, and “fiscal war” between regions. Beyond those weakened
previous determinants, new ones have aroused; some are national and others specific to each
region. Despite the changes in the determinants mentioned above, the harmful side-effects of
the economic growth and urbanization processes have affected the whole national territory. As
a conclusion, the article proposes a Research Agenda focused on regional and urban subjects
for the period 1980-2010 in order to better understand how those determinants have affected
these processes.

Keywords Regional development; urbanization; new determinants; fiscal war;


Brazil’s international position.

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