EVIDÊNCIA
olhares e pesquisa
em saberes educacionais
Conselho editorial
Prof. Dr. Alessandro Rodrigues Pimenta
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UNIARAXÁ
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Universidade Federal de Uberlândia
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Centro Universitário do Planalto de Araxá – UNIARAXÁ
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Centro Universitário do Planalto de Araxá - UNIARAXÁ
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Prof. Dr. Carlos Antônio da Silva
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Centro Universitário do Planalto de Araxá
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UNIARAXÁ
Centro Universitário do Planalto de Araxá – UNIARAXÁ
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Centro Universitário do Planalto de Araxá - UNIARAXÁ
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UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas
Profa. Dra. Betina Ribeiro Rodrigues da Cunha
UFU – Universidade Federal de Uberlândia
Os artigos publicados, no que se refere à opinião emitida, fundamentação teórica,
referência bibliográfica e organização textual, são de inteira responsabilidade de seus autores e
não refletem, obrigatoriamente, o posicionamento de Evidência.
CENTRO UNIVERSITÁRIO DO PLANALTO DE ARAXÁ
UNIARAXÁ
Instituto Superior de Educação
EVIDÊNCIA
olhares e pesquisa
em saberes educacionais
v. 14 n. 14 março de 2018 - Araxá/MG
ISSN 1808-2327
Evidência
Araxá
v. 14
n. 14
p. 1-284
2018
Endereço: Av. Ministro Olavo Drummond, 5 – Bairro São Geraldo
CEP – 38180-084 – ARAXÁ – MG
Telefone/fax: (34) 3669-2000
www.uniaraxa.edu.br; uniaraxa@uniaraxa.edu.br
Editoração: Profa. Ms. Ivana Guimarães Lodi (normalização NBR-6021 da ANBT); Capa: Aline Abadia Campos;
Revisão: Profª. M.ª Adriene Costa de Oliveira Coimbra (Língua Inglesa); Profª. Evelyn Lissette Ordóñez Contreras
(Língua Espanhola); Profª. M.ª Fabíola Cristina Melo (Língua Portuguesa); Prof. M.e Carlos Antônio da Silva
(aplicação ISSN/EAN-13)
FICHA CATALOGRÁFICA
( Preparada pela Biblioteca Central do UNIARAXÁ )
Maria Clara Fonseca – Bibliotecária CRB6/942
Evidência: olhares e pesquisa em saberes educacionais / Centro Universitário do Planalto
de Araxá, Instituto Superior de Educação. vol.13, ed. especial, (2017) - Araxá, MG: Fundação Cultural de Araxá, 2017Anual
Publicação do Instituto Superior de Educação
ISSN 1808-2327
1. Educação - Periódicos. 2. Formação de professores - Periódicos. I.
Centro Universitário do Planalto de Araxá. Instituto Superior de Educação.
CDU 37(05)
Indexada em: Edubase (Faculdade de Educação/Unicamp)
Sumário
Apresentação - p. 9
Profa: Ivana Guimarães Lodi
Prof. M.e. José Oscar Melo
Editorial - p. 11
Profa: M.e. Ivana Guimarães Lodi
Docência universitária: aventuras e desventuras - p. 19
CASTANHO, Maria Eugênia
Profissão-Professor: identidade, contradições e o trabalho docente - p. 37
CORNÉLIO, Wellington Félix
O professor na sociedade contemporânea: Educação para a liberdade? - p. 47
ALVES, Érika Cristina Silva
Constituir-se professor universitário na perspectiva do desenvolvimento
profissional - p. 57
GONTIJO, Débora Viviane Teles Magalhães
A Educação Superior no Brasil e a busca pela democratização: trajetória
histórica até os tempos de Sisu - p. 67
BORGES, Gabriela Fernanda Silva
Trajetórias formativas de acadêmicos de Educação Física da UFPI: ser ou não
professor? - p. 81
SANTOS, José Carlos dos
SIMÕES, Regina
MOREIRA, Wagner Wey
A Educação na contemporaneidade: contribuições da tecnologia digital para a
inclusão das pessoas com deficiência auditiva - p. 93
KIKUICHI, Vivian Zerbinatti da Fonseca
QUEIROZ, Florence Alves Pereira de
Aprendendo com o Fred: Jogo didático e suas aplicações - p. 103
MOTTA, Frederico Martins
OLIVEIRA, Camila Tenório Freitas de
SANTOS, Rafael Alves dos
As possíveis abordagens sobre corpo/corporeidade nos programas de PósGraduação em Educação do Estado de São Paulo: o estado da Arte - p. 113
TANNÚS, Fernanda Machain Silva
LIMA, Lucas de Oliveira
CAMPOS, Marcus Vinicius Simões de
MOREIRA, Wagner Wey
O corpo adolescente privado de sua liberdade altera a prática de esporte? - p. 127
REIS, Laudeth Alves dos
MOREIRA, Wagner Wey
Educação Científica nos museus: a importância das diversas linguagens
presentes nas exposições - p. 139
CASTILHO, Thaís Balada
SOUSA, Adriano Ribeiro
OVIGLI, Daniel Fernando Bovolenta
Espaços não formais: utilização dos museus no processo de ensino/
aprendizagem voltado às Ciências - p. 149
PINHEIRO, Cleiton da Silva
LIMA, Maurício Szaz de
GRACIOLI, Jéferson Muniz Alves
SANTOS, Ricardo André Ferreira de Oliveira
A formação do professor de Ciências Biológicas: o que tem sido
pesquisado? - p. 159
MELLINI, Carolina Kiyoko
SIVIERI-PEREIRA, Helena de Ornellas
Pedagogia dos multiletramentos: desafios e perspectivas na docência - p. 171
SANTOS, Wagno da Silva
KARWOSKI, Acir Mário
Pesquisa escolar no Brasil: a produção científica em periódicos nacionais de
Educação - p. 181
SILVA, Diego Gerônimo
SIMÕES, Regina Maria Rovigati
Nuances acerca da rotina de uma classe hospitalar: um estudo de caso - p. 193
RODRIGUES, Júlio
SIMÕES, Regina Maria Rovigati
A produção de banner em uma abordagem de iniciação para a Cultura Digital
com base na prática educativa - p. 203
FERREIRA, Cléa Rocha;
SIQUEIRA, Alexandra Bujokas de;
LINHARES, Martha Maria Prata.
Aspectos identitários e sentidos do Ensino Médio no Brasil - p. 213
RAMALHO, Ricardo de Oliveira
CURI, Luciano Marcos
GIORDANI, Camila Cunha Oliveira
O uso de tecnologias no Ensino Médio: o que dizem os artigos? - p. 225
OLIVEIRA, Camila Tenório Freitas de;
OVIGLI, Daniel Fernando Bovolenta;
SILVA, Monica Izilda da;
SIMÕES, Regin Maria Rovigati
Notas sobre Formação Integrada e Ensino Médio Integrado - p. 237
MELO, Sthéfany
COUTINHO, Ednaldo Gonçalves
MARQUES, Welisson
A Modalidade Profissional Técnica Integrada ao Ensino Médio no Brasil - p. 251
GIORDANI, Camila Cunha Oliveira
RAMALHO, Ricardo de Oliveira
CURI, Luciano Marcos
Filosofia e Didática: Intermezzo Teórico-Metodológico sobre o fazer filosófico no
Ensino Médio - p. 265
ALMEIDA, Francis Silva de.
Normas gerais para publicação em Evidência - p. 281
Apresentação
“O importante da educação não é apenas formar
um mercado de trabalho,
mas formar uma nação, com gente capaz de pensar.”
J. A. Giannotti
A Revista Evidência – olhares e pesquisa em saberes educacionais, é uma
publicação do curso de Pedagogia do UNIARAXÁ – Centro Universitário do
Planalto de Araxá. A sua publicação é anual, sendo esta edição a de número 14
– uma edição especial, resultado da parceria desta instituição com a UFTM –
Universidade Federal do Triângulo Mineiro, na realização do VI Seminário de
Formação de Professores – SEFORPROF, nos dias 15, 16, 17 e 18 de novembro
de 2017.
Em sua trajetória de 14 anos ininterruptos, esta publicação busca socializar o pensamento de educadores engajados que, com o registro de suas reflexões
e experiências, enriquecem suas páginas e multiplicam seu saber.
Nosso objetivo é cumprir com a política de produção científica e de divulgação institucional e, o cumprimento desta política, tem garantido a produção
de artigos de pesquisas e de opinião, além de resenhas, que contribuam com o
aprofundamento do conhecimento em educação em suas diversas áreas e formas
de manifestação. Também buscamos a disseminação do conhecimento produzido
pelos docentes e discentes de nossa Instituição e de outras Instituições de Ensino
Superior, como os trabalhos aqui apresentados, que são resultados de pesquisas
oriundas de produções apresentadas no VI Seminário de Formação de Professores
- SEFORPROF 2017 na UFTM – Universidade Federal do Triângulo Mineiro.
Acreditamos que os artigos aqui apresentados, reforçam o papel do professor como um mediador de aprendizagens, o elo entre o saber e o aluno e entre
este e o saber, como uma espécie de tradutor e mediador do conhecimento e a
maneira como essa mediação tem sido feita nos últimos anos, em face das enormes mudanças ocorridas na sociedade.
Esta publicação já se tornou um meio de comunicação consolidado e de
grande contribuição sobre o conhecimento na área da educação, em suas muitas
formas de manifestação. Também é um canal de comunicação do UNIARAXÁ
com diversas outras instituições e pessoas empenhadas em viver e construir a
educação em nosso país.
Evidência tem sido nestes 14 anos, uma revista voltada para a educação,
mas aberta para o diálogo com todo fazer científico que possa contribuir para
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 9-10, 2018
a melhoria da prática pedagógica e a construção de uma sociedade mais justa,
democrática e desenvolvida em tempos de constantes desafios da contemporaneidade.
Desejamos a você leitor, uma boa e instigante leitura!
Profa: M.e. Ivana Guimarães Lodi
Editora responsável
Prof: M.e. José Oscar de Melo
Reitor
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 9-10, 2018
Editorial
Profª. M.a. Ivana Guimarães Lodi
“Vamos continuar nossa jornada para o nosso destino
de paz e educação.
Ninguém pode nos parar.
Vamos falar por nossos direitos e vamos trazer a
mudança para a nossa voz.
Nós acreditamos no poder e na força de nossas
palavras.
Nossas palavras podem mudar o mundo inteiro,
porque estamos todos juntos,
unidos pela causa da educação.
E se quisermos alcançar o nosso objetivo, então vamos
nos fortalecer com a arma do conhecimento e vamos
proteger-nos com a unidade e união”
Malala Yousafzai
Com o reconhecimento a todos os nossos leitores, apresentamos a Revista Evidência – olhares e pesquisa em saberes educacionais, em Edição Especial,
resultado da parceria desta instituição com a UFTM – Universidade Federal do
Triângulo Mineiro, na realização do VI Seminário de Formação de Professores –
SEFORPROF, nos dias 15, 16, 17 e 18 de novembro de 2017. Esta é uma publicação do curso de Pedagogia do UNIARAXÁ – Centro Universitário do Planalto
de Araxá. A sua publicação é anual, sendo esta edição a de número 14 – Edição
Especial.
Mais uma vez discutiu-se sobre o ofício e os fazeres de Professor e algumas das tramas que permeiam este fazer, o que nos remete à reflexão sobre
a importância e os desafios que este profissional vive e enfrenta em todos os
segmentos educativos. Acreditamos ser o professor um semeador de futuro, um
transformador da realidade, um criador de caminhos que descortinam mudanças,
um construtor de possibilidades para construir, talvez, um futuro mais promissor
e humano.
Acreditando nestas possibilidades é que citamos Malala como epígrafe
desta apresentação, já que a educação é o único meio para transformação das pessoas e assim, dos lugares do mundo. É preciso acreditar e buscar caminhos para
que o fazer educativo possa sempre se transformar em possibilidades concretas
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 11-18, 2018
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das mudanças que são necessárias, não só no desenvolvimento científico, mas
humano, uma jornada com destino para a paz e a liberdade.
Sendo assim, os artigos aqui apresentados, resultados das pesquisas desenvolvidas pelo programa de pós-graduação stricto sensu – Mestrado na UFTM –
em seus variados temas relacionados com a educação, apresentam reflexões atuais
e com um olhar para o futuro.
Acreditamos que o salto de qualidade que tanto almejamos na educação
brasileira passam, essencialmente pela formação continuada dos professores que
se dedicam ao ofício de professor e, constroem cotidianamente a sua identidade.
Como já disse Dominicé (1990, p. 149-150) “Devolver à experiência o
lugar que merece na aprendizagem dos conhecimentos necessários à existência
(pessoal, social e profissional) passa pela constatação de que o sujeito constrói
o seu saber ativamente ao longo do seu percurso de vida. Ninguém se contenta
em receber o saber, como se ele fosse trazido do exterior pelos que detêm os seus
segredos formais. A noção de experiência mobiliza uma pedagogia interativa e
dialógica”
Assim, esta edição especial, mais uma vez coloca em cena o professor,
com algumas inquietações que permeiam seu ofício cotidiano, apresentando artigos que analisam sobre este fazer em diversas modalidades e etapas do processo
educativo.
O primeiro texto aqui apresentado, constitui-se em um Ensaio da Professora Dra. Maria Eugênia de Lima e Montes Castanho, resultado da sua fala
durante uma Mesa Redonda realizada no evento citado. Mais uma vez, de forma
profunda e humana a professora relata sobre sua própria trajetória de vida profissional, destacando as várias etapas pelas quais passou e as maiores influências
pedagógicas adquiridas. Destaque especial foi dado para a sua atuação no Ensino
Superior na formação de professores. Diz ela que “parte substancial de minha
trajetória de educadora está marcada pela paixão com o trabalho de sala de aula.
Estando sempre em contato com diversas universidades, o tema que mais me envolveu e sobre o qual mais me dediquei foi o da formação docente para o ensino
superior”. Maria Eugênia também nos traz algumas análises sobre algumas políticas e programas de formação, destacando suas contribuições e suas falhas. Mesmo
reconhecendo o grave momento por que passa a educação no país, a autora termina seu texto dizendo que “Viver é responder aos desafios que o tempo nos faz, responder às perguntas que os outros nos fazem ou que nós mesmos nos fazemos.”
Na sequência o professor Wellington Félix Cornélio nos traz uma abordagem reflexiva quanto à identidade do professor com relação às contradições existentes neste processo e a relação direta destas temáticas na discussão do trabalho
docente. O texto inaugura a leitura nos convidando a pensarmos e repensarmos
sobre o magistério, a atratividade da carreira e atuais desafios da profissão. Segundo as análises do professor “nos tempos atuais, há um “colapso existencial” que
acontece porque a identidade profissional docente está intimamente relacionada
à carga pessoal e social que a profissão simboliza, levando a uma infindável busca
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 11-18, 2018
(em aspectos individuais, pessoais e coletivos) por um platônico encontro entre
o ser e viver docentes.
No terceiro texto, a autora Érika Cristina Silva Alves também discute
sobre o professor e sua identidade na sociedade contemporânea, questionando se
a educação é promotora da liberdade, e sobre a Educação enquanto organização
institucional do Estado, que deveria estar à serviço da emancipação do cidadão,
permitindo que o mesmo crie condições de perceber-se no mundo e de modificar
o ambiente à sua volta, apontando que isto não tem acontecido. Também aponta
sobre o professor da escola pública, nesse contexto, como agente à serviço da
emancipação ou submissão do aprendiz, destacando que ele precisa necessariamente perceber-se como tal, ou seja, estar consciente das forças que atuam em seu
campo de trabalho.
Na sequência a autora Débora Viviane Teles Magalhães Gontijo nos convida a refletir sobre a formação de professores, bem como os pressupostos da
formação inicial e continuada, na perspectiva do desenvolvimento profissional.
A autora realiza uma abordagem sobre a construção da identidade profissional
nesse processo e o que se entende por saberes docentes. O objetivo principal do
estudo aqui apresentado, foi ampliar a visão dos fatores que contribuem para
o desenvolvimento profissional de professores na atualidade. A autora acredita
que essas temáticas constituam reflexões importantes sobre a necessidade de uma
formação de qualidade, para a constituição da identidade do professor como um
profissional reflexivo e com domínio teórico e prático para responder aos desafios
da contemporaneidade, assim como, da responsabilidade do estado, enquanto
organizador das políticas públicas educacionais de formação, de garantir a sua
continuidade.
No artigo seguinte, a autora Gabriela Fernanda Silva Borges discute sobre a trajetória histórica da Educação superior no Brasil até a criação do Sisu –
Sistema de Seleção Unificado, buscando refletir sobre os avanços e impasses desse
programa de governo no processo de democratização do ensino superior no país.
A autora aponta que apesar dos diversos processos de implementação de políticas públicas voltadas para a educação superior, faz-se necessário avaliar os efeitos
destas políticas no contexto das instituições de ensino, pois apenas aumentar o
número de vagas e cursos não é suficiente para promover a democratização. É
necessário garantir o acesso e a permanência com qualidade e equidade e, no caso
do Sisu, esta avaliação no interior das instituições se torna fundamental, uma vez
que diversas instituições públicas têm aderido ao Sistema de Seleção Unificada
como única forma de ingresso em seus cursos superiores.
Pensando sobre as trajetórias formativas de acadêmicos em Educação
física, o artigo seguinte, dos autores José Carlos dos Santos, Regina Simões e
Wagner Wey Moreira, apresentam um estudo realizado com os alunos da UFPI
– Universidade Federal do Piauí. Os alunos que participaram do estudo foram
selecionados entre os que escolheram fazer, além do bacharelado, a licenciatura,
buscando conhecer sobre as influências da formação que contribuíram para a opção
pela carreira de professor. Os autores acreditam que os percursos percorridos na
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 11-18, 2018
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formação inicial produziram vivências significativas nas trajetórias dos acadêmicos
pesquisados, como também, na formação da identidade docente destes graduandos.
O artigo seguinte, dos autores Vivian Zerbinatti da Fonseca Kikuichi e
Florence Alves Pereira de Queiroz, nos convida a refletir sobre a Educação Inclusiva e a era digital na contemporaneidade como um dos grandes desafios para
o sistema educacional. Segundo eles, a perspectiva da educação inclusiva precisa
questionar as práticas educacionais excludentes em detrimento às práticas que
valorizam a diferença presente em sala de aula. Assim, o objetivo do estudo aqui
apresentado, foi destacar as contribuições da tecnologia digital para a inclusão das
pessoas com deficiência auditiva e foi realizado por meio de revisão de literatura a
fim de buscar os principais recursos tecnológicos digitais, disponíveis atualmente
no mercado, em prol desse público específico.
O próximo artigo, dos autores Frederico Martins Motta, Camila Tenório
Freitas de Oliveira e Rafael Alves dos Santos, nos trazem uma interessante discussão sobre o uso dos jogos didáticos e suas aplicações no processo educativo. No
estudo aqui apresentado, eles demonstram como a utilização do jogo “Aprendendo com o Fred”, desenvolvido durante a realização da disciplina de Tecnologias
Digitais de Informação e Comunicação na Educação na Formação de Professores,
do curso de Mestrado em Educação, na Universidade Federal do Triângulo Mineiro, constitui-se em um rico instrumento metodológico, que contribui para a
formação de cidadãos críticos.
Continuando, os autores Fernanda Machain Silva Tannús, Lucas de Oliveira Lima, Marcus Vinicius Simões de Campos e Wagner Wey Moreira, nos
apresentam uma interessante pesquisa que traz as possíveis abordagens sobre
corpo e corporeidade nos programas de pós-graduação do estado de São Paulo.
Através de um estudo de revisão, do tipo estado da arte, são analisadas a produção
acadêmica sobre estas temáticas de 2000 a agosto de 2017. Todo o processo de
investigação foi feito em dois momentos: o primeiro se caracterizou pelo levantamento dos programas de pós-graduação em Educação do estado de São Paulo,
segundo os dados da Plataforma Sucupira. O segundo momento identificou as
dissertações e teses sobre a temática corpo e corporeidade nos sites do próprio
programa. Bibliotecas digitais e acervos de cada programa também foram utilizados no processo de coleta. Os dados levantados permitiram chegar à conclusão de
que muito pouco se tem produzido, comparado a influência que a corporeidade
possui no processo de formação humana em todas as áreas do conhecimento.
Estas pesquisas ainda são incipientes e carecem de um fortalecimento reflexivo e
metodológico.
Pensando sobre a adolescência como uma etapa do desenvolvimento humano que necessita ser compreendida no contexto de transformações e fenômenos ligados a essa transição considerada complexa, os autores Laudeth Alves dos
Reis e Wagner Wey Moreira apresentam na sequência, um estudo em que discutem sobre como a prática esportiva pode favorecer o aumento das habilidades sociais como a relação interpessoal, a comunicação e a redução do comportamento
antissocial e ainda, a ressocialização de indivíduos privados de liberdade ao partiEvidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 11-18, 2018
rem de uma motivação própria. Segundo os autores, “o estudo ajudou a observar
a importância do esporte na vida dos adolescentes, em especial, os privados de
liberdade, atentando-se ainda à necessidade de mais estudos que possibilitem o
desenvolvimento de projetos e programas ligados ao esporte visando a inclusão
desses adolescentes na sociedade”.
Na sequência, os autores Thaís Balada Castilho, Adriano Ribeiro Sousa
e Daniel Fernando Bovolenta Ovigli, apresentam uma discussão muito interessante e importante na educação que é o trabalho através do uso de metodologias
diferenciadas. Eles discutem sobre a educação científica praticada em museus de
ciências e a influência das várias linguagens que são utilizadas nestas exposições,
na busca da compreensão de conceitos científicos. Os autores observam que as
várias linguagens utilizadas neste processo de comunicação, permitem as interações entre público e exposição, o que estimula os visitantes por diversos canais
sensoriais, aguçando o processo educativo. Esta prática metodológica transforma
o processo de aprender em uma experiência prazerosa e mostra o museu como
instituição ponte entre educação e sociedade.
Ainda discutindo sobre metodologias de ensino inovadoras, o artigo seguinte, escrito pelos autores Cleiton da Silva Pinheiro, Maurício Szaz de Lima,
Jéferson Muniz Alves Gracioli e Ricardo André Ferreira de Oliveira Santos, nos
trazem uma rica discussão em que os autores afirmam que ao relacionar museus
e aprendizagem, consegue-se perceber que é este é um espaço muito importante
para a educação não formal, desse modo, podemos identificar que quando se
trata de museus como um espaço não formal ligado a aprendizagem, ele se torna
um espaço bem interessante para ser utilizado, principalmente para o ensino de
Ciências. São apresentados os pontos de vista de diferentes autores sobre o tema
abordado e a importância do uso dos museus como espaço de ensino/aprendizagem para a construção do conhecimento.
Na sequência as autoras Carolina Kiyoko Mellini e Helena de Ornelas
Sivieri-Pereira, trazem uma interessante pesquisa quanti-qualitativa, sobre a formação do professor de Ciências Biológicas, realizada através da análise da produção científica publicada em periódicos referentes ao tema no período de 2010
a 2017. O processo possibilitou identificar 20 artigos alinhados à temática da
pesquisa, que foram agrupados em quatro áreas de conteúdo. As autoras afirmam
que foi possível perceber a existência de uma lacuna teórica nos estudos sobre a
formação de professores de CB no Ensino Superior, bem como evidenciar que a
área em questão, caracteriza-se emergente no campo da Formação de Professores.
Continuando, os autores Wagno da Silva Santos e Arci Mário Karwoski
discutem sobre a Pedagogia do Multiletramentos, comentando sobre seus desafios e perspectivas para a docência. O artigo traz reflexões acerca desta perspectiva
multimodal e os seus pressupostos na formação continuada de professores interligados às Novas Tecnologias da Informação e Comunicação. Entre os resultados
aqui apresentados, percebeu-se a necessidade da valorização da multiplicidade de
linguagens presente nos mais variados textos em circulação social, que em sua
maioria estão inseridos em nossas vidas por meio dessas novas tecnologias, apontando para a necessidade de redimensionar o currículo escolar à incorporação
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 11-18, 2018
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dos Multiletramentos, sendo assim, de grande relevância para a reflexão sobre a
prática docente.
Na sequência, Diego Gerônimo Silva e Regina Maria Rovigati Simões,
nos apresentam um estudo sobre Pesquisa Escolar no Brasil, através do estado da
arte, em que a análise foi feita por levantamento bibliográfico sobre o tema, nas
pesquisas acadêmico-científicas publicadas em periódicos nacionais, indexadas na
área da Educação pela Capes entre os anos de 2000 a 2017. Detectou-se 17 trabalhos distribuídos em 13 revistas, no qual diagnosticou-se a prevalência de periódicos da região Sudeste e de revistas/publicações em estrato B2. Ademais, o ano
de 2016 destacou-se na divulgação sobre o tema. Os resultados mostraram que a
produção científica sobre o tema Pesquisa escolar ainda é insuficiente.
O artigo seguinte aborda sobre a importância da Pedagogia Hospitalar.
Os autores Júlio Rodrigues e Regina Simões, através de um Estudo de caso,
discutem sobre como se configura a rotina de uma classe hospitalar, utilizando
da observação não participante. Os autores apontam que o ambiente da classe
hospitalar se mostra dinâmico e potencialmente produtivo, uma vez que permite
às crianças hospitalizadas um saber sistematizado que garante a manutenção da
sua vida escolar e ao mesmo tempo se constitui de maneira adaptada à realidade
hospitalar. Conforme constatam, “o ambiente da classe hospitalar está envolvido
de sentimentos tão profundos quanto um oceano. Por esse motivo, possibilita
diversas aberturas emocionais por parte da criança e principalmente dos familiares – que comumente são aqueles que sabem da gravidade da patologia dessas
crianças”.
Na sequência, os autores Cléa Rocha Ferreira, Alexandra Bujokas de Siqueira e Martha Maria Prata Linhares discutem sobre a produção de banner em
uma abordagem de iniciação para a cultura digital com base na prática educativa. Segundo eles, em um mundo cada vez mais digital, uma avassaladora onda
de informação é enviada e recebida instantaneamente, através de meios diversos.
Em sala de aula, um dos desafios do docente é aprender a utilizar as chamadas
tecnologias digitais de Informação e Comunicação na prática. Pretendeu-se, por
meio de um apanhado de autores relacionados a uma prática específica, realizada
em uma escola de nível médio-técnico, colocar em debate a alfabetização digital
a partir da iniciação na produção científica por meio da produção de banner. Tal
prática perpassa pelo aprendizado na produção de conteúdo, uma vez que o aluno
quando na posição de produtor, confeccionando material que pode ser disponibilizado no meio digital, abre precedente para os questionamentos acerca daquele
conteúdo que consome no próprio meio.
Os artigos apresentados na sequência, nos trazem estudos referentes ao
Ensino Médio no país. No primeiro deles os autores Ricardo de Oliveira Ramalho, Luciano Marcos Curi e Camila Cunha Oliveira Giordani apontam que o Ensino Médio no país é entendido por uns como uma preparação para a Educação
Superior e, para outros, com a finalidade de profissionalização para a inserção no
mercado de trabalho. São propostas algumas reflexões sobre os aspectos identitários e sentidos atribuídos ao Ensino Médio brasileiro na atualidade e os resulEvidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 11-18, 2018
tados do estudo apontam que são válidas as tentativas de repensar esta etapa de
formação no país. Segundo os autores, faltam soluções para a crise de identidade
do Ensino médio e é urgente a definição e implantação de políticas públicas coerentes, com caráter verdadeiramente emancipatório, que conduzam os resultados
desta etapa a um patamar aceitável e exitoso.
Já pensando sobre o uso das tecnologias no Ensino Médio, os autores
Camila Tenório Freitas de Oliveira, Daniel Fernando Bovolenta Ovigli, Mônica
Izilda da Silva e Regina Maria Rovigati Simões, buscam, através da sistematização
das produções sobre tecnologias no Ensino Médio dos últimos seis anos - 2012 a
2017, entender sobre a sua utilização e seus impactos nesta etapa de formação. Os
autores apontam que os artigos pesquisados discutiram a relação entre o aluno e
o mundo, o impacto das tecnologias na sociedade atual e a ampliação do saber, o
que permite afirmar que os professores precisam contribuir para a construção de
sujeitos ativos no contexto de práticas e vivências pautadas no uso das tecnologias.
Continuando sobre esta temática, o artigo, produzido por Sthéfany Melo,
Ednaldo Gonçalves Coutinho e Welisson Marques nos propõe algumas análises
sobre a Formação Integrada e o Ensino Médio Integrado no estado de Minas
Gerais. Segundo os autores o Ensino Médio integrado possui número bem menor de alunos em comparação ao tradicional Ensino Médio regular. Na prática, o
conceito de integração vem sendo edificado até mesmo pelos próprios profissionais da educação, os quais se mantêm incertos quanto aos procedimentos a serem
adotados para que a educação geral se torne parte inseparável da educação profissional. Os autores afirmam que a ideologia de conhecimento fragmentado por
meio de disciplinas isoladas perdura no imaginário educacional e, resistir a essa
ideia através de processos pedagógicos inter e transdisciplinares, continua sendo
uma metodologia inovadora e utópica, questionada por pais, alunos, professores
e por toda a comunidade escolar.
Mais uma vez, ainda pensando sobre o Ensino Médio e a nova modalidade recentemente criada, de formação profissional integrada a esta etapa de formação, os autores Camila Cunha Oliveira Giordani, Ricardo de Oliveira Ramalho
e Luciano Marcos Curi nos trazem uma discussão interessante. Segundo eles, o
Ensino Médio situa-se, atualmente, em uma estrutura educacional centrada nas
formas fragmentárias de educação, desarticulada do processo global. As instituições trabalham, muitas vezes, com modelos variados de ensino, desprivilegiando
o estudante pobre e o jovem trabalhador. O objetivo da pesquisa aqui apresentada, foi fazer um estudo histórico e sociológico sobre o Ensino Médio. As reflexões
aqui apresentadas, apontam algumas questões iniciais sobre o tema, o qual visa
contribuir com o atual debate da reforma na última etapa da educação básica.
No último artigo desta edição, Francis Silva de Almeida retoma parte
das análises realizadas durante a pesquisa de Mestrado “Filosofia e fazer filosófico
no ensino médio: ressonâncias e deslocamentos em Deleuze-Guattari”, levada a efeito
em dezembro de 2016, junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal do Triângulo Mineiro. A pesquisa teve como objeto de investigação o ensino da filosofia e o fazer filosófico no ensino médio, e seu objetivo
foi examinar em que medida os sentidos atribuídos pelos professores de filosofia
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do ensino médio ao fazer filosófico têm provocado a possibilidade de uma “pedagogia do conceito”. Segundo a autora, as discussões que se destacam situam-se
no campo da didática, especialmente no que diz respeito aos recursos, ao planejamento e as unidades teórico-metodológicas que orientam o fazer filosófico em
sala de aula.
Assim, esta edição especial da Revista Evidência: olhares e pesquisa em saberes educacionais, nos apresenta temas diversos relacionados ao fazer educativo, com
a qualidade que sempre buscamos imprimir em todas as edições desta publicação,
sempre comprometidos com a qualidade e buscando evidenciar a nossa missão
institucional de “Promover a educação cidadã, por meio do Ensino, Pesquisa e Extensão,
para a empregabilidade e a sustentabilidade, com ética e respeito às pessoas”.
Fernando Pessoa disse uma vez que “nenhum dos meus escritos foi concluído; sempre se interpuseram novos pensamentos, associações de ideias extraordinárias, impossíveis de excluir, como infinito como limite. Não consigo evitar a
aversão que tem meu pensamento ao ato de acabar” (PESSOA, apud GIANETTI, 2008, p.?). Acreditamos que a Educação é assim, nunca se esgota, nunca se
concluí, são novas ideias, novos pensares, novos fazeres. Assim, também é esta
publicação que busca discutir temas diversos de educação, na constante busca pela
qualidade e inovação.
Agradecemos imensamente a todos que colaboraram com esta edição da
Revista, de diferentes modos. Em especial, agradecemos por esta rica parceria
com o programa de mestrado da UFTM. O resultado alcançado, é fruto do esforço coletivo de todos os envolvidos e nos colocamos à disposição para novas
publicações e parcerias.
Uma boa leitura a todos!
Referências
Dominicé, Pierre. L’histoire de vie comme processus de formation. Paris: Éditions
L’Harmattan, 1990.
GIANETTI, Eduardo. O livro das citações: um breviário de ideias replicantes. São Paulo:
Companhia das Letras, 2008.
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Docência universitária: aventuras e
desventuras
CASTANHO, Maria Eugênia
“Mestre não é quem sempre ensina, mas quem, de repente,
aprende”
(Guimarães Rosa)
1. Introdução
Após tempo prolongado de trabalho na área da Educação, escrevo sobre
minha trajetória, sempre marcada por um interesse profundo na formação dos
seres humanos com quem convivi em situação pedagógica. Professora há várias
décadas, vivo o privilégio de participar de todo o processo de reflexão e ação que
tem reformulado a educação brasileira. Nessa caminhada fui aprendendo por conta e risco próprios, mas não sozinha, pois toda fala, conforme Bakhtin, é abstraída
de um diálogo.
Sempre tive e continuo tendo o sentimento de trabalhar com vistas a
uma sociedade mais democrática, já que nossa história mostra que tivemos uma
república com democracia bastante restrita (1889-1930), depois o período liberal
varguista (1930-1937), sucedido pela modernização autoritária do Estado Novo
(1937-1945), pela restauração liberal de caráter populista (1945-1964), seguida
pelo Golpe Militar que resultou numa ditadura de 21 anos (1964-1985), como
ocorreu com outros países da América Latina. Hoje há uma clara desconstrução
da política, ensejando a fragilização da estrutura democrática.
É nesse contexto geral do país que passo a falar de minha experiência basicamente ocorrida na educação superior, detendo-me em aventuras e desventuras
vividas nessa área acadêmica.
2. Origem e formação
Minha formação deu-se toda em Campinas, SP, cidade para a qual vim
poucos meses após ter nascido em Itajubá, MG. Meu curso primário (hoje, séries
iniciais do ensino fundamental), ocorrido de 1953 a 1956, dos 6 aos 10 anos de
idade, foi desenvolvido numa escola municipal em Campinas, que ocupava todo
um quarteirão bonito, gramado, com um prédio majestoso onde ficavam as salas
de aula e que foi posteriormente demolido. A mesma professora acompanhava a
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turma nos 4 anos do curso primário. A minha iniciou-nos com a maior competência nos ensinamentos desse período. A base por ela dada foi muito importante
para os estudos seguintes. Os quatro anos de ginásio (séries finais do ensino fundamental), de 1957 a 1960, foram cursados numa escola particular de Campinas,
já extinta.
Formei-me professora primária aos 17 anos na antiga Escola Normal de
Campinas (Instituto de Educação “Carlos Gomes”), ali tive uma inesquecível
professora da disciplina Metodologia e Prática de Ensino que formou a mim e
a minha turma com grande competência técnica: Professora Judith Stucchi, viva
ainda hoje com 93 anos de idade. O que ela me ensinou foi a base segura de tudo
quanto veio depois, destacando-se a compreensão profunda do que é dar aula, do
que é o ensino, do que é a aprendizagem. Fala-se tanto em competência técnica,
mas não é simples nem fácil exercê-la com a maestria com a qual d. Judith a exercia e com a qual nos formou. Nesse curso, minha primeira aula aos 15 anos, para
crianças de 10 anos de idade, foi o grande marco de minha paixão pela docência.
Depois fiz o curso de Pedagogia (de 1964 a 1967) na PUC-Campinas.
No início de meu primeiro ano de Pedagogia ocorreu o Golpe Militar no país. Eu
não tinha consciência do que isso significava. Comecei a frequentar o Centro Acadêmico e também me tornei membro da Juventude Universitária Católica (JUC),
onde fui entendendo aos poucos a situação política do país. No final do curso, em
1967, eu já compreendia os desdobramentos da situação e consequentes prejuízos
sociais, muito mais pela convivência com colegas no Centro Acadêmico e na JUC,
já que os professores não se manifestavam sobre o contexto nacional.
Recém-formada, em 1968 ia lecionar e coordenar o Curso de Pedagogia
na Faculdade de Filosofia de Uberlândia, MG (hoje fazendo parte da Universidade Federal de Uberlândia). A diretora do Curso era Madre Ilar, uma educada
e inteligente freira que havia estudado Pedagogia na então Universidade Católica
de Campinas, anos antes. Desisti por ter sido ao mesmo tempo selecionada para
Orientadora Pedagógica no Ginásio Vocacional de Rio Claro, SP, ligado ao Serviço do Ensino Vocacional no âmbito público estadual. O trabalho no “Vocacional”, durante todo o ano de 1968, foi altamente positivo para meu crescimento
profissional, além de se dar num serviço considerado por consagrados educadores
como de qualidade ímpar no ensino público no Estado de São Paulo e possivelmente no Brasil. Publicações sobre a história desse ensino são disponíveis, destacando-se um livro organizado por Esméria Rovai, intitulado Ensino Vocacional:
uma pedagogia atual, da editora Cortez, publicado em 2005.
Embora fosse recém-formada na graduação nesse mesmo ano de 1968,
comecei a trabalhar na PUC-Campinas, porque não eram exigidos estudos pós-graduados. Em dezembro houve o endurecimento do regime ditatorial com a
edição do Ato Institucional n. 5, que reprimiu fortemente o pouco que se tinha
de liberdade, com prisões e perda total de direitos de toda a população. Um clima
de muita apreensão com a situação passou a ser instaurado na instituição.
Monsenhor Emílio José Salim, fundador e reitor da instituição, embora fosse uma pessoa de pensamento conservador, sempre defendeu a autonomia
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da instituição e nunca permitiu que a polícia entrasse no “Pátio dos Leões” da
universidade, local de convivência e reunião dos estudantes. Monsenhor Salim
sempre exerceu a reitoria sem vice-reitor. No entanto, pouco tempo antes de sua
morte nomeou o promotor e professor da Faculdade de Direito Benedito José
Barreto Fonseca como vice-reitor. Barreto acabou assumindo a reitoria e foi considerado “reitor do regime”, cumprindo fielmente tudo o que lhe era solicitado
pelo poder militar.
A situação política caracterizada por uma ditadura rigorosa capilarizou-se por toda a vida do país, atingindo tudo e todos. O clima na PUC-Campinas
tornou-se tão persecutório que culminou com um pedido coletivo de demissão
de 49 professores em agosto de 1969. Só havia o campus central na Rua Marechal
Deodoro, em Campinas, SP. A Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras abrigava
praticamente todos os cursos que ficaram sem seus professores.
Muitos, como foi o meu caso, foram trabalhar em faculdades que estavam começando na região. Fui para a Universidade Metodista de Piracicaba
(UNIMEP), onde trabalhei durante 10 anos. Como o Curso de Pedagogia na
minha época dava direito a lecionar Matemática nas séries do que se denominava
ginásio (atuais séries finais do ensino fundamental), lecionei também a disciplina
em Campinas. Consegui me sair bem e vários alunos que tomaram gosto pela
disciplina manifestaram desejo de fazer (e mais tarde fizeram) o Curso de Matemática na PUC. Saí-me bem graças à Matemática que aprendera no curso ginasial
com um professor inesquecível pela competência profissional, já que no Curso
de Pedagogia havia apenas um ano de uma disciplina chamada Complementos de
Matemática, com um professor que pouco ensinava.
Com a abertura política que preparava o fim da ditadura (terminaria três
anos depois), as instituições começaram a democratizar-se e, prestando concurso,
voltei a trabalhar na PUC-Campinas em 1982. Nesse mesmo ano estava defendendo minha dissertação de mestrado na Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp) com o tema Arte-educação e intelectualidade da arte. Na sequência
cursei ali o doutorado, defendendo a tese intitulada Universidade à noite: fim ou
começo de jornada? Em 1989.
Cursar mestrado e doutorado na UNICAMP ajudou-me a fazer as ligações necessárias entre competência técnica e compromissos maiores com a educação e a sociedade. Inúmeros professores foram fundamentais. Autores em profusão eram lidos e discutidos. Nesses estudos muitas ideias tornaram-se bastante
importantes orientando-me nas pesquisas que se sucederam.
2.1 As aventuras
Comecei meu trabalho docente no ensino superior lecionando a disciplina Didática, que foi para mim um grande desafio. Foi um longo caminho
pontuado por muito estudo e reflexão sobre a prática, principalmente com a pós-graduação stricto sensu na Unicamp. Nessa empreitada entrei em contato com
muitos autores e experiências. Sempre tive a forte convicção da necessidade de
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competência técnica para um compromisso de âmbito maior, pensando numa
sociedade realmente democrática e justa. E sempre tive como horizonte trabalhar visando formar professores que crescessem pessoal e profissionalmente, com
consciência da importância de desenvolver nos alunos posturas criativas, éticas,
maduras, democráticas, coerentes.
Tendo começado a docência pelo ensino de Didática, retomei o estudo
sobre Comênio, nascido em 1592, originário da Morávia, atualmente território
da República Checa. Em 1657 sua Didactica Magna foi publicada. Há 339 anos
atrás, no contexto geral da época (meados do século XVII), esse educador, considerado o fundador da didática, já apregoava as principais ideias das bandeiras
atuais dos educadores. Seu objetivo foi mostrar, através de muitos escritos, como
é possível “ensinar tudo a todos”.
Escreveu ele em 1657:
Se, portanto, queremos Igrejas e Estados bem ordenados e
florescentes, e boas administrações, primeiro que tudo ordenemos
as escolas e façamo-las florescer, a fim de que sejam verdadeiras
e vivas oficinas de homens, e viveiros eclesiásticos, políticos e
económicos. Assim, facilmente atingiremos o nosso objetivo;
doutro modo, nunca o atingiremos. (COMÊNIO, 1985, p.33;
grifos meus).
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É considerado o precursor da psicologia genética mais de cem anos antes
de Rousseau e o pai da pedagogia moderna. Sua Didactica Magna tem 33 capítulos divididos em 4 partes.
Propõe ele os mesmos conteúdos nos diferentes níveis, porque correspondem a necessidades permanentes. Diferem no modo como são reestruturados
ou reelaborados. Trata-se, segundo ele, de aprender as mesmas coisas, de maneira
diversa: isto coincide com a proposta de Jerome Bruner, três séculos depois, do
currículo em espiral e remete à descoberta de Jean Piaget sobre funções intelectuais
constantes e estruturas variáveis em todo ser humano.
Ensinar as coisas e o discurso é uma das ideias pedagógicas centrais de
Comênio. Ele fundamenta a importância de começar a partir das coisas, que são
objeto da inteligência e do discurso. E, no entanto, essa continua sendo ainda uma
das questões mais graves do ensino.
Ensinar envolveu estudar profundamente as várias ciências ligadas à educação. Em Psicologia minha opção foi na linha de autores que viam a questão
educativa de forma interdisciplinar. Detive-me, como consequência de estudos
básicos, principalmente em aprofundar as obras de Jean Piaget, L.S.Vigotski, Jerome Bruner e David Ausubel.
Bruner (1991), em instigante estudo, apontou o risco de a Psicologia
perder a coesão necessária para poder fazer um intercâmbio interno que justifique
a divisão do trabalho entre suas partes. No entanto, os grandes temas e interrogações continuam vivos. Por exemplo, os psicólogos mais recentes são tributários
do passado: Chomsky reconhece sua dívida com Descartes; Piaget com Kant;
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Vigotski com Hegel e Marx. O objetivo principal atual é a natureza da construção do significado, sua conformação cultural e o papel essencial que desempenha
na ação humana. Deve-se, segundo Bruner, tentar compreender como o homem
pensa o seu mundo, o de seus semelhantes e o de si próprio.
Para esse tipo de abordagem convergem as posições de Vigotski, elaboradas com antecedência histórica de décadas em relação aos teóricos posteriores.
Bruner apresenta em 1961 para o público norte-americano a versão em inglês do
livro Pensamento e Linguagem de Vigotski (com tradução criticada por inúmeros
estudiosos dadas as simplificações e alterações ocorridas no texto original). Na
época, Bruner não percebia que o autor já apontava para a emergência de um
novo paradigma na área. Prefaciando a publicação, revela sua admiração pelo
autor russo, porém manifesta incompreensão sobre como articular suas posições
científicas com as daquele autor. Só na década de 90 é que alarga sua compreensão
sobre o paradigma emergente, não deixando de resgatar a importância de pesquisas anteriores. Em uma publicação do ano 2000 ele declara com todas as letras:
Mantenho firmemente os pontos de vista expressos na minha obra
anterior [The processofeducation, 1960, Toward a theoryofinstruction,
1966, The relevanceofeducation, 1971], sobre o ensino de uma
matéria: a importância de dar ao discente um sentido da estrutura
gerativa de uma disciplina, o valor de um “currículo em espiral”, o
papel fulcral da descoberta autoproduzida na aprendizagem de uma
matéria, e por aí adiante (BRUNER, 2000, p. 65).
A psicologia cognitiva no campo do ensino e da aprendizagem é interacionista porque, ao analisar a construção dos processos mentais, reconhece ser
indispensável considerar-se o sujeito e o objeto, as características pessoais e o
papel da cultura, a construção da subjetividade em permanente troca com o meio,
principalmente cultural.
Bruner, 17 anos mais jovem que Piaget, responsável pelo new look nos
estudos sobre a percepção, criou o conceito de currículo em espiral (atendimento à
estrutura básica da matéria, selecionando e organizando as ideias fundamentais).
Quanto mais fundamental (estrutural) for a ideia aprendida, maior será a amplitude da aplicação. A volta constante, o reexame das mesmas ideias em profundidade, garante a forma de uma espiral.
David Ausubel, cognitivista norte-americano, em um livro de 625 páginas intitulado Psicologia Educacional (1980, p. 1), assim resume sua posição: “Se
eu tivesse que reduzir toda a Psicologia educacional a um único princípio, diria
isto: o fator isolado mais importante que influencia a aprendizagem é aquilo que
o aluno já conhece. Descubra o que ele já sabe e baseie nisso os seus ensinamentos”. Isso parece simples, mas a observação do que ocorre na prática pedagógica
revela que é bastante complexo e exige especial competência docente.
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3. Revendo concepções, fazendo opções
Quantidade incomensurável de textos de autores, os mais variados, procura ora aproximar ora separar profundamente as concepções de Piaget e Vigotski. Apresento a seguir minha posição sobre a questão uma vez que minha
práxis é tributária de conceitos de tais autores.
Piaget (1977) gravou um filme resumindo suas ideias, concretizando um
antigo desejo de esclarecer do modo mais claro possível os equívocos de que sua
teoria foi alvo. Deixa claro que não é um empirista ou inatista (os conhecimentos
não são pré-formados no objeto ou no sujeito). Por essa razão declara-se interacionista considerando que acontece autorregulação, isto é, construção e reconstrução.
Piaget trabalhou 50 anos com isso, tendo feito duas principais e impressionantes descobertas. A primeira é a de que crianças de uma mesma idade dão
sempre respostas iguais. A segunda é a de que ocorre sempre a mesma ordem de
sucessão nas respostas dadas, isto é, os níveis são sequenciais. As idades em que
ocorrem esses níveis variam, quer se trate de sujeitos da África, da Ásia, índios
da América do Norte etc. Resultados similares foram encontrados, por exemplo,
entre sujeitos de Teerã e de Genebra. Analfabetos das montanhas ou do campo
apresentaram respostas “atrasadas” mais ou menos em três anos.
Dado que o conhecimento é construído pela ação do sujeito sobre o objeto, resta apontar que Piaget não realizou uma teoria sobre o meio, a cultura, o outro
polo. Vigotski, psicólogo russo, também interacionista, lançou instigantes questões sobre o papel do objeto (a cultura) na formação do sujeito (da subjetividade).
A grande contribuição de Vigotski a explicitação dos processos pelos
quais o desenvolvimento é socialmente constituído. Isso é feito a partir de dois
conceitos básicos: internalização e desenvolvimento proximal. O funcionamento
no plano intersubjetivo cria o funcionamento individual. O plano interno não
consiste de reprodução das ações no plano externo. O plano intrassubjetivo da
ação é formado pela internalização de capacidades originadas no plano intersubjetivo. O plano intersubjetivo não é o plano do outro, mas sim o plano da relação
do sujeito com o outro.
Vigotski criou o conceito de zona de desenvolvimento proximal: são funções
emergentes no sujeito, capacidades apoiadas em recursos auxiliares oferecidos pelos outros. Funções consolidadas refletem o desenvolvimento atingido. A zona
de desenvolvimento proximal é a distância entre o nível real e o nível potencial.
Assim, a boa aprendizagem é aquela que consolida e principalmente cria zonas
de desenvolvimento proximal sucessivas. A gênese do conhecimento é social. A
presença do outro é constitutiva do conhecimento. Assim, a relação entre sujeito e
objeto é socialmente mediada. As funções têm origem nas relações entre as pessoas.
De meu ponto de vista, para a reflexão sobre a prática pedagógica, Bruner, Piaget e Vigotski têm muitas aproximações no interacionismo que defendem,
e as distâncias teóricas que neles podem ser apontadas explicam-se pelos contextos
culturais bastante diferentes em que viveram e produziram: (Estados Unidos e
o primado de uma sociedade pragmática; Suíça, uma sociedade liberal na plena
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acepção do termo; Rússia, uma sociedade com um projeto social novo e com
todos os percalços históricos conhecidos).
Considero que o professor constrói sua prática pessoal integrando, de
acordo com toda sua história, as várias contribuições das várias disciplinas, sendo
capaz de refletir sobre seu trabalho, observando e avaliando a caminhada e tornando os saberes ensináveis de modo a enriquecer-se e enriquecer seus estudantes.
Certamente é no diálogo entre as reflexões psicológicas e sociopolíticas que se
pode alcançar uma visão abrangente de todo o processo educacional e, em particular, didático-pedagógico.
Termino esta seção trazendo uma citação que para mim sintetiza um
pouco a aproximação que proponho. António Nóvoa, respeitado educador português com várias publicações no Brasil, considera que a educação do educador
deve se fazer mais pelo conhecimento de si próprio do que pelo conhecimento da
disciplina que ensina, e afirma:
(...) eis-nos de novo face à pessoa e ao profissional, ao ser e ao ensinar.
Aqui estamos. Nós e a profissão. E as opções que cada um de nós
tem de fazer como professor, as quais cruzam a nossa maneira de ser
com a nossa maneira de ensinar e desvendam na nossa maneira de
ensinar a nossa maneira de ser. É impossível separar o eu profissional
do eu pessoal. (NÓVOA, 1997, p.18)
4. As aventuras em meu quefazer pedagógico
Exerci inúmeras atividades no ensino superior, mas a mais importante sempre foi a docência, momento mágico de encontro humano. Na verdade,
estudante e professor estão no mesmo patamar de protagonismo. Como disse
Gusdorf, cada um está exposto ao outro e ninguém pode dizer como terminará
a aventura. Isso porque a experiência de ensino e de aprendizagem não é neutra.
Lecionei por 10 anos na Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep), trabalhando em seguida com muitas turmas de graduação de Pedagogia e
demais cursos de licenciatura na PUC-Campinas a partir de 1982 e no Mestrado
em Educação quando passou a existir. Isso até 2011. Em seguida passei a atuar,
até hoje, a convite, em diversas instituições de ensino superior, com docentes
sobre sua formação.
Sempre esteve claro para mim que apenas usar estratégias diferentes para
animar a aula não era o caminho, uma vez que, passado o efeito surpresa, tudo
voltaria à apatia anterior. O objetivo: provocar reflexões, desenvolver processos
mentais, promover o crescimento tanto discente quanto docente. E ainda despertar a vontade política de melhorar a sociedade, sem ingenuidade, preparando-se
com competência. Em texto que publiquei há tempos defendo que o estrangulamento das práticas atuais que se pretendem críticas se deve à não apropriação, por
parte dos alunos, dos instrumentos teóricos e práticos necessários ao equacionamento dos problemas detectados na prática social. Considero que a instauração
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do diálogo nas práticas cotidianas usando as técnicas como meios indispensáveis
para revolver ideias, concepções e preconceitos colabora para preparar pessoas
genuinamente comprometidas com a busca da verdade.
Sendo historicamente ligada à área de metodologia, minha posição sobre
a questão das técnicas de ensino é a seguinte. Anos de autoritarismo no país produziram no âmbito da educação, a partir do final dos anos 60 e especialmente na
década de 70 do século XX, o chamado tecnicismo, cuja característica maior foi a
de hipertrofiar a dimensão técnica e querer desligá-la das demais dimensões presentes no processo. Essa importância excessiva dada ao aspecto técnico foi usada
para escamotear a violência simbólica desencadeada sobre a vida institucional e
levou os educadores a rejeitar, cada vez com mais intensidade, o tema técnicas de
ensino. Esse desprezo, inicialmente usado como forma de defesa, explica, em parte, na minha opinião, a insuficiente formação técnica dos professores diplomados
a partir de meados da década de 70 e durante os anos 80, que acabaram por receber muitos dos resultados da reflexão filosófica e nada da didática.
O exame da taxonomia apresentada há décadas por Bloom, Hastings e
Madaus mostra que a ação educativa parte do trabalho mais elementar e pode chegar ao ápice de se ter o trabalho independente e autônomo do aluno. Nomeiam os
níveis: terminologia, fatos específicos, regras e princípios, realização de processos
e procedimentos, fazer tradução (de uma forma em outra) e finalmente aplicação.
{taxonomia: exemplos de habilidades e competências}.
De modo geral o trabalho docente fixa-se nos três primeiros pontos (conhecimento) e deixa de ativar os processos mentais (procedimentos, traduções e
aplicações). E o interessante é que nas propostas contemporâneas de pesquisadores sobre ensino e aprendizagem, com apresentação de nomes novos os mais
variados, observa-se que a “novidade” é a sugestão de atividades ligadas aos três
últimos itens da competente taxonomia.
Discutir técnicas de ensino remete à reflexão sobre a apropriação, por
parte dos estudantes, dos instrumentos teóricos e práticos necessários ao equacionamento dos problemas encontrados na prática social. Tem havido poucas tentativas de se compreender como os diferentes discursos e práticas de sala de aula
funcionam na formação das consciências e comportamentos dos estudantes.
É nesse contexto que precisamos pensar a questão das técnicas de ensino.
A técnica é sempre meio para, nunca fim. A técnica deve ajudar a abrir perspectivas
para que o estudante possa expor verdadeiras questões, permitindo-lhe progredir
e avançar sozinho. O diálogo abre o campo da verdade porque põe em circulação
uma pluralidade de pontos de vista.
Nos tempos atuais, dado o desenvolvimento de todo tipo de recursos,
considero que o trabalho do professor não diminuiu mas modificou-se. Penso que
o professor é ainda mais importante do que antes porque a orientação para a
incorporação de conhecimentos e consequente constituição de processos mentais
no estudante exige mais atualmente, dependendo de um trabalho de competência
docente muito grande.
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5. Formação de docentes para o Ensino Superior
Parte substancial de minha trajetória de educadora está marcada pela paixão com o trabalho de sala de aula. Estando sempre em contato com diversas
universidades, o tema que mais me envolveu e sobre o qual mais me dediquei
foi o da formação docente para o ensino superior. Comecei a planejar e vivenciar
encontros com docentes do ensino superior sobre os desafios da aula universitária
a convite do então reitor da PUC-Campinas Eduardo José Pereira Coelho na
década de 1990. Continuo, como disse, fazendo isso agora a convite de várias
instituições, cada vez mais desafiadas pelos tempos atuais. A bibliografia sobre a
problemática é intensa.
Tive o prazer de conhecer muitas universidades no Brasil e no exterior e
de discutir incansavelmente a complexidade da questão. Tive o privilégio de compor um grupo da PUC-Campinas que ministrou um programa de mestrado em
educação no sul do Chile, na cidade de Villarrica, numa sede universitária ligada
à PUC da capital do país, Santiago.
Quando cursava o doutorado, conheci Ilma Veiga, também doutoranda,
que estava organizando um livro de didática com vários autores, todos desconhecidos, inclusive ela, e tive o grande prazer de escrever um capítulo. Não havia editora ainda para publicar o texto. Ofereci-me para falar com a editora Papirus, que
se interessou imediatamente, pois sentia que havia muita demanda pelo assunto.
Ilma Veiga, interessada em ver a aceitação do texto pelo público, com
novos autores, não quis que o prefácio fosse escrito por alguém conhecido na
área. O livro foi publicado com o título Repensando a Didática e tornou-se um
sucesso editorial que persiste até hoje, às vezes com duas edições no mesmo ano.
Até 2017, trinta edições. Ilma Veiga foi convidada pela editora para organizar
coleções na área da educação, tornando todos do grupo conhecidos nesse campo.
Passei a ter ainda mais participação em encontros de discussão sobre desafios da
docência no ensino superior.
Sendo frequentemente convidada para falar sobre formação para o ensino superior, considero grave pensar que, para ensinar nos níveis anteriores ao
superior, sempre existiram as licenciaturas, que de uma maneira ou outra procuraram se desincumbir dessa formação. Para o ensino superior não. Os professores
geralmente contam com o conhecimento específico da área em que lecionam,
sem qualquer formação pedagógica. Instituindo-se a pós-graduação, os mestrados e doutorados das várias áreas do conhecimento passam a desenvolver programas com disciplinas e demais atividades sobre sua área sem preocupações com a
docência universitária. De modo geral tais programas incluem no máximo uma
disciplina de cunho pedagógico. Nos vários programas das diferentes áreas do
saber, a pesquisa específica foi privilegiada em detrimento de pesquisas na área do
ensino e da aprendizagem. Isso inclusive na área da pós-graduação em educação.
Ao longo das várias décadas em que continuo atuando, aprendo que é
necessário um trabalho articulado e contínuo, um programa mais duradouro do
que geralmente se faz. Uma vez mais registro que os ensinamentos profundos
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 19-36, 2018
sobre como realizar a docência, que aprendi com a professora da Escola Normal,
foram vitais. Convém registrar também que muitos anos depois, numa pesquisa
que realizei como bolsista produtividade do CNPq, entrevistei esta professora já
aposentada há tempo. E ela declarou que, enquanto lecionou disciplinas apenas
teóricas, não encontrou problemas, mas quando assumiu a disciplina Metodologia
e Prática de Ensino teve que construir toda uma forma de trabalho porque não
aprendera nada sobre isso e nada encontrou na literatura. E era de uma época
em que se fala que a qualidade do ensino era boa! Iniciando o trabalho no ensino
superior com a disciplina Didática passei pela mesma dificuldade. Fui descobrindo que um ensino de qualidade exigia uma fundamentação com todas as demais
disciplinas de cunho teórico. Um desafio!
Há grandes estudiosos que mostram a importância de desenvolver nos
docentes primeiramente uma reflexão profunda sobre toda a formação, não apenas resumindo-se a questões técnicas. É preciso enfrentar os desafios para formar
pensadores autônomos em vez de técnicos para o mercado. Na área da Economia, por
exemplo, Andrew John Mearman, da Universidade West of England, considera
que as universidades geram economistas despreparados para entender a realidade. Ele aponta que empresas e governos podem treinar seus empregados e que
universidades devem formar os alunos. Mostra ele que a economia tem a ver com
solução de complexos problemas concretos, que exigem um conhecimento econômico
aliado à flexibilidade de pensamento, insights de outras disciplinas, consciência da realidade comercial ou política etc. Penso que tais características devem fazer parte
dos programas de formação.
Sempre mostrei a necessidade de desenvolver nos docentes a importância
de clareza quanto às intenções educativas que se ramificam em objetivos de várias
dimensões. Meios e fins devem ser vividos sempre. O uso de técnicas como novidade anima no início, mas se não estiver alicerçado numa proposta mais ampla,
passado o entusiasmo inicial tudo volta ao comodismo anterior. A técnica é bastante importante, porém por si só pouco vale.
6. As desventuras
Precisamos de critérios humanistas de valor, sem os quais o emprego cego
dos meios técnicos pode ser funesto. Isso pode ocorrer sempre que os interesses
em jogo tomam a parte pelo todo atribuindo à racionalidade dos meios uma dimensão axiológica e normativa que não lhe é própria. É necessária uma resistência
ética ao falso neutralismo que se esconde no uso de técnicas. O trabalho deve, em
primeiro lugar, obedecer a uma lógica de fins, que é a lógica do sentido das ações
humanas. O projeto deve integrar-se em um projeto social superior à mecânica
dos meios. É preciso edificar uma nova docência universitária.
Atualmente os problemas contam com uma questão bastante complexa já
que há grandes grupos empresariais atuando no ensino com ramificações nas forças dominantes da economia e na esfera pública. Não é fácil defender a educação
pública de qualidade acessível a toda a população já que a força de tais grupos se
liga a mecanismos de mercado e contaminam a própria esfera pública.
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 19-36, 2018
Registro a elevada concentração de grandes empresas de ensino superior
privado, de modo geral privilegiando o fator financeiro, com enormes aplicações
no mercado (a empresa Kroton, por exemplo, cada vez mais ampliando sua união
com outras empresas de ensino). Isso coloca novos e gravíssimos problemas no
contexto atual da educação superior, comprometendo a formação de brasileiros,
geralmente trabalhadores, que buscam seu aprimoramento e melhoria de vida.
Grandes grupos multinacionais tomando conta da educação. Interesses privados
dominando sua prática, ilusões tecnológicas sendo disseminadas. É preciso reforçar a profissão.
Há, certamente, instituições de excelente nível, mas existem muitas cuja
qualidade acadêmica é questionável. Ao MEC caberia retomar e ampliar com urgência os processos de avaliação dos cursos de graduação. Isso vale também para
os cursos à distância.
Quanto aos materiais didáticos utilizados, há faculdades privadas que
produzem os próprios livros, reduzindo assim os custos para equipar bibliotecas
e aumentando margens de lucro. Estas produções, em geral, não contam com
os teóricos, peritos e especialistas mais reconhecidos de cada área, a não ser por
citações e recortes. Assim, os alunos têm cada vez menos acesso às ideias originais
de pesquisadores de ponta, e cada vez menos exigência de leitura, com linguagem
e conceitos muito simplificados.
Não há uma rede pública consistente de formação de professores que poderia corrigir uma grande distorção que é o fato de a grande maioria dos docentes
que atuam nas redes públicas de educação básica do país ser formada em instituições
particulares de ensino superior de duvidosa qualidade. A educação básica pública fica
refém do ensino privado mercantilizado, impossibilitando a resolução de problemas de qualidade (SAVIANI, 2014).
Programas (embora ainda incipientes) de formação para a docência estão
sendo desenvolvidos em universidades em sua maioria públicas e merecem incentivo e palavras positivas. Certamente há uma série de questões a analisar para que
não se percam esforços, investimentos e tempo.
Noto a preocupação em desenvolver ações apoiando o ensino e a aprendizagem, falando-se em metodologias como aprendizagem ativa e outras, criando-se
espaços e promovendo-se atividades variadas. Mas há uma série de questões que
não vejo explicitadas na divulgação desses programas. O que pode ser notado é
que há, por parte de educadores e instituições sérias, preocupação com o aperfeiçoamento das questões didático-pedagógicas e com o reforçar de competências
e habilidades necessárias ao exercício profissional através de palestras, seminários
e oficinas. Também se fala em dar suporte aos professores para o uso de novas
metodologias e novas técnicas, preparo de novos conteúdos didáticos e estímulo
a novos projetos de graduação. A pesquisa deve ser encarada como método de
ensino, o que é altamente positivo.
Tudo isso deve acontecer num contexto em que fiquem claras as consequências finais esperadas: professores que cresçam do ponto de vista pessoal
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 19-36, 2018
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e profissional e conscientes da importância de desenvolver nos alunos posturas
criativas, éticas, maduras, democráticas, coerentes.
Na divulgação de programas vemos boas medidas relativas à posição de
lousas panorâmicas (levemente côncavas para facilitar a visão de qualquer ponto
da sala), oferecimento de condições adequadas para que os estudantes desenvolvam suas atividades com segurança e conforto, de dia ou à noite, laboratório de
informática equipado com notebooks e rede wi-fi. Mas isso só produz efeitos se
houver uma visão ampla do que se entende por formação, isto é, se as intenções
educativas forem direcionadas para uma generosa formação humana e não apenas
para treinar técnicas de trabalho. Entendo que a pessoa e o profissional são inseparáveis e que o trabalho de formação para a docência tem a ver com o desenvolvimento pessoal e profissional do professor. Isso significa bem mais que fazer um
treinamento para o uso de técnicas, que são, todavia, necessárias.
Como deve ser feita a formação pedagógica dos professores? Penso que,
entre muitas outras possibilidades, os cursos para capacitação de professores de
ensino superior devem ser ministrados numa linha que começa com cursos pequenos do tipo de minicursos e que se estendam para cursos de maior duração, na
medida em que os professores vão se motivando para reflexões sobre as questões
pedagógicas. Cursos de 4 horas, de 10 horas, de 20 horas são formatos que preparam para outros cursos de caráter mais duradouro.
Infelizmente as experiências com capacitação para o trabalho na educação superior são, no geral, pontuais. Deve haver um programa contínuo para
essa formação, a instituição deve assumir esse programa de formação, fugindo
de soluções tecnicistas e esclarecendo seu conceito de qualidade, a formação da
pessoa e do profissional, levando os docentes a falar da vida, da realidade, de seu
repertório e dos alunos, de seus desejos e desafios, de suas dificuldades, de sua
capacidade de criar.
Considero que todo e qualquer programa de formação docente para desenvolver um trabalho com resultados significativos, ensinando através de atividades as mais variadas, usando toda a estrutura física criada para isso, precisa ter
como horizonte, antes de tudo, a expectativa de um crescimento pessoal e profissional dos próprios docentes e consequentemente de seus alunos de graduação.
O momento de tantas dúvidas e poucas certezas infelizmente é também o
momento em que as universidades valorizam os progressos da pesquisa em áreas
científicas específicas, mas pouco valorizam pesquisas no campo da educação,
desmotivando a aplicação de procedimentos mais efetivos. De modo geral, os
professores ensinam como foram ensinados, não vendo motivos para mudar. No
entanto, é importante afirmar que o conhecimento não pode ser apenas transmitido, é necessário que o aluno o domine e o coloque em prática.
Thomaz Wood Jr. (2016) informa que o Reino Unido vem tendo iniciativas pioneiras de mudanças no ensino superior. A nova iniciativa em 2016 foi
denominada Teaching Excellence Framework. O objetivo é melhorar a qualidade
do ensino. O ponto crítico do novo sistema será como definir critérios e indicaEvidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 19-36, 2018
dores para avaliar o ensino. Sempre se valorizou a pesquisa, professores de universidades, principalmente públicas, não se importando com o ensino. Wood fala
de professores que marcam a vida dos alunos e mostra que há também outros fatores
além desse: orientação geral do curso, organização das disciplinas, definição dos conteúdos, articulação teoria-prática, métodos de ensino e aprendizagem adotados. Ele fala
em pressão sobre professores resistentes para atualizar suas práticas pedagógicas.
7. Professores marcantes
Coordenei muitos encontros pedagógicos com variados públicos sobre o
tema “Professores marcantes” (positiva e negativamente) como consequência de várias pesquisas que empreendi e/ou coordenei. As narrativas negativas superaram
as positivas. Dentre as positivas, sobressaiu a descrição de bons professores com
aulas interdisciplinares; ou que estimulavam a criticidade; ou ainda que buscavam
integrar ensino com pesquisa ou eram muito competentes na transposição didática, isto é, na “transmissão do conhecimento científico de modo muito pessoal e
didático”. Eram professores criativos e que desenvolviam a criatividade: “O professor que me marcou incluía muito estímulo, vibração, respeito às nossas dificuldades, procurando sempre levar a raciocinar, a refletir sobre o que se estudava”.
Às vezes detalhes que podem passar despercebidos marcam a pessoa. Há
um depoimento que relembra um momento de exame vestibular, estando numa
sala aguardando pela prova de redação, quando aparece um senhor vestindo um
terno preto (todos os detalhes desse momento lhe estão presentes até hoje, passadas muitas décadas), e dá o tema da redação: Ser ou Ter. Aprovado para o curso
de Filosofia, teve este professor em várias disciplinas e relata que suas aulas começaram a seduzir os graduandos: “discurso fácil e articulado, lógica argumentativa,
profusão de exemplos e um imenso entusiasmo pela Filosofia”(...). “Postura de
Mestre que também o caracterizou para sempre e está presente na memória de
seus ex-alunos”.
É interessante observar que as descrições de professores geralmente vêm
acompanhadas de características docentes ligadas não apenas ao domínio intelectual, mas também, ao domínio afetivo: professores que “amavam” o que estavam
fazendo, professores “apaixonados” pelo ofício de ensinar. Muitos depoimentos
revelam atuação de professores ministrando ensino de qualidade, embora predomine o que se chama usualmente de ensino tradicional. Isto é, a ideia de que
ensinar é apenas dar aulas, transmitindo a matéria sem preocupações ligadas à
maneira de aquisição dos conhecimentos por parte do aluno ou à construção
epistemológica de cada campo do saber. Assim é que há ênfase na memória, valorizando-se a reprodução do que o professor diz. Muitos professores podem
apresentar bastante bem o conteúdo mas desconhecem procedimentos que levem
o aluno a ter autonomia intelectual e construir sua própria aprendizagem.
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 19-36, 2018
8. Perspectivas
Os estudos nas áreas das ciências humanas vêm mostrando que não se
pode pretender para elas a mesma objetividade das ciências naturais. Há pesquisas
baseadas no estudo de professores universitários que mostram inovações significativas na sala de aula universitária. Entendemos ser necessária uma nova visão em
que o conhecimento preside a prática pedagógica para se fundar uma consistente
e sólida pedagogia universitária.
Segundo Rudduck, muitas experiências fracassam por quererem impor
mudanças sem se preocupar com o próprio significado da mudança. Dedica-se
muito tempo à preparação dos professores e esquece-se da dos alunos, que podem
se transformar numa força conservadora se não participarem do planejamento e
se não souberem o que a mudança significará para eles, utilizando seu poder para
forçar os professores a voltar às velhas estruturas da aula, nas quais se sentem mais
confortáveis. (1994, p. 391-3).
A aula deve ser entendida como espaço para dúvida, nela praticando-se a
leitura e interpretação de textos, trabalhos em grupo, poesias, músicas, observações, vídeos. Em estudo visando a busca de novos mecanismos na universidade,
chega-se a várias conclusões, dentre as quais as relativas a métodos de trabalho:
ter o aluno como referência, valorizar o cotidiano, preocupar-se com a linguagem
(acerto de conceitos), privilegiar a análise sobre a síntese, ver a aprendizagem
como ação, selecionar conteúdos emergindo dos objetivos, inserir a dúvida como
princípio pedagógico, valorizar outros materiais de ensino etc. São nítidos os
ganhos de um ensino nessa direção: recuperação do prazer de ensinar e aprender,
possibilidade de interdisciplinaridade, novas aprendizagens. As boas escolas não
se sentem ameaçadas pela internet porque sabem que são imprescindíveis no papel de formadoras de redes de contato.
As ideias aqui apresentadas sempre serviram para trabalhar numa perspectiva generosa em relação ao ser humano e à sociedade. E numa perspectiva de
paciência: não esperar que as mudanças de caráter geral ocorram imediatamente.
A propósito há uma fala de Antonio Gramsci que me marcou e esclareceu muito.
Diz ele:
A humanidade só se coloca sempre tarefas que pode resolver;
a própria tarefa só surge quando as condições materiais da sua
resolução já existem ou, pelo menos, já estão em vias de existir; uma
formação social não desaparece antes que se tenham desenvolvido
todas as forças produtivas que ela ainda comporta; e novas e
superiores relações de produção não tomam o seu lugar antes que
as condições materiais de existência destas novas relações já tenham
sido geradas no próprio seio da velha sociedade. (GRAMSCI apud
VANZULLI, 2016, p. 4)
Convém por fim apontar que penso que a educação só pode ser entendida no contexto das relações sociais de que nasce. E a sociedade não é um tecido
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 19-36, 2018
homogêneo. É uma arena de conflitos, onde está a educação. A velha lógica dizia
que tudo o que se predica de um ser deve estar contido nele. A lógica dialética
acrescenta que tudo quanto se predica de objetos sociais em disputa deve conter
o que nele se encontra como afirmação e negação. E a educação é uma das mais
importantes mediações das relações sociais conflitivas. Por essa razão há que se
aplaudir uma iniciativa que vem tomando corpo na área: a constituição de redes
de pesquisadores ligando programas de formação para o ensino.
9. Redes e Rades
Vêm sendo criadas redes interligando/articulando os programas de formação existentes visando trocas e inter-relações entre as instituições, fortalecendo grupos formadores. No campo da pedagogia universitária existe, por exemplo, desde 2001 a Rede Sul Brasileira de Investigadores da Educação Superior
(RIES), congregando instituições do Rio Grande do Sul (PUCRS, UFRGS,
UFSM e UNISINOS) envolvendo também diversas IES, inclusive de outros países da América do Sul. A rede conta com inúmeros pesquisadores que defendem
as ideias aqui expostas, por exemplo, Maria Isabel da Cunha (2008), Maria Estela
Dal Pai Franco (2016) e muitos outros. Enriqueci-me participando de inúmeros
eventos com pesquisadores desta rede.
O site da RIES afirma que a Educação Superior, enquanto campo científico de produção e disseminação do conhecimento, não tem recebido atenção. A
RIES - Rede Sul Brasileira de Investigadores em Educação Superior busca a cooperação e o compromisso social dos pesquisadores universitários na construção da
Educação Superior e da Pedagogia Universitária como área de conhecimento e de
prática profissional. Nos vários sites relativos à rede há extensa e atual bibliografia
sobre estudos e pesquisas na área.
Considero serem os principais desafios que se sobressaem quando voltamos nosso olhar para as complexas questões que envolvem a constituição de programas de apoio pedagógico nas universidades: a luta constante na resistência às
políticas reguladoras que caminham na contramão de uma educação que vise uma
qualidade social; a concretização de políticas institucionais que garantam a consolidação e continuidade de tais programas, independentemente dos atores que
os defendem e os estruturam hoje; e a valorização de uma formação pedagógica
universitária baseada em princípios éticos e políticos de emancipação humana.
Uma estratégia a ser buscada, com vistas ao enfrentamento dos desafios
postos, a meu ver, é a construção de redes de articulação entre os programas existentes visando, além de trocas de experiências, uma aprendizagem colaborativa e
uma formação compartilhada, além do fortalecimento dos grupos e constituição
de políticas institucionais cada vez mais favoráveis à formação docente numa perspectiva progressista em nosso país.
Redes desse tipo ajudaram a fortalecer a iniciativa das instituições estaduais paulistas, tendo sido criada em 2016 no Estado de São Paulo a Rede de Apoio
à Docência no Ensino Superior – a RADES, da qual faço parte. O projeto RA33
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 19-36, 2018
DES tem um Conselho Gestor congregando representantes do Espaço de Apoio
ao Ensino e Aprendizagem da UNICAMP, do Centro de Estudos e Práticas Pedagógicas, da UNESP e representantes de pesquisadores do campo da Pedagogia
Universitária.
A rede visa construir um espaço coletivo de ações de formação pedagógica e articulação da produção do conhecimento sobre o tema. Inclui o objetivo de
integração com outras redes de apoio pedagógico nacionais e internacionais, com
ações voltadas aos professores universitários em instituições de ensino superior,
além de construir um acervo de produções acadêmicas sobre o tema. O apoio das
pró-reitorias é fundamental, pois não se trata de ações de um órgão, mas de uma
política para o ensino de graduação, envolvendo instituições de peso no sentido
de alavancar este debate.
10. Concluindo...
Especialmente na atual conjuntura vivemos um momento bastante grave.
Os desafios educacionais da democracia são grandes, já que é preciso resistir às
iniciativas que colocam em risco o que se conseguiu até os dias de hoje com tanta
luta e também é preciso assegurar uma formação de qualidade para o exercício da
cidadania. Não se vê sinal de projeto político que indique saída socialmente palatável ou pactuada na situação atual e que dê sinal de esperança para uma divisão
mais justa dos custos do ajuste. Cumpre lutar para assegurar às novas gerações uma
formação sólida que possibilite o exercício da cidadania numa democracia real.
Meu trabalho pedagógico concentra-se na formação para a docência universitária, e é direcionado ao entendimento cada vez mais rigoroso das intenções
que permeiam todo o quefazer educativo, devendo levar a uma atuação inteligente no sentido do atingimento dos objetivos da educação. Para isso, há uma exigência técnica, que nunca é neutra e que deve ser enfrentada corajosamente, para que
não se fique no espaço da sala de aula com palavras de ordem que apenas desmobilizam, não levando à realização de “ações vitais”, como aconselhava Gramsci.
Trabalhei e continuo trabalhando em educação sem ingenuidade, certamente dentro de um contexto sociopolítico desfavorável, consciente de que vivemos no Brasil uma sociedade conservadora do ponto de vista estrutural e conhecedora do que vem sendo feito com a anulação de vitórias duramente obtidas.
Sinto que minha trajetória de décadas na área, cuja espinha dorsal sempre
foi a busca de docência de qualidade, desemboca numa organização que soma
bastante para sua continuidade. E fica fortalecido o convite que sempre faço em
minhas aulas para públicos dos mais variados rincões: pessoas que querem dedicar-se à docência devem procurar ser professores marcantes na vida de seus
alunos, catalisando o desejo ardente de conhecer, fazendo com o medo vá embora
e a verdade se torne preciosa.
Encerro lembrando a afirmação de Charles Péguy: “A vida é o caminho
sem retorno das nossas opções”.
Somos o que fazemos, somos as nossas opções que não têm retorno.
Não podemos apagar passo algum da nossa caminhada. Eles nos marcam, nos
34
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 19-36, 2018
definem. Viver é responder aos desafios que o tempo nos faz, responder às perguntas que os outros nos fazem ou que nós mesmos nos fazemos. Dessa forma
nós vamos nos construindo e edificando a nossa própria história. Com aventuras
e desventuras.
Referências
AUSUBEL, David P. et al. Psicologia educacional. Rio de Janeiro: Editora Interamericana,
1980.
BRUNER, Gerome. A cultura da educação. Porto Alegre: Artmed, 2000.
COMÊNIO – John Amos Comenius. Didática Magna. São Paulo: Martins Fontes, 1985.
NÓVOA, Antonio. Formação de Professores e a profissão docente. In: __________. Os
professores e sua formação. Lisboa, Publicações dom Quixote/Instituto de Inovação
Educacional, 1997. p. 15-34.
SAVIANI, Dermeval. Entrevista com Dermeval Saviani – PNE. 2014. Disponível em:
http://www.anped.org.br/news/entrevista-com-dermeval-saviani-pne. Acesso em: out.
2017.
VANZULLI, Marco. Gramsci e a Reforma Gentile - Os aparatos ideológicos do
estado: a escola. Disponível em:
http://www.verinotio.org/conteudo/0.9549040039581284.pdf Acesso em: out. 2017.
- Maria Eugênia de Lima e Montes Castanho
Currículo: http://lattes.cnpq.br/3883562938853685
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 19-36, 2018
Profissão-Professor: identidade,
contradições e o trabalho docente
CORNÉLIO, Wellington Félix
Resumo: O presente artigo objetiva promover uma abordagem reflexiva quanto à identidade do professor, às contradições existentes neste processo e à relação direta destas temáticas na discussão do trabalho docente. Utilizamos o estudo teórico-bibliográfico, expondo
principais conceitos e indagações, especialmente quanto ao debate da desvalorização e
desprofissionalização da profissão-professor. O texto inaugura a leitura nos convidando
pensarmos e repensarmos sobre o magistério, a atratividade da carreira e atuais desafios da
profissão. Com o imperativo da globalização e o eixo “educação para a equidade social”,
debutados na década de 1990, tornaram-se evidentes as transformações substantivas na
educação pública, repercutindo diretamente na composição e estrutura da Escola Contemporânea. Em tempos atuais, há um “colapso existencial” que acontece porque a identidade
profissional docente está intimamente relacionada à carga pessoal e social que a profissão
simboliza, levando a uma infindável busca (em aspectos individuais, pessoais e coletivos)
por um platônico encontro entre o “ser&viver docentes”.
Palavras-chave: Professor; Identidade; Trabalho docente.
Abstract: This article aims to promote a reflexive approach to teacher identity, to the contradictions existing in this process and to the direct relation of these themes in the discussion of teaching work. We use the theoretical-bibliographic study, exposing main concepts
and questions, especially regarding the debate of devaluation and deprofessionalization of
the profession-teacher. The text opens the reading inviting us to think and rethink about
the teaching, the attractiveness of the career and current challenges of the profession. With
the imperative of globalization and the axis “education for social equity”, debuted in the
1990s, substantive transformations in public education became evident, directly affecting
the composition and structure of the Contemporary School. In current times, there is an
“existential collapse” that happens because the professional identity of the teacher is closely
related to the personal and social burden that the profession symbolizes, leading to an endless search (in individual, personal and collective aspects) for a platonic encounter between
the “To be & live teachers”.
Keywords: Teacher; Identity; Teaching work.
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 37-45, 2018
1 - Introdução
Apresentarmos uma abordagem reflexiva quanto à tão debatida identidade do professor, quiçá, não seja uma tarefa serena, em meio a numerosas
contradições existentes neste processo. Utilizamos o estudo teórico-bibliográfico,
destacando conceitos principais e questionamentos, mobilizando diretamente, de
forma inevitável e complementar, a temática do trabalho docente, a desvalorização e desprofissionalização da profissão-professor.
Cabe inicialmente pensarmos e repensarmos os desafios da profissão docente, apresentando algumas das proposições providenciais ao atual mundo contemporâneo, tais como: Em que consiste a profissão de professor? O que significa
ser professor? Por que nenhum jovem quer virar professor no Brasil? Como melhorar a qualidade da educação se absolutamente ninguém quer ensinar? 1
É oportuno expor definição de Pimenta (1998 apud LIBÂNEO, 2004, p.
76), que considera a identidade profissional do professor moldada e determinada
conforme necessidades educacionais, pautadas a partir do momento histórico e
do contexto social, indo esta identidade, além “do conjunto de conhecimentos,
habilidades, atitudes, valores [...]”, que influenciam o seu trabalho.
Vejamos novamente Libâneo e Pimenta, apontando a seguir, as duas dimensões da identidade profissional de professor:
O desenvolvimento profissional envolve formação inicial e
contínua articuladas a um processo de valorização identitária e
profissional dos professores. Identidade que é epistemológica, ou
seja, que reconhece a docência como um campo de conhecimentos
específicos configurados em quatro grandes conjuntos, a saber:
1) conteúdos das diversas áreas do saber e do ensino, ou seja, das
ciências humanas e naturais, da cultura e das artes; 2) conteúdos
didático-pedagógicos, diretamente relacionados ao campo da prática
profissional; 3) conteúdos relacionados a saberes pedagógicos mais
amplos do campo teórico da prática educacional; 4) conteúdos
ligados à explicitação do sentido da existência humana (individual,
sensibilidade pessoal e social). E identidade que é profissional.
Ou seja, a docência constitui um campo específico de intervenção
profissional na prática social - não é qualquer um que pode ser
professor. (LIBÂNEO; PIMENTA, 1999, p. 41)
Neste sentido, o processo de constituição identitária [pessoal ou profissional] se desenvolve, necessariamente, pela imagem projetada ou moldada, a partir
da relação do autoreconhecimento [a noção do eu] e da relação com outro/outros.
Contraditoriamente, forma-se uma disputa dialética entre consciência individual e
consciência social [indivíduo e sociedade] em constante transformação, constru1
38
As duas últimas indagações fazem relação à matéria publicada em 07/12/2016 no Jornal
Folha de São Paulo, intitulada “Nenhum jovem quer virar professor no Brasil, mostra exame da OCDE”.
Disponível: <http://www1.folha.uol.com.br/colunas/ericafraga / 2016/12/1839126-nenhum-jovemquer-se-tornar-professor-no-brasil.shtml> Acesso: 08.12.2016
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 37-45, 2018
ção e desconstrução. “A identidade é o momento em que o sujeito é ele e a forma
como é representado socialmente o seu próprio ‘eu’”. (FURTADO, 2002, p. 98)
Ciampa (1998) acredita que “o processo permanente de formação e
transformação do sujeito humano se dá dentro de condições materiais e históricas
dadas”; enquanto Furtado (2002) refere-se também à “identidade como metamorfose”, explicando que a história é dinâmica, em constante transformação, o
que repercute também na história de vida dos sujeitos, em contínuo processo de
mudança e interação.
Penna (1992) apud Galindo (2004), postula que esta [identidade] é constituída no jogo do reconhecimento, formado por dois pólos (sic): o do autoreconhecimento [como o sujeito se reconhece] e do alter-reconhecimento [como é
reconhecido pelos outros].
Bolívar (2006) conclui a respeito:
La identidad profesional es resultado de un proceso dinámico, que
integra diferentes experiencias del individuo a lo largo de su vida,
marcado por rupturas, inacabado y siempre retomado a partir de
los remanentes que permanecen. Se construye por medio de um
conjunto de dinámicas y estrategias identitarias que, para sí o para
otros, se van constituyendo en torno al ejercicio de la profesión.
(BOLIVAR, 2006, p. 57)
Libâneo (2004, p. 74) ainda nos alerta, que o processo de desvalorização socioeconômica do professor vem interferindo diretamente na imagem da
profissão. “Os governos têm sido incapazes de garantir a valorização salarial dos
professores, levando a uma degradação social e econômica da profissão e a um
rebaixamento evidente”. Ao analisar a identidade profissional dos professores, ele
ressalta a precarização do trabalho, que acelera a desvalorização social do trabalho docente, prejudica elementos constitutivos da identidade, particularmente dos
futuros professores com a profissão. Tal “colapso existencial”, acontece porque a
identidade com a profissão, diz respeito à carga pessoal e social que a profissão
significa para a pessoa. “Se o professor perde o significado do trabalho tanto para
si próprio como para a sociedade, ele perde a identidade com a sua profissão”
(LIBÂNEO, loc. cit.). [grifo nosso]
Nesta perspectiva, o professor, no processo de constituição identitária
do seu retrato/imagem, na relação objetividade versus subjetividade, desenvolve
uma consciência individual [ego/autoreconhecimento] e social [superego/alter-reconhecimento] e demonstra também, como sujeito, possuir uma ligação umbilical direta e estreita com o exercício [ou a práxis] do seu trabalho.
É de Karl Marx a asserção de que todo novo estado da divisão do trabalho
determina as relações dos indivíduos entre si (BRUNIERA, 2014). Contudo,
somente se passou a efetivar tal divisão, quando se estabeleceu no capitalismo [no
trabalho industrial], a separação entre o trabalho manual e trabalho intelectual. E
é esta divisão, que engendra a propriedade privada. Segundo Marx (1986, p. 46)
“são expressões idênticas: a primeira enuncia em relação à atividade, aquilo que
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 37-45, 2018
39
se enuncia na segunda em relação ao produto da atividade”. O trabalho torna-se
alienado, “[...] o homem que se perdeu a si mesmo”.
Aliás, a polêmica sobre a centralidade e o papel do trabalho está longe de ser concluída, mesmo em tempos pós-modernos. Apesar das significativas
mudanças, especialmente nas relações humanas e no “mundo do trabalho”, a categoria trabalho continua sendo central. O que se modificam são as formas de
organização técnica e social do trabalho e da produção.
Oliveira (2004) observa que há ainda uma grande lacuna em relação aos
estudos “no que se refere tanto às condições atuais de trabalho na escola quanto às
formas de resistência e conflito que são manifestas nessa organização”.
Com o imperativo da globalização e o eixo “educação para a equidade
social”, debutados na década de 1990, tornaram-se evidentes as transformações
substantivas na organização e na gestão da educação pública, repercutindo diretamente na composição e estrutura da Escola Contemporânea; considerando
como meta principal: a formação dos indivíduos para a empregabilidade [já que a
educação geral é requisito indispensável para o emprego formal] e concomitantemente, a contenção da pobreza através de políticas compensatórias.
Neste cenário (Ibid, 2004), a expansão da educação básica possibilitou
um maior envolvimento da comunidade e produziu naturalmente uma sobrecarga dos professores, exigindo uma reestruturação do trabalho docente e uma
maior responsabilização de tal profissional [principalmente tomando para si a
responsabilidade quanto ao êxito ou insucesso de projetos e/ou programas, pelo
desempenho dos alunos, da escola e do sistema...]
Trazem medidas que alteram a configuração das redes nos seus
aspectos físicos e organizacionais e que têm se assentado nos conceitos
de produtividade, eficácia, excelência e eficiência, importando, mais
uma vez, das teorias administrativas as orientações para o campo
pedagógico (OLIVEIRA, 2004, p. 1130)
40
Oportunamente, muito se tem discutido sobre a centralidade dos professores. Com as suas inúmeras funções, a Escola Pública Contemporânea tem
exigido do professor, um ofício a ser cumprido além da sua formação profissional. Muitas vezes, o professor se sente convocado a desempenhar as funções de
assistente social, enfermeiro, psicológico, conselheiro e orientador sentimental,
entre outras.
Essa situação é reforçada mais ainda, por detrimento de um discurso fantasioso, baseado no comunitarismo, no voluntariado, na aparente “promoção” de
uma educação para todos, acentuado pela falsa e enganosa ideia da gestão “ampla”
e “participativa” [que na prática, esvazia a importância do gestor – em que todos e
ninguém – ao mesmo tempo administram], resultando um vácuo e um paradoxo
quanto às efetivas responsabilidades; identificando nesse contexto um processo de
desqualificação e desvalorização sofrido pelos professores.
Na lógica da concepção vigorante, estas exigências colaboram para um
sentido de desprofissionalização, de perda de identidade profissional da constataEvidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 37-45, 2018
ção de que ensinar, às vezes, não é o mais importante. (NORONHA, 2001 apud
OLIVEIRA, 2004).
Nóvoa (2005) chamou de “transbordamento”, considerando que a Escola, num discurso de cidadania, desenvolveu uma “acumulação de missões e de
conteúdos”, assumindo “uma infinidade de tarefas”.
A escola no centro da colectividade remete para uma instituição
fortemente empenhada em causas sociais, assumindo um papel de
“reparadora” da sociedade; remete para uma escola de acolhimento
dos alunos e, até, de apoio comunitário às famílias e aos grupos mais
desfavorecidos; remete para uma escola transbordante, uma escola
utópica que procura compensar as “deficiências” da sociedade”,
chamando a si todas as missões possíveis e imagináveis. (NÓVOA,
2009, p. 60)
As mudanças recentes na organização escolar, indicam uma flexibilidade
nas matrizes curriculares e processos avaliativos, resultando novos padrões no
ambiente escolar e um novo perfil de trabalhadores docentes.
Destarte, essas mudanças, aparentemente promissoras, demonstram mais
uma pregação sobre a prática do que a própria realidade (Ibidem, 2004). Em
síntese, há um abismo entre o que é difundido nos programas de reforma educacional e o que é de fato implementado nas escolas, apresentando-se uma grande
defasagem. Verdadeiramente, para se compreender as mudanças reais que ocorrem no cotidiano docente, necessário se faz, chegar até o interior, o “chão” e a
“essência” da escola.
Na realidade aquela escola tradicional, transmissiva, autoritária,
verticalizada, extremamente burocrática mudou. O que não quer
dizer que estejamos diante de uma escola democrática, pautada
no trabalho coletivo, na participação dos sujeitos envolvidos,
ministrando uma educação de qualidade. Valores como autonomia,
participação, democratização foram assimilados e reinterpretados
por diferentes administrações públicas, substantivados em
procedimentos normativos que modificaram substancialmente o
trabalho escolar. O fato é que o trabalho pedagógico foi reestruturado,
dando lugar a uma nova organização escolar, e tais transformações,
sem as adequações necessárias, parecem implicar processos de
precarização do trabalho docente. (OLIVEIRA, 2004, p. 1140)
E vejamos o entendimento dos autores, a seguir:
Tais fronteiras (as da Educação) transformam o professor num
Sísifo, que nelas vê limitações, como correntes que o amarram e lhe
impõem tarefas impossíveis. Mas, se tais fronteiras são consideradas
legítimas, elas podem levar a conhecimentos que permitam a
formulação da teoria educacional, baseada não no “idealismo
narcisista”, mas na ciência. (ALEXANDER et al, 1981, p. 467)
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 37-45, 2018
41
Neste aspecto, talvez grande parte dos elementos discorridos, sejam fatores condicionantes para ajudar a explicar e a compreender resultado de pesquisa
realizada pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE) em 2015, no Pisa [exame aplicado a cada triênio que busca medir a qualidade da educação nos países], que divulga de forma chocante, o “índice zero”
quanto à procura pelo Magistério entre os jovens de 15 anos. Tal notícia foi veiculada pela Folha de São Paulo, intitulada “Nenhum jovem quer virar professor no
Brasil, mostra exame da OCDE”, recentemente em dezembro de 2016.
Observemos as tabelas adiante:
Tabela 01: Resultados da Média – Brasil.
Fonte: Dados fornecidos pelo Jornal Folha de São Paulo, 07/12/2016.
Tabela 02: Resultados da Média - Países Ricos da OCDE.
Fonte: Dados fornecidos pelo Jornal Folha de São Paulo, 07/12/2016.
Segundo o texto noticiado (FRAGA, 2016), indicadores como esses oferecem “a dimensão do nosso enorme desafio educacional”, pois questiona como
melhorar a qualidade da educação, se não teremos professores para ensinar. E
ainda complementa a colunista: “[...] países que conseguiram saltos educacionais
expressivos como a Finlândia começaram adotando medidas para melhorar a formação de seus docentes e aumentar a atratividade da carreira”.
42
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 37-45, 2018
Atratividade da carreira? Certamente assiste razão à matéria jornalística,
pois se trata, porventura, do nosso maior desafio da Educação. Todavia, não poderíamos restringir tal questão a discussões apenas de ordem salarial, visto que
perpassa pela profissionalização, capacitação e fortalecimento da identidade da
profissão-professor.
Mas façamos a seguinte reflexão: Como pensar em atratividade de uma
carreira que se encontra em grave crise de identidade e em progressivos ataques
político-ideológicos?
Giraldes (2011) em sua Dissertação de mestrado defendida pela Universidade de São Paulo, problematiza o debate, considerando que a crise do magistério vai além das questões pertinentes aos baixos salários, pois envolve ainda uma
carga identitária do professor, que ultimamente enfrenta dificuldades em encontrar o seu devido lugar dentro da sala de aula e na própria sociedade que ele está
inserido. Ele defende que o complexo mítico mestre/herói/aprendiz possibilita
“presentificar-se” no trajeto de imagens desse professor, podendo se constituir um
grande passo para reconstrução dessa “identidade quase perdida”.
Em uma análise antropológica, podemos afirmar que perdura no Brasil
uma tradição católica romana (não a tradição protestante), que transformou o
trabalho como castigo numa ação destinada à salvação. Achamos o trabalho um
horror, o famoso “batente”, nome indicativo de um obstáculo. O fato é que não
temos a glorificação do trabalhador, não há realização plena no trabalho e sim,
“sofrimento”. E no caso específico do professor, condições adicionais, simbólicas,
intensificam esse processo, pois ele “sacerdotizou” e “sacralizou” seu trabalho,
encobrindo-o de uma aura missionária e salvadora.
O professor apresenta, como uma boa parte dos trabalhadores do
nosso país, uma boa dose de sofrimento “no trabalho”. O sistema
capitalista de produção torna quase abismal a separação entre
trabalho e gozo, enrijecendo a segmentação entre os patamares
da divisão social do primeiro. Não me parece que a “nova ordem
mundial” venha contribuindo efetivamente para alicerçar a produção
de condições mais plenas de cidadania, a partir do exercício do
trabalho. (OLIVEIRA, 2001, p. 09)
Existe uma resistência de se considerarem trabalhadores e temem a explícita proletarização real que a categoria profissional sofreu e talvez, temem a proximidade com outras categorias de trabalhadores, a quem “transmitem o saber”
e “salvam das trevas da ignorância”. Acompanhando esta compreensão, à medida
que a categoria docente se aviltava em termos de salário e se encontrava perante
dificuldades organizativas (o enfraquecimento de uma categoria, falta de pertencimento ao algo coletivo), “um processo de representação social de heroicização
encobria à consciência do que acontecia na realidade” (OLIVEIRA, loc. cit.)
Em resumo, esta “rede representacional” incentivou a visão e atitudes de
se considerar o magistério um dom ou uma missão. Nesta perspectiva, a autora
acima, leva-nos a especular se seria esta saga, missionária e salvadora dos probleEvidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 37-45, 2018
43
mas educacionais, uma enunciação promovida inconscientemente pela voz dos
próprios professores (para expressar uma representação mais ampla que transcende a categoria profissional), somente por uma questão de status e reafirmação de
poder, com a finalidade de estar sempre presente em outros setores da população.
Enfim, como já exposto, embora o processo de constituição identitária
seja dinâmico e em constante transformação, construção e desconstrução; subjetivamente, temos a impressão de que o professor, nesta incansável busca por sua
identidade (em aspectos individuais, pessoais e coletivos) está sempre à procura
de algo não findável; porém, não conseguindo ainda encontrar-se enquanto “profissão-professor”. Talvez, tornar este encontro possível e esta busca satisfatória
sejam os maiores desafios dos próximos tempos.
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- Wellington Félix Cornélio
Mestre em Educação.
Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM)
Professor, Cientista Social e Advogado.
E-mail: wfc.cientistasocial@gmail.com
Currículo: http://lattes.cnpq.br/8665388576464165
45
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 37-45, 2018
O professor na sociedade contemporânea:
Educação para a liberdade?
ALVES, Érika Cristina Silva1
Resumo: A educação na sociedade contemporânea pode ser entendida como um instrumento regulador da mesma. Dimensões políticas, sociais, ideológicas permeiam essa relação. A Educação, enquanto organização institucional do Estado, deve estar à serviço da
emancipação do cidadão, permitindo que o mesmo crie condições de perceber-se no mundo e modificar o ambiente à sua volta, pelo menos é isso o que se espera. Mas isso acontece
de fato? O professor da escola pública, nesse contexto, possui um papel fundamental,
haja vista que o mesmo pode servir como agente à serviço da emancipação ou submissão
do aprendiz. Para tanto, ele precisa necessariamente perceber-se como tal, ou seja, estar
consciente das forças que atuam em seu campo de trabalho. Refletir sobre essa questão é o
objetivo do presente artigo.
Palavras chave: Educação; Professor; Sociedade.
Abstract: Education in contemporary society can be understood as an instrument regulating it. Political, social, and ideological dimensions permeate this relationship. Education,
as an institutional organization of the State, must be at the service of the emancipation of
the citizen, allowing the same to create conditions to perceive themselves in the world and
modify the environment around them, at least that is what is expected. But does this really
happen? The teacher of the public school, in this context, has a fundamental role, since it
can serve as an agent in the service of the emancipation or submission of the learner. To do
so, he must necessarily perceive himself as such, that is, be aware of the forces that work in
his field of work. Reflecting on this issue is the purpose of this article.
Keywords: Education; Society; Teacher.
1. Introdução
A educação se dá de forma dialética, repleta de contradições e este caráter
é que permite mudanças, já que não segue um plano contínuo e passivo numa realidade complexa. É nesse contexto que o educador está inserido e estabelece relações entre indivíduos, geralmente da classe oprimida, situando a escola púbica no
1
Prof. Licenciada em Pedagogia Plena pelo CESUBE. Mestranda no Programa de PósGraduação em Educação da Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 47-55, 2018
47
Brasil. É primordial que o educador se perceba como atuante em um campo onde
lida com forças expressivas de legitimação do poder. No entanto, esse mesmo perfil pede desse profissional uma visão crítica e consciente da carreira docente. Para
que o mesmo não se torne apenas um instrumento a serviço da classe dominante
(BOURDIEU; PASSERON, 1982; FOUCAULT, 1979; GADOTTI, 1998). E
é nesse cenário que iremos articular alguns conceitos a respeito do perfil do educador na sociedade atual, sobretudo o que trabalha na escola pública.
2. A situação do educador na atualidade
O professor da rede púbica, apesar da sua clara importância na sociedade
se defronta com grandes dificuldades no seu cotidiano.
A primeira se encontra no seu reconhecimento profissional, a credibilidade dada ao professor modificou-se consideravelmente. No que se refere à questão
econômica, estando em uma sociedade capitalista onde o “status social é estabelecido em termos exclusivamente econômicos, a função do docente passa a ser
desconsiderada ou relativizada” (RICCI, 1999 apud UNESCO, 2004, p. 29).
O baixo salário reflete negativamente na sua vida pessoal, na busca de formação
profissional, na sua disponibilidade de tempo, já que por isso, precisa trabalhar
em dois ou três turnos. Essa falta de respaldo econômico imposto à classe trabalhadora funciona como um meio repressor e neutralizante para a sua atuação.
“O desprezo por sua função se traduz primeiro, na remuneração mais ou menos
irrisória que lhe é atribuída” (BOURDIEU, 1998 apud UNESCO, 2004, p. 31).
Os professores, fazendo parte de uma sociedade que se transforma
com velocidade extrema, que impõe constantes mudanças e
adaptações, sentem-se impotentes por não conseguir atender às
exigências que lhes são feitas no campo profissional, pela sobrecarga
de trabalho, pela falta de apoio do pais dos alunos, pelo sentimento
de inutilidade em relação ao trabalho que realizam, pela concorrência
com outros meios de transmissão de informação e cultura e,
certamente, pelos baixos salários (UNESCO, 2004, p. 32).
Não se pretende, porém, fazer um levantamento negativo do perfil do
professor, mas sim identificar o contexto em que o professor atua e que por isso,
quão necessária é a sua luta.
Não reconhecer, porém o esforço desenvolvido pelos educadores,
notadamente, pelos professores de Primeiro e Segundo Graus, para
sobreviverem em condições precárias e com salários desvalorizados,
parece-me profundamente melancólico [...] Como é possível que
não se reconheça no sacrifício que é hoje o ato de ensinar num país
onde a educação tem sido boicotada sistematicamente? [...] Os
educadores têm hoje que lutar não apenas pelo direito de ensinar, de
educar - direito que deveria ser garantido pelo Estado - mas também
48
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 47-55, 2018
para exercer com dignidade uma profissão que esse mesmo Estado
desprestigiou (GADOTTI, 1996, p. 60-61).
Ficam evidentes as dificuldades e a complexidade de sua ação, mas se cabe
à essa classe, principalmente, a tarefa de conscientização, que essa mesma classe
seja primeira conscientizada, pelos colegas de profissão, pelo estudo contínuo,
investindo na formação continuada, para que assim saibam lidar de uma forma
eficaz com as contradições do seu campo de atuação.
Investir na formação parece ser a melhor forma de (re) agir diante desse
quadro.
2.1. A formação do professor
No meio educacional, nunca se falou tanto em formação do professor, em
formação continuada. Tenta-se buscar uma (re) significação do papel do professor diante da realidade. É necessário que esse professor mantenha-se atualizado
sobre as novas metodologias de ensino e desenvolvimento de práticas pedagógicas eficientes (MORIN, 2003; PERRENOUD, 2000; PERRENOUD, 2002).
Nessa análise fica evidente o papel do curso superior durante a graduação docente, na preparação de profissional realmente apto para atuar nas escolas,
profissional esse que consciente de sua atuação necessitaria de uma visão crítica
da realidade que irá atuar. O professor da rede pública precisa perceber-se como
passível agente de mudanças através de sua práxis.
Os cursos de graduação em formação docente, no entanto, apresentam
muitas vezes um caráter conteudista e totalmente alienado à realidade das escolas
e das salas de aula. Isso tem feito do ensino superior uma formação sem força
em suas bases para a ação de seus alunos-docentes. Diante desse fato, parece ser
impossível atuar no campo educacional, mas para a conscientização do aluno-docente, é necessário que ele entenda que “o antagonismo das classes sociais se
apresenta também dentro da universidade, acompanha a evolução do antagonismo das classes na sociedade” (GADOTTI, 1998, p. 115). A educação superior,
embora de forma velada, também atende à classe dominante.
A formação do educador se mostra necessária e urgente exatamente por
isso. É preciso que o educador da escola pública busque a formação do cidadão
completo, o educando que consciente de seu papel na sociedade se perceba como
manipulado e oprimido para que a partir daí, exija mudanças através de ações de
enfrentamento diante das injustiças sociais.
Entretanto, na formação do professor é importante estar claro que:
Uma docência limitada à transmissão de conhecimentos vira um
supermercado de ideias. A pesquisa é essencial à própria docência.
Entendo aqui por pesquisa o seu sentido original de busca, de procura,
de inquietação, de dúvida. [...] Aqui também acuso a única tradição
que é a tradição humanista da nossa universidade mais preocupada
em transformar consciências através de sermões, do verbo, do que
pelo trabalho, pela pesquisa. Proponho uma metodologia diferente
49
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 47-55, 2018
para a formação da consciência crítica: o trabalho, a produção. O
crescimento da consciência não se dá na contemplação, na pura
reflexão, mas no trabalho. É pela transformação do mundo que eu
tomo consciência do mundo. O professor preocupado em ‘dar essa
consciência’ engana-se. A atividade paternalista do professor que
quer ensinar a verdade, como se ele fosse o único possuidor só pode
tornar o aluno impotente para o ato pedagógico, para a aquisição
dessa consciência crítica (GADOTTI, 1998, p. 91).
Daí a necessidade de o educador ter em sua ação, a prática reflexiva, para
que esse não siga apenas modelos pré-estipulados para a sua práxis, ou então, siga
qualquer tendência modista, sem sequer saber realmente o propósito para tal e se
esta prática atende às necessidades do campo onde atua.
Pensando numa postura reflexiva do educador como forma de atenuar
as dificuldades de sua prática e agir de maneira a superá-las Perrenoud (2002)
cita dez motivos ligados, de forma desigual às evoluções e às ambições recentes dos sistemas educativos. Em todos os casos eles traduzem uma visão definida do ofício do professor e da escola. O leitor que ao estar de acordo com
ela não aceitará os motivos apresentados para formar professores que reflitam sobre sua prática. Talvez não aceite nenhum deles. Entre esses motivos,
não há cronologia nem hierarquia. Podemos esperar uma prática reflexiva:
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
50
compense a superficialidade da formação profissional;
favoreça a acumulação de saberes de experiência;
propicie uma evolução rumo a profissionalização;
prepare para assumir uma responsabilidade política e ética;
permita enfrentar a crescente complexidade das tarefas;
ajude a vivenciar um ofício impossível;
ofereça os meios necessários para trabalhar sobre si mesmo;
estimule a enfrentar a irredutível alteridade do aprendiz;
aumente a cooperação entre os colegas;
aumente a capacidade de inovação. (PERRENOUD, 2002, p.48)
A prática de ensino que leva à transformação, tanto do educando, quanto
do espaço onde atua não se dá de forma passiva e simples, por isso a importância
desse mesmo educador perceber de forma crítica a complexidade de sua ação, para
que dessa forma não busque soluções “mágicas” ou então, não se conforme com
a situação, acreditando que educar seja impossível.
O educador reflexivo sente a necessidade de desenvolver competências
no campo onde atua, para que possa mobilizar os recursos disponíveis com a
realidade à sua volta, utilizando os seus conhecimentos para a solução dessas
dificuldades. Por isso, a razão de se mudar as metodologias de ensino, a maneira
de abordar determinado assunto ou tema com o educando. O educador deve sair
da didática obsoleta onde utiliza exercícios que não fazem parte da realidade do
aluno, que não o instiga a buscar novos conhecimentos. Para formar indivíduos
capazes de atuarem em busca de mudanças em suas próprias vidas e também na
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 47-55, 2018
sociedade, é preciso que se busquem estratégias de ensino que desperte esse educando, instigando a perceber a realidade para que possa nela interferir.
Perrenoud (2000), chama essa forma diferenciada de ensinar de situação-problema, que busca através de objeto-obstáculo, levar o aluno a encontrar
a solução do problema. São situações instigadoras, estimulantes que levam em
conta a idade, o nível dos alunos, o tempo disponível, as competências a serem
desenvolvidas. Espera-se dessas situações problemas características como:
• uma situação-problema é organizada em torno da resolução de
um obstáculo pela classe, obstáculo previamente bem-identificado;
• o estudo organiza-se em torno de uma situação de caráter
concreto, que permita efetivamente ao aluno formular hipóteses e
conjecturas;
• os alunos vêm a situação que lhes é proposta como um verdadeiro
enigma ‘a ser resolvido,’ no qual estão em condições de investir;
• a atividade deve operar em uma zona próxima , propícia ao
desafio intelectual a ser resolvido;
• o trabalho da situação-problema funciona assim, como um debate
científico dentro da classe, estimulando os conflitos sócio-cognitivos
potenciais;
• a validação da solução e sua sanção não são dadas de modo
externo pelo professor, mas resultam do modo de estruturação da
própria situação. (ASTOLFI, 1999 apud PERRENOUD, 2002,
p. 42-43).
A realidade da sala de aula pede, com urgência, mudanças. Os alunos hoje
apresentam uma inquietação que não se via nos alunos de vinte anos atrás e os
professores não estão sabendo mais conduzir essa situação, talvez porque ainda
utilizem as mesmas estratégias que usavam antes.
Efetuaram-se progressos gigantescos nos conhecimentos no âmbito
das especializações disciplinares, durante o século XX. Porém,
estes progressos estão dispersos, desunidos, devido, justamente
à especialização que muitas vezes fragmenta os contextos, as
globalidades e as complexidades. Por isso, enormes obstáculos
somam-se no próprio seio de nossos sistemas de ensino (MORIN,
2003, p. 40).
Faz-se necessário uma reformulação do pensamento e da visão da realidade complexa do campo educacional para que não se reproduza os mesmos erros e
assim, não se obtenha os mesmos resultados.
2.2. Perceber novos caminhos: educar para a liberdade
Perceber a educação como um projeto de vida, de construção de conhecimentos, de formação do sujeito é a chave para querer a sua mudança atualmente.
51
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 47-55, 2018
Não se pode mais permitir que a escola pública continue formando somente mão-de-obra para o mercado capitalista,
Na qual o trabalhador simplesmente aprenda o que irá utilizar
no dia ou semana seguinte no seu cotidiano (em uma dimensão
utilitária e redutora), mas aquela que selecione e apresente
conteúdos que possibilitem aos alunos uma compreensão de sua
própria realidade e seu fortalecimento como cidadãos, de modo a
serem capazes de transformá-la na direção dos interesses da maioria
social (CORTELLA, 2003, p. 16).
O ambiente escolar não deve reproduzir a ignorância, o descaso, o conformismo porque tais comportamentos não estão ligados à percepção do educando - na sua globalidade, individualidade, complexidade - como passível de aprender, com potencialidades e, principalmente, como a grande população adulta de
amanhã.
Em outras palavras, nós educadores, precisamos ter o universo
vivencial discente como princípio (ponto de partida), e de maneira
a atingir a meta (ponto de chegada) do processo pedagógico,
afinal de contas, a prática educacional tem como objetivo central,
fazer avançar a capacidade de compreender e intervir na realidade
para além do estágio presente, gerando autonomia e humanização
(ibidem, p. 125).
A escola deve criar ambientes que permitam a transformação de pensamentos, de posturas congeladas, sedimentadas em concepções reducionistas e
unilaterais. Para tanto é importante que o educador conheça a íntima ligação entre
conhecimento, Educação e Política, porque estes nortearão a sua prática:
O conhecimento é uma construção cultural (portanto, social
e histórica) e a Escola (como veículo que o transporta) tem um
comprometimento político de caráter conservador e inovador que
se expressa também no modo como esse mesmo conhecimento é
compreendido, selecionado, transmitido e recriado (ibidem, p. 17).
A escola pública não deve ignorar a realidade na qual está inserida, por
isso a importância do educador saber que a sua prática deve estar alicerçada na
teoria, que lhe dará suporte para uma ação afirmativa. “Qual o sentido social do
que fazemos?” (ibidem, 2003 p. 120). Essa pergunta deve ecoar em cada ato
educador para que se perceba como instrumento de transformação social e não de
reprodução dessa sociedade que oprime e degrada o ser.
A educação que não liberta, que não permite a formação do indivíduo
autônomo, consciente da realidade circundante e com forças de nela resistir, atuar
e modificar. O educador ressalta a importância da formação e dos saberes neces52
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 47-55, 2018
sários ao educador. “De nada adianta o discurso competente se a ação pedagógica
é impermeável à mudança”. (FREIRE, 1997, p.11)
Diante de uma realidade educacional complexa, não se pode buscar soluções simplistas para a formação do indivíduo, o educador deve antes de tudo, perceber o educando em seu todo, como humano. Por isso a importância dada por
Paulo Freire à amorosidade, respeito, ética, humildade, tolerância, criticidade e
diálogo. Não se pode investigar e analisar a Educação esquecendo-se do principal
objetivo do seu estudo: o aprendiz. O educador comprometido com a educação
libertadora não pode ignorar o educando nas suas especificidades humanas.
O que quero dizer é que a educação nem é uma força imbatível a
serviço da transformação da sociedade, porque assim eu queria, nem
tampouco é a perpetuação do status quo [grifo do autor] porque o
dominante o decrete. O educador e a educadora críticos não podem
pensar que a partir do curso que coordenam ou do seminário que
lideram, podem transformar o país. Mas podem demonstrar que
é possível mudar. E isto reforça nele ou nela a importância de sua
tarefa político-pedagógica (ibidem, 1997, p. 126-127).
A escola como ambiente de relações sociais deve ter sempre a presença
da esperança, vida, inconformidade, luta, estudo, respeito, diálogo, amorosidade.
Ambiente com esses elementos, tendem a ser permeáveis á mudanças, á novas
possibilidades, ao crescimento.
A educação e a Escola são os lugares nos quais podemos dizer
e exercer mais fortemente o nosso não. Não à miséria, não à
injustiça, não à contradição humana versus humano, não à Ciência
exclusivista, não ao poder opressor [...] Afinal de contas, por que
somos educadores e educadoras? [...] Tenho uma forte suspeita: por
causa da paixão [...] Paixão por uma ideia irrecusável: gente foi feita
pra ser feliz! (CORTELLA, 2003, p. 157).
O educador precisa compreender que se educa para a vida e não para o
aprisionamento, alienação e a morte do Ser. Qualquer ação que não conduza a
esse movimento de libertação, deve ser reconsiderada.
Considerações finais
Pensar numa pedagogia para a autonomia requer dos envolvidos saberes
e práticas que vão além do quadro e giz. O professor, enquanto profissional, deve
buscar compreender as relações ideológicas, políticas que permeiam a sua prática
para que assim, possa oferecer aos educandos, possibilidades de se desvencilharem
dos grilhões que uma educação não emancipadora pode gerar. Professores, sejam
conscientes no ato de ensinar, eduquem para voar, para a liberdade!
53
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 47-55, 2018
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55
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 47-55, 2018
Constituir-se professor universitário
na perspectiva do desenvolvimento
profissional
GONTIJO, Débora Viviane Teles Magalhães
Resumo: Este artigo baseia-se numa revisão bibliográfica da formação de professores, bem
como dos pressupostos da formação inicial e continuada, na perspectiva do desenvolvimento profissional. Realiza-se uma abordagem sobre a construção da identidade profissional
nesse processo e o que se entende por saberes docentes. O objetivo deste trabalho é ampliar
a visão dos fatores que contribuem para o desenvolvimento profissional de professores na
atualidade. Acredita-se que essas temáticas constituam reflexões importantes sobre a necessidade de uma formação de qualidade, para a constituição da identidade do professor como
um profissional reflexivo e com domínio teórico e prático para responder aos desafios da
contemporaneidade, assim como, da responsabilidade do estado, enquanto organizador
das políticas públicas educacionais de formação, de garantir a sua continuidade.
Palavras Chave: Identidade profissional; Formação de professores; Saberes docentes.
Abstract: This article is based on a bibliographic review of teachers’ formation, as well as
the assumptions of the early training, which is continued at the perspective of professional
development. It is done an approach on the construction of the professional identity on
this process and what is to be understood from teaching knowledge. The goal of this work
is to amplify the vision of the factors that contribute to the professional development of
teachers nowadays. It is believed that these topics constitute important reflections on the
need of a quality training for the establishment of the professor’s identity as a reflective,
theoretical and practical skilled professional in order to respond to the challenges of contemporaneity, just as the state’s responsibility, while organizer of the public educational
formation politics, of guaranteeing its continuity.
Keywords: Professional identity; Teacher’s formation; Teaching knowledge.
57
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 57-66, 2018
1. Introdução
De acordo com os estudos de Saviani (2009) a história da formação de
professores no Brasil surge da transformação da sociedade monárquica em republicana e da necessidade de organizar uma instrução popular. Durante o período
colonial, as reformas pombalinas estipulavam que os professores deveriam ser
treinados pelo método do ensino mútuo, utilizando seus próprios recursos financeiros. O ensino mútuo, também conhecido como método Lancaster, tinha
como objetivo ensinar o maior número de alunos, usando pouco recurso, em
pouco tempo e com qualidade. Essa exigência, criada em 1827, ainda hoje é
uma realidade para muitos professores que se veem obrigados a bancar a sua
própria formação inicial e continuada. A formação inicial dos professores, sob a
responsabilidade das Escolas Normais, dava ênfase ao domínio dos conteúdos,
enquanto a preparação didático-pedagógica ficava reduzida a uma formalidade
para obtenção do registro. Os institutos de educação e a transformação das escolas normais em Escolas de Professores representaram uma tentativa de valorizar
a pedagogia como uma ciência e oferecer uma estrutura do jardim de infância à
escola secundária, para a prática de ensino e pesquisa. No entanto, a formação
em nível superior dos cursos de licenciatura e Pedagogia perdeu essa referência e
contemplava, em seu currículo, três anos para as disciplinas específicas e um ano
para a formação didática.
Percebe-se que a formação de professores não representava uma prioridade para o desenvolvimento das províncias. As reformas seguiam os interesses
de seus idealizadores enquanto esses permaneciam nos cargos de decisão. Mesmo
após a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases (LDB), em 1996, a política de
formação docente não representou uma prioridade para conquistar a qualidade
tão almejada para a educação. A ênfase dada na formação inicial de caráter propedêutica continua não respondendo às novas demandas de trabalho do professor
na atualidade. A formação de professores, dentro do paradigma da sociedade do
conhecimento, precisa ser pensada a partir de sua função social, interligando a
teoria e prática, num currículo dinâmico, que valorize a identidade e a formação
crítica e reflexiva para o exercício do magistério. Isso supõe investimento em políticas públicas de formação com recursos definidos para assegurar formação de
qualidade, melhores condições de trabalho e bons salários, com o objetivo de
atrair novos jovens para a carreira do magistério e motivar os que já atuam, para
continuar seu desenvolvimento profissional.
2. Formação inicial e continuada de professores
O currículo da formação inicial retrata diferentes concepções e finalidades da
educação. Ao priorizar um conhecimento em detrimento do outro, corre-se o risco
de apresentar uma formação especializada que não dialoga nem se enriquece com os
diversos saberes. A formação docente pressupõe, além de conhecimentos e competências cognitivas, valores e atitudes que contribuam para uma formação humanista.
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 57-66, 2018
Diante da diversidade dos alunos e contextos institucionais não há como
propor uma formação homogênea. Uma proposta de formação inicial que colabore com a construção da identidade dos professores precisa considerar os diferentes saberes que os alunos trazem com suas experiências. A identidade é um
processo dinâmico, o qual se reconfigura por meio dos significados sociais que
a profissão adquire, em cada contexto histórico. Mesmo na formação inicial, os
alunos já apresentam concepções sobre o que é ser professor, mas muitos não se
reconhecem professores. O significado da docência como prática social só terá seu
reconhecimento, se for mediado pela reflexão crítica e contextualizado, junto aos
pares. O papel da educação não se limita a informar, mas propiciar condições para
que o conhecimento seja reelaborado pelo aluno.
Segundo Pimenta (2012) para que isso se concretize, é importante realizar a revisão do currículo que muitas vezes se encontra fragmentado e propor
um conhecimento em que teoria e prática dialoguem com a realidade das práticas
de ensino. Que se valorizem as práticas de ensino como espaço de aprendizagem
e investigação sistemática da própria prática educativa. Essa articulação não só
colabora com a autoformação dos professores, como também com a formação
das instituições escolares.
Ao considerar a formação dos professores em exercício, é mister afirmar que a utilização de diferentes termos, carregam em si concepções distintas.
Para García (1991) o conceito de desenvolvimento profissional de professores se
aproxima da concepção do professor como um profissional do ensino que está
em constante processo de evolução, independente da etapa de formação que se
encontra.
Nosso contexto social e mundial tem gerado mudanças significativas de
comportamento e valores, que têm suscitado nos professores uma sensação de
impotência para responder aos desafios da contemporaneidade. Nesse sentido,
a formação de professores pode ser um instrumento para contextualizar, refletir,
dialogar, e propor soluções possíveis para os contextos educacionais. Entretanto, os programas de formação permanente, propostos a partir da década de 80,
tiveram um caráter prescritivo, com cursos padronizados por experts e realização
de grandes conferências com renomados pesquisadores. Essa concepção deixava
transparecer que os professores precisavam adquirir conhecimentos, independente de seu contexto social e educativo.
Estudos sobre as práticas de formação apontam uma crítica a esse modelo
técnico-formativo. É preciso buscar novos modelos de formação que valorizem
o contexto social e político, que respeitem a capacidade do professor e permitam
a participação ativa dele na definição dos estudos. Para Imbernón (2009) o êxito
de um programa de formação consiste na elaboração de uma proposta, realizada
com a participação dos professores.
De acordo com os estudos de Gatti (2011) alguns programas federais do
Brasil, como o Reuni (Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais), Pró-Licenciatura, PARFOR (Plano Nacional de
Formação de Professores da Educação Básica) e PIBID (Programa Institucional
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 57-66, 2018
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de Bolsa de Iniciação à Docência), tiveram um impacto na formação de professores, à medida que contribuíram para a expansão e o acesso de estudantes e
professores aos cursos de licenciaturas. Mas, trata-se de políticas compensatórias,
que sofrem rupturas, por se tratarem de políticas de governo.
Para atender à demanda de professores em exercício que não possuíam
curso superior ou precisavam se qualificar, foi inaugurada a UAB (Universidade
Aberta do Brasil), incentivando o uso das metodologias de formação à distância
por meio da Plataforma Freire. O PARFOR (Plano Nacional de Formação de
Professores da Educação Básica) se configurou, portanto, como uma política de
centralização na visão de Rodriguez (2015).
As políticas educacionais de formação também sofreram influência do
modelo de gestão gerencial, baseado em metas, resultados. Ao mesmo tempo em
que valoriza a autonomia do docente, responsabiliza-o pelos resultados obtidos
nas avaliações externas. Essa política tem estimulado, na verdade, a competição e
o individualismo. A tendência é naturalizar as responsabilidades do plano institucional para o plano individual.
A formação continuada apresenta-se como fundamental no processo de
desenvolvimento profissional docente. No entanto, para Oliveira (2012) atribui-se um valor excessivo ao quesito formação, como se esse conseguisse resolver
todos os problemas da educação. Responsabiliza-se o professor pelo sucesso ou
insucesso na educação, sem levar em conta as condições desiguais de trabalho, a
falta de infraestrutura das escolas, a situação da carreira docente, dentre outros.
Canário (2000, apud NACARATO, 2016) aponta que as escolas deveriam ser o local privilegiado da formação de professores, pois é lá que as aprendizagens e os problemas acontecem e precisam ser refletidos e resolvidos. É, nesse
ambiente, que o trabalho colaborativo pode realmente tornar-se efetivo e fortalecer a identidade do professor. Nessa perspectiva, a escola deixa de ser um local
de aplicação de conhecimentos, para se tornar produtora de conhecimento. Essa
concepção implica valorizar os saberes profissionais dos professores onde atuam
e oportunizar a discussão dos desafios que perpassam a prática pedagógica, para
construir coletivamente soluções e conhecimento. A formação precisa estar articulada com o cotidiano escolar e responder às inquietações que os professores
vivenciam, em sua prática de ensino.
3. Construção da identidade profissional
Oliveira (2012) acredita que não se pode falar em formação de professores sem levar em consideração a identidade docente. Os profissionais da educação
constituem um grupo heterogêneo e o professor que atua em cada nível de ensino apresenta uma subjetividade que lhe é própria. É necessário reconhecer seus
saberes, suas rotinas de trabalho, suas responsabilidades, para contribuir com a
profissionalização docente.
Segundo Lane (2002) a subjetividade é uma relação dialética entre indivíduo e sociedade, entre o particular e o universal. Essa interação entre os grupos
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 57-66, 2018
sociais desenvolve as emoções, a linguagem, o pensamento, a consciência, a afetividade, e nossa identidade, que constitui o psiquismo humano. Isso só é possível,
se consideramos o ser humano em do seu contexto social histórico.
Isso implica reconhecer que os professores desenvolvem, ao longo de sua
formação, características e saberes específicos, de acordo com o nível de ensino
em que atua. Não se trata de classificá-los, mas de valorizá-los como profissionais
da educação. Cada grupo apresenta competências e habilidades que são próprias
de suas responsabilidades de trabalho e isso repercute em sua identidade docente.
Cada pessoa tem sua subjetividade enriquecida pelo amálgama entre individual e
social. Nossa maneira de ser e estar no mundo sofre influência do contexto sócio
histórico a que pertencemos.
A realidade histórica coloca em interação os planos subjetivos e objetivos, fazendo com que o indivíduo esteja em um processo contínuo de formação
da sua identidade. Nesse sentido, Furtado (2002) orienta que devemos evitar
uma generalização da identidade coletiva, pois corremos o risco de uniformizar
as diferentes expressões da subjetividade. É fundamental que reconheçamos os
determinantes que influenciam a dinâmica social e individual.
Para Galindo (2004), o conceito de identidade profissional ora proposto,
considera o docente em relação a si mesmo e com os seus pares, numa relação de
semelhanças e não de igualdade. A vivência da identidade profissional se estabelece na interação do reconhecimento de si mesmo e do reconhecimento do outro.
Esse processo de identificação é importante para a construção da identidade.
Desse ponto de vista, para Dubar (2005) a identificação pode encontrar ressonância naquilo que eu acredito ou não corresponder com o que eu me
identifico. A identidade se encontra num processo permanente de construção e
reconstrução presente nos espaços sociais e históricos, nos quais as relações acontecem. Por isso, a construção de novas identidades é uma tentativa de acomodar
a identidade para si à identidade para o outro.
A identidade é um processo em constante mutação, pois se beneficia da
relação consigo mesmo e com o outro. Porém, cada um tem sua própria identidade e não se pode generalizar as identidades profissionais, mesmo estando no
mesmo nível de ensino.
De acordo com Bolívar (2006), durante a formação inicial, construímos
uma identidade profissional de base que entra em crise, quando nos deparamos
com a realidade do exercício da profissão. A prática docente é mais exigente do
que aquilo pata o que fomos preparados. Essa crise de identidade é consequência
da dicotomia entre teoria e prática. É imprescindível repensar a identidade profissional, desde a formação inicial, e reconhecer que não existe uma identidade única
dos professores. Ela se estabelece por meio da relação entre a história pessoal de
vida de cada professor com o contexto de trabalho em que está inserido. Essas experiências entrelaçadas contribuem tanto para construir, quanto para desconstruir
a identidade profissional de base.
Um estudo de Flores e Day (2006, apud BOLÍVAR, 2006) mostra que
a identidade profissional é influenciada pelas experiências prévias, pela formação
inicial e exercício da prática docente, e também pelo contexto cultural da escola
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 57-66, 2018
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e da sala de aula. O reconhecimento desse conjunto de influências reforça a importância de refletir e problematizar essas questões nos programas de formação
inicial e continuada.
Imbernón (2009) afirma que a formação permanente deve favorecer a
subjetividade docente, fazendo com que a identidade de cada professor complemente a identidade grupal. Nessa proposta, o professor é protagonista de sua
formação e, ao compartilhar suas experiências e seus saberes, contribui para o
desenvolvimento de toda instituição escolar.
4. Saberes docentes
Para Monteiro (2001) os saberes dos professores construídos no contexto de trabalho constituem a essência da atividade docente. É, nesse ambiente, que
são mobilizados os conhecimentos, as crenças, valores e identidade profissional.
No entanto, para o paradigma da racionalidade técnica, o professor era considerado um profissional habilitado para transmitir o saber científico produzido por
outros. Não se valorizava os saberes ensinados e dominados pelos professores em
sua prática pedagógica.
Essa condição permaneceu por um longo período e contribuiu para incitar a desqualificação do trabalho dos professores. Ao desconsiderar a subjetividade do professor no processo de ensino-aprendizagem, não se reconhece que
os conhecimentos profissionais são dinâmicos. O contexto escolar, no qual estão
inseridos, exige dos professores uma capacidade reflexiva para adaptar esses conhecimentos profissionais ao objetivo que ser quer atingir.
Essa desvalorização dos saberes docentes demonstra, por um lado, que a
formação profissional não tem conseguido atrair nem atender adequadamente as
necessidades da prática educativa. Para Tardif (2012) o cenário aponta a urgência
de renovar os fundamentos epistemológicos do ofício de professor para compreender os saberes acionados em seu trabalho.
Para estudar os saberes profissionais, é preciso estar engajado no cotidiano escolar em que eles verdadeiramente acontecem e se transformam. É nesse
espaço concreto que o professor é ou deixa de ser o protagonista de sua ação educativa. A pesquisa em educação precisa se aproximar desses atores e fenômenos.
A formação universitária para o magistério ainda se baseia numa relação
linear e mecanicista do conhecimento, com ênfase na lógica disciplinar. É preciso
aproximar a prática docente da formação de professores. Isso implica ressignificar
o ensino, partindo da inovação curricular. O conhecimento universitário precisa
ser contextualizado, refletido e reelaborado coletivamente por professores e alunos para que se torne possível usar esse conhecimento para gerar uma transformação social (MASETTO, 2012; PIMENTA, 2012).
Essa ausência ou insipiente formação pedagógica nos cursos de licenciatura tem provocado o estrangulamento do propósito da formação dos professores. A ênfase dada na formação disciplinar inviabiliza uma visão ampliada da
identidade profissional e provoca esse sentimento de impotência diante da diver62
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 57-66, 2018
sidade dos alunos de uma turma. É preciso oportunizar ao futuro aluno-professor
a construção de sua identidade como profissional da educação.
Shulman (2005) aponta quatro fontes da base de conhecimento para o
ensino:
[...] (1) formação acadêmica nas áreas de conhecimentos ou
disciplinas; (2) os materiais e entorno do processo educacional
institucionalizado; (3) pesquisas sobre escolarização, organizações
sociais, aprendizado humano, ensino e desenvolvimento, e outros
fenômenos sociais e culturais que afetam o que os professores fazem;
(4) a sabedoria que deriva da própria prática [...] (SHULMAN,
2005, p. 207).
Essa visão das fontes implica a importância do professor ter o conhecimento do conteúdo e da forma de comunicá-lo aos alunos; de conhecer o ambiente educacional e as ferramentas que potencializam ou dificultam sua ação; de
compreender os processos de desenvolvimento humano, ensino, aprendizagem e
os fundamentos normativos, éticos e filosóficos da educação. E por fim, conhecer
a sabedoria que é construída e adquirida na prática docente.
A prática do professor revela uma concepção de educação, de relação
com o aluno, marcada por uma intencionalidade, uma visão de mundo e valores. O exercício da docência supõe uma relação de diálogo, respeito, interesse na
aprendizagem do educando. Masetto (2012) salienta que as universidades são
locais de encontro entre educadores e educandos e devem favorecer o desenvolvimento intelectual, afetivo-emocional, de atitudes e valores. Para isso:
Precisamos de um professor com um papel de orientador das
atividades que permitirão ao aluno aprender, que seja um elemento
motivador e incentivador do desenvolvimento de seus alunos, que
esteja atento para mostrar os progressos deles, bem como para
corrigi-los quando necessário [...] (MASETTO, 2012, p. 23).
Segundo Pimenta (2012) para propagar os saberes docentes, é preciso
registrar as boas práticas não como receitas a serem copiadas, mas como parâmetros que norteiem o trabalho docente. Esses conhecimentos, ricos em significados, expressam a sabedoria da prática. As novas tendências sobre formação de
professores devem valorizar não somente os saberes científicos, mas igualmente
os saberes pedagógicos e os saberes da experiência.
É inegável que a sabedoria da prática proporciona ao professor maior
confiança em seu trabalho. No entanto, é preciso refletir sobre essa prática para
não cair na comodidade da repetição de ações mecânicas. Cada contexto escolar,
cada etapa da aprendizagem, cada turma, apresenta singularidades que exigem
que o professor proceda a uma constante avaliação. Por isso, a atividade docente
é uma profissão em movimento, que exige estudo, reflexão, compartilhamento de
ideias, em torno de um objetivo que é a educação.
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 57-66, 2018
Considerações finais
A história de formação de professores passou e passa por momentos de
lutas e conflitos que refletem as diferentes concepções sobre a educação, que se
estendem desde uma educação entendida como instrução básica para capacitar
as pessoas para o mercado de trabalho até uma concepção de educação como
condição para a emancipação do ser humano e para a convivência pacífica num
mundo marcado pela diversidade e complexidade. Nesse sentido, as propostas de
formação inicial e continuada, organizadas pelo estado, sofrem influências econômicas, sociais e culturais que delimitam um contexto histórico. Por se tratarem
de políticas de governo, as propostas sofrem rompimentos e descontinuidades irresponsáveis. Não se leva em consideração a participação de quem faz a educação,
para refletir e avaliar o que foi realizado.
Tanto na formação inicial como na continuada, tem-se um grupo heterogêneo que apresenta necessidades diferenciadas e específicas. Por muito tempo,
prevaleceu um currículo tecnicista e conteudista que se limitava a informar e padronizar. Nessa concepção, o aluno-professor era considerado um mero receptor
de conhecimentos científicos. Mas a formação de professores pressupõe um processo não linear de desenvolvimento de pessoas adultas que vivenciam diferentes
etapas até encontrarem o seu próprio estilo para contribuírem com a melhoria
da educação. Uma formação eficaz tem que dar espaço para ouvir as experiências
e saberes dos professores. É na interação entre os pares que o professor constrói
sua identidade profissional. Os desafios da sociedade contemporânea exigem um
conhecimento que dialogue com o contexto social e educativo. Que valorize a
subjetividade do professor e os saberes da experiência, na construção de um conhecimento significativo para sua prática docente.
O cotidiano escolar constitui a essência da atividade docente e a formação universitária precisa aproximar dos atores e fenômenos que acontecem nesse
ambiente. Para isso, é preciso pensar um currículo dinâmico, contextualizado, que
propicie a reflexão e a reelaboração do conhecimento proposto. O exercício do
magistério, na atualidade, demanda um conhecimento pertinente, que contribua
para uma formação humanista e favoreça o desenvolvimento profissional de professores. A educação, enquanto projeto de transformação precisa dar voz e condições dignas de trabalho e estudo aos professores, para se conquistar a qualidade
tão almejada. Essa compreensão dos saberes pedagógicos reforça toda a diferença
que existe entre o especialista na área do conhecimento e o professor. Mais do
que uma habilitação para o exercício da profissão a formação docente pressupõe o
desenvolvimento de conhecimentos, habilidades, atitudes e valores que nortearão
a prática dos futuros professores para a construção de uma sociedade civilizada,
solidária e democrática.
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 57-66, 2018
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 57-66, 2018
A Educação Superior no Brasil e a busca
pela democratização: trajetória histórica
até os tempos de Sisu
BORGES, Gabriela Fernanda Silva1
Resumo: O Brasil é um país historicamente marcado pela desigualdade social e, essa atinge, principalmente, a parcela da sociedade que não consegue ingressar na educação superior. Por isso, nos últimos anos alguns programas que visam à democratização deste nível
de ensino estão sendo implementados no país. O processo de democratização busca alterar
o contexto no qual ingressar e concluir um curso superior é opção reservada a pequenos e
determinados grupos. Assim, na atualidade uma das questões centrais das políticas educacionais é justamente a democratização da educação, sendo o acesso com qualidade um de
seus grandes desafios. Este texto traz uma breve trajetória histórica da educação superior
no país até a implantação do Sisu, sendo parte de uma pesquisa que busca refletir sobre
os avanços e impasses do Sistema de Seleção Unificada no processo de democratização do
ensino superior.
Palavras chave: Democratização; Educação Superior; Sisu.
Abstract: Brazil is a country historically marked by social inequality, and this mainly affects the part of society that can not enter higher education. Therefore, in the last years
some programs that aim at the democratization of this level of education are being implemented in the country. The process of democratization seeks to change the context in
which to enter and to conclude a university course is an option reserved for small and
certain groups. Thus, at present one of the central issues of educational policies is precisely
the democratization of education, quality access being one of its great challenges. This text
brings a brief historical trajectory of higher education in the country until the implementation of Sisu, being part of a research that seeks to reflect on the advances and impasses of
the Unified Selection System in the process of democratization of higher education.
Key words: Democratization; Higher Education; Sisu.
1
Mestranda em Educação Tecnológica pelo IFTM – Campus Uberaba
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 67-79, 2018
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1. Introdução
A história da educação superior no Brasil tem sua origem no século XIX,
e como reflexos de uma sociedade desigual, esta história é marcada por desigualdades. Na prática, a educação superior reproduz socialmente o que aconteceu
com a educação básica: para os filhos dos colonizados brancos, a educação estava
relacionada à formação intelectual e humanística, com características europeias,
enquanto que para os índios, negros e mestiços a educação baseava-se na catequização.
Além de elitista, o ensino superior se firmou como um modelo de conhecimentos fragmentados e de natureza profissionalizante, atendendo as demandas
de racionalidade e eficiência – características típicas do capitalismo. Este panorama histórico marcou profundamente a educação superior no país e apresenta
marcas que explicam muitas distorções em nossos sistemas de ensino.
Conforme defendido por Ghiraldelli Jr. (2008), do Período Colonial,
passando pelo Império até a República as iniciativas no campo da educação superior evidenciam duas características: um ensino voltado para a elite e uma série
de mecanismos que excluíam a maior parte da população do acesso aos cursos de
graduação, visto como um instrumento para contribuir para a consolidação da
burguesia.
Porém, a educação é um direito social e um instrumento de inclusão
socioeconômica, e por isso deve ser oferecida de forma democrática, visando a
equidade e a inclusão dos grupos até então marginalizados deste nível de ensino.
Assegurar uma educação de qualidade é dever do Estado, e as políticas públicas
educacionais são mecanismos necessários frente às grandes desigualdades da sociedade brasileira.
2. A Educação Superior no Brasil
A educação superior brasileira, desde seu início, foi reservada para poucos, pois segundo Cunha (1980), os primeiros cursos de filosofia e teologia implantados no Colégio dos Jesuítas da Bahia, privilegiavam a formação das elites.
Em 1808, com a chegada da família real, houve a abertura dos cursos de
natureza profissionalizante, justamente para atender às necessidades do mercado,
porém, prevaleceu o predomínio de cursos de Direito e Medicina, devido à valorização da carreira jurídica e carreira médica. Outra característica desta época, é
que as instituições eram isoladas, não havendo interesse em criar universidades.
Entre 1989 e 1918 foram criadas no Brasil mais de 50 escolas superiores,
sendo a maioria delas privada. De um lado as escolas públicas ofereciam um ensino de característica confessional através das instituições católicas, e de outro lado,
os cursos oferecidos pela rede privada preparavam as elites locais.
Apenas em 1920, como resultado da agregação de algumas faculdades, a
universidade é oficialmente criada no Brasil. A Universidade do Rio de Janeiro,
reunia faculdades profissionais já existentes e que mantinham suas autonomias.
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Além disso, a instituição era mais voltada para o ensino e possuía um caráter elitista. Cunha (1980) considera tardia a criação das universidades no país, uma vez
que várias colônias espanholas já as possuíam – o que seria uma forma de Portugal
manter o Brasil dependente.
Na década de 1930, no Governo de Getúlio Vargas, e frente a diversos
debates políticos sobre educação, é criado o Ministério dos Negócios da Educação
e da Saúde Pública, o que originou algumas reformas na educação brasileira, entre
elas a aprovação do Estatuto das Universidades Brasileiras, que ficou em vigor até
1961 e diz:
a universidade poderia ser oficial, ou seja, pública (federal, estadual
ou municipal) ou livre, isto é, particular; deveria, também, incluir
três dos seguintes cursos: Direito, Medicina, Engenharia, Educação,
Ciências e Letras. Essas faculdades seriam ligadas, por meio de uma
reitoria, por vínculos administrativos, mantendo, no entanto, a sua
autonomia jurídica (SOARES, 2002).
A primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei
nº 4.024/1961, acabou ampliando e legitimando os anseios dos setores privados e
conservadores, pois basicamente estabeleceu mecanismos de controle da expansão
do ensino superior e do conteúdo a ser trabalhado.
O ano de 1968 no Brasil foi marcado pelas reivindicações por mudanças
sociais, políticas e culturais, e, depois de derrotar o movimento estudantil, o governo militar propôs a chamada reforma do ensino superior – Lei nº 5.540/1968.
A reforma propôs reorganização administrativa das instituições de ensino superior, visando alinhar os objetivos deste nível de ensino às demandas do mercado.
Porém, de acordo com Santana (2015), apesar da proposta, não houve verdadeira
reforma curricular e a ampliação do sistema se deu através do crescimento das
matrículas nos mesmos cursos tradicionais.
O grande desenvolvimento econômico da década de 70 aumentou a demanda pelo ensino superior com o aumento dos recursos federais e o orçamento
destinado à educação. Este aumento esteve diretamente relacionado ao crescimento de oportunidades de trabalho e consequente crescimento das camadas médias.
Infelizmente, a educação pública, diferentemente da privada, não estava preparada para receber o público interessando em ingressar no ensino superior. Este momento alavancou a educação superior particular, e a tornou um negócio rentável,
porém, pouco preocupado com a qualidade do ensino. A educação superior com
viés mercantilista passou pelo processo de expansão, porém,
tal expansão, por sua vez, não atende à demanda existente para a
educação superior, pois o acesso e a permanência de grande parte de
alunos têm relação com as condições existentes em termos de capital
cultural, construídas ao longo da trajetória escolar e de vida (GISI,
2006, p. 05).
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Sendo assim, o aumento no número de vagas em cursos de graduação
não é suficiente para garantir o acesso e a permanência principalmente da parcela
da sociedade em situação de vulnerabilidade econômica e social.
Enquanto a década de 1980 foi marcada pela crise econômica e consequente estagnação do ensino superior, a década de 1990 apresentou ações voltadas
para educação superior como a regulação dos mecanismos de avaliação e renovação periódica de reconhecimento dos cursos e a criação do Exame Nacional do
Ensino Médio (Enem) como alternativa ao tradicional vestibular criado em 1911.
A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.396/1996)
incorporou algumas inovações como a obrigatoriedade do recredenciamento das
instituições de educação superior, e reafirmou no artigo 3º que o ensino deverá
ser ministrado com base no princípio da igualdade de condições para acesso e
permanência na escola.
A história da educação superior mostra que a educação não promovia o
desenvolvimento da sociedade, mesmo porque poucos tinham acesso a ela; seu
objetivo era propagar o prestígio daqueles que conseguiam ingressar e concluir
um curso superior, ou seja, reforçar ainda mais o poder das elites.
As políticas e reformas empreendidas no Brasil desde o período colonial até a década de 1990 tiveram como eixo central os interesses dos grupos
dominantes e as demandas da economia. Segundo Jacob (1997), estas reformas
resultaram no caráter intervencionista e centralizador que caracteriza as ações do
Estado no campo educacional. Na prática, o Estado sustentou ao longo da história os interesses das classes sociais favorecidas.
A partir de 2003 foram realizadas várias iniciativas com o objetivo reestruturar, desenvolver e democratizar o ensino superior no país. O processo de
democratização busca, justamente, reverter o quadro no qual ingressar e concluir
um curso superior é opção reservada à alguns grupos. Assim, no século XXI uma
das questões centrais das políticas educacionais é justamente a democratização
da educação, sendo o acesso e a permanência com qualidade um de seus grandes
desafios.
3. As Políticas Públicas no cenário da Educação Superior Brasileira
A educação está prevista constitucionalmente como direito fundamental
de natureza social, entretanto, verifica-se que a educação superior é a que está
mais distante de chegar à sua universalização. Nota-se que o crescimento da oferta
de vagas na educação superior, além de estar abaixo do previsto no Plano de Educação Nacional, foi maior na iniciativa privada de ensino. Assim, se, por um lado
a educação superior, por ser gratuita em instituições públicas é vista como um
direito social, por outro, existe uma grande parcela que só consegue este acesso
por meio de instituições privadas, pagando por seus estudos.
Como o Brasil é um país historicamente marcado pela desigualdade social
e, essa atinge, principalmente, a parcela da sociedade que não consegue se inserir
principalmente na educação superior, nos últimos anos alguns programas que
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visam a expansão e melhoria deste nível de ensino vêm sendo implementadas nas
instituições de ensino.
No país, a segunda metade do século XX foi caracterizada pela expansão
da demanda e oferta de cursos de educação superior. Esta expansão está relacionada tanto à importância do saber acadêmico pelo mercado de trabalho quanto à
valorização da pesquisa.
E, com a crescente demanda pela formação profissional qualificada e consequentemente pela formação no ensino superior, aliada ao fato de que o maior
percentual de vagas disponíveis para este nível de ensino ser ofertado pela iniciativa privada, o governo federal passou a implementar e a ampliar programas
de democratização do acesso e da permanência nos cursos superiores. Como as
instituições de ensino superior contribuem ativamente para o desenvolvimento
científico e tecnológico do país, novas diretrizes e parâmetros estão sendo implantados no contexto da educação superior no Brasil.
Desta forma, ações que contemplam aumento de vagas nos cursos de
graduação, iniciativas de combate à evasão e promoção de políticas de democratização do acesso e permanência tem mostrado sua importância na busca por uma
reorganização social através da educação.
De acordo com Lima e Bianchini (2016), a democratização infere no
estabelecimento de igualdade de condições de escolha, acesso e permanência em
cursos e instituições de educação superior, em um processo que viabiliza que o
segmento estudantil represente toda a diversidade social. Em sociedades desiguais
como a brasileira, as políticas compensatórias tornam-se fundamentais na busca
pelo atendimento dos direitos coletivos.
Para promover a democratização do ensino superior, o governo federal
criou vários projetos e ações, chamadas de políticas públicas, elucidadas pela concepção de educação alinhada aos objetivos traçados pela Constituição Brasileira
como: construir uma sociedade livre, justa e solidária; reduzir as desigualdades
sociais e promover o bem de todos.
Azevedo (2003, p. 38) define que “política pública é tudo o que um
governo faz e deixa de fazer, com todos os impactos de suas ações e de suas
omissões”. Na busca por atender as necessidades do mercado de trabalho, bem
como oportunizar condições de acesso e permanência nas instituições de ensino
superior através da democratização, o Ministério da Educação afirma que: “os
desafios ligados à educação superior podem ser condensados na tríade expansão,
qualidade e democratização”.
Para Saviani, educação e política são práticas distintas, mas que mantém
uma estreita relação:
[...] a educação depende da política no que diz respeito a
determinadas condições objetivas como a definição de prioridades
orçamentárias que se reflete na constituição-consolidação-expansão
da infraestrutura dos serviços educacionais etc.; e a política depende
da educação no que diz respeito a certas condições subjetivas como
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a aquisição de determinados elementos básicos que possibilitem o
acesso à informação, a difusão das propostas políticas, a formação
de quadros para os partidos e organizações políticas de diferentes
tipos, etc. (1986, p. 89).
Segundo Giron (2008), quando se fala em Políticas Públicas na educação a abordagem trata-se da articulação de projetos que envolvem o Estado e a
sociedade, na busca pela construção de uma educação mais inclusiva e de melhor
qualidade, ou seja, que resgate a construção da cidadania.
As políticas voltadas para a educação superior têm propiciado mudanças
significativas, incluindo a expansão das instituições públicas, cursos e vagas. Entre os programas que visam à expansão, a permanência e a melhoria da educação
superior estão:
• O Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (FIES) que
é um programa do Ministério da Educação destinado a financiar a graduação na educação superior de estudantes matriculados em cursos superiores
não gratuitos na forma da Lei 10.260/2001;
• O Programa Universidade para Todos (PROUNI), criado pelo Governo
Federal em 2004 e institucionalizado pela Lei nº 11.096 de 2005, e que
tem como finalidade a concessão de bolsas de estudo integrais e parciais em
cursos de graduação e sequenciais de formação específica, em instituições
de ensino superior privadas;
• O Programa de apoio a Planos de Restruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), instituído pelo Decreto nº 6.096/2007, é uma
das ações que integram o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE)
e que tem como principal objetivo ampliar o acesso e a permanência na
educação superior através da adoção de medidas que promovam a expansão física, acadêmica e pedagógica da rede federal de educação superior;
• O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), criado
pela Lei n° 10.861, de 14 de abril de 2004, é formado por três componentes principais: a avaliação das instituições, dos cursos e do desempenho dos
estudantes. O SINAES avalia todos os aspectos como o ensino, a pesquisa,
a extensão, a responsabilidade social, o desempenho dos alunos, a gestão
da instituição, o corpo docente e as instalações (MEC).
• A Universidade Aberta do Brasil (UAB) que busca ampliar e interiorizar a
oferta de cursos e programas de educação superior, por meio da educação
a distância;
72
• O Plano Nacional de Assistência Estudantil (PNAES), regulamentado pelo
Decreto nº 7234/2010, apoia a permanência de estudantes de baixa renda
matriculados em cursos de graduação presencial das instituições federais
de ensino superior. O objetivo é viabilizar a igualdade de oportunidades
entre todos os estudantes e contribuir para a melhoria do desempenho
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acadêmico oferecendo assistência à moradia estudantil, alimentação, transporte, à saúde, inclusão digital, cultura, esporte, creche e apoio pedagógico
(MEC).
• A Lei n. 12.711/2012 que institui a reserva de vagas para estudantes oriundos de escolas públicas e/ou com renda igual a 1,5 salários mínimos per
capita e/ou autodeclarados pretos, pardos ou indígenas;
• O Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), institucionalizado por
meio da Portaria Normativa nº 438/1998 e regulamentado pela Portaria Normativa nº 807/2010, para servir como instrumento de avaliação
educacional do governo federal, com a finalidade principal de aferir o desempenho dos alunos concluintes e egressos do ensino médio, e que pode
ser utilizado tanto como forma de ingresso em instituições superiores de
ensino como também para o PROUNI ou FIES;
• O Sistema de Seleção Unificada (SISU), instituído pela Portaria Normativa nº 2/2010 e regulamentado pela Portaria Normativa nº 21/2012, é o
sistema informatizado do Ministério da Educação por meio do qual instituições públicas de ensino superior oferecem vagas a candidatos participantes do Enem. O sistema tem como objetivo a democratização das
oportunidades de acesso ao ensino superior e a promoção da migração
acadêmica entre cidades e/ou estados.
No Brasil, a Secretaria de Educação Superior (SESu), criada em 1979, é a
unidade do Ministério da Educação responsável por planejar, orientar, coordenar
e supervisionar o processo de formulação e implementação da Política Nacional de Educação Superior, sendo responsável por orientar políticas, programas e
ações relacionadas à educação superior.
Como toda política pública reflete na sociedade e na economia, além de
ser uma ação intencional, ou seja, com objetivos a serem alcançados, estas ações
implicam além da implementação e execução, a avaliação.
Costa e Castanhar (2003, p. 971), afirmam que:
a avaliação sistemática, contínua e eficaz destes programas pode ser
um instrumento fundamental para se alcançar melhores resultados
e proporcionar uma melhor utilização e controle dos recursos neles
aplicados, além de fornecer aos formuladores de políticas sociais e
aos gestores de programas dados importantes para o desenho de
políticas mais consistentes e para a gestão pública mais eficaz.
Na tentativa de buscar novas reflexões sobre o processo de democratização do ensino superior, é necessário analisar, de forma geral, os avanços e impasses da implementação destas políticas educacionais brasileiras, e especificamente
analisar a utilização do Enem/Sisu como forma de acesso às Instituições Públicas
de Educação Superior.
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4. O ENEM E O Sisu como políticas de democratização do Ensino
Superior
As políticas educacionais não visam apenas ampliar necessariamente o
quantitativo da oferta de vagas na educação superior, contudo, pretende redistribuir o módulo do vetor de acesso, que é maior para as classes economicamente
mais favorecidas, de forma a proporcionar oportunidades aos segmentos social e
historicamente excluídos.
Estas políticas são de grande importância principalmente para os setores
historicamente negligenciados do ensino superior, como negros, pardos, indígenas e/ou pessoas em situação de vulnerabilidade econômica, pois, interferem diretamente nos processos de organização e gestão das instituições na busca pela
democratização deste nível de ensino, e por isso, devem ser frequentemente avaliadas e/ou melhoradas, se for o caso.
No contexto de políticas educacionais, destaca-se o ENEM, que mesmo
não sendo criado com o intuito de ser um exame de acesso à educação superior,
sempre teve relação com essa finalidade desde o princípio. De acordo com informações do Relatório Final do ENEM 1999 (INEP, 2000), em sua primeira
edição, duas instituições utilizaram seus resultados para acesso aos seus cursos
superiores e foi esta relação que proporcionou sua popularização, tendo como
marco desse fenômeno o ano de 2001, quando o Enem passou a ser usado por
algumas instituições como modalidade isolada ou complementar de seleção para
seus cursos. Em 2005, selecionou candidatos ao PROUNI e, em 2009, passou a
ser usado como exame unificado de acesso à educação superior.
Desde sua primeira edição, o ENEM foi organizado e coordenado pelo
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP).
O uso do Enem pelas instituições de educação superior é opcional, sendo quatro
as formas de adesão, que funcionam da seguinte forma: 1) o Enem como fase única, que implica no uso do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) para preencher o
quantitativo de vagas disponibilizado pela instituição, para acesso por meio desse
formato; 2) combinado ao atual vestibular da instituição - neste caso, realiza-se
uma composição de notas entre resultados do Enem e do processo seletivo institucional; 3) O Enem é usado como 1ª etapa e o vestibular é utilizando apenas na
2ª etapa do processo seletivo institucional ou 4) utiliza-se o Enem para as vagas
remanescentes do processo seletivo realizado pela instituição.
De acordo com o art. 3º da Portaria Nº 468, de 03 de abril de 2017, os
resultados do Enem possibilitam:
74
I - a constituição de parâmetros para a autoavaliação do participante,
com vistas à continuidade de sua formação e a sua inserção no
mercado de trabalho;
II - a criação de referência nacional para o aperfeiçoamento dos
currículos do ensino médio;
III - a utilização do Exame como mecanismo único, alternativo ou
complementar para acesso à educação superior, especialmente a
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ofertada pelas instituições federais de educação superior;
IV - o acesso a programas governamentais de financiamento ou
apoio ao estudante da educação superior;
V - a sua utilização como instrumento de seleção para ingresso nos
diferentes setores do mundo do trabalho; e
VI - o desenvolvimento de estudos e indicadores sobre a educação
brasileira. (BRASIL, 2017).
Neste contexto, o Sisu foi desenvolvido com o objetivo de promover a
unificação da seleção das vagas de cursos de ensino superior em instituições federais, a partir das notas obtidas no Enem, com o intuito de substituir o vestibular
descentralizado destas instituições. Com o Sistema de Seleção Unificada, candidatos participantes do ENEM e que tenham nota maior que zero na redação, são
selecionados automaticamente pela pontuação após a inscrição em dois cursos de
uma mesma instituição ou de instituições diferentes.
Em relação ao processo de democratização do acesso ao ensino superior
cabe destacar que o Sistema de Seleção Unificada está de acordo com a Lei nº
12.711/2012 que, ao dispor sobre o ingresso nas universidades federais e nas
instituições federais de ensino técnico de nível médio, afirma:
Art. 1º. As instituições federais de educação superior vinculadas ao
Ministério da Educação reservarão, em cada concurso seletivo para
ingresso nos cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo
50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que
tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.
Parágrafo único. No preenchimento das vagas de que trata o caput
deste artigo, 50% (cinquenta por cento) deverão ser reservados aos
estudantes oriundos de famílias com renda igual ou inferior a 1,5
(um salário-mínimo e meio) per capita (BRASIL, 2012).
A participação das instituições públicas e gratuitas de ensino superior
no Sisu é formalizada por meio da assinatura de Termo de Adesão. Neste termo,
a instituição deverá descrever as condições específicas de concorrência às vagas
por ela ofertadas no âmbito do Sisu, devendo conter informações como cursos e
turnos, número de vagas, vagas reservadas, pesos e notas mínimas eventualmente
estabelecidos pela instituição de ensino referentes às provas do Enem, em cada
curso e turno.
Somente podem se inscrever no Sisu o estudante que tenham participado
do Enem, e que atenda às condições específicas do edital do processo seletivo daquele período letivo. O processo seletivo do Sisu compreende as seguintes etapas:
1. Oferta de vagas pelas instituições; 2. Inscrição dos estudantes; 3. Classificação
e seleção dos estudantes na chamada regular; 4. Lançamento pelas instituições,
das vagas ocupadas na chamada regular; 5. Declaração de interesse em participar
da lista de espera; 6. Convocação dos aprovados na lista de espera; e 7. Lançamento pelas instituições, das vagas ocupadas na lista de espera.
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 67-79, 2018
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Em termos numéricos o Sisu se apresenta como uma política pública
bem-sucedida. Criado em 2010, o Sisu ofereceu, no primeiro semestre daquele
ano, 47.913 vagas. Em 2014, também no primeiro semestre, foram 171.401 vagas – um crescimento de 258%. E, no primeiro semestre de 2017 foram mais de
238 mil vagas disponibilizadas e 131 instituições que aderiram ao sistema.
A implementação do Sisu alterou a forma de ingresso nas instituições de
ensino superior, passando de um modelo de seleção descentralizado, em que cada
instituição era responsável por seu calendário de aplicação das provas, bem como
pela elaboração das questões e dos critérios de seleção, para um modelo totalmente centralizado, baseado em um único exame comum a todas às instituições que
aderiram ao sistema.
Por meio do Sisu os alunos diminuem custos com inscrições e viagens,
uma vez que não precisam se submeter a processos seletivos de diversas instituições e nem saírem de suas cidades para realizarem o exame. As instituições também são beneficiadas com a diminuição de custos, não sendo mais responsáveis
pela elaboração e aplicação das provas.
Não há dúvidas de que o Sistema de Seleção Unificada tem grande mérito ao permitir o acesso à educação superior de jovens de várias partes do país,
além de ajudar a incrementar a proporção de jovens na educação superior, seja na
facilitação geográfica, divulgação das instituições e diminuição dos custos com
processos de seleção.
Porém, é preciso avaliar também os resultados contraditórios, especialmente ao considerar as características meritocráticas que cabem aos exames desta
natureza, com testes em larga escala. Um único exame aplicado em todo o país,
sem considerar as peculiaridades regionais e locais, é capaz de promover a democratização?
É necessário analisar se além dispensar os vestibulares, o Enem/Sisu torna o acesso à educação superior mais democrático. É preciso verificar como as
diferenças e desigualdades sociais tem se reproduzido nas instituições, e refletir
sobre a hierarquização dos cursos. Será que o Sisu tem conseguido a inclusão
de população até então marginalizada da educação superior, principalmente nas
instituições e cursos mais disputados? Este panorama do ensino superior no país
tem sofrido alterações? Como tem sido o processo de ocupação de vagas nas instituições que aderiram ao sistema?
Mais ainda, é preciso refletir sobre a Lei de Cotas dentro do sistema no
intuito de ampliar os espaços de equidade e inclusão na educação superior e avaliar sua eficácia tanto no acesso como na permanência e êxito dos alunos no Ensino Superior.
Como reflexo de toda a trajetória histórica do ensino superior no Brasil,
e das evidências de necessidade de políticas que realmente melhorem as possibilidades de acesso a este nível de ensino, é importante analisar a eficiência destas
políticas, e principalmente propor novas reflexões que poderão subsidiar melhores resultados.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 67-79, 2018
Considerações finais
A educação é um mecanismo importante de ascensão social. Será por
meio da educação que os indivíduos até então marginalizados da sociedade serão
capazes de buscar alternativas que melhorem sua qualidade de vida; será por meio
da educação que se sentirão capacitados para lutar contra a reprodução social.
A “cultura”, supostamente, garantida pelo diploma escolar, é um
dos componentes fundamentais do que faz o homem realizado em
sua definição dominante, de modo que a privação é percebida como
uma mutilação essencial que atinge a pessoa em sua identidade
e dignidade de homem, condenando-a ao silêncio em todas as
situações oficiais em que tem de “aparecer em público”, mostrar-se
diante dos outros com seu corpo, sua maneira de ser e sua linguagem
(BOURDIEU, 2017, p. 363).
Desta forma, as políticas públicas educacionais são consideradas importantes instrumentos de expansão e democratização do ensino superior, afinal, não
basta elevar o nível de instrução de uma sociedade, é necessário oferecer uma
educação de qualidade e de forma democrática.
E, apesar dos diversos processos de implementação de políticas públicas
voltadas para a educação superior, faz-se necessário avaliar os efeitos destas políticas no contexto das instituições de ensino, pois apenas aumentar o número
de vagas e cursos não é suficiente para promover a democratização. É necessário
garantir o acesso e a permanência com qualidade e equidade.
No caso do Sisu esta avaliação no interior das instituições se torna fundamental uma vez que diversas instituições públicas têm aderido ao Sistema de
Seleção Unificada como única forma de ingresso em seus cursos superiores. Os
resultados destas avaliações subsidiarão a manutenção da política ou indicarão
necessidade de discussões, reformulações e melhorias no processo de democratização da educação superior no país.
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 67-79, 2018
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79
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 67-79, 2018
Trajetórias formativas de acadêmicos de
Educação Física da UFPI: ser ou não
professor?
SANTOS, José Carlos dos1
SIMÕES, Regina2
MOREIRA, Wagner Wey3
Resumo: O objetivo foi analisar a percepção que os acadêmicos de EF da UFPI – Universidade Federal do Piauí, têm de sua trajetória formativa e como veem as contribuições
da formação inicial na construção da identidade de professor. O estudo é de abordagem
qualitativa. Foram entrevistados quatro acadêmicos do 8° semestre, que responderam:
Quais experiências fizeram você escolher ser um professor (a) de Educação Física? Os
desafios no curso de Licenciatura em EF da UFPI permitiu que você se identificasse com
a profissão de professor (a)? Quais as contribuições que o curso de Licenciatura em Educação Física te ofertou para a sua formação como professor de Educação Física? A interpretação foi via Análise de Conteúdo. Quanto às experiências, foi por terem vivenciado
práticas na área esportiva. Os principais desafios centram-se nos estágios supervisionados.
Os contributos sinalizaram para a importância do professor de EF. Acredita-se que os percursos percorridos na formação inicial, produziram vivências significativas nas trajetórias
dos acadêmicos pesquisados.
Palavras chave: Educação Física; Formação inicial; Professor.
Abstract: The objective was to analyze the perception that UFPI – Federal University of
Piaui - EF scholars have of their formative trajectory and how they see the contributions of
the initial formation in the construction of the teacher identity. The study is of qualitative
approach. Four students from the 8th semester were interviewed, who answered: What
experiences have made you choose to be an EF teacher? Did the challenges in the UFPI
EF Licentiate course allow you to identify yourself with the teaching profession? What
1
Prof. Licenciado em Educação Física pela UFPI. Mestrando no Programa de Pós-Graduação
em Educação Física da Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM. Pesquisador membro do
Núcleo de Estudo e Pesquisa em Corporeidade e Pedagogia do Movimento – NUCORPO
2
Doutora em Educação. Professora dos Programas de Mestrado em Educação e Educação
Física da Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM. Pesquisadora e coordenadora do
Núcleo de Estudo e Pesquisa em Corporeidade e Pedagogia do Movimento - NUCORPO
3
Doutor em Educação. Professor dos Programas de Mestrado em Educação e Educação
Física da Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM. Pesquisadora e coordenadora do
Núcleo de Estudo e Pesquisa em Corporeidade e Pedagogia do Movimento - NUCORPO
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 81-92, 2018
81
contributions did the EF Licentiate course offer you for your EF teacher training? The
interpretation was via Content Analysis. As for the experiences, it was because they had
experienced practices in the sports field. The main challenges are focused on the supervised
stages. The contributions signaled to the importance of the EF teacher. It is believed that
the trajectories covered in the initial formation, produced significant experiences in the
trajectories of the researched academics.
Keywords: Physical Education; Initial training; Teacher.
1. Introdução
82
No atual contexto da Educação brasileira, muitas são as discussões que
envolvem a temática da formação de professores (CUNHA, 2013; PRYJMA,
2012). Por esta razão, têm se procurado reconhecer os percursos percorridos por
esses agentes ainda na formação inicial, ampliando discussões e reflexões acerca
das problemáticas que se apresentam nas trajetórias formativas desses sujeitos.
No caso da formação de um professor de Educação Física (EF), envolve-se processos múltiplos de saberes, que vão sendo construídos inicialmente na
Universidade e que se desenvolvem no decorrer do percurso das vivências e experiências adquiridas na atuação profissional. Nessa direção, percebe-se que ser
professor de EF não tem sido uma tarefa fácil, pois este profissional “está sujeito a
inúmeras questões que podem interferir na sua atuação e portanto, na construção
de sua prática educacional” (GARCES; LAUXEN; ANTUNES, 2012, p. 199).
Tendo em vista uma dimensão mais pontual, as pesquisas têm demonstrado que a formação inicial na área da EF é um espaço importante para se discutir o
desenvolvimento profissional (CUNHA, 2013; SILVA; KRUG, 2012).
Nesta linha de raciocínio, é preciso considerar como estes profissionais
compreendem suas trajetórias e de que formas elas contribuem para a ação afirmativa de ser ou não um futuro professor na Educação Básica. Na busca por
compreender os contributos da formação inicial para os futuros professores, esta
pesquisa pautou-se na seguinte questão: Que significados são atribuídos pelos os
acadêmicos do curso de Licenciatura em Educação Física da Universidade Federal
do Piauí (UFPI) acerca da formação inicial e quais significados são dados as suas
experiências na busca por ações afirmativas de ser ou não professor de EF?
O estudo centra-se na formação inicial em EF, por ser um dos momentos
de descobertas significativas e indispensáveis na formação de todo e qualquer professor. Pois é através dela que os saberes são construídos e colocados em prática
por seus agentes (TARDIF, 2002).
Uma das razões que justificam a escolha por este estudo, está centrada
na importância que a formação inicial de professores em EF tem ganhado nos
últimos anos. Além disso, é sabido que a Licenciatura tem por finalidade formar professores reflexivos, capazes provocar mudanças educativas no espaço no
qual estão inseridos. Para tanto, levou-se em consideração também, as mudanças
ocorridas no curso de Licenciatura em EF da UFPI, decorrentes das reformas
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 81-92, 2018
curriculares de acordo com as Resoluções do Conselho Nacional de Educação/
Conselho Pleno (CNE/CP) n. 01 e 02/2002 (BRASIL, 2002a; 2002b). Outro
fator determinante desta pesquisa está embasado nas mudanças ocorridas no Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em Educação Física nos anos de 2006
e posteriormente em 2012 (UFPI, 2006; 2012).
A busca por compreender as trajetórias formativas de acadêmicos do curso de Educação Física da UFPI, demonstra a preocupação centrada na formação
de professores, que no decorrer dos anos vem se tornando algo cada vez mais
complexo. E no caso da formação inicial, muitos são os desafios presentes, portanto, torna-se pertinente ouvir os acadêmicos, de modo que eles possam relatar
em seus trajetos iniciais os problemas enfrentados e quais desdobramentos estes
vem tomando no decorrer deste trilhar (REZER; FENSTERSEIFER, 2008).
Nesta perspectiva, entende-se que a formação inicial oferece aos seus
agentes conhecimentos que podem ser eficazes na atuação profissional, oportunizando assim, um olhar mais preciso sobre os processos de novos profissionais para
atuarem na Educação Básica. Portanto, torna-se relevante analisar a percepção que
os acadêmicos da Licenciatura em Educação Física da UFPI têm de sua trajetória
formativa e como eles veem as contribuições da formação inicial na construção da
identidade de futuros professores da Educação Básica.
2. Percurso metodológico
A investigação teve início logo após aprovação pelo Comitê de Ética em
Pesquisa com Seres Humano (CEP/UFPI), sob n° 50145115.0.0000.5214. O
estudo ancora-se no referencial da pesquisa qualitativa, de modo que partiu da
premissa de buscar compreender uma realidade complexa, mista de desejos, de
crenças e interesses, além de fatos que nela circundam, no qual podem ampliar um
olhar de compreensão sobre o todo (TRIVIÑOS, 1987).
A escolha por esta abordagem de pesquisa, parte da convicção de que a
investigação qualitativa possibilita um olhar mais atencioso e amplo para o fenômeno investigado. Como instrumento de pesquisa, optou-se pela utilização de
uma entrevista estruturada (MACEDO, 2006), visando garantir o contexto social
através das narrativas dos sujeitos pesquisados.
Foram convidados a participar da pesquisa quatro (4) estudantes do 8°
semestre do curso de Licenciatura em EF da UFPI, onde os sujeitos foram escolhidos dois motivos: 1. Por estarem matriculados regularmente na disciplina
de Estágio Supervisionado Obrigatório em EF, no qual está disciplina apresenta
como principal objetivo promover uma análise e uma reflexão sobre a prática
pedagógica e docente da Educação Física nos diferentes níveis de ensino no contexto escolar, aproximando-se assim da temática da investigação aqui proposta; 2.
Por ser uma disciplina do último semestre, demonstra que os acadêmicos já estão
em processo de conclusão do curso, e de certa forma poderiam facilmente olhar
retrospectivamente para o percurso percorrido durante sua formação.
83
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 81-92, 2018
As entrevistas ocorreram no mês de novembro de 2016, em uma sala
reservada no Setor de Esportes da UFPI e todos os participantes receberam os
esclarecimentos sobre os procedimentos tomados e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Os acadêmicos responderam às seguintes questões: 1. Quais experiências
fizeram você escolher ser um professor (a) de EF? 2. Os desafios no curso de
Licenciatura em EF da UFPI permitiu que você se identificasse com a profissão
de professor (a)? 3. Quais as contribuições que o curso de Licenciatura em EF te
ofertou para a sua formação como professor de EF?
Os resultados foram tratados por meio da técnica de Análise de Conteúdo
(BARDIN, 2010), visando obter por procedimentos sistemáticos e objetivos de
descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que
permitem a inferência de conhecimento relativo às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) da mensagem. Em seguida, empreendeu-se o processo de
análise das falas dos respondentes a partir das frases constituintes de suas narrativas. Procurou-se identificar sentidos e intenções presentes nas narrativas, buscando sempre reconhecer o que era essencial para o objetivo do estudo, conforme
determina Bardin (2010), como procedimento na Análise de Conteúdo.
Cabe salientar, que os sujeitos desta investigação receberam nomes fictícios para manter o sigilo sobre suas identidades. Os personagens serão chamados
de sinalizados por “acadêmicos” e cada um deles recebeu um número, como demonstra o exemplo: acadêmico 1, acadêmico 2.
2.1 Os achados: As interfaces da formação profissional
Os motivos da escolha profissional
Ao serem questionados sobre as experiências pessoais que fizeram com
que os estudantes escolhessem a profissão de professor de EF, pode-se observar
narrativas carregadas de significados, principalmente naquelas relacionadas a trajetória escolar e na prática esportiva fora deste ambiente. Tais apontamentos nos
direcionaram para a compreensão de que as atividades propostas nas aulas de EF
na escola e as atividades que foram desenvolvidas fora dela (capoeira, voleibol,
dança), tiveram muita influência na escolha da profissão dos acadêmicos. Onde
para o acadêmico 2, a escolha pelo curso de EF se deu porque este sujeito gostava
muito das aulas de educação física na escola e principalmente dos campeonatos
de futsal que o mesmo participara. Assim como para o acadêmico 1, que escolheu
a profissão por gostar muito da capoeira. Já o acadêmico 3 sinaliza a sua escolha
pela profissão porque gostava de ajudar o professor de EF nas aulas de voleibol,
bem como a acadêmica 4 que escolheu a profissão porque era estimulada a fazer
aulas de dança dentro da escola e a participar de apresentações promovidas por
festivais dentro da escola.
É possível compreender as afirmações feitas acima, através de recortes dos
sujeitos pesquisados:
84
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 81-92, 2018
“[...] a educação física entrou na minha vida quando era estudante
do ensino fundamental menor. Eu amava participar das aulas,
principalmente quando o professor organizava os treinos de futsal. Lembro
que eu participava de muitos campeonatos. Minha escolha pela educação
física começou neste momento [...]” (Acadêmico 1).
“[...] nas minhas aulas de educação física, o professor fazia com que a
gente tivesse aula de capoeira. Era sempre o melhor dia da semana. Eu
ficava muito feliz nas aulas de educação física, porque eu me sentia livre.
Eu não pensei duas vezes. Eu disse pra mim mesmo que quando fosse fazer
vestibular, eu queria fazer educação física. E hoje estou aqui contando isso
pra você [...]” (Acadêmico 2).
“[...] eu praticava vôlei com um grupo de amigos da escola. Nosso
professor era muito legal. Quando tinha muita gente pra jogar, eu
pedia pra ficar ajudando ele a treinar o pessoal do grupo. Eu era muito
curiosa, perguntava sobre tudo. Aí teve um dia que ele pediu pra eu ser a
treinadora do grupo. Foi o dia mais feliz pra mim. [...]” (Acadêmica 3).
“[...] eu tinha um grupo de dança na escola. De repente entrou uma
professora nova de educação física. Ela ministrava aula de dança pra
gente, fazia festivais de dança. Todo mundo queria participar das aulas
dela. Foi a melhor professora de educação física que eu tive. Eu cresci
querendo ser igual a ela um dia [...]” (Acadêmica 4).
A EF teve seu reconhecimento na sociedade, como uma área que atua
com o movimento humano, por isso, é comum encontrar pesquisas cientificas
onde muitos dos profissionais de EF, atribuem sua escolha pela profissão porque
gostava de participar de aulas práticas através do esporte e de outros conteúdos
específicos da área. Por outro lado, tornar-se primordial chamar atenção que a
EF por ser um componente curricular obrigatório - Lei n.9.393/96 (BRASIL,
1996), apresenta um universo de conhecimentos e saberes que devem ser explorados no ambiente escolar, proporcionando momentos também de reflexão sobre
a utilização desses conteúdos (SILVA; KRUG, 2012).
Chama-se atenção neste caso para a EF na escola, bem como, para a formação inicial nos cursos de Licenciatura, de modo que estas não estejam cristalizadas na ideia de que devem ser apenas um espaço de reprodução mecânica e sem
contextualização do movimento humano. Da mesma forma, sinalizamos para a
questão da utilização do esporte, pois é importante que ele não seja visto como
um fim em si mesmo (SILVA; KRUG, 2012), que caracteriza a EF.
Maschio et al. (2008), no estudo “motivações para a escolha do curso de licenciatura em Educação Física: um diálogo com acadêmicos em formação inicial”,
diagnosticaram que os estudantes apontaram três grandes motivos fundamentais
para a escolha do curso de Licenciatura em EF, sendo eles: relação com a prática
de atividades esportivas e atividades físicas, a relação do curso com outras áreas da
saúde e claro, e por fim, a identificação que os mesmos mantinham com o curso.
Krug e Krug (2008) no estudo realizado com acadêmicos do curso de
Licenciatura em EF da Universidade Federal da Santa Maria (UFSM), diagnostiEvidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 81-92, 2018
85
caram nove motivos que levaram aos estudantes escolherem o curso de EF, sendo
eles: a influência do professor de EF da escola; o gosto pela prática de atividades
esportivas e atividades físicas; alunos que não conseguiram passar no curso superior almejado e tiveram a EF como segunda opção; gosto pelo esportes abordados
na área; curiosidade por entender como funciona o corpo humano; prazer em
trabalhar com pessoas e com o movimento humano; interesse em ensinar; por
eliminação na hora do teste vocacional.
Razeira et al. (2014) mostraram na investigação realizada com 122 estudantes do curso de Licenciatura em EF, que os principais motivos que os fizeram
escolher esta profissão foram: gosto pelo esporte (outras atividades relacionadas
ao movimento); identificação com área e por ter um campo de atuação amplo;
por querer ser professor; e por influência do professor da escola.
Diante dos apontamentos da literatura, é possível perceber que as principais razões pela escolha do curso de Licenciatura em EF, está intrinsecamente
relacionada ao gosto da prática esportiva e da prática de atividade física, por outro
lado, há também a presença da influência do professor de EF na escola. Neste
ponto, compreende-se que o professor é um personagem essencial que pode direcionar seus alunos para escolhas onde elas estejam inseridas de forma integral.
2.2 Ser ou não ser professor: os desafios enfrentados
Ser professor requer enfrentar desafios, mas também é aventurar-se por
caminhos desconhecidos e imprevisíveis. Onde muitas vezes é preciso buscar motivação e desejos para não ser surpreendido pelos problemas que podem vir a
ofuscar todo o brilho da docência, trazendo para o dia a dia frustrações e inseguranças. Para tanto, é sabido que nem todos os profissionais estão preparados para
enfrentar os medos que assolam o professor de EF.
Neste caso, advogamos na concepção de que ser professor, é uma descoberta que vai ocorrendo de forma contínua e cotidianamente. É importante considerar que as aprendizagens só são significativas a partir do momento que seus
agentes tomam consciência daquilo que lhe foi repassado durante todo o processo
de formação. Para que isso ocorra, é preciso que os espaços de formação, ampliem
discussões que promovam reflexão sobre o papel do professor na sociedade.
Buscando compreender os percursos formativos dos acadêmicos e de
como o curso de Licenciatura em EF da UFPI assegurou e permitiu a vivência de
ser professor, indagou-se aos estudantes se a universidade proporcionou experiências que permitissem a eles identificarem-se com a função de um professor da
Educação Básica. Tal questionamento foi lançado após a compreensão de que a
formação inicial é um momento para o desenvolvimento dos saberes que devem
e podem ser mobilizados na prática profissional.
Ao serem provocados, os acadêmicos responderam que:
[...] ser professor de EF não é uma realidade que eu acreditasse. Até porque
quando entrei neste curso, eu não tinha pensado nisso ainda. Entrei
86
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 81-92, 2018
muito imaturo, sem saber direito como as coisas aconteciam. Quando nós
começamos a ter disciplinas com o fogo mais pedagógico, eu comecei a
ver que as coisas eram ainda mais complicadas. E que ser professor não
era algo fácil. Quando tivemos o primeiro estágio, achei tudo muito
frustrante. Porque não tínhamos apoio de nada, eu e meu amigo ficamos
literalmente abandonados na escola. Tivemos que pedir ajuda para uma
professora que defendia o lance da educação física escolar. Foi a partir da
convivência com ela que eu pude ter um pouco mais identificação com a
escola [...] (Acadêmico 2).
[...] Pra mim, o curso permitiu a experiência de professor através dos
estágios. O que pra mim não significa dizer que todos queiram ser professor
só ter tido essa vivência de alguns meses. Porque dependendo do lugar onde
a gente vai fazer o estágio, tive amigo que se sentiu foi “aperreado”, com
medo de enfrentar os alunos na escola [...] (Acadêmica 4).
[...] O curso deveria era propor mais momentos pra galera entender
sobre o que é ser professor. Além dos estágios, penso que poderia ser criado
estratégias para aproximar os alunos que entram no curso para saberem o
que é ser um professor na escola. Porque os desafios são grandes. Os estágios
não dão garantia de que todos queiram ser docente. Mas não posso negar
que o meu curso ofereceu momentos como este [...] (Acadêmica 3).
Apesar dos acadêmicos relatarem a respeito das dificuldades e desafios
enfrentados, é possível perceber que o curso de EF da UFPI permitiu principalmente através dos estágios supervisionados obrigatórios, que os alunos vivenciassem na pele a função do que é ser professor na Educação Básica. Por outro lado,
sinalizamos para o discurso do acadêmico 2, deixando nítido em seu relato que
houve por um momento frustação, insegurança e medo. Isso demonstra os ritos
iniciais que muitos professores iniciantes passam, quando se deparam com situações para além daqueles que eles imaginavam.
Destaca-se também o discurso da acadêmica 4, quando a mesma diz que
mesmo o curso garantindo experiências docentes através dos estágios “[...] isso
não significa dizer que todos queiram ser professor, só por ter tido essa vivência
de alguns meses [...]”. De acordo com os discursos dos alunos, chama-se a atenção para que o referido curso possa pensar numa possibilidade de ordenar uma
forma de possibilitar com que os alunos possam ter um contato mais próximo
com a docência logo no início do curso.
Como nos discursos dos acadêmicos os estágios foram os momentos que
mais tiveram destaque, é possível compreender no estudo de Souza, Bonela e
Paula (2007), que o estágio supervisionado apareceu como um momento muito
importante na formação do profissional de EF, sendo apontado por todos os estudantes pesquisados. Autores como Felício e Oliveira (2008) chamam a atenção
ao afirmar que o estágio curricular quando realizado de maneira planejada e bem
orientado, torna-se um momento fundamental na formação inicial.
Krug (2010) afirma que é por meio das experiências do estágio supervisionado que o estudante conhece a realidade escolar e começa a reconhecer-se
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 81-92, 2018
87
como profissional da educação. Porém como percebido, para os acadêmicos deste
estudo, o estágio foi um momento de desafios, o que também pode ser diagnostica no estudo de Souza, Bonela e Paula (2007), quando os acadêmicos pesquisados deixaram claro que:
Na graduação aprendemos a teoria e como “devemos trabalhar”, mas
na realidade escolar é diferente, tem muita coisa que aprendemos e não
conseguimos trabalhar na escola [...] (Acadêmico 3).
[...] a realidade escolar é completamente diferente da que vemos na
faculdade [...] (Acadêmico 22).
Bom a diferença é grande, pois ao chegar em uma escola a ideia de se
trabalhar de uma certa forma as vezes se torna totalmente ao contrário.
Na graduação o que aprendemos e estudamos parece que vai dar certo na
escola, mas muitas vezes não dá [...] (Acadêmico 24).
Como já apontado, o curso de formação inicial, repassa conhecimentos
que somente a vivência e experiência na escola é capaz de afirmar se o que foi
aprendizado foi significativo no momento de repassar os conteúdos. Milanesi
(2012, p. 223) aponta que o estágio “é o momento mais significativo de se conhecer a realidade escolar para aprender a profissão na prática”. Mas em muitas
situações deixa a desejar. Por esta razão, é preciso que as instituições possam estreitar os laços entre as Instituições de Ensino Superior (IES) com as escolas da
Educação Básica, aproximando os estudantes do curso de Licenciatura em EF
com a realidade que acontece no chão da escola e em seu cotidiano.
2.3 Contributos da formação inicial para identidade de professor (a)
Os cursos de formação de professores devem ser sempre espaços de diálogos e de construção dos saberes sobre a docência, contribuindo para uma formação sólida e reflexiva sobre a função do professor, deixando claro quais são os
desafios que este poderá enfrentar em sua trajetória enquanto docente de uma
instituição de ensino. Sendo assim, compactuamos com o pensamento de Zabalza
(2004), quando afirma que a formação ofertada pelas instituições de ensino, devem ter como princípio o de qualificar as pessoas para que elas tenham condições
de repassar seus conhecimentos afim de desenvolver e aprimorar tudo aquilo que
lhe foi proposto.
Quando os acadêmicos foram indagados sobre as contribuições do curso
para a formação de professor, é possível compreender nos discursos que:
[...] nesta etapa final da graduação, eu percebi que ser professor de EF
é algo além do eu imaginava. Temos que ter certeza da nossa profissão,
porque a escola é um local cheio de desafios (Acadêmico 1).
88
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 81-92, 2018
O curso me fez perceber o quanto a educação precisa de professores que
valorizem a educação física. Se não vamos continuar levando a fama de
professores que não fazem nada escola, além de dar bola para os alunos
jogarem futsal [...] (Acadêmico 2).
Eu agradeço por saber que o curso de educação física nos dá a possibilidade
da gente trabalhar com o movimento. Acho que essa foi a principal
contribuição do curso. A gente pode mover a escola (Acadêmica 3).
[...] amadureci meu pensamento sobre os professores de Educação Física
e sobre a escola. Sei que posso aprender ainda muito mais, mas o que
aprendi me fez perceber que precisamos de gente goste da nossa área
(Acadêmica 4).
É notório pelos discursos dos acadêmicos, que os contributos do curso
para a construção da identidade do ser professor, deu-se principalmente na questão da valorização do espaço da escola e da figura do professor de EF. Os relatos
apontam que os acadêmicos mesmo enfrentando desafios durante seu percurso
formativo, ainda tiveram ânimo para fortalecer o pensamento positivo sobre a EF,
demostrando assim vontade para exercer sua função com conhecimento e respeito
sobre aquilo que se faz. Para tanto, é preciso salientar que os professores iniciantes
em muitos momentos passam por dificuldades ao se inserirem na docência, como
afirma Ilha (2012) ao dizer que muitos problemas quanto ao professor de EF na
escola, está ligado aos reflexos da formação inicial, mas também por influência de
fatores externos.
Sendo assim, corroboramos com o pensamento de Rausch e Franzt
(2013, p. 629) quando os autores afirmam que “o professor é considerado figura
central no processo de ensino e seu papel é imprescindível para o sucesso no processo de significação de novos conhecimentos”.
Considerações finais
A partir do objetivo proposto por esta investigação de analisar a percepção que os acadêmicos da Licenciatura em Educação Física da UFPI têm de sua
trajetória formativa e como eles veem as contribuições da formação inicial na
construção da identidade de futuros professores da Educação Básica. Foi possível
perceber que os acadêmicos pesquisados demonstraram ter segurança sobre as
trajetórias percorridas por eles na formação inicial.
Quanto as razões sobre a escolha pelo curso de Licenciatura em Educação Física da UFPI, compreendeu-se que os sujeitos pesquisados escolheram ser
professores EF, por terem vivenciado experiências práticas na área esportiva e em
práticas esportivas, mas também se apoiaram nas memórias afetivas do período
escolar, tendo como principal referência seus professores de EF no espaço escolar.
Já os principais desafios enfrentados pelos acadêmicos, centram-se principalmente
nas vivências dos estágios supervisionados, mostrando que embora os estágios
pudessem ser momentos essenciais na construção da identidade do ser professor,
89
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 81-92, 2018
ele também pode demonstrar a real a situação do espaço escolar e de como suas
ações podem interferir ou não nas atividades proposta pelos futuros professores.
Quanto aos contributos da formação proposta pelo curso, os acadêmicos
sinalizaram para a importância do professor de EF no ambiente, e de como a partir de agora eles veem a escola como um espaço de transformação social, no qual
precisa de um olhar mais atencioso.
Portanto, acredita-se que os percursos percorridos na formação inicial,
produziram vivências significativas nas trajetórias dos acadêmicos pesquisados,
o qual pode ser visto pelos relatos disponíveis neste estudo. Salientamos aqui a
importância de haverem mais estudos sobre a formação inicial, considerando este
um espaço reflexivo e cheio de significados.
Agradecimentos
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, pela bolsa concedida para continuar o mestrado. Agradecimento profundo
ao Núcleo de Estudo e Pesquisa em Corporeidade e Pedagogia do Movimento
– NUCORPO, pela acolhida e por toda solidariedade direcionada a este nobre
nordestino arretado com sede de aprendizado.
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 81-92, 2018
91
- José Carlos dos Santos
Prof. Licenciado em Educação Física pela UFPI. Mestrando no Programa de
Pós-Graduação em Educação Física da Universidade Federal do Triângulo
Mineiro – UFTM. Pesquisador membro do Núcleo de Estudo e Pesquisa em
Corporeidade e Pedagogia do Movimento – NUCORPO
- Regina Simões
Doutora em Educação. Professora dos Programas de Mestrado em
Educação e Educação Física da Universidade Federal do Triângulo Mineiro
– UFTM. Pesquisadora e coordenadora do Núcleo de Estudo e Pesquisa em
Corporeidade e Pedagogia do Movimento - NUCORPO
- Wagner Wey Moreira
Doutor em Educação. Professor dos Programas de Mestrado em Educação
e Educação Física da Universidade Federal do Triângulo Mineiro –
UFTM. Pesquisadora e coordenadora do Núcleo de Estudo e Pesquisa em
Corporeidade e Pedagogia do Movimento - NUCORPO
92
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 81-92, 2018
A Educação na contemporaneidade:
contribuições da tecnologia digital para
a inclusão das pessoas com deficiência
auditiva
KIKUICHI, Vivian Zerbinatti da Fonseca
QUEIROZ, Florence Alves Pereira de
Resumo: A Educação Inclusiva e a era digital são grandes desafios para o sistema educacional. Na perspectiva da educação inclusiva passa-se a questionar as práticas educacionais
excludentes em detrimento às práticas que valorizam a diferença presente em sala de aula.
Os recursos disponibilizados pela tecnologia digital podem constituir-se em um importante caminho para que as pessoas com deficiência se tornem sujeitos ativos no processo de
construção de conhecimento. O presente artigo tem como objetivo destacar as contribuições da tecnologia digital para a inclusão das pessoas com deficiência auditiva por meio de
revisão de literatura a fim de buscar os principais recursos tecnológicos digitais disponíveis
atualmente no mercado em prol desse público específico. Entende-se que os desafios da
educação contemporânea exigem que os sistemas educacionais se reorganizem, investindo
na inovação das práticas pedagógicas e na mobilização de novos saberes capazes de reconhecer a potencialidade de aprendizagem de todos os alunos.
Palavras-chave: Educação Inclusiva; Saberes docentes; Tecnologias digitais.
Abstract: Inclusive Education and the digital age are major challenges for the education system. From the perspective of inclusive education, we question the exclusionary
educational practices to the detriment of practices that value the difference present in the
classroom. The resources made available by digital technology can be an important way
for people with disabilities to become active subjects in the knowledge-building process.
This article aims to highlight the contributions of digital technology to the inclusion of
hearing impaired people through a literature review in order to search for the main digital
technological resources currently available in the market for this specific public. It is understood that the challenges of contemporary education require that educational systems
reorganize, investing in the innovation of pedagogical practices and the mobilization of
new knowledge capable of recognizing the learning potential of all students.
Keywords: Inclusive Education; Teacher knowledge; Technologies.
93
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 93-101, 2018
1. Educação inclusiva e a era digital: reflexões iniciais
Berger e Luckmann afirmam que as instituições sociais, incluindo as escolas, são produtos históricos da atividade humana e que “é impossível compreender
adequadamente uma instituição sem entender o processo histórico em que foi produzida” (1985, p. 79). Partindo dessa afirmação, considera-se importante refletir
sobre a trajetória histórica que culminou com a atual proposta de inclusão vigente
no cenário educacional brasileiro para compreender a concepção de homem construída ao longo da história e principalmente pensar qual é a concepção que está
sendo construída na sociedade contemporânea, marcada não apenas pelo advento
da inclusão como também pela presença das tecnologias digitais que apontam
para a necessidade de refletirmos sobre o papel da escola diante desses desafios.
A história de consolidação da educação especial mostra-nos que a exigência legal por uma educação de qualidade e igualdade de direitos aos alunos com
deficiência começou com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que já
indicava a necessidade de uma educação inclusiva quando em seu artigo 208, III, p.
123-124, afirma que “o dever do Estado com a educação será efetivado mediante
a garantia de atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino”. Assegurar atendimento especializado às pessoas com deficiência no ensino público significa reconhecer que as especificidades precisam ser trabalhadas de forma diferenciada no contexto escolar.
As discussões sobre a inclusão se intensificaram após a realização da Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada na cidade de Jomtien,
em 1990, na Tailândia e a Conferência Mundial sobre Educação Especial que
aconteceu em Salamanca, Espanha, em 1994. Esses eventos resultaram, respectivamente, na elaboração da Declaração de Jomtien e Declaração de Salamanca,
documentos que propunham mudanças que favorecessem a construção de um
sistema educacional inclusivo capaz de garantir uma educação de qualidade para
todos os alunos. Tanto a Declaração Mundial de Educação para Todos (1990)
quanto a Declaração de Salamanca (1994) influenciaram a formulação de políticas públicas da educação inclusiva em todo mundo.
No Brasil, os reflexos dessas conferências podem ser percebidos em diversos documentos como a atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, nº
9.394 de 1996 que preconiza em seu artigo 59 que os sistemas de ensino devem
assegurar aos alunos currículo, métodos, recursos e organização específicos para
atender às suas necessidades; a partir dessa Lei, os municípios assumem a responsabilidade de universalização do ensino da Educação Infantil e Ensino Fundamental, devendo desenvolver ações necessárias para implementar a educação inclusiva.
Ações como o Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade, implementado pelo Ministério da Educação em 2003, com o objetivo de apoiar a transformação dos sistemas de ensino em sistemas educacionais inclusivos, para garantir o
direito de acesso de todos os alunos à escolarização, à oferta do atendimento educacional especializado, além da garantia de acessibilidade, também tiveram inspiração nos documentos elaborados após as Conferências de Jomtien e Salamanca.
94
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 93-101, 2018
Atualmente, vigora em nosso país a Lei Brasileira de Inclusão (2015),
aprovada por unanimidade no Senado depois de 12 anos em tramitação no Congresso Nacional. A Lei 13.146 de 2015, também conhecida como Estatuto da
Pessoa com Deficiência assegura, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais da pessoa com deficiência, visando à sua
inclusão e cidadania.
A consolidação da política de inclusão (BRASIL, 2015) na escola comum,
aponta a necessidade de implementação de novas práticas pedagógicas que resultem na oferta de uma educação de qualidade para todos e na ressignificação dos
espaços de aprendizagem de forma que estejam voltados para atender às especificidades desse público que começa a frequentar as salas de aula das escolas brasileiras. A Lei da Inclusão (2015) prevê o “aprimoramento dos sistemas educacionais,
visando garantir condições de acesso, permanência, participação e aprendizagem,
por meio da oferta de serviços e de recursos de acessibilidade (grifo nosso)
que eliminem as barreiras e promovam a inclusão plena” (art. 28, II, p.07).
Com as contribuições dos recursos disponibilizados pela tecnologia digital as pessoas com deficiência passaram a ter direito não apenas ao acesso, mas
à permanência no contexto escolar em condições de equidade. A educação da
contemporaneidade enfrenta uma realidade desafiadora: de um lado é preciso
aprender como oferecer uma educação de qualidade que reconhece, respeita e
valoriza as diferenças presentes em sala de aula, com um ensino que permita a
todos aprenderem a partir de suas potencialidades; e de outro é preciso aprender a
utilizar os recursos tecnológicos disponíveis para que os estudantes tenham acesso
à informação e um papel ativo no processo de construção do conhecimento independentemente das necessidades que apresentem.
A escola contemporânea é o espaço da diferença, do digital, dos desafios,
da controvérsia, do inusitado, da possibilidade, mas de nada adiantará a inovação
tecnológica e a variedade de recursos e serviços disponíveis se a escola não estiver
preparada para lidar com as mudanças, para acolher a diferença, para aprender
com o novo uma nova forma de exercer o seu papel. Sobre o papel da escola
diante dos impactos causados pelas transformações do mundo contemporâneo
Silva afirma que:
O impacto das transformações de nosso tempo obriga a sociedade,
e mais especificamente os educadores, a repensarem a escola,
a repensarem a sua temporalidade. E continua. Vale dizer que
precisamos estar atentos para a urgência do tempo e reconhecer que
a expansão das vias do saber não obedece mais a lógica vetorial.
É necessário pensarmos a educação como um caleidoscópio, e
perceber as múltiplas possibilidades que ela pode nos apresentar, os
diversos olhares que ela impõe, sem, contudo, submetê-la à tirania
do efêmero (SILVA, 2001, p. 37).
95
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 93-101, 2018
É interessante a ideia proposta por Silva (2001) de pensarmos a educação tendo como referência um caleidoscópio, que segundo Freitas (2015) em
suas voltas, muda suas perspectivas, ampliando seu alcance visual. É fundamental
que a escola tendo como referência a história vivida, repense seus paradigmas,
concepções e condutas, buscando ressignificar seu papel em prol da oferta de um
ensino de qualidade a partir das múltiplas possibilidades de aprendizagem que os
recursos tecnológicos oferecem.
As tecnologias digitais podem caracterizar-se como alternativa importante para mudanças no cenário educativo, desde que a educação não passe a simplesmente fazer uso da técnica, mas pense a tecnologia enquanto um caminho
para a mudança social (FREITAS, 2015). Alonso (2008, p. 749) acredita que “a
incorporação das TIC1 pelas escolas seja um elemento catalizador de mudanças
significativas na aprendizagem dos alunos”. Segundo Alonso (2008), embora as
tecnologias de informação e comunicação não sejam produzidas e processadas
nos contextos escolares, espera-se que elas possam promover transformações nos
modos de ensinar e aprender.
Assim, nesse cenário de mudanças que impera no mundo contemporâneo
é inevitável que a escola além da inclusão discuta e considere as contribuições das
tecnologias digitais para o contexto educativo, entendendo-as não como meros
recursos que facilitam o acesso das pessoas com deficiência, mas como um importante caminho para que o aluno, independentemente de suas especificidades,
construa seu conhecimento de forma autônoma, participativa e sinta-se realmente
incluído em qualquer ambiente em que estiver inserido.
Portanto, o presente artigo destaca as contribuições da tecnologia digital
para a inclusão das pessoas com deficiência auditiva, levando em consideração que
o acesso às novas tecnologias tem se tornado cada vez maior por todas as esferas
sociais, e principalmente pelas pessoas com deficiência, que têm se beneficiado
muito com esses recursos no seu dia-a-dia.
Para a realização do mesmo foi feita uma revisão de literatura a fim de realizar um levantamento dos principais recursos tecnológicos disponíveis no mercado, atualmente, que podem beneficiar direta e indiretamente as pessoas com
deficiência auditiva.
2. As tecnologias digitais e a educação: saberes necessários para o
fortalecimento do processo de inclusão
Para as pessoas sem deficiência a tecnologia torna as coisas mais fáceis.
Para as pessoas com deficiência, a tecnologia torna as coisas possíveis.
(RADABAUGH, 1993)
A inclusão educacional é uma proposta que se constrói coletivamente, à
medida que as necessidades vão sendo diagnosticadas e que os sujeitos participantes do processo socializem os obstáculos, as dificuldades, as conquistas e os
1
96
Tecnologias da Comunicação e Informação.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 93-101, 2018
avanços percebidos nos contextos em que estão atuando. A implementação de
políticas que respaldam legalmente as ações das instituições escolares é um passo
importante, mas não determina o sucesso da proposta; é preciso que elas sejam
socializadas e entendidas pela sociedade e efetivadas pela escola. A mobilização de
novos saberes para se atuar no contexto da escola contemporânea é um aspecto
fundamental para que se alcance o objetivo de atender a todos com qualidade,
com respeito às diferenças, com igualdade de oportunidades, princípios básicos
que caracterizam a verdadeira educação inclusiva.
A escola comum se torna inclusiva quando reconhece as diferenças dos
alunos diante do processo educativo e busca a participação e o progresso de todos, adotando novas práticas pedagógicas (BRASIL, 2007). Para que a proposta
da educação inclusiva possa se concretizar, faz-se necessário além da qualificação
constante dos profissionais da área, o desenvolvimento de novos saberes e a redefinição das práticas educacionais para que estejam mais adequadas às necessidades
dos alunos e às exigências da contemporaneidade.
As transformações necessárias por parte da escola envolvem mudanças
arquitetônicas, curriculares, pedagógicas e atitudinais. Do professor espera-se
qualificação profissional constante, reestruturação de conceitos e novas práticas
pedagógicas. Isso porque a complexidade das relações estabelecidas em âmbito
educacional exige que o professor construa múltiplos saberes que se revelam cada
vez mais diversificados e necessários. Saberes que vão desde o conhecimento científico da área em que atua, à novas metodologias de ensino, recursos e estratégias
adequados à faixa etária, nível de desenvolvimento e necessidades dos alunos, ou
seja, espera-se que o professor adquira competências que favoreçam sua atuação
nos diferentes ambientes em que estiver atuando.
Quando se fala na necessidade de adquirir novos conhecimentos não se
pode desconsiderar o potencial das novas tecnologias e sua estreita relação com a
educação, com a aprendizagem e com o desenvolvimento de todos os envolvidos.
De acordo com Freitas (2015) a atuação pedagógica voltada para a promoção do
processo ensino-aprendizagem com a presença das tecnologias digitais pode promover tanto o desenvolvimento dos docentes quanto dos estudantes. Ainda segundo a autora, o foco não deve estar no instrumento propriamente dito, mas no que
ele possibilita ao sujeito. Assim, de nada adianta termos à disposição uma gama de
recursos tecnológicos se a escola não souber utilizá-los em benefício de seus alunos.
A inclusão de alunos com deficiência auditiva é um grande desafio para as
unidades escolares, pois além das especificidades desse grupo, ainda existe a falta
de comunicação entre os alunos e o ambiente no qual estão inseridos. O que se
percebe em algumas salas de aulas é a segregação desses alunos perante os demais,
devido à ausência de comunicação. Tentando amenizar ou superar a barreira imposta pela falta de uma língua compartilhada, inúmeros recursos tecnológicos foram criados e se bem utilizados podem trazer significativos benefícios aos usuários.
Dentro dos recursos tecnológicos que facilitam a acessibilidade das pessoas com deficiência auditiva encontra-se dispositivos que ajudam o professor e o
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 93-101, 2018
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aluno a interagirem melhor, como por exemplo, os aplicativos gratuitos de Língua de Sinais que contribuem para a comunicação entre surdos e ouvintes. Dentre
os principais aplicativos estão o ProDeaf e o Hand Talk.
O ProDeaf consiste em um aplicativo de tradução de texto e voz da língua
portuguesa para a língua brasileira de sinais com o objetivo de tornar possível a
comunicação entre surdos e ouvintes. Esse aplicativo está disponível gratuitamente e pode ser baixado em celulares e tabletes.
O Hand Talk é outro aplicativo que oferece a ajuda de um intérprete
virtual para levar acessibilidade em Libras para qualquer lugar. É uma ferramenta
de uso personalizado que converte textos, imagens e áudio para Língua de Sinais
gratuitamente. Ele torna possível a tradução da foto de uma placa, por exemplo.
Foi eleito pela ONU (Organização das Nações Unidas) como o melhor aplicativo
social do mundo.
Existe também o Uni Libras, um dicionário com índice em Libras, desenvolvido especialmente para pessoas com deficiência auditiva, ele permite que
o usuário encontre palavras através da língua brasileira de sinais obtendo vídeos,
fotos e palavras em português, além de oferecer opções de busca na internet, auxiliando na sua comunicação em momentos específicos.
Resultado de uma parceria entre o Ministério do Planejamento (MP), por
meio da Secretaria de Tecnologia da Informação (STI) e a Universidade Federal
da Paraíba (UFPB), a Suíte VLibras consiste em um conjunto de ferramentas
computacionais de código aberto, responsável por traduzir conteúdos digitais
(texto, áudio e vídeo) para a Língua Brasileira de Sinais, tornando computadores,
dispositivos móveis e plataformas Web acessíveis para pessoas surdas. É possível
utilizar essas ferramentas tanto no computador Desktop quanto em smartphones
e tablets; os interessados em utilizar as ferramentas podem baixar os aplicativos
gratuitamente na Google Play e na Apple Store. Ao acessar o link: http://vlibras.
gov.br as pessoas além de baixarem, gratuitamente o VLibras, terão informações
detalhadas sobre como utilizar essa ferramenta.
Com a utilização do VLibras os surdos reduzem as barreiras de comunicação na web. A Suíte VLibras possui atualmente um dicionário o WikiLibras
com mais de 11 mil termos que pode ser ampliado e aperfeiçoado pelas pessoas
com deficiência auditiva. Ele é uma ferramenta que permite aos usuários colaborarem com a construção do dicionário em Libras. Com este recurso, os surdos
podem ensinar Ícaro, o avatar do VLibras, a fazer um sinal e corrigir outro que,
por ventura, esteja errado.
Em relação aos benefícios oportunizados pelo desenvolvimento tecnológico destaca-se para a comunidade surda a criação da TV INES, a primeira
emissora para surdos, totalmente sinalizada. A TV INES foi criada pelo Instituto
Nacional de Educação para Surdos (INES) e tem como objetivo atender aos
usuários da língua de sinais do Brasil, por isso oferece toda sua programação em
LIBRAS. A emissora2 é online e atende a diferentes públicos em sua programação, desde o infantil até o adulto.
2
98
O site oficial da emissora é http://www.tvines.com.br/.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 93-101, 2018
Um recurso tecnológico que traz grandes benefícios para a pessoa com
perda auditiva é o Aparelho de Amplificação Sonora Individual – AASI; é um
aparelho auditivo que consiste em um mini sistema de amplificação. O aparelho é
desenvolvido e adaptado para se adequar à situação auditiva de cada pessoa. Isso
se deve ao fato de cada pessoa ter uma necessidade individual diferente da outra.
Outro equipamento muito importante para a acessibilidade de quem
apresenta perda auditiva é o Sistema de Frequência Modulada (Sistema FM).
Trata-se de um dispositivo eletrônico de tecnologia assistiva com o objetivo de
melhorar por meios eletrônicos a eficiência do indivíduo para receber e ouvir a
mensagem falada, independente da distância entre fonte sonora e ouvinte, presença de ruído e acústica do ambiente.
Em sala de aula, o sistema de frequência modulada (FM) filtra a voz do
professor e elimina os ruídos do ambiente, de maneira a melhorar a qualidade do
som para os alunos que usam aparelhos de amplificação sonora ou implante coclear. Na prática, o uso desse sistema funciona da seguinte forma: o professor usa um
pequeno microfone em seu pescoço e o aluno acrescenta uma peça no aparelho
que já utiliza. O som ambiente deixa de ser captado, dando ênfase exclusiva à voz
do professor. Isso permite que os alunos com perda auditiva driblem os ruídos e
tenham mais facilidade para ouvir o que o professor diz.
Tem-se também como recurso tecnológico o Implante Coclear que consiste em um aparelho implantado cirurgicamente na orelha, capaz de estimular
diretamente o nervo auditivo, causando sensações sonoras.
Freitas (2015) afirma ser importante olharmos as tecnologias digitais
pensando na variedade de possibilidades abertas com o desenvolvimento dos novos telefones celulares, smartfones, ipad, ipod, tablets, que por possibilitarem acesso
à internet aumentam a capacidade comunicacional entre as pessoas. Considerando ser a comunicação um dos principais problemas enfrentados pela pessoa com
deficiência auditiva, entende-se que tais recursos assumem um papel muito importante no processo de aprendizagem e socialização dessas pessoas. Porém, sabemos que somente os recursos tecnológicos não são suficientes para suprir todas as
necessidades educacionais e sociais dos sujeitos.
Diante da realidade da educação contemporânea que revela desafios provocados pelo advento da inclusão e as inovações tecnológicas, ressalta-se um saber
fundamental constitutivo de todo professor: a sensibilidade. “A aquisição da sensibilidade relativa às diferenças entre os alunos constitui uma das principais características do trabalho docente” (TARDIF, 2012, p. 267). O professor que atua no
contexto da educação inclusiva precisa demonstrar disposição interna para conhecer as necessidades de seus alunos, valorizar suas singularidades e estar disposto a
acolher as diferenças e não simplesmente aceita-las por uma imposição do sistema.
A proposta de uma prática pedagógica inovadora precisa vir impregnada
de sensibilidade. Uma sensibilidade que transforme a aceitação em acolhimento,
que aponte caminhos plurais para as especificidades e singularidades presentes
em sala de aula, uma sensibilidade capaz de mobilizar os diversos saberes que
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 93-101, 2018
99
os docentes constroem ao longo de sua trajetória pessoal e profissional e que se
constituirão em elementos fundamentais para a humanização da educação e consolidação da inclusão.
Considerações finais
Ao longo da história a concepção que temos de homem, de educação, de
deficiência foi se transformando de acordo com o contexto, devido à influência de
legislações específicas e políticas públicas voltadas para a melhoria da qualidade da
educação. Essas mudanças influenciaram no atual conceito de educação inclusiva
que está sendo disseminado e implantado em todo país.
Ao abordar a inclusão é inevitável refletir sobre a necessidade de práticas
educacionais voltadas para os indivíduos que, por séculos, ficaram invisíveis perante a sociedade e as políticas públicas voltadas para a educação. Por muito tempo, as pessoas com deficiência foram obrigadas a frequentar escolas especiais ou
se adaptar ao ambiente escolar, tendo o direito à educação de qualidade previsto
desde a Constituição Federal (1988) negligenciado.
A proposta vigente de um sistema educacional inclusivo está diretamente
relacionada à necessidade da escola preparar-se para acolher e valorizar a diferença que constitui os indivíduos presentes na sala de aula. É preciso investir na
formação continuada dos professores, estimulando momentos de reflexão sobre a
própria prática para que os docentes tenham consciência da função social de seu
trabalho e construam novas concepções sobre a aprendizagem, sobre a educação,
por meio da mobilização de saberes plurais e heterogêneos que levem em consideração as especificidades e necessidades presentes no contexto educacional.
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dezembro de 2016.
100
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 93-101, 2018
DECLARAÇÃO DE SALAMANCA. 1994. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/
seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf. Acesso em: maio 2017.
FREITAS, M. T. A. Tecnologias digitais: cognição e aprendizagem. In: 37a Reunião
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TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. 14. ed. Petrópolis, RJ: Vozes,
2012.
- Vivian Zerbinatti da Fonseca Kikuichi
Universidade Federal do Triângulo Mineiro
vivian.zerbinatti@uberabadigital.com.br
Currículo: http://lattes.cnpq.br/6346755982382415
- Florence Alves Pereira de Queiroz
Universidade Federal do Triângulo Mineiro
florence.apqueiroz@gmail.com
Currículo: http://lattes.cnpq.br/7292744303107353
101
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 93-101, 2018
Aprendendo com o Fred: Jogo didático e
suas aplicações
MOTTA, Frederico Martins
OLIVEIRA, Camila Tenório Freitas de
SANTOS, Rafael Alves dos
Resumo: Os recursos tecnológicos têm grande potencial de uso nas aulas em geral, sobretudo, no uso de alternativas didáticas para a realização de tais, fomentando assim o
interesse dos alunos e de professores. Dentre os recursos, destaca-se aqui o jogo didático,
visto que este proporciona atração, afinidade, desejo e conhecimento por parte dos alunos.
Defende-se aqui que o jogo, aliado à Geopolítica, contribui de maneira significativa para
a formação de cidadãos críticos. O presente artigo irá demonstrar o desenvolvimento do
jogo “Aprendendo com o Fred”, que foi desenvolvido no período de aulas da disciplina de
Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação na Educação: Formação de Professores, do curso de Mestrado em Educação, na Universidade Federal do Triângulo Mineiro.
Palavras chave: Recursos Tecnológicos; Jogo Didático; Educação.
Abstract: Technological resources have great potential for use in general classes, above all,
in the use of didactic alternatives for the accomplishment of such, thus fostering the interest of students and teachers. Among the resources, we highlight the didactic game, since
this provides attraction, affinity, desire and knowledge on the part of the students. It is
argued here that the game, allied to Geopolitics, contributes significantly to the formation
of critical citizens. This article will demonstrate the development of the game “Learning
with Fred”, which was developed during the period of classes of the Digital Technologies
of Information and Communication in Education: Teacher Training, Master’s Degree in
Education, Federal University of Mining Triangle.
Keywords: Technology Resources; Didactic Game; Education.
1. Introdução
Falar sobre tecnologias tornou-se algo tão natural que é inevitável pensar
na educação sem o seu uso. Segundo Ponte (2000, p. 64), as tecnologias “representam uma força determinante do processo de mudança social, surgindo como a
trave-mestra de um novo tipo de sociedade, a sociedade da informação”. A conEvidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 103-112, 2018
103
figuração que se têm hoje é a de crianças e jovens voltados, exclusivamente, para
uma era digital. Trata-se da Geração Z, ou Geração Internet, formada por indivíduos conectados constantemente a dispositivos portáteis com acesso à internet.
“Os jovens da Geração Internet são mais espertos, rápidos e tolerantes quanto à
diversidade do que seus predecessores” (TAPSCOTT, 2010, p. 15). [...] Este autor ainda diz que “A conclusão é a seguinte: se você entender a Geração Internet,
entenderá o futuro. Também compreenderá como as nossas instituições e a nossa
sociedade precisam mudar hoje” (TAPSCOTT, 2010, p. 21).
A partir da inclusão digital difundida na sociedade, a escola tem pela
frente o desafio de se apropriar e moldar-se frente às tecnologias. Todavia, embora
o uso das tecnologias na educação pode ser de grande valor para construção de
saberes educacionais, ele exige alguns cuidados quanto a elaboração de conteúdo
a ser estudados por parte do professor. Valente (2003, p.19) retrata que o computador, por exemplo, tendo em vista suas facilidades técnicas, permite ampla
diversidade de atividades e possibilita a exploração ilimitada de ações pedagógicas
a serem realizadas por professores e alunos. Entretanto, tais ações podem ou não
estar contribuindo para o processo de construção de conhecimento dos alunos.
Eles poderão “estar fazendo coisas fantásticas, porém o conhecimento usado nessas atividades pode ser o mesmo que o exigido em uma outra atividade menos
espetacular. O produto pode ser sofisticado, mas não ser efetivo na construção de
novos conhecimentos”.
Deste modo, Valente (2005, p.23) observa que:
[...] embora as sofisticações tecnológicas sejam ainda maiores,
existem dois aspectos que devem ser observados na implantação
dessas tecnologias na educação. Primeiro, o domínio do técnico e
do pedagógico não deve acontecer de modo estanque, um separado
do outro. É irrealista pensar em primeiro ser um especialista
em informática ou em mídia digital para depois tirar proveito
desse conhecimento nas atividades pedagógicas. O melhor é
quando os conhecimentos técnicos e pedagógicos crescem juntos,
simultaneamente, um demandando novas idéias do outro. [...] O
segundo aspecto diz respeito à especificidade de cada tecnologia
com relação às aplicações pedagógicas. O educador deve conhecer o
que cada uma dessas facilidades tecnológicas tem a oferecer e como
pode ser explorada em diferentes situações educacionais.
Nesse aspecto, o professor carece em desenvolver diferentes estratégias
na sua prática docente, buscando interagir com novas formas de ensino. É fundamental que o professor, tanto tenha conhecimento das técnicas de informática
utilizadas para compor essa atividade, quanto tenha conhecimento das diferentes
modalidades de uso da informática na educação. Ainda, é preciso que o professor se posicione como um parceiro e não mais como “detentor do monopólio
do saber”. É preciso que ele “encaminhe e oriente o aluno diante das múltiplas
possibilidades”, independente se vai ou não utilizar tecnologias em suas aulas
104
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 103-112, 2018
(KENSKI, 2003). Segundo Levy (1999), pela primeira vez na história da humanidade, competências adquiridas no início da vida profissional de um docente estarão obsoletas no final de sua carreira, devido ao rápido desenvolvimento tecnológico. Tendo isto em vista, nota-se a necessidade de contribuir na formação dos
educadores possibilitando a apresentação de novos métodos de ensino e aliando
o conhecimento teórico com as novas tecnologias da informação e comunicação.
Silva (2001) relata que estamos em uma geração onde o Ministro da Educação Paulo Renato Souza veio a público para falar do “efeito chatice” e aventar
suas causas:
i. A Prevalência Do Modelo Tradicional De Ensino: o professor se
sente o todo-poderoso, repete conceitos e não sabe interagir com os alunos. Ainda, os conteúdos estão distantes da realidade e devem ser decorados e cobrados em provas;
ii. A Oferta Atual De Informação E Conhecimento: é cada vez maior
e melhor fora da sala de aula, graças aos novos recursos tecnológicos, em
especial a internet e a multimídia interativa. Ou seja, é quase impossível
competir com a era tecnológica: o professor possui em sua frente uma
barreira maior do que o seu conhecimento teórico. Ele agora deve buscar
meios para suprimir essa “chatice” e conseguir retomar seu espaço dentro
da sala de aula, aliando sempre sua bagagem teórica com novos métodos
de ensino.
De acordo com as orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais (2002, p. 9), uma formação assim,
[...] exige métodos de aprendizado compatíveis, ou seja, condições
efetivas para que os alunos possam comunicar-se e argumentar,
deparar-se com problemas, compreendê-los e de enfrentá-los,
participar de um convívio social que lhes dê oportunidade de se
realizarem como cidadãos, fazerem escolhas e proposições, tomarem
gosto pelo conhecimento, aprenderem a aprender.
Ou seja, de modo a contribuir para a efetividade do ensino e da aprendizagem, faz-se necessário que os professores se mantenham atualizados, buscando
evidenciar a busca pelo conhecimento por parte dos alunos a partir de objetos de
interesse dos mesmos.
Frente à breve discussão sobre a importância dos recursos tecnológicos
aliados às metodologias dos professores, destacam-se aqui os Jogos Digitais. Estes, segundo Gee (2009), se pensados na educação, incorporam princípios de
aprendizagem que: incentivam a sociabilidade e interação com os demais; encoraja os alunos a serem os próprios autores da aprendizagem; abre espaço para o
risco, independente se houver, ou não, fracasso, de modo a explorar diferentes
perspectivas e caminhos; entre outros. A intenção não é transformar a sala de
aula em um espaço onde os alunos podem ficar jogando e se divertindo um turno
inteiro, mas criar um espaço onde os professores possam identificar “questões
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 103-112, 2018
105
éticas, políticas, ideológicas, culturais, etc. que podem ser exploradas e discutidas
com os discentes, ouvindo e compreendendo as relações que os jogadores, nossos
alunos, estabelecem com estas mídias” (ALVES, 2008, p. 8). Ou seja, onde os
professores e os alunos tenham oportunidade de compreender esta nova alternativa para o processo de ensino e aprendizagem.
Nesta perspectiva, pensou-se na programação e desenvolvimento do
game Aprendendo Com o Fred, cujo objetivo é abordar sobre Geopolítica, com
base nas Delações da Odebrecht por meio de um modelo de game baseado no
“Super Trunfo”.
2. Desenvolvimento
Partindo do pressuposto de que a formação do professor está intimamente relacionada ao futuro da educação, optou-se pela aplicação do jogo didático
durante a realização das aulas da disciplina Tecnologias Digitais de Informação e
Comunicação na Educação: Formação de Professores, do Mestrado em educação,
da Universidade Federal do triângulo Mineiro, para professores e educadores de
diversas áreas do conhecimento, visando uma demonstração de eventuais alternativas as quais os professores podem e devem se amparar durante o desenvolvimento profissional.
O jogo didático, caracterizado como de atividade lúdica facilitadora da
apropriação do conhecimento, tem feito com que os jogos venham se destacando
no âmbito acadêmico. Desta forma, os jogos educativos têm sido mais requisitados pelos docentes que buscam aprimorar seus recursos didáticos. Ou seja, a
utilização de um jogo inédito, correlato a temas encontrados na sala de aula, é
importante para o desenvolvimento do aluno e das aulas ministradas pelos professores. Segundo (GEE, 2009, p 171) a escola costuma oferecer muito menos
espaço para o risco, a exploração e o insucesso e por isso, acaba delimitando o
desenvolvimento crítico dos alunos.
2.1 Metodologia
106
O jogo didático Aprendendo Com o Fred foi desenvolvido por uma professora de Matemática, um professor de Geografia e um Analista de Sistema, que
fizeram uso de um trabalho compartilhado para se chegar a conclusão da elaboração do game.
O jogo se deu a partir de um pedido da professora que ministrava a disciplina, pois ele contribuiria para trabalhar na prática o conteúdo teórico que estava
sendo discutido, Tecnologias Digitais na Formação de Professores. Nesta perspectiva, o tempo para a elaboração, discussão, programação e desenvolvimento do
jogo didático foi de 30 dias.
De modo a situar os jogadores ao que está ocorrendo na política brasileira e incentivá-los a discutir sobre a corrupção e eleições no Brasil, pensou-se em
abordar sobre as Delações da Odebrecht, pois esta vem sendo considerada por
todos os veículos de mídia o maior escândalo de corrupção do Brasil revelado pela
Operação Lava Jato.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 103-112, 2018
Usualmente, o tradicional jogo “Super Trunfo” é um jogo de cartas colecionáveis, indicado para a faixa etária a partir de 7 anos, cujos elementos explorados num total de 32 cartas com ilustrações e informações a respeito de determinado tema incentivam os participantes a analisarem e escolherem as características
que melhor atendam a rodada, ou seja, que seja um “Super Trunfo” da rodada.
Não é um jogo que exige sorte, mas sim conhecimento a respeito de determinado
tema. Exemplificando, um “Super Trunfo” de carros sugere que o jogador conheça a respeito do peso, velocidade, frequência do motor, cilindradas, entre outros.
Assim, em cada rodada, o jogador saberá em qual das categorias terá maior chance de ser o “Super Trunfo”, ou seja, de ter a categoria mais forte em mãos.
Seguindo esta lógica, o jogo Aprendendo Com o Fred foi pensado. Inicialmente, foram realizadas pesquisas onlines de modo a fazer um levantamento da
quantidade de pessoas envolvidas. Como base, utilizamos o seguinte site <http://
especiais.g1.globo.com/politica/2017/lava-jato/delacao-da-odebrecht/>,
pois
este desenvolveu uma plataforma completa e atualizada sobre as delações. Visto
que o número ultrapassa a quantidade original de cartas, considerou-se somente
nomes de políticos maior veiculados pelas mídias, resultando num total de 24.
Para os atributos, após análise completa e testes entre os desenvolvedores,
definiu-se as seguintes características: quantidade de delatores que mencionaram
o político, tempo do último ou atual mandato e quantidade de votos obtidos em
sua última eleição. Deste modo, os jogadores têm a oportunidade de se posicionar
frente às discussões que envolvem tais políticos quando o assunto é corrupção.
Vale a ressalva de que, a título de informação, as cartas indicam o cargo de cada
político.
Após levantar todas as informações necessárias para a programação do
jogo, optou-se pela utilização do sistema Android, visto que este possui um sistema de programação simples e, principalmente, gratuito. A seguir, encontram-se
as características para a programação:
• IDE – Integrated Development Environment (Ambiente de Desenvolvimento Integrado – AndroidStudio);
• Linguagem de Programação Java;
• Linguagem de Layouts XML;
• Tempo Para Desenvolvimento: 5 dias.
107
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 103-112, 2018
Figura 1: Plataforma Aprendendo Com o Fred
Fonte: Arquivo Pessoal, 2017.
O jogo, por ser contextualizado, inovador, atrativo, lúdico e criativo, pode
ser adaptado para qualquer conteúdo escolar. Ele favorece o ensino interdisciplinar e contextualiza as informações trabalhadas em sala de aula, além de explorar a
ludicidade considerada por muitos estudiosos como uma condição essencial para
a aprendizagem significativa. Mariotti define a atividade lúdica como expressão de
liberdade, de vida, de sentimentos. Para o autor, não há possibilidade do indivíduo desenvolver sua inteligência se sua liberdade e afetividade para expressar seu
mundo interior forem cerceadas. A atividade lúdica é “a base do que mais tarde
será a capacidade de pensamento” (MARIOTTI, 2004, p. 36). Antunes (2014)
corrobora com o autor ao afirmar que a atividade com intenção lúdica estimula a
alegria e a flexibilidade de pensamento, provoca sensação de prazer e motivação.
2.2 Jogabilidade: Aprendendo com o Fred
108
“Aprendendo com o Fred” é um jogo de cartas digital offline onde o ganhador é aquele que possuir o maior número de vitórias em rodadas. Em cada
rodada, ganha quem tiver em mãos uma característica (representada por números) superior à do seu adversário. Para a realização do jogo, é indicado que o
participante possua conhecimentos básicos sobre a política atual brasileira, especificamente a Delação da Odebrecht.
Os requisitos exigidos para o jogo são: aparelho que rode sistema Android e conexão com internet (apenas para download do jogo). Embora o jogo
tenha sido desenvolvido para jogar em duplas, é possível também formar grupos
para jogar em conjunto.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 103-112, 2018
Figura 2: Jogo no Android (Antes e Depois)
Fonte: Arquivo Pessoal, 2017.
Após a instalação, os jogadores deverão decidir quem jogará com o Deck1
e Deck2, respectivamente. É importante ressaltar aqui que os Decks foram pensados de maneira a balancear as características presentes nas cartas. Ou seja, não tem
um conjunto melhor que o outro: ambos competem de igual para igual.
De modo a auxiliar nas aulas de geopolítica, o jogo oferece a oportunidade de conferir as cartas de cada Deck antes de iniciar a partida. Ou seja, o professor
(mediador) poderá abordar sobre o conteúdo previamente utilizando as cartas,
que por sua vez, contém informações sobre determinado político. Deste modo, os
alunos (jogadores) terão uma base maior para analisar cada caraterística e escolher
a que melhor os convém na rodada.
Antes de iniciar o jogo, os jogadores deverão definir quem irá começar,
ou seja, quem será o Jogador da Rodada. Todas as rodadas funcionam da mesma
forma: sem revelar as cartas em mãos, o Jogador da Rodada define um atributo
(uma característica) e os dois revelam em voz alta o valor correspondente a sua
carta. Quem tiver o maior valor, o “Super Trunfo”, ganha a rodada. O Jogador da
Rodada será sempre quem venceu a rodada anterior, ou seja, caso o jogador que
iniciou tenha ganhado a rodada, ele continuará definindo o atributo da vez. Caso
contrário, a rodada será comandada pelo outro jogador. Vale ressaltar que em caso
de empate, será computado 1 ponto para cada jogador.
109
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 103-112, 2018
Tendo em vista que o jogo ainda está em versão de testes, a contagem de
pontos ainda não foi programada pelo sistema. Deste modo, a mesma deverá ser
realizada manualmente pelos jogadores. Indica-se, neste momento, que para cada
partida, se defina um árbitro, a fim de realizar a contagem de pontos e garantir as
regras do jogo por ambas as partes.
Figura 3: Deck Com as Cartas/Exemplo de Carta do Jogo
Fonte: Arquivo Pessoal, 2017.
Ao término da partida, indica-se que os jogadores troquem os Decks e
joguem novamente, pois assim ambos ficarão familiarizados com o assunto envolvido e o jogo em si.
Aprendendo com o Fred traz a possibilidade de discussão a respeito do
cenário político nacional a partir de uma atividade lúdica. Os alunos (jogadores)
estarão descontraídos e informados sobre o motivo de cassação de cada político
envolvido no processo. Desta forma, poderão desenvolver sua autocriticidade.
Considerações finais
110
A partir de cada etapa do desenvolvimento do jogo didático, ficou mais
evidente que a utilização dos recursos tecnológicos por parte dos professores na
sua metodologia pode influenciar no processo de ensino e aprendizagem. Além
disto, auxilia no desenvolvimento profissional e avanço na qualidade educacional,
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 103-112, 2018
estreitando laços entre a prática docente e a realidade do aluno e acompanhando
os avanços tecnológicos cotidianos.
Entende-se também que todos os processos do projeto foram benéficos
para a formação dos autores, visto que a quantidade de conhecimento obtida durante as pesquisas será de suma importância para a formação dos mesmos como
cidadãos.
Espera-se dar prosseguimento a este projeto, pois há confiança de que
muito pode ser explorado a partir de um aperfeiçoamento no app, este proveniente das ideias que virão dos jogares em futuras aplicações do jogo em salas de aula.
Referências
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MEC. Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais. Geografia (5aa
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internet estão mudando tudo, das empresas aos governos. Rio de Janeiro: Agir Negócios,
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VALENTE, J. Pesquisa, comunicação e aprendizagem com o computador. Série
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VALENTE, J. A. Pesquisa, comunicação e aprendizagem com o computador. O papel
do computador no processo ensino-aprendizagem. In: M. E. B. Almeida e J. M. Moran
(org.), Integração das Tecnologias na Educação. Brasília: Ministério da Educação, Seed,
2005. P. 22-31.
111
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 103-112, 2018
- Frederico Martins Motta
Currículo: http://lattes.cnpq.br/9751968258673530
- Camila Tenório Freitas de Oliveira
Currículo: http://lattes.cnpq.br/6319171905942362
- Rafael Alves dos Santos
Currículo:
112
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 103-112, 2018
As possíveis abordagens sobre corpo/
corporeidade nos programas de PósGraduação em Educação do Estado de
São Paulo: o estado da Arte
TANNÚS, Fernanda Machain Silva1
LIMA, Lucas de Oliveira2
CAMPOS, Marcus Vinicius Simões de3
MOREIRA, Wagner Wey4
Resumo: O presente trabalho é um estudo de revisão, do tipo estado da arte, que analisa
a produção acadêmica sobre as temáticas corpo e corporeidade nos programas de pós-graduação em Educação do estado de São Paulo, de 2000 a agosto de 2017. Para o desenvolvimento da investigação dividiu-se o processo em dois momentos: o primeiro se
caracterizou pelo levantamento dos programas de pós-graduação em Educação do estado
de São Paulo, segundo os dados da Plataforma Sucupira; o segundo momento identificou
as dissertações e teses sobre a temática corpo e corporeidade nos sites do próprio programa. Bibliotecas digitais e acervos de cada programa também foram utilizados no processo
de coleta. A análise do artigo permitiu concluir que muito pouco se tem produzido, comparado a influência que a corporeidade possui no processo de formação humana em todas
as áreas do conhecimento. Estas ainda são incipientes e carecem de um fortalecimento
reflexivo e metodológico.
Palavras chave: Corpo; Corporeidade; Estado da arte; Pesquisa.
Abstract: The present work is a review, state-of-the-art, that analyzes the academic production on the body and corporal themes in the postgraduate programs in Education of
1
Mestre em Educação Física pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro/UFTM.
Professora de Dança na Academia Beth Dorça/Uberaba/MG. – email - fernandamtannus@hotmail.com
2
Mestre em Educação Física pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro/UFTM.
Preparador Físico da Associação Atlética Ponte Preta/Campinas. – email - lucasolima7@gmail.com
3
Mestre em Educação pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro/UFTM. Doutorando
na Faculdade de Educação Física da Universidade Estadual de Campinas/UNICAMP – email –
camposmvs@gmail.com
4
Doutor em Psicologia da Educação pela Universidade Estadual de Campinas/UNICAMP.
Professor dos cursos de graduação e de Pós-graduação em Educação e em Educação Fisica na
Universidade Federal do Triângulo Mineiro/UFTM. – email – weymoreira@uol.com.br
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 113-126, 2018
113
the state of São Paulo, from 2000 to August 2017. The research was divided into two
phases: the first one was characterized by the survey of postgraduate programs in Education in the state of São Paulo, according to the data of the Sucupira Platform; the second
moment identified the dissertations and theses on the theme body and corporeality in the
website of each program. Digital libraries and collections of each program were also used
in the data collection process. The analysis in this article allowed to conclude that very
little has been produced, compared to the influence that corporeality has in the process of
human formation in all areas of knowledge. These are still incipient and require a reflexive
and methodological strengthening.
Keywords: Body; Corporeality; State-of-the-art; Research.
1. Introdução
As temáticas corpo e educação vem sendo recorrentes nas pesquisas científicas e nas problemáticas do foco educacional desde o início do século XXI (BEZERRA; MOREIRA, 2013). Este panorama deve-se especialmente às reflexões
originadas no final do século passado, as quais concebem o corpo a partir de uma
dimensão holística da educação, para a qual o ato educativo é uma experiência que
se dá através do corpo e da sua relação com o conhecimento para a compreensão
de sua existência (FREIRE; DANTAS, 2012).
No ambiente escolar percebemos que apesar deste esforço o corpo ainda
é tratado numa visão disciplinadora, que restringe os movimentos em prol da eficiência e do controle (FREIRE, 1992). O espaço escolar deve proporcionar liberdade de movimentos e incentivar a expressividade corporal (RIOS; MOREIRA,
2015). O professor exerce um importante papel no contexto educacional, sendo
um agente norteador responsável por promover o conhecimento, incentivar seus
alunos a aprender pelo corpo, tornando-os sujeitos críticos, responsáveis pela sua
própria história e existência. Considerar a sua formação, assim como o que é
produzido, seja por ele ou pelas universidades, torna-se relevante para compreendermos as relações existentes entre o que é construído e as ações do professor no
ato educativo.
Optamos pela temática corpo e corporeidade na educação pelas possibilidades que esta nos proporciona na ressignificação do corpo nos processos educacionais, pela pouca atenção que lhe é reservada dentro das pesquisas em educação
no território nacional, além de complementar os levantamentos já feitos por Rios,
Moreira e Resende (2015), que pesquisaram o corpo na educação e sua relação
com o ensino aprendizagem, utilizando as teses e dissertações produzidas entre
2006 e 2013 na BDTD (Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações),
bem como Bezerra e Moreira (2013) que trouxeram o corpo no processo de ensino aprendizagem dentro dos artigos encontrados no banco de dados da SciELO
(Scientific Electronic Library Online) entre os anos de 2008 e 2012.
Elegemos apenas o Estado de São Paulo em virtude da sua representatividade dentro do cenário acadêmico nacional e por este estudo fazer parte de
114
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 113-126, 2018
uma pesquisa maior desenvolvida pelo grupo de estudos NUCORPO (Núcleo de
Estudos e Pesquisas em Corporeidade e Pedagogia do Movimento) do programa
de pós-graduação em Educação Física da UFTM (Universidade Federal do Triângulo Mineiro). Buscando identificar possíveis lacunas e caracterizar as produções
a respeito da temática, objetivamos identificar e analisar as possíveis abordagens
sobre o corpo presente nas publicações dos programas de pós-graduação em Educação do estado de São Paulo entre o período temporal de 2000 a agosto de 2017.
2. A pesquisa do Estado da Arte sober corpo e corporeidade
Caminhos do levantamento
O presente trabalho é um estudo de revisão, do tipo estado da arte, que
analisa a produção acadêmica nos programas de pós-graduação em Educação do
estado de São Paulo, de 2000 a agosto de 2017. As pesquisas do tipo estado da
arte podem ser ferramentas importantes na contribuição da problematização dos
estudos sobre um determinado tema, pois apresentam um balanço daquilo que
foi produzido em um tempo e lugar específico, identificando como as produções
estão sendo sistematizadas e disseminadas, além de apresentar possíveis meios de
desenvolver e fomentar ferramentas que sustentem as necessidades encontradas
acerca do tópico investigado.
Para o desenvolvimento da investigação dividiu-se o processo em dois
momentos: o primeiro se caracterizou pelo levantamento dos programas de pós-graduação em Educação do estado de São Paulo, com base nos dados da Plataforma Sucupira; o segundo momento identificou as dissertações e teses sobre a
temática corpo e corporeidade nos sites dos próprios programas. Quando não encontrado nestes locais estendemos a pesquisa para às bibliotecas digitais e acervos
de cada programa. Como critério de inclusão do material, elegeu-se os seguintes
itens: 1. Publicação entre 2000 e agosto de 2017; 2. Deter a palavra corpo e/ou
corporeidade em seu título ou palavra-chave; 3. Disponibilizar o trabalho integralmente online.
A opção por utilizar um banco de dados virtual se justifica pela possibilidade de acesso as teses e dissertações na íntegra, pela facilidade de acesso, por permitir maior abrangência das pesquisas, desde as mais antigas até as mais recentes,
e por ser disponível a qualquer profissional da área (CARBINATTO et al., 2016).
Existem 130 universidades com programas de pós-graduação em Educação (130 de mestrado, 74 de doutorado e 47 de mestrado profissional). Destas,
16 possuem apenas programas de mestrado profissional, contabilizando 114 universidades com mestrado acadêmico. Das 114 universidades, 18 são do estado de
São Paulo e dentro das 18 existem 25 programas de mestrado e 19 de doutorado
em Educação. Dos 44 programas, 13 possuem estudos sobre o tema investigado.
Destes obtivemos um total de 112 estudos (68 dissertações e 44 teses), dos quais
oito trabalhos foram excluídos por não se relacionarem com o tema corpo e/ou
corporeidade especificamente ou não estarem disponíveis integralmente, resultanEvidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 113-126, 2018
115
do em um total de 104 (62 dissertações e 42 teses) pesquisas analisadas, como
mostra a tabela 1.
Tabela 1. Total de dissertações e teses encontradas na área da Educação
Total de
estudos por
programa
Número de estudos
sobre corpo/
corporeidade
Estudos
excluídos
Frequência
absoluta
Frequência
relativa
Mestrado
7253
68
6
62
0,84%
Doutorado
3296
44
2
42
1,27%
Total
10549
112
8
104
0,97%
Programas
Fonte: coleta de dados 2017.
As 104 pesquisas foram catalogadas e analisadas em dois momentos interligados, mas com características distintas. O primeiro previu o diagnóstico das
dissertações e teses por meio da leitura dos resumos, metodologias, e se necessário
a introdução dos quais foram extraídas informações organizadas em uma planilha
Microsoft Office Excel 13, estas são: 1) Instituição de Ensino Superior (IES); 2.
Título das dissertações e teses; 3. Nome dos autores; 4. Nome dos orientadores; 5. Abordagem do estudo; 6. Ano de publicação. Para Ferreira (2002) optar
apenas pela leitura dos resumos pode limitar o estudo do tipo estado da arte, o
ideal é se apropriar e conhecer todo o material, tendo efetivamente contato com
a construção, desenvolvimento e conclusões das pesquisas, justificando a escolha
pela leitura dos três momentos das dissertações e teses.
O segundo momento se desenvolveu com base no estudo apresentado
por Maldonado et al. (2014) no qual criamos nossas próprias unidades de análise
de acordo com as abordagens apresentadas pelos estudos, em maioria nos objetivos expostos em seus resumos. Decidimos desenvolver nossas próprias unidades
por acreditarmos que estas sustentam com maior fidedignidade a abordagem de
todas as pesquisas, abrangendo cinco campos possíveis de atuação do corpo/corporeidade, como: Corpo e Educação; Corpo e Cultura; Corpo e Artes; Corpo
e Professores; Corpo e Infância. Estas unidades foram criadas de acordo com a
Análise de Conteúdo de Morares (1999). Os procedimentos de coleta, o arquivamento e construção de categorias de análise contou com a participação de todos
os envolvidos na pesquisa, passando por um crivo minucioso de inserção das
dissertações e teses.
Vale salientar que não houve submissão ao Comitê de Ética e Pesquisa
(CEP) e nem assinatura de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)
por se tratar de uma pesquisa online com conteúdo de acesso público e livre.
116
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 113-126, 2018
conhecimento Educação, em relação aos respectivos programas em que as pesquisas
foram desenvolvidas. Classificados em cinco campos possíveis, criados pelos próprios
autores, a saber: Corpo e Educação (aborda o corpo/corporeidade dentro das diversas
3. Resultados
vertentes que envolve a educação e seus processos educacionais em diferentes contextos
A figura 1 e 2 (expostas nas apresentações gráficas) apresentam as dissere ambientes);
e Cultura
(apresenta
o corpo/corporeidade
enquantodentro
veículodacriador,
tações e Corpo
teses com
os campos
de atuação
do corpo/corporeidade
grande
área
de
conhecimento
Educação,
em
relação
aos
respectivos
programas
em
que
construtor e transformador da cultura, adquirindo diferentes funções e possibilidades
nasas
pesquisas foram desenvolvidas. Classificados em cinco campos possíveis, criados
diversas
Corpo ea saber:
Artes Corpo
(discute
o corpo/corporeidade
nas variadas
pelosculturas);
próprios autores,
e Educação
(aborda o corpo/corporeidade
dentro
das
diversas
vertentes
que
envolve
a
educação
e
seus
processos
educaciomanifestações artísticas, como por exemplo, a dança, o circo, a capoeira, etc, adquirindo
nais em diferentes contextos e ambientes); Corpo e Cultura (apresenta o corpo/
papel corporeidade
fundamental enquanto
na formação
e educação
corpo sensível
seja dos alunos
ou
veículo
criador, do
construtor
e transformador
da cultura,
adquirindo
diferentescontextos
funções ee ambientes);
possibilidades
nas ediversas
culturas);
Corpoas e
professores
nos diferentes
Corpo
Professores
(apresenta
Artes (discute o corpo/corporeidade nas variadas manifestações artísticas, como
práticas
professores
dentro
fora adas
escolas,etc,
assim
como as vertentes
da formaçãona
pordos
exemplo,
a dança,
o ecirco,
capoeira,
adquirindo
papel fundamental
formação
e educação
do corpo
seja aluno
dos alunos
ou professores
nos
diferendocente,
estabelecendo
relação
com a sensível
convivência
e professor,
discutindo
como
ela
tes contextos e ambientes); Corpo e Professores (apresenta as práticas dos prose desenvolve e se torna importante no ato educativo); Corpo e Infância (abrange o corpo
fessores dentro e fora das escolas, assim como as vertentes da formação docente,
da criança
perpassando
por diversos
meios e contextos
de discussão).
estabelecendo
relação
com a convivência
aluno possíveis
e professor,
discutindo como ela
se desenvolve e se torna importante no ato educativo); Corpo e Infância (abrange o corpo da criança perpassando por diversos meios e contextos possíveis de
Figura
1. Relação entre as 62 dissertações, os campos de atuação e as IES/Programas
discussão).
que publicaram sobre o tema.
Figura 1: Relação entre as 62 dissertações, os campos de atuação e as IES/Programas que publicaram sobre o tema.
PUC-SP/História, Política e Sociedade (00)
UNINOVE/Educação (02)
USF/Educação (02)
UNIMEP/Educação (04)
UNISO/Educação (05)
USP/Educação (05)
UNICAMP/Educação (23)
1
11
11
2
111
2 2
1 2 1
5
4
1
1 3 1
3 111
3
0
Corpo e Educação (19)
5
Corpo e Artes (16)
13
10
2 1
4
15
20
25
Corpo e Professores (16)
Fonte: coleta de dados 2017.
Fonte: coleta
de dados
2017. - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; UNINOVE - Universidade Nove
Legenda.
PUC-SP
Legenda.
Pontifícia
Universidade São
Católica
de São Paulo;
UNINOVE
- Universidade
Nove dede
Julho;
USF dePUC-SP
Julho; - USF
- Universidade
Francisco;
UNIMEP
- Universidade
Metodista
Piracicaba;
Universidade São Francisco; UNIMEP - Universidade Metodista de Piracicaba; UNISO - Universidade de Sorocaba;
UNISO - Universidade de Sorocaba; USP - Universidade de São Paulo; UNICAMP - Universidade
USP - Universidade de São Paulo; UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas.
Estadual de Campinas.
117
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 113-126, 2018
Figura 2. Relação entre as 42 teses, os campos de atuação e as IES/Programas que
Figura 2: Relação entre as 42 teses, os campos de atuação e as IES/Programas
publicaram sobre o tema.
que publicaram sobre o tema.
1
1 1
1 1 1
1
3
3
UFSCAR/Educação (02)
UNESP/ARA/Educação Escolar (04)
UNICAMP/Educação (24)
0
7
2
3
4
5
Corpo e Educação (12)
Corpo e Artes (05)
Corpo e Cultura (15)
Corpo e Infância (04)
2
10
9
15
2
20
25
Corpo e Professores (06)
Fonte:
coleta
de dados
Fonte:
coleta
de dados
2017. 2017.
Legenda.
PUC-SP
Pontifícia
Universidade
Católica de
São Paulo;
UFSCAR
de São Carlos;
Legenda. PUC-SP - Pontifícia
Universidade
Católica
de São
Paulo;– Universidade
UFSCAR – Federal
Universidade
Federal
UNIMEP - Universidade Metodista de Piracicaba; UNESP/ARA - Universidade Estadual Paulista em Araraquara; USP
de
São
Carlos;
UNIMEP
Universidade
Metodista
de
Piracicaba;
UNESP/ARA
Universidade
Esta- Universidade de São Paulo; UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas.
dual Paulista em Araraquara; USP - Universidade de São Paulo; UNICAMP - Universidade Estadual
de Campinas.
Notamos que as produções sobre corpo/corporeidade diferem entre si, pois para
Notamos que as produções sobre corpo/corporeidade diferem entre si,
as dissertações o campo de atuação com maior número é o Corpo e Educação com 19
pois para as dissertações o campo de atuação com maior número é o Corpo e
pesquisas
(30,6%
de dissertações),
já total
para as
o campo significativamente
Educação
com do
19total
pesquisas
(30,6% do
deteses
dissertações),
já para as teses o
campo
significativamente
maior
é
Corpo
e
Cultura,
com
15
produções
maior é Corpo e Cultura, com 15 produções (35,7% do total de teses). Seguidos do(35,7%
Corpo
do total de teses). Seguidos do Corpo e Artes (16) para as dissertações e Corpo
e eArtes
(16) para
dissertações
e menor
Corpo efrequência
Educação absoluta
(12) parafoi
as para
teses.o A
menorde
Educação
(12)aspara
as teses. A
campo
atuação Corpo
ambos,
com três
dissertações
quatro
teses.
Quanfrequência
absolutae Infância
foi para opara
campo
de atuação
Corpo
e Infância epara
ambos,
com
três
do observamos o universo das instituições de ensino superior percebemos que
dissertações e quatro teses. Quando observamos o universo das instituições de ensino
a Unicamp é a que mais produziu em relação ao tema corpo/corporeidade para
superior
que a Unicamp
é ae 23
quedissertações),
mais produziu
em relação
ao para
temaas
ambos percebemos
os tipos de pesquisas
(24 teses
seguida
da USP
teses
(08)
e
Unesp/Ara
para
as
dissertações
(06).
corpo/corporeidade para ambos os tipos de pesquisas (24 teses e 23 dissertações), seguida
Relacionando os campos com a universidades constatamos que a Unidacamp
USP para
as teses
(08) e Unesp/Ara
as dissertações
(06).
é a única
universidade
com para
a presença
de todos
os campos de atuação em
suas produções
sobre
a temática
para as dissertações
e teses,
Relacionando
os campos
comcorpo/corporeidade,
a universidades constatamos
que a Unicamp
éa
com destaque para Corpo e Artes com 16 dissertações e Corpo e Cultura com
única universidade com a presença de todos os campos de atuação em suas produções
nove teses. Em nenhuma outra universidade houve essa variedade nas abordagens
sobre
a temática
corpo/corporeidade,
para as dissertações
teses, comQuase
destaque
para
discutidas,
talvez
seja pelo maior número
de estudos epresentes.
a metade
em relação
ao total,
de 13 universidades,
47 pesquisas
dissertações
e 24
teCorpo
e Artes com
16 dissertações
e Corpo e Cultura
com nove(23
teses.
Em nenhuma
outra
ses), de 104, foram produzidas na Unicamp, o que representa 45,2% do total.
universidade
variedade naseabordagens
discutidas,
talvez seja
pelo maior
A tabela 2 houve
mostraessa
os orientadores
a quantidade
de orientações
separadas
pelo
tipo do
os camposQuase
de atuação
dasem
pesquisas
produzidas
nauniversidades,
Unicamp que
número
deestudo
estudose presentes.
a metade
relação ao
total, de 13
abordaram o corpo/corporeidade. Só fizeram parte da tabela os orientadores que
47 pesquisas (23 dissertações e 24 teses), de 104, foram produzidas na Unicamp, o que
participaram mais de uma pesquisa, os que dentro dos 17 anos orientaram apenas
representa
do total. A foram
tabela incluídos
2 mostra nesta
os orientadores
um aluno45,2%
de pós-graduação
seleção. e a quantidade de
orientações separadas pelo tipo do estudo e os campos de atuação das pesquisas
118
produzidas na Unicamp que abordaram o corpo/corporeidade. Só fizeram parte da tabela
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 113-126, 2018
Tabela 2: Relação dos orientadores, a quantidade de defesas de mestrado e os
campos de atuação da Unicamp.
Orientador
Campos de Atuação
Dissertações/
Quantidade de defesas
Campos de Atuação
Teses/Quantidade de
defesas
Corpo e Artes (01)
Corpo e Cultura (04)
Corpo e Cultura (01)
Corpo e Educação (04)
____
Corpo e Infância (01)
Corpo e Professores (03)
Corpo e Artes (03)
Corpo e Artes (02)
____
Corpo e Educação (02)
____
Adilson Nascimento de
Jesus
Corpo e Professores (01)
____
Corpo e Artes (03)
____
Silvio D. Gallo
Corpo e Educação (01)
Corpo e Professores (01)
Carlos Eduardo
Albuquerque Miranda
Corpo e Cultura (01)
Corpo e Educação (01)
Carmem Lúcia Soares
Márcia Maria Strazzacappa
Hernández
Eliana Ayoub
Fonte: coleta de dados 2017.
Dos professores/orientadores, Carmem Lúcia Soares foi a que mais falou
sobre o corpo dentro do doutorado em Educação com nove defesas, que discutem basicamente sobre o Corpo na Educação (04) e o Corpo na Cultura (04),
apenas uma tese abordou o Corpo e Infância. No mestrado em Educação orientou apenas dois alunos com abordagens no campo de atuação Corpo e Artes (01)
e Corpo e Cultura (01). A segunda orientadora a dar espaço ao corpo/corporeidade dentro do programa foi Márcia Maria Strazzacappa Hernández, com quatro
estudos no doutorado, todos abordando o Corpo e Artes e quatro dissertações no
campo de atuação Corpo e Professores.
Quando analisamos o período de publicações durante os 17 anos observamos que existe uma regularidade nas publicações, em praticamente todos os
anos que se produziram, com exceção de 2002 para o doutorado e 2004 para o
mestrado. Apesar da quantidade de estudos não serem significantes e dos números serem maiores a partir do ano de 2004, desde 2000 se fala sobre o corpo e
a corporeidade na Educação. O destaque vai para o ano de 2010, com maioria
tanto para as dissertações quanto (nove) para as teses (sete). Dados no Figura 3.
119
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 113-126, 2018
Figura 03: Análise Temporal separada por mestrado e doutorado.
10
Figura
03:3:Análise
Temporal
separada
por mestrado
e doutorado.
Figura
Análise
Temporal
separada
por mestrado
e doutorado.
8
10
6
8
4
6
2
4
0
2 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017
0
Mestrado
Doutorado
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017
Mestrado
Fonte: dados coleta 2017.
Doutorado
Fonte: dados coleta 2017.
Fonte: dados coleta 2017.
Apresentamos os resultados em relação ao campo de atuação e sua interseção com
Apresentamos
os resultados
relação
ao campo
de atuação
e et
sua inoutras áreas
científicas e temas
de pesquisa, em
conforme
proposto
no trabalho
de Simões
Apresentamos
os áreas
resultados
em relação
ao campo
de atuação econforme
sua interseção
com no
terseção
com
outras
científicas
e
temas
de
pesquisa,
proposto
al. (2016) e Carbinatto et al. (2016). Devido as leituras e análises terem sido feitas apenas
trabalho
Simões eettemas
al. (2016)
e Carbinatto
et al. (2016).
Devido
as leituras
e
outras
áreasdecientíficas
de pesquisa,
conforme proposto
no trabalho
de Simões
et
com
os resumos,
metodologias
e se necessário
a resumos,
introdução,metodologias
e não o estudo por
completo,
análises
terem
sido
feitas
apenas
com
os
e
se
necessário
a
al. (2016) e Carbinatto et al. (2016). Devido as leituras e análises terem sido feitas apenas
introdução,
nãoCarbinatto
o estudoetpor
completo,
faremospormenorizada
assim comodas
Carbinatto
faremos
assim ecomo
al. (2016)
uma discussão
áreas mais et al.
com
os resumos,
metodologias
e se necessáriodas
a introdução,
e não
o estudo por
(2016)
uma discussão
pormenorizada
áreas mais
prevalentes
emcompleto,
cada um dos
prevalentes em cada um dos campos de atuação sobre o corpo/corporeidade,
campos
de
atuação
sobre
o
corpo/corporeidade,
acrescentando
algumas
áreas que
faremos assim como Carbinatto et al. (2016) uma discussão pormenorizada das áreas mais
acrescentando
algumas áreas
que nãode
foram
expressas
estudo de
Simões
et al. que
(2016).
não foram expressas
no estudo
Simões
et al.no
(2016).
Vale
salientar
existem
prevalentes em cada um dos campos de atuação sobre o corpo/corporeidade,
estudos
que
se
repetem
dentro
das
temáticas
expostas,
por
se
comunicarem
Vale salientar que existem estudos que se repetem dentro das temáticas expostas, por se com
acrescentando
áreas que como
não foram
expressas
estudo3dee Simões
et al. (2016).
mais de umaalgumas
área científica,
exposto
nas no
figuras
4.
comunicarem com mais de uma área científica, como exposto nas figuras 3 e 4.
Vale salientar que existem estudos que se repetem dentro das temáticas expostas, por se
Figura 4: Relação
campos
de como
atuação
e temáticas
comunicarem
com maisentre
de umaosárea
científica,
exposto
nas figurasnos
3 e 4.programas de
Figura
4. Relação entre os campos de atuação e temáticas nos programas de mestrado.
mestrado.
12
Figura 4. Relação entre os campos de atuação e temáticas nos programas de mestrado.
10
12
8
10
6
8
4
6
2
4
0
2 Outros Temas
0
Outros Temas
Saúde
Saúde
Corpoe e Educação
Fonte: coleta de dados 2017.
História
Formação e
Práticas
Atuação
Pedagógicas
Profissional
História
Formação e
Práticas
Corpo e Professores
CorpoPedagógicas
e Cultura
Atuação
Profissional
Fonte: coleta de dados 2017.
Corpoe e Educação
120
Corpo e Professores
Corpo e Cultura
Fonte: coleta de dados 2017.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 113-126, 2018
Dança
Escola
Culturas
Dança
Escola
Culturas
Corpo e Artes
Corpo e Artes
Corpo e Infância
Corpo e Infância
Figura 5: Relação entre os campos de atuação e temáticas nos programas de
doutorado.
Figura 5. Relação entre os campos de atuação e temáticas nos programas de doutorado.
10
9
8
7
6
5
4
3
2
1
0
Outros Temas
Saúde
Corpoe e Educação
História
Formação e
Práticas
Atuação
Pedagógicas
Profissional
Corpo e Professores
Corpo e Cultura
Dança
Corpo e Artes
Escola
Culturas
Corpo e Infância
Fonte:
coleta
de dados
2017. 2017.
Fonte:
coleta
de dados
4. Discussão
4 – DISCUSSÃO
É notável o crescimento das publicações sobre corpo/corporeidade nos
programas de pós-graduação em Educação ao longo dos 17 anos, apesar das
oscilações
entreo crescimento
os anos tanto
nas dissertações
quanto nas teses,
números se
É notável
das publicações
sobre corpo/corporeidade
nosos
programas
mantêm
em
uma
boa
proporção,
demonstrando
que
desde
o
início
deste
século se
de pós-graduação em Educação ao longo dos 17 anos, apesar das oscilações entre os anos
fala sobre o corpo e a corporeidade dentro do programa, e que para o mestrado o
tanto
nas dissertações
quantosenas
os números
mantêm
emdados
uma boa
proporção, com
aumento
das produções
fazteses,
presente
a cadaseano.
Estes
corroboram
diversos estudos
do tipo
estado
arte
em se
áreas
da nossa
(MEDEIROS,
demonstrando
que desde
o início
deste
século
faladistintas
sobre o corpo
e a corporeidade
DIAS, 2015; RIOS, MOREIRA, RESENDE, 2015; BISOL, SANGHERLIN,
dentro do programa, e que para o mestrado o aumento das produções se faz presente a
VALENTINI, 2013), nos mostrando que esta pode ser uma realidade da póscada
ano. Estes
dados corroboram
diversos(2005),
estudos apontam
do tipo estado
-graduação
brasileira.
Kuenzer com
e Moraes
que arte
estaem
se áreas
expandiu
e ainda da
tende
a se
expandir alcançando
objetivos,
promovendo
pesquisas
de alto
distintas
nossa
(MEDEIROS,
DIAS, 2015;
RIOS, MOREIRA,
RESENDE,
2015;
padrão de qualidade em várias áreas do conhecimento, contribuindo para o deBISOL, SANGHERLIN, VALENTINI, 2013), nos mostrando que esta pode ser uma
senvolvimento do país. Especificamente a pós-graduação em Educação no Brasil
realidade
da pós-graduação
brasileira.
Moraes
apontam
que esta sesignipassou por
grandes mudanças
nosKuenzer
últimose 20
anos,(2005),
sofrendo
um aumento
ficativo, edevido
ao maior
número
de programas
pós-graduação
criados,
expandiu
ainda tende
a se expandir
alcançando
objetivos,depromovendo
pesquisas
de altoassim
como também, mudanças nas temáticas e problemas, referencial teórico, abordapadrão
de qualidade
em várias 2001).
áreas do conhecimento, contribuindo para o
gens, dentre
outras (ANDRÉ,
Nossos do
resultados
podem se justificar
por inúmeros
motivos,
como o
desenvolvimento
país. Especificamente
a pós-graduação
em Educação
no Brasil
aumento
dos
programas
e
cursos
de
pós-graduação,
especificamente
no
estado
passou por grandes mudanças nos últimos 20 anos, sofrendo um aumento significativo,
de São Paulo; maiores fomentos a pesquisa científica sobre educação, devido às
devido
ao maior número
de programas
de pós-graduação
criados,
como também,pleno
fortes discussões
a respeito
dos processos
educacionais
no assim
desenvolvimento
do ser humano;
os autores
que produzem
tema no mesmo
mudanças
nas temáticas
e problemas,
referencial sobre
teórico,o abordagens,
dentre programa,
outras
saindo do mestrado e continuando no doutorado (ANDRÉ, 2001; KUENZER,
(ANDRÉ, 2001).
MORAES, 2005).
Nossos resultados podem se justificar por inúmeros motivos, como o aumento dos
programas e cursos de pós-graduação, especificamente no estado de São Paulo; maiores
Evidência,
v. 14, n. 14,a p.
113-126,
fomentos a pesquisa científica sobre educação,
devido àsAraxá,
fortes discussões
respeito
dos 2018
121
122
É certo considerar que a Unicamp muito contribuiu para os números encontrados na presente pesquisa, o que demonstra o compromisso da universidade
em discutir e disseminar a temática, sendo um reflexo do empenho e da dedicação
dos professores/orientadores para com seus mestrandos e doutorandos, os incentivando a conceber a importância do corpo dentro da Educação. Carmem Lúcia
Soares nos demonstrou isso.
Estes números não são novidade dentro das pesquisas do estado da arte,
a Unicamp com 51 anos de existência (fundada em 5 de outubro de 1966) já
foi foco de muitos resultados destes tipos de pesquisas, Simões et al. (2016),
ao analisar os artigos científicos sobre ginástica, afirmam que dos 340 artigos,
28 vincularam-se a USP e 26 a Unicamp. Milani, Soares e Bortoleto (2015),
contribuem com a afirmação ao destacar a produção científica sobre ginástica da
faculdade de Educação Física da Unicamp. Ao pesquisar o estado da arte do ensino de sociologia na Educação básica, Handfas (2011), não foge dos resultados
até agora apresentados, a Unicamp, USP e Unesp são as universidades detentoras
dos maiores números de estudos, com destaque para a Unicamp.
Ao lançarmos nosso olhar para os campos de atuação observamos que a
predominância de produções nos programas investigados está na categoria Corpo
e Educação, com 29,8% do total (n=31 – 19 dissertações e 12 teses). Destes destacam-se a Uniso (05), Unesp/Ara (03) e Unicamp (03) para as dissertações e a
Unicamp (07) e USP (03) para as teses e concordam com a Handfas (2011) e Milani, Soares e Bortoleto (2015). Constatamos que a maior parte das dissertações
se relacionaram aos temas escola (11), outros temas (06) e práticas pedagógicas
(02), e as teses aos outros temas (09) e Formação e Atuação Profissional (02). Os
temas discutiram diversos contextos e os mais abordados abrangeram o Ensino
Fundamental e a Educação Infantil, as aulas de Educação Física e as possibilidades
do esporte na alfabetização dos sentidos, expressões e movimento. Concluímos
que o cuidado com o corpo deve e pode estar presente em todo ato educativo,
nas suas mais variadas formas e propostas, porém ainda existe uma barreira a ser
quebrada, da qual a maioria dos estudos se apropriam, que é a instrumentalização
do corpo. É preciso entender que contar, narrar, jogar, dançar, escrever, ler, são
produções do sujeito, e que a corporeidade é capaz de ressignificar e alterar as
metas educativas e sociais preconizadas atualmente (NÓBREGA, 2005).
As produções sobre Corpo e Cultura perfizeram um total de 23 estudos
(08 dissertações e 15 teses), com destaque para a Unicamp com duas dissertações
e nove teses, seguidos da Unimep com duas dissertações e Unesp/Ara e Usp com
três teses respectivamente. Dentre as temáticas mais abordadas, Culturas elencou estudos dos dois programas, dois para mestrado e três para doutorado, com
produções que trazem o corpo nas diferentes culturas, como a Japonesa, a Afro-Brasileira e a Indígena. A História abrangeu apenas duas dissertações e uma delas
traz a história da ginástica brasileira concomitante com a história da Educação
Física. A temática Saúde apresentou apenas uma dissertação, diferindo das teses
que trouxeram quatro estudos, o que nos demonstra que o caráter médico higienista que há muito tempo foi atribuído ao corpo, ainda se faz presente. Outros
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 113-126, 2018
temas perfizeram seis dissertações e duas teses, Formação e Atuação Profissional
uma dissertação e Escola uma tese.
A categoria Corpo e Professores apresenta 22 produções (16 dissertações
e 06 teses) com preponderância para as temáticas Formação e Atuação do Profissional com sete dissertações e cinco teses, com discursos sobre a formação continuada dos professores, a atuação e os ideais de corpo aplicado pelos professores e
as possibilidades da arte de contar estórias como potencializadora na formação e
atuação do professor. Outros temas perfizeram cinco dissertações e duas teses, e
apresentam como uma de suas discussões o corpo e o movimento nas práticas dos
professores, principalmente da Educação Infantil. Dança, Escola, Saúde e História foram temas de uma dissertação cada, e as Práticas Pedagógicas com uma tese,
dados que demonstram uma concentração quando o assunto são os professores
e suas práticas. André et al. (2001) trouxeram em seu estudo assuntos como formação inicial, formação continuada e práticas pedagógicas discutidos na escola e
salas de aula, assuntos que também estimularam a realização das pesquisas alocadas nesta categoria. Assim como no estudo exposto, em conjunto com os autores
das teses e dissertações, nos mostramos preocupados com o trato do corpo nas
questões teórico metodológicas do processo de ensino, na construção do saber, e
na pesquisa do professor. Para as universidades, os destaques de mestrado são para
a Unesp e Unicamp (04 dissertações), e Usp (03 dissertações), e doutorado para
Usp e Unicamp com duas pesquisas cada uma.
Em relação a categoria Corpo e Artes existem 21 produções (16 dissertações e 05 teses), com destaque para a Unicamp detentora da maioria dos estudos
(13 dissertações e 04 teses), seguidas da USP e Unisal com uma dissertação cada,
e a Unimep com uma tese. Neste item observamos uma grande abrangência do
corpo na arte, houve estudos para quase todos os temas relacionados as dissertações, a dança apresentou o maior número (04), trazendo pontos sobre a dança
circular, a dança e suas relações com o teatro, a dança contemporânea e o hip hop,
nos diversos ambientes e contextos. As práticas pedagógicas compuseram quatro
dissertações, com destaque para a pedagogia do circo nos discursos educacionais, principalmente a do palhaço. outros temas perfizeram três dissertações e a
formação e atuação profissional uma. para as teses, as temáticas história e dança
com duas teses cada, dando destaque as histórias de vida, sendo uma delas de
uma bailarina e coreógrafa, e a Formação e Atuação Profissional com uma tese.
Rodrigues (2015, p. 13), considera que “Através da arte, ressignificamos a vida,
compartilhamos e propagamos pensamentos e podemos permear camadas mais
profundas, poéticas e sensíveis”. A educação deve e tem o poder de se apropriar
deste sensível, criativo e lúdico durante suas práticas, pois assim desenvolverá
o aluno por completo, permitindo a aprendizagem a partir das experiências vividas pelo corpo, das relações com o entorno e as produções humanas (RIOS,
MOREIRA, 2015). É neste pensamento que os estudos alocados na categoria
se fazem importante no processo de formação educacional e formação humana.
A categoria Corpo e Infância é a última em frequência absoluta com apenas sete estudos (03 dissertações e 04 teses). Encontramos uma dissertação para
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123
uma das seguintes universidades, Unicamp, Unesp/RC e PUC/SP, já para as teses
duas são da Unicamp, e uma para Unimep e Ufscar respectivamente. Três das dissertações estão distribuídas na temática Outros Temas, e uma dissertação cada para
as Práticas Pedagógicas. Paras as teses discutiu-se sobre Outros Temas, dos quais
os mecanismos publicitários, a escolarização precoce, o trabalho infantil e a infância moderna abrangeram as abordagens dos estudos. Nesta categoria há pesquisas
que se repetem em mais de uma temática. Acreditamos que este talvez seja um dos
mais importantes assuntos abordados em relação ao corpo, e ao mesmo tempo
negligenciado, diante dos números de pesquisas. Falar da criança não é algo fácil,
exige muito estudo e um pensamento complexo, devido a infinidade de discursos
possíveis. O corpo da criança é sensível e suscetível a influências oriundas dos
processos educacionais, da família e da própria sociedade. Respeitar esse corpo é
cultivar todo um futuro, toda uma mudança de paradigmas (MORUZZI, 2012).
5. Considerações finais
Analisar o estado da arte sobre o corpo/corporeidade nos programas de
pós-graduação em Educação nos permite concluir que muito pouco se tem produzido, comparado a influência que a corporeidade possui no processo de formação humana em todas as áreas do conhecimento. Estas ainda são incipientes
e carecem de um fortalecimento reflexivo e metodológico. Portanto um trabalho
em prol da massificação do corpo/corporeidade dentro das universidades pode
suscitar em um aumento destas pesquisas, principalmente sobre os campos de
menor concentração como as temáticas sobre as crianças. Além disso, é certo que
a experiência e afinidade com o assunto constituem o quadro de produções. Pesquisadores que acreditam na importância em se falar do corpo é que a disseminam
e não propriamente as universidades.
Neste contexto, concluímos que os programas de pós-graduação em
Educação do estado de São Paulo, não se apropriaram de modo significativo do
corpo e suas possibilidades no processo educativo, existe ainda uma resistência
em mudar as concepções de corpo fragmentado e suas formas reducionistas de
concebê-lo. Desenvolver pesquisas e buscar o locus em que o corpo na educação
é abordado nos permite, indicar lacunas, evidenciar os problemas, e chamar a
atenção para a busca de novas alternativas de investigações.
Agradecimentos
124
Estendemos o nosso agradecimento a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) pelo financiamento da presente pesquisa
tornando-a possível. Ao grupo de estudos NUCORPO pelos incessantes aprendizados, auxílio e companheirismo na busca de contribuir para a ampliação dos
estudos sobre o corpo e a pedagogia do movimento na Educação Física e Educação. Além da participação do projeto maior em que este estudo está alocado,
possibilitando a ampliação das pesquisas sobre o corpo/corporeidade para todo o
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Brasil, nos programas de Educação e Educação Física. E a UFTM (Universidade
Federal do Triângulo Mineiro) pelo espaço e possibilidade desenvolvimento da
pesquisa, sendo um locus para a disseminação e produção do conhecimento.
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- Lucas de Oliveira Lima
Currículo: Mestre em Educação Física pela Universidade Federal do
Triângulo Mineiro/UFTM. Preparador Físico da Associação Atlética Ponte
Preta/Campinas.
- Marcus Vinicius Simões de Campos
Currículo: http://lattes.cnpq.br/0829010705250836
- Wagner Wey Moreira
Currículo: http://lattes.cnpq.br/5798244047692726
126
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 113-126, 2018
O corpo adolescente privado de sua
liberdade altera a prática de esporte?
REIS, Laudeth Alves dos
MOREIRA, Wagner Wey
Resumo: A adolescência é uma etapa do desenvolvimento humano e necessita ser compreendida no contexto de transformações e fenômenos ligados a essa transição considerada
complexa. Assim, a prática esportiva pode favorecer o aumento das habilidades sociais
como a relação interpessoal, a comunicação e redução do comportamento antissocial e,
ainda, a ressocialização de indivíduos privados de liberdade ao partirem de uma motivação
própria. As medidas socioeducativas são atribuídas, em geral, por infrações cometidas por
adolescentes em condição de vulnerabilidade social como desamparo familiar e governamental, às drogas, a economia, às políticas públicas e, até mesmo, levando em consideração
aspectos pessoais. O presente artigo pretende abordar tal fase do desenvolvimento, na condição de acautelamento, enquanto medida socioeducativa para autores de atos infracionais,
tendo em vista a compreensão do corpo privado de liberdade e sua relação com o esporte.
Palavras chave: Adolescentes; Corpo privado de liberdade; Esporte.
Abstract: Adolescence is a stage of human development and needs to be understood in the
context of transformations and phenomenon linked to this transition considered complex.
Thus, sports practice can favor the increase of social skills such as interpersonal relationship, communication and reduction of antisocial behavior and, also, the resocialization
of individuals deprived of freedom starting from a motivation of their own. The socioeducational measures are generally attributed to infractions committed by adolescents in
conditions of social vulnerability, such as family and governmental helplessness, drugs,
economics, public policies, and even considering personal aspects. The present article intends to approach this phase of development, in the condition of caution, as a socio educative measure for authors of infractions, bearing in mind the comprehension of the body
deprived of freedom and its relationship with sport.
Keywords: Teenagers; Body deprived of liberty; Sport.
127
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 127-138, 2018
1. Introdução
Buscamos neste estudo trazer algumas reflexões acerca do corpo privado
de liberdade e sua relação com o esporte. Como problemática abordamos a percepção do corpo à luz dos adolescentes em conflito com a lei e como vivenciam a
corporeidade. Aliado a isso, de que forma o esporte pode favorecer nesse processo
de busca de autonomia e ressocialização.
As medidas socioeducativas são aplicadas na situação de ato infracional
grave cometido por adolescentes que, de acordo com os termos da lei, estejam na
idade que compreende dos doze aos dezoitos anos incompletos. Elas representam
responsabilização pelo ato praticado, mas seu objetivo maior visa a ressocialização
do adolescente em conflito com a lei, atendendo suas necessidades pedagógicas
(VOLPI, 2014).
Para este estudo foi realizado um percurso metodológico que vislumbra
uma pesquisa qualitativa e como instrumento de coleta de dados utilizou-se a entrevista semiestruturada. Os 64 sujeitos da pesquisa correspondem a adolescentes
entre 12 e 18 anos que cumprem medida socioeducativa de internação, situada no
estado de Minas Gerais. Os dados obtidos pela coleta foram transcritos e analisados de acordo com a Técnica de elaboração e análise de Unidades de Significado
de Moreira, Simões e Porto (2005).
2. O corpo adolescente em privação de liberdade
Compreender o adolescente na amplitude do seu processo de desenvolvimento requer o entendimento da sua existencialidade enquanto um ser em constante interatividade com o mundo, com os outros e consigo próprio. Segundo
Merleau-Ponty (2011, p. 6) é por meio dessas relações que se apreende o mundo,
ao perceber e lhe atribuir significados, pois “[...] o homem está no mundo, é no
mundo que ele se conhece”. Suas ideias nos permitem compreender o homem,
em especial nesse estudo, o adolescente, de forma integral.
O momento conturbado de conflitos pessoais nada mais é que sua maneira de exprimir o corpo no mundo, “como presença viva, em movimento”
(NÓBREGA, 2005, p. 64), pois marca a sua singularidade enquanto ser uno e
inacabado em constante aprendizado. Nessa interação, transforma-se por meio da
sua ação, (re)construindo sua personalidade e com isso, formando sua identidade
pessoal, se conscientizando das responsabilidades.
Desprezar o corpo é negar a sua própria existência, uma vez que a corporeidade é presença em todos os atos humanos e, mesmo na condição de privado
de liberdade, por um período temporário, o adolescente expressa por meio de
movimentos que se constituem enquanto expressão, comunicação e criação. Entretanto, em todo gesto há uma significação marcada por sua existência corporal
no mundo e essa necessidade de movimentar é que garante a vida. De acordo com
Santin (2003, p. 66):
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 127-138, 2018
[...] todo indivíduo se percebe e se sente como corporeidade.
É na corporeidade que o homem se faz presente. A dimensão da
corporeidade vivida, significante e expressiva caracteriza o homem e
a distância dos animais. Todas as atividades humanas são realizadas
e visíveis na corporeidade.
O uso que faz do corpo revela as relações a partir do contexto social a qual
o indivíduo está inserido. Freire (1991) acrescenta que a condição do ser humano
de nascer sabendo pouco, o diferencia dos demais seres, impulsionando-o a aprender incessantemente, rumo a autossuperação.
O corpo não pode ser concebido como mero objeto a ser disciplinado,
manipulado, reduzido ao seu uso racional uma vez que vivemos a corporeidade
e a partir dela delineamos nossa experiência de ser no mundo. A esse respeito
Merleau-Ponty (2011, p. 14) afirmou: “O mundo não é aquilo que eu penso, mas
aquilo que eu vivo; eu estou aberto ao mundo, comunico-me indubitavelmente
com ele, mas não o possuo, ele é inesgotável”. Essa relação estabelecida de conhecimento é consequência da experiência existencial da corporeidade.
Promover a humanização do adolescente privado de liberdade significa
inseri-lo numa ação conscientizadora que possa efetivamente desenvolver suas potencialidades, buscando condições que o permita alcançar sua liberdade pessoal, enquanto sujeito protagonista de sua história. Nas palavras de Moreira (2001, p. 23),
O ser humano em seu processo de humanização, produz cultura,
produz história, ao mesmo tempo em que é modificado pela
cultura que produz é modificado pela história que realiza. Quando
caminhamos para a superação, seja qual for o sentido dado a essa
superação, já estão implícitos os sentidos de fazer, saber, pensar,
sentir, comunicar e querer. Esses seis aspectos identificam o ser
humano e definem sua corporeidade como condição de presença,
de participação e de significação do homem no mundo.
O adolescente se mantém no dever e no processo de aprendizagem com
maior motivação e desejo de crescimento pessoal quando sente que pode superar
limitações e obstáculos. Para isso demandará de condições que lhe permitam possibilidades de viver a corporeidade, a partir do encorajamento de atitudes positivas que favoreçam a sua formação pessoal.
A relevância atribuída ao corpo nesse estudo reside no entendimento do
caráter constitutivo do corpo para a compreensão e emancipação do ser humano,
livre para o pleno exercício de sua corporeidade em consonância com o contexto social a qual está inserido (KUNZ, 2012; NISTA-PICCOLO, MOREIRA,
2012a).
Advogamos a corporeidade, no sentido de um corpo ativo, existencial que
se faz presente no mundo, enquanto história e cultura, ao mesmo tempo em que a
modifica e é modificado por ambas. Por isso, nos ancoramos no esporte à medida
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que proporciona ao ser a valorização de um corpo possível que busca superações
e que exercita a criatividade (NISTA-PICCOLO, MOREIRA, 2012a), mesmo
àqueles em condições de privação da sua liberdade, que nos momentos propícios
ao movimento do seu corpo, o faça consciente dos limites do seu pensar e agir.
Entendemos o esporte como veículo educativo (KUNZ, 2012; NISTA-PICCOLO, MOREIRA, 2012a) que permite aos adolescentes em cumprimento
de medida socioeducativa, a conquista da sua autonomia e cidadania. Isso deve
ser cultivado por todos os profissionais envolvidos nesse processo como meio de
integração social, aceitação, respeito às normas e regras de convivência, elementos
básicos para obtenção do objetivo maior da medida: a ressocialização.
2.1 O esporte e sua abrangência
O adolescente privado de liberdade possui uma vida restrita, tendo sua
autonomia e capacidade de decisão, regulado pela própria condição de acautelamento. Sua vida íntima, desde as necessidades fisiológicas e todas as demais atividades, como frequentar a escola (legalmente obrigatória), se consolidam em dispositivos disciplinares do sistema socioeducativo em meio fechado – internação
– e dessa maneira, visam à submissão e controle do corpo. E o esporte se constitui
num momento que o mesmo pode se revelar enquanto possibilidade de usufruir
certa autonomia, ao expressar os diferentes movimentos. (DOMINGOS, 2014)
Galatti (2006), afirma que por ser o esporte um fenômeno de múltiplas
possibilidades, promove, além da aprendizagem das questões técnicas e táticas, a
discussão de valores. Reverdito e Scaglia (2009, p. 131) fortalecem a expansão
das contribuições do esporte na formação humana ao afirmar que a Pedagogia
do Esporte deve “permitir ao homem aprender a viver, a viver em sociedade, a
compartilhar sua humanidade”. É dessa maneira que a vivência esportiva favorece
o aperfeiçoamento da humanidade, o que justifica o seu valor social, sendo o momento propício para o desenvolvimento de ações que favorecem o trabalho em
equipe, a socialização de diferentes sentimentos como alegria, tristeza, nervosismo, ansiedade, elementos dentre tantos outros presentes em práticas esportivas devidamente orientadas (KUNZ, 2012; NISTA-PICCOLO, MOREIRA, 2012a).
Reverdito e Scaglia (2009, p.37) asseveram que “o ensinar pelo esporte
deve estar comprometido com a autonomia do ser humano, com a formação de
cidadãos críticos”. Para tanto, uma das maneiras de contribuir com esta formação é proporcionar, através do processo de ensino, vivência e aprendizagem das
modalidades esportivas englobando aspectos técnicos, táticos, motores, físicos,
bem como a aquisição de valores e modos de comportamentos a partir de uma
ação conscientizadora da prática educativa (PAES,1996; KUNZ, 2012; NISTA-PICCOLO, MOREIRA, 2012a).
Diante do mito que o esporte atrai pela simples condição e objetivo em
“passar o tempo” e “ocupar a cabeça” entendemos que para a eficácia dos projetos
esportivos o conhecimento e a prática deve proporcionar acesso ao universo interior do ser humano, fomentando desejos e vontades, superação de limites, sensa130
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 127-138, 2018
ções captadas pelas conquistas e derrotas. Nista-Piccolo e Moreira (2012a, p. 42)
enfatizam o sentido maior do esporte, pois “[...] conhecer e praticar o esporte nos
permite vivenciar o corpo com suas possibilidades, seus limites, estabelecendo um
diálogo entre as naturezas interior e exterior, existencializando a vida e o mundo”.
De acordo com os autores, isso vem demonstrar o quanto o esporte contribui
significativamente para a busca e manutenção de uma melhor qualidade de vida.
O esporte é um meio privilegiado para a formação humana por se tratar
de um domínio cultural criado livre de finalidades existenciais ou mesmo de sobrevivência. Quando utilizado como instrumento educativo, seja em espaços formais ou não formais, ele demonstra sua importância desde que estejam presentes,
conforme explicitam Nista-Piccolo e Moreira (2012b, p.23):
[...] o sentido de corpo possível e não de corpo perfeito; o
conhecimento, e este transformado em sabedoria, para poder
escolher quais as melhores formas de vivenciar as possibilidades
esportivas; o ensino qualificado do fenômeno esportivo em sua
interdisciplinaridade e em sua especificidade; o redimensionamento,
por meio do esporte, do conhecimento corporal, passando de um
corpo dócil a uma corporeidade ativa, a qual busca transcendência.
É dessa maneira que advogamos o esporte como uma conquista significativa na íntima relação com o mundo, presença viva e ativa em constante movimento. Isso porque a aprendizagem do mundo se faz com e por meio do corpo.
(MOREIRA, 1992; BENTO, MOREIRA, 2012; NISTA-PICCOLO, MOREIRA, 2012b)
A esse respeito, Kunz (2012), defende uma transformação didática dos
esportes que vise a totalidade de participação em igualdade de condições, apontando perspectivas e orientações capazes de superar o ensino repetitivo de movimentos padrões do esporte normativo por uma aprendizagem enquanto processo
dinâmico que permita àquele que aprende, ser sujeito das suas próprias ações.
É nesse sentido que elucidamos a razão desse estudo em propiciar a adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa, possibilidades de conscientização do valor da prática esportiva, internalizando a relevância do hábito de sua
prática diária. E a isso, implica o cuidado consigo próprio como, por exemplo,
hábitos e alimentação saudáveis, furtando-se inclusive, do uso de substâncias prejudiciais à sua saúde. Necessitamos, em síntese, de contemplar o esporte nas suas
múltiplas dimensões: educação, lazer e rendimento para que encontre neste uma
atividade prazerosa, sem imposições, momento propício ao exercício de sua autonomia, enquanto ser humano que se movimenta intencionalmente na direção da
superação ou transcendência (BENTO; MOREIRA, 2012).
3. Metodologia do estudo
Trata-se de um estudo qualitativo, caracterizado como exploratório-descritivo. Essa abordagem permite compreender em profundidade os significados e
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 127-138, 2018
as formas de vida das pessoas, sendo válida para a observação de vários elementos
ao mesmo tempo em um pequeno grupo (MINAYO, 2004). Participaram 64
adolescentes autores de atos infracionais, do sexo masculino, de um Centro Socioeducativo do Estado de Minas Gerais que cumprem medida socioeducativa de
internação.
As informações foram coletadas por meio de uma pergunta geradora aplicada aos adolescentes em regime de Internação: Você praticava algum esporte
que aqui está impossibilitado de vivenciar mas gostaria de praticar? Mencione
qual(ais) esporte(s) e justifique o porquê.
Os dados obtidos pela coleta em formulários foram transcritos e analisados segundo a Técnica de Elaboração e Análise de Unidades de Significado de
Moreira, Simões e Porto (2005) que, a partir dos relatos ingênuos dos sujeitos,
identifica os indicadores e estabelece as unidades de significado. Esse processo facilita a compreensão do sentido das palavras dos sujeitos. Após análises foi possível definir a seguinte categoria temática: O corpo privado de liberdade e a relação
com o esporte.
4. Resultados e discussão
Os atos infracionais praticados na juventude são um fato social que tem
preocupado a sociedade, seja na parcela dos integrantes desta que se incomodam
com esses problemas, buscando uma reflexão e possíveis soluções, seja naquela
que se irrita e encontra-se amedrontada com a crescente violência. Em sua maioria, esses adolescentes autores de atos infracionais, são vítimas da própria sociedade. Para Cruz (2005), a infração é fruto, em primeiro lugar, do ambiente formado
na família, ou pela ausência desta; depois, nas amizades constituintes do ambiente
social, na escola ou grupos comunitários, na rua, já que a formação, o crescimento
físico, moral e psicológico, dependem dos ambientes criados pelos adultos até que
adquira a própria consciência da decisão e escolha ao atingir a maturidade.
Os 64 participantes da pesquisa são adolescentes do sexo masculino, com
idades entre 12 e 18 anos, que cometeram ato infracional e como resposta estatal,
a eles foi aplicada medida socioeducativa de internação, cumprida num Centro
Socioeducativo do estado de Minas Gerais.
As respostas à pergunta geradora indicaram que entre os adolescentes
pesquisados, 59 responderam praticar antes da medida socioeducativa algum esporte, exercício físico ou atividade artística. No entanto, não foi possível identificar se as atividades ocorriam através de algum programa social que poderia adotar
a pedagogia do esporte, e que a vivência dessas atividades acontecia nas ruas.
Somente cinco dos entrevistados relataram que não praticavam atividade alguma
desse gênero não justificando suas respostas. Como registro digno de atenção, o
único respondente que justificou a ausência do envolvimento com práticas esportivas apontou ser responsabilidade a sua dependência química.
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 127-138, 2018
[...] Gostava muito de jogar “bete” na rua, [...] soltar pipa que é uma
atividade e aqui não pode. O resto aqui dentro pode fazer tudo: jogar
bola, basquete... (16 anos).
[...] Quando eu estava na rua eu participava de vários jogos de futebol
aos fins de semana, mas também era só isso, eu jogava, mas não treinava;
não mantinha meu corpo físico. Eu jogava por eu gostava não porque era
pra melhora meu condicionamento físico i sim por lazer (17 anos).
[...] Sim, jogava bola de vez em quando e nadava na piscina, jogava
capoeira, aqui dentro eu faço sim atividades físicas mais vez no mês ou na
semana que ela na rua... (18 anos).
[...] Fazer natação, antes eu praticava natação. É uma parte de mim que
eu gosto demais, não só pelas medalhas e também pela atividade física que
eu gosto desde a minha infância e tudo tem questão de tempo, obrigado
(16 anos).
[...] Eu sou apaixonado em futebol, peteca voleibol, basquete, só isso,
praticava lá de fora só futebol quando eu saía do serviço e aqui dentro
pratico as atividades físicas e obrigado a ajuda de vocês todos. (16 anos)
[...] Não fazia nada de atividade só usava drogas (18 anos).
Apesar da pedagogia do esporte não ser a solução para todos os problemas, é possível percorrer através dela os pilares da educação propostos pela
UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura): aprender a conhecer; aprender a fazer; aprender a conviver e aprender a
ser (DELORS, 2012). É possível utilizá-la para ajudar a enfrentar problemas
comuns à realidade de comunidades carentes como: baixa autoestima; falta de
pertencimento a um grupo; inexistência de expectativa de transformação, de quebra do círculo vicioso presente muitas vezes nas famílias; reduzidas opções para o
distanciamento do tráfico, da violência, além da exclusão aos ambientes propícios
ao desenvolvimento educacional.
Outras manifestações podem ser assim apresentadas: nove adolescentes
indicaram a continuidade da prática esportiva sem problemas; já um aderiu recentemente e três conheceram no centro socioeducativo novas modalidades esportivas.
[...] Eu jogava futebol, eu trabalhava de pintor, agora vou começa
praticar pintura (18 anos).
[...] Tudo que eu fazia lá na rua eu faço aqui como, joga bola, natação,
desenha. (sem identificação da idade)
[...] Futebol, mas aqui pode (14 anos).
[...] Não. Aqui jogo bola. (sem identificação da idade)
[...] Eu mais gosto de futebol agora eu tô aprendendo outras coisas que eu
estol gostando mais (15 anos).
133
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 127-138, 2018
Uma pesquisa sobre a atividade física e comportamento antissocial, identificou na análise de 175 programas o oferecimento de várias modalidades esportivas, atividades físicas e atividades ao ar-livre (ex.: escoteiro e acampamento) para
jovens, cujo foco na maioria dos programas é a habilidade social e autoestima,
valorizando mais a forma – o processo – como é realizada a tarefa para o jovem
do que a prática em si. Desse modo, o envolvimento da comunidade é importante
para o sucesso do programa e atividades em grupo são utilizadas para o desenvolvimento social. O que indica que a prática esportiva reduz o tédio e pode ser
usada contra a baixa autoestima e baixa autoconfiança, aumentando as habilidades
sociais como a relação interpessoal, a comunicação e redução do comportamento
antissocial (MORRIS; SALLYBANKS; WILLIS; MAKKAI, 2003).
Oito depoimentos apontaram dificuldade de continuar com a prática da
atividade e dez relataram a impossibilidade, reunindo dessa maneira, dezoito respostas equivalentes às unidades de significado “encontra dificuldade” e “impossibilitado”.
[...] Antes eu tinha a liberdade de saí com meu pai e mãe. Aqui dentro
pra você ir no banheiro você tem que pedir (16 anos).
[...] Eu ia muito viajar para a casa de minha vó e meu vô e agora não
posso visitá-lo. (17 anos).
[...] Praticava karatê e natação que aqui não tem como praticar (15
anos).
[...] Eu praticava capoeira jogava futebol e eu dançava axé e brincar com
meus irmão. (16 anos).
[...] Sim, eu corria no campo, e isso era bom pra mim porque eu fazia um
trabalho pra queimar caloria e coordenação motora (18 anos).
[...] Praticava muito bola, gostava de nadar, hoje em dia não posso praticar
todos esses exercícios porque estou cumprindo a medida socioeducativa!
(16 anos)
[...] Eu gosto muito de trabalhar na minha área de trabalho e que eu
estou impossibilitado agor. (19 anos).
[...] Eu gostava muito de nadar e aqui não pode, isso me deixa muito
triste eu queria um dia nadar, por que eu era acostumado nadar direto.
(16 anos).
[...] Fazia sim, fazia grafite, fazia letras e hoje não posso fazer. Queria
fazer grafite, bordado e várias coisas que hoje não posso fazer (17 anos).
[...] eu andava de skate e aqui sou impossibilitado de praticar (16 anos).
[...] somente futebol, aqui eu estou impossibilitado por causa da minha
perna que está machucada. Eu gostaria de fazer natação para ajudar a
minha perna porque é quase uma fisioterapi. (16 anos).
[...] Eu praticava natação e corrida e agora está difícil, por causa que
134
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 127-138, 2018
eu estou cumprindo uma medida sócio educativa, mais o que faço aqui é
jogar bola, jogar peteca, vôlei e handebol (16 anos.)
[...] natação diariamente, jogava bola todos os fins de semana e etc. Hoje
tô privado de várias coisas que fazia lá fora. Fazia amor diariamente com
as garotas, etc (18 anos).
A sociedade, ao utilizar meios de controle dos indivíduos, faz com que a
pessoa se ajuste segundo os sistemas definidos, pois a condição de acautelamento,
retira do adolescente sua autonomia e capacidade de escolhas e decisões, uma vez
que tem suas atividades reguladas. Mas as pessoas possuem características próprias, ideologias, crenças e formação familiares distintas. Não existe apenas um
raciocínio e um caminho a ser seguido pelos integrantes do grupo social e, inevitavelmente, as diferenças podem acarretar, muitas vezes, situações de conflitos
que podem culminar com a prática de um crime (CRUZ, 2005; VOLPI, 2014).
Se há um interesse na mudança do crescimento da violência, ela não ocorrerá com o aumento do caráter punitivo e isolamento da população que está à
margem da sociedade. É nesse sentido que advogamos a premissa de que a prática
esportiva pode ser um meio para auxiliar os adolescentes privados de liberdade a
absorverem valores considerados positivos pela sociedade como forma de serem
reintegrados à sociedade e não isolá-los (FERRETTI; KNIJNIK, 2009).
De acordo com os relatos, treze adolescentes demonstraram desejo de
praticar algum esporte, exercício físico ou atividade que praticavam antes do cumprimento da medida socioeducativa, dentre eles:
[...] Corrida e natação, gostaria de praticar tênis (18 anos).
[...] queria ter oportunidade de dar aula de percussão. É isso que eu
queria passar para os adolescentes (Não informou idade).
[...] Aqui só jogo bola, mais tudo tem sua hora eu tenho um sonho fazer
curso de natação (16 anos).
[...] Eu praticava judô lá de fora, aqui dentro eu gostaria de praticar
(16 anos).
[...] Tudo que eu fazia lá de fora eu posso fazer aqui, jogar futebol, vôlei
pelo projeto Superação, mais aqui eu gostaria de fazer dança, música
porque eu praticava quando eu estava lá de fora e eu gosto fazer esse tipo
de coisa (17 anos).
[...] Sim, aqui eu pratico alguns, lá de fora eu praticava futebol, vôlei,
basquete e gostaria de praticar aqui dentro (16 anos).
[...] Sim, eu praticava natação e capoeira e gostaria de fazer natação
(17 anos).
[...] Eu estava começando a ir na academia, mais aqui onde eu estou
eu fico meio impossibilitado de fazer e eu gostaria de voltar a fazer (17
anos).
135
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 127-138, 2018
[...] Praticava academia e virava mortais e eu corria muito, fazia
caminhada, eu gostava da minha vida (15 anos).
[...] Sim, futebol de salão e fazer trilha, mas aqui está difícil de fazer esses
tipos de esportes (18 anos).
[...] Eu fazia academia lá, mais aqui não pode eu fazia atividades de
musculação (16 anos).
Uma possibilidade de reeducação – ressocialização –dos adolescentes privados de liberdade seria por meio da pedagogia da autonomia na Educação Física,
pois esta se preocupa em oferecer a todos os indivíduos a capacidade de pensar
na busca da solução de um problema por meio da cooperação. Segundo Freire
(1996, p. 19) é importante reconhecer que “somos seres condicionados e não
determinados” (grifos do autor), o que pressupõe elucidar que estamos abertos
ao aprendizado com capacidade de ir além dos condicionantes, daí a relevância de
se assumir como ser social e histórico, pensante, crítico e transformador. É nesse
sentido que primamos por um fazer da prática esportiva que deixaria de ser a superação do mais fraco para ser a autossuperação, de maneira que um possa ajudar
na dificuldade do outro (KORSAKAS; ROSE, 2002; KUNZ, 2012).
Sob a perspectiva pedagógica a Educação Física contribui para o movimentar-se/relacionar-se humano na e para a educação. Isto favorece a absorção de
valores e modos mais adequados ao se deparar com situações do cotidiano, como
ser capaz de auto organizar, de interferir no seu meio e de ser ético.
Segundo Kunz (2012), uma Educação Física aberta a novas experiências
só se efetivará quando houver a superação das atividades rotineiras e aquelas baseadas na manutenção do sentido esportivo normatizado. Tais mudanças ocorrerão
se fundadas num processo ação-reflexão-ação, o que implica em propostas que
favoreçam o questionamento/reflexão e não a mera reprodução automática de
aquisição de destrezas e habilidades.
Assim, a prática esportiva pode ser tanto um meio eficaz enquanto ação
conscientizadora da prática educativa quanto alternativa de alívio das tensões características desta condição de acautelamento (FERRETTI; KNIJNIK, 2009),
dada a condição de pessoa em desenvolvimento, “capazes de atos construtivos e
reparadores” (VOLPI, 2014, p. 219).
Considerações finais
136
Dar voz aos adolescentes autores de atos infracionais é um trabalho essencial para a compreensão da forma como encaram a vida. Seus relatos ilustram
a dificuldade que populações marginalizadas têm de se expressarem, ou melhor,
de serem ouvidas e enxergadas. É uma maneira de expor os sentimentos dos sujeitos do estudo, o estigma de viverem confinados. O que se pretende afirmar é
a possibilidade de superar situações como estas, destacando o esporte, exercícios
físicos e atividades/trabalhos manuais como elo de superação e estímulo para sonhar novamente.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 127-138, 2018
O esporte deve assumir seu papel na formação, desmistificando sua atuação apenas como atrativo para aqueles que precisam ocupar-se e livrar-se de
más influências ou até mesmo brincadeiras, consideradas equivocadamente, sem
valor. O trabalho esportivo precisa lidar com frustrações, presentes em qualquer
condição natural da vida, encarando-o como aliado à superação de limitações e
obstáculos, muitas das vezes necessários para um contínuo aprendizado.
Paralelamente à modalidade esportiva, um efetivo projeto socioeducativo
necessita desenvolver outras atividades que permitam a autonomia e demonstrem
a importância dos adolescentes no convívio social. Deve-se prezar o ser humano,
sua sensibilidade, e não deixar que o condicionamento supere sua razão fundamental, o relacionamento entre pessoas.
O estudo ajudou a observar a importância do esporte na vida dos adolescentes, em especial, os privados de liberdade, atentando-se ainda à necessidade de
mais estudos que possibilitem o desenvolvimento de projetos e programas ligados
ao esporte visando a inclusão desses adolescentes na sociedade.
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- Laudeth Alves dos Reis
UFTM – Universidade Federal do Triângulo Mineiro
Currículo: http://lattes.cnpq.br/3330613284585256
138
- Wagner Wey Moreira
UFTM – Universidade Federal do Triângulo Mineiro
Currículo: http://lattes.cnpq.br/5798244047692726
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 127-138, 2018
Educação Científica nos museus: a
importância das diversas linguagens
presentes nas exposições
CASTILHO, Thaís Balada
SOUSA, Adriano Ribeiro
OVIGLI, Daniel Fernando Bovolenta
Resumo: A educação científica é parte indispensável na formação de cidadãos. Desta forma, este trabalho tem como objetivo entender o processo de educação científica nos museus e a influência das várias linguagens, utilizadas nas exposições, na compreensão de
conceitos científicos dentro dos museus de ciências. Observa-se que as várias linguagens
utilizadas no processo de comunicação permitem as interações entre público e exposição,
o que estimula os visitantes por diversos canais sensoriais, aguçando o processo educativo.
O que permite concluir que aprendizagem dentro dos museus é decorrente de vários caminhos sensoriais e, pode, transforma este processo em uma experiência prazerosa. Por fim,
posiciona-se o museu como instituição ponte entre educação e sociedade.
Palavras chave: Educação Científica; Museus; Linguagens.
Abstract: scientific education is an indispensable part of the formation of citizens. In this
way, this work aims to understand the process of scientific education in museums and the
influence of the various languages used in the expositions, in the understanding of scientific concepts within the science museums. It is observed that the various languages used
in the communication process allow interactions between the public and the exhibition,
which stimulates visitors through several sensorial channels, thus enhancing the educational process. This allows us to conclude that learning within museums is due to several
sensorial paths and, can, turns this process into a pleasurable experience. Finally, the museum is positioned as a bridge between education and society.
Keywords: Scientific Education; Languages; Museums.
139
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 139-148, 2018
1. Introdução
A acumulação de conhecimentos é um dos mais importantes passos da
humanidade (CHASSOT,1994). Sendo um processo acumulativo, o saber sistematizado é, também, um produto da Ciência e do seu papel no desenvolvimento
social. A relação entre a construção do conhecimento científico e desenvolvimento tecnológico é alimentada mutualmente e pode ser melhor compreendida quando pensamos em momentos históricos, como a revolução industrial em que um
princípio científico, a produção de energia elétrica por magnetismo, modificou a
produção das industrias e, essas duas condições, transformaram a economia.
Essa relação entre ciência e tecnologia demanda que a sociedade esteja
envolvida em discussões sobre o conhecimento científico que só podem acontecer
de maneira proveitosa com uma população educada cientificamente. A educação
científica, na perspectiva de educar cidadãos, é por Oliveira definida como
Um conceito multidimensional envolvendo simultaneamente três
dimensões: aprender Ciência (aquisição e desenvolvimento de
conhecimento conceitual); aprender sobre Ciência (compreensão
da natureza e métodos da Ciência evolução e história do seu
desenvolvimento bem como uma atitude de abertura e interesse
pelas relações complexas entre Ciência, Tecnologia, Sociedade
e Ambiente); aprender a fazer Ciência (competências para
desenvolver percursos de pesquisa e resolução de problemas).
(OLIVEIRA, 2010, p. 26)
Aprender ciência, como descrito na preposição acima, é definida pelas
regras, leis e equações de conceito, muito conhecidos na sala de aula e, por vezes,
se torna o ponto central da educação científica escolar. Aprender a fazer ciência,
em geral, está presente nas universidades e na formação de pesquisadores. Aprender sobre a ciência, engloba questões da sua construção sócio histórica e de sua
influência no desenvolvimento humano, fica, constantemente, fora das discussões
em sala de aula.
Ensinar ciências, no contexto de promover debates que envolvam questões tanto da sua produção como o seu entrelaçamento com o desenvolvimento
sociocultural, implicam o contato com conhecimentos que vão além do saber
técnico, perpassando o “entendimento acerca das novas formas de conceber os
fenômenos naturais e os impactos que estes têm sobre nossa vida” (SASSERON,
2015, p. 52). Na educação formal, aquela que ocorre dentro da sala de aula com
horários, avaliação e currículos estruturados, existem limitações curriculares para
a implantação de atividade com abordagens que extrapolem a compreensão de
leis e regras e a resolução de exercícios. Assim, o uso de ambientes extraescolares
de forma consciente pelos educadores pode ser uma alternativa que fomente a
aprendizagem da ciência.
Utilizar de espaços diferentes para a educação científica é justificado pelas
atividades únicas e de difícil replicação nos espaços formais de ensino. As experi140
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 139-148, 2018
ências adquiridas nestas atividades são motivadoras, já que, a abordagem dinâmica que os temas são apresentados e os diferentes recursos utilizados, causam um
efeito positivo nos estudantes, muitas vezes, tornando-se marca nas lembranças
educacionais.
A definido dado pelo Conselho Internacional de Museus (ICOM), diz
que
Museu é uma instituição permanente sem fins lucrativos, ao
serviço da sociedade e do seu desenvolvimento, aberta ao público,
que adquire, conserva, investiga, comunica e expõe o património
material e imaterial da humanidade e do seu meio envolvente com
fins de educação, estudo e deleite (ICOM, 1992).
Os museus de ciências são instituições que têm como objetivo o desenvolvimento de atividades ligadas à divulgação científica em várias camadas da
sociedade. Desta forma, os museus de ciências podem ser utilizados como importantes espaços educacionais e aliados para a educação científica.
Cury (2005) coloca que a interpretação de cada peça museológica é única e individual, advinda dos referenciais dos visitantes e acrescida pelo discurso
museológico. O aprendizado só é efetivado quando existe a apropriação deste
discurso pelo público, satisfazendo suas necessidades. Desta maneira o visitante
“cria e difunde um novo discurso e o processo recomeça, sendo que esse novo
discurso será apropriado por outros e a história se repete” (CURY, 2010, p. 361).
Entre a exposição e o visitante estão os processos de comunicação dos
museus e a sua intencionalidade. Existe, ainda, a figura do mediador, importante
colaborador para a realização de visitas, elaborando estratégias de aproximação
entre o público e exposição. Para Queiroz e seus colaboradores, entre as habilidades dos mediadores é necessário
[...] que, entre outras coisas, sejam capazes de evidenciar as
concepções e modelos mentais alternativos aos da ciência e colaborar
com perguntas e atividades para que o público se engaje no processo
de construção de novos conhecimentos, mais compatíveis com o
elaborado pela ciência e transposto para as exposições do museu
(QUEIRÓZ, et. al., 2002, p. 79).
As exposições, de modo geral, estão impregnadas com a mensagem, previamente concebida, que os organizadores da exposição querem transmitir. Para
isso, os curadores das exposições laçam mão de objetos, recursos audiovisuais
e, com frequência, múltiplos recursos sensoriais, inserindo o visitante em uma
realidade artificial que está ali para que ele possa compreender a mensagem objetivada. As várias formas de transmissão da mensagem desejada se transformam no
processo de comunicação dos museus.
141
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 139-148, 2018
A função museológica é, fundamentalmente, um processo de
comunicação que explica e orienta as atividades específicas do
Museu, tais como a coleção, conservação e exibição do património
cultural e natural. Isto significa que os museus não são somente
fontes de informação ou instrumentos de educação, mas espaços e
meios de comunicação que servem ao estabelecimento da interação
da comunidade com o processo e com os produtos culturais (ICOM,
1992, p. 3).
Neste sentindo se faz importante pensar na influência das várias linguagens presentes nos museus e seu papel na interpretação das exposições pelo público visitante, pensando em como, ou quando, a comunicação museológica se
torna realmente efetiva.
2. Educação Científica nos museus
A educação, independente da área, tem por finalidade preparar o educando para a vida (BRASIL, 1996). Esse preparo está diretamente ligado com a capacidade do educando de comunicar-se, argumentar, compreender e agir; enfrentar
problemas de diferentes naturezas; ser capaz de elaborar críticas ou propostas
(BRASIL, 2002). Dentro deste contexto e no âmbito da educação em ciências,
torna-se importante propiciar a compreensão do desenvolvimento científico e tecnológico e de suas implicações sociais, econômicas, políticas, ambientais e éticas.
Os museus possuem diversas funções como a aquisição, conservação, investigação, comunicação e exposição de patrimônios culturais da humanidade,
com propósitos relacionados a estudo e educação. No que se refere às suas funções educacionais, os museus dependem das suas especificidades como: tamanho,
recursos financeiros, quadro de pessoal, acervo e, principalmente, do público que
o museu quer atingir.
A relação museu-educação ocorre desde o surgimento dos museus. Um
dos primeiros museus da humanidade foi o de Alexandria, antiga capital do Egito.
Esse museu atuava juntamente com a sua biblioteca e foi fundado por Ptolomeu
após a divisão do império de Alexandre, O grande, devido a sua morte. Ptolomeu era o governante dessa região do Egito e ele era sedento por conhecimento
e intelectualidade (FLOWER, 2010). Um dos seus principais conselheiros era
Demétrio, que convenceu Ptolomeu a adquirir manuscritos e que hospedasse a
cultura atual da época.
O museu de Alexandria tinha diversos aspectos que se diferem dos atuais
museus. Sua concepção era de um templo para as Musas, personagens da mitologia grega que faziam referência à arte e ciências, e tinha a finalidade de debates,
aulas, pesquisas e cópias de documentos, relacionados aos mais diversos temas.
Além disso, o museu era destinado à nobreza.
No século XVII, a organização dos museus levava em conta o armazenamento dos objetos e as coleções particulares da realeza e das diversas obras que
foram chegando com o advento das navegações e do encontro de comunidades,
142
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 139-148, 2018
até então, pouco conhecidas. A organização dessas coleções passou a acontecer no
século XVIII, o que propiciou o início das pesquisas nestes locais, sendo que, já
existia a intencionalidade educacional, principalmente das elites (MARANDINO,
2008).
A abertura para a comunidade, de forma geral, começou nos séculos XIX
e XX. Com essa abertura, foi necessário criar mecanismo de interação com o público não só para ganhar o seu interesse, mas, para que as explicações dos aspectos
científicos ficassem mais claras. Em meados do século XX, a interatividade com
as exposições passa a ser o carro-chefe dos museus, colocando o visitante como
sujeito ativo. Neste momento, o museu de ciências passa a ver como prioridade
informar à sociedade sobre os processos científicos e o a sua influência no contexto social.
No Brasil, a relação museu e educação vem desde a chegada da família
real com a criação do Museu Nacional no século XIX, dentro do programa de
modernização do país e com fortes influências francesas. O Museu Nacional era
aberto ao público e oferecia palestras e cursos direcionados a população (VALENTE; CAZELLI; ALVES, 2005).
Hoje, a preocupação da equipe educativa do museu, de forma geral, é
gerar exposições que tenham uma linguagem acessível aos visitantes para que
estes possam não apenas compreender seu objetivo, mas tornando-a significativa.
Marandino (2008, p. 16) coloca que “é preciso que o visitante seja ativo e engajado intelectualmente nas ações que realiza no museu e que as visitas promovam
situações de diálogo entre o público e, deste, com os mediadores. ”
As abordagens promovidas pelos museus de ciências não mostram apenas a concepção da ciência do museus, curador e pesquisadores de determinado
museu. Também estabelecem um diálogo com os visitantes, configurando perfis
distintos tanto de exposições como de público. Para se estabelecer objetivos educativos para as atividades é necessário se definir os papeis dos mediadores e dos
visitantes dentro da dinâmica museológica.
Os mediadores dos museus, focados em ciências, como define Queiróz e
colaboradores
[...] buscam desenvolver modelos pedagógicos [...] que, entre outras
coisas, sejam capazes de evidenciar as concepções e modelos mentais
alternativos aos da ciência e colaborar com perguntas e atividades
para que o público se engaje no processo de construção de novos
conhecimentos, mais compatíveis com o elaborado pela ciência e
transposto para as exposições do museu (QUEIRÓZ et. al. 2002).
Uma das competências dos museus de ciências e tecnologia, é a de “aproximar o visitante do saber científico, levando em conta a necessária transformação
desse saber de forma a torná-lo acessível ao público” (QUEIROZ, 2002, p.79).
Dentro dos museus essa aproximação pode ser feita pelos mediadores e a eles cabe
a construção de estratégias para que ela ocorra. A formação adequada dos mediadores deve ser responsabilidade da instituição que administra os museus, não se
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 139-148, 2018
143
preocupando somente com os aspectos teóricos da exposição, mas também com
os aspectos de comunicação.
Os visitantes dos museus, especialmente nos de ciências, buscam compreender as exposições de maneira livre ou, frequentemente solicitando a explicação
de um mediador. Almeida (2005, p. 32) refere que “cada visitante constrói sua
própria exposição ao selecionar seu percurso de acordo com seu desejo, suas motivações, suas necessidades e seus companheiros, entre outras variáveis. ”
O processo de comunicação ocorre pelas diversas interações do público
com a exposição (da exposição com o visitante, entre monitores e visitantes e
entre visitantes) e ocorre na relação entre conhecimentos antigos e novos e, ainda,
na esfera emocional. Chinelli, Pereira e Aguiar (2008, s.p.) referem que “no nível
concreto, a interação se dá mediante atividade - por isso, interatividade. Quando
o visitante liga, toca, lê, manuseia, joga, observa, ouve..., encontra oportunidades
para realizar operações mentais que resultam em conhecimento: interpretar, problematizar, questionar, refletir, criticar, elaborar hipóteses. ”
Atualmente compreende-se a prática educativa dos museus como uma
ação multifacetada cujo objetivo maior é o cumprimento da atividade educativa
do museu. A relação e a interação com o público são a razão da existência dos
museus, porém, estabelecer contato e se relacionar diretamente é o um desafio.
Desta forma, as múltiplas linguagens utilizadas nos museus têm o objetivo de
diminuir esta lacuna.
2.1 As diferentes linguagens nos museus
O museu é um ambiente organizado por estratégias que ilustram valores
de um universo social. “Entrar em um museu e visitá-lo é ultrapassar um limite
espacial que medeia e instaura contato com outros espaços/temporalidades/percepções do real. ” (CRIPPA, 2013, p. 136) O que nos auxilia na percepção do
ambiente quase mágico do museu e a compreender a mensagem de cada exposição é a maneira como essa se comunica.
Segundo Hooper-Greenhill (1998, p. 11) “todo o processo de comunicação atua como um conjunto de mensagens intencionadas, que também pode
ser entendido como um conjunto de mensagens não-intencionadas”. No diálogo
entre museu e visitantes é possível elencar vários pontos de sutura que conduzem
ao intuito da exposição. Entre eles estão: objetos, recursos audiovisuais, placas informativas, decoração, visitantes e mediadores e seus discursos, sendo que, os dois
últimos caracterizam a parte não intencional da comunicação, esta, “marcada por
uma dose de imprevisibilidade” (VALENTE; CAZELLI; ALVES, 2005, p. 197).
144
As linguagens do museu podem ser observadas por uma instância
semiótica configurada na medida em que é ferramenta de
interpretação de culturas e de modalidade de suas articulações,
através de textos, discursos e artefatos significantes, interações,
situações e formas de vida estudados através de modelos gerais que
revelam diferenças gerais e específicas. (CRIPPA, 2013, p. 13)
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 139-148, 2018
Os objetos e experimentos são base no discurso museal, visto que grande
parte das atividades que ocorrem nos museus de ciência é centrada neles. Isso
porque estas ferramentas permitem ao visitante a apropriação do conceito, favorecendo sua compreensão científica e sócio histórica, levando-os para uma análise pessoal e posterior discussão com mediadores (outros visitantes, professores).
“Tendo como ponto de partida o objeto real e concreto, o museu associa-lhe um
significante, o texto que o identifica, e um significado, ou seja, um conceito”
(ROQUE, 2015, p. 216), desta maneira, existe uma intencionalidade na escolha
de cada peça exposta.
Os instrumentos científicos auxiliam na conexão entre técnica e ciência.
A exposição desses objetos solitariamente leva a um entendimento muito restrito
do pensamento científico e de sua construção. Para um entendimento global, os
objetos devem ser mostrados sob uma ótica holística, aproximando o contexto
sociocientífico do visitante, assim, o público pode construir um significado contextualizado sobre os instrumentos.
Sendo as exposições construídas por uma equipe que vive em um meio
social, é carregado das influências deste meio. As construções socioculturais estão
relacionadas diretamente com a sua linguagem, que reflete condições particulares
e são diferenciadas pelo uso do seu enunciado característico: “(...) cada esfera de
utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo
isso que denominamos gêneros do discurso” (BAKTHIN, 1997, p. 279).
Grande parte dos discursos são tão entrelaçados às construções sociais
que “de uma forma imediata, sensível e ágil, refletem a menor mudança na vida
social” (BAKTHIN, 1997, p. 285). Os museus selecionam e montam exposições
“com o intuito de comunicar determinados valores simbólicos contidos nos objetos, produzindo, dessa forma, um discurso e uma narrativa museal.” (ROSA,
2015, p.4)
Assim, discurso museológico que empreendem contemplar a diversidade
de expressões estéticas e culturais existentes, ainda, obter o diálogo entre todos os
aspectos físicos da exposição com o visitante.
Roque coloca que:
O discurso museológico pretende informar acerca do objecto e da
perspectiva veiculada pela exposição, disponibilizando um conjunto
de chaves de leitura que o visitante possa gerir de acordo com os
seus interesses, mas não impondo essa informação à faixa de público
que apenas pretenda aproveitar a exposição como um espaço de
lazer e contemplação. (2015, p.221)
Além do discurso próprio, o museu conversa com o espaço em que está
inserido, modificando o meio e executando ações de reconhecimento mútuo.
Para Crippa:
145
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 139-148, 2018
O museu que dialoga com o espaço em que se insere, seja este
um bairro, uma cidade, seja um espaço simbólico, tem se tornado
um tema muito abordado pela literatura que discute significados
e funções dos museus em todas as instâncias, desde sua ontologia
até as tarefas executivas nele realizadas, passando pelas suas funções
sociais, históricas, políticas e econômicas. (CRIPPA, 2013, p. 135)
Todas as relações destacadas entre exposição e meio cultural também se
configura como linguagem, já que, comunica ideias, sentimentos e possibilita
discussões através dos objetos e todos os signos convencionais, sonoros, gráficos,
gestuais. Desta forma, a exploração de temas científicos sob a perspectiva histórica, contemplando seus aspectos sociais e culturais, permite perceber a ciência
como uma construção humana coletiva. Além disso, a articulação de diferentes
pontos de vista permite o alargamento do entendimento da ciência, da tecnologia
e das relações sociais
Considerações finais
146
A educação científica é bem mais que promover a fixação de termos e
conceitos, é, também, privilegiar momentos de aprendizagem que possibilitem
aos alunos uma formação para viver em sociedade. Os museus têm a capacidade
de ir além do processo histórico, estimulando debates e experiências diferenciadas, utilizando de recursos com grande potencial de impacto nos visitantes.
A interação sociocultural permite a introspecção cognitiva capaz de redefinir o objeto descoberto e desenvolver uma compreensão dos temas tratados.
Essa interação tem uma condição única que é alguém que queira ou precise saber.
Assim, aprender em um museu de ciências, por exemplo, leva a quem aprende
uma visão em várias dimensões e transforma a aprendizagem em um processo
prazeroso que, até certo ponto, pode não ser reconhecido como aprendizagem
pelos visitantes.
É obvio que somente apresentar exposições em um ambiente com amplos
dispositivos sensoriais não é suficiente para que sejam compreendidos. A compreensão ocorre quando a disposição dos objetos, o cenário montado, os recursos
sensoriais são aliados ao contexto e a um discurso que mobilize todas essas ferramentas na direção de um conhecimento.
Pensar sobre as relações discursivas estabelecidas dentro do museu de ciências, implica a compreensão da variedade de sentidos dados ao conhecimento
científico nos diferentes contextos e que constituem o imaginário social. Desta
forma, cabe aos museus o papel de levar até a sociedade as bases de uma cultura
científica, mostrando os riscos e benefícios do conhecimento produzido pela Ciência, promovendo um intercâmbio entre ciência e a sociedade.
Se faz necessário pensar em um aprofundamento nas relações entre educação e museus, posicionando os museus como instituição ponte entre sociedade
e educação, o que é justificado ao se pensar que a maioria dos visitantes visam a
aprendizagem, conferindo aos museus a responsabilidade com a sociedade no que
tange a educação.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 139-148, 2018
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148
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 139-148, 2018
Espaços não formais: utilização
dos museus no processo de ensino/
aprendizagem voltado às Ciências
PINHEIRO, Cleiton da Silva
LIMA, Maurício Szaz de
GRACIOLI, Jéferson Muniz Alves
SANTOS, Ricardo André Ferreira de Oliveira
Resumo: Ao relacionarmos museus e aprendizagem conseguimos perceber que é este é um
espaço muito importante para a educação não formal, desse modo, podemos identificar
que quando se trata de museus como um espaço não formal ligado a aprendizagem ele
se torna um espaço bem interessante para ser utilizado, principalmente para o ensino de
Ciências. Este artigo tem como objetivo observar os pontos de vista de diferentes autores
sobre o tema abordado e dissertar sobre a importância do uso dos museus como espaço
de ensino/aprendizagem contribuindo para a construção do conhecimento. É um estudo
embasado em uma revisão bibliográfica. A partir da produção desse artigo observamos
que existem pontos que são de suma importância para a educação, seja ela formal ou não
formal. Temos espaço para a compreensão de que as mesmas formam sujeitos a fim de
compreender o mundo, sua existência e seu papel dentro da sociedade.
Palavras chave: educação não formal; Museu; Escola.
Abstract: When we relate museums and learning we can realize that this is a very important space for non-formal education, so we can identify that when it comes to museums as
a non-formal space linked to learning it becomes a very interesting space to be used, mainly
for the teaching of Sciences. This article aims to observe the points of view of different
authors about the theme and to discuss the importance of the use of museums as a teaching
/ learning space contributing to the construction of knowledge. It is a study based on a
bibliographical review. From the production of this article we observe that there are points
that are of great importance for education, whether formal or non-formal. We have room
for understanding that they form subjects in order to understand the world, its existence
and its role within society.
Keywords: Non-formal education; Museum; School.
149
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 149-158, 2018
1. Introdução
É perceptível que nos últimos anos houve um crescente na quantidade
de museus e espaços não formais de educação, mas mesmo isso sendo observado,
percebe-se que essa quantidade ainda não contempla um número satisfatório de
pessoas. Existe ainda certa quantidade de sujeitos que nunca visitaram nenhum
desses espaços por diversos motivos como: desconhecimento da existência destes
espaços em suas cidades, dificuldade de locomoção, falta de interesse da população, falta de divulgação desses espaços, entre outros.
Esses são alguns dos exemplos de problemas discutidos por vários autores
especializados em estudos sobre a educação não formal, informal e formal. Dentre eles podemos citar Gaspar (2002), Falcão e Gilbert (2005), Queiroz (2002),
Bitter (2010), Teixeira (2014), dentre outros. Esses autores discutem vários problemas enfrentados por esses espaços e em seus textos trazem ideias que podem
ser utilizadas para a melhoria dessas situações.
Ao relacionarmos museus e espaços não formais, observa-se que há possibilidade da construção da aprendizagem que segundo Stuart (2007) é “um
processo de mudança conceitual”, em vez de “absorção de um conhecimento
transmitido”. Tal percepção pode ser obtida a partir da definição de espaços não
formais de Marandino:
Qualquer atividade organizada fora do sistema formal de educação,
operando separadamente ou como parte de uma atividade mais
ampla, que pretende servir a clientes previamente identificados
como aprendizes e que possui objetivos de aprendizagem, notase o laço entre os espaços não formais, educação e museus”.
(MARANDINO, 2008, p. 13)
E ainda, em congruência da construção de conhecimento relacionada a
espaços não formais e museus, temos a definição desta posta por Silva e Fonseca
de que o museu é,
Etimologicamente, a palavra museu deriva de musa (na mitologia
greco-latina, uma divindade inspiradora) como se ela fosse à casa
das musas, um lugar dos saberes, dos conhecimentos elevados, um
local onde diferentes materiais, considerados significativos para uma
sociedade, são preservados e expostos como fontes de inspiração
e incentivo para novas grandezas surgirem (SILVA e FONSECA,
2007, p.73).
Em complemento ao conceito de Silva e Fonseca, temos o Conselho Internacional de Museus (ICOM), que define museu como um espaço criado de
interesse público que tem como finalidade conservar, expor, estudar e valorizar
a história material do homem e do meio em que vive com o intuito de educar e
fornecer lazer a sociedade. Como exemplos desses espaços podem citar: jardins
150
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 149-158, 2018
zoológicos, aquários, exposições não comerciais, jardins botânicos, monumentos
naturais, etc.
Smaniotto, nos traz a importância de utilizar os museus como espaços
de aprendizagem,
Assim sendo, a instituição-museu é o espaço ideal para o
desenvolvimento desses processos. Os museus são, por excelência,
locais de observação, interação e reflexão. Desta forma, os museus
podem ser trabalhados como espaço de discussão de ideias, espaço
de aprendizagem consequente e não somente como o lugar do
lúdico ou da contemplação. (SMANIOTTO, 2016, p.3)
Autores como Cazelli et al, (1997 e 1998); e Falcão et al, (1997a), destacam a diferença observada por professores e alunos sobre o espaço dos museus. É
citada a falta de compreensão que certos professores têm das possibilidades de utilizarem os museus como espaço de ensino favorecendo ao aluno uma ampliação
cultural de seus conhecimentos. Além do prisma da aprendizagem não formal podemos compreender os museus também como um espaço de divulgação científica,
que de acordo com Rebello (2001), “Os museus de ciência possuem uma missão
comum: a de estimular a compreensão pública da ciência”. Deste modo o museu
de ciências tem como objetivo geral o de alfabetizar cientificamente os cidadãos.
Este artigo tem como objetivo observar os pontos de vista de diferentes
autores sobre o tema abordado e dissertar sobre a importância do uso dos museus como espaço de ensino/aprendizagem contribuindo para a construção do
conhecimento. É um estudo embasado em uma revisão bibliográfica com base
nos textos relacionados a esse conteúdo.
2. Educação ormal, informal e não formal
Ao falarmos sobre a escola atrelamos a ela diretamente a ideia de educação, mas o que é educação? Segundo René Hubert (1996, p.94),
A educação é o conjunto das ações e das influências exercidas
voluntariamente por um ser humano num outro, em princípio
por um adulto num jovem, e orientadas para um fim que consiste
na formação, no jovem, de toda a espécie de disposições que
correspondem aos fins a que é destinado quando atinge a maturidade.
Segundo Gaspar (2002, p. 171), “a educação com reconhecimento oficial, oferecida nas escolas em cursos com níveis, graus, programas, currículos e
diplomas, costuma ser chamada de educação formal”. O autor ainda cita que o
ensino formal já era conhecido na china desde o seculo XI e complementa que
suas características eram bem parecidas com as que temos hoje.
Já para Rauber (2008, p. 17-28),
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 149-158, 2018
Com a crescente escrituração e estratificação da sociedade, à casta
sacerdotal, devem-se o primeiro sistema de ensino formal, motivado
pela necessidade da formação do sacerdote escriba – guardião da
ordem religiosa – o qual passa a ser o encarregado da administração
da sociedade. [...] O novo sistema escolar será reservado aos filhos
das classes que detêm o poder, portanto, não sendo nem universal
nem tampouco compulsório. O processo educativo dedica-se à
conservação e continuidade do sistema sócio-político e dos valores
vigentes nas classes que detêm o poder. O conteúdo do ensino
será diretamente vocacional, moral e didático. A capacidade de ler
e escrever confere àquele que a possui certo ar de mistério, pois,
apoiadas em sansões religiosas, a autoridade da palavra escrita à
torna invulnerável.
Epistemologicamente a educação é um ato humano e observa-se isso pelos diferentes pontos de vista postos por Gaspar (2002) e Rauber (2008).
Gaspar (2002), relata que “O surgimento da escola nas civilizações mais
avançadas decorre da necessidade de preservar e garantir o legado do acervo cultural continuamente gerado por essas civilizações”. E ainda, “provavelmente, foi
também por essa razão que o conhecimento a ser transmitido na escola se organizou e se especializou num ordenamento de conteúdos separados em áreas
uniformes e distintas, com o significativo nome de disciplinas” (GASPAR, 2002,
p. 172).
Em complemento, Gaspar (2002) relata que a sociedade que vivemos
tem uma necessidade que vai além do ensino formal oferecido pelas escolas, das
disciplinas ensinadas e também dos currículos empregados. Ele nos reforça que a
educação informal também sempre existiu e nunca esteve atrelada a apenas espaços, horários e currículos. Dessa forma, os seres humanos conseguirão compartilhar todos seus conhecimentos.
Por definição, Marandino (2008, p. 13) cita que a educação informal é
“o verdadeiro processo realizado ao longo da vida em que cada indivíduo adquire
atitudes, valores, procedimentos e conhecimentos da experiência cotidiana e das
influências educativas de seu meio – na família, no trabalho, no lazer e nas diversas
mídias de massa”.
A partir disso Gaspar (2002), relata que existe além da educação formal
e informal, uma educação que se assemelha com a formal pelo fato de ter disciplinas, currículos e programas, porém diferencia na não obtenção de diplomas e
graus oficiais, é a educação não formal. Essa educação é defendida por Marandino
(2008, p. 13), comenta como “qualquer atividade organizada fora do sistema formal de educação, operando separadamente ou como parte de uma atividade mais
ampla, que pretende servir a clientes previamente identificados como aprendizes
e que possui objetivos de aprendizagem”.
Para Rebello (2001), somado a isso, a educação tem muito a ganhar com
os espaços não formais, considerando também que há diversos museus com inúmeras temáticas que contribuem para esta educação e ensino.
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 149-158, 2018
3. Museus como espaços de aprendizagem
Queiroz et al (2002), ao tratar da educação não formal, observa que,
alguns desses espaços sofrem um impasse. Ele cita que os museus sofrem com a
dificuldade de seus visitantes terem autonomia quando forem visitá-los e se preocupa também com a não escolarização dos seus espaços.
Pozo e Crespo (1998), trazem que a educação não formal possui aspectos próprios em relação à autonomia do visitante nesses espaços o que auxilia a
expansão e o refinamento cultural em um ambiente que surge de processos cognitivos dotados de motivação intrínseca para a aprendizagem de ciências. Desse
modo, cada sujeito vai se motivar de alguma forma, pois somos pessoas diferentes
umas das outras e sofremos com influências internas, tais como, o jeito de ser, o
gosto específico, a relevância que cada um dá para cada coisa em específico, etc. E
isso invalida alguns fatores externos.
Para Gaspar (2002), existem muitas dúvidas e inquietações dos educadores de ciências em relação à educação não formal. Muitos acreditam que não seja
cabível ensinar e aprender ciências nesses ambientes, pois existem muitas formas
da criança se dispersar. Já alguns educadores alegam que algumas coisas sempre
ficam e que muitos conceitos científicos se tornam melhores compreendidos depois de uma visita a um centro de ciência, aliás, um resultado comprovado por
inúmeras pesquisas acadêmicas empíricas realizadas nessas instituições, em todo
o mundo.
Fica evidente a eficiência da interação verbal desencadeada por provocações, questões que estimulavam os alunos a pensar e a manifestar-se. Quando acompanhadas de demonstrações experimentais, essas questões despertavam
enorme interesse, tornando as aulas movimentadas, alegres e produtivas. Nessas
ocasiões, alunos e alunas mobilizavam intensamente suas estruturas de pensamento, e o processo de ensino e aprendizagem se tornava extraordinariamente rico e
produtivo (GASPAR, 2002).
Corroborando com a discussão iniciada, temos a ideia de Vigotski (1987),
de que o ensino formal dá origem aos conceitos espontâneos e o ensino informal
aos conceitos científicos. A ideia básica, inicial, leva em conta que a aquisição
cognitiva de um novo conceito, espontâneo ou científico, é sempre um processo
de construção gradativo que se assenta em alicerces previamente construídos que,
por sua vez, são também conceitos espontâneos ou científicos.
A partir disso, Gaspar (2002) afirma que quanto mais rica a vivência sociocultural proporcionada a uma criança, maior a capacidade linguística, verbal e
simbólica que ela será capaz de adquirir e maior o acervo cognitivo de percepções
sensoriais que ela poderá acumular. E isso pode acontecer na escola e fora dela, em
casa, nas ruas, nos parques e, é claro, em museus e centros de ciências.
Em consonância a essa ideia Falk (2010), traz que a aprendizagem é algo
que fazemos o tempo todo, ao longo de nossas vidas, acontece na escola e em
casa, em salas de aula, nos locais de trabalho, em museus, enquanto assistimos
televisão, quando praticamos esportes e durante uma conversa com amigos.
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 149-158, 2018
Cazelli et al (1997) e Falcão et al (1998) destacam por meio de estudos
a falta de compreensão dos professores, das possibilidades de ampliação cultural
que os museus oferecem aos estudantes, seguindo esta perspectiva constatou a
necessidade de inserir um trabalho mais extenso e completo de formação de professores para a participação como mediadores dos museus, que é a ponte entre o
museu e os visitantes. Traz ainda o uso do museu como uma forma de complementar os diversos espaços vividos pelos estudantes, tornando mais ricas as suas
oportunidades de aprendizagem.
4. Relação museu e escola
Observamos muitos alunos desmotivados matriculados nas escolas e que
não se reconhecem nela, por muitas vezes esses alunos não conseguem perceber
seu real sentido. Gómez, cit. em Oliveira, Vieira e Palma (1997, p.45), citam que
“numa sociedade em profundas mudanças, o que justifica plenamente o sentido
da escola é sem dúvida o desenvolvimento, nos alunos, do sentido crítico e criativo sobre a atualidade, para que eles possam construir o seu próprio amanhã”.
A partir disso Ditrano e Silverstein (2006), vem nos mostrar que o conhecimento informal adquirido por esses alunos em casa ou em qualquer outro
espaço frequentado por eles, fora do ambiente escolar, se torna importantíssimo
para criar em cada um deles uma “bagagem” que será adicionada ao seu processo
de escolarização e a partir de suas experiências e seus saberes contribuirão para a
formação de sua identidade escolar.
Mora (2013), aponta certas propostas de implementação da relação entre
os espaços de educação formal e não formal e ainda afirma que elas são delineadas
considerando a importância de se avaliar as experiências através de seus usuários
em um processo de “retroalimentação” que permitiria a melhoria e retorno quase
que instantâneo aos usuários dos museus.
Marandino (2008) nos diz que o público mais vultoso nas visitas realizadas em museus por todo o mundo é o público escolar e isso se dá pela quantidade
de escolas que existem ou por várias ações que são organizadas para conseguir
atendê-lo. A partir disso, estudos realizados no Brasil indicam que em vários momentos que alunos de classes sociais desfavorecidas só conhecem museus ou espaços não formais de educação a partir da escola (CAZELLI, 2005).
Desse modo, Krapas e Rebello vem nos falar sobre as dificuldades de
conseguir se observar uma boa relação entre a escola e os museus,
A visita de escolas a museus é uma prática cada vez mais difundida
entre professores, muitos dos quais veem nesses espaços a
oportunidade de ilustrar os conteúdos desenvolvidos em sala de
aula. Contudo, as possibilidades da ação educativa desenvolvida
pelos museus ultrapassam a simples complementação do trabalho
escolar. Os programas educativos em museus não se destinam
exclusivamente ao público escolar, ainda que este seja, em alguns
museus, seu maior usuário. O discurso do museu atinge todo tipo
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 149-158, 2018
de público. Assim, embora possam se dedicar a temas referentes
ao currículo escolar, entendemos que o museu não deve orientar
suas ações sistematizadas de acordo com o currículo e cronograma
escolar (KRAPAS e REBELLO, 2001, p. 16-17).
E essas dificuldades também podem ser observadas na fala de Mora
(2013), que nos mostra que o museu é considerado um espaço informal que
promove a cultura cientifica e justamente por ser um espaço informal, encontra
dificuldade por parte da escola em compreender os processos de aprendizado neste ambiente diferente do vivido nas escolas (formal). Nesta perspectiva é preciso
compreender que a educação em um espaço informal é um processo individual
definido pelos conhecimentos prévios, motivações e interesses do sujeito/visitante
do museu.
Na mesma obra Mora (2013), afirma que um dos principais problemas
levantados é a relação entre o museu e a escola. Esta parceria que deveria aperfeiçoar o processo de aprendizado está rodeada de desentendimentos e dificuldades que não permitem a concretização destes espaços com todo o potencial
que deveria ser desempenhado. A escola nem sempre está satisfeita por perder
um dia de aula para levar os alunos aos museus e também nem sempre adéquam
seu currículo escolar de acordo com os temas que serão vistos no museu gerando
pouco aproveitamento da visita. Já os museus, de acordo com a autora, não se
sentem confortáveis com visitas sem planejamento, grupos grandes e todo tumulto gerado.
Assim, quando se tem um grupo de alunos visitando um museu, surge o
desafio de oferecer de forma coletiva uma experiência que atinja seus objetivos gerais, mas que também contemple os anseios individuais dos alunos. Anseios que
devem ser atendidos ou considerados, pois é preciso compreender que o processo
de aprendizado e compreensão dos conteúdos devem ser motivadores, prazerosos
e memoráveis por parte dos sujeitos (MORA, 2013).
Como possível forma de favorecer essa relação museu e escola Krapas
e Rebello nos dá uma boa posição do que poderia ser feito para minimizar essa
distância que ainda existe entre os dois,
A incorporação da discussão sobre a utilização dos espaços não
formais nos cursos de formação inicial de professores pode favorecer
a formação de profissionais aptos a trabalhar nesses espaços, seja
enquanto profissionais de museus, seja enquanto futuros professores
em visitas aos museus. A par disso, entendemos que o debate sobre
a relação museu/escola poderá também propiciar a discussão sobre
os limites da educação formal, questionando a eficácia dos recursos
empregados pelas escolas, que priorizam a racionalidade da palavra e
dos enunciados em detrimento do objeto (KRAPAS E REBELLO,
2001, p.17).
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 149-158, 2018
Queiroz et al (2002), também nos leva a refletir sobre essa importância da
aproximação entre o museu e a escola e propõe para um melhor andamento dos
dois a importância da formação de profissionais aptos a desenvolver essa tarefa.
Considerações finais
A partir da produção deste artigo, observamos que existem pontos que
são de suma importância para a educação, seja ela formal ou não formal. Temos
espaço para a compreensão de que a mesma forma o sujeito a fim de compreender
o mundo, sua existência e seu papel dentro da sociedade. É dada à reflexão de que
o museu é uma ferramenta de construção da aprendizagem, visto que esse ambiente pode construir de maneira lúdica o conhecimento, porém é necessário que
exista uma conversação entre o profissional da educação e esses espaços.
A aproximação dos jovens a esses espaços de educação não formal desde
o início de sua educação formal, fará despertar o interesse para certas áreas do
conhecimento e também facilitar seu entendimento do mundo. E a partir disso
pode utilizar esses espaços como forma de aumentar a consciência da população
sobre a importância da ciência e tecnologia e também poder criar na população
um interesse de aprofundar em seus conhecimentos científicos formando assim
uma sociedade mais crítica e menos dominada.
Por fim, cada exposição possui uma particularidade e sempre estão em
mudanças para se adaptar a individualidade e a subjetividade de seus visitantes.
Essas exposições é que possibilitam a interação entre o museu e o público e por
isso se faz necessário utilizar de estratégias para se criar um novo mundo ao visitante. Para isso se faz necessário que tanto a educação formal quanto a informal
caminhem em congruência para a formação de novos paradigmas onde os sujeitos
inseridos na sociedade se reconheçam como sujeitos históricos, ou seja, parte integrante desses ambientes.
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- Jéferson Muniz Alves Gracioli
Currículo: http://lattes.cnpq.br/1430569136446167
- Ricardo André Ferreira de Oliveira Santos
Currículo: http://lattes.cnpq.br/3937865523360941
158
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 149-158, 2018
A formação do professor de Ciências
Biológicas: o que tem sido pesquisado?
MELLINI, Carolina Kiyoko
SIVIERI-PEREIRA, Helena de Ornellas
Resumo: A proposta deste artigo é analisar a produção científica publicada em periódicos
referentes ao tema de formação de professores de Ciências Biológicas (CB). A temática
foi pesquisada em publicações da base de dados de artigos SCIELO, no período de 2010
a 2017. Trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa/quantitativa, caracterizando-o
como estudo de revisão bibliográfica. O processo possibilitou identificar 20 artigos alinhados à temática da pesquisa, que foram agrupados em quatro áreas de conteúdo: Formação
inicial de professores de CB; Formação de professores em uma área específica das CB; Formação de professores de CB e o Estágio Supervisionado; Educação Inclusiva e a formação
do professor de CB. Foi possível perceber a existência de uma lacuna teórica nos estudos
sobre a formação de professores de CB no Ensino Superior, bem como evidenciar que a
área em questão, caracteriza-se emergente no campo da Formação de Professores.
Palavras chave: Ciências Biológicas; Ensino Superior; Formação de professores.
Abstract: The purpose of this article is to analyze the scientific production published in
periodicals related to the theme of teacher training in Biological Sciences (BS). The theme
was researched in publications of the SCIELO article database, from 2010 to 2017. It is
a qualitative/quantitative research, characterizing it as a bibliographic review study. The
process made it possible to identify 20 articles aligned to the research theme, which were
grouped into four content areas: Initial training of BS teachers; Teacher training in a specific field of BS; BS Teacher Training and Supervised Internship and Inclusive Education
and teacher training in BS. It was possible to perceive the existence of a theoretical gap in
the studies on the training of teachers of BS in Higher Education, as well as to show that
the area in question is emerging in the field of Teacher Training.
Keywords: Biological Sciences; Higher Education; Teacher Training.
159
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 159-170, 2018
1. Introdução
No Brasil, o surgimento dos cursos de Ciências Biológicas está relacionado ao antigo curso de História Natural criado em 1934 pela Universidade Federal
do Rio de Janeiro. A extinção da História Natural no Ensino Superior se deu por
volta de 1963, devido ao seu desdobramento em dois cursos independentes, Geologia e Ciências Biológicas (TOMITA, 1990). A começar deste desdobramento,
em 1967 foi criado o curso de Bacharelado em Ciências Biológicas (Modalidade
Médica) e em 1974, o curso de Licenciatura em Ciências (habilitação em Biologia), resultante da Resolução 30/74. Tomita (1990) e Furlani (1993) indicam que
a Resolução 30/74 instaurou as Licenciaturas de curta duração, com carga horária
mínima de 1.800 horas, em que as grades curriculares apresentavam conteúdos de
Física, Química, Biologia, Matemática e Geologia para a formação de professores
polivalentes em Ensino de Ciências (para atuarem no primeiro grau). Por outro
lado, a formação de professores para atuarem no segundo grau, de acordo com
essa resolução, seria realizada em complementação por habilitação específica do
núcleo comum polivalente.
A transformação proposta pela Resolução 30/74, ocorreu devido à urgência em licenciar um número maior de docentes, visando suprir a falta de professores atuantes no Ensino Fundamental. Isso se deu devido à expansão da escola
pública no Brasil, impulsionando o surgimento de novos cursos de licenciatura no
país (TOMITA, 1990). Até a década de 1970, houve um certo receio por parte de
instituições privadas em criarem cursos de Ciências Biológicas, porém, a partir da
resolução, foi possível verificar um aumento significativo e intenso na criação de
novos cursos com Licenciatura em Ciências e com habilitação em Biologia, tanto
em instituições privadas, quanto na rede pública de ensino.
Com a expansão das licenciaturas a partir da década de 1970, foram
encontrados problemas de diversas ordens, relacionados às Licenciaturas de curta
duração, conforme mencionam Scheibe (1993) e Gatti (2000): a concentração
desses cursos se dava (em sua maioria) na rede privada de ensino e no período
noturno, os índices de evasão eram elevados, o corpo docente do curso apresentava qualidade duvidosa, além de existirem problemas na estrutura administrativa
e acadêmica nas instituições. Todos esses fatores colaboravam para a acentuação
da desarticulação entre as diferentes áreas do conhecimento, o que comprometia
a qualidade da formação docente.
A percepção dos problemas que afligiam e comprometiam a formação
docente no ensino superior e o interesse pelos temas relacionados à formação de
professores e sua profissionalização, caracterizaram uma tendência fortemente influenciada pelas reformas educacionais nos anos 90, em diversos países, inclusive
no Brasil. No final do século XX, foi instituída a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB – Lei nº9.394/96), que se articulou com um conjunto de reformas,
nos campos econômico, social e político, trazendo para a discussão acadêmica
a questão da formação de professores no Brasil (BARZANO, 2001). Barzano
(2001) realizou um levantamento de teses e dissertações sobre a problemática
160
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 159-170, 2018
da formação de professores no Brasil no final do século XX, indicando que a
produção de trabalhos com essa temática cresceu significativamente no período,
passando de 10, na década de 1970, para 43 na década de 1990. O aumento de
publicações mostra-se crescente e notório até os dias atuais, como é possível constatar entre os trabalhos apresentados nas últimas edições do Encontro Regional de
Ensino de Biologia (EREBIO).
Um grande número de pesquisas tem apontado críticas e limitações com
relação à efetividade dos cursos de licenciatura na preparação de professores para
atuarem no ensino básico (PEREIRA, 1998; SILVA & SCHENETZLER, 2001;
CUNHA & KRASILCHIK, 2000). De acordo com Silva e Schenetzler (2001),
as principais limitações referem-se: à dicotomia teoria-prática, derivado do modelo de formação profissional pautado na racionalidade técnica; ao modelo pedagógico que entende o processo de ensino e aprendizagem em termos de transmissão-recepção e à concepção empirista-positivista de Ciências e Biologia. Cunha e
Krasilchik (2000) apontam outros problemas associados à formação do professor,
que interferem no ensino de Ciências e Biologia, como: alta carga horária de
permanência em sala de aulas, baixos salários da categoria, número excessivo de
alunos nas salas de aula e também falta de material didático diversificado e de boa
qualidade para o professor.
Essa realidade requer uma mudança de direcionamento na formação de
professores e para uma formação adequada, torna-se necessário que os problemas
e limitações citadas sejam revertidas. Para isso, é extremamente importante que
pesquisas na área da formação de professores, principalmente de professores de
Ciências e Biologia, sejam realizadas no ambiente acadêmico, visando analisar o
panorama dessa formação, a identidade desse professor que está se formando,
bem como soluções para os problemas e limitações encontradas nessa temática.
Ademais, é preciso olhar para a formação inicial desse professor de ciências e
biologia, analisar a contribuição das disciplinas pedagógicas do curso e também
como o estágio interfere na relação professor-escola-aluno.
Frente a essa constatação e consideração de que estudos desse tipo tem
muito a contribuir com o profissional que se está formando e também com a
identidade que ele está construindo é que se objetivou o desenvolvimento desta
investigação, a partir da seguinte pergunta de pesquisa: o que tem sido pesquisado,
no Brasil, na área de formação de professores, particularmente de Ciências Biológicas?
Trata-se de um estudo caracterizado na literatura como “estado da arte”, que
tem como objetivo a quantificação das pesquisas realizadas em determinada área,
bem como sua descrição e análise, visando o levantamento das características dessa produção e perspectivas de pesquisa (FERREIRA, 2002). Utilizando como
material empírico artigos de periódicos referentes à formação de professores de
Ciências Biológicas, o estudo analisou o panorama da produção sobre a temática,
considerando o quantitativo desta produção ao longo do tempo, sua procedência
e conteúdo.
161
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 159-170, 2018
2. Procedimentos metodológicos
Esse estudo pode ser classificado como exploratório, pois seu objetivo
é analisar a produção científica publicada em periódicos referentes ao tema de
Formação de Professores de Ciências Biológicas. De acordo com Gil (2008), a
pesquisa exploratória tem como objetivo proporcionar uma familiaridade maior
com o problema, assim como Richardson (2012) evidencia que esse tipo de pesquisa busca conhecer características de um fenômeno para investigá-lo. Essas características ficam evidentes na investigação visto que a produção científica será
apresentada por indicadores de publicações científicas, possibilitando a apuração
dos principais autores/referências mais citadas dentro da temática, a averiguação
da origem dos artigos publicados, e também analisar as áreas associadas à formação de professores encontradas nas publicações.
A presente pesquisa focaliza a produção acadêmica de autores brasileiros
que se voltam à Formação de Professores, particularmente de Ciências Biológicas
(que irão atuar no ensino de Ciências e/ou Biologia), tendo em vista as possíveis
implicações/contribuições desses estudos para a área. Trata-se, pois, de uma investigação de natureza qualitativa e quantitativa, que realiza um estudo de revisão
bibliográfica (FIORENTINI & LORENZATO, 2006).
Os procedimentos metodológicos incluíram a realização de consultas ao
banco de dados Scientific Eletronic Library Online (Scielo), utilizando os termos
“formação de professores” e “ciências biológicas” como descritores, no período de
2010 a 2017, havendo o retorno de 20 artigos, listados abaixo:
162
• ARAUJO, Monica Lopes Folena; FRANCA, Tereza Luiza de. Concepções de Educação Ambiental de professores de biologia em formação nas universidades públicas federais do Recife. Educar em Revista,
Curitiba, n. 50, p. 237-252, ez. 2013.
• CASTRO, Déborah Praciano; LIMA, Daniel Cassiano. Conhecimento
do tema ofidismo entre futuros professores de Ciências Biológicas do
Estado do Ceará. Ciência e Educação, Bauru, v. 19, n. 2, p. 393-407,
2013.
• DE SENZI ZANCUL, Mariana; APARECIDA VIVEIRO, Alessandra. O laboratório de ensino de ciências como espaço privilegiado para
o planejamento de regência nos estágios supervisionados. Revista Eletrónica de Investigación en Educación en Ciencias, Tandil, v.7, n.
2, p. 22-29, 2012.
• GASTAL, Maria Luiza de Araújo; AVANZI, Maria Rita. Saber da experiência e narrativas autobiográficas na formação inicial de professores de biologia. Ciência e Educação, Bauru, v.21, n. 1, p. 149158, mar. 2015.
• GATTI, Bernardete A. Formação de professores no Brasil: características e problemas. Educação e Sociedade, Campinas, v.31, n. 113, p.
1355-1379, dez.2010.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 159-170, 2018
• GUERTA, Rafael Soave; CAMARGO, Cristiane Cordeiro de. Comunidade de aprendizagem da docência em estágio curricular obrigatório: aprendizagens evidenciadas pelos licenciandos. Ciência e Educação, Bauru, v.21, n. 3, p. 605-621, set.2015.
• GUIMARAES, Simone Sendin Moreira; INFORSATO, Edson do
Carmo. A percepção do professor de Biologia e a sua formação: a Educação Ambiental em questão. Ciência e Educação, Bauru, v. 18, n.
3, p. 737-754, 2012.
• JUSTINA, Lourdes Aparecida Della et al. A percepção de estudantes
da Licenciatura em Ciências Biológicas sobre a pesquisa na área de Ensino de Ciências. Revista Eletrónica de Investigación en Educación
en Ciencias, Tandil, v. 5, n. 2, p. 20-30, dic. 2010.
• JUSTINA, Lourdes Aparecida Della; MEGLHIORATTI, Fernanda
Aparecida; CALDEIRA, Ana Maria de Andrade. A (re)construção de
conceitos biológicos na formação inicial de professores e proposição
de um modelo explicativo para a relação genótipo e fenótipo. Revista
Ensaio, Belo Horizonte, v. 14, n. 3, p. 65-84, dez.2012.
• NICOLINI, Livia Baptista; FALCAO, Eliane Brígida Morais; FARIA,
Flavio Silva. Origem da vida: como licenciandos em Ciências Biológicas lidam com este tema? Ciência e Educação, Bauru, v. 16, n. 2, p.
355-367, 2010.
• OLIVEIRA, Odisséa Boaventura de. Em defesa da leitura de textos
históricos na formação de professores de ciências. Pró-Posições, Campinas, v. 22, n. 1, p. 71-82, abr. 2011.
• QUEIROZ AMARAL, Anelize et al. Limites e desafios do Estágio
Supervisionado demonstrados em um processo de reflexão num Curso
de Licenciatura em Ciências Biológicas. Revista Eletrónica de Investigación en Educación en Ciencias, Tandil, v. 7, n. 2, p. 13-21, 2012.
• REIS, Michele Xavier dos; EUFRASIO, Daniela Aparecida; BAZON,
Fernanda Vilhena Mafra. A formação do professor para o ensino superior: prática docente com alunos com deficiência visual. Educação em
Revista, Belo Horizonte, v. 26, n. 1, p. 111-130, abr. 2010.
• ROSA, Jeâni Kelle Landre; WEIGERT, Célia; SOUZA, Ana Cristina Gonçalves de Abreu. Formação docente: reflexões sobre o estágio
curricular. Ciência e Educação, Bauru, v. 18, n. 3, p. 675-688, 2012.
• SELLES, Sandra Escovedo; ANDRADE, Everardo Paiva de. Saberes
docentes em formação: a pesquisa e a prática de ensino nas licenciaturas em Ciências Biológicas e História. Pró-Posições, Campinas, v.
24, n. 1, p. 109-112, abr.2013.
• STAUB, Tatiane; STRIEDER, Dulce Maria; MEGLHIORATTI, Fernanda Aparecida. Análise da Controvérsia entre Evolução Biológica
163
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 159-170, 2018
•
•
•
•
e Crenças Pessoais em Docentes de um Curso de Ciências Biológica. Revista Eletrónica de Investigación en Educación en Ciencias.
Tandil, v. 10, n. 2, p. 20-35, 2015.
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Horizonte, v. 28, n. 4, p. 17-49, dez.2012.
Em um primeiro momento, o estudo foi realizado a partir da leitura e
registro, por meio de fichamentos, dos títulos, palavras-chave e resumos, procendo-se a leitura integral do artigo quando esses três elementos se mostravam confusos. Em seguida, optou-se pela divisão dos artigos em áreas de conteúdo pré-determinadas: formação inicial de professores de Ciências Biológicas; formação
de professores em uma área específica da Biologia (educação ambiental, genética,
etc.); formação de professores e o estágio supervisionado e por último, educação
inclusiva e a formação de professores de Ciências Biológicas. Em algumas produções haviam aspectos que permitiam enquadrá-las em duas ou mais áreas de
conteúdo. Dessa forma, a leitura do trabalho na íntegra permitiu a categorização
desses trabalhos na área de conteúdo com que mantinham maior afinidade. Além
disso, os focos temáticos abordados nesse estudo foram delineados a partir da
identificação do tema central de cada artigo, de modo a envolver todos os trabalhos cuja denominação mostrasse, explicitamente, o assunto principal tratado.
3. Resultados e discussão
A distribuição quantitativa dos artigos foi realizada por ano de publicação, conforme mostra a Tabela I.
164
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 159-170, 2018
Tabela I: Distribuição da produção por ano.
Ano
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
Número de Artigos
5
2
5
3
1
3
0
1
Porcentagem
25%
10%
25%
15%
5%
15%
0%
5%
Fonte: produzido pela autora.
A partir da análise da tabela I, pode-se observar que a publicação de artigos com relação à Formação de Professores de Ciências Biológicas é bastante
difusa, dispersa e não há concentração em apenas um período. Em 2010 e 2012,
tem-se 5 artigos publicados em cada ano, nos outros anos o número de publicações é menor, enquanto que o ano de 2016 não teve nenhuma publicação registrada. Essa dispersão ou mesmo a ausência de artigos no ano de 2016 pode ocorrer
devido à utilização de apenas uma base de dados, o Scientific Eletronic Library
Online (Scielo), e outros artigos não terem sido disponibilizados nessa plataforma.
Da mesma forma, é possível observar que os autores que redigiram os
estudos são de diversas universidades brasileiras, dos mais variados estados, conforme a tabela II. Isso caracteriza a temática como eixo de pesquisa no país todo,
visto que pelo número de artigos encontrados pode-se dizer que apesar da importância para compreensão da formação do professor de Ciências e Biologia, ainda
é um tema emergente no cenário das instituições.
Tabela II: Relação das universidades de origem dos autores com seus respectivos
estados e o número de artigos publicados.
Estado
(UF)
Nº
Artigos
Universidade Federal Fluminense (UFF)
RJ
2
Universidade Federal do Ceará (UFC)
CE
1
Universidade de Brasília (UnB)
DF
2
Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE)
PR
4
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
MG
1
Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC)
BA
1
Universidade Federal de Goiás (UFG)
GO
1
Universidade Federal do Paraná (UFPR)
PR
1
Fundação Carlos Chagas (FCC)
SP
1
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
PE
2
Universidade
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
RJ
1
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais
MG
1
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
SC
1
Universidade Federal de Alfenas (UFAL)
MG
1
Fonte: produzido pela autora.
165
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 159-170, 2018
Apesar de as universidades apresentadas se localizarem em diversas unidades federativas do país, não caracterizando distinção ou uma região que se dedicasse mais a esse tipo de pesquisa, as submissões dos artigos escritos pelos autores
dessas universidades foram para revistas das regiões sul (1 revista) e sudeste (5
revistas), e uma revista argentina (ver Tabela III). Isso pode indicar que, mesmo
com a diversidade dos autores dos artigos, das universidades, as revistas selecionadas foram as mais bem qualificadas em determinada área, por isso a concentração
de publicações em revistas da região sudeste/sul do país.
Tabela III: Relação das revistas em que os artigos foram publicados e sua localização geográfica.
Revista
Cidade/UF
Nº
Artigos
Educar em Revista
Curitiba/PR
2
Tandil/Argentina
4
Bauru/SP
7
Revista Eletrónica de Investigación en Educación en Ciencias
Ciência e Educação
Revista Ensaio
Belo Horizonte/MG
2
Campinas/SP
2
Educação em Revista
Belo Horizonte/MG
2
Educação e Sociedade
Campinas/SP
1
Pró-Posições
Fonte: produzido pela autora.
Com relação ao corpo teórico dos artigos, apesar de todos os 20 estarem
dentro da grande temática “Formação de Professores” e “Ciências Biológicas”,
cada um apresentava particularidades, de modo que foi possível agrupá-los em
quatro categorias ou áreas de conteúdo: (I) Formação inicial de professores de
CB1 (geral); (II) Formação de professores em uma área específica das CB; (III)
Formação de professores de CB e o Estágio Supervisionado; (IV) Educação Inclusiva e a formação do professor de CB (ver Gráfico I).
1
166
CB é a abreviação para Ciências Biológicas.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 159-170, 2018
Gráfico 1: Representação da relação do número de artigos publicados e a área de
conteúdo ao qual foi agrupado.
Na primeira categoria/área de conteúdo, “Formação Inicial de Profes=-ores de CB” (I), foram alocados os artigos que abordavam temáticas referentes à
formação inicial desses professores, ainda na graduação, como por exemplo: os
limites e as possibilidades da formação inicial para o desenvolvimento de práticas
docentes autônomas; as representações sociais (RS) construídas no cotidiano da
formação inicial dos licenciandos em CB; o estudo de processos de construção das
relações entre teoria e prática na formação de professores de CB; a percepção do
professor de biologia sobre a sua formação e também sobre a pesquisa na área de
ensino de Ciências. Essa gama de temáticas que se desdobram dentro da grande
área, revela que há uma preocupação por parte dos pesquisadores a respeito da
formação inicial dos futuros professores, quais os problemas e limites existentes
na instituição, como isso influencia na identidade do profissional que se está formando, qual a percepção dos próprios graduandos sobre a sua formação, contribuindo para uma melhor compreensão do ser professor de Ciências e Biologia.
A categoria correspondente a “Formação de Professores em uma Área Específica das CB” (II), correspondeu aos artigos que apresentavam como tema a
formação de professores associado a alguma área caracterizada como específica
das Ciências Biológicas. Dentre elas, pode-se citar: análise da controvérsia entre
evolução biológica e as crenças pessoais dos futuros professores; as concepções de
educação ambiental que os graduandos possuem; qual o conhecimento sobre o
tema ‘ofidismo’ que é abordado na formação do professor; as concepções acerca
da relação genótipo e fenótipo; os conceitos de fotossíntese e também origem da
vida (como os licenciandos lidam com esse tema). Essa categoria demonstra que
quando se fala em formação de professores de Ciências Biológicas, não é necessário abordar o assunto de maneira geral, generalizando todas as temáticas para se
trabalhar a questão. Pode-se definir ou delinear uma área específica de estudo, gerando debates, apresentando os problemas e limitações que cada uma tem, podendo ir desde o conhecimento do futuro professor sobre Ofidismo, até mesmo as
discussões sobre Origem da Vida, passando pela Genética e Educação Ambiental.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 159-170, 2018
167
168
A terceira área de conteúdo, “Formação de Professores de CB e o Estágio
Supervisionado” (III), representou o grupo com o maior número de artigos associados. Dos 20, sete (35%) abordavam o tema Formação de Professores associado à disciplina de Estágio Supervisionado, presente nos cursos de graduação de
licenciaturas, das mais variadas formas: foram investigados os diferentes tipos de
conhecimentos docentes e em quais ambientes de aprendizagem sua aquisição foi
favorecida durante o período de estágio; o papel da subjetividade na formação
do professor, o papel das narrativas como metodologia de pesquisa e formação
de professores; as práticas docentes nas perspectivas dos licenciandos; as contribuições do desenvolvimento do planejamento da regência para a disciplina de
estágio; como o estágio é desenvolvido em determinada instituição, se existe articulação entre a instituição de ensino superior (IES) e a escola de educação básica
(EEB); e também os saberes e experiências para a promoção da formação do professor. Os artigos alocados nessa terceira categoria, apresentaram metodologias
de pesquisa de abordagem qualitativa, que valorizam o subjetivismo, a partir de
narrativas, relatórios e questionários. Esses dados evidenciam que as disciplinas
de estágio supervisionado dos cursos de licenciatura em Ciências Biológicas têm
papel fundamental na formação docente, que é um momento de aprofundamento teórico e prático, em que o aluno fica diante de um problema concreto com
o qual deve lidar, pode teorizar e terá um momento único, assim como afirma
Chaveiro (2008). Além disso, existem estudos que buscam discutir a formação de
professores a partir da relação teoria e prática presentes nas atividades de estágio
(LIMA; PIMENTA, 2010), bem como a importância e contribuições dos diários
de campo ou diários de bordo durante as atividades da disciplina, recurso que
apresenta uma potencialidade expressiva, em que o futuro professor pode escrever
suas percepções, analisar e refletir sobre a sua prática (SOUZA et al., 2012).
Por fim, “Educação Inclusiva e a Formação do Professor de CB” (IV) contemplou apenas um artigo, em que analisava a formação de professores de Ciências
Biológicas para o atendimento de pessoas com deficiência visual. O tema educação inclusiva ainda é bastante raro nas pesquisas acadêmicas. Como se pode notar,
no período de seis anos e meio, apenas um artigo foi publicado sobre o tema.
Isso acaba acarretando prejuízos em uma via de mão dupla: tanto para os alunos
deficientes, quando para o professor, fato que é corroborado por Michels (2008),
que aponta a falta de preparo dos professores para o atendimento à alunos com
necessidades educacionais especiais é uma das causas do fracasso escolar.
As pesquisas aqui apresentadas sobre a formação de professores de CB,
foram agrupadas em quatro categorias, as quais teve destaque a “Formação de
Professores de CB e o Estágio Supervisionado” (III) e “Educação Inclusiva e a Formação
do Professor de CB” (IV). A terceira categoria apresentou maior número de artigos
alocados na área, demonstrando que a principal finalidade do estágio é propiciar
ao aluno uma aproximação à realidade na qual ele irá atuar, se afastando da compreensão (que seria a parte prática do curso), sugerindo uma redefinição, de que o
estágio deve seguir para a reflexão, a partir da realidade vivenciada, contribuindo
para a bagagem pessoal e a formação desse futuro professor. Já a quarta categoria
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 159-170, 2018
apresentou apenas um artigo alocado, demonstrando a incipiência de estudos na
área da educação inclusiva na formação do professor de Ciências e Biologia.
Considerações finais
A preparação profissional de docentes para o ensino de Ciências em geral
e para o ensino de Biologia em particular, não constitui um tema novo no cenário
educacional brasileiro das últimas décadas. A partir de 1990, os cursos de licenciaturas ganharam espaço no cenário brasileiro, evidenciando pesquisas na área de
formação de professores, que buscavam identificar os problemas e limitações da
temática. Assim, os resultados mostraram que a temática “Formação de Professores de Ciências Biológicas” é recorrente em universidades de todo o país, não caracterizando apenas uma região. Entretanto, as revistas escolhidas para publicação
desses artigos foram todas das regiões sudeste ou sul do Brasil, além de uma, ser
argentina (Revista Eletrónica de Investigación en Educación en Ciencias), evidenciando que a qualidade das revistas pode ser variável dependendo da localização,
e que existe um maior número de revistas e melhor qualificadas nestas regiões.
Dessa forma, é possível concluir que mesmo a temática compreendendo
uma área de estudo emergente na atualidade, abrangendo estudos de diversas
universidades, em diversos estados e grupos de pesquisa, ainda existem lacunas
teóricas nos estudos sobre a formação de professores de Ciências Biológicas no
Ensino Superior, visto que os trabalhos são direcionados mais para algumas áreas
(como a relação com o Estágio Supervisionado) e menos para outras (como a
relação da formação do professor e a educação inclusiva, ou mesmo para alguma
área específica das Ciências Biológicas).
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- Carolina Kiyoko Mellini
Graduada em Licenciatura em Ciências Biológicas pela Universidade Federal
do Triângulo Mineiro (UFTM). Atualmente é mestranda pelo Programa de
Pós-Graduação em Educação pela mesma universidade.
Contato: carolmellini@hotmail.com
Currículo: http://lattes.cnpq.br/6405562516586056
- Helena de Ornellas Sivieri-Pereira
Psicóloga, mestre em Psicologia Escolar e doutora em Psicologia. É
professora adjunta da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM)
e integra o corpo docente permanente do Programa de Pós-Graduação em
Educação da mesma universidade.
Contato: helena.sivieri@gmail.com
Currículo: http://lattes.cnpq.br/5662197248196394
170
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 159-170, 2018
Pedagogia dos multiletramentos: desafios
e perspectivas na docência
SANTOS, Wagno da Silva1
KARWOSKI, Acir Mário2
Resumo:Compartilhando das reflexões de Rojo (2012), acerca da fundamentação e relevância da Pedagogia dos Multiletramentos, o referido artigo, objetiva trazer reflexões
acerca desta perspectiva multimodal e os seus pressupostos na formação continuada de
professores interligados as Novas Tecnologias da Informação e Comunicação. Desta forma, utilizamos como metodologia o uso da pesquisa bibliográfica, buscando aportes que
apontem os desafios e contribuições dos multiletramentos na atuação docente. Entre os
resultados deste trabalho, percebeu-se a necessidade da valorização da multiplicidade de
linguagens presente nos mais variados textos em circulação social, que em sua maioria
estão inseridos em nossas vidas por meio das NTDICs. Contudo, este artigo aponta para
a necessidade de redimensionar o currículo escolar à incorporação dos Multiletramentos,
sendo de grande relevância para reflexão sobre a prática docente.
Palavras-chave: Formação Continuada; Novas Tecnologias da Informação e Comunicação; Pedagogia dos Multiletramentos.
Abstract:Sharing the reflections of Rojo (2012), about the fundamentals and relevance
of Pedagogy of Multiliteracies, this article aims to bring reflections about this multimodal
perspective and its assumptions in the continued formation of teachers connected to the
New Technologies of Information and Communication. In this way, we use as methodology the use of bibliographical research, seeking contributions that point out the challenges
and contributions of Multiliteracies in the teaching performance. Among the results of this
work, we noticed the need to value the multiplicity of languages present in the most varied
texts in social circulation, which are mostly inserted in our lives through NTDICs. However, this article points to the need to resize the school curriculum to the incorporation of
Multiliteracies, being of great relevance for reflection on the teaching practice.
Keywords: Continuing Education; New Information and Communication Technologies;
Pedagogy of Multiliteracies.
1
Mestrando no Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal do
Triângulo Mineiro.
2
Doutor em Letras pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 171-179, 2018
171
1. Introdução
A pedagogia dos multiletramentos, caminho apontado como pressuposto
a valorização e incorporação de gêneros textuais cotidianos na vida escolar, foi
afirmada em meados da década de 90 através da reunião do New London Group,
grupo de pesquisadores da área de letramento, reunidos em Nova Londres, Connecticut, EUA, a fim de discutir a imprescindibilidade de fomentar ações de
valorização das culturas locais, e inserção dos mais variados gêneros textuais que
haviam surgido no entorno da escola através das mudanças sociais e da ascensão
das Novas Tecnologias da Informação e Comunicação (NTDICs), o que fugiam
do contexto pressuposto como letramento na época. O que para Cope e Kalantzis (2015), as conotações do letramento se dissolviam tornando anacrônicos
seus conceitos convencionais, onde a pedagogia não buscava mais alcançar seus
objetivos pautados na proporcionalização de oportunidades sociais. Sendo assim,
tal reunião buscou fazer um aparato real e estimativas futuras para esta pedagogia.
Com tais mudanças sociais, culturais e tecnológicas, surgiu o multiletramento. Assim, este artigo busca trazer reflexões acerca desta perspectiva multimodal, e os seus pressupostos na formação continuada de professores interligados as
Novas Tecnologias da Informação e Comunicação. Nesta visão, levanta-se como
problemática as referidas discussões: Quais desafios e perspectivas a Pedagogia
dos Multiletramentos oportunizam na atuação do professor da Educação Básica?
Quais as interfaces das Novas Tecnologias da Informação e Comunicação para o
Multiletramento? O que a formação continuada na perspectiva de multiletramento pode oportunizar ao corpo docente?
O conceito de multiletramento
[...] aponta para dois tipos específicos e importantes de multiplicidade
presentes em nossas sociedades, principalmente urbanas, na
contemporaneidade: a multiplicidade cultural das populações e a
multiplicidade semiótica de constituição dos textos por meio dos
quais ela se informa e se comunica. (ROJO, 2012, p. 13)
Com a intensificação das TIC’s (Tecnologias da Informação e Comunicação) nas últimas décadas, houve um vasto crescimento de recursos multimodais,
trazendo uma grande expansão de gêneros textuais, até então não valorizados no
âmbito escolar, textos multissemióticos, possuindo recursos orais, visuais, táteis,
etc, utilizados com frequência pelos atuais alunos através das tecnologias móveis,
devendo ser um objeto de ensino da leitura e escrita. Desta forma, surgiu um
novo desafio para as escolas: atender um novo perfil de aluno. Aluno este inserido
num contexto global, ao qual faz uso dos mais variados recursos tecnológicos,
sendo para ele caminhos atrativos. Desta maneira, espera-se dos professores a
busca pela preparação de aulas nesta perspectiva, envolvendo o uso crítico da
cultura midiática, que despertem seu interesse em aprender e que de fato o oportunizem estímulos para a assimilação.
172
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 171-179, 2018
2. Desafios e perspectivas
Marcelo (2013), baliza a relação entre escolas, professores e alunos, apontando o distanciamento entre séculos de suas práticas e perspectivas, ao citar que
temos escolas no século XIX, com os professores do século XX, para os alunos
do século XXI. Tal disparidade aponta para os confrontos de interesses didáticos,
onde a escola, em sua maioria, possuidora de uma estrutura arcaica, por vezes
possui profissionais com metodologias tradicionais e alunos da contemporaneidade atualizados com outra visão de mundo, fazendo uso de recursos diferentes e,
por vezes, recursos estes não tão bem dominados pelo professor. É o que Cortella
(2014), retrata ao fazer utilização da frase de arguição usada por muitos professores do ciclo de alfabetização: “A pata nada”, registrando que há metodologias
que serviram para escolarizar no tempo pretérito, havendo assim uma grande
distância entre tal tempo e a atualidade, e se há um novo perfil de geração, deve-se
também haver um novo modo de ensino, atrativo e condizente com a realidade.
Inserimos nesta perspectiva a incorporação das NTDICs na sala de aula como
caminho para o fortalecimento e difusão da Pedagogia dos Multiletramentos contribuindo para o sucesso escolar.
Na era da informatização, ao qual o mundo tem sido movido pelo avanço
tecnológico, nos deparamos com um cenário de rupturas, ao qual os estudantes
estão mais integrados a cultura digital do que seus professores. Sendo necessário a
busca por uma educação ativa voltada as necessidades e interesses dos alunos, trazendo as NTDICs para o contexto escolar, estimulando-os a uma aprendizagem
significativa por meio de um ensino emancipatório, e para que esta aprendizagem
aconteça, é imprescindível levar em consideração a multiplicidade cultural das
populações e reconhecimento dos textos multissemióticos do seu meio.
Alves aponta que “Construir um sentido diferenciado para as tec-
nologias digitais e da web nos espaços escolares requer uma mudança de
papel dos professores e dos alunos, permitindo que esses sujeitos do processo de ensinar e aprender sejam atores e autores das suas trajetórias de
aprendizagem” (2016, p. 06). Desta forma, este autor configura as NTDICs
para além do seu sentido instrumental, utilizando-as a valorizar a autonomia do
indivíduo, estimulando o interesse pela aprendizagem no espaço escolar. Autonomia esta, defendida majoritariamente nos estudos de Freire (2007), refletindo
sobre o papel do professor a instigar o sujeito cognoscente ao desejo em construir
conhecimento. Assim, a incorporação dos Multiletramentos no cotidiano escolar
valoriza as práticas sociais da leitura e escrita, trazendo desafios que precisam ser
enfrentados pela equipe pedagógica no referido contexto.
Entre as primícias desta provocação, consta a necessidade de redimensionar o currículo escolar a incorporação do Multiletramento (múltiplas linguagens)
na escola, fazendo uso do Learning by Design, “qualquer atividade semiótica, incluindo a utilização da língua para consumir e produzir textos”, questão pautada
nas discussões propostas pelo Grupo de Nova Londres (COPE; KALANTIZIS
et al, 2000).
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 171-179, 2018
173
A escola por sua vez, seguidora de uma matriz curricular pré-estabelecida,
traz em seu escopo didático o destaque demasiado de textos cultos/ eruditos e
valorizados, porém cotidianamente percebe-se a existência de variados textos híbridos que circulam socialmente, dominados com destreza pelo alunado, através
da difusão das NTDICs.
Inerente a esta conjuntura, ainda como desafio, há também uma nova ótica que vislumbra a multiplicidade de culturas, traçada pela diversidade de costumes e ideias, o que sugere a indagação de como haver a unidade entre a cultura de
massa com a canônica, esta última, tão valorizada pela escola. Para isto, incorpora-se a necessidade de transformação da atual pedagogia, onde numa visão horizontal o corpo discente é participante efetivo no processo educativo, contribuindo
com seus conhecimentos empíricos na consolidação da aprendizagem.
Os multiletramentos possuem uma estrutura colaborativa, que predispõe
uma didática interativa, valorizando a cultura local e as mais variadas formas da
linguagem cotidiana, sendo imprescindível sua abordagem no viés acadêmico.
Tal inserção no contexto escolar oportuniza na atuação do professor da Educação
Básica a reflexão da sua práxis pedagógica na busca pela inovação, envolvendo-se
numa prática interacionista, deixando de ser o transmissor de conteúdo, passando
a ser estimulador e moderador de reflexões grupais. Conforme aportes de Charlot
(2008), o ensino passa a ser simultaneamente construído pela relação das atividades dos alunos com os saberes sistematizados historicamente. Desta forma, o
surgimento de didáticas inovadoras por meio da Pedagogia dos Multiletramentos
potencializa e dinamiza o processo de ensino e aprendizagem, fazendo uso de
textos multimodais, o que leva a beneficiar os alunos por meio da melhoria do
ensino, tornando-os protagonistas em todo o processo. Ainda como perspectiva,
a inserção de textos híbridos do seu cotidiano para o espaço didático por meio
das novas tecnologias, oportuniza a projeção de designs futuros, pautados na integração curricular orientada pedagogicamente no multiletramento. Assim, Cope
e Kalantzis apontam uma metalinguagem de multiletramentos com base no conceito de Design:
O design tornou-se central na inovação no local de trabalho,
bem como nas reformas escolares para o mundo contemporâneo.
Professores e gerentes são vistos como designers de processos e
ambientes de aprendizagem, não como chefes ditando o que os
responsáveis devem se tornar uma ciência do design, estudando
diferentes tipos de aprendizado. (COPE e KALANTIZIS, 2000. p.
19, tradução nossa3)
Tal afirmação conecta com a ideia de que a aprendizagem se dá interligada por variadas estruturas, através do meio, novas tecnologias, textos, individuos,
3
174
Texto original: “Design has become central to workplace innovation, as well as to school
reforms for the contemporary world. Teachers and managers are seen as designers of learning processes
and environments, not as bosses dictating what those in their charge should become a design science,
studying how different sorts of learning.”
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 171-179, 2018
etc. O que confirma cada vez mais a necessidade da valorização da multiplicidade
de linguagens presente nos mais variados textos em circulação social, que em sua
maioria estão inseridos em nossas vidas por meio das NTDICs.
3. Interfaces: multiletramentos e novas tecnologias da informação e
comunicação
Freitas (2015), observa a constante interação entre as mais variadas mídias digitais, especialmente após a ascensão tecnológica e criação da multiplicidade de equipamentos eletrônicos e softwares, podendo ser instrumentos de grande
potencial para o desenvolvimento cognitivo, sendo necessário lançar novos olhares sobre tais recursos a incluir nas ações didáticas do currículo escolar.
Neste sentido, enfatiza-se a importância do conhecimento e da inovação
em sala de aula, onde Linhares (2014) aponta para a necessidade de recriação
constante da prática educativa, sendo necessário disponibilidade e coragem para
tal transformação. Assim, surge como instrumento pedagógico o multiletramento, sendo o caminho para a inclusão da cultura digital, num eixo semiótico no
fortalecimento de uma prática construtivista, ao qual para Rojo e Moura:
Trabalhar com multiletramentos pode ou não envolver (normalmente
envolverá) o uso de novas tecnologias de comunicação e de
informação (“novos letramentos”), mas caracteriza-se como
um trabalho que parte das culturas de referência do alunado
(popular, local, de massa) e de gêneros, mídias e linguagens por
eles conhecidos, para buscar um enfoque crítico, pluralista, ético
e democrático – que envolva agência – de textos/discursos que
ampliem o repertório cultural, na direção de outros letramentos [...]
(2012, p. 08).
O que vem a aquilatar a importância da inserção de multiletramentos na
educação devido as novas formas do processo de ensino e aprendizagem, envolvendo as mais variadas linguagens, focalizando o educando, como o centro na
construção do conhecimento. Ressaltamos aí a necessidade das NTDICs, onde os
multiletramentos estão tão bem inseridos. Marques (2003), consolida tal ideia,
percebendo estas novas tecnologias como desafios a propor novas práticas buscando a reconstrução profissional, abdicando do seu uso instrumentalizador.
Os alunos de hoje, pertencentes a geração Z, considerados como nativos
digitais, têm se envolvido cada vez mais com os meios tecnológicos, principalmente com as redes sociais, o que para si são os meios mais interessantes. Para
Cherubin (2012), a solução para atrair a atenção desta geração na escola seria
recorrer ao uso das Tecnologias digitais, valorizando deste modo a multimodalidade. O que tem instigado cada vez mais a participação efetiva do corpo discente,
tornando o ensino fascinante, uma vez que de acordo com a pesquisa “Motivos
da evasão escolar” lançada pela Fundação Getúlio Vargas - FGV-RJ (2009), “40%
dos jovens de 15 a 17 anos que evadem deixam de estudar simplesmente porque
175
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 171-179, 2018
acreditam que a escola é desinteressante.” E são estes tipos de dados que nos
fazem repensar a prática escolar, recriando um caminho que prepare o professor
para lhe dar com tais situações incorporando em sua prática a utilização de recursos tecnológicos oportunizando a inserção dos alunos em ambientes virtuais por
meio de textos multimodais (som, imagem, texto, animação, etc.). O que para
o corpo discente será oportuno a despertar sua criticidade e envolvimento, uma
vez que torna-se um ensino atrativo, condizente com seus interesses particulares.
Para isto, não é necessário apenas inserir equipamentos tecnológicos na
escola, mas também preparar o corpo docente para a utilização pedagógica numa
perspectiva multimodal. Com isto, Pretto (1996) afirma que [...] “não podemos
pensar que a pura e simples incorporação destes novos recursos na educação seja
garantia imediata de que se está fazendo uma nova educação, uma nova escola,
para o futuro.” Para tal é necessário que a escola trace caminhos que viabilizem o
uso das NTDICs e estabeleça objetivos a serem alcançados fomentando a prática
digital, inserindo-as no cotidiano escolar como recurso facilitador. E é oportunizando uma formação continuada aos professores voltada para a introdução às
NTDICs na práxis pedagógica que levará à um processo contínuo conduzindo-os
à uma prática de multiletramentos.
4. Formação continuada de professores e a pedagogia dos
multiletramentos
Em meio a difusão tecnológica, compreendemos a real importância do
corpo docente estar se adequando as novas realidades dos alunos, na busca incessante pela atualização contínua, conhecendo e fazendo uso das Novas Tecnologias a facilitar a integração de um ensino coparticipativo numa perspectiva de
multiletramentos, valorizando a diversidade cultural dos indivíduos envolvidos
e a pluralidade de linguagens, fazendo-se necessário formar-se continuamente a
atender este novo perfil de aluno. Para tal, Linhares aponta que:
A palavras ‘formar’ nos remete a ideias de dar formas, de criar. Aqui o
sentido que damos à palavra é o de criar-se, construir, elaborar. Não
entendemos a formação como algo externo ao sujeito, que chegará
até ele somente por meio de informações, teorias, conteúdos, mas
sim como um horizonte, cujo formar é formar-se. (2011, p. 7)
176
Formar, inclui a necessidade de acompanhar as atuais demandas incorporadas as escolas, onde é possível apontar entre elas a popularização das novas
tecnologias, o que tem provocado alterações no cotidiano, inclusive no campo
educacional. Com tal transformação deste espaço, é imprescindível propor mudanças nas metodologias escolares, incentivando a busca por práticas que venham
ao encontro do desenvolvimento integral do aluno, buscando satisfazer seus anseios e necessidades, o que fortalece cada vez mais a real importância da formação
continuada de professores numa concepção engajada em multiletramentos, indicando o uso das NTDICs como direção facilitadora.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 171-179, 2018
Dionísio (2005), eleva como características de uma pessoa letrada, a capacidade de produzir e interpretar mensagens incorporadas através de múltiplas
fontes de linguagem. Estas variadas fontes são denominadas multiletramento, ao
qual traduz-se como a capacidade de conceder e gerar sentidos a mensagens multimodais, o que é fundamental para as unidades escolares envolver este ato no
cotidiano escolar, iniciando-se pela formação continuada em serviço, onde oportunizará ao corpo docente o fortalecimento de uma prática eficaz que aproxime as
aulas da realidade dos alunos, atendendo suas expectativas e anseios, inserindo as
NTDICS nas questões escolares adequando-se as reais necessidades.
Engajando-se na perspectiva do currículo emancipatório, Freire (1987,
p. 86), retrata que “[...] será a partir da situação presente, existencial, concreta,
refletindo o conjunto de aspirações do povo, que poderemos organizar o conteúdo programático da educação ou da ação política”, ressaltando desta maneira a
relevância da organização curricular ser apoiada nas relações da vida cotidiana, e
os conhecimentos prévios dos alunos na constituição do currículo escolar, fortalecendo desta maneira a cidadania. Assim, poderemos refletir sobre o processo
de formação de professores no contexto da cultura digital, utilizando do multiletramento a seu favor, uma vez que os novos alunos, anteriormente neste artigo
denominados nativos digitais, dominam com primazia tais recursos.
Com isto, a inserção das mídias educativas em sua práxis pedagógica,
estimulará a prática do multiletramento como fator indissociável do processo de
ensino e aprendizagem, cabendo as unidades escolares e os meios que as regem,
oportunizarem formações continuadas de professores enquanto instrumento de
orientação para as práticas condizentes com a realidade do corpo discente envolvidos na cultura digital. Ao qual percebe-se atualmente que o ensino muito tem
se afastado da atratividade, sendo por vezes uma prática de arguições e repetições
o que tem tornado a sala de aula inúmera vezes um espaço unicamente de transmissão de conteúdo, o que tem ocasionado desinteresse por partes dos alunos.
Grande parte dos atuais professores ainda não estão preparados para atender essa demanda, reforçando aí a necessidade da formação continuada voltada
para a incorporação das NTDICs em sala, sendo um dos caminhos para fomentar
ações de multiletramento, contribuindo com sua utilização no fortalecimento de
uma prática pedagógica inovadora e eficaz.
5. Reiterações e reflexões
Permeada pela globalização, a sociedade contemporânea organizada em
redes, vislumbra em suas faces a multiplicidade de linguagens, marcada pelas variadas interações de recursos textuais, numa perspectiva de multimodalidade.
Integrando num mesmo texto imagem, áudio, vídeo, gráficos etc, o multiletramento tem crescido e se mostrando de forma substancial aos meios comunicativos, através da multiplicidade de culturas, sendo imprescindível a consolidação de uma nova pedagogia, capaz de unir tal conjuntura a fortalecer processos
educacionais, pautados na valorização do conhecimento oportunizado aos alunos
por meio de suas experiências sociais. Desta forma, reiteramos a colaboração da
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 171-179, 2018
177
Pedagogia dos Multiletramentos na consolidação de um ensino centrado no aluno, seguindo um novo design de aprendizagem na utilização de textos híbridos,
valorizando as mais variadas formas de produção do conhecimento, reconhecendo as Novas Tecnologias de Informação e Comunicação e suas interfaces como
aporte para a integração e fortalecimento de didáticas em tal perspectiva.
Atrelada as novas tecnologias, empoderamos a formação continuada,
uma vez que esta, contribui para a construção identitária profissional do corpo
docente, além da transformação e exercício de sua prática pedagógica. Tal união
e valorização dos multiletramentos possibilitam a consolidação eficiente do fazer
didático. Ao qual o professor formado continuamente, apropriando-se da cultura
digital associada à flexibilidade e saberes docentes, buscará na prática cotidiana de
seus alunos o fortalecimento do processo de ensino e aprendizagem.
Referências
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o caso do Gamebook Guardiões da Floresta. Revista de Educação Pública, [S.l.],
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contradição. Revista da FAEEBA – Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 17,
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178
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Paulo: Parábola Editorial, 2012.
- Wagno da Silva Santos
Mestrando no Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade
Federal do Triângulo Mineiro. wagnossantos@outlook.com.
Currículo: http://lattes.cnpq.br/1929025209736973
- Acir Mário Karwoski
Doutor em letras pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).
acirmario@letras.uftm.edu.br
Currículo: http://lattes.cnpq.br/0772872573503574
179
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 171-179, 2018
Pesquisa escolar no Brasil: a produção
científica em periódicos nacionais de
Educação
SILVA, Diego Gerônimo
SIMÕES, Regina Maria Rovigati
Resumo: Este artigo, caracterizado como do tipo estado da arte, analisou o levantamento
bibliográfico sobre pesquisa escolar nas pesquisas acadêmico-científicas publicadas em periódicos nacionais indexadas na área da Educação pela Capes entre os anos de 2000 a 2017.
Detectou-se 17 trabalhos distribuídos em 13 revistas no qual diagnosticou-se a prevalência
de periódicos da região sudeste e de revistas/publicações em estrato B2. Ademais, o ano
de 2016 destacou-se destaque na divulgação sobre o tema. Os resultados mostraram que a
produção científica sobre o tema pesquisa escolar ainda é insuficiente.
Palavras chave: Estado da arte; Levantamento bibliográfico; Pesquisa escolar.
Abstract: This article, characterized as an art type, analyzed the bibliographic survey of
scholarly research in academic-scientific researches published in national journals indexed
in the area of Education by Capes between the years of 2000 to 2017. It was detected 17
papers distributed in 13 journals without diagnosis is the prevalence of journals in the
southeast region and journals / publications in stratum B2. In addition, the year 2016
stood out prominently in the disclosure on the subject. The results showed that the scientific production on the topic of school research is still insufficient.
Keywords: State of the art. Bibliographic survey. School research.
1. Introdução
Observa-se diferentes concepções e práticas na direção e desenvolvimento da pesquisa escolar, em que autores como Gil (1999), Moran (1997), Bagno
(2008), que debatem a prática da pesquisa e admitem a relevância desta intervenção pelos diversos sujeitos nas instituições escolares.
Demo (2015), menciona que a estrutura da pesquisa dentro da escola é
um modo de educar e um método que favorece a educação, considerando-a como
181
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 181-192, 2018
uma indispensabilidade para a cidadania moderna. Educar pela pesquisa é uma
perspectiva propedêutica, unida ao desafio de criar nas educações básica e superior, a capacidade de se reconstruírem. A pesquisa segue o conhecimento novo,
aforando com seu método, o questionamento sistemático crítico e criativo.
A utilização da pesquisa por docentes e discentes envolvidos para melhorias nas relações de ensino-aprendizagem na escola, sendo necessário compreender e discutir que a pesquisa está diretamente associada ao processo de ensinar e
aprender, e quando de fato isso ocorre, é derivado de uma a pesquisa que se faz
presente nas práticas educativas, entre professor e aluno, uma vez que um e outro
realizam questionamentos e constatações durante o processo de ensino e aprendizado (DEMO, 2011, 2015).
Ao ver as várias nuances do ensino e aprendizado inseridos na educação
escolar a qual está pautada como “um processo de formação da competência humana” que procura subsídios no conhecimento inovador e que trata a pesquisa
como um meio de “questionamento reconstrutivo” abarcando teoria e prática,
inovação, ética e qualidade formal. (DEMO, 2015, p. 1). Demo (2015, p. 8-16)
descreve o conhecimento reconstrutivo como um ato que é alimentado pela pesquisa como princípio científico e educativo no qual se busca alcançar a percepção
emancipatória do sujeito que procura “fazer e fazer-se oportunidade” quando se
inicia e reestabelece pelo questionamento sistemático da realidade.
Bagno (2008), permite refletir que ensino focado na aprendizagem promove inúmeras possibilidades para que o discente busque e alce sozinho as fontes
do conhecimento que estão dispostos na sociedade moderna. Contudo, não quer
dizer apenas mostrar as alternativas, mas oferecer suporte, orientar e direcionar o
aluno para que potencialize um olhar crítico em que consiga escolher as fontes, de
conhecimento e de informação, fidedignas.
Compreender a pesquisa escolar como um dos alicerces da educação e
não de aula – simples interação entre docente e discente – é apreender que o
conhecimento, não é fim, mas um meio. Contudo, para que esse conhecimento
se torne educativo tem-se a necessidade de orientação tendo ética e valores como
pilares dos fins almejados (BAGNO, 2008).
Para tal fim, a interação entre professor e aluno precisa ser orientada para
que esse conhecimento reconstrutivo seja (re)configurado no cotidiano da sala
de aula, por meio do diálogo, da mediação para induzir o aluno ao questionamento, envolvendo-se e interpretando o contexto que engloba a pesquisa e, tal
envolvimento só se articular quando há conscientização de ambas as partes para
a percepção do processo.
Nesse contexto, compreender o questionamento reconstrutivo exige considera-lo como a maneira de construção do sujeito acerca conhecimento inovador; exige, ainda, participação histórica do sujeito no aprendizado com ética. Ao
abordar a historicidade do sujeito, precisa-se apreendê-la como elemento distintivo da característica emancipatória do processo educacional, que denota a pesquisa
como um método formativo (DEMO, 2015).
182
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 181-192, 2018
Em contraponto, o alargamento da concepção de pesquisa no ensino-aprendizagem precisa ser ponderado com acautelamento. Esse interesse tende a
uma reflexão das implicações pedagógicas, em se refletir quando o fazer pesquisa
se delimita a um mero procedimento didático, fundamentado em uma atitude em
que o professor apresenta um tema para o aluno pesquisar e este procura a informação de forma arbitrária (MACIEL, 2015).
Ao propor uma atividade de pesquisa, o docente pode proporcionar diferentes saberes pedagógicos e metodológicos, conforme menciona Maciel (2015),
e ainda pode indicar, avaliar e redimensionar as informações que vão se fazendo
presentes na prática pedagógica. O processo investigativo é fundamental, dado
que aspectos significativos podem ser socializados, considerando que o envolvimento do educador não é ato de isolação e sim de socialização – em que rodeia o
diálogo e compartilhamento de saberes e experiências – tanto na elucidação do que
será pesquisado conquanto na averiguação de soluções, sendo esses fundamentais.
À vista disso, a educação pautada na pesquisa direciona o professor a
(re)pensar sobre a flexibilização dos conteúdos didáticos, porque eles certamente
irão extrapolar os que, à princípio, foram propostos. Exigindo articulação, que
promove o movimento entre as diversas área do conhecimento, buscando complementar as informações imprescindíveis para os fenômenos a serem pesquisados
(MACIEL, 2015).
2. Caminhos da pesquisa
Segundo Rocha (1996), a pesquisa escolar é um recurso brilhante para se
estudar e aprender. No cotidiano escolar é corriqueiro os docentes requisitarem
trabalhos aos seus discentes com a finalidade de pesquisa. Esse objetivo é colocado em prática enunciando aos alunos que precisem realizar um “trabalho de pesquisa”, expondo o tema e o dia da entrega dessa pesquisa. Contudo, o ato de fazer
pesquisa resulta somente nisso? Diante desta indagação, procurou-se investigar o
que há de produção científica em relação a temática em estudo.
Para tanto, fora realizado um levantamento bibliográfico caracterizado
como do tipo estado da arte, o qual analisou a produção acadêmica nos periódicos nacionais da área da Educação, sobre a Pesquisa Escolar nos anos iniciais do
Ensino Fundamental. Esse tipo de pesquisa é de caráter bibliográfico e contribui
para a sistematização e avaliação da produção acadêmica em determinada área do
conhecimento e num período previamente estabelecido, vislumbrando responder
aspectos e dimensões que devem ser elucidados (FERREIRA, 2002).
Para o desenvolvimento da pesquisa foi realizado um levantamento online
de todas as revistas da área da Educação, classificadas em A1, A2, B1, B2 e B3
disponíveis na base de dados do sítio da Plataforma Sucupira da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) é uma “ferramenta para
coletar informações, realizar análises e avaliações e ser a base de referência do
Sistema Nacional de Pós-Graduação (SNPG)” e disponibiliza “em tempo real e
com muito mais transparência as informações, processos e procedimentos que a
183
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 181-192, 2018
CAPES realiza no Sistema Nacional de Pós-graduação para toda a comunidade
acadêmica”, no sistema WebQualis do ano de 2015, o qual estabelece periodicamente a estratificação.
Em todas essas buscas foram utilizados os seguintes critérios de inclusão: revistas nacionais com o idioma português, revistas eletrônicas que possuíam
ISSN (International Standard Serial Number - Número Internacional Normalizado para Publicações Seriadas).
A opção por um banco de dados virtual justificou-se por possibilitar boa
visibilidade, pela facilidade de acesso, por garantir maior abrangência das pesquisas mais recentes sobre o tema e por se tratar de informações disponíveis a
qualquer profissional da área.
3. Análise quantitativa das produções científicas
Em um primeiro levantamento obteve-se um total de 528 revistas, sendo
323 nacionais na área de Educação. Após essa etapa passou-se a identificar os
artigos completos e em português presentes nas revistas e que tivessem no título
ou nas palavras-chaves os seguintes termos: pesquisa escolar, pesquisa na sala de
aula, pesquisa na escola e projeto de pesquisa. Houve um recorte temporal entre
2000 a 2017, visto que o enfoque da pesquisa era analisar o tema escolhido nas
produções no Século XXI.
Partindo do levantamento no banco de dados e da leitura dos títulos e
das palavras-chaves, 204 revistas não tinham artigos sobre a temática escolhida,
75 estavam repetidas (disponíveis tanto on-line como impressa), 30 periódicos
não foram encontradas ou permitiram acesso aos artigos, sendo selecionadas 13
revistas que continham material sobre o assunto.
Nestas revistas foram encontrados 17 artigos, os quais foram catalogados
em planilha utilizando o software do pacote Office – Excel para análise. Observou-se que das revistas nacionais que estão vinculadas à área da Educação pelo
sistema WebQualis, apenas 8,9% do total tem artigos sobre a temática pesquisa
escolar (Quadro 1).
Quadro 1: Caracterização dos artigos sobre pesquisa escolar.
Nº
Título do Estudo
Ano
1.
A pesquisa escolar em
tempos de internet
2002
2.
Professor e internet: a
concepção de pesquisa
escolar em ambientes
informatizados
2007
Autor (es)
BERNARDES, Alessandra
Sexto; FERNANDES, Olívia
Paiva
Revista
Teias
ROCHA, Luciano Roberto;
BRITO, Gláucia da Silva
184
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 181-192, 2018
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
A interação entre os
alunos, educadores,
bibliotecários e a pesquisa
escolar
Tecnologia e(m) Sala de
Aula: oportunidades para
(re)conciliar a internet e o
trabalho do professor
2004
MORO, Eliane Lourdes da
Silva; ESTABEL, Lizandra
Brasil
2015
BRAGA, Diego Vieira;
MARRONI, Fabiane Villela;
FRANCO, Patricia Pereira
O bibliotecário nas escolas:
2007
uma necessidade
GARCEZ; Eliane Fioravante
Googleteca? A biblioteca
escolar e os bibliotecários
em tempos de Google
Sistema hipermídia
ajudando a construir a
pesquisa escolar
DUARTE, Adriana Bogliolo
Sirihal; ANTUNES, Maria L.
Amorim
MACHADO, Ana Maria
Nogueira; VIDOTTI; Silvana
Aparecida Borsetti Gregorio
Estado da arte sobre
pesquisa escolar no Brasil
Refletindo sobre a pesquisa
e sua importância na
formação e na prática
do professor do ensino
fundamental
Núcleo de pesquisa escolar
compartilhada: formação
continuada investigativa
na constituição de
experiências instituintes
Uma análise da pesquisa
escolar subsidiada na
Pedagogia HistóricoCrítica
O que as crianças sabem
sobre o seu ambiente?
A relação entre o senso
comum e o saber científico
em crianças de AnápolisGO
A pesquisa escolar como
instrumento pedagógico:
um dos caminhos para
ampliar as situações
didáticas da educação
física escolar no ensino
fundamental
Letramento em tempos
de novas tecnologias de
informação, comunicação e
expressão
Arte, cultura e
15. conhecimento escolar: a
integração é possível!
2016
2013
Informática na
Educação: teoria e
prática
Revista ACB
Transinformação
OLIVEIRA; Iandara Reis de;
2016
CAMPELLO, Bernadete Santos
2008
ABREU, Roberta Melo de
Andrade; ALMEIDA, Danilo
Di Manno
SILVA, Raimunda Nonata
Machado; SOUSA, Arsenia
2008
Pereira de; FRAZÃO; Maria das
Dores Cardoso
Revista Faced
Práxis Educacional
2010
MACIEL, Lizete Shizue
Bomura; VIEIRA; Renata de
Almeida Vieira
2014
SANTOS; Jéssica de Andrade; Revista Eletrônica do
FIGUEIREDO-ECHALAR, Mestrado em Educação
Adda Daniela Lima
Ambiental
Educação Unisinos
2014
D”AVILA, Jorge Luis;
FERNANDES, Christiane
Martins
Pensar a Prática
2015
NASCIMENTO, Lucy Mirian
Campos Tavares; GARCIA,
Lenise Aparecida Martins
2016
LAPLANE, Adriana Lia
Friszman de; GONÇALVES,
Dayane; PORTELA Tatiana
Brochado
Revista Brasileira
de Ensino de
Comunicação e
Tecnologia
Espaço Pedagógico
185
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 181-192, 2018
16.
A pesquisa dialógica como
ato lúdico de conhecer
Pesquisa na formação
inicial: contribuições a
17.
partir de um projeto de
extensão
2016
PASSOS; Marcos Paulo de;
PIERUCCINI, Ivete
Perspectivas em
Ciência da Informação
2017
CHALUH, Laura Noemi
Revista Educação
PUC-Campinas
Fonte: Elaborado pelos Autores, 2017.
É necessário que o leitor fique ciente que a varredura inicial proposta para
o levantamento amostral bruto não foi exaustivo, ou seja, provavelmente, mesmo
alguns artigos – elegíveis conforme os princípios aqui elencados – podem ter sido
considerados no levantamento delineado.
Quanto à relação da procedência territorial das revistas das publicações
das produções cientificas, identificou-se que 35,3% estão lotadas na região sudeste e 47,1% estão na região Sul; 5,8% no Centro-Oeste e 11,8% no Nordeste.
Esta realidade provavelmente se justifique em função do número de programas
de pós-graduação existentes nestas regiões do país. Afinal, a referência que as regiões Sudeste e Sul ocupam no campo acadêmico é decorrente dos investimentos
realizados em programas de pós-graduação, universidades e grupos de pesquisa
(CARNEIRO, 2011).
A análise dos estados da federação acerca das publicações demonstrou
que São Paulo (2), Paraná (1), Santa Catarina (1), Rio Grande do Sul (4), Rio de
Janeiro (2), Minas Gerais (1), Goiás (1) e Bahia (2) as procedências de editoração
das revistas científicas que publicaram sobre o tema pesquisa escolar, conforme o
gráfico 1.
Gráfico 1: Publicações por estado sobre pesquisa escolar
Gráfico 1: Publicações por estado sobre pesquisa escolar
5
4
3
2
1
0
SP
MG
RJ
RS
PR
SC
BA
GO
Fonte:
Elaborado
pelos
Autores,
2017.2017.
Fonte:
Elaborado
pelos
Autores,
186
Dessa forma, houve uma considerável concentração desta produção em alguns
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 181-192, 2018
estados específicos, o que se configura como fator negativo, pois isto pode ser um fator
Dessa forma, houve uma considerável concentração desta produção em
alguns estados específicos, o que se configura como fator negativo, pois isto pode
ser um fator limitante em relação à expansão da pesquisa escolar no Brasil.
Se faz necessário que ocorra uma maior presença desta temática no âmbito das universidades, inclusive nos programas de pós-graduação, uma vez que
quanto mais locais considerarem a pesquisa escolar como recurso para o ensino e
aprendizado no contexto pedagógico, maior será o número de produções e melhores serão as contribuições para área.
Gráfico 2: Publicações ano a ano sobre pesquisa escolar
Fonte: Elaborado pelos Autores, 2017.
Ao considerar o estrato das revistas nacionais da área da Educação e as
relações com os artigos sobre a pesquisa escolar no Brasil, os resultados da investigação mostram que a produção do conhecimento sobre a temática se dá, sobretudo, em revistas dos estratos B2 que apresentaram o maior número (35,3%) de
publicações de artigos dentre as demais estratificações, de acordo com o ano de
publicação dos mesmos. Tal classificação foi realizada com os estratos do Web-Qualis referente ao ano de 2015.
4. O conteúdo dos artigos selecionados
A falta de motivação docente para as práticas investigativas (ABREU;
ALMEIDA, 2008; SILVA; SOUSA; FRAZÃO, 2008; MACIEL; VIEIRA,
2010; CHALUH, 2017) junto aos alunos os leva à incompreensão da responsabilidade das ações realizadas, e da capacidade de agir e promover mudanças
nos ambientes aos quais está inserido, percebendo que a inserção da pesquisa nas
formações inicial e continuada é necessária ao professor do ensino fundamental
para que possa vivenciá-la e praticá-la em sua prática pedagógica.
187
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 181-192, 2018
Desta maneira, conforme articula Júlio (2009) o aluno deve estar motivado para realizar observações com emoção como estar defronte a uma obra de
arte, com um olhar atento e um sorriso que expresse alegria, para que haja novas
descobertas por meio de novos conhecimentos. É transformar informações em
saberes, em que mediante um roteiro orientador do processo de pesquisa por
meio de questionamentos e hipóteses, identificando o estudo como investigação
científica, na qual o discente utiliza a sua criatividade e a sua iniciativa.
Segundo Oliveira e Campello (2016, p. 186), “a ausência de questionamento parece levar a um dos pontos também recorrentes nos estudos analisados:
a falta de motivação dos alunos para realizar a pesquisa”. A grande maioria das
pesquisas são direcionadas pelos docentes com temáticas escolhidas a priori, sem
fazer um levantamento de temas em sala de aula dos quais os alunos tenham
interesse de realizarem pesquisa, tal característica foi localizada nos estudos de
D’’Avila e Fernandes (2014) e, Santos e Figueiredo-Echalar (2014).
Outro ponto, é a inserção das tecnologias e da internet como recursos
para a realização e estruturação de pesquisas escolares (BERNARDES: FERNANDES, 2002; ROCHA; BRITO, 2007; MACHADO; VIDOTTI, 2013;
BRAGA; MARRONI; FRANCO, 2015; NASCIMENTO; GARCIA, 2015;
DUARTE; ANTUNES, 2016) constituindo um recurso que rompe com as barreiras do tempo e do espaço, contribuindo muito para o ambiente de escolarização. Percebe-se que não pode haver uma exclusão das mídias digitais por meio do
docente no processo de ensino-aprendizado, tais ferramentas são artifícios para a
construção do conhecimento na sociedade do século XXI.
Santos (2007), evidencia a utilização desses recursos, e esclarece como a
internet pode auxiliar o discente durante uma pesquisa escolar e, de modo consequente, na elaboração de inúmeros conhecimentos. De acordo com ela,
o uso da Internet como meio de pesquisa e produção de
conhecimento possibilita ao aluno participar, intervir, usar
conceitos de bidirecionalidade (contidos nos hiperlinks), usar
uma multiplicidade de conexões (hipertextos), aprender através de
simulações, ter autonomia na organização dos conteúdos, ter acesso
a conteúdos em diversos formatos (som, texto, imagens, vídeo etc),
traçar seu próprio caminho que não será igual aos dos autores que
acessou (SANTOS, 2007, p. 274-275).
Outro recurso utilizado para as investigações por meio dos discentes são
as bibliotecas escolares, por menor que seja a procura por tais ambientes no Ensino Fundamental, como espaços possíveis à construção de conhecimento com a
mediação do bibliotecário (GARCEZ, 2007) o qual é necessário para o envolvimento do aluno, procurando haver um diálogo com o professor. De acordo com,
Moro e Estanbel (2004),
188
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 181-192, 2018
Os efeitos do uso da informação compartilhada entre os educadores,
os bibliotecários, os alunos, pode encaminhar para uma rede
integrada de comunicação, permitindo o estabelecimento de novas
relações entre os mesmos (inter-relação de pessoas) e destes com a
comunidade (p. 56).
O estudo, também denominado estado da arte, realizado por Oliveira e
Campello (2016), mostra que existia uma percepção teórica da pesquisa como
princípio educativo pelos docentes, contudo na maior parte da análise realizada
isso não se apresenta satisfatoriamente, para ser viabilizada como “prática escolar
eficiente”, sucedendo que uma grande parte das produções científicas constatou
“aspectos negativos” (p. 181) correlacionados à pesquisa escolar.
O levantamento realizado pelas autoras retratou algumas carências acerca
da pesquisa escolar no Brasil, tais como:
Malogro da pesquisa escolar como estratégia didática; Falta de
questionamento e debates acerca do objeto da pesquisa; Falta
de motivação do aluno para a pesquisa; Falta de orientação pelo
professor e pelo bibliotecário, ou precariedade dessa orientação;
Prática recorrente da cópia pelos alunos; Falta de preparo do
professor e do bibliotecário para orientar a pesquisa; Falta de
preparo do aluno para empreender a pesquisa; Falta de interação
entre bibliotecário e professor; Insuficiência das avaliações acerca
da pesquisa efetuada; Falta de orientação para uso da Internet
(OLIVEIRA, CAMPELLO, 2016, p. 183 e 186)
Por fim, os estudos de Laplane, Gonçalves e Portela (2016) e Passos e
Pieruccini (2016) evidenciam a pesquisa escolar como mecanismo para a organização de conhecimentos para que o educando questionar a realidade levantando
questionamentos e tentando resolvê-los, aplicando para tal o pensamento lógico,
a capacidade de análise crítica, a intuição, a criatividade, escolhendo procedimentos corretos e para que haja uma verificação de sua adequação.
5. Reflexões finais
Os resultados mostraram que a produção científica sobre o tema pesquisa escolar ainda é insuficiente, visto a grande escala de escrita de artigos em
periódicos da Educação no Brasil. Os artigos analisados delinearam um amplo
cenário da pesquisa escolar, revelando que estudos sobre a temática se fazem necessário no ambiente educacional. Ao considerar que a aprendizagem por meio
da pesquisa, do questionamento e da curiosidade seja um dos caminhos para
formar alunos crítico e autônomo, faz-se necessário articular formas de fazer com
que essa estratégia seja trabalhada de forma apropriada nas escolas (OLIVEIRA;
CAMPELLO, 2016).
As produções científicas demonstram que esse simplório panorama da
pesquisa escolar no Brasil, revela obstinadamente as contradições entre prática e
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 181-192, 2018
189
discursos. A pesquisa escolar, teoricamente, é entendida como uma prática metodológica que mostra caminhos para a atuação efetiva do discente, na qual suas
experiências são valorizadas, ocasionava uma interação entre o professor e ele,
direcionando para uma melhor interação entre ambos.
Todavia, essa articulação teórica da pesquisa que possui um foco como
princípio educativo, no qual se apoiam especialmente nas concepções de Pedro
Demo – autor citado em grande parte dos artigos – em sua grande maioria não é
o bastante para viabilizada nas instituições de ensino, principalmente as dos anos
iniciais do Ensino Fundamental.
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diego-silva@hotmail.com
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- Regina Maria Rovigati Simões
rovigatisimoes@uol.com.br
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192
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 181-192, 2018
Nuances acerca da rotina de uma classe
hospitalar: um estudo de caso
RODRIGUES, Júlio
SIMÕES, Regina Maria Rovigati
Resumo: Este estudo teve por objetivo descrever como se configura a rotina de uma classe
hospitalar. Para isso, utilizou-se da observação não participante, apoiando-se num estudo
de caso. Constatou-se que o ambiente da classe hospitalar se mostra dinâmico e potencialmente produtivo, uma vez que permite às crianças hospitalizadas um saber sistematizado
que garante a manutenção da sua vida escolar e ao mesmo tempo se constitui de maneira
adaptada à realidade hospitalar.
Palavras chave: Pedagogia hospitalar; Práticas pedagógicas; Educação especial.
Abstract: This study aimed to describe how to configure the routine of a hospital class.
For this, non-participant observation was used, based on a case study. It was found that
the environment of the hospital class is dynamic and potentially productive, since it allows
hospitalized children a systematized knowledge that guarantees the maintenance of their
school life and at the same time is constituted in a way adapted to the hospital reality.
Keywords: Hospital pedagogy; Pedagogical practices; Special education.
1. Introudução
O direito à educação não se encerra para a criança hospitalizada. As políticas educacionais voltadas para educação especial asseguram que, embora a criança
esteja impossibilitada de frequentar a escola regular devido sua condição de hospitalizada, é possível que ela dê continuidade em sua vida escolar por meio da
classe hospitalar.
Sabe-se que os primeiros vestígios sobre a educação em ambientes hospitalares, aconteceu em Paris, no ano de 1935 com Henri Sellier, na época ministro
da saúde da França. Henri estruturou um sistema de controle dos serviços de
higiene em instituições assistencialistas que tinham por objetivo acolher crianças
órfãs advindas da segunda guerra mundial.
Posteriormente essa ideia se estendeu por toda a Europa e Estados Unidos, conforme lembram Ferreira, Vargas e Rocha (1998, p.112): “[...] com o
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 193-202, 2018
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início da segunda guerra mundial, houve a necessidade de se criar, em toda a Europa, instituições destinadas ao atendimento dos órfãos de guerra e das crianças
separadas de seus pais”. Com o passar dos anos a classe hospitalar se modificou
e atualmente possui o modelo que conhecemos, funcionando como uma escola
dentro dos hospitais na qual os professores realizam atendimentos pedagógicos
para crianças internadas em idade escolar.
O atual documento que orienta as ações pedagógicas dentro dos hospitais
é denominado de “Classe Hospitalar e Atendimento Pedagógico Domiciliar: estratégias e orientações”, editado em 2002 pelo Ministério da Educação/Secretaria
de Educação Especial, em conjunto com representantes dos Sistemas de Educação
e Saúde, objetivando normatizar as ações em todo país. (BRASIL, 2002)
De acordo com este documento, os atendimentos educacionais desenvolvidos dentro dos hospitais são de responsabilidade das Secretarias Estaduais, do
Distrito Federal e Municipais de Educação, da mesma forma que as direções clínicas dos serviços e sistemas de saúde brasileiras (BRASIL, 2002), tendo como base
as normativas previstas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação e nas Diretrizes
Nacionais da Educação Especial na Educação Básica – LDB 9394/96.
A atuação do pedagogo, no ambiente da classe hospitalar, nos dá ideia
de uma prática pedagógica que vá de encontro com o contexto educacional na
qual a criança está inserida, tendo em vista sua vida escolar até aquele momento.
O tempo de internação da criança deve ser considerados também, uma vez que
esses fatores são cruciais ao se organizar os conteúdos a serem trabalhados com a
criança. Tendo em vista que, segundo Fonseca (2003), essa organização constitui
num efetivo atendimento pedagógico desenvolvido nos hospitais.
Dessa maneira, o aluno que frequenta a classe hospitalar, além de se ver
mediante aos processos de ensino-aprendizagem, possui a percepção de que há
um mundo que o espera fora do hospital, por isso:
[...]a abordagem pedagógica pode ser entendida como instrumento
de suavização dos efeitos traumáticos da internação hospitalar e
do impacto causado pelo distanciamento da criança de sua rotina,
principalmente no que se refere ao afastamento escolar. O período de
hospitalização é transformado, então, num tempo de aprendizagem,
de construção de conhecimento e aquisição de novos significados,
não sendo preenchido apenas pelo sofrimento e o vazio do não
desenvolvimento afetivo, psíquico e social (FONTES, 2004, p.276).
194
Além do processo de ensino-aprendizagem, a criança deve preocupar-se
com outras necessidades, tais como: emocionais, sociais, intelectuais, que se revela na classe hospitalar, conforme apontam Ortiz, Freitas (2005), este é um espaço
de acolhimento para a criança e seus familiares, estabelecendo um elo com seu
retorno do seu convívio social, que ao mesmo tempo traga expectativas para a
continuidade da sua vida escolar.
Dessa forma, o objetivo do presente estudo é relatar como se configura a
rotina de uma classe hospitalar com atendimento nos leitos localizada no interior
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 193-202, 2018
do estado de São Paulo. Para isso, o método utilizado foi a observação não participante. Os resultados revelaram que o ambiente da classe hospitalar se estrutura de
forma dinâmica e potencialmente produtivo em relação aos processos de ensino-aprendizagem, bem como na percepção do aluno como agente inventivo da sua
realidade que culmina na superação da sua condição de hospitalizado.
2. Procedimentos metodológicos
Constitui-se num estudo qualitativo e descritivo que foi desenvolvido em
2015 dentro de um hospital do interior do estado de São Paulo. Esta pesquisa
foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa - CEP da Universidade Federal do
Triângulo Mineiro sob o número 1.343.986.
Para atingir os objetivos desta pesquisa foi necessário desenrolar um estudo de caso que segundo Lüdke (1986), esse método pretende viabilizar pesquisas
qualitativas através da descrição profunda de um caso, enfatizando a singularidade
e o contexto da situação que é, em geral complexa, mas deve estar bem delimitada. Stake (1983) defende o uso do estudo de caso no campo educacional como
forma de compreender integralmente as dificuldades práticas no ensino.
Para coletar os dados que permitissem descrever e analisar tal ambiente,
utilizamos como instrumento a observação não participante realizada a partir de
toda dinâmica que acontecia durante as aulas na classe hospitalar mediante ao
horário estabelecido. Gil (2002) aponta que esse tipo de pesquisa caminha no
sentido de descrever e relacionar as características de uma população específica
ou fenômeno que surge por meio de técnicas que seguem um padrão de coleta
de dados.
.
A observação de campo se deu por meio de gravação de voz e anotações
em diários de campo. Nesta atividade, buscou-se compreender, por meio de registros das atividades na classe hospitalar. Segundo Ludke (1986), o contato com
o ambiente traz a realidade como ele realmente se apresenta, fazendo com que
todos os objetos observados tenham sua importância. O período de observação
foi de aproximadamente três semanas, tempo em que o pesquisador percebeu que
os dados estavam saturados.
O pesquisador era apresentado aos alunos hospitalizados como “amigo”
das professoras que estava ali para assistir as aulas e o mesmo se mantinha dentro
do leito, acompanhando de perto a rotina da professora, respeitando ao máximo
a distância para interferir o menos possível na rotina em questão.
Os materiais utilizados nessa coleta foram: caneta esferográfica azul e caderno para anotações, bem como gravador de voz para fixar o que era observado.
No diário de campo, foi registrada a sequência de atividades ministradas
na classe hospitalar, a rotina da professora e dos alunos enfermos, a quantidade
desses alunos presentes, informações sobre os materiais utilizados e o tratamento
da professora frente as condições clínicas dos alunos, a estrutura física da escola,
as intervenções de terceiros e as impressões do pesquisador.
195
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 193-202, 2018
3. Resultados
3.1 Características da classe hospitalar:
A classe hospitalar investigada é vinculada a uma escola estadual, conta
com apenas uma professora no quadro de docentes, sendo que essa professora
está na faixa etária de 30 a 40 anos. Ministra aulas nesse ambiente a mais de 5
anos. Além de professora da classe hospitalar, é também professora na rede municipal, neste ofício está a mais de 10 anos.
Possui graduação em pedagogia, sendo esta uma exigência do Conselho
Nacional de Educação, e também possui licenciatura em Letras/Inglês e especialização em Educação Especial.
Segundo Fonseca (1999) cabe aos hospitais oferecerem o espaço físico
para realização do atendimento pedagógico, contudo, o atendimento da professora dessa classe hospitalar acontece de leito em leito, uma vez que o hospital não
oferece espaço físico para realização das aulas. Dessa forma, a professora utiliza os
elevadores e escadas para chegar até os leitos dos alunos enfermos. Os materiais
utilizados ao longo das aulas ficam guardados num leito adaptado, esse cômodo
possui uma mesa, uma cadeira e armários e os materiais mais utilizados são: atividades de alfabetização impressa, papeis em branco para realização de atividades
com os alunos, lápis grafite, borrachas, apontadores e por fim, atividades para
desenhar/colorir.
Outro aspecto a ser considerado é a rotatividade de alunos que recebem
o atendimento pedagógico. Ao longo da pesquisa foi visto que em determinados
dias haviam um número grande de alunos para serem atendidos pela professora,
mas em outros, o que se tinha eram um número aquém. Sendo essa rotatividade
uma das características da classe hospitalar (BARROS, 1999).
Os atendimentos dão início com a professora fazendo um checkup no
sistema interno do hospital que mostra os pacientes internados em idade escolar
e em quais leitos estão. A ordem dos atendimentos é escolhida aleatoriamente
pela professora. O início da atividade escolar do aluno enfermo depende das suas
condições clínicas que é realizada por uma equipe constituída por médicos e enfermeiros, sendo esses os responsáveis pela autorização do início e também pela
continuidade das aulas.
O período de internação do aluno enfermo é constituído por uma rotina
intensa em relação aos horários de medicação, coleta de material para exames e
controle de temperatura, onde estes devem ser seguidos rigorosamente e por esse
motivo, as aulas são frequentemente interrompidas. Importante salientar que as
aulas acontecem somente no período da manhã para crianças com idade correspondente ao Ensino Fundamental etapa I.
Relevante lembrar que a modalidade de atendimento pedagógico nesse
hospital acontece, como foi dito, de leito em leito. Logo, acreditamos que quando a
professora inicia seu trabalho pedagógico com uma criança enferma, esta passa a ser
um aluno enfermo e, seu leito, passa a ser o ambiente considerado de classe hospitalar.
196
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 193-202, 2018
3.2 As características dos alunos enfermos:
Os casos clínicos presentes ao longo da coleta eram diversificados e cada
um deles limitava as crianças de alguma maneira. As limitações clínicas mais recorrentes são as do “acesso”, que limitava as crianças em escrever, pintar, apagar,
apontar o lápis etc. Outras limitações, em recorrência menor, são os casos das
crianças que passaram por cirurgia e estavam em repouso, assim, o tempo de
atendimento era menor em relação as demais.
Haviam casos mais isolados, como pacientes oncológicos que estavam
fazendo tratamento de quimioterapia e os pacientes de diálise. Esses últimos raramente recebiam o atendimento pedagógico até o fim, pois a enfermidade se
manifestava por meio do mal-estar desses alunos devido as medicações, o que
fazia com que o atendimento da professora se encerrasse. Logo, foi visto que
tais limitações clínicas fazem parte do escopo heterogêneo na qual caracteriza os
alunos da classe hospitalar, como já foi descrito por Barros quando diz a respeito
da heterogeneidade da classe hospitalar:
Para cada criança, o tempo de permanência no hospital é diferente, e,
por conseguinte, a duração e extensão do investimento pedagógico
recebido. A seriação escolar e/ou o aproveitamento acadêmico
apresentado pelos pequenos pacientes sofre alguma variação
também. Assim, por exemplo, podem-se ter dois pacientes, ambos
no mesmo ano e encontrar-se um deles bastante defasado em relação
ao outro (BARROS, 1999, p.86).
Nesse sentido a classe hospitalar se configura como espaço de superação
dessas limitações, que faz a criança perceber que ela pode, mesmo que de maneira
limitada, desenvolver as atividades pedagógicas.
A criança na condição de hospitalizada passa a vivenciar outro mundo
dentro de um hospital, sendo esse, muitas vezes, sem cores, frio e com experiências dolorosas advindas dos procedimentos clínicos que corriqueiramente são
invasivos em relação ao seu corpo e principalmente a sua identidade. Foi visto que
a perca de identidade é um fator recorrente do ambiente hospitalar na qual caracteriza os alunos enfermos, isto é, uma vez internada a criança passa a ser conhecida como “paciente da doença x”, ou, “paciente do leito Y” e a frequentar uma
rotina exaustiva de exames, repousos, cuidados, poucas conversas e vivências que
não ultrapassam os limites do seu leito, conforme lembra Ortiz, Freitas (2005),
isso acontece quando o sujeito transita para condição de paciente.
3.3 Rotina pedagógica
As crianças aguardavam a chegada da professora entusiasmadas, com o
material aberto e, no momento que a professora chegava, o que não faltavam
eram sorrisos. Do ponto de vista do que se espera da postura do professor que
ministra aulas para crianças impossibilitadas de freqüentar a escola regular, está
197
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 193-202, 2018
a questão da atuação transformadora na qual é entendida na medida em que se
resgata o respeito à vida humana ao considerar as circunstâncias sociais, éticas,
educacionais presentes no ato de humanizar, conhecendo o ser humano (CALEGARI, 2003).
Em relação ao trabalho pedagógico da professora, quando uma criança
passava a receber o atendimento pedagógico, este se iniciava a partir de uma avaliação diagnóstica realizada pela professora. Este método, traz segurança para dar
início ao trabalho pedagógico com as crianças hospitalizadas, conforme Varela,
Santos (2007) apontam que a avaliação diagnóstica se constitui por uma sondagem em relação ao desenvolvimento do aluno, dando-lhe elementos a fim de
verificar o que aprendeu e como aprendeu. Isso permite que a professora da classe
hospitalar sistematize um plano de ensino que contemple as dificuldades do aluno
encontradas nessa avaliação.
Ao longo da observação houve casos de crianças cessarem a avaliação
diagnóstica e voltarem a fazê-la no dia seguinte devido às manifestações da enfermidade, contudo, mesmo com esse impasse, é visto que esse é o método mais
eficaz nesse ambiente para iniciar o trabalho pedagógico, tendo em vista que a
vida escolar da criança quando passa a receber o atendimento pedagógico é desconhecida pela professora da classe hospitalar.
Na medida que a criança não recebe alta, ou seja, que ela permanece no
hospital e a frequentar cada vez mais as aulas da classe hospitalar, é sugerido pela
professora que os responsáveis pela criança enferma busquem parceria com sua
escola de origem, a fim de direcionar e sintonizar o trabalho pedagógico que
acontece na classe hospitalar com a escola regular.
Nesta perspectiva, a atenção pedagógica, mediante a comunicação e
diálogo, é essencial para o ato educativo e se propõe a ajudar a criança
hospitalizada para que, imerso na situação negativa que atravessa
no momento, possa se desenvolver em suas dimensões possíveis
de educação continuada, como uma proposta de enriquecimento
pessoal. (MATOS, 2006, p.69).
198
Segundo Fonseca (1999b) a passagem pela classe hospitalar
contribui para a reintegração da criança à sua escola de origem, isso devido ao
acompanhamento pedagógico que objetiva, ao longo da internação, evitar o fracasso escolar das crianças em idade de escolarização que, por conta da hospitalização, se afastam do ensino regular.
Foi visto que quando não existem sintonia dos conteúdos da escola de
origem do aluno enfermo com a classe hospitalar, a professora acaba por ministrar
conteúdos focados na alfabetização e leitura como representação do ensino regular, isto é, o trabalho da professora da classe hospitalar é uma reprodução da escola
regular, não existe seleção de conteúdos oriundos de um currículo próprio da
classe hospitalar, o que existe são atividades impressas que não exigem qualquer
esforço por parte do corpo do aluno, isto é, são atividades que o aluno enfermo
realiza sem precisar se mover da sua cama.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 193-202, 2018
Gohn, (1999) aponta que existe uma certa preocupação por parte dos
professores em transmitir os mesmos conteúdos da escola regular em ambientes
não formais. Contudo, essa transmissão é desenvolvida em espaços alternativos
e com metodologias e sequencias cronológicas diferenciadas, como é o caso do
ambiente da classe hospitalar, com conteúdos curriculares flexíveis, adaptados segundo a realidade do alunado a ser atendido.
Em relação a como acontece o trabalho pedagógico por meio de visitas
no leito do aluno enfermo, este se dá de forma individualizada. Foi observado
que por menor que seja o tempo de permanência do aluno na classe hospitalar, o
atendimento individualizado traz diversos benefícios tanto no aprendizado quanto na afetividade. Isso se deve ao fato de que as crianças saem da rotina hospitalar,
com exames, medicamentos, e entram numa rotina repleta de sorrisos, fantasia e
desejos e, mais que isso, a criança tem total atenção, tanto dos professores quanto
dos acompanhantes, que por diversas vezes se fazem presentes. Logo, percebe-se que esse trabalho individualizado desencadeia um laço de afetividade entre
professor e aluno.
O professor da classe hospitalar, de fato, representa alguém de enorme
confiabilidade da criança, em consequência deste profissional representar alguém
que faz parte do seu mundo, dessa forma, o professor deve
Ouvir a criança falar da sua dor, na proximidade afetiva, exige
uma identificação não apenas com a dor em si, mas com a própria
criança. De certa forma, reviver as crianças que fomos falar de novo
com as mesmas palavras, ouvir na mesma lógica, agir com aquele
mesmo sentido. (OLIVEIRA,1991, p. 42)
Ao longo da observação foi visto que a criança atendida pela classe hospitalar demonstra ganhos significativos em relação ao enfretamento da doença,
deixando de ser um sujeito coadjuvante e tornando-se protagonista do processo
de recuperação.
3.4 A participação da família
A compreensão do familiar que acompanha a criança ao longo do período
de internação tem sobre a importância da escolaridade é fundamental no momento da realização das aulas. A família, em parceria com o hospital, deve fornecer à
classe hospitalar todas as informações necessárias para, além de facilitar o processo
de reinserção escolar, contribuir para que a criança seja vista como aluno, não
como paciente. Do mesmo modo, a escola pode fazer os contatos com o hospital
para a manutenção do que a criança aprendeu na classe hospitalar.
O ambiente da classe hospitalar, além de propiciar um espaço de reaproximação com o cotidiano da criança que lhe foi diminuído, pois este ambiente
traz consigo a figura do professor que representam um elo com o mundo fora do
hospital potencializa os sentimentos de superação desse período de internação.
O professor da escola hospitalar é, antes de tudo, um mediador das interações
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 193-202, 2018
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da criança com o ambiente hospitalar[...] e também para os familiares e para as
perspectivas de vida fora do hospital (FONSECA, 2003, p. 25).
Esse status de “professor mediador” foi visto várias vezes. É fato que o
professor da classe hospitalar, por se fazer presente no cotidiano da criança, acaba
se tornando “membro da família”. Isso facilita a troca de informações em relação
aos estados emocionais da criança, na qual contribui diretamente com a organização dos conteúdos que o professor poderá ministrar, dado que o professor
entende que outros fatores, tais como emocionais, medo, angústia, traumas etc,
podem, de fato, influenciar no rendimento dos alunos enfermos ao longo das
aulas. Comumente, essas conversas aconteciam nos corredores do hospital, longe
da presença das crianças.
A participação e o acompanhamento dos pais nas atividades escolares
dos filhos, foi visto como sendo de fundamental importância em se tratando das
questões afetivas do contexto hospitalar. Este acompanhamento se mostrou de
maior valor quando os alunos enfermos estão mais fragilizados em decorrência
da enfermidade, isto é, a presença da família no desenvolvimento das atividades
pedagógicas faz as crianças se sentirem acolhidas, conforme Oliveira (1991, p.
61) aponta, “a criança hospitalizada necessita da presença amorosa e solidária dos
familiares ligados a ela por laços de parentesco mais estreitos”.
Na maior parte dos atendimentos pedagógicos, a professora tinha a companhia dos familiares dos alunos que estavam internados. Se de um lado a presença dos pais contribui nas questões afetivas na realização das atividades, por outro
lado, atrapalha. Isso por que na busca de fazer com que o aluno obtivesse êxito, os
familiares davam a resposta, o que de fato não ia de encontro com o aprendizado
dos alunos.
Considerações finais
Acreditamos que por meio das investigações referentes ao acompanhamento da rotina de uma classe hospitalar de atendimento nos leitos foi possível
compreendermos a dinâmica desse espaço.
Verificamos que a professora reproduz o modelo de ensino-aprendizagem
realizado no ensino regular, isto é, o foco na sua atuação profissional está na
transmissão do conteúdo, prevalecendo o enfoque nas questões de alfabetização e
leitura dos alunos hospitalizados que frequentam a classe hospitalar.
O cotidiano de uma classe hospitalar é repleto de rotinas consolidadas –
processo de encaminhamento da criança para classe hospitalar, avaliação diagnóstica – e outras rotinas que são adaptadas de acordo com as necessidades os alunos
que versam na diversidade de que surge no dia a dia – adesão, permanência do
aluno na classe hospitalar, continuidade nos conteúdos.
Podemos constatar que a classe hospitalar, apesar de ser um espaço complexo, se mostra dinâmico e potencialmente produtivo, uma vez que permite às
crianças hospitalizadas a manutenção e o aprendizado da sua vida escolar, sendo
este adaptado à as suas condições.
200
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 193-202, 2018
Esse ambiente da classe hospitalar está envolvido de sentimentos tão profundos quanto um oceano. Por esse motivo, possibilita diversas aberturas emocionais por parte da criança e principalmente dos familiares – que comumente são
aqueles que sabem da gravidade da patologia dessas crianças. Essas aberturas não
só culminam na aproximação, como também auxiliam na troca de informações
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Mestre em Educação Física
- Regina Maria Rovigati Simões - Universidade Federal do Triângulo
Mineiro -UFTM
jc_rodrigues@yahoo.com
Doutora em Educação Física
Currículo: http://lattes.cnpq.br/7770158896621784
202
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 193-202, 2018
A produção de banner em uma
abordagem de iniciação para a Cultura
Digital com base na prática educativa
FERREIRA, Cléa Rocha
SIQUEIRA, Alexandra Bujokas de
LINHARES, Martha Maria Prata
Resumo: Atualmente em um mundo cada vez mais digital, uma avassaladora onda de
informação é enviada e recebida instantaneamente, através de meios diversos. Em sala de
aula, um dos desafios do docente é aprender a utilizar as chamadas tecnologias digitais
de Informação e Comunicação na prática. Refletir sobre estas questões é o objetivo deste
trabalho. Afinal, a produção de conteúdo digital começa muito antes da conexão com a
rede. Pretende-se, por meio de um apanhado de autores relacionados a uma prática específica, realizada em uma escola de nível médio-técnico, colocar em debate a alfabetização
digital a partir da iniciação na produção cientifica por meio da produção de banner. Tal
prática perpassa pelo aprendizado na produção de conteúdo, uma vez que o aluno quando
na posição de produtor, confeccionando material que pode ser disponibilizado no meio
digital, abre precedente para os questionamentos a cerca daquele conteúdo que consome
no próprio meio.
Palavras chave: Banner; Cultura digital; Prática educativa.
Abstract: Currently in an increasingly digital world, an overwhelming wave of information is sent and received instantly, through various means. In the classroom, one of
the challenges of the teacher is to learn how to use the so-called digital Information and
Communication technologies in practice. Reflecting on these issues is the purpose of this
paper. After all, the production of digital content begins long before the connection to
the network. It is intended, through a collection of authors related to a specific practice,
held in a middle-technical school, to debate digital literacy from the initiation in scientific
production through the production of banner. This practice goes through learning in the
production of content, since the student when in the position of producer, making material
that can be made available in the digital environment, sets the precedent for the questions
about the content that consumes in the medium itself.
Keywords: Banner; Digital culture; Educational practice.
203
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 203-212, 2018
1. Cultura Digital na prática educativa
Atualmente em um mundo cada vez mais digital, uma avassaladora onda
de informação é enviada e recebida instantaneamente, através de meios diversos.
Em sala de aula, o desafio dos docentes é aprender a utilizar as chamadas tecnologias digitais de Informação e Comunicação na prática. O avanço das tecnologias
de programação trouxe à tona a internet que permite ao usuário comum produzir,
remixar e compartilhar conteúdo. O digital é, de acordo com Pretto e Silveira
(2008), uma metalinguagem que permitiu separar e liberar todos os conteúdos e
formatos dos seus suportes físicos. E esse processo assegurou a possibilidade de
recombinação constante dos bens intangíveis.
Nesse cenário, passamos rapidamente de uma situação de escassez de informação em que o acesso ao ensino superior significava a possibilidade de acessar
livros, revistas e outras fontes de informação na biblioteca e na sala de aula para
uma situação de abundância da informação. O ensino universitário se vê então
diante da necessidade de revisão das práticas pedagógicas há muito estabelecidas,
e neste novo momento os professores precisam se apropriar de novas abordagens.
Uma dessas abordagens é a produção de conteúdo como estratégia de aprendizagem.
Aparentemente a urgência do aprendizado para a utilização das inovações
tecnológicas se sobrepõem a experimentação dos mecanismos de produção para o
contexto escolar. Embora Alonso (2008), aponte que a incorporação de tecnologias nesse âmbito contribui, na maioria das vezes, para acelerar a crise de identidade dos professores. Quando são integradas ao fazer pedagógico, necessitam ser
significadas. E ainda que o sentido do objeto técnico na prática escolar termina
por definir não somente determinado uso, mas a sedimentação de culturas. Existe
uma grande dificuldade em meio a tantas inovações de encontrar uma porta pela
qual todos possam entrar com conhecimento razoável para saber onde se está
indo no que diz respeito à preparação de conteúdo digital.
A cultura digital modificou o processo da aprendizagem, no entanto o
consumo de conteúdo midiático não encontra antagonismo na forma de analise para além de pequenos núcleos acadêmicos o que nem sempre é eficiente
para alcançar os mecanismos educacionais no nível de ensino médio. De acordo
com Freitas (2015), no ciberespaço, as pessoas falam/escrevem, intercambiam
ideias em tempo real, criam grupos de amigos com pessoas de diferentes partes
do mundo sem, no entanto, existir um encontro presencial. São rompidas assim,
as fronteiras entre o real e o virtual. De maneira geral a maioria tende a fazer isso
para fins de entretenimento, quando se trata de levar as habilidades de produção,
remix e compartilhamento para situações de aprendizado, nem todos os alunos se
sentem seguros o suficiente. Este é o desafio docente atual promover a interação
entre a desenvoltura da utilização cotidiana da cultura digital que temos como
consumidores de mídia com nossas situações de aprendizado no ensino formal.
Nossa vida, nossos relacionamentos, memórias fantasias e desejos também fluem pelos canais de mídia (JENKINS, 2009). O aproveitamento educacio204
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14 p. 203-212, 2018
nal ofertado pela utilização dos avanços tecnológicos está diretamente ligado ao
letramento inicial. Embora aparentemente a utilização do meio eletrônico pareça
satisfatoriamente instintivo, da mesma maneira que ocorreu a cada um a necessidade de aprendizado para a fala, também é necessário conhecimento relativo para
utilização dos meios eletrônicos que formam a cultura digital vigente a nossa volta.
É importante considerar os novos desafios que as mídias trazem ao sistema
de educação formal e à educação continuada dos cidadãos (PIMENTA; PRATALINHARES 2013, p. 798). É necessário ensinar conteúdos programáticos e
também ensinar como produzi-lo para que não se deixe apanhar por conceitos
errôneos desenvolvidos por mecanismos ou pessoas de pouca idoneidade na web.
Imersos nessa nova cultura baseada nas tecnologias digitais, crianças e jovens vêm
desenvolvendo novas formas de relacionamento, novos processos cognitivos,
atenção multifocada e capacidade de exercer diferentes tarefas simultaneamente. Daí
a importância do desenvolvimento de propostas pedagógicas que aproveitem esse
potencial para promover novas formas de ensino e aprendizagem (FREITAS, 2015).
Refletir sobre estas questões é o objetivo deste trabalho. Afinal, a produção de conteúdo digital começa muito antes da conexão com a rede. Uma vez que
a prática educativa se aproprie desta produção, o observador usual e esporádico
tem melhores chances de compreensão dos mecanismos e informação difundidos
nos meios eletrônicos. Pretende-se, por meio de um apanhado de autores relacionados a uma prática específica colocar em debate a letramento digital, a partir da
iniciação na produção científica por meio da produção de banner.
2. Produzindo banner digital fora da rede
O mecanismo escolhido para a prática aqui descrita foi à produção de
banner com informações de anatomia, patologia e posicionamento relacionadas à
radiologia. Para tanto foi proposto a um grupo de alunos de curso técnico de nível
equivalente ao ensino médio em radiologia a produção de um banner com tema
de livre escolha, relacionado ao curso.
Uma das grandes dificuldades de trabalho com inserção da cultura digital
na pratica é o desnivelamento de conhecimento. Enquanto que a maioria dos
alunos conhece o banner como um representante de anúncios comerciais apenas alguns poucos têm ligeiro conhecimento de sua representatividade nos meios
acadêmicos para demonstração de produção científica. Quando Alonso (2008),
aponta para a utilização educativo-pedagógica das TIC, vistas como recurso e material, seria congruente com a necessidade de incorporar aos processos de ensino/
aprendizagem codificações diferentes, que estariam sendo elaboradas nas distintas
manifestações da cultura em nossos dias. Propõe uma ponderação a respeito da
produção de conteúdo considerada como ferramenta pedagógica que neste aspecto
não apenas amplia o espectro de linguagens disponíveis na educação formal, mas
oferece ao produtor a possibilidade de ressignificação na utilização do produto.
A nomenclatura que envolve este tipo de produção embora diante da
grande utilização midiática no mundo virtual necessita chegar até o aprendiz para
205
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 203-212, 2018
que as atividades de produção de conteúdo se tornem uma via prática e produtiva. Afinal o que é um banner, um infográfico, um flyer ou um panfleto no
mundo digital para aqueles que navegam inadvertidamente na web? O acesso às
tecnologias é fundamental, mas precisa ser qualificado. De acordo com Freitas
(2015), é preciso considerar também as diferentes formas de aprendizagem que
são estabelecidas por tutoriais e vídeos explicativos na internet. Os internautas
desenvolvem novas formas de relação com a aprendizagem, mais autônomas, nas
quais os sujeitos vão guiando seus próprios processos desenvolvendo novas formas de pensamento e raciocínio.
Desta maneira a oficina que dá origem a esta descrição propôs de modo
geral a produção de conteúdo pelo aluno utilizando o modelo de banner utilizado
em apresentação de trabalhos científicos. Embora apresentando um texto maior
sua disposição gráfica é semelhante aos anúncios veiculados, onde uma ideia ou
conceito é exposto de maneira sucinta, porém eficiente. Para isto, inicialmente os
alunos foram convidados a acessar os sites dos dois geradores de banner on line:
Canva e Bannersnack para se familiarizarem com os mecanismos.
As tecnologias digitais, portanto, nada mais são do que mediadoras
do exercício da mente humana, agentes de conexões. Oportunizam
a extensão da presença. Os objetivos e os interesses de cada um são
os provocadores dos caminhos trilhados, das trajetórias percorridas
(FREITAS, 2015, p. 33).
206
Esta proposta de prática educacional para o desenvolvimento crítico da
produção de conteúdo resultou em um grande desafio para os alunos envolvidos,
uma vez que muitos deles desconhecem os softwares básicos utilizados para a
produção de banner, assim como os produtores de infográficos disponíveis na internet. Embora os sujeitos fizessem parte de curso técnico de nível ensino médio
com base em imagem encontraram grandes dificuldades com o layout das páginas
e com os comandos embora estes sejam extremamente semelhantes aos de qualquer editor de imagens disponível.
A proposta desta produção se torna ainda mais desafiadora, pois não incluiu a utilização de imagens e sim apenas texto. Quando expostos inicialmente
à proposta os alunos institivamente se preocuparam com onde ficaria exposto
cada trecho do texto. Demonstrando a relevância da acuidade visual desenvolvida
através da exposição continua a qual esta sociedade está sujeita da gráfica visual
envolvida nos componentes midiáticos. “A possibilidade de conectar o que está
disperso em momentos da produção faz com que seja concentrado o controle sobre o que é produzido, definindo uma nova realidade”. (ALONSO, 2008, p. 65).
Quando estabelecida a sequência textual de acordo com a organização
de redação descritiva tendo como componentes título, apresentação dos autores,
introdução, objetivo, discussão, conclusão e referência, os alunos passaram então
a trabalhar sistematicamente como quem preenche um gabarito. Satisfazendo o
arranjo visual das divisões a serem preenchidas. “Vivemos em um mundo em que
cada vez mais há uma centralidade da mídia na experiência cotidiana, no trabalho,
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14 p. 203-212, 2018
no estudo e no lazer e a qualidade das informações tem um papel importantíssimo
em nossas decisões” (PIMENTA; PRATA-LINHARES, 2013, p. 45). No entanto o aluno não se questiona para onde vai o conteúdo que ele produz em meio eletrônico como apresentações e banners por exemplo. Da mesma maneira pouco se
preocupa com quem produziu e a que se destina o conteúdo que consome diariamente nos meios eletrônicos para satisfazer suas buscas por conteúdo de estudo.
Ainda de acordo com Pimenta e Prata-Linhares (2013), a qualidade da
informação que recebemos tem um papel importantíssimo e decisivo nas escolhas
que fazemos nas nossas ações e na nossa capacidade de usufruir das liberdades. No
entanto o aluno frequenta diversas vezes os meios eletrônicos em busca de conteúdo para satisfazer requisições educacionais como um autômato que preenche
os espaços indicados com informação aleatória. Sem questionamento de fonte ou
mecanismo de produção. Um adolescente fazendo a lição de casa pode trabalhar
ao mesmo tempo em quatro ou cinco janelas no computador: navegar na internet, ouvir e baixar arquivos mp3, bater papo com amigos, digitar um trabalho e
responder e-mails, alternando rapidamente as tarefas. (JENKINS, 2009)
Os alunos, objetos desta descrição, encontraram mais dificuldade na diagramação, e layout dos banners do que propriamente na produção de conteúdo
relacionado ao seu curso de nível médio. O banner científico pode ser considerado como uma combinação entre formas gráficas, cores e informações que atraem a atenção por tempo suficiente para transmitir e fixar uma mensagem. Esta
observação teve caráter introdutório e por tanto se utilizou apenas texto e sua
distribuição dentro do espaço gráfico como chamariz.
A produção e a execução requerem um planejamento cuidadoso, baseado
em critérios bem definidos, que permitam uma comunicação clara e efetiva de
resultados, em um formato que estimule a interação e a discussão. Desta maneira
foi estabelecido que a apresentação deveria constar de identificação da instituição
no topo da imagem, identificação de aluno e professor logo a baixo. Em sequência introdução, desenvolvimento e conclusão como itens mínimos, e com livre
escolha de disposição no layout. Obrigatoriamente as referências deveriam estar
presentes no final da imagem, com livre escolha de posicionamento central ou
lateral. De maneira geral todos fizeram a opção de centralizar toda a informação
coletada e não ocorreu nenhuma variante para o layout produzido entre eles.
Tantas são as possibilidades de efeitos visuais que muitas vezes os alunos
se tornaram indecisos. Algumas considerações que justificaram determinadas escolhas merecem ser destacadas, tais como quando indagados sobre a escolha de tamanho e fonte de letra um aluno afirmou que foi apenas porque ficou bonito assim
como outro revelou que sua escolha se deveu ao fato de ter ficado “bom de olhar”.
A cibercultura, com todos os dispositivos que são desenvolvidos e criados a cada
dia, permite diferentes formas de encontros entre pessoas, ideias e novas formas de
ações em conjunto que derivam em formas outras de pensar e de aprender (FREITAS, 2015). No entanto a hegemonia do estimulo visual sobre os outros dispositivos como os sonoros, por exemplo, estabelece o poder de venda do conteúdo.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 203-212, 2018
207
Os banners desenvolvidos neste estudo, na sua totalidade foram executados em programa especifico do pacote instalado no computador pessoal, embora
a escolha pelo mecanismo de produção fosse livre, os estudantes não se sentiram
confortáveis para a utilização de programas geradores disponíveis na internet. O
que aponta para a necessidade de mediação do conhecimento dos mecanismos.
Pois mesmo apresentando semelhanças e, até mesmo, maior eficiência, o fato de
estar alocado na rede impõe ressalva entre os estudantes em sua utilização.
De acordo com Jenkins (2009), o status de cultura convergente para a
qual caminhamos ao longo dos últimos anos não envolve apenas as reuniões entre
empresas de telefone celular e produtoras de cinema para decidirem quando e
onde vamos assistir a estreia de um filme. A convergência também ocorre quando
as pessoas assumem o controle das mídias. Entretenimento não é a única coisa
que flui pelas múltiplas plataformas de mídia.
A navegação pela internet hoje não se faz só com a leitura/escrita.
Facebook, Whatsapp, Skype e tantos outros dispositivos permitem
a interação por voz (áudio) e vídeo. Basta clicar e falar. A interação
por voz e imagem já é uma realidade muito presente. Nesse sentido,
posso compreender o papel mediador exercido por este instrumento
que é ao mesmo tempo tecnológico e simbólico. Por isso cunhei
a expressão indicando que os computadores são instrumentos
culturais de aprendizagem (FREITAS, 2015, p. 85).
208
Insere-se aqui o conceito de analfabetismo funcional de maneira correlativa, quando descrito por Ribeiro (1997), ampliando seu conceito na tentativa de ir
além de uma concepção acadêmica da alfabetização, que a limita ao desempenho
de tarefas tipicamente escolares. Investigando o nível e o tipo de competências
necessárias para que os indivíduos possam se desenvolver no seu contexto sociocultural, tal perspectiva abre, inclusive, a possibilidade de se questionar a adequação dos currículos escolares com relação às demandas da sociedade. Tal descritor
pode ser aplicado à capacidade de compreensão da utilização dos dispositivos
on line ofertados dentro da cultura digital. Quando indagados a respeito da não
utilização de sites e aplicativos disponíveis na web para a produção do banner a
maioria dos alunos relacionou a produção de conteúdo escolar, segundo conceitos
expressos pelos mesmos, a dispositivos do pacote básico do computador pessoal.
Ou seja, desconsideram a possibilidade de utilização dos mecanismos on line na
produção de conteúdo para a própria escola, quando o buscam a todo o momento
pela sua disponibilidade de acesso.
Neste cenário ainda havemos de levar em conta a descrição de Wesz
(2016), apontando que existe um amplo descompasso tecnológico entre um
indivíduo nativo digital (aluno) e um indivíduo imigrante digital (professor),
que precisa ser transposto e não há como encobrir esse desacerto. Diante disso, surgem várias proposições para as novas funções da escola, do professor e,
consequentemente, também do aluno, ou seja, novas propostas que devem ser
incorporadas ao sistema educativo para que todos estejam direcionados, visando
a melhorias no processo de ensino-aprendizagem.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14 p. 203-212, 2018
Freitas (2015), aponta ainda que só equipar as escolas com laboratórios
de informática e acesso à internet não é garantia de um avanço pedagógico. Também a introdução do uso de tecnologias digitais não pode se dar apenas porque
essa é uma demanda da sociedade atual, mas sim porque estes são úteis em si
mesmos como meios de ensino e aprendizagem. Tais divergências de capacitação
entre professores e alunos desenvolvem um distanciamento na pratica educativa,
uma vez que fica condicionada a conhecimentos externos trazidos por um ou
outro elemento formador do contexto da sala de aula, quando ambos, aluno e
professor poderiam construir um caminho mais firme trabalhando em conjunto.
A escola continua sendo uma das instituições privilegiadas, onde é possível construir um referencial crítico com os alunos. Esse referencial crítico: capacidade de analisar, avaliar e prever - que também contribui para qualificação
profissional, deve servir para o questionamento dos papéis das várias instituições
sociais, inclusive da escola e da empresa. Dessa forma, seria possível fortalecer a
sociedade civil, e esta assumiria uma condição mais ativa (FREITAS, 2015). As
formas tradicionais de “transmissão do conhecimento” são também questionadas,
constrangendo a busca por novos atributos culturais, em consequência, escolares.
Esses fatores determinam e condicionam, pouco a pouco, o sentido e o significado da escola, apontando para enormes contradições entre o que se pretende e
o necessário a uma formação que “atenda ao mercado”. No cenário educacional
brasileiro, isso vem marcado pelo aligeiramento, pela produção em escala e centralizada de programas de formação (ALONSO, 2008). Estes dois conceitos se
tornam quase antagônicos diante da necessidade de conhecimento para utilização
dos mecanismos digitais pela escola. Quando o professor aprende? Quando o
aluno aprende? Quando o professor ensina? Quando o aluno aprendeu?
As iniciativas de inclusão de conteúdo midiático e pratica com dispositivos eletrônicos além do computador pessoal, apontam para a proposta de uma
nova atitude, dentro da perspectiva do trabalho com alfabetização midiática que
pode adequar-se tanto à Educação Básica, quanto aos cursos de formação de
professores uma vez que as questões educacionais são exaustivamente discutidas
nos vários produtos da indústria cultural (FREITAS, 2015). Faz parte de nosso
cotidiano um grau de repetição, quase um automatismo, de ideias e de ações
(inclusive do ato de consumir). “Associa-se a isto o fato da mídia utilizar-se da linguagem audiovisual que tem acesso ao imaginário, reduto dos desejos humanos
– podendo chegar a manifestá-los” (PIMENTA; PRATA- LINHARES, 2013,
p. 801). O fato é que a demanda por mais escolarização, pela universalização
da escola fundamental e média, e por níveis mais elevados de educação, põe-se
como condição necessária e suficiente para o avanço das forças produtivas ou de
ajuste às demandas de trabalho. A contradição está justamente na crença de que
a escola poderá solucionar tais problemas e, por isso, a sociedade exige “escola de
qualidade”, entendida como extensão do mundo economicamente produtivo. As
formas tradicionais de “transmissão do conhecimento” são também questionadas,
constrangendo a busca por novos atributos culturais, em consequência, escolares
(ALONSO, 2008).
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 203-212, 2018
209
As iniciativas as quais este trabalho se refere são aquelas possíveis de execução com os materiais existentes dentro da própria escola e ainda com probabilidade de compreensão por todos os alunos envolvidos. Podemos retornar então
ao questionamento anterior: Quando o professor aprende e os alunos aprendem?
Nos últimos anos, problematizações e propostas sobre o aprender e ensinar escolar, a formação de professores, seja ela inicial ou continuada, têm fomentado algumas “saídas” para o “uso pedagógico”, como denominado por várias iniciativas
governamentais, das TDIC nas escolas. O maior problema de tais iniciativas tem
a ver, sobretudo, com o pensamento, ainda reducionista, de que bastaria trabalhar algumas competências/habilidades técnicas para que estas tecnologias fossem
mais bem aproveitadas no cotidiano dos estabelecimentos escolares (ALONSO,
2008). Ao professor então cabe à função de utilizar os mecanismos disponíveis
na escola, tais como computadores da sala de informática, enquanto que ao aluno
resta concluir determinada tarefa independente dos meios utilizados.
A cibercultura, com todos os dispositivos que são desenvolvidos e criados a cada dia, permite diferentes formas de encontros entre pessoas, ideias e
novas formas de ações em conjunto que derivam em formas outras de pensar e de
aprender. (ALONSO, 2008). Esta talvez seja a significação mais apropriada para
emprego na aplicação de atividades escolares.
Alonso (2008), ainda aponta que o computador é um instrumento cultural da contemporaneidade construído pelo homem. Um instrumento de linguagem, de leitura e escrita. Seus programas são construídos a partir de uma
linguagem binária. Para acioná-lo tenho que seguir instruções escritas na tela,
movimentando o mouse entre diferentes ícones ou usando o teclado (com letras e
números) para redigir instruções e colocá-lo em ação. Ou seja, apenas a interação
da pessoa com a máquina é que molda a cultura enquanto constrói o conhecimento na pratica.
Assim deveria ser a prática na escola com base na interação para o conhecimento dos dispositivos e o desenvolvimento dos mecanismos e não apenas
voltada a utilização do conteúdo disponível. Enfim, tudo que, em contraposição
ao que é dado pela natureza, é obra do homem. É assim que compreendo as
tecnologias digitais como criação humana, produto de uma sociedade e de uma
cultura (FREITAS, 2015).
4. A prática começa muito antes da Rede Digital
A cultura digital modificou o processo da aprendizagem. Embora muitos
apostem cegamente no papel transformador ocasionados na forma de ensinar e
aprender. Existe ainda um longo caminho a ser percorrido pelos profissionais da
educação no que diz respeito aos mecanismos envolvidos na cultura digital. Uma
simples produção de banner para apresentação pode ocasionar a abertura de discussão que se amplia para uma rede de itens a serem observados dentro da pratica
docente relacionada à utilização dos mecanismos digitais pelo aluno. Mesmo que
Prensky (2001), considere os adolescentes de hoje, verdadeiros nativos digitais,
210
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14 p. 203-212, 2018
boa parte destes adolescentes têm uma relativa alfabetização digital, mas não tem
habilidade com as estratégias necessárias para transformar essa informação a que
tem acesso em conhecimento aplicável ao contexto escolar.
Uma das maiores dificuldades na formação de professores é integrar as
tecnologias à educação, principalmente unindo os conhecimentos interdisciplinares. Os projetos pedagógicos geralmente são voltados para a parte técnica como
ligar, desligar, usar um software ou aplicativo. Entretanto, não será somente isso
que o professor encontrará na pratica escolar. Ele também encontrara uma miscelânea de alunos, cada um em um estágio de compreensão diferente dos meios
digitais. E na verdade sua grande maioria apenas como consumidores passivos e
não questionadores do produto que consomem. Caberá ao professor a mediação
necessária para que o aluno saia da sala de aula com plena capacidade de usufruir
das possibilidades que o universo digital oferece.
Chegamos a um ponto da cultura digital em que a pratica docente implica
seu uso não para reprodução de conceitos de ensino e aprendizagem, e sim para
fomentar novas formas de aprender e ensinar em que o docente seja o mediador
de uma pratica que extrapole a sala de aula para incorporar os novos espaços
de conhecimento disponibilizados pelos meios digitais. Tal pratica perpassa pelo
aprendizado na produção de conteúdo, uma vez que o aluno quando na posição
de produtor, confeccionando materiais que pode ser disponibilizados no meio
digital, abre precedente para os questionamentos a cerca daquele conteúdo que
consome no próprio meio.
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- Cléa Rocha Ferreira
Licenciada em Ciências Biológicas, Universidade Federal do Triângulo
Mineiro/UFTM, Programa de pós-graduação em Educação da Universidade
Federal do Triângulo Mineiro, Brasil, clearochaferreira@gmail.com.
Currículo: http://lattes.cnpq.br/8754342314119475
- Alexandra Bujokas de Siqueira
Doutorado em Educação Escolar pela Universidade Estadual Paulista Júlio
de Mesquita Filho, Brasil (2005). Programa de pós-graduação em Educação
da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Brasil, alexandra.bujokas@
midia-educacao.net.
Currículo: http://lattes.cnpq.br/9128093573466760
- Martha Maria Prata Linhares
Doutorado em Educação (Currículo) pela Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo, Brasil (2008). Programa de pós-graduação em Educação da
Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Brasil, martha.prata@gmail.
com.
Currículo: http://lattes.cnpq.br/2261656066135090
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14 p. 203-212, 2018
Aspectos identitários e sentidos do
Ensino Médio no Brasil
RAMALHO, Ricardo de Oliveira1
CURI, Luciano Marcos2
GIORDANI, Camila Cunha Oliveira3
RESUMO: Alguns conceituam o Ensino Médio, como uma preparação para a Educação
Superior, enquanto, para outros, a sua finalidade principal é a profissionalização e a inserção no mercado de trabalho. Este nível correspondente à última etapa da educação básica
padece de um problema crônico de identidade. Nesta perspectiva, este artigo objetiva,
por meio da pesquisa bibliográfica, promover reflexões sobre os aspectos identitários e
sentidos atribuídos ao Ensino Médio brasileiro na atualidade. Os fundamentos teóricos
do estudo foram baseados, prioritariamente em Arroyo (2014); Libâneo (2010; 2012);
Ramos (2008). Os resultados apontaram que são válidas as tentativas de repensar o Ensino
Médio, contudo, faltam soluções para a crise de identidade e ainda urgência na definição e
implantação de políticas públicas coerentes, com caráter verdadeiramente emancipatório e
que conduzam os resultados desta etapa a um patamar aceitável.
Palavras chave: Ensino Médio; Sentido; Identidade; Políticas Públicas.
ABSTRACT: Some conceptualize High School, as a preparation for Higher Education,
while for others, its main purpose is professionalization and insertion in the labor market.
This level corresponding to the last stage of basic education suffers from a chronic problem of identity. In this perspective, this article aims, through the bibliographical research,
to promote reflections on the identity and sense aspects attributed to the Brazilian High
School in the present time. The theoretical foundations of the study were based primarily
on Arroyo (2014); Libâneo (2010; 2012); Ramos (2008). The results showed that attempts to rethink secondary education are valid, however, solutions to the crisis of identity
are still lacking, as well as urgency in the definition and implementation of coherent public
policies with a truly emancipatory character and that lead the results of this stage to an
acceptable level.
Keywords: High School; Direction; Identity; Public Policies.
1
Mestrando em Educação Tecnológica pelo IFTM, Professor Universitário e Gestor de RH
do Centro Universitário do Planalto de Araxá (UNIARAXÁ)
2
Doutor em História, Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do
Triângulo Mineiro
3
Mestranda em Educação Profissional e Tecnológica pelo IFTM, Pedagoga no IFTM –
Campus Patrocínio-MG
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 213-223, 2018
213
1. Introdução
A oferta do Ensino Médio como etapa final da educação básica no Brasil
só foi reconhecida como obrigatória a partir da Emenda Constitucional n. 59 de
2009 e incluída efetivamente no texto da atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional em abril de 2013. Desta forma, é extremamente recente sua garantia
como direito aos jovens do Brasil.
O Ensino Médio no Brasil padece de um problema crônico de identidade.
Alguns conceituam esta etapa escolar, como uma preparação para a Educação Superior, enquanto, para outros, a sua finalidade principal é a profissionalização e a
inserção no mercado de trabalho. Num contexto histórico, a primeira concepção
atende aos interesses dos filhos das classes mais abastadas, que seguem os passos
dos pais e perpetuam a elite. A segunda concepção é tida como a solução para
os mais pobres, que não podem esperar por um diploma de nível superior para
começar a contribuir com o sustento doméstico.
A crise do sentido identitário se dá pela falta histórica dessa fase escolar
como possibilidade garantida a todos. Observando-se as funções que lhe foram
atribuídas nos últimos tempos, não há dúvida a respeito do caráter predominantemente propedêutico a ele associado.
A prática recorrente do Ensino Médio na preparação para a entrada nas
Instituições de Ensino Superior, bem como em uma profissionalização, reforça a
dualidade da escola pública brasileira, “caracterizada como uma escola de conhecimento para os ricos e como uma escola do acolhimento social para os pobres”
(LIBÂNEO, 2012, p. 85). Dentro deste contexto, não são possíveis resoluções
simples para limitações complexas, resoluções que destoam do desafio formativo
nessa etapa da vida dos jovens e, sobretudo, destoam do estilo desta geração atual
que muito tem a contribuir e a dizer de si, dos seus respectivos saberes e projetos.
A Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação
(CNE) aprovou, em janeiro de 2012, a Resolução nº 2, definindo as Diretrizes
Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Contudo, ainda faltam políticas que
explicitem a necessidade de avançarmos na perspectiva de uma educação emancipadora e que, portanto, devem contemplar todas as dimensões da formação
humana, promovendo assim, uma educação para a vida.
Centrado na análise bibliográfica, esse estudo objetiva elucidar questões
quanto ao sentido e identidade do Ensino Médio brasileiro promovendo reflexões
significativas para o debate desta temática controversa e polêmica. Sabendo o
quanto este assunto é abrangente, limitamos nossa discussão a observar os aspectos identitários e as recentes alterações aprovadas pelo governo.
O nosso foco emergente de indagação é: Haverá realmente condições
estruturadas que permitirão os estudantes escolherem as áreas que vão se aprofundar? As recentes mudanças proporcionarão melhorias quanto ao fortalecimento
da identidade do Ensino Médio? Os principais atores desta etapa formativa estão
sendo ouvidos? Estarmos inseridos e trabalhando cotidianamente com estudantes
do Ensino Médio, nos desperta o interesse em apontar possíveis contribuições na
estruturação destes aspectos.
214
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 213-223, 2018
2. O atual contexto do Ensino Médio no Brasil
Atualmente, não há dúvidas sobre a necessidade de aperfeiçoar o Ensino
Médio brasileiro. Professores mal remunerados e sem formação específica em
diversas áreas, escolas sucateadas, estudantes em condições de vulnerabilidade
social, são alguns dos predicados que remetem aos baixos índices educacionais
brasileiros. A baixa qualidade do ensino oferecido em grande parte das escolas
públicas tem prejudicado os jovens no sentido de terem um futuro promissor,
tornando-os incapazes de uma inserção produtiva no mercado de trabalho, tanto
quanto impossibilitando o prosseguimento dos estudos em nível superior. Em
outras palavras, a crise de identidade, fruto de uma crise real no Ensino Médio
brasileiro é tão crítica que esta etapa escolar não tem conseguido preparar os estudantes nem para o trabalho e nem para a vida. “Por sua vez, sujeitos e identidades
se constituem enquanto portadores das dimensões física, cognitiva, afetiva, social,
ética, estética, situados em contextos socioculturais, históricos e institucionais”
(LIBÂNEO, 2010, p. 64). Buscar entender como esses contextos atuam e se correlacionam nos processos de ensino e aprendizagem, de modo a formar o desenvolvimento cognitivo, afetivo e moral dos indivíduos com base em necessidades
sociais, é o grande desafio.
Recentemente foi aprovada a medida provisória 746/2016, agora Lei
13.415/2017, que reformula o Ensino Médio. As mudanças propostas têm gerado inúmeras desconfianças e um debate controverso. Uma das alterações mais
polêmica é a organização do currículo em cinco áreas de conhecimento: Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e profissionalizante.
Faltam, contudo, soluções para a crise de identidade. A tentativa de repensar o
Ensino Médio é válida, o grande problema está na forma como a política está
sendo aplicada, sem a participação dos principais atores do processo, podendo
assim comprometer ainda mais a qualidade do ensino público e aprofundar as
desigualdades educacionais.
Poderia ser o ponto de partida – quando as escolas, os coletivos
docentes e até as Diretrizes Curriculares do CNE se propõem
repensar os currículos do Ensino Médio – perguntar-nos que
práticas inovadoras estão acontecendo nas escolas, nas diversas
áreas do conhecimento. Se o conhecimento é um campo dinâmico,
o currículo não pode ser reverenciado como um campo estático,
mas como um território de disputa no que diz respeito à forma
como o próprio conhecimento é disputado na sociedade. Trata-se
de reconhecer o currículo, na prática, como um território de saberes
e incertezas. (ARROYO, 2014, p.54)
Nesse contexto, merece destaque o esforço que já acontece na maioria das
escolas, os profissionais docentes vão renovando os conhecimentos de cada área,
mantendo-se atentos à dinâmica própria do conhecimento de que são profissionais e vêm tentando, nos limites das condições de trabalho, que os conhecimentos
do currículo do Ensino Médio incorporem inovações de cada área. Contudo, esse
215
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 213-223, 2018
esforço não é suficiente, o processo inovador nos conhecimentos necessita de
apoio das políticas públicas. Exige reconhecer o direito dos docentes a períodos
de pesquisa e de renovação do currículo.
Por outro lado, há um considerável número de professores do Ensino
Médio que atuam de forma paralela, nem sempre articulada, ministrando diferentes disciplinas, com base em diversos estilos e capacidades, utilizando métodos e
estratégias diversificadas. Essa diferenciação em si é um elemento de fragmentação e de relativização dos conhecimentos ensinados. Desta forma, os alunos não
conseguem dar unidade a esse processo de socialização fragmentado e plural. Isso
mostra a importância de trabalhar a interdisciplinaridade, como observa Ramos
(2008, p.88) “não se trata de somatório, superposição ou subordinação de conhecimentos uns aos outros, mas sim de sua integração na perspectiva da totalidade”.
Nesse sentindo, é factível compreendermos que a prática interdisciplinar impõe a
cada professor a transcendência de sua especialidade, estando consciente dos seus
próprios limites, a fim de absorver contribuições das outras disciplinas. Nos estudantes, a interdisciplinaridade implica uma mudança de atitude que se expressa
quando se “analisa um objeto a partir do conhecimento das diferentes disciplinas,
sem perder de vista métodos, objetivos e autonomia próprios de cada uma delas”
(MOURA, 2007, p. 54).
Muitos estudos e pesquisas elucidam que o ensino é ainda, em geral,
tradicional, preocupando-se com a simples memorização e repetição de nomes,
fórmulas e cálculos, inteiramente descontextualizados do cotidiano em que os
alunos estão inseridos (SANTANA; WARTHA, 2006).
A questão é que existe uma grande lacuna, bem como um grande desperdício entre a abundante informação que é repassada e a aprendizagem que é
efetivamente registrada e processada pelo alunado, convertida em conhecimento
posteriormente.
O aluno registra palavras ou fórmulas sem compreendê-las. Repeteas simplesmente para conseguir boas classificações ou para agradar
ao professor (...) habitua-se a crer que existe uma ‘língua do
professor’, que tem de aceitar sem a compreender, um pouco como
a missa em latim. (...) O verbalismo estende-se até às matemáticas;
pode-se passar a vida inteira sem saber por que é que se faz um
transporte numa operação; aprendeu-se mas não se compreendeu;
contenta-se em saber aplicar uma fórmula mágica. (REBOUL,
apud PIMENTA, ANASTASIOU, 2005, p. 86).
216
O destaque no “ser que aprende”, como protótipo para o Ensino Médio,
modifica o papel dos protagonistas do processo: “ao aprendiz cabe o papel central
de sujeito que exerce as ações necessárias para que aconteça sua aprendizagem”
(MASETTO, 2003, p. 43). E o professor torna-se “um orientador e organizador
das situações de ensino” (PIMENTA; ANASTASIOU, 2005, p. 96). É importante ressaltar a relevância do Ensino Médio como última etapa da formação geral
básica, como um dos elementos determinantes da condição de inclusão ou exclusão social, de acordo com o que sintetiza Charlot sobre a natureza da educação:
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 213-223, 2018
É o processo por meio do qual um membro da espécie humana,
inacabado, desprovido dos instintos e das capacidades que lhe
permitiriam sobreviver rapidamente sozinho se apropria, graças
à mediação dos adultos, de um patrimônio humano de saberes,
práticas, formas subjetivas, obras. Essa apropriação lhe permite se
tornar, ao mesmo tempo e no mesmo movimento, um ser humano,
membro de uma sociedade e de uma comunidade, e um indivíduo
singular, absolutamente original. A educação é, assim, um triplo
processo de humanização, de socialização e de singularização. Esse
triplo processo é possível apenas mediante a apropriação de um
patrimônio humano. Isso quer dizer que educação é cultura, em três
sentidos que não podem ser dissociados. (CHARLOT, 2000, p.38)
A educação é um direito público que deve ser dirigido a todas as classes
sociais e a todos os níveis de idade, sem qualquer tipo de discriminação, devendo
o Estado proporcionar condições para que todos tenham acesso de modo igualitário a esse direito, conforme consta na Constituição Federal. Logo, um Ensino
Médio ideal, será aquele que contemplar a formação e o aprimoramento de todas
as dimensões humanas, visando o enfrentamento e diminuição das desigualdades sociais. Não haverá mudanças efetivas enquanto a elite intelectual do campo
científico da educação e os educadores profissionais não se derem conta de algo
muito simples:
Escola existe para formar sujeitos preparados para sobreviver
nesta sociedade e, para isso, precisam da ciência, da cultura, da
arte, precisam saber coisas, saber resolver dilemas, ter autonomia
e responsabilidade, saber dos seus direitos e deveres, construir sua
dignidade humana, ter uma auto-imagem positiva, desenvolver
capacidades cognitivas para se apropriar criticamente dos benefícios
da ciência e da tecnologia em favor do seu trabalho, da sua vida
cotidiana, do seu crescimento pessoal. (LIBÂNEO, 2010, p.19)
Dessa forma, a relevância da temática em voga se faz presente quando
tentamos responder aos seguintes questionamentos: Qual sentido os estudantes,
professores e comunidade atribuem ao Ensino Médio? Estamos promovendo a
formação integral dos estudantes para o desenvolvimento da razão crítica, isto é,
conhecimento teórico-científico, capacidades cognitivas e modos de ação, nesta
etapa escolar? Estamos fomentando o desenvolvimento da subjetividade dos alunos e a ajuda na construção de sua identidade pessoal e no acolhimento à diversidade social e cultural?
O Ensino Médio deve preparar o aluno para a vida e para a cidadania, na
conquista de disposições que lhe permitam integrar-se à sociedade e assumir nela
um lugar próprio. Como retrata Perrenoud (1995, p. 44): “Na escola, sem se
saber, aprende-se a viver numa organização, que se constrói através da aprendizagem do ofício do aluno, adaptado à vida nas sociedades modernas”. A emancipação humana só acontece na totalidade das relações sociais onde a vida é produzi217
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 213-223, 2018
da. “O avanço do saber só têm valor se realizados num contexto mais amplo que
concerne em conjunto e simultaneamente à religião, à moral, à política” (ROSSI,
2000, p. 42).
As tentativas de reconstruir o Ensino Médio deveriam seguir práticas inovadoras que garantissem aos docentes e alunos jovens-adultos o direito a valorizar
experiências sociais de que são sujeitos ou vítimas; levantar as indagações que
trazem sobre essas experiências históricas; reconhecer os saberes, leituras e modos
de se pensar essas relações sociais e políticas e incorporá-las nos currículos, colocá-las em diálogos horizontais com os conhecimentos sistematizados. Trata-se de
reconhecer os mestres e alunos como sujeitos da produção de conhecimentos, não
meros transmissores-aprendizes do conhecimento hegemônico.
Durante o Ensino Médio, muitas vezes, os alunos evidenciam dificuldades na assimilação do conteúdo, com isso, as escolas enfrentam uma considerável
evasão. Entre as principais razões para a desistência estão o desconhecimento e
a insatisfação com a estrutura das aulas e a vulnerabilidade social, que é a mais
preocupante, já que nesta etapa, muitos estudantes conciliam os estudos com o
trabalho. Há casos de alunos que abandonam a escola por não conseguirem acompanhar as aulas (INEP, 2006).
De acordo com o Censo Escolar de 2007, do total de matrículas no Ensino Médio, 41% estão alocadas no noturno, o que representa uma taxa de atendimento nesse turno próxima ao percentual de alunos com idade superior a 17
anos (44%).
Fica claro que as escolas que oferecem o Ensino Médio precisam olhar
para si próprias. Do ponto de vista da gestão, uma providência essencial é atacar
as causas da evasão. O acompanhamento eficiente da frequência também deve
estar na pauta das reuniões pedagógicas, pois auxiliam a mapear o problema.
Uma revisão curricular parece inevitável. O projeto pedagógico precisa
garantir que as aulas não sejam vistas como uma obrigação, mas como um espaço
de formação para a vida. Isso inclui diálogo com o universo dos jovens, com o
intuito de aprimorar o processo de ensino e aprendizagem, deixando as aulas e as
atividades propostas pelos professores mais atraentes e dinâmicas. Os professores,
assim, trabalham como colaboradores da aprendizagem. Como propõe Carl Rogers (1986), “o homem educado é o homem que aprendeu a aprender”.
A Constituição Federal de 1988 consagra em seu (art. 205),
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando
ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho e tem como princípio a
igualdade de condições de acesso e permanência na escola (BRASIL,
1988 p. 89).
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB, aprovada em 20/12/96,
contém dispositivos que amparam o acesso e a permanência dos alunos, entre os
218
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 213-223, 2018
quais se destaca: “Art. 3º - O ensino deverá ser ministrado com base nos seguintes
princípios: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”.
A Constituição Federal e a LDB tratam da igualdade de condições de
acesso e permanência na escola como um direito fundamental do brasileiro, logo
o fator evasão deve ser tratado com mais atenção.
Nesse contexto e nessas condições, cabe analisar, por fim, qual o desempenho
escolar dos alunos no Ensino Médio. Para analisar a qualidade do ensino, correlacionando os dados de desempenho dos estudantes com o fluxo escolar, foi criado em
2007, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), que nos mostra uma
situação preocupante e que merece muita atenção. No ano de 2007, o IDEB para os
estudantes do 3º ano do Ensino Médio regular foi de 3,5, em uma escala que vai de 0
a 10. A média de desempenho dos estudantes nas provas de português e matemática
foi de 4,4 e o percentual médio de aprovação foi de 78%. O quadro de fluxo de estudantes, ao longo das séries que compõem o Ensino Médio, somado às dificuldades de
acompanhamento dos estudos, que se acumulam com o passar dos anos, fizeram com
que a taxa de conclusão ficasse em apenas 50% (INEP, 2006).
Com base neste breve levantamento, fica claro que a permanência do estudante no Ensino Médio brasileiro, envolve diversos aspectos que podem facilitar ou não esse processo, tais como: idade com que os alunos ingressam na escola;
inclusão ou não no mercado de trabalho; taxas de repetência e evasão; aproveitamento dos estudos; infraestrutura oferecida; qualidade do corpo docente, entre
outros. Nesse sentido, qualquer política direcionada a esse nível de ensino e aos
seus estudantes, precisa ser pensada de modo que considere integradamente, esses
múltiplos aspectos.
Nesse contexto, há urgência em definir medidas que conduzam os resultados do Ensino Médio a um patamar aceitável, com caráter verdadeiramente
emancipatório, capacidade para ser um dos pilares de desenvolvimento do nosso
país, e de forma acessível a todos, conforme preconiza a nossa Constituição.
3. Adversidades a serem superadas
Considerando que a maioria das escolas não possui a mínima estrutura
e condição de propiciar os cinco itinerários formativos, torna-se utopia a possibilidade ou liberdade, dos estudantes escolherem as áreas que vão se aprofundar
no Ensino Médio. Desta forma, a limitação mais evidente do novo Ensino Médio
refere-se à divisão do currículo em duas partes: A parte comum de 1800 horas e
a outra dividida em cinco opções (BRASIL, 2017), assim, sobrará ao estudante
cursar as áreas que a escola ofertar e não de acordo com suas vocações.
A capacidade em oferecer o ensino técnico é menor ainda, uma vez que
esta formação requisita laboratórios, equipamentos e materiais didáticos específicos, utilização de tecnologias, bem como professores especializados nas diferentes
áreas técnicas. Para a viabilização efetiva dessa reforma, seria imprescindível um
grande investimento na estruturação das escolas de todo o Brasil e ainda uma ampla contratação de professores, uma realidade distante com a atual perspectiva de
219
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 213-223, 2018
um orçamento congelado por vinte anos, como estabelecido recentemente através
da emenda constitucional n° 95 de 2016.
Para dar conta dessa limitação, o que se propõe para a formação técnica
do Ensino Médio é a parceria com o setor privado de ensino, utilizando-se recurso
público do FUNDEB (BRASIL, 2017). Em outras palavras, pretende-se retirar
recurso do ensino fundamental, da educação infantil e das creches, diga-se de
passagem, igualmente precárias, para efetuar uma espécie de “aquisição” no setor
privado. Outro ponto polêmico é a precarização da atividade docente em níveis
inimagináveis, uma vez que cai a exigência de professor formado na área, flexibilizando a possibilidade de lecionar para aqueles que atestarem “notório saber” em
qualquer habilitação técnica (BRASIL, 2017).
Nesse novo modelo é previsto ainda, a possibilidade de concessão de
certificados intermediários de qualificação para o trabalho, ou seja, o estudante
que cumprir um “módulo” poderá obter um certificado parcial (BRASIL, 2017).
Com os atuais índices de evasão no Ensino Médio, mais elevado do que em qualquer outro nível, e considerando ainda, a realidade da maioria dos jovens brasileiros, que precisam ajudar no sustento das suas famílias, a certificação parcial é a
carta branca para a interrupção, de forma precoce, dos projetos educacionais em
desenvolvimento. O que está implícita nesta proposta é a diminuição do papel
do Estado em relação ao oferecimento de uma educação plena e verdadeiramente
emancipadora, elevando, assim, as fileiras de trabalhadores semiespecializados.
Fica explícita, nesse contexto, a natureza liberal e mercadológica dessa reforma,
reiterando o sentido da educação para os trabalhadores subalternizados, a fim de
garantir a manutenção do processo produtivo atual, reservando-lhes um lugar
muito específico na divisão social contemporânea do trabalho.
A ideia de trabalhar o currículo em áreas do conhecimento é interessante,
em termos de relacionamento de conteúdos numa abordagem transdisciplinar,
mas dependendo da forma como esse currículo for operacionalizado nas escolas,
representará um agravamento do atual cenário de desigualdades educacionais e
sociais, conforme preconiza Libâneo:
Destaca-se no contexto social contemporâneo a contradição
entre a pobreza de muitos e a riqueza de poucos, entre a lógica
da gestão empresarial e as lógicas da inclusão social, ampliando
as formas explícitas e ocultas de exclusão. As escolas e as salas de
aula têm contribuído pouco para a superação dessas contradições,
especialmente estão falhando em sua missão primordial de promover
o desenvolvimento cognitivo dos alunos, correndo o risco de terem
que assumir o ônus de estarem ampliando a exclusão com medidas
aparentemente bem intencionadas. (LIBÂNEO, 2010, p.17)
220
É necessário levar em consideração o acúmulo de conhecimento adquirido
até os dias de hoje, além disso, considerar as diferentes experiências educacionais
promovidas no decorrer do tempo. Nesta perspectiva, não há como deixar de
mencionar o modelo de ensino médio integrado à formação técnica que os InsEvidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 213-223, 2018
titutos Federais realizam desde 2008 no Brasil, agraciado pelos melhores resultados em diversos indicadores educacionais, à frente, algumas vezes, inclusive, das
escolas privadas. Trata-se de um modelo de ensino médio de sucesso e que possui
todas as caraterísticas que o país precisa: público, gratuito e com qualidade.
Para se ter uma ideia, em 2015, no ranking do ENEM, o melhor desempenho foi do Instituto Federal do Espírito Santo (INEP, 2015). Desta forma, ao
elevar com louvor os seus respetivos egressos para o Ensino Superior, os Institutos Federais cumprem sua função de formar técnicos para o mercado de trabalho,
mas promovem também, o princípio da verticalidade, auxiliando na continuidade
dos estudos e na elevação da escolaridade, o que é igualmente relevante e necessário, além de oferecer a inúmeras famílias das camadas populares, talvez a única,
possibilidade de mobilidade social.
Nesse contexto, as perguntas que não querem calar são: por que não
considerar replicar este modelo louvável e notável de Ensino Médio que o Brasil
possui, em vez de propor um modelo que desde sua concepção apresenta características questionáveis e ainda implica em realocar recursos públicos para o setor
privado? Desta forma, cabe aos educadores a seguinte reflexão: Quem se beneficia
efetivamente com essa reforma?
Considerações finais
O Ensino Médio brasileiro passa por um período de grandes mudanças,
quanto sua estrutura, organização, currículo e objetivos. Num contexto histórico,
um aspecto que tem permeado o debate sobre essa importante etapa escolar, é a
sua própria identidade, temática que ganha ainda mais destaque na atualidade
devido as iminentes mudanças propostas e aprovadas pelo governo. No cenário
atual, infelizmente, o acesso ao Ensino Médio tem se mantido estático, somado
aos altos percentuais de evasão, repetência e associados a um desempenho baixo
dos estudantes, a realidade torna-se cada dia mais preocupante.
Toda e qualquer alteração proposta em educação, implica na implementação de coerentes políticas públicas e em um diálogo eficaz, que muitas vezes não
ocorre, entre governo, professores, gestores, funcionários, estudantes e pais. As
análises destas percepções contribuirão para a promoção de novas e consistentes
competências, para a construção dos conhecimentos, habilidades e atitudes que
permitam uma inclusão emancipatória, nesta sociedade, que cabe a todos transformar, auxiliando também, na identificação e fortalecimento do sentido e da
identidade desta fase escolar.
O artigo teve como propósito trazer algumas contribuições para as novas inquietações que rondam o Ensino Médio brasileiro. Fica claro que o fator
identidade representa ainda um dos maiores desafios na formulação de políticas
públicas educacionais. Políticas que precisam fomentar ações para trazer de volta
os estudantes que abandonaram a escola, acolher os adultos que não conseguiram
concluir o Ensino Médio e oferecer condições para que todos usufruam do direito
221
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 213-223, 2018
de avançar na sua formação acadêmica. Um Ensino Médio exitoso pode ser considerado peça chave no desenvolvimento do país, sintonizado com os arranjos produtivos locais e comprometido com princípios pedagógicos emancipatórios, associados ao desenvolvimento humano, econômico e social que tanto almejamos.
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Currículo: http://lattes.cnpq.br/0559083211415956
*Luciano Marcos Curi
Currículo: http://lattes.cnpq.br/6230715943028936
*Camila Cunha Oliveira Giordani
Currículo: http://lattes.cnpq.br/7913971385381852
223
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 213-223, 2018
O uso de tecnologias no Ensino Médio: o
que dizem os artigos?
OLIVEIRA, Camila Tenório Freitas de
OVIGLI, Daniel Fernando Bovolenta
SILVA, Monica Izilda da
SIMÕES, Regin Maria Rovigati
Resumo: O objetivo do artigo foi realizar um levantamento e sistematização das produções sobre tecnologias no Ensino Médio, dos últimos seis anos (2012 a 2017). Como
metodologia, optou-se por um estudo de revisão bibliográfica, do tipo estado da arte, com
um levantamento total de nove artigos, obtidos por meio da base de dados eletrônicos
Scielo, os quais foram interpretados pela Análise de Conteúdo (BARDIN, 1977). Os resultados foram sistematizados em quatro categorias: Tecnologia Para a Prática, Tecnologia
para a Compreensão de Significados e Sentidos, Tecnologia Além de Conceito e Tecnologia Sistematizada na Prática Pedagógica. Em linhas gerais, os artigos discutiram a relação
entre o aluno e o mundo, o impacto das tecnologias na sociedade atual e a ampliação do
saber. Conclui-se que os professores precisam contribuir para a construção de sujeitos ativos no contexto de práticas e vivências pautadas no uso das tecnologias.
Palavras chave: Ensino Médio; Sujeito ativo; Tecnologias.
Abstract: This article aims to carry out a survey and systematization of the productions
on technologies in High School in the last six years (2012 to 2017). A state-of-the-art
bibliographic review study with a total of nine articles was chosen as methodology and it
was obtained by means of Scielo electronic database. The data were interpreted by Content
Analysis (BARDIN, 1977) and the results systematized into four categories: Technology
for Practice, Technology for the Understanding of Meanings and Senses, Technology beyond Concept and Systematized Technology in Pedagogical Practice. In general terms the
articles discussed the relationship between the student and the world, the impact of technologies in today’s society and the expansion of knowledge. We came to the conclusion
that High School teachers need to contribute to the construction of active subjects in the
context of practices and experiences guided by the use of technologies.
Keywords: High School; Active subject; Technologies.
225
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 225-236, 2018
1. Introdução
A virtualização da informação e da comunicação caracteriza-se como movimento que afeta direta e profundamente a dinâmica social (LÉVY, 1999). Este
processo teve início nos anos 1970, ganhou força após a invenção do computador
pessoal, em meados dos anos 1980, e perdura até os dias atuais.
A sociedade está cada vez mais conectada com a linguagem midiática. A
configuração que se tem hoje é de crianças e jovens constantemente conectados
aos dispositivos com acesso à internet. Ponte (2000, p. 64) revela que as tecnologias de informação e comunicação “[...] representam uma força determinante no
processo de mudança social, surgindo como a trave-mestra de um novo tipo de
sociedade: a sociedade da informação”.
A “evolução tecnológica invade nossa vida e nos ajuda a viver com as
necessidades e exigências da atualidade, transformando o modo que compreendemos e representamos o tempo e o espaço à nossa volta” (KENSKI1, 2003). Nesta
perspectiva, a escola e os meios tecnológicos necessitam caminhar em paralelo,
“pois ambos retratam a realidade e a cotidianidade” (PORTO, 2006, p.45).
Embora pareça, a inserção das tecnologias nas escolas não é novidade. Há
20 anos, em 1997, foi lançado, pelo MEC2, um programa denominado Programa
Nacional de Informática na Educação - Proinfo que visava assegurar, por meio
do desenvolvimento e implementação da informática, melhores condições para o
avanço da educação pública. Nele buscava-se
melhorar a qualidade do processo de ensino-aprendizagem,
possibilitar a criação de uma nova tecnologia cognitiva nos
ambientes escolares mediante incorporação adequada das novas
tecnologias da informação pelas escolas, propiciar uma educação
voltada para o desenvolvimento científico e tecnológico e educar
para uma cidadania global numa sociedade tecnologicamente
desenvolvida, onde a informação desempenhará um papel cada vez
mais estratégico (BONILLA, PRETTO, 2000, sem paginação).
O Proinfo previa ações para um contexto mais amplo que incluía livro
didático, Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs, TV Escola, Educação a distância, valorização do magistério, descentralização de recursos para escolas e avaliação da qualidade educacional. Também pretendia ampliar e oportunizar o uso
das tecnologias nos ambientes escolares.
Posteriormente, em 1998, os PCNs reafirmaram a necessidade do uso
das tecnologias na educação, com vistas à formação de cidadãos com percepção
de mundo, incluindo valores e possibilidades de atuação social, bem como possibilitar novas formas de comunicação e produção do conhecimento no contexto
da Educação Básica.
1
226
A fonte não possui paginação. Portanto, em toda citação referente a essa obra não será
possível informar o número da página.
2
Ministério da Educação. Possui um portal online que pode ser acessado por meio da
seguinte plataforma: <http://portal.mec.gov.br/institucional>.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 225-236, 2018
Mais recentemente, em 2012, com a promulgação das novas Diretrizes
Curriculares para o Ensino Médio, a inserção das tecnologias coloca-se como
premente neste nível de ensino, visto que o documento reforça a integração entre
educação e as dimensões da tecnologia como base do desenvolvimento curricular.
Frente ao breve panorama histórico acima apresentado, é que se delineou
o presente artigo, cuja temática é Tecnologias Digitais no Ensino Médio, justificado pela inquietação das autoras acerca do desafio das escolas frente à inserção
das tecnologias em seu meio e pela expressiva evasão escolar, devido ao baixo
desempenho dos estudantes nas disciplinas atualmente ministradas, como pode
ser visto no quadro 1.
Quadro 1: Censo Escolar 2014
Ensino Médio
Reprovação
Abandono
Aprovação
1°
16,5%
44.307
10,1%
27.121
73,4%
197.096
2°
10,0%
21.727
9,2%
19.989
80,8%
175.552
3°
7,8%
14.768
5,6%
10.603
86,6%
163.959
Fonte: Merrit (2014)
Estes fatores foram determinantes, tanto para a investigação das tecnologias no Ensino Médio, quanto para a seguinte problematização: O que tem sido
pesquisado sobre a inserção das tecnologias no Ensino Médio?
Ao questionar o incentivo e a relevância do uso das tecnologias pelos
jovens, foi estabelecido como objetivo geral o levantamento e a sistematização
das produções sobre tecnologias no Ensino Médio, de forma a compreender os
métodos utilizados para se aprender com tecnologias, a percepção da inserção das
tecnologias no âmbito escolar e a discussão sobre os recursos tecnológicos com
vistas à prática educacional.
1.1 Processo de Ensino e Aprendizagem a Partir do Uso das
Tecnologias: uma síntese da revisão de literatura
Imersos na atual conjuntura da sociedade, na qual os indivíduos são considerados nativos digitais, “[...] é de se esperar que a escola tenha que “se reinventar”, se deseja sobreviver como instituição educacional” (SOUSA et al., 2011,
p.20), pois “não existe mais a possibilidade de considerar que o estudante já possui conhecimentos e informações suficientes, independente do grau de escolarização em que ele se encontra” (KENSKI, 2003, sem paginação). Para adaptar-se
neste meio, faz-se necessário estar em permanente estado de aprendizagem. Em
outras palavras, é primordial estar motivado a aprender e ser instigado a buscar
novas informações.
227
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 225-236, 2018
(...) Encontra-se nesta perspectiva, a possibilidade para que
professores da Educação Básica, e de outros mais variados níveis
de ensino, possam rever concepções de sustentação de suas
práticas cotidianas, terem acesso e apropriem-se de conhecimentos
necessários para trabalharem com a produção de vídeos digitais na
sala de aula ou outras interfaces nas diversas disciplinas escolares,
com vistas a propiciar motivação e aprendizagem (SOUSA et. al.,
2011, p. 22).
Kenski (2003) aponta que ensinar e aprender com as novas tecnologias
traz consigo dois enormes desafios: adaptar-se aos avanços tecnológicos constantes e orientar-se na direção do domínio e de apropriação crítica. Ela aponta que
a escola é o local de acesso ao conhecimento e nela deve-se fazer presente, um
processo de mediação, de forma que os alunos e professores se apropriem das
tecnologias e as repensem com vistas à prática educacional.
Nesta perspectiva, Moran (2012) sugere que a sala de aula seja um espaço
de investigação no qual ensinar e aprender exige flexibilidade. Para atingir tal finalidade, faz-se necessário diminuir as distâncias entre as tecnologias e as escolas,
bem como entre alunos e professores.
É importante alertar para este cenário de investigação, visto que, segundo
Valente (1999):
[...] a promoção dessas mudanças pedagógicas não depende
simplesmente da instalação dos computadores nas escolas. É
necessário repensar a questão da dimensão do espaço e do tempo
da escola. A sala de aula deve deixar de ser o lugar das carteiras
enfileiradas para se tornar um local em que professor e alunos podem
realizar um trabalho diversificado em relação ao conhecimento
(VALENTE, 1999, p.17-18).
Desta forma, o aluno passa a ser ativo no processo educacional, tendo a
oportunidade de construir seu próprio conhecimento de maneira significativa e
motivadora. Neste momento, a memorização passa a não existir, sendo substituída pelo uso crítico das tecnologias, pautado nas metodologias investigativas de
ensino (PONTE et al., 2016). Estas metodologias se apropriam de uma aprendizagem em conjunto, colaborativa, em que “as competências são mais exercidas e
distribuídas (simbolicamente, socialmente e fisicamente); e a competência do grupo sobressai à competência individual de seus membros” (LOPES, 2014, p.41).
2. Metodologia
228
A presente pesquisa é uma análise documental caracterizada por uma
abordagem qualitativa, respeitando a análise dos dados quanto à sua riqueza em
detalhes (BOGDAN e BIKLEN, 1994). Metodologicamente, apresenta-se como
um estudo do tipo estado da arte o qual, de acordo com Fiorentini e Lorenzato
(2006), faz-se predominantemente sobre documentação escrita. Quanto à análise
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 225-236, 2018
documental, estas “são capazes de oferecer um conhecimento mais objetivo da
realidade” (GIL, 2008, p. 153).
O percurso metodológico incluiu a realização de consulta ao banco de dados Scielo, a partir das coleções de periódicos do Brasil. Em um primeiro momento, investigando os índices, utilizamos as palavras-chave “tecnologia” e “Ensino
Médio” e obtivemos um retorno de vinte artigos. Ao utilizar os termos “tecnologias” e “Ensino Médio”, surgiram nove produções e, por fim, ao pesquisar as palavras-chave “tecnologias” ou “tecnologia” e “Ensino Médio”, houve um retorno
de vinte e seis artigos. Em função das inconsistências de busca evidenciadas pela
plataforma Scielo, o total de artigos retornados, a partir da realização das buscas
com os dois primeiros argumentos, não totaliza o obtido com o terceiro. Assim,
optou-se por considerar apenas a busca realizada com as palavras-chave “tecnologias” ou “tecnologia” e “Ensino Médio”, cujo retorno foi de vinte e seis artigos.
A partir da leitura dos resumos, foi possível identificar os trabalhos que
iam ao encontro da questão norteadora: O que tem sido pesquisado sobre a inserção das tecnologias no Ensino Médio? Com isto, do total de artigos, foram
selecionados nove para a pesquisa.
Para o tratamento de dados, optou-se por utilizar a Análise de Conteúdo
que, segundo Bardin (1977, p.42) é “um conjunto de técnicas de análises das comunicações” obtendo, a partir de uma sistematização, indicadores que permitam
“a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção”.
A análise foi feita com base na perspectiva de Fiorentini e Lorenzato
(2006) e realizado o cruzamento de informações obtidas por meio da leitura
integral dos artigos. Vale ressaltar que foram criadas categorias de análise que
sistematizassem as informações.
3. Resultados
Fazendo um panorama dos nove artigos selecionados sobre as tecnologias no Ensino Médio, percebe-se que há maior concentração de publicação nos
periódicos paulistas, sendo quatro deles na revista “Ciência e Educação”, um na
revista “Educação e Sociedade”, e um na revista “Trabalhos em Linguística Aplicada”. Quanto aos demais, dois foram publicados na revista gaúcha “Educação e
Realidade” e um na revista paranaense “Educar em Revista”.
Com base no recorte temporal selecionado, em 2012 foram publicados
dois artigos; em 2013 um; em 2014 dois; em 2015 dois; em 2016 um; e, em
2017 um. Percebe-se, assim, que a evolução das pesquisas sobre esta temática
mantém-se equilibrada nas publicações em periódicos ao longo dos anos, porém
ainda de forma discreta.
Em linhas gerais, os nove artigos discutiram acerca da relação entre o
aluno e o mundo, na busca dos sentidos de sua identidade no contexto social; do
impacto das tecnologias na sociedade atual, visto que estas estão reconfigurando
as novas formas de se relacionar e aprender; da ampliação do saber, utilizando
uma perspectiva colaborativista entre os sujeitos e, da compreensão das tecnolo229
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 225-236, 2018
gias além da técnica, pois não basta somente ter domínio de determinado recurso,
mas sim explorá-lo em uma perspectiva educacional.
Diante do cenário apresentado e baseando-se na proposta apresentada
por Fiorentini e Lorenzato (2006), foram organizadas, em quadros, as informações acerca do referencial teórico, metodologia empregada e principais resultados,
obtidas a partir da leitura integral dos textos, de forma a categorizá-las por meio
do confronto das informações e relações pertinentes entre si. Nesta perspectiva, foram criadas quatro categorias: tecnologias para a prática, tecnologia para a
compreensão de significados e sentidos, tecnologia além do conceito e tecnologia
sistematizada na prática pedagógica.
3.1 Tecnologias para a prática
Esta categoria reflete a aproximação do ensino à prática por meio das
tecnologias. Para atingir tal finalidade, são utilizados recursos multimídias ou produções de materiais digitais, elaborados visando uma aula interativa e, ao mesmo
tempo, motivadora.
Entre os autores dos artigos pesquisados que colaboram com esta prática
de ensino e aprendizagem, destacam-se Santos e Mortimer (2002), defendendo
uma abordagem temática no ensino de ciências, a qual contribui para os alunos
tornarem-se mais críticos e reflexivos, compreendendo não só o conceito, mas
também a complexidade social; Carvalho e Gil-Pérez (2003), defendendo a criação de multimídia, visto que esta permite ao aluno a visualização dos conceitos e
teorias por meio de animações; e Jenkins (2008), destacando que a mídia-educação se preocupa em estudar a mídia a partir de sua cultura específica, na qual os
educadores são comprometidos com o desenvolvimento de habilidades críticas
para o acesso, a avaliação, o uso e a produção de mensagens usando as mídias.
3.2 Tecnologia para a compreensão de significados e sentidos
230
Nesse contexto discute-se sobre o desinteresse dos alunos pelas disciplinas
da Educação Básica, tendo em vista que as aulas denominadas expositivas não
conseguem motivá-los na busca do conhecimento.
Os autores Dayrell (1999), Dias (2009), Barlette (2009) e Martins
(2009) ressaltam a necessidade dos alunos em conseguirem estabelecer relações
com o que aprendem, sem reduzi-las a uma visão utilitarista, mas sim a uma aquisição ampla e com significados do conhecimento. Desta forma, o estabelecimento
destas relações mostra-se de grande importância para que o interesse surja naturalmente, pois elas passam a fazer sentido para o aluno, passam a ter significado,
o que faz uma grande diferença.
Zanetic (1989) dialoga com Hall (1997) na busca de significados para os
alunos, pois estes são tecidos a partir de uma prática na sala de aula. E as tecnologias, como defende Lima (2009), Nascimento, Santo e Nigri (2006), Rappoport
(2009) e Vargas (2003), aparecem como uma das maneiras de aproximar o ensino
da prática. Charlot (2000) corrobora com os autores e afirma que a produção dos
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 225-236, 2018
sentidos para os alunos se faz necessária, já que se não existir, impossibilitará o
aluno de aprender.
Cachapuz, Praia e Jorge (2002) e Gil-Pérez e Vilches (2011) contribuem
a partir da defesa da formação de cidadãos cientificamente cultos, capazes de
compreender as problemáticas da realidade e argumentá-las, debatê-las e assumir
um posicionamento crítico. Numa perspectiva educacional, os autores propõem
a construção de conceitos, competências, atitudes e valores, ou seja, a promoção
de abordagens críticas às problemáticas que sejam familiares aos alunos, tornando
o processo de ensino e aprendizagem mais significativo e relevante (DEBOER,
1991; YAGER, 1996).
3.3 Tecnologia além do conceito
Esta categoria estuda as tecnologias dentro de um contexto social, destacando seus desafios quando inseridas na educação e suas potencialidades para o
processo de ensino e de aprendizagem, que vão além da técnica.
Contribuíram para esta categoria os autores Dourado e Oliveira (2009),
Silva (2009), Charlot (2005), Costa (2007), Bauman (2008), Gauchet (2006),
Machado (2004), Castells (2007) e Leffa (2006), refletindo sobre as transformações na sociedade provenientes das tecnologias. Em suma, após análise, é possível
afirmar que as tecnologias não devem ser tratadas como radicalmente positivas
ou negativas, mas sim analisadas de modo a compreender como elas moldam as
práticas sociais na vida contemporânea.
Dentro desta perspectiva encontram-se Souza (2014), Mellucci (2004)
e Dayrell (1999/2007), refletindo acerca do que é ser jovem e ser aluno num
contexto midiático no qual ficam evidentes as novas formas de interação e de sentidos. Eles apresentam os desafios da escola em não só usar as tecnologias como
aparatos, mas na compreensão de como os jovens se identificam e se expressam
nestes contextos.
3.4 Tecnologia sistematizada na prática pedagógica
Nesta última categoria, há discussões e análises de autores sobre a prática
pedagógica dos professores. Vale destacar aqui a investigação como metodologia,
na busca da construção de conceitos por parte dos alunos, e a aprendizagem colaborativa, na qual os sujeitos aprendem com os seus pares.
Goldenberg, Scher e Feurzeig (2008) defendem os softwares educativos, visto
que estes permitem aos estudantes uma investigação acerca de determinado problema previamente estabelecido. Um software de Matemática, por exemplo, possibilita
a criação de construções geométricas e sua manipulação com o auxílio do mouse.
Em contraste a este recurso, espelha-se a insegurança (ou resistência) dos
professores, visto que, segundo Penteado (2001), esses profissionais precisam assumir riscos, saindo da previsibilidade e certeza (zona de conforto) e adotando a
zona de riscos (situações imprevisíveis, nunca experimentadas).
231
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 225-236, 2018
Nesta perspectiva, Miskulin e Piva Jr. (2007) sugerem que as práticas
pedagógicas dos professores sejam planejadas e sistematizadas com antecedência,
de modo a permitir o desenvolvimento das competências de análise e reflexão
e o trabalho simultâneo com os colegas, visando construir uma aprendizagem
colaborativa.
É importante ressaltar que, apesar dos autores trazerem (ou indicarem)
tutoriais, eles ressaltam que este método se limita apenas a uma versão computadorizada do que já ocorre em sala de aula, não dispondo, assim, de uma vantagem
educacional. Para atingir tal vantagem, é necessário que o professor se aproprie
destes recursos e extraia todo o potencial educativo que eles têm a oferecer.
Considerações finais
Pelo presente estudo foi possível concluir que apesar das discussões e pesquisas acerca da temática “Tecnologias no Ensino Médio” não ser recente, ainda
se encontram tímidas as produções científicas relacionadas a este assunto.
Tendo em vista as diferentes concepções sobre a inserção das tecnologias
no processo de ensino e aprendizagem, onde uns as defendem e outros as negam,
não há ainda uma segurança no meio escolar ao incluí-las em seus planos. Em
meio a essa dualidade, percebe-se o aumento considerável de recursos tecnológicos, acompanhados de jovens cada vez mais ávidos para obtê-los e desvendá-los.
Percebendo que a presença das tecnologias é irreversível, é importante
enfatizar que elas, unicamente, não geram o conhecimento. Esta afirmação fica
nítida na leitura dos artigos, nos quais foi possível constatar que o uso das tecnologias nos espaços escolares ainda não vai além de recursos para se aprender. É
preciso uma compreensão deste uso no contexto social, político, pessoal e escolar
para que seja possível extrair suas potencialidades visando à prática educacional.
Vale ressaltar, ainda, que, por meio da análise dos artigos, ficou evidente
a urgência das escolas em repensar seu papel na atual conjuntura da sociedade,
pois não se percebe a separação dos jovens e dos recursos tecnológicos oferecidos no mercado. Da mesma forma observando os professores, agentes de grande
importância no processo educativo, defende-se que eles devem assumir um papel
de mediadores entre o conteúdo e a utilização das tecnologias pelos alunos, considerando também os espaços não formais nos quais as tecnologias vão além de
aparatos e se configuram como um novo estado de cultura.
Conforme análise das metodologias presentes nos artigos, todas as investigações foram realizadas por professores universitários, não havendo nenhuma
de professores do Ensino Básico. Este quadro reforça a necessidade de políticas
públicas que possam validar tais orientações a fim de colaborar com uma prática
que auxilie na exploração e compreensão das novas tecnologias.
Outro fator detectado foi a evidente defasagem de artigos oriundos das
regiões norte e nordeste. Conforme análise há uma maior concentração das pesquisas na região sudeste, principalmente no estado de São Paulo. As demais se
232
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 225-236, 2018
encontram espalhadas pelas outras regiões, com exceção da região norte. Estima-se que a falta de divulgação das pesquisas e práticas lá desenvolvidas de maneira
nenhuma diminui a validade de suas excelentes experiências.
Defende-se, nesta pesquisa, que as tecnologias devem ser encaradas como
uma atual configuração social e, com isso, absorvidas pelas escolas. Faz-se necessária uma reestruturação das concepções que precisam ir ao encontro das identidades e desejos dos alunos.
Neste sentido, ainda existe um grande caminho a ser explorado, percorrendo tanto as práticas pedagógicas com enfoque nas tecnologias, quanto os currículos que devem passar a orientar a inclusão das tecnologias no ambiente escolar, visando qualidade e desejo no processo de ensino e aprendizagem.
Foram localizados poucos estudos sobre as percepções quanto ao uso das
tecnologias, tendo como foco os alunos do Ensino Médio nos espaços não formais. Ressalta-se aqui Dayrell (2007, p.4), que afirma que “na realidade não há
tanto uma juventude e sim jovens, enquanto sujeitos, que experimentam e sentem
segundo determinado contexto sociocultural onde se inserem.” Acredita-se na
importância de haver estudos que analisem as tecnologias além dos muros das escolas, pois estas indicaram a motivação dos alunos quando eles utilizam recursos
tecnológicos.
Portanto, conclui-se que as escolas precisam perceber as tecnologias com
vistas à percepção dos alunos. Deste modo, elas estarão contribuindo para a construção de sujeitos ativos no contexto de práticas e vivências pautadas no uso das
tecnologias.
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- Daniel Fernando Bovolenta Ovigli
Currículo: http://lattes.cnpq.br/1037654075125918
- Monica Izilda da Silva
Currículo: http://lattes.cnpq.br/9605112723087762
- Regina Maria Rovigati Simões
Currículo: http://lattes.cnpq.br/7770158896621784
236
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 225-236, 2018
Notas sobre Formação Integrada e
Ensino Médio Integrado
MELO, Sthéfany
COUTINHO, Ednaldo Gonçalves
MARQUES, Welisson
Resumo: O Ensino Médio integrado possui bem menor número de alunos em comparação ao tradicional Ensino Médio regular. No estado de Minas Gerais, o número de ingressantes no Ensino Médio regular é violentamente superior aos de ensino médio integrado,
conforme dados do Censo Escolar do ano de 2015, aplicado pelo Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e disponível através do portal
InepData. Na prática, o conceito de integração vem sendo edificado até mesmo pelos
próprios profissionais da educação, os quais se mantêm incertos quanto aos procedimentos
a serem adotados para que a educação geral se torne parte inseparável da educação profissional. A ideologia de conhecimento fragmentado por meio de disciplinas isoladas perdura
no imaginário educacional e, resistir a essa ideia através de processos pedagógicos inter e
transdisciplinares continua sendo uma metodologia inovadora e utópica, questionada por
pais, alunos, professores e por toda a comunidade escolar.
Palavras chave: Educação profissional; Ensino médio integrado; Ensino técnico.
Abstract: Integrated secondary education remains anonymous compared to traditional
regular secondary education. In the state of Minas Gerais, the number of regular high
school students is violently higher than those of integrated secondary education, according to the 2015 School Census, applied by the National Institute of Educational Studies
and Research Anísio Teixeira (Inep). Moreover, in practice, the concept of integration is
still being built even by the education professionals themselves, who remain uncertain
about the procedures to be adopted so that general education becomes an inseparable part
of professional education. The ideology of fragmented knowledge in isolated disciplines
lingers in the educational imaginary, and resisting this idea through interdisciplinary and
transdisciplinary pedagogical processes continues to be an innovative and utopian methodology, questioned by parents, students, teachers and the entire school community. Do
we study to work or study for life?
Keywords: Professional education; Integrated secondary education; Technical education.
237
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 237-249, 2018
1. Ensino Médio Integrado a quê?
O Ensino Médio, por ser para muitos a etapa final de qualificação para
o mercado de trabalho, tem sido foco permanente de discussão e reflexão e um
desafio como parte de políticas educacionais.
Nosso futuro está penhorado porque não cuidamos do patrimônio
mais importante que um país tem: sua gente. Se dependermos
da qualificação dela para avançarmos, tudo leva a crer que
continuaremos vendo os países desenvolvidos de longe e que, assim
como a geração anterior viu o Brasil ser ultrapassado pelos tigres
asiáticos, a nossa irá testemunhar a passagem de China, Índia e
outros países menores. (IOSCHPE, 2014, p.21)
Nessa perspectiva, que envolve os desafios advindos do capitalismo, da
globalização e em virtude dos reflexos gerados por eles na educação, como a elevação da escolaridade enquanto condição para a inserção no mercado de trabalho,
é importante pesquisar sobre as políticas públicas1 desenvolvidas pelo Estado, em
especial às relacionadas ao ensino e à qualificação profissional pela rede pública.
Ao longo dos anos, os governos implementaram diversos programas
e políticas públicas de formação profissional. Uma das primeiras
propostas realizadas no país foram as 19 Escolas de Aprendizes
Artífices instituídas pelo Decreto Presidencial nº 7.566 de 1909,
assinado pelo presidente à época, Nilo Peçanha. Tais escolas eram
destinadas ao ensino profissional, primário e gratuito. Elas deram
origem a diversas propostas e ações voltadas para a qualificação
profissional ofertadas por meio do governo federal como, por exemplo,
as Escolas Industriais e Técnicas e os Centros Federais de Educação
Tecnológica – CEFETs (SOUZA JÚNIOR, 2017, p. 24-25).
Somente em 2008, com a articulação para a criação dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia através da Lei nº 11.892, a qual absorveu
os CEFETs e as Escolas Técnicas remanescentes, que a integração entre ensino
médio e ensino técnico conquistou maior visibilidade perante a sociedade.
Dentre as instituições de ensino ofertantes dessa educação integrada (ensino médio e ensino técnico) permanecem frequentes algumas reflexões a respeito
dos motivos que levam os estudantes a optarem por um ensino médio integrado,
tendo em vista esse tipo de formação ainda ser desconhecida por boa parte da
população ou, então, estar meramente relacionada a uma qualificação vocacional
e destinada a setores técnico-industriais. Muitos deles iniciam seus estudos sem ao
menos conhecer os reais propósitos de uma formação integrada, quais os objetivos
do curso técnico em si e em qual mercado de trabalho atuará após a sua conclusão.
1
238
Por políticas públicas foi utilizada, neste trabalho, a definição de Souza (2006) que destaca
o termo como a soma das atividades dos governos, que agem diretamente ou através de delegação, e
que influenciam a vida dos cidadãos.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 237-249, 2018
O público abrangido pelos cursos de formação integrada é bastante heterogêneo e suas histórias de aprendizagem passadas se cruzam em um ambiente
onde os diferentes níveis de formação, tanto escolar quanto cultural e pessoal,
interferem no desenvolvimento desses futuros profissionais e de sua formação
identitária.
É preciso entender melhor tais alunos, quais as suas perspectivas em relação ao aprendizado e em relação ao mercado de trabalho, seus medos, suas
crenças/autocrenças e suas considerações quanto ao prestígio e notoriedade de
um curso integrado, sendo significativo questionar se houve alguma forma de
resistência ou incentivo, pelo aprendiz ou por sua própria família e amigos, na
escolha desse tipo de formação, o que pode afetar sensivelmente a formação da
identidade desse estudante.
As “identidades” flutuam no ar, algumas de nossa própria escolha,
mas outras infladas e lançadas pelas pessoas em nossa volta, e é
preciso estar em alerta constante para defender as primeiras em
relação às últimas. Há uma ampla probabilidade de desentendimento,
e o resultado da negociação permanece eternamente pendente
(BAUMAN, 2005, p. 19).
As crenças constituem-se de todos os entendimentos populares tidos
como verdades pela sociedade, ou seja, ideias difundidas pelo povo sem nenhum
embasamento científico ou acadêmico, ao passo que as autocrenças refletem o
conjunto de expectativas trazidas pelo próprio aluno, ou seja, todas as convicções
carregadas pelo próprio indivíduo e consideradas como sua opinião, construídas
a partir de sua experiência de mundo até o momento. Tais convicções pessoais
podem ou não ser modificadas pelas crenças da sociedade.
O ingressante de um ensino médio integrado a um ensino técnico chega à
escola com suas próprias crenças e autocrenças acerca do conceito de educação integrada, muitas vezes são opiniões rasas e superficiais, além de profundamente influenciadas pelas ideias da própria família e dos amigos, os quais constituem o seu
ciclo principal de informações. As crenças e autocrenças desse indivíduo são construídas a partir dos aspectos históricos-sociais que arquitetaram uma consagrada
divisão social do trabalho, a qual discriminava os homens responsáveis pela ação de
pensar e aqueles responsáveis pela ação de executar. Esse dualismo entre trabalho
intelectual2 e trabalho manual3 reservou historicamente às elites dirigentes a educação geral e aos desamparados a educação técnica (ou profissional). Nesse viés,
construiu-se o homem limitado da sociedade capitalista, consequência de uma
realidade imposta pelo próprio desenvolvimento da grande indústria. Foi nesse
2
Trabalho intelectual é entendido aqui como aquele historicamente reservado ao poder
das elites, nos quais se incluíam os filósofos, os sábios e os religiosos que obtinham na escola uma
educação geral direcionada predominantemente à ação de pensar.
3
Trabalho manual é entendido aqui como aquele reduzido ao seu aspecto operacional,
simplificado, escoimado dos conhecimentos que estão na sua gênese científico-tecnológica e na sua
apropriação histórico-social, direcionado predominantemente aos esforços físicos.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 237-249, 2018
239
contexto em que a história da educação brasileira foi erguida, entre concepções
e contradições formadas exclusivamente pelas ideologias dominantes da época.
É com o intuito de prepararem-se para o exercício de profissões técnicas
que, mesmo não garantindo o ingresso no mercado de trabalho, os alunos se interessam pelo ensino médio integrado, não somente eles, mas também a própria
família, a qual é responsável, na maioria dos casos, pela matrícula do filho em tais
instituições. É com esse pensamento puramente mercadológico e mergulhado em
fins estritamente capitalistas que o aluno se forma. Para ele, o conceito de “integrado” pouco importa, o fim maior é a conclusão do ensino médio e a obtenção
extra de um certificado que o qualifique para a atuação em alguma profissão
específica.
Em síntese, este trabalho tem o propósito de apontar o enorme desconhecimento por esta forma de ensino e a visão equivocada acerca dos seus reais
objetivos. O ensino médio regular permanece predominante nessa etapa de formação dos jovens brasileiros e, dentre as esferas governamentais, a rede estadual
de ensino absorve o maior número de matrículas, enquanto a Rede Federal lidera
dentre as instituições ofertantes de ensino médio integrado, como consequência
da força adquirida pela Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica no
ano de 2008.
De cunho introdutório para a conscientização da população, este estudo
é mais uma ferramenta na luta pela disseminação dessa política educacional, que
almeja formar cidadãos qualificados para o mercado de trabalho, mas, antes disso,
para a vida; desfragmentando o conhecimento e tornando-o um só.
2. Breve conceituação sobre Formação Integrada
A década de 1980 foi o período de redemocratização na educação brasileira, por meio da construção da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB),
publicada no ano de 1996, quando concepções como o Ensino Médio integrado
e a oferta de uma educação unitária, politécnica e omnilateral foram dominantes
na discussão.
O termo formação integrada, ou seja, o ensino médio integrado ao ensino técnico, é comumente conceituado como formação politécnica ou educação
tecnológica, e ainda como pluriprofissional como preferem Manacorda (1990) e
Nosella (2007).
240
O ensino técnico articulado com o ensino médio, preferencialmente
integrado, representa para a juventude uma possibilidade que não
só colabora na sua questão da sobrevivência econômica e inserção
social, como também uma proposta educacional, que na integração
de campos do saber, torna-se fundamental para os jovens na
perspectiva de seu desenvolvimento pessoal e na transformação da
realidade social que está inserido. A relação e integração da teoria
e prática, do trabalho manual e intelectual, da cultura técnica e a
cultura geral, interiorização e objetivação vão representar um avanço
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 237-249, 2018
conceitual e a materialização de uma proposta pedagógica avançada
em direção à politecnia como configuração da educação média de
uma sociedade pós-capitalista. (SIMÕES, 2007, p. 84)
Para tanto, a formação integrada almeja enfocar o trabalho como princípio educativo, no sentido de superar a dicotomia trabalho manual e trabalho
intelectual, conforme preceitua Gramsci (1981). Assim, assumir o trabalho como
princípio educativo na perspectiva do trabalhador, como diz Frigotto:
implica superar a visão utilitarista, reducionista de trabalho. Implica
inverter a relação situando o homem e todos os homens como
sujeito do seu devir. Esse é um processo coletivo, organizado, de
busca prática de transformação das relações sociais desumanizadoras
e, portanto, deseducativas. A consciência crítica é o primeiro
elemento deste processo que permite perceber que é dentro destas
velhas e adversas relações sociais que podemos construir outras
relações, onde o trabalho se torne manifestação de vida e, portanto,
educativo (FRIGOTTO, 1989, p. 8).
Para o filósofo alemão Karl Marx, em seus Manuscritos datados de 1844,
a educação politécnica é uma formação mais elevada dos filhos dos trabalhadores
em relação às demais classes sociais, uma forma de se confrontar com a formação
unilateral e os malefícios da divisão do trabalho e da internalização de valores
burgueses relacionados à competitividade, ao individualismo e ao egoísmo. A
politecnia, em resumo, deve encontrar o caminho entre a existência alienada e a
emancipação humana em que se constrói o homem omnilateral4. Essa omnilateralidade é conceituada por Marx como uma ruptura ampla e radical com o homem
limitado da sociedade capitalista. É uma busca da práxis revolucionária no presente, no qual sua realização plena apenas é possível com a superação dos traços
capitalistas de uma sociedade, o que a torna uma formação humana praticamente
inalcançável em nosso corpo social atual. A omnilateralidade, portanto, é entendida, neste trabalho, como uma formação perfeita e utópica do processo educativo,
que é utilizada como guia para o aperfeiçoamento de nossa realidade atual.
O homem omnilateral é aquele que se define não pela riqueza que o
preenche, mas pela riqueza do que lhe falta e do que se torna absolutamente
indispensável para o seu ser. O homem é tanto mais rico quanto mais demanda manifestações humanas. Necessidades essas não determinadas pelo caráter de
mercadoria, e que só podem nascer e serem amplamente satisfeitas em relações
não burguesas, que ultrapassem o sistema de relações do capital. A história da luta
de classes no capitalismo coincide com a história da dualidade educacional. Por
isso, a educação até hoje permanece dividida entre aquela destinada aos que produzem a vida através da sua força de trabalho e aquela destinada aos dirigentes. É
uma luta que só pode ser combatida com muito esforço coletivo.
4
O conceito de “homem omnilateral” não foi precisamente definido por Karl Marx, todavia,
em seus Manuscritos datados de 1844, há suficientes indicações para que seja compreendido no
sentido de uma formação humana oposta à formação unilateral provocada pelo trabalho alienado.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 237-249, 2018
241
Para Nosella (2007), a fórmula marxiana de formação omnilateral ou de
escola unitária, para todos, é antes de tudo a superação da dicotomia entre o trabalho produtor de mercadorias e o trabalho intelectual.
Nessa perspectiva, Antonio Gramsci propôs a concepção de escola unitária, a qual considera a educação como direito de todos. A escola unitária configura-se numa escola que não exclua ninguém do processo educativo e que possibilite
a todos a apropriação dos conhecimentos construídos até então pela humanidade.
É através dela que não mais se estabeleceria distinção entre o trabalho intelectual
e o trabalho operacional, entre o diretor e o operário.
A proposta de Gramsci para uma escola unitária que promova
a maturidade intelectual está diretamente associada ao seu
posicionamento político claramente comprometido com a classe
trabalhadora. Gramsci, ao mesmo tempo em que desenvolveu
uma proposta educacional, defendeu a necessidade de que as
instituições proletárias (sindicatos e partidos) se organizassem
com o intuito de promover a auto-educação dos trabalhadores,
uma educação que conduzisse à emancipação destes em relação ao
Estado capitalista. Gramsci apresentou este desafio: construir uma
verdadeira “escola unitária”, incumbida da “[...] tarefa de inserir os
jovens na atividade social, depois de tê-los levado a um certo grau de
maturidade e capacidade, à criação intelectual e prática e a uma certa
autonomia na orientação e na iniciativa.” (GRAMSCI, 1981, apud
NASCIMENTO e SBARDELOTTO, 2008, p. 284)
Com isto, é possível compreender os dois pilares conceituais de uma educação integrada: um tipo de escola que não seja dual, pelo contrário, seja unitária
e garanta a todos o direito ao conhecimento; e uma educação politécnica, que
possibilita o acesso à cultura, à ciência, ao trabalho por meio de uma educação
básica e profissional.
2.1 Analisando números: dados estatísticos
242
O Censo Escolar é o principal instrumento de coleta de informações da
educação básica e o mais importante levantamento estatístico educacional brasileiro nessa área. É coordenado pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), órgão vinculado ao Ministério da Educação,
e realizado em regime de colaboração entre as secretarias estaduais e municipais
de educação e com a participação de todas as escolas públicas e privadas do país.
Os dados mais completos até a presente data, para o estado de Minas
Gerais, referem-se ao ano de 2015, e podem ser visualizados através do próprio
portal do InepData, disponível a toda população. O portal InepData é uma base
de dados pública e de fonte confiável, e foi utilizado nesta pesquisa, ainda, a fim
de solidificar entre a sociedade a sua existência. A busca realizada envolveu o ano
de 2015, no estado de Minas Gerais, na mediação didático-pedagógica presencial;
e a coleta de dados ocorreu no mês de setembro de 2017.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 237-249, 2018
Para fins de conceituação, o ensino médio regular foi considerado neste
trabalho como o tradicional ensino médio ofertado em escolas durante os comuns
3 anos de duração, constituído de disciplinas basilares, normalmente fragmentadas por áreas de conhecimento e lecionadas durante somente um turno do dia. Já
o ensino médio integrado é conceituado aqui como a união entre o ensino médio
regular e o curso técnico, o qual proporcionará independência ao educando para a
sua inserção no mercado de trabalho através de disciplinas técnicas específicas. O
Ensino Médio integrado é normalmente lecionado em dois turnos, o que confunde a sociedade ao bipartir o conhecimento em educação geral durante a manhã e
educação técnica durante a tarde. É por conta deste pensamento que a maioria da
comunidade escolar acreditar frequentar dois cursos distintos. O conceito de integração pretende exatamente romper com essa distinção e unir a educação geral à
educação técnica, transformando o aprendizado para a vida e para o trabalho em
uma única massa indivisível de conhecimentos.
Na tentativa de ilustrar esse enfrentamento entre ensino médio regular
e ensino médio integrado, os dados coletados – mesmo que de forma bastante
primária – já demonstram o contraste entre os dois modelos de ensino e servem
como exemplo para se entender o longo caminho a ser percorrido para que o
ensino integrado adquira reconhecimento e seja também, verdadeiramente, integrador de saberes.
No ano de 2015, no estado de Minas Gerais, o ensino médio regular
ainda foi devastadoramente predominante em relação ao ensino médio integrado,
conforme Gráfico 01; considerando as escolas ofertantes em todas as redes de
ensino: federal, estadual, municipal e privada. Nesse ano, o ensino médio regular
contabilizou 764.569 matrículas, enquanto o ensino médio integrado totalizou
apenas 17.018 matrículas.
Gráfico
01: Matrículas do Censo Escolar 2015 nas redes federal, estadual, muGráfico 01: Matrículas do Censo Escolar 2015 nas redes federal, estadual, municipal e
nicipal e privada
privada
Matrículas do Censo Escolar 2015: redes federal, estadual,
municipal e privada
800000
700000
600000
500000
400000
300000
200000
100000
0
Ensino médio regular
Ensino médio integrado
Fonte:
Dados
da pesquisa
Fonte:
Dados
da pesquisa
243
Das 764.569 matrículas do ensinoEvidência,
médio regular,
a maior
delas
é efetivada2018
Araxá,
v. 14,parte
n. 14,
p. 237-249,
na rede estadual de ensino, contando com 676.493 matrículas, seguidas pelas 79.718 na
rede privada, 5.718 na rede municipal e 2.640 na rede federal de ensino, conforme Gráfico
Fonte: Dados da pesquisa
Das 764.569 matrículas do ensino médio regular, a maior parte delas é efetivada
na redeDas
estadual
de ensino,
contandodo
com
676.493
matrículas,
seguidas
pelasparte
79.718delas
na é
764.569
matrículas
ensino
médio
regular,
a maior
efetivada
na
rede
estadual
de
ensino,
contando
com
676.493
matrículas,
seguidas
rede privada, 5.718 na rede municipal e 2.640 na rede federal de ensino, conforme Gráfico
pelas 79.718 na rede privada, 5.718 na rede municipal e 2.640 na rede federal de
02 abaixo.
ensino, conforme Gráfico 02 abaixo.
Gráfico
02: Ensino
médio
regular
redesdedeensino,
ensino,
no Censo
Escolar
Gráfico
02: Ensino
médio
regularpor
por redes
no Censo
Escolar
2015 2015
Ensino médio regular por redes de ensino, 2015
700000
600000
500000
400000
300000
200000
100000
0
Federal
Estadual
Municipal
Privada
Fonte:
Dados
da pesquisa
Fonte:
Dados
da pesquisa
Das 17.018 matrículas no ensino médio integrado, 15.158 são constantes da rede
Das 17.018 matrículas no ensino médio integrado, 15.158 são constantes
federal de ensino, seguidas pelas 1.395 inscrições na rede privada e pelas 465 na rede
da rede federal de ensino, seguidas pelas 1.395 inscrições na rede privada e pelas
(Gráfico (Gráfico
03). Nesse03).
ano Nesse
não houve
matrícula
em ensino
médioem
465 namunicipal
rede municipal
ano nenhuma
não houve
nenhuma
matrícula
ensinointegrado
médio nas
integrado
nas redes
estaduais de ensino.
redes estaduais
de ensino.
Gráfico 03:
Ensino
médiomédio
integrado
por
Censo
Escolar
Gráfico
03: Ensino
integrado
porredes
redesde
de ensino,
ensino, nono
Censo
Escolar
20152015
Ensino médio integrado por redes de ensino, 2015
16000
14000
12000
10000
8000
6000
4000
2000
0
Federal
Estadual
Municipal
Privada
Fonte:
da pesquisa
Fonte: Dados
da Dados
pesquisa
244
O ensino médio integrado apresenta predominância na rede federal de ensino por
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 237-249, 2018
conta do mérito que vêm alcançando a Rede Federal de Educação Profissional, Científica
e Tecnológica, instituída pela Lei nº 11.892/2008, assim como por ocasião da publicação
O ensino médio integrado apresenta predominância na rede federal de
ensino por conta do mérito que vêm alcançando a Rede Federal de Educação
Profissional, Científica e Tecnológica, instituída pela Lei nº 11.892/2008, assim
como por ocasião da publicação do Decreto nº 5.154/2004, o qual determina a
indissociabilidade entre teoria e prática através da articulação entre ensino médio
e ensino técnico como uma de suas premissas fundamentais. Nesse contexto e
com números bastante desequilibrados a eficácia do Decreto 5.154/2004 pode
ser questionada, configurando uma necessidade de revisão entre o que foi preconizado e o que vem se apresentando na prática. O referido Decreto - retomando a
concepção da LDB - estabelece a oferta da educação profissional em “articulação”
com o ensino médio, podendo ser realizada de forma integrada, concomitante e
subsequente ao ensino médio (art.1º e 4º). Representou um avanço em relação
aos efeitos ocasionados pelo Decreto nº 2.208/1997, constituindo-se como uma
inusitada e diferente oferta de educação profissional, mas que ainda não pôde ser
implantado em sua plenitude.
3. Ensino Médio Integrado ou Integral?
O Ensino Médio Integrado é uma modalidade de ensino que articula a
educação profissional técnica e o ensino médio, tudo isso de forma integrada, a
quem tenha concluído o ensino fundamental, sendo o curso planejado de modo
a conduzir o aluno à habilitação profissional técnica de nível médio na mesma
instituição de ensino, contando com matrícula única. Para que isso aconteça, na
maioria das Instituições de Ensino que oferecem essa proposta, ela se dá em período integral de estudos, normalmente nos turnos matutino e vespertino.
Um projeto de ensino médio integrado obviamente almeja superar o histórico conflito existente em torno do papel da escola, de formar para a cidadania
ou para o trabalho produtivo. A formação integrada garante ao adolescente, ao
jovem e ao adulto trabalhador o direito a uma formação completa para a leitura
do mundo e para a sua atuação como cidadão pertencente a um país. A integração
é bem mais do que o ensino de conteúdos gerais e, de conteúdos específicos de
forma homogênea ou misturada. Integrar significa tornar inteiro o ser humano
historicamente despedaçado pelo mundo do capital.
Os homens de classe operária têm desde cedo necessidade do
trabalho de seus filhos. Essas crianças precisam adquirir desde cedo o
conhecimento e sobretudo o hábito e a tradição do trabalho penoso
a que se destinam. Não podem, portanto, perder tempo nas escolas
(...). Os filhos da classe erudita, ao contrário, podem dedicar-se a
estudar durante muito tempo; têm muitas coisas para aprender, para
alcançar o que se espera deles no futuro. Esses são fatos que não
dependem de qualquer vontade humana; decorrem necessariamente
da própria natureza dos homens e da sociedade: ninguém está em
condições de muda-los. Portanto, trata-se de dados invariáveis dos
quais devemos partir. (TRACY, 1908, apud FRIGOTTO, 1995, p. 34)
245
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 237-249, 2018
Apesar do esforço de inúmeros profissionais da educação na tentativa de
implantar, de fato, uma formação integrada nas instituições de ensino, a ideologia
dominante visualiza a integração como integralização. Ao contrário do que foi
preceituado até aqui, a integralização refere-se não a uma educação integrada,
unitária, transdisciplinar e homogênea, mas é tratada exclusivamente como uma
educação em período integral, na qual o educando permanece na escola no período matutino e vespertino, normalmente; o que acarreta o pensamento de que o
estudante frequenta dois cursos distintos. E é assim que a integração é vista por
muitos, dois cursos que sustentam o educando na escola por um período integral.
Essa ideia minimiza e quantifica o conceito de educação, fazendo com que o
aprendizado para a vida fosse tão melhor, quanto por mais tempo se permanecesse dentro dos limites físicos da escola.
É nesse contexto em que muitos pais acreditam estar oportunizando aos
filhos uma formação para a vida, universal e ontológica, capaz de qualificá-los de
forma ética, cidadã, social, política, moral e etc., e também produtiva; na expectativa de constituí-los verdadeiros super-heróis. Nessa visão quantitativa, quanto
mais cursos, melhor. Mas, “deixar” o aluno na escola durante todo esse período
não é garantia de aprendizado, mas é, em muitos casos, uma oportunidade brilhante para os pais satisfazerem-se enquanto intermediários cuidadosos e responsáveis pela instrução dos filhos, além de diminuírem a permanência do jovem dentro de casa, facilitando a rotina diária do lar e transferindo à escola a incumbência
de zelar pelos adolescentes.
A publicação da Lei 11.892 em 2008, a qual criou os Institutos Federais
de Educação, Ciência e Tecnologia (IFs), oportunizou que o tema se tornasse
acessível às discussões pedagógicas, uma vez que é objetivo dos IFs ministrar a
educação profissional técnica de nível médio prioritariamente na forma de cursos
integrados. Desde 2008, então, a implantação de um currículo integrado tem
se tornado assunto recorrente nas reuniões pedagógicas entre professores e gestores escolares. O currículo integrado organiza o conhecimento e desenvolve o
processo de ensino-aprendizagem de forma que os conceitos sejam apreendidos
como sistema de relações de uma totalidade concreta que se pretende explicar e
compreender. É nessa batalha em que muitos professores, incluindo os de ensino
médio regular, se encontram atualmente, na tentativa de unificarem não somente
as disciplinas, mas também os cursos, de forma que o ensino propicie um conhecimento uno, capaz de construir a episteme do indivíduo e levá-lo ao êxito
enquanto ser humano e, por consequência, a um êxito profissional.
Considerações finais
“Meu filho estuda em um curso integrado. Ele faz parte de um
futuro promissor.”
Com 109 anos de vida, a Rede Federal está presente na sociedade com
mais de 644 unidades em funcionamento em todos os estados da federação, ofe246
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 237-249, 2018
recendo cursos de qualificação, ensino médio integrado, cursos superiores e especializações lato e stricto sensu.
Apesar da grande evolução vivenciada desde 2008, o ensino médio integrado continua sofrendo desvantagem em comparação ao tradicional ensino médio regular, o qual foi responsável por 97,82% das matrículas de nível médio no
ano de 2015 no estado de Minas Gerais, segundo o Censo Escolar. A visão de um
curso assistencialista, voltado para o desenvolvimento de habilidades técnicas e
mecanizadas ainda sobrevive no imaginário da população quando se discute sobre
ensino técnico. Não obstante, o conceito de integração também é interpretado
erroneamente, como a agregação entre dois cursos trabalhados simultaneamente,
porém, de forma isolada. A integração, a valer, é um desafio aos educadores em
um Estado no qual as condições estruturais, ideológicas, políticas e sociais caminham em desconformidade.
O educador e a educadora críticos não podem pensar que alcançarão a
formação integrada em semanas. Mas podem demonstrar que é possível. E isto
reforça nele ou nela a sua tarefa político-pedagógica. É preciso atestar a sua capacidade de luta e o seu respeito às diferenças para que a cada dia se esteja mais
próximo de se modificar a realidade educacional. É necessário insistir e reinsistir.
Grandes mudanças não ocorrem em pouco tempo, precisam ser pensadas, formuladas, refletidas, analisadas, questionadas, corrigidas e repensadas em trabalhos
como este.
A educação está posta diante de uma nova forma de conciliar a formação
para a vida com as exigências capitalistas que exigem trabalhadores qualificados
para o mercado de trabalho. É um processo em construção, cujos alicerces ainda
estão sendo edificados. Todos sabem que qualquer alteração a ser realizada nos
Aparelhos Ideológicos do Estado – nesse caso, a Escola – é um enfrentamento moroso, pois repercute no imaginário dos indivíduos e suas autocrenças de mundo.
No âmbito da sinalização do Governo, o ensino médio integrado não parece como uma política fundamental e estratégica às vistas de se ter uma base científica e tecnológica ampla, como é feito em diversos outros países. Entretanto, a
integração do ensino médio com o ensino técnico é uma necessidade conjuntural
e uma condição necessária para que se efetive a “travessia” em direção a um ensino
omnilateral, conforme Marx já imaginava. Caminhar rumo a uma escola unitária
refletirá em todos os organismos de cultura, transformando-os e dando-lhes um
novo conteúdo por meio de uma consciência coletiva, que transpasse a histórica
dualidade educacional e avance em direção à igualdade de oportunidades.
Embora árduo, o processo de evolução sempre persegue bons ideias. É
necessário entender o ensino médio integrado como um passo adiante, um salto
em direção a um futuro promissor, que trará novas maneiras de se assimilar a
ciência, a educação e a cultura.
247
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 237-249, 2018
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Mestranda em Educação Profissional e Tecnológica (PROFEPT)
Instituto Federal do Triângulo Mineiro Campus Uberlândia
Currículo: http://lattes.cnpq.br/9322228644060538
- Ednaldo Gonçalves Coutinho
Doutor em Educação (UFSCar)
Instituto Federal do Triângulo Mineiro Campus Uberlândia
Currículo: http://lattes.cnpq.br/0739472266207885
- Welisson Marques
Pós-doutor em Educação (USP)
Instituto Federal do Triângulo Mineiro Campus Uberaba
Currículo: http://lattes.cnpq.br/1695154848013278
249
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 237-249, 2018
A Modalidade Profissional Técnica
Integrada ao Ensino Médio no Brasil
GIORDANI, Camila Cunha Oliveira
RAMALHO, Ricardo de Oliveira
CURI, Luciano Marcos
RESUMO: O Ensino Médio situa-se, atualmente, em uma estrutura educacional centrada
nas formas fragmentárias de educação, desarticulada do processo global. As instituições
trabalham, muitas vezes, com modelos variados de ensino, desprivilegiando o estudante
pobre e o jovem trabalhador. O objetivo desta pesquisa é fazer um estudo histórico e
sociológico sobre o Ensino Médio, focando na modalidade Integrada à Educação Profissional. Para tal, o estudo busca seus construtos teóricos em autores como Marx, Gramsci,
Ramos, Carneiro e Frigotto a fim de refletir sobre a finalidade pedagógica e política do
Ensino Médio no âmbito do sistema educacional brasileiro. A metodologia utilizada será a
pesquisa bibliográfica, suas fontes primárias e secundárias. Por se tratar de uma pesquisa de
mestrado, todavia em andamento, o presente artigo aponta reflexões iniciais sobre o tema,
o qual visa contribuir com o atual debate da reforma na última etapa da educação básica.
Palavras chave: Ensino Médio; Educação Profissional.
ABSTRACT:Secondary school is currently located in an educational structure centered
on the fragmentary forms of education, disjointed from the global process. Institutions
often work with varied models of teaching, depriving poor student and young worker. The
aim of this research is to make a historical and sociological study about High School, focusing on the Integrated Modality of Professional Education. To this end, the study seeks
its theoretical constructs in authors such as Marx, Gramsci, Ramos, Carneiro and Frigotto
in order to reflect on the pedagogical and political purpose of Secondary Education within
the Brazilian educational system. The methodology used will be the bibliographic research,
its Primary and Secondary sources. Since this is a Master’s research, still in progress, this
article points out initial reflections on the theme, which aims to contribute to the current
debate on reform in the last stage of basic education.
Keywords: High School; Professional Education.
251
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 251-263, 2018
1. Introdução
O ensino médio em pauta
O ensino médio está no centro das atenções e, nos últimos meses, tem
frequentado o noticiário nacional. Comerciais de TV, polêmicas e debates, inúmeros artigos, notícias e muitas críticas espalhas pela internet têm ocupado a
atenção dos brasileiros, quando o assunto se refere a esta etapa de ensino. Mas
afinal o que aconteceu para tanto estardalhaço em relação ao Ensino Médio? A
resposta é simples: todos os estudiosos, especialistas, boa parte dos profissionais
da educação, que trabalham com esta etapa escolar, e até mesmos os estudantes
sabem que o ensino médio não está indo bem no Brasil. A divulgação do resultado do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) de 2016 ratifica:
o Ensino Médio tem uma estrutura que remonta, no mínimo, à década de 1980,
não possuindo muita coerência e sentido com as demandas da faixa etária dos
estudantes que o cursam, adolescentes e jovens, e nem com as demais disposições
que dele se espera.
O resultado foi divulgado no dia 08 de setembro de 2016 e, quatorze
dias depois, o governo do presidente Michel Temer, em ato solene no Palácio do
Planalto, assinou a Medida Provisória nº 746 /2016 (MP 746 de 22/09/2016,
dita MP 746), publicando-a no dia seguinte. Este instrumento buscou reformar o
Ensino Médio no Brasil e lançou uma faísca num barril de pólvora, cuja polêmica
tem rendido muitos comentários e poucos esclarecimentos proveitosos.
Foi então promulgada a Lei nº 13.415, de 16 de fevereiro de 2017, que
trouxe em seu cerne mudanças para a legislação educacional brasileira, no que diz
respeito tanto à organização curricular para o Ensino Médio, quanto às regras de
uso dos recursos públicos destinados a este. Nesse sentido, segundo esta instrução normativa, o currículo será composto pela Base Nacional Comum Curricular
– BNCC e por itinerários formativos específicos, com ênfase nas áreas de linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e formação técnica
profissional. O currículo terá 1400 horas/ano, totalizando 4.200 horas. Porém,
a carga horária destinada ao cumprimento da BNCC não pode exceder a 1.800
horas da carga horária total do Ensino Médio. Tal medida já alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, e, no que tange à Educação Profissional Técnica de Nível Médio (Seção VI-A), a lei não sofreu modificações até o momento.
Contudo, em meio a tanta polêmica e debates, acredita-se que alguns pontos precisavam ter sido considerados antes da aprovação e da publicação da lei:
o primeiro deles, seria a necessidade de ter tido uma discussão profunda entre os
interessados e o segundo, a identificação da importância de tal etapa não somente
para as demandas futuras, mas também para as emergenciais de seu público.
Nesse ponto, fazem-se urgentes questionamentos, tais como:
• A reforma proposta pelo governo conseguirá resolver as falhas já detectadas no Ensino Médio atual? Acredita-se que infelizmente não, tendo
em vista um debate rápido e desordenado.
252
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 251-263, 2018
• Existe algum modelo de Ensino Médio no Brasil que se aproxima do
que se espera desta etapa escolar? Acredita-se que sim. Este modelo
se chama: Técnico Integrado ao Ensino Médio e é sobre ele que este
artigo irá tratar.
2. Desenvolvimento
2.1 A importância da última etapa do ensino básico
Percurso historicamente renegado no conjunto das políticas públicas do
Estado brasileiro, o Ensino Médio, segundo Carneiro (2012), tem sido entendido
como preparação para a universidade, sem identidade própria. Entretanto, esta
etapa possui peculiaridades, principalmente no que diz respeito ao aspecto emocional, que demandam atenção por parte daqueles que lidam diretamente com
esta fase, como reforça Nosella (2016):
A especificidade pedagógica do ensino de 2º grau decorre da
peculiaridade psicológica de sua clientela que, implicitamente, exige
da geração mais adulta uma sistemática e racional formação para
o exercício da responsabilidade, da autonomia e da criatividade
individual e coletiva. (...) O 2º grau é, portanto, um ensino
marcadamente histórico e renovador e, dessa perspectiva, deve assumir
sua autonomia didático-metodológica (NOSELLA, 2016, p. 21).
Tanto na esfera pública, quanto na esfera particular, percebe-se a falta de
sentindo deste período, que não deve ser destituída de seu compromisso de ser a
última etapa da educação básica. Nos termos da LDB, Capítulo II, artigo 22, o
estudante espera alcançar uma série de competências, tais como: preparação para
o exercício de sua cidadania, subsídios para que possa progredir tanto no trabalho, quanto em estudos posteriores. No entanto, o que se percebe é um marketing exacerbado, referente principalmente ao Exame Nacional do Ensino Médio,
dispensando sua importância por meio dos cursinhos pré-vestibulares. Segundo
Carneiro, (2012) é importante que esta etapa não fique focada aos interesses
econômicos e ao exame preparatório para o ensino superior, mas que trabalhe
competências e habilidades voltadas para a cidadania participativa e crítica, para o
trabalho humano, a democracia, a identidade e a justiça social.
É necessário, nesse sentido, um conhecimento que contribua para a formação integral dos estudantes, voltado para a superação da dualidade existente
entre cultura geral versus cultura técnica. Esse Ensino Médio deve ser conduzido
de forma a incluir não somente o público a ele designado, mas também o EJA;
à formação de cidadãos que possam compreender de forma crítica e reflexiva a
realidade e o mundo do trabalho – alicerçado em conhecimentos científicos, tecnológicos, sociais e humanísticos que contribuam para a transformação da sociedade em função dos interesses sociais e coletivos (BRASIL, 2007). Ainda sobre
a dualidade na educação, da divisão entre trabalho intelectual e manual, educação
253
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 251-263, 2018
profissional versus escolas de formação geral, Gramsci propõe uma escola única,
o que significa dizer “desinteressada”, que oportunizasse as mesmas condições de
instrução a todos de forma equânime. Assim:
A crise terá uma solução que, racionalmente, deveria seguir esta
linha: escola única inicial de cultura geral, humanista, formativa,
que equilibre equanimemente o desenvolvimento da capacidade
de trabalhar manualmente (tecnicamente, industrialmente) e o
desenvolvimento das capacidades de trabalho intelectual. Deste
tipo de escola única, através de repetidas experiências de orientação
profissional, passar-se-á a uma das escolas especializadas ou ao
trabalho produtivo (GRAMSCI, 1991, p. 118).
Saviani (2007), amparado nas reflexões de Gramsci, explicita a respeito
da organização do Ensino Médio. Esta etapa, segundo autor, deve proporcionar
aos alunos o conhecimento dos fundamentos das diferentes técnicas utilizadas na
produção, e não o mero adestramento. Sendo assim, não à formação de técnicos
especializados, mas de politécnicos – entendida como:
(...) domínio dos fundamentos científicos das diferentes técnicas
utilizadas na produção moderna. Nessa perspectiva, a educação de
nível médio tratará de concentrar-se nas modalidades fundamentais
que dão base à multiplicidade de processo e técnicas de produção
existentes (SAVIANI, 2007, p.161).
Nessa perspectiva, segundo Moura (2007), os estudantes seriam formados não em cursos técnicos específicos, stricto sensu, mas em conhecimentos científicos gerais. A opção por um curso superior ou técnico só viria após a conclusão
do ensino médio na visão politécnica, ou seja, a partir da maior idade ou mais
tarde. Porém, será que a realidade brasileira conseguiria implementar a politecnia,
e tudo que isso significaria materialmente falando, conforme mencionado? De
acordo com Moura (2007) seria inviável, pois grande parte da população jovem
precisa trabalhar para complementar seu rendimento familiar, ou até mesmo se
autossustentar, antes mesmo dos 18 anos. Daí denota-se a importância de uma
escolarização que contemple a formação de cidadãos éticos e políticos, cientes de
seus direitos e deveres, comprometidos com a transformação social e a superação
da dicotomia: trabalho manual versus trabalho intelectual.
Nesse sentido, ainda reforçam Marx e Engels:
Enquanto as circunstâncias em que vive este indivíduo lhe não
permitem senão o desenvolvimento unilateral de uma faculdade à
custa de todas as outras e lhe não fornecem senão a matéria e o
tempo necessários ao desenvolvimento desta única faculdade, este
indivíduo só atingirá um desenvolvimento unilateral e mutilado
(MARX; ENGELS, 1978, p. 62).
254
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 251-263, 2018
Deve-se pensar o problema do ensino considerando que a dicotomia dos
saberes e a incapacidade de articulá-los, uns aos outros, não permite desenvolver
a qualidade da mente humana, tendo em vista a contextualização e a integração
como premissas que precisam ser mais bem trabalhadas (produzindo sentido), e
não tolhidas. (MORIN, 2003). “É preciso substituir um pensamento disjuntivo
e redutor por um pensamento do complexo, no sentido originário do termo complexus: que é tecido junto” (MORIN, 2003, p.89, itálico do autor).
Gramsci (1991) aponta, também, para a necessidade de desenvolver nos
educandos o elemento da responsabilidade autônoma, sinalizando que a aprendizagem “ocorre notadamente graças a um esforço espontâneo e autônomo do
discente, e no qual o professor exerce apenas uma função de guia amigável, como
ocorre ou deveria ocorrer na universidade (GRAMSCI, 1991, p. 154)”.
Acerca da responsabilidade sobre a construção do conhecimento que seja
significativo, da relação dialética entre o ensinar e o aprender, Paulo Freire (1998)
nos fala da importância da autonomia como princípio pedagógico para uma educação libertadora. Para a qual os sujeitos se reconheçam como responsáveis por
seu processo de conhecimento e de mudança social. Assim, “para Paulo Freire,
autonomia é libertar o ser humano das cadeias do determinismo neoliberal, reconhecendo que a história é um tempo de possibilidades” (MACHADO, 2008,
p.56).
Do ponto de vista pedagógico, de acordo com Araújo et al. (2010), construir um projeto em que os interesses da classe trabalhadora sejam relevados, considerando seu meio, suas necessidades, promovendo a integração entre formação
intelectual-política e estratégias de educação para esta classe, é um desafio a ser
enfrentado.
Considera-se importante, então, pensar nas últimas notícias das políticas
públicas que vêm sendo implementadas e qual o seu real objetivo. Será que estão comprometidas com aqueles que realmente necessitam delas? Ou será que a
preocupação é atender a números estabelecidos por organismos internacionais e,
consequentemente, perpetuar o status quo?
2.2 O Integrado no Brasil: resumo e legislação
Na segunda metade da década de 1990, o futuro das Instituições Federais
de Educação Profissional e Tecnológica sinalizava novos percursos. Almejava-se
a promoção de uma reforma estrutural baseada não somente em currículos técnicos, mas que dialogasse, ao mesmo tempo, com as demandas sociais e regionais.
Porém, um ano após a aprovação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional nº 9394/96, o Decreto nº 2.208/971 muda os caminhos da “Reforma
da Educação Profissional” (BRASIL, 2010).
O referido decreto acentuava o dualismo (já existente no nível médio
no Brasil) entre as disciplinas propedêuticas e profissionais nos cursos técnicos.
Assim, o ensino técnico seria oferecido, prioritariamente, sob duas formas: con1
Tal decreto estabeleceu as bases da reforma da educação profissional.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 251-263, 2018
255
comitante, com matrículas distintas; e subsequente, em que o aluno conclui o ensino médio para depois ingressar nesta modalidade. Isso significou uma série de
restrições, tanto na organização curricular e pedagógica, quanto na oferta desses
cursos no país (BRASIL, 2010). O sonho da politecnia no Brasil, desse modo,
ficou adiado.
A manutenção dos cursos de ensino médio de caráter profissionalizante
passou a ser um negócio de risco, pois: “se alguma unidade federada decidisse
manter a versão integrada poderia fazê-lo, com apoio na Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LDB, 9394/1996); o preço desta decisão, contudo, seria a
de não receber recursos do convênio firmado pelo Banco Mundial” (KUENZER,
2003 apud CÊA, 2006).
A formação para o trabalho, com o objetivo de elevar os níveis de escolaridade foi, dessa forma, desarticulada durante a vigência do Decreto nº 2.208/97
(CÊA, 2006). Tal financiamento foi materializado por meio do Programa de Expansão da Educação Profissional (PROEP). O PROEP tinha um papel de tornar
a Rede Federal mais competitiva, o que significa dizer que, ao prestar serviço à
comunidade, poderia também autofinanciar-se, desonerando aos poucos o Estado de sustentá-la.
Nesse sentido, os projetos institucionais que sugerissem propostas relacionadas ao Ensino Médio eram rejeitados (BRASIL, 2007). A Portaria 646/97,
revogada apenas em 2003, estabelecia que a oferta de vagas para cursos de Ensino
Médio, conjugado à Educação Profissional, no ano de 1998, cairia pela metade
da oferta disponibilizada em 1997, tendo um teto de, no máximo, 50%. Ou seja,
tal portaria reduziu de forma considerável a proposta anterior (BRASIL, 2007),
conforme artigo terceiro:
Art. 3º - As instituições federais de educação tecnológica ficam
autorizadas a manter ensino médio, com matrícula independente
da educação profissional, oferecendo o máximo de 50% do total de
vagas oferecidas para os cursos regulares em 1997, observando o
disposto na Lei nº 9394/96 (PORTARIA MEC 646/1997, Art. 3º).
Com a substituição do Decreto nº 2.208/97 pelo Decreto 5.154/04,
novas medidas são editadas para a Educação Profissional e Tecnológica. Assim,
fortaleceu-se a possibilidade, já indicada pela LDB, de ofertar o Ensino na modalidade Integrada (articulado ao Ensino Médio, com a formação para o trabalho)2,
permanecendo, também, a oferta de formação nas modalidades concomitante e
sequencial (CÊA, 2006). Logo, a proposta de matrícula independente, passa a ser
de matrícula única:
Art. 4° A educação profissional técnica de nível médio, nos termos
dispostos no § 2° do art. 36, art. 40 e parágrafo único do art. 41 da
2
256
Entende-se por trabalho em seu sentido ontológico: “como práxis humana e, então, como
a forma pela qual o homem produz sua própria existência na relação com a natureza e como os outros
homens e, assim, produz conhecimentos.” (RAMOS, 2007).
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 251-263, 2018
Lei no 9.394, de 1996, será desenvolvida de forma articulada com
o ensino médio, observados:
I - os objetivos contidos nas diretrizes curriculares nacionais
definidas pelo Conselho Nacional de Educação;
II - as normas complementares dos respectivos sistemas de
ensino; e
III - as exigências de cada instituição de ensino, nos termos de
seu projeto pedagógico.
§ 1° A articulação entre a educação profissional técnica de nível
médio e o ensino médio dar-se-á de forma:
I - integrada, oferecida somente a quem já tenha concluído o
ensino fundamental, sendo o curso planejado de modo a conduzir
o aluno à habilitação profissional técnica de nível médio, na mesma
instituição de ensino, contando com matrícula única para cada aluno
[...] (DECRETO 5154/04, Art. 4º).
Diante do exposto, a Educação Profissional Técnica Integrada ao Ensino
Médio, antes no plano das experimentações, materializou-se e pode vislumbrar
novos caminhos.
Exemplo disso foi o processo denominado “ifetização”, conhecido como
a transformação das Escolas Agrotécnicas Federais e dos Centros Federais de
Educação Tecnológica, em Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia.
Este fato esteve relacionado ao Plano de Desenvolvimento da Educação
(PDE) e culminou, no final de 2008, mais precisamente em 29 de dezembro de
2008 (Lei nº 11. 892), na criação de trinta e oito Institutos Federais em todo o
Brasil, dentre eles o IFTM – Instituto Federal do Triângulo Mineiro.
A Lei nº 11.892/2008 preconizou que os Institutos deveriam, entre
outros objetivos, instaurar e promover a pesquisa, desenvolver as regiões onde
seus Campi estão inseridos, oferecer cursos de licenciaturas, de graduação e pós-graduação e, ainda, reservar 50% de suas vagas para o ensino técnico de nível
médio, prioritariamente na Modalidade Integrada. Dando ênfase, portanto, a tal
configuração de ensino.
No mesmo período, ainda no segundo mandato do então presidente Luís
Inácio Lula da Silva (2007-2010), algumas questões relacionadas à educação profissional foram aprofundadas, também, em outros entes federativos. O Programa
Brasil Profissionalizado, concretizado pelo Decreto nº 6.302 de 12 de dezembro
de 2007, foi o primeiro, segundo Cêa e Silva (2013), a ter um financiamento por
parte do governo federal nos estados, nos municípios e no Distrito Federal que
pretendeu:
(...) estimular o ensino médio integrado à educação profissional,
enfatizando a educação científica e humanística, por meio da
articulação entre formação geral e educação profissional no
contexto dos arranjos produtivos e das vocações locais e regionais
(DECRETO 6302/07, Art. 1º).
257
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 251-263, 2018
De acordo com Moura et al. (2015) o programa fomentou e desenvolveu
ações de expansão, ampliação e modernização das escolas estaduais, objetivando
expandir e ampliar a oferta de cursos, principalmente do técnico integrado à educação profissional. Assim, ficou acordado que a União iria financiar a infraestrutura necessária enquanto os estados assegurariam algumas contrapartidas, como
a criação ou adequação do quadro docente. Apesar disso, em relação principalmente às disciplinas específicas isso não ocorreu, e o curso técnico de nível médio
continuou sem avançar em muitos estados, conforme pesquisa abaixo explicitada.
O Brasil Profissionalizado foi regulado pela Resolução/FNDE/CD/nº
062/2007, que estabeleceu as diretrizes para a assistência financeira a Estados,
Distrito Federal e Municípios, com uma série de exigências, dentre elas, a adesão
dos convenentes ao Compromisso Todos Pela Educação3.
O Programa contemplou, entre 2007 até janeiro de 2016, 24 estados.
Segundo informação disponível no site do Ministério da Educação ( MEC): “foram concluídas 342 obras, sendo 86 novas escolas, 256 ampliações e/ou reformas. Ainda foram entregues 635 laboratórios para aulas práticas”. No âmbito do
sistema federal, constata-se a presença do Ensino Técnico Integrado ao Ensino
Médio, em todos os estados da federação.
Em recente pesquisa realizada no período de agosto a setembro de 2016,
identificou-se que 85% do país ofertavam a modalidade integrada a nível estadual4. Dentre os estados supracitados, alguns chamam a atenção pela quantidade
de escolas Técnicas Integradas, como é caso da Bahia (78), em relação a outros,
como Minas Gerais (15) e Rio Grande do Norte (16).
É importante ressaltar também que, seja de forma cooperativa, como o
estado de Rondônia - que oferta cursos com mediação tecnológica pelo IFRO
- seja por meio de autarquias estaduais, como é o caso do Acre (Instituto de Desenvolvimento da Educação Profissional Dom Moacyr Grechi), todos os estados
(sem distinção) possuem algum contato com a educação profissional, o que, de
certa forma demonstra a importância que se dá a tal modalidade de educação
profissional.
Considerações finais
A Educação Profissional Técnica Integrada ao Nível Médio é uma modalidade oferecida àqueles que já tenham concluído o ensino fundamental e tem
como objetivo: habilitar profissionalmente o aluno ao final da educação básica.
3
258
O Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação são 28 diretrizes pautadas em
resultados de avaliação de qualidade e de rendimento dos estudantes. O decreto nº 6094, de 24 de
abril de 2007 dispõe sobre esta implementação.
4
Não possuem ETIEM os estados de Rondônia, Roraima, Amapá e Amazonas. Todos os
estados que possuem Ensino Técnico Integrado ao Ensino Médio também oferecem tal modalidade
de forma regular.
5
Foi implementada, em 2016, na cidade de Brazópolis, uma escola de Ensino Técnico
integrado ao Ensino Médio que, atualmente, conta com três turmas.
6
Segundo informações obtidas, o estado possui uma escola de Ensino Técnico Integrado ao
Ensino Médio, com 20 turmas.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 251-263, 2018
O Integrado visa, sobretudo, a formação omnilateral dos sujeitos, buscando integrar todas as dimensões da vida no processo educativo, quais sejam:
trabalho, cultura e ciência – trabalho em seu sentido ontológico e como prática
econômica; cultura que orienta, por seus valores éticos e estéticos, as normas de
conduta de uma sociedade; ciência, concebida como os conhecimentos produzidos pela humanidade, que possibilita o avanço das forças produtivas (BRASIL,
2007).
Não significa, assim, a mera junção da educação profissional à educação básica. Segundo Ramos (2007), ao formar profissionalmente um aluno, o
exercício do trabalho precisa ser um dos objetivos, mas não o principal. Devem
ser incorporados valores ético-políticos, conteúdos históricos e científicos, que
adjetivam a práxis humana, habilitando-os para exercerem de forma autônoma
e crítica sua profissão, proporcionando-lhes à compreensão das dinâmicas sócio
produtivas das sociedades modernas.
Mais que priorizar o desenvolvimento do mercado e o fortalecimento da
economia, tal modalidade, integrada, busca superar o modelo socioeconômico vigente, beneficiando o trabalhador e suas relações com o meio em que vive. Nesse
sentido, porém, não se busca apenas suprir a necessidade imediata do trabalho,
nem se concentra na vertente propedêutica, ela compreende uma forma orgânica
num mesmo currículo.
Tal modalidade tem como características principais: a formação com o
objetivo ético, técnico e político, que contribua para a transformação social; a
superação da dicotomia trabalho manual versus trabalho intelectual e a formação
de trabalhadores capazes de atuar como dirigentes e cidadãos.
O que se quer, portanto, é que a concepção de educação integrada seja um
núcleo sólido. Ou seja, que a educação geral se torne indivisível da educação profissional em todos os campos onde se dê a preparação para o trabalho. Percebe-se que ainda se faz necessário desmistificar algumas concepções equivocadas de
autores que, por não conhecerem ações que buscam minimizar a problemática da
dualidade que o nosso sistema educacional enfrenta, acabam por terem uma visão
distorcida, a respeito da proposta de Educação Profissional, especificamente da
modalidade Integrada ao Ensino Médio, como o caso de Nosella (2016, p. 135)
ao dizer “(...) é preciso afirmar que não existe complementaridade curricular entre
o Ensino Médio de elevada qualidade e o ensino profissionalizante popular, mas
oposição: o primeiro é para os dirigentes e o segundo para os dirigidos”
Nesse sentido, é importante ressaltar que o Ensino Médio não deve ser
profissionalizante do ponto de vista do “adestramento em uma determinada habilidade sem o conhecimento dos fundamentos dessa habilidade e, menos ainda da
articulação dessa habilidade com o conjunto do processo produtivo” (SAVIANI,
2007, p.161). Como já dito anteriormente, isso não significa a mera junção da
educação profissional à educação básica. Mais que priorizar o desenvolvimento do
mercado e o fortalecimento da economia, tal modalidade, integrada, busca superar
o modelo socioeconômico vigente, beneficiando o estudante que precisa trabalhar e suas relações com o meio em que vive. Nesse sentido, porém, busca-se não
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 251-263, 2018
259
apenas suprir a necessidade imediata do trabalho, nem se concentra na vertente
propedêutica, ela compreende, assim, uma forma orgânica num mesmo currículo.
Assim, são colocadas em discussão as finalidades desta etapa ou, ainda,
sobre o que lhe dá sentido: conhecimentos e sujeitos. Conhecimentos que são
construídos socialmente ao longo da história e constitui o patrimônio da humanidade. Sujeitos que possuem uma vida, uma história e uma cultura. Que têm
suas próprias necessidades, porém lutam por direitos universais (RAMOS, 2007).
“(...) uma educação para além do capital pressupõe, em última análise, a própria
derrocada do capital. A educação que toma o trabalho como princípio educativo
já é um passo nessa direção” (ARAÚJO E RODRIGUES, 2010, p.61).
Em defesa do Ensino Médio
É preciso ter em mente, nesse sentido, que a última etapa da educação
básica não pode ser apenas preparação para ingressar no Ensino Superior, como
também não pode ser apenas preparação para o mercado de trabalho.
Ela corresponde geralmente ao período da adolescência, faixa etária extremamente importante para o desenvolvimento humano, de cujas demandas específicas precisavam ter encontrado respaldo na discussão sobre qual modelo de
Ensino Médio o Brasil deveria adotar. Assim como nos diz Carneiro (2012), é
importante que esta etapa não fique focada aos interesses econômicos e ao exame
preparatório para o ensino superior, mas que trabalhe competências e habilidades
voltadas para a cidadania participativa e crítica, para o trabalho humano, a democracia, identidade e justiça social.
Tanto na esfera pública, quanto na esfera particular, percebe-se a falta de
sentindo deste período, que não deve ser destituído de seu compromisso de ser
a última etapa da educação básica. Assim, seria importante que o debate político
educacional, acerca da reforma do ensino médio, tivesse sido estendido a todos,
amplamente, e não somente a uma parcela minoritária da população que, sequer,
usufruirá de tal direito.
Segundo Frigotto et al. (2012) é neste nível de ensino, que se manifesta
de forma mais evidente a oposição entre o capital e o trabalho, expressa no dilema
de identidade desta etapa: ela dedica-se à formação propedêutica ou à preparação
para o trabalho? Eis o velho dualismo histórico dessa etapa de escolarização. Esta
dúvida deve-se, principalmente, em função das novas demandas do mercado, da
necessidade de qualificação do trabalho frente à modernização, da automatização
dos equipamentos e da participação dos trabalhadores nas tomadas de decisões.
Nesse sentido, grande parte da população tem no Integrado uma oportunidade que, em função da necessidade de antecipar sua inserção no mercado de
trabalho, o faz a partir da formação profissional de nível técnico.
Após a pesquisa, constatou-se que o Integrado se encontra tanto a nível
federal, quanto estadual e até mesmo municipal em todos os estados do Brasil,
o que, de certa forma, demonstra a importância que se dá a tal modalidade de
educação profissional.
260
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 251-263, 2018
Assim, este artigo pretendeu mostrar que há uma diversidade de perspectivas coexistentes num mesmo país, o que indica a falta de foco nesta última
etapa da educação básica. Dentro do debate acerca da reforma nacional do Ensino
Médio e diante do exposto, acredita-se que a modalidade que melhor possa suprir tais carências, possibilitar aos jovens o entendimento científico, tecnológico e
sociocultural; aumentar sua escolarização e melhorar sua qualidade de formação,
seja o Ensino Técnico Integrado ao Ensino Médio. Porém, muito se tem a perder,
caso a Educação Profissional Técnica Integrada ao Ensino Médio venha a aderir
à Lei nº 13.415, sobretudo pela defesa do governo de uma formação aligeirada
e politicamente descomprometida, sob o risco de afastar a convergência entre a
educação básica e a educação profissional.
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261
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 251-263, 2018
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- Camila Cunha Oliveira Giordani
Currículo: http://lattes.cnpq.br/7913971385381852
- Ricardo de Oliveira Ramalho
Currículo: http://lattes.cnpq.br/0559083211415956
- Luciano Marcos Curi
Currículo: http://lattes.cnpq.br/6230715943028936
263
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 251-263, 2018
Filosofia e Didática: Intermezzo1 TeóricoMetodológico sobre o fazer filosófico no
Ensino Médio
ALMEIDA, Francis Silva de.
Resumo: Este texto retoma parte das análises realizadas durante a pesquisa de Mestrado
Filosofia e fazer filosófico no ensino médio: ressonâncias e deslocamentos em Deleuze-Guattari,
levada a efeito em dezembro de 2016, junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação
da Universidade Federal do Triângulo Mineiro. Contextualizada pelo âmbito da linha de
pesquisa Fundamentos e Práticas Educacionais, a pesquisa teve como objeto de investigação o ensino da filosofia e o fazer filosófico no ensino médio, e seu objetivo foi examinar
em que medida os sentidos atribuídos pelos professores de filosofia do ensino médio ao
fazer filosófico têm provocado a possibilidade de uma “pedagogia do conceito”. A articulação teórica que nos baliza neste trabalho foi realizada nas obras de Deleuze (1992, 2006),
Deleuze; Guattari (1995, 2005), Marcondes (2004), Silveira (2007), Rodrigo (2009) e
Gallo (2010). Nesse ínterim, as discussões que se destacam situam-se no campo da didática, especialmente no que diz respeito aos recursos, ao planejamento e as unidades teórico-metodológicas que orientam o fazer filosófico em sala de aula.
Palavras chave: Ensino da filosofia; Ensino Médio; Didática.
Abstract: This text reproduces part of the analyzes carried out during the Master’s research
Philosophy and philosophical practice in high school: Resonances and displacements in DeleuzeGuattari project carried out in December 2016, with the Post-graduate Program in Education of the Federal University of Triângulo Mineiro. It was contextualized by the scope of
the research line Fundaments and Educational practices, the present study had as object
1
O termo intermezzo diz respeito aos novos espaços de produção que se originam da
conexão entre os pontos de um rizoma. Segundo Deleuze e Guattari (1995, p. 37), “um rizoma
não começa nem conclui, ele se encontra sempre no meio, entre as coisas, inter-ser, intermezzo. [...]
o rizoma tem como tecido a conjunção „e... e... e...”” (grifo dos autores). O rizoma é o espaço da
variação, do possível, da criação, dos deslocamentos que revelam o movimento à luz de um duplo
registro. De um lado, remetendo-nos à ideia de multiplicidade, o rizoma desconstrói as estruturas
estanques e hierarquizadas do conhecimento, suprimindo os aspectos do poder e da importância e das
prioridades da circulação, características próprias do paradigma arbóreo (DELEUZE; GUATTARI,
1995). Do outro, como uma miríade de pequenas raízes emaranhadas, o rizoma coloca em evidência as
múltiplas possibilidades de conexões, aproximações, cortes, percepções. É, portanto, um “e... e... e...”
que indica um movimento potencial de atravessamentos e intersecções entre os seus inúmeros devires.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 265-279, 2018
265
of investigation the teaching of philosophy and the philosophical doing in high school,
and its objective was to examine to what extent the meanings attributed by the teachers of philosophy of high school to make philosophical have provoked the possibility of
a “pedagogy of the concept”. The theoretical articulation in this work was made in the
works of Deleuze (1992, 2006), Deleuze and Guattari (1995, 2005), Marcondes (2004),
Silveira (2007), Rodrigo (2009) and Gallo (1999). In the meantime, the discussions that
stand out are in the field of didactics, especially with regard to resources, planning and
the theoretical-methodological units that guide the philosophical doing in the classroom.
Keywords: Philosophy teaching; High school; Didactic.
1. Introdução
Em junho de 2008, a publicação da Lei 11.684 reconduziu a filosofia
ao quadro curricular do Ensino Médio, atribuindo-lhe o estado de componente
obrigatório em todas as suas séries. Esse evento, rompendo um hiato de quatro
décadas em que o fazer filosófico esteve distante da educação básica, expôs a
necessidade de reorientar de modo ainda mais radical a pesquisa sobre a filosofia
como campo de ensino no nível médio.
Nesse cenário, as questões reportadas aos conteúdos e às metodologias
do ensino da filosofia ganharam matéria e se destacaram como objetos prioritários de sua pesquisa. O que ensinar para que o jovem aluno do ensino médio se
sinta seduzido pela filosofia? Há paradigmas a serem seguidos? O que priorizar:
os conteúdos da história da filosofia ou os diferentes problemas que tematizam o
pensamento filosófico? O ensino de filosofia está submetido às formas didáticas
tradicionais ou existem formas próprias para o fazer filosófico no ensino médio?
São questões que exemplificam e ensaiam uma descrição dos traços da pesquisa
acadêmica sobre a filosofia e o seu ensino na última década.
Outras questões, contudo, têm acentuado uma relevante tendência nesse
âmbito da pesquisa. Assim, ao indagarmos: qual o papel do professor-filósofo no
ensino médio? O que significa o filosofar como ofício do ensino, o que é o pensamento? Ou, ainda: o que acontece quando a filosofia se põe em relação com a não-filosofia? Referimo-nos a questões que se colocam nos domínios da política e da
epistemologia e que evidenciam o fazer filosófico não só como ato de resistência aos
processos de massificação e exclusão, mas também os sentidos e as formas teóricas
próprias que caracterizam a vocação radical, crítica e criativa da filosofia. Com efeito, verificamos que o enfoque pedagógico, político, epistemológico ou das interfaces construídas entre essas questões, exprimem, em última análise, as ressonâncias
de uma pesquisa voltada antes para os sentidos da filosofia e do fazer filosófico no
ensino médio como atenção constante aos modos de expressão do pensamento.
Daí, então, a necessidade de exceder as questões orientadas pela natureza do currículo para alcançar as dimensões do fazer filosófico como proposição
que justifique o ensino da filosofia enquanto parte essencial de uma proposta
formativa. Significa dizer que os sentidos e os objetivos da filosofia no ensino
médio devem convergir esforços que afirmem um fazer filosófico pautado numa
266
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 265-279, 2018
experiência de pensamento capaz de negar a natureza legisladora do próprio conhecimento, pois “[...] para além do conteúdo concreto a ser ensinado, o que está
em questão é, antes, a necessidade de tornar familiar ao estudante um certo modo
de pensar” (BRASIL, 1999, p. 50).
Seguindo o itinerário das discussões aqui introduzidas, propomos resgatar parte das análises realizadas durante a pesquisa de Mestrado Filosofia e fazer filosófico no ensino médio: ressonâncias e deslocamentos em Deleuze-Guattari. Para
tanto, elegemos como recorte a unidade de contexto “Filosofia e fazer filosófico
no ensino médio”, tendo em conta as discussões que se constituem no campo da
didática, especialmente no que diz respeito aos recursos, ao planejamento e as
unidades teórico-metodológicas que orientam o fazer pedagógico em sala de aula.
2. Sintése do percurso metodológico e da produção de dados
A identificação dos sujeitos participantes da pesquisa foi realizada em
face dos dados obtidos junto à Divisão de Recursos Humanos – DIVRH, da
Superintendência Regional de Ensino de Uberaba-MG, não tendo sido utilizado
como critério de nominação, a situação profissional (efetivos ou contratados) dos
mesmos. A produção dos dados ocorreu mediante a proposição de questionário
escrito para os professores graduados em filosofia e atuantes nas escolas de ensino
médio da rede pública em Uberaba-MG. Dos onze professores identificados pela
DIVRH da SER/Uberaba, somente sete aceitaram o convite e participarem da
pesquisa respondendo por escrito um questionário de roteiro misto (GIL, 2010)
que lhes foi proposto também por escrito.
A proposição do questionário possibilitou-nos não só construir um importante diálogo com as diferentes impressões e percepções que os sujeitos possuem
das variáveis da pesquisa, como, sobremaneira, permitiu-nos alcançar esses modos
de expressão da subjetividade, das crenças e dos valores que constituem os aspectos mais particularizados da realidade desses sujeitos, sem que corrêssemos o risco
da exposição dos pesquisados à influência do pesquisador e sem que o processo final resultasse num acúmulo de informações que, muitas vezes, não oferecem uma
clara visão da perspectiva do sujeito, inviabilizando os procedimentos de análise.
A opção que assumimos pela análise temática como técnica de pesquisa
inscrita no âmbito da metodologia da análise de conteúdo se respalda pelo fato
de que, constituindo-se como uma operação de classificação de elementos por
diferenciação e, seguidamente, pelo reagrupamento desses elementos segundo o
seu gênero, esse procedimento pareceu-nos, ante a realidade do que propomos,
a alternativa mais adequada à análise do conteúdo dos valores, das opiniões, das
atitudes e das crenças produzidas por meio de dados qualitativos.
Quanto ao processo de codificação, a criação dos núcleos de sentido ocorreu em função da expressão dos sentidos implícitos nas unidades de registro. No
que tange às questões fechadas e de classificação de valor, desenharam-se como
unidades de sentido os dados cuja presença ou frequência de aparição configuraram as impressões acerca da realidade estudada.
267
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 265-279, 2018
268
Acompanhando os pressupostos metodológicos apresentados por Bardin
(2010), a condução da análise dos dados envolveu as seguintes etapas: (i) na pré-análise foi estabelecido o primeiro contato com os documentos e a constituição
do corpus, a sistematização das ideias iniciais dispostas pelo quadro referencial
teórico e a pormenorização dos indicadores para a interpretação dos dados produzidos por meio dos questionários; (ii) na exploração do material foram realizados
os recortes dos textos em unidades de registros, sua codificação em unidades de
sentido e a agregação das informações nas unidades temáticas a priori, obedecendo ao processo de classificação disposto no instrumento da pesquisa; (iii) na
etapa de inferência e interpretação foram designados e assimilados os conteúdos
semânticos potenciais contidos nas unidades de contexto.
A produção de dados, cuja análise apresentamos neste texto sob a forma
de notas, foi realizada conforme a descrição a seguir.
Quanto aos recursos didáticos no ensino de filosofia em nível médio, foram construídas as seguintes unidades de registro intermediárias: exposição oral
dos conteúdos; exposição dialogada dos conteúdos; sensibilização dos temas;
problematização dos temas; construção de diálogos em torno das diferentes perspectivas de um tema e/ou problema; debates e júri simulado; livro didático; leitura dos textos filosóficos; elaboração de textos filosóficos; construção de portfólios de leitura e aprendizagem; cinema, música e literatura e livros paradidáticos.
Essas, por seu lado, foram inseridas no questionário na forma de uma questão de
classificação, onde os professores sujeitos da pesquisa indicaram, de acordo com
o uso que fazem destes recursos, a seguinte ordem de recorrência: 2 para o que
mais utilizam, 1 para o que utilizam eventualmente e 0 para o que não utilizam.
Tendo em conta a frequência de aparição dos recursos didáticos, conforme a recorrência 2/1/0, a unidade de sentido - Como ensinar?, evidenciou que as
aulas de filosofia têm se orientado, basicamente, na problematização dos temas
a serem abordados, na exposição oral ou oral dialogada dos conteúdos e na leitura de textos filosóficos. O uso de recursos primários como os livros didático e
paradidáticos tem sido eventual ou não tem se concretizado. O uso de recursos
alternativos como a linguagem cinematográfica, musical ou literária, a construção de portfólios de leitura e aprendizagem, os debates e júri simulado ocorrem
eventualmente ou não ocorrem. Chamou-nos atenção o fato de que tanto a sensibilização dos temas, como a elaboração de textos filosóficos ocorrem apenas de
modo eventual, ou não ocorrem.
No tocante ao problema do planejamento das aulas, construídas as seguintes unidades de registro intermediárias: o Conteúdo Básico Comum – CBC/
Filosofia; o livro didático e outras orientações teórico-metodológicas. Essas, por
sua vez, foram apresentadas no questionário na forma de uma questão de múltiplas alternativas, possibilitando aos sujeitos pesquisados indicarem uma ou mais
opções dentre as unidades teórico-metodológicas utilizadas para o planejamento
das aulas de filosofia.
A construção da unidade de sentido Forma e conteúdo do ensino: planejamento indicou que, quanto planejamento das aulas, os professores respondentes
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 265-279, 2018
do questionário têm se valido do CBC/Filosofia2 e do livro didático; nenhum
professor pesquisado indicou o uso de outras orientações teórico-metodológicas
durante o planejamento das aulas.
Quanto à discussão sobre as unidades teórico-metodológicas que orientam o fazer pedagógico em sala de aula, foram construídas as seguintes unidades
de registro intermediárias: temas, problemas e história da filosofia. No questionário respondido pelos professores sujeitos da pesquisa, essas unidades foram inseridas na forma de uma questão objetiva em que foi solicitado ao professor respondente assinalar apenas uma classe e indicar, na classe assinalada, o/s conteúdo/s
privilegiado/s nas atividades de ensino. A construção da unidade de sentido levou
em consideração o critério da frequência de aparição das unidades teórico-metodológicas e seus respectivos conteúdos.
A unidade de sentido - O que ensinar? sinalizou a recorrência do uso dos
temas e da história da filosofia como orientação sobre o conteúdo a ser ensinado;
nenhum professor pesquisado indicou o uso dos problemas da filosofia como
orientação teórico-metodológica para o ensino da filosofia.
1. Em que pese à liberdade do professor de escolher os procedimentos de ensino
com os quais se identifica e que julga serem os mais apropriados para o desenvolvimento de determinados conteúdos, a opção dos professores respondentes
do questionário pela exposição oral ou oral dialogada dos conteúdos da filosofia,
coloca em destaque uma importante questão: a centralização do ensino nas tradicionais práticas de oralidade como instrumento de transmissão dos conteúdos.
Trata-se de uma questão que tem se demonstrado indispensável aos estudos da
didática, justamente porque coloca sob suspeita uma relação de ensino e aprendizagem baseada mais na assimilação e reprodução do conhecimento do que propriamente não sua crítica e reelaboração.
Convém ilustrar que, desde a proposição das teorias pedagógicas modernas, o foco do debate sobre o ensino foi deslocado para o aluno com o objetivo de
evidenciar o processo da aprendizagem como espaço de interlocução autônoma
e emancipatória do sujeito que aprende. Parece-nos claro que abordar as questões relativas aos procedimentos de ensino não seja algo simples. Pelo contrário,
destacamos a sua complexidade por compreendermos não só o movimento de
circularidade intencional entre professor e aluno, mas, sobremaneira, que o uso de
determinadas práticas de ensino se relaciona de forma direta com as concepções
que se tenham formadas sobre o que significa ensinar.
No caso específico da filosofia, o sentido do ensino como prática fundada
sobre a exposição oral nos alerta para uma prática instrutiva e propedêutica, como
a que orientou o fazer filosófico em toda a história da educação brasileira. A trans2
Partindo das disposições do Parecer CNE/CEB nº 38/2006, da Resolução CNE/CEB nº
04/2006 e das orientações para o ensino de filosofia, publicadas no terceiro volume das Orientações
Curriculares para o Ensino Médio – Ciências humanas e suas tecnologias (BRASIL, 2006), a
Secretaria de Estado de Educação do Governo de Minas Gerais, a par do trabalho de seus consultores,
apresentou em 2007 uma proposta de Conteúdo Básico Comum – CBC com o objetivo de oferecer
parâmetros para o ensino de filosofia no ensino médio.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 265-279, 2018
269
missão dos conhecimentos concernentes a uma tradição filosófica pré-existente
enfatiza uma conduta pedagógica ajustada à clássica ideia do mestre, aquele a
quem se remete a responsabilidade de tornar o conteúdo ensinado acessível àquele
que aprende. Nessa perspectiva, o ensino da filosofia “apresenta exemplarmente o
discurso docente como um pensamento que se exercita diante dos alunos [expressando] uma crença didática muito antiga e arraigada na classe docente, segundo
a qual o aluno aprende a filosofar ouvindo o mestre” (RODRIGO, 2009, p. 72).
Não defendemos aqui o desuso da exposição oral ou oral dialogada dos
conteúdos filosóficos. Ao contrário, registramos a sua validade como forma de
demonstrar o envolvimento pessoal do professor ao apresentar os seus modos de
contextualizar e elaborar esse conhecimento. Em vista disso, a exposição oral e
oral dialogada dos conteúdos pode ser utilizada como recurso de exemplificação
das formas de organização do pensamento e, consequentemente, de orientação
da aprendizagem.
Destacamos ainda que, mesmo quando acompanhada de procedimentos
fundamentais ao seu ensino, como, por exemplo, a problematização dos conteúdos e o uso do texto filosófico, o recurso da aula expositiva ou expositiva dialogada carece de aproximar-se o quanto for possível do sentido mais profundo do
fazer filosófico: a busca. Nesse contexto, o que se destaca não é outra coisa senão
uma determinada concepção de filosofia a ser ensinada. Assim, à medida que
corroboramos em Deleuze e Guattari (2005) uma concepção de filosofia como
teoria da multiplicidade, o fazer filosófico, como o próprio ato de filosofar, deve
alinhar-se ao sentido da busca como expressão da postura crítico-reflexiva e de
inserção criativa no mundo, através do pensamento.
Acerca disto, Marcondes (2004, p. 55-56) assim se pronuncia:
O buscar nos transforma, faz-nos mudar de atitude em relação ao
que sempre fomos, revela as nossas insatisfações, nos impulsiona a
atingir uma nova visão das coisas. [...] Nesse sentido não podemos
ensinar a filosofia, já que não se trata de algo pronto ou acabado, de
um conteúdo informativo que pode ser transmitido e reproduzido.
Mas pode-se ensinar a filosofar no sentido de motivar ou impulsionar
para a busca.
Nesse ponto, destacamos de modo problemático o uso eventual ou o
não uso tanto dos recursos considerados primários, como os livros didático e
paradidático, quanto das linguagens alternativas da literatura, da música e do
cinema como apoio metodológico para o fazer filosófico. Entretanto, destacamos
de modo ainda mais contundente o fato de que tanto a sensibilização dos temas
como a elaboração de textos filosóficos ocorrem apenas de modo eventual, ou
não ocorrem.
Notamos: quando o professor de filosofia assume a prerrogativa do ensino como prática de oralidade, mas não identifica o ponto de partida do processo
de ensino-aprendizagem com a sensibilização do aluno, o que se cria é um intenso desinteresse pelo fazer filosófico (RODRIGO, 2009). A didática centrada
270
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 265-279, 2018
no professor que exercita o seu pensamento diante do aluno não cumpre a tarefa
de despertar o interesse pelo fazer filosófico como experiência concreta de pensamento. O interesse do aluno do ensino médio pelo fazer filosófico precisa ser
construído. Referimo-nos a um processo que se orienta de forma projetiva, como
criação de atos de reconhecimento: estabelecer relações entre o saber filosófico,
as experiências e as referências culturais levadas à sala de aula pelo próprio aluno.
Construir interesses é despertar virtualidades, relações intensas que ligam pontos,
criam conexões entre pessoas, entre coisas, entre problemas; é provocar o que
está entre como o que se põe à análise e compreensão em sua articulação com
diferentes percepções. O espaço da sensibilização como construção de interesses
é precisamente o momento em que o problema filosófico é posto em perspectiva.
A sensibilização é a ação provocativa capaz de mover inquietações e suscitar no aluno a intrusão do signo que força e introduz o pensamento no ato de
pensar (DELEUZE, 2006). Sua ação resulta das diferentes formas de experimentação do signo como corpo impregnado de sentido. Sensibilizar é dar origem ao
movimento crítico-criativo do pensamento como experiência de singularidade,
de associações subjetivas que ligam o sujeito às suas percepções, experiências,
conhecimentos e valores: algo que, como temos notado, exige a reinvenção dos
modos de ser professor.
2. Ao encontro desses apontamentos, verificamos a existência de uma realidade
que, consonante a esse cenário, nos chama a atenção tanto para o distanciamento
entre a formação específica em filosofia e a preparação didático-pedagógica essencial ao exercício do ensino quanto para a reprodução dos modelos construídos ao
longo da formação inicial. Há, portanto, uma primeira questão: a dicotomia entre
o que ensinar e como ensinar. Nesse aspecto, não é raro que os cursos de licenciatura em filosofia privilegiem a formação de especialistas em prejuízo da formação
de professores. A despeito da importância do fazer filosófico como exercício do
pensamento no ensino médio, temos observado uma hierarquização dos objetos de estudo da filosofia e, em consequência disso, a estratificação por grau de
importância dos temas e dos problemas centrais da filosofia e de sua história em
detrimento das questões pedagógicas relacionadas ao ensino. Segundo Rodrigo
(2009, p. 71), “o trabalho docente costuma parecer muito modesto aos olhos do
pesquisador ou do especialista, uma postura elitista que não se sustenta quando
leva em conta sua relevância para a consolidação de um projeto democrático de
acesso ao saber”.
Há, ainda, uma segunda questão: a tendência de se reproduzirem, nas
práticas de ensino, o modelo do mestre: aquele que toma para si, como dever do
ofício, a tarefa de dar transparência às ideias no plano epistemológico, tornando
o conhecimento acessível ao discípulo. O risco que aqui notamos diz respeito à
reprodução da ideia de que a filosofia consiste em um trabalho intelectual muito
difícil e, por isso, inacessível àqueles que não são especialistas. A esse respeito,
alerta Silveira (2007, p. 80): “[...] essa maneira de conceber a filosofia constitui
uma outra forma de preconceito, igualmente conservadora, cujo resultado é sua
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 265-279, 2018
271
banalização, sua desqualificação”. Não se trata, portanto, de liquidar a história das
ideias ou a tradição do filósofo, mas, ao contrário, de torná-las acessíveis na medida em que a sensibilização dos problemas que nos cercam evidencia o sentido da
busca e o desejo pelo conhecimento.
O aspecto problemático dessas questões toma contornos bastante claros
exatamente porque dimensionamos o ensino da filosofia no ensino médio sobre
duas formas teóricas: pensar sem pressupostos (DELEUZE, 2006) e criar conceitos (DELEUZE; GUATTARI, 2005).
A experiência como acontecimento singular, é aquilo que, ao acontecer
ao sujeito, transforma-lhe. É uma película de intensidade, como a condição de
encontro com um signo que atravessa seu pensamento, suas ideias e faz com que
já não possa mais ser o mesmo. Segundo Deleuze e Guattari (2005, p. 143),
“pensar é experimentar, mas a experimentação é sempre o que se está fazendo – o
novo, o notável, o interessante que substituem a aparência de verdade e são mais
exigentes que ela”. Sobre esse sentido, destacamos que não há maneira de pensar
que não seja igualmente a maneira de realizar uma experiência flexiva de tempo e
modo. A experiência do pensamento é a experiência de fazer filosofia. É, portanto, o próprio fazer filosófico como ato concreto, permeado pela intencionalidade,
pelos desejos, pelos discursos e pela singularidade dos sujeitos.
Por seu lado, a criação de conceitos decorre de um processo de existencialização do pensamento. Em outras palavras: a atividade de criação de conceitos
não se produz de modo abstrato, mas na forma imanente e consonante com que
as relações se tecem na própria imanência. A filosofia cria conceitos a partir da posição sempre nova dos problemas, e o modo como se articulam os novos problemas constitui seu estatuto pedagógico. Em suma, o que está em jogo é a produção
de conceitos sempre novos e capazes de responder ao apelo de problemas reais.
A esse respeito, Deleuze e Guattari (2005, p. 16) afirmam:
Os conceitos têm sua maneira de não morrer, e todavia são
submetidos a exigências de renovação, de substituição, de mutação,
que dão à filosofia uma história e também uma geografia agitadas,
das quais cada momento, cada lugar se conservam, mas no tempo, e
passam, mas fora do tempo.
272
Quando afinado com essa perspectiva, o fazer filosófico no ensino médio inclui no horizonte de seu plano a forma do conceito (filosofia), a função
do conhecimento (ciência) e a força da sensação (arte). Para Deleuze e Guattari
(2005), a filosofia, a ciência e a arte constituem as três potências do pensamento
quando “traçam planos sobre o caos” (DELEUZE; GUATTARI, 2005, p. 260).
Este traço sobre o caos, conforme sugerem os filósofos, diz respeito à busca pela
criatividade como função criadora própria do pensamento como “gênese do ato
de pensar no próprio pensamento” (DELEUZE, 2006, p. 203).
Destarte, parece-nos claro que quando assumimos esta orientação, a
apropriação e o uso de diferentes linguagens e recursos de ensino se demonstra
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 265-279, 2018
fundamental para a promoção do encontro com aquilo que nos força a pensar
e nos aproxima da atividade criativa com a qual identificamos a filosofia. Esse
encontro pode se dar com o uso de uma música, de um poema, de um trecho de
filme ou, ainda, no contato com uma obra de arte. O importante, reiteramos, é
que o fazer filosófico se revele como acontecimento: deslocamento de intensidades que permitam o encontro com um signo, um de-fora que força, que invade o
pensamento e abre as fissuras que colocam em evidência os diferentes modos de
pensar a si mesmo e o mundo.
3. A proposta curricular da SEE/MG disciplina os conteúdos programáticos da
filosofia em campos de investigação considerados, pelo documento, “grandes áreas de questionamento e da pesquisa filosóficas” (CBC/Filosofia, 2007, p. 14).
São elas: Ser humano, Agir e Poder, e Conhecer, que, por seu lado, correspondem fundamentalmente às disciplinas de antropologia filosófica, ética, filosofia
política, e teoria do conhecimento. Em cada um desses campos de investigação
são orientados os temas a serem desenvolvidos, bem como os objetivos a serem
alcançados, e as habilidades que se supõe construir no acesso aos conhecimentos
aí circunstanciados.
Sobre a organização do CBC/Filosofia, destacamos como pontos problemáticos: (i) a relação desproporcional entre o volume de conteúdos e a carga
horária da disciplina de filosofia; (ii) a perspectiva unilateral que aborda o conhecimento filosófico somente a partir dos temas da filosofia.
Quanto ao primeiro item, vale destacar que, cumprindo o disposto no
Art. 3º da Resolução nº 1/20093, a carga horária destinada à disciplina de filosofia
no atual currículo do ensino médio4 cumpre apenas o mínimo correspondente a
um módulo-aula semanal que integraliza, ao final do ano letivo, o total de trinta
e três horas e vinte minutos, situação se repete também com as disciplinas de
sociologia e artes.
Há, portanto, uma clara disparidade na relação carga horária/conteúdo
quando identificamos a orientação de dezesseis temas básicos e nove temas complementares para serem distribuídos ao longo de pouco mais de cem horas de
carga horária (considerando a integralização dos três anos do ensino médio). Esse
problema se desdobra, ainda, de outra forma: a desproporcionalidade entre o
repertório de conteúdos orientados pelo CBC/Filosofia e a realidade da carga
horária insuficiente, tenciona o professor a selecionar, entre os temas, aqueles que
serão trabalhados com os alunos. Contudo, não se nota no documento qualquer
indicação de critérios para que essa seleção seja realizada de modo coerente, significativa e com o mínimo de prejuízo da relação de ensino e aprendizagem.
3
Considerando o Parecer CNE/CEB nº 22/2008, a Resolução nº 1, de 15 de maio de 2009,
disciplina a implementação das disciplinas de filosofia e sociologia no currículo do ensino médio,
conforme a edição da Lei nº 11.684/2008, que alterou a Lei nº 9.394/1996 e dispõe que “os sistemas
de ensino devem zelar para que haja eficácia na inclusão dos referidos componentes, garantindo-se,
além de outras condições, aulas suficientes em cada ano e professores qualificados para o seu adequado
desenvolvimento”.
4
Cf. Resolução SEE Nº 2.742, de 22 de Janeiro de 2015.
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 265-279, 2018
273
Quanto ao segundo item, parece-nos questionável, a partir dos argumentos que seguem, a proposição teórica que sustenta a opção de organização temática dos conteúdos da filosofia. A análise e discussão de temas parecem mais
adequadas à faixa etária à qual se destina o programa, pois tornam mais fácil estabelecer relações entre a reflexão filosófica e a experiência do aluno. Países que têm
tradição no ensino da filosofia no nível médio propõem programas temáticos,
como é o caso da França e de Portugal. A História da Filosofia é uma das disciplinas filosóficas, juntamente com a Ética, a Teoria do Conhecimento, a Metafísica,
a Estética e outras. Um programa temático possibilita que várias disciplinas sejam
contempladas, num nível introdutório, incluindo a própria História da Filosofia,
sem, no entanto, privilegiá-la (CBC/Filosofia, 2007, p. 13).
Cumpre, então, questionar: a organização do ensino da filosofia em eixos
temáticos é, de fato, o que determina a aproximação entre “a reflexão filosófica e
a experiência do aluno”? Não seriam as diferentes abordagens didático-metodológicas adotadas pelo professor as responsáveis por mediar esse fazer como experiência filosófica significativa, tendo em conta “a faixa etária à qual se destina o
programa”? Em que medida a orientação dos conteúdos de forma temática afirma
o fazer filosófico como atitude de perceber, problematizar, refletir, conceituar e
argumentar? (CBC/Filosofia, 2007).
Quanto ao livro didático, a recorrência dos questionários apontou para a
adoção do livro “Filosofando: Introdução à Filosofia”, das autoras Maria Lúcia de
Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins. No que concerne o livro indicado,
a opção por uma abordagem temática alinhada à história da filosofia é indicada pelas autoras logo na introdução do material: “[...] optamos pela abordagem
temática dos assuntos, sem, no entanto, descuidar da necessária referência à história da filosofia, que permite estabelecer o fio condutor da exposição dos temas”
(ARRUDA; ARANHA, 2013, p. 4, grifo nosso). Dessa afirmação, destacamos
a expressão “fio condutor”, haja vista que sua incursão elucida uma compreensão
linear da história da filosofia, o que, para nós, compromete a construção de uma
perspectiva da história das ideias e dos conceitos como processo marcado de rupturas e continuidades.
O conteúdo programático se encontra organizado em trinta e um capítulos distribuídos nas seguintes unidades: o homem, o conhecimento, a moral, a
política, as ciências e a estética. Há, também, uma unidade introdutória dedicada
à experiência filosófica e às origens históricas da filosofia. As unidades temáticas
correspondem aos estudos realizados no campo da antropologia filosófica, da
teoria do conhecimento, da filosofia da ciência, da ética, da filosofia política e da
estética. Os capítulos contêm uma proposta de sensibilização geralmente enleada
às diferentes linguagens da arte, um texto básico elaborado pelas autoras, um texto complementar extraído dos grandes autores e exercícios. Em todos os capítulos
evidencia-se um traço comum: a ausência de uma articulação clara entre a cena
274
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 265-279, 2018
artística, o texto autoral e o texto filosófico. Há, ao que parece, um amálgama
entre os temas e as áreas da pesquisa filosófica o que, em certa medida, contribui
para que o livro seja notado mais como uma bricolagem de leituras filosóficas
pouco coordenadas do que como um recurso que favoreça a forma orgânica de
elaboração de problemas.
Chamou-nos atenção o fato de que os questionários apontam para o
eventual ou não uso desse material, mesmo quando a sua a indicação é realizada
trienalmente pelo professor atuante na disciplina, e que a distribuição dos exemplares para alunos e professores ocorre por meio do Programa Nacional Livro
Didático – PNLD37. A prefiguração desse dado assinala tanto uma relação conflitiva entre as dimensões pedagógica e filosófica da prática docente quanto certo
descompasso no que diz respeito ao reconhecimento das funções pedagógicas que
o livro didático pode desempenhar. Acerca dessa conjuntura, destacamos como
hipóteses: (i) a deficiência pedagógica da formação do professor de filosofia; (ii)
o fato de que os livros de filosofia foram inseridos no PNLD somente a partir do
triênio ano de 2012-215.
4. O uso de unidades temáticas para o ensino da filosofia faz incursão a uma
abordagem sistêmica do pensamento e do conhecimento filosófico. Desse ponto
de vista, a organização dos conteúdos filosóficos decorre dos processos de ordenamento e conferência de coesão às diferentes frações do saber filosófico, e do modo
como essas partes de justificam pelas relações orgânicas que mantém entre si, por
sua inscrição no todo. Segundo Rodrigo (2009, p. 43), essa forma de organização programática não só reduz o saber filosófico, como simplifica os produtos do
pensamento “sem que o próprio pensamento seja recuperado do ponto de vista
do movimento que o engendra”.
Sob essa perspectiva, o ensino da filosofia não só reduz o fazer filosófico
ao exercício de articulação e contextualização dos saberes num plano epistemológico maior, como, sobremaneira, coloca em risco a possibilidade de uma experiência filosófica como prática do pensamento e criação de conceitos.
Nesse sentido,
criticar os programas de disciplina calcadas na filosofia sistemática
não significa ir contra a necessidade de sistematização do pensamento
– uma exigência da filosofia e da própria razão humana –, mas
contra uma forma de sistematização empobrecedora para produzir
o desvirtuamento da atividade reflexiva (RODRIGO, 2009, p. 44).
Por seu lado, a abordagem histórica do ensino da filosofia tem se constituído como um aspecto destacadamente problemático quando o que se coloca
em questão é o fazer filosófico no ensino médio. Isso porque a sua adoção como
matriz curricular para o ensino da filosofia no ensino médio, ao mesmo em que
nega o currículo como pluralidade dos processos objetivos e subjetivos de cons275
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 265-279, 2018
trução do conhecimento, reduz o fazer filosófico à forma enciclopédica em que se
baseavam os estudos filosóficos durante a escolástica medieval e a modernidade.
Conforme nos apoiamos em Deleuze (1992, p. 170), compreendemos
que a história da filosofia se constitui como “arte do retrato”5 e, por esse motivo,
implica “não redizer o que o que disse um filósofo, mas dizer o que ele necessariamente subentendia, o que ele não dizia e que, no entanto, está presente naquilo
que diz”. Por isso, notamos: (i) a história da filosofia não deve se inscrever no
plano central do currículo, mas, ao contrário, nos pontos referenciais a partir do
quais se torna possível identificar o modo como os filósofos, ao longo da tradição
filosófica, elaboraram seus problemas; (ii) o uso da história da filosofia como
parte do fazer filosófico no ensino médio, deve suscitar um processo didático-metodológico objetivamente orientado, posto que sua consideração não se revela
como um processo linear, cumulativo e de expansão do conhecimento. Justificando essas perspectivas, Marcondes (2004, p. 61), sugere destacar a história da filosofia “como a história dos conceitos que inicialmente formulados pelos filósofos
acabaram por ir além do âmbito da discussão filosófica e se incorporaram à nossa
forma de pensar, à nossa visão de mundo”.
Ora, se assumimos o ensino da filosofia e o fazer filosófico como experiência de pensamento e criação de conceitos, admitimos, por consequência, que
esses modelos – pelo menos enquanto observados de modo paradigmático –,
pouco dialogam com um programa de filosofia cuja orientação se presta à proposição de rizomas e à criação de espaços lisos de constituição do pensamento. É,
pois, nesse contexto, que a forma do problema se torna referencial ao ensino da
filosofia: partir do problema como aquilo que incomoda, que afeta, sensibiliza e
força o pensamento.
Segundo Gallo (2010, p. 163),
esta abordagem abarca as duas anteriores, na medida em que
permite tanto o acesso aos temas filosóficos mais relevantes quanto
à história da filosofia. Mas também avança para além delas, pois
toma a filosofia como uma ação, uma atividade, posto que se
organiza em torno daquilo que motiva e impulsiona o filosofar, isto
é, o problema.
O ensino da filosofia como fazer filosófico voltado para a experiência do
pensamento e criação de conceitos não deriva de outro ponto, senão da problematização, do modo singular como nos permitimos atravessar por aquilo que causa
perplexidade e produz o ato de pensar no próprio pensamento. A esse respeito,
assinalamos: “Deve-se então partir da realidade destes estudantes, de seu contexto, de sua experiência de vida, de suas inquietações. É preciso ser sensível a seus
dilemas e interesses” (MARCONDES, 2004, p. 65).
Trata-se de fazer nascer no pensamento o ato de pensar como matéria a
ser reconhecida, e orientar-se pedagogicamente nesse sentido não significa ou5
276
Termo utilizado por Deleuze em Conversações (1992).
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 265-279, 2018
tra coisa senão movimentar-se didática e filosoficamente na tentativa de “suscitar
acontecimentos, mesmo pequenos, que escapem ao controle, ou engendrar novos
espaços-tempo, mesmo de superfície ou volume reduzidos” (DELEUZE, 1992,
p. 218). Significa, por fim, dar ao aluno do ensino médio o direito aos seus próprios problemas e conferir-lhe autorização para criar os caminhos de descobertas
que singularmente lhe pertence.
Considerações finais
Os sentidos atribuídos pelos professores participantes da pesquisa aos
contextos em que foram questionados exibiram diferentes leituras para as questões que se inscrevem no campo da didática e para a relação que a filosofia mantém com a educação: nuances da contradição como negação do caráter absoluto
da oposição, e evidência de que o modo como o homem se subjetiva e representa
a si mesmo a partir das diferentes experiências tecidas no espaço/tempo de sua
existência se modifica sempre e em função dos intensos movimentos de recomposição da realidade.
Destacamos a forma fundamental dessas variações avaliando a importância de que o fazer filosófico seja continuamente posto em questão. Para tanto, há
que considerar o duplo movimento entre ensinar e aprender como aquilo que é,
essencialmente, acontecimento; devir. Dito de outro modo: reconhecer a aula de
filosofia como plano de imanência, mapa dos seus próprios problemas e lugar de
multiplicidade; espaços de imprevisilidade que se constituem entre pontos; superfície sobre a qual se deslocam os múltiplos processos de construção dos sentidos
que sustentam o ato educativo.
Trata-se, dessa forma, de pensarmos o fazer filosófico como o domínio
das reflexões realizadas pelos próprios sujeitos que ali se inscrevem. Não como
algo que se possa fazer de outro modo ou lugar, pois é intrínseco ao filósofo-professor. O ensino da filosofia não pode ser pensado senão por aqueles que a
ele se dedicam. Assumir essa forma imanente significa admitir um movimento
contínuo de questionamentos e ideias que conjuram hipóteses e ações, clareiam
significados, reelaboram conceitos, interpretam situações e, bem frequentemente,
inspiram outras versões de ensinar e aprender: subversões.
Na apresentação da obra O que é a filosofia?, Deleuze e Guattari (2005,
p. 9) lançam um profundo olhar sobre o ofício do filósofo e trazem à tona uma
questão fundamental: “o que é isso que fazemos sob o nome de filosofia?” (DELEUZE; GUATTARI, 2005, p. 9, grifo nosso). Ao assumirmos com estes pensadores a dimensão problematizadora do fazer filosófico como uma “pedagogia
do conceito”, assumimos, também, que o ensino da filosofia é um exercício de
comprometimento do professor-filósofo para com os alunos e para com a própria
filosofia. Comprometimento que se efetiva na vivência única e no interesse que
a sala de aula possibilita. Trata-se de olhar as múltiplas subjetividades e singularidades que ali se encontram e ser um pouco de cada uma delas, numa relação
pedagógica, afetiva e empática, como sugeriu Nietzsche nas conferências “Sobre o
futuro dos nossos estabelecimentos de ensino” (1872).
277
Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 265-279, 2018
É, pois, nesse sentido, que nos apoiamos na formulação tardia de uma filosofia como arte de criar conceitos para conceber e afirmar o propósito de um fazer filosófico estético, criativo e postulante de uma intuição originária que amplie
as reflexões sobre o saber e os seus sentidos. “Criar conceitos sempre novos é o
objeto da filosofia. É porque o conceito deve ser criado que ele remete ao filósofo
como aquele que o tem em potência, ou que tem sua potência e sua competência”
(DELEUZE, GUATTARI, 2005, p. 13).
Referências
ALMEIDA, Francis Silva de. Filosofia e fazer filosófico no ensino médio: ressonâncias
e deslocamentos em Deleuze-Guattari. 2016. 172 f. Dissertação (Mestrado em Educação)
–Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Uberaba, 2016.
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando:
Introdução à Filosofia. 5. ed. São Paulo: Moderna, 2013.
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Tradução de Luís Antero Reto e Augusto
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- Francis Silva de Almeida:
Mestre em Educação pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro –
UFTM.
Professor do curso de Pedagogia (EaD) da Universidade de Uberaba.
E-mail: francis.almeida@uniube.br
Currículo: http://lattes.cnpq.br/6092406184518622
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Normas gerais para publicação em Evidência
Evidência: olhares e pesquisa em saberes educacionais é uma revista científica de responsabilidade do ICSAH - Curso de Pedagogia/UNIARAXÁ - Instituto de Ciências da Saúde,
Agrárias e Humanas do Centro Universitário do Planalto de Araxá – que trata de temas
teóricos e práticos da educação, escritos por pesquisadores, docentes e discentes de Cursos de Graduação e de Pós-graduação na área da Educação, ou afins, com natureza de
artigos de cunho científico, de resenhas de obras na área da Educação, de resumos de
dissertações e teses, de entrevistas e de traduções consideradas relevantes.
NORMAS EDITORIAIS
1. Evidência – olhares e pesquisa em saberes escolares, revista anual, publicará trabalhos
de cunho científico em Língua Portuguesa, Espanhola, Francesa ou Inglesa na área da
Educação.
2. O Conselho Editorial só aceitará trabalhos, ainda não publicados em outros veículos de comunicação.
3. Os textos impressos com identificação serão excluídos do processo de avaliação.
A identificação do autor do trabalho dar-se-á pela carta de encaminhamento anexa aos
textos enviados e pelo texto digital.
4. O autor deverá encaminhar à Secretaria Editorial três cópias impressas do trabalho e uma
cópia digital em CD, ou cópia digital, via e-mail – ivanalodi@uniaraxa.edu.br.
5. Os trabalhos enviados à Revista devem ser acompanhados de uma carta de encaminhamento, constando endereço completo, telefone e endereço eletrônico do(s) autor(es)
responsável(is), a área de conhecimento em que o artigo se enquadra, natureza do trabalho, dados gerais: nome completo, última titulação, Instituição e Curso a que pertence(m).
6. O autor deverá, também, enviar uma autorização de cessão dos direitos autorais do
seu texto para a Revista Evidência – olhares e pesquisa em saberes escolares.
7. Evidência reserva para si o direito de proceder a alterações no texto no que diz
respeito a erro de digitação e adequação às normas gramaticais, sem consulta a seu autor.
Qualquer alteração sugerida no texto será efetuada pelo autor.
8. Serão enviados a cada um dos autores (03) três exemplares da revista.
9. Os trabalhos enviados à revista serão, preliminarmente, examinados pelo Conselho
Editorial. Havendo necessidade de reformulação, serão encaminhados ao autor para as
modificações necessárias, com prazo de 15 dias para devolução. Em seguida, serão encaminhados a 02 (dois) membros do Comitê Científico. Aqueles aceitos serão agrupados na
seção em que melhor se enquadrarem, no número da revista que estiver sendo preparado
ou em outro seguinte.
10. O artigo científico deve ter, no mínimo, 08 (oito) páginas e não deve exceder a 20
(vinte) páginas, incluindo tabelas, gráficos, figuras e referências.
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10.1. O artigo deverá ter a seguinte estrutura: introdução, desenvolvimento,
conclusão e referências.
10.2. O título, conciso, deve ser preciso e informativo.
10.3. O artigo escrito em Língua Portuguesa deverá conter um resumo nesta
língua e em Língua Inglesa (Abstract); o artigo escrito em Língua Espanhola, Língua
Francesa ou Língua Inglesa deverá conter, além do resumo na língua de origem, um resumo em Língua Portuguesa, com, no máximo, 150 palavras. As duas versões do resumo
deverão vir acompanhadas de três palavras-chave, em ordem alfabética.
11. A Resenha constitui um parecer crítico sobre qualquer obra na área da Educação.
O autor deve, no máximo de (05) cinco laudas, descrever o assunto ou temas centrais do
livro ou tese, bem como as contribuições que traz ao campo da Educação. Deverá enviar
a obra resenhada para apreciação da resenha.
12. O resumo de dissertação ou de tese não deve exceder a 500 palavras e vir acompanhado de cinco palavras-chave, em ordem alfabética.
13. As colaborações não selecionadas pelo Conselho Editorial/Comitê Científico não
serão devolvidas aos autores. E
14. Os artigos deverão ser encaminhados para publicação no seguinte endereço:
UNIARAXA - Centro Universitário do Planalto de Araxá
A/c da editora: Profa. Ms. Ivana Guimarães Lodi
Av. Ministro Olavo Drummond, 5 - Bairro São Geraldo
CEP 38180-084 - Araxá - Minas Gerais - Brasil
NORMAS PARA APRESENTAÇÃO DOS ARTIGOS
Os trabalhos digitados devem estar de acordo com os seguintes aspectos formais:
1. As páginas deverão ser configuradas da seguinte maneira:
a) Papel: A4
b) Margens: Superior: 3 cm; Inferior: 2 cm; Esquerda: 3 cm; Direita: 2 cm
Observação: uma página em texto corrido equivale a 33 linhas, sem citações em rodapé).
2. Fonte: Times New Roman ou Garamond
a)Tamanhos da Fonte:
Títulos: 20;
Nome do autor, última titulação, instituição a que pertence: 12;
Subtítulos e texto: 12;
Nota de rodapé: 10;
Citações literais com mais de 3 linhas: 10, com afastamento esquerdo de 3 cm.
3. Configuração de parágrafos:
a) Alinhamento do texto: justificado
b) Parágrafo: 1,25
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4. Espaçamento: no texto, entre linhas 1,5; da margem superior ao título, dois espaços; do título para o nome do autor, dois espaços; do nome do autor para o corpo do
texto, dois espaços; do corpo do texto para o subtítulo, dois espaços; do subtítulo para
o corpo do texto, 1 espaço; citações literais, com afastamento: entre linhas simples, com
dois espaços antes e dois depois.
5. Figuras: as ilustrações, quadros, tabelas e gráficos devem ser numerados, em algarismos arábicos, relacionados com suas respectivas legendas, apresentar dimensões não
superiores a 9 cm de altura por 15 cm de altura, para fotos horizontais. Para as verticais,
fazer a equivalência. Enviar cópias digitais, tipo JPEG, em anexo.
6. Citação de fonte: utilizar o sistema autor/data previsto na norma NBR 10.520
da ABNT.
Araxá-MG, setembro de 2014.
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Evidência, Araxá, v. 14, n. 14, p. 281-283, 2018
Evidência
olhares e pesquisa em saberes educacionais
recebe artigos, em fluxo contínuo, para publicação. Os interessados devem
encaminhar sua produção, de acordo com o regulamento e as normas estabelecidas.
Evidência circula anualmente e é lançada, sempre, durante a
Jornada de Educação do Uniaraxá, preferencialmente, no mês de maio, como
tem ocorrido desde seu primeiro número.
As normas para encaminhamento de artigos estão disponíveis na página
eletrônica do Uniaraxá: www.uniaraxa.edu.br.
Endereço para remessa:
Centro Universitário do Planalto de Araxá - Uniaraxá
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