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DOI: 10.46943/IX.CONEDU.2023.GT10.

024

JOVENS E ADULTOS COM


DEFICIÊNCIA INTELECTUAL NOS
CIEJAS PAULISTANOS: DESAFIOS DE
EDUCAR PARA O TRABALHO

ADRIANA FERNANDES DA SILVA


MARIA DE FÁTIMA CARVALHO

RESUMO
Este trabalho apresenta excerto de pesquisa de mestrado já qualificada, em desenvol-
vimento em instituição pública, sobre a inclusão social educacional de estudantes com
deficiência intelectual na Educação de Jovens e Adultos (EJA), a qual investiga a proposta
educacional orientadora do Centro Unificado de Educação de Jovens e Adultos (CIEJA),
na cidade de São Paulo, com o objetivo de compreender e apontar limites e possibilidades
de realização da preparação deste público para o mundo do trabalho conforme projeto da
instituição. Para efeito desta apresentação discute a perspectiva de professoras sobre
o objetivo educacional constante no projeto do CIEJA de preparação desses estudantes
para o mundo do trabalho na relação com concepções de deficiência intelectual, EJA e
preparação para o trabalho expressas pelas entrevistadas. A fundamentação teórica e
a análise de dados têm como base contribuições de estudos de políticas e história da
educação de jovens e adultos no Brasil com ênfase na educação especial e inclusiva e as
contribuições da teoria histórico-cultural de Vygotsky e colaboradores sobre a educação
e o desenvolvimento de pessoas com deficiência intelectual. Este trabalho enfoca a pro-
posta de uma unidade educacional e ressalta aspectos de seu fazer atual, assim como
recorre a entrevistas semiestruturadas realizadas com oito professoras de um CIEJA
do município. Com base em uma abordagem qualitativa descritiva, as análises buscam
a articulação entre documentos estudados e dizeres de professoras sobre a educação
para o mundo do trabalho problematizando e refletindo os desafios que determinam a
realização desse objetivo social educacional em sua relação com as práticas de inclusão
desses estudantes e, nesse contexto, de sua preparação para o mundo do trabalho.
Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos(EJA), CIEJA, Trabalho, Deficiência
Intelectual, Teoria Histórico-cultural.

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INTRODUÇÃO

A
educação é um direito fundamental assegurado pela Declaração Universal
dos Direitos Humanos (ONU, 1948) com a premissa de garantir os direitos
essenciais para construção de uma sociedade mais justa, igualitária e eman-
cipatória. Quando tratamos do campo educacional, nos deparamos com um longo
processo de exclusão, em que historicamente os mais pobres não tinham acesso à
escolarização. Segundo Gentili (2009), o processo de escolarização é marcado por
uma dinâmica de exclusão includente, repleta de avanços e retrocessos e, para um
avanço mais efetivo, é fundamental contarmos com decisões políticas em prol de
ações efetivas de inclusão.
O direito à educação para todos é algo recente no Brasil; por muito tempo, a
educação escolar em nosso país foi um privilégio para poucos, já que o acesso aos
bancos escolares era privilégio das pessoas pertencentes a uma elite política e eco-
nômica (ARAUJO, 2020). A seleção, baseada na ordem social, excluiu por muitos
anos as famílias pobres, os negros, as pessoas com deficiência, e o resultado desse
processo de exclusão é a quantidade de pessoas que não se alfabetizou ou que se
alfabetizou, porém, não conseguiu concluir a educação básica e não conseguem.
Como sabemos, a Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948),
promulgada há mais de 70 anos, define no artigo 26 que todo o ser humano tem
o direito à educação gratuita e orientada para o pleno desenvolvimento da perso-
nalidade humana. Posteriormente, a Constituição da República Federal do Brasil
(BRASIL, 1988) reafirma o direito à educação.
É por meio do direito social fundamental à educação que outros direitos
sociais podem ser alcançados pelo cidadão. O direito a uma educação de qualidade
pressupõe que a escola seja um local privilegiado para assegurar a aprendizagem de
todos, independentemente de gênero, etnia/raça, classe social, orientação sexual,
religião, convicção política, deficiência, idade ou nacionalidade.
Nessa perspectiva, há os estudantes da Educação de Jovens e Adultos que
não concluíram os seus estudos na “idade certa” ou não conseguiram permanecer
na escola por inúmeros motivos, seja pela violação do direito à educação na infância
ou na adolescência em virtude de preconceitos, distância de escolas, necessidade
de trabalhar para ajudar no sustento da casa ou mesmo por não terem tido êxito na
aprendizagem, o que causou reprovações”, como afirma (Di Pierro 2017 p.11).

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A cidade de São Paulo mesmo sendo uma grande metrópole ainda possui um
número expressivo de pessoas que não concluíram os seus estudos. A expressivi-
dade do problema na metrópole resulta na oferta de cinco formas de atendimento
de EJA, sendo que os Centro Integrados de Educação de Jovens e Adultos - os
CIEJAs são centros exclusivos de atendimento a jovens, adultos e idosos, atingindo
um grande número de pessoas com deficiência acima de 15 anos de idade. De
acordo com os dados de outubro de 2022 da Divisão de Informações Educacionais
(DIE) da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo os CIEJAs contavam com
8.209 estudantes matriculados; desse total, 716 possuíam algum tipo de deficiência
e, entre esses estudantes, 482 têm o diagnóstico de deficiência intelectual, o que,
por seguinte, justifica a nossa opção pela investigação dessa forma de atendimento.
Quando falamos do estudante com deficiência da EJA estamos tratando
de um processo de dupla exclusão. Essa dupla exclusão se dá pelo fato de que
esse estudante que está matriculado na EJA já foi excluído por diversos motivos
já citados e pelo fator da deficiência. O processo de inclusão educacional ainda é
muito recente em nosso país e, desta forma, é possível afirmar que muitos desses
estudantes com deficiência que chegam à EJA são pessoas que passaram por um
período em que o acesso não estava assegurado pela legislação.
Historicamente, as pessoas com deficiência eram tratados à margem da
sociedade, experimentando várias formas de exclusão, sendo considerados como
inválidos e incapazes. Dentre as legislações que estabelecem direitos e demar-
cam a transformação de um cenário mundial de exclusão social e, principalmente,
educacional essas pessoas, é possível citar as Declarações de Jontiem (1990), de
Salamanca (1994), Lei de Diretrizes e Bases 9.394/1996 e o Decreto nº 3.298, de
1999, entre outros (GARRIDO, Del-Masso; SILVA, 2017, p.7). As mudanças legais,
embora incidam sobre a sociedade, não são o suficiente para uma transformação
mais potente dos modos sociais de organização e o processo de exclusão vivido pela
pessoa com deficiência vai se (re)configurando histórica e socialmente, de tal forma
que essa população vai sendo sistematicamente excluída dos processos sociais de
educação e trabalho e diferentemente de uma pessoa que não teve acesso à edu-
cação formal, mas acessou o mercado de trabalho por meio da construção civil, do
serviço de limpeza, ou como vendedor informal, entre outras funções/ profissões
que não exigem o domínio da leitura e escrita, o jovem e o adulto com deficiência
intelectual, é totalmente excluído do mundo do trabalho o que cria impossibilidades
de ordem estrutural e permanente, predominando em sua relação com a sociedade
uma “lógica de exclusão” (RUAS, 2018, p.21).

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Nesse contexto, é possível conceber que para a pessoa com deficiência
intelectual adulta, as possibilidades de participação e inserção social são mais limi-
tadas. Nesse sentido, faz-se necessário que a escola amplie suas possibilidades
de inclusão social por meio da educação integral e favoreça a interação social, a
ampliação de vínculos, o acesso às diversas formas de cultura e ao mundo do tra-
balho (CARVALHO, 2006 p. 183).
Não há dúvida que é preciso compreender quem são esses sujeitos e reco-
nhecê-los como estudantes da EJA para que a educação de jovens e adultos possa
ressignificar o seu papel, reconhecendo não apenas as especificidades desse público,
mas também, neste processo de seu reconhecimento como sujeitos de aprendizagem,
criando oportunidades de emergência e ampliação de possibilidades de aprendiza-
gem e inclusão educacional-social. Nesta perspectiva, a educação formal cresce em
importância para que se possa cogitar o acesso ao mundo do trabalho.
Estamos então, diante de um cenário que exige atenção política e pedagógica,
pois como afirmam Fernandes e Oliveira (2017), a presença do estudante que é, ao
mesmo tempo, público da EJA e da Educação Especial é complexa, por se tratar da
articulação de duas modalidades de ensino que tradicionalmente não são prioridade
para os sistemas de educação escolar. (FERNANDES; OLIVEIRA, 2017, p.288).
Com a publicação do Plano Nacional de Educação (2001), os jovens e adultos
com deficiência foram direcionados para a EJA. O PNE (2001), ao tratar sobre a
Educação Especial, reconhece a importância da integração das pessoas com defi-
ciência na sociedade e no âmbito educacional, determinando que a escola seja um
espaço integrador, inclusivo e aberto para a participação social.
É da perspectiva acima descrita de necessidade de atenção à inclusão dessa
população nos CIEJA paulistanos que este artigo apresenta um recorte de pesquisa
de mestrado, já qualificada e em vias de conclusão, buscando compreender e apon-
tar limites e possibilidades de realização da preparação deste público para o mundo
do trabalho conforme projeto dos CIEJA. Neste artigo é nosso objetivo apresentar
a perspectiva de professoras sobre o objetivo educacional constante no projeto do
CIEJA de preparação desses estudantes para o mundo do trabalho na relação com
concepções de deficiência intelectual, EJA e preparação para o trabalho, expressas
pelas entrevistadas.
Neste artigo, destacamos o que dizem as professoras entrevistadas e o que
podemos depreender de como entendem esses objetivos quando os relacionam
à educação inclusiva e à relação entre ensino e aprendizagem. A reflexão sobre o

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tema é pautada nos estudos de Vigotski(2019), autor que define o desenvolvimento
como um processo social, atribui enorme importância à educação escolar e, desta
perspectiva, ao ensino e ao professor. Suas ideias nos fazem compreender e ques-
tionar o papel social da escola e também os entendimentos dos professores em um
projeto que atribui à escola o papel de preparar estudantes com deficiência intelec-
tual para o trabalho, projeto que amplia a ideia de educação inclusiva e exige uma
posição inclusiva na compreensão da relação entre os processos de aprendizagem
e desenvolvimento na escola
Tomamos como base as ideias de Vigotski(2001) sobre o desenvolvimento
humano como processo social e a obra Fundamentos da Defectologia (2019), onde
o autor trata das dimensões orgânicas-biológicas e socioculturais da criança nor-
mal e da criança com defeito, assim como da complexidade do funcionamento do
psiquismo humano e dos diversos modos e vias de constituição do ser humano.
De acordo com Vigotski(xxxx) as pessoas com Deficiência Intelectual podem
se desenvolver significativamente por meio das interações sociais no ambiente de
trabalho, desde que sejam valorizadas as suas potencialidades como sujeito social
(SILVA, et al., 2019). Nesse sentido, a escola encontra vários desafios ao tratar sobre
os seguintes assuntos: educação para o trabalho que vise a integração e partici-
pação social; a diversidade, a inclusão e diversidade. Para que a escola avance se
faz necessário um currículo flexível que favoreça o aprendizado de todos, com o
fortalecimento da formação continuada dos docentes para que estejam preparados
para compreender as necessidades de seus estudantes e assim instrumentalizando
seus estudantes para as necessidades do mundo do trabalho (DEL-MASSO, 2012)
segundo a autora é papel da escola o seu preparo acadêmico para o futuro profis-
sional, ou seja para o mundo de trabalho e para o próprio envelhecimento humano
(DEL-MASSO, 2012 p. 426).
Segundo o Dicionário de Ciências Sociais a expressão mercado de trabalho,
está relacionada a oferta e a procura de mão-de-obra em âmbito restrito ou global,
tipos de mão-de-obra.A expressão mundo do trabalho de maneira complexa, ou
seja, uma noção que abarca diferentes tipos de conhecimentos e que tem o intuito
de informar o indivíduo não somente a respeito do trabalho em si, mas o de informar
sobre sua autonomia e, porque não dizer, prepará-lo para a auto-suficiência. (DEL-
MASSO, 2000, p. 50-51)
As teses vigotskianas do desenvolvimento social - histórico-cultural é central
na explicação do desenvolvimento de todas as pessoas e seus escritos continuam

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contribuindo com as pesquisas e discussões nos dias atuais acerca do desenvol-
vimento das pessoas em situação de exclusão e desigualdade social, quando a
realidade social as torna vulneráveis. É nessa direção que as ideias vigotskianas
embasam a pesquisa sendo articulada às contribuições de pesquisadores da histó-
ria da educação de pessoas com deficiência, da EJA e da relação trabalho educação
no âmbito da educação de jovens e adultos.

METODOLOGIA

A pesquisa realizada foi de natureza exploratória com base na abordagem


qualitativa descritiva, as análises buscam a articulação entre documentos estuda-
dos e dizeres de professoras via entrevistas semi estruturadas sobre a educação
para o mundo do trabalho problematizando e refletindo os desafios que determi-
nam a realização desse objetivo social educacional em sua relação com as práticas
de inclusão desses estudantes e, nesse contexto, de sua preparação para o mundo
do trabalho. As pesquisas exploratórias têm como principal finalidade desenvolver,
esclarecer e modificar conceitos e idéias, tendo em vista a formulação de problemas
mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos posteriores(GIL, 2008 p.27)
A base teórica e a abordagem metodológica nos trazem elementos impor-
tantes para a reflexão sobre o papel do Projeto Político-Pedagógico dos CIEJA
paulistanos na educação desses jovens e adultos, tendo em vista a preparação para
o acesso aos conteúdos sobre o mundo do trabalho visando o ingresso e permanên-
cia no mercado do trabalho, quando compreendemos a centralidade do trabalho no
desenvolvimento social dos sujeitos.
As ações realizadas no desenvolvimento da pesquisa, de outubro a dezembro
de 2022 foram: solicitação de autorização do comitê de ética da universidade e da
escola escolhida como campo de pesquisa para realização do trabalho e submissão
do projeto as professoras juntamente com convite à entrevista e apresentação de
termos de consentimento livre esclarecido; estudo das contribuições de Vigotski
e de pesquisadores que abordam a educação de adultos com deficiência intelec-
tual na EJA; revisão bibliográfica, estudo de documentos curriculares do município
de São Paulo com base na relação com documentos nacionais, estudo do Projeto
Político Pedagógico de uma unidade de CIEJA e realização de entrevistas semies-
truturadas com oito professoras, da escola no campo de pesquisa, transcrição das
entrevistas e discussão de dados construídos.

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Por se tratar de projeto de mestrado, a pesquisa foi aprovada pelo comitê
de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de São
Paulo - UNIFESP para, as entrevistas foram realizadas após assinatura do termo
de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Participaram do estudo oito pro-
fessoras, sendo duas do primeiro segmento1 (Módulos I e II), quatro do segundo
segmento (módulos III e IV) da EJA e duas professoras do Atendimento Educacional
Especializado. As professoras foram identificadas como A, B, C, D, E, F, G e H, res-
pectivamente, para a análise das entrevistas. Apresentamos abaixo um quadro
descritivo das participantes.

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

1 O primeiro segmento da EJA corresponde aos anos iniciais da educação básica. A subdivisão do
Ensino Fundamental de nove anos em quatro etapas. A Módulo I - Etapa de Alfabetização com-
preende os três primeiros anos (1º, 2º e 3º); o Módulo II- Etapa Básica envolve os dois anos seguintes
(4º, 5º); a Módulo III - Etapa Complementar compreende os 6º e 7º anos e a Módulo IV- Etapa Final
que abarca os anos nais (8º e 9º).

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As entrevistas foram realizadas tendo como objetivo compreender como
a EJA é concebida na escola e por cada professora. Como a unidade concebe a
educação de jovens, adultos e idosos no seu território2, e de que forma o projeto
do CIEJA articula com as propostas elencadas no Projeto Político-Pedagógico no
ano de 2022 da unidade pesquisada, e como esse planejamento colabora com a
formação continuada de seus professores, a fim de reverberar em ações efetivas
com os estudantes com deficiência intelectual, Desta forma organizamos em seis
categorias:

1. Acesso e Permanência na escola


2. Educação inclusiva
3. Formação continuada em serviço
4. Conhecimento das legislações nacionais e municipais sobre o tema.
5. Processo de Ensino e Aprendizagem: potencialidades e dificuldades dos
estudantes
6. Contribuições do CIEJA na formação do estudante com deficiência inte-
lectual para o mundo do trabalho

A pesquisa tem como campo de investigação um único CIEJA, sendo os


participantes professores/as da unidade escolhida, por ser a escola de EJA que
contempla o maior número de matrículas de Educação Especial em perspectiva de
Educação inclusiva.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A educação de jovens, adultos e idosos não é marcada apenas pelas con-


dições socioeconômicas, pois estas têm como desdobramentos a violação dos
direitos mais básicos de proteção e participação e os que dessas faltas se origi-
nam: falta de saúde, falta de educação, falta de proteção, falta de perspectivas de
participação social etc e nesse sentido, há muito que caminhar, pois existem muitos
desafios a serem superados, como a reparação dos direitos violados na infância e

2 Território- Diz respeito às características socioculturais e econômicas da vizinhança, na qual a


escola está inserida, desta forma é possível compreender que as escolas são diferentes umas
das outras, com isso o PPP da unidade considera as características e necessidades apresentadas
daquela região.

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adolescência, a qualificação e aperfeiçoamento profissional, o manejo de novas tec-
nologias e fruição cultural ao longo da vida, de modo que esse sujeito possa atender
às necessidades de qualificação exigidas pela sociedade (DI PIERRO, 2017, p.11-12).
Visando atender essa parcela da população, o Governo Federal e o Ministério
da Educação - MEC criam algumas estratégias a serem adotadas pelos estados
e municípios para a garantia de uma educação de qualidade, por meio do Plano
Nacional de Educação - PNE3 (BRASIL, 2001) na qual a Meta 10 apresenta onze
estratégias fundamentais para o público da EJA. As estratégias implícitas no Plano
Nacional de Educação estão vinculadas à educação profissional, ao mundo do tra-
balho e à oferta de cursos; as estratégias4 10.4, 10.5 e 10.8 estão ligadas diretamente
ao estudante com deficiência na EJA.
Desde a promulgação da Lei Federal nº 5.692, de 1971, que a EJA está asso-
ciada ao acesso à formação para o trabalho e profissionalização ou seja, do Mobral
à EJA que conhecemos hoje ocorreram algumas mudanças na legislação; porém, a
relação com o mercado de trabalho nunca deixou de fazer parte desta modalidade
de ensino.
O município de São Paulo, conta com 16 CIEJAs, ofertam o Ensino
Fundamental I e II, com a duração de quatro anos, estruturadas em quatro módulos,
cada um deles com duração de 1 ano (200 dias letivos). O CIEJA realiza uma forma
de atendimento em diversos períodos e, por se tratar de um centro que atende
exclusivamente o público adulto, apresenta características específicas. Um ponto
importante a ser observado é que o corpo docente é formado por educadores con-
cursados da Rede Municipal de educação- RME-SP, designados para atuar nessas

3 Plano Nacional de Educação- PNE - SubsÌdios para a Elaboração dos Planos Estaduais e Municipais
de Educação. Governo Federal,2001.Disponível em: Plano Nacional de Educação (PNE) – Subsídios
para a elaboração dos planos estaduais e municipais de educação — Instituto Nacional de Estudos
e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira | Inep (www.gov.br) Acesso em:05 de mar. de 2023
4 Estratégias: 10.4 - ampliar as oportunidades profissionais dos jovens e adultos com deficiência e
baixo nível de escolaridade, por meio do acesso à Educação de Jovens e Adultos articulada à edu-
cação profissional;
10.5- implantar programa nacional de reestruturação e aquisição de equipamentos voltados à
expansão e à melhoria da rede física de escolas públicas que atuam na EJA, integrada à educação
profissional, garantindo acessibilidade à pessoa com deficiência;
10.8-fomentar a oferta pública de formação inicial e continuada para trabalhadores e trabalhadoras
articulada à Educação de Jovens e Adultos, em regime de colaboração e com apoio de entidades
privadas de formação profissional vinculadas ao sistema sindical e de entidades sem fins lucrativos
de atendimento à pessoa com deficiência, com atuação exclusiva na modalidade;

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unidades, após terem sido aprovados no processo seletivo. O professor designado
nesses centros possui 8 horas semanais da sua jornada de trabalho destinadas à
formação docente e para planejamento das aulas e projetos com os demais profes-
sores da unidade.
O CIEJA no qual a pesquisa foi realizada, era composto por um público bem
diverso, estudantes trabalhadores, donas de casa, jovens, idosos e educandos com
deficiência intelectual, a faixa etária desses estudantes no período de realização da
pesquisa variava entre 15 a 86 anos. O total de matrículas no segundo semestre do
ano de 2022 era de 382 distribuídas em 26 turmas, desses 59 estudantes possuem
algum tipo de deficiência (que apresentaram laudo médico), o que correspondia a
14% dos das matrículas.
Além dos estudantes que possuem laudo, há um grande número de estudan-
tes com severas dificuldades de aprendizagem que buscam os serviços de saúde
e não possuem laudo, porém possuem o indicativo de deficiência ou algum dis-
túrbio de aprendizagem. A unidade conta com duas professores do Atendimento
Educacional Especializado-AEE e duas Salas de Recursos Multifuncionais5 para
atender o estudante com deficiência pela manhã e outra no período da tarde e
professoras.
Existem muitos desafios a serem superados ao tratarmos das condições em
que os sistemas de ensino concebem o processo de ensino e aprendizagem do
sujeito com deficiência. Frente a esses desafios, consideramos que o professor
tem papel central e buscamos aqui destacar o que dizem os professores sobre a
educação inclusiva e a relação entre aprendizagem e desenvolvimento. Buscamos
também aprender como a EJA e a deficiência intelectual são compreendidas, con-
siderando-se que é uma característica constitutiva dos sujeitos, assim como a
modalidade EJA, em suas especificidades também define as relações de ensino e
aprendizagem.

EDUCAÇÃO INCLUSIVA

A inclusão é um conceito amplo, há sempre uma preocupação que permeia


a educação: será que os estudantes são realmente incluídos ou na prática ainda

5 A Sala de Recursos Multifuncionais-SRM é ofertada no contraturno do estudante com deficiência


sempre que houver necessidade.

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ocorre a integração? Incluir implica ações que estão além do acesso e da garantia
de matrícula. A educação é um direito inegociável, principalmente quando nos pro-
pomos a lutar para um ensino realmente inclusivo que reconheça as diferenças.
Os CIEJAs, assim como todas modalidades de ensino da Secretaria Municipal
de Educação, atuam com base nos princípios que fundamentam a Política Paulistana
de Educação Especial, na Perspectiva da Educação Inclusiva, por meio da Portaria
8.764/16 (SÃO PAULO, 2016). O documento está ancorado na: Convenção sobre
os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU, 2007) e seu Protocolo Facultativo,
promulgada pelo Decreto Federal nº 6.949 (BRASIL, 2009), de 25 de agosto de
2009, e das Leis Federais nº 9.394 (BRASIL, 1996), de 20 de dezembro de 1996, e
nº 13.146 (BRASIL, 2015), de 6 de julho de 2015, bem como a Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2007) e ainda, a
Lei Municipal nº 16.271 (SÃO PAULO, 2015), de 17 de setembro de 2015, que aprovou
o Plano Municipal de Educação de São Paulo e finalmente, a deficiência como um
conceito em evolução, resultante da interação entre as pessoas com deficiência e
as barreiras atitudinais e ambientais que impedem a sua plena e efetiva participa-
ção na sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.
Desta forma, a unidade educacional CIEJA pesquisado, organiza seu PPP
segundo a Política Paulistana de Educação Especial, na Perspectiva da Educação
Inclusiva do município e define as ações para cada ano letivo, para o ano de 2022.
Ao perguntar às professoras entrevistadas como elas avaliam os processos
de inclusão escolar desses estudantes no CIEJA, na relação com o projeto curricu-
lar do CIEJA, obtivemos as seguintes respostas:
Ainda precisa de muitas coisas a serem feitas, porque por exemplo, EU era da
sala regular antes, então meu olhar era diferente, um olhar de que o aluno com
deficiência tinha que fazer algo diferente dos outros estudantes (professora A)
Então eu acho que aqui eles são muito acolhidos, né? Esse lado? Dá atenção, eu
acho isso muito importante[...] Então eu acho que aqui eles são muito acolhidos
[...] Dá atenção, eu acho isso muito importante.Todo mundo é muito amoroso, mas
eu acho nesse um ano que eu estou aqui, estou aprendendo muito também. Eu
acho que deveria ter esses registros de para especificar mais, sabe? (professora
B)
Então eu vejo de forma positiva, principalmente nos módulos 1 e 2. Porque é dife-
rente dos outros módulos 3 e 4, que às vezes você vai encontrar adolescentes
no nosso módulo. É difícil ter adolescente, então o acolhidos.[...] Nós elogiamos,
chamamos, né? Para que ele se sinta encorajado a fazer, a participar. Então eles
ficam assim, extremamente felizes( professora C)

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‘eu acho que eles conseguem se integrar bastante. Eu vejo uma postura bem dife-
rente, porque… teve um aluno que geralmente é mais dependente, muito cuidado
no sentido de, né? É até infantilizado. Quando ele chega aqui, ele começa a con-
viver com o espaço. É onde tem outros jovens e adultos, então a postura muda,
cria uma autonomia maior, né? Eles conseguem se apropriar do espaço, ter uma
Independência, e eu acho que só essa questão do convívio com o mundo do tra-
balho, os temas que os professores da sala regular trazem, muda a perspectiva de
vida e abre 11 perspectivas. (professora E)
Acho que sim! Enfim, e sim, por que contribui com […] porque houve um progresso
de muitos alunos assim, no aspecto emocional, no aspecto social, a convivência é
essa questão de […] É até do aluno que tem uma certa deficiência intelectual dele
olhar um outro também, que tem deficiência, se colocar na condição do outro e de
ter essa interação até a interação entre eles, entre a gente e entre eles também.
Então eu acho muito importante, eu acho muito bom, certo (professora B)

Das oito professoras entrevistadas, todas professoras apresentaram exem-


plos da inclusão dos estudantes na turma, e como se deu a relação com os outros
colegas da turma, por meio de exemplo de convivência e acolhimento. A professora
B, ao relatar as ações da sua prática, traz a importância de acolher as famílias e da
afetividade com os estudantes. Observamos que o relato está em consonância com
a concepção de Educação Inclusiva expressa no PPP da unidade: “acolher e escutar
os estudantes com deficiência e de suas famílias são ações fundamentais para
decisões sobre o trabalho a ser feito. Conhecer seus medos, anseios e expectativas”
[...] (PPP. 2022 p.40). No entanto, as professoras entrevistadas, não mencionaram
a complexidade constitutiva dos processos de inclusão desses alunos quando se
trata da relação com o conhecimento, com conteúdos e práticas específicas como,
por exemplo, a alfabetização - central na educação de jovens e adultos.
Nos dizem da importante contribuição do trabalho institucional sem fazer
menção à relação com os pares adultos e sem entretecer qualquer relação que
aponte para a importância do papel do outro nos processos de inclusão. Os desta-
que das entrevistadas são em sua maioria referentes a dimensão da socialização e
dos afetos, mas muito pouco se diz sobre os processos de ensinar e aprender.
Nesse sentido, o Currículo do Município de São Paulo da EJA como documento
norteador de trabalho do professor, ao conceituar sobre a educação inclusiva reco-
nhece a diversidade humana e a atenda a necessidade de se constituir uma escola
para todos, sem barreiras, na qual a matrícula, a permanência, a aprendizagem e
a garantia do processo de escolarização sejam, realmente e sem distinções, para
todos (SÃO PAULO, 2019 p.25). Deste modo os conceitos trazidos pelo documento

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não se resume apenas ao acesso, permanência e socialização, o documento e des-
taca que:
Os conteúdos sejam portas abertas para a aprendizagem de todos. De
acordo com Connell, “ensinar bem [nas] escolas [...] requer uma mudança
na maneira como o conteúdo é determinado e na pedagogia. Uma
mudança em direção a um currículo mais negociado e a uma prática de
sala de aula mais participativa” (2004, p.27). Portanto, coloca-se o desa-
fio de se pensar formas diversas de aplicar o currículo no contexto da
sala de aula e adequá-lo para que todos os estudantes tenham acesso
ao conhecimento, por meio de estratégias e caminhos diferenciados.
Cada um pode adquirir o conhecimento escolar nas condições que lhe
são possibilitadas em determinados momentos de sua trajetória escolar
(OLIVEIRA, 2013 apud São Paulo, 2019 p.25)

Logo, observamos uma lacuna entre a concepção apresentada pelo currículo


do município e a compreensão do conceito trazidos pelos professores. Acreditamos
que a formação continuada é um fator relevante para o trabalho da equipe docente,
uma vez que a escola não é apenas um espaço para socialização e acolhimento.
Para Fernandes e Oliveira (2017) a questão da formação continuada com
foco na Educação de Jovens e Adultos e no estudante com deficiência é complexa,
por envolver necessidade de duas formações. As autoras destacam que há poucas
produções acadêmicas sobre esta temática.

A RELAÇÃO ENSINO - APRENDIZAGEM

Ao perguntar para as professoras se as propostas pedagógicas realizadas na


sua unidade escolar contribuem para o desenvolvimento da cidadania dos estudan-
tes com deficiência intelectual, elas relataram:
Acho que sim! Enfim, e sim, por que contribui […] porque houve um progresso de
muitos alunos assim, no aspecto emocional, no aspecto social, a convivência é
essa questão […] É até do aluno que tem uma certa deficiência intelectual dele
olhar um outro também, que tem deficiência, se colocar na condição do outro e de
ter essa interação até a interação entre eles, entre a gente e entre eles também.
Então eu acho muito importante, eu acho muito bom (professora B)

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Sim, porque também nas aulas de história, Geografia não, mas eu tive oportuni-
dade de acompanhar, porque eu também fico colaborativo6 com esses estudantes.
Falaram sobre as leis, sobre a política, sobre o SUS, quase os países que têm o
SUS, quais os países que não têm, como a importância disso. Então várias coisas
foram mencionadas durante as aulas para esses estudantes no geral. (professora
A)
Olha, eu acho sim, porque, nós procuramos sempre colocar eles dentro do debate
toda, todas as aulas, independência que que nós damos, nós trabalhamos com
ele esse ano [...] eu trabalhei uma questão ela trabalhou outra. então a gente falou
das eleições, mostramos, fizemos simulação com todos os estudantes. E como
era uma votação eletrônica, qual era essa importância. Porque tirar o título de
eleitor. [...] a gente permite e dá espaço, às vezes que não é coisa da aula, mas ele
está ansioso para contar. Então, a gente dá esse espaço para que ele possa falar,
interagir. Então, eu acredito que é trabalhado. Eu acho que tem coisas que a gente
tem uma limitação [...] às vezes a gente não pode entrar muito no campo, mas nós
acabamos trabalhando (professora C).
Acho que contribui, mas eu acho que quando a gente faz a cidadania, a unidade
tem que estar também dialogando com outros espaços. É o que eu sinto. Então,
quando você fala a cidadania, você vai trazer as informações pra ele. Mas se você
tiver que nem a gente tem que levar pra alguns espaços culturais, tem muito pro-
jeto fora pra conhecer, outros espaços. Ocupar os espaços falando que a gente
ocupou muito aqui a praça [...].A história da né! na cidade do bairro [...] Eu acho
que o maior papel que a gente poderia dar para ele é se tivesse um intercâmbio
com outros espaços [...] Teria que ter mais uma rede de apoio, sabe? Para ter essa
troca (professora E).

Compreendemos que as falas das professoras vão ao encontro da concep-


ção e conceitos8 do Currículo da Cidade- EJA e das propostas da unidade, pelas
7

atividades serem significativas e vinculadas às práticas sociais, dialógicas, levando


em consideração a importância das histórias dos estudantes e de seus valores e
saberes.
Ao centrar o olhar para as estratégias pedagógicas realizadas com os
estudantes da EJA espera-se que tais propostas considerem o público, os seus

6 Atendimento colaborativo é uma das formas de atendimento do AEE onde o professor da Sala de
Recursos Funcionais - SRM atua no ensino regular em colaboração conforme Portaria SME nº
8.674/2016.
7 Concepção do Currículo do Município de São Paulo- EJA
8 Conceitos norteadores do Currículo do Município de São Paulo- EJA - Educação integral, Equidade
e Educação Inclusiva. Disponível em: https://educacao.sme.prefeitura.sp.gov.br/educacao-de-jo-
vens-e-adultos-eja/publicacoes-eja/curriculo-da-cida de-eja/ Acesso em 14agos.2023

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saberes aprendidos no seu percurso de vida e que dialogue com a sua realidade,
ou seja, é preciso considerar esse estudante jovem e adulto, o que nada muda
para os estudantes com deficiência intelectual.Logo ao perguntar para as profes-
sores entrevistadas sobre as estratégias pedagógicas, seis conheciam o Desenho
Universal para Aprendizagem -DUA, onde elas dialogam sobre as diversas formas
de aprender e ensinar. O entendimento ainda não está consolidado com algumas
professoras como afirma a professora E:
Agora eu não estou lembrada. Já ouvi falar alguma coisa [...] Eu acho que é alguma
coisa recente, né? (professora E)
Eu não faço atividade diferenciada, tá?Então eu não faço, então assim, quando eu
penso na minha atividade de organização, eu já estou. Eu já estou pensando nesse
aluno, então se eu trabalho com muitas cores, figuras, música..Dentro da da das
minhas sequências didáticas (Professora F)
Eu acho que o CIEJA, automaticamente, mas o professor que dá aula, ou CIEJA,
ele já mesmo que não saiba, ele já acaba, é aplicando o DUA, porque o público é
muito de diversos, então. A gente tem adultos aqui que ainda tem uma grande
dificuldade que só escrita não daria para ele absorver a informação. Então eles
usam data show muito, até não ser ver na escola, todas têm [...] Eu acho muito
importante, então começar com o audiovisual, começar com projetos todos. [...]
Nunca vi tanto o projeto, mas para esse público do EJA, já está dentro, já está
inserido (professora E)

Observamos, novamente, que há um descompasso entre a formação docente


e a atuação das professoras, e que o processo de ensino e aprendizagem não é
mencionado. As entrevistadas descrevem um trabalho que considera a leitura do
mundo, que é fundamental neste processo, mas ao tratar sobre os estudantes com
deficiência não é mencionada uma relação sistemática com a língua escrita, um
trabalho de ensino-aprendizagem da palavra escrita.
Del-Masso(2000) reafirma que para a escola avançar se faz necessário um
currículo flexível que favoreça o aprendizado de todos, e destaca a necessidade da
formação continuada dos docentes para que estejam preparados para compreender
as necessidades de seus estudantes preparando-os/instrumentalizando-os para as
necessidades do mundo do trabalho. Segundo a autora, é papel da escola o preparo
acadêmico para o futuro profissional, ou seja para o mercado de trabalho e para
o próprio envelhecimento humano (DEL-MASSO, 2012 p. 426). Acrescentamos aos
argumentos da autora, a necessidade de preparação para o presente, para a vida
diária, onde a relação com a escrita é fundamental: escrever e ler o próprio nome,

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ler um calendário, compreender uma placa, ler o que identifica o itinerário de um
ônibus etc.tudo isso inclui os sujeitos na realidades social, nas práticas organizadas
permitindo uma participação individual-coletiva mais efetiva. Dessa perspectiva
podem ser consideradas as contribuições de Freire ( FREIRE, 1968 ) sobre a com-
preensão do sujeito em suas relações com o mundo.
Se reportando a Freire, Britto e Di Giorgi explicam(2022, p. 11 )
É imperativo reconhecer o direito da gente – o(a) educando(a), o(a)
outro(a), com quem nos relacionamos e a quem dirigimos nossa pala-
vra – de “dizer a sua palavra” e, portanto, de “escutá-los”, falando com
ela e não a ela, pois “simplesmente falar a eles seria uma forma de não
os ouvir”; e, para falar com os educandos e educandas, devem os edu-
cadores e as educadoras [...] “assumir” a ingenuidade dos educandos
para poder, com eles, superá-la. E assumir a ingenuidade dos educandos
demanda de nós a humildade necessária para assumir também a sua
criticidade, superando, com ela, a nossa ingenuidade também (FREIRE,
1982b, p. 17 ).

CONTRIBUIÇÕES DO CIEJA NA FORMAÇÃO DO ESTUDANTE COM


DEFICIÊNCIA INTELECTUAL PARA O MUNDO DO TRABALHO

Para que a escola possa cumprir o seu papel, a partir dos conceitos e prin-
cípios expressos nas legislações e nos documentos oficiais vigentes da Secretaria
Municipal de Educação de São Paulo e do Projeto Político-Pedagógico da unidade,
é necessário que os princípios da Educação Especial na perspectiva Inclusiva,
a educação integral e a equidade caminhem juntos. Nesse sentido, as falas das
professoras trazem uma preocupação na formação integral e humanizadora dos
estudantes como um todo e, especificamente, daqueles educandos com deficiên-
cia intelectual. A professora E compreende que a unidade colabora pelo próprio
“método” e destaca a importância do convívio ao pontuar que:
“[...]eu ainda acho que a gente poderia auxiliar mais. Porque eu percebo que ele sai
do CIEJA, nem todos são acolhidos em outros espaços”.

A professora B destaca a importância de identificar as potencialidades e


barreiras no seu dia a dia, assim como o envolvimento das famílias; reconhece o
papel da escola em orientar para o acesso ao mundo trabalho e a necessidade de
parcerias para auxiliar no trabalho com as famílias. A entrevistada nota que elas

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não acreditam ou desconhecem as potencialidades dos filhos. “Se tivesse alguém
que pudesse fazer essa ponte entre escola e trabalho seria uma ação fundamental”.
(professora B).
A professora E, ao citar o caso de um estudante que trabalhou em uma rede
atacadista de alimentos, passou por vários setores no local de trabalho, mas não
tinha êxito, pois não se encaixava na rotina da empresa — faltava alguém para expli-
car-lhe as suas atividades, a rotina do local, entre outras coisas —, reconhece que
as suas potencialidades daquele estudante talvez não tenham sido observadas ou
consideradas na atribuição do cargo, durante a contratação.
Todas as professoras afirmam a importância de parcerias para as ações
relacionadas ao mundo do trabalho visando o mercado de trabalho. É possível iden-
tificar que algumas iniciativas e parcerias ocorridas em anos anteriores auxiliaram;
porém, ainda há carência de profissionais e/ou instituições que possam orientar a
escola, as famílias e as empresas. Essa questão é retratada pela professora A:
Seria o ideal nós termos uma parceria com uma instituição que ofereça cursos
que encaminhe esses estudantes do mercado de trabalho que tragam mais
informações sobre a legislação também, porque muitos pais são bem simples e
desinformados a esse respeito. A gente se depara com pais assim, que acreditam
até que não precisam colocar na escola, que podem ficar em casa e aí gera uma
dependência. E eles precisam de mais autonomia, e creio que mais parcerias …
escolas. (professora A)

Nesse sentido é fundamental que a Secretaria Municipal de Educação como


órgão central possa criar políticas públicas que atendam de forma efetiva as neces-
sidades apresentadas pelas professoras, a parceria com as instituições públicas e
privadas podem auxiliar no acesso ao mercado de trabalho.
Ao questionar os docentes da unidade sobre o desejo dos estudantes com
deficiência ingressarem ao mercado de trabalho, todos afirmaram que são pou-
cos os casos na unidade, alguns já trabalham no mercado informal ou em casa. A
professora A cita a lei de cotas Lei nº 8.112 (BRASIL,1990) que determina a reserva
de até 20% do percentual de vagas para concursos públicos, a lei de Cota Lei nº
8.213 (BRASIL,1991) que estabelece a reserva de para empresas com mais de 100
funcionários,a Lei nº 13.146 (BRASIL,2015) que apresenta diretrizes e tecnologias
que possam apoiar esse indivíduo no ambiente de trabalho e traz o trabalho como
apoio como uma modalidade, porém acredita que ainda há muitos desafios a serem
superados.

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As professoras entrevistadas relataram que os encontros das famílias com
a escola ocorrem até com uma certa frequência, por motivos de faltas, em festas,
apresentações de projetos, todavia não houve menção de ações com vistas a con-
tribuir para um diálogo sobre o ingresso e/ou permanência no mercado de trabalho.
Notamos que as professoras entrevistadas demonstraram uma preocupação
com os estudantes com deficiência intelectual ao concluírem o Ensino Fundamental,
uma vez que as famílias não compreendem a importância do trabalho ou mesmo da
escola para os seus filhos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados apontam para a existência de um trabalho de acolhimento e


de leitura de mundo com os estudantes com deficiência intelectual, porém nos per-
guntamos por que a discussão enfatiza o campo dos afetos e a leitura do mundo,
mas não problematiza as relações com conhecimentos e conteúdos, as relações
de ensino e aprendizagem, como por exemplo, da palavra. Essa forma de pautar a
educação da população com deficiência intelectual persiste vinculada aos modos
biologizantes e médicos de conceber a deficiência e as consequentes formas de
simplificar sua educação, nivelando-a por um número menor de exigências e ofertas.
Isso nos permite refletir sobre em que medida o projeto dos CIEJA, ainda que
apresentado pelas professoras como um êxito, em suas formulações, organização
e execução na escola, realmente contribui para que os estudantes jovens e adul-
tos com deficiência intelectual possam efetivamente acessar o mundo do trabalho
e lá permanecer de forma que concorra para seu desenvolvimento, sua formação
cidadã. Devemos indagar sobre o que efetivamente o CIEJA ensina e os estudantes
aprendem. Como, por que e com quem aprendem e, em que medida, os aprendiza-
dos contribuem para a sua inserção no mundo do trabalho, para o acesso a uma
profissão?
O mercado de trabalho hoje é muito competitivo, a cada dia de trabalho sur-
gem novos desafios e situações de toda ordem podem ser instauradas exigindo do
jovem e do adulto com deficiência intelectual respostas que efetivamente o incluam
em sua ambiência de trabalho.
É possível, como alternativa, levar às últimas consequências a ideia vigotskiana
de desenvolvimento social e, sobre essa base de entendimento do desenvolvimento
na existência (ou não) de deficiência, poder transformar as práticas de educação

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dessa população tendo como fim, mais que sua preparação para o trabalho, sua
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