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Comprar Para O Melhor Amigo

Revista Eletrônica de Administração e Turismo - ReAT

O estudo possui o objetivo de verificar se a forma de relacionamento entre donos de cães e gatos e seus animais possui influência no comportamento de compra. A pesquisa utilizou de metodologia quantitativa via survey, com a participação de 599 respondentes de 25 estados brasileiros. Questões sobre antropomorfismo, autoconceito orientado, e objeto/utilidade foram utilizadas para verificar o tipo de relacionamento entre homem-pet, e sobre esforço e disposição de compra para o comportamento de consumo. Os principais achados deste estudo destacam que o tipo de relacionamento afeta o comportamento de compra dos donos de pets. Frente ao exposto, a pesquisa contribui para o avanço na exploração do comportamento de consumo desse segmento de mercado, possibilitando aos gestores e profissionais de marketing desenvolverem estratégias mais assertivas na influência e estímulo de compra dos donos de animais.

COMPRAR PARA O MELHOR AMIGO: RELACIONAMENTO HOMEM-PET E COMPORTAMENTO DE COMPRA1 Michele Raasch Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC micheleraasch@hotmail.com João Henriques de Sousa Júnior Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC sousajunioreu@hotmail.com João Coelho Soares Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC joaocsoares88@gmail.com Weverson Soares Santos Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC weverson_ss@hotmail.com Rudimar Antunes da Rocha Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC rrudimar@hotmail.com RESUMO O estudo possui o objetivo de verificar se a forma de relacionamento entre donos de cães e gatos e seus animais possui influência no comportamento de compra. A pesquisa utilizou de metodologia quantitativa via survey, com a participação de 599 respondentes de 25 estados brasileiros. Questões sobre antropomorfismo, autoconceito orientado, e objeto/utilidade foram utilizadas para verificar o tipo de relacionamento entre homem-pet, e sobre esforço e disposição de compra para o comportamento de consumo. Os principais achados deste estudo destacam que o tipo de relacionamento afeta o comportamento de compra dos donos de pets. Frente ao exposto, a pesquisa contribui para o avanço na exploração do comportamento de consumo desse segmento de mercado, possibilitando aos gestores e profissionais de marketing desenvolverem estratégias mais assertivas na influência e estímulo de compra dos donos de animais. PALAVRAS-CHAVE: Comportamento de compra; Antropomorfismo; Autoconceito. 1 Recepção: Março/2022. Aprovação: Maio/2022. Publicação: Ago/2022. Revista Eletrônica de Administração e Turismo Volume 16 | Número 2 Julho - Agosto / 2022 127 BUYING FOR THE BEST FRIEND: MAN-PET RELATIONSHIP AND SHOPPING BEHAVIOR ABSTRACT The study aims to verify if the form of relationship between dog and cat owners and their animals has an influence on purchasing behavior. The research used a quantitative methodology via survey, with the participation of 599 respondents from 25 Brazilian states. Questions about anthropomorphism, oriented self-concept, and object/utility were used to verify the type of relationship between man-pet, and about effort and willingness to buy for consumption behavior. The main findings of this study highlight that the type of relationship affects the purchasing behavior of pet owners. In view of the above, the research contributes to advancing the exploration of consumer behavior in this market segment, enabling managers and marketing professionals to develop more assertive strategies for influencing and encouraging purchases by pet owners. KEYWORDS: Buying behavior; Anthropomorphism; Self-concept. INTRODUÇÃO A relação entre seres humanos e animais não é recente, desde os primórdios da espécie humana há registros de vários tipos de relacionamentos que foram estabelecidos, alguns encontram-se gravados em pinturas rupestres, por exemplo. Conforme estudos diversos, o relacionamento entre essas espécies é capaz de produzir diversos sentimentos em seus donos, como: bem-estar (BELK, 1996; BAO; SCHREER, 2016; KYLKILAHTI et al., 2016); amor incondicional (BELK, 1996; HOLBROOK et al., 2001; HOLBROOK, 2008; KYLKILAHTI et al., 2016; HOFFMAN et al., 2018); lealdade e confiança (BELK, 1996; BOYA; DOTSON; HYATT, 2012; HOFFMAN et al., 2018). Tais sentimentos fazem com que os donos de animais de estimação se aproximem cada vez mais de seus pets. E se encontrem dispostos a consumir e gastar, uns mais que outros, por produtos e serviços para seus animais (BELK, 1996; HOLBROOK, 2008; LUE; PANTENBURG; CRAWFORD, 2008; BOYA et al., 2012; CHEONG; YI, 2015; KIRK, 2019; SCHLEICHER; CASH; FREEMAN, 2019). Nesse sentido, compreender o comportamento de compra de donos de animais é cada vez mais crítico para o marketing (KUMCU; WOOLVERTON, 2015). É salutar destacar que os animais de estimação desempenham um papel cada vez mais importante na vida dos consumidores e na economia (KIRK, 2019). O Brasil é o segundo maior mercado pet mundial, atrás apenas dos EUA, com faturamento de US$ 20,3 bilhões em 2018 (Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação, 2019). No tocante aos gastos com esses animais, aponta-se que o gasto médio mensal com cães de todos os portes é de R$ 338,76, enquanto o mesmo gasto com gatos gira em torno de R$ 196,56 (IPB, 2019). No Brasil, há uma estimativa de que existiam 54,2 milhões de cães e 23,9 milhões de gatos no Revista Eletrônica de Administração e Turismo Volume 16 | Número 2 Julho - Agosto / 2022 128 ano de 2018 (ABINPET, 2019). Tais números impressionam ao se constatar que, por exemplo, consumidores norte-americanos que são donos de cães tendem a ter gastos distintos a depender da forma como se relacionem com seus animais (BOYA et al., 2012, 2015). Nesse contexto, pautando-se nos estudos supracitados, na recomendação de estudos futuros de Boya, Dotson e Hyatt (2012), e Cheong e Li (2015), da teoria e os dados levantados do cenário pet no Brasil, percebe-se a relevância deste mercado para o cenário nacional. Assim, pesquisas empíricas direcionadas para este segmento de mercado no Brasil são necessárias para auxiliar gestores na tomada de decisão e no posicionamento de mercado, enquanto que pesquisas voltadas para o marketing do setor pet podem servir de base empírica para os profissionais de marketing desenvolverem estratégias mais assertivas e direcionadas para o público-consumidor. Com isso, o objetivo desta pesquisa foi verificar se a maneira como os donos e seus animais de estimação se relacionam possui alguma relação com o comportamento de compra dos donos de animais de estimação, verificando possíveis fatores que influenciam em tais comportamentos. Aqui serão considerados apenas cães e gatos como animais de estimação ou pets. REFERENCIAL TEÓRICO Relacionamento homem-pets O aumento no consumo de produtos e serviços para pets, assim como a quantidade de tempo e energia gastos com o animal, indicam para um relacionamento de proximidade, de companheirismo, amor e de afeto entre donos e seus bichos (DOTSON; HYATT, 2008; HOLBROOK, 2008). Pessoas que possuem animal de estimação se mostram mais satisfeitas com a vida do que pessoas que não possuem pet (BAO; SCHREER, 2016), bem como encontram-se dispostas a alterar suas rotinas, seus padrões de vida e seus hábitos por conta da presença de seu animal de estimação (BELK, 1996; HIGGINS et al., 2013). Os animais de estimação são vistos como objetos principalmente por aquelas pessoas que os consideram literalmente como animais de estimação. Geralmente estes donos adestram seus animais como forma de comando ou então como uma peça colecionável como, por exemplo, um brinquedo (BELK, 1996). Esse tipo de relação faz com que o animal seja reduzido, por vezes, a um papel de cumprir o status do seu dono, um ornamento, um objeto de exibicionismo de riqueza e poder, ou ainda como vocação para competições (HIRSCHMAN, 1994). Em contrapartida, a companhia do pet para o indivíduo transcende os limites entre humanos e animais, atribuindo emoções humanas e até características humanas a seus animais (HIGGINS et al., 2013). Nessa perspectiva, cães e gatos são vistos pelos seus donos como membros da família, como amigos, filhos, irmãos, companheiros de brincadeiras, colaborando para a sua felicidade e transcendendo um amor incondicional por seus companheiros (BELK, 1996; DOTSON; HYATT, 2008; HIGGINS et al., 2013; HIRSCHMAN, 1994; HOLBROOK et al., 2001; HOLBROOK, 2008). Revista Eletrônica de Administração e Turismo Volume 16 | Número 2 Julho - Agosto / 2022 129 Os cães e os gatos são os animais mais humanizados e antropomorfizados que existem (HIRSCHMAN, 1994). O antropomorfismo ocorre desde a escolha de um nome humano ou através da conversa de humanos com seus animais como se eles fossem humanos (BELK, 1996). Por tudo isso, o antropomorfismo representa a necessidade de um esforço de marketing importante, pois os donos dos animais aplicam as suas preferências pessoais e humanas na compra de produtos para o seu animal de estimação (BOYA et al., 2012). Para Holbrook et al. (2001), a relação humano-animal não gera posses, mas sim uma série de oportunidades para os humanos envolvidos na relação com o animal e na experiência de consumo desenvolvida por esta relação. Os autores Dotson e Hyatt (2008), responsáveis pela primeira pesquisa quantitativa a respeito da companhia cão-humano, identificaram sete dimensões que refletem essa relação: i) relação simbólica; ii) eu estendido/autoconceito orientado a cães; iii) antropomorfismo; iv) atividade/juventude; v) limites; vi) compras especiais; e vii) disposição a se adaptar. Essas duas últimas estão ligadas ao comportamento de compra dos donos de cães. Distinções entre os sentimentos produzidos na relação de companhia do homem com seu animal de estimação podem ocorrer entre donos de cães e de gatos (BAO; SCHREER, 2016; HOFFMAN et al., 2018; LUE et al., 2008). Essas distinções podem refletir no comportamento de compra dos donos de animais de estimação. Comportamento de compra de donos de animais de estimação Os motivos que levam as pessoas a realizarem uma compra baseiam-se em um estado de ser desejado; se esse for o relacionamento próximo com seu animal de estimação, o tipo de compra realizada corresponderá a esse estado (BOYA et al., 2012). A pesquisa de Cheong e Yi (2015), por exemplo, indica que quando os donos de pets consideram seus animais como uma extensão de si mesmos, eles tendem a tomar decisões de compra como se estivessem consumindo para si. Os autores Boya et al. (2012) identificaram três grupos de segmentos para donos de cães americanos, que diferem em comportamento de compra e relacionamento entre homem e animal de estimação: i) proprietários fortemente conectados; ii) proprietários moderadamente conectados; iii) proprietários básicos. Já o estudo de Boya, Dotson e Hyatt (2015) segmentou o mercado de cães baseado na relação cão-humano, e verificaram a existência de diferença significativa na natureza da relação entre cães e seus donos, possibilitando a segmentação deste mercado com base no antropomorfismo e eu estendido. A relação entre o consumidor e seu animal de estimação parece ser um fator importante no comportamento de compra de produtos para esses animais de estimação (SCHLEICHER et al., 2019). Nesse ínterim, as pessoas estão se mostrando cada vez mais ligadas a seus pets, mais exigentes e envolvidas quando o assunto é a compra de produtos e serviços para o seu animal de estimação, culminando no entendimento de que o preço já não é mais um critério essencial de compra (BOYA et al., 2015; SCHLEICHER et al., 2019). Finalmente, o resultado da pesquisa de Kylkilahti et al. (2016) com donos de cães da Finlândia mostra que os animais de estimação agem como co-consumidores de produtos, Revista Eletrônica de Administração e Turismo Volume 16 | Número 2 Julho - Agosto / 2022 130 serviços e experiências. As escolhas de compra e atividades além do consumo feitas por eles, donos, levam em consideração a existência do animal de estimação como, por exemplo, a compra de um carro, o local de trabalho, onde morar, com quem se relacionar e, como resposta, o animal de estimação retribui ao seu dono com amor, carinho, companheirismo e bem-estar (KYLKILAHTI et al., 2016). Percebe-se que a literatura apresenta indícios de que os donos de pets possuem um comportamento de compra que condiz com a forma como ele se relaciona com seu animal de estimação. De acordo com os resultados das pesquisas apresentados, e com a teoria a respeito do relacionamento entre humano-pet, percebe-se que o cão e/ou gato, não são apenas animais de estimação para seus donos, os indivíduos os veem como reflexo de si próprios. Tais sentimentos podem impactar no comportamento destes consumidores, seja no consumo de produtos, serviços ou até mesmo de experiências. Como é esse comportamento de compra? Quais as variáveis que podem influenciá-lo? É o que a literatura precisa identificar para assim desenvolver a teoria e auxiliar os profissionais de marketing. Diante do exposto, formulou-se a primeira hipótese de pesquisa: H1: A distribuição do relacionamento com o animal de estimação difere entre os grupos de comportamento de compra. Estudos anteriores já apontaram a importância de analisar as possíveis diferenças dos fatores demográficos no comportamento de compra (JAMES; HU; LEONCE, 2019; VINASSA et al., 2020). Para Hult et al., (2019) variáveis demográficas, como o gênero, a idade e a escolaridade do cliente são importantes, pois esses possivelmente afetam a forma como as pessoas compram. Uma das variáveis comumente utilizadas para verificar possíveis diferenças no comportamento do consumidor é o gênero. Por apresentar características distintas, para Hult et al. (2019), as mensagens de marketing e as interações entre empresas e clientes podem ser adaptadas visando garantir a satisfação dos diferentes gêneros. Entretanto, já foi observado na literatura resultados onde o gênero não influenciou estatisticamente a intenção de compra (JAMES et al., 2019); não influenciou no comportamento de compra, mas influenciou no tipo de relacionamento com o cão (BOYA et al., 2012; DOTSON; HYATT, 2008). Assim, decidiuse formular a segunda hipótese do estudo: H2a: Há diferença significativa de gêneros em relação ao comportamento com o animal de estimação. H2b: Há diferença significativa de gêneros em relação ao comportamento de compra. A literatura aponta que a renda é uma variável importante que pode afetar as decisões de compra dos consumidores (JAMES et al., 2019). Em seu estudo, Kumcu e Woolverton (2015) observaram que a renda impacta no comportamento de compras, especificamente de rações premium. Entretanto, em James, Hu e Leone (2019) não foi observada influência da renda na intenção de compra. Assim como no estudo de Boya et al. (2012), onde a renda não influenciou no comportamento de compra e no relacionamento entre o cão e seu dono. Diferenças podem ser encontradas, mas sem significância estatística, o que pode significar a simples distinção da disponibilidade de recursos financeiros entre os indivíduos (DOTSON; HYATT, 2008). Desta forma, com base na literatura e por acreditar que ainda se faz necessário verificar a possível influência da renda, formulou-se a terceira hipótese do estudo: H3a: Há Revista Eletrônica de Administração e Turismo Volume 16 | Número 2 Julho - Agosto / 2022 131 diferença significativa da renda em relação ao comportamento com o animal de estimação. H3b: Há diferença significativa da renda em relação ao comportamento de compra. A literatura sugere que a escolaridade influencia o comportamento de compra (JAMES et al., 2019; KUMCU; WOOLVERTON, 2015). Os resultados de Kumcu e Woolverton (2015) apontaram que escolaridade apresentou impacto positivo na compra de rações premium. Conforme Vinassa et al. (2020) o processo de tomada de decisão de compra do dono de um animal pode ser fortemente influenciado pelo seu nível de escolaridade. Pessoas com menos escolaridade podem se comportar de maneira diferente daquelas com ensino superior em relação a como fazem suas compras (HULT et al, 2019). A escolaridade pode ainda afetar na forma como o cão e seu dono interagem, uma maior interação foi identificada em indivíduos com ensino superior, assim como indivíduos com pósgraduação apresentaram maior tendência a adaptar seu estilo de vida em razão do seu cão, de acordo com o estudo de Dotson e Hyatt (2008). Porém o estudo de Boya et al. (2012) não identificou influencia da escolaridade no comportamento de compra, ou no relacionamento entre cão e seu dono. Com base na literatura já existente e nos objetivos da pesquisa, decidiuse formular a hipótese quatro do estudo: H4a: Há diferença significativa da escolaridade em relação ao comportamento com o animal de estimação. H4b: Há diferença significativa da escolaridade em relação ao comportamento de compra. A literatura também sugere um provável efeito da idade no comportamento de compra de donos de animais de estimação (KUMCU; WOOLVERTON, 2015); assim como sugere que este efeito não é significante, conforme identificaram Boya et al. (2012). Mas sabe-se que consumidores mais jovens geralmente apresentam características distintas dos demais grupos etários, como uma maior consciência social (JAMES et al., 2019); maior disponibilidade para adaptar seu estilo de vida em função do seu pet (DOTSON; HYATT, 2008). O que leva a acreditar que a faixa etária pode influenciar no comportamento de compra. O estudo de Vinassa et al. (2020) revelou diferenças na influência de características dos alimentos para animais de estimação na intenção de compra, dependendo da idade dos respondentes: os idosos não costumam considerar importante o uso de embalagens recicláveis, característica esta considerada importante para os mais jovens, o que pode refletir um maior nível de consciência dos impactos ambientais nessa faixa etária. Consonantemente, os resultados de James et al. (2019) apontam que a idade está negativamente associada a intenção de compra de produtos orgânicos. Já Kumcu e Woolverton (2015) descobriram que os consumidores jovens são mais propensos a comprar alimentos premium para seus animais de estimação. Assim, decidiu-se formular a quinta hipótese do estudo: H5a: Há diferença significativa da idade em relação ao comportamento com o animal de estimação. H5b: Há diferença significativa da idade em relação ao comportamento de compra. A presença de filhos também pode influenciar o comportamento. Famílias sem filhos são mais comumente associados à humanização de animais de estimação (KUMCU; WOOLVERTON, 2015). Possuem seus animais de estimação como substitutos de crianças, e como bons companheiros (DOTSON; HYATT, 2008). Revista Eletrônica de Administração e Turismo Volume 16 | Número 2 Julho - Agosto / 2022 132 Em seu estudo Kumcu e Woolverton (2015), observaram que casais sem filhos compram menos alimentos premium para seus pets do que casais com filhos. A presença, ou inexistência de filhos também é um influenciador na forma de interação entre cães e seus donos (DOTSON; HYATT, 2008). Assim, decidiu-se formular a sexta hipótese do estudo: H6a: Há diferença significativa da presença de filhos em relação ao comportamento com o animal de estimação. H6b: Há diferença significativa da presença de filhos em relação ao comportamento de compra. O tipo de animal também pode ser um indicativo do comportamento. O estudo de Kirk (2019) revela que consumidores atribuem maior valorização econômica aos cães do que aos gatos. O tipo de animal de estimação também pode possuir relação com as características de seus donos, onde quem possui cães são mais extrovertidos em relação a donos de gatos (BAO; SCHREER, 2016). Os resultados de Vinassa et al. (2020) sugerem diferenças entre donos de cães e gatos em relação a compra de ração para seu animal, onde as características externas da ração (aparência e cheiro) possuem maior influência na intenção de compra para proprietários de gatos, enquanto os donos de cães expressam mais interesse na composição nutricional da ração. Desta forma, decidiu-se por formular a sétima e última hipótese do presente estudo: H7a: Há diferença significativa do tipo de animal em relação ao comportamento com o animal de estimação. H7b: Há diferença significativa do tipo de animal em relação ao comportamento de compra. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS O presente estudo emprega uma abordagem quantitativa, com coleta de dados realizada via survey. A amostra foi selecionada pela técnica de amostragem não probabilística por conveniência. A coleta de dados foi realizada on-line, entre os dias 02 de fevereiro de 2020 a 06 de abril de 2020, através da divulgação do questionário em mídias sociais (ex. Facebook, WhatsApp e Instagram) dos pesquisadores/autores. Foi solicitado aos respondentes que encaminhassem o questionário para outras pessoas que possuíssem cães e/ou gatos e que fossem maiores de 18 anos, para que assim o mesmo fosse disseminado para diversas regiões do Brasil. A amostra final é composta por 599 questionários válidos, com respondentes de 24 estados do Brasil e do Distrito Federal (apenas os estados do Maranhão e Roraima não tiveram respondentes). O questionário utilizado possui 32 itens, sendo 24 para o levantamento de dados a respeito das dimensões relacionadas ao comportamento com o animal de estimação (antropomorfismo, objeto/utilidade e eu estendido/autoconceito) e 8 relacionadas ao comportamento de compra. Para estes itens foi utilizada a escala Likert de 7 pontos, onde 1 refere-se a discordo fortemente e 7 concordo fortemente com as afirmativas apresentadas. As dimensões e os itens do questionário, presentes no Quadro 1, foram identificadas, traduzidas (tradução reversa), analisadas e adaptadas buscando a compatibilidade com o tema e o contexto da atual pesquisa. Revista Eletrônica de Administração e Turismo Volume 16 | Número 2 Julho - Agosto / 2022 133 Quadro 1 – Dimensões, definições e principais autores Dimensão Itens Antropomorfismo 9 Eu estendido/autoconceito 5 Objeto/utilidade 10 Comportamento de compra 8 Definição Autores Hirschman (1994); Humanização do animal, ele é parte da família, é visto Dotson e Hyatt (2008); como uma criança, há comunicação com o animal, Boya, Dotson e Hyatt oportunidade de aprendizado (2012) Animal é uma extensão do dono e ao mesmo tempo seu melhor amigo, seus donos tendem a passar menos tempo com outras pessoas pela presença do animal, se Dotson e Hyatt (2008) relacionam melhor com pessoas que aceitam seu pet ou que possuem um animal Hirschman (1994); Posse do animal possui uma finalidade utilitária, ele é Boya, Dotson e Hyatt visto como um meio para atingir o ego do seu dono (2012) O esforço e disponibilidade de gastar com seu animal, Boya, Dotson e Hyatt capaz de proporcionar uma segmentação psicográfica (2012) de acordo com o comportamento de compra Fonte: autoria própria. As variáveis do questionário foram elaboradas a partir dos estudos de Hirschman (1994), Dotson e Hyatt (2008) e Boya et al. (2012). As afirmativas do questionário foram traduzidas para o português e, posteriormente, realizou-se o pré-teste com dois pesquisadores da área de marketing. Os pesquisadores analisaram o questionário completo e sugeriram pequenas alterações no texto. Foram realizados os ajustes necessários, e realizado novo pré-teste, no qual não foram encontradas novas correções a serem feitas. Após a realização do pré-teste deu-se início a coleta de dados. O questionário também abordou 12 questões demográficas (gênero, faixa etária, renda, escolaridade) e a respeito da presença de filhos, tipo de animal de estimação. Estas questões foram levantadas visando obter mais informações a respeito do comportamento afetivo e do comportamento de compra em relação a estas variáveis. Para a validação da tradução e do questionário em si, foi realizado além do pré-teste, análise estatísticas de confiabilidade. Para a análise dos dados, foi realizado o teste de confiabilidade de alfa de Cronbach com valores esperados ≥ 0,70 (Hair et al., 2009). Foi realizado análise de agrupamento para agrupar em dimensões o comportamento de compra, para isso utilizou-se da classificação hierárquica com o método de Ward e a distância euclidiana quadrada. O teste de Kruskall-Wallis (ρ≤0,05) foi utilizado, conforme orienta Hair et al. (2009) e Field (2009), para a verificação do tipo de relacionamento com o comportamento de compra (H1). E para as demais hipóteses foram realizados tanto o teste de Kruskall-Wallis (H6a, H6b, H7a, H7b) quanto o teste de Mann-Whitney (Ha2, H2b, H3a, H3b, H4a, H4b, H5a, H5b) com valor esperado de ρ<0,001 (Hair et al., 2009). Para este estudo foram utilizados a plataforma Google Docs para coleta de dados e o software SPSS® versão 22.0 para os cálculos estatísticos. Revista Eletrônica de Administração e Turismo Volume 16 | Número 2 Julho - Agosto / 2022 134 RESULTADOS De acordo com as regiões do Brasil o estudo é composto por uma amostra que corresponde a: 62% sul; 24% sudeste; 7% nordeste; 4,5% centro-oeste; 2,5% norte. A maioria dos respondentes se identificou como do sexo feminino 89,5% (n=536); 31,5% (n=188) na faixa etária de 25 até 29 anos; 32% (n=192) declararam ser solteiro (a); 8,5% (n=482) não possui filhos; 61% (n=366) possui pós-graduação; 25% (n=149) possui renda em torno de R$ 2.090,01 até R$ 3.135,00. Quanto as características relacionadas com o animal de estimação, 47,5% dos respondentes (n=285) indicou ter apenas cachorro, 29,5% indicou ter apenas gato (n=177) e 23% indicou ter tanto cachorro quanto gato (n=137). Para iniciar as análises estatísticas que envolveram os construtos utilizados na pesquisa, foi realizado o teste de confiabilidade de alfa de Cronbach, realizado individualmente, visando garantir a validade interna dos construtos possibilitando a sequência das análises. A análise fatorial exploratória não foi realizada, uma vez que as variáveis e suas dimensões já obtiveram suas validades confirmadas nos construtos por estudos anteriores (BOYA et al., 2012, 2015; DOTSON; HYATT, 2008; HIRSCHMAN, 1994). A Tabela 1 apresenta os resultados encontrados. Tabela 1 – Alfa de Cronbach Comportamento de compra Alfa de Cronbach 0,774 Fonte: dados da pesquisa Antropomorfismo 0,868 Autoconceito/ Eu estendido 0,739 Objeto/Utilidade 0,765 Os dados apresentaram confiabilidade interna (alfa de Cronbach >0,7), permitindo o prosseguimento das análises estatísticas. Foram analisadas as médias e desvio padrão das variáveis de relacionamento animal-humano, a Tabela 2 apresenta os resultados. Tabela 2 – Análise descritiva das variáveis de relacionamento animal-humano ANTROPOMORFISMO AN1 AN2 AN3 AN4 AN5 AN6 AN7 AN8 AN9 Variável Eu vejo meu cão/gato mais como uma pessoa do que um animal. Sinto que posso me comunicar com meu cão/gato. Meu cão/gato faz parte da minha família. Meu cão/gato é como uma criança para mim. Eu aprendo muito com meu cão/gato. Tenho as mesmas responsabilidades de um pai/mãe quando se trata de cuidar do meu cão/gato. Eu gosto de mimar meu cão/gato. Eu gosto de comemorar o aniversário do meu cão/gato. Se meu cão gato fosse uma pessoa, ele seria muito parecido comigo. M DP V 5,20 2,041 4,165 6,24 6,66 5,63 6,10 1,200 0,865 1,984 1,447 1,440 0,749 3,937 2,093 5,86 1,684 2,837 6,03 3,71 1,502 2,413 2,257 5,824 5,48 1,826 3,333 MC 5,65 Revista Eletrônica de Administração e Turismo Volume 16 | Número 2 Julho - Agosto / 2022 135 EU ESTENDIDO/ AUTOCONCEITO Meu cão/gato é meu melhor amigo. 5,30 Passar um tempo com meu cão/gato me impede de passar 2,79 tempo com outras pessoas. AC3 Meu cão/gato me ajudou a desenvolver melhores relacionamentos com outras pessoas que também possuem 4,73 cão/gato. AC4 Eu não estou disposto a estabelecer relacionamentos com 5,69 alguém que não está disposto a aceitar meu cão/gato. AC5 Meu cão/gato é uma extensão de mim mesmo. 4,92 OB1 A principal razão pela qual eu tenho um cão/gato é pela 2,24 proteção. OB2 Meu cão/gato é principalmente um guarda. 2,03 OB3 Eu escolhi meu cão/gato porque ele parece legal. 3,33 OB4 Eu valorizo meu cão/gato principalmente por sua aparência. 2,21 OB5 Tenho um cão/gato exótico, o que me torna diferente dos 1,71 demais. OB6 Meu cão/gato possui pedigree, faço questão de deixar isso 1,26 claro. OB7 Meu animal de estimação recebe cuidados especiais para 1,26 exposições e eventos. OB8 Realizei alguma mudança no visual (cauda/orelha) do meu 1,13 cão/gato porque eu gosto. OB9 Meu cão/gato serve principalmente como guia. 1,16 OB10 Tenho meu cão/gato como forma de terapia. 3,52 Legenda: M (média); DP (desvio padrão); V (variância); MC (média do construto) Fonte: dados da pesquisa OBJETO AC1 AC2 1,929 3,721 1,984 3,938 2,130 4,538 1,899 3,607 2,131 4,540 1,724 2,972 1,649 2,257 1,676 2,720 5,094 2,810 1,548 2,397 0,915 0,838 1,023 1,047 0,724 0,525 0,726 2,241 0,527 5,022 4,68 1,98 A análise dos dados referente ao relacionamento com o animal de estimação percebe-se que as médias para as variáveis antropomorfismo (m=5,65) e eu estendido (m=4,68) possuem valores que corroboram para afirmar que a amostra antropomorfiza e vê seu animal com um eu estendido/autoconceito. A dimensão objeto/utilidade apresenta médias que demostram que a amostra pesquisada não vê o seu animal de estimação como um objeto, ou como uma utilidade, dada a média de 1,98. O comportamento de compra dos donos de cães e gatos foi analisado através da criação de agrupamentos em três dimensões. O Grupo 1 (n=336, m=4,80) denominado Compras Moderadas é composto por donos de animais de estimação que estão entre os extremos, não apresentam a máxima concordância e nem discordância com as questões postas. De acordo com as médias as características das pessoas que estão neste grupo são principalmente a influência do animal de estimação na configuração da sua casa (m=5,88), ou seja, no momento de adquirir objetos para casa, alterar o layout, até mesmo penar em mudar imóvel, o animal de estimação será considerado. Outra característica forte é a compra de comida saudável (m=5,69), a compra de produtos especiais (m=5,40) e a insignificância do fator preço (m=5,40). Pessoas desse grupo não consideram o animal de estimação na escolha de um veículo (m=1,42). Revista Eletrônica de Administração e Turismo Volume 16 | Número 2 Julho - Agosto / 2022 136 O Grupo 2 (n= 127, m=577) denominado Compras Dedicadas, é composto por pessoas com os mais altos níveis de pontuação média nas afirmativas do comportamento de compra. Pessoas desse grupo consideram seu animal de estimação na configuração da casa (m=6,48), assim como na compra de veículos (m=6,09), o preço é insignificante (m=5,80) perante outras qualidades, compram comida saudável (m=5,78), presentes (m=5,73), produtos especiais (5,63) para seus animais. Além disso frequentam o veterinário regularmente (5,56), e considera, gastar muito dinheiro com seus companheiros (5,13). O Grupo 3 (n=136, m= 3,12) denominado Compras Desconectadas é composto pelas menores médias de pontuação identificadas. Pessoas neste grupo apontaram não gastar muito dinheiro com seu animal de estimação (m=2,91), assim como não levam seu animal ao veterinário com frequência (2,92), tampouco consideram o animal na escolha de um veículo (m=1,42). Raramente a presença do animal de estimação afetou na configuração de suas casas (m=4,29). A Tabela 3 apresenta os resultados estatísticos dos grupos. Tabela 3 – Agrupamento variáveis comportamento do consumidor Variável O preço não é problema quando se trata de cuidar do meu cão/gato. Eu gasto muito dinheiro com meu cão/gato. Encontro produtos especiais para meu cão/gato. Eu gosto de comprar presentes para meu cão/gato. Eu compro a comida mais saudável para meu cão/gato independente do preço. Eu levo meu cão/gato ao veterinário regularmente. Possuir um cão/gato alterou a configuração da minha casa. Ter um cão/gato já influenciou na escolha de um veículo. Totais (média) Legenda: M (média); DP (desvio padrão) Fonte: dados da pesquisa Grupo 1 Compras Moderadas M DP Grupo 2 Compras Dedicadas M DP 5,40 1,419 5,80 1,475 3,98 1,468 4,49 5,40 5,09 1,518 1,389 1,853 5,13 5,63 5,73 1,517 1,338 1,422 2,91 3,09 3,18 1,319 1,653 1,695 5,69 1,096 5,78 1,339 3,32 1,618 5,11 1,791 5,56 1,587 2,92 1,760 5,88 1,718 6,48 0,898 4,29 2,379 1,42 1,025 6,09 1,211 1,29 0,885 4,80 5,77 Grupo 3 Compras Desconectadas M DP 3,12 Para a análise da possível relação entre variáveis relacionadas ao comportamento de compra com a forma de relacionamento entre donos e seus pets, foram realizadas as análises das médias quanto para as variáveis de relacionamento para cada grupo. Para análise de H1, e verificação da relação entre o tipo de relacionamento com o comportamento de compra foi realizado o teste de Kruskall-Wallis, seguindo as determinações de Hair et al. (2009) e Field (2009). Para verificação dos grupos com distribuição diferente foi analisado o Post-Hoc com a comparação de pares. A Tabela 4 apresenta os resultados encontrados. Revista Eletrônica de Administração e Turismo Volume 16 | Número 2 Julho - Agosto / 2022 137 Tabela 4 – Relacionamento com o animal de estimação e o comportamento de compra: teste Kruskall-Wallis OBJETO EU ESTENDIDO/ AUTOCONCEITO ANTROPOMORFISMO Variável AN1 AN2 AN3 AN4 AN5 AN6 AN7 AN8 AN9 AC1 AC2 AC3 AC4 AC5 OB1 OB2 OB3 OB4 OB5 OB6 OB7 OB8 OB9 OB10 Grupo 1 M MC 5,21 6,30 6,74 5,77 6,16 5,67 5,97 6,02 3,65 5,26 5,46 2,71 4,76 4,71 5,76 4,86 2,13 1,89 3,22 2,15 1,59 1,93 1,24 1,23 1,11 1,12 3,63 Grupo 2 M MC 5,85 6,57 6,90 6,49 6,61 6,24 6,47 6,41 4,91 5,95 6,28 3,63 5,57 5,54 6,38 5,85 2,46 2,17 3,65 2,43 2,12 2,17 1,29 1,38 1,13 1,17 3,95 Grupo 3 M 4,54 5,79 5,79 4,74 5,44 5,02 5,25 2,74 4,78 4,77 2,19 3,87 4,90 4,18 2,31 2,26 3,29 2,15 1,62 1,26 1,24 1,18 1,24 2,87 Q2 df Sig. 26,701 25,333 39,472 33,570 37,903 46,798 42,834 54,787 21,955 42,002 38,778 36,002 38,788 40,008 4,655 6,402 3,776 3,930 8,933 0,452 4,783 1,106 1,820 18,338 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,098 0,041 0,151 0,140 0,011 0,798 0,092 0,575 0,402 0,000 MC 4,89 3,98 1,94 Legenda: M (média); MC (média do construto) Fonte: dados da pesquisa A partir das médias apresentadas para a relação de cada das variáveis comportamentais pode-se perceber novamente as baixas médias para o relacionamento com o animal de estimação como um objeto/utilidade, corroborando com as análises das médias de respostas. Ou seja, nenhum dos grupos considera como comportamento a relação animal-humano como objeto, nem mesmo as pessoas do Grupo 3 com menor comportamento de compra direcionado para o animal. O teste de Kruskall-Wallis mostra que existe efeito significativo entre o comportamento de compra e o relacionamento de antropomorfismo e de autoconceito com o animal de estimação (ρ≤0,05), mas não há efeito significativo no relacionamento de objeto/utilidade (ρ≥0,05). Revista Eletrônica de Administração e Turismo Volume 16 | Número 2 Julho - Agosto / 2022 138 Este resultado corrobora com o que a análise dos dados já apresentou, o relacionamento animal-humano de objeto/utilidade não foi evidenciado na amostra, por conta disso nenhum dos grupos de comportamento de compra se identificaram com essa relação e, com isso não surgiu efeito entre as médias dos grupos. Decide-se por aceitar a hipótese H1: A distribuição do relacionamento com o animal de estimação difere entre os grupos de comportamento de compra. O teste de Post-Hoc realizado para identificar onde as diferenças eram existentes mostraram que a variável antropomorfismo apresentou diferença significante (ρ≤0,05) para com todos os grupos, indicando que a distribuição é diferente entre os grupos. Apenas as questões AN3 (ρ=0,08), AN7(ρ=0,08) não apresentaram significância entre os grupos 1 e 2, e a questão AN9 (ρ=0,12) não apresentou diferença significante entre os grupos 1 e 3. A variável eu estendido/autoconceito apresentou diferença significante (ρ≤0,05) entre todos os grupos. E a variável objeto/utilidade apresentou diferença significante (ρ≤0,05) apenas na questão OB10 para os grupos 1 e 3, e 2 e 3. As demais hipóteses que envolviam dados demográficos dos respondentes e informações acerca dos seus animais foram analisadas a partir dos testes de Kruskall-Wallis com valor estimado de ρ≤0,05e de Man Whitney com valor estimado de ρ≤0,001 (HAIR et al., 2009; FIELD, 2009). As hipóteses H2a, H2b, H3a, H3b, H4a, H4b, H5a, H5b, relacionadas a fatores demográficos foram todas rejeitas, apresentaram ρ>0,001, assim como H7a e H7b, referente ao tipo de animal que apresentou ρ>0,05. Ou seja, fatores como gênero, renda, escolaridade, idade e tipo de animal de estimação não possuem diferenças significativas quanto ao seu relacionamento com o animal e nem com o comportamento de compra direcionado a ele. Já a presença de filhos afeta no relacionamento antropomorfizado com o animal de estimação (ρ≤0,001), verificou-se os seguintes valores: AN1(U=23010; ρ≤0,001), AN2(U=23732; ρ=0,002), AN3(U=24451; ρ≤0,001), AN4(U=23250; ρ≤0,001), AN5(U=23330; ρ≤0,001), AN6(U=25602; ρ=0,086), AN7(U=23324; ρ≤0,001), AN8(U=23598; ρ=0,005), AN9(U=22401; ρ≤0,001). A questão AN2 refere-se à capacidade de se comunicar com o animal de estimação, e a AN6 refere-se a ter as mesmas responsabilidades de pai/mãe para com o animal, pode-se considerar que elas não apresentaram significância, visto que estão relacionadas ao tratamento do animal como uma criança, e tanto pais quanto não pais teriam as mesmas atitudes quanto a seus animais. Decide-se por aceitar a hipótese H6a, pelo fato das demais variáveis do construto apresentarem significância. Porém, ter filhos não interfere no comportamento de compra, rejeita-se H6b (ρ>0,001). Foi realizada uma análise descritiva comparativa com donos apenas de cães, apenas de gatos e de ambos, verificou-se que em todos os casos prevalece o sexo feminino, solteiro, sem filhos, com renda de até 3 salários, pós-graduação, já teve um animal antes. A única distinção identificada foi da faixa etária, onde donos de cães pertencem em sua maioria a faixa etária de 30 até 34 anos e donos de gatos e de ambos na faixa etária de 25 até 29 anos. Revista Eletrônica de Administração e Turismo Volume 16 | Número 2 Julho - Agosto / 2022 139 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Para os respondentes desta pesquisa seu animal de estimação faz parte da família, fato que já havia sido identificado em outras pesquisas (HIRSCHMAN, 1994; BELK, 1996; HOLBROOK, 2008; LUE et al., 2008; BOYA et al., 2012, 2015; HIGGINS et al., 2013). Os donos de cães e gatos antropomorfizam e auto conceituam seus pets, mas não os veem como objetos, ou utilidades, descordando de postulações feitas por Hirschman (1994) sobre um dos papéis da companhia do animal. Isso deve refletir nas estratégias de marketing, que devem levar em consideração a humanização dos pets, e aspectos de família, por seus donos no momento da compra de produtos e serviços para seus animais (BOYA, 2012). Foram identificados três grupos distintos no agrupamento realizado para o comportamento de compra dos respondentes – moderado (n=336), dedicado (n=127), desconectado (n=136) -, baseado no peso médio de cada variável. Os resultados obtidos através das análises estatísticas realizadas apontam que o tipo de relacionamento desenvolvido com o animal de estimação afeta o comportamento de compra, visto que foram identificadas diferenças entre as médias através do teste de Kruskall-Wallis entre os grupos e o tipo de relacionamento. O que corrobora o estudo dos autores Boya et al. (2012), que identificaram que a segmentação psicográfica por comportamento de compra, possuía uma relação positiva com o tipo de relacionamento cão-humano. E ainda com a afirmação de Boya et al. (2015), de que existe diferença significativa na natureza da relação entre cães e seus donos, baseado no antropomorfismo e autoconceito orientado para cães, o que de acordo com os autores permitiria a segmentação de mercado baseado nestas características psicográficas, visto que cada segmento apresenta critérios de compra distintos. Possuir um animal de estimação demostrou ser uma forte influência na configuração das casas dos respondentes, principalmente para os indivíduos do grupo de compras dedicadas (m=6,48). O grupo de compras dedicadas também demonstrou média significante (m=6,09) para a escolha de um veículo na presença do animal de estimação. Segundo Belk (1996) e Higgins et al. (2013) donos de cães são capazes de adaptar seus padrões de vida em função de seu cão, para melhor acomodá-lo. Neste caso essa adaptação vale também para donos de gatos. Os respondentes apresentaram, em maior destaque, concordância significativa para a compra de comida saudável para seu animal de estimação, e pouca importância quanto ao preço quando compram itens e serviços para seu pet. Resultados semelhantes ao de Boya et al. (2015) e Schleicher, Cash e Freeman (2019) quanto ao critério preço. O perfil de respondentes na presente pesquisa para donos de cães e gatos separadamente foi para donos de cães a maioria mulheres, faixa etária de 30 a 34 anos, solteiros, sem filhos, com renda entre R$ 2.090,01 até R$ 3.135,00, escolaridade pós-graduação. O perfil de donos de gatos foi a maioria mulheres, solteiros, faixa etária entre 25 e 29 anos, renda entre R$ 2.090,01 até R$ 3.135,00, escolaridade pós-graduação. Revista Eletrônica de Administração e Turismo Volume 16 | Número 2 Julho - Agosto / 2022 140 Os resultados demográficos dos donos de animais de estimação da pesquisa contradizem informações levantadas pelo Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (IBOPE, 2016) que verificou para o perfil de donos de cães em sua maioria eram homens, casados e com média de idade de 41 anos, classe AB, e donos de gatos eram em sua maioria mulheres, com média de idade de 40 anos. Esta incompatibilidade nos resultados das pesquisas pode ocorrer pelo fato de a pesquisa IBOPE ter considerado 6 cidades brasileiras, e a presente pesquisa ter considerado 25 estados do Brasil, ou pela ocorrência de alteração após a pesquisa IBOPE. Quando verificada a existência de distinção entre o gênero e o tipo de relacionamento animal-humano e de comportamento de compra, não foi identificada significância estatística para tal. O mesmo ocorreu com a idade, escolaridade, renda, tipo de animal. Isso aponta que para a amostra desta pesquisa variáveis demográficas não interferem no tipo de relacionamento com o animal, e nem mesmo com o comportamento de compra, ao contrário do tipo de relacionamento existente. Pesquisas apontam que donos de cães do sexo feminino possuem maiores níveis de relacionamento com seus cães, assim como pessoas acima dos 65 anos e com ensino superior, mas o nível de renda e o estado civil não apresentou influência (DOTSON; HYATT, 2008). Os resultados desta pesquisa não condizem com os achados de Lue, Pantenburg e Crawford (2008) com americanos donos de cães. Sua pesquisa revelou que donos levam os cães com mais frequência ao veterinário que donos de gatos. Neste estudo tanto donos de cães, de gatos ou de ambos levam seus animais com frequências semelhantes ao veterinário. Outro estudo que identificou a distinção entre variáveis e o tipo de animal foi o estudo realizado por Kirk (2019), com donos de cães e gatos, ficou evidente na pesquisa que os donos de cães estavam dispostos a pagar a mais para salvar a vida de seus animais em relação aos donos de gatos. Dados que não podem ser corroborados por esta pesquisa, visto que não houve diferença significativa entre as médias quanto a levar o animal ao veterinário, assim como não há diferença referente a valores econômicos. CONSIDERAÇÕES FINAIS Com o objetivo de verificar se a relação entre os donos e seus animais de estimação possui alguma relação com o comportamento de compra dos donos de pets, e a influência de possíveis fatores nesse comportamento, este estudo possibilitou descobertas relevantes para o mercado pet. Os resultados aqui obtidos, assim como já mencionado pela literatura, tanto donos de cães quanto donos de gatos tendem a antropomorfizar e auto conceituar seus animais. Não há distinção para quem o faz com mais ou menos força, ambos os donos apresentaram capacidade de relacionamento semelhante. Então, cumprindo com o objetivo de pesquisa proposto, foi possível identificar que a forma de relacionamento do humano com o animal de estimação afeta no comportamento de compra, corroborando com resultados já apresentados pela literatura para amostras de outros países. Revista Eletrônica de Administração e Turismo Volume 16 | Número 2 Julho - Agosto / 2022 141 A partir dos resultados desta pesquisa profissionais de marketing poderão direcionar seus esforços estratégicos para ações voltadas ao antropomorfismo e autoconceito dos donos de cães e gatos. A literatura sobre relacionamento de animais de estimação e sua influência na vida de seus donos, ligada ao consumo está em desenvolvimento, como exemplo Boya et al. (2012, 2015), Cheong e Yi (2015), Bao e Schreer (2016), Holbrook (2008), Kilkilahti et al. (2016), Kirk (2019), Lue et al. (2008), Morelli et al. (2020), Schleicher et al. (2019). Nesse sentido, a presente pesquisa corrobora com este desenvolvimento, contribuindo e acrescentando o conhecimento empírico sobre o Brasil no consumo de produtos e serviços pet. A partir deste conhecimento científico é possível embasar melhores decisões de mercado, e desenvolver novas pesquisas acadêmicas e de mercado. Essa pesquisa apresenta uma contribuição social e mercadológica importante, uma vez que comprova, empiricamente, que brasileiros que são donos de cães e gatos possuem forte relacionamento com seus animais, e que tal relacionamento influencia no momento da compra de itens para seu companheiro. Ou seja, provavelmente, se o dono do animal de estimação encontrar um produto que não se apresente condizente com a imagem que o dono tem de seu pet e, além disso, que o trate apenas como um animal de estimação, este consumidor poderá pontuar negativamente este aspecto e decidir por não comprar tal produto. Assim, frente aos resultados e contribuições elencadas neste estudo, cabe aos gestores e profissionais de marketing o desenvolvimento de estratégias mais assertivas que tendam a estimular o comportamento de aproximação dos donos de pets a seus produtos e serviços e, dessa forma, decidam por efetivar tais compras. Como toda pesquisa, essa também apresenta limitações, especialmente no que tange à metodologia utilizada. Dito isto, é importante destacar que, a partir da adoção de amostragem por conveniência, os resultados aqui apresentados não são generalizáveis a todos os donos de pets brasileiros. Porém, apesar de tais limitações, enfatiza-se que a amostragem obtida neste estudo representa uma importante parcela de consumidores e traz resultados significativos para o conhecimento do comportamento de compra deste segmento de mercado. Ainda, esta pesquisa analisou produtos e serviços de forma ampla, portanto sugere-se verificar comportamentos de consumo voltados para produtos e serviços pet específicos, e, ainda, que sejam desenvolvidas pesquisas abordando critérios de compra e intenção de compra, por exemplo. Como sugestões futuras, indica-se constatar se há distinção entre pessoas que vivem em área rural e em área urbana, e ainda se pessoas idosas podem ter seus animais de estimação companheiros. Tem-se então como sugestão estabelecer um perfil dos donos de animais de estimação em cada uma destas áreas, rural e urbana, do indivíduo idoso, e se o seu comportamento de compra e de relacionamento se assemelha. Revista Eletrônica de Administração e Turismo Volume 16 | Número 2 Julho - Agosto / 2022 142 REFERÊNCIAS Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (ABIPAE). Mercado pet Brasil 2019. 2019. 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