139
Impacto das capinas mecânica e química do sub-bosque ...
IMPACTO DAS CAPINAS MECÂNICA E QUÍMICA DO SUB-BOSQUE DE
Eucalyptus grandis SOBRE A COMUNIDADE DE FORMIGAS
(Hymenoptera: Formicidae)1
Lucimeire de Souza Ramos2, Ronald Zanetti3, Cidália Gabriela Santos Marinho4, Jacques Hubert Charles Delabie2;
Marcelo Nivert Schlindwein5 e Roosevelt de Paula Almado6
RESUMO - O efeito das capinas mecânica e química do sub-bosque em plantações de eucaliptos e as conseqüências
desses tratamentos sobre a comunidade de formigas foram avaliados no município de Bom Despacho, Minas
Gerais, Brasil. As formigas foram coletadas com o extrator de Winkler. Coletou-se um total de 86 espécies,
pertencentes a seis subfamílias. Oito dias após as capinas, o número de espécies reduziu-se de um quarto para os
dois tipos de capina. Sessenta dias após, o número de espécies tendeu a retornar ao estágio inicial, verificando-se
que a eliminação do sub-bosque causa efeito deletério imediato, de igual intensidade e de pouca duração sobre a
comunidade de formigas. As razões das variações observadas serão discutidas.
Palavras-chave:
Formicidae, eucalipto, manejo, diversidade e serapilheira.
IMPACT OF MECHANICAL AND CHEMICAL WEEDINGS OF EUCALYPTS GRANDIS
UNDERGROWTH ON AN ANT COMMUNITY (HYMENOPTERA: FORMICIDAE)
ABSTRACT - The effect of mechanical and chemical undergrowth weedings on an ant community was tested in
eucalypts plantations and the consequences of such treatments were evaluated at Bom Despacho, Minas Gerais
State, Brazil. The ants were collected by applying the Winkler trap method. Eighty-six species of six sub-families
were found. Eight days after the clearings, the number of species dropped to 1/4 in both weedings systems. Sixty
days later, the number of species tended to return to the initial level, showing that undergrowth elimination caused
an immediate depressive effect on the ant community of similar intensity and over a short time. The reasons of the
variations observed are discussed.
Key words:
Formicidae, eucalypts, management, diversity, litter.
1. INTRODUÇÃO
O plantio de Eucalyptus spp. (Myrtales, Myrtaceae)
ocupa grandes áreas do Estado de Minas Gerais. A partir
do momento que se reconheceu o valor de sua madeira,
houve a preocupação de explorar mais racionalmente as
áreas plantadas, enquanto os problemas ligados à
preservação do ambiente e as conseqüências do plantio
somente foram enfocados mais tarde (Golfari, 1975,
Lima, 1993), visto que muitos impactos sobre a
biodiversidade têm sido detectados (Paula, 1997; Peck
et al., 1998; Louzada et al., 2000; Andersen et al., 2002).
1
Recebido para publicação em 14.11.2002 e aceito para publicação em 17.2.2004.
U.P.A. Laboratório de Mirmecologia. Convênio UESC/CEPLAC, Caixa Postal 7, 45660-000 Itabuna-BA, Brasil,
<ramosls@cepec.gov.br>, <delabie@cepec.gov.br>. 3 Departamento de Entomologia da Universidade Federal de Lavras – UFLA,
37200-000 Lavras-MG, Brasil, <zanetti@ufla.br>. 4 Departamento de Biologia Animal/Entomologia Agrícola da Universidade
Federal de Viçosa – UFV, 36570-000 Viçosa-MG, Brasil, <marinho@insecta.ufv.br>. 5 Rua Borba Gato, 471 Jd Centenário, 13564100 São Carlos-SP, Brasil, <mnivert@uol.com.br>. 6 CAF Santa Bárbara Ltda., Av. Carandaí, 1115, 30130-915 Belo HorizonteMG, Brasil, <ralmado@caf.ind.br.
2
Sociedade de Investigações Florestais
R. Árvore, Viçosa-MG, v.28, n.1, p.139-146, 2004
140
RAMOS, L.S. et al.
Para manutenção das áreas de eucalipto utilizam-se
técnicas silviculturais como a capina química (herbicida)
ou a mecânica (roçadeira), que servem para retirada de
plantas invasoras e para facilitar a localização das colônias de formigas-cortadeiras dentro do eucaliptal. Paula
(1997) relatou que o uso deste tipo de tratamento é desnecessário, pois traz perdas ecológicas, uma vez que reduz
a biodiversidade de herbívoros e organismos decompositores e ainda aumenta a ocorrência de pragas devido à
redução de inimigos naturais.
A falta de uma cobertura vegetal diversificada no
solo, devido a capinas repetidas, favorece as formigas
Attini. Pesquisas indicam que o desenvolvimento do subbosque reduz a quantidade média de novos sauveiros
a cada ano (Almeida et al., 1983b). Em tais casos, a
presença do sub-bosque pode dificultar o pouso e a instalação desses insetos, uma vez que eles tendem a pousar
somente em locais limpos e de solo desnudo (Almeida
et al., 1983a).
Uma excelente função das formigas em áreas antropizadas é que elas podem ser utilizadas como indicadores
biológicos, ferramenta de inestimável utilidade. Elas
podem indicar o grau de perturbação do ambiente ou
permitem avaliar a dinâmica de recuperação de uma área
após um distúrbio (Peck et al., 1998; Louzada et al., 2000;
Andersen et al., 2002; Ramos et al., 2003). Com a presença desses insetos é possível avaliar o impacto do
desmatamento, utilizando características das comunidades para indicar o efeito desse processo sobre a fauna
original, determinar quais ambientes estão sendo manejados de forma adequada à preservação da biodiversidade
local e quais os tipos de tratamentos afetam a diversidade
do inseto estudado e, a partir de dados avaliados, propor
técnicas de manejo florestal que minimizem perdas da
diversidade.
O presente estudo foi realizado com o objetivo de
avaliar o efeito em função do tempo da capina química e
mecânica sobre a diversidade de formigas em eucaliptais.
2. MATERIAL E MÉTODOS
O estudo foi conduzido no período de junho a
setembro de 2000, em áreas pertencentes à CAF Santa
Bárbara Ltda., localizadas no município de Bom
Despacho (45º22’ W; 19º41’S), Estado de Minas Gerais,
Brasil, cuja altitude média é de 695 m. As amostragens
dos formicídeos foram obtidas em duas áreas de
monocultura de eucalipto com sub-bosque desenvolvido,
R. Árvore, Viçosa-MG, v.28, n.1, p.139-146, 2004
tendo na primeira sido realizada a capina mecânica com
roçadeira acoplada a um trator. Essa área possui 52 ha de
plantação de Eucalyptus grandis W. Hill ex Maiden. A
segunda área possui 38,70 ha, ocupada também por
Eucalyptus grandis, em que foi aplicado o herbicida
glifosato (4 litros de calda/ha), em uma dosagem de
160 g i.g./ha, também com o auxílio de um trator acoplado
a um pulverizador.
As coletas foram efetuadas em três ocasiões: a primeira antes do tratamento (capina) e a segunda e a terceira
aos 8 e 60 dias após as capinas, respectivamente. Em
cada tratamento foram retiradas 50 amostras aleatórias,
utilizando o método do extrator de Winkler, a uma
distância mínima de 200 m dos limites da área, para evitar
o efeito de borda. Para garantir a independência das
amostras, um intervalo de 50 m foi respeitado entre as
amostras consecutivas (Delabie, 1999; Bestelmeyer et al.,
2000). Recentemente, Faria et al. (2001), em uma amostragem de Formicidae com pit-fall, relataram que 15 m
são suficientes para garantir essa independência.
Os formicídeos coletados foram montados e identificados, utilizando-se a coleção de referência do
Laboratório de Mirmecologia da CEPLAC/CEPEC e a
nomenclatura de Bolton (1995).
Os resultados foram tabelados na forma de matriz e
a riqueza esperada (Chao2) e o índice de diversidade de
Shannon-Weaver (H) foram calculados com o uso do
programa EstimateS (Statistical Estimation of Species
Richness and Shared Species from Samples) (Colwell,
1997).
Considerando que no decorrer da análise a maioria
das espécies se mostrou rara, foi estudado em detalhe o
caso das espécies que apareceram pelo menos 20 vezes
em cada área.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Nos eucaliptais, coletou-se um total de 86 espécies
de formigas, distribuídas em 34 gêneros (Quadro 1).
Observou-se que não houve diferenças significativas entre
as áreas estudadas 8 e 60 dias após as capinas mecânica
e química (ANOVA, p > 0,05). Quanto ao efeito das
capinas em função do tempo, ambas afetaram o número
de espécies de formigas encontradas por amostra
(Quadro 2). Aos oito dias, foram observadas reduções
da freqüência relacionada a esse tipo de manejo, constatando-se rápido efeito negativo sobre a diversidade
141
Impacto das capinas mecânica e química do sub-bosque ...
estudada (ANOVA, p > 0,05). Provavelmente, a redução
do número de formigas logo após as aplicações do herbicida e da capina com a roçadeira deveu-se ao distúrbio
da eliminação do sub-bosque. No final do período de
observação, a comunidade pareceu bastante resiliente.
A riqueza observada e esperada e o índice de diversidade são sistematicamente maiores antes do tratamento
(Quadro 3). Os resultados mostraram que aos oito dias
após a realização dos tratamentos os valores de riqueza
observada, riqueza estimada e índice de diversidade
diminuíram, enquanto aos 60 dias esses valores tornaramse similares aos inicias, indicando não ter havido um
grande distúrbio por parte dos tratamentos sobre a
diversidade de formigas (Quadro 3).
Quadro 1 – Formicidae coletadas em áreas de eucaliptais aos 0, 8 e 60 dias após as capinas química e mecânica. Bom
Despacho-MG/Brasil. Junho a setembro de 2000
Table 1 – Formicidae collected in Eucalyptus plantations 0, 8 and 60 days after chemical and mechanical weedings. Bom
Despacho, MG, Brazil. June to September, 2000
Espécie
Tempo 0 dias
Acromyrmex balzani
Acromyrmex subterraneus brunneus
Anochetus diegensis
Apterostigma sp.1
Apterostigma sp.3
Atta sexdens
Brachymyrmex sp.1
Brachymyrmex sp.4
Camponotus rufipes
Camponotus crassus
Camponotus melanoticus
Camponotus trapezoideus
Camponotus renggeri
Cardiocondyla wrougthoni
Cephalotes pusillus
Crematogaster sp.1
Crematogaster sp.3
Crematogaster sp.4
Crematogaster sp.5
Crematogaster sp.6
Cyphomyrmex transversus
Ectatomma edentatum
Ectatomma permagnum
Ectatomma brunneum
Ectatomma planidens
Ectatomma tuberculatum
Gnamptogenys sulcata
Hypoponera sp.1
Hypoponera sp.2
Hypoponera sp.3
Hypoponera sp.7
Hypoponera sp.4
Hypoponera foreli
Labidus coecus
Labidus predator
2
0
4
2
3
2
12
0
8
11
0
1
1
0
1
2
0
8
1
0
2
2
3
2
2
0
0
1
1
0
0
0
0
2
0
Capina Mecânica
Tempo 8 dias Tempo 60 dias Tempo 0 dias
Número de observações
0
0
0
0
0
0
8
15
7
2
0
0
3
3
4
0
0
0
9
23
14
0
0
1
4
9
7
3
2
7
0
0
1
4
3
9
0
0
0
0
0
0
0
0
1
0
0
1
1
0
1
2
5
0
0
0
0
1
0
0
2
4
3
2
1
3
0
1
1
0
0
4
0
0
3
0
0
0
0
0
0
1
4
10
1
1
4
0
1
2
0
0
3
1
0
4
0
2
3
0
0
1
0
0
1
Capina Química
Tempo 8 dias Tempo 60 dias
0
0
3
0
1
0
11
0
6
0
0
2
0
1
0
0
1
2
0
0
0
1
0
2
0
0
0
5
4
0
1
2
1
0
0
0
1
11
2
0
0
11
0
12
5
0
6
0
0
1
0
0
10
2
0
6
2
1
1
1
1
1
3
7
0
1
0
1
1
0
Continua...
Continued...
R. Árvore, Viçosa-MG, v.28, n.1, p.139-146, 2004
142
RAMOS, L.S. et al.
Quadro 1, cont.
Table 1, cont.
Espécie
Linepithema humile
Megalomyrmex sp.1
Mycetarotes acutus
Mycocepurus smithi
Mycocepurus goeldi
Myrmicocrypta foreli
Octostruma jheringhi
Odontomachus brunneus
Odontomachus bauri
Odontomachus chelifer
Odontomachus meinert
Oligomyrmex sp.1
Pachycondyla harpax
Pachycondyla gilbert
Paratrechina sp.1
Paratrechina sp.3
Pheidole sp.1
Pheidole sp.2
Pheidole sp.3
Pheidole sp.5
Pheidole sp.6
Pheidole sp.7
Pheidole sp.8
Pheidole sp.9
Pheidole sp.11
Pheidole fallax
Pogonomyrmex abdominalis
Pseudomyrmex simplex
Pseudomyrmex tenuis
Pseudomyrmex termitarius
Pyramica eggersi
Pyramica denticulata
Pyramica schulzi
Rogeria sp.1
Rogeria sp.4
Rogeria sp. gp. creightoni
Sericomyrmex sp.1
Solenopsis sp.1
Solenopsis sp.2
Solenopsis sp.3
Solenopsis sp.4
Solenopsis substituta
Thaumatomyrmex mutilatus
Trachymyrmex sp.1
Trachymyrmex sp.2
Trachymyrmex sp.3
Trachymyrmex sp.4
Trachymyrmex sp.5
Trachymyrmex sp.6
Wasmannia sp.1
Wasmannia auropunctata
Total
Tempo 0 dias
0
0
0
3
29
0
2
0
0
0
1
0
1
0
0
0
8
2
0
1
0
4
3
0
0
4
1
0
1
0
2
0
0
0
1
1
12
13
1
2
0
0
8
5
3
17
1
1
0
0
4
204
Capina Mecânica
Tempo 8 dias Tempo 60 dias Tempo 0 dias
Número de observações
0
2
0
2
0
0
0
0
0
3
0
5
23
15
22
0
0
1
0
2
5
0
0
1
0
0
2
0
2
2
0
1
6
0
0
0
2
1
0
1
0
0
0
0
0
1
0
0
4
3
0
1
2
5
0
4
2
0
0
1
0
0
2
0
0
5
1
0
2
3
18
3
2
3
0
3
12
6
0
0
0
0
0
1
0
0
1
1
0
0
5
12
13
0
3
2
0
0
2
1
1
0
1
1
3
0
0
0
5
15
16
14
15
30
0
6
0
1
13
5
0
1
0
2
0
1
1
4
9
2
2
2
0
2
1
12
6
18
0
0
1
0
0
0
0
0
1
0
1
0
5
11
13
140
232
284
R. Árvore, Viçosa-MG, v.28, n.1, p.139-146, 2004
Capina Química
Tempo 8 dias Tempo 60 dias
0
1
1
4
19
0
0
0
1
0
3
1
0
2
3
0
7
0
1
0
0
5
0
12
5
14
0
0
0
0
8
0
0
0
0
0
10
12
1
4
0
1
4
2
0
7
1
0
0
0
6
178
0
0
0
4
30
0
3
1
1
0
4
0
0
0
0
0
14
3
5
0
2
0
0
23
3
24
0
0
0
0
21
5
3
0
3
1
17
15
11
18
0
0
1
4
0
10
0
0
0
0
11
324
143
Impacto das capinas mecânica e química do sub-bosque ...
Portanto, o comportamento nas duas áreas selecionadas para o estudo pode ser explicado pela grande
aptidão à rápida colonização e à fácil recuperação que
as comunidades desses insetos possuem. Mackay et al.
(1991) demonstraram esse fato em um trabalho sobre o
impacto do fogo sobre a diversidade de formigas, concluindo que as espécies que colonizaram mais rapidamente foram as generalistas, pois possuem nichos mais
amplos, podendo formar ninhos em muitos locais, além
de utilizarem várias fontes alimentares. Fato similar a este
pode ter ocorrido nas áreas em que foram realizadas as
capinas. Outra hipótese é que, após a capina química, a
vegetação morta e parte da viva se mantiveram presentes
no local, facilitando talvez a recolonização das formigas,
pois nem todo o sub-bosque foi eliminado, mas apenas
as gramíneas e algumas plantas herbáceas, predominando
no local os vegetais de folhas largas.
Thaumatomyrmex mutilatus, uma espécie de ambientes conservados e que merece destaque, por ser predador
especializado em miriápodes (Delabie et al., 2000), também
ocorreu nas áreas de eucaliptais antes da realização dos
tratamentos (Quadro 1). Tal fato pode ser explicado pela
presença de um sub-bosque nas áreas, o que provavelmente aumentou a variabilidade de locais disponíveis
de forrageamento, nidificação e alimento, por exemplo.
Os resultados mostraram que apenas 11 espécies
representadas nos dois talhões são coletadas pelo menos
20 vezes em cada um, além de Pheidole fallax e Pyramica
eggersi, que tiveram uma freqüência bastante alta (44) e
(42) no talhão onde houve a capina mecânica (Quadro 1).
Analisando as respostas das 11 outras espécies
(9 Myrmicinae, 1 Formicinae e 1 Ponerinae), constatouse que houve respostas diferentes em função do tipo de
capina realizada. Foi encontrada também uma morfoespécie de Solenopsis, cuja freqüência aumentou bastante
ao final dos 60 dias, em ambos os talhões.
Apenas duas espécies foram afetadas negativamente pela capina mecânica: Trachymyrmex sp.3 e
Mycocepurus goeldii, enquanto quatro espécies foram
afetadas pela capina química: Brachymyrmex sp.1,
Solenopsis sp.1, Trachymyrmex sp.3 e Wasmannia
auropunctata. Nota-se que apenas Trachyrmyrmex. sp.3
foi afetada em ambos os tratamentos.
Quadro 2 – Número médio de espécies de formigas por amostra em função do período, antes e depois da aplicação dos
tratamentos, em eucaliptais. Bom Despacho-MG/Brasil. Junho a setembro de 2000. As médias seguidas pela mesma
letra minúscula na linha e maiúscula na coluna não diferem entre si Tukey, p 0,05)
Table 2 – Average number of ant species per sample according the time before and after treatment application on Eucalyptus
plantations. Bom Despacho, MG, Brazil. June to September, 2000. Averages followed by the same lower-case letter in the
line and upper-case letter in the column do not differ among them (Tukey, p 0.05)
Número de Espécies por Amostra
Tratamento
Antes do tratamento
8 dias após
Capina mecânica
4,1
2,8
Capina química
5,7
3,6
Data de Amostragem*
60 dias após
8 dias após
60 dias após
4,7
-1,3 bB
-0,6 aA
6,4
-2,1 bB
-0,8 aA
Quadro 3 – Número de espécies observadas e estimadas (Chao2), índice
porcentagem da riqueza inicial observada em função do período, antes
eucaliptais. Bom Despacho-MG/Brasil. Junho a setembro de 2000
Table 3 – Number of observed and estimated species (Chao2) and diversity
observed initial richness as a function of time, before and after treatment
Despacho, MG, Brazil. June to September 2000
8 Dias Antes
de diversidade de Shannon-Weaver (H) e
e depois da aplicação dos tratamentos, em
index of Shannon-Weaver (H) and % of the
application, in Eucalyptus plantations. Bom
8 Dias Depois
60 Dias Depois
Riqueza
observada
Riqueza
estimada
(Chao 2)
H
Riqueza
observada
Riqueza
estimada
(Chao 2)
H
Riqueza
observada
Riqueza
estimada
(Chao 2)
H
Capina mecânica
49
(100%)
58,8
3,4
39
(79,5%)
49,9
3,2
41
(83,6%)
47,3
3,3
Capina química
57
(100%)
73,1
3,6
41
(71,9%)
57,3
3,3
48
(84,2%)
72,5
3,4
Tratamento
R. Árvore, Viçosa-MG, v.28, n.1, p.139-146, 2004
144
Outras seis espécies (Anochetus diegensis,
Camponotus rufipes, Pheidole sp.9, Pheidole fallax,
Pyramica eggersi e Sericomyrmex sp.1) foram mais
freqüentes 60 dias após os tratamentos, notando-se que
não houve nenhum efeito negativo sobre essas formigas
em relação aos dois tratamentos. O incremento dessas
seis espécies foi certamente devido a alterações no nicho
ecológico. A capina, conseqüentemente, obrigou algumas
dessas formigas a aumentar seu território de forrageamento ou diminuiu a competição com as demais espécies
que usavam os mesmos recursos.
O gênero Anochetus não foi diretamente afetado
pelas capinas no final do tratamento, provavelmente
porque é um predador generalista de solo e serapilheira,
não ocorrendo no extrato arbustivo presente no subbosque. C. rufipes é uma espécie que nidifica debaixo de
troncos de árvores caídos ou debaixo de pedras; é
bastante agressiva e territorialista, além de ter um poder
de adaptação e colonização muito grande em habitat
impactado (Caetano et al., 2002), o que mostra a sua
capacidade de resiliência, ou seja, o retorno ao estado
original após o distúrbio do local.
O mesmo ocorreu com o gênero Pheidole, que
também não foi diretamente afetado, o que pode ser
constatado quando se analisa o aumento da sua
freqüência aos 60 dias das capinas. É importante destacar
a espécie P. fallax, que segundo Marinho et al. (2002)
apresentou alta freqüência em uma área de vegetação
nativa de cerrado. Para os autores esse comportamento
foi inesperado, pois essa formiga é característica de
ambientes antropizados. Esse fato pode ser comprovado
diante da alta freqüência da espécie no final das coletas.
P. eggersi é uma espécie que se comportou da mesma
forma diante dos tratamentos, talvez por ser predadora
especialista de Collembola (Fowler, 1991). É provável que
suas presas não tenham sido afetadas pelas capinas,
tendo indiretamente favorecido o crescimento das suas
colônias, havendo, então, um aumento considerável na
freqüência da espécie.
Sericomyrmex é um gênero da tribo Attini que se
utiliza de material vegetal vivo, ou não, para o cultivo de
seu fungo e que, segundo a classificação de Silvestre
(2000) das guildas de formigas do cerrado, é colocado
como formigas cultivadoras de fungos a partir de matéria
em decomposição. Marinho et al. (2002) constataram que
esse gênero é comum em ambientes degradados, com
ocorrência alta em áreas de eucaliptais, o que comprova
o resultado desta pesquisa.
R. Árvore, Viçosa-MG, v.28, n.1, p.139-146, 2004
RAMOS, L.S. et al.
Constatou-se também que algumas espécies de
formigas foram particularmente mais suscetíveis à
capina com herbicida, como Brachymyrmex sp.1,
Solenopsis sp.1 e W. auropunctata. Muitas espécies de
Brachymyrmex e Solenopsis, e secundariamente de
W. auropunctata, são formigas arborícolas (Delabie, 1988),
o que pode ter levado à diminuição das freqüências diante
da capina química. Segundo Delabie et al. (2000), as
espécies que compõem esses gêneros forrageiam no solo,
na serapilheira e também na vegetação, além de serem
formigas bastante sensíveis às modificações do seu
habitat. Um ponto de suma importância para o comportamento de W. auropunctata diante desse tratamento é
a sua associação simbiótica com o Planococcus citri,
uma espécie de Homoptera (Coccidea: Pseucoccidae)
(Delabie et al., 1994).
M. goeldii foi sensível apenas em relação à capina
mecânica. É uma espécie que alimenta seu fungo simbionte com restos de flores e frutas e com excrementos
de pássaros, insetos e outros animais (Caetano et al.,
2002). Provavelmente, a capina mecânica alterou o nicho
ecológico relacionado com a manutenção dos substratos
alimentares do fungo, o que explica, assim, a freqüência
observada.
A espécie Trachymyrmex sp.3, por sua vez, foi
afetada negativamente tanto na capina mecânica, quanto
na química. Segundo Silvestre (2000), esta é uma Attini
desfolhadora. Observou-se a queda da sua freqüência
no final do tratamento, decorrida provavelmente da
retirada da vegetação de sub-bosque, onde certamente
essas formigas forrageavam normalmente.
Conclui-se que qualquer tipo de capina perturba a
comunidade de formigas momentaneamente, apresentando um efeito deletério imediato, de igual intensidade e
de pouca duração sobre a diversidade de Formicidae.
Apesar disto, sabe-se que parte da diversidade é afetada principalmente pela capina mecânica, em que foi
constatada maior perturbação da comunidade. Muitos
efeitos negativos foram atribuídos à diminuição da
disponibilidade dos recursos alimentares diretamente
utilizáveis, assim como dos organismos que vivem associados com numerosas espécies de formigas (Delabie,
2001).
Deve-se então recomendar, quando este tipo de
manejo se fizer indispensável, o uso da capina química,
por ser a prática que causa menos efeitos negativos à
Impacto das capinas mecânica e química do sub-bosque ...
comunidade de formigas (e certamente à fauna em geral).
No entanto, é preciso iniciar uma intensa reflexão no meio
científico, de um lado sobre o relacionamento que há entre
fauna e flora (com a manutenção ecologicamente correta
e desejável de sua biodiversidade) e de outro sobre a
importância do crescimento do sub-bosque nativo em
meio às plantações de eucalipto.
4. AGRADECIMENTOS
À CAPES e à Empresa CAF Santa Bárbara Ltda.,
pelo suporte financeiro. Ao CEPEC/CEPLAC (Lucileide
de Souza Ramos e Mércia Dayane de Santana Maia),
pelo auxílio nas montagens dos formicídeos; e aos
funcionários da Empresa CAF, João Batista Rodrigues e
Geraldo Gonçalves Pereira, pelo auxílio nas coletas.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, A. F.; ALVES, J. E. M.; MENDES FILHO, J.
M.A. Manutenção de sub-bosque em florestas de Eucalyptus
urophylla e a distribuição regular de porta-iscas, visando o
controle preventivo de saúvas (Atta spp.). Silvicultura, v. 8,
n. 28, p. 142-144, 1983a.
ALMEIDA, A. F. et al. A avifauna e o sub-bosque como
fatores auxiliares no controle biológico das saúvas em florestas
implantadas. Silvicultura, v. 8, n. 28, p. 145-150, 1983b.
ANDERSEN, A. N. et al. Using ants as bioindicators in land
management: simplifying assessment of ant community
responses. Journal of Applied Ecology. v. 39, p. 8-17, 2002.
BESTELMEYER, B. T. et al. Soil microarthropods of a
rubber plantation and a natural forest. Environment &
Ecology, v. 3, n. 2, p. 143-147, 2000.
BOLTON, B. A new general catalogue of the ants of the
world. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1995.
504 p.
CAETANO, F. H.; JAFFÉ, K.; ZARA, F. J. Formigas:
biologia e anatomia. São Paulo: Topázio, 2002. 131 p.
145
DELABIE, J. H. C.; ENCARNAÇÃO, A. M. V.;
CARZOLA, I. M. Relations between the little fire ant,
Wasmannia auropunctata, and its associated mealybug,
Planococcus citri, in Brazilian cocoa farms, p, 91-103. In:
WILLIAMS, D. F. (Ed) Exotic Ants: biology, impact, and
control of introduced species. Boulder: Westview Press,
1994. 332 p.
DELABIE, J. H. C. Comunidades de formigas
(Hymenoptera. Formicidae) métodos de estudo e estudos de
casos na Mata Atlântica. In: ENCONTRO DE ZOOLOGIA
DO NORDESTE, 1999, Feira de Santana-BA. Anais... Feira
de Santana: 1999. p. 58-68.
DELABIE, J. H. C. et al. Litter and soil ant communities:
how many samples need to be taken. In: AGOSTI, D. et al.
Ants: standart methods for measuring and monitoring
biodiversity. Washington: Smithsonian Institution, 2000.
280 p.
DELABIE, J. H. C. Trophobiosis between Formicidae and
Hemiptera (Sternorrhyncha and Auchenorrhyncha): an
overview. Neotropical Entomology, v. 30, n. 4, p. 501-516,
2001.
FARIA, F. S. B. et al. Uso da armadilha “pit-fall” na
avaliação dos efeitos da fragmentação florestal em
comunidades de formigas epígeas da mata atlântica. In:
ENCONTRO DE MIRMECOLOGIA, 15., 2001, Londrina.
Anais... Londrina: 2001. p. 365-368.
FOWLER, H. G. et al. Ecologia Nutricional de formigas. In:
PANIZZI, A. R.; PARRA, J. R. P. (Eds). Ecologia
Nutricional de Insetos e suas Implicações no Manejo de
Pragas. São Paulo: Manole e CNPq, 1991. 359 p.
GOLFARI, L. Zoneamento ecológico do Estado de Minas
Gerais para reflorestamento. Belo Horizonte: Centro de
Pesquisa Florestais da Região de Cerrado, 1975. 65 p.
(Série Técnica, 3).
LIMA, W. P. Impacto ambiental do eucalipto. São Paulo:
EDUSP, 1993. 301 p.
LOUZADA, J. N. C.; SANCHES, N. M.;
SCHILINDWEIN, M. N. Bioindicadores de qualidade e de
impactos ambientais da atividade agropecuária. Informe
Agropecuário, v. 21, n. 202, p. 72-77, 2000.
COLWELL, R. K. EstimateS: Statistical estimation of
species richness and shared species from samples. Version
5.0 bl User’s Guide and application published. University
of Connecticut, USA, 1997. Disponível em: http://
viceroy.eeb.uconn.edu/estimates.
MACKAY, W. P. et al. Impact of slashing and burning of a
tropical rain forest on the native ant fauna (Hymenoptera:
Formicidae). Sociobiology, v. 18, n. 3, p. 257-268, 1991.
DELABIE, J. H. C. Ocorrência de Wasmannia
auropunctata (Hymenoptera, Formicidae, Myrmicinae) em
cacauais na Bahia. Revista Theobroma, v. 18, n. 1, p. 2937, 1988.
MARINHO, C. G. S. et al. Diversidade de formigas
(Hymenoptera: Formicidae) da serapilheira em eucaliptais
(Myrtaceae) e área de cerrado de Minas Gerais.
Neotropical Entomology, v. 31, n. 2, p. 187-195, 2002.
R. Árvore, Viçosa-MG, v.28, n.1, p.139-146, 2004
146
RAMOS, L.S. et al.
PAULA, J. A. Biodiversidade, população e economia:
uma região de Mata Atlântica. Belo Horizonte: Universidade
Federal de Minas Gerais, 1997. 672 p.
RAMOS, L. S. et al. Impacto de iscas formicidas granuladas
sobre a mirmecofauna não-alvo em eucaliptais segundo duas
formas de aplicação. Neotropical Entomology, v. 32, n. 2,
p. 231-237, 2003.
PECK, S. L.; MCQUAID, B.; CAMPBELL, L. Using ant
species (Hymenoptera: Formicidae) as a biological indicator
of agroecossystem condition. Environmental Entomology.
v. 27, n. 5, p. 1102-1110, 1998.
SILVESTRE, R. Estrutura de comunidades de formigas
do cerrado. 2000. 216 f. Tese (Doutorado em
Entomologia) – Universidade Estadual de São Paulo,
Ribeirão Preto, 2000.
R. Árvore, Viçosa-MG, v.28, n.1, p.139-146, 2004