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1987 Art Acrtupinamba

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A PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL NO BRASIL:

Sua Evolução e Situação Atual

ANTÔNIO CAUBI RIBEIRO TUPINAMBÁ*

RESUMO
A trajetória da psicologia organizacional pode ser traçada a par-
tirt da própria evolução da psicologia como ciência e profissão no Bra-
sil.
Neste trabalho nós temos por objetivo compreender a situação
desta área da psicologia no âmbito das universidades e do mercado de
trabalho, caracterizando e criticando os modelos de formação e de
atuação do psicólogo organizacional no Brasil, sugerindo paralelamente
possibilidades de sair de um impasse ideológico que apronta a formação
e a atuação destes profissionais.
Para a efetivação deste projeto, consideramos, além da nossa ex-
periência como professor e supervisor de estágio nesta área do Curso de
Psicologia da Universidade Federal do Ceará, as idéias dos diversos au-
tores que formam o livro publicado pelo Conselho Federal de Psicologia
em 1988, que, de acordo com seu r.refácio, pode ser considerado "um
marco na história da psicologia braslleira"**.
A partir da demarcação e caracterização do papel do psicólogo
brasileiro em diferentes fases, avaliamos esta prática no curso de psico-
logia da UFC*** e sugerimos novas perspectivas de ação, quer seja a ní-
vel acadêmico ou profissional.

ABSTRACT

. The history and present situation of organizational psychology in


Brazil can be understood from lhe point of view of lhe development of
psychology as seience and profession.
.. The purpose of Ihis articIe is to deseribe the situation of this spe-
CI~I~ ~~Id <;>fpsychol?gy in the University and job market, showing and
cntícízing 115 academic pattems and application.
The retlexion .about po~sible altematives to lhe ideologicaI pro-
~Iems of this acadenuc formation and application is also part of this ar-
IIcIe.
Two main sources were considered for lhe realization of this
project: our o~ e~perience with this branch ofknowledge as professor
at Fede~l. University o~ C~ará an~ !he ideas of lhe book published by
lhe Brazlll~n Psychologísts .Council IO lhe year 1988. We recognize as a
fact the opmion of ItS publishers, who considered it a milestone in lhe
history of psychology in Brazil.
The acad~mic psychological formation at the Federal University
of Ceará IS descnbed based upon lhe division of different developmental

(*) Professor Assistente do Departamento de Psicologia da UFC


(U) Conselho Federal de Psicologia, Quem é o PsW6Iogo BI3IIÜciro? Edicon, São Paulo, 1988.
(***) Universidade Federal do Ceará

Rev. de Psicologia, 5 (2): pág. 95-104, Jul/Dez. 1987 95


Apresentamos abaixo um quadro geral representativo da população de
periods in which we can insert the development of psychology in Brazil
Itself. I psicólogos inscritos por região em todo o Pais, apontando a grande concentração
h Suggestions for new possible actions related to the formation of destes profissionais na região Sudeste, onde de fato a psicologia acadêmica teve o
t .e psychologísr as well as new perspectives for the application of orga- seu início e apresenta o seu maior contingente:
mzanonal psychology out of the University are also presented.
"De modo bastante aproximado à distribuição dos cursos, registra-se a
distribuição dos psicólogos pelas Unidades da Federação (...). Somos 58277 psicó-
l-Introdução logos em atividade profissional. Cerca de 75% desse total são vinculados aos CRPs
Existem diferentes definições do q '. 04,05 e 065 e trabalham sobretudo em São Paulo (23336), Rio de Janeiro (11 396)
Os "Psychological Abstracts" id uep~ossa s.er psicologia organizacional. e Minas Gerais (6 449). Juntos, esses Estados abrigam 44 181 dos 58 277 psicólogos
- consi eram a sicologia do Trabalho e da Or ani- trabalhando na profissão em todo o Pais."6
zaçao como aquel.aárea 9ue engloba as seguintes atividades: g
L Análise Institucional A Psicologia tem se caracterizado ao longo do tempo como uma profissão
2. Recrutamento e Sel~ão de Pessoal eminentemente "feminina": mais de 80% dos profissionais psicólogos são mulheres.
3. Treinamento e avaliação, ' A procura deste contingente feminino, são atribuídas as características intrínsecas
4. Fatores Humanos no Trabalho e da profissão dentre outros fatores: "Se a Psicologia, enquanto ciência, está voltada
para o estudo do comportamento de homens e animais, o papel do psicólogo, en-
5'. Planejamento Ambiental e Comportamento Humano.
quanto profissional, objetiva facilitar o desenvolvimento da pessoa e a realização
P , Iniciando CO~1O~m apêndice de ciências e profissões já estabelecidas no
plena de suas potencialidades, levando em conta a realidade, em cada caso presente.
ais, como a ~edagogI~, Filosofia e Medicina ou mesmo como disciplina curricular
~~stas ffrmaçoes, a psicologia manteve este status complementar até a vigência da
er regu amentad?ra da pr?fissão em 1962. Já nesse ano 15 profissionais se cadas- relações humanas do pessoal administrativo e de supervisão e, de um modo geral, para com
t~a~am no MEC comoy.sIcól.ogos, chegando a 11 343 em 1974 este número. Vale programas de desenvolvimento gerencial. E mais, o interesse pelos aspectos sociais do traba-
ain a ressal.tar que.? Ministério da Guerra criava um curso de psicologia em meio a lho humano levou logicamente ao estabelecimento do que hoje é referido como psicologia or-
outras mO':lffient~çoes para ~ fo~ação em instituições civis de profissionais desta ganizacional. Nesta nova disciplina, o enfoque principal é sobre a motivação humana, procu-
rando-se compreender os efeitos da estrutura organizacional sobre a motivação, satisfação no
área. A PSIcologia Aplicada J~ vinha sendo exercida na década de 50 na forma de trabalho e eficiência no trabalho. O desenvolvimento da psicologia organizacional acarretou
trabalhos de consult.onos,. gabinetes, serviços, institutos e centros destinados a di- um crescente interesse por estudos de liderança, filosofias de administração, políticas e estru-
versos c~pos da p~IcologIa. ~c~nteceu no período imediatamente posterior à regu- turas organizacionais, sistemas de incentivo e outros aspectos das organizações relacionados
lame~taçao profissional a cnaçao de um curso de Psicologia Industrial (1963) na tanto com a satisfação humana como com a eficiência organizacional." (Vol, I, p. 6 e 7)
Schein (1982) atribui, por sua vez, ao desenvolvimento de teorias e métodos que capacitaram
PUC , sendo que foi no ISOp3 onde a psicologia organizacional teve uma forte os psicólogos a melhor compreender e agir sobre a organização, o aumento do interesse pela
presença nos seus curs~,.especialmente no campo da psicotécnica. O decreto de 27 psicologia organizacional. Limita o nome de psicologia industrial àquela fase de ação do
de agosto de 19~2.perrruna, além do cadastro de profissionais que exerciam ativida- psicólogo sobre as questões voltadas para a área de seleção e avaliação do trabalhador, passan-
des nas áreas Clínica e Escolar, também aqueles que exercessem a psicoloai" "Apli- do a ocupar novos espaços à medida em que entravam em contato com os problemas organiza-
cada ao Trabalho". ..~ cionais, integrando equipes de trabalho com novos propósitos, como, por exemplo, as pesqui-
sas de "tempos e movimentos" junto aos engenheiros, a padronização do trabalho através das
. . Para q~e se entenda a situação da psicologia organizacional na realidade análises das tarefas, estudos do ambiente físico e sua relação com quantidade e qualidade do
brasil7lfa d.e hOJ~, necessário se faz acompanhar de forma sumária a evolução da trabalho etc., evoluindo para estudos sobre sistemas de recompensa e punição nas organi-
própna psicología brasileira, ~etirando oportunamente desta trajetória aqueles zações e seus efeitos motivacionais e condicionadores da aprendizagem; estudos sobre o rela-
cionamento entre os funcionários entre si e com seus chefes e as conseqüências na produtivi-
fenornenos qu~ apontam o surgunento e ? desenvolvimento de uma área específica dade e no moral. "Foi com o estudo da motivação dos funcionários, dos sistemas de incenti-
que ora denommamos de psicologia organizacionaj+, vos, da política de pessoal e das relações intergrupais que a organização como um sistema total
pela primeira vez passou a ser melhor compreendida." (p. 5) Para o autor, os conceitos e teo-
rias adicionais são o que no presente molda a psicologia organizacional, aqueles que derivam
(1) Ministério de Educação e Cultura de teorias da dinâmica dos sistemas e das teorias desenvolvi mentais. Neste caso, os estudos da
(2) Pontiffcia Universidade Católica psicologia industrial como compreendidos por McCormick e Tiffin (1977) estão contidos ou
(3) Instituto ~e Seleç.ão e Orientação Profissional fazem parte de um período no curso da evolução da psicologia organizacional definida por
(4) McConruck & Tiffin (1977) ainda se utilizaram do termo "Psicologia Industrial" ara Schein.
assuntos que ora podem p~~ncer a? c~po d~ es~do da psicologia organizacionfI. A ~: A pesar de que Schein (1982) nos ofereça uma visão mais complexa do que vem a ser a psico-
logia organizacional atualmente, consideramos útil para as nossas reflexões neste momento
:un::i~;e: ~m~ rr:lOrlroxUnIdade histórica do início da aplicação de estudos de psiCOlogia no
levar em conta todos os aspectos desta área da psicologia que possam ser pertinentes à compre-
d ~. ra a o, o comportamento humano relacionado com a indústria "e à aplicação
ensão do nosso tema. Desta forma, dependendo do contexto ou do momento histórico a que
n~:~:nte~:~~t(~~fbtp~ ~)mportamento do homem para a solução dos problemas humanos reportamos nossa análise, poderemos nos referir à psicologia industrial ou do trabalho corno
V' sinônimos, inclufdas na psicologia organizacional ou como parte de um período do seu desen-
,,;;:mo~ o q~~ os ::st~r~ fmpreendem como o surgimento da psicologia organizacional:
ran ~ .c~ _e 40 e 1950 devotou-se muita atenção aos aspectos das relaç~ hu- volvimento.
manas na a mlIUs~ç_ao d~ pessoal, incluindo um interesse particular r inte ão ru I (5) Conselhos Regionais de Psicologia
pr;:cessos ~e s~pervlsao e hde~ança, comunicação e satisfação no trabalho. Esta ~fas; m~~; (6) ROSAS, Paulo, et alii. "Quantos e Quem Somos?", ln: Conselho Federal de Psicologia,
so re as re açoes humanas na indüstria levou a uma maior atenção para com o treinamento em Quem 60 Psicólogo Brasileiro?, Edicon, 1988, São Paulo, p. 39.

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Assim, por se af~star do mO,d~lotecnolõgico, pelo caráter humanístico que predo- Freqüência relativa com que determinadas áreas da Psicologia
n:una em sua ~rá~lca,,o exercicio da psicologia tem muito a ver com o papel expres- são abordadas nas pesquisas relatadas na SBPC em 1983 e 19848:
s~voque ,é a~~b~ldo,a_mulhe.r,.~m ?poslçao ao papel instrumental por sua vez rela-
cionado as ciencias naO-SOCIalS e a tecnologia, reservado ao homem pelo establish- Área G2- Psicol. Geral G2-1- Psioobiolog. G2-2-An.Comport. Total
menr'I- 1983 1984 Total 1983 1984 Total 1983 1984 Total Geral

Fund. Med. 11,2 25,6 16,7 5,3 6,5 5,9 15,8 21,1 18,9 15,0
Fatores de_ordem econômica são certamente contributivos para este esta- Proc. Bás. 4,5 3,7 4,2 21,1 2,2 10,7 18,1 14,0 17,9 10,4
P. Fisiol. 50,0 41,3 45,2 9,6
tuto. Aos homens. sao reservadas profissões que se coadunem com o exercício do P. Comparo 7,9 41,3 26,2 2,6 1,1 5,8
poder e em especial com o domínio econômico advindos do exercício profissional P. Social 27,6 15,9 23,1 2,6 1,2 10,5 22,8 15,8 15,2
além destes aspectos referentes ao "caráter" masculino. ' P. Desenv. 25,4 14,6 21,3 28,9 28,1 28,1 18,5
P. Cogn. 5,2 4,9 5,1 7,9 3,1 3,5
. Schein (I 982~ utiliza-se .de estudos que visam a delimitar as profissões e P. Ensino 8,9 6,1 7,9 13,1 7,0 9,5 6,7
~elaclOná-las com motivos pessoais da escolha profissional. O autor sugere que ao P. Desenvolv. 25,4 14,6 21,3 28,9 28,1 28,4 18,5
m~és de procurar encontrar "um conjunto único de motivos ou valores que deter- P. Cogn. 5,2 4,9 5,1 7,9 3,1 9,5
mm~ a escolha ~a profissão, talvez seja ~ais produtivo compreender que uma de- P. Ensino 8,9 6,1 7,9 13,1 7,0 9,5 6,7
te~ada profissao pode atender a uma séne de necessidades e utilizar uma série de P. Clínica 13,4 18,3 15,3 10,5 6,5 8,3 2,6 7,0 5,3 11,3
aptidões" (p. 67). P. Trab. 3,0 1,9 1,0
NSA 0,7 11,0 4,6 2,6 2,2 2,4 3,0
E~ suma, o autor aponta p~a o fato de que nossa imagem ocupacional é 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Total
uma parte Imp'?rtante de nossa auto-Imagem, talvez a mais importante. Urna com-
plexa correlaçao de fatores individuais e sociais devem ser considerados para se Existe um fenômeno paralelo à produção científica nesta área quando se
compreender o fenômeno da escolha profissional. consideram os trabalhos no contexto organizacional. Os profissionais da área se es-
Não ~ difícil, a despeito desta complexidade de fatores deterrninantes da forçam em criar instrumentos, manuais, adaptar os já existentes, pesquisar e escre-
escolh~ profissíonal, fazer .uma possível correlação entre este pequeno contingente ver sobre novas formas de intervenção organizacional, teorizar sobre fenômenos
m~c~lino qu~ ~pta pela. psicologia e sua direção às áreas que parecem corresponder organizacionais etc., sendo que esta produção muitas vezes foge aos padrões
mais ~ des~n~oes mencionadas anteriormente sobre profissões masculinas. No caso científicos estabelecidos ou é inacabada quanto a estes critérios científicos tradicio-
~ psicologia, Importante se faz investigar certos setores da área clínica e organiza- nais, tendo em vista os objetivos limitados às fronteiras da organização, omitindo
cional em contrapartida à área escolar como mantenedores destas expectativas. por vezes uma produção que poderia contribuir para o avanço ou novas descobertas
neste campo do conhecimento.
A nível dos cursos de graduação, naqueles cursos onde existe a disciplina
2 - Produção científica em Psicologia de "Monografia", esta produção não-cadastrada, exceto quando transcende os limi-
tes do próprio curso e passam a compor anais de reuniões científicas, nos impede de
. . Do ponto de vista hist6rico, a produção científica na área da psicologia or- calcular a quantidade e qualidade destes trabalhos. No caso específico do Curso de
garnzaclOn~ sofr.e uma d~fasagem semelhante, mas não proporcional às demais Psicologia da UFC, identificamos uma afluência mínima de trabalhos que versem
área~ da p~lcologIa no Bras~. Até me.ados de 1960, segundo Matos (1988), esta pro- sobre temas de psicologia organizacional. No ano de 1989, das 52 monografias
duçao, e!a ISolada e ~sJX>rádlca,relacionando-se principalmente a relatos de ativida- aprovadas, duas foram formalmente registradas e apresentadas na SBPC, ambas na
des .c~cas e à. afençao de testes e escalas, s6 se solidificando a partir de 1980 com área clínica e apenas 03 estavam diretamente voltadas para a área em questão.
a cnaçao dos diferentes cursos de pós- graduação no Brasil. A "Revista de Psicologia" da Universidade Federal do Ceará, nos seus seis
_ ':'- ~rática pr~fissional, não tendo este respaldo da produção científica até anos de existência, tem três artigos que podem ser considerados corno pertinentes ao
en~ao se limita~a à aplicação ou re~tição de instrumentos e à viabilização de t~rias nosso tema, sendo que dois destes artigos já foram publicados e um terceiro está no
onund~ de países ~ desenvolvidos, onde muitas vezes resultava urna adaptação prelo.
grosse~a deste matenal carente de um redimensionamento face às idiossincrasias Somem-se a estes fatores a existência de poucos cursos de pós-graduação
culturais etc.
que tenham explícito o seu direcionamento para a psicologia organizacional em es-
. A .SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), entidade que pecífico, ainda o fato de que no mercado de trabalho onde estes profissionais se en-
Visa a aglutínar os e~forços dos diversos centros produtores de ciência no País e que contram inseridos a correlação entre sucesso profissional e produção científica é
Fe servir de ~ermometro para a situação da ciência no Brasil, pode nos dar uma duvidosa; o pragmatismo e o teor eminentemente técnico do seu, desempenho pro-
Idéia da evoluçao desta produção científica no âmbito da Psicologia 'nos anos mais fissional desestimulam ou distanciam-no deste tipo de produção. E estabelecida uma
r~entes. Observ~-se a produção científica por vezes insignificante ou mesmo ine- contradição entre a demanda organizacional contra a entropia e a exigência da per-
xistente, no que diz respeito à psicologia organizacional: formance do psícõlogo.

(7) Ibidem, p. 40. (8) MATOS, Maria A. "Produção e Formação Científica em Psicologia", In: Quem 60 Psic6lo-
go Braileiro? CFP,Edicon, SP, 1988, p. 113.

98 Rev. de Psicologia, 5 (2):pág. 95-104, Jul/Dez. 1987 Rev. de Psicologia, 5 (2): pág. 95-104, Jul/Dez. 1987 99
desenvolvimento geral da psicologia organizacional no Brasil e a experiência da
3 - As quatro fases da psicologia organizacional no Brasil? UFC:
A descaracterização da psicologia organizacional se intensifica a partir do I - Fase preliminar: as bases científicas e universitárias
"clinicismo" que permeia a formação e os currículos de psicologia nas universidades A Psicologia Experimental penetra nos domínios da Filosofi~, E?ucação e
brasileiras 1O. Psiquiatria, sendo ensinada nas universidades, sobretudo quanto à aplicaçao de tes-
Para compreender esta afirmação, é necessário que se leve em conta a in- tes psicológicos na educação e na clínica. ... . ..
serção deste psicólogo a ser formado num mercado de trabalho e, do ponto de vista Nesta fase, as primeiras gerações de fut~ros pSlc~l~gos m~ustnaIs a~q~;
"sistêmico", numa sociedade que pressupõe valorações gradativas e status diferen- ram os fundamentos científicos, mas sob um pnsma de diagnóstlc? prescntí".el ,
ciados às diferentes áreas de atuação profissional. Tampouco podemos negligenciar com predominância da psicometria. Isto e.xplica a Psicologia In~ustrial e Orgaruza-
questões de ordem político-econômicas no desenvolvimento da sociedade brasileira, ciona! ter começado por urna fase predommantemente psicométrica.
que acompanham e de certa forma determinam a estrutura e o conteúdo dos currí-
culos acadêmicos. A grosso modo, podem-se detectar estas diferenças ainda hoje 11e 111- Fase psicotécnica e fase educacional
quando se faz uma comparação dos diferentes currículos e suas filosofias subjacen- do treinamento nas organizações
tes entre as diferentes universidades. Some-se a este fato o escasso avanço da pro- Fase bastante técnica, objetivando a aplicação da psicologia expe~ntal
dução científica específica, especialmente quando se compara com as demais áreas no âmbito do trabalho, predominando trabalhos de seleção profissional, VISandoa
da psicologia. adaptar o homem ao trabalho, segundo conc_eitostayloristas. . . _
Como vimos anteriormente, a psicologia industrial/organizacional iniciou a Tendo sido constatado que a seleçao com os recursos psícotécnícos nao era
sua participação nos currículos dos cursos de graduação com o estudo e desenvol- suficiente para a alocação adequada e rendimento .do empre~a~o, outros fatores fo-
vimento de atividades na área psicométrica, o que é constatável, por exemplo, nos ram detectados dentro da organização que podenam contnbwr para este trabalho.
cursos de psicologia da USP, UFRJ e UFPell. Podemos observar que a formação Houve desta forma urna expansão do papel do psicólog? n;s~e setor. Pod~mo~ con-
do psicólogo foi precedida pela prática profissional que desta forma influenciava siderar aqui um rudimento do que seja uma abordagem SlS.tenucada orgamzaçao.
sobremodo os futuros currículos. Esta terceira fase continua, contudo, caractenzando uma expansao d~s
Bastos (1988) questiona o modelo de atuação do psicólogo em função do métodos anteriores; novas técnicas serão aplicadas em outros setores da orgam-
contexto histórico-social em que a profissão surgiu e se desenvolveu, relacionando
zação. .. balh d
ainda este modelo à própria origem social destes profissionais. Este modelo de Podemos traçar um paralelo entre estas fases e o iníCl(:~do tr~ o e su-
atuação é reproduzido pelas instituições de ensino, o que significa um reforço na pervisão de estágio em psicologia orgcu:m~cional ~o curso de I?sl~logIa da U~C .no
manutenção desta praxis. Isto resulta numa prática questionável quanto a sua ade- ano de 1977, quando a preocupação principal sena a de capaclt~çao dos ~sta!?ários
quação à realidade social ou às possibilidades de contribuir na superação dos cruciais para transferir técnicas para o contexto das ~mp~as. ~ própna denomm~çao d~
problemas do homem brasileiro. disciplinas básicas e de apoio ao fu~ro estágio: P~colo~ do Trabalho e PSlcolo~
A promoção de urna identidade básica dos profissionais é intenção dos da Indústria, juntamente com a bibliografia sugenda, dao margem a esta concepçao
cursos de formação. Bastos (1988) concorda com a existência desta identidade e do trabalho desenvolvido neste período.
mostra a dificuldade para o estabelecimento de critérios que sejam divisores das di- A área de psicologia organizacional ganha ainda nes~ mesma é~ca ';1m
ferentes áreas de atuação. impulso "politizador" no que tange à concepção do papel do psicólogo O~g~clO-
Neste "gerneralisrno" da graduação, é possível defmir a nível formal, nal. Desenvolvem-se então pré-concepções do que se dev: e ;;e pode .atm~ com o
através de grupos de disciplinas e estágios, o encaminhamento do profissional para trabalho desenvolvido nesta área O caráter ideológico atribuído à Psicologia c~mo
diferentes áreas de estudo e de atuação. Podemos observar a nível da UFC, tomando reforçadora das relações de exploração .no ~terior ~ empresa e. seu C?mprOlmSso
como exemplo o curso de graduação em psicologia, certas tendências na formação com a manutenção do status quo organizacional, aliados a ~ distanc~ament~ ~
do psicólogo organizacional, mais especificamente no que diz respeito à prática do técnicas até então desenvolvidas e aplicadas, ferramentas consideradas imprescindí-
estágio, em semelhança ao caminho seguido pela própria psicologia organizacional veis para a atuação na época, acentuaram as dificuldades na c~n~iliação entre poten-
no Brasil. cialidades do mercado de trabalho e ideologia dos novos estagiários.
Transcrevemos a seguir os "divisores da psicologia organizacional" no IV - Fase psicossociol6gica:
Brasil conforme a concepção de Pierre Weil (1974), traçando um paralelo entre o
Problemas da fase anterior que foram sendo sentidos no Brasil, EUA e
Europa:
(9) Baseado no trabalho apresentado com a Prol! Maria de Fátima de Sena e Silva no Encontro a) eficientes métodos de recru~ent.?, sel~ã~ e trein~n~ ~? inefi-
Nacional de Administradores e Psicólogos em Salvador, Bahia, em 1987. cientes se não houver na orgamzaçao um clima organIzaC~ona! .resul-
(10) BATITUCCI, Márcio D. "Psicologia Organizacional: Urna Saída para uma Profissão em tante de uma "cultura organizacional", favorecendo e apoiando as mu-
Crise no Brasil", em Arq_iws Brasileir08 de Psicologia Aplic •••• Rio de Janeiro
30(1-2): 137-156, jan.-jun. 1978. ' danças propostas; _
(11) USP: Universidade de São Paulo; UFRJ: Universidade Federal do Rio de Janeiro: UFPe· b) o treinador pode funcionar como agente de evoluçao (ou mesmo de re-
Universidade Federal de Pernarnbuco. ' .

Rev. de Psicologia, 5 (2): pág. 95-104, Jul/Dez. 1987 101


100 . Rev. de Psicologia, 5 (2): pág. 95-104, Jul/Dez, 1987
volução), mas também como agente catalisador e de estagnação; O Brasil tem um pólo industrial e empresarial que, seguindo as suas carac-
c) o homem de recrutamento, seleção e treinamento deve ser na realidade terísticas de país dos extremos, se localiza num continuum de artesanal ou pré-in-
um agente de mudanças, de evolução; dustrial (veja, por exemplo, as indústrias de redes, as fiações, as fábricas beneficia-
d) é necessário que o psicólogo industrial se conscientize deste seu papel; doras, as usinas etc.) até a informatização e robotização (veja, por exemplo, as
e) o problema é saber como fazer evoluir o homem e a organização ao indústrias automobolísticas, os bancos, os pólos petroquúnicos, o desenvolvimento
mesmo tempo. de tecnologia de ponta etc.). Neste universo organizacional heterodoxo, podem a
Trabalhos de psicossociõlogos organizacionais (McGregor, Argyris, Blake qualquer nível permear as questões das relações de trabalho e a grosso modo a in-
e Mouton, nos EUA, e Max Pagês, na França) levaram às seguintes experiências: terferência da psicologia organizacional. Não é nosso intuito neste momento qualifi-
1) todas as operações de uma organização são influenciadas pela cultura car ou graduar a participação de diferentes conhecimentos na manutenção e desen-
organizacional; volvimento organizacional. O que nos compete é abstrair deste universo multifa-
2) os diferentes tipos de cultura organizacional (autoritária, paternalista, cetário aquele elemento componente desta organização que, sob uma "lupa", pode
diplomática, participante etc ...) exigem diferentes maneiras de recrutar, ser analisado em suas funções ou conseqüências. No sentido inverso, isto é, vendo
selecionar e treinar; da "sala de espera" ou do "galpão da produção", não é difícil acompanhar ao longo
3) para que uma organização evolua, é necessário agir sobre a cultura or- da estrutura organizacional a impregnação de ações diferentes (aqui considerando
ganizacional; também políticas e filosofias subjacentes) na vida do trabalhador, nas relaçêos de
4) s6 se consegue o item 3 acima por meio de estratégias de D.O. (Desen- trabalho e no sistema organizacional.
volvimento Organizacional), em que os próprios dirigentes se empe-
nham na mudança; As quatro fases aqui compreendidas que caracterizam a formação e a prá-
tica da psicologia organizacional no Brasil ainda servem de parâmetro para caracte-
5) as operações de recrutamento, seleção e treinamento têm de adaptar-se
rizar diversas possibilidades e modelos acadêmicos e de prática profissional. As uni-
ao estilo cultural escolhido.
versidades primam pela formação de profissionais que respaldem as necessidades do
. Podemos destacar nesta 4! fase duas variantes que serão denominadas res- mercado, ainda que paralelamente funcione como um dos poucos ambientes propí-
pectlv~ente de Subfase de sensibilização e Subfase de D.O., com as seguintes ca-
ractenstícas: cios ao questionamento e revisão destes princípios e modelos de ação.
A demanda organizacional muitas vezes corrobora com a entropia do co-
Subfase de sensibilização (década de 60) - adoção de processos de T- nhecimento da psicologia organizacional, freando sua evolução ou transformação.
Group. Os métodos clássicos de discussão dos casos só mudam opiniões mas não Limitando-se à execução e inserção de "tecnologia psicológica" no âmbito da orga-
comportamentos efetivos. '
nização, a psicologia funcionaria de "cara-metade" da engenharia industrial .
. " S~bfase de D.O. (década de 70) - reconhecimento de que os métodos de "A fábrica, como se vê, prescinde da intervenção do psicólogo na escolha
sensibílização 'ta . .
. " necessi vam msenr-se numa estratégia de D.O. que envolvesse os de seus funcionários e na manutenção de um bom andamento da produção. Isto é
própnos dmgentes da organizações. possível devido a dois mecanismos básicos: primeiro, através da intervenção da En-
Passada a f~ d~ Administração de Recursos Humanos, o psicólogo for- genharia Industrial, que se dedica ao estudo pormenorizado do trabalho, visando à
mado ?o ~urso de psícoíogíe da UFC deveria se preocupar com o Desenvolvimento maximização dos lucros por meio da simplificação ad extremum da atividade do
Orgamzaclon~; a _VlSaomacroscõpíca e sistêmica deveria nortear sua prática. Con- operário, o que não só agiliza, pela divisão do trabalho na linha de montagem, a con-
ceber a.or~amzaçao COmoum sistema e interferir nesta organização a nível de D.O. secução do produto [mal, como também, e não menos importante, torna o operário
era a principal meta neste segundo período da UFC. facihnente substituível (eis aqui o verdadeiro agente de controle do comportamento
.Surgem neste momento certas incompatibilidades entre o mercado de tra- dentro da fábrica); e, segundo, por um exército industrial de reserva farto e acoto-
b~o existente e as novas perspectivas de trabalho do novo estagiário. Preocu- velado às portas da fábrica à espera de demissões que possibilitem ao trabalhador o
paçoes com ass.untos como ':m~tivação e satisfação no trabalho" poderiam ser gera- acesso cada vez mais raro ao emprego." (CODO, 1989, p. 199)
doras de conflitos com as Idéias preconcebidas do psicólogo "psicometrista" por
parte das empresas. A hipótese de que é possível fazer evoluir o homem e a organização con-
Acompanhando estas mudanças, as disciplinas ganham nova denominação comitantemente é muitas vezes inviabilizada por fatores que também se originam na
econteüdo, passando a se chamar "psicologia organizacional". O estágio é enrique- própria ação empresarial. A ação do psicólogo organizacional será incorporada à es-
c~d? com n~vos recursos teóricos e metodológicos como, por exemplo, as super- trutura e sentida no sistema organizacional somente se localizada no nível do "fazer
vtsoes grupaISe seminários integrados . política", no estabelecimento da conduta organizacional. Katz e Kahn (1987) consi-
. , _O último. período aqui considerado se caracteriza basicamente por uma deram esta a "expressão mais significativa de liderança" e afirma que "o estabele-
concilia~o dos dois períodos anteriores. A preocupação agora é resgatar o estudo cimento de política fica no âmbito da tomada de decisão. Esta perspectiva de ação
das ~écll1casde .tra~alho do psicólogo organizacional para integrá-Ias numa con- do psicólogo organizacionaljá ganha mais espaço na sociedade organizacional brasi-
ce~ao de organização que faltava à primeira fase que poderíamos, a partir de Pierre leira e encontra correspondência no âmbito da formação acadêmica de certas uni-
We~ (1~74),denominar de "psicotécnica e fase educacional de treinamento nas or- versidades, como seria o caso da "quarta fase" por nós presentemente perseguida no
ganizações" .
curso de psicologia da UFC.

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Rev. de Psicologia, 5 (2): pág. 95-104, Jul/Dez. 1987 Rev. de Psicologia, 5 (2): pág, 95-104, Jul/Dez. 1987 103
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