“Resíduos alimentares, infecções parasitárias e evidência do uso de
plantas medicinais em grupos pré-históricos das Américas”
por
Isabel Teixeira-Santos
Dissertação apresentada com vistas à obtenção do título de Mestre em
Ciências, na área de Epidemiologia em Saúde Pública.
Orientador principal: Prof. Dr. Adauto José Gonçalves de Araújo
Segundo orientador: Prof. Dr. Karl Jan Reinhard
Assistente de orientador: Prof.ª Dr.ª Luciana Sianto
Rio de Janeiro, março de 2010.
Esta dissertação, intitulada
“Resíduos alimentares, infecções parasitárias e evidência do uso de
plantas medicinais em grupos pré-históricos das Américas”
apresentada por
Isabel Teixeira-Santos
foi avaliada pela Banca Examinadora composta pelos seguintes membros:
Prof.ª Dr.ª Beatriz Brener de Figueiredo
Prof. Dr. Sergio Augusto de Miranda Chaves
Prof. Dr. Adauto José Gonçalves de Araújo – Orientador principal
Dissertação defendida e aprovada em 29 de março de 2010.
Catalogação na fonte
Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica
Biblioteca de Saúde Pública
S237
Teixeira-Santos, Isabel
Resíduos alimentares, infecções parasitárias e evidência do uso de
plantas medicinais em grupos pré-históricos das Américas. / Isabel
Teixeira dos Santos. Rio de Janeiro: s.n., 2010.
103 f., il., tab., graf., mapas
Orientador: Araújo, Adauto José Gonçalves de
Reinhard, Karl Jan
Dissertação (Mestrado) – Escola Nacional de Saúde Pública Sergio
Arouca, Rio de Janeiro, 2010
1. Doenças Parasitárias - história. 2. Plantas Medicinais. 3. Uso de
Medicamentos - história. 4. Arqueologia - métodos. 5. Paleontologia métodos. 6. Fósseis. 7. Evolução. 8. Sedimentos Geológicos microbiologia. 9. Saúde Pública - história. I. Título.
CDD - 22.ed. – 616.96
Aos meus pais, por estarem sempre ao
meu lado, pelo amor e dedicação
incondicionais. E por me fazerem
acreditar até mesmo no impossível...
“Mesmo as noites mais desprovidas de estrelas
podem anunciar a aurora de um grande
acontecimento.”
Martin Luther King
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, por nunca duvidarem de mim, pelas infinitas horas acordados ao meu
lado, em todos estes anos de estudo. Pela perseverança, amor, coragem, respeito e
carinho dedicados. Por desistirem de muitos de seus sonhos para tornarem os meus
possíveis. Vocês são a base de tudo! Amo vocês!
Aos meus orientadores tão queridos:
Ao Dr. Adauto Araújo por me inserir na paleoparasitologia, por me fazer crescer nesta
área tão fascinante; pelas palavras carinhosas que me fizeram nunca desistir. Por todo o
tempo e ensinamento, por toda a paciência e principalmente por ser um exemplo de
afeto e sucesso. Obrigada por tudo!
Ao Dr. Karl Reinhard pela dedicação e paciência ao me apresentar aos microfósseis, me
passando a sua paixão pelos amidos e por toda alegria e motivação!
À Dra. Luciana Sianto, que além de orientadora sempre foi uma amiga, pelos conselhos,
pelas palavras duras nas horas necessárias, por toda a alegria e risos, pela mulher que é!
Obrigada!
Ao Dr. Sérgio Chaves, por estar sempre tão disponível, por me ajudar com os adoráveis
grãos de pólen e microfósseis.
Ao Dr. Luiz Fernando Ferreira, pela mente e companhia brilhantes. É uma honra dividir
o mesmo ambiente!
À Dra. Sheila Mendonça por acreditar em mim e me levar a campo por dois anos
seguidos. Pelo carinho, por todo o conhecimento passado, pelas horas acordadas a noite
em Joinville, por ainda ter tempo para me aconselhar em meio a tanta correria.
À amiga inseparável Gabriella Mendes, por toda a jornada juntas! Pelo anos de
amizade, por dividir a mesma paixão pela Biologia e mais tarde pela Paleoparasitologia.
Por sempre estar pronta para me socorrer e por sempre me fazer rir e acreditar.
Às amigas Mônica Vieira e Juliana Magalhães, por sempre se mostrarem tão prestativas,
sem vocês esta tese não estaria pronta! Por todo o carinho, conselhos, risos e choros
compartilhados! Vocês são anjos em minha vida!
Às outras meninas da Paleoparasitologia: Priscilla, Bárbara, Morgana, Daniela, Bruna e
a recém chegada Siglia, pelo tempo em laboratório tão agradável na presença de vocês!
Os dias sempre são mais divertidos com vocês por perto!
Ao meu irmão Ricardo e minha cunhada Débora, pelo apoio, incentivo, risadas e
palavras sábias. Por serem um exemplo de amor e família! À minha sobrinha Rachel por
todo o carinho!
À minha irmã Kátia e meu sobrinho Daniel pelo carinho e apoio constantes!
Às amigas Bárbara Calçado e Lívia Mendes, por vocês serem tão especiais e por
dividirem comigo suas vidas!
Aos amigos da vida acadêmica! Por todas as horas de estudo, desespero e alegrias!
Aos funcionários da SECA e da ENSP, por todo o suporte e paciência ilimitados!
A todos os maravilhosos pesquisadores que aceitaram a árdua tarefa de avaliar e fazer
parte da banca! Obrigada!
RESUMO
A paleoparasitologia utiliza como principal instrumento de estudo a análise de
coprólitos e sedimentos retirados do solo de sítios arqueológicos, latrinas e da área
pélvica de esqueletos. Associando-se dados da arqueologia, antropologia e
paleoparasitologia, entre outras ciências, é possível obter resultados consistentes sobre
modo de vida e saúde das populações no passado.
Neste trabalho foram analisadas amostras de três regiões diferentes das
Américas. Um total de 59 amostras de coprólitos e sedimentos provenientes de sítios
arqueológicos localizados na área arqueológica de São Raimundo Nonato, que engloba
o Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC), Piauí, Brasil, foram analisadas. Esta
região apresenta sítios com datações bastante antigas obtidas na área do Parque, com
evidência de atividades humanas datadas aproximadamente de 50.000 anos; 12 amostras
provenientes do sítio arqueológico Antelope Cave, localizado no Arizona, EUA. Assim
como o PNSC, este sítio possui a presença de cerâmica e a iniciação da agricultura pelos
grupos pré-históricos naquela região; e 15 amostras retiradas diretamente da região
pélvica de sepultamentos provenientes do sambaqui Cubatão I, localizado em Joinville,
Santa Catarina, Brasil. Este sítio arqueológico é, na verdade, um desafio metodológico
devido ao clima e a atividade biótica do solo da região que não permitem boas
condições de preservação do material arqueológico.
A análise de resíduos alimentares destas diferentes regiões arqueológicas
forneceu dados a respeito da dieta de populações antigas e a relação entre a presença de
parasitos e o encontro de plantas com propriedades anti-helmínticas, e ainda foi possível
a determinação de casos de falso parasitismo.
Palavras-Chave:
paleodieta,
microfósseis, paleoparasitologia.
coprólito,
resíduos
alimentares,
anti-helmínticos,
ABSTRACT
Paleoparasitology uses, as the main tool to study, the analysis of coprolites and
sediments removed from the land of archaeological sites, latrines and the pelvic area of
skeletons. Joining data from archeology, anthropology and paleoparasitology, among
other sciences, it is possible to obtain solid results on livelihoods and health of people in
the
past.
On this study were analyzed samples from three different regions of the Americas. A
total of 59 samples of coprolites and sediments from archaeological sites located in the
archaeological area of São Raimundo Nonato, which includes the National Park Serra
da Capivara (PNSC), located in Pernambuco, Brazil, were analyzed. This region has
sites with the oldest dating obtained in the Park, with human activities recorded from
50.000 years BP; 12 samples from the archaeological site of Antelope Cave, located in
Arizona, USA. This site, just like PNSC, has features such as the presence of pottery
and the initiation of agriculture by prehistoric groups in the region, and 15 samples
taken directly from the pelvic region of burials from the sambaqui Cubatão I, located in
Joinville, Santa Catarina, Brazil. This archaeological site is actually a methodological
challenge due to the climate and soil biotic activity in the region that don't allow good
conditions of preservation of the archeological material.
The analysis of alimentary residues of these different archaeological areas supplied data
regarding the diet of old populations and the relationship between the presence of
parasites and the encounter of plants with anthelminthic properties, and it was still
possible the determination of cases of false parasitism.
Keywords: paleodiet, coprolite, swill, antihelmintic, microfossils, paleoparasitology.
SUMÁRIO
LISTA DE TABELA......................................................................................................ix
LISTA DE FIGURAS.....................................................................................................x
LISTA DE GRÁFICOS...............................................................................................xiii
1. INTRODUÇÃO...........................................................................................................1
2. REVISÃO DE LITERATURA ..................................................................................4
2.1 Revisão Bibliográfica ....................................................................................4
2.2 A Importância dos Resíduos Alimentares ................................................17
2.2.1 Amidos .......................................................................................................18
2.2.2 Fitólitos ......................................................................................................19
2.2.3 Grãos de Pólen ...........................................................................................20
2.2.4 Macrofósseis ..............................................................................................21
3. JUSTIFICATIVA .....................................................................................................23
4. OBJETIVOS .............................................................................................................24
4.1 Objetivo Geral .............................................................................................24
4.2 Objetivos Específicos ..................................................................................24
5. METODOLOGIA .....................................................................................................25
5.1 Grupos de Estudo ........................................................................................25
5.1.1 São Raimundo Nonato, PI – Brasil ............................................................25
5.1.1.1 Toca do Boqueirão da Pedra Furada .......................................................28
5.1.1.2 Toca do Sítio do Meio ............................................................................30
5.1.1.3 Toca dos Coqueiros ................................................................................30
5.1.1.4 Toca do Baixa do Cipó I .........................................................................31
5.1.1.5 Toca do Paraguaio ..................................................................................31
5.1.1.6 Toca do Serrote do Tenente Luis ............................................................32
5.1.1.7 Toca do Morcego ....................................................................................32
5.1.1.8 Toca da Passagem ...................................................................................33
5.1.1.9 Toca da Baixa dos Caboclos ...................................................................33
5.1.1.10 Toca do Gongo I ...................................................................................34
5.1.1.11Toca da Janela da Barra do Antonião ....................................................34
5.1.2 Antelope Cave – Arizona, E.U.A. .............................................................35
5.1.3 Joinville, SC – Brasil .................................................................................37
5.2 Análise Inicial do Material Utilizado no Estudo ......................................41
5.3 Análise Laboratorial ...................................................................................42
5.3.1 Análise da Dieta Macroscópica .................................................................42
5.3.2 Análise da Dieta Microscópica e Parasitológico .......................................42
5.3.3 Análise Química para Sedimentos .............................................................43
5.3.4 Análises Estatísticas....................................................................................44
6. RESULTADOS .........................................................................................................45
6.1 Análise Morfológica ....................................................................................45
6.2 Análise de Vestígios Alimentares Macroscópicos.....................................45
6.3 Análise de Vestígios Alimentares Microscópicos .....................................52
6.3.1 Identificação de Amidos ............................................................................53
6.3.2 Identificação de Grãos de Pólen.................................................................58
6.4 Resultados para Plantas com Propriedades Anti-Helmínticas ...............63
6.5 Análise Estatística........................................................................................66
7. DISCUSSÃO .............................................................................................................67
7.1 Da Análise da Dieta......................................................................................67
7.1.1 São Raimundo Nonato, PI – Brasil ............................................................67
7.1.2 Antelope Cave, Arizona – E.U.A. .............................................................69
7.1.3 Cubatão I, Joinville – Brasil ......................................................................69
7.2 Da Análise Parasitológica e de Plantas Medicinais...................................71
8. CONCLUSÃO ...........................................................................................................73
9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................74
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Lista de resultados para análise parasitológica e para análise palinológica, por
sítio arqueológico............................................................................................................65
ix
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Grânulos de amido de Solanum tuberosum (batata inglesa), identificados
através da luz polarizada (400x)......................................................................................19
Figura 2: Grânulos de fitólitos não identificados (400x).................................................20
Figura 3: Grão de pólen de Malvaceae tipo Sida sp. (400x) ..........................................21
Figura 4: Exemplo de restos macrofósseis ecnontrados: semente encontrada em dieta de
humano em coprólito do Sítio do Meio, garra de réptil encontrada em dieta de felino em
coprólito do Sítio Toca do Morcego, cabeça de inseto encontrada em dieta de tamanduá
em coprólito do Sítio Toca dos Coqueiros e fragmento de osso encontrado em dieta de
humano em coprólito do Sítio Toca do Boqueirão da Pedra Furada (aumento
40x)..................................................................................................................................22
Figura 5 - Localização do Parque Nacional Serra da Capivara, PI.................................26
Figura 6: Localização dos sítios arqueológicos do Parque Nacional Serra da Capivara,
PI. Toca do Paraguaio (001), Toca do Sítio do Meio (022), Toca do Boqueirão do Sítio
da Pedra Furada (023), Toca do Morcego (049), Toca do Gongo I (082), Toca dos
Coqueiros (090), Toca da Baixa do Cipó I, Toca da Janela da Barra do Antonião (184),
Toca da Baixa dos Caboclos (411), Toca da Passagem (613), Toca do Serrote do
Tenente Luis (643)...........................................................................................................28
Figura 7: Sítio Toca do Boqueirão da Pedra Furada, área arqueológica de São Raimundo
Nonato, PI .......................................................................................................................29
Figura 8: Sítio do Meio, área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI......................30
Figura 9: Toca do Paraguaio, área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI..............32
Figura 10: Sítio Toca do Morcego, área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI.....33
Figura 11: Localização do sítio arqueológico Antelope Cave, Arizona – E.U.A............35
Figura 12: Foto da caverna Antelope Cave e foto da paisagem do sítio, Arizona –
E.U.A...............................................................................................................................37
Figura 13: Localização do Sambaqui Cubatão I, Joinville, Santa Catarina, Brasil.........38
Figura 14: Sítio Cubatão I, Joinville, Santa Catarina , Brasil – durante escavação em
2007.................................................................................................................................39
Figura 15: A, B, C, D, E) Coprólitos Humanos recuperados no Sítio do Meio (022); F)
Coprólito Humano recuperado no sítio arqueológico Sítio Toca da Baixa dos Caboclos,
área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI.............................................................45
x
Figura 16: A) amido sugestivo de Zea mays (milho); B) amido sugestivo de Manioc
suculenta; C) Amido não identificado quanto ao taxon; D) Amido sugestivo de Ipomoea
batatas (batata-doce); E) Amido sugestivo de Araucária angustifólia; F) Amido
quadrado facetado, hilo central globular, não identificado; G) Grânulo de amido
facetado sugestivo de Ipomoea batatas (batata-doce); H) Amido modificado
possivelmente de Ipomoea batatas (batata-doce). Sítio do Meio (aumento de 400x), área
arqueológica de São Raimundo Nonato, PI.....................................................................53
Figura 17: A e B) Grânulo de amido facetado com hilo central sugestivo de Ipomoea
batatas; C) Amido modificado, não identificado; D) Amido semelhante ao de Ipomoea
batatas; E) Amido não identificado alongado, hilo centra globular; F) Amido
arredondado, hilo central, globular; G) Amido sugestivo de pinhão (Araucária
angustifólia); H)Amido globular, com facetas, hilo central em forma de ponto escuro,
semelhante ao de Araceae; I) Amido sugestivo de Pinhão (Araucária angustifólia); J)
Amido possivelmente de Ipomoea batatas. Sitio Toca do Boqueirão da Pedra Furada
(aumento de 400x), área arqueológica de São Raimundo Nonato,
PI......................................................................................................................................54
Figura 18: A) Amido modificado, não identificado; B) Amido facetado, com hilo
central, sugestivo de Ipomoea batatas; C) Amido sugestivo de Manioc esculenta. Sítio
Toca dos Coqueiros (aumento de 400x), área arqueológica de São Raimundo Nonato,
PI......................................................................................................................................55
Figura 19: A) Grânulo de amido sugestivo de Zea mays alterado; B)Amido alongado,
com uma faceta, hilo central, não identificado; C) Amido cupuliforme, hilo central, não
identificado; D) Amido quadrado, facetado, com hilo central, globular. Sítio Toca da
Baixa dos Caboclos (aumento de 400x), área arqueológica de São Raimundo Nonato,
PI......................................................................................................................................55
Figura 20: Grânulo de amido globular, hilo central, não identificado. Sítio Toca da
Passagem (aumento de 400x)..........................................................................................56
Figura 21: Grânulo de amido globular, com facetas, hilo central, não identificado,
similar à Araceae do Sítio Baixa do Cipó I (aumento de 400x), área arqueológica de São
Raimundo Nonato, PI......................................................................................................56
Figura 22: A) Amido globular, com hilo central sugestivo de Zea mays (milho); B)
Grânulos de amidos; C) Amido sugestivo de Manihot esculenta (mandioca); D)
Grânulos de amidos não identificados (aumento de 400x). Sítio Antelope Cave, Arizona
– E.U.A............................................................................................................................57
Figura 23: Grânulos de amidos não identificados (aumento de 400x). Sítio Cubatão I,
Joinville, Santa Catarina – Brasil....................................................................................57
Figura 24: A) Grão de pólen da família Poaceae; B) Grão de pólen não identificado; C)
Grão de pólen da família Convolvulaceae tipo Ipomoea sp.; D) Grão de pólen da família
Malvaceae tipo Sida sp.; E) Grão de pólen não identificado; F) Grão de pólen da família
Malpighiaceae (aumento 400x). Sitio do Meio, área arqueológica de São Raimundo
Nonato, PI.......................................................................................................................58
xi
Figura 25: A e B) Grão de pólen da família Convolvulaceae tipo Ipomoea sp.; C) Grão
de pólen de Caesalpinia sp.; D) Grão de pólen da família Malvaceae tipo Sida sp.; E)
Grão de pólen da família Concurbitaceae; F) Esporo da família Polypodiaceae (aumento
400x). Sitio Toca do Boqueirão da Pedra Furada, área arqueológica de São Raimundo
Nonato, PI......................................................................................................59
Figura 26: A) Grão de pólen não identificado; B) Grão de pólen da família
Convolvulaceae tipo Ipomoea sp.; C) e D) Grãos de pólen Euphorbia sp. (aumento
400x). Sítio Toca dos Coqueiros, área arqueológica de São Raimundo Nonato,
PI......................................................................................................................................60
Figura 27: A) Grão de pólen de Chenopodium sp.; Be C) Grãos de pólen de
Convolvulaceae tipo Ipomoea sp. (aumento 400x). Sítio Toca da Baixados Caboclos,
área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI.............................................................60
Figura 28: A) Grão de pólen possivelmente da família Arecaceae; B) Grão de pólen não
identificado (aumento de 400x). Sítio Toca da Passagem, área arqueológica de São
Raimundo Nonato, PI......................................................................................................61
Figura 29: Grão de pólen de Malvaceae tipo Sida sp. (aumento 400x). Sítio Gongo I,
área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI.............................................................61
Figura 30: A) Grão de pólen não identificado; B) Grão de pólen possivelmente
pertencente à família Poaceae. (aumento de 400x). Sítio Antelope Cave, Arizona –
E.U.A...............................................................................................................................62
Figura 31: A) Grão de pólen não identificado; B) Esporo de samambaia
(Polypodiaceae), Sítio Cubatão I, Joinville, Santa Catarina - Brasil (aumento de
400x)................................................................................................................................62
Figura 32: Escama de réptil encontrada em dieta de uma amostra do Sítio Toca dos
Caboclos, na região arqueológica de São Raimundo Nonato, PI (aumento de
40x)..................................................................................................................................68
xii
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1: Riqueza e abundância de vestígios alimentares macroscópicos dos coprólitos
do sítio arqueológico Toca da Baixa dos Caboclos, área arqueológica de São Raimundo
Nonato, PI........................................................................................................................46
Gráfico 2: Riqueza e abundância de vestígios alimentares macroscópicos dos coprólitos
do sítio arqueológico Toca dos Coqueiros, área arqueológica de São Raimundo Nonato,
PI......................................................................................................................................47
Gráfico 3: Riqueza e abundância de vestígios alimentares macroscópicos dos coprólitos
do sítio arqueológico Sítio do Meio, área arqueológica de São Raimundo Nonato,
PI......................................................................................................................................48
Gráfico 4: Riqueza e abundância de vestígios alimentares macroscópicos dos coprólitos
do sítio arqueológico Toca do Boqueirão da Pedra Furada, área arqueológica de São
Raimundo Nonato, PI......................................................................................................49
Gráfico 5: Riqueza e abundância de vestígios alimentares macroscópicos dos coprólitos
do sítio arqueológico Sítio Gongo I, área arqueológica de São Raimundo Nonato,
PI......................................................................................................................................50
Gráfico 6: Riqueza e abundância de vestígios alimentares macroscópicos dos coprólitos
dos sítios arqueológicos Sítio Antonião, Toca da Passagem, Toca do Morcego, Toca do
Paraguaio e Baixa do Cipó I, área arqueológica de São Raimundo Nonato,
PI......................................................................................................................................51
Gráfico 7: Riqueza de vestígios alimentares microscópicos, dos sítios arqueológicos
estudados: Sítio do Meio, Sítio Toca do Boqueirão da Pedra Furada, Sítio Toca da
Baixa do Cipó I, Sítio Toca do Gongo I, Sítio Toca da Passagem, Sítio Toca do
Paraguaio, Sítio Toca do Serrote do Tenente Luiz, Sítio Toca dos Coqueiros, Sítio Toca
dos Caboclos, Sítio Toca do Morcego, Toca Janela da Barra do Antonião, área
arqueológica de São Raimundo Nonato, PI – Brasil, Sítio Antelope Cave, Arizona –
E.U.A., Sítio Cubatão I, Joinville, Santa Catarina - Brasil.............................................52
xiii
1. INTRODUÇÃO
O termo caçador-coletor é uma referência às diferentes estratégias de obtenção de
alimentos. O termo gerou conflito entre diversos autores ao longo dos anos, já que os
caçadores-coletores dependiam muito mais de outras fontes de alimento do que do consumo
de carne. Estima-se que a atividade da caça contribuía de 20 a 40% da dieta, portanto, o
termo caçador-coletor se refere à grande variedade de atividades praticadas pelos grupos
pré-históricos [1].
Além da caça como fonte de alimento, outro recurso disponível para caçadorescoletores incluía uma grande variedade de vegetais selvagens. Mais do que a preferência, a
alimentação destes grupos era governada pela oferta de alimentos.
A abundância e a variedade de alimentos para este grupo eram essencialmente
governadas pelo ambiente da região que ocupavam. Sabe-se que cada grupo de homens préhistóricos tinha suas preferências e seu modo de vida próprio, bem como as estratégias de
caça. Deste modo, estes grupos apresentavam diferenças em relação a sua dieta [2].
O modo de subsistência destes grupos pré-históricos foi mudando ao longo dos
anos, bem como seus métodos de conservação e de preparação de alimentos. É evidente a
diversidade da natureza da alimentação do humano pré-histórico, e por esta diversidade, a
população antiga apresentava quadros de carência alimentar e adquiria doenças, ao passar
longos períodos de fome ou através da ingestão de alimentos sem preparo para consumo,
contribuindo assim com uma série de fatores que os levavam a adoecer.
Estudos como o de Lessa [3], Mendonça [4] e Araújo [5], revelam que o humano
pré-histórico tanto sofria de carências alimentares como de infecção por diversos parasitos.
Alguns grupos de populações de humanos pré-históricos do Paleolítico e do
Mesolítico possuíam um poder de adaptação à condições desfavoráveis bastante
organizados, o que leva a presumir que a caça e o recolhimento de vegetais eram mais
eficientes do que em sociedades agrárias evoluídas [6].
Assim como a flutuação na distribuição dos alimentos outros fatores como
condições climáticas desfavoráveis e doenças, são contribuintes para a situação de carência
alimentar nestes grupos antigos [6].
1
As doenças se intensificavam com os períodos de fome e com a perda de alimentos
que, como conseqüência de condições climáticas não tão favoráveis, deficiências no solo e
perturbações políticas em cada cultura, dizimavam grupos inteiros [7].
As carências vitamínicas e a fome não eram as únicas moléstias que acometiam as
populações antigas. Vermes intestinais já eram citados como causadores de anemia entre os
grupos pré-históricos [8].
Apesar de testemunhos diretos sobre doenças infecciosas e parasitárias serem raros,
a resistência dos ovos de parasitos à decomposição e sua preservação em coprólitos e em
sedimentos retirados de latrinas ou diretamente de corpos mumificados foi confirmada pela
Paleoparasitologia em grupos pré-históricos, confirmando essas infecções [9].
Sabe-se que a automedicação é um hábito praticado por várias espécies de pássaros,
gado, ursos e primatas [10]. Estudos conduzidos em animais buscam compreender a prática
deste hábito e possibilitam remeter ao complexo de interação animal-planta-parasito, na
busca pela compreensão da evolução da automedicação em hominídeos recentes [11].
A ingestão de plantas com superfície grossa e coberta com pêlos feita por
chimpanzés, por exemplo, sugere uma relação com controle de parasitos. O hábito de
engoli-las por inteiro e não mastigá-las demonstra que foram ingeridas sem propósito
nutricional, mas sim com o propósito de automedicação [10, 12, 13].
Plantas com a superfície coberta por pêlos servem como uma espécie de “velcro”,
removendo os parasitos ao passar pelo trato digestivo. [12] Não é somente através deste
mecanismo físico, mas através da má digestão de alimentos, ou seja, da não mastigação
dessas plantas, onde o trato gastrintestinal rapidamente responde com diarréias, que podem
causar a expulsão das verminoses e interromper o seu ciclo de vida [10, 14].
De acordo com vários padrões, estudos sugerem que certas espécies de primatas,
como os chimpanzés de Gashaka, ingerem plantas com intuito medicinal. O encontro de
helmintos juntamente com plantas inteiras nas fezes frescas, o fato de que este hábito é
praticado com mais intensidade nos períodos de chuva (período no qual re-infecções
parasitárias são mais freqüentes), e a não mastigação das plantas, confirmam o intuito
medicinal ao engolir certas espécies de plantas [10-14].
Ao estudar os coprólitos e sedimentos, uma visão mais clara de como estes grupos
se alimentavam, se adaptavam ao meio e utilizavam as plantas como recursos para prevenir
2
ou remediar doenças, pode ser obtida. Assim, a Paleodieta tem como objetivo estudar
padrões alimentares de populações passadas, incluindo mudanças climáticas e geográficas,
bem como as mudanças de estratégias de subsistência adotadas pelos grupos pré-históricos
[15].
Por meio da recuperação de alimentos, como grãos de amido, fitólitos, grãos de
pólen e outros vegetais, de uso alimentar ou medicinal, podemos identificar as espécies que
eram coletadas ou cultivadas, em que período do ano eram consumidas, onde e em que
abundância existiam e até como eram preparadas para consumo (cozidas, torradas, cruas,
fermentadas, etc.) [16] .
Estudos anteriores revelam as possíveis inferências sobre os hábitos, doenças, e
recursos utilizados por populações passadas. Diversos autores aprimoraram a metodologia,
e através de suas análises em material antigo trouxeram novas contribuições para o campo
da paleodieta.
Ao estudarmos os resíduos alimentares encontrados nos coprólitos, estudamos o
indivíduo e seus hábitos no ambiente em que vivia, tornando possível distinguir casos de
falso parasitismo daqueles de infecção verdadeira, analisar a associação entre parasitos e
plantas com propriedades anti-helmínticas, comparar os diferentes modos de consumo de
alimento entre populações pré-históricas de regiões distintas e compreender a evolução e
novas estratégias na obtenção de alimentos.
3
2. REVISÃO DE LITERATURA
2.1 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Coprólitos (fezes antigas ressecadas naturalmente) são os vestígios de grupos préhistóricos. Eles oferecem informações únicas sobre a dieta desses grupos, adaptação
ecológica, doenças e parasitos, sazonalidade da ocupação do sítio arqueológico, paleoclima
e comportamento [17].
Os estudos de dieta tiveram início com W. Jones, Young, V. Jones, Wakerfield e
Dellinger, Sperry e Fonner, Webb e Baby, MacNeish, e Watson e Yarnell [18].
Martin Lister foi o autor do primeiro trabalho que fez referência aos coprólitos em
1678, porém os primeiros estudiosos sobre material fecal surgiram com mais força no
século XVII, com identificações importantes para a história da paleodieta [19].
O século XIX foi o ponto de partida para os estudos em paleodieta. O termo
coprólito foi criado por Buckland [18] e Hashberger foi pioneiro no campo da paleodieta ao
descobrir que era possível fazer inferências sobre hábitos alimentares de populações préhistóricas [17], [18].
O século XX foi um século de grandes autores e publicações, por isso será
detalhado por décadas.
Século XX – Primeira Década
A primeira década do século XX trouxe estudos mais elaborados sobre a
alimentação na antiguidade, com análises do conteúdo estomacal de múmias [20].
Estudos de dieta em coprólitos arqueológicos de Salts Cave, Kentucky, EUA, feitos
por Young [21], trouxeram novas perspectivas sobre a alimentação no Novo Mundo.
Esta década foi marcada pelo trabalho que se tornou referência de Ruffer [22] ao
analisar fezes de múmias egípcias e encontrar o parasito Bilharzia haematobia.
Um dos primeiros achados sobre restos vegetais foi relatado em um estudo feito em
um sepultamento na Inglaterra, conduzido por Warren [23].
Netolitzky [18] foi um grande colaborador para as metodologias de recuperação do
material arqueológico ao propor a técnica de reidratação de fezes utilizando peróxido de
4
hidrogênio ao continuar os estudos nos materiais recuperados em Nubia, inicialmente por
Jones [20, 24].
Século XX - Década de 20
Na segunda década do século XX, Seton foi um naturalista que atentou para a
importância da forma e do conteúdo para o diagnóstico da origem do coprólito, foi um
grande colaborador para os estudos sobre os hábitos alimentares dos animais silvestres [18].
Loud e Harrington, deram início a uma descrição mais detalhada da dieta, ao identificar
sementes e fibras de plantas, recuperados de coprólitos humanos de Lovelock Cave,
Nevada [25].
Século XX – Década de 30
Eames [18] trouxe novas informações sobre os padrões alimentares e dieta, ao
estudar coprólitos de preguiças extintas do Novo México, este estudo se tornou importante
ao fazer uma descrição mais detalhada da dieta destes mamíferos. Um estudo extenso sobre
coprólitos foi conduzido por Warkefield e Dellinger e se tornou uma referência nesta
mesma década, por serem os primeiros a apresentarem em seu trabalho identificações de
macrofósseis de plantas, cultura de microorganismos, testes de conteúdo biliar e análises
químicas quantitativas e também por ser o primeiro estudo sobre conteúdo fecal de uma
múmia do Novo Mundo [26]. O estudo de Jones em Kentucky, E.U.A. revelou que certas
sementes como Chenopodium sp. e Iva ciliata eram cultivadas com seleção artificial [27].
Bird escavou o sítio Huaca Prieta de Chicama no Peru e neste trabalho foram
coletadas fezes humanas antigas e também amostras fecais de intestinos preservados de
múmias humanas. O estudo foi importante ao identificar uma enorme variedade de
macrofósseis que refletiam a dieta do grupo pré-histórico local [28].
Século XX – Década de 40
Espécies de plantas começaram a ser identificadas e evidenciadas com maior
precisão por Brandt em no que seria a última refeição de um homem de Jutland, Alemanha
[29].
5
Jennings conduziu o primeiro trabalho em Utah, E.U.A. que tinha uma atenção
especial aos coprólitos humanos. Apesar de ser questionada a origem dos coprólitos, anos
mais tarde, ao observar que as sementes haviam sofrido modificações por serem preparadas
para consumo a origem do coprólito foi confirmada como sendo de humanos [30].
Callen e Cameron [31] deram continuidade ao estudo de Bird [31] sobre os
coprólitos de Huaca Prieta, Peru. Este estudo se tornou um marco para a metodologia dos
estudos coprológicos ao aprimorarem a técnica de reidratação de coprólitos que utiliza uma
solução de fosfato trissódico, inicialmente desenvolvida em 1947 por Van Cleave e Ross
[32] para reidratar espécies zoológicas e, utilizada, por Benninghoff em 1947, para reidratar
espécies de plantas [17].
Século XX – Década de 50
Sperry e Fonner [17], Webb e Baby [17] e MacNeish [33] continuaram observando
e examinando coprólitos de diversos e diferentes sítios arqueológicos durante a década de
50.
Helbaek [34] conduziu um estudo importante onde diferenciava plantas cultivadas
de plantas não cultivadas em o que seria a última refeição do homem de Grauballe , na
Alemanha. Helbaek [35] publicou um sumário aonde evidenciou e estudou a dieta de
grupos antigos. Glob [36] analisou plantas estudadas inicialmente por Helbaek e concluiu
que pertenciam a um ritual de sacrifício humano.
Troels-Smith, estudou resíduos alimentares de excrementos humanos no sítio
Muldbjerg que apresentavam ocupação do período Neolítico, com datações de
aproximadamente 4830 A.P. Os resultados deste trabalho indicaram atividades de
mastigação de tecidos vegetais e a sazonalidade dos vestígios florais e faunísticos [18].
Século XX – Década de 60
O estudo de Callen e Cameron [31] abriu caminhos para novas pesquisas no Peru,
nesta década [37]. Iniciaram também estudos no México em 1963 e 1965, que foram
conduzidos por Callen até 1967 com um grande número de coprólitos de Tehuacan, no
México [38].
6
A década de 60 foi marcada por estudos conduzidos por Heizer, que analisou
material fecal em Nevada [17, 18].
Word foi um arqueólogo que também marcou a década de 60 ao notar e reportar a
importância das análises em coprólitos, ao conduzir escavações em Baker Cave, Texas
E.U.A., por três anos consecutivos [18].
O estudo de Martin e Sharrock em coprólitos de Utah, E.U.A., trouxe informações
sobre o conteúdo polínico de coprólitos humanos. Este estudo abriu caminhos para que
novos pesquisadores usassem a análise polínica para sugerir certas preferências dietéticas,
mudanças nos hábitos alimentares, e até a estação do ano em que alguns coprólitos são
depositados [17].
Colyer e Osborne [18] trabalharam em coprólitos do sudoeste dos EUA, seguidos
anos mais tarde por Rohn [39], que também estudou coprólitos dessa região.
Marsh [40] publicou sua dissertação de mestrado onde tratava de resíduos
faunísticos encontrados em coprólitos de Ocampo Caves, Tamaulipas, México, escavada
inicialmente por MacNeish [33]. Os coprólitos apresentavam datações de até 9000 A.P.
Lumley conduziu uma análise palinológica em coprólitos recuperados durante a
escavação de um sítio em Terra Amata Nice, França [41]. Assim como Carran [18],
Lumley se tornou importante ao estudar grãos de pólen em o que ele acreditava ser
coprólitos com datação de 400.000 anos provenientes da costa mediterrânea da França [42].
Watson descreveu os resíduos alimentares de coprólitos e apresentou uma discussão
minuciosa sobre os resíduos vegetais. Nesse mesmo ano, Watson e Yarnell conduziram
uma escavação em Salts Cave, Kentucky, E.U.A, onde realizaram estudos em material
humano fecal para análise da dieta [43].
Estudos conduzidos por Ambro [44], traziam discussões sobre os conteúdos
recuperados de coprólitos de Lovelock Cave, Nevada; Cowan [45] evidenciou uma dieta
balanceada incluindo vestígios alimentares vegetais e animais em 50 coprólitos de Nevada;
Follet [46] identificou resíduos de peixes recuperados de coprólitos provenientes de
Lovelock Cave, Nevada; Heizer [18] fez um estudo importante no material de Lovelock
Cave, Nevada, no qual discutiu as problemáticas da metodologia, a dieta, a sazonalidade da
dieta representada e ainda análises paleoparasitológicas; e como estes, estudos de Roust,
Tubbs e Berger e Napton [17, 18].
7
Um artigo na American Antiquity sobre os coprólitos de Ocampo Caves,
Tamaulipas, México detalhou a transição de caçadores-coletores para a agricultura na
Mesoamérica, escrito por Callen, que despertou a atenção de diversos pesquisadores [38].
Aikens publicou um artigo baseado em sua análise em coprólito recuperado nas
escavações de dois sítios de Salt Lake City, Utah, E.U.A., onde descreveu vários vestígios
vegetais, ossos de peixes e cristais que podem ser parte de pedras utilizadas para a moagem
dos alimentos antes do consumo [47].
Fry [48], um dos pioneiros do estudos da paleodieta, defendeu sua tese de Mestrado
estudando a dieta em coprólitos de Danger Cave, Utah. Este trabalho gerou outro estudo
feito pelo autor, onde detalhou a dieta, fez análises palinológicas e paleoparasitológicas na
década de 70 [49]. Bryant [50], Kelso [51] e Williams-Dean [38] continuaram as pesquisas
sobre grãos de pólen em coprólitos.
Bryant identificou fitólitos em coprólitos do Texas; e Heizer e Napton reconstruíram
as formas de subsistência da área de Lovelock Cave, Nevada ao estudar coprólitos da
região [50].
Os estudos de Brothwell e Brothwell [6] sobre a alimentação na antiguidade
trouxeram grandes contribuições sobre os modos de subsistência de grupos humanos préhistóricos. Callen e Martin [52] estudaram oito coprólitos de Utah e trouxeram novas
perspectivas sobre análises palinológicas.
Napton [53] apontou e discutiu sobre a dificuldade em reconstruir a dieta por meio
dos estudos em coprólitos, uma vez que não havia associação ao corpo que o depositou.
Dean publicou uma tese de doutorado sobre os coprólitos do Texas [38] onde analisou e
evidenciou o conteúdo das dietas.
Riskind [54] e Bryant [50, 55] estudaram coprólitos do sudoeste do Texas e
Revelaram a diversidade de alimentos de plantas e animais na dieta, porém não
encontraram nenhuma evidência da atividade agrícola.
Século XX – Década de 70
Williams trouxe novas discussões sobre a metodologia utilizada em análises de
coprólitos, ao publicar um artigo baseado em seu estudo em 26 coprólitos de um sítio do
norte do Chile [18].
8
Rohn analisou amostras fecais de 32 humanos do Colorado e identificou uma série
de resíduos alimentares, incluindo sementes de milho e feijão, Chenopodium sp., Physalis
sp., Opuntia sp., Montia sp., Rhus trilobata, Cleome sp., dentre outros tecidos vegetais,
insetos, fragmentos de ossos animais, cascas de ovo e cabelo humano [39].
Hall [56] e Winter e Wylie [57] revelaram a transição de caçadores-coletores no
final do período Arcaico para a agricultura, principalmente do milho, no primeiro milênio
Jarman et al. [58], se tornaram colaboradores para as pesquisas de paleodieta ao
identificar vestígios de plantas.
Fry e Hall [17, 18, 59] se tornaram importantes referências para este estudo ao
analisarem coprólitos da região do Arizona, E.U.A., mais especificamente Inscription
House e Antelope House, locais próximos e semelhantes à Antelope Cave, uma das regiões
estudadas neste trabalho.
Conduzido por Nissen, o estudo sobre coprólitos pré-históricos do sítio
arqueológico de Bamert Cave, Amador County, Califórnia revela uma grande diversidade
na dieta, apresentando pequenos roedores, sementes de gramíneas de diversas espécies,
insetos e larvas [60].
O estudo de Hall, que revelou uma grande quantidade de sementes nos resíduos
alimentares do que seria a última refeição encontrada no intestino, estômago e esôfago de
um corpo humano do sexo feminino bem preservado da República da China, tornou-se
referência [61].
Allison et al.[62] examinaram intestinos e fezes de uma múmia do Peru. Além de
achados importantes para a paleoparasitologia, o autor trouxe novas informações sobre a
paleodieta ao identificar restos vegetais como milho e feijão, e ainda recuperar vestígios de
carne bem preservados no intestino. Esse estudo evidência, também, os processos de
preparação de alimentos realizados antes do consumo.
O trabalho de Bryant [55, 63, 64] em coprólitos provenientes do Texas e de
Kentucky, trouxe novas contribuições para as análises palinológicas, para a paleodieta ao
revelar uma dieta variada composta por diversos resíduos vegetais, insetos, mamíferos,
répteis, peixes e outros vestígios, e ainda, sobre o paleoclima, ao fazer inferências sobre a
estação de ocupação dos sítios em que foram coletadas as amostras.
9
Marquardt descreveu a dieta de 27 humanos pré-históricos de coprólitos de
Mammoth Cave, Kentucky, E.U.A. e discutiu as técnicas utilizadas para as análises
paleodietéticas [65].
O trabalho de Schoenwetter trouxe novas contribuições para as análises
palinológicas e para as análises de macrofósseis presentes na dieta de nove coprólitos de
Upper Salts Cave, Kentucky. Foram feitas também inferências sobre as economias de base,
tamanho e organização de grupos e a medicina utilizada por esses grupos [66].
Wilke e Hall publicaram uma revisão bibliográfica extensa sobre material fecal
antigo em que levantaram análises sobre possíveis estudos sobre dieta, tecnologia da
população, clima do local de ocupação e outros aspectos paleológicos [17, 18, 38].
O artigo publicado na Science por Cockburn et al. [67], detalhou a autópsia feita em
um corpo egípcio mumificado e revelou uma dieta rica em carne digerida e fibras, ao retirar
amostras de parte do intestino bem preservado. Além de contribuir para exames
paleoparasitológicos.
Fonner analisou quatro amostras com sua origem previamente identificadas como
de ursos, ao analisar a dieta e identificar que as sementes haviam sofrido tipos de
preparação para o consumo, as amostras tiveram sua origem confirmada como coprólitos
humanos [68].
Lin et al. [69] enfatizaram a pesquisa com o objetivo de encontrar esteróides em
coprólitos humanos. Seguindo esta linha, anos mais tarde Sobolik et al.[70] utilizaram
esteróides para identificar o sexo do indivíduos que produziu as fezes em doze coprólitos
humanos recuperados em Mammoth e Salts Caves em Kentucky. Baseados nos níveis de
testosterona, concluiu que todos os coprólitos pertenciam a indivíduos do sexo masculino.
O importante trabalho de Prench [71]sobre a alimentação do homem pré-histórico, o
trabalho de Prous [72] que trouxe grandes contribuições sobre a palinologia e arqueologia e
ainda a contribuição de Torres [73] sobre dieta, nutrição e arqueologia no VI Congresso
Brasileiro de Arqueologia, foram marcos desta década.
Ferreira, Araújo e Confonalieri publicaram o primeiro trabalho que utilizou o termo
paleoparasitologia, o que culminou na primeira tese de Mestrado sobre paleoparasitologia
no Brasil, defendida por Araújo. Tornando-se assim um marco na história da paleopatologia
[9, 74-76].
10
Pozorski estudou a dieta e o modo de subsistência pré-histórica em Moche Valley,
Peru [77].
Wing e Brown publicaram o livro Paleonutrition: Method and Theory in Prehistoric
Foodways onde tratam de pontos importantes para construir conhecimento sobre a nutrição
do passado. O livro se torna um marco na história da paleodieta por investigar formas de
subsistência, incluindo informação sobre a preferência alimentar e rituais que
acompanhavam a caça e a plantação. A identificação e a interpretação dos vestígios
alimentares também é um aspecto importante tratado no livro [78].
Stock [79] e Sobolik [18] apresentaram em seu trabalho, uma discussão extensa
sobre fitólitos recuperados em coprólitos de Hinds Cave e Bakers Cave. Van Zeist e
Casparie trouxe contribuições no campo da paleobotânica [80].
Século XX – Década de 80
Moore et al. reportaram um trabalho que afirmava que o uso de gás cromatográfico
poderia identificar com sucesso plantas que haviam sido ingeridas, apesar de nenhuma
evidência visível ser encontrada nos coprólitos durante as análises de microfósseis. Apesar
de esta hipótese nunca ter sido confirmada, o estudo foi importante pela tentativa de
identificação dos microfósseis na dieta [18].
Aasen discute em seu trabalho a eficiência do uso de partes do coprólito e levanta a
hipótese metodológica de que é essencial utilizar todo o coprólito para a análise.
Levantando novas discussões quanto à metodologia utilizada para as análises coprológicas
[38].
Souza et al.[81] conduziu um estudo sobre paleonutrição em Itaipu, Brasil.
Eaton e Konner publicaram um artigo com novas perspectivas sobre a nutrição
paleolítica, traçando um paralelo com o ambiente da época [82], expandindo os estudos
paleoepidemiológicos.
Hastorf e Deniro [83] fizeram um estudo aonde reconstruíram a produção de plantas
pré-históricas e práticas de preparo de alimentos feitas por populações pré-históricas.
Schoeninger publicou um artigo na American Journal of Physical Anthropology que
trazia resultados de análises sobre a dieta pré-histórica [84].
11
Fornaciari e Mallegni [85] fizeram um estudo a partir dos níveis de estrôncio e
zinco retirados de ossos humanos de diversos sítios pré-históricos e históricos da Europa
para indicar a dieta. O nível do estrôncio nos ossos indica os vegetais consumidos e o nível
de zinco indica os alimentos de origem animal. Com estes dados os autores chegaram à
conclusão de que a dieta mesolítica era predominantemente composta por vegetais, e a dieta
neolítica predominantemente composta por alimentos de origem animal.
Reinhard et al.[86] realizaram um estudo onde utilizaram técnicas palinológicas em
três sítios arqueológicos das Américas, Arizona, Novo México e Utah, e comparou a dieta e
os achados paleoparasitológicos caracterizando a sua relação. Reinhard iniciou pesquisas
em coprólitos da Era Anasazi [87] e continuou nos anos seguintes pesquisando a dieta e os
parasitos, buscando analisar esta relação, tornando-se referência nos estudos da paleodieta
[88-92]. E no Brasil, Shmitz [93] estudou os hábitos de caçadores-coletores.
Século XX – Década de 90
Cummings conduziu um estudo minucioso sobre fitólitos em coprólitos da ilha de
Kulubnarti em Nubia [18].
Haller e Kirch [94] fizeram estudos importantes sobre o cultivo de batata-doce na
pré-história da Polinésia; Stiner [95] conduziu importante pesquisa em resíduos faunísticos;
e Hather fez um estudo sobre a arqueobotânica de subsistência do Pacífico [96].
Rylander, ao utilizar o SEM – Scanning Electron Microscope em seu estudo em
coprólitos pré-históricos tornou possível a identificação de diferentes tipos de cozimento,
mastigação e técnicas de trituração de alimentos. Com os resultados deste estudo, Rylander,
foi capaz de reconstruir prováveis técnicas de preparação de alimentos e calcular o valor
nutricional de tipos específicos de milho que eram consumidos [38].
Bracho estudou o comportamento de indígenas do continente americano e
relacionou os alimentos e plantas, encontrados na dieta e suas implicações para a
civilização [97]. Assim como Bracho, Manyam [98] definiu o conceito de nutrição e fez
inquisições sobre a dieta balanceada e apetite na Índia Antiga.
Análises em cálculos dentários permitiram Fox et al. [99] a observação de fitólitos
que são indicadores eficientes dos vegetais consumidos em populações passadas.
12
Pesquisadores como Baschetti [100] e Eaton [101] realizaram estudos sobre a
paleonutrição, especialmente sobre a nutrição do período Paleolítico; Lietava et al. [102]
realizaram análises sobre a paleodieta, ao relacioná-la com a aterosclerose e Hastorf [103]
descreveu a transição de caçadores-coletores para a agricultura.
Danielson e Reinhard [104] utilizaram análises de fitólitos para traçar a dieta de
caçadores-coletores do período Arcaico na região de Pecos, Texas.
Piperno e Holst [105] também estudaram os microfósseis em ferramentas préhistóricas. A análise de grãos de amido neste estudo indicou a introdução da agricultura
pela população de estudo, que era proveniente do Panamá.
Fernandez-Jalvo et al. [106] discutiram a possibilidade de distinguir dieta e
canibalismo ao analisar material de seis indivíduos de um sítio arqueológico na Espanha.
MacFaden et al. [107] evidenciaram os vestígios alimentares vegetais da dieta de
cavalos pré-históricos com datação de cinco milhões de anos na Flórida.
Macko et al. [108], fizeram análises de isótopos estáveis em cabelos bem
preservados de múmias, onde estudaram a dieta de populações pré-históricas.
Burger et al. [109], identificaram a paleodieta e trouxeram informações sobre a
estrutura econômica, cultivo, domesticação de animais e plantas, ao fazer análises
palinológicas em artefatos pré-históricos.
Estudos como o de Cejkova [110], Smrcka et al. [111] e Schwartz [112], sobre a
paleodieta de diferentes períodos da pré-história tentaram recriar o estilo de vida e os
hábitos alimentares de grupos humanos de populações passadas. E ainda o trabalho de
Hofreiter et al. [113] que estudou a paleodieta ao fazer análises moleculares em material da
última glaciação. E o trabalho de Holden [114] em populações Anasazi onde estudou a
paleodieta e a prática de canibalismo executada por esta população.
Poinar et al. [115] extraíram ADN utilizando técnicas de aplicação de PCR em
cinco coprólitos humanos provenientes de Hinds Cave, Texas. Este estudo foi comparado
ao estudo de Sobolik [70] que originalmente identificou os macrofósseis e os conteúdos
polínicos, com isso foi possível identificar a presença de diversos resíduos de plantas e de
animais que haviam sido consumidos [18].
13
Lin e Connor [116] fizeram análises de esteróides na dieta de uma múmia esquimó
em Greeland, Arkansas, E.U.A. e compararam os resultados com um estudo feito em
Nevada Caves [69] em seis coprólitos com datações de 2000 anos A.P.
Berg [117] publicou um artigo onde testou novos métodos de análise para recuperar
o conteúdo abdominal de corpos humanos mumificados.
Richards [118] analisou a dieta paleolítica e neolítica em cinco Neandertais
indicando a importância de proteínas animais nas dietas, e discutiu sobre as mudanças
morfológicas e sobre a evidenciação do material arqueológico, por meio de análises
químicas dos ossos.
No Brasil, estudos como o de Lessa e Guidon em um esqueleto proveniente da Toca
dos Coqueiros, Piauí, que levantou a hipótese da utilização de plantas analgésicas na préhistória das Américas [119]; e a tese de Chaves [120] que fez análises palinológicas em
coprólitos humanos provenientes de dois sítios arqueológicos do Piauí que fazem parte
deste estudo.
Século XXI
A
virada
do
século
trouxe
novas
perspectivas
quanto
às
análises
paleoepidemiológicas. A primeira década foi marcada por Horrocks et al. [121] que
analisaram grãos de pólen, fitólitos e diatomáceas em 16 coprólitos de cães pré-históricos
para explorar a dieta Maori na Nova Zelândia.
Bouchet et al. [122] tentaram reconstruir a paleoecologia e as doenças com a
cooperação de arqueólogos, paleontólogos e paleoparasitólogos. Neste estudo foi realizada
uma revisão sobre as técnicas utilizadas para recuperar parasitos.
Chaves e Reinhard publicaram um artigo importante e que serve de base para este
estudo, onde recuperaram resíduos alimentares e parasitos, evidenciando a utilização de
plantas medicinais e relacionando-as com condições específicas de saúde, em material
arqueológico proveniente do sítio arqueológico Boqueirão da Pedra Furada localizado no
Parque Nacional Serra da Capivara, Piauí, Brasil [123]. E ainda, o trabalho de Reinhard e
Buisktra, onde demonstraram as primeiras implicações e contribuições sobre a
paleoepidemiologia no Peru [124].
14
Horrocks et al. [125], conduziram um estudo sobre grãos de amido recuperados em
coprólitos, onde discutiram a introdução da batata doce por um determinado grupo préhistórico, trazendo novas informações sobre a dieta e o cultivo. E ainda neste mesmo ano, o
trabalho de Gupta [126] sobre a origem da agricultura e a domesticação de plantas e
animais e sua ligação com a melhora do clima durante o Holoceno.
Barnes publicou uma compilação de vários pesquisadores de diferentes campos
científicos no livro Diseases and Human Evolution. O livro se tornou importante por
enfatizar as mudanças do comportamento humano durante a evolução cultural e como tais
mudanças afetaram o desenvolvimento das doenças humanas [127].
Roberts e Manchester publicaram a terceira edição de seu livro The Archaeology of
Disease, que reporta as últimas técnicas científicas e arqueológicas que podem ser
utilizadas para identificar doenças e ferimentos sofridos por humanos na antiguidade [84].
White et al. [128] publicaram um estudo sobre doença, dieta e ecologia em dois
sítios Maia em Belize. Ao investigar ossos humanos e animais, o estudo trouxe
contribuições sobre a relação entre doença (particularmente anemia), dieta, cultura e
ambiente.
O artigo de Bryant e Williams-Dean sobre o legado de Eric Callen (grande
colaborador dos estudos paleológicos) [38] e o estudo de Scarabino et al. [129], em ossos
humanos recuperados de Pontecagnano, Itália, que reconstruiu a paleodieta da população
Etrusca, se tornam importantes para estudos de paleodieta.
Reinhard [130] fez um estudo importante sobre a dieta de populações de Ancestral
Pueblo ao investigar práticas de canibalismo praticadas por esta população.
Rocha et al. [131] conduziram um estudo comparando dieta e doenças
parasitológicas na Bélgica com amostras de sedimentos retirados do solo e de latrinas.
Zeder [132] estudou a domesticação de plantas e animais e a associação desta
prática com o início da agricultura.
Polo-Cerda et al. [133], conduziram uma investigação sobre a paleodieta de
vestígios humanos da Era do Bronze de sepultamentos de Castello, Espanha.
Este último século trouxe novas contribuições no campo da paleodieta, estudo como
o de Fornaciari relacionando a paleodieta e as doenças em Florença e Napa [134]; Henry e
Piperno que reconstruíram a paleodieta baseados em microfósseis vegetais, como grãos de
15
amido e fitólitos, recuperados de sedimentos, ferramentas de pedras e cálculos dentários na
Síria [135], foram importante para o crescimento deste novo campo.
Johnson et al. [136], analisaram a dieta em um coprólito recuperado no Arizona,
onde evidenciaram o consumo de carrapatos e seu potencial como causadores de doenças.
Piperno e Dillehay analisaram os grânulos de amido preservados em cálculos
dentários para indicar a dieta e o tipo de cultivo, através de um coprólito do Norte do Peru
[137].
Wood et al. [138] revelaram a dieta e a ecologia do mega herbívoro extinto
Dinornithiformes da Nova Zelândia, ao estudar seu coprólito.
Reinhard et al. [139], identificaram resíduos alimentares de origem animal e
vegetal, recuperados de sedimentos retirados de sepultamentos e puderam reconstruir a
dieta. E os trabalhos sobre microfósseis e a tentativa de reconstruir a paleodieta de
populações pré-históricas de Tito et al. [140]. Seguindo esta mesma linha de pesquisa sobre
grânulos de amidos, a tese de doutorado de Wesolowski em cálculos dentários de
populações passadas de sambaquis, no Brasil [141].
O ano de 2009 mostrou-se um ano promissor nas pesquisas paleodietéticas. Alguns
pesquisadores como Barberena [142] e Shillito et al. [143], têm publicado trabalhos onde
estudam os micro resíduos, na tentativa de reconstruir a dieta de grupos pré-históricos e
trazem novas contribuições para a metodologia e conhecimento sobre os hábitos destes
grupos.
Autores como Arnay-de-la-Rosa et al. [144], Hu et al. [145]¸Katzenberg et al. [146],
Knudson et al. [147] e Lu et al. [148] contribuíram com estudos moleculares sobre a
introdução de novos alimentos nas dietas de certo grupos pré-históricos.
Piperno [149] trouxe novas informações a respeito de amidos e fitólitos de milho
(Zea mays), encontrados em populações pré-históricas de Central Balsas River Valley, no
México.
Ranere et al. [150] trouxe novas perspectivas sobre o cultivo de milho, com o
auxílio de análises moleculares realizadas com amostras da floresta tropical de Central
Balsas River Valley, no México.
Ainda em 2009, Richards et al. [151] publicou um artigo comparando, por meio de
análises isotópicas, a dieta de Neandertais europeus e humanos recentes.
16
Thow & Hawkes [152], Vega-Arreguin et al. [153], Vinton et al. [154], trouxeram
novas contribuições sobre a paleodieta de diferentes grupos pré-históricos.
O ano de 2010 já traz novas perspectivas para o campo da paleodieta, estudos como
o de Arnay-de-la-Rosa et al. [155] e Somerville et al. [156] publicados na Science, revelam
o consumo de alimentos marinhos e outros vegetais utilizando análises de isótopos estáveis,
tais como, carbono, nitrogênio e hidrogênio.
Baseada nestes estudos, meu estudo será feito em três grupos de populações préhistóricas distintos nas Américas, descritos mais adiante, na tentativa de reconstruir a dieta
e relacioná-la com os helmintos identificados anteriormente nas áreas estudadas.
2.2 A IMPORTÂNCIA DOS RESÍDUOS ALIMENTARES
O estudo de vestígios alimentares consiste na análise de restos macroscópicos e
restos microscópicos de coprólitos e sedimentos. A identificação de restos de alimentos
consumidos incluindo micro e macrofósseis vegetais como sementes, frutas, folhas e outros
restos de tecidos existentes nas plantas são o objetivo principal desta análise.
Por meio da conservação, os macrofósseis e os microfósseis podem ser encontrados
em sua forma perfeita [16]. Assim, a identificação de plantas e sementes é possível. Esta
identificação é importante para observar plantas que foram consumidas como fonte de
alimento ou com fins medicinais [157].
Grande parte dos coprólitos, especialmente os de origem humana apresentam uma
quantidade de fibras generosa o que confere à análise microscópica uma quantidade
abundante de grãos de pólen, fitólitos e amidos. Por meio da forma da distribuição das
nervuras das folhas encontradas, ou seja, sua venação é possível identificar as espécies
[158].
Para identificação dos restos alimentares são utilizados também recursos como
recuperação de grãos de amido e grãos de pólen observados na dieta microscópica [159].
Grãos de amido são armazenadores de carboidratos e indicam a ingestão de
mandioca e até mesmo milho. Analisando os grãos de pólen nos coprólitos pode-se
identificar presença de plantas utilizadas medicinalmente [16]. Não somente os grãos de
17
pólen, mas outros microfósseis vegetais estão recebendo cada vez mais atenção por
estudiosos de paleoetnobotânica [160, 161].
A análise de fitólitos e grãos de amido vem mostrando enorme importância na
identificação das vegetais consumidos, principalmente quando encontrados associados a
instrumentos de preparação de alimentos, tais como recipientes de cerâmicas e outras
ferramentas [105, 137, 140].
Estudos de vestígios alimentares podem também ajudar a revelar crises ecológicas e
períodos de fome sofridos por populações antigas como as que ocorreram na Antelope
House no Arizona no período pré-colombiano dos Estados Unidos. Neste caso, as
alterações climáticas provocaram crises de subsistência no modo de vida dos habitantes
desta região. A revelação de que esses grupos recorreram ao consumo de vegetais silvestres
e à caça e pesca com consumo de itens sem qualquer preparo, muitas vezes crus, veio pela
análise dos vestígios alimentares presentes nos coprólitos [130].
Nos sítios arqueológicos com datações antigas da América do sul (datações entre
5000 e 4000 AP), foram encontrados microfósseis botânicos, como fitólitos e grãos de
amido, que demonstram a diversidade da agricultura e a complexidade cultural
desenvolvida nas Américas no Velho Mundo [162].
A análise das dietas macroscópicas e microscópicas são extremamente úteis para a
recuperação de informações sobre a utilização de plantas por grupos de populações préhistóricas, especialmente em alguns sítios arqueológicos, como os sambaquis, aonde a
conservação de restos vegetais é bastante limitada.
2.2.1 Amidos
Apesar do potencial do estudo de grãos de amido em contextos antigos ter sido
reconhecido há quase um século, apenas nas duas últimas décadas as pesquisas se
desenvolveram. Entre as questões centrais dos estudos estão a domesticação de vegetais,
escolhas e padrões alimentares, técnicas de preparo do alimento, padrões de uso de
ferramentas e do solo e reconhecimento de áreas de atividade [163].
18
Cálculos dentários, coprólitos e artefatos, amostras de solo e alimentos preservados
por dessecação e carbonização, possuem grãos de amido que podem ser recuperados dentre
essas diversas variedades de ambientes e substratos [77, 80, 105, 121, 160].
Grânulos de amido (Figura 1) são moléculas de reserva energética formadas
basicamente por dois polímeros orgânicos, amilose e amilopectina, os quais são
depositados em camadas alternadas em torno de um hilo [161, 163]. O amido se forma pela
transformação da glicose durante a fotossíntese e se acumula em grande quantidade nos
órgãos de estocagem, como raízes tuberosas e tubérculos, ou ainda em rizomas e sementes,
sendo utilizados pelas plantas para fornecer energia quando necessário [163].
A identificação do vegetal de origem é possível por meio da formação e agregação
dos grânulos de amido no interior do amiloplasto. A forma dos grãos, posição e forma do
hilo, a espessura das camadas de amilose e amilopectina e a forma da cruz de extinção
podem ser visualizados sob a luz polarizada e permitem identificar a que grupos
taxonômicos as plantas pertencem [163].
Com isso, é possível identificar os alimentos de origem vegetal que eram
consumidos por grupos de populações passadas.
45µm
Figura 1: Grânulos de amido de Solanum tuberosum (batata inglesa), identificados através da luz
polarizada no laboratório de Paleoparasitologia, ENSP – FIOCRUZ (aumento 400x).
2.2.2 Fitólitos
Fitólitos (Figura 2), assim como os grãos de pólen, são microfósseis essencialmente
indestrutíveis no trato digestivo de humanos [91, 158]. Fitólitos são a parte mais durável
19
das plantas. São cristais de sílica ou oxalato de cálcio depositados no tecido da planta, e são
produzidos em grandes quantidades por muitas famílias de monocotiledôneas e
dicotiledôneas [105, 158].
Os fitólitos podem ser encontrados em estruturas variadas como folhas, raízes,
inflorescências, lenho e casca [163]. As condições do solo, condições climáticas e a
disponibilidade de água são alguns dos fatores que influenciam diretamente na produção
dos fitólitos pelas plantas [137].
Fitólitos são importantes na identificação de espécies, com a silificação de algumas
estruturas presentes no tecido vascular é possível prover informações sobre a taxonomia de
certas plantas [157].
Graças à grande diferença de forma de fitólitos dentro de uma única espécie, sua
classificação foi considerada uma dificuldade, porém estudos recentes têm revelado que a
aproximação ao gênero, a família e até mesmo a espécie dos fitólitos com base em sua
morfologia tem tornado possível sua classificação [137, 163].
22µm
Figura 2: Grânulo de fitólito possivelmente de gramínea (aumento 400X).
2.2.3 Grãos de Pólen
Os grãos de pólen permitem identificar com certa precisão algumas espécies de
plantas utilizadas pelo homem pré-histórico. Podem ser encontrados durante escavações
20
arqueológicas em sedimentos, em urnas funerárias, na superfície de objetos que foram
manipulados por humanos e ainda em coprólitos [157].
Grãos de pólen (Figura 3) não podem ser destruídos pelo processo digestivo, uma
vez que em sua composição está presente sexina, camada externa da exina, esculturada
[63], que não é alterada durante a transição pelo intestino [164]. São estruturas duráveis por
meio da inclusão de esporopolenina, (estrutura mais durável produzida pelas plantas), nas
paredes do grão de pólen [159].
Os grãos de pólen podem ser ingeridos através da ingestão de alimentos, inalação do
ar e ainda através da chuva polínica atual que pode depositar grãos de pólen nos
remanescentes arqueológicos expostos à chuva [158].
As análises palinológicas permitem reconstruir a flora do ambiente em que o
homem pré-histórico vivia, além de fornecer informações sobre o alimento ingerido e o uso
de plantas medicinais específicas [120, 165-167].
60µm
Figura 3: Grão de pólen de Malvaceae tipo Sida sp. (aumento 400x).
2.2.4 Macrofósseis
Os resíduos alimentares encontrados nos coprólitos auxiliam na identificação do
grupo zoológico ao qual o coprólito pertence. Fragmentos de carvão são resíduos
encontrados em coprólitos como resultado do cozimento dos alimentos [38, 168].
Macrofósseis (Figura 4) vegetais como sementes, frutas, folhas e restos de tecidos
vegetais, são encontrados, repetidamente, em perfeito estado de conservação, auxiliando na
identificação de plantas utilizadas tanto na obtenção de valor energético como na utilização
21
de plantas com fins medicinais. Por meio da venação das folhas é possível, em alguns
casos, identificar as espécies de plantas [157].
Restos de insetos, fragmentos de exoesqueletos, ossos que permitem identificação
taxonômica das espécies de animais consumidos, penas, pêlos e garras também auxiliam ao
traçar a dieta desses grupos pré-históricos.
A
B
1cm
1cm
C
D
1cm
1cm
Figura 4: Exemplo de restos macrofósseis encontrados: A) semente encontrada em coprólito de humano
do Sítio do Meio;B) garra de réptil encontrada em coprólito de felino do Sítio Toca do Morcego;C)
cabeça de Isoptera encontrada em coprólito de Myrmecophagidae (tamanduá) do Sítio Toca dos
Coqueiros; D) fragmento de osso encontrado em coprólito de humano do Sítio Toca do Boqueirão da
Pedra Furada (aumento 40x), área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI – Brasil.
22
3. JUSTIFICATIVA
Embora se saiba que as parasitoses intestinais existiam nas populações préhistóricas das Américas, algumas eram mais comuns do que outras em algumas regiões. Por
exemplo, o parasitismo por Trichuris trichiura e ancilostomídeos existia tanto em grupos
sul-americanos da caatinga nordestina, cerrado mineiro e Patagonia, assim como no semiárido norte-americano. Porém, a ascaridíase só pode ser diagnosticada após o advento das
técnicas de biologia molecular [169, 170]. Este quadro era diferente na Europa, aonde ovos
de Ascaris lumbricoides podem ser encontrados em abundância após o fim do Neolítico até
a Idade Media [171].
Embora as condições de transmissão existissem nas Américas, aparentemente a
prevalência era baixa para trichurídeos, ancilostomídeos ascarídeos, pois a quantidade de
ovos encontrada em coprólitos é sempre pequena, levando-se em conta as condições de
preservação dos sítios e a diversidade de ambientes em que se encontram.
Por isso, e considerando-se o encontro sugestivo de restos de plantas com
propriedades anti-helmínticas em coprólitos, especialmente na América do Norte, esta
pesquisa foi feita em coprólitos de diversos sítios arqueológicos ocupados por grupos de
caçadores-coletores e de agricultores, em três diferentes situações. Portanto, investiga-se a
possibilidade destes três grupos pré-históricos terem usado plantas com propriedades antihelmínticas. Como Ascaris lumbricoides não se fixa a mucosa intestinal e é, portanto, mais
facilmente eliminado por substâncias que inibem sua movimentação, isto explicaria a
constância de achados negativos à microscopia óptica. Somente com uso do PCR é possível
detectar vestígios de ADN do parasito [172].
Este trabalho busca assim identificar restos alimentares para estudos da dieta no
passado e sua possível associação com a presença ou ausência de parasitos intestinais.
Espera-se que os resultados das análises deste estudo possam contribuir para futuros
estudos sobre paleoambiente, paleonutrição e para a paleoparasitologia.
23
4. OBJETIVOS
4.1 Objetivo Geral
Comparar os vestígios alimentares e parasitos encontrados em vestígios, coprólitos e
sedimentos abdominais, em grupos pré-históricos das Américas, procurando responder se
existe relação entre as plantas com propriedades anti-helmínticas e os ovos de parasitos
encontrados em vestígios arqueológicos.
4.2 Objetivos Específicos
Relacionar as plantas medicinais encontradas em três grupos de populações
pré-históricas: Piauí - Brasil, Antelope Cave - E.U.A. e Joinville - Brasil com os dados de
helmintos.
Identificar os resíduos alimentares macroscópicos e microscópicos
encontrados nas dietas recuperadas em coprólitos e sedimentos analisados.
24
5. METODOLOGIA
5.1 GRUPOS DE ESTUDO
5.1.1 São Raimundo Nonato, Piauí – BRASIL.
A arqueologia da região nordeste do Brasil provê uma rica fonte de informação
sobre as primeiras culturas americanas. O Sertão é marcado pela caatinga que é uma grande
vegetação característica de regiões com clima semiárido que inclui porções dos estados
brasileiros como o Piauí. Este é um sistema ecológico ameaçado e menos de 50 % da
caatinga original sobrevive hoje [123].
A área arqueológica de São Raimundo Nonato, localizada no estado do Piauí,
apresenta a maior concentração de sítios arqueológicos das Américas e engloba o Parque
Nacional Serra da Capivara (Figura 5), aonde existe um grande número de sítios
arqueológicos, a maioria com pinturas e gravuras rupestres, nos quais se encontram os mais
antigos registros da presença do homem (aproximadamente 50.000 anos antes do presente)
[173, 174]. Esta região é marcada pela presença de paisagens variadas na forma de serras,
canyons, vales e planícies [175].
O Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC), foi criado em 1979 pela Presidência
da República com o objetivo de defender a ecologia local e preservar o patrimônio
arqueológico. As pesquisas tiveram início na região em 1970 liderada pela Doutora Niède
Guidon e seu grupo auxiliar financiado pela França, e em 1986 foi criada a Fundação
Museu do Homem Americano – FUMDHAM [175].
O Parque está situado no sudeste do Piauí (08 o26’50,099’’N a 08o 54’23,365’’S e
08o36’33,681’’E a 08o46’28,382’’W), em pleno domínio morfoclimático da caatinga [176],
numa das áreas mais pobres do país. Seus 130.000ha abrigam espécies de mamíferos
endêmicas e ameaçadas de extinção.
25
Figura 5 - Localização do Parque Nacional Serra da Capivara, PI – Brasil.
A flora consiste num mosaico de cinco tipos fisionômicos de caatinga, com 70% de
endemismo [177].
O clima é semi-árido, quente, com seca invernal, e média anual de precipitação de
600 mm, mal distribuída [173]. A paisagem é formada por chapadas recortadas por canyons
profundos, com paredes altas e reniformes (as frentes de cuesta). Não há rios perenes, e
bacias esculpidas nas rochas pela água em tempos idos – os caldeirões - formam
reservatórios naturais que estocam água da chuva e constituem centro das atividades
relativas à fauna silvestre [178, 179].
A disponibilidade de água na região obedece, há pelo menos 12.000 anos, a
conjunção entre a dinâmica climática sazonal e a presença desses reservatórios naturais de
tamanhos e capacidades de estocagem variáveis, forçando o deslocamento e dispersão da
fauna [180].
26
Estudos mostram atividade humana na área do Parque Nacional desde há, pelo
menos, 50.000 anos e que sua presença foi contínua até a chegada dos colonizadores
brancos. Os povos mais antigos eram caçadores-coletores, isto é, viviam da caça e da coleta
de produtos animais e vegetais, como ovos, mel, frutos, raízes, tubérculos, etc. [174].
No Sertão, a cultura mais antiga humana, chamada de Tradição Nordeste que data
de 12.000 a 7.000/6.000 anos AP, tem sido documentada por meio de sepultamentos,
pinturas rupestres, e associação de artefatos de diferentes sítios bem datados [3, 175, 181,
182].
Reinhard et al. [183], apontou que a infecção mais antiga por ancilostomídeos foi
diagnosticada em coprólitos da Tradição Nordeste. Infecções por Trichuris sp. Também
acometiam esta cultura [184]. Anti-helmínticos e tratamentos para os sintomas de infecções
parasitárias podem ter sido necessários.
Estão cadastrados nos bancos de dados da FUMDHAM mais de 1.000 sítios [174],
entre os quais pelo menos 657 apresentam pinturas rupestres, sendo os outros sítios ao ar
livre (acampamentos ou aldeias) de caçadores-coletores. Esses sítios ou aldeias de
ceramistas-agricultores são na verdade, ocupações em grutas ou abrigos, sítios funerários e
sítios arqueo-paleontológicos [174].
Estudos multidisciplinares têm sido conduzidos na região de São Raimundo Nonato
desde 1970. Dentre eles estudos ecológicos, arqueológicos, parasitológicos, estudos de
conservação, botânicos e estudos palinológicos focando o desenvolvimento econômico da
área sem causar impactos à caatinga [123].
Foram analisados coprólitos e sedimentos humanos recuperados de 11 sítios
arqueológicos localizados no Parque (Figura 6).
27
Figura 6: Localização dos sítios arqueológicos do Parque Nacional Serra da Capivara, PI - Brasil. Toca
do Paraguaio (001), Toca do Sítio do Meio (022), Toca do Boqueirão do Sítio da Pedra Furada (023),
Toca do Morcego (049), Toca do Gongo I (082), Toca dos Coqueiros (090), Toca da Baixa do Cipó I
(171), Toca da Janela da Barra do Antonião (184), Toca da Baixa dos Caboclos (411), Toca da
Passagem (613), Toca do Serrote do Tenente Luis (643).
5.1.1.1 Toca do Boqueirão da Pedra Furada (023)
Este sítio desperta interesse por apresentar atividades humanas desde o final do
Pleistoceno, apresentando as mais antigas datações obtidas na área do Parque Nacional (até
aproximadamente 50.000 anos AP) [174, 175].
No sítio Boqueirão da Pedra Furada (Figura 7) pode-se encontrar evidências da
presença humana no NE do Brasil com uma seqüência cronológica que vai desde 48.000
anos até 60.000 anos antes do presente.
Este sítio (768877 UTM L e 9022398 UTM N) forma um abrigo sob-rocha de
grandes dimensões, com 75 metros de altura e com 70 metros de largura aproximadamente.
Sendo aberto ao sul, localizado no sopé de uma costa arenítica e em frente a uma planície
cambriana. As paredes desse abrigo estão cobertas de pinturas [175, 185].
28
O abrigo possui uma enorme plataforma (que permite o assentamento de vários
indivíduos) aonde, no lado esquerdo, um caldeirão que recebe diretamente água da chuva
que escorre por uma chaminé escavada na rocha e pode armazenar aproximadamente 7000
litros d’água [175].
Este sítio era úmido e fresco, e por isso era usado como centro cerimonial em
diversos períodos da pré-história, além de ter sido abrigo de caçadores-coletores durante o
Pleistoceno e o Holoceno [186].
Foram evidenciadas as ocupações que foram agrupadas por Niède Guidon em três
períodos: Fase Pedra Furada, que corresponde ao Pleistoceno; Fase Serra Talhada, que
corresponde ao Holoceno e a última ocupação iniciada a partir de 6000 anos AP
denominada Fase Agreste [187].
Nos períodos mais antigos foram identificados fogões com abundante presença de
carvão e artefatos líticos. O sítio foi escavado durante 20 anos, hoje sendo um museu ao ar
livre [175].
Figura 7: Sítio Toca do Boqueirão da Pedra Furada, área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI
– Brasil. Fonte: Adauto Araújo.
29
5.1.1.2 Toca do Sítio do Meio (022)
Este sítio (Figura 8) foi ocupado durante o Pleistoceno (UTM 770050 L e UTM
9023206 N). Possui características morfológicas semelhantes ao sítio Toca do Boqueirão da
Pedra Furada. É um abrigo sob rocha do tipo arenítico que fornece evidências de ocupação
desde o Pleistoceno, há cerca de 20.280 anos antes do presente [188].
Vários restos faunísticos aparecem associados a vestígios de fogueiras,
especialmente de mamíferos como tatus, roedores, tamanduás, veados, porcos, além de
lagartos, cobras não peçonhentas, aves, sapos e peixes [175].
Figura 8: Sítio do Meio, área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI – Brasil. Fonte: Laboratório
de Ecologia – ENSP/FIOCRUZ.
5.1.1.3 Toca dos Coqueiros
Trata-se de um abrigo sob rocha e localiza-se a 9022106 de UTM N e 768076 de
UTM L. No sítio foram encontradas figuras rupestres, vestígios de cerâmica, indústria lítica
e fóssil [189]. Foi escavado neste um esqueleto de mulher com datação entre 11.120 –
30
11.025 anos AP; e foram recuperados piolhos que infestavam os cabelos associados ao
esqueleto [3, 190].
5.1.1.4 Toca da Baixa do Cipó I (171)
Duas datações foram obtidas para o sítio, a mais antiga de 8.700 ± 90 anos AP.
Localizado em área de boqueirão na Serra da Capivara (UTM 774248 L e UTM 9028415
N), pinturas e a presença de materiais líticos, foram recuperados neste abrigo sob rocha
[191].
5.1.1.5 Toca do Paraguaio (001)
É um abrigo sob rocha localizado no fundo do Boqueirão (vale) de mesmo nome, O
Boqueirão do Paraguaio drena as águas que descem da chapada, passando em frente ao
abrigo (UTM 776238 L e UTM 9028069 N).
Estudos feitos no sítio (Figura 9) mostraram intensa atividade de grupos humanos
desde 8.670 ± 120 anos. Até recentemente o abrigo mostrou-se refúgio para caçadores,
agricultores e viajantes entre São Raimundo Nonato e São João do Piauí. Apesar da
perturbação do sedimento causado por tanta movimentação, foi possível recuperar restos de
alimentos em 17 camadas estratigráficas, além de indústria lítica. Duas sepulturas de 7.000
e 8.670 anos foram escavadas no local [191].
31
Figura 9: Toca do Paraguaio, área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI – Brasil. Fonte:
Laboratório de Ecologia – ENSP/FIOCRUZ.
5.1.1.6 Toca do Serrote do Tenente Luis (643)
Este sítio cárstico está localizado a 9024947 UTM N e 783909 UTM L. Foram
encontrados fósseis, objetos líticos e mais de cinco esqueletos, inclusive em urnas
funerárias. A datação mais antiga obtida para este sítio foi de 1630 ± 50 anos AP [192].
5.1.1.7 Toca do Morcego (049)
Este sítio (Figura 10) possui evidências da atividade humana desde o Holoceno.
Apresenta diversas pinturas que mostram diferentes técnicas e gravuras. É um abrigo sob
rocha localizado a meia vertente da Serra Branca, localizada à Noroeste do PNSC, e suas
coordenadas são UTML 759714 e UTMN 9060683[193]. As datações mais antigas para
este sítio se aproximam dos 9.200 anos AP [174]. Neste sítio foram encontrados também
fragmentos de cerâmica e material lítico lascado [192].
32
Figura 10: Sítio Toca do Morcego, área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI – Brasil. Fonte:
Laboratório de Ecologia – ENSP/ FIOCRUZ.
5.1.1.8 Toca da Passagem (613)
Este sítio está localizado a 750514 de UTM L e 9049988 de UTM N na região da
Serra Branca. Foi descoberto em 2002 e por isso ainda não foi escavado, apenas sondado. A
datação obtida é de 3.110 ± 70 anos AP. As evidências de atividade humana são marcadas
pela presença de pinturas rupestres e objetos líticos [192].
5.1.1.9 Toca da Baixa dos Caboclos (411)
Localiza-se no município de Gervásio Pires, a nordeste do PNSC (UTM L 821141 e
UTM N 9065356), tratando–se de um sítio peculiar por ser em uma região diferente dos
demais sítios. Neste sítio foram encontrados enterramentos em urnas como a de uma
33
criança com cerca de seis meses com cabelos aparados e pedaços de madeira compondo o
enxoval funerário. Este sítio (Figura 11) fornece importantes dados a respeito dos rituais
funerários praticados pelos antigos habitantes da região, juntamente com os achados de
outros sítios localizados próximos a este [192].
5.1.1.10 Toca do Gongo I (082)
Este sítio encontra-se na região Centro-Oeste do Parque (771699 UTM L e 9042616
UTM N). A datação mais antiga obtida neste sítio arqueológico foi 2.090 ±110 anos AP.
Foi utilizado como um tipo de cemitério, onde foram encontrados seis sepultamentos,
sendo dois em urnas funerárias. Associados às sepulturas foram encontrados restos de
tecidos, fogueiras e peças líticas [191].
5.1.1.11 Toca da Janela da Barra do Antonião (184)
Situa-se no Serrote da Barra, um maciço calcário explorado atualmente pela
população local para produção de cal (784194 UTM L e 9026010 UTM N). O sítio é
bastante amplo, possuindo 180 metros de largura e uma profundidade de 28 metros, sendo
considerado um dos mais importantes da região devido ao encontro de mais de 1.900
fragmentos de ossos e aproximadamente a mesma quantidade de peças líticas. Várias delas
foram encontradas junto com os restos de fauna, revelando a presença associada da espécie
humana com a fauna no local [191]. Essa riqueza de material paleontológico pode ser
explicada por duas hipóteses sobre a origem da sedimentação.
Sedimentação de regime lacustre com rápido soterramento dos cadáveres de animais
que morreram no local bebendo água tendo como testemunhas vários esqueletos completos
ou fragmentos em conexão anatômica; e sedimentação em regime de alta energia,
favorecida pela circulação cárstica, deixando vários ossos reduzidos ao estado de seixo por
terem sido muito rolados [191, 194].
Foi recuperado ainda, um esqueleto humano de mulher em perfeito estado de
conservação que teria sido soterrado pelo desprendimento de um bloco de
aproximadamente seis toneladas. Pela datação de 9.670 anos AP obtida da fogueira
associada ao esqueleto, esta se tornou a descoberta mais importante deste tipo na região
[173].
34
5.1.2 Antelope Cave, Arizona – USA.
O sítio arqueológico Antelope Cave, localizado no deserto do Arizona, Estados
Unidos (Figura 11), possui a evidência da ocupação por um grupo pré-histórico que habitou
esta enorme caverna por aproximadamente 3000 anos (2028 AC a 1100 DC) [130].
Figura 11: Localização do sítio arqueológico Antelope Cave, Arizona – E.U.A.
De acordo com uma enorme quantidade de artefatos encontrados nesta caverna, fica
evidente a ocupação por um grupo ceramista.
A área ao redor da caverna indica que se tratava de grupos de caçadores-coletoresagricultores, pois eles cultivavam milho e feijão, além da domesticação de plantas
selvagens para alimentação [195].
O Arizona possui um clima semiárido e recebe menos de 40 milímetros de chuva
por ano, sendo muito quente no verão e ameno no inverno [88].
Os estudos conduzidos na população da Antelope Cave ajuda a representar as
doenças parasitárias e as diferenças dietéticas do período agricultor que existiu em um dos
mais áridos desertos do oeste da América do Norte [195].
35
A Antelope Cave é um enorme abrigo parcialmente encoberto por pedregulhos que
desabaram e cobrem parcialmente a entrada. O interior da caverna tem forma hemisférica
com a área de dentro dominada por um campo de blocos grandes de fragmentos de pedra
calcária, alguns destes pesam muitas toneladas. O chão desce rapidamente à parte traseira,
afunilando. Ao longo da parede e na parte traseira da caverna o chão é coberto por terra e o
teto é predominantemente coberto por fumaça enegrecida [196].
A caverna foi descoberta em 1923 por William Atkin de St. George. A reputação do
local como uma fonte rica de artefatos pré-históricos rapidamente atraiu numerosos
coletores materiais antigos. Centenas de sandálias (de fazedores de cestas e de estilos como
os dos Pueblos), vasos de cerâmica inteiros, e vários itens perecíveis, foram recuperados no
início da exploração da caverna [195].
Jack Rudy da Universidade de Utah, E.U.A, foi o pioneiro a executar um trabalho
arqueológico profissional na caverna em 1949. Mas a primeira escavação profissional foi
feita por Robert Euler do Museum Northern Arizona (MNA) em 1954 [197].
A caverna é rica em artefatos, e foi saqueada durante mais de 50 anos. A
persistência dos saqueadores é evidência do sucesso dessas atividades. Diversos trabalhos e
coleções de museus garantem esta riqueza. Em escavações feitas pela UCLA (University of
California, Los Angeles), por exemplo, inúmeras sandálias foram recuperadas, milhares de
cordames e diversas miscelâneas de fibras, cerâmica, pedra lascada, madeira e artefatos de
cana, e milhares de espécime faunísticos e espécimes botânicos [197].
Além de lítico, diversos artefatos perecíveis foram encontrados durantes as
escavações da caverna, sendo estes últimos encontrados em maior abundância [195].
Iúca (Yucca filamentosa) foi o material preferido para a confecção de cordames,
juntamente com algodãozinho do campo (Asclepia sp.), urtiga (Urtica sp.), e outras [197].
Material faunístico foi recuperado da Antelope Cave incluindo ossos e pele, alguns
dos quais ou ambos estavam mumificados. Restos de coelhos (Sylvilagus sp.),
especialmente, veado-hemíono (Odocoileus hemionus), (comum no ocidente da América do
Norte) e lebres (Lepus sp.) dominavam a fauna recuperada na Antelope Cave, apesar de
Antilocapra, também estar presente durante os achados, Janetski & Hall [198]
evidenciaram a presença de veados (Cervus sp.), peru (Meleagris gallopavo) e outros
roedores, tais como packrat (Neotoma sp.) e esquilos (Sciurus sp.).
36
Os depósitos secos da caverna preservaram vestígios de plantas em larga
quantidade. Dentre eles galhos, especialmente Atiplex sp. e sálvia (Salvia divinorum),
fragmentos de grama, iúca (Yucca filamentosa), junípero (Juniperus sp.) e fibras de
Artemísia (Chrysanthemum parthenium) , amento (Abatia sp.) e fragmentos de caule de tule
(Schoenoplectus sp.), sabugo de milho (Zea mays) em abundância, e caules; assim como
inúmeras sementes [198].
A Antelope Cave (Figura 12) foi ocupada do médio ao último período Arcaico pelos
Pueblos, servindo como abrigos temporários ou locais de esconderijos [197].
Figura 12: Foto da direita, no centro, a entrada da caverna situa-se sob a rocha em destaque. Foto da
esquerda está Keith L Johnson, escavando o local aonde se encontraram os coprólitos na caverna
Antelope Cave, Arizona – E.U.A. Fonte: Adauto Araújo.
5.1.3 Joinville, Santa Catarina - Brasil.
Este grupo pré-histórico possui características distintas já que se trata de um grupo
de coletores-caçadores litorâneos proveniente do sambaqui Cubatão I localizado em
Joinville, Santa Catarina (Figura 13).
37
Figura 13: Localização do Sambaqui Cubatão I, Joinville, Santa Catarina, Brasil.
Sambaquis são monumentos funerários, construídos intencionalmente. São
constituídos de camadas sobrepostas de conchas e areia entre as quais se encontram
vestígios da cultura material destes grupos (Figura 14). Pela presença destes remanescentes,
sabe-se que os sambaquis foram locais de moradia, como uma aldeia. Neles são
encontrados vestígios que indicam atividades cotidianas de preparação e consumo de
alimentos, como fogueiras, ossos de animais com marcas de corte e pedras para quebrar
coquinhos; de preparo e utilização de instrumentos, como fragmentos de ossos e pedras
polidas; de construção e utilização de moradias, como marcas de pisos e estacas; e de
sepultamento de mortos e seus rituais, o que significa dizer que os sambaquis não eram
depósitos de lixo nem cemitérios [199].
38
Figura 14: Sítio Cubatão I, Joinville, Santa Catarina, Brasil – durante escavação em 2007. Fonte:
Sheila Mendonça.
Para garantir a sobrevivência do grupo sambaquiano diversos ambientes e recursos
marinhos e terrestres eram explorados. Os moluscos, provavelmente utilizados na
alimentação, mas também como material construtivo, eram coletados, principalmente, nos
manguezais e nas águas da baía. Embora, tenha-se a impressão, ao olhar um sambaqui, que
os moluscos foram os alimentos preferidos, eram os peixes os animais mais significativos
na dieta alimentar, capturados tanto no mar aberto como nas águas da baía [200, 201].
Apesar da pesca ser a principal atividade executada como fonte de alimento, os
grupos sambaquianos também praticavam a caça de animais terrestres. A espécie Tayassu
tajacu (porco-do-mato), conforme estudos [201, 202], foi o preferido, mas se encontram
ossos de uma grande variedade de animais como Hydrochoerus hydrochaeris (capivara),
Ozotoceros bezoarticus (veado), Panthera onca (onça), Cebus sp. (macaco), Sauria sp.
(lagarto), dentre outros pequenos animais que compunham a dieta destes grupos. São
encontrados, também restos ósseos de aves, cujo objetivo final deveria estar na confecção
de adornos e artefatos.
Estudos feitos pelo campo da Antropologia Biológica sobre os esqueletos
encontrados nos sambaquis têm indicado ausência da prática de horticultura, mesmo nos
períodos finais quando a cerâmica já ocorria [163]. O ambiente da região é marcado por um
39
mosaico de formações geomorfológicas e vegetais que compõe um rico ecótono litorâneo
com acesso a ambientes lacustres, estuarinos, pequenas lagoas e baías de fundo lodoso e
arenoso, praias de mar aberto, costões, mangue, mata de restinga, Mata Atlântica, etc.
[203].
O sambaqui Cubatão I (UTM 22J 7099808/0722575) faz parte de um conjunto de
sete sítios da embocadura do rio Cubatão, denominados por Oliveira [204] de Complexo
Cubatão. Este rio desemboca no sul do Canal do Palmital, no fundo e a norte da Baía da
Babitonga, situada no litoral norte de Santa Catarina, Brasil. Tem, aproximadamente, altura
de 10m, 80m de comprimento e 70m de largura, de forma oval orientada norte - oeste/sulsudeste. Tendo em vista estar localizado atualmente na margem do rio, forte processo de
erosão vem atuando na sua face norte - leste o que produziu um corte de 10m de altura por
80m de comprimento, aproximadamente. A base desta face é permanentemente atingida
pela maré [205].
A Baía da Babitonga é uma das regiões que se destaca pela grande quantidade de
sambaquis até o momento são conhecidos 150 sítios deste tipo. Em Joinville, cidade em
que se localiza o sambaqui Cubatão I, existe 39 sambaquis cadastrados. A data mais antiga
para a região é do sambaqui Palmital de 5.420 anos AP e a mais recente é de 1.110 anos AP
do sambaqui Forte Marechal Luz [201].
Nesta região ocorrem espécies que podem fornecer uma série de recursos
importantes para a alimentação e produção de artefatos como: frutas, sementes, folhas,
raízes, mel, óleos, temperos, remédios, sucos, fibras, ceras, resinas, madeiras, corantes,
combustíveis, adornos etc. Entre as quase 20.000 espécies existentes, algumas se destacam
por servirem de matéria prima para a construção de canoas, cabanas, corantes, adornos ou
como fonte de alimento; dentre elas estão os garapuvu (Shizolobium parahybum), ingá
(Inga sp.), palmiteiro (Euterpe sp.), coqueiro (Coco nucifera sp.), canela (Cinnamomun
zeulanicum), ipê (Zeyheria sp.) e as figueiras (Ficus carica), urucuns (Bixa orellana), além
das bromélias (Alcantaraea imperialis), das orquídeas (Orchidaceae sp.), entre tantos
outros [206]. A fauna é constituída de diversas espécies abundantes de mamíferos, peixes,
aves, répteis, anfíbios, crustáceos e moluscos, entre diversas outras classes de
invertebrados. Embora a dificuldade de se encontrar os mamíferos e as aves atualmente, por
40
causa da atividade de caça em abundância e a destruição de seus habitats, essas eram de
grande importância para o grupo pré-histórico [203].
A riqueza da microfauna, como abelhas, vespas, larvas e formigas que, segundo
determinados pressupostos culturais, podem assumir significativo papel nas dietas
alimentares deve ser considerada um fator importante.
5.2 ANÁLISE INICIAL DO MATERIAL UTILIZADO NO ESTUDO
As amostras utilizadas neste estudo foram coletadas pelos arqueólogos associados à
Fundação do Homem Americano - FUMDHAM e à Fundação Oswaldo Cruz – FIOCRUZ
durante escavações, na área arqueológica de São Raimundo Nonato, no estado do Piauí, e
engloba o Parque Nacional da Serra da Capivara, em 2005. Foram utilizadas 59 amostras,
tanto de coprólitos livres no solo e identificados como coprólitos de origem humana, como
sedimentos recolhidos diretamente da região pélvica de esqueletos sepultados.
As amostras provenientes da Antelope Cave, Arizona, E.U.A, foram coletados pelos
arqueólogos associados à Universidade de Nebraska, diretamente da região pélvica dos
sepultamentos. Foram coletadas 11 amostras de sedimentos desta região.
As coletas em Joinville, Santa Catarina, Brasil, foram feitas em Junho de 2007 e
maio de 2008, por equipes coordenadas por Dra. Sheila Mendonça de Souza
(ENSP/FIOCRUZ - Brasil), Dr. Levy Figuti (MAE/USP - Brasil), Dra. Dione Bandeira
(MASJ/FCJ - Brasil) e Dr. Jean Pierre Bocquet-Appel (CNRS - França). Foram coletadas
15 amostras de sedimentos retirados diretamente da região pélvica dos sepultamentos.
Os coprólitos e sedimentos coletados dos diferentes grupos pré-históricos foram
armazenados
em
sacos
plásticos,
etiquetados
e
enviados
ao
laboratório
de
paleoparasitologia, localizado no Departamento de Endemias Samuel Pessoa, Escola
Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz.
41
5.3 ANÁLISE LABORATORIAL
No laboratório, os coprólitos com origem humana confirmada pela morfologia
foram reidratados. Fragmentos soltos e aproximadamente cinco gramas dos coprólitos
permaneceram em solução aquosa de fosfato trissódico a 0,5% por um período de 72 horas
[37], homogeneizados e coados em gaze triplamente dobrada em cálices cônicos para
sedimentar por um período de 24 horas, segundo a técnica adaptada de Lutz [207] para
diagnóstico da esquistossomose mansônica e adotada no Laboratório de Paleoparasitologia
como a mais indicada [19, 86].
5.3.1 Análise da Dieta Macroscópica
Para estudo da dieta macroscópica, analisou-se o material retido na gaze em
microscópio estereoscópico. Todos os fragmentos vegetais macroscópicos encontrados,
como tecidos vegetais, sementes, folhas e cascas; além de outros resíduos como carvão,
insetos, pêlos, penas, ossos e dentes, foram identificados, sempre que possível, separados,
fotografados e catalogados.
Após identificação dos itens alimentares encontrados na dieta macroscópica, os
resíduos foram organizados quanto à abundância, nas seguintes categorias: raro, abundante,
pouco abundante e predominante.
5.3.2 Análise da Dieta Microscópica e Análise Parasitológica
O material que percolou pela gaze no momento da filtração foi utilizado para análise
da dieta microscópica e de parasitos. Com o sedimento acumulado foram montadas 20
lâminas de cada amostra, analisadas em microscópio óptico (400x) segundo procedimentos
de rotina adotados em análises paleoparasitológicas [19, 86, 171]. Os resultados
parasitológicos foram obtidos por meio de análises feitas por outros membros do
laboratório de paleoparasitologia em estudos anteriores, os resultados da região
arqueológica de São Raimundo Nonato, PI, foram revistos por Sianto [194].
Os resíduos alimentares microscópicos, tais como fitólitos, grãos de amido, grãos de
pólen, tecidos vegetais, carvão insetos, pêlos, penas, debris foram identificados,
fotografados e catalogados sempre que possível.
42
Para a identificação dos grãos de amido foi utilizada a luz polarizada em
microscópio óptico com o aumento de 400x.
5.3.3 Análise Química para Sedimentos
Para os sedimentos coletados diretamente da região pélvica de sepultamentos, foi
utilizada a técnica química para observação de polens, que consiste na inserção de 2,0 cm3
de sedimento em um Becker de 100 ml com adição de 50 ml de água destilada para
dissolução deste material; após este processo é feita a tamisagem do material em uma
malha de 200 m, para retirada de restos vegetais, areias e outros materiais De acordo com
a metodologia descrita é feita a adição de duas pastilhas de esporo exótico (Lycopodium sp.
- cada uma com 12.100 esporos, para cálculo posterior da freqüência absoluta dos
palinomorfos - Stockmarr, 1971); no entanto em meu estudo não foi adicionado o
Lycopodium sp. por esta planta fazer parta da flora do Piauí e pelo fato de meu estudo não
se tratar de um estudo quantitativo, somente qualitativo, não havendo necessidade da
inserção deste material. É feita a transferência do material solubilizado para tubos plásticos
de centrífuga para descarte da água, é adicionado HF (ácido fluorídrico) a 40%, para
eliminação dos silicatos, com repouso de 24h; (esta etapa é repetida quando necessário); é
feita a adição de HCl (ácido clorídrico) a 50%, para eliminação dos fluossilicatos formados
na reação anterior; fervura por 15 minutos; e após este processo, é adicionado hidróxido de
potássio a 10% para eliminação dos elementos vegetais indesejáveis.
A adição de CH3COOH (ácido acético) ocorre para desidratar o material. A adição
de 5 ml da mistura para acetólise: 4,5 ml de HOOC-COOH P.A. (anidrido acético) e 0,5 ml
de H2SO4 P.A. (ácido sulfúrico), é feita para dissolução de parte da matéria orgânica, em
especial da celulose, e acetilação da exina (Erdtman, 1952), fervura por 4 minutos.
A lavagem do material contido no tubo com 10 ml de água destilada é feita e ocorre
a adição de ZnCl2 (cloreto de zinco), para separação dos palinomorfos do material restante;
com transferência do sobrenadante com palinomorfos para outro tubo de centrífuga (esta é
a única etapa em que o sobrenadante é aproveitado).
É adicionado HCl (ácido clorídrico) a 10%, para possibilitar a sedimentação dos
palinomorfos, recuperando-os; e após a lavagem do material é adicionada água glicerinada,
para a posterior montagem das lâminas [165, 167, 208].
43
5.4 ANÁLISE ESTATÍSTICA
As amostras foram analisadas estatisticamente com o auxílio do pacote estatístico
gratuito R, para medir a significância estatística entre os resultados.
Foi estabelecida pelo teste do chi-quadrado ou pelo teste exato de Fischer, quando
indicado, para as variáveis categóricas, e pelo teste t de Student ou Anova, quando indicado
para as variáveis contínuas. Um p-valor igual ou menor que 0,05 foi considerado
significativo. Para identificar possíveis associações entre grãos de pólen com propriedades
anti-helmínticas e a presença de ovos de helmintos, por região arqueológica.
44
6. RESULTADOS
6.1 Análise morfológica
Um total de 85 amostras de coprólitos e sedimentos foram analisados. Pelas
características morfológicas (Figura 15) dos coprólitos e por meio da identificação dos
vestígios alimentares, foi possível confirmar que todas as amostras eram de origem humana.
1cm
1cm
1cm
1cm
1cm
1cm
Figura 15: A, B, C, D, E) Coprólitos Humanos recuperados no Sítio do Meio (022); F) Coprólito
Humano recuperado no sítio arqueológico Sítio Toca da Baixa dos Caboclos (411), área arqueológica de
São Raimundo Nonato, PI – Brasil.
6.2 Análise de vestígios alimentares macroscópicos
Foram analisados todos os coprólitos selecionados, e separados por sítios
arqueológicos.
Os dados macroscópicos de sedimentos não foram levados em consideração, por
tornarem as análises estatísticas tendenciosas.
45
Foram encontrados no Sítio Toca da Baixa dos Caboclos uma grande quantidade de
material vegetal e sedimento, neste caso uma grande quantidade de sedimento. E foi
encontrada em uma amostra escamas de réptil e partes de insetos. Em duas amostras foram
encontradas sementes (Gráfico 1), Este sítio apresenta coprólitos com datações de 400 ± 50
anos AP.
100%
90%
80%
70%
porcentagem
60%
sedimento
mat. Veg.
insetos
sementes
escamas
50%
40%
30%
20%
10%
0%
raro
pouco abundante
abundante
predominante
abundância
Gráfico 1: Riqueza e abundância de vestígios alimentares macroscópicos dos coprólitos do sítio arqueológico
Toca da Baixa dos Caboclos (411), área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI. – Brasil.
46
No Sítio Toca dos Coqueiros foram recuperados sementes, dentes, fragmentos de
ossos, carvão e em maior abundância material vegetal e sedimento (Gráfico 2). Os
coprólitos deste sítio apresentam datações de 8.870 ± 60 anos AP.
100%
porcentagem de amostras
80%
sedimento
mat. Veg.
60%
carvão
insetos
sementes
40%
dentes
ossos
20%
0%
raro
pouco abundante
abundante
predominante
abundância
Gráfico 2: Riqueza e abundância de vestígios alimentares macroscópicos dos coprólitos do sítio arqueológico
Toca dos Coqueiros (090), área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI – Brasil.
47
O Sítio do Meio possui coprólitos com datações superiores a 8800 anos AP. O item
alimentar predominante encontrado nos restos macroscópicos deste sítio foi sedimento, de
acordo com a formação do coprólito, o carvão, seguido do material vegetal. Foram
encontrados partes de exoesqueletos de insetos, fragmentos de ossos de pequenos roedores,
dentes e sementes (Gráfico 3).
100%
90%
80%
porcentagem de amostras
70%
sedimento
mat. Veg.
carvão
insetos
sementes
dentes
ossos
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
raro
pouco abundante
abundante
predominante
abundância
Gráfico 3: Riqueza e abundância de vestígios alimentares macroscópicos dos coprólitos do sítio
arqueológico Sítio do Meio (022), área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI – Brasil.
48
Os coprólitos do Sítio Toca do Boqueirão da Pedra Furada, com datações de 9800 ±
60 anos AP, apresentaram itens alimentares predominantes como material vegetal,
sedimento, partes de exoesqueleto de insetos, sementes, e fragmentos de ossos de pequenos
roedores (Gráfico 4).
100%
90%
80%
porcentagem de amostras
70%
sedimento
mat. Veg.
carvão
insetos
sementes
ossos
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
raro
pouco abundante
abundante
predominante
frequência
Gráfico 4: Riqueza e abundância de vestígios alimentares macroscópicos dos coprólitos do sítio arqueológico
Toca do Boqueirão da Pedra Furada (023), área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI – Brasil.
49
O Sítio Gongo I, com amostras sem datação determinada. Apresentou
predominantemente material vegetal e pêlos em suas amostras, e abundantemente partes de
insetos e sementes, além de apresentar em pouca quantidade sedimento (Gráfico 5).
100%
90%
80%
porcentagem de amostras
70%
sedimento
mat. Veg.
carvão
insetos
sementes
pêlos
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
raro
pouco abundante
abundante
predominante
frequência
Gráfico 5: Riqueza e abundância de vestígios alimentares macroscópicos dos coprólitos do sítio arqueológico
Sítio Gongo I (082), área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI – Brasil.
50
Representado no Gráfico 6 estão os resultados da dieta macroscópica dos Sítios
Antonião, Toca da Passagem este sítio com datações de 3190 ± 70 anos AP, Toca do
Morcego, Toca do Paraguaio e Toca da Baixa do Cipó I, por se tratarem apenas de uma
amostra por sítio arqueológico. Os itens alimentares mais predominantes em todas as
amostras foram sedimento, material vegetal e fragmentos de ossos de pequenos roedores.
Carvão e partes de exoesqueleto de insetos também foram encontrados nestas amostras.
100%
90%
80%
porcentagem de amostras
70%
60%
sedimento
mat. Veg.
carvão
insetos
ossos
50%
40%
30%
20%
10%
0%
raro
pouco abundante
abundante
predominante
frequência
Gráfico 6: Riqueza e abundância de vestígios alimentares macroscópicos dos coprólitos dos sítios arqueológicos Sítio
Antonião (184), Toca da Passagem (613), Toca do Morcego (049), Toca do Paraguaio (001) e Baixa do Cipó I (171),
área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI – Brasil.
51
6.3 Análise de vestígios alimentares microscópicos gerais
Foram analisados microscopicamente todos os coprólitos e sedimentos. No gráfico
abaixo (Gráfico 7), está apresentada a riqueza dos vestígios alimentares recuperados por
sítio arqueológico.
Em quase todos os sítios estudados, houve uma grande variedade de resíduos
alimentares recuperados. A maioria das amostras apresentou carvão e uma grande
quantidade de material vegetal, que são itens característicos da dieta humana.
Chama atenção o sítio Toca do Morcego, em razão de que apenas uma amostra
correspondia a este sítio, e foi possível identificar apenas debris em sua análise.
100%
porcentagem de amostras
80%
pólen
debris
amido
mat.veg.
carvão
insetos
traqueídeo
fitólito
pêlos
60%
40%
20%
ub
a
tã
o
I
av
e
C
C
iã
o
to
n
te
lo
pe
An
An
eg
o
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te
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o
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gu
I
Pa
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ag
em
G
on
go
I
Ba
ix
a
do
Ci
p
o
BP
F
M
ei
o
0%
sítios arqueológicos
Gráfico 7: Riqueza de vestígios alimentares microscópicos, dos sítios arqueológicos estudados: Sítio do Meio,
Sítio Toca do Boqueirão da Pedra Furada, Sítio Toca da Baixa do Cipó I, Sítio Toca do Gongo I, Sítio Toca
da Passagem, Sítio Toca do Paraguaio, Sítio Toca do Serrote do Tenente Luiz, Sítio Toca dos Coqueiros, Sítio
Toca dos Caboclos, Sítio Toca do Morcego, Toca Janela da Barra do Antonião, área arqueológica de São
Raimundo Nonato, PI – Brasil; Sítio Antelope Cave, Arizona – E.U.A.; Sítio Cubatão I, Joinville, Santa
Catarina - Brasil.
52
6.3.1 Identificação de Amidos
Foram recuperados amidos de oito sítios arqueológicos. Os amidos foram analisados
e identificados quando possível.
Sítio do Meio
Foram recuperados do Sítio do Meio diferentes tipos de amidos, tais como, amidos
de Zea mays (milho), Manihot esculenta (mandioca), grânulos de amido globular, com
facetas, hilo central em forma de ponto escuro (similar à Araceae), amidos modificados
possivelmente de Ipomoea batatas (batata doce). E ainda, amido sugestivo de Araucaria
angustifolia (Pinhão). Os amidos identificados e outros que não puderam ser identificados
estão representados na figura 16.
20µm
20µm
20µm
20µm
20µm
20µm
20µm
20µm
Figura 16: A) amido sugestivo de Zea mays (milho); B) amido sugestivo de Manioc suculenta; C) Amido
não identificado; D) Amido sugestivo de Ipomoea batatas (batata-doce); E) Amido sugestivo de
Araucaria angustifolia; F) Amido quadrado facetado, hilo central globular, não identificado; G)
Grânulo de amido facetado sugestivo de Ipomoea batatas (batata-doce); H) Amido modificado
possivelmente de Ipomoea batatas (batata-doce). Sítio do Meio, área arqueológica de São Raimundo
Nonato, PI – Brasil. (aumento de 400x).
53
Sítio Toca do Boqueirão da Pedra Furada
Foram identificados amidos sugestivos de Araucaria angustifolia (pinhão), Ipomoea
batatas (batata doce), amidos semelhantes aos de Araceae, além de alguns amidos que não
puderam ser identificados (Figura 17).
20µm
20µm
20µm
20µm
20µm
20µm
20µm
20µm
20µm
20µm
Figura 17: A e B) Grânulo de amido facetado com hilo central sugestivo de Ipomoea batatas; C) Amido
modificado, não identificado; D) Amido semelhante ao de Ipomoea batatas; E) Amido não identificado
alongado, hilo centra globular; F) Amido arredondado, hilo central, globular; G) Amido sugestivo de
pinhão (Araucaria angustifolia); H)Amido globular, com facetas, hilo central em forma de ponto escuro,
semelhante ao de Araceae; I) Amido sugestivo de Pinhão (Araucaria angustifolia); J) Amido
possivelmente de Ipomoea batatas. Sitio Toca do Boqueirão da Pedra Furada, área arqueológica de São
Raimundo Nonato, PI – Brasil (aumento de 400x).
Sítio Toca dos Coqueiros
Foram identificados amidos de Ipomoea batatas (batata doce) e Manihot
esculenta (mandioca), além de alguns amidos que não puderam ser identificados
(Figura 18).
54
20µm
20µm
20µm
Figura 18: A) Amido modificado, não identificado; B) Amido facetado, com hilo central, sugestivo de
Ipomoea batatas; C) Amido sugestivo de Manioc esculenta. Sítio Toca dos Coqueiros, área arqueológica
de São Raimundo Nonato, PI – Brasil (aumento de 400x).
Sítio Toca da Baixa dos Caboclos
Foram recuperados amidos alongados, com uma faceta, hilo central, que não
puderam ser identificados quanto ao táxon. Alguns amidos modificados também não
permitiram que fossem identificados (Figura 19). Foram encontrados amidos sugestivos de
Zea mays (milho).
20µm
20µm
20µm
20µm
Figura 19: A) Grânulo de amido sugestivo de Zea mays alterado; B)Amido alongado, com uma faceta,
hilo central, não identificado; C) Amido cupuliforme, hilo central, não identificado; D) Amido
quadrado, facetado, com hilo central, globular. Sítio Toca da Baixa dos Caboclos, área arqueológica de
São Raimundo Nonato, PI – Brasil (aumento de 400x).
Sítio Toca da Passagem
Foram recuperados amidos globulares, hilo central, não identificados (Figura 21).
55
20µm
20µm
Figura 20: Grânulo de amido globular, hilo central, não identificado, foto esquerda com luz polarizada
e foto da direita sem em microscópio óptico. Sítio Toca da Passagem, área arqueológica de São
Raimundo Nonato, PI – Brasil (aumento de 400x).
Sítio Baixa do Cipó I
Não foi possível identificar os amidos recuperados neste sítio quanto ao
taxon (Figura 21).
20µm
20µm
Figura 21: Grânulo de amido globular, com facetas, hilo central, não identificado, similar à Araceae.
Foto da esquerda com luz polarizada e foto da direita sem, em microscópio óptico. Amostras do Sítio
Baixa do Cipó I, área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI – Brasil (aumento de 400x)
Sítio Antelope Cave
Foram identificados amidos de Manihot esculenta (mandioca) e Zea mays (milho),
Figura 22.
56
10µm
20µm
10µm
20µm
Figura 22: A) Amido globular, com hilo central sugestivo de Zea mays (milho), foto com luz polarizada
(aumento 400x); B) Grânulos de amidos foto com luz polarizada (aumento 100x); C) Amido sugestivo
de Manihot esculenta (mandioca), foto com luz polarizada (aumento 400x); D) Grânulos de amidos não
identificados (aumento de 100x). Sítio Antelope Cave, Arizona – E.U.A.
Sítio Cubatão I
Foram recuperados diversos grânulos de amidos modificados, que não
puderam ser identificados (Figura 23).
50µm
Figura 23: Grânulos de amidos não identificados (aumento de 400x). Sítio Cubatão I, Joinville, Santa
Catarina – Brasil.
57
6.3.2 Identificação de Grãos de Pólen
Foram recuperados grãos de pólen de oito sítios arqueológicos: Sítio do Meio, Sítio
Toca do Boqueirão da Pedra Furada, Sítio Toca dos Coqueiros, Sítio Toca da Baixa dos
Caboclos, Sítio Toca da Passagem, Sítio Gongo I, Sítio Antelope Cave e Sítio Cubatão I.
Os grãos de pólen foram analisados e identificados quando possível.
Sítio do Meio
O Sítio do Meio apresentou um total de 24 amostras. Foram recuperados do Sítio do
Meio diferentes tipos de grãos de pólen em três das oito amostras positivas para o exame
parasitológico.
Grãos de pólen de espécies com propriedade anti-helmíntica como Malvaceae tipo
Sida sp. foram identificados em uma amostra.
Foi possível identificar a família de alguns grãos de pólen sem propriedade antihelmíntica, mas que faziam parte da dieta, somente nas 16 amostras negativas para exame
parasitológico (Figura 24).
40µm
40µm
40µm
40µm
40µm
40µm
Figura 24: A) Grão de pólen da família Poaceae; B) Grão de pólen não identificado; C) Grão de pólen
da família Convolvulaceae tipo Ipomoea sp.; D) Grão de pólen da família Malvaceae tipo Sida sp.; E)
Grão de pólen não identificado; F) Grão de pólen da família Malpighiaceae. (aumento 400x) Sitio do
Meio, área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI – Brasil.
58
Sítio Toca do Boqueirão da Pedra Furada
Um total de 12 amostras foram recuperadas do sítio Toca do Boqueirão da Pedra
Furada. Foram identificados grãos de pólen da família Malvaceae tipo Sida sp., plantas com
propriedades anti-helmínticas, em
três das seis amostras negativas para o exame
parasitológico.
Grãos de pólen sem propriedades anti-helmínticas foram identificados quanto à
família em todas as seis amostras positivas para o exame parasitológico (Figura 25).
40µm
40µm
40µm
40µm
40µm
40µm
Figura 25: A e B) Grão de pólen da família Convolvulaceae tipo Ipomoea sp.; C) Grão de pólen
Caesalpinia sp.; D) Grão de pólen da família Malvaceae tipo Sida sp.; E) Grão de pólen da família
Concurbitaceae; F) Esporo da família Polypodiaceae (aumento 400x) Sitio Toca do Boqueirão da Pedra
Furada, área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI – Brasil.
Sítio Toca dos Coqueiros
Foram recuperados do Sítio Toca dos Coqueiros sete amostras. Foram
identificados grãos de pólen sem propriedade anti-helmíntica em duas das três
amostras positivas para o exame parasitológico (Figura 26).
59
40µm
40µm
30µm
20µm
Figura 26: A) Grão de pólen não identificado; B) Grão de pólen da família Convolvulaceae tipo
Ipomoea sp.; C) e D) Grãos de pólen Euphorbia sp. (aumento 400x). Sítio Toca dos Coqueiros, área
arqueológica de São Raimundo Nonato, PI – Brasil.
Sítio Toca da Baixa dos Caboclos
Foram utilizadas duas amostras recuperadas neste sítio e ambas mostraram-se
positivas para o exame parasitológico. Foram recuperados grãos de pólen em ambas as
amostras.
Foram identificados grãos de pólen do tipo Chenopodium sp. e Sida sp., plantas
características por possuírem propriedades anti-helmínticas (Figura 27).
40µm
60µm
40µm
Figura 27: A) Grão de pólen de Chenopodium sp.; B) e C) Grãos de pólen de Convolvulaceae tipo
Ipomoea sp. (aumento 400x). Sítio Toca da Baixa dos Caboclos, área arqueológica de São Raimundo
Nonato, PI – Brasil.
60
Sítio Toca da Passagem
Foi recuperado apenas um tipo de grão de pólen na única amostra deste sítio que se
mostrou negativa para o exame parasitológico (Figura 28).
50µm
50µm
Figura 28: A) Grão de pólen possivelmente da família Arecaceae; B) Grão de pólen não identificado
(aumento de 400x) Sítio Toca da Passagem, área arqueológica de São Raimundo Nonato, PI – Brasil.
Sítio Gongo I
Foram analisadas duas amostras provenientes deste sítio. Grãos de pólen do
tipo Sida sp., planta importante por apresentar propriedades anti-helmínticas foram
recuperados na amostra negativa para o exame parasitológico (Figura 29).
60µm
Figura 29: Grão de pólen de Malvaceae tipo Sida sp. (aumento 400x). Sítio Gongo I, área arqueológica
de São Raimundo Nonato, PI – Brasil.
Sítio Antelope Cave
Em duas das cinco amostras positivas para o exame parasitológico foram
recuperados grãos de pólen possivelmente pertencentes à família Poaceae (Figura 30).
61
50µm
40µm
Figura 30: A) Grão de pólen não identificado; B) Grão de pólen possivelmente pertencente à família
Poaceae (aumento de 400x). Sítio Antelope Cave, Arizona – E.U.A.
Sítio Cubatão I
Foram recuperados esporos de samambaias (Polypodiaceae) em uma
amostra das 14 negativas para o exame parasitológico. Grãos de pólen não
identificados foram recuperados em uma amostra também negativa para o exame
parasitológico (Figura 31).
40µm
40µm
Figura 31: A) Grão de pólen não identificado; B) Esporo de samambaia (Polypodiaceae), Sítio Cubatão
I, Joinville, Santa Catarina - Brasil (aumento de 400x).
62
6.4 Resultados para plantas com propriedades anti-helmínticas
As amostras nas quais foram encontradas formas embrionárias de helmintos foram
analisadas por outros pesquisadores do laboratório de Paleoparasitologia e foram
comparadas com as amostras nas quais grãos de pólen com e sem propriedades antihelmínticas foram identificados (Tabela 1).
No Sítio do Meio foram encontrados parasitos como Trichuris sp. (Nematoda:
Trichuridae), Spirometra sp. (Cestoda: Diphyllobothridae), Trematoda não identificado,
Ancylostomidae e ovos de Oxyuridae. E foram encontrados nestas mesmas amostras grãos
de pólen com propriedades anti-helmínticas como, Malvaceae tipo Sida sp. e grão de pólen
sem propriedades anti-helmínticas.
As seis amostras positivas para helmintos provenientes do Sítio Toca do Boqueirão
da Pedra Furada não apresentaram grãos de pólen com propriedades anti-helmínticas. Três
amostras negativas para parasitos deste sítio, apresentaram grãos de pólen de Malvaceae
tipo Sida sp., planta com propriedades anti-helmínticas.
O Sítio Toca dos Coqueiros apresentou em suas amostras helmintos como Trichuris
sp. (Nematoda: Trichuridae), Ancylstomidae, Ascaridae e Parapharyngodon sp.
(Nematoda: Pharyngodonidae). Os grãos de pólen identificados não possuem propriedades
anti-helmínticas,
são
eles:
Convolvulaceae
tipo
Ipomoea
sp.
e
Euphorbia
sp.(Magnoliophyta: Euphorbiaceae).
O Sítio Gongo I apresentou grãos de pólen de Malvaceae tipo Sida sp., planta com
propriedade anti-helmíntica, em sua amostra negativa para o exame parasitológico.
O Sítio Toca da Passagem teve resultados negativos tanto para a análise parasitológica,
como para a presença de grãos de pólen com propriedades anti-helmínticas. Foram
encontrados grãos de pólen semelhantes aos da família Arecaceae e grãos de pólen não
identificados.
63
O Sítio Toca da Baixa do Caboclos teve em suas amostras os helmintos: Parapharyngodon
sp. (Nematoda: Pharyngodonidae), Trematoda não identificado, Oxyuridae e Trichuris sp.
(Nematoda: Trichuridae). Nestas amostras foram encontrados grãos de pólen com
propriedades
anti-helmínticas
tais
como
Chenopodium
sp.
(Magnoliophyta:
Amaranthaceae) e Malvaceae tipo Sida sp.
Os sítios Toca da Baixa do Cipó I, Toca do Paraguaio, Toca do Serrote do Tenente Luiz,
Toca do Morcego e Toca da Barra da Janela do Antonião, tiveram suas amostras negativas
tanto para as análises parasitológicas, quanto para as análises palinológicas.
O Sítio Antelope Cave apresentou os helmintos: Enterobius vermicularis
(Nematoda: Oxyuridae), Macracanthorhynchus hirudinaceus e Ancylostomidae. Os grãos
de pólen identificados foram de Poaceae, que não possuem propriedades anti-helmínticas.
O Sítio Cubatão I teve apenas uma amostra positiva para Trichuris sp.. E grão de
pólen de Pteridophytas, que são plantas sem propriedades anti-helmínticas, porém
utilizadas por animais para provocar vômito.
64
Tabela 1: Lista de resultados para análise parasitológica e para análise palinológica,
por sítio arqueológico.
*Os helmintos das amostras da região arqueológica de São Raimundo Nonato, PI – Brasil, foram analisados por pesquisadores do laboratório de
paleoparasitologia e revisados por Sianto, 2005.
**Os helmintos das amostras do Sítio Antelope Cave, Arizona – E.U.A. e do Sítio Cubatão I, Joinville, Santa Catarina – Brasil, foram analisados por
pesquisadores do laboratório de paleoparasitologia em análises anteriores
65
6.5 Análise Estatística
Os sítios da região arqueológica de São Raimundo Nonato, PI - Brasil, foram agrupados
formando a região de comparação para o teste estatístico, denominado Piauí.
Foi realizado o teste exato de Fisher, nas três regiões arqueológicas: Piauí, Antelope Cave
e Joinville. Porém não houve associação estatisticamente significativa, ao nível de 5%, entre a
presença de grão de pólen com propriedade anti-helmíntica e a presença de helmintos nestes
locais.
Para o sítio Antelope Cave, Arizona – E.U.A. não foi realizado o teste, pois em nenhuma
das amostras estudadas foi encontrado grãos de pólen com propriedades anti-helmínticas.
66
7. DISCUSSÃO
7.1 Da análise da dieta
7.1.1 Região Arqueológica São Raimundo Nonato, PI.
Foram confirmados nos achados coprológicos, vegetais cultivados nas regiões pelos
habitantes pré-históricos dos sítios arqueológicos da região de São Raimundo Nonato, PI.
Resíduos alimentares como, milho, mandioca, batata-doce, e pinhão são vegetais
que eram consumidos por estes habitantes [173, 192].
Foram encontrados, conforme o esperado, fragmentos de carvão nas dietas, que
indicam a preparação do alimento sem recipiente próprio para o cozimento, diretamente no
fogo [19, 194].
Restos de inseto, tais como partes de cabeças e exoesqueleto não puderam ser
identificados por estarem muito fragmentados.
Partes de ossos que foram encontrados nas dietas, puderam ser identificados como
ossos de roedores, graças a mandíbulas e dentes bem preservados. Assim, a caça de animais
e o consumo de pequenos roedores inteiros se confirmam.
Escamas de réptil foram encontradas em perfeito estado de conservação (Figura 32)
em uma das amostras do sítio Toca da Baixa dos Caboclos. Nesta mesma amostra foram
encontrados ovos do parasito Parapharyngodon sp., helminto de lagartos, indicando um
provável caso de falso parasitismo. Mesmo não sendo considerado zoonótico, o encontro de
Parapharyngodon sp. em coprólitos humanos é um achado bastante interessante, pois
evidencia o consumo de animais inteiros e crus ou mal cozidos [194].
Alguns autores, como Reinhard [130], Martin [173], Prous [209], Bastos [210] e
Sianto [194], já atentaram ao fato de grupos humanos pré-histórico consumirem lagartos
em períodos de estiagem severa. Principalmente em grupos da Antelope House, Arizona.
Em estudos paleoecológicos, Sianto [194], reuniu em sua tese evidências, de que no
sudeste do Piauí os períodos de estiagem severa não diminuíam a oferta de alimentos
vegetais, gerando a possibilidade de que populações pré-históricas faziam o consumo de
lagartos.
67
0,5cm
Figura 32: Escama de réptil encontrada em dieta de uma amostra do Sítio Toca dos Caboclos, na região
arqueológica de São Raimundo Nonato, PI - Brasil (aumento de 40x).
Foram recuperados ainda, em algumas amostras traqueídeos, que são células
alongadas, ricamente pontoadas, de extremidades não perfuradas. A água passa de
traqueídeo a traqueídeo através das pontoações areoladas, ou seja, a água atravessa a parede
delgada (membrana) da pontoação. Os traqueídeos são os principais elementos condutores
na maioria das Pteridófitas, (com exceção de Pteridium e Selaginella), Gimnospermas
(exceto as Gnetales) e Angiospermas [211].
A área arqueológica de São Raimundo Nonato registram, até o momento, os grupos
humanos mais antigos que habitaram as Américas. Essencialmente caçadores-coletores,
estes grupos permaneceram com os hábitos de caça, mesmo com a iniciação da agricultura
há cerca de 2.000 anos AP [212].
A megafauna da região sudeste do Piauí ocupava principalmente os vales das áreas
cársticas, como a região dos serrotes, próxima de diversos sítios que apresentam indícios de
ocupação humana desde o Pleistoceno. Como as regiões são bastante próximas, torna-se
fácil de imaginar que os grupos humanos se locomoviam para caçar nesta área, retornando
após o período de caça para o local de habitação [191, 194].
68
7.1.2 Antelope Cave
Por serem sedimentos retirados diretamente da região pélvica dos sepultamentos,
não foi possível a realização da análise da dieta macroscópica.
Assim, a análise microscópica da dieta revela uma série de vegetais, tais como,
milho e mandioca, que eram cultivados pela população local [213].
A grande quantidade de amido de milho e mandioca indica uma dieta rica em
tubérculos, assim como outros grupos pré-históricos que habitavam regiões próximas como
já foi descrito por autores como Reinhard [154].
Apenas duas amostras não apresentaram amido de nenhuma espécie, possivelmente
pelo fato de não ter sido consumido no período em que o coprólito foi excretado.
Foram identificados grãos de pólen da família Poaceae, mas não foi possível
identificar a espécie.
Fragmentos de carvão foram identificados em praticamente todas as amostras,
apenas uma não apresentou carvão, possivelmente devido a pouca quantidade de
sedimento.
Fitólitos foram recuperados, mas não foram identificados devido a má conservação
do material.
Nas amostras do sítio arqueológico Antelope Cave foram encontrados fragmentos
de insetos, por se tratar de uma análise microscópica não foi possível a separação de partes
que indicassem a espécie à que pertenciam.
Grânulos de amido de Chenopodiaceae foram encontrados tanto nas amostras que se
mostraram negativas para a análise parasitológica quanto nas amostras positivas. Das cinco
amostras positivas para parasitos, três apresentaram grânulos de Chenopodiaceae. Esta
família de planta é conhecida por possuir propriedades anti-helmínticas [214].
Traqueídeos também foram recuperados em amostras positivas e negativas para
parasitos, mas não puderam ser identificados quanto ao táxon.
7.1.3 Cubatão I – Joinville, SC
As amostras de sedimentos retirados diretamente da região pélvica de
sepultamentos, não puderam ser analisadas quanto à dieta macroscópica.
69
Em praticamente todas as amostras foram recuperados fragmentos de carvão,
indicando o uso de fogueiras e de algum tipo de preparação dos alimentos.
Foram recuperados fragmentos muito pequenos de tecido vegetal, impossibilitando
a identificação das espécies ou famílias de plantas consumidas.
Partes de exoesqueleto de insetos também foram visualizados nas amostras deste
sítio.
A análise da dieta microscópica quase não apresenta microfósseis, devido ao fato de
que esta região por ser bastante úmida e ter um solo de difícil retenção. Assim, é composta
basicamente por restos celulares de alimentos digeridos, comumente chamados de debris.
O encontro de um único ovo de parasito, identificado como um Trichurídeo, pode
ser um caso de contaminação do solo, já que antes das escavações no sítio serem iniciadas,
o sítio fazia parte de uma fazenda, aonde o gado tinha constante acesso.
Nenhum microfóssil como grânulos de amido, grãos de pólen foram recuperados
nas amostras analisadas pelo laboratório.
O encontro de macrofauna no sítio arqueológico Cubatão I durante as escavações,
nos leva a crer que este grupo em específico tinha o hábito de consumir carne de peixe e
outros moluscos, por serem um população que vivia às margens de rios.
Por ser uma pesquisa que teve início recentemente e ainda apresenta alguns desafios
metodológicos, que deverão ser mais bem elaborados no futuro, a região arqueológica de
Joinville, Santa Catarina, não pôde apresentar dados específicos sobre os hábitos
alimentares e o consumo de plantas medicinais, bem como não foi possível evidenciar se
este grupo pré-histórico sofria com algum tipo de infecção parasitária.
70
7.2 Da análise parasitológica e de plantas com propriedades anti-helmínticas
A prevalência de enteroparasitoses varia de acordo com a região e população
estudadas [215].
Fatores como presença de indivíduos susceptíveis, migrações humanas, condições
ambientais favoráveis de temperatura e umidade e os aglomerados de pessoas que vivem
em condições mínimas de qualidade de vida, são fatores interferentes na disseminação das
helmintoses [216]. Fatores agravantes como falta de saneamento básico, carência de infraestrutura, de programas de prevenção e de tratamento colaboram para o agravo da
transmissão de geohelmintos e biohelmintos, uma vez que as principais vias de transmissão
destes parasitos são a fecal-oral e o contato direto do solo [217].
Pouco se sabe sobre a prevalência de parasitoses intestinais no Nordeste. Alguns
estudos conduzidos nesta região revelaram que Ascaridíase, Ancilostomíase e Tricuríase
representam as parasitoses intestinais mais freqüentes nesta região [218].
No entanto, alguns autores atentaram à ausência de infecção por Trichuris sp. E
baixa freqüência de infecção por Ascaris sp. [219].
Os resultados deste estudo revelaram que tanto as amostras negativas quanto as
positivas para a presença de ovos de helmintos, da área arqueológica do Piauí,
apresentaram grãos de pólen com propriedades anti-helmínticas.
Alves et al. afirmaram em seu estudo, que a disseminação das helmintíases na
região nordeste do Brasil, está estritamente ligada à umidade do solo [219]. Assim, a longa
estação de seca das regiões semiáridas é uma das circunstâncias limitantes para a
proliferação de parasitos [218], e por possuírem climas semelhantes isso deve ocorrer na
região do Piauí e na região da Antelope Cave.
Embora seja aventado que populações habitantes de áreas rurais tenham uma
prevalência alta de parasitoses intestinais, os dados na população humana pré-histórica e
atual da região de São Raimundo Nonato mostram, até o momento, padrões diferentes dos
encontrados em regiões próximas desta área.
Destaca-se a permanência da infecção por ancilostomídeos há pelo menos 7 mil
anos, em um ambiente desprovido de infecção por Ascaris lumbricoides. e Trichuris
trichiura [194, 220].
71
Diversos estudos indicam uma alta prevalência de parasitoses intestinais nas
populações ameríndias [221] devido a fatores que favorecem a transmissão de parasitos tais
como fatores de ordem sócio-cultural e ambiental, como por exemplo, falta de tratamento
de água, destino inapropriado dos dejetos, hábitos como andar descalço e constante contato
com o solo [217].
A prevalência global encontrada para parasitismo intestinal é de 58%, sendo 6%
para prevalência de helmintos.
Estudos conduzidos em diferentes regiões do Brasil, em populações atuais,
revelaram que as helmintoses são infecções bastante disseminadas nas populações e que
suas taxas de prevalências se mostram bastante elevadas, especialmente para geohelmintos
como Ascaris lumbricoides, Trichuris trichiura e ancilostomídeos [217, 221-223].
A baixa prevalência de helmintos nas amostras nos remete a hipótese de que estas
populações pré-históricas poderiam utilizar de alguma maneira plantas com propriedades
anti-helmínticas como forma de tentaram amenizar os sintomas causados pelas infecções
intestinais, bem como certos primatas também o fazem até o presente [224-226].
O encontro de plantas com propriedades anti-helmínticas nas amostras positivas
para a análise parasitológica indica a possibilidade de que este indivíduo poderia estar
parasitado no momento, e sendo assim, fazendo o uso de algum tipo de alimento que tinha
propriedades medicinais, seja este hábito intencional ou não, e que no momento em que o
coprólito foi excretado ainda não havia eliminado por completo os parasitos.
O encontro de plantas com propriedades anti-helmínticas nas amostras negativas
para a análise parasitológica indica a possibilidade de o indivíduo ter feito um uso contínuo
do vegetal e que este já havia cumprido o efeito esperado, ou seja, eliminar por completo os
parasitos.
72
8. CONCLUSÃO
Não puderam ser observadas diferenças estatísticas em relação à presença de
parasitos e de plantas com propriedade anti-helmínticas em razão do pequeno número
amostral para a realização dos testes paramétricos;
De alguma maneira os grupos pré-históricos da região arqueológica de São
Raimundo Nonato, PI e da região arqueológica Antelope Cave, Arizona, faziam uso de
plantas com propriedades anti-helmínticas, como forma de automedicação ou apenas para a
alimentação;
Os resultados obtidos neste trabalho confirmam estudos anteriores e apontam
possibilidades de estudo, abrindo perspectivas tanto de novas análises de hábitos préhistóricos, quanto nas análises num contexto epidemiológico. Assim, do ponto de vista
epidemiológico os estudos paleodietéticos e sociais de populações passadas, ajudam a
entender a relação entre infecções parasitárias e o consumo de plantas com propriedades
anti-helmínticas.
73
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