Location via proxy:   [ UP ]  
[Report a bug]   [Manage cookies]                
Laboratórios Cidadãos em rede e como rede por Rodrigo Savazoni RESUMO O artigo aborda o processo metodológico desenvolvido pelo Instituto Procomum para o desenvolvimento de um laboratório cidadão na região da Baixada Santista, no Estado de São Paulo, Brasil. Esse processo recebeu o nome de LAB.IRINTO e culminou com a realização de um encontro internacional sobre cultura livre e inovação cidadã, em junho de 2016. Esse encontro reuniu ativistas, criadores e gestores de iniciativas públicas e privadas da região, de outras localidades do Brasil e de países da América Latina, África, Ásia e Europa que vêm se articulando em uma potente rede global. Realizo aqui uma sistematização dessas contribuições e afirmo que, sobretudo em escala local, devemos pensar os laboratórios cidadãos como rede, tanto no aspecto territorial como na mobilização e articulação dos atores. Também defendo, neste texto, uma revisão da visão hegemônica de tecnologia, uma vez que os laboratórios que pretendemos construir devem ser instrumentos de afirmação da diversidade cultural e construção do procomum, portanto, vetores de promoção da diversidade tecnológica que emerge dos diferentes povos que nos constituem. Em nossa abordagem, o laboratório cidadão é essencialmente um projeto de hibridização tecnológica, onde equipamentos de eletrônica e cibernética convivem com práticas ancestrais e a permacultura, na finalidade de produzir soluções criativas para os impasses que a humanidade vive. PALAVRAS-CHAVE cultura; tecnologia; cidadania; inovação cidadã; laboratórios cidadãos Figura 1: Roda de trabalho durante o LAB.IRINTO, para debater a formação de redes. Crédito: Divulgação No mês de junho, realizamos em Santos, São Paulo, um encontro internacional de cultura livre e inovação cidadã a que demos o nome de LAB.IRINTO. Tinhamos três objetivos ao promover essa atividade: 1. articular referências para a construção de um laboratório cidadão na Baixada Santista, o LABxS; 2. retomar o diálogo entre a rede de cultura livre brasileira, que perdeu impulso nos últimos anos; 3. produzir uma articulação internacional sul-sul, conectando agentes da rede ibero-americana de inovação cidadã com a rede do Global Innovation Gathering, com forte presença de atores da África, da Ásia e da Europa Central. Usar uma metáfora borgeana no nome foi a forma que encontramos para qualificar nossa metodologia, baseada na ideia de que estamos, de certa forma, perdidos dentro de um emaranhado de possibilidades – algumas delas extremamente destrutivas – e precisamos juntos tecer um fio que nos leve à saída – o fio de ariadne. Ao término dos dois dias de trabalho, onde também nos confraternizamos em momentos de festa e deriva, em espaços inovadores e disruptivos de nossa cidade, como a Casa Rizoma e a Ocupação da Vila do Teatro, não logramos chegar a conclusões generalizantes, mas a muitos novos imputs. Na sequência deste artigo, compartilharei alguns tópicos que reunimos a partir da colaboração dos participantes. Foram muitas as vozes que se somaram no esforço de sistematizar esse processo e quero, ao final, registrar o nome de todos que estiveram conosco. Sem essas contribuições, este texto não existiria. Ele é, portanto, apesar de por mim escrito, uma obra coletiva. Antes de avançar com a descrição dos fatos e expor essas valiosas contribuições, creio que se faz necessário desenvolver dois aspectos de ordem mais teórica: 1. O que é um laboratório cidadão? 2. Qual a visão de tecnologia que este texto propõe? Em relação ao conceito de laboratório cidadão, podemos iniciar separando os significados dos substantivos laboratório e cidadão. O laboratório seria, numa abordagem capitalista, o lugar onde se produz a ciência, que, por sua vez, seria uma prática social distinta de todas as outras de nossa sociedade por sua racionalidade suprema. Nessa abordagem, o laboratório é o espaço hegemônico de produção do conhecimento, com a finalidade de transformar ideias em produtos, soluções, respostas para orientarem a ação humana. No fim dos anos 1970, Latour e Woolgar desenvolveram um estudo etnográfico que contribuiu centralmente para a desconstrução da ideia de que o laboratório é o epicentro da produção de verdades inquestionáveis. Nesse livro, os autores aportam uma série de elementos para compreendermos como o fato científico é produzido, mas o que interessa para este nosso artigo é a ideia de que “tanto o enunciado científico 'verdadeiro' quanto o 'falso' assumem tais atributos não por suas qualidades internas distinguidas pelo 'bom' ou 'mau' uso do método científico, mas em função de um processo social de convencimento que possibilitou que eles fossem reconhecidos enquanto tais.” (KROPF; FERREIRA, 1998, p. 592) Assim, uma mesma “verdade”, com base no mesmo método, só será considerada verdade se seguir o “processo social de convencimento” que o sistema impõe. Aquilo, portanto, aquilo que um jovem, em sua garagem, descobre, com base em métodos científicos consagrados, não chegará à capa da revista Nature por não fazer parte da “liturgia” científica. Se entendemos isso, compreendemos a importância do laboratório como ambiente/percurso para a “validação” do conhecimento como científico. Recuperemos agora a noção de cidadão. A bibliografia e a elaboração sobre essa temática são gigantescas, por isso recorrerei a uma sentença simples: o cidadão é o ser em exercício ou na reivindicação de seus direitos (humanos, sociais, culturais, ambientais...). Assim, o cidadão, aqui, é usado como adjetivo para qualificar o laboratório como ambiente destinado à cidadania, que é uma das dimensões que todo ser humano carrega consigo. O laboratório cidadão, portanto, ao ser despido de sua aura de altar da verdade científica, emerge como projeto onde a cidadania pode se reunir para gerar conhecimentos úteis à humanidade, com o adicional de formatar um novo “processo social de convencimento” que possa fazer da inovação cidadã um discurso tão potente quanto aquele que os laboratórios privados ou universitários impõem à sociedade. Passemos então à questão da tecnologia. No nosso entender, esse é o conceito que centralmente um laboratório cidadão deve disputar, ao se afirmar como projeto destinado ao “faça você mesmo”. Sendo assim, só pode trabalhar com tecnologias abertas, livres e reapropriáveis, que compartilhem seus códigos e metodologias, permitindo assim reapropriação, reuso, ressignificação. Deve ser um ambiente (um espaço, um processo, um encontro) que estimule a criatividade que cada um de nós carrega consigo. Em seu livro Nowtopia, Chris Carlsson chama esse cidadão que busca produzir alternativas de “fuçador” - hackers, permacultores, artesãos, cicloativistas, desenvolvedores, artistas, entre outros – e diz que são eles os sujeitos de um fazer científico de outra matriz e com potencialmente outros resultados (essencialmente sem fins de lucro). “Esse caminho questiona os rumos da ciência e da tecnologia a partir de baixo. Em vez de aguardar passivamente os resultados de laboratórios de empresas e universidades, que podem ser realmente úteis (o que só acontece por acaso, pois não há qualquer mecanismo social para definir ou orientar pesquisas 'úteis'), os protagonistas de uma tecnocultura autônoma estão inventando tecnologias práticas, e desenvolvendo e compartilhando habilidades cotidianas” (CARLSSON, 2014, p. 70-71). Entre as tecnologias práticas, cabem as indígenas, quilombolas, a permacultura, a gambiarra, mas também as invenções mais avançadas que especialistas em eletro-eletrônica, linguagem de programação ou robótica – desde que livres – possam produzir. Perder-se para se encontrar De volta dos esclarecimentos teóricos, retomemos o processo metodológico do LAB.IRINTO. Nosso intuito foi reunir um conjunto de inteligências e expertises para debater o status da arte dos laboratórios, a partir de diferentes perspectivas sobre esse tema. Em alguma medida, a ideia de LAB tornou-se uma moda, um guarda-chuva para abrigar diferentes iniciativas cujo formato híbrido não cabe nas caixas pré-definidas da produção contemporânea. Em nosso encontro, compareceram experiências dispares como o Laboratório Sóciocriativo, de André Martinez, que se configura como metodologia de formação inovadora, dirigida sobretudo a produtores e criadores culturais ou o Disruption Network Lab, de Tatiana Bazzichelli, italiana radicada em Berlim que dirige um think thank e um espaço de pesquisa sobre a cultura tecnológica. Também tivemos o Lab Mocorongo, uma iniciativa cidadã na Amazônia, em Santarém, Pará, que é uma evolução dos processos de trabalho dos Pontos de Cultura e o Olabi Makerspace, do Rio de Janeiro, que poderíamos definir como um centro irradiador e propagador da cultura maker, com foco acentuado na apropriação crítica das tecnologias pela população de baixa renda e lupa nas questões racial e de gênero. Todos esses projetos se definem como LABs, mas são muito distintos entre si. O que reforça a afirmação de Raul Oliván, diretor do projeto Zaragoza Activa, ativador dos laboratórios La Azucarera e La Colaboradora, que afirma, em um texto produzido como relato de sua participação no LAB.IRINTO, não existir um modelo de LAB1. Um LAB é uma resposta líquida, adaptativa, flexível, que aproveita as oportunidades e fortalezas do cenário local. É o não-modelo (Marcos. MediaLab-Prado) se impõe, não por necessidade ou ausência de certezas, senão por desejo, como uma estratégia consciente. Os modelos envelhecem, os não-modelos são sempre jovens e irreverentes, desafiam, tensionam. (OLIVAN, 2016, online) O primeiro passo dado no LAB.IRINTO foi mobilizar a rede local, da Baixada Santista, interessada na temática da inovação cidadã e da cultura livre. Para isso, promovemos uma série de encontros preparatórios, realizados todos eles na cafeteria de um museu público-privado. Com essas atividades, conseguimos no primeiro mês de trabalho compartilhar algumas visões e identificar potenciais parceiros. Na sequência, realizamos, em parceria com a Secretaria Geral IberoAmericana e o coletivo de arquitetos madrilenho Viveros de Iniciativas Ciudadanas, uma oficina de mapeamento, que resultou na alimentação de uma plataforma de dados sobre os agentes da região2. Com essa plataforma, a rede começou a se visualizar. Em paralelo, trabalhamos na identificação e mobilização de agentes do Brasil e do Exterior para se juntarem a nós em uma imersão reflexiva. 1 2 OLIVÁN, RAUL. “Um Lab é para a Cidade o que a poesia é para a linguagem”. Site do LAB.IRINTO. 28.6.2016. <http://labirinto.procomum.org/2016/06/28/um-lab-e-para-a-cidade-o-que-a-poesia-e-para-a-linguagem/> Acesso em 1.9.2016 Plataforma Civics: http://www.viveroiniciativasciudadanas.net/civics/iniciativas/?city=Santos Figura 2: Oficina de Mapeamento da Inovação Cidadã conduzida pelo VIC. Foto: divulgação A metodologia do encontro surgiu de um esforço da curadoria3 e dos tecelões, como nominamos os sistematizadores dos grupos de trabalho4. Durante dois dias, nos reunimos em cinco grupos temáticos, de livre escolha, sendo que os participantes não eram obrigados a permanecer em uma discussão até o final e também poderiam ser “convocados” por seus pares a dar sua contribuição em outra roda. Ao fim de três períodos de trocas, os sistematizadores apresentaram os resultados compilados ao conjunto dos participantes. Também procuramos deixar vários espaços e momentos em branco, para fortalecer as relações entre os agentes e estimular as trocas livres de ideias. Esse foi, aliás, o princípio que nos orientou a realizar no primeiro dia, à noite, uma festa na Casa Rizoma, uma iniciativa que se define como “espaço cultural independente, colaborativo, social e experimental”, localizado em uma região do centro de Santos abandonada pelo poder público. Figura 3: Oficina de móveis de papelão com crianças na Casa Rizoma. Crédito: Casa Rizoma O caso da Rizoma, aliás, é emblemático de algo que está no cerne da discussão sobre novas formas de cidadania e criação na sociedade da informação. Surgida de um coletivo autônomo, busca seu financiamento (instável) por meio de ações coletivas de arrecadação e festas promovidas em seu 3 4 A curadoria ficou a meu encargo e da diretora do Instituto Procomum, Georgia Nicolau. Os tecelões foram: Guilherme Turri (geral); Thiago Carrapatoso (Programação e Conteúdo); Gabi Agustini (Sustentabilidade e Modelo de Negócio); Niva Silva (Rede e Mobilização); Mariel Zasso (Gestão Institucional e Metodologias); Lincoln Spada (Território). espaço. Cumprem uma função essencial em sua comunidade, articulam-se com a vizinhança, promovem um espaço livre para as dissidências e, por isso, alimentam o manancial de renovação ética e estética que o tempo atual exige. Experiência recente, e que se conectou orgânicamente ao processo do LAB.IRINTO, a Casa Rizoma tem encontrado dificuldades de permanecer viva. Para explicar esse tipo de fenômeno, há um conceito que pode ser muito útil: extituições. Ele remete à obra do filósofo francês Michel Serres e busca definir um (não)modelo contemporâneo de organização. Para Tirado e Domènech, em práfrase ao que propõe Serres, “ extituições e redes não tem nem dentro nem fora, são só limítrofes, elementos que podem se conectar ou não. Uma extituição é uma superfície impossível de geometrizar, mais bem uma amálgama de conexões e associações em movimento. Sua matéria são as posições, as vizinhanças, as proximidades, as distâncias, aderências ou acumulações de relações.” Os arquitetos do VIC também desenvolvem esse conceito em seus trabalhos e buscam aplicá-lo ao debate sobre inovação cidadã5. Outras iniciativas se desenvolvem rapidamente e de forma muito distribuída em diferentes territórios, cada um com suas particularidades. Mais que úteis, o que são, são necessárias, muito necessárias. Chegam onde as instituições tradicionais não chegam ou não querem chegar. Desenvolvem uma paisagem nova de possibilidades que ampliam o contexto cultural, política e social que nos conforma. Se replicam, são recursivas e se redistribuem, e por isso tem alcance frente a ideia de escala. E sobretudo, os cidadãos precisam delas. Se convertem, assim, em extituições. (VIC, 2014, online) Uma extituição, portanto, existe como rede e em rede. Se estrutura por meio de suas associações e não por aquilo que é, em si. Sua forma é híbrida e mutante, o que dificulta, e muito, sua capacidade de conectar-se aos formatos sólidos que o mundo industrial produziu e que parecem ainda ditar as regras do jogo no que tange à formatação jurífica e aos modelos de financiamento. Voltaremos a esse conceito no capítulo final deste texto. Durante o workshop final do LAB.IRINTO, como já dito, obtivemos uma série de novos imputs que podem ser muito relevantes para um debate sobre laboratórios cidadãos. Não será possível, neste artigo, sob pena de que se torne muito extenso, abordar todas as contribuições. Por isso, faço um recorte para localizar as ideias sistematizadas pelo pesquisador e ativista Thiago Carrapatoso no grupo dedicado a pensar programação e conteúdo, porque elas desembocam em elementos relevantes para o objetivo deste artigo, que é afirmar os LABs como rede. Comecemos por essa tabela, que busca estabelecer um parâmetro comparativo entre as 5 VIC. “Extituciones: nuevas instituciones ciudadanas. Blog Planeta Futuro, El Pais. 26.5.2014. <http://blogs.elpais.com/alterconsumismo/2014/05/extituciones-nuevas-instituciones-ciudadanas.html> Acesso em 1.9.2016 ideias de centro cultural e laboratório cidadão. CENTRO CULTURAL X LABORATÓRIO CIDADÃO CENTRO CULTURAL LABORATÓRIO CIDADÃO ESTRUTURADO EXPERIMENTAL UMA ILHA UMA REDE VOCÊ VAI FAZER O QUE VOCÊ QUER FAZER? ETHOS: CONCEPÇÃO DA ARTE (CULTURE) ETHOS: CONCEPÇÃO DE CULTURA (ALL CULTURES) CONTEÚDO PRÉ-DEFINIDO CONTEÚDO MODULAR: FLEXÍVEL APREENSÃO CRÍTICA COMPARTILHAMENTO E CÓDIGO ABERTO ARTE É CULTURA TUDO É CULTURA O conteúdo da tabela é auto-explicativo, porém vale acrescentar que, como distinção, o laboratório cidadão parte da noção de cultura para ganhar interfaces com as demais questões da vida em comum. Tudo que é humano interessa ao LAB cidadão, principalmente tudo que transforma a vida humana. Porque sua função principal deve ser contribuir para a elaboração de alternativas profundas, que revolvam a cultura política e cidadã. Outros dois pontos compilados por Carrapatoso da discussão sobre conteúdo e programação foram o de contra-curadoria e de des-programação. A contra-curadoria pode ser realizada de muitas maneiras, mas sua forma principal seria desenvolver um padrão de programação baseado no “peer-review (revisão pelos pares) de projetos mandados em chamada pública”. Isso evoca uma aproximação com os sistemas científicos e permite que a “pessoa que propõe uma atividade não seja apenas proponente, como também juri dos projetos escolhidos”. A des-programação é baseada na ideida de que um laboratório “não pode ter uma programação definida”, deve ser “um espaço aberto que possa ser explorado pelos participantes como desejarem.” Felipe Fonseca evoca o “espaço em branco”, na busca por uma liberdade efetiva para os usuários. Documentação e transparência são aspectos essenciais. Laboratórios em rede e como rede Nos últimos anos, grandes empresas têm trabalhando no desenvolvimento de tecnologias que pretendem levar internet aos artefatos e equipamentos que organizam nossas vidas, desde geladeiras até semáforos, na chamada internet das coisas. Isso deu origem à perspectiva das cidades inteligentes e/ou conectadas. Melhor seria dizer cidades do controle, evocando o conceito deleuziano, mas isso assustaria as pessoas. De qualquer forma, esse já é um dos grandes temas contemporâneos e ganhará mais força nos próximos anos. No nosso entender, laboratórios de cultura livre e inovação cidadã podem ser um instrumento para que a cidadania e os criadores independentes apresentem perspectivas de baixo para cima para seus territórios, apresentando-se como alternativa ao modelo centralizado e top-down que começa a se tornar hegemônico nas nossas cidades. Para isso, têm de operar em rede e como rede. Mas o que significa operar em rede? Significa constituir um repertório comum de ações, atividades, visões, experimentações e processos que permitam o intercâmbio entre diferentes e complementares iniciativas de laboratórios dentro de uma região, estado, país e internacionalmente. Significa manter um olhar sempre atento ao que o outro está realizando e criar processos para que o compartilhamento de ideias, narrativas e sistematizações ocorra permanentemente. Significa trabalhar para gerar fundos de financiamento que irriguem essa rede, de forma equânime, impulsionando iniciativas e cooperando com a sustentabilidade de todos. Significa desenvolver ações conjuntas que gerem narrativas convincentes e que abram espaço de interlocução com governos, empresas, universidades, permitindo o reconhecimento da maturidade desses laboratórios. Operar em rede é o que permitirá aos laboratórios cidadãos se tornarem um enxame. Recorro outra vez a Oliván: O objetivo deve ser o continente. Um LAB deve estar encarregado de uma política global, porque se não for assim não servirá para muita coisa. É preciso aprender com os saberes populares, com as comunidades que constróem palafitas sobre as águas (cidades que aprendem) para avançar na direção de um laboratório de multidões (Raúl Oliván. Labmeeting) (OLIVÁN, 2016, online) E o que significa operar como rede? O debate sobre se o laboratório deve ou não estar vinculado a um espaço físico (se o laboratório é o espaço físico) é muito recorrente nos encontros que se dedicam a discutir o tema. Não foi diferente no LAB.IRINTO. A primeira imagem que nos vem à cabeça quando se pensa em laboratório, afinal, é em uma sala, um prédio, um ambiente. Mas parece ser consensual que um laboratório não é um espaço. É, no entanto, uma infra-estrutura, à medida que deve oferecer recursos e meios aos quais seus usuários não teriam acesso de outra maneira. Do ponto-de-vista do espaço, quando mais presente for na cidade ou na região, melhor. Como afirma Camilo Cantor, gestor do Colaboratório, do Parque Explora, em Medellin, Colômbia: Devemos buscar não criar espaços-ilha, que geram mais limites e solidões: a oficina ou o laboratório é um lugar que permite encontros e intercâmbios, é um espaço para nos encontrarmos na diferença dos processos e ideias, nas diferentes maneiras de fazer, solucionar e usar as técnicas disponíveis; Assim, mais que um espaço, devemos compreender um laboratório cidadão como rede que congrega pessoas, máquinas, espaços públicos, privados, autônomos e pessoais e existe na articulação de todas essas dimensões. Uma rede de extituições. Menos que um ponto estático, uma interface, uma plataforma, uma ponte entre mundos. Conecta e faz conectar, na busca sempre por criar condições para que as pessoas façam, realizem, produzam, inventem – lembremos que é um espaço destinado aos fuçadores. Pode se traduzir em uma, duas ou quantas sedes forem necessárias para que essa rede se realize. De que vale um laboratório “central” forte e uma rede desnutrida? No caso do LABxS (Lab Santista), nosso plano, ainda que passe por administrar uma sede própria, é dinamizar a rede, fortalecê-la e ampliá-la. Entre as medidas que estão previstas para os próximos meses, como desdobramento do trabalho até aqui realizado, estão a ocupação de um prédio público, cedido pela prefeitura, para o desenvolvimento de um “canteiro aberto” de criação; o desenvolvimento de uma plataforma e um aplicativo tecnológico para organizar as relações entre os agentes, com a evolução do trabalho de mapeamento; a promoção de atividades de formação, compartilhamento e colaboração, ocupando espaços públicos e privados da região, na perspectiva de ampliar o conhecimento do nosso trabalho pelos cidadãos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARLSSON, Chris. Nowtopia - Iniciativas que estão construindo o futuro hoje. Tomo Editorial, 2014. LATOUR, Bruno e WOOLGAR, Steve. A Vida de Laboratório: A produção dos fatos científicos. Relume-Dumará, 1997. LATOUR, Bruno. Jamais Fomos Modernos. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1994. TIRADO, Francisco J.; DOMÈNECH, Miquel. Extituciones: del poder y suas antomías. Universidad Autónoma de Barcelona. Política y Sociedad, 36 (2001), Madrid (pp. 191-204) KROPF, Simone Petraglia; FERREIRA, Luis Otávio. A prática da ciência: uma etnografia no laboratório. História, Ciências, Saúde, IV (1997-1998), Rio de Janeiro (pp. 589-597)