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Por Ricardo Balthazar — Para o Valor, de São Paulo


O economista Armínio Fraga: “A externalidade positiva dessas atividades de restauro, os benefícios que proporcionam, é gigantesca e justificaria subsídio” — Foto: Leo Pinheiro/Valor
O economista Armínio Fraga: “A externalidade positiva dessas atividades de restauro, os benefícios que proporcionam, é gigantesca e justificaria subsídio” — Foto: Leo Pinheiro/Valor

O aproveitamento das oportunidades que o Brasil tem à sua frente com os esforços para descarbonizar a economia global dependerá da criação de um mercado bem regulado para negociação de créditos de carbono e sua integração com o mundo, diz o economista Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central (1999-2002) e fundador da Gávea Investimentos.

Sócio de uma empresa que atualmente investe em dois projetos de reflorestamento na Bahia, a Re.green, ele se tornou um observador atento das tentativas de reorganizar a economia mundial para enfrentar a crise climática e teme que a influência de indústrias poluidoras prejudique o desenho do marco regulatório em discussão no Brasil.

“Não tenho dúvida de que existe um lobby forte dos poluidores para comprar um carbono baratinho aqui no Brasil, para poderem continuar poluindo”, diz Fraga. “É necessário que o mundo como um todo capture o carbono da forma mais eficiente possível, e o Brasil tem potencial para ganhar muito com isso.” Leia a entrevista.

Valor: A mudança de governo e a redução do desmatamento ajudaram a reparar os danos causados por Jair Bolsonaro à imagem do Brasil no mundo. Lula soube aproveitar esse bônus?

Armínio Fraga: Estamos aproveitando a janela que se abriu, e a atitude com relação ao desmatamento resume bem a mudança. Mas a aproximação com os produtores de petróleo, com a adesão à Opep+ durante a COP28, repercutiu mal.

Foi ruim também o discurso do [presidente francês, Emmanuel] Macron, deixando claro que a discussão do acordo comercial do Mercosul com a União Europeia não vai andar. Para nós é uma perda relevante, porque ficará mais difícil para o Brasil se conectar com o mercado regulado de carbono, onde nossos créditos valeriam cerca de quatro vezes mais. Nós ainda estamos construindo nosso marco legal para entrar nesse mercado, mas já criamos uma situação esdrúxula, uma jabuticaba, ao excluir o agronegócio do controle de emissões. Não tem por que um setor ficar fora disso.

Há muitas peças na engrenagem do mundo que está se reorganizando para lidar com as mudanças climáticas. Algumas poderiam ser ajustadas a nosso favor, porque o Brasil de fato tem muito a oferecer para o enfrentamento do problema e deveria ser remunerado por isso. Me parece ser uma prioridade do governo.

Valor: O senhor é sócio de uma empresa de reflorestamento, a Re.green. Como ela é afetada?

Fraga: A Re.green busca recuperar áreas degradadas com o reflorestamento e a restauração da biodiversidade. Essa atividade gera créditos de carbono durante a fase de crescimento das árvores, que financiam o trabalho. Não estou querendo fazer discurso em defesa do negócio em que investi. Mas é certo que, com um preço de carbono mais alto, seria viável economicamente restaurar áreas mais difíceis, como algumas da Mata Atlântica, onde se encontra morros carecas e muito barro vermelho exposto, como grandes feridas.

Montamos a Re.green sem qualquer tipo de subsídio. A gente só precisa ter um mercado para os créditos de carbono. Dependendo do preço que vigorar, será possível restaurar mais ou menos, num ritmo mais lento ou mais acelerado. Se um mercado global para o carbono prosperar, o Brasil poderá aproveitar suas vantagens nessa área.

Valor: As projeções dos cientistas indicam que preservar e recuperar florestas é muito importante, mas insuficiente para reduzir o aquecimento do planeta como seria necessário.

Fraga: Soluções baseadas na natureza ajudam a ganhar tempo enquanto mudanças tecnológicas e de hábitos de consumo não ocorrem. Não é pouco, mas não basta. Depois que a floresta cresce, ela para de capturar carbono. Se o planeta continuar emitindo gases de efeito estufa, o quadro climático seguirá piorando.

Sabemos que o desmatamento é importante fonte de emissões. É terrível a sensação de que isso era tolerado até outro dia, em vez de ser reprimido. Estive no ano passado em Alter do Chão (PA) para uma reunião do projeto Amazônia 2030, de pesquisadores que trabalham num plano de desenvolvimento sustentável para a região. A penetração do crime é assustadora. Tem mercúrio na água, por causa da mineração ilegal. Tem milícia. São desafios grandes.

Leia mais:

Valor: O que lhe parece o desenho do mercado de carbono, em discussão no Congresso?

Fraga: Após um início difícil, as coisas vêm melhorando. Há várias questões que precisam ser bem regulamentadas. Uma delas é a necessidade de evitar dupla contagem das capturas de carbono. Os compradores precisam ter certeza de que os créditos acumulados em uma certa área não serão contabilizados por outras.

Para ter um marco legal que funcione, precisamos definir parâmetros para medir o uso e a captura de carbono pelas empresas e definir, com isso, quem são os que recebem e os que pagam. Não é trivial, mas dá para fazer, e a Europa já tem algo assim. Aí se decide quem está dentro e se monta o sistema. Obviamente, quem paga não vai gostar, quem recebe, sim.

Não tenho dúvida de que existe um lobby forte dos poluidores para comprar um carbono baratinho aqui no Brasil, para poderem continuar poluindo. Isso é um problemaço. É uma discussão que requer visão macro da coisa, não uma visão setorial. É necessário que o mundo como um todo capture o carbono da forma mais eficiente possível, e o Brasil tem potencial para ganhar muito com isso.

Valor: O senhor está defendendo subsídios para as atividades que capturem carbono?

Fraga: Estou falando como economista, não como investidor. A externalidade positiva dessas atividades de restauro, os benefícios que proporcionam, é gigantesca e justificaria subsídio. Seria como um imposto negativo. O modelo ideal seria aquele em que o subsídio seria pago pelos poluidores para quem capturasse o carbono. Isso representaria uma transferência de renda, mas realmente acredito que seria melhor para a economia, inclusive para os mais pobres, que tendem a sofrer mais com o aquecimento global.

Valor: Houve pressões intensas nas últimas semanas para que os países se comprometessem com um plano de eliminação gradual dos combustíveis de origem fóssil, como petróleo e carvão. Por que é tão difícil dar esse passo?

Fraga: É uma decisão complicada para qualquer país, porque exige abrir mão de muito dinheiro. Ainda mais para países com tantas carências, como o Brasil. Temos uma matriz energética sustentada por fontes renováveis e nossa produção de petróleo representa uma contribuição marginal para o planeta relativamente pequena. Parar de produzir e deixar o petróleo enterrado para sempre seria bom, mas parece politicamente difícil. Sem prejuízo de se tomar todos os cuidados com o impacto ambiental da prospecção e da produção.

O que eu acho imperdoável é não agir no lado da demanda. Subsidiar o consumo de combustíveis de origem fóssil, segurando os preços de forma artificial, é algo que não faz sentido no contexto em que estamos vivendo.

O Brasil tem avançado na diversificação da sua matriz, com o desenvolvimento de fontes renováveis como a energia eólica e a energia solar. Mas também fizemos avanços incríveis na tecnologia de exploração de petróleo em águas profundas. Para equilibrar o jogo, precisamos de um arcabouço bem-feito para o carbono. Não sou dos que acham que o mercado resolve tudo, mas não vejo como resolver o problema do clima sem incentivos na direção correta.

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