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Ética e Profissão.pdf

2017

O presente Livro de Estudos tem como objetivo sistematizar os elementos básicos da disciplina de Ética e Profissão, o qual proporcionará um contato com os principais tópicos, autores, obras, normas e regulamentações da área, além dos instrumentos necessários, não apenas para acompanhar a disciplina ofertada, mas também para os estudos autônomos posteriores. Na primeira unidade, Introdução à Ética, introduzimos a natureza da moralidade, definições e delimitações da investigação sobre o comportamento moral. Aqui, apresentamos os conceitos e o vocabulário da Ética Filosófica. Distinguimos os diferentes campos de investigação do comportamento e raciocínio moral. Assim como delimitamos o campo da abordagem filosófica à moral, a ética normativa e a metaética. A partir destes pressupostos prosseguimos apresentando as principais teorias filosóficas da ética normativa. Primeiro exploramos as teorias consequencialistas da moralidade. Aqui abordamos questões como o egoísmo psicológico e ético, o utilitarismo de ato e de regras, e a teoria da ética do cuidado de Gilligan. Depois, analisamos as teorias não consequencialistas da moralidade. Nesse tópico apresentaremos o não consequencialismo de ato e de regras, a teoria do comando divino, a ética do dever de Kant e os deveres Prima Facie de Ross. Finalizando a primeira unidade deste Livro de Estudos você também terá uma leitura complementar, que introduz o campo da Bioética e sua relevância atual para os profissionais na área da saúde. Na segunda unidade, Raciocínio Ético e a Psicologia, introduzimos mais uma teoria ética, a Ética da Virtude, que teve seu ressurgimento na contemporaneidade e cujos elementos essenciais se encontram nos antigos gregos e no pensamento oriental. Após este primeiro tópico, focamos nos modelos de raciocínio ético para resolução de conflitos éticos e tomada de decisão ética. Nos últimos três tópicos dessa unidade utilizamos vários exemplos práticos, casos e situações, nos quais exploramos as possibilidades do uso das teorias éticas anteriormente analisadas para a aplicação do raciocínio, resolução e tomada de decisão ética. A proposta é que, antes mesmo de adentrarmos nos quesitos das normas éticas específicas da profissão, enquadradas no código de ética profissional ou nas diversas resoluções, o profissional de saúde, de modo amplo; e de psicologia, de modo estrito, possam compreender a centralidade das teorias éticas e a essencial importância de raciocinar eticamente na prática profissional. A terceira e última unidade deste Livro de Estudos tem como proposta apresentar o Código de Ética Profissional do Psicólogo e as principais Resoluções que normatizam sua atuação. Para isso, inicialmente é feito um breve resgate histórico da consolidação da psicologia como profissão no Brasil até sua regulamentação em 1962, a posterior criação dos Conselhos Regionais e do Conselho Federal de Psicologia em 1971 e o atual funcionamento do Sistema Conselhos de Psicologia. Tendo como referência os Princípios Fundamentais do Código de Ética, seus 25 artigos são analisados, bem como as principais resoluções vigentes que são apresentadas divididas por temáticas que vão desde o registro profissional até questões específicas da avaliação psicológica. Por último, o Manual de Elaboração de Documentos Escritos produzido pelo psicólogo decorrente de avaliação psicológica é detalhado quanto à finalidade e estrutura dos mesmos.

Ética e Profissão Prof. Kevin Daniel dos Santos Leyser Profª. Gessiane Keila Ignatowicz Pasquali 2017 Copyright © UNIASSELVI 2017 Elaboração: Prof. Kevin Daniel dos Santos Leyser Profª. Gessiane Keila Ignatowicz Pasquali Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográica elaborada na fonte pela ”iblioteca Dante “lighieri UNI“SSELVI – Indaial. 362.850981 L685e Leyser, Kevin Daniel dos Santos Ética e proissão / Kevin Daniel dos Santos Leyser; Gessiane Keila Ignatowicz Pasquali: UNIASSELVI, 2017. 280 p. : il. ISBN 978-85-515-0102-3 1.Ética Proissional. I. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. aPresentação Caro acadêmico, antes de apresentarmos o conteúdo deste livro, gostaríamos de nos apresentar a você. O autor prof. Kevin Daniel dos Santos Leyser possui graduação em Psicologia com licenciatura plena, ”acharelado e Formação pela Universidade Comunitária Regional de Chapeć , em Filosoia com licenciatura plena pela Universidade Comunitária Regional de Chapeć , em Teologia com ”acharelado pela Faculdade de Educação Teoĺgica Logos . É especialista em Psicopedagogia e Práticas Pedaǵgicas e Gestão Escolar pela Faculdade de “dministração, Ciências, Educação, Letras F“CEL . Mestre em Educação pela Universidade Regional de ”lumenau FUR” . Trabalha há anos no Ensino Superior, atualmente ́ professor na F“MEG/UNI“SSELVI em Guaramirim SC e no Centro Universitário Leonardo da Vinci/UNI“SSELVI em Indaial SC . Faz parte do grupo de pesquisa em Filosoia da Educação EDUCOGIT“NS . Tem experiência na área de Filosoia, com ênfase em epistemologia, pragmatismo e educação na área de Psicologia, com ênfase em psicoterapias fenomenoĺgico-existenciais, processos cognitivos, aprendizagem socioemocional e educação na área de Teologia, com ênfase em ilosoia, psicologia e epistemologia da religião. Na E“D, publicou Filosoia Geral e da Religião Psicologia Geral e da Religião Filosoia Política Epistemologia da Teologia no prelo e Educação Comparada e Integral no prelo . “ autora profª. Gessiane Keila Ignatowicz Pasquali possui graduação em Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá , especialização em Psicologia Clínica Psicanalítica , Psicopedagogia e ́ mestranda em Saúde Coletiva pela Universidade Regional de ”lumenau FUR” . Trabalha como psićloga da Prefeitura Municipal de Indaial e professora da Faculdade Metropolitana de Guaramirim. Tem experiência na área de Psicologia, com ênfase em Psicologia do Desenvolvimento Humano, atuando principalmente nos seguintes temas envelhecimento, adolescência e promoção de saúde. O presente Livro de Estudos tem como objetivo sistematizar os elementos básicos da disciplina de Ética e Proissão, o qual proporcionará um contato com os principais t́picos, autores, obras, normas e regulamentações da área, aĺm dos instrumentos necessários, não apenas para acompanhar a disciplina ofertada, mas tamb́m para os estudos autônomos posteriores. Na primeira unidade, Introdução à Ética, introduzimos a natureza da moralidade, deinições e delimitações da investigação sobre o comportamento moral. “qui, apresentamos os conceitos e o vocabulário da Ética Filośica. III Distinguimos os diferentes campos de investigação do comportamento e raciocínio moral. “ssim como delimitamos o campo da abordagem ilośica à moral, a ́tica normativa e a metática. “ partir destes pressupostos prosseguimos apresentando as principais teorias ilośicas da ́tica normativa. Primeiro exploramos as teorias consequencialistas da moralidade. “qui abordamos questões como o egoísmo psicoĺgico e ́tico, o utilitarismo de ato e de regras, e a teoria da ́tica do cuidado de Gilligan. Depois, analisamos as teorias não consequencialistas da moralidade. Nesse t́pico apresentaremos o não consequencialismo de ato e de regras, a teoria do comando divino, a ́tica do dever de Kant e os deveres Prima Facie de Ross. Finalizando a primeira unidade deste Livro de Estudos você tamb́m terá uma leitura complementar, que introduz o campo da ”iótica e sua relevância atual para os proissionais na área da saúde. Na segunda unidade, Raciocínio Ético e a Psicologia, introduzimos mais uma teoria ́tica, a Ética da Virtude, que teve seu ressurgimento na contemporaneidade e cujos elementos essenciais se encontram nos antigos gregos e no pensamento oriental. “ṕs este primeiro t́pico, focamos nos modelos de raciocínio ́tico para resolução de conlitos ́ticos e tomada de decisão ́tica. Nos últimos três t́picos dessa unidade utilizamos vários exemplos práticos, casos e situações, nos quais exploramos as possibilidades do uso das teorias ́ticas anteriormente analisadas para a aplicação do raciocínio, resolução e tomada de decisão ́tica. “ proposta ́ que, antes mesmo de adentrarmos nos quesitos das normas ́ticas especíicas da proissão, enquadradas no ćdigo de ́tica proissional ou nas diversas resoluções, o proissional de saúde, de modo amplo e de psicologia, de modo estrito, possam compreender a centralidade das teorias ́ticas e a essencial importância de raciocinar eticamente na prática proissional. “ terceira e última unidade deste Livro de Estudos tem como proposta apresentar o Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo e as principais Resoluções que normatizam sua atuação. Para isso, inicialmente ́ feito um breve resgate hist́rico da consolidação da psicologia como proissão no ”rasil at́ sua regulamentação em , a posterior criação dos Conselhos Regionais e do Conselho Federal de Psicologia em e o atual funcionamento do Sistema Conselhos de Psicologia. Tendo como referência os Princípios Fundamentais do Ćdigo de Ética, seus artigos são analisados, bem como as principais resoluções vigentes que são apresentadas divididas por temáticas que vão desde o registro proissional at́ questões especíicas da avaliação psicoĺgica. Por último, o Manual de Elaboração de Documentos Escritos produzido pelo psićlogo decorrente de avaliação psicoĺgica ́ detalhado quanto à inalidade e estrutura dos mesmos. IV Desejamos uma boa jornada a todos, rumo à ediicação da educação e sucesso frente aos desaios intelectuais, ́ticos e pessoais proporcionados pelo estudo da Ética e Proissão. Prof. Kevin Daniel dos Santos Leyser Profª. Gessiane Keila Ignatowicz Pasquali UNI Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! V VI sumário UNIDADE 1 - INTRODUÇÃO À ÉTICA ........................................................................................... 1 TÓPICO 1 - A NATUREZA DA MORALIDADE ............................................................................. 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 2 DEFINIÇÃO DE TERMOS-CHAVE: ÉTICO, MORAL, ANTIÉTICO, IMORAL ................... . C“R“CTERÍSTIC“S DO ”OM, M“U, CERTO, ERR“DO, FELICID“DE OU PR“ZER .................................................................................................................................... . O “MOR“L E O NÃO MOR“L ................................................................................................... 3 ABORDAGENS DO ESTUDO DA MORALIDADE .................................................................... 4 A MORALIDADE E SUAS APLICAÇÕES ..................................................................................... . “ ÉTIC“ E “ ESTÉTIC“ ................................................................................................................ . ”OM, M“U, CERTO E ERR“DO US“DO EM UM SENTIDO NÃO MOR“L ..................... . “ MOR“L E “S ”O“S M“NEIR“S OU ETIQUET“ ................................................................ . “ QUEM OU O QUE SE “PLIC“ À MOR“LID“DE? ............................................................. . QUEM É MOR“LMENTE OU ETIC“MENTE RESPONSÁVEL? .......................................... 5 DE ONDE VEM A MORALIDADE? ................................................................................................ . “ “V“LI“ÇÃO DE POSIÇ6ES O”JETIV“S E SU”JETIV“S ................................................... . UM“ SÍNTESE E POSSÍVEL RESPOST“ P“R“ “ ORIGEM D“ MOR“LID“DE .............. 6 MORALIDADE COSTUMEIRA E MORALIDADE REFLEXIVA ............................................. 7 MORALIDADE, LEI E RELIGIÃO ................................................................................................... . “ MOR“LID“DE E “ LEI ............................................................................................................. . MOR“LID“DE E RELIGIÃO ....................................................................................................... 8 A TEORIA DO DESENVOLVIMENTO MORAL DE KOHLBERG .......................................... . DEFINIÇÃO DE ET“P“S MOR“IS ............................................................................................. 9 POR QUE OS SERES HUMANOS DEVEM SER MORAIS? ...................................................... RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ TÓPICO 2 - TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE .................................... 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 2 O EGOÍSMO PSICOLÓGICO .......................................................................................................... 3 O EGOÍSMO ÉTICO ........................................................................................................................... . PRO”LEM“S COM O EGOÍSMO ÉTICO INDIVIDU“L E PESSO“L .................................. . O EGOÍSMO ÉTICO UNIVERS“L ............................................................................................... . . Problemas com o Egoísmo Ético Universal ........................................................................... . . Vantagens do Egoísmo Ético Universal ................................................................................. . EGOÍSMO ÉTICO R“CION“L DE “YN R“ND ....................................................................... 4 O UTILITARISMO .............................................................................................................................. . O UTILIT“RISMO DE “TO .......................................................................................................... . . Crítica ao utilitarismo de ato ................................................................................................... . O UTILIT“RISMO DE REGR“S ................................................................................................... . . Crítica ao utilitarismo de regras ............................................................................................. . UTILIT“RISMO DE PRÁTIC“S ................................................................................................... . “ “NÁLISE CUSTO-”ENEFÍCIO OU “”ORD“GEM FIM JUSTIFIC“ OS MEIOS ........ VII 3 3 3 7 9 10 11 17 18 21 22 22 26 28 30 34 35 35 36 38 45 5 DIFICULDADE COM AS TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS EM GERAL ....................... 6 A ÉTICA DO CUIDADO .................................................................................................................... RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 54 56 58 60 TÓPICO 3 - TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE ......................... 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 2 TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DE ATO .................................................................. . INTUICIONISMO ........................................................................................................................... . CRÍTIC“S “O NÃO CONSEQUENCI“LISMO DE “TO ........................................................ 3 TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DE REGRAS .......................................................... . TEORI“ DO COM“NDO DIVINO ............................................................................................. . “ ÉTIC“ DO DEVER DE K“NT .................................................................................................. . . Dever ao inv́s da inclinação ................................................................................................... . . Crítica à Ética do Dever de Kant ............................................................................................. 4 DEVERES PRIMA FACIE DE ROSS ................................................................................................ . CRÍTIC“S À TEORI“ DE ROSS ................................................................................................... 5 CRÍTICAS GERAIS ÀS TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS ....................................... LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 61 61 62 65 72 73 77 85 88 UNIDADE 2 - RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA ............................................................... 89 TÓPICO 1 - A ÉTICA DA VIRTUDE .................................................................................................. 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 2 DEFINIÇÃO DE TERMOS ................................................................................................................ 3 A ÉTICA NICOMAQUEIA DE ARISTÓTELES ............................................................................ . O C“RÁTER E O FLORESCIMENTO HUM“NO .................................................................... . “V“LI“NDO “ CONCEPÇÃO “RISTOTÉLIC“ DE FLORESCIMENTO ........................... . “”ORD“GENS CONTEMPORÂNE“S “O FLORESCIMENTO ........................................... . “ ESTRUTUR“ D“S VIRTUDES EM “RIST2TELES .............................................................. 4 O AUTOCULTIVO MORAL CONFUCIANO .............................................................................. . OS “N“LECTOS CONFUCI“NOS ............................................................................................. . H“RMONI“ CONFUCIONIST“ ................................................................................................. . “ ÉTIC“ CONFUCIONIST“ DOS P“PÉIS ................................................................................ 5 ANÁLISE CONTEMPORÂNEA DA ÉTICA DA VIRTUDE ...................................................... . “NÁLISE DE “L“SD“IR M“CINTYRE D“ ÉTIC“ D“ VIRTUDE ..................................... . DESV“NT“GENS OU PRO”LEM“S .......................................................................................... 6 QUEM É A PESSOA VIRTUOSA IDEAL? ..................................................................................... 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................................. RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ TÓPICO 2 - MODELOS DE RACIOCÍNIO ÉTICO ......................................................................... 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 2 O RELATIVISMO ÉTICO .................................................................................................................. . “V“LI“ÇÃO CRÍTIC“ DO REL“TIVISMO ÉTICO ................................................................. . RELEVÂNCI“ DO REL“TIVISMO ÉTICO P“R“ “S PROFISS6ES DE S“ÚDE MENT“L ........................................................................................................................... 3 O HEDONISMO ÉTICO .................................................................................................................... . “V“LI“ÇÃO CRÍTIC“ DO HEDONISMO ÉTICO .................................................................. VIII 91 91 91 92 102 108 110 112 113 116 119 121 121 122 125 . “ RELEVÂNCI“ DO HEDONISMO ÉTICO P“R“ “S PROFISS6ES DE S“ÚDE MENT“L ........................................................................................................................... 127 4 O UTILITARISMO .............................................................................................................................. 128 . “V“LI“ÇÃO CRÍTIC“ DO UTILIT“RISMO ............................................................................ . RELEVÂNCI“ DO UTILIT“RISMO P“R“ “S PROFISS6ES DE S“ÚDE MENT“L ......... 5 A TEORIA ÉTICA FORMALISTA DE KANT ................................................................................ 133 . “ “V“LI“ÇÃO CRÍTIC“ D“ TEORI“ ÉTIC“ FORM“LIST“ DE K“NT ........................... . RELEVÂNCI“ D“ TEORI“ ÉTIC“ FORM“LIST“ DE K“NT P“R“ “S PROFISS6ES DE S“ÚDE MENT“L ........................................................................................................................... RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... 140 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 142 TÓPICO 3 - MODELOS DE RACIOCÍNIO NA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS ÉTICOS .... 143 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 143 2 SITUAÇÕES QUE REQUEREM HABILIDADES DE SOLUÇÃO DE PROBLEMAS ÉTICOS ....................................................................................................................... 143 3 O RELATIVISMO ÉTICO .................................................................................................................. 145 4 O UTILITARISMO .............................................................................................................................. 145 . “V“LI“ÇÃO CRÍTIC“ DO PONTO DE VIST“ UTILIT“RIST“ EM REL“ÇÃO “O CONFLITO ÉTICO ......................................................................................................................... 5 A TEORIA ÉTICA FORMALISTA DE KANT ................................................................................ 146 . “V“LI“ÇÃO CRÍTIC“ DO PONTO DE VIST“ K“NTI“NO EM REL“ÇÃO “O CONFLITO ÉTICO ............................................................................................................................................... 6 A ÉTICA SITUACIONAL DE FLETCHER ..................................................................................... 148 . “ “V“LI“ÇÃO CRÍTIC“ D“ ÉTIC“ SITU“CION“L ............................................................ 7 O CONTEXTUALISMO ÉTICO DE WALLACE ............................................................................ 152 . “V“LI“ÇÃO CRÍTIC“ DO CONTEXTU“LISMO ÉTICO ...................................................... RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 159 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 161 TÓPICO 4 - UM MODELO DO PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO ÉTICA ................ 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 2 O PROPÓSITO DO MODELO ......................................................................................................... 3 O MODELO .......................................................................................................................................... . P“SSO “V“LI“ÇÃO INICI“L D“S CONSIDER“Ç6ES ÉTIC“S IMPLIC“D“S .......... . P“SSO REUNIR INFORM“Ç6ES ........................................................................................... . P“SSO “V“LI“ÇÃO SECUNDÁRI“ D“S CONSIDER“Ç6ES ÉTIC“S IMPLIC“D“S .................................................................................................................................. . P“SSO DELI”ER“Ç6ES MET“ÉTIC“S REL“TIV“S À RELEVÂNCI“ D“S CONSIDER“Ç6ES ÉTIC“S ......................................................................................................... . P“SSO DELI”ER“Ç6ES MET“ÉTIC“S REL“TIV“S À RESOLUÇÃO DO DILEM“ ÉTICO ....................................................................................................................... . P“SSO “V“LI“ÇÃO TERCIÁRI“ D“S CONSIDER“Ç6ES ÉTIC“S GER“R OPÇ6ES ............................................................................................................................. . P“SSO ESTIM“R “S CONSEQUÊNCI“S DE C“D“ OPÇÃO .......................................... . P“SSO TOM“R UM“ DECISÃO ............................................................................................. . P“SSO DOCUMENT“R “ JUSTIFIC“ÇÃO E O PROCESSO DE TOM“D“ DE DECIS6ES ................................................................................................................................. RESUMO DO TÓPICO 4 ....................................................................................................................... AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ IX 163 163 163 164 170 171 171 171 173 174 UNIDADE 3 - O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO ...... 175 TÓPICO 1 - A REGULAMENTAÇÃO DA PROFISSÃO E OS ÓRGÃOS DE CLASSE ........... 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 2 A PROFISSIONALIZAÇÃO DO PSICÓLOGO NO BRASIL .................................................... . “SPECTOS HIST2RICOS D“ CONSOLID“ÇÃO D“ PSICOLOGI“ COMO PROFISSÃO NO ”R“SIL .............................................................................................................. . “ REGUL“MENT“ÇÃO D“ FORM“ÇÃO E D“ PROFISSÃO DE PSIC2LOGO NO ”R“SIL ...................................................................................................................................... . “ CRI“ÇÃO DO SISTEM“ CONSELHOS ................................................................................. 3 CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA (CFP) ......................................................................... . PLENÁRIO ....................................................................................................................................... . DIRETORI“ ..................................................................................................................................... . SECRET“RI“S ................................................................................................................................ . CONGRESSO N“CION“L DE PSICOLOGI“ CNP .............................................................. . “SSEM”LEI“ DE POLÍTIC“S, D“ “DMINISTR“ÇÃO E D“S FIN“NÇ“S “P“F ........ . GRUPOS DE TR“”“LHO ............................................................................................................. . COMISS6ES PERM“NENTES ..................................................................................................... 4 CONSELHOS REGIONAIS (CRPs) ................................................................................................. 5 CREPOP ................................................................................................................................................. RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ TÓPICO 2 - CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO ...................................... 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 2 A ÉTICA PROFISSIONAL E O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO ................................................................................................................................. . ”REVE HIST2RICO DOS C2DIGOS DE ÉTIC“ PROFISSION“L DO PSIC2LOGO ............................................................................................................................ 3 O ATUAL CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO ...................................... . PRINCÍPIOS FUND“MENT“IS .................................................................................................. . D“S RESPONS“”ILID“DES DO PSIC2LOGO ........................................................................ . DISPOSIÇ6ES GER“IS .................................................................................................................. 4 CÓDIGO DE PROCESSAMENTO DISCIPLINAR ...................................................................... RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ TÓPICO 3 - RESOLUÇÕES DO CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA ............................ 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 2 REGISTRO PROFISSIONAL ............................................................................................................ 3 TÍTULO DE ESPECIALISTA ............................................................................................................. 4 PRECONCEITO E ORIENTAÇÃO SEXUAL ................................................................................. 5 PSICOTERAPIA ................................................................................................................................... . USO D“ HIPNOSE COMO RECURSO “UXILI“R DE TR“”“LHO DO PSIC2LOGO .... . SERVIÇOS PSICOL2GICOS RE“LIZ“DOS POR MEIOS TECNOL2GICOS DE COMUNIC“ÇÃO “ DISTÂNCI“ ............................................................................................... 6 AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA .......................................................................................................... . “ “V“LI“ÇÃO PSICOL2GIC“ P“R“ O”TENÇÃO D“ CNH ............................................. . “V“LI“ÇÃO PSICOL2GIC“ P“R“ REGISTRO E PORTE DE “RM“ ................................ . PSIC2LOGO COMO PERITO E “SSISTENTE TÉCNICO ...................................................... 7 TESTES PSICOLÓGICOS .................................................................................................................. 8 REGISTRO DOCUMENTAL E PRONTUÁRIO ............................................................................ X 177 177 177 178 180 182 183 187 188 188 189 192 194 195 197 197 197 202 202 215 218 219 221 221 222 224 225 226 227 229 233 235 RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 238 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 240 TÓPICO 4 - PRODUÇÃO DE DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS .............................................. 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 2 DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS .................................................................................................. 3 PRINCÍPIOS NORTEADORES NA ELABORAÇÃO DOCUMENTAL ................................... . PRINCÍPIOS TÉCNICOS D“ LINGU“GEM ESCRIT“ ........................................................... . PRINCÍPIOS ÉTICOS ..................................................................................................................... . PRINCÍPIOS TÉCNICOS ............................................................................................................... 4 MODALIDADES DE DOCUMENTOS ........................................................................................... 5 CONCEITO/ FINALIDADE/ ESTRUTURA ................................................................................... . DECL“R“ÇÃO ............................................................................................................................... . “TEST“DO PSICOL2GICO ......................................................................................................... . REL“T2RIO/L“UDO PSICOL2GICO ....................................................................................... . P“RECER PSICOL2GICO ............................................................................................................ 6 VALIDADE DOS CONTEÚDOS E GUARDA DOS DOCUMENTOS .................................... LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. RESUMO DO TÓPICO 4 ....................................................................................................................... AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ REFERÊNCIAS ........................................................................................................................................ XI 241 241 241 242 245 245 251 254 260 262 263 UNIDADE 1 INTRODUÇÃO À ÉTICA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM Esta disciplina tem por objetivos • deinir e explicar termos concernentes à ́tica e à moralidade e entender as abordagens do estudo da moralidade • deinir a teoria consequencialista da moralidade e descrever suas principais abordagens • descrever as teorias não consequencialistas da moralidade e identiicar seus principais conceitos • descrever as teorias da ́tica da virtude e compará-las com as outras teorias ́ticas. PLANO DE ESTUDOS Esta unidade está dividida em três t́picos. No decorrer da unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. T2PICO - “ N“TUREZ“ D“ MOR“LID“DE T2PICO - TEORI“S CONSEQUENCI“LIST“S D“ MOR“LID“DE T2PICO - TEORI“S NÃO CONSEQUENCI“LIST“S D“ MOR“LID“DE 1 2 TÓPICO 1 UNIDADE 1 A NATUREZA DA MORALIDADE 1 INTRODUÇÃO “ moralidade reivindica nossas vidas. Faz reivindicações sobre cada um de ńs que são mais fortes do que as reivindicações da lei e tem prioridade sobre o interesse pŕprio. Como seres humanos que vivem no mundo, temos deveres e obrigações básicas. Há certas coisas que devemos fazer e certas coisas que não devemos fazer. Em outras palavras, há uma dimensão ́tica da existência humana. Como seres humanos, experimentamos a vida em um mundo de bem e mal e entendemos certos tipos de ações em termos de certo e errado. “ pŕpria estrutura da existência humana dita que devemos fazer escolhas. “ ́tica nos ajuda a usar nossa liberdade de maneira responsável e a compreender quem somos. E a ́tica dá direção em nossa luta por responder às perguntas fundamentais que questionam como devemos viver nossas vidas e como podemos fazer escolhas certas. 2 DEFINIÇÃO DE TERMOS-CHAVE: ÉTICO, MORAL, ANTIÉTICO, IMORAL Na linguagem comum, frequentemente utilizamos as palavras ́tica e moral e antítico e imoral de forma intercambiável. Isto ́, falamos da pessoa ou ato como ́tico ou moral. Por outro lado, falamos de ćdigos de ́tica, mas apenas raramente mencionamos ćdigos de moralidade. “lguns reservam os termos moral e imoral somente para o reino da sexualidade e usam as palavras ́tica e antítica ao discutir como as comunidades proissionais e de neǵcios devem se comportar em relação a seus membros ou ao público. Mais comumente, entretanto, ńs não usamos nenhuma destas palavras com tanta frequência quanto usamos os termos bom, mau, certo e errado. O que signiicam todas essas palavras, e quais são as relações entre elas? Ética vem do termo grego ethike, que prov́m de ethos, que por sua vez deriva de duas matizes distintas, uma que designa costumes normativos e outra que designa constância do comportamento, hábito ou caráter. Na verdade, o termo ethos ́ uma transposição metaf́rica de um termo que denota a morada dos animais V“Z, . Os gregos antigos, ao fazerem essa transposição, queriam se referir ao mundo humano, quanto aos seus costumes e o pŕprio agir humano que constituiria sua morada e simultaneamente seu caráter. Moral vem do latim moralis, que signiica costumes ou hábitos, mas com uma maior amplitude de sentido. Termo este que foi usado para traduzir para 3 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA o latim o termo grego ethike - Ética V“Z, . “ ́tica, contudo, normalmente ́ entendida como pertencente ao caráter individual de uma pessoa ou pessoas, enquanto a moralidade parece apontar para as relações entre os seres humanos. No entanto, na linguagem comum, se chamarmos uma pessoa de ́tica ou moral, ou um ato de antítico ou imoral, realmente não faz qualquer diferença signiicativa. Na ilosoia, no entanto, o termo Ética tamb́m ́ usado para se referir a uma área especíica de estudo a área da moral, que se concentra na conduta humana e valores humanos. Quando falamos de pessoas como sendo morais ou ́ticas, geralmente queremos dizer que elas são pessoas boas, e quando falamos delas como sendo imorais ou antíticas, queremos dizer que elas são pessoas más. Quando nos referimos a certas ações humanas como sendo morais, ́ticas, imorais ou antíticas, queremos dizer que elas estão certas ou erradas. “ simplicidade dessas deinições, contudo, termina aqui, pois, como deinimos uma ação certa ou errada ou uma pessoa boa ou má? Quais são os padrões humanos pelos quais tais decisões podem ser tomadas? Estas são as questões mais difíceis que constituem a maior parte do estudo da moralidade, e serão discutidas em mais detalhes em t́picos posteriores. O importante ́ lembrar aqui que moral, ́tica, imoral e antítico signiicam essencialmente o bom, o certo, o mau e o errado, com frequência dependendo se algúm está se referindo às pŕprias pessoas ou às suas ações. 2.1 CARACTERÍSTICAS DO BOM, MAU, CERTO, ERRADO, FELICIDADE OU PRAZER Parece ser um fato empírico que o que os seres humanos consideram ser bom envolve de alguma forma felicidade e prazer, e tudo o que eles consideram ser mau envolve a infelicidade e a dor de alguma forma. Essa visão do que ́ bom tem sido tradicionalmente chamada de "hedonismo". Enquanto uma ampla variação de interpretação ́ dada a essas palavras de simples prazeres sensoriais a prazeres intelectuais ou espirituais e da dor sensorial à profunda infelicidade emocional , ́ difícil negar que tudo o que ́ bom envolve, pelo menos, algum prazer ou felicidade, e o que ́ mau envolve alguma dor ou infelicidade. Um elemento envolvido na realização da felicidade ́ a necessidade de tomar a visão de longo alcance em vez da visão de curto alcance. “s pessoas podem sofrer alguma dor ou infelicidade a im de alcançar algum prazer ou felicidade no longo prazo. Por exemplo, podemos suportar a dor de ter nossos dentes perfurados a im de manter os dentes e gengivas saudáveis para que possamos desfrutar do comer e da boa saúde geral, que resulta de ter dentes saudáveis. Da mesma forma, as pessoas podem engajar-se em trabalhos muito árduos e at́ mesmo dolorosos por dois dias a im de ganhar dinheiro que lhes trará prazer e felicidade para uma semana ou duas. “ĺm disso, o termo bom deve ser deinido no contexto da experiência humana e das relações humanas e não apenas em um sentido abstrato. Por 4 TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE exemplo, conhecimento e poder em si mesmos não são bons a menos que um ser humano obtenha alguma satisfação deles ou a menos que contribuam de alguma forma para relacionamentos morais e signiicativos do homem. Eles são, de outra forma, não morais. E quanto às ações que levarão algum bem a uma pessoa, mas que causarão dor a outra, como aqueles atos de um sádico que obt́m prazer de maltratar violentamente outro ser humano? Nossa declaração original era de que tudo o que ́ bom trará alguma satisfação, prazer ou felicidade a algúm, mas essa airmação não necessariamente funciona no sentido inverso – que tudo o que traz satisfação a algúm ́ necessariamente bom. Certamente, há "prazeres maliciosos". William Frankena , p. airma que tudo o que ́ bom tamb́m provavelmente envolverá "algum tipo ou grau de excelência". Ele continua dizendo que "o que ́ mau em si ́ assim por causa da presença de dor ou infelicidade ou de algum tipo de defeito ou falta de excelência". “ excelência ́ uma importante adição ao prazer ou à satisfação, na medida em que torna experiências ou atividades melhores ou piores do que seriam de outra forma". Por exemplo, o prazer ou a satisfação obtida ao ouvir um concerto, ver um bom ilme, ou por ler um bom livro ́ devido, em grande medida, à excelência dos criadores e apresentadores desses eventos compositores, artistas, diretores, atores e escritores . Outro exemplo, talvez mais profundo, da importância da excelência ́ que se algúm obtiver satisfação ou prazer de testemunhar um caso judicial bem conduzido e de ver e ouvir o juiz e os advogados cumprirem bem suas funções, essa satisfação será aprofundada se o juiz e os advogados tamb́m são pessoas excelentes, isto ́, se são seres humanos bondosos, justos e compassivos, aĺm de inteligentes e capazes. Tudo o que ́ bom, então, provavelmente conterá algum prazer, felicidade e excelência, enquanto o que ́ mau será caracterizado por seus opostos dor, infelicidade e falta de excelência. “s reivindicações acima indicam apenas que provavelmente haverá alguns destes elementos presentes. Por exemplo, uma boa pessoa realizando uma ação correta pode não estar particularmente feliz e pode at́ perceber o que ele ou ela está fazendo como algo doloroso de qualquer modo, os destinatários da ação correta podem estar felizes, e a ação correta pode tamb́m envolver a excelência. Há dois outros atributos de "bom" e "mau" que podem somar à nossa deinição. Estes são harmonia e criatividade no lado "bom" e disćrdia, ou desarmonia, e falta de criatividade no lado "mau". Se uma ação ́ criativa ou pode ajudar os seres humanos a tornarem-se criativos e, ao mesmo tempo, ajudar a conseguir uma integração harmoniosa de tantos seres humanos quanto possível, então podemos dizer que ́ uma ação certa. Se uma ação tem o efeito oposto, então podemos dizer que ́ uma ação errada. Por exemplo, se uma pessoa ou um grupo de pessoas pode terminar uma guerra entre duas nações e criar uma paz honrosa e duradoura, então uma ação certa ou boa foi realizada. Esta ação pode permitir que os membros de ambas as nações sejam criativos e não destrutivos e podem criar harmonia entre os dois 5 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA lados e dentro de cada nação. Por outro lado, causar ou iniciar uma guerra entre duas nações terá exatamente o efeito oposto. Lester “. Kirkendall enfatiza esses pontos e tamb́m acrescenta à discussão anterior a necessidade de colocar ênfase primária no que ́ bom ou excelente na experiência e nos relacionamentos humanos Sempre que uma decisão ou uma escolha deve ser feita com relação ao comportamento, a decisão moral será aquela que trabalha para a criação de coniança e integridade nos relacionamentos. Deve aumentar a capacidade dos indivíduos para cooperar, e aumentar a sensação de autorrespeito no indivíduo. “tos que criam desconiança, suspeita e mal-entendidos, que constroem barreiras e destroem a integridade, são imorais. Eles diminuem o senso de autorrespeito do indivíduo e, ao inv́s de produzir uma capacidade de trabalhar juntos, separam as pessoas e rompem a capacidade de comunicação KIRKEND“LL, , p. . Dois outros termos que devemos deinir são amoral e não moral. 2.2 O AMORAL E O NÃO MORAL “moral signiica não possuir um sentido moral, ou estar indiferente ao certo e ao errado CORTIN“ M“RTÍNEZ, . Este termo pode ser aplicado a poucas pessoas. Certas pessoas que tiveram lobotomias pŕ-frontais tendem a agir amoralmente aṕs a operação. Isto ́, elas não têm nenhum senso de certo e errado. E há alguns seres humanos que, apesar da educação moral, permaneceram ou se tornaram amorais. Encontramos tais pessoas entre certos tipos de criminosos que não conseguem perceber que izeram algo de errado. Eles tendem a não ter qualquer remorso, arrependimento ou preocupação com o que izeram. Um exemplo de uma pessoa amoral ́ Gregory Powell, que, com Jimmy Lee Smith, matou gratuitamente um policial em um campo de cebola ao sul de ”akersield, Calif́rnia. Uma boa descrição dele e de sua atitude pode ser encontrada na obra The Onion Field, de Joseph Wambaugh . Outro exemplo ́ Colin Pitchfork, outro personagem da vida real. Pitchfork violentou e matou duas jovens na Inglaterra e foi descrito por Wambaugh na obra The Blooding . Neste livro, Wambaugh tamb́m cita vários psićlogos falando sobre a personalidade amoral, psicopatoĺgica, sociopatoĺgica, que ́ deinida como uma pessoa caracterizada por instabilidade emocional, falta de bom senso, comportamento perverso e impulsivo muitas vezes criminoso , incapacidade de aprender com experiência, sentimentos amorais e associais e outros defeitos śrios de personalidade" , p. . Robert D. Hare descreve ausência do senso de consciência, culpa ou remorso na psicopatia, que conduzem a atos nocivos que são cometidos sem desconforto ou vergonha. “ amoralidade, então, ́ basicamente uma atitude que alguns – felizmente, apenas alguns – seres humanos possuem. 6 TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE DICAS SUGESTÃO DE FILME A obra The Onion Field, de Joseph Wambaugh, foi levada às telas do cinema no filme “Assassinato a sangue frio”, de 1979. Tudo isso não signiica que os criminosos amorais não devem ser culpados e punidos por seus erros. Na verdade, essas pessoas podem ser ainda mais perigosas para a sociedade do que aqueles que podem distinguir o certo do errado, porque geralmente eles são moralmente ineducáveis. “ palavra não moral signiica completamente fora do domínio da moral SHER, . Por exemplo, objetos inanimados, como carros e armas, não são nem morais nem imorais. Uma pessoa usando o carro ou arma pode usá-lo imoralmente, mas as coisas em si são não morais. Muitas áreas de estudo por exemplo, matemática, astronomia e física são em si mesmas não morais, mas porque os seres humanos estão envolvidos nessas áreas, a moralidade tamb́m pode estar envolvida. Um problema de matemática não ́ nem moral nem imoral em si mesmo. No entanto, se ele fornece os meios pelos quais uma bomba de hidrogênio pode ser explodida, então questões morais certamente sobrevirão. Em resumo, então, a pessoa imoral viola conscientemente os padrões morais humanos fazendo algo errado ou sendo má. “ pessoa amoral tamb́m pode violar os padrões morais porque ele ou ela não tem senso moral. “lgo não moral não pode ser bom nem ruim, nem fazer nada certo ou errado, simplesmente porque não se enquadra no âmbito da moralidade. 3 ABORDAGENS DO ESTUDO DA MORALIDADE Existem duas abordagens principais para o estudo da moralidade. “ primeira ́ cientíica ou descritiva HEGEN”ERG, a . Esta abordagem ́ mais frequentemente utilizada nas ciências sociais e, como a ́tica, lida com o comportamento e a conduta humanos. “ ênfase aqui, entretanto, ́ empírica. Isto ́, os cientistas sociais observam e coletam dados sobre os comportamentos e as condutas humanas e então extraem certas conclusões. Por exemplo, alguns psićlogos, depois de ter observado muitos seres humanos em muitas situações, chegaram à conclusão de que os seres humanos agem frequentemente em seu interesse pŕprio. Esta ́ uma abordagem descritiva ou cientíica do comportamento humano – os psićlogos observaram como os seres humanos agem em muitas situações, descreveram o que observaram e tiraram conclusões. No entanto, eles não fazem juízos de valor sobre o que ́ moralmente certo ou errado, nem prescrevem como os seres humanos devem se comportar. 7 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA “ segunda abordagem principal para o estudo da moralidade ́ chamada abordagem ilośica, e consiste em duas partes. “ primeira parte da abordagem ilośica trata de normas ou padrões e prescrições, denominada de Ética Normativa ou Prescritiva HEGEN”ERG, a . Usando o exemplo de que os seres humanos agem frequentemente em seu interesse pŕprio, os iĺsofos ́tico-normativos iriam aĺm da descrição e conclusão dos psićlogos e quereriam saber se os seres humanos devem ou deveriam agir em seu interesse pŕprio. Eles podem at́ ir mais longe e chegar a uma conclusão deinitiva. Por exemplo, "dados esses argumentos e essa evidência, os seres humanos devem sempre agir em seu interesse pŕprio" egoísmo . Ou eles poderiam dizer "Os seres humanos devem sempre agir no interesse dos outros" altruísmo , ou "os seres humanos devem sempre agir no interesse de todos os interessados, o eu incluído" utilitarismo . Estas três conclusões não são mais apenas descrições, mas prescrições. Ou seja, as airmações estão prescrevendo como os seres humanos devem se comportar, não apenas descrevendo como eles, de fato, se comportam. Outro aspecto da ́tica normativa ou prescritiva ́ que ela abrange a realização de juízos de valor moral e não apenas a apresentação ou descrição de fatos ou dados. Por exemplo, airmações como "o aborto ́ imoral" e "Maria ́ uma pessoa moralmente boa" podem não prescrever nada, mas envolvem os juízos normativos de valor moral que todos ńs fazemos todos os dias de nossas vidas. “ segunda parte da abordagem ilośica ao estudo da ́tica ́ chamada de metática ou, às vezes, denominada de ́tica analítica HEGEN”ERG, a NERI, . Em vez de ser descritiva ou prescritiva, essa abordagem ́ analítica de duas maneiras. Primeiramente, os metaeticistas analisam a linguagem ́tica por exemplo, o que signiicamos quando ńs usamos a palavra bom . Segundo, analisam os fundamentos racionais dos sistemas ́ticos, ou a ĺgica e o raciocínio de vários eticistas. Os metaeticistas não prescrevem qualquer coisa, nem lidam diretamente com sistemas normativos. Em vez disso, eles "vão aĺm" um signiicado-chave do preixo grego meta , referindo-se apenas indiretamente aos sistemas ́tico-normativos, concentrando-se no raciocínio, nas estruturas ĺgicas e na linguagem, e não no conteúdo. Deve-se notar aqui que a metática, embora sempre usada por todos os eticistas, at́ certo ponto, tornou-se o único interesse de muitos iĺsofos ́ticos modernos NERI, . Isto pode ser devido em parte à crescente diiculdade de formular um sistema de ́tica aplicável a todos ou mesmo à maioria dos seres humanos. Nosso mundo, nossas culturas e nossas vidas se tornaram cada vez mais complicadas e pluralistas, e encontrar um sistema ́tico que subjaz às ações de todos os seres humanos ́ uma tarefa difícil, se não impossível. Portanto, esses iĺsofos sentem que poderiam fazer o que outros especialistas izeram e se concentrarem na linguagem e na ĺgica, em vez de tentar chegar a sistemas ́ticos que ajudem os seres humanos a viver juntos mais signiicativamente e eticamente. 8 TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE Um dos principais objetivos da primeira e segunda unidades deste livro ́ um compromisso com uma síntese razoável das visões ́ticas. Isto ́, esta síntese pretende ser uma união de posições opostas em um todo no qual nenhuma posição se perde completamente, mas as melhores partes ou mais úteis de cada posição são enfatizadas atrav́s de um princípio básico que se aplicará a todas. Há, ́ claro, conlitos que não podem ser sintetizados – você não pode sintetizar as políticas de genocídio do ditador alemão “dolf Hitler com qualquer sistema ́tico que enfatize o valor da vida para todos os seres humanos, mas muitos podem ser. O ponto, entretanto, ́ que um estudo completo da ́tica exige o uso das abordagens descritiva, normativa e metática. É importante que os especialistas em ́tica utilizem todos os dados e resultados válidos de experiências das ciências naturais, físicas e sociais. Eles tamb́m devem examinar sua linguagem, ĺgica e fundações, mas parece ainda mais crucial que os eticistas contribuam para ajudar todos os seres humanos a viverem de forma mais signiicativa e ́tica. Se a ilosoia não pode contribuir para este último imperativo, então a ́tica humana será decidida ao acaso ou por cada indivíduo por si mesmo ou por pronunciamentos religiosos não examinados. Neste sentido, este t́pico compromete-se com uma síntese da ́tica descritiva, normativa e analítica, com grande ênfase na disposição da utilidade da ́tica à comunidade humana. Isso signiica, de fato, colocar uma maior ênfase na ́tica normativa. 4 A MORALIDADE E SUAS APLICAÇÕES “t́ agora, discutimos terminologias e abordagens para estudar a moralidade, mas ainda temos de descobrir exatamente o que ́ moralidade. Uma deinição completa de moralidade, assim como outras questões complexas, se revelará à medida que prosseguirmos por esta primeira unidade. Neste t́pico, no entanto, o objetivo ́ duplo fazer algumas distinções importantes e chegar a uma deinição operacional básica da moralidade. 4.1 A ÉTICA E A ESTÉTICA Há duas áreas de estudo em ilosoia que lidam com valores e juízos de valor em assuntos humanos. “ primeira ́ a ́tica, ou o estudo da moralidade – o que ́ bom, mau, certo ou errado – em um sentido moral. “ segunda ́ a est́tica, ou o estudo dos valores na arte ou na beleza, o que ́ bom, mau, certo ou errado na arte e o que constitui o belo e o não belo em nossas vidas. Pode haver, obviamente, alguma sobreposição entre as duas áreas HERM“NN, . Por exemplo, pode-se julgar a pintura de Pablo Picasso, Guernica veja a Figura , do ponto de vista artístico, decidir se ela ́ bonita ou feia, se constitui uma arte boa ou má em termos de t́cnica artística. Pode-se tamb́m discutir sua importância moral nela Picasso faz comentários morais sobre a crueldade e a imoralidade da guerra e a 9 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA desumanidade das pessoas em relação umas às outras. Essencialmente, no entanto, quando dizemos que uma pessoa ́ atraente, e quando dizemos que um pôr do sol ́ bonito ou um cão ́ feio ou uma pintura ́ grandiosa ou seu estilo ́ medíocre, estamos falando em termos de est́tica em vez de moral ou valores ́ticos. FIGURA 1 - GUERNICA FONTE: Guernica, de Pablo Picasso. Disponível em: <http://wallpapercave.com/guernicawallpaper>. Acesso em: 12 maio 2017. 4.2 BOM, MAU, CERTO E ERRADO USADO EM UM SENTIDO NÃO MORAL “s mesmas palavras que usamos em um sentido moral tamb́m são frequentemente usadas em um sentido não moral. O uso est́tico descrito anteriormente ́ um deles. E quando, por exemplo, dizemos que um cão ou uma faca ́ bom/boa, ou que um carro tem um mau desempenho, muitas vezes usamos esses termos de valor bom, mau, ruim etc. em nenhum sentido est́tico ou moral. “o chamar um cão de bom, não queremos dizer que o cão ́ moralmente bom ou mesmo bonito. Ńs provavelmente queremos dizer que não morde ou que late apenas quando estranhos nos ameaçam ou que se desempenha bem como um cão de caça. Quando dizemos que um carro tem um mau desempenho ou que uma faca ́ boa, queremos dizer que há algo mecanicamente mas não moralmente ou esteticamente errado com o motor do carro ou que a faca ́ aiada e corta bem. Em suma, o que geralmente queremos dizer com tal airmação ́ que a coisa em questão ́ boa porque pode ser usada para cumprir algum tipo de função. Isto ́, está em "bom" funcionamento ou tem sido bem treinada. É interessante notar que “rist́teles “EC – “ntes da Era Comum argumentou que ser moral tem a ver com a função de um ser humano e que, ao desenvolver seu argumento, ele passou dos usos não morais para os usos morais de bom e mau. Ele sugeriu que tudo o que ́ bom ou mau ́ assim porque funciona bem ou mal. Ele então continuou dizendo que se pud́ssemos descobrir qual ́ a função de um ser humano, então saberíamos como o termo bom ou mau pode ser aplicado à vida humana. Tendo chegado à teoria de que a função adequada do ser 10 TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE humano ́ a razão, ele concluiu que ser moral signiica essencialmente raciocinar bem para uma vida completa “RIST2TELES, . “o longo dos anos, muitas questões foram levantadas sobre essa teoria KR“UT, . “lguns duvidam que “rist́teles realmente conseguiu identiicar a função dos seres humanos, por exemplo, algumas religiões airmam que a função primária de um ser humano ́ servir a Deus. Outros questionam se ser moral pode estar diretamente ligado apenas ao funcionamento, mas o ponto dessa discussão ́ que os mesmos termos que são usados no discurso moral muitas vezes tamb́m são usados de forma não moral, e nem “rist́teles nem ningúm realmente quis dizer que esses termos, quando aplicados a coisas como facas, cães ou carros, têm algo diretamente a ver com moral ou ́tica. 4.3 A MORAL E AS BOAS MANEIRAS OU ETIQUETA “s boas maneiras, ou a etiqueta, ́ uma outra área do comportamento humano aliada à ́tica e à moral, mas distinções cuidadosas devem ser feitas entre as duas esferas. Não há dúvida de que moral e ́tica têm muito a ver com certos tipos de comportamento humano. No entanto, nem todo comportamento humano pode ser classiicado como moral. “lguns destes são não morais e alguns são sociais, tendo a ver com boas maneiras ou etiqueta, que ́ essencialmente uma questão de gosto e não de certo ou errado. Muitas vezes, ́ claro, essas distinções se confundem ou se sobrepõem, mas ́ importante distinguir o mais claramente possível entre comportamento não moral e moral e o que tem a ver somente com os costumes ou boas maneiras JOHNSON, . Tomemos um exemplo da vida cotidiana um empregador dando ao secretário uma carta de neǵcios rotineira para ele digitar. Tanto o ato de dar a carta ao secretário quanto o ato do secretário digitá-la envolvem comportamento não moral. Suponhamos agora que o empregador usa palavras de baixo calão ao falar com o secretário e o faz em tom alto e rude na frente de todos os funcionários do escrit́rio. O que o empregador fez, essencialmente, ́ exibir más maneiras, ele realmente não fez nada de imoral. O praguejar e a rudeza podem ser considerados como conduta errada por muitos, mas basicamente são uma ofensa ao gosto, em vez de uma ofensa à moralidade. Vamos agora supor, no entanto, que o conteúdo da carta iria arruinar a reputação de uma pessoa inocente ou resultar na morte de algúm ou perda de seus bens. O comportamento agora entra na esfera da moralidade, e questões devem ser levantadas sobre a moralidade do comportamento do empregador. “ĺm disso, um problema moral surge para o secretário sobre se ele deve digitar a carta. “ĺm disso, se o empregador usa palavras de baixo calão para assediar moral ou sexualmente o secretário, então ele está sendo imoral, ameaçando o sentimento de segurança pessoal, privacidade, integridade e orgulho proissional do funcionário. 11 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA O comportamento não moral constitui uma grande parte do comportamento que vemos e realizamos todos os dias em nossas vidas. Devemos, no entanto, estar sempre cientes de que nosso comportamento não moral pode ter implicações morais. Por exemplo, digitar uma carta ́, em si mesmo, não moral, mas se o ato de digitar e enviar a carta resultará na morte de algúm, então a moralidade certamente entrará em cena. No domínio das boas maneiras, comportamentos tais como praguejar, comer com as mãos e vestir-se mal podem ser aceitáveis em algumas situações, mas ser considerado má conduta em outros. Tal comportamento raramente seria considerado imoral, no entanto. Não queremos dizer que não há conexão entre as boas maneiras e a moral, apenas que não há nenhuma conexão necessária entre elas. De um modo geral, em nossa sociedade sentimos que as boas maneiras acompanham a boa moral e assumimos que se as pessoas são ensinadas a se comportarem corretamente em situações sociais, elas tamb́m se comportarão corretamente em situações morais JOHNSON, . Muitas vezes, poŕm, ́ difícil estabelecer uma conexão direta entre o comportamento socialmente aceitável e a moralidade TORRES NEIV“, . Muitos membros decadentes de sociedades passadas e presentes agiram com boas maneiras impecáveis e, contudo, foram altamente imorais em seu tratamento com outras pessoas. É, naturalmente, geralmente desejável que os seres humanos se comportem com boas maneiras uns com os outros e tamb́m sejam morais em suas relações humanas. Para atuar moralmente ou trazer à luz um problema moral, às vezes pode ser necessário violar as "boas maneiras" de uma determinada sociedade. Por exemplo, há algumas d́cadas, em sociedades como nos Estados Unidos da “ḿrica e na África do Sul durante o Apartheid, era considerado maus modos e at́ mesmo ilegal que as pessoas negras comessem na mesma área de um restaurante que os brancos. Nos EU“ ocorreram o que foram chamados de "sit-ins" realizados nesses estabelecimentos, que eram protestos não violentos, em que pessoas negras sentavam-se nesses restaurantes, pediam para serem servidos, eram recusados, mas mesmo assim permaneciam sentados se recusando a sair SILV“, . Esse movimento inspirou o kiss-in , nos EU“ e na Europa, e o beijaço no ”rasil, que consistia na demonstração pública de afeto entre homossexuais em locais em que essa prática ́ coibida, buscando visibilidade para esse público GREEN TRIND“DE, , p. . Ou seja, estas ações violavam as boas maneiras para apontar e tentar resolver os problemas morais associados à desigualdade de tratamento e à negação da dignidade aos seres humanos. Portanto, embora possa às vezes haver uma conexão entre as boas maneiras e a moral, deve-se tomar cuidado para distinguir entre os dois quando não há uma conexão clara. Não se deve, por exemplo, equiparar o uso de palavras de baixo calão em companhia mista com estupro ou assassinato ou desonestidade nos neǵcios. 12 TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE 4.4 A QUEM OU O QUE SE APLICA À MORALIDADE? “o discutir a aplicação da moralidade, quatro aspectos podem ser considerados moralidade religiosa, moralidade e natureza, moralidade individual e moralidade social. “ moralidade religiosa refere-se a um ser humano em relação a um ser ou seres sobrenaturais COMP“R“TO, . Nas tradições judaica e cristã, por exemplo, os três primeiros dos Dez Mandamentos pertencem a esse tipo de moralidade. Esses mandamentos tratam do relacionamento de uma pessoa com Deus, não com qualquer outro ser humano. “o violar qualquer um destes três mandamentos, uma pessoa poderia, de acordo com este ćdigo de ́tica particular, agir imoralmente em relação a Deus sem agir imoralmente em relação a outra pessoa. QUADRO 1 - OS DEZ MANDAMENTOS Os dez Mandamentos . . . . . . . . . Não terás outros deuses diante de mim. Não tomarás o nome do teu Deus em vão. Guardarás o dia do Sábado. Honre teu pai e tua mãe. Não matarás. Não cometerás adult́rio. Não furtarás. Não darás falso testemunho contra o seu pŕximo. Não cobiçarás o cônjuge do seu pŕximo. . Não cobiçarás os pertences do seu pŕximo. FONTE: Uma versão parafraseada dos Dez Mandamentos (BÍBLIA, Êxodo, 20. 1-17). “ moralidade e a natureza referem-se a um ser humano em relação à natureza HEGEN”ERG, b . “ moralidade natural prevaleceu em todas as culturas primitivas, como nos povos nativos ameríndios e nas culturas do Extremo Oriente. Mais recentemente, a tradição ocidental tamb́m se tornou consciente da importância de lidar com a natureza de uma maneira moral. “lguns veem a natureza como sendo valiosa apenas para o bem da humanidade, mas muitos outros têm visto como um bem em si, digno de consideração moral OLIVEIR“ OLIVEIR“, . Com este ponto de vista não há dúvida sobre se um Robinson Crusó seria capaz de ações morais ou imorais em uma ilha deserta estando lá sozinho. No aspecto da moralidade e da natureza, ele poderia ser considerado moral ou imoral, dependendo de suas ações em relação às coisas naturais ao seu redor. “ moralidade individual refere-se aos indivíduos em relação a si mesmos e a um ćdigo individual de moralidade que pode ou não ser sancionado por qualquer sociedade ou religião LE ”ON, . Este tipo de ćdigo permite uma 13 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA "moralidade superior", que pode ser encontrada dentro do indivíduo em vez de aĺm deste mundo em algum domínio sobrenatural. Uma pessoa pode ou não realizar algum ato particular, não porque a sociedade, lei ou religião diz que pode ou não, mas porque ele mesmo pensa que ́ certo ou errado dentro de sua pŕpria consciência. Por exemplo, numa lenda grega, uma ilha “ntígona enfrenta um rei Creonte , quando ela procura contrariar a ordem do rei enterrando seu irmão morto. Na peça de Śfocles C. “EC , “ntígona se opõe a Creonte por causa da lei superior de Deus, mas a “ntígona na peça de Jean “nouilh opõe-se a Creonte não por causa da lei divina, da qual ela não reivindica nenhum conhecimento, mas por causa de suas pŕprias convicções individuais sobre o que ́ certo fazer ao lidar com seres humanos, at́ seres humanos mortos POCIÑ“ et al., . Este aspecto tamb́m pode referir-se a essa área da moralidade preocupada com as obrigações que os indivíduos têm para com eles pŕprios promover seu pŕprio bem-estar, desenvolver seus talentos, ser iel àquilo em que acreditam etc. . Os mandamentos nove e dez Quadro , embora tamb́m aplicáveis à moral social, como veremos a seguir, são bons exemplos de pelo menos uma exortação à moralidade individual. O proṕsito de dizer "não cobiçarás" parece ser a criação de um controle interno dentro de cada indivíduo para que nem sequer pense em roubar os pertences ou o cônjuge de um vizinho. De qualquer modo, esses mandamentos parecem enfatizar uma moralidade individual, assim como uma moralidade social. “ moralidade social diz respeito a um ser humano em relação a outros seres humanos. É provavelmente o aspecto mais importante da moralidade, na medida em que atravessa todos os outros aspectos e ́ mais encontrado em sistemas ́ticos do que qualquer um dos outros TORRES NEIV“, . Voltando brevemente ao exemplo da ilha deserta, a maioria dos eticistas provavelmente declararia que Robinson Crusó ́ incapaz de qualquer ação realmente moral ou imoral, exceto para si e para a natureza. Tal ação seria mínima se comparada com o potencial de moralidade ou imoralidade se houvesse outras nove pessoas na ilha a quem ele poderia subjugar, torturar ou destruir. Muitos sistemas ́ticos permitiriam que o que ele faria a si mesmo ́ estritamente uma questão que importa ś a ele, desde que não prejudique ningúm. Para a maioria dos eticistas, as questões morais humanas mais importantes surgem quando os seres humanos se reúnem em grupos sociais e começam a entrar em conlito uns com os outros NERI, . Mesmo que os sistemas ́ticos judeus e cristãos, por exemplo, pressionem persistentemente os seres humanos a amar e obedecer a Deus, ambas as religiões, em todas as suas divisões e seitas, têm uma mensagem social forte. Na verdade, talvez a por cento de todas as suas admoestações são direcionadas para como um ser humano deve se comportar em relação aos outros REIFLER, . Jesus declarou esta mensagem sucintamente quando disse que os dois maiores mandamentos são amar a Deus e amar ao pŕximo ”Í”LI“, Mateus, . - . Estes se enquadram igualmente sob os aspectos religiosos e sociais, mas, observando toda a ação e pregações de Jesus, vê-se a maior ênfase no tratamento moral de outros seres humanos. Ele parece 14 TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE dizer que se algúm age moralmente em relação a outros seres humanos, então este algúm está automaticamente agindo moralmente em relação a Deus. Isto ́ enfatizado em uma das parábolas do Juízo Final de Jesus, quando Ele diz aqui parafraseado "Tudo o que izeste ao mais pequenino dos meus irmãos [seres humanos mais marginalizados e necessitados], assim o izestes a Mim" ”Í”LI“, Mateus, . . Três dos Dez Mandamentos são direcionados especiicamente a Deus, enquanto que sete são dirigidos a outros seres humanos – o aspecto social tem precedência. Em outras religiões, como o budismo e o confucionismo, o aspecto social representa quase toda a moralidade, havendo muito pouco ou nenhum foco no aspecto sobrenatural ou religioso ”R“NNIG“N, . “ĺm disso, tudo o que ́ dirigido para o aspecto individual tamb́m ́ muitas vezes destinado ao bem de outros que compartilham da cultura do indivíduo. Os sistemas ́ticos não religiosos, muitas vezes, enfatizam o aspecto social. O egoísmo ́tico, que parece enfatizar o aspecto individual e diz em sua forma mais comumente declarada que todos devem agir em seu interesse pŕprio, enfatiza tamb́m todo o meio social FURROW, . O utilitarismo, em todas as suas formas, enfatiza o bem de todos os interessados e, portanto, obviamente está lidando com o aspecto social. Teorias não consequencialistas ou deontoĺgicas, como a de Kant , enfatizam as ações para com os outros mais do que qualquer outro aspecto, embora as razões para agir moralmente em relação aos outros sejam diferentes das do egoísmo ́tico ou do utilitarismo. Essas teorias serão tratadas detalhadamente nos T́picos e desta unidade. O importante a ser observado neste ponto ́ que a maioria dos sistemas ́ticos, mesmo os mais individualistas ou religiosos, enfatizará o aspecto social exclusivamente ou muito mais do que qualquer outro aspecto. Como, então, devemos usar esses aspectos? Podemos recorrer a eles como distinções efetivas que nos permitirão pensar em termos mais amplos sobre a aplicabilidade da ́tica humana. No espírito de síntese, entretanto, podemos ser sábios em manter essas distinções abertas em unidade para que possamos aceitar em uma ́tica humana ampla os aspectos religiosos, naturais, individuais e sociais da moralidade. Reconhecendo, no entanto, que a maioria dos sistemas ́ticos se encontra no aspecto social. Devemos, em outras palavras, manter os olhos nos três primeiros aspectos enquanto permanecemos irmemente plantados no aspecto social, onde ocorre a maioria dos problemas e conlitos morais humanos. 4.5 QUEM É MORALMENTE OU ETICAMENTE RESPONSÁVEL? Quem pode ser moralmente ou eticamente responsável por suas ações? Todas as evidências que obtivemos at́ hoje nos obrigam a dizer que a moral pertence aos seres humanos, ao menos na complexidade com a qual a compreendemos. Se algúm quer atribuir a moralidade a seres sobrenaturais, ́ preciso fazê-lo na f́. Se algúm quer atribuir animais ou plantas moralmente responsáveis por atos destrutivos uns contra os outros ou contra humanos, então ́ preciso ignorar a maior parte da evidência que a ciência nos deu sobre o comportamento instintual de tais seres e a evidência de nossas pŕprias observações diárias. 15 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA “ experimentação com o ensino da língua aos animais sugere que são pelo menos minimamente capazes de desenvolver alguns processos de pensamento semelhantes aos dos seres humanos. É, ao menos, possível que a eles possa ser ensinado moralidade no futuro, como aos seres humanos. Se isso acontecer, então os animais poderiam ser considerados moralmente responsáveis por suas ações. Pesquisas recentes, como as de Sarah ”rosnan e Franz de Waal , demonstram que sim, podemos ver traços fundamentais do senso moral, como empatia, reciprocidade, cooperação e senso de justiça em outros animais. Essas evidências comprovam a natureza bioĺgica de nossa moralidade. Todavia, a complexidade da moralidade humana ainda parece delinear o âmbito da responsabilidade moral. DICAS SUGESTÃO DE VÍDEO Veja o vídeo “Frans de Waal: Comportamento moral em animais”, em que o pesquisador Frans de Waal apresenta seus experimentos e comenta seus surpreendentes resultados sobre o comportamento moral em outros animais. Disponível em: <https://www.ted.com/talks/frans_ de_waal_do_animals_have_morals?language=pt-br>. Acesso em: 10 maio 2017. No momento presente, a maioria das evidências parece indicar que seres como as plantas devem ser classiicados como não morais ou amorais, ou seja, devem ser considerados como não tendo sentido moral ou como estando fora da esfera moral completamente TUGENDH“T, . Os outros animais, mais pŕximos do ser humano em termos evolucionários, quando não se aplica a classiicação da não moralidade ou da amoralidade, no mínimo são considerados como inferiores moralmente no sentido da complexidade moral humana e não necessariamente no sentido do valor moral . Portanto, quando usamos os termos moral e ́tico, estamos usando-os em referência apenas aos seres humanos. Não imputamos responsabilidade moral a um lobo por matar uma ovelha, ou uma raposa como moralmente responsável por matar uma galinha. Podemos matar o lobo ou raposa por ter cometido este ato, mas não o matamos porque consideramos o animal moralmente responsável. Fazemos isso porque não queremos que mais de nossas ovelhas ou galinhas sejam mortas. Neste ponto da hist́ria do mundo, somente os seres humanos podem ser morais ou imorais, especialmente se enfatizarmos o aspecto da responsabilidade moral, e, portanto, somente os seres humanos devem ser considerados moralmente responsáveis por suas ações e comportamento. Há, naturalmente, limitações quanto ao momento em que os seres humanos podem ser considerados moralmente responsáveis o momento ou período do desenvolvimento bioĺgico em que estamos aptos a agir/pensar moralmente, ou em casos de demência ou outros casos em que alegamos a perda da autonomia do indivíduo e, portanto, alegamos 16 TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE que não pode mais agir/pensar moralmente , mas a questão da responsabilidade moral não deve sequer ser levantada onde os não humanos estão envolvidos TUGENDH“T, . 5 DE ONDE VEM A MORALIDADE? Sempre houve uma grande quantidade de especulações sobre a origem da moralidade ou da ́tica HEGEN”ERG, b . Será que tem sido sempre uma parte do mundo, proveniente de algum ser sobrenatural, ou incorporado dentro da pŕpria natureza, ou ́ estritamente um produto das mentes dos seres humanos? Ou ́ alguma combinação de alguns destes fatores? Pela razão de que a moralidade e a ́tica lidam com valores que têm a ver com o bem/bom, o mal/mau, o certo e o errado, esses valores seriam totalmente objetivos, isto ́, fenômenos "externos" aos seres humanos? Seriam eles subjetivos ou estritamente "internos" aos seres humanos? Ou são uma combinação destes dois domínios? Consideremos as possibilidades que pertencem ao estudo da metática HEGEN”ERG, a. Há três maneiras de olhar para os valores quando eles são tomados como sendo totalmente objetivos . Eles vêm de algum ser, ou seres, sobrenatural . Há leis morais de alguma forma embutidas dentro da pŕpria natureza . O mundo e seus objetos têm valor com ou sem a presença da valorização dos seres humanos HEGEN”ERG, a NERI, SÁNCHEZ VÁZQUEZ, . Vejamos primeiro a teoria sobrenatural. “lgumas pessoas acreditam que os valores vêm de algum poder superior ou de um ser ou seres sobrenaturais, ou princípios – o ”em Platão Os deuses os gregos e romanos Jav́ ou Deus os judeus Deus e Seu Filho Jesus os cristãos “lá os muçulmanos e ”rahma os hindus , para citar alguns. Eles acreditam, aĺm disso, que esses seres ou princípios incorporam o pŕprio bem supremo e revelam aos seres humanos o que ́ certo ou bom e o que ́ mau ou errado NERI, . Se os seres humanos querem ser morais e geralmente são encorajados em tais desejos por algum tipo de recompensa temporal ou eterna , então eles devem seguir esses princípios ou os ensinamentos desses seres. Se não o izerem, então eles acabarão sendo desobedientes à moralidade mais elevada Deus, por exemplo , serão considerados imorais e geralmente receberão algum castigo temporal ou eterno por suas transgressões. No caso de eles acreditarem em um princípio, em vez de um ser sobrenatural ou seres, então eles estarão sendo não verdadeiros, desleais, ao mais alto princípio moral HEGEN”ERG, a. “gora, vejamos o caso da teoria do direito natural. Outros acreditam que a moralidade de alguma forma está incorporada na natureza e que existem "leis naturais" às quais os seres humanos devem aderir se quiserem ser morais. Santo Tomás de “quino defendeu isso tanto quanto defendeu a base sobrenatural da moralidade CORTIN“ M“RTÍNEZ, V“Z, . Por exemplo, algumas pessoas airmarão que a homossexualidade ́ imoral porque vai contra a "lei moral natural" – isto ́, que seria contra a lei da natureza que seres do 17 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA mesmo sexo desejem, ou amem sexualmente uns aos outros, ou se envolvam em atos sexuais. Em oposição a esses argumentos, há aqueles que argumentam que a moralidade decorre estritamente do interior dos seres humanos, que são valores totalmente subjetivos, ou seja, eles acreditam que as coisas podem ter valores e serem classiicadas como boas, más, certas ou erradas se, e somente se, houver algum ser consciente que possa valorizar essas coisas HEGEN”ERG, a . Em outras palavras, se não há seres humanos, então não pode haver valores. 5.1 A AVALIAÇÃO DE POSIÇÕES OBJETIVAS E SUBJETIVAS Vejamos agora os críticos da teoria sobrenatural. “lbert Einstein , o grande matemático/físico, disse "Não creio na imortalidade do indivíduo e considero a ́tica como uma preocupação exclusivamente humana, sem nenhuma autoridade sobre-humana por trás" EINSTEIN apud HITCHENS, , p. . Obviamente, ́ possível que o sobrenatural exista e que de alguma forma se comunique com o mundo natural e os seres humanos nele. Esta visão ́ principalmente uma crença baseada na f́. Há, naturalmente, justiicativa racional para tal crença, a f́ pode ter uma base racional. Evidências para a existência de um ser sobrenatural são frequentemente citadas e, de fato, tem havido argumentos ilośicos apresentados que tentaram provar a existência de Deus LEYSER, . No entanto, não há nenhuma prova conclusiva da existência de um ser, seres, ou princípio sobrenatural. “ĺm disso, há um grande número de tradições altamente diversas descrevendo tais seres, ou princípios. Essa diversidade torna muito difícil determinar exatamente quais valores os seres, ou princípios, estão tentando comunicar e quais valores, comunicados atrav́s das muitas tradições, os seres humanos devem aceitar e seguir. Tudo isso não signiica que devemos parar de procurar a verdade, ou de veriicar a possibilidade de valores baseados sobrenaturalmente, mas signiica que ́ difícil estabelecer com alguma certeza que a moralidade vem dessa fonte. Vejamos agora as críticas da teoria do direito natural. Certamente falamos sobre "leis da natureza", como a lei da gravitação universal, mas se examinarmos essas leis de perto, vemos que elas são muito diferentes das leis artiiciais que têm a ver com a moralidade, ou o governo das sociedades. “ lei da gravitação, por exemplo, diz, de fato, que todos os objetos materiais são atraídos para o centro da Terra. Se lançarmos uma bola para o ar, ela sempre cairá de volta ao chão. Sir Isaac Newton descobriu que esse fenômeno ocorreu cada vez que um objeto foi submetido à atração da gravidade e descreveu essa recorrência constante chamando-a de "lei da natureza" STR“THERN, . “ palavra-chave neste processo ́ descrita, pois as chamadas leis naturais são descritivas, enquanto as leis morais e societárias são prescritivas. Em outras palavras, a lei natural não diz que a bola, quando lançada ao ar, deve ou não deve cair no chão, como dizemos que os seres humanos devem ou não devem matar outros seres humanos. Em vez disso, 18 TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE a lei da gravitação diz o que a bola faz, ou vai fazer quando lançada, descreve, em vez de prescrever seu comportamento. “ pergunta que devemos fazer neste momento ́ "Existem leis morais naturais que prescrevem como os seres na natureza deveriam ou não deveriam se comportar?" Se existirem tais leis morais, quais seriam elas? Como mencionado anteriormente, a homossexualidade ́ considerada por alguns como "antinatural" ou "contra as leis da natureza", uma crença que implica a convicção de que apenas o comportamento heterossexual ́ "natural". Se, no entanto, examinarmos todos os aspectos da natureza, descobriremos que a heterossexualidade não ́ o único tipo de sexualidade que ocorre na natureza. “lguns seres na natureza são assexuados não têm sexo , alguns são homossexuais outros animais, assim como os animais humanos , e muitos são bissexuais engajando-se em comportamento sexual com machos e fêmeas da esṕcie . Os seres humanos, naturalmente, podem querer prescrever, por uma razão ou outra, que o comportamento homossexual ou antiheterossexual ́ errado, mas ́ difícil argumentar que há alguma "lei da natureza" que proíbe a homossexualidade. Vejamos agora as críticas dos valores existentes no mundo e seus objetos. É factível, ou mesmo possível, pensar em algo que tenha um valor sem que haja algúm para valorizá-lo? Que valor o ouro, a arte, a ciência, a política e a música têm sem seres humanos para valorizá-los? “inal de contas, com exceção do ouro nestes exemplos, os seres humanos não os inventaram e criaram? Parece, então, quase impossível que os valores existam totalmente no mundo e nas pŕprias coisas. Quanto às críticas à posição subjetiva? Devemos então chegar à posição de que os valores são inteiramente subjetivos e de que o mundo em todos os seus aspectos não teria absolutamente nenhum valor se não existissem seres humanos nele? Tentemos imaginar objetivamente um mundo sem nenhum ser humano nele. Não há nada de valor no mundo e na natureza – ar, água, terra, luz solar, mar – a menos que os seres humanos estejam lá para apreciá-la? Certamente, quer os seres humanos existam ou não, plantas e animais encontrariam o mundo "valioso" na realização de suas necessidades. Encontrariam "valor" no calor do Sol e na sombra das árvores, nos alimentos que comem e na água que sacia sua sede. É verdade que muitas coisas no mundo, como a arte, a ciência, a política e a música, são valorizadas apenas por seres humanos, mas há tamb́m muitas coisas que são valiosas se os seres humanos estão presentes ou não. “ssim, parece que os valores não são inteiramente subjetivos, assim como não são inteiramente objetivos. 5.2 UMA SÍNTESE E POSSÍVEL RESPOSTA PARA A ORIGEM DA MORALIDADE Parece, portanto, que pelo menos alguns valores residem fora dos seres humanos, embora talvez muitos mais dependam de seres humanos conscientes, que são capazes de valorizar as coisas FURROW, . Portanto, parece que os 19 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA valores são mais complexos do que a posição subjetiva ou a posição objetiva pode descrever. “ssim, uma posição melhor ́ assumir que os valores são objetivos e subjetivos R“CHELS R“CHELS, . Uma terceira variável deve ser adicionada para que haja uma interação de três variáveis, da seguinte maneira . “ coisa de valor ou a coisa valorizada . Um ser consciente que valoriza, ou o avaliador . O contexto ou situação em que a valorização ocorre. Por exemplo, o ouro tem em si valor em seu conteúdo mineral e em ser brilhante e maleável. No entanto, quando visto por um ser humano e descoberto ser raro, torna-se, no contexto de sua beleza e em seu papel como um suporte para as inanças do mundo, um item muito mais valorizado do que ́ em si mesmo. Seu valor máximo, portanto, depende não ś de suas qualidades individuais, mas tamb́m de algum ser consciente que o está valorizando em um contexto ou situação especíica. Nem precisamos dizer que o ouro ́ uma daquelas coisas cujo valor ́ fortemente dependente da valorização subjetiva. Note, entretanto, que o valor do ouro mudaria se o contexto ou a situação o izessem. Por exemplo, suponha que algúm estivesse preso em uma ilha deserta sem comida, água ou companheirismo humano, mas com quilos de ouro. O valor do ouro diminuiria consideravelmente em função do contexto, ou da situação em que falta comida, água e companhia humana e que nenhuma quantidade de ouro poderia comprar? Este exemplo mostra como o contexto ou situação podem afetar valores e valorização. Os valores, então, pareceriam vir mais frequentemente de uma interação complexa entre seres humanos conscientes e "coisas" materiais, mentais ou emocionais em contextos especíicos. Como essa discussão pode nos ajudar a responder à questão de onde vem a moralidade? Qualquer suposição sobre a resposta a esta questão da origem da moral certamente tem de ser especulativa. No entanto, ao observar como a moralidade se desenvolve e muda nas sociedades humanas, pode-se ver que ela surgiu em grande parte das necessidades e desejos humanos e que se baseia nas emoções e na razão humana LE ”ON, . Parece ĺgico supor que, à medida que os seres humanos começaram a tomar consciência de seu ambiente e de outros seres como eles, descobriram que poderiam realizar mais quando estavam juntos do que poderiam quando isolados uns dos outros. “trav́s de sentimentos e pensamentos profundos, e depois de muitas experiências, eles decidiram sobre "bons" e "maus" que iriam ajudá-los a viver juntos com mais sucesso e signiicado. Essas crenças necessitavam de sanções, que eram fornecidas por sumos sacerdotes, profetas e outros líderes. “ moralidade era ligada por esses líderes não apenas à sua autoridade, mas tamb́m à autoridade de algum tipo de ser, ou seres sobrenaturais, ou à natureza, que, em tempos anteriores, eram muitas vezes considerados inseparáveis SÁNCHEZ VÁZQUEZ, . Por exemplo, os seres humanos são capazes de sobreviver com mais sucesso em seu ambiente estando em um grupo do que eles podem como indivíduos isolados. No entanto, se eles devem sobreviver como uma comunidade, deve haver alguma proibição de matar. Esta proibição pode ser alcançada por um consenso 20 TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE de todas as pessoas na comunidade ou por ações tomadas pelos líderes do grupo. Os líderes podem fornecer mais sanções para a lei contra matar, informando às pessoas que algum ser ou seres sobrenaturais, que podem ou não ser pensados operar atrav́s da natureza, airmam que matar ́ errado. Tamb́m ́ possível, ́ claro, que um ser ou seres sobrenaturais que estabeleceram tais leis morais realmente existam. No entanto, como a maioria dessas leis de fato foi entregue a seres humanos por outros seres humanos Moiśs, Jesus, ”uda, Maoḿ, Confúcio e outros , ś podemos dizer com certeza que a maioria de nossa moralidade e ́tica vem de ńs mesmos, ou seja, de origens humanas. Tudo o mais ́ especulação ou uma questão de f́. No mínimo, parece que a moralidade e a responsabilidade moral devem ser derivadas dos seres humanos e aplicadas em contextos humanos. “ĺm disso, as pessoas devem decidir o que ́ certo ou bom e o que ́ errado ou mau, usando tanto a sua experiência e seus melhores e mais profundos pensamentos e sentimentos e aplicando-os de forma racional e signiicativa como eles podem. Isso nos leva à importante distinção entre a moralidade costumeira ou tradicional e a moralidade relexiva. 6 MORALIDADE COSTUMEIRA E MORALIDADE REFLEXIVA John Dewey, em sua obra Teoria da vida moral, distingue bem a moralidade costumeira da relexiva, dizendo que a distinção intelectual entre a moralidade costumeira e a relexiva ́ marcadamente clara. “ primeira baseia a norma e as regras de conduta no âmbito ancestral, a segunda apela à consciência, à razão ou algum princípio que implica pensamento , p. . Podemos dizer que estamos todos bastante familiarizados com a moralidade costumeira ou tradicional, porque todos ńs nascemos nela. É a primeira moral com a qual entramos em contato. “ moralidade que existe em várias culturas e sociedades ́ geralmente baseada no costume ou na tradição, e ́ apresentada aos seus membros, muitas vezes sem análise crítica ou avaliação, durante toda a sua infância e anos de adultez. Não há nada necessariamente errado ou mau sobre essa abordagem para a formação da juventude da sociedade e tamb́m seus membros como um todo. Muitos costumes e tradições são bastante eicazes e úteis na criação de sociedades morais. Como sugerido nos parágrafos anteriores, muitos ensinamentos morais surgiram da necessidade humana na interação social e se tornaram costumes e tradições em uma sociedade particular. Por exemplo, para viver juntos criativamente e em paz, um dos primeiros ensinamentos ou regras morais tem que ser sobre a vida humana, porque, obviamente, se a vida está constantemente em perigo, então ́ muito difícil para as pessoas viver e trabalhar juntos. No entanto, para que os costumes e tradições sejam eicazes e continuamente aplicáveis aos membros de uma sociedade, devem ser analisados, testados e avaliados criticamente, e ́ aí que entra a moralidade relexiva. Os iĺsofos, em geral, exigem de si mesmos e de outros que todas as crenças, proposições ou ideias humanas sejam examinadas cuidadosamente e criticamente para assegurar que elas tenham sua base na verdade. “ moralidade 21 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA não ́ diferente de qualquer outra área de estudo ilośico a este respeito. Os iĺsofos não sugerem que o costume e a tradição sejam eliminados ou expulsos, mas exortam os seres humanos a usarem a razão para examinar a base e a eicácia de todos os ensinamentos ou regras morais, por mais tradicionais ou aceitos que sejam. Em outras palavras, a ilosoia exige que os seres humanos relitam sobre seus costumes e tradições morais para determinar se devem ser retidos ou eliminados. O reverenciado iĺsofo grego Ścrates “EC disse "“ vida não examinada não vale a pena ser vivida" PL“TÃO, , p. . Para a moral, um corolário poderia ser "O costume ou tradição não examinados não valem a pena serem seguidos na vida". Portanto, assim como as pessoas não devem aceitar declarações ou proposições para as quais não há prova ou argumento ĺgico signiicativo, assim tamb́m não devem aceitar costumes ou tradições morais sem primeiro testá-los contra a prova, a razão e a experiência. É importante, portanto, que todos os costumes, tradições, sistemas de ́tica, regras e teorias ́ticas sejam cuidadosamente analisados e avaliados criticamente antes de continuarmos a aceitá-los ou a vivê-los. Novamente, não devemos rejeitálos, mas tampouco devemos endossá-los de todo o coração, a menos que os submetamos a um escrutínio cuidadoso e ĺgico. “o longo dos t́picos restantes deste livro, você será fortemente encorajado a se tornar um pensador e praticante relexivo quando estiver lidando com questões morais e da moralidade. 7 MORALIDADE, LEI E RELIGIÃO Nesse ponto, ́ importante que usemos a relexão para distinguir a moralidade de outras duas áreas da atividade e da experiência humana com as quais muitas vezes ́ confundida e das quais muitas vezes ́ considerada uma parte lei e religião. 7.1 A MORALIDADE E A LEI “ frase "lei injusta" pode servir como ponto de partida para entender que as leis podem ser imorais. Ńs tamb́m temos operadores do direito que podem ser "corruptos", considerados antíticos dentro de sua pŕpria proissão. Por essa razão, faz-se necessário haver o Tribunal de Ética e Disciplina, onde operadores do direito podem julgar e punir outros operadores do direito por terem infringido o seu Ćdigo de Ética. Obviamente, a moralidade e a lei não são necessariamente a mesma coisa quando duas pessoas podem ser advogadas, ambas tendo estudado em grande parte do mesmo material, e uma ́ moral, enquanto a outra não. Os muitos protestos que tivemos ao longo da hist́ria contra leis injustas, onde, na maioria das vezes, os manifestantes estavam preocupados com "o que ́ moral" ou com uma "moralidade superior", tamb́m parecem indicar que as distinções devem ser feitas entre lei e moralidade. 22 TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE Tudo isso signiica que não há relação entre lei e moralidade? Uma resposta "sim" a essa pergunta seria extremamente difícil de sustentar, porque grande parte de nossa moralidade se tornou encarnada em nossos ćdigos legais COMP“R“TO, . Tudo o que temos a fazer ́ rever qualquer um dos nossos estatutos legais em qualquer nível de governo, e encontramos sanções legais contra furtar, estuprar, matar e causar maus-tratos físicos e mentais aos outros. Encontraremos muitas outras leis que tentam proteger os indivíduos que vivem juntos em grupos de danos e fornecer resoluções de conlitos decorrentes de diferenças – muitas delas estritamente morais – entre os indivíduos que compõem esses grupos. Qual ́, então, a relação entre lei e moralidade? Note uma diferença importante quando discutimos as diferenças e distinções entre os Dez Mandamentos, que são uma das leis mais antigas da cultura ocidental, cridas por cristãos e judeus de terem sido transmitidas por Deus. Podemos, então, distinguir entre as leis contra a cobiça e as leis contra assassinato, furto e adult́rio veja o Quadro . Não há nenhuma maneira em que uma lei possa regular o desejo de algúm pelo cônjuge ou os pertences de outro algúm, contanto que o desejo por ato adúltero ou ato de furto nunca foram executados COMP“R“TO, . Portanto, as airmações sobre a cobiça contidas nos Dez Mandamentos parecem ser admoestações morais no que diz respeito a como se deve pensar ou manter a moral interior, enquanto que as declarações contra o furto, assassinato e adult́rio são leis, proibições que são, de alguma forma, aplicáveis contra certos atos humanos. “ lei fornece uma śrie de declarações públicas – um ćdigo legal, ou sistema de normas do que fazer e do que não fazer – para orientar os seres humanos em seu comportamento e para protegê-los de fazer mal a pessoas e bens. “lgumas leis têm menos importância moral do que outras, mas a relação entre lei e moralidade não ́ inteiramente recíproca. O que ́ moral não ́ necessariamente legal e vice-versa WEIL, . Ou seja, você pode ter leis moralmente injustas, como mencionado anteriormente. “ĺm disso, certas ações humanas podem ser consideradas perfeitamente legais, mas moralmente questionáveis. Na verdade, deve ser ́bvio, então, que a moralidade não ́ necessariamente baseada na lei. Um estudo da hist́ria provavelmente indicaria o oposto – que a moralidade precede a lei, enquanto a lei sanciona a moralidade R“CHELS R“CHELS, . Isto ́, a lei coloca a moral em um ćdigo ou sistema que pode então ser executado por recompensa ou punição. Talvez, quanto maior e mais complexa a sociedade, maior a necessidade de leis, mas não ́ inconcebível que uma sociedade moral possa ser formada sem qualquer sistema jurídico, apenas alguns princípios básicos de moralidade e um acordo para aderir a esses princípios. Isto não quer sugerir que a lei deve ser eliminada dos assuntos humanos, mas sim mostrar que a lei não ́ um atributo necessário da moralidade. Pode a lei, entretanto, existir sem a moralidade? Parece que a moralidade fornece as razões que subjazem a quaisquer leis signiicativas que governam os seres humanos e suas instituições. Qual seria o sentido de ter leis contra matar e roubar se não houvesse alguma preocupação de que tais atos fossem imorais? É difícil pensar em qualquer lei que não tenha por trás alguma preocupação moral, 23 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA não importa quão menor ou remota. Podemos dizer, então, que a lei ́ a codiicação pública da moral que lista para todos os membros de uma sociedade o que veio a ser aceito como a maneira moral de se comportar naquela sociedade. “ lei tamb́m estabelece qual ́ a maneira moral de agir e sanciona – por sua codiicação e por todo o processo judiciário criado para formar, defender e alterar partes do ćdigo – a moralidade que ela cont́m. “ correção de leis injustas, no entanto, não ́ necessariamente mais leis, mas um raciocínio moral válido realizado pelas pessoas que vivem sob o ćdigo. 7.2 MORALIDADE E RELIGIÃO Pode haver moralidade sem religião? Será que Deus ou deuses existem para que haja algum sentido real para a moralidade? Se as pessoas não são religiosas, elas podem ser verdadeiramente morais? E se a crença em Deus ́ necessária para ser moral, qual religião ́ o verdadeiro fundamento da moralidade? Parece haver tantos conlitos como existem diferentes religiões e pontos de vista religiosos. “ religião ́ uma das mais antigas instituições humanas. Temos pouca evidência de que a linguagem existia nos tempos pŕ-hist́ricos, mas temos evidências de práticas religiosas que estavam entrelaçadas com a expressão artística, e de leis ou tabus exortando os primeiros seres humanos a se comportarem de determinadas maneiras. Nesses tempos antigos, a moralidade estava inserida nas tradições, costumes e práticas religiosas da cultura R“CHELS R“CHELS, . “ĺm disso, a religião serviu como tem servido at́ muito recentemente como uma sanção poderosíssima para levar as pessoas a comportar-se moralmente, ou seja, se por trás de uma proibição moral contra o assassinato reside o poder punitivo e recompensador de um ser ou seres sobrenaturais todo-poderosos, então os líderes de uma cultura têm a maior sanção possível para a moralidade que querem que seus seguidores abracem. “s sanções do castigo e da recompensa tribal empalidecem ao lado da ideia de uma punição ou recompensa que pode ser mais destrutiva ou prazerosa do que qualquer outra pessoa humana poderia administrar. No entanto, a noção de que a religião pode ter precedido qualquer sistema jurídico formal ou sistema moral separado na hist́ria da humanidade, ou de ter proporcionado sanções muito poderosas e eicazes para a moralidade, não prova de modo algum que a moral deve necessariamente ter uma base religiosa. Muitas razões podem ser dadas para demonstrar que a moralidade não precisa – e na verdade não deve – ser baseada unicamente na religião OLIVEIR“, . Primeiro, para provar que se deve ser religioso para sermos morais, teríamos de provar conclusivamente que existe um mundo sobrenatural e que a moralidade existe lá, assim como no mundo natural. Mesmo que isso pudesse ser provado, o que ́ duvidoso, teríamos que mostrar que a moralidade existente no mundo sobrenatural tem alguma conexão com o que existe no mundo natural. 24 TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE Parece ́bvio, no entanto, que ao lidar com a moralidade, a única base que temos ́ este mundo, as pessoas que nele existem e as ações que realizam. Um teste da verdade dessa airmação seria tomar qualquer conjunto de admoestações religiosas e perguntar honestamente quais delas seriam absolutamente necessárias para o estabelecimento de qualquer sociedade moral. Por exemplo, podemos fazer um argumento para qualquer um dos Dez Mandamentos, exceto os três primeiros veja o Quadro . Os três primeiros podem ser um conjunto de regras necessárias para uma comunidade judaica ou cristã, mas se uma comunidade não religiosa observasse apenas os mandamentos quatro a dez, como, moralmente, as duas comunidades difeririam – supondo que a comunidade religiosa observasse todos os dez mandamentos? Não precisamos implicar que a moralidade não pode ser fundada na religião. É um fato empírico ́bvio que ela tem sido fundada na religião e provavelmente será no futuro. No entanto, a moralidade não precisa ser fundada na religião, e há o perigo de estreiteza e intolerância se a religião se torna o único fundamento para a moralidade. É um fato conhecido que algumas pessoas religiosas podem ser imorais. Considere as muitas guerras e outras perseguições realizadas por quase todas as religiões na hist́ria da humanidade. Por outro lado, se pudermos caracterizar brevemente a moral neste mundo como não prejudicar os outros ou assassinar nossos semelhantes e, geralmente, tentar tornar a vida e o mundo melhores para todos e tudo o que existe, e se muitos seres humanos não aceitam a existência de um mundo sobrenatural e ainda agir moralmente como outros fazem, então deve haver alguns atributos aĺm da crença religiosa que são necessários para algúm ser moral. Embora seja ́bvio que a maioria das religiões cont́m sistemas ́ticos, não ́ verdade que todos os sistemas ́ticos são religiosamente fundamentados OLIVEIR“, . Portanto, não há conexão necessária entre moralidade e religião. O pŕprio fato de que pessoas completamente não religiosas por exemplo, eticistas humanistas podem desenvolver sistemas ́ticos signiicativos e consistentes ́ prova disso. “ĺm disso, fornecer uma base racional para um sistema ́tico ́ difícil o suiciente sem ter que fornecer uma base racional para a religião que supostamente funda o sistema ́tico. Mesmo se as religiões pudessem ser racionalmente fundadas, qual religião deveria ser a base da ́tica humana? Dentro de uma determinada religião essa questão ́ respondida, mas obviamente não ́ respondida satisfatoriamente para membros de outras religiões conlitantes, ou para aqueles que não acreditam em nenhuma religião. Outra questão ́ como resolvemos os conlitos decorrentes de vários sistemas ́ticos baseados na religião sem recorrer a um sistema de moralidade mais amplo – uma base mais ampla para tomar decisões ́ticas? Devemos estabelecer uma base para a moralidade de fora da religião, mas deve ser uma em que a religião está incluída. Este ́ um primeiro passo necessário para uma sociedade moral em um mundo moral. Em resumo, então, qual ́ a conexão entre religião e moralidade? “ resposta ́ que não há conexão necessária. Pode-se ter um sistema ́tico completo, sem menção ao sobrenatural. Isso signiica que, para sermos morais, devemos evitar a 25 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA religião? De modo nenhum. Os seres humanos devem ser autorizados a acreditar ou descrer, contanto que haja alguma base moral que proteja todas as pessoas do tratamento imoral nas mãos dos religiosos e não religiosos. Considerando todas as diferenças que existem entre religiões e entre religiosos e não religiosos, faz sentido que devemos esforçar-nos ainda mais para criar uma moralidade mais ampla que permita que essas diferenças e relações religiosas pessoais continuem e se desenvolvam, ao mesmo tempo que permitam atitudes e ações ́ticas para com todos. O que precisamos não ́ uma ́tica estritamente religiosa ou uma ́tica estritamente humanista, mas sim uma ́tica que inclui esses dois extremos e o meio-termo tamb́m. 8 A TEORIA DO DESENVOLVIMENTO MORAL DE KOHLBERG Na d́cada de , Lawrence Kohlberg avançou o que muitos consideram ser a teoria mais importante do desenvolvimento moral no śculo XX KOHL”ERG, . Sua tipograia, inluenciada pelo trabalho do psićlogo infantil suíço Jean Piaget , estabelece três níveis distintos de pensamento moral o pŕ-convencional, convencional e ṕs-convencional autônomo ou de princípios . Cada nível ́ organizado em dois estágios que são "conjuntos estruturados" ou sistemas organizados de pensamento que dão consistência racional aos juízos morais. Kohlberg estava preocupado com o conhecimento crescente dos valores culturais e as implicações desse conhecimento em apoio à posição da relatividade ́tica. Embora reconhecesse que os valores, e seu conteúdo especíico, variam de cultura para cultura, no entanto, ele acreditava que existe uma sequência de desenvolvimento universal para estruturas de desenvolvimento moral que se estende por todas as culturas. 8.1 DEFINIÇÃO DE ETAPAS MORAIS No nível pŕ-convencional os termos como bom e mau, certo ou errado são interpretados em termos de consequências físicas ou hedonistas da ação. No Estágio – orientação de punição e obediência – as decisões morais são feitas em resposta à autoridade. Evitação da punição e deferência a uma autoridade, que tem o poder de produzir consequências físicas em resposta a atos de um agente, explica o primeiro estágio da tomada de decisão moral. No Estágio – orientação instrumental/relativista – os indivíduos são pragmáticos, e a tomada de decisão moral ́ condicionada principalmente pelo interesse pŕprio. De acordo com Kohlberg , p. , a ação correta consiste naquilo que instrumentalmente satisfaz as necessidades de algúm e ocasionalmente as necessidades dos outros". O nível convencional da teoria de Kohlberg ́ semelhante à moralidade costumeira ou tradicional, como discutido anteriormente neste t́pico. Esse nível de moralidade ́ irrelexivo e consiste em manter ou conformar-se às expectativas dos outros, da família, do grupo ou da sociedade. Em situações de neǵcios, o nível convencional de Kohlberg envolveria a conformidade com a cultura corporativa e 26 TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE o cumprimento das políticas de ́tica da empresa. No Estágio – orientação de concordância interpessoal ou orientação "”om Garoto – ”oa Garota", os indivíduos são agradadores de pessoas. “ conformidade com o grupo, vivendo de acordo com as expectativas dos outros, e ganhando a aprovação dos outros por ser "agradável", caracteriza as pessoas no terceiro estágio do desenvolvimento moral. Já no Estágio – orientação de "Lei e Ordem" – as pessoas estão preocupadas em manter a ordem social por si mesmas ou como um im em si mesmas. Um indivíduo do quarto estágio, por exemplo, obedece à lei porque ́ a lei. O comportamento correto neste nível ́ caracterizado por cumprir o dever de cada um e demonstrar respeito pela autoridade. O terceiro nível, ṕs-convencional autônomo ou de princípio requer moralidade relexiva e a capacidade de envolver efetivamente o raciocínio ́tico, independentemente da identiicação e autoridade do grupo KOHL”ERG, . No Estágio – a orientação do contrato social – os indivíduos compreendem que existem ins aĺm da lei e que as leis são criadas para trazer esses ins. “ĺm disso, no quinto estágio, aqueles que tomam a decisão entendem como as leis são feitas e que as leis podem ser alteradas por boas razões, ou seja, neste estágio vemos as leis como um "contrato social" baseado em considerações válidas destinadas a trazer ins socialmente bons. Já para o indivíduo no Estágio – orientação de princípio ́tico universal – o certo ́ deinido pela decisão de consciência de acordo com os princípios ́ticos escolhidos por si mesmos, apelando à integralidade ĺgica, universalidade e consistência. Esses princípios são abstratos e ́ticos por exemplo, a Regra de Ouro, o imperativo cateǵrico , mas não são regras concretas, como os Dez Mandamentos. Em outras palavras, os indivíduos do estágio seis possuem um grande estoque de conceitos ́ticos e entendem os princípios operacionais por trás das regras morais, da lei e da norma ́tica. “ĺm disso, as pessoas neste estágio do desenvolvimento moral podem pensar claramente e bem sobre dilemas morais usando conceitos como justiça, reciprocidade, igualdade e respeito pela dignidade humana e, assim, são capazes de chegar de forma independente a julgamentos morais ślidos. Kohlberg , tentou identiicar estruturas cognitivas inatas que são universais para todos os seres humanos. Tais estruturas explicam tanto o desenvolvimento moral como a base para a tomada de decisão moral em vários estágios. Sua teoria nos ajuda a entender "por que" certas decisões são tomadas e como estágios anteriores são integrados numa ordem superior de raciocínio moral. De acordo com a teoria de Kohlberg, tende-se a passar para o pŕximo nível mais elevado de desenvolvimento moral, a im de resolver o conlito que surge dentro do pŕprio ponto de vista do indivíduo. Em suma, sua teoria fornece uma ferramenta adicional para analisar o nível de raciocínio moral. 27 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA 9 POR QUE OS SERES HUMANOS DEVEM SER MORAIS? “ntes de discutirmos mais detalhadamente os sistemas ́ticos ou morais, há uma última questão que deve ser tratada neste t́pico "Por que os seres humanos devem ser morais?". Outra maneira de colocar o problema ́ a seguinte Existe algum fundamento claro para a moralidade – pode-se encontrar alguma razão para que os seres humanos sejam bons e pratiquem atos corretos em vez de serem maus e praticarem atos errados? “ pergunta acima não deve ser confundida com a pergunta "por que eu, ou qualquer indivíduo deveria ser moral? , como Kai Nielsen diz em seu brilhante ensaio "Por que devo ser moral?", estas são duas questões diferentes. “ segunda ́ muito difícil de responder com qualquer evidência clara, conclusiva ou ĺgica, mas a primeira não ́. “o examinarmos a natureza humana da maneira mais empírica e racional possível, descobriremos que todos os seres humanos têm muitas necessidades, desejos, metas e objetivos em comum. Por exemplo, as pessoas geralmente parecem precisar de amizade, amor, felicidade, liberdade, paz, criatividade e estabilidade em suas vidas, não apenas para si, mas tamb́m para os outros. Não ́ necessário um exame muito mais profundo para descobrir que, para satisfazer essas necessidades, as pessoas devem estabelecer e seguir princípios morais que as encorajem a cooperar uns com os outros e que os libertem do medo de perder a vida, serem mutilados, roubados, enganados, severamente restringidos ou presos. “ moralidade existe, em parte, por causa das necessidades humanas e pelo reconhecimento da importância de viver juntos de forma cooperativa e signiicativa. Pode não ser o caso que todos os seres humanos serem convencidos de que eles devem ser morais, ou mesmo que será sempre no interesse individual de cada indivíduo ser moral. No entanto, a pergunta "por que os seres humanos devem ser morais?", geralmente pode ser mais bem respondida pela declaração de que aderir aos princípios morais permite que os seres humanos vivam suas vidas de forma pacíica, feliz, criativa e signiicativa como ́ possível. Tem havido um aumento acentuado no ensino de ́tica, tanto em instituições de ensino quanto em empresas e outras organizações. “ssim como cursos foram estabelecidos em escolas ḿdicas e houve um aumento do interesse na biótica e outros comitês de ́tica em hospitais e empresas diversas. Poder-se-ia perguntar "Isso signiica que estamos a tornar-nos mais ́ticos, ou que o seremos, à medida que estas ́ticas começarem a iltrar-se para a população em geral?". Certamente ́ admirável que muitos estejam interessados nos valores e na melhoria da vida ́tica, mas quão supericial ́ essa preocupação? De qualquer modo, independentemente de quão popular, supericial ou não a ́tica pode se tornar, certamente deve ser o aspecto mais importante da sua vida. “inal, o que poderia ser mais importante do que aprender a viver mais eticamente e melhorar a qualidade de sua vida e as vidas dos outros ao seu redor? Como disse “lbert Einstein apud M“RTINELLI, , p. 28 TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE a mais importante busca humana ́ esforçar-se pela moralidade em nossa ação. Nosso equilíbrio interno, inclusive da existência, depende disso. Somente a moralidade em nossas ações pode dar beleza e dignidade à vida. Fazer disso uma força viva e trazê-la para a consciência ́ talvez a tarefa principal da educação. Neste t́pico, discutimos muito sobre o que a moralidade ou ́tica não ́, mas ainda não dissemos detalhadamente o que ela ́. “qui está uma deinição de moralidade “ moralidade lida basicamente com os seres humanos e como eles se relacionam com outros seres, tanto humanos como não humanos. Lida com questões de como os seres humanos tratam os outros seres de modo a promover bem-estar, crescimento, criatividade e signiicados mútuos à medida que se esforçam pelo que ́ bom acima do que ́ mau, pelo o que ́ certo acima do que ́ errado. Nos pŕximos três t́picos, examinaremos os principais pontos de vista ́ticos. Estes contêm um número de teorias ́ticas tradicionais que não se preocupam com a razão pela qual os seres humanos devem ser morais, mas sim em como a moralidade pode ser alcançada. Não há sentido em "partir do zero" no estudo da moralidade quando podemos nos beneiciar de nossas pŕprias tradições ́ticas, das quais quase todas as teorias ́ticas modernas evoluíram de uma forma ou de outra. UNI POR QUE SER MORAL? Platão (2001) conta a história de Gyges, um pastor, que encontra um anel mágico. Quando Gyges gira o anel 180°, ele se torna invisível, e ao girar o anel novamente, ele reaparece. Sob o manto da invisibilidade ele executa uma série de atos antiéticos e imorais, incluindo o assassinato. Ele é um vilão, todavia se torna rico e famoso. Gyges não só acumula benefícios ao parecer ser moral, mas também goza da recompensa colhida da maldade sem consequências punitivas, pois ele nunca será pego. Agora, imagine um segundo anel mágico dado a um indivíduo justo e reto. A tentação de se envolver em transgressões para ganho pessoal será muito grande? Sabendo que não haverá consequências punitivas, uma boa pessoa se transformaria rapidamente em um vilão? Dada a situação que acabamos de descrever, por que alguém seria moral? Discuta. O que você faria se a você fosse dado um anel de Gyges? Por que serias moral? 29 RESUMO DO TÓPICO 1 Neste tópico, você aprendeu que • Moral e ́tico e imoral e antítico são intercambiáveis na linguagem ordinária. Moral signiica o que ́ bom ou certo. Imoral signiica o que ́ mau ou errado. • Características de "bom, mau, certo, errado". "”om" ou "certo" deve envolver prazer, felicidade e excelência e tamb́m levar à harmonia e criatividade. "Mau" ou "errado" envolverá dor, infelicidade e falta de excelência e levará à desarmonia e falta de criatividade. • Os termos bom e mau devem ser deinidos no contexto da experiência humana e relações humanas. • “moral signiica não ter sentido moral ou ser indiferente ao certo e ao errado. • Não moral signiica fora do reino da moral completamente. • “ abordagem cientíica ou descritiva ́ usada nas ciências sociais e está preocupada com a forma como os seres humanos, de fato, se comportam. Por exemplo Os seres humanos muitas vezes agem em seu pŕprio interesse. • “ abordagem ilośica ́ dividida em duas categorias. “ normativa, ou prescritiva, está preocupada com o que deveria ser ou o que as pessoas deveriam fazer. Por exemplo Os seres humanos devem agir em seu interesse pŕprio. Uma segunda categoria diz respeito aos juízos de valor. Por exemplo "”árbara ́ uma pessoa moralmente boa". • “ metática, ou ́tica analítica, ́ analítica de duas maneiras. “nalisa a linguagem ́tica. “nalisa os fundamentos racionais dos sistemas ́ticos ou da ĺgica e raciocínio de vários eticistas. • No decurso da determinação da moralidade, algumas distinções devem ser feitas. Existe uma diferença entre ́tica e est́tica. Ética ́ o estudo da moralidade, ou do que ́ bom, mau, certo ou errado em um sentido moral. “ est́tica ́ o estudo da arte e da beleza, ou do que ́ bom, mau, certo ou errado na arte e o que constitui o belo em nossas vidas. • Os termos bom, mau, certo e errado tamb́m podem ser usados em um sentido não moral, geralmente em referência a como algúm ou algo funciona. • “s boas maneiras, ou a etiqueta, diferem da moral mesmo que as duas estejam relacionadas, na medida em que boas maneiras se referem a certos tipos de comportamento social lidando com o gosto, enquanto a moralidade se preocupa com o comportamento ́tico. 30 • Há quatro aspectos principais relacionados à aplicação da moralidade. “ moralidade religiosa se preocupa com os seres humanos em relação a um ser ou seres sobrenaturais. “ moralidade e a natureza se preocupam com os seres humanos em relação à natureza. “ moralidade individual se preocupa com os seres humanos em relação a si mesmos. “ moralidade social se preocupa com os seres humanos em relação a outros seres humanos, esta ́ a categoria mais importante de todas. • Existe evidência para nos ajudar a determinar quem ́ moralmente ou eticamente responsável. “ experimentação com a comunicação com certos animais revela que no futuro os animais poderiam concebivelmente ser ensinados a serem morais, experimentações recentes demonstram aspectos de comportamento moral em outros animais. • “tualmente, os seres humanos, apenas os seres humanos, podem ser considerados morais ou imorais e, portanto, apenas eles devem ser considerados moralmente responsáveis. • Há três maneiras de ver os valores como totalmente objetivos. “lgumas pessoas acreditam que os valores se originam com um ser ou seres sobrenaturais ou um princípio. “lguns acreditam que os valores são incorporados na pŕpria natureza, isto ́, que existem valores morais nas leis na natureza. “lguns acreditam que o mundo e os objetos nele encarnam valores se há ou não há seres humanos para percebê-los e apreciá-los. • “lguns sustentam a teoria de que os valores são totalmente subjetivos que a moralidade e os valores residem estritamente dentro dos seres humanos e que não há valores ou moralidade fora deles. • É possível criticar a posição de que os valores são objetivos. É difícil provar conclusivamente a existência de qualquer ser, ou seres, sobrenatural ou princípio ou provar que os valores existem em qualquer outro lugar que não no mundo natural. • Há uma diferença entre "leis naturais", que são descritivas, e "leis morais e sociais", que são prescritivas. E não há provas conclusivas de que existem "leis morais naturais". • É possível criticar a posição de que os valores são subjetivos. Porque os aspectos do mundo e da natureza podem ser valorizados se os seres humanos existem ou não, os valores não pareceriam ser totalmente subjetivos. • Os valores são subjetivos e objetivos. Eles são determinados por três variáveis. “ primeira variável ́ a coisa de valor, ou a coisa valorizada. “ segunda ́ um ser consciente que valoriza, ou o avaliador. “ terceira ́ o contexto ou situação em que a valorização ocorre. 31 • Considerando a crença de que os valores são subjetivos e objetivos, ́ possível construir uma teoria sobre a origem da moralidade. Prov́m de uma interação complexa entre seres humanos conscientes e coisas materiais, mentais ou emocionais em contextos especíicos. Ela decorre de necessidades e desejos humanos e ́ baseada em emoções e razões humanas. • “ moralidade costumeira ou tradicional baseia-se no costume ou na tradição e ́ frequentemente aceita. • “ moral relexiva ́ o exame cuidadoso e a avaliação crítica de todas as questões morais, quer se baseiem ou não na religião, no costume ou na tradição. • “ moralidade não ́ necessariamente baseada na lei. “ moralidade fornece as razões básicas para quaisquer leis signiicativas. “ lei ́ uma expressão pública de uma sanção para a moralidade social. • “ moralidade não precisa – e de fato não deve – ser baseada unicamente na religião, pelas seguintes razões. É difícil provar conclusivamente a existência de um ser sobrenatural. “s pessoas religiosas podem ser imorais. “s pessoas não religiosas tamb́m podem ser morais. É difícil fornecer um fundamento racional para a religião, o que torna difícil fornecer tal fundamento para a moralidade. Se a religião fosse o fundamento da moralidade, qual religião fundamentaria e quem iria decidir? • Existe uma diiculdade em resolver os conlitos decorrentes de vários sistemas ́ticos religiosamente baseados sem sair deles. • Parece ser necessária uma ́tica que não seja nem estritamente religiosa, nem estritamente humanista, mas que inclua esses dois extremos e o meio-termo tamb́m. • “ teoria de desenvolvimento moral de Kohlberg estabelece três níveis distintos de pensamento moral, e cada nível ́ organizado em dois estágios que são "conjuntos estruturados" ou sistemas organizados de pensamento que dão consistência racional aos juízos morais. • Nível pŕ-convencional “qui, termos como bons e maus, e certos e errados são interpretados em termos de consequências físicas ou hedonistas da ação. Estágios - “ Orientação de Punição e Obediência - “ Orientação Instrumental/ Relativista. • Nível convencional Este nível da moralidade ́ geralmente irreletido e costumeiro. Consiste em manter ou conformar-se às expectativas dos outros ou às regras da sociedade. Estágios - “ Concordância Interpessoal ou Orientação "”om Garoto - ”oa Garota" - “ orientação "Lei e Ordem". 32 • Nível ṕs-convencional, autônomo ou de princípios Esse nível de desenvolvimento moral requer moralidade relexiva e capacidade de envolver o raciocínio ́tico, independentemente da identiicação e autoridade do grupo. Estágios - “ Orientação do Contrato Social - “ Orientação Princípio-ÉticoUniversal. • “ importância de determinar por que os seres humanos devem ser morais. “ questão não ́ "por que um indivíduo deve ser moral?", mas sim "por que os seres humanos em geral devem ser morais?". • Foram postuladas várias razões para ser moral. É nossa conclusão que a moralidade ocorreu por causa das necessidades humanas comuns e pelo reconhecimento da importância de viver juntos de forma cooperativa e signiicativa, a im de alcançar a maior quantidade possível de amizade, amor, felicidade, liberdade, paz, criatividade e estabilidade na vida de todos os seres humanos. • Uma deinição operacional da moralidade. “ moral ou a ́tica tratam basicamente das relações humanas, como os seres humanos tratam os outros seres de modo a promover o bem-estar, o crescimento, a criatividade e os signiicados mútuos à medida que se esforçam pelo bom sobre o mau e o certo sobre o errado. 33 AUTOATIVIDADE Por que o aspecto social da moralidade ́ considerado o aspecto mais importante? O que ́ a metática e como ela difere da ́tica normativa e da ́tica descritiva? 34 TÓPICO 2 UNIDADE 1 TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE 1 INTRODUÇÃO Depois de ler este t́pico você deverá ser capaz de deinir as concepções consequencialistas teleoĺgicas e não consequencialistas deontoĺgicas da moralidade. “ssim como diferenciar o egoísmo psicoĺgico do egoísmo ́tico, e explicar ambas as teorias. Distinguir os três tipos de egoísmo ́tico e descrever e analisar criticamente as duas principais teorias consequencialistas, o egoísmo ́tico e o utilitarismo. E distinguir entre os dois tipos de utilitarismo. “ palavra grega theoria signiica literalmente "uma maneira de ver" ”“RROS, . “s teorias morais tentam "ver" ou "perspectivar" fenômenos morais, e, portanto, entender a moralidade, a partir de uma perspectiva abrangente. ”oas teorias morais tamb́m fornecem princípios práticos para orientar e dirigir a conduta humana. “s teorias que veremos neste t́pico tratam de uma avaliação das consequências, resultados ou ins de ações e, como tais, são baseadas em consequências. Na hist́ria da ́tica emergem dois pontos de vista principais o consequencialista baseado ou preocupado com as consequências e o não consequencialista não baseado ou preocupado com as consequências . Tradicionalmente, essas teorias foram chamadas de teorias "teleoĺgicas" e "deontoĺgicas" CORTIN“ M“RTÍNEZ, , respectivamente, mas este livro se referirá a elas como consequencialistas e não consequencialistas porque essas palavras apontam as diferenças reais entre elas. “s duas principais teorias ́ticas consequencialistas são o egoísmo ́tico e o utilitarismo MULG“N, . “mbas as teorias concordam que os seres humanos devem se comportar de maneira que trarão boas consequências. Elas diferem, no entanto, na medida em que discordam sobre quem deve se beneiciar dessas consequências. O egoísta ́tico diz essencialmente que os seres humanos devem agir em seu interesse pŕprio, enquanto que os utilitaristas dizem essencialmente que os seres humanos devem agir no interesse de todos os envolvidos. Suponha que João tenha a chance de desviar alguns fundos da empresa onde trabalha. Se ele for um consequencialista, tentará prever as consequências de desviar e de não desviar os fundos. Se ele for um consequencialista egoísta, tentará prever o que estará em seu interesse pŕprio. Se ele for um consequencialista utilitarista, tentará prever o que estará no interesse de todos os envolvidos. À 35 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA primeira vista, quando ainda estamos aprendendo sobre o egoísmo ́tico, algumas pessoas imediatamente assumem que se uma pessoa, tal como João, adere a esta teoria, vai desviar os fundos porque fazê-lo lhe dará o dinheiro que precisa para viver uma vida boa e assim por diante. No entanto, ́ interessante notar que tanto os egoístas ́ticos quanto os utilitaristas podem decidir, com base em suas abordagens opostas às consequências, não desviar o dinheiro. Egoístas ́ticos podem pensar que não ́ em seu interesse pŕprio quebrar a lei ou causar raiva da empresa e seus acionistas ou sujeitar-se ao risco de punição por sua ação. Os utilitaristas, por outro lado, poderiam chegar à mesma conclusão, mas com o argumento de que o desfalque teria consequências ruins para outras pessoas envolvidas na empresa, embora isso possa trazer boas consequências para eles. “ssim como os egoístas e utilitaristas podem acabar agindo da mesma maneira por diferentes razões, seu raciocínio ́tico tamb́m ́ semelhante, na medida em que ambos se preocupam com as consequências de qualquer ação que estão contemplando. É importante examinar cada teoria ́tica mais detalhadamente, observando vantagens e desvantagens e examinando semelhanças e diferenças. 2 O EGOÍSMO PSICOLÓGICO “ntes de discutir o egoísmo ́tico em mais detalhes, devemos fazer uma distinção entre o egoísmo psicoĺgico, que não ́ uma teoria ́tica, e egoísmo ́tico. “lguns egoístas ́ticos tentaram basear suas teorias egoísticas no egoísmo psicoĺgico, por isso ́ importante examinarmos se esta ́ uma inferência válida e termos certeza de que sabemos a diferença entre a forma como as pessoas de fato agem e a forma como elas deveriam agir ”ONJOUR ”“KER, . No T́pico , o egoísmo psicoĺgico foi introduzido a im de apontar a diferença entre as abordagens cientíicas e as ilośico-normativas da moralidade. Para reiterar, o egoísmo psicoĺgico ́ uma abordagem cientíica e descritiva do egoísmo, enquanto que o egoísmo ́tico ́ a abordagem ilośico-normativa prescritiva . Veja o quadro a seguir. QUADRO 2 - TIPOS DE EGOÍSMO Tipo de Egoísmo Tipo de Reivindicação Psicoĺgico Descritiva “irma que cada um age em seu interesse pŕprio Ético Normativa “irma que todos devem agir em seu interesse pŕprio FONTE: O autor 36 Tese principal TÓPICO 2 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE O egoísmo psicoĺgico pode ser dividido em duas formas R“CHELS R“CHELS, . “ forma forte sustenta que as pessoas sempre agem em seu interesse pŕprio – que elas são psicologicamente construídas para fazê-lo –, enquanto que a forma fraca sustenta que as pessoas, muitas vezes, mas nem sempre, agem em seu interesse pŕprio. Entretanto, nenhuma das duas formas pode operar como base para o egoísmo ́tico. Se a forma forte for aceita, então por que dizer às pessoas fazerem o que não podem deixar de fazer? Se os seres humanos são psicologicamente construídos de modo a agir sempre por interesse pŕprio, que bem fará dizer a algúm que ele deve sempre agir por interesse pŕprio? Quanto à forma mais fraca, a airmação de que os indivíduos muitas vezes agem a partir do interesse pŕprio não tem nenhuma conexão em si mesma com a compreensão do que eles deveriam fazer. Isto ́ referido na ́tica como tentando obter "um deveria de um ́" – não há nenhum argumento ĺgico que prove conclusivamente que, porque as pessoas estão se comportando de determinadas maneiras, devem fazê-lo ou continuar a fazê-lo. “lgúm poderá ser capaz de mostrar, por meio de algum argumento racional, que se deve agir sempre a partir do interesse pŕprio, mas se izer isso não constituirá nem um argumento necessário absolutamente necessário , tampouco um argumento suiciente de que se deve agir assim. E quanto à verdade da forma mais forte do argumento? Se os seres humanos precisam realmente agir em seu interesse pŕprio e não podem fazer o contrário, então estaríamos condenados à posição egoísta. Existe alguma prova conclusiva de que o egoísmo psicoĺgico forte ́ verdadeiro? “ im de fazer uma declaração abrangente, absoluta e universal, usada sempre em conexão com motivos e comportamentos humanos, que são ao mesmo tempo complexos e variados, seria necessário examinar todos os motivos e comportamentos de todos e cada ser humano antes que tal declaração pudesse ser provada conclusivamente. É presunçoso para os egoístas psicoĺgicos argumentar que as pessoas sempre agem por interesse pŕprio se algúm lhes puder dar um exemplo de uma ś vez quando não agiu deste modo HEGEN”ERG, a . Eles certamente podem inventar uma śrie de maneiras de mostrar a um indivíduo que tudo o que ele faz está em última análise relacionado, por uma razão ou outra, ao interesse pŕprio, mas pode-se replicar "Olha, quando eu desprezei minha pŕpria segurança e fui atrás do ladrão que roubou a loja, eu não estava motivado por nenhuma das razões que você sugere, eu simplesmente iz isso porque eu pensei que o que o ladrão fez estava errado, e porque eu gosto do meu chefe e não queria vê-lo sendo roubado . Os egoístas psicoĺgicos podem insistir, por sua vez, que o indivíduo provavelmente queria impressionar seu chefe ou queria parecer um heŕi para sua namorada ou que o indivíduo queria a aprovação da sociedade ou de Deus ou do patrão, mas se a pessoa insiste que esses motivos não estavam presentes, então os proponentes do egoísmo psicoĺgico estão apenas teorizando, e eles não podem transformar tal teorização em uma teoria absolutista sobre todos os motivos e ações humanas FURROW, . Pela razão que os seres humanos variam tanto nos pensamentos, sentimentos, motivos e razões de suas ações, ́ altamente presunçoso supor que todos "sempre" pensam, sentem, são motivados ou raciocinam de uma forma à 37 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA exclusão de todas as outras FEIN”ERG, . Esta teoria, como a teoria sobre a existência de um ser sobrenatural, não pode ser provada de forma conclusiva. Na verdade, há provas do contrário. Quando todos os outros argumentos falham, como costumam fazer na tentativa de defesa do egoísmo psicoĺgico, o egoísta psicoĺgico, ao tentar provar seu caso, frequentemente volta-se para a posição de que as pessoas sempre fazem o que realmente querem fazer. De acordo com o egoísta, se as pessoas "querem" realizar tal ato desinteressado, então elas não estão realmente sendo altruístas porque estão fazendo o que realmente querem fazer, mas há problemas com esse argumento. Em primeiro lugar, como o egoísta psicoĺgico pode lidar com o fato de que muitas vezes as pessoas não querem agir desinteressadamente, mas o fazem de qualquer maneira? Às vezes, algúm realmente prefere fazer outra coisa, mas o indivíduo, no entanto, sente que ele ou ela "deve" ou "tem que" fazer o que não quer fazer. Em segundo lugar, a única evidência que o egoísta psicoĺgico pode citar em apoio da airmação "as pessoas sempre fazem o que querem fazer" ́ que o ato foi feito. Tudo isso signiica que "todos fazem sempre o que fazem", e isso realmente não dá qualquer informação sobre a conduta humana, nem prova de modo algum que os seres humanos sempre agem apenas em seu interesse pŕprio FEIN”ERG, . Parece que podemos descartar o egoísmo psicoĺgico como base para o egoísmo ́tico. Em sua forma forte destruiria toda a moralidade e ainda assim lhe faltaria evidência e ĺgica. E tanto na forma forte quanto na fraca, falha em fornecer uma base racional para o egoísmo ́tico. 3 O EGOÍSMO ÉTICO O que ́ o egoísmo ́tico? Não ́ necessariamente a mesma coisa que o egoísmo, que poderia ser um comportamento que não está de nenhum modo no interesse pŕprio do egoísta, ou seja, se eu estiver sempre agindo de forma egoísta, as pessoas podem me odiar e geralmente me tratar mal, então talvez esteja mais no meu interesse pŕprio não ser egoísta. Eu poderia at́ chegar ao ponto de ser altruísta em meu comportamento, pelo menos uma parte do tempo – quando estiver no meu interesse pŕprio ser assim, ́ claro. Portanto, o egoísmo ́tico não pode ser equiparado ao egoísmo, nem deve ser equiparado a ter um ego grande ou ser presunçoso. Um egoísta pode muito bem ser pretensioso e vaidoso, por outro lado, ele pode parecer ser muito modesto e humilde R“CHELS, . O egoísmo ́tico pode assumir três tipos possíveis, o pessoal, o individual e o universal, veja o Quadro . 38 TÓPICO 2 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE QUADRO 3 - TIPOS DE EGOÍSMO ÉTICO TIPOS DE EGOÍSMO ÉTICO Egoísmo Ético Pessoal Egoísmo Ético Individual Egoísmo Ético Universal TESE PRINCIPAL Diz que eu vou agir em meu pŕprio interesse e todo o resto ́ irrelevante. Diz que todo mundo deve agir em meu interesse pŕprio. Diz que cada pessoa deve agir em seu pŕprio interesse. FONTE: Hinman (2008, p. 114) 3.1 PROBLEMAS COM O EGOÍSMO ÉTICO INDIVIDUAL E PESSOAL Há śrios problemas associados ao egoísmo ́tico individual e pessoal, na medida em que se aplicam apenas a um indivíduo e não podem ser estabelecidos para a humanidade em geral. Trata-se de uma verdadeira desvantagem ao pensar na moralidade ou no sistema moral como algo aplicável a todos os seres humanos, isto ́, se desejamos ir aĺm de uma moralidade estritamente individualista, o que a maioria dos moralistas faz. Entretanto, os problemas associados à promulgação de qualquer dessas formas de egoísmo ́tico são mais profundos do que sua falta de aplicabilidade geral. Provavelmente não seria do interesse de egoístas individuais ou pessoais declararem sua teoria, porque eles poderiam enfurecer outras pessoas e, assim, frustrar seu interesse pŕprio. Por esta razão, tais egoístas podem ter de aparecer diferente do que realmente são ou mentir sobre o que realmente acreditam, sendo que a desonestidade e a mentira são consideradas ações morais questionáveis na maioria das teorias morais R“CHELS, . Podemos tamb́m perguntar se um sistema moral não deve ser consistente, e se não deve ser mais do que apenas uma teoria. Se uma pessoa tem que propor uma teoria moral, enquanto que conscientemente e propositadamente opera sob outra, então não estaria ela sendo inconsistente? E quão moral pode ser esse sistema se não puder ser exposto para que os outros vejam? Outro problema com tais sistemas individualistas ́ que eles não levam em consideração o fato de que os seres humanos não estão isolados uns dos outros e que as ações morais e imorais de todas as pessoas afetam outras pessoas ao seu redor. Essas duas versões do egoísmo, contudo, são boas apenas para uma pessoa e podem nem mesmo ser beńicas para aquele indivíduo, especialmente se algúm descobrir que ele está realmente operando sob tal sistema HINM“N, . Portanto, essas concepções do egoísmo não são impossíveis de sustentar – na verdade, você poderá descobrir, depois de termos terminado de discutir sobre o egoísmo ́tico universal, que elas são as únicas realmente possíveis –, mas elas são altamente suspeitas como teorias morais válidas. 39 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA 3.2 O EGOÍSMO ÉTICO UNIVERSAL O egoísmo ́tico universal ́ a versão da teoria mais comumente apresentada pelos egoístas, porque, como a maioria das outras teorias ́ticas, ́, como diz seu nome, "universal" – uma teoria ́tica que airma se aplicar a todos os seres humanos. Esta teoria não diz apenas o que o indivíduo deve fazer. “ntes, trata-se do que todos os seres humanos devem fazer se querem ser morais devem sempre agir em seu interesse pŕprio. O egoísmo ́tico universal tem sido proposto por Epicuro , , “yn Rand , Jesse Kalin e John Hospers , , entre outros. Esses iĺsofos desejam estabelecer um sistema ́tico para todos os seres humanos, e eles acreditam que o ponto de vista mais ́tico ́ que cada um aja em seu interesse pŕprio. 3.2.1 Problemas com o Egoísmo Ético Universal O primeiro problema aqui ́ a inconsistência. O ataque mais devastador ao egoísmo ́tico universal foi feito por ”rian Medlin em seu artigo Princípios Últimos e o Egoísmo Ético", que Jesse Kalin tentou refutar em seu artigo "Em Defesa do Egoísmo". Medlin apresentou alguns dos mesmos argumentos já descritos aqui contra o egoísmo ́tico individual e pessoal. Por exemplo, ele airmou que o egoísta ́tico diz que todos devem agir em seu interesse pŕprio individual. Suponha, no entanto, que Pedro está agindo em seu interesse pŕprio individual, o que não estaria no interesse pŕprio do egoísmo ́tico de, por exemplo, João. Então certamente não seria do interesse de João dizer a Pedro que ele deveria agir em seu o de Pedro interesse pŕprio. Portanto, João estaria pelo menos reticente em airmar seu sistema ́tico e provavelmente seria mais sábio sob o egoísmo ́tico em não o declarar em absoluto. Suponhamos que João, o egoísta ́tico, signiique realmente que todas as pessoas devem agir em seu pŕprio interesse individual, que o maior bem deve ser feito a todos os envolvidos por qualquer ação ́tica ou, como Medlin airma, que João realmente quer que todo mundo saia como vencedor. Não estaria João propondo realmente alguma forma de utilitarismo que indica que todos devem sempre agir de modo que o número maior de consequências boas acumule a todos envolvidos pela ação ao inv́s de egoísmo? Isso poderia fazer os utilitaristas felizes, mas não precisamos de dois nomes para uma única teoria ́tica. O problema torna-se realmente crítico quando perguntamos exatamente o que os egoístas ́ticos universais signiicam quando airmam que todos devem agir em seu interesse pŕprio individual. Quer dizer que tanto João quanto Pedro devem agir em seu pŕprio interesse quando seus interesses pessoais conlitam? Como esse conlito será resolvido? Suponha que Pedro pergunte a João o que ele deveria fazer no meio do conlito entre eles? Deveria João dizer-lhe para agir em seu interesse pŕprio, mesmo que isso signiique que João irá perder? O egoísmo ́tico universal parece defender isso. No entanto, obviamente não seria do interesse pŕprio de João que o Pedro izesse isso. Há uma inconsistência aqui, não importa o que João faça, porque quando os interesses pŕprios conlitam, o egoísmo ́tico universal não oferece nenhuma resolução que será verdadeiramente no melhor 40 TÓPICO 2 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE interesse de todos. O egoísmo ́tico torna-se altamente questionável quando falamos em oferecer conselho moral R“CHELS R“CHELS, . Tal conselho ́ inconsistente, na medida em que João deve fazer o que está em seu interesse pŕprio, mas deve aconselhar Pedro a agir quer no interesse de João ou no interesse de Pedro. Se ele aconselhar Pedro a agir em seu interesse, o de João, então João está recuando para o egoísmo individual. Se ele aconselhar Pedro a agir em seu pŕprio interesse, então João não está servindo ao seu interesse pŕprio. De qualquer maneira, parece que o proṕsito subjacente ao egoísmo ́tico ica derrotado. Jesse Kalin diz que a única maneira de declarar o egoísmo ́tico universal consistentemente ́ defender que João deveria agir em seu interesse pŕprio individual e Pedro em seu interesse pŕprio individual. Tudo então icará bem, porque mesmo que a teoria seja anunciada a todos e mesmo que João tenha que aconselhar Pedro que ele o Pedro deveria agir em seu pŕprio interesse, João não precisa querer que Pedro atue em seu pŕprio interesse. É neste ponto que Kalin sente que ele refutou Medlin, pois airma que o egoísmo ́tico universal ́ inconsistente, porque o que o egoísta quer ́ obviamente incompatível, ele quer que ele vença e quer que todos os outros tamb́m vençam. Os interesses conlitam, pois tem obviamente desejos incompatíveis. Kalin usa o exemplo de João e Pedro jogando xadrez. João, vendo que Pedro poderia mover seu bispo e colocar o rei de João em xeque, acredita que Pedro deve mover seu bispo, mas não quer que ele o faça, não precisa persuadi-lo a fazê-lo. Na verdade, deve sentar-se lá em silêncio, esperando que ele não faça o movimento como deveria. Com esta airmação, o problema que ocorreu com o egoísmo ́tico individual e pessoal surge novamente no egoísmo ́tico universal – que o que as pessoas deveriam fazer não pode ser promulgado isto ́, apresentado para que todos possam ver . Em outras palavras, temos novamente uma teoria ́tica que tem de ser um segredo. Caso contrário violará, ao ser declarada, seu pŕprio princípio central o interesse pŕprio. Devemos tamb́m examinar como Kalin está usando o termo "deve" em seu exemplo sobre o jogo de xadrez. Um dos resultados não intencionais do artigo de Kalin parece ser um ofuscamento da distinção entre o uso moral dos termos deve e deveria e um uso não moral dos dois termos. No T́pico , descrevemos a grande diferença entre as abordagens cientíica e as ilośiconormativas da moralidade como sendo a diferença entre o que ́ ou o que se faz e o que deve e o que deveria ser feito. Tamb́m foi apontado que as duas últimas palavras deve e deveria nem sempre são usadas em um sentido moral e, com frequência, podem ser usadas em um sentido não moral. Por exemplo, se as instruções para montar um brinquedo especiicar que você deveria colocar dois parafusos e porcas nas extremidades antes de colocar os outros quatro parafusos, não há nenhum sentido moral em operação nesta atividade. "Deveria" aqui implica "se você quiser que este brinquedo funcione direito e quiser que estas duas peças se encaixem bem". Não existe um imperativo moral a não ser que a montagem incorreta do brinquedo possa custar à criança 41 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA sua vida, por exemplo. Raramente as vidas dependem se jogos como xadrez são ganhos ou perdidos, ou se dois lados de um brinquedo se encaixam bem. Deveria, nesses contextos, provavelmente não ter qualquer ramiicação moral. Evidentemente, pelo menos para Kalin , as regras e os conselhos morais têm uma aplicação tão supericial que deveria e deve signiicam nada a mais do que signiicariam quando aplicados a um jogo ou às instruções para montar algo. Parece que apenas o mais estranho dos sistemas ́ticos indicaria muitos faça e não faça e dizer que as pessoas devem aderir a eles, mas, em seguida, esperar que elas não o façam. Considere o que signiicaria para João aconselhar Pedro "Você deveria me matar porque eu estou no caminho entre você e a minha esposa, já que você a deseja, e está em seu interesse pŕprio que você faça isso. Todavia, porque não está em meu interesse pŕprio que você faça isso, eu espero que você não o faça . Certamente não estaria incompatível com o que João diz que pensa que deve ser, mas ́ um sistema moral no mínimo estranho, sendo que de fato airma o que seu proponente realmente não quer. É ́bvio que o que João realmente pensa que o que Pedro deveria fazer ́ deixar João e sua esposa em paz. Isto signiica, na melhor das hiṕteses, que o egoísmo ́tico universal ́ altamente impraticável e, na pior das hiṕteses, que ́ uma teoria que causa seriamente um conlito nos desejos das pessoas por coisas boas e que vê a busca da felicidade como sendo algum tipo de jogo intelectual, as regras das quais os seres humanos "devem" ser instruídos a seguir. Kalin parece ter mostrado que o egoísta não precisa querer que outros façam o que ele advoga. “o fazê-lo, no entanto, Kalin levanta o espectro de uma divisão ainda mais ampla entre o que "deve ser" e o que ́". O dilema acima leva o argumento de volta à ĺgica de Medlin , p. Mas não seria acreditar que algúm deveria agir de certa maneira, tentar persuadi-lo a fazê-lo?", e "faz sentido dizer, claro que você deveria fazer isso, mas por tudo o que ́ mais sagrado, não faça?" Sem essa ĺgica, os sistemas ́ticos não são mais do que meros ideais abstratos que seus proponentes esperam que não sejam efetivamente realizados. O que isso signiica, se Kalin estiver correto, ́ que o egoísmo ́tico universal reivindica ser um sistema moral baseado no não moral – suas regras não têm mais importância moral do que as regras de um jogo de xadrez ou as instruções para montar um brinquedo. Outra crítica ao egoísmo ́tico em qualquer de suas formas ́ que ela não fornece a base ́tica apropriada para as pessoas que estão em proissões ligadas ao cuidado e à ajuda. Certamente, ́ verdade que muitas pessoas estão em tais proissões por seu interesse pŕprio, at́ certo ponto, mas a verdadeira razão para ser psićlogo, enfermeiro, ḿdico, assistente social, professor, entre outras proissões ains, ́ ajudar os outros, e uma atitude de interesse pŕprio exacerbada não teria boas consequências para algúm nestas proissões. ”andman e ”andman argumentam que proissionais da saúde que aceitam o egoísmo ́tico sempre colocaram seus interesses e conforto como im último de sua ação moral, escolhendo, por exemplo, contextos e locais de trabalho que não tenham que atender e cuidar de indivíduos com doenças infecciosas. 42 TÓPICO 2 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE Essas críticas apoiariam as airmações de alguns iĺsofos de que o egoísmo ́tico em qualquer de suas formas não ́ realmente um sistema moral, mas sim a postura não moral da qual se pergunta "Por que eu deveria ser moral?" NIELSEN, . No entanto, não ́ necessário endossar uma posição tão extrema para perceber que há muitos problemas com o egoísmo ́tico que não são facilmente resolvíveis. Portanto, parece ser uma teoria ́tica altamente questionável. 3.2.2 Vantagens do Egoísmo Ético Universal Que conclusões podem ser tiradas desta discussão sobre o egoísmo ́tico? “ teoria tem alguma vantagem? Uma vantagem do egoísmo ́tico sobre as teorias que advogam fazer o que ́ de interesse para outros envolvidos ́ que ́ muito mais fácil para os indivíduos saber quais são os seus pŕprios interesses do que seria para eles saberem o que ́ do melhor interesse para os outros. “s pessoas nem sempre agem em seu interesse pŕprio e certamente cometerão erros no julgamento sobre o que ́ de seu pŕprio interesse, mas estão em uma posição muito melhor para estimar corretamente o que elas querem, precisam e deveriam ter e fazer do que qualquer outra pessoa. “ĺm disso, elas têm uma melhor chance de avaliar seu interesse pŕprio pessoal do que avaliar os interesses de qualquer outra pessoa HINM“N, . Outra vantagem do egoísmo ́tico universal ́ que ele encoraja a liberdade e a responsabilidade individuais R“CHELS, . Os egoístas precisam apenas considerar seu interesse pŕprio e então assumir a responsabilidade por suas ações. Não precisa haver dependência de ningúm, basta buscar seu interesse pŕprio e deixar que os outros façam o mesmo. Portanto, os egoístas tamb́m argumentam, isso signiica que suas teorias realmente se encaixam melhor com a economia capitalista da maior parte das sociedades vigentes. O egoísmo ́tico pode funcionar com sucesso, mas tem severas limitações. “ teoria funcionará melhor enquanto as pessoas estiverem operando em relativo isolamento, minimizando assim as ocasiões de conlito entre seus interesses pŕprios ”ONJOUR ”“KER, . Por exemplo, se todos pudessem ser sua pŕpria comunidade autossuiciente e ser quase totalmente independente, então o interesse pŕprio funcionaria bem. No entanto, assim que as esferas individuais começam a se tocar ou se sobrepor, e o interesse pŕprio de João começa a entrar em conlito com o de Pedro, o egoísmo ́tico não fornece os meios de resolver esses conlitos de tal forma que o interesse pessoal de todos seja protegido ou satisfeito. “lgum princípio de justiça ou de compromisso deve ser introduzido, e provavelmente não seria do interesse de todos. Neste ponto, os egoístas devem ou se tornar utilitaristas e se preocupar com os melhores interesses de todos os envolvidos, ou entrar em seu jogo não moral, dizendo às pessoas o que elas deveriam fazer, esperando que elas não irão, de fato, fazê-lo. 43 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA O problema real e imediato com o egoísmo, entretanto, ́ que não vivemos em comunidades autossuicientes. Vivemos, em vez disso, em comunidades cada vez mais abarrotadas onde a interdependência social, econômica e at́ mesmo moral ́ um fato da vida e onde os interesses pŕprios conlitam constantemente e de alguma forma devem ser comprometidos. Isso signiica que o interesse pessoal de uma pessoa será apenas parcialmente servido e, de fato, poderá não ser servido em absoluto. 3.3 EGOÍSMO ÉTICO RACIONAL DE AYN RAND “yn Rand , a principal expoente moderna do egoísmo ́tico universal que ela chamou de egoísmo ́tico racional , disse que os interesses pŕprios dos seres humanos racionais, em virtude de serem racionais, nunca entrarão em conlito. Não importa como Rand tente discutir os conlitos de interesse pŕprio que continuamente surgem entre os seres humanos racionais, a observação mostra que eles existem e precisam ser tratados. Por exemplo, “lbert Einstein e ”ertrand Russell , matemáticos e cientistas Russell tamb́m era iĺsofo , eram totalmente opostos ao desenvolvimento de armas atômicas. Por outro lado, o Dr. Edward Teller , o renomado físico responsável por muitos dos desenvolvimentos do poder atômico, defendia sua proliferação. Não são meras diferenças de opinião. Russell, por exemplo, at́ mesmo foi preso em protesto contra o acoplamento de submarinos nucleares americanos na Inglaterra ROS“, . Russell não ś pensava que o desenvolvimento e o uso de armas atômicas não eram de seu interesse pŕprio, mas tamb́m sentia que não eram do interesse dos seres humanos em geral. Rand pode querer argumentar que esses homens não são racionais nem inteligentes, mas se assim for, seria difícil aceitar a sua deinição de seres humanos racionais e interesse pŕprio racional. “ĺm disso, ́ interessante especular, nesse sentido, por que “yn Rand se recusou irmemente a apoiar qualquer das comunidades ou projetos que foram criados sob suas teorias. Um deles foi o Projeto Minerva, uma comunidade insular a ser governada sem governo STR“USS, , e outro foi o Libertarianismo, um partido político que nomeou John Hospers como candidato presidencial em SMITH, . Nenhum dos esforços recebeu a bênção de Rand. Em conclusão, parece que as pessoas podem ser egoístas ́ticos com algum sucesso somente se advogarem alguma outra teoria aĺm do egoísmo ́tico, e somente se não disserem às pessoas que ́ isso que estão fazendo. Conforme observado anteriormente, isso a torna uma teoria ́tica questionável na pior das hiṕteses e, na melhor das hiṕteses, impraticável. Diante de todos esses śrios problemas, certamente não devemos contentar-nos com o egoísmo ́tico at́ que tenhamos examinado outras teorias ́ticas. 44 TÓPICO 2 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE 4 O UTILITARISMO O utilitarismo ́ uma teoria ́tica cujos principais arquitetos foram Jeremy ”entham e John Stuart Mill . Deriva seu nome da concepção de utilidade. O utilitarista diz que um ato ́ correto moral se for útil em produzir um im desejável ou bom MULG“N, . Os utilitaristas, portanto, alegam que a única coisa que conta moralmente ́ o que produz a maior quantidade de utilidade, ou as maiores consequências positivas gerais. No entanto, qual ́ o crit́rio apropriado de utilidade? O que tem valor intrínseco? Historicamente, os utilitaristas têm tomado o prazer e a felicidade como medida de consequências. Versões mais recentes do utilitarismo voltaram-se para bens mais elevados "ideais" ou para preferências como medida de consequências. Cada uma dessas quatro medidas de valor intrínseco tem suas forças e suas limitações. Originalmente, o utilitarismo tornou-se inluente com o trabalho de Jeremy ”entham , que deiniu a utilidade em termos de prazer e dor. De acordo com ”entham , devemos agir de forma a maximizar o prazer e minimizar a dor. Esta posição ́ conhecida como utilitarismo hedonista. Observe que isso ́ muito diferente de um hedonismo direto, que recomendaria maximizar o pŕprio prazer e minimizar a pŕpria dor. O utilitarismo hedonista recomenda maximizar a quantidade total de prazer e minimizar a quantidade total de dor. “ ilosoia de ”entham rapidamente foi atacada como "a ilosoia do porco" por causa do que parecia ser sua ênfase grosseira em prazeres sensuais e corporais, em que os porcos tamb́m sentem tais prazeres assim como os humanos S“NTOS, . John Stuart Mill , o ailhado de ”entham, propôs uma grande reformulação da posição utilitarista argumentando que a utilidade deveria ser deinida em termos de felicidade em vez de prazer MILL, .O padrão de Mill parecia ser um avanço deinitivo sobre o de ”entham, pois era baseado em um padrão mais elevado que o simples prazer. Isso ́ chamado de utilitarismo eudemonista a palavra eudemonista vem da palavra grega para "felicidade", eudaimonia . Para ver por que este ́ o caso, vamos considerar algumas das diferenças entre prazer e felicidade como o padrão de utilidade. “s diferenças entre prazer e felicidade são signiicativas. Tendemos a pensar que o prazer ́ primordialmente corporal ou sensual. Comer, beber e fazer sexo vêm imediatamente à mente como modelos de casos de prazer. Felicidade, por outro lado, geralmente ́ menos imediatamente atrelada ao corpo. Poderíamos inicialmente caracterizá-la como pertencendo mais à mente ou espírito do que ao corpo S“NTOS, . Em segundo lugar, o prazer geralmente parece ser de duração menor do que a felicidade. Isso decorre da natureza do pŕprio prazer MULG“N, . O prazer, pelo menos aos olhos de muitos psićlogos e iĺsofos, ́ o sentimento agradável que experimentamos quando um estado de privação ́ substituído por um estado de saciedade ou satisfação. Por exemplo, o prazer ́ o que sentimos quando bebemos um copo de água fresca e agradável para saciar nossa sede. No 45 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA entanto, isso nos dá uma visão da razão pela qual os prazeres são de curta duração. Uma vez que estamos saciados, já não experimentamos o objeto como prazeroso. Uma vez que não estamos mais sedentos, beber água torna-se menos agradável. “ felicidade, por outro lado, parece estar na realização de certas metas, esperanças ou planos para a pŕpria vida. Na medida em que esses objetivos são intrinsecamente gratiicantes, não nos cansamos deles da mesma maneira que podemos nos cansar de certos prazeres. Em terceiro lugar, a felicidade pode abranger tanto o prazer quanto a dor DONNER FUMERTON, . Na verdade, poderíamos facilmente imaginar algúm dizendo que sua vida ́ feliz, mas ainda reconhecendo momentos dolorosos. Um bom exemplo disso ́ uma mulher que dá à luz uma criança há muito esperada. Ela pode experimentar um pouco de dor durante e aṕs o parto, mas ela ainda pode se sentir feliz. Por outro lado, podemos imaginar algúm experimentando prazer, mas não se sentindo feliz. Pense em algúm fumando crack, que estimula diretamente o centro de prazer do ćrebro. Eles podem ter prazer quando eles inalam profundamente, mas eles poderiam se sentir muito infelizes com suas vidas, carreiras, casamento, e assim por diante. Finalmente, há um melhor elemento avaliativo em nossa noção de felicidade do que há em nossa ideia de prazer. Podemos querer distinguir entre prazeres bons e maus, entre inofensivos e nocivos, mas não duvidamos que os maus prazeres sejam ainda prazeres. Com a felicidade, por outro lado, construímos um componente avaliativo DONNER FUMERTON, . É provável que questionemos se as pessoas são genuinamente felizes de uma forma que não questionamos se elas estão realmente sentindo prazer. O prazer e a felicidade não são os únicos padrões possíveis de utilidade, e no śculo XX as tentativas de redeinir o padrão de utilidade em termos de bens ideais como liberdade, conhecimento e justiça G. E. Moore e preferências individuais Kenneth “rrow HINM“N, . Estas versões, utilitarismo ideal e utilitarismo de preferência, respectivamente, fornecem variações sobre o tema utilitarista. Podemos resumir estas várias versões do utilitarismo da seguinte maneira QUADRO 4 - MEDIDAS DE UTILIDADE TIPO DE UTILITARISMO PADRÃO DE UTILIDADE Hedonista Eudaimonista Ideal De Preferência Prazer Felicidade Justiça, liberdade etc. Preferência NÚMERO DE BENS INTRÍNSECOS Um Um Muitos Indeterminado FONTE: Hinman (2008, p. 133) 46 PRINCIPAL PROPONENTE ”entham Mill Moore “rrow TÓPICO 2 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE Nenhum candidato único surgiu como a única escolha entre os iĺsofos para o padrão de utilidade. O desacordo entre os iĺsofos sobre esta questão parece reletir um desacordo maior em nossa pŕpria sociedade MULG“N, . Se as consequências importam, ainda temos que decidir qual crit́rio utilizar na medição delas. “ atração da teoria da preferência neste contexto ́ que ela permite essa multiplicidade de padrões, todos os quais são expressos como preferências. Na verdade, pode haver uma vantagem distinta em permitir uma multiplicidade de diferentes tipos de fatores subjacentes à utilidade. Este ́ um tipo de pluralismo dentro de uma teoria moral especíica. O utilitarismo já foi criticado por ser muito estreito, por reduzir todas as nossas considerações na vida a um único eixo de utilidade, geralmente prazer ou felicidade. Há muito a ser dito para uma teoria mais completa e lexível que nos permita reconhecer que as consequências precisam ser medidas de acordo com vários padrões. “ diiculdade com tal movimento, entretanto, ́ que torna o utilitarismo uma doutrina mais complexa, que seja mais difícil de aplicar na prática R“CHELS R“CHELS, . “ĺm disso, os utilitaristas que vão nessa direção precisam especiicar a relação entre os diferentes tipos de padrões. Quando, por exemplo, uma alternativa ocupa um lugar de destaque na medida da felicidade, e outra linha de ação se destaca na escala da justiça, qual delas teria precedência. Finalmente, ameaça roubar o utilitarismo de sua principal vantagem, isto ́, oferecer um ḿtodo claro para o cálculo da moralidade das ações, regras e políticas sociais MULG“N, . O utilitarista sustenta que devemos preferir o que produzir a maior utilidade total, e isso ́ determinado pesando as consequências, mas as consequências de quê? Os utilitaristas deram pelo menos três respostas diferentes a esta questão, que não são necessariamente mutuamente exclusivas atos, regras e práticas. DICAS Assista ao documentário “O Utilitarismo: o projeto de construir uma ética racional” do Curso Livre de Humanidades – Filosofia, com Luis Alberto Peluso, Prof. Dr. em Filosofia PUC/ Campinas. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=xf_SeZjM0Zw>. 4.1 O UTILITARISMO DE ATO O utilitarismo de ato diz essencialmente que todos devem executar esse ato que trará a maior quantidade possível de bens para todos afetados pelo ato ”ONJOUR ”“KER, . Seus defensores não acreditam na criação de regras para a ação porque sentem que cada situação e cada pessoa são diferentes. Cada indivíduo, então, deve avaliar a situação em que está envolvido e tentar descobrir qual ato traria a maior quantidade de consequências boas com a menor quantidade 47 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA de consequências ruins, não apenas para si mesmo, como no egoísmo, mas para todos os envolvidos na situação. “o avaliar a situação, o agente a pessoa que vai atuar ou está agindo deve decidir se, por exemplo, dizer a verdade ́ a coisa certa a fazer nesta situação e neste momento. Não importa que a maioria das pessoas acredite que dizer a verdade ́ geralmente uma coisa boa a se fazer. O utilitarista de ato deve decidirse com respeito à situação particular que está vivendo no momento se ou não ́ correto dizer a verdade. Para o utilitarismo de ato, não pode haver regras absolutas contra matar, roubar, mentir e assim por diante, porque cada situação ́ diferente e todas as pessoas são diferentes CORTIN“ M“RTÍNEZ, . Portanto, todos aqueles atos que, em geral, podem ser considerados imorais, seriam considerados morais ou imorais pelo utilitarista de ato apenas em relação a se eles trariam ou não trariam o maior bem sobre o menor mal para todos em uma situação particular. 4.1.1 Crítica ao utilitarismo de ato Existem várias críticas ao utilitarismo de ato. Uma delas foi citada como fornecendo apoio para o egoísmo ́tico, e isso ́ porque ́ muito difícil determinar o que resultará em boas consequências para os outros HINM“N, HURK“, . Envolvido na diiculdade de decidir quais serão as consequências de qualquer ação que se está a tomar, soma-se o problema de decidir o que ́ "bom" e "certo" para os outros. O que pode ser uma boa consequência para você pode não ser igualmente bom, ou de nenhum modo bom para outros. E como você poderia saber, a menos que você possa perguntar às outras pessoas o que seria bom para elas? Muitas vezes, ́ claro, não há tempo para perguntar nada a ningúm. Simplesmente devemos agir da melhor maneira possível. “ĺm disso, há certa impraticabilidade em ter que começar de novo com cada situação R“CHELS R“CHELS, . De fato, muitos moralistas podem questionar a crença do consequencialista de ato e avaliar que cada ato e cada pessoa ́ completamente diferente, airmando que há muitas semelhanças entre os seres humanos e seus comportamentos que justiicariam a deinição de certas regras. Por exemplo, os críticos do utilitarismo de ato podem dizer que há pessoas suicientes que valorizam suas vidas para que haja alguma regra contra o assassinato, mesmo que tenha que ser qualiicado, por exemplo dizendo "Nunca mate, exceto em legítima defesa". Poderia ainda dizer que ́ uma perda de tempo e at́ absurdo reavaliar cada situação quando há uma escolha de matar ou não matar. Parece que algúm deveria simplesmente seguir a regra geral e qualquer de suas qualiicações válidas. Como mencionado anteriormente, o fator tempo na tomada de decisões morais ́ muitas vezes importante. Muitas vezes uma pessoa não tem tempo para começar do zero quando confrontada com cada novo problema moral. Na verdade, ser forçado a começar constantemente de novo pode resultar em uma incapacidade de cometer um ato moral a tempo. 48 TÓPICO 2 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE O utilitarista de ato responderia que depois de experimentar muitas situações, aprende-se a aplicar a experiência de uma pessoa à situação nova prontamente, com um mínimo de desperdício de tempo, de modo que algúm não estaria realmente começando do zero a cada vez HINM“N, . Quando as pessoas invocam a experiência passada e agem consistentemente de acordo com ela, não estariam realmente agindo com base em regras não especiicadas? Se elas estiveram em uma śrie de situações em que a escolha moral ́ não matar outro ser humano, e elas fossem agora confrontadas com outra situação semelhante, então elas não estariam realmente operando sob uma regra oculta que diz "Nunca mate outro ser humano em qualquer situação semelhante à situação X"? Se assim for, eles são utilitaristas de regras que simplesmente não anunciaram suas regras. Uma última crítica ao utilitarismo de ato pergunta como se deve educar os jovens ou os não iniciados a agir moralmente se não houver regras ou guias a seguir, exceto uma Cada pessoa deve avaliar quais seriam as maiores e melhores possíveis consequências boas de cada ato para cada situação que surge para todos envolvidos MULG“N, . Parece que sob este sistema ́tico todo mundo deve começar de novo, na medida em que ele está crescendo em busca de descobrir qual ́ a coisa moralmente correta a ser feita em cada situação, tal como ela ocorre. Isso pode ser admissível na estimativa de alguns iĺsofos, mas ́ muito difícil, se não impossível, conduzir qualquer tipo de educação moral sistemática nessa base. 4.2 O UTILITARISMO DE REGRAS Foi para dar uma resposta a muitos dos problemas do utilitarismo de ato que o utilitarismo de regras foi estabelecido MULG“N, . Nessa forma, o princípio básico utilitarista não ́ que "todos deveriam sempre agir para trazer o maior bem para todos os envolvidos", mas sim que "todos deveriam sempre estabelecer e seguir essa regra ou as regras que produzirão o maior bem para todos os envolvidos". Isso, pelo menos, elimina o problema de ter que começar de novo para descobrir as prováveis consequências para todos em cada situação, e tamb́m fornece um conjunto de regras que podem ser aludidas na educação moral dos não iniciados. Os utilitaristas de regras tentam, a partir da experiência e do raciocínio cuidadoso, estabelecer uma śrie de regras que, quando seguidas, renderão o maior bem para toda a humanidade FURROW, . Por exemplo, ao inv́s de tentar descobrir se algúm deve ou não matar algúm em cada situação em que esse problema possa surgir, os utilitaristas de regras podem formar a regra nunca mate, exceto em autodefesa . Sua suposição em airmar esta regra ́ que, exceto quando ́ feito em legítima defesa, matar trará mais consequências ruins do que boas para todos os envolvidos, tanto agora como provavelmente em longo prazo. Matar, eles poderiam acrescentar, se permitido em qualquer situação, exceto a situação de autodefesa, criaria precedentes perigosos. Isso encorajaria mais pessoas a tirar a vida dos outros do que eles fazem agora, e porque a vida humana ́ básica e importante para todos, não ter tal regra sempre causaria mais mal do que bem a todos os interessados. 49 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA Os utilitaristas de regras, obviamente, acreditam ao contrário de suas contrapartes de "ato", que existem motivos, ações e situações humanas semelhantes o suiciente para justiicar a criação de regras que se apliquem a todos os seres humanos e a todas as situações humanas HINM“N, . Para o modo de pensar do utilitarista de regras, ́ tolo e perigoso deixar as decisões das ações morais aos indivíduos sem lhes dar alguma orientação e sem tentar estabelecer uma esṕcie de estabilidade e ordem moral na sociedade, ao contrário da aleatoriedade, quase adivinhação, que parece ser defendida pelo utilitarista de ato. 4.2.1 Crítica ao utilitarismo de regras “ssociados ao utilitarismo de regras estão alguns dos mesmos problemas que encontramos com o utilitarismo de ato, especialmente na área de tentar determinar as consequências boas para os outros R“CHELS R“CHELS, . Esse problema, como mencionado anteriormente, ́ uma desvantagem que o egoísmo não compartilha. Como se pode ter certeza, dadas as grandes diferenças entre os seres humanos e as situações humanas, que realmente se pode estabelecer uma regra que cubra tal diversidade, muito menos que ela sempre e verdadeiramente produza o maior bem para todos os interessados? Esta diiculdade ́ acrescentada àquela compartilhada pelo egoísta e pelo utilitarista de ato, que ́ tentar determinar todas as consequências não apenas para uma ação, mas para todas as ações e situações que ocorrem sob qualquer regra particular. Os moralistas que não aderem às regras argumentam fortemente que não há nenhuma regra para a qual não se pode encontrar pelo menos uma exceção em algum lugar ao longo do tempo, e no momento em que um indivíduo incorpora todas as exceções possíveis em uma regra, está na verdade defendendo o utilitarismo de ato. Portanto, eles argumentam, uma pessoa estaria melhor sem regras, como elas possivelmente não podem aplicar-se a todas as situações que algúm poderá enfrentar. Por exemplo, poderia a regra nunca mate, exceto em legítima defesa cobrir todas as situações em que os seres humanos estariam propensos a se envolver? “brangerá o aborto, por exemplo? Muitos antiabortistas pensam assim, airmando que de nenhuma maneira poderá o feto não nascido ser considerado um agressor. Portanto, não poderia ser abortado. Por outro lado, os defensores da pŕ-escolha não consideram o feto como um ser humano ou defendem a precedência da vida da mãe sobre o feto e acreditam que há momentos em que o feto deve ser abortado ”ONJOUR ”“KER, . Como, por exemplo, a regra utilitarista lida com o aborto do feto quando a vida da mãe está em perigo não especiicamente porque ela está grávida, mas por alguma outra razão? O feto não pode ser considerado um agressor, então como poderia ser abortado em legítima defesa? Nenhuma reivindicação foi de fato feita que os utilitaristas de regras tivessem tal regra, mas o exemplo foi projetado aqui para mostrar como ́ difícil formar uma regra que cubra todas as situações, sem exceção. Os utilitaristas de regras podem, obviamente, classiicar suas regras colocando-as em categorias primárias e secundárias MULG“N, , mas o problema continua independentemente da categoria na qual a regra ́ encontrada. Os utilitaristas de ato não têm esse 50 TÓPICO 2 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE problema. Eles podem ter problemas para justiicar uma determinada ação, mas pelo menos eles não se comprometem a agir de uma ś maneira em todas as situações. Eles podem cometer um erro na situação “, mas quando a situação ” surge eles têm outra chance de julgar e agir de novo, sem serem impedidos por quaisquer regras vinculativas que os liguem a uma śrie de erros. 4.3 UTILITARISMO DE PRÁTICAS “lguns iĺsofos tomaram um passo aĺm dos utilitaristas de regras, sugerindo que as considerações utilitaristas têm relevância para justiicar a existência de certos tipos de práticas HINM“N, , embora o utilitarismo possa não fornecer uma base adequada para decidir atos especíicos dentro dessa prática. Pode-se considerar isso como um tipo de utilitarismo de regra, mas ́ importante notar que há uma diferença signiicativa entre regras e práticas. “s regras são mais especíicas do que as práticas, e uma prática pode abranger numerosas regras. Colecionar selos, por exemplo, ́ uma prática, e cont́m muitas regras de ação especíicas sobre quais tipos de selos comprar, quando vender e assim por diante. “s práticas incluem regras, mas contêm outras coisas a mais tamb́m. Elas são, muitas vezes, incorporadas em instituições especíicas sociedades ilat́licas e em padrões de interação social por exemplo, convenções de colecionadores de selos que vão aĺm de qualquer conjunto especíico de regras. John Rawls , iĺsofo contemporâneo cuja obra Teoria da Justiça ́ uma das mais recentes e inluentes obras de ́tica, sugeriu que podemos justiicar a prática da punição como um todo atrav́s de argumentos utilitários. Uma sociedade sem instituições e práticas de punição produziria menos utilidade geral do que aquela que contivesse tais instituições e práticas. Rawls evita os problemas levantados pelas justiicações utilitaristas de ato de punição especíicas, argumentando que punições especíicas devem ser determinadas com base em considerações retributivas, não por motivos utilitários. “ punição especíica dependeria da gravidade da ofensa, não da utilidade de impor a punição. Em outras palavras, indivíduos especíicos seriam punidos porque o mereciam, não por causa das consequências produzidas punindo-os. O ḿrito de uma sugestão como a de Rawls ́ que ela nos permite combinar intuições utilitárias e kantianas LOVETT, . O raciocínio utilitarista justiica a existência da instituição da punição, e as considerações kantianas de retribuição determinam a natureza e a severidade de atos punitivos especíicos. Quando resumimos essas várias posições, obtemos o seguinte quadro 51 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA QUADRO 5 - CONSEQUÊNCIAS DO QUÊ? TIPO DE UTILITARISMO CONSEQUÊNCIAS DO QUÊ? PRINCÍPIO CENTRAL Ato Cada ato Desempenhar o ato que produzirá a maior quantidade de utilidade. Regra Regras Seguir a regra que produzirá a maior quantidade de utilidade. Prática Práticas “poiar as práticas que produzirão a maior quantidade de utilidade. FONTE: Hinman (2008, p. 149) 4.4 A ANÁLISE CUSTO-BENEFÍCIO OU ABORDAGEM “FIM JUSTIFICA OS MEIOS” Há outro problema em ambas as formas de utilitarismo, e essa ́ a diiculdade de se levar o aspecto "útil" do utilitarismo longe demais R“CHELS R“CHELS, . Os não utilitaristas podem perguntar, por exemplo, se ́ sempre correto tentar alcançar "o maior bem para o maior número". Isso não acabaria às vezes como o maior benefício para a maioria, todavia com algumas consequências muito ruins para a minoria? Será que a ciência, por exemplo, estaria justiicada em pegar crianças e realizar experiências dolorosas e eventualmente fatais se os ḿdicos pudessem garantir a salvação de milhões de vidas de crianças no futuro? Certamente, pensando ś em número, isso seria o maior bem para o maior número, mas muitos moralistas objetariam dizendo que cada indivíduo ́ único, moralmente falando, e, portanto, nenhuma dessas experiências deve ser realizada independentemente de quantas pessoas serão salvas. Podemos tamb́m imaginar um caso em que a escravização de uma população de minoria muito pequena fará a população da maioria muito feliz. Em geral, a felicidade será maximizada por reter, em vez de abolir, o sistema. Em sua defesa cuidadosamente argumentada do utilitarismo de ato, Richard M. Hare argumenta que a preservação da escravidão sob tais circunstâncias ́ de fato uma exigência moral. Hare argumenta que nossas convicções sobre a importância da justiça podem ser explicadas e justiicadas por motivos utilitários. Quando se trata de avaliar a moralidade real de nossas práticas, às vezes devemos deixar de lado essas crenças convencionais fortemente mantidas e apelar diretamente ao princípio utilitarista de ato que nos diz que estamos realmente moralmente obrigados a perpetrar algumas instâncias de injustiça. No entanto, se estamos buscando o maior bem para todos, existe o perigo do que muitos chamam de "análise de custo-benefício" ou abordagem "im que justiica os meios" da moralidade, ou seja, tentar calcular quanto esforço ou custo trará mais benefícios. Esta abordagem tamb́m nos envolve na determinação do valor social dos indivíduos em uma sociedade, de modo que aquelas pessoas que são de "valor" mais elevado para a sociedade, como alguns proissionais, recebem 52 TÓPICO 2 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE mais benefícios do que aqueles com valor menor. Em outras palavras, às vezes, ao tentar fazer o maior bem para o maior número, podemos nos encontrar sendo muito imorais em relação a alguns poucos. “lguns moralistas, incluindo Immanuel Kant e “yn Rand , acreditam que cada ser humano deve ser considerado como um im em si mesmo, nunca meramente como um meio. Tentar ser equitativo e justo para com todos os membros de uma sociedade parece ser uma abordagem mais moral do que simplesmente tentar alcançar o maior bem para o maior número. Certamente, há momentos em que um grupo de pessoas tem que pensar na sobrevivência do grupo em vez de um ou dois indivíduos, e então as decisões morais têm que ser feitas sobre quem recebe os "bens" que estão em falta. No entanto, uma pessoa que sempre opera sob o ideal "o maior bem para o maior número" muitas vezes ignora o que ́ bom para todos. Na medicina, por exemplo, pode ocorrer um momento em que a sobrevivência do grupo ́ colocada acima da sobrevivência de alguns indivíduos CLOTET, . Durante um desastre grave, quando as instalações ḿdicas simplesmente não podem lidar com todos os que estão feridos, os ḿdicos concentram-se nos pacientes que sabem que podem salvar e não nos casos "sem esperança". “ĺm disso, um ḿdico ou enfermeira ferida que poderia ser posto a trabalhar provavelmente seria o primeiro a obter atendimento ḿdico porque ele ou ela seria capaz de ajudar a salvar mais pessoas feridas do que uma pessoa leiga em medicina. Estas, felizmente, são circunstâncias incomuns, e elas exigem prioridades diferentes de situações mais normais. “plicar a análise de custo-benefício ou a abordagem im que justiica os meios às situações mais normais, no entanto, equivale tratar os seres humanos como se fosse algum tipo de "produto" inanimado em uma transação de neǵcios. Deste modo, a maioria dos moralistas acha esta visão da humanidade abominável e imoral. Em conclusão, então, o utilitarismo ́ uma melhoria em relação ao egoísmo ́tico, na medida em que ele tenta levar em consideração em qualquer ação moral todas as pessoas envolvidas. “o mesmo tempo, no entanto, ele se depara com a diiculdade de determinar o que seria bom para os outros, uma diiculdade não envolvida no egoísmo ́tico. No utilitarismo de ato, o problema ́ que não há regras morais ou guias para conduzir-nos. Uma pessoa deve decidir o que ́ certo para todas as pessoas em cada situação que ela enfrenta. No utilitarismo de regras, o problema ́ descobrir quais regras abrangem realmente todos os seres humanos e situações, embora esta forma de utilitarismo evite a ambiguidade de ter que recomeçar em cada nova situação. O último problema com ambas as formas de utilitarismo ́ que ele se presta ao tipo de pensamento de análise custo-benefício, que muitas vezes resulta no tipo de moralidade em que se busca o "maior bem para o maior número", ou seja, a noção de que qualquer im, e especialmente qualquer im que seja bom, justiica qualquer meio usado para alcançá-lo. Existe uma questão entre muitos moralistas sobre se devemos nos concentrar apenas nas 53 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA consequências ou nos ins e ignorar outras coisas, como meios ou motivos ao tomar decisões morais. Essa questão será discutida mais adiante, quando o Imperativo Prático de Immanuel Kant for apresentado no pŕximo t́pico. Outra vantagem que o utilitarismo tem sobre o egoísmo ́tico ́ que ele ́ muito mais adequado para as pessoas nas proissões de ajuda, como a psicologia, na medida em que se preocupa com as melhores consequências boas para todos. 5 DIFICULDADE COM AS TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS EM GERAL Uma diiculdade inerente a todas as teorias consequencialistas ́ a necessidade de tentar descobrir e determinar o máximo de consequências possíveis de nossas ações – uma tarefa difícil, na melhor das hiṕteses HINM“N, R“CHELS R“CHELS, . Esse problema existe tanto para aqueles que estão preocupados com o interesse pŕprio como para aqueles que estão preocupados com o interesse de todos. Poŕm, obviamente, ́ um problema maior para os utilitaristas, porque eles têm que se preocupar em como as consequências afetam outras pessoas aĺm de a si mesmas. O crítico às teorias consequencialistas provavelmente diria que ́ muito difícil avaliar todas as consequências de qualquer uma de nossas ações, porque os indivíduos não podem ver o suiciente no futuro, nem os humanos têm conhecimento suiciente sobre o que ́ melhor para ńs ou para todos os interessados para fazer tal julgamento. Por exemplo, se algúm está vivendo sob o governo de um líder incompetente, a maneira mais rápida de remover esse líder seria assassiná-lo, mas qual seria a consequência de tal ato e como os indivíduos podem calcular o número de benefícios em oposição ao número de consequências ruins e fazer isso para ńs ou para todos os envolvidos pela ação? É ́bvio que algúm acabaria com o governo do líder matando-o, mas quem chegaria ao poder depois? Essa pŕxima pessoa seria melhor, ou seria pior? Suponhamos que algúm soubesse quem seria o pŕximo líder e pensou que seria um bom líder, mas acabou por ser pior do que o líder anterior. O que seria pior, sofrer por três ou quatro anos sob um líder incompetente ou dar precedente ao ato de assassinato, de modo que quando as pessoas estivessem insatisfeitas, com razão ou sem razão, com seu líder, sentissem que podem usar do assassinato para removê-lo? No caso do utilitarismo, pela razão de que os indivíduos estão preocupados com todos os envolvidos na situação, pode-se avaliar com alguma precisão o efeito que matar ou não matar o líder terá sobre as crianças da sociedade e at́ mesmo sobre seus futuros membros que irão nascer? Será que será possível saber quais serão as consequências, presentes e futuras, de um ato? Se não, então como se pode julgar cada situação bem o suiciente para tomar a ação correta? Em um exemplo tirado da hist́ria dos EU“, poderia o presidente Harry Truman ter previsto todas as consequências de sua decisão de derrubar as bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki durante a Segunda Guerra Mundial? Obviamente, ele poderia determinar as consequências mais imediatas, como o 54 TÓPICO 2 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE encurtamento da guerra e poupar mais vidas de cidadãos norte-americanos. Poderia ele ter previsto as consequências em longo prazo a guerra fria, o desenvolvimento das bombas de hidrogênio e de nêutrons, o armazenamento de armas nucleares at́ uma quantidade na qual a capacidade de destruição ultrapassaria o necessário, as consequências da radiação e consequente poluição da atmosfera? Como ilustra este exemplo, a descoberta e determinação das consequências dos atos e das regras, seja para ńs mesmos ou para os outros, não ́ uma tarefa fácil, não ́ uma tarefa que pode ser realizada com acurácia ou precisão. “s preocupações sobre como o consequencialismo pode ser muito exigente levaram muitos a rejeitá-lo V“Z, . Peter Railton tenta diagnosticar e refutar essas preocupações, oferecendo uma imagem impressionantemente matizada de consequencialismo de ato que ele acredita que pode resistir às várias preocupações que foram agrupadas sob as objeções da "exigência". Se ele tem razão, então, na melhor compreensão das exigências do consequencialismo, podemos manter nossas amizades, integridade pessoal e compromissos especiais com outras coisas, aĺm de tornar o mundo um lugar melhor e ainda agir como o consequencialismo exige que façamos. Peter Singer tamb́m está alerta para as preocupações sobre como o consequencialismo pode ser exigente. Ele argumenta francamente que a moralidade pode ser muito exigente, e que nossa relutância em aceitar isso ́ autoindulgência, e não uma razão para duvidar dos ḿritos do utilitarismo de ato. Singer aplica a doutrina utilitarista do ato ao tema do alívio da fome, argumentando que ńs que vivemos nos países mais pŕsperos podemos salvar muitos outros da morte prematura se abrirmos mão de uma boa parte do que temos. Pensamos que temos discrição moral sobre nossas posses e nossas folhas de pagamento, mas se Singer está correto, esse pensamento está errado. Grande parte do que possuímos não ́, ele pensa, moralmente pertencente a ńs, mesmo que a lei nos proteja em nossas reivindicações. Na visão de Singer, se pudermos evitar o sofrimento sem, no entanto, causar a ńs mesmos um mal similar ao dos nossos pretendidos beneiciários, então estaríamos moralmente obrigados a fazê-lo. DICAS Àqueles que se opõem a tal sugestão aconselhamos a ler o artigo provocativo Famine, aluence and morality (Fome, riqueza e moralidade), de Singer (2013), ou sua obra “O maior bem que podemos fazer” (2016), e usá-los como uma espécie de caso avaliativo para determinar a plausibilidade do utilitarismo do ato que sua proposta encarna. E se algúm criasse um sistema moral sem ter que considerar as consequências? Se os indivíduos pudessem decidir o que ́ certo ou errado em alguma base diferente das consequências, talvez pud́ssemos evitar algumas das diiculdades envolvidas tanto no egoísmo ́tico quanto no utilitarismo. O pŕximo t́pico abordará essas teorias. 55 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA 6 A ÉTICA DO CUIDADO Há uma teoria mais nova chamada "́tica do cuidado", e às vezes "́tica feminista", que foi estabelecida pela psićloga Carol Gilligan - em seu livro Uma voz diferente . Esta teoria não ́ geralmente considerada uma teoria ́tica consequencialista no sentido formal, como o egoísmo ́tico e o utilitarismo, mas parece que se enquadra no consequencialismo mais do que no não consequencialismo. De acordo com Gilligan , homens e mulheres pensam de forma bastante diferente quando se trata de tomada de decisão ́tica. Outro psićlogo famoso, Lawrence Kohlberg , concorda, mas conclui que essa diferença signiica que o raciocínio ́tico das mulheres ́ inferior ao dos homens. Gilligan , por outro lado, acha que as opiniões das mulheres sobre a ́tica são diferentes, mas devem ser consideradas iguais às dos homens. “ diferença, segundo ambos os psićlogos, ́ que os pontos de vista dos homens sobre a ́tica têm mais a ver com a justiça, os direitos, a competição, a independência e o viver segundo regras, enquanto as mulheres têm mais a ver com a generosidade, a harmonia, a reconciliação e o trabalho para manter relacionamentos pŕximos. Kohlberg criou um dilema onde a mulher de um homem está desesperadamente doente e o homem não pode pagar a medicação que ela precisa. Kohlberg então perguntou a duas crianças de anos, um menino e uma menina, se o homem deveria roubar a medicação. O menino disse sim porque a vida da esposa ́ mais importante do que a regra de não roubar. “ garota, no entanto, disse que não, porque se o homem for pego e conduzido à cadeia, quem cuidaria de sua esposa doente? “ssim como ele talvez pudesse pedir ao farmacêutico para dar-lhe o medicamento e ele poderia pagar ao farmacêutico mais tarde. De acordo com Kohlberg , o rapaz tinha uma compreensão clara da situação porque os direitos da esposa iriam se sobrepor à regra de não roubar, ou seja, a questão era toda sobre direitos e justiça. “ĺm disso, Kohlberg achou que a compreensão da menina sobre a situação era fraca. Por outro lado, Gilligan pensa que o menino e a menina estavam respondendo a diferentes perguntas O rapaz estava respondendo à pergunta O homem deveria roubar ou não a medicação?" Enquanto a menina estava respondendo à pergunta O homem deve roubar a medicação ou fazer alguma outra coisa? . “ menina não estava tão preocupada com direitos e justiça, mas com o que aconteceria com o homem e sua esposa, e ela tamb́m estava considerando a humanidade possível do farmacêutico. Em outras palavras, ela pensou em termos de cuidar. Portanto, Gilligan vê uma tendência dos homens para se concentrar em uma ́tica da justiça, enquanto as mulheres se concentram em uma ́tica do cuidar. Todavia, ela acha que ambos os pontos de vista da ́tica são vantajosos e devem ser considerados diferentes, mas igualmente válidos. Ela acha que a situação ideal ́ que homens e mulheres devem considerar ambas as visões de ́tica, porque os homens poderiam aprender sobre compaixão e cuidado na ́tica e as mulheres poderiam aprender a se concentrarem 56 TÓPICO 2 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE em direitos e justiça. “ĺm disso, ela ressalta que as mulheres deveriam reconhecer seus pŕprios direitos como seres humanos e não serem consideradas inferiores aos homens simplesmente porque eles pensam de forma diferente sobre a ́tica. “lguns críticos, como Dindia e Hyde , pensam que, aceitando a teoria de Gilligan, pode-se estar elevando os chamados valores femininos muito acima dos valores masculinos e substituindo um sistema ́tico injusto por outro sistema ́tico injusto, estabelecendo as mulheres como normais e os homens como inferiores. “ĺm disso, se algúm diz que ́ a natureza das mulheres ser cuidadosas e compassivas, não estamos empurrando-as de volta para onde estavam antes de Gilligan? Portanto, ao inv́s da teoria de Gilligan, oferecer aos homens e às mulheres mais oportunidades, ela pode estar criando novas categorias que poderiam resultar na exclusão de mulheres de trabalhos tradicionalmente masculinos por exemplo, engenharia e homens de trabalhos femininos por exemplo, enfermagem . “ĺm disso, os críticos dizem que Gilligan perturbou a ilosoia da igualdade de gênero de modo que uma empresa que queira contratar algúm com uma boa compreensão de regras legais, por exemplo, não vai contratar uma mulher para o trabalho, porque ela não tem verdadeiro senso de justiça. Desta forma, sua teoria psicoĺgica do gênero pode passar de descrever a igualdade de gênero para prescrever um conjunto de regras sobre quem deve fazer quais trabalhos. UNI Problema ético VOCÊ ACIONARIA O INTERRUPTOR? A filósofa Philippa Foot (1920-2010), em 1967, desenvolveu um experimento de pensamento ético conhecido como o Dilema do Bonde. Outros filósofos criaram variações deste problema e uma busca rápida na internet possibilitará a atualização sobre os detalhes. O experimento segue assim. Um bonde está fora de controle, está acelerando em direção a um grupo de quatro ou cinco homens que trabalham na trilha. Eles não veem o bonde vindo e todos serão mortos se nenhuma ação for tomada. No entanto, você pode acionar um interruptor que desviará o bonde para uma trilha lateral. Isso vai salvar os trabalhadores, mas há um trabalhador solitário na trilha lateral que será morto se você acionar o interruptor. Você vai acionar o interruptor? Por que ou por que não? Depois de ter discutido o problema, pesquise o "Homem Gordo", uma variação do Dilema do Bonde. Você empurraria o homem gordo da ponte? Por que ou por que não? Quais são os limites do pensamento utilitarista estrito? 57 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que • “ moralidade consequencialista teleoĺgica se baseia ou se preocupa com as consequências. “ moralidade não consequencialista deontoĺgica não se baseia ou se preocupa com as consequências. • O egoísmo psicoĺgico não ́ uma teoria ́tica, mas ́ uma teoria descritiva ou cientíica que tem a ver com o egoísmo. • O egoísmo psicoĺgico aparece em duas formas, nenhuma das quais pode funcionar como base para o egoísmo ́tico. “ forma forte sustenta que as pessoas sempre agem em seu interesse pŕprio. “ forma fraca sustenta que as pessoas, muitas vezes, mas não sempre, agem em seu interesse pŕprio. • O egoísmo psicoĺgico em sua forma forte não refuta a moralidade, e em sua forma fraca não fornece uma base racional para o egoísmo ́tico. • O egoísmo ́tico ́ uma teoria ilośica-normativa e prescritiva. “parece em três formas . “ forma individual sustenta que cada um deve agir em seu interesse pŕprio individual . “ forma pessoal sustenta que eu deveria agir em meu interesse pŕprio, mas não fazer airmações sobre o que qualquer outra pessoa deveria fazer . “ forma universal sustenta que todos devem sempre agir em seu interesse pŕprio. • O problema com a primeira e a segunda forma do egoísmo ́tico ́ que elas se aplicam apenas a um indivíduo e não podem ser estabelecidas para a humanidade em geral, porque isso provavelmente não estaria no interesse pŕprio do egoísta ́tico. • O egoísmo ́tico universal ́ a versão mais comum do egoísmo ́tico, mas tamb́m tem seus problemas . É inconsistente, na medida em que não está claro qual interesse pŕprio deve ser satisfeito . O que se entende por todos não ́ claro . Há uma diiculdade em determinar como dar conselhos morais . “o responder a essas críticas, os defensores do egoísmo tendem a nublar os usos morais e não morais dos termos deveria e deve . Não se encaixa bem com as proissões de ajuda. • O egoísmo ́tico tem certas vantagens . É mais fácil para os egoístas saber o que está em seu interesse pŕprio do que para outros moralistas, que se preocupam em saber o que ́ do melhor interesse dos outros . Incentiva a liberdade individual e a responsabilidade e se encaixa melhor, de acordo com os egoístas, com nossa economia capitalista . Pode funcionar com sucesso, desde que as pessoas estejam operando em esferas limitadas, isoladas umas das outras, minimizando conlitos. 58 • “s limitações destas vantagens são . Não oferece um ḿtodo consistente de resolução de conlitos de interesse pŕprio . Não vivemos em comunidades isoladas e autossuicientes, mas em comunidades cada vez mais abarrotadas onde a interdependência social, econômica e moral são fatos da vida e onde os interesses pŕprios conlitam constantemente e de alguma forma devem ser comprometidos. • O utilitarismo sustenta que todos deveriam executar esse ato ou seguir essa regra moral que trará o maior bem ou felicidade para todos os envolvidos. • O utilitarismo de ato airma que todos devem executar esse ato que trará o maior bem em detrimento do mal para todos os afetados pelo ato. • O utilitarismo de ato acredita que não se pode estabelecer regras antecipadamente para cobrir todas as situações e pessoas, porque são todas diferentes. • Há diiculdades com este argumento É muito difícil determinar quais seriam as boas consequências para os outros ́ impraticável ter que começar de novo com cada situação, para decidir o que seria moral nessa situação ́ quase impossível educar os jovens ou os não iniciados a agir moralmente se eles não podem receber regras ou guias para seguir. • O utilitarismo de regras airma que todos devem seguir a regra ou regras que trarão o maior número de boas consequências para todos os envolvidos. • O utilitarista de regras acredita que existem suicientes motivos, ações e situações humanas similares para justiicar a criação de regras que se aplicarão a todos os seres humanos e situações. • Existe o perigo de tentar determinar o valor social dos indivíduos "o maior bem para todos os interessados" pode muitas vezes ser interpretado como "o maior bem para a maioria", com possíveis consequências imorais para qualquer pessoa na minoria at́ mesmo um bom im justiica qualquer meio usado para alcançálo, ou devemos tamb́m considerar nossos meios e motivos? • “s teorias consequencialistas exigem que descubram e determinem todas as consequências de nossas ações ou regras. Isso ́ praticamente impossível de realizar. “s consequências ou ins constituem toda a moralidade? • Gilligan acredita que as atitudes morais dos homens têm a ver com justiça, direitos, competição, ser independente e viver de acordo com as regras. “s atitudes morais das mulheres têm a ver com generosidade, harmonia, reconciliação e trabalhar para manter relações íntimas. Estas duas visões são diferentes, mas igualmente válidas. • “s críticas à teoria de Gilligan argumentam que pode estar substituindo uma teoria problemática por outra. Em vez de sua teoria descrever a igualdade de gênero, pode prescrever quem deve realizar certas atividades proissionais, por exemplo. 59 AUTOATIVIDADE Qual ́ a diferença entre as concepções consequencialistas teleoĺgicas e não consequencialistas deontoĺgicas da moralidade? Explique a diferença entre egoísmo psicoĺgico e egoísmo ́tico. Em que os utilitaristas de ato acreditam? Como suas crenças diferem das de utilitaristas da regra? 60 TÓPICO 3 UNIDADE 1 TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE 1 INTRODUÇÃO Depois de ler este t́pico, você deverá ser capaz de descrever as teorias não consequencialistas da moralidade, mostrando como elas diferem das teorias consequencialistas. “ssim como diferenciar entre o não consequencialismo de ato e de regras e mostrar como eles diferem do utilitarismo de ato e de regras, respectivamente. Você deverá ser capaz de descrever e analisar criticamente o não consequencialismo de ato, a teoria do comando divino, a ́tica do dever de Kant e os deveres Prima Facie de Ross os principais exemplos do não consequencialismo de regras . Em suma, deinir e analisar termos e conceitos importantes, como universalizabilidade, imperativo cateǵrico, reversibilidade, seres humanos como ins e não meios e deveres prima facie. Vimos, no t́pico anterior, que muitas vezes ́ difícil, quando não impossível, controlar as consequências de nossas ações. No entanto, podemos controlar diretamente o que escolhemos fazer ou não fazer. Em uma análise não consequencialista, as consequências ou possíveis resultados de nossas ações são irrelevantes quando se trata de fazer juízos morais HEGEN”ERG, b . Em vez disso, as ações devem ser julgadas por padrões básicos de certo e errado. O dever, então, ́ fazer a coisa certa, como prescrito pelos padrões morais, ou seja, a ́tica não consequencialista ́ baseada no dever NERI, . “s teorias não consequencialistas da moralidade baseiam-se em algo que não sejam as consequências das ações de uma pessoa. Vimos que, tanto no egoísmo ́tico quanto no utilitarismo, os moralistas estão interessados nas consequências ou resultados das ações humanas. Os egoístas ́ticos estão preocupados com o fato de que as pessoas devem agir em seu interesse pŕprio, e os utilitaristas estão preocupados com o fato de que as pessoas devem agir no interesse de todos os envolvidos. Nessas duas teorias, a bondade de uma ação ́ mensurada pelo quão bem ela atende aos interesses de algúm, enquanto a bondade de um ser humano ́ mensurada na medida em que ele executa tais ações e realmente causa boas consequências. “ coisa mais importante de lembrar quando se discute as teorias não consequencialistas ́ que seus proponentes airmam que as consequências não participam, e na verdade não deveriam participar, do juízo de ações ou pessoas se as mesmas são morais ou imorais. Os atos devem ser julgados unicamente no quesito de se eles são corretos e as pessoas unicamente no quesito de se elas são 61 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA boas, com base em algum outro padrão ou padrões muitos não consequencialistas diriam padrão superior" de moralidade CORTIN“ M“RTÍNEZ, . Ou seja, os atos ou as pessoas devem ser julgados morais ou imorais, independentemente das consequências das ações. O exemplo mais ́bvio de tal teoria ́ a Teoria do Comando Divino . Esta teoria sustenta que se algúm acredita que existe um Deus, deusa ou deuses, e que Ele, ela/eles criaram uma śrie de comandos mandamentos, ordenamentos morais, então uma ação ́ correta e as pessoas são boas se, e somente se, obedecerem a esses comandos, independentemente das consequências que podem advir R“CHELS R“CHELS, . Por exemplo, Joana d'“rc estava agindo sob as instruções do que ela sentia ser vozes de Deus. Os egoístas ́ticos provavelmente considerariam seu martírio como não tendo sido em seu interesse pŕprio. Eles estariam preocupados com as consequências de suas ações sua tortura e morte ao recusar-se negar as vozes. No entanto, o térico do Comando Divino declararia que se deve obedecer a um Ser sobrenatural e aos seus mandamentos transmitidos aos seres humanos atrav́s de vozes ou de qualquer outro meio , independentemente das consequências, simplesmente porque esse Ser ́ bom e nos diz o que ́ que devemos fazer HOOFT, . O que ́ bom, e o que ́ correto, ́ o que este Ser declarou que ́ bom e correto. O fato de que as consequências podem envolver a perda de vidas, por exemplo, não tem nada a ver com a moralidade ou imoralidade de um ato ou uma pessoa. Devese apenas aceitar quaisquer consequências que surjam. Esta teoria ́ provavelmente o exemplo mais claro de uma teoria não consequencialista da moralidade, mas não ́ a única teoria. Na verdade, nem precisamos que tal teoria fundamente-se na existência de um Ser sobrenatural. 2 TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DE ATO “ssim como o utilitarismo se divide em duas categorias ato e regras , o mesmo acontece com as teorias não consequencialistas. Lembre-se, no entanto, que a principal diferença entre o utilitarismo de ato e de regras e o não consequencialismo de ato e de regras ́ que os primeiros são baseados nas consequências, enquanto os últimos não são M“NCUSO P“COMIO, . No entanto, alguns dos problemas e desvantagens das teorias são semelhantes, como veremos a seguir. Os não consequencialistas de ato aderem à suposição de que não há nenhuma regra ou teorias morais gerais em absoluto, mas somente ações, situações, e pessoas particulares sobre as quais ńs não podemos generalizar. Consequentemente, ́ preciso abordar cada situação individualmente como algo único e, de alguma forma, decidir qual ́ a ação correta nessa situação ISR“EL H“Y, . É o "como ńs decidimos" nesta teoria que ́ mais interessante. “s decisões para os não consequencialistas de ato são "intuicionistas", ou seja, o que uma pessoa decide em uma situação particular, pela razão de que ela não pode usar quaisquer regras ou padrões, ́ baseado no que acredita ou sente ou intui como sendo a ação correta a adotar. Este tipo de teoria, então, ́ altamente individualista – os indivíduos devem decidir o que sentem que seja a coisa certa a 62 TÓPICO 3 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE fazer, e depois colocar isso em prática. Não se preocupam com as consequências – e certamente não se preocupam com as consequências de outras situações –, ou com pessoas que não estão imediatamente envolvidas nesta situação particular. Todavia, devem fazer o que consideram correto, dada esta situação particular e as pessoas envolvidas nela. Esta teoria ́ caracterizada por dois slogans populares da d́cada de Se isso te faz sentir bem, faça-o e Faça do seu jeito . Tamb́m tem uma base mais tradicional nas teorias intuicionistas, emotivas e não cognitivas da moralidade POJM“N, . O que essas teorias parecem enfatizar ́ que a moralidade no pensamento, na linguagem e na ação não se baseia na razão. “lgumas dessas teorias sugerem at́ mesmo que a moralidade não pode ser racionalizada, porque não se baseia na razão da mesma maneira que a experimentação cientíica e airmações factuais sobre a realidade. “ "teoria emotiva", conhecida como emotivismo H“RE, , por exemplo, airma que as palavras e sentenças ́ticas fazem realmente apenas duas coisas expressam os sentimentos e atitudes das pessoas e evocam ou geram certos sentimentos e atitudes nos outros. 2.1 INTUICIONISMO Neste ponto ́ importante discutirmos o signiicado de intuição e sua relação com a moralidade. Em seu livro Direito e Razão , “ustin Fagothey enumera algumas razões gerais para aceitar ou rejeitar a intuição como base para a moral. “s razões gerais que apoiam o intuicionismo moral são qualquer pessoa bem-intencionada parece ter um sentimento imediato de certo e errado os seres humanos tinham ideias e convicções morais muito antes que os iĺsofos criassem a ́tica como um estudo formal nosso raciocínio sobre questões morais geralmente ́ usado para conirmar nossas percepções mais diretas ou "intuições" e nosso raciocínio pode dar errado em relação a questões morais, assim como outras questões, e então devemos retornar aos nossos insights morais e intuições F“GOTHEY, , p. . Esses argumentos apresentam a intuição como uma forma mais elevada de raciocínio, indicando que os seres humanos têm insights morais profundos que têm valores em si mesmos. Há pelo menos quatro argumentos fortes contra o intuicionismo moral H“RE, R“CHELS R“CHELS, . Primeiro, algumas pessoas descrevem a intuição como "palpites", "inspirações irracionais" e "clarividência", entre outros signiicados que carecem de respeitabilidade cientíica e ilośica. Em suma, ́ difícil deinir a intuição, e ́ ainda mais difícil provar sua existência. Em segundo lugar, não há nenhuma prova de que tenhamos um conjunto de regras morais inatas com as quais podemos comparar nossos atos para ver se eles são ou não morais. Em terceiro lugar, a intuição ́ imune à crítica objetiva porque se aplica apenas ao seu possuidor e porque as intuições diferem de uma pessoa para a outra. 63 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA Em quarto lugar, os seres humanos que não possuem intuições morais não teriam nenhuma ́tica ou teriam que estabelecer sua ́tica em outras bases. 2.2 CRÍTICAS AO NÃO CONSEQUENCIALISMO DE ATO O maior problema para o não consequencialismo de ato pareceria ser o terceiro argumento listado no parágrafo precedente, porque se as intuições diferem de pessoa para pessoa, como podem os conlitos entre intuições opostas ser resolvidos? Tudo o que poderíamos dizer ́ que discordamos das intuições da outra pessoa. Não teríamos nenhuma base ĺgica para dizer "Sua intuição está errada, enquanto a minha está correta". “s intuições simplesmente não podem ser arbitradas como o podem ser as razões e juízos de evidência. Portanto, qualquer teoria da moral baseada apenas em intuições, como o não consequencialismo de ato, ́ altamente questionável H“RE, . Outras críticas ao não consequencialismo de ato são estas R“CHELS R“CHELS, . Como sabemos que o que intuímos – sem mais nada para nos guiar – será moralmente correto? . Como podemos saber quando temos fatos suicientes para tomar uma decisão moral? . Sendo a moral tão altamente individualizada, como podemos ter certeza de que estamos fazendo a melhor coisa para qualquer outra pessoa envolvida na situação? . Podemos realmente coniar em nada mais do que nossas intuições momentâneas para nos ajudar a tomar nossas decisões morais? . Como seremos capazes de justiicar nossas ações, exceto dizendo ”em, eu tive uma intuição que era a coisa certa para fazer? Parece ser muito difícil estabelecer uma moralidade de qualquer aplicabilidade social aqui, porque as intuições de qualquer pessoa poderão justiicar qualquer ação que ela poderia tomar. Uma pessoa zangada pode matar aquele que o irritou e depois justiicar o assassinato dizendo "Tive a intuição de que eu deveria matá-lo". Como arbitrar o conlito entre a intuição do assassino e o intenso sentimento da família da vítima e de seus amigos de que o ato estava errado? Este ́ o relativismo moral do mais alto grau, e absolutamente nenhum acordo ́ possível quando as únicas coisas que temos de seguir são as intuições de um determinado indivíduo em um determinado momento. Outra crítica ao não consequencialismo de ato, similar à crítica ao utilitarismo de ato, centra-se na suposição questionável de que todas as situações e pessoas são completamente diferentes, não tendo nada em comum H“RE, . Há, naturalmente, algumas situações altamente únicas para as quais não podem ser estabelecidas regras com antecedência, mas existem muitas outras situações que contêm semelhanças suicientes para que as regras, talvez com algumas exceções ou qualiicações anexadas, possam ser declaradas de forma bastante eicaz. Por exemplo, todas as situações em que algúm ́ assassinado têm pelo 64 TÓPICO 3 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE menos a semelhança de haver um assassino e uma vítima. Pela razão de que a vida humana ́ considerada essencialmente valiosa em si mesma, as regras que regem quando o assassinato ́ ou não justiicado não são difíceis de estabelecer. Nosso sistema jurídico, com suas diferentes categorias de homicídio como o homicídio simples, privilegiado, qualiicado, culposo e doloso ́ um bom exemplo de regras carregadas de importância moral ”R“SIL, . Estes geralmente funcionam bastante satisfatoriamente condenando atos imorais, ao mesmo tempo em que reconhecem circunstâncias atenuantes, alcançando assim um grau signiicativo de justiça e equidade para todos os envolvidos. Essas duas críticas – de que cada ato ́ completamente diferente de qualquer outro ́ simplesmente uma falsa airmação empírica e a diiculdade de coniar unicamente nas intuições individuais – tornam o não consequencialismo de ato um sistema ́tico questionável. “t́ mesmo um "situacionista como Joseph Fletcher , autor da obra Ética Situacional”, airma que em todas as ações ́ticas deve haver pelo menos um fator uniicador, a saber, o amor cristão. Por causa de sua crença religiosa, ele provavelmente deve ser classiicado como um utilitarista de ato e não um não consequencialista de ato. 3 TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DE REGRAS Os não consequencialistas de regras acreditam que há ou pode haver regras que sejam a única base para a moralidade e que as consequências não importam. É o fato de seguir as regras que são os comandos morais corretos que ́ moral e o conceito de moralidade não pode ser aplicado às consequências que sucedem quando se segue as regras. “ principal maneira pela qual as diferentes teorias não consequencialistas diferem ́ nos seus ḿtodos de estabelecer as regras ISR“EL H“Y, . 3.1 TEORIA DO COMANDO DIVINO Conforme descrito anteriormente, a Teoria do Comando Divino airma que a moralidade não se baseia nas consequências de ações ou regras, nem no interesse pŕprio ou em outro interesse, mas sim em algo "superior" a esses meros eventos mundanos que ocorrem nos mundos humano ou natural HOOFT, . ”aseiase na existência de um ser de todo-bondoso ou em seres que são sobrenaturais e que comunicaram aos seres humanos o que deveriam e o que não deveriam fazer no sentido moral. Para sermos morais, então, os seres humanos devem seguir literalmente os comandos e as proibições de tal ou tais seres sem se preocupar com as consequências, o interesse pŕprio, ou qualquer outra coisa. “s diiculdades da Teoria do Comando Divino são inerentes à falta de fundamento racional para a existência de algum tipo de ser ou seres sobrenaturais e à falta de provas de que a sustentação de tal ser ou seres ́ suiciente para tornar racional e útil o sistema ́tico em questão veja o T́pico desta unidade . 65 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA Mesmo que se pudesse provar conclusivamente a existência do sobrenatural, como se poderia provar que qualquer ser sobrenatural ́ moralmente coniável? “s pŕprias regras podem ser moralmente válidas, mas a justiicativa para segui-las independentemente das consequências ́ de fato fraca. “ĺm disso, qual validade teriam as regras se uma pessoa não acreditasse em qualquer tipo de existência sobrenatural? E mesmo se aceitássemos a existência deste ser sobrenatural e seus mandamentos, como poderíamos ter certeza de que estávamos interpretando corretamente? “s interpretações dos Dez Mandamentos variam e muitas vezes entram em conlito HESTER, . Não deve haver alguma base mais clara e geralmente mais aceitável para as regras do que a existência do sobrenatural? 3.2 A ÉTICA DO DEVER DE KANT Outra teoria não consequencialista de regras, muitas vezes chamada de "Ética do Dever" M“RCONDES, , foi formulada por Immanuel Kant e cont́m vários princípios ́ticos. Vejamos alguns destes princípios a seguir. Kant acreditava que nada era bom em si, exceto a boa vontade, e deiniu a vontade como a habilidade humana única de agir de acordo com regras, leis ou princípios morais, independentemente de interesses ou consequências. Depois de estabelecer a boa vontade como o atributo humano mais importante, Kant , então argumentou que a razão era o segundo atributo humano mais importante e que, portanto, era possível estabelecer regras morais absolutas válidas com base apenas na razão, não por referência a qualquer ser sobrenatural ou por evidências empíricas, mas pelo mesmo tipo de raciocínio ĺgico que estabelece verdades tão indiscutíveis em matemática e ĺgica. “ primeira exigência de Kant para uma verdade moral absoluta ́ que ela deve ser logicamente coerente. Isto ́, não pode ser autocontradit́ria como seria a airmação "Um círculo ́ um quadrado". Em segundo lugar, a verdade deve ser universalizável. Isto ́, ela deve ser capaz de ser declarada de modo a se aplicar a tudo sem exceção, não apenas para algumas ou talvez at́ mesmo a maioria das coisas. Isso ́ exempliicado pela airmação "Todos os triângulos são triláteros", para os quais não há exceções. Triângulos podem ser de diferentes tamanhos e formas, mas eles são por deinição indiscutivelmente e universalmente triláteros. Se as regras morais pudessem de fato ser estabelecidas da mesma maneira, como pensava Kant, então elas tamb́m seriam indiscutíveis e, portanto, ĺgicas e moralmente obrigat́rias para todos os seres humanos. É claro que algumas pessoas podem desobedecer a essas regras, mas podemos claramente classiicar essas pessoas como imorais. De certa forma, as ideias de Kant foram brilhantes. Por exemplo, ele poderia estabelecer o fato de que viver parasiticamente seria imoral porque tamb́m seria iĺgico. Ele poderia dizer que o mandamento "sempre seja um parasita, vivendo à custa de outra pessoa" ́ iĺgico porque se todas as pessoas vivessem como parasitas, então às custas de quem poderiam viver? É fácil ver 66 TÓPICO 3 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE que o fato de estar em conlito com o princípio da universalizabilidade causa a inconsistência aqui. Obviamente, algumas pessoas podem ser parasitas, mas não todas. “gora, se pud́ssemos encontrar tais absolutos morais, então um sistema ́tico completamente irrefutável poderia ser estabelecido, e a obediência das regras deste sistema seria o que ́ moral, independentemente das consequências para si ou para os outros. “ principal maneira que Kant nos deu para descobrir esses absolutos morais foi por meio de seu Imperativo Cateǵrico. O Imperativo Cateǵrico pode ser declarado de várias maneiras, mas basicamente airma que um ato seria imoral se a regra que o autorizar não puder ser transformada em uma regra a ser seguida por todos os seres humanos K“NT, . Isso signiica que sempre que algúm está prestes a fazer uma decisão moral, ele deve, segundo Kant, perguntar primeiro "Qual ́ a regra que autoriza esse ato que estou prestes a realizar?" E, segundo, "Pode se tornar uma regra universal para todos os seres humanos?" Por exemplo, se uma pessoa preguiçosa está pensando "Por que eu deveria trabalhar tanto para viver, por que não apenas roubo de todos os outros? . Se esta pessoa está ciente da exigência de Kant, ela terá que se perguntar qual seria a regra para esta ação contemplada. “ regra teria de ser "Eu nunca trabalharei, mas roubarei o que eu preciso de outros seres humanos". Se a pessoa tentar universalizar esta airmação, então esta será "Nenhum ser humano deve nunca trabalhar, mas todos os seres humanos devem roubar o que precisam uns dos outros . Se ningúm trabalhasse, não haveria nada para roubar. Como, então, os seres humanos viveriam? Quem haveria para roubar? É ́bvio que alguns seres humanos podem viver somente roubando dos outros, mas ́ contradit́rio que todos os seres humanos o façam. Segundo Kant , o roubo deve ser imoral porque não pode ser aplicado a todos os seres humanos. Outro exemplo, mais crucial, do Imperativo Cateǵrico de Kant diz respeito à morte de outro ser humano. Kant argumentava que não se podia matar outro ser humano sem violar um absoluto moral porque, para isso, teria que estabelecer uma regra que seria autocontradit́ria "Todo ser humano deve matar todos os seres humanos." Pela razão que o sentido da vida ́ viver , todos matando todos os outros iria contradizer esse signiicado e, portanto, violaria o imperativo cateǵrico e não conseguiria universalizar-se. Matar, então, ́ imoral, e não se deve matar. Outro princípio importante no sistema ́tico de Kant ́ que nenhum ser humano deve ser pensado ou usado apenas como um meio para o im de outra pessoa, que cada ser humano ́ um im único em si mesmo, moralmente falando, ao menos. Esse princípio às vezes ́ referido como o "Imperativo Prático" de Kant. Ele certamente parece ser um princípio importante, se considerarmos a justiça e a igualdade de tratamento como atributos necessários de qualquer sistema moral. “liás, este princípio tamb́m pode funcionar como um antídoto para a "análise custo-benefício", ou o problema "im-justiica-os-meios" mencionado em conexão com ambas as formas de utilitarismo no T́pico . 67 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA Vamos dar um exemplo de como este imperativo prático poderia funcionar na prática a partir do campo da ́tica ḿdica na área de experimentação humana. Kant se oporia a usar um ser humano para ins experimentais "para o bem da humanidade" ou por qualquer outra razão que nos leve a encarar um ser humano como meramente um "meio" para um "im". “ssim, no caso descrito no T́pico sobre a experimentação em bebês para salvar milhões de vidas de crianças no futuro, Kant deinitivamente classiicaria essa experimentação como imoral. Por outro lado, se um procedimento experimental fosse a única maneira de salvar a vida de uma criança e tamb́m fornecesse aos ḿdicos informações que poderiam salvar vidas no futuro, Kant provavelmente o permitiria, porque neste caso um ser humano não se limitaria a ser usado como um meio para um im, mas seria considerado um im em si mesmo, ou seja, o procedimento experimental seria terapêutico para o ser humano envolvido, neste caso, a criança. 3.2.1 Dever ao invés da inclinação Em seguida, Kant falou sobre obedecer a tais regras por um senso de dever. Ele disse que cada ser humano está inclinado a agir de certas maneiras, ou seja, cada um de ńs está inclinado a fazer uma variedade de coisas, como ajudar aos pobres, icar na cama em vez de ir ao trabalho, estuprar algúm, ou ser gentil com as crianças. Pela razão de que as inclinações, de acordo com Kant, são irracionais e emocionais e porque ńs parecemos operar com base no capricho ao inv́s da razão quando ńs as seguimos, as pessoas devem forçar-se a fazer o que ́ moral a partir de um senso de dever. Em outras palavras, temos muitas inclinações de vários tipos, algumas das quais são morais e outras imorais. Se devemos agir moralmente, no entanto, devemos coniar em nossa razão e nossa vontade e agir a partir de um senso de dever. Kant chegou at́ mesmo a dizer que um ato simplesmente não ́ totalmente moral a menos que o dever, em vez da inclinação, seja o motivo por trás dele. Uma pessoa que está meramente inclinada a ser gentil e generosa com os outros não deve ser considerada moral no sentido mais completo em que Kant usa a palavra. Somente se esta pessoa, talvez por causa de alguma traǵdia inesperada em sua vida, já não está mais inclinada a ser gentil e generosa com os outros, mas agora se obriga a ser assim somente por um senso de dever, ś então ela estará agindo de forma totalmente moral. Isso impressiona a maioria das pessoas como sendo uma abordagem muito severa, mas revela a ênfase de Kant em seu conceito de dever, na medida em que se refere ao seguir regras morais claramente estabelecidas e absolutas. Kant acreditava que tinha estabelecido absolutos morais, e lhe parecia ́bvio que, para ser moral, deveríamos obedecê-los por um senso de dever. Com este último ponto estabelecido, parece que inalmente temos um sistema moral bem completo, que não pode ser atacado de forma alguma. Temos "provado" que existem regras morais absolutas que podem ser estabelecidas irrefutavelmente pela razão, que se deve obedecê-las por um senso de dever para 68 TÓPICO 3 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE serem morais, e que todas as pessoas devem ser consideradas como indivíduos únicos que nunca devem ser usados como meio para os ins de qualquer outra pessoa. Para mostrar como Kant levou sua teoria à prática, ́ importante apresentar aqui uma de suas várias "ilustrações". Kant descreve um homem que, em desespero, ainda em posse de sua razão, está contemplando o suicídio. Usando o sistema de Kant, o homem deve descobrir se uma máxima de sua ação poderia ser transformada em uma lei universal para todos os seres humanos, então ele enquadra a máxima da seguinte maneira "Por amor-pŕprio eu deveria acabar com a minha vida sempre que não acabar com ela ́ provável que traga mais mal do que bem". Kant airma então que esta máxima não pode ser universalizada porque ́ contradit́rio acabar com a vida pelo pŕprio sentimento amor-pŕprio que impulsiona algúm a melhorar a vida. Portanto, a máxima não pode existir como uma lei universal para todos os seres humanos, porque ́ totalmente inconsistente em si mesma e com o Imperativo Cateǵrico. Tamb́m viola o Imperativo Prático de Kant – que todo ser humano ́ um im em si mesmo –, porque se o homem se destŕi para escapar de circunstâncias dolorosas, ele usa uma pessoa meramente como um meio para manter condições toleráveis at́ o im de sua vida. No entanto, Kant sustenta que as pessoas não são nem coisas nem meios para os ins de outra pessoa, mas são ins em si mesmas. Portanto, o homem suicida não pode destruir uma pessoa seja ela mesma ou outra pessoa sem violar este princípio. 3.2.2 Crítica à Ética do Dever de Kant Como você pode suspeitar, existem várias críticas signiicativas ao sistema de Kant. Ele mostrou que algumas regras, quando universalizadas, se tornariam inconsistentes e, portanto, poderiam ser consideradas imorais por causa de sua inconsistência. No entanto, isso não nos diz quais regras são moralmente válidas. Kant promulgou várias proibições morais ao estilo dos Dez Mandamentos baseadas em seu sistema moral, tais como "Não matarás", "Não furtarás" e "Não quebrarás promessas" M“RCONDES, . Ele argumentou, por exemplo, que não se deve quebrar uma promessa porque seria inconsistente dizer "Eu prometo que te pagarei em dias, mas não pretendo cumprir minha promessa" ”L“CK”URN, . “ĺm disso, Kant argumentou, você não pode universalizar a regra "Nunca quebre promessas, exceto quando ́ inconveniente para você mantê-las", porque as promessas, então, não teriam sentido, ou pelo menos não saberíamos quando elas teriam ou não sentido. Kant perguntou qual sentido um acordo contratual teria se depois de ter dito "Eu prometo cumprir as cláusulas , , e ", mas a cláusula , diria, "eu posso quebrar esse acordo a qualquer momento, de acordo com a minha conveniência . Suponha, no entanto, que não quebrar uma promessa resultaria em algúm ser gravemente ferido ou at́ mesmo morto. De acordo com Kant, teríamos que cumprir a promessa, e porque as consequências não importam, uma pessoa 69 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA inocente simplesmente teria que ser ferida ou morta ”L“CK”URN, . O que ́, de fato, mais importante manter uma promessa ou impedir que uma pessoa inocente seja ferida ou morta? Um dos problemas aqui ́ que Kant nunca nos diz como escolher entre deveres conlitantes, como obedecer a regras diferentes, mas igualmente absolutas. Temos um dever de não matar e um dever de não quebrar as promessas, mas qual teria precedência quando os dois deveres conlitam? Outra crítica à universalizabilidade e à consistência, como crit́rio da moralidade, ́ que muitas regras de valor moral questionável podem ser universalizadas sem inconsistência FORD, . Por exemplo, há alguma coisa inconsistente ou não universalizável sobre "Nunca ajude algúm em necessidade?" Se uma sociedade fosse constituída por indivíduos bastante autossuicientes, não haveria nada de imoral em não ajudar ningúm. Mesmo se houvesse pessoas necessitadas, o que estabeleceria a necessidade de ajudá-las? Se pessoas em um grupo fossem autossuicientes e estivessem em necessidade, seria inconsistente ou não universalizável que os mantivessem o que tinham e sobrevivessem, permitindo que os outros morressem? Poderia não ser moral sob algum outro tipo de regras ou princípios, mas não seria inconsistente declarar tal regra. Kant respondeu a esse tipo de crítica introduzindo o crit́rio da reversibilidade ZING“NO, , ou seja, se uma ação fosse revertida para o agente de tal ação, esta pessoa quereria que lhe fosse feita tal ação? Isto ́ conhecido de outra maneira como o conceito da Regra de Ouro". Por exemplo, Kant pediria à regra "nunca ajude algúm em necessidade", o que você quereria que fosse feito para você se você estivesse em necessidade? Você gostaria de ser ajudado. Portanto, tal regra, embora universalizável, não seria moralmente universalizável, porque não iria satisfazer o crit́rio de reversibilidade você quereria-isto-feito-a-você . Este crit́rio ajuda a eliminar um pouco mais do que parecem ser regras imorais, mas não ́ uma forma bastante suspeita de contrabandear as consequências? Será que Kant não está realmente dizendo que, embora a máxima "nunca ajude algúm em necessidade" seja universalizável, não ́ moralmente aceitável porque as consequências de tal regra podem ser contraproducentes para a pessoa que a declara? Isso, obviamente, não ́ problema para o consequencialista o utilitarista de regras que estaria mais pŕximo da teoria de Kant se não fosse pelo fato de que o utilitarista considera as consequências importantes , mas Kant disse que regras morais absolutas, e não consequências, são a base da moralidade. Não seria inconsistente para ele, especialmente porque ele fez questão de tal consistência, permitir que as consequências se iniltrem em sua teoria? Outra crítica ao conceito de regras absolutas ́ que deixa em aberto a questão de saber se uma regra qualiicada ́ menos universalizável do que aquela que não ́ qualiicada WOOD, . Kant nunca distinguiu entre fazer uma exceção a uma regra e qualiicar essa regra. Por exemplo, se a regra ́ declarada, "Não quebrarás promessas, mas eu posso quebrá-las a qualquer momento que eu quiser", eu estaria fazendo uma injusta exceção de mim mesmo à regra. Kant pensava que não se deve fazer uma exceção a uma regra geral e certamente não para um único indivíduo. No entanto, o que ocorre se a regra for qualiicada para 70 TÓPICO 3 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE que se aplique a todos "Não quebrarás promessas, exceto quando não quebrar uma promessa gravemente prejudicaria ou mataria algúm? . “qui a exceção se aplica à pŕpria regra e não a algum indivíduo ou indivíduos. Kant certamente tinha um argumento forte a fazer sobre não fazer exceções. “inal, de que serve uma regra se algúm pode fazer uma exceção de si mesmo a qualquer momento que quiser? No entanto, "Não matarás exceto em autodefesa" não ́ menos universalizável do que "Não matarás", e a regra anterior parece estar relacionada à hist́ria dos valores humanos e tamb́m a uma doutrina de justiça muito melhor do que a segunda. Há ainda outra crítica que tem a ver com o conlito entre inclinação e dever que Kant descreveu, e isto ́ o que acontece quando suas inclinações e deveres são os mesmos? Por exemplo, se você está inclinado a não matar pessoas, uma tendência que se encaixa bem com a regra de Kant "Não matarás", que ́ seu dever de obedecer. Isso signiica que, porque você não está inclinado a matar, você não seria uma pessoa moral, porque o seu dever não está lhe afastando de suas inclinações? Muitos moralistas discordam da ideia de que as pessoas não são morais meramente porque estão inclinadas a ser boas em vez de sempre se debater com elas mesmas para serem assim. Kant não acreditava que uma pessoa que age moralmente por inclinação ́ imoral, mas acreditava que tal pessoa não ́ moral no sentido mais verdadeiro da palavra. É verdade que em muitas ocasiões o verdadeiro teste da moralidade pessoal vem quando os seres humanos devem decidir se querem lutar contra suas inclinações por exemplo, roubar dinheiro quando ningúm pode pegá-los e agir por um senso de dever eles não devem roubar porque ́ errado ou porque eles não querem que algúm roube deles . Isso seria motivo suiciente para considerar as pessoas como não sendo totalmente morais se elas levam uma vida boa, não fazem mal aos outros porque não querem, e tamb́m pensam que este ́ seu dever? Com qual tipo de pessoa você se sentiria mais seguro, com a pessoa que está inclinada a não prejudicar ou matar os outros ou a pessoa que tem uma forte inclinação para matar outros, mas se restringe apenas por um senso de dever? Parece que a sociedade tem uma melhor chance de ser moral se a maioria das pessoas se torna inclinada a ser moral atrav́s de algum tipo de educação moral. Outra incoerência na Ética do Dever de Kant ́ que ele era fortemente contra matar e ainda assim era a favor da pena de morte. DICAS Assista aos dois vídeos da aula de Clóvis de Barros Filho, “Desejo x Vontade (Kant)”, em que ele apresenta a teoria moral de Kant. Disponível em: <https://www.youtube.com/ watch?v=ArLm0w5GyPk>. E a aula “A dignidade moral em Kant”, disponível em: <https://www. youtube.com/watch?v=r2_YLWaCCuk>. 71 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA 4 DEVERES PRIMA FACIE DE ROSS Sir William David Ross concordou com Kant que a moralidade basicamente não deve assentar-se nas consequências, mas discordou com o absolutismo inlexível das teorias de Kant. Podemos situar Ross em algum lugar entre Kant e os utilitaristas de regras, na medida em que ele acreditava que temos certos deveres prima facie que devemos sempre aderir, a menos que circunstâncias ou razões śrias nos digam para fazer de outra forma. Nessas circunstâncias excepcionais, o dever real de um indivíduo pode ser diferente do dever prima facie. Em outras palavras, ele não acreditava que as consequências tornavam uma ação certa ou errada, mas ele pensava que ́ necessário considerar as consequências quando estamos fazendo nossas escolhas morais. O termo prima facie signiica literalmente "à primeira vista" ou "à superfície das coisas". Um dever prima facie, então, ́ aquele que todos os seres humanos devem obedecer de uma maneira geral antes que qualquer outra consideração entre em cena. “lguns dos Deveres Prima Facie de Ross são os deveres seguintes . Fidelidade ou lealdade dizer a verdade, manter as promessas reais e implícitas e cumprir os acordos contratuais. . Reparação compensar os erros que izemos aos outros, em outras palavras, fazer reparação por atos ilícitos. . Gratidão reconhecer o que os outros izeram por ńs e estender nossa gratidão a eles. . Justiça impedir a distribuição impŕpria do bem e do mal que não estão de acordo com o que as pessoas merecem ou têm direito. . ”eneicência ajudar a melhorar a condição dos outros nas áreas da virtude, inteligência e felicidade. . “utoaperfeiçoamento a obrigação que temos de melhorar nossa pŕpria virtude, inteligência e felicidade. . Não maleicência não ferir ou causar danos aos outros e prevenir lesões aos outros. “ssim, Ross, como Kant, pensou que existissem regras que todos os seres humanos deveriam aderir porque ́ sua obrigação moral fazê-lo. Ele tamb́m melhorou muito a proposta kantiana na área do que fazer quando deveres especialmente deveres Prima Facie conlitam. Ross estabeleceu dois princípios que podemos invocar ao tentar lidar com o conlito de deveres Prima Facie sempre faça aquele ato de acordo com o dever prima facie mais forte e sempre faça aquele ato que tem o maior grau de retidão prima facie acima da injustiça prima facie. 72 TÓPICO 3 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE 4.1 CRÍTICAS À TEORIA DE ROSS Claramente, há alguns problemas prima facie com as teorias de Ross. Como devemos decidir quais deveres são, na verdade, prima facie? Ross listou alguns desses deveres para ńs, mas baseado em que ele fez isso, e qual justiicação para a evidência ou o raciocínio ele nos ofereceu? Quando confrontado com perguntas sobre como devemos selecionar os deveres prima facie, Ross disse que ele estava airmando que ńs sabemos que eles são verdadeiros. Para mim, parece tão autoevidente como qualquer coisa poderia ser, que fazer uma promessa, por exemplo, ́ criar uma reivindicação moral sobre ńs em outra pessoa. Muitos leitores talvez digam que não sabem que isso ́ verdadeiro. Se assim for, certamente não posso provar isso para eles. Ś posso pedir-lhes para reletir novamente, na esperança de que eles acabem por concordar que eles tamb́m sabem que ́ verdadeiro ROSS, , p. - . Deste modo, Ross está realmente baseando essa seleção de tais deveres na intuição, ou seja, não há ĺgica ou evidência para justiicar suas escolhas, mas devemos aceitar o que ele diz com base na intuição. Se não tivermos as mesmas intuições que ele, então devemos continuar tentando at́ que as tenhamos. Obviamente, isto ́ altamente especulativo e vago em sua aplicação com todos os problemas que encontramos quando discutimos e avaliamos a base intuitiva para o não consequencialismo de ato KOTTOW, . Um segundo problema surge quando olhamos para a maneira pela qual Ross tenta resolver a diiculdade da tomada de decisão ao escolher o dever prima facie correto quando ele entra em conlito com outro SGRECCI“, . “mbos os princípios de Ross são difíceis de aplicar. Ele realmente não nos diz como devemos determinar quando uma obrigação ́ mais forte do que a outra. “ĺm disso, ele não nos dá uma regra clara para determinar o "equilíbrio" de retidão prima facie acima da injustiça. Por conseguinte, não parece haver crit́rios claros para escolher quais os deveres que são prima facie ou para decidir como devemos distinguir entre eles depois de terem sido estabelecidos. 5 CRÍTICAS GERAIS ÀS TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS “ crítica às teorias não consequencialistas em geral ́ esta Podemos e de fato deveríamos evitar consequências quando estamos tentando estabelecer um sistema moral? R“CHELS R“CHELS, . “ĺm disso, as teorias não consequencialistas de regras levantam os seguintes problemas . Por que devemos seguir as regras se as consequências de as seguir podem ser ruins mesmo para alguns, mas tamb́m, em alguns casos, para todos os interessados? . Como podemos resolver conlitos entre regras que são todas igualmente e absolutamente obrigat́rias? 73 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA . Existe tal coisa como uma regra moral absolutamente sem exceções, dadas as complexidades do comportamento e da experiência humana? Se assim for, qual seria? Primeiro, at́ mesmo Kant, que lutou contra as consequências, parece têlas contrabandeado por meio de sua doutrina da reversibilidade ZING“NO, . Mesmo sem essa doutrina, quando algúm pressiona qualquer sistema ́tico o suiciente, perguntando por que algúm deveria fazer as coisas prescritas, as respostas não teriam que trazer as consequências para si, para os outros ou para todos os interessados? Por exemplo, na Teoria do Comando Divino, não seria realmente possível justiicar os mandamentos mais imediatamente aplicáveis e práticos como sendo necessidades ́ticas, quer se acredite ou não que um ser sobrenatural os prescreva aos seres humanos? Poder-se-ia perguntar por que tal ser seria tão sábio ao airmar que os seres humanos não devem matar, roubar ou cometer adult́rio e responder que as consequências de não ter algumas regras nessas áreas seriam muito piores. Se a matança fosse livremente permitida, então a vida das pessoas estaria constantemente em perigo, o crescimento humano não seria capaz de acontecer e não haveria sistemas ou culturas morais, apenas batalhas constantes para evitar a morte. Estes mandamentos e outros como eles ajudam todos os seres humanos a respeitar os direitos de seus semelhantes e trazer alguma estabilidade e ordem em um sistema social que de outra forma estaria em constante estado cático. Em segundo lugar, ́ verdade que Kant inicia sem usar oicialmente as consequências, começando com a inconsistência ĺgica, mas será que as consequências icam realmente fora da questão? Qual ́ o ponto real de qualquer sistema moral se não for fazer o bem para si ou para os outros, ou se não for criar uma sociedade moral na qual as pessoas possam criar e crescer paciicamente com um mínimo de conlitos desnecessários? Seria realmente possível pensar em um sistema de moralidade que não está preocupado com as consequências em algum ponto ao longo de sua elaboração? Muitos sistemas podem tentar justiicar seus imperativos airmando "Você deve fazer isso simplesmente porque ́ certo [ou porque algum ser sobrenatural disse assim, ou porque fazer o contrário seria logicamente inconsistente]". “pesar dessas justiicativas, as prescrições morais de cada sistema são calculadas para causar algumas consequências boas, geralmente para a maioria, se não para todos os seres humanos M“RCONDES, . Terceiro, Ross pelo menos tentou responder à questão de se realmente existem regras morais absolutas. No entanto, muitos téricos, especialmente no śculo XXI, demonstraram haver exceções naquilo que eram considerados absolutos. Estes téricos insistem que não há absolutos, ou são tão poucos que diicilmente se poderia airmá-los. “lguns moralistas – relativistas morais – airmam que tudo ́ relativo e que não há absolutos ”ONJOUR ”“KER, . Outros, como Joseph Fletcher , airmam que há apenas um absoluto, o amor, e que tudo o mais ́ relativo ao amor FLETCHER, . Independentemente de seus argumentos serem convincentes, existe um śrio problema com todas as teorias não consequencialistas, na medida em que a seleção das regras e dos deveres morais parece ser arbitrária e muitas vezes destrutiva do argumento criativo. Não 74 TÓPICO 3 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE se pode argumentar que o assassinato às vezes pode ser justiicado se um não consequencialista declarou simplesmente que, para ser moral, não se deve matar. Um bom exemplo desse tipo de raciocínio sem saída ́ o argumento antiaborto que, sob nenhuma circunstância, uma vida pode ser tirada e que a vida começa na concepção R“CHELS R“CHELS, . Como se pode defender a salvação da vida da mãe ou considerar o tipo de vida que a mãe ou o bebê viverão se tais absolutos já tiverem sido estabelecidos? Por outro lado, como se pode argumentar sobre o valor da vida de um feto se o defensor da pŕescolha tomar como absoluto o direito de uma mulher sobre seu pŕprio corpo, independentemente do que esse corpo cont́m? Qual justiicação poderiam ambos os arguidores oferecer para a validade destes absolutos e por que não poderia haver exceções a eles sob quaisquer circunstâncias? Quando as pessoas estão argumentando as consequências, elas podem pelo menos mostrar que uma ação terá melhores consequências do que outra, mas quando elas estão apenas apresentando "absolutos", não pode haver contraargumentos que sirvam para justiicar exceções. Se simplesmente adotarmos uma regra moral absoluta arbitrária, não consequencialista, então todos os argumentos dos consequencialistas e de outros simplesmente são excluídos. Encerrar o debate desta forma ́ destrutivo para a busca da verdade e da compreensão em outras áreas, como a ciência, mas ́ desastroso na esfera da moral, onde a necessidade de chegar a respostas certas ́ mais crucial do que em qualquer outra área de experiência humana. Em suma, as teorias não consequencialistas da moralidade têm certas vantagens. Primeiro, elas não exigem a difícil tarefa de computar as consequências para uma ação moral. Em segundo lugar, elas fornecem, em sua forma de regra, um conjunto forte de guias morais, ao contrário dos moralistas de ato, tanto das abordagens da moralidade consequencialistas quanto das não consequencialistas. Terceiro, os não consequencialistas são capazes de fundar seu sistema em algo que não seja consequências, evitando assim a armadilha de uma análise de custobenefício da moralidade. Por outro lado, por mais difíceis que possam ser as consequências da computação, os não consequencialistas parecem realmente evitar ponto central da moralidade – certamente da moralidade social – ao tentar ignorar as consequências de suas regras ou atos. Embora seja útil ter uma śrie de regras e guias fortes a ser seguida, o não consequencialismo de regras torna difícil decidir quais regras seriam essas e como classiicá-las em ordem de importância ou resolver conlitos quando os absolutos se opõem uns aos outros. “ĺm disso, o não consequencialismo de regras não prevê nenhuma discussão aberta dos dilemas morais, porque fecha a porta arbitrariamente airmando o que ́ certo e o que ́ errado, sem qualquer possibilidade de exceção. E o que ́ certo e errado ́ baseado nos supostos comandos de um ser sobrenatural a quem ningúm ́ permitido questionar ou sobre uma teoria de consistência ĺgica que pode mostrar que os seres humanos não devem ser inconsistentes, mas oferecem poucas outras razões por que se deve seguir uma regra e não outra. 75 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA “s teorias não consequencialistas de regras não parecem ser mais satisfat́rias do que as consequencialistas. O que vamos fazer, então? Devemos recuar para as teorias consequencialistas com os problemas que as acompanham ou adotar a abordagem não consequencialista como sendo o "menor de dois males"? Ou, poderia haver valor na tentativa de sintetizar o melhor desses sistemas enquanto diminuímos a ênfase no pior. UNI PROBLEMA ÉTICO VOCÊ MATARIA POR CAUSA DO DEVER? Há uma cena dramática no clássico hindu conhecido como o Bhagavad-Gita (ACHARYA; PARAMADVAITI, 2003). Nos momentos antes de uma grande batalha, o mais nobre guerreiro dos Pandavas, e arqueiro extraordinário, Arjuna, tem sérios questionamentos sobre a moralidade da guerra. Ele considera a carnificina que está prestes a acontecer. Ele sabe que no exército oposto dos Kauravas estão seus primos, professores e amigos. Se ele se envolver na batalha, muitos morrerão, talvez mortos por suas flechas. Considerando as consequências e os resultados que seriam prováveis, Arjuna não deseja lutar. No entanto, seu cocheiro Krishna (uma encarnação do deus Vishnu) explica que a obrigação moral de Arjuna reside no desempenho do dever (dharma). Como membro da classe guerreira, seu dever é lutar. Sua escolha é fazer a coisa certa, agir sem levar em conta as consequências, e assim ele luta. Você concorda com o conselho de Krishna e a decisão de Arjuna? Por que ou por que não? Você mataria por causa do dever? Ou as consequências devem ser consideradas? 76 TÓPICO 3 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE LEITURA COMPLEMENTAR BIOÉTICA COMPLEXA: UMA ABORDAGEM ABRANGENTE PARA O PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO INTRODUÇÃO “ ́tica surge na hist́ria da humanidade como uma estrat́gia de organizar o pensamento sobre a adequação do viver humano. “ capacidade de questionar a sua pŕpria existência ́ uma das características que permite identiicar a pessoa humana como tal. “ ́tica, de forma sistematizada e crítica, relete sobre as intuições morais, buscando as justiicativas que servem de embasamento para as escolhas morais que as pessoas fazem. Foram relexões deste tipo que permitiram avaliar o que era estar no mundo, de como as pessoas se relacionam entre si, das suas preocupações e da busca de realização que todos almejam. Estes questionamentos e relexões vêm sendo feitos desde o período da Filosoia Clássica. Com o avanço da ciência, novos desaios foram introduzidos. “ ampliação dos conhecimentos cientíicos e o impacto da sua transposição tecnoĺgica geraram a necessidade de avaliar at́ onde podemos ir. Às discussões sobre o bem-viver foram acrescidos os questionamentos sobre a vida em si, sobre o que ́ estar vivo. “ identiicação de que o ser humano ́ parte da natureza, que ́ um ser que tem interações ativas com seu meio, reconhecendo que pode alterar o seu pŕprio destino e de toda a natureza, introduziu uma nova pauta de questionamentos. Repensar o início e o inal da vida, produzir embriões, congelá-los, ressigniicar os paṕis familiares e o pŕprio conceito e crit́rios de morte foram itens determinantes. Saber reconhecer os limites da pesquisa, identiicando a sua adequação ́tica e metodoĺgica, a existência de grupos e pessoas vulneráveis foram outros temas fundamentais. Tudo isso levou à necessidade de propor uma ampliação da discussão ́tica, que acabou sendo denominada de biótica. UM POUCO DE HISTÓRIA DA BIOÉTICA “ rigor, a ́tica sempre se preocupou com o tema da vida. Os grandes iĺsofos de todos os tempos reletiram sobre questões envolvendo vida, suicídio, morte, nascimento, entre outros temas. No śculo XX, alguns autores propuseram questionamentos sobre o papel do ser humano, da vida, do lugar do ser humano na natureza. “lbert Schweizer, ḿdico, télogo e humanista, em uma palestra proferida em , mas publicada apenas em , introduziu a discussão da sacralidade da vida em todas as suas dimensões. Friz Jahr, pastor luterano, que possivelmente foi o primeiro a utilizar a palavra bioética, propôs a ampliação da noção dos deveres dos seres humanos para com outros seres humanos, tamb́m para com os animais e as plantas. “ssim, bioética foi utilizada no sentido de ampliar a discussão da ́tica para o conjunto de todos os seres vivos. “ldo Leopold, engenheiro lorestal, e Hans Jonas, iĺsofo, em ambientes, situações e ́pocas distintas, d́cadas de 77 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA e , respectivamente, ampliaram a abrangência temporal dos deveres dos seres humanos uns para com os outros, incluindo tamb́m as gerações futuras. “t́ esta proposição, as discussões da ́tica se restringiam ao plano contemporâneo, nos deveres que os indivíduos têm para com seus semelhantes pŕximos, tanto no sentido geográico quanto temporal. Estes dois autores propuseram que todos os seres vivos, mesmo os ainda não existentes, são merecedores de consideração. “ “ssociação Ḿdica Mundial, em , propôs a Declaração de Helsinki visando a provocar uma relexão sobre os aspectos ́ticos envolvidos na pesquisa em seres humanos. Esta Declaração reforçou os termos do Ćdigo de Nuremberg, que, devido a sua origem como parte da sentença do segundo Tribunal de Nuremberg, em , havia tido uma repercussão prática limitada. “ Declaração de Helsinki iniciou uma discussão de abrangência mundial sobre a adequação das formas de utilização de seres humanos em pesquisas. Daniel Callahan, iĺsofo, e Willard Gayling, psiquiatra, criaram, em , o primeiro centro de pesquisa sobre aspectos ́ticos e sociais envolvidos nas ciências da vida – Institute of Society, Ethics and the Life Sciences. Posteriormente, esta instituição passou a ser denominada de Hastings Center, sendo reconhecida internacionalmente como um local de excelência na relexão de temas tão relevantes. Em , Robert Veatch, farmacêutico, que havia rećm-terminado o seu doutorado em ́tica ḿdica, foi o primeiro pesquisador contratado para estudar estes temas. Van Rensselaer Poter, químico e farmacologista, no início da d́cada de , reletiu, de forma integrada, sobre a abrangência das relações entre seres vivos e da necessidade de ampliar esta relexão ao longo do tempo. Poter questionou se a possibilidade de sobrevivência da pŕpria humanidade não dependeria de uma relexão ́tica interdisciplinar, denominada por ele de biótica, que poderia servir de ponte para o futuro . Esta contribuição foi fundamental para a incorporação da biótica como a área de discussão sobre temas emergentes e relevantes para a vida, combinando ciência e ilosoia. “ndŕ Hellegers, ḿdico ginecologista, de forma independente e quase simultânea, propôs, em , a rediscussão do foco da ́tica ḿdica. “ perspectiva tradicional baseada predominantemente na atuação do ḿdico deveria ser ampliada para uma relexão mais ampla sobre temas da área da saúde, incluindo os aspectos sociais a eles associados. Por sugestão de R. Sargent Shriver, então responsável pela Fundação Kennedy, que propiciou os fundos necessários para a realização dessas pesquisas, a denominação biótica foi incorporada ao nome da nova instituição Joseph and Rose Kennedy Institute for the Study of Human Reproduction and Bioethics, por sintetizar a união de temas bioĺgicos e ́ticos. Posteriormente, esta denominação foi alterada apenas para Kennedy Institute of Ethics, reletindo a sua posição de entender a biótica como uma ́tica aplicada. Esta instituição foi a responsável pela formação inicial de muitos proissionais que estavam interessados em atuar em biótica. 78 TÓPICO 3 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE O ”elmont Report, publicado em , estabeleceu as bases da utilização de princípios na relexão biótica. “o utilizar a beneicência, o respeito às pessoas e à justiça como referenciais das diretrizes para a pesquisa em seres humanos nas áreas de saúde e comportamental, este documento oicial do governo norteamericano consolidou a proposta térica predominante do Instituto Kennedy de Ética. Tom L. ”eauchamp, iĺsofo, e James F. Childress, iĺsofo e télogo, então vinculados ao mesmo Instituto Kennedy de Ética, publicaram o seu livro clássico Princípios de Ética ”ioḿdica , onde lançaram as bases da Corrente Principialista de ”iótica. “tualmente, este livro já se encontra na sua quinta edição. Warren Reich, télogo, empreendeu uma importante tarefa ao editar a Encicloṕdia de ”iótica em . Em uma obra de quatro volumes, organizada entre e , procurou compendiar os temas mais relevantes e as bases téricas necessárias para a relexão biótica então emergente. Publicou ainda outra edição, em , desta mesma encicloṕdia, ampliada para cinco volumes. “ partir desta śrie de autores e instituições que deram os primeiros passos da biótica, inúmeros outros se sucederam. “ relexão biótica sobre temas das áreas da saúde e do ambiente se ampliou e aprofundou em diferentes locais do mundo. Na Europa surgiram diferentes perspectivas de abordagem de questões na área da saúde. Na “ustrália, a discussão de temas envolvendo o uso de animais em pesquisa e at́ mesmo em alimentação ganhou grande repercussão. Na “ḿrica Latina, as discussões sobre acesso a sistemas de saúde, sobre pobreza e preservação ambiental se associaram aos grandes temas de discussão mundial, como privacidade, transplantes, reprodução assistida, eutanásia e suicídio assistido. BIOÉTICA COMPLEXA: UMA ABORDAGEM CONTEMPORÂNEA “tualmente, a biótica pode ser entendida como sendo uma relexão complexa, interdisciplinar e compartilhada sobre a adequação das ações envolvendo a vida e o viver. “ biótica ́ uma relexão complexa, pois inclui os múltiplos aspectos envolvidos no seu objeto de atenção ́ interdisciplinar, devido à possibilidade de contar com conhecimentos oriundos de diferentes áreas do saber e ́ compartilhada, por utilizar as diferentes interfaces para realizar diálogos mutuamente enriquecedores. Vale lembrar a diferença existente na língua grega dos signiicados das palavras relativas à vida zoe e bios, descritos por Giorgio “gamben. Zoe se refere à vida natural, à vida nua, ao estar vivo, enquanto que bios ́ a vida política, ́ o bem-viver, ́ o estar no mundo. “s relexões bióticas mais se referem às questões derivadas da palavra bios que de zoe. Muitas vezes, poŕm, as pessoas se confundem e utilizam crit́rios de um para elucidar o outro, chegando a conclusões equivocadas. Um exemplo disso ́ buscar um argumento bioĺgico zoe para estabelecer o crit́rio de pessoa bios . Ora o crit́rio serve, ora não, e a confusão conceitual se instala. 79 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA “ biótica complexa ́ uma proposta de abordagem onde a ́tica se insere na realidade e não apenas a ela se aplica. “ biótica parte de problemas e acaba por reletir sobre situações de complexidade sempre crescente. No processo de relexão e de tomada de decisão, o importante ́ identiicar adequadamente o problema a ser abordado, os fatos e as circunstâncias envolvidos, as alternativas e suas respectivas consequências. Como parte da relexão, devem ser incluídos os referenciais téricos e os casos já ocorridos relacionados ao problema. Todos estes elementos, desde a identiicação do problema at́ a utilização de experiências e vivências pŕvias são passíveis de discussão racional. “ biótica complexa tamb́m leva em consideração outros dois componentes não racionais os sistemas de crenças e valores e a afetividade. Os problemas, os fatos e as circunstâncias O objetivo da biótica complexa ao buscar solucionar problemas não ́ identiicar uma solução ideal, mas buscar achar a melhor solução disponível nas circunstâncias reais. É fundamental reconhecer que algumas vezes as circunstâncias podem ser alteradas, e em outras não assim como algumas delas dependem de ńs e outras não. Os fatos e as circunstâncias devem ser adequadamente avaliados para entender o mais adequadamente possível o problema a ser abordado. Quanto mais informação e de melhor qualidade for coletada, menos ambiguidade estará presente, e assim o pŕprio problema poderá ser melhor compreendido. Na busca de soluções para um problema ́ fundamental levar em consideração as múltiplas alternativas possíveis. Habitualmente, as questões ́ticas são abordadas sob a forma de dilemas, restringindo as alternativas a apenas duas possibilidades de solução. Na área da saúde, as alternativas são múltiplas assim, ́ melhor utilizar a denominação problema ́tico ao inv́s de dilemas ́ticos, com o objetivo de não restringir a pŕpria relexão. Cada alternativa deve ser sempre cotejada com as suas consequências, pois elas constituem a pŕpria ação a ser realizada. “s consequências manifestam e explicitam a ação em si. “s consequências podem ser associadas às circunstâncias. Os referenciais teóricos “ biótica complexa utiliza vários referenciais téricos para buscar justiicativas para a adequação das ações. Os referenciais utilizados são os princípios, os direitos, as virtudes e a alteridade. O modelo baseado em princípios ́, possivelmente, o referencial mais utilizado na biótica. Os princípios eram entendidos na ́tica como recomendações, como diretrizes a serem seguidas. Com a proposta de ”eauchamp e Childress, em seu livro Princípios de Ética ”ioḿdica , os princípios passaram a ser cada vez mais utilizados como sendo deveres prima facie. Deveres prima facie são obrigações que se devem cumprir, a menos que entrem em conlito, numa situação particular, com um outro dever de igual ou maior porte. Um dever prima facie, na perspectiva proposta por William David Ross, ́ obrigat́rio, salvo quando for sobrepujado por outras obrigações morais simultâneas. Desta forma, os deveres prima facie 80 TÓPICO 3 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE podem, quando em conlito, ser ponderados ou priorizados. Inicialmente, William Frankena utilizava apenas dois princípios beneicência, entendida como fazer o bem e evitar o mal, e justiça. O Relat́rio ”elmont ampliou este referencial para três princípios, incluindo o respeito às pessoas, aĺm da beneicência e da justiça. Neste mesmo período inal da d́cada de , ”eauchamp e Childress propuseram um referencial de quatro princípios. Mantiveram a justiça, desdobraram o princípio da beneicência em beneicência propriamente dita fazer o bem e não maleicência evitar o mal , e reduziram o princípio do respeito às pessoas à autonomia. O referencial baseado em princípios ́ uma excelente ferramenta didática, mas que demonstrou ter inúmeras diiculdades na sua transposição para aplicações práticas. “lgumas vezes, devido a sua utilização como um sendo um conjunto de deveres, a ́tica dos princípios, ou principialismo, pode ser entendida como uma moral, ao prescrever normas de conduta. O referencial dos direitos humanos, que estabelece garantias individuais, coletivas e transpessoais tem sido utilizado na elaboração de legislações, como a Constituição brasileira de , e de documentos internacionais na área da biótica, especialmente por parte da UNESCO, como a Declaração Universal de ”iótica e Direitos Humanos. Os direitos individuais incluem a vida, a privacidade, a liberdade e a não discriminação, entre outros. Os direitos coletivos, de criação mais recente, se referem à saúde, à educação e à assistência social, como garantias de todos. Os direitos transpessoais, últimos a serem propostos, referem-se às questões ambientais e à solidariedade. “ utilização do referencial dos direitos humanos na biótica surge no mesmo momento em que o dos princípios, ou seja, no inal da d́cada de , com a obra de Elsie ”andman e ”ertran ”andman, poŕm ś mais recentemente tem sido objeto de relexão por muitos outros autores. Muitas vezes o referencial térico dos direitos humanos tem sido confundido com a utilização dos mesmos como militância política. O referencial térico auxilia na argumentação para justiicar uma dada ação, a militância, por sua vez, assume os direitos humanos como sendo a pŕpria justiicação das suas ações políticas. “ ́tica das virtudes vem sendo utilizada desde a Gŕcia. Platão e, especialmente, “rist́teles já utilizavam este referencial. “s virtudes devem ser entendidas como a busca da excelência das ações humanas, como a busca do autoaprimoramento. Uma deinição muito utilizada diz que virtude ́ um traço adequado do caráter de uma pessoa. Devido à perspectiva ideal e individual das virtudes, pouco a pouco ela foi sendo deixada de lado como elemento de justiicação e argumentação. Em período mais recente, este referencial tem sido retomado na perspectiva de rediscutir a busca do autoaprimoramento e da excelência nas atividades proissionais da área da saúde. Por im, a alteridade, mais recentemente, ́ considerada um referencial fundamental e fundante para a biótica. Reconhecer que o olhar do outro ́ que legitima a pessoa, o ressigniica enquanto existente, ́ a marca da alteridade. Entender que esta efetiva interação nos torna pessoas corresponsáveis, estabelecendo uma copresença ́tica, onde não há lugar para a neutralidade, ́ compreender o signiicado e a importância da alteridade para a biótica. “ alteridade ressigniica 81 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA o entendimento da relação proissional-paciente, pesquisador-participante da pesquisa, proissionais de saúde entre si, proissional-família, a partir da noção de corresponsabilidade. “ biótica complexa estabelece inúmeros pontos de contato e complementaridades entre os diferentes referenciais téricos. O princípio da justiça, por exemplo, estabelece o dever de não discriminar qualquer pessoa, podendo ser associado ao direito individual de cada pessoa em particular de não ser discriminada. “ privacidade, outro direito individual, tem como contraparte a conidencialidade, que ́ um dever decorrente do princípio do respeito às pessoas. O princípio da justiça, ao estabelecer, dentre outros, o dever de proteger as pessoas vulneráveis, se associa ao direito transpessoal de solidariedade. “s virtudes, por sua vez, são a base de conduta para a realização destes direitos e princípios. “ temperança, ao usar os recursos na medida da necessidade, a coragem, entendida como a característica de fazer o que deve ser feito, a sabedoria, como o uso do conhecimento de forma adequada, e a justiça, aqui entendida como virtude, no sentido de tratar as diferentes pessoas de forma não desigual, são virtudes básicas. O amor, a maior de todas as virtudes, pode-se dizer, engloba todas as demais, servindo de base e justiicativa para todas as condutas adequadas do indivíduo. “ alteridade ́ o referencial que pode dar unidade às diferentes perspectivas apresentadas pelos princípios, virtudes e direitos. “o reincluir o outro na relação, ao perceber que o olhar do outro ́ que nos torna não indiferentes, a alteridade reconhece a existência desta copresença ́tica e da corresponsabilidade nesta interação. Os casos relacionáveis Utilizar casos relacionáveis ao problema em questão ́ permitir integrar a hist́ria e a vivência ao novo desaio no presente. “ meḿria de situações semelhantes deve basear-se em um repert́rio de situações reais, visando a compreender a relevância dos casos e buscando a coerência nas decisões. Devem ser utilizados apenas casos reais para ilustrar problemas tamb́m reais. Os casos reais apresentam as limitações da pŕpria ação sobre a realidade, como já descrito nas circunstâncias. Os casos hipot́ticos podem mudar, lutuar, sem o compromisso com a realidade. “ compreensão da relevância dos casos passados pode permitir analogias com os atuais de forma não linear. “lgumas vezes casos aparentemente não relacionados podem ter pontos de contato que auxiliam no processo de relexão. Utilizar as decisões passadas para orientar o processo de decisão no presente exige coerência, que não deve ser entendida como rigidez, mas sim rigor metodoĺgico. Mesmo em casos semelhantes, as decisões podem mudar se as circunstâncias mudaram. “ experiência remete para o passado, sempre atual e atualizado, pois a meḿria opera desde o presente. “ experiência ́ um conhecimento mobilizável. 82 TÓPICO 3 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE Os casos ilustram e iluminam a relexão de um novo problema devido a sua total novidade. Nestes casos, nem sempre ́ possível ter casos semelhantes, mas relacionáveis sim. Os sistemas de crenças: as tradições e os interesses Os sistemas de crenças incluem os valores, as tradições e os interesses envolvidos no problema em questão. “s crenças são julgamentos subjetivos da pessoa, referentes a alguns aspectos discrimináveis do seu mundo, que dizem respeito à compreensão que esta pessoa tem de si e de seu meio. De cinco a nove crenças determinam as atitudes das pessoas. Os valores são crenças duradouras em um modelo especíico de conduta ou estado de existência, que pode ser adotado de forma pessoal ou social, e se baseia em conduta anteriormente existente. “ tradição ́ um passado presente, ́ uma referência do passado que atua no presente. “ tradição ́ uma meḿria individual ou coletiva individual porque dá identidade ao indivíduo, e coletiva porque dá sentido de partilha efetiva, de pertencimento. Os interesses são uma satisfação vinculada à representação da existência de um determinado objeto. Em outras palavras, os interesses geram envolvimento, despertam atenção, geram curiosidade. De forma geral, os interesses reduzem as alternativas de solução ao restringirem o foco de atenção. Em suma, os sistemas de crenças lidam no presente simultaneamente com o passado e o futuro. “s tradições são um presente hist́rico, pois baseiam-se na meḿria, na contínua restauração de crenças e condutas. Por outro lado, os interesses são uma antecipação do futuro no tempo presente. A afetividade: os vínculos e os desejos “ afetividade inclui os afetos, as emoções, os sentimentos, as vontades e as não vontades. Dois elementos importantes da afetividade que têm forte inluência no processo de tomada de decisão são os vínculos e os desejos. Os vínculos afetivos têm um importante papel no processo de tomada de decisão. Os vínculos, especialmente os familiares, atuam no sentido de reduzir o impacto dos custos associados aos benefícios decorrentes de uma dada alternativa. Os desejos são uma projeção de futuro no tempo presente, são uma antecipação. Os desejos podem alterar o impacto das consequências associadas às alternativas de solução. Uma alternativa tida como desejo poderá ter suas consequências prejudiciais minimizadas. O desejo interfere no processo de avaliação das consequências mais no sentido de minimizar os custos que de superestimar os benefícios associados. Os desejos muitas vezes são confundidos com as necessidades e as preferências. O desejo não ́ carência, ́ potência. Do desejo podem surgir a coragem e a vontade. “ ́tica e a educação atuam sobre os desejos, orientando-os, transformando-os e at́ mesmo sublimando-os. “ ́tica e a educação associam os desejos às circunstâncias e alternativas, buscando desejar um pouco mais o que ́ e que depende da pŕpria pessoa e menos o que não ́ ou que dela não depende. 83 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À ÉTICA Da mesma forma que os sistemas de crenças, a afetividade tamb́m lida no tempo presente com o passado e o futuro. Os vínculos preservam no presente o que foi integrado no passado e o desejo projeta o futuro no presente, não como antecipação, mas sim como potência. Considerações inais “ relexão ́tica sobre problemas ́ sempre um desaio para todos. Os proissionais de saúde, e especialmente os ḿdicos, que na maioria das vezes são os responsáveis pela tomada de decisão, em situações que envolvem a vida e o viver. “ biótica complexa pode auxiliar neste processo, pode servir como um apoio qualiicado, na busca de justiicativas para a adequação das ações. “ biótica não vai dar respostas, não vai tomar decisões. “ relexão biótica vai ser um elemento a mais na busca de uma relexão adequada sobre estes temas. FONTE: GOLDIM, José Roberto. Bioética complexa: uma abordagem abrangente para o processo de tomada de decisão. Revista da AMRIGS, Porto Alegre, v. 53, n. 1, p. 58-63, jan./mar. 2009. Disponível em: <https://www.ufrgs.br/bioetica/complexamrigs09.pdf>. Acesso em: 27 jun. 2017. 84 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você aprendeu que • Teorias não consequencialistas deontoĺgicas da moralidade. “ suposição básica destas teorias ́ que as consequências não devem participar do nosso juízo de se as ações ou as pessoas são morais ou imorais. • O que ́ moral e imoral ́ decidido com base em algum padrão ou padrões de moralidade que não sejam consequências. • “ suposição principal do não consequencialista de ato ́ que não há nenhuma regra ou teorias morais gerais, mas somente ações, situações e pessoas particulares sobre as quais ńs não podemos generalizar. • “s decisões baseiam-se no "intuicionismo". Isto ́, o que ́ certo ou errado em qualquer situação particular ́ baseado no que as pessoas sentem intuem que seja certo ou errado, esta ́, portanto, uma teoria altamente individualista. • Há várias críticas ao não consequencialismo de ato . Como podemos saber, sem outros guias, que o que sentimos ́ moralmente correto? . Como saberemos quando adquirimos fatos suicientes para tomar uma decisão moral? . Com a moral tão altamente individualizada, como podemos saber que estamos fazendo a melhor coisa para todos os envolvidos em uma situação particular? . Podemos realmente coniar em nada mais do que nossos sentimentos momentâneos para nos ajudar a tomar nossas decisões morais? . Como seremos capazes de justiicar nossas ações, exceto dizendo "”em, senti que era a coisa certa para eu fazer"? • “ principal suposição das teorias não consequencialistas de regras ́ que há ou pode haver regras que são a única base para a moralidade e que as consequências não importam – seguir as regras, que são comandos morais corretos, ́ o que ́ moral, não o que acontece porque se segue a regras. • De acordo com a Teoria do Comando Divino, uma ação ́ correta e as pessoas são boas se, e somente se, obedecem aos comandos supostamente dados a eles por um ser divino, independentemente das consequências. • Existem algumas críticas à Teoria do Comando Divino . “ teoria não fornece um fundamento racional para a existência de um ser sobrenatural e, portanto, tampouco oferece para a moralidade . Mesmo se pud́ssemos provar conclusivamente a existência de um ser sobrenatural, como poderíamos provar que esse ser ́ moralmente coniável? . Como interpretar esses mandamentos mesmo se aceitarmos a existência do sobrenatural? . “s regras fundadas na Teoria do Comando Divino podem ser válidas, mas precisam ser justiicadas em alguma outra base mais racional. 85 • Ética de Dever de Kant. Kant acreditava que ś por meio do raciocínio ́ possível estabelecer regras morais absolutas e válidas que tenham a mesma força de verdades matemáticas indiscutíveis . Tais verdades devem ser logicamente consistentes, não autocontradit́rias . Elas tamb́m devem ser universalizáveis. • De acordo com o Imperativo Cateǵrico, um ato ́ imoral se a regra que o autorizasse não puder ser transformada em uma regra para todos os seres humanos seguirem. • O Imperativo Prático, outro princípio importante no sistema moral de Kant, airma que nenhum ser humano deve ser pensado ou usado apenas como um meio para o im de outra pessoa, mas sim que cada ser humano ́ um im único em si mesmo. • Uma vez que as regras morais foram descobertas como absolutas, os seres humanos devem obedecê-las por um senso de dever, em vez de seguir suas inclinações. • Há críticas ao sistema de Kant . Embora Kant tenha mostrado que algumas regras se tornariam inconsistentes quando universalizadas, isso não nos diz quais regras são moralmente válidas . Kant nunca nos mostrou como resolver conlitos entre regras igualmente absolutas, como "Não quebre uma promessa" e "Não mate" . Kant não distinguiu entre fazer uma exceção a uma regra e qualiicar uma regra. • “lgumas regras, como Não ajude ningúm em necessidade , podem ser universalizadas sem inconsistência, mas ainda têm valor moral questionável. Kant respondeu a essa crítica por meio do crit́rio de reversibilidade, isto ́, a ideia de se você-iria-querer-que-isto-fosse-feito-a-você, ou a Regra de Ouro. No entanto, o crit́rio de reversibilidade sugere uma dependência das consequências, o que vai contra tudo o que Kant pretende fazer em seu sistema. • Kant parece ter enfatizado os deveres sobre as inclinações, ao airmar que devemos agir a partir de um senso de dever e não de nossas inclinações. No entanto, ele não nos deu nenhuma regra para o que devemos fazer quando nossas inclinações e deveres são os mesmos. • Os deveres Prima Facie de Ross. Ross concordou com Kant quanto ao estabelecimento da moral em uma base diferente das consequências, mas discordou das regras excessivamente absolutas de Kant. Ele se situa entre Kant e o utilitarismo de regras em sua abordagem à ́tica. • Ross estabeleceu os Deveres Prima Facie que todos os seres humanos devem aderir, a menos que haja razões śrias por que eles não deveriam. • Ross enumerou vários deveres Prima Facie . Fidelidade . Reparação . Gratidão . Justiça . ”eneicência . “utoaperfeiçoamento . Não maleicência. 86 • Ross ofereceu dois princípios para uso na resolução de deveres conlitantes . Sempre agir de acordo com o mais forte dever Prima Facie . Sempre atuar de forma a obter a maior quantidade de justiça prima facie sobre a injustiça. • Críticas gerais a teorias não consequencialistas Podemos, e deveríamos evitar consequências quando estamos tentando estabelecer um sistema moral? ́ inteiramente possível excluir consequências de um sistema ́tico? qual ́ o sentido real de qualquer sistema moral se não for fazer o bem para si, para os outros, ou para ambos, e se não for para criar uma sociedade moral na qual as pessoas possam criar e crescer paciicamente com um mínimo de conlitos desnecessários? como resolver conlitos entre regras morais igualmente absolutas? Esse problema ́ peculiar para as teorias não consequencialistas de regras qualquer sistema que funcione com base em absolutos rígidos, como faz o não consequencialismo de regras, fecha a porta para continuar a discussão dos dilemas morais. 87 AUTOATIVIDADE O que são, essencialmente, as teorias não consequencialistas deontoĺgicas da moralidade? Como diferem das teorias consequencialistas teleoĺgicas ? Em que acreditam os não consequencialistas de ato? Como diferem dos utilitaristas de ato? Em que os não consequencialistas de regras acreditam? Descreva a Teoria do Comando Divino. Explique o imperativo prático de Kant. 88 UNIDADE 2 RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM A partir desta unidade você será capaz de • descrever as teorias da ́tica da virtude e compará-la às outras teorias ́ticas • examinar a capacidade das teorias ́ticas para fornecer fundamentos aos padrões ́ticos de uma proissão de saúde mental • analisar ḿtodos de resolução de conlitos ́ticos e introduzir os modelos da ́tica situacional e do contextualismo ́tico • introduzir um modelo para fundamentar o agir ́tico e a justiicativa racional do proissional psićlogo. PLANO DE ESTUDOS Esta unidade está dividida em quatro t́picos. No decorrer da unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. T2PICO – “ ÉTIC“ D“ VIRTUDE T2PICO – MODELOS DE R“CIOCÍNIO ÉTICO T2PICO – MODELOS DE R“CIOCÍNIO N“ RESOLUÇÃO DE CONFLITOS ÉTICOS T2PICO – UM MODELO DO PROCESSO DE TOM“D“ DE DECISÃO ÉTIC“ 89 90 TÓPICO 1 UNIDADE 2 A ÉTICA DA VIRTUDE 1 INTRODUÇÃO Depois de ler este t́pico, você deverá ser capaz de descrever as teorias da Ética da Virtude, mostrando como elas diferem das teorias ́ticas consequencialistas ou não consequencialistas. Tamb́m poderá deinir e analisar termos e conceitos importantes, como as virtudes e os vícios. “ssim como descrever a Ética a Nicômaco de “rist́teles e como as virtudes são essenciais para viver uma vida boa. Descrever a ́tica de Confúcio nos “nalectos e explicar as virtudes à luz da noção confucionista de autocultivo e explicar as vantagens e desvantagens da ́tica da virtude no contexto de uma teoria geral da ́tica. “s ́ticas da virtude são ́ticas baseadas no caráter. Este tipo de teoria moral centra-se na questão do tornar-se certo tipo de pessoa. Sua preocupação, idealmente, ́ o desenvolvimento da excelência humana HOOFT, . Desde que as ações luem do caráter, a ́tica da virtude aspira desenvolver pessoas boas e comunidades humanas boas. Podemos então dizer que outra teoria moral que se tornou signiicativa para muitos ́ticos contemporâneos ́ conhecida como a "́tica da virtude". Certamente não ́ uma nova teoria, pois ́ tipicamente associada aos gregos e especialmente a “rist́teles no śculo IV “EC “ntes da Era Comum . Embora suas origens na ilosoia chinesa sejam ainda mais antigas. Essencialmente, esta teoria difere de todas as anteriores que discutimos na primeira unidade, em que se concentra não em consequências, intuições ou regras, mas no desenvolvimento interior dos seres humanos de um caráter moral ou virtuoso por meio do agir tal como uma pessoa boa ou "virtuosa" agiria. 2 DEFINIÇÃO DE TERMOS “o consultarmos um dicionário de língua portuguesa, teremos como deinição de virtude força moral disposição irme e habitual para a prática do bem boa qualidade moral ato virtuoso castidade e modo austero de vida FERREIR“, , p. . Os dicionários de ilosoia descrevem o termo virtude como aquele que designa uma capacidade qualquer ou excelência, seja qual for a coisa ou o ser a que pertença [...] capacidade ou potência em geral [...] capacidade ou potência do homem […] capacidade ou potência moral do homem “””“GN“NO, , p. . 91 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA Como você pode ver, a ênfase está no caráter bom ou virtuoso dos pŕprios seres humanos, e não em seus atos ou nas consequências de seus atos, sentimentos ou regras. Em outras palavras, ́ o desenvolvimento da pessoa boa ou virtuosa que ́ importante nesta teoria moral, e não regras abstratas ou consequências de atos ou regras, exceto quando derivam de uma pessoa boa ou virtuosa ou fazem com que essa pessoa seja boa ou virtuosa. 3 A ÉTICA NICOMAQUEIA DE ARISTÓTELES “ Ética da Virtude deriva da Ética a Nicômaco de “rist́teles , obra dedicada ao seu ilho, Nicômaco. Tal ́tica tem caráter teleoĺgico isto ́, aponta para algum im ou proṕsito . Como disse “rist́teles "“dmite-se geralmente que toda arte e toda investigação, assim como toda ação e toda escolha, têm em mira um bem qualquer e por isso foi dito, com muito acerto, que o bem ́ aquilo a que todas as coisas tendem , . , a, p. . Por exemplo, a arte do ḿdico visa à saúde, a marinhagem visa uma viagem segura e a economia visa à riqueza. Ele prossegue dizendo que o im da vida humana ́ a felicidade, e a atividade básica dos seres humanos ́ o uso da razão – uma atividade virtuosa. Portanto, o objetivo dos seres humanos, segundo “rist́teles, ́ raciocinar bem para uma vida inteira ou completa. “rist́teles está preocupado com a ação, não como sendo correta ou boa em si mesma, mas por ser condutiva ao bem humano ROSS, . Em sua elaboração térica da ́tica, ele parte dos julgamentos morais reais dos seres humanos e diz que os comparando, contrastando-os e ponderando-os chegamos à formulação de princípios gerais “RIST2TELES, . Observem como isso difere da Teoria do Comando Divino e das teorias de Kant e Ross, quanto ao modo como os princípios são estabelecidos. Nas três últimas teorias, os princípios ́ticos são objetivos ou externos aos seres humanos e são estabelecidos pelo sobrenatural ou pela pŕpria razão abstrata. “rist́teles pressupõe que há tendências ́ticas naturais implantadas nos seres humanos e que as seguir com uma atitude geral de harmonia e proporção consistentes constitui uma vida ́tica. “rist́teles descreve seu sistema ́tico como sendo eminentemente baseado no senso comum, na maior parte, fundado como está nos juízos morais do ser humano ideal que, baseado na razão, ́ considerado bom e virtuoso KR“UT, . “rist́teles airma que os seres humanos começam com uma capacidade de bondade, que tem de ser desenvolvida pela prática. Ele diz que começamos fazendo atos que são objetivamente virtuosos, sem o conhecimento de que os atos são bons e sem os escolhermos ativa ou racionalmente. “o praticarmos esses atos, percebemos que a virtude ́ boa em si mesma RICKEN, . Por exemplo, uma criança ́ ensinada a dizer a verdade objetivamente uma virtude por seus pais, e ela faz isso porque eles ensinaram que ela deveria. Eventualmente, ela reconhece que a verdade ́ uma virtude em si mesma, e ela continua a dizer a verdade, porque ela sabe que ́ virtuoso fazê-lo. 92 TÓPICO 1 | A ÉTICA DA VIRTUDE Este processo parece ser circular, exceto que “rist́teles faz uma distinção entre os atos que criam uma boa disposição, por exemplo, dizer a verdade sem saber que isso ́ uma virtude, e aqueles que luem da boa disposição uma vez que foi criada, por exemplo, dizer a verdade porque a pessoa a conhece como uma virtude SILVEIR“, . “rist́teles airma ainda que a pŕpria virtude ́ uma disposição que se desenvolveu a partir de uma capacidade pelo pŕprio exercício dessa capacidade PERINE, . 3.1 O CARÁTER E O FLORESCIMENTO HUMANO Um dos principais atrativos da ́tica de “rist́teles ́ a forma como encoraja o lorescimento humano KR“UT, . Na verdade, a ́tica de “rist́teles está em grande parte preocupada com a questão do que promove a felicidade ou o lorescimento humano e conduz a uma vida humana mais plena e mais feliz. “ palavra grega para felicidade que “rist́teles usa, eudaimonia, tamb́m pode ser traduzida como "lorescimento", plenitude , prosperidade ou "bem-estar" CRUZ, . Virtudes e vícios são compreendidos precisamente nesse contexto. “s virtudes são aquelas forças ou excelências de caráter que promovem o lorescimento humano, e os vícios são aquelas fraquezas de caráter que impedem o lorescimento. “ coragem, por exemplo, ́ uma virtude porque devemos enfrentar e superar nossos medos se quisermos alcançar nossos objetivos na vida. No entanto, o que, exatamente, ́ o lorescimento humano? “ noção de lorescimento ou felicidade humana ́ notoriamente escorregadia, mas a abordagem de “rist́teles ́ útil, mesmo que, em última análise, seja incompleta. Duas linhas de argumento passaram por sua abordagem para determinar o que conta como um lorescimento humano. Por um lado, o lorescimento ́ entendido num contexto funcional. Um martelo, por exemplo, ́ um bom martelo se ele faz bem o que foi projetado para fazer – se martelar bem os pregos. Um violão ́ um bom violão se for capaz de fazer boa música. “rist́teles expressa-se desta maneira no Livro da Ética a Nicômaco Observemos, pois, que toda virtude ou excelência não ś coloca em boa condição a coisa de que ́ a excelência como tamb́m faz com que a função dessa coisa seja bem desempenhada. Por exemplo, a excelência do olho torna bons tanto o olho como a sua função, pois ́ graças à excelência do olho que vemos bem. “nalogamente, a excelência de um cavalo tanto o torna bom em si mesmo como bom na corrida, em carregar seu cavaleiro e em aguardar de ṕ irme o ataque do inimigo. Portanto, se isto vale para todos os casos, a virtude do homem tamb́m será a disposição de caráter que o torna bom e que o faz desempenhar bem a sua função “TIST2TELES, , . , a, p. . Observe, no entanto, que estes são objetos projetados para atender a um proṕsito humano particular, como martelar pregos ou fazer música. Os seres humanos não têm uma função ́bvia na mesma maneira não problemática que os martelos e os violões têm suas funções. 93 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA É claro que, em certos contextos religiosos, os seres humanos têm uma função ou proṕsito ́bvio, e esse proṕsito ́ ordenado por Deus. Dentro dessa visão de mundo, as virtudes têm uma justiicativa muito mais ́bvia são essas forças de caráter necessárias para que possamos cumprir o plano de Deus para ńs. Tal visão pressupõe que nos foi dado um proṕsito por um ser divino e que podemos saber qual ́ a inalidade. Por outro lado, “rist́teles, às vezes, entende o lorescimento em termos do exercício de propriedades únicas SHIELDS, . Considere uma ameixeira. Sua característica única ́ que ela dá ameixas. Consequentemente, uma boa ameixeira será uma que faça isso bem. De forma semelhante, existe uma característica única que separa os seres humanos de outros tipos de seres a capacidade de raciocinar ou pensar. Consequentemente, um bom ser humano será aquele que raciocine bem. O lorescimento humano ́, portanto, deinido em termos de raciocínio ou pensamento – para “rist́teles, em última análise, em termos da vida contemplativa. Quando o lorescimento ́ abordado atrav́s de uma análise da função, “rist́teles tende a enfatizar como a felicidade está relacionada à sabedoria prática SHIELDS, . Pessoas de sabedoria prática, “rist́teles nos diz em Ética a Nicômaco, são pessoas que podem deliberar bem sobre o que ́ bom para sua vida como um todo, não apenas o que ́ bom para parte dela ou o que ́ conveniente. Esses indivíduos, muitas vezes, pensam que o lorescimento tem elementos sociais e políticos profundamente enraizados neles. De acordo com essa concepção de lorescimento, os seres humanos são profundamente sociais por natureza, e a participação na vida comum da cidade-estado, a polis, ́ uma parte essencial de qualquer vida feliz. Felicidade ou lorescimento seria impossível sem comunidade RICKEN, . Podemos chamar a isso de concepção política da felicidade, mas ́ importante reconhecer que a palavra política não carregava conotações negativas para os gregos do tempo de “rist́teles. Para os gregos, o domínio político abrangia praticamente tudo o que se refere à criação de uma vida comum em conjunto. Há uma segunda concepção de lorescimento no pensamento de “rist́teles que existe em uma tensão desconfortável com a primeira. Esta ́ a teoria do lorescimento que deriva do argumento da unicidade SHIELDS, . De acordo com esta concepção, o lorescimento consiste essencialmente na contemplação do bem. O ́cio ́ um pressuposto necessário de tal visão, pois deve haver algum modo de criar o tempo necessário para a contemplação. Esta ́ a concepção contemplativa da felicidade. Considerando que a concepção política vê a felicidade como residindo pelo menos parcialmente na atividade, a concepção contemplativa enfatiza como a felicidade ́ encontrada atrav́s de um afastamento do mundo e de seus assuntos cotidianos. Os pŕprios escritos de “rist́teles sugerem que ele vacila entre essas duas concepções de felicidade PICHLER, . “ssim como estudiosos de “rist́teles, como argumenta Ricken , estiveram divididos sobre qual destas representa sua visão verdadeira ou se as duas concepções podem ser reconciliadas. Se ampliássemos a abordagem pluralista desta questão na ilosoia de “rist́teles, poderíamos dizer que a pŕpria felicidade pode ser entendida de forma pluralista. 94 TÓPICO 1 | A ÉTICA DA VIRTUDE “ felicidade em geral pode ser vista como a satisfação que vem com a consecução dos objetivos mais importantes da vida, mas podemos reconhecer que existe uma ampla variabilidade em metas aceitáveis. “lguns desses objetivos podem estar localizados irmemente dentro do domínio social, e outros podem ser principalmente contemplativos. No entanto, tamb́m podemos reconhecer que existem algumas restrições mínimas impostas a esses objetivos por nossa natureza social e intelectual. “ssim como não podemos encontrar a felicidade em completo isolamento de outras pessoas, tamb́m não conseguimos encontrá-la sem uma relexão signiicativa sobre os objetivos que ńs escolhemos realizar. “mbos os elementos são necessários em uma extensão mínima, mas existe uma ampla variabilidade no peso relativo que damos a um sobre o outro. 3.2 AVALIANDO A CONCEPÇÃO ARISTOTÉLICA DE FLORESCIMENTO Há muito a ser dito em favor do relato de “rist́teles sobre o lorescimento humano, não menos importante, ́ que ́ antirreducionista HINM“N, . “rist́teles não tenta reduzir a existência humana a um único e menor denominador comum. Isso contrasta fortemente com as teorias que reduzem os seres humanos a algum fator único – como a geńtica como faz a sociobiologia , a economia como alguns marxistas e alguns capitalistas tentam fazer , ou o meio ambiente como o behaviorismo mais estrito – que eles têm em comum com outros tipos de seres vivos. “rist́teles vê os seres humanos como únicos entre outros seres vivos e não tenta minimizar ou ignorar esse aspecto dos seres humanos que os torna únicos. No entanto, “rist́teles, às vezes, parece ir quase ao outro extremo, aparentemente procurando apenas pelo denominador comum mais elevado SHIELDS, . Porque o pensar torna os seres humanos únicos, ele o trata como a única coisa que nos torna únicos. Como resultado, em ocasiões ele tem uma noção mais intelectualista e contemplativa da natureza e da virtude humana. Seu erro no raciocínio ́ simples, como podemos ver de outro exemplo. Imagine que você tenha um MP player que tamb́m seja um gravador de voz. O recurso de gravação de voz pode torná-lo único, mas sua excelência ainda está na totalidade de suas funções. Da mesma forma com os seres humanos Sua excelência reside na totalidade de suas funções e poderes incluindo a capacidade de sentir , não apenas na capacidade de pensar. “rist́teles, às vezes, enfatizando demais o papel do pensamento em sua concepção de lorescimento humano, não era suicientemente holístico em sua abordagem. Enfatizamos isso porque muitas vezes o papel positivo de emoções e sentimentos na vida moral ́ negado ou negligenciado. Este ́ um perigo que “rist́teles às vezes, mas nem sempre, sucumbe. Há ainda outra desvantagem para o relato das virtudes de “rist́teles, que compartilha com a maioria das outras abordagens antigas e, em menor medida, as medievais e as modernas. É uma ́tica para a classe dominante, para homens gregos privilegiados, livres e adultos, cujos principais interesses eram a política doḿstica, a guerra e o ́cio. Tal ́tica excluiu completamente as mulheres e a 95 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA maioria dos estrangeiros, muitos dos quais eram tratados como escravos ou menos do que pessoas morais completas. No entanto, a vida que essa classe privilegiada apreciava dependia, em grande medida, do apoio desses grupos excluídos. O ́cio grego, que “rist́teles viu como o pressuposto da ilosoia, ́ baseado nessas desigualdades J“EGER, . O que devemos dizer sobre tudo isso? Claramente, em aspectos importantes, “rist́teles estava no caminho certo. “ssim como claramente vemos que sua visão às vezes era obscurecida ou distorcida, em parte por causa da ́poca em que ele vivia. Podemos aprender com a abordagem de “rist́teles ao lorescimento, mas diicilmente podemos entendê-la como a palavra inal. 3.3 ABORDAGENS CONTEMPORÂNEAS AO FLORESCIMENTO Pensadores contemporâneos – psićlogos, economistas e outros cientistas sociais, bem como iĺsofos – continuaram a tarefa de “rist́teles de entender o lorescimento humano HEGEN”ERG, b . Em termos gerais, suas abordagens se dividem em duas categorias, dependendo de onde localizam os impedimentos primários para o lorescimento humano. Para aqueles que veem as principais barreiras ao lorescimento humano como externas a qualquer indivíduo em particular, sua abordagem de uma vida lorescente normalmente irá estressar fatores externos e sociais. Para aqueles que veem os principais obstáculos ao lorescimento humano como internos ao indivíduo, o lorescimento ́ geralmente retratado principalmente em termos internos e psicoĺgicos. “ abordagem externa ou social ao lorescimento humano abrange uma ampla gama de diferentes tipos de fatores que afetam o bem-estar humano. “lguns são ́bvios muitas pessoas sentem que fatores econômicos, por exemplo, desempenham um papel importante na determinação do desenvolvimento humano. “qui, o lorescimento ou o bem-estar podem ser descritos em termos de fatores objetivos, como o padrão de vida. “queles que conseguem certo nível de bem-estar econômico são ditos lorescentes, e aqueles que se afastam do nível mínimo não são vistos como lorescentes. Economistas e cientistas sociais estão profundamente preocupados com esta questão e procuram desenvolver índices de bem-estar em uma sociedade. Um dos conceitos mais intrigantes, defendido por Robert Putnam , ́ a ideia de que as sociedades possuem certa quantidade de "capital social" que funciona para fortalecer as comunidades e permitir que o caráter individual loresça mais plenamente. Outros tipos de fatores externos podem ser menos ́bvios para a maioria de ńs. Pense, por exemplo, na relação entre a arquitetura e o lorescimento humano. “s formas como estruturamos nossos ambientes de vida e trabalho reletem e afetam nossas interações com outras pessoas. Locais de trabalho sem áreas comuns para funcionários incentivam um isolamento e separação de colegas de trabalho que não são encontrados tão facilmente em ambientes de trabalho que estimulam 96 TÓPICO 1 | A ÉTICA DA VIRTUDE a interação GÜNTER GUZZO PINHEIRO, . Casas em que todas as cadeiras estão voltadas para a televisão reletem uma concepção diferente de felicidade do que casas em que as cadeiras são situadas de frente para si DE ”OTTON, . Historicamente, os pensadores ut́picos muitas vezes nos forneceram modelos possíveis de uma vida social que encoraja o lorescimento humano. Muitos desses modelos pressupõem que as pessoas serão felizes ou seja, lorescerão se certas condições materiais e sociais possam ser atendidas FREIT“G, . Muitas versões das teorias sociais marxistas e capitalistas compartilham esse pressuposto. Uma vez que o lorescimento ́ especiicado em termos de condições externas, temos um caminho claro para aumentar a quantidade ou grau de lorescimento na sociedade. Ńs simplesmente temos que aumentar as condições externas necessárias para lorescer, sejam elas especiicadas em termos de renda, cuidados de saúde ou algum outro fator objetivo. Muitos téricos conectaram o lorescimento humano principalmente com algum estado interno. Praticamente todas as abordagens espirituais para o bemestar humano, por exemplo, veem o lorescimento principalmente como um estado da alma que ́, em grande parte talvez inteiramente , independente das condições externas. Da mesma forma, muitos relatos psicoĺgicos do lorescimento enfatizam os fatores internos na psique do indivíduo que afetam o bem-estar. “lgumas abordagens psicoĺgicas analisaram a questão do lorescimento humano, como a Teoria do Fluxo de Mihalyi Csikszentmihalyi , em que enfatiza um estado mental de total envolvimento no processo de uma atividade, ou a abordagem da Psicologia Positiva de Martin Seligman , ao lorescimento e à felicidade autêntica. DICAS Assista ao vídeo de Mihaly Csikszentmihalyi, “Fluidez, o segredo da felicidade”, no qual ele explica a sua Teoria do Fluxo, disponível em: <https://www.ted.com/talks/mihaly_ csikszentmihalyi_on_flow?language=pt-br>. Assista também ao vídeo de Martin Seligman, “Psicologia Positiva”, no qual ele descreve como a psicologia investiga a felicidade e o florescimento humano, disponível em: <https://www.ted.com/talks/martin_seligman_on_the_ state_of_psychology?language=pt-br>. O que ́ comum à maioria dessas abordagens internas ́ o pressuposto compartilhado de que muitas vezes somos o nosso pior inimigo e nos retemos de ter as mesmas satisfações que valorizamos tão altamente. Sabotamo-nos sem perceber o que estamos fazendo. O caminho para a felicidade envolve principalmente a superação das barreiras internas ao lorescimento, e isso geralmente ́ uma questão de disciplina espiritual ou de saúde psicoĺgica. Nesta tradição, o lorescimento ́ principalmente um estado de espírito ou psíquico e não um estado meramente físico. 97 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA 3.4 A ESTRUTURA DAS VIRTUDES EM ARISTÓTELES Ńs já falamos muito sobre virtudes sem realmente deinir o que “rist́teles signiica pelo termo. Vamos remediar essa situação. “ virtude, “rist́teles nos diz, ́ um hábito ou disposição da alma envolve sentimento e ação busca a mediania em todas as coisas relativas a ńs e a mediania ́ deinida atrav́s de razão tal como o homem prudente virtuoso e de sabedoria prática a deiniria. “ virtude conduz, como já vimos, à felicidade ou ao lorescimento humano. Cada um desses elementos na deinição de “rist́teles ́ importante, então vamos pausar para examinar cada parte da deinição. “rist́teles nos diz que a virtude ́ um hexis, termo grego que se refere a uma disposição ou hábito SHIELDS, . Não nascemos com virtudes. Elas não são naturais ou inatas. Em vez disso, elas são adquiridas, muitas vezes atrav́s da prática. “ educação moral para “rist́teles, portanto, se concentra em torno do desenvolvimento do caráter fundamental de uma pessoa, o que “rist́teles chama de psique ou "alma". “ virtude, para “rist́teles, não ́ simplesmente uma questão de atuação de uma maneira particular. Tamb́m ́ uma questão de sentir de certas maneiras. “ virtude inclui emoção e ação SILVEIR“, . “ pessoa compassiva não age apenas de certas maneiras que ajudam a aliviar o sofrimento dos outros, mas tamb́m tem certos tipos de sentimentos em relação ao seu sofrimento. “ inclusão do sentimento na deinição de virtude ́ importante para nossas preocupações aqui, pois, como vimos nos t́picos anteriores da primeira unidade, a exclusão das emoções na vida moral ou pelo menos sua desvalorização leva a problemas signiicativos para as teorias kantiana, utilitaristas e egoístas da moral. O relato de “rist́teles sobre a vida moral em termos de virtude, com sua ênfase no caráter emotivo ou afetivo da virtude, nos permite deixar de lado essa objeção. Uma virtude, diz-nos “rist́teles , envolve encontrar a mediania entre os dois extremos de excesso e deiciência. “ coragem, por exemplo, ́ aquele meio-termo entre covardia deiciência e temeridade excesso . Nas virtudes que contêm vários elementos, pode haver vários vícios associados, dependendo de qual dos elementos está em excesso e quais são deicientes. “ coragem, quando a examinamos mais de perto, tem pelo menos dois componentes medo e coniança ROSS, . Podemos errar em relação a qualquer dos fatores podemos ter muito ou pouco medo, ou podemos ter muita ou pouca coniança em ńs mesmos. O pŕprio “rist́teles sugere que este quadro tripartido nem sempre se aplica. O exemplo que ele dá ́ o assassinato. Não há, ele nos diz, qualquer mediania em relação ao assassinato. É apenas um extremo. No entanto, “rist́teles deve estar confuso sobre este assunto, pois o assassinato não ́ uma virtude nem um vício. É uma ação, não uma qualidade de caráter. Na verdade, a qualidade de caráter relevante seria algo como o respeito pela vida, que ́ uma virtude que pode 98 TÓPICO 1 | A ÉTICA DA VIRTUDE ter extremos. Por um lado, há aqueles com pouco respeito pela vida. Eles matam e ferem outros sem levar em conta a dor e o sofrimento que estão inligindo. Por outro lado, há aqueles que nem pisam em uma formiga. Pode-se argumentar que eles têm um respeito excessivo pela vida. Entretanto, “rist́teles dá duas maneiras de determinar qual seria a mediania atrav́s da razão e atrav́s da observação da pessoa prudente SHIELDS, . Essa dualidade relete a questão de que precisamos tanto de princípios, quanto de pessoas para a vida moral. Em vez de escolher um ou outro, “rist́teles escolhe os dois porque os vê como complementares. Deste modo, segundo “rist́teles, a virtude ́ uma mediania, o meio-termo entre dois extremos, em que ambos são vícios – ou excesso ou deiciência ou defeito . “ virtude moral, então, ́ deinida por “rist́teles como sendo uma disposição de caráter relacionada com a escolha e consistente numa mediania, isto ́, a mediania relativa a ńs, a qual ́ determinada por um princípio racional pŕprio do homem dotado de sabedoria prática. É um meio-termo entre dois vícios, um por excesso e outro por falta , . b a , p. . “ssim, a sabedoria prática ́ a capacidade de ver qual ́ a coisa certa a fazer em qualquer circunstância SPINELLI, . Portanto, uma pessoa deve determinar o que um homem virtuoso com sabedoria prática escolheria em qualquer circunstância que exigisse uma escolha moral e então faria a coisa certa. Obviamente, “rist́teles atribui muito mais importância a uma consciência esclarecida do que a regras téricas pŕvias diferindo de novo do térico do Comando Divino, Kant ou Ross . Então, qual ́ o meio-termo, a mediania entre o excesso e a deiciência, e como a podemos determinar? De acordo com “rist́teles, a mediania na ́tica não pode ser determinada matematicamente. Pelo contrário, ́ uma mediania "relativa a ńs" ou para quem está tentando determinar a coisa certa a fazer CRUZ, . Por exemplo, se dez quilos de alimentos são demais excesso e dois são muito pouco deiciência ou defeito , então seis quilos, que ́ o meio-termo entre estes dois extremos, ainda pode ser muito para alguns e pouco para os outros. Portanto, deve-se escolher a mediania apropriada entre os dois extremos, em relação a si mesmo. “lguns exemplos de meios-termos entre dois extremos, estabelecidos por “rist́teles e tabulados por Sir William David Ross , p. , que estabeleceu a teoria ́tica dos deveres Prima Facie, estão no quadro a seguir. Esta lista parcial lhe dará uma ideia do que “rist́teles queria dizer por mediania entre dois extremos, mas não mostra realmente o que seria o meio-termo "relativo a ńs". Contudo, fornece-nos algumas diretrizes gerais às quais podemos nos referir quando tentamos determinar a mediania "relativa a ńs". 99 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA QUADRO 6 - VIRTUDES ARISTOTÉLICAS Sentimento/Ação Coniança “titude frente à morte ou perigo Prazer sensual “titude frente aos pŕprios desejos Empatia “titude frente ao sofrimento dos outros Vergonha “titude frente às nossas ofensas Excesso Temeridade Meio-Termo Coragem Defeito Covardia Luxúria/Gula Temperança/Moderação “nedonia Pena/d́ Compaixão Insensibilidade Culpa T́xica “rrependimento Indiferença FONTE: Adaptado de Ross (1987) e Van Hooft (2006) “ssim, “rist́teles nos diz que a virtude ́ a disposição da alma/mente atrav́s do raciocínio para encontrar a mediania em todas as coisas relativas a ńs. “ mediania ́ aquele meio-termo entre dois extremos – os extremos do excesso tendo muito de algo e deiciência tendo pouco . “ mediania ́ descrita de forma diferente, dependendo da esfera particular da existência em que estamos buscando o meio-termo. Certas esferas de existência são encontradas em quase todas as culturas PERINE, . “s virtudes, diz-nos “rist́teles, são aquelas forças do caráter que promovem o lorescimento humano. “lgumas dessas forças são forças da vontade KR“UT, . “ perseverança em face de uma tarefa difícil e longa ́ uma virtude da vontade, o que alguns chamaram de Virtude Executiva HOOFT, . “ssim tamb́m ́ a coragem, a capacidade de agir em face dos medos de algúm. Essas virtudes da vontade são em grande parte independentes da bondade moral. “lgúm pode tão facilmente perseverar em uma vida de crime como em uma vida de bondade. Ladrões de banco podem exibir tanta coragem quanto um agente da polícia que tenta capturá-los. Outras virtudes estão mais intimamente relacionadas ao bem moral, e ńs podemos chamá-las de Virtudes Morais ou de Caráter HOOFT, . “ compaixão ́ claramente uma virtude de caráter, pois está diretamente ligada a uma preocupação com o bem moral de uma maneira que a perseverança e a coragem não o estão. No núcleo da compreensão de “rist́teles da vida moral está a sua noção de phronesis, que ́ várias vezes traduzida como "sabedoria", "sabedoria prática", "prudência" e at́ "inteligência" PERINE, . Sabedoria prática, embora o termo pareça ter um ar paradoxal porque a sabedoria geralmente se pensa ser algo contemplativo em vez de ativo, ́ a tradução mais precisa. “o discutir phronesis, “rist́teles está enfatizando dois elementos nesta faculdade de juízo. Primeiro, 100 TÓPICO 1 | A ÉTICA DA VIRTUDE ele enfatiza a dimensão prática de tais juízos, que está essencialmente focada na aplicação de algo geral – uma concepção da vida boa ou seja, de lorescimento humano – a casos muito especíicos. Em segundo lugar, ao chamar isso de sabedoria, enfatizamos o fato de que vai aĺm da mera aplicação mecânica das regras KR“UT, . Desta forma, os juízos morais aristot́licos se distinguem dos simples cálculos do tipo que encontramos no utilitarismo. De fato, phronesis está mais perto da arte do que da ciência. Vamos analisar isso mais de perto. “ sabedoria prática tem vários elementos FURROW, . Envolve a aplicação relexiva e afetiva de uma disposição geral para a ação correta de algum tipo ou seja, uma virtude como a coragem para uma situação particular por exemplo, uma ameaça de um ladrão à luz de uma concepção geral do lorescimento humano. “ssim, existem três elementos principais uma virtude, uma situação particular e uma concepção da vida boa ou do lorescimento humano. “ssim, a sabedoria prática consiste na aplicação de uma excelência especíica de caráter a uma situação particular à luz de uma concepção geral da vida boa. Esta aplicação tem uma dimensão intelectual e afetiva. É um processo de relexão ou um ato de relexão em que tomamos um conceito geral e o aplicamos a um caso especíico. No entanto, ́ acompanhado tamb́m por um processo afetivo pelo qual o indivíduo ordenou corretamente os desejos. Uma parte da sabedoria ́ conhecer a melhor maneira de alcançar um im particular e, para isso, não há um conjunto exaustivo de regras detalhando como determinar em qualquer caso particular quais são os melhores meios. Pelo contrário, ́ uma questão do que “rist́teles chama de astúcia PERINE, . “o discutir esta questão, “rist́teles levanta um ponto interessante e importante sobre a diferença entre sabedoria e mera astúcia. “ pessoa simplesmente astuta ou inteligente, airma “rist́teles , conhece os melhores meios para qualquer im particular, mas não sabe quais os ins que vale a pena perseguir. “ pessoa sábia, ao contrário, não ś sabe a melhor forma de atingir um im particular, mas tamb́m entende quais os ins que merecem ser alcançados. “rist́teles faz o que parece ser uma airmação surpreendente em sua discussão sobre as virtudes você não pode ter uma virtude sem ter as outras, ou seja, há uma reciprocidade das virtudes. Contudo, dada a concepção de “rist́teles sobre a sabedoria prática, isso faz sentido. “s virtudes não existem isoladamente, elas estão conectadas tanto a situações particulares quanto a uma concepção geral do lorescimento humano. Se este for o caso, então, ter qualquer virtude especíica de modo pleno ́ ver como ela se encaixa no esquema mais geral de uma vida boa. E para fazer isso ́ preciso ter as outras virtudes que são necessárias para prosseguir a vida boa tamb́m. Esta visão da relação entre virtudes especíicas e uma concepção geral do lorescimento humano nos permite resolver alguns casos sobre a decisão em relação às virtudes. Tome a coragem como exemplo. Indivíduos temerários e imprudentes enfrentam grandes perigos por coisas de pouco valor. Eles não conseguiram integrar sua capacidade de enfrentar o medo em uma concepção 101 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA maior de lorescimento humano e, como resultado disso, não possuem a total virtude de coragem. Existe uma questão semelhante à compaixão. “ pessoa que sente muita pena ou d́ ́ aquela que responde dando ajuda ou dinheiro de forma irrelexiva e sem uma concepção geral suiciente da vida boa. “ pessoa genuinamente compassiva responderá ao sofrimento dos outros tanto de forma pensativa como emocional e fará isso no contexto de uma concepção da vida boa tanto para a pessoa compassiva quanto para a pessoa em necessidade. Às vezes, ́ difícil saber como responder a problemas morais de uma maneira que mostre sabedoria prática. Pense, por exemplo, no problema da pobreza na sociedade brasileira de hoje. O desaio que enfrentamos como nação ́ como responder às grandes desigualdades econômicas encontradas em nosso meio, especialmente aquelas desigualdades que têm pouco a ver com habilidade ou perseverança. Os programas sociais, como o ”olsa Família, foram destinados a responder desta forma, e muitos destes programas foram parcialmente bemsucedidos. No entanto, os programas foram muitas vezes desenvolvidos e administrados sem uma concepção clara do lorescimento humano ou seja, a vida boa que estamos buscando realizar . Como resultado, as etapas foram motivadas pela compaixão, mas não foram suicientemente orientadas por uma concepção da vida boa. Pense, por exemplo, em projetos de habitação pública. Eles foram bemintencionados na maioria dos casos, mas raramente conseguiram seus objetivos. Eles criaram comunidades mais alienadas e isoladas, cada vez mais incomodadas pela violência e com uma sensação de desesperança e raramente foram orientadas por uma visão realista da vida boa. “prender a ser compassivo de boa maneira, que ́ o sentido desta virtude, ́ realmente difícil. “ssim tamb́m ́ aprender a ser um artista realizado, um ḿdico qualiicado ou um bom pai, mas a diiculdade não ́ motivo para abandonar a tentativa. Seja como for, ́ um motivo para tentar ainda mais. “gora, vamos dedicar um espaço para explorar a virtude na perspectiva das teorias chinesas, em especial o confucionismo. 4 O AUTOCULTIVO MORAL CONFUCIANO No núcleo das teorias chinesas do autocultivo moral está o conceito de virtude. O termo chinês Te virtude pode ser rastreado at́ a dinastia Shang no śculo XII “EC. Onde era entendido como "uma esṕcie de poder que se acumulava ou residia dentro de um indivíduo que agia favoravelmente a um espírito ou a outra pessoa" IV“NHOE, , p. ix . Em etimologias posteriores, o termo Te virtude signiicava "ter um controle sobre algúm, mas esse poder de inluenciar os outros era tal que não podia ser usado para manipular os outros, a im de satisfazer o seu pŕprio interesse IV“NHOE, . Te” ́ o poder inerente ou tendência para afetar os outros e ́, portanto, mais comumente traduzido como "virtude ou poder . 102 TÓPICO 1 | A ÉTICA DA VIRTUDE “creditava-se que o Te poderia ser cultivado e desenvolvido de forma que levaria a uma autotransformação necessária para viver uma vida eticamente plena. “s vidas desses indivíduos transformados, por sua vez, teriam um efeito positivo, dramático e poderoso sobre os outros. O termo, assim, carrega o sentido de autorrealização em que signiica tudo o que uma pessoa pode fazer ou ser como membro de uma comunidade. Como tal, o termo "excelência" pode ser uma melhor tradução do termo Te . Ele denota um indivíduo sobressaindo-se em tornar-se tudo o que se pode ser no sentido de fazer o melhor com o que se tem. “quilo que cada pessoa tem inerentemente ́ o Te , mas a excelência ́ desenvolvê-lo plenamente no contexto de sua pŕpria vida e na sociedade L“U, . Desde a ́poca da dinastia Zhou, aproximadamente no śculo XI “EC, a virtude esteve intimamente ligada ao Estado. Os antigos reis sábios governavam atrav́s da propriedade ritual e dos costumes termo em chinês Lí e não pela lei e pela força, pois os bons governantes exibiam reverência sincera pelo seu passado e se preocupavam em cuidar do bem-estar material e espiritual do povo e manter a harmonia entre ću e terra. O cultivo apropriado da virtude real ou Te era necessário para realizar isso de maneira apropriada, porque permitia ao governante obter o endosso do ću, atrair e reter ministros bons e capazes, e assegurar o respeito e a lealdade dos súditos L“U, ”UENO NETO, . Kongzi ou "Confúcio" “EC disse O governo pela virtude [Te] pode ser comparado à estrela Polar, que comanda a homenagem da multidão de estrelas sem sair do lugar CONFÚCIO, , . , p. . Era por meio do cultivo apropriado do Te que um excelente líder era capaz de exercer um efeito tão poderoso e abrangente sobre a sociedade. Foi Confúcio e seus seguidores que trabalharam as bases para um programa abrangente de autocultivo moral IV“NHOE, . 4.1 OS ANALECTOS CONFUCIANOS Nenhum pensador inluenciou a ́tica da Ásia mais do que Confúcio. Ele ́ o maior professor da China e suas lições são profundamente humanistas, enfatizando as responsabilidades que as pessoas têm entre si com o objetivo de produzir e manter uma sociedade justa e ordenada. Confúcio viveu durante um período de agitação política e caos, conhecido como o Período das Primaveras e Outonos, uma ́poca que imediatamente precedeu o Período de Estados Combatentes, e suas percepções morais prevaleceram e se tornaram a base para a longa estabilidade da China como civilização e como nação COUTO, . Para Confúcio, os seres humanos são fundamentalmente sociais de natureza. Um indivíduo ́ nascido em uma família e ́ membro de uma comunidade e de uma nação que era considerada como uma família extensa ou "grande" ”UENO NETO, . Em outras palavras, a identidade está sempre ligada ao grupo e aos relacionamentos dentro da ordem social. Como um eu relacional, o indivíduo ocupa certos paṕis sociais que carregam responsabilidades correspondentes 103 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA IV“NHOE, . Em um mundo chinês, a unidade fundamental ́ a família, enquanto o Estado ́, de fato, a família como um mandato ampliado. O indivíduo enredado e como parte dessa estrutura social, espera-se que ele exerça uma consideração mútua em todas as relações humanas. No confucionismo existem cinco relações cardeais, principalmente de natureza patriarcal e hierárquica, que especiicam deveres e priviĺgios. É dentro da estrutura dessas relações que se realizam as virtudes e atitudes que reforçam a vida cotidiana OUTHW“ITE ”OTTOMORE, . QUADRO 7 - AS CINCO RELAÇÕES CARDEAIS CONFUCIANAS As Cinco Relações Cardeais Confucianas Governante e súdito Pai e ilho Marido e esposa Irmão mais velho e irmão mais novo “migo e amigo FONTE: Outhwaite e Bottomore (1996, p. 124) Discutimos a relação entre governante e súdito anteriormente em nossa apresentação da virtude real Te e da propriedade e dos costumes rituais Li . Nos “nalectos, Confúcio , . , p. expressa assim Guie-o por meio de editos zheng , mantenha-o na linha com punições xing , e o povo se manterá longe de problemas, mas não será capaz de sentir vergonha. Guie-o pela virtude Te , mantenha-o na linha com os ritos Lí , e o povo, aĺm de ser capaz de sentir vergonha, reformará a si mesmo . Podemos ver, portanto, que Confúcio percebe uma clara diferença entre fazer a coisa certa e ser uma boa pessoa. Todos os relacionamentos confucianos são governados pela prática de Shu, "reciprocidade". O pai deve cuidar do ilho, dar proteção e fornecer educação. Em troca, o ilho deve praticar piedade ilial. “ceitar instrução, orientação e direção do pai e cuidar dele na velhice. “ĺm disso, o ilho mais velho deveria realizar a cerimônia de sepultamento de acordo com os procedimentos costumeiros e honrar os antepassados CONFÚCIO, . Como marido, o homem ́ a cabeça da casa e cuida dos deveres da família e provê para sua esposa e família. “ĺm disso, ele deveria ser honrado e iel. “ posição da esposa ́ subordinada ao marido. Ela deve cuidar da casa e ser obediente ao marido. Há um velho ditado na China "O marido canta e a esposa harmoniza" HSU, , p. . “ĺm disso, a esposa deve atender às necessidades de seu marido e cuidar das crianças. O irmão mais velho deve dar um exemplo de bom comportamento e cultivar reinamento para as crianças mais novas. O irmão mais novo, por sua vez, mostra respeito ao irmão mais velho por causa de sua experiência e caráter. 104 TÓPICO 1 | A ÉTICA DA VIRTUDE “ amizade ́ uma relação recíproca de respeito entre iguais. É a única relação cardinal que não ́ hierárquica OUTHW“ITE ”OTTOMORE, . “ natureza das relações confucianas nos diz que, embora devamos mostrar respeito igualmente a todos, nem todos são iguais. Há um lugar para a autoridade legítima e ́ apropriado mostrar deferência a essa posição de autoridade. Com o passar do tempo, as relações e seus paṕis correspondentes e responsabilidades mudam – o ilho mais velho se torna marido e pai e os ilhos tornam-se pais. Nos relacionamentos confucianos cada pessoa compreende seu lugar em relação aos outros, e a virtude ś faz sentido dentro das relações interpessoais. “s virtudes confucianas são assim decididamente de natureza social. 4.2 HARMONIA CONFUCIONISTA Um estudo do pensamento chinês sugere que seu objetivo ́ alcançar uma grande harmonia. À luz desta noção de harmonia, discutiremos as duas principais virtudes confucianas, a saber, o termo Ren”, traduzido diversas vezes como amabilidade humana, benevolência, bondade ou humanidade, e o termo Lí , traduzido como ritos, propriedade ritual, ou adequação ”UENO, . Ren, etimologicamente se referia a "membros de um clã" em oposição àqueles fora do clã ou forasteiros. Dentro do clã referia-se à tolerância em relação a outros membros que não era estendida para aqueles fora do clã. Seu comportamento era humanitário e acabou se tornando um termo geral para o ser humano, distinguindo assim o "humano" do "animal" e sugerindo uma conduta digna e apropriada de um ser humano como distinta dos brutos. Caracteriza-se pela Regra de Ouro, às vezes chamada de Regra de Prata Confucionista "Não faça aos outros o que você não gostaria que izessem a ti mesmo IV“NHOE, , p. . Ren ́ a principal virtude confucionista e destaca e realça a relação natural entre o indivíduo e a comunidade. Na verdade, o termo Ren ́ realmente composto de dois caracteres chineses. O primeiro representa a pessoa individual e o segundo ́ o carácter para o número dois. Portanto, o ideograma para Ren ́ "um-ser-comoutros" ”R“NNIG“N, , p. . O self chinês ́ um self relacional. “ pessoa ́ um "indivíduo" apenas em relação aos outros e essas relações constituem a pŕpria identidade. O estudioso confuciano Roger “mes , p. descreve assim “ comunidade ́ um projeto de revelação. Essa inseparabilidade da integridade pessoal e da integração social colapsa a distinção entre meios e ins, tornando cada pessoa um im em si mesmo e uma condição ou meio para todos os outros na comunidade serem o que são. O modelo ́ de mutualidade. O Ren tenta harmonizar interesses individuais com o bem da comunidade. No entanto, em todos os casos o primado se estende ao bem comum. Este último ponto conduz logicamente a uma consideração de Lí. 105 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA Lí, a "propriedade ritual", ́ a virtude confucionista que deve ser cultivada se quisermos ser um participante pleno na comunidade. Lí refere-se a todos os paṕis e formas de vida com signiicado investido dentro da comunidade que são transmitidos por meio do costume e da tradição de geração em geração. Se o cultivo da virtude Ren resulta na atitude disposicional adequada que, como ser humano, o indivíduo traz para as relações humanas, então Lí torna possível ao indivíduo exibir uma conduta apropriada em qualquer situação especíica de conduzir-se na presença de um governante, como vestir-se, as maneiras de mesa e etiqueta, padrões de saudação, de graduações, casamentos, funerais e culto aos antepassados. "Lí ́ a expressão concretizada da humanidade" ”R“NNIG“N, , . Lí ́ a apropriação pessoal da tradição e, portanto, da comunidade de uma forma não meramente formal e supericial, mas tamb́m autêntica, sincera e pessoal. Lí traz estabilidade social a uma sociedade e permite que ela funcione bem sem a imposição excessiva de leis e ameaças de punição. O discípulo de Confúcio, Meng Zi ou Mencius “EC , apresentou um confucionismo idealizado e argumentou que os seres humanos são inatamente bons. Isto ́, as pessoas têm uma disposição natural em relação ao bem. Como tal, o autocultivo moral envolve o desenvolvimento e a promoção de verdadeira natureza do indivíduo L“U, . Como "brotos", a virtude precisa ser cultivada e cultivada em plena loração. No entanto, uma igura igualmente grande na tradição confucionista, Xun Zi “EC , ofereceu o que considerava uma interpretação realista do pensamento confucionista. O Mestre Xun ensinou que a natureza humana ́ má. “ natureza humana ́ má porque as pessoas não são, como ensinou Mencius, naturalmente dispostas ao bem, mas inclinadas ao interesse pŕprio. Como os bens são limitados e as pessoas desejam as mesmas coisas, haverá conlito e mal. “ssim, a conduta virtuosa que leva a uma sociedade estável e boa envolve o cultivo disciplinado. Em contraste com Mencius, que descreve o autocultivo moral utilizando a metáfora agrícola da tendência de brotos, Xun Zi descreve o autocultivo moral metaforicamente em termos dos processos severos de endireitar a madeira torta e aiar o metal em uma moagem, ou seja, tornar-se virtuoso não ́ natural, mas estritamente convencional ”UENO, . De qualquer modo, todos os confucionistas concordam que as virtudes são desenvolvidas atrav́s do autocultivo moral at́ se tornarem hábitos e atitudes de caráter. Este processo ́ um processo de não ś se tornar uma boa pessoa, mas tamb́m, de fato, de se tornar plenamente humano. Este ideal moral ́ encarnado na pessoa do Junzi, "pessoa superior" ou "indivíduo cultivado" similar em alguns aspectos ao "homem virtuoso com sabedoria prática" de “rist́teles . No pensamento confucionista, o autocultivo moral ́ sempre um exercício e um reinamento da virtuosidade social IV“NHOE, . 4.3 A ÉTICA CONFUCIONISTA DOS PAPÉIS “s qualidades de excelência e, de fato, a instituição da moralidade na tradição confucionista estão fundamentadas no cultivo da reverência familiar. Os “nalectos de Confucius declaram 106 TÓPICO 1 | A ÉTICA DA VIRTUDE É raro um homem que ́ bom como ilho e obediente [Xiaoti] como jovem ter a inclinação de transgredir contra seus superiores não se sabe de algúm que, não tendo tal tendência, tenha iniciado uma rebelião. O cavalheiro [Junzi] dedica seus esforços às raízes, pois, uma vez que as raízes estão estabelecidas, o Caminho [Dao] daí brotará. Ser um ilho bom e um jovem obediente ́, talvez, a raiz do caráter [Ren] de um homem CONFÚCIO, , . , p. . “ reverência familiar ́ a raiz do Ren que tamb́m pode ser traduzida como bondade ou humanidade ”R“NNIG“N, . Henry Rosemont e Roger “mes , p. xii identiicaram este sistema confucionista da moralidade como "Ética dos Paṕis". Eis o que eles dizem Dada esta centralidade do sentimento familiar na evolução de uma sensibilidade moral confucionista, tentamos com base no Xiaojing – o Clássico da Reverência Familiar – e passagens suplementares encontradas nos outros escritos ilośicos iniciais para articular o que consideramos ser uma concepção confucionista da "́tica dos paṕis". Essa ́tica dos paṕis toma como seu ponto de partida e como sua inspiração a necessidade percebida do sentimento familiar como fundamento no desenvolvimento da vida moral. “mes e Rosemont estão, de fato, colocando a ́tica dos paṕis como uma teoria distintamente diferente das teorias morais básicas que emergiram no curso da tradição ́tica ocidental. Neste livro, a "́tica confucionista dos paṕis" tamb́m ́ considerada como um tipo "novo" de teoria ́tica, juntamente com as teorias tradicionais da ́tica consequencialista e não consequencialista, mas distintas delas. Incluímo-la aqui no t́pico sobre Ética da Virtude porque há conexões ́bvias e imediatas que são frequentemente feitas entre a ́tica de “rist́teles e a ́tica de Confúcio. O argumento aqui ́ que, como o mundo chinês assume uma ontologia inteiramente diferente, não essencialista, um cosmos dinâmico e um mundo humano em que todas as relações são caracteristicamente familiares, a ́tica dos paṕis confucionista ́ distinta como uma teoria ́tica e deve ser entendida em seus pŕprios termos. “ ́tica dos paṕis confucionista não tem equivalente ocidental. O antigo ĺxico chinês cont́m quase nenhum dos termos utilizados no discurso moral ocidental. Por exemplo, o self relacional chinês ́ fundamentalmente diferente da visão iluminista e ocidental contemporânea de um indivíduo como um "agente moral livre, racional e autônomo". “ssim, o confucionista não considera indivíduos abstratos, mas coloca o foco da atenção e da tomada de decisão ́tica em pessoas concretas em uma matriz de relações de paṕis relacionais com os outros. O fundamento dessa ́tica ́ a "reverência familiar" ou o "sentimento familiar" Xiao . O caráter chinês Xiao era representado em um retrato estilizado de uma pessoa idosa de cabelos grisalhos e uma criança pequena, e assim, reletindo a deferência geracional e a reverência que ela engendra. Tradicionalmente foi traduzida como "piedade ilial", mas tal tradução não ressoa bem com os leitores modernos IV“NHOE, S“NTI“GO, . 107 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA Quanto à centralidade de Xiao em uma teoria da ́tica dos paṕis, Rosemont e “mes , p. são explícitos Xiao ́ a base de todos os ensinamentos confucianos, pois sem o sentimento de reverência pela e no interior da família, o cultivo moral e espiritual necessário para se tornar "um ser humano consumado [Ren] e uma "pessoa exemplar" [Junzi] social e politicamente engajada não seria possível. Signiicativamente, essa "́tica dos paṕis" confucionista – como viver otimamente nos paṕis e relações que constituem a si – origina e irradia dos sentimentos familiares concretos que constituem as relações entre crianças e seus idosos e os paṕis interdependentes que eles vivem. Tal sentimento familiar ́ ao mesmo tempo comum e cotidiano, e ao mesmo tempo, sem dúvida, ́ o aspecto mais extraordinário da experiência humana. “ reverência da família, então, ́ tanto o solo como a cola que permeia todas as relações confucionistas. E ́ por meio de paṕis familiares e sociais família extensa que se exerce responsabilidade, se alcança a humanidade e, assim, estende o caminho Dao . “trav́s de vários paṕis e relacionamentos, ao indivíduo ́ possível atualizar virtudes como Ren, Lí e Shu. Como a ́tica dos paṕis confucionista ́ uma ́tica de responsabilidades que requerem ação, ́ uma ́tica robusta que invoca uma imaginação moral criativa que permite ao indivíduo colocar-se no lugar de outro, a im de determinar a fazer o melhor esforço para o resultado mais adequado nas circunstâncias especíicas. 5 ANÁLISE CONTEMPORÂNEA DA ÉTICA DA VIRTUDE “s teorias contemporâneas da ́tica da virtude são primeiramente uma reação contra as teorias morais que tentam encaixar nossa experiência moral em um sistema estabelecido de regras ou de ideais preestabelecidos. Isto ́, as teorias contemporâneas da ́tica da virtude estão em oposição às teorias morais que passaram a dominar o mundo moderno, especiicamente o consequencialismo e o kantianismo. Foram feitas sugestões de que a ilosoia moral moderna está equivocada, hiperformalizada e incompleta M“CINTYRE, S“TTLER, . Os defensores da ́tica da virtude sustentam que a consideração do caráter fornece uma compreensão mais adequada e abrangente da experiência moral, porque capta mais adequadamente as questões e preocupações da vida ordinária. Há uma grande variedade de teorias contemporâneas de Ética da Virtude, e embora a maioria se baseie fortemente nas ideias de “rist́teles, essas teorias se preocupam principalmente em superar as fraquezas percebidas da teoria moral moderna baseada em grande parte nas regras. Tem havido um crescente interesse, e um ressurgimento, de pontos de vista confucionistas da ́tica tamb́m HOOFT, . 108 TÓPICO 1 | A ÉTICA DA VIRTUDE 5.1 ANÁLISE DE ALASDAIR MACINTYRE DA ÉTICA DA VIRTUDE Provavelmente a análise contemporânea mais signiicativa e proeminente da Ética da Virtude, especialmente a versão aristot́lica dela, pode ser encontrada no livro de “lasdair MacIntyre , Depois da Virtude . “o analisar as intenções de “rist́teles, MacIntyre airma que as virtudes são disposições não apenas para agir de maneiras particulares, mas tamb́m para sentir-se de maneiras particulares, o que obviamente enfatiza a criação de um caráter virtuoso em si mesmo, não apenas o seguimento de regras ou o cálculo de boas consequências. É preciso criar sentimentos virtuosos ou inclinações interiores e não simplesmente agir virtuosamente. MacIntyre airmou ainda que agir virtuosamente não ́ agir contra a inclinação como pensava Kant , mas sim agir a partir de inclinações que foram formadas atrav́s do cultivo das virtudes. “ ideia, então, ́ decidir o que o ser humano virtuoso e sábio na prática faria em qualquer situação envolvendo a escolha moral, e então fazer o mesmo. MacIntyre estaria, portanto, airmando que os seres humanos devem saber o que estão fazendo quando julgam ou agem virtuosamente, e então devem fazer o que ́ virtuoso apenas porque ́ assim. “ ́tica da virtude tenta criar o ser humano bom ou virtuoso, não apenas bons atos ou regras e não apenas um robô que segue regras preestabelecidas ou uma pessoa que age por capricho ou tenta conseguir boas consequências. Ela procura inculcar a virtude ao instar os seres humanos a praticar atos virtuosos a im de criar a pessoa habitualmente virtuosa ou boa que então continuará a agir virtuosamente. Muitos eticistas veem isso como constituindo um de nossos principais problemas hoje temos regras e leis e sistemas de ́tica, mas ainda não temos seres humanos ́ticos ou virtuosos. Esses eticistas acreditam que at́ que criemos pessoas ́ticas ou virtuosas, nossas chances de criar uma sociedade moral permanecerão mínimas. “inal de contas, temos tido regras, leis e regulamentos por pelo menos vários milênios e ainda os seguimos tendo, mas ainda a maldade, a imoralidade, o vício e a crueldade parecem estar piorando em vez de melhorarem. Neste contexto, vemos que ́ geralmente aceito que as virtudes são beńicas para os indivíduos e para a comunidade HOOFT, . Um exemplo deste debate pode ser extraído da aprovação de leis contra a discriminação racial. Quando o presidente Harry Truman propôs a integração racial dos militares dos EU“, alguns argumentaram que não se poderia legislar a moralidade SCHLESINGER JR., . Ou seja, poderíamos aprovar leis que obrigam as pessoas a comportar-se de certas maneiras ou a agir de forma diferente do que eles querem ou izeram no passado, mas as leis não podem mudar a maneira como as pessoas se sentem por dentro. “t́ não mudarem os sentimentos, argumenta-se, o indivíduo nunca vai realmente mudar a sua moral. Esta ideia tem seu ponto argumentativo. Entretanto, as visões morais de muitas pessoas mudaram quando a integração racial se tornou a lei nacional nos EU“. Os pontos de vista de muitas outras pessoas, ́ claro, ainda não mudaram, e os críticos dessa visão poderiam questionar se não ́ muito idealista pensar que poderíamos mudar a moralidade das pessoas at́ o ponto em que todo mundo se tornaria uma pessoa 109 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA virtuosa. “ questão então ica ainda sem resposta deinitiva, se as regras e as leis ajudam a criar pessoas virtuosas e em que amplitude , ou apenas as obrigam a agir virtuosamente. Outro ponto a ser ressaltado aqui ́ que tanto o não consequencialismo de ato e as teorias de Kant tentam separar a razão da emoção ou dos sentimentos HEGEN”ERG, b . “ ́tica da virtude, por outro lado, tenta uniicá-los airmando que as virtudes são disposições não apenas para agir de certas maneiras, mas tamb́m para se sentir de certo modo, virtuosamente em ambos os casos HOOFT, . O proṕsito ́ usar o raciocínio sabedoria prática para fazer com que as pessoas façam o que ́ virtuoso e, ao mesmo tempo, inculcar essa virtude no interior para que os seres humanos não apenas raciocinem virtuosamente, mas tamb́m comecem e continuem a se sentir virtuosos. Nenhuma das outras teorias tenta fazer isso. Kant deliberadamente evita o atuar sobre a inclinação quase ao ponto do absurdo, de modo que a questão crítica a ser proposta contra sua teoria ́ "E se as pessoas estão inclinadas a ser virtuosas? Não deveriam agir de acordo com essas inclinações? Kant parece dizer que essas pessoas não seriam tão morais como teriam sido se tivessem agido virtuosamente contra suas más inclinações. Por outro lado, o não consequencialista de ato diz que ńs devemos agir somente em uma base da emoção, ou seja, o que sentimos como correto ou virtuoso em algum momento particular ou em alguma situação particular R“CHELS R“CHELS, . “rist́teles, tal como Kant, icaria horrorizado com tal teoria da moralidade, porque acreditava que a atividade por excelência dos seres humanos era raciocinar bem para alcançar uma vida completa. No entanto, ele tentou, muito mais do que Kant, integrar a emoção ou os sentimentos com a razão, sem excluir o primeiro. “ ́tica da virtude, pelo menos a versão de “rist́teles, nos dá uma maneira de alcançar a moderação entre o excesso e a deiciência HOOFT, . Muitos eticistas acreditam, junto com os gregos, que a moderação em todas as coisas ́ o que os seres humanos devem se esforçar para alcançar. “rist́teles tenta estabelecer meios para alcançar a moderação, codiicando o que constitui o excesso, o defeito e a mediania entre eles, como descrito por Ross, no quadro mostrado anteriormente. Ele tamb́m encoraja a liberdade permitindo que os indivíduos decidam sobre o meio-termo adequado relativo a si mesmos. Novamente, ele parece encorajar uma integração entre sentimento e razão, exortando os indivíduos a usar tanto a razão quanto os sentimentos para decidir o meio apropriado para eles. Para Confúcio , , as virtudes contribuem para a harmonia entre a razão e os sentimentos e para a harmonia entre o indivíduo e a sociedade. 5.2 DESVANTAGENS OU PROBLEMAS Podemos perguntar será que os seres humanos têm um im telos , um proṕsito? Uma das primeiras suposições de “rist́teles ́ que todas as coisas têm um proṕsito ou um im ao qual elas visam. Ele prossegue dizendo 110 TÓPICO 1 | A ÉTICA DA VIRTUDE que o im da vida humana ́ a felicidade, e que todos os seres humanos visam isso. Todavia, será que ́ verdade ou provado que todas as coisas têm um im ou proṕsito? Muitas pessoas argumentam que sim, mas muitos tamb́m argumentam que não está claro se isso ́ correto. Por exemplo, alguns poderiam argumentar que o mundo e tudo o que há nele ocorreu por acaso ou aleatoriamente e que não ́ de todo claro que qualquer coisa em tal universo visa para qualquer im, exceto para sua pŕpria morte ou dissolução. Mesmo se assumirmos que tudo tem um im para o qual visa, o que prova que o im da vida humana ́ a felicidade? Não poderia ser, por exemplo, o conhecimento, a espiritualidade, a morte, o sofrimento ou outras coisas? “ suposição de “rist́teles ́ apenas isso, uma suposição. Muitos poderiam tamb́m argumentar que a felicidade não ́ um im apropriado para a vida humana, mas que algo mais "nobre" seria apropriado, como indivíduos religiosos poderiam argumentar que o im deveria ser o amor de Deus e a esperança de estar com Ele. “ĺm disso, poderiam argumentar que o raciocinar bem para alcançar uma vida completa pode ser a visão de um iĺsofo sobre a inalidade humana, mas por que não poderia ser outras coisas tamb́m? Mais uma vez, “rist́teles fez uma suposição, mas os religiosos podem argumentar que ser espiritual ́ o objetivo humano, e outros iĺsofos podem argumentar que os sentimentos ou as emoções são o objetivo. Muitos defensores contemporâneos da Ética da Virtude não concordam com “rist́teles de que o objetivo inal ́ a felicidade, mas algo mais, por exemplo, responder bem às exigências do mundo como uma questão de disposição HOOFT, . É apropriado questionar o pressuposto de “rist́teles sobre o im último dos seres humanos, mas os desaios à visão de “rist́teles não apresentam uma falha fatal para a Ética da Virtude. Uma segunda grande suposição de “rist́teles ́ que a tendência a ser moral está naturalmente implantada nos seres humanos. Que evidência há para apoiar essa airmação? Muitos poderiam argumentar que a moralidade não ́ alguma característica ou ideia inata, mas algo que ́ ensinado e aprendido com a experiência. “ única tendência que os seres humanos têm ́ ser capazes de raciocinar e a razão por si ś não implicaria necessariamente moralidade, embora muitos eticistas, como Kant e inclusive “rist́teles, considerem que a razão ́ a sua base. Seria então verdade que os seres humanos têm uma tendência natural, inata para ser moral? “lguns argumentam que sim e alguns argumentam o contrário, mas não há evidência ou prova clara de que a suposição de “rist́teles seja verdadeira. O erudito confuciano Xun Zi, como vimos anteriormente, fez a suposição oposta como a base de sua explicação da virtude e do autocultivo moral. Entretanto, um dos problemas mais signiicativos dessa teoria gira em torno das seguintes questões o que ́ a virtude, quais são as virtudes e o que ́ o ideal, ou quem ́ o ser humano virtuoso a quem devemos supostamente emular quando escolhemos nossas virtudes? “lguns eticistas, inclusive “rist́teles, argumentam que tudo o que precisamos saber e fornecer ́ um relato sobre o que constitui o lorescimento e bem-estar humano. Então as virtudes podem ser adequadamente caracterizadas como aquelas qualidades necessárias para promover tal lorescimento e bem-estar. De acordo com MacIntyre , no entanto, houve, e ainda há, profundos conlitos quanto ao que está envolvido no lorescimento e bem-estar humanos. 111 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA O autor supracitado prossegue dizendo que períodos diferentes na hist́ria e iguras hist́ricas desses períodos nos apresentam vários conjuntos de virtudes . Na Gŕcia hoḿrica antiga, um homem era o que ele fazia, ou seja, um homem e seus atos eram considerados idênticos. “ moralidade e a estrutura social eram uma e a mesma coisa em sociedades heroicas. O homem virtuoso ideal era o guerreiro e as virtudes eram força e coragem. . Para “rist́teles, Tomás de “quino e para o Novo Testamento, a virtude ́ uma qualidade que permite avançar para a realização de um im especiicamente humano natural ou sobrenatural . Para “rist́teles, isso era racionalidade e o homem virtuoso ideal era o cavalheiro ateniense. Para Tomás de “quino e o Novo Testamento, as virtudes são f́, esperança, caridade ou amor e humildade, e o homem virtuoso ideal era o santo. . Para ”enjamin Franklin , a virtude ́ uma qualidade que tem utilidade para alcançar o sucesso terrenal e celestial. Seu conceito de virtude era teleoĺgico, como o de “rist́teles, mas de caráter utilitário. Para Franklin, as virtudes eram a limpeza, o silêncio, a diligência e a castidade, entre muitos outros. 6 QUEM É A PESSOA VIRTUOSA IDEAL? Finalmente, “rist́teles airma que devemos decidir o que ́ um ato ou pessoa virtuosa modelando-nos segundo a pessoa virtuosa ideal, todavia, como determinamos quem e o que essa pessoa ́? É possível que cada um nomeie uma pessoa ideal que sentimos que deveríamos emular, mas não chegaríamos a um monte de diferentes tipos de pessoas diferentes, dependendo de nossos pŕprios antecedentes, experiências e desejos? Por exemplo, o ideal hoḿrico de um ser humano virtuoso seria atraente para algumas pessoas, como seria o santo humilde para os outros, ou a pessoa intelectual para outros, mas ńs não agiríamos de forma diferente dependendo de quais traços admiramos? Nenhuma reivindicação ́ feita de que não pud́ssemos concordar com algum tipo de pessoa virtuosa composta, mas a alegação ́ que isso não seria fácil. Como poderíamos dizer que deveríamos agir em conexão com tal ideal quando seria apenas isso um ideal abstrato de um ser humano? “ĺm disso, como saberíamos que de fato conseguimos encontrar a pessoa ideal verdadeiramente virtuosa? Certamente um dos objetivos do ensino da ́tica parece ser a criação de uma pessoa virtuosa ou ́tica. Entretanto, uma coisa ́ tentar fazer com que as pessoas atuem de maneira ́tica e outra ́ assumir que farão atos ́ticos porque já são virtuosos. Teríamos muita diiculdade de obter sucesso, por exemplo, em selecionar algumas iguras públicas e dizer "“qui está a pessoa virtuosa ideal, agora atuem como ele ou ela faz". “ hist́ria mostrou que muitos dos nossos chamados heŕis tinham ṕs de argila , ou pelo menos nem sempre agiram virtuosamente. Observe o número de estudiosos-oiciais corruptos que caracterizaram grande parte da longa hist́ria da China ”UENO, . Esses homens receberam treinamento extensivo nos clássicos confucionistas como uma exigência para o serviço público. 112 TÓPICO 1 | A ÉTICA DA VIRTUDE Olhe quantos presidentes não foram perfeitos em suas vidas privadas e públicas. Muitos deles ainda izeram algum bem para o país e as pessoas nele, mas eles não necessariamente se encaixam em qualquer padrão da "pessoa ideal virtuosa". “lguns téricos contemporâneos da Ética da Virtude, como Christine Swanton , argumentam que as exigências para a virtude não são estabelecidas por um padrão, por exemplo, aquele atingível pelo homem virtuoso e com sabedoria prática de “rist́teles ou o junzi confucionista. Os padrões de conduta virtuosa devem reletir a condição humana manchada por problemas variados e a diiculdade de alcançar a virtude. Sua visão ́ que a virtude ́ um conceito que deve ser sempre compreendido e aplicado contextualmente. "Uma virtude", diz Swanton, "́ uma boa qualidade de caráter, mais especiicamente uma disposição para responder a itens ou reconhecer itens dentro de seu campo ou campos de uma maneira excelente ou suicientemente boa" SW“NTON, , p. . “gora, a noção de uma "maneira suicientemente boa" ́ vaga e, portanto, problemática. Para Swanton, isso signiica que a resposta de algúm deve adequadamente atender às demandas do mundo em uma situação particular na qual a virtude se aplica. Em termos aristot́licos, pode-se dizer que entre os extremos do excesso e da deiciência há uma gama de possíveis respostas que podem ser consideradas virtuosas em relação a uma situação particular. “ Ética da Virtude nos ajuda a ver que uma teoria geral da ́tica deve fornecer uma compreensão do caráter moral. Claramente, a ilosoia moral moderna não conseguiu fazer isso e, portanto, ́ incompleta S“TTLER, . No entanto, as teorias da Ética da Virtude tamb́m são incompletas do modo oposto, porque elas não nos dizem o que devemos fazer em situações especíicas, ou seja, as virtudes não fornecem diretrizes especíicas para a conduta correta. “ĺm disso, as teorias da Ética da Virtude não nos ajudam a analisar questões morais ou a nos engajar efetivamente no raciocínio moral. Este último ponto ́ especialmente importante porque o mundo em que vivemos está se tornando cada vez mais não tradicional. “ĺm disso, o mundo ́ impulsionado por mudanças tecnoĺgicas e sociais de alta velocidade que criam questões de crescente novidade e complexidade. “ capacidade de raciocinar bem sobre questões ́ticas complicadas e pensar em problemas morais globais e contextos multiculturais deve ser uma preocupação primordial da educação moral. O que precisamos ́ de uma educação moral racional não doutrinação em um ćdigo ́tico especíico que permitirá às pessoas aprenderem quais são as questões morais e como lidar com elas. Com uma educação assim, poderíamos esperar que pelo menos os indivíduos soubessem como agir com virtude e ́tica. Prover uma educação assim ́ um dos principais objetivos deste livro. 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS Podemos dizer que o relato de “rist́teles sobre a sabedoria prática nos fornece uma visão útil do pluralismo ́tico. “ pessoa virtuosa sempre age à luz de uma concepção geral do lorescimento humano. Cada uma das teorias morais 113 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA que estudamos na primeira unidade e neste primeiro t́pico da segunda unidade contribui para a nossa compreensão do lorescimento humano, e a pessoa virtuosa de sabedoria prática ́ capaz de equilibrar essas teorias concorrentes em situações particulares, discernindo qual ́ mais moralmente signiicativa em um caso especíico. Considere o exemplo de dizer a verdade. O kantiano nos diz que nunca devemos mentir, pois isso ́ um ato de profundo desrespeito à autonomia da outra pessoa. “ utilitarista de regras olha para as consequências de todos seguindo uma regra particular sobre mentir, e o utilitarista de ato nos encoraja a olhar para as consequências de cada caso antes de decidir se uma mentira ́ justiicada ou não. Os egoístas ́ticos simplesmente nos exortam a agir de uma maneira que maximize o equilíbrio, e não há nada intrinsecamente censurável à mentira como tal. Todas essas considerações são moralmente iluminadoras, e o desaio enfrentado por pessoas virtuosas ́ equilibrá-las em situações particulares. O objetivo não ́ provar um conjunto de considerações corretas e todas as outras erradas. Em vez disso, ́ admitir que todas são relevantes pelo menos at́ certo ponto e, em seguida, buscar o curso de ação que melhor equilibra essas preocupações concorrentes. “ĺm disso, na visão aristot́lica, não ́ simplesmente uma questão de dizer a verdade ou a mentira. Tamb́m ́ uma questão de como a verdade ́ dita com cuidado e consideração sobre seu impacto , quando ́ dito, e para quem ́ dito. O indivíduo virtuoso usa teorias morais para iluminar a paisagem moral e servir de guia para navegar em direção à vida boa. “gora podemos ver como esse relato de sabedoria prática nos permite responder a alguns críticos de “rist́teles. Uma das principais críticas formuladas contra a abordagem da ́tica de “rist́teles ́ que ela não nos diz como agir. “pesar de todas as coisas iluminantes que “rist́teles tem a dizer sobre o bom caráter, ainda somos mantidos sem respostas para as questões morais urgentes do dia, como o aborto, a eutanásia, a pena de morte e a alocação de escassos recursos ḿdicos. Há muito ḿrito nessa crítica, e essa ́ uma boa razão para dizer que a ́tica da virtude está seriamente incompleta sem as tradições morais que consideramos anteriormente na primeira unidade. Não há dúvida de que uma ́tica do caráter ou da virtude deve ser completada por uma ́tica da ação. Podemos cultivar a virtude da compaixão, por exemplo, mas quando agimos com compaixão, devemos estar conscientes das preocupações morais levantadas por outras tradições. Quando atuamos com compaixão em relação a outras pessoas, tamb́m devemos estar cientes de seus direitos, levar em conta as consequências de nossas ações compassivas e tratar outras pessoas como ins em si mesmas. O bom caráter, em outras palavras, não evita a necessidade de outros tipos de consideração moral. No entanto, uma ́tica da ação necessita igualmente de uma ́tica do caráter por pelo menos dois motivos. Primeiro, uma das maiores diiculdades que as ilosoias morais orientadas ao ato enfrentam ́ na aplicação de uma teoria moral a um caso particular. Um caráter moralmente sensível ́ mais provável de garantir 114 TÓPICO 1 | A ÉTICA DA VIRTUDE que apliquemos um princípio com insight e criatividade. Sem um bom caráter, ś poderemos aplicar, provavelmente, os princípios morais de maneira mecânica, em grande medida insensível às nuances da situação. Em segundo lugar, como vimos ao longo da primeira unidade e neste t́pico, existem várias tradições morais diferentes que são relevantes para nossas considerações de como agir. “ virtude da sabedoria prática consiste, em parte, em equilibrar tais preocupações potencialmente concorrentes sobre direitos, deveres e consequências. “ pessoa sábia ́ o indivíduo que ́ capaz de saber quando as preocupações de uma tradição têm precedência sobre as preocupações das outras tradições. UNI PROBLEMA ÉTICO BULLYING – O QUE VOCÊ DEVERIA FAZER? O bullying é uma forma de abuso, emocional, verbal e/ou físico. Sempre envolve um desequilíbrio de poder com indivíduos ou grupos que impõem sua vontade aos outros. O bullying e o cyberbullying são prevalentes e são problemas graves na escola e no local de trabalho. “Como se já não bastasse os próprios alunos ofenderem outros jovens, em algumas instituições brasileiras, os próprios “educadores” estimulam a prática do bullying. Em uma escola municipal na cidade de Osasco, São Paulo, um menino de apenas oito anos foi castigado e agredido verbalmente por estar acima do peso. O professor queria que ele passasse por uma sessão de castigos, mas ao se recusar, foi alvo de xingamentos. Além de praticar bullying com o aluno, o professor incentivou outros estudantes a fazerem o mesmo”. Disponível em: <https://medium. com/educa%C3%A7%C3%A3o-turismo/6-casos-de-bullying-no-brasil-73ad264a2161>. Acesso em: 20 jun. 2016. Olhe para essa história e considere outros artigos sobre bullying. Até que ponto o bullying exibe questões de caráter? Até que ponto vícios como ciúme, inveja e rancor envolvem tais incidentes? Muitos afirmam que um valentão não tem ou é incapaz de ter empatia com outros seres humanos. Além disso, as testemunhas de tais atos muitas vezes exibem uma falta de empatia e não se envolvem. Discuta as questões de caráter envolvidas no bullying. O que pode ser feito para reduzir os atos de bullying e abuso? 115 RESUMO DO TÓPICO 1 Neste tópico, você aprendeu que • “ ́tica da virtude não ́ uma teoria nova, tendo tido seus começos com os gregos e especialmente com “rist́teles no IV “EC, embora suas origens na ilosoia chinesa sejam ainda mais antigas. Tornou-se signiicativa para muitos eticistas contemporâneos. • “ virtude ́ deinida como "excelência moral, justiça, responsabilidade ou outras qualidades exemplares consideradas merit́rias". • “ ênfase está no caráter bom ou virtuoso dos pŕprios seres humanos, e não em seus atos, consequências, sentimentos ou regras. • “ Ética a Nicômaco de “rist́teles baseia-se nos seguintes princípios . “ realidade e a vida são teleoĺgicas, apontam para algum im ou proṕsito . O im da vida humana ́ a felicidade, e a razão ́ a atividade básica dos seres humanos, portanto, o objetivo dos seres humanos ́ raciocinar bem para alcançar uma vida completa . “rist́teles começa com os juízos morais de seres humanos razoáveis e virtuosos e, em seguida, formula princípios gerais, ao contrário dos não consequencialistas - téricos do Comando Divino, Kant e Ross -, que começam com princípios ́ticos abstratos . Os seres humanos têm uma capacidade de bondade. Isto tem que ser desenvolvido pela prática baseada em uma emulação da tomada de decisão moral do ser humano virtuoso ideal. • “ virtude ́ uma mediania, relativa a ńs, entre os dois extremos de excesso e deiciência ou defeito . No sentimento de coniança, por exemplo, a coragem ́ a mediania entre o excesso temerário e o defeito da covardia. • O “utocultivo da Moral Confucionista. O termo chinês Te, "virtude", ́ o poder inerente ou a tendência de afetar os outros de uma maneira positiva, dramática e poderosa para o bem. • Em um mundo confucionista, a identidade está sempre ligada ao grupo e aos relacionamentos dentro da ordem social. “s virtudes confucianas são assim decididamente de natureza social. • Todas as virtudes confucionistas são realizadas dentro do contexto de cinco relações cardeais que são todas governadas pela prática de Shu, "reciprocidade". • Ren, traduzido de várias formas como "bondade humana", "benevolência", "bondade" ou "humanidade", ́ a principal virtude confucionista, destaca e realça as relações naturais entre o indivíduo e a comunidade. O ideograma para Ren ́ "um-ser-com-outros". 116 • Li, "propriedade ritual", ́ a virtude confucionista que deve ser cultivada para ser um participante pleno na comunidade e torna possível que um indivíduo apresente uma conduta apropriada em situações especíicas. • Concepções idealistas e realistas do confucionismo. Meng Zi ou "Mencius" sustentava que os seres humanos têm uma disposição natural em relação ao bem, e a virtude ́ cultivada, metaforicamente, como regar "brotos". Xun Zi ensinou que os seres humanos não são naturalmente dispostos em direção ao bem, mas a natureza humana ́ má e deve ser superada tal como a maneira que se endireita a madeira torta ou se aia o metal em um moedor. • Ética Confucionista dos Paṕis. Xiao, "reverência familiar" ou "sentimento familiar", ́ a raiz da conduta consumada. • “ "́tica confucionista dos paṕis" ́ um tipo "novo" de teoria ́tica, juntamente com as teorias tradicionais de ́tica consequencialista, não consequencialista e da ́tica da virtude, mas distintas das mesmas. • Não há uma teoria ́tica equivalente na tradição ocidental, e assim, a ́tica confucionista dos paṕis deve ser entendida em seus pŕprios termos. Na prática, produz uma ́tica robusta de responsabilidade para com pessoas particulares em uma matriz de relacionamentos de paṕis com os outros. • “s teorias contemporâneas da Ética das virtudes ́ primeiramente uma reação contra as teorias morais que tentam encaixar nossa experiência moral em um sistema a priori das regras ou dos ideais preestabelecidos, especiicamente o consequencialismo e o kantianismo. • “ maioria das teorias contemporâneas da Ética da Virtude se origina pesadamente de “rist́teles, embora não necessariamente aceitem todas as suas suposições. • “lasdair MacIntyre fornece uma análise contemporânea da Ética da Virtude . “s virtudes são disposições tanto para agir como para sentir-se de maneiras particulares, e ́ preciso criar sentimentos virtuosos dentro de si mesmo, não apenas agir virtuosamente . Deve-se então decidir o que o ser humano praticamente sábio e virtuoso faria em qualquer situação e então fazer o ato virtuoso que tal pessoa faria. • Há várias vantagens para a Ética da Virtude . Ela se esforça para criar o ser humano bom, não meramente bons atos ou boas regras . Ela tenta uniicar a razão e a emoção . Enfatiza a moderação, uma qualidade reconhecida por muitos eticistas. • Tamb́m tem desvantagens . Os seres humanos têm um im ou proṕsito? Se sim, qual ́, e como podemos provar qualquer um destes? . “ moral ́ inata, ou ́ aprendida atrav́s da experiência? . O que ́ virtude e o que constitui as virtudes? Parece haver uma grande variedade de opiniões sobre isso, então como 117 podemos decidir o que ́ realmente a virtude e quais virtudes são realmente válidas? . Quem ́ o ser humano virtuoso ideal, e como vamos determinar ou provar isso? • Os vícios, como covardia, ciúme, inveja, cobiça e a glutonaria são exemplos de traços de caráter indesejáveis que se encaixam na vida de um indivíduo por meio da indulgência de apetites degradantes, falta de autodisciplina, educação e prática habitual de conduta imoral. • “ pessoa viciosa não ́ governada pela razão, mas pelo impulso e vive uma vida atormentada pela tensão interior e pelo caos. • “s virtudes são "excelências humanas" e consistem naquelas características de caráter que devem ser promovidas nos seres humanos, tais como honestidade, lealdade, coragem, sabedoria, moderação, civilidade, compaixão, tolerância e reverência. “ vida da pessoa virtuosa ́ caracterizada pela força interior, contentamento, felicidade e proṕsito. 118 AUTOATIVIDADE O que ́ essencialmente a Ética da Virtude e de onde ela se originou? Como ela difere das teorias consequencialistas e não consequencialistas da ́tica? Quais são as vantagens da Ética da Virtude? Quais são as desvantagens da Ética da Virtude? 119 120 TÓPICO 2 UNIDADE 2 MODELOS DE RACIOCÍNIO ÉTICO 1 INTRODUÇÃO Considere a seguinte situação Um psićlogo decide que o melhor ḿtodo para ajudar sua cliente a superar seu medo de intimidade ́ se envolver em um relacionamento sexual com ela. Ela conia nele implicitamente, e ele sente com convicção que a experiência será positiva para ela. Será eticamente apropriado para um psićlogo prosseguir nesse tipo de relacionamento íntimo? Esperar-se-ia que estudantes e proissionais da saúde mental respondessem universalmente com um lúcido não! . No entanto, a im de estabelecer regras de conduta para proissionais de saúde mental que todos os proissionais são obrigados a obedecer, o comitê que cria o ćdigo ́tico de uma proissão deve ser capaz de ir aĺm de simplesmente indicar quais comportamentos são exigidos e proibidos, desenvolvendo uma justiicativa racional para os princípios ́ticos proissionais e padrões de conduta que eles propõem. Em outras palavras, uma explicação racionalmente convincente do motivo de um determinado comportamento ser aceitável ou inaceitável deve ser possível. Essas explicações, embora não geralmente mencionadas no ćdigo ́tico, constituem o fundamento ilośico da perspectiva ́tica da proissão. Por que seria errado para o psićlogo envolver-se em um relacionamento sexual com sua cliente se ele acredita que tal relacionamento será beńico para ela? O fato de existirem regras que proíbem tal comportamento não ́ uma explicação adequada do motivo pelo qual tal comportamento seja inadequado. “ validade da regra deve ser demonstrada racionalmente para airmar que o psićlogo em questão ́ obrigado isto ́, tem um dever ́tico de obedecer a essa regra. Este t́pico examinará a capacidade das principais teorias ́ticas da ilosoia ocidental para fornecer o fundamento ilośico para os padrões ́ticos de uma proissão de saúde mental como a psicologia. Os ḿritos de cada teoria serão avaliados criticamente e sua relevância para as proissões de saúde mental será enfatizada. 121 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA 2 O RELATIVISMO ÉTICO O relativismo ́tico, o ponto de vista de que não existem princípios ́ticos universalmente válidos, tornou-se um termo bastante impreciso, porque tem sido usado de várias maneiras por pessoas diferentes. Muitas vezes, ́ apresentado como uma visão de que uma determinada ação por exemplo, não pagar pelos alimentos fornecidos por outra pessoa pode ser eticamente apropriada em uma circunstância por exemplo, quando um convidado na casa de algúm e inadequada em outra por exemplo, ao comer em um restaurante . Seguindo esta deinição, todos se qualiicariam como um relativista, mas este não ́ o verdadeiro signiicado t́cnico do termo ”R“NDT, . O genuíno relativismo ́tico envolve a suposição de que os valores ́ticos de indivíduos diferentes às vezes conlitam de maneira fundamental. Em um conlito fundamental, as duas partes não discordam simplesmente sobre questões de fato, como seria o caso se duas pessoas discordassem sobre os crit́rios apropriados para um diagństico válido de Esquizofrenia, Tipo Paranoide. Pelo contrário, as duas partes concordam sobre as questões de fato por exemplo, ambos reconhecem o mesmo conjunto de crit́rios diagństicos para a esquizofrenia paranoide , mas discordam quanto à moralidade de fazer tal diagństico. Uma segunda suposição que ́ característica da maioria das formas de relativismo ́tico ́ que essas discordâncias fundamentais não podem, pelo menos em alguns casos, ser resolvidas racionalmente. Em outras palavras, nem sempre há uma avaliação moral "correta" de um ato que seja demonstrável, de modo que dois pontos de vista morais conlitantes podem ser discutidos como sendo igualmente corretos. Quando essa suposição ́ adicionada, a posição ́ referida como relativismo metático. O relativista metático airmaria que não existe nenhum ḿtodo efetivo para resolver tais dilemas morais, tal posição ́ referida como relativismo metático metodoĺgico, ou se existe um ḿtodo para resolver conlitos ́ticos, ́ efetivo em apenas um número limitado de casos, posição referida como relativismo metático não metodoĺgico ”R“NDT, . Com relação à vinheta no início deste t́pico, um relativista metático pode argumentar que ́ impossível estabelecer se as ações do psićlogo são ou não são ́ticas comparando racionalmente à validade de valores que apoiam tal prática e aqueles que a condenam. Duas formas de relativismo ́tico que se tornaram bastante populares, particularmente nas ciências sociais, são o relativismo cultural e o relativismo pessoal. O relativismo cultural ́ o ponto de vista de que as discordâncias fundamentais sobre questões ́ticas ocorrem frequentemente entre membros de diferentes grupos culturais. O relativismo cultural baseia-se nas suposições de que as pessoas adquirem a maioria dos seus valores pessoais de sua cultura e que os valores e as expectativas comportamentais normativas variam de uma cultura para outra. “lgumas formulações do relativismo cultural acrescentam a componente de que os membros de uma determinada cultura são eticamente obrigados a respeitar os padrões morais de sua cultura, caso em que o ponto de vista ́ uma forma de relativismo cultural normativo. Os relativistas culturais normativos diferem 122 TÓPICO 2 | MODELOS DE RACIOCÍNIO ÉTICO quanto à questão de saber se as pessoas devem sempre obedecer aos valores de sua pŕpria cultura ou se devem conformar seu comportamento com os valores da cultura em que se encontram atualmente. “ perspectiva do relativismo pessoal envolve uma posição como a seguinte Se algúm realmente acredita que ́ correto ou errado fazer “ na circunstância C, então ́ correto ou errado fazer “ em C. Por exemplo, relativistas pessoais considerariam as ações do psićlogo na vinheta no início do t́pico apropriadas porque ele realmente acredita que iniciar uma relação sexual com sua cliente irá beneiciá-la. De acordo com o relativismo pessoal, se uma pessoa acredita que sua ação ́ apropriada, sua ação não pode ser criticada em bases ́ticas por outros. Essa ideia ́ consistente com o ponto de vista de que a sinceridade afetiva de uma pessoa, em vez de qualquer questão do que seria "certo" ou "errado" objetivamente, ́ o que torna seu comportamento ́tico. 2.1 AVALIAÇÃO CRÍTICA DO RELATIVISMO ÉTICO O relativismo ́tico, em suas diversas formas, airma que a razão não fornece um meio adequado de avaliar o status ́tico de uma ação em alguns, na maioria ou talvez mesmo em todos os casos. No entanto, o ponto de vista de que as posições ́ticas conlitam de maneira fundamental e irresolúvel não implica que qualquer posição seja correta ou que seja incorreta. De fato, se você seguir com as implicações do relativismo ́tico, desembocará no ceticismo ́tico, o ponto de vista de que nenhuma crença ́tica pode ser comprovada como universalmente válida. Portanto, tudo o que restaria são atitudes ou opiniões ́ticas. O relativismo cultural envolve o problema adicional de determinar a que cultura se deve referir ao determinar a adequação das ações de uma pessoa por exemplo, a sociedade brasileira, sua subcultura ́tnica, sua comunidade local? . No caso de prisioneiros encarcerados, seu comportamento deve ser avaliado por referência às expectativas normativas dentro da prisão? É claro que não, se o objetivo ́ reabilitar os prisioneiros para que eles possam se tornar membros produtivos da sociedade maior. Outro problema com o relativismo cultural, que ́ ́bvio para a maioria das pessoas, ́ que o status ́tico de uma ação não depende de sua aceitabilidade social. “ssim, o relativismo cultural, ao igualar a moral com os costumes ou seja, os hábitos ou costumes de uma cultura ou grupo particular , ́ realmente uma rejeição da possibilidade de qualquer padrão ́tico objetivo para julgar as ações. Finalmente, as formulações do relativismo pessoal geralmente não airmam quaisquer condições sob as quais uma ação ́ moralmente inapropriada. O ponto de vista de que uma pessoa sempre age moralmente se agir de acordo com seus verdadeiros sentimentos não implica necessariamente que ela age de forma imoral se ela não agir com base em seus sentimentos. Qualquer perspectiva ́tica signiicativa deve, no mínimo, especiicar as condições nas quais as ações devem ser consideradas eticamente apropriadas e inapropriadas. 123 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA 2.2 RELEVÂNCIA DO RELATIVISMO ÉTICO PARA AS PROFISSÕES DE SAÚDE MENTAL Como airmou Richard F. Kitchener , o relativismo ́tico ́ uma posição insustentável para qualquer proissional de saúde mental. Para que haja padrões de comportamento proissional, os proissionais de saúde mental devem ser capazes de fornecer uma justiicativa racional para a eticidade e antieticidade de ações particulares. “ falha em fazê-lo leva ao niilismo ́tico ou seja, a posição de que, como as distinções ́ticas não possuem signiicado ou validade, argumentar sobre questões ́ticas ́ absolutamente inútil . Se uma justiicação racional dos requisitos ́ticos de uma proissão não puder ser produzida, então os proissionais não podem razoavelmente ser compelidos a obedecer a tais exigências. Portanto, embora a justiicação racional de proposições ́ticas não seja uma tarefa fácil, especialmente quando há considerações morais conlitantes em uma situação, uma proissão de saúde mental não pode abandonar a tarefa de desenvolver tal base sem abandonar toda a esperança de estabelecer e fazer cumprir padrões de comportamento proissional aceitável. “s opiniões ́ticas intuitivas, baseadas na intuição e na experiência em vez de um plano ou ḿtodo, fornecidas pelo relativismo pessoal não são adequadas como justiicação ́tica em uma proissão de saúde mental ou qualquer outra proissão . Se o agir de uma maneira que sinceramente acredita-se ser apropriada constitui prática ́tica, então qualquer tipo de comportamento não proissional como aquele do psićlogo na vinheta poderia ser argumentado como permissível. Os proissionais não podem ser autorizados a "apenas intuir" na decisão de ḿtodos eticamente apropriados de tratamento, de ensino e de realização de pesquisa sem diminuir signiicativamente a coniança do público no padrão de comportamento dentro da proissão. “ outra grande variante do relativismo ́tico, o relativismo cultural, ́ claramente oposta aos princípios fundamentais subjacentes aos ćdigos ́ticos das proissões de saúde mental. Por exemplo, se uma proissão de saúde mental adotasse o relativismo cultural, não haveria justiicativa para apoiar a autonomia de uma pessoa se a autonomia pessoal não fosse valorizada pela cultura, ou simplesmente se a autonomia pessoal pudesse ser argumentada em reduzir a probabilidade de que um indivíduo adotaria os valores da cultura dominante. Na prática clínica, há muitas vezes um grau de conlito entre os interesses da cultura e do indivíduo. Se um cliente está experimentando ambivalência sobre seus impulsos homossexuais em um contexto cultural que ́ fortemente heterossexual, há uma pergunta sobre se o papel do terapeuta ́ fazer o indivíduo "melhor ajustar-se" na cultura, incentivando-o a se comportar de uma maneira consistente com os valores da cultura dominante ou explorar seus sentimentos e determinar seu pŕprio curso na vida de forma autônoma. O relativismo cultural normativo encorajaria os terapeutas, professores e pesquisadores a impor seus valores isto ́, os valores da cultura dominante aos clientes, estudantes e participantes da pesquisa. 124 TÓPICO 2 | MODELOS DE RACIOCÍNIO ÉTICO Finalmente, a inaceitabilidade do relativismo cultural ́ ilustrada ainda mais quando se consideram as diiculdades adicionais introduzidas pela presença de subculturas dentro de um contexto cultural dominante. Se terapeutas, pesquisadores e professores fossem eticamente obrigados a adotar os valores da cultura dominante, como resolveriam conlitos com os valores de sua cultura ou subcultura nativa? “ĺm disso, como eles deveriam lidar com os problemas multiculturais colocados pelos clientes, participantes da pesquisa e estudantes que se identiicam com outras culturas ou subculturas? Claramente, o relativismo ́tico tem pouco a oferecer como fonte de justiicação ́tica para as proissões de saúde mental aĺm de ilustrar as consequências negativas do fracasso dos proissionais em fornecer uma justiicativa racional adequada para seus julgamentos ́ticos. “ busca por fontes de apoio aos princípios ́ticos dos proissionais de saúde mental deve continuar. UNI Caso 2.1 Um cliente em uma clínica de tratamento de abuso de substância informa ao psicólogo sobre as atividades (por exemplo, tráfico de drogas, agressão) em que ele estava envolvido antes de entrar em um tratamento ordenado pelo tribunal de justiça. Quando o psicólogo pergunta como ele se sente por ter cometido esses crimes, ele responde: "Isso não foi crime. Todo mundo estava fazendo essas coisas. Você simplesmente não entende como funciona na rua". 3 O HEDONISMO ÉTICO O hedonismo ́tico ́ uma teoria do valor. Hedonismo vem da palavra grega hedone, que signiica prazer . O iĺsofo grego Epicuro ca. “EC , um adepto precoce da perspectiva hedonista, airmou que o maior bem ́ o que ́ intrinsecamente desejável isto ́, desejado para si, não como um meio para algum outro im e que a única coisa que ́ verdadeiramente intrinsecamente desejável na vida ́ o prazer EPICURO, , . Por prazer, Epicuro signiicava o que ́ agradável. “ssim, o objetivo do hedonismo ́ sempre desfrutar de si mesmo. "O prazer ́ o começo e o im da vida abençoada" EPICURO, apud RUSSELL, , p. . “ dor ́ a única coisa intrinsecamente indesejável. Em sua formulação original da posição hedonista, Epicuro não propôs uma busca desenfreada de prazeres sensuais isto ́, "dinâmicos" . Em vez disso, ele defendeu uma vida simples de relexão ilośica isto ́, prazer "estático" como a vida mais agradável ou boa RUSSELL, . Porque Epicuro considerava o prazer como a ausência de desconforto, ele preferia uma vida sem incandescentes paixões corporais. Embora tais paixões sejam talvez agradáveis por um breve período, elas tendem a ser seguidas de desconforto quando o prazer intenso termina. 125 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA Por exemplo, o psićlogo e seu cliente podem experimentar prazer considerável de sua paixão sexual, mas a atividade sexual pode resultar em grande desconforto mais tarde, se seus desejos sexuais não são satisfeitos completamente ou se uma ou ambas as pessoas sentem pesar sobre o relacionamento. Epicuro acreditava que a atividade mental que permitia a uma pessoa alcançar uma compreensão mais clara de si mesmo e seu mundo era altamente prazerosa e que evitava o desconforto que tendia a seguir o prazer físico intenso. Uma longa linhagem de pensadores distintos por exemplo, Thomas Hobbes, Jeremy ”entham, James Mill, John Stuart Mill, Henry Sidgwick e Sigmund Freud avançaram e reinaram a teoria hedonista do valor desde Epicuro, embora as deinições de prazer apresentadas por esses pensadores variavam. Hoje em dia, o ponto de vista hedonista geral ́ que uma pessoa está experimentando prazer genuíno se, e somente se, no momento em que ela está envolvida em uma atividade, a experiência ou atividade ́ desfrutada por si mesma, ou seja, a pessoa não gostaria de mudar a atividade e preferiria que ela não fosse alterada por qualquer outra pessoa. Embora o hedonismo tenha sido usado como fundamento da teoria da ́tica normativa conhecida como utilitarismo, o hedonismo ́tico não ́ uma proposta sobre o que ́ moralmente correto. É simplesmente uma declaração do que ́ intrinsecamente desejável. Muitas coisas, como o dinheiro, são desejáveis instrumentalmente isto ́, para as consequências desejáveis que produzem , mas apenas o prazer ́ desejado como um im em si mesmo. 3.1 AVALIAÇÃO CRÍTICA DO HEDONISMO ÉTICO O primeiro problema com a posição hedonista ́ que os hedonistas tentam argumentar dos fatos ao valor. Mesmo que seja verdade que o prazer ́ intrinsecamente desejável, isso não torna o prazer "bom" em um sentido ́tico. Na verdade, o argumento de que o prazer ́ a única coisa que ́ intrinsecamente desejável pode ser contestado. Poder-se-ia argumentar que para obter prazer, uma pessoa deve querer algo diferente do prazer por sua pŕpria causa. Por exemplo, para que a obtenção do conhecimento seja agradável, a pessoa deve ter tido um desejo intrínseco de alcançar o conhecimento. Joseph ”utler argumentou que o hedonista ́tico não reconhece que deve haver "paixões particulares" que permitem às pessoas obter prazer , p. . O hedonismo ́tico tamb́m não explica o fato ́bvio de que as pessoas são motivadas por fatores que não dependem da crença de que o evento futuro será agradável para eles pessoalmente. “s pessoas at́ correrão o risco de perda pessoal em vez de violarem seus princípios morais. É claro que o hedonista argumentará que, em tais circunstâncias, agir de acordo com seus valores deve ser agradável. No entanto, o que ́ intrinsecamente desejável neste caso ́ comportarse de uma maneira consistente com sua moralidade pessoal. O comportamento não ́ simplesmente um meio para alguma outra inalidade isto ́, a realização do prazer . 126 TÓPICO 2 | MODELOS DE RACIOCÍNIO ÉTICO 3.2 A RELEVÂNCIA DO HEDONISMO ÉTICO PARA AS PROFISSÕES DE SAÚDE MENTAL Como teoria do valor, o hedonismo ́tico não pretende informar os proissionais de saúde mental sobre seus deveres ́ticos. No entanto, o hedonismo torna-se uma teoria da normativa quando ́ combinada com o utilitarismo. No entanto, a perspectiva hedonista tem sido utilizada por um número de téricos da psicologia, por exemplo, Sigmund Freud e Edward Thorndike , tentando compreender os princípios fundamentais que explicam a motivação humana. Essas teorias motivacionais são referidas como hedonismo psicoĺgico. Em tal modelo, o objetivo da vida ́ a busca do prazer. Portanto, a motivação subjacente à preferência de uma pessoa para um estado de coisas sobre outra ́ que o preferido ́ esperado proporcionar mais prazer. Por exemplo, Thorndike apresentou a "lei do efeito" em sua teoria comportamental, que postula que se um comportamento for seguido por um "estado de coisas satisfat́rio", a associação do comportamento com a situação será fortalecida, enquanto que se um comportamento ́ seguido por um "estado de coisas frustrantes", a associação será enfraquecida THORNDIKE, , p. . Da mesma forma, Freud considerava o comportamento humano como dominado pelo "princípio do prazer". Os seres humanos procuram satisfazer os seus impulsos instintivos, que são experimentados como prazerosos, evitando ao mesmo tempo um acúmulo de tensão instintiva, o que ́ doloroso. O hedonismo psicoĺgico, como uma teoria da motivação, levanta uma questão interessante sobre o papel que o interesse pŕprio desempenha no comportamento humano FEIN”ERG, . Se a motivação subjacente a todo comportamento ́ a busca do prazer, segue-se que as pessoas sempre se comportam egoisticamente? Embora todos os hedonistas não necessariamente adotem esse ponto de vista, que ́ referido como egoísmo psicoĺgico, um hedonista certamente argumentaria que os seres humanos sempre agem de acordo com seu interesse pŕprio. Mesmo que as pessoas se comportem de maneira altruísta isto ́, se envolvem num comportamento que envolve algum grau de autossacrifício por preocupação com outro , comportar-se de tal maneira deve ser consistente com seu interesse pŕprio para ser agradável. Por exemplo, elas podem achar muito agradável ser consideradas como caridosas. Esse comportamento ́ egoísta? Claramente não. Dois sentidos obviamente diferentes de interesse pŕprio devem ser distinguidos no hedonismo ́tico. O que poderia razoavelmente ser chamado de comportamento egoísta envolve um desprezo pelos interesses dos outros. “s pessoas egoístas ś pensam em si mesmas ao determinar seu curso de ação. Por outro lado, quando as pessoas assumem comportamentos de higiene pessoal, por exemplo, o comportamento mostra uma clara consideração pelos pŕprios interesses, mas não implica necessariamente uma desconsideração pelos interesses dos outros. Embora um hedonista ́tico possa justiicadamente argumentar que as pessoas nunca agem contra seus interesses pŕprios, mesmo no comportamento altruísta, não se segue que todo comportamento seja egoísta, como o egoísmo psicoĺgico manteria ”UTLER, . 127 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA UNI Caso 2.2 Um conselheiro tenta encorajar um cliente deprimido a aproveitar as oportunidades de se envolver com as pessoas, apontando que sua solidão a deixou infeliz. Ele diz a ela que, embora não haja nenhuma garantia de que as pessoas irão responder positivamente a ela, pelo menos assumir o risco de chegar a outros tem o potencial de trazer a sua felicidade. "E afinal", ele diz, "não é isso que todos nós estamos procurando na vida: felicidade?". 4 O UTILITARISMO O utilitarismo ́ uma das duas principais teorias ́tica normativas no pensamento ocidental moderno, como visto no T́pico da primeira unidade deste livro. Para o utilitarista, a moralidade ou imoralidade de uma ação depende da bondade ou da maldade de suas consequências. Por causa de seu foco nos ins alcançados por uma ação, o utilitarismo ́ caracterizado como uma teoria teleoĺgica normativa da palavra grega telos, que signiica "im último" . “ noção de "o bem" na maioria das concepções utilitaristas ́ emprestada do hedonismo ́tico prazer ou felicidade ́ o bem. No entanto, algumas formulações do utilitarismo, como a de G. E. Moore , airmam que certas experiências mentais por exemplo, a aquisição de conhecimento possuem valor intrínseco independente do prazer que pode estar associado a elas. Esse ponto de vista tem sido referido como utilitarismo ideal SM“RT WILLI“MS, , p. . Jeremy ”entham foi uma igura importante no desenvolvimento do utilitarismo. Sua formulação do princípio da utilidade, que subjaz a todas as ideias utilitaristas, airma que uma ação ́ ́tica se ela traz o maior equilíbrio positivo do prazer sobre a dor, porque o prazer ́ bom e as pessoas são obrigadas a trazer o bem à existência ”ENTH“M, . Se todas as opções disponíveis produzirão algum grau de sofrimento, a alternativa eticamente apropriada envolve o menor equilíbrio negativo da dor. O utilitarismo resume-se a esse princípio, que serve de padrão para julgar a moral de qualquer ação proposta. É certamente atraente acreditar que uma consideração razoavelmente quantiicável pode resolver todas as questões e dilemas morais. Houve várias formulações diferentes da perspectiva utilitarista. Como descrito na primeira unidade deste livro, uma distinção feita pelos utilitaristas ́ se o princípio da utilidade deve ser aplicado a atos especíicos ou a classes gerais de atos isto ́, regras . No utilitarismo de ato, o crit́rio do prazer ́ aplicado a cada ação particular. Portanto, uma pessoa julga o status ́tico de cada ação por suas consequências. Por outro lado, no utilitarismo de regras, o status ́tico das regras gerais de conduta ́ avaliado por julgar as prováveis consequências se todos fossem obrigados a se comportar de maneira similar SM“RT WILLI“MS, . 128 TÓPICO 2 | MODELOS DE RACIOCÍNIO ÉTICO Uma regra será adotada como um dever ́tico por exemplo, as pessoas devem cumprir suas promessas se as consequências gerais do comportamento de acordo com esta regra produzem maior prazer do que aquelas obtidas pela adoção de uma regra alternativa. O utilitarismo de ato ́ geralmente considerado como sendo mais lexível do que o utilitarismo de regras, porque o utilitarista ́ sensível a possíveis mudanças no status ́tico de um ato realizado em diferentes circunstâncias. Outra questão para os utilitaristas ́ o prazer de quem deve ser levado em conta quando se aplica o princípio da utilidade – do indivíduo ou o da comunidade? Para o proponente do utilitarismo egoísta, a bondade de uma ação depende de suas consequências para a pessoa particular envolvida na ação. Por outro lado, um defensor do utilitarismo universalista airmaria que o status ́tico de uma ação ́ uma função de suas consequências para todos geralmente, dentro de uma determinada comunidade afetados pela ação. Todos devem agir de modo a apoiar a felicidade geral da comunidade ao mais alto grau, com cada pessoa considerando sua felicidade pessoal como sendo de igual importância para a felicidade de qualquer outro membro da comunidade SM“RT WILLI“MS, . ”entham , p. airmou que o interesse da comunidade não deve entrar em conlito com o interesse dos indivíduos. O que ́, então, o interesse da comunidade? “ soma dos interesses dos muitos membros que a compõem . Um exemplo da aplicação de princípios utilitaristas universalistas ́ o Plano de Saúde de Oregon, uma iniciativa de reforma de cuidados de saúde implementada pelo Estado de Oregon, dos EU“, em . Em resposta à escalada de custos de cuidados de saúde, a legislatura do Estado de Oregon criou uma Comissão de Serviços de Saúde para desenvolver um plano para racionar os cuidados de saúde para aqueles que recebem seguro de saúde do Estado por exemplo, os beneiciários do seguro de saúde chamado de Medicaid . O plano expandiu as inscrições do Medicaid em %, incluindo trabalhadores com rendimentos abaixo da linha de pobreza, enquanto controlava o custo da cobertura ḿdica CUTLER MCF“RL“ND WINTHROP, “NDR“DE LIS”O“, . “ comissão desenvolveu uma lista priorizada de problemas de saúde física e mental depois de considerar os benefícios do tratamento para o indivíduo e a sociedade versus o custo para a sociedade de fornecer ou reter tratamento, a cronicidade da condição, o risco de morte associado à condição e a probabilidade de que o tratamento estendesse a vida e a eicácia do tratamento em restaurar "o indivíduo a um nível de função ao nível pŕ-ḿrbido ou perto dele" POLL“CK et al., , p. . O legislador estatal determinou que existiam fundos suicientes para cobrir as principais categorias de diagństico, que incluíam a maioria das condições de saúde mental. Entre as condições de saúde mental excluídas da cobertura no Plano de Saúde de Oregon estavam o Transtorno de Conversão em adultos , a Hipocondria e vários transtornos de personalidade, incluindo “ntissocial, Paranoide, Dependente, Esquiva, Esquizoide, Obsessivo Compulsivo, Histriônica e Narcisística POLL“CK et al., . “queles que priorizaram os transtornos reconheceram que as condições excluídas da cobertura são graves e dolorosas para aqueles que sofrem com elas. Entretanto, a preocupação da comissão era usar os recursos inanceiros limitados 129 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA do cuidado ḿdico disponíveis ao Estado para fornecer a cobertura da saúde para tantas pessoas quanto possível e para beneiciar a maioria das pessoas na extensão maior possível. Essas considerações superam o sofrimento das pessoas cujos diagństicos não foram cobertos. Tais considerações utilitaristas são convincentes para muitas pessoas, particularmente os contribuintes, que estão cientes de que há um limite para os recursos inanceiros que um Estado pode investir em cuidados de saúde. Na prática, a lista priorizada não tem sido amplamente utilizada para negar às pessoas os serviços de saúde mental necessários. Em vez disso, a contenção de custos foi conseguida ao forçar os beneiciários do Medicaid em programas de cuidados gerenciados que podem oferecer tratamento menos extensivo ”ODENHEIMER, “NDR“DE LIS”O“, . No entanto, se os custos ḿdicos aumentarem, a lista priorizada continua a ser um meio legalmente aceitável de racionar os cuidados de saúde em Oregon. 4.1 AVALIAÇÃO CRÍTICA DO UTILITARISMO Como a teoria do valor subjacente ao utilitarismo ́ o hedonismo, os utilitaristas têm sido confrontados com muitas das mesmas críticas que os defensores do hedonismo. Por exemplo, a questão de argumentar dos fatos aos valores ́ ainda mais premente para o utilitarista. Mesmo se uma pessoa aceitasse o argumento de que o prazer ́ o que ́ mais desejado na vida, ele ainda não pode estabelecer que o prazer ́ bom, em um sentido ́tico. Os utilitaristas devem ser capazes de fazê-lo, a im de argumentar que as pessoas são eticamente obrigadas a agir apenas de forma a maximizar o prazer. Um problema ainda maior para utilitaristas universalistas, como Jeremy ”entham e John Stuart Mill , ́ demonstrar que resultaria da bondade do pŕprio prazer do indivíduo, ao qual ele ́ obrigado a promover a "felicidade geral" de sua comunidade. Por que uma pessoa não poderia dizer "Sim, a felicidade geral ́ boa, mas estou interessado apenas em minha pŕpria felicidade?" Na verdade, parece que a maioria das pessoas está muito mais investida em seus interesses pessoais do que em interesses de outras pessoas e não exibem a atitude geral de "benevolência" que os utilitaristas assumem que caracteriza os seres humanos SM“RT WILLI“MS, . “ tendência dos interesses individuais das pessoas para o conlito ́ justamente a razão pela qual as questões relativas ao comportamento ́tico chamam tanta atenção em primeiro lugar RUSSELL, . Outra questão que os utilitaristas universalistas não abordaram suicientemente ́ a questão de como o bem ou seja, o prazer deve ser distribuído pela comunidade. Por exemplo, e se uma determinada ação produziria um grande prazer para um pequeno grupo de pessoas, enquanto outra ação beneiciaria mais pessoas, mas produziria uma menor quantidade total de prazer? Um exemplo extremo da questão importante da distribuição do bem ́ que uma regra utilitarista poderia apresentar um argumento defendendo a moralidade da escravidão com base em que ́ economicamente vantajosa para a sociedade como um todo ou seja, que produz maior felicidade total . No entanto, uma teoria ́tica que ́ compatível com a escravidão ́ absurda por causa de sua incompatibilidade total com as teorias da justiça. 130 TÓPICO 2 | MODELOS DE RACIOCÍNIO ÉTICO NOTA Vale observar que há os utilitaristas que acreditam que minimizar o sofrimento é uma preocupação mais premente do que a maximizar a felicidade, estes são referidos como "utilitaristas negativos" (MULGAN, 2012) e não estariam sujeitos a essa crítica. No entanto, este ponto de vista nunca foi muito popular entre os utilitaristas. O foco do utilitarismo nas consequências dos atos levanta outras questões. Por exemplo, Williams assinalou que, uma vez que ́ a existência de estados de coisas agradáveis e dolorosos no mundo que interessa a um utilitarista, independentemente de como esses estados de coisas venham a ser, o indivíduo parece assumir a mesma responsabilidade pelos estados de coisas que ela produz por meio de seus pŕprios atos e estados de coisas que ela não impede de existir SM“RT WILLI“MS, . Parece que sua responsabilidade por seus pŕprios atos não ́ diferente da sua responsabilidade pelos atos de outras pessoas que produzem estados de coisas desejáveis ou indesejáveis. Williams referiu-se a essa questão como a "responsabilidade negativa" da perspectiva utilitarista SM“RT WILLI“MS, , p. . É claro que os críticos do utilitarismo poderiam questionar o signiicado de sempre ter um indivíduo diretamente responsável pelos estados de coisas no mundo, particularmente, as consequências remotas dos pŕprios atos de um indivíduo. Por exemplo, suponha que um psicoterapeuta dispensa uma cliente prematuramente de um programa de tratamento por causa de questões contratransferenciais. “o tentar conseguir uma carona para casa, a cliente encontra um homem com quem ela estabelece um relacionamento extremamente positivo e passa a viver feliz para sempre. Pode-se dizer que o psicoterapeuta agiu de maneira eticamente apropriada porque o efeito a longo prazo de sua ação foi um aumento na felicidade do cliente e de seu companheiro? Lembre-se de que, para o utilitarista, a intenção do indivíduo em executar o ato não deve importar, pois são estados de coisas isto ́, consequências que são avaliadas em última instância. “s consequências diretas e indiretas do ato de um indivíduo são os únicos determinantes da responsabilidade ́tica. Williams tamb́m apontou que a ênfase exclusiva dada às consequências na perspectiva utilitarista faz com que os pŕprios sentimentos morais do indivíduo não sejam importantes. "O utilitarismo aliena o indivíduo dos seus sentimentos morais [...] mais basicamente, aliena o indivíduo de suas ações tamb́m" SM“RT WILLI“MS, , p. . “s concepções confusas e impessoais da responsabilidade do utilitarista ignoram as seguintes noções ́ticas de bom senso a os limites da responsabilidade pessoal b a diferença entre as consequências intencionais e as não intencionais e c a diferença ́tica essencial entre os atos que executo e os atos executados por outros. 131 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA Um problema inal enfrentado pelos utilitaristas ́ como uma pessoa pode ser esperada por calcular as consequências potenciais de suas opções de resposta em situações envolvendo tomada de decisão consciente moral. Quando uma ação produziria um efeito misto de prazer e dor, como ́ frequentemente o caso, como ela deve comparar o prazer acumulado a uma pessoa com a dor resultante de outra? “ĺm disso, ela deveria considerar apenas as consequências imediatas do ato ou os potenciais efeitos a longo prazo – o que J. J. C. Smart chama de "postulado das ondulações no lago" SM“RT WILLI“MS, , p. ? E se os efeitos a curto prazo forem positivos por exemplo, aumentando o senso de autonomia pessoal de um cliente hospitalizado concordando em dispensá-lo para viver independentemente , mas os efeitos a longo prazo poderiam ser bastante negativos por exemplo, seu potencial descumprimento com seu regime de medicação, possivelmente resultando em tornar-se perigoso para si mesmo ou para os outros ? Quanta relexão ́ necessária antes de agir para assegurar uma adequada consideração das prováveis consequências a curto e longo prazo? O que parecia inicialmente ser uma abordagem muito pragmática e quantiicável para fazer julgamentos ́ticos acaba por ser um modelo que ́ quase impossível de aplicar com sucesso. 4.2 RELEVÂNCIA DO UTILITARISMO PARA AS PROFISSÕES DE SAÚDE MENTAL “ justiicativa fornecida nos ćdigos de ́tica proissional para o uso de engano na pesquisa ́ primariamente de natureza utilitarista. Vemos isso na regulamentação do ćdigo de conduta da “ssociação “mericana de Psicologia. Os pesquisadores têm permissão para enganar os participantes, violando assim o dever de obter o consentimento informado, se "tiverem determinado que o uso de t́cnicas de engano ́ justiicado pelo potencial cientíico, educacional ou valor aplicado" “P“, , p. . Sob certas circunstâncias, então, a obrigação de um pesquisador para com os participantes individuais pode ser compensada, pelo menos em certa medida, pelo seu interesse em promover o bem-estar da sociedade em geral. “ noção utilitarista de que as pessoas devem promover a felicidade de outras pessoas afetadas por suas ações tamb́m ́ bastante consistente com o espírito dos ćdigos ́ticos das proissões de saúde mental. De fato, esse ́ o dever ́tico da beneicência, que está subjacente à preocupação que os proissionais de saúde mental mostram para o bem-estar dos clientes, estudantes, participantes da pesquisa e outros afetados por suas ações COHEN COHEN, . Os proissionais têm um dever ́tico de se esforçar para trazer consequências boas e positivas para as pessoas a quem servem. Numa situação que não pode resultar em consequências prazerosas para as pessoas envolvidas, os proissionais de saúde mental têm um dever ́tico de minimizar o dano ou a dor sofrida pelos envolvidos. Este ́ o dever ́tico da não maleicência, que tamb́m tem claramente 132 TÓPICO 2 | MODELOS DE RACIOCÍNIO ÉTICO suas raízes no raciocínio utilitarista. No entanto, embora as considerações utilitárias possam explicar a preocupação dos proissionais com as consequências de suas ações, tais considerações não podem explicar por que os proissionais se preocupam com as consequências para outras pessoas. “ teoria utilitarista não explica o respeito dos proissionais de saúde mental pela autonomia ou pessoalidade das pessoas a quem servem. De fato, a principal deiciência do utilitarismo como fundamento ilośico potencial para a tomada de decisões ́ticas nas proissões de saúde mental ́ que as necessidades de um indivíduo em particular têm pouca importância desde uma perspectiva utilitarista, especialmente quando essas necessidades são inconsistentes com as necessidades da sociedade em geral. Em contrapartida, os ćdigos ́ticos das proissões de saúde mental atribuem grande importância ao respeito do direito dos indivíduos à privacidade, à conidencialidade, à autodeterminação e à autonomia" COMITÉ COORDIN“DOR DE PSIC2LOGOS DEL MERCOSUR Y P“ÍSES “SOCI“DOS, , p. . “ssim, há uma tensão deinida nos "Princípios Éticos" “P“, e no Ćdigo de Ética CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, entre a forte consideração declarada pela autonomia pessoal e as justiicativas utilitaristas para limitar a adesão a esses valores, como quando as pessoas são enganadas como participantes da pesquisa. O valor atribuído à autonomia e à dignidade do indivíduo pelos proissionais de saúde mental tem suas raízes ́ticas em outra grande teoria da ́tica normativa, a teoria ́tica formalista de Kant, a qual foi descrita no T́pico da primeira unidade, mas que será aprofundada a seguir. UNI Caso 2.3 Uma psicóloga de aconselhamento que trabalha em um centro de saúde mental da comunidade recebe um telefonema da mãe de um cliente. O cliente, que sofre de esquizofrenia de tipo indiferenciado, parou de tomar a medicação, e sua família está muito chateada. A psicóloga explica que seu filho deixa de tomar a medicação por causa dos efeitos colaterais extremamente desagradáveis que ela produz (por exemplo, tremores, rigidez muscular, constipação). Sua mãe diz que ela entende o desconforto de seu filho com a medicação, mas que tê-lo sob a medicação torna a vida muito mais fácil para todos os outros na família e no bairro. Ela diz à psicóloga que ela tem a obrigação de convencer seu filho a voltar a tomar sua medicação. O que a psicóloga deve fazer? 5 A TEORIA ÉTICA FORMALISTA DE KANT Immanuel Kant , como iĺsofo racionalista, acreditava que a verdade ou o conhecimento ś poderiam ser descobertos atrav́s dos princípios da ĺgica e da razão. Consistente com essa visão, Kant airmou em sua teoria ́tica que 133 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA a verdade moral ́ determinada pela avaliação de se o princípio orientador de uma ação ́ consistente com as leis da razão. Como todas as pessoas são seres racionais, todas elas são capazes de reconhecer a validade universal de princípios morais racionais K“NT, . “ teoria ́tica de Kant ́ um exemplo de formalismo ́tico, na medida em que a moral de um ato ́ determinada formalmente, em virtude da validade racional da máxima envolvida, e não por qualquer referência a circunstâncias ou consequências práticas do ato. NOTA A teoria de Kant é também referida como deontológica (derivado do termo grego “deon”, que significa "o que é obrigatório"), porque os deveres éticos são justificados independentemente de qualquer teoria do valor. Por outro lado, no utilitarismo, os deveres morais são justificados por referência aos resultados "bons" (isto é, prazerosos) que tais ações provocam (baseados na teoria do valor chamado hedonismo). O utilitarismo é, portanto, uma teoria teleológica, ou axiológica (do termo grego “axio”, que significa "valor"), da obrigação moral. Os princípios de moralidade revelados pela razão são conhecidos por serem necessariamente verdadeiros isto ́, não poderiam ser falsos . “ĺm disso, estes princípios são conhecidos por serem verdadeiros independentemente da experiência isto ́, a priori . “ssim como todo mundo sabe que + = sem ter que constantemente veriicar o fato colocando duas coisas com mais duas, todo mundo sabe que ́ errado roubar. Isso, de acordo com Kant, ́ por que uma máxima moral isto ́, a descrição do princípio incorporado em um ato ́ sempre expressa na forma de um comando universal, como "Tu não roubarás" K“NT, . “s pessoas não precisam estabelecer a validade desse princípio atrav́s da experiência isto ́, reunindo dados sobre os efeitos do roubo . É ́bvio para qualquer um que o roubo ́ errado, embora os seres humanos nem sempre ajam de acordo com princípios morais ou seja, racionais . “s pessoas são profanas o suiciente para serem inluenciadas pelo prazer de transgredir a lei moral, embora reconheçam sua autoridade K“NT, Claramente, Kant não faz nenhuma referência às consequências de um ato na avaliação de seu status ́tico, embora Kant acreditasse certamente que operar na base da razão beneiciaria tanto o indivíduo quanto os outros. Seu ponto era que a racionalidade de uma ação ́ uma justiicação suiciente de seu status moral. “ĺm disso, Kant não estava argumentando que a motivação de uma pessoa em se comportar moralmente necessita sempre ser a racionalidade do ato. “s pessoas podem agir de acordo com a lei da razão, mas devem ser motivadas por um senso de justiça, afeição pessoal ou algo parecido. Como uma pessoa sabe se a máxima expressa em um ato particular ́ razoável isto ́, ́tica ? Kant apresentou seus "testes" da racionalidade de uma 134 TÓPICO 2 | MODELOS DE RACIOCÍNIO ÉTICO máxima em sua obra Fundamentos da Metafísica dos Costumes . Estes testes são referidos coletivamente como o imperativo cateǵrico. O primeiro teste do imperativo cateǵrico ́ se a máxima pode ser expressa signiicativamente como uma lei universal a priori da razão, ou seja, a máxima faz sentido ĺgico quando expressa como uma lei moral universal? Por exemplo, suponha que uma cliente diagnosticada como sofrendo de esquizofrenia tipo paranoide pede a seu terapeuta para prometer-lhe que ele nunca vai discutir com ningúm as coisas que ela revela na terapia. O terapeuta acredita que se ele recusar a prometer e tentar explicar a importância de documentar o curso de sua psicoterapia nos registros hospitalares e de discutir aspectos de seu caso com o resto da equipe de tratamento, ela icará muito agitada e se recusará a participar ativamente na terapia. Portanto, ele promete a ela não revelar nada a ningúm, sabendo que, embora ele siga todas as diretrizes ́ticas sobre conidencialidade, ele não tem a intenção de realmente manter a promessa literal que está fazendo para ela. Ele justiica mentir para ela com base em que está no melhor interesse da cliente. “ natureza de seu ato ́ expressa nesta máxima "É lícito fazer uma promessa que não tenhamos intenção de manter". Esse tipo de ato, que Kant chamou de "falsa promessa" K“NT, , ́ eticamente apropriado? Kant argumentou que não ́ apropriado, porque se fosse universalizado, a máxima implicaria que todos izessem promessas sem a intenção de mantê-las. Tal comportamento tornaria a noção de promessa sem sentido. Por deinição, uma promessa implica que a pessoa sinceramente pretende manter o voto feito para o outro. Portanto, tal máxima ́ obviamente irracional. Por outro lado, suponha que uma professora de aconselhamento esteja atrasada quando ela tenta atravessar o campus para uma reunião importante com seu reitor sobre o status de seu pedido de posse como professora titular. Enquanto ela se apressa em direção ao escrit́rio do reitor, um estudante que participou de sua aula no dia anterior a interrompe para discutir algumas dúvidas śrias que ele teve sobre a aula. O aluno está obviamente muito atribulado. “ professora quer parar e discutir o assunto porque o aluno está aparentemente em grande alição, mas decide não parar porque não quer chegar atrasada para o encontro, o que ́ extremamente importante para ela. Ela diz a ele para ir ao seu escrit́rio na manhã seguinte. Kant airmaria que a máxima expressa neste ato seria algo como "Eu não sou obrigado a ajudar outro que está em alição". Curiosamente, quando expressamos essa máxima como uma lei moral universal, ela não envolve nenhuma contradição ĺgica ou inconsistência. Pode-se realmente imaginar um mundo onde ningúm presta assistência a outro em alição. Entretanto, o fato de que uma máxima pode ser universalizada sem contradição não ́ suiciente para declará-la eticamente apropriada. Kant airmou que, para que uma máxima seja comprovadamente moral, um ser racional tamb́m teria que ser capaz de querer que a máxima seja lei universal. Este requisito constitui o segundo componente do imperativo cateǵrico. No exemplo, a professora, como ser racional, não poderia querer que a máxima "Ningúm ́ obrigado a ajudar outro que está em alição" se torne lei moral universal porque a 135 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA máxima implicaria que ningúm seria obrigado a ajudá-la se ela mesma estivesse em alição. Um ser racional não agiria de maneira que se opusesse diretamente a seus interesses pŕprios. “ssim, esta máxima falha no segundo teste do imperativo cateǵrico. “ moralidade das ações ́ descoberta dessa maneira negativa para Kant. Os testes do imperativo cateǵrico permitem que as pessoas descubram aqueles atos em que não devem se envolver. “tos que não são eliminados por esse processo são eticamente apropriados. De acordo com Kant , quando as pessoas agem de forma imoral, elas o fazem apesar de saberem que o ato está errado ou que a lei moral que estão violando ́ válida universalmente. Em geral, decidem hipocritamente que a sua situação constitui uma exceção ao princípio geral em causa. Kant não permitiu exceções ao dever moral como ́ revelado aos seres humanos pela razão. Os testes da razoabilidade das máximas associadas ao imperativo cateǵrico não representam uma explicação completa da origem dos deveres das pessoas para com eles mesmos e com os outros. Kant explicou que quando as pessoas agem de acordo com a razão, elas agem de forma autônoma e livre, isto ́, de maneira consistente com sua natureza de seres racionais. Tais atos são autocausados porque as únicas leis reletidas neles são as leis da razão, que são o fundamento do ser humano. Portanto, quando as pessoas agem razoavelmente, elas tamb́m agem de acordo com a natureza de qualquer outro ser humano. Elas nunca impõem sua vontade a outro ser humano quando agem de uma maneira razoável e ́tica, porque o que um ser racional deseja ́ a mesma coisa que qualquer outro ser racional faria. Kant descreveu essa mistura harmoniosa de vontades racionais humanas autônomas como um "reino de ins". Kant argumentou que há uma diferença fundamental entre uma coisa e uma pessoa. “ diferença ́ que somente os seres racionais são considerados pessoas. “ consideração das pessoas por si mesmas baseia-se no reconhecimento de que elas possuem a razão e, portanto, o conhecimento, que as diferencia dos objetos ou seres não racionais por exemplo, animais não humanos . “s "coisas" têm "apenas um valor relativo como meio" K“NT, . Em outras palavras, tudo na natureza existe como um meio para algum im, com exceção dos seres humanos. Os seres racionais são chamados de pessoas porque sua natureza já os marca como ins em si mesmos, isto ́, como algo que não deve ser usado apenas como um meio. “ssim, para Kant, todas as pessoas possuem valor intrínseco e são dignas de respeito como ins em si mesmas. Portanto, segue-se logicamente que as pessoas devem agir de tal maneira que tratem sempre a humanidade, seja na pŕpria pessoa ou na pessoa de qualquer outra, nunca simplesmente como um meio, mas sempre ao mesmo tempo como um im K“NT, . Esta doutrina do reino dos ins ́ simplesmente outra implicação da base racional para a moralidade fornecida pelo imperativo cateǵrico. Se as pessoas agirem somente sob máximas que possam ser razoavelmente desejadas como lei moral universal, elas agirão em direção aos outros somente de uma maneira que esses outros, como seres racionais, endossariam como eticamente apropriadas. “o fazê-lo, as pessoas sempre mostram o respeito pelos outros como ins em si mesmos 136 TÓPICO 2 | MODELOS DE RACIOCÍNIO ÉTICO isto ́, como seres humanos autônomos , tratando-os apenas como eles gostariam de serem tratados. Da mesma forma, esta doutrina, que tem um forte aspecto de "regra de ouro" isto ́, "faça aos outros como você gostaria que eles o izessem a você" , ́ muito atraente quando as pessoas consideram suas implicações sobre como elas serão tratadas por outros Elas podem estar coniantes de que elas serão tratadas apenas da maneira que elas gostariam de ser tratadas ou seja, de forma justa e respeitosa . “ moralidade, para Kant, envolve não apenas os deveres de um indivíduo para com os outros, mas tamb́m para si mesmo. Kant fez uma distinção entre os deveres "perfeitos" e "imperfeitos" de uma pessoa para si mesmo e para os outros K“NT, . “s máximas que representam deveres perfeitos especiicam ações que são claramente imorais. Por exemplo, a proibição de roubar constitui um dever perfeito para com os outros. Roubar de um cliente por não apontar o seu erro em pagar duas vezes para a mesma sessão ́ antítico porque mostra uma falta de consideração para a humanidade ou seja, a pessoalidade desse indivíduo. Os deveres perfeitos de um indivíduo para com ele pŕprio proíbem qualquer ação que comprometa seu valor como pessoa. Por exemplo, fumar cigarros ́ contrário ao dever de uma pessoa de valorizar e preservar sua pŕpria vida. Os deveres imperfeitos, por outro lado, não identiicam ações especíicas. Em vez disso, eles representam ins racionais eticamente apropriados que devem motivar o comportamento de uma pessoa para si mesmo e para os outros. Os deveres imperfeitos de uma pessoa para com os outros envolvem promover o bem-estar e a felicidade dos outros. Por exemplo, um proissional de saúde mental tem um dever imperfeito de promover o bem-estar de seus clientes, estudantes, participantes da pesquisa ou qualquer outra pessoa a quem ele presta serviços. Os deveres imperfeitos indicam o objetivo ou im a ser buscado, mas não especiicam os atos que são apropriados para realizar esses ins ou seja, o dever não inclui informações especíicas sobre como um proissional de saúde mental iria atingir o im de promover o bem-estar e a felicidade daqueles que encontra em suas atividades proissionais . Os deveres imperfeitos de uma pessoa para com ela mesma envolvem esforçar-se para aperfeiçoar seus talentos humanos atrav́s do cultivo de suas capacidades ou dons naturais K“NT, . “s diferenças entre a teoria ́tica de Kant e o utilitarismo podem ser ilustradas reconsiderando o Plano de Saúde de Oregon desde uma perspectiva kantiana. O plano tinha um embasamento fundamentalmente utilitarista Os limitados recursos de inanciamento para o plano de saúde fornecido pelos impostos dos contribuintes devem ser usados para fornecer cobertura de saúde para o maior número possível de pessoas, cobrindo apenas as condições que beneiciariam a maioria das pessoas na maior medida possível. “o discutir as críticas ao plano quando a proposta estava sendo debatida, Pollack et al. relataram que "alguns sugeriram em tom jocoso que os legisladores aplicassem a experiência em si mesmos ou talvez todos os funcionários do Estado antes de mudarem o Medicaid" POLL“CK et al., , p. . Esta crítica enfatiza o ponto kantiano de que as pessoas são obrigadas a tratar as outras pessoas apenas de uma maneira que elas mesmas desejariam ser tratadas. Escolher quais pessoas serão ajudadas 137 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA nunca poderia ser desejado por seres racionais como lei moral universal, porque as pessoas nunca desejariam serem excluídas de receber ajuda se estivessem sofrendo de um transtorno de baixa prioridade no futuro. 5.1 A AVALIAÇÃO CRÍTICA DA TEORIA ÉTICA FORMALISTA DE KANT O imperativo cateǵrico de Kant ́ inicialmente bastante atraente como um meio de testar a razoabilidade das máximas. No entanto, o imperativo cateǵrico tem uma simplicidade enganosa. Considere o efeito de modiicar características particulares de uma máxima na avaliação moral dessa máxima. Por exemplo, Kant argumentaria que ́ antítico para um terapeuta iniciar o tratamento com um cliente quando ela sabe que não há espaço em sua agenda atual para ver a pessoa em uma base regular. No entanto, qual seria o status ́tico da máxima se a terapeuta iniciasse uma relação terapêutica com um cliente sabendo que não poderia ver o cliente novamente no dia seguinte? Não poderia uma pessoa introduzir fatores situacionais complexos que tornariam a aplicação do imperativo cateǵrico confusa, se não impossível? Segundo, quando as máximas são formuladas como regras gerais de conduta menos complicadas por exemplo, nunca se deve dizer uma mentira , o modelo torna-se extremamente rígido e insensível a fatores contextuais que complicam a situação. Por exemplo, a maioria das pessoas razoáveis concorda que há situações em que dizer uma mentira para poupar os sentimentos de algúm por exemplo, quando perguntado, "Você gostou do meu corte de cabelo?" seria eticamente apropriado. No entanto, tal comportamento não poderia ser justiicado pelo modelo de Kant. 5.2 RELEVÂNCIA DA TEORIA ÉTICA FORMALISTA DE KANT PARA AS PROFISSÕES DE SAÚDE MENTAL “ ênfase de Kant no respeito que deve ser mostrado para a autonomia das pessoas no reino dos ins está fortemente representada nos ćdigos ́ticos das proissões de saúde mental. Evitar relações de exploração, manter a conidencialidade, prestar serviços competentes, evitar e corrigir práticas discriminat́rias e respeitar os direitos dos participantes da pesquisa são todos relexos da ênfase kantiana no valor intrínseco e na importância do indivíduo. O respeito de Kant pelas pessoas ́ muito semelhante à atitude de Rogers de consideração positiva incondicional pelos clientes ROGERS KINGET, . “mbos reletem uma completa aceitação e respeito pela liberdade, autonomia e pessoalidade de cada indivíduo. No entanto, tanto nos "Princípios Éticos" da “P“ como no Ćdigo de Ética Proissional do psićlogo existe um certo grau de tensão entre a importância fundamental dos direitos do indivíduo e o desejo de promover os objetivos 138 TÓPICO 2 | MODELOS DE RACIOCÍNIO ÉTICO cientíicos da proissão atrav́s da pesquisa. Embora o consentimento informado seja um valor importante na psicologia e no aconselhamento, este dever ́tico pode ser comprometido atrav́s do uso do engano na pesquisa. Esta justiicação utilitarista ́ curiosamente incompatível com a ênfase kantiana em respeitar o valor, a dignidade, o potencial e a singularidade de cada indivíduo que podemos encontrar no Ćdigo de Ética Proissional do psićlogo CFP, . “ discussão das teorias ́ticas, neste t́pico, revelou que, embora representem diferentes abordagens à justiicação ́tica, nenhuma abordagem ́ claramente superior como base para julgamentos ́ticos proissionais. “ĺm disso, em cada teoria há o potencial para os princípios ́ticos entrarem em conlito uns com os outros em algumas circunstâncias. “ combinação de justiicativas utilitárias e kantianas nos ćdigos ́ticos das proissões de saúde mental produz um potencial adicional signiicativo de conlito entre princípios. É extremamente importante que um proissional ́tico seja capaz de resolver conlitos que surgem em situações que envolvem considerações ́ticas concorrentes. No pŕximo t́pico serão apresentados os pontos de vista de várias teorias ́ticas sobre tais conlitos. Com base nas informações apresentadas no T́pico , um modelo que os proissionais podem empregar para resolver conlitos entre considerações ́ticas concorrentes será apresentado no T́pico desta unidade. UNI Caso 2.4 Um psicólogo clínico é o coordenador do tratamento para um internamento voluntário em uma enfermaria que fornece avaliação e reabilitação para clientes que sofrem de uma variedade de transtornos mentais orgânicos. O cliente é um homem de 33 anos, casado, branco, que sofre de encefalite, afasia produtiva e AIDS. Ele é considerado demente, mas não se comunica com o pessoal técnico, por isso é difícil determinar isso com certeza. Ele está claramente alerta e é geralmente agradável e cooperativo. O problema é que ele tem incontinência urinária e fecal, e às vezes se masturba publicamente na enfermaria. Funcionários estão preocupados que seus fluidos corporais representem um perigo potencial para os outros clientes, muitos dos quais são eles próprios dementes e podem ser susceptíveis de manipular ou ingerir fluidos corporais do paciente ou material fecal. A equipe decide que ele deve ser trancado em seu quarto para proteger os outros clientes, embora esta ação irá restringir sua liberdade física e acesso às atividades da enfermaria (por exemplo, televisão). Esta decisão é eticamente apropriada? 139 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que • Os proissionais de saúde mental devem ser capazes de demonstrar uma base racional para seus julgamentos ́ticos. • O relativismo ́tico assume a posição de que diferentes indivíduos relativismo pessoal ou diferentes culturas relativismo cultural podem ter diferentes concepções sobre o que ́ mais valioso na vida e sobre qual ação ́ eticamente apropriada em determinado contexto. • O relativista ́tico acredita que essas diferenças fundamentais não podem ser resolvidas em todos os casos, portanto não existem padrões universalmente válidos de comportamento ́tico. • O relativismo ́tico leva inevitavelmente ao ceticismo ́tico. • “s teorias do valor tentam estabelecer o que ́ mais valorizado na vida humana. • O signiicado ́tico de fazer tal determinação ́ que o que ́ mais valorizado na vida humana constitui o maior bem na vida. • O hedonismo ́tico ́ uma teoria do valor que airma que o prazer ́ a única coisa valorizada intrinsecamente isto ́, como um im em si pelos seres humanos. • “s teorias da ́tica normativa descrevem os princípios que revelam como as pessoas deveriam se comportar isto ́, os princípios que constituem seu dever ́tico . • Há duas teorias principais da ́tica normativa na ilosoia ocidental. “ primeira ́ o utilitarismo. • O dever ́tico de um utilitarista ́ airmado no princípio da utilidade um ato ́ eticamente apropriado se ele maximiza o equilíbrio positivo do prazer sobre a dor. • Na teoria formalista de Kant, a segunda importante teoria normativa, o dever ́tico de uma pessoa ́ revelado pela razão. • Usando o imperativo cateǵrico, uma máxima pode ser testada para determinar se ela constitui uma lei moral universal consistente com as leis da razão. • Em sua discussão sobre o reino dos ins, Kant argumentou que quando as pessoas agem de acordo com a razão, elas sempre tratam os outros de uma maneira 140 consistente com a maneira como os outros como seres racionais gostariam de ser tratados. • “o agir dessa maneira ́tica, as pessoas nunca impõem sua vontade aos outros, porque sua vontade racional ́ a mesma de todos os outros. • Toda a humanidade deve ser tratada como um im em si mesma, nunca como um meio para o pŕprio im irracional e egoísta de uma pessoa. • “ relevância de cada ponto de vista ́tico para as proissões de saúde mental foi apresentada juntamente às principais críticas de cada teoria. Por exemplo, o utilitarismo ́ reletido nos "Princípios Éticos" “P“, em disposições tais como a aceitabilidade de usar o engano na pesquisa em determinadas circunstâncias. • “ teoria ́tica de Kant ́ a base de muitas das preocupações ́ticas enfatizadas nos ćdigos ́ticos de psicologia, incluindo o respeito pela autonomia pessoal e a preocupação com o bem-estar das pessoas afetadas pelas atividades de um proissional. 141 AUTOATIVIDADE O que ́ o relativismo ́tico e quais críticas podemos fazer a esta posição ́tica? Esta posição ́ relevante para as proissões de saúde mental? O que ́ o hedonismo ́tico? Esta posição ́ relevante para as proissões de saúde mental? O que ́ o utilitarismo? Esta posição ́ relevante para as proissões de saúde mental? O que ́ a teoria ́tica formalista de Kant? Esta posição ́ relevante para as proissões de saúde mental? 142 TÓPICO 3 UNIDADE 2 MODELOS DE RACIOCÍNIO NA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS ÉTICOS 1 INTRODUÇÃO O ćdigo ́tico de cada proissão de saúde mental destina-se a familiarizar os proissionais com os princípios, ou valores, que devem orientar seu comportamento. No entanto, os princípios que presumivelmente revelam o dever ́tico de um proissional em qualquer situação, às vezes, podem entrar em conlito, ou seja, os proissionais de saúde mental encontram situações em que ́ difícil determinar um curso de ação que lhes permita cumprir cada dever ́tico aparentemente relevante, como normalmente se esforçam para fazer. Por exemplo, suponha que um cliente expresse ideação suicida em uma sessão. Ele tem um plano e os meios para realizá-lo. O clínico considera o cliente como um perigo iminente. No entanto, o cliente se recusa a procurar ajuda de familiares ou amigos ou a se admitir em um hospital. Nessa situação, o clínico tem, como sempre, o dever de preservar a conidencialidade do cliente. No entanto, o clínico tamb́m ́ obrigado a preservar a vida do cliente, presumivelmente por procurar admiti-lo em um hospital onde ele será impedido de se prejudicar. Neste exemplo, dois deveres ́ticos prima facie parecem entrar em conlito. Um proissional eticamente responsável deve ser capaz de resolver esses conlitos de forma apropriada. Como? Neste t́pico serão analisados os ḿtodos de resolução de conlitos ́ticos propostos pelos principais modelos ilośicos de raciocínio ́tico descritos nos t́picos anteriores. Tamb́m serão apresentados dois modelos adicionais que são projetados especiicamente para enfrentar tais dilemas ́ticos. “mbos os modelos, a ́tica situacional Ética da Situação de Fletcher e a formulação do contextualismo ́tico Ética Contextualista de Wallace , enfatizam a importância de ter em consideração fatores contextuais ou seja, situacionais na tentativa de resolver conlitos aparentes entre deveres ́ticos. 2 SITUAÇÕES QUE REQUEREM HABILIDADES DE SOLUÇÃO DE PROBLEMAS ÉTICOS Devido ao potencial de deveres ́ticos de entrar em conlito em algumas situações, a adesão de um proissional a um modelo particular de raciocínio ́tico, mesmo quando combinado com a atenção cuidadosa ao ćdigo ́tico de sua proissão, não ́ suiciente para garantir a prática proissional ́tica, pois embora esses modelos e ćdigos proissionais ofereçam orientações consideráveis em 143 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA relação a questões ́ticas, a competência ́tica tamb́m exige que um proissional atenda cuidadosamente a presença potencial de considerações ́ticas em cada situação encontrada. Se um proissional não está pensando eticamente, existe uma possibilidade distinta de que ele possa ignorar considerações ́ticas sutis, mas importantes. “ĺm disso, em situações em que as considerações ́ticas parecem conlitantes, a competência ́tica exige que ele seja capaz de resolver tais conlitos atrav́s do uso de sua capacidade de raciocínio prático ou seja, ́tica . O raciocínio prático envolve a adaptação de princípios ́ticos gerais aos contextos da vida sempre em mudança de uma maneira racionalmente defensável W“LL“CE, . O raciocínio ́tico ́ um tipo de resolução de problemas, e os problemas ́ticos mais difíceis são confrontados em situações que envolvem um aparente conlito entre dois ou mais princípios fundamentais. No exemplo da proposta de reforma do Plano de Saúde de Oregon POLL“CK et al., , discutida no T́pico , o que torna o plano tão controverso ́ que a situação envolve não apenas um dever prima facie de melhorar o sofrimento de cada pessoa, mas tamb́m um dever de garantir que os recursos limitados de cuidados de saúde disponíveis sejam distribuídos de maneira justa e razoável, e um terceiro dever de evitar criar uma onerosa carga tributária para os habitantes do Estado, controlando as despesas de saúde pode-se certamente argumentar que existem deveres adicionais representados nesta situação. No interesse da clareza e da extensividade, a discussão atual está limitada aos três deveres declarados . É extremamente difícil, e alguns podem argumentar impossível, formular um plano de ação que dê uma devida atenção a cada um desses deveres ́ticos importantes e conlitantes. Dilemas ́ticos como esse representam o teste inal da viabilidade de uma teoria ́tica. UNI Caso 3.1 Um conselheiro recebe uma ligação de sua vizinha pedindo que ele forneça aconselhamento para seu filho de oito anos. O menino retornou recentemente do acampamento de verão e exibiu algumas mudanças de comportamento perturbadoras. Sua mãe diz que ele ficou bravo e agressivo, está molhando sua cama e se recusa a falar sobre suas experiências no acampamento. Seus pais lhe disseram que queriam que ele se encontrasse com um conselheiro. Sua mãe disse que ela está ligando para o conselheiro porque seu filho se recusa a conversar com alguém além dele. O conselheiro sabe que a situação envolve relacionamentos múltiplos potencialmente problemáticos, mas ele também sente que é muito importante que o menino converse com um profissional. O que o conselheiro deve fazer? Os principais modelos de raciocínio ́tico apresentados no t́pico anterior podem ser avaliados mais profundamente em termos de sua eicácia para permitir que proissionais de saúde mental resolvam conlitos ́ticos aparentes. 144 TÓPICO 3 | MODELOS DE RACIOCÍNIO NA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS ÉTICOS 3 O RELATIVISMO ÉTICO O relativismo ́tico baseia-se nos pressupostos de que os valores ́ticos de diferentes indivíduos muitas vezes conlitam de maneiras fundamentais e que não há nenhum ḿtodo disponível para resolver todas essas discordâncias ”R“NDT, . Para o relativista ́tico, não há meios racionais efetivos para resolver conlitos entre princípios ́ticos. Conforme discutido no T́pico desta unidade, os pressupostos subjacentes ao relativismo ́tico levam invariavelmente ao ceticismo ́tico. “ incapacidade de resolver conlitos de forma racional prejudica a validade racional dos pŕprios valores ́ticos. Os relativistas ́ticos são incapazes de estabelecer a validade ou invalidez de qualquer proposta ́tica. “s teorias utilitaristas e kantianas são muito menos pessimistas quanto ao potencial para resolver conlitos ́ticos aparentes. 4 O UTILITARISMO Tanto os utilitaristas de regras quanto de ato argumentariam que não existem dilemas ́ticos genuínos, porque em todas as circunstâncias envolvendo conlito aparente entre princípios, a única consideração ́tica verdadeiramente relevante ́ a de maximizar a utilidade ou seja, o equilíbrio do prazer sobre a dor . Se a aplicação de duas regras diferentes utilitarista de regras ou o engajamento em dois atos diferentes utilitarista de ato produzirá quantidades iguais de prazer, a decisão de qual regra a aplicar ou qual a ação a realizar não tem signiicado moral, porque qualquer uma produzirá igualmente "boas" consequências. 4.1 AVALIAÇÃO CRÍTICA DO PONTO DE VISTA UTILITARISTA EM RELAÇÃO AO CONFLITO ÉTICO “pesar dos protestos dos utilitaristas em contrário, a possibilidade de conlito entre considerações ́ticas concorrentes existe dentro das perspectivas utilitárias de regras e de ato. Como os utilitaristas de regras reconhecem a existência de mais de uma regra de conduta eticamente apropriada, sempre ́ possível que surjam conlitos em relação a qual regra prevalece em uma dada situação. Para os utilitaristas de ato, o conlito ́tico pode ocorrer porque maximizar a utilidade não ́ a única consideração ́tica relevante. Especiicamente, ao tentar discutir a questão da justiça, os utilitaristas devem abordar como o bem ou seja, o prazer deve ser distribuído, uma crítica apresentada no t́pico anterior MULG“N, . Embora um utilitarista possa argumentar com sucesso que o objetivo de maximizar a soma do prazer em uma comunidade ́ efetivamente realizado em uma economia capitalista como a brasileira, poucos concordariam que a distribuição de recursos ́ justa, com recursos de tratamento de saúde física e mental frequentemente inacessíveis para os pobres, enquanto outros segmentos da população gozam de riqueza enorme. Um utilitarista, como o Smart, que está interessado em evitar essa 145 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA crítica da injustiça, argumentaria que a atitude dos seres humanos em relação aos outros ́ ou deve ser uma "benevolência generalizada, isto ́, a disposição para buscar a felicidade, ou em qualquer medida, em algum sentido ou outro, boas consequências, para toda a humanidade" SM“RT WILLI“MS, , p. . Smart conclui, então, que tais injustiças são inconsistentes com o modelo utilitarista, apesar do fato de que eles parecem maximizar a utilidade. Claramente, essa adição do princípio da benevolência torna o conlito ́tico bastante possível para um utilitarista de ato, porque agora existem múltiplas considerações ́ticas relevantes isto ́, maximizando a utilidade e atuando de forma benevolente que devem ser levadas em consideração em uma determinada situação e que podem sugerir diferentes cursos de ação W“LL“CE, . “ssim, at́ mesmo os utilitaristas não podem evitar a necessidade de elaborar um ḿtodo razoável de resolução de conlitos entre princípios, embora eles não ofereçam esse ḿtodo porque continuam a insistir que o conlito ́ impossível. 5 A TEORIA ÉTICA FORMALISTA DE KANT O modelo formalista de Kant propõe que haja uma solução racional para cada questão ́tica e que a aceitabilidade de qualquer máxima ́tica possa ser estabelecida aĺm de qualquer dúvida puramente por dedução racional K“NT, . “ssim, a abordagem kantiana tamb́m nega a existência de verdadeiros conlitos ́ticos W“LL“CE, . Para Kant, duas máximas não podem representar cursos de ação razoáveis e ainda entrar em conlito entre si. Kant tamb́m airmou que nenhum conlito pode ocorrer entre deveres "perfeitos" e "imperfeitos", porque os deveres perfeitos sempre têm precedência. Os conlitos ́ticos aparentes são o resultado de análises e raciocínios inadequados. Wallace descreve esse tipo de teoria moral como exigindo uma atitude "passiva" em relação às regras. “s pessoas devem simplesmente aceitar os ditames de uma razão universal a priori K“NT, . Não há situações nas quais seria necessário argumentar mais sobre a relevância de uma regra para um contexto particular, em relação a outras regras que tamb́m podem ser aplicadas. 5.1 AVALIAÇÃO CRÍTICA DO PONTO DE VISTA KANTIANO EM RELAÇÃO AO CONFLITO ÉTICO “ concepção passiva de moral de Kant ́ ilustrada no exemplo do T́pico da "mentira beńica", que ́ concebida para poupar os sentimentos de outra pessoa. Para Kant, dizer uma mentira ́ errado em qualquer circunstância. “ maioria das pessoas argumentaria que esta regra se aplica em geral, mas com algumas exceções, pois, na vida real ocorrem conlitos entre princípios. Por exemplo, suponha que um possível assassino se aproxime de um psicoterapeuta e pergunte se o colega dele que era o seu antigo psicoterapeuta e vítima em potencial está no escrit́rio hoje. Ele sabe que, se ele revelar o fato de que seu colega está trabalhando em seu escrit́rio, esse indivíduo entrará e cometerá assassinato. Seu poder de 146 TÓPICO 3 | MODELOS DE RACIOCÍNIO NA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS ÉTICOS raciocínio prático não ́ testado seriamente ao chegar com a resposta de que ele não deve divulgar a verdade, com base no princípio de preservar a vida que ́ mais importante nesta situação do que o princípio da honestidade. Este exemplo pode parecer simplista ou extremo, mas Kant usa um exemplo semelhante em seu ensaio "Sobre um suposto Direito de Mentir por amor à Humanidade" . No entanto, a análise de Kant conclui que seria errado mentir para o suposto assassino para salvar a vida da vítima em potencial, porque o psicoterapeuta estaria violando o princípio ́tico universal de honestidade. "“ veracidade nas declarações, que não se pode evitar, ́ o dever formal do homem em relação seja a quem for, por maior que seja a desvantagem que daí decorre para ele ou para outrem" K“NT, , p. . Para Kant, as consequências de um ato dentro de um conjunto especíico de circunstâncias são irrelevantes para a determinação do status ́tico do princípio ́tico geral expresso no ato. Mentir ́ errado, de acordo com Kant, sem exceções. NOTA Fletcher (1966) analisa um ponto interessante de que, de um ponto de vista jurídico, atuando de acordo com o princípio ético da honestidade em tal circunstância, como Kant sugere que alguém deveria, poderia fazer com que alguém se tornasse um cúmplice perante o fato do assassinato. No entanto, a análise de Kant não corresponde à forma como as pessoas resolvem problemas morais reais. “s pessoas aplicam as regras de forma ativa, julgando a relevância de cada consideração concorrente para uma determinada situação e tentando ativamente trabalhar com conlitos entre princípios. “s pessoas nem ignoram a existência de conlitos ́ticos, nem lavam as mãos e desistem quando os encontram. Em vez disso, elas tentam deliberar racionalmente as coisas. Kant, em sua insistência de que a razão sempre revela o dever moral das pessoas, evidentemente não considerou a possibilidade de que a razão pudesse informá-las de um conlito entre dois princípios ́ticos por exemplo, honestidade e respeito pela vida . “ falta de vontade de Kant em reconhecer a realidade de deveres ́ticos conlitantes ou seja, dilemas morais apresenta um grande problema quando as pessoas tentam aplicar os princípios kantianos a questões morais complexas da vida real. Nas proissões de saúde mental, a posição kantiana de que nunca existe um verdadeiro conlito entre princípios ́ticos tem sido aparentemente apoiada por argumentos de que certas considerações ́ticas são sempre mais fundamentais do que outras. Por exemplo, existem proissionais de saúde mental que airmaram que o princípio ́tico da não maleicência ou seja, "não causar dano" ́ a consideração ́tica mais fundamental na avaliação psicoĺgica FR“NCISCONI GOLDIM, CFP, e psicoterapia ROSEN”“UM, . O endosso de tal esquema reduziria signiicativamente os problemas inerentes na tentativa de determinar 147 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA qual consideração ́ mais importante em uma determinada situação. No entanto, aplicar uma diretriz como um princípio universal de prática novamente ignora a possibilidade real de conlito ́tico. Por exemplo, quando um cliente hospitalizado está se comportando de maneira violenta em relação a outros clientes e ao quadro de funcionários do tratamento, a quem o clínico ́ obrigado a não causar dano? Se o cliente violento ́ retido isicamente, o cliente ́ que sofrera o dano, se não isicamente, pelo menos no sentido de ter suas liberdades civis reduzidas. No entanto, a falta de restrição ao cliente provavelmente resultaria em danos a outro cliente ou a um membro da equipe. O clínico não pode evitar prejudicar algúm, de modo que, obviamente, evitar danos não pode ser sua única consideração nesse caso. Considerações adicionais por exemplo, o desejo de beneiciar os outros clientes, reduzindo o nível de estresse em seu ambiente tamb́m são relevantes para sua decisão. Se o clínico procura, em vez disso, minimizar os danos em relação ao benefício, parece que ele volta a uma perspectiva utilitarista na qual ele precisaria quantiicar o dano e o benefício de uma maneira que permitisse que os dois fossem comparados diretamente, uma tarefa impossível. UNI Caso 3.2 Uma professora declara no programa de sua disciplina de Teorias da Personalidade que ela não aplica exames de segunda chamada. A pontuação mínima de cada aluno nos quatro exames realizados durante o semestre será descartada (ou seja, não incluída no cálculo da nota da disciplina), então, se um exame não for realizado pelo aluno, a pontuação para esse exame será descartada. Um estudante em sua classe vai mal no primeiro exame, mas ganha um 9,5 em cada um dos próximos dois exames. Seu pai morreu repentinamente no dia anterior ao quarto exame. Ele notifica a professora e pergunta se ele pode fazer o exame quando ele retornar à faculdade após o funeral. A professora diz que não precisa se preocupar com o exame. Simplesmente será o exame descartado. O aluno aponta que ele pretendia que fosse descartada a nota do primeiro exame e estava contando em ganhar uma nota acima de 9,0 para a disciplina no quarto exame. A professora diz que entende a situação do aluno, mas não seria justo se ela mudasse as regras da disciplina para um aluno. A professora está tratando o aluno de forma justa? 6 A ÉTICA SITUACIONAL DE FLETCHER “ ́tica situacional ́ uma abordagem contextualista teologicamente baseada na tomada de decisão ́tica apresentada por Joseph Fletcher . Em geral, as perspectivas religiosas sobre a ́tica constituem modelos formais como o de Kant. Isto ́, são ́ticas baseadas em regras que governam a conduta moral. No entanto, ao contrário da teoria de Kant, nenhum apelo ́ feito à razão como base do dever das pessoas em obedecer às leis morais ou aos mandamentos de uma religião. Em vez disso, as regras são consideradas como a vontade revelada de Deus, que as pessoas são obrigadas a obedecer. “s teorias teístas, portanto, assumem a crença 148 TÓPICO 3 | MODELOS DE RACIOCÍNIO NA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS ÉTICOS em Deus. Somente aqueles que compartilham as crenças de uma religião particular se consideram obrigados a obedecer suas leis morais. Fletcher reconheceu que os princípios ́ticos cristãos de fato parecem entrar em conlito às vezes. No entanto, ele argumentou que os conlitos aparentes entre princípios são o resultado da crença equivocada das pessoas de que tais princípios são universalmente válidos ou seja, válidos em todas as situações em todos os momentos . Segundo Fletcher , o único princípio moral universalmente válido ́ o do amor cristão, ou ágape, que obriga uma pessoa a buscar sempre o que ́ melhor para o pŕximo. "Há apenas uma coisa que ́ sempre boa e correta, intrinsecamente boa, independentemente do contexto, e esta coisa ́ amor" FLETCHER, , p. . Pela razão de que há apenas uma regra fundamental que orienta o comportamento ́tico, Fletcher acreditava que o conlito ́tico seria impossível. O modelo de Fletcher ́ chamado de "́tica situacional" porque a aplicação apropriada do princípio do amor variará de uma situação, ou contexto, para outra. “ ́tica situacional ́ muitas vezes mal interpretada como uma forma de utilitarismo egoísta ou relativismo pessoal, mas tamb́m não ́ nenhuma destas formas. É pragmática porque aborda as consequências de atos especíicos em situações especíicas, assim como o faz o utilitarismo, e ́ relativista apenas no sentido limitado de que nenhuma regra moral especíica ́ vista como válida em todos os contextos em todos os momentos ou seja, como sendo universalmente válida . O amor cristão ́ a única consideração moral universalmente válida. Fletcher descreve a ́tica situacional como uma "́tica cristoĺgica", porque o princípio ́tico fundamental ́ o do amor cristão modelado no amor perfeito de Jesus Cristo. Quando uma regra obrigaria uma pessoa a agir de maneira contrária ao amor, essa regra não ́ apropriada para a situação. No exemplo anterior, de dizer uma mentira para evitar magoar os sentimentos de outra pessoa por exemplo, se um cliente de terapia pergunta a seu psicoterapeuta sua opinião sobre seu novo penteado, o qual ele não deu nenhuma importância particular , o situacionista argumentaria que mentir por amor pelo outro ́ eticamente apropriado. "Não ́ escusadamente mau, ́ positivamente bom" FLETCHER, , p. . Todas as "regras" da moral, como "É errado dizer uma mentira", são contingentes, úteis apenas na medida em que servem para o proṕsito do amor em qualquer situação. "O ḿtodo do amor ́ julgar por particularidade" FLETCHER, , p. . "Ńs seguimos a lei, se em tudo, por amor ńs não seguimos o amor por causa da lei" FLETCHER, , p. . Embora Fletcher não acreditasse que existam regras ́ticas que representem a resposta moralmente correta a cada situação em todos os momentos, o conhecimento de uma pessoa sobre regras e precedentes ́ticos ́ importante. "O situacionista entra em todas as situações de tomada de decisão totalmente armado com as máximas ́ticas de sua comunidade e sua herança, e as trata com respeito como iluminadores de seus problemas" FLETCHER, , p. . No entanto, as regras morais não são seguidas de forma rígida ou dogmática. O situacionista acredita que os princípios deixam de ser úteis e realmente se tornam um obstáculo 149 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA ao comportamento ́tico quando "estão endurecidos em leis" FLETCHER, , p. . É necessária uma consideração cuidadosa para determinar qual a melhor forma de servir o princípio do amor cristão em um determinado contexto. Fletcher apontou que, embora a virtude nunca saia de moda, não ́ representada pela continuação das mesmas práticas antigas em moda alternativa porque as situações mudam. Fletcher identiicou quatro considerações que são importantes para o processo de aplicação do princípio do amor em uma determinada situação. Uma pessoa deve identiicar o im procurado, os meios necessários para obtê-lo, o motivo por trás do ato e quaisquer outras consequências prováveis do ato aĺm do im procurado. “ ́tica da situação tem um vínculo deinitivo com o utilitarismo em sua preocupação com as consequências. No entanto, o objetivo não ́ maximizar o prazer, mas escolher uma ação que produza "a maior quantidade de bem-estar do pŕximo para o maior número possível de pŕximos" FLETCHER, , p. . De acordo com Fletcher, um ato ś pode ser avaliado de forma signiicativa com base no efeito que produz, e os motivos que o subjazem, nesse conjunto especíico de circunstâncias. "Para ńs, se ́ bom ou mal, certo ou errado, não está na ação, mas pelas suas circunstâncias" FLETCHER, , p. . Por exemplo, Fletcher argumentou que, embora existam fortes argumentos religiosos e ́ticos contra o aborto disponíveis sob demanda, o aborto pode ser um curso de ação eticamente apropriado em determinadas circunstâncias. Suponha que uma mulher solteira que sofra de Transtorno ”ipolar, que não tem condições de lidar com uma gravidez ou com uma criança, ́ estuprada por outro cliente psiquiátrico e ica grávida. Um situacionista airmaria que, neste conjunto particular de circunstâncias, um aborto justiicadamente serviria melhor ao bem-estar da mulher e não deveria ser rejeitado a priori como uma opção simplesmente porque o aborto ́ considerado imoral em outros contextos. 6.1 A AVALIAÇÃO CRÍTICA DA ÉTICA SITUACIONAL “ opinião de Fletcher ́ que os juízos ́ticos não são justiicáveis por meio da razão. Em vez disso, a fonte inal do dever ́tico de uma pessoa ́ o mandamento de Deus de amar o pŕximo como ele mesmo. “ validade desse mandamento ́ assumida baseada na f́ cristã. Portanto, como o amor cristão ́ modelado a partir da bondade e do amor de Deus, pareceria redundante airmar que agir por amor ́ fazer o bem. É como dizer "Vá e faça o que Jesus faria" como uma resposta a questões morais. Uma pessoa supostamente não poderia cometer algum erro se ela seguisse esse conselho efetivamente, mas como ela deveria saber o que Jesus faria? Fletcher não ajudou substancialmente na tarefa de identiicar o que ́ o bem ou seja, o ato amoroso em circunstâncias ́ticas complexas porque sua posição ́ que uma pessoa teria que estar na circunstância para poder deliberar um juízo signiicativo. Tamb́m não haveria nenhuma maneira conclusiva, antes ou depois do fato, de avaliar racionalmente a moralidade do curso de ação escolhido. “ssim, não haveria um ḿtodo racional de avaliação da adequação da concepção subjetiva 150 TÓPICO 3 | MODELOS DE RACIOCÍNIO NA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS ÉTICOS do amor cristão que possa motivar uma pessoa que sofre de esquizofrenia de tipo indiferenciado matar seus ilhos, a im de poupá-los de sofrer a dor de viver, embora nenhum eticista razoável toleraria tal ato. Pela razão de que há apenas uma consideração ́tica importante para o situacionista ou seja, a expressão do amor cristão nas ações de algúm , nenhum conlito ́tico genuíno poderia existir. Uma pessoa precisa apenas julgar qual opção em uma situação representa a maior quantidade de amor para o maior grupo possível de pŕximos. No entanto, para quantiicar essa questão, o que envolve claramente a intenção e as consequências ́ tão impossível se não mais que o cálculo utilitarista discutido anteriormente. “ĺm disso, um situacionista não pode determinar de antemão como deve agir porque a importância dos fatores situacionais ́ muito grande, exceto dizer que ele sempre atuará por amor cristão. Essa conceptualização do comportamento ́tico ́ muito exigente. Isso sugere que cada situação ́ uma demanda difícil, exigindo uma avaliação cuidadosa de como o melhor amor pode ser servido nas circunstâncias apresentadas. Na realidade, surgem poucas situações que não podem ser gerenciadas adequadamente, referindo-se às regras da moral convencional. Nesses casos difíceis cada um dos exemplos apresentados por Fletcher envolve um dilema ́tico que requerem uma tomada de decisão ́tica relexiva, a aplicação do amor cristão ́ indiscutivelmente redutível ao sentimento da pessoa em relação ao que seria o melhor curso de ação. Nenhuma justiicativa adicional ́ necessária ou ́ realmente possível. Portanto, a ́tica situacional não representa um ḿtodo para resolver dilemas ́ticos de forma racional. Os proissionais de saúde mental são obrigados a citar razões ślidas em apoio aos juízos ́ticos que fazem. “gir por benevolência e preocupação ́ certamente importante, mas essas considerações são extremamente abstratas e imprecisas. “ssim como os pais e as crianças frequentemente têm percepções muito diferentes do amor associado ao castigo corporal, a perspectiva subjetiva de uma pessoa seria de importância crítica para a percepção do papel do amor cristão em qualquer ato proposto dentro de um determinado conjunto de circunstâncias. Da mesma forma, a perspectiva foi importante para a formulação precisa de uma máxima a ser avaliada com o imperativo cateǵrico de Kant. Finalmente, embora o amor cristão seja um conceito extremamente amplo, não pode disfarçar o fato de que as pessoas encontram situações que envolvem múltiplas considerações ́ticas. “irmar que todas as considerações por exemplo, conidencialidade, preocupação com o bem-estar dos outros, respeito pela autonomia pessoal, responsabilidade social são subsumidas sob este princípio geral tem o efeito de tornar a resolução de problemas ́ticos mais ambígua e complicada do que mais clara e fácil. O princípio único do amor torna-se tão complexo que se torna praticamente impossível comparar e quantiicar as implicações potenciais para o amor representadas pelas alternativas em um verdadeiro dilema ́tico. 151 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA UNI Caso 3.3 Um psicólogo clínico em uma cidade pequena está ciente de um indivíduo que aterrorizou muitas pessoas da cidade há vários anos. Ele assediou mulheres e cometeu vários crimes contra pessoas e seus bens, mas nunca houve evidências suficientes para acusá-lo de um crime. Recentemente, uma menina de 12 anos foi estuprada e assassinada. Embora a evidência aponte fortemente para o mesmo homem, ele não foi preso. Em uma tentativa aparente de se proteger no caso de ser preso, o homem foi ao centro de saúde mental da comunidade, queixando-se de uma longa história de "ouvir vozes". O psicólogo realiza uma avaliação que indica que o homem está simulando os sintomas, embora ele de fato se qualifique em um diagnóstico de Transtorno de Personalidade Antissocial. No entanto, para proteger a comunidade dessa pessoa "malvada", o psicólogo prepara um relatório documentando que o cliente está mentalmente doente (como ele pretende estar) e que é extremamente perigoso para os outros. Além disso, o psicólogo contata as autoridades legais e relata que sua avaliação indica que o homem deveria ser internado em um hospital para receber tratamento psiquiátrico. Quais são as considerações éticas envolvidas nesta situação? O psicólogo está se comportando de maneira ética? 7 O CONTEXTUALISMO ÉTICO DE WALLACE Como contextualista, James Wallace reconheceu que ocorrem conlitos entre princípios ́ticos concorrentes e que nenhum princípio ́ válido em todos os contextos concebíveis ou seja, não há princípios ́ticos universalmente válidos . Wallace apontou que a existência de conlitos ́ticos não ́ surpreendente. Em vez disso, ́ curioso que os especialistas em ́tica assumissem frequentemente que um sistema dedutivo de regras ́ticas por exemplo, a teoria formalista de Kant , derivado de forma independente da experiência, poderia efetivamente abordar o que as pessoas deveriam fazer nos contextos sempre em mudança da vida humana real. "Como um conjunto de princípios poderia antecipar as mudanças contínuas e extensas na condição humana?" W“LL“CE, , p. . Wallace creditou John Dewey como tendo reconhecido a importância de mudar os contextos para a tomada de decisões ́ticas e a compreensão evolutiva das pessoas sobre questões ́ticas. Dewey , p. disse "Em qualidade, o bem nunca ́ duas vezes igual. Nunca se copia. É novo todas as manhãs, fresco todas as noites. É único em todas as suas apresentações". Como as pessoas são capazes de adaptar sua compreensão ́tica a circunstâncias novas e em constante mudança? De acordo com Wallace , a educação moral que as pessoas recebem como crianças envolve mais do que a aprendizagem de regras. “s pessoas gradualmente adquirem uma compreensão cada vez mais soisticada de como determinadas regras se aplicam ou não se aplicam à solução de problemas morais práticos em diferentes tipos de contextos. Em outras palavras, as pessoas aprendem que considerações de moral e justiça às vezes exigem que as regras sejam adaptadas para se adequarem a circunstâncias 152 TÓPICO 3 | MODELOS DE RACIOCÍNIO NA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS ÉTICOS incomuns. "“ maravilhosa plasticidade de resposta de que os seres humanos são capazes envolve a capacidade de adaptar velhas rotinas a novas circunstâncias. Inteligência e compreensão são exibidos em tal adaptação" W“LL“CE, , p. . Este processo de adaptação da aplicação de regras para decidir qual será o curso de ação ́tica em um determinado conjunto de circunstâncias encontradas na vida ́ o que os eticistas chamam de raciocínio prático COHEN COHEN, . O raciocínio prático ́ uma área de inqúrito humano que está evoluindo continuamente à medida que os princípios ́ticos são aplicados em novas situações envolvendo novas combinações de considerações morais. Como adultos, as pessoas geralmente não estão conscientes da necessidade de adaptar seu raciocínio moral às variações no contexto. Wallace explicou que a educação moral que as pessoas recebem fornece um estoque considerável de diretrizes ́ticas contextualmente sensíveis, que representam a sabedoria prática acumulada de sua comunidade e cultura. Embora a maioria das pessoas possa não ser capaz de articular os princípios envolvidos, elas podem, no entanto, empregar este acúmulo de sabedoria prática com facilidade considerável para emitir juízos quanto à relevância de regras ́ticas aparentemente concorrentes ou para determinar quais considerações ́ticas prevalecem em uma situação. “s pessoas tornam-se conscientes da necessidade de raciocínio prático apenas nesses casos difíceis ou seja, dilemas ́ticos em que inicialmente parece que qualquer opção que elas escolherem envolve ignorar outra consideração ́tica igualmente importante. “ capacidade de raciocínio prático dos indivíduos ́ empregada nesses casos para conceber soluções criativas que melhor atendam cada uma das considerações relevantes em uma situação. Portanto, ao inv́s de negar a existência de conlitos potenciais entre princípios ́ticos e sentimento ameaçado por tal possibilidade, o contextualista ́tico reconhece que a experiência humana sempre envolveu tais dilemas e que a capacidade de raciocínio prático das pessoas geralmente provou ser adequada para abordar essas situações razoavelmente e efetivamente. “ssim como Fletcher , Wallace acreditava que os princípios ́ticos que as pessoas foram ensinadas são extremamente importantes para o comportamento ́tico. Kant demonstrou que esses princípios ́ticos revelam às pessoas as considerações que devem ser expressas em seus atos. No entanto, as regras por si ś não são suicientes para garantir a conduta ́tica nas circunstâncias em mudança da vida em que dois deveres ́ticos podem entrar em conlito. Dizer que "as regras são regras" e que as circunstâncias não inluenciam o status ́tico de um ato ́ uma visão ingênua que não relete a maneira como as pessoas razoáveis realmente fazem juízos ́ticos. "Ser crítico, em um sentido importante deste termo, ́ ser bom em ver como o que já se sabe pode ser alterado para que possa ser aplicado em situações sem precedentes" W“LL“CE, , p. . Wallace argumentou que existem dois tipos fundamentais de problemas que revelam a insuiciência de regras ́ticas questões de relevância e verdadeiros conlitos ́ticos. Primeiro, em casos envolvendo um aparente conlito entre princípios, em vez de aplicar uma ou outra regra de forma passiva e irracional, as pessoas razoáveis avaliam se cada consideração ́ verdadeiramente relevante para o contexto. Por exemplo, suponha que um aluno em uma aula de 153 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA estatística informe a seu professor em uma conversa casual um rumor sobre o comportamento de outro professor no departamento. Como o aluno não diz nada sobre manter a conversa conidencial, o professor repete a hist́ria para o outro membro do corpo docente por preocupação com o bem-estar do colega . O colega percebe qual aluno deve ter relatado o rumor e confronta o aluno sobre isso. O aluno então acusa o professor de estatística de ter violado sua conidencialidade. Embora esta situação possa parecer inicialmente envolvida em considerações ́ticas concorrentes, o conhecimento do professor de estatística dos "Princípios Éticos" permite que ele reconheça que a inalidade do dever ́tico em relação à conidencialidade não ́ relevante para essa circunstância, porque nem sua relação com o aluno nem a natureza das informações comunicadas cumprem as condições necessárias para estabelecer o dever de manter a conidencialidade. Em segundo lugar, as regras ́ticas tamb́m são insuicientes quando as pessoas são confrontadas com uma situação em que dois ou mais princípios ́ticos relevantes verdadeiramente conlitam. Um exemplo de um dilema ́tico seria se um psićlogo clínico tratasse outra proissional de saúde mental em psicoterapia e ela revela a ele no contexto da psicoterapia que ela estava tendo uma relação sexual com um cliente atual. Nesse caso, a conidencialidade do cliente ́ uma consideração ́tica relevante, assim como a obrigação do psićlogo clínico de proteger o bem-estar de seu cliente e relatar o comportamento não ́tico por parte da outra proissional. Ele seria confrontado com um conlito entre deveres ́ticos relevantes que, à primeira vista, parece irresolúvel KITCHENER, . Resolver situações que parecem envolver múltiplas considerações ́ticas questões de relevância ou que verdadeiramente representam conlitos entre princípios ́ticos dilemas ́ticos requerem entender por que as pessoas possuem os valores que elas têm. Em outras palavras, por que os princípios ́ticos envolvidos na situação são importantes para as pessoas? Wallace airmou que a razão pela qual as pessoas mantêm certos valores ́ que esses valores promovem a vida humana e a atividade humana de alguma maneira importante. “ chave para resolver conlitos aparentes entre valores ́ compreender o ponto ou função de cada valor e determinar a importância da consideração em relação à situação em questão. Essas relexões metáticas exigem uma compreensão clara das fontes dos valores ́ticos, que ́ a razão pela qual tanta atenção foi dedicada à análise das teorias ́ticas na primeira unidade deste livro e nos dois t́picos anteriores desta unidade. O exemplo a seguir ilustra a aplicação do contextualismo ́tico de Wallace. Um departamento de psicologia opera uma clínica-escola com o objetivo de proporcionar treinamento de prática para estudantes de graduação em psicologia clínica. “ clínica-escola fornece serviços de avaliação e psicoterapia aos estudantes universitários e à comunidade local. “ clínica-escola está aberta apenas durante as tardes da semana. Devido à disponibilidade limitada de espaço no departamento de psicologia, vários professores deste departamento, tanto clínicos como não clínicos, perguntam se o espaço da clínica-escola poderia ser usado para realizar pesquisas durante a manhã e nos ins de semana, justiicando seu pedido, citam a necessidade dos estudantes de espaço de pesquisa para completar projetos de 154 TÓPICO 3 | MODELOS DE RACIOCÍNIO NA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS ÉTICOS teses e o potencial valor cientíico da pesquisa de estudantes e professores. “lguns membros do departamento de psicologia clínica argumentam que o pedido deve ser rejeitado porque a conidencialidade dos clientes pode ser comprometida, observando que os registros dos clientes são mantidos na clínica-escola e que os clientes deixam as mensagens telefônicas em um atendedor de chamadas na clínica-escola durante as horas de não atendimento. Claramente, há várias considerações ́ticas, aparentemente conlitantes citadas pelas duas partes neste caso. “o tentar resolver potenciais conlitos ́ticos de forma racional, o raciocínio prático, segundo Wallace , primeiro envolve uma avaliação da relevância de cada uma das considerações para a situação. Como “rist́teles apontou, a sabedoria prática envolve dar a cada consideração concorrente o peso que merece. Obviamente, uma consideração irrelevante não merece o mesmo peso que uma relevante. “ obrigação de fornecer espaço e recursos suicientes para que os alunos completem o trabalho de pesquisa de suas teses ́ certamente relevante para um proṕsito fundamental de um departamento acadêmico. O potencial valor cientíico dos projetos de pesquisa do corpo docente do departamento ́ difícil de determinar, mas a realização de pesquisas faz parte da descrição do trabalho de um psićlogo no mundo acadêmico e o departamento ́ certamente obrigado a facilitar a capacidade dos membros do corpo docente de fazer seu trabalho. “ questão de garantir a conidencialidade do cliente ́ obviamente importante para qualquer clínica que ofereça serviços psicoĺgicos, mas não está claro como o uso da clínica-escola, quando estiver fechada para atendimentos, por funcionários que não são clínicos ou at́ mesmo aqueles que o são, prejudicaria a conidencialidade dos clientes. Se os registros do cliente não estivessem trancados nos arquivadores ou fossem facilmente acessíveis sem senhas em um computador, uma preocupação ́tica certamente seria justiicada. No entanto, em tal caso, a conidencialidade dos clientes já estaria em risco porque os funcionários da guarda ou da limpeza ou qualquer outra pessoa com uma chave para a porta da clínicaescola teria acesso ao material. Por outro lado, se alunos dos estágios práticos e seus supervisores forem diligentes em suas tarefas de guardar as anotações, arquivos físicos e digitais e outros materiais conidenciais em armários trancados no inal das horas da clínica, certiicando-se de que os registros de computador não possam ser acessados sem senhas bem protegidas, e manter o atendedor de chamadas em uma área segura e privada, uma violação da conidencialidade não deve ser um risco potencial. “ssim, pode-se argumentar que a consideração ́tica de proteger a conidencialidade dos clientes clínicos está sendo aplicada de maneira inadequada à questão de como o espaço da clínica-escola pode ser usado quando a clínica está fechada. “ sensibilidade dos professores clínicos à questão da conidencialidade ́ admirável, mas a questão não ́ demonstrativa de grande relevância para o contexto em consideração. Se os docentes clínicos respondessem que a conidencialidade ́ sempre a principal consideração ́tica em qualquer contexto envolvendo a clínicaescola, sua posição seria revelada em estar fundamentada nos pressupostos de que existem regras ́ticas invioláveis e que a sensibilidade a fatores contextuais não ́ 155 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA uma parte importante do raciocínio prático. Essas posições foram consideradas insustentáveis na consideração da teoria formalista de Kant no início deste t́pico. “ssim, não há uma objeção ́tica razoável neste caso para usar o espaço da clínicaescola para ins de pesquisa durante as horas de não atendimento, desde que haja medidas de proteção adequadas para garantir a conidencialidade dos clientes. Um verdadeiro dilema ́tico, por outro lado, envolve considerações ́ticas múltiplas e concorrentes, que são cada vez mais relevantes para o contexto. O exemplo a seguir ́ um dilema ́tico baseado na questão de oferecer aos clientes acesso aos seus registros de saúde mental. Uma cliente de anos, que havia sido hospitalizada por um epiśdio de depressão, solicita permissão para rever seu registro de tratamento antes de ser dispensada. Seu terapeuta está preocupado porque a seção do registro sobre a hist́ria dos problemas da cliente airma que seu primeiro epiśdio de depressão ocorreu quando tinha anos, pouco depois de seus pais morrerem. Sua tia havia dito ao psiquiatra no momento de sua admissão que o pai da cliente matara sua mãe e depois se matara. “ tia forneceu uma ćpia de um relato do jornal dos eventos, que foi incluído no registro da cliente. O terapeuta está ciente de que sua cliente fora informada de que seus pais morreram em um acidente automobilístico. Ela aparentemente não conhece a hist́ria verdadeira das mortes de seus pais. O respeito pela autonomia de sua cliente sugere que ela tem o direito de saber o que o registro de seu tratamento cont́m, incluindo a verdade sobre sua família e seu pŕprio passado. Por outro lado, a preocupação do terapeuta pelo bem-estar de sua cliente ́ que ela poderia icar traumatizada com essa informação. “mbas as considerações ́ticas concorrentes são claramente relevantes para a situação. Wallace argumentou que para resolver tal dilema de forma razoável, o terapeuta deve tentar interpretar o signiicado e o proṕsito dos princípios envolvidos "de maneiras que são íis às pŕprias regras e às atividades que as regras são projetadas para facilitar" W“LL“CE, , p. . O respeito pela autonomia da cliente para tomar decisões sobre sua pŕpria vida ́ fundamentado no respeito das pessoas por outras pessoas. “s pessoas não acreditam que seja apropriado que outra pessoa tome decisões importantes sobre suas vidas sem o seu conhecimento e consentimento. “s pessoas tamb́m acreditam que não ́ apropriado mentir para outra pessoa, porque esse comportamento mostra uma falta de respeito pela pessoalidade do indivíduo. “ĺm disso, o respeito pela autonomia relete a crença das pessoas no potencial dos seres humanos para o crescimento e autocompreensão. Não se pode então ser verdadeiramente autônomo sem conhecimento de aspectos relevantes do passado, conhecimento que foi negado a esta jovem mulher atrav́s do engano perpetrado por parentes paternalistas. Na ́poca, ela era uma menor de idade, mas, aparentemente, ningúm a tinha informado da verdade quando se tornou adulta. Negar o acesso às informações contidas em seu registro sobre sua família ́ concordar com esse padrão contínuo de desrespeito por sua autonomia. 156 TÓPICO 3 | MODELOS DE RACIOCÍNIO NA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS ÉTICOS “ preocupação com seu bem-estar era, sem dúvida, uma grande consideração na decisão em curso de sua família de não contar a ela as verdadeiras circunstâncias da morte de seus pais, pois suas diiculdades com a depressão persistiram episodicamente at́ a idade adulta. O princípio da preocupação com o bem-estar dos outros baseia-se no respeito e consideração dos proissionais de saúde mental, assim como o princípio concorrente do respeito pela autonomia de uma pessoa. Não ś os proissionais clínicos têm a obrigação de nunca prejudicar intencionalmente outra pessoa, mas tamb́m têm o dever de tentar proteger os outros contra danos sempre que possível. “ questão fundamental aqui ́ se o terapeuta se justiica em proteger sua cliente de danos, agindo de forma paternalista e negando seu acesso a informações potencialmente perturbadoras. Negar seu acesso à informação pode servir para protegê-la de danos, mas apenas à custa de ignorar a obrigação de respeitar sua autonomia como indivíduo. O terapeuta percebe que poderia argumentar que um cliente, de fato, "sofre danos" sempre que outros interferem com seu funcionamento autônomo. É bastante difícil justiicar causar danos a um indivíduo negando sua autonomia para protegê-lo de outros danos. Infantilizar algúm, como foi feito no caso desta mulher, comunica um profundo desrespeito por sua pessoalidade. “lternativamente, proporcionando-lhe acesso supervisionado ao registro para que ela possa aprender a verdade sobre seu passado e trabalhar com as implicações dessas revelações com seu terapeuta demonstraria respeito pela sua autonomia pessoal e tamb́m abordar sua preocupação com seu bem-estar psicoĺgico. Esta estrat́gia tamb́m eliminaria a possibilidade de que ela pudesse aprender a verdade sobre seus pais, em algum momento aṕs a alta, quando ela não poderia ter qualquer apoio disponível para ajudá-la a lidar com a descoberta dolorosa. Essa resolução pode ter ocorrido espontaneamente em muitos leitores, na medida em que eles pensaram sobre o caso. No entanto, outras pessoas podem ter tido diferentes respostas para este caso. O ponto importante ́ que o processo de raciocínio prático descrito acima resultou em uma solução que ́ apoiada por boas razões e ́ consistente com os proṕsitos das considerações ́ticas relevantes para a situação, em vez de um curso de ação arbitrariamente determinado que poderia ser visto como reletindo os preconceitos ́ticos pessoais do proissional envolvido. Para o contextualista ́tico, o comportamento moral inteligente baseiase sempre na compreensão de como os princípios ́ticos foram aplicados no passado e os ins que foram atendidos por essas aplicações W“LL“CE, . O contextualista ́tico demonstra uma compreensão dos "modos de vida" que representam a sabedoria prática acumulada de uma sociedade ou, neste caso, das proissões de saúde mental . O contextualista reconhece que o raciocínio prático exige que as pessoas adaptem essas formas a situações novas. “ resolução de problemas ́ticos ́, portanto, um empreendimento criativo. Resolver um dilema ́tico raramente envolve simplesmente escolher um princípio sobre outro. Em vez disso, ele precisa elaborar uma solução consistente com o proṕsito de todos os princípios envolvidos W“LL“CE, . O contextualista ́tico se esforça para 157 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA tomar decisões que reletem as considerações que as pessoas valorizam mais ou seja, que provaram ser mais importantes e úteis para seus modos de vida , ao modiicar ou excluir o que as pessoas valorizam menos. 7.1 AVALIAÇÃO CRÍTICA DO CONTEXTUALISMO ÉTICO Wallace airmou que a experiência cotidiana das pessoas fornece evidências consideráveis em apoio à visão de que a capacidade prática de raciocínio dos seres humanos ́ eicaz para enfrentar os desaios ́ticos apresentados pelos contextos sempre em mudança da vida moderna. Embora a teoria contextualista parece fornecer um meio muito promissor para resolver o conlito ́tico atrav́s do uso da razão prática, a aplicação bem-sucedida do ḿtodo de Wallace parece exigir uma soisticação metática considerável por parte de um proissional de saúde mental. É necessário que os proissionais se familiarizem não apenas com os valores e princípios ́ticos que devem orientar a sua conduta, mas tamb́m com as justiicativas metáticas desses princípios. Caso contrário, eles não estarão em condições de entender a função das considerações ́ticas envolvidas em uma situação, o que ́ necessário para reconhecer os pontos de conexão entre as considerações e priorizar os princípios de forma razoável. O fato de que o comportar-se eticamente ́ um desaio difícil não ́ uma acusação formal ao contextualismo ́tico. É simplesmente uma realidade com a qual o proissional ́tico deve esforçar-se para lidar. Exercitar o raciocínio prático para se comportar de forma ́tica não ́ uma tarefa fácil. No entanto, como Wallace apontou, tamb́m não ́ impossível. “ atenção dedicada às teorias ́ticas normativas na primeira unidade e no primeiro t́pico desta unidade e os modelos de raciocínio ́tico e fontes de justiicação metática no t́pico anterior e no presente t́pico representam o passo inicial no desenvolvimento da competência no raciocínio prático. Este processo continua no pŕximo t́pico. Será apresentado um modelo de tomada de decisão ́tica com base no contextualismo ́tico de Wallace. Este modelo foi criado para fornecer orientação e estrutura para as deliberações ́ticas de proissionais de saúde mental que lhes permitirão resolver situações eticamente complexas de forma racionalmente defensável. 158 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você aprendeu que • Os ćdigos de ́tica das proissões de saúde mental nem sempre fornecem informações suicientes sobre como os proissionais podem resolver conlitos ́ticos. • Os modelos de resolução de conlitos ́ticos o relativismo ́tico, o utilitarismo, a teoria formalista de Kant, a ́tica situacional de Fletcher e a teoria do contextualismo ́tico de Wallace. “s duas últimas teorias são especiicamente destinadas a abordar dilemas ́ticos. • O relativismo ́tico airma que os dilemas ́ticos não podem ser resolvidos de forma racional. • Tanto o utilitarismo como a teoria formalista de Kant negam a existência de dilemas ́ticos, embora uma análise mais aprofundada das teorias demonstre que o conlito ́tico ́ realmente possível dentro dos quadros dessas teorias, mas ́ irresolúvel. • Em sua ́tica situacional, Fletcher argumenta que os dilemas não são possíveis quando se age de acordo com o amor cristão, que ́ o único verdadeiro princípio moral universal. • Mesmo que a teoria de Fletcher tenha o ḿrito de ser sensível a contextos em mudança, a análise desta teoria não elimina a possibilidade de conlitos ́ticos e o fato de que não nos proporciona um meio racional e efetivo para resolver esses conlitos. • “ teoria do contextualismo ́tico de Wallace tamb́m enfatiza a importância de adaptar diretrizes ́ticas a fatores situacionais. • Wallace argumentou que o conlito ́tico pode ser resolvido e que uma justiicativa racional pode ser providenciada para a tomada de decisões ́ticas. Ele airmou que as pessoas são capazes de resolver conlitos ́ticos, aproveitando uma sabedoria prática comunicada a eles por sua cultura e comunidade. • Quando confrontadas com um verdadeiro dilema ́tico, as pessoas podem praticar um raciocínio prático efetivo, envolvendo discussões metáticas sobre as funções das considerações ́ticas relevantes. Essas deliberações envolvem a relexão sobre como cada consideração contribui para os modos de vida das pessoas ou seja, de que forma o valor ́tico ́ valioso na vida humana , a im de elaborar uma solução consistente com o proṕsito de cada princípio ́tico envolvido na situação. 159 • Uma lacuna da teoria do raciocínio prático de Wallace ́ que ele subestima a diiculdade de atingir o nível de soisticação metática que um proissional precisaria para lidar efetivamente com considerações ́ticas concorrentes. 160 AUTOATIVIDADE Como podemos caracterizar a avaliação crítica do ponto de vista utilitarista em relação ao conlito ́tico? Como podemos caracterizar a avaliação crítica do ponto de vista formalista kantiano em relação ao conlito ́tico? 161 162 TÓPICO 4 UNIDADE 2 UM MODELO DO PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO ÉTICA 1 INTRODUÇÃO Os ćdigos ́ticos proissionais têm duas deiciências principais. Primeiro, os ćdigos proissionais são necessariamente vagos. Eles oferecem princípios gerais para orientar a conduta proissional, juntamente com alguns padrões e proibições especíicas, mas os ćdigos ́ticos não podem fornecer orientação sobre todas as diferentes circunstâncias que surgem na prática de uma proissão de saúde mental. Em segundo lugar, os proissionais de saúde mental ocasionalmente encontram situações em que dois ou mais princípios ́ticos parecem entrar em conlito por exemplo, os princípios de conidencialidade e preocupação com o bem-estar dos outros . Os ćdigos de ́tica das proissões de saúde mental não fornecem um ḿtodo para resolver tais dilemas ́ticos. Como resultado, os proissionais têm pouca orientação aĺm dos seus valores ́ticos pessoais para se referir ao decidir o que fazer. Muitas vezes, eles icam desconfortáveis com o curso de ação que eles selecionam, porque ́ inconsistente com um dos princípios ́ticos envolvidos na situação SMITH et al., . Os proissionais precisam de um ḿtodo racional para determinar um curso de ação eticamente aceitável em circunstâncias tão complexas. O T́pico examinou as formas como os principais modelos de raciocínio ́tico abordaram a questão da resolução de dilemas ́ticos. Este t́pico introduzirá um novo modelo que os proissionais podem usar para fundamentar de forma mais eicaz quando confrontados com problemas ́ticos complexos e fornecer uma justiicativa racional para seus julgamentos ́ticos. 2 O PROPÓSITO DO MODELO O modelo a ser apresentado fornece um ḿtodo que os proissionais podem usar para organizar seu pensamento sobre considerações ́ticas que garantam a abrangência de suas deliberações na tentativa de identiicar e resolver dilemas ́ticos. “ĺm disso, empregar o modelo servirá para aumentar sua consciência da complexidade ́tica associada à sua atividade proissional. Estar consciente do potencial de complicações ́ticas em uma situação permitirá aos proissionais evitar o desenvolvimento de conlitos em muitos casos. Os dilemas ́ticos muitas vezes têm uma maneira de "se esgueirar" para as pessoas quando não reconhecem ou apreciam as implicações complexas de decisões e compromissos 163 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA aparentemente menores M“CK“Y O'NEILL, . Por exemplo, suponha que um cliente de psicoterapia peça ao seu terapeuta sobre suas crenças religiosas. Qual consideração ́tica deve ser levada em conta na escolha de uma resposta a essa consulta? Por outro lado, estar continuamente obcecado com a possibilidade de que haja considerações ́ticas importantes que podem não ter sido detectadas por exemplo, na decisão de oferecer ou não a um estudante ou participante da pesquisa uma xícara de caf́ seria quase tão contraproducente para a eiciência de um proissional, como uma insensibilidade grosseira às questões ́ticas. O objetivo do modelo ́ a permitir aos proissionais diferenciar contextos envolvendo considerações ́ticas múltiplas ou concorrentes daqueles que são menos complexos eticamente e b fornecer um modelo de etapas que os proissionais de saúde mental podem tomar para resolver questões ́ticas complexas de uma maneira racional. O modelo não fornece respostas a problemas ́ticos, apenas um quadro que permita aos proissionais chegarem a suas pŕprias decisões racionalmente bem informadas sobre o que fazer em um determinado conjunto de circunstâncias. O modelo ́ projetado para se aplicar a questões ́ticas que possam surgir em qualquer área da prática de uma proissão de saúde mental por exemplo, ensino, pesquisa, trabalho clínico . 3 O MODELO Vários outros interessados no treinamento de ́tica nas proissões de saúde mental reconheceram o valor de fornecer aos alunos e proissionais um modelo que descreva as etapas apropriadas para abordar questões ́ticas complexas e na resolução de conlitos ́ticos, por exemplo, K. S. Kitchener , Koocher e KeithSpiegel , Francis . O modelo apresentado aqui empresta extensivamente dos estudos destes pesquisadores, mas acrescenta os insights importantes sobre a teoria da ́tica contextualista de Wallace, apresentada no T́pico . O princípio fundamental subjacente a este modelo ́ que a complexidade ́tica de uma situação deve ser avaliada inicialmente, depois reavaliada continuamente à luz das novas informações obtidas e do progresso do raciocínio prático do proissional. Considerações ́ticas adicionais são muitas vezes identiicadas no decurso dessas deliberações. Sempre que o proissional está convencido de que ele abordou a complexidade ́tica da situação de forma adequada e uma opção viável para a ação eticamente apropriada ou não ação está disponível, ele pode tomar uma decisão e concluir suas deliberações. Um esquema do modelo ́ apresentado no quadro a seguir. 164 TÓPICO 4 | UM MODELO DO PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO ÉTICA QUADRO 8 - MODELO DO PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO ÉTICA . “valiação Inicial das Considerações Éticas Implicadas a. Se não houver conlito Tome uma Decisão b. Se aparentemente existe um conlito. . Reúna Informações fatos especíicos do caso, diretrizes ́ticas e legais pertinentes, consulta com colegas e especialistas . . “valiação Secundária das Considerações Éticas Implicadas a. Se o conlito foi resolvido Tome uma Decisão b. Se um conlito aparentemente ainda existe. . Deliberações Metáticas Sobre a Relevância das Considerações Éticas a. Se as deliberações de relevância resolverem o conlito Tome uma Decisão b. Se existe um dilema ́tico. . Deliberações Metáticas Sobre a Resolução do Dilema Ético . “valiação Terciária das Considerações Éticas Geração de Opções . Estime as Consequências de Cada Opção . Tome uma decisão . Documente a Justiicação e o Processo de Tomada de Decisão deve ser feito ao longo do processo . FONTE: O autor Em situações que envolvem considerações ́ticas aparentemente conlitantes, um proissional ́tico deve tentar resolver o conlito aparente de forma racional. Para isso, ele precisará aplicar sua compreensão das fontes de deveres morais, analisadas na primeira unidade e nos t́picos anteriores desta unidade, porque 165 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA não são os princípios ́ticos da proissão, mas os deveres morais subjacentes a esses princípios, que são a fonte fundamental de suas obrigações ́ticas. “ lealdade a um princípio ́tico proissional por exemplo, conidencialidade deve ser substituída apenas por outra consideração ́tica de que um proissional determina ser uma obrigação ́tica mais poderosa e fundamental em uma circunstância particular. "Quando superamos um princípio moral, isso ś deve ser feito por boas razões morais" KITCHENER, , p. . O fracasso de um proissional em se esforçar para resolver conlitos ́ticos de forma razoável representa uma atitude pouco proissional de indiferença em relação à sua proissão e às pessoas a quem ele atende por exemplo, estudantes, clientes, participantes da pesquisa . Podemos dizer que o Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo CFP, airma em sua apresentação que a eicácia dos padrões ́ticos exige um compromisso pessoal com um esforço vital para agir de forma ́tica. O desenvolvimento de habilidades de raciocínio prático ́ um aspecto essencial desse compromisso, porque um proissional deve ser capaz de fornecer uma justiicativa moral racional para suas decisões em casos envolvendo um aparente conlito ́tico. 3.1 PASSO 1: AVALIAÇÃO INICIAL DAS CONSIDERAÇÕES ÉTICAS IMPLICADAS Este passo inicial de avaliação da presença de possíveis considerações ́ticas aplica-se a todo tipo de situação ocupacional encontrada por um proissional de saúde mental por exemplo, pesquisa, ensino, psicoterapia . Um proissional ́tico deve ser particularmente cuidadoso para considerar se, com base nas informações disponíveis, parece haver considerações ́ticas potencialmente conlitantes ou seja, se cumprindo um dever ́tico na situação levará à violação de outro dever igualmente importante . Tenha em mente que a tarefa de avaliar a presença potencial de considerações ́ticas não ́ concluída quando o proissional identiicou um princípio que parece ser importante para a situação. “o concentrar sua atenção de forma restrita em um princípio, um proissional frequentemente ignorará, e talvez violará, outros princípios relevantes. “ĺm disso, ́ importante lembrar que, embora a situação possa envolver uma relação proissional com uma igura principal por exemplo, um cliente de psicoterapia, aluno , frequentemente há mais de uma pessoa que se afeta pela situação por exemplo, a família do cliente, os outros alunos da turma . O proissional deve considerar se a situação envolve uma responsabilidade proissional para outros sujeitos, aĺm do sujeito principal KOOCHER KEITHSPIEGEL, . “ identiicação efetiva da complexidade ́tica nesta fase inicial exige que o proissional seja apropriadamente sensível à presença de considerações ́ticas. No exemplo apresentado anteriormente de um cliente de psicoterapia perguntando ao 166 TÓPICO 4 | UM MODELO DO PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO ÉTICA seu terapeuta sobre suas crenças religiosas, seria importante para ele ser sensível à possibilidade de que seu cliente possa vê-lo como uma autoridade sobre isso, bem como sobre outros assuntos. O potencial para o cliente ser indevidamente inluenciado por seus valores pessoais, apresentado em um ambiente proissional, ́ uma importante consideração ́tica. NOTA Obviamente, as implicações éticas deste ou de qualquer outro cenário variam em diferentes contextos. Se a pergunta for feita durante uma entrevista inicial de psicoterapia, o cliente pode ser visto como solicitando informações relevantes para sua decisão sobre se deve ou não proceder com a psicoterapia com o terapeuta. Se não houver considerações aparentemente concorrentes, o proissional deve encerrar suas deliberações e agir de acordo com o s princípio s ́tico s e/ ou legalidades envolvidas. É importante que um proissional considere válido o ćdigo ́tico de sua proissão. Isto ́, o ćdigo ́tico ́ um guia válido para a conduta proissional, a menos que algum princípio concorrente ou circunstância especial seja ainda mais forte em sua obrigação ”E“UCH“MP CHILDRESS, . Por outro lado, se a situação envolver considerações ́ticas aparentemente concorrentes, as deliberações devem continuar. 3.2 PASSO 2: REUNIR INFORMAÇÕES Quando há considerações ́ticas aparentemente conlitantes, a primeira tarefa ́ reunir o máximo de informações possível. Os fatos especíicos de uma situação são extremamente importantes para as distinções precisas que podem afetar os juízos ́ticos de um proissional KITCHENER, , como se viu no T́pico . “ tomada de decisão ́tica de um proissional geralmente ́ tão boa quanto sua informação. “ segunda tarefa no processo de coleta de informações ́ rever o ćdigo ́tico de sua proissão, dando especial atenção aos princípios e padrões relevantes para as considerações ́ticas concorrentes que ele enfrenta. “ĺm disso, algumas proissões, como a psicologia, geraram um, ou mais, conjunto de diretrizes que regulamentam as especialidades. Estas orientações suplementares devem ser consultadas se forem relevantes para o contexto em que surgiu o conlito por exemplo, pesquisa com participantes humanos . “s informações relativas a quaisquer diretrizes legais aplicáveis tamb́m são extremamente importantes, na medida em que um estatuto jurídico pode indicar que uma das considerações envolvidas constitui um dever legal na situação. Contudo, a existência de um 167 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA estatuto jurídico que aborda a situação pode ou não eliminar o conlito ́tico. Em alguns casos, uma lei pode ser incompatível com o dever ́tico de um proissional, como visto no T́pico da primeira unidade. Os valores pessoais do proissional certamente podem prejudicar sua percepção de uma situação e fazer com que ele favoreça um determinado curso de ação ou dê um peso indevido a uma das considerações ́ticas concorrentes. Um proissional de saúde mental precisa tornar-se consciente de seus preconceitos de valor, suas tendenciosidades, para que possa evitar ser indevidamente inluenciado por eles durante o processo de tomada de decisão ́tica. Outra fonte potencialmente importante de informação para essas deliberações ́ a opinião de colegas experientes e respeitados que lidaram com situações similares ou com a Comissão de Ética do Conselho Regional ou Federal de Psicologia. “ consulta com colegas mais experientes poderia fornecer informações sobre soluções criativas que foram desenvolvidas em resposta a conlitos ́ticos similares. Tais discussões podem tamb́m informar um proissional dos benefícios e desvantagens que os outros experimentaram como uma consequência de dar maior prioridade a uma das considerações ́ticas envolvidas. Como observou Wallace , a sabedoria prática de uma comunidade ou uma proissão baseia-se nos valores de seus membros e na sua experiência cumulativa na aplicação desses valores com sucesso aos contextos sempre em mudança da vida comunitária ou proissional . O raciocínio prático efetivo ́ sempre fundamentado em uma compreensão das maneiras pelas quais os dilemas semelhantes foram resolvidos no passado. O desaio ́ adaptar essas formas ao contexto novo presente W“LL“CE, . 3.3 PASSO 3: AVALIAÇÃO SECUNDÁRIA DAS CONSIDERAÇÕES ÉTICAS IMPLICADAS Se as informações obtidas de qualquer uma das fontes indicam claramente ao proissional que um dos deveres aparentemente conlitantes tem prioridade em uma situação como a que ele enfrenta, o conlito ́tico foi resolvido e ele está pronto para tomar uma decisão. Por exemplo, um cliente pede para ver seu registro de tratamento. Embora sua terapeuta acredite que deva respeitar sua autonomia, ela tamb́m está preocupada em que, em sua condição atual, ele possa ser prejudicado emocionalmente se confrontado com seu diagństico. “o perguntar ao cliente sobre seus motivos para solicitar a exibição de seus registros, ela descobriu que ele realmente viu seu diagństico há uma semana, enquanto uma enfermeira estava atualizando seu registro, e agora simplesmente deseja entender melhor sua situação. “ terapeuta pode simplesmente prosseguir permitindo que o cliente veja seu arquivo, porque os deveres de respeitar a autonomia do cliente e proteger seu bem-estar não estão em desacordo com essa situação. Se, por outro lado, a informação adicional não resolveu o conlito ou aumentou a complexidade ́tica da situação por exemplo, introduziu considerações conlitantes adicionais , em seguida, com base em toda a informação obtida, ela deverá deinir as considerações 168 TÓPICO 4 | UM MODELO DO PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO ÉTICA ́ticas fundamentais que aparentam ser relevantes prima facie para a situação. Se qualquer aspecto da situação ou as considerações não estiverem claras, ela deve, em todos os casos, voltar ao Passo e reunir mais informações. Lembre-se sempre de que os melhores juízos ́ticos são os baseados na melhor informação, porque os fatores situacionais são de grande importância. 3.4 PASSO 4: DELIBERAÇÕES METAÉTICAS RELATIVAS À RELEVÂNCIA DAS CONSIDERAÇÕES ÉTICAS Em situações que envolvem um aparente conlito entre deveres ́ticos, um proissional deve, em seguida, ter um ḿtodo de determinar, de forma racional, se cada consideração ́ genuinamente relevante para a situação. Embora todos os princípios ́ticos sejam importantes, eles não se aplicam a todas as situações. Por exemplo, a conidencialidade ́ um princípio ́tico de importância vital, mas não ́ relevante para uma situação em que um proissional de saúde mental observe seu vizinho abusando de seu cônjuge. Conforme discutido no T́pico , as deliberações relativas à relevância envolvem compreender o ponto de cada consideração. Isto ́, o proissional deve reletir sobre um nível metático para determinar os motivos pelos quais cada princípio ou valor ́ levado a śrio como uma consideração ́tica como o princípio contribui para a vida humana W“LL“CE, . Para deliberar efetivamente, os proissionais devem ser capazes de rastrear a origem metática de qualquer regra de conduta proissional. O contexto das teorias ́ticas previstas nos t́picos anteriores ajudará os proissionais nesta tarefa. Se o aparente conlito ́tico tiver sido abordado com base nas deliberações sobre relevância, não deixando mais conlito, o proissional está em condições de resolver a situação de maneira apropriada eticamente. Se for conlitante, ainda existem considerações ́ticas relevantes, serão necessárias mais deliberações para resolver racionalmente a situação, que agora ́ entendida como constituindo um verdadeiro dilema ́tico. 3.5 PASSO 5: DELIBERAÇÕES METAÉTICAS RELATIVAS À RESOLUÇÃO DO DILEMA ÉTICO Todo o aporte obtido at́ agora deve ser aplicado à tarefa de analisar mais detalhadamente as considerações ́ticas concorrentes para entender claramente o ponto de cada consideração e o peso que a cada um deve ser dado no contexto ́tico especíico a ser tratado. Por que tem sido atribuído um tal prestígio a esse valor no passado? Como contribui para os modos de vida de uma comunidade ou de uma proissão? Essas deliberações metáticas geralmente esclarecerão e simpliicarão um problema ́tico complexo, porque a multiplicidade de princípios ́ticos estabelecidos em um ćdigo proissional se funde em um conjunto muito menor de fontes metáticas de valor. Diferentes princípios ́ticos por exemplo, conidencialidade e respeito pela autonomia que parecem entrar em conlito 169 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA em uma situação dada são muitas vezes encontrados reletindo o mesmo valor fundamental ou seja, o respeito pelas pessoas ́ a base tanto para a crença de que as pessoas têm direito à sua privacidade e que elas deveriam ter permissão para escolher como elas desejam realizar suas vidas . Nesse caso, resolver o problema ́tico ́ então uma questão de elaborar uma solução que sirva melhor o valor fundamental que agora ́ reconhecido como a fonte do dever ́tico do proissional na situação. 3.6 PASSO 6: AVALIAÇÃO TERCIÁRIA DAS CONSIDERAÇÕES ÉTICAS - GERAR OPÇÕES Depois de aplicar suas habilidades práticas de raciocínio para resolver o dilema ́tico, um proissional deve novamente reavaliar a situação para avaliar o progresso de suas deliberações. Se ele percebe alguma ambiguidade na situação que ́ devido à inadequação de sua informação, ele sempre pode procurar informações adicionais. Uma vez que ele reuniu as novas informações e determinou a importância relativa de cada uma das considerações ́ticas concorrentes, ele deve começar o processo de geração de opções comportamentais. “o gerar opções, o proissional retorna ao nível pragmático de aplicar o ćdigo ́tico à situação concreta. “ melhor opção será aquela que seja consistente com a inalidade do valor ́tico mais fundamental relevante para a situação, mas que não prejudica quaisquer outras considerações relevantes. Embora as opções que relitam cada uma das considerações conlitantes devam ser consideradas, ́ extremamente importante lembrar que a solução que melhor serve o ponto de cada uma das considerações concorrentes será, geralmente, uma solução criativa que representa um afastamento das opções com base em considerações únicas que geralmente orientam o pensamento das pessoas. O raciocínio prático deve ser visto como uma atividade de resolução de problemas altamente criativa. No entanto, às vezes ocorrem situações nas quais nenhuma das opções parece ideal. Nessas circunstâncias, o princípio da não maleicência tornase particularmente importante. Por exemplo, se não houver nenhuma opção disponível que permita que um proissional ajude todos os envolvidos na situação, existe pelo menos uma opção que o capacitará a ajudar a pessoa que mais precisa de ajuda e ainda evitar causar danos a algúm? “o gerar opções, ele tamb́m deve sempre considerar a possibilidade de que o curso eticamente mais apropriado seja não tomar nenhuma ação. Em algumas circunstâncias por exemplo, uma ameaça vaga contra algúm relatado como tendo sido feita por um participante da pesquisa , esta opção pode ser mais consistente com o princípio da falta da não maleicência. 170 TÓPICO 4 | UM MODELO DO PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO ÉTICA 3.7 PASSO 7: ESTIMAR AS CONSEQUÊNCIAS DE CADA OPÇÃO Uma vez que um proissional gerou um menu de potenciais opções de ação, ele deve estimar as consequências prováveis de cada opção para cada pessoa envolvida, utilizando qualquer evidência disponível para sustentar essas estimativas. Embora tal estimativa seja extremamente difícil e nunca pode ser feita com precisão absoluta como foi discutido anteriormente em relação ao utilitarismo , a probabilidade de resultados particulares ́, no entanto, uma consideração importante. “ĺm disso, dadas as deliberações muito cuidadosas envolvidas at́ este ponto no processo, ele provavelmente terá um senso bastante claro das consequências prováveis de uma determinada opção. Se não o izer, talvez seja necessária a coleta de mais informações. No mínimo, o exercício de estimar as consequências das soluções que ele gerou diminuirá a probabilidade de agir de forma impulsiva, sem ter levado devidamente em conta as implicações potenciais de sua decisão para cada pessoa afetada, ou seja, embora este processo não revele qual opção ́ absolutamente correta, será muito improvável que ele vá buscar uma opção eticamente inapropriada ou insensível. 3.8 PASSO 8: TOMAR UMA DECISÃO Mesmo na situação mais complexa, considerações ́ticas conlitantes exigem algum tipo de resolução. Se o tempo e as circunstâncias o permitirem, um proissional pode cercar sua decisão um pouco mais, propondo sua solução para um supervisor ou colega experiente antes de implementá-la. De fato, diante de uma questão ́tica difícil, ́ sempre desejável aproveitar o máximo de tempo possível para deliberar. Os maus juízos são muito mais prováveis de ocorrer quando um proissional está sob intensa pressão de tempo. “inda assim, no inal, ele precisará agir. Embora ele geralmente não tenha certeza de que está tomando o curso correto, seu grau de conforto na atuação será signiicativamente maior se ele atendeu atentamente suas deliberações ́ticas e desenvolveu uma justiicativa ślida, bem informada e racional para a ação que está tomando. 3.9 PASSO 9: DOCUMENTAR A JUSTIFICAÇÃO E O PROCESSO DE TOMADA DE DECISÕES Sempre que um proissional toma uma ação que relete uma ou mais considerações ́ticas, mesmo que não haja conlito ́tico, as ações tomadas e a justiicativa da decisão devem ser registradas. Documentar a decisão e o processo de deliberações ́ticas será feito atrav́s de qualquer forma de manutenção de registros apropriada ao contexto proissional por exemplo, arquivo do cliente, registro de pesquisa . 171 UNIDADE 2 | RACIOCÍNIO ÉTICO E A PSICOLOGIA Em situações que envolvem um aparente conlito entre considerações ́ticas ou seja, questões de relevância e em situações que representam dilemas ́ticos genuínos, um proissional deve manter registros cuidadosos ao longo do processo de suas deliberações, tanto para organizar seus pensamentos sobre o assunto, quanto para fornecer uma explicação permanente dos passos tomados em suas tentativas para resolver o problema. É essencial que ele registre cuidadosamente o raciocínio de sua ação. “o lidar com um dilema particularmente difícil, ́ provável que algumas pessoas não concordem com a decisão a que ele chegou. É importante que ele seja capaz de documentar os cuidados que tomou ao chegar à sua decisão e o fato de que ele estava ciente das considerações relevantes, reuniu informações, consultou colegas etc., para que qualquer revisor de sua decisão reconheça que ele agiu de boa-f́, isto ́, com base em deliberações cuidadas e racionais. “s Comissões de Ética de iscalização proissional vinculadas aos Conselhos Regionais e Federal de Psicologia não esperam que os proissionais tenham julgamento perfeito em questões ́ticas difíceis, mas esperam que os proissionais demonstrem cuidados e preocupações adequadas para lidar com situações eticamente problemáticas. Geralmente, reconhece-se que diferentes indivíduos, que possuem vários graus de experiência, podem diferir em suas opiniões ́ticas H““S M“LOUF M“YERSON, . “ negligência não ́ atribuída a proissionais baseados simplesmente em uma diferença de opinião em relação a uma questão ́tica. “ negligência envolve um julgamento de que o proissional agiu de modo impulsivo ou imprevisível, com aparente desrespeito por importantes considerações ́ticas. Deliberações ́ticas cuidadosas, reletidas com precisão na manutenção de registros oiciais, demonstrarão um comportamento proissional apropriado. 172 RESUMO DO TÓPICO 4 Neste tópico, você aprendeu que • Duas principais deiciências dos ćdigos ́ticos proissionais são a que os ćdigos não podem fornecer orientação especíica sobre o curso de ação eticamente apropriado em cada circunstância que um proissional possa enfrentar e b que os ćdigos não fornecem um ḿtodo para resolver situações nas quais dois ou mais princípios ́ticos codiicados parecem entrar em conlito. • O modelo de tomada de decisão ́tica apresentado neste t́pico fornece aos proissionais de saúde mental uma estrutura de raciocínio mais eicaz ao tentar resolver problemas ́ticos complexos. Empregar este modelo aumentará a sensibilidade dos proissionais à presença de múltiplas considerações ́ticas em situações que surjam no decorrer de sua atividade proissional. • O modelo exposto não ś ajudará os proissionais a resolver conlitos ́ticos, mas tamb́m os permitirá prever e evitar potenciais conlitos que, de outra forma, poderiam atrapalhá-los. • “ premissa fundamental subjacente a este modelo ́ que a complexidade ́tica de uma situação deve ser avaliada inicialmente, então continuamente reavaliada à luz das novas informações obtidas e do progresso das deliberações de decisão. • Cada vez que as considerações ́ticas envolvidas na situação são avaliadas, o proissional deve determinar se existe um conlito. • Se não houver conlito, ele deve tomar uma decisão sobre um curso de ação. Se existe um conlito, ele deve passar por etapas adicionais envolvendo a coleta de informações e a realização de deliberações metáticas. • Este processo permitirá que ele gere opções viáveis, estimar as consequências prováveis de cada opção e chegar a uma decisão, que ele terá documentado como sendo a alternativa mais racional disponível no caso. 173 AUTOATIVIDADE Descreva, na ordem correta, os passos do processo de tomada de decisão ́tica proposto no modelo deste t́pico. 174 UNIDADE 3 O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM Esta unidade tem por objetivos • relatar o processo de regulamentação da formação e da proissão do psićlogo no ”rasil, bem como a criação e a estrutura do Sistema Conselho • analisar o Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo • apresentar as principais resoluções do Conselho Federal de Psicologia • examinar o Manual de Elaboração de Documentos Escritos produzidos pelo psićlogo. PLANO DE ESTUDOS Esta unidade está dividida em quatro t́picos. No decorrer da unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. T2PICO - REGUL“MENT“ÇÃO D“ PROFISSÃO E OS 2RGÃOS DE CLASSE T2PICO - C2DIGO DE ÉTIC“ PROFISSION“L DO PSIC2LOGO T2PICO - RESOLUÇ6ES DO CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“ T2PICO - PRODUÇÃO DE DOCUMENTOS PSICOL2GICOS 175 176 TÓPICO 1 UNIDADE 3 A REGULAMENTAÇÃO DA PROFISSÃO E OS ÓRGÃOS DE CLASSE 1 INTRODUÇÃO Historicamente, o nascimento da Psicologia como ciência ́ atribuído à data de fundação do primeiro laborat́rio de Psicologia em Leipzig, por Wilhelm Wundt, em , e sua evolução ocorreu de forma acelerada na Europa e nos Estados Unidos com o desenvolvimento de diversas abordagens téricas e pesquisas, bem como na aplicação de suas t́cnicas psicoĺgicas SILV“ JUNIOR C“NT“RINI PRUDENTE, . E a psicologia como proissão no ”rasil, como se deu sua construção? Quais são as instituições que orientam e normatizam a atuação do psićlogo em nosso país? Vamos começar entendendo o que signiica o termo proissão . Esta palavra vem do latim professione ou professio, e de acordo com Passos , p. seu signiicado remete ao ato ou efeito de professar, e quem professa explicita o que acredita uma crença, valores, compromissos etc. . Segundo Freidson apud PEREIR“ PEREIR“ NETO, , p. , proissão ́ um tipo especíico de trabalho especializado, teoricamente fundado que apresenta algumas características, como ter um conhecimento que lhe ́ pŕprio, possuir instituições que defendam seus interesses e regulem a conduta de seus membros atrav́s de normas e regras, por exemplo, os ćdigos de ́tica, aĺm de ser reconhecida como necessária pela sociedade e pelo Estado. “ssim, para que domine as normativas e o compromisso ́tico da práxis do psićlogo no ”rasil, nesta unidade você irá conhecer e discutir sobre os aspectos hist́ricos do reconhecimento da proissão e da sua organização enquanto categoria proissional. Posteriormente, trataremos sobre a conduta ́tica e as normativas que orientam sua atuação. 2 A PROFISSIONALIZAÇÃO DO PSICÓLOGO NO BRASIL Para que a psicologia fosse reconhecida como proissão no ”rasil, foi necessário um longo percurso de lutas e articulações. Para entender esse processo, ́ importante conhecermos um pouco da hist́ria da Psicologia no ”rasil, isso porque, como airma Pato , p. 177 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO Escreve-se a hist́ria não para perilar cronologicamente nomes, fatos e datas, tendo em vista celebrar os grandes vultos ou a grande ciência que ajudaram a construir, mas para entender a constituição hist́rica do presente e reletir sobre o futuro no marco do inevitável engajamento da ciência ou de seu compromisso ́tico. 2.1 ASPECTOS HISTÓRICOS DA CONSOLIDAÇÃO DA PSICOLOGIA COMO PROFISSÃO NO BRASIL No ”rasil, de acordo com “ntunes , desde a ́poca colonial pode-se localizar escritos onde se encontra uma preocupação com fenômenos psicoĺgicos. Soares aponta que a partir de , no período do ”rasil Imperial, foram produzidas teses escritas por ḿdicos das faculdades de Medicina do Rio de Janeiro e da ”ahia que versavam sobre temas do interesse da Psicologia. Com o avanço da Psicologia na Europa, passam a ser produzidas publicações no ”rasil já com objetos de conhecimento e t́cnicas psicoĺgicas com rigor cientíico pŕprios da psicologia enquanto ciência. Tamb́m foram construídos, no ”rasil, a partir de , laborat́rios de Psicologia em hospitais e clínicas psiquiátricas com equipamentos trazidos de Leipzig e Paris. “ĺm dos ḿdicos, ainda no śculo XIX, os educadores tamb́m contribuíram grandemente para a inserção da Psicologia em nosso país atrav́s das Escolas Normais, que eram institutos de formação de professores. “trav́s de estudos sobre a aprendizagem e desenvolvimento, as ideias psicoĺgicas foram aos poucos sendo incorporadas na pedagogia, o que levou ”enjamin Constant, em , aṕs a proclamação da República, a propor uma reforma no ensino brasileiro e modiicar a disciplina de Filosoia nas Escolas Normais para Psicologia e Ĺgica “NTUNES, . Nos primeiros anos do śculo XX a sociedade brasileira passou por transformações devido ao processo de industrialização e urbanização do país, o que exigiu mudanças sociais nas áreas da saúde, educação e organização do trabalho, por exemplo, a necessidade de creches e de cursos proissionalizantes. Foi a partir desse período, principalmente aṕs , que vemos a consolidação da psicologia no ”rasil, ao contribuir com práticas psicoĺgicas que atendessem essa demanda, como a atuação de psicot́cnicos em organizações e hospitais psiquiátricos, na seleção proissional em indústrias e convite para que pesquisadores da Psicologia da Europa e dos Estados Unidos viessem capacitar os proissionais que atuassem com a Psicologia no país ”“PTIST“, . Sobre o ensino formal da Psicologia, em , o ainda Minist́rio da Educação e Saúde, atrav́s de uma portaria aprovada pelo ministro Ernesto de Souza Campos, concedeu o título de Especialização em Psicologia para quem cursasse três anos do curso de Filosoia e izesse, aĺm de cursos de Psicologia, estágios em serviços psicoĺgicos. Tamb́m a especialização de Psicologia Educacional passou 178 TÓPICO 1 | A REGULAMENTAÇÃO DA PROFISSÃO E OS ÓRGÃOS DE CLASSE a ser concedida a proissionais que concluíssem o curso de Pedagogia e disciplinas especíicas da Psicologia, bem como estágios em Psicologia “plicada SO“RES, . “lguns anos depois, em , foi criado no Minist́rio da Guerra, por meio de uma portaria, um curso de Classiicação de Pessoal . Sua instalação merece destaque, pois a conclusão desse curso outorgava o Diploma de Psićlogo SO“RES, . Conforme aponta ”aptista , foi no inal da d́cada de que se iniciou um movimento pela regulamentação da psicologia como proissão no ”rasil. Proissionais fundaram então, em , a Sociedade de Psicologia de São Paulo e, em , propuseram um debate sobre a formação dos psicologistas , como eram chamados os proissionais que atuavam com práticas psicoĺgicas na ́poca. Outra questão tratada pela classe era a necessidade dos cursos de Psicologia se separarem dos de Filosoia e Pedagogia e se tornarem autônomos devido ao status da Psicologia como ciência independente. Em , ocorreu a criação do primeiro curso de formação em Psicologia no Rio de Janeiro e a apresentação do primeiro anteprojeto de lei sobre a formação e a regulamentação da proissão ao Minist́rio de Educação e Cultura. É interessante perceber que, neste documento, em sua parte introdut́ria, se justiica a importância da proissão em suas três principais áreas de atuação escolar, trabalho e clínica, e pleiteava que a formação fosse dividida em duas a do psicologista, considerada uma formação térico-prática com três anos de curso de bacharel e dois anos de licenciado ou a de auxiliar-psicologista aṕs a conclusão somente do bacharelado. Nesse mesmo ano foi realizado, em Curitiba, o I Congresso ”rasileiro de Psicologia, onde aṕs discussões foi elaborado um documento com uma segunda proposta de formação e regulamentação da proissão que tamb́m foi entregue ao Minist́rio da Educação e Cultura ”“PTIST“, . DICAS SUGESTÃO DE FILME Em 2012, o Conselho Federal de Psicologia lançou um vídeo em comemoração aos 50 anos de profissão no Brasil e que faz um resumo da história da Psicologia no país desde o período colonial até os dias atuais. O vídeo está disponível em: <https://www.youtube.com/ watch?v=82shonzH99A>. 179 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO 2.2 A REGULAMENTAÇÃO DA FORMAÇÃO E DA PROFISSÃO DE PSICÓLOGO NO BRASIL “pesar de todos os movimentos dos psicologistas, o projeto de lei referente à formação e regulamentação da proissão foi elaborado apenas em , pela Comissão de Ensino Superior do Minist́rio da Educação. Nesse documento, segundo ”aptista , consta que na ́poca já existiam mais de mil proissionais atuando na área, alguns como autodidatas, devido à falta de formação especíica. O parecer tamb́m aponta que a especialidade Psicologia Clínica deveria icar a cargo da proissão ḿdica, visto que esta categoria defendia que as expressões clínica e psicoterapia eram consideradas privativas dos ḿdicos. Essa proposta não agradou aos proissionais que atuavam na área clínica, que se mobilizaram em conjunto com a “ssociação ”rasileira de Psićlogos e a Sociedade de Psicologia de São Paulo e apresentaram um projeto de lei substituto que solicitava, entre outras mudanças, a adoção da denominação de psićlogo sem divisão de funções entre psicologista e psicologista auxiliar. Foram necessárias ainda outras propostas e emendas para que no dia de agosto de , a Lei nº . fosse assinada pelo presidente João Goulart. Esta lei, que dispõe sobre a formação em Psicologia e regulamenta a proissão do psićlogo , determinou que a formação em Psicologia ocorreria em nível de bacharelado, licenciatura e formação de psićlogo, aĺm de estabelecer, no “rt. , § º, que Constitui função privativa do psićlogo a utilização de ḿtodos e t́cnicas psicoĺgicas com os seguintes objetivos a diagństico psicoĺgico b orientação e seleção proissional c orientação psicopedaǵgica d solução de problemas de ajustamento ”R“SIL, . Como você pode perceber, no texto da lei não consta a expressão psicoterapia como atribuição privativa do psićlogo, e sim solução de problemas de ajustamento . “ utilização da psicoterapia como prática do psićlogo foi regulamentada apenas no ano de , atrav́s de uma resolução do Conselho Federal de Psicologia, a qual trataremos no T́pico . NOTA Você sabia que, apesar de ser considerado o dia 27 de agosto, data da aprovação da Lei 4.119, como o Dia Nacional do Psicólogo, esta data só foi oficializada no ano de 2016 através da Lei 13.407? Para saber mais, acesse: <http://site.cfp.org.br/dia-nacional-do-psicologoagora-e-oficial/>. 180 TÓPICO 1 | A REGULAMENTAÇÃO DA PROFISSÃO E OS ÓRGÃOS DE CLASSE Outra questão tratada pela Lei . / e que merece destaque ́ sobre a regularização da situação dos proissionais que já atuavam como psićlogos. Estes, que possuíam especialização em Psicologia Educacional, Psicologia Clínica e Psicologia “plicada ao Trabalho, ou que já exerciam por mais de cinco anos atividades dentro da Psicologia “plicada, tiveram o direito de requerer o registro como psićlogo. Em , atrav́s do Decreto nº . , a Lei nº . foi regulamentada e se ampliou as funções do psićlogo, pois, onde aĺm das citadas anteriormente, segundo seu “rt. º, tamb́m ́ da sua competência Dirigir serviços de Psicologia em ́rgãos e estabelecimentos públicos, autárquicos, paraestatais, de economia mista e particulares. Ensinar as cadeiras ou disciplinas de Psicologia nos vários níveis de ensino, observadas as demais exigências da legislação em vigor. Supervisionar proissionais e alunos em trabalhos téricos e práticos de Psicologia. “ssessorar, tecnicamente, ́rgãos e estabelecimentos públicos, autárquicos, paraestatais, de economia mista e particulares. Realizar perícias e emitir pareceres sobre a mat́ria de Psicologia ”R“SIL, . NOTA Sobre a formação dos psicólogos, é importante que você saiba que em 2004 foram aprovadas as novas Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Psicologia. Se antes a graduação era estruturada por meio de um currículo mínimo, agora passa a ter um núcleo comum composto por um conjunto de competências básicas que objetivam desenvolver no acadêmico o domínio de conhecimentos da Psicologia e habilidades, garantindo uma formação ampla, pluralista, que o capacite a “utilizá-los em diferentes contextos que demandam a investigação, análise, avaliação, prevenção e intervenção em processos psicológicos”. Define ainda que cada instituição pode organizar seu curso a partir de ênfases curriculares e a realização de estágios básicos e específicos. Você pode conhecer mais sobre o assunto acessando o Parecer do Conselho Nacional de Educação sobre o tema, disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/ces062.pdf>. Acesso em: 15 jul. 2017. Com a deinição da formação e da regulamentação da proissão psićlogo no país, outros problemas surgiram, pois, quem seria responsável por conceder os registros para os proissionais? Quem iscalizaria a atuação desses psićlogos? Quais normas deveriam ser seguidas? Para resolver essas questões, ́ necessário que exista um ćdigo de conduta, bem como um ́rgão de classe para cuidar dos interesses e proteger proissionais e usuários dos serviços. Sobre o Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo, trataremos de forma mais detalhada no T́pico . “ seguir, veremos como foi que ocorreu a criação do Sistema Conselhos, formado pelo Conselho Federal de Psicologia e os Conselhos Regionais de Psicologia. 181 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO 2.3 A CRIAÇÃO DO SISTEMA CONSELHOS “ssim como na regulamentação da proissão em lei, para que houvesse a criação de um ́rgão responsável por zelar pela proissão do psićlogo tamb́m foram necessários alguns anos de articulação entre os proissionais da classe. De acordo com Passos , a organização dos trabalhadores em grupos proissionais ́ uma conquista não ś proissional, mas tamb́m social, pois visa a segurança e o cuidado de uma classe com as questões ́ticas e o compromisso com as necessidades da sociedade. Como vimos, a formação e a regulamentação da proissão psićlogo no ”rasil ocorreram em . “companhando a hist́ria do ”rasil, vemos que a partir de passamos a viver sob a ditadura militar, o que levou a mudanças no cenário nacional. Instalou-se na sociedade brasileira um clima de tensão e insegurança devido à repressão política e à perda de direitos LEITE, . Em foi aprovada uma nova Lei de Diretrizes e ”ases da Educação Nacional, Lei nº . , onde a Psicologia sofreu uma perda, já que esta disciplina foi retirada da grade curricular do então º Grau hoje nomeado como Ensino Ḿdio . Poŕm, nesse mesmo ano, no mês de fevereiro, a Sociedade Mineira de Psicologia deu o primeiro passo em direção à organização da proissão e propôs a realização de um Encontro Nacional de Entidades da Psicologia ”rasileira. O encontro ocorreu em março, na Cidade Universitária em São Paulo, e como resultado tivemos a decisão dos psićlogos ali presentes de promover mais congressos em nível nacional e a necessidade de mobilizarem as autoridades competentes para a aprovação de uma lei para a instalação de um ́rgão representativo da categoria. Em dezembro do mesmo ano, depois de nove anos de regulamentação da proissão, ́ aprovada a Lei nº . , que criou os Conselhos Regionais e o Conselho Federal de Psicologia LEITE, . “ referida lei estabelece, em seu “rt. º, que o conjunto dos Conselhos Regionais e Federal forma uma autarquia de direito público com autonomia administrativa e inanceira cujo objetivo ́ orientar, disciplinar e iscalizar o exercício da proissão de psićlogo e zelar pela iel observância dos princípios de ́tica e disciplina da classe . Tamb́m estão previstas na lei as atribuições dos Conselhos Regionais e Federal, bem como o funcionamento deles, tendo inicialmente como sede local cedida pelo Minist́rio do Trabalho e Previdência Social SO“RES, . No entanto, para que o Conselho fosse efetivado seria necessária a regulamentação da lei e a articulação dos psićlogos para a eleição e posse dos primeiros conselheiros. Para isso, em foi marcado o II Encontro Nacional das Sociedades de Psicologia em ”arbacena MG , para discutir os rumos da psicologia enquanto proissão. Foi no ano seguinte, de acordo com Soares , em , dia de dezembro, que o ministro do Trabalho, Julio ”arata, convocou em ”rasília a assembleia prevista na Lei nº . , com a presença dos delegados de todas as Sociedades de Psicologia. “o indar da sessão, estava eleito o Primeiro Conselho 182 TÓPICO 1 | A REGULAMENTAÇÃO DA PROFISSÃO E OS ÓRGÃOS DE CLASSE Federal de Psicologia CFP , com representantes de todas as regiões do país e seus suplentes, sendo eleito como o primeiro presidente o psićlogo “rrigo Leonardo “ngelini, que foi reeleito em assembleia posterior, terminando seus mandatos em . UNI Arrigo Leonardo Angelini – graduado em Pedagogia pela USP em 1944, em 1953 obtém o título de doutor em Psicologia pela mesma instituição. Participou do movimento para a regulamentação da Psicologia no país enquanto profissão. Foi presidente da Sociedade de Psicologia de São Paulo, Presidente da Associação Brasileira de Psicólogos, Presidente da Sociedade Interamericana de Psicologia e o primeiro Presidente do Conselho Federal de Psicologia no Brasil. FONTE: Academia Paulista de Psicologia (2005). Disponível em: <www.psi.bvs.br/local/file/ subsidios/atuais/ArrigoAngelini.pdf>. Acesso em: 15 jul. 2017. Os consiliários do primeiro conselho teriam pela frente grandes desaios na tarefa de estruturar a proissão, como a elaboração de uma legislação para regular o exercício proissional, por exemplo, o Ćdigo de Ética Proissional dos Psićlogos. Uma das providências tomadas por essa primeira gestão foi a aprovação, em , de um anteprojeto de regulamentação da Lei n. . , que ś ocorreu por meio do Decreto . , em de junho de LEITE, . O Conselho Federal de Psicologia, enquanto ́rgão central do Sistema Conselhos, tem a sua sede no Distrito Federal e jurisdição em todo o territ́rio nacional. Você vai conhecer sua organização e funcionamento com base no estabelecido em lei e nas decisões tomadas atrav́s de resoluções. 3 CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA (CFP) O CFP, segundo a Lei n. . , ́ formado por nove conselheiros efetivos e nove suplentes eleitos na “ssembleia Regional dos Delegados, cujo mandato ́ de três anos, sendo permitida a reeleição consecutiva apenas uma vez. “ lei descreve 183 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO ainda as atribuições dos membros eleitos, o registro, o patrimônio da autarquia, o funcionamento das assembleias, a iscalização da proissão e a deinição das infrações disciplinares, que trataremos mais adiante. Listaremos agora as competências do CFP que estão descritas no “rt. º da supracitada Lei a elaborar seu regimento e aprovar os regimentos organizados pelos Conselhos Regionais b orientar, disciplinar e iscalizar o exercício da proissão de psićlogo c expedir as resoluções necessárias ao cumprimento das leis em vigor e das que venham modiicar as atribuições e competência dos proissionais de Psicologia d deinir, nos termos legais, o limite de competência do exercício proissional, conforme os cursos realizados ou provas de especialização prestadas em escolas ou institutos proissionais reconhecidos e elaborar e aprovar o Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo f funcionar como tribunal superior de ́tica proissional g servir de ́rgão consultivo em mat́ria de Psicologia h julgar em última instância os recursos das deliberações dos Conselhos Regionais i publicar, anualmente, o relat́rio de seus trabalhos e a relação de todos os psićlogos registrados j expedir resoluções e instruções necessárias ao bom funcionamento do Conselho Federal e dos Conselhos Regionais, inclusive no que tange ao procedimento eleitoral respectivo l aprovar as anuidades e demais contribuições a serem pagas pelos psićlogos m ixar a composição dos Conselhos Regionais, organizando-os à sua semelhança e promovendo a instalação de tantos Conselhos quantos forem julgados necessários, determinando suas sedes e zonas de jurisdição n propor ao poder competente alterações da legislação relativa ao exercício da proissão de psićlogo o promover a intervenção nos Conselhos Regionais, na hiṕtese de sua insolvência p dentro dos prazos regimentais, elaborar a proposta orçamentária anual a ser apreciada pela “ssembleia dos Delegados Regionais, ixar os crit́rios para a elaboração das propostas orçamentárias regionais e aprovar os orçamentos dos Conselhos Regionais q elaborar a prestação de contas e encaminhá-la ao Tribunal de Contas ”R“SIL, . Você pode perceber que, embora tenha sido criado durante a ditadura militar e ligado ao Estado pela necessidade de manter sua estrutura inicial, cabe ao Conselho Federal de Psicologia a tarefa de não apenas iscalizar e disciplinar o exercício da proissão, mas tamb́m de orientar os proissionais na sua prática, defender seu campo de atuação e contribuir com a escuta das necessidades sociais do seu povo LEITE, , p. . Retomando a hist́ria do ”rasil, na d́cada de o país vivenciou o processo de redemocratização. Em tivemos a aprovação da nova Constituição Federal, com avanços signiicativos na conquista de direitos sociais, tanto que icou conhecida como a Constituição Cidadã . “companhando esse movimento de mudanças sociais, o Conselho convocou, em , um Congresso Uniicado da Psicologia CONUP , onde os presentes discutiram a necessidade de tamb́m 184 TÓPICO 1 | A REGULAMENTAÇÃO DA PROFISSÃO E OS ÓRGÃOS DE CLASSE democratizar o Sistema Conselhos enquanto instituição representativa de toda a classe dos psićlogos, pensando o desenvolvimento da Psicologia enquanto ciência e proissão para poder atender à demanda da sociedade com compromisso ́tico e social ”OCK, . Nesse sentido, foi convocado, em , o Congresso Constituinte da Psicologia em Campos do Jordão, que debateu os novos compromissos dos conselhos e sua reestruturação, priorizando, como nos aponta ”ock , p. , o papel de orientadores da categoria . Desde então, o funcionamento do Conselho está organizado da seguinte forma, conforme descrito no Regimento Interno do CFP e aprovado pela Resolução CFP nº / “rt. º - O Conselho Federal de Psicologia ́ composto pelos seguintes ́rgãos I - Plenário II - Diretoria III - Secretarias IV - “ssembleia das Políticas “dministrativas e Financeiras V - Congresso Nacional da Psicologia. Parágrafo único - Quando necessário, serão constituídos Grupos de Trabalho para ins especíicos CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Trataremos agora de cada um dos ́rgãos listados acima conforme retratado no Regimento Interno do CFP . 3.1 PLENÁRIO É o ́rgão deliberativo do CFP, sendo composto pelo conjunto dos conselheiros eleitos. Seus membros se reúnem ao menos uma vez por mês, sendo que, se forem convocados, podem tamb́m participar conselheiros regionais de Psicologia e convidados. Dentre suas funções podemos citar • aprovar e fazer ser cumprido o plano de ação da gestão • aprovar a realização de inqúritos ou adotar medidas necessárias sobre o funcionamento dos Conselhos Regionais de Psicologia • autorizar o funcionamento de Grupos de Trabalho • editar resoluções, instruções normativas e portarias. 3.2 DIRETORIA É o ́rgão executivo do CFP, responsável, segundo o “rt. º do Regimento Interno, pela operacionalização de diretrizes e decisões do Plenário CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . É formado pelo presidente, vice-presidente, secretário-geral e tesoureiro, que são eleitos na primeira reunião ordinária de cada ano pelo Plenário. “ĺm das atribuições de cada cargo, compete à Diretoria tamb́m 185 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO elaborar propostas de atuação que serão apreciadas pelo Plenário, subsidiar as discussões e executar as decisões do Plenário. Para atender suas tarefas e cumprir com as deliberações do Plenário, a Diretoria pode se reunir quantas vezes forem necessárias. 3.3 SECRETARIAS No CFP estão discriminadas cinco Secretarias Regionais uma para cada região geográica do país , bem como a Secretaria de Orientação e Ética e a Secretaria de Comunicação. Os secretários tamb́m são eleitos na primeira reunião ordinária do ano pelo Plenário e respeitando a região de residência dos secretários regionais. Essas Secretarias têm como função, segundo o “rt. , dialogar com os Conselhos Regionais e instituições da sua região com o objetivo de viabilizar a execução de projetos e ações do Conselho Federal de Psicologia CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Especiicamente sobre a Secretaria de Orientação e Ética, ́ importante que você conheça suas responsabilidades, que são “rt. - São atribuições do Secretário de Orientação e Ética conduzir os processos, responder a consultas e tomar as medidas relacionadas à I - legislação interna II - orientação e iscalização do exercício proissional III - processos eleitorais IV - processos, consultas e medidas relacionadas ao Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo e de todas as questões que envolvam a Ética proissional, assim como todos aqueles correlatos que lhe sejam atribuídos pelo Plenário do Conselho Federal de Psicologia CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Desta forma, aṕs ser recebido pelo presidente do CFP, cabe ao Secretário de Orientação e Ética emitir parecer sobre processos ́ticos instaurados nos Conselhos Regionais de Psicologia, visto que o CFP funciona como tribunal superior de ́tica da nossa proissão. Mais detalhes sobre processos ́ticos serão trabalhados nos pŕximos t́picos, já que aqui o objetivo ́ apenas conhecer a estrutura do Sistema Conselhos. DICAS Para entender melhor o funcionamento e atribuições dos Conselhos de Psicologia, assista ao vídeo produzido pelo CFP, disponível em: <https://goo.gl/K6pYU4>. 186 TÓPICO 1 | A REGULAMENTAÇÃO DA PROFISSÃO E OS ÓRGÃOS DE CLASSE 3.4 CONGRESSO NACIONAL DE PSICOLOGIA (CNP) Como você já viu anteriormente, por volta dos anos , os psićlogos já haviam conseguido que fossem criados, por meio de lei, o CFP e os Conselhos Regionais de Psicologia. No entanto, passaram a surgir debates sobre o futuro da proissão e do seu compromisso social, assim como do papel do CFP na condução dessas decisões. Para tentar encontrar respostas para essas questões, foi convocado, em , o CONUP, que decidiu pela realização de um Congresso Constituinte da Psicologia que ocorreu em , considerado o primeiro CNP. “ partir de então, a cada três anos, reúnem-se delegados eleitos nos Congressos Regionais para decidir as diretrizes de atuação do CFP e dos Conselhos Regionais para os pŕximos três anos, por isso ele ́ deinido como a instância máxima de deliberação. Tamb́m ́ um espaço de articulação política, pois ́ durante o CNP que ocorre a inscrição das chapas que concorrerão à eleição para a gestão vindoura. Para que aconteça o CNP são necessárias várias etapas de mobilização, organização, debates e levantamento de propostas dos psićlogos de todas as regiões do país sobre as ações a serem executadas pelos Conselhos de Psicologia, de forma a atender às necessidades da sociedade e tamb́m o desenvolvimento da Psicologia como ciência e proissão. Todo psićlogo pode participar e se candidatar como delegado, desde que esteja inscrito regularmente no Conselho Regional de Psicologia e estar adimplente com o pagamento da sua anuidade. No quadro a seguir estão descritas todas as etapas desse importante instrumento de construção da Psicologia no país. QUADRO 9 – ETAPAS DO CNP EVENTOS PREPARATÓRIOS – Mesas redondas, encontros temáticos, debates realizados em diversas cidades. São elaboradas propostas para serem votadas nos pŕ-congressos. PRÉ-CONGRESSOS – Discussão e aprovação das propostas levantadas nos eventos preparat́rios. Tamb́m podem ocorrer em mais de uma cidade de um Conselho Regional. Eleição dos delegados que representarão os psićlogos daquela região no Congresso Regional. CONGRESSOS REGIONAIS COREPs – Ocorre um em cada Conselho Regional com a participação dos delegados eleitos nos pŕ-congressos. “provação das propostas que serão encaminhadas para o CNP e eleição dos delegados que representarão aquele Conselho no CNP. Inscrição das chapas para as eleições dos Conselhos Regionais. CONGRESSO NACIONAL – Realizado em ”rasília com a presença dos delegados eleitos nos COREPs. São discutidas e aprovadas as deliberações a serem implantadas pela pŕxima gestão do CFP. Inscrição das chapas para a eleição do CFP. FONTE: Adaptado de <http://nucleodeatendimento.weebly.com/ uploads/6/0/0/8/60089183/2_-_revista_do_conselho_federal_de_psicologia_2016.pdf>. Acesso em: 18 ago. 2017. 187 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO “o todo já foram realizados nove CNPs. “o inal, tanto do COREPs quanto do CNP, são produzidos relat́rios com as deliberações inais, que são divulgadas amplamente, garantindo transparência e acesso às informações por parte de todos os psićlogos. NOTA Você pode ter acesso às deliberações finais do 9º CNP através do site <http://9cnp. cfp.org.br/> e assim ficar conhecendo sobre as ações a serem desenvolvidas pelo CFP. 3.5 ASSEMBLEIA DE POLÍTICAS, DA ADMINISTRAÇÃO E DAS FINANÇAS (APAF) “ “P“F foi criada em durante o II CNP e, desde então, acompanha a execução das deliberações do CNP e as ações do CFP. É formada por três conselheiros do CFP e conselheiros dos Conselhos Regionais nas seguintes proporções, de acordo com o “rt. do Regimento Interno do CFP § º - Os integrantes da “ssembleia das Políticas “dministrativas e Financeiras, por Conselho Regional e Federal, serão escolhidos da seguinte forma I - CRP com at́ . três mil proissionais um representante II - CRP com . três mil e um at́ . dez mil proissionais dois representantes III - CRP com mais de . dez mil proissionais três representantes CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Por meio de suas reuniões, que ocorrem ordinariamente duas vezes por ano, os psićlogos de todas as regiões são ouvidos atrav́s de seus representantes, continuando a construção democrática da Psicologia enquanto ciência e proissão. 3.6 GRUPOS DE TRABALHO Quando necessário, o Plenário pode criar um Grupo de Trabalho para executar um projeto ou ações especíicas dentro de um prazo especíico. São formados, preferencialmente, por conselheiros federais, mas tamb́m podem ser convidados conselheiros regionais, outros psićlogos e at́ proissionais de outras categorias que possam contribuir com aquela tarefa. “s reuniões são marcadas de acordo com a necessidade da execução do trabalho. 188 TÓPICO 1 | A REGULAMENTAÇÃO DA PROFISSÃO E OS ÓRGÃOS DE CLASSE 3.7 COMISSÕES PERMANENTES Cabe aqui mencionar, enquanto falamos da estrutura do CFP, que existem Comissões Permanentes que tratam de assuntos de responsabilidade do CFP e que foram criadas atrav́s de Resoluções do CFP. “tualmente, são as seguintes • • • • Comissão de Direitos Humanos Comissão de “nálise sobre Título de Especialistas Comissão Nacional de Credenciamento de sites Comissão Consultiva em “valiação Psicoĺgica Dada a importância desses temas para a Psicologia, eles serão tratados mais detalhadamente nos T́picos e . NOTA Você percebeu que são muitas as atribuições e atividades desenvolvidas pelos conselheiros do CFP. É importante registrar também sua atuação em fóruns de entidades e nos Conselhos de Direitos, por exemplo, Conselho Nacional da Saúde, Conselho Nacional da Criança e do Adolescente, Conselho Nacional de Segurança Pública e Conselho Nacional de Assistência Social. 4 CONSELHOS REGIONAIS (CRPs) De acordo com ”ock , a partir da Lei nº . / e consequentemente a instalação do Conselho Federal de Psicologia, foram criados tamb́m sete CRPs de acordo com a distribuição dos psićlogos nas regiões do país. Em já eram e atualmente são CRPs que, junto com o CFP, formam o Sistema Conselhos. Como vimos no “rt. º da referida lei, os Conselhos são dotados de personalidade jurídica de direito público, autonomia administrativa e inanceira, constituindo, em seu conjunto, uma autarquia, destinados a orientar, disciplinar e iscalizar o exercício da proissão de psićlogo e zelar pela iel observância dos princípios de ́tica e disciplina da classe ”R“SIL, . Sobre sua organização e funcionamento, você vai encontrar a descrição na Resolução do CFP nº / , que Institui a Consolidação das Resoluções do Conselho Federal de Psicologia . Essa normativa estabelece em seu “rt. º que O número de membros dos Conselhos Regionais de Psicologia será ixado proporcionalmente ao número de proissionais inscritos, utilizando-se os seguintes crit́rios I - at́ . dez mil proissionais nove conselheiros efetivos II - de . dez mil e um at́ . quinze mil proissionais treze conselheiros efetivos 189 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO III - acima de . quinze mil proissionais quinze conselheiros efetivos. § º - Em cada Conselho Regional de Psicologia o número de conselheiros suplentes será idêntico ao de conselheiros efetivos CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . “ssim como vimos ao descrever as instâncias do CFP, todo CRP participa do CNP e da “P“F. Tamb́m aprendemos que ́ durante o COREP que se faz a articulação política e a inscrição das chapas que concorrem à gestão do CRP. “ṕs eleitos para mandatos de três anos, os conselheiros participam do Plenário e elegem a Diretoria, que tem as mesmas funções referidas no CFP presidente, vicepresidente, secretário e tesoureiro. Para facilitar a comunicação dos proissionais e dos usuários de serviços psicoĺgicos com o CRP, seguindo os princípios de democratização e descentralização administrativa, podem ser instaladas subsedes que são geridas por comissões gestoras. Nestes espaços são oferecidos os serviços que envolvem o registro proissional, suporte a evento da categoria e orientação aos psićlogos e comunidade. Outra instância do CRP ́ a “ssembleia Geral Regional, que de acordo com a Lei . / , deve ocorrer pelo menos uma vez por ano, tendo como inalidade deinir o valor da anuidade e aprovar o plano de ação da gestão do CRP. Dentre as atribuições dos CRPs podemos destacar sua responsabilidade em cumprir as resoluções do CFP em sua jurisdição, funcionando como tribunal regional de ́tica proissional. Para isso existe em sua estrutura a Comissão de Orientação e Ética COE e a Comissão de Orientação e Fiscalização COF . “ COE ́ responsável por analisar e dar encaminhamento às denúncias ́ticas recebidas pelo Conselho. “ apuração e o julgamento das denúncias são feitos de acordo com o estabelecido no Ćdigo de Processamento Disciplinar instituído pela Resolução CFP n° / . Sobre as penalidades previstas para as infrações ́ticas dos psićlogos, veremos mais adiante no T́pico , poŕm ́ importante que você saiba que qualquer pessoa pode fazer uma denúncia sobre psićlogos que estejam infringindo as normativas previstas para o exercício da proissão. Para isto, basta acessar o formulário de denúncia no site do Conselho Regional da sua área de jurisdição. Quando a denúncia ́ feita de forma anônima, ela não pode ser acolhida e tratada inicialmente pela COE, pois antes deve ser analisada pela COF, que primeiro deve veriicar se existem provas dessa infração para posteriormente, atrav́s do presidente do CRP, fazer o envio da infração à COE. “ COF ́ responsável por coordenar as atividades de orientação e iscalização da proissão. Suas atribuições e funcionamento estão previstos na Resolução CFP nº / , que aprova o Manual Uniicado de Orientação e Fiscalização. “ssim, ela ́ responsável pelas orientações quanto a direitos e deveres do psićlogo, visitas de 190 TÓPICO 1 | A REGULAMENTAÇÃO DA PROFISSÃO E OS ÓRGÃOS DE CLASSE inspeção às pessoas jurídicas, visitas de veriicação do exercício proissional, como no caso de denúncias citadas acima, mas tamb́m desenvolve ações de iscalização sobre as condições mínimas para o exercício da proissão em instituições. Toda a normativa que estabelece a Política de Orientação e Fiscalização do Sistema Conselhos de Psicologia está descrita na Resolução CFP nº / . Outra importante atribuição do CRP ́ o registro proissional dos psićlogos e expedição da Carteira de Identidade Proissional. “s normas para a inscrição na categoria proissional estão previstas na Resolução CFP nº / , e para que faça seu requerimento o proissional deve apresentar no CRP os seguintes documentos, de acordo com o “rt. º I - diploma de psićlogo, devidamente registrado, ou certidão de colação de grau de curso autorizado pelo ́rgão ministerial competente II - ćdula de identidade III - comprovantes de votação da última eleição ou justiicativas IV - CPF CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . DICAS No site do CRP da sua região você encontrará todas as orientações de como proceder para solicitar sua inscrição. Em Santa Catarina temos o Conselho Regional de Psicologia – 12ª Região, que você pode consultar através do site: <http://www.crpsc.org.br>. Acesso em: 15 jul. 2017. É importante que você saiba que, se o psićlogo exercer atividades proissionais em regiões diferentes, fora da abrangência do CRP da sua inscrição principal por tempo superior a dias por ano, deverá realizar a inscrição secundária no CRP da região onde ocorrerá esse trabalho proissional, para que receba uma autorização daquele Conselho. Essa inscrição secundária não acarreta ônus inanceiro, ou seja, não necessita do pagamento de duas anuidades por ter inscrições em Conselhos diferentes. “ĺm de todas essas atribuições e instâncias referidas, em Santa Catarina o CRP tamb́m dispõe de Comissões e Grupos de Trabalho que tratam de assuntos pertinentes à categoria e de interesse da sociedade, dentre estes podemos citar a Comissão de Políticas Públicas, que se divide em Eixos com o objetivo de oportunizar espaços de discussão de uma determinada área de atuação, como Educação, Saúde, “ssistência Social, Psicologia Organizacional e do Trabalho, Psicologia na Relação com a Justiça e o Centro de Referência T́cnica em Psicologia e Políticas Públicas CREPOP , sobre o qual falaremos a seguir. 191 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO 5 CREPOP Foi durante o V CNP que surgiu a ideia de criar um espaço responsável por identiicar as práticas e produzir referenciais sobre a atuação dos psićlogos em políticas públicas. Essa demanda já vinha sendo percebida desde os anos de , quando se passou a reletir sobre a atuação dos psićlogos no ”rasil e seu compromisso social no atendimento à população, e que foram ampliadas nas d́cadas seguintes aṕs a implantação de diversas políticas públicas, por exemplo, Saúde, “ssistência Social, Educação, Criança e “dolescente, dentre outras CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . O CREPOP tem sede no CFP, mas está estruturado em rede com ramiicações em todos os CRPs, para identiicar as necessidades sociais e oferecer contribuições ao Estado brasileiro junto ao Executivo, Legislativo ou Judiciário. Em cada instância do CREPOP a equipe ́ composta por um psićlogo conselheiro e um t́cnico que conduzem as pesquisas e a articulação política da Psicologia nas políticas públicas. Desde a sua criação, o CREPOP já publicou diversas Referências T́cnicas e documentos com orientações para gestores de políticas públicas, entre tantas, citaremos aqui • Práticas Proissionais de Psićlogos e Psićlogas na “tenção ”ásica à Saúde . • Referências T́cnicas para a “tuação do Psićlogo em Varas de Família . • Referências T́cnicas para a “tuação das os Psićlogas os no Sistema Prisional . • Referências T́cnicas para a “tuação das os Psićlogas os em Questões Relativas a Terra . • Referências T́cnicas para a “tuação de Psićlogas os na Educação ”ásica . • Referências T́cnicas para a “tuação de Psićlogas os no C“PS – Centro de “tenção Psicossocial . • Referências T́cnicas para a “tuação de Psićlogas os nos Centros de Referência Especializado de “ssistência Social – CRE“S . • Nota t́cnica com parâmetros para atuação das dos proissionais de psicologia no âmbito do Sistema Único de “ssistência Social SU“S . DICAS Para você ter acesso à lista completa dos documentos produzidos pelo CREPOP você pode acessar o site: <http://crepop.pol.org.br>. 192 TÓPICO 1 | A REGULAMENTAÇÃO DA PROFISSÃO E OS ÓRGÃOS DE CLASSE Neste t́pico, conversamos sobre como transcorreu a proissionalização dos psićlogos em nosso país, bem como a lei que regulamentou os cursos de formação em Psicologia e o exercício proissional. “o tratarmos sobre a lei que criou o CFP e tamb́m os CRPs foi apresentada a organização e a estrutura do Sistema Conselhos, assim como a preocupação do ́rgão com a democratização das decisões e o fortalecimento da relação entre o Conselho e a sociedade. Todas essas informações são importantes para que se compreenda a construção das normativas que regulam o exercício proissional e que serão estudadas nos pŕximos t́picos. 193 RESUMO DO TÓPICO 1 Neste tópico, você aprendeu que • “ Psicologia passou a ser discutida no ”rasil atrav́s das teses produzidas por ḿdicos e das Escolas Normais nas disciplinas de formação de professores. • “ partir da d́cada de , a Psicologia foi percebida como ciência e tamb́m como proissão capaz de contribuir com o processo de modernização vivido no país. • “ṕs a mobilização de associações e sociedades de psicologia compostas por proissionais que utilizavam de práticas psicoĺgicas, no dia de agosto de foi aprovada a Lei nº . , que regulamentou a formação e a proissão de psićlogo no ”rasil. • Decorridos nove anos da regulamentação da proissão, ́ aprovada a Lei nº . que cria os Conselhos Regionais e o Conselho Federal de Psicologia. , • O Conselho Federal de Psicologia, junto aos Conselhos Regionais de Psicologia, forma o Sistema Conselhos, que tem por inalidade orientar, disciplinar e iscalizar o exercício da proissão de psićlogo, zelando pelo cumprimento dos princípios ́ticos e disciplina da classe. • São ́rgãos do Conselho Federal de Psicologia a Plenária, a Diretoria, as Secretarias, a “ssembleia das Políticas “dministrativas e Financeiras e o Congresso Nacional de Psicologia. • “tualmente, existem Conselhos Regionais em nosso país. Entre suas atribuições estão o acolhimento de denúncias do exercício irregular da proissão e infrações ́ticas e o registro de psićlogos no Conselho. 194 AUTOATIVIDADE Por que o Dia Nacional do Psićlogo ́ comemorado no dia De acordo com a Lei . do psićlogo? / de agosto? , quais são as funções consideradas privativas Qual a lei que cria o Conselho Federal de Psicologia e os Conselhos Regionais? Qual a inalidade destas instâncias segundo a lei? Cite duas atribuições dos Conselhos Regionais de Psicologia 195 196 TÓPICO 2 UNIDADE 3 CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO 1 INTRODUÇÃO No t́pico anterior você aprendeu sobre o caminho percorrido pelos proissionais da Psicologia para que essa ciência fosse reconhecida no ”rasil tamb́m como proissão. Tal discussão foi necessária para que você compreenda quais são e como funcionam as instituições que orientam e iscalizam a práxis dos psićlogos. Neste t́pico vamos discutir questões ligadas à ́tica proissional, bem como ao Ćdigo de Ética. Você vai conhecer os ćdigos que já foram produzidos pela categoria e aprender sobre o atual Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo, assim como as resoluções a ele relacionadas, por exemplo, o Ćdigo Processual, que ́ aplicado em questões consideradas infrações ́ticas de acordo com as normas vigentes. 2 A ÉTICA PROFISSIONAL E O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO “ntes de falarmos sobre o Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo ́ importante abordarmos o signiicado de ́tica proissional. Segundo Passos , ela ́ considerada como uma deontologia. Essa palavra vem do grego e ́ o resultado da composição de dois termos deon, que signiica dever, e logos, traduzida como estudo, ou seja, estudo dos deveres. Esteves , p. , grifo do original aborda o tema e indica que a deontologia pertence à ́tica normativa, que ́ uma disciplina da ilosoia que busca fornecer diretrizes ou princípios gerais para nos orientarmos em nossas decisões ou escolhas concernentes a problemas morais particulares com que topamos na vida cotidiana . Em relação à ́tica proissional, Camargo apud P“SSOS, a deine como a aplicação da ́tica no exercício proissional e se articula com a deontologia, mas não se reduz a ela, pois vai aĺm de deveres a serem seguidos, deinindo princípios e valores do ser humano que se evidenciam atrav́s da conduta do proissional diante da vida e da sociedade. Dito em outras palavras, esse conjunto dos deveres prescritos aos proissionais ́ muito importante, poŕm sua práxis deve 197 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO estar alicerçada em uma relexão ilośica que deina sua concepção de mundo e, consequentemente, seu comportamento ́tico. Feitas essas considerações, devemos agora ponderar que, diante do avanço das ciências e da multiplicidade de campos de atuação proissional, a sociedade, de maneira geral, passou a perceber a necessidade de poder contar com mecanismos que estabelecessem regras para resolver problemas surgidos nas relações dos proissionais com os usuários dos serviços prestados e tamb́m entre os pŕprios proissionais diante dos interesses das categorias. “ssim, conforme Maciel, Frizzo e Castro , ́ principalmente durante o śculo XX que foram construídos os ćdigos deontoĺgicos de cada proissão, ou como habitualmente são chamados, Ćdigos de Ética. De acordo com “mendola , uma das grandes conquistas dos psićlogos aṕs o reconhecimento da Psicologia enquanto ciência e proissão, foi a construção do seu Ćdigo de conduta. “inda segundo essa mesma autora Um Ćdigo de conduta tem por inalidade apresentar os princípios que determinado grupo de pessoas deverá utilizar como referência para suas ações. Inversamente, estes mesmos princípios tamb́m servirão como recurso para avaliar e julgar as ações desse grupo em relação à sociedade se tais ações estão ou não em conformidade com o Ćdigo p. . “ssim, podemos deinir que ́ atrav́s do Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo, formalizado como norma jurídica, que o Conselho Federal e os Conselhos Regionais regulam a conduta moral do psićlogo, ao indicar princípios, direitos e deveres, bem como as punições, caso exista um descumprimento deles “MENDOL“, . Reforçamos ainda que, embora o objetivo desta unidade seja apresentar o conjunto de regras que normatizam a práxis do psićlogo, ́ de suma importância salientar que o fazer ́tico do psićlogo não está restrito a uma disciplina especíica ou a um ćdigo de conduta, ou seja, não basta conhecer o Ćdigo de Ética e as resoluções do Conselho de Psicologia, mas sim ter a compreensão de que o compromisso ́tico da proissão ́ transversal a todas as disciplinas e ações do psićlogo. Como airma Passos , p. , o psićlogo trabalha com pessoas na perspectiva da sua subjetividade, assim, seu compromisso ́tico já está explícito nos objetivos da Psicologia, que consistem em ajudar o indivíduo a ser livre, especiicamente, de suas angústias, suas ansiedades e seus medos e, no plano maior, fortalecer e defender direitos humanos . 2.1 BREVE HISTÓRICO DOS CÓDIGOS PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO DE ÉTICA Você se recorda que no t́pico anterior falamos sobre o processo de proissionalização da Psicologia no ”rasil, que alcançou seu status de proissão 198 TÓPICO 2 | CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO em , atrav́s da Lei nº . . Vimos tamb́m que toda categoria proissional necessita de uma legislação que forneça ferramentas para orientar e regular suas ações protegendo e defendendo os direitos dos proissionais, mas tamb́m dos usuários dos serviços. Por conseguinte, “mendola aponta que o Ćdigo de Ética contribui na construção da identidade proissional dando legitimidade à proissão diante da sociedade. “ssim, antes mesmo da criação do Conselho Federal e dos Conselhos Regionais, atrav́s da “ssociação ”rasileira de Psićlogos, que era na ́poca presidida por “rrigo “ngelini, e da Sociedade de Psicologia de São Paulo, foi elaborado um anteprojeto de um Ćdigo de Ética para a categoria. O texto proposto foi embasado em uma publicação da New York State Psychological Association e aprovado durante a “ssembleia Geral da “ssociação ”rasileira de Psicologia realizada em ”lumenau, no ano de . Esse documento foi nomeado pela categoria, na ́poca, como o Ćdigo de Ética dos Psićlogos ”rasileiros, e era composto por cinco princípios fundamentais e artigos. Na ocasião, tamb́m foram deinidos os membros do Conselho de Ética Proissional, um ́rgão que seria responsável por zelar pelo cumprimento do Ćdigo de Ética da proissão “MENDOL“, ROM“RO, . No entanto, era necessário que essa entidade fosse regulamentada na forma de lei, o que ocorreu em . Como vimos no t́pico anterior, foram criados os Conselhos, por meio da Lei nº . / , com a inalidade de orientar e iscalizar o exercício proissional, bem como funcionar como tribunal superior de ́tica. Para cumprir com essas tarefas, em , durante a primeira gestão do Conselho Federal, o Ćdigo proposto em foi reformulado e aprovado por meio de Resolução, sendo considerado o Primeiro Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo. Nele estavam previstos como princípios fundamentais o exercício proissional pautado no respeito ao outro, a sua integridade e a importância da formação e responsabilidade proissional, entre outros. “presentava tamb́m capítulos que versavam sobre os deveres do psićlogo e das responsabilidades com os clientes, instituições empregadoras, outros psićlogos e demais disposições presentes na Resolução CFP / ROM“RO, . “mendola aponta que de a o número de psićlogos inscritos nos Conselhos aumentou muito, chegando a mil. “ autora tamb́m menciona que surgiram novos campos de atuação proissional que demandaram a necessidade de revisão do Ćdigo de Ética. Para isso foram consultados os Conselhos Regionais e professores de ́tica dos cursos de Psicologia para saber as ânsias surgidas nas diversas regiões, bem como a análise de Ćdigos de Ética de outras proissões. O resultado foi apresentado ao Plenário do CFP, que culminou na aprovação da nova versão do Ćdigo de Ética da categoria em de agosto de , em comemoração ao centenário da Psicologia. 199 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO Conforme lembra Romaro , os dois primeiros ćdigos foram aprovados em meio ao regime militar, poŕm, no ano de pode-se observar a diminuição do autoritarismo político e o fortalecimento de movimentos sociais. Com cinco princípios fundamentais e artigos, distribuídos em capítulos, este Ćdigo trouxe de forma mais clara as questões sobre o respeito ao sigilo proissional, a conidencialidade das informações, as relações com a Justiça e a deinição do grau de parentesco permitido nos casos de perícia. Tamb́m excluiu um artigo que falava de interrogat́rios sob ação hipńtica. Em conjunto com a reformulação do Ćdigo de Ética, foi instituída, em caráter permanente, a Comissão de Fiscalização do Exercício Proissional desmembrando a função de iscalização da Comissão de Ética COE “MENDOL“, . Cabe lembrar que o funcionamento dessas duas comissões foi tratado no t́pico anterior. Com o movimento de democratização vivido pelo país na d́cada de , os psićlogos, atrav́s dos Conselhos de Psicologia, novamente perceberam a necessidade de rever o Ćdigo de Ética com a inalidade de atender às transformações sociais e as demandas dos proissionais. Foram criados então grupos de trabalho com objetivo de realizar pesquisas junto aos psićlogos de todo o país e tamb́m proissionais de outras categorias. “ssim, ao completar anos de regulamentação da Psicologia no ”rasil, aṕs ampla discussão, foi proposto e aprovado um novo Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo, atrav́s da Resolução CFP nº , de de agosto de “MENDOL“, . Na parte introdut́ria no Ćdigo de consta uma Exposição de Motivos que evidencia o ser humano enquanto sujeito em constante transformação e, sendo a psicologia uma ciência que estuda e interpreta o comportamento humano, seu Ćdigo de Ética precisa acompanhar essas mudanças e ser representativo dessa realidade, estando sujeito a alterações e atualizações contínuas. “ssim, esse Ćdigo ́ elaborado com o proṕsito de orientar os proissionais, apresentando as regras de forma clara, mas tamb́m deve servir como fonte de relexão O Ćdigo ́ a expressão da identidade proissional daqueles que nele vão buscar inspirações, conselhos e normas de conduta. Ele ́, ao mesmo tempo, uma pergunta e uma resposta. É um apelo-pergunta no sentido de ver o ser humano não apenas como uma unidade isolada, mas como um subsistema de um grande sistema. É uma resposta enquanto encarna uma concepção da proissão dentro de um contexto social e político, que lhe confere o selo da identidade, naquele momento hist́rico CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Nesse preâmbulo, o Conselho Federal de Psicologia tamb́m aponta sua concepção de ́tica destacando que, aĺm da importância de o psićlogo cumprir com os seus deveres enquanto proissional, agindo de acordo com a norma, o ser ́tico pressupõe compromisso social. Um Ćdigo será falho se izer uma ́tica para o psićlogo, esquecendo-se da ́tica do homem. É essa ́tica que fará do psićlogo um proissional engajado social e politicamente no mundo, e não um proissional a serviço exclusivo do indivíduo CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . 200 TÓPICO 2 | CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO “ṕs essa exposição, o Ćdigo apresenta seus sete princípios fundamentais e seus artigos, distribuídos em responsabilidades gerais do psićlogo que se subdividem em deveres fundamentais e vedações proissionais responsabilidades e relações com instituições empregadoras e outras relações com outros proissionais ou psićlogos relações com a categoria relações com a Justiça sigilo proissional comunicações cientíicas e sua divulgação ao público publicidade e honorários proissionais CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . De acordo com “mendola , o Ćdigo de recebeu críticas por ser mais incisivo que o anterior. Outros comentários foram favoráveis à criticidade política e social apresentada. Cabe aqui mencionarmos que em , o “rt. º deste Ćdigo e seus respectivos parágrafos foram revogados e, em , foi incluída uma alínea no “rt. º, que determinava ser vedado ao psićlogo prestar serviços ou mesmo vincular seu título de psićlogo a serviços de atendimento psicoĺgico via telefônica CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . DICAS Você pode acessar o conteúdo completo do Código de Ética Profissional do Psicólogo de 1987 no site: <http://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2012/07/resolucao1987_2. pdf>. Acesso em: 15 jul. 2017. Você percebeu que de tempos em tempos, devido às transformações políticas e sociais, os psićlogos, atrav́s da representação nos seus Conselhos, indicaram a necessidade de reformular o Ćdigo de Ética. Como já apontado, devemos entender as normativas como resultado de um determinado contexto ścio-hist́rico. O que não foi diferente aṕs a promulgação da Constituição Federal em , visto que a categoria passou a expressar a necessidade de se harmonizar com o contexto institucional-legal vivido pelo país, bem como com as demais políticas e leis que vieram aṕs esse grande marco na hist́ria do ”rasil CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . “mendola descreve que esse movimento de mudança foi percebido durante o I F́rum Nacional de Ética realizado em , mas foi posteriormente, em , durante o II F́rum Nacional de Ética promovido pelo Sistema Conselhos, que os participantes construíram as proposições que constituiriam o novo Ćdigo de Ética dos Psićlogos. O II F́rum foi antecedido por F́runs Regionais que elaboraram propostas para discussão. O relat́rio inal desse trabalho foi encaminhado para a “P“F, que criou um Grupo de Trabalho para formular uma minuta do Ćdigo de 201 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO Ética. Esse documento foi então aprovado pela Plenária do Sistema Conselhos e, posteriormente, pela “P“F, entrando em vigor no dia de agosto de , e que discutiremos a partir de agora. 3 O ATUAL CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO Como vimos, aṕs dois anos de muito debate e propostas apresentadas pela categoria, em foi aprovado, por meio da Resolução CFP nº / , o atual Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo. “ título de apresentação, o documento enfatiza que as normas lá presentes não visam estabelecer apenas uma compilação de regras que determinam o padrão de conduta para o exercício proissional do psićlogo, mas, principalmente, sirva como um instrumento que proporcione a autorrelexão exigida de cada indivíduo acerca da sua práxis, de modo a responsabilizá-lo pessoal e coletivamente, por suas ações e suas consequências no exercício proissional CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . No atual Ćdigo ica explícito o seu compromisso com os Direitos Humanos. Estes são entendidos como valores universais traduzidos em princípios pautados no respeito ao sujeito humano e seus direitos fundamentais CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Esses princípios são considerados grandes eixos que balizam a práxis do psićlogo atrav́s de constante relexão sobre a sociedade, a proissão e as instituições. DICAS Para saber mais sobre a história dos Direitos Humanos, assista ao vídeo produzido por United Human Rights, disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=uCnIKEOtbfc>. Passaremos agora a apresentar na íntegra todos os sete princípios e os artigos presentes no vigente Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo Resolução CFP / , com comentários sobre os temas abordados. 3.1 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS O primeiro Princípio Fundamental do Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo estabelece que “O psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos” CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. , grifo nosso . 202 TÓPICO 2 | CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO “ Declaração Universal dos Direitos Humanos mencionada neste princípio foi promulgada pela “ssembleia Geral das Nações Unidas em de dezembro de como uma resposta aos horrores vividos na Segunda Guerra Mundial, documento este tamb́m assinado pelo ”rasil. No seu preâmbulo, os EstadosMembros se comprometem a adotar a declaração como ideal de todos os indivíduos e instituições sociais e a promover, atrav́s do ensino e da educação, o respeito aos direitos e liberdades registradas. Storck esclarece que a Declaração Universal dos Direitos Humanos retoma os ideais da Revolução Francesa, mas acrescenta o ideal de solidariedade. TUROS ESTUDOS FU Ao final desta unidade é apresentada a Declaração Universal dos Direitos Humanos na íntegra, como leitura complementar, devido à sua importância na formulação das atuais legislações, como a Constituição Federal do Brasil de 1988 e o Código de Ética Profissional do Psicólogo de 2005. Cabe destacar que o Ćdigo de Ética, na primeira parte, aborda os Princípios Fundamentais e, na sequência, estabelece artigos, ou seja, regras. Essa diferenciação acontece, de acordo com Storck , p. , porque os princípios são, de certo modo, mais importantes do que as regras . Os princípios necessitam ser interpretados e guiam a construção das regras. “ssim, de acordo com o mesmo autor e seguindo essa ĺgica, os Direitos Humanos devem ser tomados como princípios e não regras. “tendendo a essas recomendações, o Sistema Conselhos embasa seus princípios na Declaração Universal dos Direitos Humanos, irmando o compromisso de todos os psićlogos em relação à saúde e qualidade de vida das pessoas e seu empenho em empregar valores como a não discriminação, não violência e responsabilidade social, conforme expressos nos princípios II e III II - O psićlogo trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. III - O psićlogo atuará com responsabilidade social, analisando crítica e historicamente a realidade política, econômica, social e cultural CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Tamb́m como um princípio ́tico proissional vemos a necessidade do psićlogo se manter atualizado, em um processo contínuo de formação, como airma o IV Princípio Fundamental “O psicólogo atuará com responsabilidade, por meio do contínuo aprimoramento proissional, contribuindo para o desenvolvimento da Psicologia como campo cientíico de conhecimento e de prática” CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. , grifo nosso . 203 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO “ssim, ao desenvolver pesquisas ou acompanhar os avanços téricos e t́cnicos da ciência psicoĺgica, o proissional cumpre com seu dever enquanto categoria comprometida não ś com a qualidade dos serviços oferecidos aos usuários, mas tamb́m em encontrar soluções que proporcionem o bem-estar social. Seguem a esse princípio os demais, que são V - O psićlogo contribuirá para promover a universalização do acesso da população às informações, ao conhecimento da ciência psicoĺgica, aos serviços e aos padrões ́ticos da proissão. VI - O psićlogo zelará para que o exercício proissional seja efetuado com dignidade, rejeitando situações em que a Psicologia esteja sendo aviltada. VII - O psićlogo considerará as relações de poder nos contextos em que atua e os impactos dessas relações sobre as suas atividades proissionais, posicionando-se de forma crítica e em consonância com os demais princípios deste Ćdigo CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Perceba que estes princípios manifestam o compromisso com a democratização dos serviços psicoĺgicos, instruindo a população sobre o papel do psićlogo na sociedade com transparência, sem descuidar do rigor ́tico P“SSOS, . “ĺm disso, ressalta a importância da criticidade para que sua conduta esteja de acordo com os ideais desse Ćdigo, sem separação entre o dizer e o fazer ́ticos SILV“ Z“NELLI TOLFO, . “ssim, vimos que os Princípios Fundamentais dispostos no Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo servem como norte para guiar a relação do proissional com a sociedade, com as instituições e com a pŕpria Psicologia enquanto ciência e proissão. 3.2 DAS RESPONSABILIDADES DO PSICÓLOGO Neste momento você deve estar se perguntando quais são as regras que o psićlogo deve seguir no seu exercício proissional? O Ćdigo de Ética, aṕs enfatizar quais são os Princípios Fundamentais da proissão, passa a apresentar seus artigos, iniciando pelos deveres fundamentais no “rt. º e alíneas, a saber “rt. º - São deveres fundamentais dos psićlogos a Conhecer, divulgar, cumprir e fazer cumprir este Ćdigo. b “ssumir responsabilidades proissionais somente por atividades para as quais esteja capacitado pessoal, térica e tecnicamente. c Prestar serviços psicoĺgicos de qualidade, em condições de trabalho dignas e apropriadas à natureza desses serviços, utilizando princípios, conhecimentos e t́cnicas reconhecidamente fundamentados na ciência psicoĺgica, na ́tica e na legislação proissional. d Prestar serviços proissionais em situações de calamidade pública ou de emergência, sem visar benefício pessoal. e Estabelecer acordos de prestação de serviços que respeitem os direitos do usuário ou beneiciário de serviços de Psicologia. 204 TÓPICO 2 | CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO f Fornecer, a quem de direito, na prestação de serviços psicoĺgicos, informações concernentes ao trabalho a ser realizado e ao seu objetivo proissional. g Informar, a quem de direito, os resultados decorrentes da prestação de serviços psicoĺgicos, transmitindo somente o que for necessário para a tomada de decisões que afetem o usuário ou beneiciário. h Orientar a quem de direito sobre os encaminhamentos apropriados, a partir da prestação de serviços psicoĺgicos, e fornecer, sempre que solicitado, os documentos pertinentes ao bom termo do trabalho. i Zelar para que a comercialização, aquisição, doação, empŕstimo, guarda e forma de divulgação do material privativo do psićlogo sejam feitas conforme os princípios deste Ćdigo. j Ter, para com o trabalho dos psićlogos e de outros proissionais, respeito, consideração e solidariedade, e, quando solicitado, colaborar com estes, salvo impedimento por motivo relevante. k Sugerir serviços de outros psićlogos, sempre que, por motivos justiicáveis, não puderem ser continuados pelo proissional que os assumiu inicialmente, fornecendo ao seu substituto as informações necessárias à continuidade do trabalho. l Levar ao conhecimento das instâncias competentes o exercício ilegal ou irregular da proissão, transgressões a princípios e diretrizes deste Ćdigo ou da legislação proissional CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Neste primeiro artigo ́ explicitado o zelo que o psićlogo deve ter na sua atuação proissional. Todos os proissionais da categoria devem conhecer e cumprir o estabelecido nas normas vigentes, oferecendo serviços de qualidade em condições dignas e adequadas ao que se propõe. Ser zeloso com o outro e com a proissão signiica tamb́m não assumir responsabilidades proissionais para as quais não esteja preparado térica e tecnicamente. “ competência t́cnica ́ necessária a im de não provocar danos materiais e morais causados por erros proissionais P“SSOS, . De acordo com Goldim e Protas , os erros proissionais podem ser classiicados em três grupos por imperícia, imprudência e negligência. O primeiro grupo ocorre nos casos onde o proissional, mesmo não sendo devidamente qualiicado, se compromete a prestar um serviço e acaba expondo o usuário a um risco desnecessário. O segundo grupo envolve situações em que o proissional toma decisões sem ponderar que imprevistos podem ocorrer, ou seja, sem a devida prudência, por supor que tem domínio total da situação. Por último, a negligência representa a falta de atenção aos deveres proissionais, como em casos de omissão. Os autores ainda alertam para a importância da supervisão e da discussão de casos com proissionais mais qualiicados que possam contribuir na tomada de decisão apropriada. Observe ainda que as alíneas g e h tratam da devolutiva, entrega de documentos e encaminhamentos necessários aṕs a prestação de serviços psicoĺgicos, que aqui são entendidos como um dever do psićlogo e um direito do usuário, mas sem esquecer sobre a conidencialidade das informações, onde o psićlogo deve comunicar apenas o que for necessário para se compreender aquela situação especíica. 205 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO DICAS Para saber mais sobre a atuação da Psicologia nas Emergências e Desastres, consulte o site do Conselho Regional de Psicologia de Santa Catarina – 12ª Região, através do link: <http://www.crpsc.org.br/psicologia-nas-emergencias-e-desastres>. Lá você encontrará vídeos e materiais publicados que detalham esse campo da Psicologia. Outro tema que merece destaque está indicado na alínea l , que fala sobre o exercício ilegal ou irregular da proissão. Mas você sabe diferenciar uma situação da outra? O CRP de São Paulo publicou em seu Jornal PSI uma mat́ria que apresenta situações onde são exempliicados casos em que ocorre o chamado exercício ilegal da proissão. Isso ocorre quando o proissional, mesmo com formação na área da Psicologia, não estiver devidamente inscrito no CRP, por exemplo, aṕs ter solicitado o cancelamento do seu registro proissional, ou ter a sua inscrição suspensa ou cassada como penalidade ́tica, mesmo assim continuar atuando como psićlogo. Tamb́m pode ser considerado exercício ilegal da proissão pessoas que não têm a formação de psićlogo, mas se identiicam como tal ou realizam atividades que são pŕprias do psićlogo. “ mat́ria ressalta que estão incluídos nessa categoria estudantes de Psicologia que estejam praticando atividades de psićlogo sem a devida formalização do contrato de estágio. Nos casos em que se veriica o exercício ilegal da proissão, cabe à justiça o recebimento das denúncias e a instalação do processo visando a possível aplicação de uma pena, que varia da prisão simples, de dias a três meses, aĺm da aplicação de multa pecuniária, conforme prevê o artigo , da Lei de Contravenções Penais. Quanto ao exercício irregular da proissão, podemos citar o exemplo do proissional que deixa de fazer a inscrição secundária ao atuar por mais de dias em um Estado diferente da área de abrangência do seu Conselho Regional de Psicologia. Esse fato ́ considerado uma infração e o proissional responde a Processo Disciplinar Ordinário PSI JORN“L DE PSICOLOGI“, . “s questões que dizem respeito à violação dos direitos humanos e ao exercício ilegal da proissão são novamente abordadas no “rt. º, que trata das vedações proissionais, como pode ser observado a seguir “rt. º - “o psićlogo ́ vedado a Praticar ou ser conivente com quaisquer atos que caracterizem negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade ou opressão. b Induzir a convicções políticas, ilośicas, morais, ideoĺgicas, religiosas, de orientação sexual ou a qualquer tipo de preconceito, quando do exercício de suas funções proissionais. c Utilizar ou favorecer o uso de conhecimento e a utilização de práticas psicoĺgicas como instrumentos de castigo, tortura ou qualquer forma de violência. 206 TÓPICO 2 | CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO d “cumpliciar-se com pessoas ou organizações que exerçam ou favoreçam o exercício ilegal da proissão de psićlogo ou de qualquer outra atividade proissional. e Ser conivente com erros, faltas ́ticas, violação de direitos, crimes ou contravenções penais praticados por psićlogos na prestação de serviços proissionais. f Prestar serviços ou vincular o título de psićlogo a serviços de atendimento psicoĺgico cujos procedimentos, t́cnicas e meios não estejam regulamentados ou reconhecidos pela proissão CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . UNI EXEMPLO DE UM CASO DE INDUÇÃO A CONVICÇÕES RELIGIOSAS, SIGILO E MAPA ASTRAL Uma adolescente, atendida em orientação vocacional, queixou-se de que o psicólogo influenciava pacientes a participar de cultos, relacionando acontecimentos à vontade de Deus, utilizava-se de mapa astral em suas orientações e trocava informações de diferentes pessoas de uma mesma família entre elas. Em sua defesa, o psicólogo negou ter devassado o sigilo, destacando ser a inviolabilidade relativa por ser a atendida menor de idade. Afirmou utilizar-se eventualmente da técnica de mapa astral para melhor compreender os pacientes e abreviar os processos psicoterápicos. Foi constatado o uso de mapas astrológicos em sessões de orientação vocacional, como ferramenta complementar de análise e a indução a convicções morais e religiosas. A Astrologia não pode ser considerada prática complementar da Psicologia e nem um método científico compatível com a mesma. Deste modo, não pode ser utilizada direta ou indiretamente no decorrer de um processo ou tratamento psicológico. Houve transversalidade no atendimento a diversos membros da família, sem ser definida uma terapia familiar, mas sim atendimentos individuais, caracterizando quebra de sigilo profissional. O fato de a pessoa atendida ser menor de idade não justifica repasse de informações sem a presença do interessado. Entendeu-se que o profissional infringiu o Código de Ética dos Psicólogos nos seguintes artigos: Art. 1º “c”; Art. 2º “b” e Art. 9º. FONTE: Adaptado de PSI Jornal da Psicologia, (mar./abr. 2012). Disponível em: <http://www. crpsp.org.br/portal/comunicacao/jornal_crp/168/frames/fr_processos_eticos.aspx>. Acesso em: 15 jul. 2017. Seguindo ainda com o “rt. º, vemos que tamb́m ́ vedado ao psićlogo g Emitir documentos sem fundamentação e qualidade t́cnico-cientíica. h Interferir na validade e idedignidade de instrumentos e t́cnicas psicoĺgicas, adulterar seus resultados ou fazer declarações falsas. i Induzir qualquer pessoa ou organização a recorrer a seus serviços. j Estabelecer com a pessoa atendida, familiar ou terceiro, que tenha vínculo com o atendido, relação que possa interferir negativamente nos objetivos do serviço prestado. k Ser perito, avaliador ou parecerista em situações nas quais seus vínculos pessoais ou proissionais, atuais ou anteriores, possam afetar a qualidade do trabalho a ser realizado ou a idelidade aos resultados da avaliação. l Desviar para serviço particular ou de outra instituição, visando 207 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO benefício pŕprio, pessoas ou organizações atendidas por instituição com a qual mantenha qualquer tipo de vínculo proissional. m Prestar serviços proissionais a organizações concorrentes de modo que possam resultar em prejuízo para as partes envolvidas, decorrentes de informações privilegiadas. n Prolongar, desnecessariamente a prestação de serviços proissionais. o Pleitear ou receber comissões, empŕstimos, doações ou vantagens outras de qualquer esṕcie, aĺm dos honorários contratados, assim como intermediar transações inanceiras. p Receber, pagar remuneração ou porcentagem por encaminhamento de serviços q Realizar diagństicos, divulgar procedimentos ou apresentar resultados de serviços psicoĺgicos em meios de comunicação, de forma a expor pessoas, grupos ou organizações CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Sobre a produção de documentos psicoĺgicos, o T́pico desta unidade ́ todo dedicado a esse assunto, desde a sua elaboração at́ sua guarda. No entanto, conv́m destacar que a emissão de documentos psicoĺgicos sem fundamentação e qualidade t́cnico-cientíica tem sido uma das principais causas de denúncias à COE nos Conselhos Regionais PSI JORN“L DE PSICOLOGI“, . Dando continuidade às ações vedadas ao psićlogo, o Ćdigo deixa explícita a proibição de condutas que possam prejudicar o usuário dos serviços psicoĺgicos. Goldim e Protas deinem essas ações como má prática proissional e abrangem relacionamentos sociais e sexuais entre terapeutas e pacientes, a manutenção do vínculo de dependência do usuário pelo proissional de forma indevida a im de obter benefícios inanceiros, sociais ou políticos. “inda mencionam como má prática proissional quando terapeutas se utilizam das mídias para ganhar notoriedade falando de personalidades públicas que foram seus pacientes, o que expõe o atendido, ferindo, deste modo, o sigilo proissional. O “rt. º vai abordar a necessidade de avaliação por parte do psićlogo dos valores das instituições de que possa vir a fazer parte, para que sejam coerentes com os princípios expressos no Ćdigo de Ética. Observe que, havendo antagonismos, cabe ao interessado oferecer denúncia aos ́rgãos competentes “rt. º - O psićlogo, para ingressar, associar-se ou permanecer em uma organização, considerará a missão, a ilosoia, as políticas, as normas e as práticas nela vigentes e sua compatibilidade com os princípios e regras deste Ćdigo. Parágrafo único Existindo incompatibilidade, cabe ao psićlogo recusar-se a prestar serviços e, se pertinente, apresentar denúncia ao ́rgão competente CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Um assunto que desperta curiosidade por parte dos acadêmicos diz respeito aos honorários que são ixados pelo psićlogo na execução do seu serviço. Veja o que diz o Ćdigo a respeito disso “rt. º - “o ixar a remuneração pelo seu trabalho, o psićlogo a Levará em conta a justa retribuição aos serviços prestados e as condições do usuário ou beneiciário. 208 TÓPICO 2 | CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO b Estipulará o valor de acordo com as características da atividade e o comunicará ao usuário ou beneiciário antes do início do trabalho a ser realizado. c “ssegurará a qualidade dos serviços oferecidos independentemente do valor acordado CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . No Ćdigo são anunciadas apenas situações da conduta ́tica do psićlogo ao estabelecer sua remuneração, que deve ponderar o serviço prestado e a condição do contratante. Para saber sobre a ḿdia de remuneração cobrada pelos serviços psicoĺgicos, você pode consultar a Tabela de Honorários disponível no site do Conselho Federal de Psicologia, e tamb́m nos sites dos Conselhos Regionais. O Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo tamb́m prevê, no “rt. º, a conduta do proissional ao participar de greves e paralisações, indicando a necessidade de garantir que “a) as atividades de emergência não sejam interrompidas; b) haja prévia comunicação da paralisação aos usuários ou beneiciários dos serviços atingidos pela mesma” CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. , grifo nosso . Vamos agora saber o que falam os artigos º e º do Ćdigo “rt. º - O psićlogo, no relacionamento com proissionais não psićlogos a Encaminhará a proissionais ou entidades habilitados e qualiicados demandas que extrapolem seu campo de atuação. b Compartilhará somente informações relevantes para qualiicar o serviço prestado, resguardando o caráter conidencial das comunicações, assinalando a responsabilidade, de quem as receber, de preservar o sigilo. “rt. º - O psićlogo poderá intervir na prestação de serviços psicoĺgicos que estejam sendo efetuados por outro proissional, nas seguintes situações a “ pedido do proissional responsável pelo serviço. b Em caso de emergência ou risco ao beneiciário ou usuário do serviço, quando dará imediata ciência ao proissional. c Quando informado expressamente, por qualquer uma das partes, da interrupção voluntária e deinitiva do serviço. d Quando se tratar de trabalho multiproissional e a intervenção izer parte da metodologia adotada CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Esses artigos falam da relação do psićlogo com outros psićlogos e com proissionais não psićlogos, como no caso de trabalhos desenvolvidos em equipes multiproissionais. Manifesta que o psićlogo deve discernir o que vai aĺm do seu campo de atuação e encaminhar as demandas aos proissionais competentes na área, sempre lembrando da importância da conidencialidade das informações a que teve acesso e do repasse das informações com responsabilidade e compromisso ́tico. “inda sobre o caráter conidencial das comunicações, Goldim e Protas ilustram o assunto com o juramento hipocrático, do śculo V a.C., in verbis 209 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO Qualquer coisa que eu veja ou ouça, proissional ou privadamente, que não deva ser divulgada, eu conservarei em sigilo e contarei a ningúm HIP2CR“TES, apud GOLDIM PROT“S, , p. . Destarte, pode-se extrair deste texto a importância atribuída ao sigilo nas proissões de saúde já indicado desde a Gŕcia antiga. UNI EXEMPLO DE UM CASO DE DENÚNCIA ÉTICA: PSICÓLOGO EM EQUIPE MULTIDISCIPLINAR Psicólogo que atuava na atenção à saúde, responsável por atendimento de pacientes, aos quais eram dispensados cuidados de outros colegas da equipe de saúde. Em denúncia junto ao Conselho de Psicologia, familiar do atendido alega que o mesmo não realizou o trabalho de modo ético, negligenciando o atendimento. A partir dos dados colhidos através do devido processo ético, concluiu-se que o profissional não realizou encaminhamentos aos demais colegas da equipe multiprofissional quando necessário; não cumpriu o procedimento de anotar corretamente, em prontuário, o andamento dos atendimentos e, quando poucas vezes o fez, expôs questões do usuário, além do necessário, a terceiros alheios ao tratamento. Ademais, o psicólogo não cuidou do aspecto ético do sigilo profissional, expondo informações que não cabiam serem repassadas, sem o devido cuidado ético de preservar o melhor interesse do usuário, sem ponderar o repasse apenas daquilo que fosse estritamente necessário à compreensão e favorecimento da atenção integral à saúde desse usuário, pela equipe de saúde. Como resultado, houve prejuízos nos encaminhamentos do tratamento do usuário, houve imprudência por parte do profissional da Psicologia e o usuário abandonou o tratamento multidisciplinar, o que acarretou em maior comprometimento das condições de saúde do atendido. Pelo exposto, o profissional, no caso em questão, não cuidou de preservar os princípios éticos de sua profissão, comprometendo sua prática, como também, comprometendo os atendidos. Ao atuar do modo como o fez, o profissional cometeu infração ética, segundo os seguintes artigos do Código de Ética Profissional: Princípios Fundamentais I e II; Art. 1º “b”, “c”; Art. 3º; Art. 6º “a”, “b” e Art. 9º. FONTE: Adaptado de PSI Jornal da Psicologia (dez./jan., 2009). Disponível em: <http://www. crpsp.org.br/portal/comunicacao/jornal_crp/163/frames/fr_questoes_eticas.aspx>. Acesso em: 15 jul. 2017. O “rt. º aborda a necessidade de autorização dos responsáveis legais no atendimento à criança, adolescente ou interdito, que ́ uma pessoa incapacitada de tomar suas pŕprias decisões “rt. º - Para realizar atendimento não eventual de criança, adolescente ou interdito, o psićlogo deverá obter autorização de ao menos um de seus responsáveis, observadas as determinações da legislação vigente § ° - No caso de não se apresentar um responsável legal, o atendimento deverá ser efetuado e comunicado às autoridades competentes. § ° - O psićlogo responsabilizar-se-á pelos encaminhamentos que se izerem necessários para garantir a proteção integral do atendido CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . 210 TÓPICO 2 | CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO Passos observa que este artigo está de acordo com as leis vigentes, como o Estatuto da Criança e do “dolescente e a Resolução / do Conselho Nacional de Saúde CNS . Uma das questões mais comentadas da prática do psićlogo diz respeito ao sigilo e quando ́ permitido a quebra deste. Observe o que o Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo diz a respeito “rt. º - É dever do psićlogo respeitar o sigilo proissional a im de proteger, por meio da conidencialidade, a intimidade das pessoas, grupos ou organizações, a que tenha acesso no exercício proissional. “rt. - Nas situações em que se conigure conlito entre as exigências decorrentes do disposto no “rt. º e as airmações dos princípios fundamentais deste Ćdigo, excetuando-se os casos previstos em lei, o psićlogo poderá decidir pela quebra de sigilo, baseando sua decisão na busca do menor prejuízo. Parágrafo único – Em caso de quebra do sigilo previsto no caput deste artigo, o psićlogo deverá restringir-se a prestar as informações estritamente necessárias. “rt. – Quando requisitado a depor em juízo, o psićlogo poderá prestar informações, considerando o previsto neste Ćdigo. “rt. - Nos documentos que embasam as atividades em equipe multiproissional, o psićlogo registrará apenas as informações necessárias para o cumprimento dos objetivos do trabalho. “rt. - No atendimento à criança, ao adolescente ou ao interdito, deve ser comunicado aos responsáveis o estritamente essencial para se promoverem medidas em seu benefício. “rt. - “ utilização de quaisquer meios de registro e observação da prática psicoĺgica obedecerá às normas deste Ćdigo e a legislação proissional vigente, devendo o usuário ou beneiciário, desde o início, ser informado CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . O “rt. º apresenta a deinição de sigilo, que ́ a proteção atrav́s da norma da conidencialidade, das informações de usuários ou instituições, obtidas no exercício da proissão. Sua obrigatoriedade ́ um dos pilares da atividade proissional do psićlogo. Conidencialidade ́ uma palavra que procede da palavra coniança , ou seja, o usuário relata informações da sua intimidade porque conia que o psićlogo irá mantê-las sob sigilo GOLDIM, PROT“S, . Entretanto, existem situações que podem demandar a quebra do sigilo e o Ćdigo, no “rt. , estabelece essa possibilidade quando surgirem conlitos entre a regra de manter a conidencialidade das informações, mas que são confrontadas com os princípios fundamentais previstos no pŕprio Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo. “ decisão sobre a quebra do sigilo deve se pautar na busca do menor prejuízo. Este ́ o caso da notiicação às autoridades competentes de situações em que o psićlogo suspeite de violência ou maus-tratos a crianças, adolescentes ou idosos, conforme tamb́m previsto no Estatuto da Criança e do “dolescente e do Estatuto do Idoso. No entanto, se você vivenciar uma situação que ique em dúvida sobre a quebra ou não do sigilo proissional, procure o Conselho Regional de Psicologia, que dispõe, atrav́s da COF, de proissionais habilitados a auxiliar na tomada de decisão de forma crítica e fundamentada PSI JORN“L DE PSICOLOGI“, . 211 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO E o que fazer com materiais sigilosos do psićlogo em casos de suspensão ou encerramento do serviço, seja por questões da instituição ou por morte do psićlogo? “companhe o que o “rt. diz a esse respeito “rt. - Em caso de interrupção do trabalho do psićlogo, por quaisquer motivos, ele deverá zelar pelo destino dos seus arquivos conidenciais. § ° - Em caso de demissão ou exoneração, o psićlogo deverá repassar todo o material ao psićlogo que vier a substituí-lo, ou lacrá-lo para posterior utilização pelo psićlogo substituto. § ° - Em caso de extinção do serviço de Psicologia, o psićlogo responsável informará ao Conselho Regional de Psicologia, que providenciará a destinação dos arquivos conidenciais CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . UNI EXEMPLO DE CASO DAS PROVIDÊNCIAS QUE DEVEM SER TOMADAS DIANTE DO DESLIGAMENTO DO PSICÓLOGO DE UMA INSTITUIÇÃO. A responsável técnica pelos serviços de Psicologia de uma clínica queixa-se de que o psicólogo que trabalhou lá solicitou desligamento e partiu não finalizando seus atendimentos: não concluiu relatórios de avaliação e não entregou prontuários e folhas de testes aplicados, comprometendo os atendidos. Os pais de crianças atendidas informaram ter recebido e-mail do profissional comunicando o desligamento. O psicólogo explica que comunicou seu desligamento à clínica e conversou com as pessoas atendidas por ele. Entretanto, foi impedido de fazer os desligamentos pela responsável técnica, que alegou que os pacientes eram da clínica, e não dele. Afirma que terminou e encaminhou os relatórios e folhas dos testes; e entregou todos os prontuários da clínica, sendo que a responsável técnica assinou confirmação de recebimento. A Resolução CFP 07/03 e a Resolução CFP 01/09 estabelecem ser necessária a guarda de material decorrente da prestação de serviços psicológicos pelo prazo mínimo de cinco anos. Caso o(a) psicólogo(a) se desligue de uma instituição, ele(a) deverá repassar o material ao profissional que irá substitui-lo. Caso não haja substituto(a), o material deverá ser lacrado para posterior utilização pelo psicólogo(a) que for contratado(a) (Art. 15 do Código de Ética). Neste caso, recomenda-se ao(à) psicólogo(a) solicitar ao(à) responsável a assinatura de um Termo de Compromisso pela guarda e manutenção do material em sigilo. Se for prontuário multiprofissional, outro(a) técnico(a) da equipe assume a responsabilidade. É imprescindível o zelo com o encaminhamento das pessoas atendidas, considerando o melhor benefício a elas, realizando encaminhamentos apropriados, fazendo fechamento do atendimento. Neste caso, o psicólogo apresentou provas que comprovaram a entrega das documentações remetidas à instituição e familiares responsáveis. Nesses documentos constam orientações quanto à continuidade necessária a ser dada pelo profissional que vier a assumir os atendimentos. O procedimento ético foi arquivado. FONTE: PSI Jornal da Psicologia, (jan./fev., 2012). Disponível em: <http://www.crpsp.org.br/ portal/comunicacao/jornal_crp/171/frames/fr_questoes_eticas.aspx>. Acesso em: 15 jul. 2017. 212 TÓPICO 2 | CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO O Ćdigo de Ética tamb́m aborda a participação dos psićlogos em pesquisas cientíicas, conforme o indicado nos artigos subsequentes “rt. - O psićlogo, na realização de estudos, pesquisas e atividades voltadas para a produção de conhecimento e desenvolvimento de tecnologias a “valiará os riscos envolvidos, tanto pelos procedimentos, como pela divulgação dos resultados, com o objetivo de proteger as pessoas, grupos, organizações e comunidades envolvidas. b Garantirá o caráter voluntário da participação dos envolvidos, mediante consentimento livre e esclarecido, salvo nas situações previstas em legislação especíica e respeitando os princípios deste Ćdigo. c Garantirá o anonimato das pessoas, grupos ou organizações, salvo interesse manifesto destes. d Garantirá o acesso das pessoas, grupos ou organizações aos resultados das pesquisas ou estudos, aṕs seu encerramento, sempre que assim o desejarem. “rt. - Caberá aos psićlogos docentes ou supervisores esclarecer, informar, orientar e exigir dos estudantes a observância dos princípios e normas contidos neste Ćdigo. “rt. - O psićlogo não divulgará, ensinará, cederá, emprestará ou venderá a leigos instrumentos e t́cnicas psicoĺgicas que permitam ou facilitem o exercício ilegal da proissão CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Devemos aqui aprender mais sobre a já citada Resolução do CNS / . Este documento tem por objetivo estabelecer princípios ́ticos e normas para regulamentar as pesquisas envolvendo seres humanos e foi constituído pelo Minist́rio da Saúde tomando como base tratados internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos de , a Declaração Internacional sobre os Dados Geńticos Humanos de e a Declaração Universal sobre ”iótica e Direitos Humanos de , dentre outros. Suas diretrizes ́ticas são estabelecidas mediante a ponderação de que toda pesquisa envolve riscos e benefícios aos envolvidos e por isso deve ser apreciada por um Comitê de Ética em Pesquisa antes de ser iniciada. “ resolução prevê a necessidade de consentimento livre e esclarecido por parte do participante da pesquisa e, em casos de crianças, adolescentes e incapazes, aĺm do consentimento livre e esclarecido dos responsáveis, tamb́m solicita o termo de assentimento, que deve ser produzido em linguagem acessível ao sujeito da pesquisa. Tamb́m devem estar garantidos os sigilos e a privacidade das informações MINISTÉRIO D“ S“ÚDE, . DICAS Para obter a Resolução 466/2012 na íntegra, acesse o site: <http://bvsms.saude. gov.br/bvs/saudelegis/cns/2013/res0466_12_12_2012.html>. Acesso em: 15 jul. 2017. 213 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO Com relação à participação em veículos de comunicação ou publicidade de seus serviços, observe os seguintes artigos “rt. - O psićlogo, ao participar de atividade em veículos de comunicação, zelará para que as informações prestadas disseminem o conhecimento a respeito das atribuições, da base cientíica e do papel social da proissão. “rt. - O psićlogo, ao promover publicamente seus serviços, por quaisquer meios, individual ou coletivamente a Informará o seu nome completo, o CRP e seu número de registro. b Fará referência apenas a títulos ou qualiicações proissionais que possua. c Divulgará somente qualiicações, atividades e recursos relativos a t́cnicas e práticas que estejam reconhecidas ou regulamentadas pela proissão. d Não utilizará o preço do serviço como forma de propaganda. e Não fará previsão taxativa de resultados. f Não fará autopromoção em detrimento de outros proissionais. g Não proporá atividades que sejam atribuições privativas de outras categorias proissionais. h Não fará divulgação sensacionalista das atividades proissionais CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Coerente com os demais artigos, o Ćdigo de Ética salienta a responsabilidade ́tica do psićlogo nas informações prestadas em veículos de comunicação, pois devem contribuir para a eliminação de discriminação, violência e o acesso da população ao conhecimento da ciência psicoĺgica e de serviços, conforme destacado nos Princípios Fundamentais. Tamb́m deve assegurar-se de que o ato não colocará em risco a conidencialidade de informações de pessoas ou organizações. O Ćdigo lembra ainda que ao fazer anúncios dos seus serviços, o psićlogo deve informar obrigatoriamente seu nome completo, o CRP em que está inscrito e o seu número de registro, não podendo fazer propaganda baseada no preço dos serviços oferecidos ou em títulos e especialidades que não possua. Outra grande preocupação e motivo de denúncias nos Conselhos Regionais ́ associar o título de psićlogo com práticas não reconhecidas ou regulamentadas pelo CRP. Essa norma, como já vimos, tamb́m está explícita no “rt. º, alínea f . “inda sobre este tema, a Resolução CFP nº / disciplina a oferta de serviços psicoĺgicos e produtos ao público. “ norma determina que, aĺm do Ćdigo de Ética, o psićlogo deve nortear suas ações tamb́m pelo estabelecido no Ćdigo de Proteção e Defesa do Consumidor em relação aos direitos básicos do consumidor e sobre a publicidade. 3.3 DISPOSIÇÕES GERAIS Como visto, um Ćdigo de Ética Proissional ́ um ćdigo de condutas e por isso determina normas que regulam as atividades de uma determinada proissão. Com o estabelecimento das normas tamb́m ́ necessário apontar quais 214 TÓPICO 2 | CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO as penalidades a serem impostas àqueles que as infringirem. Desta forma, os últimos artigos do Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo vão proferir quais são as punições diante das infrações disciplinares, a saber “rt. - “s transgressões dos preceitos deste Ćdigo constituem infração disciplinar com a aplicação das seguintes penalidades, na forma dos dispositivos legais ou regimentais a “dvertência. b Multa. c Censura pública. d Suspensão do exercício proissional, por at́ trinta dias, ad referendum do Conselho Federal de Psicologia. e Cassação do exercício proissional, ad referendum do Conselho Federal de Psicologia. “rt. - “s dúvidas na observância deste Ćdigo e os casos omissos serão resolvidos pelos Conselhos Regionais de Psicologia, ad referendum do Conselho Federal de Psicologia. “rt. - Competirá ao Conselho Federal de Psicologia irmar jurisprudência quanto aos casos omissos e fazê-la incorporar a este Ćdigo. “rt. - O presente Ćdigo poderá ser alterado pelo Conselho Federal de Psicologia, por iniciativa pŕpria ou da categoria, ouvidos os Conselhos Regionais de Psicologia. “rt. - Este Ćdigo entra em vigor em de agosto de CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . O “rt. estabelece quais são as penalidades previstas, inclusive estipula que a suspensão do exercício proissional por at́ dias e a cassação do exercício proissional são aplicadas mediante aprovação do Conselho Federal de Psicologia. “ssim, como vimos na Lei . / , compete aos Conselhos Regionais de Psicologia receber as representações ́ticas contra psićlogos, funcionando como tribunais regionais de ́tica. Cabendo recurso, compete ao CFP a decisão inal dos processos, bem como aplicação da suspensão ou cassação do exercício proissional, pois ele atua como tribunal superior de ́tica quanto ao exercício proissional do psićlogo. “ĺm disso, o Ćdigo de Ética tamb́m prevê que conv́m ao CFP, nos casos não mencionados no presente Ćdigo, dirimir quaisquer dúvidas e preencher lacunas existentes por meio da elaboração de normas adequadas. Diante do exposto, você deve ter percebido que o “rt. não deixa claro como proceder nos casos de transgressões disciplinares at́ a aplicação da multa. Para resolver situações como essa, o CFP e tamb́m os Conselhos Regionais fazem uso de resoluções visando regulamentar situações não previstas no Ćdigo e leis, como ́ o caso da Resolução CFP nº / , que instituiu o Ćdigo de Processamento Disciplinar, o qual passaremos a estudar agora. 4 CÓDIGO DE PROCESSAMENTO DISCIPLINAR “nterior ao Ćdigo de Processamento Disciplinar aprovado em pelo CFP, já existiram outras resoluções para regulamentar os processos ́ticos instaurados e, assim como vimos com o Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo, 215 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO essas regras e normas vão sendo modiicadas buscando sempre o aperfeiçoamento das ações e o atendimento da demanda dos psićlogos e sociedade. O atual Ćdigo de Processamento Disciplinar determina nos seus três primeiros artigos que “rt. º - “s faltas disciplinares e infrações ao Ćdigo de Ética praticadas por psićlogos, no exercício proissional ou no cargo de Conselheiro, serão apuradas em todo territ́rio nacional, pelos Conselhos de Psicologia, nos termos do presente Ćdigo. “rt. º - Os processos disciplinares serão iniciados mediante representação de qualquer interessado ou, de ofício, pelos Conselhos de Psicologia, por iniciativa de qualquer de seus ́rgãos internos ou de seus Conselheiros, efetivos ou suplentes. “rt. º - Os processos disciplinares ordinário, funcional e ́tico e os procedimentos a serem adotados em cada caso seguirão o disposto neste Ćdigo CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Desta maneira, estabelece, como já visto, que qualquer pessoa pode fazer uma representação junto a um Conselho Regional sobre o exercício proissional de um psićlogo, que fará a apuração dela de acordo com a área de abrangência da sua Regional. Embora estejamos aqui estudando sobre as questões ́ticas, o supracitado Ćdigo faz uma divisão dos processos disciplinares em ordinário, funcional e ́tico. O processo disciplinar ordinário apura infrações de natureza administrativa, como o exemplo dado do psićlogo que não faz sua inscrição secundária ao trabalhar por mais de dias em territ́rio de outro Conselho Regional que não o da sua inscrição principal. O processo disciplinar funcional averigua situações praticadas por conselheiro no exercício do cargo. E, por último, o processo disciplinar ́tico investiga faltas e infrações ao Ćdigo de Ética CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . “o longo da Resolução estão detalhadas todas as etapas que devem ser seguidas, desde a fase preliminar, passando pela fase de instrução at́ o julgamento. Conv́m apontar que nem sempre uma representação ou denúncia chega a se tornar um processo ́tico, pois pode ocorrer que ainda na fase preliminar se chegue à conclusão de que não houve infração. Em todas as etapas se busca garantir a imparcialidade e lisura, bem como a ampla defesa do psićlogo. O conteúdo do processo ́ de caráter sigiloso, ou seja, apenas as partes e seus procuradores podem ter acesso aos autos PSI JORN“L DE PSICOLOGI“, . DICAS O Conselho Regional de Psicologia de Santa Catarina – 12ª Região, tem disponível na sua página um fluxograma do código de processamento disciplinar que você pode acessar através do link: <http://www.crpsc.org.br/ckfinder/userfiles/files/Fluxograma%20CPD(1).pdf>. Acesso em: 15 jul. 2017. 216 “ṕs transcorrido todo o processo legal, são aplicadas as penalidades já conhecidas, e em casos de reincidência na mesma mat́ria, dentro de um período de dois anos, a penalização tende a ser mais rigorosa. “inda sobre as penalidades, o Ćdigo de Processamento Disciplinar dispõe que a advertência ́ aplicada em caráter conidencial, visto que um processo ́tico tamb́m tem função orientadora. No tocante a censura pública, a suspensão e a cassação do exercício proissional, o “rt. aponta que § º - “ censura pública, a suspensão e a cassação do exercício proissional serão publicadas em Diário Oicial, jornais ou boletins do Conselho Regional e aixados na sua sede onde estiver inscrito o psićlogo processado e nas suas Seções. § º - “ publicação tamb́m deverá ser feita na localidade onde ocorreu o fato e onde reside o psićlogo processado, caso não coincidam com as referidas no parágrafo anterior CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . “ Resolução ainda prevê que os Conselhos têm o dever de informar, quando solicitados, sobre a existência de processos julgados com penalidades públicas aplicadas, assim como tamb́m devem iscalizar se as penalidades estão sendo cumpridas, especialmente quando da cassação. “inda sobre esta penalidade, o psićlogo somente pode pedir a reabilitação e novamente poder exercer a proissão, aṕs decorrido o prazo de cinco anos da decisão, que será deferida ou não pelo Plenário, aṕs ouvida a Comissão de Ética. DICAS Para saber mais sobre o Código de Processamento Disciplinar, acesse a Resolução CFP nº 006/2007, que está disponível no site do CFP: <http://site.cfp.org.br/wp-content/ uploads/2012/07/resolucao2007_6.pdf>. 217 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que • Deontologia ́ o estudo dos deveres, das condutas proissionais. Ćdigos de Ética tamb́m são conhecidos como ćdigos deontoĺgicos. Um Ćdigo de conduta tem por objetivo estabelecer os princípios que os proissionais devem utilizar como referência para suas ações. • Ética proissional ́ a aplicação da ́tica ao exercício proissional e se articula com a deontologia. “ práxis do proissional deve estar alicerçada em uma relexão ilośica que deina sua concepção de mundo e, consequentemente, seu comportamento ́tico. • Os psićlogos já tiveram alguns ćdigos que foram sendo reformulados para atender às demandas e interesses dos proissionais e da sociedade. “ṕs a criação do Sistema Conselhos, em , foram aprovados os seguintes Ćdigos em , o primeiro Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo, tendo sido apresentada nova versão em . Em tivemos um novo Ćdigo na ocasião da comemoração dos anos de regulamentação da proissão no ”rasil. O atual Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo foi aprovado em , aṕs ampla discussão que envolveu todos os Conselhos Regionais de Psicologia do país. • O atual Ćdigo de Ética foi aprovado e está disposto na Resolução CFP nº / . Dispõe sete Princípios Fundamentais e artigos e traz uma apresentação onde enfatiza seu compromisso com os Direitos Humanos estabelecidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos de . • Os artigos do Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo são divididos nos seguintes temas ao falar sobre as responsabilidades do psićlogo expressos em deveres fundamentais e o que ́ vedado ao psićlogo, aĺm de tratar sobre a remuneração, da participação de greves ou paralisações, do relacionamento com proissionais não psićlogos e com outros psićlogos, trata tamb́m sobre o sigilo proissional, do zelo pelos arquivos conidenciais em situações de interrupção do trabalho do psićlogo e da publicidade dos serviços psicoĺgicos. • “s penalidades aplicadas em casos de transgressões do Ćdigo de Ética são advertência, multa, censura pública, suspensão do exercício proissional por at́ dias e cassação do exercício proissional. • Todas as etapas de um processo disciplinar estão descritas na Resolução do CFP nº / , no Ćdigo de Processamento Disciplinar. 218 AUTOATIVIDADE Em que ano foi aprovado o Ćdigo de Ética Proissional de Psićlogo vigente? Seus valores estão embasados em qual documento internacional? Quantos são seus Princípios Fundamentais? Cite um deles Cite quatro condutas que são vedadas ao psićlogo de acordo com o Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo O que o Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo dispõe sobre o sigilo proissional? Em que situações o psićlogo pode decidir pela quebra de sigilo? Quais são as penalidades previstas diante de transgressão dos preceitos determinados no Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo? 219 220 TÓPICO 3 UNIDADE 3 RESOLUÇÕES DO CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA 1 INTRODUÇÃO Para orientar e disciplinar o exercício proissional do psićlogo e tamb́m informar a sociedade sobre a Psicologia enquanto ciência e proissão com compromisso ́tico, o CFP precisa contar com uma legislação que respalde suas decisões. Essa atribuição lhe ́ imputada pela Lei . / , descrita no “rt. º, nas seguintes alíneas b orientar, disciplinar e iscalizar o exercício da proissão de psićlogo c expedir as resoluções necessárias ao cumprimento das leis em vigor e das que venham modiicar as atribuições e competências dos proissionais de Psicologia e elaborar e aprovar o Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo f funcionar como tribunal superior de ́tica proissional g servir de ́rgão consultivo em mat́ria de Psicologia n propor ao poder competente alterações da legislação relativa ao exercício da proissão de psićlogo ”R“SIL, . Em conformidade a essas prerrogativas, o CFP e os Conselhos Regionais elaboram resoluções, que nada mais são do que atos normativos que visam disciplinar mat́rias especíicas. Em outras palavras, resoluções são normas aprovadas pelo Sistema Conselhos que devem ser cumpridas pelos psićlogos, pois para a categoria tais regras têm força de lei. “ criação de uma resolução envolve discussões regionais da categoria, que são pleiteadas a partir da ocorrência de um problema percebido na atuação proissional ou demanda social. “s resoluções buscam acompanhar as transformações relacionadas à atuação do a psićlogo a , sendo a categoria incluída frequentemente nos debates realizados com esse im CONSELHO REGION“L DE PSICOLOGI“ DE SÃO P“ULO, , p. Neste t́pico iremos apresentar as principais deliberações do Sistema Conselhos. Estas não serão descritas na íntegra, somente serão apontadas as principais características delas com o objetivo de informar e despertar o seu interesse para que você possa acessá-las na íntegra atrav́s do site do CFP e dos Conselhos Regionais. É importante que você tamb́m saiba que manter-se atualizado ́ um dever de todo psićlogo, conforme estabelece o Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo . “ssim, procure sempre acompanhar as discussões da categoria atrav́s do Sistema Conselhos e as atualizações da legislação vigente. 221 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO Para facilitar a compreensão e a busca por determinado assunto de interesse, as resoluções foram agrupadas de acordo com temas e estão classiicadas da seguinte forma • • • • • • • Registro Proissional Título de Especialista Preconceito e Orientação Sexual Psicoterapia “valiação Psicoĺgica Testes Psicoĺgicos Registro Documental e Prontuário 2 REGISTRO PROFISSIONAL De acordo com a Lei . / , para ser um psićlogo ́ obrigat́ria a conclusão do Curso de Formação de Psićlogo. No entanto, para exercer atividades como psićlogo, ́ exigido que o proissional faça sua inscrição no Conselho Regional de Psicologia, conforme “rt. da Lei . / Todo proissional de Psicologia, para o exercício da proissão, deverá inscrever-se no Conselho Regional de sua área de ação ”R“SIL, . No T́pico você já aprendeu sobre o registro proissional de psićlogo, tais como quais os documentos que devem ser encaminhados ao Conselho Regional de Psicologia CRP da sua região, visando a inscrição no Conselho da categoria. São os CRPs que têm a atribuição de inscrever e manter atualizados os registros proissionais dos psićlogos, de acordo com o Decreto nº . / , que regulamenta a Lei . , de . No caso de psićlogos rećm-formados, que ainda não possuem o Diploma de Formação de Psićlogo, estes podem solicitar sua inscrição mediante a apresentação do Certiicado de Colação de Grau do Curso de Psicologia. O psićlogo terá dois anos para substituir o Certiicado de Colação de Grau pelo Diploma de Formação de Psićlogo. Nesse tempo, receberá uma carteira de identidade proissional proviśria que será substituída pela deinitiva assim que a documentação adequada for apresentada ao CRP. “gora, no caso de o psićlogo deixar de exercer a proissão, ele pode solicitar o cancelamento do seu registro no CRP. Seu número de registro poderá ser reativado a qualquer momento por solicitação do psićlogo, tão logo retome a proissão. Da mesma forma, empresas que oferecem serviços de Psicologia como atividade principal tamb́m devem solicitar a inscrição no CRP como pessoa jurídica, estando tamb́m sujeitas ao pagamento da anuidade. Tamb́m já vimos no T́pico que, caso um psićlogo exerça por mais de dias atividades proissionais em outra regional, deve requerer sua inscrição secundária, que não terá ônus inanceiro. No entanto, se o motivo for mudança de 222 TÓPICO 3 | RESOLUÇÕES DO CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA endereço proissional, o psićlogo deve solicitar a transferência de registro do seu CRP de origem para o CRP de destino. Toda essa legislação detalhada você encontra nas Resoluções CFP / e / , que dispõem sobre a Consolidação das Resoluções do CFP. Este documento delineia tamb́m sobre a arrecadação das anuidades, taxas e multas e a sua distribuição no Sistema Conselhos. E IMPORTANT A Resolução do CFP nº 003/2007, enquanto Consolidação das Resoluções do CFP, traz normatizações importantes para a categoria, por exemplo, o conceito das funções consideradas privativas do psicólogo. Esses termos, algumas vezes são usados de forma indiscriminada ou causam confusão, por isso observe suas definições: Art. 2º - Os métodos e as técnicas psicológicas utilizados no exercício das funções privativas do psicólogo a que se refere o § 1º do art. 13 da Lei nº 4.119, de 27 de agosto de 1962, são entendidos da seguinte forma: I - MÉTODO – conjunto sistemático de procedimentos orientados para fins de produção ou aplicação de conhecimentos; II - TÉCNICA – entende-se como toda atividade específica, coerente com os princípios gerais estabelecidos pelo método; III – MÉTODOS PSICOLÓGICOS – conjunto sistemático de procedimentos aplicados à compreensão e intervenção em fenômenos psíquicos nas suas interfaces com os processos biológicos e socioculturais, especialmente aqueles relativos aos aspectos intra e interpessoais; IV – DIAGNÓSTICO PSICOLÓGICO - é o processo por meio do qual, por intermédio de métodos e técnicas psicológicas, se analisa e se estuda o comportamento de pessoas, de grupos, de instituições e de comunidades, na sua estrutura e no seu funcionamento, identificando-se as variáveis nele envolvidas; V – ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL - é o processo por meio do qual, por intermédio de métodos e técnicas psicológicas, se investigam os interesses, aptidões e características de personalidade do consultante, visando proporcionar-lhe condições para a escolha de uma profissão; VI – SELEÇÃO PROFISSIONAL - é o processo por meio do qual, por intermédio de métodos e técnicas psicológicas, se objetiva diagnosticar e prognosticar as condições de ajustamento e desempenho da pessoa a um cargo ou atividade profissional, visando a alcançar eficácia organizacional e procurando atender às necessidades comunitárias e sociais; VII - ORIENTAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA - é o processo por meio do qual, por intermédio de métodos e técnicas psicológicas, proporcionam-se condições instrumentais e sociais que facilitem o desenvolvimento da pessoa, do grupo, da organização e da comunidade, bem como condições preventivas e de solução de dificuldades, de modo a atingir os objetivos escolares, educacionais, organizacionais e sociais; VIII - SOLUÇÃO DE PROBLEMAS DE AJUSTAMENTO - é o processo que propicia condições de autorrealização, de convivência e de desempenho para o indivíduo, o grupo, a instituição e a comunidade, mediante métodos psicológicos preventivos, psicoterápicos e de reabilitação (CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA, 2007). Outra norma que diz respeito ao registro proissional ́ a Resolução CFP / . Esta deliberação dispõe no seu “rt. º que ́ assegurado às pessoas transexuais e travestis o direito à escolha de tratamento nominal a ser inserido no campo observação da Carteira de Identidade Proissional do Psićlogo, por meio 223 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO da indicação do nome social CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, .“ decisão se estende à assinatura de documentos psicoĺgicos ou na publicização do seu trabalho, que deve ser acompanhado de seu nome e número de registro proissional. 3 TÍTULO DE ESPECIALISTA Se um psićlogo desejar registrar sua especialidade proissional na sua Carteira de Identidade Proissional, esta pode ser concedida pelo Conselho de Psicologia aṕs decorridos dois anos de inscrição no CRP. Para isto, o interessado precisa atender alguns crit́rios que foram regulamentados atrav́s da Resolução CFP nº / . No entanto, observe o que está explicitado no “rt. O título de especialista em Psicologia ́ uma referência à maior dedicação do proissional na área da especialidade, não se constituindo condição para o exercício proissional de psićlogo CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . “ssim, a obtenção do título de especialista não ́ obrigat́ria, no entanto, ele qualiica sua formação proissional, reconhecendo a área de especialidade de atuação do psićlogo. Embora existam muitas especialidades na Psicologia, at́ o momento foram regulamentadas somente as que se seguem “rt. º - “s especialidades a serem concedidas são as seguintes I - Psicologia Escolar/Educacional II - Psicologia Organizacional e do Trabalho III - Psicologia de Trânsito IV - Psicologia Jurídica V - Psicologia do Esporte VI - Psicologia Clínica VII - Psicologia Hospitalar VIII - Psicopedagogia IX - Psicomotricidade X - Psicologia Social XI - Neuropsicologia “rt. º - Novas especialidades poderão ser regulamentadas, pelo CFP, sempre que sua produção térica, t́cnica e institucionalização social assim as justiiquem CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Conforme descrito no referido documento, outras especialidades podem ser reconhecidas pelo Sistema Conselhos. Foi o que aconteceu em , atrav́s da Resolução CFP nº / , que reconheceu a especialidade Psicologia em Saúde em seu rol. Os psićlogos poderão solicitar o registro de at́ dois títulos de especialistas, podendo tamb́m solicitar a substituição de um título por outro e, at́ mesmo, o cancelamento da especialidade. Para obtenção da titularidade, o psićlogo deve atender a um dos seguintes requisitos conclusão de cursos de especialização credenciados pelo CFP ou credenciados pelo MEC ou aprovação em concurso de 224 TÓPICO 3 | RESOLUÇÕES DO CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA provas e títulos e comprovação de dois anos de experiência proissional. Sobre o concurso, cabe ressaltar que ele ́ realizado uma vez por ano pelo CFP para todas as especializações regulamentadas. DICAS Para saber sobre os editais, provas e gabaritos do concurso de provas e títulos do CFP e/ou outras formas de obtenção do Título de Especialista em Psicologia, acompanhe o site do CFP, através do link: <http://site.cfp.org.br>. Acesso em: 15 jul. 2017. 4 PRECONCEITO E ORIENTAÇÃO SEXUAL Um assunto que merece destaque no estudo da conduta ́tica do psićlogo ́ a preocupação do Sistema Conselhos com o enfrentamento do racismo, preconceitos ́tnicos e a homofobia. Tanto que a categoria possui duas deliberações que tratam desses temas. “ primeira delas, a Resolução CFP nº / , estabelece normas de atuação para os psićlogos em relação à questão da Orientação Sexual. Dentre seus artigos, salientamos os seguintes “rt. ° - Os psićlogos deverão contribuir, com seu conhecimento, para uma relexão sobre o preconceito e o desaparecimento de discriminações e estigmatizações contra aqueles que apresentam comportamentos ou práticas homoeŕticas. “rt. ° - Os psićlogos não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeŕticas, nem adotarão ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados. Parágrafo único - Os psićlogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades. “rt. ° - Os psićlogos não se pronunciarão, nem participarão de pronunciamentos públicos, nos meios de comunicação de massa, de modo a reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . O segundo expediente que mencionaremos aqui ́ a Resolução CFP nº / , que estabelece normas de atuação para os psićlogos em relação ao preconceito e à discriminação racial e deixa explícito no “rt. º que Os psićlogos não exercerão qualquer ação que favoreça a discriminação ou preconceito de raça ou etnia CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . “ norma vale tamb́m para instrumentos ou t́cnicas psicoĺgicas que não devem ser utilizados para gerar ou reforçar esterétipos ou discriminação racial. Essas duas resoluções vão ao encontro do discutido no t́pico anterior sobre os Princípios Fundamentais estabelecidos no Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo. Como vimos, este documento versa o compromisso de toda a 225 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO categoria para com os valores que norteiam os Direitos Humanos, tais como a liberdade, dignidade, igualdade e a integridade do ser humano. Lembrando ainda que o trabalho do psićlogo, aĺm de ter como objetivo a promoção da saúde e qualidade de vida, deve contribuir para eliminar quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . “ necessidade de relexão e de defesa dos Direitos Humanos ́ o que motivou o CFP a criar, em , uma Comissão de Direitos Humanos do CFP em caráter permanente e tamb́m nos Conselhos Regionais. Essa comissão atua em diversas frentes, com destaque, aĺm dos temas abordados nas resoluções referidas, ao enfrentamento da violência de Estado e da tortura e tamb́m sobre os direitos e assistência aos usuários de drogas e suas famílias JORN“L DO FEDER“L, . 5 PSICOTERAPIA Embora a psicoterapia seja conhecida como uma prática tradicional do psićlogo, vimos que a Lei nº . / , que regulamenta a formação e a proissão do psićlogo, não considera esta atividade como função privativa da categoria. Entretanto, com o objetivo de respaldar a atuação do psićlogo psicoterapeuta, bem como zelar pelo usuário desse serviço, o CFP aprovou a Resolução / , que qualiica a psicoterapia como prática do psićlogo. No “rt. º está especiicado “ Psicoterapia ́ prática do psićlogo por se constituir, t́cnica e conceitualmente, um processo cientíico de compreensão, análise e intervenção que se realiza atrav́s da aplicação sistematizada e controlada de ḿtodos e t́cnicas psicoĺgicas reconhecidos pela ciência, pela prática e pela ́tica proissional, promovendo a saúde mental e propiciando condições para o enfrentamento de conlitos e/ou transtornos psíquicos de indivíduos ou grupos CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . 5.1 USO DA HIPNOSE COMO RECURSO AUXILIAR DE TRABALHO DO PSICÓLOGO “tendendo ao disposto na norma citada, assim como o estabelecido no Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo de somente utilizar teorias e t́cnicas que sejam reconhecidas ou regulamentadas pela legislação proissional, o CFP editou a Resolução nº / , que trata do uso da hipnose, determinando o seguinte “rt. º - O uso da hipnose inclui-se como recurso auxiliar de trabalho do psićlogo, quando se izer necessário, dentro dos padrões ́ticos, garantidos a segurança e o bem-estar da pessoa atendida. 226 TÓPICO 3 | RESOLUÇÕES DO CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA “rt. º - O psićlogo poderá recorrer à hipnose, dentro do seu campo de atuação, desde que possa comprovar capacitação adequada, de acordo com o disposto na alínea a do artigo º do Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo. “rt. º - É vedado ao psićlogo a utilização da hipnose como instrumento de mera demonstração fútil ou de caráter sensacionalista ou que crie situações constrangedoras às pessoas que estão se submetendo ao processo hipńtico. Esse debate suscita muitas dúvidas de quais são as práticas consideradas regulamentadas pelo CFP, aĺm da hipnose. O entendimento ́ de que devem ser seguidas as orientações da Resolução CFP nº / e / , que estabelecem os crit́rios para pesquisa, divulgação, publicidade e o exercício proissional do psićlogo de práticas em desacordo com crit́rios cientíicos estabelecidos na ciência psicoĺgica. “ legislação recomenda que a utilização delas seja feita em caráter experimental, com a devida aprovação de um Comitê de Ética em Pesquisa CONSELHO REGION“L DO RIO DE J“NEIRO, . UNI A PRÁTICA DA ACUPUNTURA PELO PSICÓLOGO A Resolução CFP nº 005/2002, que dispunha sobre a prática da acupuntura como prática complementar do psicólogo, foi anulada após decisão do STF. O entendimento do tribunal é que, diante da inexistência de lei específica para o exercício da acupuntura, sua prática é livre para todas as categorias. Para saber mais sobre esse tema, acesse: <http://site.cfp.org.br/ acupuntura-2/>. Acesso em: 15 jul. 2017. 5.2 SERVIÇOS PSICOLÓGICOS REALIZADOS POR MEIOS TECNOLÓGICOS DE COMUNICAÇÃO A DISTÂNCIA Devido à atual facilidade de acesso à internet e as possibilidades de comunicação que essa ferramenta proporcionou, bem como a discussão pela categoria e da sociedade sobre o uso dessa ferramenta por proissionais da Psicologia, o CFP, por meio da Resolução nº / , regulamentou a oferta de serviços psicoĺgicos por meios tecnoĺgicos de comunicação a distância e, em caráter experimental, o atendimento psicoterapêutico. Primeiro ́ preciso discriminar que a resolução supracitada entende por meios de comunicação a distância todas as mediações computacionais com acesso à internet, por meio de televisão a cabo, aparelhos telefônicos, aparelhos conjugados ou híbridos, ou qualquer outro modo de interação que possa vir a ser implementado CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . 227 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO “ Resolução / está dividida em duas partes. “ primeira especiica quais os serviços psicoĺgicos que podem ser realizados atrav́s dos referidos equipamentos e a quantidade de contatos virtuais. São eles I - “s orientações psicoĺgicas de diferentes tipos, entendendo-se por orientação o atendimento realizado em at́ encontros ou contatos virtuais, síncronos ou assíncronos. II - Os processos pŕvios de seleção de pessoal. III - “ aplicação de testes devidamente regulamentados por resolução pertinente. IV - “ supervisão do trabalho de psićlogos, realizada de forma eventual ou complementar ao processo de sua formação proissional presencial. V - O atendimento eventual de clientes em trânsito e/ou de clientes que momentaneamente se encontrem impossibilitados de comparecer ao atendimento presencial CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Quando a prática não for eventual, ou seja, quando a atividade for prestada de forma regular pelo psićlogo, ́ preciso que se faça um cadastramento no site no Conselho Regional da sua jurisdição. “ deliberação detalha que o site precisa ser exclusivo para a oferta desse serviço, sem links para outros sites, com exceção para os endereços eletrônico do CFP e CRP. “ Resolução tamb́m regulamenta toda a documentação necessária para se obter essa licença. “ segunda parte trata da possibilidade do atendimento psicoterapêutico ser realizado à distância, por meios tecnoĺgicos de comunicação. “ permissão para essa prática está condicionada ao caráter exclusivamente experimental, sendo assim, por ser considerada então uma pesquisa com seres humanos, está sujeita à aprovação de um Comitê de Ética em Pesquisa. Como se trata de pesquisa, ica proibido ao participante pesquisado o recebimento de qualquer forma de remuneração. É importante frisar que, independentemente de ser um serviço psicoĺgico ou atendimento psicoterapêutico, compete ao proissional garantir o sigilo das informações, por meio de recursos tecnoĺgicos, devendo esclarecer o cliente sobre isso, sempre respeitando os preceitos do Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo. Os debates em torno desse assunto são vários e há necessidade de pesquisas para a obtenção das respostas apropriadas. Por exemplo, cita-se a dúvida que se tem em relação ao manejo em situações de crise em um atendimento à distância, ou ainda, como diferenciar, na prática, uma orientação psicoĺgica, que pela resolução pode ser realizada em at́ sessões de psicoterapia? No entanto, há de se ponderar tamb́m os avanços conquistados pela sociedade com os recursos tecnoĺgicos e a comodidade proporcionada pela internet. “s respostas para essas perguntas poderão ser obtidas em estudos e pesquisas dessas transformações sociais e sua discussão de forma crítica e comprometida com a ́tica e com a sociedade CONSELHO REGION“L DE PSICOLOGI“ DO RIO DE J“NEIRO, . 228 TÓPICO 3 | RESOLUÇÕES DO CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA 6 AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA “ realização de avaliação psicoĺgica ́ uma função privativa do psićlogo e pode ser considerada como uma das atividades mais importantes e complexas do exercício proissional. Esta prática pode ser deinida como um processo t́cnicocientíico de coleta de dados, estudos e interpretação de informações a respeito dos fenômenos psicoĺgicos, que são resultantes da relação do indivíduo com a sociedade, utilizando-se, para tanto, de estrat́gias psicoĺgicas – ḿtodos, t́cnicas e instrumentos CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Realizada com indivíduos, grupos ou instituições, nos diversos campos de atuação do psićlogo, a avaliação psicoĺgica tem por objetivo subsidiar o trabalho do proissional. Para tanto, requer planejamento e metodologias especíicas de acordo com a demanda e os ins aos quais se destina. Tamb́m se deve considerar que Os resultados das avaliações devem considerar e analisar os condicionantes hist́ricos e sociais e seus efeitos no psiquismo, com a inalidade de servirem como instrumentos para atuar não somente sobre o indivíduo, mas na modiicação desses condicionantes que operam desde a formulação da demanda at́ a conclusão do processo de avaliação psicoĺgica CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Visando fornecer informações téricas, metodoĺgicas e ́ticas sobre a avaliação psicoĺgica, o CFP lançou em uma Cartilha sobre “valiação Psicoĺgica. O manual distingue avaliação psicoĺgica de testagem psicoĺgica, apontando a avaliação psicoĺgica como um processo que envolve várias etapas e busca informações em diversas fontes, como entrevistas, observações e testes psicoĺgicos. Logo, testagem psicoĺgica pode ser entendida como uma parte da avaliação psicoĺgica que utiliza de diferentes tipos de testes psicoĺgicos CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Não nos cabe aqui fazer um estudo detalhado sobre avaliação psicoĺgica, mas sim apontar que esta atividade do psićlogo demanda dúvidas e questionamentos por parte não ś da categoria, como tamb́m dos usuários deste serviço, sendo esta prática responsável por um grande número de denúncias ́ticas nos CRPs contra os psićlogos CONSELHO REGION“L DE PSICOLOGI“ DO RIO DE J“NEIRO, . Consciente destas questões, o Sistema Conselhos aprovou algumas resoluções que tratam da avaliação psicoĺgica nos diversos contextos, como a avaliação psicoĺgica para obtenção da Carteira Nacional de Habilitação CNH , avaliação psicoĺgica para concessão de registro de arma de fogo, a atuação como perito e assistente t́cnico no Poder Judiciário. “s supracitadas resoluções serão descritas a seguir. 229 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO 6.1 A AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA PARA OBTENÇÃO DA CNH “ Resolução CFP nº / institui normas e procedimentos para a avaliação psicoĺgica no contexto do trânsito e tamb́m revoga a norma de que versava sobre este assunto. O expediente tem por objetivo deinir exigências mínimas de qualidade na avaliação psicoĺgica dos candidatos à CNH. Para isso, dispõe sobre o conceito de avaliação psicoĺgica e as habilidades mínimas do candidato à CNH, indicando que, independentemente de o condutor do veículo automotor ter essa atividade como proissão, o candidato deve ser avaliado quanto às suas habilidades de tomada de decisão atenção em seus diferentes tipos , processamento de informação inteligência, meḿria, orientação espacial , comportamento e traços de personalidade. Para atingir o objetivo da avaliação, o psićlogo se utiliza de instrumentos de avaliação psicoĺgica, dentre os quais, como citados na resolução, a entrevista psicoĺgica e testes psicoĺgicos. No dispositivo tamb́m são indicadas, de forma detalhada, as condições necessárias para a aplicação dos testes psicoĺgicos, sua mensuração, avaliação e orientações quanto aos resultados e a elaboração do laudo resultante da avaliação psicoĺgica CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . “inda, no expediente da Consolidação das Resoluções do CFP, está estabelecida a seguinte norma para atuação de psićlogos que atuam no contexto do trânsito, segundo o “rt. Cada psićlogo ś poderá efetuar atendimento de, no máximo, dez candidatos por jornada diária de oito horas de trabalho CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . 6.2 AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA PARA REGISTRO E PORTE DE ARMA O psićlogo interessado em realizar avaliação para registro e porte de arma deve atentar para a Resolução CFP nº / e para as Resoluções nº / e nº / , que alteram alguns artigos da primeira resolução citada. Especiicamente, a Resolução CFP nº / estabelece que Parágrafo único - Para atuar na área de avaliação psicoĺgica para a concessão de registro e/ou porte de arma de fogo, ́ indispensável que o psićlogo esteja inscrito no Conselho Regional de Psicologia de sua região e credenciado pela Polícia Federal CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Observe que para oferecer este serviço psicoĺgico, o proissional deve se credenciar na Polícia Federal. Tamb́m ́ importante que o psićlogo conheça a legislação nacional concernente ao tema, como a Instrução normativa do Departamento de Polícia Federal nº , de / / , que estabelece os procedimentos para o credenciamento do proissional junto à Polícia Federal 230 TÓPICO 3 | RESOLUÇÕES DO CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA e tamb́m como deve ser realizada a avaliação psicoĺgica e o que deve estar registrado no laudo que conclui sobre a aptidão psicoĺgica ou não, necessária para o manuseio de arma de fogo. “inda segundo esta norma, o exercício da proissão de vigilante exige a anterior avaliação psicoĺgica por parte de um proissional devidamente habilitado. Outras orientações presentes na resolução do CFP sobre a avaliação psicoĺgica para o porte de arma tratam sobre a proibição de vínculo empregatício com as instituições que formam ou contratam vigilantes, e sobre a devolutiva “rt. º - “os psićlogos responsáveis pela avaliação psicoĺgica ica vedado estabelecer qualquer vínculo com os centros de formação de vigilantes, empresas de segurança privada, escolas de formação ou outras empresas e instituições públicas que possa gerar conlitos de interesse em relação aos serviços prestados. “rt. º - É de responsabilidade do psićlogo encaminhar o resultado da avaliação ao solicitante, mediante protocolo de recebimento, bem como garantir a entrevista devolutiva ao candidato CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . DICAS Para saber mais sobre o credenciamento na Polícia Federal para avaliação psicológica para porte de arma, visite o site da Polícia Federal em: <www.dpf.gov.br>. 6.3 PSICÓLOGO COMO PERITO E ASSISTENTE TÉCNICO Entendendo a necessidade de estabelecer diretrizes para a atuação do psićlogo como perito nos diversos contextos, o CFP aprovou a Resolução nº / , que dispõe sobre a atuação do psićlogo como perito. Cabe informar que no Decreto nº . / está descrito como função do psićlogo, aĺm das já citadas aqui, realizar perícias e emitir pareceres sobre a mat́ria de psicologia ”R“SIL, . “ssim, a resolução conceitua que o psićlogo, ao atuar como perito, realiza uma avaliação direcionada a responder demandas especíicas, originada no contexto pericial CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Observe os seguintes artigos “rt. º – Conforme a especiicidade de cada situação, o trabalho pericial poderá contemplar observações, entrevistas, visitas domiciliares e institucionais, aplicação de testes psicoĺgicos, utilização de recursos lúdicos e outros instrumentos, ḿtodos e t́cnicas reconhecidas pela ciência psicoĺgica, garantindo como princípio fundamental o bemestar de todos os sujeitos envolvidos. “rt. º – O periciado deve ser informado acerca dos motivos, das t́cnicas utilizadas, datas e local da avaliação pericial psicoĺgica. 231 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO Caso o periciado seja uma criança, adolescente ou interdito, ́ necessário o consentimento formal de pelo menos um dos responsáveis legais. “ realização de uma perícia pode demandar atuação em equipe multiproissional, onde devem ser respeitadas as atribuições de cada proissão, cabendo ao psićlogo, conforme estabelecido no seu Ćdigo de Ética Proissional, compartilhar somente as informações que foram necessárias para responder àquela demanda. O psićlogo deve, ainda, ao comunicar os resultados, sinalizar o caráter conidencial das informações e a responsabilidade por parte de quem as receber, de preservar o sigilo. Em foi elaborada pelo CFP uma norma que dispõe especiicamente sobre a atuação como perito e assistente t́cnico no Poder Judiciário. Trata-se da Resolução nº / . Em sua apresentação, a deliberação diferencia o perito do assistente t́cnico, informando que o perito ́ um proissional designado para assessorar a Justiça no limite de suas atribuições e, portanto, deve exercer tal função com isenção em relação às partes envolvidas e comprometimento ́tico para emitir posicionamento de sua competência térico-t́cnica, a qual subsidiará a decisão judicial CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Já o assistente t́cnico ́ um proissional contratado pela parte para assessorar e garantir o direito a uma opinião que pode ser contrária da parte oposta, ou seja, perito e assistente t́cnico são proissionais do mesmo campo de saber, poŕm o perito ́ nomeado pelo juiz e o assistente t́cnico ́ indicado pelas partes CONSELHO REGION“L DE PSICOLOGI“ DO RIO DE J“NEIRO, . Quanto à realização da perícia, a resolução versa que “rt. º - O psićlogo perito e o psićlogo assistente t́cnico devem evitar qualquer tipo de interferência durante a avaliação que possa prejudicar o princípio da autonomia térico-t́cnica e ́tico-proissional, e que possa constranger o periciando durante o atendimento. “rt. º - O psićlogo assistente t́cnico não deve estar presente durante a realização dos procedimentos metodoĺgicos que norteiam o atendimento do psićlogo perito e vice-versa, para que não haja interferência na dinâmica e qualidade do serviço realizado. Parágrafo Único - “ relação entre os proissionais deve se pautar no respeito e colaboração, cada qual exercendo suas competências, podendo o assistente t́cnico formular quesitos ao psićlogo perito. “ resolução ainda deixa explícito que o psićlogo psicoterapeuta das partes que estão em litígio não pode aceitar ser perito ou assistente t́cnico e, caso lhe seja solicitado que forneça informações sobre o processo psicoterápico, necessita o consentimento formal da pessoa atendida. Sempre ́ importante relembrar que as resoluções são construídas com base no Ćdigo de Ética, que determina que o psićlogo não deve assumir responsabilidades proissionais pelas quais não esteja preparado pessoal, térica e tecnicamente. “ponta tamb́m que este proissional ś deve utilizar conhecimentos e t́cnicas reconhecidos pela ciência psicoĺgica e que não deve, segundo a alínea k do “rt. º do Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo Ser perito, avaliador 232 TÓPICO 3 | RESOLUÇÕES DO CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA ou parecerista em situações nas quais seus vínculos pessoais ou proissionais, atuais ou anteriores, possam afetar a qualidade do trabalho a ser realizado ou a idelidade aos resultados da avaliação CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . 7 TESTES PSICOLÓGICOS “ssim como a avaliação psicoĺgica, os testes psicoĺgicos tamb́m são instrumentos de uso exclusivo do psićlogo. Devido à quantidade de instrumentos e o compromisso ́tico de oferecer serviços psicoĺgicos de qualidade aos usuários, o Sistema Conselhos entendeu a necessidade de estabelecer diretrizes para a elaboração, a comercialização e o uso dos testes psicoĺgicos. Estes são deinidos pelo CFP como procedimentos sistemáticos de observação e registro de amostras de comportamentos e respostas de indivíduos com o objetivo de descrever e/ou mensurar características e processos psicoĺgicos, compreendidos tradicionalmente nas áreas emoção/afeto, cognição/inteligência, motivação, personalidade, psicomotricidade, atenção, meḿria, percepção, dentre outras, nas suas mais diversas formas de expressão, segundo padrões deinidos pela construção dos instrumentos CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . “ Resolução CFP nº / , que trata da mat́ria, atendeu à necessidade de aprimorar os instrumentos e procedimentos t́cnicos de trabalho dos psićlogos e de revisão perídica das condições dos ḿtodos e t́cnicas utilizados na avaliação psicoĺgica CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Mediante essas considerações, a referida resolução estabelece a criação de uma Comissão Consultiva em “valiação Psicoĺgica. Esta comissão, formada por psićlogos de reconhecido saber em testes psicoĺgicos, tem como atribuição, de acordo com o “rt. º analisar e emitir parecer sobre os testes psicoĺgicos encaminhados ao CFP, com base nos parâmetros deinidos nesta Resolução, bem como apresentar sugestões para o aprimoramento dos procedimentos e crit́rios envolvidos nessa tarefa, subsidiando as decisões do Plenário a respeito da mat́ria CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . “ Comissão avalia os testes psicoĺgicos a partir dos requisitos que os instrumentos devem ter e que foram deinidos pela resolução, tanto para os inventários e escalas, quanto para os testes projetivos e os testes estrangeiros que foram traduzidos para o português. “ṕs avaliação e análise, os testes recebem parecer favorável ou desfavorável no Plenário do CFP. Caso a decisão ao uso do teste psicoĺgico seja desfavorável, ́ possível que o mesmo seja reapresentado aṕs passar por revisão e adequação quanto às condições mínimas estabelecidas. Mesmo com parecer favorável, os testes precisam de revisões perídicas. O prazo estabelecido para apresentar os estudos necessários ́ de at́ anos para os dados referentes à padronização do teste psicoĺgico e de at́ anos para 233 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO estudos referentes à validade e precisão do instrumento. Caso não apresentar as revisões necessárias, o teste ́ excluído da lista dos testes com parecer favorável e os psićlogos não poderão mais fazer uso dele. “ Resolução CFP nº / prevê ainda que o CFP mantenha a relação de testes favoráveis para consulta dos psićlogos e de toda a comunidade. Para atender a essa determinação foi criado o Sistema de “valiação de Testes Psicoĺgicos, o S“TEPSI. “ listagem dos testes citada há pouco ica localizada no site do S“TEPSI, possibilitando por esse meio desse recurso a consulta aos testes psicoĺgicos favoráveis e aos desfavoráveis. Tamb́m pode veriicar a legislação completa e a relação dos testes que não são privativos do psićlogo, mas que podem ser usados por ele desde que exista respaldo térico na sua utilização. DICAS Você pode acessar o SATEPSI através do site: <http://satepsi.cfp.org.br/>. Sobre a utilização dos testes pelos psićlogos, ́ importante apontar os seguintes artigos da Resolução CFP Nº / “rt. – “s condições de uso dos instrumentos devem ser consideradas apenas para os contextos e proṕsitos para os quais os estudos empíricos indicaram resultados favoráveis. Parágrafo Único – “ consideração da informação referida no caput deste artigo ́ parte fundamental do processo de avaliação psicoĺgica, especialmente na escolha do teste mais adequado a cada proṕsito e será de responsabilidade do psićlogo que utilizar o instrumento. [...] “rt. - Será considerada falta ́tica, conforme disposto na alínea c do “rt. º e na alínea m do “rt. º do Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo, a utilização de testes psicoĺgicos que não constam na relação de testes aprovados pelo CFP, salvo os casos de pesquisa. Parágrafo Único - O psićlogo que utiliza testes psicoĺgicos como instrumento de trabalho, aĺm do disposto no caput deste artigo, deve observar as informações contidas nos respectivos manuais e buscar informações adicionais para maior qualiicação no aspecto t́cnico operacional do uso do instrumento, sobre a fundamentação térica referente ao construto avaliado, sobre pesquisas recentes realizadas com o teste, aĺm de conhecimentos de Psicometria e Estatística CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . 234 TÓPICO 3 | RESOLUÇÕES DO CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA UNI Em 2013, o CFP lançou uma campanha contra a banalização do uso de testes psicológicos, principalmente nas redes sociais e em canais do YouTube. O objetivo é defender o uso responsável e a qualidade dos resultados dos testes psicológicos. A campanha faz parte de uma ação do CFP em que também foi emitida uma nota técnica esclarecendo o assunto. A matéria completa está disponível em: <http://site.cfp.org.br/campanha-do-cfp-quer-barrarbanalizacao-de-testes-psicologicos/>. 8 REGISTRO DOCUMENTAL E PRONTUÁRIO Vamos falar agora de um assunto que merece muita atenção de todos os psićlogos como deve ser realizado o registro das informações obtidas na prestação de serviços psicoĺgicos. Essa padronização icou estabelecida na Resolução CFP nº / , que determinou a obrigatoriedade do registro documental das atividades proissionais, visto que, at́ esta data, a dever de manter um registro existia apenas na resolução que fala da Psicoterapia como prática do psićlogo, conforme vimos anteriormente Resolução CFP nº / . “gora, essas regras passam a se estender a todas as áreas de atuação de Psicologia, por isso preste muita atenção a todas as deliberações sobre o tema, pois as informações registradas dos serviços psicoĺgicos são instrumentos valiosos, objeto de pesquisa cientíica, mas tamb́m para a orientação ́tica e iscalização das atividades do psićlogo, possibilitando veriicar a responsabilidade t́cnica adotada e como meio de prova idônea para instruir processos disciplinares e à defesa legal CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . O registro documental, assunto tratado na resolução supracitada, ́ de caráter sigiloso e está deinido no § º do “rt. º como um conjunto de informações que tem por objetivo contemplar de forma sucinta o trabalho prestado, a descrição e a evolução da atividade e os procedimentos t́cnico-cientíicos adotados . “ Resolução CFP nº / , que posteriormente foi alterada pela Resolução CFP / , estabelece ainda que o registro das informações provenientes da prestação de serviços psicoĺgicos deve ocorrer prioritariamente na forma de prontuário psicoĺgico, ou seja, um arquivo, em papel ou informatizado, que contenha as seguintes informações dispostas no “rt. I - identiicação do usuário/instituição II - avaliação de demanda e deinição de objetivos do trabalho III - registro da evolução do trabalho, de modo a permitir o conhecimento do mesmo e seu acompanhamento, bem como os procedimentos t́cnicocientíicos adotados IV - registro de encaminhamento ou encerramento V - ćpias de outros documentos produzidos pelo psićlogo para o usuário/instituição do serviço de psicologia prestado deverão ser arquivadas, aĺm do registro da data de emissão, inalidade e destinatário. 235 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO É importante destacar que o usuário do serviço psicoĺgico, ou terceiro por ele autorizado, pode ter acesso integral e irrestrito às informações que constam no seu prontuário. “ssim, a resolução tamb́m delibera no inciso III do “rt. º que, para atendimento em grupos não eventual, o psićlogo deve manter, aĺm dos registros dos atendimentos, a documentação individual referente a cada usuário CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Quando se tratar de atendimento em equipe multiproissional, as informações devem ser registradas em prontuário único. Entretanto, neste caso, o psićlogo deve registar somente as informações necessárias ao cumprimento de seus objetivos, protegendo assim a intimidade das pessoas. No entanto, no inciso VI do “rt. º da referida Resolução, consta que documentos resultantes da aplicação de instrumentos de avaliação psicoĺgica deverão ser arquivados em pasta de acesso exclusivo do psićlogo CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Explicando melhor, nos casos onde existir intervenções psicoĺgicas os documentos precisam icar restritos do compartilhamento de informações com o atendido, como ́ o caso dos documentos mencionados ainda há pouco, estes devem ser arquivados em pasta exclusiva do psićlogo, ou seja, em arquivo denominado Registro documental. De forma geral, podemos dizer que todo prontuário ́ um registro documental, poŕm nem todo registro documental se conigurará em um prontuário PSI JORN“L DE PSICOLOGI“, . / Sobre o registro documental do estagiário de Psicologia, a Resolução diz o seguinte “rt. ° Em caso de serviço psicoĺgico prestado em serviços-escola e campos de estágio, o registro deve contemplar a identiicação e a assinatura do responsável t́cnico/supervisor que responderá pelo serviço prestado, bem como do estagiário. Parágrafo único. O supervisor t́cnico deve solicitar do estagiário registro de todas as atividades e acontecimentos que ocorrerem com os usuários do serviço psicoĺgico prestado CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Outro assunto que tamb́m ́ tratado na resolução no “rt. º, diz respeito à guarda do registro documental “rt. ° “ guarda do registro documental ́ de responsabilidade do psićlogo e/ou da instituição em que ocorreu o serviço. § ° O período de guarda deve ser de no mínimo cinco anos, podendo ser ampliado nos casos previstos em lei, por determinação judicial, ou ainda em casos especíicos em que seja necessária a manutenção da guarda por maior tempo. § º O registro documental deve ser mantido em local que garanta sigilo e privacidade e mantenha-se à disposição dos Conselhos de Psicologia para orientação e iscalização, de modo que sirva como meio de prova idônea para instruir processos disciplinares e à defesa legal CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . 236 TÓPICO 3 | RESOLUÇÕES DO CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA “ssim, quando o registro for feito no computador, este deve estar protegido com senha exclusiva do psićlogo, e caso o registro for físico, em papel, que tenha um espaço separado, que pode ser um arquivo ou um armário protegido com chave. Lembramos que as resoluções aqui mencionadas podem sofrer mudanças e alterações, pois, como visto, a regulamentação da proissão acompanha as transformações e demandas da categoria e da sociedade. Deste modo, ́ muito importante manter-se atualizado acerca das discussões da categoria atrav́s do site do CFP e do Conselho Regional. DICAS Acessando os sites do CFP e do CRP de Santa Catarina, você poderá conhecer todas as resoluções da categoria, além de se cadastrar e receber via e-mail ou aplicativo para celular as últimas notícias da profissão. Site do CFP: <site.cfp.org.br>. Site do CRP SC – 12ª Região: <www.crpsc.org.br>. 237 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você aprendeu que • Para orientar, disciplinar e iscalizar o exercício proissional do psićlogo, o Sistema Conselhos elabora e aprova resoluções. Estas são atos normativos com força de lei que devem ser cumpridas pelos psićlogos sob pena de cometer infração ́tica. “ criação de uma norma surge de problemas na atuação percebidos pelos proissionais ou pela sociedade. • “ inscrição no CRP ́ obrigat́ria para poder exercer a proissão. Mediante a solicitação de inscrição e a entrega necessária de alguns documentos, o psićlogo recebe um número de registro proissional que ica anotado na Carteira de Identidade Proissional fornecida pelo CRP. Um psićlogo pode ter mais de uma inscrição em Conselhos Regionais diferentes, desde que trabalhe por mais de dias em área de jurisdição de outro Conselho de Psicologia. Essa inscrição, chamada de secundária, não tem custo adicional para o psićlogo. • Pessoas transexuais e travestis têm o direito da inserção do nome social no campo observação da Carteira de Identidade Proissional do Psićlogo . • O psićlogo pode solicitar o registro em sua Carteira de Identidade Proissional de at́ duas especialidades de sua atuação, desde que apresente documentos comprobat́rios de conclusão de cursos de especialização credenciados pelo CFP ou pelo MEC ou mediante aprovação em concurso de provas e títulos com comprovação de dois anos de experiência proissional. • É proibido ao psićlogo atuar de forma que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeŕticas ou que contribuam para a discriminação ou preconceito de raça ou etnia. • “ psicoterapia foi qualiicada como prática do psićlogo pela Resolução do CFP nº / . O uso da hipnose como recurso auxiliar no trabalho do psićlogo foi reconhecido pela Resolução CFP nº / . • Serviços psicoĺgicos como orientações psicoĺgicas, processos pŕvios de seleção de pessoal, aplicação de testes, supervisão do trabalho do psićlogo e atendimento eventual de clientes em trânsito podem ser realizados por meios tecnoĺgicos de comunicação a distância com número limitado de at́ encontros. Os atendimentos psicoterapêuticos atrav́s dos referidos meios tecnoĺgicos ś são permitidos em caráter experimental. 238 • “valiação psicoĺgica ́ uma função privativa do psićlogo que se caracteriza como processo t́cnico e cientíico de coleta de dados e análise das informações sobre fenômenos psicoĺgicos. Para se realizar uma avaliação psicoĺgica ́ necessário planejamento e uso de estrat́gias psicoĺgicas, como ḿtodos, t́cnicas e instrumentos psicoĺgicos, entre estes, os testes psicoĺgicos, considerando a demanda e os ins aos quais se destinam. • “ regulamentação da avaliação psicoĺgica no contexto do trânsito ́ apresentada na Resolução / , onde são estabelecidas as habilidades mínimas psicoĺgicas a serem avaliadas nos candidatos à CNH. Tamb́m estabelece as regras para a aplicação dos testes psicoĺgicos e a elaboração do laudo com os resultados da avaliação. • Para oferecer o serviço psicoĺgico de avaliação para registro e porte de arma, o proissional deve se credenciar junto à Polícia Federal. • O psićlogo perito realiza avaliações psicoĺgicas para responder perguntas que surgiram no contexto pericial. “ssistente t́cnico ́ um proissional contratado por uma das partes para avaliar determinadas demandas, garantido o direito ao contradit́rio. “mbos devem atuar sem prejudicar a autonomia térico-t́cnica do outro proissional e sem constranger o avaliado durante o atendimento. O psićlogo psicoterapeuta das pessoas que estão na disputa judicial não pode atuar como perito ou assistente t́cnico do litígio. • Os testes psicoĺgicos são avaliados por uma Comissão Consultiva em “valiação Psicoĺgica e recebem parecer favorável ao seu uso ou desfavorável mediante análise de crit́rios mínimos estabelecidos por resolução do CFP. O S“TEPSI – Sistema de “valiação de Testes Psicoĺgicos – possui listagem completa dos testes com parecer favorável ou desfavorável e tamb́m dos testes de uso exclusivo do psićlogo e os que podem ser utilizados por outras categorias proissionais. • “ Resolução CFP nº / dispõe sobre a obrigatoriedade do registro documental decorrente da prestação de serviços psicoĺgicos. “ obrigatoriedade se estende a todos os campos de atuação e estabelece que o registro documental do psićlogo tem caráter sigiloso e deve contar com a descrição, a evolução e os procedimentos psicoĺgicos adotados. Preferencialmente deve ser feito no formato de Prontuário Psicoĺgico, cujo acesso ́ livre ao usuário. No entanto, se houver informações ou documentos que precisam icar restritos do compartilhamento com o usuário, deve estar então em arquivo exclusivo do psićlogo, documento este denominado de Registro Documental. 239 AUTOATIVIDADE 1 O CFP, fazendo uso de suas atribuições que foram conferidas em lei, aprova resoluções. “ssim, como pode ser deinida resolução ? Como ́ o processo de elaboração de uma resolução pelo CFP? Quais são os crit́rios que o psićlogo deve atender para solicitar o registro de especialista em sua Carteira de Identidade Proissional? De acordo com a Resolução CFP nº / , quais são os serviços que podem ser realizados à distância, pelo computador ou outros meios tecnoĺgicos de comunicação? O que a resolução diz a respeito de atendimento psicoterápico realizado atrav́s da internet? Sobre a atuação do psićlogo como perito no Poder Judiciário qual a diferença entre essa função com a de assistente t́cnico? O registro documental da prestação de serviços psicoĺgicos ́ obrigat́rio em todos os campos de atuação do psićlogo. Quais são as possibilidades de registro previstas pela Resolução CFP nº / e qual a diferença que existe entre elas? 240 TÓPICO 4 UNIDADE 3 PRODUÇÃO DE DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS 1 INTRODUÇÃO Nesta unidade você tem acompanhado as discussões sobre as questões ́ticas do exercício proissional, enquanto obrigações deontoĺgicas a serem seguidas pelo psićlogo. “t́ aqui você já aprendeu sobre as leis que regulamentam a proissão e a formação do psićlogo, sobre o Ćdigo de Ética Proissional da categoria e sobre algumas resoluções que são essenciais para exercer a função de psićlogo dentro dos princípios ́ticos da proissão. Neste último t́pico, você vai aprender sobre um assunto que desperta muitas dúvidas no dia a dia do psićlogo a produção de documentos psicoĺgicos. Que tipos de documentos o psićlogo pode utilizar? Como devem ser elaborados? O que deve constar neles? “ resposta para tais perguntas ́ o objetivo de aprendizagem deste t́pico. 2 DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS Como já foi citado anteriormente, situações envolvendo a avaliação psicoĺgica e a produção de documentos pelo psićlogo são os principais motivos de representações contra os proissionais da área no CRP. Essa informação ́ ratiicada por autores como Lago, Yates e ”andeira , Preto e Fajardo e “lmeida et al. , que, a partir desses dados, apontam a relevância de se discutir esse tema e exercitar sua execução ao longo da formação. Visando subsidiar o proissional da Psicologia na elaboração dos documentos escritos decorrentes de avaliação psicoĺgica, o CFP formulou princípios e regras para assegurar uma padronização e qualidade na sua produção. “ primeira norma sobre documentos psicoĺgicos foi aprovada em , atrav́s da Resolução CFP nº / . Ela foi revogada pela Resolução CFP nº / , que, por sua vez, tamb́m acabou sendo revogada pela atual norma, a Resolução CFP nº / . Cabe ressaltar que o Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo já trata especiicamente sobre a responsabilidade do psićlogo diante da produção de documentos psicoĺgicos, como o que se observa na alínea h do “rt. º Orientar a quem de direito sobre os encaminhamentos apropriados, a partir da prestação de serviços psicoĺgicos, e fornecer, sempre que solicitado, os documentos pertinentes ao bom termo do trabalho . Tamb́m ́ proibido, segundo o “rt.º , 241 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO alínea g Emitir documentos sem fundamentação e qualidade t́cnico-cientíica CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Destarte, a Resolução CFP nº / tem o proṕsito de instituir e apresentar o Manual de Elaboração de Documentos Escritos produzidos pelo psićlogo, decorrentes de avaliação psicoĺgica. Ela determina que a produção escrita, fruto de avaliação psicoĺgica, deve obedecer às diretrizes apresentadas na resolução, caso contrário incorre em falta ́tico-disciplinar. O Manual está organizado em alguns itens, conforme a seguinte ordem Princípios Norteadores da elaboração documental Modalidade de Documentos Conceito/Finalidade/Estrutura Validade dos documentos e Guarda dos documentos. 3 PRINCÍPIOS NORTEADORES NA ELABORAÇÃO DOCUMENTAL Como já ́ sabido, quando falamos de princípios, nos referimos a diretrizes que servem como referência para a práxis do psićlogo. No Manual são adotados como princípios na elaboração dos documentos escritos por psićlogos os aspectos t́cnicos da linguagem escrita e os princípios ́ticos e t́cnicos. 3.1 PRINCÍPIOS TÉCNICOS DA LINGUAGEM ESCRITA Quanto à linguagem escrita, conforme “lmeida et al. , a elaboração de documentos psicoĺgicos exige do proissional o desenvolvimento de habilidades e competências, que devem ser desenvolvidas durante a formação, pois a diiculdade está em redigir um documento que necessita de uma linguagem precisa sobre dados de natureza subjetiva. Para se alcançar esse resultado, o Manual de Elaboração de Documentos decorrentes de “valiações Psicoĺgicas , p. estabelece crit́rios t́cnicos para a linguagem escrita, apontando que o documento deve apresentar uma redação bem estruturada e deinida, expressando o que se quer comunicar. Deve ter uma ordenação que possibilite a compreensão por quem o lê, o que ́ fornecido pela estrutura, composição de parágrafos ou frases, aĺm da correção gramatical . Na busca pelo aperfeiçoamento deste importante momento da avaliação psicoĺgica, o Manual destaca que, na construção das frases, deve-se utilizar da linguagem proissional, evitando a linguagem popular, que pode levar a interpretações equivocadas das informações. Sobre o emprego dos termos psicoĺgicos, a resolução alerta que se deve considerar a quem o documento está destinado. Explicando melhor essa questão, Cunha deine que em um processo de avaliação psicoĺgica existem os seguintes elementos o examinando, 242 TÓPICO 4 | PRODUÇÃO DE DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS o psićlogo, as t́cnicas psicoĺgicas, o informe dos resultados da avaliação e o receptor. “o comunicar os resultados, se faz necessária a adaptação do conteúdo em níveis diferentes de especiicidade, profundidade e extensão, de acordo com o receptor que solicitou a avaliação e que busca determinadas respostas, como ́ o caso, por exemplo, de psiquiatras, empresas, escolas, Poder Judiciário, os responsáveis legais pela criança ou adolescente ou o pŕprio sujeito. Essa recomendação já está prevista no Ćdigo de Ética Proissional , ao estabelecer, na alínea f do “rt. º, que o psićlogo deve Fornecer, a quem de direito, na prestação de serviços psicoĺgicos, informações concernentes ao trabalho a ser realizado e ao seu objetivo proissional . No entanto, tamb́m determina que esse informe deve preservar a intimidade das pessoas, e, conforme a alínea g do mesmo artigo citado, deve constar somente o que for necessário para a tomada de decisões que afetem o usuário ou beneiciário . “inda, são estabelecidas pela resolução como diretrizes para a linguagem escrita a clareza, a concisão e a harmonia, que são deinidas como “ clareza se traduz, na estrutura frasal, pela sequência ou ordenamento adequado dos conteúdos, pela explicitação da natureza e função de cada parte na construção do todo. “ concisão se veriica no emprego da linguagem adequada, da palavra exata e necessária. Essa economia verbal requer do psićlogo a atenção para o equilíbrio, que evite uma redação lacônica ou o exagero de uma redação prolixa. Finalmente, a harmonia se traduz na correlação adequada das frases, no aspecto sonoro e na ausência de cacofonias CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . 3.2 PRINCÍPIOS ÉTICOS O psićlogo, na elaboração de documentos, deve atender aos princípios e normas estabelecidos no Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo, atentando para a sua responsabilidade com a pessoa atendida, com o sigilo proissional e com o impacto das informações ali apresentadas, visto que subsidiam decisões, como processos de seleção de pessoas, avaliações psicoĺgicas em concursos públicos, manutenção do poder familiar, habilitação de veículos automotores, dentre outros tantos contextos a que se destina uma avaliação psicoĺgica CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . “gir de acordo com os princípios ́ticos signiica observar o que está anunciado na introdução do Manual sobre o pŕprio conceito de avaliação psicoĺgica, enquanto processo t́cnico-cientíico de coleta de dados, estudos e interpretação de informações a respeito dos fenômenos psicoĺgicos, que são resultantes da relação do indivíduo com a sociedade CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. , ou seja 243 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO Os resultados das avaliações devem considerar e analisar os condicionantes hist́ricos e sociais e seus efeitos no psiquismo, com a inalidade de servirem como instrumentos para atuar não somente sobre o indivíduo, mas na modiicação desses condicionantes que operam desde a formulação da demanda at́ a conclusão do processo de avaliação psicoĺgica CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Cabe ainda ressaltar que cumprir com os preceitos ́ticos signiica tamb́m prestar um serviço de qualidade, alicerçado no compromisso social da Psicologia. 3.3 PRINCÍPIOS TÉCNICOS que Com relação aos princípios t́cnicos, a Resolução CFP nº / determina Os psićlogos, ao produzirem documentos escritos, devem se basear exclusivamente nos instrumentais t́cnicos entrevistas, testes, observações, dinâmicas de grupo, escuta, intervenções verbais que se coniguram como ḿtodos e t́cnicas psicoĺgicas para a coleta de dados, estudos e interpretações de informações a respeito da pessoa ou grupo atendidos, bem como sobre outros materiais e documentos produzidos anteriormente e pertinentes à mat́ria em questão CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Lembramos que, em concordância com o estabelecido na Resolução CFP nº / , que regulamenta o uso de testes psicoĺgicos e que foi estudada no t́pico anterior, ś podem ser utilizados instrumentos que tiveram parecer favorável da Comissão Consultiva em “valiação Psicoĺgica e tiverem sido aprovados pelo CFP. O psićlogo deve atentar para a utilização de testes somente para os proṕsitos e contextos em que os estudos indicaram resultados favoráveis, ou seja, ́ responsabilidade do psićlogo a escolha do teste mais apropriado para os objetivos da avaliação psicoĺgica a que se propôs realizar. “ĺm de todas essas considerações, a resolução leva o psićlogo a reletir que uma avaliação psicoĺgica sinaliza um resultado de uma determinada situação em um momento delimitado. “ssim, estabelece que o proissional, ao elaborar o documento, deve considerar a natureza dinâmica, não deinitiva e não cristalizada do seu objeto de estudo CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . “ resolução adverte ainda que o psićlogo deve rubricar o documento da primeira at́ a penúltima página, sendo que a última deverá estar assinada e nela constar o registro da sua inscrição no CRP. 244 TÓPICO 4 | PRODUÇÃO DE DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS UNI EXEMPLO DE PROCESSO ÉTICO - DOCUMENTO ELABORADO POR PSICÓLOGO No caso em análise, uma psicóloga foi procurada por uma mãe para emitir atestado psicológico da filha de quatro anos e sua relação com a figura paterna. A profissional realizou duas sessões com a genitora e oito sessões com a criança, utilizando caixa lúdica e material gráfico. O trabalho se estendeu pelo período de três meses e ela alega que não se ateve a uma abordagem teórica específica. O pai, por sua vez, queixa-se que a psicóloga elaborou 'Parecer Psicológico' para ser anexado em processo de regulamentação de visitas, contendo julgamento sobre seu estado psicológico e índole. No documento consta que foi realizada a avaliação psicológica da "menor" e diagnosticada dificuldade no relacionamento pai-filha. A relação tem sido esporádica, por não residirem na mesma casa, e tumultuada. A profissional considerou que o pai expõe a criança a riscos, além de causar prejuízos psicológicos e morais à criança. Em razão disso, recomendou a suspensão das visitas. Após analisar os autos, a Comissão de Ética aponta que o documento carece de fundamentação técnico-científica que sustente suas conclusões. Este não menciona os indícios levantados em sua análise para chegar à conclusão de prejuízos provocados pelo pai. Destaca, ainda, que as afirmações sobre o pai não foram apresentadas em forma de hipótese, mas sim conclusivas sobre as intenções e atitudes de uma pessoa que não foi avaliada pela profissional. Diante do exposto, ficou comprovado que a psicóloga infringiu: o Código de Ética Profissional do Psicólogo, Art. 1º, alínea “c”, Art. 2º, alínea “g” e a Resolução CFP nº 007/2003, que institui o Manual de Elaboração de Documentos Escritos produzidos pelo psicólogo decorrentes de avaliação psicológica. FONTE: PSI Jornal da Psicologia, (maio/jun., 2015). Disponível em: <http://www.crpsp.org.br/ portal/comunicacao/jornal_crp/183/frames/fr_processos.aspx>. Acesso em: 15 jul. 2017. 4 MODALIDADES DE DOCUMENTOS São consideradas modalidades de documentos psicoĺgicos a Declaração, o “testado Psicoĺgico, o Relat́rio/Laudo Psicoĺgico e o Parecer Psicoĺgico. “ Resolução CFP nº / faz uma ressalva quanto à Declaração e o Parecer Psicoĺgico, indicando que não são documentos decorrentes da avaliação psicoĺgica, embora muitas vezes apareçam desta forma CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. , mesmo assim estão incluídos no Manual para que sejam diferenciados. “ssim, são apresentados na sequência os documentos aludidos há pouco, detalhando o conceito, a inalidade e a estrutura que deve conter cada um deles. 5 CONCEITO/ FINALIDADE/ ESTRUTURA “ṕs conhecer os princípios norteadores para a elaboração de documentos psicoĺgicos contemplados na Resolução CFP / , ́ importante que você saiba o conceito, inalidade e a estrutura que cada um destes documentos deve ter. 245 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO 5.1 DECLARAÇÃO “ Declaração ́ um documento que se limita a fornecer informações situacionais do atendimento psicoĺgico J“CINTO et al., . De acordo com a Resolução CFP nº / , sua inalidade ́ declarar sobre a Comparecimentos do atendido e/ou do seu acompanhante, quando necessário. b “companhamento psicoĺgico do atendido. c Informações sobre as condições do atendimento tempo de acompanhamento, dias ou horários CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Neste documento não se deve fazer o registro de sintomas, situações ou estados psicoĺgicos. De acordo com o Manual instituído pela resolução referida, no que diz respeito a sua estrutura a Ser emitida em papel timbrado ou apresentar na subscrição do documento o carimbo, em que conste nome e sobrenome do psićlogo, acrescido de sua inscrição proissional Nome do psićlogo / Nº da inscrição . b “ declaração deve expor - Registro do nome e sobrenome do solicitante. - Finalidade do documento por exemplo, para ins de comprovação . - Registro de informações solicitadas em relação ao atendimento por exemplo se faz acompanhamento psicoĺgico, em quais dias, qual horário . - Registro do local e data da expedição da declaração. - Registro do nome completo do psićlogo, sua inscrição no CRP e/ ou carimbo com as mesmas informações CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Lembramos, como já assinalado, que o documento deve contar com a assinatura do psićlogo acima do carimbo ou identiicação do seu registro proissional. 5.2 ATESTADO PSICOLÓGICO O “testado Psicoĺgico ́ um documento redigido pelo psićlogo e tem como objetivo certiicar uma determinada situação ou estado psicoĺgico de quem o solicita, para ins de a Justiicar faltas e/ou impedimentos do solicitante. b Justiicar estar apto ou não para atividades especíicas, aṕs realização de um processo de avaliação psicoĺgica, dentro do rigor t́cnico e ́tico que subscreve esta Resolução. c Solicitar afastamento e/ou dispensa do solicitante, subsidiado na airmação atestada do fato, em acordo com o disposto na Resolução CFP nº / CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . 246 TÓPICO 4 | PRODUÇÃO DE DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS “ Resolução CFP nº / , citada no Manual de Elaboração de Documentos Escritos produzidos pelo psićlogo, institui e regulamenta a concessão de “testado Psicoĺgico para tratamento de saúde por problemas psicoĺgicos. Tal resolução se fundamenta no fato de que o psićlogo ́ um proissional que tamb́m trabalha na área da saúde e que pode realizar diagństicos de condições mentais que ofereçam riscos para o paciente ou o incapacitem para o trabalho ou estudos. “ norma supracitada estabelece que ́ facultado ao psićlogo o uso do Ćdigo Internacional de Doenças – CID ou outros ćdigos como fonte de enquadramento de diagństicos ao conceder um atestado. Tamb́m determina que o psićlogo deve manter em seu registro documental a documentação que justiica a concessão do atestado para afastamento do trabalho por motivo de tratamento de saúde. O “testado Psicoĺgico segue as mesmas normas que os atestados concedidos por outros proissionais ao conferir afastamento do trabalho por mais de dias, o paciente deve fazer perícia junto à Previdência Social, encaminhado pela empresa, para concessão de auxílio-doença CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . Embora a Resolução CFP n° / permita ao psićlogo a emissão de atestados psicoĺgicos, de acordo com Lago, Yates e ”andeira , muitas empresas não aceitam o documento para afastamento do trabalho e alegam que, conforme a Consolidação das Leis de Trabalho CLT , ś os ḿdicos estão autorizados a fazê-lo. “s autoras indicam que o CFP tem estudado com outras categorias a proposição de um projeto de lei para regulamentar um “testado de Saúde ao inv́s de um “testado Ḿdico . Entretanto, já existe jurisprudência que admite a validade do “testado Psicoĺgico para o afastamento do trabalho. Voltando ao Manual de Elaboração de Documentos, este delimita que no atestado deve constar apenas a informação solicitada pelo requerente, enunciando apenas o fato constatado. Sua estrutura deve seguir determinadas normas, que são a Ser emitido em papel timbrado ou apresentar na subscrição do documento o carimbo, em que conste o nome e sobrenome do psićlogo, acrescido de sua inscrição proissional Nome do psićlogo / Nº da inscrição . b O atestado deve expor - Registro do nome e sobrenome do cliente. - Finalidade do documento. - Registro da informação do sintoma, situação ou condições psicoĺgicas que justiiquem o atendimento, afastamento ou falta – podendo ser registrado sob o indicativo do ćdigo da Classiicação Internacional de Doenças em vigor. - Registro do local e data da expedição do atestado. - Registro do nome completo do psićlogo, sua inscrição no CRP e/ou carimbo com as mesmas informações. - “ssinatura do psićlogo acima de sua identiicação ou do carimbo CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . 247 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO O Manual tamb́m determina que ao elaborar o “testado Psicoĺgico, o registro seja feito de forma corrida, sem parágrafos, separados apenas pela pontuação com a inalidade de se evitar adulterações. Não podendo evitar o uso de parágrafos, o psićlogo deve preencher esses espaços com traços CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . 5.3 RELATÓRIO/LAUDO PSICOLÓGICO Como você pode observar, a Resolução CFP nº / descreve o relat́rio psicoĺgico e o laudo como uma única modalidade de documento, com os mesmos objetivos e estrutura de redação. Nas resoluções anteriores que tratavam sobre o assunto, o relat́rio psicoĺgico e o laudo eram apresentados separadamente com inalidades diferentes, mas, segundo Jacinto et al. , os conceitos anteriores que diferenciavam estes documentos eram confusos, embora que, na atual resolução, a estrutura que deve ser obedecida para elaboração dos documentos foi pouco alterada. Por conseguinte, o relat́rio ou laudo psicoĺgico ́ conceituado pela atual resolução como uma apresentação descritiva acerca de situações e/ou condições psicoĺgicas e suas determinações hist́ricas, sociais, políticas e culturais, pesquisadas no processo de avaliação psicoĺgica CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, . “ssim como nos demais documentos, suas considerações devem estar amparadas em instrumental t́cnico, como entrevistas, observação, testes psicoĺgicos, dentre outros, e embasadas em referencial térico adotado pelo proissional. Segundo o Manual, a inalidade do Relat́rio ou Laudo Psicoĺgico ́ apresentar os procedimentos e conclusões gerados pelo processo da avaliação psicoĺgica, relatando sobre o encaminhamento, as intervenções, o diagństico, o progństico e evolução do caso, orientação e sugestão de projeto terapêutico, bem como, caso necessário, solicitação de acompanhamento psicoĺgico, limitando-se a fornecer somente as informações necessárias relacionadas à demanda, solicitação ou petição CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Para Guzzo e Pasquali , o laudo psicoĺgico expressa a competência proissional do psićlogo, pois atrav́s das conclusões apresentadas neste documento, intervenções de qualidade podem ser planejadas ou, de maneira oposta, podem apenas discorrer sobre o ́bvio, sem o resultado esperado. Os autores apontam que por muito tempo houve pouca discussão e orientações sobre a elaboração de laudos psicoĺgicos no ”rasil, o que trouxe como consequência a constatação de ineiciência quanto ao seu objetivo de subsidiar decisões e ações destinadas aos usuários dos serviços psicoĺgicos e tamb́m uma grande quantidade de processos ́ticos devido a problemas na sua elaboração. Desta forma, entende-se que aprender o padrão mínimo estabelecido para a emissão de relat́rios/laudos e o exercício de sua elaboração ́ essencial para o proissional atuar dentro dos preceitos ́ticos, oferecendo serviços psicoĺgicos de qualidade. 248 TÓPICO 4 | PRODUÇÃO DE DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS Diante desta demanda, o CFP estabelece no Manual disposto, atrav́s da Resolução nº / , que o relat́rio psicoĺgico deve ter, no mínimo, estes cinco t́picos identiicação, descrição da demanda, procedimento, análise e conclusão. Passaremos agora a discorrer sobre cada um deles I. IDENTIFICAÇÃO ́ a primeira parte do relat́rio e deve identiicar o autor/relator nome do psićlogo que fez a avaliação e seu número de registro no CRP o interessado nome do autor do pedido – o usuário, a escola, a empresa e o assunto/inalidade motivo do pedido de avaliação psicoĺgica . II. DESCRIÇÃO DA DEMANDA deve narrar as informações referentes à problemática apresentada e os motivos e expectativas que motivaram o pedido do documento. Nesta parte, deve-se apresentar a análise que se faz da demanda de forma a justiicar o procedimento adotado CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . III. PROCEDIMENTO: o psićlogo apresenta os instrumentos t́cnicos utilizados na avaliação psicoĺgica para coletar as informações embasado em um referencial térico. Descrever número de encontros, pessoas ouvidas etc. IV. ANÁLISE: nesta parte do documento, alicerçado em um referencial térico e tamb́m respeitando os princípios ́ticos estabelecidos para a comunicação de resultados decorrentes da avaliação psicoĺgica, o psićlogo faz uma exposição descritiva de forma met́dica, objetiva e iel dos dados colhidos e das situações vividas relacionados à demanda em sua complexidade CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . V. CONCLUSÃO apresentação do resultado e considerações a respeito da avaliação psicoĺgica. É importante que nesta parte se faça sugestões de intervenções apropriadas para a situação analisada. Como nos demais documentos, ao inal o relat́rio ́ encerrado com a inserção do local, data de emissão, assinatura do psićlogo e seu número de registro no CRP. UNI Exemplo de Processo Ético devido a documentos decorrentes de avaliação psicológica B. apresenta queixa de relatório elaborado pelo psicólogo, argumentando que ele apresentou conclusão carente de dados. Trata-se de processo de destituição do poder familiar, com suspeita de abuso de B. em face de seu filho, que culminou em decisão judicial de suspensão das visitas. O psicólogo afirma que agiu com correção no seu ofício, que a criança apresentou manifestações de vivências traumáticas, expressou vontade de não manter contato com o genitor e encontra-se em tratamento psicológico. Verificou-se que o relatório psicológico produzido continha os itens indicados pela Resolução CFP 07/03, pontos esses fundamentais para um documento escrito decorrente de uma avaliação psicológica, ou seja, apresenta a identificação (autor, solicitante e finalidade/motivo do pedido), a descrição da demanda 249 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO (problemática), procedimentos utilizados (número de encontros, pessoas ouvidas, entrevistas, testes com parecer favorável do CFP, hora lúdica), análise (histórico familiar, considerações psicológicas dos dados colhidos, análise à luz do referencial teórico adotado) e sua conclusão. Encerra o documento com indicação do local, data de emissão, assinatura do psicólogo e número de inscrição no CRP SP. No que se refere à análise, buscou referência nos indícios colhidos nas entrevistas, testes e histórico contido no processo. Traz o contexto para auxiliar sua análise e conclusão. O psicólogo também demonstrou ter buscado suporte em referenciais teóricos para embasar sua conclusão, fundamentando suas argumentações. Faz associações, relacionando suas observações com o que descreve literatura especializada. As referências sobre os envolvidos aparecem de modo não tendencioso, fazendo uma análise dinâmica e não parcial dos aspectos observados, apresentando os indícios de onde tirou suas hipóteses e conclusão. Dessa forma, entendeu-se que a psicóloga realizou seu trabalho de forma condizente com os direcionamentos éticos/técnicos da profissão. Importante acrescentar que o trabalho realizado esteve pautado pela busca do bem-estar da criança atendida. FONTE: Adaptado de PSI Jornal da Psicologia, (ago./set. 2010). Disponível em: <http://www. crpsp.org.br/portal/comunicacao/jornal_crp/166/frames/fr_indice.aspx>. Acesso em: 15 jul. 2017. 5.4 PARECER PSICOLÓGICO O Parecer Psicoĺgico ́ um documento que expressa de forma resumida, mas fundamentada, uma questão focal pertencente ao campo da Psicologia, cujo resultado pode ser indicativo ou conclusivo. Sua inalidade ́ responder a questõesproblema por meio de uma avaliação t́cnica-especializada de proissionais de referência no assunto. São exemplos de pareceres, de acordo com Lago, Yates e ”andeira , a solicitação de um parecer psicoĺgico por um advogado sobre a guarda compartilhada de crianças menores de dois anos de idade ou de um psićlogo que ́ questionado por uma escola sobre a perspectiva de uma criança com Transtorno do Espectro “utista poder acompanhar uma sala do º ano do Ensino Fundamental regular. Nessas situações, o psićlogo não responderia com base em um único sujeito, mas considerando o atual estado da arte que motivou tal consulta L“GO Y“TES ”“NDEIR“, , p. . O Manual esclarece ainda que o psićlogo parecerista, diante de quesitos que lhe são perguntados o psićlogo deve respondê-los de forma sint́tica e convincente, não deixando nenhum quesito sem resposta. Quando não houver dados para a resposta ou quando o psićlogo não puder ser cateǵrico, deve-se utilizar a expressão sem elementos de convicção . Se o quesito estiver mal formulado, pode-se airmar prejudicado , sem elementos ou aguarda evolução CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . Sobre a estrutura do Parecer Psicoĺgico, este ́ composto por quatro itens I. IDENTIFICAÇÃO nome do parecerista e sua titulação nome do autor da solicitação e sua titulação. 250 TÓPICO 4 | PRODUÇÃO DE DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS II. EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS descrição do motivo do parecer, com transcrição dos quesitos ou dúvidas do solicitante. Lembrando que o Parecer Psicoĺgico não ́ realizado por meio de avaliação psicoĺgica, assim, na sua estrutura não consta o item procedimentos . III. ANÁLISE discussão e apresentação de forma minuciosa da pergunta formulada embasada no conhecimento da ciência psicoĺgica, respeitando as normas para elaboração de trabalhos cientíicos. IV. CONCLUSÃO: na parte inal, o psićlogo apresentará seu posicionamento, respondendo à questão levantada. Em seguida, informa o local e data em que foi elaborado e assina o documento CONSELHO FEDER“L DE PSICOLOGI“, , p. . 6 VALIDADE DOS CONTEÚDOS E GUARDA DOS DOCUMENTOS Por último, a resolução delibera sobre a validade do conteúdo dos documentos escritos, decorrentes das avaliações psicoĺgicas, que se deve respeitar a legislação vigente para os casos em que já esteja deinida. Caso contrário, onde for possível, o psićlogo deve indicar o prazo de validade do documento emitido a partir dos objetivos da avaliação e das informações. Como exemplo, podemos citar uma situação em que ́ feita uma avaliação neuropsicoĺgica de uma pessoa que estava passando por um processo de desintoxicação por agentes químicos. No laudo ́ indicado que se reizesse a avaliação aṕs um ano, com a inalidade de se acompanhar os possíveis efeitos do tratamento na área da cognição L“GO Y“TES ”“NDEIR“, . Em relação à guarda dos documentos, o Manual estabelece um prazo mínimo de cinco anos, onde os documentos elaborados e todo o material que subsidiou sua construção icam sob a responsabilidade do psićlogo e da instituição em que ocorreu a avaliação psicoĺgica. Por determinação judicial, o prazo pode ser ampliado, ou ainda em casos especíicos que exijam a manutenção dos documentos por um tempo maior. Havendo extinção do serviço, devem ser seguidas as orientações previstas no Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo, já tratadas aqui, no T́pico . Neste t́pico você aprendeu sobre os documentos produzidos pelo psićlogo, decorrentes da avaliação psicoĺgica. Essa resolução encerra a discussão tratada nesta unidade sobre a conduta moral dos psićlogos estabelecida pelo ́rgão de classe da categoria, o CFP, em conjunto com os Conselhos Regionais de Psicologia. No entanto, como foram abordadas várias leis, decretos e resoluções que regulamentam a proissão do psićlogo, para facilitar a consulta a elas, você tem discriminados, a seguir, dois quadros que listam a legislação estudada e o que cada uma delas delibera para sistematizar todos os assuntos tratados nesta unidade. 251 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO QUADRO 10 - LEIS E DECRETOS FEDERAIS SOBRE A REGULAMENTAÇÃO DA FORMAÇÃO E DA PROFISSÃO DE PSICÓLOGO Decreto n° 79.822/77 Lei Federal n° 5.766/71 Lei Federal n° 5.692/71 Decreto nº 53.464/64 Lei Federal n° 4.119/62 Regulamenta a Lei nº . , de dezembro de , que criou o Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Psicologia e dá outras providências. Cria o Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Psicologia e dá outras providências. Fixa diretrizes e bases para o ensino de ° e º graus, e dá outras providências. Regulamenta a Lei . / , que dispõe sobre a proissão de psićlogo. Dispõe sobre os cursos de formação em Psicologia e regulamenta a proissão de psićlogo. QUADRO 11 - RESOLUÇÕES DO CFP Resolução Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Ementa “ltera a Resolução CFP nº / , que institui a Consolidação das Resoluções relativas ao Título Proissional de Especialista em Psicologia e dispõe sobre normas e procedimentos para seus registros. Dispõe sobre a atuação do psićlogo como perito nos diversos contextos. Regulamenta os serviços psicoĺgicos realizados por meios tecnoĺgicos de comunicação a distância, o atendimento psicoterapêutico em caráter experimental e revoga a Resolução CFP nº / . Dispõe sobre a inclusão do nome social no campo observação da Carteira de Identidade Proissional do Psićlogo e dá outras providências. Revoga a Resolução CFP nº / , publicada no DOU do dia de dezembro de , Seção I, e institui normas e procedimentos para a avaliação psicoĺgica no contexto do trânsito. “ltera a Resolução CFP nº / e dá outras providências. “ltera a Resolução CFP nº / e dá outras providências. Dispõe sobre a obrigatoriedade do registro documental decorrente da prestação de serviços psicoĺgicos. Dispõe acerca do trabalho do psićlogo na avaliação psicoĺgica para concessão de registro e/ou porte de arma de fogo. 252 TÓPICO 4 | PRODUÇÃO DE DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP n° / Resolução CFP n° / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Resolução CFP nº / Institui a Consolidação das Resoluções relativas ao Título Proissional de Especialista em Psicologia e dispõe sobre normas e procedimentos para seu registro alterada pela Resolução CFP nº / . Institui o Ćdigo de Processamento Disciplinar. Institui a Consolidação das Resoluções do Conselho Federal de Psicologia. “prova o Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo. Institui o Manual de Elaboração de Documentos Escritos produzidos pelo psićlogo, decorrentes de avaliação psicoĺgica e revoga a Resolução CFP / . Define e regulamenta o uso, a elaboração e a comercialização de testes psicoĺgicos e revoga a Resolução CFP / Estabelece normas de atuação para o psićlogo em relação ao preconceito e discriminação racial. “prova o Regimento Interno do CFP e estabelece o funcionamento deste ́rgão. Determina como os Conselhos de Psicologia devem proceder para auxiliar da melhor forma os profissionais de Psicologia em sua área de trabalho. Disciplina a oferta de produtos e serviços ao público. “prova e regulamenta o uso da hipnose como recurso auxiliar de trabalho do psićlogo. Especiica e qualiica a Psicoterapia como prática do psićlogo. Estabelece normas de atuação para os psićlogos em relação à questão da orientação sexual. Dispõe sobre a realização de pesquisas com ḿtodos e t́cnicas não reconhecidos pela Psicologia. Estabelece para divulgação, a publicidade e o exercício proissional do psićlogo, associados a práticas que não estejam de acordo com os crit́rios cientíicos estabelecidos no campo da Psicologia. Institui e regulamenta a concessão de atestado psicoĺgico para tratamento de saúde por problemas psicoĺgicos. “prova o Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo revogada pela Resolução CFP nº / . 253 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO LEITURA COMPLEMENTAR Declaração Universal dos Direitos Humanos “dotada e proclamada pela “ssembleia Geral das Nações Unidas Resolução “ III em de dezembro . Preâmbulo Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis ́ o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo. Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da humanidade e que o advento de um mundo em que mulheres e homens gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do ser humano comum. Considerando ser essencial que os direitos humanos sejam protegidos pelo imṕrio da lei, para que o ser humano não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra a tirania e a opressão. Considerando ser essencial promover o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações. Considerando que os povos das Nações Unidas reairmaram, na Carta, sua f́ nos direitos fundamentais do ser humano, na dignidade e no valor da pessoa humana e na igualdade de direitos do homem e da mulher e que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla. Considerando que os Países-Membros se comprometeram a promover, em cooperação com as Nações Unidas, o respeito universal aos direitos e liberdades fundamentais do ser humano e a observância desses direitos e liberdades. Considerando que uma compreensão comum desses direitos e liberdades ́ da mais alta importância para o pleno cumprimento desse compromisso. “gora, portanto, a “ssembleia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada ́rgão da sociedade tendo sempre em mente esta Declaração, esforce-se, por meio do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universais e efetivos, tanto entre os povos dos pŕprios Países-Membros quanto entre os povos dos territ́rios sob sua jurisdição. 254 TÓPICO 4 | PRODUÇÃO DE DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS Artigo 1 Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade. Artigo 2 . Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer esṕcie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, ordem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição. . Não será tamb́m feita nenhuma distinção fundada na condição política, jurídica ou internacional do país ou territ́rio a que pertença uma pessoa, quer se trate de um territ́rio independente, sob tutela, sem governo pŕprio, quer sujeito a qualquer outra limitação de soberania. Artigo 3 Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Artigo 4 Ningúm será mantido em escravidão ou servidão a escravidão e o tráico de escravos serão proibidos em todas as suas formas. Artigo 5 Ningúm será submetido a tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante. Artigo 6 Todo ser humano tem o direito de ser, em todos os lugares, reconhecido como pessoa perante a lei. Artigo 7 Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação. Artigo 8 Todo ser humano tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes reḿdio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei. Artigo 9 Ningúm será arbitrariamente preso, detido ou exilado. Artigo 10 Todo ser humano tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir seus direitos e deveres ou fundamento de qualquer acusação criminal contra ele. 255 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO Artigo 11 .Todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente at́ que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa. . Ningúm poderá ser culpado por qualquer ação ou omissão que, no momento, não constituam delito perante o direito nacional ou internacional. Tamb́m não será imposta pena mais forte de que aquela que, no momento da prática, era aplicável ao ato delituoso. Artigo 12 Ningúm será sujeito à interferência na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, nem a ataque à sua honra e reputação. Todo ser humano tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques. Artigo 13 . Todo ser humano tem direito à liberdade de locomoção e residência dentro das fronteiras de cada Estado. . Todo ser humano tem o direito de deixar qualquer país, inclusive o pŕprio e a esse regressar. Artigo 14 . Todo ser humano, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países. . Esse direito não pode ser invocado em caso de perseguição legitimamente motivada por crimes de direito comum ou por atos contrários aos objetivos e princípios das Nações Unidas. Artigo 15 . Todo ser humano tem direito a uma nacionalidade. . Ningúm será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade. Artigo 16 . Os homens e mulheres de maior idade, sem qualquer restrição de raça, nacionalidade ou religião, têm o direito de contrair matrimônio e fundar uma família. Gozam de iguais direitos em relação ao casamento, sua duração e sua dissolução. . O casamento não será válido senão com o livre e pleno consentimento dos nubentes. . “ família ́ o núcleo natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado. outros. Artigo 17 . Todo ser humano tem direito à propriedade, ś ou em sociedade com . Ningúm será arbitrariamente privado de sua propriedade. 256 TÓPICO 4 | PRODUÇÃO DE DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS Artigo 18 Todo ser humano tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião esse direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença pelo ensino, pela prática, pelo culto em público ou em particular. Artigo 19 Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão esse direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras. Artigo 20 . Todo ser humano tem direito à liberdade de reunião e associação pacíica. . Ningúm pode ser obrigado a fazer parte de uma associação. Artigo 21 . Todo ser humano tem o direito de tomar parte no governo de seu país diretamente ou por interḿdio de representantes livremente escolhidos. . Todo ser humano tem igual direito de acesso ao serviço público do seu país. . “ vontade do povo será a base da autoridade do governo essa vontade será expressa em eleições perídicas e legítimas, por sufrágio universal, por voto secreto ou processo equivalente que assegure a liberdade de voto. Artigo 22 Todo ser humano, como membro da sociedade, tem direito à segurança social, à realização pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento da sua personalidade. Artigo 23 . Todo ser humano tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego. . Todo ser humano, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho. . Todo ser humano que trabalha tem direito a uma remuneração justa e satisfat́ria que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social. . Todo ser humano tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar para proteção de seus interesses. Artigo 24 Todo ser humano tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e a f́rias remuneradas perídicas. 257 UNIDADE 3 | O CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL E A PRÁXIS DO PSICÓLOGO Artigo 25 . Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e à sua família saúde, bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados ḿdicos e os serviços sociais indispensáveis e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle. . “ maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social. Artigo 26 . Todo ser humano tem direito à instrução. “ instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. “ instrução elementar será obrigat́ria. “ instrução t́cnico-proissional será acessível a todos, bem como a instrução superior está baseada no ḿrito. . “ instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos do ser humano e pelas liberdades fundamentais. “ instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz. . Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus ilhos. Artigo 27 . Todo ser humano tem o direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar do progresso cientíico e de seus benefícios. . Todo ser humano tem direito à proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de qualquer produção cientíica literária ou artística da qual seja autor. Artigo 28 Todo ser humano tem direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades estabelecidos na presente Declaração possam ser plenamente realizados. Artigo 29 . Todo ser humano tem deveres para com a comunidade, na qual o livre e pleno desenvolvimento de sua personalidade ́ possível. . No exercício de seus direitos e liberdades, todo ser humano estará sujeito apenas às limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o im de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de outrem e de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática. . Esses direitos e liberdades não podem, em hiṕtese alguma, ser exercidos contrariamente aos objetivos e princípios das Nações Unidas. 258 TÓPICO 4 | PRODUÇÃO DE DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS Artigo 30 Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada como o reconhecimento a qualquer Estado, grupo ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à destruição de quaisquer dos direitos e liberdades aqui estabelecidos. FONTE: Organização das Nações Unidas. Disponível em: <http://www.onu.org.br/img/2014/09/ DUDH.pdf>. Acesso em: 15 jul. 2017. 259 RESUMO DO TÓPICO 4 Neste tópico, você aprendeu que • “ Resolução CFP nº / instituiu e apresentou o Manual de Elaboração de Documentos Escritos produzidos pelo psićlogo, decorrentes de avaliação psicoĺgica. Nele são apresentados os Princípios Norteadores da elaboração documental Modalidade de Documentos Conceito/Finalidade/Estrutura Validade e Guarda dos Documentos. • Os Princípios norteadores na elaboração dos documentos escritos por psićlogos são os aspectos t́cnicos da linguagem escrita e os princípios ́ticos e t́cnicos. • Na linguagem escrita de um documento psicoĺgico se orienta que os mesmos tenham uma redação bem estruturada, com ordenação adequada das frases e correção gramatical. “ linguagem escrita precisa ter clareza, concisão e harmonia. • “o elaborar um documento psicoĺgico, o proissional deve observar os princípios e normas estabelecidos no Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo, prestando um serviço de qualidade, alicerçado no compromisso social da Psicologia. • Como princípios t́cnicos estão as recomendações de se basear apenas em ḿtodos e t́cnicas psicoĺgicas na produção dos documentos psicoĺgicos, considerando que o objeto de estudo do psićlogo, ou seja, as questões psíquicas, têm natureza dinâmica, não deinitiva e não cristalizada. • São quatro modalidades de documentos psicoĺgicos a Declaração, o “testado Psicoĺgico, o Relat́rio/Laudo Psicoĺgico e o Parecer Psicoĺgico. • “ Declaração tem por inalidade declarar sobre comparecimentos do atendido ou acompanhante acompanhamento psicoĺgico do atendido e informações sobre as condições do atendimento e não deve constar de registro sobre sintomas, situações ou estados psicoĺgicos. • O “testado Psicoĺgico ́ produzido a im de justiicar faltas ou impedimentos do solicitante justiicar estar apto ou não para alguma atividade especíica solicitar afastamento do trabalho para tratamento de saúde, conforme o disposto na Resolução CFP nº / . Este documento deve ser elaborado de forma corrida, sem parágrafos e constar apenas a informação solicitada pelo requerente sobre o fato constatado. 260 • O Relat́rio ou Laudo Psicoĺgico ́ uma descrição dos procedimentos e conclusões de uma avaliação psicoĺgica, sugerindo encaminhamentos e intervenções para a situação avaliada. Deve ser estruturado em cinco itens identiicação, descrição da demanda, procedimento, análise e conclusão. • O Parecer Psicoĺgico expressa de forma resumida uma questão focal pertencente ao campo da Psicologia, cujo resultado pode ser indicativo ou conclusivo. Sua inalidade ́ responder a questões-problema por meio de uma avaliação t́cnicaespecializada de proissionais de referência no assunto. Sua estrutura ́ composta por quatro itens identiicação, exposição de motivos, análise e conclusão. Como o Parecer Psicoĺgico não ́ realizado por meio de avaliação psicoĺgica, na sua estrutura não precisam ser descritos procedimentos adotados. • Todos os documentos psicoĺgicos devem possuir a indicação do local, data de emissão, assinatura do psićlogo acima do carimbo ou identiicação do seu registro proissional, e se forem produzidos em mais de uma lauda, as demais deverão estar rubricadas. • “ Resolução CFP nº / estabelece que o psićlogo, se for possível, deve indicar o prazo de validade do documento emitido a partir dos objetivos da avaliação e das informações. O prazo estabelecido para a guarda dos documentos psicoĺgicos ́ de, no mínimo, cinco anos, podendo ser ampliado por determinação judicial. 261 AUTOATIVIDADE De acordo com a Resolução CFP nº / documentos produzidos pelo psićlogo? , quais são as modalidades de Como deve ser elaborado um “testado Psicoĺgico de acordo com o Manual de Elaboração de Documentos Escritos produzidos pelo psićlogo Resolução CFP nº / ? Quais são os t́picos que devem estar obrigatoriamente presentes em um Relat́rio ou Laudo Psicoĺgico? O que cada um deles deve descrever? 262 REFERÊNCIAS “””“GN“NO, Nicola. Dicionário de ilosoia. Trad. “lfredo ”osi e Ivone Castilho ”enedeti. . ed. São Paulo Martins Fontes, . “CH“RY“, Sripad “tulananda P“R“M“DV“ITI, Swami ”. “. Comp. . O Bhagavad-gita a ciência suprema. São Paulo Instituto de Estudos V́dicos, . Disponível em <htp //vrinda.vaisnava.hu/vrindastudio/portugues/ bhagavadgita.pdf>. “cesso em maio . “LMEID“, Rodrigo da Silva et al. Documentos psicoĺgicos os laudos e os problemas em torno de sua elaboração. Caderno de Graduação Ciências Humanas e Sociais -UNIT ALAGOAS, v. , n. , p. , . Disponível em <htps //periodicos.set.edu.br/index.php/itshumanas/article/view/ / >. “cesso em jul. . “MENDOL“, Marcia Ferreira. Hist́ria da construção do Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo. Estudos e Pesquisas em Psicologia, v. , n. , “MERIC“N PSYCHOLOGIC“L “SSOCI“TION. 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Estabelece normas de atuação para os psićlogos em relação à questão da orientação sexual. Disponível em <htps // site.cfp.org.br/wp-content/uploads/ / /resolucao _ .pdf>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 001/2009. Dispõe sobre a obrigatoriedade do registro documental decorrente da prestação de serviços psicoĺgicos. Disponível em <htps //site.cfp.org.br/wp-content/uploads/ / /resolucao _ .pdf>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 002/1987. “prova o Ćdigo de Ética Proissional do Psićlogo. Disponível em <htps //transparencia.cfp.org.br/wp-content/ uploads/ / /resolucao _ .pdf>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 002/2009. “ltera a Resolução CFP nº / e dá outras providências. Disponível em <htp //site.cfp.org.br/wp-content/ uploads/ / /resolucao _ .pdf>. “cesso em jul. . 266 ________. Resolução CFP nº 007/2009. Revoga a Resolução CFP nº / , publicada no DOU do dia de dezembro de , Seção I, e institui normas e procedimentos para a avaliação psicoĺgica no contexto do Trânsito. Disponível em <htps //site.cfp.org.br/wp-content/uploads/ / /resolucao _ .pdf>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 010/1997. Estabelece para divulgação, a publicidade e o exercício proissional do psićlogo, associados a práticas que não estejam de acordo com os crit́rios cientíicos estabelecidos no campo da Psicologia. Disponível em <htp //site.cfp.org.br/wp-content/uploads/ / / resolucao _ .pdf>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 010/2000. Especiica e Qualiica a Psicoterapia como Prática do Psićlogo. Disponível em <htps //site.cfp.org.br/wp-content/ uploads/ / /resolucao _ .pdf>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 010/2009. “ltera a Resolução CFP nº / e dá outras providências. Disponível em < htps //site.cfp.org.br/wp-content/ uploads/ / /resolucao _ .pdf>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 011/1997. Dispõe sobre a realização de pesquisas com ḿtodos e t́cnicas não reconhecidas pela Psicologia. Disponível em <htp // site.cfp.org.br/resolucoes/resolucao-n- />. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 011/2000. Disciplina a Oferta de Produtos e Serviços ao Público. Disponível em <htp //www.crprj.org.br/site/wp-content/ uploads/ / /resolucao - .pdf>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 011/2012. Regulamenta os serviços psicoĺgicos realizados por meios tecnoĺgicos de comunicação à distância, o atendimento psicoterapêutico em caráter experimental e revoga a Resolução CFP n. / . Disponível em <htps //site.cfp.org.br/wp-content/uploads/ / /Resoluxo_ CFP_nx_ - .pdf>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 013/2000. “prova e Regulamenta o uso da Hipnose como Recurso “uxiliar de Trabalho do Psićlogo. Disponível em <htp //site.cfp. org.br/wp-content/uploads/ / /resolucao _ .pdf>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 013/2007. Institui a Consolidação das Resoluções relativas ao Título Proissional de Especialista em Psicologia e dispõe sobre normas e procedimentos para seu registro. Disponível em <htps //site.cfp.org.br/ wp-content/uploads/ / /resolucao _ .pdf>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 014/2011. Dispõe sobre a inclusão do nome social no campo observação da Carteira de Identidade Proissional do Psićlogo e dá outras providências. Disponível em <htp //site.cfp.org.br/wp-content/ uploads/ / /resolucao _ .pdf>. “cesso em jul. . 267 ________. Resolução CFP nº 017/2000. “prova o Regimento Interno do CFP e estabelece o funcionamento deste ́rgão. Determina como os Conselhos de Psicologia devem proceder para auxiliar da melhor forma os proissionais de Psicologia em sua área de trabalho. Disponível em <htp //site.cfp.org.br/wpcontent/uploads/ / /resolucao _ .pdf>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 017/2012. Dispõe sobre a atuação do psićlogo como Perito nos diversos contextos. Disponível em <htps //site.cfp.org.br/wp-content/ uploads/ / /Resolu%C %“ %C %“ o-CFP-n%C %”“.pdf>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 018/2002. Estabelece normas de atuação para o psićlogo em relação a preconceito e discriminação racial. Disponível em <htps //site.cfp.org.br/wp-content/uploads/ / /resolucao _ .PDF>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 018/2008. Dispõe acerca do trabalho do psićlogo na avaliação psicoĺgica para concessão de registro e/ou porte de arma de fogo. Disponível em <htp //site.cfp.org.br/wp-content/uploads/ / / resolucao _ .pdf>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 03/2016. “ltera a Resolução CFP nº / , que institui a Consolidação das Resoluções relativas ao Título Proissional de Especialista em Psicologia e dispõe sobre normas e procedimentos para seus registros. Disponível em <htps //site.cfp.org.br/wp-content/uploads/ / / Resolu%C %“ %C %“ o.pdf>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº 06/2007. Institui o Ćdigo de Processamento Disciplinar. Disponível em <htp //site.cfp.org.br/wp-content/uploads/ / resolucao _ .pdf>. “cesso jul. . / ________. Resolução CFP nº002/2003. Deine e regulamenta o uso, a elaboração e a comercialização de testes psicoĺgicos e revoga a Resolução CFP / . Disponível em <htps //site.cfp.org.br/wp-content/uploads/ / / resolucao _>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº007/2003. Institui o Manual de Elaboração de Documentos Escritos produzidos pelo psićlogo, decorrentes de avaliação psicoĺgica e revoga a Resolução CFP / . Disponível em <htps //site.cfp. org.br/wp-content/uploads/ / /resolucao _ .pdf>. “cesso em jul. . ________. Resolução CFP nº015/1996. Institui e regulamenta a concessão de atestado psicoĺgico para tratamento de saúde por problemas psicoĺgicos. Disponível em <htp //site.cfp.org.br/wp-content/uploads/ / / Resolu%C %“ %C %“ o- .pdf>. “cesso em jul. . 268 CONSELHO REGION“L DE PSICOLOGI“ DO RIO DE J“NEIRO. 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