Oferenda Ao Ori - Bori, Um Rito de Comunhão
Oferenda Ao Ori - Bori, Um Rito de Comunhão
Oferenda Ao Ori - Bori, Um Rito de Comunhão
A proposta deste artigo delinear um rito elaborado a quem se prope a ingressar na religio dos rs, nos candombls ditos de nao Ktu no Brasil, de origem tnica Yorb. Previamente h de se conceituar que, iy o universo fsico concreto onde est a Terra e o run outra dimenso ou espao sobrenatural. Dois espaos ou dimenses que coexistem, mas nunca se encontram, sendo, portanto, paralelos. O homem cultua o seu elemento mais sacro, o Or, sua cabea. Bor o rito de oferenda cabea (ebo Or), que consiste em assentar, sacralizar, reverenciar e ofertar o rs Or, portanto cultuar e louvar Or e assim estabelecer o elo entre a cabea (or) do nefito que esta no iy e duplo de sua cabea que esta no run, ou seja, criar a harmonia e equilbrio necessrios vida. (anlogo ao conceito de run/iy) A coexistncia do or-run e or-iy perfaz o rs Or, e, atravs dos ritos prprios do Bor, que se estabelece essa comunho e assim se busca a estabilidade espiritual. desta forma que se consegue optar melhor e viver o mais prspero possvel. Or quem sempre est mais prximo do homem, portanto fundamental harmonizar a coexistncia.
1 Original em: Revista bano: Ano IV n. 21, p.4, So Paulo, 1984. Esse texto foi reeditado, ampliado, revisado e adaptado para a internet, em janeiro de 2010.
2 Pesquisador e professor da religio tradicional Yorb e da afrodescedente. Babalrs do candombl Il se Ode Kitlesi, em So Paulo, e Asoj Oba Alktu, em Ktu.
Somente o rs Or, assentado, sacralizado, reverenciado e ofertado no cerimonial do Bor, esse um dos mais importantes rituais da religio, pois abrange todos os adeptos. Assim sendo, deve-se sempre rogar e ofertar antes de todos os outros. Essa uma regra rgida e deve ser obedecida, ao contrario, sofrer srias sanes. O que interessante (e bvio) notar neste ritual, que o nefito nunca entra em transe, pois o rito feito para sua prpria cabea, por extenso para ele prprio, portanto no h como ter transe de si prprio. Enfatizando, a nica divindade cultuada no Bor o Or. Nenhuma das divindades normalmente vistas incorporadas nos rituais do candombl, como por exemplo, gn, Oya, Yemoja, e tantas outras, que se caracterizam por incorporar nos seus iniciados, essas, no so cultuadas e nem tampouco louvadas no ritual do Bor. Portanto, reafirmamos, no existe transe no nefito no ritual do Bor. Pois, para cultuar essas divindades (as citadas, entre outras) necessrio que o nefito antes tenha assentado seu Or, quando recebe o oy (ttulo) de Borizado (ou Boriado), sendo assim, somente depois do Bor que outras divindades podero ser cultuadas ou assentadas, e se for o caso, dar transe no ento j boriado, pois, sua cabea, j foi assentada e est sendo cultuada, portanto, apta para dar seqncia a outras iniciaes, ou seja, de sua divindade, que pode gerar transe. tambm digno de nota, que os elementos usados para simbolizar o Or em seu assento so nicos, pois, diferem e nem tampouco se assemelham, com nenhum dos outros assentamentos dos rs que comumente geram transe, ou seja, no simbolizado, por exemplo, um kta e/ou ota (pedra ou seixo) e nem em irin (ferro),. Or a cabea total do homem na Terra, a que vemos, e que se divide em orde (externa), o crnio palpvel, e ori-in3 (interna), tudo o que preenche o crnio, o
3 In em yorb significa tudo o que interno de algo, o preenchimento de alguma coisa, no caso, o interior da cavidade craniana, o crebro.
crebro e suas funes. Cultua-se Or e se ritualiza no Bor, na sua forma mais pratica e tangvel, no crnio do nefito. Os smbolos dos duplos do run so representados no iy, por vasilhas, chamadas de igb, que sero assentadas e sacralizadas durante o ritual. Os assentos a serem confeccionados no Bor, so o igb-or e o klb. O igb-or um receptculo com tampa que representa seu or-ode run e o klb, semelhante, porm bem menor que o outro, que representa seu or-in run. O conjunto igb-or / klb representa o seu or-run e o conjunto or-de iy / or-in iy o seu or-iy, esses conjuntos formam o rs Or, a ser ofertado no ritual do Bor. Os rs funfun Obtl, rnml e jl, fazem parte da criao do homem no run. E no iy, o polivalente, rs s, cumpre suas funes. Essas so as nicas divindades a serem saudadas no Bor. Note: somente saudadas, veja o por qu. Na gnese yorb, no run, o rs funfun rsnl (Obtl) que cria, molda e esculpe todo o nosso corpo (ara) assim ele cria o ara run, o corpo do run, completo, inclusive com o or run. Por esse motivo, rsnl passa a ser conhecido por Almrere, Senhor da boa argila, portanto, deve ser reverenciado e saudado no Bor. Mesmo depois de finalizada a escultura do ara run, ela continua a ser a ser inanimada, e assim permanece estocada e na espera de um ato executado isoladamente por Oldmar, o Criador, que emana para a figura inanimada Seu eflvio imperecvel, e desta forma, a escultura de Obtl torna-se viva, assim Ele cria o arrun4 - sem testemunhas, nem do prprio rsnl, desconhecida e totalmente dogmtica. O rs rnml, senhor do orculo sagrado, que atravs dos 256 Od (signos do orculo) existentes, cede genes divinos (pores nfimas) desses Od para serem amalgamado, "moldado e cozido" por mais um funfun, jl, o oleiro
4 Entende-se aqui o homem (o duplo) como energia, antimatria, etc. Com todas as devidas reservas dos termos usados, em relao aos seus conceitos e definies originais.
do run. Quando seco e pronto esse gene passa a conter um Od (dos 256), e assim permanece estocado e zelado por jl, a espera da escolha do arrun, quando o fato advm, o arrun escolhe o seu Od dessa vida, que est preste a acontecer - o nascer. Simbolicamente esse Od fica codificado no seu or-in run. Sendo assim, esses tambm devem ser reverenciados e saudados no Bor. O ser humano possui caractersticas especficas e individuais que podemos chamar (de uma forma simplificada) de personalidade, o Od escolhido um dos componentes que perfazem a nossa individualizao. Or o rs pessoal de todo homem, o poder de Or se concentra no crebro (or-in iy) e se concretiza atravs de comandos fisiolgicos por ele, crebro, emitidos, que resultam em aes e no dinamismo do ser; s, no iy o start dessa dinmica fisiolgica e, nesta particularidade recebe o cognome de Bara. E lgico que para o ritual de assentamento do Or e o conseguintemente Bor necessrio um perodo mnimo de trs dias de recolhimento na casa de culto, para ser realizada esta obrigao. No linguajar do candombl a cabea come, o rs Or come, e, principalmente desta forma que mais se recebe e acumula se. O que normalmente acontece em vrios candombls, fazer deste cerimonial uma pr-iniciao do rs de cabea do nefito, pouqussimo ou nada se faz, da sua nica e real funo, que assentar, cultuar e ofertar Or. Estes sacerdotes somente fazem uma pr-iniciao de divindades que s futuramente deveriam ser cultuadas, divindades estas que so responsveis por transes medinicos. Queremos enfatizar que um cerimonial totalmente independente do outro. Que podero ser realizados em pocas diferentes ou na mesma poca, mas, sempre em dias diferentes e a ordem no poder ser mudada, primeiro o Or e aps a divindade, isto imutvel. Como diz um verso religioso yorb (ese if): Nenhuma divindade poder ser adorada, sem o consentimento do seu prprio Or.
Il Or, In: Wande Abimbola -If, An Exposition of If Literary Corpus. Ibadan, Oxford Uni. Press, 1976.