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Livro 5 Apostando Um Amor - Damas Ousadas - Emma v. Leech

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DIREITOS AUTORAIS

Título original: To Wager with Love


Girls Who Dare Livro 5
Copyright © Emma V. Leech, 2019
Copyright da tradução©2021 Leabhar Books Editora Ltda.

Editor: Tereza Rocca


Tradução: Hamireths Costa
Revisão: D. Marquezi
Revisão: Regiane Moreira
Diagramação: Jaime Silveira
Capa: Luis Cavichiolo

Todos os direitos reservados.


Nenhuma parte deste livro pode ser utilizada ou reproduzida sob quaisquer meios existentes sem autorização por
escrito do proprietário dos direitos autorais.

Todos os direitos reservados, no Brasil e língua portuguesa, por Leabhar Books Editora Ltda.
CP: 5008 CEP: 14026-970 - RP/SP - Brasil
E-mail: leabharbooksbr@gmail.com
www.leabharbooks.com.br
Damas Ousadas - Livro 5

E 1
MEMBROS DO CLUBE DO LIVRO DAS SENHORITAS
PECULIARES

L P A ,D B – membro fundador
das Senhoritas Peculiares e secretamente Miss Terry, autora de “A História
Sombria de um Duque Maldito”.
S . A H ( D ) – não mais tão tímida como
antes; casada recentemente com o notório Nathanial Hunt, proprietário do
exclusivo clube de apostas Hunters, e irmão de Matilda.
L A C (L F ) – uma beldade estrangeira;
recentemente e escandalosamente casada e feliz com Silas Anson, visconde
Cavendish.
S .K B ( C ) – quieta e vigilante, até que
não esteja. Recentemente fugiu com seu amor de infância, Sr. Luke Baxter.
H S – séria, estudiosa, inteligente, puritana e usa
óculos.
B C – franca demais e sempre em apuros.
R S – herdeira e filha de um comerciante rico.
M B – prima de Prue; não é tão inútil e vazia quanto
parece; sonha com o amor.
Jemima Fernside – bonita e sem um tostão.
L H A – vivaz, controladora, surpreendente.
M H – loira, linda, e arruinada por um escândalo do qual
não teve culpa.
PR LOGO

Prezada Jemima,
Espero que esteja bem. Faz tanto tempo que nenhuma de nós
tem notícias suas. Esperava que fosse ao baile de St Clair, mas
Kitty me disse que não estará presente. Já faz uma eternidade
desde a última vez que a vimos. Está tudo bem? Aviso que
pretendo visitá-la assim que estiver de volta à cidade e espero
uma excelente desculpa para a sua falta de comunicação. Se
algo a incomoda, pode confiar em mim. Sabe disso, não sabe?
Eu a ajudaria se me deixasse. Por favor, responda, Jem,
querida. Nós nos preocupamos contigo.
-Trecho de uma carta da senhorita Matilda Hunt para a
senhorita Jemima Fernside.

M 31 1814. H H .
S .
As pálpebras de Harriet tremeram enquanto a luz da madrugada
perfurava seu cérebro sensível. Santo Deus, mas sua cabeça estava
latejando. Ergueu uma mão, pressionando dedos hesitantes contra suas
têmporas doloridas. Devia estar doente, decidiu, percebendo que seu
estômago também estava instável; um desagradável turbilhão ácido em suas
entranhas, certamente lhe causava o mal-estar. Com um suspiro suave,
protegeu seus olhos do sol, com a intenção de dormir um pouco mais. A
cama estava aconchegante e quentinha, e se enroscava deliciosamente sobre
ela, exultando no conforto de seu abraço. Até cheirava bem: um toque de
loção Bay rum, sabonete e algo almiscarado e... masculino.
Espere.
O quê?
Harriet congelou ao registrar um murmúrio satisfeito atrás dela -
extremamente próximo.
Começou a acordar, e olhou horrorizada para baixo para descobrir que
estava quase nua - usando apenas o seu chemise - e que o braço musculoso
de um homem rodeava sua cintura, logo abaixo de seus seios. Enquanto o
olhava fixamente, o braço se contraiu, puxando-a para mais perto e, com
crescente alarme, seu cérebro acossado registrou o calor de um amplo peito
apertado contra suas costas, para não mencionar... para não mencionar....
Harriet guinchou com o comprimento quente e duro de um membro
muito masculino pressionado firmemente contra seu traseiro. Em pânico,
virou-se para os limites do abraço que a mantinha cativa e ficou cara a cara
com um par de olhos Aquamarine de uma beleza assombrosa.
Um par muito familiar de olhos Aquamarine.
Meu bom Deus.
Harriet arfou, atordoada demais para dizer uma palavra enquanto
Jasper St. Clair lhe dava aquele sorriso tortuoso que era famoso em toda a
ton, por ter a capacidade de fazer as mulheres sensatas perderem seus
sentidos, e sua virtude.
— Não! — Ofegou, horrorizada demais para encontrar outra coisa para
dizer no momento, embora sentisse que uma avalanche de palavras surgiria
assim que se levantasse... e vestisse suas roupas íntimas, que pareciam estar
espalhadas pela casa de verão.
Meu Deus! Estavam sozinhos e juntos, na casa de verão, e pelo aspecto
das coisas, tinham ficado lá a noite toda. O que tinham feito? O que ela
tinha feito? Harriet agitou seu cérebro dolorido, mas o miserável se recusou
a cooperar. Tudo o que conseguia lembrar era a sensação dos braços de
Jasper sobre ela, a pressão dos seus lábios contra os dela....
Oh, não.
Oh, não, não, não, não....
—Bom dia, — ele disse, seu sorriso desvanecendo-se um pouco à luz
do óbvio desânimo dela.
—O Q-Que...? — ela começou, apenas para que ambos se abalassem
ao som da abertura da porta da casa de verão, o raspar reconhecível da
madeira mal ajustada ralando sobre o chão de pedra marcado.
O riso e a tagarelice chegaram até eles, tarde demais para que se
movessem, para que se escondessem ou juntassem suas coisas, e de repente,
tinham um público.
Jasper reagiu primeiro, arrancando seu casaco do chão ao lado de sua
cama improvisada, que parecia ser compilada de um ninho de cobertores
sortidos. Cobriu Harriet o melhor que pôde e depois a segurou junto a ele,
encontrando os olhares atônitos da multidão reunida, que os encaravam com
olhares que iam desde o deleite e diversão, até o fascínio aterrorizado.
O rubor no rosto de Harriet era tão intenso que pensou que poderia
entrar em combustão espontânea, o que parecia um resultado mais feliz do
que enfrentar Lady St Clair, Matilda, o Sr. Burton, o irmão de Jasper,
Jerome, e dois de seus companheiros de escola cujos nomes lhe escaparam.
Lembrava-se que um deles era o maior fofoqueiro que já havia conhecido.
Meu Deus. Estava arruinada.
—Ah, — disse Jasper, sua voz um pouco menos descontraída do que
de costume. Limpou a garganta, e quando falou novamente, as palavras
foram firmes e muito, muito claras. — Parece que são os primeiros a nos
parabenizar. Harriet concordou em se casar comigo.
A cabeça de Harriet se virou para encará-lo novamente, boquiaberta
diante da mentira descarada. Jasper apenas sorriu para ela e beijou-a no
nariz.
—Te peguei, — ele sussurrou.
1

Querido papai,
Estou muito animada para o baile de hoje à noite. Todo
mundo que é importante estará lá. O senhor ficou sabendo
que minha grande amiga Kitty se casou com Luke Baxter? Ele
é o herdeiro do condado de Trevick. O antigo conde morreu
recentemente e seu herdeiro não está muito bem de saúde e
decerto não passará deste ano. Envergonha-me admitir, mas
tenho pouca simpatia pelo homem. Não era uma boa pessoa e
tampouco cristão. Mas estou muito feliz por Kitty, é
inacreditável que será uma condessa! É certamente uma
história romântica. Faz-nos esperar que essas coisas não se
restrinjam apenas aos contos de fadas e, sim, papai, antes que
pergunte, é claro que ficarei de olho em qualquer cavalheiro
elegível que esteja pronto para me arrebatar.
—Trecho de uma carta da Srta. Ruth Stone para seu
pai, Sr. George Stone.

N .O S .C . 30
1814, H H ,S .
Harriet observou Jasper arrastar Kitty pelo salão de baile ricamente
decorado. Formavam um par impressionante, a beleza dourada de Jasper
contrastando com a beleza escura e exuberante de Kitty. Harriet suspirou
internamente. Deve ser bom ser bonita. Não que se importasse com esses
tipos de frivolidades. A beleza nada mais era do que um lindo papel de
presente: rasgue-o e o que cobria será exposto para todos verem. Às vezes,
o embrulho combinava com a delicadeza do presente, mas, na maioria das
vezes, era uma decepção.
Tinha que admitir que esse não era o caso de Kitty. Havia se tornado
uma amiga querida e era adorável tanto por dentro quanto por fora. Era uma
pessoa bem-humorada, vivaz e divertida; Kitty era o tipo de moça que
estava sempre com um sorriso no rosto e em busca do melhor que a vida
tinha para oferecer, além de dar muito trabalho. Harriet sorriu ao ver o
marido de Kitty, Luke, observando-a dançar com um brilho de adoração
visível nos seus olhos. Certamente dançará alegremente com ele, não havia
dúvidas quanto a isso, e ele adorará cada momento.
Embora tentasse resistir ao impulso, Harriet olhou para Jasper e sentiu
o coração apertar no peito. Por que tinha que ser tão bonito? Disse a si
mesma diversas vezes que sua estupidez terminou e que não se importaria
mais com ele, mas sabia que aquilo era uma mentira deslavada.
Infelizmente, Kitty também sabia disso, e a maneira como estava falando
com Jasper - sem mencionar o olhar intenso no seu rosto - arrastou um
formigamento nada agradável para cima e para baixo na espinha de Harriet.
Certamente Kitty não falaria sobre ela, pois não trairia uma
confidência. Exceto que não foi exatamente uma confidência. Harriet não
admitiu nada, tampouco negou. Kitty, com sua esperteza, havia descoberto
que a animosidade de Harriet em relação a Jasper não era resultado de uma
mera antipatia.
— Acho que ele a machucou, — disse Kitty, e Harriet não conseguiu
encontrar uma resposta adequada.
Harriet ficou tentada em contar-lhe tudo, deixar escapar que Jasper
Cadogan tinha roubado seu coração e, em seguida, esmagado e jogado fora.
Mas não disse nada, é claro. Harriet nunca tinha compartilhado seus
sentimentos com ninguém, nunca tinha contado nada até o momento em
que se forçou a ser corajosa e confiar em Jasper, mas prometeu nunca mais
repetir o mesmo erro. Se der oportunidade às pessoas, elas te machucam.
Era muito melhor confiar na ciência e na razão, e em coisas quantificáveis,
coisas que podem ser medidas e pesadas e suas qualidades dissecadas e
discutidas, espalhadas na sua frente sem onde esconder. Essas coisas eram
tangíveis e sólidas, comprovadas, ao contrário do amor, que lhe parecia uma
fera mítica, na qual não conseguia acreditar. Não mais, pelo menos; o amor
não era para ela.
Ainda assim, depois de todos esses anos, seu olhar foi atraído de volta
para ele e uma dor, que acreditava estar entorpecida, tomou conta do seu
peito, trazendo desejo, solidão e tristeza, fazendo-a se sentir frágil e oca e
extremamente brava. Ele lhe fez isso, lembrou-se, e então recordou do que
mais Kitty havia dito.
Acho que a machucou muito, mas não acredito que ele tenha a menor
ideia de como ou o que fez. Deve uma explicação a ele, Harriet. Não é justo
continuar punindo uma pessoa por anos sem dar-lhe a chance de se redimir.
Era verdade que via a dor e a confusão nos olhos de Jasper com
frequência, quando o insultava ou o cortava, mas a expressão de cachorro
ferido era sua especialidade. Viu-o usar esse olhar a seu favor. Só porque
aquele olhar fazia seu coração amolecer e seu interior derreter, não
significava que era real. Tinha o poder de envolver as mulheres em volta do
seu dedo, e o fazia com maestria. Todos conheciam sua reputação, sabiam
que se deitava com as mulheres mais glamorosas da ton. Certamente nunca
perdia uma oportunidade de zombar dela por ser uma mulher intelectual,
fazendo-a se sentir a criatura estranha que ambos sabiam que era. Então, o
que diabos ele poderia querer com a simples e estudiosa Harriet Stanhope?
Sua última amante foi a Sra. Tate. Estava presente no baile e enviava
olhares cobiçosos para Jasper, do outro lado da pista de dança. Era uma
visão de tirar o fôlego, vestida de cetim vermelho com seus cachos de
mogno reluzentes em um estilo simples e sem esforço, que sem dúvida
levou horas para fazer. A Sra. Tate era bela, sofisticada, espirituosa e
totalmente à vontade consigo mesma. Irradiava a confiança de uma mulher
que conhecia seu próprio valor, sabia uma ou duas coisas sobre o mundo e
como fazer um homem desejá-la sem levantar um dedo. Em comparação,
Harriet se sentia exatamente o que era: invisível, uma intelectual que usava
óculos e que nunca sabia o que dizer e preferia sentar-se em um canto
escondido com um bom livro do que assistir a um baile. Por que um homem
como Jasper iria querê-la quando poderia ter mulheres como a Sra. Tate?
Era uma equação bastante simples, mas que Harriet se esquecera de calcular
por um breve momento, todos aqueles anos, cheia de esperança de que tudo
o que sempre sonhou pudesse ser dela.
Que tola era.
Pretérito, no entanto. Tinha sido uma tola e não seria novamente. De
agora em diante, usaria a cabeça, e não o coração, para guiá-la, mas talvez
Kitty estivesse certa. Talvez sua amargura tenha se transformado em
crueldade. Jasper não podia evitar quem realmente era, e muito menos ela.
Sabia e entendia que os animais nascem com o instinto de agir de
determinada maneira. Parecia que alguns homens haviam evoluído menos
do que outros, seus impulsos físicos ficavam muito próximos da superfície,
suas vontades e desejos sobrepujando a moralidade ou a decência. Ele não
sabia que suas ações a machucariam tão profundamente. Não podia saber,
ou sua perplexidade com a forma como Harriet o tratava não seria tão
marcante.
Era hora de se livrar da dor e da raiva. Hora de perdoá-lo e seguir em
frente, tanto para o seu próprio bem quanto para o dele. Tinha uma nova
vida pela frente, da qual Jasper não faria parte. Não havia contado nem
mesmo para o seu irmão, Henry, ainda - estava esperando a hora certa - mas
contaria em breve.
Em breve.

Jasper olhou para Kitty com gratidão.


— Sra. Baxter, — disse sorrindo. — Seu marido é um homem de muita
sorte, e sou muito grato à senhora.
Embora não tivesse como saber se suas palavras deram motivos para
Harriet reconsiderar, Kitty falara com ela em seu nome e Harriet prometera
pensar no que dissera. Não era muito, talvez, mas era algo e Jasper iria se
agarrar a isso. Se Harriet derrubasse a parede que erguera entre eles, talvez
tivesse uma chance. Uma chance pequena e tênue, mas era melhor do que
nada.
— Talvez o senhor pudesse dançar com ela, é uma noite tão mágica —,
disse Kitty, antes de acrescentar em um sussurro teatral, — ora, tudo pode
acontecer!
Jasper bufou, suas esperanças não ousavam ir tão longe. — De fato, se
eu tiver sorte, pode ser que não queira jogar sua bebida na minha cara.
— Oh! — Kitty disse, seus olhos escuros cheios de malícia. — Quase
esqueci-me do desafio!
— O quê? — Jasper perguntou, intrigado.
— O desafio — repetiu Kitty, praticamente gritando de empolgação. A
dança terminou e ela agarrou o braço de Jasper, gesticulando para que se
abaixasse um pouco para que pudesse falar-lhe em particular. — Estou
falando das Senhoritas Peculiares — disse, saltando impaciente.
Jasper devolveu um olhar vazio. — Perdão, ainda não entendo. As
peculiares o que?
— Nosso grupo de leitura, somos as Senhoritas Peculiares —
continuou Kitty apressada, ignorando sua perplexidade. — E todas nós
temos que tirar um desafio do chapéu. O meu era vestir o seu urso com
roupas formais.
— Bem, isso explica muita coisa, — Jasper disse gargalhando. — Mas
achei que tivesse sido Harriet quem tivesse aprontado isso.
— Ela me ajudou — admitiu Kitty. — Na verdade, foi maravilhosa.
Não poderia ter feito isso sem sua ajuda.
Jasper sorriu, feliz com a evidência do senso de humor de Harriet.
Tinha sido testemunha do seu senso brincalhão muitas vezes quando eram
crianças, mas parecia ter desaparecido desde então, e tinha uma
desagradável sensação de que fora o culpado por isso.
— Enfim, Harriet pegou seu desafio hoje à noite.
— Pegou foi? — Jasper ficou imóvel, seu coração arrebentando no seu
peito. Poderia ser essa a oportunidade? Poderia ser essa a chance que estava
esperando? — E qual é o desafio?
Os olhos de Kitty brilharam. — Apostar algo que não deseja perder —
agarrou seu braço, firmando o aperto. — Ela vai me matar por ter lhe
contado — disse, com a voz urgente. — Pelo amor de Deus, aproveite ao
máximo, não estrague tudo.
Olhou-a, viu suas esperanças refletidas em seus olhos. Ela queria que a
amiga fosse tão feliz quanto estava sendo, podia ver isso, e pelos céus, ele
queria isso também. Queria que Harriet o olhasse como Kitty olhava para
Luke, esse era o seu desejo mais profundo.
— Não vou, tem minha palavra —, respondeu, rezando para que fosse
verdade. Abriu-lhe o sorriso, esperando que ela soubesse o quanto era grato.
— Darei tudo de mim ou morrerei tentando.
Matilda sorriu quando Prue acenou.
— Aí estão todas! — Prue exclamou. — Eu as estava procurando.
— Sim, a senhorita me deve a próxima dança, Srta. Hunt —, disse seu
arrojado marido, o duque de Bedwin, sorrindo para Matilda. — Espero que
a senhorita não tenha esquecido.
— Como se eu pudesse — disse Matilda, abraçando Prue antes de
cumprimentar sua prima, a Srta. Minerva Butler, e a irmã de Bedwin, Lady
Helena.
— É um prazer revê-la, Srta. Hunt — disse a Srta. Butler com um
sorriso caloroso.
— Sim, faz muito tempo que não a vejo — Lady Helena concordou. —
Deve vir nos visitar.
Antes que Matilda pudesse responder, todos ouviram uma gargalhada e
quando se viraram depararam com Bonnie arrastando um sorridente Jerome
Cadogan para a pista de dança. Foi possível ouvir murmúrios de
desaprovação dos convidados mais velhos, e Matilda franziu a testa
desconfortavelmente.
— Oh meu Deus, — Prue murmurou.
— Eu sei — respondeu Matilda. — Tive uma conversa com ela e sei
que St. Clair falou com Jerome, mas...
— Mas estão se divertindo, — Lady Helena disse com um suspiro
melancólico.
— O tipo de diversão que pode arruinar a reputação de uma jovem
dama — disse Bedwin sombriamente.
— Robert, querido, não poderia falar com ele? — Prue perguntou
pegando a sua mão.
Bedwin olhou para sua esposa com horror. — De forma alguma farei
isso! Não é da minha conta. Além disso, parece que sua Srta. Campbell é a
instigadora. Deve falar com ela.
Prue fez uma careta. — Ora, muito bem, mas deveria pelo menos falar
com St. Clair. Ele é seu amigo.
— Querida, a Srta. Hunt acabou de lhe dizer que St. Clair já trocou
algumas palavras com o irmão. O que acha que posso fazer?
— Não sei —, disse Prue exasperada. — Está claro que a pobre moça
está obcecada pelo irmão dele, e eu odiaria vê-la machucada.
— Ela acredita que essa é sua última chance de se divertir, — Matilda
disse, seu coração doendo por Bonnie.
Virou-se e descobriu Minerva, Prue e Lady Helena olhando-a.
— Gordon Anderson — disseram em uníssono.
Matilda fez uma careta e acenou. — Pobre garota.
Ficaram em silêncio por um momento, pensando sobre o destino de
Bonnie e o terrível escocês, que ela descrevia frequentemente e por longas
horas. Parecia pior cada vez que falava dele.
— Preciso de um pouco mais de ponche, — Lady Helena anunciou,
quebrando o silêncio e olhando atraentemente para o seu irmão. — Robert,
pode fazer o favor?
Estendeu o copo vazio para o duque, que respirou fundo.
— Querida irmã, já não tomou ponche o suficiente por uma noite? —
Perguntou com suspeita.
— É porque está delicioso — disse Helena sorrindo. — Muito melhor
do que a bebida maçante que geralmente é oferecida. Normalmente passo a
noite toda desejando poder beber champanhe, mas hoje não.
Sorriu vagamente.
Matilda observou quando a expressão suspeita do duque se
aprofundou. Levou o copo vazio até o nariz, murmurou uma maldição e
virou o copo para permitir que os resíduos escorressem para sua língua.
— Maldito seja! — Exclamou indignado. — Não é à toa que está
gostando tanto, minha irmã, é o ponche mais potente que já provei.
— Robert? — Sua esposa indagou preocupada. — O que tem nele?
— O que não tem, a senhora minha esposa quer dizer — respondeu,
balançando a cabeça. — Mas, pela forma como todas as jovens estão
consumindo esse ponche, esta noite certamente será animada.

Harriet tomou um gole de seu ponche, perguntando-se distraidamente


por que estava tão mais saboroso que o normal, e observando o turbilhão de
cores enquanto os casais sobre a pista de dança deslizavam de um lado para
o outro.
— Gostaria de dançar, Harry?
Enrijeceu imediatamente, a voz familiar enviando a conscientização
patinando através de seu corpo como galinhas se espalhando ante uma
raposa. Como diabos a encontrou? Pensou que este canto escuro fosse o
esconderijo perfeito. Harriet obrigou-se a se virar e olhar para Jasper.
Um pânico cresceu em seu peito quando notou o brilho de esperança
que havia nele. Não é real, lembrou a si mesma, ele é assim com todas as
mulheres; você não tem nada de especial.
— Não, obrigada, milorde, — respondeu.
Depois lembrou-se de sua promessa de ser menos horrível com ele,
esforçou-se para manter seu tom leve e agradável. — M-mas obrigada por
perguntar.
Pronto, isso foi perfeitamente civilizado.
— Ora, vamos lá, Harry, —retrucou. — A senhorita não dançou a noite
toda. Por favor, não quer dançar comigo?
Viu? murmurou uma vozinha na sua cabeça. Esse era o problema com
Jasper Cadogan. Não conseguia entender que todas as mulheres no mundo
não estavam dispostas a cair em seus braços a qualquer momento.
— Não gosto de dançar, Lorde St. Clair. Acredito que já o tenha
lembrado desse fato antes, — disse, antes de perceber que sua voz tinha
ficado azeda. Respirou fundo e forçou um sorriso rígido nos lábios antes de
acrescentar: — Mas obrigada novamente pela gentil oferta.
— Isso não é verdade, —disse com a voz baixa, muito íntima. — Pelo
menos, antigamente amava dançar. Esqueceu que costumava implorar para
que eu dançasse com a senhorita?
Para sua intensa frustração, um rubor ardeu em chamas sobre sua pele.
Parecia que começava na ponta dos pés e subia espiralando até que toda sua
pele exposta ficasse corada, quase do mesmo tom de seu vestido.
— Éramos crianças naquela época —, disse, fazendo o possível para
manter o tom calmo e uniforme. Não perderia a paciência; não essa noite.
Virou-se para voltar a se concentrar nos casais. — As coisas mudam.
— Sei disso —, disse, e apesar de tudo ela o olhou e ficou surpresa
com a tristeza que ouvira em sua voz. — Está mudada, Harry.
E de quem é a culpa? Queria ficar com raiva dele, mas não ficou, pois
não podia. Nunca o deixaria saber o quão gravemente ficou ferida. Já tinha
sido feita de boba por completo uma vez, e não iria passar por isso
novamente.
— Para o senhor é Srta. Stanhope, milorde — respondeu levando o
copo de ponche até os lábios só para perceber que estava vazio. Sem
proferir outra palavra, saiu em busca de mais.
— Não, não é!
Irritada, olhou por cima do ombro e descobriu que Jasper a seguia.
— O que quer? — Perguntou irritada, enquanto abria caminho através
da multidão.
Jasper se aproximou e pegou o braço dela para impedir seu progresso,
em seguida se inclinou para falar em seu ouvido.
— Não é ‘milorde’ e não é ‘Srta. Stanhope’. Pelo amor de Deus, Harry,
nos conhecemos desde que éramos bebês.
Harriet puxou seu braço de seu aperto e abriu a boca para dar-lhe uma
boa bronca, antes de se lembrar da promessa. Droga, mas isso era muito
mais difícil do que imaginava.
— Com licença, milorde. Estou com uma sede terrível.
Fez uma reverência e saiu apressada, nada surpresa ao chegar à sala de
refrescos e descobrir que ainda a seguia. Viu, era por isso que tinha que ser
rude, nada mais entrava naquela sua cabeça dura. A mesa de refrescos
estava rodeada de pessoas, mas Harriet conseguiu abrir caminho em direção
a tigela de ponche. A quantidade de pessoas e o ar úmido da noite causou-
lhe uma sede violenta e - apesar de ser terrivelmente pouco feminino -
encheu seu copo e bebeu de uma vez, suspirando aliviada antes de voltar a
enchê-lo.
Bebeu um pouco mais devagar, mas permaneceu onde estava. Matilda,
Deus a abençoe, atraiu a atenção de Jasper, prendendo-o na entrada. No
entanto, foi apenas uma trégua temporária, pois Harriet não podia deixar a
sala sem passar por ele. Jasper não parecia muito feliz, seja com o que fosse
que Matilda estivesse lhe dizendo.
Ótimo, pensou. Talvez seu irmão estivesse praticando seus truques de
libertino e Jasper seria forçado a ir atrás dele.
Céus, mas aquela noite estava quente. Harriet respirou fundo e desejou
ter trazido um leque. Em vez disso, esvaziou o copo e o encheu novamente.
Talvez se abrisse caminho ao redor da sala, pudesse escapar por trás de
Jasper sem que percebesse.
Seu progresso era lento e não totalmente equilibrado, tanto que Harriet
precisou se apoiar contra a parede por um momento para recuperar o fôlego.
Estava se sentindo um pouco tonta. Sem dúvida, o calor a estava deixando
fraca; precisava de ar fresco.
Infelizmente, chegou à porta quando Matilda se afastou de Jasper. Ele
se virou para ela imediatamente, como se tivesse perfeitamente ciente de
sua tentativa de escapar o tempo todo.
— Vá embora, Jasper, — disse com um suspiro. — Estou com muito
calor e não tenho energia para brigar.
— Ótimo —, disse, sua expressão um pouco mais feroz do que antes.
— Já era hora, vamos.
Jasper agarrou seu braço, arrastando-a atrás dele enquanto Harriet
segurava sua bebida no alto, tentando não derramar. Estava fervendo de
nervoso.
— Jasper! — Protestou, aborrecida demais para não usar seu nome de
batismo. — Deixe-me em paz, seu desgraçado teimoso.
— Nem por cima do meu cadáver — disparou de volta. — Hoje não;
hoje nós vamos conversar.
O que?
Ah não.
Aquilo era uma ideia terrível.
— Solte-me, seu... seu aborto de refocilante porco!
Isso chamou a atenção dele.
Paralisou e se virou para encará-la com diversão. — Do que me
chamou?
— De aborto de refocilante porco —, respondeu com dignidade. —
Entre outras coisas.
— Sim, foi o que pensei que tivesse dito. — Contraiu os lábios. —
Hmmm, Ricardo III, se me lembro bem. De quantos outros insultos
shakespearianos a senhorita consegue se lembrar?
Harriet suspirou, impressionada por ele estar certo e desejando ter
mantido sua maldita boca fechada. Era um jogo que jogavam quando eram
crianças, ela, Jasper, Jerome e Henry, cada um abusando um do outro com
os piores insultos que podiam desenterrar. Harriet surpreendia a todos com
praguejos inventivos, até que descobriram o que ela já sabia, que
Shakespeare era uma fonte assombrosa de material.
— Todos eles, — disse sombriamente.
Jasper riu e continuou seu caminho, seu aperto na mão de Harriet firme
e inflexível.
— Solte-me —, exigiu asperamente. — As pessoas estão olhando.
— Não estariam olhando se a senhorita não estivesse fazendo um
escândalo — respondeu, perfeitamente alegre.
Harriet desistiu e o seguiu até o jardim. Talvez pudesse escapar dele lá
fora.
Para seu aborrecimento, ele não parou no terraço e continuou
arrastando-a em direção aos jardins.
— Jasper Cadogan, se não me soltar agora eu vou...
— Vai fazer o que? — Exigiu, finalmente parando nas sombras de um
canto recluso. — Me odiar para sempre? Não falar mais comigo? — Deu
uma risada sem humor. — Não sei de que outra forma pode me punir,
Harry.
Da forma como falava parecia estar ferido, e Harriet reconheceu uma
pontada de culpa. Talvez Kitty estivesse certa. Talvez isso já tivesse durado
tempo demais.
Houve um silêncio tenso, pois Harriet não sabia o que dizer. Estava
com muito medo de ceder e acabar incitando qualquer tipo de aproximação
entre os dois. Ele era sua fraqueza, seu calcanhar de Aquiles, e a única
maneira de mantê-lo sob controle era permanecer zangada, construir uma
parede de gelo impenetrável ao seu redor que ele não conseguiria
atravessar. Se deixasse isso de lado, estaria vulnerável e correndo risco, não
poderia permitir que isso acontecesse. Mesmo assim, logo iria embora e não
teria que vê-lo mais. Quando partisse poderia tirá-lo de sua cabeça e de seu
coração, pois dificilmente frequentariam o mesmo círculo de pessoas;
estaria segura.
Harriet deixou escapar um suspiro. Se desculparia, asseguraria que não
o odiava e depois iria para o quarto e escreveria uma carta. Quanto mais
cedo estivesse em segurança longe dali, melhor. Seus planos
cuidadosamente elaborados teriam que ser postos em prática, isso era tudo.
No entanto, antes que pudesse falar, Jasper se adiantou.
— O que vai apostar, Harry?
Uma sensação estranha, semelhante à água gelada escorrendo por suas
costas, chamou a atenção de Harriet de volta para Jasper. Seus olhos
Aquamarine estavam atentos, e algo em sua expressão fez seu coração bater
mais rápido.
— O-o que?
— Tem um desafio para completar. Apostar algo que não deseja
perder.
Kitty Connolly, vou torcer seu lindo pescocinho!
— E o que tem? — Harriet exigiu.
Sua cabeça estava girando novamente, seu coração batendo muito
rápido. Estava tomada pelo desejo de fazer algo imprudente, fugir em
direção a escuridão e nunca mais ser vista.
Arfou, extremamente chocada, quando Jasper a pegou pela cintura e a
puxou para perto. De repente, tinha dezesseis anos novamente, olhando para
o menino que sempre amou.
Não.
Não, não seria aquela garota novamente; aquela menina boba.
— Eu a desafio, Harriet — disse com a voz baixa e tão íntima que os
cabelos de sua nuca se arrepiaram. Ela não conseguia respirar. — Eu a
desafio a parar de se esconder de mim, da vida. Eu a desafio a voltar para
aquele baile e dançar e rir e se divertir. Eu a desafio a dançar comigo, com o
coração aberto e sem pretensão entre nós. Eu a desafio a dançar comigo,
olhar-me nos olhos e me dizer que não significo nada.
Harriet o encarou. Certamente seu coração não deveria bater naquele
ritmo ridículo. Não suportaria aquela punição e explodiria a qualquer
momento. Só que não explodiu. Simplesmente continuou trovejando,
batendo contra suas costelas como um pássaro em pânico tentando escapar
de uma armadilha, e esta era uma armadilha.
— E o que eu ganho se vencer? — Perguntou, ciente da forma como
sua voz soava ofegante.
— Vou deixá-la em paz — disse, apertando a sua cintura. — A
senhorita nunca mais será atormentada por mim. Não vou procurá-la e nem
lhe dirigirei a palavra. A senhorita ficará livre de mim, para sempre.
— O senhor e-está falando de verdade? — Perguntou, agarrando-se às
palavras dele.
Era o que queria, o que estava planejando: uma maneira de escapar
dele, uma maneira de esquecê-lo, e ele estava lhe entregando isso. Tudo o
que precisava fazer era fingir que estava se divertindo por algumas horas.
Poderia fazer isso, certo?
— Sim, estou falando de verdade —, disse asperamente. — Mas não se
esqueça do seu castigo, Harry.
Havia uma nota de advertência ali que ela deveria ter prestado atenção,
mas a possibilidade de se livrar dessa conexão enlouquecedora que a
mantinha presa ao passado era tentadora demais.
— Que é?
— Se a senhorita falhar...
— Sim? — Observou-o tentando ler sua expressão e se perguntando
sobre a determinação que viu ali, ou aquilo era desespero?
— A senhorita se entregará para mim.
Harriet piscou, sem entender.
— Eu vou...? — Começou a perguntar, mas parou, franzindo a testa.
Jasper riu, mas não era um som que associava a ele. Era um som
sombrio, um tom desesperado na voz.
— A senhorita vai mostrar a todos a verdadeira Harriet, aquela com
quem cresci, aquela que eu sabia ser ousada, corajosa e engraçada, e então,
à meia-noite, a senhorita dançará comigo. Vai dançar comigo, olhar nos
meus olhos e dizer o que sente por mim. Se a senhorita conseguir dizer que
eu não significo nada, se a senhorita conseguir dizer com convicção e com
todo o seu coração e jurar que não há nada entre nós, que não se importa
comigo, então nunca mais me verá. Mas se, no entanto, a senhorita não
puder dizer essas coisas, vou levá-la até a casa de verão e faremos amor.
Será minha, Harry, assim como sempre deveria ter sido.
Harriet o encarou. Queria dizer-lhe que estava louco, queria dar-lhe um
tapa no rosto e chutá-lo nas canelas e bater com os pés com raiva, mas não
podia. A ideia de Jasper levá-la para a casa de verão e fazer amor com ela
era tão esmagadora que não conseguia nem respirar, muito menos se mover.
— Eu a machuquei, Harry? — Perguntou, segurando o rosto dela com
as duas mãos, e disse suavemente. — Juro que nunca tive a intenção.
Essa foi provavelmente a única coisa que poderia tê-la tirado do transe
em que havia caído. Afastou-se dele e de seus braços.
— É claro que não — disse, se esforçando para se acalmar, para
alcançar a raiva que a protegia. Se ficasse com raiva, estaria segura. Tudo o
que precisava fazer, era provar que estava errado, e depois estaria livre dele
para sempre. — E não estou me escondendo de nada, nem de ninguém.
— Então prove —, disse com um brilho nos olhos que pressagiava algo
ruim.
— Está bem!
Poderia completar seu desafio e se livrar daquele homem miserável de
uma vez por todas. Depois poderia continuar com sua vida em paz, sabendo
que estava livre dele.
— Vai aceitar?
— Por que não? — Respondeu, drenando o que restava de sua bebida e
jogando o copo vazio nele. Jasper o pegou, hábil como sempre, maldito. —
Isso será fácil, e é melhor cumprir sua promessa.
— Oh, eu vou cumprir — disse, um sorriso enlouquecedor curvando-se
em seus lábios.
Maldito desgraçado arrogante, o faria pagar por isso.
— Nem que estivesses limpo o suficiente para cuspir! — Atirou de
volta.
Ele franziu a testa pensativo. — Rei Lear?
— Ha! — Disse triunfante. — Timão de Atenas.
Jasper revirou os olhos. — O tempo está se esgotando, amor, —
avisou.
— Argh! — Harriet respondeu e voltou para o salão de baile.
2

Cara Srta. Stanhope,


Muito obrigado pelo livro de Watts, o qual gostei muito.
“Lógica, ou o uso correto da razão na investigação após a
verdade com uma variedade de regras para se proteger contra
o erro nos assuntos da religião e da vida humana,” levantou
algumas questões interessantes que eu certamente ficaria feliz
em discutir com a senhorita, quando nos encontrarmos
novamente. Antecipando esse encontro, anexo “Conversas
sobre Química,” da Sra. Jane Marcet, a quem conheço. É uma
introdução ao assunto pelo qual a senhorita demonstrou tanto
interesse e espero que seja um ponto de partida útil.
—Trecho de uma carta do sr. Inigo De Beauvoir para a
Srta. Harriet Stanhope.

A S . C . 30
1814, H H ,S .
Jasper ficou no jardim escuro e se perguntou o que, diabos, tinha
acabado de fazer; devia estar fora de si. Harriet era tão teimosa que provaria
que estava errado, nem que isso fosse a última coisa que fizesse. Voltaria
para o baile e seria espirituosa, animada e engraçada e tudo o que ele sabia
que era capaz de ser, porque ela era todas essas coisas, simplesmente tinha
se esquecido disso. Pensar que ele era o motivo dessa mudança o deixou
enojado.
Como pude ter feito isso?
Pela milésima vez, lembrou-se do ano em que realmente notou Harry
pela primeira vez. Tinha dezoito anos e Harry dezesseis; ela o adorou por
toda a sua vida, sabia disso. Suportou ser arrastada pela lama e bancar a
heroína infeliz para que ele e seus dois irmãos, alternadamente, a
resgatassem ou a sequestrassem novamente. Cristo, quase a afogaram uma
vez! Nunca reclamou de nada, e sempre o olhava com admiração por trás
daqueles óculos; até que fez dezesseis anos de idade, e então foi sua vez de
olhá-la.
Isso o pegou de surpresa, tanto que achava difícil falar com ela. Passou
o verão inteiro criando coragem para beijá-la, e quando conseguiu foi
perfeito - mais do que perfeito - porém depois tudo mudou; aquele beijo o
mudou. Como de praxe com suas escolhas de momentos inoportunos,
finalmente aconteceu na manhã em que partiria para o exterior, o desespero
de partir sem que ela tivesse a menor ideia de seus sentimentos foi o
suficiente para dar-lhe coragem para aproveitar a oportunidade. Não a viu
por um pouco mais de um ano, quando tudo mudou, em sua ausência.
Ainda se lembrava da ansiedade que sentiu para vê-la novamente e da
perplexidade quando o ignorou.
No entanto, mais uma vez, o desespero o motivou a agir
precipitadamente, e sem sombra de dúvida o resultado seria terrível. O
olharia dentro dos olhos e diria que não lhe dava a mínima, e teria que ter a
honra de deixá-la ir. Seu coração se apertou.
— Por favor — disse, olhando para o céu limpo de nuvens. — Por
favor, permita-me reconquistá-la.

Harriet estava exasperada no caminho todo de volta ao casarão. Como


se atrevia? Como ousava desafiá-la? E era um desafio tão ridículo. Bem,
mostraria a ele...
De repente, estava olhando para o grande número de casais girando e
seu estômago deu um nó, porque ninguém nunca a convidava para dançar.
Era uma pessoa acanhada que usava óculos e que se escondia nos cantos
escuros e preferia morrer a ser notada.
Como diabos iria provar o contrário?
Uma onda fria atravessou seu corpo, seguida por um calor intenso
quando percebeu o desafio com o qual havia concordado. Deus do céu.
Cambaleando um pouco, tropicou para o lado para se apoiar na parede.
Tudo parecia estar girando, não apenas os casais que dançavam.
Harriet, sua imbecil!
Perderia essa aposta e depois... e depois... Jasper a levaria para a casa
de verão e...
A sensação de calor e frio intensificou-se como uma dor estranha em
sua barriga. Oh, não. Não queria isso, se assegurou. No entanto, enquanto
se imaginava nos braços de Jasper - imaginava aquelas mãos sobre seu
corpo, aqueles lábios - algo dentro dela queimou desejoso. Sua respiração
prendeu e seu peito foi tomado por um pânico. Se a tocasse daquela forma,
estaria perdida. Voltaria aos seus dezesseis anos e estaria loucamente
apaixonada, entregando-lhe, assim, o poder de destruí-la totalmente.
Isso não poderia acontecer.
— Jerome! — Harriet quase gritou seu nome enquanto corria pelo
salão em sua direção.
Como sempre, Bonnie estava colada a ele.
Harriet se perguntou se Jerome era o único que não percebia que
Bonnie estava apaixonada por ele. Pobre Bonnie, outro caso de amor
causando sofrimento. Oh, mas nesse caso ainda não, porque Bonnie não
parecia ter entendido a verdade. Jerome nunca corresponderia ao seu amor
e, certamente, não se casariam. Harry conhecia Jerome tão bem quanto
conhecia seu próprio irmão, e Bonnie simplesmente não era o tipo dele. Era
muito ousada, muito franca, muito problemática. O demônio perverso só
usurparia o máximo de sua companhia, divertindo-se enquanto pudesse,
depois iria embora, e Bonnie ficaria arrasada. Não que Jerome fosse tirar
vantagem, não agiria como um canalha; simplesmente não notaria o dano
que havia feito. Os homens muitas vezes não notavam.
— Harry! — Jerome exclamou e sorriu para ela. Era um eco do sorriso
de Jasper, embora o nariz quebrado de Jerome desse-lhe um ar um pouco
mais libertino do que a perfeição do deus grego que era a imagem de Jasper.
— A senhorita está se divertindo?
— O senhor está embriagado? — Harry perguntou, franzindo a testa.
— Eu? — Jerome respondeu parecendo afrontado. — Como se eu
fosse capaz, em um evento familiar! Bebi apenas ponche a noite toda, como
prometi à mamãe.
Ao lado dele, Bonnie deu uma risadinha, e eles trocaram um olhar
antes de debulharem em risada. Harriet ignorou e balançou a cabeça.
— Bem, isso não importa. O senhor deve dançar comigo, — disse
secamente.
Jerome se endireitou, sua expressão instantaneamente sóbria. — A
senhorita quer dançar? — Repetiu, parecendo como se tivesse acabado de
dizer que queria fazer a dança dos sete véus, e não dançar a quadrilha ou o
que quer que fosse que todos estavam se preparando para dançar naquele
momento.
— Sim.
— Comigo?
Parecia tão surpreso que o temperamento de Harriet piorou.
— Sim, — repetiu, lutando para ter paciência.
— A senhorita quer dançar... comigo? — Jerome repetiu todo o pedido
novamente, claramente precisando ter certeza.
— Sim, por favor, Jerome, se isso não for matá-lo — Harriet implorou,
perguntando-se se teria que implorar. Era realmente um pedido tão horrível
assim?
— Mas nunca dança, Harry.
— Bem, hoje eu quero dançar!
Tendo se cansado daquele absurdo, agarrou a mão de Jerome e o
arrastou para a pista de dança.
Uma vez em posição, Harriet avistou Jasper olhando-a e lembrou que
deveria estar se divertindo. Forçou uma expressão no rosto, algo que
lembrasse antecipação e sorriu para Jerome.
— Está se sentindo bem, Harry? — Jerome perguntou preocupado. —
A senhorita... a senhorita andou bebendo ponche?
— Estou muito bem, obrigada —, Harriet respondeu, sorrindo tanto
que seu rosto doeu. — Jerry, pode fazer alguns de seus amigos dançarem
comigo também?
Jerome piscou, atordoado, em silêncio, o que foi muito bom, em
seguida o passo da dança o afastou dela e levou vários segundos antes que
se reaproximassem. Não se espantaria se ele berrasse uma resposta para
todo o salão ouvir. Sutileza não era seu forte.
— Acho que poderia, —respondeu, estreitando os olhos. — Por quê?
O que está acontecendo?
— Nada —, disse Harriet, tentando manter o sorriso fixo. Podia sentir
Jasper olhando-a; seu olhar parecia queimar um buraco em sua nuca. —
Acabei de decidir que é hora de parar de ficar criando raízes nas sombras,
só isso.
— Ora, muito bem! — Jerome bateu as mãos, seu rosto brilhando com
satisfação. — E já não era sem tempo, também. Certamente posso encontrar
alguns parceiros de dança para a senhorita. Cholly me deve um favor, para
começar.
Harriet suspirou. Teria sido bom pensar que ele não teria que
chantagear seus amigos para que dançassem com ela, mas aquilo não a
surpreendia. Harriet sabia que não era popular. Nunca foi, teve amizade
apenas com Jasper e Jerome, e isso era apenas porque cresceram juntos.
Com pessoas que não conhecia, Harriet não sabia o que dizer, então preferia
não dizer nada. Naturalmente, parecia desajeitada e acanhada, se não
totalmente hostil, e quando finalmente falava, geralmente dizia algo do tipo
que estampava a palavra intelectual na sua testa. Além disso, não era
exatamente bonita. Não era feia, era simplesmente... comum.
Seu cabelo era de um tom normal de castanho, nem escuro nem claro,
assim como seus olhos. Tinha estatura mediana e sua figura era elegante o
suficiente, mas nem excepcionalmente esguia, nem voluptuosa. Harriet era
a garota pela qual as pessoas passavam sem perceber, e não tinha problema,
disse a si mesma. Se as pessoas a notavam, era sempre a garota de óculos,
ou uma combinação de risos abafados e perplexidade porque havia dito algo
que ninguém mais entendeu.
Ainda assim, não tinha que gostar de nada daquilo, tinha apenas que
convencer Jasper de que estava gostando, e realmente não importava o
motivo de dançarem com ela, precisava apenas que dançassem. Colou uma
expressão de alegria no rosto e sorriu para Jerome, que devolveu um sorriso
cauteloso, e então se afastaram novamente.
Jasper observou Jerome dizer algo para Harriet e ela jogou a cabeça
para trás e riu. Jerome parecia um pouco surpreso, assim como aqueles que
dançavam de cada lado deles, mas parecia que a risada de Harriet era
contagiante. Todos sorriam para ela que retribuía, enquanto Jerome ria e
balançava a cabeça.
Droga, seu maldito idiota, Jasper se amaldiçoou. Fez tudo errado e irá
perdê-la.
Conforme a noite avançava, os parceiros de dança de Harriet iam e
vinham, todos com um sorriso estampado no rosto quando chegava o
momento de deixá-la. Na verdade, alguns nem mesmo queriam ir embora.
Ficavam para conversar buscando mais ponche entre as danças. Quando
finalmente a deixavam, pareciam confusos por terem sido tão entretidos, o
que só fez Jasper ranger os dentes com mais força. Somente agora
conseguiam ver o que sempre viu; que Harriet era uma jovem notável
quando estava relaxada e feliz. Houve uma época em que apenas ele
enxergava isso, tinha visto a verdadeira Harriet, tinha visto antes de
qualquer outra pessoa e, certamente, isso significava alguma coisa. Deveria
muito bem significar alguma coisa. Alguns de seus parceiros de dança
pareciam relutantes em ter que deixá-la, e muitos pareciam ter garantido
uma segunda dança com ela.
Jasper sentiu sua mandíbula apertar mais. Era melhor ela ter guardado
a valsa da meia-noite para ele.
Àquela altura, não sabia se estava desejando que a meia-noite se
aproximasse ou que nunca chegasse. Por mais que o ciúme o estivesse
queimando por dentro ao vê-la se divertindo com todos os outros
cavalheiros elegíveis, exceto ele, estava com medo de que simplesmente
olhasse em seus olhos e dissesse que ele não significava nada. Talvez
dissesse que o odiava, ou simplesmente que não gostava dele. De alguma
forma, preferia o ódio a qualquer coisa menor... pelo menos era uma reação
forte. Ser meramente malquisto parecia um destino lamentável. Tampouco
podia acreditar que o olharia nos olhos e diria que o amava, que sempre o
amou e sempre o amaria. Mas certamente se importaria, apenas um pouco?
Seu coração apertou.
Gostou dele uma vez, e por muitos anos. Sabia que gostava dele, e deu
tudo por certo, tolo que era, mas será que talvez ela poderia voltar a gostar
dele? Será que poderia dar-lhe uma nova chance?
Não importava o que acontecesse, moveria céus e terras ao menor sinal
de que se importava com ele e a arrastaria para a maldita casa de verão. Oh,
não que fosse forçá-la, não era um canalha, mas precisavam ficar a sós,
precisava de uma chance para poder reconquistá-la, não sabia mais o que
poderia fazer se não quisesse mais nada com ele. Sabia que as mulheres o
desejavam, sabia que todas as outras mulheres aqui acreditavam que era
excepcionalmente bonito; apenas Harry que parecia ser imune a seus
encantos. O problema era que não se importava com o que os outros
pensavam, e nunca se importou. Harry julgava as pessoas pelas suas
mentes. Não tinha interesse em um rosto bonito ou um físico forte, e foi aí
que tudo desmoronou. Achava que era um tolo, e ele não podia fingir que
estava errada.
Desejou ser inteligente o bastante para impressioná-la, e não era como
se não tivesse tentado. Havia tentado muito na escola, estudando por horas
a fio, até perceber que não havia esperança, e era menos humilhante fingir
que não se importava do que continuar fracassando.
Naturalmente, o desprezava por não se importar, por agir como se não
tivesse interesse em aprender, nada além do superficial, mas ficaria
mortificado demais para explicar a verdade.
Se ela soubesse, teria pena dele, e isso o crucificaria.
Finalmente, a meia-noite chegou e Jasper cruzou o salão em sua
direção. Por favor, rezou enquanto caminhava até ela, por favor, dê-me uma
chance.
Harriet estava esperando por ele, e toda a alegria sumiu do seu rosto
quando a alcançou. Estava de olhos arregalados quando o olhou; pensou
que talvez ela estivesse tremendo. Esperava que sim, porque se não era ela,
era ele. Não que isso não fosse humilhante o suficiente quando dissesse a
ele que queria que a deixasse em paz. Não era totalmente tolo, sabia que
essa era a única razão pela qual ela aceitou seu desafio, a fim de nunca mais
ser incomodada por ele.
Jasper engoliu em seco e a tomou em seus braços, puxando-a para mais
perto do que ditava as normas da sociedade, mas incapaz de se conter. Se
esta fosse a última vez que a seguraria, iria aproveitar ao máximo.
3

Querida Matilda,
Como a senhorita é gentil por se preocupar assim comigo.
Garanto que não há nada de malicioso ou gótico em meu
desaparecimento. Longe disso, temo, pois decerto preferia
estar entretida por um vilão neste momento. Sinto muito,
mas não há nenhum mistério fascinante para entretê-la.
Minha tia tem estado um pouco indisposta nas últimas
semanas e se preocupa quando estou distante. Tem sido tão
querida para mim que o mínimo que posso fazer é oferecer-lhe
minha companhia.
Então aí está. Uma explicação enfadonha, mas nada que
aborreça seu terno coração.
Espero ter dissipado as suas preocupações.

— Trecho de uma carta da Srta. Jemima Fernside para a


Srta. Matilda Hunt.

A S . C . 30
1814, H H ,S .
Harriet estremeceu quando Jasper a puxou para seus braços para
dançar a valsa. Estranhamente, se divertiu bastante naquela noite, como
Jasper devia muito bem saber. Pela primeira vez, o nervosismo a deixou e
dançou, riu e se divertiu muito. O que era estranho, já que sempre
desprezou dançar. Mas se fosse honesta consigo mesma, isso não era
totalmente verdade. Jasper estava certo, ela nem sempre desprezou dançar.
A verdade era que nunca aprendeu a se divertir com ninguém mais além de
Jasper e seu irmão. Harriet havia aprendido com Jasper, Jerome e seu irmão,
Henry, revezando-se entre eles, sob a orientação do instrutor de dança, pois
era a única garota. Amava aquelas aulas, eram repletas de diversão e
risadas, e acima de tudo, amava dançar com Jasper, porque o amava mais
do que tudo também.
Embora tivesse dito a si mesma a noite toda que estava temendo aquele
momento - pois precisava contar uma mentira descarada para se afastar dele
de uma vez por todas - descobriu, agora, que medo era algo que estava
longe de seus pensamentos. Lembrando-se das aulas, sorriu, lembrou-se de
como Jasper fora paciente quando ela pisava no seu pé, e a maneira como
sorria quando a rodopiava em um giro complicado, e ela não tropeçava.
— Por que está sorrindo? — Sua voz era suave, e ela estava muito
perdida na doçura da memória para encontrar uma mentira fácil.
— Estava me lembrando das nossas aulas de dança — admitiu,
sabendo que era uma coisa perigosa de se dizer naquelas circunstâncias.
Tinha que dizer-lhe que não significava nada para ela. Tinha que se livrar
dele de uma vez por todas.
— Esse era meu momento preferido da semana — disse,
surpreendendo-a.
— Seu mentiroso — respondeu, balançando a cabeça em descrença. —
Odiava aulas de dança e sempre dizia que era uma perda de uma tarde
perfeitamente bonita.
Jasper olhou-a nos olhos e ela cometeu o erro de retribuir o olhar.
Deus, mas era lindo. Seus olhos eram extraordinários, nem verdes nem
azuis, mas uma mistura tentadora dos dois, um verde-mar brilhante que
roubava seu fôlego sempre que os via.
— Não estou mentindo — respondeu —, mas somente depois do verão
em que completou dezesseis anos. E desde então... desde então era para isso
que eu vivia.
Os olhos de Harriet arderam e desviou o olhar. Apesar de suas
melhores intenções, deu uma gargalhada.
— Poderia ter me enganado — murmurou, embora tão baixinho que
ele provavelmente não a tivesse ouvido.
— Harry —disse o nome dela como um apelo, doído de tristeza.
Forçou-se a olhá-lo, estava determinada a acabar com aquilo tudo de
uma vez por todas. Se estava realmente tão infeliz quanto parecia - o que
não podia acreditar nem por um momento - então merecia se ver livre dela
tanto quanto ela precisava se ver livre dele e finalmente o momento havia
chegado. Iria dizer-lhe que não se importava com ele e que os dois
poderiam seguir com suas vidas.
No momento em que seus olhos se encontraram, porém, as palavras
morreram em sua boca e prendeu a respiração quando viu a profundeza dos
dele.
— Harry —, disse novamente. — Não se importa mais? Não se
importa nem um pouco?
Sentiu-se tonta de repente, tomada pelo calor e pela emoção e pelo
jeito que a olhava, como se... como se quisesse carregá-la para a casa de
verão e fazer amor apaixonado com ela.
Oh, bom Deus.
Nenhum homem jamais a olhou daquela maneira. Duvidava que algum
outro olharia. Boba. A única razão pela qual Jasper a estava olhando
daquele jeito era porque o rejeitou por muito tempo. Era como um
garotinho a quem foi negado um agrado, querendo-o além da razão
simplesmente porque lhe haviam dito que não. No entanto, uma verdade
incômoda surgiu quando o olhou e reconheceu aquele desejo desenfreado.
Sentia isso também.
Ela o queria.
Queria-o muito, era realmente uma tola em pensar que poderia
simplesmente ir embora e que ele não a atormentaria mais. Sempre a
atormentaria, mesmo se ela estivesse do outro lado do mundo. Afetava-a,
sempre faria isso.
Então, talvez isso finalmente fosse livrá-la dele. Agarrou-se à ideia,
mesmo quando uma voz fraca na sua cabeça dizia que aquilo era um
absurdo. Harriet silenciou aquela voz, pois a ansiedade por um motivo para
acreditar nessa nova e atraente possibilidade era arrebatadora. Talvez se
cedesse ao seu desejo físico, seu coração estúpido reconheceria que tudo
aquilo tinha sido apenas luxúria, não amor. Certamente Jasper se cansaria
dela. Perderia o interesse, uma vez que tivesse o que queria, e ela voltaria à
razão de uma vez por todas. Por que não acabar logo com isso e acabar com
o sofrimento deles?
Naquele momento, parecia perfeitamente lógico. Um argumento
perfeitamente fundamentado. Harriet conseguia lidar com um argumento
lógico, eram as emoções que lutava para compreender. Este não era seu
coração a guiando. Isso seria tolice. Não, esta era uma decisão fria e
calculada que a libertaria.
— Harry, responda-me, pelo amor de Deus —, implorou.
Não respondeu. Respondê-lo era muito perigoso. Não. Muito melhor
acabar com isso agora que a decisão foi tomada. A dança terminou, e não
largou a mão dele, mas a puxou, tirando-o da pista de dança.
— Harry —, disse com urgência. — O que está fazendo? Prometeu
responder à pergunta.
Ignorou-o e forçou seu caminho através da multidão de pessoas,
atravessando as portas abertas em direção ao jardim escuro.
— Para onde estamos indo? — Exigiu, uma nota estranha em sua voz
enquanto Harriet descia os degraus correndo. — Harriet, pelo amor de
Deus, mais devagar! Para onde estamos indo?
Não respondeu e continuou apressada e sem fôlego.
— Harry!
— Para a casa de verão —, disse por cima do ombro, impaciente e sem
diminuir o ritmo.
Houve um silêncio atordoante.
— A casa de verão?
A mão que segurava a puxou com tanta força que ela tropeçou para trás
contra o corpo duro dele. Jasper a firmou com as mãos na sua cintura. Ela
deu de cara com sua gravata, que brilhava como a neve sob o luar. Olhar
dentro dos olhos de Jasper era uma péssima ideia, como já havia concluído,
então forçou seus olhos a permanecer cravado no linho imaculado.
— Por que estamos indo para a casa de verão? — Perguntou e parecia
ofegante.
Correr daquela forma tinha deixado os dois sem fôlego, ela supôs.
— Sabe por que —, respondeu irritada com a pergunta. Aquele era o
desafio dele, não era?
Ele ergueu seu queixo, forçando-a a olhá-lo. Droga, aqueles olhos
malditos, deveria haver uma lei contra eles. Davam-lhe uma vantagem
injusta sobre os mortais de castas inferiores.
— Harry — disse, olhando-a tão atentamente que teve vontade de virar
de costas. — Q-quer dizer que... que se importa comigo?
Harriet fechou os olhos, aquela era a única maneira de evitar aquele
olhar penetrante. Se a olhasse, veria a mentira, a coisinha frágil que era.
Ele deixou cair a mão e o silêncio se estendeu por tanto tempo que
quase se sentiu tentada a olhá-lo. Quase.
— Por que então? — Perguntou desanimado.
— Eu... —começou, apenas para vacilar quando um rubor escaldou
suas bochechas. Ainda bem que ele não poderia ver aquilo sob a luz da lua.
— Eu o desejo. — As palavras saíram trêmulas e, de uma certa forma,
forçada. — E se sentirá melhor quando tiver... quando tiver... — Harriet
lambeu os lábios, sem saber como dizer, mas supôs que já tinham
ultrapassado a obrigação de serem educados. — Quando tiver dormido
comigo, vai parar de agir como se eu significasse alguma coisa, e depois vai
me deixar em paz.
Ele soltou uma gargalhada, embora não estivesse achando nada
engraçado. — Então é assim que funciona?
— Sim — disse, aliviada, talvez ele estivesse começando a entender.
— Será arruinada — disse.
Harriet riu dessa vez. — Não, não serei —, disse com desgosto. —
Meus valores não têm nada a ver com minha virgindade.
— Aos olhos da sociedade, tem sim.
— Ora, às favas com a sociedade! Além disso, ninguém jamais saberá.
— Abriu os olhos e se atreveu a olhá-lo. — Estou indo para a casa de verão.
Vem ou não?
— É melhor eu ir, suponho, — disse com um brilho estranho nos
olhos. — Se tiver certeza de que isso vai me curar da obsessão que tenho.
— Vai — respondeu, com um aceno decisivo. — Eu raciocinei, c-
cientificamente, — disse, tropeçando um pouco na palavra. — E raramente
me engano quando faço isso.
— Harry, andou... andou bebendo?
A voz de Jasper era cautelosa, como deveria ser. Sabia que Harriet
nunca bebia. Perder o controle da razão e perder o controle em geral era
uma ideia aterrorizante e apavorante e, por Deus, não. Nunca!
— Claro que não andei bebendo! — Exclamou. — Que ideia — virou-
se para encará-lo e tropeçou na grama disforme, Jasper a segurou. — Não
bebi nada além do ponche de frutas.
— Hmmm —, Jasper respondeu, franzindo um pouco a testa.
Logo chegaram na casa de verão e Harriet encostou na porta,
empurrando com força para abri-la enquanto raspava no chão de pedra
como sempre fazia.
— Eu deveria consertar isso — disse Jasper.
Harry riu. — Disse isso todas as vezes que viemos aqui.
— Não viemos aqui há anos, Harry — respondeu.
— Não seja bobo. Viemos aqui quando armou para que Kitty e Luke se
encontrassem em segredo.
— Nós não entramos.
Harriet jogou os braços para o ar. — Tudo bem, não viemos aqui há
anos, — concordou, decidindo deixá-lo seguir seu próprio caminho.
— Já se passaram oito anos. Oito anos desde que a beijei, e não acho
que um dia se passou sem que não tivesse pensado nisso.
Ela se virou para olhá-lo e sorriu, completamente admirada.
— Nossa, realmente é muito bom nisso, não é?
Ele enrijeceu e o movimento, mesmo no escuro, foi visível. O pequeno
cômodo estava todo sombreado, com pequenos flashes da luz da lua
refletindo aqui e ali.
— Bom em que?
Harriet acenou, gesticulando rudemente em sua direção. — Sedução —
disse, sentindo outra onda de tontura e levantando a mão para agarrar uma
cadeira para se equilibrar. — Sabe exatamente o que dizer para conseguir
tirar as roupas de uma mulher, não é?
— Parece estar completamente vestida.
Harriet bufou, descartando o tom sarcástico de sua voz. — Acabamos
de atravessar a porta. Imagino que o libertino mais experiente precise de
alguns minutos para lançar sua magia, mesmo que se pareça com um anjo
caído.
Ela corou então, reconhecendo o brilho de interesse nos olhos de
Jasper pelo elogio involuntário. Ainda assim, já havia admitido que o
desejava, ele sabia que era um homem bonito. A maneira como as mulheres
se jogavam sobre ele, aonde quer que fosse, era uma pista ao mais humilde
dos homens. Pelo que sabia, Jasper nunca foi humilde. Mesmo assim virou-
se, pois não queria testemunhar seu olhar presunçoso quando comentasse
sobre sua admissão.
— Não sou um libertino, Harry.
Isso a surpreendeu. Não só que não tivesse aproveitado a oportunidade
para provocá-la por compará-lo a um anjo caído, mas que o negasse. Todo
mundo sabia dos seus casos, era uma legião de histórias.
Ela bufou. Não era o som mais elegante, se arrependeu imediatamente,
mas realmente, por que negar o óbvio?
— Não sou, —insistiu. — Metade das histórias que circulam não são
verdadeiras, e o resto é grosseiramente exagerado.
Harriet revirou os olhos e se virou para encará-lo. — Então, não teve
um caso com a Sra. Tate?
Ele teve a graça de parecer um pouco envergonhado, mas sustentou seu
olhar.
— Também nunca disse que era um santo — houve uma leve
contração em seus lábios. — Mas rompi com ela faz algum tempo.
— Rompeu? — Harriet respondeu, esforçando-se para soar indiferente.
O que importava se estava tudo acabado entre eles? Não era da sua conta,
ainda assim, não podia negar que ficou feliz. — É por isso que tenho o
prazer da sua atenção, não é? Está entediado?
— Não, droga!
Havia raiva real na explosão daquelas duas palavras, e saltou,
assustada, mas foi muito lenta para reagir quando ele diminuiu a distância
entre eles e a tomou nos braços. Beijou-a, quente, feroz e urgentemente, e
naquele momento a resistência de Harriet - o pouco que restava - levantou
uma bandeira branca e se rendeu.
As memórias de outro beijo a assaltaram, dado naquele mesmo lugar.
Foi um beijo hesitante, mais doce, cheio de esperança e expectativas, e não
pôde deixar de compará-lo com este. Não tinham nada em comum. Era
muito jovem, ingênua e idealista, e Jasper estava apenas brincando,
praticando sua técnica, sem dúvida.
Este beijo era diferente.
Um homem que sabia o que estava fazendo dava-lhe este beijo e queria
o que ela, tão descaradamente, estava oferecendo. Era feroz e intenso, e
seus braços a envolveram, puxando-a para mais perto, tão perto que mal
conseguia respirar. Sentiu-se possuída e desejada e foi maravilhoso,
dramático e nenhum pouco opressor.
Harriet se derreteu em seu abraço, afundando as mãos em seus cabelos
e achando-os quentes e sedosos. Jasper aprofundou o beijo, saqueando sua
boca como se fosse morrer se não pudesse beijá-la, como se ela fosse o ar e
ele estivesse se afogando até que seus lábios se encontrassem.
Sim, era o único pensamento coerente em sua mente, e, não pare, como
era estranho e agradável não pensar. Harriet pensava em tudo, considerando
as coisas de todos os ângulos, pesando suas decisões com precisão
matemática, mas o pensamento estava além dela naquele momento. Não
havia nada além do calor do corpo de Jasper queimando através de suas
roupas, da força de seus braços envolvendo-a, e quando ele agarrou seu
quadril e a puxou contra seu membro enrijecido, ela também ardeu.
Harriet arfou e se apertou mais contra o calor que latejava sob sua pele,
a dor, que se instalou na sua carne mais cedo naquela noite, desceu para
pulsar entre suas coxas em um latejar constante e insistente que parecia
repetir seu nome.
Jasper, Jasper, oh, sim, por favor, Jasper.
No momento seguinte, a única coisa que conseguiu perceber foi que as
mãos dele estavam nos fechos de seu vestido, e restou-lhe rir da velocidade
com que foi despojada dele e das anáguas.
— Ainda negando que é um libertino? — Perguntou, ao mesmo tempo
rindo e balançando a cabeça confusa, enquanto observava seu espartilho
cair no chão, estava se sentindo estranhamente distante, como se aquilo
tudo estivesse acontecendo com uma Harriet diferente, uma Harriet mais
corajosa, que não se lembrava do pavor que tinha de Jasper, e de que
precisava ficar longe, muito longe dele.
— Sim, — disse, puxando-a de volta e mordiscando o lóbulo da sua
orelha enquanto uma mão deslizava por baixo de seu chemise, acariciando
sua coxa. — Estava me sentindo solitário, Harriet. Sozinho sem sua
presença, só isso. Precisava apenas estalar o dedo e eu teria vindo correndo.
Harriet sorriu, atordoada, mas não totalmente irracional. As coisas que
os homens diziam para conseguir tirar as roupas de uma mulher...
Estranho, pois ela tinha concordado com aquilo.
— Não precisar tentar tanto, — sussurrou, assustada ao ouvir as
palavras arrastadas e, em seguida, ofegando quando os dedos dele roçaram
seu sexo. Ela estremeceu e se agarrou a ele. — Oh, sim, — murmurou.
Jasper parou e recuou para olhá-la.
— Não pare, — implorou, seu corpo vivo com antecipação.
— Tem certeza de que não bebeu? — Perguntou.
— Ora, Jasper, sério? — Exclamou impaciente. Puxou seus cabelos
loiros, forçando-o a se inclinar para que pudesse beijá-lo e ele gemeu contra
sua boca enquanto seus dedos deslizavam suavemente para cima e para
baixo sobre os cachos macios entre suas coxas.
— Harry, oh, Deus, Harry, eu a quero tanto.
— Sim —concordou, não conseguindo dizer nada além daquilo. —
Sim, sim, sim.
— Precisamos de uma cama — disse, desesperadamente, enquanto
olhava ao seu entorno. Soltou-a tão de repente que Harriet tropeçou e teve
que se segurar no encosto da cadeira para se equilibrar. Felizmente, Jasper
pareceu não notar, concentrado que estava juntando vários cobertores e os
arrumando no chão, antes de jogar uma variedade de almofadas na pilha.
Satisfeito, tirou as botas e atirou-as a um canto qualquer com espantosa
falta de cuidado, sabendo a importância que dava ao brilho impecável que
tinham.
O casaco e a gravata foram em seguida, e Harriet observou, com
fascinação extasiada, enquanto desabotoava o colete, jogava-o no chão e
tirava a camisa pela cabeça. Sua boca ficou seca quando as mãos dele se
moveram para o fecho da sua calça e ela mal ousou respirar quando as tirou,
junto das roupas de baixo em um movimento fluido, antes de chutá-las para
o lado. Ele estava respirando com dificuldade agora, enquanto Harriet
acreditava que, no caso dela, tinha esquecido completamente como fazê-lo.
Deus do céu. De fato, um anjo caído.
Encarou-o, desavergonhada, estudando-o como uma obra de arte, pois
ele era, em todos os sentidos da palavra; muito bonito. Jasper Cadogan era
uma obra-prima da perfeição masculina, era todo calor, carne e sangue em
vez de mármore frio e inflexível. Seu olhar viajou sobre o corpo dele,
apreciando cada centímetro, dos ombros largos e braços musculosos ao
abdômen esculpido e barriga esticada, gravando-o na memória enquanto
seus olhos se moviam para a saliência orgulhosa de sua ereção, onde não
pôde evitar manter o olhar por um longo momento antes de retornar ao seu
rosto.
Para sua surpresa, Jasper hesitou. Ele estava corando?
— Ainda me quer, Harry? — Perguntou, soando estranhamente
incerto.
Um sorriso indefeso curvou-se em seus lábios e ela assentiu. Jasper
soltou um suspiro.
— Não é a primeira vez que o vejo nu, — disse, em seguida tapando a
boca com a mão, horrorizada com a admissão. Por que diabos disse aquilo?
Jasper deu uma gargalhada de prazer e puxou-a de volta para seus
braços. Harriet arfou com a sensação de seu corpo nu, o calor feroz dele
contra ela atravessando o tecido fino do seu chemise.
— Não é? — Disse, olhando-a com uma malícia nos olhos. — Andou
me espionando, amor?
Ele não parecia exatamente desagradado com a revelação, mas Harriet
ainda queimava de mortificação. O que havia de errado com ela?
— Ora vamos lá, não pode deixar por isso mesmo. Quando foi isso?
— Anos atrás — murmurou, querendo enterrar o rosto em seu peito,
mas encontrando sua pele quente e sedosa sob seu toque. Mal conseguia
pensar. — Você tinha dezoito anos.
Harriet achou que ele era a coisa mais bonita que já tinha visto em toda
a sua vida quando o encontrou no lago, nadando como viera ao mundo com
o irmão dela, naquele longo e glorioso verão em que foi feliz. No entanto,
ainda era jovem naquela época, prestes a chegar à idade adulta. Agora era
um homem de verdade e a deixava sem fôlego, fazia seu coração doer de
desejo e o lugar secreto entre suas coxas pulsar.
Incapaz de se conter, tocou seu peitoral com as pontas dos dedos,
arrastando-os pela dispersão de pelos dourados mais escuros até que
encontrou o disco plano de seu mamilo e o circulou. Harriet observou,
intrigada, como a pele ficou tensa sob seu toque, e não pôde negar o
impulso de inclinar-se e lamber a pequena protuberância. Jasper gemeu, e o
som percorreu sua espinha, uma sensação de tal poder que era impossível
não se deleitar. Repetiu o gesto, mas desta vez usando a língua para exercer
a tarefa, chupando levemente.
Jasper praguejou e, em um piscar dos olhos, foi colocada,
cuidadosamente, sobre os amontanhados de cobertores e almofadas que
cobriam o chão. Ele a beijou novamente, desfazendo o nó que prendia seu
chemise no pescoço e abrindo-a para expor seus seios.
— Harry — respirou reverentemente enquanto segurava sua carne
macia. — É tão linda.
Harry riu um pouco, achando graça por ele estar se esforçando tanto,
mas ficou tocada do mesmo jeito. Pelo menos estava fazendo um esforço.
Olhou-a, uma expressão perplexa em seus olhos. — É linda, Harry —
repetiu.
— Hmmm, — murmurou, sorrindo, não querendo estragar as coisas
apontando o óbvio.
— Vou te mostrar o quão linda é, — murmurou, abaixando a boca para
seu seio, beijando e lambendo até que estivesse louca de prazer. Trocou de
seio e continuou o banquete enquanto sua mão voltava para baixo do seu
chemise, deslizando para o lugar que doía por ele e procurando a fonte de
seu prazer.
Harriet arfou e se arqueou sob seu toque e Jasper murmurou coisas
doces que não conseguia assimilar de tão perdida que estava no prazer que
ele estava proporcionando. Ele deslizou um dedo na sua abertura e o
gemido que deixou sua boca ecoou com o dela.
— Oh, Deus, Harry, quero isso. Eu a quero. A quero há tanto tempo
que pensei que fosse enlouquecer. Diga que isso significa algo para você
também, amor, por favor.
Harry não podia dizer-lhe nada, pois naquele momento era incapaz de
comandar qualquer conversa, estava além de pensamentos ou palavras,
atordoada do jeito que estava com o prazer que ele parecia comandar sem
esforço do seu corpo. Sentia-se como um instrumento abandonado e de
repente arrebatado pelas mãos de um mestre. Como podia conhecer seu
corpo e entender seu prazer melhor do que ela?
— Jasper — disse enquanto o agarrava, e ele voltava a sua boca para a
dela.
— Diga que significo algo, Harry. Diga que não é apenas desejo.
— Oh, Jasper, — disse, querendo chorar, querendo dizer para que não
falasse, para não fazer aquelas perguntas, perguntas que a deixariam
vulnerável e exposta muito mais do que ter suas mãos de uma forma tão
íntima. — Pare com isso, pare com isso.
Ele parou imediatamente e ela teve vontade de gritar de frustração.
— N-Não... não pare! — lastimou. — Apenas pare de falar. N-não
consigo pensar. Não quero pensar. Não agora.
Jasper a olhou. — Cristo, Harry, está bêbada.
— Não estou! — Exclamou furiosa. — Já disse, só bebi o ponche.
— Oh, amor, — gemeu, descansando sua testa sobre a dela. — Pode
ser, mas está bêbada e não posso, Harry, não posso fazer amor contigo. Não
agora. Preciso saber se quer.
Harriet o fulminou com o olhar, indignada. — Jasper, estamos nus e
sua mão está... naquele lugar. Acho que você pode assumir com segurança
que eu quero isso.
— Quer, Harry? — Perguntou com a voz baixa enquanto acariciava o
pescoço dela. — Realmente quer?
— Jasper Cadogan, se não terminar o que começou, vou matá-lo.
Houve um estrondo baixo de risadas e Jasper respirou fundo. — Tudo
bem, amor. Não se preocupe, vou acabar com o seu sofrimento.
4

Não. Não vou voltar e certamente não vou me casar com o


maldito Gordon Anderson. Aí está!

—Trecho de uma carta da Srta. Bonnie Campbell para o


Conde de Morven.

A S . C . 30
1814, H H ,S .
Jasper poderia ter gritado. Do jeito que estava, mataria seu maldito
irmão, pois não tinha a menor dúvida de que foi Jerome o responsável por
batizar o ponche. Aqui estava ele, com a mulher que amava em seus braços,
apenas para descobrir que estava bêbada. Tinha suspeitado disso antes, mas
a) era impossível acreditar que Harriet estivesse bêbada e b) ela negou tão
vigorosamente que acreditou, ou talvez quisesse tanto acreditar que ignorou
o óbvio. De qualquer maneira, não podia fingir que não sabia agora, não
importa o quanto quisesse.
No entanto, não podia simplesmente parar com tudo quando foi o
responsável por deixá-la naquele estado. Ela era muito sensível ao seu
toque, e muito menos tímida e nervosa do que esperava. Perguntou-se se era
por causa da bebida, mas logo dispensou o pensamento, pois achava que
talvez aquela fosse apenas a Harriet. Antes das coisas mudarem entre eles,
era ousada o bastante para falar o que pensava dele. Apenas quando estava
cercada de pessoas ou diante de estranhos que ficava tímida e insegura.
Sempre doía assistir a isso, e fazia com que desejasse poder segurar sua
mão e tranquilizá-la.
Ela não precisava da sua mão agora, pensou ironicamente, enquanto
ela puxava seus ombros para que voltasse, e agarrava seus cabelos até que a
beijasse novamente. Não podia fazer amor com ela, não naquele momento
quando não tinha certeza se ela realmente queria aquilo, mas podia aliviar a
dor que sabia que estava sentindo.
Beijou-a, lenta e profundamente, saboreando-a, enfeitiçado pelo sabor
sedutor da inocência e do entusiasmo enquanto ela suspirava contra sua
boca, e sua mão voltou para acariciar sua parte mais íntima. Não era difícil
satisfazê-la, embora seu próprio corpo doesse com desejo para unir-se a ela
e torná-la sua em todos os sentidos, de tal forma que ela não pudesse mais
negar que lhe pertencia, ou que pertenciam um ao outro. Quando ela se
desfez sob seu toque, arqueando-se e gritando e com os dedos cravados em
suas costas, olhou-a e seu coração explodiu, com desejo por estar amando-a
e com o desespero para garantir que fosse sua, apenas sua, para sempre.
— Jasper, — murmurou sonolenta, seus membros ficando flexíveis e
pesados enquanto o prazer diminuía, deixando-a sem forças e saciada.
— Estou aqui, amor — disse, puxando-a para seus braços e contra seu
peito. — Sempre estarei aqui, — acrescentou, enquanto sua respiração
ficava pesada e ela se aconchegava em seu abraço.

— Felicitações — sua mãe disse com o tom seco enquanto observava


os dois.
Harriet estava corando com tanta ferocidade que ele podia sentir o
calor que emanava dela contra a sua pele, a pele nua dele, como era
perfeitamente óbvio para o público. Era Harriet quem o cobria com seu
corpo, enquanto ele fazia o possível para cobri-la com seu casaco.
Ainda assim, Jasper olhou carrancudo para o Sr. Burton, Jerome e seus
amigos.
— Virem-se! — Rosnou.
— Acho que podemos fazer melhor do que isso —, respondeu o Sr.
Burton, com uma expressão de profunda desaprovação ao abrir a porta e
indicar para que todos saíssem.
Saíram, graças a Deus. Todos, exceto a mãe de Jasper.
— Gostaria de ter uma palavrinha com os dois, em casa, assim que...
— Olhou para as roupas espalhadas pelo chão e seus lábios se contraíram.
— Assim que puderem. Temos um casamento para organizar. Devo dizer,
Harriet — acrescentou, cedendo ao desejo e abrindo um sorriso — não
poderia estar mais feliz. Muito bem-feito, Jasper!
Bateu palmas com óbvia felicidade e saiu apressada da casa de verão.
Jasper prendeu a respiração.
Harriet estava rígida e paralisada em seus braços, de costas para ele.
Não se moveu e ele suspeitava que não estava nem mesmo piscando.
Parecia demasiadamente chocada para esboçar qualquer reação. Ouviu
todos se afastando da casa e as vozes se distanciando enquanto sua mãe os
conduzia para longe.
Respirou fundo, imaginando o que dizer quando pousou seu olhar
sobre os ombros de Harriet. Incapaz de resistir, inclinou-se e depositou um
beijo sobre um deles. Ela arfou, e por um momento ele achou que aquele
fosse um bom sinal, e que, talvez, pudessem terminar o que haviam
começado, mas então Harriet se afastou dele.
— Acho que vou vomitar — disse, antes de sair correndo pela porta e
ele ouvir sons de vômito do lado de fora.
Talvez não, então.

Quando Harriet se limpou e se vestiu, queria morrer. Nunca se sentiu


tão mal em toda a sua vida, mas estava agradecida por isso, ou quase.
Porque, pelo menos, aquilo afastava da sua mente o desastre que acabara de
fazer com sua vida.
Não entre em pânico, se instruiu. Não. Entre. Em. Pânico.
Estava entrando em pânico.
Jasper tentou falar com ela, mas o silenciou quando levantou a mão e o
fitou com chamas nos olhos. Ele parou de falar imediatamente. Não podia
falar com ele, não naquele momento. Não até que descobrisse o que tinha
acontecido na noite anterior. Era tudo um borrão, uma coleção nebulosa de
imagens e palavras esmaecidas, misturadas numa espiral bagunçada. Havia
apenas uma coisa que conseguia se lembrar com alguma clareza, e
realmente gostaria de poder esquecer aquela parte. Corando furiosamente,
deu as costas para Jasper e fez um espetáculo para recompor seu vestido.
Não pense nisso. Não pense nisso. Naturalmente, não conseguia pensar
em outra coisa. Nada mais preenchia a sua mente, exceto o corpo nu de
Jasper sobre o dela, sua boca presa em seu seio e sua mão entre suas pernas
e os seus dedos estavam...
Seu corpo inteiro aqueceu quando se lembrou do prazer primoroso de
seus dedos deslizando dentro da sua parte mais íntima, e os sons que fez
quando ele lhe deu a experiência mais incrível da sua vida.
— Harry — chamou seu nome novamente, e ela balançou a cabeça em
negativa, lutando contra as lágrimas que ameaçavam cair.
Oh, Harriet, sua idiota.
Abriu a porta e saiu correndo.

A única coisa que Jasper poderia fazer era observá-la, partindo. Queria
ir atrás dela mais do que tudo, mas aquele não era o momento, sabia disso.
Além disso, teria uma vida inteira agora, uma vida inteira para convencê-la
de que foram feitos um para o outro. Sabia que não deveria ficar tão
contente com a situação, principalmente porque fora o responsável por
prender Harriet nessa armadilha, embora sem querer. No entanto, estava
além dele sentir pena e lamentar que tenha acontecido. Harriet se casaria
com ele, pois não tinha escolha, seria sua.
Supondo que o perdoasse algum dia por ter feito isso e por seja o que
for que tivesse feito para machucá-la em primeiro lugar.
Com um suspiro pesaroso, fechou a porta e começou o trajeto de volta
para a casa. Jasper tinha acabado de alcançar os jardins que ficavam
diretamente atrás da casa quando avistou Henry, irmão de Harriet,
caminhando em sua direção com uma expressão determinada.
Instintivamente, Jasper quase levantou a mão para saudá-lo como
sempre fazia - considerando que Henry era seu melhor amigo - até se
lembrar de que tinha acabado de arruinar a irmã do homem, existia a
possibilidade de não estar nada feliz com aquilo.
— Seu desgraçado! — Henry gritou do meio do jardim, confirmando
suas suspeitas.
— Henry — disse Jasper, parando e levantando as mãos em um gesto
pacífico. — Henry, deixe-me explicar, por favor...
— Explicar o quê, seu canalha? — Henry exigiu, caindo sobre ele
furiosamente. — Como embebedou minha irmã e a seduziu? Meu Deus,
vou espancá-lo até a morte, seu patife miserável!
Jasper respirou fundo e desistiu de tentar se defender. Devia a Henry a
chance de expressar seus sentimentos. Ainda assim, o golpe em sua
mandíbula veio como um choque, ainda mais quando cambaleou para trás e
caiu sobre as herbáceas de sua mãe, o aroma fresco de lavanda esmagada
espalhou no ar.
— Cristo — murmurou, tocando, cautelosamente, um dedo na
mandíbula e verificando se ainda estava com todos os dentes.
— Levante-se para que eu possa acertá-lo novamente, — Henry
rosnou.
— Eu a amo, Henry, — Jasper disse, olhando para seu melhor amigo e
esperando que ele pudesse ouvir a verdade nas suas palavras. — Sempre a
amei e, só para constar, ela ainda é virgem e vou me casar com ela.
Henry olhou-o por um momento.
— Oh — disse, endireitando-se e esfregando a nuca. — Bem, suponho
que isso mude as coisas — respondeu com uma expressão mais leve.
Estendeu a mão, oferecendo-a para Jasper e ajudando-o a se levantar. —
Desculpe por isso — disse, apontando para a mandíbula de Jasper. — Tinha
que ser feito, questão de honra e tudo mais.
— Entendo muito bem, acredite em mim — respondeu Jasper. — E já
que estamos falando nisso, também não a embebedei. Como pode pensar
uma coisa dessas?
Henry deu de ombros. — Não esperava ouvir que os dois foram
encontrados juntos na casa de verão. Mas sei que Harry nunca bebe e...
bem, não sabia em que acreditar.
Jasper deu a seu amigo um olhar incrédulo. — Nunca percebeu nada?
— Perguntou, balançando a cabeça em espanto. — Nunca teve a menor
ideia de que eu estava apaixonado por ela?
— Não — Henry admitiu, balançando a cabeça. — Bem, houve aquele
verão, anos atrás, quando parecia passar muito tempo sonhando com ela, e
ela ficava escarlate sempre que falava com ela. Achei na época que fossem
ficar juntos, mas desde então... não. Está sempre fazendo troça dela e
deixando-a furiosa, e, verdade seja dita, achei que ela não o suportasse.
Jasper soltou uma risada, embora não fosse um som especialmente
feliz. — Acredito que nada tenha mudado, — disse tristemente. — Vamos,
tenho que enfrentar todo mundo. Temos um casamento para organizar.

Harriet hesitou do lado de fora da porta da sala rosa. Tia Nell, Lady St.
Clair e Jasper estavam todos esperando por ela. Era fim de tarde e sua dor
de cabeça havia resignado para uma dorzinha resistente. A percepção de
que estava bêbada explicava ao menos tudo o que tinha acontecido, e
quando descobrisse quem tinha colocado álcool naquele maldito ponche, o
mataria. Que confusão terrível tinha se metido agora.
Enrolou os dedos em torno da maçaneta da porta, mas não conseguia
encontrar coragem para girar a maldita coisa. Apenas entre e acabe logo
com isso, disse a si mesma. Vai conseguir. Respirando fundo, Harriet se
forçou a se mover e entrou na sala para encontrar tia Nell e Lady St. Clair
com os dentes à mostra, sorrindo para ela. A vontade de dar meia volta e
sair correndo era muito grande.
— Harriet, querida — disse Lady St. Clair, estendendo as mãos. —
Estou muito feliz. Confesso que espero por este dia há muito tempo.
Sempre a considerei como uma filha.
Oh, não. O coração de Harriet apertou. Isso não seria fácil. Virou-se e
viu Jasper a observando cautelosamente. Havia se lavado e parecia
abominavelmente bonito. Ela, ao contrário, parecia como se sentia.
Totalmente miserável.
— Sinto muito, Lady St. Clair, — disse, forçando as palavras. — M-
mas temo que terei que desapontá-la. Não posso me casar com Jasper.
O sorriso de Lady St. Clair sumiu e tia Nell deu um suspiro chocado
que provavelmente deu para ouvir da cozinha.
— Não seja ridícula, Harriet — rebateu a tia. — Deve se casar com ele.
Será arruinada se não se casar.
Harriet se preparou para o ataque que certamente seguiria após suas
próximas palavras. — Não quero me casar com Jasper, e tenho certeza de
que ele não quer se casar comigo.
— Não se atreva a colocar palavras na minha boca, Harry — Jasper
respondeu rispidamente.
Sua voz estava baixa, mas sua expressão era estrondosa. Quase podia
acreditar nele, tão intenso era o seu olhar. Quase podia acreditar que a
figura divina perto da janela realmente queria a comum Harriet Stanhope, e
não que estivesse sendo um cavalheiro e fazendo a coisa certa com a sua
amiga de infância.
— Quero me casar contigo, e tem que se casar comigo, goste ou não.
Lamento se essa for uma perspectiva tão horrível, mas não tem escolha.
— Na verdade, Jasper, tenho — respondeu, finalmente se virando para
olhá-lo. — Mas de qualquer forma, a decisão é minha e de mais ninguém,
então seja sensato. Certamente percebe que seríamos desastrosos juntos.
— Não —respondeu com o tom cortante e furioso. — Não percebo
nada disso, o que diabos quer dizer?
— Harriet Stanhope, foi pega em flagrante delicto com... com um
homem — lamentou sua tia com um fervor tão melodramático que Harriet
ficou na expectativa de ouvir um trovão para enfatizar sua reação. Mas não
teve nenhum, embora sua tia tenha adquirido um tom espantoso de
escarlate. — Deve se casar!
— Vou me casar — Harriet respondeu irritada, decidindo que poderia
muito bem acabar com aquilo. — Simplesmente não será com ele!
Houve um silêncio retumbante enquanto todos a olhavam, em choque,
em seguida se assustaram quando uma batida soou na porta.
— Vá embora! — Jasper berrou assim que Lady St. Clair convidou
quem quer que fosse para entrar.
O mordomo apareceu, parecendo chocado e sem saber se deveria
fechar a porta novamente.
— Sim, Temple, o que é? — Lady St. Clair perguntou, calma e
equilibrada como sempre.
— Há um cavalheiro aqui, minha senhora, um Sr. De Beauvoir. Está
perguntando pela Srta. Stanhope. Insiste muito em vê-la.
Todos os olhos se voltaram para Harriet, que soltou um suspiro de
alívio. Enviou-lhe uma mensagem urgente, naquela manhã, mas não ousou
esperar que pudesse vir imediatamente, como exigiu.
— Faça-o entrar, por favor, Temple — disse Harriet, ignorando os
olhares de descrença que lhe foram enviados.
Temple olhou para Lady St. Clair, que assentiu, e depois para Jasper,
que parecia querer assassinar alguém. Temple recuou apressadamente.
— Quem é ele? — Jasper exigiu saber, cruzando a sala para poder ficar
cara a cara com ela.
Harriet engoliu em seco, estava um pouco nervosa com a intensidade
da ira nos olhos de Jasper.
— Senhor Inigo De Beauvoir — respondeu, mas a sua voz não era
nada firme. — Meu noivo.
Jasper sentiu como se tivesse sido golpeado.
— Seu o quê?
Harriet ergueu o queixo, tentando ao máximo conter as lágrimas. Por
um momento, a tentação de se jogar nos braços dele, chorar e dizer-lhe que
sentia muito era quase insuportável, mas aquilo era estupidez e fraqueza.
Estava perfeitamente correta antes. Fariam um casamento desastroso.
— Meu noivo — repetiu, mais suave agora, ao perceber que seu
choque era palpável.
Pobre Jasper, mimado e adorado a vida toda. Não estava acostumado a
ouvir não.
Sabia que se casar com ele seria perfeito, seu sonho tornado realidade,
mas isso era antes. Jasper seria atencioso e amoroso, e baseado na forma
como a fez se sentir na noite passada, ela pareceria uma marionete em suas
mãos. Não seria capaz de manter intacto o muro que havia construído em
volta do seu coração. Bom Deus, ele derrubou parte dele no decorrer de
algumas horas na noite anterior, e sabia que estava certa em tê-lo mantido
distante por tanto tempo.
Jasper Cadogan era o sonho romântico infantil que uma vez teve, mas
não seria feita de idiota novamente. Não abriria seu coração da maneira que
fizera antes, para depois ser esquecida no momento em que não estivesse
por perto. Quando era uma jovem de dezesseis anos, foi destruída, mas foi
resistente o suficiente para juntar os cacos e começar de novo. Como sua
esposa, porém, e a mãe de seus filhos...
O que pensaria quando ele estivesse longe das suas vistas?
O que sentiria ao ouvir as histórias de suas conquistas?
Não.
De qualquer forma, Jasper nunca a entendeu. Suas atividades não o
interessavam, não tinha interesse em aprender nada, na verdade, desprezava
o aprendizado, e isso ela não podia tolerar. Inigo não a amava, nem ela a
ele, mas ambos tinham uma profunda admiração e respeito pelo intelecto
um do outro, e essa era uma boa base para um casamento feliz. Não só isso,
ele seria leal e nunca lhe traria sofrimento com seus casos amorosos. O que
mais poderia querer?
Como se para responder a sua pergunta, a porta se abriu e Temple
apareceu mais uma vez.
— Senhor Inigo De Beauvoir — disse, antes de fazer uma reverência e
fechar a porta atrás do recém-chegado.
Harriet deixou escapar um suspiro aliviado ao finalmente conhecê-lo.
Era alto e magro, o seu perfil lembrava muito o de um falcão. Seu cabelo
era preto, comprido e estava fora de moda, e seus olhos eram de um
estranho verde-acinzentado, frios e impassíveis sob sobrancelhas grossas.
Parecia ser mais velho que seus trinta anos, principalmente porque se
cuidava muito mal, dormia pouco e trabalhava longas horas, daí sua decisão
de encontrar uma esposa. Ao todo, tinha uma aparência bastante sinistra,
embora soubesse que não deveria julgá-lo. Correspondiam-se em segredo
há alguns anos, e, de alguma forma, se tornaram amigos e colegas. Ele a
encorajava a aprender sempre que possível e acreditava firmemente que as
mulheres deveriam receber a mesma educação que os homens. Aos seus
olhos, as mulheres e os homens eram iguais e só pareciam ignorantes em
comparação porque foram ensinadas que era isso que se era esperado delas.
— Obrigada por ter vindo — disse, movendo-se para cumprimentá-lo.
Ele fez uma reverência formal, depois levantou a cabeça para a plateia
que os observava. — Senhorita Stanhope, como posso ser útil?
Harriet enrubesceu, percebendo que deveria explicar exatamente o que
aconteceu na noite anterior, mas estava se perguntando como reagiria. Não
se amavam, é claro, mas ainda assim, concordou em se casar com ele e...
Engoliu em seco.
— Eu... estou em uma situação terrível, — começou mantendo a voz
baixa e de costas para o público. — Talvez possamos conversar a sós e... em
particular.
— Não há necessidade disso.
Harriet saltou quando a voz de Jasper veio atrás dela.
— Senhor De Beauvoir — Jasper continuou suavemente, avaliando o
homem. — Sou St. Clair. Receio que Harriet e eu tenhamos passado por
uma situação muito comprometedora esta manhã. A notícia já deve ter se
espalhado por toda a aldeia a essa altura. Nos casaremos imediatamente. —
Fez uma pausa e olhou para Inigo. — O senhor tem a liberdade de me
desafiar para um duelo, naturalmente.
— Jasper! — Sua mãe exclamou, colocando a mão no coração. — Oh,
não!
Inigo permaneceu inexpressivo, exceto pelo menor movimento de uma
sobrancelha. — Acalme-se, senhora — disse, sem desviar o olhar de Jasper.
— Não vejo necessidade de derramamento de sangue, a menos que... —
Olhou para Harriet. — A senhorita foi forçada?
— Não! — Exclamou enquanto Jasper enrijecia indignado. — Não...
Eu... Eu estava bêbada... quero dizer, não sabia que estava bêbada. Alguém
colocou álcool no ponche de frutas e a noite estava tão quente, eu estava
com uma sede terrível e bebi muito e... e... — Parou quando percebeu que
estava balbuciando, antes de adicionar desesperadamente. — Ainda sou
virgem.
Harriet havia vivido muitos momentos mortificantes em sua vida.
Como uma jovem que usava óculos e era considerada uma excentricidade
na maioria das vezes, era inevitável, mas nunca em sua vida experimentou
algo que a fizesse querer se enrolar e morrer de tanta vergonha.
— Entendo — Inigo disse lentamente, franzindo os lábios. Ele olhou
para Jasper, que ainda parecia querer matar alguém, antes de se virar para
ela. — Bem, Srta. Stanhope, não vejo razão para tanto barulho. É evidente
que a senhorita estava inebriada, e não tenho intenção de puni-la por um
erro tão bobo. Minha oferta é válida, se a senhorita ainda deseja se casar.
— O que? — Jasper explodiu, a sua indignação era tão forte que
Harriet deu um pulo assustada. — Não vê razão? — Trovejou. — Ficamos
pelados juntos, a noite toda! A única razão pela qual ela ainda é virgem é
porque percebi que estava embriagada e eu decidi não continuar, ela
certamente irá se casar comigo!
— Jasper! — Harriet e sua mãe exclamaram em uníssono horrorizado.
Tia Nell soltou um gemido e desabou sobre uma poltrona. Todos a
ignoraram.
— Vai negar isso? — Jasper exigiu, virando-se para Harriet. — Vai
negar que me queria, que implorou?
Harriet olhou-o, furiosa e humilhada. Como pôde dizer aquelas coisas
íntimas sobre ela na frente de todos? A vontade de chorar fez seu peito se
apertar e sua garganta doer, mas em vez de se deixar abater, virou-se para o
Sr. De Beauvoir que estivera observando o evento com o interesse imparcial
de um filósofo observando o comportamento de algumas espécies
desconhecidas.
— Se o senhor puder perdoar minha chocante falta de decoro, ficarei
feliz em continuar nosso noivado, Sr. De Beauvoir, embora ficarei ainda
mais grata se pudermos acelerar o processo.
— Acredito que seja uma decisão sábia —disse, contraindo um lado da
boca na primeira demonstração de emoção que esboçou desde que chegou.
— Harry, não!
Ela soltou um gemido quando Jasper pegou seu braço e a girou com
pânico nos olhos. — Harry, pelo amor de Deus, chega. Chega dessa charada
ridícula. Não o ama, e ele com certeza não a ama. Pode realmente se casar
com um homem que não dá a mínima para o que fizemos juntos ontem à
noite?
— Sei que ele não me ama — disse Harriet, a exaustão tomando conta
e fazendo-a ansiar pelo fim desse melodrama ridículo.
Sua cabeça latejava, sentia-se mal e queria ir embora e cair em prantos,
mas antes precisava acabar logo com aquilo.
— Nosso casamento será baseado na admiração e no respeito mútuo,
milorde — disse o Sr. De Beauvoir, com o que Harriet tinha que admitir um
tom bastante condescendente. — O amor é uma ideia arcaica e sem sentido,
impulsionada por costumes sociais para permitir a paixão física. Na
verdade, o casamento é um conceito antiquado, no entanto, não estamos em
posição de desafiar o mundo e, portanto, devemos nos conformar. Tirando
isso, admiro muito a mente da Srta. Stanhope. Ela tem um intelecto
surpreendente e acho que poderíamos fazer grandes coisas juntos. A... —
Acenou com a mão, indiferente — indiscrição da noite passada foi
provocada pelo álcool e as atenções de um homem bem apessoado — disse,
sorrindo um pouco. — Qualquer jovem inexperiente perderia a cabeça em
tal situação.
Jasper o encarou como se estivesse falando uma língua estrangeira,
embora seu desejo de quebrar o nariz De Beauvoir lhe parecesse bastante
eloquente.
— O amor é uma ideia sem sentido...? — Repetiu fracamente, chocado
demais para expressar qualquer outra coisa. Balançou a cabeça e voltou-se
para Harriet, sua voz urgente. — Harry, amor, sinto muito por como isso
aconteceu, mas não sinto muito por ter acontecido. Eu a queria ontem à
noite e a quero agora. Quero me casar com você.
Harriet engoliu em seco e balançou a cabeça. — Não acredito, Jasper.
Me humilhou hoje, e tudo porque não pode ter o que acredita ser seu, mas
não sou sua. — Não mais, acrescentou silenciosamente, embora seu coração
estivesse se despedaçando por dentro. — Cometi um erro e sinto muito,
mas não vejo razão para nos punirmos ainda mais, quando não há
necessidade.
— Harry, não...
O coração de Harriet se apertou com o desespero em sua voz. Se ao
menos pudesse acreditar nele, acreditar que era real, e não apenas pelo
momento, não apenas por algumas semanas ou meses, mas sempre. — Me
quer, sei que quer. Não negue só porque isso a assusta. Apenas... Apenas me
dê uma chance. Algumas semanas... Por favor.
— Pare com isso — Harriet implorou, balançando a cabeça e piscando
para conter as lágrimas. Podia ouvir a mãe dele soluçando agora também, a
culpa e seu próprio desejo a estavam deixando tonta e sem forças. — Por
favor, pare!
— Não — Jasper respondeu bruscamente enquanto negava com a
cabeça, em seguida pegando as mãos dela. — Não posso, não vou!
— Senhorita Stanhope. — Todos se viraram quando Inigo falou, sua
voz calma e comandante cortando a atmosfera cada vez mais pesada.
Harriet se voltou para ele, grata por sua mente lógica e deslocada.
Queria fugir de toda a agitação e se enterrar em livros e pesquisas, e
qualquer coisa que permitisse que não sentisse mais nada. Era exatamente
por isso que havia aceitado a sua oferta em primeiro lugar.
— Senhorita Stanhope, depois de refletir, acho que Lorde St. Clair tem
razão. Não desejo me casar com a senhorita para descobrir depois que tem
arrependimentos. Nessas circunstâncias, acho que a senhorita precisa tirar o
que quer que esteja entre os dois do seu sistema. Se - uma vez que a
senhorita expurgar toda e qualquer necessidade física que sente por ele - e
ainda desejar se casar comigo, terei o maior prazer em continuar com
nossos planos.
Harriet ficou boquiaberta. Ele estava... estava realmente sugerindo
que...
— Não precisa parecer tão escandalizada — disse De Beauvoir,
claramente achando graça. — Já discutimos essas coisas no passado e a
senhorita conhece minha opinião sobre a liberdade de mente e corpo. Não
tenho exigência de que minha esposa seja virgem. Não quero, entretanto,
ataques emocionais e manifestações de arrependimento interferindo em
meu trabalho. Prefiro que a senhorita tire esses impulsos físicos do caminho
agora, em vez de mudar depois que estivermos casados. É puramente bom
senso. — Olhou de volta para Jasper, analisando-o da cabeça aos pés, com
desprezo. — Estou certo de que uma mulher com uma mente tão brilhante
quanto a sua tomará a decisão certa.
— Seu desgraçado — Jasper disse, sua voz como gelo.
Pela primeira vez, Harriet ficou tentada a concordar com ele.
Houve um silêncio ensurdecedor após esse pronunciamento, e o Sr. De
Beauvoir deu uma risadinha, enquanto olhava de um rosto chocado para o
outro.
— Digamos uma semana? — Sugeriu, antes de se curvar sobre a mão
dela. — Estarei hospedado na estalagem da aldeia, caso precise de mim.
Adeus, Srta. Stanhope. Lady St. Clair, senhora, Lorde St. Clair, bom dia a
todos.
5

Alice! Harriet está na situação mais terrível! Devemos fazer


tudo o que pudermos para diminuir a fofoca. Não ficarei nem
um pouco surpresa se já tiver ouvido sobre isso, essas notícias
viajam na velocidade de um relâmpago, bem sei disso, sinto
muito em dizer, mas é tudo verdade...

—Trecho de uma carta da Srta. Matilda Hunt para a


Sra. Alice Hunt.

31 1814. H H ,S .
— Deixe-nos sozinhos. — A voz de Jasper soou tão dura e implacável,
que mal a reconhecia, mas sua mãe e a tia de Harriet tiveram inteligência
suficiente para sair de uma vez e não proferir nenhum argumento.
Seu coração e sua mente estavam sendo golpeados por todos os lados
por tantas emoções conflitantes. Tudo o que conseguiu fazer foi ficar
imóvel e não dizer nada enquanto todos deixavam a sala. O desejo de
quebrar tudo, pedaço por pedaço, era tão tentador que podia sentir o gosto.
Nunca, em sua vida, se sentiu tão fora de controle, tão apavorado, tão
furioso.
Como se atrevia? Como aquele homem ousava falar de Harriet daquela
maneira? Um homem que se considerava digno de ser seu marido, mas que
a jogaria na cama de outro homem até que se cansassem um do outro.
Jasper se sentiu enojado. Também sentiu o pânico crescendo em seu peito.
Inigo De Beauvoir era um nome com o qual estava familiarizado. Não
por interesse, mas porque tinha ouvido falar dele com bastante frequência.
Era membro da The Royal Society, membro da The Geological Society e
frequentemente dava palestras na The Royal Institution, que era tão
frequentada que pessoas se aglomeravam nos corredores para ter a chance
de ouvi-lo. Bem, o miserável pode ter uma mente brilhante, mas tinha uma
geleira onde seu coração deveria estar.
Ainda assim, estava certo. Harriet era assustadoramente inteligente.
Tinha uma mente que Jasper só podia admirar silenciosamente e com a qual
não poderia sequer pensar em competir. Cristo... nem universidade ele
frequentou. Se o maldito Napoleão não tivesse causado um caos por toda a
Europa, teria feito uma Grand Tour em vez de continuar a humilhação
diária de ser acusado, repetidamente, de ser um idiota. Mesmo assim, seu
pai o enviou para visitar alguns parentes maternos na Rússia, o que Jasper
realmente gostou, embora tivesse sentido muita falta de Harriet.
Não que ela acreditasse nisso.
Por que, em nome de Deus, o escolheria, em vez de um homem com
uma mente brilhante? No entanto, viver sem qualquer tipo de amor era
realmente o que ela queria, o que precisava? Não sabia se poderia fazê-la
feliz e manter sua atenção, mas morreria tentando. Não era como se ele se
ressentisse de sua inteligência ou fosse impedi-la de continuar aprendendo,
passar tempo com pessoas que compartilhavam das mesmas opiniões.
Jasper podia não conseguir discutir as coisas com as quais ela se
interessava, era verdade, e, se conseguisse, era muito provável que não
entendesse a metade delas, mas poderia lhe dar todas as oportunidades,
poderia amá-la, já a amava.
De Beauvoir podia ser inteligente, mas dessa vez errou no cálculo, pois
assim que Jasper tivesse Harriet na sua cama, se certificaria de que nunca
mais quisesse deixá-lo. Talvez não fosse um gigante intelectual, mas sabia
lidar com o corpo de uma mulher. Talvez não fosse nada além de um rosto
bonito, mas aquele rosto funcionaria a seu favor naquele momento. Não se
importava com o que teria que fazer, o quão sujo teria que jogar, Harriet iria
desejá-lo. Ela já havia admitido isso. Iria desejá-lo de carne e osso, e lutaria
por ela. A faria precisar do calor, da paixão e da alegria que poderia dar
para ela. A noite passada não tinha sido nada, apenas um doce sabor do que
poderia haver entre eles, um vislumbre tentador de como seria quando a
tornasse sua. Deus o ajude, mas a deixará tão louca de desejo que não se
lembrará do próprio nome, muito menos do maldito Inigo De Beauvoir.
Assim que tomou posse das suas faculdades e do controle sobre si
mesmo, virou-se para poder olhá-la. Estava parada perto da janela,
observando os jardins. Seus ombros curvados, seus braços abraçando seu
corpo, a pura imagem de sofrimento.
— Seus pais sabem? — Perguntou. — Sobre o noivado?
Balançou a cabeça em negativa. — Sou maior de idade — respondeu
secamente. — Nunca se interessaram pela minha vida. Não vejo razão para
que isso os incomode agora.
Jasper estremeceu. Desde que conseguia se lembrar, Harriet desejava a
atenção do pai. Outro homem brilhante com engrenagens no lugar onde
deveria bater um coração. Não importava o quanto tentasse - e ela tentava -
não conseguia impressioná-lo, pois ele não acreditava que o cérebro
feminino fosse capaz de genialidade. Henry era uma decepção para seu pai
de outras maneiras. Oh, não era burro - tinha se saído muito melhor do que
Jasper - mas não podia se comparar a Harriet. Não que seu pai se dignasse a
notar.
— Quer mesmo ir em frente com isso?
— Com o noivado? — Perguntou com a voz maçante. — Por que não?
Jasper soltou um suspiro e lutou para se acalmar. — Porque não o ama,
e não me venha com nenhum absurdo desdenhoso sobre os costumes
sociais. Precisa ser amada, Harry. Todo mundo precisa. Você merece.
— Talvez o que mais preciso é ser compreendida.
— Certeiro, Harry, — reconheceu, sentindo a ponta farpada daquele
comentário afundar na carne exposta do seu coração. Parecia sempre
colocá-lo no front, aberto a ataques. — É por isso que me despreza, por que
me considera um idiota?
Ela se virou, sua surpresa evidente. — Não o desprezo e nunca pensei
que fosse um idiota. Pelo contrário. Estou cansada de ser objeto de suas
troças e não consigo respeitar um cavalheiro que despreza o aprendizado
como acontece contigo, que zomba de mim e de tudo o que eu amo.
— Mas eu não zombo, Harry, — grunhiu. — Sempre a admirei.
Certamente sabe disso?
A risada amarga dela o assustou. — Ah, claro. Sempre fez questão de
admirar meu intelecto. Ora, ora, as coisas que sabe, Srta. Stanhope —
imitou-o, capturando sua fala arrastada e arrogante com uma precisão
incrível. — Quantas vezes me humilhou em público, Jasper? Gostaria de
contar as ocasiões?
Jasper corou, sabendo que merecia aquilo. Zombou dela, terrivelmente,
por sua inteligência, muitas vezes e até mesmo rudemente, e sim, em
público, mas apenas porque estava cansado de ser ignorado. Melhor odiá-lo
e atacá-lo, do que deixar de existir no seu mundo.
— Não quis dizer nada daquilo — disse, sabendo que era uma resposta
inadequada, mas nunca tinha sido eloquente com ela, e não esperava
conseguir isso agora. — Eu simplesmente... Droga, Harry, me faz ter as
ações mais selvagens quando me ignora!
Ela riu então, e foi um som tão cansado e desgastado que seu coração
doeu. — Eu sei — disse, as palavras quase calmantes. — Pobre Jasper.
Nunca lhe foi negado nada, não é? Deus, era tão mimado. Você e Jerome.
Os príncipes dos olhos da sua mãe. É uma surpresa que consiga se vestir
sozinho. Ora, mas é claro! Tem um valete, não tem? — Acrescentou
ironicamente.
— Então é isso? Acha que sou um garotinho mimado?
Ela balançou a cabeça e não havia malícia em suas palavras, nenhum
calor, mas queimavam do mesmo jeito. — Acho que nunca teve que
trabalhar para conseguir tudo o que sempre quis. Tem um cérebro decente
na cabeça, mas não o usa porque nunca precisou, é preguiçoso demais para
tentar ser mais do que é.
Aquilo estava tão longe da verdade que queria lamentar a injustiça de
suas acusações, só que ela não sabia disso. Ninguém sabia. Não sabia que
tudo tinha sido uma encenação para disfarçar a verdade, que ele não tinha
um cérebro decente. Era muito melhor ser considerado um libertino e
promíscuo que não dava a mínima para livros e educação, do que deixar as
pessoas saberem que era um burro ignorante.
O que diria se soubesse que mal conseguia escrever, que qualquer
tentativa era cheia de erros de ortografia, e as frases que conseguia escrever
tinham umas estruturas estranhas, e que ler era uma tarefa tão árdua que
fazia sua cabeça doer? Sempre que tentava, as letras pareciam se
reorganizar e não faziam o menor sentido até que sua vontade era gritar de
frustração. Tinha se safado na escola fazendo com que os meninos mais
novos lessem coisas para ele e fizessem sua lição de casa, aprendendo o
máximo que podia de cor. Como poderia dizer isso a ela? Como poderia
dizer para a brilhante e inteligente Harriet, a quem venerou e admirou por
tanto tempo, que era quase analfabeto? Certamente o desprezaria. Ele era o
maldito Conde St. Clair e levava horas para escrever as notas mais simples,
e mesmo assim quase ilegíveis. Era além de humilhante.
Jasper forçou o nó em sua garganta. Não podia confessar a verdade,
mas poderia continuar tentando se desculpar por provocá-la.
— Sinto muito — disse, desejando com tanta força que suas palavras,
com a voz rouca, soaram estranhas a seus ouvidos. — Sinto muito por todas
as vezes que fiz troça e a deixei com raiva. Nunca fui sincero em nenhuma
das vezes, Harry. Eu a admiro muito, amor. Juro que sim. Por favor, não
recuse minha oferta sem ao menos pensar nela primeiro. Nós fomos
próximos uma vez, gostou de mim uma vez. Até mesmo...
— Não, Jasper. — Virou-se e o encarou, seus olhos excessivamente
brilhantes, mas sua voz firme. — Vou me casar com o Sr. De Beauvoir. É
melhor assim. Verá isso quando eu for embora. No minuto em que eu sair
da sua vista, vai se esquecer de mim.
A respiração de Jasper prendeu com suas palavras. Isso era o que ela
pensava dele, que era um bobo superficial, insensível e sem coração? A dor
cresceu em seu peito, quente e com raiva.
— E o que aconteceu ontem à noite, Harry? — Exigiu, diminuindo a
voz, enquanto se aproximava dela. — E o fato de me implorar para fazer
amor contigo?
As bochechas de Harriet ficaram vermelhas, ela tentou se afastar, mas
Jasper a segurou e puxou-a para seus braços. Arfou, chocada, e fez um som
de protesto até que ele a beijou, sufocando seu choque antes que pudesse
dizer não. Houve um momento de resistência e então se derreteu, abrindo a
boca e beijando-o de volta. Jasper a segurou contra ele com tanta força que
deve ter esmagado o ar de seus pulmões, mas ela não fez nenhuma objeção,
suas mãos agarraram seus cabelos e os puxaram, o desejo fazendo uma dor
atravessar seu corpo, sabendo que os dois estavam com raiva, mas que o
queria muito, embora odiasse ter que admitir isso.
— Negue isso — provocou sem fôlego enquanto a olhava fixamente.
Encarou-o de volta, seus olhos escuros mais arregalados do que nunca
por trás dos óculos. Estavam tortos, podia estar com a aparência cômica,
mas seu coração se apertou de desejo. Deus, era um tolo. De todas as
mulheres por quem poderia se apaixonar. Não era arrogância acreditar que
poderia ter quase qualquer mulher que quisesse com um estalar dos dedos,
era a simples verdade, e se apaixonou pela única que não conseguia
impressionar.
— Não posso negar que existe uma... uma atração física — disse de
uma forma tão fria e cínica que ele quis sacudi-la. — Inigo... o Sr. De
Beauvoir estava certo.
— Oh, sim, amor, ele estava certo. — Jasper riu, um som sombrio e
infeliz de que não gostou muito. — Mas lhe digo agora, se acha que pode
me tirar do seu sistema em uma semana, está muito enganada. Assim que a
tiver na minha cama, nunca mais vai querer sair dela.
Harriet enrijeceu em seus braços e empurrou seu peito, e Jasper a
soltou.
— Não tenho intenção de ir para a sua cama.
— Mas foi mandada, Harry, — zombou, sentindo-se mal por aquilo,
mas incapaz de se conter. Estava desesperado agora, lutando por seu futuro,
e faria o que fosse necessário, não importando o quão mal tivesse que se
comportar. — Seu futuro marido quer que me expurgue do seu corpo e da
sua cabeça, e baseado no nosso pequeno beijo agora pouco, está muito, mas
muito longe de conseguir isso.
— Bobagem — respondeu, mas parecia sem fôlego e seus olhos ainda
estavam escuros com o desejo. — A luxúria é uma emoção de curta
duração, não dura muito tempo. Depois que sair da minha vida, vou parar
de pensar em você.
— Mas não vou sair da sua vida, Harry, — avisou. — Então, não pense
que pode fugir disso.
— O que quer dizer? — Exigiu.
— Quero dizer que mereço uma chance, droga — praguejou, o que
restava da sua compostura se partindo. — Tenho uma semana para
conquistá-la, para fazê-la ver que é a mim que quer, e não vou desistir sem
lutar primeiro.
Harriet engoliu em seco e balançou a cabeça.
— O que foi, amor? — Perguntou, aproximando-se dela. — Tem medo
de mudar de ideia?
— Não! — Respondeu, erguendo o queixo, os olhos brilhando de
indignação. — Não vou mudar de ideia.
— Então prove.
— Está bem!
— Hoje à noite.
— Sim! — Harriet o fulminou com o olhar, cerrando os punhos,
totalmente furiosa.
Jasper se lançou sobre ela e a puxou para os seus braços, beijando-a
como se fosse o fim do mundo, como se fosse a última coisa que soubesse
fazer, e seu coração cantou em triunfo quando Harriet respondeu da mesma
forma, pressionando-se contra ele com abandono, segurando-se em seus
ombros.
Embora fosse a coisa mais difícil do mundo, Jasper quebrou o beijo e
deu um passo para trás, tão rapidamente que ela cambaleou. Estava
respirando com dificuldade, seus lábios avermelhados pelo beijo dele, sua
expressão, uma combinação feroz de desejo, indignação e raiva que ele
entendia bem.
— Sabe onde fica meu quarto — disse, as palavras soando mais frias
do que pretendia. — Espero-a depois do jantar.
Ela assentiu tensa e Jasper girou nos calcanhares e deixou a sala.
6

Querida Prue,
Nunca tive a chance de lhe agradecer por persuadir mamãe a
me deixar ficar com Bonnie e Ruth. Elas são tão divertidas e,
embora saiba que não devo dizer uma coisa tão horrível, é tão
maravilhoso ficar livre de mamãe por um tempo.
—Trecho de uma carta da Srta. Minerva Butler para
Sua Graça, a Duquesa de Bedwin.

31 1814. H H ,S .
Matilda respirou fundo e olhou para as nuvens escuras que se
acumulavam no céu. Era melhor se apressar para Holbrooke House, supôs,
mas ainda não estava disposta a voltar, queria ficar fora o máximo possível.
Inventando uma desculpa esfarrapada, disse que precisava comprar luvas
novas e assim caminhou até a aldeia.
Todos os outros convidados haviam partido naquela manhã, como
programado, após o grande baile da noite anterior, mas nenhum deles
levantou cedo o bastante para não obter os detalhes obscenos do mais
recente e suculento escândalo. Quando os convidados partissem para suas
casas, o escândalo iria com eles, para a história ser de conhecimento geral,
era questão de dias.
Ruth, Bonnie e Minerva também saíram cedo, antes de descobrirem
Harriet com St. Clair, para visitar uma tia de Ruth, que morava a cerca de
uma hora de distância. Voltariam no final da tarde, o que deixava Matilda
como a única hóspede remanescente na casa, um fato que a deixava
desconfortável. Isso era sem dúvida ridículo, pois seria possível perder um
exército inteiro naquele lugar cavernoso e não notar, mas Harriet e Jasper
precisavam de um tempo a sós, sem se preocupar com os convidados
metendo o nariz em seus problemas, e para ser honesta, Matilda não queria
esbarrar nos dois antes que estivessem prontos para falar.
Lady St. Clair convidou Matilda para que ficasse o tempo que
desejasse, Bonnie e Ruth também ficariam mais alguns dias. Prue e Bedwin
haviam partido, pois tinham um compromisso anterior, para grande
ansiedade de Prue, que não perdeu tempo em assegurar Matilda que
informasse Harriet que fariam tudo ao seu alcance para mitigar o pior do
boato, embora ambas soubessem que seria em vão. Kitty também queria
ficar e adiar a viagem de volta à Irlanda, onde informaria seus pais sobre
seu casamento com Luke. No entanto, Harriet foi inflexível para que não
fizesse aquilo; não queria que seus problemas obscurecessem a felicidade
de Kitty e seu casamento. Prometeu a Kitty que escreveria, caso precisasse
dela, e Matilda ficou tocada pela maneira como Kitty jurou que retornaria a
qualquer momento que ela precisasse. Não mentia e sua sinceridade
também comoveu Harriet.
Matilda estava feliz que as meninas tivessem se tornado amigas,
embora fossem terrivelmente diferentes umas das outras. Esperava poder
ser um conforto agora, se Harriet pudesse confiar nela. O fato de ter sido
pega com Jasper, de todas as pessoas, só provou as suspeitas de Matilda de
que havia muito mais em seu relacionamento do que Harriet permitia que as
pessoas soubessem. Jasper tinha aproveitado a oportunidade e a seduzido?
De alguma forma, Matilda achava que não, mas nunca se sabe em relação
aos homens, e jurou dar a Harriet todas as chances para que desabafasse.
O Sr. Burton também estava entre o êxodo de convidados que partiram
naquela manhã. Matilda não pôde evitar o suspiro de alívio que escapou ao
saber disso, embora soubesse que era apenas um alívio temporário. Fez
questão de dizer-lhe que iria visitá-la assim que voltasse para a cidade. Esse
foi um dos motivos pelos quais aceitou a oferta de Lady St. Clair com tanto
entusiasmo. Tinha muito que pensar sobre alguns assuntos e ficou grata
pelo convite, até porque Harry precisaria do seu apoio naquele momento.
Recusou-se a admitir o alívio extra de ter os problemas de outra pessoa com
os quais se preocupar. Os seus problemas certamente poderiam esperar.
Matilda olhou para o céu ameaçador e murmurou uma maldição nada
feminina. Tinha sido uma manhã adorável, mas o calor e a umidade
excessivas dos últimos dias finalmente chegaram ao limite. O trovão
ribombou ameaçadoramente à distância e Matilda correu o mais rápido que
pôde, quando as primeiras gotas de chuva caíram sobre a estrada
empoeirada, com uma agressão surpreendente. Diabos. Estava exatamente
na metade do caminho entre a aldeia e Holbrooke House, não fazia sentido
voltar para trás. A distância entre a casa e a aldeia era de cerca de cinco
quilômetros, e Matilda estava ansiosa com a oportunidade de esticar as
pernas e fazer uma caminhada agradável. Mas seu otimismo parecia ter sido
equivocado; soltou um pequeno grito de consternação quando os céus se
abriram e a raivosa rajada de chuva ensopou seu vestido de musselina em
questão de segundos.
Correndo o melhor que podia com o tecido molhado grudado em suas
pernas, Matilda buscou abrigo debaixo de um enorme carvalho, quando um
trovão estrondoso rasgou o céu acima da árvore. Estremeceu e olhou ao
redor, em busca de outro abrigo, com menos probabilidade de ser atingida
por um raio. Lembrando ter visto o que talvez tivesse sido uma cabana um
pouco mais a frente, na estrada, cambaleou para longe do carvalho e tentou
ignorar a chuva congelante que picava sua pele. Um grito escapou dela
quando outro trovão explodiu, o estrondo foi tão alto que estremeceu o chão
e vibrou em seu peito, fazendo seus ouvidos zumbirem. À medida que o
som dissipou, outro ocupou seu lugar, e demorou um momento para que
percebesse que não se tratava de outro trovão, e sim um guinchado
aterrorizado de um cavalo.
Virou-se e arfou quando um enorme cavalo baio empinou na estrada,
logo atrás dela, seus cascos se agitaram e expôs o branco dos seus olhos
enquanto a besta relutava contra o controle de seu cavaleiro. Matilda
observou admirada e horrorizada, incapaz de acreditar que o cavaleiro
conseguia permanecer montado naquelas circunstâncias e controlar o
animal. A besta ainda estava com os olhos selvagens e apavorados quando
outra explosão de trovão estourou acima deles, seguida rapidamente por um
raio que atingiu apenas três metros de distância. O cavalo reagiu
imediatamente, relinchando de medo e empinando de forma tão violenta
que ela pensou que cavalo e cavaleiro fossem cair para trás, mas antes
disso, ele finalmente deslocou seu cavaleiro e disparou ao longo da estrada
a uma velocidade vertiginosa.
— Deus do Céu! — Matilda exclamou e correu em direção ao sujeito,
rezando para que não estivesse gravemente ferido.
Quando se aproximou dele, seus olhos registraram uma mecha de
cabelo loiro platinado e seu coração deu um salto no peito quando o
reconheceu.
— Oh, não, — disse, já que a figura estava terrivelmente imóvel.
Ajoelhando-se, afastou o cabelo encharcado de seus olhos, que
permaneceram fechados. O perfil belo e arrogante era angelical quando
visto daquela forma, seus cílios eram grossos e tinham a cor de ouro mais
escuro, sombreando as maçãs do seu rosto saliente; e a boca, que sempre
acreditou ser cruel, era muito mais suave e surpreendentemente cheia em
repouso.
— Milorde — chamou, dando tapinhas em sua bochecha, enquanto seu
coração disparava de medo. Não podia estar morto, não ele. Não era
possível. — Milorde, acorde, por favor... por favor, acorde.
Ele não se mexeu e o coração de Matilda apertou. Não, não, não se
atreva.
— Milorde — disse novamente com mais urgência. — Oh, Montagu,
seu maldito, acorde! Por favor, por favor...
Ele suspirou e suas pálpebras abriram. Matilda prendeu a respiração
quando aqueles surpreendentes olhos prateados encontraram os dela. Por
apenas um segundo ele piscou, ainda estava confuso quando Matilda soltou
um grito e colocou a mão no coração.
— Graças a Deus, — disse, incapaz de esconder as profundezas de seu
alívio. — Graças a Deus!
— Estou morto? — Veio um murmúrio divertido e seco.
— Não me tente — Matilda murmurou encontrando seus olhos
brilhando e focados apenas nela. — O senhor me deu um grande susto.
— Ah — disse, seu tom ligeiramente curioso. — Só queria saber por
que a senhorita estava agradecendo a Deus com tanto fervor. Estou aliviado
ao descobrir que não foi porque a senhorita finalmente se livrou de mim.
Embora a chuva ainda estivesse caindo insistentemente ao redor deles,
como ele não tentou se mover, perguntou-se se estava gravemente ferido.
— O que há de errado? — Exigiu, inclinando sobre ele quando o
pânico que sentiu antes retornou. Olhou-o, inspecionando o comprimento
de seu corpo poderoso enquanto procurava por qualquer sinal de sangue ou
ossos quebrados. O desejo de correr as mãos sobre seu corpo e verificar
cuidadosamente foi algo que lutou para conter. — O senhor está
machucado? Quebrou alguma coisa?
Quando seu olhar voltou para o rosto dele, teve uma fração de segundo
para registrar um olhar que fez seu coração pular antes dele levantar a mão
e apertar sua nuca.
— Ah não! — Gritou, tapeando o braço dele e se afastando com tanta
rapidez que caiu de costas em uma poça.
Seu coração estava retumbando aterrorizado em pensar num beijo dele,
pois sabia que era isso que ele pretendia fazer. Também sabia que, se sua
boca encostasse a dele, todas as esperanças que tinha para o futuro
desapareceriam no espaço entre um batimento cardíaco e outro. Não podia
mais negar o que ele vivia afirmando, de que havia algo entre eles, uma
poderosa atração magnética que parecia não se importar se realmente
gostavam ou não um do outro. Tinha razão, mas ela negaria até seu último
suspiro.
— Uma pena — Montagu suspirou, apoiando-se nos cotovelos. —
Pensei que a senhorita pudesse ser mais gentil com um cavalheiro ferido.
— Ferido? — Matilda retrucou, levantando toda desequilibrada e
fazendo o possível para olhar furiosamente para ele enquanto enxugava a
chuva dos seus olhos. Não era fácil. — Vou feri-lo permanentemente se o
senhor tentar fazer isso de novo.
Montagu a olhou, aquela sua boca arqueada de forma tão arrogante que
lhe era muito familiar. — Não se preocupe, Srta. Hunt, não vou tentar
novamente. Na verdade, acho que prefiro que a senhorita instigue nosso
primeiro beijo. Será muito mais doce assim.
Matilda ficou boquiaberta. — O senhor é insano.
Encarou-a, e, na intensidade de seu olhar, aquela certeza inabalável de
que estava certo, fazendo com que ela ficasse com um desejo
enlouquecedor de desviar os olhos, mas não fez isso. — A senhorita sabe
perfeitamente que não sou. A senhorita deseja me beijar tanto quanto eu
quero que o faça, mas sou um homem paciente, Srta. Hunt. Agora, —
continuou mudando de assunto como se estivessem falando sobre o tempo,
e deixando Matilda abalada, — temo que terei de me valer de sua ajuda.
Acredito que machuquei meu tornozelo na queda.
Matilda o encarou por um momento, dividida entre negar
fervorosamente que queria beijá-lo - embora soubesse que era uma mentira
e que provavelmente precisava ser trancada para sua própria segurança - e
continuar a se preocupar com o quão gravemente estava ferido.
— Está quebrado? — Perguntou, voltando para o lado dele.
— Não, — respondeu, enquanto ela se abaixava e colocava o braço sob
o dele para ajudá-lo a se levantar. — Acho que não, mas... Cristo!
Matilda vociferou quando os dois quase caíram de novo, pois não
conseguia suportar o peso dele. De alguma forma, Montagu equilibrou os
dois, e ao olhá-lo descobriu que seu rosto estava pálido.
— O senhor tem certeza de que não está quebrado? — Arriscou.
— Bastante certeza — disse, laconicamente. — Torcido, acredito.
— Pelo menos a chuva está diminuindo —, disse Matilda, tentando se
distrair do fato de que o braço do marquês de Montagu estava em volta da
sua nuca e apoiado em seu ombro, fazendo com que ficasse pressionada
firmemente a lateral de seu corpo. Um trovão estrondou baixinho, ficou
aliviada ao perceber que a tempestade estava se afastando. — O que
fazemos agora? — Perguntou, rezando para que ele não fizesse algum
comentário desagradável, pois estava tremendo, e sabia que não era pelo
frio, mas juraria por sua vida que era, se fosse questionada.
Era tão sólido, muito mais musculoso do que imaginou por baixo de
toda aquela alfaiataria impecável. Acreditava que fosse alto e magro, mas o
corpo abaixo da sua mão era firme e muito mais poderoso do que
imaginava. O calor que emanava queimava através de suas roupas úmidas e
começou a se sentir desnorteada com sua proximidade. Talvez estivesse
ficando doente. Esperava que pudesse ser pneumonia e não algo mais
perigoso.
Montagu não respondeu, mas olhou em volta ao ouvir o som de cascos
de cavalos.
— Graças aos céus pelas pequenas bênçãos — disse, com um suspiro,
enquanto quem quer que fosse parou e os cumprimentou, escorregando da
sela e correndo até o marquês.
— Milorde! — O homem exclamou, os olhos arregalados de
preocupação. — O senhor está ferido, milorde? Saí assim que ouvi a
tempestade.
Matilda admitiu surpresa, com a preocupação óbvia na expressão do
homem. Pela aparência, presumiu que fosse um cavalariço ou algo do tipo,
e era óbvio que saíra apressado pois não usava um casaco, estava apenas
com sua camisa de baixo. Rijo e magro, era, talvez, vinte anos mais velho
que o marquês.
— Nada com que se preocupar, — Montagu respondeu. — Obrigado
por vir.
O sujeito tirou tardiamente o chapéu da cabeça e surpreendeu Matilda
ao murmurar: — Eu disse ao senhô que ia caí uma tempestade.
— De fato — Montagu disse, sua expressão benigna e sufocante ao
mesmo tempo. Estava se perguntando como ele fazia aquilo. — Vou
precisar da sua montaria para levar a Srta. Hunt de volta para Holbrooke
House. Volte para a estalagem, mande minha carruagem me buscar e faça
com que o pessoal saia à procura de Rhaebus. Rezo para que ele não se
tenha ferido.
— Sim, milorde, imediatamente.
— E como o senhor propõe montar um cavalo com um tornozelo
torcido, milorde? — Matilda perguntou irritada.
Montagu devolveu um olhar de leve surpresa quando Thornton se
aproximou com o cavalo. Matilda observou quando o marquês agarrou um
punhado de crina com a mão esquerda, colocou a direita na sela e saltou
sem nunca tocar nos estribos. A boca de Matilda ficou um pouco seca e ela
bufou, recusando-se a admitir que estava impressionada.
— Posso fazer isso sem sela também, se a senhorita preferir —
ofereceu.
— Dificilmente o certo para o marquês de Montagu, —rebateu,
fingindo uma expressão escandalizada, quando, na verdade, já estava
imaginando exatamente isto. — O que a ton diria se soubesse?
— Imagino que todos os jovens cavalgariam para cima e para baixo em
Rotten Row, sem nenhuma sela, no dia seguinte — disse, seu tom entediado
usual evidente, embora seus olhos estivessem brilhando de diversão.
Matilda murmurou algo sobre orgulho vir antes de uma queda, mas por
outro lado se recusou a cair na isca dele.
Montagu deu algumas instruções para Thornton, antes que o homem
corresse de volta para a aldeia. O marquês aproximou o cavalo dela.
— Venha, Srta. Hunt.
Matilda olhou para cima com os olhos arregalados quando Montagu
estendeu-lhe a mão.
— Absolutamente não —, disse, recuando e balançando a cabeça. —
Não, não. De fato, não. Agradeço, mas prefiro caminhar.
— Não deveria preferir, sua tola. A senhorita está encharcada até os
ossos e vai acabar ficando doente. Além disso, — acrescentou com um
brilho perverso nos olhos, que fez seu pulso vibrar de uma forma
notavelmente estúpida — a senhorita sabia que a musselina fica
curiosamente transparente depois de molhada?
Matilda de repente sentiu-se um pouco menos gelada quando suas
bochechas chamuscaram, deu um pequeno gemido de indignação. Pelo
menos da cintura para cima ela estava coberta por sua spencer, embora
também estivesse encharcada, mas da cintura para baixo...
— Venha, ande logo, Srta. Hunt. Afinal, sou um cavalheiro.
Certamente a senhorita confia em mim o suficiente para não olhar.
— Não confio — Matilda respondeu sucintamente e começou a se
afastar, apenas para perceber que tipo de visão aquilo lhe proporcionaria.
Praguejou e se virou, segurando sua reticule à sua frente. — O senhor vá na
frente, — grunhiu por entre os dentes cerrados.
— Não, Srta. Hunt. Não poderia.
Matilda estreitou os olhos para ele e sabia que perderia aquele embate.
— O senhor é, sem dúvida, o homem mais odioso, arrogante e irritante de
todo o país.
Montagu resmungou, balançando a cabeça consternado. — Do
império, certamente? Se é algo que valha a pena, etc... — Acrescentou,
acenando com a mão indiferentemente.
Reprimindo o desejo de rosnar furiosamente - pois certamente ele
gostaria disso - Matilda foi até o cavalo. Montagu se abaixou antes que ela
se preparasse, e a próxima coisa que percebeu foi que estava sendo
levantada e posta de lado na frente dele. Deu um gritinho agudo, até porque
o pomo era muito desconfortável, quase escorregou, mas um braço forte
agarrou sua cintura, segurando-a firmemente no lugar.
— Acalme-se, a senhorita vai acabar assustando o cavalo, —
respondeu irritantemente frio, enquanto Matilda olhava para o chão, que
parecia terrivelmente longe demais.
— Não gosto de cavalos — disse, sem saber o que lhe causava mais
angústia, se a proximidade do marquês ou a falta de proximidade com o
solo. Não. Não tinha nenhum pouco de dúvida. Na verdade, não tinha muita
opção a não ser se agarrar a ele, dada a falta de espaço. Era íntimo demais e
estava destruindo seu equilíbrio.
— Estou segurando a senhorita — disse, com a voz calma, o que a
perturbou mais do que qualquer outra coisa que ele poderia ter dito ou feito.
As palavras deslizaram sobre sua pele como uma carícia e a fizeram
querer afundar em seu abraço. Em vez disso, se afastou e se aprumou, o
mais longe possível, rígida de ansiedade enquanto o cavalo balançava em
movimento. Alarmada, agarrou a coisa mais próxima para se firmar,
percebendo depois que eram as lapelas de Montagu.
Ele olhou para baixo e suspirou. — Bem, já estava arruinado de
qualquer maneira, suponho, embora prefira que a senhorita coloque seus
braços em volta do meu pescoço.
— Prefiro morrer, — Matilda disse, desejando que seus dedos
soltassem seu casaco, mas completamente incapaz de fazê-lo.
Observou o chão passando sob o cavalo, enquanto a besta avançava.
Continuaram assim por algum tempo, Matilda rígida de tensão e olhando
fixamente a terra.
— Pare de olhar para baixo, — Montagu disse, uma nota de diversão
em sua voz. — Prometo que não vou deixá-la cair. Devo confessar que
estou satisfeito em descobrir algo que a assusta. Estava começando a
acreditar que a senhorita era totalmente destemida.
Isso foi o suficiente para fazê-la olhar para cima e encará-lo com
espanto.
— Que foi? — Perguntou. — Há muitas pessoas que me temem, que
gaguejam e balbuciam na minha presença, mas a senhorita não. Nem uma
única vez. A senhorita nunca teve medo de mim, desde o começo.
Disse aquilo sem inflexão, apenas um reconhecimento da verdade.
Montagu era um homem poderoso e com muitos interesses. Ame-o ou
odeie-o, ninguém pode ignorá-lo e muitos temem seu desagrado.
— O senhor está equivocado — Matilda respondeu, afastando-se dele.
Temia-o, temia o caminho a que ele poderia levá-la se cedesse à
tentação.
— O que o senhor está fazendo aqui? — Perguntou, antes que ele
pudesse questioná-la mais, e ficou ainda mais aliviada por Holbrooke
House começar a aparecer à frente.
Quanto antes se afastasse dele, melhor.
Houve uma breve pausa antes dele responder. — Eu tinha negócios na
região.
— Com St. Clair?
— Não, eu... St. Clair me convidou para a festa, mas eu tinha outros
assuntos que precisavam da minha atenção. Enfim, estava aqui há alguns
dias, por isso achei educado fazer uma visita.
Matilda se virou e arqueou uma sobrancelha para ele.
— O que? — Perguntou. — Minhas maneiras são impecáveis, Srta.
Hunt, pergunte a qualquer um.
Ela fez um som que não era particularmente elogioso e ouviu o som
baixo de uma risada. Cavalgaram em silêncio por um tempo e Matilda
concentrou todo seu ser em ignorar o corpo masculino musculoso tão perto
dela, as coxas poderosas controlando o cavalo abaixo com facilidade, e o
perfume dele que emanava de suas roupas úmidas. Couro e cavalos, o
aroma sutil de bergamota e algo quente e masculino a envolveram. O desejo
de afrouxar o aperto em sua lapela e deslizar a mão por seu pescoço era
tentador. Poderia afundar os dedos em seus cabelos e ver as mechas loiras
emaranhadas neles, observar aqueles olhos cinza-prata pálidos
escurecerem...
Pare com isso. Pare imediatamente com isso. Seria como acariciar uma
cobra, se repreendeu. Perdeu completamente o juízo?
Totalmente, inegavelmente, irremediavelmente, respondeu uma voz
melancólica em sua cabeça que se recusou a reconhecer.
— A senhorita já pensou mais sobre a minha oferta, Srta. Hunt?
Ora, era isso.
— Aqui é o suficiente — disse, furiosamente, enquanto arrancava o
braço dele da sua cintura.
— Senhorita Hunt, tome cuidado, a senhorita vai cair, —protestou, mas
Matilda não se importou.
Praguejando baixinho, escorregou do cavalo em uma pilha nada
feminina antes de se endireitar.
— Vire-se e volte por onde veio —, disse, e esticou o braço, apontando
de volta para a aldeia.
Graças a Deus, pensou, grata por estar enraivecida, e aliviada porque
isso a salvou de fazer papel de boba. No entanto, não estava disposta a sair
andando, com ele a observando, não depois do comentário sobre musselina
molhada. Chegar ao quarto sem ser vista já seria um desafio e tanto.
Sua expressão ficou sombria. — A senhorita age como se a estivesse
insultando, — disse friamente. — Ainda assim, a senhorita seria uma das
mulheres mais poderosas da ton. Sei de mulheres que se comportaram
levianamente pela menor oportunidade de serem consideradas minhas
amantes.
— Então vá e conceda suas honras a elas, milorde, — disse, zombando
dele, grata por lembrar exatamente quem ele era e o que queria dela. Por um
momento, no alívio de saber que ele estava vivo, se esqueceu disso, foi uma
coisa imperdoavelmente estúpida e perigosa de se fazer.
Observou-a, e ela pensou que falaria alguma coisa, mas então sua
mandíbula apertou e ele deu um aceno quase imperceptível.
— Bom dia, Srta. Hunt.
Matilda observou enquanto virava seu cavalo e partia; esperou até que
estivesse fora de vista, antes de correr para o abrigo da casa.
7

Querida Aashini,
O que aquele homem horrível tem...
Não pode adivinhar quem encontrei hoje...
Sou uma tola.
Tenho me divertido muito aqui em Holbrooke House, mas
temo que a pobre Harriet esteja em uma situação difícil...
―Trecho de uma carta da Srta. Matilda Hunt para Lady
Aashini Cavendish

31 1814. H H ,S .
Matilda observava as chamas que crepitavam alegremente na lareira de
seu quarto. Estava seca e aquecida, um bule de chá sobre a mesa ao lado e
um prato de bolinhos no colo. A chuva tinha voltado, e quando se está
confortavelmente dentro de casa, o som da chuva batendo contra o vidro da
janela é bastante reconfortante. Ao menos a tempestade havia partido com a
mesma velocidade com que havia chegado. Com uma onda atípica de
vingança, esperava que o tornozelo de Montagu doesse muito, e depois
suspirou quando seus olhos pousaram na bela orquídea que ele lhe deu.
Sabia que não desejava isso de verdade. Deveria desejar, se tivesse um
pingo de juízo, desejar com todas as suas forças, mas não tinha.
O fato de ter trazido a maldita orquídea, em vez de deixá-la correr o
risco de morrer em sua ausência, dizia muito sobre seu estado de espírito.
Só o maldito Montagu para dar-lhe algo tão perfeitamente lindo e
horrivelmente caro que a faria se sentir como um monstro, se sofresse
algum dano em suas mãos. Gastou uma fortuna em livros e horas lendo
sobre como cuidar da maldita coisa, pelo amor de Deus. Era lamentável.
Por que o maldito não podia simplesmente enviar-lhe rosas e acabar com
isso?
Uma batida na porta espantou seus pensamentos, e ela colocou o prato
de bolinhos de lado.
— Entre.
Matilda levantou-se com um pulo, quando Harriet colocou a cabeça
entre a porta entreaberta.
— Posso entrar? — Perguntou com a voz nada firme.
— Claro que sim, querida. Entre e sente-se. Oh, Harriet... — exclamou,
quando Harriet fechou a porta e começou a chorar imediatamente.
Matilda foi ao seu encontro e a abraçou com força.
— Pronto, pronto, — acalmou-a. — Venha e me conte tudo. Prometo
que vai se sentir muito melhor quando tirar isso do peito. Duvido que seja
tão horrível quanto pensa.
Guiou Harriet, que soluçava, até a cadeira que acabara de desocupar e
aguardou, permitindo-lhe um momento para se recompor enquanto acendia
o fogo e servia outra xícara de chá. Depois que a jovem recuperou um
pouco do seu controle, Matilda arrastou a poltrona para perto de sua amiga
e se sentou.
— Agora, então, querida. Acho que talvez seja melhor que comece do
início, não é?
Harriet olhou-a por um bom momento, seus olhos escuros como uma
coruja e vulneráveis por trás daqueles óculos delicados que usava, e então
assentiu.

31 1814. T W ,S .
— Céus, mas a sua tia é uma mulher desagradável — Bonnie disse
enquanto a carruagem se afastava ruidosamente da casinha onde vivia a tia
de Ruth.
— Bonnie! — Minerva exclamou chocada, mas Ruth apenas riu da
avaliação contundente de Bonnie, uma risada tão profunda que fez Minerva
sorrir apesar de seu choque.
— Bom, temo em dizer, mas é verdade — Ruth respondeu com os
lábios ainda distorcidos quando se virou para Bonnie. — Todas as mulheres
Stone são formidáveis, para dizer o mínimo, mas tia Ethel é uma das piores.
— Quase derrubei minha xícara de chá quando ela perguntou se estava
se esforçando o suficiente para conseguir um marido — Minerva admitiu.
Certamente ficou apavorada com a velha megera, verdade seja dita, e
estava admirada pela dignidade silenciosa de Ruth. A jovem não perdeu a
paciência nenhuma vez sequer, apesar de algumas provocações chocantes
quanto à sua falta de beleza e incapacidade de conseguir um nobre, apesar
de seu dote ultrajante. Porém, Ruth também deixou perfeitamente claro que
não seria intimidada.
Minerva gostaria de ter esse tipo de força de caráter. Sempre temeu ser
superficial e um tanto tola, e sempre soube que não era terrivelmente
inteligente, ao contrário de sua prima Prue, que era escritora. Isso a irritava
tanto que foi bastante desagradável com Prue, que sempre a fez se sentir
uma boba, mas apenas porque Minerva temia que ela estivesse certa.
Felizmente, estavam próximas agora, todos os mal-entendidos foram
completamente esquecidos. Prue tinha até pedido a seu marido, o duque,
que desse um belo dote a Minerva e uma mesada para ela e sua mãe, uma
generosidade que Minerva jamais poderia retribuir.
Antes, dependia apenas da sua aparência, já que nunca foi espirituosa
ou popular, mas pelo menos agora tinha o dote para falar a seu favor. Na
verdade, era bastante deprimente pensar que um cavalheiro pudesse
escolher se casar com ela por seu dinheiro, senão por outra coisa, mas... ora,
bem, sua aparência não iria durar para sempre, não queria viver como sua
mãe havia vivido, economizando sem parar e se preocupando com as
dívidas. Sua mãe aparentava despreocupação com isso, mas nunca era
possível saber se essa era toda a verdade. Minerva sabia como agir, como
sorrir, e fingir que estava se divertindo quando na verdade estava cansada,
sentindo-se miserável e querendo ir para casa.
Voltou sua atenção para Ruth e Bonnie, e sorriu. Era tão bom ter
amigas. Prue tinha feito a maior gentileza de todas ao convidá-la para se
juntar às Senhoritas Peculiares, e Minerva sentiu uma pequena onda de
felicidade ao observar Ruth e Bonnie rindo da tia apavorante de Ruth.
— Acho que merecemos um presente por suportar uma provação tão
terrível — Bonnie disse, olhando pela janela enquanto passavam pela
elegante Tunbridge Wells.
— O que tem em mente? — Ruth perguntou com os olhos brilhando.
— Bolos de creme — Bonnie e Minerva disseram em uníssono,
Minerva agora conhecia Bonnie bem o suficiente para saber que essa era
sua ideia de paraíso.
Ruth riu e deu um aceno decisivo. — Bolos de creme, então.

Depois de apreciar uma quantidade deliciosa e autoindulgente de chás


e bolos, vasculharam as lojas encantadoras em The Walks. Ruth comprou
uma touca nova, enfeitada com cerejas falsas, do qual Minerva tentou
dissuadi-la com muito tato, pois a considerava um tanto vulgar. Bonnie
olhava com desejo para um pedaço de fita azul escuro que não podia pagar,
mas que Minerva, abundante com sua nova mesada, felizmente comprou
para ela. Não houve nada que chamou a atenção de Minerva, o que lhe
pareceu tão estranho, já que quando tinha muito pouco dinheiro para gastar,
sempre havia uma dúzia de coisas pelas quais ansiava.
— Olha, uma livraria — exclamou, puxando Bonnie pela mão.
— Nunca pensei que fosse uma leitora, Minerva — Bonnie disse
surpresa, correndo atrás dela.
— Não sou — disse alegremente. — Durmo depois de algumas
páginas, mas Prue adora livros, gostaria de dar um presente para ela.
— Uma ideia adorável — Ruth concordou, enquanto as três se reuniam
para olhar pela vitrine.
— Olhe aquele, que ilustrações lindas — disse Minerva, apontando
para um pequeno livro na janela que estava aberto e mostrava gravuras
coloridas dentro.
— Um livro de poesia, acho — disse Ruth, olhando para ver mais de
perto. — Oh, diabos! Olha, aquele sujeito está pedindo para olhar também.
Venha, vamos entrar.
As três senhoritas correram para dentro, assim que o dono da loja
colocou o livro nas mãos do sujeito.
— Ah, muito bem — Minerva disse. — Tenho certeza de que deve
haver alguma outra coisa tão linda quanto essa. — Virou-se rapidamente e
esbarrou direto em um outro cliente que estava equilibrando uma enorme
pilha de livros em seus braços. Era um homem pequeno e pálido com a
aparência de estudioso. Talvez fossem os livros.
— Maldito inferno — o sujeito exclamou, alto e irritado quando os
livros em questão caíram no chão, um volume grande que parecia ser
enciclopédica atingindo-o bem na ponta dos pés. — Maldição. Sua
estúpida, não olha por onde anda?
Minerva sentiu seu rosto em chamas e se engasgou em choque, o som
ecoou por Ruth e Bonnie que estavam atrás dela, todas as três atordoadas
demais para responder de imediato.
— Já chega — veio uma voz afiada por trás de Minerva. — Vi o que
aconteceu e foi um acidente. O senhor não tem nada que carregar tantos
livros assim, se não tiver a inteligência para equilibrá-los adequadamente, e
certamente não tem que abusar desta jovem.
Minerva se virou e olhou para cima... e para cima, para seu defensor.
Seu coração tremulava. Meu Deus. Olhou, espantada, não tão surpreendida
com o rápido bater de seu coração - que nunca havia agido de maneira tão
peculiar antes - mas pela causa disso.
Estava tão longe da sua ideia de um herói romântico quanto poderia
imaginar. Imensamente alto e um pouco magro demais com um perfil
afiado, certamente não era bonito, até se chegar, talvez, a seus olhos.
Aqueles olhos eram de um profundo cinza ardósia com estranhas manchas
verdes e totalmente atraentes. Minerva acreditava que provavelmente
tivesse cerca de trinta anos, uma idade que considerava avançada, mas
havia tanta vitalidade queimando daquele homem que engavetou a ideia
imediatamente. Seu casaco estava um pouco largo, fazendo-a suspeitar que
havia perdido peso recentemente e precisava cortar o cabelo.
Seu coração deu um pequeno sobressalto estranho novamente.
Que coisa mais estranha.
Forçando seus olhos para longe do estranho para que não fosse vista
olhando-o fixamente, virou-se para o homem que a havia insultado para
descobrir que estava com um tom espantoso de branco. Supôs que não
poderia culpá-lo. Seu salvador tinha um aspecto bastante ameaçador, que
faria qualquer homem hesitar.
— Perdoe-me, S-Sr. De Beauvoir —, gaguejou o sujeito, erguendo os
olhos para o homem alto com uma reverência quase divina. — Eu... Eu não
fazia ideia de que... de que... Senhor, por favor, posso dizer o quanto o
admiro e...
— Não, não pode. Vá embora.
O Sr. De Beauvoir fez um gesto impaciente de enxotar e o sujeito
enrubesceu, mortificado, antes de recolher os livros desordenados e sair
apressado.
— Idiota bajulador — murmurou De Beauvoir irritado, antes de se
voltar para Minerva. — Sinto muito por qualquer aborrecimento que ele
possa ter-lhe causado, senhorita.
— Srta. Butler — Minerva disse imediatamente, embora ele não
estivesse realmente solicitando seu nome. — E não há a menor necessidade
do senhor se desculpar. Achei que o senhor foi maravilhoso.
O sujeito pareceu um pouco surpreso e possivelmente revoltado com
seu elogio. Houve um leve som de risadinha, que Minerva reconheceu
como pertencente a Bonnie e que foi rapidamente sufocado; sem dúvida
coisa de Ruth.
— Foi um prazer — disse bruscamente, prestes a se virar até que
Minerva o impediu colocando a mão em seu braço.
— Mas, ainda assim, o senhor não precisava vir em meu resgate e... e
eu estou terrivelmente grata.
Enviou-lhe seu olhar mais devastador, aperfeiçoado por horas diante de
um espelho, tímido, mas ainda assim interessado, seus olhos azuis sob os
cílios longos. Esse olhar já foi a causa de muitos jovens suspirarem
desejosos.
O Sr. De Beauvoir torceu o nariz.
— Tenha um bom dia, Srta. Butler. Senhoritas...
Fez uma reverência bastante rígida e Minerva observou enquanto ele
deixava a livraria. Soltou a respiração que estava segurando quando a porta
se fechou atrás dele.
— Minerva... oh, Minerva...? — Bonnie sussurrou, acenando com a
mão na frente dos olhos de Minerva como se quisesse tirá-la de um transe.
— Ora, pare com isso — disse Minerva corando um pouco.
— Só se me contar o que, diabos, está acontecendo na sua cabeça, —
Bonnie exigiu, olhando-a maravilhada. — Olhou-o como se ele fosse o sol,
a lua e as estrelas todos juntos, e não é nem bonito, além de parecer ser
mais pobre que um rato de igreja. Viu aquele casaco horrível que estava
usando? Estava todo desbotado na altura dos cotovelos.
— Ele precisa de cuidados — disse Minerva sonhadora, acenando.
Bonnie fez uma careta. — Blarg — disse, olhando para Minerva como
se tivesse ficado louca. — Ruth, fale com ela.
— Sobre o que? — Ruth respondeu rindo. — O sujeito foi muito
cavalheiresco, tem que admitir, e gosto não se discute.
— Claramente — Bonnie respondeu, obviamente confusa.
— Oh, com licença.
As duas mulheres olharam em volta, surpresas, quando Minerva atacou
o sujeito que a havia insultado tão rudemente. O homem se assustou, quase
deixando cair pela segunda vez, seus livros agora bem embalados.
— Por favor — disse Minerva —, o senhor poderia me dizer quem era
aquele homem? O senhor obviamente o tem em alta estima.
— Era o Sr. Inigo De Beauvoir — disse, com o mesmo tom que
poderia ter dito, era o duque de Wellington. Havia reverência em suas
palavras, junto com um desprezo bastante óbvio por sua ignorância. — É
uma das mentes mais brilhantes de nossa geração, um notável filósofo
natural. Já ouvi várias de suas palestras na Royal Academy — acrescentou,
como se fosse uma conquista, o que talvez fosse.
Saiu apressado, parecendo estar louco para contar a alguém exatamente
quem tinha acabado de conhecer. Minerva se perguntou se a história
mudaria um pouco ao ser contada.
— Um filósofo natural — disse, ou melhor, respirou fundo, sentindo-se
profundamente maravilhada com tal proeza intelectual. — Como...
— Enfadonho — Bonnie murmurou.
— Interessante — Ruth disse com firmeza, enquanto Minerva olhava
para a porta, ponderando porque maravilhoso era a única palavra em que
conseguia pensar.
8

Sinceramente, Kitty, não sei o que deu em Minerva. Se eu


fosse tão bonita quanto ela, não desperdiçaria tudo com um
intelectual antiquado. Ele não parecia nem um pouco
interessado nela, como isso é possível? É linda e, além do
mais, duvido que ele já tenha ido a um baile na vida.

—Trecho de uma carta da Srta. Bonnie Campbell para a


Sra. Kitty Baxter

31 1814. H H ,S .
— Passou muito tempo aqui quando criança. — Matilda adivinhou,
observando enquanto Harriet olhava para o fogo, a imagem do sofrimento.
Harriet acenou. — Nós praticamente morávamos aqui. O falecido
conde e meu pai eram amigos muito próximos, e meus pais frequentemente
viajavam, devido ao trabalho de papai, para pesquisar sobre algum rei
egípcio morto há séculos ou algum papiro ilegível. Papai viajava com a
consciência tranquila, pois sabia que Lorde e Lady St. Clair cuidariam de
nós.
Havia uma certa amargura por trás das palavras e Matilda se perguntou
o quanto Harriet e seu irmão viam seus pais.
— Então, você e Jasper eram amigos?
Harriet deixou escapar uma risadinha e tirou os óculos para enxugar os
olhos com um lenço, antes de voltar a olhar para Matilda. — Eu o amo
desde que me lembro.
— Oh, Harriet — disse Matilda com o coração doendo.
Os lábios de Harriet tremeram, mas ela balançou a cabeça decidida. —
Não. Não seja boazinha comigo, ou vou começar a chorar de novo, me
recuso a fazer isso. Passei muitos anos chorando por aquele homem e jurei
que nunca mais faria isso. Não... não de novo — acrescentou com a voz
trêmula.
— O que aconteceu?
Harriet demorou a responder e Matilda esperou, dando tempo à jovem
para organizar seus pensamentos.
— Nunca me enxergou, não de verdade. Durante todo o tempo em que
estávamos crescendo, me arrastou aqui e ali com Jerome e Henry, mas
sempre me senti como um acessório. Entende, como uma arma de
brinquedo se estivessem brincando de soldados, ou um telescópio ou baú de
tesouro, se fossem piratas. Eu era resgatada, motivo de luta, capturada e
sequestrada mais vezes do que posso me lembrar. Sempre fazia um papel
passivo, naturalmente — disse, revirando os olhos. — Não importava o
quanto protestasse. Não que fosse tão ruim assim, sempre levava um livro
comigo e aprendi a ignorar toda a gritaria.
A boca de Matilda se curvou divertida, imaginando uma pequena
Harriet de trança e indignada e um Jasper criança vestido de pirata. Harriet
percebeu sua expressão e riu um pouco.
— Foi tudo bastante idílico para ser honesta, embora passasse a maior
parte do tempo coberta de lama ou sendo jogada no lago. Pelo menos me
salvavam, suponho.
— E então? — Matilda perguntou.
— E então — Harriet repetiu, seus olhos assumindo uma expressão
enevoada e distante. — Eu tinha dezesseis anos e estava mais perdidamente
apaixonada por Jasper do que nunca. Matilda, ele era tão lindo, mesmo
naquela época. Como um deus pagão, uma perfeição dourada. Tinha quase
dezenove anos e, naturalmente, era um sucesso devastador com todas as
mulheres a quilômetros de distância. Todas eram apaixonadas por ele, desde
as ajudantes da cozinha até as jovens elegíveis. Precisava apenas levantar
um dedo e todas cairiam a seus pés, ainda caem — acrescentou com um
suspiro.
Matilda assentiu, entendendo o quão difícil deve ter sido para Harriet
ver Jasper crescer e se afastar dela, enquanto pulava de uma aventura
amorosa para a outra. Sua reputação pode não ser a verdade completa de
quem era, como sua mãe era inflexível em dizer, mas também não a ganhou
sem motivo.
— Recusou-se a ir para a universidade — Harriet disse com uma
carranca, sua voz ilustrando sua perplexidade.
Matilda também podia entender isso, mas conteve a língua. Harriet
teria dado o braço direito por essa chance, mas essas coisas eram proibidas
para as mulheres.
— Seu pai não sabia o que fazer com ele — continuou. — Meteu-se
em muitos problemas durante seu último ano na escola e o conde se
preocupava com que tipo de travessura um homem tão jovem, bonito e rico
poderia se meter se não recebesse alguma orientação, algo com que se
ocupar. Um Grand Tour estava fora de questão com a guerra em iminência,
então decidiu que Jasper deveria ir para a Rússia, para visitar a família de
sua mãe. A avó dele era russa, sabe.
Matilda assentiu, esperando que Harriet continuasse, mas a jovem
ficou em silêncio, torcendo o lenço que segurava nas mãos. Por fim, voltou
a falar.
— Eu sabia que ficaria fora por quase um ano, o que para mim parecia
uma vida inteira. Então, passei as semanas, antes de sua partida, tentando
reunir coragem para dizer alguma coisa, qualquer coisa. Só que não
conseguia. Fiz a única coisa que pude pensar. Comprei para ele um diário
para registrar suas viagens e... e pedi a uma amiga para fazer um desenho
meu e... e enfiei-o entre as páginas. Achei que pelo menos assim ele poderia
se lembrar de mim, de vez em quando.
— Isso é adorável — disse Matilda, sorrindo.
Harriet bufou. — Foi inútil! Duvido que ele soubesse que estava lá.
Que eu saiba, nunca escreveu uma palavra sobre suas viagens. De qualquer
maneira... — Disse respirando fundo. — Era o dia em que iria embora, eu
estava fora de mim. Achei que meu coração fosse despedaçar por ter que
ficar longe dele por tanto tempo, e... e eu sabia que ele nem se importava,
exceto que...
— Exceto que?
— Viajaria para o porto com outro jovem que conhecia da escola, que
o visitou mais tarde naquela manhã. Tive pena dele. De acordo com meu
irmão, Peter Winslow era uma criatura vil e sorrateira, mas seu pai estaria
viajando como guia de Jasper porque tinha interesses comerciais na Rússia,
e Jasper passaria a noite na casa deles antes de partir. Felizmente, Peter não
iria com eles, sua mãe disse que sua constituição não era forte o suficiente
para suportar o clima russo. Ainda bem, já que teria tornado a vida de
Jasper insuportável, uma criatura tão bajuladora assim. De qualquer forma,
disse a Jasper que tinha um presente para ele e fomos dar um passeio até a
casa de verão. Dei uma desculpa de ter deixado o presente lá, mas na
verdade, queria ficar sozinha com ele.
Matilda esperou, inclinando-se com antecipação ao perceber que estava
morrendo de curiosidade para saber o que causou essa briga terrível entre os
dois, esperando que, se soubesse, pudesse ajudá-los a se reaproximarem.
— Ficou tão contente, muito mais do que o diário justificava e... e
quando dei por mim ele... ele me beijou — Harriet engoliu em seco, seus
olhos se enchendo de lágrimas. — Foi um beijo e tanto, Matilda, um beijo
tão... tão terno, disse-me para não me casar com ninguém enquanto
estivesse fora. — Deu uma risada melancólica e enxugou os olhos com o
lenço mutilado. — Como se alguém fosse pedir a minha mão!
Matilda estendeu a mão e pegou a de Harriet e a apertou.
— De qualquer forma — disse Harriet, afastando-se de seu sofrimento
e endireitando a coluna. — Winslow chegou e tivemos que voltar para a
casa. Jasper não podia me dizer mais nada com todos por perto, me
convenci de que essa era a única razão pela qual ele não disse nada. Pedi a
ele que me escrevesse e me contasse como estava, e prometi responder de
volta.
Matilda esperou enquanto Harriet organizava seus pensamentos mais
uma vez.
— Seus pais iam com eles até a costa para se despedir, e Lady St. Clair
é uma criatura muito esquecida. No momento da partida, lembrou-se de que
havia deixado o livro que queria levar na mesa do console. Bem, é claro que
teria pedido a uma criada, mas eu estava começando a querer chorar e
tentando esconder isso, então me ofereci e corri de volta para dentro para
buscar o livro e ter um momento para mim. Quando voltei, Jasper e Peter
estavam na porta e a porta estava entreaberta, não sabiam que eu estava lá.
Matilda esperou, um aperto repentino na garganta.
— Peter fez alguma observação sobre eu ser uma criatura estranha,
sobre eu sempre ter seguido Jasper como um cachorrinho e perguntando se
ele tinha algum interesse em mim e Jasper, ele... ele deu uma risada
estranha, como se Peter estivesse louco por pensar em tal coisa. Então
olhou para Peter e sua voz estava tão fria, sua expressão cheia de nojo. Não
seja ridículo, disse, como se eu fosse me interessar por Harriet, e desceu as
escadas.
— Oh, Harriet. — Matilda ficou de joelhos na frente dela e segurou
sua mão enquanto a jovem se desmanchava em lágrimas.
Com um tremendo esforço de vontade, Harriet se acalmou mais uma
vez.
— Nunca vou esquecer o jeito que disse aquilo, Matilda. Com tanto
desdém! Como se Peter fosse um idiota, por apenas considerar que ele
poderia ter algum interesse em mim. Disse a mim mesma que não quis dizer
aquilo de verdade, embora certamente parecesse que sim. Disse a mim
mesma que estava apenas irritado com Peter e esperei que me escrevesse.
Se sentisse alguma coisa por mim, com certeza escreveria, não acha?
— É o que se pode imaginar — Matilda concordou, balançando a
cabeça.
— Esperei e esperei, decidida a não escrever para ele até que me
mandasse uma carta. Se me escrevesse, responderia e perguntaria por que
falou aquilo com Peter, mas nunca escreveu, Matilda. Nem uma única vez.
Esteve fora quase um ano inteiro e nunca me escreveu, mas isso não foi o
pior de tudo.
— Oh Senhor! — Matilda disse com sentimento.
Harriet devolveu um sorriso pálido. — Vi Peter dois meses depois.
Estava cheio de notícias de Jasper, ouviu de seu pai, entende? Parecia se
regozijar em me contar o quão popular Jasper era com as mulheres, e
algumas histórias verdadeiramente chocantes sobre ele, coisas que nunca se
deve discutir com uma dama, mas certamente estava claro que Jasper não
estava morrendo de desejo por mim.
— Sinto muito, Harriet.
Harriet encolheu os ombros. — Pelo menos eu soube. Melhor ter
descoberto naquela época, em vez de ficar sentada esperando que voltasse
para casa e pedisse permissão a papai para me cortejar, quando isso
claramente não estava em sua mente. Quando voltou, decidi esquecê-lo e
me concentrar em meus estudos. Tanto quanto meu papai permitiria, de
qualquer maneira — deu um suspiro pesado. — Agora acho que talvez
Jasper tenha pensado que estava sendo gentil, — disse, sua expressão
perplexa. — Kitty me fez reconsiderar suas ações e tenho tentado fazer o
que pediu. Com o benefício da percepção tardia, passei a acreditar que ele
achou que era uma coisa adorável de se fazer, me dando meu primeiro
beijo, pois nunca soube dele agir com crueldade antes, e certamente sabia
que eu estava apaixonada. Talvez tivesse pensado que aquele era um bom
momento, pois ficaria longe muito tempo. Tenho tentado perdoá-lo por isso.
Não sabia o quanto me machucou, quantas noites chorei até dormir depois
que foi embora.
O coração de Matilda se contraiu com a confusão nos olhos de Harriet,
sabendo que a pobre moça esteve pensando sobre isso, intrigada por tantos
anos.
— E quando ele voltou?
Harriet desviou o olhar e olhou para o fogo. — Eu o evitei. Fui visitar
minha tia na Escócia algumas semanas antes dele voltar. Todos presumiram
que eu voltaria para o grande evento, mas fingi estar doente, e minha tia é
hipocondríaca, então não foi difícil convencê-la de que não estava bem para
viajar. Não o vi por meses depois disso, já que nós dois estávamos fora por
vários motivos, e quando finalmente o vi, praticamente o ignorei e
acabamos como estamos agora.
— Mas ele nunca perguntou por quê? — Matilda exigiu.
— É claro — disse Harriet, balançando a cabeça. — Mas nunca
consegui dizer que tinha ouvido o que disse. Me senti tão humilhada,
sabendo que estava apenas brincando comigo. Deus, deve ter se divertido
com a forma como eu caí em seus braços. Praticamente desmaiei. Então,
fingi que tinha sido uma paixonite boba e que tinha superado isso.
— Mas não foi uma paixonite, foi, Harriet? Ainda está apaixonada por
ele.
Harriet fechou os olhos e assentiu. — Tentei tanto, Matilda. Tentei
tanto parar de amá-lo. Não é mais o garoto por quem eu me apaixonei, não
é? É um homem adulto e não o conheço de jeito nenhum. Não temos nada
em comum. Sou simples e adoro aprender, ele parece um anjo caído e
despreza aprendizagem. Por que diabos iria me querer? Por que o quero?
Ele me machucou muito, e o odiei tanto por isso, não entendo como posso
odiar alguém e amá-lo ao mesmo tempo. É ilógico.
Matilda deu um sorriso irônico. — Pode ser ilógico, mas não
impossível, garanto-lhe.
Harriet devolveu um olhar interrogativo e Matilda apressou a conversa.
— O que aconteceu noite passada...
Houve um gemido sincero de sofrimento e Matilda esperou pelo que
viria a seguir.
— Eu me permiti amolecer um pouco, aceitar o conselho de Kitty e
abandonar o passado, perdoá-lo, e isso - junto com o ponche banhado de
conhaque e aquele estúpido desafio maldito - bem... — Harriet ergueu as
mãos em desespero. — E olhe só a bagunça em que estou agora!

Jerome observou seu irmão enquanto se servia de outra bebida. Aquele


devia ser o segundo que tomava em dez minutos, o que era muito incomum
por parte dele.
— Vá com calma, Jasper — disse, divertido por ter dito aquilo.
Normalmente era o contrário.
Seu irmão mais velho se virou e olhou-o, mas não disse nada, depois
levou o copo aos lábios.
Jerome encolheu os ombros. — Não me incomoda se estiver bêbado no
jantar, mas mamãe vai ficar furiosa, e eu diria que já está encrencado.
— Bem, achei que eu devia ter a minha vez — Jasper murmurou,
olhando impaciente para Jerome antes de se virar.
— Não posso negar, suponho. É um homem quase respeitável hoje em
dia. Um velho chato. Bem, até a empolgação de hoje cedo, devo dizer. Que
escândalo, Jaz, realmente! Não sabia que tinha isso em seu interior, e com
Harriet, de todas as pessoas.
— O que quer dizer com isso?
Jerome fez uma pausa, surpreso com a fúria das palavras de seu irmão.
— Bem — falou com cuidado, observando Jasper com interesse —, se
tivesse sido a Srta. Hunt ou a Srta. Butler, não teria ficado tão surpreso, mas
Harry? Ela é...
— É o quê? — Jasper retrucou com a postura rígida.
Jerome piscou assustado. — Sensível, — disse finalmente. — Uma
intelectual, e praticamente nossa irmã. No que estava pensando?
A mandíbula de Jasper apertou e Jerome não achou que responderia.
— Ela não é nossa irmã — respondeu laconicamente, mas, pelo menos
agora, não parecia que iria deixar Jerome com um olho roxo.
— Bem, não, não tecnicamente, mas..., mas se já está noiva desse
sujeito De Beauvoir, e ele não se importa com o que está acontecendo, por
que está lutando tanto para se casar com ela?
— Porque ele é um miserável sem coração que só se importa com o
que Harriet pode fazer para alavancar a sua carreira. Nunca vai dar a
mínima para ela, a não ser de tudo o que aquele cérebro aterrorizante dela
pode fazer. Nunca vai se dedicar ao seu conforto, nunca vai se preocupar se
está feliz ou não. Não vou tolerar isso! Ela merece coisa melhor.
— Mas essa não é a decisão dela? — Jerome pressionou e olhou para o
irmão novamente. — E desde quando se importa? Viveram se bicando por
malditos anos. Achei que fosse o trabalho de sua vida antagonizá-la, e agora
está tão preocupado com a felicidade dela que está a ponto de se casar com
ela? Meu Deus, Jasper, vão se matar dentro de uma semana.
— Cale a boca, Jerome. Não sabe do que está falando.
Jerome encolheu os ombros. — Nenhuma surpresa nisso, mas gostaria
que me explicasse do mesmo jeito.
— Deixa eu te falar uma coisa. Explico o que está acontecendo com
Harriet, se me contar qual jogo está fazendo com Bonnie Campbell.
O gongo do jantar soou naquele exato momento e Jerome soltou um
suspiro aliviado e pôs-se de pé.
— Salvo pelo gongo — disse, com um sorriso malicioso, e saiu
correndo em direção à sala de jantar.
Bonnie não era um assunto que queria abordar com seu irmão. Jasper
estava se preocupando à toa. Bonnie era uma garota animada com uma boca
inteligente e faro para problemas. Também era muito divertida, mais do que
qualquer pessoa que já conheceu. Não estava oferecendo nada além de
amizade, no entanto, ela sabia disso tão bem quanto ele. Tinha sido muito
franco sobre isso, ela riu e lhe disse que sabia exatamente o que estava
oferecendo e o que não estava. Até fez uma grande piada sobre como a
nobreza ficaria escandalizada se ele se casasse com uma escocesa sem
importância e sem sangue azul e com os piores modos ainda por cima.
Então, por que não deveriam desfrutar da companhia um do outro?
Especialmente agora, quando todos tinham ido embora e não tinha mais a
velharia desaprovando os dois... bem, além de Jasper. Numa época não
muito distante, Jerome idolatrava Jasper e muito se inspirou em seu irmão
mais velho. Era a vida e a alma de qualquer festa, amado por todos - exceto
os professores da escola - e diabólico com as mulheres.
Nos últimos anos, tornou-se cada vez mais circunspecto, com apenas
vislumbres ocasionais do jovem ultrajante que tinha sido. Nessas ocasiões,
Jerome tinha a sensação inquietante de que Jasper estava muito infeliz. Não
que tivessem conversado sobre isso. Não se falava com irmãos sobre...
sobre sentimentos. Deus me livre. Ainda assim, havia uma sensação
incômoda puxando-o e Jerome perguntou se poderia ser sua consciência.
Não tinha certeza, porque raramente o incomodava, mas talvez devesse
descobrir o que havia de errado com Jasper. Afinal, o sujeito parecia ter
prazer em meter o nariz nos assuntos de Jerome.
Não viu nenhuma razão para não retribuir o favor
9

O que, diabos, fiz?


Por que, diabos, o deixei me irritar?
Nunca deveria ter concordado com essa ideia ridícula...
ultrajante... escandalosa!
Oh céus. O que devo fazer? Não posso recuar, mas se
continuar...

—Trecho de uma anotação da Srta. Harriet Stanhope


em seu diário.

31 1814. H H ,S .
— Claro que não vamos dizer nada — disse Ruth, embora seus olhos
ainda estivessem arregalados com o choque.
Minerva não a criticava. Harriet e Jasper? Achava que Harriet o
odiava. Embora, pensando nisso agora, supôs que aquilo poderia ser a
faísca da atração que sentiam um pelo outro.
— Vamos fingir que não sabemos o que aconteceu — Minerva
concordou, dando a Matilda um sorriso tranquilizador enquanto colocavam
as luvas e se preparavam para descer para o que certamente seria uma noite
estranha.
— Mas de que vai adiantar fingir? — Bonnie disse revirando os olhos.
— Todos têm conhecimento de que nós sabemos. Como poderíamos não
saber? Não estou dizendo que devemos falar sobre isso, mas podemos, pelo
menos, mostrar nosso apoio a Harriet, não fingir que estamos indiferentes
ao escândalo gigantesco que está acontecendo debaixo desse teto.
Matilda assentiu. — Sim, Bonnie tem razão. Não adianta fingir que
não sabemos de nada, mas vamos tentar ser discretas. A pobre Harriet está
tão chateada. De qualquer maneira, acredito que não descerá para o jantar.
Ao menos foi o que me disse quando a vi, poucas horas atrás.
— No entanto, imagine — Bonnie disse com os olhos brilhando
maliciosamente. — Uma noite com Jasper Cadogan. Garota de sorte.
Minerva mordeu o lábio quando Ruth se engasgou chocada e Matilda
olhou feroz.
— Não é totalmente apropriado, Bonnie.
— Desculpe — Bonnie se desculpou soando nada arrependida. — Mas
disse que estava noiva de outro sujeito, quem é ele? Nós o conhecemos? E
por que ela não nos contou?
— Acredito que só aceitou o noivado há algumas semanas, embora ele
tenha oferecido no verão passado. Aparentemente, estão se correspondendo
há quase três anos.
— Meu Deus, Harriet é uma caixinha cheia de surpresas — disse
Bonnie com aprovação.
Matilda balançou a cabeça e deu a Bonnie um olhar desesperado. —
Não se tratava de billet doux, e sim de uma troca de ideias e teorias
intelectuais. Não havia nada de romântico nisso pelo que Harriet disse.
Bonnie fez uma careta. — Bem, como ele é, então?
— Não faço ideia. Estava fora quando visitou a casa esta manhã.
— Oh sim, — Minerva acrescentou. — Henry disse que voltou
parecendo um rato afogado. Foi pega por aquela tempestade terrível,
coitadinha? Felizmente tinha acabado quando deixamos a casa da tia de
Ruth.
Matilda enrubesceu, sem nenhum motivo que Minerva pudesse
imaginar. — Eu me molhei um pouco, mas nada com que se preocupar.
Agora, — continuou gesticulando para que todas se apressassem — o
gongo está soando, então é melhor descermos.
As damas desceram as escadas e Minerva admitiu estar apreensiva pela
noite que tinha pela frente. Odiava quando havia tensão no ar, mas toda a
conversa decorreu de forma polida e ninguém ousou dizer nada
desconcertante. Ainda assim, estava faminta e não havia sentido fingir o
contrário. Finalmente aceitou o conselho de Prue e parou de fazer dietas
drásticas, e foi tão gostoso desfrutar de uma boa refeição ao invés de ficar
apenas observando todos comendo enquanto mal tocava o seu próprio prato.
Além disso, Bonnie estava certa. Deviam apoiar Harriet, quer estivesse
presente ou não, e não poderiam fazer isso se não aparecessem.
Lady St. Clair cumprimentou a todos calorosamente, como se não
houvesse nada errado, e todos se sentaram para jantar. Estavam comendo na
sala de jantar menor aquela noite, aquela que a família usava quando não
estavam recebendo, o que foi um alívio. Era um pouco mais íntima e menos
intimidante.
Lady St Clair tomou seu lugar em uma extremidade da mesa enquanto
St Clair sentou-se na outra. Não havia arranjos formais de assentos, e todos
apenas procuraram uma cadeira e pararam em seus lugares quando Harriet
apareceu. Estava pálida e rígida, mas aprumou-se e manteve a cabeça
erguida enquanto caminhava até a mesa. Sentou-se na cadeira mais próxima
de Lady St. Clair e à esquerda de Minerva, o mais longe possível de St.
Clair.
Melhor assim, Minerva pensou, e estendeu a mão por baixo da mesa
para pegar a de Harriet e apertá-la. Não a conhecia muito bem, mas
esperava que o gesto lhe desse coragem. Para seu alívio, Harriet retribuiu ao
aperto antes de soltar a mão.
— Contei-lhe que recebi uma carta de Jemima? — Matilda perguntou a
Bonnie animadamente enquanto quebrava o silêncio ensurdecedor.
— Não — Bonnie respondeu mordendo a isca imediatamente, para
alívio de todos. — Como ela está? Explicou por que desapareceu?
Minerva lembrava vagamente de Jemima, embora só a tivesse visto
uma ou duas vezes. Era loira e bonita, sua compleição era frágil, quase
etérea. Minerva se lembrava principalmente de ter notado que o vestido que
usava estava várias temporadas fora de moda e um pouco grande demais,
claramente sofreu várias alterações. Ocorreu-lhe que talvez a jovem não
pudesse mais se dar ao luxo de comparecer a eventos tão suntuosos da ton,
se fosse forçada a emendar suas roupas. Sem dúvida seria caçoada por
muitos que a desprezariam por essas coisas. Minerva sentiu uma onda de
alívio por não ter sido uma delas. Agiu mal durante a primeira parte desta
temporada, principalmente por desespero, mas não tinha nenhum desejo de
aumentar sua vergonha ao se lembrar de quaisquer palavras indelicadas que
tenha dito. Pelo menos não era culpada disso com relação a Jemima.
— Diz que sua tia está doente e que está cuidando dela. São muito
próximas, creio eu
Bonnie concordou. — Acredito que ela mora com a tia, não mora?
Matilda assentiu. — Sim, isso mesmo. De qualquer forma, devo visitá-
la quando voltar para a cidade.
— Gostaria de poder acompanhá-la — Bonnie disse melancolicamente.
— A senhorita voltará para a Escócia, Srta. Campbell? — Lady St.
Clair perguntou, com o que Minerva suspeitou ser um tom esperançoso.
— Imagino que sim — Bonnie respondeu, retornando um sorriso que
era obviamente forçado. Minerva sentiu um pouco de pena dela, ainda mais
quando o olhar de Bonnie mudou para Jerome e ficou nele.
— Todos ficaram sabendo da novidade? — Lady St. Clair perguntou,
atraindo a atenção de Bonnie para longe de seu filho mais novo, enquanto
sua voz vibrava com excitação reprimida. — O Marquês de Montagu estava
a caminho para nos visitar esta tarde quando foi pego por aquela terrível
tempestade. Acabou caindo do cavalo.
— Não poderia acontecer com um sujeito mais simpático — Jerome
brincou, ganhando uma risadinha de Bonnie e um olhar furioso de sua mãe.
— A senhorita não o viu, Srta. Hunt? — Lady St. Clair perguntou,
virando-se para Matilda. — Devia estar na mesma estrada que a senhorita.
As bochechas de Matilda inflamaram quando todas as Senhoritas
Peculiares presentes ergueram os olhos para olhá-la com idêntica expressão
de indagação.
— Eu... eu... eu... — gaguejou.
— É um longo caminho, Lady St. Clair — Harriet deixou escapar,
tirando a atenção de todos de Matilda. — E Matilda ficou encharcada, mas
voltou para casa muito antes de a tempestade passar, não foi, Henry?
Henry olhou para a irmã por um longo tempo antes de falar. — Sim.
Sim, de fato. Eu a vi. Molhada. Muito molhada, mas..., mas ainda estava
caindo uma tempestade, trovejando, quero dizer... Raios também.
— Então, Montagu provavelmente estava a quilômetros de distância de
onde ela estava, do outro lado da estrada — Harriet acrescentou com um
pouco de força.
— Oh — Lady St. Clair disse com um assentimento e voltou sua
atenção para a sopa.
Henry lançou à irmã um olhar de que diabos foi isso, mas Harriet o
ignorou. Matilda se concentrou em sua própria tigela e não levantou os
olhos. Minerva se perguntou o que Matilda estava escondendo. Estava
acontecendo alguma coisa entre ela e Montagu? Certamente não. Não
depois do que fez com ela.
— Ele ficou gravemente ferido? — Henry perguntou enquanto todos
olhavam para Lady St. Clair mais uma vez.
— Uma torção no tornozelo, acredito — a dama respondeu. —
Doloroso, mas não é nada sério.
— Que pena — Bonnie murmurou baixinho enquanto Minerva tentava
não se engasgar com sua sopa.
— Lady Helena estava maravilhosa, não estava? — Lady St. Clair
perguntou, mudando de assunto mais uma vez.
— Ah, sim, estava — disse Minerva, feliz por ter algo com que
contribuir. Conhecia bem Lady Helena agora, desde que Prue se casou com
seu irmão, o duque de Bedwin. — Ela é adorável, tão vivaz e está sempre
fazendo alguma coisa. Juro que nunca se cansa. Nunca conheci alguém tão
cheia de energia e de natureza tão doce também.
— Sim, exatamente o que penso da jovem. — Lady St. Clair assentiu,
satisfeita, antes de se virar para o filho. — Não acha, Jerome?
Jerome, que claramente não estava participando da conversa, ergueu os
olhos do jantar.
— Acha o que? — Perguntou, enquanto partia um pãozinho ao meio.
— Lady Helena — disse sua mãe pacientemente.
— O que tem ela? — Enfiou um grande pedaço de pão na boca e
mastigou enquanto esperava.
— Honestamente, Jerome, posso muito bem falar com a parede.
Participe da conversa, querido. O que achou de Lady Helena?
— Oh — disse Jerome, engolindo. Fez uma pausa e pensou um pouco.
— Qual dama era ela?
Bonnie deu uma risadinha e houve um lampejo de impaciência nos
olhos de Lady St. Clair. — Não importa — disse, desistindo da conversa.
Minerva mordeu o lábio e se dedicou mais uma vez à sopa, até que
todos terminaram e os criados tiraram a mesa e trouxeram os próximos
pratos. Embora fosse apenas um jantar informal, a mesa estava cheia. Um
prato de peixe que Minerva não conseguiu identificar foi servido ao lado de
rosbife, vários frangos assados, torta de pombo, ensopado de carneiro,
vitela, uma torta de amêndoa e vários pratos de vegetais.
Com um pequeno suspiro feliz de antecipação, Minerva aceitou
porções da torta, frango assado e uma boa porção de vegetais.
— É bom vê-la comendo direito — Bonnie murmurou. — A primeira
vez que a vi em um jantar fiquei preocupada. Não comeu basicamente nada.
Minerva sorriu, então deu uma grande garfada do frango assado
deliberadamente e suspirou contente. Bonnie riu e seguiu seu exemplo.
Minerva olhou ao redor da mesa para ver se todos estavam comendo e
notou Harriet beliscando seu jantar com uma nítida falta de entusiasmo. Um
olhar para a outra extremidade da mesa confirmou que St. Clair não estava
muito diferente. Sua mão descansava na haste de sua taça de vinho, que
girava para frente e para trás, enquanto estudava o conteúdo com uma
expressão inescrutável.
Minerva suspirou e torceu para que os dois pudessem resolver seus
problemas. Era possível. Bedwin e Prue também tiveram uma situação
difícil quando o duque descobriu quem havia escrito aquela história
obscena sobre ele. Certamente, se eles puderam superar esses problemas,
St. Clair e Harriet poderiam ter o mesmo destino.
Melancolicamente, a memória de Minerva voltou à livraria e ao olhar
verde-acinzentado bastante enervante do homem que conheceu. Deveriam
ter mais esperança do que ela, de qualquer maneira. Pois não havia
nenhuma razão terrena para um homem considerado uma das grandes
mentes de nossa geração prestar atenção a uma bela estúpida como
Minerva.
Com um suspiro abatido, Minerva voltou sua atenção para o jantar e
tentou tirá-lo da cabeça.

Jasper não saiu exatamente correndo da mesa quando o jantar acabou,


mas foi por pouco. Tinha sido uma noite interminável, agravada pela
expressão pálida e preocupada de Harriet, enquanto olhava para o prato e
mal comia.
Era isso que a noite que se aproximava significava para ela? Era uma
provação a ser superada? Seu coração despencou até o chão. Se fosse, não
seria capaz de continuar com aquilo. Nunca levou uma mulher relutante
para sua cama, e não estava prestes a levar agora. Ainda assim, ela não
estava relutante quando a beijou mais cedo, não mais do que tinha estado na
noite passada, e, de manhã, estava perfeitamente sóbria. No momento em
que a teve em seus braços, se transformou em calor e perdeu as forças dos
seus membros, seu desejo era bastante inconfundível. Bem, obviamente
mudou de ideia. Não conversou com ele durante ou depois do jantar, então
ele poderia muito bem não ter muitas esperanças.
Não que estivesse desistindo - longe disso - mas se não pudesse levá-la
para sua cama, tinha que reconhecer que suas chances estavam diminuindo.
Mesmo se conseguisse, tinha que admitir que seus problemas poderiam
estar apenas começando. O que aconteceria quando dormir com ele já não
fosse mais uma novidade? E se isso fosse tudo que pudessem ter em
comum? Amava sua companhia, adorava ouvi-la falar tão apaixonadamente
sobre qualquer coisa nova em que estivesse interessada, não importava se
entendia ou não, mas e ela? O que aconteceria quando se cansasse de sua
companhia e ele não conseguisse prender seu interesse em nenhum outro
lugar, a não ser na cama?
Ainda assim, não pôde deixar de ouvir cada rangido e passo, enquanto
se preparava para dormir e dispensava seu valete, garantindo ao homem que
não seria mais necessário e que poderia recolher-se. Jasper foi até a cama e
sentou-se na beira do colchão, lembrando-se de uma época em que Harriet o
olhava como se ele tivesse pendurado a lua só para ela. No ano em que ela
fez dezesseis anos, ele se banhou nessa adoração, mesmo temendo colocá-la
à prova. E se permitisse que ela se aproximasse e ela visse o quão longe ele
realmente estava do ideal pelo qual se apaixonou? E se visse a verdade
sobre ele e mudasse de ideia? Ver aquela adoração se transformar em
arrependimento - ou pior ainda, pena - seria terrível. O medo disso quase o
matou. No entanto, tinha acontecido de qualquer maneira.
Lembrou-se de todas as noites que passaram juntos, quando Harriet lia
para eles. Quando ele, Jerome e Henry se sentavam em volta dela, em frente
à lareira, enquanto contava uma história mágica. Jasper amava aquelas
noites acima de tudo. Adorava ouvir histórias quando criança, mas, à
medida que crescia, não podia pedir a ninguém que lesse uma história para
ele dormir, por medo de ser considerado um bebê. Ler por si próprio era
uma tarefa tão difícil, que tirava qualquer prazer da história, então desistiu,
mas Harriet lia para ele sempre que pedia e parecia gostar de fazer isso. Seu
favorito era “Os entretenimentos das noites árabes”. Eram aventuras
românticas, cheias de perigo e intriga, amor e traição, e ouvir Harriet lê-las
fazia com que as histórias ganhassem vida. Ela deve ter lido aquele livro
um milhão de vezes, e embora seus irmãos se opusessem e exigissem que
lesse outra coisa, ela apenas sorria, pegava o livro da mão dele e começava
tudo de novo.
Jasper esfregou a palma da mão sobre o coração, tentando amenizar a
dor que se instalou ali. Ela o amava naquela época. Amou-o por tanto
tempo, e depois disso parou de amá-lo. Harriet havia parado de olhá-lo com
adoração. Parou de olhá-lo de qualquer forma. Não falava com ele, a menos
que falasse com ela, nesses casos era educada e distante. Tinha sido cortado
de sua vida e não sabia o motivo. A dor o deixou com tanta raiva que
começou a atacá-la, aproveitando a oportunidade para zombar dela na frente
dos amigos, quando fazia algum comentário inteligente, fazia troça dela por
estar mais interessada em livros do que na vida real. Ela suportou a
princípio, com toda a dignidade silenciosa de que era capaz, mas ele
continuou até que ela começou a retaliar, até que começou a odiá-lo por
fazer aquilo. Viu-a se afastar do mundo e sabia que era o culpado, odiava a
si mesmo por isso, mas era incapaz de parar com aquilo. Se parasse de
atormentá-la, deixaria de existir em seu mundo. Iria esquecê-lo
completamente, e isso era a mesma coisa que morrer.
Portanto, não havia sentido ficar ali, sentado, esperando que fosse
aparecer. Destruiu sua própria felicidade e, mesmo que Harriet ainda o
quisesse fisicamente, era muito inteligente para ceder a desejos tão
superficiais.
Com um suspiro, abriu uma gaveta da mesa de cabeceira e tirou um
livrinho amassado. Carregava com ele aonde quer que fosse. Não importa
se era por alguns dias ou um mês, o livro estava sempre em seu poder. Era
um diário, ou deveria ser. O fato de nunca ter escrito uma palavra nele fazia
seu peito se apertar. Como gostaria ter podido. Queria contar a Harriet sobre
todas as coisas extraordinárias e maravilhosas que viu quando foi para a
Rússia. Ansiava por escrever para ela também, e estava dividido entre rezar
para que ela escrevesse e rezar para que não escrevesse. Pois não havia
garotos da escola para ler para ele ou ajudá-lo a escrever uma resposta, e
mesmo se conseguisse alguém para fazer isso, dificilmente poderia deixar
alguém ler uma carta tão pessoal, nem responder. Estava preso. Hoje em dia
se esquivava, fazendo o papel de um nobre altivo, com o nariz muito
empinado para se incomodar em ler correspondência, quanto mais
responder, mas era mais difícil então.
Então, aguardava a chegada do correio ansiosamente. Cartas de seus
pais chegavam a cada poucas semanas ou mais, e passava horas trabalhando
nelas para decifrar qualquer coisa importante que precisava saber ou
qualquer menção a Harriet. Pelo menos nunca esperavam uma resposta. A
família brincava sobre como Jasper era um correspondente terrível e
acreditavam que era muito preguiçoso e ocupado com seus próprios
negócios para se dar ao trabalho de responder. Além disso, seu guia, o Sr.
Winslow, tinha a incumbência de se reportar aos seus pais.
Pelo menos, desde que se tornou conde, contratou um secretário,
aparentemente porque era muito presunçoso para ler ou escrever por si
mesmo, mas na verdade porque era a única forma que poderia lidar. Mas
não ajudava muito quando os assuntos eram pessoais.
De qualquer forma, Harriet nunca lhe havia escrito. Nem uma vez, e a
dor disso foi pior do que imaginou ser possível. Pensou que o beijo que
compartilharam tinha sido especial, perfeito. Tinha sido para ele. Não
demorou a assumir o interesse de um jovem por aventuras amorosas e, a
essa altura, aprendera o suficiente para saber que o beijo era fora do
comum, que Harriet era fora do comum. Ela esteve lá, bem na frente dele
todo esse tempo, mas foi apenas naquele verão que realmente a viu como
era, e se apaixonou, perdidamente.
Jasper alisou a mão sobre o couro gasto da encadernação e inclinou-o
ligeiramente, de modo que abriu na única página que importava. Um
pequeno desenho a lápis de Harriet estava dentro dele, a figura tão familiar,
conhecia cada linha, cada contorno sombreado. Naturalmente era mais
jovem na imagem, mas mudou pouco, pois sua expressão estava séria como
sempre. Respirou fundo e desejou saber como as coisas tinham dado tão
errado. Por um tempo, acreditou que era porque nunca tinha escrito para
ela, então tentou lhe falar, estava preparado para se humilhar e explicar, se
fosse por isso que estava magoada, mas ou ela mentiu de forma muito
convincente ou então devia haver alguma outra razão mais séria para o
modo como o excluiu de sua vida.
Descobriria, prometeu a si mesmo. Chegaria à verdade e então faria o
que fosse necessário para consertar as coisas, não importa o que tivesse que
dizer, o que tivesse que fazer. Só de pensar na sua vida e na sua casa sem
Harriet, era um futuro sombrio demais para contemplar.
Houve uma batida silenciosa na porta e Jasper derrubou o livro no chão
de tão surpreso. De repente, seu coração batia forte nos ouvidos, colocou o
livro de volta na gaveta e correu para a porta para abri-la.
— Jaz, posso pegar emprestado aquele seu colete verde?
Jasper olhou para seu irmão, dividido entre quebrar seu nariz
novamente e uivar de desespero.
— Sim, tudo bem, tanto faz. Vou pedir a Merrick que te leve pela
manhã.
— Muito bom, obrigado, meu velho, oh, erm... Jasper...?
— Sim? — Praticamente rosnou, querendo que seu irmão fosse embora
imediatamente.
— Bem, — Jerome hesitou e então estendeu uma mão embaraçosa e
bateu no ombro de Jasper na demonstração mais desconfortável de afeto
familiar que Jasper teve a infelicidade de testemunhar. — Eu só... bem,
espero... está tudo bem, não está, Jasper?
Apesar da irritação de Jasper, a preocupação de seu irmão era
comovente. — Vou sobreviver, Jerome. Não precisa se preocupar, não
tenho intenção de me jogar de um penhasco e lançar o condado no seu colo,
se é isso que o está incomodando.
— Graças a Deus — disse Jerome com óbvio alívio. — Quero dizer,
não estava preocupado com isso — acrescentou apressadamente. — Não a
parte do condado, quero dizer.
Jasper bufou, sabendo que era totalmente verdade, mas também que
seu irmão preferia morrer a se tornar conde. Muita responsabilidade. — Sei,
Jerry. Não se preocupe. No entanto, obrigado por se incomodar.
— Bem, é meu irmão, Jaz. Não gosto de vê-lo tão sério.
Jasper acenou e fez um movimento de enxotar. — Agora, fora, seu
tolo. Estou terrivelmente cansado e não estarei em melhor estado de espírito
se não me deixar dormir.
Jerome sorriu, acenou e lhe desejou boa noite, obviamente tão ansioso
quanto Jasper estava para terminar aquela conversa. Com um suspiro
pesado, Jasper fechou a porta e se recostou nela. Idiota desgraçado. Claro
que não era Harriet. Nunca seria Harriet. Ela tinha mais senso do que isso.
Céus, a mulher tinha um cérebro do tamanho da Inglaterra, o que diabos iria
querer com ele?
A batida que soou foi tão fraca que poderia não ter percebido se não
estivesse encostado na porta. Mesmo assim, estremeceu de choque e abriu a
porta com tanta rapidez que Harriet saltou para trás com um gritinho
estridente.
— Estava esperando na porta? — Perguntou, pressionando a mão em
seu coração.
— Não! — Jasper respondeu um pouco rápido e com muita força,
antes de perceber que ela não deveria ser vista na porta do seu quarto e
abriu a porta para que entrasse. — Eu... Eu estava passando pela porta
quando... quando bateu — disse tremendo por dentro ao soar como um
completo idiota. Nada de novo, portanto.
Harriet entrou em seu quarto e Jasper fechou a porta e olhou-a com
admiração. Ela veio. Não conseguia acreditar. Realmente veio. Sua garganta
ficou seca quando a olhou. Usava uma camisola simples, de algodão branco
e um xale. Sem babados ou rendas, nada nem um pouco provocativo nele.
Bem Harriet, e bem diferente de todas as outras mulheres com quem já se
deitou, que usavam sedas e técnicas sedutoras. No entanto, Jasper nunca
sentiu um anseio como o que estava crescendo dentro dele ao vê-la.
Ela apertou os braços em volta de si mesma, obviamente nervosa, e o
coração de Jasper doeu.
— Achei que não viria — admitiu.
Ela encolheu os ombros como se não fosse nada importante, mas foi
um movimento rígido. — Eu disse que viria.
— Eu sei, mas... — Hesitou, querendo ser honesto e querendo sua
honestidade em troca. — Mesmo assim, estava com medo de que não
viesse. Fico feliz que tenha vindo.
— Vamos terminar logo com isso, tudo bem? — Disse, puxando os
laços de seu xale com as mãos trêmulas.
Jasper sentiu as palavras como uma faca, e apenas respirou fundo e se
aproximou, parando as mãos dela nas suas. — Harry — disse suavemente.
— Olhe para mim.
Ela balançou a cabeça e ele colocou as mãos em seus ombros para
descobrir que estava tremendo.
— Não tenha medo, amor. Não de mim. Não faria nada que não
quisesse, certamente sabe disso. Não a machucaria por nada neste mundo.
Ela bufou com isso, e ele engoliu em seco.
— Sei que a machuquei. Sei disso, mas tem que acreditar em mim
quando digo que não...
Antes que pudesse terminar a frase, Harriet estendeu a mão e colocou
as mãos sobre seu pescoço, puxando-o para baixo e beijando-o, encerrando
qualquer discussão. O calor explodiu entre eles e a puxou para seus braços,
suspirando contra sua boca e como aquilo era certo.
Este era o lugar onde ela deveria estar, onde pertencia; com ele, e
nunca a soltaria.
10

A tia está em ótima forma, como sempre e manda lembranças


para o senhor. Estou me divertindo muito aqui em Holbrooke
House. Bonnie, Minerva, Matilda e Harriet são muito gentis,
e Lady St. Clair é muito acolhedora, faz com que todos nos
sintamos em casa.
Sim, o conde ainda é tão bonito e charmoso quanto deveria
ser, mas não, papai, ele realmente não vai oferecer nada por
mim. Nem mesmo se o senhor dobrar meu dote. Acredito que
já fixou seus interesses em outra jovem.
—Trecho de uma carta da Srta. Ruth Stone para o pai
dela, o Sr. George Stone.

A 31 1814. H H ,
S .
Jasper recuou, sentindo-se um pouco tonto ao interromper o beijo.
— Onde estão seus óculos? — Perguntou, tocando o dedo na ponta de
seu nariz.
— Deixei-os no meu quarto — respondeu piscando. — Achei que não
fosse precisar deles.
— Isso depende — disse com um sorriso bobo curvando sobre sua
boca. — Consegue me ver?
Harriet revirou os olhos. — Não sou totalmente cega, sabia?
— Sei. Só não quero que perca nada. — O sorriso de Jasper se alargou
em deleite quando corou em tom escarlate. — Além do mais, adoro seus
óculos.
— Ora, por favor — disse, e ele sabia que estava morrendo de vontade
de revirar os olhos mais uma vez. — Ninguém gosta de jovens de óculos.
— Eu gosto — murmurou, abaixando a cabeça para dar um beijo na
lateral do pescoço dela e amando o som de sua respiração acelerada
enquanto o fazia. — Sempre gostei.
— Não — disse, afastando-o. — Não faça isso.
Jasper franziu a testa e olhou-a. — Não faça o que?
— Não... não faça amor comigo, ou diga coisas que não são
verdadeiras. Já disse que vou para a cama, mas..., mas é algo puramente
físico. Nada além disso. Só precisamos tirar isso dos nossos sistemas, isso é
tudo.
Encarou-a por um longo momento, perguntando-se se seu coração
poderia aguentar muito mais aquele batimento acelerado entre a felicidade e
o sofrimento.
— Vá então — disse não totalmente firme, e depois se afastou dela,
sabendo que não suportaria vê-la partir.
— Mas... — Harriet disse tão perplexa que teve vontade de chorar.
— Não posso fazer isso, Harry — disse, tomado por uma forte emoção
quando se virou para ela. — Diz para que eu não diga o que é verdade e
para manter as coisas puramente físicas, mas não posso fazer as duas coisas.
A verdade é que eu a amo e se a levar para a cama, farei amor contigo
porque não posso fazer outra coisa além disso. Isso seria uma mentira,
Harry, e tem havido muitas mentiras entre nós.
Encarou-a e viu a confusão em seus olhos, sabendo muito bem que não
acreditava nele.
— Muito bem — falou com a voz trêmula — então faça-me acreditar.
A respiração de Jasper ficou presa. Agora, isso ele poderia fazer.
Diminuiu a distância entre os dois e a puxou de volta para seus braços,
a tensão deixando seu corpo ao passo que os dedos de Harriet entrelaçaram
seus cabelos, e se derreteu nele. Jasper sorriu contra sua boca enquanto as
mãos dela deslizaram por seu pescoço e por seu peito em direção a fita que
segurava seu roupão, puxando-o e abrindo-o antes de levantar os braços e
tirá-lo dos seus ombros. Soltou-a, apenas para permitir que o roupão caísse
no chão. Não usava nada por baixo dele, e ficou parado, sem se mexer,
dando a Harry tempo suficiente para observá-lo.
Seus olhos se arregalaram, sua respiração ficou presa, e cada
terminação nervosa em seu corpo saltou à atenção quando estendeu a mão
hesitante e tocou sua pele nua.
— Já me viu antes — lembrou-a — Duas vezes, aparentemente.
Ela corou e deu-lhe um olhar atrevido. — Uma vez à distância e a
segunda vez foi um pouco... nebuloso — admitiu.
— Bem, é melhor dar uma boa olhada desta vez. Gostaria de deixar
uma impressão duradoura — disse, embora não tivesse intenção de dar a ela
a menor oportunidade para esquecê-lo.
— Como Davi — murmurou, arrastando um dedo sobre o pelo áspero
em seu peito.
— Nunca viu Davi — respondeu sem fôlego.
— Vi figuras e uma cópia em tamanho real — respondeu
desafiadoramente. — Embora existam... algumas diferenças — permitiu
dizer.
Jasper sorriu. — Sim, sempre o achei um pouco mal dotado.
— Está certo — Harriet murmurou, olhando para a parte dele que
clamava por sua atenção. Mas tirando isso...
Seu dedo traçou um caminho pelo abdômen, fazendo os músculos se
contraírem e saltarem até que ela alcançou seu quadril. Olhou para ele. — É
a coisa mais bonita que já vi.
A garganta de Jasper apertou. Sabia que era bonito, claro que sabia. As
mulheres costumavam repetir muitas vezes e se comportavam de forma
chocante para conseguir levá-lo para suas camas, mas os elogios delas
nunca significavam nada para ele. Nunca teria a mesma inteligência de
Harriet, nunca poderia entretê-la com seu engenho, mas isso... isso ele
poderia lhe dar, por mais superficial que parecesse em comparação.
— Acredito que essa seja a minha fala — disse, tentando sorrir, mas
descobrindo que estava dominado demais para poder controlá-lo.
Ela deixou escapar um pequeno sorriso. — Diremos apenas a verdade,
lembre-se.
Ele franziu a testa e estendeu a mão, capturando o rosto dela. — Não
sei o que vê quando se olha no espelho, amor, e nem o que as outras pessoas
veem, mas eu a vejo, Harriet, e é linda.
Harriet o encarou com os olhos marejados, desejando poder acreditar
nele, embora não confiasse. Ainda não, mas iria confiar. Nem que se
passasse uma vida inteira, passaria a acreditar que era bonita e amada por
ele.
Aproximou-se e tocou sua boca na dela, suavemente, ternamente,
colocando todas as suas esperanças e sonhos no toque de seus lábios.
Harriet suspirou e estendeu a mão, pressionando-se contra ele e o desejo
reacendeu, mais forte do que nunca. Era a coisa mais difícil ter que se
conter, manter seu toque lento e suave.
Alcançando os laços que ela havia desatado pela metade, terminou o
trabalho, empurrando o xale no chão antes de desfazer a gola de sua
camisola e abri-la para que deslizasse até a curva generosa de seus quadris.
Sua respiração engatou quando se afastou para olhá-la e pegou suas
mãos quando quis se cobrir.
— Já me viu antes também — reclamou enquanto ele afastava suas
mãos.
— E, ainda assim, me deixa sem fôlego — disse falando sério. — Oh
amor.
Abaixou a cabeça e beijou primeiro um seio, depois o outro, voltando a
brincar com o mamilo enrugado, circulando-o com a língua antes de chupar
suavemente. Harriet se engasgou e agarrou seu cabelo, segurando-o
firmemente.
— Adorável — murmurou. — Tão perfeita.
Ergueu-se e olhou-a, encontrando seus olhos mais escuros do que
nunca e suas bochechas coradas. Sorriu e beijou seu nariz, antes de remover
a camisola de seus quadris.
— Venha para a cama comigo, Harry, por favor — acrescentou, ainda
um pouco incerto, apesar do seu olhar.
Ela assentiu e foi à frente dele, subindo na cama e se deitando rígida
como uma tábua. Jasper deitou-se ao lado dela, a cabeça apoiada no braço e
um sorriso ridículo no rosto.
— Que foi? — Exigiu.
— Nada — disse, ainda sorrindo como um bobo. — Estou muito feliz,
só isso. Me faz feliz.
— Não, não faço —rebateu e desviou o olhar. — Eu o deixo irritado.
— Só porque a provoco e revida. Então fico irritado.
Ela soltou a respiração. — Verdade. Então, por que me provoca?
— Porque é melhor do que ser ignorado, Harry. Se não me vê, sinto
que posso desaparecer completamente.
O olhar de Harriet voltou para o seu, atento e questionador, aquele
cérebro feroz examinando suas palavras e pesando cada uma delas. Desviou
o olhar novamente, ainda intrigada, mas ele sabia que não faria quaisquer
perguntas que estivessem queimando dentro da sua cabeça. Se ela mesma
não conseguisse decifrar, não procuraria uma resposta, pois era orgulhosa
demais para pedir que explicasse.
— Não deveria... fazer alguma coisa? — Perguntou impaciente.
— Talvez — disse, se deitando de costas e postando as mãos atrás da
cabeça. — Mas acho que é sua vez de começar.
— O que? — Harriet se sentou e olhou para ele.
— Vamos, Harry. Sempre amou um enigma. — Passou a mão pelo
comprimento do corpo. — Descubra-me.
Suas sobrancelhas arquearam, mas ele podia ver o brilho interessado
em seus olhos.
— Como...?
— Como quiser — respondeu com a voz mais rouca ainda. — Toque-
me onde quiser, como quiser.
Ela engoliu em seco e ele esperou, enquanto a antecipação o matava.
Depois do que pareceu uma eternidade, ela se aproximou e colocou a mão
espalmada sobre seu peito, bem onde batia seu coração. Batia por baixo da
sua mão, rápido e errático.
— Não está morto, então — disse com um sorriso brilhando em seus
lábios.
— Certamente não estou morto — murmurou.
Harriet lambeu os lábios e moveu a mão para tocar seu mamilo, seus
dedos roçando a pele sensível até se transformar numa pequena
protuberância endurecida. — Gosto deles — disse. — São muito
interessantes.
Jasper bufou.
— Quando... quando faço o que fez comigo, com a sua boca... a
sensação é a mesma?
— Já fez isso antes.
— Sim, mas não me disse como foi, e não consigo me lembrar...
Ele resmungou. — Nunca mais irá para a cama embriagada —
murmurou. — Por que não tenta e descobre? — Com o olhar determinado,
Jasper se perguntou o quanto poderia suportar a investigação dela, pensando
que poderia ter cometido um erro de julgamento. Não. Estava fascinada e
ele não negaria nada, mesmo que isso o matasse.
Harriet se curvou um pouco desajeitada e franziu a testa em
concentração enquanto passava a língua pelo mamilo dele. A respiração de
Jasper prendeu e ela olhou para cima com os olhos brilhando de satisfação.
Fez de novo dessa vez com mais força, circulando a língua antes de fechar a
boca sobre ele e chupar um pouco mais firme.
Jasper soltou um pequeno suspiro enquanto ela repetia a ação do outro
lado.
Harriet se sentou.
— A sensação é a mesma — disse presunçosamente.
Ele fechou os olhos e riu. — Sim, certamente a sensação é a mesma.
Quando voltou a abrir os olhos reparou que o observava, seus olhos
curiosos viajando até seu membro que brilhava na ponta, molhado com
antecipação. Jasper prendeu a respiração quando ela se mexeu na cama e
correu a ponta do dedo de forma experimental por todo o comprimento
dele.
Seu membro saltou sob seu toque e Jasper amaldiçoou sob sua
respiração.
Harriet puxou a mão.
— Não pare — ele grunhiu. — Faça de novo.
Ela repetiu e sua respiração ficou mais pesada, o que era ridículo, pois
ela mal o havia tocado, mas também aquela era Harriet e isso era o que
queria há muito tempo, isso era o que queria por uma maldita eternidade.
— Posso beijá-lo aqui também? — ela perguntou naturalmente, e
Jasper ficou momentaneamente atordoado e em silêncio.
— Sim — coaxou antes de cobrir o rosto com as mãos. — Por Deus,
sim. Sim, por favor.
Não podia olhar para ela, pois temia que o momento em que ela o
tocasse com a boca e a visse fazendo aquilo... Em vez disso, fechou os
olhos com força e prendeu a respiração e quase morreu de desejo ao
primeiro movimento quente da respiração dela contra sua barriga.
Não houve nada por um momento, apenas o suave sussurro de sua
respiração correndo sobre seu corpo, deixando-o à beira de implorar por
misericórdia quando sentiu o lampejo de sua língua contra seu membro. Ela
se arrastou ao longo dele e Jasper gemeu, o som profundo e sincero. Harriet
deve ter interpretado aquilo como um som de aprovação, o que
definitivamente era, tanto que repetiu a ação e depois depositou pequenos
beijos úmidos ao longo do caminho que sua língua havia tomado. Ela
alcançou a ponta e sua língua o percorreu novamente. Então ouviu um som
de surpresa.
— Salgado — disse, e seus dedos acariciaram a cabeça lustrosa,
alisando a umidade sobre ele. — O que é isso? — Perguntou nada inibida,
apenas por curiosidade. — Sei que a concepção é causada pela ejaculação
masculina do esperma, mas isso não é o mesmo, não é?
Jasper fez um som sufocado em algum lugar entre diversão e
desespero. — Não, amor — disse com a voz quase estrangulada. — N-não
é o mesmo. É o meu corpo dizendo que está me deixando louco e que quer
estar dentro de você, muito mesmo de fato. — Atreveu-se a olhá-la e a
encontrou balançando a cabeça seriamente.
— Esta é uma evidência física de desejo, então?
Jasper acenou positivamente com a cabeça.
— Existe algo semelhante, não existe? — Perguntou diretamente. —
Em mim?
Jasper acenou novamente, mostraria a ela. — Deite-se.
Ela fez o que pediu e Jasper se virou de lado novamente, deslizando a
mão pela parte externa de sua coxa. Harriet o observou, enquanto ele se
abaixava e a beijava, satisfeito quando ela respirou fundo e se abriu para ele
imediatamente. Enquanto se beijavam, gentilmente separou suas pernas e
voltou a acariciar de baixo para cima, ciente da aceleração de sua
respiração. Interrompeu o beijo enquanto seus dedos procuravam os cachos
entre suas coxas e querendo observá-la, precisando ter certeza de sua
aprovação.
— Aqui está sua evidência, amor — disse, separando as dobras
delicadas e buscando o calor úmido dentro dela enquanto mergulhava a
ponta do dedo.
Harriet prendeu a respiração. — Sim. — respondeu. — Oh, sim.
Jasper inclinou a cabeça e beijou-a novamente enquanto continuava a
acariciá-la, seu dedo deslizando um pouco mais fundo enquanto seu polegar
circulava sobre o pequeno botão escondido, com cuidado. Harriet se
arqueou, um grito suave foi arrancado dela, o que fez seu corpo se contrair
com uma necessidade.
— E-eu... — Harriet começou antes que seu toque a fizesse arquear
novamente e as palavras se perdessem.
— Você o que? — Jasper perguntou, acariciando seu pescoço e
mordiscando suavemente o lóbulo de sua orelha.
— E-eu... — começou de novo e olhou-a, observando-a enquanto ela
perguntava com a solenidade típica. — Eu também sou salgada?
Jasper olhou-a, imaginando por um momento frenético se ela estava
fazendo isso de propósito, pois estava destruindo seu autocontrole. Engoliu
em seco e tentou encontrar sua voz.
— Por que não descobrimos?
Desceu da cama, encantado e surpreso quando ela abriu mais as pernas
para ele, dando-lhe total acesso. Ela se sentou apoiada nos cotovelos e
olhou para ele.
— Quer? — Perguntou franzindo um pouco a testa. — Nunca
perguntaria se...
Jasper deu uma risada ligeiramente histérica. — Sim. Sim, quero. Mais
do que tudo.
— Ótimo —disse, aparentemente satisfeita enquanto se deitava
novamente.
Os lábios dele se curvaram. Deus, era maravilhosa. Totalmente única,
verdadeiramente ela mesma. Não havia outra mulher no mundo como ela, e
não podia se dar ao luxo de deixá-la escapar. Com isso em mente,
acomodou-se ao trabalho, determinado a agradá-la, a proporcionar-lhe tal
prazer que ela jamais seria capaz de esquecer, ou de esquecê-lo.
O som que fez quando ele separou seus cachos e a lambeu, certamente
ficaria gravado em sua mente até o dia de sua morte. Era ao mesmo tempo
obsceno e uma surpresa totalmente inocente e, quando repetiu, havia tanta
aprovação no suspiro ofegante que deu, que ele teria ronronado se fosse
capaz.
— Oh — gritou, estendendo a mão para enredar o dedo em seu cabelo,
arqueando os quadris para se entregar mais completamente ao seu alcance.
— Oh, Jasper.
O som de seu nome falado com tanto desejo enviou uma necessidade
direto para sua virilha e ele precisou de toda concentração possível para não
ceder ao desejo de afundar nela naquele momento. Não seria egoísta.
Embora nunca tivesse dormido com uma virgem antes, sabia que sua
primeira vez poderia não ser tudo o que ele queria para ela, mas não havia
nenhuma maneira dela sair de sua cama sem saber quanto prazer poderia ser
encontrado nela.
— Qual é o meu gosto, Jasper?
Jasper riu contra sua pele, achando graça que ela ainda quisesse saber.
— Mais doce que mel — murmurou. — Doce e ácido e absolutamente
delicioso.
Suspirou, satisfeita, e se entregou ao prazer que lhe dava. Para seu
alívio, não demorou muito para que ele sentisse seu clímax se aproximando.
Não que quisesse parar, longe disso, mas não achava que poderia esperar
muito mais. Debaixo dele, percebeu seu corpo dela ficando tenso, o aperto
de seus dedos em seu cabelo e sua respiração falha ao se aproximava do
limite.
Jasper murmurou com aprovação enquanto chupava suavemente o
delicado botão de seu sexo e ela se despedaçou, seu grito alto e franco o
suficiente para deixá-lo extremamente feliz de seus aposentos ficarem longe
dos outros. O prazer vibrou por ele enquanto a guiava, aliviando cada gota
de prazer que sentia de seu corpo antes que finalmente se movesse para
tomar seu lugar entre suas coxas. Não conseguia esperar mais, aquilo o
estava matando.
— Harriet — disse, olhando-a enquanto piscava vagamente para ele.
— Por favor — acrescentou, perguntando-se se isso era coerente o
suficiente, já que estava além das palavras naquele momento. Deslizou seu
membro sobre sua carne lisa e ela perdeu o fôlego e então envolveu suas
pernas ao redor de seus quadris, arqueando-se para encontrá-lo.
—Sim — respondeu. — Sim.
Isso era tudo que precisava, empurrando para dentro, observando seu
rosto por qualquer sinal de dor ou angústia.
— Isso é...?
— Sim.
Ele inclinou a cabeça, descansando sua testa contra a dela e deslizando
mais fundo, fechando os olhos quando o calor requintado dela o envolveu
como uma luva de veludo.
— Qual a sensação? — Ela perguntou.
Jasper forçou seus olhos a se abrirem novamente e olhou para ela,
atordoado de prazer. — Como o paraíso. Como se não existisse nada na
terra além de você, Harry — disse entrando mais ainda nela, e ela soltou um
pequeno grito de surpresa. Ele parou imediatamente. — Está doendo?
Harriet balançou a cabeça negativamente. — Não, quero dizer, doeu
por um momento. É estranho, só isso.
— E agora? — Perguntou, retirando-se e deslizando para dentro dela
novamente.
— Está tudo bem — falou, fechando os olhos quando ele repetiu o
movimento. — Tudo bem... Oh.
Ele sorriu com aquele pequeno som de prazer e beijou sua testa
enquanto deslizava a mão entre eles e encontrava o lugar secreto que sua
língua tanto amava.
— E agora? — Perguntou tocando-a muito suavemente.
— Oh, sim — disse, suspirando e envolvendo os braços em torno dele,
puxando sua cabeça para baixo e procurando sua boca. — Sim —
sussurrou.
Do ponto de vista de um homem que acreditava ser um amante
experiente, passou-se um tempo embaraçosamente curto antes que Jasper
sentisse seu próprio corpo enrijecer.
— Harry — disse olhando para ela.
— Sim — murmurou enquanto o olhava sorrindo, realmente sorrindo
para ele, o seu olhar era tão afável que seu coração disparou. — Oh, sim.
Ele tremeu quando ondas de prazer tomaram conta do seu corpo,
abraçando Harriet e gritando, incapaz de conter sua alegria quando disse o
nome dela.
— Harry, oh, sim, Harry. Eu te amo. Eu te amo.
11

Minha querida Srta. Hunt,


Espero que a senhorita esteja bem e não tenha piorado devido
à sua exposição ao clima inclemente desta manhã. Ficaria feliz
em ter meu médico atendendo a senhorita, caso precise.
Torci o meu tornozelo, como suspeitei, mas posso relatar que
não há danos permanentes ou mais graves. Informo-a apenas
para lhe poupar o trabalho de inquirir, como não tenho
dúvidas de que estava prestes a fazer. Não gostaria que a
senhorita se preocupasse indevidamente por mim.
Felizmente, Rhaebus foi recuperado, ileso.
Prevejo que a próxima vez que nos cruzarmos - ou
discutirmos - não será menos dramática. Aguardando
ansiosamente…
M
—Carta do Muito Honorável, Lucian Barrington, o
Marquês de Montagu para a Srta. Matilda Hunt.

N 31 1814. H H ,
S .
— Argh! — Matilda amassou o bilhete e estava prestes a ateá-lo ao
fogo, mas se viu obrigada a desamassá-lo e ler a maldita nota novamente.
— Como não tenho dúvidas de que estava prestes a fazer — leu
amargamente, antes de acrescentar: — Por cima do meu cadáver.
De todos os presunçosos, irritantes, convencidos...
Grrrr.
Caminhou de um lado para outro no quarto, transtornada e frustrada.
Se ao menos estivesse em casa e pudesse arremessar algum objeto pelo
quarto e dar vazão a seus sentimentos. Ele sabia tão bem quanto ela que não
tinha a menor intenção de perguntar sobre seu maldito tornozelo. Quer
quisesse ou não, teria sido bastante inapropriado, especialmente porque
ninguém estava ciente do encontro deles. No entanto, suas amigas
claramente perceberam que algo havia acontecido. Mas isso estava fora de
questão. A própria ideia de que estava morrendo de medo por causa dele era
risível.
Certamente que se perguntou se ele estava bem, mas apenas para que
pudesse desfrutar da vaga esperança de que tivesse quebrado um maldito
osso. Oh, isso também não era verdade, mas também não tinha se
preocupado indevidamente.
O bilhete havia sido colocado sob sua porta, encontrou-o depois do
jantar, quando voltou para seu quarto. Não tinha ideia de como tinha feito
isso, ou melhor, como tinha providenciado para que fosse feito. Não estava
disposta a contemplar a possibilidade de Montagu rastejar por Holbrooke
House para entregar-lhe um bilhete, mesmo que seu tornozelo não estivesse
quebrado. Sem dúvida, tinha criados de confiança para fazer um trabalho
tão sorrateiro.
Prevejo que a próxima vez que nos cruzarmos - ou discutirmos - não
será menos dramático. Aguardando ansiosamente...
O que, diabos, quis dizer com isso?
Matilda se jogou na cadeira perto do fogo e olhou para a nota que
ainda segurava. A caligrafia era previsivelmente elegante e precisa, como o
próprio homem. Até o florescente M no final era arrogante. Ainda fervendo
de raiva, Matilda desejou a atirar a nota agravante, e quaisquer pensamentos
sobre homem, às chamas. Não conseguiu se obrigar a fazê-lo, o que só a
irritou ainda mais. Em vez disso, levantou-se, caminhou até a mesinha de
cabeceira, enfiou o bilhete entre as páginas do livro que estava lendo e
fechou a gaveta novamente.
A orquídea em sua mesinha tremeu com a força do movimento fazendo
com que as delicadas flores balançassem.
Matilda praguejou baixinho e apagou a vela.
Harriet olhou para as cores ricas do dossel sobre a cama, tentando
compreender os acontecimentos das últimas horas. Nada tinha acontecido
como havia imaginado.
Precisou de cada pingo de coragem que possuía para andar pelos
corredores escuros de Holbrook House até os aposentos de Jasper. Claro
que sabia onde ficava, pois conhecia aquela gigantesca casa tão bem quanto
a família, melhor até.
Lembrou-se da história do fantasma e se perguntou se o veria no
caminho. Nunca o tinha feito antes e era bastante ambivalente sobre a ideia
de vê-lo ou não. Embora fosse desagradável, seria interessante ter a prova
de tal fenômeno. Neste ponto, percebeu que estava tentando se distrair de
seu propósito atual, sem muito sucesso também. Estava toda trêmula, seu
coração batendo forte no peito, de forma tão furiosa, que achou
perfeitamente possível convocar os mortos.
Então Jasper havia estado lá, à espera, e... as coisas que ele tinha dito, a
forma como a tinha tocado... isso tinha-lhe feito ter esperança e sonhar e....
Como poderia ousar acreditar?
Virou-se de lado, o que não foi fácil, já que Jasper tinha uma perna e
um braço sobre ela. Ele estava dormindo e roncando, bem, não exatamente,
mas respirando pesadamente. Harriet o estudou, satisfeita com a
oportunidade de fazê-lo de perto, sem se preocupar.
Seus cílios eram de um tom de ouro mais escuro comparado ao cabelo
e ridiculamente longos. Qualquer mulher mataria por cílios como esses.
Parecia jovem e imperturbável no sono, as rugas de preocupação que notou
ao redor de seus olhos no início da noite suavizaram. Havia também sardas
levemente espalhadas sobre seu nariz que nunca tinha notado antes, e que
achou perfeitamente charmoso. Suas mãos estavam marcadas de forma
semelhante onde o sol o havia bronzeado, e saber daquilo a fez sorrir.
Ele disse que a amava. Disse aquilo como se fosse verdade. Entretanto,
tinha soado assim todos aqueles anos atrás, quando pediu que não se
casasse com mais ninguém. Bem, não se casou, não que alguém tivesse
pedido a sua mão. Não até Inigo.
O que devia fazer? Ficar com Jasper e ter uma vida ao seu lado era o
seu sonho até o momento que ele despedaçou o seu coração. Poderia
realmente arriscar novamente? Não seria mais seguro ficar com Inigo?
Tinham muito mais semelhanças, muito mais interesses em comum. Exceto
que agora havia um novo problema.
Visto que tinha plena consciência de que ele sabia, Jasper não se tinha
retirado no momento crucial. O que significava que havia uma chance, por
menor que fosse, dela estar carregando o futuro conde de St. Clair. A ideia
de que ele permitiria que se casasse com Inigo agora...
Não que fosse sua escolha, mas...
Suspirou. Se não estava presa antes, certamente estava agora. O mais
preocupante era que ela achava que ficaria feliz. Talvez não fosse corajosa o
suficiente para confiar nele de novo e permitir-se amá-lo como havia amado
uma vez, mas poderia simplesmente deixar isso acontecer. Agora a escolha
havia sido tirada dela.
O que fazer com Jasper Cadogan.
Deus do céu.
Quanto de sua vida foi desperdiçada, contemplando essa mesma
questão? Exceto que não parecia um desperdício naquele momento.
Jasper suspirou. Seu braço, que era um peso na cintura dela, apertou,
puxando-a para mais perto, e ele fez um som de contentamento.
— Está dormindo?
— Uhun — ele murmurou.
— Preciso ir.
Seu braço apertou ainda mais, e uma carranca desfigurou seu belo
rosto, embora seus olhos permanecessem fechados. Harriet estendeu a mão,
alisando as rugas. — Não posso ser encontrada nos seus aposentos, e estou
cansada. Se adormecer, ficarei aqui até de manhã.
Os olhos dele se abriram e ela ficou deslumbrada de novo com sua cor
notável, aquele azul-esverdeado claro que não era exatamente nem um nem
outro, mas ao mesmo tempo os dois.
— Acredito que agora seja tarde demais — disse, com um sorriso
malicioso nos lábios.
— Isso não significa que eu queira começar outra rodada de
maledicências. Sabe como os criados falam.
Jasper balançou a cabeça. — Não Merrick. Ele odeia fofoca. Levará
meus segredos para o túmulo.
— Hmmm — disse Harriet, não gostando do som daquilo. — Quantos
segredos sombrios tem exatamente?
— Apenas um que valha a pena — disse, estendendo a mão e traçando
a linha de sua mandíbula. — E está se tornando menos segredo a cada
minuto.
Olhou-o fixamente, dividida entre a expectativa de que dissesse e a
esperança de que não o fizesse. Quanto mais seu coração poderia suportar
antes de capitular totalmente e se dissolver em uma poça aos pés dele?
Prevendo inteiramente a questão, o beijou. Ele a puxou para ele,
aprofundando o beijo, e despertando todo o tipo de sensações enquanto o
seu corpo respondia de imediato, apesar do cansaço.
— Fique — disse com tal súplica que não pôde recusar. Não quando
queria realmente ficar. — Por favor — acrescentou. — Quero acordar ao
seu lado.
Com um suspiro, ela se aproximou e colocou a cabeça em seu peito,
fechando os olhos enquanto ele acariciava suas costas com a mão
preguiçosa.
— Muito bem — respondeu, fechando os olhos. — Estou muito
cansada para discutir.
— Milagres acontecem — murmurou e, pela primeira vez, o deixou ter
a última palavra.

O dia seguinte amanheceu com a vivacidade renovada que sempre se


seguia a uma chuva torrencial de verão. A terra ressecada pelo sol havia
absorvido cada gota e a grama estava mais brilhante, as cores mais
dramáticas, como se a Mãe Natureza estivesse tendo uma última explosão
de glória antes que o outono, que se aproximava, roubasse a cena do verão.
Minerva olhou pela janela de seu quarto com uma explosão de
antecipação. Havia uma viagem planejada para Tunbridge Wells. Embora
tenha parado lá, com Bonnie e Ruth, não tiveram a oportunidade para ver
tudo, e estava muito ansiosa para explorar um pouco mais. Para ser honesta,
porém, seu principal motivo para querer voltar era a chance muito pequena
de topar com o Sr. De Beauvoir uma segunda vez.
Porque estava tão impressionada com ele, depois de um encontro tão
desfavorável, não tinha a menor ideia. Ocorreu-lhe que talvez fosse algum
desejo perverso de frustrar sua mãe, que esteve agressivamente em busca de
um marido nobre para sua filha desde o momento em que debutou. Minerva
foi intimidada e forçada a comparecer a vários eventos sociais, sua mãe lhe
dizia sempre o que dizer, o que fazer, como agir, quando sorrir, até que um
dia ficou tão cansada e enojada de tudo aquilo, que acabou se esquecendo
de quem era e o que queria para si mesma. Com a ajuda de Prue, mudou e
prometeu a si mesma que tomaria suas próprias decisões de agora em
diante. O intrigante Sr. De Beauvoir era tudo o que sua mãe abominava.
Não tinha título e nem era rico, não tinha charme ou rosto bonito para
recomendá-lo e, que Deus o livre, era um intelectual.
Se sua querida mãe tivesse a menor ideia dos pensamentos de Minerva,
provavelmente sofreria um colapso nervoso.
Mesmo assim...
Minerva ainda esperava vê-lo novamente. Mordendo o lábio,
considerou o que vestir para mostrar-se em sua melhor forma, e então
considerou o que poderia realmente impressioná-lo, já que duvidava que
fosse seu vestido.
— Será que Harriet tem algum livro interessante que eu possa pegar
emprestado? — Perguntou-se em voz alta.
Se pudesse lhe mostrar que estava tentando expandir seu cérebro,
talvez isso o impressionasse. Minerva fez uma careta e suspirou. Só se
pudesse falar sobre o referido livro com alguma convicção, o que achava
improvável. Ainda assim, era a única coisa em que conseguia pensar.
Jasper pestanejou, olhando para a mulher dormindo ao seu lado com a
descrença atordoada de um homem que acabou de despertar de um sonho.
Por um terrível momento, sonhos e realidade se sobrepuseram, e temeu que
não fosse nada além de sua imaginação, mas então ela resfolegou um
pouco, algo entre um ronco e um bufo, e sua boca se curvou em um sorriso.
O som a acordou e ela piscou na luz fraca de seu quarto, os olhos se
arregalando com o choque ao vê-lo.
— Oh — disse surpresa, e então soltou um suspiro. — Bom dia.
— Case-se comigo — disse Jasper, incapaz de conter o pedido por
mais tempo. — Por favor, Harry, diga que se casará comigo.
Observou sua testa franzir e viu a preocupação em seus olhos.
— Vou fazê-la feliz, prometo.
Ela suspirou e virou de costas para ele. — Não podemos passar nossas
vidas na cama, Jasper. Casamento é mais do que isso.
— Eu sei — respondeu e levantou a mão para pegar o rosto dela,
virando-o para que pudesse olhá-lo. — Mas a cama é mais importante do
que acho que pensa. Realmente poderia se casar com De Beauvoir agora?
Não vai pensar em mim sempre que ele a tocar? Pois não será como é
conosco, Harry. Isso eu prometo.
As palavras soaram um pouco mais duras do que pretendia,
alimentadas pelo ciúme. Não acreditava que seu coração sobrevivesse se ela
escolhesse De Beauvoir.
Ela não disse nada, apenas olhou-o, seus olhos escuros solenes
enquanto um pânico crescia em seu peito. Por que o escolheria? Achava que
era um almofadinha sem cérebro e não sabia como convencê-la do
contrário, não quando temia que fosse verdade. Um dia, em breve, teria que
dizer-lhe a verdade, devia muito a ela, mas a ideia o deixava doente. E se
ficasse chocada, até mesmo envergonhada, ou pior, e se tivesse pena? Como
suportaria isso?
— Tem que se casar comigo agora, de qualquer maneira — disse mais
severamente do que pretendia, enervado com o seu silêncio, atacando como
sempre fazia quando o irritava e afetava sua confiança. — Pode estar
carregando meu filho.
— Sim, sei que se certificou de que essa fosse uma possibilidade —
disse friamente.
Jasper corou, dividido entre o desejo de ter feito isso de propósito e a
mortificação. Meu Deus, por que sempre o fazia se sentir como um garoto
tolo? — Não fiz de propósito — disse rigidamente. — Eu... Eu
simplesmente não pensei, não consegui pensar. Perdi o controle.
— Eu poderia esperar até ter certeza de que não há nenhuma criança —
respondeu, e embora tivesse dito aquilo de forma branda, as palavras
atingiram seu coração. — É improvável, sabe. Algumas pessoas tentam por
anos antes de conceber.
Isso era muito razoável e Jasper tinha ido muito além da razão. Moveu-
se para cima dela e abriu as suas pernas, ajustando seu corpo intimamente
contra o dela. — Então é melhor dobrar as minhas chances, não acha? —
rosnou.
Harriet arfou quando ele deslizou seu membro rígido entre suas pernas,
mas não se queixou e levantou os quadris em direção aos dele, envolvendo-
o com os braços.
— Realmente faria isso comigo? — Perguntou olhando-o. — Me
engravidaria de propósito para me obrigar a fazer o que quer?
Jasper fechou os olhos e engoliu em seco quando foi tomado por uma
vergonha. Balançou a cabeça. — Não — admitiu, ousando olhá-la. —
Embora tema o quão longe iria. Não posso perdê-la, Harry, eu te amo tanto
— declarou. — Sei que poderíamos ser felizes. Sei que faria qualquer coisa
para fazê-la feliz.
Havia medo em seus olhos, mas também desejo, tinha certeza disso.
Ela queria acreditar nele, e isso era mais do que poderia esperar.
— Harriet — soprou o nome dela contra seu pescoço ao entrar nela e
um prazer desenrolou sobre seu corpo enquanto ela ofegava e o apertava,
dando-lhe as boas-vindas. — Não me recuse, amor, por favor. Diga que sim.
— Eu... Não consigo pensar quando... Oh...
— Harry?
— Vou pensar sobre isso, Jasper, prometo. Só que... mais tarde...
preciso de um pouco de tempo.
Não foi um não, pelo menos, e foi mais do que conseguira do dia
anterior. Não disse mais nada. Poderia dar-lhe tempo, e durante esse tempo
ele se certificaria de que ela nunca mais fosse capaz de olhar para outro
homem, não quando o queria tanto.
12

Milorde,
Lamento verdadeira e profundamente sua perda e, embora
duvide que o senhor acredite em mim, não tenho a intenção de
lhe causar mais sofrimento. No entanto, não faz diferença
para mim se Gordon Anderson agora é seu herdeiro. Não me
importaria se ele fosse o próximo rei da Escócia. Não vou me
casar com ele. Estou certa de que o senhor não enfrentará
nenhum problema em encontrar uma jovem que aproveitaria
melhor a chance, então por que não encontrar uma? Mas não
eu!
—Trecho de uma carta da Srta. Bonnie Campbell ao
Honorável William Douglas, o Conde de Morven.

1 1814. H H ,S .
Harriet agradeceu a criada e dispensou-a, depois pegou os óculos.
Havia voltado para seu quarto sem ser vista, graças ao fato de ter
conhecimento detalhado de todas as passagens ocultas e buracos escondidos
que percorriam o vasto casarão. Merrick, como Jasper sugeriu, nem mesmo
piscou um olho por ela estar nos aposentos de seu mestre, e a tratou com
todo o respeito devido à futura condessa.
Deu um suspiro pesado e se levantou para olhar pela janela. Que bom
seria viver em um lugar tão esplêndido, e com Jasper como seu marido. Era
a personificação de todos os seus sonhos, mas ainda não tinha certeza se era
corajosa o suficiente para alcançá-lo. Ontem à noite e esta manhã -
lembrou-se com um pouco de rubor - foi tão fácil estar com ele. Ficou tão
impressionada com a forma como a fazia se sentir que concordaria com
tudo que ele quisesse, mas temia tomar qualquer decisão naquele momento.
Desejo não era base para um casamento, não quando ainda estava tão
insegura de sua motivação.
Não podia fingir que acreditava que suas declarações de amor eram
sinceras. Não que achasse que estava mentindo; ele claramente acreditava
nisso. No entanto, Jasper era tão teimoso e o havia recusado por tanto
tempo, que não podia deixar de suspeitar que era apenas um caso de querer
o que não poderia ter. Certamente, uma vez que sua satisfação por ter ganho
o que antes era impossível passasse, perceberia que se casou com uma sabe-
tudo entediante e desprovida de beleza. Lembrou-se novamente da beleza
exuberante de sua última amante, a Sra. Tate, e a comparação com os
encantos limitados de Harriet parecia cruel. Ele se arrependeria com o
tempo, quando percebesse que sua esposa preferia ficar em casa com o
nariz enfiado em um livro do que assistir qualquer baile ou evento social
que preenchesse sua agenda.
Não seria melhor para ela se casar com Inigo e acabar logo com isso?
Pouparia a ambos uma grande dor no coração, quando Jasper percebesse o
erro que cometeu. Harriet estendeu a mão e massageou as têmporas. Sua
cabeça latejava, embora não achasse que fosse apenas sua ansiedade pela
decisão que tinha que enfrentar. Sentia calor e sua garganta estava
arranhando. Certamente pegou um resfriado e logo teria que enfrentar
Jasper com a indignidade extra de um nariz vermelho e olhos lacrimejantes.
Era revoltante. Resolveu então pedir um pouco de chá de casca de
salgueiro, antes de descer para um farto desjejum. Talvez não sucumbisse
ao resfriado se o tirasse da sua cabeça.
Os pensamentos de Harriet se dispersaram quando alguém bateu na
porta de seu quarto, ao abrir encontrou Minerva do outro lado.
— Olá Harriet — Minerva cumprimentou e por um momento Harry
sentiu uma onda de ciúme.
Esse era o tipo de moça que deveria ser a próxima condessa de St.
Clair. Era adorável, com seus cabelos loiros espessos e seus olhos azuis
surpreendentes. Por um momento, Harriet a imaginou com Jasper e
reconheceu o casal bonito que formariam. O ciúme a rasgou tanto que quase
roubou seu fôlego.
— Minerva — respondeu, com o tom gelado.
A jovem hesitou com a saudação hostil e Harriet praguejou por ser tão
estúpida e indelicada.
— Perdoe-me — disse suspirando. — Estou com um pouco de dor de
cabeça e isso está me deixando irritada.
— Oh, coitadinha — disse Minerva com simpatia. — Devo pedir a
alguém para buscar um pouco de chá de casca de salgueiro?
Harriet sorriu e assentiu, sentindo-se pior do que nunca. — Sim,
certamente é disso que preciso. Isso e um pouco de ar fresco me farão muito
bem. Está pronta para descer para o café da manhã? É melhor nos
apressarmos se não quisermos deixar todos esperando.
— Sim, estou, mas... estava me perguntando se... se pode me emprestar
um livro, por favor?
Surpresa, Harriet piscou para a jovem. — Certamente, embora,
geralmente, não leio muitos romances. Pelo menos, não tenho nenhum
comigo no momento. Mas, no entanto, acredito que Matilda tenha, se...
— Oh não — Minerva disse, suas bochechas corando em um rosa
suave que a fez parecer mais linda do que nunca. Harriet conteve sua
frustração. — Não quero um livro de romance. Eu... eu gostaria de algo
educacional.
Minerva ergueu o queixo com um brilho levemente desafiador em seus
olhos que supôs que Harriet a julgaria burra demais para ler algo do tipo.
— Claro — disse sorrindo para Minerva. Seria maravilhoso se a jovem
quisesse usar seu cérebro e Harriet ficaria feliz em encorajá-la. — O que
tem em mente?
— Erm... — Minerva começou, mas soando um pouco em pânico. —
O que tem disponível?
— Bem — Harriet pensou, abrindo a tampa de uma caixa que continha
os livros que trouxera com ela.
— Deus do Céu! — Minerva exclamou olhando para a caixa com
espanto. — Trouxe tudo isso para uma festa?
Harriet empurrou os óculos pelo nariz e encolheu os ombros. — Gosto
de ler. Agora, vejamos bem — falou, pegando alguns livros. — Só tenho
uma seleção limitada aqui, mas há filosofia, física, ciências naturais,
química...
— Ah, hum. Química, talvez? — Minerva se aventurou, parecendo não
ter certeza.
— Oh, bem, nesse caso, vou lhe emprestar esse — disse Harriet,
selecionando Conversas sobre Química, o livro que Inigo havia enviado
para ela. — Já li, mas preciso ler de novo porque estava um pouco er...
distraída e não acho que apreciei como deveria. A autora é uma mulher,
embora não seja creditada, mas tenho um amigo que a conhece e a tem em
alta conta. Acho uma leitura interessante para um iniciante no assunto. Foi
muito bem escrito.
Minerva pegou o livro com uma expressão assustada, sugerindo que
acreditava que ele a morderia.
— Não fique tão apavorada — Harriet sorriu. — Não está em grego,
prometo. Experimente pequenas seções de cada vez. Se não fizer sentido,
venha até mim e poderemos conversar sobre isso. Não que eu seja uma
especialista, longe disso, apenas é um assunto que me interessa e gostaria
de aprender mais.
— Existe algum assunto que não a interesse? — Minerva perguntou
ainda parecendo bastante intimidada.
— Não — disse Harriet com um suspiro, franzindo a testa para sua
coleção de livros. — Esse é um problema frequente que tenho. Não consigo
me contentar com apenas um assunto e fazê-lo justiça. Simplesmente gosto
de aprender e, se algo novo surgir, quero saber. Por isso, nunca aprendo
nada com profundidade, o que temo ser uma fraqueza terrível.
— Mas sabe bastante sobre muitas coisas. Quero dizer... Não sei nada,
nada! A menos que conte saber que vestido usar em qual ocasião, como
fazer uma reverência a um duque ou visconde, como fazer chá, bordar ou
uma dúzia de outros talentos inúteis.
— Minerva! — Harriet a repreendeu. — Isso não é nem um pouco
inútil. Essas são coisas que precisamos saber para navegar no mundo em
que nascemos, e reflita sobre por que não sabe mais nada? Nunca foi à
escola, não é?
— Não, claro que não.
— Bem, então como deveria saber alguma coisa? As mulheres são
mantidas na ignorância para mantê-las dóceis e fáceis de controlar, se quer
saber. Muitos homens temem uma mulher intelectual, pois podem descobrir
que somos tão inteligentes e capazes quanto eles. Bem, nem todos os
homens — acrescentou para ser justa, pois Inigo encorajou seus estudos
sem hesitação.
Minerva olhou para o livro em sua mão e respirou fundo. — Bem, vou
tentar, Harriet, e falarei contigo sobre isso, se não conseguir entender essa
maldita coisa.
Harriet sorriu para ela. — Bem, isso é um bom começo, e é muito bom
ter alguém com quem conversar sobre isso, posso lhe dizer. Agora, venha. É
melhor nos apressarmos.

Minerva viajou com Harriet, Lorde St. Clair e Matilda. Bonnie e Ruth
seguiam na carruagem de Ruth com Henry e Jerome. Chegaram a
Tunbridge Wells em boa hora, com as carruagens parando perto de The
Walks. O plano geral parecia ser dar uma olhada nas lojas, visitar a Capela
de tranquilidade, Charles, rei e mártir, comer algo e depois passear no
parque The Grove.
— Vai tomar as águas? — Harriet perguntou a Matilda, que fez uma
careta quando passaram pela fonte de Chalybeate.
A água tinha manchado tudo que tocava em um laranja vivo, rico em
ferro. Uma senhora segurava uma concha nas mãos, a qual se tinha que
pagar para usar. A água em si era de graça, mas se você quisesse bebê-la de
maneira refinada, teria que pagar pelo privilégio.
— Não, obrigada — Matilda disse com um calafrio. — Estou me
sentindo bem. Se eu estivesse doente, talvez me forçasse a beber um pouco,
mas não beberei se não precisar.
— Concordo — disse St. Clair sorrindo. — Talvez se servissem com
um pouco de conhaque...
Todos riram e seguiram em frente.
— Acha que vai chover de novo? — Harriet perguntou olhando para
um céu azul claro tomado por um número crescente de nuvens brancas e
macias. No entanto, era possível ver nuvens mais escuras e pesadas vindo
do Oeste.
— Bem, eu trouxe meu guarda-chuva, mas espero que não — Matilda
disse com uma piscadela.
— Oh, Bonnie, vamos voltar aqui — Ruth disse, puxando o braço de
Bonnie enquanto passavam por uma loja com sua vitrine cheia de chapéus e
peças luxuosas de tecido nas cores da última moda. — Foi aqui que
comprei aquela cartola querida.
Bonnie e Minerva trocaram um olhar. Ela deu de ombros e devolveu
um sorriso pesaroso.
— Jasper!
Jasper se virou quando seu irmão o saudou, e deram de cara com um
cavalheiro que ambos pareciam conhecer.
— Por Deus, é Rothborn — Jasper exclamou surpreso.
— Solo Rothborn? — Matilda perguntou, olhando para o homem com
interesse.
Minerva seguiu seu olhar, mas não conseguiu ver nada além da nuca
do cavalheiro. Era alto e tinha os ombros largos, com cabelo castanho claro,
mas nada mais digno de nota.
— Quem é ele? — Perguntou, curiosa do porquê aquilo ser uma
surpresa.
— Solomon Weston, Barão Rothborn — disse Matilda enquanto Jasper
pedia licença para falar com o amigo. — Ele é um recluso, quase nunca é
visto em público. É por isso que todo mundo o chama de ‘Solo’ Rothborn.
Minerva se virou para Harriet, que estava olhando para a livraria duas
portas abaixo com uma expressão de anseio. — Vamos entrar? — Minerva
perguntou, suas esperanças esvoaçando.
Harriet deu um sorriso agradecido. — Por que não?
Minerva prendeu a respiração por todo o caminho até a livraria, que
infelizmente estava desprovida de qualquer evidência de sua presa. Harriet
se acomodou em um canto com um livro de tamanho formidável que fazia a
cabeça de Minerva doer só de pensar, então vagou pelos corredores sozinha.
Sorriu, encantada ao descobrir cópias do livro de Prue, encadernados
carinhosamente em couro escarlate, e passou um tempo folheando os
romances antes de voltar para Harriet, que ainda estava abrigada com seu
livro.
— Acho que vou esperar lá fora — ofereceu, ao que Harriet ergueu a
mão, sem tirar os olhos do livro. Minerva deu um sorriso triste e saiu.
Encontrou Lorde St. Clair vindo em sua direção.
— Senhorita Butler, viu a Srta. Stanhope? — Perguntou enquanto se
aproximava. — A procurei em todos os lugares.
— Sim, a vi, ela está com o nariz enfiado em um livro — Minerva riu
gesticulando para trás.
Jasper sorriu, e a respiração de Minerva prendeu ao ver o olhar dele. —
Foi o que pensei — disse pesarosamente, antes de se apressar para dentro.
Sorte da Harriet, Minerva pensou com um suspiro. Qual a sensação de
ter um homem tão apaixonado por nós? Harriet seria uma tola se não ficasse
com ele. Minerva voltou para a loja em que Matilda e as outras haviam
entrado, se perguntando se já teriam terminado, e então parou ao ver o rosto
que estava procurando.
— Senhor De Beauvoir!
A respiração de Minerva prendeu ao perceber a coisa ultrajante que
acabara de fazer. Nunca tinha sido apresentada a ele apropriadamente e aqui
estava na rua, para todos os efeitos e propósitos, sozinha, cumprimentando
um homem que mal conhecia.
O homem parou, suas sobrancelhas escuras se juntando enquanto a
olhava sem o menor traço de reconhecimento.
— Temo que a jovem me tenha em desvantagem, senhorita...?
— Butler — Minerva disse imediatamente, sentindo suas bochechas
esquentarem de vergonha. — Nós nos conhecemos na livraria. Aquela
livraria ali — acrescentou, apontando para a livraria enquanto a expressão
dele não mostrava nenhum sinal de que se lembrava dela. Que humilhante.
Não era algo que tinha acontecido semanas atrás! — Um sujeito gritou
comigo quando deixou cair seus livros, e o senhor, muito gentilmente, me
defendeu e disse a ele que foi um acidente — parou, sentindo-se cada vez
mais mortificada.
De Beauvoir grunhiu, o que Minerva interpretou como um sinal de
que, finalmente, se lembrou dela.
— Não sabia que estava falando com uma celebridade — acrescentou,
forçando um sorriso radiante, desesperada para encontrar algo para dizer a
ele. — Entendo que suas palestras na Royal Academy são muito apreciadas.
— A senhorita se interessa por química, Srta. Butler? — Perguntou,
parecendo um pouco cético.
— Eu... não sei — admitiu Minerva. — Mas tenho isso — acrescentou
apressadamente, procurando em sua bolsa o livro. Harriet a olhou quando o
enfiou na bolsa – afinal não era exatamente uma leitura leve - mas esperava
por um cenário como este. Mostrou a capa fazendo-o levantar as
sobrancelhas surpreso.
— De fato — disse com aprovação. — Conheço a senhora que
escreveu isto. A senhorita não poderia ter uma melhor introdução ao
assunto. O que está achando?
— Oh — Minerva disse, sentindo a cor subir em suas bochechas. —
Peguei o livro hoje de manhã, então eu... eu não...
— Bem, tenho certeza de que a senhorita o achará esclarecedor. Agora,
se me der licença...
Droga, ele já estava indo.
— O senhor está aqui para comprar mais livros? — Perguntou, se
questionando por que estava prolongando aquela agonia quando ele ansiava
para se livrar dela.
— Erm... não, não hoje. Eu...
— Senhor De Beauvoir!
Ele se virou, não parecendo especialmente satisfeito quando foi
saudado mais uma vez, desta vez por um grupo de pessoas elegantes que se
dirigia a eles.
— Ora, maldição — murmurou carrancudo. — Senhorita Butler —
acrescentou, sotto voce, ou seja, em voz baixa. — Posso pedir-lhe que me
lembre de um compromisso urgente em exatamente dois minutos?
— Oh! — Minerva exclamou, feliz por ter a oportunidade de lhe ser
útil. — Certamente, que pode.
Voltou sua atenção para os recém-chegados com interesse. Havia três
homens, um da mesma idade De Beauvoir e os outros dois jovens dândis.
Com eles estava uma mulher deslumbrante e primorosamente vestida com
cerca de trinta anos de idade, e uma senhorita que Minerva assumiu ser sua
criada.
— Lorde Havisham — disse o Sr. De Beauvoir, cumprimentando o
homem mais velho antes de se virar para a mulher com o cenho franzido. —
E Sra. Tate, boa tarde — suas palavras foram perfeitamente educadas, mas
sua relutância em falar com eles era palpável.
— De Beauvoir — disse Havisham, ignorando ou alegremente
inconsciente da indiferença De Beauvoir. — Tentei ver aquela sua última
palestra. Não consegui passar pela maldita porta. Queria perguntar se o
senhor estaria disponível a repeti-la para alguns amigos. Rapazes espertos,
todos eles. Saiba que gostará deles. Iremos alimentá-lo, é claro, e teremos
muita bebida. Na verdade, venha passar o fim de semana!
— Uma oferta generosa — respondeu De Beauvoir, parecendo
acreditar em tudo, menos naquilo. — Receio ter compromissos de trabalho.
— Ora, nada que não possa esperar, certamente — respondeu
Havisham, acenando com a indiferença descuidada de um homem que
nunca trabalhou um dia na vida.
— Oh, Sr. De Beauvoir, perdoe-me por interromper — disse Minerva,
sentindo-o eriçado de irritação, — mas o senhor tem aquele compromisso...
— Sim — concordou De Beauvoir, agarrando-se à saída que ela lhe
ofereceu. — Muito bem, Srta. Butler.
— Que compromisso seria esse, Inigo? — A mulher, a quem ele se
dirigiu como Sra. Tate, ronronou. Deu a Minerva um olhar penetrante e
sorriu. — Tenho certeza de que esperarão mais alguns minutos, por um
preço.
Minerva se engasgou de indignação.
— A senhora se engana, madame — disse De Beauvoir, sua voz tão
friamente furiosa que Minerva sentiu o arrepio mesmo quando não era
dirigido a ela. — O compromisso é com o meu advogado. Estava apenas
acompanhando a Srta. Butler de volta aos seus companheiros. Se nos derem
licença.
Estendeu o braço para Minerva, que o pegou com entusiasmo, lançou
um olhar de puro triunfo para a vil Sra. Tate e saiu andando com ele, com o
nariz empinado.
Assim que estavam fora do alcance de serem ouvidos, De Beauvoir
soltou um suspiro.
— Senhorita Butler, devo implorar seu perdão por tê-la submetido a tal
cena.
— Por favor, não se desculpe, nunca me diverti tanto — disse Minerva,
sorrindo para ele. — E parecia que o senhor realmente precisava de uma
rota de fuga. Fiquei muito feliz em fornecer uma. Que mulher horrível.
Ele assentiu. — Não posso discordar. É uma coisa estranha, mas
algumas mulheres parecem considerar o desinteresse de um homem por elas
como uma afronta pessoal, especialmente se forem consideradas bonitas.
Minerva acenou, entendendo perfeitamente como uma mulher
glamorosa como a Sra. Tate ficaria irritada por De Beauvoir não se
interessar por ela. Afinal, ela mesma ficou irritada por ele não se lembrar
dela.
— Bem, para algumas de nós, nossos rostos são nossa fortuna. Tire
isso e suponho que seja bastante assustador contemplar o que resta, se é que
resta alguma coisa — acrescentou, sentindo um nó de ansiedade na boca do
estômago.
Demorou um pouco para perceber que De Beauvoir havia parado e a
olhava fixamente. Minerva se engasgou, percebendo que tinha falado
descuidadamente e praticamente admitiu que era uma jovem vazia. Bem,
era mesmo, por ter falado sem pensar, pensou irritada.
— E o que a senhorita acha que encontraria, Srta. Butler, se não fosse
abençoada dessa forma?
Minerva engoliu em seco, perplexa com a pergunta bastante direta.
Bem, provavelmente perderia qualquer chance de conhecê-lo melhor;
poderia muito bem falar o que pensa. — Não muito — admitiu. — Eu...
Sempre tive medo de pessoas inteligentes. Minha prima Prue é
terrivelmente inteligente, é escritora — acrescentou melancolicamente. —
Odiei-a durante muito tempo porque fazia com que me sentisse burra em
comparação, mas sei agora que não foi culpa dela, foi a minha própria falta
que fez com que me zangasse com ela
Olhou para cima e se viu objeto daqueles intensos olhos verde-
acinzentados. Céus, mas eram determinados. Minerva teve a sensação mais
estranha de que ele podia ver bem o que se passava dentro da sua cabeça...,
e isso não era um pensamento assustador?
— Acho, Srta. Butler, que a senhorita é muito mais inteligente e
perceptiva do que acredita.
— Oh — Minerva disse brilhando com o que ele disse.
— Se eu fosse a senhorita, leria aquele livro. Acredito que poderá se
surpreender.
— E-eu vou — gaguejou, seu coração batendo rápido demais de uma
forma não totalmente desagradável. Olhou-o, absorvendo suas feições
intransigentes. Era um rosto severo, sem dúvida, mas que o sentia gravado
na sua alma, inesquecível. Ele hesitou por um momento e então pareceu
tomar uma decisão.
Enfiou a mão no bolso interno e tirou uma pequena caixa de prata e a
abriu. — Meu cartão, Srta. Butler — disse, entregando-o a ela. — Se a
senhorita se interessar pelo livro, ou tiver alguma dúvida, pode escrever
para mim.
Minerva engoliu em seco e pegou o cartão da mão dele, desejando não
estar usando luvas quando seus dedos se tocaram. — Muito obrigada —
disse com a voz fraca. — Farei isso.
Ele assentiu, guardou a caixa de cartões e fez uma leve reverência. —
Tenha um bom dia, Srta. Butler.
— Bom dia, Sr. De Beauvoir — disse Minerva, ainda se sentindo um
pouco tonta.
Observou-o se afastar, seu corpo alto e magro desaparecendo na
multidão, enquanto ela segurava o cartão com força.
13

Minha querida Harriet,


Como está passando? O que está acontecendo com St. Clair?
Vai se casar com ele?
Sinto-me a amiga mais abominável do mundo por deixá-la
sozinha nessa hora. Não deveria ter permitido que me
convencesse a partir. Minha querida Harry, por favor, conte-
me tudo, apenas diga-me se quer que eu volte. Pode confiar
que voltarei imediatamente.
—Trecho de uma carta da Sra. Kitty Baxter para a Srta.
Harriet Stanhope.

1 1814, H H ,S .
Harriet levantou os olhos do livro, a tosse discreta ao lado de sua
orelha a tirou de sua leitura.
— Oh Jasper — disse com um suspiro. — Me assustou.
— Mesmo? — Respondeu parecendo cético. — Estava tão absorta que
estou quase certo de que um meteorito poderia ter caído em Wells e não
teria percebido.
Ela deu uma risadinha e balançou a cabeça. — É verdade. Há quanto
tempo estou aqui?
— Meia hora, pelo menos, diria.
Deu-lhe um sorriso afetuoso que fez coisas estranhas em seu estômago.
— Sabia que os filósofos naturais costumavam acreditar que os
meteoritos vinham de vulcões da lua ou eram causados por raios ou
condensação nas nuvens? Isto é, até que um meteorito de vinte e cinco
quilos caiu em um campo perto de Wold Cottage em Yorkshire. Caiu de um
céu azul claro e deixou uma cratera com 50 centímetros de profundidade!
Que choque deve ter sido.
— Não sabia disso — disse Jasper sorrindo. — Mas não sei expressar
o quanto amo que saiba sobre isso.
Harriet enrubesceu, perguntando-se se a estava provocando, mas
parecia sincero.
— Venha — disse, tirando o livro da mão dela.
— O que vai fazer com isso? — Protestou.
— Vou comprá-lo para você, naturalmente.
Ela o encarou com uma sensação estranha no peito que era ao mesmo
tempo alarmante e inevitável. — Não precisa fazer isso.
Deu-lhe um olhar estranho, depois se abaixou e beijou-lhe a testa. —
Prometi fazê-la feliz, Harriet. Se livros a fazem feliz, vou gastar cada
centavo que tenho com eles.
— Jasper — disse, não sabendo ao certo o que queria dizer, mas as
palavras morreram com o olhar em seus olhos.
— Contanto que se lembre de olhar em volta de vez em quando e notar
que estou lá, será um dinheiro bem gasto.
Harriet suspirou e contemplou a probabilidade de ser capaz de resistir
ao charme de natureza doce de Jasper por mais algumas horas, sem ceder e
concordar com qualquer coisa que ele quisesse. O maldito homem era uma
ameaça, e ainda assim uma pequena vibração de algo quente e esperançoso
se desdobrou em seu peito, não pôde deixar de sorrir para ele.
— Obrigada, Jasper. É alguém bastante difícil de esquecer, sabe.
Ela sabia; tentou muitas vezes e por mais anos do que gostaria de
contemplar.
— Acho que sou — respondeu, antes de sair para comprar seu livro.
Harriet o ficou observando, o sorriso estúpido ainda colado em seu
rosto.
— Senhorita Stanhope, não estou surpresa pela senhorita parecer como
uma felina que pegou o canário. Devo parabenizá-la pelo trabalho bem-
feito.
Harriet se virou, seu coração despencando quando se viu cara a cara
com a Sra. Tate, a viúva glamorosa que havia sido a amante mais recente de
Jasper.
— Não consigo entender o que quer dizer e não acredito que tenhamos
sido apresentadas, senhora — Harriet respondeu, as palavras estalando com
todo o gelo que conseguiu reunir, embora suas bochechas estivessem em
chamas, pois sabia exatamente o que a mulher miserável estava implicando.
— Bem, se soubesse que ele cairia em um truque tão óbvio, poderia ter
tentado também — disse a Sra. Tate enquanto seus olhos verdes felinos
brilhavam maliciosamente.
— Mas é preciso de uma reputação imaculada para ser arruinada, Sra.
Tate — Harriet atirou, um pouco assustada com sua própria audácia, mas
seu temperamento estava aguçado e estaria condenada se permitisse que a
mulher soubesse o quão inadequada a fazia se sentir. — Receio, no caso da
senhora, que seja muito, muito tarde para isso.
Para sua irritação, a Sra. Tate apenas riu, um som profundo e rico que
só fez Harriet se sentir cada vez mais grosseira.
— Touché, Srta. Stanhope. Realmente quis dizer isso como um elogio,
entenda. Que tacada para... — A Sra. Tate gesticulou para Harriet mirando-
a da cabeça aos pés. — ...alguém como a senhorita — disse espantada,
sacudindo a cabeça enquanto olhava para Harriet com uma expressão de
sofrimento.
Naquele momento, Harriet estava ciente de como se parecia ao lado
daquela mulher. Seu vestido simples de musselina era o da última
temporada, já que se vestiu apressadamente e não deu a devida importância
ao que escolheu. Era da melhor qualidade, mas simples e terrivelmente
imaturo quando comparado ao conjunto estiloso da Sra. Tate em azul meia-
noite. Parecia deslumbrante, como bem sabia.
Harriet prendeu a respiração quando a Sra. Tate se inclinou e foi
atacada com o cheiro de âmbar gris. — Eu o terei de volta, espero que
entenda — disse ameaçadoramente. — Vai se casar com a senhorita porque
precisa de um herdeiro, mas uma vez que conseguir isso, vai voltar para
mim, eles sempre voltam.
Recuou e piscou para Harriet, que se sentiu enojada, com calor, frio e
nauseada ao mesmo tempo. Havia o desejo desafiador dentro dela de dizer à
Sra. Tate que não queria Jasper e que ela era bem-vinda para ficar com ele,
mas seria obviamente uma mentira, e uma coisa terrível de se dizer. Se
Jasper a ouvisse dizer aquilo, iria machucá-lo, não importando seus
verdadeiros sentimentos, sabia muito bem, por experiência própria, como
era falar sem pensar nas consequências.
— Harriet.
Virou-se quando Jasper se aproximou. Havia fúria em seus olhos
quando olhou para a Sra. Tate, e Harriet se sentiu um pouco melhor.
— Está tudo bem, querida? — Perguntou, deslizando um braço
possessivo em volta da cintura dela.
Harriet levantou os olhos para ele. — Está tudo bem, obrigada, Jasper.
A Sra. Tate estava me explicando que só vai se casar comigo porque deve e
porque precisa de um herdeiro. Estava me contando como voltará para sua
cama quando isso acontecer.
Harriet se virou e deu a Sra. Tate o mais doce dos sorrisos,
experimentando uma onda momentânea de triunfo com o pânico crescente
nos olhos da mulher, antes de se virar e ir embora.

— Sua megera desgraçada.


A Sra. Tate enrijeceu, mas ergueu o queixo. — Não é nada além da
verdade. A garota pode muito bem saber disso. É crueldade da sua parte
enganá-la, querido — a expressão dela mudou, um olhar astuto, que ele
conhecia muito bem, aparecendo no seu rosto quando ela se aproximou e
deslizou a mão pelo peito dele. — Nós estávamos bem juntos. O senhor não
se lembra como era bom? — Ronronou.
Jasper deu um tapa na mão dela com nojo e deu um passo para trás.
— É uma tola, Jenny — disse, imaginando o que, em nome de tudo
que era sagrado, fez, envolvendo-se com ela. Devia estar desesperado. —
Estou apaixonado por ela, sempre a amei. Fui eu quem a prendeu no
casamento, se quiser saber, e se sequer falar o nome dela, vou garantir que
ninguém nunca mais queira se envolver com a senhora. Não haverá mais
protetores ricos, não quando eu terminar.
Fulminou-o com o olhar, seus olhos estavam furiosos embora sua pele
estivesse perdendo a cor.
— Eu a tratei bem — falou, fora de si com a injustiça daquilo. — A
senhora se saiu perfeitamente bem depois de mim, mas isso não é o
suficiente, é? Queria meu coração em uma bandeja como qualquer outro
pobre idiota que ludibriou. Bem, lamento desapontá-la, mas interfira na
minha vida de novo, e vou fazê-la se arrepender. Estamos entendidos?
A Sra. Tate deu um aceno tenso e Jasper se virou, correndo para fora da
livraria, atrás de Harriet. Olhando para cima se irritou ao ver que o céu
estava escurecendo quando as nuvens pesadas se acumulavam no alto. Uma
garoa fina começou a cair, espiralando no ar frio e agarrando-se a seus
cabelos e roupas enquanto saía em busca de Harriet.
Levou quase uma hora para encontrá-la e, quando a encontrou, seu
coração afundou. Estava encolhida em um banco em um canto tranquilo de
Grove. Era uma pequena área arborizada, cercada por charnecas no Monte
Scion, um lugar adorável para passear em um dia ensolarado. Com o clima
piorando a cada momento, a área estava deserta e Harriet parecia pequena,
sozinha e profundamente infeliz. Sem mencionar que estava molhada. A
copa das árvores acima a salvou do pior do tempo, mas suas roupas já
estavam úmidas e a chuva estava caindo mais forte agora.
Jasper amaldiçoou a Sra. Tate e depois a si mesmo por ter se envolvido
com ela. Estava conquistando Harriet, tinha certeza disso, mas agora...
— Harry — disse ao se aproximar dela, como faria com um cavalo
nervoso, com medo que fugisse à menor provocação. — Harry — chamou-a
novamente, seu coração apertando quando não respondeu e ficou apenas
observando o vazio.
— Sempre será assim, Jasper — disse inexpressiva. — Não importa
como se sinta agora, se acredito ou não que esteja apaixonado por mim,
sempre haverá mulheres como a Sra. Tate.
— N-Não, Harriet, eu nunca...
Ela ergueu a mão, silenciando-o. — Mesmo que isso seja verdade,
sempre vou me perguntar — olhou para ele que pôde ver que ela estava
chorando, os olhos mais arregalados do que nunca e avermelhados por trás
dos óculos. — É bonito, rico e poderoso, e mulheres bonitas sempre se
colocarão em seu caminho. Mulheres muito mais bonitas do que eu. O tipo
de mulher que pode ser espirituosa e divertida e o agradar na cama. Pode
me dizer honestamente que nunca será tentado em cinco anos, em dez que
seja, após a novidade de ter uma esposa sabe-tudo ter se dissipado?
— Não quero ninguém além de você, Harry — Jasper disse
desamparado.
— Mas será que não vê? — Uma lágrima escorreu por sua bochecha.
— Mesmo que isso seja verdade, sempre vou me perguntar. Sempre terei
medo quando se sentir tentado, e acho que isso pode me enlouquecer,
Jasper. Certamente não é justo com você.
— Não — Jasper disse balançando a cabeça negativamente. Ficou de
joelhos diante dela, sem dar a mínima à sujeira ou ao fato de que a chuva
caía mais forte a cada momento, encharcando seu casaco e escorrendo por
sua nuca. — Nunca vou ficar tentado, Harry, porque sempre foi você.
Ela deu uma risadinha impaciente. — Quer dizer como no dia em que
partiu para a Rússia, quando me beijou e pediu para eu não me casar com
ninguém, e nem vinte minutos depois o ouvi dizer a Peter Winslow para não
ser tão ridículo quando perguntou se estava interessado em mim? É essa a
sua ideia de devoção, Jasper? Pois eu o digo agora, não é a minha.
Jasper olhou para ela em estado de choque, surpreso por finalmente ter
entendido e por ser tão absurdamente sem sentido.
— Então é por isso? — Disse roucamente. — É por isso que me odiou
todos esses anos? Porque... — a encarou, sem saber se ria ou chorava.
— Em parte —concordou com um aceno rígido.
— Harry. Oh, meu amor, se tivesse me dito, por Deus — colocou a
cabeça entre as mãos e respirou fundo para se acalmar antes de falar. —
Harry — disse com a voz trêmula. — Peter Winslow era um cretino
maldoso, o odiava, e ele a mim. Tinha ciúme de mim desde... desde que eu
nem consigo me lembrar. Se ele soubesse que era importante para mim,
teria arruinado tudo. Teria lhe contado mentiras maliciosas ou... — fez uma
pausa quando percebeu a expressão de choque que tomou conta do rosto
dela. — Cristo — disse, balançando a cabeça negativamente. — Aquele
miserável, vou matá-lo. O que lhe disse, Harry?
Harry piscou com força, seus olhos muito brilhantes e sua voz grossa.
— Ele... ele disse que ouviu de seu pai que escreveu para dizer o quão
popular era e com ... como todas as mulheres o estavam bajulando. Disse
que estava...
Jasper sentiu a raiva crescer dentro dele e prometeu a si mesmo o
prazer de acabar com as chances de Peter Winslow ter um filho.
— Posso imaginar o que ele disse — rosnou, fora de si com a
frustração e amargura por tanto tempo ter sido desperdiçado. Sua raiva
aumentou e sua voz ficou estridente. — Não era verdade, Harry. Não havia
ninguém. Meu Deus, esse foi provavelmente o único período da minha vida
em que, ao voltar para casa, vi como meu pai estava feliz comigo porque
me comportei e não causei nenhum problema, e foi tudo por sua causa,
Harry! — Gritou a última parte, dominado pela emoção.
Harriet o encarou. — Eu... Eu não acredito — disse, olhando-o através
dos óculos salpicados de chuva, seu cabelo pingando, nenhum dos dois saía
do lugar. — N-nunca me escreveu, Jasper, nem uma vez. Nem uma única
vez em um ano inteiro.
— Também nunca me escreveu! — Jasper acusou, sabendo como
poderia ter resolvido tudo com facilidade se apenas tivesse sido capaz de
lhe escrever. Se tivesse escrito para ela, reafirmando a ela seus sentimentos,
nunca teria duvidado dele, mas estava ciente de como uma carta dele
pareceria, o quão estúpido o faria parecer para alguém tão inteligente como
Harriet. Seu estômago deu um sobressalto de culpa e arrependimento. —
Pelo amor de Deus, Harry. Não podemos conversar aqui, pode ficar doente.
Ele a pôs de pé e a puxou, com a intenção de levá-la de volta para a
carruagem. Teriam que suportar um maldito passeio de carruagem
acompanhados, mas no minuto em que chegassem a Holbrook House, a
levaria para sua cama e tiraria qualquer dúvida que ainda tivesse sobre os
sentimentos dele.
Naquele momento os céus se abriram e a chuva despejou sobre eles,
Jasper os guiou para baixo do abrigo relativo de um enorme carvalho.
— Graças a Deus não tem trovão dessa vez — disse, virando-se para
olhá-la e a expressão que encontrou nos olhos dela fez seu coração dar uma
cambalhota estranha no peito. Ela levantou a mão e agarrou seu pescoço,
puxando sua cabeça em direção à dela e beijando-o como se o mundo
estivesse prestes a acabar. Havia desespero na maneira como se agarrou a
ele, como se nunca pudesse chegar perto o suficiente.
— Harry — disse entre beijos, seu coração acelerado porque ela o
queria, droga, mas sua cabeça estava lhe dizendo que estava molhada e com
frio, precisavam se aquecer e se secar o mais rápido possível. Tentou se
afastar. — Harry, amor... — protestou, mas a boca de Harriet era quente e
urgente e depois a mão dela desceu sobre sua calça e cobriu seu membro.
A respiração de Jasper ficou presa na garganta e seus sentidos o
abandonaram em uma onda de desejo que só aumentava. Puxou-a para mais
perto, suas mãos segurando-a por trás enquanto ela puxava seus botões,
libertando-o.
Jasper sibilou com uma combinação de dor e prazer quando sua
pequena mão gelada cobriu sua carne superaquecida. Pelo menos estavam
escondidos sob as árvores e ninguém era louco o suficiente para passear
naquela tempestade. Além disso, iriam se casar agora, qualquer outro
desfecho estava fora de questão, não havia outro resultado possível. Puxou
as saias de Harriet para cima, ciente de que estavam úmidas e grudadas nas
suas pernas, mas não se importava. Arrastando-se, apoiou-a contra a árvore,
depois a levantou até que seus pés estivessem suspensos e ela circulasse
suas pernas em volta da sua cintura. Entrou nela em um movimento rápido
que fez os dois gritarem.
Ela se agarrou ao pescoço dele, fervendo de excitação, e apanhou seus
cabelos enquanto a penetrava.
— Sim — ela gritou, os sons ofegantes de seu prazer lhe excitando,
enquanto o prazer e imprudência do que estavam fazendo ao ar livre tomou
conta deles.
Depois de tanto tempo desejando, de acreditar que a tinha perdido, ela
estava aqui, louca por ele, e ele estava perdendo sua maldita mente.
— Jasper — chamou seu nome e o som nos seus lábios preenchidos
com a mesma combinação de admiração pela loucura do que estavam
fazendo. — Jasper — chamou novamente, seu nome perdido com o som do
vento e da chuva quando seu corpo começou a apertar ao redor do membro
dele, jogando-o ao limite. Ela tremeu em seus braços e agarrou-se nele,
soltando em seguida gritos de prazer enquanto Jasper a beijava para
amenizar seu som e a seguia no êxtase.
14

Querida Alice,
Foi tão bom ter notícias suas. Fico feliz em saber que estão
felizes, embora não fique surpresa. Lamento sobre o enjoo
matinal, mas estou tão animada para ser uma titia que, sinto
muito, não posso ser tão solidária. Estou muito feliz com a
ideia de uma sobrinha ou sobrinho para mimar. Certamente
irei visitá-la quando estivermos de volta à cidade. Estou
ansiosa para descobrir se engordou assustadoramente!
—Trecho de uma carta da Srta. Matilda Hunt para a
Sra. Alice Hunt.

1 1814. H H ,S .
Harriet suportou a viagem de carruagem de volta para casa em uma
espécie de torpor. Jasper se sentou perto dela, o calor de sua coxa queimava
contra sua pele, mas ainda estava gelada até os ossos. O calor de fazer amor
havia se desvanecido, embora as suas bochechas já estivessem
suficientemente quentes ao considerar o que tinha feito. Céus, deve ter
perdido a cabeça. Em The Grove, de todos os lugares, e em público! Que
tipo de criatura devassa estava se tornando?
Olhou de soslaio para Jasper, ciente do porquê de ter sido capaz de um
comportamento devasso como esse. O homem era como uma droga; quanto
mais experimentava, mais queria. Não era de se admirar que a Sra. Tate
ficou tão irritada por perdê-lo. Harriet afastou os pensamentos da Sra. Tate
com irritação. Acreditava que Jasper não tinha interesse na mulher, mas o
que ela disse era verdade também. Sempre haveria Sras. Tate tentando
roubar-lhe o marido.
Bem, deixe-as tentar. O pensamento era franco e selvagem, e naquele
momento, soube que tinha tomado sua decisão. Casaria com Jasper e rezaria
para que isso não acabasse em lágrimas. Era tudo o que podia fazer, pois
não tinha força o suficiente para se afastar dele. Se o fizesse, sempre se
perguntaria: e se isso a tornasse mais infeliz do que qualquer outra coisa. Se
seu casamento não desse certo, pelo menos saberia que tentou, sempre teria
seu trabalho, e talvez filhos.
Harriet alisou a barriga com a mão e olhou para baixo, se perguntando
se, mesmo agora, a semente dele estava crescendo dentro dela. Ergueu os
olhos, ciente do olhar sobre ela, mas Minerva e Matilda estavam cochilando
enquanto a carruagem voltava para Holbrooke House. Virando-se,
encontrou Jasper olhando-a de forma afável, enquanto considerava a mão
que estava sobre seu estômago, sabia que ele tinha adivinhado seu
pensamento. Ele estendeu a mão e pegou a dela, levando-a aos lábios e
beijando seus dedos.
— Harry, querida, está congelando — disse, balançando a cabeça.
Já havia tirado o casaco e colocado em volta dos ombros dela, mas
agora a envolveu com os braços e a puxou para perto.
— Mandarei lhe preparar um banho quente, assim que chegarmos.
Depois, algo para comer e um gole de conhaque... e direto para a cama —
murmurou em seu ouvido, as palavras fazendo-a tremer ainda mais. — Vou
me certificar de que esteja aquecida, o corpo inteiro.
— Jasper! — Sussurrou, escandalizada por ele dizer aquelas coisas
com Minerva e Matilda na carruagem, mesmo que estivessem dormindo.
Ele riu e se inclinou para beijar sua têmpora. — Eu te amo.
Harriet sorriu para ele, desejando dizer o mesmo em troca, pois ainda
não tinha dito e não tinha motivo para negar. Ainda assim, não parecia certo
dizê-las agora, não até que visse Inigo e explicasse por que não se casaria
com ele. Uma vez que estivesse livre do noivado, diria a Jasper que o
amava, que sempre o amou e sempre o amaria, e depois... depois veriam
onde isso os levaria.
Assim que chegaram em casa, Harriet correu as escadas e, com pesar,
pediu à criada que atrasasse o banho, que Jasper havia pedido. Parecia uma
ideia excelente, pois estava completamente gelada e a dor de cabeça, que a
atormentou o dia inteiro, piorou mais um pouco. Em vez disso, dispensou
sua criada e pediu que uma carruagem fosse preparada para ela
imediatamente. Harriet trocou suas roupas encharcadas, sua pele estava
arrepiada mesmo estando diante do fogo. Depois de vestida com roupas
quentes, refez o cabelo, o melhor que pôde, e desceu correndo as escadas.
O tempo não havia melhorado em nada e a chuva continuava
martelando no teto da carruagem, fazendo-a sentir que estava sentada
dentro de um tambor. Fechou os olhos em uma tentativa de amenizar o
barulho, mas de nada adiantou pois não aliviou sua dor de cabeça, tentou
ignorar o fato de que estava exausta e que sua garganta doía.
Era apenas uma viagem de meia hora até a pousada onde Inigo estava
hospedado, mas o lugar estava movimentado. Do lado de fora, três
carruagens ocupavam todo o espaço disponível para desembarque, pois
pararam o mais próximo possível da entrada para permitir que os
convidados entrassem sem se molharem.
Harriet praguejou; não tinha escolha a não ser correr para dentro.
Saltou e seus pés ficaram imediatamente encharcados. O solo estava
saturado e a chuva ainda caía forte. Com as saias nas mãos, correu
desordenadamente para a porta, mas, quando a alcançou, estava ensopada
pela segunda vez naquele dia. Tremendo, entrou correndo e perguntou pelo
Sr. De Beauvoir.
A pousada estava lotada de hóspedes inesperados, trazidos pelo tempo
terrível, o que acabou demorando até que alguém encontrasse o homem em
questão. Quando apareceu, olhou para Harriet consternado.
— Senhorita Stanhope — exclamou, olhando-a. — Minha nossa, a
senhorita está completamente molhada. Venha comigo até a sala de estar
antes que morra de frio.
Harriet fez o que pediu, grata por ficar de pé e aquecer as mãos perto
do fogo; estavam azuis de frio e ela se sentia muito mal agora. — L-
lamento c-chegar sem avisar — gaguejou com os dentes batendo —, mas eu
tinha que falar com o senhor.
— Bem, deve ser urgente para trazê-la numa noite como esta — disse,
balançando a cabeça.
— É urgente — Harriet concordou. — Senti que devo lhe dizer de uma
vez que que pretendo me casar com Lorde St. Clair.
— Ah.
Harriet deixou escapar um suspiro, enquanto ele sorria. Graças a Deus
que não tenha ficado com raiva.
— Bem, então deixe-me ser o primeiro a parabenizá-la.
— O senhor não está chateado? — Perguntou, o alívio lavando sua
alma.
— Bem, estou desapontado, naturalmente. Mas nós somos amigos,
espero, Srta. Stanhope, e não vejo razão para isso mudar?
— Fico feliz — disse Harriet, afastando o cabelo molhado da testa. —
Apenas senti que deveria contar imediatamente. Parecia errado se não o
fizesse.
— Compreendo muito bem. Ele é um homem muito bonito e
charmoso, sem mencionar que tem título e é rico. Qualquer mulher ficaria
tentada, tenho certeza.
Harriet o encarou, repentinamente bastante zangada, embora não
tivesse certeza do motivo. Jasper era todas essas coisas, mas não era por
isso que o amava. De certa forma, o amava apesar dessas coisas, já que sua
beleza e charme a assustavam mais e a faziam temer que o acabaria
perdendo.
— Não é por... — começou chacoalhando a cabeça enquanto seu
cérebro parecia repentinamente tomado por uma névoa. — Não é por isso
— repetiu, determinada a transmitir seu ponto de vista. — Eu o amo.
Sempre o amei. Desde que éramos crianças, ele diz que também sente o
mesmo por mim. — Sorriu com a expressão confusa de Inigo e sua raiva
desapareceu quando percebeu que ele não entendia. — Acho que o senhor
é, sem dúvida, o homem mais brilhante que já conheci. No entanto, mesmo
homens brilhantes cometem erros. O senhor está errado sobre o amor, Inigo.
Há muito mais nisso do que o senhor supõe. Espero que um dia descubra.
Sua perplexidade se transformou em uma carranca, e ele balançou a
cabeça, o movimento curto e decisivo. — Não tenho tempo para essas
fantasias. Meu amor - se é que existe tal coisa - é apenas pelo meu trabalho.
A senhorita entendeu, e por isso nosso acordo me convinha. Não há espaço
em minha vida para uma ligação romântica, certamente não para o amor,
mesmo que eu reconheça que o sentimento exista. Eu, certamente, nunca
amarei uma mulher que não seja igual a mim, intelectualmente. Que
desculpa lamentável de marido seria se tentasse, o que não tenho desejo de
fazer. Seria crueldade me casar com uma mulher que não tenha interesse no
meu trabalho e esteja destinada a ser ignorada, pois sempre virá em segundo
lugar. Não. Se a senhorita tiver alguma compaixão comigo, faria bem em
desejar que eu encontre uma dama de pensamento semelhante, cujas
paixões são reservadas à ciência, ou para permanecer solteiro e feliz com
minha sorte.
— Como quiser, Inigo — Harriet disse com um sorriso. Estava se
sentindo um pouco tonta agora e não achava que conseguiria permanecer de
pé por muito mais tempo. — É melhor deixá-lo agora, antes que sintam a
minha falta.
— Sim, a senhorita deve ir para casa e se aquecer, Srta. Stanhope.
Embora aprecie o sentimento, não posso deixar de pensar que teria feito
melhor se não tivesse vindo. A senhorita não me parece nada bem.
Harriet acenou e murmurou algo, não tinha certeza do que, e então
esperou enquanto Inigo procurava por um guarda-chuva, para que não
ficasse ainda mais molhada ao voltar para a carruagem. Uma vez lá dentro,
Harriet apoiou a cabeça nas almofadas. Sentia-se distintamente estranha,
exausta e fria até os ossos, seu corpo sacudia com calafrios. Sucumbindo ao
desejo de dormir, deslizou para se deitar no assento e fechou os olhos.

Jasper tirou seu relógio de bolso e franziu a testa. Enviou o jantar para
o quarto de Harriet, mas imaginava que ela já teria terminado. Decidindo
que havia muito pouco sentido em se preocupar com o decoro, após a
pequena aventura daquela tarde - especialmente considerando que podia
confiar nos convidados que restaram - foi diretamente para o quarto dela.
Tinha acabado de levantar a mão para bater à porta, quando uma
comoção no corredor abaixo chamou sua atenção, voltou até a galeria para
poder olhar por cima do corrimão. Houve gritos e exclamações e Jasper
franziu a testa, movendo-se em direção às escadas e descendo apressado
caso fosse necessário.
— O que aconteceu, Temple? — Jasper indagou, e então parou quando
um lacaio carregava algo para dentro da casa. Não, não algo, alguém. Uma
mulher.
Por Deus.
Jasper apressou os passos sobre as escadas e descobriu que era Harriet
quem o lacaio carregava. Estava corada, febril e molhada mais uma vez. O
que, diabos, tinha feito?
— Harriet! — Exclamou, colocando a mão em seu rosto, descobrindo
que ela estava queimando em febre. — Passe-a para mim — ordenou,
pegando-a dos braços do lacaio. Harriet murmurou alguma coisa e virou o
rosto para o pescoço dele. — Temple, vá buscar minha mãe e mande
chamar o Dr. Haysom imediatamente.
— Sim, meu senhor — respondeu Temple, latindo instruções e
enviando os criados, correndo, em todas as direções.
Jasper carregou Harriet escada acima. — O que andou fazendo, sua
boba? — Perguntou, querendo sacudi-la. — Deveria ter tomado um banho
quente e se aquecido, não voltado a sair na chuva.
Chutou a porta de seu quarto, fazendo a criada dela correr para abri-la.
A garota exclamou, alarmada, quando Jasper apareceu, carregando Harriet
nos braços. Colocou-a na cama.
— Precisamos tirar essas roupas molhadas imediatamente — instruiu,
tirando os sapatos de Harriet e jogando-os no chão, enquanto a criada o
olhava boquiaberta com horror.
— Não fique aí parada! — Gritou. — Tire as roupas dela.
— M-Mas, meu senhor — a garota gaguejou, olhando para ele com
olhos arregalados.
— Oh, pelo amor de Deus! — Jasper rosnou, muito impaciente para
lidar com tamanha futilidade. — Vamos nos casar, supondo que ela não
morra porque está hesitando.
— Jasper! A garota está certa, deixe-nos.
Jasper se virou, ao mesmo tempo aliviado e indignado ao ver sua mãe
chegar e assumir o controle.
— Mas... — começou, mas sua mãe segurou seu braço e deu-lhe um
sorriso caloroso, estendendo a mão para acariciar sua bochecha.
— Pense em como Harriet ficará mortificada quando os criados
cochicharem sobre isso. Agora, deixe-a comigo, pode entrar quando ela se
sentir confortável. Agora, saia.
Jasper praguejou, mas a única coisa importante era que Harriet fosse
cuidada imediatamente, então esperou do lado de fora. Andou de um lado
para o outro, perguntando-se o que havia de tão importante para Harriet ter
saído de novo com aquele tempo. O que havia sido tão urgente para que
tivesse que lidar com isso imediatamente e se arriscar a ficar doente?
— Temple! — Gritou por cima do corrimão. — Temple!
Desceu as escadas correndo e encontrou o mordomo correndo ao seu
encontro. — Milorde?
— Para onde a Srta. Stanhope foi, esta noite?
— Lamento, mas não sei dizer, milorde. Gostaria que perguntasse ao
cocheiro?
Jasper acenou afirmativamente, depois franziu a testa antes de
dispensar seu mordomo e subir as escadas.
15

Senhor De Beauvoir,
Foi bom vê-lo hoje, apesar da odiosa Sra. Tate. Ainda não
comecei a ler o livro de que falamos, mas pretendo começar
depois do jantar, contanto... contanto que eu consiga parar de
sonhar acordada com seus olhos e com o jeito penetrante que o
senhor olha para mim. Como gostaria que o senhor se
lembrasse de mim desta vez, talvez até pensasse em mim,
como estou pensando no senhor...
—Trecho de uma carta da Srta. Minerva Butler, jogada
no fogo.

2 1814. H H ,S .
Matilda correu pelo corredor em direção a Lorde St. Clair, que acabara
de deixar o quarto de Harriet.
— Milorde — chamou-o, notando o fato de que estava vestindo as
mesmas roupas da noite anterior, e que ainda não tinha se barbeado.
Parecia cansado e desanimado e, ao vê-la, enrijeceu, sua expressão
cautelosa.
— Posso assegurar-lhe que não há impropriedade — disse fragilmente.
— A criada está com ela e mamãe a visita desde que amanheceu.
— Ora, Lorde St. Clair, como se eu me importasse com essas coisas —
disse, balançando a cabeça. — Eu, de todas as pessoas? Só queria saber
como ela está. Existe alguma coisa que eu possa fazer, qualquer coisa?
Ele respirou fundo, era possível ver que estava exausto, esfregou o
rosto e depois balançou a cabeça. — Perdoe-me, Srta. Hunt. Estou cansado
e morrendo de medo, se quiser saber a verdade. Ela está ardendo em febre
e... — Engoliu em seco. — Meu pai morreu de pneumonia.
— Oh, milorde — Matilda disse, seu coração apertando com o medo
que vira nos olhos dele. — Mas certamente Harriet não corre o risco de...?
— Parou, incapaz de terminar a frase.
Observou St. Clair engolir em seco. — Não — disse decisivamente.
Como se ele tivesse decretado aquilo, e era isso. — Não, ela não corre o
risco. Está terrivelmente mal, mas ainda não é pneumonia, está tendo os
melhores cuidados, e... e não permitirei que ela me deixe, droga. Não agora.
Matilda estendeu a mão e a depositou em seu braço. — Achei que
Harriet parecia feliz ontem, no caminho de volta para casa. Do jeito que
sorriu para o senhor, achei que...
— Eu também — respondeu, tomado por desespero. — Mas ontem
quando chegamos, em vez dela se secar e se aquecer, saiu de novo naquele
maldito dilúvio. Foi visitar o Sr. De Beauvoir, Srta. Hunt. Agora me diga,
por que faria isso?
— Eu... — Matilda começou, mas foi interrompida pela expressão de
devastação nos olhos de St. Clair. — Tenho certeza de que há uma
explicação para isso — disse com firmeza. Encarou-o, desejando que
acreditasse nela, pois sabia que Harriet não brincaria nem com ele nem com
o Sr. De Beauvoir. Era intrinsecamente honesta, às vezes tanto que se
prejudicava. — Harriet é a pessoa mais decente e leal que conheço, nunca o
trataria mal. Certamente o senhor sabe disso?
St. Clair engoliu em seco e assentiu tensamente. — Sim, eu sei. Fico
me dizendo isso o tempo todo, e na maioria das vezes, acredito. Só que... —
Suspirou e passou a mão pelo cabelo. — Infelizmente, não consigo pensar
com clareza no momento. Se a senhorita me der licença, Srta. Hunt. Minha
mãe se recusou a me deixar vê-la até eu tomar banho e me trocar.
— Claro — Matilda disse, seu coração tomado de simpatia pelo pobre
homem enquanto ele se afastava.

Jasper olhou para cima quando ouviu a porta do quarto abrir e respirou
fundo ao ver a criada sair na ponta dos pés por um momento. Não era como
se fosse ficar sozinho com Harriet por mais do que alguns minutos, sua
maldita criada a protegia como um cachorro a um osso. A pobre coitada
provavelmente morreria aterrorizada se soubesse o que fizeram no parque
ontem, na chuva...
Deus, como foi idiota.
A culpa tomou conta do seu corpo. Harriet estava gelada até os ossos
quando a encontrou, e ele sabia disso, mas estava tão consumido por suas
próprias necessidades, que não conseguiu pensar em outra coisa. No que
estava pensando? Fazer amor com ela contra uma árvore, como se fosse
uma meretriz qualquer, e ainda debaixo de uma chuva torrencial. Era um
maldito sátiro imundo, e se alguma coisa acontecer com ela...
A angústia fechou sua garganta, e se esquivou da ideia, incapaz de
terminar o pensamento.
Não permitiria que Harriet escapasse de seus dedos, como aconteceu
com seu pai. Era apenas uma febre, nada mais. Não era pneumonia, disse o
médico. Ainda assim, sua mão estava quente e seca quando a pegou e
beijou seus dedos.
Olhou para cima quando a porta se abriu e sua mãe apareceu. Jasper
piscou com força e desviou o olhar. Ouviu o farfalhar de um tecido caro
quando Lady St. Clair se moveu para ficar ao lado dele.
Colocou as mãos em seu ombro e deu um beijo no topo de sua cabeça.
— Não se preocupe assim, meu querido. É uma jovem forte e tem muito a
fazer. Sem mencionar que é uma das criaturas mais teimosas que já existiu.
Ela não vai a lugar nenhum, prometo, e o Dr. Haysom concordou que não
havia motivo para alarme, não foi?
Jasper olhou para o lindo rosto de sua mãe, tomado por um desejo de
criança de acreditar nela sem questionar. Sua expressão era serena;
claramente acreditava naquilo, e o médico havia dito o mesmo. Algo se
desenrolou em seu peito, e pegou a mão dela e a levou até a bochecha. —
Obrigado.
— Claro, meu querido menino. Agora, me sentarei com minha futura
nora e enquanto come alguma coisa. Merrick queixou-se a seu respeito,
receio, então não me diga que tomou um farto desjejum, pois sei que não.
Não adianta nada tentar me convencer de que meia fatia de torrada é
suficiente para um homem do seu tamanho, então, vá.
Fez um movimento, enxotando-o e Jasper sabia que não adiantaria
discutir. Com um longo suspiro de sofrimento, lançou um último olhar para
Harriet e se levantou.
— A senhora vai me chamar se...
Lady St. Clair lançou um olhar que dizia que era um bobo.
— Sim, claro que vai. Obrigado, mãe.
Ela inclinou a cabeça graciosamente e sentou-se na cadeira que acabara
de desocupar, então Jasper não teve escolha a não ser deixá-la sozinha. Uma
vez do lado de fora, percebeu que realmente estava faminto e estava na
metade da escada quando Temple conduzia um visitante ao grande saguão
de entrada.
— O senhor! — Jasper rosnou.
Se foi a noite sem dormir sentado ao lado da cama de Harriet enquanto
ardia em febre, ou simplesmente o fato de que estava desejando nocautear o
sujeito desde o primeiro momento que o viu, Jasper não tinha certeza.
Certamente não se importava. Tudo o que sabia era que estava fervendo
com uma emoção reprimida e a válvula de escape estourou. Explodiu pelo
corredor e agarrou o Sr. De Beauvoir pela gravata nada arrumada e o
acertou.

Minerva franziu a testa para o livro que segurava.


Para seu espanto, descobriu que havia estado totalmente absorta nele
por mais de duas horas. Duas horas! Não apenas isso, mas foi escrito de tal
forma que não se sentia como uma moça burra e sem cérebro. Na verdade,
o livro era escrito na forma de uma conversa entre três mulheres, Caroline e
Emily - que iniciaram com apreensão sobre o tema da química tanto quanto
Minerva - e a Sra. B, sua instrutora. A primeira conversa - aquela sobre a
diferença entre decompor um corpo e, meramente, cortá-lo em pedaços -
havia chocado Minerva da maneira mais deliciosa e agora estava fascinada.
Já havia aprendido que ‘decompomos um corpo em suas partes
constituintes; e o dividimos em suas partes integrantes’ e estava se sentindo
muito satisfeita consigo mesma.
Agora, entretanto, seu estômago estava roncando, começou a se
perguntar que horas deveria ser, enquanto se desenrolava da cadeira
deliciosamente confortável em que estava colada na biblioteca. Deixando o
livro de lado, se espreguiçou, suspirou, levantou-se e pegou os sapatos de
onde os havia chutado. Sua mão estava na maçaneta quando ouviu o
estrondo.
Foi seguido rapidamente por vozes elevadas, e Minerva abriu a porta e
viu... Deus do céu! St. Clair e o Sr. De Beauvoir no chão... lutando.
Por um momento, St. Clair pareceu ter a vantagem, pois o nariz De
Beauvoir estava ensanguentado, parecia que o conde estava prestes a
desferir outro golpe, quando seu oponente ergueu o joelho em um
movimento brusco que fez Minerva estremecer.
St. Clair se dobrou, gemendo, dando a De Beauvoir tempo suficiente
para se levantar, embora seu alívio tivesse durado pouco. Lorde St. Clair se
levantou e teria investido contra De Beauvoir de novo, exceto...
Minerva soltou um grito e olhou para os olhos turquesa selvagens de
St. Clair enquanto se colocava entre os dois homens que brigavam.
— M-milorde — gaguejou. — C-certamente há algum mal-entendido?
— Há? — St. Clair rosnou, seu peito arfando. — Então por que Harriet
estava com ele ontem à noite? Por que saiu naquela maldita chuva pela
segunda vez? Porque está lá em cima, no quarto, queimando de febre, diga-
me isso!
— Ah, pelo amor de... — De Beauvoir exclamou, aceitando o lenço
que Minerva lhe entregou para conter o fluxo de sangue. — Ela veio me
dizer que estava apaixonada pelo senhor, seu imbecil estúpido — disse, as
palavras ligeiramente abafadas. — Não — acrescentou com fúria, — que eu
possa pensar em uma única razão pela qual uma mulher tão inteligente faria
algo patentemente idiota. No entanto, ela parecia pensar que o senhor era
digno dela e decidiu se casar com o senhor em vez de mim. Por ser
escrupulosamente honesta, sentiu a necessidade de me dizer imediatamente
que havia tomado sua decisão e o senhor era sua escolha. O senhor deve me
perdoar, milorde — zombou, — por suspeitar que ela cometeu um grave
erro de julgamento.
Minerva estava entre os dois homens, sentindo-se um pouco como um
coelho indefeso mantendo dois lobos separados, até que a tensão formigante
entre eles se dissipou.
— Oh — Jasper disse, claramente perdido por falta de uma palavra
mais eloquente.
— Oh — imitou De Beauvoir, o que Minerva teve que admitir que não
ajudou muito.
Ela poderia ter se esforçado mais para que fizessem as pazes, mas
ainda estava se recuperando da ideia de que Beauvoir estava noivo de
Harriet e ela não sabia. Meu Deus, estava sonhando com o noivo da amiga!
A ideia a deixou enojada, até que se lembrou de que não estavam mais
noivos e que De Beauvoir não parecia terrivelmente perturbado com isso.
Então se comparou a Harriet, e a sensação de náusea voltou com força total.
— De Beauvoir, eu… Devo-lhe desculpas — disse St. Clair, passando
a mão não totalmente firme pelo cabelo. — A verdade é que Harriet chegou
ontem à noite, toda molhada e inconsciente, ardendo em febre, eu estive
acordado a noite toda, preocupado, acho que, talvez por isso, perdi a
cabeça.
Minerva observou o rosto De Beauvoir ficar tenso de ansiedade.
— Como ela está?
St. Clair encolheu os ombros. — Fui informado pelo médico de que
deve ter uma boa recuperação, mas... — O conde soltou um suspiro. —
Meu pai morreu de uma doença que começou assim, e...
De Beauvoir assentiu. — Não há necessidade de explicar, aceito suas
desculpas. Só vim para me assegurar de que ela estava bem. Percebi que
não estava muito bem ontem à noite, ralhei com ela, dizendo que o que
fizera era uma coisa idiota. Confrontei-a, ela poderia muito bem ter
esperado até hoje, mas... bem, é uma mulher extremamente teimosa.
O conde sorriu e acenou. — Ela é sim.
— Jasper!
Todos olharam para cima e viram Lady St. Clair inclinada sobre a
galeria. — Oh, bom dia, Sr. De Beauvoir — disse, antes de apontar o dedo
para o filho. — Jasper, há alguém aqui que deseja vê-lo.
O conde deixou escapar um suspiro e não se preocupou em pedir
licença. Subiu as escadas, dois degraus de cada vez, e nem olhou para trás.
Isso deixou Minerva e o Sr. De Beauvoir sozinhos, os criados saíram
discretamente, assim que tiveram certeza de que seu mestre não cometeria
assassinato diante de seus olhos.
Minerva hesitou por um momento antes de chamar um lacaio. —
Preciso de água morna, tintura de arnica e alguns panos limpos na
biblioteca imediatamente, por favor. Ah, e traga um pouco de chá e
sanduíches também. O Sr. De Beauvoir teve uma manhã difícil, receio.
— Por favor, Sr. De Beauvoir — disse, sorrindo enquanto seu coração
batia forte de alegria com a perspectiva inesperada de bancar a babá de suas
feridas.
— Não há realmente necessidade, Srta. Butler — ele disse, hesitando.
Suas sobrancelhas escuras estavam franzidas, estava olhando para ela
como se suspeitasse que tivesse segundas intenções. Realmente era
inteligente.
— Se o senhor se visse no espelho, pensaria de outra forma —
Minerva disse, pegando seu braço e guiando-o para a biblioteca. Embora
estivesse bastante surpresa com sua própria ousadia, estar sozinha com ele
estava longe das noções rigorosas de decoro que sempre tinha seguido, mas
não deixaria o sujeito escapar tão facilmente. — Pedirei a Temple para
encontrar-lhe uma gravata nova. A sua está coberta de sangue. E devemos
passar alguma coisa no seu olho, está inchando bastante.
De Beauvoir grunhiu, mas parecia saber reconhecer uma batalha
perdida quando via uma e permitiu que Minerva o arrastasse até a
biblioteca.
Ela o acomodou em uma cadeira perto da lareira, com um prato de
sanduíches e uma xícara de chá, puxou um banquinho, arrumando a tigela
de água e outros itens em uma mesinha ao lado dela, enquanto comia.
Minerva olhou-o de soslaio, enquanto ele inalava os sanduíches e se
perguntou quando havia comido pela última vez. Era muito alto e magro.
Uma vez que seus suprimentos estavam em ordem e ele terminou de
comer, começou sua tarefa.
— Posso fazer isso sozinho perfeitamente bem —insistiu, tentando,
mais uma vez, evitar os cuidados de seu anjo de misericórdia, mas Minerva
apenas revirou os olhos.
— O senhor não pode ver onde está machucado. Eu posso —
protestou. — Então, pare de agir como um bebê.
— Não estou agindo... — começou indignado antes de reconhecer o
olhar provocador nos olhos de Minerva e bufou resignado. — Por que as
mulheres sentem a necessidade de cuidar das feridas dos homens? Sou
perfeitamente capaz, garanto-lhe.
— Sentimos a necessidade porque sabemos muito bem que
simplesmente limparão o sangue com o lenço e deixarão os ferimentos
putrificarem. Assim como o senhor deixou o botão do casaco solto. Está
prestes a cair, vê —Minerva acrescentou, balançando a cabeça para ele.
— Meus botões são da minha conta — murmurou, parecendo tão
adoravelmente amuado, que Minerva teve que se conter para não rir.
— O senhor tem uma governanta, pelo menos? — Minerva perguntou,
curiosa para saber mais sobre ele.
Ele franziu a testa - o que parecia ser sua expressão natural - e pareceu
vagamente desconfortável. — Ela avisou e partiu há seis semanas. Não tive
tempo de contratar outra — acrescentou, cruzando os braços com força
enquanto Minerva torcia um pano limpo e começava a limpar o sangue do
seu rosto.
— Ai! — Reclamou e se afastou.
Minerva resmungou e segurou seu queixo com a mão livre, mantendo-
o no lugar.
— Por que ela foi embora? — Perguntou, tendo que despender um
esforço considerável para manter sua voz calma e não totalmente ofegante,
incomodada como deveria, porque ela estava.
Podia sentir o pinicar áspero da barba ao longo da linha intransigente
de sua mandíbula, e isso estava fazendo coisas estranhas com o seu coração.
— Houve uma... explosão — admitiu.
Minerva olhou-o. — Uma explosão — repetiu, divertida com o flash
de culpa em seus olhos, como se ele tivesse acabado de admitir que chutou
uma bola através de uma janela.
— Era para explodir — disse, claramente irritado, o que, por alguma
razão bizarra, só fez Minerva querer abraçá-lo. O que havia de errado com
ela? — Apenas esqueci de avisar a Sra. Thompson que poderia haver um...
um estrondo, e ela teve um ataque. A mulher, absurdamente, me acusou de
tentar explodi-la e disse... — Parou e bufou enquanto Minerva esperava que
terminasse. Revirou os olhos. — Me acusou de ser uma espécie de
feiticeiro.
Minerva deu um risinho.
— Oh, minha nossa — disse, falhando em manter sua voz totalmente
uniforme. — Que momentos difíceis o senhor tem passado, e agora perdeu
sua única esperança para o chamado de um amor verdadeiro.
Isso foi claramente demais e ele afastou a mão dela. — Por favor —
disse, revoltado. — São dois adultos saudáveis e atraentes. Não é nada mais
do que luxúria, uma reação química; um desejo primitivo de procriar. Nem
mais, nem menos.
Minerva sentiu sua cor aumentar com a sua declaração e viu um brilho
de satisfação em seus olhos por tê-la chocado. Algo diabólico se agitou em
seu peito, enquanto seu temperamento ganhava vida. O desejo de mostrar
que ele poderia muito bem ser um homem brilhante, mas também
notavelmente estúpido, era irresistível.
— Então, é assim entre qualquer homem e qualquer mulher? —
Perguntou, olhando-o com os olhos arregalados.
Ele franziu a testa, aparentemente dando a devida consideração à
pergunta. — Não — permitiu, balançando a cabeça. — Existem
preferências, garanto-lhe. Por exemplo, não posso competir com a
aparência de St. Clair e não vou mentir, nem com seu dinheiro —
acrescentou. — A aparência física pesa muito para a maioria das pessoas,
naturalmente. Quanto mais bonita a mulher, mais popular ela é e vice-versa.
Embora os homens sejam menos exigentes do que as mulheres até serem
forçados a se casar.
Minerva assentiu gravemente.
— Sim, entendo. — Franziu os lábios, considerando suas palavras e se
perguntou qual a melhor forma de irritá-lo. — Então, quando um homem e
uma mulher se beijam, há uma reação química entre eles, que as mulheres
erroneamente identificam como amor, quando nada mais é do que luxúria.
Estou correta?
Ele se mexeu na cadeira, claramente desconfortável com o rumo que a
conversa havia tomado, que era inteiramente sua culpa.
— Não apenas mulheres. Conheci homens perfeitamente racionais que
se tornaram igualmente afligidos por emoções exageradas.
— Tão afligidos que correram para o matrimônio? — Adivinhou, seu
tom inocente enquanto reprimia um sorriso.
— Isso mesmo.
— Mas um homem de ciência, um homem como o senhor, deve ser
muito mais objetivo, imagino. O senhor nunca poderia confundir atração ou
luxúria com outra coisa?
— Não, claro que não.
— Mas e quanto a mim? — Perguntou, e não foi nenhum esforço
baixar a voz e soar ofegante, pois seu peito estava apertado com
antecipação. — Como posso saber a diferença entre amor e luxúria? Pois
acredito que corro o risco de cometer um erro terrível.
Sua expressão escureceu e o pouco que restava de seu fôlego ficou
preso em seus pulmões enquanto aqueles penetrantes olhos verde-
acinzentados focavam nela. — Tem algum canalha brincando com seus
sentimentos, Srta. Butler? Nesse caso, basta me dizer o nome do crápula
que eu o enxotarei. Espero... Espero que a senhorita não tenha sido
indiscreta? — Perguntou, e Minerva ficou satisfeita por haver preocupação
no seu rosto.
— Ainda não — murmurou, olhando para ele e se perguntando se tinha
perdido completamente a cabeça. — Mas..., mas estou fascinada e acho...
Acho que poderia muito facilmente me apaixonar.
— Não é amor, Srta. Butler — insistiu duramente. — Na melhor das
hipóteses, não passa de uma breve paixonite. Vai passar, imploro que a
senhorita não faça nenhuma tolice...
— Tarde demais — disse Minerva, e se inclinou para beijá-lo.
Por um momento, seus lábios ficaram quentes sob os dela e
impossivelmente macios. Que esquisito. Não esperava por isso, e então ele
se afastou e tropeçou em seus pés, olhando para ela como se fosse uma
espécie de cobra venenosa.
— Não vou bancar o idiota, Srta. Butler, se esse for o seu objetivo —
disse, com desdém gélido, praticamente vibrando de fúria. — A senhorita
achou que eu cairia aos seus lindos pés? Tente suas artimanhas com outro
cavalheiro, mais receptivo a essas iscas, pois a senhorita não me enganará.
Tenha um bom dia.
Com isso, ele saiu da sala e bateu a porta.
Minerva estremeceu quando o som reverberou pela sala e então tocou
os lábios com os dedos. Bem, pelo menos ele acha que meus pés são lindos,
pensou com um suspiro.
16

Senhor De Beauvoir,
Lamento que o senhor tenha tido uma recepção violenta
quando veio me visitar. Sei que Lorde St. Clair se arrepende
de suas ações, mas, por favor, entenda que foi por preocupação
comigo. Espero que o senhor possa nos perdoar. Estou me
recuperando bem e decidi que não sairei em nenhuma chuva
novamente tão cedo.
—Trecho de uma carta da Srta. Harriet Stanhope para o
Sr. Inigo De Beauvoir.

2 1814. H H ,S .
Harriet sorriu quando Jasper entrou apressado no quarto e caiu de
joelhos ao lado da cama.
— Harry — disse, pegando a mão dela e levando-a aos lábios. — Por
Deus, Harry, me deu um susto, amor.
— Sinto muito — disse, falando sério.
Sabia como seu pai morreu e se lembrava do tempo que levou para
morrer, cada respiração sua mais difícil e dolorosa de suportar, e da tosse
violenta que o fazia gritar de dor. O falecido conde era um homem grande,
um maroto encantador, mas dedicado à esposa e aos filhos. Sua morte
devastou a todos e atingiu Jasper com uma força especial. Apesar da
fachada que ele usava para o bem de sua mãe, suspeitava que não se sentia
preparado para assumir o condado tão jovem.
— Não me assuste assim de novo, por favor — disse, fechando os
olhos e soltando um suspiro. — Temo em dizer, mas perdi um pouco a
cabeça.
Harriet franziu a testa, perguntando-se o que queria dizer. Sua cabeça
doía, seus olhos doíam, sentia-se como se tivesse engolido vidro quebrado.
— O que aconteceu? — Perguntou, o que foi um esforço máximo.
— Eles a trouxeram da carruagem ontem à noite — ele disse. —
Encharcada até os ossos, de novo — acrescentou, olhando-a. Harriet
poderia ter corado de remorso se já não estivesse com febre. — Depois
descobri que foi ver De Beauvoir.
O coração de Harriet deu um salto. Oh, bom Deus, o que ele fez?
Visões de pistolas ao amanhecer e só Deus sabe mais o que encheu seu
cérebro confuso de febre. — N-Não, Jasper, não entende... — ela
murmurou, forçando as palavras a passarem por sua garganta inflamada.
— Xiii — disse, sorrindo para ela. — Entendo. De Beauvoir me contou
por que foi vê-lo. Infelizmente, não conseguiu dizer isso antes de eu
nocauteá-lo.
Harriet gemeu.
— Está tudo bem. Eu me desculpei. — Jasper disse, sorrindo. — Não
acho que sou a pessoa favorita dele, mas não vai me chamar para um duelo.
Ela soltou uma gargalhada, que rapidamente se transformou em uma
tosse seca, e Jasper se preocupou, afofando seus travesseiros e ajudando-a a
se sentar, antes de pegar um copo d’água.
— Melhorou? — Perguntou ansiosamente, quando o acesso de tosse
diminuiu.
Harriet acenou, suspirou e recostou-se nos travesseiros.
— O que ele te disse, Jasper? — Perguntou.
Jasper pegou a mão dela novamente e colocou-a contra sua bochecha,
antes de virar a cabeça para ela e pressionar os lábios na palma da sua mão.
Harriet estremeceu.
— Acho que sabe — disse suavemente.
Olhou para ela que prendeu a respiração. Era tão bonito que doía olhá-
lo, e era tão difícil acreditar que pudesse segurar um homem daquele. No
entanto, aqui estava ela, febril e doente - só o céu sabia em que estado seu
cabelo estava, devia estar com uma aparência horrível - e ele ainda a estava
olhando com adoração. A cabeça dele devia estar confusa, decidiu, e tentou
se lembrar se Lady St. Clair alguma vez mencionou que ele caiu de cabeça
quando era criança.
— Te amo — ela disse, porque tinha que dizer, porque ele merecia
ouvir isso depois de todo esse tempo.
Para seu espanto, os olhos dele brilharam e ele piscou com força antes
de dar uma risadinha melancólica.
— Graças a Deus — disse, sua voz quase tão áspera quanto a dela. —
Graças a Deus, e obrigado acima de tudo, minha querida menina. Também
te amo e não vou decepcioná-la. Prometo.
Harriet assentiu, enquanto uma exaustão forçava suas pálpebras. Ficou
muito feliz por tê-lo agradado e, com um suspiro de satisfação, voltou a
dormir.

7 1814. H H ,S .
Jasper se tornou um estorvo pelos próximos dias, enlouquecendo a
pobre criada de Harriet enquanto mexia e reorganizava tudo que ela já tinha
arranjado perfeitamente bem, mas sentiu como se fosse enlouquecer se não
tivesse nada para fazer.
Harriet dormia muito no início, mas, com o passar dos dias, melhorou,
a febre diminuiu e um tom mais saudável voltou ao seu rosto. Esta manhã,
quando entrou em seu quarto, estava sentada na cama e parecia muito mais
altiva.
— Bom dia, amor. Como está se sentindo?
— Entediada — Harriet disse com um bufo. — Quero me levantar,
mas aquele médico estúpido diz que não posso, até amanhã, no mínimo.
— É adorável quando está mal-humorada, sabia disso? — Jasper disse,
sorrindo enquanto se inclinava para beijar sua testa.
— Nunca sou adorável — Harriet respondeu, franzindo o nariz.
— Perdoe-me, mas discordo. Agora — disse, puxando uma cadeira e
sentando-se ao lado dela. — Temos um casamento para planejar.
Harriet gemeu.
— Bem, esse é o tipo de reação que pode ferir os sentimentos do seu
companheiro, amor — Jasper disse, balançando a cabeça, ciente de que não
era ao casamento a que se opunha, e sim o rebuliço disso.
— Não quis dizer isso dessa forma — disse rapidamente e então notou
a diversão em seus olhos. — Oh, Jasper, não aguentaria. Todas aquelas
pessoas olhando para mim e se perguntando como o prendi no casamento.
Jasper sentiu seu temperamento aumentar com a ideia. — Já deixei
bem claro para quem quiser ouvir, que eu a prendi no casamento — disse, o
que era perfeitamente verdade, mas Harriet apenas bufou.
— Vão pensar que está sendo um cavalheiro e salvando minha
reputação, — disse irritada.
— Não quando virem como sou um marido dedicado, seguindo-a como
um cordeirinho.
Harriet bufou de novo, embora parecesse divertida dessa vez. — O
que? Um cordeirinho?
— Baaaa.
Ela riu e balançou a cabeça. — Homem tolo — disse, mas com tanto
afeto em seu tom, que Jasper sentiu seu coração inchar. Ela o amava.
Parecia totalmente impossível, mas ela disse isso, e Harriet nunca mentia.
Não estrague tudo, St. Clair, advertiu a si mesmo.
— Que tal um casamento privado, na capela daqui? Seremos nós dois,
nossos irmãos, suponho — acrescentou com um longo suspiro de
sofrimento. — E todas as damas peculiares que desejar convidar.
— Senhoritas Peculiares — Harriet corrigiu severamente, antes de
suspirar e estender a mão para pegar a dele. — Oh, Jasper, isso parece
perfeito, mas não se importa? Sua mãe não ficará terrivelmente
desapontada? Imagino que ela anseia por uma grande festa.
— Falarei com ela — disse, passando o polegar para a frente e para
trás sobre a mão dela, ainda tendo dificuldade em acreditar que o tinha
aceitado, que o queria.
A ansiedade permanecia no seu coração, o medo de que o quisesse
contra a sua vontade, que sabia tão bem quanto ele que provavelmente se
aborreceria. Não, ela me ama, lembrou-se, e não apenas por seu rosto
bonito, não apenas por como a fazia sentir na cama, havia mais do que isso,
não havia?
Um pânico desagradável começou a se desenrolar em seu estômago e
tentou ignorá-lo.
— Quero me casar assim que pudermos — disse, assegurando-se de
que não o dizia para a amarrar a ele, para garantir que nunca pudesse deixá-
lo, não tendo tempo de voltar a si e mudar de opinião.
— Acho que devemos — disse com um suspiro. — Não consigo
imaginar o que as pessoas devem estar falando sobre mim.
— Ninguém vai ousar dizer uma palavra — assegurou. — Não se
souberem o que é melhor para eles.
Ela respirou fundo e levou a mão ao coração. — Adoro quando age
todo autoritário e resmungão.
Jasper bufou, ciente de que estava sendo provocado. — Miserável.
Seu rosto se suavizou e houve uma estranha sensação de tremor em seu
coração.
— Eu o amo, Jasper. Sempre o amei. Sabe disso, não sabe?
Ele engoliu em seco, ainda desacostumado a essa revelação
extraordinária, mas assentiu, pois estava emocionado demais para falar.
— Mal posso esperar para sair desta cama — disse, fechando os olhos
por um momento.
— Mal posso esperar para tê-la de volta na minha —rebateu,
encontrando sua voz novamente e apreciando o bombardeio de cor em suas
bochechas.
Ela ignorou o comentário, embora seus lábios tivessem se contraído.
— Devo avisar que mamãe está fazendo planos para um grande baile
para nossa festa de noivado — disse, sorrindo para sua expressão chocada.
Harriet deu de ombros, seus lábios se curvando. — Bem, devo isso a
ela, já que não vai ter o grande casamento que esperava — disse com um
suspiro. — Diga que aprovo tudo, o que ela quiser. Estou nas mãos dela.
— Isso vai agradá-la — disse Jasper, balançando a cabeça em
aprovação.
Ela suspirou e se virou para olhar para a janela e as pequenas manchas
de céu azul visíveis do lado de fora. — Estou tão entediada — reclamou, a
coisa mais próxima de um gemido que ele já ouviu dela. — Não consigo
nem ler porque faz minha cabeça doer.
— Pobre querida — disse, sua voz suave quando se inclinou e deu um
beijo em seu nariz. — Deveria descansar.
— Não quero descansar — murmurou, — quero fazer algo. Oh, —
disse, iluminando-se e sentando-se mais ereta. — Poderia ler para mim. Por
favor, Jasper, ou acho que vou enlouquecer.
Jasper teve um momento de puro pânico. Ficou quente, depois frio e,
em seguida, uma combinação pegajosa dos dois se estabeleceu sobre sua
pele.
— Eu... eu... — gaguejou, com medo de que ela finalmente descobrisse
seu segredo. Sabia que tinha que contar a ela um dia, deveria contar, mas
não estava preparado para fazer isso tão cedo, pelo menos não antes de se
casarem. Não estava pronto.
Seu pânico foi tal que fez com que qualquer possibilidade de inventar
uma desculpa razoável se desvanecesse em uma improvável baforada de
fumaça, como um mágico ruim. De repente, tinha oito anos, com seu tutor
respirando em seu pescoço e dizendo-lhe para não ser tão absurdo, que
estava fazendo aquilo de propósito quando descobriu que a escrita pelo qual
Jasper lutou por horas era uma bagunça absoluta, e muitas das palavras ou
letras estavam de trás para frente.
O homem ficou furioso com ele, pensando que estava brincando, e
Jasper ficou tão mal, humilhado e frustrado que agarrou o pote de tinta do
estande e jogou no chão. Houve algo satisfatório na batida que fez, e na
forma como a tinta preta respingou em tudo, cobrindo seu tutor da cabeça
aos pés com manchas de tinta.
Aquele tinha sido o começo de uma vida de mal comportamento, de
evitar seus estudos e fingir que não se importava, quando se importava mais
do que qualquer um poderia imaginar.
— Eu não posso... eu... — respondeu, levantando-se. — Preciso fazer...
uma coisa. Esqueci, desculpe, querida... Voltarei mais tarde...
Sentindo-se um canalha e um idiota absoluto, Jasper saiu apressado do
quarto. Uma vez do lado de fora, encostou-se na parede, seu estômago
amarrado com um nó, achou que fosse vomitar. Por Deus. Oh, meu Deus.
Ela descobriria. Perceberia que era um maldito idiota e então se recusaria a
se casar. E se seus filhos herdassem o cérebro dele em vez do dela? E se...
Pare com isso, disse a si mesmo, forçando o pânico a ir embora, como
se ensinou a fazer. Contornaria isso. Sempre contornou. Talvez pudesse
memorizar o primeiro capítulo de um livro. Não, não tinha tempo o
suficiente. Levaria séculos, e a única maneira de lidar com isso seria pedir a
alguém para ler a peça repetidamente enquanto imaginasse as palavras em
sua cabeça até que pudesse recitá-la de volta. Lidou com muitas situações
embaraçosas dessa maneira ao longo dos anos, mas Harriet já estaria
recuperada quando pudesse fazer isso com confiança.
Desceu as escadas correndo e saiu, indo para o único lugar onde
ninguém o perturbava.
Foi uma caminhada e tanto até o santuário de Jasper, que ficava na
extremidade mais distante da fazenda: um espaço amplo e bem iluminado
em uma das muitas dependências necessárias para servir a uma propriedade
tão vasta e opulenta quanto Holbrooke House. Este lugar estava
estritamente fora dos limites para todos, e Jasper nunca tinha permitido que
criada alguma limpasse o local, preferindo fazer essas tarefas ele mesmo.
As janelas eram altas e recebiam bastante luz, que não permitia que
ninguém conseguisse ver dentro ou que Jasper visse o lado de fora.
Soltou um suspiro quando fechou a porta atrás de si e encostou-se nela,
aliviado. O doce cheiro de serragem e madeira secando encheu o ar e
aliviou o pânico que estava arranhando seu peito, fazendo sua garganta
apertar. Tomando um momento para trancar a porta, Jasper tirou seu casaco
perfeitamente desenhado e pegou uma versão leve e folgada que chegava
aos joelhos e cobria suas roupas caras. Suas botas ficariam cobertas de
poeira e o pobre Merrick não gostaria nada disso, mas não havia como
evitar.
Jasper entrou na oficina, suas mãos percorrendo cinzéis e ferramentas
que o conde de St. Clair nunca deveria tocar. Olhou para suas mãos, feliz
por ver os calos ali, como qualquer trabalhador comum. Era para lá que ia
quando precisava fugir, quando a frustração com suas próprias
inadequações o fazia se sentir um fracassado e quando seu desejo pela
aprovação de Harriet o fortalecia.
Com um suspiro, selecionou o cinzel de que precisava e começou a
trabalhar.

Harriet olhou para a porta que Jasper acabara de passar - praticamente


correndo - e franziu a testa.
Sua primeira reação foi de profunda mágoa e indignação por ele não se
dar ao trabalho de se sentar e ler para aliviar seu tédio. Ainda assim, sentou-
se com ela por horas, aparentemente perfeitamente contente em lhe fazer
companhia, mesmo quando estava dormindo. Não, não era falta de vontade
de entretê-la ou fazer-lhe companhia. Então, por que correu como se o
quarto estivesse pegando fogo? Viu o pânico em seus olhos quando sugeriu
que lesse para ela; foi a coisa mais próxima de terror que já testemunhou
em sua vida.
A ideia a perturbou. O que diabos fazia Jasper sentir tanto medo? Por
mais que tentasse, não conseguia entender. Atormentou-a por anos por
causa de sua inteligência, embora entendesse agora que tinha feito isso para
chamar sua atenção, por mais idiota que isso lhe parecesse. Os homens
eram criaturas estranhas sem dúvidas. No entanto, disse que a amava por
sua inteligência, amava as coisas estranhas que sabia. Disse que gastaria
cada centavo que tivesse em livros para ela.
Se já não estivesse loucamente apaixonada por ele, aquela única
declaração teria sido o suficiente para deixá-la de pernas para o ar. Na
opinião de Harriet, essa foi a coisa mais romântica que alguém já disse na
história. Por que então, se fosse assim, fugiria quando sugeriu que lesse
para ela? Não fazia o menor sentido. Sem dúvida, havia alguma explicação
masculina estúpida que faria sua cabeça doer, mas não conseguia pensar o
que era.
Suspirando, Harry fechou os olhos e desejou que seu cérebro estivesse
funcionando na velocidade normal. Atualmente, parecia lento e leve e
inadequado para a tarefa, mas descobriria. Decifraria o enigma do homem
que ele era, eventualmente
17

Querido Sr. De Beauvoir,


Por favor, perdoe-me por meu comportamento chocante
quando o senhor visitou Holbrooke House ontem. Poderia
dizer que não sei o que aconteceu comigo, mas sei.
Lamento informar, mas estou apaixonada.
Juro que o beijo não foi planejado - como poderia ter sido? - e
que não há conspiração para o enredar em minhas armadilhas.
Na verdade, estou tão perplexa com minha reação ao senhor
quanto o senhor pareceu estar revoltado com ela. Devo
informá-lo que mamãe espera que eu me case com um
cavalheiro nobre e rico, e se ela tivesse a menor ideia de meu
comportamento, provavelmente me trancaria pelo resto da
vida.
Como um homem de ciência e razão, explique-me o que devo
fazer. Como faço para me livrar desse desejo bobo por alguém
que claramente me despreza, como sempre soube que o senhor
desprezaria?
Por favor, aconselhe-me, Sr. De Beauvoir, porque temo fazer
papel de boba se nos encontrarmos novamente.
Sua em admiração,
Srta. Minerva Butler
PS: Estou gostando muito do livro, como o senhor previu.
—Carta da Srta. Minerva Butler para o Sr. Inigo De
Beauvoir.

8 1814. H H ,S .
Harriet ficou muito aliviada por finalmente ter sido liberada para
deixar o quarto. Aninhada diante da lareira da biblioteca, estava tentando,
sem sucesso, ler o livro que trouxera com ela. Não via Jasper desde o dia
anterior, ou desde aquela manhã, e embora ainda se sentisse cansada e
letárgica, sua mente não estava tão nebulosa quanto antes.
— Prefere rosas cor de rosa ou amarelas?
Harriet se virou para a escrivaninha onde Lady St. Clair estava
alegremente instalada, cercada por listas e planejando a festa de noivado
dela e de Jasper com o mesmo semblante determinado que Wellington
certamente usou antes da batalha de Waterloo.
— Rosa — Harriet respondeu distraidamente. — Onde está Jasper?
Lady St. Clair levantou os olhos das anotações e franziu a testa. — Não
tenho ideia — disse. — Embora suponha que, provavelmente, esteja
naquela oficina dele.
— Oficina? — Harriet repetiu. — Jasper tem uma... oficina?
Houve um trinado de risos vindo da mesa. — Ele não é o presunçoso
desocupado que todo mundo pensa que é, Harriet, querida. Achei que você,
de todas as pessoas, soubesse disso.
Harriet corou, perguntando-se o que, realmente, sabia sobre Jasper,
sobre o homem que era agora. Havia-o julgado mal nos últimos anos. O que
mais havia entendido errado? Antigamente o conhecia melhor do que a si
mesma, mas eram crianças naquela época, e haviam se passado muitos anos
desde que se afastaram um do outro. Durante esses anos, ele se transformou
em um homem, um homem bonito, com uma reputação selvagem de
mulherengo. Embora tivesse notado que, mesmo que tivesse se acalmado
nos últimos anos, sua reputação ainda o seguia. Mas, uma oficina?
— Que tipo de oficina?
Lady St. Clair encolheu os ombros. — Não tenho ideia, ele não deixa
ninguém entrar. Até mesmo os criados são proibidos. — Ergueu os olhos
deixando Harriet impressionada com a tonalidade dos seus olhos turquesa, a
mesma cor incomum que seu filho herdou. — Por que não descobre?
Harriet se encolheu um pouco ao pensar em invadir o espaço privado
de Jasper. Era aparente que guardava a sete chaves, se nem mesmo deixava
os criados entrarem. Naturalmente, agora estava sendo comida viva de
curiosidade.
— O médico disse que um passeio ao ar livre seria bom, não disse? —
Lady St. Clair comentou indiferentemente.
— Muito bem —Harriet disse, pondo o livro de lado.
Dez minutos depois, estava seguindo o pequeno mapa de Lady St.
Clair, passando pelos estábulos imponentes e mais adiante, pela vasta horta
que abastecia a casa com produtos frescos, e pelas estufas onde frutas
exóticas e flores eram cultivadas com ternura. Em seguida, foi para a
fazenda, observando enquanto caminhava como tudo era limpo, organizado
e bem cuidado. Jardineiros e trabalhadores rurais tiraram seus chapéus e
saudaram-na com um sorriso no rosto enquanto ela lançava seus olhos sobre
um grande e bem administrado empreendimento. Não havia um telhado
sequer precisando de conserto, ou uma vidraça quebrada à vista. Cada
quintal e passeio era bem cuidado. Lembranças surgiram de ter brincado
dentro e ao redor daquelas construções quando eram crianças, roubando
frutas suculentas, fazendo carinho nos porquinhos e geralmente tornando-se
estorvos. Já fazia muito tempo desde que havia estado naquela parte da
propriedade, sorriu ao se lembrar de uma centena de aventuras e disputas, e
muitas risadas. Harriet não se lembrava de o lugar estar em tão excelente
estado naquela época. Na verdade, era um conjunto de construções muito
mais desorganizado, muitos deles em mau estado de conservação.
Jasper tinha feito tudo isso?
Harriet olhou para o mapa mais uma vez para se orientar, concluindo
que a construção que procurava ficava na periferia do complexo da fazenda,
antes de dar lugar aos campos. De acordo com o mapa, agora havia um
aglomerado de construções e todos deviam ser novos, pois não se lembrava
de ter havido nada além de campos ali. Continuou andando, pulando as
poças e aproveitando o ar fresco. O sol aqueceu suas costas e inspirou
profundamente o ar puro e doce, grata por respirar com muito mais
facilidade do que há alguns dias.
A construção, quando finalmente a encontrou, era um prédio de tijolos
vermelhos sólidos com janelas altas, altas demais para permitir que Harriet
espiasse discretamente antes de reunir coragem e bater à porta.
Bem, veio até aqui, e era apenas Jasper. Por que, diabos, estava tão
nervosa?
Harriet ergueu a mão enluvada e bateu com força na porta.
Por um longo momento não houve resposta, estava prestes a bater
novamente quando a porta se abriu e Jasper colocou a cabeça para fora.
— Harriet! — Exclamou, obviamente surpreso.
Ele saiu e fechou a porta atrás de si, sem permitir que ela visse o que
estava fazendo ali.
— O que faz aqui? — Perguntou.
— Estava te procurando — respondeu estudando seu rosto. — Não o vi
desde a noite passada, quando saiu do meu quarto como se seus calcanhares
estivessem em chamas.
— Não foi bem assim — endureceu imediatamente, sua expressão
cautelosa, e ela estava ciente da tensão vibrando no seu corpo.
— Sim, saiu — disse, estendendo a mão e pegando o braço dele, que
estava rígido e inflexível.
— Tinha que tomar conta de algumas coisas. Disse que tinha
esquecido... uma coisa.
Harriet respirou fundo e olhou para ele, perguntando-se por que insistia
em seguir com aquela desculpa esfarrapada, quando era patentemente
mentira.
— Esqueceu o quê, Jasper?
— Não importa! — Respondeu tenso e irritado e algo mais, parecido
com pânico.
Lembrou-se do pânico que vira em seus olhos no dia anterior também.
— Tudo estava bem até que pedi que lesse para mim — meditou,
considerando as possibilidades até que algo óbvio ocorreu a ela. Suspirou e
olhou para seu belo rosto, tentando manter o sorriso nos seus lábios. — Oh,
Jasper, pre... precisa de óculos? É por isso que fez tanto alarde?
Ela se assustou quando ele afastou o braço do dela.
— Não, não preciso de óculos — respondeu rispidamente, e Harriet se
assustou com a raiva e mágoa no rosto dele. — Embora dificilmente possa
estar surpreso que pense isso. Acredita que sou um tolo sem cérebro, não é?
Acha que só me importo com a minha aparência e com o que vestir. Claro,
Jasper é muito vaidoso para usar óculos para ler, prefere não se incomodar
em vez de estragar seu belo rosto - é isso, não é, Harry? Cristo, se isso for
tudo que...
Fechou a boca e afastou-se, cruzando os braços com força sobre o
peito. Ela podia sentir o sofrimento e a tensão emanando do seu corpo e não
sabia por que, ou como ajudar, embora desejasse fazê-lo.
Harriet se aproximou dele com cautela, seu coração arrebentando no
seu peito. Sua óbvia dor a fez se sentir péssima, e uma culpa tenebrosa
baixou sobre ela. Seu coração doeu ao vê-lo tão agitado. Jasper sempre foi
aquele que ria, aquele com um sorriso rápido e algo espirituoso a dizer,
aquele que a socorria quando estava fora de si por seu pai a tratar como uma
garotinha boba e se recusar a ver que era mais do que isso.
— Jasper — chamou-o, estava perto o suficiente para colocar a mão
em seu braço. Olhou para ele, que manteve o rosto virado. — Jasper, o que
é? Qual é o problema?
— Nada.
Queria abraçá-lo, segurá-lo com força, pois estava claramente
mentindo. Essa única palavra continha um mundo de dor e desafio, e sabia
que deveria agir com cuidado. Fosse o que fosse, havia ferido gravemente
seu orgulho. Harriet cresceu entre meninos e sabia como esse orgulho era
frágil. Um menino zombaria e riria e diria que não estava com medo,
quando na verdade estava tremendo em suas botas, ou, isso não doeu,
quando esfolava os joelhos, mesmo que o desejo de ser abraçado e beijado
brilhasse nos seus olhos. Reconheceu aquele mesmo orgulho feroz agora,
em cada linha de seu corpo, e na maneira como se recusava a encontrar seu
olhar.
— Por que acha que acredito que seja tolo, Jasper? — Perguntou,
mantendo sua voz suave. — Não acho, espero que saiba. Nunca achei.
Ele fez um som de desgosto que sugeria que não acreditava em uma
palavra que estava falando.
— Fiquei frustrada com a sua falta de interesse em estudar, é verdade
— ela continuou decidindo que seria melhor fazê-lo falar sobre isso, mesmo
que tivesse que deixá-lo com raiva se fosse necessário, pois certamente isso
era o cerne do, seja qual for, problema que ele tinha. Teve medo de ler caso
escolhesse algum jornal científico que não conseguiria acompanhar?
Certamente que não. — Quando optou por não ir para a universidade, fiquei
chateada e com ciúmes, porque eu teria dado meu braço inteiro por essa
oportunidade e apenas disse não, sem pensar um momento. Nem mesmo
considerou e...
— Porque sou muito burro para considerar isso! — Gritou, furioso,
enquanto se afastava dela.
— Não, não é! — Harriet gritou de volta, indignada por ele pensar uma
coisa dessas, quando era tão claramente mentira. — Sei que não é.
— Não sabe absolutamente nada sobre isso, Harry! — Ele se virou e a
dor em sua expressão a devastou, o brilho em seus olhos fez com que seu
peito doesse. — Não sabe... — começou de novo, as palavras cruas, mas
sua voz falhou, e ele se afastou.
— Jasper! — Gritou, correndo até ele e jogando os braços sobre sua
cintura. — Oh, meu amor. Seja o que for, diga-me, por favor. Não suporto
vê-lo tão infeliz. Por que pensa isso? Quem, diabos, colocou isso na sua
cabeça?
— Quem? — Perguntou incrédulo, com uma risada amarga enquanto
passava a mão pelo cabelo. — Cada tutor e mestre de escola que já tive,
somente essas pessoas!
— Mas por quê? Por que os enganava e não participava das aulas e os
enfrentava?
— Não! — Gritou, e foi um som tão angustiado que tudo o que
conseguiu fazer foi segurá-lo com mais força.
Ele estava respirando fundo agora, tão obviamente perturbado que
Harriet não sabia o que fazer ou dizer, então fez a única coisa em que
conseguia pensar. Segurou-o com força enquanto o olhava.
— Eu te amo, Jasper. Seja qual for o problema, isso não mudará a
forma como me sinto.
Para sua consternação, ele balançou a cabeça em negativa e sua
garganta se mexeu.
— Vai me deixar —disse as palavras, tão destruído, que ela sentiu seu
coração se despedaçar. — Vai me desprezar.
— Não vou! — Exclamou, desejando ter força suficiente para sacudi-
lo. — Bom Deus, Jasper. Estive apaixonada por você minha vida toda.
Minha vida toda! Acha que qualquer segredo obscuro que pensa que tem
pode mudar isso? Mesmo quando zombava de mim sem parar e me fazia
sentir como uma rata de biblioteca sem graça, ainda o amava. Tentei muito
não te amar, acredite, tentei, mas não consegui parar. Não vou parar, Jasper.
Por favor, meu amor — implorou. — Não vai confiar em mim?
Harriet observou enquanto ele cobria o rosto com as mãos e ela ergueu
as dela, cobrindo-as com as suas e afastando-as. Colocou-as em seu próprio
rosto e beijou primeiro uma, depois a outra.
— Diga-me — pediu, sentindo sua garganta fechar com emoção
quando uma lágrima deslizou por sua bochecha.
Ele ficou em silêncio por um bom momento e então respirou fundo e
ela o viu se preparar para sua resposta, sua rejeição.
— Eu n-não consigo ler, Harry — disse, e foi um esforço para não
reagir, para não dizer não seja bobo, isso não é possível, como, diabos, ele
conseguiu se virar todo esse tempo se isso fosse verdade?
Olhou para seu belo rosto, reconhecendo o medo naqueles olhos,
sabendo que estava esperando que ela risse dele ou o rejeitasse, ou para
recriar o que quer que tenha experimentado no passado que o machucou tão
profundamente.
Harriet respirou fundo. — E o que acha que possa ter causado isso? —
Perguntou, calmamente, antes de adicionar — e não diga por que é burro,
Jasper, porque não vou admitir. Não é burro.
— Me disse que eu era — rebateu, aquele tom frágil e defensivo
aparecendo em sua voz.
— Talvez seja porque eu não entendia — retrucou. — Da mesma
forma que não entendia por que era tão cruel comigo, e você não entendia
por que eu não o amava mais. Acho que cometemos muitos erros tolos nos
últimos anos, Jasper, e todos poderiam ter sido resolvidos tão facilmente se
apenas tivéssemos conversado.
Ele engoliu em seco e depois enxugou os olhos com um gesto irritado.
— Não sei por quê. Eu... Eu tentei tanto, Harry — ele disse, e a angústia em
sua voz a fez querer chorar pela dor que ele guardou dentro dele todos esses
anos. — Quer dizer, posso ler, só que é muito difícil, fico uma eternidade e
depois quando tento escrever... as palavras saem todas erradas. Escrevo de
trás para a frente e é... uma confusão maldita.
— Jasper — disse, estendendo a mão para tocar seu rosto, mas ele se
afastou dela e do seu abraço.
— Não tenha pena de mim —explodiu, se afastando e enfiando as
mãos no cabelo como se fosse arrancá-lo pela raiz. — Não ouse ter pena de
mim! Isso não.
— Não tenho pena — disse, lutando para manter a voz, mesmo quando
queria chorar e abraçá-lo e se enfurecer com o mundo por ter lhe causado
tanta dor. — Estou impressionada, isso sim, Jasper. Com o quão duro deve
ter trabalhado, quão inteligente deve ter sido para esconder isso de todo
mundo, todo esse tempo.
— Não seja tão condescendente — rosnou, andando para cima e para
baixo agora, como um animal selvagem que ficara preso em um espaço
muito pequeno por bastante tempo.
— Não estou sendo, juro. Não consigo imaginar como administrou esta
vasta propriedade durante todos esses anos, muito menos como terminou os
estudos. Meu Deus, não admira que não quisesse ir para a universidade —
fez uma pausa e prendeu a respiração quando outro pensamento lhe
ocorreu. — Oh, meu Deus, e a forma como o tratei, as coisas que eu disse
— sussurrou, horrorizada com sua crueldade, embora não fosse sua
intenção causar tal dano. Se ao menos ela soubesse!
— Não importa — disse, chutando uma pedra e parecendo tão cansado
que desejou ir até ele e consertar tudo, mas não sabia como.
— Alguém sabe? — Perguntou.
Balançou a cabeça negativamente, e soube que ele vinha lutando contra
isso sozinho a vida inteira, com medo de que alguém descobrisse.
— Acho que, talvez, Merrick suspeite — disse sem olhá-la.
— Seu valete?
Jasper assentiu. — Tenho que pedir às pessoas que leiam as coisas para
mim. Meu secretário acha que sou muito esnobe para fazer isso sozinho,
mas tudo bem. É assim que lidei com a maioria das situações, mas..., mas é
mais complicado com questões pessoais.
Harriet sentiu um nó na garganta. — Foi por isso que não escreveu —
disse, piscando para conter as lágrimas.
— Sinto muito — respondeu. — Eu queria, mas...
Ela não conseguiu se conter mais um minuto, maldito seja o orgulho
dele. Harriet correu e envolveu-se nele o mais firme que pôde.
— Eu te amo, Jasper. Eu te amo, é a pessoa mais corajosa que já
conheci, não é burro e nunca deve pensar que é.
Ele estava rígido e inflexível em seus braços, a dor que sentia
escondida atrás de uma parede frágil que ela precisava estilhaçar.
— Talvez não burro — admitiu. — Mas não sou um grande pensador,
amor. Não como...
— Se disser De Beauvoir, eu o mato — ameaçou-o, antes que ele
tivesse tempo de terminar a frase. — Estou lhe dizendo agora, admiro
muitas coisas em Inigo De Beauvoir, mas concluí que ele é o gênio mais
estúpido que conheço.
Jasper deu a ela um olhar vazio.
— As ideias dele sobre o amor são as mais idiotas que já ouvi em toda
a minha vida — continuou balançando a cabeça. — Tentei acreditar nelas
por muito tempo, mas dentro do meu coração sempre soube que estava
errado. Honestamente, quão estúpido precisa ser para pensar que tal coisa
não foi provada repetidamente de maneiras infinitas, desde o início da raça
humana? Que grande tolo ele é.
Para seu imenso alívio, os lábios dele se contraíram.
— Bem, não gosto de dizer, mas avisei — disse.
Harriet deixou escapar uma risadinha e olhou para ele, tocando seu
rosto com a mão.
— Fico feliz que tenha me dito, e aliviada por entender, então, vamos
resolver as coisas juntos, certo?
Ele encolheu os ombros, sua expressão ainda cautelosa e incerta. —
Não pode me consertar, Harry.
— Não preciso ou quero consertá-lo — atirou de volta, irritada com a
ideia. — Não está quebrado, talvez... — sustentou seu olhar enquanto
pensava sobre isso — talvez apenas funcione diferente das outras pessoas.
Não mal, apenas... diferente.
Observou-o, esperando ter dito a coisa certa, aliviada quando ele soltou
um longo suspiro e se inclinou para pressionar a testa contra a dela. — Eu
te amo muito, Harry. Não suportaria que tivesse vergonha de mim, ou...
— Nunca! — Disse, ouvindo sua voz falhar com a palavra enquanto
balançava a cabeça. Puxou-o para perto e deu um beijo feroz em seus
lábios. — Nunca, jamais teria vergonha de você.
— Obrigado — disse, seu sorriso um pouco mais seguro agora.
— Eu que te agradeço — respondeu. — Por confiar em mim.
Ficaram juntos por um longo tempo, abraçados fortes e sem dizer nada,
até que Harriet levantou os olhos.
— Agora — disse, seu tom de negócios. — Não é hora de me mostrar
o que esconde nesta sua oficina secreta? Estou morrendo de curiosidade.
Ele riu, e aquele era o Jasper despreocupado de sua juventude, aquele
por quem se apaixonou, sem nem perceber o que estava acontecendo.
— Tudo bem — falou um pouco tímido. — Acontece que acabei de
terminar seu presente de casamento.
Harriet o encarou. — Me... me fez um presente de casamento? —
Perguntou surpresa por ele ter se dado tanto trabalho. — Oh, Jasper, isso é...
— Não viu ainda —a lembrou, e ela viu um lampejo de dúvida em seus
olhos. — Pode não gostar.
Pegou o braço dele, perguntando-se como nunca tinha notado antes
como estava inseguro, quão frágil era aquele rosto confiante e sorridente.
— Fez para mim, Jasper. Seja o que for, devo considerá-lo
terrivelmente romântico e amá-lo mais do que qualquer outra coisa no
mundo.
Ele pareceu satisfeito com aquilo e pegou sua mão. — Venha então.
18

Senhorita Butler,
Eu aceito suas desculpas. Lamento informar, porém, que não
tenho noção de como lidar com esses sentimentos
inadequados. Sugiro fortemente que nos esforcemos para
evitar um ao outro a todo custo.
Sinto que é o melhor.
Atenciosamente,
De Beauvoir
—Carta do Sr. Inigo De Beauvoir para a Srta. Minerva
Butler.

8 1814. H H ,S .
Harriet não sabia o que esperar quando entrou na oficina, mas
certamente não foi o que viu.
A oficina estava limpa e organizada, era claro que havia um lugar para
cada objeto, e não tinha nada fora do lugar. Harriet olhou em volta,
apreciando o aroma doce e empoeirado da madeira, até que seu olhar
pousou em uma prateleira repleta de objetos esculpidos. Com o coração na
boca, pegou um, mal ousando tocá-lo, pois era muito delicado.
Era um cavalo esculpido, com o pescoço orgulhoso arqueado e a crina
flagrada no exato momento em que joga a cabeça. Havia capturado cada
tendão e músculo na madeira de grão fino com muita precisão.
— Fez... fez isso, Jasper?
Ela se virou para ele, sentindo sua garganta doer de emoção.
Ele assentiu, observando-a atentamente.
— Não sei o que dizer. — Olhou ao longo das prateleiras, para entalhes
de cães e gatos e vacas, ratos e pássaros. Voltou o cavalo para o lugar e
pegou outro, um pequeno arganaz enrolado em um ninho de madeira. — É
um artista, Jasper — disse, alisando um dedo sobre a minúscula criatura
capturada em detalhes perfeitos. Sua voz estava pesada e seus olhos tão
cheios de lágrimas que ele ficou fora de foco quando o olhou.
— Gostaria de ver o que fiz? — Perguntou, e ela assentiu em silêncio,
comovida demais para falar enquanto colocava o pequeno arganaz de volta
na prateleira.
Jasper segurou sua mão e a levou a uma bancada de trabalho robusta
no meio da oficina. Havia algo grande e retangular coberto com um pano e,
quando se aproximou, Jasper estendeu a mão para removê-lo e hesitou.
— Quando disse que era o seu presente de casamento, só quis dizer
que era um dos seus presentes. Vou te dar joias também, é claro, mas... Fiz
isso para o seu enxoval — disse, puxando o lençol que o cobria.
Harriet ofegou e levantou a mão para cobrir a boca.
— Oh, meu Deus — disse, as palavras mais sussurradas do que
faladas. — Minha nossa.
Aproximou-se, incapaz de acreditar no detalhe, no cuidado, no tempo
que deve ter gastado nisso, por ela.
— Posso tocá-lo? — Perguntou.
Jasper riu e acenou. — Claro, é seu.
Harriet passou a mão pela escultura. Uma garota estava sentada
embaixo de uma macieira, lendo um livro. Piscou com força para limpar a
umidade em seus olhos e uma lágrima caiu. Por toda a parte externa do baú
havia mais livros esculpidos na madeira em tamanho real, lado a lado e
empilhados, outros abertos. Leu alguns dos títulos, “A República” de
Platão, “A Ilíada” de Homero, “Um Tratado da Natureza Humana” de
David Hume e romances como “As Viagens de Gulliver”. Como deve ter
sido difícil para ele esculpir a escrita. E não só o fez contra todas as
probabilidades, mas também notou o que ela estava lendo e se deu a tanto
trabalho, sendo que suas próprias dificuldades eram tão desafiadoras para
desfrutar de coisas assim.
Mal conseguiu absorver o que estava acontecendo quando uma emoção
surgiu dentro dela como uma maré crescente.
— É uma nogueira — disse, enquanto Harriet lutava para respirar. —
Lembra-se daquela enorme árvore que explodiu na tempestade, perto do
lago?
Harriet acenou. Amavam aquela árvore, subiam e faziam muitos
piqueniques à sua sombra. Foi como perder um velho amigo quando
souberam que uma terrível tempestade de verão a tinha destruído pela raiz.
Não conseguia pensar em nenhum uso melhor para a madeira do que esse,
com todo o amor e cuidado que tinha sido dispensado a ela. Seu coração
inchou até que pensou que fosse explodir. Como podia ter passado tanto
tempo se sentindo inútil, como claramente se sentia, quando era capaz de
coisas tão extraordinárias? Entendia por que não compartilhava seu trabalho
publicamente; não era bom um conde trabalhar, ainda mais com as próprias
mãos, mas que não as compartilhasse com sua família, seus amigos... Só
agora o entendeu realmente, e percebeu o quão frágil era seu orgulho,
quanta vergonha suportou, e como acreditava que só dependia da sua
aparência.
— Quando fez isso, Jasper?
Olhou-o, incapaz de esconder as lágrimas que caíam livremente agora.
Ele encolheu os ombros, alisando a mão ao longo da parte superior do
baú. — Comecei quando voltei da Rússia — admitiu. — Tenho trabalhado
nisso desde então. Não constantemente, — acrescentou, com um sorriso
irônico — mas durante as vezes que ousei ter esperanças de reconquistá-la.
Nunca desisti de esperar que pudesse mudar sua opinião sobre mim.
Harriet emitiu um som, algo entre uma risada e um soluço, e se jogou
em seus braços. — Eu amei, Jasper. Amei muito. Mais do que qualquer
outra coisa no mundo, e eu o amo.
Ele a beijou, e Harriet afundou em seus braços, sabendo que realmente
era amada. Por mais estranho e impossível que fosse acreditar que aquele
homem lindo e surpreendente a amasse, sabia agora que sim, e não
duvidaria dele novamente.
10 1814, H H ,S .
O piquenique foi uma ideia maravilhosa. Matilda, Harriet, Ruth,
Bonnie e Minerva tinham ido com Henry, Jasper e Jerome, até o lago com
cestas carregadas de guloseimas. Agora, todos estavam com sono, tendo se
empanturrado até o ponto de estourar.
Matilda suspirou e colocou a sombrinha de lado, jogando a cabeça para
trás. O verão decidiu que ainda não estava pronto para entregar o manto ao
outono e estava dando um show final para eles. O sol aqueceu seu rosto,
decidiu que valia a pena arriscar um pouco de sardas para aproveitá-lo.
Faltava pouco para não terem dias como este aquele ano, queria se deleitar
com o que restava do verão.
A tarde preguiçosa foi deliciosa e perfeita; não tão quente a ponto de
deixar todos irritados, mas quente o suficiente para se aquecer na luz
dourada que lustrava cada centímetro de pele exposta. Não havia muita,
naturalmente, mas ainda assim era uma delícia.
Jasper levou Harriet para passear no barco e Matilda sorriu feliz ao ver
os dois se inclinarem e roubarem um beijo. Houve um suspiro melancólico
ao lado dela, e Matilda se virou para ver Bonnie olhando para os dois
pombinhos.
— Pessoas de sorte — disse, apertando os braços em volta de si.
Matilda assentiu, incapaz de discordar. — De fato.
— Não temos tanta sorte, não é? — Bonnie disse sombriamente.
Matilda sentiu seu coração doer, e não apenas por Bonnie.
— Não — disse, pois de que adiantava fingir o contrário? — Mas é
jovem e bonita, Bonnie. Ainda há tempo.
Bonnie balançou a cabeça. — Não — disse, e Matilda ouviu a pressão
em sua voz. — Não, não há. Já disse, estou vivendo um tempo emprestado.
Matilda estendeu a mão e pegou a dela, e Bonnie apertou de volta. —
Não ficará sozinha, Bonnie. Não será esquecida e nem abandonada.
Aconteça o que acontecer, não permitiremos isso. Suas amigas sempre
estarão aqui. Irei para a Escócia e ficarei contigo, prometo. Não importa em
qual fim de mundo tentem escondê-la.
Bonnie fez um som sufocado e então riu, e Matilda a seguiu, piscando
para conter as lágrimas.
— Por Deus, como nos tornamos piegas — disse, balançando a cabeça.
— Isso não pode acontecer.
— Sim, há tempo suficiente para lágrimas e lamentações — disse
Bonnie lutando para ficar de pé. — Não vou perder um minuto do meu
tempo.
Matilda observou, bastante assustada com o que Bonnie queria dizer
quando a jovem pegou seu copo e foi até a beira da água, enchendo-o até a
borda.
— Oh minha nossa — Matilda murmurou ao ver Bonnie correr
infalivelmente em direção a Jerome, que estava cochilando sobre um
cobertor ao sol. Bonnie jogou água nele, e riu quando Jerome se engasgou e
praguejou.
— Ora, sua pirralha! — Gritou, levantando-se, enquanto Bonnie
gritava, largava o copo, levantava as saias e fugia enquanto Jerome corria
atrás dela.
— Vou jogá-la no lago, Bonnie Campbell — Jerome avisou enquanto a
perseguia.
Bonnie gargalhou e se virou, mostrando a língua para ele.
— Tem que me pegar primeiro, seu tolo — provocou, antes de correr
em direção às árvores.
— Minha nossa, como é ousada — Minerva disse, balançando a cabeça
com admiração quando ela e Ruth vieram se sentar ao lado de Matilda.
— Sim — Matilda disse preocupada, enquanto se perguntava como
trazer Bonnie de volta, antes que tivessem outro escândalo para enfrentar.
— Gostaria de ter metade da sua coragem — Ruth admitiu com um
suspiro. — Cada vez que penso no meu desafio, tremo nas minhas botas.
— Dizer algo totalmente ultrajante para um homem bonito? —
Minerva disse, sorrindo. — Tenho certeza de que vai pensar em alguma
coisa. Precisa de uma testemunha, no entanto. Precisamos de provas.
Matilda olhou para Ruth preocupada.
— Alguém sabe quando Bonnie completará seu desafio? — Perguntou.
— Tenho um pressentimento de que escolherá o baile de noivado.
Ruth e Minerva balançaram a cabeça.
— Não, ela tem estado muito quieta sobre isso — Ruth admitiu, o que
foi a coisa mais preocupante que poderia ter dito.
Bonnie nunca ficava quieta sobre nada. Isso significava que estava
tramando algo. Seu desafio, usar um disfarce em público, era o tipo de coisa
que Bonnie teria prazer em levar longe demais, provavelmente se arruinaria
a ponto de não ter salvação.
— Oh, não fique tão surpresa — disse Ruth sorrindo para Matilda. —
Sei que é bastante selvagem, mas não é boba. Acho que está apenas
juntando seus botões enquanto pode, parece que não poderá escapar de
Gordon Anderson, não importa o que faça, ou quão mal se comporte.
Morven está perdendo o juízo. Está ameaçando mandar o brutamontes aqui
para carregá-la de volta para a Escócia. Mesmo que tenha se arruinado
nesse ínterim, não escapará; disse isso a ela. Vai se casar com Gordon
Anderson, a menos que outra pessoa se case com ela primeiro, suponho,
mas não há sinal disso. O conde está decidido a fazê-lo.
— Alguém sabe alguma coisa sobre esse tal de Anderson, além do que
Bonnie diz? — Matilda perguntou, desejando que houvesse algo que
pudessem fazer.
Ruth fez uma careta e balançou a cabeça. — Não, mas cada vez que
fala dele as descrições ficam mais e mais terríveis. Admito que acho difícil
acreditar que qualquer homem seja tão vil quanto o pinta. Espero que não,
pelo bem dela.
Matilda assentiu, em total concordância. Gordon Anderson havia se
tornado uma lenda para as Senhoritas Peculiares, quando as descrições de
Bonnie do homem pintaram um quadro vívido de um bruto ignorante, que
comia crianças pequenas no café da manhã, cheirava a chiqueiro e tinha
tanto apelo pessoal quanto uma dose de tifoide. Estavam todas divididas
entre sentir uma pena desesperada de Bonnie por ter que enfrentar um
destino nada invejável, e morrer para ver o homem em carne e osso.
— Pelo menos será uma condessa um dia — Ruth disse com um
suspiro. — Parece que o último herdeiro direto de Morven morreu mês
passado, e Anderson é seu parente mais próximo.
— Mesmo? — Matilda disse espantada. — E o conde ainda quer que
se case com Bonnie?
Não que quisesse dizer isso de maneira desagradável, mas parecia
estranho. Pelo que sabia sobre Bonnie, não vinha de nenhuma grande
família e - a julgar pela quantidade de problemas que causou a Morven até
agora - as pessoas poderiam pensar que a única coisa que ele queria era se
livrar dela, não fazer com que se casasse com seu herdeiro.
— Aparentemente, foi uma promessa no leito de morte ou algo assim
— disse Ruth com um suspiro. — O pai de Bonnie era leal a Morven e um
grande amigo. Morven jurou encontrar um bom marido para Bonnie e
cuidar dela, antes que o homem morresse. Apesar de ser um desnaturado,
Morven gosta dela. Acho que admira seu espírito e, de certa forma, até
gosta da forma como o desafia. Ela me mostrou uma de suas cartas uma
vez, e era muito afetuosa, de uma maneira insultuosa, um tanto grosseira de
falar — Ruth acrescentou com uma carranca. — Eles não se contêm, posso
lhe dizer. Na verdade, era bastante revigorante.
— Posso imaginar — Matilda disse com um suspiro. — Como é
libertador dizer o que quiser para um homem que diz exatamente o que
pensa.
— Bastante — Ruth respondeu, balançando a cabeça.
— Oh, não sei — elas se viraram para Minerva, que havia estado
quieta até agora e olhava o lago, sua expressão preocupada. — Muita
honestidade pode ser bastante brutal.
Matilda se perguntou o que queria dizer com aquilo, mas não conhecia
Minerva bem o suficiente para bisbilhotar. Franziu a testa, decidindo que
deveria remediar isso.
— O que vai vestir para o baile, Minerva? — Perguntou, pensando ser
um assunto seguro para se envolver com a moça.
— Não faço ideia. Realmente não pensei sobre isso.
Ruth e Matilda trocaram um olhar. Quando a conheceram, Minerva
parecia uma criatura superficial que só se importava com a aparência.
Aprenderam que havia muito mais coisas nela do que isso. Mesmo assim,
estava sempre bem-vestida e obviamente cuidava muito de seu aspecto.
— Bem, por que não vem ao meu quarto mais tarde, me ajudar a
escolher? Sempre está tão linda, Minerva. Eu deveria receber seu conselho.
Minerva pareceu surpresa com o convite, mas satisfeita. — Mesmo?
Vou gostar muito disso. Embora não tenha a menor ideia de porque quer
minha ajuda. Todo mundo a olha, Matilda, certamente sabe disso?
Matilda deu uma risadinha, um pouco pesarosa. — Bem, para uma
velha solteirona, suponho que não apresento uma imagem tão terrível —
disse com uma peculiaridade nos seus lábios. — Mas, mesmo assim, um
novo par de olhos é sempre uma coisa boa.
— Bem, é melhor me ajudarem então, ou acabarei escolhendo algo
diabólico. Não sei o que me deu para comprar aquele chapéu com as
cerejas. Era uma touca tão bonita também, mas quando a coloquei ontem,
percebi o quão terrível ficou em mim — Ruth suspirou pesadamente e
balançou a cabeça. — Simplesmente não tenho o corpo certo para usar
essas coisas.
— Bobagem — Matilda disse firmemente. — Precisa de cortes
simples, Ruth, e desenhos mais belos, só isso. Sem babados e frescuras. O
que acha, Minerva?
Minerva assentiu, seu olho especialista viajando sobre Ruth. — Sim,
está certa. Digo, por que não examinamos o guarda-roupa de Ruth também
e encontramos algo deslumbrante para ela?
— Oh — Ruth disse encantada com a oferta. — Ah sim, por favor.
— Está resolvido, então — disse Matilda, sorrindo com satisfação até
que seus olhos se desviaram para a linha das árvores, e percebeu que
Bonnie e Jerome ainda não haviam retornado.
19

Acho que nunca poderei me perdoar pela maneira como tratei


Jasper, por como o deixei infeliz. Sempre que penso nisso
agora, meu coração dói e tenho vontade de chorar. Se ele
tivesse me contado, confiado em mim, eu teria ido até os
confins da terra para ajudá-lo, para guardar seu segredo.
Como pode acreditar que eu pensaria menos dele quando o
idolatrei por tanto tempo?
Se ao menos eu soubesse. Se ao menos tivesse entendido.
Como é tolice desejar mudar o passado e, no entanto, desejo,
mas agora tenho o futuro diante de mim, nosso futuro, e
nunca mais o decepcionarei. Jamais permitirei que ninguém o
faça se sentir inferior ou qualquer coisa menos do que o
homem brilhante e maravilhoso que é. Direi a ele todos os dias
o quanto o amo e admiro, e não será nada menos do que a
verdade.
—Trecho de uma anotação da Srta. Harriet Stanhope
em seu diário.

18 1814. H H ,S .
— Gostou? — Jasper considerou a expressão de espanto no rosto de
Harriet com diversão.
— Se eu gostei? — Harriet respirou, olhando para a caixa forrada de
seda que Jasper acabara de lhe apresentar. — Oh, Jasper é lindo.
Ele sorriu. — São rubis, mas procurei as pedras mais rosas que pude
encontrar. Sei que rosa é a sua cor favorita.
Ela olhou para ele, seus lábios se curvando em um sorriso encantado.
— Como sabe disso?
Ele encolheu os ombros. — Usa rosa com mais frequência do que
qualquer outra cor.
Harriet balançou a cabeça, rindo baixinho. — Não o mereço, Jasper.
Depois de todas as coisas terríveis que pensei e disse.
Jasper riu e se abaixou, beijando o lado do pescoço dela, satisfeito ao
sentir o arrepio percorrê-la. — Acho que estamos empatados nisso, amor,
mas pode me compensar se insiste.
— Insisto, e vou passar o resto dos meus dias fazendo exatamente isso,
juro — disse.
O tom dela fez com que o sangue corresse quente em suas veias e
desejou que não houvesse um baile para assistir, mas havia, e era em
homenagem a Harriet e queria que ela aproveitasse.
— Coloque-os, então — disse impaciente.
— Tenho medo de tocá-los — admitiu. — Faça-o, por favor.
Jasper colocou a caixa na mesa. Dentro havia um conjunto de rubi e
diamante que combinaria perfeitamente com o vestido rosa profundo que
ela estava usando. Ergueu o colar primeiro e ela se virou para que ele
pudesse prendê-lo no seu pescoço. Em seguida, prendeu a pulseira em torno
de seu pulso esguio e entregou-lhe os brincos, um de cada vez, observando
enquanto ela se olhava no espelho para fixá-los.
— Nunca usei nada tão bonito na vida — disse Harriet, parecendo um
tanto sem fôlego ao se virar de um lado para o outro diante do espelho.
— Não tão bonita quanto você — disse Jasper, ainda vendo a
expressão de dúvida nos olhos de Harriet. — É verdade — insistiu. — Ele
brilha ao seu redor, amor, e tira o meu fôlego.
Puxou-a contra ele, de forma que ficasse de costas para seu peito, e se
inclinou para dar um beijo em seu ombro.
— Eu te amo, Jasper — disse, e ele olhou para cima para ver seus
olhos brilhando de emoção. — Eu te amo tanto.
Jasper sorriu, a verdade de suas palavras estabelecendo-se em seu
coração enquanto a apertava um pouco mais forte. — Também te amo —
estava espantado com o quanto era fácil dizer aquilo agora, com o quanto
era simples, não havia mais mal-entendidos e mágoas. — Agora então —
disse contra sua pele enquanto beijava um caminho ao longo de seu
pescoço, observando a cor subir em suas bochechas até rivalizar com os
rubis que usava. — Acho melhor saudarmos nossos convidados, ou não vou
deixá-la sair deste quarto.

— Muito obrigada, Tilda. Você e Minerva fizeram um verdadeiro


milagre. Três pessoas já me elogiaram pelo vestido esta noite.
Os olhos de Matilda vasculharam o salão, procurando, e demorou um
pouco para perceber que Ruth estava falando com ela. — O quê? Oh! Oh,
perdoe-me, Ruth, estava distraída, não precisa agradecer.
Ruth franziu a testa, seus olhos escuros preocupados. — Algo a está
incomodando? Perguntou, colocando a mão no braço de Matilda. — Parece
um pouco nervosa.
— Não! — Matilda disse, fixando um sorriso brilhante e balançando a
cabeça, o pequeno trinado de riso que deu soou falso e frágil, no entanto, e
Ruth não estava claramente convencida. — Não, não tem nada me
incomodando. Estou apenas feliz por Harriet e St. Clair, e bastante
preocupada com Bonnie — acrescentou, esperando desviar a atenção de si
mesma.
Além disso, era verdade.
Ruth seguiu seu olhar para onde Bonnie estava dançando com o irmão
de Harriet, Henry. Estava rindo, a cabeça jogada para trás e cada parte dela
saltando com exuberância enquanto se jogava no momento, como sempre.
Henry parecia divertido e ligeiramente atordoado, o que parecia ser o caso
da maioria dos que assistiam. O olhar de Matilda viajou para Jerome, que
também estava observando Bonnie dançar com um riso brilhando em seus
olhos azuis.
— Ela está se divertindo — disse Ruth com cautela.
— Sim — Matilda respondeu com um suspiro. — Está mesmo.
— Ainda não disse nada sobre seu desafio?
Matilda balançou a cabeça. — Não para mim.
—Bem — Ruth encolheu os ombros e deu a Matilda um sorriso
simpático. — Contamos com o seu bom senso e orientação, Matilda, mas
não é nossa mãe e não é responsável por nossos atos. Somos mulheres
adultas e nossas decisões são nossas. Não deve estragar sua própria
diversão preocupando-se com todas nós. Bonnie fará o que quiser, para o
bem ou para o mal. Avisou-a para ter cuidado, agora cabe a ela dar atenção
às suas palavras ou ignorá-las.
— Eu sei — disse baixo, mas sinceramente. Cada um faz suas próprias
escolhas por seus próprios motivos. Às vezes, essas escolhas parecem
incompreensíveis para qualquer um que observe de fora, mas ninguém sabe
o que se passa no coração e na mente de outra pessoa. — Meu Deus, está
calor aqui — disse, sentindo o desejo urgente de mudar de assunto.
Matilda pressionou o copo que segurava contra a bochecha, mas a
bebida estava morna e não oferecia alívio. Espontaneamente, em sua
memória surgiu uma cena de um copo com gelo e o choque do frio contra
sua pele, de um caminho sombreado e um homem em quem não tinha que
pensar. Pare de se comportar como uma tola, se repreendeu. Não era de se
admirar que Ruth achasse que estava sempre nervosa, pois estava, e sempre
esteve desde que Lady St. Clair a avisou que havia convidado Montagu. Era
impossível não o ter convidado, disse a Matilda com simpatia nos olhos,
não quando sabiam que ainda estava na área.
Matilda ficou imóvel, ciente da onda repentina de interesse que ecoou
por todo o salão. Entre os dançarinos, entre os flashes de cor que passaram
por ela, olhou para a entrada, e a figura alta e impecável que estava lá,
observando-a através do vasto espaço. Disse a si mesma que não podia ver
o prateado invernal estranho de seus olhos de onde estava. Agora que o gelo
que procurava para arrefecer a sua pele arrepiou-a, seguiu-se o calor. Que
enigma ele era, tão frio, e mesmo assim fazia-a arder sem nada mais do que
um olhar.
Matilda sustentou seu olhar por um longo momento, seu coração
batendo forte no peito como algo preso, e então lhe deu as costas e foi
embora.
Jerome se serviu de outra bebida. Embora não devesse, precisava de
algo para acalmar seus nervos. Estava com um problema muito grande e
não conseguia ver como sair dele. Como Bonnie o convenceu a entrar em
um esquema tão confuso, não conseguia entender. O problema era que,
quando estava com ela, tudo era uma brincadeira. Era engraçada e vivaz, e
o fazia rir como ninguém conseguiu antes. Também era ousada e
surpreendentemente inteligente. A verdade é que nunca se divertiu tanto na
vida, mas sabia que as coisas estavam saindo do controle. Também sabia
que seu irmão tinha notado, estava inexoravelmente perto de ter sua cabeça
removida de seus ombros.
Já havia recebido um aviso severo, mas, se Jasper ficasse sabendo
dessa aventura, certamente faria uma visita a algum pequeno píer. No
entanto, achava impossível recusar ao pedido de Bonnie. Esses eram seus
últimos dias, disse-lhe, sua última chance de viver e se divertir um pouco
antes de Morven enviar seu futuro marido para buscá-la e levá-la para as
regiões selvagens da Escócia.
Algo desconfortável puxou a consciência de Jerome e a acalmou. Não
foi ele quem a condenou a um casamento infeliz com um homem que não
suportava. Não era como se tivesse lhe dado o menor motivo para ter
esperanças com ele também. Deixou claro que nunca poderiam ser mais do
que amigos, e Bonnie riu e disse que era um idiota. Não esperava mais uma
oferta de Jerome do que criar asas e voar. No entanto, não estava indiferente
ao olhar nos olhos dela, tinha sido um miserável absoluto por tomar
liberdades, sabendo que sentia algo por ele. Não que tivesse sido ideia dele.
Tentou agir como um cavalheiro, mas Bonnie não queria isso. Ela sabia o
que queria e era preencher esses últimos dias com lembranças que a
aquecessem e a fizessem sorrir quando se casasse e lhe cortassem suas asas
para sempre.
Parecia improvável, na melhor das hipóteses, que alguém conseguisse
cortar as asas de Bonnie e subjugar seu espírito agitado, e Jerome só
poderia se perguntar se Gordon Anderson tinha a menor ideia do que estava
fazendo. Ter uma Bonnie relutante como esposa parecia uma receita para
um desastre em uma escala apocalíptica, mas não era da sua conta. Era seu
amigo e concordou em ajudá-la a viver como desejava até que seu tempo
acabasse, que Deus o ajudasse. Era de sua natureza ajudar uma donzela em
perigo, embora nunca tivesse conhecido uma com noções tão estranhas de
resgate antes. Jerome não tinha entendido com o que estava concordando
quando ela extraiu aquela promessa dele, e só agora percebeu o quão idiota
tinha sido. Sua promessa o limitou, no entanto, não podia fazer nada além
de seu melhor para evitar um escândalo. Gemeu por dentro. Evitar
escândalo não era algo em que se destacasse.
— Aí está, meu velho. Tenho lhe procurado em todos os lugares!
Jerome estremeceu, arrancado de seus pensamentos por um forte tapa
nas costas. Irritado com a voz desconhecida, virou-se com uma carranca
para encarar o jovem que estava sorrindo para ele.
— Quem diabos é? — Começou, apenas para as palavras morrerem em
sua boca quando viu os olhos verdes pálidos incomuns que eram muito
familiares.
— B-Bonnie? — Gaguejou, enquanto seu coração saltava para a
garganta.
— Não me reconheceu, não é? — Gritou, seu rosto iluminado com
triunfo. — Eu disse que podia fazer isso.
Jerome engoliu em seco e a olhou de cima a baixo. — Maldição do
Inferno, será a minha morte, Bonnie Campbell. Oh, Senhor, seu cabelo!
Bonnie, o que fez com seu cabelo?
Ela encolheu os ombros, aparentemente despreocupada, embora
houvesse um brilho naquelas profundidades verdes pálidas que lhe disse
que ela não estava tão otimista quanto parecia.
— Está na moda usar cabelo curto — disse desafiadoramente. — E
dificilmente posso passar por um homem com o cabelo comprido, posso?
Jerome a pegou pelo braço e puxou-a para um canto silencioso. — Isso
é uma loucura — disse, resistindo à vontade de sacudi-la. — Nós seremos
pegos e estará arruinada, e meu irmão irá me prender, se não me mandar
para Bedlam primeiro.
Bonnie sacudiu seu braço e o olhou. — Não importa se serei arruinada,
não vê? Não vai mudar nada. Ainda terei de me casar com meu primo, não
importa o que eu tenha feito, então podem me enforcar, eu sendo uma
ovelha negra ou um cordeiro. E não tente se esquivar agora, deu a sua
palavra.
Jerome amaldiçoou e esfregou a mão no rosto. Estava certa, droga,
tinha a honra de fazer o que havia prometido. — Tudo bem — falou,
zangado consigo mesmo, com ela e com toda essa situação ridícula. —
Tudo bem, vou levá-la, mas não venha correndo para mim quando tudo der
errado.
— Eu não sonharia com isso, e não vai — Bonnie disse suavemente.
— Afinal, não me reconheceu e sabia o que eu estava fazendo.
— Por cerca de cinco segundos — respondeu e então soltou um
suspiro, balançando a cabeça. — Vou me arrepender muito disso.
— Ora, não seja assim —persuadiu, pegando sua mão e apertando-a.
— Vamos nos divertir, prometo.
Jerome olhou para ela, para sua óbvia excitação, a curva de seus lábios
exuberantes e o brilho malicioso em seus olhos. — Não duvido, sua
diabinha. Só me pergunto por quanto tempo vou pagar por isso depois.
— Vai valer a pena — disse com os olhos fixos nos dele, algo em sua
voz que fez a antecipação chacoalhar a sua espinha. — Prometo.
Assentiu, acreditando nela, porque sempre acreditava nela. — Sei —
disse, antes de dar uma risada curta. — Bem, então se vamos para o inferno,
podemos muito bem fazer isso com estilo. Como devo chamá-lo, senhor?
Bonnie sorriu, e na alegria feroz daquele sorriso irreprimível todas as
terríveis consequências desapareceram e não havia nada além daquele
momento, aquela aventura ridícula.
— Bartholomew Camden. Um primo distante por parte de mãe, Jerry,
meu velho.
Jerome bufou, desarmado por seu entusiasmo, e uma bolha de riso
cresceu dentro dele. — Bem, primo, estou muito feliz em conhecê-lo. Por
que não saímos daqui e encontramos um lugar mais animado?
— Pensei que nunca perguntaria — Bonnie disse, dando a ele uma
pequena reverência. — Em frente, Macduff.
— Na verdade é ‘avante’ — Jerome a corrigiu, mas Bonnie apenas
bufou e revirou os olhos.
— Cale a boca e venha — repreendeu e arrastou-o para fora do salão
pelo braço.
— Um casamento de amor, ao que parece.
O coração de Matilda saltou para a garganta ao som da voz familiar
perto dela.
Forçou-se a não se virar e não reagir. — É certamente isso, milorde.
Continuou a assistir Jasper e Harriet dançando, a felicidade era tão
óbvia que irradiava pelo salão, mas não eram eles que prendiam sua atenção
agora. Matilda podia sentir Montagu parado atrás dela, sentir o calor dele
um pouco perto demais. Se fechasse os olhos, poderia ser capaz de detectar
seu cheiro também, aquela combinação intrigante de bergamota e pele
masculina limpa, o leve traço de couro e cavalos... embora talvez estivesse
diferente dessa vez, já que teria chegado de carruagem. O desejo de se
inclinar e cheirá-lo era tão ultrajante que quase sorriu.
— Que estranho — ele meditou. — Quando todos acreditavam que ela
o odiava e ele a considerava uma rata de biblioteca.
— As aparências enganam.
Seu tom era irônico, e se perguntou se ele sorria ou se sentia um pouco
culpado por todas as calúnias ligadas a seu nome por causa dele. Embora
quisesse se virar e estudar seu rosto, Matilda continuou a observar Harriet e
Jasper, tentando parecer indiferente à sua proximidade.
— É o que parece, já que foram pegos em errm... circunstâncias
delicadas.
Matilda se virou então para encarar aqueles olhos frios e prateados que
a assombravam há tanto tempo. Um leve sorriso tocou os cantos de sua
boca, suavizando pouco as linhas austeras de seu rosto. Seu cabelo cintilava
com um brilho dourado sob a luz das velas, o intenso preto e branco de seu
traje de noite formal apenas destacava sua coloração extraordinária.
— Sempre se amaram. O que aconteceu entre os dois foi apenas uma
sequência de mal-entendidos e falta de comunicação. Se ao menos tivessem
conversado, se tivessem sido honestos, as coisas poderiam ter sido
resolvidas há muito tempo.
Ele concordou com o que disse, surpreendendo-a. Presumiu que ele
faria algum comentário cortante, mas não. — A honestidade deve ser
valorizada acima de todas as coisas.
Matilda o observou atentamente por um momento. — Acredita nisso.
— Acredito — disse, olhando-a intensamente. — Mas às vezes é um
luxo que não podemos ter.
Matilda bufou sem humor. — Isso não é verdade — disse, — pelo que
me lembro das falsidades que o senhor proferiu para me levar ao Green
Park com o senhor. Não, de fato, parece o tipo de coisa que um marquês
diria para se sentir melhor por ter mentido.
— Nunca minto — disse, sua voz fria, cortada e um tanto zangada. —
E esse é o caso em discussão. Sabia que eu não estava falando a verdade tão
bem quanto eu. Estava simplesmente administrando a situação a meu favor
e a senhorita sabia disso. Sempre fui honesto com a senhorita.
— Honesto até demais, milorde — retornou com um sorriso tenso,
desejando que a deixasse.
Falar com ele era como dançar em volta de uma lâmina: mais cedo ou
mais tarde tropeçaria e acabaria em pedaços.
Ele se aproximou, mais ainda, seu hálito quente contra o pescoço dela
e o que disse a seguir fez seu corpo tremer. — Eu a quero muito, Srta. Hunt.
Passo muito tempo pensando na senhorita, em como seria tomá-la em meus
braços. O que acha dessa honestidade?
Matilda se manteve quieta, recusando-se a esboçar qualquer reação,
embora suas palavras tivessem acendido seu sangue e suas terminações
nervosas estivessem estalando como pequenos fogos de artifício sob sua
pele.
— Eu sei — respondeu, orgulhosa de si mesma pela frieza de sua
resposta, pelo fato de sua voz não ter tremido quando o resto dela fizesse
exatamente isso.
Seus dedos deslizaram ao redor de seu pulso, gentil, mas firme, e seu
pulso trovejou sob seu toque, sua pele queimando contra a dela como se ele
estivesse marcando sua carne.
— A senhorita já aceitou o Sr. Burton?
A pergunta a pegou de surpresa e corou antes que tivesse tempo de se
recompor. Seu toque tinha dispersado seu juízo e feito seu coração bater
forte em seu peito como um animal selvagem.
— Não.
— Por que não? — Perguntou. — Ele é rico e bem apessoado, oferece
tudo o que a senhorita quer, não oferece?
— E o senhor espera que eu acredite que o senhor se lembre do que
quero, muito menos que se importe, milorde? — Matilda perguntou,
desejando ter forças para se desvencilhar de seu aperto.
Em vez disso, afastou-se de seu olhar penetrante. A raiva e a frustração
com a força de sua reação a deixava frágil. Olhou ao redor, se perguntando
se alguém estava assistindo a troca, mas todos os olhos ainda estavam em
Harriet e Jasper.
— Um lar, filhos e casamento com um homem que a ame e honre.
Matilda sentiu sua respiração prender enquanto ele recitava com
precisão, as palavras que ela havia dito.
— A senhorita disse que não importava se era um lorde ou um
comerciante, a senhorita disse que o amaria de todo o coração e lhe daria
tudo que ele poderia sonhar.
Matilda não pôde fazer nada além de se virar, e olhar para aqueles
surpreendentes olhos prateados, tão presa a sua presença como se sua mão
fosse uma algema, segurando-a, quando, na verdade, apenas acariciava seu
pulso com o mais leve toque. Ele se lembrava do que ela disse, palavra por
palavra.
— Por que a senhorita não disse sim, já que ele oferece tudo o que a
senhorita sonha?
Havia algo quente e perturbador ardendo em seus olhos, e a sua
indagação ecoava uma pergunta idêntica, uma que tinha circulado o seu
cérebro incessantemente e que não a abandonava. Seu polegar acariciou o
interior do pulso dela, aquele leve toque ligeiro ligando-se imediatamente a
um lugar muito mais íntimo, fazendo com que o seu corpo conspirasse
contra o bom senso como se estivesse pulsando sob a sua pele. Matilda
lutou para manter a respiração uniforme, lutou para encontrar uma resposta
quando não tinha nenhuma. Considerou dizer-lhe que tencionava aceitar o
Sr. Burton assim que regressasse à cidade, mas não estava nada certa de que
fosse verdade e descobriu que não queria mentir para ele, por mais tolo que
isso fosse.
— Eu... — começou e então soltou um suspiro. — Não sei — admitiu,
ofegante. — Ele me oferece muito do que eu esperava, apenas...
— Apenas...
Matilda olhou-o surpresa. Havia uma ponta feroz na pergunta, um
indício de algo que talvez ele não quisesse revelar. Encontrou seu olhar e,
por nenhuma razão que pudesse pensar, disse a verdade.
— Porque não o amo, porque temo que deseje me ter como faria com
uma pintura ou um belo cavalo, e ele... me assusta um pouco.
— Mais do que eu?
Sua voz era suave agora, arrepiando sua pele como uma carícia
enquanto seu polegar deslizava para cima e para baixo em seu pulso, e
então se acomodou no lugar onde sua pulsação trovejava, frenética de medo
e desejo. Matilda engoliu em seco e se obrigou a lembrar o que ele queria
dela.
— Não — disse duramente, firme e honestamente. — Não, não tanto
quanto o senhor, Milorde Montagu. Então, se me der licença, acredito que
prometi esta dança para St. Clair.
Matilda se virou, puxou o pulso de sua mão e saiu correndo.
20

Eu sei que não deveria ter feito isso, mas eu o amo, e foi tão
maravilhoso, tão perfeito. Eu o amo tanto que chega a doer.
Que opção eu tinha?
Oh Senhor, estou tão infeliz.
—Trecho de uma anotação de uma das Senhoritas
Peculiares em seu diário.

19 1814. H H ,S .
Era uma tarde quente, mas o aroma do Outono permanecia no ar, o sol
dourando as cores à sua volta para tons mais profundos de vermelho e
dourado à medida que o Verão finalmente cedia lugar. Todos estavam
lânguidos hoje, sonolentos e satisfeitos depois de uma manhã preguiçosa
recuperando dos excessos da noite passada.
— Estou tão cansada — disse Minerva abafando um bocejo. — E meus
pés doem. Acho que nunca dancei tanto.
— Foi uma festa esplêndida, não foi? — Ruth perguntou pousando sua
xícara de chá.
Matilda acenou positivamente para a Senhorita Peculiar que fazia
companhia para ela no terraço, aproveitando a tarde.
— Esplêndida — concordou, virando para olhar Harriet.
Como sempre, a jovem estava com um livro nas mãos, mas não estava
absorta nele como de costume. Em vez disso, seus olhos estavam fixos em
uma figura que caminhava pelos jardins, com uma expressão tão cheia de
adoração, que Matilda sentiu sua garganta apertar.
Ruth seguiu seu olhar até onde Lorde St. Clair estava conversando
profundamente com seu irmão. Matilda suspeitou que Jerome estivesse
recebendo uma bronca. Observaram Harriet pousar o livro, se levantar e
caminhar em sua direção. St. Clair se virou antes mesmo que tivesse
chegado, como se soubesse que estava lá. Levantou a mão e Harriet correu
os últimos passos, alcançando-o para beijá-lo, enquanto Jerome virava de
costas para o casal feliz e fingia não notar.
— Acredita que existe esperança, por menor que seja, de se encontrar
algo assim ou isso acontece apenas com amigos de infância? — Ruth
perguntou suspirando melancolicamente. — Como com Kitty e Luke.
— Meu irmão se apaixonou por Alice quando a viu pela primeira vez
— disse Matilda sorrindo. — Acho que o amor funciona de forma diferente
para cada pessoa, mas se o encontrar, deve segurá-lo com força, pois pode
não ter a mesma sorte de Harriet para ter uma segunda chance.
— Concordo — disse Minerva. — Acho que deve ser corajosa e
persegui-lo, mesmo que pareça impossível.
— Acho que nunca vou saber — falou Ruth, embora não tivesse dito
aquilo de forma desesperada, apenas aceitando o seu destino. — Acho que
seria tolice da minha parte esperar por algo assim.
— O que espera? — Matilda indagou, perguntando-se se Ruth estava
certa. No caso dela, temia que tudo fosse verdade e que deveria tomar
cuidado com o que falava.
Ruth deu seu sorriso pragmático e colocou as mãos no colo, tomando
um momento para considerar a pergunta. — Espero agradar papai e deixá-lo
orgulhoso, casando-me com um homem nobre para elevar a família, como
ele sonha que eu faça. Espero que esse homem e eu possamos ser amigos e
aliados e que possamos nos deixar confortáveis e talvez até mesmo
contentes. Espero ter filhos para amar, uma casa para administrar e uma
posição de respeito e segurança. É isso que espero. E você?
— Espero poder ficar satisfeita com tudo o que acabou de dizer —
respondeu Matilda sinceramente. — Pois sei que também é tudo que
deveria desejar, e teria que ser mais do que suficiente, mais do que tenho o
direito de esperar, dadas as minhas circunstâncias.
— Não é o que quer de verdade, é? — O tom de Ruth era simpático e
compreensivo demais.
— Claro que não!
Ruth e Matilda se entreolharam, surpresas com a declaração concisa de
Bonnie. Matilda pensou que ela estava dormindo, já que estava deitada e
com os olhos fechados desde a última meia hora, mas, aparentemente,
estava participando da conversa.
— Como podem esperar ficar apenas confortáveis e contentes? —
Perguntou indignada, assustando-as com a força de sua explosão. Parecia
zangada e seus olhos brilhavam com a ameaça de lágrimas. — Talvez essa
seja a melhor opção que a realidade nos dá, mas certamente esperam mais
do que isso, não esperam? Não esperam e sonham com um grande amor,
com a felicidade e uma vida repleta de todas essas coisas, uma que valha a
pena ser vivida, uma que toque os outros e os mude?
Matilda estendeu a mão e pegou a de Bonnie, apertando-a com força.
— Sim, — disse, segurando firme. — Sim, espero. É claro que sonho com
isso.
— Eu também — Ruth admitiu, estendendo a mão e pegando a outra
de Bonnie. — Embora esteja ciente de que é uma esperança vã, ainda sonho
com isso.
— E eu — Minerva disse ao levantar e colocar os braços em volta de
Bonnie, e depois beijar sua bochecha. — Sonho com coisas impossíveis o
tempo todo, todos os dias, e não vou parar, embora isso me torne uma boba.
— Não uma boba — disse Bonnie ferozmente. — Isso faz com que
viva, me recuso a viver como se estivesse com um pé na cova. Pelo menos
ainda não, não vou desistir!
Matilda estendeu a mão e bagunçou os cachos curtos de Bonnie.
Embora tivesse que admitir que o penteado ousado combinava com ela,
todos ficaram chocados com sua aparência naquela manhã, ainda mais
quando consideraram como ela se desculpou na noite anterior e se retirou
para o quarto com uma dor de cabeça... cabeça essa que estava cheia de
cabelo. Por enquanto, Matilda não ousou perguntar o que andou fazendo.
— Morven escreveu de novo? — Matilda perguntou, desejando que
houvesse algo que pudesse fazer, quando Bonnie a olhou sombriamente e
balançou a cabeça.
— Não vai voltar a escrever — disse, olhando fixamente o irmão de St.
Clair, enquanto os dois homens passeavam com Harriet no lago. — Ele
disse tudo o que tinha para dizer.
— Bem, de certo que não pode ir embora antes do casamento —
Minerva disse, sentando-se novamente. — Lady St. Clair foi muito
generosa, nos oferecendo a estadia até o grande dia. Portanto, temos pelo
menos duas semanas inteiras, e com esse novo corte de cabelo arrojado,
está fadada a chamar atenção, Bonnie. Talvez algum cavalheiro se apaixone
à primeira vista.
Bonnie bufou. — Chamar a atenção é suficientemente fácil. Tenho
feito isso toda a minha vida, embora não pelas razões certas. Difícil é fazê-
los nos enxergar, ver além de tudo o que pensavam querer, as coisas que são
importantes, as coisas que realmente precisam — suspirou e fechou os
olhos novamente. — Ah, sou uma tola e estou sonhando com coisas
impossíveis, assim como Minerva disse, mas irei até o fim, pois não há
mais nada que eu possa fazer.
— Assim como todas nós — Matilda disse, Ruth e Minerva assentiram
e concordavam com o que havia dito.
Os olhos de Bonnie se abriram novamente e ela olhou de Matilda para
Ruth e depois para Minerva. — Sou muito grata pela amizade de todas —
disse, com um sorriso verdadeiro nos lábios —, apesar de todos os
problemas que causo e de todos os conselhos aos quais não dou ouvidos,
nunca se esqueçam disso. Sei que fui abençoada com minhas amigas e isso
é mais do que muitas pessoas conseguem. Obrigada por me aturarem, —
adicionou com humor.
— É um grande prazer, Bonnie, e acredito que todas nós diríamos o
mesmo, de como somos abençoadas por ter amigas. Às Senhoritas
Peculiares — Matilda disse levantando sua xícara para fazer um brinde, as
outras a acompanhando. — E aos nossos futuros, seja o que for que
aconteça.

2 1814. H H ,S .
O casamento foi informal e realizado na capela privativa de Holbrooke
House. O irmão de Harriet a entregou, pois, a carta, informando seus pais
sobre suas núpcias, provavelmente não os teria alcançado ainda. Lady St.
Clair garantiu a Harriet que sua mãe sempre teve esperança de que ela se
casasse com Jasper, e não havia razão para atrasar o evento. Era melhor não
abusar da sorte, de qualquer forma. Harriet precisava da proteção do nome
de Jasper e ele estava ansioso demais para concordar com a menor demora
que fosse.
Harriet ficou feliz com isso e orgulhosa por seu irmão levá-la até o
altar. Após seu choque inicial, Henry parecia muito satisfeito por seu
melhor amigo estar se casando com sua irmã, embora ainda parecesse um
pouco confuso com a ideia.
As Senhoritas Peculiares também compareceram. Kitty voltou
correndo com seu novo marido a reboque, sem dar atenção aos protestos de
Harriet por terem interrompido sua lua-de-mel, e quase a derrubou em seu
exuberante deleite ao ver sua amiga novamente, e em tão felizes
circunstâncias. Prue e seu marido, o duque de Bedwin, chegaram com a
irmã de Bedwin, Lady Helena, todos entusiasmados com o sucesso do
último livro de Prue, que estava ganhando o mundo em uma velocidade
exorbitante. O irmão de Matilda, Nate, e uma Alice florescente, também
compareceram. Agora que os primeiros três meses de sua gravidez haviam
passado sem incidentes, Alice parecia em ótima forma, seus olhos
brilhavam e seus lábios estavam sempre com um sorriso estampado, e não
havia dúvida sobre o motivo; já seu marido se preocupava com seu conforto
e ela o olhava com adoração. Harriet teve um sobressalto de desejo, quando
viu Alice alisar uma mão protetora sobre seu ventre levemente inchado e se
perguntou se ela também poderia estar grávida. Esperou entrar em pânico
com a ideia, mas ao invés disso, um sorriso se instalou em seus lábios.
Como era maravilhoso e extraordinário pensar sobre isso, em como Jasper
ficaria feliz com a ideia e como queria fazê-lo feliz.
Harriet virou-se para ele agora, tentando acompanhar as palavras do
serviço, mas completamente enfeitiçada pela visão do homem que estava ao
seu lado. Era incrivelmente bonito, e estava tão orgulhosa dele, por muito
mais do que apenas o seu belo rosto. Passaria a sua vida de casada
compensando qualquer ferimento que lhe tenha causado durante os últimos
anos. O protegeria de qualquer coisa que pudesse magoá-lo ou envergonhá-
lo, pois percebia agora que Jasper precisava de proteção, não que ele
alguma vez o dissesse. E não porque não fosse suficientemente esperto,
como poderia pensar isso quando ele tinha escondido do mundo as suas
dificuldades durante tanto tempo? Também não porque alguém tivesse
necessidade de ter pena dele, pois era claramente um artista brilhante, e
Harriet tinha admiração por qualquer pessoa que pudesse criar tal beleza
quando ela mesma era não conseguia traçar uma linha reta. Não, ele só
precisava de proteção contra as coisas que o deixavam desconfortável e
infeliz, e o faziam sentir-se menos do que era, e Jasper nunca mais deveria
voltar a sentir-se assim.
Talvez ele tenha sentido o peso de seu olhar, pois se virou, aqueles
incríveis olhos turquesa fixos nela, e a profundidade da emoção que viu
neles virou seu coração do avesso. Ele sorriu e apertou a mão que segurava,
e Harriet apertou de volta, querendo tanto beijá-lo que quase perdeu as
palavras seguintes.
— Jasper Augustus Louis Cadogan, deseja esta mulher para ser tua
esposa, para viverem juntos após a ordenança de Deus, no sagrado estado
do matrimônio? Deseja amá-la, confortá-la, honrá-la e mantê-la na doença e
na saúde; e, abandonando todas as outras, manter-se somente para ela,
enquanto viverem?
Harriet prendeu a respiração enquanto Jasper lhe sorria, um sorriso que
tirou o ar de seus pulmões e encheu seu coração com todos os sonhos que já
ousara sonhar desde que era uma garotinha.
— Sim.

— Onde está me levando?


Harriet olhou por cima do ombro para o marido e sorriu. — É uma
surpresa — disse, rindo da expressão de contentamento dele.
Escapuliram de seus convidados, por insistência de Harriet, não que
tivesse demorado muito para persuadi-lo. Conduziu-o pelos jardins, suas
sapatilhas umedecendo na grama molhada, enquanto o calor do dia se
dissipava com o sol poente. Brilhava agora, riscando o céu com chamas
berrantes de rosa e laranja, deixando o lago em chamas, refletindo suas
surpreendentes cores.
Harriet admirou a cena. — Que lindo — disse sorrindo, quando Jasper
deslizou o braço em volta da sua cintura.
— Esta é a sua surpresa?
Ela riu e balançou a cabeça. — Infelizmente, meus talentos não são
capazes de organizar um show como esse, embora o faria se pudesse. É
merecedor de uma magnificência como essa.
Jasper bufou e a puxou para mais perto. — Pare — disse, segurando o
rosto dela com as duas mãos. — Ficarei impossível se continuar dizendo
essas coisas. Vou desejar um dos seus ataques se continuar assim.
O sorriso de Harriet sumiu e ela escondeu o rosto no colete dele,
envolvendo-o com os braços.
— Não — disse com a voz abafada. — Não suporto lembrar de todas
as coisas estúpidas e odiosas que disse.
— Ah amor — disse Jasper, beijando o topo de sua cabeça. — Eu a
incitei a dizer aquelas coisas, mais do que pode imaginar, e nós dois
sabemos disso. Fomos tolos. Deveria ter confiado o suficiente para saber
que nunca me julgaria da maneira que eu temia. Sempre soube que eu não
era tão inteligente e sempre cedeu seu tempo para me explicar as coisas,
sem me fazer sentir um idiota. Eu a subestimei por causa do meu próprio
orgulho e isso é minha culpa, não sua.
— Mas é inteligente, Jasper — disse, agarrando-se à lapela dele e
querendo sacudi-lo por pensar o contrário. — Essa é a questão. Sempre
soube que era, e é por isso que estava tão zangada contigo. Achei que
estava desperdiçando seu talento por preguiça e agora... agora, que sei o
quanto deve ter trabalhado...
Sua voz tremeu e Jasper se curvou e a beijou, roubando quaisquer
palavras que diria em seguida, com um beijo que amoleceu seus ossos e
roubou sua capacidade de pensar, quanto mais falar.
Finalmente a soltou e sorriu, satisfeito. — Seus óculos estão tortos —
disse, o diabo presunçoso.
— Estou surpresa que não tenham derretido — Harriet respondeu,
endireitando-os com uma pequena fungada digna. — Deveria haver uma lei
contra você, Jasper Cadogan. É um homem perigoso. Não consigo pensar
quando me beija assim.
— Bem, o que é justo é justo. Um homem tem que ter algumas
vantagens, amor — disse, pegando sua mão novamente. — Agora, não
estava me levando a algum lugar para se aproveitar perversamente de mim?
— Era isso que eu estava fazendo? — Harriet respondeu, tentando soar
azeda, o que era difícil quando sua boca se recusava a fazer qualquer coisa
além de sorrir estupidamente para ele.
— Acredito que sim.
Harriet desistiu e riu, puxando sua mão. — Venha, então.
Conduziu-o até ele perceber para onde estavam indo. — A casa de
verão?
— Sim — disse corando. — Nosso primeiro beijo foi aqui e então
pensei... — Harriet sentiu seu rubor aumentar, mas ele parecia tão satisfeito
que continuou mesmo assim. — Achei que seria o lugar perfeito para a
nossa primeira noite.
— Dificilmente é a primeira — Jasper sorriu, sem dúvida se
lembrando, assim como ela, que mal se separaram durante a espera
interminável pelo dia do casamento.
Harriet bufou, sabendo que estava brincando. — Nossa primeira noite
como marido e mulher — esclareceu.
— Bem, isso soa muito romântico, amor — admitiu, embora parecesse
um pouco duvidoso. — Mas acho que meu quarto pode ser mais
confortável.
— Isso é o que pensa — disse Harriet, satisfeita consigo, conduzindo-o
até a porta.
Jasper a olhou curioso, antes de colocar a mão na maçaneta e girá-la.
Ouviu seu suspiro de surpresa e apertou os braços em volta de si mesma,
explodindo de alegria ao ver tudo o que tinha feito. Era magnífico. Fios de
seda vermelha pendiam do centro do teto e desciam pelas paredes, o chão
coberto por tapetes e almofadas em dezenas de cores vivas. Havia travessas
douradas, com uvas, morangos, frutas exóticas e massas folhadas, cada item
um bocadinho perfeito. O fogo ardia na lareira e as lamparinas brilhavam,
tornando o espaço íntimo, quente e desesperadamente romântico.
— As mil e uma noites — Jasper disse, sua voz pouco mais que um
sussurro.
— Sempre foi o seu favorito — disse Harriet, fechando a porta atrás
dela e pegando sua mão.
Jasper se virou para encará-la com os olhos brilhando. — Deve ter lido
para mim um milhão de vezes e nunca reclamou quando eu pedia para que
lesse novamente.
Harriet encolheu os ombros. — Amava ler para você, era o único
momento em que tinha toda a sua atenção, mesmo que fosse o livro que o
cativava, e não eu.
— Sempre foi você, Harry, por muito tempo — disse suavemente. — E
sempre será apenas você.
O coração de Harriet deu um pequeno sapateado em seu peito, a
felicidade borbulhando dentro dela era tanta que lançou os braços em volta
do pescoço dele e puxou sua cabeça para beijá-lo.
— Eu te amo — disse ofegante quando finalmente o soltou. — Tenho
um presente.
Ela riu, satisfeita com o prazer em seus olhos quando foi pegar o
pacote cuidadosamente embrulhado.
— Na verdade — disse sentindo-se um pouco travessa. — Para ser
sincera, é mais um presente para mim do que para você.
Jasper devolveu um olhar curioso e estendeu a mão para aceitar o
pacote, e depois puxou a fita para desembrulhá-lo. Deixou o papel cair no
chão e pegou a roupa dobrada. O tecido era de um ouro deslumbrante,
intrincadamente bordado e adequado para um rei.
Olhou para Harriet surpreso. — Um banyan?
Harriet assentiu, corando escarlate. — Quando... Quando eu lia as
histórias para você, eu... — Sua boca ficou seca e ela se sentiu um pouco
tola em admitir suas fantasias, mas devia muito a Jasper e queria que
soubesse disso, queria que soubesse tudo o que havia sonhado. —
Costumava imaginá-lo como o Príncipe Shahryar e eu...
— Era Sherazade — concluiu por ela. — Contando seus contos e
deixando todos inacabados, na esperança de viver mais uma noite.
Harriet assentiu, sua timidez evaporando ao ver como os olhos dele
escureceram.
— Eu o imaginava como o príncipe — disse sem fôlego —, vestido
com sedas e recostado em almofadas de diversas cores, enquanto eu
contava minhas histórias.
— Muito bem, então — disse, acariciando a seda pesada do roupão. —
Não ousaria desapontá-la — a boca de Harriet ficou seca quando ele tirou o
casaco e o jogou descuidadamente no chão. Parou então e seus lábios se
curvaram quando notou o olhar extasiado no rosto dela e fez um movimento
circular com os dedos. — Vire-se, por favor. Quero que tenha uma surpresa
completa.
Harriet bufou, pois não queria perder a visão tentadora de seu belo
marido se despindo, mas o obedeceu. O farfalhar do tecido foi um tormento
que a fez desejar se virar e dar uma espiada, mas não o fez, depois
finalmente o ouviu falar.
— Bem, Sherazade, tenho sua aprovação?
Harriet se virou e o ar deixou seus pulmões quando viu a cena diante
dela. Jasper estava deitado sobre um amontoado de almofadas, e cada
pedaço de sua pele exposta brilhava como ouro sob a luz do fogo. Parecia,
em cada centímetro, a imagem do príncipe persa que tanto imaginou, ou
talvez um paxá satisfeito, esperando uma de suas esposas para alimentá-lo
com uva, ou mesmo um deus pagão esperando a devoção de seus
suplicantes. O banyan caindo descuidadamente de seus ombros, abrindo um
pouco e expondo uma extensão de pele macia e uma linha de pelos
dourados que desaparecia em uma trilha provocante sob a fita frouxa em
torno de seus quadris.
— Certamente a tem — murmurou Harriet, perguntando-se como
Sherazade teria mantido o juízo por tanto tempo se seu príncipe se
parecesse com qualquer coisa como Jasper. A ameaça de perder a cabeça a
faria focar ainda mais, supôs.
Harriet se aproximou e se ajoelhou em frente a ele. Não podia fazer
nada além de olhar extasiada sua beleza, vestido de seda e iluminado pela
luz do fogo, rodeado pela extensão sensual de tapetes e almofadas de cores
vivas.
— O quê, nenhuma história inteligente para me contar, amor? —
Jasper brincou com ela, seus lindos olhos escurecidos com antecipação.
Harriet balançou a cabeça. — Não — respirou. — Nenhuma. Devo
tentar agradá-lo de outra forma, suponho.
Os lábios de Jasper se curvaram e ele descansou uma mão atrás da
cabeça, fazendo um gesto expansivo ao comprimento do seu corpo com a
outra. — Estou à sua disposição.
Ela se inclinou e deslizou a mão sob a seda quente e acomodando-se no
peito dele. Seu corpo queimava sob sua mão e sua respiração oscilou.
— Está sempre muito mais quente do que eu — disse, curiosa como
sempre, embora muito impaciente para considerar o porquê daquilo.
Deslizou a mão para baixo, sobre sua barriga tensa, até que a fita do
manto impediu seu avanço. Harriet deu um puxão impaciente e empurrou o
tecido exuberante para o lado, expondo-o a sua visão.
Os olhos de Jasper estavam sobre ela, sabia disso, mas não se
importava se ele visse a adoração que continha neles, a profundidade de seu
desejo. Não podia fazer nada além de se embriagar dele e admirar a beleza
masculina pura do seu marido.
— Meu — sussurrou, ousando encontrar seus olhos.
Ele a olhou com a expressão séria. — Todo seu.
Harriet deixou escapar um pequeno suspiro de prazer, tirou os óculos e
os colocou cuidadosamente de lado.
— Hmmm, Sherazade tirou os óculos. Devo ficar preocupado?
— Certamente — disse Harriet, sentindo-se bastante indecente e muito
satisfeita consigo mesma, inclinando-se para pressionar sua boca sobre seu
membro. Ele tremeu com o toque e gemeu quando o beijou sem parar e, em
seguida, deu-lhe uma lambida cautelosa. Isso lhe rendeu um suspiro e seus
quadris se inclinaram em sua direção, exigindo mais, então ela repetiu.
Sabia que ele gostava disso e adorava os sons urgentes que emitia, mas
também tinha ciência de que era terrivelmente inexperiente e queria saber
mais, queria ser boa nisso para ele.
— Me ensine — pediu, olhando-o enquanto sua própria pele queimava
de desejo. O olhar misterioso nos olhos de Jasper a fez se sentir quente,
dolorida e impaciente, mas ela queria aprender, queria lhe dar tanto prazer
quanto ele tinha dado a ela.
— Acredito que esteja se saindo admiravelmente bem —falou,
ofegante, enquanto enrolava os dedos nos cabelos dela.
Harriet balançou a cabeça em negativa. — Me ensine, quero aprender.
Viu sua garganta se mexer e depois prender a respiração quando
conseguiu dizer as palavras para instruí-la. — Deve colocá-lo na boca —
respondeu.
Após fechar os olhos e deslizar seu membro para dentro da boca, ela
fez o que ele instruiu. O som que ele emitiu fez seu sangue ferver e a fez se
sentir triunfante, então repetiu o movimento, sua confiança aumentando ao
passo que ele respirava fundo e gemia, e seus quadris se elevavam debaixo
dela, e ela aumentava a velocidade. Sentindo-se extremamente satisfeita
consigo mesma, foi um choque quando ele se afastou dela e momentos
depois ela se viu jogada de costas.
Jasper jogou o banyan dourado de lado e puxou as saias do seu vestido,
juntando-as e movendo-se entre elas com movimentos frenéticos, quase
desesperados.
— Por Deus, Harry — disse, estabelecendo-se entre suas coxas e
deslizando seu membro sobre ela. Harriet deu um pulo com o contato, sua
pele sedosa tão quente e perfeita que o prazer a atingiu. — Deixe-me entrar
—implorou, e Harriet não conseguia dizer nada, focada que estava
querendo a mesma coisa, focada na necessidade de senti-lo dentro dela.
— Sim, sim — gemeu impotente, inclinando seus quadris enquanto ele
procurava, encontrava e deslizava firmemente dentro dela. Um grito
surpreso deixou seus lábios e ela ase garrou a seus ombros enquanto ele se
erguia sobre ela. Harriet arqueou quando ele se afastou e se afundou nela
novamente, e ela riu de pura alegria.
— Gosta disso, Harry? — Perguntou, olhando-a com os olhos
brilhando de prazer.
— Gosto, gosto de você todo Jasper — disse, ofegando novamente
quando ele inclinou seus quadris e roubou seu fôlego.
— Diga-me — disse com urgência. — Diga-me o quanto gosta.
— Eu amo — disse, lutando para pronunciar as palavras enquanto sua
mente se embaçava de desejo e seu corpo derretia sob seu toque. — E eu te
amo.
— Diga de novo — exigiu, envolvendo os braços ao redor dela e
segurando-a com força.
— Eu te amo — repetiu, e então ele reivindicou sua boca, mas aquelas
três palavras ainda estavam entre eles, na carícia de suas mãos sobre sua
pele, no toque de seus lábios contra os dele, e ela jurou que deixaria isso
óbvio para ele a partir de agora, em tudo o que dissesse e fizesse.
— Harry — disse, o nome dela arrancado de seus lábios enquanto seu
corpo se convulsionava e seu clímax tomava conta, levando-a com ele
enquanto os dois se agarravam, finalmente unidos, sem nenhum mal-
entendido bobo para separá-los.

— As Crônicas dos Sassânidas, os antigos reis da Pérsia que


estenderam seu império às Índias, sobre todas as ilhas dependentes, a uma
distância considerável além do Ganges, e até a China, informam que existiu
anteriormente um rei daquela família potente, o príncipe mais excelente de
seu tempo...
Jasper se recostou em um amontoado de almofadas de seda, o tecido
dourado do banyan cobria os dois; Harriet estava sentada entre os seus
braços e lia as histórias de As Mil e Uma Noites. Ele a provocou por ter
trazido o livro para sua noite de núpcias, fazendo-a corar ao perguntar se ela
achava que ficaria entediada, mas na verdade estava além de emocionado
por ela ter se lembrado e pensado nisso. Memórias de outras noites, de uma
vida muito tempo atrás, agora, inundaram a sua mente. Memórias de ser
arrebatado por Harriet, contando suavemente as histórias de Sherazade, e a
maneira como ele erguia os olhos e capturava seu olhar e ela tropeçava na
frase que estava lendo e corava, antes de encontrar onde havia se perdido e
continuar a leitura. Passou toda a sua juventude sabendo que ela o amava,
que o adorava e o considerava sem falhas. Suportou ser arrastada pela lama,
quase ser afogada, sequestrada, resgatada e nunca lhe faltava aquele olhar
de adoração.
Quando voltou da Rússia para encontrar seu mundo tão mudado, ficou
desolado e confuso, e foi então que percebeu o quanto não levou seu amor a
sério. Somente percebeu o que tinha depois de perdê-la. Agora sabia o
porquê. Ambos sabiam o quão perto chegaram de perder o que mais
importava e não arriscariam novamente.
A voz de Harriet o envolveu enquanto lia a primeira das histórias de
Sherazade e a abraçou com força, segurando-a perto dele. Ela fez uma
pausa e virou a cabeça para olhá-lo com um sorriso.
— Não vou conseguir respirar, muito menos ler, se me apertar mais —
murmurou, embora fosse claro o suficiente que não estava reclamando.
Jasper olhou-a, totalmente enfeitiçado com a imagem, de seus cabelos
caídos sobre o rosto em total desordem, seu corpo nu e mal coberto pelo
tecido dourado de seu presente, seus óculos empoleirados na ponta de seu
doce narizinho e, como sempre, um livro na mão. Ele abaixou a cabeça e
roubou-lhe um beijo.
— Está feliz?
Harriet riu, sua expressão bastante incrédula. — Sabe que estou. Se
ficasse mais feliz, explodiria.
— Ótimo — disse, recostando-se nas almofadas. — Desejo que todas
as pessoas de quem gostamos também encontrem a mesma felicidade.
— Como é romântico — disse, virando-se em seus braços para
considerá-lo.
Ele encolheu os ombros, mas não negou. — Gostaria que Jerome se
apaixonasse por alguém adequado — acrescentou, com um suspiro. — Eu
me desespero com ele.
— Certamente, ainda há tempo?
Jasper franziu a testa preocupado. — Não sei. Temo que ele esteja se
envolvendo em uma confusão.
Harriet se sentou e ele viu a ansiedade em seus olhos. — Está querendo
dizer Bonnie, — disse, e ouviu o tom de sua voz. — Jasper, não vou ouvir
nada contra ela. É uma jovem adorável, é minha amiga, e se seu irmão se
aproveitou dela...
Jasper estendeu a mão e pressionou um dedo sobre seus lábios. —
Então deverá assumir as consequências — disse com firmeza. — Mas não
posso fingir que acho que é um bom casamento.
— Por que não?
Havia uma nota desafiadora na pergunta que fez Jasper sorrir. Sabia
que Harriet sempre teve dificuldade em fazer amizades. Era muito tímida,
muito insegura de si mesma quando acompanhada para ficar à vontade, mas
encontrou amigas entre a estranha coleção de damas que formava as
Senhoritas Peculiares. Estava feliz com isso e não o surpreendeu a sua
lealdade. Então, falou com cuidado.
— Bonnie parece ser uma jovem adorável, e posso ver que Jerome
gosta dela, mas temo que a veja como vê seus amigos, não como uma dama
com quem deseja se casar. Jerome sempre sentiu a necessidade de resgatar
belas donzelas em perigo. Quer alguém para proteger e cuidar, alguém que
precise dele, e Bonnie...
— Bonnie é totalmente destemida e enfrentaria o mundo e cuspiria em
seus olhos.
Jasper riu um pouco e assentiu para a descrição dela. — Precisamente
isso.
— Realmente acha que é uma união fadada ao desastre, Jasper? —
Harriet perguntou, e seu coração afundou ao perceber que seus temores
tinham fundamento.
— Por quê? — Perguntou, embora soubesse a resposta antes que ela
dissesse.
— Porque tenho muito medo de que ela esteja perdidamente
apaixonada por ele e não posso suportar vê-la magoada.
Jasper suspirou, desejando não ter visto aquilo chegando, desejando ter
tido mais sucesso em tirar seu irmão idiota de problemas. — Ela foi
prometida ao herdeiro de Morven — disse, encolhendo os ombros. —
Mesmo que Jerome anunciasse seu amor eterno por ela, o que realmente
não consigo ver acontecendo, ela está praticamente noiva.
Harriet balançou a cabeça. — É melhor não deixar Bonnie ouvi-lo
dizer isso. Suponho que sua mãe também não ficaria feliz com a união?
— Não ficaria — admitiu. — Embora esperemos que hoje tenha
contribuído muito para amenizar qualquer decepção que Jerome possa
trazer para ela.
Harriet sorriu quando ele beijou sua testa. — Ela tinha esperanças com
Lady Helena, acredito?
Jasper assentiu. — Sim, acho que sim, mas Jerome nem mesmo a
notou. Não que ela parecesse se importar com isso, veja bem.
— Bem, faremos o que pudermos — disse Harriet, pensativa.
— Harry? — Jasper disse, sentindo-se também ansioso. — O que quer
dizer?
— Na verdade, nada. Apenas... que é como disse. Todos os nossos
amigos deveriam estar tão felizes quanto nós, e nossos irmãos também, e se
houver algo que possamos fazer para ajudar...
— Não — Jasper balançou a cabeça. — Nada de agir como
casamenteira, eu a proíbo.
— Faz o quê? — Harriet repetiu arregalando os olhos.
Jasper hesitou e tentou novamente. — Acredito que o que quis dizer
foi: vamos tentar resolver isso.
Harriet riu e Jasper a cutucou nas costelas até ela gritar.
— Intimidadora — murmurou contra sua orelha, antes de dar uma
pequena mordida.
— Quem, eu? — Harriet respondeu toda inocente. — Sou Sherazade.
E está ameaçando cortar minha cabeça.
Jasper riu e a acomodou mais confortavelmente em seus braços. —
Bem, então esposa, é melhor continuar com sua história e se certificar de
que tenha um final feliz.
Harriet ergueu os olhos e deu um beijo em sua bochecha. — Sempre,
Jasper. Sempre me certificarei disso.
PR XIMO LAN AMENTO DA S RIE

D O , 6

Sinto como se estivesse correndo desordenadamente em


direção à beira de um penhasco e, embora saiba que seja uma
queda abrupta, não consigo me conter. Nunca me considerei
uma jovem boba, mas certamente isso é uma loucura. No
entanto, a alternativa é ceder e fazer o que me mandam e me
casar com um homem que não quero e morar em um lugar
que não desejo estar.
Então a única saída é à beira do precipício.
—Trecho de uma anotação da Srta. Bonnie Campbell
em seu diário.
10 1814, H H ,S .
Bonnie contemplou o interior das suas pálpebras, brilhando
avermelhadas quando o sol aquecia seu rosto. O sono empurrava sua mente,
sonolenta da tarde preguiçosa e do delicioso piquenique que fazia com as
amigas. Seria fácil afastar-se, esquecer todas as preocupações que
ultimamente a atrapalhavam, como espectadores do infortúnio alheio,
juntando-se para ficar olhando, fofocando e agradecendo aos céus por não
terem sido atropelados pela carruagem do correio, ou caído de cara na lama.
Bonnie estava acostumada com os espectadores, com as pessoas a
olhando de forma desaprovadora, sussurrando a seu respeito. Era ciúme,
dissera a si mesma, estavam simplesmente com ciúmes, porque ela tinha a
audácia de fazer as coisas que sonhavam em fazer, mas não tinham
coragem. O que importava se achavam que era uma moça atrevida?
Abriu os olhos e piscou para um céu azul-celeste, ofuscada pelo sol do
meio-dia, tão azul quanto os olhos de Jerome Cadogan. Senhor, mas ela era
clichê, uma zé ninguém boba e apaixonada por um homem diabolicamente
bonito e muito além de seu alcance. Ele era um encantador perverso com
uma risada malandra e olhos azuis cintilantes, cujo interesse em colocar um
anel em seu dedo era tanto quanto o de se tornar o próximo arcebispo de
Canterbury. Podia ser a protegida do conde de Morven, mas sua família não
era ilustre. Certamente eram respeitáveis, mas Jerome Cadogan, irmão do
conde de St. Clair, poderia conseguir algo muito melhor.
Sua única esperança era fazer com que ele se apaixonasse tão
perdidamente por ela quanto estava por ele. Bonnie soltou uma risada suave
e abafada, considerando o quão bem esse seu plano havia funcionado até o
momento. Jerome a amava, de certo que sim, assim como amava a sua
miscelânea de amigos. Considerava-a um tipo alegre e divertido, e tratava-a
como se fosse um dos seus amigos ruidosos, e não como uma jovem dama.
Não que Bonnie fosse frágil e tivesse sido criada com delicadeza, não havia
nada de frágil nela. Sua figura era voluptuosa, beirando a roliça,
considerava-se quase inabalável e tinha o talento especial de falar a
primeira coisa que passava pela sua cabeça, e geralmente alto o suficiente
para ser ouvida a várias ruas de distância.
Não, agora conhecia muito bem o tipo de mulher que Jerome gostava e
certamente não era o tipo dela, longe disso. Ele tinha a reputação de se
apaixonar em um piscar de olhos e sempre por mulheres inadequadas, para
desespero de seu irmão. Além da inadequação, essas mulheres tinham
outras coisas em comum; tinham uma beleza delicada, olhos azuis e eram
loiras, e, é claro, precisavam ser resgatadas. Bonnie poderia ser o epítome
da inadequação, mas a comparação parava aí. Tinha cabelos escuros, olhos
vagamente verdes, uma figura robusta e era mais do que capaz de nocautear
um homem com um golpe certeiro no nariz se fosse necessário. Suspirou,
ciente de sua própria idiotice e pior, ciente de que suas amigas sabiam de
sua paixão e tinham pena dela por causa disso.
Fizeram o possível para alertá-la, para avisar que Jerome não a via
dessa maneira e nunca veria, e não é que não acreditasse nelas, acreditava;
sabia que estavam certas. Até Jerome, coitado, a tinha alertado de que ele
não era do tipo que se casava, quando a pegou olhando-o com algo mais do
que afeto amigável e a ficha finalmente caiu. Também tinha sido gentil com
relação a isso, certificando-se de que soubesse o quanto valorizava sua
amizade e assegurando-lhe que a perda era dele e não dela, pois ele seria o
marido mais terrível de todos os tempos. Agarrou uma corda imaginária e
fingiu se enforcar com ela naquele momento, e Bonnie riu de suas
travessuras, embora seu coração estivesse se despedaçando. Bem, melhor
ter amado e perdido... afff, que baboseira. Se pudesse se "desapaixonar'' por
Jerome Cadogan tão facilmente como se apaixonou, o faria em um piscar de
olhos, mas seu coração batia apenas por ele, não sabia como fazer isso
parar.
Por que não poderia, simplesmente, agradar a todos e se apaixonar pelo
maldito Gordon Anderson? A ideia a fez estremecer. O sujeito taciturno e
mal-humorado e seu castelo austero e hostil, Wildsyde, não tinham nada
para recomendá-los na visão de Bonnie. Ele não saberia o que é diversão
nem mesmo se ela caísse na sua cabeça com uma etiqueta anexada escrito
DIVERSÃO com letras maiúsculas. Bem, estava condenada a casar com um
homem que a achava frívola porque gostava de rir e desejava dançar e
desfrutar da vida, independentemente dos planos que Anderson tinha para o
seu dote ou do que Moven tinha prometido ao seu pai antes de ele morrer.
Essa promessa era dele e não dela. Não os deixaria trancá-la em algum
castelo horrível nas Highlands, longe de todas as suas amigas, sem ter outra
ocupação a não ser dar a seu marido tantos pirralhos quanto pudesse
aguentar antes que a atividade a matasse como matara sua mãe. Não, muito
obrigada.
O problema era que não podia evitá-lo para sempre. Estava vivendo
um tempo emprestado. Anderson viria buscá-la em breve, sabia, e como
vivia com o dinheiro de Morven, não havia como escapar de seu destino,
não realmente. No entanto, podia, e iria, adiar o máximo possível. Talvez,
se ela se comportasse mal o suficiente, Anderson se recusasse a se casar
com ela. Só a queria por seu dote de qualquer forma, e se fosse uma
mercadoria estragada...
Seria o suficiente para fazê-lo recusá-la?
A ideia persistiu, embora soubesse que era perigosa. No entanto,
significava que poderia ter o que quisesse, pelo menos por um breve
período. Poderia se entregar ao homem que amava e ser honesta com
Anderson sobre o que havia feito. Isso mudaria seu destino ou não. Talvez
Morven a renegasse, mas não acreditava nisso. Sem dúvida a despacharia
para algum lugar onde não causasse mais constrangimento, mas isso tinha
que ser melhor do que apodrecer em algum castelo esquecido por Deus no
meio do nada, certamente.
Bem, provavelmente daria em nada de qualquer maneira, pensou
melancolicamente. Jerome simplesmente não a via desse jeito,
provavelmente não aceitaria arruiná-la, mesmo que se entregasse de
bandeja. Entretanto, valia a pena tentar.
Bonnie olhou para o lago à sua frente enquanto considerava a ideia, seu
olhar caindo sobre St. Clair e Harriet. Finalmente se resolveram e estavam
claramente apaixonados. Sorte da Harriet, pensou com um suspiro.
Matilda, que estava sentada ao seu lado, olhou de relance com o som.
— Pessoas de sorte — Bonnie disse, sorrindo melancolicamente
enquanto Matilda acenava em concordância.
— De fato.
— Não temos sorte, não é?
— Não — Matilda disse, e havia uma nota sombria naquela palavra
que Bonnie ouviu e reconheceu. — Mas é jovem e bonita, Bonnie. Ainda há
tempo.
Bonnie balançou a cabeça. — Não — disse, desejando que sua voz não
tivesse tremido. — Não, não há. Já disse, estou vivendo um tempo
emprestado.
Matilda estendeu a mão e pegou a dela e Bonnie apertou-a em troca,
grata pelo apoio e compreensão infalíveis da amiga. Matilda entendia por
que seu tempo também estava se esgotando. — Não ficará sozinha, Bonnie.
Não será esquecida e nem abandonada. Aconteça o que acontecer, não
permitiremos isso. Suas amigas sempre estarão aqui por você. Irei para a
Escócia e te farei companhia, prometo. Não importa em qual fim de mundo
tentem escondê-la.
Bonnie fez um som sufocado e então riu, e Matilda a seguiu, piscando
para conter as lágrimas.
— Por Deus, como nos tornamos piegas — disse Matilda balançando a
cabeça. — Isso não pode acontecer.
Bonnie assentiu. Ela não poderia concordar mais.
— Aye, há tempo suficiente para lágrimas e lamentações — disse
Bonnie, lutando para ficar de pé e determinada a fazer alguma coisa. —
Não perderei um minuto do meu tempo.
Respirando fundo, Bonnie pegou seu copo e foi em direção ao lago.

Jerome suspirou contente e se espreguiçou ao sol como um gato


preguiçoso. Considerava-se um sujeito simples, com gostos simples, sendo
preciso pouca coisa para agradá-lo. Um dia de sol, companhia alegre, boa
comida e não trocaria de lugar com um duque ou um rei. Certamente não
invejava seu irmão com as responsabilidades do condado. Não, não, a vida
de um filho mais novo era, de longe, preferível. Nenhuma contabilidade,
livro-razão e inquilinos perturbando sobre problemas, ou sobre telhados e o
preço da cevada, nenhuma expectativa de casar bem e fornecer um herdeiro
e um suplente, embora parecesse que Jasper tivesse isso em mãos, o
danado. Harry Stanhope, quem poderia imaginar?
Porque não tinha visto antes, se perguntou, pois agora era tão claro
quanto o sorriso apaixonado no rosto de seu irmão. Os dois se adoravam.
Estiveram se atacando por anos e o tempo todo... bem, era isso o que
parecia, ninguém sabia ao certo o que se passava na cabeça do sujeito.
Provavelmente o melhor também, pensou, suprimindo um sorriso, enquanto
voltava seus próprios pensamentos para uma nova servente que tinha visto
no The Swan, na vila. Era loira e bonita, esguia como um junco, mas com
curvas em todos os lugares certos, deu-lhe um sorriso e um olhar sedutor
convidativo, ou quase.
Tinha acabado de se acomodar na grama e estava prestes a se entregar
a um devaneio e pensar em como conseguir um convite da servente, quando
um choque de água fria o atingiu no rosto fazendo-o sentar-se, assustado.
Por um momento, ficou apenas sentado, pingando água, confuso demais
para esboçar qualquer reação, e então a viu.
— Ora, sua pirralha! — Trovejou, quando seu olhar indignado caiu
sobre o culpado.
Quem mais?
— Vou jogá-la no lago, Bonnie Campbell — alertou-a, se levantando
enquanto ela puxava a saia e soltava um grito agudo. Jerome amaldiçoou e
saiu em perseguição. Bonnie olhou por cima do ombro e o viu correndo
atrás dela e gargalhando, virou e mostrou-lhe a língua.
— Tem que me pegar primeiro, seu tolo — provocou antes de correr
em direção às árvores.
Apesar de seu aborrecimento, Jerome riu enquanto a perseguia em
direção a sombra fria da floresta. Bonnie gritou quando se lançou atrás dela
e ela conseguiu se desvencilhar do seu alcance e continuou correndo. Era
mais rápida do que parecia, embora seu rosto estivesse corado agora e seus
olhos brilhando com maldade.
— Miserável! — Gritou, antes de prender o dedo do pé em uma raiz e
cair de joelhos. — Maldição —murmurou, levantando-se e descobrindo que
Bonnie havia desaparecido. Ainda podia ouvi-la, então correu, seguindo o
som de folhas e galhos se quebrando; o que pareceu uma vida inteira
depois, parou ofegante e encostou em uma árvore. Bom Deus, mas seu
estilo de vida estava começando a prejudicar sua resistência. Precisava
mesmo era fazer mais sacrifícios antes de começar a engordar como seu
amigo Cholly, que parecia cada vez mais corpulento. Forçando-se a seguir
em frente, separou-se da linha das árvores, que dava para a beira do lago.
Havia uma pequena enseada ali, fora de vista e isolada, o que era bom,
pois quando viu a imagem à sua frente, congelou em choque.
— Bonnie Campbell, será a causa minha morte —murmurou enquanto
seu olhar se fixava na mulher diante dele, vestindo nada além de seu
chemise. Ela se virou sorrindo, parada sobre uma grande rocha que se
projetava sobre as águas mais profundas.
— Bonnie, não! — Gritou, mas era tarde demais. Com uma graça
notável, considerando como era impetuosa, ela mergulhou no lago.
Jerome correu para a beira com o coração na boca enquanto tentava
enxergar através da água escura. Aquele pedaço era tão profundo que nem
mesmo ele e Jasper jamais conseguiram nadar até o fundo. Nem uma
ondulação perturbou a superfície e foi tomado por um pânico. Não, não,
não, não, não.
Despiu-se sem tirar os olhos da água e então mergulhou, indo cada vez
mais fundo até que seus pulmões arderam e foi forçado a subir tossindo e
cuspindo água. Prestes a respirar fundo e mergulhar mais uma vez, quase
gritou quando uma mão agarrou seus ombros e o afundou.
Foi apenas por um segundo, mas quando emergiu encontrou Bonnie
gritando de tanto rir e teve que lutar contra o desejo de estrangulá-la.
— Que uma praga a leve! — Gritou, enxugando os olhos. — Isso não
foi nada engraçado, sua criatura diabólica. Achei que tivesse se afogado,
maldita seja.
— Nessa pequena poça? — Respondeu fazendo uma careta e
obviamente impressionada. — Acho que não. Eu nado em lagos muito mais
fundos, mais escuros e mais gelados do que esse desde que era criança. É
como tomar banho.
— Talvez eu a afogue agora com as minhas próprias mãos então — ele
murmurou, e nadou atrás dela.
Ela gritou e tentou nadar para longe dele, mas foi muito mais lenta
dessa vez, então ele a agarrou pela cintura.
— Solta — ela protestou, se contorcendo em suas mãos, mas Jerome
estava muito furioso para fazer o que estava pedindo. Embora ela tivesse
comparado a temperatura da água a de um banho, estava na verdade gelada
e, em circunstâncias normais, o suficiente para esfriar o ardor de qualquer
homem. Ter uma mulher de curvas generosas e quase nua em seus braços,
entretanto, foi o suficiente para o corpo de Jerome se assentar e tomar nota
da situação.
Comporte-se, disse a si mesmo com firmeza. Bonnie estava fora dos
limites. E sabia. Se não o soubesse, seu irmão o tinha lembrado do fato tão
repetidamente que não havia como fugir dele. Jasper o alertou que sua mais
recente pequena aliança foi a última da qual ele livrou a cara do irmão. Para
ser justo, custou um bom dinheiro e não tinha sido seu melhor momento,
então Jerome estava tentando se comportar. Além disso, Bonnie não era seu
tipo, exceto quando se virou em seus braços e o tecido fino de seu chemise
não fez absolutamente nada para criar uma barreira entre seu corpo quase
nu e o dele, seu membro não parecia ser capaz de fazer uma distinção.
Embora a água estivesse muito fria, seus seios ainda estavam quentes e
carnudos e pressionados contra seu peito, as protuberâncias duras de seus
mamilos uma pressão insistente sobre sua pele que fez seu sangue esquentar
apesar do lago gelado. Ela arfou surpresa quando sua ereção pressionou
contra a suavidade de sua barriga e Jerome prendeu a respiração, esperando
que gritasse horrorizada e lhe desse um tapa. Exceto que aquela era Bonnie,
a ousada e perversa Bonnie, e ele deveria saber disso. Ela envolveu suas
pernas em volta da cintura dele, e um prazer tomou conta do seu corpo
quando seu membro se aninhou entre suas coxas e a boca dela pressionou a
dele. O prazer foi tão intenso e inesperado, que se esqueceu de nadar, e os
dois afundaram na profundeza da água novamente.
Surgiram um momento depois, tossindo, respingando a água e rindo.
Jerome jogou a cabeça para trás e rugiu com a insanidade daquilo tudo e
Bonnie o observou com deleite e chamas em seus olhos. Viu então o
demônio nela, reconheceu-o enquanto lidava com seu próprio, um terrível
canto de sereia que atrairia os dois para as águas profundas e os destruiria
nas rochas se não fossem mais cuidadosos. Era por isso que deveriam ficar
longe, muito longe um do outro, e porque era muito difícil mantê-la
afastada. Eles eram iguais, duas ervilhas estragadas em uma vagem, e
prontos para descer para o inferno juntos.
Com pesar, Jerome se afastou dela e nadou de volta até a costa,
cambaleando sobre as rochas até a grama e sentando-se jogado, ofegando
por ar e tentando diminuir sua excitação. Olhou para cima e então soube
que isso nunca aconteceria quando Bonnie emergiu da água. Seu cabelo
longo e escuro estava grudado ao redor do seu rosto, pingando
grosseiramente sobre seus ombros, emoldurando a abundância dos seus
seios. Os gostos de Jerome nunca foram excessivos, um punhado era o
suficiente para qualquer homem em sua opinião, mas se perguntava agora
se não tinha sido um pouco apressado, ao ver as curvas exuberantes de
Bonnie. Sua respiração parou nos pulmões quando viu que o chemise estava
quase transparente e agarrava-se ao seu corpo, deixando nada para a
imaginação. Seus mamilos eram claramente definidos, assim como o
triângulo escuro de seu sexo enquanto seu olhar viajava sobre o corpo dela.
O calor explodiu sob sua pele e seu corpo palpitou, ainda mais quente e
insistente por saber que receberia bem seus avanços, ela deixou isso claro o
bastante. No entanto, era uma inocente, uma jovem dama, não uma
messalina disposta ou uma cipriota. Havia regras. Se alguém não esperava
oferecer casamento, não tinha nada que flertar com virgens.
No entanto, quando Bonnie se ajoelhou ao seu lado com os olhos
verdes pálidos mais escuros do que antes, isso foi quase impossível de
lembrar. Ela pressionou os lábios nos dele novamente e ele gemeu,
empurrando-a para a grama e enchendo as mãos com seu corpo. Ela se
arqueou sob seu toque e suspirou de prazer quando apertou suavemente seu
seio e, em seguida, tomou seu mamilo na boca, sugando-o.
Oh Deus, estava condenado.
Ele a lambeu, provocou e mordiscou, o desejo era algo selvagem em
seu sangue agora, se debatendo dentro dele e exigindo liberação, e então a
olhou. Por apenas um momento foi pego em seu olhar, na emoção que viu
ali, no amor. Por mais um momento, seu coração se apertou em seu peito, e
então o pânico venceu e se afastou, ficando de pé. Afastou-se com o
coração batendo erraticamente em seu peito.
— Jerry — disse, o desapontamento no som do seu nome era evidente
demais. Ela deveria acostumar-se a isso, supôs. Ele seria sempre uma
desilusão para ela se o olhasse como se tivesse pendurado a lua no céu.
— Não — disse, tentando manter a palavra suave, tão gentil quanto
conseguia quando frustração e desejo fervilhavam sob sua pele como se
estivesse dentro de um caldeirão, a poção da bruxa que Bonnie parecia
agitar em seu sangue lutando para controlá-lo. — Não podemos, Bonnie.
Não.
— Nós poderíamos —persistiu, e ele queria amaldiçoá-la por tentá-lo.
— Eu não iria...
— Não! — Quase gritou dessa vez, lutando contra a vontade de se
jogar no chão ao lado dela e tomar tudo que estava oferecendo.
— Não — ela repetiu e ele odiou o som daquela palavra, a forma como
soou tão derrotada, como se esperasse por aquela resposta.
Claro que esperava, ele se enfureceu consigo mesmo. Ele disse isso a
ela, não disse, disse que não havia futuro para eles juntos. Não tinha
intenção de se casar, pelo menos não por muito, muito tempo. Por que
diabos se amarraria a uma esposa e filhos quando sua vida era tão boa? Só
precisava ficar longe de problemas e Jasper não iria importuná-lo para que
se casasse, não por alguns bons anos, pelo menos.
Ele se enxugou o melhor que pôde, descartando as ceroulas molhadas.
Teria que recuperá-las outra hora antes que escandalizassem algum
visitante, ou sua mãe, que Deus não permitisse. Quando se virou, Bonnie
também estava vestida. Ele chamou sua atenção, soltou um suspiro e depois
sorriu para ela. Se não gostasse tanto dela, isso não seria tão difícil, mas ele
gostava. Ele a amava, mas não do jeito que ela queria que a amasse. Tinha
sido muito inocente em sua juventude, sempre entregando seu coração
numa bandeja e fazendo papel de bobo, mas nunca mais repetiria os
mesmos erros. Jurou para seu irmão e para si mesmo, nunca mais faria isso,
e estava falando sério.
— Nós somos amigos, Bonnie — disse suavemente. — Não estrague
tudo.
Ela assentiu e lançou um sorriso no qual não acreditou porque não
alcançou seus olhos e aquela dor desagradável fixou residência em seu peito
novamente.
— Venha, seu incômodo de mulher — disse estendendo a mão para
ela. — É melhor encontrarmos uma maneira de colocá-la para dentro de
casa, de novo —acrescentou, fazendo som de desaprovação para ela. —
Está parecendo uma gatinha afogada.
— Como tem jeito com as palavras, Jerome — disse, pressionando a
mão livre sobre o coração e fingindo desfalecer. — Vou desmaiar se
continuar dizendo coisas tão românticas.
Ele bufou e pegou sua mão e depositou na curva de seu braço. — Se
desmaiar, vou deixá-la aqui e terá que encontrar o caminho de casa por
conta própria. Estou faminto e não tenho energia suficiente para transportar
seu cadáver até a casa, garanto-lhe.
Desta vez, Bonnie bateu com as costas da mão na cabeça. — Oh,
minha nossa — disse, enquanto seus joelhos se dobravam, e ela deslizou
elegantemente no chão. Um momento depois, olhou para ele por entre os
dedos e sorriu. Rindo e balançando a cabeça, ele se abaixou e pegou as
mãos dela.
— Sua boba — disse, com muito afeto em sua voz, incapaz de evitar.
— Eu sei —disse com um suspiro, antes de se colocar de pé com
menos elegância do que tinha caído.
Aliviado por ela ter recuperado seu bom humor, Jerome colocou a mão
dela na curva de seu braço e a acompanhou de volta para casa.
MAIS DAMAS OUSADAS

Emma V. Leech
9786599019845
Adquira Aqui
D O -L 1

Dentro de cada jovem tímida e isolada pulsa o coração de uma leoa,


uma pessoa apaixonada disposta a arriscar tudo pelo seu sonho, se puder
encontrar a coragem para começar. Quando essas jovens ignoradas fazem
um pacto para mudar suas vidas, tudo pode acontecer.
Dez mulheres - dez desafios inesperados. Quem se atreverá a arriscar
tudo?
Desafiando um Duque
Sonhos de amor verdadeiro e felizes para sempre.
Sonhos de amor são todos muito bons, mas tudo o que Prunella
Chuffington-Smythe quer é publicar seu romance. O casamento a custo de
sua independência é algo que ela não considerará. Experimentou o sucesso
escrevendo sob um nome falso na revista semanal The Ladies, onde seu
álter ego está alcançando notoriedade e fama, a qual Prue gosta bastante.
Um dever que tem que ser suportado...
Robert Adolphus, o duque de Bedwin, não tem pressa em se casar, ele
já fez isso uma vez e repetir esse desastre é a última coisa que deseja. No
entanto, um herdeiro é um mal necessário para um duque e não pode se
esquivar disso. Uma reputação sombria o precede, visto que sua primeira
esposa pode ter morrido jovem, mas os escândalos que a bela, vivaz e
rancorosa criatura forneceu à sociedade não a acompanharam. Devia
encontrar uma esposa. Uma esposa que não seria nem bonita nem vivaz,
mas doce e sem graça, e que com certeza ficasse longe de problemas.
Desafia a fazer algo drástico
O súbito interesse de um certo duque desprezível é tão desconcertante
quanto indesejável. Ela não vai jogar suas ambições de lado para se casar
com um canalha assim como seus planos de autossuficiência e liberdade
estão se concretizando. Se mostrar claramente ao homem que ela não é a
florzinha que ele procura, será suficiente para dar fim às suas intenções?
Quando Prue é desafiada por suas amigas a fazer algo drástico, isso parece
ser a oportunidade perfeita para matar dois pássaros.
No entanto, Prue não pode deixar de ficar intrigada com o ladino que
inspirou muitos de seus romances. Normalmente, ele desempenhava o papel
de bonito libertino, destinado a destruir sua corajosa heroína. Mas será
realmente o vilão da trama desta vez, ou poderia ser o herói?
Descobrir será perigoso, mas poderá inspirar sua melhor história até o
hoje.
**** Atenção: Este livro contém uma seleção cuidadosa de
determinação silenciosa, boca firmemente fechada e níveis (quase)
intransponíveis de tensão. Embora acoplado à presença de encontros
sexuais ocasionalmente descritivos, temos o prazer de destacar que este
livro - e série - não está de modo algum próximo da erótica. ****
Emma V. Leech
9786588382103
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D O -L 2

Dentro de cada jovem tímida e isolada pulsa o coração de uma leoa,


uma pessoa apaixonada disposta a arriscar tudo pelo seu sonho, se puder
encontrar a coragem para começar. Quando essas jovens ignoradas fazem
um pacto para mudar suas vidas, tudo pode acontecer.
Dez mulheres - dez desafios inesperados. Quem se atreverá a arriscar
tudo?
Roubando um Beijo
O desejo de arriscar e arrebatar a felicidade.
Ser ousada e beijar um homem ao luar é uma boa ideia, mas os homens
e o luar não caem do céu à vontade.
Até aconteça.
Sob instruções de uma amiga, a monótona Alice Dowding permanece
sozinha numa varanda iluminada pelo luar. Não é o curso de ação mais
sensato para uma jovem geralmente sensata. No entanto, sendo sensata,
Alice ganhou um lugar entre as isoladas e sua única chance provável de se
casar, é com um homem que acha repulsivo.
Tinha que fazer algo.
Uma consciência culpada e um homem mau.
Quando a irmã de Nathaniel Hunt implora por um favor, ele
dificilmente pode recusar. Nathaniel, coproprietário de uma das mais
escandalosas casas de apostas em Londres, é responsável pela reputação
destroçada de Matilda, e ela sabe que ele não está em posição de lhe negar
nada.
Ela implora para que ele beije sua amiga tímida em uma noite de luar.
No entanto, uma série de eventos aos quais nenhum deles poderia ter
previsto é desencadeada.
Quando um pequeno favor incendeia um inferno.
Incendiada por um beijo que lhe rouba a alma, a tímida, sensível e
enfadonha Alice, está soltando faíscas por onde quer que seus pés passem, e
tudo o que Nathaniel pode fazer é rezar para que ele não se queime.

Emma V. Leech
9786588382295
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D O -L 3

Dentro de cada jovem tímida e isolada pulsa o coração de uma leoa,


uma pessoa apaixonada disposta a arriscar tudo pelo seu sonho, se puder
encontrar a coragem para começar. Quando essas jovens ignoradas fazem
um pacto para mudar suas vidas, tudo pode acontecer.
Dez mulheres - dez desafios inesperados. Quem se atreverá a arriscar
tudo?
Quebrando as regras
Um enigma irresistível...
A senhorita Lucia de Feria é possivelmente a mulher mais bonita do
mundo e, sem dúvida, a mais bonita que o visconde de Cavendish já viu.
No entanto, essa beleza misteriosa está tramando algo, algo que
convenceu Cavendish de que seus motivos são menos do que puros.
O visconde não precisa de mais motivação para passar seu tempo na
companhia adorável de Lucia, mas desejo e intriga criam tentações
profanas.
Um amante perigoso...
Lucia não é tudo o que parece ser. Ela tem segredos... segredos pelos
quais um homem a mataria.
Agora, com a vingança em seu coração e uma fortuna em jogo, ela está
perto de ter tudo ou perder a vida.
Mas, em cada curva, o Visconde Cavendish está lá, com o seu sorriso
de pirata e aqueles olhos azuis perversos.
Um círculo ousado de amigos...
Quando um incomum clube do livro traz para sua vida damas
peculiares, Lucia fica encantada e atraída por sentir, pela primeira vez, que
pertence a algo. Entre suas novas amigas e um homem pelo qual corre o
risco de se apaixonar, seus planos começam a dar errado.
Essa linda Senhorita passou a vida inteira desejando vingança, mas
nunca esperou encontrar ao longo do caminho, algo com o qual se
importaria mais.
Lucia não poderia se permitir distrações, amigos ou um nobre
desconfiado. No entanto, de repente, ela tinha os três.
Talvez fosse a hora de quebrar suas próprias regras.
Emma V. Leech
9786588382486
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D O -L 4

Dentro de cada jovem tímida e isolada pulsa o coração de uma leoa,


uma pessoa apaixonada disposta a arriscar tudo pelo seu sonho, se puder
encontrar a coragem para começar. Quando essas jovens ignoradas fazem
um pacto para mudar suas vidas, tudo pode acontecer.
Dez mulheres - dez desafios inesperados. Quem se atreverá a arriscar
tudo?
Seguindo seu Coração
Um amor perdido ...
Kitty Connolly passou toda a última temporada assegurando que seu
tio tem tentado encontrar um marido, mas há um problema que ele
desconhece.
Ela já tem um.
É verdade que tinha apenas onze anos quando a cerimônia foi realizada
na presença do cão de sua família, e seu noivo tinha apenas treze anos. No
entanto, os votos foram trocados e, no que diz respeito a Kitty, uma
promessa é uma promessa. Luke Baxter prometeu amá-la até que a morte o
separasse e ele não vai escapar disso.
Os problemas não param por aí, no entanto, pois Luke desapareceu de
sua vida apenas semanas após seu casamento secreto, e Kitty nunca mais o
viu.
Até agora.
As esperanças reacenderam ...
Quando Luke aparece do nada na festa na casa de verão do Conde de
St. Clair e anuncia seu noivado com a bela herdeira, Lady Francis
Grantham, Kitty fica atordoada ...
... e a honra deve mencionar o problema.
Um coração determinado ...
Todo caos se instala quando Kitty ameaça processar por quebra de
promessa e ela tem uma questão de dias para convencer Luke de que sua
namorada de infância vale mais do que a fortuna da Srta. Grantham.
Mas este Luke não é o menino despreocupado de sua infância, e
lembrá-lo do que significa viver por amor, pode significar arriscar mais do
que apenas seu coração.
SOBRE AUTORA

Pela autora:
Comecei essa incrível jornada em 2010 com A chave para
o Erebus, mas não tive coragem de publicá-lo até outubro
de 2012. Para quem já passou por isso sabe que publicar
seu primeiro trabalho é uma coisa assustadora. Ainda fico
nervosa quando um novo trabalho é lançado, mas, agora
esse terror diminuiu um pouco. Hoje o meu pavor é quando minhas filhas
tiverem idade o suficiente para lê-los.
Que horror! (para ambas as partes, suponho)
2017 marcou o ano em que fiz minha primeira incursão em Romance
Histórico e no mundo do Romance da Era Regencial, e meu Deus, que ano!
Fiquei encantada com a resposta a esta série e mal posso esperar para
adicionar mais títulos
Sou muito influenciada pelo belo interior da França onde vivo. Apesar
de ser nascida e criada na Inglaterra, moro no sudoeste francês há vinte
anos. Minhas três filhas lindas são todas bilíngues e a mais nova, de apenas
seis anos, está mostrando sinais de seguir os meus passos após produzir The
Lonely Princess totalmente sozinha.
Um passarinho me disse que o livro dois estará disponível em breve...
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