Monomito
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A Jornada do Herói ou monomito é um conceito de jornada cíclica presente em mitos, segundo o escritor e mitologista Joseph Campbell. Como conceito de narratologia e mitologia comparada, é o modelo comum de histórias que envolvem um herói que parte em uma aventura, é vitorioso em uma crise decisiva e retorna à casa mudado ou transformado.[1]
O termo aparece pela primeira vez em 1949, no livro de Campbell The Hero with a Thousand Faces ("O Herói de Mil Faces").[2] Eventualmente, os estudos do padrão de mito do herói foram popularizados por Campbell, influenciado pela psicologia analítica de Carl Jung.[1] No entanto, Campbell era um conhecido estudioso da obra de James Joyce (em 1944 publicara, em coautoria com Henry Morton Robinson, a resenha A Skeleton Key to Finnegans Wake, “Uma Chave-Mestra para Finnegan's Wake”[1]) e tomou emprestado o termo monomyth (monomito) do conto Finnegan's Wake, do autor irlandês.
Figuras anteriores propuseram conceitos semelhantes, incluindo o psicólogo Otto Rank e o antropólogo amador Lord Raglan, que discutem padrões narrativos de heróis em termos de psicanálise freudiana e ritualismo.[1] Campbell e outros acadêmicos, tais como Erich Neumann, descrevem as narrativas de Gautama Buddha, Moisés e Cristo em termos do monomito e Campbell afirma que mitos clássicos de muitas culturas seguem esse padrão básico. O padrão do monomito foi adotado também por George Lucas para a criação da saga Star Wars, tanto na trilogia original quanto suas "prequências".
O roteirista de Hollywood e executivo da indústria cinematográfica Christopher Vogler também usou as teorias de Campbell para criar um memorando para os estúdios Disney, depois desenvolvido como o livro "The Writer's Journey: Mythic Structure For Writers" (A Jornada do Escritor: Estrutura Mítica para Roteiristas). Este trabalho influenciou os 10 filmes produzidos pela empresa entre 1989 (A Pequena Sereia) e 1998 (Mulan), além da trilogia Matrix das irmãs Wachowski.
A ideia de monomito em Campbell explica sua ubiquidade por meio de uma mescla entre o conceito junguiano de arquétipos, forças inconscientes da concepção freudiana, e a estruturação dos ritos de passagem por Arnold van Gennep. Desde o final dos anos 1960, com o advento do pós-estruturalismo, teorias como as do monomito (que são dependentes de abordagens baseadas no estruturalismo) perderam terreno nos círculos acadêmicos. Este padrão da "jornada do herói" ainda é influente entre artistas e intelectuais mundo afora, no entanto, o que pode indicar a utilidade contínua e a influência ubíqua dos trabalhos de Campbell (e assim como evidência sobre a importância e validade dos modelos psicológicos freudiano e especialmente junguiano).
Origem
[editar | editar código-fonte]O estudo das narrativas do mito do herói pode ser rastreado até 1871 com as observações do antropólogo Edward Burnett Tylor de padrões comuns nas tramas das jornadas dos heróis.[3] Na narratologia e na mitologia comparada, outros propuseram padrões narrativos como o psicanalista Otto Rank em 1909 e o antropólogo amador Lord Raglan em 1936.[4] Ambos apresentaram listas de diferentes traços transculturais frequentemente encontrados nos relatos de heróis, incluindo heróis míticos (classificados no chamado mitotipo Rank-Raglan).[5][6] De acordo com Robert Segal, "as teorias de Rank, Campbell e Raglan tipificam o conjunto de análises dos mitos de herói".[7]
Estrutura
[editar | editar código-fonte]Está dividido em três seções: Partida (às vezes chamada Separação), Iniciação e Retorno.
A Partida lida com o herói aspirando à sua jornada; a Iniciação contém as várias aventuras do herói ao longo de seu caminho; e o Retorno é o momento em que o herói volta a casa com o conhecimento e os poderes que adquiriu ao longo da jornada.
Isto foi estabelecido por Joseph Campbell na primeira parte de O Herói de Mil Faces, intitulada "A Aventura do Herói". A tese do autor é de que todos os mitos seguem essa estrutura em algum grau. Para citar vários exemplos, as histórias de Prometeu, Osíris, Buda e Jesus Cristo todas seguem este paradigma quase exatamente, enquanto a Odisseia apresenta repetições freqüentes da Iniciação, o conto da Gata Borralheira (Cinderela) segue esta estrutura um tanto mais livremente e até mesmo o anime Cãezinhos de Sorte se vale de alguns estágios.
Os 12 Estágios da Jornada do Herói - "The Writer's Journey" (Christopher Vogler)
[editar | editar código-fonte]- Mundo Comum - O mundo normal do herói antes da história começar.
- O Chamado da Aventura - Um problema se apresenta ao herói: um desafio ou a aventura.
- Reticência do Herói ou Recusa do Chamado - O herói recusa ou demora a aceitar o desafio ou aventura, geralmente porque tem medo.
- Encontro com o mentor ou Ajuda Sobrenatural - O herói encontra um mentor que o faz aceitar o chamado e o informa e treina para sua aventura.
- Cruzamento do Primeiro Portal - O herói abandona o mundo comum para entrar no mundo especial ou mágico.
- Provações, aliados e inimigos ou A Barriga da Baleia - O herói enfrenta testes, encontra aliados e enfrenta inimigos, de forma que aprende as regras do mundo especial.
- Aproximação - O herói tem êxitos durante as provações
- Provação difícil ou traumática - A maior crise da aventura, de vida ou morte.
- Recompensa - O herói enfrentou a morte, se sobrepõe ao seu medo e agora ganha uma recompensa (o elixir).
- O Caminho de Volta - O herói deve voltar para o mundo comum.
- Ressurreição do Herói - Outro teste no qual o herói enfrenta a morte, e deve usar tudo que foi aprendido.
- Regresso com o Elixir - O herói volta para casa com o "elixir", e o usa para ajudar todos no mundo comum.
Os Estágios da Aventura do Herói - "O Herói de Mil Faces" (Joseph Campbell)[8]
[editar | editar código-fonte]- Partida, separação
- Mundo cotidiano
- Chamado à aventura
- Recusa do Chamado
- Ajuda Sobrenatural
- Travessia do Primeiro Limiar
- Barriga da baleia
- Descida, Iniciação, Penetração
- Estrada de Provas
- Encontro com a Deusa
- A Mulher como Tentação
- Sintonia com o Pai
- Apoteose
- A Grande Conquista
- Retorno
- Recusa do Retorno
- Voo Mágico
- Resgate Interior
- Travessia do Limiar
- Senhor de Dois Mundos
- Liberdade para Viver
Ver também
[editar | editar código-fonte]Referências
- ↑ a b c Singh, Manvir (julho de 2021). «The Sympathetic Plot, Its Psychological Origins, and Implications for the Evolution of Fiction». Emotion Review (em inglês). 13 (3): 183–198. ISSN 1754-0739. doi:10.1177/17540739211022824
- ↑ Campbell, Joseph. The Hero with a Thousand Faces. Princeton: Princeton University Press, 1968, p. 30 / Novato, Califórnia: New World Library, 2008, p. 23.
- ↑ Segal, Robert; Raglan, Lord; Rank, Otto (1990). «Introduction: In Quest of the Hero». In Quest of the Hero. Princeton, N.J.: Princeton University Press. ISBN 0691020620
- ↑ Green, Thomas A. (1997). Folklore: An Encyclopedia of Beliefs, Customs, Tales, Music, and Art. [S.l.]: ABC-CLIO. p. 165. ISBN 978-0-87436-986-1
- ↑ Lord Raglan. The Hero: A Study in Tradition, Myth and Drama by Lord Raglan, Dover Publications, 1936
- ↑ Segal, Robert; Dundes, Alan; Raglan, Lord; Rank, Otto (1990). In Quest of the Hero. Princeton, N.J.: Princeton University Press. ISBN 0691020620
- ↑ Segal, Robert; Raglan, Lord; Rank, Otto (1990). «Introduction: In Quest of the Hero». In Quest of the Hero. Princeton, N.J.: Princeton University Press. ISBN 0691020620
- ↑ CAMPBELL, JOSEPH. O Herói de Mil Faces. [S.l.: s.n.]
Bibliografia
[editar | editar código-fonte]Livros baseados em entrevistas com Campbell
[editar | editar código-fonte]- The Hero's Journey: Joseph Campbell on His Life and Work. Editado por e com introdução de Phil Cousineau. Prefácio de Stuart L. Brown, Editor Executivo. Nova York, EUA: Harper and Row, 1990.
- The Power of Myth (Bill Moyers e Betty Sue Flowers, ed.), 1988
- Vogler, Christopher. The Writer's Journey: Mythic Structure For Writers. Studio City, EUA: Michael Wiese Productions, 1998.
Filmes
[editar | editar código-fonte]- Joseph Campbell and the Power of Myth (1988)
- The Hero's Journey: The World of Joseph Campbell (1987)