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Fservienski, 6 - DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

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DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: LEVANTANDO O VÉU DA

PERCEPÇÃO

DIGNITY OF THE HUMAN PERSON: RAISING THE VEIL OF PERCEPTION

DIGNIDAD DEL SER HUMANO: ALZANDO EL VELO DE LA PERCEPCIÓN

Luiz Alexandre Solano Rossi1


Leila Fátima dos Santos2

Resumo

O objetivo deste trabalho é analisar a diversidade religiosa e cultural no contexto das escolhas individuais e
coletivas que envolvem crenças religiosas, no âmbito do ordenamento jurídico pátrio. Para tanto, serão abordadas
questões de religiosidade, fé, liberdade e suas correlações com o Estado Democrático de Direito, frente a conceitos
e diferentes abordagens, pautados no princípio fundamental da dignidade humana bem como em suas dimensões,
no alcance do desenvolvimento histórico, político e social.

Palavras-chave: dignidade humana; diversidade; cultura; religião; liberdade.

Abstract

The objective of this paper is to analyze religious and cultural diversity in the context of individual and collective
choices involving religious beliefs, within the national legal system. To this end, questions of religiosity, faith,
freedom, and their correlations with the Democratic Rule of Law will be addressed, based on the fundamental
principle of human dignity as well as its dimensions, in the scope of historical, political, and social development.

Keywords: human dignity; diversity; culture; religion; freedom.

Resumen

El objetivo de este trabajo es analizar la diversidad religiosa y cultural en el contexto de las selecciones individuales
y colectivas que implican creencias religiosas, en el ámbito del ordenamiento jurídico patrio. Para ello, se tratarán
cuestiones relativas a religiosidad, fe, libertad y sus correlaciones con el Estado Democrático de Derecho, ante
conceptos y diferentes enfoques, pautados en el principio fundamental de la dignidad humana, así como en sus
dimensiones, en el logro del desarrollo histórico, político y social.

Palabras-clave: dignidad humana; diversidad; cultura; religión; libertad.

1 Introdução

A cultura é constituída pelo conjunto dos saberes, dos fazeres, das regras, das normas,
das proibições, das estratégias, das crenças, das ideias, dos valores, dos mitos, que se transmite
de geração em geração, se reproduz em cada indivíduo, controla a existência da sociedade e
mantém a complexidade psicológica e social (MORIN, 2001, p. 56). Assim, a diversidade

1 Doutor em Ciências da Religião (UMESP) e professor na UNINTER (Centro Universitário Internacional). E-mail:
luiz.ro@uninter.com.
2 Graduada em Gestão Pública pela UNINTER. Pós-graduada em Políticas Públicas e Direitos (UNINTER). Graduanda em

Direito pela Universidade do Rio dos Sinos - UNISINOS. Graduanda em Licenciatura em Filosofia pela UNINTER. E-mail:
leila.f@uninter.com.
Dignidade da pessoa humana: levantando o véu da percepção

cultural é uma das maiores riquezas da humanidade. Nela se encontram expressas e


materializadas várias formas de criatividade humana e múltiplos elementos simbólicos que
servem de referência para a constituição das identidades pessoais e coletivas, desta e das futuras
gerações. A diversidade cultural se constitui em uma ferramenta de desenvolvimento humano,
capaz de ampliar horizontes e transformar sentidos, à medida que se percebe que cada cultura
é somente uma parte de um universo repleto de possibilidades.
O estudo dos fenômenos culturais apresenta-se como uma preocupação central na
atualidade. Na verdade, podemos falar sempre no plural: culturas. Afinal de contas, quando se
absolutiza e/ou dogmatiza um caso específico de cultura, sempre se faz em prejuízo de outra.
Assim, se usamos a expressão imperialismo para qualificar ações de nações desenvolvidas
sobre nações menos desenvolvidas, poderíamos falar de imperialismo cultural e, por que não,
de colonialismo cultural. Uma ação que acaba se tornando vetor de desestabilização e, em
muitos casos, de dizimação de culturas autóctones; uma ação que acaba por reduzir culturas
específicas a partir do que se pode chamar de linguicídio, epistemicídio.
Todos os grupos têm o direito de falar de si mesmos, em sua própria voz, e ter aceita
essa voz como autêntica e legítima. O domínio do centro exprime-se como subordinação
linguística de toda pessoa gramatical à pessoa inclusiva, mas repressiva, de um “nós” universal.
O ponto final é o desejo de ser e ter condições de falar em seus próprios termos e não como eco
ventríloquo de algum outro; é declarar “não sou uma potencialidade de alguma coisa. Sou por
inteiro aquilo que sou. Não tenho de buscar o universal. Minha consciência negra/índia/pobre
não se mantém como uma falta. Ela é. Ela segue a si mesma”.
Ao assumir novas maneiras de reconstruir e representar as vozes e experiências dos
sujeitos, enfatiza-se a abertura dada à compreensão da diferença e da alteridade, bem como o
potencial libertário que oferece a todo um conjunto de novos movimentos sociais. Assim, é
possível fustigar o imperialismo de uma modernidade iluminada, que precisaria falar pelos
outros (povos colonizados, negros e minorias, grupos religiosos, mulheres e trabalhadores) com
uma voz unificada.
Mas aceitar a fragmentação, o pluralismo e a autenticidade de outras vozes e outros
mundos traz o agudo problema da comunicação e dos meios de exercer o poder através do
comando. Articular questões de poder e de valor na pós-modernidade é com frequência
identificar princípios centralizadores — do eu, do gênero, da raça, da nação, da forma estética
— para determinar o que esses centros empurram para as periferias silenciosas e invisíveis.

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Luiz Alexandre Solano Rossi e Leila Fátima dos Santos

Resistir à mortal universalização do sentido e explorar as várias possibilidades de


inverter mapeamentos e distribuições convencionais do poder. Apenas nas margens pode-se
ainda chamar a atenção para aquilo que o sistema “universal” deixa de fora.
Assim, podemos nos aproximar da cultura pela porta do cotidiano; é justamente no
sentido das coisas, sentimentos, pessoas, ações de cada dia que se desenvolve a cultura. O
acontecer cotidiano é como uma síntese do universo social, cultural, político e religioso. Estudar
a cultura, então, implica um olhar atento sobre o cotidiano. Que é o cotidiano para as maiorias?
Seria, pois, a cotidianidade um exemplo claro e definitivo de uma anticultura de violência e de
morte? É a partir da cotidianidade que se dá a construção social da realidade. Mas é necessária
uma precaução: toda cultura é uma criação humana, mas quando uma cultura determinada se
torna a nossa segunda natureza, temos muita dificuldade em perceber isso. Parece que é “a”
realidade, e não uma realidade possível. Isso porque nós vemos a realidade, julgamos as ações
humanas e damos sentido às nossas vidas a partir desta cultura interiorizada. Interiorizada não
somente por mim, mas por todo um grupo que a compartilha. É esse fato que reforça a minha
convicção de que nossa maneira de interpretar a realidade é “a” realidade.
O ser humano é um ser “inacabado”. Não é programado pela natureza (instintos), nem
pelo destino ou ainda pela vontade divina. O mundo humano é um mundo aberto. Um mundo
que deve ser modelado pela própria atividade humana. Ainda que estejamos em um mundo que
é anterior ao nosso aparecimento, precisamos organizá-lo para superar o caos. Construir o
mundo e construir a si mesmo. Isto porque a vida social não é, simplesmente, uma questão de
objetos e de fatos que ocorrem como fenômenos de um mundo natural. Ela é, também, uma
questão de ações e expressões significativas, de manifestações verbais, símbolos, textos e
artefatos de vários tipos, e de sujeitos que se expressam através desses artefatos e que procuram
entender a si mesmos e aos outros pela interpretação das expressões que produzem e recebem.
A cultura (nossa segunda natureza), que vestimos sobre nossa natureza biológica (a
primeira natureza) é fruto de uma criação social. É o resultado de soluções e respostas criativas
dadas pelos indivíduos e pelo grupo social frente aos desafios que a vida coloca. O mundo
humano, construído pelos próprios seres humanos, é a cultura, entendida como a totalidade dos
produtos da atividade do ser humano, materiais ou espirituais, tais como instrumentos para
produzir a sua sobrevivência na relação com a natureza, linguagem para a comunicação e
guardar a memória coletiva, leis e normas para regular a convivência e religião para dar sentido
ao mundo, à existência e à morte.
O presente trabalho tem por objetivo analisar, de forma simples e objetiva, a partir de
uma abordagem crítica de natureza teórica, subsidiada qualitativamente por dados

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Dignidade da pessoa humana: levantando o véu da percepção

argumentativos explicativos, as diferentes faces da diversidade cultural e religiosa. Abordar-se-


ão elementos históricos e contemporâneos que contribuíram de forma relevante na
transformação da cultura local e global, além de questionar o sentido da vida e da
transcendência em relação às questões vitais que preocupam os seres humanos, tais como a
dignidade da pessoa humana e as várias formas de discriminação que afrontam a Declaração
Universal dos Direitos Humanos (NAÇÕES UNIDAS-BRASIL, 2020)3.
Para elucidar a importância do assunto ora sob análise, será exibido o julgamento do
Superior Tribunal Federal (STF) que, em maio de 2011, após inúmeros debates (religiosos,
costumeiros e culturais), acolhe no ordenamento jurídico brasileiro a união estável homoafetiva,
com base no princípio da dignidade da pessoa humana4. Novos paradigmas se estabelecem,
rompendo com velhos laços, rasgando, aos poucos, o véu da ignorância. Porém, para que este
processo ocorra de forma menos conflituosa é essencial que haja transformações na política
educacional brasileira. Por fim, serão apresentadas as considerações pertinentes ao assunto, que
não terminam aqui; antes, encorajam futuros debates.

2 Diversidade: origens da liberdade e do livre-arbítrio

Ainda que possa parecer complicado e desafiador conhecer e conviver com as


diversidades culturais e religiosas, é algo necessário e indispensável à promoção dos direitos
humanos, o que requer, entre outros aspectos, o respeito, a liberdade e o reconhecimento às
diferentes formas de crenças, tradições e movimentos religiosos, bem como daqueles que não
professam religião alguma. Entre todos os aspectos, o que mais deve ser observado, pois dele
dependem os demais, é a liberdade ou o livre-arbítrio que, dependendo do ponto de vista, podem
significar a mesma coisa.
Inicialmente, importa frisar que, mesmo vivendo o vigésimo primeiro século da Era
Cristã ou Era Comum, ainda existem sociedades que insistem em manter a liberdade cultural5
aprisionada em função do costume e do falso moralismo que, em outros tempos — e ainda
nestes —, servem para disseminar o preconceito e o ódio. Ora, se perante a lei de Deus e a lei

3 A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) é um documento marco na história dos direitos humanos. Elaborada
por representantes de diferentes origens jurídicas e culturais de todas as regiões do mundo, a Declaração foi proclamada pela
Assembleia Geral das Nações Unidas em Paris, em 10 de dezembro de 1948, por meio da Resolução 217 A (III), da Assembleia
Geral, como uma norma comum a ser alcançada por todos os povos e nações. Ela estabelece, pela primeira vez, a proteção
universal dos direitos humanos. Traduzida em mais de 500 idiomas — o documento mais traduzido do mundo — inspirou as
constituições de muitos Estados e democracias recentes.
4 O princípio da dignidade da pessoa humana se refere à garantia das necessidades vitais de cada indivíduo, ou seja, um valor

intrínseco como um todo. É um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, nos termos do artigo 1º, III da Constituição
Federal, sendo fundamento basilar da República (BRASIL, 1988).
5 A cultura pode ser considerada como conjuntos de crenças, conhecimentos, instituições e práticas pelas quais cada

coletividade afirma sua presença no mundo, garante sua continuidade e permanência no tempo.

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Luiz Alexandre Solano Rossi e Leila Fátima dos Santos

dos homens, o ser humano é livre para fazer suas escolhas, o que o impede de viver sua vida
em plenitude e gozo de tudo o que lhe apraz?
Pare responder a este e outros questionamentos, é necessário analisar, ainda que
superficialmente, as origens e as implicações concernentes ao livre-arbítrio e à liberdade do ser
humano no convívio em sociedade, se é que em algum tempo ou momento o homem foi
realmente livre debaixo do céu. Pois, na visão do filósofo suíço, Jean Jacques Rousseau6, o
homem é naturalmente bom e, provavelmente, poderia viver com certo grau de reciprocidade
amigável se vivesse em uma floresta à base de seus próprios recursos, em um estado de
natureza. Porém, ao submeter-se a um contrato social, sob o jugo de um Estado, longe do estado
de natureza, o ser humano teria se tornado ganancioso, invejoso e possuidor de um sentimento
contínuo de dominar os outros e tornar-se o centro da atenção.
Assim, vale citar a célebre frase de Rousseau (2011, p. 17): “O homem nasceu livre, e
por toda a parte geme agrilhoado; o que julga ser senhor dos demais é de todos o maior escravo”.
Observando as palavras do autor, é possível inferir que todo ser humano após o nascimento,
ainda que entendesse ser livre, e ainda que imaginasse ser superior aos outros, seria, talvez por
sua arrogância, o escravo maior.
Neste contexto, quais seriam estes lugares, e por qual motivo o homem estaria
acorrentado? Thomas Hobbes (1588 – 1640), ao aborda a origem do poder do Estado, em sua
obra "Leviatã”7, afirma que a humanidade possui um desejo perpétuo e inquieto de poder, que
cessa apenas com a morte. Afirma, também, sobre o poder do Estado:

O maior dos poderes humanos é aquele que é composto pelos poderes de vários
homens, unidos por consentimento numa só pessoa, natural ou civil, que tem o uso de
todos os poderes na dependência de sua vontade: é o caso do poder de um Estado
(HOBBES, 1997, p. 53).

Nota-se uma conexão entre Rousseau e Hobbes: um narra a liberdade ao nascer e o outro
o fim do poder (que escraviza), que só cessa com a morte. Ou seja, de certa forma, os dois
concordam com a falta de plenitude da liberdade, o que pode ser constatado a partir do Contrato
Social (ROUSSEAU, 2011), segundo o qual as pessoas, de bom grado, restringem suas
liberdades em prol da cooperação e da paz, concordando em conceder sua soberania ao Estado,
com poder absoluto, para que atenda a vontade de todos, a paz em casa e a ajuda mútua contra

6 Jean-Jacques Rousseau foi filósofo, escritor, teórico político e compositor. Autor da obra Contrato Social (1762), teve vários
de seus livros banidos pela Igreja Católica por apresentarem conceitos religiosos pouco convencionais para a época, como a
ideia de que a verdadeira religião vinha do coração.
7 Leviatã, muitas vezes é ligado a Behemoth, um terrível monstro marinho mítico que aparece em várias histórias da criação

no Antigo Testamento e em outros lugares. O nome é usado por Hobbes para sugerir o poder do Estado.

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Dignidade da pessoa humana: levantando o véu da percepção

os inimigos. Logo, não é difícil perceber que, desde sempre, a liberdade é algo desejável e ao
mesmo tempo complexo.
Sendo assim, passa-se a analisar a liberdade no sentido de livre-arbítrio. Santo
Agostinho (1995), no livro I da obra Livre-Arbítrio, comenta sobre a liberdade de vontade
existente no ser humano e que essa vontade procede da graça; o livre-arbítrio significa ter acesso
ao poder de decisão, de maneira que o mal não vem de Deus, mas do poder de escolha que o
homem exerce através de sua vontade.
O mal é evidente, principalmente nos dias de hoje, com o advento da pandemia da Covid
19 8; a todo o momento famílias estão sendo destruídas, a fome e a miséria assolam várias
nações e o noticiário sobre o número de mortos, nos veículos de comunicação, passa a fazer
parte da rotina, assim como a previsão do tempo. Mas é possível deduzir que foram as escolhas
dos homens que trouxeram esse mal até aqui, neste cenário de tristeza e incertezas. Ben Dupré,
a respeito do livre-arbítrio, menciona:

Historicamente a sugestão mais popular e influente é a chamada “defesa do livre


arbítrio”. Nossa liberdade de fazer escolhas genuínas nos permite viver uma vida de
valor moral verdadeiro e entrar em um relacionamento profundo de amor e confiança
com Deus (DUPRÉ, 2015, p. 172).

O homem goza da liberdade que advém do Estado e da liberdade (livre-arbítrio) recebida


como graça de Deus (os que creem); disfruta de ambas, ainda que uma seja restrita pelo Estado
e a outra, de certa forma, pela escolha da bondade moral que deveria ser acatada por todos para
o bem de todos. No entanto, muitas vezes escolhas más são feitas e as consequências vêm cedo
ou tarde.
Analisadas as duas situações, vislumbramos que a liberdade é poderosa, capaz de causar
conflitos, ainda na contemporaneidade, quando direitos são negados e dignidades arrancadas,
através de atitudes maldosas, racistas9, xenofóbicas10, machistas, homofóbicas11. A falta de
respeito às diversidades religiosas e culturais é um dos responsáveis pelo atraso social e cultural
que, mesmo no mundo globalizado e digital, é tão visível e dolorido.

8 A COVID-19 é uma doença infecciosa causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2). Uma em cada seis pessoas infectadas
por COVID-19 fica gravemente doente e desenvolve dificuldade de respirar. As pessoas idosas e as que têm outras condições
de saúde, como pressão alta, problemas cardíacos e do pulmão, diabetes ou câncer, têm maior risco de ficarem gravemente
doentes. No entanto, qualquer pessoa pode se contagiar e ficar gravemente doente (OPAS/OMS, 2021).
9 Racista é aquele que demonstra racismo, denominação da discriminação e do preconceito (direta ou indiretamente) contra

indivíduos ou grupos por causa de sua etnia ou cor. Dia 21 de março é o Dia Internacional da Luta Contra a Discriminação
Racial (NAÇÕES UNIDAS, 2021).
10 Xenofóbico é aquele que demonstra temor, aversão ou ódio aos estrangeiros ou à cultura estrangeira, seu comportamento,

ideia e cultura.
11 Homofobia são atitudes e sentimentos negativos, discriminatórios em relação a pessoas que sentem atração por pessoas do

mesmo sexo.

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Luiz Alexandre Solano Rossi e Leila Fátima dos Santos

Mas é importante ressaltar os esforços de líderes religiosos, bem como de algumas


entidades governamentais e da sociedade civil, para transpor os obstáculos que atrapalham o
progresso da diversidade e do respeito às diferenças, sejam elas sociais, étnicas, sexuais,
culturais etc.
Um exemplo pôde ser visto e ouvido no dia 21 de maio de 2021, Dia Mundial da
Diversidade Cultural para o Diálogo e o Desenvolvimento; trata-se do nobre gesto do papa
Francisco, que enviou a primeira mensagem no Twitter para a data, dizendo que:

Podemos buscar juntos, a verdade no #diálogo, na conversa tranquila ou na discussão


apaixonada. É um caminho perseverante, feito também de silêncios, capaz de recolher
pacientemente a vasta experiência das pessoas e da #DiversidadeCultural dos povos
(FRANCISCO, 2021).

Amartya Sen12 considera que o desenvolvimento está conectado à liberdade, que elege
como indicador de êxito ou fracasso do desenvolvimento. Nessa concepção, a liberdade é o
elemento constitutivo básico do desenvolvimento, responsável pela expansão das capacidades
humanas, pelo aumento das possibilidades de as pessoas viverem o tipo de vida que valorizam
e alcançarem os resultados que desejam, e assim, cuidar de si e influenciar no mundo.

3 A diversidade cultural, religiosa e constituição

A Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988), em consonância com tratados


internacionais e com o verdadeiro sentido de democracia, mostra-se avessa a qualquer tendência
que implique imposição de silêncio a qualquer que seja a corrente de pensamento. A
Constituição preceitua a não existência de religião oficial; não se privilegia uma religião em
detrimento de outra. Assim, em seu Preâmbulo, institui um Estado assegurador da liberdade, da
igualdade e da justiça como seus valores supremos, para a formação de uma sociedade pluralista
e alicerçada na harmonia social.
Nesse contexto, José Scampini (1974) ensina que o conteúdo da liberdade religiosa não
é a verdade religiosa, é a imunidade contra qualquer coação externa; enquanto o fundamento
da liberdade religiosa é a dignidade humana. Desta forma, é correto afirmar que o fundamento
da liberdade religiosa é também a dignidade da pessoa. Logo, privá-la de manifestar sua crença
e sua cultura religiosa é o mesmo que retirar sua dignidade, o que é proibido por norma

12 Amartya Sen, em 1998, recebeu o Nobel de Economia por sua formulação original sobre desenvolvimento, processo que
passou a ser visto como uma extensão das liberdades para trabalhar, consumir, dispor de saúde e educação de qualidade e
expressar livremente os pensamentos. Sen é um dos criadores do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).
(https://exame.com/economia/mercados-justica-e-liberdade/).

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Dignidade da pessoa humana: levantando o véu da percepção

constitucional. Embora complexo, o direito está impregnado pela essência que invade os
campos — nem sempre floridos e por vezes espinhentos —, das relações no que tange à
diversidade cultural assegurada pela UNESCO (2002) em seu artigo 4º – Os direitos humanos,
garantes da diversidade cultural:

A defesa da diversidade cultural é um imperativo ético, inseparável do respeito pela


dignidade da pessoa humana. Implica o compromisso de respeitar os direitos humanos
e as liberdades fundamentais, em particular os direitos das pessoas que pertencem a
minorias e os dos povos autóctones13.

A UNESCO é taxativa ao referir que a cultura é um imperativo ético, inseparável do


respeito pela dignidade da pessoa humana; logo, não há como falar em diversidade cultural sem
abarcar o direito, porquanto são elementos que se fundem para que o imperativo ético não
desapareça diante de certas “moralidades”.
A relação entre os distintos ordenamentos, nessa perspectiva, deve se construir de forma
conjunta, compartilhada e harmonizada, o que apenas ocorre por meio do reconhecimento
mútuo da validade e legitimidade de todos os sistemas sociais, de todos os ordenamentos e de
todas as culturas, sem reconhecer a superioridade de um sobre o outro (QUEIROZ, 2009). A
afirmação da universalidade dos direitos humanos depende necessariamente da observância da
diversidade cultural existente em âmbito local, regional e nacional.
De acordo com David Hume (2004), em questão de religião, tudo o que é distinto está
em oposição. Enfatiza, ainda, que os dogmas que serviam de disputas não poderiam ser aceitos
nos primeiros tempos do mundo:

Os dogmas especulativos da religião, que ensejava tão acirradas disputas, não


poderiam ser concebidos ou aceitos nos primeiros tempos do mundo, quando a
humanidade, sendo completamente iletrada, formava da religião uma idéia mais
apropriada à sua fraca compreensão, e compunha seus dogmas sagrados mais a partir
das lendas que faziam parte das crenças tradicionais do que a partir de argumentos de
discussões (HUME, 2001, p. 184).

Mesmo hoje, existem rituais relacionados aos povos originários que ferem, sem
consciência, o direito intransponível à vida. No entanto, diante de tais dogmas, ainda que
sagrados, prevalece o direito à vida e à dignidade. Assim, salienta-se que o reconhecimento da
identidade cultural dos povos indígenas constitui questão fundamental para assegurar uma
relação harmoniosa entre direitos humanos e o direito costumeiro indígena. Em meio a tais

13Autóctones são naturais do país ou da região em que habitam e descendem das raças que ali sempre viveram; aborígene,
indígena.

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movimentos, caracterizados pela luta contra a supressão das identidades culturais pela
globalização, um de essencial importância refere-se ao movimento de preservação das tradições
e das culturas indígenas, movimento esse que exige a constante interação entre culturas para o
respeito à autonomia e identidade indígenas e para que não haja imposição da cultura nacional
sobre a local.

4 Dignidade da pessoa humana, base da diversidade

Todo ser humano, independentemente de condição econômica, social, física,


psicológica, gênero, raça14 ou etnia, possui direito a uma vida digna; assegura-se a ele o devido
respeito, resguardam-se os seus direitos e reconhecem-se os seus deveres como cidadão. A
dignidade é uma forma de valorização do ser humano, como frisa a Declaração Universal sobre
a Diversidade Cultural (UNESCO, 2002), em seu Preâmbulo do Ato Constitutivo da UNESCO:

[...] que a difusão da cultura e a educação da humanidade para a justiça, a liberdade e


a paz são indispensáveis à dignidade humana e constituem um dever sagrado que todas
as nações devem cumprir com Espírito de assistência mútua aos Direitos Humanos e
Culturais.

O preâmbulo da Declaração recorda os preceitos fundamentais, indispensáveis à


dignidade humana, como dever sagrado para a difusão da cultura e educação, para a justiça, a
liberdade e a paz. É necessário refletir e dialogar sobre a complexidade humana, tendo em vista
diferentes ângulos, que devem convergir para o mesmo ponto, o da diversidade cultural e
religiosa em face do comportamento humano. David Hume menciona a dignidade de caráter:
“Algo que jamais se desculpa é a completa falta de personalidade e de dignidade de caráter, ou
de uma percepção adequada do que é devido a si mesmo em sociedade e na vida cotidiana”
(2004, p. 327).
Como se pode verificar, o princípio da dignidade da pessoa humana é garantia de que
as pessoas, independentemente de suas escolhas, possam viver com dignidade e o devido
respeito; caso contrário, contam com tutela jurídica para fazer cessar qualquer incômodo, de
acordo com o disposto no inciso III, artigo 1º da Constituição Federal, que representa o
fundamento de validade do Estado Democrático de Direito brasileiro. Esse artigo foi utilizado

14O conceito de raça engloba características fenotípicas, como a cor da pele; a etnia também compreende fatores culturais,
como a nacionalidade, afiliação tribal, religião, língua e as tradições de um determinado grupo

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Dignidade da pessoa humana: levantando o véu da percepção

pelo Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.27715, que tratou do
pedido formulado pelo requerente. Trata-se da aplicação do regime jurídico previsto no artigo
1.723 do Código Civil às uniões entre pessoas do mesmo sexo, com a intenção de constituir
família. Para elucidar quão importante é o Princípio da Dignidade Humana no combate a
preconceitos e na promoção da diversidade, vale citar parte do voto do Ministro Celso de Mello
(ADI 4.277):

É fácil notar a influência da moral no Direito, por exemplo, em institutos como o


casamento – no direito de família – e em tipos penais, como eram muitos dos
denominados “crimes contra os costumes”, os quais têm origem comum em
sentimentos morais e religiosos. [...] As garantias de liberdade religiosa e do Estado
Laico impedem que concepções morais religiosas guiem o tratamento estatal
dispensado a direitos fundamentais, tais como o direito à dignidade da pessoa humana,
o direito à autodeterminação, o direito à privacidade e o direito à liberdade de
orientação sexual.

A universalidade dos direitos humanos é encontrada em inúmeros dispositivos que


afirmam a importância da proteção de direitos humanos, tais como a Convenção Europeia de
Direitos Humanos (1950), o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (1966) e a
Convenção Americana de Direitos Humanos (1969).
Nesses documentos, a universalidade abstrata dos direitos humanos é ressaltada,
apontando-se que basta a condição de pessoa para a aplicabilidade das normas internacionais.
Então, por qual motivo ainda existe tanto preconceito e desrespeito? Edgar Morin aponta o
caminho, ao defender que a cultura é transmitida de geração em geração, constituída por
conjunto de proibições e dotada de complexidades psicológicas e sociais:

A cultura é constituída pelo conjunto de proibições, das estratégias, das crenças, das
ideias, dos valores, dos mitos, que se transmite de geração em geração, se reproduz
em cada indivíduo, controla a existência da sociedade e mantém a complexidade
psicológica e social. Não há sociedade humana, arcaica ou moderna, desprovida de
cultura, mas cada cultura é singular (MORIN, 2001, p. 55).

Logo, a educação é a peça fundamental para a real transformação, pois se a cultura está
em toda sociedade e é transmitida às novas gerações, é crucial que exista um olhar atento para
a política educacional, principalmente em âmbito nacional. Nesse contexto, Morin (2001, p.
54), destaca que “cabe à educação do futuro cuidar para que a ideia de unidade da espécie
humana não apague a ideia de diversidade, e que a da sua diversidade não apague a da unidade”.

15 Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) é a ação que tem por finalidade declarar que uma lei ou parte dela é
inconstitucional, ou seja, contraria à Constituição Federal. Disponível em:
http://stf.jus.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADI&documento=&s1=4277&numProcesso=4277

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Luiz Alexandre Solano Rossi e Leila Fátima dos Santos

A Lei n. 10.639, de 09 de janeiro de 2003, representa um marco ao estabelecer a


promoção da diversidade como diretriz da política educacional do Brasil. Esse texto implantou
e regulamentou o ensino da história e da cultura africana e afrodescendente nas escolas
brasileiras (BRASIL, 2003). A lei atende, em parte, o art. 215, da Carta Magna de 1988, que
afirma que o Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes
da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das suas manifestações.
No entanto, o atual cenário exige políticas educacionais mais efetivas, equânimes, para que o
processo de aprendizado passe a gerar resultados que impactem a sociedade, para que, de fato,
o preconceito e a discriminação sejam atos isolados, raros em todas as nações.

5 A face desumana do humano revelado em raça e preconceito

A promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e
quaisquer outras formas de discriminação está prevista na Constituição Federal de 1988, o que
não significa que não exista, muito pelo contrário. O preconceito e a discriminação, com o
advento da pandemia do Coronavirus, tornaram-se evidentes e visíveis, até para quem não quer
ver. As diferenças sociais, relacionadas com a crise da pandemia podem-se constatar nos dados
do Ministério da Saúde, publicados na Folha de São Paulo em 10/04/2020 (MENA, 2020); a
letalidade da COVID-19 incide nas populações mais carentes e precárias. Importante ressaltar
que o censo do IBGE16 de 2010, identificou que viviam no país 91 milhões de pessoas que se
classificaram como brancas (47,7%), cerca de 82 milhões que se declararam pardas (43,1%) e
15 milhões, pretas (7,6%), formando um contingente maior de pessoas negras e pardas17. Ainda,
segundo dados do IBGE18, mais de 13,6 milhões de pessoas vivem abaixo da linha da extrema
pobreza e quase 46 milhões de brasileiros declaram ter algum grau de dificuldade em pelo
menos uma das habilidades investigadas (enxergar, ouvir, caminhar ou subir degraus), ou
possuir deficiência mental / intelectual19.
Ora, considerando os dados, não se pode esquecer que pessoas pobres e com deficiências
também são alvo de discriminação e preconceitos. De modo que uma parcela importante da
população brasileira está mais vulnerável a sofrimentos físicos e psicológicos, em razão de sua
condição. Sobre a condição de sofrimento do pobre, Rossi apresenta a figura de Jó como um
representante legítimo de todos os seres humanos:

16 O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE se constitui no principal provedor de dados e informações do Brasil.
17https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/21206-ibge-mostra-as-cores-da-

desigualdade
18 Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2019.
19IBGE2010 https://educa.ibge.gov.br/jovens/conheca-o-brasil/populacao/20551-pessoas-com-deficiencia.html

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Dignidade da pessoa humana: levantando o véu da percepção

Jó descreve para Deus a condição do ser humano que sofre, constituindo-se ele mesmo
um exemplo de todos. Por isso, não devemos ver Jó como uma exceção, mas um porta-
voz de tantas outras vítimas de uma sociedade esmagadoramente desigual. Seus gritos
não são os únicos, nem os primeiros. Eles se juntam aos gritos de tantos que têm
sofrido ao longo da história. As dores de Jó, assim como as nossas, podem ser curadas
com a solidariedade (ROSSI, 2018, p.12).

O sofrimento de uma grande maioria leva a perceber a vida de bem-estar e de privilégios


como inaceitável, posto que o privilégio se relaciona com liberdades. Djamila Ribeiro alerta
que “acordar para o privilégio que certos grupos sociais têm e praticar pequenos exercícios de
percepção pode transformar situações de violência que antes do processo de conscientização
não seriam questionados” (RIBEIRO, 2019, p. 590).
Às vezes é difícil saber se o que dói mais são as feridas físicas ou psicológicas. Só um
negro pode dizer o que significa a lepra social imposta a ele, independentemente de sua
condição econômica ou intelectual. Eis uma verdade brilhantemente citada na série20
documental da Netflix (EUA..., 2021) apresentada por Will Smith, que discute a 14ª Emenda
dos Estados Unidos (1868). Essa emenda prometeu liberdade e proteção igualitária para todos
os cidadãos, o que não houve de imediato. Caso semelhante ocorreu no Brasil, após a abolição
da escravatura pela Lei nº 3.353, de 13 de maio de 1888 (Lei Áurea) (BRASIL, 1888), que não
os libertou das correntes do preconceito e tampouco da cultura da servidão. Existem muitas
mentes presas em seus próprios devaneios, incapazes de vivenciar a beleza de descobrir novas
culturas e possibilidades de alegrar a vida, aceitando e se fazendo aceitável.
Hume (2004, p. 204) propõe que “é necessário preservar uma adequada imparcialidade
nos julgamentos e libertar a mente de todos os preconceitos que podem ter sido transmitidos
pela educação ou opinião apressada”. Desta forma, o autor sugere que o preconceito está ligado
a uma filosofia do julgamento, que aprisiona a mente.
Para celebrar o Dia Mundial da Paz, em 1º de janeiro21 de 2021, o papa Francisco
declarou que é doloroso constatar que, ao lado de numerosos testemunhos de caridade e
solidariedade, infelizmente ganham novo impulso várias formas de nacionalismo, racismo,
xenofobia e também guerras e conflitos que semeiam morte e destruição. De fato, a cultura da
indiferença tem se perpetuado desde os primórdios da humanidade; ainda que muitos tenham
lutado contra os que permanecem aprisionados no interior da caverna, como sugeriu Platão, em

20Série documental Amend: The Fight For América (Emenda: A Luta Pela América, em uma tradução livre). A produção
discute a 14a emenda, criada em 1868 no país, que promete liberdade e proteção igualitária para todos os cidadãos.
21 54º quinquagésimo quarto Dia Mundial da Paz.

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Luiz Alexandre Solano Rossi e Leila Fátima dos Santos

O Mito da Caverna22, ainda há muito chão a se percorrer, neste mundo de gente que às vezes
nem parece ser gente.
Há, no entanto, dispositivos criados por organizações internacionais que objetivam
tutelar o direito à cultura e à diversidade. Um deles é Princípio da Autodeterminação dos Povos,
que visa assegurar a independência, a liberdade e o direito de organização própria dos povos e
que preza pela livre deliberação dos povos a respeito de sua organização.
Quanto à sociedade brasileira, a diversidade religiosa foi perseguida e inviabilizada em
razão de um processo colonizador enraizado na supremacia da cultura europeia e da
universalidade do cristianismo, em razão de alianças firmadas entre a Igreja e o poder político.
De modo que as culturas e crenças indígenas e africanas foram arrancadas à força, para que
servissem como escravos nos territórios conquistados. As diferentes minorias étnicas (judeus e
ciganos foram combatidos, convertidos e negados) foram discriminadas em nome de ideais
civilizatórios exclusivistas.

6 Considerações finais

Considerando o atual cenário, é bem verdade que o ser humano está rodeado de
incertezas, sacudido pelas tempestades da crise da pandemia da Covid 19, mas continua firme
na esperança de que um amanhã mais justo e igualitário há de surgir, com o romper de um
“novo normal”, em que as diferenças sejam mitigadas e que a diversidade sirva para aproximar
e não para afastar.
Ainda há muito a ser feito, mas alguns avanços foram percebidos nos últimos tempos,
sob a tutela jurídica e devido à mobilização de organizações internacionais que prezam pelo
princípio da dignidade humana, essencial para ampliar direitos e promover a diversidade de
todos os tipos. Novos horizontes e sentidos poderão se abrir a partir do ensino e do esforço de
todos para remover o véu da ignorância, que desde a época dos primórdios insiste em
permanecer, parecendo ter sido confeccionado em tecido de natureza perpétua. Alguns não se
rasgarão nunca, mas de sorte, ainda podem ser levantados para que haja pelo menos uma
percepção do que realmente é a diversidade. Linda e apaixonante, sem cavernas sombrias, sem
cheiro de podridão, cheira a flores do campo, de todas as cores, vistas de uma varanda, em um
lindo dia de sol e céu azul.

22 Mito da caverna é uma metáfora criada pelo filósofo grego Platão, que consiste na tentativa de explicar a condição de
ignorância em que vivem os seres humanos e o que seria necessário para atingir o verdadeiro “mundo real”, baseado na razão
acima dos sentidos.

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Dignidade da pessoa humana: levantando o véu da percepção

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