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Cap

51 7 Funcionalismo e estruturalismo diacrônico (Círculo de Praga): a importância das Funções da Linguagem na abordagem linguística Funcionalista: o primeiro passo para a abordagem da Teoria da Variação Como se viu, a obra de Saussure deve ser encarada como o marco da ciência linguística. Entretanto, além de tecer uma ideia excessivamente idealista da língua, chegando a compará-la, numa parábola célebre que tomou de empréstimo a Copérnico, a um sistema semelhante ao sistema solar, em que o equilíbrio de um planeta (corpo) depende e atua sobre o equilíbrio dos demais, numa afirmação, portanto, excessivamente hipotética e com inequívoca falta de PUC-Rio - Certificação Digital Nº null 0912651/CA evidências empíricas, o mestre suíço tampouco empreendeu sobre seu objeto de estudo a fina peneira científica que ele propôs como necessária (e ausente) nos neogramáticos e nos que de algum modo considerassem a variação e a mudança num primeiro plano. Surge, como dialética à formulação saussuriana, o chamado Círculo Linguístico de Praga, em 1926. A mais importante contribuição do grupo para a Linguística, como foi dito, ocorreu no campo da fonologia, devendo-se dar destaque ao russo Trubetzkoy, com seus Princípios de fonologia. Também foi muito importante, e a princípio na mesma área de estudo linguístico, o também russo Roman Jakobson. Além desse passo, por si só revolucionário (vale dizer que, no Brasil, a tese de doutoramento de Mattoso Câmara foi sobre Fonêmica Portuguesa), o Círculo, sem negar a noção básica de estrutura e sistema de Saussure, expande-a à seara histórica, num processo que não se via mais como excludente, e, sim, complementar, criando o que se passou a chamar de estruturalismo diacrônico. Se não bastassem esses dois importantes construtos, o Círculo, como se sabe, partiu à análise de línguas particulares, dando ensejo a uma verdadeira linguística aplicada. Além dos estudos do Círculo, houve também os trabalhos de André Martinet. Ocorre que, ora, acrescentou-se à noção de língua tão bem delimitada por Saussure, apesar das lacunas citadas, a visão epistêmica de funcionalidade. 52 Como se percebe, as duas principais “matérias” relegadas por Saussure a planos secundários (meramente instrumentais, fortuitos e não sistêmicos), passam a fazer parte do plano central dos estudos da linguística: a fonologia (encarecendo-se grandemente a noção de fonema, cuja criação alguns atribuem a Baudoin de Courtenay e outros ao próprio Saussure) e a dimensão histórica. Ademais, por seu caráter de funcionalidade, poder-se-ia dizer que o Círculo e Martinet buscaram, na dialética de Hegel, a solução para as antinomias que, em Saussure, seriam irreconciliáveis. Se por um lado a parte social impõe sobre o indivíduo uma estrutura relativamente fixa e coercitiva, por outro lado esse indivíduo, com sua ação concreta contínua dessa língua, irá atualizá-la a cada instante. A síntese desse processo dialético de tese e antítese seria o fato de que a língua, com o passar do tempo, e em áreas geográficas distintas, acataria variações que, muitas vezes, se transformariam em mudanças, algo que PUC-Rio - Certificação Digital Nº null 0912651/CA é perfeitamente comprovável, como se fará ainda neste trabalho. Foi muito importante a contribuição de Karl Bühler, austríaco, pertencente ao Círculo de Praga, ao afirmar que língua, ao lado de sua “função” representativa (em alemão Darstellungsfunktion), que era aquela exclusiva que o viés matemático, racionalista e objetivista de Saussure permitia ver, possuía, ainda, simultaneamente, nos atos concretos de sua realização, em qualquer momento histórico, as funções de exteriorização ou manifestação psíquica (em alemão Kundgabefunktion) e a de apelo (al.: Appelfunktion). Desse modo, a língua não teria a função exclusiva de representar coisas ou ideias, mas, além disso, possuía outras características pessoais e interpessoais que influenciavam no que Saussure se recusava a ver: a presença da mudança. Mais tarde, Jakobson estenderá as três funções propostas por Bühler a outras três. A importância do estudo das FUNÇÕES da linguagem é fundamental no intercurso para as pesquisas sobre gramaticalização. Moura Neves (2004, p. 515) dedica-se à questão em capítulo intitulado “A questão das funções da linguagem”, e mais adiante (op.cit., p. 15-23) alicerça seu capítulo “O funcionalismo em linguística” sobre a prévia demonstração da inconteste contribuição do Círculo de Praga. Desse modo, cumpre assinalar que, como se dizia, às funções Referencial, Emotiva e Apelativa, Jakobson acrescentou outras três, que vieram 53 a ensejar fortemente os estudos sobre funcionalismo, incluindo-se a pragmática (lograda, em grande parte, graças à definição de “função fática”), que abordaram as modificações oriundas da interdiscursividade com grande ênfase. São as seguintes as funções acrescidas ao rol por Roman Jakobson, embasado em estudos anteriores: 1 - Função fática: PUC-Rio - Certificação Digital Nº null 0912651/CA Esta função tem como escopo o estabelecimento de contato - geralmente o primeiro - entre interlocutores. O termo foi proposto por Malinowski. Faz, grosso modo, que permaneçam abertas as possibilidades de manutenção do intercâmbio comunicativo, quer seja abrindo-o, quer seja encerrando-o. O estudo da função fática surgiu com a observação da linguagem dos deficientes, sendo também de proveniência da investigação da linguagem infantil. É muito encontrada na literatura, sobretudo na dramaturgia, em que, por necessidade, não raro, de se porem à frente do texto situações plausíveis de contatos do diaa-dia, põem-se, pois, aquelas fórmulas - às vezes fossilizadas - de manejo hábil do estabelecimento do contato de que há pouco falamos. 2 - Função metalinguística: Centra-se no código, buscando decifrá-lo. Sua ocorrência maior é quando se faz menção a uma palavra, seja para saber- lhe o significado, seja para utilizá-la no discurso direto (ou indireto livre) etc. Tudo o que serve para dar explicações a respeito de um código proferido é função metalinguística. 3 - Função poética: Situa-se na mensagem, fazendo com que esta como que se volte para si mesma. Passa-se a ter em vista cada signo daí retirado, lidando-se, portanto, não apenas com a transmissão pura e simples daquela mensagem, senão que, também, com a arrumação daqueles signos, com uma escolha mais cuidada, mesmo em termos fônicos: visa à integralidade da dicotomia significantesignificado. (...) (Caetano, 2008, p. 18-20) Com isso, acrescenta-se à noção de estrutura e sistema o seguinte axioma: o sistema é a descrição e a análise que garantem o funcionamento da estrutura de uma língua. A partir desse enfoque, chegar-se-á à conclusão de que “ estrutura de uma língua somente será totalmente entendida à medida que se compreendam efetivamente os processos históricos de sua configuração” (Tarallo, 1999, p.64). 54 Além dos processos históricos, a pesquisa sobre o processo da gramaticalização aponta que, mesmo no eixo sincrônico de uma língua, percebem-se variantes ocorrendo constantemente, no continuum de que a gramática e o próprio dicionário como compêndios em aberto do idioma fazem PUC-Rio - Certificação Digital Nº null 0912651/CA parte.