Artigo Original
Efeitos do banho logo após o nascimento sobre as adaptações
térmica e cardiorrespiratória do recém-nascido a termo
Effects of bathing after birth on term newborn’s thermal and cardiorespiratory adaptation
Vania Elisa M. Pugliesi1, Alice D’Agostini Deutsch2, Marcia de Freitas3, Maria Fernanda P.S. Dornaus4, Celso Moura Rebello5
RESUMO
Objetivo: Determinar se o banho dado ao recém-nascido
(RN) logo após o nascimento interfere na transição para a
vida extrauterina, especialmente nas adaptações cardiorrespiratória e na termorregulação.
Métodos: Estudo retrospectivo realizado por meio de
levantamento de prontuários de RN admitidos em maternidade de São Paulo, entre janeiro e março de 2006. Foram
incluídos RN com boletim de Apgar ≥8 no quinto minuto
de vida: peso de nascimento ≥2500g; idade gestacional ≥37
semanas e sem malformações congênitas, divididos em dois
grupos: ‘banho’, banhados na sala de parto, e ‘controle’,
banhados após a terceira hora de vida. Na admissão do RN
na unidade neonatal, as seguintes variáveis foram analisadas:
temperatura axilar, frequência cardíaca e respiratória, pressão
arterial média e saturação de oxigênio. Analisou-se também
o tipo de parto, o tempo decorrido entre o parto e a admissão
no berçário e a taxa de aleitamento na sala de parto.
Resultados: Incluíram-se 194 RN, 98 no grupo banho e
96 no grupo controle. Em ambos os grupos, a temperatura
corpórea na admissão era similar (36,6±0,4 e 36,6±0,3°C;
p=0,68); frequência cardíaca (143±13 e 146±14 bpm;
p=0,26) e respiratória (51±6 e 51±9 mov/min; p=0,90), pressão arterial média (44±6 e 47±9 mmHg; p=0,13) e saturação
de oxigênio (98±2 e98±3%; p=0,99) foram semelhantes. A
taxa de aleitamento materno (91 e 57%; p<0.001) e o tempo
em sala de parto (95±21 e 79±29 minutos, p<0,001) foram
signiicativamente maiores no grupo banho.
Conclusões: Neste estudo retrospectivo, o banho na
sala de parto em RN a termo e saudáveis não interferiu na
Instituição: Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE), São Paulo, SP, Brasil
1
Enfermeira graduada pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp);
aluna do curso de Pós-graduação lato sensu em Perinatologia do HIAE,
São Paulo, SP, Brasil
2
Doutora em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo (FMUSP); Coordenadora médica do Departamento Materno-Infantil
do HIAE, São Paulo, SP, Brasil
3
Doutora em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da USP;
médica do Departamento Materno-Infantil do HIAE, São Paulo, SP, Brasil
4
Mestre em Enfermagem obstétrica e neonatal pela Faculdade de Enfermagem da USP; Coordenadora de Enfermagem da Unidade Neonatal do
HIAE, São Paulo, SP, Brasil
adaptação cardiorrespiratória e na temperatura à admissão
na unidade neonatal.
Palavras-chave: banhos; recém-nascido; salas de parto;
monitorização isiológica; regulação da temperatura corporal.
ABSTRACT
Objective: To determine the effect of bathing right after
birth on newborn’s transition to extra-uterine life, mainly regarding thermoregulation and cardiorespiratory adaptation.
Methods: A retrospective comparative study enrolled infants admitted between January and March 2006 in a private
tertiary care maternity hospital in the city of São Paulo, Brazil.
Inclusion criteria were: Apgar score ≥ 8 (5th minute), birth
weight ≥2500g; gestational age ≥37 weeks, no congenital
anomalies. Newborns were divided in two study groups: ‘bath’
(bath right after birth) and ‘control’ (bath after the 3rd hour
of life). Outcome variables were evaluated at neonatal unit
arrival: body temperature, heart and respiratory rate, oxygen
saturation, mean arterial pressure. The time interval from birth
to admission in the neonatal unit, the rate of breastfeeding in
delivery room and mode of delivery were also analyzed.
Results: 194 newborns were included: 98 in the bath
and 96 in the control group. Both groups had similar temperature at admission in the neonatal unit (36.6±0.4 and
36.6±0.3°C; p=0.68); heart rate (143±13 and 146±14 bpm;
p=0.26) respiratory rate (51±6 and 51±9 mov/min; p=0.90)
mean blood pressure (44±6 and 47±9 mmHg; p=0.13) and
oxygen saturation (98±2 and98±3%; p=0.99) were also
similar. The breastfeeding rate (91% and 57%; p<0.001) as
5
Doutor em Medicina pela FMUSP; médico do Departamento MaternoInfantil do HIAE, São Paulo, SP, Brasil
Endereço para correspondência:
Celso Moura Rebello
Rua Engenheiro Teixeira Soares, 165
CEP 05505-030 – São Paulo/SP
E-mail: celso.rebello@uol.com.br
Recebido em: 12/2/09
Aprovado em: 12/6/09
Rev Paul Pediatr 2009;27(4):410-415.
Vania Elisa M. Pugliesi et al
well as the interval from birth to admission in the neonatal
unit (95±21 and 79±29 minutes; p<0.001) were higher in
the bath group.
Conclusions: In this retrospective study, bathing after
birth in the delivery room did not affect thermoregulation
and cardiorespiratory adaptation of term newborns.
Key-words: baths; infant, newborn; delivery rooms;
monitoring, physiologic; body temperature regulation.
Introdução
A manutenção da temperatura corpórea é um dos fatores
determinantes para o sucesso da adaptação cardiocirculatória
e respiratória do recém-nascido (RN) imediatamente após o
nascimento. O protocolo de atendimento ao RN na sala de reanimação estabelecido pela Academia Americana de Pediatria
orienta a manter a temperatura corpórea, enxugando o RN e
envolvendo-o em campos aquecidos sob calor radiante(1). Sob
condições habituais de sala de parto (20-25°C), a temperatura
cutânea do RN cai cerca de 0,3°C/min e a temperatura central
diminui cerca de 0,1°C/min no período imediatamente após
o parto, resultando em uma queda de 2 a 3°C na temperatura
central no processo de adaptação à vida extrauterina(2).
Por outro lado, imediatamente após o nascimento, a pele
do RN se encontra envolvida por secreções e sangue, com
potencial de contaminar tanto proissionais de saúde como
familiares(3,4), o que justiica a ideia presente em muitas
culturas de administrar o banho imediatamente após o
nascimento. De fato, essa rotina está presente em muitas
maternidades, exceto para partos de alto risco ou para os
recém-nascidos prematuros(5).
Críticas em relação ao banho logo após o nascimento
têm sido feitas em decorrência da possibilidade de facilitar
a hipotermia, prejudicando a estabilização cardiorrespiratória e térmica da criança(6,7). Isso implicaria a necessidade
de encaminhar o RN para uma unidade de risco (Unidade
de Cuidados Intensivos ou Semi-intensivos), resultando em
efeitos indesejáveis relacionados não apenas ao vínculo mãeilho como também aos custos e ao tempo de internação(8).
Diante desses questionamentos sobre o momento ideal
do banho de RN após o nascimento, fez-se a hipótese de
que o banho realizado logo após o nascimento resultaria em
maior incidência de hipotermia e de desconforto respiratório,
resultando em maior taxa de admissão em setor de cuidados
intensivos. Este estudo visa a determinar a inluência do banho – realizado logo após o nascimento, em sala de parto – na
Rev Paul Pediatr 2009;27(4):410-415.
adaptação cardiorrespiratória e na temperatura corporal do
RN a termo, no momento da sua admissão no berçário.
Métodos
O Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE) é um hospital
privado localizado na zona sul do município de São Paulo. A
população assistida no hospital é de alto nível socioeconômico,
com atendimento realizado por médicos de clínica privada e
todas as mães têm cuidado pré-natal adequado. O hospital
realiza em média 3.000 partos por ano, com taxa de prematuridade de 14,6% e de baixo peso de 10,8%. A taxa de admissão no setor de risco (Unidade de Terapia Intensiva – UTI,
e Unidade de Cuidados Intermediários – UCI) é de 15,1%.
A amamentação em sala de parto é incentivada em todos os
partos a termo – desde que mãe e RN estejam em condições
clínicas para tal – e ocorre em cerca de 75% dos partos.
Após a aprovação pelo Comitê de Pesquisa e Ética, foi
realizado um estudo descritivo e retrospectivo a partir de
dados secundários tipo caso-controle, sendo analisados os
prontuários dos recém-nascidos admitidos entre janeiro e
março de 2006. No grupo banho, foram incluídos todos os
RN submetidos ao banho logo após o nascimento, ainda na
sala de parto. No grupo controle foram incluídas as crianças
admitidas imediatamente após o nascimento de um RN do
grupo banho e que preenchessem os seguintes critérios de
inclusão: classiicação como termo adequado para a idade
gestacional (idade gestacional ≥37 semanas), percentil
de peso ≥10 segundo Lubchenko(9), peso de nascimento
≥2500g, boletim de Apgar ≥8 no quinto minuto de vida e
a não-apresentação de intercorrências ao nascer. Em ambos
os grupos foram excluídas as gestações gemelares, os RN
com malformações ou que apresentavam desconforto respiratório inicial.
Os dados foram obtidos por meio de levantamento do livro
de registro dos partos e por análise dos prontuários digitalizados do Sistema de Informação e Estatística do HIAE. As
variáveis analisadas incluíram a idade da mãe, o número de
gestações, a paridade e o tipo de parto (vaginal ou cesáreo).
Entre as variáveis dos RN, as seguintes foram analisadas:
sexo; peso de nascimento; idade gestacional (avaliada pela
data da última menstruação, ultrassom obstétrico e método
de Capurro(10)); classiicação de acordo com o peso de nascimento e a idade gestacional, sendo considerados adequados
para idade gestacional aqueles com peso ao nascer entre o
percentil 10 e 90 na curva de crescimento de Lubchenko(9);
boletim de Apgar no quinto minuto; local de destino do RN
411
Efeitos do banho logo após o nascimento sobre as adaptações térmica e cardiorrespiratória do recém-nascido a termo
(berçário de normais ou de risco – UTI neonatal ou UCI) e
taxa de amamentação na sala de parto. No local de destino
foram analisados, imediatamente após a admissão, a temperatura axilar, a frequência cardíaca, a frequência respiratória,
a pressão arterial média, a saturação de oxigênio (avaliada
por oxímetro de pulso Datascope®, Passport 2), o intervalo
de tempo entre o parto e a admissão no local de destino e a
presença de desconforto respiratório.
Na sala de parto, os RN foram submetidos aos procedimentos de rotina, incluindo a reanimação, a identiicação e a
avaliação pelo médico neonatologista. O aleitamento materno
na primeira hora de vida foi incentivado para todas as puérperas, desde que o RN apresentasse boas condições clínicas.
Para realizar o banho logo após o nascimento (grupo banho),
ainda na sala de parto, foi necessária a solicitação por parte
dos pais; além disso, o RN deveria ser a termo e adequado
para a idade gestacional, com peso de nascimento ≥2500g,
boletim de Apgar ≥8 no quinto minuto de vida e não ter
apresentado intercorrências ao nascer. A temperatura da
sala de parto foi mantida ao redor de 26°C e a da água entre
36-37°C (aferida por termômetro antes da imersão do RN).
O banho, com duração média entre cinco e dez minutos, foi
realizado pelo pai e auxiliado pela enfermeira, em berço de
acrílico com água suiciente para imersão do recém-nascido
até o pescoço, de forma a permitir que todo abdome e a
parte superior do tórax fossem cobertos pela água. O banho
do recém-nascido foi realizado entre 15 e 30 minutos após o
nascimento, sem sabão, de forma que os resíduos de sangue,
mecônio e secreções fossem removidos e o vernix mantido. A
seguir, o RN foi secado completamente, envolto em toalhas
e mantido ao lado da mãe em berço aquecido até o término
do parto. Após a transferência do bebê para o seu local de
destino, foi mantido em observação sob calor radiante até a
terceira hora de vida.
No grupo controle (banho realizado após a terceira hora
de vida), o recém-nascido recebeu o mesmo atendimento em
sala de parto, com exceção do banho. Após a transferência do
bebê para o seu local de destino, o RN também permaneceu
em observação sob calor radiante até a terceira hora de vida,
quando foi realizado o banho pela enfermeira com a mesma
técnica e equipamentos descritos acima.
Os dados contínuos foram analisados pelo teste t de
Student ou teste Mann–Whitney, de acordo com as premissas de distribuição normal e mesma variância dos grupos
analisados. Para dados qualitativos, foi utilizado o teste
do qui-quadrado ou teste Exato de Fisher. Foi adotado
como nível de signiicância o valor de p<0,05. O tamanho
amostral foi calculado para obter uma diferença de temperatura entre os grupos na admissão no berçário da ordem
de 0,2ºC, considerando uma distribuição bicaudal, um
nível de signiicância de 0,05, um poder de teste de 0,8
e um desvio padrão da temperatura da ordem de 0,4 ºC,
sendo necessários 150 recém-nascidos (75 em cada braço do
estudo). A análise estatística foi realizada com o programa
SigmaStat versão 4.0 (SPSS Inc.).
Resultados
Foram incluídos 194 recém-nascidos, 98 no grupo banho
e 96 no grupo controle. As características demográicas de
ambos os grupos são detalhadas na Tabela 1. Os grupos
foram comparáveis em relação a: idade materna, paridade,
sexo, peso de nascimento e boletim de Apgar de 5 minutos. Observou-se menor incidência de parto cesáreo entre
os RN do grupo banho (49 versus 82%, p<0,01) e, embora
não tenham sido observadas diferenças em relação ao peso
de nascimento, os RN do grupo controle apresentaram uma
idade gestacional ligeiramente inferior aos do grupo banho
(39,4±1,1 e 38,9±0,9; p<0,001), diferença clinicamente não
relevante. Foi observado maior tempo transcorrido entre
o nascimento e a admissão na unidade neonatal (95±27 e
79±29 minutos; p<0,001) e maior taxa de amamentação
Tabela 1 – Características demográicas de ambos os grupos
Idade materna (anos)
Primigesta (%)
Parto cesárea (%)
Sexo feminino (%)
Peso de nascimento (g)
Idade gestacional (semanas)
Apgar 5 minutos
Minutos entre nascimento e admissão na unidade
Amamentação na sala de parto (%)
412
Banho n=98
32±4
49
49
53
3284±376
39,4±1,1
9,9±0,2
95±27
91
Controle n=96
33±4
50
82
51
3295±380
38,9±0,9
9,9±0,3
79±29
57
Valor de p
0,592
0,999
<0,001
0,573
0,896
<0,001
0,515
<0,001
<0,001
Rev Paul Pediatr 2009;27(4):410-415.
Vania Elisa M. Pugliesi et al
Tabela 2 – Temperatura e valores cardiorrespiratórios de ambos os grupos no momento da admissão no local de destino
Pressão arterial sistêmica média (mmHg)
Frequência cardíaca (bpm)
Temperatura axilar (°C)
Saturação de oxigênio (%)
Frequência respiratória (mov/min)
na sala de parto entre os RN do grupo banho (90,8% versus
56,8%, p<0,01).
Não foram observadas diferenças entre os dois grupos de
estudo em relação aos parâmetros cardiorrespiratórios avaliados (Tabela 2). Todos os 194 RN estudados foram admitidos
no berçário de normais, sem desconforto respiratório, não
havendo, na amostra estudada, admissões na UTI neonatal
ou na UCI.
Discussão
Em anos anteriores a este estudo, grande número de pais
e obstetras manifestava o desejo e banhava os recém-nascidos
em sala de parto. Apesar de boas condições ao nascimento,
a presença de desconforto respiratório após o banho e a admissão na UTI neonatal surpreendia a equipe multiproissional. Dessa maneira, no ano de execução deste estudo, foi
determinado que o banho fosse realizado apenas nos casos
solicitados, sendo implementada a rotina de banho em sala
de parto descrita acima.
Este estudo demonstra, pela primeira vez no nosso meio,
que o banho realizado logo após o nascimento em recémnascidos saudáveis a termo não interfere na adaptação cardiorrespiratória e na temperatura do RN à admissão, não
aumentando o risco de internação em um setor de risco por
insuiciência respiratória. Nossos resultados estão de acordo
aos encontrados por Varda et al(11), que relataram que o banho
logo após o nascimento não afetou a estabilidade térmica de
recém-nascidos a termo. Isto se torna particularmente importante porque a capacidade do RN manter a temperatura
corporal determina muitas funções orgânicas, especialmente
a obtenção do oxigênio, sendo que os cuidados prestados na
recepção do neonato podem, em teoria, afetar seriamente a
sua perda calórica(1,2). Sabe-se que os recém-nascidos perdem
calor rapidamente durante o primeiro dia de vida quando
são banhados, sendo que a diminuição de temperatura pode
variar entre 0,1 a 1,1ºC(6,7,11,12).
Essa preocupação com a instabilidade térmica do recémnascido resultou em uma recomendação da Organização
Rev Paul Pediatr 2009;27(4):410-415.
Banho n=98
44±6
143±13
36,6±0,4
98±2
51±6
Controle n=96
47±9
146±14
36,6±0,3
98±3
51±9
Valor de p
0,129
0,265
0,685
0,999
0,900
Mundial da Saúde determinando que o banho do RN deveria
ser evitado antes da sexta hora após o nascimento(11). Apesar
dessa recomendação, o banho nas primeiras horas de vida
é prática padrão em muitas instituições no Brasil devido à
preocupação com a possibilidade de transmissão de infecções
para os proissionais de saúde e familiares através do contato
com sangue e secreções presentes na pele do RN, incluindo,
entre outros, os vírus HIV e hepatites B e C(4).
No presente estudo, não foram observados efeitos do
banho sobre a saturação de oxigênio, frequência cardíaca e
respiratória e sobre a pressão arterial média no momento da
admissão no setor de destino. Resultados semelhantes foram
encontrados por Nako et al em 95 RN a termo banhados logo
após o nascimento e 92 RN do grupo controle(5). Embora o
grupo de RN submetidos precocemente ao banho registrasse
uma temperatura retal em média 0,3ºC maior do que a do
grupo controle, não foram observadas diferenças em relação
às frequências cardíaca e respiratória, à pressão arterial média
ou em relação à morbidade de ambos os grupos(5).
Nossos resultados demonstram que o banho em sala de
parto possibilitou um maior contato do RN com os pais,
identiicado pela chegada do RN ao local de destino cerca
de 15 minutos depois do grupo controle. Essa diferença de
tempo decorrido para admissão na unidade de destino foi
devida, também, a uma maior taxa de amamentação na sala
de parto do grupo banho em relação ao grupo controle (91%
versus 57%, p<0,001), porém esta diferença de tempo não
teve magnitude suiciente para aumentar o risco de desfechos
principais desfavoráveis: insuiciência respiratória e menor
temperatura axilar no momento da admissão.
Sabe-se que o banho de imersão promove grande conforto
ao recém-nascido, como pode ser observado pelo relaxamento,
pelos movimentos de mãos e pés dos RN durante o banho
e pelo fato de que eles adquirem um estado sustentado de
alerta, tornando-se menos agitados após o procedimento(13).
De fato, admite-se que o banho de imersão é uma situação
que propicia uma série de trocas e ajustes interacionais entre
o adulto e o recém-nascido, proporcionado pela estimulação
tátil com os pais e outros cuidadores(14,15). Esses fatores podem
413
Efeitos do banho logo após o nascimento sobre as adaptações térmica e cardiorrespiratória do recém-nascido a termo
estar associados à maior adesão à amamentação na primeira
hora de vida entre os RN do grupo banho.
Uma possível explicação para os nossos achados é que a
diferença entre a temperatura corporal do RN e do meio
externo observada após o nascimento poderia ter um papel
isiológico na adaptação à vida extrauterina, desde que
mantida em certos limites. A signiicativa perda calórica
por dissipação para o meio ambiente resultaria no resfriamento da pele (cuja temperatura no ambiente intrauterino é
0,5°C superior à materna), com o consequente estímulo das
terminações nervosas cutâneas, havendo ativação do centro
respiratório e provocando vasoconstrição, o que resulta em
aumento da resistência vascular periférica e auxilia na adaptação circulatória(16,17). Sob esse prisma, o banho logo após o
nascimento poderia atrapalhar a adaptação pós-natal devido
à vasodilatação periférica, levando à hipotensão e relativa
hipertensão pulmonar. Ademais, o início da respiração pode
ser mais demorado em bebês que nascem diretamente em
água quente, situação em que ocorre mínima perda inicial
de temperatura corpórea(18). Entretanto, os resultados do
presente estudo não demostraram efeitos negativos do banho
em sala de parto na adaptação inicial do recém-nascido.
Um fator teórico de confusão em relação à morbidade respiratória seria a maior incidência de parto cesáreo nos recémnascidos do grupo controle, uma vez que foi demonstrada
maior morbidade respiratória relacionada ao parto cesáreo,
particularmente na ausência de trabalho de parto(19). No
entanto, apesar da maior incidência de parto cesáreo entre
os RN desse grupo, não houve correspondente aumento da
morbidade respiratória, mesmo imediatamente após o nascimento (o que contraindicaria o banho), embora o presente
estudo não conte com dados sobre as indicações das cesáreas
ou tempo de trabalho de parto.
Os resultados aqui apresentados demonstram que tanto os
nascidos de parto normal quanto de parto cesáreo mantiveram
sua temperatura, frequência cardíaca, frequência respiratória e
oximetria de pulso adequadas após o banho em sala de parto.
O desenho do estudo adotado apresenta limitações que devem
ser levadas em consideração. Por se tratar de uma análise
retrospectiva, não foi possível realizar uma randomização dos
recém-nascidos nos dois grupos. Embora o número de recémnascidos estudados tenha sido superior ao cálculo do tamanho
amostral, o desenho de estudo adotado deve ser levado em
consideração na análise global dos resultados. Sem dúvida, as
conclusões inais seriam mais contundentes se o estudo fosse
conduzido de forma prospectiva, randomizada e controlada.
Apesar dessas considerações, a presente pesquisa forneceu
evidências para mudar a rotina dos cuidados de enfermagem na
unidade neonatal do HIAE. Atualmente, o banho de imersão
é feito no momento da admissão no berçário em todos os RN
estáveis que não vivenciaram essa prática na sala de parto, em
contraste com a rotina anterior, em que o banho era realizado
apenas depois de três ou quatro horas de vida. O tempo de
observação do RN foi reduzido de três para apenas uma hora
dentro da unidade neonatal, favorecendo ainda mais a amamentação e os vínculos familiares. A lexibilidade do momento
do banho é recomendada, de acordo com a estabilidade do RN
e o desejo da família. O primeiro contato dos pais com seu
bebê é signiicativo no processo de apego. O banho favorece
uma interação harmoniosa com os pais, além de propiciar estimulação tátil e auxiliar na organização do RN(20). Esse contato
agradável parece inluenciar o estado de alerta e a disposição
do RN para mamar na sala de parto.
Pode-se concluir que os resultados deste estudo retrospectivo sugerem que o banho realizado imediatamente
após o parto, com controle adequado de sua duração, da
temperatura da água e da sala no centro cirúrgico, visando
ao relaxamento e à retirada das secreções e sangue, não interferiu nas condições cardiorrespiratórias e na temperatura
do RN na admissão no berçário. As mães que optaram pelo
banho imediato amamentaram mais seus recém-nascidos
logo após o nascimento.
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