Location via proxy:   [ UP ]  
[Report a bug]   [Manage cookies]                

Guia de Vigilância Epidemiológica

Guia de Vigilância Epidemiológica © 2005. Ministério da Saúde Todos os direitos reservados. É permitida a reprodução parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte e que não seja para venda ou qualquer fim comercial. A coleção institucional do Ministério da Saúde pode ser acessada na íntegra na Biblioteca Virtual do Ministério da Saúde: www.saude.gov.br/bvs Série A. Normas e Manuais Técnicos 1. ed. 1985; 2. ed. 1986; 3. ed. 1992; 4. ed. 1998; 5. ed. 2002 6ª edição ampliada – 2005 – Tiragem: 2.000 exemplares Edição e distribuição MINISTÉRIO DA SAÚDE Secretaria de Vigilância em Saúde Departamento de Vigilância Epidemiológica Produção: Núcleo de Comunicação Endereço Esplanada dos Ministérios, Bloco G Edifício Sede do Ministério da Saúde, 1º andar CEP: 70.058-900, Brasília/DF E-mail: svs@saude.gov.br Endereço eletrônico: www.saude.gov.br/svs Produção editorial Copidesque/revisão: Napoleão Marcos de Aquino Projeto gráfico: Fabiano Camilo, Sabrina Lopes Diagramação: Edite Damásio da Silva, Sabrina Lopes (revisão) Impresso no Brasil / Printed in Brazil Ficha Catalográfica Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Guia de vigilância epidemiológica / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde. – 6. ed. – Brasília : Ministério da Saúde, 2005. 816 p. – (Série A. Normas e Manuais Técnicos) ISBN 85-334-1047-6 1. Vigilância epidemiológica. 2.Saúde pública. I. Título. II. Série. NLM WA 105 Catalogação na fonte – Editora MS – OS 2005/1082 Títulos para indexação Em inglês: Guide to Epidemiological Surveillance Em espanhol: Guía de Vigilancia Epidemiológica Ministério da Saúde Secretaria de Vigilância em Saúde Departamento de Vigilância Epidemiológica Guia de Vigilância Epidemiológica 6ª edição Série A. Normas e Manuais Técnicos Brasília - DF 2005 Sumário Equipe de elaboração | 7 Apresentação | 13 Introdução | 15 Capítulo 1. Vigilância epidemiológica | 17 Capítulo 2. Investigação epidemiológica de casos e epidemias | 35 Capítulo 3. Sistemas de informação em saúde e vigilância epidemiológica | 65 Capítulo 4. Sistema de vigilância epidemiológica de eventos adversos pós-vacinais | 85 Capítulo 5. Acidentes por animais peçonhentos | 101 Capítulo 6. Doenças | 127 Aids | 129 Antraz ou carbúnculo | 153 Botulismo | 170 Cólera | 187 Coqueluche | 209 Dengue | 231 Difteria | 254 Doença de Chagas | 282 Esquistossomose mansônica | 297 Febre amarela | 307 Febre do Nilo Ocidental | 325 Febre maculosa brasileira | 330 Febre purpúrica brasileira | 344 Febre tifóide | 350 Hanseníase | 364 Hantaviroses | 395 Hepatites virais | 409 Influenza (gripe) | 434 Leishmaniose tegumentar americana | 444 Leishmaniose visceral | 467 Leptospirose | 502 Malária | 521 Meningites | 541 Parotidite infecciosa | 570 Peste | 574 Poliomielite | 587 Raiva | 603 Rubéola | 633 Sarampo | 652 Sífilis congênita | 673 Síndrome da rubéola congênita | 684 Tétano acidental | 696 Tétano neonatal | 708 Tracoma | 721 Tuberculose | 732 Varicela/Herpes zoster | 757 Varíola | 768 Bibliografia | 778 Glossário | 796 Relação de endereços | 811 Equipe de elaboração Editores Jarbas Barbosa da Silva Júnior Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde Maria da Glória Teixeira Universidade Federal da Bahia, Instituto de Saúde Coletiva Maria da Conceição Nascimento Costa Universidade Federal da Bahia, Instituto de Saúde Coletiva Susan Martins Pereira Universidade Federal da Bahia, Instituto de Saúde Coletiva Expedito Luna Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde Eduardo Hage Carmo Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde Estela Maria Ramos do Nascimento Secretaria de Saúde do Estado da Bahia, Diretoria de Informação e Comunicação em Saúde Maria Adelaide Millington Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde Fernando Barros Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde Gerson Oliveira Penna Universidade de Brasília, Núcleo de Medicina Tropical Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 7 Elaboradores e colaboradores Departamento de Vigilância Epidemiológica Colaborador: Ricardo Gadelha de Abreu. Coordenação de Vigilância das Doenças de Transmissão Respiratória e Imunopreveníveis Elaboradores: Fernando Ribeiro de Barros; Marcia Lopes de Carvalho; Giselle Hentzy Moraes; Lícia Kamila Melo; Luciane Zapellini Daufenbach; Tatiana Miranda Lanzieri; Teresa Cristina Vieira Segatto; Tochie Massuda; Maria Glória Vicente; Neuma Terezinha Rosseto Hidalgo; Paulo Neves Baptista Filho; Marilda M. Siqueira; Sara Jany Medeiros da Silva; Zirlei Matos Silva; Lúcia Regina Ferraz; Lúcia Helena Berto; Tânia Maria Ibelli Vaz; Silvana Tadeu Casagrande; Maria Selma Soares. Colaboradores: Anita Gomes Cardoso; Carmo Elias de Andrade Melles; Vera Lúcia Simonsen; Maria Cristina Brandileone; Édson Elias da Silva; José Cerbino Neto; Maria Salet Parise; Maria Carolina Q. Pereira; Marlene Benfica Mattos; Marília Mattos Bulhões; Naura Inês Backes Gomes Gandin; Rosane Martins Will; Sandra Solange Leite Campos; Maria Mazarello Franco Vilaça; Hilda Guimarães de Freitas; João Lima Filho. Coordenação de Vigilância das Doenças Transmitidas por Vetores e Antropozoonoses Elaboradores: Ana Nilce Silveira Maia Elkhoury; Marcia Leite de Sousa; Wagner Alexandre Costa; Waneska Alexandra Alves; Fan Hui Wen; Marcelo Santalucia; Vera Lúcia Carvalho da Silva; Zouraide Guerra Antunes Costa; Emanuel Carvalho Martins; Camila Sihler; Mauro Rosa Elkhoury; Lucia Regina Montebello Pereira; Marcelo Yoshito Wada; Rosely Cerqueira de Oliveira; Márcio Costa Vinhaes; Antonia Lins Fernandes Carlos; Maria de Lourdes Simões Arsky; Aderbal Henry Strugo Arruda; Francisco Anilton Araujo; Ricardo Vianna; Wanderson Kleber de Oliveira. Colaboradores: João Carlos Pinto Dias; Maria Gloria Teixeira; Roozevelt Ramos Bonfim. Coordenação de Vigilância das Doenças Transmitidas por Vetores Elaboradores: Ronaldo Santos do Amaral; Maria José Rodrigues de Menezes; Maria Aparecida Honório Tolentino; Tibério César de Morais Dantas; Helen Selma de Abreu Freitas; João Batista Furtado Vieira; Maria de Fátima Costa Lopes. Colaboradores: Steven K. Ault; Hélio Tadashi Yamada; Norma Helen Medina; Gilberto Fontes; Eliana Rocha. Gerência Técnica de Doenças Emergentes e Reemergentes Elaboradores: Vera Lúcia Gattás; Antonio Silva Lima Neto; Alessandra Araújo Siqueira; Dráurio Barreira Cravo Neto. 8 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sistema de Informação de Agravos de Notificação Elaboradores: Carla Magda Allan Santos Domingues; Carolina Novaes Carvalho; Eduardo Marques Macário; Ruth Glatt. Coordenação de Vigilância das Doenças de Transmissão Hídrica e Alimentar Elaboradores: Rejane Maria de Souza Alves; Greice Madeleine Ikeda do Carmo; Cristiane Penaforte do Nascimento Dimech; Moacir Gerolomo; Maria Lucilia Nandi Benatto. Programa Nacional de Eliminação da Hanseníase Elaboradores: Rosa Castália França Ribeiro Soares; Sandra de Sousa Ribeiro Petrus; Magda Levantezi; Vera Lúcia Gomes Andrade. Colaboradores: Danielle Bandeira Costa de Sousa; Marleide Aurélio da Silva; Marcos Cunha Lopes Virmond; Maurício Lisboa Nobre; Isabela Maria Fernandes Goulart; Maria Eugênia Noviski Gallo; Adgine Freitas Dantas. Programa Nacional de Controle da Tuberculose Elaboradores: Cláudio Sérgio Romano; Elza Ferreira Noronha; Joseney Santos; Rui Rafael Durlacher. Programa Nacional de Hepatites Virais Elaboradores: Gerusa Maria Figueiredo; João Eduardo Pereira; Katia Biscuola de Campos. Coordenação Geral do Programa Nacional de Imunizações Elaboradores: Marilía Ferraro Rocha; Marly Galdino de Almeida; Márcia Vieira Leite Nascimento; Neusa Gueths; José Evoide Moura; Sâmia Abdul Samad; Sirlene de Fátima Pereira. Colaboradores: Maria de Lourdes de Sousa Maia; Vânia Blois de Souza; Andreia de Pádua Careli Dantas; Angela Maria Pinheiro Galvão; Heliana Raimunda de Macedo. Programa Geral de Laboratórios de Saúde Pública Elaboradores:Lúcia Regina Ferraz; Lúcia Helena Berto; Maria Selma Soares; Denise Santos Correia de Oliveira; Maria Adelaide Millington; Geane Maria Oliveira; Marlene Benfica Matos; Rômulo Henrique da Cruz; Suely Esashika. Colaboradores: Maria Cristina C. Brandileone; Edson Elias da Silva; Tânia Mara Ibelli Vaz; Dália dos Prazeres Rodrigues; Miyoko Jacob; Marilda Mendonça Siqueira; Terezinha Paiva; Wyller Alencar Mello; Regina Moreira; Manoel do Carmo Pereira Soares; Clara Yoshida; Martha Maria Pereira; Elizabeth S. Travassos da Rosa; Ivani Bisordi Ferreira; Akeme Suzuki; Albert Ko; Maria Luiza Carrieri; Leon Rabinovtch; Cláudio Mafia; Márcio Galvão; Elvira Mendes do Nascimento; Simone Berger Calic; Eliana Furtado; Cor Jésus Fontes; Armando Schubach; Mitermayer Galvão Reis; Elizabeth Salbé; Hermann Schatzmayr; Iray Rocco; José Marcos Sócrates; Marly Tenório; Alzira Paiva de Almeida. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 9 Coordenação Geral do Programa Nacional de Controle da Malária Elaboradores: Carlos José Mangabeira da Silva; Edmar Cabral da Silva; Carmen Lucia Muricy; Cor Jesús Fernades Fontes; José Lázaro de Brito Ladislau; Lubélia Sá Freire da Silva; Maria da Paz Luna Pereira; Pedro Luiz Tauil; Roseli La Corte dos Santos; Rui Moreira Braz. Coordenação Geral do Programa Nacional de Controle da Dengue Elaboradores: Pedro Vasconcelos; Sueli Rodrigues; Elizabeth Salbe; Hermann Schatzmayr; Rita Nogueira; Iray Rocco; José Marcos Sócrates; Marly Tenório; Ana Cristina da Rocha Simplício; Paulo Cesar da Silva; Giovanini Evelim Coelho; João Bosco Siqueira Junior; Suely Esashika. Diretoria Técnica do Programa Nacional de DST/Aids Elaboradores: Ana Lúcia R. Vasconcelos; Carmen Correia de Barros Dhalia; Cristine Ferreira; Denise Arakaki Sanchez; Fabio Moherdaui; Maria Fernanda Sardella Alvim Hilton; Eduardo Campos de Oliveira; Gerson Fernando Mendes Pereira; Leidijany Costa Paz; Pedro Chequer; Ricardo Pio Marins. 10 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Agradecimentos As várias edições deste Guia têm sido fruto de um trabalho coletivo que envolve profissionais e dirigentes das áreas técnicas afins do Ministério da Saúde. Os editores têm o papel de coordenar este processo e revisar os capítulos com vistas a imprimir certa uniformidade à publicação, além de elaborar capítulos sobre temas específicos. Assim, centenas de profissionais vêm participando ativamente desta construção, de modo que parte dos conteúdos das edições anteriores permanecem nas edições seguintes. Nesse sentido, os editores desta 6ª edição expressam o seu reconhecimento e agradecem o empenho e contribuições de todos os autores e colaboradores. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 11 Apresentação O Brasil vem acumulando importantes vitórias na área de vigilância epidemiológica, prevenção e controle de doenças, a exemplo da erradicação da poliomielite e eliminação do sarampo. Apesar dos desafios ainda presentes, há no cenário mundial o reconhecimento de que nosso país situa-se entre os que têm avançado na consolidação das atividades essenciais de Saúde Pública, tendo inclusive, neste campo, contribuído com as experiências exitosas na Região das Américas. Certamente, a consciente participação dos profissionais de saúde tem representado papel vital para o alcance deste reconhecimento. Para tanto, um dos instrumentos tem sido a constante atualização dos conhecimentos que propiciam o avanço técnico das ações de vigilância e controle de doenças transmissíveis. A presente publicação sintetiza grande parte deste conhecimento de forma clara para que as ações preconizadas pelo Sistema Único de Saúde nesta área sejam executadas pelos sistemas locais com eficiência e efetividade, com vistas ao aperfeiçoamento contínuo do Sistema Nacional de Vigilância em Saúde e cumpre uma das missões mais importantes da esfera federal de gestão do Sistema Único de Saúde: disponibilizar para toda a rede de serviços informações e procedimentos, à luz do atual estado da arte, com vistas à promoção e proteção da saúde coletiva, bem como à prevenção de doenças que colocam em risco indivíduos ou grupos populacionais. Assim, tenho grande alegria em oferecer a todos os profissionais da rede de serviços do SUS a 6ª edição do Guia de Vigilância Epidemiológica produzido pelo Ministério da Saúde/Secretaria de Vigilância em Saúde. Saraiva Felipe Ministro de Estado da Saúde Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 13 Introdução A Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) do Ministério da Saúde tem a satisfação de apresentar aos profissionais que integram o Sistema Nacional de Vigilância em Saúde mais uma edição, revisada e ampliada, do Guia de Vigilância Epidemiológica. Este manual objetiva orientar os profissionais de saúde por meio de informações sistematizadas sobre as ações de investigação epidemiológica e as medidas de prevenção e controle das doenças transmissíveis. Assim, procura-se melhorar a condição de saúde de nossa população pela eliminação e/ou atenuação dos riscos associados à rápida disseminação ou persistência com grande impacto sobre a morbimortalidade que as mesmas apresentam. O Guia de Vigilância Epidemiológica tem se constituído em importante instrumento de divulgação das normas e procedimentos de vigilância e controle de doenças transmissíveis de interesse para o Sistema Nacional de Vigilância em Saúde. Essa ação, atribuição específica do Ministério da Saúde, é essencial para assegurar a padronização de procedimentos em todo o país e permitir a adoção das medidas capazes de prevenir e controlar as doenças transmissíveis. De sua elaboração participaram técnicos e dirigentes da SVS e das secretarias estaduais e municipais de Saúde, bem como consultores especialistas em cada tema específico, que incorporaram aos conteúdos das edições anteriores os atuais conhecimentos técnico-científicos. Além disso, as normas e procedimentos indicados consideram a capacidade operacional e os recursos disponíveis nos sistemas locais de saúde. Esperamos que a ampla utilização do Guia contribua com seu permanente aperfeiçoamento, auxiliando o processo coletivo de construção de um sistema de vigilância em saúde capaz de responder aos desafios postos pelo complexo perfil epidemiológico da atualidade. Jarbas Barbosa da Silva Júnior Secretário de Vigilância em Saúde Ministério da Saúde Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 15 CAPÍTULO Vigilância epidemiológica 1 Vigilância Epidemiológica Bases históricas e conceituais As primeiras intervenções estatais no campo da prevenção e controle de doenças, desenvolvidas sob bases científicas modernas, datam do início do século XX e foram orientadas pelo avanço da era bacteriológica e pela descoberta dos ciclos epidemiológicos de algumas doenças infecciosas e parasitárias. Essas intervenções consistiram na organização de grandes campanhas sanitárias com vistas ao controle de doenças que comprometiam a atividade econômica, a exemplo da febre amarela, peste e varíola. As campanhas valiamse de instrumentos precisos para o diagnóstico de casos, combate a vetores, imunização e tratamento em massa com fármacos, dentre outros. O modelo operacional baseava-se em atuações verticais, sob forte inspiração militar, e compreendia fases bem estabelecidas – preparatória, de ataque, de consolidação e de manutenção. A expressão vigilância epidemiológica passou a ser aplicada ao controle das doenças transmissíveis na década de 50, para designar uma série de atividades subseqüentes à etapa de ataque da campanha de erradicação da malária, vindo a designar uma de suas fases constitutivas. Originalmente, significava “a observação sistemática e ativa de casos suspeitos ou confirmados de doenças transmissíveis e de seus contatos”. Tratava-se, portanto, da vigilância de pessoas, com base em medidas de isolamento ou quarentena, aplicadas individualmente, e não de forma coletiva. Na década de 60, o programa de erradicação da varíola também instituiu uma fase de vigilância epidemiológica, subseqüente à de vacinação em massa da população. Simultaneamente, o programa disseminou a aplicação de novos conceitos que se firmavam no âmbito internacional e não se vinculavam à prévia realização de uma fase de ataque. Pretendia-se, mediante busca ativa de casos de varíola, a detecção precoce de surtos e o bloqueio imediato da transmissão da doença. Essa metodologia foi fundamental para o êxito da erradicação da varíola em escala mundial e serviu de base para a organização de sistemas nacionais de vigilância epidemiológica. A vigilância epidemiológica foi o tema central da 21ª Assembléia Mundial de Saúde realizada em 1968, na qual se estabeleceu a abrangência do conceito, que permitia aplicação a variados problemas de saúde pública, além das doenças transmissíveis, a exemplo das malformações congênitas, envenenamentos na infância, leucemia, abortos, acidentes, doenças profissionais, comportamentos como fatores de risco, riscos ambientais, utilização de aditivos, dentre outros. No Brasil, a Campanha de Erradicação da Varíola (CEV) − 1966-73 − é reconhecida como marco da institucionalização das ações de vigilância no país, tendo fomentado e apoiado a organização de unidades de vigilância epidemiológica na estrutura das secretarias estaduais de saúde. O modelo da CEV inspirou a Fundação Serviços de Saúde Pública (FSESP) a organizar, em 1969, um sistema de notificação semanal de doenças selecionadas e disseminar informações pertinentes em um boletim epidemiológico de circulação quinzenal. Tal processo fundamentou a consolidação, nos níveis nacional e estadual, de bases técnicas e operacionais que possibilitaram o futuro desenvolvimento de ações de impacto no controle de doenças evitáveis por imunização. O principal êxito relacionado a esse esfor- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 1 19 Vigilância Epidemiológica ço foi o controle da poliomielite no Brasil, na década de 1980, que abriu perspectivas para a erradicação da doença no continente americano, finalmente alcançada em 1994. Por recomendação da 5ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1975, o Ministério da Saúde instituiu o Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SNVE), por meio de legislação específica (Lei nº 6.259/75 e Decreto nº 78.231/76). Esses instrumentos legais tornaram obrigatória a notificação de doenças transmissíveis selecionadas, constantes de relação estabelecida por portaria. Em 1977, o Ministério da Saúde elaborou o primeiro Manual de Vigilância Epidemiológica, reunindo e compatibilizando as normas técnicas então utilizadas para a vigilância de cada doença, no âmbito de programas de controle específicos. O atual Sistema Único de Saúde (SUS) incorporou o SNVE, definindo em seu texto legal (Lei nº 8.080/90) a vigilância epidemiológica como “um conjunto de ações que proporciona o conhecimento, a detecção ou prevenção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde individual ou coletiva, com a finalidade de recomendar e adotar as medidas de prevenção e controle das doenças ou agravos”. Além de ampliar o conceito, as ações de vigilância epidemiológica passaram a ser operacionalizadas num contexto de profunda reorganização do sistema de saúde brasileiro, caracterizada pela descentralização de responsabilidades e integralidade da prestação de serviços. O Anexo 1 deste capítulo traz maiores informações sobre a atual organização do SNVE. Por sua vez, as profundas mudanças no perfil epidemiológico das populações, no qual se observa declínio das taxas de mortalidade por doenças infecciosas e parasitárias e crescente aumento das mortes por causas externas e doenças crônico-degenerativas, têm propiciado a discussão da incorporação de doenças e agravos não-transmissíveis ao escopo de atividades da vigilância epidemiológica. Iniciativas nesta direção estão sendo adotadas tanto pelo Ministério da Saúde/SVS como por algumas secretarias estaduais e municipais de saúde. Propósitos e funções Por propósito, a vigilância epidemiológica deve fornecer orientação técnica permanente para os profissionais de saúde que têm a responsabilidade de decidir sobre a execução de ações de controle de doenças e agravos, tornando disponíveis, para esse fim, informações atualizadas sobre a ocorrência dessas doenças e agravos, bem como dos fatores que a condicionam, numa área geográfica ou população definida. Subsidiariamente, a vigilância epidemiológica constitui-se importante instrumento para o planejamento, organização e operacionalização dos serviços de saúde, bem como a normatização das atividades técnicas correlatas. A operacionalização da vigilância epidemiológica compreende um ciclo de funções específicas e intercomplementares, desenvolvidas de modo contínuo, permitindo conhecer, a cada momento, o comportamento da doença ou agravo selecionado como alvo das ações, de forma que as medidas de intervenção pertinentes possam ser desencadeadas com oportunidade e eficácia. São funções da vigilância epidemiológica: • coleta de dados; • processamento dos dados coletados; 20 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Vigilância Epidemiológica • • • • • análise e interpretação dos dados processados; recomendação das medidas de controle apropriadas; promoção das ações de controle indicadas; avaliação da eficácia e efetividade das medidas adotadas; divulgação de informações pertinentes. As competências de cada nível do sistema de saúde (municipal, estadual e federal) abarcam todo o espectro das funções de vigilância epidemiológica, porém com graus de especificidade variáveis. As ações executivas são inerentes ao nível municipal e seu exercício exige conhecimento analítico da situação de saúde local, mas cabe aos níveis nacional e estadual conduzir as ações de caráter estratégico e longo alcance. A eficiência do SNVE depende do desenvolvimento harmônico das funções realizadas nos diferentes níveis. Quanto mais capacitada e eficiente for a instância local, mais oportunamente podem ser executadas as medidas de controle. Os dados e informações aí produzidos serão mais consistentes, possibilitando melhor compreensão do quadro sanitário estadual e nacional e, conseqüentemente, o planejamento adequado da ação governamental. Nesse contexto, as intervenções oriundas dos níveis estadual e federal tenderão a tornar-se seletivas, voltadas para questões emergenciais ou que, por sua transcendência, requerem avaliação complexa e abrangente, com participação de especialistas e centros de referência, inclusive internacionais. A atual orientação para o desenvolvimento do SNVE estabelece, como prioridade, o fortalecimento dos sistemas municipais de vigilância epidemiológica, dotados de autonomia técnico-gerencial para enfocar os problemas de saúde próprios de suas respectivas áreas de abrangência. 1 Coleta de dados e informações O cumprimento das funções de vigilância epidemiológica depende da disponibilidade de dados que sirvam para subsidiar o processo de produção de informação para a ação. A qualidade da informação depende, sobretudo, da adequada coleta de dados gerados no local onde ocorre o evento sanitário (dado coletado). É também nesse nível que os dados devem primariamente ser tratados e estruturados para se constituírem em um poderoso instrumento – a informação –, capaz de subsidiar um processo dinâmico de planejamento, avaliação, manutenção e aprimoramento das ações. A coleta de dados ocorre em todos os níveis de atuação do sistema de saúde. A força e o valor da informação (dado analisado) dependem da precisão com que o dado é gerado. Portanto, os responsáveis pela coleta devem ser preparados para aferir a qualidade do dado obtido. Tratando-se, por exemplo, da notificação de doenças transmissíveis, é fundamental a capacitação para o diagnóstico de casos e a realização de investigações epidemiológicas correspondentes. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 21 Vigilância Epidemiológica Outro aspecto relevante refere-se à representatividade dos dados, em relação à magnitude do problema existente. Como princípio organizacional o sistema de vigilância deve abranger o maior número possível de fontes geradoras, cuidando-se de assegurar a regularidade e oportunidade da transmissão dos dados. Geralmente, não é possível nem necessário conhecer a totalidade dos casos. A partir de fontes selecionadas e confiáveis pode-se acompanhar as tendências da doença ou agravo, com o auxílio de estimativas de subenumeração de casos. O fluxo, periodicidade e tipos de dados coletados devem corresponder às necessidades de utilização previamente estabelecidas, com base em indicadores adequados às características próprias de cada doença ou agravo sob vigilância. A prioridade de conhecimento do dado sempre será concedida à instância responsável pela execução das medidas de controle. Quando for necessário o envolvimento de outro nível do sistema, o fluxo deverá ser suficientemente rápido para que não ocorra atraso na adoção de medidas de controle. Tipos de dados Os dados e informações que alimentam o Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica são os seguintes: Dados demográficos, ambientais e socioeconômicos Os dados demográficos permitem quantificar grupos populacionais, com vistas à definição de denominadores para o cálculo de taxas. Dados sobre o número de habitantes, nascimentos e óbitos devem ser discriminados segundo características de sua distribuição por sexo, idade, situação do domicílio, escolaridade, ocupação, condições de saneamento, etc. A disponibilidade de indicadores demográficos e socioeconômicos é primordial para a caracterização da dinâmica populacional e das condições gerais de vida, às quais se vinculam os fatores condicionantes da doença ou agravo sob vigilância. Dados sobre aspectos climáticos e ecológicos também podem ser necessários para a compreensão do fenômeno analisado. Dados de morbidade São os dados mais utilizados em vigilância epidemiológica, por permitirem a detecção imediata ou precoce de problemas sanitários. Correspondem à distribuição de casos segundo a condição de portadores de infecções ou patologias específicas, como também de seqüelas. Trata-se, em geral, de dados oriundos da notificação de casos e surtos, da produção de serviços ambulatoriais e hospitalares, de investigações epidemiológicas, da busca ativa de casos, de estudos amostrais e de inquéritos, entre outras formas. Seu uso apresenta dificuldades relacionadas à representatividade e abrangência dos sistemas de informações disponíveis, à possibilidade de duplicação de registros e a deficiências de métodos e critérios de diagnóstico utilizados. Merecem, por isso, cuidados especiais na coleta e análise. 22 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Vigilância Epidemiológica O SNVE deve estimular, cada vez mais, a utilização dos sistemas e bases de dados disponíveis, vinculados à prestação de serviços, para evitar a sobreposição de sistemas de informação e a conseqüente sobrecarga aos níveis de assistência direta à população. As deficiências qualitativas próprias desses sistemas tendem a ser superadas à medida que se intensificam a crítica e o uso dos dados produzidos. Dados de mortalidade São de fundamental importância como indicadores da gravidade do fenômeno vigiado, sendo ainda, no caso particular de doenças de maior letalidade, mais válidos do que os dados de morbidade, por se referirem a fatos vitais bem marcantes e razoavelmente registrados. Sua obtenção provém de declarações de óbitos, padronizadas e processadas nacionalmente. Essa base de dados apresenta variáveis graus de cobertura entre as regiões do país, algumas delas com subenumeração elevada de óbitos. Além disso, há proporção significativa de registros sem causa definida, o que impõe cautela na análise dos dados de mortalidade. Atrasos na disponibilidade desses dados dificultam sua utilização na vigilância epidemiológica. A disseminação eletrônica de dados tem contribuído muito para facilitar o acesso a essas informações. Considerando tais fatos, os sistemas locais de saúde devem ser estimulados a utilizar de imediato as informações das declarações de óbito. 1 Notificação de surtos e epidemias A detecção precoce de surtos e epidemias ocorre quando o sistema de vigilância epidemiológica local está bem estruturado, com acompanhamento constante da situação geral de saúde e da ocorrência de casos de cada doença e agravo sujeito à notificação. Essa prática possibilita a constatação de qualquer indício de elevação do número de casos de uma patologia, ou a introdução de outras doenças não incidentes no local e, conseqüentemente, o diagnóstico de uma situação epidêmica inicial para a adoção imediata das medidas de controle. Em geral, esses fatos devem ser notificados aos níveis superiores do sistema para que sejam alertadas as áreas vizinhas e/ou para solicitar colaboração, quando necessária. Fontes de dados A informação para a vigilância epidemiológica destina-se à tomada de decisões – informação para a ação. Este princípio deve reger as relações entre os responsáveis pela vigilância e as diversas fontes que podem ser utilizadas para o fornecimento de dados. Dentre essas, a principal é a notificação, ou seja, a comunicação da ocorrência de determinada doença ou agravo à saúde feita à autoridade sanitária por profissionais de saúde ou qualquer cidadão, para fins de adoção de medidas de intervenção pertinentes. Historicamente, a notificação compulsória tem sido a principal fonte da vigilância epidemiológica, a partir da qual, na maioria das vezes, se desencadeia o processo informaçãodecisão-ação. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 23 Vigilância Epidemiológica A listagem das doenças de notificação nacional (Anexo 1) é estabelecida pelo Ministério da Saúde entre as consideradas de maior relevância sanitária para o país. Os dados correspondentes compõem o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). Estados e municípios podem adicionar à lista outras patologias de interesse regional ou local, justificada a sua necessidade e definidos os mecanismos operacionais correspondentes. Entende-se que só devem ser coletados dados para efetiva utilização no aprimoramento das ações de saúde, sem sobrecarregar os serviços com o preenchimento desnecessário de formulários. Dada a natureza específica de cada doença ou agravo à saúde, a notificação deve seguir um processo dinâmico, variável em função das mudanças no perfil epidemiológico, dos resultados obtidos com as ações de controle e da disponibilidade de novos conhecimentos científicos e tecnológicos. As normas de notificação devem adequar-se, no tempo e no espaço, às características de distribuição das doenças consideradas, ao conteúdo de informação requerido, aos critérios de definição de casos, à periodicidade da transmissão dos dados, às modalidades de notificação indicadas e à representatividade das fontes de notificação. Os parâmetros para a inclusão de doenças e agravos na lista de notificação compulsória devem obedecer os seguintes critérios: Magnitude – aplicável a doenças de elevada freqüência, que afetam grandes contingentes populacionais e se traduzem por altas taxas de incidência, prevalência, mortalidade e anos potenciais de vida perdidos; Potencial de disseminação – representado pelo elevado poder de transmissão da doença, por meio de vetores ou outras fontes de infecção, colocando sob risco a saúde coletiva; Transcendência – expressa-se por características subsidiárias que conferem relevância especial à doença ou agravo, destacando-se: severidade, medida por taxas de letalidade, de hospitalização e de seqüelas; relevância social, avaliada, subjetivamente, pelo valor imputado pela sociedade à ocorrência da doença e que se manifesta pela sensação de medo, repulsa ou indignação; e relevância econômica, avaliada por prejuízos decorrentes de restrições comerciais, redução da força de trabalho, absenteísmo escolar e laboral, custos assistenciais e previdenciários, etc.; Vulnerabilidade – medida pela disponibilidade concreta de instrumentos específicos de prevenção e controle da doença, propiciando a atuação efetiva dos serviços de saúde sobre os indivíduos e coletividades; Compromissos internacionais – relativos ao cumprimento de metas continentais ou mundiais de controle, de eliminação ou de erradicação de doenças, previstas em acordos firmados pelo governo brasileiro com organismos internacionais. Esses compromissos incluem obrigações assumidas por força do Regulamento Sanitário Internacional, estabelecido no âmbito da Organização Mundial da Saúde, que ainda exige a notificação compulsória dos casos de cólera, febre amarela e peste. Entretanto, este regulamento está sendo objeto de revisão e, possivelmente, os Estados-Membros da OMS passarão a notificar eventos inusitados que possam ter repercussões internacionais; Ocorrência de epidemias, surtos e agravos inusitados à saúde – são situações emergenciais em que se impõe a notificação imediata de todos os casos suspeitos, com o objetivo 24 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Vigilância Epidemiológica de delimitar a área de ocorrência, elucidar o diagnóstico e deflagrar medidas de controle aplicáveis. Mecanismos próprios de notificação devem ser instituídos com base na apresentação clínica e epidemiológica do evento. No processo de seleção das doenças notificáveis, esses critérios devem ser considerados em conjunto, embora o atendimento a apenas alguns deles possa ser suficiente para incluir determinada doença. Por outro lado, nem sempre podem ser aplicados de modo linear, sem considerar a factibilidade de implementação das medidas decorrentes da notificação, as quais dependem de condições operacionais objetivas de funcionamento da rede de prestação de serviços de saúde. O caráter compulsório da notificação implica responsabilidades formais para todo cidadão, e uma obrigação inerente ao exercício da medicina, bem como de outras profissões na área da saúde. Mesmo assim, sabe-se que a notificação nem sempre é realizada, o que ocorre por desconhecimento de sua importância e, também, por descrédito nas ações que dela devem resultar. A experiência tem evidenciado que o funcionamento de um sistema de notificação é diretamente proporcional à capacidade de se demonstrar o uso adequado das informações recebidas, de forma a conquistar a confiança dos notificantes. O sistema de notificação deve estar permanentemente voltado para a sensibilização dos profissionais e das comunidades, visando melhorar a quantidade e qualidade dos dados coletados mediante o fortalecimento e ampliação da rede. Todas as unidades de saúde (públicas, privadas e filantrópicas) devem fazer parte do sistema, bem como os profissionais de saúde e mesmo a população em geral. Não obstante, essa cobertura universal idealizada não prescinde do uso inteligente da informação, que pode basear-se em dados muito restritos para a tomada de decisões oportunas e eficazes. Aspectos que devem ser considerados na notificação: • notificar a simples suspeita da doença. Não se deve aguardar a confirmação do caso para se efetuar a notificação, pois isto pode significar perda da oportunidade de intervir eficazmente; • a notificação tem de ser sigilosa, só podendo ser divulgada fora do âmbito médicosanitário em caso de risco para a comunidade, respeitando-se o direito de anonimato dos cidadãos; • o envio dos instrumentos de coleta de notificação deve ser feito mesmo na ausência de casos, configurando-se o que se denomina notificação negativa, que funciona como um indicador de eficiência do sistema de informações. 1 Além da notificação compulsória, o Sistema de Vigilância Epidemiológica pode definir doenças e agravos como de notificação simples. O Sinan, descrito no terceiro capítulo deste Guia, é o principal instrumento de coleta dos dados de notificação compulsória. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 25 Vigilância Epidemiológica Outras bases de dados dos sistemas nacionais de informação O registro rotineiro de dados sobre saúde, derivados da produção de serviços ou de sistemas de informação específicos, constitui valiosa fonte de informação sobre a ocorrência de doenças e agravos sob vigilância epidemiológica. Com a progressiva implementação de recursos informacionais no setor saúde, esses dados tendem a tornar-se cada vez mais acessíveis por meios eletrônicos, sendo de primordial importância para os agentes responsáveis pelas ações de vigilância, em todos os níveis. Seu uso para a vigilância epidemiológica deve ser estimulado, objetivando aprimorar a qualidade do registro e compatibilizar as informações oriundas de diferentes fontes. Laboratórios Os resultados laboratoriais vinculados à rotina da vigilância epidemiológica complementam o diagnóstico de confirmação de casos e, muitas vezes, servem como fonte de conhecimento de casos que não foram notificados. Também devem ser incorporados os dados decorrentes de estudos epidemiológicos especiais, realizados pelos laboratórios de saúde pública em apoio às ações de vigilância. Entretanto, o uso do laboratório como fonte de detecção de casos tem sido restrito a algumas doenças, em situações especiais. Há necessidade de se organizar um sistema integrado de resultados das análises realizadas para diagnóstico das doenças sob vigilância, abrangendo, inicialmente, a rede de laboratórios centrais de saúde pública nos estados (Lacens) e também a rede de hemocentros, onde é realizada a triagem sorológica de doadores de sangue. Complementarmente, esse sistema deve ser progressivamente estendido a outros laboratórios públicos e privados. Investigação epidemiológica Os achados de investigações epidemiológicas de casos e de surtos complementam as informações da notificação no que se refere a fontes de infecção e mecanismos de transmissão, dentre outras variáveis. Também podem possibilitar a descoberta de novos casos não notificados. Imprensa e população Muitas vezes, informações oriundas da imprensa e da própria comunidade são fontes importantes de dados, devendo ser sempre consideradas para a realização da investigação pertinente. Podem ser o primeiro alerta sobre a ocorrência de uma epidemia ou agravo inusitado, principalmente quando a vigilância em determinada área é insuficientemente ativa. 26 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Vigilância Epidemiológica Fontes especiais de dados Estudos epidemiológicos Além das fontes regulares de coleta de dados e informações para analisar, do ponto de vista epidemiológico, a ocorrência de eventos sanitários, pode ser necessário, em determinado momento ou período, recorrer diretamente à população ou aos serviços para obter dados adicionais ou mais representativos, que podem ser coletados por inquérito, levantamento epidemiológico ou investigação. Inquérito epidemiológico – estudo seccional, geralmente do tipo amostral, levado a efeito quando as informações existentes são inadequadas ou insuficientes em virtude de diversos fatores, dentre os quais se podem destacar: notificação imprópria ou deficiente; mudança no comportamento epidemiológico de determinada doença; dificuldade na avaliação de coberturas vacinais ou eficácia de vacinas; necessidade de avaliação da eficácia das medidas de controle de um programa; descoberta de agravos inusitados. Levantamento epidemiológico – estudo realizado com base nos dados existentes nos registros dos serviços de saúde ou de outras instituições. Não é um estudo amostral e destina-se a coletar dados para complementar informações já existentes. A recuperação de séries históricas, para análises de tendências, e a busca ativa de casos, para aferir a eficiência do sistema de notificação, são exemplos de levantamentos epidemiológicos. Investigação epidemiológica – método de trabalho utilizado para esclarecer a ocorrência de doenças transmissíveis ou de agravos inusitados à saúde, a partir de casos isolados ou relacionados entre si. Consiste em um estudo de campo realizado a partir de casos notificados (clinicamente declarados ou suspeitos) e seus contatos. Destina-se a avaliar as implicações da ocorrência para a saúde coletiva, tendo como objetivos: confirmar o diagnóstico, determinar as características epidemiológicas da doença, identificar as causas do fenômeno e orientar as medidas de controle. Por ser uma atividade de fundamental importância para o processo de decisão-ação da vigilância epidemiológica, exigindo conhecimento e competência profissional, os procedimentos para sua realizaçao encontram-se detalhados em roteiro específico no segundo capítulo deste Guia. A expressão “investigação epidemiológica” aqui utilizada tem o sentido restrito de importante diagnóstico da vigilância epidemiológica, diferente de uma ampla conotação como sinônimo da pesquisa científica em epidemiologia. Para diferenciar, na vigilância epidemiológica costuma ser denominada como “investigação epidemiológica de campo”. 1 Sistemas sentinelas Nem sempre o processo de decisão-ação necessita da totalidade de casos (notificação universal) para o desencadeamento das estratégias de intervenção, pois isto se vincula à apresentação clínica e epidemiológica das doenças e agravos e, principalmente, aos instrumentos de controle disponíveis e indicados para cada situação específica. Para intervir em determinados problemas de saúde pode-se lançar mão de sistemas sentinelas de informações capazes de monitorar indicadores-chave na população geral ou em grupos especiais que sirvam de alerta precoce para o sistema de vigilância. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 27 Vigilância Epidemiológica Existem vários tipos destes sistemas, como, por exemplo, a organização de redes constituídas de fontes sentinelas de notificação especializadas, já bastante utilizadas para o acompanhamento e vigilância da situação de câncer. Outra técnica baseia-se na ocorrência de evento sentinela, que é a detecção de doença prevenível, incapacidade ou morte inesperada cuja ocorrência serve como sinal de alerta de que a qualidade terapêutica ou prevenção deve ser questionada. Entende-se que todas as vezes em que isto ocorra o sistema de vigilância deve ser acionado para que o evento seja investigado e as medidas de prevenção adotadas. A instituição de unidades de saúde sentinelas tem sido muito utilizada no Brasil para a vigilância das doenças infecciosas e parasitárias que demandam internamento hospitalar. O monitoramento de grupos-alvos, através de exames periódicos, é de grande valor na área de prevenção de doenças ocupacionais. Mais recentemente, tem-se trabalhado no desenvolvimento da vigilância de espaços geográficos delimitados em centros urbanos, denominado vigilância de áreas sentinelas. Diagnóstico de casos A credibilidade do sistema de notificação depende, em grande parte, da capacidade dos serviços locais de saúde – responsáveis pelo atendimento dos casos – diagnosticarem corretamente as doenças e agravos. Para isso, os profissionais deverão estar tecnicamente capacitados e dispor de recursos complementares para a confirmação da suspeita clínica. A correta e oportuna realização do diagnóstico e tratamento assegura a confiança da população em relação aos serviços, contribuindo para a eficiência do sistema de vigilância. Normatização A definição de normas técnicas é imprescindível para a uniformização de procedimentos e a comparação de dados e informações produzidos pelo sistema de vigilância. Essas normas devem primar pela clareza e constar de manuais, ordens de serviço, materiais instrucionais e outros, disponíveis nas unidades do sistema. Tem especial importância a definição de caso de cada doença ou agravo, visando padronizar os critérios diagnósticos para a entrada e classificação final dos casos no sistema. Em geral, os casos são classificados como suspeitos, compatíveis ou confirmados (laboratorialmente ou por outro critério), o que pode variar segundo a situação epidemiológica específica de cada doença. Definições de caso devem ser modificadas ao longo do tempo, por alterações na epidemiologia da própria doença, para atender necessidades de ampliar ou reduzir a sensibilidade ou especificidade do sistema, em função dos objetivos de intervenção e, ainda, para adequarem-se às etapas e metas de um programa especial de controle. Como exemplo, o programa de erradicação da poliomielite adotou, ao longo de seu curso, diferentes critérios para definir caso suspeito, compatível, provável ou confirmado. As normas técnicas devem estar compatibilizadas em todos os níveis do sistema de 28 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Vigilância Epidemiológica vigilância, para possibilitar a realização de análises consistentes, qualitativa e quantitativamente. Nesse sentido, a adaptação das orientações de nível central, para atender realidades estaduais diferenciadas, não deve alterar as definições de caso, entre outros itens que exigem padronização. O mesmo deve ocorrer com as doenças e agravos de notificação estadual exclusiva, em relação às normas de âmbito municipal. Retroalimentação do sistema 1 Um dos pilares do funcionamento do sistema de vigilância, em qualquer de seus níveis, é o compromisso de responder aos informantes, de forma adequada e oportuna. Fundamentalmente, essa resposta – ou retroalimentação – consiste no retorno regular de informações às fontes produtoras, demonstrando a sua contribuição no processo. O conteúdo da informação fornecida deve corresponder às expectativas criadas nas fontes, podendo variar desde a simples consolidação dos dados até análises epidemiológicas complexas correlacionadas com ações de controle. A credibilidade do sistema depende de que os profissionais de saúde e as lideranças comunitárias se sintam participantes e contribuintes. A retroalimentação do sistema materializa-se na disseminação periódica de informes epidemiológicos sobre a situação local, regional, estadual, macrorregional ou nacional. Essa função deve ser estimulada em cada nível de gestão, valendo-se de meios e canais apropriados. A organização de boletins informativos, destinados a dirigentes com poder de decisão, pode auxiliar na obtenção de apoio institucional e material para a investigação e controle de eventos sanitários. Além de motivar os notificantes, a retroalimentação do sistema propicia a coleta de subsídios para reformular normas e ações nos seus diversos níveis, assegurando a continuidade e aperfeiçoamento do processo. Avaliação dos sistemas de vigilância epidemiológica O sistema de vigilância epidemiológica mantém-se eficiente quando seu funcionamento é aferido regularmente, para correções de rumo oportunas. A avaliação do sistema presta-se, ainda, para demonstrar os resultados obtidos com a ação desenvolvolvida, que justifiquem os recursos investidos em sua manutenção. Expressa-se a importância de um problema de saúde pública pelos seus indicadores de morbidade, mortalidade, incapacidade e custos atribuídos. Nesse sentido, o reconhecimento da função de vigilância decorre, em última análise, da capacidade demonstrada em informar com precisão, a cada momento, a situação epidemiológica de determinada doença ou agravo, as tendências esperadas, o impacto das ações de controle efetivadas e a indicação de outras medidas necessárias. Os resultados do conjunto de ações desenvolvidas no sistema são também medidos pelos benefícios sociais e econômicos decorrentes, em termos de vidas poupadas, casos evitados, custos assistenciais reduzidos, etc. Informações como essas devem ser contrapostas às despesas operacionais do sistema. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 29 Vigilância Epidemiológica A manutenção em funcionamento de um sistema de vigilância envolve variadas e complexas atividades, que devem ser acompanhadas e avaliadas continuamente, com vistas a aprimorar a qualidade, eficácia, eficiência e efetividade das ações. Avaliações periódicas devem ser realizadas em todos os níveis, com relação aos seguintes aspectos, entre outros: atualidade da lista de doenças e agravos mantidos no sistema; pertinência das normas e instrumentos utilizados; cobertura da rede de notificação e participação das fontes que a integram; funcionamento do fluxo de informações; abrangência dos tipos de dados e das bases informacionais utilizadas; organização da documentação coletada e produzida; investigações realizadas e sua qualidade; informes analíticos produzidos, em quantidade e qualidade; retroalimentação do sistema, quanto a iniciativas e instrumentos empregados; composição e qualificação da equipe técnica responsável; interação com as instâncias responsáveis pelas ações de controle; interação com a comunidade científica e centros de referência; condições administrativas de gestão do sistema; e custos de operação e manutenção. As medidas quantitativas de avaliação de um sistema de vigilância epidemiológica incluem sensibilidade, especificidade, representatividade e oportunidade; e as qualitativas, simplicidade, flexibilidade e aceitabilidade. Sensibilidade é a capacidade de o sistema detectar casos; especificidade expressa a capacidade de excluir os “não-casos”. A representatividade diz respeito à possibilidade de o sistema identificar todos os subgrupos da população onde ocorrem os casos. A oportunidade refere-se à agilidade do fluxo do sistema de informação. A simplicidade deve ser utilizada como princípio orientador dos sistemas de vigilância, tendo em vista facilitar a operacionalização e reduzir os custos. A flexibilidade se traduz pela capacidade de adaptação do sistema a novas situações epidemiológicas ou operacionais (inserção de outras doenças, atuação em casos emergenciais, implantação de normas atualizadas, incorporação de novos fatores de risco, etc.), com pequeno custo adicional. A aceitabilidade se refere à disposição de indivíduos, profissionais ou organizações, participarem e utilizarem o sistema. Em geral, a aceitação está vinculada à importância do problema e à interação do sistema com os órgãos de saúde e a sociedade em geral (participação das fontes notificantes e retroalimentação). Perspectivas Uma das características dos sistemas de vigilância epidemiológica é estar permanentemente acompanhando o desenvolvimento científico e tecnológico por meio da articulação com a sociedade científica e formação de comitês técnicos assessores. Essa articulação é importante por possibilitar a atualização dinâmica das suas práticas mediante a incorporação de novas metodologias de trabalho, avanços científicos e tecnológicos de prevenção (imunobiológicos, fármacos, testes diagnósticos, etc.) e aprimoramento das estratégias operacionais de controle. A rápida evolução das ferramentas computacionais, aliadas à redução dos seus custos, vem possibilitando o desenvolvimento de sistemas de informações mais 30 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Vigilância Epidemiológica agéis que contribuem significativamente para tornar mais oportunas as intervenções neste campo da saúde pública. A atual política de descentralização do sistema de saúde está proporcionando um salto qualitativo para a reorganização dos sistemas locais de vigilância epidemiológica (Anexo 1). As secretarias estaduais estão, cada vez mais, deixando de desempenhar o papel de executoras para assumir as responsabilidades de coordenação, supervisão e monitoramento das ações. Os profissionais de saúde têm como desafio atual trabalhar para o desenvolvimento da consciência sanitária dos gestores municipais dos sistemas de saúde, para que passem a priorizar as ações de saúde pública e trabalhem na perspectiva de desenvolvimento da vigilância da saúde, que tem como um dos seus pilares de atuação a vigilância epidemiológica de problemas de saúde prioritários, em cada espaço geográfico. Nesta perspectiva, descreve-se no Anexo 2 deste capítulo o novo modelo de organização do sistema de vigilância epidemiológica, com a definição das principais atribuições das três esferas de governo. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 1 31 Vigilância Epidemiológica Anexo 1 Portaria nº 2.325/GM Em, 8 de dezembro de 2003 Define a relação de doenças de notificação compulsória para todo o território nacional. O MINISTRO DE ESTADO DA SAÚDE, no uso de suas atribuições, e tendo em vista o disposto no art. 8º, inciso I, do Decreto nº 78.231, de 12 de agosto de 1976, e na Portaria nº 95/2001 do Ministério da Saúde, que regulamentam a notificação compulsória de doenças no País, e ainda considerando a necessidade de regulamentar os fluxos e a periodicidade dessas informações, RESOLVE: Art. 1º Os casos suspeitos ou confirmados das doenças constantes no Anexo I desta Portaria são de notificação compulsória às Secretarias Municipais e Estaduais de Saúde e ao Ministério da Saúde. Parágrafo único. A ocorrência de agravo inusitado à saúde, independentemente de constar desta relação, deverá também ser notificada imediatamente às autoridades sanitárias mencionadas no caput deste artigo. Art. 2º A definição de caso, o fluxo e instrumentos de notificação para cada doença relacionada no Anexo I desta Portaria deverão obedecer à padronização definida pela Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde – SVS/MS. Art. 3º Os gestores municipais e estaduais do Sistema Único de Saúde poderão incluir outras doenças e agravos no elenco de doenças de notificação compulsória, em seu âmbito de competência, de acordo com o quadro epidemiológico local. Parágrafo único. A inclusão de outras doenças e agravos deverá ser definida conjuntamente entre os gestores estaduais e municipais e a SVS/MS. Art. 4º Fica delegada competência ao Secretário de Vigilância em Saúde para editar normas regulamentadoras desta Portaria. Art. 5º Fica revogada a Portaria nº 1.943/GM, de 18 de outubro de 2001, publicada no DOU nº 204, Seção 1, pág. 35, de 24 de outubro de 2001. Art. 6º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação. HUMBERTO COSTA 32 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Vigilância Epidemiológica Anexo I. Lista nacional de agravos de notificação compulsória Botulismo 1 Carbúnculo ou “antraz” Cólera Coqueluche Leishmaniose tegumentar americana Leishmaniose visceral Leptospirose Malária Dengue Difteria Doença de Chagas (casos agudos) Doenças meningocócicas e outras meningites Meningite por Haemophilus influenzae Peste Poliomielite Paralisia flácida aguda Esquistossomose (em área não-endêmica) Febre amarela Febre do Nilo Febre maculosa Raiva humana Rubéola Síndrome da rubéola congênita Sarampo Febre tifóide Hanseníase Hantaviroses Hepatites virais Sífilis congênita Síndrome da imunodeficiência adquirida (aids) Síndrome respiratória aguda grave Tétano Infeccção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) em gestantes e crianças expostas ao risco de transmissão vertical Tularemia Tuberculose Varíola Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 33 Vigilância Epidemiológica Anexo 2 O Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SNVE) compreende o conjunto articulado de instituições do setor público e privado, componente do Sistema Único de Saúde (SUS), que, direta ou indiretamente, notifica doenças e agravos, presta serviços a grupos populacionais ou orienta a conduta a ser tomada para o controle dos mesmos. Reorganização do Sistema de Vigilância Epidemiológica: desde a implantação do SUS, o SNVE vem passando por profunda reorganização operacional, para adequar-se aos princípios de descentralização e de integralidade da atenção à saúde. Esse processo foi bastante impulsionado a partir das Portarias nº 1.399/GM, de 15/12/99, e nº 950, de 23/12/99. Estes instrumentos legais instituíram o repasse fundo-a-fundo dos recursos do governo federal para o desenvolvimento das atividades de epidemiologia, vigilância e controle de doenças, rompendo os mecanismos de repasses conveniais e por produção de serviços. Além disso, estabeleceu os requisitos e atividades mínimas de responsabilidade municipal, a definição do teto de recursos financeiros e a transferência de recursos humanos dos níveis federal e estadual para o municipal. A definição do teto financeiro para estados e municípios considerou: diferenças epidemiológicas regionais e operacionais (três diferentes estratos); valores diferenciados, de acordo com a extensão territorial do município; e acréscimo de um valor fixo per capita para os municípios que assumem a gestão das ações de vigilância e controle de doenças. As referidas portarias estabelecem as competências da União, estados, Distrito Federal e municípios; as condições para certificação dos diferentes níveis, na gestão das ações de epidemiologia e controle de doenças; a PPI (Programação Pactuada Integrada) como eixo de negociação das ações desta área, a forma de repasse fundo-a-fundo, a partir da certificação dos estados e municípios; descentralizam as atividades de controle de endemias, anteriormente sob a responsabilidade executiva da Funasa; e recomendam a articulação dos serviços de vigilância epidemiológica com o Programa Saúde da Família, entre outras disposições. São reconhecidas as dificuldades existentes nos municípios para assegurar o pleno desenvolvimento de um sistema de vigilância epidemiológica sensível e efetivo. Há insuficiência de recursos humanos, resistências institucionais ao processo de descentralização, incipiente capacidade instalada para diagnóstico, investigação e implementação de ações de controle e, ainda, limitações dos recursos disponíveis para o setor saúde. Não obstante, os instrumentos legais específicos instituídos representam importante avanço no SUS, por propiciar a capacitação e ampliação das equipes de profissionais que atuam em vigilância epidemiológica, elevando a capacidade da análise de informações e execução das ações dos municípios, conferindo maior agilidade ao desencadeamento de ações decorrentes. Os resultados das estratégias adotadas poderão ser maximizados pela atuação competente das Comissões Bipartites e dos Conselhos Sociais de cada sistema local de saúde. Além disso, a flexibilidade parcial do uso dos recursos do Teto Financeiro de Epidemiologia e Controle de Doenças pode propiciar a construção de modelos de gestão, pautados no conceito de vigilância à saúde, com vistas a impulsionar o processo de atenção integral à saúde da população brasileira. 34 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS CAPÍTULO 2 Investigação epidemiológica de casos e epidemias 2 Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias A ocorrência de casos novos de uma doença (transmissível ou não) ou agravo (inusitado ou não), passíveis de prevenção e controle pelos serviços de saúde, indica que a população está sob risco e pode representar ameaças à saúde que precisam ser detectadas e controladas ainda em seus estágios iniciais. Uma das possíveis explicações para que tal situação se concretize encontra-se no controle inadequado de fatores de risco, por falhas na assistência à saúde e/ou medidas de proteção, tornando imperativa a necessidade de seu esclarecimento para que sejam adotadas as medidas de prevenção e controle pertinentes. Nestas circunstâncias, a investigação epidemiológica de casos e epidemias constitui atividade obrigatória de qualquer sistema local de vigilância epidemiológica. A investigação epidemiológica deve ser iniciada imediatamente após a notificação de casos isolados ou agregados de doenças/agravos, quer sejam suspeitos, clinicamente declarados ou mesmo contatos, para os quais, as autoridades sanitárias considerem necessário dispor de informações complementares. 2 Investigação epidemiológica é um trabalho de campo, realizado a partir de casos notificados (clinicamente declarados ou suspeitos) e seus contatos, que tem por principais objetivos: identificar a fonte de infecção e o modo de transmissão; os grupos expostos a maior risco e os fatores de risco; bem como confirmar o diagnóstico e determinar as principais características epidemiológicas. O seu propósito final é orientar medidas de controle para impedir a ocorrência de novos casos. A necessidade de uma resposta rápida, para que as medidas de controle possam ser instituídas, muitas vezes determina que alguns procedimentos utilizados não apresentem o rigor necessário para o estabelecimento de uma relação causal. Portanto, embora a investigação epidemiológica de campo apresente diversas semelhanças com a pesquisa epidemiológica, distingue-se desta principalmente por duas diferenças importantes: • as investigações epidemiológicas de campo iniciam-se, com freqüência, sem hipótese clara. Geralmente, requerem o uso de estudos descritivos para a formulação de hipóteses que posteriormente deverão ser testadas por meio de estudos analíticos − na maioria das vezes, estudos de caso-controle; • quando ocorrem problemas agudos que implicam em medidas imediatas de proteção à saúde da comunidade, a investigação de campo deve restringir a coleta dos dados e agilizar sua análise, com vistas ao desencadeamento imediato das ações de controle. A gravidade do evento representa um fator que condiciona a urgência no curso da investigação epidemiológica e na implementação de medidas de controle. Em determinadas situações, especialmente quando a fonte e o modo de transmissão já são evidentes, as ações de controle devem ser instituídas durante ou até mesmo antes da realização da investigação. A orientação do tratamento dos pacientes e, principalmente, a definição e adequação das medidas de controle, que devem ser adotadas em tempo hábil, ou seja, antes que o evento atinja maiores dimensões, dependem fundamentalmente das informações coletadas durante a investigação. Assim, esta atividade da vigilância epidemiológica deve ser entendi- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 37 Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias da como um desafio para a resolução de um problema de saúde individual, de algum modo relacionado a outros indivíduos da comunidade e que, portanto, pode estar representando sério risco à população. Uma investigação epidemiológica envolve o exame do doente e de seus contatos, com detalhamento da história clínica e de dados epidemiológicos, além da coleta de amostras para laboratório (quando indicada), busca de casos adicionais, identificação do(s) agente(s) infeccioso(s) quando se tratar de doença transmissível, determinação de seu modo de transmissão ou de ação, busca de locais contaminados ou de vetores e identificação de fatores que tenham contribuído para a ocorrência dos casos. O exame cuidadoso do caso e de seus comunicantes é fundamental, pois, dependendo da enfermidade, pode-se identificar suas formas iniciais e instituir rapidamente o tratamento (com maior probabilidade de sucesso) ou proceder o isolamento, visando evitar a progressão da doença na comunidade. Pode-se dizer, de modo sintético, que uma investigação epidemiológica de campo consiste na repetição das etapas listadas a seguir, até que os objetivos sejam alcançados: • consolidação e análise de informações já disponíveis; • conclusões preliminares a partir dessas informações; • apresentação das conclusões preliminares e formulação de hipóteses; • definição e coleta das informações necessárias para testar as hipóteses; • reformulação das hipóteses preliminares, caso não sejam confirmadas, e comprovação da nova conjectura, caso necessária; • definição e adoção de medidas de prevenção e controle, durante todo o processo. De modo geral, quando da suspeita de doença transmissível de notificação compulsória, o profissional da vigilância epidemiológica deve buscar responder várias questões essenciais para o controle da doença. Dentre elas, destacam-se: Investigação epidemiológica Questões a serem respondidas Informações produzidas Trata-se realmente de casos da doença que se suspeita? Confirmação do diagnóstico Quais são os principais atributos individuais dos casos? Identificação de características biológicas, ambientais e sociais A partir do quê ou de quem foi contraída a doença? Fonte de infecção Como o agente da infecção foi transmitido aos doentes? Modo de transmissão Outras pessoas podem ter sido infectadas/afetadas a partir da mesma fonte de infecção? Determinação da abrangência da transmissão A quem os casos investigados podem ter transmitido a doença? Identificação de novos casos/contatos/ comunicantes Que fatores determinaram a ocorrência da doença ou podem contribuir para que os casos possam transmitir a doença a outras pessoas? Identificação de fatores de risco Durante quanto tempo os doentes podem transmitir a doença? Determinação do período de transmissibilidade 38 Como os casos encontram-se distribuídos no espaço e no tempo? Determinação de agregação espacial e/ou temporal dos casos Como evitar que a doença atinja outras pessoas ou se dissemine na população? Medidas de controle Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias O profissional responsável pela investigação epidemiológica deve estar atento para orientar seu trabalho na perspectiva de buscar respostas às questões acima referidas. Deve entender, ainda, que muitos passos desta atividade são realizados de modo simultâneo e que a ordem aqui apresentada deve-se apenas a razões didáticas. Investigação de casos de uma doença Em geral, os pacientes que apresentam quadro clínico compatível com doença incluída na lista de notificação compulsória, ou algum agravo inusitado, necessitam de atenção especial tanto da rede de assistência à saúde quanto dos serviços de vigilância epidemiológica, os quais devem ser prontamente disponibilizados. Salientam-se, portanto, os procedimentos a seguir descritos. Assistência médica ao paciente − primeira providência a ser tomada no sentido de minimizar as conseqüências do agravo para o indivíduo. Quando a doença for de transmissão pessoa a pessoa, o tratamento contribui para reduzir o risco de transmissão. Portanto, dependendo da magnitude do evento, a equipe de vigilância epidemiológica deve buscar articulação com os responsáveis pela rede de assistência à saúde, para que seja organizado o atendimento à população. Qualidade da assistência − verificar se os casos estão sendo atendidos em unidade de saúde com capacidade para prestar assistência adequada e oportuna, de acordo com as características clínicas da doença. Proteção individual − quando necessário, adotar medidas de isolamento, considerando a forma de transmissão da doença (entérica, respiratória, reversa, etc.). Proteção da população − logo após suspeita diagnóstica, adotar as medidas de controle coletivas específicas para cada tipo de doença. 2 Os fundamentos de uma investigação de campo são aplicados tanto para o esclarecimento da ocorrência de casos como de epidemias. Várias etapas são comuns a ambas situações, sendo que para a segunda alguns procedimentos complementares são necessários. Para facilitar o trabalho dos profissionais, apresenta-se em primeiro lugar o roteiro de investigação de casos, com as atividades comuns a qualquer investigação epidemiológica de campo, inclusive de epidemias. Posteriormente, são descritas as etapas específicas para esta última situação. Roteiro de investigação de casos Neste item, são descritas de forma sucinta as várias etapas de uma investigação epidemiológica. Embora apresentadas em seqüência, algumas delas são desenvolvidas paralela e simultaneamente, visto tratar-se de um processo dinâmico. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 39 Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Etapa 1. Coleta de dados sobre os casos Em geral, as unidades de saúde dispõem de formulários padronizados do Sinan (Ficha de Investigação Epidemiológica) para a maioria das doenças incluídas no sistema de vigilância epidemiológica (ver como exemplo a Ficha Epidemiológica de Dengue no Anexo 1). Quando se tratar de evento inusitado, uma ficha de investigação especial deverá ser elaborada, considerando-se as características clínicas e epidemiológicas da doença/ agravo suspeito. O preenchimento desta ficha deve ser muito cuidadoso, registrando-se com o máximo de exatidão possível as informações de todos os seus campos. O investigador poderá acrescentar novos itens que considere relevantes. O espaço reservado para “observações” deve ser utilizado para anotar informações adicionais que possam ajudar no esclarecimento do evento. Dados obtidos mediante entrevista com o paciente, familiares, médicos e outros informantes: Identificação do paciente − nome, idade, sexo, estado civil, profissão, local de trabalho e de residência, com ponto de referência; Anamnese e exame físico − data de início dos primeiros sintomas, história da moléstia atual, antecedentes mórbidos, antecedentes vacinais, mudanças de hábitos nos dias antecedentes aos sintomas e dados do exame físico; Suspeita diagnóstica − na pendência de dados complementares para firmar o diagnóstico, devem ser formuladas as principais suspeitas visando possibilitar a definição de medidas de controle preliminares e a solicitação de exames laboratoriais; Meio ambiente − depende do tipo de doença investigada. Por exemplo, se a suspeita for uma doença de veiculação hídrica são essenciais as informações sobre o sistema de abastecimento e o tratamento de água, bem como o destino de resíduos líquidos, sólidos e lixo, alagamentos, chuvas; em outros casos, podem estar envolvidos insetos vetores, inseticidas e pesticidas, etc.; Exames laboratoriais − devem ser solicitados com vistas ao esclarecimento do diagnóstico do paciente, fontes de contaminação, veículo de transmissão e pesquisa de vetores, conforme cada situação. É importante salientar que embora os exames laboratoriais representem importante contribuição para a conclusão diagnóstica, em muitas ocasiões não se faz necessário aguardar os seus resultados para dar início às medidas de controle. Etapa 2. Busca de pistas Esta é uma etapa essencial da investigação epidemiológica, pois visa buscar subsídios que permitirão responder a várias das questões formuladas. Cabe ao investigador, considerando os dados já coletados nas etapas anteriores, estabelecer que outras informações são importantes para o esclarecimento do evento, sendo relevante para este raciocínio identificar: • fontes de infecção (a exemplo de água, alimentos, ambiente insalubre, etc.); 40 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias • período de incubação do agente; • modos de transmissão (respiratória, sexual, vetorial, etc.); • faixa etária, sexo, raça e grupos sociais mais acometidos (características biológicas e sociais); • presença de outros casos na localidade (abrangência da transmissão); • possibilidade da existência de vetores ligados à transmissão da doença; • fatores de risco: época em que ocorreu (estação do ano); ocupação do indivíduo; situação de saneamento na área de ocorrência dos casos (fonte de suprimento de água, destino dos dejetos e do lixo, etc.); outros aspectos relevantes das condições de vida nas áreas de procedência dos casos (hábitos alimentares, aspectos socioeconômicos, etc.); potenciais riscos ambientais (físicos, químicos, biológicos, etc.). 2 As equipes de outras áreas devem ser acionadas para troca de informações e complementação de dados a serem utilizados nas análises (parciais e final), no sentido de permitir uma caracterização mais abrangente do evento e orientar os passos seguintes da investigação. Ou seja, a avaliação dessas e de outras variáveis, em seu conjunto, fornecerão as pistas que contribuirão para a identificação do problema e a tomada de medidas mais específicas orientadas para o seu controle. Etapa 3. Busca ativa de casos O propósito desta etapa é identificar casos adicionais (secundários ou não) ainda não notificados ou aqueles oligossintomáticos que não buscaram atenção médica, e tem como finalidade: • tratar adequadamente esses casos; • determinar a magnitude e extensão do evento; • ampliar o espectro das medidas de controle. Para isso, deve-se identificar e proceder a investigação de casos similares no espaço geográfico onde houver suspeita da existência de contatos e/ou fonte de contágio ativa. Esta busca de casos pode ser restrita a um domicílio, rua ou bairro e/ou ser realizada em todas as unidades de saúde (centros, postos de saúde, consultórios, clínicas privadas, hospitais, laboratórios, etc.), ou ainda ultrapassar as barreiras geográficas de municípios ou estados, conforme as correntes migratórias ou características dos veículos de transmissão. Etapa 4. Processamento e análises parciais dos dados Na medida em que se dispor de novos dados/informações, deve-se sempre proceder análises parciais visando definir o passo seguinte, até que a conclusão da investigação e as medidas de controle tenham se mostrado efetivas. A consolidação, análise e interpretação dos dados disponíveis devem considerar as características de pessoa, tempo, lugar e os aspectos clínicos e epidemiológicos, para a formulação de hipóteses quanto ao diagnóstico clínico, fonte de transmissão, potenciais riscos ambientais e efetividade das medidas de controle adotadas até o momento. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 41 Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Quando a investigação não se referir a casos isolados, os dados colhidos deverão ser consolidados em tabelas, gráficos, mapas da área em estudo, fluxos de pacientes e outros. Essa disposição fornecerá uma visão global do evento, permitindo a avaliação de acordo com as variáveis de tempo, espaço e pessoas (quando? onde? quem?), possível relação causal (por quê?), e deverá ser comparada com a informação referente a períodos semelhantes de anos anteriores. Uma vez processados, os dados deverão ser analisados criteriosamente. Quanto mais oportuna e adequada for a análise, maior será a efetividade desta atividade, pois orientará com mais precisão o processo de decisão-ação. Etapa 5. Encerramento de casos Nesta etapa da investigação epidemiológica, as fichas epidemiológicas de cada caso devem ser analisadas visando definir qual critério (clínico-epidemiológico-laboratorial; clínico-laboratorial; clínico-epidemiológico) foi ou será empregado para o diagnóstico final, considerando as definições de caso específicas para cada doença, de acordo com as instruções constantes neste Guia. Etapa 6. Relatório final Os dados da investigação deverão ser sumarizados em um relatório que inclua a descrição do evento (todas as etapas da investigação), destacando-se: • causa da ocorrência, indicando, inclusive, se houve falhas da vigilância epidemiológica e/ou dos serviços de saúde e quais providências foram adotadas para sua correção; • se as medidas de prevenção implementadas em curto prazo estão sendo executadas; • descrição das orientações e recomendações, a médio e longo prazos, a serem instituídas tanto pela área de saúde quanto de outros setores; • alerta às autoridades de saúde dos níveis hierárquicos superiores, nas situações que coloquem sob risco outros espaços geopolíticos. Em situações de eventos inusitados, após a coleta dos dados dos primeiros casos, deve-se padronizar o conjunto de manifestações clínicas e evidências epidemiológicas, definindo-se o que será considerado como “caso”. Este documento deverá ser enviado aos profissionais que prestaram assistência médica aos casos, bem como aos participantes da investigação clínica e epidemiológica, representantes da comunidade, autoridades locais, administração central dos órgãos responsáveis pela investigação e controle do evento. Investigação de surtos e epidemias Os primeiros casos de uma epidemia, em uma determinada área, sempre devem ser submetidos à investigação em profundidade. A magnitude, extensão, natureza do evento, 42 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias forma de transmissão e tipo de medidas de controle indicadas (individuais, coletivas ou ambientais) são alguns elementos que orientam a equipe sobre a necessidade de investigar todos ou apenas uma amostra dos casos. O principal objetivo da investigação de uma epidemia ou surto de determinada doença infecciosa é identificar formas de interromper a transmissão e prevenir a ocorrência de novos casos. As epidemias também devem ser encaradas como experimentos naturais, cuja investigação permite a identificação de novas questões a serem objeto de pesquisas, e seus resultados poderão contribuir para o aprimoramento das ações de controle. É essencial a detecção precoce de epidemias/surtos para que as medidas de controle sejam adotadas oportunamente, de modo que grande número de casos e óbitos possam ser prevenidos. Além da prevenção de novos casos e surtos, a investigação desse tipo de evento pode contribuir para a descoberta de novos agentes, novas doenças e novos tratamentos, além de ampliar o conhecimento sobre novas doenças e as já conhecidas e fazer com que a população passe a ter mais confiança no serviço público de saúde. 2 Epidemia – elevação do número de casos de uma doença ou agravo, em determinado lugar e período de tempo, caracterizando de forma clara um excesso em relação à freqüência esperada. Surto – tipo de epidemia em que os casos se restringem a uma área geográfica pequena e bem delimitada ou a uma população institucionalizada (creches, quartéis, escolas, etc.). Planejamento do trabalho de campo Antes de iniciar o trabalho de investigação, os profissionais da vigilância epidemiológica deverão procurar apreender o conhecimento disponível acerca da doença que se suspeita estar causando a epidemia, e ainda: • verificar o material e equipamentos necessários para realizar a investigação; • prever a necessidade de viagens, insumos e outros recursos que dependam de aprovação de terceiros, para as devidas providências; • definir, junto aos superiores, seus papéis no processo de investigação (executor, assessor da equipe local, líder da investigação, etc.); • constituir equipes multiprofissionais, se necessário. Nestes casos, o problema e as atividades específicas a serem desenvolvidas deverão ser discutidos previamente em conjunto, bem como as respectivas atribuições; • a equipe deve partir para o campo com informações acerca do encaminhamento de pacientes para tratamento (unidades básicas e de maior complexidade, quando indicado), material para coleta de amostras biológicas, roteiro de procedimento de coletas, procedimentos para transporte de amostras, laboratórios de referências, dentre outras. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 43 Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Roteiro de investigação de epidemia ou surto Etapa 1. Confirmação do diagnóstico da doença Quando da ocorrência de uma epidemia, torna-se necessário verificar se a suspeita diagnóstica inicial enquadra-se na definição de caso suspeito ou confirmado da doença em questão, à luz dos critérios definidos pelo sistema de vigilância epidemiológica (vide capítulos específicos deste Guia). Para isso, deve-se proceder, imediatamente, as etapas 1 e 2 apresentadas no roteiro de investigação de casos, pois os dados coletados nestas etapas servirão tanto para confirmar a suspeita diagnóstica como para fundamentar os demais passos da investigação da epidemia. Deve-se estar atento para que, na definição de caso, não seja incluída uma exposição ou fator de risco que se deseja testar. Em geral, no início da investigação, emprega-se uma definição de caso mais sensível, que abrange casos confirmados e prováveis (e até mesmo os possíveis), a fim de facilitar a identificação, a extensão do problema e os grupos populacionais mais atingidos, processo que pode levar a hipóteses importantes. Somente quando as hipóteses se tornarem mais claras o investigador utilizará uma definição mais específica e restrita. Neste caso, por terem sido excluídos os “falsos-positivos”, será possível testar hipóteses aplicando o instrumental da epidemiologia analítica. Para doenças incluídas no Sistema de Vigilância Epidemiológica utilizam-se as definições padronizadas encontradas nos itens específicos deste Guia. Quando se tratar de agravo inusitado, após a coleta de dados clínicos e epidemiológicos, estabelece-se uma definição de “caso” com sensibilidade suficiente para identificar o maior número de suspeitos. Esta definição também poderá ser aperfeiçoada no decorrer da investigação, quando já se dispuser de mais informações sobre as manifestações clínicas da doença, área de abrangência do evento, grupos de risco, etc. De acordo com a suspeita, um plano diagnóstico deve ser definido para orientar a coleta de material para exames laboratoriais, envolvendo, a depender da doença, amostra proveniente dos indivíduos (fezes, sangue, líquor, etc.) e do ambiente (água, vetores, mechas, etc.). Etapa 2. Confirmação da existência de epidemia ou surto O processo de confirmação de uma epidemia ou surto envolve o estabelecimento do diagnóstico da doença e do estado epidêmico − o qual diz respeito a uma situação dinâmica e transitória, ainda que possa ser prolongada, caracterizada pela ocorrência de um número infreqüente de casos em dado momento e lugar. Considerando-se que freqüência inusitada, tempo e lugar são aspectos fundamentais para estabelecer fidedignamente um estado epidêmico, torna-se imprescindível conhecer a freqüência habitual (nível endêmico) desses casos naquele lugar e período. A confirmação decorre da comparação dos coeficientes de incidência (ou do número de casos novos) da doença no momento da ocorrência do evento investigado com aqueles usualmente verificados na mesma população (ver Anexo 2). 44 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Quando do diagnóstico de uma epidemia, faz-se importante observar os cuidados necessários para o descarte de uma série de outras circunstâncias que não uma epidemia, as quais podem explicar porque o número de casos da doença superou o valor esperado, tais como: • mudanças na nomenclatura da doença; • alteração no conhecimento da doença que resulte no aumento da sensibilidade diagnóstica; • melhoria do sistema de notificação; • variação sazonal; • implantação ou implementação de programa de saúde que resulte no aumento da sensibilidade de detecção de casos. 2 Breve análise da tendência temporal da doença deve ser realizada imediatamente, para que se disponha de uma síntese de sua história natural (a doença vinha apresentando tendência estacionária, ascendente, descendente ou com oscilação periódica?). Etapa 3. Caracterização da epidemia As informações disponíveis devem ser organizadas de forma a permitir analisar algumas características e responder questões relativas à sua distribuição no tempo, lugar e pessoa. Por exemplo: Relativas ao tempo − Qual o período de duração da epidemia? − Qual o período provável de exposição? Como o período de incubação das doenças é variável, a curva epidêmica (representação gráfica da distribuição dos casos ocorridos durante o período epidêmico, de acordo com a data do início da doença) expressa a dispersão dos períodos de incubação individuais, em torno de uma média na qual a maioria dos casos está agrupada (ver Anexos 3 e 4). Um aspecto importante a ser considerado na construção desta curva é a escolha do intervalo de tempo adequado para o registro dos casos. Na escolha desse intervalo, um critério útil é que o mesmo se situe entre 1/8 e 1/4 do período de incubação da doença em questão. Relativas ao lugar (distribuição espacial) − Qual a distribuição geográfica predominante? Bairro de residência, escola, local de trabalho ou outra? A análise espacial permite identificar se o surto/epidemia afeta uniformemente toda a área, ou se há locais que concentram maior número de casos e de maior risco. Por exemplo, quando a distribuição apresenta uma concentração dos mesmos em determinado ponto, isto sugere que a água, alimento ou outras fontes comuns, possam ser os possíveis veículos de transmissão. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 45 Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Relativas às pessoas − Quais são os grupos etários e sexo mais atingidos? − Quais são os grupos, segundo o sexo e idade, expostos a maior risco de adoecer? − Que outras características distinguem os indivíduos afetados da população geral? A descrição dos casos deve considerar as características individuais (sexo, idade, etnia, estado imunitário, estado civil), atividades (trabalho, esporte, práticas religiosas, costumes, etc.) e condições de vida (estrato social, condições ambientais, situação econômica). A caracterização de uma epidemia é muito útil para a elaboração de hipóteses com vistas à identificação das fontes e modos de transmissão, além de auxiliar na determinação de sua duração. Etapa 4. Formulação de hipóteses preliminares Embora, na realidade, o desenvolvimento de conjecturas ocorra desde o momento de conhecimento da epidemia, a leitura das informações relativas à pessoa, tempo e lugar possibilita a formulação de hipóteses mais consistentes e precisas. As hipóteses devem ser testáveis, uma vez que esta avaliação constitui uma das etapas da investigação epidemiológica. Hipóteses provisórias são elaboradas com base nas informações obtidas anteriormente (análise da distribuição segundo características de pessoa, tempo e lugar) e na análise da curva epidêmica, já que esta representa um fato biológico a partir do qual pode-se extrair uma série de conclusões, tais como: se a disseminação da epidemia ocorreu por veículo comum, por transmissão pessoa a pessoa ou por ambas as formas; provável período de exposição dos casos às fontes de infecção; período de incubação; provável agente causal. Pela curva epidêmica do evento pode-se perceber se o período de exposição foi curto ou longo, se a epidemia está em ascensão ou declínio e se tem períodos (dias, meses) de remissão e recrudescimento de casos, dentre outras informações. No contexto da investigação de uma epidemia, as hipóteses são formuladas com vistas a determinar a fonte de infecção, o período de exposição dos casos à mesma, o modo de transmissão, a população exposta a um maior risco e o agente etiológico. De maneira geral, a hipótese relativa à fonte de infecção e modo de transmissão pode ser comprovada quando: • a taxa de ataque para expostos for maior que para não expostos e a diferença entre elas, estatisticamente significante; • nenhum outro modo de transmissão pode determinar a ocorrência de casos com mesma distribuição geográfica e etária. Avaliação de hipóteses – quando as evidências epidemiológicas, clínicas, laboratoriais e ambientais são suficientes para apoiar as hipóteses, torna-se desnecessário o seu teste formal pois os fatos estabelecidos são suficientes. Entretanto, quando as circunstâncias são 46 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias menos evidentes, deve-se lançar mão da epidemiologia analítica cuja característica principal é a utilização de um grupo de comparação. Nesta circunstância podem ser empregados os estudos tipo caso-controle. Ressalte-se que estas estratégias são também utilizadas para o refinamento de hipóteses inicialmente não bem fundamentadas ou quando da necessidade de estudos adicionais. Etapa 5. Análises parciais Em cada etapa da investigação e com periodicidade definida de acordo com a magnitude e gravidade do evento (diária, semanal, mensal), deve-se realizar os seguintes procedimentos: • consolidação dos dados disponíveis, de acordo com as características de pessoa, tempo e lugar; • análises preliminares dos dados clínicos e epidemiológicos; • discussão das análises com outros profissionais; • formulação de hipóteses quanto ao diagnóstico clínico, fonte de transmissão e potenciais riscos ambientais; • identificação de informações adicionais, necessárias para a elucidação das hipóteses levantadas e a continuidade da investigação; • identificação de informações adicionais, necessárias para a avaliação da efetividade das medidas de controle adotadas; • definição de outras medidas de controle, quando necessárias. 2 Etapa 6. Busca ativa de casos Objetiva reconhecer e proceder a investigação de casos similares no espaço geográfico onde haja suspeita da existência de contatos e/ou fonte de contágio ativa, cuja abrangência, conforme descrito na investigação de caso, é mais ou menos ampla em função dos dados coletados nas etapas anteriores. Caso necessário, as equipes de outras áreas devem ser acionadas para troca de informações e complementação de dados a serem utilizados nas análises (parciais e final), visando caracterizar o evento e orientar os novos passos da investigação. Etapa 7. Busca de dados adicionais Quando necessário, pode-se conduzir uma investigação minuciosa de todos os casos ou de amostra representativa dos mesmos, visando esclarecer/fortalecer as hipóteses iniciais. Etapa 8. Análise final Os dados coletados são consolidados em tabelas, gráficos, mapas da área em estudo e fluxos de pacientes. Essa disposição fornece uma visão global do evento, permitindo a avaliação de acordo com as variáveis de tempo, espaço, pessoa (quando? onde? quem?) e a relação causal (por quê?) que deverá ser comparada com períodos semelhantes de anos anteriores. É importante lembrar que em situações epidêmicas, além das freqüências simples, torna-se necessário calcular os indicadores epidemiológicos (coeficientes de incidência, Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 47 Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias letalidade e mortalidade). Uma vez processados, os dados deverão ser analisados criteriosamente. Quanto mais oportuna e adequada for a análise, maiores serão as possibilidades de precisão, sob bases firmes, do processo de decisão-ação. Caso as informações não sejam suficientes para uma conclusão sobre o mecanismo causal do evento, em algumas situações deve-se proceder ou sugerir a realização de pesquisa epidemiológica (caso-controle, prevalência) capaz de verificar a existência de associações ou mesmo testar as hipóteses levantadas. Etapa 9. Medidas de controle Logo após a identificação das fontes de infecção, modo de transmissão e população exposta a elevado risco de infecção, devem ser recomendadas as medidas adequadas de controle, bem como um relatório circunstanciado, a ser amplamente divulgado a todos os profissionais de saúde envolvidos no processo. Na realidade, quando se conhece a fonte de um surto/epidemia, as medidas de controle devem ser imediatamente implementadas, pois este é o objetivo primordial da maioria das investigações epidemiológicas. As medidas podem ser direcionadas para qualquer elo da cadeia epidemiológica, quer seja o agente, fonte ou reservatórios específicos, visando interromper a cadeia de transmissão ou reduzir a susceptibilidade do hospedeiro. Etapa 10. Relatório final Os dados da investigação devem ser sumarizados em relatório que contenha a descrição do evento (todas as etapas da investigação), incluindo tabelas e gráficos, e as principais conclusões e recomendações, das quais destacam-se: • situação epidemiológica atual do agravo; • causa da ocorrência, indicando, inclusive, se houve falhas da vigilância epidemiológica e/ou dos serviços de saúde e que providências foram ou serão adotadas para a devida correção; • se as medidas de prevenção implementadas a curto prazo estão sendo executadas; • descrição das orientações e recomendações, a médio e longo prazos, a serem instituídas tanto pela área de saúde quanto por outros setores; • alerta às autoridades de saúde dos níveis hierárquicos superiores, naquelas situações que coloquem sob risco outros espaços geopolíticos. Etapa 11. Divulgação O relatório deve ser enviado aos profissionais que prestaram assistência médica aos casos, aos participantes da investigação clínica e epidemiológica, aos representantes da comunidade, às autoridades locais e à administração central dos órgãos responsáveis pela investigação e controle do evento. Sempre que possível, quando se tratar de surto ou agravo inusitado, deve-se divulgar, por boletins, um resumo da investigação. 48 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Características da investigação de surtos de doença transmitida por alimento (DTA) Os surtos de doença transmitida por alimento (DTA) possuem características que demandam procedimentos especiais. Muitas vezes, é difícil estabelecer a etiologia da doença, pois em geral estes surtos são produzidos por vários agentes etiológicos e se expressam por variadas manifestações clínicas. Por esta razão, diferentemente das outras doenças também importantes para o Sistema de Vigilância Epidemiológica, não há definições de casos preestabelecidas. A notificação de casos só se torna obrigatória quando da suspeita de ocorrência de surto. Os propósitos fundamentais desta investigação são determinar as circunstâncias nas quais o surto foi produzido e obter informações que possam orientar as medidas necessárias para evitar novos casos. As atividades desenvolvidas envolvem, basicamente, comensais, definição de caso e coleta de amostras clínicas, bromatológicas e toxicológicas, além da inspeção sanitária. Como em outras situações epidêmicas, os dados devem ser continuamente analisados para possibilitarem, paralelamente à investigação, a adoção de medidas de prevenção e controle (processo informação-decisão-ação). O DTA será registrado no formulário Inquérito Coletivo de Surto de Doença Transmitida por Alimento, disponível no Sinan. Investigações deste tipo de evento envolvem, obrigatoriamente, desde o primeiro momento, as vigilâncias epidemiológica e sanitária, e na maioria das vezes profissionais de outros setores, tais como do Ministério da Agricultura, da indústria de alimentos (empresas produtoras, fornecedoras e distribuidoras) e de companhias de abastecimento de água, dentre outros. As seguintes orientações devem ser feitas no momento da notificação: • evitar que os alimentos suspeitos continuem a ser consumidos ou vendidos; • guardar sob refrigeração todas as sobras de alimentos, na forma em que se encontram acondicionados, até a chegada do grupo encarregado da investigação; • preservar as embalagens e respectivos acondicionamentos, quando a suspeita estiver relacionada a produtos industrializados; • orientar os doentes a não se automedicarem, mas, sim, a procurarem o serviço de saúde. 2 Planejamento das atividades Por se tratar de evento muitas vezes grave, súbito e de curta duração, é essencial o rápido e adequado planejamento das atividades a serem desenvolvidas, logo que se tenha o conhecimento da suspeita, atentando-se especificamente para: • avaliar o quadro clínico dos doentes, principalmente dos mais graves, visando a obtenção de informações que orientem as hipóteses diagnóstica e terapêutica; • providenciar o meio de transporte (se necessário), os formulários e o material necessário à coleta de amostras; Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 49 Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias • constituir uma equipe para participar da investigação e discutir, conjuntamente, sobre o problema e as atividades a serem desencadeadas; • informar a ocorrência do surto ao laboratório de referência para que prepare-se para receber e processar as amostras; • iniciar rapidamente a investigação e coletar as amostras antes que os doentes recebam medicação e os alimentos suspeitos sejam descartados; • informar nível hierárquico superior. Em surtos de grande magnitude, a investigação pode ser feita por amostragem. Na impossibilidade de realizar tal procedimento, deve-se entrevistar o maior número possível de comensais. Roteiro da investigação de DTA A metodologia da investigação epidemiológica é a mesma apresentada para os casos e epidemias. A seguir, detalhamos informações e procedimentos específicos para as etapas de eventos relacionados à toxiinfecção alimentar. Etapas 1 e 2 Confirmação do diagnóstico da doença e existência do surto: diagnosticar a doença e identificar o(s) agente(s) etiológico(s) − obter dados sobre os comensais (doentes e não doentes), alimentos ingeridos (tipo, procedência, manipulação, acondicionamento), definição de caso para o evento específico (considerando quadro clínico, período de incubação, tempo e lugar), coleta de amostras clínicas (de doentes, não doentes, manipuladores usuais e não usuais), inspeção sanitária (inspeção da cozinha e de manipuladores) e coleta de amostras bromatológicas e toxicológicas. Em seguida, verificar: • duração do período de incubação; • sintomas predominantes; • taxa de ataque global no grupo afetado; • circunstâncias que envolveram o acidente. Para a identificação do agente causal, pode-se lançar mão de duas estratégias: • reduzir ao mínimo a lista de alimentos suspeitos, considerando cuidadosamente sua qualidade e as circunstâncias: bom meio de cultura (leite, cremes, etc.); exposição a temperatura ambiente; manipulação inadequada; oportunidades de contaminação; tempo transcorrido entre a manipulação e o consumo; procedência, etc; • realizar inquérito epidemiológico individual entre doentes e não doentes, incluindo coleta de material para exames (única possibilidade para se fazer diagnóstico laboratorial na ausência de sobras de alimentos). Confirmação da existência do surto – as DTA podem apresentar-se tanto sob a forma de um surto resultante de exposição maciça comum de curta duração (partilhamento de 50 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias refeição em situações especiais: casamentos, aniversários, reuniões, etc.) ou como exposição maciça comum prolongada (provocada por partida de alimento contaminado, acidente com rede de abastecimento de água, etc.). Recomenda-se que sejam investigados: • os estabelecimentos onde o alimento suspeito foi preparado e consumido, particularmente: ❯ o cardápio do dia em que ocorreu o surto; ❯ a procedência e método de preparação dos alimentos constantes do cardápio; ❯ os métodos de armazenamento dos alimentos de fácil decomposição (antes e depois de cozidos); ❯ a procedência dos alimentos servidos; ❯ a higiene e saúde dos manipuladores dos alimentos; ❯ a presença no corpo dos empregados de lesões nas mãos ou em qualquer parte descoberta ou processos supurativos da rinofaringe; ❯ a evidência da presença de insetos e roedores. 2 • as pessoas que estavam ou supunha-se estar presentes quando os alimentos suspeitos foram servidos e consumidos (anotar dados na ficha específica): ❯ identificar os alimentos ingeridos até 48 horas antes do aparecimento dos sintomas (na suspeita de febre tifóide, este período deve ser de 7-21 dias); ❯ verificar os dados clínicos e epidemiológicos. • os pacientes hospitalizados ou atendidos por médico particular: ❯ obter dados relativos a sintomas, laboratoriais e diagnóstico e tratamento. Etapas 3 e 4 Caracterização da epidemia e formulação de hipóteses preliminares: • identificar a população acometida e/ou sob risco, de acordo com a característica do evento: comensais, não comensais, população que utiliza a mesma fonte de abastecimento de água, rastreamento da rede de distribuição do(s) alimento(s) suspeito(s), identificação dos consumidores deste(s) alimento(s) segundo o local de ocorrência e registro dos casos diagnosticados considerando a data de aparecimento dos sintomas, dentre outros; • a partir dos dados coletados, formular hipóteses considerando os fatores de risco associados ao surto e a possível fonte de infecção; • coletar amostras para exames laboratoriais (bromatológicos, toxicológicos, bacteriológicos) dos indivíduos (casos e não casos) e do ambiente, orientadas pelas hipóteses inicialmente formuladas. Etapas 5, 6 e 7 Análise parcial, busca ativa de casos e de dados adicionais: • verificar se as hipóteses formuladas estão consistentes com os dados coletados e se Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 51 Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias as medidas de controle e tratamento adotadas são consonantes com a possível fonte de infecção, modo de transmissão, possível agente causal, etc. Após esta análise preliminar, determinar se há necessidade de se realizar busca ativa de casos, de acordo com as orientações dos roteiros de investigação de casos e epidemias; • contatar com a pessoa/instituição responsável pela organização do evento (se a suspeita ocorreu em casamento, aniversário, confraternização, seminário, etc.) ou com os organismos responsáveis pelo abastecimento de água e/ou produção, armazenamento e distribuição dos alimentos suspeitos. Teste de hipótese – dependendo do tipo, magnitude e abrangência do evento, muitas vezes faz-se necessário realizar um estudo de caso-controle para testar as hipóteses. Nestas situações, deve-se: • definir caso e não-caso: não incluir os fatores de risco que se deseja testar na definição de caso; • determinar o tamanho da amostra (pode ser calculado no Epi-info); • definir o instrumento de coleta de informações (que pode ser a Ficha Individual de Investigação de DTA, disponível no Sinan. Pode-se acrescentar, caso necessário, variáveis específicas ao evento); • definir e fazer treinamento rápido dos entrevistadores, para padronizar a coleta de informações; • realizar o processamento e análise dos dados; • interpretar os resultados. Quando o nível local não dispuser de profissional capacitado para desenvolver este tipo de estudo, deve-se buscar apoio nos níveis hierárquicos superiores. Etapa 8 Medidas de prevenção e controle: • evitar que os alimentos suspeitos continuem a ser consumidos, distribuídos e comercializados; • analisar e avaliar a cadeia alimentar envolvida, identificando pontos críticos para o controle; • orientar quanto à mudança no processo de manipulação, produção, acondicionamento, armazenamento e/ou conservação do alimento; • manter a educação continuada dos profissionais envolvidos no processo de produção e serviços; • estimular a implantação e implementação de normas e rotinas referentes ao assunto; • estabelecer e estimular um fluxo sistemático com outras instituições integrantes do processo, tais como Secretaria de Agricultura, universidades, Secretaria de Educação, Ação Social, Meio Ambiente, etc.; • garantir o acesso da população às informações e conhecimentos necessários à prevenção e controle dos surtos de DTA; 52 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias • manter as unidades de saúde ou demais serviços informadas sobre o andamento da investigação; • repassar informações ao público; • estimular a notificação de surtos de DTA. Etapa 9 Processamento e análise final, relatório final e divulgação. 2 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 53 Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Anexo 1 SINAN República Federativa do Brasil Ministério da Saúde DENGUE FICHA DE INVESTIGAÇÃO Dados Gerais 1 Tipo de Notificação Nº SISTEMA DE INFORMAÇÃO DE AGRAVOS DE NOTIFICAÇÃO 2 Data da Notificação 2- Individual | | | | | | | | | | DENGUE | | | | | | | A 9 0 | 10 Sexo D - dias M - meses A - anos | | | | | | | 14 Nome da mãe | | | | | | | | Código | 17 Complemento (apto., casa, ...) | | | Distrito | | | | Código (IBGE) | 23 (DDD) Telefone | | | | 19 UF Código (IBGE) 21 Bairro | 16 Número | 18 Ponto de Referência 20 Município de Residência | || | 1-Nenhuma 2-De 1 a 3 3-De 4 a 7 4-De 8 a 11 5-De 12 e mais 6- Não se aplica 9-Ignorado 1-Branca 2-Preta 3-Amarela 4-Parda 5-Indígena 9-Ignorado 15 Logradouro (rua, avenida,...) | | 12 Escolaridade (em anos de estudo concluídos) 11 Raça/Cor M - Masculino F - Feminino I - Ignorado 13 Número do Cartão SUS | | 8 Data de Nascimento | | | | | (ou) Idade 9 | 6 Data dos Primeiros Sintomas Código (CID10) 7 Nome do Paciente Dados do Caso | Código 4 Unidade de Saúde (ou outra fonte notificadora) 5 Agravo Dados de Residência | Código (IBGE) 3 Município de Notificação | | 24 Zona 1 - Urbana 2 - Rural 3 - Urbana/Rural 9 - Ignorado | | 22 CEP | | | | | | | - | | Código 25 País (se residente fora do Brasil) | | | | Dados Complementares do Caso Antecedentes Epidemiológicos 26 Data da Investigação | | | | | 27 Ocupação / Ramo de Atividade Econômica | | 28 Deslocamento (datas e locais frequentados no período de 15 dias anteriores ao início de sinais e sintomas) Data Município 29 Teve Dengue Antes? 30 Caso Sim Ano 1 - Sim 2 - Não 9 - Ignorado | | UF País 31 Vacinado Contra Febre Amarela? 1- Sim 2- Não 9- Ignorado | 32 Data da Última Dose | | | | | Sinais e Sintomas 34 Data de Início da Febre 33 Febre 1- Sim 2- Não 9- Ignorado | 37 Outros Sinais e Sintomas Dados Clínicos 1- Sim 2- Não 9- Ignorado | 35 Duração da Febre em Dias || || || Dor Retro-Orbitária Mialgia Artralgia Exantema Prostração Náuseas/Vômitos Outros:__________________ 1- Sim 2- Não 9- Ignorado Diarréia Epistaxe Gengivorragia Hematúria Petéquias Metrorragia Sangramento Gastrointestinal Outros:_________________________ 39 Derrame Cavitário 1 - Sim 2 - Não 9 - Ignorado 1- Sim 2- Não 9- Ignorado 36 Prova do Laço 1 - Positiva 2 - Negativa 3 - Não Realizada Cefaléia 38 Manifestações Hemorrágicas Espontâneas 40 Sinais de Alerta e/ou Gravidade | Ascite Derrame Pleural Derrame Pericárdico Dor Abdominal Intensa Hipotensão Arterial/Postural Manifestações Neurológicas Hepatomegalia Dolorosa Choque Hipovolêmico Insuficiência Hepática Miocardite Outros:_______________________ 41 Data do Choque ou Hipotensão | | | | | Dengue 54 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS CENEPI 02.4 30/05/01 Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Atendimento 42 Ocorreu Hospitalização? Data da Internação 43 1 - Sim 2 - Não 9 - Ignorado | | | | | 44 UF 45 Município do Hospital | | | 46 Nome do Hospital 47 | | | | | | | 48 Endereço do Hospital 50 Hematócrito (maior) 49 Data da Coleta | | | | | | | | 53 Data da Coleta | | | | | 57 Data da Coleta (1ª Amostra) | | | | | | 60 Data do Resultado (1ª Amostra) | | | | | | | | | | | | | | | | | | | Isolamento Viral | | | 1 - Reagente 2 - Não Reagente 3 - Inconclusivo 4 - Não Realizado | | | mm3 | 2 56 Plaquetas (menor) | | | | Soro 1ª Amostra 63 Tipo de Material 1 - Sim 2 - Não 9 - Ignorado 62 Colheu Material 1 - Sim 2 - Não 9 - Ignorado | 61 Data do Resultado (2ª Amostra) | | | | | | 59 Resultado 58 Data da Coleta (2ª Amostra) | | | | | 55 Data da Coleta % | 52 Plaquetas (maior) 51 Data da Coleta % | 54 Hematócrito (menor) | | | | | | Sorologia Dados do Laboratório (DDD) Telefone | | | | mm3 | Títulos IgM IgG S1 1: | | | | _________________________ S2 _________________________ 1: | | | | 64 Resultado Soro 2ª Amostra 1 - Sorotipo 1 3 - Sorotipo 3 Tecidos 2 - Sorotipo 2 4 - Sorotipo 4 5 - Não Detectado Patologia 66 Imunohistoquímica 1 - Positivo 2 - Negativo 65 Histopatologia 1 - Compatível 2 - Negativo 3 - Não Realizado PCR 67 Tipo de Amostra 68 Resultado 1 - Soro 1 - Positivo 2 - Negativo 2 - Tecidos 3 - Não Realizado Outro 69 Tipo de Amostra 1 - Soro 2 - Tecidos 70 Resultado 1 - Positivo 2 - Negativo Téc. Utilizada_____________________________ 71 Classificação Final 1 - Dengue Clássico 4 - Síndrome do Choque de Dengue 2 - Dengue com Complicações 5 - Descartado 3 - Febre Hemorrágica do Dengue - FHD 72 Critério de Confirmação/Descarte 1 - Laboratório 2 - Vinculo-Epidemiológico 73 No Caso de FHD Especificar Conclusão 1 - Grau I 2 - Grau II 3 - Grau III 4 - Grau IV Local Provável de Infecção (no período de 15 dias) 74 UF 77 Bairro 76 Município 75 País | 79 Doença Relacionada ao Trabalho 78 Distrito 1 - Sim 2 - Não 9 - Ignorado 80 Evolução do Caso 81 Data do Óbito 1 - Cura 2 - Óbito 9 - Ignorado | | | | | 82 Data do Encerramento | | | | | | | | | Investigador Observações: Dengue 83 Município/Unidade de Saúde 84 Cód. da Unid. de Saúde | 85 Nome 86 Função | | | | | 87 Assinatura CENEPI 02.4 30/05/01 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 55 Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Anexo 2 Como calcular o nível endêmico de uma doença e diagnosticar a ocorrência de uma epidemia Um dos métodos utilizados para a verificação de ocorrência de uma epidemia é o Diagrama de Controle, que consiste na representação gráfica da distribuição da média mensal e desvio-padrão dos valores da freqüência (incidência ou casos) observada, em um período de tempo (habitualmente 10 anos). A construção deste diagrama pode ser feita da seguinte forma: • verificar se a distribuição do número de casos/incidência da doença, registrado mensalmente durante os últimos anos (geralmente dez anos ou mais), apresenta grandes variações; • excluir os dados referentes a anos epidêmicos; • calcular a média aritmética e os desvios-padrão (pode ser calculado no programa Excel) de cada distribuição mensal das incidências registradas no período selecionado; • observar que os valores compreendidos entre aqueles correspondentes à média de cada mês acrescidos de 1,96 desvios-padrão e aqueles de cada média mensal menos 1,96 desvio-padrão, (distribuição normal), correspondem ao nível endêmico da doença, ou seja, o limite de variação esperada para cada mês; • representar graficamente (diagrama curvilinear) a distribuição das médias e desvios-padrão da incidência (diagrama de controle); • observar que quando os valores observados ultrapassam os do limite máximo da variação esperada, diz-se que está ocorrendo uma epidemia. Desta maneira, quando uma doença deixa de ocorrer em determinada área, o registro de um único caso pode configurar uma epidemia ou surto. Para exemplificar, são apresentados os cálculos necessários à construção do diagrama de controle, utilizando-se os dados da Tabela 1, que contém a incidência mensal de doença meningocócica por 100 mil habitantes no Brasil, de 1983 a 2000. A Tabela 1 e o diagrama apresentam a incidência média mensal, os limites superiores do diagrama de controle e a incidência mensal observada para a doença em 1994. 56 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Tabela 1. Coeficiente de incidência da doença meningocócica. Brasil, 1983-2000 Meses 83 84 85 86 87 88 89 90 91 Jan 0,08 0,08 0,06 0,11 0,15 0,12 0,14 0,24 0,22 Fev 0,08 0,07 0,05 0,08 0,11 0,11 0,13 0,16 Mar 0,1 0,07 0,05 0,1 0,17 0,14 0,15 Abr 0,08 0,08 0,06 0,07 0,15 0,18 Mai 0,12 0,11 0,07 0,1 0,17 Jun 0,11 0,09 0,06 0,11 Jul 0,11 0,11 0,07 Ago 0,11 0,1 Set 0,09 Out 92 93 94 95 96 97 98 99 00 0,2 0,22 0,29 0,27 0,28 0,34 0,28 0,23 0,24 0,17 0,19 0,23 0,21 0,23 0,28 0,26 0,22 0,22 0,16 0,2 0,18 0,25 0,29 0,27 0,37 0,33 0,31 0,29 0,24 0,2 0,17 0,18 0,19 0,22 0,36 0,28 0,28 0,31 0,31 0,25 0,25 0,18 0,17 0,24 0,25 0,21 0,23 0,36 0,31 0,39 0,36 0,36 0,35 0,29 0,25 0,16 0,22 0,27 0,26 0,23 0,25 0,31 0,41 0,47 0,43 0,43 0,43 0,36 0,26 0,17 0,17 0,3 0,31 0,3 0,3 0,29 0,36 0,49 0,49 0,53 0,48 0,45 0,33 0,3 0,07 0,15 0,12 0,29 0,27 0,28 0,28 0,29 0,34 0,44 0,45 0,5 0,42 0,33 0,28 0,28 0,08 0,06 0,12 0,13 0,17 0,2 0,32 0,28 0,28 0,3 0,4 0,43 0,38 0,4 0,31 0,24 0,32 0,08 0,1 0,07 0,13 0,15 0,15 0,2 0,28 0,3 0,29 0,29 0,32 0,37 0,38 0,3 0,31 0,23 0,28 Nov 0,09 0,09 0,06 0,12 0,13 0,17 0,19 0,24 0,21 0,2 0,24 0,31 0,32 0,3 0,28 0,27 0,2 0,24 Dez 0,06 0,07 0,05 0,1 0,11 0,17 0,15 0,22 0,2 0,21 0,22 0,27 0,27 0,26 0,29 0,23 0,19 0,22 Meses Média Desvio-padrão Limite máximo esperado Limite mínimo esperado Jan 0,1472727 0,0638891 0,2724954 0,0220501 Fev 0,1254545 0,0562785 0,2357605 0,0151486 Mar 0,1545455 0,073941 0,2994698 0,0096211 Abr 0,1380000 0,0873863 0,3092771 -0,0332771 Mai 0,1845455 0,0844232 0,3500149 0,019076 Jun 0,1881818 0,0850668 0,3549128 0,0214509 Jul 0,2263636 0,1015158 0,4253346 0,0273927 Ago 0,2090909 0,0982298 0,4016213 0,0165605 Set 0,1845455 0,0963705 0,3734316 -0,0043407 Out 0,1854545 0,0902622 0,3623685 -0,0296413 Nov 0,1581818 0,0633748 0,2823964 0,0339672 Dez 0,1418182 0,0664557 0,2720714 0,011565 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 57 2 Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Diagrama de controle da doença meningocócica, no período 1983-1993. Brasil, 1994 0,5 0,45 0,4 Casos /100 mil hab. 0,35 0,3 0,25 0,2 0,15 0,1 0,05 0 Jan Fev Mar Abr 1994 58 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Mai Jun Média Jul Ago Set Out Limite máximo esperado Nov Dez Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Anexo 3* Classificação das epidemias de acordo com sua progressão no tempo Exposição maciça comum de curta duração (epidemia explosiva) – quando os casos aparecem em rápida sucessão e curto período de tempo, a epidemia surge, aumenta de intensidade e declina, sugerindo a existência de um veículo comum de transmissão e uma exposição simultânea de vários susceptíveis. A duração máxima de todo o surto incluiu-se no período máximo de incubação (ex. surto de intoxicação alimentar). No caso de transmissão por veículo comum, devem ser identificados os seguintes períodos ou datas: pico do surto, início, fim e duração da epidemia e período provável de exposição dos casos às fontes de infecção. 2 Representação esquemática de curvas epidêmicas a) Exposição maciça comum de curta duração b) Exposição maciça comum prolongada (mais de 1 ano) período de incubação máximo c) Exposição maciça comum seguida de casos secundários d) Exposição múltipla – epidemia prolongada Exposição maciça comum prolongada – embora também seja de fonte única, a exposição dos indivíduos à mesma é prolongada. A curva é menos abrupta que a anterior e o evento, em geral, excede um período de incubação (intoxicação por uma partida de alimento contaminado; acidente com a rede de distribuição de água, etc.). Exposição maciça comum seguida de casos secundários – quando nas situações anteriores ocorrem casos secundários, em forma de uma segunda onda tardia. Assim, a curva apresenta, como características, o prolongamento no tempo e o aspecto bimodal. A duração total do surto excede um período de incubação. *Reproduzido de Rojas RA. Epidemiologia, volume I, p. 79-80. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 59 Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Exposição múltipla (epidemias progressivas ou prolongadas) – devido a fatores como difusibilidade, curto período de incubação e abundância de formas clínicas e inaparentes constituindo-se em vários focos de propagação, o surto se estende até que se esgote o número de susceptíveis. Logo, sua duração excede em muito o período de incubação. A curva pode apresentar várias ondas epidêmicas e, às vezes, o período transcorrido entre as ondas é compatível com o período de incubação da doença (surtos de infecções respiratórias, cólera, sarampo, varíola, etc.). Determinação do provável período de exposição dos casos em surto por veículo comum Método do período médio de incubação – identifica-se a data do pico da epidemia e a partir da mesma calcula-se retrospectivamente, com base no período médio de incubação, o dia provável de exposição. Método do período máximo e mínimo de incubação – identificam-se as datas do primeiro e último caso da epidemia e, a partir das mesmas calcula-se retrospectivamente, com base, respectivamente, no período mínimo e máximo de incubação, o período provável de exposição. Esse método só pode ser aplicado quando a duração da epidemia for, aproximadamente, igual ou menor que a diferença entre o período máximo e mínimo de incubação. 60 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Anexo 4* Exemplo de análise e interpretação de curva epidêmica De acordo com o gráfico, observa-se que o número de atendimentos por diarréia nas unidades de saúde de Paulo Afonso começou a elevar-se a partir da última semana de março de 1988, atingindo as freqüências mais altas no mês de abril e só voltando a reduzir-se após a primeira semana de maio. A média diária desses atendimentos, que era de 6,6 + 4,3 no mês de fevereiro, alcançou rapidamente 45,7 + 3,9 entre 19 e 31 de maio. Os casos estavam distribuídos em todas as faixas etárias e atingiam ambos os sexos. A curva observada permite deduzir que a epidemia teve início no final de março de 1988, estendendo-se por todo o mês de abril e reduzindo de intensidade após a primeira semana de maio. Seu início foi abrupto, acometendo rapidamente elevado número de pessoas, perdurando por mais de um mês, o que caracteriza uma epidemia maciça e prolongada de fonte possivelmente comum. 2 Distribuição dos atendimentos por gastroenterite nas unidades de saúde da 10ª Diretoria Regional, 1º de fevereiro a 31 de maio de 1988 80 70 Enchimento da zona rural, Glória/BA Número de casos 60 Enchimento da zona rural, Fechamento Paulo Afonso/BA da 2a aduta 50 40 30 CuSO4 Fechamento da 1a aduta Início de enchimento 20 10 0 Fevereiro Março Abril Maio *Reproduzido de: Teixeira et al., Boletim da Oficina Panamericana, 114 (6), 1993. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 61 Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Anexo 5* Procedimentos para coleta, conservação, acondicionamento e transporte de amostras biológicas Tipo de amostra Secreção das fossas nasais Técnica de coleta Umedecer o swab em solução salina estéril. Introduzir em ambas as narinas e ,com movimentos giratórios suaves, colher o material da mucosa nasal e colocar o swab em meio de transporte para material biológico Para cultura, utilizar a técnica de swab fecal ou retal em meio de transporte (Cary Blair ou Stuart), ou ainda utilizar a técnica de impregnação das fezes em papel-filtro, segundo Wold e Kelterer Fezes Fezes in natura para exame direto e coloração de Gram: utilizar um frasco limpo e seco ou frasco próprio fornecido pelo laboratório. Coletar em torno de 1g de fezes ou menos da metade e fechar firmemente após a coleta Conservação Meio de transporte adequado − Meio de Stuart ou Amies Quando colocada em meio de transporte, encaminhar, se possível, em até 48 horas em temperatura ambiente. Acima deste tempo, sob refrigeração em até 7 dias. No caso de amostras refrigeradas, respeitar as especificidades de cada agente. O papelfiltro deve ser acondicionado em invólucro plástico, perfeitamente vedado (a amostra só é válida enquanto o papel-filtro estiver úmido) Enviar as amostras in natura ao laboratório em até 2 horas As margens e superfícies das lesões devem ser descontaminadas, tanto quanto possível, com álcool a 70% e/ou solução fisiológica estéril. Feridas superficiais Proceder nova limpeza com solução fisiológica. Coletar o material purulento localizado na parte mais profunda da ferida utilizando-se, de preferência, aspirado com seringa e agulha. O material coletado deve ser encaminhado ao laboratório imediatamente, em meio de transporte adequado (meio de Stuart ou Amies) Os swab (menos recomendado) será utilizado quando os procedimentos acima citados não forem possíveis de realização Secreção de orofaringe Usar um abaixador de língua e, com um swab estéril, esfregar sobre as amígdalas e faringe posterior, evitando tocar na língua ou bochechas Procurar o material nas áreas com hiperemia, próximas aos pontos de supuração, ou remover o pus. Passar o swab firmemente sobre as áreas citadas ou amígdalas e faringe posterior Vômito Coletar 5g do espécime durante a fase aguda da doença, em frasco estéril de boca larga Transportar imediatamente ao laboratório. Se a demora for inevitável, refrigerar a 4ºC para evitar o crescimento de outras bactérias Urina Coletar o jato médio da 1ª micção do dia ou com intervalo de 2 a 3 horas após a higiene íntima. Para pacientes sem controle da micção (crianças), usar saco coletor após a higiene prévia Encaminhar imediatamente ao laboratório, sob refrigeração Sangue A antissepsia da pele deve ser rigorosa. Coletar 3 amostras com intervalo de 30 minutos entre cada uma, sendo a quantidade de sangue de 10 a 20 ml, para adulto, e de 3 a 5 ml, para criança Anotar em cada frasco o horário da coleta e o número da amostra Utilizar metodologia tradicional, inoculando na proporção de 10% de sangue para frasco contendo meio de cultura *Reproduzido do Manual de Doenças Transmitidas por Alimentos − Funasa/Cenepi 62 Encaminhar o material imediatamente ao laboratório, em meio de transporte adequado (Stuart ou Amies) Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Inocular a 35º-37º C por 24 horas ou enviar ao laboratório imediatamente Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Observações 1. O material colhido deve ser representativo do processo infeccioso, devendo-se evitar contaminações e procurar o melhor sítio de coleta. 2. A coleta deve ser realizada na fase aguda da doença e, sempre que possível, antes da administração de antibióticos. 3. Feridas: não é recomendada a cultura das lesões secas e crostas, a menos que não seja possível a obtenção de exsudato. 4. As amostras biológicas devem ser acondicionadas em recipiente adequado, rotuladas, identificadas, colocadas em sacos plásticos lacrados (fita adesiva) e transportadas para o laboratório em caixas isotérmicas com gelo embalado ou em temperatura ambiente, dependendo da amostra e metodologia empregada. Lembrar que os laboratórios com condições de processar as amostras devem adotar a metodologia convencional e dar continuidade ao procedimento laboratorial. As amostras devem vir acompanhadas da ficha de investigação epidemiológica (2ª via ou cópia) e da ficha de remessa de amostras biológicas, devidamente preenchidas. 2 Coleta e conservação de amostras para toxicologia clínica Toxologia clínica Dosagem de metais pesados Tipo de amostra Sangue Urina Técnica de coleta Para chumbo: 8ml de sangue total heparinizado e isento de coágulo Para cobre e zinco: 2ml de soro ou plasma sem hemólise Para mercúrio: urina de 24 horas (de preferência) ou aproximadamente 200ml de urina matinal Conservação -4ºC no freezer, até 60 dias 8ºC na geladeira, até 8 dias 0,1g de persulfato de potássio para cada 100ml de urina. Conservar por 8 dias Exposição aos inseticidas do grupo organofosforados e carbamatos Determinação das atividades de colinesterase sangüínea Tipo de amostra Técnica de coleta Conservação Método Ellman, G.L. e colaboradores Emprego de kit (triagem) Sangue Aproximadamente 5ml de sangue para a separação de soro sem hemólise Método Ellman modificado por Oliveira Silva/Fiocruz -20ºC no freezer, até a análise Procedimento no laboratório de referência: separar o plasma dos eritrócitos e adicionar tampão de lise aos mesmos. Conservar congelado por até 3 dias Aproximadamente 5ml de sangue coletados em presença de heparina Exposição aos inseticidas do grupo dos piretróides Tipo de amostra Sangue Técnica de coleta Conservação Metodologia por cromotografia líquida Aproximadamente 10ml de sangue coletados em presença de heparina -20ºC no freezer, até a análise Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 63 Investigação Epidemiológica de Casos e Epidemias Coleta de amostras bromatológicas e toxicológicas Qualquer quantidade da amostra do alimento efetivamente consumido é significativa, uma vez que não se constitui em amostra com fins de análise fiscal. A distribuição de microrganismos em lotes ou porções individualizadas no alimento não é homogênea. Além disso, as condições de acondicionamento, conservação, transporte e manuseio podem variar de unidade para unidade da amostra e interferir na presença e/ou manifestação do agente. Para avaliar a qualidade de alimentos, são estabelecidas quantidades mínimas, representativas ou não. No que se refere às amostras relacionadas com a DTA, nem sempre é possível cumprir estas orientações. Na impossibilidade de se coletar determinada quantidade de alimentos, existem algumas alternativas; tais como: • coletar produtos envolvidos no preparo dos alimentos; • examinar os utensílios (panela, conchas, colher, etc.) utilizados no preparo dos alimentos, caso não tenham sido lavados. Recolher esse material em sacos plásticos esterilizados ou de primeiro uso. Em determinadas situações (como na suspeita de botulismo), na ausência de restos de alimento efetivamente consumido a amostra coletada pode ser a própria embalagem vazia. A toxina pode estar presente nas paredes internas e ser retirada para análise por enxugadura. Outra unidade do mesmo lote pode não apresentar a toxina botulínica. A coleta da água para consumo humano, ofertada no local de produção do alimento suspeito, deve ser efetuada para comprovar se os padrões físico-químicos e biológicos estão adequados à legislação vigente. 64 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS CAPÍTULO Sistemas de informação em saúde e vigilância epidemiológica 3 3 Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica A informação é instrumento essencial para a tomada de decisões. Nesta perspectiva, representa imprescindível ferramenta à vigilância epidemiológica, por constituir fator desencadeador do processo “informação-decisão-ação”, tríade que sintetiza a dinâmica de suas atividades que, como se sabe, devem ser iniciadas a partir da informação de um indício ou suspeita de caso de alguma doença ou agravo. Dado − é definido como “um valor quantitativo referente a um fato ou circunstância”, “o número bruto que ainda não sofreu qualquer espécie de tratamento estatístico”, ou “a matéria-prima da produção de informação”. Informação − é entendida como “o conhecimento obtido a partir dos dados”, “o dado trabalhado” ou “o resultado da análise e combinação de vários dados”, o que implica em interpretação, por parte do usuário. É “uma descrição de uma situação real, associada a um referencial explicativo sistemático”. 3 Não se deve perder de vista que a informação em saúde é o esteio para a gestão dos serviços, pois orienta a implantação, acompanhamento e avaliação dos modelos de atenção à saúde e das ações de prevenção e controle de doenças. São também de interesse dados/informações produzidos extra-setorialmente, cabendo aos gestores do Sistema a articulação com os diversos órgãos que os produzem, de modo a complementar e estabelecer um fluxo regular de informação em cada nível do setor saúde. Oportunidade, atualidade, disponibilidade e cobertura são características que determinam a qualidade da informação, fundamentais para que todo o Sistema de Vigilância Epidemiológica apresente bom desempenho. Dependem da concepção apresentada pelo Sistema de Informação em Saúde (SIS), e sua sensibilidade para captar o mais precocemente possível as alterações que podem ocorrer no perfil de morbimortalidade de uma área, e também da organização e cobertura das atividades desenvolvidas pela vigilância epidemiológica. Entende-se sistema como o “conjunto integrado de partes que se articulam para uma finalidade comum.” Para sistema de informação existem várias definições, tais como: • “conjunto de unidades de produção, análise e divulgação de dados que atuam integradas e articuladamente com o propósito de atender às demandas para o qual foi concebido”; • “reunião de pessoas e máquinas, com vistas à obtenção e processamento de dados que atendam à necessidade de informação da instituição que o implementa”; • “conjunto de estruturas administrativas e unidades de produção, perfeitamente articuladas, com vistas à obtenção de dados mediante o seu registro, coleta, processamento, análise, transformação em informação e oportuna divulgação”. Em síntese, um sistema de informação deve disponibilizar o suporte necessário para que o planejamento, decisões e ações dos gestores, em determinado nível decisório (municipal, estadual e federal), não se baseie em dados subjetivos, conhecimentos ultrapassados ou conjecturas. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 67 Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica O SIS é parte dos sistemas de saúde; como tal, integra suas estruturas organizacionais e contribui para sua missão. É constituído por vários sub-sistemas e tem como propósito geral facilitar a formulação e avaliação das políticas, planos e programas de saúde, subsidiando o processo de tomada de decisões. Para tanto, deve contar com os requisitos técnicos e profissionais necessários ao planejamento, coordenação e supervisão das atividades relativas à coleta, registro, processamento, análise, apresentação e difusão de dados e geração de informações. Um de seus objetivos básicos, na concepção do Sistema Único de Saúde (SUS), é possibilitar a análise da situação de saúde no nível local tomando como referencial microrregiões homogêneas e considerando, necessariamente, as condições de vida da população na determinação do processo saúde-doença. O nível local tem, então, responsabilidade não apenas com a alimentação do sistema de informação em saúde mas também com sua organização e gestão. Deste modo, outro aspecto de particular importância é a concepção do sistema de informação, que deve ser hierarquizado e cujo fluxo ascendente dos dados ocorra de modo inversamente proporcional à agregação geográfica, ou seja, no nível local faz-se necessário dispor, para as análises epidemiológicas, de maior número de variáveis. Felizmente, os atuais recursos do processamento eletrônico estão sendo amplamente utilizados pelos sistemas de informação em saúde, aumentando sua eficiência na medida em que possibilitam a obtenção e processamento de um volume de dados cada vez maior, além de permitirem a articulação entre diferentes subsistemas. Entre os sistemas nacionais de informação em saúde existentes, alguns se destacam em razão de sua maior relevância para a vigilância epidemiológica: Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) O mais importante sistema para a vigilância epidemiológica foi desenvolvido entre 1990 e 1993, visando sanar as dificuldades do Sistema de Notificação Compulsória de Doenças (SNCD) e substituí-lo, tendo em vista o razoável grau de informatização disponível no país. O Sinan foi concebido pelo Centro Nacional de Epidemiologia, com o apoio técnico do Datasus e da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte para ser operado a partir das unidades de saúde, considerando o objetivo de coletar e processar dados sobre agravos de notificação em todo o território nacional, desde o nível local. Mesmo que o município não disponha de microcomputadores em suas unidades, os instrumentos deste sistema são preenchidos neste nível e o processamento eletrônico é feito nos níveis centrais das secretarias municipais de saúde (SMS), regional ou secretarias estaduais (SES). É alimentado, principalmente, pela notificação e investigação de casos de doenças e agravos constantes da lista nacional de doenças de notificação compulsória, mas é facultado a estados e municípios incluir outros problemas de saúde regionalmente importantes. Por isso, o número de doenças e agravos contemplados pelo Sinan, vem aumentando progressivamente desde seu processo de implementação, em 1993, sem relação direta com a compulsoriedade nacional da notificação, expressando as diferenças regionais de perfis de morbidade registradas no Sistema. 68 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica No Sinan, a entrada de dados ocorre pela utilização de alguns formulários padronizados: Ficha Individual de Notificação (FIN) − é preenchida para cada paciente, quando da suspeita de problema de saúde de notificação compulsória (Portaria GM nº 2.325, de 8 de dezembro de 2003) ou de interesse nacional, estadual ou municipal, e encaminhada pelas unidades assistenciais aos serviços responsáveis pela informação e/ou vigilância epidemiológica. É também utilizada para a notificação negativa. Notificação negativa − é a notificação da não-ocorrência de doenças de notificação compulsória na área de abrangência da unidade de saúde. Indica que os profissionais e o sistema de vigilância da área estão alertas para a ocorrência de tais eventos. 3 A notificação de surtos também deve ser feita por esse instrumento, obedecendo os seguintes critérios: • casos epidemiologicamente vinculados de agravos inusitados. Sua notificação deve estar consoante com a abordagem sindrômica, de acordo com as seguintes categorias: síndrome diarréica aguda, síndrome ictérica aguda, síndrome hemorrágica febril aguda, síndrome respiratória aguda, síndrome neurológica aguda e síndrome da insuficiência renal aguda, dentre outras; • casos agregados, constituindo uma situação epidêmica de doenças não constantes da lista de notificação compulsória; • casos agregados das doenças constantes da lista de notificação compulsória, mas cujo volume de notificações operacionalmente inviabiliza o seu registro individualizado. Ficha Individual de Investigação (FII) − na maioria das vezes, configura-se como roteiro de investigação, distinto para cada tipo de agravo, devendo ser utilizado, preferencialmente, pelos serviços municipais de vigilância ou unidades de saúde capacitadas para a realização da investigação epidemiológica. Esta ficha, como referido no tópico sobre investigação de surtos e epidemias, permite obter dados que possibilitam a identificação da fonte de infecção e mecanismos de transmissão da doença. Os dados, gerados nas áreas de abrangência dos respectivos estados e municípios, devem ser consolidados e analisados considerando aspectos relativos à organização, sensibilidade e cobertura do próprio sistema de notificação, bem como os das atividades de vigilância epidemiológica. Além dessas fichas, o sistema também possui planilha e boletim de acompanhamento de surtos, reproduzidos pelos municípios, e os boletins de acompanhamento de hanseníase e tuberculose, emitidos pelo próprio sistema. A impressão, distribuição e numeração desses formulários é de responsabilidade do estado ou município. O sistema conta, ainda, com módulos para cadastramento de unidades notificadoras, população e logradouros, dentre outros. A Figura 1 traz o fluxo de informação definido pelo Ministério da Saúde. Após o preenchimento dos referidos formulários, as fontes notificadoras deverão encaminhá-los para Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 69 Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica o primeiro nível informatizado. A partir daí, os dados serão enviados para os níveis hierárquicos superiores por meio magnético (arquivos de transferência gerados pelo Sistema). Figura 1. Fluxo de informação do Sinan Unidades ambulatoriais de saúde Hospitais Outras fontes Municipal Secretaria municipal de saúde Regional de saúde Estadual Secretaria estadual de saúde Nacional Ministério da Saúde Os agravos e doenças relacionados no Quadro 1 devem ser prontamente notificados às Secretarias Estaduais de Saúde, as quais deverão informar tal fato imediatamente à Secretaria de Vigilância em Saúde, por meio do correio eletrônico notifica@saude.gov.br ou às áreas técnicas do Ministério da Saúde responsáveis por seu acompanhamento, sem prejuízo do registro das notificações pelos procedimentos rotineiros do Sinan. Quadro 1. Agravos de notificação imediata via fax, telefone ou e-mail, além da digitação e transferência imediata por meio magnético, no Sinan Caso suspeito de Febre hemorrágica do dengue Botulismo Hantavirose Carbúnculo ou antraz Paralisia flácida aguda Cólera Peste Difteria Raiva humana Doença meningocócica Varíola Febre amarela Tularemia Caso confirmado de Surto, agregação de casos ou agregação de óbitos por Poliomielite Sarampo Tétano neonatal Agravos inusitados Doenças de etiologia não esclarecida Febre hemorrágica ou etiologia não esclarecida Propõe-se, de maneira geral, que as fichas individuais de notificação sejam preenchidas pelos profissionais de saúde nas unidades assistenciais, as quais devem manter uma segunda via arquivada pois a original é remetida para o serviço de vigilância epidemiológica responsável pelo desencadeamento das medidas de controle necessárias. Este, por sua vez, 70 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica além dessa incumbência, deve encaminhar os formulários para o setor de digitação das secretarias municipais, para que posteriormente os arquivos de transferência sejam enviados por meio magnético às secretarias estaduais e, em seguida, ao Ministério da Saúde, conforme periodicidade definida na Figura 2. Figura 2. Periodicidade para envio dos arquivos de transferência do Sinan Secretaria municipal de saúde Secretaria de estado da saúde Semanal Regional de saúde 1º ao 3º dia útil 15º ao 18º dia útil Semanal Ministério da Saúde 3 Casos de hanseníase e tuberculose, além do preenchimento da ficha de notificação/investigação, devem constar do boletim de acompanhamento, visando a atualização de seu acompanhamento até o encerramento para avaliação da efetividade do tratamento, de acordo com as seguintes orientações: • o primeiro nível informatizado deve emitir o Boletim de Acompanhamento de Hanseníase e Tuberculose, encaminhando-o às unidades para complementação dos dados; • os meses propostos para a alimentação da informação são, no mínimo: janeiro, abril, julho e outubro, para a tuberculose; janeiro e julho, para a hanseníase; • cabe ao 1º nível informatizado emitir o boletim de acompanhamento para os municípios não-informatizados; • após retornar das unidades os boletins devem ser analisados criticamente e as correções devem ser solicitadas de imediato à unidade de saúde; • a digitação das informações na tela de acompanhamento e arquivamento dos boletins deve ser realizada no 1º nível informatizado. O encerramento das investigações referentes aos casos notificados como suspeitos e/ ou confirmados deve ocorrer até o prazo máximo de 60 dias da data de notificação, exceto: Sarampo e rubéola 30 dias da data de notificação Gestante HIV+ e criança exposta 540 dias da data do parto/nascimento da criança exposta Leishmaniose tegumentar americana e leishmaniose visceral 180 dias da data de notificação Síndrome da rubéola congênita 180 dias da data de nascimento da criança Hepatites virais 240 dias da data de notificação A partir da data do diagnóstico, 270 dias para os casos paucibacilares (PB) e 540 dias para os casos multibacilares (MB) Hanseníase Para os casos que abandonam o tratamento: PB − 2 anos após a data do diagnóstico MB − 4 anos após a data do diagnóstico 270 dias para os casos em tratamento de esquema I e IR Tuberculose 360 dias para os casos em tratamento de esquema II e 50 dias para os casos em tratamento de esquema III, após a data do diagnóstico, conforme normas do Manual Técnico para Controle da Tuberculose Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 71 Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica Preconiza-se que em todas as instâncias os dados aportados pelo Sinan sejam consolidados e analisados e que haja uma retroalimentação dos níveis que o precederam, além de sua redistribuição, segundo local de residência dos pacientes objetos das notificações. No nível federal, os dados do Sinan são processados, analisados juntamente com aqueles que chegam por outras vias e divulgados pelo Boletim Epidemiológico do SUS e informes epidemiológicos eletrônicos, disponibilizados no site www.saude.gov.br. Ao contrário dos demais sistemas, em que as críticas de consistência são realizadas antes do seu envio a qualquer outra esfera de governo, a necessidade de desencadeamento imediato de uma ação faz com que, nesse caso, os dados sejam remetidos o mais rapidamente possível, ficando a sua crítica para um segundo momento − quando do encerramento do caso e, posteriormente, o da análise das informações para divulgação. No entanto, apesar desta peculiaridade, esta análise é fundamental para que se possa garantir uma base de dados com qualidade, não podendo ser relegada a segundo plano, tendo em vista que os dados já foram encaminhados para os níveis hierárquicos superiores. A partir da alimentação do banco de dados do Sinan, pode-se calcular a incidência, prevalência, letalidade e mortalidade, bem como realizar análises de acordo com as características de pessoa, tempo e lugar, particularmente no que tange às doenças transmissíveis de notificação obrigatória, além de outros indicadores epidemiológicos e operacionais utilizados para as avaliações local, municipal, estadual e nacional. As informações da ficha de investigação possibilitam maior conhecimento acerca da situação epidemiológica do agravo investigado, fontes de infecção, modo de transmissão e identificação de áreas de risco, dentre outros importantes dados para o desencadeamento das atividades de controle. A manutenção periódica da atualização da base de dados do Sinan é fundamental para o acompanhamento da situação epidemiológica dos agravos incluídos no Sistema. Dados de má qualidade, oriundos de fichas de notificação ou investigação com a maioria dos campos em branco, inconsistências nas informações (casos com diagnóstico laboratorial positivo, porém encerrado como critério clínico) e duplicidade de registros, entre outros problemas freqüentemente identificados nos níveis estadual ou federal, apontam para a necessidade de uma avaliação sistemática da qualidade da informação coletada e digitada no primeiro nível hierárquico de entrada de dados no Sistema, que torna possível a obtenção de dados confiáveis, indispensáveis para o cálculo de indicadores extremamente úteis, tais como as taxas de incidência, letalidade, mortalidade e coeficiente de prevalência, entre outros. Roteiros para a realização da análise da qualidade da base de dados e cálculos dos principais indicadores epidemiológicos e operacionais estão disponíveis para os agravos de notificação compulsória, bem como toda a documentação necessária para a correta utilização do Sistema (dicionário de dados e instrucionais de preenchimento das fichas Manual de Normas e Rotinas e Operacional). Para que o Sinan se consolide como a principal fonte de informação de morbidade para as doenças de notificação compulsória, faz-se necessário garantir tanto a cobertura 72 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica como a qualidade das informações. Sua utilização plena, em todo o território nacional, possivelmente possibilitará a obtenção dos dados indispensáveis ao cálculo dos principais indicadores necessários para o monitoramento dessas doenças, gerando instrumentos para a formulação e avaliação das políticas, planos e programas de saúde, subsidiando o processo de tomada de decisões e contribuindo para a melhoria da situação de saúde da população. Indicadores são variáveis susceptíveis à mensuração direta, produzidos com periodicidade definida e critérios constantes. A disponibilidade de dados, simplicidade técnica, uniformidade, sinteticidade e poder discriminatório são requisitos básicos para sua elaboração. Os indicadores de saúde refletem o estado de saúde da população de determinada comunidade. 3 Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) Criado em 1975, este sistema iniciou sua fase de descentralização em 1991, dispondo de dados informatizados a partir de 1979. Seu instrumento padronizado de coleta de dados é a Declaração de Óbito (DO), impressa em três vias coloridas, cuja emissão e distribuição para os estados, em séries prénumeradas, é de competência exclusiva do Ministério da Saúde. Para os municípios, a distribuição fica a cargo das secretarias estaduais de saúde, devendo as secretarias municipais se responsabilizarem por seu controle e distribuição entre os profissionais médicos e instituições que a utilizem, bem como pelo recolhimento das primeiras vias em hospitais e cartórios. O preenchimento da DO deve ser realizado exclusivamente por médicos, exceto em locais onde não existam, situação na qual poderá ser preenchida por oficiais de Cartórios de Registro Civil, assinada por duas testemunhas. A obrigatoriedade de seu preenchimento, para todo óbito ocorrido, é determinada pela Lei Federal n° 6.015/73. Em tese, nenhum sepultamento deveria ocorrer sem prévia emissão da DO. Mas, na prática, sabe-se da ocorrência de sepultamentos irregulares, em cemitérios clandestinos (e eventualmente mesmo em cemitérios oficiais), o que afeta o conhecimento do real perfil de mortalidade, sobretudo nas regiões Norte e Nordeste. O registro do óbito deve ser feito no local de ocorrência do evento. Embora o local de residência seja a informação comumente mais utilizada, na maioria das análises do setor saúde a ocorrência é fator importante no planejamento de algumas medidas de controle, como, por exemplo, no caso dos acidentes de trânsito e doenças infecciosas que exijam a adoção de medidas de controle no local de ocorrência. Os óbitos ocorridos fora do local de residência serão redistribuídos, quando do fechamento das estatísticas, pelas secretarias estaduais e Ministério da Saúde, permitindo, assim, o acesso aos dados tanto por ocorrência como por residência do falecido. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 73 Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica O SIM constitui importante elemento para o Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica, tanto como fonte principal de dados, quando há falhas de registro de casos no Sinan, quanto como fonte complementar, por também dispor de informações sobre as características de pessoa, tempo e lugar, assistência prestada ao paciente, causas básicas e associadas de óbito, extremamente relevantes e muito utilizadas no diagnóstico da situação de saúde da população. As informações obtidas pela DO também possibilitam o delineamento do perfil de morbidade de uma área, no que diz respeito às doenças mais letais e às doenças crônicas não sujeitas à notificação compulsória, representando, praticamente, a única fonte regular de dados. Para as doenças de notificação compulsória, a utilização eficiente desta fonte de dados depende da verificação rotineira da presença desses agravos no banco de dados do SIM. Deve-se também checar se as mesmas constam no Sinan, bem como a evolução do caso para óbito. O fluxo da declaração de óbito é apresentado na Figura 3 e o acesso às suas informações consolidadas para os níveis nacional, regional, estadual e municipal é disponibilizado em CD-ROM. A SVS também disponibiliza essas informações na internet, pelo site www. datasus.gov.br. Figura 3. Fluxo da Declaração de Óbito Hospital Cartório de Registro Civil Preenche Preenche o documento 1a via 1a via 2a via 2a via 3 via a 3a via Encaminha Encaminha Família Secretaria de Saúde Cartório de Registro Civil Secretaria de Saúde Arquiva Fonte: SVS/MS, Portaria nº 20, de 3 de outubro de 2003 74 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Arquiva Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica Uma vez preenchida a DO, quando se tratar de óbitos por causas naturais, ocorridos em estabelecimento de saúde, a primeira via (branca) será da secretaria municipal de saúde (SMS); a segunda (amarela) será entregue aos familiares do falecido, para registro em Cartório de Registro Civil e emissão da Certidão de Óbito (ficando retida no cartório); a terceira (rosa) ficará arquivada no prontuário do falecido. Nos óbitos de causas naturais ocorridos fora do estabelecimento de saúde, mas com assistência médica, o médico que fornecer a DO deverá levar a primeira e terceira vias para a SMS, entregando a segunda para os familiares do falecido. Nos casos de óbitos de causas naturais, sem assistência médica, em locais que disponham de Serviço de Verificação de Óbitos (SVO), estes serão responsáveis pela emissão da DO, obedecendo o mesmo fluxo dos hospitais. Em lugares onde não exista SVO, um médico da localidade deverá preencher a DO obedecendo o fluxo anteriormente referido para óbitos ocorridos fora do estabelecimento de saúde, com assistência médica. Nos óbitos por causas naturais em localidades sem médicos, o responsável pelo falecido, acompanhado de duas testemunhas, comparecerá ao Cartório de Registro Civil onde será preenchida a DO. A segunda via deste documento ficará retida no cartório e a primeira e terceira vias serão recolhidas pela secretaria municipal de saúde. Nos óbitos por causas acidentais ou violentas, o médico legista do Instituto Médico-Legal (IML) deverá preencher a DO (nos locais onde não exista IML um perito é designado para tal finalidade), seguindo-se o mesmo fluxo adotado para os hospitais. As SMS realizarão a busca ativa dessas vias em todos os hospitais e cartórios, evitando a perda de registro de óbitos no SIM, com conseqüente perfil irreal da mortalidade da sua área de abrangência. Nas SMS, as primeiras vias são digitadas e enviadas em disquetes para as Regionais, que fazem o consolidado de sua área e o enviam para as secretarias estaduais de saúde, que consolidam os dados estaduais e os repassam para o Ministério da Saúde. 3 Em todos os níveis, sobretudo no municipal, que está mais próximo do evento, deve ser realizada a crítica dos dados, buscando a existência de inconsistências como, por exemplo, causas de óbito exclusivas de um sexo sendo registradas em outro, causas perinatais em adultos, registro de óbitos fetais com causas compatíveis apenas com nascidos vivos e idade incompatível com a doença. A análise dos dados do SIM permite a construção de importantes indicadores para o delineamento do perfil de saúde de uma região. Assim, a partir das informações contidas nesse Sistema, pode-se obter a mortalidade proporcional por causas, faixa etária, sexo, local de ocorrência e residência e letalidade de agravos dos quais se conheça a incidência, bem como taxas de mortalidade geral, infantil, materna ou por qualquer outra variável contida na DO, uma vez que são disponibilizadas várias formas de cruzamento dos dados. Entretanto, em muitas áreas, o uso dessa rica fonte de dados é prejudicada pelo não preenchimento correto das DO, com omissão de dados como, por exemplo, estado gestacional ou puerperal, ou pelo registro excessivo de causas mal definidas, prejudicando o uso dessas informações nas diversas instâncias do sistema de saúde. Estas análises devem ser realizadas em todos os níveis do sistema, sendo subsídios fundamentais para o planejamento de ações dos gestores. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 75 Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc) O número de nascidos vivos constitui relevante informação para o campo da saúde pública, pois possibilita a constituição de indicadores voltados para a avaliação de riscos à saúde do segmento materno-infantil, a exemplo dos coeficientes de mortalidade infantil e materna, nos quais representa o denominador. Antes da implantação do Sinasc, em 1990, esta informação só era conhecida no Brasil por estimativas realizadas a partir da informação censitária. Atualmente, são disponibilizados pela SVS, no site www.datasus.gov.br, dados do Sinasc referentes aos anos de 1994 em diante. Entretanto, até o presente momento, só pode ser utilizado como denominador, no cálculo de alguns indicadores, em regiões onde sua cobertura é ampla, substituindo deste modo as estimativas censitárias. O Sinasc tem como instrumento padronizado de coleta de dados a Declaração de Nascido Vivo (DN), cuja emissão, a exemplo da DO, é de competência exclusiva do Ministério da Saúde. Tanto a emissão da DN como o seu registro em cartório serão realizados no município de ocorrência do nascimento. Deve ser preenchida nos hospitais e outras instituições de saúde que realizam parto, e nos Cartórios de Registro Civil, na presença de duas testemunhas, quando o nascimento ocorre em domicílio sem assistência de profissional de saúde. Desde 1992 sua implantação ocorre de forma gradual. Atualmente, vem apresentando em muitos municípios um volume maior de registros do que o publicado nos anuários do IBGE, com base nos dados dos Cartórios de Registro Civil. A DN deve ser preenchida para todos os nascidos vivos no país, o que, segundo conceito definido pela OMS, corresponde a “todo produto da concepção que, independentemente do tempo de gestação ou peso ao nascer, depois de expulso ou extraído do corpo da mãe, respire ou apresente outro sinal de vida tal como batimento cardíaco, pulsação do cordão umbilical ou movimentos efetivos dos músculos de contração voluntária, estando ou não desprendida a placenta”. A obrigatoriedade desse registro é também dada pela Lei n° 6.015/73. No caso de gravidez múltipla, deve ser preenchida uma DN para cada criança nascida viva. É sabida a ocorrência de uma proporção razoável de subnotificação de nascimentos, estimada em até 35% para alguns estados, em 1999, particularmente nas regiões Norte e Nordeste − que nesse ano apresentaram cobertura média em torno de 80% do número de nascidos vivos estimado para cada região, motivo que levou as áreas responsáveis pelas estatísticas vitais a realizarem uma busca ativa nas unidades emissoras de DNs. Entretanto, nesse mesmo período, a captação de nascimentos pelo Sinasc encontrava-se igual ou superior a 100% em relação às estimativas demográficas nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, com índices mínimos de 87%, 90% e 96% em três estados. Tais dados revelam progressiva melhoria da cobertura desse sistema, o que favorece sua utilização como fonte de dados para a confecção de alguns indicadores. Igualmente à DO, os formulários de Declaração de Nascido Vivo são pré-numerados, impressos em três vias coloridas e distribuídos às SES pela SVS/MS. As SES encarregavamse, até recentemente, e sua distribuição aos estabelecimentos de saúde e cartórios. Apesar da preconização de que as SMS devem assumir esse encargo, isto ainda não está acontecendo em todo o território nacional. 76 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica O fluxo recomendado pelo Ministério da Saúde para a DN (Figura 4) tem a mesma lógica que orienta o da DO. Figura 4. Fluxo da Declaração de Nascido Vivo Cartório de Registro Civil Hospital DN − 1a via Preenche o documento 2a via 3 3a via 1a via 2a via Família Cartório 3a via Arquiva Secretaria de Saúde Encaminha Secretaria de Saúde Arquiva Unidade de Saúde Fonte: SVS/MS, Portaria nº 20, de 3 de outubro de 2003 Nos partos ocorridos em estabelecimentos de saúde, a primeira via (branca) da DN preenchida será para a SMS; a segunda (amarela) deverá ser entregue ao responsável pela criança, para a obtenção da Certidão de Nascimento no Cartório de Registro Civil, onde ficará retida; a terceira (rosa) será arquivada no prontuário da puérpera. Para os partos domiciliares com assistência médica, a primeira via deverá ser enviada para a SMS e a segunda e terceira vias entregues ao responsável, que utilizará a segunda via para registro do nascimento em cartório e a terceira para apresentação em unidade de saúde onde realizar a primeira consulta da criança. Nos partos domiciliares sem assistência médica, a DN será preenchida no Cartório de Registro Civil, que reterá a primeira via, a ser recolhida pela SMS, e a segunda, para seus arquivos. A terceira via será entregue ao responsável, que a destinará à unidade de saúde do primeiro atendimento da criança. Também nesses casos as primeiras vias da DN deverão ser recolhidas ativamente pelas secretarias municipais de saúde, que após digitá-las envia o consolidado para as SES, onde os dados são processados e distribuídos segundo o município de residência e, a seguir, enviados para o MS, que os reagrupa por estados de residência, sendo disponibilizados pela SVS através do site www.datasus.gov.br e em CD-ROM. Em todos os níveis do sistema, os dados deverão ser criticados. As críticas realizadas visam detectar possíveis erros de preenchimento da Declaração de Nascido Vivo ou da digitação de dados. Sua validação é feita pelo cruzamento de variáveis para verificação de consistência, como, por exemplo, o peso do bebê com o tempo de gestação ou a idade da mãe com a paridade. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 77 Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica A utilização dos dados deste sistema para o planejamento e tomada de decisões nas três esferas de governo ainda é incipiente. Na maioria das vezes, como denominador para o cálculo de taxas como as de mortalidade infantil e materna, por exemplo. Apesar disso, alguns indicadores vêm sendo propostos − a grande maioria voltada à avaliação de risco da mortalidade infantil e a qualidade da rede de atenção à gravidez e ao parto. Entre os indicadores de interesse para a atenção à saúde materno-infantil, são imprescindíveis as informações contidas na DN: proporção de nascidos vivos de baixo peso, proporção de nascimentos prematuros, proporção de partos hospitalares, proporção de nascidos vivos por faixa etária da mãe, valores do índice Apgar no primeiro e quinto minutos, número de consultas pré-natal realizadas para cada nascido vivo, dentre outros. Além desses, podem ainda ser calculados indicadores clássicos voltados à caracterização geral de uma população, como a taxa bruta de natalidade e a taxa de fecundidade geral. Sistema de Informações Hospitalares (SIH/SUS) O SIH/SUS, que possui dados informatizados desde 1984, não foi concebido sob a lógica epidemiológica, mas sim com o propósito de operar o sistema de pagamento de internação dos hospitais contratados pelo Ministério da Previdência. Posteriormente, foi estendido aos hospitais filantrópicos, universitários e de ensino e aos hospitais públicos municipais, estaduais e federais. Nesse último caso, somente aos da administração indireta e de outros ministérios. Reúne informações de cerca de 70% dos internamentos hospitalares realizados no país, tratando-se, portanto, de grande fonte das enfermidades que requerem internação, importante para o conhecimento da situação de saúde e gestão de serviços. Ressalte-se sua gradativa incorporação à rotina de análise e informações de alguns órgãos de vigilância epidemiológica de estados e municípios. Seu instrumento de coleta de dados é a Autorização de Internação Hospitalar (AIH), atualmente emitida pelos estados a partir de uma série numérica única definida anualmente em portaria ministerial. Este formulário contém, entre outros, os dados de atendimento, com os diagnósticos de internamento e alta (codificados de acordo com a CID), informações relativas às características de pessoa (idade e sexo), tempo e lugar (procedência do paciente) das internações, procedimentos realizados, valores pagos e dados cadastrais das unidades de saúde, que permitem sua utilização para fins epidemiológicos. As séries numéricas de AIHs são mensalmente fornecidas pelo Ministério da Saúde às secretarias estaduais de saúde (Figura 5), de acordo com o quantitativo anual estipulado para o estado, que desde o início de 1995 é equivalente ao máximo de 9% da população residente (estimada pelo IBGE). Quando se trata de município em gestão plena do sistema, a cota de AIH definida pela Programação Pactuada e Integrada (PPI) é repassada diretamente pelo Ministério da Saúde para o município. O banco de dados do prestador envia as informações para o Datasus, com cópia para a secretaria estadual de saúde. Nos municípios em gestão plena de atenção básica, é o estado que faz a gestão da rede hospitalar. 78 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica Figura 5. Fluxo básico de Autorização de Internação Hospitalar (AIH) Laudo é encaminhado Paciente é examinado Órgão emissor Emite Encaminha Hospital 3 Digita Encaminha Secretaria Municipal de Saúde Ministério da Saúde Critica, analisa e glosa Encaminha Encaminha Secretaria Estadual de Saúde Os números de AIHs têm validade de quatro meses, não sendo mais aceitos pelo sistema. Tal regra permite certa compensação temporal naqueles estados em que a sazonalidade da ocorrência de doenças influencia fortemente o número de internações. O banco de dados, correspondente ao cadastro de todas as unidades prestadoras de serviços hospitalares ao SUS credenciadas, é permanentemente atualizado sempre que há credenciamento, descredenciamento ou qualquer modificação de alguma característica da unidade de saúde. Os dados produzidos por este Sistema são amplamente disponibilizados pelo site www. datasus.gov.br e pela BBS (Bulletin Board System) do Ministério da Saúde, além de CDROM com produção mensal e anual consolidadas. Os arquivos disponibilizados podem ser de dois tipos: o “movimento”, em que constam todos os dados, e o “reduzido”, em que não aparecem os relativos aos serviços profissionais. O SIH/SUS foi desenvolvido para propiciar a elaboração de alguns indicadores de avaliação de desempenho de unidades, além do acompanhamento dos números absolutos relacionados à freqüência de AIHs e que vêm sendo cada vez mais utilizados pelos gestores para uma primeira aproximação da avaliação de cobertura de sua rede hospitalar, e até para a priorização de ações de caráter preventivo. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 79 Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica Entre suas limitações encontram-se a cobertura dos dados (que depende do grau de utilização e acesso da população aos serviços da rede pública própria, contratada e conveniada ao SUS), ausência de críticas informatizadas, possibilidade das informações pouco confiáveis sobre o endereço do paciente, distorções decorrentes de falsos diagnósticos e menor número de internamentos que o necessário, em função das restrições de recursos federais – problemas que podem resultar em vieses nas estimativas. Contudo, ao contrário do que ocorre nos bancos de dados dos sistemas descritos anteriormente, os dados do SIH/SUS, não podem ser corrigidos após terem sido enviados, mesmo após investigados e confirmados erros de digitação, codificação ou diagnóstico. O Sistema também não identifica reinternações e transferências de outros hospitais, o que, eventualmente leva a duplas ou triplas contagens de um mesmo paciente. Apesar de todas as restrições, essa base de dados é de extrema importância para o conhecimento do perfil dos atendimentos na rede hospitalar. Adicionalmente, não pode ser desprezada a agilidade do Sistema. Os dados por ele aportados tornam-se disponíveis aos gestores em menos de um mês, e cerca de dois meses para a disponibilização do consolidado Brasil. Para a vigilância epidemiológica, avaliação e controle de ações, esta é uma importante qualidade para o estímulo à sua análise rotineira. Sistema de Informações Ambulatoriais do SUS (SIA/SUS) Em 1991, o SIA/SUS foi formalmente implantado em todo o território nacional como instrumento de ordenação do pagamento dos serviços ambulatoriais (públicos e conveniados), viabilizando aos gestores apenas a informação do gasto por natureza jurídica do prestador. O total de consultas e exames realizados era fornecido por outro sistema, de finalidade puramente estatística, cujo documento de entrada de dados era o Boletim de Serviços Produzidos (BSP) e o único produto resultante, a publicação Inamps em Dados. Embora tenha sofrido algumas alterações com vistas a um melhor controle e consistência de dados, o SIA/SUS pouco mudou desde sua implantação. Por obedecer à lógica de pagamento por procedimento, não registra o CID do(s) diagnóstico(s) dos pacientes e não pode ser utilizado como informação epidemiológica, ou seja, seus dados não permitem delinear os perfis de morbidade da população, a não ser pela inferência a partir dos serviços utilizados. Entretanto, como sua unidade de registro de informações é o procedimento ambulatorial realizado, desagregado em atos profissionais, outros indicadores operacionais podem ser importantes como complemento das análises epidemiológicas, por exemplo: número de consultas médicas por habitante/ano; número de consultas médicas por consultório; número de exames/terapias realizados pelo quantitativo de consultas médicas. Desde julho de 1994 as informações relacionadas a esse sistema estão disponíveis no site www.datasus.gov.br e por CD-ROM. Ressalte-se como importante módulo o cadastramento de unidades ambulatoriais contratadas, conveniadas e da rede pública própria dos estados e municípios, bem como as informações sobre profissionais por especialidade. 80 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica Quando da análise de seus dados, deve-se atentar para as questões relativas à cobertura, acesso, procedência e fluxo dos usuários dos serviços de saúde. Outras importantes fontes de dados A depender das necessidades dos programas de controle de algumas doenças, outros sistemas de informação complementares foram desenvolvidos pelo Cenepi, tais como o FAD (Sistema de informação da febre amarela e dengue), que registra dados de infestação pelo Aedes aegypti, a nível municipal, e outros dados operacionais do programa. Outros sistemas de informação que também podem ser úteis à vigilância epidemiológica, embora restritos a uma área de atuação muito específica, quer por não terem uma abrangência nacional ou por não serem utilizados em todos os níveis de gestão, são: Sistema de Informação da Atenção Básica (Siab) – sistema de informação territorializado que coleta dados que possibilitam a construção de indicadores populacionais referentes a áreas de abrangência bem delimitadas, cobertas pelo Programa de Agentes Comunitários de Saúde e Programa Saúde da Família. Sua base de dados possui três blocos: o cadastramento familiar (indicadores sociodemográficos dos indivíduos e de saneamento básico dos domicílios); o acompanhamento de grupos de risco (menores de dois anos, gestantes, hipertensos, diabéticos, pessoas com tuberculose e pessoas com hanseníase); e o registro de atividades, procedimentos e notificações (produção e cobertura de ações e serviços básicos, notificação de agravos, óbitos e hospitalizações). Os níveis de agregação do SIAB são: microárea de atuação do agente comunitário de saúde (território onde residem cerca de 150 famílias), área de abrangência da equipe de Saúde da Família (território onde residem aproximadamente mil famílias), segmento, zonas urbana e rural, município, estado, regiões e país. Assim, o Sistema possibilita a microlocalização de problemas de saúde como, por exemplo, a identificação de áreas com baixas coberturas vacinais ou altas taxas de prevalência de doenças (como tuberculose e hipertensão), permitindo a espacialização das necessidades e respostas sociais e constituindo-se em importante ferramenta para o planejamento e avaliação das ações de vigilância da saúde. Sistema de Informações de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan) – instrumento de políticas federais, focalizadas e compensatórias. Atualmente, encontra-se implantado em aproximadamente 1.600 municípios considerados de risco para a mortalidade infantil. Disponibiliza informações sobre o programa de recuperação de crianças desnutridas e gestantes sob risco nutricional. Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunização (SI-PNI) – implantado em todos os municípios brasileiros, fornece dados relativos à cobertura vacinal de rotina e, em campanhas, taxa de abandono e controle do envio de boletins de imunização. Além do módulo de avaliação do PNI, este Sistema dispõe de um subsistema de estoque e distribuição de imunobiológicos para fins gerenciais. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 3 81 Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano (Siságua) – fornece informações sobre a qualidade da água para consumo humano, proveniente dos sistemas público e privado, e soluções alternativas de abastecimento. Objetiva coletar, transmitir e disseminar dados gerados rotineiramente, de forma a produzir informações necessárias à prática da vigilância da qualidade da água de consumo humano (avaliação da problemática da qualidade da água e definição de estratégias para prevenir e controlar os processos de sua deterioração e transmissão de enfermidades) por parte das secretarias municipais e estaduais de saúde, em cumprimento à Portaria nº 36/90, do Ministério da Saúde. Além das informações decorrentes dos sistemas descritos existem outras grandes bases de dados de interesse para o setor saúde, com padronização e abrangência nacionais. Entre elas destacam-se: Cadernos de Saúde e Rede Interagencial de Informação para a Saúde/ Ripsa, da qual um dos produtos é o IDB/Indicadores e Dados Básicos para a Saúde (acesso via www.datasus.gov.br ou www.saude.gov.br), além daquelas disponibilizadas pelo IBGE (particularmente no que se refere ao Censo Demográfico, à Pesquisa Brasileira por Amostragem de Domicílios – Pnad e Pesquisa Nacional de Saneamento Básico 2000). É também importante verificar outros bancos de dados de interesse à área da saúde, como os do Ministério do Trabalho (Relação Anual de Informações Sociais/Rais) e os do Sistema Federal de Inspeção do Trabalho (informações sobre riscos ocupacionais por atividade econômica), bem como fontes de dados resultantes de estudos e pesquisas realizados por instituições como o Ipea e relatórios e outras publicações de associações de empresas que atuam no setor médico supletivo (medicina de grupo, seguradoras, autogestão e planos de administração). A maioria dos sistemas de informação ora apresentados possui manual instrucional e modelos dos instrumentos de coleta (fichas e declarações) para implantação e utilização em computador – disponibilizados pela Secretaria de Vigilância em Saúde. A utilização dos sistemas de informações de saúde e de outras fontes de dados, pelos serviços de saúde e instituições de ensino e pesquisa, dentre outras, pode ser viabilizada via Internet, propiciando o acesso a dados nas seguintes áreas: • demografia – informações sobre população, mortalidade e natalidade; • morbidade – morbidade hospitalar e ambulatorial, registros especiais, seguro social, acidentes de trânsito, de trabalho, etc.; meio ambiente: saneamento básico, abastecimento de água, destino dos dejetos e lixo, poluição ambiental, condições de habitação, estudo de vetores; • recursos de saúde e produção de serviços – recursos físicos, humanos, financeiros, produção na rede de serviços básicos de saúde e em outras instituições de saúde, vigilância sanitária; no âmbito documental e administrativo: legislação médico-sanitária, referências bibliográficas e sistemas administrativos. Existem outros dados necessários ao município e não coletados regularmente, que podem ser obtidos mediante de inquéritos e estudos especiais, de forma eventual e localizada. Contudo, é preciso haver racionalidade na definição dos dados a serem coletados, 82 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sistemas de Informação em Saúde e Vigilância Epidemiológica processados e analisados no SIS, para evitar desperdício de tempo, recursos e descrédito no sistema de informação, tanto pela população como pelos técnicos. Divulgação das informações A retroalimentação dos sistemas deve ser considerada um dos aspectos fundamentais para o contínuo processo de aperfeiçoamento, gerência e controle da qualidade dos dados. Tal prática deve ocorrer nos seus diversos níveis, de forma sistemática, com periodicidade previamente definida, de modo a permitir a utilização das informações quando da tomada de decisão e nas atividades de planejamento, definição de prioridades, alocação de recursos e avaliação dos programas desenvolvidos. Adicionalmente, a divulgação das informações geradas pelos sistemas assume valor inestimável como instrumento de suporte ao controle social, prática que deve ser estimulada e apoiada em todos os níveis e que deve definir os instrumentos de informação, tanto para os profissionais de saúde como para a comunidade. 3 Perspectivas atuais Desde 1992, a SVS vem desenvolvendo, de forma descentralizada, uma política de estímulo ao uso da informação e da informática como subsídio à implantação do SUS no país. Para isso, adotou iniciativas junto aos estados e municípios, visando a descentralização do uso do SIM, Sinan e Sinasc, financiou cursos de informação, epidemiologia e informática, e divulgou os programas EPI-Info e Epimap. Este processo vem avançando, particularmente, a partir da implantação da Norma Operacional Básica do Sistema Único de Saúde (NOB 01/96) e da instituição da transferência de recursos, fundo a fundo, para o desenvolvimento de atividades na área de epidemiologia (Portaria MS nº 1.399/99). Considerações finais A compatibilidade das principais bases de dados dos diversos sistemas de informações em saúde, com vistas à sua utilização conjunta, é meta há algum tempo buscada pelos profissionais que trabalham com a informação no setor saúde. A uniformização de conceitos e definições do Sinan, Sinasc e SIM é exemplo das iniciativas adotadas no sentido de obter a compatibilização destes sistemas que, entretanto, até o momento ainda não foi totalmente atingida. A necessidade de integração dos bancos de dados, para maior dinamização das ações de vigilância epidemiológica por meio da utilização dos sistemas nacionais de informações descritos, apresenta-se como pré-requisito para o melhor desenvolvimento de uma política de informação e informática para o SUS. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 83 CAPÍTULO 4 4 Sistema de vigilância epidemiológica de eventos adversos pós-vacinais Sistema de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinais As vacinas previnem o adoecimento e a morte de milhões de pessoas a cada ano, representando a intervenção com melhor custo-benefício. Apesar disso, cerca de dois milhões de crianças morrem anualmente por doenças imunopreveníveis que poderiam ser evitadas pela utilização de vacinas de baixo custo. No começo do século XX, de cada 1 mil crianças nascidas 160 morriam de uma causa infecciosa antes dos 5 anos. As vacinas, como todo produto farmacêutico, não são isentas de efeitos colaterais ou eventos adversos. Como significativa proporção da população é vacinada a cada ano, há certo número de eventos adversos após a vacinação – tanto apenas coincidentes como com relação causal com a vacina. O grande impacto que um evento adverso pós-vacinal pode causar na sociedade devese ao fato de que as vacinas geralmente são utilizadas em pessoas saudáveis, principalmente crianças. Deste modo, qualquer reação, por mais leve que seja ou apenas associada temporalmente (coincidente), causa grande repercussão. Diante da redução expressiva na ocorrência de doenças imunopreveníveis, os eventos adversos passaram a ter maior destaque, conseqüentes ao aumento progressivo do uso de imunobiológicos em todo o mundo. Entende-se por evento adverso toda situação clínica ocorrida em tempo variável após a utilização de produtos imunobiológicos, respeitando-se um diagnóstico diferencial adequado, o afastamento de situação coincidentes e a plausibilidade biológica do evento. De modo geral, podem ser locais ou sistêmicos, leves, moderados ou graves, categorizados em: • relação à vacina (tipos de cepas, substâncias estabilizadoras e/ou conservadoras, manipulação, conservação e administração); • relação aos vacinados (fatores predisponentes e/ou imunologicamente idiossincráticos). 4 Apesar do constante aperfeiçoamento dos métodos de produção e purificação das vacinas, estas são constituídas, em sua maioria, por agentes infecciosos atenuados ou inativados ou por algum dos seus produtos ou componentes, podem induzir a eventos adversos. Diversos países mantêm sistemas de vigilância e investigação de eventos adversos pósvacinais, considerando que o monitoramento adequado e a investigação oportuna e competente são de fundamental importância para a manutenção da confiança nos programas de imunizações, uma vez que ao cumprirem os seus objetivos orientam, quando necessárias, a tomada de medidas, como a retirada de um produto do calendário vacinal, ou alterações na posologia ou faixa etária, entre outras. No Brasil, o registro da chegada da primeira vacina data de 1805, trazida pelo marquês de Barbacena, sob a forma de vírus vacínico da varíola no braço dos escravos. Em 1925, o BCG, já utilizado mundialmente, começa a ser utilizado e produzido no país, bem como a vacina contra a febre amarela, em 1937 – mas só em meados de 1987 inicia-se a sistematização do registro de eventos adversos. No início dos anos 90, a Organização Mundial da Saúde recomenda a notificação e investigação de eventos adversos pós-vacinais. Em 1992, o Programa Nacional de Imunizações implantou oficialmente este sistema, que gradativamente aprimorado conta a partir de 2000 com o Sistema Informatizado de Eventos Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 87 Sistema de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinais Adversos Pós-Vacinais, que permite uma análise mais rápida e contempla maior número de variáveis quanto à reatogenicidade dos produtos usados pelo Programa Nacional de Imunizações. Objetivos do Sistema • • • • Identificar os eventos adversos pós-vacinação. Identificar eventos novos e/ ou raros. Acompanhar a investigação dos eventos adversos. Promover uma investigação capaz de estabelecer ou descartar a relação de causalidade com a vacina. • Identificar os fatores de risco e/ou condições que potencializem eventos adversos. • Fornecer dados que possibilitem uma avaliação descritiva e/ou analítica da ocorrência dos eventos adversos. • Sinalizar a necessidade de estudos mais elaborados para melhor interpretar os dados da vigilância e investigação de eventos adversos pós-vacinais. Notificação e investigação dos eventos adversos: atribuições dos diferentes níveis do sistema de saúde Todos os eventos ocorridos após a aplicação de um produto imunobiológico utilizado pelo Programa Nacional de Imunizações, devem ser notificados, desde que respeitadas a plausibilidade biológica da ocorrência, o diagnóstico diferencial abrangente e descartadas as condições concomitantemente ocorridas ao uso da vacina mas sem qualquer relação com a mesma. No Manual de Vigilância de Eventos Adversos, 1998 (em revisão), encontram-se definições de caso para os eventos adversos específicos ou não para cada vacina. O fluxo de informação deve obedecer as seguintes orientações: Nível local • A unidade de saúde deverá identificar, investigar inicialmente e notificar a Coordenação de Imunizações e/ou serviço de vigilância do município. • Adotar as condutas clínicas pertinentes e avaliar a necessidade de ampliar a investigação. • Consolidar e analisar os casos notificados. Nível municipal • Receber as notificações das unidades de saúde. • Notificar de imediato os casos graves (fluxo imediato) ao nível regional ou estadual. • Promover a investigação das notificações recebidas, analisando e estabelecendo a conduta adequada, no âmbito de sua competência. 88 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sistema de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinais • Detectar e notificar a ocorrência de surtos de eventos adversos. • Consolidar e avaliar os dados municipais. • Repassar cópias das fichas e consolidado para as regionais de saúde (quando houver) ou secretarias estaduais de saúde, até o quinto dia útil de cada mês. • Promover a capacitação e atualização dos recursos humanos. Nível regional (quando houver) • • • • • Receber, analisar e consolidar os dados dos municípios de sua área de abrangência. Notificar de imediato os casos graves (fluxo imediato) ao nível estadual. Assessorar os municípios na investigação dos casos, quando necessário. Detectar e notificar a ocorrência de surtos de eventos adversos. Repassar cópias das fichas e consolidado para as secretarias estaduais de saúde, até o décimo dia útil de cada mês. • Promover a capacitação e atualização dos recursos humanos. 4 Nível estadual • Receber, consolidar e analisar as notificações regionais ou municipais. • Notificar de imediato os casos graves (fluxo imediato) ao nível nacional. • Garantir, através dos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (Crie), os mecanismos necessários para a investigação, acompanhamento e elucidação de eventos adversos graves ou inusitados, associados temporalmente às aplicações de imunobiológicos (Instrução Normativa nº 2, de 24 de setembro de 2002). • Assessorar as regionais ou os municípios na investigação dos casos, quando necessário. • Detectar e notificar a ocorrência de surtos de eventos adversos. • Consolidar e analisar os dados do estado. • Repassar o consolidado para o nível nacional até o décimo quinto dia útil de cada mês. • Promover a capacitação e atualização dos recursos humanos e/ou colaborar, nesta área, com as regionais e municípios. Nível nacional • Estabelecer as diretrizes gerais para vigilância de eventos adversos pós-vacinação. • Receber e analisar os consolidados estaduais. • Garantir, através dos Crie, apoio técnico aos estados, participando inclusive da investigação epidemiológica de campo, quando necessário. • Elaborar e manter atualizados os protocolos de investigação dos eventos adversos. • Adotar medidas imediatas frente à ocorrência de surtos de eventos adversos. • Realizar supervisões sistemáticas aos estados. • Promover e colaborar, com os estados, na capacitação e atualização dos recursos humanos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 89 Sistema de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinais Anexo 1 Descrição, tempo decorrente entre aplicação e evento, freqüência, conduta e exames para cada vacina do Calendário Básico de Vacinação Vacina Eventos adversos Tempo decorrente Freqüência das doses 1/2 a 5 Tétano Difteria Conduta Notificar e investigar reações muito intensas ou “surtos” - Aumentam com a repetição das doses Idem - Idem Menos de1/50 Idem - Febre 24/48 horas 1/14 a 1/200 Idem - Febre alta Idem Rara Notificar e investigar - Reação anafilática Menos de 2 horas, geralmente nos primeiros 30 minutos 1/100 mil a 1/150 mil Notificar e investigar. Contra-indica doses subseqüentes - Síndrome de Guillain-Barré Semanas Extremamente rara Neuropatia periférica Horas a semanas 0,4/1milhão Notificar e investigar. Avaliação neurológica. Contra-indica doses subseqüentes Rubor, calor, dor, endurecimento local De 24 a 48 horas De 1/3 a 1/2 Notificar reações mais intensas ou “surtos” Febre Nas primeiras 48 horas 1/330 Febre maior ou igual a 39,5ºC Nas primeiras 48 horas 1/330 Sonolência Ocorre nas primeiras 24 horas 1/3 Dor 1º dia Edema, eritema Idem Edema acentuado Aumenta com a repetição das doses 1/4 a 1/3 Notificar e investigar DTP (I) Exame Tratamento especializado Contra-indica doses subseqüentes Notificar e investigar Tratamento: ver Anexo 2 Não contra-indica doses subseqüentes Recomenda-se antitérmico profilático - Investigação clínica e laboratorial especializada Idem - - - - Tratamento: ver Anexo 2 Choro persistente Inicia-se entre 2 a 8 horas, prolongando-se até 48 horas após a vacina Recomenda-se tratamento sintomático 1/100 Observar Não contra-indica doses subseqüentes Notificar e investigar a existência de relação com outras causas 90 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS - Sistema de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinais Vacina Eventos adversos Irritabilidade Tempo decorrente Nas primeiras 24 horas Freqüência das doses Conduta Exame Não há necessidade de notificar e investigar 1/2 - Não contra-indica doses subseqüentes Vômito Idem 1/15 Idem - Anorexia Idem 1/5 Idem - Episódio hipotônicohiporresponsivo (EHH) Nas primeiras 48 horas, principalmente nas primeiras 6 horas após a vacina Notificar e investigar Tratamento de suporte 1/1.750 Avaliar o EHH e o risco de adquirir coqueluche. Utilizar nas doses subseqüentes a dupla infantil DT ou a DTP, de preferência acelular, se disponível, com as precauções indicadas Clínico, para diagnóstico diferencial 4 Alertar os pais quanto às complicações da coqueluche Notificar e investigar Tratamento a cargo do neurologista DTP (II) Encefalopatia Nos primeiros 7 dias 1/110 mil Contra-indica as doses subseqüentes de DPT. Completar o esquema com a DT (dupla infantil) Alertar os pais quanto às complicações da coqueluche Notificar e investigar Tratamento: ver Anexo 2 Até 72 horas, quase sempre nas primeiras 12 horas 1/1.750 Anafilaxia Geralmente nos primeiros 30min até 2 horas Extremamente rara Reações imunoalérgicas Mais de 2 horas até dias após a aplicação da vacina Ardência, eritema, hiperestesia, enduração 1º dia Convulsão Tríplice viral (I) Continuar esquema com DT ou DPT ou DTaP, caso disponível, com precauções (avaliar riscos) Administrar antitérmico profilático e alertar os pais quanto ao risco da coqueluche - - Exame neurológico Investigação clínica e laboratorial especializada No caso de convulsões de mais de 15 minutos, exame neurológico e investigação clínica e laboratorial Clínico Notificar e investigar Tratamento: ver Anexo 2 Não contra-indica doses subseqüentes Clínico, para diagnóstico diferencial Raros Notificar e investigar reações intensas e “surtos”. Não contraindica doses subseqüentes - Linfadenopatia regional - Rara Idem - Resposta local imune - Rara Idem - Febre baixa, cefaléia, irritabilidade, conjuntivite ou manifestações catarrais 5-12 dias 1/25 a 1/200 Idem - Febre alta 5-12 dias 1/6,7 a 1/20 Idem Exame clínico Exantema 7-10 dias 1/20 Idem Idem Linfadenopatias 7-21 dias 1/100 Idem Idem Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 91 Sistema de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinais Vacina Tríplice viral (II) Eventos adversos Tempo decorrente Meningite 2-3 semanas Desde 1/1 mil até 1/1 milhão conforme a cepa do componente caxumba Pan-encefalite Em média, 5 a 7 anos 0,7/1 milhão Até 2 meses De 1/30 mil a 1/1 milhão Púrpura trombocitopênica Urticária local - Reação anafilática Nos primeiros 30 min até 2 horas Articulares - Tríplice viral (III) Parotidite - Conduta Exame Notificar e investigar. Tratamento sintomático. Contra-indica dose subseqüente Investigação clínica e laboratorial especializada Notificar e investigar. Tratamento com neurologista. Contra-indica dose subseqüente Idem Notificar e investigar Tratamento a cargo de especialista Contra-indica dose subseqüente Idem Muito rara Notificar e investigar. Tratamento: ver Anexo 2. Aplicar dose subseqüente, se necessária, com precauções - 1/2,1 milhões Notificar e investigar. Contraindica dose subseqüente. - Em crianças: 1/333 Notificar e investigar. Tratamento sintomático. Contra-indica doses subseqüentes Investigação clínica, para diagnóstico diferencial Notificar e investigar. Tratamento sintomático. Não contra-indica doses subseqüentes Idem Raras Notificação e investigação: desnecessárias. Tratamento sintomático. Não há contra-indicação para doses subseqüentes Idem Em mulheres adultas: 1/6,7 10-14 dias Orquite, pancreatite Hepatite B Freqüência das doses - Dor 1º dia 1/3,5 a 1/33,3 Notificar e investigar. Contra-indica dose subseqüente - Enduração Idem 1/12,5 Idem - Febre Idem 1/16,9 a 1/100 Idem - Mal-estar, cefaléia, astenia, mialgia, artralgia Idem - Local (dor, abcesso) 1º dia - Febre, mialgia, cefaléia 6 dias Reação anafilática Nos primeiros 30 min até 2 horas 1/20 Não é necessário notificar e investigar. Tratamento sintomático. Não contra-indica doses subseqüentes Idem Clínico, para descartar intercorrência infecciosa - 1/1 milhão Febre amarela Encefalite Visceralização 92 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS - 30 dias após vacinação Geralmente em pessoas com alergia a proteínas do ovo de galinha Notificar e investigar. 1/17 milhão (USA). Notificar e investigar. Contra-indica doses subseqüentes. Tratamento da encefalite No Brasil não há relato Raro. Em investigação Contra-indica doses subseqüentes Notificar - Investigação clínica e laboratorial para afastar outros diagnósticos - Sistema de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinais Vacina Eventos adversos Tempo decorrente Freqüência das doses Maior freqüência nos 6 primeiros meses O risco médio descrito para efeitos locais e regionais (úlcera, abcesso e linfadenopatia regional supurada) é de 0,387 por mil vacinados Abcessos subcutâneos frios Nos primeiros 3 meses Idem Abcessos subcutâneos quentes Podem ocorrer precocemente, até o 15º dia Linfadenopatia regional não supurada Em média nos três primeiros meses Úlcera com diâmetro maior que 1cm BCG (I) Lesões locais e regionais Idem Conduta Exame Notificar e investigar. No caso de não cicatrização até seis meses após a aplicação da vacina, Isoniazida, na dose de 10mg/kg/dia, dose máxima de 400mg, até a regressão completa da lesão - Garantir limpeza local e não usar pomadas, antibióticos ou anti-sépticos Notificar, investigar e acompanhar. Isoniazida na dose de 10mg/kg/dia, dose máxima de 400mg/dia, até a regressão completa da lesão - Notificar, investigar e acompanhar. Conduta indicada para qualquer processo infeccioso agudo de pele - 4 Notificar, investigar e acompanhar Idem Não puncionar e não administrar Isoniazida - Notificar, investigar e acompanhar Linfadenopatia regional supurada Em média, nos três primeiros meses Isoniazida na dose de 10mg/kg/dia, dose máxima de 400mg/dia, até o desaparecimento da supuração e diminuição significativa do tamanho do gânglio. Na presença de gânglios, não fazer incisão; não fazer exérese Idem - Normalmente não se faz nada Reação quelóide Após a cicatrização - Em situação especial, indicam-se cirurgia e radioterapia superficial, para diminuir a probabilidade de formação de quelóide após a cirurgia Notificar, investigar e acompanhar Esquema tríplice com: Isoniazida: 10mg/kg/dia Reação lupóide Tardia Menos de 1 por 10 milhões de vacinados Rifampicina: 10mg/kg/dia Etambutol: 25mg/kg/dia, durante 2 meses, seguido de: Isoniazida: 10mg/kg/dia Rifampicina: 10mg/kg/dia, durante 4 meses - Biópsia de fragmentos de pele Exame bacteriológico direto, cultura, tipificação e exame histológico Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 93 Sistema de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinais Vacina Eventos adversos Tempo decorrente Freqüência das doses Conduta Exame Exame bacteriológico: BCG (II) Lesões resultantes de disseminação Lesões generalizadas Em geral, no decorrer do 1º ano 1,9 por milhão de vacinados Idem - direto Obs.: o esquema acima deve ser prescrito por um período mínimo de 6 meses - cultura - tipificação - exame histopatológico - exame radiológico Todas as doses Vacinados: 1 caso/4,4 a 6,7 milhões de doses administradas Vacinado: 4-40 dias Anti-pólio oral Poliomielite associada à vacina Comunicante de vacinado: 4-85 dias após a vacinação Comunicantes: 1 caso/6,7 a 15,5 milhões de doses administradas Notificar e investigar Tratamento de suporte Na 1ª dose Encaminhar aos Centros de Referência Vacinados: 1 caso/670 mil doses administradas No caso de imunodeficiência, continuar a vacinação com vacina inativada Fezes: colher 2 amostras nos primeiros 15 dias após o início da deficiência motora, observando um intervalo mínimo de 24 horas da 1ª para a 2ª coleta Eletroneuromiografia Comunicantes: 1 caso/milhão de doses administradas Soro anti-rábico 94 Reação anafilática Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Nos primeiros 30 minutos até 2 horas Todos os casos deverão ser notificados e investigados Raro Substituir o soro heterólogo por imunoglobulina humana anti-rábica - Sistema de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinais Anexo 2 Conduta frente a alguns eventos adversos comuns a vários imunobiológicos As vacinas situam-se entre os produtos de maior segurança de uso. Entretanto, é possível que haja reações, até mesmo graves, com a sua utilização. A orientação a seguir destina-se aos serviços de rotina de imunização, com os seus recursos habituais. Não é impositiva, devendo ser adaptada às circunstâncias operacionais e à experiência e treinamento de cada grupo. 4 Manifestações locais Podem ocorrer após a aplicação de qualquer vacina. Os casos de abscesso geralmente encontram-se associados com infecção secundária e erros na técnica de aplicação. Notificação e investigação Notificar e investigar os casos com abscessos ou outras reações locais muito intensas (edema e/ou vermelhidão extensos, limitação de movimentos acentuada e duradoura); também notificar o aumento exagerado de determinadas reações locais associadas eventualmente a erros de técnica ou a lote vacinal (“surtos”). Conduta Tratamento • Analgésico, se necessário; • Compressas frias ou quentes: é prática comum em nosso país a aplicação local de compressas frias ou quentes, para alívio da dor e/ou inflamação. Embora sua eficácia não tenha sido validada em estudos controlados, seu emprego não é contra-indicado. Observação: o Programa Nacional de Imunizações, em seu Manual de Capacitação de Pessoal da Sala de Vacinação, recomenda apenas o uso de compressas frias para tratamento de eventos locais; • Os abscessos devem ser submetidos à avaliação médica, para conduta apropriada. Contra-indicação para doses subseqüentes Não há. Febre Pode ocorrer logo após a aplicação da vacina (como na vacina tríplice DPT, vacina meningocócica B/C) ou alguns dias depois (como na vacina contra o sarampo). É possível que se deva a alguma infecção intercorrente ou desidratação. A criança deve ser examinada quando a febre for alta ou fugir do padrão esperado para o tipo de vacina aplicada. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 95 Sistema de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinais Notificação e investigação Notificar e investigar se detectada com intensidade e freqüência acima do esperado, associadas eventualmente a lotes (“surtos”). Conduta Tratamento Manter a criança em repouso, em ambiente bem ventilado, administrar água e outros líquidos apropriados, tais como o leite materno e terapia de reidratação oral (TRO). Administrar antitérmico, se necessário, de 6/6 horas. Quando a febre for decorrente da vacinação, o quadro é benigno e autolimitado. Não aplicar gelo, álcool ou clisteres gelados. Antitérmicos: de preferência paracetamol, 15mg/kg, via oral. Nos casos de febre muito alta, dipirona, 15mg/kg/dose, via oral ou intramuscular. Evitar aspirina. Antitérmico profilático: utilizá-lo quando na dose anterior houve febre elevada ou convulsão febril. Administrar no momento da vacinação e repetir de 6/6 horas durante 24 a 48 horas. Usar de preferência o paracetamol, na dose já indicada. Ficar atento para a possibilidade de infecção intercorrente, que pode necessitar de tratamento apropriado. Contra-indicação para doses subseqüentes Não há. Considerar a conveniência de antitérmico profilático. Convulsão febril As convulsões febris são observadas geralmente entre os 6 meses a 6 anos de idade, com maior freqüência entre os 12 e 18 meses, incidindo em cerca de 3% da população infantil. São geralmente de curta duração. Podem, entretanto, ocorrer crises múltiplas e prolongadas, circunstâncias em que a pesquisa de doença neurológica, especialmente meningite, é obrigatória. Deve-se oferecer repetidamente às crianças com febre, sobretudo nos dias muito quentes, água, leite materno e outros líquidos apropriados; bem como mantê-las em ambiente ventilado e longe do sol ou de outras fontes de calor. Notificação e investigação Notificar e investigar todos os casos. Conduta Tratamento • Colocar o paciente em decúbito lateral e Trendelenburg; • Aspirar secreções; • Afrouxar as roupas; • Proteger a língua do paciente, com gaze dobrada entre os dentes; • Aplicar anticonvulsivante: o medicamento de escolha para a terapêutica inicial é o Diazepan, administrado por via intravenosa, lentamente, na dose de 0,3mg/kg. 96 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sistema de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinais O qual não deve ser aplicado caso a crise tenha cessado espontaneamente. Pode também ser utilizada a via retal, na dose de 0,5mg/kg. Dose máxima: 10mg/dose. É droga de meia-vida curta, com pequeno período de ação terapêutica. Fenobarbital – a ser utilizado como alternativa inicial, quando não houver diazepínico disponível, ou para dar continuidade ao tratamento. Sua atividade é duradoura, por ter meiavida prolongada. Dose de ataque: 15mg/kg, por via intramuscular; • Oxigênio úmido, se necessário (cianose, mesmo após aspiração); • É comum a criança dormir após a crise, mesmo sem medicação; não se deve acordá-la. Contra-indicação para doses subseqüentes Quando a convulsão for associada à vacina tríplice DTP, completar o esquema vacinal com a dupla infantil DT, ou, se a avaliação do caso e a situação epidemiológica o indicar, com a vacina tríplice, de preferência acelular (DTaP), se disponível, com administração de antitérmico profilático e demais precauções indicadas. 4 Reações de hipersensibilidade Graves: choque anafilático (anafilaxia, reação anafilática) São reações que ocorrem menos de 2 horas após a aplicação da vacina (ou medicamento), geralmente na primeira meia hora, sendo extremamente raras em associação com as vacinações, embora possam ocorrer. Contra-indicam doses subseqüentes com qualquer um dos componentes vacinais do agente imunizante que provocou o choque anafilático. O choque anafilático caracteriza-se por alterações do tônus muscular, paralisia parcial ou completa, palidez, cianose, resposta diminuída ou ausente aos estímulos, depressão ou perda do estado de consciência, alterações cardiovasculares com hipotensão ou choque, alterações respiratórias e, às vezes, parada cardíaca. A reação anafilática induzida pela aplicação de vacina pode estar associada com: • reações ao ovo de galinha, como a vacina de febre amarela; • reação à gelatina, usada como estabilizador em algumas vacinas, como a tríplice viral; • reação a alguns antibióticos (por exemplo, kanamicina) contidos em algumas vacinas; • reação a alguns dos componentes do próprio imunógeno. As manifestações podem ser: • Dermatológicas (prurido, angioedema, urticária generalizada e/ou eritema); • Cardiocirculatórias (hipotensão, arritmias, choque, etc.); • Respiratórias (edema de laringe, com estridor, dificuldade respiratória, tosse, dispnéia, sibilos, etc.); • Neurológicas (síncope, convulsão, alteração da consciência, etc.). Notificação e investigação Notificar e investigar todos os casos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 97 Sistema de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinais Conduta Tratamento Toda unidade que aplique vacinas (ou medicamentos) deve ter um estojo de reanimação permanente, com os medicamentos dentro do prazo de validade. É preciso que o pessoal médico e de enfermagem esteja treinado em relação às condutas para tratamento do choque anafilático. A rapidez do tratamento é fundamental, devendo ser feito no local do primeiro atendimento, pelo menos inicialmente: • adrenalina, 0,01ml/kg, via subcutânea (em caso de choque intramuscular) até 3 vezes, com intervalos de 20 minutos, se necessário; • prometazina, 0,5-1mg/kg, via intramuscular; • acesso venoso; • hidrocortisona, 5mg/kg/dose, via intravenosa, podendo ser repetida a cada 4 ou 6 horas; • manter as vias aéreas permeáveis; • O2 sob máscara ou ambú ou entubação, segundo indicado e possível; • expansores de volume nos choques hipovolêmicos; • encaminhar para unidade hospitalar. Alguns pacientes podem apresentar um segundo episódio até 24 horas após a recuperação do primeiro; por esse motivo, todos os que apresentarem crise grave devem permanecer hospitalizados por 36 horas no mínimo. Contra-indicação para doses subseqüentes Sim, de todos os componentes vacinais do imunobiológico causador. Reações moderadas (urticária, prurido cutâneo, exantema, petéquias) São reações que envolvem apenas um sítio/sistema, ocorrendo mais de duas horas após a vacinação. Notificação e investigação Notificar e investigar todos os casos. Conduta Tratamento Anti-histamínicos via oral, no caso de urticária ou exantema pruriginoso. No caso de manifestações petequiais e/ou purpúricas generalizadas, encaminhar a unidade hospitalar para avaliação por especialista; nas reações locais, apenas observação. Contra-indicação para doses subseqüentes Não há, mas devem ser aplicadas com precauções. 98 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sistema de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinais Reação local grave, consistente com reação tipo Arthus Notificação e investigação Sim. Conduta Tratamento sintomático. Contra-indicação para doses subseqüentes Não administrar dose de reforço até dez anos após a última dose. 4 Alergia ao timerosal (merthiolate) Usado como preservativo de várias vacinas, como DTP, DT, dT, TT, meningocócica B/C, etc., o timerosal pode provocar dermatite de contato mediada por células (hipersensibilidade tardia). Caso alguém tenha alergia cutânea ao timerosal, pode apresentar discreto aumento do processo inflamatório local nos primeiros dias após a vacinação. Notificação e investigação Desnecessárias. Conduta Tratamento Desnecessário. Contra-indicação para doses subseqüentes Não há. Orientar a família. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 99 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 3 Nome do evento adverso Descrição Abscesso frio Tumoração no local de aplicação com flutuação, SEM sinais inflamatórios evidentes 2 Abscesso quente Tumoração no local de aplicação com flutuação, COM sinais inflamatórios (edema, calor, rubor e dor) 23 Artralgia Dor nas articulações 45 Artrite Dor nas articulações, associada com inflamação das mesmas – inchaço, vermelhidão e calor 39 Ataxia Alteração da marcha. Deve ser avaliada por um profissional habilitado 57 Atrofia no local da aplicação Retração da pele no local da aplicação 50 Cefaléia Dor de cabeça 54 Cefaléia e vômito Dor de cabeça e vômito 28 Choque anafilático Hipotensão ou choque associado à urticária , edema de face, laringoespasmo 12 Convulsão afebril Alteração do nível de consciência acompanhada de contrações musculares involuntárias. Em crianças menores, podem ocorrer sem contrações evidentes. Sem associação com febre 11 Convulsão febril Alteração do nível de consciência acompanhada de contrações musculares involuntárias. Em crianças menores, podem ocorrer sem contrações evidentes. Sempre acontecem após período febril 52 Dificuldade de deambular Dificuldade para caminhar. Deve ser avaliada por profissional habilitado 29 Dor, rubor e calor Tipo de reação no local de aplicação 35 Encefalite Inflamação do encéfalo (cérebro) diagnosticada por profissional habilitado, sendo afastadas outras causas conhecidas mediante realização de exames complementares 36 Encefalopatia Distúrbio do sistema nervoso central não explicado por outra causa além da vacinação, ocorrida nos primeiros 7 dias (geralmente nas primeiras 72h) após aplicação da DTP Assemelha-se clinicamente à encefalite, mas sem evidência de reação inflamatória 9 Enduração Tipo de reação com endurecimento no local de aplicação 13 Episódio hipotônico hiporresponsivo Palidez ou cianose perioral, hipotonia(“flacidez”) e diminuição de resposta a estímulos de curta duração 17 Exantema Erupção cutânea generalizada com ou sem prurido 10 Febre maior ou igual a 39,5°C Verificada com termômetro 58 Granuloma Tipo de reação com formação de “caroço” no local de aplicação (diagnóstico histopatológico) 56 Icterícia Coloração amarelada da pele e mucosas, mais evidente nos olhos 41 Lesões generalizadas Lesões semelhantes às da tuberculose, decorrentes da disseminação do BCG nos órgãos 6 Linfadenomegalia maior que 3 cm não supurada Aumento dos gânglios linfáticos (“ínguas”) SEM flutuação ou supuração 5 Linfadenomegalia maior que 3 cm supurada Aumento dos gânglios linfáticos (“ínguas”) COM flutuação ou supuração 7 Linfadenomegalia não supurada Aumento dos gânglios linfáticos (“ínguas”) SEM flutuação ou supuração 8 Linfadenomegalia supurada Aumento dos gânglios linfáticos (“ínguas”) COM flutuação ou supuração 22 Meningite asséptica Inflamação das meninges com culturas do LCR negativas 53 Mialgia Dor muscular 42 Mielite Inflamação da medula espinhal com diagnóstico por profissional habilitado e realização de exames complementares 14 Nódulo Tipo de reação com caroço palpável no local da aplicação 46 Orquite Inflamação dos testículos 49 Osteomielite Infecção do aparelho ósteoarticular 47 Outros eventos Sem definição – Usar campo de resumo clínico para especificar o evento 43 Pancreatite Inflamação do pâncreas diagnosticado por profissional habilitado e realização de exames complementares 26 Paralisia de membros inferiores Paralisação das pernas. Deve ser avaliada por profissional habilitado 55 Paresia Diminuição de força de membros ou de um grupo muscular. Deve ser avaliada por profissional habilitado 15 Parestesia Alteração de sensibilidade na pele (formigamento, dormência). Deve ser avaliada por profissional habilitado 21 Parotidite Inflamação das parótidas – região submandibular – normalmente acompanhada de febre e mal-estar 38 Poliomielite associada à vacina Paralisia flácida aguda que ocorre entre 4-40 dias após a aplicação da vacina, sendo constatada seqüela após 60 dias do início do quadro. Nos casos de comunicantes dos vacinados, o período é de 4-85 dias 48 Polirradiculite (síndrome de Guillain-Barré) Inflamação das raízes nervosas da medula espinhal, caracterizada por dor nos MMII e paralisia ascendente. Deve ser diagnosticada por profissional habilitado e realização de exames complementares 18 Púrpura trombocitopênica Presença de manchas violáceas na pele, de tamanhos variados ( puntiformes a equimoses), acompanhada da diminuição do número de plaquetas no sangue 27 Quelóide Cicatriz elevada e disforme no local da aplicação 32 Reação de Arthus Reação de hipersensibilidade local importante 51 Reação de hipersensibilidade após 2h Urticária localizada ou disseminada, edema de face, laringoespasmo 20 Reação de hipersensibilidade até 2h Urticária localizada ou disseminada, edema de face, laringoespasmo 4 Úlcera maior que 01cm Formação de lesão ulcerada maior que 1cm no local da aplicação 24 Visceralização Quadro de disseminação do vírus vacinal da FA com quadro semelhante ao da doença por vírus selvagem. Deve ser avaliada por profissional habilitado e realização de exames complementares 1 Outras reações locais Sem definição – Usar campo de resumo clínico para especificar o evento 25 Febre menor que 39,5°C Verificada com termômetro 54 Cefaléia / mialgia / mal-estar Sintomas inespecíficos associados que podem ocorrer após a aplicação de algumas vacinas Sistema de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinais 100 Tabela de eventos adversos Código CAPÍTULO 5 Acidentes por animais peçonhentos Acidentes por Animais Peçonhentos Acidentes ofídicos Características clínicas e epidemiológicas Descrição No Brasil, quatro tipos de acidente são considerados de interesse em saúde: botrópico, crotálico, laquético e elapídico. Acidentes por serpentes não-peçonhentas são relativamente freqüentes, porém não determinam acidentes graves e, por isso, são considerados de menor importância médica. O envenenamento causado pela inoculação de toxinas, através de aparelho inoculador (presas) de serpentes, pode determinar alterações locais (na região da picada) e sistêmicas. Agentes causais A presença de fosseta loreal, órgão termorregulador localizado entre o olho e a narina, caracteriza o grupo de serpentes peçonhentas de interesse médico no Brasil, onde se incluem os gêneros Bothrops (jararaca, jararacuçu, urutu, caiçaca), Crotalus (cascavel) e Lachesis (surucucu, pico-de-jaca); como exceção de serpente peçonhenta, o gênero Micrurus (coral verdadeira) não possui fosseta loreal. O gênero Bothrops representa o grupo mais importante de serpentes peçonhentas, com mais de 60 espécies encontradas em todo o território brasileiro (incluindo os gêneros Bothriopsis e Bothrocophias). As principais espécies são: B. atrox – o ofídio mais encontrado na Amazônia, principalmente em beiras de rios e igarapés; B. erythromelas – abundante nas áreas litorâneas e úmidas da região Nordeste; B. jararaca – tem grande capacidade adaptativa, ocupa e coloniza tanto áreas silvestres como agrícolas e periurbanas, sendo a espécie mais comum da região Sudeste; B. jararacussu – é a espécie que pode alcançar o maior comprimento (até 1,8m) e que produz a maior quantidade de veneno dentre as serpentes do gênero, predominante nas regiões Sul e Sudeste; B. moojeni – principal espécie dos cerrados, capaz de se adaptar aos ambientes modificados, com comportamento agressivo e porte avantajado; e B. alternatus – vive em campos e outras áreas abertas, da região Centro-Oeste à Sul. As serpentes do gênero Crotalus são identificadas pela presença de guizo ou chocalho na extremidade caudal. São representadas no Brasil por uma única espécie (C. durissus), com ampla distribuição geográfica, desde os cerrados do Brasil central, regiões áridas e semi-áridas do Nordeste, até os campos e áreas abertas do Sul, Sudeste e Norte. Para o gênero Lachesis, é também identificada uma única espécie (L. muta), habitante da floresta Amazônica e dos remanescentes da Mata Atlântica, que pode alcançar até 3,5m de comprimento. O gênero Micrurus é o representante da família Elapidae no Brasil, onde se incluem as najas asiáticas e africanas. Com cerca de 22 espécies, apresenta ampla distribuição geográfica no país. Os hábitos fossorais, os reduzidos tamanhos da abertura bucal e das presas inoculadoras de veneno e a baixa agressividade justificam o pequeno número de acidentes registrados por este gênero. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 5 103 Acidentes por Animais Peçonhentos Diversos gêneros de serpentes consideradas não-peçonhentas ou de menor importância médica são encontrados em todo o país, sendo também causa comum de acidentes: Phylodrias (cobra-verde, cobra-cipó), Oxyrhopus (falsa-coral), Waglerophis (boipeva), Helicops (cobra d’água), Eunectes (sucuri) e Boa (jibóia), dentre outras. Mecanismo de ação Os venenos ofídicos podem ser classificados de acordo com suas atividades fisiopatológicas, cujos efeitos são observados em nível local (região da picada) e sistêmico. Atividade Veneno Efeitos Inflamatória aguda Botrópico e laquético Lesão endotelial e necrose no local da picada Liberação de mediadores inflamatórios Coagulante Botrópico, laquético e crotálico Incoagulabilidade sangüínea Hemorrágica Botrópico, laquético Sangramentos na região da picada (equimose) e a distância (gengivorragia, hematúria etc.) Neurotóxica Crotálico e elapídico Bloqueio da junção neuromuscular (paralisia de grupos musculares) Miotóxica Crotálico Rabdomiólise (mialgia generalizada, mioglobinúria) “Neurotóxica” vagal Laquético Estimulação colinérgica (vômitos, dor abdominal, diarréia, hipotensão, choque) Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade é universal e a gravidade depende da quantidade de veneno inoculada. Pode haver casos de picada em que não ocorre envenenamento (“picada seca”). Nessas circunstâncias, não há indicação de soroterapia. Não existe imunidade adquirida. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas Na maioria dos casos, o reconhecimento das manifestações clínicas e a história epidemiológica do acidente permitem o diagnóstico do tipo de envenenamento. O diagnóstico por meio da identificação do animal é pouco freqüente. Acidente botrópico Manifestações locais – evidenciam-se nas primeiras horas após a picada, com a presença de edema, dor e equimose na região atingida, que progride ao longo do membro acometido. As marcas de picada nem sempre são visíveis, assim como o sangramento nos pontos de inoculação das presas. Bolhas com conteúdo seroso ou sero-hemorrágico podem surgir na evolução e dar origem à necrose cutânea. As principais complicações locais são decorrentes da necrose e da infecção secundária, que podem levar à amputação e/ou déficit funcional do membro. 104 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Acidentes por Animais Peçonhentos Manifestações sistêmicas – sangramentos em pele e mucosas são comuns (gengivorragia, equimoses a distância do local da picada), hematúria, hematêmese e hemorragia em outras cavidades pode determinar risco ao paciente. Hipotensão pode ser decorrente de seqüestro de líquido no membro picado ou hipovolemia conseqüente a sangramentos, que podem contribuir para a instalação de insuficiência renal aguda. Acidente crotálico Manifestações locais – não se evidenciam alterações significativas. A dor e o edema são usualmente discretos e restritos ao redor da picada; eritema e parestesia são comuns. Manifestações sistêmicas – o aparecimento das manifestações neuroparalíticas tem progressão craniocaudal, iniciando-se por ptose palpebral, turvação visual e oftalmoplegia. Distúrbios de olfato e paladar, além de ptose mandibular e sialorréia, podem ocorrer com o passar das horas. Raramente a musculatura da caixa torácica é acometida, o que ocasiona insuficiência respiratória aguda. Essas manifestações neurotóxicas regridem lentamente, porém são totalmente reversíveis. Pode haver gengivorragia e outros sangramentos discretos. Progressivamente, surgem mialgia generalizada e escurecimento da cor da urina (cor de “cocacola” ou “chá-preto”). A insuficiência renal aguda é a principal complicação e causa de óbito. 5 Acidente laquético As manifestações, tanto locais como sistêmicas, são indistinguíveis do quadro desencadeado pelo veneno botrópico. A diferenciação clínica se faz quando, nos acidentes laquéticos, estão presentes alterações vagais como náuseas, vômitos, cólicas abdominais, diarréia, hipotensão e choque. Acidente elapídico Manifestações locais – dor e parestesia na região da picada são discretos, não havendo lesões evidentes. Manifestações sistêmicas – fácies miastênica ou neurotóxica (comum ao acidente crotálico) constitui a expressão clínica mais comum do envenenamento por coral verdadeira, complicação decorrente da progressão da paralisia da face para os músculos respiratórios. Acidentes por serpentes não-peçonhentas A maioria das picadas causa apenas traumatismo local. Nos acidentes por Phylodrias (cobra-verde, cobra-cipó) e Clelia (muçurana, cobra-preta), pode haver manifestações locais como edema, dor e equimose na região da picada, porém sem gravidade. Diagnóstico diferencial As histórias clínica e epidemiológica permitem a diferenciação dos tipos de envenenamento, mesmo que a serpente não seja identificada. Apenas nas áreas onde há superposição na distribuição geográfica de serpentes do gênero Bothrops e Lachesis, o diagnóstico diferencial de acidente botrópico e laquético somente é possível com a identificação do animal ou presença de manifestações vagais. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 105 Acidentes por Animais Peçonhentos Diagnóstico laboratorial Não existe exame laboratorial para determinar o tipo de envenenamento ofídico, sendo o diagnóstico eminentemente clínico-epidemiológico. Nos acidentes botrópicos, laquéticos e crotálicos, exames de coagulação devem ser realizados para a confirmação diagnóstica e avaliação da eficácia da soroterapia. O tempo de coagulação (TC), simples e de fácil execução, pode ser feito nos locais que não dispõem de laboratório (ver técnica no Anexo 1). Tratamento O tratamento é feito com a aplicação do soro (antiveneno) específico para cada tipo de acidente, de acordo com a gravidade do envenenamento. A aplicação dos soros deve ser por via intravenosa, podendo ser diluídos ou não, em solução fisiológica ou glicosada. Acidente Soro Antibotrópico (SAB) Botrópico Laquético Crotálico Elapídico Antibotrópicolaquético (SABL) Antibotrópicolaquético (SABL) Anticrotálico (SAC) Antielapídico (SAE) Gravidade Nº de ampolas Leve: quadro local discreto, sangramento em pele ou mucosas; pode haver apenas distúrbio na coagulação 2a4 Moderado: edema e equimose evidentes, sangramento sem comprometimento do estado geral; pode haver distúrbio na coagulação 5a8 Grave: alterações locais intensas, hemorragia grave, hipotensão, anúria 12 Moderado: quadro local presente, pode haver sangramentos, sem manifestações vagais 10 Grave: quadro local intenso, hemorragia intensa com manifestações vagais 20 Leve: alterações neuroparalíticas discretas; sem mialgia, escurecimento da urina ou oligúria 5 Moderado: alterações neuroparalíticas evidentes, mialgia e mioglobinúria (urina escura) discretas 10 Grave: alterações neuroparalíticas evidentes, mialgia e mioglobinúria intensas, oligúria 20 Considerar todos os casos potencialmente graves pelo risco de insuficiência respiratória 10 Devido à natureza heteróloga, a administração dos soros pode causar reações de hipersensibilidade imediata. No entanto, testes de sensibilidade cutânea não são recomendados pois, além de terem baixo valor preditivo, retardam o início da soroterapia. Durante a infusão e nas primeiras horas após a administração do soro, o paciente deve ser rigorosamente monitorado para a detecção precoce da ocorrência de reações, tais como urticária, náuseas/vômitos, rouquidão e estridor laríngeo, broncoespasmo, hipotensão e choque. Uma vez diagnosticada a reação, a soroterapia deve ser interrompida e posteriormente reinstituída após tratamento da anafilaxia. 106 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Acidentes por Animais Peçonhentos Reações tardias (doença do soro) podem ocorrer uma a quatro semanas após a soroterapia, com urticária, febre baixa, artralgia e adenomegalia. Não há evidências de que fármacos (antiinflamatórios, heparina) neutralizem os efeitos dos venenos. O único tratamento medicamentoso efetivo pode ser realizado no acidente elapídico, utilizando-se anticolinesterásico (neostigmina). Dose de ataque: 0,25mg/kg adultos ou 0,05mg/kg crianças, via intravenosa. Manutenção: 0,05 a 1mg, via intravenosa a cada 4 horas, precedida de atropina, via intravenosa (0,5mg/kg adultos, 0,05mg/kg). A hidratação endovenosa deve ser iniciada precocemente, para prevenir a insuficiência renal aguda. Aspectos epidemiológicos O número de notificações de ofidismo vem aumentando ano a ano. Em 2003, por exemplo, foram registrados 25.478 acidentes, correspondendo à incidência de 15 casos por 100 mil habitantes. Verifica-se, no entanto, significativa variação por região, com coeficientes mais elevados nas regiões Norte e Centro-Oeste (Tabela 1). 5 Tabela 1. Incidência de acidentes ofídicos por regiões. Brasil, 2003 Região Nº de casos Incidência (100 mil hab.) 7.073 54,8 Nordeste 6.117 12,8 Sudeste 6.840 9,5 Sul 2.741 10,9 Centro-Oeste 2.627 22,6 Brasil 25.478 15,0 Norte Observação: 80 casos sem informação. Uma vez que nem sempre é possível identificar a serpente causadora do acidente, o diagnóstico do tipo de envenenamento é baseado em critérios clínicos e epidemiológicos. Assim, dos quatro gêneros de serpentes peçonhentas verifica-se o predomínio do acidente botrópico, que corresponde a 87,5% dos casos ofídicos notificados no país, seguidos pelo crotálico (9,2%), laquético (2,7%) e elapídico (0,6%), com pequenas variações de acordo com a região e distribuição geográfica das serpentes. Poucos casos são diagnosticados como acidentes por serpentes não-peçonhentas, provavelmente em vista da não utilização de soro específico. Por outro lado, 18,9% dos acidentes ofídicos notificados em 2003 foram diagnosticados como acidente por serpente não identificada. Considerando-se a existência de marcadas diferenças na apresentação clínica dos envenenamentos ofídicos no país, não se justifica essa elevada proporção de casos ignorados. A distribuição dos acidentes ao longo do ano não ocorre de maneira uniforme, verificando-se um incremento no número de casos nas épocas de calor e chuvas, que coincidem Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 107 Acidentes por Animais Peçonhentos com o período de maior atividade humana no campo, o que na maioria dos estados corresponde ao período de janeiro a abril (Gráfico 1). Deste modo, o acidente ofídico acomete, com maior freqüência, adultos jovens do sexo masculino durante o trabalho na zona rural. Gráfico 1. Distribuição mensal dos acidentes ofídicos, por macrorregião. Brasil, 2003 900 800 700 Número de casos 600 500 400 300 200 100 0 Jan Fev Mar Abr N Mai NE Jun Jul SE Ago S Set Out Nov Dez CO O reconhecimento dos períodos de maior risco, dado pela característica sazonalidade na ocorrência destes acidentes, tem importância não apenas para preparar os serviços e os profissionais de saúde para o aumento na demanda de casos mas também para estabelecer estratégias de distribuição e controle dos estoques de soros específicos nos locais de atendimento, bem como fortalecer as ações de prevenção por meio de atividades de educação em saúde. A maioria dos acidentes é classificada como leve e a letalidade geral é relativamente baixa (0,5%). O tempo decorrido entre o acidente, atendimento e tipo de envenenamento pode elevar a letalidade em até oito vezes esta taxa, como no envenenamento crotálico, quando o atendimento é realizado mais de 6 a 12 horas após o acidente (4,7%). Por outro lado, a freqüência de seqüelas, relacionada a complicações locais, é bem mais elevada, situada em 10% nos acidentes botrópicos, associada a fatores de risco como o uso de torniquete, picada em extremidades (dedos de mãos e pés) e retardo na administração da soroterapia. 108 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Acidentes por Animais Peçonhentos Escorpionismo Características clínicas e epidemiológicas Descrição Envenenamento causado pela inoculação de toxinas através de aparelho inoculador (ferrão) de escorpiões, podendo determinar alterações locais (na região da picada) e sistêmicas. Agentes causais No Brasil, os escorpiões de importância médica são representados pelo gênero Tityus, com várias espécies descritas: T. serrulatus (escorpião-amarelo) – com ampla distribuição desde a Bahia ao Paraná e região central do país, representa a espécie de maior interesse pela facilidade de reprodução partenogenética, adaptação ao meio urbano e maior potencial de gravidade de envenenamento; T. bahiensis (escorpião-marrom) – encontrado em todo o país, com exceção da região Norte; T. stigmurus – espécie mais comum do Nordeste; T. cambridgei (escorpião-preto) e T. metuendus – encontrados na Amazônia. São animais carnívoros e alimentam-se principalmente de insetos, como grilos e baratas. Apresentam hábitos noturnos, escondendo-se durante o dia sob pedras, troncos, dormentes de trilhos, entulhos, telhas ou tijolos. Muitas espécies vivem em áreas urbanas, onde encontram abrigo dentro ou próximo das casas, onde dispõem de farta alimentação. Podem sobreviver vários meses sem alimento ou água, o que dificulta sobremaneira seu controle. 5 Mecanismo de ação O veneno escorpiônico, independentemente da espécie, estimula canais de sódio em terminações nervosas, levando à estimulação de nervos periféricos sensitivos, motores e do sistema nervoso autônomo. Susceptibilidade e imunidade Apesar da intensidade das manifestações clínicas ser dependente da quantidade de veneno inoculada, em geral os adultos apresentam quadro local benigno, enquanto as crianças constituem o grupo mais susceptível ao envenenamento sistêmico grave. A susceptibilidade é universal e não existe imunidade adquirida após o acidente escorpiônico. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas Na maioria dos casos, o reconhecimento das manifestações clínicas e a história epidemiológica do acidente permitem o diagnóstico do tipo de envenenamento. O diagnóstico etiológico, quando há identificação do animal, é pouco freqüente. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 109 Acidentes por Animais Peçonhentos Manifestações locais – a dor, de instalação imediata, é o principal sintoma, podendo se irradiar para o membro e ser acompanhada de parestesia, eritema e sudorese localizada ao redor do ponto de picada. Tem duração de até 24 horas, embora o quadro mais intenso ocorra nas primeiras horas após o acidente. Manifestações sistêmicas – após intervalo de minutos até poucas horas (duas a três), podem surgir, em crianças, manifestações sistêmicas como sudorese profusa, agitação psicomotora, tremores, náuseas, vômitos, sialorréia, hipertensão ou hipotensão arterial, arritmia cardíaca, insuficiência cardíaca congestiva, edema pulmonar agudo e choque. A presença dessas manifestações impõe a suspeita do diagnóstico de escorpionismo, mesmo na ausência de história de picada ou identificação do animal. Diagnóstico diferencial Nos casos de impossibilidade de obtenção da história de picada e/ou identificação do agente causal, o diagnóstico diferencial deve ser feito com acidente por aranha do gênero Phoneutria, que provoca quadros local e sistêmico semelhantes ao do escorpionismo. Diagnóstico laboratorial O diagnóstico é eminentemente clínico-epidemiológico e não existe exame laboratorial para confirmação. Os seguintes exames complementares são úteis no acompanhamento de pacientes com manifestações sistêmicas: • eletrocardiograma – taqui ou bradicardia sinusal, extra-sístoles ventriculares, distúrbios na repolarização ventricular, presença de ondas U proeminentes, alterações semelhantes às observadas no infarto agudo do miocárdio e bloqueio na condução ventricular; • radiografia de tórax – aumento da área cardíaca e sinais de edema pulmonar agudo. A ecocardiografia evidencia, nas formas graves, hipocinesia do septo interventricular e de parede, às vezes associada à regurgitação mitral; • bioquímica – creatinofosfoquinase e sua fração MB elevadas, hiperglicemia, hiperamilasemia, hipopotassemia e hiponatremia. Tratamento Na maioria dos casos, onde há somente o quadro local, o tratamento é sintomático e consiste no alívio da dor por infiltração de anestésico sem vasoconstritor (lidocaína a 2%) ou analgésico sistêmico, como dipirona, na dosagem de 10mg/kg. O tratamento específico consiste na administração de soro antiescorpiônico (SAEsc) ou antiaracnídico (SAA) aos pacientes com formas moderadas e graves, mais freqüentes nas crianças picadas por T. serrulatus. A aplicação dos soros deve, como os soros antiofídicos, ser feita pela via intravenosa, bem como os cuidados na administração perante a possibilidade de reações alérgicas. 110 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Acidentes por Animais Peçonhentos Acidente Soro Nº de ampolas Gravidade - Leve: dor e parestesia local Escorpiônico Antiescorpiônico (SAEsc) ou antiaracnídico (SAA) Moderada: dor local intensa associada a uma ou mais manifestações: náuseas, vômitos, sudorese, sialorréia, agitação, taquipnéia e taquicardia 2a3 Grave: além das acima citadas, presença de uma ou mais das seguintes manifestações: vômitos profusos e incoercíveis, sudorese profusa, sialorréia intensa, prostração, convulsão, coma, bradicardia, insuficiência cardíaca, edema pulmonar agudo e choque 4a6 Pacientes com manifestações sistêmicas, especialmente crianças (casos moderados e graves), devem ser mantidos em regime de observação continuada das funções vitais, objetivando o diagnóstico e tratamento precoces das complicações. 5 A bradicardia sinusal associada a baixo débito cardíaco e o bloqueio AV total devem ser tratados com atropina (0,01 a 0,02mg/kg). A hipertensão arterial persistente, associada ou não a edema pulmonar agudo, é tratada com o emprego de nifedipina (0,5mg/kg) sublingual. Nos pacientes com edema pulmonar agudo, além das medidas convencionais de tratamento deve ser considerada a necessidade de ventilação artificial mecânica, dependendo da evolução clínica. O tratamento da insuficiência cardíaca e do choque é complexo e geralmente necessita do emprego de infusão venosa contínua de dopamina e/ou dobutamina (2,5 a 20 μg/kg/min). Aspectos epidemiológicos A distribuição do escorpionismo ao longo do ano não ocorre de maneira uniforme, verificando-se um incremento no número de casos nas épocas de calor e chuvas, que coincidem com o período de maior atividade biológica dos escorpiões. De caráter predominantemente urbano, sua ocorrência tem se elevado nos últimos anos, particularmente nos estados do Nordeste, atingindo mais de 21.022 acidentes em 2003 e taxa de incidência de 12 casos por 100 mil habitantes. A maioria dos acidentes é classificada como leve e não requer soroterapia, podendo ser tratada na unidade de saúde mais próxima do local de ocorrência. Em que pese a baixa letalidade (0,2%), crianças abaixo de 14 anos têm risco mais elevado de evoluir para óbito (3,2%). Em 2003, foram registrados 48 óbitos, a quase totalidade em menores de 14 anos (Figura 1). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 111 Acidentes por Animais Peçonhentos Figura 1. Percentual acumulado de óbitos por escorpianismo. Brasil, 2003 100,0 % 95,8 90,0 97,9 100,0 80,0 93,8 70,0 60,0 77,1 50,0 40,0 43,8 30,0 20,0 10,0 4,2 0,0 < 1 ano 1a4 5a9 10 a 14 15 a 19 20 a 34 35 a 40 50 a 64 65 a 79 80 e + No caso do escorpionismo, o tempo entre o acidente e o início de manifestações sistêmicas graves é bem mais curto do que para os acidentes ofídicos. Deste modo, crianças picadas por T. serrulatus, ao apresentar os primeiros sinais e sintomas de envenenamento sistêmico, devem receber o soro específico o mais rapidamente possível, bem como cuidados para a manutenção das funções vitais. Araneísmo Características clínicas e epidemiológicas Descrição Envenenamento causado pela inoculação de toxinas através de aparelho inoculador (quelíceras) de aranhas, podendo determinar alterações locais (na região da picada) e sistêmicas. Apesar do grande número de aranhas encontradas na natureza, poucas são consideradas de importância médica. Agentes causais As aranhas peçonhentas de interesse médico no Brasil são representadas pelos gêneros Loxosceles (aranha-marrom), Phoneutria (armadeira) e Latrodectus (viúva-negra), que apresentam aspectos biológicos e distribuição geográfica bastante distintos. O gênero Loxosceles é encontrado em todo o país, mas sua importância é mais destacada na região Sul, particularmente no Paraná, onde vem proliferando de maneira significativa na última década. Várias são as espécies descritas e as principais causadoras de acidentes são: Loxosceles intermedia, L. laeta e L. gaucho. Podem atingir 1cm de corpo e até 3cm de envergadura de pernas. Constroem teias irregulares em fendas de barrancos, sob cascas de 112 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Acidentes por Animais Peçonhentos árvores, telhas e tijolos, atrás de quadros e móveis e em vestimentas, geralmente ao abrigo da luz; não são agressivas e picam somente quando comprimidas contra o corpo. Outras aranhas bastante comuns no peridomicílio, como as representantes da família Lycosidae (aranha-de-grama, aranha-de-jardim) e as caranguejeiras, não representam problema de saúde. Eventualmente, podem ocasionar picada dolorosa, porém sem repercussão sistêmica. Mecanismo de ação De acordo com as atividades fisiopatológicas, os efeitos dos venenos das aranhas de interesse médico são distintos, tanto em nível local como sistêmico. 5 Atividade Veneno Efeitos Dermonecrótica Loxosceles Necrose cutânea no local da picada Hemolítica Loxosceles Hemólise intravascular Sobre terminações nervosas Phoneutria, Latrodectus Local: dor, edema, sudorese Sistêmico: contraturas musculares, intoxicação adrenérgica/colinérgica Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas Loxoscelismo Manifestações locais – a picada é usualmente pouco dolorosa, podendo passar desapercebida; após algumas horas, tornam-se evidentes dor, eritema e edema na região da picada, com equimose central, áreas de palidez (placa marmórea) e, eventualmente, bolhas com conteúdo sero-hemorrágico; à palpação, nota-se área endurada. A lesão cutânea pode evoluir com necrose seca e úlcera. Manifestações sistêmicas – acompanhando o quadro local, queixas inespecíficas como mal-estar, cefaléia, febre e exantema são comumente referidas pelos pacientes. A presença de hemólise intravascular caracteriza a chamada forma cutâneo-visceral do loxoscelismo, observada na minoria dos casos, em geral nas primeiras 72 horas após a picada. Os casos graves podem evoluir com insuficiência renal aguda. Foneutrismo Manifestações locais – a dor irradiada e de início imediato é o sintoma mais característico, podendo ser bastante intensa nas primeiras três a quatro horas após a picada; o quadro pode ser acompanhado por edema e sudorese no local e parestesia ao longo do membro. As marcas dos pontos de inoculação podem ou não ser visualizadas. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 113 Acidentes por Animais Peçonhentos Manifestações sistêmicas – em associação ao quadro local, os pacientes podem apresentar taquicardia, hipertensão arterial, agitação psicomotora e vômitos. Crianças podem apresentar manifestações graves, como sudorese profusa, sialorréia, priapismo, hipotensão, choque e edema pulmonar agudo, que podem eventualmente levar a óbito. Latrodectismo Manifestações locais – geralmente o quadro se inicia com dor local de pequena intensidade, evoluindo com sensação de queimação; observa-se pápula eritematosa e sudorese localizada. Manifestações sistêmicas – são mais freqüentemente observadas alterações motoras, como dor irradiada e contrações espasmódicas dos membros inferiores, contraturas musculares intermitentes, tremores, dor com rigidez abdominal (que pode simular abdome agudo) e fácies latrodectísmica, caracterizada por contratura facial e trismo dos masseteres. Outras manifestações, menos freqüentes, incluem opressão precordial, taquicardia e hipertensão arterial, náuseas, vômitos, sialorréia e priapismo. Diagnóstico diferencial Os quadros de dor local observados nos acidentes por Phoneutria e escorpiônicos são indistinguíveis. Nesses casos, mesmo que o agente não seja identificado, é realizado o tratamento sintomático; se houver indicação de soroterapia, deve ser utilizado o soro antiaracnídico que contém frações que neutralizam os venenos de Tityus, Phoneutria e Loxosceles. Diagnóstico laboratorial Não existe diagnóstico específico para o loxoscelismo. Na forma cutâneo-visceral, as alterações laboratoriais podem ser subclínicas, com anemia aguda e hiperbilirrubinemia indireta; elevação dos níveis séricos de uréia e creatinina é observada somente quando há insuficiência renal aguda. Da mesma forma, as alterações laboratoriais no latrodectismo são inespecíficas, sendo descritos distúrbios hematológicos (leucocitose, linfopenia), bioquímicos (hiperglicemia, hiperfosfatemia), do sedimento urinário (albuminúria, hematúria, leucocitúria) e eletrocardiográficas (fibrilação atrial, bloqueios, diminuição de amplitude do QRS e da onda T, inversão da onda T, alterações do segmento ST e prolongamento do intervalo QT). As alterações laboratoriais do foneutrismo são semelhantes às do escorpionismo, notadamente aquelas decorrentes de comprometimento cardiovascular. Tratamento Além de calor local e analgésico sistêmico, o tratamento sintomático para a dor no foneutrismo inclui infiltração anestésica local ou troncular com lidocaína a 2% ou similar, sem vasoconstritor (3-4ml em adultos e 1-2ml em crianças). Havendo recorrência da dor, pode ser necessária nova infiltração, em geral em intervalos de 60 min. Caso não haja resposta satisfatória ao anestésico, recomenda-se o uso de meperidina 50-100mg (crianças: 1mg/kg) via intramuscular. A soroterapia tem indicação restrita, conforme a gravidade do 114 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Acidentes por Animais Peçonhentos acidente, sendo utilizado o soro antiaracnídico que contém frações que neutralizam o veneno de Tityus, Phoneutria e Loxosceles. No loxoscelismo, a limitação ao uso de antiveneno se deve ao diagnóstico tardio, muitas vezes realizado já com a necrose cutânea delimitada. Nesse caso, medidas de suporte, como uso de antissépticos, lavagem com KMnO4 (permanganato de potássio) a 1:40 mil e curativos locais são recomendados até que ocorram a remoção da escara e o acompanhamento cirúrgico para o manejo da úlcera e correção da cicatriz. O soro antilatrodéctico encontra-se em fase experimental, não sendo disponível para uso de rotina. Desta forma, o tratamento medicamentoso do latrodectismo inclui, além de analgésicos sistêmicos: • benzodiazepínicos do tipo diazepan: 5-10mg (crianças: 1-2mg), via intravenosa, a cada 4 horas, se necessário; • gluconato de cálcio 10%: 10-20ml (crianças: 1mg/kg), via intravenosa, a cada 4 horas, se necessário; • clorpromazina: 25-50mg (crianças: 0,55mg/kg/dose), via intramuscular, a cada 8 horas, se necessário. 5 Aspectos epidemiológicos Acidente Soro Nº de ampolas Gravidade Leve: dor local, edema, eritema, sudorese, piloreção Foneutrismo Antiaracnídico (SAA) - Moderada: dor local intensa, sudorese, vômitos ocasionais, agitação psicomotora, hipertensão arterial 2a4 Grave: sudorese profusa, sialorréia, vômitos profusos, priapismo, choque, edema pulmonar agudo 5 a 10 Leve: aranha identificada, lesão incaracterística, ausência de comprometimento sistêmico Loxoscelismo Antiloxoscélico (SALox) ou antiaracnídico (SAA) - Moderada: independentemente da identificação do agente, lesão sugestiva ou característica, manifestações sistêmicas inespecíficas (exantema, febre), ausência de hemólise 5* Grave: lesão característica, manifestações clínicas e/ou evidências laboratoriais de hemólise intravascular 10* *Recomenda-se a associação com prednisona (adultos: 40mg/dia; crianças: 1mg/kg/dia) durante 5 dias. A epidemiologia dos acidentes aracnídicos é bastante distinta, a depender dos três tipos de envenenamento. Dos 15.038 casos registrados em 2003 (incidência: 8,9 acidentes por 100 mil habitantes), o loxoscelismo foi responsável por 49,6% das notificações, enquanto o foneutrismo respondeu por 11,9% e o latrodectismo por 0,4%. Boa parte dos registros não fornece informações sobre o tipo de envenenamento, com cerca de 33,6% sem identificação do tipo de acidente. Diferentemente dos acidentes ofídicos e escorpiônicos, o pico de ocorrência do fonoeutrismo se concentra nos meses de abril e maio, pelo menos na região Sudeste, que concentra a Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 115 Acidentes por Animais Peçonhentos maioria das notificações. Uma vez que 90% dos casos são considerados acidentes leves, a freqüência do uso de soro antiaracnídico é baixa, podendo, em sua grande maioria, ser tratados em unidades de saúde não especializadas. Na vigência de manifestações sistêmicas, onde há necessidade de soroterapia, o tratamento deve ser feito em ambiente hospitalar com recursos para o monitoramento das funções vitais e suporte de terapia intensiva, se necessário. Os acidentes por Loxosceles ocorrem com maior freqüência no verão, com sazonalidade semelhante à dos acidentes ofídicos e escorpiônicos. As causas para o incremento da população de aranhas no Paraná e, conseqüentemente, dos acidentes neste estado não estão bem definidas. É possível que, além de condições ambientais (umidade, temperatura), a adaptação ao meio intradomiliciar possa ter facilitado a disseminação desses animais, mais notadamente no município de Curitiba. A importância do loxoscelismo nessa unidade federada levou, inclusive, à produção do soro antiloxoscélico pelo Centro de Produção e Pesquisa em Imunobiológicos (CPPI), da Secretaria de Estado da Saúde do Paraná, hoje distribuído para todo o país. Os dados epidemiológicos do latrodectismo são escassos, por serem acidentes de baixa incidência e restritos à faixa litorânea da região Nordeste. Não há óbitos registrados por este gênero de aranha. Por outro lado, a eficácia do soro antilatrodéctico, importado da Argentina, na redução da intensidade e duração das manifestações sistêmicas de alguns casos motivou o desenvolvimento de pesquisas para viabilizar a produção do antiveneno específico. No momento, sua utilização encontra-se em fase experimental. Acidentes por lonomia e outras lagartas Características clínicas e epidemiológicas Descrição Envenenamento causado pela penetração de cerdas de lagartas (lepidópteros) na pele, ocorrendo, assim, a inoculação de toxinas que podem determinar alterações locais e, nos envenenamentos pelo gênero Lonomia, manifestações sistêmicas. Agentes causais São considerados de importância médica os acidentes causados por insetos pertencentes a ordem Lepidoptera, na sua forma larvária. Popularmente conhecidas como taturana, oruga, ruga, lagarta-de-fogo, apresentam grande variedade morfológica. As principais famílias de lepidópteros causadoras de acidentes são a Megalopygidae e a Saturniidae. Os representantes da família Megalopygidae (megalopigídeos) apresentam cerdas pontiagudas, curtas e que contêm as glândulas de veneno, entremeadas por outras longas, coloridas e inofensivas. Já as lagartas da família Saturniidae (saturnídeos) têm “espinhos” ramificados e pontiagudos de aspecto arbóreo, com tonalidades esverdeadas, mimetizando, muitas vezes, as plantas que habitam. Nesta família se inclui o gênero Lonomia, causador de acidentes hemorrágicos. 116 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Acidentes por Animais Peçonhentos Alimentam-se durante a noite, permanecendo no tronco durante o dia. Os megalopigídeos são solitários, enquanto os saturnídeos têm hábitos gregários, fazendo com que o acidente ocorra, geralmente, com várias lagartas, principalmente em crianças que, ao subir no tronco das árvores, terminam por entrar em contato com as mesmas. Os lepidópteros têm ampla distribuição em todo o país. As lagartas do gênero Lonomia vêm adquirindo, na última década, maior relevância em função do aumento na população de insetos, com duas espécies descritas: L. obliqua, encontrada predominantemente na região Sul, São Paulo e Minas Gerais, e L. achelous, identificada no Pará, Amapá e Maranhão. É o único grupo responsável por manifestações sistêmicas, caracterizadas por sangramentos. Mecanismo de ação Não se conhece exatamente como agem os venenos das lagartas. Atribui-se ação aos líquidos da hemolinfa e da secreção das espículas, tendo a histamina como um dos principais componentes. O veneno de Lonomia provoca um distúrbio na coagulação sangüínea, com dois mecanismos descritos. Os extratos de cerdas de L. obliqua indicam atividade procoagulante do veneno por ativação de um ou mais fatores de coagulação (fator X e protrombina). Já para o veneno de L. achelous é descrita intensa ação fibrinolítica e quadro semelhante ao de coagulação intravascular disseminada, cujo resultado final se traduz por consumo dos fatores de coagulação e conseqüente incoagulabilidade sangüínea. 5 Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade é universal e a gravidade depende da quantidade de veneno inoculada. Pode haver acidentes em que ocorrem somente alterações locais; nessas circunstâncias não há indicação de soroterapia e o tratamento pode ser feito com sintomáticos. Não existe imunidade adquirida após o envenenamento. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas Manifestações locais – independentemente do gênero ou família do lepidóptero causador do acidente, o quadro local é indistinguível e se caracteriza por dor imediata em queimação, irradiada para o membro, com área de eritema e edema na região do contato; eventualmente, pode-se evidenciar lesões puntiformes eritematosas nos pontos de inoculação das cerdas. Adenomegalia regional dolorosa é comumente referida. Embora raro, pode haver evolução com bolhas e necrose cutânea superficial. Os sintomas normalmente regridem em 24 horas, sem maiores complicações. Manifestações sistêmicas – são somente observadas nos acidentes por Lonomia e instalam-se algumas horas após o acidente, mesmo após a regressão do quadro local. Chama a atenção a presença de queixas inespecíficas, como cefaléia, mal-estar, náuseas e dor Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 117 Acidentes por Animais Peçonhentos abdominal, que muitas vezes estão associadas ou mesmo antecedem o aparecimento de sangramentos. Dentre as manifestações hemorrágicas, são mais comumente observadas gengivorragia, equimoses de aparecimento espontâneo ou provocados por traumatismo/ venopunção, epistaxe e, em outros sítios que podem determinar maior gravidade, hematúria, hematêmese e hemoptise. Insuficiência renal aguda e hemorragia intracraniana têm sido associados a óbitos. Diagnóstico diferencial Se o agente causal não for identificado e houver somente manifestações locais, não é possível fazer o diagnóstico diferencial de acidente por Lonomia e outros lepidópteros. Na situação de um paciente com história de contato com lagarta, sem sangramento ou alteração na coagulação, recomenda-se observação clínica e controle laboratorial durante as primeiras 24 horas após o acidente, período em que pode haver o surgimento do quadro hemorrágico e/ou alteração da coagulação. Neste caso, está indicada a soroterapia específica. Diagnóstico laboratorial Cerca de 50% dos pacientes acidentados por Lonomia apresentam distúrbio na coagulação sangüínea, com ou sem sangramentos. O tempo de coagulação, a exemplo dos acidentes ofídicos, é ferramenta útil na detecção desses casos e no acompanhamento após soroterapia. A reversão da incoagulabilidade sangüínea costuma ocorrer 24 horas após a administração do antiveneno específico, podendo o controle ser realizado pelas provas de coagulação, como tempo de protrombina, tempo de tromboplastina parcial ativada e tempo de trombina, que, em geral, estão alteradas na admissão e mantêm um perfil semelhante na recuperação pós-soro. Não há alteração na contagem de plaquetas, a não ser nos casos graves. Hemólise subclínica pode ser detectada. Uréia e creatinina se elevam na vigência de insuficiência renal aguda. Caso o paciente apresente torpor, rebaixamento do nível de consciência e coma, recomenda-se a realização de tomografia computadorizada de crânio para a detecção de eventual sangramento intracraniano. Tratamento O tratamento do quadro local é realizado com medidas sintomáticas que envolvem lavagem e compressas da região com água fria ou gelada, analgésicos e anti-histamínicos sistêmicos e infiltração local com anestésico do tipo lidocaína a 2%. Nos acidentes com manifestações hemorrágicas, o paciente deve ser mantido em repouso, evitando-se intervenções traumáticas, como injeções intramusculares, punções e manipulações cirúrgicas até a normalização da coagulopatia. O soro antilonômico (SALon) encontra-se disponível para aplicação, conforme a gravidade do envenenamento. 118 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Acidentes por Animais Peçonhentos Acidente lonômico Gravidade Nº de ampolas Leve: quadro local apenas, sem sangramento ou distúrbio na coagulação - Moderada: quadro local presente ou não, presença de distúrbio na coagulação, sangramento em pele e/ou mucosas 5 Grave: independente do quadro local, presença de sangramento em vísceras ou complicações com risco de morte ao paciente 10 Soro Antilonômico (SALon) A aplicação é por via intravenosa e os cuidados em relação às reações adversas são os mesmos adotados na administração dos demais soros antipeçonhentos, uma vez que a produção das imunoglobulinas específicas se faz por meio da imunização de cavalos com extratos de cerdas de lagartas. 5 Aspectos epidemiológicos A notificação dos acidentes por lepidópteros depende da importância dos envenenamentos por Lonomia, os quais, por sua vez, adquiriram magnitude significativa nos últimos anos. Os dados disponíveis, no entanto, não refletem a real incidência desses casos. Em 2003, foram registrados 291 acidentes por Lonomia e 820 por outras lagartas, principalmente em Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná. Mas estados que nunca haviam registrado casos anteriormente, como Maranhão e Minas Gerais, passaram a notificar acidentes hemorrágicos. Nos estados das regiões Sul e Sudeste, a sazonalidade no registro dos acidentes é bastante marcada, com predomínio de outubro a abril. São acidentes característicos da zona rural. Sendo as lagartas polífagas, cuja alimentação é baseada em folhas, freqüentemente são encontradas em árvores frutíferas como goiabeira, ameixeira, abacateiro etc., além de plantas nativas. O grupo etário pediátrico é o mais acometido, com ligeira predominância no sexo masculino, fato relacionado às circunstâncias em que os acidentes ocorrem. Já os casos graves e óbitos têm sido registrados em idosos com patologias prévias. Outros fatores de risco para gravidade envolvem a quantidade e intensidade do contato com as lagartas e a presença de traumatismos que podem levar a hemorragia maciça ou em órgão vital. Vigilância epidemiológica Objetivos Reduzir a incidência dos acidentes por animais peçonhentos por meio da promoção de ações de educação em saúde; Diminuir a gravidade, a freqüência de seqüelas e a letalidade mediante o uso adequado da soroterapia. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 119 Acidentes por Animais Peçonhentos Definição de caso Paciente com evidências clínicas compatíveis com envenenamento por animal peçonhento, com ou sem a identificação do animal causador do acidente. O diagnóstico etiológico é realizado quando, além das alterações decorrentes do envenenamento, o animal causador do acidente é levado pelo paciente ou familiares e identificado. Entretanto, para efeito de tratamento e de vigilância epidemiológica, são considerados confirmados todos os casos que se enquadrem na definição acima constante. Notificação Agravo de interesse nacional, todo acidente por animal peçonhento atendido na unidade de saúde deve ser notificado, independentemente do paciente ter sido ou não submetido à soroterapia. Existe uma ficha específica de investigação do Sinan que se constitui instrumento fundamental para o estabelecimento de normas de atenção ao paciente e distribuição de soros antipeçonhentos, de acordo com as características regionais na ocorrência dos acidentes. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente Todo paciente deve receber atendimento por profissional médico para avaliação e indicação do tratamento indicado. Recomenda-se que todos aqueles submetidos à soroterapia sejam hospitalizados para monitorar o aparecimento de reações, avaliar a eficácia da soroterapia (mediante parâmetros para verificar a neutralização dos efeitos do envenenamento) e a ocorrência de complicações locais e sistêmicas, em especial a insuficiência renal aguda. As unidades de saúde que aplicam soros devem contar com materiais e medicamentos essenciais para a intervenção em caso de reação alérgica ao antiveneno, bem como para a abordagem inicial das complicações. Qualidade da assistência O diagnóstico precoce e o tratamento adequado são fatores fundamentais para o prognóstico do paciente. Assim, o profissional de vigilância epidemiológica deve verificar se as equipes de assistência estão capacitadas para realizar o diagnóstico e aplicar corretamente a soroterapia, e se as unidades de saúde dispõem de antivenenos em quantidade adequada e para todos os tipos de envenenamento. O paciente deve ser avaliado minuciosamente para se evitar a administração desnecessária de soro nos casos de acidente sem envenenamento ou por animal nãopeçonhento. 120 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Acidentes por Animais Peçonhentos A inoculação de pequena quantidade de veneno pode determinar o aparecimento insidioso dos sintomas. Deste modo, indica-se a observação mínima de 6 a 12 horas em todos os casos cujas manifestações clínicas não sejam evidentes à admissão. Proteção individual para evitar acidentes • Não andar descalço: o uso de sapatos, botinas sem elásticos, botas ou perneiras evita 80% dos acidentes. • Olhar sempre com atenção o local de trabalho e os caminhos a percorrer. • Usar luvas de couro nas atividades rurais e de jardinagem. • Não colocar as mãos em tocas ou buracos na terra, ocos de árvores, cupinzeiros, entre espaços situados em montes de lenha ou entre pedras, usar antes um pedaço de pau, enxada ou foice. • No amanhecer e no entardecer, evitar a aproximação da vegetação muito próxima ao chão, gramados ou até mesmo jardins, pois é nesse momento que as serpentes estão em maior atividade. • Usar calçados e luvas nas atividades de jardinagem e ao manusear materiais de construção. • Examinar calçados e roupas pessoais, de cama e banho, antes de usá-las. 5 Proteção da população • Não depositar ou acumular material inútil junto à habitação, como lixo, entulhos e materiais de construção; manter sempre a calçada limpa ao redor da casa. • Evitar trepadeiras encostadas à casa, folhagens entrando pelo telhado ou mesmo pelo forro. • Controlar o número de roedores existentes na área: sua diminuição pode evitar a aproximação de serpentes peçonhentas que deles se alimentam. • Não montar acampamento junto a plantações, pastos ou matos, áreas onde normalmente há roedores e maior número de serpentes. • Não fazer piquenique às margens dos rios ou lagoas, deles mantendo distância segura, e não se encostar a barrancos durante pescarias. • Afastar as camas das paredes e evitar pendurar roupas fora de armários. • Limpar regularmente móveis, cortinas, quadros, cantos de parede e terrenos baldios. • Vedar frestas e buracos em paredes, assoalhos, forros, meia-canas e rodapés. • Utilizar telas, vedantes ou sacos de areia em portas, janelas e ralos. • Manter limpos os locais próximos das residências, jardins, quintais, paióis e celeiros. • Combater a proliferação de insetos, principalmente baratas e cupins, pois são alimentos para escorpiões. • Preservar os predadores naturais de escorpiões, como seriemas, corujas, sapos, lagartixas e galinhas. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 121 Acidentes por Animais Peçonhentos Investigação Consiste na obtenção detalhada de dados do acidente, mediante o preenchimento da ficha de investigação de caso, com o objetivo de determinar o tipo de envenenamento ocorrido, a gravidade das manifestações clínicas e a soroterapia instituída. A investigação deve ser realizada em todos os casos confirmados, independentemente da aplicação de antiveneno. Roteiro de investigação epidemiológica Identificação do paciente Preencher todos os campos dos itens da ficha de investigação de caso do Sinan, relativos aos dados gerais, de residência e notificação individual. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos • Anotar, na ficha de investigação, dados dos antecedentes epidemiológicos e clínicos, para determinar o tipo de acidente compatível com o quadro clínico-epidemiológico. • Verificar a compatibilidade entre o tipo e quantidade de soro administrado e o diagnóstico e gravidade do envenenamento. • Acompanhar a evolução após a soroterapia, para identificar a ocorrência de complicações e eventual óbito. Análise de dados A análise dos dados objetiva proporcionar conhecimentos atualizados sobre características epidemiológicas dos acidentes, no que diz respeito, principalmente, à distribuição da incidência por áreas geográficas, tipos de envenenamento, sazonalidade, grupos etários, utilização de soros, letalidade, eficiência da distribuição e aplicação dos soros e possíveis falhas na assistência médica no diagnóstico e tratamento dos casos. Os casos ocorrem predominantemente na zona rural, o que determina diferenças na incidência dos acidentes nas unidades federadas. O conhecimento sobre as áreas de maior risco e a distribuição geográfica das serpentes peçonhentas causadoras de acidentes permite estratégias para a organização da assistência médica e planejamento das ações de vigilância, incluindo a distribuição de soros compatível com o perfil epidemiológico dos acidentes. No caso do ofidismo, o grupo etário mais acometido é composto por adultos jovens (entre 15 e 40 anos), com predomínio do sexo masculino, devido à maior exposição ao trabalho agrícola. A letalidade é mais elevada nos extremos de idade (crianças abaixo de 7 anos e maiores de 65 anos), o que indica a necessidade de maior atenção a esses grupos. Da mesma forma, a letalidade é variável de acordo com o tipo de envenenamento, apresentando o acidente crotálico taxa três a quatro vezes maior que o botrópico, apesar deste ser o acidente de maior freqüência em todo o país. Os envenenamento por T. serrulatus são mais comuns em crianças abaixo de 14 anos. De modo geral, as manifestações sistêmicas e os óbitos são descritos precocemente, o que reflete a importância do pronto atendimento aos acidentados, para a redução da letalidade, complicações e seqüelas. 122 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Acidentes por Animais Peçonhentos Encerramento de caso As fichas epidemiológicas devem ser analisadas visando definir, a partir do diagnóstico, a evolução de cada caso, considerando as seguintes alternativas: Cura completa – paciente que, após soroterapia, apresenta evolução sem complicações locais ou sistêmicas; Cura com seqüelas – nos acidentes ofídicos e no loxoscelismo, independentemente da soroterapia, podem ocorrer complicações em decorrência de infecção ou necrose extensa. Deste modo, registra-se com alguma freqüência déficit funcional ou amputação do membro acometido em acidentes ofídicos. Lesão renal irreversível também determina a ocorrência de seqüelas. Para o escorpionismo e foneutrismo, usualmente a resolução do quadro se faz sem seqüelas, que só ocorrem devido a complicações de procedimentos invasivos, geralmente em pacientes que necessitaram de hospitalização em unidade de terapia intensiva; Óbito – quando relacionado diretamente ao envenenamento, conseqüente a complicações ou a reações adversas à soroterapia. 5 Relatório final A elaboração dos relatórios deve ser feita sistematicamente, em todos os níveis do sistema, e sua periodicidade depende da situação epidemiológica e da organização do fluxo de informações. Instrumentos disponíveis para controle Não existem medidas específicas para controle da população dos animais peçonhentos. Por serem animais silvestres, são proibidos sua captura e transporte não autorizados legalmente. Portanto, a única garantia para que não haja acidentes é a prevenção de sua ocorrência. Vigilância ambiental Os animais peçonhentos podem estar presentes em vários tipos de ambiente. No caso de serpentes, há espécies que vivem em ambientes florestais e outras em áreas abertas, como campos cerrados e caatingas, o que torna inviável o monitoramento de sua presença na natureza. A diversidade de hábitos alimentares é grande e várias espécies alimentam-se de invertebrados, como moluscos, minhocas e artrópodes, ao passo que outras se alimentam de vertebrados, como peixes, anfíbios, lagartos, serpentes, aves e mamíferos. Ressalte-se como de importância no meio periurbano a presença de roedores, que aumenta a proximidade dos ofídios ao homem. A proteção de predadores naturais de serpentes, como as emas, siriemas, gaviões, gambás e cangambás, e a manutenção de animais domésticos como galinhas e gansos próximos às habitações, em geral afastam as serpentes. O crescimento da população dos escorpiões e de aranhas do gênero Loxosceles no meio urbano dificulta o controle desses animais, principalmente na periferia das cidades, onde Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 123 Acidentes por Animais Peçonhentos encontram alimento farto, constituído por baratas e outros insetos. Inseticidas e outros produtos tóxicos não têm ação na eliminação dos animais no ambiente. Apesar de não serem bem conhecidos os fatores que acarretam mudanças no padrão das populações de animais peçonhentos em determinado meio, como é o caso de Loxosceles e Lonomia no Sul do país, desequilíbrios ecológicos ocasionados por desmatamentos, uso indiscriminado de agrotóxicos e outros produtos químicos em lavouras, e alterações climáticas ocorridas ao longo de vários anos, certamente têm participação no incremento dos acidentes e, conseqüentemente, importância em termos de saúde pública. Ações de educação em saúde As estratégias de atuação junto às comunidades expostas ao risco de acidentes deve incluir, além das noções de prevenção dos acidentes, medidas de orientação para a não realização de práticas caseiras e alternativas no manejo dos pacientes, tais como: • o uso de torniquete ou garrote, embora ainda bastante difundido, tem sido associado a complicações locais nos acidentes botrópicos e laquéticos, por favorecer a concentração de veneno e agravar a isquemia na região da picada; • sucção e incisão no local da picada propiciam, além de infecção cutânea, a ocorrência de hemorragia, não tendo nenhuma eficácia na redução da absorção do veneno; • a colocação de substâncias como alho, esterco, borra de café e outros produtos permanecem como práticas ainda fortemente arraigadas na população. A crença nessas medidas provoca o retardo no encaminhamento do paciente para a unidade de saúde, que é feito tardiamente para a administração do soro, muitas vezes quando o indivíduo já apresenta complicações; • medicamentos fitoterápicos e outras terapias alternativas não encontram respaldo na literatura científica para o tratamento dos acidentes por animais peçonhentos, devendo-se desestimular o seu uso. Organização da distribuição dos soros antipeçonhentos Desde a implantação do Programa Nacional de Controle dos Acidentes por Animais Peçonhentos, em 1986, todos os soros antipeçonhentos produzidos no Brasil são adquiridos pelo Ministério da Saúde e distribuídos às secretarias estaduais de saúde, que, por sua vez, definem os pontos estratégicos para atendimento dos acidentes e utilização correta e racional dos antivenenos. O diagnóstico correto e a terapêutica adequada são condições essenciais para o bom prognóstico dos casos. Deste modo, é preocupação constante do Ministério da Saúde garantir o acesso gratuito e universal ao tratamento soroterápico. Para tanto, as análises epidemiológicas das séries históricas dos acidentes ocorridos no Brasil têm sido fundamentais para o planejamento dessa distribuição . Assim, considera-se a marcada sazonalidade na ocorrência dos acidentes em determinadas regiões, o que orienta a aquisição destes imunobiológicos junto aos laboratórios produtores e a distribuição racional dos estoques aos estados. Além disso, as estratégias de distribuição de soros devem levar em conta o mapeamento das áreas de maior registro 124 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Acidentes por Animais Peçonhentos de casos, visando minimizar as distâncias entre os locais de ocorrência dos acidentes e as unidades de saúde. O acompanhamento da distribuição geográfica dos animais e dos acidentes permite definir estratégias para a organização da assistência médica e planejamento das ações de vigilância, incluindo a distribuição de soros antiofídicos compatível com o perfil epidemiológico dos acidentes. 5 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 125 Acidentes por Animais Peçonhentos Anexo Técnica para determinação do tempo de coagulação (TC) • Retirar o sangue com seringa plástica, cuidadosamente, evitando a formação de coágulo e dificuldade de escoamento do fluido. • Colocar 1ml em cada um dos dois tubos de vidro (13x100mm), que devem estar secos e limpos. • Colocar os tubos em banho-maria a 37ºC. • A partir do 5º minuto, e a cada minuto, retirar sempre o mesmo tubo para leitura. • Inclinar o tubo até a posição horizontal: se o sangue escorrer pela parede, recolocar o tubo no banho-maria (o movimento deve ser suave, para evitar falso encurtamento do tempo). • Referir o valor do TC naquele minuto em que o sangue não mais escorrer pela parede interna do tubo, quando inclinado. • Confirmar o resultado com o segundo tubo, que permaneceu em repouso no banhomaria. Tempo Resultado Até 9 min Normal 10 a 30 min Prolongado Acima de 30 min Incoagulável Observação: os valores do TC variam pouco em função do diâmetro do tubo empregado, mas sofrem variações com o volume do sangue adicionado, com o número de inclinações do tubo e com a temperatura do banho. 126 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS CAPÍTULO 6 6 Doenças Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta AIDS CID 10: B20 a B24 Descrição A aids é uma doença emergente, que representa um dos maiores problemas de saúde da atualidade em virtude de seu caráter pandêmico e gravidade. Os infectados pelo HIV evoluem para grave disfunção do sistema imunológico, à medida que vão sendo destruídos os linfócitos T CD4+, uma das principais células-alvo do vírus. A contagem de linfócitos T CD4+ é importante marcador dessa imunodeficiência, sendo utilizada tanto na avaliação do tratamento e prognóstico quanto em uma das definições de caso de aids, com fim epidemiológico. A história natural da aids vem sendo alterada, consideravelmente, pela terapia anti-retroviral (ARV) que retarda a evolução da infecção, até o seu estádio final, em que surgem as manifestações definidoras de aids. Juntamente com as campanhas de prevenção, os ARV parecem estar contribuindo para a estabilização do crescimento da epidemia de aids no Brasil. A transmissão vertical, uma das prioridades do Programa Nacional de DST e Aids (PN-DST/Aids), também vem sendo reduzida com a instituição do tratamento/quimioprofilaxia da gestante/parturiente e criança exposta, que além da quimioprofilaxia com o AZT será alimentada desde o nascimento com fórmula infantil1. 6 A Sinonímia Sida, aids, doença causada pelo HIV, síndrome da imunodeficiência adquirida. Infecção pelo HIV e aids Características clínicas e epidemiológicas Agentes etiológicos HIV-1 e HIV-2, retrovírus com genoma RNA, da família Lentiviridae. Pertencem ao grupo dos retrovírus citopáticos e não-oncogênicos, necessitando, para multiplicar-se, de uma enzima denominada transcriptase reversa, responsável pela transcrição do RNA viral para uma cópia DNA, que pode então integrar-se ao genoma do hospedeiro. Bastante hábeis no meio externo, estes vírus são inativados por uma variedade de agentes físicos (calor) e químicos (hipoclorito de sódio, glutaraldeído). Em condições experimentais controladas, as partículas virais intracelulares parecem sobreviver no meio externo por até no máximo um dia, enquanto que partículas virais livres podem sobreviver por 15 dias em temperatura ambiente, ou até 11 dias a 37ºC. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de DST e Aids. Guia prático de preparo de alimentos para crianças menores de 12 meses que não podem ser amamentadas. Brasília: Ministério da Saúde, 2004. www.aids.gov.br/final/biblioteca/guia_nutricao/aids_versao_internete.pdf 1 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 129 Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta Reservatório O homem. Modo de transmissão e transmissibilidade O HIV pode ser transmitido pelo sangue (via parenteral e vertical), esperma, secreção vaginal (via sexual) e leite materno (via vertical). O indivíduo infectado pode transmitir o HIV durante todas as fases da infecção, risco esse proporcional à magnitude da viremia, principalmente na infecção aguda e doença avançada. Além dos estádios clínicos acima mencionados, os processos infecciosos e inflamatórios favorecem a transmissão do HIV. Cite-se, em primeiro lugar, a presença das doenças sexualmente transmissíveis – DST. As que cursam com úlcera – como a sífilis, o herpes genital e o cancro mole – estão associadas com o aumento no risco de infecção pelo HIV cerca de 8 a 18 vezes mais. As DST não ulcerativas, tais como gonorréia, infecção por clamídia e tricomoníase, bem como outras infecções freqüentes do trato genital inferior, como, por exemplo, a vaginose bacteriana e candidíase, e processos inflamatórios, como vaginites químicas causadas por espermicidas e outras substâncias, também aumentam o risco de adquirir e/ou transmitir o HIV. As cervicites, além do processo inflamatório adjacente, cursam quase que invariavelmente com a presença de ectopias, o que lhes confere solução de continuidade entre o ambiente vaginal e a circulação sangüínea, favorecendo a aquisição e/ou transmissão do HIV. Igualmente, as verrugas genitais causam friabilidade da mucosa ou pele infectada, levando à formação de microfissuras e, portanto, a maior risco de aquisição e/ou transmissão do HIV. Durante a gestação há maior concentração do HIV no fluido cérvico-vaginal, o que potencialmente aumenta o risco de transmissão sexual desse vírus. Outros fatores de risco associados aos mecanismos de transmissão do HIV são: Tipo de prática sexual – relações sexuais desprotegidas, durante o período menstrual ou que ocasionam sangramento, e sexo anal desprotegido (receptivo e/ou insertivo) são situações que propiciam aumento do risco de transmissão do HIV. Utilização de sangue ou seus derivados, não testados ou tratados inadequadamente; e recepção de órgãos ou sêmen de doadores não triados e testados – essas práticas, em descumprimento às normas de triagem, acondicionamento e controle de qualidade, estão hoje praticamente banidas no Brasil. Reutilização de seringas e agulhas – o compartilhamento de agulhas e seringas entre os usuários de drogas injetáveis aumenta muito a transmissão do HIV. Transmissão ocasionada por acidente com material biológico, sem a utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) – durante a manipulação com instrumentos perfurocortantes contaminados com sangue e secreções de pacientes portadores do HIV, por profissionais da área da saúde. Estima-se que o risco médio de contrair o HIV após uma exposição percutânea ao sangue contaminado seja de aproximadamente 0,3%. Nos casos de 130 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta exposição de mucosas, de aproximadamente 0,1%. Os fatores de risco identificados como favorecedores desse tipo de contaminação são profundidade e extensão do ferimento, presença de sangue visível no instrumento que produziu o ferimento, procedimento que envolve agulha instalada diretamente na veia ou artéria de indivíduo infectado e, finalmente, o paciente, fonte da infecção, apresentar evidências de imunodeficiência avançada (sinais clínicos da doença, carga viral elevada, CD4 baixo). Transmissão vertical – detalhada no tópico Gestante/HIV positiva e criança exposta. Período de incubação O tempo entre a exposição ao HIV e o aparecimento dos sintomas na fase aguda é de cinco a 30 dias. O período de latência clínica, após a infecção aguda e até o desenvolvimento da imunodeficiência é longo. Não há consenso sobre o conceito desse período em aids. Susceptibilidade e vulnerabilidade A susceptibilidade é geral, em vista dos vários modos de transmissão e transmissibilidade. Vulnerabilidade, para os não infectados, significa ter pouco ou nenhum controle sobre o risco de adquirir o HIV ou outra DST; e para os infectados ou afetados pela doença, ter pouco ou nenhum acesso a cuidados e suportes apropriados. 6 A Matriz de risco e vulnerabilidade Ocorrência freqüente de comportamento de risco e alta vulnerabilidade: • presidiários • usuários de drogas injetáveis • profissionais do sexo • caminhoneiros • garimpeiros Ocorrência freqüente de comportamento de risco e vulnerabilidade variável, segundo o grupo considerado: • homo/bissexuais masculinos (homens que fazem sexo com homens – HSH) Ocorrência variável de comportamento de risco segundo o grupo considerado, mas alta vulnerabilidade: • crianças e adolescentes • mulheres • índios • segmentos populacionais de baixa renda • efetivos militares e conscritos das Forças Armadas Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 131 Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta Aspectos clínicos e laboratoriais Diagnóstico pós-exposição A doença pode ou não ter expressão clínica logo após a infecção, sendo importante que o profissional saiba conduzir a investigação laboratorial após a suspeita de risco de infecção pelo HIV. Assim, deve-se atentar para o fato de que, com os testes atualmente disponíveis, o tempo necessário para que a sorologia anti-HIV se torne positiva é de seis a 12 semanas após a aquisição do vírus, com período médio de aproximadamente dois meses. Esse tempo, compreendido entre a aquisição da infecção e a detecção da soroconversão, é chamado de janela imunológica ou biológica. Os testes utilizados apresentam, geralmente, níveis de até 95% de soroconversão nos primeiros seis meses após a transmissão. Soroconversão – é a positivação da sorologia para o HIV. Acontece quando o sistema imunológico produz anticorpos em quantidades detectadas pelos testes sorológicos. Manifestações clínicas Infecção aguda – esta fase da doença é também chamada de síndrome da infecção retroviral aguda ou infecção primária, manifestando-se clinicamente em cerca de 50% a 90% dos pacientes. O diagnóstico desta fase é pouco realizado, em vista do baixo índice de suspeição, sendo, em sua maioria, retrospectivo. A infecção aguda caracteriza-se tanto por viremia elevada quanto por resposta imune intensa e rápida queda na contagem de linfócitos T CD4+ de caráter transitório. Existem evidências de que, nessa fase de infecção, a imunidade celular desempenha papel fundamental no controle da viremia pelo HIV. Os sintomas aparecem durante o pico da viremia e da atividade imunológica. As manifestações clínicas podem variar desde um quadro gripal até uma síndrome similar à mononucleose. Os pacientes podem apresentar sintomas de infecção viral como febre, adenopatia, faringite, mialgia, artralgia, rash cutâneo maculopapular eritematoso; ulcerações mucocutâneas, envolvendo mucosa oral, esôfago e genitália; hiporexia, adinamia, cefaléia, fotofobia, hepatoesplenomegalia, perda de peso, náuseas e vômitos. Alguns podem ainda apresentar candidíase oral, neuropatia periférica, meningoencefalite asséptica e síndrome de Guillain-Barré. Os sintomas duram, em média, 14 dias, sendo o quadro clínico autolimitado. Após a resolução da fase aguda ocorre a estabilização da viremia em níveis variáveis (set points), definidos pela velocidade da replicação e clareamento viral. O set point é fator prognóstico de evolução da doença. A queda progressiva da contagem de linfócitos T CD4+ está diretamente relacionada à velocidade da replicação viral e progressão para a aids. Fase assintomática – a infecção precoce pelo HIV, também conhecida como fase assintomática, pode durar de alguns meses a alguns anos e seus sintomas clínicos são mínimos ou inexistentes. Os exames sorológicos para o HIV são reagentes e a contagem de linfócitos T CD4+ pode estar estável ou em declínio. Alguns pacientes podem apresentar linfoadenopatia generalizada persistente, “flutuante” e indolor. 132 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta Fase sintomática inicial – nessa fase, o portador da infecção pelo HIV pode apresentar sinais e sintomas inespecíficos de intensidade variável, além de processos oportunísticos de menor gravidade, que por definição não são definidores de aids, conhecidos como ARC – complexo relacionado à aids. São indicativos de ARC: candidíase oral; testes de hipersensibilidade tardia negativos e a presença de mais de um dos seguintes sinais e sintomas, com duração superior a 1 mês, sem causa identificada: linfadenopatia generalizada, diarréia, febre, astenia sudorese noturna e perda de peso superior a 10%. Há uma elevação da carga viral e a contagem de linfócitos T CD4+ já se encontra abaixo de 500 cel/mm3. Aids/doenças oportunísticas – uma vez agravada a imunodepressão, o portador da infecção pelo HIV apresenta infecções oportunísticas (IO) causadas por microrganismos não considerados usualmente patogênicos, ou seja, incapazes de desencadear a doença em pessoas com sistema imune normal. No entanto, microrganismos normalmente patogênicos também podem, eventualmente, ser causadores de IO. Nessa situação, para serem consideradas oportunísticas, as infecções necessariamente assumem caráter de maior gravidade ou agressividade. As doenças oportunísticas associadas à aids são várias, podendo ser causadas por vírus, bactérias, fungos, protozoários e certas neoplasias: • vírus – citomegalovirose, herpes simples, leucoencefalopatia multifocal progressiva; • bactérias – micobacterioses (tuberculose e complexo Mycobacterium avium-intracellulare), pneumonias (S. pneumoniae), salmonelose; • fungos – pneumocistose, candidíase, criptococose, histoplasmose; • protozoários – toxoplasmose, criptosporidiose, isosporiose. 6 A Os tumores mais freqüentemente associados são sarcoma de Kaposi, linfomas nãoHodgkin, neoplasias intra-epiteliais anal e cervical. É importante assinalar que o câncer de colo do útero compõe o elenco de doenças indicativas de aids em mulher. Alterações neurológicas induzidas pelo HIV – além da ação primária sobre linfócitos e macrófagos, o HIV apresenta um neurotropismo bastante acentuado, levando, freqüentemente, ao aparecimento de síndromes neurológicas específicas, particularmente nas fases mais avançadas da infecção. As manifestações neurológicas mais freqüentes são as neuropatias periféricas, a mielopatia vacuolar e um quadro de atrofia cerebral e demência progressiva, todas relacionadas com a ação do HIV e do próprio sistema imune no tecido nervoso central e periférico. À medida que a infecção se agrava, a carga viral se eleva e a contagem de linfócitos T CD4+ diminui de forma significativa, podendo, no estágio mais avançado, chegar a valores abaixo de 50 cels/mm3. Diagnóstico diferencial Entendendo-se o grande polimorfismo da doença, o diagnóstico diferencial deverá considerar sua fase. Assim, na fase aguda, em virtude da inespecificidade de sintomas, deve- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 133 Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta se pensar em doenças virais do tipo mononucleose. Na fase de doença deve-se analisar o quadro clínico apresentado e o órgão acometido. Por exemplo, meningites bacterianas para afecções do sistema nervoso central; pneumonias para doenças do trato respiratório etc. Diagnóstico sorológico da infecção pelo HIV A fim de maximizar o grau de confiabilidade na emissão dos laudos e minimizar a ocorrência dos resultados falso-negativos ou falso-positivos, o Ministério da Saúde estabelece a obrigatoriedade de um conjunto de procedimentos seqüenciados (Portaria nº 59/ GM, de 28/1/03, Ministério da Saúde). Em indivíduos com mais de 2 anos os testes visam detectar anticorpos anti-HIV. Para menores de 2 anos, considerando a possibilidade de anticorpos maternos, os testes visam a detecção do RNA, DNA viral ou cultura do vírus positiva. Fluxograma para detecção de anticorpos anti-HIV, em indivíduos com mais de 2 anos Amostra (soro ou plasma) Etapa I EIA 1 (-) (+)/(Ic) Amostra negativa para HIV EIA 2 e IFI ou IB EIA 2 (-)/(Ic) e IFI (+)/(I) ou IB (+)/(I) EIA 2 (-) e IFI (-) ou IB (-) EIA 2 (+)/(Ic) e IFI (-)/(I) ou IB (-)/(I) EIA 2 (+) e IFI (+) ou IB (+) Etapa II Amostra positiva para HIV-1/HIV* Amostra negativa para HIV -1 Coletar nova amostra e repetir a Etapa 1 Western Blot (-) Amostra negativa para HIV-1 (1) Amostra indeterminada para HIV-1 Investigar soroconversão e/ou pesquisar HIV-2 Legenda EIA – Ensaio imunoenzimático IFI – Imunofluorescência indireta IB – imunoblot Ic – Inconclusivo I – Indeterminado (-) Não-reagente (+) Reagente *De acordo com o ensaio realizado (IFI ou IB) 134 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS (+) Amostra positiva para HIV-1 Coletar nova amostra e repetir Etapa 1 Etapa III Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta Fluxograma para utilização de testes de quantificação de RNA visando a detecção da infecção pelo HIV em indivíduos com idade entre 2 meses e 18 anos, nascidos de mães infectadas pelo HIV-22 Mãe Criança com idade de 2 a 24 meses (1o teste) Detectável2 Abaixo do limite de detecção1 Repetir teste imediatamente com nova amostra4 (2o teste) Repetir o teste após 2 meses (2o teste) Abaixo do limite de detecção1 Abaixo do limite de detecção1 Detectável2 Criança infectada3 Repetir após 2 meses (3o teste) Repetir o teste imediatamente com nova amostra (3o teste) Criança provavelmente não infectada1 Detectável2 Abaixo do limite de detecção1 Detectável2 Abaixo do limite de detecção1 Criança infectada3 Criança provavelmente não infectada1 Criança infectada3 Criança provavelmente não infectada1 Detectável2 6 A Manter o acompanhamento clínico nas crianças consideradas como provavelmente não infectadas, de acordo com as recomendações estabelecidas, e fazer sorologia anti-HIV aos 18 meses de idade. Caso a criança tenha sido amamentada, o presente algoritmo deve ser iniciado 2 meses após a suspensão do aleitamento materno, visando minimizar a ocorrência de resultados falso-negativos. 1 2 Este fluxograma foi elaborado para o uso de testes de detecção quantitativa de RNA e o resultado do exame deve expressar o valor de carga viral encontrado na amostra. Valores até 10 mil cópias/ml sugerem resultados falso-positivos, devendo ser cuidadosamente analisados dentro do contexto clínico, demandando nova determinação em um intervalo de quatro semanas. Avaliar a necessidade de tratamento considerando os parâmetros clínicos e laboratoriais, de acordo com as recomendações estabelecidas em seção específica do texto. 3 Para garantir a qualidade dos procedimentos e considerando a possibilidade de contaminação e/ou troca de amostra, bem como a necessidade de confirmação do resultado obtido, recomenda-se a coleta de nova amostra e a priorização da repetição do teste no menor tempo possível. 4 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de DST e Aids. Guia de tratamento clínico da infecção pelo HIV em crianças. Secretaria de Vigilância em Saúde, Programa Nacional de DST e Aids. Brasília: Ministério da Saúde, 2004. 2 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 135 Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta Os critérios indicados para exclusão da infecção, aplicam-se às crianças que não estejam sendo amamentadas pela mãe HIV positiva. A amamentação, em qualquer período, é considerada como nova exposição ao HIV. Se ocorrer, a criança deve ser submetida a nova rotina de diagnóstico da infecção pelo HIV. É importante enfatizar que mesmo com o processamento adequado das amostras de sangue e a correta execução técnica de todas as etapas da reação sorológica no laboratório, é fundamental que o processo de aconselhamento, antes e depois do teste, seja feito de forma cuidadosa, para que o resultado do exame seja corretamente interpretado, tanto pelo profissional de saúde quanto pelo paciente, gerando atitudes que visem a promoção da saúde e/ou a prevenção da infecção pelo HIV nos indivíduos testados, conforme o diagnóstico obtido a partir de suas avaliações clínica e laboratorial. Tratamento A abordagem clínico-terapêutica do HIV tem se tornado cada vez mais complexa, em virtude da velocidade do conhecimento acerca deste agente. O tratamento objetiva prolongar a sobrevida e melhorar a qualidade de vida, pela redução da carga viral e reconstituição do sistema imunológico, e é garantido pelo Sistema Único de Saúde, por meio de ampla rede de serviços. Para oferecer e garantir o alcance desses objetivos, o Ministério da Saúde, por meio do Programa Nacional de DST e Aids, instituiu o Comitê Assessor para Terapia Anti-retroviral em Adultos e Adolescentes Infectados pelo HIV, o Comitê Assessor para Terapia Anti-retroviral em Crianças Infectadas pelo HIV e o Comitê Assessor para Recomendações da Profilaxia da Transmissão Vertical do HIV e Terapia Anti-retroviral em Gestantes, que se reúne periodicamente para definir as diretrizes do tratamento para HIV/aids, disponibilizadas no site www.aids.gov.br. Aspectos epidemiológicos Na primeira metade da década de 80, a epidemia HIV/aids manteve-se basicamente restrita às regiões metropolitanas do Sudeste e Sul do país, tendo como principais vias de transmissão a sexual (entre homens que fazem sexo com homens) e a sangüínea (por transfusão de sangue e hemoderivados e uso de drogas injetáveis). Nesse período, a velocidade de seu crescimento de incidência e taxas de mortalidade eram elevadas, a estrutura assistencial encontrava-se em fase de implantação/implementação e foram priorizadas medidas dirigidas à melhoria da qualidade e controle do sangue e seus derivados. Como conseqüência imediata dessas medidas, observou-se drástica diminuição de casos de aids entre hemofílicos e transfundidos. Nos últimos anos da década de 80 e início dos anos 90, a epidemia assume outro perfil. A transmissão heterossexual passou a ser a principal via de transmissão do HIV, a qual vem apresentando maior tendência de crescimento em anos recentes, acompanhada de expressiva participação das mulheres na dinâmica da epidemia e de um importante percentual de 136 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta casos por transmissão materno-infantil. Observa-se, ainda, nos últimos anos, um desigual processo de interiorização, com maiores ritmos de crescimento nos municípios pequenos (menos de 50 mil habitantes), e a pauperização da epidemia, que tendo início nos estratos sociais de maior instrução atualmente cresce nos de menor escolaridade. A partir de 1996, com a distribuição universal e gratuita de anti-retrovirais, vem-se registrando redução na velocidade de crescimento da incidência e taxas de mortalidade da doença. É importante ressaltar que a epidemia de aids no Brasil é, de fato, o somatório de subepidemias microrregionais, em interação permanente, devido aos diferentes momentos de introdução do HIV no território nacional, às diferentes condições de vida das populações atingidas, às distintas composições das populações regionais, aos padrões de mobilidade da população e à diversidade de arranjos e padrões de comportamento sexual. Vigilância epidemiológica 6 A vigilância epidemiológica da aids, além de se basear em informações fornecidas pela notificação de casos (Sinan) e óbitos (SIM), possui dois sistemas particulares: Sistema de Controle de Exames Laboratoriais (Sicel) e Sistema de Controle Logístico de Medicamentos (Siclom). A Objetivos O componente de vigilância epidemiológica do Programa tem como propósito acompanhar a tendência temporal e espacial da doença, infecções e comportamentos de risco, visando orientar suas ações. Definição de caso com fins epidemiológicos Entende-se por caso de aids o indivíduo que se enquadra nas definições adotadas pelo Ministério da Saúde: infecção avançada pelo HIV com repercussão no sistema imunitário, com ou sem ocorrência de sinais e sintomas causados pelo próprio HIV ou conseqüentes a doenças oportunistas (infecções e neoplasias). Os critérios para a caracterização de casos de aids estão descritos na publicação Critérios de definição de casos de aids em adultos e crianças3 e suas definições estão abaixo resumidas. Definição de caso de aids em adultos (13 anos ou mais) – CID 10: B24 Notas explicativas: • testes de triagem para detecção de anticorpos anti-HIV – várias gerações de ensaio por imunoabsorbância ligado à enzima (Enzyme Linked Immunosorbent Assay, Elisa), ensaio imunoenzimático (Enzyme Immuno Assay, EIA), ensaio imunoenzimático com micropartículas (Microparticle Enzyme Immuno Assay, Meia) e ensaio imunoenzimático com quimioluminiscência; Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de DST e Aids. Critérios de definição de casos de aids em adultos e crianças/Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Programa Nacional de DST e Aids. Brasília: Ministério da Saúde, 2003. 56p.il. (Série Manuais nº 60). 3 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 137 Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta Quadro 1. Resumo dos critérios de definição de caso de aids em indivíduos com 13 anos ou mais, para fins de vigilância epidemiológica Critério CDC adaptado Existência de dois testes de triagem reagentes ou um confirmatório para detecção de anticorpos anti-HIV + Evidência de imunodeficiência: diagnóstico de pelo menos uma doença indicativa de aids e/ou Contagem de linfócitos T CD4+ <350 células/mm3 e/ou Critério Rio de Janeiro/Caracas Existência de dois testes de triagem reagentes ou um confirmatório para detecção de anticorpos anti-HIV + Somatório de, pelo menos, 10 pontos, de acordo com uma escala de sinais, sintomas ou doenças e/ou Critério excepcional óbito Menção de aids/sida (ou termos equivalentes) em algum campo da Declaração de Óbito + Investigação epidemiológica inconclusiva ou Menção de infecção pelo HIV (ou termos equivalentes) em algum campo da Declaração de Óbito, além de doença(s) associada(s) à infecção pelo HIV + Investigação epidemiológica inconclusiva • testes confirmatórios – imunofluorescência indireta, Imunoblot, Western Blot, teste de amplificação de ácidos nucléicos como, por exemplo, a reação em cadeia da polimerase (Polimerase Chain Reaction, PCR) e a amplificação seqüencial de ácidos nucléicos (Nucleic Acid Sequence Based Amplification, Nasba). No momento, está sendo finalizada a avaliação de um algoritmo de triagem utilizando apenas teste rápido, com resultados promissores; • doenças indicativas de aids – câncer cervical invasivo, candidose de esôfago, traquéia, brônquios ou pulmões; citomegalovirose em qualquer local que não fígado, baço e linfonodos; criptococose extrapulmonar; criptosporidíase intestinal crônica (mais de 1 mês); herpes simples mucocutâneo (mais de 1 mês); histoplasmose disseminada em orgãos que não exclusivamente pulmão ou linfonodos cervicais/hilares; isosporidíase intestinal crônica (mais de 1 mês); leucoencefalopatia multifocal progressiva; linfomas não-Hodgkin de células B (fenótipo imunológico desconhecido) e outros linfomas dos seguintes tipos hitológicos: linfoma maligno de células grandes ou pequenas não clivadas; linfoma maligno imunoblástico sem outra especificação; linfoma primário de cérebro; pneumonia por Pneumocystis carinii; qualquer micobacteriose disseminada em órgãos que não o pulmão, pele ou linfonodos cervicais/ hilares (exceto hanseníase ou tuberculose); reativação da doença de Chagas (meningoencefalite e/ou miocardite); sepse recorrente por Salmonella (não-tifóide) e toxoplasmose cerebral; 138 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta • escala de sinais, sintomas e doenças no critério Rio de Janeiro/Caracas – dois pontos: anemia e/ou linfopenia e/ou trombocitopenia; astenia (mais de 1 mês, excluída a tuberculose como causa básica); caquexia ( perda involuntária de + de 10% do peso corporal, excluída a tuberculose como causa básica); dermatite persistente; diarréia (mais de 1 mês); febre (=/+ 1 mês,excluída a tuberculose como causa básica); linfadenopatia (dois ou mais sítios) e tosse persistente (excluída a tuberculose como causa básica). Cinco pontos: candidose oral ou leucoplasia pilosa; disfunção do sistema nervoso central; herpes zoster em indivíduos com até 60 anos de idade e tuberculose pulmonar, pleural ou de linfonodos localizados numa única região. Dez pontos: outras formas de tuberculose e sarcoma de Kaposi; • investigação epidemiológica inconclusiva – aquela em que, após a busca em prontuários, o caso não puder ser descartado ou enquadrado num dos critérios principais, pelo não-registro de dados clínicos/laboratoriais; • data do diagnóstico na ficha de notificação/investigação é aquela em que o indivíduo se enquadra em um dos critérios de definição de caso de aids, ou seja, tenha evidência clínica e laboratorial, exceto no critério óbito. Nesse caso, é igual à do óbito. 6 A Definição de caso de aids em crianças (menores de 13 anos) Quadro 2. Resumo dos critérios de definição de caso de aids em indivíduos menores de 13 anos de idade, para fins de vigilância epidemiológica Critério CDC adaptado Evidência laboratorial da infecção pelo HIV em crianças, para fins de vigilância epidemiológica + Evidência de imunodeficiência: Diagnóstico de pelo menos duas doenças indicativas de aids de caráter leve e/ou Diagnóstico de pelo menos uma doença indicativa de aids de caráter moderado ou grave e/ou Contagem de linfócitos T CD4+ menor do que o esperado para a idade atual ou Critério excepcional óbito Menção de Aids/Sida (ou termos equivalentes) em algum dos campos da Declaração de Óbito + Investigação epidemiológica inconclusiva ou Menção de infecção pelo HIV (ou termos equivalentes) em algum dos campos da Declaração de Óbito, além de doença(s) associada(s) à infecção pelo HIV + Investigação epidemiológica inconclusiva Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 139 Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta Notas explicativas Evidência laboratorial da infecção pelo HIV em crianças, para fins epidemiológicos: • para as crianças expostas ao HIV por transmissão vertical, considera-se criança infectada aquela que apresente RNA ou DNA viral detectável acima de mil cópias/ml em duas amostras (testes de carga viral) obtidas em momentos diferentes. Apesar da possibilidade da realização desses testes após duas semanas de vida, o Ministério da Saúde preconiza que as amostras testadas sejam coletadas após o segundo mês, devido ao aumento de sensibilidade observado a partir dessa idade; • crianças com 18 meses ou mais, expostas ao HIV por transmissão vertical, serão consideradas infectadas pelo HIV quando uma amostra de soro for reativa em dois testes de triagem ou um confirmatório para pesquisa de anticorpos anti-HIV; • em crianças de qualquer idade, cuja exposição ao HIV tenha sido outra forma de transmissão que não a vertical, o diagnóstico laboratorial de infecção será confirmado quando uma amostra de soro for reativa em dois testes de triagem ou um confirmatório para pesquisa de anticorpos anti-HIV. A definição da gravidade das doenças, sinais e/ou sintomas corresponde às categorias da classificação clínica do Centers for Disease Control and Prevention (CDC 1994), tendo-se incluído a tuberculose como morbidade de gravidade moderada e excluída a coccidioidomicose pela pouca expressão epidemiológica no país. Doenças, sinais e sintomas de caráter leve – aumento crônico de parótida; dermatite persistente; esplenomegalia; hepatomegalia; linfadenopatia e infecções persistentes ou recorrentes de vias aéreas superiores (otite média ou sinusite). Doenças, sinais e sintomas de caráter moderado – anemia (mais de 30 dias); candidose oral resistente a tratamento (mais de 2 meses em maiores de 6 meses de idade); diarréia persistente ou crônica; febre (mais de 1 mês); gengivo-estomatite herpética recorrente (2 episódios em 1 ano); hepatite; herpes simples em brônquios, pulmões ou trato gastrintestinal antes de 1 mês de idade; herpes zoster (2 episódios em um ano ou mais de 1 dermátomo); infecção por citomegalovírus antes de 1 mês de idade; leiomiossarcoma; meningite bacteriana, pneumonia ou sepse; miocardiopatia; nefropatia; linfopenia; neutropenia (mais de 1 mês); nocardiose; pneumonia linfóide intersticial; toxoplasmose antes de 1 mês de idade; trombocitopenia (mais de 1 mês); tuberculose pulmonar; varicela. Doenças, sinais e sintomas de caráter grave – candidose de esôfago; traquéia, brônquios ou pulmões; citomegalovirose em qualquer local que não fígado, baço e linfonodos em maiores de 1 mês; criptococose pulmonar; criptosporidiose, com diarréia (mais de 1 mês); encefalopatia determinada pelo HIV; herpes simples em brônquios, pulmões ou trato gastrintestinal; herpes simples mucocutâneo (mais de 1 mês) em crianças com mais de 1 mês de idade; histoplasmose disseminada (em órgãos que não exclusivamente pulmões ou linfonodos cervicais/hilares; infecções bacterianas graves múltiplas e recorrentes (2 episódios em 2 anos, confirmadas bacteriologicamente); isosporidiose intestinal crônica (mais de 1 mês); leucoencefalopatia multifocal progressiva; linfoma não-Hodgkin de células B; 140 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta linfoma primário de cérebro; pneumonia por Pneumocystis carinii; qualquer micobacteriose disseminada em órgãos que não o pulmão, pele ou linfonodos cervicais/hilares (exceto tuberculose ou hanseníase); sarcoma de Kaposi; sepse recorrente por Salmonella não-tifóide; síndrome da emaciação; toxoplasmose cerebral em crianças com mais de 1 mês de idade e tuberculose disseminada ou extrapulmonar. Contagem de linfócitos T CD4+ definidora de imunodeficiência de acordo com a idade – inferior a 12 meses de idade: <1.500 células por mm3 (< 25%); 1 a 5 anos: <1 mil células por mm3 (< 25%); 6 a 12 anos: <500 células por mm3 (< 25%). Primeiras medidas a serem adotadas frente à identificação de um caso Assistência médica ao paciente – o atendimento, além de contar com as equipes do Programa Saúde da Família, está amparado por ampla rede que inclui diversas modalidades assistenciais, a saber: hospital-dia (HD), atendimento domiciliar terapêutico (ADT), serviços de assistência especializada (SAE) e hospital convencional (HC). Cada uma delas é destinada para públicos-alvo distintos, de acordo com o estágio da doença e a complexidade do tratamento. A organização e articulação desses serviços permite a cobertura diagnóstica e assistencial em todo o território nacional. 6 A Notificação Notifica-se como caso confirmado de aids aquele que atende aos critérios definidos anteriormente. A notificação é feita pelo preenchimento e envio da Ficha de Investigação Epidemiológica de Caso de Aids, adulto ou criança, disponível no Sinan, que deve ser preenchida pelo médico ou outro profissional de saúde capacitado para tal, no exercício de sua função. A Portaria n° 2.325/GM, de 8 de dezembro de 2003, regulamenta a notificação de doenças compulsórias em todo o país, inclusive da aids. Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente – chama-se a atenção para o correto preenchimento de todos os campos da Ficha de Investigação do Sinan, da maior importância para o alcance dos objetivos da vigilância epidemiológica da aids. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos – por se tratar de doença sexualmente transmissível, que carrega grande estigma social e cuja investigação demanda a coleta de dados comportamentais, é vital a garantia do sigilo das informações, principalmente quando se tratar de indivíduos facilmente identificáveis em seu meio social. Quando houver suspeita de transmissão por transfusão de sangue e hemoderivados, faz-se necessária uma investigação conjunta com a vigilância sanitária, que inclui o rastreamento das bolsas de sangue e identificação de doadores e outros receptores, tanto para a confirmação ou não dessa via de transmissão como para impedir a ocorrência de novos casos. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) normatiza as técnicas de hemovigilância em todo o território nacional 4. Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Manual técnico de hemovigilância, Brasília:Ministério da Saúde, 2003. 29p.il. www.anvisa.gov.br/divulga/public/sangue/hemovigilancia/manual_atualizado2003.pdf 4 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 141 Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta Medidas de controle e prevenção Prevenção da transmissão sexual Como o maior número de indivíduos com HIV+/aids no país apresenta, como principal via de transmissão, a sexual, o PN-DST/Aids tem priorizado ações que enfatizam como principal estratégia de prevenção o uso do preservativo masculino e feminino nas relações sexuais. Seu uso é recomendado em todas as relações sexuais e deve constituir o principal insumo nas ações de atenção básica, nas clínicas de DST, nas ações das organizações da sociedade civil, nos Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA) e nos serviços que atendem pacientes HIV/aids. O uso de outros insumos, tais como os microbicidas, encontra-se em estudos, e ainda não foram validados. Alguns ensaios evidenciaram taxas elevadas de transmissão do HIV nas suas usuárias, em virtude das irritações e microfissuras causadas na mucosa vaginal e cervical, portanto não constituem estratégias recomendadas para a prevenção do HIV. Em relação ao preservativo feminino, recomenda-se que as ações dirigidas às mulheres o adotem, prioritariamente, como insumo nas intervenções com profissionais do sexo e mulheres soropositivas. Prevenção da transmissão sangüínea Injeções e instrumentos perfurocortantes – recomendações específicas devem ser seguidas quando da realização de procedimentos que envolvam a manipulação de material perfurocortante; tais como: • máxima atenção durante a realização dos procedimentos; • jamais utilizar os dedos como anteparo; • as agulhas não devem ser reencapadas, entortadas, quebradas ou retiradas da seringa com as mãos; • não utilizar agulhas para fixar papéis; • todo material perfurocortante (agulhas, scalp, lâminas de bisturi, vidrarias, entre outros), mesmo que estéril, deve ser desprezado em recipientes com tampa e resistentes à perfuração; • os recipientes específicos para descarte de material não devem ser preenchidos acima do limite de 2/3 de sua capacidade total, e devem ser colocados sempre próximos do local onde o procedimento é realizado; • todo lixo proveniente de serviços de saúde deve, obrigatoriamente, ser recolhido para incineração. Caso o município não disponha desse serviço, proceder conforme orientação da vigilância sanitária local. Transfusão de sangue e hemoderivados Todo doador deve ser cuidadosamente triado, sendo afastados os que apresentem risco de infecção pelo HIV; e todo sangue aceito para ser transfundido deverá ser obrigatoriamente testado para a detecção de anticorpos anti-HIV. Essas medidas aumentam a segurança da transfusão mas não eliminam totalmente seu risco, em virtude do período de “janela 142 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta imunológica”. A conscientização dos doadores, no sentido de auto-avaliar os riscos de infecção pelo HIV a que possam ter sido submetidos, evitando ser identificados, constitui a melhor medida de prevenção da transmissão do HIV por essa via. Doação de sêmen e órgãos Em tipo de transmissão do HIV deve ser prevenido, à semelhança do acima mencionado, pela triagem cuidadosa e testagem dos doadores. No caso do sêmen, há a possibilidade de seu armazenamento por determinado período, para utilização posterior quando nova testagem do doador for negativa. Evita-se, assim a utilização do sêmen de doadores em “janela imunológica”. Prevenção da transmissão vertical do HIV Ver tópico Gestante HIV positiva e criança exposta. 6 Ações de educação em saúde As ações de educação em saúde para a prevenção do HIV/aids são orientadas a partir de avaliação das tendências e características da epidemia, em cada local, e das condições econômicas, sociais e culturais dos grupos mais afetados. Nesse sentido, devem ser considerados os seguintes aspectos: • a epidemia não atinge de maneira uniforme toda a população e sua distribuição é distinta nas diferentes regiões do país, apresentando, inclusive, diferenças significativas em uma mesma região, tanto nos aspectos sociais quanto nas vias de transmissão; • os grupos devem ser considerados segundo critérios de vulnerabilidade e risco; • a participação dos grupos sociais é de fundamental importância para a mudança de práticas, atitudes e comportamentos. A As ações devem ser dirigidas aos indivíduos, aos grupos específicos e à população em geral, considerando os aspectos relacionados à situação de risco e vulnerabilidade, influenciada por fatores individuais (biológicos ou não), sociais, econômicos, institucionais e culturais. As ações de educação em saúde pautam-se pelas intervenções voltadas, prioritária mas não exclusivamente, para grupos mais vulneráveis, tais como profissionais do sexo, usuários de drogas injetáveis (UDI), homens que fazem sexo com homens (HSH), pessoas que vivem com portadores de HIV/aids, população prisional e caminhoneiros. Essas ações são desenvolvidas por veiculação de campanhas de massa para toda a população, por ações específicas de intervenções na comunidade, baseadas no trabalho de pares, em consonância à premissa do protagonismo no desenvolvimento das ações de prevenção. Preconizam-se ações sistemáticas, continuadas e complementares (informação, orientação e disponibilização de insumos tais como preservativos, seringas e gel lubrificante). Esses princípios se aplicam tanto às intervenções que pretendem interferir no comportamento sexual (oferta de insumos para práticas seguras) quanto no uso de drogas, em que a perspectiva de redução de danos é o pressuposto básico para a intervenção. As ações de Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 143 Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta redução de danos destinadas aos usuários de drogas injetáveis, que não querem ou não podem interromper seu uso de drogas em curto prazo, são feitas disponibilizando seringas e agulhas para evitar compartilhamento entre os usuários. Essas ações buscam vincular os usuários às unidades que promovem atividades de promoção à saúde, a partir dos programas de atenção básica e serviços específicos de prevenção, como os centros de testagem e aconselhamento. Estratégias de prevenção As estratégias de prevenção vêm sendo aprimoradas com o avanço do conhecimento científico na área e a elevação da consciência sanitária da sociedade sobre a questão, após mais de vinte anos de convivência com esta epidemia. Atualmente, são conduzidas de acordo com as seguintes diretrizes: • promoção de mudanças de comportamento mediante disponibilização de informação qualificada sobre os meios de transmissão, prevenção e percepção de risco; • estabelecimento de modelos de intervenção que permitam considerar os diversos grupos populacionais quanto à tomada de consciência em relação à sua situação de vulnerabilidade e risco, considerando os aspectos culturais, contextos sociais e valores relativos aos grupos envolvidos; • desenvolvimento de intervenções baseadas no trabalho com indivíduos que compartilham práticas semelhantes, e agentes comunitários de saúde que incentivem as mudanças de práticas, atitudes, valores e crenças em relação às DST/aids; • fortalecimento de redes sociais visando participação nas atividades de promoção das ações de prevenção e de suporte social aos grupos mais vulneráveis, e promoção de discussão com o propósito de criar alternativas para o enfrentamento da epidemia, em cada situação específica; • desenvolvimento de parcerias com organizações não-governamentais, associações comunitárias e de classe, visando ampliar a abrangência das ações de prevenção à infecção pelo HIV; • criação de mecanismos institucionais para ampliar a participação do setor empresarial, empresas privadas e outros agentes sociais na luta contra a aids; • distribuição de insumos (preservativos masculinos e femininos, gel lubrificante, agulhas e seringas) de prevenção e programas de redução de danos; • substituição do leite materno por leite artificial para as crianças, filhas(os) de mães portadoras do HIV (risco de transmissão vertical). Contra-indica-se o aleitamento cruzado (amamentação por outra mulher) e o uso do leite materno com pasteurização domiciliar. 144 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta Gestante HIV positiva e criança exposta Modo de transmissão Vertical – o concepto filho de mulher portadora do HIV pode adquirir esse vírus durante a gestação, trabalho de parto e parto, pelo contato com o sangue e/ou a secreção vaginal, e pelo leite materno (pós-parto). Vários estudos têm evidenciado que a maioria dos casos de transmissão materno-infantil (vertical) do HIV (cerca de 65%) ocorre durante o trabalho de parto e no parto propriamente dito, e que os 35% restantes ocorrem intra-útero, principalmente nas últimas semanas de gestação. O aleitamento materno representa risco adicional de transmissão, que se renova a cada exposição (mamada), de 7% a 22%. 6 Parenteral e sexual – a mãe adquire a infecção pelo sangue e/ou esperma, conforme especificado anteriormente. A Período de incubação Ver tópico no Capítulo Aids. Aspectos clínicos e laboratoriais Ver tópico no Capítulo Aids. Manifestações clínicas Ver tópico no Capítulo Aids. Diagnóstico diferencial Ver tópico no Capítulo Aids. Diagnóstico laboratorial • Para a gestante – ver fluxograma no tópico Diagnóstico sorológico da infecção pelo HIV, no Capítulo Aids. • Para a parturiente não testada durante o pré-natal, há a possibilidade de testagem, no momento do parto, com teste rápido anti-HIV para adoção de medidas preventivas da transmissão vertical. Os testes rápidos são de simples execução e os resultados podem ser conferidos em 15 minutos. Podem ser utilizados sangue total (uma gota da polpa digital) ou soro. Não obstante sua praticidade, não substituem os testes diagnósticos preconizados. São exames de triagem para situações em que há necessidade de pronta tomada de decisão: o início ou não de ações profiláticas da transmissão vertical, como no momento do parto. Nas parturientes com resultado “reagente”, faz-se necessária a coleta de uma amostra de sangue para a confirmação Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 145 Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta do diagnóstico no pós-parto imediato, conforme o fluxo preconizado pela Portaria Ministerial nº 59/GM/MS, de 28/1/03. No momento, está sendo finalizada a avaliação de um algoritmo de triagem utilizando apenas teste rápido, com resultados promissores. Esta e qualquer outra atualização nessas normas estarão disponíveis no site www.aids.gov.br. Figura 1. Fluxograma para uso de teste rápido para HIV em parturientes1 Parturiente, sem sorologia anti-HIV Teste reagente Teste rápido mediante seu consentimento verbal 1. Iniciar quimioprofilaxia conforme esquema para redução da transmissão vertical do HIV 2. Coletar e encaminhar a amostra de sangue para esclarecimento do diagnóstico, garantindo a confirmação do resultado do teste, o mais rápido possível 3. Proceder a inibição mecânica da lactação logo após o parto (e faixamento das mamas) e considerar a utilização do inibidor de lactação (b) 4. Orientar a mulher quanto ao preparo da fórmula infantil 5. Notificar a ocorrência ao Núcleo de Vigilância Epidemiológica da maternidade, se houver, ou à Vigilância Epidemiológica do município Após confirmação do diagnóstico 6. Inibir em definitivo a lactação. Mantendo o enfaixamento ou medicando a mulher com 2 comprimidos de cabergolina (0,5mg) – dose única, com hexa hidro benzoato de estradiol, 1 ampola de 5mg (1ml), IM, de 12/12 horas (duas tomadas) 7. Encaminhar a mulher para avaliação e acompanhamento clínicos, laboratoriais e terapêuticos, em serviço especializados para portadores do HIV 8. Encaminhar o recém-nascido para acompanhamento clínico e laboratorial especializado em serviço de infectologia pediátrica Teste não-reagente Não medicar (a) (a) Investigar a condição clínicoepidemiológica e, se necessário, encaminhar a mulher para realização de sorologia (conforme determina a Portaria nº 59/GM/MS, de 28/1/03) (b) Mediante seu consentimento livre e esclarecido, e quando as evidências epidemiológicas apontam para a remota possibilidade de vir a ser esse um resultado falso-positivo • Para a criança: ver fluxograma no tópico Diagnóstico sorológico da infecção pelo HIV, no Capítulo Aids. Observação Os critérios indicados para exclusão da infecção aplicam-se às crianças que não estejam sendo amamentadas pela mãe HIV positiva. A amamentação, em qualquer período, é considerada como nova exposição ao HIV e, se acontecer, a criança deve ser submetida a nova rotina de diagnóstico da infecção pelo HIV. 1 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de DST e Aids. Recomendações para a profilaxia da transmissão materno-infantil do HIV e terapia anti-retroviral em gestantes/Secretaria de Vigilância em Saúde, Programa Nacional de DST e Aids – Brasília: Ministério da Saúde, 2004. 146 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta Tratamento Crianças infectadas pelo HIV – até o momento não está clara a indicação de tratamento de pacientes com infecção aguda recente (< 6 meses). Pacientes HIV+, com infecção crônica estabelecida (> 6 meses), devem ser tratados, conforme presença de sinais clínicos indicativos de imunodeficiência e/ou parâmetros laboratoriais (contagem de células T-CD4+ e carga viral). Atualmente, indica-se tratamento anti-retroviral potente, com a associação de 3 ou mais drogas por tempo indeterminado, e monitoramento periódico da eficácia clínico-laboratorial e de sinais de toxicidade aos medicamentos. Para maiores esclarecimentos, consultar o Guia de tratamento clínico da infecção pelo HIV em crianças2. Gestantes – vale ressaltar que alguns medicamentos estão contra-indicados em virtude do potencial efeito teratogênico, como o Efavirenz e Hidroxiuréia. Outros ARV, quando administrados juntos, promovem efeitos adversos graves no concepto, como a didanosina e estavudina, não devendo, por isso, ser utilizados na gestação. Mulheres HIV+ que engravidam em uso de Tarv devem ser avaliadas e informadas sobre os potenciais riscos/benefícios da manutenção, modificação ou suspensão do tratamento no tocante à evolução da sua própria doença e os potenciais efeitos adversos da Tarv sobre a criança, devendo os casos ser individualmente analisados. 6 A Profilaxia da transmissão vertical As gestantes portadoras do HIV deverão receber, a partir da 14ª semana, a zidovudina oral (AZT) e outros anti-retrovirais (ARV), se necessário. Ou seja, as gestantes serão avaliadas clínica e laboratorialmente (níveis de CD4+ e carga viral) para essa indicação. A zidovudina intravenosa deverá ser dada a todas as parturientes desde o início do trabalho de parto, e mantida até a ligadura do cordão umbilical. A zidovudina solução oral (xarope) deverá ser administrada para todos os recém-nascidos expostos ao HIV, durante 6 semanas (42 dias), devendo ter início até oito horas de vida. As crianças cujas mães não receberam o AZT intravenoso deverão receber o AZT oral nas duas primeiras horas de vida. Os ARV vêm sendo disponibilizados, gratuitamente, na rede pública de saúde desde 1994. A avaliação dos níveis de carga viral materna definirá qual a via de parto mais adequada como medida profilática da transmissão vertical, ou seja: • níveis de carga viral ≥ 1 mil cópias/ml (aferida na idade gestacional ≥ 34 semanas) ou desconhecida: parto por operação cesariana eletiva; • ao contrário, níveis de carga viral <1 mil cópias/ml ou indetectável (aferida na idade gestacional ≥ 34 semanas): parto vaginal. Nesse grupo de mulheres, o parto por operação cesariana só se aplica quando houver indicação obstétrica. (Para maiores esclarecimentos, sugere-se consultar a publicação do Recomendações para profilaxia da transmissão materno-infantil vertical do HIV e terapia anti-retroviral em gestantes, PN-DST/Aids). Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de DST e Aids. Guia de tratamento clínico da infecção pelo HIV em crianças. Secretaria de Vigilância em Saúde, Programa Nacional de DST e Aids. Brasília: Ministério da Saúde, 2004. 2 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 147 Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta Operação cesariana eletiva é aquela realizada antes do início do trabalho de parto, encontrando-se as membranas amnióticas ainda íntegras. Aspectos epidemiológicos No final da década de 80, a freqüência de casos de aids entre mulheres cresceu consideravelmente, quando a transmissão heterossexual passou a ser a principal via de transmissão. A razão homem/mulher com aids passou de 28:1, em 1985, para 2:1, em 2000. A feminização da aids é reflexo do comportamento sociossexual da população, associado a aspectos de vulnerabilidade biológica da mulher. Entre os indivíduos com mais de 8 anos de escolaridade, observa-se diminuição no número de casos do sexo masculino, o que não acontece, com igual intensidade, no feminino. A mulher considera-se menos exposta ao risco, talvez por sua entrada mais tardia na dinâmica da epidemia, não se enquadrando nos denominados “grupos de risco” da fase inicial. A faixa etária que concentra os maiores percentuais de casos de aids em mulheres é a de 25-34 anos, ou seja, são atingidas em plena idade reprodutiva. Como conseqüência, vem-se observando o aumento da transmissão vertical. Atualmente a quase totalidade de casos de aids em menores de 13 anos tem transmissão vertical como fonte de infecção. Um estudo tailandês (Protocolo 076 do Aids Clinical Trial Group) demonstrou que a probabilidade desse tipo de transmissão, sem o uso de zidovudina (AZT), foi de 25,5%, enquanto que em gestantes e conceptos que usaram um esquema terapêutico foi de 8,3%, o que significou redução de 67,5% de infecções pelo HIV nos recém-nascidos. Depois desse estudo, vários outros, não controlados e observacionais, confirmaram o benefício do AZT na redução da transmissão vertical do HIV, inclusive quando a intervenção é realizada tardiamente na gestação e, mesmo, quando administrado apenas para o recém-nascido, antes de 48 horas após o nascimento. O estudo demonstrou, ainda, que as intervenções profiláticas com AZT, realizadas durante o parto e puerpério, podem reduzir em cerca de 50% a probabilidade de transmissão materno-infantil do HIV. Posteriormente, o uso de outros anti-retrovirais vem sendo incorporado às recomendações de terapia anti-retroviral (TARV) em gestantes, tendo em vista a ampla comprovação de que o uso de TARV combinada (AZT e outros ARV) é capaz de reduzir, significativamente, a carga viral do HIV para níveis indetectáveis, levando as taxas de transmissão materno-infantil para níveis inferiores a 3%, segundo alguns estudos. 148 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta Vigilância epidemiológica Objetivos Conhecer, o mais precocemente possível, o estado sorológico de gestantes, parturientes, nutrizes e crianças expostas, para promover o início oportuno da terapêutica e/ou profilaxia da transmissão vertical. Acompanhar o perfil epidemiológico da infecção pelo HIV nesses grupos populacionais, para o estabelecimento, acompanhamento e avaliação de impacto das medidas de prevenção, controle e tratamento. Avaliar a operacionalização do protocolo de profilaxia da transmissão vertical, visando o aprimoramento da implementação dessas ações e, conseqüentemente, a obtenção de maior impacto na redução da transmissão vertical. Em nível nacional, a cobertura da testagem para a infecção do HIV, durante o pré-natal, está abaixo de 50%, sendo ainda menor nas gestantes mais vulneráveis para a infecção pelo HIV, em decorrência de fatores como baixa adesão ao pré-natal e/ou captação tardia. 6 A Notificação A notificação compulsória de gestantes HIV+ e crianças expostas está prevista na Portaria nº 993/2000, do Ministério da Saúde. Observe-se que, diferentemente das infecções por HIV nos outros grupos populacionais, a simples suspeita de exposição, tanto em gestantes quanto em conceptos, deve ser notificada e investigada, em virtude dos benefícios do tratamento precoce no prognóstico da criança. Momentos para notificação – pré-natal, parto e acompanhamento da criança, evitando assim a oportunidade perdida. Deve ser realizada pelo profissional de saúde que estiver atendendo o caso, em quaisquer dos três momentos. Definição de caso Gestantes, parturientes e nutrizes infectadas – para efeito de notificação e investigação, considera-se como infectada toda gestante, parturiente ou nutriz que apresentar resultado de exame laboratorial para HIV reativo (considerar o primeiro resultado reagente). Criança exposta • Todos os conceptos de mães soropositivas ou que tenham suspeita de infecção pelo HIV. • Todas as crianças que tenham sido amamentadas por mulheres infectadas ou que tenham suspeita de infecção pelo HIV. Neste caso, a notificação/investigação deverá conter dados da nutriz. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 149 Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta Primeiras medidas a serem adotadas frente à identificação de infecção pelo HIV nesses indivíduos Assistência médica às gestantes/parturientes e puérperas e à criança verticalmente exposta ao HIV A primeira ação diz respeito ao oferecimento no pré-natal do teste anti-HIV, com aconselhamento pré e pós-teste para todas as gestantes; para as parturientes, no momento do parto e para as nutrizes, quando for o caso. As mulheres portadoras do HIV devem ser aconselhadas a não amamentar. E a lactação deve ser inibida nas puérperas comprovadamente HIV+. A fórmula infantil deverá ser instituída para todos os recém-nascidos expostos ao HIV. O seguimento da mulher HIV+ e da criança exposta ao HIV deverá ser garantido: • em serviço de tocoginecologia/pediatria, credenciado para atendimento do par mãe HIV+ e seu filho (SAE - materno-infantil); • seguimento da mulher HIV+ e de sua criança, respectivamente num SAEadulto e SAE-infantil. Prevenção da transmissão vertical do HIV Vários são os fatores associados ao aumento do risco de transmissão do HIV, da mãe para filho: virais – carga viral, genotipo e fenótipo viral, diversidade circulante e resistência viral; maternos – estado clínico e imunológico; presença de DST e outras co-infecções, estados nutricionais; comportamentais – uso de drogas e prática sexual desprotegida; obstétricos – duração de ruptura das membranas amnióticas, via do parto, presença de hemorragia intraparto; inerentes ao recém-nascido – prematuridade, baixo peso ao nascer; aleitamento materno. Dentre esses, os mais fortemente associados à transmissão vertical do HIV são a carga viral elevada e a ruptura prolongada das membranas amnióticas. Sendo assim, a promoção de intervenções que reduzam a carga viral materna e que propiciem a realização rápida do parto, com adequada assistência ao binômio mãe/filho, contribuem sobremaneira para a redução desse modo de transmissão. As normas preconizadas para essas intervenções encontram-se disponíveis no site www.aids.gov.br e na publicação Recomendações para profilaxia da transmissão vertical do HIV e terapia anti-retroviral em gestantes, do PNDST/Aids. 150 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta Investigação epidemiológica Encontra-se descrita no tópico Roteiro da investigação epidemiológica, no Capítulo Aids, devendo-se, entretanto, atentar para os seguintes aspectos: • registrar os dados de identificação e residência da gestante/parturiente, mãe da criança exposta ou nutriz, nos casos em que a fonte de infecção for amamentação cruzada por mulher soropositiva para o HIV; • identificar a evidência laboratorial – informar o momento em que foi realizada a coleta do material no qual se evidenciou o diagnóstico laboratorial da infecção pelo HIV, na gestante/parturiente/mãe/nutriz da criança exposta (considerar o primeiro resultado reagente); • para fins de vigilância epidemiológica, o caso deverá ser notificado mesmo com resultados reagentes de testes de triagem, sem a necessidade de se aguardar confirmação laboratorial para seu envio. 6 Avaliação do protocolo da profilaxia no pré-natal – registrar o momento em que foi iniciado o pré-natal; se a gestante, anteriormente à gravidez, já preenchia critério de definição de caso de aids; se foi indicada profilaxia e, caso não tenha sido, quais foram os motivos. Avaliação do protocolo da profilaxia no parto – informar sobre o uso da profilaxia no pré-natal, condições clínicas da gestante no momento do parto, uso da profilaxia no parto e início da profilaxia na criança. Avaliação do protocolo da profilaxia na criança e acompanhamento – anotar os dados de identificação da criança (nome, data de nascimento e sexo), a exposição ao aleitamento materno ou cruzado e a conclusão ou não da profilaxia e diagnóstico laboratorial (carga viral e sorologia). Também deve ser registrada a ocorrência de óbito se relacionado à aids em crianças em acompanhamento. Análise da avaliação – a análise desses últimos três itens possibilitará aos responsáveis pela vigilância epidemiológica a verificação do impacto das ações implantadas a cada caso (binômio mãe/filho), bem como detectar possíveis entraves e promover as correções para atingir o resultado esperado: a redução da transmissão vertical do HIV. Encerramento de casos – o caso se encerra com o conhecimento do status sorológico da criança. Não se faz necessário aguardar o desfecho do caso para o envio dos dados. Essas informações serão solicitadas pelo setor responsável pela vigilância epidemiológica de aids, quando a criança completar 18 meses. Se os resultados da 1ª e 2ª cargas virais forem concordantes, não mais se precisa aguardar 18 meses para o encerramento do caso, pois já se tem ou não a evidência laboratorial do HIV. • Infectado – quando existirem dois resultados de cargas virais detectáveis ou sorologia após os 18 meses reagente. • Não-infectado – quando existirem dois resultados de cargas virais indetectáveis ou sorologia aos 18 meses não-reagente. • Indeterminado – quando os resultados laboratoriais forem inconclusivos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS A 151 Aids/Gestante HIV Positiva e Criança Exposta • Perda de seguimento – quando o serviço perde contato com a criança, antes de se estabelecer a conclusão do diagnóstico laboratorial. • Óbito – quando ocorrido durante o período de acompanhamento, antes da definição do status viral ou sorológico da criança, independente se o óbito estava ou não relacionado à aids. Medidas de controle Orientações gerais Ver tópico Medidas de controle e prevenção, no Capítulo Aids. Medidas específicas para a prevenção da transmissão vertical Incluem ações de educação em saúde e devem ter início na atenção ao pré-natal, quando se esclarece à gestante os benefícios do diagnóstico precoce do HIV. Nesse sentido, os serviços de pré-natal e de saúde da mulher devem disponibilizar o acesso ao teste anti-HIV e promover ações de aconselhamento pré e pós-teste. Essas ações devem ser conduzidas e acompanhadas de informações complementares em todas as atividades de promoção à saúde da mulher. A disponibilização de preservativos masculinos e femininos faz parte de todo o processo educativo, inclusive das ações dirigidas aos casais soro-discordantes. Nesses casos, o trabalho de grupo, acompanhado por profissional de saúde, tem sido recomendado, pois a troca de experiências e a interação favorecem hábitos de vida mais saudáveis. Em relação ao recém-nato de mãe HIV positiva, deve-se dispor de meios e condições de acesso ao leite artificial, garantindo-se a substituição do leite materno e/ou o acesso ao leite materno pasteurizado, ofertados por bancos de leite cadastrados e controlados pelo MS. 152 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Antraz ou Carbúnculo ANTRAZ OU CARBÚNCULO CID 10: A22 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Toxiinfecção aguda que, em geral, acomete a pele sob as formas de lesão bolhosa e pústula maligna, produzida pelo contato com animais (bovino, caprino, eqüino e outros) com a mesma doença. As formas viscerais são raras, embora graves, representadas pelo carbúnculo pulmonar, gastrintestinal e neuromeníngeo. Sinonímia 6 Anthrax, na língua inglesa. No Brasil, a confluência de furúnculos, que é um diagnóstico diferencial da toxiinfecção causada pelo Bacillus anthracis, é denominada carbúnculo ou antraz. Na vigência desta furunculose multifocal, a suspeita de antraz só deve ser levantada quando houver história epidemiológica compatível. A Agente etiológico Bacilo móvel, grampositivo encapsulado, formador de esporos denominados Bacillus anthracis. Reservatório Animais herbívoros, domésticos e selvagens. O solo contaminado também representa um reservatório, pois quando se expõem ao ar as formas vegetativas esporulam e os esporos de B. anthracis, que resistem a situações ambientais adversas e à desinfecção, podem permanecer viáveis durante muitos anos. Este bacilo é comensal do solo, em várias partes do mundo. A proliferação bacteriana e o número de esporos no solo aumentam quando de inundações ou outras circunstâncias ecológicas. A terra também pode ser contaminada por aves de rapina, que disseminam o germe de uma zona para outra, após alimentar-se de cadáver de animal infectado pelo B. anthracis e em estado de putrefação. A pele, couro seco ou processado, provenientes de animais infectados, podem albergar esporos durante anos e são fômites que transmitem a infecção pelo mundo. Vetores Aventa-se a possibilidade de transmissão por insetos hematófagos que tenham se alimentado de animais infectados. Modo de transmissão A maneira mais comum de contaminação é o manuseio de produtos tais como lã, couro, osso e pêlo, provenientes de animais infectados. Em casos mais raros, a doença também Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 153 Antraz ou Carbúnculo pode ser contraída por ingestão de alimento contaminado (carne de animais infectados) ou por inalação dos esporos. Outra forma de se adquirir a doença é pela picada de insetos hematófagos, comuns em regiões endêmicas. É bem pouco provável ocorrer a transmissão direta da doença de um indivíduo infectado para um sadio. Período de incubação Varia de um a sete dias, sendo em média de dois a três dias. É possível se estender por até 60 dias. Período de transmissibilidade Os objetos e o solo contaminados podem permanecer infectantes durante décadas. A transmissão de pessoa a pessoa é muito rara. Susceptibilidade e imunidade Indeterminadas. Existem dados de infecção não manifesta em pessoas que mantém contato freqüente com o agente infeccioso. Podem surgir segundos ataques, raras vezes identificados. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas Cutânea – lesão na pele que evolui, durante um período de dois a seis dias, do estágio de pápula para vesícula e pústula, progredindo para cicatriz negra profunda. Inalatória – inicia com febre, cefaléia, vômitos, tontura, fraqueza, dor abdominal e dor torácica, progride com piora do quadro respiratório e evidência radiológica de expansão do mediastino. Intestinal – inicia com náusea, vômito e mal-estar, com progressão rápida para diarréia sanguinolenta, abdome agudo ou sepsis. Orofaringe – lesão de mucosa, na cavidade oral ou da orofaringe, adenopatia cervical, edema e febre. Na forma cutânea, após o período de incubação, aparece pápula inflamatória, seguida de formação vesicular que logo exsuda e transforma-se em pústula com porção central de cor amarela, evoluindo para o negro, com formação de escara. Dois a três dias após o início da lesão, esta já apresenta o aspecto característico de escara indolor, seca, com centro negro e borda edemaciada e inflamada, acompanhada de adenopatia satélite (para os linfonodos regionais), febre discreta (37ºC a 38ºC) e bom estado geral. Pode haver evolução espontânea para cicatrização e cura, porém em alguns casos não tratados, quando há comprometimento da resistência, pode disseminar-se para os gânglios linfáticos regionais e a corrente sangüínea, com conseqüente septicemia. 154 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Antraz ou Carbúnculo Nas infecções respiratórias (carbúnculo por inalação), os sintomas iniciais são discretos, inespecíficos e assemelham-se aos de uma infecção comum das vias aéreas superiores. Ao término de três a cinco dias, aparecem os sintomas agudos de insuficiência respiratória, sinais radiológicos sugestivos de exsudado pleural, febre e choque, que evolui rapidamente para a morte. O carbúnculo intestinal é raro e mais difícil de ser identificado, exceto quando sob a forma de surtos epidêmicos explosivos, do tipo causado por intoxicação alimentar. As manifestações clínicas são mal-estar abdominal, seguido de febre, sinais de septicemia e morte. Diagnóstico diferencial Furunculose cutânea causada pelo Staphylococcus e/ou Streptococcus, dermatite pustulosa contagiosa (enfermidade vírica de Orf). Diagnóstico laboratorial 6 Isolamento do Bacillus anthracis no sangue, lesões ou secreções mediante esfregaços ou inoculações em animais. Em tecidos, pela histologia. Também pode ser identificado por imunofluorescência. A Tratamento Quadro 1. Esquema para profilaxia pós-exposição com ciprofloxacina Via de administração Doses Oral 500mg, 2 vezes ao dia Oral 20 a 30mg/kg/dia, em 2 doses diárias Adulto Ciprofloxacina Criança (<20kg) Ciprofloxacina Manter profilaxia pós-exposição por 60 dias, definindo esquema terapêutico após a realização de teste de sensibilidade antimicrobiana, de acordo com as seguintes orientações: • enquanto não houver resultado de teste de sensibilidade antimicrobiana (para amoxicilina ou doxiciclina) ou se o teste revelar resistência antimicrobiana comprovada laboratorialmente, manter o esquema do Quadro 1. • quando houver comprovação de que a cepa é sensível para amoxicilina e doxiciclina, o esquema de tratamento deve ser alterado, conforme os quadros a seguir: Quadro 2. 1ª escolha: Amoxicilina Via de administração Doses Oral 500mg, 3 vezes ao dia Oral 40mg/kg/dia, em 3 doses diárias Adulto (18 a 65 anos) Amoxicilina Criança (<20kg) Amoxicilina Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 155 Antraz ou Carbúnculo 2ª escolha: Doxiciclina Via de administração Doses Oral 100mg, 2 vezes ao dia Oral 5mg/kg/dia, em 2 doses diárias Adulto Doxiciclina oral Criança (<20kg) Doxiciclina • Caso o indivíduo exposto a material suspeito de contaminação pelo Bacillus anthracis apresente sintomatologia compatível com a doença, realizar tratamento conforme a conduta estabelecida. Avaliar indicação médica de uso da droga por via parenteral. • Realizar acompanhamento semanal de pacientes/expostos em regime ambulatorial até o fim do tratamento. Aspectos epidemiológicos O homem é um hospedeiro acidental e a incidência desta doença é muito baixa, geralmente esporádica em quase todo o mundo. É considerado risco ocupacional em potencial para trabalhadores que manipulam herbívoros e seus produtos. Há registro de casos na América do Sul e Central, Ásia e África. Recentemente, ocorreram casos nos Estados Unidos da América, imputados à guerra biológica. No Brasil, não existe registro de casos da doença em humanos. Atualmente, o risco de se contrair a doença é mínimo. Vigilância epidemiológica Objetivos • Diagnosticar e tratar precocemente os casos graves, para evitar complicações e óbitos. • Identificar a fonte de infecção, para adoção de medidas de controle e desinfecção concorrente. • Realizar quimioprofilaxia dos indivíduos expostos ao Bacillus anthracis. Definição de caso Suspeito • Indivíduo com lesão cutânea que evolui para pápula, vesícula e pústula, progredindo para cicatriz negra profunda; e história de exposição a material, animal ou produtos animais contaminados pelo B. anthracis. • Indivíduo que apresenta febre, cefaléia, vômitos, tontura, fraqueza, dor abdominal e dor torácica, que progride com piora do quadro respiratório, evidência radiológica 156 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Antraz ou Carbúnculo de expansão do mediastino e história de exposição a material, animal ou produtos animais contaminados pelo B. anthracis. • Indivíduo com quadro de náusea, vômito e mal-estar, com progressão rápida para diarréia sanguinolenta, abdome agudo ou sepsis; e história de exposição a material, animal ou produtos animais contaminados pelo B. anthracis. • Indivíduo com quadro de lesão em mucosa oral ou da orofaringe, adenopatia cervical, edema, febre e história de exposição a material, animal ou produtos animais contaminados pelo B. anthracis. Confirmado Critério clínico laboratorial – indivíduo com infecção pelo B. anthracis confirmada laboratorialmente. Critério clínico-epidemiológico – indivíduo com exposição a material, animal ou produtos animais contaminados pelo B. anthracis; e quadro clínico compatível com a doença. 6 Descartado Casos suspeitos cujos exames laboratoriais identificaram outro agente. A Notificação A ocorrência de casos suspeitos desta doença requer imediata notificação e investigação, por se tratar de doença grave e sob vigilância. Mesmo casos isolados impõem a adoção imediata de medidas de controle, visto tratar-se de evento inusitado. Por ser doença passível de uso indevido como arma biológica em ataques terroristas, todo caso suspeito deve ser prontamente comunicado por telefone, fax ou e-mail às autoridades sanitárias superiores. Primeiras medidas a serem adotadas Toda pessoa exposta a material supostamente contaminado com Bacillus anthracis deve ser atendida em unidade de saúde de referência. Mesmo antes da confirmação laboratorial da contaminação e início dos sintomas dos indivíduos expostos, deve-se orientá-los e mantê-los sob monitoramento. Caso alguém passe a apresentar sinais e sintomas compatíveis com a doença, realizar coleta de material de nasofaringe (swab nasal) de todos os indivíduos expostos e encaminhar para laboratório de referência. O material supostamente contaminado também deve ser enviado ao laboratório de referência, para a realização de testes segundo as seguintes diretrizes de biossegurança: • Para a pessoa que localizou um material suspeito ❯ não tocar, não agitar, não tentar limpar ou recolher o material suspeito ❯ evitar olhar muito próximo, cheirar, provar, espirrar ou tossir ❯ desligar aparelhos de climatização, condicionadores, exaustores e ventiladores de ar ❯ fechar as janelas e portas e sair do local, mantendo o mesmo isolado, sem permissão de entrada de pessoas e/ou animais Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 157 Antraz ou Carbúnculo ❯ ❯ demarcar a área a ser descontaminada com material desinfetante contactar a secretaria de saúde do estado, ou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, quando se tratar de ocorrência em áreas de terminais aquaviários, portos, aeroportos, estações, passagens de fronteiras e terminais alfandegados • Recomendações importantes em caso de contato com o material suspeito ❯ lavar imediatamente as mãos, com água corrente abundante e sabão ❯ não esfregar as mãos antes de molhá-las ❯ não escovar as mãos durante a lavagem ❯ procurar imediata orientação em uma unidade de saúde • Coleta, recolhimento (se for o caso), acondicionamento, transporte e descontaminação do material ❯ verificar se os procedimentos básicos foram adotados corretamente; caso contrário, adotá-los ❯ avaliar a situação da área suspeita de contaminação ❯ adotar estratégias específicas, relacionadas ao recolhimento, coleta, transporte e descontaminação, de acordo com o descrito nos Anexos 1 a 5 deste capítulo Essas atividades devem ser realizadas por equipe competente e capacitada, que deve atender aos seguintes requisitos: • nenhum profissional envolvido pode ser portador de ferimentos, queimaduras, imunodeficiências ou imunossupressões; • não usar relógios e adereços (anéis, brincos, colares, entre outros); • usar os equipamentos de proteção individual preconizados no Anexo 1 deste capítulo; • usar respiradores alternativos e cuidados especiais, quando portadores de pêlos faciais (barba, bigode e costeletas); • após os procedimentos, realizar higiene pessoal completa: banho com água corrente abundante e sabão. Assistência médica ao paciente Adotar medidas junto às unidades de referência para acompanhamento adequado aos doentes e a todos os indivíduos expostos sem proteção ao suposto material contaminado. Qualidade da assistência Verificar se as unidades de referência estão seguindo as orientações para a quimioprofilaxia e tratamento. Confirmação diagnóstica Garantir a coleta e transporte dos espécimes para diagnóstico laboratorial, de acordo com as normas técnicas constantes do Anexo 1 deste capítulo. 158 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Antraz ou Carbúnculo Proteção da população Descarte adequado dos materiais supostamente contaminados e quimioprofilaxia dos expostos. Investigação A investigação deve iniciar-se imediatamente após a notificação da existência de material supostamente contaminado ou de um ou mais casos da doença, para permitir que as medidas de controle possam ser adotadas em tempo oportuno. Para o material supostamente contaminado, seguir as orientações descritas anteriormente, complementadas com as dos Anexos 1 a 5 deste capítulo. Roteiro da investigação epidemiológica 6 Identificação do paciente A Preencher todos os campos da Ficha de Notificação do Sinan, relativos aos dados gerais, notificação individual e residência. Não se dispõe de ficha epidemiológica de investigação para este agravo no Sinan, devendo-se elaborar uma específica para este fim, contendo campos que coletem as principais características clínicas e epidemiológicas da doença. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmar a suspeita de exposição • Anotar na ficha de investigação elaborada os dados sobre o tipo de material (couro, pó branco, etc.), dia da exposição, etc. Uma pequena história (anamnese) deve ser feita para maior riqueza de detalhes. • Investigar minuciosamente: ❯ a fidedignidade das informações; ❯ se outras pessoas identificá-las podem ter entrado em contato com o suposto material contaminado; ❯ a abrangência da população acometida; ❯ a provável proveniência do material supostamente contaminado, quando se tratar de contaminação intencional; ❯ nos casos de contaminação por animais ou seus produtos, qual a proveniência, abrangência da disseminação do agente e vínculo com a ocupação dos indivíduos acometidos. Análise de dados A análise dos dados da investigação deve permitir a avaliação da magnitude da provável contaminação e a adequação das medidas adotadas, principalmente quanto à quimioprofilaxia, tratamento dos casos e risco de eventos semelhantes virem a acontecer. Como a doença não tem grande poder de disseminação e, mesmo quando se apresenta Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 159 Antraz ou Carbúnculo sob a forma de surtos, o número de acometidos é limitado, as análises dos eventos devem ser feitas caso a caso, descrevendo as ocorrências. Desde o início do processo o investigador deve analisar as informações para verificar se decorre de doença profissional, contaminação acidental ou intencional – análises que devem alimentar o processo de decisão das autoridades sanitárias. Observar se todas as informações necessárias para o encerramento dos casos e do evento (epidemia ou casos isolados) foram coletados durante a investigação e se as mesmas foram criteriosamente registradas e analisadas. Relatório final As informações coletadas devem ser sistematizadas em um relatório final, sejam de casos isolados, surtos e, principalmente, quando houver suspeita de que a contaminação possa ter sido intencional. Dentre as principais conclusões, devem-se destacar: • local de transmissão do(s) caso(s) e distribuição dos casos segundo espaço, pessoa e tempo em situações de surtos; • modo de transmissão (contato com animais, contaminação intencional, caso importado, etc.); • situação de risco para a ocorrência de novos casos e medidas de controle adotadas; • critérios de confirmação e descarte dos casos. Instrumentos disponíveis para controle Imunização A vacina contra o carbúnculo ou antraz contém um filtrado purificado de cultura do Bacillus anthracis. O Brasil não dispõe desta vacina e a produção mundial, por sua vez, é muito limitada. O esquema de vacinação é de 6 doses de 0,5ml, administradas por via subcutânea em 0, 2 e 4 semanas e, posteriormente, no 6º, 12º e 18º meses. Embora existam evidências de que esta vacina proteja contra as formas cutânea (pele) e inalatória da doença, tal proteção é temporária e, além do mais, exige reforços anuais de revacinação. Recomendações para a vacinação – a vacina é indicada somente quando existe risco de infecção definido. Exemplos de grupos de pessoas que estão sob risco de infecção são: técnicos de laboratório que trabalham com o bacilo e militares envolvidos em guerras com uso de arma biológica. A vacinação de civis e da população em geral não é recomendada pelas seguintes razões: • o esquema para conferir a proteção adequada é longo (18 meses). Portanto, esta vacina não está indicada para a população em situações que exigem proteção imediata, como um ataque de bioterrorismo; 160 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Antraz ou Carbúnculo • o tempo de proteção conferida pela vacina é muito curto, exigindo a aplicação de reforços anuais. Ações de educação em saúde Os indivíduos expostos ou sob risco de exposição devem ser comunicados e orientados a buscar informações nas unidades de saúde de referência, para serem submetidos à quimioprofilaxia e/ou tratamento quando indicado. Em áreas de exposição profissional, alertar sobre as formas de se adquirir a doença. Quando houver suspeita de ataque de bioterrorismo, utilizar os meios de comunicação para orientar a população como proceder nos casos de identificação de material suspeito, de acordo com as normas descritas. 6 A Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 161 Antraz ou Carbúnculo Anexo 1 Equipamentos de proteção individual para o manuseio de material com suspeição de B. anthracis Grupo 1 No caso de coleta/recolhimento de material suspeito contido em envelope, caixa ou qualquer outro recipiente, mas sem indícios de contaminação aparente do meio externo, é indicado o uso de: • máscara de proteção facial; • óculos de proteção ou protetor facial; • luvas descartáveis de látex; • avental descartável. Grupo 2 Quando o material suspeito se apresentar de forma residual e localizada, em ambiente não exposto a correntes de ar, seja desprovido (ou sem uso) de sistema de climatização, condicionador de ambiente, exaustor ou ventilador de ar, orienta-se, para quem o coletar e recolher, as seguintes proteções: • macacão descartável em não-tecido ou Tyvek, com capuz; • luvas de borracha nitrílica ou luvas emborrachadas sobrepostas a uma de látex descartável; • máscara de proteção facial; • óculos de proteção; • botas de borracha. Grupo 3 No caso do material suspeito apresentar indicativo de suspensão ou dispersão no ambiente, orienta-se, para quem o coletar e recolher, as seguintes proteções: • macacão emborrachado ou de PVC, com capuz e elástico; • luvas de borracha nitrílica, sobrepostas a uma de látex descartável; • botas de borracha; • respirador facial inteiro. 162 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Antraz ou Carbúnculo Tabela de especificações dos equipamentos de proteção individual (EPI) EPI Especificação Avental Descartável, com mangas compridas, punho em malha ou elástico, gramatura 50g/m2, resistente à esterilização por calor úmido, rasgos e tração, alta drapeabilidade, hipoalergênico, não inflamável, com 90% de eficiência na filtração de bactérias Botas de borracha Confeccionadas em borracha natural resistente a agentes químicos Luvas tipo 1 Confeccionadas em látex, descartável, não-estéril Luvas tipo 2 Confeccionadas em borracha nitrílica, descartável, não-estéril Luvas tipo 3 Confeccionadas em borracha natural resistente a agentes químicos, com característica antiderrapante Macacão não-tecido com capuz Descartável, com mangas compridas, confeccionado em material nãotecido, gramatura 60g/m2, punho de malha ou elástico, com capuz contendo ajustes ao redor da face, resistente a tração e rasgos, alta drapeabilidade, hipoalergênico, não-inflamável, com 90% de eficiência na filtração de bactérias. Abertura frontal por zíper ou velcro Macacão Tyvek com capuz Descartável, com mangas compridas, confeccionado em Tyvek, punho de malha ou elástico, com capuz contendo ajustes ao redor da face, resistente à tração e rasgos com abertura frontal por zíper ou velcro Macacão nitrílico com capuz Com mangas compridas, confeccionado em borracha nitrílica, ajustes no punho e no capuz ao redor da face, resistente a agentes químicos, tração e rasgos, com abertura frontal por zíper ou velcro Macacão emborrachado com capuz Com mangas compridas, confeccionado em poliuretano/PVC, ajustes no punho e no capuz ao redor da face, resistente a agentes químicos, tração e rasgos, com abertura frontal por zíper ou velcro Máscara de proteção facial 6 A Tipo respirador, para partículas, sem manutenção, N95, com eficácia na filtração de 95% de partículas de até 0,3μ (usada para ações contra a tuberculose) Obs: essa máscara, dependendo das condições de conservação, poderá ser reutilizada. Pode ser adquirida com válvula especial, para facilitar a respiração ou não Óculos de proteção Flexível, em PVC incolor, leve, com adaptação perfeita ao nariz para conforto em uso prolongado; com lentes em policarbonato, resistente a impactos, antiembaçante, contra riscos e proteção antiUV. Pode ser usado em combinação a óculos com lentes de prescrição Protetor facial Com ampla proteção lateral, com ajustes de tensão para posicionamento do visor. Visor em policarbonato, incolor, que fornece proteção a impactos e resistência a calor, antiembaçante. Pode ser usado em combinação a óculos com lentes de prescrição e óculos de proteção Protetor para barba Descartável, confeccionado em polipropileno, com ajustes em elástico Respirador facial inteiro Confeccionado em silicone, com ajustes de tensão para posicionamento na face. Visor com lentes em policarbonato, que fornece proteção a impactos, antiembaçante. Equipado com duplo cartucho contendo filtros N100, P100 ou R100, que oferecem uma eficácia de 99,97% na filtração de partículas com 0,3μ (o esporo do B. anthracis tem diâmetro de 2 a 6μ) Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 163 Antraz ou Carbúnculo Anexo 2 Coleta, recolhimento e acondicionamento do material suspeito • Coletar o material suspeito e colocá-lo em embalagem plástica, com fechamento hermético, lacrar, rotular adequadamente e incluir a inscrição “RISCO BIOLÓGICO”. Acondicionar em embalagens específicas (kit) para transporte de amostras infecciosas, conforme disposto na Portaria MS nº 1.985, de 25 de outubro de 2001. • As amostras devem ser embaladas em três camadas: um receptáculo impermeável dentro do qual se encontra a amostra; um segundo recipiente resistente, à prova de filtração, contendo material absorvente entre as suas paredes; e receptáculo interno, a ponto de garantir a absorção de todo o líquido em caso de vazamento, ou seja, uma embalagem externa destinada a proteger contra fatores externos, tais como impactos físicos e água durante o transporte. • Encaminhar para o Laboratório Central de Saúde Pública (Lacen) da unidade federada. Observação: caso haja necessidade de encaminhamento da(s) amostra(s) para laboratório de referência, caberá ao Lacen receptor proceder o envio, de acordo com o fluxo de amostras biológicas e não-biológicas definido pela Coordenação Geral de Laboratórios da Secretaria de Vigilância em Saúde/MS. Para agilização da remessa, deverão ser adotadas medidas junto às instituições públicas e privadas envolvidas no transporte de cargas. 164 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Antraz ou Carbúnculo Anexo 3 Descontaminação de superfícies contaminadas por B. anthracis Para a operacionalização dos procedimentos de descontaminação de superfícies recomenda-se a utilização de equipamentos de proteção individual constantes do Anexo 1. A equipe que executou a coleta e recolhimento do material suspeito, a partir de definição estratégica local, quando devidamente capacitada, poderá proceder às operações de descontaminação de superfícies. Procedimentos de descontaminação: Superfícies 6 Método I (aplicado para grupos 1 e 2 de proteção individual) A Esfregar com pano limpo, gaze ou algodão embebido em solução preparada a partir de produtos desinfetantes (Grupo A - Anexo 4) Aguardar o tempo de contato recomendado para a substância e/ou produto utilizado Secar com papel-toalha Esfregar com pano limpo, compressa, gaze ou algodão embebido em álcool a 70% e aguardar secar Acondicionar os papéis-toalha, gaze e algodão utilizados em sacos plásticos de cor branca, leitosa, com símbolo de risco biológico Lacrar os sacos plásticos de forma a não permitir o derramamento de seu conteúdo, mesmo se virados para baixo. Uma vez fechados, precisam ser mantidos íntegros até o processamento ou destino final do resíduo biológico (aterro sanitário ou incineração) • Método I. Este método é composto de três estágios, a saber: Estágio 1: Desinfecção preliminar • Cobrir o material suspeito com papel-toalha. • Colocar a solução desinfetante (Grupo A – Anexo 4), na quantidade de 1 a 1,5 litros por metro quadrado de área atingida, embebendo todo o papel-toalha. • Deixar em contato por 2 horas. • Remover os papéis-toalha, o resíduo do material suspeito e o excesso da solução desinfetante utilizando papel toalha. • Acondicionar os papéis-toalha utilizados em sacos plásticos de cor branca leitosa com símbolo de risco biológico. • Lacrar os sacos plásticos de forma a não permitir o derramamento de seu conteúdo, mesmo se virados para baixo. Uma vez fechados, precisam ser mantidos íntegros até o processamento ou destino final do resíduo biológico (aterro sanitário ou incineração). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 165 Antraz ou Carbúnculo Estágio 2: Limpeza • Esfregar pano limpo ou escova embebidos em água quente sobre as superfícies, com vistas à retirada dos resíduos. • Secar, preferencialmente, com papel-toalha e promover seu descarte como resíduo biológico. • Acondicionar os papéis-toalha em sacos plásticos de cor branca, leitosa, com símbolo de risco biológico. • Lacrar os sacos plásticos de forma a não permitir o derramamento de seu conteúdo, mesmo se virados para baixo. Uma vez fechados, precisam ser mantidos íntegros até o processamento ou destino final do resíduo biológico. Estágio 3: Desinfecção final • Aplicar a solução desinfetante (Grupo B – Anexo 4) na proporção de 500ml (meio litro) por metro quadrado de área atingida com tempo de contato de 2 horas. • Retirar todo o excesso da solução desinfetante com papel-toalha. • Acondicionar os papéis toalha em sacos plásticos de cor branca, leitosa, com símbolo de risco biológico. • Lacrar os sacos plásticos de forma a não permitir o derramamento de seu conteúdo, mesmo se virados para baixo. Uma vez fechados, precisam ser mantidos íntegros até o processamento ou destino final do resíduo biológico. • Método II. Descontaminação por fumigação: é recomendado para os casos em que houver indícios de que o material contaminado por B. anthracis foi submetido à suspensão ou dispersão no ambiente. ❯ Estimar o volume da área a ser tratada; ❯ Antes de iniciar-se o procedimento de fumigação o ambiente deverá ser preparado, com a vedação (material adesivo/fita) de portas, janelas, frestas ou quaisquer outras fontes de circulação de ar; ❯ Os equipamentos de proteção individual deverão apresentar-se de acordo com o disposto no Anexo 5. • Fumigação com equipamento específico: os ambientes podem ser fumigados por aquecimento da solução desinfetante. ❯ Para cada 25-30m3, utilizar solução de 4 litros de água contendo 400ml de formaldeído a 10%, a ser aplicada por equipamento de fumigação; ❯ O tempo de fumigação deverá ser realizado de acordo com as especificações estabelecidas pelo fabricante do aparelho fumigador; ❯ A descontaminação completa por fumigação do ambiente exposto ao material suspeito deverá ocorrer por um período de tempo maior que 12 horas, em temperatura acima de 18ºC e com umidade relativa superior a 70%; ❯ O ambiente somente poderá ser aberto após 12 horas do início da fumigação, quando deverá ser retirado o material utilizado para a vedação e submetido com- 166 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Antraz ou Carbúnculo plementarmente à limpeza e desinfecção da área. Recomenda-se, como produtos de desinfecção de mobiliários e equipamentos, o álcool a 70%, por 10 minutos (em 3 aplicações), e para teto, piso e paredes, o hipoclorito de sódio a 1% por 10 minutos ou formulações pertencentes à categoria de desinfetantes hospitalares (devidamente registrados na Anvisa), cuja diluição e tempo de exposição deverão atender às especificações de rotulagem. Descontaminação de equipamentos de proteção individual e outros materiais • Equipamentos de proteção individual: os EPI não descartáveis, utilizados nas etapas de coleta, recolhimento e descontaminação, após o uso deverão ser submetidos a processo de descontaminação com produtos do Grupo D (Anexo 4), caso tolerem os tratamentos recomendados ou submetidos à esterilização por calor úmido a 121ºC por 30 minutos. Observação: os EPI descartáveis deverão ser colocados em sacos plásticos autoclaváveis, lacrados e submetidos à esterilização por calor úmido a 121ºC por 30 minutos, para posterior descarte. 6 A • Equipamentos e outros materiais (panos, roupas, utensílios, etc.): equipamentos, bem como outros materiais utilizados na coleta, recolhimento e descontaminação, deverão, sempre que possível, ser incinerados ou submetidos à esterilização por calor úmido a 121ºC por 30 minutos. Os que não puderem ser autoclavados, devem ser imersos em formaldeído com concentração e tempo de exposição indicada no Grupo D (Anexo 4) ou fumigados conforme o estágio III do Anexo 3. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 167 Antraz ou Carbúnculo Anexo 4 Grupos de produtos desinfetantes Grupo A • Hipoclorito de sódio: este é o agente químico de escolha, exceto quando se trata de superfícies de corrosão. ❯ Concentração recomendada: 1% (10 mil ppm (mg/l) ) de cloro ativo Preparo da solução: para um volume de 10 litros, colocar 1 litro de solução de hipoclorito de sódio a 10% de cloro ativo (comercial) e completar com água Tempo de exposição: 1 hora • Formaldeído a 10% ❯ Tempo de exposição: 2 horas • Glutaraldeído a 4% (pH de 8-8,5) ❯ Tempo de exposição: 2 horas Grupo B • Ácido peracético a 1%: agente químico de escolha, excetuando superfícies de corrosão ❯ Tempo de exposição: 2 horas • Formaldeído a 10% ❯ Tempo de exposição: 2 horas • Glutaraldeído a 4% (pH de 8-8,5) ❯ Tempo de exposição: 2 horas • Peróxido de hidrogênio a 3% ❯ Tempo de exposição: 2 horas Grupo C (fumigação) • Formaldeído a 10% Grupo D • Hipoclorito de sódio a 0,5% ❯ Concentração recomendada: 0,5% (5 mil ppm (mg/l) ) de cloro ativo ❯ Preparo da solução: para um volume de 10 litros, colocar 500ml de solução de hipoclorito de sódio a 10% de cloro ativo (comercial) e completar com água ❯ Tempo de exposição: 2 horas • Formaldeído a 4% ❯ Tempo de exposição: acima de 8 horas • Glutaraldeído a 2% (pH de 8-8,5) ❯ Tempo de exposição: acima de 8 horas 168 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Antraz ou Carbúnculo Anexo 5 Descontaminação de superfícies e ambientes Local Superfície que entrou em contato com B. anthracis Descontaminação Método I Grupo do produto Grupos A e B Situação Material suspeito contido em envelope, caixa ou qualquer outro recipiente, não havendo indícios de contaminação aparente do meio externo EPI Máscara de proteção facial tipo respirador valvulado para partículas, sem manutenção, N95 Óculos de proteção ou protetor facial, em acrílico Luvas de látex para procedimentos 6 Avental descartável com mangas compridas, punho em malha, gramatura 50 No caso do material suspeito se apresentar exposto, de forma residual e localizada, em ambientes: Superfície que entrou em contato com B. anthracis Método I Grupos A e B • não expostos a correntes de ar; desprovidos de sistema de climatização, condicionador de ambiente, exaustor ou ventilador de ar, ou • presença, porém sem funcionamento, de sistema de climatização, condicionador de ambiente, exaustor e ventilador de ar A Macacão descartável gramatura 50, com capuz e elástico ou macacão em não-tecido, Tyvek com capuz e elástico Luvas de borracha nitrílica ou luva emborrachada sobreposta a uma de látex (luva de procedimentos) Máscara de proteção facial tipo respirador valvulado, sem manutenção, N95 Óculos de proteção ou protetor facial, em acrílico, incolor Botas de borracha Macacão emborrachado ou de PVC, com capuz e elástico Ambientes fechados expostos Método II Grupo C No caso do material suspeito apresentar indicativo de suspensão ou dispersão no ambiente Luvas de borracha nitrílica, com luvas de látex (de procedimentos) Botas de borracha Respirador facial inteiro, com filtro N100, P100 ou R100 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 169 Botulismo BOTULISMO CID 10: A05.1 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Doença neuroparalítica grave, não contagiosa, resultante da ação de uma potente toxina produzida pela bactéria Clostridium botulinum. Há três formas de botulismo: botulismo alimentar, botulismo por ferimentos e botulismo intestinal. Embora o local de produção da toxina botulínica seja diferente em cada uma delas, todas as formas caracterizam-se pelas manifestações neurológicas e/ou gastrointestinais. O botulismo apresenta elevada letalidade e deve ser considerado uma emergência médica e de saúde pública. Para minimizar o risco de morte e seqüelas, é essencial que o diagnóstico seja feito rapidamente e que o tratamento seja instituído precocemente através das medidas gerais de urgência. Quando causado pela ingestão de alimentos contaminados, é considerado como doença transmitida por alimento. A notificação de um caso suspeito é considerada como surto. Agente etiológico O Clostridium botulinum é um bacilo gram-positivo, anaeróbio, esporulado e sua forma vegetativa produz 8 tipos de toxina (A, B, C1, C2, D, E, F e G). As toxinas patogênicas para o homem são as dos tipos A, B, E e F, sendo as mais freqüentes a A e a B. Reservatório Os esporos do Clostridium botulinum são amplamente distribuídos na natureza, em solos e sedimentos de lagos e mares. São identificados em produtos agrícolas como legumes, vegetais e mel e em intestinos de mamíferos, peixes e vísceras de crustáceos. Modo de transmissão O modo de transmissão tem importância na apresentação clínica e nas ações de vigilância epidemiológica. Botulismo alimentar Ocorre por ingestão de toxinas presentes em alimentos previamente contaminados e que foram produzidos ou conservados de maneira inadequada. Os alimentos mais comumente envolvidos são: conservas vegetais, principalmente as artesanais (palmito, picles, pequi); produtos cárneos cozidos, curados e defumados de forma artesanal (salsicha, presunto, carne frita conservada em gordura – “carne de lata”); pescados defumados, salgados e fermentados; queijos e pasta de queijos e, raramente, em alimentos enlatados industrializados. 170 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Botulismo Botulismo por ferimentos Ocasionado pela contaminação de ferimentos com Clostridium botulinum, que em condições de anaerobiose assume a forma vegetativa e produz toxina in vivo. As principais portas de entrada para os esporos são úlceras crônicas com tecido necrótico, fissuras, esmagamento de membros, ferimentos em áreas profundas mal vascularizadas ou, ainda, aqueles produzidos por agulhas em usuários de drogas injetáveis e lesões nasais ou sinusais em usuários de drogas inalatórias. É uma das formas mais raras de botulismo. Botulismo intestinal Resulta da ingestão de esporos presentes no alimento, seguida da fixação e multiplicação do agente no ambiente intestinal, onde ocorre a produção e absorção de toxina. A ausência da microbiota de proteção permite a germinação de esporos e a produção de toxina na luz intestinal. Ocorre com maior freqüência em crianças com idade entre 3 e 26 semanas – motivo pelo qual foi inicialmente denominado botulismo infantil. Em adultos, são descritos alguns fatores predisponentes como cirurgias intestinais, acloridria gástrica, doença de Crohn e/ou uso de antibióticos por tempo prolongado, que levaria à alteração da flora intestinal. 6 B Embora raros, são descritos casos de botulismo acidental associados ao uso terapêutico ou estético da toxina botulínica e à manipulação de material contaminado em laboratório (transmissão pela via inalatória ou contato com a conjuntiva). Período de incubação Botulismo alimentar – pode variar de duas horas a 10 dias, com média de 12h a 36h. Quanto maior a concentração de toxina no alimento ingerido, menor o período de incubação. Botulismo por ferimento – pode variar de 4 a 21 dias, com média de 7 dias. Botulismo intestinal – o período não é conhecido devido a impossibilidade de determinar o momento da ingestão de esporos. Quando ocorre a ingestão de esporos ou a contaminação de ferimentos, o período de incubação é maior porque a doença só tem início após a transformação do Clostridium botulinum da forma esporulada para a forma vegetativa, que se multiplica e libera toxina. Períodos de incubação curtos sugerem maior gravidade e maior risco de letalidade. Período de transmissibilidade Não há relato de transmissão interpessoal, apesar de haver excreção da toxina botulínica e esporos da bactéria por semanas ou meses nas fezes de lactentes com botulismo intestinal. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 171 Botulismo Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas As manifestações clínicas do botulismo serão descritas de acordo com o modo de transmissão. Botulismo alimentar A doença se caracteriza por instalação súbita e progressiva. Os sinais e sintomas iniciais podem ser gastrointestinais e/ou neurológicos. As manifestações gastrointestinais mais comuns são: náuseas, vômitos, diarréia e dor abdominal e podem anteceder ou coincidir com os sintomas neurológicos. Os primeiros sintomas neurológicos podem ser inespecíficos, tais como cefaléia, vertigem e tontura. O quadro neurológico propriamente dito se caracteriza por uma paralisia flácida motora descendente, associado a comprometimento autonômico disseminado. Os principais sinais e sintomas neurológicos são: visão turva, ptose palpebral, diplopia, disfagia, disartria e boca seca. Eles começam no território dos nervos cranianos e evoluem no sentido descendente. Esta particularidade distingue o botulismo da síndrome de Guillain-Barré, que é uma paralisia flácida ascendente. Com a evolução da doença, a fraqueza muscular pode se propagar de forma descendente para os músculos do tronco e membros, o que pode ocasionar dispnéia, insuficiência respiratória e tetraplegia flácida. A fraqueza muscular nos membros é tipicamente simétrica, acometendo com maior intensidade os membros superiores. Uma característica importante no quadro clínico do botulismo é a preservação da consciência. Na maioria dos casos também não há comprometimento da sensibilidade, o que auxilia no diagnóstico diferencial com outras doenças neurológicas. O botulismo pode apresentar progressão por uma a duas semanas e estabilizar-se por mais duas a três semanas, antes de iniciar a fase de recuperação, com duração variável, que depende da formação de novas sinapses e restauração da função. Nas formas mais graves, o período de recuperação pode durar de seis meses a um ano, embora os maiores progressos ocorram nos primeiros três meses após o início dos sintomas. Botulismo por ferimentos O quadro clínico é semelhante ao do botulismo alimentar; entretanto, os sinais e sintomas gastrointestinais não são esperados e pode ocorrer febre decorrente de contaminação secundária do ferimento. O botulismo por ferimento deve ser lembrado nas situações em que não se identifica uma fonte alimentar, especialmente em casos isolados da doença. Ferimentos ou cicatrizes nem sempre são encontrados e focos ocultos, como em mucosa nasal, seios da face e pequenos abscessos em locais de injeção, devem ser investigados, especialmente em usuários de drogas. Botulismo intestinal Nas crianças, o aspecto clínico do botulismo intestinal varia de quadros com constipação leve à síndrome de morte súbita. Manifesta-se inicialmente por constipação e irri- 172 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Botulismo tabilidade, seguidos de sintomas neurológicos caracterizados por dificuldade de controle dos movimentos da cabeça, sucção fraca, disfagia, choro fraco, hipoatividade e paralisias bilaterais descendentes, que podem progredir para comprometimento respiratório. Casos leves caracterizados apenas por dificuldade alimentar e fraqueza muscular discreta têm sido descritos. Em adultos, suspeita-se de botulismo intestinal na ausência de fontes prováveis de toxina botulínica, como alimentos contaminados, ferimentos ou uso de drogas. O botulismo intestinal tem duração de duas a seis semanas, com instalação progressiva dos sintomas por uma a duas semanas, seguida de recuperação em três a quatro semanas. Complicações Desidratação e pneumonia por aspiração podem ocorrer precocemente, antes mesmo da suspeita de botulismo ou do primeiro atendimento no serviço de saúde. Infecções respiratórias podem ocorrer em qualquer momento da hospitalização, sendo a longa permanência sob assistência ventilatória e os procedimentos invasivos considerados importantes fatores de risco. 6 Patogenia B A toxina botulínica absorvida no trato gastrointestinal ou no ferimento dissemina-se por via hematogênica até as terminações nervosas, mais especificamente para a membrana pré-sináptica da junção neuromuscular, bloqueando a liberação da acetilcolina (neurotransmissor responsável pela contração muscular). Com isso, haverá falha na transmissão de impulsos nas junções das fibras nervosas, resultando em paralisia flácida dos músculos que estes nervos controlam. O dano causado na membrana pré-sináptica pela toxina é permanente. A recuperação depende da formação de novas terminações neuromusculares. Por este motivo, a recuperação clínica é prolongada, podendo variar de 1 a 12 meses. Diagnóstico clínico A anamnese, exame físico e neurológico do paciente são imprescindíveis para o diagnóstico do botulismo. Anamnese Para a investigação das doenças neurológicas que se manifestam por fraqueza muscular descendente, faz-se necessário realizar anamnese cuidadosa, buscando identificar fatores de risco específicos para botulismo. Deve-se avaliar o início e a progressão dos principais sinais e sintomas neurológicos apresentados. Na suspeita de botulismo alimentar, também devem ser verificados: alimentos ingeridos nos últimos três dias e, quando possível, até 10 dias; tempo decorrido entre a ingestão e o aparecimento da doença; existência de outros casos e fonte comum de ingestão. Identificar outros fatores de risco, como ferimentos, imunização e infecções virais recentes, picada de insetos, viagens, exposição a agentes tóxicos, medicamentos e uso de drogas endovenosas. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 173 Botulismo Exame físico geral De forma geral, prevalecem os sinais e sintomas neurológicos, sendo estes os primeiros e mais importantes achados ao se examinar o paciente. Sinais de desidratação, distensão abdominal e dispnéia podem estar presentes. Não há febre, a menos que haja uma complicação infecciosa. No botulismo por ferimento pode ocorrer febre secundária à infecção da ferida por outras bactérias. A freqüência cardíaca é normal ou baixa, se não houver hipotensão (presente nas formas graves, com disfunção autonômica). Exame neurológico Avaliar – nível de consciência; déficit de força muscular nos membros e comprometimento da musculatura ocular, facial e bulbar. Verificar – movimentos da língua e do palato; movimentos da face; reflexos profundos (aquileu, patelar, bicipital, tricipital, estilo-radial); sensibilidade; comprometimento do sistema nervoso autônomo; acuidade visual e preservação da audição. Diagnóstico eletrofisiológico A eletroneuromiografia permite identificar se a lesão no sistema nervoso periférico localiza-se na raiz, nos plexos, no nervo, no músculo ou na junção neuromuscular. Desta forma, este exame é de grande valor no diagnóstico de botulismo ao demonstrar o comprometimento da junção neuromuscular, mais especificamente da membrana pré-sináptica causada pela toxina botulínica. Além disso, o exame auxilia no diagnóstico diferencial com outras doenças com quadros clínicos semelhantes (Quadro 1). Diagnóstico diferencial Existem muitas doenças neurológicas que podem manifestar-se com fraqueza muscular súbita e paralisia flácida aguda. O Quadro 1 mostra os principais critérios utilizados para diferenciá-las do botulismo. Além destas, existem outras doenças menos comuns que também devem ser consideradas no diagnóstico diferencial: doença de Lyme, neuropatia diftérica, neuropatias tóxicas alimentares, neuropatia por metais pesados e agentes industriais e outros quadros neurológicos e/ou psiquiátricos (meningoencefalites, acidente vascular cerebral, traumatismo cranioencefálico, transtornos conversivos (histeria), hipopotassemia, intoxicação por atropina, beladona, metanol, monóxido de carbono, fenotiazínicos e envenenamento por curare). Por ser uma doença do sistema nervoso periférico, o botulismo não está associado a sinais de envolvimento do sistema nervoso central. A presença das manifestações abaixo relacionadas, em indivíduo previamente normal, é argumento contra a possibilidade desta doença: • movimentos involuntários; • diminuição do nível de consciência; • ataxia; • crises epilépticas (convulsões); 174 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Botulismo • espasticidade, hiperreflexia profunda, presença de clônus ou sinal de Babinski e sinais de liberação piramidal nos membros acometidos por fraqueza; • assimetria significativa da força muscular; • déficit sensitivo. Quadro 1. Diagnóstico diferencial de botulismo Condição Botulismo Fraqueza muscular Inicia pela face descendente e simétrica Sensibilidade Normal Características do líquor Normal Dissociação proteíno-citológica Síndrome de Guillain-Barré O envolvimento da face é menos comum que no botulismo Ascendente e simétrica Em alguns casos pode haver déficit sensitivo Hiperproteinorraquia Celularidade normal ou discretamente elevada (≤ 50 células/mm3) 6 Na primeira semana pode ser normal Fraqueza simétrica da face Síndrome de Müller-Fisher Diplegia facial (variante da síndrome de GuillainBarré) Dificuldade de mastigação e de deglutição Miastenia gravis Ptose palpebral Parestesias ou diminuição da sensibilidade da face e da língua Não há comprometimento de membros superiores e inferiores Flutuante no transcorrer do dia, piora com atividade física e melhora com repouso Normal B Dissociação proteíno-citológica Hiperproteinorraquia Celularidade normal ou discretamente elevada (≤ 50 células/mm3) Normal A maioria dos casos se inicia por ptose palpebral e diplopia Diagnóstico laboratorial O diagnóstico laboratorial é baseado na análise de amostras clínicas e bromatológicas (casos de botulismo alimentar). Os exames laboratoriais podem ser realizados por várias técnicas, sendo a mais comum a detecção da toxina botulínica por meio de bioensaio em camundongos. Em casos de botulismo por ferimentos e botulismo intestinal, realiza-se também o isolamento de Clostridium botulinum através de cultura das amostras. Estes exames são realizados em laboratório de referência nacional e a seleção de amostras de interesse e oportunas para o diagnóstico laboratorial varia de acordo com a forma de botulismo (Anexo 1). Tratamento O êxito da terapêutica do botulismo está diretamente relacionado à precocidade com que é iniciada e às condições do local onde será realizada. O tratamento deve ser realizado em unidade hospitalar que disponha de terapia intensiva (UTI). Observa-se significativa Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 175 Botulismo redução da letalidade quando o paciente é tratado nessas unidades. Basicamente, o tratamento da doença apóia-se em dois conjuntos de ações: tratamento de suporte e tratamento específico. Tratamento de suporte As medidas gerais de suporte e monitorização cardiorrespiratória são as condutas mais importantes no tratamento do botulismo. A disfagia, regurgitação nasal, comprometimento dos movimentos da língua, palato e, principalmente, da musculatura respiratória são sinais indicativos de gravidade e exigem atenção redobrada e ação imediata para evitar broncoaspiração e insuficiência respiratória. Nesses casos, a assistência ventilatória é essencial para evitar o óbito, podendo ser necessária por quatro (toxina tipo B) a oito semanas (tipo A) ou mais se houver complicações. O tratamento de suporte baseia-se fundamentalmente nos seguintes procedimentos: • assistência ventilatória pode ser necessária para cerca de 30% a 50% dos casos. Para se indicar a entubação traqueal num paciente com botulismo, não é necessário esperar que a PCO2 esteja elevada ou que a saturação de O2 diminua, pois a espera de tais sinais pode representar maior risco de instalação da insuficiência respiratória. Os critérios para indicação de entubação são essencialmente clínicos. Para indicá-la, pode-se basear em: ❯ cuidadosa avaliação da capacidade do paciente em garantir a permeabilidade das vias aéreas superiores. As paralisias podem causar asfixia e obstruções respiratórias altas (observar a mobilidade da língua e do palato, disfonia e disfagia); ❯ capacidade vital (aferida por espirômetro): em geral, a entubação é indicada quando a capacidade vital é menor que 12 ml/kg; • traqueostomia nem sempre é necessária, devendo ter sua indicação avaliada caso a caso; • lavagens gástricas, enemas e laxantes podem ser úteis nos casos de botulismo alimentar com o objetivo de eliminar a toxina do aparelho digestivo, exceto naqueles em que houver íleo paralítico; • hidratação parenteral e reposição de eletrólitos, além de alimentação por meio de sondas, devem ser mantidas até que a capacidade de deglutição seja recuperada. • outros procedimentos rotineiros em UTI também devem ser adotados. Nota: aminoglicosídeos e tetraciclinas podem piorar a evolução do botulismo, especialmente em crianças, devido à redução da entrada de cálcio no neurônio, potencializando o bloqueio neuromuscular. Tratamento específico Visa eliminar a toxina circulante e sua fonte de produção, o Clostridium botulinum, pelo uso do soro antibotulínico (SAB) e de antibióticos. Antes de iniciar o tratamento específico, todas as amostras clínicas para exames diagnósticos devem ser coletadas. 176 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Botulismo O soro antibotulínico atua contra a toxina circulante, que ainda não se fixou no sistema nervoso. Por isso, recomenda-se que o tratamento com SAB seja realizado o mais precocemente possível (até sete dias); caso contrário, poderá não mais ser eficaz. Apresenta-se em forma de soro heterólogo, eqüino, geralmente em apresentação bi ou trivalente (contra os tipos A e B ou A, B e E de toxina botulínica). A dose é uma ampola de antitoxina botulínica bi ou trivalente por via intravenosa, diluída em solução fisiológica a 0,9%, na proporção de 1:10, para infundir em aproximadamente uma hora. A solicitação do SAB para as unidades de tratamento deve ser feita pelo médico que diagnosticou o caso ou pelo pessoal de vigilância epidemiológica sempre que a mesma for acionada inicialmente. A liberação do soro estará condicionada ao preenchimento da ficha de notificação do caso suspeito, com sua prescrição e relatório sucinto. A indicação da antitoxina deve ser criteriosa, pois não é isenta de riscos uma vez que 9% a 20% das pessoas tratadas podem apresentar reações de hipersensibilidade. O teste cutâneo de sensibilidade antes do uso de soros heterólogos foi excluído da rotina, conforme normas do Programa Nacional de Imunização da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (PNI/SVS/MS). Nos casos de botulismo por ferimento, recomenda-se o uso de penicilina cristalina na dose de 10 a 20 milhões de UI/dia, para adultos, e 300 mil UI/kg/dia, para crianças, em doses fracionadas de 4/4 horas, via intravenosa, por 7 a 10 dias. O metronidazol também pode ser utilizado na dose de 2g/dia, para adultos, e 15mg/kg/dia, para crianças, via intravenosa, de 6/6 horas. O desbridamento cirúrgico deve ser realizado nos casos de botulismo por ferimento, preferencialmente após o uso do SAB, mesmo quando a ferida tem bom aspecto. No botulismo intestinal em menores de um ano de idade, acredita-se que a lise de bactérias na luz intestinal, provocada pelo antibiótico, pode piorar a evolução da doença por aumento dos níveis de toxina circulante. Em adultos esse efeito não tem sido descrito mas deve ser considerado quando a porta de entrada para a doença for o trato digestivo. O SAB e a antibioticoterapia não estão indicados para crianças menores de um ano de idade com botulismo intestinal. No botulismo alimentar a indicação de antibióticos ainda não está bem estabelecida. 6 B Prognóstico Um tratamento de suporte meticuloso pode resultar em completa recuperação. A letalidade do botulismo diminui de forma considerável quando a assistência médica dos pacientes é prestada em unidades de terapia intensiva. Mortes precoces geralmente resultam de falha em reconhecer a gravidade da doença e retardo em iniciar a terapia. Quando ocorrem após a segunda semana, resultam de complicações, como as associadas à ventilação prolongada. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 177 Botulismo Aspectos epidemiológicos A distribuição do botulismo é mundial, com casos esporádicos ou surtos familiares, em geral relacionados à produção e a conservação de alimentos de maneira inadequada. Raramente ocorrem surtos envolvendo produtos processados comercialmente. Os casos de botulismo infantil têm sido notificados na Ásia, Austrália, Europa, América do Norte e América do Sul. A incidência e a distribuição real não é precisa, porque os profissionais de saúde, em poucas ocasiões, suspeitam de botulismo. Ele pode ser responsável por 5% dos casos de morte súbita em lactentes. Vigilância epidemiológica Objetivos • Detectar precocemente os casos, visando promover a assistência adequada e reduzir a morbidade e letalidade da doença. • Caracterizar o surto por tempo, lugar e pessoa. • Identificar a fonte de contaminação e o modo de transmissão. • Propor medidas de prevenção e controle, em tempo oportuno, para impedir a ocorrência de novos casos. • Avaliar as medidas de controle implantadas. Definição de caso Caso suspeito de botulismo alimentar e botulismo por ferimentos Indivíduo que apresente paralisia flácida aguda, simétrica e descendente, com preservação do nível de consciência caracterizado por um ou mais dos seguintes sinais e sintomas: visão turva, diplopia, ptose palpebral, boca seca, disartria, disfagia ou dispnéia. Nota: A exposição a alimentos potencialmente suspeitos para presença da toxina botulínica nos últimos dez dias ou história de ferimentos nos últimos 21 dias reforça a suspeita. Caso suspeito de botulismo intestinal • Criança menor de um ano com paralisia flácida aguda de evolução insidiosa e progressiva que apresente um ou mais dos seguintes sintomas: constipação, sucção fraca, disfagia, choro fraco, dificuldade de controle dos movimentos da cabeça. • Adulto que apresente paralisia flácida aguda, simétrica e descendente, com preservação do nível de consciência caracterizado por um ou mais dos seguintes sinais e sintomas: visão turva, diplopia, ptose palpebral, boca seca, disartria, disfagia ou dispnéia na ausência de fontes prováveis de toxina botulínica, como alimentos contaminados, ferimentos ou uso de drogas. 178 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Botulismo Nota: A exposição a alimentos com risco para presença de esporo de C. botulinum (ex. mel, xaropes de milho) reforça a suspeita em menores de um ano. Caso confirmado por critério laboratorial • Caso suspeito no qual foi detectada toxina botulínica em amostra clínica e/ou no alimento efetivamente consumido. • Caso suspeito no qual foi isolado o Clostridium botulinum produtor de toxinas, em fezes ou material obtido do ferimento. Caso confirmado por critério clínico-epidemiológico Caso suspeito com vínculo epidemiológico com o caso confirmado e/ou história de consumo de alimento com risco para a presença da toxina botulínica nos últimos dez dias e/ou eletroneuromiografia compatível com botulismo e/ou ferimento em condições de anaerobiose nos últimos 21 dias. 6 Notificação O botulismo é doença de notificação compulsória desde a publicação da Portaria MS nº 1.943, de 18 de outubro de 2001. Devido à gravidade da doença e à possibilidade de ocorrência de outros casos resultantes da ingestão da mesma fonte de alimentos contaminados, um caso é considerado surto e emergência de saúde pública. A suspeita de um caso de botulismo exige notificação e investigação imediatas à vigilância epidemiológica local. O técnico que recebeu a notificação deve, inicialmente, verificar a consistência das informações. Uma vez caracterizada a suspeita de botulismo, comunicar imediatamente tal fato aos níveis hierárquicos superiores e áreas envolvidas na investigação, iniciando o planejamento das ações. B Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente O tratamento do paciente com botulismo deve ser realizado em unidade hospitalar. As medidas gerais de suporte e monitorização cardiorrespiratória são as condutas mais importantes no tratamento. A terapia de suporte deve ser instituída imediatamente, ficando a indicação do tratamento específico (administração de soro antibotulínico) condicionada à avaliação médica. Qualidade da assistência O tratamento deve ser realizado em unidade hospitalar que disponha de unidade de terapia intensiva (UTI). A partir do aprimoramento dos cuidados com os pacientes críticos, observa-se significativa redução da letalidade. Proteção dos indivíduos para evitar novas exposições No caso de botulismo de transmissão alimentar, todos os alimentos suspeitos de ocasionar casos deverão: Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 179 Botulismo • deixar de ser consumidos, sendo recolhidos imediatamente ou guardados sob refrigeração, na forma em que se encontram acondicionados, até a chegada do grupo encarregado pela investigação; • ser preservados nas embalagens originais, quando a suspeita estiver relacionada a produtos industrializados. Confirmação diagnóstica Coletar amostras clínicas de todo caso suspeito antes da administração do soro antibotulínico. Na suspeita de botulismo alimentar deve-se coletar todos os alimentos suspeitos. A investigação epidemiológica orientará quais amostras deverão ser enviadas para análise laboratorial. Investigação Todo caso suspeito de botulismo deve ser investigado imediatamente, visando impedir a ocorrência de novos casos. Roteiro da investigação epidemiológica A atividade de campo deve ser integrada entre vigilância epidemiológica, vigilância sanitária, laboratório, assistência e outras áreas que se fizerem necessárias. A cooperação e o intercâmbio de informações entre as áreas envolvidas são fatores essenciais para a boa qualidade da investigação. A coordenação da investigação deve, preferencialmente, ser delegada a um profissional da vigilância epidemiológica, que terá a responsabilidade de informar e acionar os demais membros da equipe. Os serviços devem estar organizados para providenciar imediatamente o meio de transporte, formulários e material para coleta de amostras, garantindo disponibilidade para o uso imediato, inclusive aos sábados, domingos e feriados. Identificação do paciente Preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica relativos a dados gerais, notificação individual e residência. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmar a suspeita diagnóstica • Preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica de botulismo; • Observar, com atenção, se o caso notificado enquadra-se na definição de caso de botulismo, a fim de evitar a notificação inadequada de casos; • Obter informações detalhadas do próprio paciente (quando possível), dos familiares, da equipe médica e/ou do prontuário; • Investigar a história alimentar nos últimos dez dias (quando possível) para identificar alimentos de risco; • Verificar a história prévia de ferimentos e uso de drogas injetáveis e inalatórias. 180 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Botulismo Para identificação e determinação da extensão da área de ocorrência de casos • Realizar busca ativa de casos, sobretudo de sintomatologia leve, entre aqueles que consumiram os mesmos alimentos que os casos suspeitos, nas unidades de saúde que atendem à população circunvizinha à residência dos casos e nos hospitais com unidade de terapia intensiva; • Informar a população acerca da ocorrência de casos suspeitos de botulismo e sintomas sugestivos da doença, para que procure imediatamente as unidades de saúde; • Quando a fonte da contaminação for um alimento de larga distribuição, seja de origem industrial ou artesanal, toda a área de distribuição do alimento suspeito deverá ser rastreada no intuito de buscar novos casos suspeitos e interromper o consumo do alimento envolvido. Coleta e remessa de material para exame Assegurar coleta oportuna, acondicionamento e transporte de amostras clínicas e/ou bromatológicas e encaminhamento ao Laboratório Central de Saúde Pública. Ver mais detalhes no tópico Diagnóstico laboratorial. 6 B Análise de dados Após a investigação individual de cada caso, deve-se avaliar os antecedentes epidemiológicos e resultados laboratoriais para a classificação do botulismo segundo o modo de transmissão e critério de confirmação. A identificação dos fatores de risco permite determinar as medidas de prevenção e controle específicas para o surto. Para surtos que envolvem maior número de pessoas, utilizar também os formulários e metodologia de investigação de surtos de doenças transmitidas por alimentos. Encerramento de casos Os casos de botulismo devem ser encerrados de acordo com os seguintes critérios: Critério laboratorial • Detecção de toxina botulínica em amostra clínica e/ou no alimento efetivamente consumido. • Isolamento do Clostridium botulinum produtor de toxinas, em fezes ou material obtido do ferimento. Critério clínico-epidemiológico Presença de vínculo epidemiológico com o caso confirmado e/ou história de consumo de alimento com risco para a presença da toxina botulínica nos últimos dez dias e/ou eletroneuromiografia compatível com botulismo e/ou ferimento em condições de anaerobiose nos últimos 21 dias. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 181 Botulismo Óbitos Indivíduo que foi a óbito com quadro clínico compatível com botulismo, com confirmação clínico-epidemiológica e/ou clínico-laboratorial. Relatório final Além da ficha de notificação, todas as informações obtidas durante a investigação deverão ser consolidadas em um relatório final com o seguinte conteúdo: dados do caso (idade, sexo, ocupação, local de residência), data da notificação e investigação; data de início dos sintomas; período de incubação; curva epidêmica; história alimentar e outros fatores de exposição; sinais e sintomas; tratamento realizado; amostras coletadas e exames realizados; resultados laboratoriais; fonte de transmissão; classificação final e evolução. Instrumentos disponíveis para controle Ações de educação em saúde Orientar a população sobre o preparo, conservação e consumo adequado dos alimentos associados a risco de adoecimento. Estratégias de prevenção Orientar as medidas iniciais de prevenção e controle, de acordo com o modo de transmissão e resultados da investigação do caso. Nos casos de transmissão alimentar, deve-se eliminar a permanência da fonte através da interrupção do consumo, distribuição e comercialização dos alimentos suspeitos. Imunização A imunização, realizada com toxóide botulínico polivalente, é recomendada apenas a pessoas com atividade na manipulação do microrganismo. 182 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Botulismo Roteiro de investigação epidemiológica do botulismo Notificação de casos suspeitos Atenção médica/ dados clínicos Coleta de amostras clínicas Investigação Coleta de dados clínicos e epidemiológicos em conjunto com a vigilância sanitária Resultado dos exames 6 Suspeita de botulismo por ferimentos Suspeita de botulismo alimentar Suspeita de botulismo intestinal B Exames bromatológicos Diagnóstico Caso descartado Caso confirmado clínico-epidemiológico ou clínico-laboratorial Determinar a extensão da área de ocorrência Núcleo familiar Ocorrência disseminada Ações de controle e de intervenção da vigilância sanitária Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 183 Botulismo Anexo 1 Normas para procedimentos laboratoriais 1. Amostras clínicas oportunas e de interesse para o diagnóstico laboratorial A coleta de amostras clínicas (soro, lavado gástrico, fezes/conteúdo intestinal, exsudato de ferimento) deve ser realizada o mais precocemente possível e anteceder a administração do soro antibotulínico (SAB), para evitar que a toxina ativa seja neutralizada antes da coleta. A coleta tardia pode impedir a detecção de toxina, pois esta vai sendo absorvida pelos tecidos em função do tempo. A seleção de amostras varia de acordo com o modo de transmissão do botulismo (Quadro 1). O momento e quantidade de material necessário para o diagnóstico laboratorial estão especificados no Quadro 2. Quadro 1. Tipo de amostras para o diagnóstico laboratorial de acordo com o modo de transmissão Botulismo alimentar Botulismo intestinal Botulismo por ferimento Soro Sim Sim Sim Fezes ou conteúdo intestinal Sim Sim Não* Lavado gástrico Sim Não Não* Exsudato do ferimento Não Não Sim Soro Não Não Não Fezes ou conteúdo intestinal Não Sim Não* Lavado gástrico Não Não Não* Exsudato do ferimento Não Não1 Sim Amostras Para detecção de toxina botulínica Para cultura do Clostridium botulinum *Se houver suspeita ou possibilidade do ferimento estar localizado no trato gastrointestinal, incluir a coleta destas amostras. Obs.: com exceção das amostras de soro, as demais também podem ser usadas para cultura do Clostridium botulinum. 184 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Botulismo Quadro 2. Período máximo de tempo, após o início dos sintomas, para a coleta oportuna de amostras clínicas e quantidade mínima necessária para o diagnóstico de laboratório Amostras Período máximo para coleta Total Soro 8 dias 11ml Fezes/conteúdo intestinal Com diarréia inicial Com constipação intestinal Sem alteração do trânsito intestinal 3 dias 6 dias 4 dias 15g 15g 15g Lavado gástrico/vômito 3 dias 15g Obs.: sempre que possível, coletar as amostras em quantidades superiores às indicadas para o diagnóstico específico. 6 2. Amostras bromatológicas de interesse para diagnóstico laboratorial de botulismo alimentar B Prioritárias e oportunas • Quando há suspeita de botulismo alimentar as amostras bromatológicas devem ser coletadas e enviadas o mais precocemente possível ao laboratório central de saúde pública; • Coletar todas as sobras e restos dos produtos efetivamente consumidos; • Evitar a transferência das sobras ou restos (ou ambos) para outro recipiente, mesmo que se encontre em condições precárias de integridade física ou de presença de sujidades. Caso não existam sobras ou restos, coletar o recipiente vazio que as continham originalmente; • Nas amostras bromatológicas é comum encontrar formas esporuladas do Clostridium botulinum, em especial no mel. É importante salientar que neste alimento, devido ao alto conteúdo de açúcar e baixa atividade de água, o esporo não tem condições de germinar e, portanto, não há produção de toxina. Complementares Na ausência absoluta de amostras de alimentos não consumidos, coletar outras que pertençam ao mesmo lote (amostras industrializadas) ou que tenham sido produzidas no mesmo local e data e pela mesma pessoa ou grupo de pessoas (amostras artesanais ou domésticas). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 185 Botulismo 3. Cuidados básicos para o acondicionamento e transporte de amostras clínicas e bromatológicas para o laboratório • Coletar as amostras com assepsia e em condições de segurança para o técnico responsável. • Acondicionar as amostras em recipientes limpos, de preferência esterilizados e hermeticamente fechados. Caso seja amostra de alimento contida em uma embalagem, não transferir para outro recipiente, coletar todo o conjunto. • Quando a amostra estiver contida em frascos de vidro ou similares que podem quebrar durante o transporte, protegê-los com auxílio de algodão, tiras plásticas com bolhas de ar, caixas de papelão próprias para o envio de pequenas amostras ou outro dispositivo. Vedar ou tampar o recipiente que contém a amostra, garantindo que não ocorrerá vazamento do produto. • Conservar e transportar as amostras sob refrigeração a 4ºC-8ºC, pois a toxina botulínica é termolábil, podendo ser inativada em temperaturas acima da ambiental. Importante: a única exceção cabe aos casos de botulismo por ferimento, cujas amostras devem ser enviadas em temperatura ambiente. O tempo de transporte não deve ultrapassar 48h. • Todas as amostras devem ser enviadas ao laboratório identificadas com os seguintes dados: nome do paciente, tipo de amostra (soro, fezes, alimento, etc.) e finalidade do exame (determinação de toxina botulínica, cultura). Cada amostra deve ter um formulário de encaminhamento, determinado por cada laboratório central de saúde pública. • O laboratório deve ser avisado do envio da amostra, que deverá ser recebida de imediato, inspecionada e armazenada de forma adequada até o seu encaminhamento para o laboratório de referência de botulismo. 186 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Cólera CÓLERA CID 10: A00 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Doença infecciosa intestinal aguda, causada pela enterotoxina do Vibrio cholerae. Pode se apresentar de forma grave, com diarréia aquosa e profusa, com ou sem vômitos, dor abdominal e cãibras. Esse quadro, quando não tratado prontamente, pode evoluir para desidratação, acidose e colapso circulatório, com choque hipovolêmico e insuficiência renal. Entretanto, freqüentemente a infecção é assintomática ou oligossintomática, com diarréia leve. A acloridria gástrica agrava o quadro clínico da doença. A infecção produz aumento de anticorpos e confere imunidade por tempo limitado (em torno de seis meses). 6 Agente etiológico C O Vibrio cholerae O1, biotipo clássico, ou El Tor (sorotipos Inaba, Ogawa ou Hikogima) e o O139, também conhecido como Bengal. Bacilo gram-negativo, com flagelo polar, aeróbio ou anaeróbio facultativo, produtor de endotoxina. Acreditava-se que entre todos os sorogrupos conhecidos apenas o O1 era patogênico. Em março de 1993, contudo, o Vibrio cholerae O139 foi identificado como responsável por uma epidemia no sul da Ásia. Sorogrupos não O1 do Vibrio cholerae já foram identificados em todo o mundo, sabendo-se que podem ocasionar patologias extra-intestinais ou diarréias com desidratação severa semelhante à cólera. No entanto, só estavam associados a casos isolados ou surtos muito limitados. O Vibrio cholerae O139 foi o primeiro Vibrio cholerae não O1 identificado como responsável por grande epidemia, com considerável mortalidade. As enterotoxinas elaboradas são similares para o grupo e ocasionam quadros clínicos muito semelhantes. A resistência do biotipo El Tor é maior, o que lhe dá condições de sobreviver por mais tempo no meio ambiente. Multiplica-se melhor e mais rápido em meios de cultura, além de apresentar menor susceptibilidade aos agentes químicos e maior tendência à endemização. Reservatório O principal é o homem. Estudos sugerem a existência de reservatórios ambientais, como plantas aquáticas e frutos do mar. Nos Estados Unidos, Itália e Austrália alguns surtos isolados foram relacionados ao consumo de frutos do mar crus ou mal cozidos, sugerindo a existência de reservatórios ambientais. Modo de transmissão Ocorre principalmente pela ingestão de água ou alimentos contaminados por fezes ou vômitos de doente ou portador. Os alimentos e utensílios podem ser contaminados pela Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 187 Cólera água, pelo manuseio ou por moscas. A elevada ocorrência de assintomáticos (portador sadio), em relação aos doentes, torna importante seu papel na cadeia de transmissão da doença. A contaminação pessoa a pessoa é também importante na cadeia epidemiológica. A variedade El Tor persiste na água por muito tempo, o que aumenta sua probabilidade de manter a transmissão e circulação. Alguns autores demonstraram, para a produção de infecção, a necessidade de inóculo igual ou maior que 103 vibriões em alimentos e maior do que 106 na água. Período de incubação Pode variar de algumas horas a 5 dias. Na maioria dos casos, de 2 a 3 dias. Período de transmissibilidade Ocorre enquanto houver a eliminação do Vibrio cholerae nas fezes, o que geralmente acontece até poucos dias após a cura. Para fins de vigilância, o padrão aceito é de 20 dias. Alguns indivíduos podem permanecer portadores sadios por meses ou até anos, o que os reveste de particular importância porque podem ser responsáveis pela introdução da doença em área indene. Alguns doentes tornam-se portadores crônicos, eliminando o Vibrio cholerae de forma intermitente por meses e até anos. Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade é variável e aumenta com fatores que diminuem a acidez gástrica (acloridria, gastrectomia, uso de alcalinizantes e outros). A infecção produz aumento de anticorpos e confere imunidade por tempo limitado – em torno de seis meses. Em áreas endêmicas, as repetidas infecções tendem a incrementar a produção da IgA secretora e produzir constantes estímulos à resposta imunológica, capaz de manter a imunidade local de longa duração. Esse mecanismo pode explicar a resistência demonstrada pelos adultos nessas áreas. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas Doença infecciosa intestinal aguda, causada pela enterotoxina do Vibrio cholerae, manifesta-se de forma variada, desde infecções inaparentes até diarréia profusa e grave. Além da diarréia, podem ocorrer vômitos, dor abdominal e, nas formas graves, cãibras, desidratação e choque. A febre não é manifestação comum. Nos casos graves mais típicos (menos de 10% do total) o início é súbito, com diarréia aquosa, abundante e incoercível, com inúmeras dejeções diárias. A diarréia e os vômitos, nesses casos, determinam uma extraordinária perda de líquidos, que pode ser da ordem de 1 a 2 litros por hora. Esse quadro, quando não tratado 188 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Cólera prontamente, pode evoluir para desidratação, acidose, colapso circulatório, com choque hipovolêmico e insuficiência renal. Mais freqüentemente, a infecção é assintomática ou oligossintomática, com diarréia leve. A acloridria gástrica agrava o quadro clínico da doença. Complicações As complicações na cólera decorrem, fundamentalmente, da depleção hidrosalina imposta pela diarréia e pelos vômitos e ocorrem mais freqüentemente nos indivíduos idosos, diabéticos ou com patologia cardíaca prévia. A desidratação não corrigida levará a uma deterioração progressiva da circulação, da função renal e do balanço hidreletrolítico, produzindo dano a todos os sistemas do organismo. Em conseqüência, sobrevém choque hipovolêmico, necrose tubular renal, íleo paralítico, hipocalemia (levando a arritmias), hipoglicemia (com convulsão e coma em crianças). O aborto é comum no 3º trimestre de gestação, em casos de choque hipovolêmico. As complicações podem ser evitadas com adequada hidratação precoce. 6 Diagnóstico diferencial Com todas as diarréias agudas. C Diagnóstico laboratorial O Vibrio cholerae pode ser isolado a partir da cultura de amostras de fezes de doentes ou portadores assintomáticos. A coleta do material pode ser feita por swab retal ou fecal, fezes in natura ou em papel de filtro. O método de coleta de amostras biológicas pode ser visto no Anexo I. O diagnóstico laboratorial da cólera só deve ser utilizado para a investigação de todos os casos suspeitos quando a área for considerada livre de circulação do agente. Em outra situação, deverá ser utilizado em conjunto com o critério clínico-epidemiológico, que correlaciona as variáveis clínicas e epidemiológicas dos casos de diarréia, sendo capaz de definir o diagnóstico, sem investigação laboratorial. Tratamento O tratamento fundamenta-se na reposição rápida e completa da água e eletrólitos perdidos pelas fezes e vômitos. Os líquidos deverão ser administrados por via oral ou parenteral, conforme o estado do paciente. Formas leves e moderadas – hidratação oral com soro de reidratação oral (SRO). Formas graves – hidratação venosa e oral + antibioticoterapia. Antibioticoterapia – Drogas de escolha e posologia Menores de 8 anos Sulfametoxasol (50mg/kg/dia) + Trimetroprim (10mg/kg/dia) 12/12h – 3 dias 8 anos ou mais Tetraciclina 500mg 6/6h – 3 dias Gestantes e nutrizes Ampicilina 500mg 6/6h – 3 dias Fonte: Manual Integrado de Prevenção e Controle de Cólera – CNPC/Funasa/MS Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 189 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS A A seguir, identificar outros problemas B C Perguntar se tem sangue nas fezes Em caso positivo e com comprometimento do estado geral: 1. Observe Estado geral Bem alerta Irritado, intranqüilo Comatoso, hipotônico Olhos Normal Fundos Muito fundos e secos Lágrimas Presentes Ausentes Ausentes Sede Bebe normal Sedento, bebe rápido e avidamente Bebe mal ou não é capaz de beber • Tratar o paciente durante 5 dias com Sulfametoxasol (SMX) com Trimetropim (TPM); crianças: 50mg SMX/kg de peso dividido em duas doses, a cada 12 horas Adultos: 800mg de SMX a cada 12 horas 2. Explore Sinal da prega Desaparece rapidamente Desaparece lentamente Desaparece muito lentamente (mais de 2 seg.) Cheio Rápido, débil Muito débil ou ausente Pulso • Ensinar ao responsável pelo paciente como administrar líquidos e manter a alimentação descrita no Plano A Normal (até 3 seg.) Prejudicado (de 3 a 5 seg.) Muito prejudicado (mais de 5 seg.) • Controlar o paciente após 2 dias Enchimento capilar (1) 3. Decida 4. Trate Não tem sinais de desidratação Se apresenta dois ou mais sinais, tem desidratação Se apresenta dois ou mais sinais, incluindo pelo menos um “sinal”, tem desidratação grave Use Plano A Use Plano B Pese o paciente se possível Use Plano C Pese o paciente Plano A Plano B Para prevenir a desidratação no domicílio Para tratar a desidratação por via oral Explique as três regras para o manejo adequado da diarréia no domicílio: 1. Administrar SRO Quantidade aproximada de SRO para as primeiras 4 horas: 1. Dar mais líquido do que habitualmente, para prevenir a desidratação: • A quantidade de solução ingerida dependerá da sede do paciente • O paciente deve tomar líquidos caseiros (água de arroz, soro caseiro, chás, sucos e sopas) ou sais de reidratação • O SRO deverá ser dado continuamente, até que desapareçam os sinais de desidratação • Oral (SRO), após cada evacuação diarréica 2. Manter a alimentação habitual para prevenir a desnutrição: • Continuar o aleitamento materno • Se a criança não mamar, continuar com leite habitual • Manter a dieta normal para as crianças maiores de 4 meses, que comem alimentos sólidos, e também para os adultos • Apenas como orientação inicial, o paciente deverá receber 50 a 100ml/kg no período de 4 a 6 horas 2. Observar o paciente continuamente durante a reidratação e ajudar a família a dar soro oral 3. Durante a reidratação, reavaliar o paciente. Usar o “quadro para avaliação do estado de hidratação do paciente”: • Se não apresentar sinais de desidratação, use o Plano A • Se continuar desidratado, repetir o Plano B por mais 2 horas e reavaliar o paciente Para tratar a desidratação grave Tratamento para pacientes menores de 5 anos Fase rápida Metade de soro glicosado a 5% e metade de soro fisiológico Crianças: 60mg/kg/dia a cada 6 horas durante 5 dias Adultos: 1g, a cada 8 horas, durante 5 dias Plano C Solução (1:1) • Se houver sangue nas fezes, após 2 dias de tratamento com SMX, troque a medicação para ácido nalidixico: Volume total Tempo de administração • Em áreas endêmicas de amebíase, se persistir sangue nas fezes após o tratamento acima, substituir a medicação para Metronidazol Crianças: 30mg/kg dia divididos em doses a cada 8 horas, durante 5 dias Adultos: 750mg a cada 8 horas, durante 5 dias (para os casos mais graves, continuar o tratamento até completar 10 dias) Perguntar quando começou a diarréia 100ml/kg 2 horas Quando tiver pelo menos 14 dias de evolução: • Referir o paciente ao hospital: - Se é menor de seis meses Avaliar o paciente continuamente, assim que puder beber, iniciar o SRO, mantendo a hidratação por via venosa. Fase de manutenção e reposição Volume para manutenção (SG a 5%) 4:1 (SF) 100ml/kg/24 horas + + Volume para reposição (SG a 5%) 1:1 (SF) 50ml/kg/24 horas + + KCL a 10% 2ml/100ml - Se apresentar desidratação, neste caso hidrate-o primeiro e, em seguida, refira-o ao hospital • Quando não tiver condições de referência, ensinar ao responsável como administrar os líquidos e continuar alimentando o paciente conforme o Plano A • Garantir a ingestão calórica dando, se possível, seis refeições ao dia • Marcar a volta do paciente após 5 dias: Se continuar a diarréia, mande-o a um serviço de saúde Se a diarréia parou, oriente ao responsável para: continuar com a alimentação habitual e dar uma refeição adicional ao dia, até que o paciente recupere o estado nutricional Cólera 190 Manejo do paciente com diarréia Primeiro avalie o estado de hidratação do seu paciente 3. Se o paciente não melhorar em dois dias ou se apresentar qualquer um dos sinais abaixo, leva-lo ao serviço de saúde: Tratamento para pacientes maiores de 5 anos Fase rápida • Se o paciente evoluir para desidratação com choque, passar para o Plano C Sinais de perigo 4. Aproveitar a permanência do paciente ou acompanhante no serviço de saúde para ensinar a: • Piora da diarréia • Recusa de alimentos • Vômitos repetidos • Reconhecer os sinais de desidratação • Febre • Muita sede • Preparar e administrar o SRO • Sangue nas fezes Os pacientes devem receber soro oral (SRO) no domicílio se: • Praticar medidas de higiene pessoal e domiciliar •Vierem de áreas afetadas por cólera Menores de 1 ano 50 – 100ml 1 envelope por dia 1 – 10 anos 100 – 200ml 2 envelopes por dia Maiores de 10 anos 4 envelopes por dia Tudo o que quiser 1º Soro fisiológico 30ml/kg 30 minutos 2º Ringer lactato ou solução polieletrolítica 70ml/kg 2 horas e 30 minutos Avaliar o paciente continuamente. Se não estiver melhorando, aumentar a velocidade de infusão Fase de manutenção • Quando o paciente puder beber (geralmente em 2 a 3 horas), iniciar o SRO mantendo-se a hidratação por via endovenosa com 20ml/kg/dia • A quantidade de SRO necessária varia de um paciente para outro, dependendo do volume das evacuações Se a criança tiver desnutrição grave (utilizar para diagnóstico o Cartão da Criança). • Em caso de desnutrição, iniciar a reidratação e após encaminhar a um serviço de saúde. • Entregar ao responsável • Marcar a volta do paciente após 5 dias: Se continuar a diarréia, mande-o a um serviço de saúde; Se a diarréia parou, orientar o responsável para continuar com a alimentação habitual e dar uma refeição adicional ao dia, até que o paciente recupere o estado nutricional Verificar temperatura Se a temperatura for de 39°C ou mais: • Investigar outras causas além da diarréia, por exemplo, pneumonia, otite, amigdalite, faringite, infecção urinária, malária em áreas endêmicas e tratar apropriadamente conforme as normas Uso de medicamento em crianças com diarréia • Lembrar que a quantidade de SRO a ser ingerida é maior nas primeiras 24 horas do tratamento, especialmente nos pacientes com desidratação grave • Antibióticos devem ser usados somente para casos de diarréia com sangue (desinteria) e comprometimento do estado geral, ou em casos de cólera grave • Como orientação, considerar a quantidade média de SRO necessária para estes pacientes, entre 250500ml (SRO/kg de peso/24horas) Em outras condições são ineficazes e não devem ser prescritos Os pacientes desidratados deverão permanecer na unidade de saúde até a completa reidratação. Os pacientes desidratados deverão permanecer no serviço de saúde até que não haja risco de retorno da desidratação • Antiparasitários devem ser usados somente para: - Amebíase, quando o tratamento da desinteria por Shiguella fracassou, ou em casos que se identificaram nas fezes trofozoítos de E. histolitica englobando hemácias - Giardíase, quando a diarréia durar 14 dias ou mais e forem identificados cistos ou trofozoítos nas fezes ou aspirado intestinal Antidiarréicos e antieméticos nunca devem ser usados Fonte: Adaptado do cartaz Manejo do Paciente com Diarréia, do Ministério da Saúde 191 Cólera Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Idade Tempo de administração • Retirar a via endovenosa somente quando o paciente puder ingerir o SRO suficiente para manter-se hidratado •Não puderem voltar ao serviço de saúde Quantidade de (SRO) para levar ao domicílio Volume Total • Observar o paciente durante, pelo menos, 6 horas •Estiverem desidratados e receberem alta Quantidade de (SRO) que deve ingerir após cada evacuação diarréica Solução Observar se tem desnutrição grave 6 C Cólera A observação dos sinais e sintomas é fundamental para classificar o paciente quanto ao seu estado de hidratação no decorrer da diarréia de qualquer etiologia, inclusive a causada pela cólera, com a finalidade de identificar o grau de desidratação e decidir o plano de reposição. O paciente que inicia seu tratamento com reposição venosa, devido à gravidade da desidratação, ao passar para a hidratação oral deve ficar sob constante avaliação clínica, considerando, inclusive, a possibilidade de seu retorno à reidratação endovenosa. A hospitalização prolongada é desnecessária e deve ser evitada. Os pacientes em reidratação oral podem receber alta desde que a ingesta seja suficiente para repor as perdas. No momento da alta, os pacientes devem ser providos com dois ou mais envelopes de SRO e devidamente instruídos com pertinência ao seu preparo e uso, alimentação adequada e ingestão de líquidos. A experiência demonstra que alguns pacientes que não apresentavam sinais e sintomas de desidratação no momento da primeira avaliação, mas mesmo com história de diarréia aquosa e abundante eram liberados para o domicílio após receberem os envelopes de SRO, retornavam ao serviço após 3 a 4 horas apresentando desidratação grave. Assim, deve-se iniciar a administração da solução de SRO na própria unidade de saúde, por um período mínimo de 4 horas antes da liberação. Esses casos devem ser avaliados cuidadosamente, tanto na história clínica quanto no exame físico. Aspectos epidemiológicos Até 1991, o Brasil era uma área indene para cólera. A epidemia que atingiu o país, a partir daquele ano, faz parte da progressão da sétima pandemia iniciada em 1961, com um foco epidêmico em Sulawesi, ex-Célebes (Indonésia), que se espalhou por países da Ásia, Oriente Médio, África e regiões da Europa, com eventuais achados nos Estados Unidos, desde a década de 1970. O biotipo El Tor, isolado por Gotschlich, em 1906, advindo de peregrinos provenientes de Meca, examinados na estação de quarentena de El Tor, no Egito, é o responsável pela atual pandemia de cólera. Essa pandemia atingiu o continente sul-americano pelo litoral do Peru, em janeiro de 1991, estendendo-se, em seguida, por todo aquele país e para o Brasil, atingindo finalmente 14 países da América do Sul. Esta doença, apesar de todo o conhecimento acumulado, continua impondo desafios não apenas em função das características de seu agente mas, principalmente, pela vulnerabilidade de grande parcela da população mundial, sobrevivendo em condições de pobreza extrema. A introdução da cólera em nosso país aconteceu pela selva amazônica, no Alto Solimões. A partir daí, alastrou-se progressivamente pela região Norte, seguindo o curso do rio Solimões/Amazonas e seus afluentes, principal via de deslocamento de pessoas na região. Posteriormente, atingiu as regiões Nordeste e Sudeste, através dos principais eixos rodoviá- 192 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Cólera rios. Sua chegada em áreas indenes e com precárias condições de vida teve quase sempre características explosivas. Desde então, passou-se a observar uma alternância de períodos de silêncio epidemiológico e recrudescimento da epidemia. Atualmente, o comportamento da cólera sugere um padrão endêmico, definido pela ocorrência regular de casos e flutuações cíclicas de maior ou menor gravidade, na dependência de condições locais que favoreçam a circulação do Vibrio cholerae. O registro de casos é maior nos períodos mais secos do ano, quando a baixa do volume de água nos reservatórios e mananciais proporciona a concentração de vibriões. Em algumas áreas, as condições socioeconômicas e ambientais favorecem a instalação e rápida disseminação do Vibrio cholerae. Assim, a deficiência do abastecimento de água tratada, destino inadequado dos dejetos, alta densidade populacional e carências de habitação, higiene, alimentação e educação favorecem a ocorrência da doença. Nas áreas epidêmicas, o grupo etário mais atingido é o de maiores de 15 anos. Nas áreas endêmicas, a faixa mais jovem. A incidência predomina no sexo masculino, por maior exposição à contaminação ambiental. Os indicadores de morbidade, mortalidade e letalidade são diferenciados de acordo com as condições socioeconômicas, densidade populacional, meios de transporte, acesso aos serviços de saúde e outras situações de risco. Desde a sua introdução no país, em 1991, os coeficientes de incidência de cólera aumentaram progressivamente até 1993, ano em que apresentou o maior valor (39,8 casos/100 mil habitantes), com 670 óbitos e letalidade de 1,11%. A partir de então, observouse sensível redução do risco, principalmente após 1995, sugerindo a tendência de endemização da doença. No período de 1991 a 2001 atingiu todas as regiões do país, produzindo um total de 168.598 casos e 2.035 óbitos, com registro de grandes epidemias na região Nordeste. Apesar da intensidade com que a doença atingiu principalmente a região Nordeste, entre os anos de 1992 a 1994, os esforços do sistema de saúde conseguiram reduzir drasticamente esses valores a partir de 1995, com o registro, em 2001, de somente sete casos confirmados (quatro no Ceará e um em Pernambuco, Alagoas e Sergipe). Em 2002 e 2003 não foram detectados casos confirmados. Em 2004 a cólera recrudesceu no país, com a confirmação de 21 casos no agreste de Pernambuco, em abril (Figura 1). A taxa de letalidade, em casos graves de cólera sem tratamento adequado, pode atingir 50%; porém, quando este é instituído correta e precocemente, pode cair para menos de 2%. No período de 1991 a 2004 a letalidade oscilou em torno de 1,3%, apresentando maiores percentuais desde então. Este aumento observado, no entanto, não parece estar ligado a uma deterioração do atendimento ao paciente, mas a uma subnotificação importante de casos (Figura 1). Nesta fase atual, em que a cólera encontra-se sob controle no país, é importante intensificar estudos que permitam a precoce detecção da presença do Vibrio cholerae O1 toxigênico, bem como avaliar as características genéticas das cepas eventualmente encontradas. Para alcançar tal objetivo faz-se importante realizar o mapeamento e pesquisa de ambientes reconhecidamente favoráveis à sobrevivência do agente, além do aprofundamento de estudos acerca do comportamento do agente frente a alterações ambientais. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 6 C 193 Cólera O envolvimento das equipes técnicas de vigilância epidemiológica e ambiental dos três níveis de governo é vital para o desenvolvimento das atividades de prevenção e controle, com a realização da investigação de casos suspeitos, envolvendo a coleta de amostras clínicas e da água e do meio ambiente, principalmente nos mananciais que abastecem os sistemas de captação da água para consumo humano. A monitorização das doenças diarréicas agudas (MDDA) representa a mais importante estratégia para a detecção precoce de casos de cólera. A manutenção do sistema de vigilância epidemiológica integrado e o fortalecimento do sistema de vigilância de controle da qualidade da água para consumo humano são as principais ações para garantir que a doença se mantenha sob controle no país. Vigilância epidemiológica Objetivos • Reduzir a incidência e a letalidade. • Impedir ou dificultar a propagação da doença. • Controlar surtos. Definição de caso Suspeito Em áreas sem evidência de circulação do V. cholerae patogênico (sorogrupos O1 e O139): • qualquer indivíduo, independente de faixa etária, proveniente de áreas com ocorrência de casos de cólera, que apresente diarréia aquosa aguda até o décimo dia de sua chegada (tempo correspondente a duas vezes o período máximo de incubação da doença); • comunicantes domiciliares de caso suspeito, definido de acordo com o item anterior, que apresentem diarréia; • qualquer indivíduo com diarréia, independente de faixa etária, que coabite com pessoas que retornaram de áreas endêmicas ou epidêmicas há menos de 30 dias (tempo correspondente ao período de transmissibilidade do portador somado ao dobro do período de incubação da doença); • todo indivíduo com mais de 10 anos de idade que apresente diarréia súbita, líquida e abundante. A presença de desidratação rápida, acidose e colapso circulatório reforça a suspeita. Em locais onde a sensibilidade e a capacidade operacional do sistema de vigilância epidemiológica permitam, esse limite deverá ser modificado para maiores de 5 anos (especificamente áreas de risco ainda sem casos). Em áreas com evidência de circulação do V. cholerae patogênico (V. cholerae O1) já isolado em pelo menos cinco amostras de casos autóctones ou de amostras ambientais: • qualquer indivíduo que apresente diarréia aguda, independente de faixa etária. 194 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Cólera Figura 1. Cólera. Número de casos confirmados de cólera e coeficiente de letalidade. Brasil, 1991-2004* % 70.000 3,00 60.000 2,50 Número de casos 50.000 2,00 40.000 1,50 30.000 1,00 20.000 6 0,50 10.000 0 1991 Casos Letalidade 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2.103 37.572 60.340 51.324 4.954 1.017 3.044 2.745 4.759 733 7 - - 21 2,73 - - - - 1,57 1992 1,23 1993 1,11 1994 1,06 1995 1,94 1996 2,52 1997 1,77 1998 1,42 1,95 0 C Fonte: Coveh/CGDT/Devep/SVS/MS *Dados preliminares Confirmado Critério laboratorial – indivíduo com diarréia, que apresente isolamento de Vibrio cholerae nas fezes ou vômitos. Critério clínico-epidemiológico Em áreas sem evidência de circulação do Vibrio cholerae: • qualquer indivíduo, com 5 ou mais anos de idade, proveniente de área com circulação de Vibrio cholerae, que apresente diarréia aquosa aguda até o décimo dia de sua chegada. Este caso será considerado caso importado para a região onde foi atendido, desde que tenha sido afastada laboratorialmente outra etiologia, e autóctone para a região da qual procedeu. Em áreas com circulação do Vibrio cholerae: • qualquer indivíduo, com 5 ou mais anos de idade, que apresente diarréia aguda, desde que não haja diagnóstico clínico e/ou laboratorial de outra etiologia; • menores de 5 anos de idade que apresentem diarréia aguda e história de contato com caso de cólera, num prazo de dez dias, desde que não haja diagnóstico clínico e/ou laboratorial de outra patologia. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 195 Cólera Observação paciente adulto, proveniente de área de circulação do Vibrio cholerae, com apenas um exame laboratorial negativo para esta bactéria e sem isolamento de outro agente etiológico, não descarta o caso por se dever considerar a intermitência na eliminação do Vibrio cholerae e a possibilidade de ter ocorrido coleta e/ou transporte inadequado da amostra. O critério clínico-epidemiológico é da maior importância para a vigilância epidemiológica, pois permite avaliar a magnitude do evento, monitorar e adotar medidas de controle da doença, conferindo maior agilidade ao processo diagnóstico, aumentando a sensibilidade do sistema de detecção de casos, diminuindo os custos operacionais do laboratório e liberando-o para o desempenho de outras atividades. Esse tipo de diagnóstico é feito por meioda avaliação de um caso suspeito, no qual são correlacionadas variáveis clínicas e epidemiológicas capazes de definir a confirmação do caso sem diagnóstico laboratorial. Nessa situação, um exame laboratorial com resultado negativo para cólera não descarta o caso, a menos que tenha sido identificado outro agente etiológico. Descartado – serão considerados descartados todos os casos que não se enquadrem nas definições de confirmados. Em áreas onde há evidência de circulação do Vibrio cholerae não se faz necessária a coleta de material para exame de laboratório de todos os casos suspeitos. Esses exames são feitos por amostragem (de acordo com a situação epidemiológica local). Nessa situação, cabe ao laboratório monitorar a circulação do Vibrio cholerae, avaliar a resistência aos antibióticos e detectar a introdução de novos sorotipos em casos autóctones ou importados. Importado – é o caso em que a infecção ocorreu em área diferente daquela onde foi diagnosticado, tratado ou teve sua evolução. Essa situação muda o fluxo da notificação, que deve ser feita para o local de procedência, acompanhada de ficha de investigação epidemiológica já iniciada, para ser completada no que se refere à(s) fonte(s) de infecção e outras informações epidemiológicas relevantes. Do ponto de vista da vigilância epidemiológica, o caso importado somente merece ser especificado como tal em áreas de risco silenciosa ou de baixa incidência, pela pouca probabilidade de se contrair a doença nesse local ou por se tratar de caso índice, o qual exige investigação especial para a implantação das medidas de controle. Portador – indivíduo que, sem os sinais e sintomas ou com forma subclínica, elimina o vibrião por determinado período. É de particular importância para a vigilância epidemiológica porque, muitas vezes, é o responsável pela introdução da epidemia em área indene e manutenção da endemia. 196 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Cólera Notificação A ocorrência de casos suspeitos de cólera requer imediata notificação e investigação por ser potencialmente grave e poder se manifestar sob a forma de surto, o que impõe a adoção de medidas imediatas de controle. Por se tratar de doença de notificação internacional, os primeiros casos de uma área devem ser prontamente comunicados por telefone, fax ou e-mail às autoridades sanitárias superiores. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente − a maioria dos casos (sem desidratação ou com desidratação leve a moderada) pode ser tratada no nível ambulatorial. Os casos graves deverão ser hospitalizados. Os pacientes com fatores de risco associados (diabetes, hipertensão arterial sistêmica, cardiopatias, crianças com desnutrição grave, dentre outros), idosos, gestantes, desacompanhados, residentes em locais distantes, e aqueles sem tolerância oral plena, devem permanecer em observação até a remissão do quadro. Se necessário, realizar a internação. Qualidade da assistência − o diagnóstico e o tratamento precoce dos casos de cólera são fatores fundamentais para a recuperação do paciente. Além disso, contribuem para a redução da contaminação do meio ambiente e identificação dos comunicantes. Assim, os profissionais da vigilância devem verificar se as equipes de assistência estão capacitadas para realizar estes procedimentos corretamente e se as unidades de saúde dispõem de insumos para todos os casos. O início da terapêutica independe dos resultados de exames laboratoriais. O paciente suspeito, ou com cólera confirmada, deverá obrigatoriamente iniciar seu tratamento no local onde receber o primeiro atendimento. Proteção individual − seguir as normas de precauções entéricas para casos hospitalizados ou ambulatoriais, com desinfecção concorrente de fezes, vômitos, vestuário, roupa de cama e desinfecção terminal. Orientar os pacientes quanto aos cuidados com fezes e vômitos no domicílio. Confirmação diagnóstica − a equipe de vigilância deve orientar ou coletar material para o diagnóstico laboratorial, de acordo com os procedimentos constantes no Anexo I. Proteção da população − em situações de surto, iniciar imediatamente a distribuição de sais de reidratação oral, hipoclorito de sódio a 2,5%, quando indicado para tratamento da água no nível domiciliar, bem como ações de educação em saúde para alerta à população. Investigação − é o passo seguinte à notificação do caso suspeito e deve ser feita o mais rápido possível. O tempo decorrido entre a notificação e a investigação deve ser medido para se avaliar a agilidade do sistema de vigilância epidemiológica. 6 C Roteiro da investigação epidemiológica A metodologia de investigação epidemiológica é clara, simples e fácil de ser assimilada por profissionais de saúde. Visa responder às perguntas básicas de uma investigação de campo de doença transmissível de veiculação hídrica: quem foi afetado; quando ocorreram os casos; onde se localizaram e de que maneira foram contaminados. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 197 Cólera A investigação de todos os casos suspeitos e confirmados só deve ser realizada em áreas silenciosas, ou por ocasião do início da epidemia. Com a progressão do processo epidêmico e o conseqüente aumento do número de casos, a investigação epidemiológica completa deve ser feita na medida em que os limites operacionais o permitam, sendo imprescindível, contudo, a coleta dos dados clínicos e epidemiológicos mínimos, para caracterização dos casos e monitoramento ambiental. Identificação do paciente − preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica do Sinan relativos a dados gerais, notificação individual e residência. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmar a suspeita diagnóstica • Caracterizar clinicamente o caso: evolução dos sintomas; características da diarréia e do vômito; grau de desidratação. Deve-se observar se teve início a reidratação oral com líquidos habitualmente disponíveis no domicílio do paciente, com soro caseiro ou sais de reidratação oral industrializado. • Se indicada a investigação laboratorial, coletar e encaminhar a amostra de fezes ao laboratório, caso este procedimento ainda não tenha sido efetuado por profissionais da unidade de saúde (verificar se as amostras estão sendo adequadamente coletadas). Para identificação da área de transmissão • Verificar a história dos pacientes, com ênfase nos deslocamentos efetuados para áreas atingidas pela cólera, locais de alimentação e condições de saneamento no trabalho e ambiente domiciliar. • Reconstituir as atividades dos pacientes nos 10 dias que precederam o início dos sintomas: história de deslocamentos no município (urbano/rural), estado e país, e tempo de permanência. Verificar se a área de estadia dos casos é de ocorrência de cólera. • História de contato com caso compatível com cólera. • Realizar levantamento das fontes de abastecimento de água e qual o tratamento dispensado. • Verificar a situação da disposição dos dejetos e lixo. Para determinação da extensão da área de transmissão • Realizar levantamento de diarréia, no local de ocorrência de casos suspeitos de cólera, visando verificar se há aumento da incidência, principalmente nos maiores de cinco anos. • Busca ativa nas áreas de provável procedência ❯ em áreas atingidas: no domicílio (contatos), na comunidade (quarteirão, bairro, rua ou toda a comunidade, dependendo do tamanho da área de ocorrência, distribuição dos casos e capacidade operacional), nos serviços de saúde, farmácias e curandeiras, por meio de entrevistas com lideranças locais; ❯ em áreas silenciosas: a inexistência de casos em determinada área nem sempre 198 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Cólera significa que a doença não esteja ocorrendo. A falta de conhecimento sobre a doença, a ocorrência de oligossintomáticos e o difícil acesso da população aos serviços de saúde contribuem para a existência de áreas silenciosas; ❯ em áreas de risco deve ser feita a busca ativa de casos, visando detectar precocemente a ocorrência de surtos e desencadear as medidas de controle apropriadas. • Coleta de amostras ambientais ❯ colocar mechas para coleta de amostras ambientais, principalmente nas coleções de água onde deságuam esgotos (ver procedimento no Anexo 2). Determinação das fontes de infecção • Procedência da água de consumo e cuidados com o tratamento. • Procedência de alimentos que são ingeridos crus (frutas, legumes e verduras). • Procedência e situação de higiene do acondicionamento e distribuição de pescados. • Investigar indivíduos que manipulam alimentos, principalmente quando o surto for resultante de provável fonte alimentar comum (restaurantes ou refeitórios). • Investigar prováveis portadores sadios. 6 Essas informações, dentre outras, orientarão a coleta de amostras para diagnóstico laboratorial da fonte de contaminação. C Coleta e remessa de material para exames − coletar material clínico, de alimentos e do ambiente, o mais precocemente possível, considerando os resultados das investigações realizadas e as orientações técnicas do laboratório (ver Anexo 2). Análise de dados − os dados da investigação deverão ser analisados passo a passo, de modo a subsidiar o processo de decisão sobre as medidas de controle a serem adotadas. Assim, logo que se obtenha indícios de qual seja a fonte de infecção e a abrangência da população sob risco deve-se iniciar imediatamente as medidas capazes de impedir a ocorrência de novos casos, principalmente nas situações de surtos, casos esporádicos em área de circulação estabelecida e casos importados (visando a reduzir o risco de circulação do agente). Ao final da investigação, os dados devem permitir o acompanhamento da incidência e as análises de tendência da doença. De acordo com a magnitude de cada evento ou situação endêmica da área, a análise deverá contemplar: distribuição semanal dos casos e óbitos, por sexo, faixa etária e procedência; coeficientes de incidência e mortalidade; taxas de letalidade; distribuição dos casos segundo a evolução, critério de confirmação e tipo de atendimento, etc. É importante observar que, dentre outras informações, a análise e interpretação dos dados requer o conhecimento de dados populacionais, geográficos, demográficos, situação de saneamento básico, cobertura dos serviços, qualidade da atenção aos pacientes, condições socioeconômicas e culturais da população. Para facilitar a interpretação e análise, os dados devem ser consolidados em tabelas e gráficos, utilizando-se variáveis de pessoa, tempo e lugar. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 199 Cólera Nas áreas epidêmicas, o grupo etário mais atingido é o de maiores de 15 anos, com predomínio no sexo masculino, devido à maior mobilidade e, conseqüentemente, maior exposição dos homens adultos às fontes de infecção. Nas áreas endêmicas, observa-se maior incidência nas faixas etárias mais jovens, em função da imunidade que vai sendo adquirida à medida que o vibrião circula. A distribuição dos casos de acordo com a ocupação poderá indicar os grupos profissionais expostos a maior risco. A distribuição dos casos por dia, semana epidemiológica, mês ou ano permitirá a análise da evolução temporal da doença. Algumas variações sazonais têm sido observadas em determinadas regiões, como o recrudescimento da epidemia em períodos de seca e/ou no início das chuvas, o que pode permitir, inclusive, uma previsão de novos surtos nessas áreas. Em algumas áreas, o conjunto de condições socioeconômicas e culturais pode favorecer a instalação e rápida disseminação do V. cholerae. A análise da distribuição dos casos, de acordo com as áreas de ocorrência, proporcionará o conhecimento do comportamento da cólera em todos os níveis e subsidiará o planejamento, contribuindo para o direcionamento espacial das medidas de controle. Encerramento de casos − as fichas epidemiológicas de cada caso devem ser analisadas para definir o critério utilizado para o diagnóstico, considerando as seguintes alternativas: • Confirmado por critério clínico-laboratorial – isolamento do Vibrio cholerae O1 ou O139 em amostra clínica do paciente; • Confirmado por critério clínico-epidemiológico – paciente com quadro clínico de cólera, exame laboratorial negativo ou não realizado, mas que estabeleceu vínculo epidemiológico; • Óbitos – óbitos não acompanhados também podem ser confirmados pelo critério clínico-epidemiológico, desde que existam fortes evidências epidemiológicas aliadas ao quadro clínico que resultou em morte; • Caso descartado – todos os casos que não preencham os requisitos apresentados nos itens anteriores. Relatório final − deverá conter a descrição das etapas da investigação, principais resultados, medidas de controle adotadas e conclusões e recomendações a curto e médio prazos para a prevenção de novos casos e futuros eventos. Instrumentos disponíveis para controle Em regiões onde a infra-estrutura de saneamento é adequada e existe um sistema ativo de vigilância epidemiológica das diarréias, capaz de detectar precocemente os primeiros casos, a disseminação da cólera é facilmente controlada e, em geral, a circulação não se estabelece. Entretanto, quando o Vibrio cholerae é introduzido em áreas com precárias condições sanitárias, o risco de circulação é bastante elevado, principalmente quando não existe um bom sistema de abastecimento de água potável para as comunidades. Assim, o principal instrumento para o controle da cólera é prover as populações sob risco de adequada infra-estrutura de saneamento (água, esgotamento sanitário e coleta e 200 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Fluxograma de investigação de casos suspeitos de cólera Verificar se é da mesma área de procedência de casos anteriores Com casos registrados Discutir informações com equipe técnica (saneamento, vigilância ambiental, educação em saúde, laboratório) Urbana ou rural Para identificação da área de transmissão (visita domiciliar e à comunidade) • Caracterização clínica do caso História de contato com caso confirmado Em trânsito História do deslocamento • Hidratação Caso suspeito • Coleta de material para exame e envio ao laboratório • Notificação imediata à vigilância epidemiológica • Verificar se já é área com circulação do Vibrio cholerae Dentro da própria área de ocorrência rural ou urbana Condições de saneamento no domicílio Desencadeia investigação Verificar o trajeto durante os últimos 10 dias que antecederam os sintomas Investigar a fonte provável de infecção caso ainda não seja conhecida De área urbana do mesmo município para área rural e vice-versa De um município/estado Em trânsito – vide origem do caso Condições de saneamento no trabalho Para determinação da extensão da transmissão Sintomático Proceder como novo caso suspeito Assintomático Educação em saúde Investigação de contatos Vigilância de novos casos de diarréia nos próximos 30 dias, por meio da monitorização das doenças diarréicas (MDDA) Identificação da fonte de contaminação Vigilância ambiental Água Coleta de água para exame bacteriológico Identificação da fonte de contaminação Efluentes Coleta de material para exame bacteriológico Identificação da fonte de contaminação Alimentos Coleta de água para exame bacteriológico Adoção de medidas pertinentes Saneamento Educação em saúde Vigilância sanitária 201 Cólera Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Para determinação da provável fonte de infecção 6 C Cólera disposição de lixo), o que exige investimentos sociais do poder público. Todavia, na vigência de casos isolados ou surtos, alternativas emergenciais para a prevenção desta doença podem e devem ser adotadas pelo setor saúde, por meio de sua rede de assistência à saúde, vigilâncias epidemiológica, sanitária e ambiental. Por exemplo, ações restritas de tratamento de água e destino dos dejetos. Atividades de educação em saúde devem ser prontamente implementadas para reduzir o risco de transmissão e letalidade. Algumas destas alternativas são listadas a seguir. Vigilância sanitária Oferta de água de boa qualidade e em quantidade suficiente: • tratamento domiciliar com hipoclorito de sódio; Hipoclorito de sódio a 2,5% Volume de água 1.000 litros Dosagem 100ml Medida prática Tempo de contato 2 copinhos de café (descartáveis) 200 litros 15ml 1 colher de sopa 20 litros 2ml 1 colher de chá 1 litro 0,045ml 2 gotas 30 minutos Fonte: Manual Integrado de Prevenção e Controle da Cólera/CNPC/Funasa/MS • em caso de água turva antes da cloração, recomenda-se que a mesma seja mantida em repouso, para decantação das partículas em suspensão, as quais irão depositar-se no fundo do recipiente. Após este processo, deve-se separar a parte superior, mais clara, em outro recipiente. Em seguida, filtrá-la; • outros produtos à base de cloro, autorizados para o tratamento da água e registrados no Ministério da Saúde, poderão ser utilizados desde que se observe atentamente as orientações contidas no rótulo; • a ebulição (fervura) da água, durante 1 ou 2 minutos, constitui um método de desinfecção eficaz mas pouco acessível, na prática, às condições da maior parte da população. É um procedimento oneroso, a ser recomendado em situações de urgência e na falta de outro método de desinfecção; • o acondicionamento da água já tratada deve ser feito em recipientes higienizados, preferencialmente de boca estreita, para evitar posterior contaminação pela introdução de utensílios (canecos, conchas, etc.) para a retirada da água; ❯ articulação com empresas de abastecimento, visando buscar soluções para aumentar a oferta, para as comunidades com intermitência de fluxo; ❯ articulação com órgãos governamentais para a resolução do problema a médio prazo; • tratamento dos dejetos e disposição adequada do lixo (estudar alternativas para reduzir a contaminação ambiental, consultando técnicos da área de engenharia sanitária); 202 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Cólera • promover a vigilância de indivíduos sintomáticos, mediante orientações para isolamento entérico em domicílio; • promover a vigilância de meios de transporte e terminais portuários, aeroportuários, rodoviários e ferroviários; • promover medidas que visem à redução do risco de contaminação de alimentos, em especial no comércio ambulante; • definir procedimentos com vistas a garantir a qualidade dos processos de limpeza e desinfecção, em especial para serviços de saúde e área de preparo de alimentos; • promover atividades de educação em saúde para garantir o acesso da população aos conhecimentos e informações necessárias à prevenção e controle da doença. As medidas sanitárias a serem adotadas deverão considerar as condições ambientais (fatores bióticos e abióticos) que possam favorecer a sobrevivência do V. cholerae nas áreas em questão. 6 Vigilância epidemiológica e ambiental É de fundamental importância que as equipes de vigilância epidemiológica locais implantem ou implementem a MDDA em sua área de abrangência, acompanhando seu comportamento no tempo e sua distribuição por faixa etária. Uma elevação do número de casos de diarréia, em determinado local e período e na faixa etária de maiores de 15 anos, é sugestiva de surto de cólera. A participação do laboratório é necessária para a confirmação dos primeiros casos. A monitorização ambiental de pontos estratégicos é outra medida que deve ser imediatamente adotada, com vistas à detecção precoce da circulação do V. cholerae. Consiste na coleta periódica do material de meio ambiente para a realização do diagnóstico laboratorial, atividade que deverá ser coordenada pela vigilância ambiental. C Área de circulação do Vibrio cholerae Aquela onde já foi isolado o Vibrio cholerae O1 em, pelo menos, cinco amostras (clínicas, autóctones e/ou ambientais). Algumas áreas têm um risco potencial que deve ser considerado com especial atenção. Entre elas, encontram-se localidades situadas ao longo de eixos rodoviários ou ferroviários, áreas periportuárias, locais com populações assentadas abaixo do ponto de despejos de esgotamentos sanitários ou as margens de coleções hídricas que recebam esgotos. Área de risco para cólera Local ou região onde o conjunto de condições socioeconômicas e ambientais favorece a instalação e rápida disseminação do Vibrio cholerae. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 203 Cólera É necessário delimitar o micro ou macroambiente e os locais de suposta circulação de V. cholerae para definir o caráter e abrangência das ações preventivas/assistenciais de saúde pública. A delimitação dessas áreas deve ser definida em nível local, não precisando, necessariamente, obedecer aos limites impostos por fronteiras político-administrativas. A área de risco pode ser uma única residência, rua ou bairro, etc. Fatores ambientais, populacionais e de serviços que devem ser considerados para a definição e delimitação de áreas de risco: • ausência, deficiência ou intermitência do abastecimento de água; • destino e tratamento inadequado dos dejetos; • ausência ou deficiência de coleta, transporte, destino ou tratamento do lixo; • solos baixos e alagadiços que permitem a contaminação da água por materiais fecais (principalmente em áreas sujeitas a ciclos de cheias e secas); • densidade populacional elevada e baixa renda per capita; • populações confinadas (presídios, asilos, orfanatos, hospitais psiquiátricos, quartéis, etc.); • hábitos higiênicos pessoais inadequados, que propiciam a contaminação fecal/oral; • pólos receptores de movimentos migratórios; • eventos com grandes aglomerações populacionais (festas populares, feiras, romarias, etc.); • déficit na oferta de serviços de atenção à saúde; • difícil acesso à informação/analfabetismo; • áreas periportuárias, ribeirinhas e ao longo de eixos rodoferroviários. A delimitação da área de risco é feita após a associação dos dados referentes ao isolamento do agente etiológico e os fatores acima mencionados. Sua identificação e delimitação é importante para priorizar o desenvolvimento das ações de controle e deve ser redefinida à medida que novos fatores e áreas de circulação sejam identificados. Deve-se atentar para o fato de que o uso da vigilância epidemiológica, de forma correta e coordenada no nível local, proporciona as informações necessárias para a otimização dos recursos disponíveis para a prevenção e controle da doença. Ações de educação em saúde Existem várias estratégias de trabalho que buscam estimular o indivíduo, os grupos ou a comunidade a assumir consciente, criativa e criticamente a responsabilidade sobre suas condições de saúde. O maior enfoque deverá ser dado à ação participativa, cujos componentes básicos devem ser trabalhados com bastante flexibilidade, haja vista que no desenvolvimento do processo os mesmos podem ocorrer isolados, articulados ou concomitantes, considerando-se a dinâmica da realidade social. Após o levantamento da situação de cólera, os dados devem ser cuidadosamente analisados e discutidos. Este é o momento da troca de informações (saber técnico versus saber popular) entre a equipe de saúde e a comunidade, quando se espera atingir uma percepção real da situação. 204 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Cólera É vital realizar o registro detalhado e o processamento de todos os dados e informações obtidos, para a obtenção de uma análise criteriosa da percepção do grupo sobre as situações que tais informações definem, visando à validação ou não das conclusões resultantes. As vivências da situação, observação e visitas realizadas na localidade, bem como a análise sobre os tipos de serviços oferecidos, suas fontes de recursos e mecanismos de participação da comunidade, além da utilização de dados epidemiológicos e de bibliografias sobre cólera, são instrumentos utilizados para trabalhar as informações e ampliar o conhecimento do grupo sobre a situação político-social da cólera no nível local. São de vital importância a participação da comunidade, como produtora e administradora das ações realizadas, e a parceria e apoio da equipe de saúde. O assumir responsabilidades deve ser um aprendizado contínuo, partindo do exercício da participação através dos seus grupos organizados e/ou a organizar, a exemplo de grupos de trabalho, comitês, comissões, escolas, igrejas, dentre outros. 6 Medidas inócuas no controle e prevenção da cólera Geralmente, quando ocorre um surto de cólera, por pânico da população ou, mais freqüentemente, por autoridades e profissionais desinformados, há pressões para a implementação de algumas medidas que jamais devem ser adotadas, pois sabidamente não resultam em benefícios individuais ou coletivos, dentre as quais destacam-se: Imunização − desde 1973, a Organização Mundial da Saúde aboliu do Regulamento Sanitário Internacional a necessidade de apresentação do Certificado de Vacinação para Cólera por parte dos viajantes internacionais. Essa medida levou em conta que: • as vacinas disponíveis apresentam baixa eficácia e curta duração da imunidade; • muitas vacinas não têm a potência testada e/ou requerida; • geralmente, as vacinas somente induzem imunidade após decorridos 7 a 14 dias de sua aplicação; • a vacinação não altera a severidade da doença e não reduz a taxa de infecções assintomáticas; • a vacinação não previne a introdução da cólera nem sua propagação em um determinado país; • a vacinação dá uma falsa impressão de segurança às pessoas vacinadas e o sentimento de realização e satisfação às autoridades de saúde que, conseqüentemente, negligenciam as precauções mais efetivas. C Quimioprofilaxia − são totalmente inócuas as tentativas de combate à cólera pela quimioprofilaxia de massa e de contatos domiciliares, pois mostrou-se ineficaz para conter a propagação da epidemia, por várias razões, entre as quais se destacam: • impossibilidade de tratar, sob supervisão e simultaneamente, todos os contatos ou toda a população de uma mesma área e, em seguida, mantê-la isolada para evitar a infecção; • curta duração do efeito do antibiótico; Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 205 Cólera • o fato de o meio ambiente permanecer contaminado por tempo superior ao período de proteção conferida pelo antibiótico; • a dificuldade de persuadir as pessoas assintomáticas para que tomem os antibióticos. Além disso, a administração de antibióticos pode determinar: • alteração da flora intestinal de indivíduos sadios, aumentando sua susceptibilidade à infecção pelo V. cholerae; • surgimento de cepas resistentes de V. cholerae e de outras bactérias. É importante ressaltar que a quimioprofilaxia desvia a atenção e os recursos, que deveriam estar voltados para medidas de vigilância e controle realmente eficazes. Em vários países, paradoxalmente, tem contribuído para o surgimento de cepas resistentes aos antibióticos, privando, assim, os doentes graves de um tratamento adequado. Restrições à circulação de pessoas e mercadorias (cordão ou barreira sanitária) − essas medidas não impedem a propagação da cólera de um país para outro ou de uma região para outra de um mesmo país. É impossível identificar e isolar todos os viajantes infectados, pois a grande maioria não apresentará sintomas. Por outro lado, a execução de um “cordão sanitário” implica na instalação de múltiplos postos de controle e de restrição à circulação (barreiras). Essas atividades absorvem recursos humanos e materiais importantes, que melhor seriam utilizados se direcionados às medidas eficazes. Essas medidas restritivas geram grave impacto à economia do país ou região afetada, encorajando a dissimulação da verdade acerca dos surtos de cólera. A colaboração entre as autoridades locais, nacionais e internacionais, engajadas conjuntamente no esforço de combater a epidemia, fica, dessa forma, fortemente comprometida. A realização de eventos que congregam grande número de pessoas, como festas populares, religiosas, feiras, etc., dificilmente pode ser desencorajada devido aos fortes componentes sociais, culturais e econômicos envolvidos. As ações de prevenção realmente eficazes, nesses casos, são aquelas que visam garantir o destino adequado dos dejetos humanos e do lixo, o abastecimento de água potável em quantidade suficiente e o uso de medidas de higiene no preparo e conservação de alimentos. Deve ser assegurado o acesso dessa população aos serviços de saúde, os quais podem ser reforçados com equipes móveis, treinadas no manejo de casos de diarréia e cólera, bem como de outras doenças freqüentes nesses eventos e daquelas prevalentes na região. Equipes adicionais de educação em saúde, vigilância epidemiológica, vigilância ambiental, vigilância sanitária e outras também devem ser deslocadas para trabalhar nesses locais. 206 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Cólera Anexo 1 Coleta de amostras de material clínico Instrumento Método Transporte e viabilidade da amostra Processar as amostras acondicionadas em meio de Cary-Blair, de 24 a 72 horas após a coleta, se mantidas em temperatura ambiente (no caso de temperatura ambiente acima de 30 graus, colocar Inocular no meio de transporte Caryo meio de Cary-Blair em recipiente com água em Blair ou em 10-20ml de água peptonada temperatura natural) ou em até 7 dias se alcalina (pH entre 8,4 – 8,6) mantidas sob refrigeração (entre 4º a 8ºC) Introduzir o swab na ampola retal comprimindo-o, em movimentos rotatórios suaves, em toda a extensão da ampola Swab retal Processar as amostras acondicionadas em tubos de água peptonada alcalina até 12 horas após a coleta 6 O meio de transporte Cary-Blair conserva, por até quatro semanas, numerosos tipos de bactérias, inclusive vibriões. No entanto, como o swab, retal Introduzir o swab no meio de transporte ou fecal, contém outros microrganismos da flora normal, recomenda-se processá-lo de 24 a 72 Cary- Blair ou água peptonada alcalina horas após a coleta (a 30ºC) ou em até sete dias se mantido sob refrigeração (4º a 8ºC) Recolher parte das fezes com o auxílio de um swab Swab fecal C As amostras coletadas por swab devem ser semeadas de imediato se não forem acondicionadas no meio de transporte apropriado Fezes in natura Recolher entre 3 a 5 gramas de fezes, diarréicas ou não, em recipiente de boca larga, limpo e/ou esterilizado (não utilizar substâncias químicas) A semeadura deve ser realizada imediatamente após a coleta Evitar recolher amostras fecais contidas nas roupas, superfície de cama ou chão Utilizar tiras de papel de filtro, tipo xarope ou mata-borrão (2,5cm de largura por 6,5cm de comprimento) Papel de filtro Espalhar as fezes diarréicas ou emulsionadas em água em 2/3 de uma das superfícies do papel, com o auxílio de um fragmento de madeira ou outro material disponível Colher a amostra, tampar e observar a umidade (a amostra só é válida enquanto o papel de filtro se mantiver úmido) Acondicionar as tiras de papel de filtro em invólucros plásticos, perfeitamente vedados Observações: • As amostras devem ser colhidas antes da administração de antibióticos ao paciente. • Qualquer amostra enviada ao laboratório deve ser previamente rotulada e acompanhada da ficha de encaminhamento de amostras para análise, devidamente preenchida. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 207 Cólera Anexo 2 Monitoração do meio ambiente Roteiro para coleta de material do ambiente Instrumento Método de coleta Resíduos líquidos: Manter a mecha submersa no local por 48 horas Mecha - Swab Moore Retirar, com cuidado, e introduzir em frasco com boca larga, estéril, com tampa, contendo 300ml de APA 3 vezes concentrada Procedimento Enviar rapidamente ao laboratório (idealmente, de 2 a 6 horas) Resiste, no máximo, até 24 horas sob refrigeração Observação: Os pontos de coleta são definidos pelo nível local, de acordo com a investigação dos possíveis pontos de contaminação. O número de amostras e a periodicidade dependem da capacidade operacional do laboratório. 208 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Coqueluche COQUELUCHE CID 10: A37 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Doença infecciosa aguda, transmissível, de distribuição universal. Compromete especificamente o aparelho respiratório (traquéia e brônquios) e se caracteriza por paroxismos de tosse seca. Ocorre sob as formas endêmica e epidêmica. Em lactentes, pode resultar em número elevado de complicações e até em morte. Agente etiológico 6 Bordetella pertussis. Bacilo gram-negativo, aeróbio, não-esporulado, imóvel e pequeno, provido de cápsula (formas patogênicas) e de fímbrias. Reservatório C O homem é o único reservatório natural. Não foi demonstrada a existência de portadores crônicos; entretanto, podem ocorrer casos oligossintomáticos, com pouca importância na disseminação da doença. Modo de transmissão A transmissão se dá, principalmente, pelo contato direto de pessoa doente com pessoa susceptível, através de gotículas de secreção da orofaringe, eliminadas por tosse, espirro ou ao falar. Pode ocorrer a transmissão por objetos recentemente contaminados com secreções do doente, porém é pouco freqüente, pela dificuldade do agente sobreviver fora do hospedeiro. Período de incubação Em média, de cinco a dez dias, podendo variar de uma a três semanas e, raramente, até 42 dias. Período de transmissibilidade Para efeito de controle, considera-se que o período de transmissão se estende de cinco dias após o contato com um doente (final do período de incubação) até três semanas após o início dos acessos de tosse típicos da doença (fase paroxística). Em lactentes menores de seis meses, o período de transmissibilidade pode prolongar-se por até 4-6 semanas após o início da tosse. A maior transmissibilidade da doença ocorre na fase catarral. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 209 Coqueluche Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade é geral. O indivíduo torna-se imune nas seguintes situações: • após adquirir a doença: imunidade duradoura, mas não permanente; • após receber vacinação básica (mínimo de três doses) com DTP ou DTPa: imunidade por alguns anos. Em média, de 5 a 10 anos após a última dose da vacina, a proteção pode ser pouca ou nenhuma. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas A coqueluche evolui em três fases sucessivas: Fase catarral – inicia com manifestações respiratórias e sintomas leves (febre pouco intensa ou ausente, mal-estar geral, coriza e tosse seca) e dura de 1 a 2 semanas. A freqüência e a intensidade dos acessos de tosse aumentam gradualmente até o surgimento das crises de tosse paroxística. Fase paroxística – geralmente afebril ou com febre baixa. Em alguns casos, ocorrem vários picos de febre no decorrer do dia. Apresenta como manifestação típica os paroxismos de tosse seca, que se caracterizam por crise de tosse súbita incontrolável, rápida e curta (cerca de 5 a 10 tossidas, em uma única expiração). Durante estes acessos, o paciente não consegue inspirar, apresenta protusão da língua, congestão facial e, eventualmente, cianose que pode ser seguida de apnéia e vômitos. A seguir, ocorre uma inspiração profunda através da glote estreitada, que pode dar origem ao som denominado de “guincho”. O número de episódios de tosse paroxística pode chegar a 30 em 24 horas, manifestando-se mais freqüentemente à noite. A freqüência e a intensidade dos episódios de tosse paroxística aumentam nas duas primeiras semanas; depois, diminuem paulatinamente. Nos intervalos dos paroxismos o paciente passa bem. Esta fase dura de 2 a 6 semanas. Fase de convalescença – os paroxismos de tosse desaparecem e dão lugar a episódios de tosse comum. Esta fase persiste por 2 a 6 semanas e em alguns casos pode se prolongar por até 3 meses. Infecções respiratórias de outra natureza, que se instalam durante a convalescença da coqueluche, podem provocar o reaparecimento transitório dos paroxismos. Em indivíduos não adequadamente vacinados ou vacinados há mais de 5 anos, a coqueluche nem sempre se apresenta sob a forma clássica acima descrita, podendo manifestar-se sob formas atípicas, com tosse persistente, porém sem paroxismos e o guincho característico. Os lactentes jovens (principalmente os menores de 6 meses) constituem o grupo de indivíduos particularmente propenso a apresentar formas graves, muitas vezes letais, de coqueluche. Nessas crianças, a doença manifesta-se através de paroxismos clássicos, algumas vezes associados a cianose, sudorese e vômitos. Também podem estar presentes episódios de apnéia, parada respiratória, convulsões e desidratação decorrente dos episódios repe- 210 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Coqueluche tidos de vômitos. Estes bebês exigem hospitalização, isolamento, vigilância permanente e cuidados especializados. Complicações • Respiratórias – pneumonia e otite média por Bordetella pertussis, pneumonias por outras etiologias, ativação de tuberculose latente, atelectasia, bronquiectasia, enfisema, pneumotórax, ruptura de diafragma. • Neurológicas – encefalopatia aguda, convulsões, coma, hemorragias intra-cerebrais, hemorragia subdural, estrabismo e surdez. • Outras – hemorragias subconjuntivais, epistaxe, edema de face, úlcera do frênulo lingual, hérnias (umbilicais, ingüinais e diafragmáticas), conjuntivite, desidratação e/ou desnutrição. Diagnóstico diferencial 6 Deve ser feito com as infecções respiratórias agudas, como traqueobronquites, bronquiolites, adenoviroses, laringites, etc. Outros agentes também podem causar a síndrome coqueluchóide, dificultando o diagnóstico diferencial, entre os quais Bordetella parapertussis, Mycoplasma pneumoniae, Chlamydia trachomatis, Chlamydia pneumoniae e Adenovírus (1, 2, 3 e 5). A Bordetella bronchiseptica e a Bordetella avium são patógenos de animais que raramente acometem o homem (exceto quanto imunodeprimidos). C Diagnóstico laboratorial Diagnóstico específico Realizado mediante o isolamento da Bordetella pertussis através de cultura de material colhido de nasorofaringe com técnica adequada (ver normas e procedimentos no Anexo 3). Exames complementares Para auxiliar na confirmação ou descarte dos casos suspeitos, pode-se realizar os seguintes exames: • leucograma – no período catarral, pode ocorrer uma linfocitose relativa e absoluta, geralmente acima de 10 mil linfócitos/mm3. Os leucócitos totais no final desta fase atingem um valor, em geral, superior a 20 mil leucócitos/mm3. No período paroxístico, o número de leucócitos pode elevar-se para 30 mil ou 40 mil/mm3, associado a uma linfocitose de 60% a 80%. Nos lactentes e nos pacientes com quadro clínico mais leve, a linfocitose pode estar ausente. • raios X de tórax – recomenda-se em menores de 4 anos, para auxiliar no diagnóstico diferencial e/ou presença de complicações. É característica a imagem de “coração borrado” ou “franjado”, porque as bordas da imagem cardíaca não são nítidas, devido aos infiltrados pulmonares. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 211 Coqueluche Tratamento A eritromicina (de preferência o estolato) é o antimicrobiano de escolha para o tratamento da coqueluche, visto ser mais eficiente e menos tóxico. Este antibiótico é capaz de erradicar o agente do organismo em um ou dois dias quando seu uso for iniciado durante o período catarral ou início do período paroxístico, promovendo, assim, a diminuição do período de transmissibilidade da doença. No entanto, tem-se isolado Bordetella pertussis de pacientes até 7 dias após o início do uso da eritromicina. Dose indicada – 40 a 50 mg/kg/dia (máxima de 2 gramas/dia), por via oral, dividida em 4 doses iguais, durante 14 dias. No caso de intolerância à eritromicina, pode-se usar sulfametoxazol+trimetoprim (SMZ+TMP), por via oral, de 12 em 12 horas, durante 10 dias, na seguinte dosagem: • crianças – 40mg (SMZ)/kg/dia e 8mg (TMP)/kg/dia. Com a ressalva de que a segurança e a eficácia de SMZ+TMP nos menores de 2 meses não está bem definida. • adultos e crianças com mais de 40 kg – 800mg (SMZ)/dia e 160mg (TMP)/dia de 12 em 12 horas. A imunoglobulina humana não tem valor terapêutico comprovado. Alguns cuidados gerais importantes Nos episódios de tosse paroxística, a criança deve ser colocada em lateral ou decúbito de drenagem para evitar a aspiração de vômitos e/ou de secreção respiratória. Se ocorrer cianose, deve-se aspirar delicadamente a secreção nasal e oral. Na presença de apnéia, aspirar delicadamente as secreções. Há indicação do uso de oxigênio. Estimular manualmente a respiração e, caso não obtenha resposta, utilizar ambu. Aspectos epidemiológicos Em populações aglomeradas, condição que facilita a transmissão, a incidência da coqueluche pode ser maior na primavera e no verão, porém em populações dispersas nem sempre se observa esta sazonalidade. Não existe uma distribuição geográfica preferencial nem característica individual que predisponha à doença, a não ser presença ou ausência de imunidade específica. A morbidade da coqueluche no país já foi elevada. No início da década de 80 eram notificados mais de 40 mil casos anuais e o coeficiente de incidência era superior a 30/100 mil habitantes. Este número caiu abruptamente a partir de 1983, mantendo, desde então, tendência decrescente. Em 1990, foram notificados 15.329 casos, resultando em um coeficiente de incidência de 10,64/100 mil habitantes, a maior taxa observada na década. Em 1995, registraram-se 3.798 casos (coeficiente de incidência de 2,44/100 mil habitantes) e, a partir de então, o número de casos anuais não excedeu 2 mil, mantendo-se com coeficiente de 212 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Coqueluche incidência em torno de 1/100 mil habitantes. Nos últimos três anos, o número de casos não chegou a 1.000/ano e o coeficiente de incidência manteve-se inferior a 0,05/1.000 habitantes (Gráfico 1). Desde a instituição do Programa Nacional de Imunizações, em 1973, quando a vacina tríplice bacteriana (DTP) passou a ser preconizada para crianças menores de 7 anos, observa-se um declínio na incidência da coqueluche, muito embora as coberturas vacinais iniciais não fossem elevadas. A partir dos anos noventa, a cobertura foi se elevando, principalmente a partir de 1998, resultando em importante modificação no perfil epidemiológico desta doença (Gráfico 1). Entretanto, nos últimos anos, surtos de coqueluche vêm sendo registrados, principalmente em populações indígenas. O grupo de menores de um ano concentra quase 50% do total de casos (Gráfico 2) e apresenta o maior coeficiente de incidência (Gráfico 3). Isto se deve, provavelmente, à gravidade do quadro clínico nesta faixa etária, o que, por sua vez, leva à maior procura dos serviços de saúde e maior número de casos diagnosticados. A letalidade da doença é também mais elevada no grupo de crianças menores de um ano, particularmente naquelas com menos de seis meses de idade, que concentram quase todos os óbitos por coqueluche. 6 50 100 45 90 40 80 35 70 30 60 25 50 20 40 15 30 10 20 5 10 0 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 C Cobertura (%) Casos /100 mil hab. Gráfico 1. Coeficiente de incidência da coqueluche¹ e cobertura vacinal pela DTP². Brasil, 1980-2003³ 0 Ano Coeficiente de incidência Cobertura vacinal Fonte: ¹Ministério da Saúde/SVS/Devep/CGDT/Cover; ²Ministério da Saúde/SVS/Devep/CGPNI; ³Dados sujeitos a revisão. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 213 Coqueluche Gráfico 2. Número de casos de coqueluche, por grupo de idade. Brasil, 1992-2003 7.000 6.000 Número de casos 5.000 4.000 3.000 2.000 1.000 0 91 92 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 Ano < 1 ano 1 - 4 anos 5 - 14 anos > 15 anos Fonte: Ministério da Saúde/SVS/Devep/CGDT/Cover. Dados sujeitos a revisão. Gráfico 3. Coeficiente de incidência da coqueluche, por grupo de idade. Brasil, 1982-2003 1.000 Casos /100 mil hab. 100 10 1 0,1 0,01 82 83 84 85 86 87 88 89 90 < 1 ano 91 92 93 94 1 - 4 anos 95 96 97 98 5 - 14 anos Fonte: Ministério da Saúde/SVS/Devep/CGDT/Cover. Dados sujeitos a revisão. 214 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 99 00 > 15 anos 01 02 03 Coqueluche Vigilância epidemiológica A coqueluche é uma doença de notificação compulsória em todo o território nacional e sua investigação laboratorial é obrigatória nos surtos e nos casos atendidos nas unidades sentinelas previamente determinadas, a fim de identificar a circulação da Bordetella pertussis (Anexos 1 e 2). Objetivos • Acompanhar a tendência temporal da doença, para detecção precoce de surtos e epidemias, visando adotar medidas de controle pertinentes. • Aumentar o percentual de isolamento em cultura, com envio de 100% das cepas isoladas para o laboratório de referência nacional, para estudos moleculares e de resistência bacteriana a antimicrobianos. 6 Definição de caso Suspeito • Todo indivíduo, independente da idade e estado vacinal, que apresente tosse seca há 14 dias ou mais, associada a um ou mais dos seguintes sintomas: ❯ tosse paroxística – tosse súbita incontrolável, com tossidas rápidas e curtas (5 a 10) em uma única expiração; ❯ guincho inspiratório; ❯ vômitos pós-tosse. • Todo indivíduo, independente da idade e estado vacinal, que apresente tosse seca há 14 dias ou mais e tenha história de contato com caso confirmado como coqueluche pelo critério clínico. C Confirmado • Critério laboratorial – todo caso suspeito de coqueluche com isolamento de Bordetella pertussis. • Critério epidemiológico – todo caso suspeito que teve contato com caso confirmado como coqueluche pelo critério laboratorial, entre o início do período catarral até três semanas após o início do período paroxístico da doença (período de transmissibilidade). • Critério clínico – todo caso suspeito de coqueluche cujo hemograma apresente leucocitose (acima de 20 mil leucócitos/mm3) e linfocitose absoluta (acima de 10 mil linfócitos/mm3), desde que sejam obedecidas as seguintes condições: resultado de cultura negativa ou não realizada; inexistência de vínculo epidemiológico (vide item acima); não confirmação de outra etiologia. Descartado Caso suspeito que não se enquadra em nenhuma das situações descritas anteriormente. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 215 Coqueluche Notificação Todo caso suspeito deve ser notificado através do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). Os casos atendidos nas unidades sentinelas previamente determinadas devem ser notificados imediatamente pelo meio mais rápido possível ao serviço de vigilância local, a fim de se proceder a coleta de material para a realização de cultura para a Bordetella pertussis. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente Hospitalização dos casos graves. Crianças com menos de um ano quase sempre evoluem para quadros graves. A grande maioria dos casos pode ser tratada ambulatorialmente. Qualidade da assistência Para crianças com menos de um ano pode se tornar necessária a indicação de assistência ventilatória (oxigenação e broncoaspiração), drenagem de decúbito, hidratação e/ou nutrição parenteral. Nesta situação, verificar se os casos estão sendo atendidos em unidade de saúde com capacidade para prestar atendimento adequado e oportuno. Proteção individual para evitar disseminação da bactéria Os doentes com coqueluche devem ser mantidos em isolamento respiratório durante cinco dias após o início do tratamento antimicrobiano apropriado. Nos casos não submetidos a antibioticoterapia, o tempo de isolamento deve ser de três semanas. Confirmação diagnóstica Coletar material para diagnóstico laboratorial de acordo com as orientações constantes do Anexo 3. Proteção da população Logo que se tenha conhecimento da suspeita de caso(s) de coqueluche deve-se desencadear um bloqueio vacinal seletivo nas áreas onde o paciente esteve no período de transmissibilidade, com vistas a aumentar a cobertura vacinal com a DTP. É importante lembrar que a vacina DTP é indicada para crianças de 2 meses a 6 anos completos. Deve-se realizar a quimioprofilaxia conforme indicado no tópico Controle dos comunicantes. Investigação O caso suspeito atendido nas unidades sentinelas previamente determinadas deve ser imediatamente investigado, a fim de se garantir a coleta oportuna de material para a realização de cultura de Bordetella pertussis. A ficha de investigação da coqueluche, no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), contém os elementos essenciais a serem coletados em uma investigação de rotina. Todos os campos desta ficha devem ser criteriosamente preenchidos, mesmo quan- 216 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Coqueluche do a informação for negativa. Outros itens e observações podem ser incluídos, conforme as necessidades e peculiaridades de cada situação. Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente Preencher todos os campos dos itens da ficha de investigação epidemiológica relativos aos dados gerais, notificação individual e dados de residência. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmar a suspeita diagnóstica • Anotar na ficha de investigação os dados dos antecedentes epidemiológicos e clínicos ❯ Observar com atenção se o caso notificado enquadra-se na definição de caso suspeito de coqueluche; ❯ Acompanhar a evolução do caso e o resultado da cultura de Bordetella pertussis. 6 Para identificação da área de transmissão • Verificar se no local de residência, creche ou na escola há indícios de outros casos suspeitos. Quando não se identificar casos nestes locais, interrogar sobre deslocamentos e permanência em outras áreas. C Estes procedimentos devem ser feitos mediante entrevista com o paciente, familiares ou responsáveis, bem como com lideranças da comunidade. Para determinação da extensão da área de transmissão • Busca ativa de casos ❯ Após a identificação do possível local de transmissão, iniciar imediatamente a busca ativa de outros casos, casa a casa, na creche, escola, local de trabalho e em unidades de saúde. Investigação de comunicantes Define-se como comunicante qualquer pessoa exposta a um caso de coqueluche, entre o início do período catarral até três semanas após o início do período paroxístico da doença (período de transmissibilidade). • A investigação de comunicantes deve ser feita na residência, creche, escola e outros locais que possibilitaram o contato íntimo com o caso. • Identificar os comunicantes com tosse. • Coletar material de nasofaringe dos comunicantes com tosse, a fim de realizar cultura de Bordetella pertussis (Anexo 3). • Verificar a situação vacinal dos comunicantes, considerando doses registradas na Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 217 Coqueluche caderneta de vacinação e, se necessário, atualizar o esquema vacinal dos menores de sete anos com a vacina DTP. • Preencher os campos referentes aos dados dos comunicantes na ficha de investigação da coqueluche. • Manter a área sob vigilância até 42 dias após a identificação do último caso (período máximo de incubação observado). Coleta e remessa de material para exames • Rotineiramente, deve-se coletar material de nasofaringe dos casos suspeitos atendidos nas unidades sentinelas previamente determinadas, a fim de identificar a circulação da Bordetella pertussis. Atenção Priorizar os casos em que a antibioticoterapia ainda não foi instituída ou que estão em uso de antimicrobiano há menos de 3 dias. • Em situações de surto de síndrome coqueluchóide, deve-se coletar material de nasofaringe para realização de cultura. Na impossibilidade de coletar material de todos os casos, o que sobrecarregaria a vigilância e o laboratório, selecionar uma amostra adequada de pacientes, considerando: ❯ tempo da doença – coletar espécime clínico de casos em fase aguda da doença, ou seja, com menos de quatro semanas de evolução; ❯ tempo de uso de antibiótico – priorizar os casos em que a antibioticoterapia ainda não foi instituída ou que estão em uso de antimicrobiano há menos de três dias; ❯ distribuição dos casos – coletar casos de pontos distintos, como, por exemplo, diferentes creches, aldeias, salas de aula, etc. • É de responsabilidade dos profissionais da vigilância epidemiológica e/ou dos laboratórios centrais ou de referência viabilizar, orientar ou mesmo proceder a coleta de material para exame, de acordo com a organização de cada local. • É fundamental que a coleta seja feita por pessoal devidamente treinado. Atenção Não se deve aguardar os resultados dos exames para a instituição do tratamento, desencadeamento das medidas de controle e outras atividades da investigação, embora sejam imprescindíveis para confirmar os casos e nortear o encerramento das investigações. Análise de dados A análise dos dados tem como objetivo proporcionar conhecimentos atualizados sobre características epidemiológicas no que diz respeito, principalmente, a distribuição da incidência por áreas geográficas e grupos etários, taxa de letalidade e eficiência dos programas de vacinação, bem como a detecção de possíveis falhas operacionais da atividade 218 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Coqueluche de controle da doença na área. Portanto, quando da ocorrência de surtos faz-se necessário sistematizar as informações em tabelas e gráficos, considerando critérios de confirmação do diagnóstico, proporção de casos em vacinados, padrões de distribuição da doença e cobertura vacinal. A consolidação dos dados, considerando-se as características de pessoa, tempo e lugar, permitirá uma caracterização detalhada da situação epidemiológica. Encerramento de casos As fichas de investigação de cada caso devem ser analisadas considerando-se as seguintes alternativas utilizadas para o diagnóstico: • critério laboratorial – o isolamento da Bordetella pertussis classifica o caso como confirmado; • critério epidemiológico – o vínculo epidemiológico do caso suspeito com outros casos confirmados de coqueluche pelo critério laboratorial classifica o diagnóstico como caso confirmado; • critério clínico – caso suspeito de coqueluche com resultado de hemograma com leucocitose (acima de 20 mil leucócitos/mm3) e linfocitose absoluta (acima de 10 mil linfócitos/mm3), com resultado de cultura negativa ou não realizada, mesmo sem a demonstração de vínculo epidemiológico com outro caso confirmado laboratorialmente, desde que não se confirme outra etiologia, classifica o diagnóstico como caso confirmado; • descartado – caso suspeito não confirmado por nenhum dos critérios descritos anteriormente. 6 C Relatório final As investigações de surtos devem ser sumarizadas em um relatório com as principais conclusões, dentre as quais destacam-se: • se o surto foi decorrente de falhas vacinais; • que ações de prevenção foram adotadas e quais as que devem ser mantidas a curto e médio prazos na área; • avaliação da magnitude do problema e da adequação das medidas adotadas, visando impedir a continuidade de transmissão da doença; • condições do programa de imunização na área, principalmente com referência à manutenção de elevadas e homogêneas coberturas vacinais, conservação e aplicação da vacina utilizada; • avaliação da situação da vigilância da doença na área; • medidas adotadas para superar os problemas do programa de imunização, quando pertinentes; • medidas adotadas em relação à vigilância: busca ativa de casos, definição de fluxo de vigilância para a área, definição de conduta para identificação e investigação de outros surtos e capacitação de pessoal para coleta e transporte de material. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 219 Coqueluche Quando a doença manifestar-se apenas sob a forma endêmica, a cada final de ano deve-se elaborar um relatório contendo informações sobre o desempenho operacional da vigilância epidemiológica (Anexo 4), tendência temporal, distribuição espacial da doença, cobertura vacinal em menores de um ano e homogeneidade. Instrumentos disponíveis para controle Imunização A medida de controle da coqueluche, de interesse prático em saúde pública, é a vacinação dos suscetíveis na rotina da rede básica de saúde. A vacina contra a coqueluche deve ser aplicada mesmo em crianças com histórico anterior da doença. A DTP (tríplice bacteriana) ou DTPa (tríplice acelular) é recomendada até a idade de seis anos (6 anos, 11 meses e 29 dias), sendo que a vacina combinada DTP+Hib é preconizada para os menores de um ano, pelo Ministério da Saúde. Considera-se pessoa adequadamente vacinada quem recebeu três doses de vacina DTP (contra difteria, tétano e coqueluche) ou DTP+Hib (contra difteria, tétano e coqueluche e infecções graves causadas pelo Haemophilus influenzae), a partir de dois meses de vida, com intervalo de, pelo menos, 30 dias entre as doses (o ideal é intervalo de dois meses) e com 1º reforço aplicado no prazo de 6 a 12 meses após a 3ª dose e o 2º reforço com 4-6 anos de idade. • Vacina DTP (contra difteria, tétano e coqueluche) ❯ A eficácia da vacina DTP varia de acordo com o componente, a saber: 80%-90% para difteria; 75%-80% para coqueluche e 100% para tétano. A imunidade conferida pela vacina não é permanente e decresce com o tempo. Em média, de 5 a 10 anos após a última dose da vacina a proteção pode ser pouca ou nenhuma. ❯ Deve ser aplicada por via intramuscular, a partir de dois meses de idade até 6 anos completos. É conservada entre +2ºC e +8ºC, conforme orientação do Programa Nacional de Imunizações (vide Manual de Procedimentos para Vacinação) ❯ Contra-indicações: crianças com quadro neurológico em atividade; reação anafilática após o recebimento de qualquer dose da vacina; história de hipersensibilidade aos componentes da vacina; encefalopatia nos primeiros sete dias após a aplicação de uma dose anterior desse produto ou outro com componente pertussis; convulsões até 72 horas após a administração da vacina; colapso circulatório, com choque ou episódio hipotônico-hiporresponsivo até 48 horas após a administração da vacina (vide Manual de Procedimentos para Vacinação). ❯ Eventos adversos: a maioria dos eventos pós-vacinação com DTP são de caráter benigno e ocorrem nas primeiras 48 horas após a aplicação da vacina. São co- 220 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Coqueluche muns reações locais (vermelhidão, calor, endurecimento e edema, acompanhados ou não de dor) e sistêmicas (febre, irritabilidade e sonolência, por exemplo). Menos freqüentemente, podem ocorrer reações como choro persistente e inconsolável, episódio hipotônico-hiporresponsivo e convulsão (vide Manual de Vigilância Epidemiológica dos Eventos Adversos Pós-Vacinação). • Vacina tetravalente – DTP+Hib (contra difteria, tétano, coqueluche e infecções graves causadas pelo Haemophilus influenzae) ❯ De acordo com o calendário nacional de vacinação (Portaria MS nº 597, de 8/4/04), é indicada a aplicação de três doses da vacina tetravalente nas crianças menores de um ano. Esta vacina deve ser conservada entre +2ºC e +8ºC, podendo ser utilizada por cinco dias após a reconstituição (vide Nota Técnica Introdução da Vacina Tetravalente, da Coordenação Geral do Programa Nacional de Imunizações); ❯ Deve ser aplicada por via intramuscular profunda, sendo que a via subcutânea deve ser utilizada em crianças com trombocitopenia ou distúrbios de sangramento (vide Nota Técnica Introdução da Vacina Tetravalente). ❯ Contra-indicações – reação anafilática grave ao mesmo produto ou qualquer de seus componentes; encefalopatia nos primeiros sete dias após a aplicação de uma dose anterior desse produto ou outro com componente pertussis; convulsões até 72 horas após a administração da vacina; colapso circulatório; com choque ou com episódio hipotônico-hiporresponsivo até 48 horas após a administração da vacina; quadro neurológico em atividade (vide Nota Técnica Introdução da Vacina Tetravalente). ❯ Eventos adversos – os sintomas locais mais freqüentes relatados nas primeiras 48 horas são dor, eritema, edema e/ou calor e enduração. Os sintomas sistêmicos relatados em igual período desaparecem espontaneamente, dentre os quais febre, perda de apetite, agitação, vômito, choro persistente, mal-estar geral e irritabilidade. Menos freqüentemente, pode ocorrer sonolência, choro prolongado e incontrolável, convulsões e síndrome hipotônica-hiporresponsiva. Relatos de reações alérgicas, incluindo as anafiláticas, são raros (vide Nota Técnica Introdução da Vacina Tetravalente). 6 C • Vacina DTPa (contra difteria, tétano e coqueluche acelular) ❯ Esta vacina está disponível somente nos Centros de Referência de Imunobiológicos Especiais (Crie) e é indicada para crianças de 2 meses a 6 anos completos (6 anos, 11 meses e 29 dias) que apresentaram os seguintes eventos adversos após o recebimento de qualquer uma das doses da vacina DTP: convulsão nas primeiras 72 horas ou episódio hipotônico-hiporresponsivo nas primeiras 48 horas (vide Manual de Procedimentos para Vacinação). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 221 Coqueluche ❯ ❯ ❯ Deve ser aplicada por via intramuscular, a partir de dois meses de idade até 6 anos completos. É conservada entre +2ºC e +8ºC, conforme orientação do Programa Nacional de Imunizações (vide Manual de Procedimentos para Vacinação). Contra-indicações – reação anafilática após o recebimento de qualquer dose da vacina acelular ou celular (DTP); história de hipersensibilidade aos componentes da vacina; ocorrência de encefalopatia nos primeiros sete dias após a administração da vacina acelular ou da celular (DTP) (vide Manual de Procedimentos para Vacinação). Eventos adversos – os eventos adversos locais e sistêmicos leves das vacinas acelulares são os mesmos das vacinas celulares, porém com menor freqüência e intensidade. Raramente, pode ocorrer febre > 40ºC; convulsões febris, choro com 3 horas ou mais de duração e episódios hipotônico-hiporresponsivos (vide Manual dos Centros de Referência de Imunobiológicos Especiais). • Recomendações para vacinação ❯ Rotina – o Ministério da Saúde preconiza a administração de três doses da vacina DTP+Hib, a partir de 2 meses de vida, com intervalo de 60 dias entre as doses. Doses subseqüentes da vacina DTP deverão ser aplicadas aos 15 meses (1º reforço) e aos 4-6 anos de idade (2º reforço). Esquema recomendado para as vacinas DTP+Hib e DTP Vacina DTP+Hib DTP Dose Idade Intervalo entre as doses 1ª dose 2 meses 8 semanas 2ª dose 4 meses 8 semanas 3ª dose 6 meses 8 semanas 1º reforço 15 meses 2º reforço 4-6 anos 6 a 12 meses após a 3ª dose Fonte: Ministério da Saúde. Portaria nº 597, de 8/4/04. ❯ Casos isolados e surtos – proceder a vacinação seletiva da população susceptível, visando aumentar a cobertura vacinal na área de ocorrência dos casos. Controle da fonte de infecção Medidas gerais para pacientes hospitalizados Isolamento – recomenda-se isolamento tipo respiratório por gotículas durante o período de transmissibilidade, a fim de reduzir o risco da transmissão para outras crianças expostas. Especial atenção deve ser dada aos lactentes, a fim de evitar o contágio. Quarto privativo – enquanto o paciente estiver transmitindo a bactéria. Pode haver compartilhamento com mais de um paciente com o mesmo diagnóstico. O quarto deve ser mantido com a porta fechada. 222 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Coqueluche Lavagem de mãos – deve ser feita antes e após o contato com o paciente, após a retirada das luvas, de máscara e quando houver contato com materiais utilizados pelo paciente. Uso de máscara – recomenda-se o uso de máscara comum para todos os que entram no quarto. Após o uso, deve ser descartada em recipiente apropriado e o indivíduo deve lavar as mãos. Transporte do paciente – deve ser limitado ao mínimo possível e, quando realizado, o paciente deverá usar máscara comum. Limpeza e desinfecção – recomenda-se desinfecção concorrente e terminal dos objetos contaminados com as secreções nasofaríngeas. A solução indicada é o hipoclorito de sódio a 1%. Após a desinfecção, os objetos devem ser enxaguados em água corrente. Objetos de metal podem ser desinfetados com álcool etílico a 70%. Medidas gerais para pacientes não hospitalizados Os pacientes não hospitalizados devem ser afastados de suas atividades habituais (creche, escola, trabalho): • por pelo menos cinco dias após o início de tratamento com antimicrobiano; • nos casos não submetidos à antibioticoterapia o tempo de afastamento deve ser de três semanas após o início dos paroxismos. 6 C Controle dos comunicantes Vacinação Os comunicantes íntimos, familiares e escolares, menores de sete anos não vacinados, inadequadamente vacinados ou com situação vacinal desconhecida deverão receber uma dose da vacina contra a coqueluche e orientação de como proceder para completar o esquema de vacinação. Importante Para os menores de um ano, indica-se a vacina DTP+Hib; para as crianças com idade entre 1 ano e 6 anos completos (6 anos, 11 meses e 29 dias), a vacina DTP. Quimioprofilaxia – indicações • Comunicantes íntimos menores de 1 ano, independente da situação vacinal e de apresentar quadro de tosse. • Comunicantes íntimos menores de 7 anos não vacinados, com situação vacinal desconhecida ou que tenham tomado menos de 4 doses da vacina DTP ou DTPa. • Comunicantes adultos que trabalham em profissões que envolvem o contato direto e freqüente com menores de 1 ano ou imunodeprimidos devem, após o início do uso do antimicrobiano, ser submetidos a quimioprofilaxia e afastados das atividades junto às crianças por 5 dias. • Comunicantes adultos que residam com menores de 1 ano. • Comunicantes íntimos que são pacientes imunodeprimidos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 223 Coqueluche Medicamentos indicados para a quimioprofilaxia • O medicamento de escolha é a eritromicina (de preferência o estolato), na dose de 40 a 50 mg/kg/dia (máximo de 2 gramas/dia), dividida em 4 doses iguais, durante 10 dias. • No caso de intolerância à eritromicina pode-se usar sulfametoxazol+trimetoprim (SMZ+TMP), por via oral, de 12 em 12 horas, durante 10 dias, na seguinte dosagem: ❯ crianças: 40mg (SMZ)/kg/dia e 8mg (TMP)/kg/dia. Com a ressalva de que a segurança e a eficácia de SMZ+TMP nos menores de 2 meses não está bem definida; ❯ adultos e crianças com mais de 40 kg: 800mg (SMZ)/dia e 160mg (TMP)/ dia, de 12 em 12 horas. A imunoglobulina humana não tem valor profilático ou terapêutico comprovado. Ações de educação em saúde As pessoas devem ser informadas quanto a importância da vacinação como medida de prevenção e controle da coqueluche. Deve-se dar ênfase à necessidade de se administrar o número de doses preconizado pelo calendário vigente. Também deve ser ressaltada a importância da procura aos serviços de saúde se forem observadas as manifestações que caracterizam a definição de caso suspeito de coqueluche. 224 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Coqueluche Anexo 1 Fluxograma da vigilância da coqueluche – 1ª parte Caso suspeito Caso isolado Surto Atendido em unidade sentinela? 6 Não Sim Notificação Investigação laboratorial* Notificação imediata Investigação imediata Preenchimento da Ficha de Investigação Epidemiológica Coleta de secreção nasofaríngea do caso para realizar cultura Vacinação seletiva com DTP ou DTP+HiB, na área de residência, escola, creche, trabalho Busca ativa de outros casos na área de residência, escola, creche, trabalho C Investigação dos comunicantes Coleta de secreção nasofaríngea de comunicantes com tosse Verificar situação dos comunicantes e vacinar, se necessário Realizar quimioprofilaxia dos comunicantes, conforme orientado no Guia *Opcional Manter área sob vigilância por 42 dias Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 225 Coqueluche Anexo 2 Fluxograma da vigilância da coqueluche – 2ª parte Caso suspeito Caso isolado Surto Notificação imediata Preenchimento da Ficha de Investigação Epidemiológica Coleta de secreção nasofaríngea dos casos para realizar cultura Vacinação seletiva com DTP ou DTP+HiB, na área Busca ativa de outros casos na área Investigação imediata Investigação dos comunicantes Elaboração de relatório final Coleta de secreção nasofaríngea de comunicantes com tosse Verificar situação dos comunicantes e vacinar, se necessário Realizar quimioprofilaxia dos comunicantes, conforme orientado no Guia Manter área sob vigilância por 42 dias 226 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Coqueluche Anexo 3 Diagnóstico laboratorial da coqueluche Pelo seu alto grau de especificidade, a técnica da cultura para o isolamento da Bordetella pertussis da secreção nasofaríngea é considerada como “padrão-ouro” para o diagnóstico laboratorial da coqueluche, embora sua sensibilidade seja variável. Como a Bordetella pertussis apresenta um tropismo pelo epitélio respiratório ciliado, a cultura deve ser feita a partir da secreção nasofaríngea. A coleta do espécime clínico deve ser realizada antes do início da antibioticoterapia ou, no máximo, até 3 dias após seu início. Em condições ideais, a probabilidade de crescimento da bactéria é em torno de 60% a 76%. Interferem no crescimento bacteriano nas culturas: • uso de antimicrobianos; • coleta realizada após a fase aguda, pois é raro o crescimento após a 4ª semana da doença; • uso de swab com algodão não alginatado, pois este material interfere no crescimento da Bordetella pertussis; • coleta e transporte inadequados. 6 C Em relação aos testes sorológicos, até o momento não se dispõem de testes adequados nem padronizados. Os novos métodos em investigação apresentam limitações na interpretação, sensibilidade, especificidade e reprodutibilidade. É importante salientar que o isolamento e detecção de antígenos, produtos bacterianos ou seqüências genômicas de Bordetella pertussis são aplicáveis ao diagnóstico da fase aguda. 1. Coleta de secreção nasofaríngea • Realizar preferencialmente na fase aguda da doença. • Realizar antes do início do tratamento com antimicrobiano ou, no máximo, até três dias após instituição. • Utilizar swab fino com haste flexível, estéril e alginatado. • Retirar os tubos com meio de transporte da geladeira e deixá-los atingir a temperatura ambiente. • Coletar o material de uma narina. • Utilizar um tubo de ensaio com meio de transporte específico (Regan-Lowe), com antibiótico. • Identificar o tubo com o nome e idade, indicando se é caso suspeito ou comunicante, bem como a data e horário da coleta. • Introduzir o swab na narina até encontrar resistência na parede posterior da nasofaringe. Manter o swab em contato com a nasofaringe por cerca de 10 segundos e, em seguida, retirá-lo. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 227 Coqueluche • Após a coleta, estriar o swab na superfície levemente inclinada do tubo (+ 2cm) e, a seguir, introduzir na base do meio de transporte. Atenção • O swab deve permanecer dentro do respectivo tubo. 2. Transporte do material coletado • O material deverá ser encaminhado ao laboratório imediatamente após a coleta, em temperatura ambiente. Cada espécime clínico deverá ser acompanhado da ficha de encaminhamento de amostra ou de cópia da ficha de investigação epidemiológica da coqueluche, conforme definição no âmbito estadual. Se a opção for a ficha de investigação epidemiológica, deve-se anotar se o material (espécime clínico) é do caso ou de comunicante. • Na impossibilidade do envio imediato após a coleta, incubar em estufa bacteriológica com umidade à temperatura de 35ºC a 37ºC por um período máximo de 48 horas. Encaminhar, em seguida, à temperatura ambiente. • Se o período de transporte do material pré-incubado exceder 4 horas ou se a temperatura ambiente local for elevada (> 35ºC), recomenda-se o transporte sob refrigeração, à temperatura de 4ºC. Atenção • Os tubos com meio de transporte que não forem utilizados no mesmo dia devem ser mantidos na geladeira até o momento da coleta. • Verificar, sempre, o prazo de validade do meio de transporte antes de utilizá-lo. • Estabelecer com o laboratório uma rotina referente ao envio de amostras (horário e local de entrega de material), fluxo de resultados e avaliação periódica da qualidade das amostras enviadas, bem como outras questões pertinentes. Meio de transporte com antibiótico 228 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Coqueluche Anexo 4 Indicadores operacionais da vigilância da coqueluche Nº Indicador Cálculo Nº de casos investigados 1 Percentual de casos investigados X 100 Nº de casos notificados pelas unidades sentinelas 2 3 Percentual de casos investigados oportunamente (investigação realizada nas primeiras 72 horas após a notificação) Percentual de casos notificados com coleta oportuna de material para cultura (amostra de secreção de nasofaringe coletada em até três dias após o início da antibioticoterapia) Nº de casos investigados em 72 horas X 100 Nº de casos notificados pelas unidades sentinelas 6 Nº de casos com coleta de material oportuna X 100 Nº de casos notificados pelas unidades sentinelas C Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 229 Coqueluche Anexo 5 Ficha de encaminhamento de espécime clínico para diagnóstico laboratorial da coqueluche 230 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Dengue DENGUE CID 10: A90 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Doença febril aguda, que pode ser de curso benigno ou grave, dependendo da forma como se apresente: infecção inaparente, dengue clássico (DC), febre hemorrágica da dengue (FHD) ou síndrome do choque da dengue (SCD). Atualmente, é a mais importante arbovirose que afeta o ser humano e constitui sério problema de saúde pública no mundo. Ocorre e dissemina-se especialmente nos países tropicais, onde as condições do meio ambiente favorecem o desenvolvimento e a proliferação do Aedes aegypti, principal mosquito vetor. 6 Agente etiológico É um vírus RNA. Arbovírus do gênero Flavivirus, pertencente à família Flaviviridae. São conhecidos quatro sorotipos: 1, 2, 3 e 4. D Reservatório A fonte da infecção e reservatório vertebrado é o ser humano. Foi descrito na Ásia e na África um ciclo selvagem envolvendo macacos. Vetores São mosquitos do gênero Aedes. A espécie Aedes aegypti é a mais importante na transmissão da doença e também pode ser transmissora da febre amarela urbana. O Aedes albopictus, já presente nas Américas, com ampla dispersão nas regiões Sudeste e Sul do Brasil, é o vetor de manutenção da dengue na Ásia mas até o momento não foi associado à transmissão da dengue nas Américas. Modo de transmissão A transmissão se faz pela picada dos mosquitos Aedes aegypti, no ciclo ser humanoAedes aegypti-ser humano. Após um repasto de sangue infectado, o mosquito está apto a transmitir o vírus depois de 8 a 12 dias de incubação extrínseca. A transmissão mecânica também é possível, quando o repasto é interrompido e o mosquito, imediatamente, se alimenta num hospedeiro susceptível próximo. Não há transmissão por contato direto de um doente ou de suas secreções com pessoa sadia, nem por intermédio de água ou alimento. Período de incubação Varia de 3 a 15 dias, sendo em média de 5 a 6 dias. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 231 Dengue Período de transmissibilidade O período de transmissibilidade da doença compreende dois ciclos: um intrínseco, que ocorre no ser humano, e outro extrínseco, que ocorre no vetor. A transmissão do ser humano para o mosquito ocorre enquanto houver presença de vírus no sangue do ser humano (período de viremia). Este período começa um dia antes do aparecimento da febre e vai até o 6º dia da doença. No mosquito, após um repasto de sangue infectado, o vírus vai se localizar nas glândulas salivares da fêmea do mosquito, onde se multiplica depois de 8 a 12 dias de incubação. A partir deste momento, é capaz de transmitir a doença e assim permanece até o final de sua vida (6 a 8 semanas). Imunidade e susceptibilidade A susceptibilidade ao vírus da dengue é universal. A imunidade é permanente para um mesmo sorotipo (homóloga). Entretanto, a imunidade cruzada (heteróloga) existe temporariamente. A fisiopatogenia da resposta imunológica à infecção aguda por dengue pode ser primária e secundária. A resposta primária ocorre em pessoas não expostas anteriormente ao flavivírus, e o título dos anticorpos se eleva lentamente. A resposta secundária ocorre em pessoas com infecção aguda por dengue, mas que tiveram infecção prévia por flavivírus, e o título de anticorpos se eleva rapidamente, atingindo níveis altos. A susceptibilidade, em relação à FHD, não está totalmente esclarecida. Três teorias mais conhecidas tentam explicar sua ocorrência: • teoria de Rosen – relaciona o aparecimento de FHD à virulência da cepa infectante, de modo que as formas mais graves sejam resultantes de cepas extremamente virulentas; • teoria de Halstead – relaciona a FHD com infecções seqüenciais por diferentes sorotipos do vírus da dengue, após um período de 3 meses a 5 anos. Nessa teoria, a resposta imunológica, na segunda infecção, é exacerbada, o que resulta numa forma mais grave da doença; • teoria integral de multicausalidade – tem sido proposta por autores cubanos, segundo a qual se aliam vários fatores de risco às teorias de infecções seqüenciais e de virulência da cepa. A interação desses fatores de risco promoveria condições para a ocorrência da FHD: ❯ fatores individuais – menores de 15 anos e lactentes, adultos do sexo feminino, raça branca, bom estado nutricional, presença de enfermidades crônicas (diabetes, asma brônquica, anemia falciforme), preexistência de anticorpos, intensidade da resposta imune anterior; ❯ fatores virais – sorotipos circulantes e virulência das cepas; ❯ fatores epidemiológicos – existência de população susceptível, circulação simultânea de dois ou mais sorotipos, presença de vetor eficiente, alta densidade vetorial, intervalo de tempo calculado entre 3 meses e 5 anos entre duas infecções por sorotipos diferentes, seqüência das infecções (DEN-2 secundário aos outros sorotipos), ampla circulação do vírus. 232 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Dengue Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas A infecção por dengue causa uma doença cujo espectro inclui desde formas oligo ou assintomáticas, até quadros com hemorragia e choque, podendo evoluir para óbito. Dengue clássico (DC) – a primeira manifestação é a febre alta (39° a 40°C), de início abrupto, seguida de cefaléia, mialgia, prostração, artralgia, anorexia, astenia, dor retroorbital, náuseas, vômitos, exantema, prurido cutâneo. Hepatomegalia dolorosa pode ocorrer, ocasionalmente, desde o aparecimento da febre. Alguns aspectos clínicos dependem da idade do paciente. Desse modo, dor abdominal generalizada tem sido observada mais freqüentemente entre crianças e manifestações hemorrágicas como petéquias, epistaxe, gengivorragia e metrorragia têm sido relatadas mais freqüentemente entre adultos, ao fim do período febril. A doença tem duração de 5 a 7 dias, mas o período de convalescença pode ser acompanhado de grande debilidade física, e prolongar-se por várias semanas. Febre hemorrágica da dengue (FHD) – os sintomas iniciais são semelhantes aos do DC, porém há um agravamento do quadro no terceiro ou quarto dias de evolução, com aparecimento de manifestações hemorrágicas e colapso circulatório. A fragilidade capilar é evidenciada pela positividade da prova do laço*. Outras manifestações hemorrágicas incluem petéquias, equimoses, epistaxe, gengivorragia, hemorragia em diversos órgãos (gastrintestinal, intracraniana, etc.) e hemorragia espontânea pelos locais de punção venosa. Nos casos graves de FHD, o choque geralmente ocorre entre o 3º e 7º dias de doença, geralmente precedido por dor abdominal. O choque é decorrente do aumento de permeabilidade vascular, seguida de hemoconcentração e falência circulatória. É de curta duração e pode levar a óbito em 12 a 24 horas ou à recuperação rápida, após terapia antichoque apropriada. Caracteriza-se por pulso rápido e fraco, com diminuição da pressão de pulso e arterial, extremidades frias, pele pegajosa e agitação. Alguns pacientes podem ainda apresentar manifestações neurológicas, como convulsões e irritabilidade. 6 D *A prova do laço, que não pode ser realizada com garrote ou torniquete, consiste em se obter, através do esfigmomanômetro, o ponto médio entre a pressão arterial máxima e mínima do paciente, mantendo-se esta pressão por 5 minutos; quando positiva, aparecem petéquias sob o aparelho ou abaixo do mesmo. Se o número de petéquias for de 20 ou mais por polegada (um quadrado com 2,5 cm de lado), a prova é considerada fortemente positiva. A Organização Mundial da Saúde definiu um critério de classificação das formas de FHD, em 4 categorias, de acordo com o grau de gravidade: • Grau I – febre acompanhada de sintomas inespecíficos, em que a única manifestação hemorrágica é a prova do laço positiva; • Grau II – além das manifestações constantes do Grau I, somam-se hemorragias espontâneas (sangramentos de pele, petéquias, epistaxe, gengivorragia e outras); Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 233 Dengue • Grau III – colapso circulatório com pulso fraco e rápido, diminuição da pressão arterial ou hipotensão, pele pegajosa e fria e inquietação; • Grau IV – choque profundo, com pressão arterial e pulso imperceptíveis (síndrome do choque da dengue). O Anexo 2 apresenta um roteiro para o diagnóstico e manejo clínico do paciente com dengue. Diagnóstico diferencial Dengue clássico (DC) – a dengue tem um amplo espectro clínico, mas as principais doenças a serem consideradas no diagnóstico diferencial são gripe, rubéola, sarampo e outras infecções virais, bacterianas e exantemáticas. Além das doenças citadas, outros agravos devem ser considerados de acordo com a situação epidemiológica da região. Febre hemorrágica da dengue (FHD) – no início da fase febril, o diagnóstico diferencial deve ser feito com outras infecções virais e bacterianas e, a partir do 3º ou 4º dias, com choque endotóxico decorrente de infecção bacteriana ou meningococcemia. Outras doenças com as quais deve-se fazer o diagnóstico diferencial são leptospirose, febre amarela, malária, hepatite infecciosa, influenza, bem como outras febres hemorrágicas, transmitidas por mosquitos ou carrapatos. Diagnóstico laboratorial Exames específicos – isolamento do agente ou métodos sorológicos que demonstram a presença de anticorpos da classe IgM, em única amostra de soro, ou o aumento do título de anticorpos IgG (conversão sorológica) em amostras pareadas (ver normas e procedimentos no Anexo 1). Exames inespecíficos – hematócrito e plaquetometria são os mais importantes para o diagnóstico e acompanhamento dos pacientes com manifestações hemorrágicas e para pacientes em situações especiais: gestante, idoso (>65 anos), hipertensão arterial, diabete melito, asma brônquica, doença hematológica ou renal crônicas, doença severa do sistema cardiovascular, doença ácido-péptica ou doença auto-imune. Suas interpretações são descritas no Anexo 2. Tratamento Dengue clássico – o tratamento é sintomático (analgésicos e antipiréticos) e pode ser feito no domicílio, com orientação para retorno ao serviço de saúde após 48 a 72 horas do início dos sintomas. Indica-se hidratação oral com aumento da ingesta de água, sucos, chás, soros caseiros, etc. Não devem ser usados medicamentos com ou derivados do ácido acetilsalicílico e antiinflamatórios não hormonais, por aumentar o risco de hemorragias. Febre hemorrágica da dengue – existe uma progressão do dengue clássico para a FHD, e a conduta frente ao paciente depende dos sinais clínicos e evolução da hemoconcentração. Para facilitar o tratamento desta enfermidade, um roteiro de manejo do paciente com suspeita desta forma da doença encontra-se descrito no Anexo 2. 234 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Dengue Aspectos epidemiológicos Tem sido observado um padrão sazonal de incidência coincidente com o verão, devido à maior ocorrência de chuvas e aumento da temperatura nessa estação. É mais comum nos núcleos urbanos, onde é maior a quantidade de criadouros naturais ou resultantes da ação do ser humano. Entretanto, a doença pode ocorrer em qualquer localidade desde que exista população humana susceptível, presença do vetor e o vírus seja introduzido. Nas Américas – a dengue tem sido relatada nas Américas há mais de 200 anos. Na década de 50, a FHD foi descrita, pela primeira vez, nas Filipinas e Tailândia. Após a década de 60, a circulação do vírus da dengue intensificou-se nas Américas. A partir de 1963, houve circulação comprovada dos sorotipos 2 e 3 em vários países. Em 1977, o sorotipo 1 foi introduzido nas Américas, inicialmente pela Jamaica. A partir de 1980, foram notificadas epidemias em vários países, aumentando consideravelmente a magnitude do problema. Cabe citar: Brasil (1982/1986-2002), Bolívia (1987), Paraguai (1988), Equador (1988), Peru (1990) e Cuba (1977/1981). A FHD afetou Cuba em 1981, evento de extrema importância na história da dengue nas Américas. Essa epidemia foi causada pelo sorotipo 2, tendo sido o primeiro relato de febre hemorrágica da dengue ocorrido fora do Sudeste Asiático e Pacífico Ocidental. O segundo surto ocorreu na Venezuela, em 1989. No Brasil – há referências de epidemias desde o século XIX. No século passado há relatos em 1916, em São Paulo, e em 1923, em Niterói, no Rio de Janeiro, sem diagnóstico laboratorial. A primeira epidemia, documentada clínica e laboratorialmente, ocorreu em 1981-1982, em Boa Vista/Roraima, causada pelos sorotipos 1 e 4. Em 1986, ocorreram epidemias no Rio de Janeiro e algumas capitais da região Nordeste. Desde então, a dengue vem ocorrendo no Brasil de forma continuada, intercalando-se com a ocorrência de epidemias, geralmente associadas com a introdução de novos sorotipos em áreas anteriormente indenes. Na epidemia de 1986, identificou-se a ocorrência da circulação do sorotipo DEN1, inicialmente no estado do Rio de Janeiro, disseminando-se, a seguir, para outros seis estados até 1990. Nesse ano, foi identificada a circulação de um novo sorotipo, o DEN 2, também no estado do Rio de Janeiro. Durante a década de noventa, ocorreu aumento significativo da incidência, reflexo da ampla dispersão do Aedes aegypti no território nacional. A presença do vetor associada à mobilidade da população levou à disseminação dos sorotipos 1 e 2 para 20 dos 27 estados do país. Entre os anos de 1990 e 2000, várias epidemias foram registradas, sobretudo nos grandes centros urbanos das regiões Sudeste e Nordeste do Brasil, responsáveis pela maior parte dos casos notificados. As regiões Centro-Oeste e Norte foram acometidas mais tardiamente, pois as epidemias de dengue só foram registradas a partir da segunda metade da década de 90. A maior incidência da doença foi observada em 2002, quando foram registrados cerca de 790 mil casos. A circulação do sorotipo 3 do vírus foi identificada, pela primeira vez, em dezembro de 2000, também no estado do Rio de Janeiro e, posteriormente, no estado de Roraima, em novembro de 2001. Desde o início da epidemia de 2002 observava-se a rápida dispersão do sorotipo 3 para outros estados: no primeiro semestre de 2004, por exemplo, 23 dos 27 estados do país já apresentavam a circulação simultânea dos sorotipos 1, 2 e 3 do vírus da dengue. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 6 D 235 Dengue Casos notificados por região e incidência de dengue. Brasil, 1986-2003 1.000 Casos notificados x 1 mil Incidência (100 mil hab.) 500 800 400 600 300 400 200 200 0 100 86 87 88 89 90 N 91 NE 92 93 SE 94 S 95 96 CO 97 98 99 00 01 02 03 0 Incidência Fonte: CGPNCD/Diges/SVS/MS Vigilância epidemiológica Objetivos • • • • • Evitar a ocorrência das infecções pelo vírus da dengue em áreas livres de circulação. Detectar precocemente as epidemias. Controlar as epidemias em curso. Reduzir o risco de transmissão da dengue nas áreas endêmicas. Reduzir a letalidade de FHD/SCD, mediante diagnóstico precoce e tratamento oportuno e adequado. Definição de caso Caso suspeito de dengue clássico – paciente que tenha doença febril aguda, com duração máxima de 7 dias, acompanhada de pelo menos dois dos seguintes sintomas: cefaléia, dor retroorbital, mialgia, artralgia, prostração, exantema. Além desses sintomas, deve ter estado nos últimos quinze dias em área onde esteja ocorrendo transmissão de dengue ou tenha a presença de Aedes aegypti. Caso suspeito de FHD – é todo caso suspeito de dengue clássico que também apresente manifestações hemorrágicas, variando desde prova do laço positiva até fenômenos mais graves como hematêmese, melena e outros. A ocorrência de manifestações hemorrágicas, acrescidas de sinais e sintomas de choque cardiovascular (pulso arterial fino e rápido ou 236 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Dengue ausente, diminuição ou ausência de pressão arterial, pele fria e úmida, agitação), levam à suspeita de síndrome de choque. Caso confirmado de dengue clássico – é o caso confirmado laboratorialmente. No curso de uma epidemia, a confirmação pode ser feita através de critério clínico-epidemiológico, exceto nos primeiros casos da área, que deverão ter confirmação laboratorial. Caso confirmado de FHD – é o caso em que todos os critérios abaixo estão presentes: • febre ou história de febre recente, com duração de 7 dias ou menos; • trombocitopenia (< = 100 mil/mm3); • tendências hemorrágicas evidenciadas por um ou mais dos seguintes sinais: prova do laço positiva, petéquias, equimoses ou púrpuras e sangramentos de mucosas, do trato gastrointestinal e outros; • extravasamento de plasma, devido ao aumento de permeabilidade capilar, manifestado por: hematócrito apresentando um aumento de 20% do valor basal (valor do hematócrito anterior à doença) ou valores superiores a: 45% em crianças; 48% em mulheres e 54% em homens; ou queda do hematócrito em 20%, após o tratamento; ou presença de derrame pleural, ascite e hipoproteinemia; • confirmação laboratorial específica. 6 D Caso de dengue com complicações – é todo caso que não se enquadre nos critérios de FHD e a classificação de dengue clássico é insatisfatória, dada a gravidade do quadro clínico-laboratorial apresentado. Nessa situação, a presença de um dos itens a seguir caracteriza o quadro: alterações neurológicas; disfunção cardiorrespiratória; insuficiência hepática; plaquetopenia igual ou inferior a 50 mil/mm3; hemorragia digestiva; derrames cavitários; leucometria global igual ou inferior a 1 mil/mm3; óbito. Caso descartado • Caso suspeito com diagnóstico laboratorial negativo (2 resultados negativos, amostras pareadas IgM), desde que se comprove que as amostras foram coletadas e transportadas adequadamente. • Caso suspeito de dengue com diagnóstico laboratorial de outra entidade clínica. • Caso suspeito, sem exame laboratorial, cujas investigações clínica e epidemiológica são compatíveis com outras patologias. Notificação Por ser uma doença de notificação compulsória, todo caso suspeito e/ou confirmado deve ser comunicado ao Serviço de Vigilância Epidemiológica, o mais rapidamente possível. Este deverá informar, imediatamente, o fato à equipe de controle vetorial local para a adoção das medidas necessárias ao combate do vetor. Em situações epidêmicas, a coleta e o fluxo dos dados devem permitir o acompanhamento da curva epidêmica, com vistas ao desencadeamento e avaliação das medidas de controle. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 237 Dengue Primeiras medidas a serem adotadas Atenção médica ao paciente – o atendimento dos pacientes doentes deve ser deslocado para as unidades básicas, onde deverão ter a oferta de pelo menos duas consultas, uma inicial e outra 48 a 72 horas após. Só deverão ser referenciados para as unidades de emergência, ou de maior complexidade, os pacientes que necessitarem de hidratação venosa e observação continuada. Os pacientes que apresentarem piora dos sinais e sintomas devem permanecer sob tratamento e observação rigorosa nas 24 horas seguintes, pois apresentam risco de desenvolver síndrome de choque da dengue. Qualidade da assistência – verificar se os casos estão sendo atendidos em unidades de saúde com capacidade para prestar atendimento adequado e oportuno. Considerar a necessidade de adequação da rede para prestar atendimento, inclusive provendo infra-estrutura para realizar hematócrito, contagem de plaquetas e hidratação venosa. Na maioria das vezes, os pacientes que apresentam a forma clássica da doença não necessitam de cuidados hospitalares. Entretanto, os pacientes que venham a desenvolver quadros graves ou FHD, principalmente seguidos de choque, demandam internamento em unidades de saúde de maior complexidade. Proteção individual para evitar circulação viral – se o paciente estiver em centro urbano infestado por Aedes aegypti, é recomendável que sua residência possua tela nas portas e janelas. Não é necessário isolamento, uma vez que a infecção não se transmite de pessoa a pessoa, nem por meio dos fluidos, secreções orgânicas ou fômites. Confirmação diagnóstica – a depender da situação epidemiológica, coletar material para diagnóstico laboratorial, de acordo com as orientações do Anexo I. Proteção da população – logo que se tenha conhecimento da suspeita de casos de dengue, deve-se organizar ações de bloqueio na área provável de transmissão, visando a diminuição da população adulta de mosquitos. A adoção de medidas de controle não deve aguardar resultados de exames laboratoriais para confirmação dos casos suspeitos. A integração das atividades de vigilância epidemiológica e controle vetorial é de fundamental importância para o sucesso do controle da doença. É necessário que o repasse de informações da localização dos casos suspeitos para a vigilância entomológica ocorra da forma mais ágil possível, viabilizando ações de bloqueio em momento oportuno. Ações de esclarecimento à população, através de meios de comunicação de massa (rádio e televisão), visitas domiciliares pelos agentes de endemias/saúde e palestras nas comunidades devem ser organizadas. Conhecimento sobre o ciclo de transmissão, gravidade da doença e situação de risco devem ser veiculadas, assim como medidas de proteção individual, como o uso de repelentes e telas nas portas e janelas. Investigação – envolve uma seqüência de ações diferenciadas, de acordo com a situação epidemiológica do município. Roteiro da investigação epidemiológica A depender da situação entomológica e de circulação prévia do vírus da dengue em cada área, fazem-se necessárias condutas de vigilância e controle diferenciadas, que exigem roteiros e condutas de investigação específicos. 238 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Dengue Área não infestada (Fluxograma 1) – o objetivo da vigilância epidemiológica (VE) é impedir a introdução do Aedes, procurando detectar precocemente os focos (vigilância entomológica), debelá-los em tempo hábil e fazer a vigilância de casos suspeitos, de acordo com as definições de caso preconizadas. • Notificar os casos, de acordo com o fluxo estabelecido para o estado. • Solicitar a coleta de sangue e encaminhar ao laboratório de referência para confirmação laboratorial. • Investigar o caso para detectar o local provável de infecção; no caso de suspeita de autoctonia, solicitar à equipe de controle vetorial pesquisa de Aedes aegypti na área. • Preencher a ficha de investigação de dengue, enviá-la ao nível hierárquico superior e encerrar o caso. Área infestada sem transmissão de dengue (Fluxograma 2) – o objetivo da VE é monitorar os índices de infestação predial, acompanhando as atividades das equipes de controle, com vistas a conhecer a distribuição geográfica do vetor e seus índices de infestação, identificando as áreas de maior risco para a introdução do vírus e acionando as medidas pertinentes, detectando oportunamente os casos e determinando o local provável de infecção. Nesta situação, recomenda-se implementar a vigilância das febres agudas exantemáticas e a vigilância sorológica (realizar sorologia de dengue em pacientes com suspeita inicial de rubéola e/ou sarampo, que tiveram resultado sorológico negativo para ambos). Quando houver suspeita de dengue, proceder a notificação e investigação imediata de todos os casos suspeitos. 6 D Área com história prévia de transmissão de dengue (Fluxogramas 3 e 4) – o objetivo é detectar precocemente a circulação viral, nos períodos não-epidêmicos; e diminuir o número de casos e o tempo de duração da epidemia nos períodos epidêmicos. • Períodos não-epidêmicos ❯ Notificar, de acordo com o fluxo estabelecido para o estado. ❯ Investigar os casos suspeitos, com a busca ativa de casos no local de residência, trabalho, passeio, etc., do paciente suspeito. ❯ Coletar material para sorologia de todos os pacientes suspeitos e concluir os casos. Atentar para as normas e procedimentos de coleta, de acordo com o Anexo 1. ❯ Realizar monitoramento viral, conforme rotina estabelecida pela vigilância epidemiológica municipal/estadual e pelo Lacen. Manter as medidas de combate ao vetor e desenvolver atividades educativas e de participação comunitária. ❯ Investigar imediatamente os óbitos notificados para a identificação e correção dos seus fatores determinantes. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 239 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Dengue 240 Fluxograma 1. Município não-infestado por Aedes aegypti Caso suspeito de dengue Atenção médica Notificação imediata pelo meio de comunicação mais rápido ao nível hierárquico imediatamente superior Coleta de sangue para confirmação laboratorial Proceder a investigação epidemiológica Ficha de investigação epidemiológica Laboratório de referência Confirmação diagnóstica Definir local provável de infecção Informar às autoridades de saúde a área de procedência Encerramento do caso Solicitar pesquisa de A. aegypti em torno para confirmar se a área está livre do vetor Fluxograma 2. Município infestado porém sem transmissão de dengue Caso(s) suspeito(s) de dengue Notificação imediata pelo meio de comunicação mais rápido disponível ao nível hierárquico imediatamente superior Atenção médica Medidas de controle Plano de ação para educação e comunicação para a comunidade e profissionais Proceder a investigação epidemiológica Resultado Intensificação Coleta de sangue para confirmação laboratorial Confirmação diagnóstica Caso descartado Definir local provável de infecção Caso confirmado Encerramento do caso Busca ativa de casos Há casos suspeitos Comunicar ao setor responsável pelas medidas de controle Não há casos suspeitos ALERTA DE EPIDEMIA Em áreas com altos índices de infestação predial, realizar as seguintes atividades: tratamento focal, tratamento por UBV e eliminação de criadouros potenciais 241 Dengue Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Enviar para laboratório de referência Educação em saúde 6 D Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Dengue 242 Fluxograma 3. Município com epidemia de dengue Período epidêmico de dengue Executar o plano de contingência Organização da Atenção Médica Garantir atenção médica oportuna e padronizada – Utilizar o Guia de Manejo Clínico Divulgação das características clínicas, epidemiológicas e laboratoriais da doença Divulgar as unidades de referência para casos graves Vigilância epidemiológica Reorganizar o fluxo de informação, para garantir o acompanhamento diário ou semanal da curva Análise ágil e sistemática da distribuição espacial dos casos, para orientar as medidas de controle Acompanhamento dos indicadores Definir os critérios para coleta de amostras para exame laboratorial Intensificar combate ao vetor Educação em saúde • Tratamento focal • Tratamento por UBV • Eliminação de criadouros potenciais Plano e estratégia de ação para educação/comunicação em saúde Serviços de saúde Comunidade Fluxograma 4. Município com transmissão endêmica de dengue Transmissão endêmica de dengue Notificação ao nível hierárquico imediatamente superior Atenção médica aos casos diagnosticados Resultado Coleta de sangue para controle laboratorial Medidas de controle Educação em saúde • Tratamento focal • Tratamento por UBV • Eliminação de criadouros potenciais Vigilância epidemiológica Resultado Enviar para laboratório de referência Acompanhamento da curva epidêmica Análise com ênfase para distribuição espacial para orientar a adoção das medidas de controle Análise do impacto das medidas de controle 243 Dengue Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Monitoramento laboratorial para verificação dos sorotipos circulantes 6 D Dengue • Períodos epidêmicos Notificar, de acordo com o fluxo estabelecido para o estado. Recomenda-se a realização da sorologia em apenas uma amostra dos pacientes com dengue clássico, pois a confirmação da maioria dos casos será feita pelo critério clínicoepidemiológico após a confirmação laboratorial da circulação viral na área. Em geral, temse estabelecido que se colha um a cada dez pacientes com suspeita de dengue. A coleta é obrigatória para 100% dos casos suspeitos de FHD e para os casos de dengue grave. Atentar para as normas e procedimentos de coleta, de acordo com o Anexo 1. Realizar monitoramento viral, conforme rotina estabelecida pela vigilância epidemiológica estadual/Lacen, e investigar imediatamente os óbitos notificados para a identificação e correção dos seus fatores determinantes. Adotar, concomitantemente, as seguintes medidas: • organizar imediatamente a atenção médica pela rede básica de saúde; • capacitar os profissionais de saúde, de acordo com a necessidade, no diagnóstico e tratamento da doença, nas suas diversas apresentações clínicas; • disponibilizar o protocolo de atendimento padronizado para toda a rede; • divulgar as unidades de referência para casos graves; • intensificar o combate ao Aedes; • incrementar as atividades de educação em saúde e mobilização social; • reorganizar o fluxo de informação para garantir o acompanhamento da curva epidêmica; analisar a distribuição espacial dos casos para orientar as medidas de controle; acompanhar os indicadores epidemiológicos (taxa de ataque, índices de mortalidade e letalidade) para conhecer a magnitude da epidemia e a qualidade da assistência médica. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Casos de dengue clássico – no período não-epidêmico, preencher todos os campos dos itens da ficha de investigação epidemiológica do Sinan, relativos aos dados gerais, notificação individual e dados de residência, exames laboratoriais e conclusão do caso. Durante epidemias, o município pode adotar o preenchimento apenas da notificação, não preenchendo a ficha de investigação. Essa medida visa garantir a oportunidade da notificação e deve, obrigatoriamente, ser acordada com a secretaria estadual de saúde. Casos de dengue com complicações e FHD – sempre preencher a ficha de investigação, com especial atenção para os campos referentes aos exames laboratoriais e conclusão do caso. Consultar o prontuário dos casos e o médico assistente para completar as informações sobre exames laboratoriais inespecíficos realizados (principalmente plaquetas e hematócrito). Verificar e anotar se foi realizada a prova do laço e qual foi o resultado. Busca ativa de casos graves – deve ser realizada busca ativa de casos suspeitos de FHD nas unidades de saúde, não devendo se aguardar apenas a notificação passiva. Quando o evento estiver ocorrendo em um grande centro urbano, além desta busca deve-se alertar os serviços de emergências para a possibilidade de FHD e solicitar a notificação imediata dos 244 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Dengue casos suspeitos ao serviço de vigilância. Este alerta facilita a busca ativa e a mensuração da magnitude da ocorrência de casos graves. Medidas de controle Vigilância entomológica – as atividades de rotina têm como principal função reduzir os criadouros do mosquito, empregando-se preferencialmente métodos mecânicos. Os larvicidas, quando indicados, devem ser empregados somente nos recipientes que não possam ser removidos, destruídos, descartados, cobertos ou manipulados de forma que se tornem incapazes de permitir a reprodução do vetor. As ações de rotina, além de contribuir para a redução da infestação por Aedes aegypti, podem evitar a sua reintrodução em outras áreas. • Determinação e/ou acompanhamento dos níveis de infestação vetorial – as atividades de vigilância entomológica devem ser executadas rotineiramente em toda a área urbana do município, com a finalidade de levantar os índices (predial, Breteau, recipientes, etc.) para monitoramento das ações executadas e possíveis redirecionamentos necessários. Períodos de circulação endêmica constituem momento ideal para a adoção de medidas visando impedir epidemias futuras. A meta estabelecida para os índices de infestação não podem ser superiores a 1% (zero é o ideal). • Intensificação do combate ao vetor – as atividades de emergência devem ser tomadas em caso de surtos e epidemias. Nessas situações, as aplicações de inseticida a ultra baixo volume são utilizadas para interromper a transmissão (eliminação de fêmeas infectadas), devendo ser programadas para repetições semanais. As ações de rotina (visita casa a casa, mobilização da população, mutirões de limpeza) devem ser reavaliadas e reiniciadas imediatamente. Naquelas situações onde a situação epidemiológica (surto ou epidemia) indique ações que venham a ultrapassar a capacidade operativa do município, deve ser solicitado apoio ao nível estadual. Outras ações de controle estão especificadas no tópico Instrumentos disponíveis para controle. As avaliações entomoepidemiológicas deverão ser consideradas para paralisar as atividades de aspersão de inseticida a ultra baixo volume. 6 D Vigilância epidemiológica • Acompanhar sistematicamente a evolução temporal da incidência de casos em cada área da cidade e confrontar com os índices de infestação vetorial. • Organizar discussões conjuntas com as equipes de controle de vetores e de vigilância, visando a adoção de medidas capazes de reduzir (impedir) a circulação viral em momento oportuno. • Alertar os níveis hierárquicos superiores quando houver risco de epidemias. • Implantar vigilância ativa de casos e do vírus em função da ocorrência de inúmeras infecções oligossintomáticas e dos problemas de subnotificação e sub-registro de casos. Para isso, deve-se definir unidades sentinelas em cada área da cidade e fazer coleta de material de indivíduos com suspeita de dengue, para isolamento e/ou sorologia. Este procedimento permitirá o monitoramento da circulação viral e poderá detectar mais precocemente a introdução de um novo sorotipo na cidade. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 245 Dengue • Investigar qual o local provável de infecção, verificando cuidadosamente a possibilidade de ser caso autóctone. Risco de urbanização de febre amarela A atual situação de dispersão e a elevada densidade do Aedes aegypti aumentam o risco de reurbanização da febre amarela. Atualmente, um dos principais objetivos da VE do país é o de impedir esta ocorrência, a partir da detecção oportuna de casos suspeitos. A conduta a ser adotada frente a casos suspeitos deve seguir as orientações detalhadas no capítulo sobre febre amarela. Análise dos dados A análise dos dados das investigações deve permitir a avaliação da magnitude do problema e orientar/avaliar as medidas adotadas. Deve ser feita sistematicamente, em todos os níveis do sistema, e sua periodicidade dependerá da situação epidemiológica e da organização do fluxo de informações. É preciso considerar os dados referentes à distribuição, densidade do vetor e ocorrência de casos, para que as informações possam subsidiar a análise da situação epidemiológica e otimizar o uso dos recursos de controle disponíveis. Os dados referentes aos casos devem ser consolidados, agrupados e ordenados segundo características de pessoa, tempo, lugar, possibilitando avaliação de tendência da doença e comparação com igual período em anos anteriores (se for o caso). As tabelas devem ser atualizadas periodicamente, bem como as curvas endêmica e epidêmica, para que forneçam uma visão global do evento e permitam o acompanhamento sistemático de sua evolução. Nos relatórios, empregar linguagem clara e acessível, visando a sua divulgação para a população, imprensa e dirigentes dos órgãos de saúde. Encerramento de casos Os dados de notificação, junto com os resultados dos exames laboratoriais e, nos casos em que foram indicados, a investigação epidemiológica, trarão os subsídios para o diagnóstico final, considerando as alternativas constantes da definição de caso. Instrumentos disponíveis para controle Não existem medidas de controle específicas direcionadas ao homem, uma vez que não há disponibilização de nenhuma vacina ou drogas antivirais. A notificação dos casos suspeitos, a investigação do local provável de infecção e a busca ativa de casos são elementos fundamentais. Atualmente, o único elo da cadeia epidemiológica da doença que é vulnerável é o mosquito, por meio da redução da densidade vetorial. Controle vetorial A única garantia para que não exista a dengue é a ausência do vetor. Embora não esteja determinado o limite abaixo do qual se possa ter a certeza de que não ocorrerão surtos de 246 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Dengue dengue, este nível deve ser bem próximo de zero. Dessa forma, em áreas com Aedes, o monitoramento do vetor deve ser realizado rotineiramente para conhecer as áreas infestadas e desencadear as medidas de controle: • manejo ambiental: mudanças no meio ambiente que impeçam ou minimizem a propagação do vetor, evitando ou destruindo os criadouros potenciais do Aedes; • melhoria de saneamento básico; • participação comunitária, no sentido de evitar a infestação domiciliar do Aedes, através da redução de criadouros potenciais do vetor (saneamento domiciliar); • controle químico: consiste em tratamento focal (elimina larvas), perifocal (em pontos estratégicos de difícil acesso) e por ultra baixo volume (elimina alados) com uso restrito em epidemias. Educação em saúde, comunicação e mobilização social É necessário promover a comunicação e a mobilização social para que a sociedade adquira conhecimentos sobre como evitar a dengue, participando efetivamente da eliminação contínua dos criadouros potenciais do mosquito. A população deve ser informada sobre a doença (modo de transmissão, quadro clínico, tratamento, etc.), sobre o vetor (seus hábitos, criadouros domiciliares e naturais) e sobre as medidas de prevenção e controle para que possa adotar um novo comportamento frente ao problema, promovendo ações de controle da doença. Devem ser utilizados os meios de comunicação de massa por seu grande alcance e eficácia, além da produção e distribuição de material que contemple as especificidades de cada área a ser trabalhada. Para fortalecer a consciência individual e coletiva, devem ser desenvolvidas estratégias de alcance nacional para sensibilizar os formadores de opinião para a importância da comunicação e da mobilização social no controle da dengue; para envolver a sociedade em ações de parceria com os gestores dos três níveis; e para enfatizar a responsabilidade do governo em cada nível, e da sociedade como um todo, por meio de suas instituições, organizações e representações. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 6 D 247 Dengue Anexo 1 Normas para procedimentos laboratoriais O diagnóstico específico dos pacientes com suspeita de dengue é indicado de acordo com a situação epidemiológica de cada área. A seguir, descreve-se os exames laboratoriais disponíveis, sua interpretação e as normas de coleta dos espécimes. Exames específicos A comprovação laboratorial das infecções pelo vírus da dengue pode ser feita por meio de isolamento viral, métodos sorológicos, detecção de antígenos virais e/ou ácidos nucléicos virais ou por diagnóstico histopatológico. • Sorologia – é o método de escolha para a confirmação laboratorial na rotina. Existem várias técnicas, sendo o Elisa de captura de IgM (MAC-Elisa) o método de escolha, pois detecta infecções atuais ou recentes. A sua realização requer, na maioria dos casos, somente uma amostra de soro. Baseia-se na detecção de anticorpos IgM específicos aos 4 sorotipos do vírus da dengue. O anticorpo IgM antidengue desenvolve-se rapidamente após o quinto dia do início da doença, na maioria dos casos, e tanto as primoinfecções quanto as infecções secundárias estimulam a produção destes anticorpos, tornando-os detectáveis. A detecção dos anticorpos IgM do vírus da dengue é de extrema importância tanto para o diagnóstico de casos suspeitos quanto para subsidiar os profissionais no processo de decisão-ação da vigilância epidemiológica. • Isolamento viral – é o método mais específico para a determinação do vírus responsável pela infecção. A coleta de amostra deverá ser feita, de preferência, na primeira semana da doença, durante o período de viremia, que em média é de 6 dias. O ideal é coletar o material até o 5º dia do início dos sintomas. A coleta das amostras para essa técnica deverá ser orientada pela vigilância epidemiológica, respeitando-se a capacidade dos laboratórios de referência. Outras técnicas também são utilizadas no diagnóstico sorológico do vírus da dengue, incluindo as de inibição de hemaglutinação (HI), fixação de complemento (FC) e neutralização (N), que exigem amostras pareadas do soro de casos suspeitos e cuja confirmação é mais demorada. • Detecção de antígenos virais e/ou ácido nucléico viral – gradativamente essas técnicas estão sendo incorporadas na rotina dos laboratórios e muitas vezes selam o diagnóstico em situações em que não é possível fazê-lo pelas técnicas habituais. Podem ser detectados antígenos ou ácido nucléico viral no sangue, tecidos humanos e mosquitos, mediante os seguintes métodos: • Reação em cadeia da polimerase com transcrição reversa (RT-PCR) – permite a detecção de quantidades reduzidas de ácido nucléico viral presente nos espécimes, 248 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Dengue • • • • pela amplificação do c-DNA obtido a partir do RNA viral utilizando sondas (primers) tipo-específicos de vírus da dengue e seus sorotipos. A sensibilidade, especificidade e a rápida detecção de quantidades mínimas de material genético em amostras de paciente fazem do RT-PCR um excelente método de diagnóstico de infecção por vírus de dengue. Os resultados falso-positivos geralmente estão relacionados com a manipulação inadequada das amostras. O sucesso desse método depende, em parte, da preservação do espécime clínico, sendo recomendado mantê-lo na menor temperatura possível. Imunofluorescência – a técnica de anticorpos fluorescentes baseia-se na união imunológica de um anticorpo marcado com um fluorocromo ao seu antígeno homólogo. No método indireto, o uso de anticorpos monoclonais permite identificar e caracterizar os isolamentos de dengue. Devido à alta especificidade da reação Ag-Ac, a técnica da IF é bastante utilizada. Imunohistoquímica – esse método permite a detecção de antígenos virais em cortes de tecidos fixados em formalina e emblocados em parafina. Corados pela enzima (fosfatase alcalina ou peroxidase) marcada com anticorpo específico. Essa técnica deve ser adaptada à infecção viral suspeita, após diagnóstico histopatológico prévio. Hibridização in situ – é possível detectar os genomas virais específicos usando sondas radiativas (radioisótopos) ou não radiativas (enzimas), inclusive em materiais conservados por muitos anos. Diagnóstico histopatológico – realizado a partir de coleta de material post-mortem. As lesões anatomopatológicas podem ser encontradas no fígado, rins, baço, coração e linfonodos. 6 D O rótulo das amostras deve conter, obrigatoriamente: nome completo do paciente, data da coleta e natureza da amostra. A confiabilidade dos resultados dos testes laboratoriais depende dos cuidados durante a coleta, manuseio, acondicionamento e envio das amostras (ver Quadro 1). Exames inespecíficos Os exames inespecíficos devem ser solicitados de acordo com a classificação clínica (Anexo 2). Grupo A Hematócrito, hemoglobina, plaquetas e leucograma: recomendado para pacientes que se enquadrem nas seguintes situações: gestantes; idosos (> 65 anos); hipertensão arterial, diabete melito, DPOC, doenças hematológicas crônicas (principalmente anemia falciforme), doença renal crônica, doença severa do sistema cardiovascular, doença ácido-péptica e doenças auto-imunes. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 249 Dengue Grupo B Hematócrito, hemoglobina, plaquetas e leucograma: obrigatório para todos os pacientes deste grupo. Grupos C e D • Hematócrito, hemoglobina, plaquetas, leucograma e outros conforme necessidade (gasometria, eletrólitos, transaminases, albumina, raios X de tórax, ultra-sonografia de abdome); • Uréia, creatinina, glicose, eletrólitos, provas de função hepática, líquor, urina, etc: orientados pela história e evolução clínica. Alterações observadas • Hemograma – a contagem de leucócitos é variável, podendo ocorrer desde leucopenia até leucocitose leve. A linfocitose com atipia linfocitária é um achado comum. • Coagulograma – aumento nos tempos de protrombina, tromboplastina parcial e trombina. Diminuição de fibrinogênio, protrombina, fator VIII, fator XII, antitrombina e antiplasmina. • Bioquímica – albuminúria e discreto aumento dos testes de função hepática: aminotransferase aspartato sérica/AST (conhecida anteriormente por transaminase glutâmico-oxalacética/TGO) e aminotransferase alanina sérica/ALT (conhecida anteriormente por transaminase glutâmico pirúvica/TGP). 250 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Dengue Quadro 1. Coleta, rotulagem, conservação e transporte de amostras únicas para diagnóstico laboratorial de dengue Tipo de diagnóstico Tipo de material Quantidade Período da coleta Recipiente Armazenamento/ conservação Transporte 1º-5º dia da doença Tubo estéril de plástico com tampa de rosca ou à vácuo -70ºC no freezer ou nitrogênio líquido Nitrogênio líquido ou gelo seco e menos de 24 horas após a coleta Logo após o óbito. Menos de 12 horas, máximo de 24 horas Frasco estéril de plástico ou vidro com tampa de rosca -70ºC no freezer ou nitrogênio líquido Nitrogênio líquido ou gelo seco e menos de 24 horas após a coleta Tubo estéril de plástico ou vidro com tampa de rosca ou à vácuo -20ºC no freezer Nitrogênio líquido ou gelo seco e menos de 24 horas após a coleta Frasco estéril de plástico ou vidro com tampa de rosca Temperatura ambiente, em formalina tamponada Temperatura ambiente e até 24 horas Sangue Isolamento viral Obtenção da amostra: punção venosa ou punção intracardíaca (óbito) Crianças 2-5ml Adultos 10ml Tecido (fígado, rins, coração, baço, linfonodos) Isolamento viral Obtenção da amostra: necropsia ou viscerotomia ou usando agulha de biópsia Fragmento de 1cm Sangue Sorológico Histopatologia ou imunohistoquímica ou técnicas moleculares Obtenção da amostra: punção venosa ou punção intracardíaca (óbito) Crianças 2-5ml Adultos 10ml S1 = (1º-5º) dias da doença S2 = (14º-21º) dias após S1 S = amostra única após o 5º dia da doença Tecido Obtenção da amostra: necropsia ou viscerotomia ou usando agulha de biópsia - Logo após o óbito ou menos de oito horas, máximo de 12 horas Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 6 D 251 Dengue Anexo 2 Assistência médica aos pacientes com suspeita de dengue Todos os indivíduos com doença febril com suspeita diagnóstica de dengue devem ser submetidos à avaliação clínica e classificados em um dos seguintes grupos do fluxograma de diagnóstico e conduta dos pacientes, apresentado a seguir. A presença de sinais de alerta (Quadro 1) indica a possibilidade de gravidade do quadro clínico. Quadro 1. Sinais de alerta na dengue Dor abdominal intensa e contínua Vômitos persistentes Hipotensão postural Hipotensão arterial Pressão diferencial < 20 mmHg (PA convergente) Hepatomegalia dolorosa Hemorragias importantes Extremidades frias, cianose Pulso rápido e fino Agitação e/ou letargia Diminuição da diurese Diminuição repentina da temperatura corpórea ou hipotermia Aumento repentino do hematócrito 252 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Diagnóstico e conduta do paciente com suspeita de dengue A dengue é uma doença dinâmica, o que permite que o paciente possa evoluir de um estágio a outro, durante o curso da doença. Todo caso suspeito com hipótese diagnóstica de dengue deve ser notificado à vigilância epidemiológica. Caso suspeito de dengue: paciente com doença febril aguda, com duração máxima de até sete dias, acompanhada de pelo menos dois dos seguintes sintomas: cefaléia, dor retroorbitária, mialgia, artralgia, prostração ou exantema associados a história epidemiológica compatível Grupo A Grupo B Sintomatologia • Ausência de manifestações hemorrágicas espontâneas ou induzidas (prova do laço) • Ausência de sinais de alerta Exames complementares Específico • Em período não-epidêmico: para todos os casos • Em período epidêmico, por amostragem (conforme orientação da vigilância) Inespecífico (recomendado) • Hematócrito, hemoglobinas, plaquetas para pacientes em situações especiais1: gestante, idoso (>65 anos), hipertensão arterial, diabete melito, asma brônquica, doença hematológica ou renal crônicas, doença severa do sistema cardiovascular, doença ácido-péptica ou doença auto-imune Normal ou não realizado Alterado Sintomatologia • Manifestações hemorrágicas induzidas (prova do laço) ou espontâneas sem repercussão hemodinâmica. • Ausência de sinais de alerta Normal Hematócrito aumentado em até 10% acima do valor basal ou, na ausência deste, as seguintes faixas de valores • Crianças: > 38% e < 42% • Mulheres: > 40% e < 44% • Homens: > 45% e < 50% e/ou • Plaquetopenia entre 50 e 100 mil cel/mm3 e/ou • Leucopenia < 1mil cel/mm3 • • • • • Conduta Tratamento ambulatorial Hidratação oral rigorosa (80ml/kg/dia), como orientado para o Grupo A Analgésicos e antitérmicos Orientar sobre sinais de alerta Retorno para reavaliação clínico-laboratorial em 24 horas e reestadiamento Observações: • Em vigência de hemorragia visceral importante, sobretudo no sistema nervoso central, associado à plaquetopenia <50 mil/mm3, avaliar a indicação de transfusão de plaquetas. • Pacientes com plaquetopenia <20 mil/mm3 sem repercussão clínica devem ser internados e reavaliados clínica e laboratorialmente a cada 12 horas. • As manifestações não usuais (encefalite, hepatite, miocardite, entre outras) podem ocorrer em qualquer estágio da doença e terão abordagens específicas. *Anteriormente classificado como Leve (Grupo A), Moderado (Grupo B) e Grave (Grupos C e D). Sintomatologia • Presença de algum sinal de alerta e/ou • Choque • Manifestações hemorrágicas ausentes ou presentes Obs: iniciar a hidratação imediatamente, independente do local de atendimento Alterado Hematócrito aumentado em mais de 10% acima do valor basal ou, na ausência deste, os seguintes valores • Crianças: > 42% • Mulheres: > 44% • Homens: > 50% e/ou • Plaquetopenia > 50 cel/mm3 Conduta • Leito de observação • Hidratação oral supervisionada ou parenteral: 80ml/kg/dia, sendo 1/3 do volume infundido nas primeiras 4 a 6 horas e na forma de solução salina isotônica • Reavaliação clínica e de hematócrito após a etapa de hidratação Sem hipotensão (Grupo C) Conduta • Hidratação EV imediata (fase de expansão): 20ml/kg/hora com solução salina isotônica sob supervisão médica (até 3 vezes) • Reavaliação clínica (cada 15-30 minutos) e hematócrito após 2 horas • Sintomáticos Melhora? Melhora clínica e laboratorial? SIM NÃO Etapa de manutenção, com 25ml/kg em 8 e 12 horas Repetir conduta (até 3 vezes) Melhora clínica e laboratorial? SIM NÃO Com hipotensão ou choque (grupo D) Conduta • Leito de observação ou hospitalar • Hidratação EV imediata: 25ml/kg em 4 horas, sendo 1/3 deste volume na forma de solução salina isotônica • Reavaliação clínica e de hematócrito após 4 horas e de plaquetas após 12 horas • Sintomáticos Tratamento ambulatorial Retorno em 24 horas NÃO Reestadiar SIM NÃO Avaliar hemoconcentração Melhora? SIM Melhora? SIM Exames complementares • Específico: obrigatório • Inespecíficos: hematócrito, hemoglobina, plaquetas, leucograma e outros, conforme necessidade (gasometria, eletrólítos, transaminases, albumina, RX de tórax, ultra-sonografia) NÃO Hematócrito em ascensão ou hipoalbuminemia Expansor plasmático •Albumina: 3ml/kg/hora •Substitutos artificiais Concentrado de hemácias e avaliação de especialistas Em queda Avaliar sangramentos e coagulopatias de consumo SIM NÃO Hiperhidratação? Verificar sinais de ICC SIM NÃO Melhora? Diuréticos SIM Estes pacientes podem apresentar evolução desfavorável e devem ter acompanhamento clínico diferenciado. 2 Os sinais de alerta e agravamento do quadro costumam ocorrer na fase de remissão da febre. NÃO 1 Unidade de cuidados intensivos 253 Dengue Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Conduta • Tratamento ambulatorial • Hidratação oral: 60 a 80 ml/kg/dia; um terço deste volume com SRO e o restante em líquidos caseiros (água, sucos naturais, chás, etc.) • Analgésicos e antitérmicos: dipirona, paracetamol. Reavaliar medicamentos de uso contínuo • Orientar sobre sinais de alerta2 • NÃO UTILIZAR SALICILATOS • Não há subsídio científico que dê suporte clínico ao uso de antiinflamatórios não hormonais ou corticóides • Avaliar risco de sangramento • Pacientes em situações especiais devem ser reavaliados no primeiro dia sem febre. Para os outros pacientes, reavaliar sempre que possível no mesmo período Grupos C e D* 6 D Difteria DIFTERIA CID 10: A36 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Doença transmissível aguda, toxiinfecciosa, imunoprevenível, causada por bacilo toxigênico que freqüentemente se aloja nas amígdalas, faringe, laringe, nariz e, ocasionalmente, em outras mucosas e na pele. É caracterizada por placas pseudomembranosas típicas. Sinonímia Crupe. Agente etiológico Corynebacterium diphtheriae, bacilo gram-positivo, produtor da toxina diftérica, quando infectado por um fago. Reservatório O próprio doente ou o portador, sendo este último mais importante na disseminação do bacilo, por sua maior freqüência na comunidade e por ser assintomático. A via respiratória superior e a pele são locais habitualmente colonizados pela bactéria. Modo de transmissão A transmissão se dá pelo contato direto de pessoa doente ou portadores com pessoa susceptível, através de gotículas de secreção respiratória, eliminadas por tosse, espirro ou ao falar. A transmissão por fômites é pouco freqüente, mas pode ocorrer. Período de incubação Em geral, de 1 a 6 dias, podendo ser mais longo. Período de transmissibilidade Em média, até duas semanas após o início dos sintomas. A antibioticoterapia adequada erradica o bacilo diftérico da orofaringe, de 24 a 48 horas após a sua introdução, na maioria dos casos. O portador pode eliminar o bacilo por 6 meses ou mais, motivo pelo qual torna-se extremamente importante na disseminação da difteria. 254 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Difteria Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade é geral. A imunidade pode ser naturalmente adquirida pela passagem de anticorpos maternos via transplacentária, que protegem o bebê nos primeiros meses de vida, ou através de infecções inaparentes atípicas que conferem imunidade em diferentes graus, dependendo da maior ou menor exposição dos indivíduos. A imunidade também pode ser adquirida ativamente, através da vacinação com toxóide diftérico. • A proteção conferida pelo soro antidiftérico (SAD) é temporária e de curta duração (em média, duas semanas). • A doença normalmente não confere imunidade permanente, devendo o doente continuar seu esquema de vacinação após a alta hospitalar. 6 Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas A presença de placas pseudomembranosas branco-acinzentadas, aderentes, que se instalam nas amígdalas e invadem estruturas vizinhas, é a manifestação clínica típica. Essas placas podem se localizar na faringe, laringe e fossas nasais, sendo menos freqüentemente observadas na conjuntiva, pele, conduto auditivo, vulva, pênis (pós-circuncisão) e cordão umbilical. Clinicamente, a doença manifesta-se por comprometimento do estado geral do paciente, que pode apresentar-se prostrado e pálido; a dor de garganta é discreta, independentemente da localização ou quantidade de placas existentes, e a febre normalmente não é muito elevada, variando entre 37,5ºC a 38,5°C, embora temperaturas mais altas não afastem o diagnóstico. Nos casos mais graves há intenso edema do pescoço, com grande aumento dos gânglios linfáticos dessa área (pescoço taurino) e edema periganglionar nas cadeias cervicais e submandibulares. Dependendo do tamanho e localização da placa pseudomembranosa, pode ocorrer asfixia mecânica aguda no paciente, o que muitas vezes exige imediata traqueostomia para evitar a morte. O quadro clínico produzido pelo bacilo não-toxigênico também determina a formação de placas características, embora não se observe sinais de toxemia ou a ocorrência de complicações. No entanto, as infecções causadas pelos bacilos não-toxigênicos têm importância epidemiológica por disseminar o Corynebacterium diphtheriae. D Formas clínicas Faringoamigdaliana ou faringotonsilar (angina diftérica) – é a forma clínica mais comum. Nas primeiras horas da doença observa-se discreto aumento de volume das amígdalas, além da hiperemia de toda a faringe. Em seguida, ocorre a formação das pseudo- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 255 Difteria membranas caraterísticas, aderentes e invasivas, constituídas por placas esbranquiçadas ou amarelo-acinzentadas, eventualmente de cor cinzento-escura ou negra, que se tornam espessas e com bordas bem definidas. Essas placas estendem-se pelas amígdalas recobrindoas e, freqüentemente, invadem as estruturas vizinhas, podendo ser observadas nos pilares anteriores, úvula, palato mole e retrofaringe, adquirindo aspecto necrótico. O estado geral do paciente agrava-se com a evolução da doença, em virtude da progressão das pseudomembranas e da absorção cada vez maior de toxina. Difteria hipertóxica (difteria maligna) – denominação dada aos casos graves, intensamente tóxicos, que desde o início apresentam importante comprometimento do estado geral. Observa-se a presença de placas de aspecto necrótico que ultrapassam os limites das amígdalas, comprometendo as estruturas vizinhas. Há um aumento importante do volume dos gânglios da cadeia cervical e edema periganglionar pouco doloroso à palpação, caracterizando o pescoço taurino. Nasal (rinite diftérica) – é mais freqüente em lactentes, sendo, na maioria das vezes, concomitante à angina diftérica. Desde o início observa-se secreção nasal serossanguinolenta, geralmente unilateral, podendo ser bilateral, que provoca lesões nas bordas do nariz e no lábio superior. Laríngea (laringite diftérica) – na maioria dos casos a doença inicia-se na região da orofaringe, progredindo até a laringe. É uma forma bastante comum no Brasil. Os sintomas iniciais, além dos que são vistos na faringe diftérica, são: tosse, rouquidão, disfonia e dificuldade respiratória progressiva, podendo evoluir para insuficiência respiratória aguda. Em casos raros, pode haver comprometimento isolado da laringe, o que dificulta o diagnóstico. Cutânea – apresenta-se sob a forma de úlcera arredondada, com exsudato fibrinopurulento e bordas bem demarcadas e, embora profunda, não alcança o tecido celular subcutâneo. Devido a pouca absorção da toxina pela pele, a lesão ulcerada de difteria pode tornar-se subaguda ou crônica e raramente é acompanhada de repercussões cutâneas. No entanto, seu portador constitui-se reservatório e disseminador do bacilo diftérico, daí sua importância na cadeia epidemiológica da doença. Outras localizações – apesar de raro, o bacilo diftérico pode acometer a vagina (ulcerações e corrimento purulento), o ouvido (processo inflamatório exsudativo do duto auditivo externo) e conjuntiva ocular (a infecção pode ser inaparente ou manifestar-se sob a forma de conjuntivite aguda, com eventual formação da membrana). Complicações As complicações podem ocorrer desde o início da doença até, na maioria dos casos, a sexta ou oitava semana, quando os sintomas iniciais já desapareceram. Seu estabelecimento pode estar relacionado com localização e extensão da membrana; quantidade de toxina absorvida; estado imunitário do paciente; demora no diagnóstico e início do tratamento. As principais complicações da difteria são: Miocardite – é responsável pelo maior número de óbitos a partir da 2ª semana da doença. É decorrente da ação direta da toxina no miocárdio ou, ainda, pela intoxicação do sistema de condução cardíaco. Os sinais e sintomas mais freqüentemente encontrados são: 256 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Difteria alterações de freqüência e ritmo, hipofonese de bulhas, hepatomegalia dolorosa, aparecimento de sopro e sinais de ICC. As alterações eletrocardiográficas mais encontradas são alteração de repolarização, extra-sistolias, taquicardia ou bradicardia, distúrbio de condução A-V e corrente de lesão. Neurite – são alterações transitórias, decorrentes da ação da exotoxina no sistema nervoso periférico, ocasionando as neurites periféricas. As manifestações geralmente são tardias, ocorrendo entre a segunda e a sexta semana de evolução, mas podem aparecer alguns meses depois. A forma de apresentação mais comum e mais característica é a paralisia do véu do palatino, com desvio unilateral da úvula, ocasionando voz anasalada, engasgos e regurgitação de alimentos pelo nariz, podendo ocorrer broncoaspiração. Em alguns casos, observa-se paresia ou paralisia bilateral e simétrica das extremidades, com hiporreflexia. Também pode ocorrer paralisia do diafragma, geralmente tardia, causando insuficiência respiratória. A paralisia dos músculos oculares determinando diplopia e estrabismo também pode ser observada. Renais – de acordo com a gravidade do caso, pode-se detectar a presença de albuminúria em diferentes proporções. Na difteria grave, pode se instalar uma nefropatia tóxica com importantes alterações metabólicas e, mais raramente, insuficiência renal aguda. Geralmente, quando há miocardite, pode ocorrer também insuficiência renal grave. 6 D Prognóstico Depende do estado imunitário do paciente, da precocidade do diagnóstico e da instituição do tratamento. Os fatores associados ao mau prognóstico são: • tempo da doença sem instituição de tratamento – pior se acima de três dias; • presença de edema periganglionar; • presença de manifestações hemorrágicas; • presença de placas extensas na orofaringe; • miocardite precoce; • presença de insuficiência renal. Em geral, a difteria é uma doença grave que necessita de assistência médico-hospitalar imediata e isolamento. Diagnóstico diferencial O diagnóstico diferencial da difteria deverá ser feito com as patologias descritas a seguir: • difteria cutânea – impetigo, ectima, eczema, úlceras; • difteria nasal – rinite estreptocócica, rinite sifilítica, corpo estranho nasal; • difteria amigdaliana ou faríngea – amigdalite estreptocócica, angina monocítica, angina de Plaut Vicent, agranulocitose; • difteria laríngea – crupe viral, laringite estridulosa, epiglotite aguda, inalação de corpo estranho. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 257 Difteria Diagnóstico laboratorial Realizado mediante a identificação e isolamento do Corynebacterium diphtheriae através de cultura de material colhido com técnica adequada das lesões existentes (ulcerações, criptas das amígdalas), exsudatos de orofaringe e de nasofaringe, que são as localizações mais comuns, ou de outras lesões cutâneas, conjuntivas, genitália externa, etc. (ver normas e procedimentos no Anexo 1), mesmo sem as provas de toxigenicidade. A bacterioscopia não tem valor no diagnóstico da difteria, devido à baixa especificidade do método. Tratamento Tratamento específico A medida terapêutica na difteria é a administração do soro antidiftérico (SAD), que deve ser feito em unidade hospitalar e cuja finalidade é inativar a toxina circulante o mais rapidamente possível e possibilitar a circulação de excesso de anticorpos, em quantidade suficiente para neutralizar a toxina produzida pelos bacilos. Atenção O soro antidiftérico não tem ação sobre a toxina já impregnada no tecido. Por isso, sua administração deve ser feita o mais precocemente possível, frente a uma suspeita clínica bem fundamentada. Como o soro antidiftérico tem origem heteróloga (soro heterólogo de cavalo), sua administração pode causar reações alérgicas. Deste modo, faz-se necessária a realização de provas de sensibilidade antes do seu emprego. Caso a prova seja positiva, deverá ser feita a dessensibilização. As doses do SAD não dependem do peso e da idade do paciente e sim da gravidade e do tempo da doença. O SAD deve ser feito preferencialmente por via endovenosa (EV), diluído em 100ml de soro fisiológico em dose única. Esquema de administração do SAD Forma clínica Dosagem Leve (nasal, cutânea, amigdaliana) 40 mil UI, EV Laringoamigdaliana ou mista 60 mil a 80 mil UI, EV Graves ou tardias (4 dias de doença) 80 mil a 120 mil UI, EV Administração do SAD A administração do soro antidiftérico deve ser sempre precedida da prova intradérmica de sensibilidade, da seguinte forma: • diluir 0,1ml do SAD a 1:1 mil de soro fisiológico ou soro glicosado a 5%, e fazer a injeção intradérmica (com agulha de insulina) na região interna do antebraço; após 20 minutos, realizar a leitura; • reação (+) = nódulo eritematoso maior ou igual a 3cm de diâmetro. 258 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Difteria Caso a prova intradérmica seja positiva, o soro deverá ser administrado com as seguintes precauções: • injetar um anti-histamínico 15 minutos antes da aplicação do soro: 1 ampola de 2ml de prometazina/fenergan tem 50mg. Recomenda-se: para crianças: 0,5mg/kg/dose, via intramuscular; para adultos: 100-1.000mg/dia, via intramuscular; • manter sempre à mão adrenalina milesimal, injetando de 0,5 a 1ml, via intramuscular, caso sobrevenham sintomas de choque anafilático (palidez, dispnéia intensa, hipotensão, edema de glote, convulsões, etc.); • a aplicação do soro deverá ser feita segundo o esquema de dessensibilização a seguir, usando-se injeções em séries de antitoxina, em diluições decrescentes (SG a 5% ou SF), com intervalos de 15 minutos: Esquema de dessensibilização ao SAD 6 Diluição do SAD em SF Volume de cada injeção Via de administração 1 1:1.000 0,1ml ID 2 1:1.000 0,3ml ID 3 1:1.000 0,6ml SC 4 1:100 0,1ml SC 5 1:100 0,3ml SC 6 1:100 0,6ml SC 7 1:10 0,1ml SC 8 1:10 0,3ml SC 9 1:10 0,6ml SC 10 Não diluído 0,1ml SC 11 Não diluído 0,3ml SC 12 Não diluído 0,6ml IM 13 Não diluído 1,0ml IM Nº da dose* D *Intervalo entre as doses: 15 minutos • antibioticoterapia – o uso de antibiótico deve ser considerado como medida auxiliar da terapia específica, objetivando interromper a produção de exotoxina pela destruição dos bacilos diftéricos e sua disseminação. Importante Mesmo ante o risco indicado por uma prova de sensibilidade positiva, não se deve hesitar na administração do soro antidiftérico, considerando-se as medidas de precaução acima explicadas. Pode-se utilizar eritromicina ou penicilina G cristalina ou penicilina G procaína, com a mesma eficácia, durante 14 dias, conforme orientação a seguir: Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 259 Difteria • eritromicina – deve ser administrada por via oral, na dose de 40 a 50mg/kg/dia (dose máxima de 2g/dia); • penicilina G cristalina – deve ser administrada por via endovenosa, na dose de 100 mil a 150 mil UI/kg/dia, em frações iguais de 6/6 horas; • penicilina G procaína – deve ser administrada por via intramuscular, na dose de 50 mil UI/kg/dia (dose máxima de 1.200.000UI/dia), em duas frações iguais de 12/12 horas. Observação • Quando houver melhora do quadro, a penicilina G cristalina pode ser substituída pela penicilina G procaína para completar os 14 dias de tempo total de tratamento. • A clindamicina constitui boa alternativa à eritromicina e às penicilinas, na dose de 20 a 40mg/kg/dia, em frações iguais de 8/8 horas, por via endovenosa, durante 14 dias. Tratamento sintomático O tratamento geral ou de suporte consiste em repouso no leito, manutenção do equilíbrio hidreletrolítico (gotejamento endovenoso de soro glicofisiológico, com acréscimo de glicose a 25% ou 50% para aumentar a oferta calórica), dieta leve, nebulização ou vaporização. Proceder a aspiração das secreções com freqüência. Não havendo aceitação dos alimentos e dos líquidos por via oral, deve-se administrá-los por sonda nasogástrica. Estudos realizados no Brasil apontam que a carnitina exerce efeito protetor sobre o miocárdio, desde que sua administração seja iniciada antes de decorridos cinco dias desde o início da doença. A dose recomendada é de 100mg/kg/dia (máximo de 3g/dia), por via oral, em duas ou três frações iguais de 12/12 horas ou de 8/8 horas, durante quatro dias. Segundo os estudos, a carnitina propicia redução da incidência de miocardite e redução da morbimortalidade, estando seu uso indicado como coadjuvante no tratamento da difteria. Como a carnitina não está comercializada no Brasil, médicos com experiência clínica com o seu uso orientam o preparo do xarope a 10%, dissolvendo-se 100g de DL-carnitina em 100ml de água destilada quente e completando-se o volume de 1.000ml com xarope simples. Nessa fórmula há 500mg/5ml do princípio ativo (Sakane, 2002). Tratamento das complicações diftéricas A observação do paciente com difteria deve ser contínua. Insuficiência respiratória – o agravamento precoce da insuficiência respiratória constitui indicação de traqueostomia. A paralisia da musculatura respiratória (diafragma e músculos intercostais) exige, eventualmente, a instalação de aparelhos de respiração assistida. Observação: quando houver comprometimento respiratório alto, nos casos leves e moderados de laringite, pode ser tentada a dexametasona em dose inicial de 0,6mg/kg, seguida por 0,4mg/kg/dia, por via endovenosa, em frações iguais de 6/6 horas, como medida antiedematosa; porém, caso o paciente continue com sinais progressivos de obstrução alta ou se já se apresentar ao médico com quadro de insuficiência respiratória alta estabelecida, a traqueostomia deve ser feita sem demora, evitando-se que o paciente apresente hipóxia severa. 260 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Difteria Miocardite – a terapêutica para esta complicação baseia-se no repouso absoluto no leito, durante pelo menos três semanas, na restrição de sódio e no emprego de cardiotônicos e diuréticos. Deve ser realizado eletrocardiograma. Polineurites – a cura costuma ser espontânea, em tempo variável, mas o paciente deve ser mantido internado e em observação constante. Insuficiência renal aguda – tratamento conservador, diálise peritoneal. Aspectos epidemiológicos A difteria ocorre durante o ano todo e pode afetar todas as pessoas não imunizadas, de qualquer idade, raça ou sexo. Observa-se um aumento de sua incidência nos meses frios (outono e inverno), quando é mais comum a ocorrência de infecções respiratórias devidas, principalmente, à aglomeração em ambientes fechados, que facilitam a transmissão do bacilo. Contudo, essa diferença não é importante para as regiões que não apresentam grandes oscilações sazonais de temperatura ou onde a população mantém alto índice de aglomeração durante todo o ano. É uma doença infecciosa de importância nos países do Terceiro Mundo, sendo rara quando coberturas vacinais homogêneas são obtidas em mais de 80% da população. É mais freqüente a ocorrência da doença em áreas com baixas condições socioeconômicas e sanitárias, onde a aglomeração de pessoas é maior. Comumente, estas áreas apresentam baixa cobertura vacinal e, portanto, não é obtido impacto no controle da transmissão da doença. O número de casos de difteria notificados no Brasil vem decrescendo progressivamente, provavelmente em decorrência do aumento da utilização da vacina DTP. Em 1990, foram notificados 640 casos, com coeficiente de incidência de 0,45/100 mil habitantes, número que foi progressivamente decaindo até atingir 56 casos em 1999 (coeficiente de incidência de 0,03/100 mil habitantes) e 58 casos em 2000 (coeficiente de incidência de 0,03/100 mil habitantes). Nos anos subseqüentes, o número de casos não ultrapassou 50 por ano e o coeficiente de incidência por 100 mil habitantes manteve-se em torno de 0,03. Em 2003, confirmaram-se 40 casos da doença, com coeficiente de incidência de 0,02/100 mil habitantes. A cobertura vacinal com a DTP vem se elevando neste período, passando de 66%, em 1990, para 95%, em 2003. A letalidade esperada varia de 5% a 10%, atingindo 20% em certas situações. No Brasil, este indicador tem apresentado elevações e diminuições, sendo de 8,6%, 18,8% e 22%, em 2000, 2001 e 2002, respectivamente. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 6 D 261 Difteria Coeficiente de incidência¹ da difteria e cobertura vacinal pela DTP². Brasil, 1980-2003³ 0,45 100 0,40 90 80 0,35 70 0,30 60 0,25 50 0,20 40 0,15 30 0,10 20 0,05 0 10 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 Coeficiente de incidência por 100 mil hab. 95 96 97 98 99 00 01 02 03 0 Cobertura vacinal (%) Fonte: ¹Ministério da Saúde/SVS/Devep/CGDT/Cover; ²Ministério da Saúde/SVS/Devep/CGPNI. ³Dados sujeitos a revisão Vigilância epidemiológica A difteria é uma doença de notificação e investigação obrigatória em todo o território nacional (Anexo 1). Objetivos • Investigar todos os casos suspeitos e confirmados com vistas à adoção de medidas de controle pertinentes para evitar a ocorrência de novos casos. • Aumentar o percentual de isolamento em cultura, com envio de 100% das cepas isoladas para o laboratório de referência nacional, para estudos moleculares e de resistência bacteriana a antimicrobianos. • Acompanhar a tendência da doença, para detecção precoce de surtos e epidemias. Definição de caso Suspeito Toda pessoa que, independente da idade e estado vacinal, apresenta quadro agudo de infecção da orofaringe, com presença de placas aderentes ocupando as amígdalas, com ou 262 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Difteria sem invasão de outras áreas da faringe (pálato e úvula) ou outras localizações (ocular, nasal, vaginal, pele, etc.), com comprometimento do estado geral e febre moderada. Confirmado Critério laboratorial • Todo caso suspeito com isolamento do Corynebacterium diphtheriae e provas de toxigenicidade positiva, ou • Todo caso suspeito com isolamento do Corynebacterium diphtheriae mesmo sem provas de toxigenicidade positiva. Critério epidemiológico Todo caso suspeito de difteria: • com resultado de cultura negativo ou exame não realizado, mas que seja comunicante de um outro caso confirmado laboratorial ou clinicamente; ou • com resultado de cultura negativo ou exame não realizado, mas que seja comunicante íntimo de portador, indivíduo no qual se isolou o Corynebacterium diphtheriae. 6 Critério clínico Quando for observado: • placas comprometendo pilares ou úvula, além das amígdalas; • placas suspeitas na traquéia ou laringe; • simultaneamente, placas em amígdalas, toxemia importante, febre baixa desde o início do quadro e evolução, em geral, arrastada; • miocardite ou paralisia de nervos periféricos, que pode aparecer desde o início dos sintomas sugestivos de difteria ou até semanas após. D Critério anatomopatológico (necropsia) Quando a necropsia comprovar: • placas comprometendo pilares ou úvula, além das amígdalas; • placas na traquéia e/ou laringe. Morte pós-clínica compatível Óbito de paciente em curso de tratamento de amigdalite aguda e no qual se constata miocardite. Descartado Caso suspeito não confirmado por nenhum dos critérios descritos anteriormente. Notificação Todo caso suspeito deve ser notificado imediatamente, para desencadeamento da investigação e adoção das medidas de controle pertinentes, bem como incluído no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 263 Difteria Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente Hospitalização imediata. Qualidade da assistência Verificar se os casos estão sendo atendidos em unidade de saúde com capacidade para prestar atendimento adequado e oportuno. Proteção individual para evitar disseminação da bactéria Os doentes com difteria devem ser mantidos em isolamento respiratório durante 14 dias após a introdução da antibioticoterapia apropriada. Os fômites devem receber cuidados apropriados segundo as normas de biossegurança. O ideal é suspender as medidas relativas às precauções respiratórias somente quando duas culturas de secreções obtidas de nasofaringe, em meios específicos, forem negativas para Corynebacterium diphtheriae. Inclusive nos doentes com difteria cutânea, é considerada obrigatória a realização de duas culturas de material colhido das lesões cutâneas pelo menos 24 horas depois de completada a antibioticoterapia. Confirmação diagnóstica Coletar material para diagnóstico laboratorial de acordo com as orientações constantes do Anexo 1. Proteção da população Logo que se tenha conhecimento da suspeita de casos de difteria deve-se desencadear um bloqueio vacinal seletivo com DTP e/ou dT nas áreas onde o paciente esteve no período de transmissibilidade. Coletar material de comunicantes para pesquisa de portadores e iniciar a quimioprofilaxia dos comunicantes íntimos. É importante lembrar que a vacina DTP é indicada para crianças de 2 meses a 6 anos completos e a dT para pessoas com sete anos ou mais. Investigação Devido ao curto período de incubação e alta transmissibilidade, a investigação dos casos e dos comunicantes deverá ter início imediatamente após a notificação do caso suspeito de difteria. Importante Visando a detecção precoce de outros casos, é importante desencadear busca ativa, ou seja, ir na comunidade, escola, local de trabalho e perguntar se há casos de “amigdalite”, além de verificar se nos serviços de emergência e internação apareceram casos com clínica compatível com difteria, pois a instituição da terapêutica específica (SAD e antibiótico), o mais precocemente possível, diminui a letalidade da difteria. 264 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Difteria Roteiro da investigação epidemiológica A ficha de investigação da difteria, preconizada pelo Sinan, contém os elementos essenciais a serem coletados em uma investigação de rotina. Todos os seus campos devem ser criteriosamente preenchidos, mesmo quando a informação for negativa. Outros itens e observações podem ser incluídos, conforme as necessidades e peculiaridades de cada situação. Identificação do paciente Preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica do Sinan relativos aos dados gerais, notificação individual e dados de residência. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmar a suspeita diagnóstica Anotar na ficha de investigação dados dos antecedentes epidemiológicos e dados clínicos: • preencher todos os campos da ficha de investigação de difteria; • observar, com atenção, se o caso notificado enquadra-se na definição de caso de difteria, a fim de evitar a notificação inadequada de casos; • anotar dados do prontuário do paciente, entrevistar a equipe de assistência, o próprio paciente (quando possível) e familiares; • acompanhar a evolução do paciente e o resultado das culturas de Corynebacterium diphtheriae. 6 D Para identificação da área de transmissão • Verificar se no local de residência, de trabalho, na creche, na escola, etc. há indícios de outros casos suspeitos. • Estes procedimentos devem ser feitos mediante entrevista com o paciente, familiares ou responsáveis, bem como com lideranças da comunidade. Para determinação da extensão da área de transmissão Após a identificação do possível local de transmissão, iniciar imediatamente a busca ativa de outros casos, casa a casa, na creche, na escola, no local de trabalho e em unidades de saúde. Investigação de comunicantes Comunicantes são aquelas pessoas que tiveram contato íntimo com o caso suspeito de difteria, estando, portanto, sob o risco de adquirir a doença, quer sejam moradores do mesmo domicílio ou não. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 265 Difteria • A investigação de comunicantes deve ser feita na residência, creche, escola, orfanatos, quartéis e outros locais que possibilitaram o contato íntimo com o caso. • Assim, além dos comunicantes domiciliares, devem ser considerados os colegas da mesma classe, os que usam o mesmo meio de transporte ou aqueles que brincam juntos e/ou utilizam o mesmo quintal. Se o paciente residir em quartéis, orfanatos ou passar a maior parte do tempo em creches ou similares, as outras pessoas do mesmo ambiente devem ser consideradas como comunicantes. Todos os comunicantes de um caso suspeito de difteria deverão ser submetidos a um exame clínico e ficar sob vigilância por um período mínimo de 7 dias. • Comunicante domiciliar – para todos os que compartilham o mesmo domicílio deve-se coletar material de naso e orofaringe e de lesão de pele, bem como iniciar ou completar o esquema vacinal. • Orfanatos e creches – quando o caso passar a maior parte do tempo em instituições, todas as pessoas (outras crianças/trabalhadores) que mantêm maior contato com o mesmo devem ser tratadas como comunicantes domiciliares. • Escolas e pré-escolares – quando o caso passar a maior parte do tempo na escola, todas as pessoas (outras crianças/professores/trabalhadores) que mantêm maior contato com o mesmo caso devem ser tratadas como comunicantes domiciliares. Outros contatos devem ser vacinados conforme o indicado para os comunicantes domiciliares. • Deve-se realizar contatos com a direção visando descobrir faltosos e solicitar comunicação imediata de novos casos nos próximos 15 dias. Orientar o diretor para transmitir aos alunos e pais a necessidade de consultar um médico frente a qualquer sintoma suspeito (febre, placa na garganta, etc.). Na investigação dos comunicantes é indispensável: • preencher os campos da ficha de investigação da difteria referentes aos comunicantes; • coletar material de naso e orofaringe e de lesão de pele dos comunicantes, a fim de realizar cultura de Corynebacterium diphtheriae; • verificar a situação vacinal dos comunicantes, considerando as doses registradas na caderneta de vacinação e, se necessário, iniciar ou atualizar o esquema vacinal com a DTP, DTP+Hib ou dT, de acordo com as orientações a seguir: História vacinal 266 Menores de 7 anos < 1ano > 1 ano 7 anos ou mais Não vacinados Iniciar o esquema com DTP+Hib Iniciar o esquema com DTP Iniciar o esquema com dT Vacinação incompleta Completar o esquema com DTP+Hib Completar o esquema com DTP Completar o esquema com a dT Vacinação completa Aplicar uma dose de DTP como reforço, se esta foi feita há mais de cinco anos Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Aplicar uma dose de dT como reforço, se a última dose foi aplicada há mais de 5 anos Difteria Coleta e remessa de material para exames (Anexo 2) • Deve-se retirar material das lesões existentes (ulcerações, criptas das amígdalas), exsudatos de orofaringe e de nasofaringe, que são as localizações mais comuns, ou de outras lesões cutâneas, conjuntivas, genitália externa, etc., por meio de swab estéril, antes da administração de qualquer terapêutica antimicrobiana. • Deve-se realizar cultura separada do material de nasofaringe ou da via oral e de lesão de pele. • Na coleta do material da orofaringe, não remover a pseudomembrana, pois sua remoção acelera a absorção da toxina e leva a sangramento. • A coleta deve ser efetuada antes da administração de antibióticos, mas deverá ser sempre feita. • É de responsabilidade dos profissionais da vigilância epidemiológica e/ou dos laboratórios centrais ou de referência viabilizar, orientar ou mesmo proceder estas coletas, de acordo com a organização de cada local. 6 Atenção Não se deve aguardar os resultados dos exames para o desencadeamento das medidas de controle e outras atividades da investigação, embora sejam imprescindíveis para a confirmação de casos e nortear o encerramento das investigações. D Análise dos dados A investigação deve permitir a avaliação da magnitude do problema e da adequação das medidas adotadas visando impedir a transmissão da doença, bem como indicar as ações de prevenção que devem ser mantidas a curto e médio prazos na área. Encerramento de casos As fichas de investigação de cada caso devem ser analisadas visando definir o critério utilizado para o diagnóstico, considerando as seguintes alternativas: Critério laboratorial – o isolamento do Corynebacterium diphtheriae com prova de toxigenicidade positiva ou não classifica o caso suspeito como confirmado. Critério epidemiológico – classifica o diagnóstico como caso confirmado: • o vínculo epidemiológico do caso suspeito com outros casos confirmados de difteria pelo critério laboratorial ou clínico; • o vínculo epidemiológico do caso suspeito com comunicante íntimo (sintomático ou não) em que foi isolado o Corynebacterium diphtheriae. Critério clínico – classifica o diagnóstico como caso confirmado quando for observado: • placas comprometendo pilares ou úvula, além das amígdalas; • placas suspeitas na traquéia ou laringe; • simultaneamente, placas em amígdalas, toxemia importante, febre baixa desde o iní- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 267 Difteria cio do quadro e evolução, em geral, arrastada; • miocardite ou paralisia de nervos periféricos, que pode aparecer desde o início dos sintomas sugestivos de difteria ou até semanas após. Critério anatomopatológico – classifica o diagnóstico como caso confirmado quando a necropsia comprovar: • placas comprometendo pilares ou úvula, além das amígdalas; • placas na traquéia e/ou laringe. Morte pós-clínica compatível – classifica o diagnóstico como caso confirmado quando for a óbito paciente em curso de tratamento de amigdalite aguda e no qual se constata miocardite. Descartado – caso suspeito não confirmado por nenhum dos critérios descritos anteriormente. Análise dos dados A análise dos dados obtidos pela vigilância tem como objetivo proporcionar conhecimentos atualizados sobre características epidemiológicas no que diz respeito, principalmente, a distribuição de sua incidência por áreas geográficas e grupos etários, taxas de letalidade, eficiência dos programas de vacinação, bem como a detecção de possíveis falhas operacionais da atividade de controle da doença na área, sendo, portanto, necessárias ações visando a obtenção de dados sobre confirmação do diagnóstico, proporção de casos em vacinados, padrões de distribuição da doença e cobertura vacinal. A consolidação dos dados considerando as características de pessoa, tempo e lugar permitirá uma caracterização detalhada da situação da doença. Instrumentos disponíveis para controle Imunização A vacinação com o toxóide diftérico é a medida de controle mais importante da difteria. O emprego sistemático desta vacina, com altas coberturas vacinais ao longo do tempo, além de diminuir a incidência de casos clínicos determina importante redução do número de portadores, induzindo a chamada “imunidade coletiva”. Os indivíduos adequadamente imunizados neutralizarão a toxina produzida pelo bacilo diftérico, responsável pelas manifestações clínicas da doença. A vacinação normalmente é feita de forma sistemática, com aplicação de rotina do imunobiológico pelos serviços de saúde, ou em forma de campanhas de vacinação ou, ainda, de bloqueio, realizada diante da ocorrência de um caso suspeito da doença. 268 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Difteria Considera-se adequadamente vacinado: • quem recebeu três doses de vacina DTP (contra difteria, tétano e coqueluche) ou DTP+Hib (contra difteria, tétano e coqueluche e infecções graves causadas pelo Haemophilus influenzae) ou DT (dupla infantil), a partir de dois meses de vida, com intervalo de, pelo menos, 30 dias entre as doses (o ideal é o intervalo de dois meses) e com 1º reforço aplicado no prazo de 6 a 12 meses após a 3ª dose e o 2º reforço com 4-6 anos de idade; • quem recebeu três doses da vacina dT (dupla adulto) a partir de 7 anos de idade, com intervalo de, pelo menos, 30 dias entre as doses (o ideal é o intervalo de dois meses). Vacina DTP (contra difteria, tétano e coqueluche) • A eficácia da vacina DTP varia de acordo com o componente, a saber: 80%-90% para difteria; 75%-80% para coqueluche e 100% para tétano. A imunidade conferida pela vacina não é permanente e decresce com o tempo. Daí a necessidade de aplicar uma dose de reforço com a dT a cada dez anos. Em média de 5 a 10 anos após a última dose da vacina, a proteção pode ser pouca ou nenhuma. • Deve ser aplicada por via intramuscular, a partir de dois meses de idade até 6 anos completos. É conservada entre +2ºC e +8ºC, conforme orientação do Programa Nacional de Imunizações (vide Manual de Procedimentos para Vacinação). • Contra-indicações: crianças com quadro neurológico em atividade; reação anafilática após o recebimento de qualquer dose da vacina; história de hipersensibilidade aos componentes da vacina; encefalopatia nos primeiros sete dias após a aplicação de uma dose anterior desse produto ou outro com componente pertussis; convulsões até 72 horas após a administração da vacina; colapso circulatório, com choque ou episódio hipotônico-hiporresponsivo até 48 horas após a administração da vacina (vide Manual de Procedimentos para Vacinação). • Eventos adversos: a maioria dos eventos pós-vacinação com DTP são de caráter benigno e ocorrem nas primeiras 48 horas após a aplicação da vacina. São comuns reações locais (vermelhidão, calor, endurecimento e edema, acompanhados ou não de dor) e sistêmicas (febre, irritabilidade e sonolência, por exemplo). Menos freqüentemente, podem ocorrer reações como choro persistente e inconsolável, episódio hipotônico-hiporresponsivo e convulsão (vide Manual de Vigilância Epidemiológica dos Eventos Adversos Pós-Vacinação). 6 D Vacina tetravalente – DTP+Hib (contra difteria, tétano, coqueluche e infecções graves causadas pelo Haemophilus influenzae) • De acordo com o calendário nacional de vacinação (Portaria MS nº 597, de 8/4/04), é indicada a aplicação de três doses da vacina tetravalente nos menores de um ano de idade. Esta vacina deve ser conservada entre +2ºC e +8ºC, podendo ser utilizada por cinco dias após a reconstituição (vide Nota Técnica Introdução da Vacina Tetravalente). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 269 Difteria • Deve ser aplicada por via intramuscular profunda, na região do vasto lateral; a via subcutânea deve ser utilizada em crianças com trombocitopenia ou distúrbios de sangramento (vide Nota Técnica Introdução da Vacina Tetravalente). • Contra-indicações: reação anafilática grave ao mesmo produto ou qualquer de seus componentes; encefalopatia nos primeiros sete dias após a aplicação de uma dose anterior desse produto ou outro com componente pertussis; convulsões até 72 horas após a administração da vacina; colapso circulatório, com choque ou episódio hipotônico-hiporresponsivo até 48 horas após a administração da vacina; quadro neurológico em atividade (vide Nota Técnica Introdução da Vacina Tetravalente). • Eventos adversos: os sintomas locais mais freqüentes relatados dentro das primeiras 48 horas são dor, eritema, edema e/ou calor e enduração. Os sintomas sistêmicos relatados em igual período desapareceram espontaneamente, dentre os quais febre, perda de apetite, agitação, vômito, choro persistente, mal-estar geral e irritabilidade. Menos freqüentemente, pode ocorrer sonolência, choro prolongado e incontrolável, convulsões e síndrome hipotônica-hiporresponsiva. Relatos de reações alérgicas, incluindo as anafiláticas, são raros (vide Nota Técnica Introdução da Vacina Tetravalente). Vacina DTPa (contra difteria, tétano e coqueluche acelular) • Esta vacina está disponível somente nos Centros de Referência de Imunobiológicos Especiais (Crie) e é indicada para as crianças de 2 meses a 6 anos completos (6 anos, 11 meses e 29 dias) que apresentaram os seguintes eventos adversos após o recebimento de qualquer uma das doses da vacina DTP: convulsão nas primeiras 72 horas ou episódio hipotônico-hiporresponsivo nas primeiras 48 horas (vide Manual de Procedimentos para Vacinação). • Deve ser aplicada por via intramuscular, a partir de dois meses de idade até 6 anos completos. É conservada entre +2ºC e +8ºC, conforme orientação do Programa Nacional de Imunizações (vide Manual de Procedimentos para Vacinação). • Contra-indicações: reação anafilática após o recebimento de qualquer dose da vacina acelular ou celular (DTP); história de hipersensibilidade aos componentes da vacina; ocorrência de encefalopatia nos primeiros sete dias após a administração da vacina acelular ou da celular (DTP) (vide Manual de Procedimentos para Vacinação). • Eventos adversos: os eventos adversos locais e sistêmicos leves das vacinas acelulares são os mesmos das vacinas celulares, porém com menor freqüência e intensidade. Raramente, pode ocorrer febre > 4oºC; convulsões febris, choro com 3 horas ou mais de duração e episódios hipotônico-hiporresponsivos (vide Manual dos Centros de Referência de Imunobiológicos Especiais). Vacina dT (dupla adulto – contra difteria e tétano) • Aplica-se por via intramuscular, a partir de 7 anos completos. É conservada entre +2ºC e +8ºC, conforme orientação do Programa Nacional de Imunizações (vide Manual de Normas e Procedimentos do Programa Nacional de Imunizações). 270 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Difteria Recomendações para vacinação Rotina para menores de 7 anos – o Ministério da Saúde preconiza a administração de três doses da vacina DTP+Hib, a partir de 2 meses de vida, com intervalo de 60 dias entre as doses. Doses subseqüentes da vacina DTP deverão ser aplicadas aos 15 meses (1º reforço) e aos 4-6 anos de idade (2º reforço). Esquema recomendado para as vacinas DTP+Hib e DTP Vacina DTP+Hib DTP Dose Idade Intervalo entre as doses 1ª dose 2 meses 8 semanas 2ª dose 4 meses 8 semanas 3ª dose 6 meses 8 semanas 1º reforço 15 meses 6 a 12 meses após a 3ª dose 2º reforço 4-6 anos 6 Rotina para pessoas com 7 anos ou mais – a vacina dT deve ser administrada a partir de sete anos completos. O esquema preconizado para os que não têm história de vacinação prévia contra a difteria (DTP ou DTPa ou DT ou dT) é a administração de três doses com intervalo de dois meses entre elas (intervalo mínimo de 30 dias) e uma dose de reforço a cada 10 anos. Nas pessoas com vacinação prévia contra a difteria (DTP ou DTPa ou DT ou dT) deve-se completar o esquema, ou seja, considerar as doses (comprovadas) aplicadas anteriormente e nunca reiniciar o esquema (ver Portaria MS nº 597, de 8/4/04). D Casos isolados e surtos – proceder a vacinação seletiva da população susceptível, visando aumentar a cobertura vacinal na área de ocorrência dos casos. Vacinação de bloqueio Logo após a identificação de um caso suspeito de difteria, deve ser feita a visita domiciliar e, de acordo com cada situação, visita à escola, creche, local de trabalho, etc. para vacinação de todos os contatos não vacinados, inadequadamente vacinados ou com estado vacinal desconhecido, de acordo com as seguintes orientações: • administrar uma dose da vacina DTP ou DTP+Hib ou dupla tipo adulto, conforme a idade e estado vacinal, e orientar como completar o esquema de vacinação; • as crianças e adultos com esquema de vacinação em dia só deverão receber uma dose de reforço se a última dose de vacina foi aplicada há mais de 5 anos; • a ocorrência de um surto exige, além da vacinação imediata dos comunicantes com situação vacinal inadequada (medida que procura diminuir o número de susceptíveis), uma investigação da ocorrência e situação vacinal da população sob risco, com conseqüente extensão da vacinação a todos os expostos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 271 Difteria Controle da fonte de infecção Medidas gerais para pacientes hospitalizados Isolamento – recomenda-se isolamento tipo respiratório por gotículas durante 14 dias após a introdução da antibioticoterapia. O ideal é suspender as medidas relativas às precauções respiratórias somente quando duas culturas de secreções obtidas da narina e da faringe, em meios específicos, forem negativas. Quarto privativo – o paciente com difteria deve ser mantido em aposento exclusivo ou compartilhado por mais de um paciente com o mesmo diagnóstico. A porta do quarto deve ser mantida fechada. Lavagem de mãos – deve ser feita antes e após o contato com o paciente após o manuseio de materiais utilizados pelo mesmo e após retirada das luvas e máscara. Uso de máscara – recomenda-se o uso de máscara comum para todos os que entram no quarto. Após o uso, deve ser descartada em recipiente apropriado e o indivíduo deve lavar as mãos. Limpeza e desinfecção – recomenda-se desinfecção concorrente e terminal dos objetos contaminados com as secreções nasofaríngeas. A solução indicada é o hipoclorito de sódio a 1%. Após a desinfecção, os objetos devem ser enxaguados em água corrente. Objetos de metal podem ser desinfetados com álcool etílico a 70%. Vacinação do caso pós-alta Como a difteria nem sempre confere imunidade e a reincidência não é incomum, os doentes serão considerados susceptíveis e, portanto, deverão ser vacinados logo após a alta, conforme orientação a seguir: Esquema recomendado História vacinal Menores de 7 anos < 1ano > 1 ano 7 anos ou mais Não vacinados Iniciar o esquema com DTP+Hib Iniciar o esquema com DTP Iniciar o esquema com dT Vacinação incompleta Completar o esquema com DTP+Hib Completar o esquema com DTP Completar o esquema com a dT Vacinação completa Aplicar uma dose de DTP como reforço Aplicar uma dose de dT como reforço Controle dos comunicantes Vacinação dos comunicantes • Os comunicantes domiciliares e escolares, adultos ou crianças, não vacinados, inadequadamente vacinados ou com situação vacinal desconhecida deverão receber uma dose da vacina DTP (em crianças menores de 7 anos) ou de dT (em crianças com 7 anos ou mais e adultos) e serem orientados como proceder para completar o esquema de vacinação. 272 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Difteria • Nos comunicantes, adultos ou crianças, que receberam há mais de cinco anos o esquema básico ou dose(s) de reforço, deverá ser administrada um dose de reforço de DTP (em crianças menores de 7 anos) ou de dT (em crianças com 7 anos ou mais e adultos). Pesquisa de portadores entre os comunicantes • Coletar material de naso e orofaringe e de lesão de pele dos comunicantes, a fim de realizar cultura de Corynebacterium diphtheriae. Considerando o curto período de incubação da doença (1-6 dias) e visando garantir uma margem de segurança, recomenda-se a coleta de material de pessoas que tiveram contato com o caso (suspeito ou confirmado) nos últimos 10-14 dias. • Comunicantes que trabalhem em profissões que envolvam a manipulação de alimentos, ou contato freqüente com grande número de crianças nos grupos de maior risco ou com pessoas imunodeprimidas. Recomenda-se o afastamento de seus locais de trabalho até que se tenha o resultado da cultura. Se positivo, o afastamento deverá ser de 48 horas após a administração do antibiótico (ver item Quimioprofilaxia dos portadores, no tópico Controle dos portadores). • Os comunicantes com resultado da cultura positivo deverão ser reexaminados para confirmar se são portadores ou caso de difteria, e devem ser tratados ou receber a quimioprofilaxia conforme o parecer do médico que os reexaminou. • Comunicantes não vacinados, inadequadamente vacinados ou com estado vacinal desconhecido, nos quais não se coletou material para realização da cultura, recomenda-se a quimioprofilaxia. • Se por motivos operacionais não for possível coletar material de todos os comunicantes, recomenda-se priorizar: os que têm contato com crianças (professores, atendentes de creche, etc.); pessoas que apresentam diminuição da imunidade; manipuladores de alimentos; pessoas não vacinadas, inadequadamente vacinadas ou com estado vacinal desconhecido. 6 D Atenção Todos os comunicantes susceptíveis deverão ser mantidos em observação durante 7 dias, contados a partir do momento da exposição. O soro antidiftérico não deve ser administrado com finalidade profilática. Controle dos portadores São portadores de difteria aqueles que alojam o Corynebacterium diphtheriae na nasofaringe ou na pele (no caso da difteria cutânea), sem apresentarem sintomatologia. A identificação dos portadores de difteria é extremamente importante para o controle da disseminação da doença, uma vez que esses casos são mais freqüentes do que os de difte- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 273 Difteria ria clínica e responsáveis pela transmissão da maioria dos casos de difteria na comunidade. Para que se diagnostique o estado do portador nos comunicantes de um paciente com difteria é necessário coletar amostras das secreções nasais, de orofaringe e de lesões de pele de todos os comunicantes, para realização do exame laboratorial indicado (cultura). Caso o resultado do exame seja positivo, fica caracterizado o estado de portador, que pode ou não evoluir para difteria. Vacinação dos portadores • Os portadores do Corynebacterium diphtheriae, menores e maiores de 7 anos e adultos não vacinados, inadequadamente vacinados ou com situação vacinal desconhecida deverão receber uma dose da vacina DTP ou DTP+Hib (em crianças menores de 7 anos) ou de dT (em crianças com 7 anos ou mais e adultos) e serem orientados como proceder para completar o esquema de vacinação. • Nos comunicantes, adultos ou crianças, que receberam há mais de 5 anos o esquema básico ou dose(s) de reforço, deverá ser administrada um dose de reforço de DTP (em crianças menores de 7 anos) ou de dT (em crianças com 7 anos ou mais e adultos). Quimioprofilaxia dos portadores Medicamento de escolha – eritromicina, de acordo com a orientação a seguir: • crianças: 40 a 50mg/kg/dia (máxima de 2 gramas/dia), dividida em 4 doses iguais, durante 7 dias, por via oral; • adultos: 500mg, de 6/6 horas, durante 7 dias, por via oral. Medicamento alternativo – penicilina G benzatina Devido às dificuldades operacionais para o uso da eritromicina, em função da dose indicada, tempo de uso e o fato da pessoa não apresentar sintomas, a penicilina G benzatina constitui alternativa para a eritromicina. A penicilina G benzatina deve ser aplicada em unidades de saúde adequadas para atender a ocorrência de um possível choque anafilático. Recomenda-se a aplicação em dose única, por via intramuscular, nos seguintes esquemas: • crianças com menos de 30kg: 600 mil UI; • adultos e crianças com 30 kg ou mais: 1.200 mil UI. Controle do estado de portador – duas semanas depois de completado o esquema com antibiótico, deverá ser colhida nova amostra de secreção da orofaringe para cultura em meios apropriados para Corynebacterium diphtheriae. Se o resultado for positivo, deverá ser feito tratamento adicional com eritromicina, durante dez dias. Se não houver resposta, outros antimicrobianos ativos contra o bacilo diftérico (clindamicina, rifampicina, quinolona, por exemplo) deverão ser utilizados, supondo-se ou confirmando-se ter havido (o que é raro) resistência à eritromicina. 274 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Difteria Atenção É fundamental o desencadeamento de bloqueio vacinal na área de residência, local de trabalho, escola ou creche de ocorrência do caso e/ou de identificação de portadores. Ações de educação em saúde As pessoas devem ser informadas quanto a importância da vacinação como medida de prevenção e controle da difteria. Deve-se dar ênfase a necessidade de administrar o número de doses preconizado pelo calendário vigente. Cabe ressaltar que toda população sob risco deve ser alertada para procurar os serviços de saúde caso observe manifestações clínicas compatíveis com a definição de caso suspeito de difteria. 6 D Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 275 Difteria Anexo 1 Vigilância epidemiológica da difteria Caso suspeito Notificação imediata Coleta de material para cultura Preenchimento da Ficha de Investigação Epidemiológica Vacinação seletiva com DTP ou DTP+HiB, na área de residência, escola, creche, trabalho Investigação imediata Busca ativa de outros casos na área de residência, escola, creche, trabalho Investigação dos comunicantes Coleta de secreção naso e orofaríngea e de lesões de pele Verificar situação dos comunicantes e vacinar, se necessário Realizar quimioprofilaxia dos comunicantes, conforme orientado no Guia 276 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Difteria Anexo 2 Diagnóstico laboratorial da difteria A técnica da cultura para o isolamento do Corynebacterium diphtheriae das lesões existentes é considerada como “padrão-ouro” para o diagnóstico laboratorial da difteria. Em relação à pesquisa da toxigenicidade da cepa, que é de interesse clínico e epidemiológico, a mesma poderá ser feita tanto in vivo quanto in vitro, sendo a prova de Elek o teste mais utilizado. A bacterioscopia não tem valor diagnóstico para a difteria devido a baixa especificidade do método. A visualização do Corynebacterium diphtheriae é dificultada pela presença de diversos agentes próprios da flora natural ou patogênica; além disso, o bacilo diftérico pode apresentar-se com morfologia alterada, dificultando sua caracterização. 6 Coleta de secreção nasofaríngea Material necessário • 2 swabs descartáveis, estéreis (1 para nariz e outro para garganta) • 2 tubos com meio de cultura PAI (1 para nariz e outro para garganta). Na impossibilidade de se utilizar este meio, pode-se utilizar o de Loeffler • 1 abaixador de língua descartável • Óculos • Máscaras descartáveis • Luvas descartáveis • Sacos plásticos • Fita crepe • Etiquetas para identificação dos tubos D Condições para a coleta • Observar as condições do meio de transporte, principalmente sua data de validade. O meio deve ser amarelo claro, com consistência firme e sem áreas liquefeitas ou ressecadas. • Antes de iniciar a coleta, deve-se observar se o algodão que veda os tubos não está molhado e se as demais características dos meios encontram-se adequadas. Contrariamente, os meios devem ser inutilizados. • Os swabs utilizados não deverão apresentar sinais de violação da embalagem, umidade do algodão ou qualquer outra anormalidade que possa indicar contaminação. Verificar, sempre, o prazo de validade na embalagem. Procedimento de coleta • A coleta do material deverá ser realizada na suspeita de caso(s) de difteria. • A coleta deverá ser realizada preferencialmente antes do início do tratamento com Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 277 Difteria antimicrobiano, mas deverá ser sempre feita. • Retirar os meios de transporte da geladeira e deixá-los atingir a temperatura ambiente. • Identificar um tubo como nariz e outro como garganta. • Introduzir um swab na narina do paciente até a nasofaringe e girá-lo. Com o mesmo swab, fazer idêntico procedimento na outra narina • O segundo swab será utilizado para coletar ao redor da superfície da garganta, passando ao redor da mesma, pelas amígdalas e úvula. Caso verifique-se a presença de placa pseudomembranosa, o swab deve ser passado cautelosamente ao redor da mesma, tomando-se o cuidado de não removê-la. A remoção da pseudomembrana leva ao aumento da absorção de toxina. • A coleta em casos suspeitos não deverá ser realizada em domicílio, mas sim no hospital e sob acompanhamento médico. • Uma coleta adequada evita grande número de bactérias da microbiota normal da orofaringe, o que aumenta consideravelmente a positividade do resultado. • O material deve ser semeado imediatamente no meio de transporte. Transporte do material coletado Meio de transporte • O meio de transporte utilizado é o PAI. • O meio PAI deve ser armazenado em geladeira, evitando-se colocá-lo na porta. • O prazo de validade do meio é de 3 meses a partir da data de fabricação. • Os tubos com o meio PAI devem ser acondicionados em sacos plásticos fechados para se evitar a entrada de umidade. • O swab deve ser armazenado em temperatura ambiente, em local seco. Procedimentos para transporte do espécime coletado • Passar o swab em toda a extensão (superfície) do meio, girando-o e fazendo o movimento de zig-zag, a partir da base até o ápice. • Encaminhar o material coletado ao laboratório em temperatura ambiente, imediatamente após a coleta. Na impossibilidade do encaminhamento imediato após a coleta, incubar em temperatura de 37ºC por um período máximo de 24 horas. Encaminhar, em seguida, em temperatura ambiente. • Prender os dois tubos com fita crepe e identificá-los com nome do doente e/ou comunicante, idade, data e hora da coleta. • Encaminhar os tubos com a ficha de encaminhamento de amostra (Anexo 3) ou cópia da ficha de investigação epidemiológica, conforme definição da coordenação estadual da vigilância. 278 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Difteria Recomendações adicionais • Por ser doença de transmissão respiratória, é necessário o uso de máscaras, com vistas a conferir proteção ao profissional que realiza a coleta. A máscara deverá ser utilizada tanto para a coleta de caso(s) suspeito(s) quanto de comunicantes. • Não deverá ser feita nenhuma improvisação do material. É imprescindível que o meio de transporte e swab estejam obedecendo rigorosamente as condições de uso no momento da coleta. • A coleta deverá ser feita com técnica adequada e correta para a obtenção de bons resultados. • Todo material descartável utilizado na coleta deverá ser acondicionado em saco plástico, vedado com fita crepe, identificado como contaminado e recolhido no lixo hospitalar. Quadro resumo Tipo de material Exsudatos de oro e nasofaringe Exsudatos de lesões de pele Época da coleta Tão logo se suspeite de difteria e, preferencialmente, antes da administração de antibióticos Tão logo se suspeite de difteria e, preferencialmente, antes da administração de antibióticos No momento em que se estiver pesquisando portadores 6 Indicação Confirmação do diagnóstico ou pesquisa de portadores Confirmação do diagnóstico ou pesquisa de portadores Coleta e transporte Na coleta de material da nasofaringe, introduzir o swab e girá-lo, retirando-o O material deve ser semeado em meio PAI ou Loeffler de imediato O transporte do material semeado ao laboratório deve ser feito em temperatura ambiente O material deve ser semeado em meio PAI ou Loeffler de imediato. O transporte do material semeado ao laboratório deve ser feito em temperatura ambiente Tipo de exame Cultura para isolamento e identificação do Corynebacterium diphtheriae D Cultura para isolamento e identificação do Corynebacterium diphtheriae Orientações para coleta e transporte de material para diagnóstico da difteria 1. Coleta de secreção de nasofaringe • A coleta do material deverá ser realizada na suspeita de caso(s) de difteria. • A coleta deverá ser realizada preferencialmente antes do início do tratamento com antimicrobiano, mas deverá ser sempre feita. • Retirar os meios de transporte da geladeira e deixá-los atingir a temperatura ambiente. • Identificar um tubo como nariz e outro como garganta. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 279 Difteria • Introduzir um swab na narina do paciente até a nasofaringe e girá-lo. Com o mesmo swab, fazer idêntico procedimento na outra narina. • O segundo swab será utilizado para coletar ao redor da superfície da garganta, passando ao redor da mesma, pelas amígdalas e úvula. Caso verifique-se a presença de placa pseudomembranosa, o swab deve ser passado cautelosamente ao redor da mesma, tornando-se o cuidado de não removê-la. A remoção da pseudomembrana leva ao aumento da absorção de toxina. • O material deve ser semeado imediatamente no meio de transporte. Atenção • Os swabs não devem permanecer dentro dos respectivos tubos. 2. Transporte em meio PAI Coletar das duas narinas e semear no meio PAI, no tubo indicado. Exemplo: Coletar da garganta e semear no meio PAI, no tubo indicado. Exemplo: 3. Identificação dos tubos • Identificar os tubos como nariz e outro como garganta, com dados do paciente, segundo preconizado pela vigilância e laboratório. • Anotar a data e hora da coleta do espécime clínico. 4. Envio do espécime clínico para o laboratório • Os tubos com material coletado deverão ser encaminhados imediatamente ao laboratório, em temperatura ambiente. • Na impossibilidade do encaminhamento imediato, incubar os tubos em estufa a temperatura de 37ºC, por um período máximo de 24 horas, e encaminhá-los, em seguida, em temperatura ambiente. 280 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Difteria Anexo 3 Ficha de encaminhamento de espécime clínico para cultura de Corynebacterium diphtheriae 6 D Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 281 Doença de Chagas DOENÇA DE CHAGAS CID 10: B57 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Doença infecciosa, causada por protozooário flagelado, de curso clínico crônico, que se caracteriza por fase inicial aguda, com sinais ou sintomas quase sempre inespecíficos, quando presentes, e que pode evoluir para a fase crônica, com comprometimento cardíaco (cardiopatia chagásica) ou digestivo (megaesôfago e megacólon). Outras manifestações clínicas são bastante raras, como a meningoencefalite chagásica. Agente etiológico É o Trypanosoma cruzi, protozoário flagelado da ordem Kinetoplastida, família Trypanosamatidae, caracterizado pela presença de um flagelo e uma única mitocondria. No sangue dos vertebrados, o Trypanosoma cruzi se apresenta sob a forma de trypomastigota e, nos tecidos, como amastigotas. Nos invertebrados (insetos vetores) ocorre um ciclo com a transformação dos tripomastigotas sangüíneos em epimastigotas, que depois se diferenciam em trypomastigotas metacíclicos, que são as formas infectantes acumuladas nas fezes do inseto. Reservatório Além do homem, mamíferos domésticos e silvestres têm sido naturalmente encontrados infectados pelo Trypanosoma cruzi, tais como gato, cão, porco doméstico, rato doméstico, macaco de cheiro, sagüi, tatu, gambá, cuíca, morcego, dentre outros. Os mais importantes são aqueles que coabitam ou estão muito próximos do homem, como o cão, o rato, o gambá, o tatu e até mesmo o porco doméstico, encontrado associado com espécies silvestres na Amazônia. As aves e animais de “sangue frio” (lagartos, sapos, outros) são refratários à infecção. Vetores Das mais de 120 espécies conhecidas, 48 foram identificadas no Brasil, das quais 30 já capturadas no ambiente domiciliar. Dessas, cinco têm especial importância na transmissão da doença ao homem. Por ordem de importância: Triatoma infestans, T. brasiliensis, Panstrongylus megistus, T. pseudomaculata e T. sordida. Outros, como T. rubrovaria, no Rio Grande do Sul, e Rhodnius neglectus, em Goiás, com a eliminação do T. infestans, vêm colonizando a habitação e tendem a assumir, também, algum papel na transmissão domiciliar da doença de Chagas. Outras espécies, por razões diversas, devem ser consideradas. Entre essas, deve-se fazer referência ao T. vitticeps, pelas altas taxas de infecção natural (Espírito Santo, Rio Grande do Sul e Minas Gerais), R.nasatus, pela freqüência com que é capturado, 282 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Doença de Chagas em áreas localizadas (CE e RN), e R. prolixus, pelo fato de ser a principal espécie em alguns países (Colômbia, Venezuela) e por ter sido identificado em focos naturais (macaubeiras), no estado do Tocantins. Na Amazônia, as espécies mais importantes são R. pictipes, R. robustus, P. geniculatus, P. lignarius e T. maculata. Ainda, podemos citar R. prolixus nas Guianas e Suriname, R. prolixus, T. dimidiata e R. pallescens na América Central e T. barberi, T. dimidiata e T. phyllosoma no México. Modo de transmissão A transmissão natural, ou primária, da doença de Chagas é a vetorial, que ocorre através das fezes dos triatomíneos, também conhecidos como “barbeiros” ou “chupões”. Esses, ao picar os vertebrados, em geral defecam após o repasto, eliminando formas infectantes de trypomastigotas metacíclicos, presentes em suas fezes, e que penetram pelo orifício da picada ou por solução de continuidade deixada pelo ato de coçar. A eliminação do T. infestans, espécie estritamente domiciliar, e a diminuição da densidade triatomínica domiciliar, por outras espécies de triatomíneos, reduziu significativamente a transmissão vetorial que, na década de 70, se estimava ser responsável por 80% das infecções humanas. A transmissão transfusional ganhou grande importância epidemiológica nas duas últimas décadas, em função da migração de indivíduos infectados para os centros urbanos e da ineficiência no controle das transfusões, nos bancos de sangue. A transmissão congênita ocorre, mas muitos dos conceptos têm morte prematura, não se sabendo, com precisão, qual a influência dessa forma de transmissão na manutenção da endemia. Ocorrem ainda a transmissão acidental em laboratório e a transmissão pelo leite materno, ambas de pouca significância epidemiológica. Sugere-se a hipótese de transmissão, por via oral, em alguns surtos episódicos. Recentemente, foram relatados no Paraná casos da doença de Chagas na forma aguda, conseqüentes à transmissão por via oral após ingestão de caldo de cana contaminado com fezes de barbeiros. 6 D Período de incubação Quando existe sintomatologia, na fase aguda, esta costuma aparecer 5 a 14 dias após a picada do inseto vetor. Quando adquirida por transfusão de sangue, o período de incubação varia de 30 a 40 dias. Em geral, as formas crônicas da doença se manifestam mais de 10 anos após a infecção inicial. Período de transmissibilidade A infecção só passa de pessoa a pessoa através do sangue ou placenta. A maioria dos indivíduos com infecção pelo T. cruzi alberga o parasito nos tecidos e sangue, durante toda a vida, o que significa que devem ser excluídos das doações de sangue e de órgãos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 283 Doença de Chagas Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas A doença de Chagas apresenta distintas formas clínicas, podendo ser classificada da seguinte maneira: Forma aguda Aparente Inaparente Forma crônica Indeterminada Cardíaca • Síndrome de arritmias • Síndrome de insuficiência cardíaca • Síndrome tromboembólica Digestiva • Síndrome de megaesôfago • Síndrome de megacólon Forma mista Outros megas Forma nervosa Forma congênita Dentre estas destacam-se, por sua importância epidemiológica, as formas agudas (indício de transmissão ativa), indeterminadas (mais freqüentes), cardíacas e digestiva (gravidade clínica). Estima-se que as formas agudas aparentes se manifestam em 3% dos casos, em área endêmica; as formas indeterminadas, em 50%; as formas cardíacas, em 30% e as digestivas em 7% a 8%. Fase aguda Quando aparente, corresponde aos fenômenos clínicos que se estabelecem nos primeiros dias ou meses da infecção inicial, sendo diagnosticada pelo encontro do parasito no sangue periférico. É caracterizada por uma miocardite, na maioria das vezes, só traduzível eletrocardiograficamente. As manifestações gerais são de febre (pouco elevada), mal-estar geral, cefaléia, astenia, hiporexia, edema, hipertrofia de linfonodos. Freqüentemente, ocorre hepatoesplenomegalia. Às vezes, agrava-se numa forma meningoencefálica, principalmente nos primeiros meses ou anos de vida. Quando existe porta de entrada aparente, ela pode ser ocular (sinal de Romaña) ou cutânea (chagoma de inoculação). O sinal de Romaña é um edema bipalpebral (que, às 284 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Doença de Chagas vezes, se expande à face), elástico indolor, de início geralmente brusco, coloração róseoviolácea das pálpebras, congestão conjuntival, enfartamento dos linfonodos satélites (préauriculares, parotídeos ou submaxilares) e, com menos freqüência, secreção conjuntival e dacrioadenite. O chagoma de inoculação é uma formação cutânea, ligeiramente saliente, arredondada, eritematosa, dura, incolor, quente e circundada por edema elástico, assemelhando-se a um furúnculo que não supura mas que às vezes pode exulcerar. É acompanhado de linfonodos satélites. As alterações eletrocardiográficas estão na dependência do maior ou menor acometimento do coração, e as principais são: alargamento do espaço PR, alterações primárias de onda T (baixa voltagem, bifasismo ou inversão), extra-sístoles ventriculares. Em casos muito graves: bloqueio intraventricular (BRD) e desnivelamento de S-T com alterações de T. Em geral, as alterações eletrocardiográficas são reversíveis, passada essa fase da doença. Os exames de raios X de tórax pode mostrar imagem cardíaca discretamente aumentada, logo no início do diagnóstico; achado que pode ser observado apenas após alguns dias de doença. 6 Fase crônica Forma indeterminada – passada a fase aguda aparente ou inaparente, o indivíduo alberga uma infecção assintomática que pode nunca se manifestar ou se expressar clinicamente anos ou décadas mais tarde, em uma das formas crônicas. Forma cardíaca – é a mais importante forma de limitação ao doente chagásico e a principal causa de morte. Pode apresentar-se sem sintomatologia, mas com alterações eletrocardiográficas (principalmente bloqueio completo de ramo direito), como uma síndrome de insuficiência cardíaca progressiva, insuficiência cardíaca fulminante ou com arritmias graves e morte súbita. Seus sinais e sintomas são: palpitação, dispnéia, edema, dor precordial, dispnéia paroxística noturna, tosse, tonturas, desmaios, acidentes embólicos, extra-sistolias, desdobramento de segunda bulha, sopro sistólico, hipofonese de segunda bulha. As principais alterações eletrocardiográficas são: bloqueio completo do ramo direito (BCRD), hemibloqueio anterior esquerdo (HBAE), bloqueio AV do primeiro, segundo e terceiro graus, extra-sístoles ventriculares, sobrecarga de cavidades cardíacas, alterações da repolarização ventricular, dentre outras. Os raios X de tórax revelam cardiomegalia global discreta, moderada ou acentuada, aumento isolado do ventrículo esquerdo, aumento biventricular, congestão vascular pulmonar, etc. Forma digestiva – caracteriza-se por alterações ao longo do trato digestivo, ocasionadas por lesões dos plexos nervosos (destruição neuronal simpática), com conseqüentes alterações da motilidade e de morfologia, ao nível do trato digestivo, sendo o megaesôfago e o megacólon as manifestações mais comuns. São sinais e sintomas do megaesôfago: disfagia (sintoma mais freqüente e dominante), regurgitação, epigastralgia ou dor retroesternal, odinofagia (dor à deglutição), soluço, ptialismo (excesso de salivação), emagrecimento (podendo chegar à caquexia), hipertrofia das parótidas. O megacólon se caracteriza por constipação intestinal (instalação lenta e insidiosa), meteorismo, distensão abdominal, fecaloma. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS D 285 Doença de Chagas Os exames radiológicos são importantes no diagnóstico da forma digestiva. No caso do megaesôfago há 4 grupos de alterações que vão desde uma simples dificuldade de seu esvaziamento até as dolicomegaesôfago, que correspondem àqueles com grande volume, alongado, atônico, dobrando-se sobre a cúpula diafragmática, produzindo sombra paracardíaca direita ao simples exame de tórax. O megacólon é classificado em três grupos, de acordo com a capacidade de exoneração do meio de contraste, quando se realiza o enema opaco. Forma mista – o paciente pode ter associação da forma cardíaca com a digestiva e também apresentar mais de um mega. Forma nervosa e de outros megas – apesar de aventadas, não parecem ser manifestações importantes destas infecções. Forma congênita – sobressaem, dentre os sinais clínicos, a hepatomegalia e esplenomegalia, presentes em todos os casos, icterícia, equimoses e convulsões decorrentes da hipoglicemia. Não há relato de ocorrência de febre. Diagnóstico clínico-epidemiológico e/ou laboratorial Diagnóstico diferencial Fase aguda – no que diz respeito às manifestações gerais, deve-se fazer diagnóstico diferencial com a febre tifóide, leishmaniose visceral, esquistossomose mansônica aguda, mononucleose infecciosa e toxoplasmose, dentre outras enfermidades febris. O sinal de Romaña deve ser diferenciado de múltiplas manifestações oculares, a exemplo das conjuntivites, edema de Quincke, celulite orbitária, etc. O chagoma de inoculação pode ser confundido com furunculose. A forma meningoencefálica comporta diagnóstico diferencial com as determinadas por outras etiologias. Fase crônica – a miocardiopatia chagásica tem que ser diferenciada de muitas outras cardiopatias. Os dados epidemiológicos, a idade do paciente, os exames sorológicos, eletrocardiográficos e radiológicos, em geral, permitem a perfeita caracterização dessa entidade clínica. Forma digestiva – diferenciar de megas causados por outras etiologias. Forma congênita – diferenciar da sífilis e da toxoplasmose. Diagnóstico laboratorial Parasitológico – dentre as diversas técnicas, a mais simples é a da microscopia direta sobre gota fresca de sangue, examinada entre lâmina e lamínula, com ocular 10 e objetiva 40. O exame deve ser minucioso e abarcar toda a lamínula, sendo positivo quando se encontra o parasito (geralmente em movimentação serpenteante entre as hemácias e leucócitos) com sua forma alongada, grande cinetoplasto e flagelo muito móvel. Diante da suspeita clínica, se negativo o primeiro exame, deve-se repeti-lo por três ou quatro vezes ao dia, durante vários dias. Também se pode usar a técnica de gota espessa corada, como empregada para malária, mas que é bem menos sensível que o exame a fresco. A propósito, não muito 286 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Doença de Chagas raramente tem ocorrido o diagnóstico ocasional de doença de Chagas aguda (DCA) pelo achado do parasito em esfregaços corados para contagem diferencial de leucócitos e em hemogramas de pacientes febris. Desde os anos 1960, o diagnóstico parasitológico direto da DCA vem sendo aperfeiçoado com procedimentos de enriquecimento, sendo mais empregadas as técnicas de microhematócrito (centrifugação e exame do creme leucocitário) e de Strout (centrifugação do soro após retirada do coágulo). Cabe ainda mencionar que a utilização de técnicas moleculares modernas, como a de PCR, permite detectar com grande sensibilidade e especificidade frações do DNA do parasito. Mesmo podendo ser positivas também na fase crônica, revelam-se úteis como auxílio diagnóstico de DCA – especialmente nos casos congênitos. Métodos imunológicos Hemaglutinação indireta – a interpretação do resultado varia de acordo com o ponto de corte determinado pelo fabricante dos kits. Imunofluorescência indireta (IFI) – o resultado da imunofluorescência indireta é normalmente expresso em diluições são consideradas como positivas reações a partir da diluição de 1:80. Ensaio imunoenzimático (Elisa) – consiste na reação de anticorpos presentes nos soros com antígenos solúveis e purificados de T. cruzi obtidos a partir de cultura in vitro (ou antígenos recombinantes de T. cruzi). Esse antígeno é adsorvido em microplacas e os soros diluídos (controle do teste e das amostras) são adicionados posteriormente. Os anticorpos específicos presentes no soro vão se fixar aos antígenos. A visualização da reação ocorre quando adicionada uma anti-imunoglobulina marcada com a enzima peroxidase, que se ligará aos anticorpos específicos caso estejam presentes, gerando um produto colorido que poderá ser medido por espectrofotometria. O resultado considerado sororreagente é aquele que apresente o valor da densidade ótica igual ou superior ao ponto de corte (Cut-Off) do resultado do controle negativo. As sorologias que detectam IgM (imunofluorescência e hemaglutinação), também são utilizadas para diagnóstico da fase aguda; entretanto, só se deve firmar o diagnóstico de forma aguda com o encontro de parasito no sangue periférico. Na fase crônica, utiliza-se mais freqüentemente os métodos de detecção de anticorpos circulantes (IgG). Dentre os citados, os mais utilizados são o Elisa, a imunofluorescência e a hemaglutinação indireta. Testes moleculares – reação em cadeia de polimerase – PCR (amplificação do DNA do parasita), ainda não disponível na rede de laboratórios de saúde pública, utilizada apenas em situações especiais. 6 D Tratamento Todo indivíduo com infecção chagásica deve ter acesso a um serviço médico capaz de fazer os diagnósticos clínico, laboratorial e epidemiológico e identificar a fase da doença, para definição do tratamento adequado, quando necessário. O manejo clínico do paciente chagásico, particularmente das formas cardíacas, é importante, pois quando bem conduzido e iniciado precocemente pode resultar na elevação da expectativa de sobrevivência. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 287 Doença de Chagas Tratamento específico Objetiva suprimir a parasitemia e, conseqüentemente, seus efeitos patogênicos ao organismo. Esse tratamento está indicado na fase aguda da doença, em casos congênitos, na reativação da parasitemia por imunossupressão (aids e outras doenças imunossupressoras), transplantado que recebeu órgão de doador infectado, quando a supressão da parasitemia ou a prevenção do seu aparecimento tem ação benéfica para os pacientes. Não está indicada para casos crônicos pois os pacientes não se beneficiam clinicamente, visto que nesta fase a parasitemia não tem importância significativa na evolução da doença e, mesmo em altas doses, não se consegue, com segurança, curas parasitológicas. Está contra-indicado para gestantes porque, além de não impedir a infecção congênita, as drogas podem causar danos ao concepto. Esquema terapêutico: benznidazol – 8mg/kg/dia, em duas tomadas diárias, durante 60 dias. Efeitos colaterais: cefaléias, tonturas, anorexia, perda de peso, dermatites, lassidão, depleção das células da série vermelha. Tratamento sintomático Formas cardíacas – o manejo da cardiopatia chagásica exige um conhecimento específico das respostas que as drogas utilizadas na prática cardiológica apresentam neste tipo de doente. Vale ressaltar que o início precoce e o tratamento bem conduzido beneficiam significativamente o prognóstico de muitos pacientes, podendo aumentar a sobrevivência e melhorar a sua qualidade de vida, permitindo o desenvolvimento das atividades habituais desde que não impliquem em grandes esforços físicos. As drogas utilizadas são as mesmas que se usam em outras cardiopatias: cardiotônicos, diuréticos, antiarrítmicos, vasodilatadores, etc. Em alguns casos, indica-se a implantação de marca-passo, com resultados bastante satisfatórios na prevenção da morte súbita. Formas digestivas – dependendo do estágio em que a doença é diagnosticada, indica-se medidas mais conservadoras (uso de dietas, laxativos ou lavagens). Em estágios mais avançados, impõe-se a dilatação ou correção cirúrgica do órgão afetado. Aspectos epidemiológicos A doença de Chagas, primitivamente uma zoonose, passou a constituir problema de patologia humana, ou seja, uma antropozoonose, a partir da domiciliação dos vetores, deslocados de seus ecótopos silvestres originais pela ação do homem sobre o ambiente. A transmissão natural ocorre pela contaminação da pele ou mucosas e pelas fezes dos vetores – insetos hematófagos estritos, da família Triatominae (Hemiptera: Reduviidae), conhecidos genericamente por triatomíneos e, vulgarmente, por barbeiro, chupão, fincão, procotó – com formas infectantes de T. cruzi. Os mecanismos secundários de transmissão são por via transfusional sangüínea, materno-infantil (transplacentária ou por aleitamento), por via oral, transplante de órgãos e transmissão acidental, mais freqüente pela manipu- 288 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Doença de Chagas lação de material contaminado em laboratório. Entre essas outras “possibilidades” de veiculação da doença, tem especial importância epidemiológica a transmissão por transfusão de sangue, que pode levar a doença para áreas sem transmissão natural, inclusive para grandes centros populacionais, e a transmissão congênita, que pode representar o risco mais duradouro de produção de novos casos e de manutenção da endemia chagásica. A distribuição espacial da doença, limitada ao continente americano – por isso é também chamada de tripanosomíase americana – depende da distribuição dos vetores e, além disso, da distribuição da pobreza e das condições por ela geradas, que determinam o convívio do homem com o vetor, no ambiente domiciliar. A casa mal construída, mal acabada ou mal conservada e a desinformação são algumas dessas condições, expressão da precária situação de sobrevivência das populações sob risco. Então, em acréscimo aos determinantes de natureza biológica ou ecológica, aqueles de natureza econômica e social estão na origem da produção da doença de Chagas. 6 Vigilância epidemiológica Objetivos • Manter erradicado o Triatoma infestans e sob controle as outras espécies importantes na transmissão humana. • Investigação epidemiológica de casos agudos, de transmissão vetorial, transfusional ou transplacentária, visando a adoção de medidas de controle adequadas. • Monitoramento da presença do vetor nos domicílios (vigilância entomológica). • Monitoramento da infecção na população humana, através de inquéritos sorológicos periódicos. D Definição de caso Forma aguda Suspeito Todo paciente residente em área caracterizada como provável de estar infestada por triatomíneo e que apresente sinal de Romaña ou chagoma de inoculação. Todo paciente residente em área de transmissão ativa da doença e que apresente febre com mais de uma semana de duração. Todo paciente, com febre, que tenha sido submetido à transfusão de sangue ou hemoderivados sem o devido controle de qualidade. Todo paciente com clínica sugestiva e com exame parasitológico direto negativo ou não realizado. Confirmado Todo caso suspeito com: Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 289 Doença de Chagas • parasitológico direto positivo com ou sem sintomas; • achados necroscópicos positivos. Confirmado de formas crônicas Indeterminada – indivíduo que apresente duas ou mais sorologias positivas, ou xenodiagnóstico positivo, para T. cruzi, sem manifestações clínicas. Cardíaca – indivíduo que apresente duas ou mais sorologias positivas e/ ou xenodiagnóstico positivo para T. cruzi, com manifestações clínicas de miocardiopatia chagásica. Digestiva – indivíduo com duas ou mais sorologias positivas e/ou xenodiagnóstico positivo para T. cruzi, que apresente algum tipo de mega. Mista – indivíduo com duas ou mais sorologias positivas e/ou xenodiagnóstico positivo para T. cruzi, que apresente algum tipo de mega e manifestações de miocardiopatia. Congênita – recém-nascido, filho de mãe chagásica, com hepatoesplenomegalia, parasito no sangue periférico e/ou reações sorológicas que detectam IgM positivas. Notificação Todos os casos agudos, independente da forma de transmissão devem ser notificados e investigados imediatamente, mediante instrumentos do Sinan. As principais fontes de conhecimento de casos são: • laboratórios, através de quaisquer exames hemoscópicos para diagnóstico parasitológico; • serviços de hemoterapia, pelo diagnóstico sorológico na triagem de doadores de sangue; • serviços de assistência médica ambulatorial e hospitalar; • inquéritos sorológicos; • declaração de óbito. No atual estágio avançado de controle alcançado pelo país, a investigação de casos agudos da doença de Chagas, que venham a ser conhecidos, torna-se indispensável para determinar a origem e o mecanismo de transmissão. Sendo o caso resultante de transmissão vetorial, impõe-se uma investigação entomológica que forneça dados sobre a espécie de vetor envolvida e extensão do foco de infestação domiciliar. Uma vez confirmado que a transmissão ocorreu por via transfusional, deve ser identificado o serviço de hemoterapia que forneceu o sangue, com o objetivo de evitar a ocorrência de novos casos. A investigação de surtos, acontecimento raro em doença de Chagas, é impositiva para determinar a fonte comum de infecção, quase sempre alimento contaminado por fezes de triatomíneos. Os casos crônicos não são de notificação compulsória. 290 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Doença de Chagas Primeiras medidas a serem adotadas frente a um caso agudo Assistência médica ao paciente Todo caso suspeito de forma aguda da doença de Chagas deve ser internado, visando instituir tratamento específico. Qualidade da assistência médica A evolução clínica da forma aguda da doença de Chagas é muito variada, podendo ser benigna ou apresentar manifestações de cardiopatia e meningoencefalite, razão pela qual se indica internamento, se possível em hospitais de referência. Por outro lado, o tratamento específico necessita de acompanhamento, devido aos efeitos colaterais e monitoramento da parasitemia. Proteção da população Se a transmissão ocorreu por via transfusional, solicitar à vigilância sanitária inspeção da instituição responsável e adoção das medidas pertinentes. Em caso de transmissão vetorial, realizar imediatamente pesquisa entomológica no domicílio e área de residência do caso, visando a adoção das medidas de controle da população de triatomíneos. 6 D Confirmação diagnóstica A doença de Chagas só é confirmada mediante exame laboratorial, o que impõe que os profissionais dos serviços de vigilância verifiquem se foram providenciados a coleta e o envio de material, conforme detalhado no Anexo I. Como a investigação só está indicada para casos agudos, os exames de eleição são pesquisa de T. cruzi em sangue periférico e sorologia para detecção de IgM. Investigação A inespecificidade dos sinais e sintomas, quando presente, na fase aguda da doença de Chagas faz pouco freqüente a suspeita clínica. Não obstante, para que medidas de controle sejam tomadas com oportunidade, a detecção e investigação de casos agudos pela vigilância epidemiológica são importantes, seja por transmissão vetorial como transfusional, para a adoção de medidas de controle. Roteiro da investigação epidemiológica de doença de Chagas aguda Identificação do paciente Preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica do Sinan, relativos aos dados gerais, notificação individual e dados de residência. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 291 Doença de Chagas Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmação da suspeita diagnóstica Anotar na ficha de investigação os dados da história e manifestações clínicas. Como, em geral, as suspeitas de doença de Chagas aguda se referem a casos com manifestações clínicas e os doentes são hospitalizados, deve-se consultar o prontuário e entrevistar o médico assistente para anotar as informações clínicas sobre o paciente, as quais servirão para definir se o quadro apresentado é compatível com a doença. Sugere-se que se faça cópia da anamnese, exame físico e da evolução do doente, com vistas ao enriquecimento das análises e também para que possam servir como instrumento de aprendizagem dos profissionais do nível local. Acompanhar a evolução dos pacientes e os resultados dos exames laboratoriais específicos. Para identificação da forma de transmissão Relato do paciente, ou familiares, de estadia ou residência em área de provável existência de triatomíneos, ou do indivíduo ser submetido à transfusão de sangue, nos 30 dias que antecederam o início dos sintomas, orienta quanto à suspeita da forma de transmissão. Para identificação e delimitação da área de transmissão, quando se tratar de transmissão vetorial Verificar se o local de residência corresponde a uma área de provável infestação de triatomíneos transmissores da doença. Caso o paciente não resida em área de provável transmissão, verificar seus deslocamentos para caracterizar se houve permanência em local com esta característica. Lembrar que a identificação da área onde se deu a transmissão é de fundamental importância para nortear a continuidade do processo de investigação. Observe-se que, mesmo em áreas onde o Programa de Controle da Doença de Chagas já tenha eliminado o vetor, pode-se ter transmissão eventual pelo aparecimento de triatomíneos que surgem nos domicílios vindos de matas próximas, mesmo que não se encontre indício de colonização no intra ou peridomicílio. Para determinação da extensão da área de transmissão Captura e identificação de triatomíneos: fazer pesquisa de triatomíneos em 100% dos domicílios da área, visando delimitar qual o raio de transmissão ativa. Identificar as espécies e adotar as medidas de rociamento indicadas. Coleta e remessa de material para exames Logo após a suspeita clínica de doença de Chagas, coletar material do caso e de outros suspeitos que forem encontrados durante a busca ativa, encaminhando para exame, de acordo com as normas técnicas apresentadas no Anexo 1. Encaminhar, para exame do conteúdo gastrointestinal, alguns espécimes de triatomíneos capturados. 292 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Doença de Chagas Deve-se aguardar os resultados dos exames para iniciar o tratamento específico do paciente. Só devem ser submetidos à terapêuticos, doentes com diagnóstico confirmado, devido à toxicidade das drogas. Inspeção em unidades de hemoterapia Na suspeita de transmissão transfusional, notificar imediatamente ao órgão de vigilância sanitária e acompanhar os resultados das inspeções e medidas adotadas. Análise de dados e relatório final Em geral, os casos agudos diagnosticados ocorrem de forma isolada e a análise se restringe à conclusão do diagnóstico, tratamento adotado e encerramento do caso. Importante registrar, no relatório, as medidas de controle adotadas tanto pela vigilância epidemiológica como sanitária, quando pertinente. 6 Vigilância entomológica A presença de focos silvestres nos quais o T. cruzi se mantém em circulação, entre animais hospedeiros, veiculada por diversas espécies de triatomíneos, determina a necessidade de uma vigilância entomológica de caráter permanente para se manter a doença de Chagas sob controle. Cabe aqui caracterizar, ao menos, quatro diferentes situações, em função do comportamento das espécies de triatomíneos presentes e da pressão de infestação ou reinfestação existente na área sob vigilância: • presença exclusiva de espécie de triatomíneo, completamente domiciliada; • presença de triatomíneo, estritamente domiciliado, e de espécies nativas, sem conhecida capacidade de invasão de ecótopos artificiais; • presença de triatomíneo, estritamente domiciliado, e de espécies nativas, com conhecida capacidade invasiva de ecótopos artificiais; • presença de espécies nativas, presentes em ecótopos artificiais e naturais. D Além disso, outras variáveis devem ser consideradas: • a existência ou não de localidades próximas com infestação domiciliar; • a densidade das populações silvestres de triatomíneos, de ecótopos naturais existentes, sua proximidade das casas e a relação que com eles tem a população humana; • mudanças que venham a se processar, ou estejam se processando, no ambiente natural, pela ação do homem. O conhecimento e análise de todo esse conjunto de condições vão implicar a definição do tipo e extensão da vigilância a ser exercida. Para uma situação, por exemplo, onde se observa a presença exclusiva de uma espécie de vetor introduzida – T. rubrofasciata, em área urbana –, uma vez eliminado o vetor não há, ao menos teoricamente, qualquer possibilidade de reinfestação das casas e a vigilância Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 293 Doença de Chagas entomológica seria dispensável. Por outro lado, quando presentes espécies nativas com reconhecido potencial de domiciliação, em alta densidade, em grande número de ecótopos silvestres próximos às casas, e com os quais a população mantém estreita relação, a vigilância entomológica deve ser a mais atenta possível. Inquéritos sorológicos Inquéritos sorológicos para determinação da infecção no homem, como parte da vigilância epidemiológica, servem ao monitoramento da situação e ao esclarecimento de questões, ou acontecimentos, em que importa determinar o grau de risco de transmissão, tais como: infestação peridomiciliar, por diferentes espécies de vetor; infestação intradomiciliar residual, com baixa densidade populacional de triatomíneos, e infestação intradomicilar recente, por espécies de vetor de hábitos até então silvestres. Além disso, inquéritos sorológicos podem estar indicados para a detecção de outros casos, a partir do conhecimento de caso agudo ou da infecção em triatomíneos domiciliados. Instrumentos disponíveis para controle Não se dispõe de vacina que permita a proteção de susceptíveis. Não se pode pretender o esgotamento das fontes de infecção desde que as drogas existentes são comprovadamente eficazes apenas nos casos de infecção recente, e também porque são muitos os reservatórios animais de T. cruzi. Então, por limites determinados pela tecnologia disponível, ou por particularidades da própria epidemiologia da doença de Chagas, todo controle da transmissão natural depende da intervenção sobre o vetor; enquanto que a transmissão transfusional, do controle de qualidade do sangue transfundido. Controle vetorial Controle químico – a outra forma é pelo emprego, regular e sistemático, de inseticidas de ação residual nas habitações sabidamente infestadas por triatomíneos. Portanto, faz-se necessária a realização de pesquisa entomológica antes de se iniciar o rociamento das habitações. Os objetivos do controle químico variam de acordo com as espécies e o estágio de domiciliação do vetor. Se a espécie é estritamente domiciliar, o objetivo é sua completa eliminação, como é o caso do T. infestans, cuja proposta hoje é a de eliminá-lo em todos os países que compõem o Cone Sul. No caso do Panstrongylus megistus, T. brasiliensis, T.pseudomaculata, e T. sordida, o controle a ser alcançado é a manutenção dos intradomicílios livres de colônias, visto que a existência de focos silvestres possibilita a reinfestação das habitações. Com relação às outras espécies existentes, o objetivo é prevenir a colonização dos domicílios, através de rigorosa vigilância entomológica. Melhoria ou substituição de habitações – a transmissão vetorial pode ser controlada através da melhoria ou substituição de habitações de má qualidade, que propiciam a domiciliação e permanência dos triatomíneos no habitat humano (casas de pau a pique, de sopa- 294 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Doença de Chagas po, de adobe sem reboco, etc.), por casas de paredes rebocadas, sem frestas, que dificultem a colonização dos vetores. Prioriza-se a melhoria de habitações onde se encontram espécies nativas, presentes, em alta densidade, em ecótopos naturais, em especial o T. brasiliensis e o T.pseudomaculata. Controle biológico – o uso de inibidores do crescimento, feromônios, microrganismos patógenos e esterilização induzida está sendo estudado, mas a utilização sistemática desses métodos ainda não é, até aqui, aplicável na prática. Controle da transmissão transfusional Basicamente, consiste na fiscalização das unidades de hemoterapia, para que se faça o controle de qualidade do sangue a ser transfundido através da triagem sorológica de todos os doadores de sangue com, pelo menos, duas técnicas de alta sensibilidade. Esta triagem deve ser feita não só para a doença de Chagas como para todas as outras doenças transmitidas pelo sangue (aids, sífilis, malária em áreas endêmicas e hepatites virais). Outra forma indicada, mas que não tem tido boa aceitação, por modificar a coloração do sangue, é a de se adicionar violeta de genciana, na concentração de 1:4.000, no sangue, 24 horas antes deste ser transfundido, visto que este produto elimina os parasitos. 6 Controle de outras formas de transmissão D A transmissão em laboratório deve ser prevenida através de rigoroso uso das normas de biossegurança. A transmissão pelo leite materno, apesar de descrita na década de 30, não tem sido diagnosticada e, possivelmente, não tem muito significado epidemiológico. Não existe forma de prevenção da forma congênita. Ações de educação em saúde A prevenção e controle de doenças implica na adoção de medidas efetivas, entre as quais ressaltam as ações educativas. Todo esse processo requer a participação ativa da população, de modo a permitir a apropriação de conhecimentos visando a transformação da realidade sociosanitária. Em relação à doença de Chagas, a população e os serviços de saúde devem participar de discussões sobre formas de prevenção, tratamento e controle, inclusive sobre mecanismos que facilitem o acesso às informações, e o entendimento sobre as relações sociais de convivência, com fatores predisponentes e facilitadores para a instalação de doenças. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 295 Doença de Chagas Anexo 1 Coleta e conservação de material para diagnóstico da doença de Chagas Tipo de diagnóstico Sorológico Tipo de material Sangue Quantidade 5-10ml (mínimo 2 ml de soro) 2 gotas Parasitológico Nº de amostras 1 1 Método Imunofluo rescência Indireta/IFI Hemaglutinação indireta (HAI) ou Elisa Gota espessa ou esfregaço fino Período da coleta Fase aguda (IgM) Fase crônica (IgG, Ig total) Duas lâminas para esfregaço Fase aguda Tubo de vidro ou plástico, sem tampa (melhor se tubo capilar de micromatócrito) Concentração: 1 QBC ou creme leucocitário Tubo de vidro ou de plástico estéril e com tampa (melhor se Ependorf®) Fase aguda Sangue 1-5ml Recipiente Armazenamento/ conservação Transporte Sangue total: 2ºC a 8ºC Gelo seco ou reciclável Soro: -20ºC Nitrogênio líquido Exame a fresco é mais eficiente Para secagem estocar em suporte de madeira Não precisa, pois deve ser feito imediatamente após a coleta Após a secagem, anexar e embrulhar a lâmina junto com o papel identificatório - Observações: 1. O diagnóstico de infecção crônica (IgG) deve ser feito por, no mínimo, duas técnicas de princípios diferentes, na mesma amostra de soro. O diagnóstico sorológico de forma aguda (IgM) pode ser feito por exame único. 2. Nos casos de inquérito sorológico (humanos e de reservatórios), é recomendável o uso de papel-filtro com amostras duplicadas, podendo ser transportadas em dispositivo de madeira para estocar lâminas, sacos plásticos ou envelope de papel. O papel-filtro pode ser estocado em temperatura ambiente com sílica gel e/ou na geladeira no máximo por 60 dias. A sensibilidade depende da técnica empregada e oscila entre 90%-97%. 3. A lâmina pode ser fixada através do calor (flambagem) e corada (pelo método de Giemsa) para caracterização do Trypanossoma. 4. Deve-se deixar coagular o sangue e retrair-se o coágulo. Os flagelados concentram no soro, que pode ser centrifugado para se obter maior concentração. 296 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Esquistossomose Mansônica ESQUISTOSSOMOSE MANSÔNICA CID 10: B65 Características clínicas e epidemiológicas Descrição A esquistossomose mansônica é uma doença infecciosa parasitária, causada por um trematódeo (Schistosoma mansoni) que vive na corrente sangüínea do hospedeiro definitivo, cuja evolução clínica pode variar desde formas assintomáticas até as extremamente graves. A magnitude de sua prevalência e a severidade das formas clínicas complicadas conferem à esquistossomose uma grande transcendência. 6 Agente etiológico O agente etiológico é o Schistosoma mansoni, trematódeo digenético, da família Schistosomatidae, gênero Schistosoma. Reservatório O homem é o principal reservatório. Os roedores selvagens, primatas, marsupiais, são experimentalmente infectados pelo S. mansoni, o camundongo e o hamster são excelentes hospedeiros. No Brasil, foram encontrados naturalmente infectados alguns roedores, marsupiais, carnívoros silvestres e ruminantes. Ainda não está bem definida a participação desses animais na transmissão da doença. E Vetores Hospedeiros intermediários A transmissão da doença, numa região, depende da existência dos hospedeiros intermediários. No Brasil, as três espécies, por ordem de importância, envolvidas na transmissão da doença são: Biomphalaria glabrata, Biomphalaria straminea e Biomphalaria tenagophila. A distribuição conhecida do B. glabrata abrange 16 estados (Alagoas, Bahia, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo e Sergipe) e o Distrito Federal. A B. straminea tem distribuição conhecida mais extensa, estando presente, praticamente, em todas as bacias hidrográficas do território brasileiro. Ocorre em 23 estados (Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo, Santa Catarina, Sergipe e Tocantins) e no Distrito Federal. A B. tenagophila é amplamente encontrada no sul do país, embora possa ser detectada em menor extensão em outras regiões. Hoje, sua distribuição alcança 11 estados (Bahia, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina) e o Distrito Federal. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 297 Esquistossomose Mansônica Modo de transmissão Os ovos do S. mansoni são eliminados pelas fezes do hospedeiro infectado (homem). Na água, estes eclodem, liberando larvas ciliadas denominadas miracídios, que infectam o hospedeiro intermediário (caramujo). Após quatro a seis semanas, abandonam o caramujo, na forma de cercárias que ficam livres nas águas naturais. O contato humano com águas que contêm cercárias, devido a atividades domésticas tais como lavagem de roupas e louças, de lazer, banhos em rios e lagoas; e de atividades profissionais, cultivo de arroz irrigado, alho, juta, etc., é a maneira pela qual o indivíduo adquire a esquistossomose. Período de incubação Em média, de duas a seis semanas após a infecção. Período de transmissibilidade A partir de cinco semanas após a infecção o homem pode excretar ovos viáveis de S. mansoni nas fezes, permanecendo assim durante muitos anos. Os caramujos infectados liberam cercárias durante toda a sua vida, que varia de semanas até três meses. Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade humana é universal. A imunidade absoluta é desconhecida; no entanto, a diminuição da intensidade da infecção e da incidência, observada em idosos residentes em áreas endêmicas, tem sido atribuída ao desenvolvimento de resistência contra o agente. Apesar disso, o desenvolvimento de imunidade, como conseqüência à infecção, ainda não está bem definido. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas Características clínicas A esquistossomose mansônica é uma doença de evolução crônica, de gravidade variada, causada por um verme trematódeo – Schistosoma mansoni – que, no homem, habita os vasos sangüíneos do fígado e intestino. Classificação clínica A maioria das pessoas infectadas pode permanecer assintomática, dependendo da intensidade da infecção; a sintomatologia clínica corresponde ao estágio de desenvolvimento do parasito no hospedeiro. O conhecimento completo da evolução da doença, somado às características epidemiológicas, serve para o estabelecimento de bases para o seu controle. Clinicamente, a esquistossomose pode ser classificada em: 298 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Esquistossomose Mansônica Fase aguda Dermatite cercariana – corresponde à fase de penetração das larvas (cercárias) através da pele. Varia desde quadro assintomático até apresentação de quadro clínico de dermatite urticariforme, com erupção papular, eritema, edema e prurido, podendo durar até 5 dias após a infecção. Esquistossomose aguda ou febre de Katayama – após três a sete semanas de exposição pode aparecer quadro caracterizado por alterações gerais que compreendem: febre, anorexia, dor abdominal e cefaléia. Com menor freqüência, o paciente pode referir diarréia, náuseas, vômitos e tosse seca. Ao exame físico, pode ser encontrado hepatoesplenomegalia. Laboratorialmente, o achado da eosinofilia elevada é bastante sugestivo, quando associado a dados epidemiológicos. Fase crônica Esquistossomose crônica – inicia-se a partir dos 6 meses após a infecção, podendo durar vários anos. Nela, podem surgir os sinais de progressão da doença para diversos órgãos, podendo atingir graus extremos de severidade, como hipertensão pulmonar e portal, ascite, ruptura de varizes do esôfago. As manifestações clínicas variam, dependendo da localização e intensidade do parasitismo, da capacidade de resposta do indivíduo ou do tratamento instituído. Apresenta-se por qualquer das seguintes formas: Tipo I ou forma intestinal – caracteriza-se por diarréias repetidas que podem ser mucossangüinolentas, com dor ou desconforto abdominal. Porém, pode apresentar-se assintomática; Tipo II ou forma hepatointestinal – caracteriza-se pela presença de diarréias e epigastralgia. Ao exame físico, o paciente apresenta hepatomegalia, podendo-se notar, à palpação, nodulações que nas fases mais avançadas dessa forma clínica, correspondem a áreas de fibrose decorrentes de granulomatose periportal ou fibrose de Symmers; Tipo III ou forma hepatoesplênica compensada – caracteriza-se pela presença de hepatoesplenomegalia. As lesões perivasculares intra-hepáticas são em quantidade suficiente para gerar transtornos na circulação portal, com certo grau de hipertensão que provoca congestão passiva do baço. Nessa fase, inicia-se a formação de circulação colateral e de varizes do esôfago, com o comprometimento do estado geral do paciente; Tipo IV ou forma hepatoesplênica descompensada – inclui as formas mais graves de esquistossomose mansônica, responsáveis pelo obituário por essa causa específica. Caracteriza-se por fígado volumoso ou já contraído pela fibrose perivascular, esplenomegalia avantajada, ascite, circulação colateral, varizes do esôfago, hematêmese, anemia acentuada, desnutrição e quadro de hiperesplenismo. 6 E Podem ser consideradas, ainda, como formas particulares, as formas pulmonar e cardiopulmonar, verificadas em estágios avançados da doença. Predomina uma arteriolite obstrutiva que ocasiona cor pulmonale crônica, insuficiência cardíaca direta e perturbações respiratórias severas. Dentre as formas ectópicas a mais grave é a neuroesquistossomose (mielorradiculite esquistosssomótica), cuja prevalência nas áreas endêmicas tem sido su- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 299 Esquistossomose Mansônica bestimada. O diagnóstico é difícil, mas a suspeita clínica e epidemiólogica conduz, com segurança, ao diagnóstico presuntivo. O seu diagnóstico e a terapêutica precoce previnem a evolução para quadros incapacitantes e óbitos. Complicações – a principal complicação da esquistossomose mansônica é a hipertensão portal nos casos avançados, que se caracteriza por hemorragias, ascites, edemas e insuficiência hepática severa. Estes casos, a despeito do tratamento, quase sempre evoluem para óbito. Diagnóstico diferencial A esquistossomose pode ser confundida com diversas doenças, em função das diferentes manifestações que ocorrem durante sua evolução. Dermatite cercariana – seu quadro clínico pode ser confundido com manifestações exantemáticas como sarampo, rubéola, escarlatina e dermatites causadas por outros tipos de cercárias de aves aquáticas. Esquistossomose aguda ou toxêmica – o diagnóstico diferencial deve ser feito com outras doenças infecciosas agudas, tais como febre tifóide, malária, hepatite viral anictérica, estrongiloidíase, amebíase, mononucleose, tuberculose miliar e ancilostomose aguda. Esquistossomose crônica – nessa fase, a doença pode ser confundida com amebíase, estrongiloidíase, giardiase e demais parasitoses, além de outras afecções que cursam com hepatoesplenomegalia, tais como calazar, leucemia, linfoma, salmonelose prolongada, esplenomegalia tropical e cirroses. Para se chegar ao diagnóstico da esquistossomose são muito importantes não somente os resultados laboratoriais mas também os dados epidemiológicos, como história de banhos em águas com caramujos e procedência do doente. A esquistossomose aguda, por exemplo, é mais freqüente em pessoas que não vivem em áreas endêmicas. Diagnóstico laboratorial O diagnóstico é feito mediante a realização do exame parasitológico de fezes, preferencialmente através do método Kato-Katz. Este método permite a visualização e contagem dos ovos por grama de fezes, fornecendo um indicador seguro para se avaliar a intensidade da infecção e a eficácia do tratamento. O teste da reação em cadeia da polimerase (PCRPolymerase Chain Reaction) e os testes sorológicos possuem sensibilidade ou especificidade suficiente e seriam úteis principalmente em áreas de baixa prevalência da doença, ou em pacientes com baixa parasitemia e/ou imunodeprimidos, a exemplo da aids, mas não estão disponíveis na rotina. A ultra-sonografia hepática é de auxílio no diagnóstico da fibrose de Symmers. A biópsia retal ou hepática, apesar de não indicada para utilização na rotina, pode ser útil em casos suspeitos, na presença de exame parasitológico de fezes negativo. 300 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Esquistossomose Mansônica Tratamento A importância do tratamento reside não só no fato de curar a doença ou diminuir a carga parasitária dos pacientes, bem como impedir sua evolução para formas graves. Existem trabalhos demonstrando que a quimioterapia também reduz a hepatoesplenomegalia previamente instalada. Todo caso confirmado deve ser tratado, a não ser que haja contraindicação médica. Nas áreas de baixa prevalência com transmissão focal e nas áreas indenes está indicada a verificação de cura no 4° mês ao término do tratamento, com três amostras colhidas em dias sucessivos. Em caso de persistência da positividade do exame, o tratamento deve ser repetido. Existem duas drogas disponíveis para o tratamento da esquistossomose mansônica: oxamniquine e praziquantel. Os dois medicamentos se equivalem quanto à eficácia e segurança. Atualmente, o praziquantel é a droga de escolha, em função do menor custo/tratamento. A dosagem recomendada para o praziquantel é de 60mg/kg para crianças até 15 anos e 50mg/kg para adultos, ambos em dose única. O medicamento é apresentado em comprimidos de 600mg, divisível em duas partes iguais, de modo a facilitar a adequação da dose. O oxamniquine é recomendado na dosagem de 15mg/kg para adultos e 20mg/kg para crianças até 15 anos, ambos em dose única. Existem duas apresentações: cápsulas de 250mg e suspensão contendo 50mg por cada ml. 6 Efeitos colaterais – tonturas, náuseas, vômitos, cefaléia, sonolência. Esses efeitos são comuns aos dois medicamentos, sendo a tontura mais freqüente com oxamniquine e náuseas e vômitos com praziquantel. E Contra-indicações – nos seguintes casos é contra-indicada a utilização das drogas que compõem o arsenal terapêutico antiesquistossomótico: • durante a gestação; • durante a fase de amamentação (se o risco/benefício compensar o tratamento da mulher nutriz, esta só deve amamentar a criança 24 horas após a administração da medicação); • criança menor de 2 anos (não deve ser tratada devido à imaturidade hepática); • desnutrição ou anemia acentuada; • infecções agudas ou crônicas intercorrentes; • insuficiência hepática grave (fase descompensada da forma hepatoesplênica); • insuficiência renal ou cardíaca descompensada; • estados de hipersensibilidade e doenças do colágeno; • história de epilepsia (convulsão) ou de doença mental (com uso de medicamentos anticonvulsivantes ou neurolépticos); • qualquer doença associada que seja mais grave ou incapacitante do que a própria esquistossomose; • adulto com mais de 70 anos (somente se na avaliação médica o risco/benefício compensar o tratamento). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 301 Esquistossomose Mansônica Aspectos epidemiológicos A esquistossomose mansônica é uma endemia mundial, ocorrendo em 52 países e territórios, principalmente na América do Sul, Caribe, África e Leste do Mediterrâneo, onde atinge as regiões do Delta do Nilo, além de países como Egito e Sudão. No Brasil, a transmissão ocorre em 19 estados, numa faixa contínua ao longo do litoral, desde o Rio Grande do Norte até a Bahia, na região Nordeste, alcançando o interior do Espírito Santo e Minas Gerais, no Sudeste. De forma localizada, está presente nos estados do Ceará, Piauí e Maranhão, no Nordeste; Pará, na região Norte; Goiás e Distrito Federal, no Centro-Oeste; São Paulo e Rio de Janeiro, no Sudeste; Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, na região Sul. Atualmente, as prevalências mais elevadas são encontradas nos estados de Alagoas, Pernambuco, Sergipe, Minas Gerais, Bahia, Paraíba e Espírito Santo. Os estados indenes sofrem fluxo migratório de pessoas oriundas de áreas endêmicas; em conseqüência, devem estruturar um sistema de vigilância epidemiológica e malacológica para evitar a introdução da doença. Figura 1. Áreas endêmicas e focais da esquistossomose mansônica. Brasil, 2004 Faixa de prevalência (%) por município > 15 5-15 <5 não-endêmico Fonte: GT-Esquistossomose/CDTV/CGDT/SVS/MS 302 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Esquistossomose Mansônica Vigilância epidemiológica Objetivos Evitar a ocorrência de formas graves e óbitos; reduzir a prevalência da infecção e impedir a expansão geográfica da endemia. A fim de se evitar a instalação de focos urbanos, é importante manter a vigilância ativa nas periferias das áreas urbanas, em virtude do grande fluxo migratório para as cidades. Definição de caso Suspeito Todo indivíduo residente e/ou procedente de área endêmica para esquistossomose, com quadro clínico sugestivo das formas agudas, crônicas, ectópicas ou assintomático com história de contato com as coleções de águas onde existe o caramujo eliminando cercárias. Todo suspeito deve ser submetido a exame parasitológico de fezes. 6 Confirmado Critério clínico-laboratorial – todo indivíduo residente e/ou procedente de área endêmica para esquistossomose, com quadro clínico compatível, com história de exposição a águas onde existe o caramujo eliminando cercárias e que apresente ovos viáveis de S. mansoni nas fezes. A realização de biópsia retal ou hepática, quando indicada, pode auxiliar na confirmação diagnóstica, embora seja mais indicado, na rotina, a repetição de vários exames de fezes. Todo caso confirmado deve ser tratado, a não ser que haja contra-indicação médica. E Descartado Caso suspeito ou notificado sem confirmação laboratorial. Notificação É doença de notificação compulsória nas áreas não-endêmicas conforme a Portaria MS/GM nº 2.325, de 8/12/03. Entretanto, é recomendável que sejam notificadas todas as formas graves na área endêmica e todos os casos de esquistossomose diagnosticados na área endêmica com focos isolados (Pará, Piauí, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Goiás, Distrito Federal e Rio Grande do Sul). Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente Tratamento ambulatorial e acompanhamento de cura (três exames de fezes em dias sucessivos no quarto mês após o tratamento). A internação hospitalar é indicada nas formas clínicas graves. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 303 Esquistossomose Mansônica Qualidade da assistência Verificar se os casos com confirmação laboratorial (coproscopia positiva para S. mansoni) foram investigados, tratados e acompanhados; e se foram orientadas e adotadas as medidas de educação em saúde e de proteção ambiental (saneamento básico). Proteção individual para evitar a propagação da transmissão Tratamento de todas as pessoas infectadas ou reinfectadas positivas para S. mansoni ao exame laboratorial. Confirmação diagnóstica Laboratorial (presença de ovos de S. mansoni nas fezes). Proteção da população Busca ativa periódica, sistemática e prolongada de casos, investigação e exames dos contatos para detecção da(s) fonte(s) de infecção, adoção de medidas de educação em saúde e ambiental comunitária. Investigação Consiste na obtenção detalhada de dados do caso, mediante o preenchimento da ficha de investigação de caso, com o objetivo, principalmente, de determinar o local ou locais de risco e onde possivelmente ocorreu a transmissão do caso, visando o direcionamento das ações e controle. A investigação deve ser realizada em todos os casos notificados nas áreas indenes vulneráveis e nas áreas focais em vias de eliminação; nas áreas endêmicas, somente nos casos de forma grave notificados. Uma vez concluída a investigação, o caso deverá ser classificado como autóctone se a transmissão ocorreu no mesmo município onde foi investigado; importado, se a transmissão ocorreu em outro município diferente daquele em que foi investigado; e indeterminado se o local da transmissão é inconclusivo ou descartado se caso suspeito ou notificado não tiver confirmação laboratorial. Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente Preencher todos os campos dos itens da ficha de investigação epidemiológica do Sinan relativos aos dados gerais, notificação individual e dados de residência. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmar a suspeita diagnóstica – anotar, na ficha de investigação, dados da história e manifestações clínicas. Para identificação da área de transmissão – verificar o local de procedência do doente, efetuar exame coproscópico dos conviventes e pesquisa malacológica, com identificação dos caramujos nas coleções hídricas existentes. Para determinação da extensão da área de transmissão – observar as condições lo- 304 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Esquistossomose Mansônica cais que favorecem a instalação de focos de transmissão da doença, quais sejam: a distribuição geográfica dos caramujos hospedeiros intermediários (B. glabrata, B. straminea e B. tenagophila); os movimentos migratórios de caráter transitório ou permanente de pessoas oriundas das áreas endêmicas. Tanto em áreas rurais quanto urbanas a investigação deve ser conduzida para identificar os locais de transmissão visando à eliminação. Conduta frente a um surto – a ocorrência de surtos de esquistossomose é rara e, geralmente, só acontece quando um grupo (escolares, recrutas, turistas, etc.) residente em área indene viaja para área endêmica e, inadvertidamente, entra em contato com coleções hídricas contaminadas com cercárias e desenvolve a forma aguda da doença. Nestes casos, todo o grupo deve ser examinado parasitologicamente, investigado e os casos positivos tratados e acompanhados para verificação de cura. Análise de dados Os dados coletados pela vigilância epidemiológica deverão ser analisados quanto ao desempenho das medidas de vigilância e controle, permitindo acompanhar a evolução de tendência da doença. A análise deverá levar em consideração, entre outras, as seguintes variáveis: faixa etária, sexo, distribuição geográfica, número de ovos por grama de fezes, etc. 6 Encerramento de casos Confirmado por critério laboratorial – qualquer caso suspeito que apresenta ovos de S. mansoni nas fezes. Óbitos – não tendo sido feito exame parasitológico de fezes, considerar caso confirmado aquele com achado de ovos de S. mansoni no exame histopatológico. Caso descartado – caso notificado mas cujo resultado laboratorial não foi confirmado ou teve como diagnóstico outra doença. E Instrumentos disponíveis para controle Controle de hospedeiros intermediários As ações dirigidas aos hospedeiros intermediários, abaixo listadas, são de natureza complementar e têm indicação nas seguintes situações: levantamento de áreas ainda não trabalhadas; investigação e controle de focos; e áreas bem delimitadas de altas prevalências. • Pesquisa de coleções hídricas, para determinação do seu potencial de transmissão. • Medidas de saneamento ambiental, para dificultar a proliferação e o desenvolvimento dos hospedeiros intermediários, bem como impedir que o homem infectado contamine as coleções de águas com ovos de S. mansoni; • Tratamento químico de criadouros de importância epidemiológica; • Controle biológico dos moluscos com espécies competidoras. Esta medida, embora desejável, na prática ainda não tem se mostrado eficaz. Nota: estas ações devem ser realizadas em parceria com os órgãos e com participação da comunidade. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 305 Esquistossomose Mansônica Ações de educação em saúde A educação em saúde deve preceder e acompanhar todas as atividades de controle e ser baseada em estudos dos comportamentos das populações em risco. A orientação da população, quanto às maneiras pelas quais se previne as doenças transmissíveis, é fator indispensável para o sucesso de qualquer campanha profilática. Realizada pelos agentes de saúde e por profissionais das unidades básicas, tem como público-alvo a população geral e escolares das localidades localizadas nas áreas endêmicas. Para tanto, utiliza várias técnicas pedagógicas e meios de comunicação de massa. As ações de educação em saúde e a mobilização comunitária são muito importantes no controle da esquistossomose, basicamente para promover atitudes e práticas que modificam as condições favorecedoras e mantenedoras da transmissão. Estratégias de prevenção A esquistossomose é, fundamentalmente, uma doença resultante da ausência ou precariedade de saneamento básico. Controle dos portadores • Identificação dos portadores de S. mansoni, por meio de inquéritos coproscópicos a cada dois anos, deve fazer parte da programação de trabalho das secretarias municipais de saúde das áreas endêmicas. • Quimioterapia específica dos portadores, visando reduzir a carga parasitária e impedir o aparecimento de formas graves. Para o diagnóstico e tratamento dos portadores faz-se necessária a participação das equipes do Programa Saúde da Família (PSF), que devem atuar em conjunto com os agentes de saúde encarregados do Programa de Controle da Esquistossomose, por exemplo, no tratamento dos portadores e nas orientações sobre educação em saúde para as pessoas expostas ao risco de contrair esquistossomose. A coproscopia para a detecção dos indivíduos infectados pelo S. mansoni e o conseqüente tratamento são medidas dirigidas de maneira direta e mais imediata ao objetivo principal do Programa: controlar a morbidade, especialmente prevenindo a evolução para as formas graves da doença. Essas ações de diagnóstico e tratamento devem ser viabilizadas, incorporadas e integradas à rotina dos serviços de atenção primária à saúde (rede básica de saúde). Saneamento ambiental As ações de saneamento ambiental são reconhecidas como as de maior eficácia para as modificações de caráter permanente das condições de transmissão da esquistossomose e incluem: coleta e tratamento de dejetos, abastecimento de água potável, instalações hidráulicas e sanitárias, aterros para eliminação de coleções hídricas que sejam criadouros de moluscos, drenagens, limpeza e retificação de margens de córregos e canais, construções de pequenas pontes, etc. Essas ações deverão ser simplificadas e de baixo custo, a fim de serem realizadas em todas as áreas necessárias. 306 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Amarela FEBRE AMARELA CID 10: A95 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Doença infecciosa febril aguda, transmitida por vetores, que possui dois ciclos epidemiológicos distintos (silvestre e urbano). Reveste-se da maior importância epidemiológica, por sua gravidade clínica e elevado potencial de disseminação em áreas urbanas. Agente etiológico Vírus RNA. Vírus da febre amarela, arbovírus pertencente ao gênero Flavivirus, família Flaviviridae. 6 Hospedeiros Na febre amarela urbana (FAU) o homem é o único hospedeiro com importância epidemiológica. Na febre amarela silvestre (FAS) os primatas não-humanos (macacos) são os principais hospedeiros do vírus amarílico, sendo o homem um hospedeiro acidental. F Vetores reservatórios O mosquito da espécie Aedes aegypti é o principal transmissor da febre amarela urbana. Na febre amarela silvestre, os transmissores são mosquitos, com hábitos estritamente silvestres, sendo os dos gêneros Haemagogus e Sabethes os mais importantes na América Latina. No Brasil, a espécie Haemagogus janthinomys é a que se destaca na transmissão do vírus. Devido a persistência do vírus em seu organismo por tempo mais longo do que nos macacos, os mosquitos seriam os verdadeiros reservatórios, além de vetores. Modo de transmissão Picada dos mosquitos transmissores infectados. Não há transmissão de pessoa a pessoa. Período de incubação Três a seis dias após a picada do mosquito infectado. Período de transmissibilidade A viremia humana dura, no máximo, sete dias, e vai desde 24-48 horas antes do aparecimento dos sintomas a três a cinco dias após o início da doença, período em que o homem pode infectar os mosquitos transmissores. Uma vez infectado, o mosquito pode transmitir o vírus amarílico durante toda a sua vida. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 307 Febre Amarela Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade é universal. A infecção confere imunidade permanente. Nas zonas endêmicas, são comuns as infecções leves e inaparentes. Os filhos de mães imunes podem apresentar imunidade passiva e transitória durante seis meses. A imunidade conferida pela vacina dura em torno de 10 anos. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas O quadro clínico típico é caracterizado por manifestações de insuficiência hepática e renal, tendo em geral apresentação bifásica, com um período inicial prodrômico (infecção) e um toxêmico que surge após uma aparente remissão e, em muitos casos, evolui para óbito em aproximadamente uma semana. Período de infecção – dura cerca de três dias, tem início súbito e sintomas gerais como febre, calafrios, cefalalgia, lombalgia, mialgias generalizadas, prostração, náuseas e vômitos. Remissão – caracteriza-se pelo declínio da temperatura e diminuição dos sintomas, provocando uma sensação de melhora no paciente. Dura poucas horas, no máximo um a dois dias. Período toxêmico – reaparecem a febre, a diarréia e os vômitos com aspecto de borra de café. Caracteriza-se pela instalação de quadro de insuficiência hepato-renal representado por icterícia, oligúria, anúria e albuminúria, acompanhado de manifestações hemorrágicas (gengivorragias, epistaxes, otorragias, hematêmese, melena, hematúria, sangramentos em locais de punção venosa) e prostração intensa, além de comprometimento do sensório, com obnubilação mental e torpor, com evolução para coma e morte. O pulso torna-se mais lento, apesar da temperatura elevada. Essa dissociação pulso-temperatura é conhecida como sinal de Faget. Diagnóstico diferencial As formas leve e moderada da febre amarela são de difícil diagnóstico diferencial pois podem ser confundidas com outras doenças infecciosas que atingem os sistemas respiratório, digestivo e urinário. As formas graves, com quadro clínico clássico ou fulminante, devem ser diferenciadas de malária por Plasmodium falciparum, leptospirose, além de formas fulminantes de hepatites. Devem ser lembradas, ainda, as febres hemorrágicas de etiologia viral, como dengue hemorrágico e septicemias. Diagnóstico laboratorial Realizado mediante isolamento do vírus amarílico em amostras de sangue ou de tecido hepático, por detecção de antígeno em tecido (imunofluorescência e imunoperoxidase) e por sorologia (ver normas e procedimentos no Anexo 1). 308 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Amarela Tratamento Não existe tratamento específico. É apenas sintomático, com cuidadosa assistência ao paciente que, sob hospitalização, deve permanecer em repouso, com reposição de líquidos e das perdas sangüíneas, quando indicado. Nas formas graves, o paciente deve ser atendido numa unidade de terapia intensiva, o que reduz as complicações e a letalidade. Aspectos epidemiológicos A febre amarela apresenta dois ciclos epidemiologicamente distintos: febre amarela silvestre (FAS) e febre amarela urbana (FAU). A forma silvestre é endêmica nas regiões tropicais da África e das Américas. Em geral, apresenta-se sob a forma de surtos com intervalos de 5 a 7 anos, alternados por períodos com menor número de registros. Na população humana, o aparecimento de casos é precedido de epizootias. No Brasil, a partir do desaparecimento da forma urbana em 1942, só há ocorrência de casos de febre amarela silvestre e até 1999 os focos endêmicos estavam situados nos estados das regiões Norte, Centro-Oeste e área pré-amazônica do Maranhão, além de registros esporádicos na parte oeste de Minas Gerais. Nos surtos ocorridos no período de 2000/2003, observou-se uma expansão da circulação viral no sentido Leste e Sul do país, detectando-se sua presença em áreas silenciosas há várias décadas, o que impôs uma redefinição das áreas de risco. Além da ampliação da área de transição foi estabelecida uma nova área, denominada de indene de risco potencial, onde há maior risco para circulação do vírus, contígua à área de transição e com ecossistemas semelhantes, compreendendo municípios do sul de Minas Gerais e da Bahia e a região centro-norte do Espírito Santo (Figura 1). O número anual de notificações de FAS é muito variável. No período entre 1980 e 2003, foram diagnosticados 657 casos, dos quais 337 evoluíram para óbito (Figura 2), o que corresponde a uma letalidade média de 51,3%, com uma variação de 22,9% a 100%. Todas as unidades federadas da região Norte vêm registrando casos, sendo responsáveis por 39,9% das notificações do país, nas duas últimas décadas. Esta doença acomete com maior freqüência o sexo masculino e a faixa etária mais atingida situa-se acima dos 15 anos, em função da maior exposição profissional, relacionada à penetração em zonas silvestres da área endêmica de FAS. Um outro grupo de risco são as pessoas não vacinadas que residem próximas aos ambientes silvestres, onde circula o vírus, além de turistas e migrantes que adentram estes ambientes. A maior freqüência da doença ocorre nos meses de janeiro a abril, período com maior índice pluviométrico, quando a densidade vetorial é elevada, coincidindo com a época de maior atividade agrícola. A febre amarela urbana não ocorre no país desde 1942. Enquanto o Aedes aegypti encontrava-se erradicado, havia uma relativa segurança quanto à não possibilidade de reurbanização do vírus amarílico. Entretanto, a reinfestação de extensas áreas do nosso território por este vetor, inclusive já presente em muitos dos centros urbanos das áreas endêmicas, epizoóticas e enzoóticas, coloca a população brasileira sob o risco de reestabelecer este ciclo Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 6 F 309 Febre Amarela do vírus. Recentemente, o diagnóstico de casos infectados em área de transmissão próxima ao Distrito Federal, demandou a execução de ampla campanha vacinal em função da presença de Aedes aegypti em centros urbanos do DF, inclusive da capital federal. Considera-se como potenciais fatores de risco para a reurbanização da febre amarela no Brasil: • expansão territorial da infestação do Aedes aegypti já detectada em 3.794 municípios, distribuídos por todas as unidades federadas; • áreas com Aedes aegypti superpostas a áreas de circulação do vírus amarílico; • presença do Aedes albopictus em estados das regiões endêmicas e de transição; • áreas urbanas infestadas por Aedes aegypti próximas de áreas endêmicas para febre amarela silvestre; • intenso processo migratório rural-urbano, levando à possibilidade de importação do vírus amarílico dos ambientes silvestres para os urbanos. Figura 1. Áreas de risco de febre amarela silvestre. Brasil, 2003* Áreas Área endêmica Área de transição Área indene Área de risco potencial Estados População 12 29.327.171 hab. parcialmente 7 22.347.837 hab. 8 e parcialmente 7 109.660.162 hab. parcialmente 3 4.777.348 hab. *Redefinidas a partir de estudo realizado em 2003 310 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Amarela Figura 2. Número de casos e de óbitos e taxa de letalidade de febre amarela silvestre. Brasil, 1982-2003 100 Nº de casos Taxa de letalidade (%) 100 80 80 60 60 40 40 20 20 0 0 82 Taxa 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 6 03 87,5 100 62,2 71,4 88,9 87,5 53,9 33,3 50 53,3 58,3 22,9 27,8 50 86,7 100 44,1 37,3 47,1 46,9 40 35,9 Óbito 21 6 28 5 8 14 14 3 1 8 7 19 6 2 13 3 15 28 40 15 6 23 Cura 3 0 17 2 1 2 12 6 1 7 5 64 13 2 2 0 19 47 45 32 9 40 Fonte: SVS/MS Vigilância epidemiológica F Objetivos Reduzir a incidência da febre amarela silvestre e impedir a transmissão urbana mediante a detecção precoce da circulação viral e adoção das medidas de controle pertinentes. A doença é de notificação e investigação obrigatória, cuja finalidade é identificar a área de transmissão e confirmar se o caso é de FAU ou FAS, visando definir as populações sob risco para prevenir a ocorrência de novos casos. Definição de caso Suspeito Indivíduo com quadro febril agudo (até 7 dias), de início súbito, com icterícia, residente ou procedente de área de risco para febre amarela ou de locais com ocorrência de epizootias em primatas não-humanos ou isolamento de vírus em mosquitos, nos últimos 15 dias, sem comprovação de ser vacinado contra a febre amarela (solicitar apresentação do cartão de vacina). Observação Em situações de surto recomenda-se adequar a definição de caso suspeito, tornandoa mais sensível para detectar o maior número possível de casos, levando em conta o amplo espectro clínico da febre amarela. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 311 Febre Amarela Confirmado Critério clínico-laboratorial – todo caso suspeito que apresente pelo menos uma das seguintes condições: • isolamento do vírus da FA; • detecção de anticorpos do tipo IgM pela técnica de Mac-Elisa em indivíduos não vacinados ou com aumento de 4 vezes ou mais nos títulos de anticorpos do tipo IgG, pela técnica de inibição da hemaglutinação (IH) ou IgG-Elisa; • achados histopatológicos compatíveis; • detecção de genoma viral. Também será considerado caso confirmado o indivíduo assintomático ou oligossintomático originado de busca ativa que não tenha sido vacinado e que apresente sorologia (MAC-Elisa) positiva para FA. Critério clínico-epidemiológico – todo caso suspeito de febre amarela que evoluiu para óbito em menos de 10 dias sem confirmação laboratorial, no início ou curso de surto ou epidemia, em que outros casos já tenham sido comprovados laboratorialmente. Descartado Caso suspeito com diagnóstico laboratorial negativo, desde que se comprove que as amostras foram coletadas e transportadas adequadamente; ou caso suspeito com diagnóstico confirmado de outra doença. Notificação A ocorrência de casos suspeitos de febre amarela requer imediata notificação e investigação por se tratar de doença grave. Um caso pode significar a existência de um surto, o que impõe a adoção imediata de medidas de controle. Por ser uma doença de notificação compulsória internacional, todo caso suspeito deve ser prontamente comunicado por telefone, fax ou e-mail às autoridades sanitárias superiores. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente Hospitalização imediata dos pacientes. Qualidade da assistência Verificar se os casos estão sendo atendidos em unidade de saúde com capacidade para prestar atendimento adequado e oportuno. Na maioria das vezes, estes pacientes necessitam de cuidados permanentes e contínuos, demandando internamento em unidades de saúde de maior complexidade, inclusive em unidade de terapia intensiva. 312 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Amarela Proteção individual para evitar circulação viral Se o paciente estiver em centro urbano infestado por Aedes aegypti, seu quarto deverá ser telado. Recomenda-se, ainda, o uso do mosquiteiro, para reduzir o risco de urbanização da doença. Não é necessário outro tipo de isolamento, uma vez que a infecção não se transmite de pessoa a pessoa, nem por meio dos fluidos, secreções orgânicas ou fômites. Confirmação diagnóstica Coletar material para diagnóstico laboratorial, de acordo com as orientações do Anexo 1. Proteção da população Logo que se tenha conhecimento da suspeita de caso(s) de febre amarela, deve-se organizar um bloqueio vacinal nas áreas onde o paciente esteve no período de viremia, privilegiando as populações expostas ao risco de transmissão, não sendo necessário aguardar resultados de exames laboratoriais para a confirmação dos casos suspeitos. As informações sobre a cobertura vacinal da área endêmica, quando disponíveis, são importantes para o processo de decisão quanto à extensão inicial e seletividade do bloqueio. Em áreas consideradas indenes, situadas próximas às enzoóticas e epizoóticas, o que caracteriza um território de expansão de circulação viral, a vacinação de bloqueio sempre deverá ser extensa e indiscriminada, caso não se tenha informações de campanhas anteriores. Devem ser organizadas ações de esclarecimento à população, utilizando-se os meios de comunicação de massa, bem como visitas domiciliares e palestras nas comunidades. Também é importante veicular conhecimentos sobre o ciclo de transmissão da doença, gravidade e esclarecimentos da situação de risco. 6 F Investigação Imediatamente após a notificação de um ou mais casos de febre amarela, deve-se iniciar a investigação epidemiológica para permitir que as medidas de controle possam ser adotadas em tempo oportuno. O instrumento de coleta de dados, a ficha de investigação epidemiológica disponível no Sinan, contém os elementos essenciais a serem coletados em uma investigação de rotina. Todos os seus campos devem ser criteriosamente preenchidos, mesmo quando a informação for negativa. Outros itens e observações podem ser incluídos, conforme as necessidades e peculiaridades de cada situação. É imprescindível que os profissionais que irão participar das investigações tenham sido vacinados pelo menos dez dias antes de se deslocarem para a provável área de transmissão. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 313 Febre Amarela Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente Preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica relativos aos dados gerais, notificação individual e dados de residência. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmação da suspeita diagnóstica Anotar na ficha de investigação epidemiológica os dados da história e manifestações clínicas. • Como, em geral, quando se suspeita de FA os doentes são hospitalizados, deve-se consultar o prontuário e entrevistar o médico assistente para completar as informações clínicas sobre o paciente. Estas informações servirão para definir se o quadro apresentado é compatível com a doença. • Sugere-se que se faça uma cópia da anamnese (história clínica), exame físico e da evolução do doente, com vistas ao enriquecimento das análises e também para que possam servir como instrumentos de aprendizagem dos profissionais do nível local; • Verificar se o paciente foi vacinado previamente contra a febre amarela e registrar a data da vacinação, para saber se o mesmo encontrava-se protegido. Esta informação é também utilizada como subsídio para a escolha dos exames laboratoriais. • Acompanhar a evolução dos pacientes e os resultados dos exames laboratoriais específicos. Para identificação da área de transmissão Verificar se o local de residência corresponde a uma área de provável transmissão do vírus amarílico. Investigar minuciosamente: • deslocamentos do caso, de familiares e/ou amigos (considerar todos aqueles que antecederam 15 dias do início dos sintomas, inclusive os de curta duração) para caracterizar se houve permanência em local de provável circulação viral; • notícias de mortes de macacos naquele período, bem como averiguar esta ocorrência em anos anteriores. Estes procedimentos devem ser feitos mediante entrevista com o paciente, familiares ou responsáveis, bem como com lideranças da comunidade. Tais dados, que serão anotados na ficha de investigação e folhas anexas, permitirão identificar o provável local de transmissão do vírus amarílico e verificar se trata-se de área enzoótica, epizoótica, endêmica ou indene. Quando o paciente residir em área reconhecidamente endêmica, enzoótica ou epizoótica, a caracterização do local de transmissão é facilitada. Entretanto, a história dos deslocamentos de todos os casos suspeitos permitirá definir com maior grau de certeza o local provável de infecção. Importante observar que mesmo a permanência de poucas horas em local de risco pode resultar em infecção. 314 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Roteiro de investigação epidemiológica da febre amarela Notificação de caso(s) suspeito(s) Atenção médica/ Dados clínicos Investigação Coleta de dados clínicos e epidemiológicos do paciente Indene Endêmica (enzoótica/epizoótica) Identificar área de transmissão Determinação da extensão da área de transmissão Coleta de material Envio ao laboratório Busca ativa de casos Investigar Aedes aegypti em centros urbanos próximos Silvestre (área de expansão) Busca ativa de epizootias e coleta de vetores silvestres Medidas de controle Medidas imediatas de controle Envio para laboratório de referência Resultado do exame Identificação de novos suspeitos Levantamento sorológico Vigilância de casos febris Avaliar se as ações desenvolvidas estão sendo suficientes para o controle da situação Não Educação em saúde Proteger com telas o ambiente onde o paciente está internado Sim Vacinação em massa Redimensionar as ações de controle Ações emergenciais de combate ao Aedes aegypti Educação em saúde Isolamento com telagem do local onde o paciente se encontra 315 Febre Amarela Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Encerrar o caso Positivo Verificar se a área de transmissão é a mesma do caso índice Vigilância ativa de casos sintomáticos e oligossintomáticos Inquéritos sorológicos Bloqueio Negativo Urbana 6 F Febre Amarela Lembrar que a identificação da área onde se deu a transmissão é de fundamental importância para nortear a continuidade do processo de investigação e a extensão das medidas de controle imediatas. Para determinação da extensão da área de transmissão Busca ativa de casos humanos • Após a identificação do possível local de transmissão, iniciar imediatamente busca ativa de outros casos humanos, casa a casa e em unidades de saúde. Além daqueles com sinais e sintomas evidentes de febre amarela, deve-se considerar os óbitos com quadro sugestivo da doença, ocorridos nos dias anteriores na comunidade e os oligossintomáticos, inclusive todos os indivíduos da área que apresentaram febre (vigilância de casos febris), com ou sem outras manifestações clínicas, pois os resultados dos exames laboratoriais irão esclarecer o diagnóstico. • Na suspeita de transmissão urbana, o procedimento é o mesmo e a delimitação da busca também se baseia na área onde se suspeitou ter havido a transmissão. • Recomenda-se, quando possível, a realização de inquérito sorológico em indivíduos sem sintomatologia, residentes na área de ocorrência dos casos suspeitos, para detecção de IgM (casos agudos). • Preferencialmente, inclui-se neste inquérito os indivíduos suspeitos de terem sido expostos à infecção, excluindo-se os vacinados há mais de 10 dias e há menos de 10 anos. Estes inquéritos devem ser organizados rapidamente, buscando-se apoio técnico e logístico de profissionais dos níveis hierárquicos superiores e laboratórios de referência. O percentual de positividade dará uma idéia da magnitude do surto e a análise individual de todos os casos positivos, encontrados neste levantamento, indicará se todos procedem da área de transmissão delimitada no início da investigação. Estes resultados servirão como mais um elemento para avaliar se as medidas de controle adotadas são suficientes ou precisam ser redimensionadas. Captura e identificação de mosquitos transmissores • Em áreas silvestres – equipe treinada em pesquisa de vetores silvestres deve ser deslocada para a(s) área(s) de ocorrência, visando proceder a captura de vetores silvestres (Haemagogus, Sabethes e Aedes albopictus). Os espécimens coletados devem ser enviados ao laboratório de referência, atendendo aos procedimentos técnicos indicados no Anexo 1 para identificação e posterior isolamento do vírus amarílico. • Em áreas urbanas – pesquisar se existe infestação de Aedes aegypti e Aedes albopictus em localidade ou centro urbano próximo à ocorrência de casos, visando identificar a extensão do risco de ocorrência de febre amarela. Identificar se no local de hospitalização existe a presença deste vetor e, em caso afirmativo, proteger com telas o local de permanência do(s) paciente(s) e instituir ações emergenciais e intensas de combate vetorial. 316 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Amarela Busca ativa de morte de macacos A morte de macacos é sugestiva da circulação do vírus amarílico; por esta razão, a comprovação deste evento sentinela na área de procedência do(s) caso(s) pode auxiliar na delimitação das áreas de risco. Se houver condições de coletar amostras de macacos vivos ou mortos (fragmentos de fígado, rins, baço, gânglios linfáticos, cérebro, pulmões ou suprarenais), este procedimento deve ser realizado por equipes treinadas, com observância dos cuidados de biossegurança. Coleta e remessa de material para exames • Logo após a suspeita clínica de febre amarela, coletar material de todos os casos (óbitos, formas graves ou oligossintomáticas), de acordo com as normas técnicas apresentadas no Anexo 1, observando-se criteriosamente todas as recomendações. • É da responsabilidade dos profissionais da vigilância epidemiológica e/ou dos laboratórios centrais ou de referência viabilizar, orientar ou mesmo proceder a estas coletas. 6 Não se deve aguardar os resultados dos exames para o desencadeamento das medidas de controle e outras atividades da investigação, embora sejam imprescindíveis para a confirmação de casos e para nortear o encerramento das investigações. Atentar para a interpretação dos resultados de sorologias, considerando as datas de coleta e dias de aparecimento dos sintomas, necessidade de amostras pareadas se não for dosagem de IgM e o estado vacinal do paciente, que pode levar a resultados falso-positivos. F Análise de dados A análise dos dados da investigação deve permitir a avaliação da magnitude do problema, da adequação das medidas adotadas logo de início visando impedir a transmissão humana e indicar as ações de prevenção que devem ser mantidas a curto e médio prazos na área, incluindo o combate ao vetor urbano da doença, quando indicado. Desde o início do processo, faz-se necessária a análise dos dados que estão sendo coletados, para alimentar a tomada de decisão sobre as atividades de investigação e as ações de controle. Esta análise, como referido anteriormente, deve ser orientada para a identificação do local de transmissão, fonte de infecção (animais silvestres) e vetores envolvidos na transmissão, dimensionamento da real magnitude do episódio (incidência e letalidade), extensão da área de transmissão e populações sob risco que devem ser incluídas nas medidas de controle, bem como identificar se a área de transmissão está incluída nos limites das áreas enzóoticas, epizoóticas e de transição. Para isso, o profissional deve interpretar passo a passo os dados coletados, de modo a que possa ir definindo as medidas de controle imediatas, as atividades para dar continuidade à investigação em cada momento e as alterações das medidas adotadas de acordo com a evolução do evento e da investigação. A consolidação dos dados, considerando as características de pessoa, tempo e, principalmente, de área geográfica, permitirá uma caracterização detalhada do episódio para avaliação da necessidade de extensão das medidas de prevenção em curto e médio prazos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 317 Febre Amarela Encerramento de caso As fichas de investigação epidemiológica, de cada caso, devem ser analisadas visando definir qual o critério utilizado para o diagnóstico, considerando as seguintes alternativas: Confirmado por critério clínico-laboratorial (isolamento viral, sorologia e histopatologia) – o isolamento ou laudo histopatológico positivo sela o caso como confirmado. Os testes sorológicos devem ser interpretados considerando-se positivo IgM em qualquer titulação, ou elevação de no mínimo quatro vezes os títulos de anticorpos IgG; Confirmado por critério clínico-epidemiológico – verificar se existe vínculo epidemiológico entre o caso suspeito e outros casos confirmados, o que sela o diagnóstico de febre amarela; Óbitos – também serão considerados confirmados os óbitos de pacientes que apresentarem manifestações clínicas de febre amarela, procedentes de área endêmica e onde há comprovação laboratorial de circulação viral; Caso descartado – caso notificado mas cujos resultados de exames laboratoriais, adequadamente coletados e transportados, foram negativos ou tiveram como diagnóstico outra doença. Observar se todos os dados necessários ao encerramento dos casos e do evento (epidemia ou caso isolado) foram coletados durante a investigação, devendo estar criteriosamente registrados e analisados. O prazo máximo para encerramento de caso é de sessenta dias. Relatório final Os dados da investigação deverão ser sumarizados em um relatório com as principais conclusões, das quais destacam-se: • se o caso foi decorrente de falhas de vacinação, principalmente de baixa cobertura vacinal na área, ou conservação inadequada da vacina, o que impõe a adoção de medidas de aprimoramento dos serviços de saúde no território; • se o indivíduo foi infectado acidentalmente, por ser turista ou um novo habitante da área, e se não tinha conhecimento de que deveria ser vacinado 10 dias antes do deslocamento para a área endêmica; • se a área era considerada indene e/ou que medidas especiais de vacinação para a proteção de todas as populações sob risco foram e ainda devem ser adotadas e/ou estendidas; • descrição das situações em que houve proximidade da área de circulação viral com centros urbanos infestados pelo Aedes aegypti, ou se os pacientes foram deslocados para hospitais situados nestes centros, quais as medidas adotadas para evitar a transmissão e se foi dado o alerta do risco de urbanização às autoridades estaduais e nacionais. Lembrar que nas atuais condições de infestação do país pelo Aedes aegypti podem ser indicadas amplas campanhas vacinais emergenciais, nestas situações. A atual situação epidemiológica da febre amarela no Brasil exige uma vigilância ativa de casos visando identificar precocemente qualquer suspeita de urbanização. Toda suspeita da doença impõe uma investigação bastante criteriosa, para que se possa confirmar ou não 318 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Amarela se houve transmissão urbana, pois falhas na coleta de informações podem levar a falsas conclusões. Admite-se que houve ocorrência de transmissão urbana quando o caso preencher um ou os dois critérios abaixo: • confirmação de caso de febre amarela em ambiente urbano infestado com Aedes aegypti, em indivíduo que não reside nem se deslocou para ambiente silvestre; • evidência de que no centro urbano houve permanência de indivíduos com diagnóstico de febre amarela silvestre, com aparecimento de novos casos. Caso algum desses critérios seja preenchido, alertar os dirigentes do nível nacional do Sistema Único de Saúde. Instrumentos disponíveis para controle 6 Imunização A vacina contra febre amarela produzida no Brasil desde 1937, pelo Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos Bio-Manguinhos, é da cepa 17DD, sendo constituída por vírus vivos atenuados derivados de uma amostra africana do vírus amarílico selvagem denominada Asibi. A conservação da vacina é de vital importância para a manutenção de sua qualidade imunogênica. Deverá obedecer rigorosamente as seguintes regras: • na instância central ou regional deverá ser conservada a –20°C em freezer ou câmara fria negativa; • na sala de vacinação a conservação é feita em geladeira, com temperatura que varia entre +2°C a +8°C; • a vacina reconstituída deve ser mantida em temperatura de +2°C a +8°C, preferencialmente a +2°C. Após a diluição, deverá ser utilizada em até quatro horas. O diluente deverá estar na mesma temperatura da vacina e colocado na geladeira no mínimo 6 horas ou um dia antes de ser utilizado; • a faixa etária inicial é a partir de 9 meses, sem limite de idade. Em situações de epidemias recomenda-se a vacinação a partir de 6 meses, por via subcutânea, em dose única de 0,5ml e reforço de 10 em 10 anos. F Eventos adversos – os eventos adversos mais comuns são mal-estar, cefaléia, dores musculares e febre baixa, o que ocorre em 2% a 5% dos vacinados, por volta do 5° ao 10º dia. Estas reações duram de 1 a 2 dias. Foram descritos raros casos de encefalite pós-vacinal, geralmente em menores de 6 meses. Reações de hipersensibilidade imediata como erupção, urticária, angiodema e choque anafilático podem ocorrer de 30 minutos até 2 horas após a administração do imunobiológico, porém são incomuns (incidência <1/1 milhão) e mais freqüentes em pessoas com histórico de alergia a proteínas do ovo. Na literatura, foram descritos casos de eventos adversos graves após a vacinação contra a febre amarela. Nos EUA, Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 319 Febre Amarela há o registro de 4 casos e 3 óbitos ocorridos em 1996 e 1998. No Brasil, foram notificados 4 casos com 4 óbitos no período de 1999 a 2003. O pequeno número de casos avaliados e a ampla utilização desta vacina no mundo, associados aos dados de estudos destes casos, apontam para uma predisposição individual ainda não conhecida, muito difícil de ser identificada previamente ao uso da vacina. Imunidade – os anticorpos protetores aparecem entre o sétimo e décimo dia após a aplicação, razão pela qual a imunização deve ocorrer dez dias antes de se ingressar em área de transmissão. Uma só dose confere imunidade no período mínimo de dez anos. Contra-indicação – para criança menores de 6 meses de idade; pessoas com história de reação anafilática após ingestão de ovo e seus derivados; indivíduos com doença infecciosa aguda em estado febril (acima de 38,5°); portadores de imunodeficiência congênita ou adquirida, neoplasia maligna e pacientes sintomáticos infectados pelo vírus HIV; pacientes em terapêutica imunodepressora (quimioterapia, radioterapia), uso de corticóide em doses elevadas, estados de imunodepressão ou adiamento de dois anos após transplante de medula óssea. Gestação – não é recomendada a administração da vacina em gestantes, exceto em situações de emergência epidemiólogica, vigência de surtos ou epidemias ou viagem para área de risco. Observações: a administração da vacina poderá ser feita simultânea com outras vacinas vivas ou com intervalo mínimo de duas semanas para aplicação. Não são contra-indicadas vacinação recente contra poliomielite, exposição recente ao sarampo ou rubéola e alergia que não tenha sido de natureza anafilática. Recomendações para a vacinação – a vacina contra a febre amarela objetiva conferir proteção individual e coletiva, bloqueando a propagação geográfica da doença, na prevenção de epidemias. Deverá estar disponível de forma permanente nos serviços de saúde da rede pública. A partir de 2004, foi instituída no calendário de vacinação da criança, do adolescente e do idoso, de acordo com a Portaria MS nº 597, de 8/4/04. É recomendada para toda a população a partir dos 9 meses de idade, tanto as residentes nas áreas de risco de transmissão quanto as que eventualmente se exponham ao risco de adoecer de febre amarela (motoristas, agricultores, turistas, caminhoneiros, pescadores, caçadores, garimpeiros). Na área indene, a vacinação também se inicia a partir dos 9 meses de idade e deve ser direcionada à população que se dirige esporadicamente e/ou freqüentemente às áreas de risco. A vacina deve ser aplicada, no mínimo, 10 dias antes do deslocamento. Estratégias recomendadas pelo PNI/MS para o alcance da cobertura de 100% de forma homogênea: vacinação de rotina nas unidades de saúde; vacinação por equipes móveis nas zonas urbana e rural; utilizar as campanhas de multivacinação e, diante de risco de febre amarela urbana, desencadear campanha de vacinação em massa e ações emergenciais de combate ao Aedes aegypti. Na zona rural, realizar a vacinação casa a casa e monitoramento rápido de cobertura. 320 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Amarela A vacinação de bloqueio é realizada diante de um caso humano suspeito, de epizootias ou de confirmação da circulação viral em vetores silvestres, numa área de abrangência de 30 km ao redor do caso. Controle vetorial Evitar o acesso de mosquitos transmissores urbanos ou silvestres ao doente mediante telagem do seu local de permanência, pois pode se constituir em fonte de infecção. Adotar ações emergenciais de eliminação do Aedes aegypti, principalmente no ambiente onde os casos estão internados. Fortalecer as ações de combate vetorial nos municípios situados próximos às áreas de transmissão, visando reduzir os índices de infestação para zero. Ações de educação em saúde As populações devem ser informadas quanto ao risco da ocorrência de febre amarela mediante técnicas pedagógicas disponíveis e meios de comunicação de massa, alertando quanto à importância de vacinar crianças e adultos. Devem ser implementadas estratégias especiais para conscientizar os indivíduos que se deslocam para áreas de risco quanto à importância da imunização prévia (10 dias antes). 6 Estratégias de prevenção da reurbanização da febre amarela • Estabelecimento de imunidade coletiva em áreas infestadas por Aedes aegypti. • Proteção individual das pessoas que vivem ou adentram áreas enzoóticas ou epizoóticas. • Eliminação do Aedes aegypti em cada território ou manutenção de índices de infestação muito próximos de zero (vide capítulo de dengue). • Isolamento de casos suspeitos durante o período de viremia em áreas infestadas pelo Aedes aegypti. • Identificação precoce de casos para pronta intervenção da vigilância epidemiológica. • Vigilância laboratorial das enfermidades que fazem diagnóstico diferencial com febre amarela. • Vigilância sanitária de portos, aeroportos e fronteiras: exigência do certificado internacional de vacina, com menos de dez anos da última dose aplicada para viajantes procedentes de países ou área endêmica de febre amarela. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS F 321 Febre Amarela Anexo 1 Normas para procedimentos laboratoriais O diagnóstico específico de cada paciente com suspeita de febre amarela é da maior importância para a vigilância epidemiológica, tanto em casos isolados quanto em situações de surtos, muito embora após a confirmação laboratorial de alguns casos em determinada área possa se proceder a confirmação pelo critério clínico-epidemiológico, de acordo com as orientações do tópico Definição de caso. A seguir, descreve-se os exames laboratoriais disponíveis, sua interpretação e as normas de coleta dos espécimes. Isolamento e identificação viral – realizado através de inoculação do material do paciente e/ou animal (sangue, derivados ou tecidos infectado) em camundongos recémnascidos, mosquitos ou cultivos celulares. Uma vez isolado, o vírus é identificado através dos testes de fixação de complemento e de imunofluorescência indireta. Detecção de antígenos virais e/ou ácidos nucléicos virais – realizado através de imunofluorescência, imunohistoquímica, hibridização “in situ” e reação em cadeia da polimerase com transcrição reversa (RT-PCR), seguida de sequenciamento nucleotídico, sendo usados para identificação da amostra viral isolada dos espécimes clínicos e de lotes de mosquitos. Estes testes são utilizados com freqüência e na maioria das vezes selam o diagnóstico em situações em que não é possível fazê-lo pelas técnicas habituais. Diagnóstico histopatológico – realizado a partir de coleta de material post-mortem. As lesões anatomopatológicas podem ser encontradas no fígado, rins, baço, coração e linfonodos. As maiores alterações encontram-se no fígado e rins. Testes sorológicos – são complementares ao isolamento do vírus e utilizados como alternativas ao diagnóstico: • MAC-Elisa – é bastante sensível e detecta anticorpos específicos da classe IgM. Estes anticorpos desenvolvem-se rapidamente a partir do 5º dia da infecção e geralmente pode persistir por 60 a 90 dias após o início da doença. Em área sem flavivírus, este exame, quando positivo, é indicativo de FA. É o teste de eleição para triagem de casos, por ser sensível e dispensar coleta de duas amostras. Deve-se ressaltar que a vacina contra a febre amarela também induz a formação de anticorpos IgM. Por isso, é importante a informação sobre o estado vacinal do paciente, inclusive a data da última dose de vacina recebida; • Inibição da hemaglutinação (IH) – apesar de pouco específico, é ideal para estudos soroepidemiológicos pois detecta anticorpos da classe IgG e IgM, que aparecem na primeira semana após o início da doença e persistem por longo tempo (provavelmente toda a vida). A limitação deste teste deve-se à necessidade de obter 322 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Amarela duas amostras de sangue, coletadas com intervalo de 15 dias. Pode ocorrer reações cruzadas com outros flavivírus, dificultando a interpretação. A IH não é boa para avaliar resposta à vacina e é frequentemente negativa em pessoas que demonstram soroconversão pelo teste de neutralização; • Fixação de complemento (FC) – menos sensível, mais específico que a IH, porém só detecta os anticorpos tardios (produzidos a partir da 2ª semana após o início da doença) e declinam após 6 a 12 meses após a infecção, podendo persistir em títulos moderados, por períodos mais prolongados (pelo menos dois anos); • Neutralização (TN) – é o mais específico, detecta anticorpos que aparecem precocemente (1ª semana) e permanecem por muitos anos (provavelmente toda a vida). O resultado deste teste é sugestivo para FA ao demonstrar a presença de anticorpos nos soros iniciais ou aumento do título de anticorpos específicos em pares de soros obtidos na fase aguda da doença e na de convalescença. Os anticorpos neutralizantes são protetores e se caracterizam pela capacidade de reduzir ou eliminar a infectividade do vírus. As técnicas usadas para detecção dos anticorpos neutralizantes incluem o PRNT (Plaque Reduction Neutralization Test), o teste de neutralização por redução em placa de lise em cultura celular e o teste de proteção de camundongos. Atualmente, o PRNT é a técnica padrão para avaliação de resposta à vacina antiamarílica. 6 F Nos três últimos testes, o diagnóstico está relacionado ao aumento de quatro vezes ou mais no título de anticorpos específicos, entre amostras de soro colhidas nas fases aguda e de convalescença da enfermidade. As amostras devem ser analisadas simultaneamente se coletadas com intervalo de 14 a 21 dias. Observações: • Os fragmentos de tecidos de um mesmo paciente para exames anatomopatológicos podem ser acondicionados em um único frasco. • Todo o material deverá ser enviado devidamente identificado e acompanhado de cópia da ficha de investigação epidemiológica, que servirá para orientar os técnicos do laboratório quanto aos exames indicados, de acordo com o período que antecedeu a suspeita da infecção. • A informação sobre história vacinal dos casos suspeitos é muito importante para subsidiar a análise adequada dos resultados de testes sorológicos. • Não coletar tecidos para exame histopatológico em pacientes vivos, devido ao risco de sangramento. • Lembrar que o perfeito acondicionamento das amostras para remessa é de fundamental importância para o êxito dos procedimentos laboratoriais. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 323 Febre Amarela Coleta e conservação de material para diagnóstico de febre amarela Tipo de diagnóstico Isolamento viral Tipo de material Sangue Crianças: Obtenção da amostra: punção venosa ou punção intracardíaca (óbito) 2-5ml Tecido (fígados, rins, coração, baço, linfonodos, cérebro) Isolamento viral Sorológico Histopatologia ou imunohistoquímico ou técnicas moleculares 324 Quantidade Obtenção da amostra: necropsia ou viscerotomia ou usando agulha de biópsia Nº de amostras 1 Fragmento de 1cm Crianças: Obtenção da amostra: punção venosa ou punção intracardíaca (óbito) 2-5ml o Logo após o óbito. 1 1 S2 = 14-21 dias após S1 S = amostra única após o 5o dia da doença Adulto: 10ml - Menos de 12 horas, máximo de 24 horas S1 = após o 5o dia da doença Tecido (fígados, rins, coração, baço, linfonodos, cérebro) Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 1 -5 dia da doença o Adulto: 10ml Sangue Obtenção da amostra: necropsia ou viscerotomia ou usando agulha de biópsia Período da coleta Amostra Logo após o óbito ou menos de oito horas, máximo de 12 horas Recipiente Tubo estéril de plástico com tampa de rosca com vácuo Frasco estéril de plástico ou vidro com tampa de rosca Tubo estéril de plástico ou vidro com tampa de rosca com vácuo Frasco estéril de plástico ou vidro com tampa de rosca Armazenamento/ conservação -70oC no freezer ou nitrogênio líquido -70oC no freezer ou nitrogênio líquido -20oC no freezer Temperatura ambiente, em formalina tamponada a 10% Transporte Nitrogênio líquido ou gelo seco e menos de 24 horas após a coleta Nitrogênio líquido ou gelo seco e menos de 24 horas após a coleta Gelox ou gelo Temperatura ambiente e até 24 horas Febre do Nilo Ocidental FEBRE DO NILO OCIDENTAL CID 10: A92.3 Aspectos clínicos e epidemiológicos Descrição Infecção viral que pode transcorrer de forma subclínica ou com sintomatologia de distintos graus de gravidade, que variam desde uma febre passageira a uma encefalite grave. A doença se manifesta de forma mais severa em adultos com idade acima de 50 anos. Agente etiológico O vírus da febre do Nilo Ocidental pertence ao gênero Flavivirus da família Flaviviridae, comumente encontrado na África, Ásia Ocidental e Oriente Médio e, mais recentemente, na Europa e América do Norte e Central. Faz parte do complexo da família das encefalites japonesas, como St.Louis, Rocio, Murray e Valley, Ilhéus. 6 Reservatório O vírus pode infectar humanos, aves, cavalos e outros mamíferos. Seu principal reservatório e amplificador são algumas espécies de aves. Somente elas estão em condições de atuar como reservatório, já que têm uma viremia alta e prolongada, servindo, assim, como fonte de infecção para os vetores. F Vetores A competência vetorial está diretamente ligada à abundância do vetor no local, além da prática da antropofilia e ornitofilia. O principal gênero de mosquito identificado como vetor do vírus da febre do Nilo Ocidental é o Culex. Entretanto, outras espécies de mosquitos já foram encontradas infectadas com o vírus. Das espécies infectadas, o Culex pipiens parece ser a mais importante nos Estados Unidos. Neste gênero, algumas espécies sobrevivem ao inverno, o que permite manter a transmissão mesmo em baixas temperaturas. No Brasil, a espécie que mais se assemelha ao Culex pipiens é o Culex quiquefasciatus. Além disso, o Aedes albopictus, espécie amplamente distribuída em nosso país, também é considerada vetor potencial, além do Anopheles. Modo de transmissão O vírus do Nilo Ocidental pode ser transmitido quando um mosquito infectado pica um humano ou animal para se alimentar. Os mosquitos se infectam quando fazem o repasto em aves infectadas, as quais podem circular o vírus em seu sangue por alguns dias. O vírus se replica no intestino dos insetos, sendo armazenado nas glândulas salivares dos mesmos. Além disso, a transmissão pode ocorrer, mais raramente, através da transfusão sangüínea ou transplante de órgãos, além do aleitamento materno. Não há evidências de que a gestação esteja sob algum risco. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 325 Febre do Nilo Ocidental Não ocorre transmissão de pessoa para pessoa. Período de incubação Varia de 3 a 14 dias. Período de transmissibilidade Nas aves, varia de 3 a 7 dias. Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade varia entre as espécies. Aves e mamíferos são as espécies mais acometidas pela doença. No ser humano, indivíduos com idade superior a 50 anos têm apresentado quadro mais grave da doença. Outras espécies de animais, como répteis e roedores, podem se infectar com o vírus. Imunidade A doença pode conferir imunidade duradoura. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas As infecções pelo vírus do Nilo Ocidental normalmente geram uma infecção clinicamente inaparente, sendo que 20% dos casos desenvolvem uma doença leve (febre do Nilo Ocidental). Os primeiros sinais e/ou sintomas da forma leve da doença são: doença febril de início abrupto, freqüentemente acompanhada de mal-estar, anorexia, náusea, vômito, dor nos olhos, dor de cabeça, mialgia, exantema máculo-papular e linfoadenopatia. Aproximadamente, uma em cada 150 infecções resulta em doença neurológica severa (encefalite do Nilo Ocidental), cujo maior fator de risco é a idade avançada. A encefalite é mais comumente relatada do que a meningite e apresenta-se com febre, fraqueza, sintomas gastrointestinais e alteração no “padrão mental”. Podem apresentar exantema máculo-papular ou morbiliforme envolvendo pescoço, tronco, braços e pernas, seguido de fraqueza muscular severa e paralisia flácida. São incluídas as apresentações neurológicas como ataxia e sinais extrapiramidais, anormalidades dos nervos cranianos, mielite, neurite ótica, polirradiculite e convulsão. Existe descrição de miocardite, pancreatite e hepatite fulminante. Diagnóstico diferencial Dengue, leptospirose, febre maculosa, meningites e outras encefalites. Diagnóstico laboratorial O teste diagnóstico mais eficiente é a detecção de anticorpos IgM para o vírus do Nilo Ocidental em soro ou líquido cefalorraquideano (LCR) coletado até o oitavo dia do início 326 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre do Nilo Ocidental da doença, utilizando o método de captura de anticorpos IgM (EIA). Pacientes recentemente vacinados ou infectados com outro Flavivírus (ex: febre amarela, dengue, encefalite japonesa) podem apresentar resultado de IgM-EIA positivo. Outras provas, como a hemaglutinação, PCR e isolamento do vírus, também são comumente usadas. Outros achados importantes Entre pacientes dos recentes surtos, observou-se que: • pode ocorrer anemia; • a contagem de leucócitos apresenta-se geralmente normal ou com linfocitopenia; • o exame do LCR mostra pleocitose linfocítica com proteínas elevadas e glicose normal; • a tomografia computadorizada do cérebro apresenta-se normal e em um terço dos pacientes a imagem por ressonância magnética apresenta aumento das leptomeninges e/ou da área periventricular. 6 Tratamento O tratamento é de suporte, freqüentemente envolvendo hospitalização, fluido intravenoso, suporte respiratório e prevenção de infecção secundária para os pacientes com a doença em sua forma severa. F Aspectos epidemiológicos A infecção cerebral denominada febre do Nilo Ocidental foi identificada pela primeira vez na Uganda, em 1937. Na década de 50, verificou-se em Israel a primeira epidemia, sendo reconhecida como o vírus do Nilo Ocidental, causador de uma meningoencefalite severa. Subseqüentemente, sua presença foi novamente identificada em Israel, bem como na Índia, Egito e outros países da África. Em 1974, ocorreu na África do Sul a maior epidemia conhecida causada por este agente. Na década de 90, ocorreram surtos nos seguintes países: Argélia (1994), Romênia (1996-1997), República Checa (1997), República Democrática do Congo (1998), Rússia (1999) e Israel (2000). Nos EUA, a doença vem ocorrendo desde 1999 e em 2002 foram registrados 4.156 casos, com 284 óbitos; em 2003, ocorreram 9.862 casos, com 264 óbitos, sendo o vírus isolado em 40 estados e no Distrito de Columbia; e em 2004 ocorreram 2.539 casos, com 100 óbitos. No Canadá, em 2002 (até novembro), ocorreram 75 casos e 2 óbitos. Vigilância epidemiológica Em situações onde se desconhece a atividade do vírus da febre do Nilo Ocidental, deve-se implementar um sistema de vigilância para casos de encefalites de etiologia desco- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 327 Febre do Nilo Ocidental nhecida, tanto em humanos como em aves e mamíferos. A vigilância deve ser realizada de forma a detectar o mais precocemente possível a circulação viral na área, evitar a ocorrência da infecção em áreas livres e prevenir a circulação em humanos. Assim, a estruturação deve obedecer os seguintes tipos de vigilância: Vigilância em aves • O aparecimento de aves mortas, sem etiologia definida, é fator de alerta para a vigilância. • Implantação de pontos sentinelas de vigilância de aves mortas em zoológicos, parques e praças. • Realização de inquéritos sorológicos em aves residentes e migratórias, para tentativa de isolamento viral. Vigilância entomológica • Inquéritos entomológicos em áreas em que ocorrem mortes de aves, objetivando o monitoramento das espécies presentes na área e a determinação do índice de infestação para a tomada de decisão. • Tentativa de isolamento viral em mosquitos. Vigilância em cavalos Envio de amostras de cérebros de eqüinos que vierem a óbito com suspeita de raiva e tiveram diagnóstico laboratorial negativo. Nota: este material deve ser encaminhado para diagnóstico das encefalites eqüinas do Leste, Oeste e Venezuelana, além da febre do Nilo Ocidental. Vigilância em humanos Realização do diagnóstico diferencial com as meningites virais, utilizando como critério de inclusão pessoas adultas com idade acima de 50 anos. Vigilância sentinela • A utilização de animais como sentinelas tem sido prática utilizada em áreas onde já tenha sido detectada a circulação viral. • Aves domésticas (galinhas), sorologicamente negativas, devem ser introduzidas na área e, periodicamente, realizados testes para averiguação de positividade nestes animais. Definição de caso Define-se caso suspeito como sendo qualquer pessoa com sintomas clínicos, como febre e manifestações neurológicas graves (de meningite a encefalite) de etiologia desconhecida. 328 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre do Nilo Ocidental Define-se caso provável como sendo um caso suspeito que preenche um ou mais dos seguintes critérios: • demonstração de anticorpos IgM no soro contra o vírus do Nilo Ocidental, no ensaio imunoenzimático Elisa; • demonstração de elevado título de anticorpos IgG específicos para o vírus do Nilo Ocidental em soro da fase de convalescência (triagem por Elisa ou inibição de hemoaglutinação e confirmação pelo teste de PRNT). Define-se caso confirmado como um caso provável que preenche um ou mais dos seguintes critérios: • isolamento do vírus do Nilo Ocidental ou demonstração do antígeno viral ou seqüências genômicas do vírus do Nilo Ocidental em tecidos, soro, líquido cefalorraquidiano e outras secreções orgânicas; • demonstração de soroconversão (aumento de quatro vezes ou mais no título de anticorpos) do vírus do Nilo Ocidental no teste de PRNT em amostras séricas ou pareadas de líquido cefalorraquidiano (fase aguda ou de convalescência); • demonstração de anticorpos IgM para o vírus do Nilo Ocidental em amostra do líquido cefalorraquidiano na fase aguda por MAC-Elisa. 6 A detecção de anticorpos IgM específicos para o vírus do Nilo Ocidental e/ou anticorpos IgG (por Elisa) em uma única amostra sérica ou de líquido cefalorraquidiano deve ser confirmada por uma das outras técnicas precedentes. F Medidas de controle Como proteção individual, recomenda-se o uso de repelentes e evitar exposição aos vetores, principalmente ao amanhecer e entardecer. Uso de telas em janelas e portas podem ser recomendadas. Ênfase deve ser dada ao controle integrado dos vetores, visando ao controle larvário, o que inclui: • redução dos criadouros: eliminar todos os recipientes descartáveis que possam acumular água. Atenção especial deve ser dada aos pneus; • manejo ambiental: alterações no meio ambiente que reduzam os criadouros potenciais de Aedes e de Culex;. • melhoria de saneamento básico: mosquitos do gênero Culex criam-se em fossas e remansos de rios ou lagoas poluídas; • controle químico e biológico dos criadouros que não possam ser descartados. O controle químico de mosquitos adultos deve ser reservado para as situações de surto, com objetivo de bloqueio da transmissão. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 329 Febre Maculosa Brasileira FEBRE MACULOSA BRASILEIRA CID 10: A77.0 Características clínicas e epidemiológicas Descrição A febre maculosa brasileira (FMB) é uma doença infecciosa febril aguda, de gravidade variável, podendo cursar desde formas assintomáticas até formas graves, com elevada taxa de letalidade. É causada por uma bactéria do gênero Rickttesia (R. rickettsii), transmitida por carrapatos, caracterizando-se por ter início brusco, com febre elevada, cefaléia e/ou mialgia intensa e/ou prostração, seguida de exantema máculo-papular predominantemente nas regiões palmar e plantar, que pode evoluir para petéquias, equimoses e hemorragias. Pacientes não tratados precocemente podem evoluir para formas graves e, destes, cerca de 80% evoluem para óbito. Agente etiológico Rickettsia rickettsii, bactéria gram-negativa intracelular obrigatória. Reservatório No Brasil, o principal reservatório da Rickettsia rickettsii é o carrapato da espécie Amblyomma cajennense. Entretanto, qualquer espécie de carrapato pode ser potencialmente reservatório, como ocorre com o Haemaphysalis leporis-palustris (carrapato do coelho) e o Amblyomma cooperi, possível transmissor da doença para os cães. A participação dos eqüídeos no ciclo de transmissão é discutível, havendo evidências de que além de transportadores de carrapatos potencialmente infectados podem atuar como sentinelas, semelhantemente ao cão. Supõe-se que a capivara (Hydrochaeris capibara) poderia também estar envolvida neste ciclo, mas é importante ressaltar que não existem estudos que comprovem ser este roedor um reservatório silvestre de Rickettsia. Um dos fatores que poderiam justificar sua importância na ecologia e epidemiologia da doença seria a sua grande área corporal, que viabilizaria a alimentação de centenas/milhares de ixodídeos. Vetores No Brasil, os carrapatos da espécie Amblyomma cajennense são os principais vetores da R. rickettsii causadora da febre maculosa brasileira. São popularmente conhecidos como “carrapato-estrela”, “carrapato-de-cavalo” ou “rodoleiro”; suas ninfas (estádio entre a fase larvar e a adulta), por “vermelhinhos”; e as larvas, por “carrapatinhos” ou “micuins”. 330 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Maculosa Brasileira Modo de transmissão A febre maculosa brasileira é geralmente adquirida pela picada de carrapato infectado e a transmissão ocorre se o artrópode permanecer aderido ao hospedeiro por, no mínimo, 4-6 horas. A doença não se transmite de pessoa a pessoa. Período de incubação De 2 a 14 dias. Período de transmissibilidade Os carrapatos permanecem infectados durante toda a vida, em geral 18 meses. A partir de um carrapato infectado, outros podem tornar-se infectados, através de transmissão vertical (transovariana), transmissão estádio-estádio (transestadial) ou transmissão através da cópula, além da possibilidade de alimentação simultânea de carrapatos infectados com não-infectados em animais com suficiente rickettsemia. 6 Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas A doença pode ser de difícil diagnóstico, sobretudo em sua fase inicial, mesmo entre profissionais bastante experientes. Por ser doença multissistêmica, a febre maculosa pode apresentar um curso clínico variável, desde quadros clássicos a formas atípicas sem exantema. O início geralmente é abrupto e os sintomas são inicialmente inespecíficos, incluindo febre (em geral elevada), cefaléia, mialgia intensa, mal-estar generalizado, náuseas e vômitos. Em geral, entre o segundo e o sexto dia da doença surge o exantema máculo-papular, de evolução centrípeta predominando nos membros inferiores, podendo acometer região palmar e plantar em 50% a 80% dos pacientes. Embora seja o sinal clínico mais importante, o exantema pode estar ausente, o que pode dificultar e retardar o diagnóstico e tratamento, determinando, assim, maior número de óbitos. Nos casos graves, o exantema vai se transformando em petequial e, posteriormente, em hemorrágico, constituído principalmente por equimoses ou sufusões. No paciente não tratado, as equimoses tendem à confluência, podendo evoluir para necrose, principalmente nos lóbulos das orelhas, escroto e extremidades. Nos casos graves é comum a presença de: • edema de membros inferiores; • hepatoesplenomegalia; • diarréia e dor abdominal; • manifestações renais com azotemia pré-renal caracterizada por oligúria e insuficiência renal aguda; • manifestações gastrointestinais como náusea, vômito, dor abdominal e diarréia; • manifestação pulmonar com tosse, edema pulmonar e alterações radiológicas incluindo infiltrado alveolar, pneumonia intersticial e derrame pleural; Secretaria de Vigilância em Saúde / MS F 331 Febre Maculosa Brasileira • manifestações neurológicas como cefaléia, déficit neurológico, meningite/meningoencefalite com líquor claro; • manifestações hemorrágicas como petéquias, sangramento mucocutâneo, digestivo e pulmonar. Se não tratado, o paciente pode evoluir para um estágio de torpor e de confusão mental, com freqüentes alterações psicomotoras, chegando ao coma profundo. Icterícia e convulsões podem ocorrer em fase mais avançada da doença. A letalidade desta forma da doença, quando não tratada chega a 80%. Diagnóstico diferencial O diagnóstico precoce é muito difícil, principalmente durante os primeiros dias da doença, quando as manifestações clínicas também podem sugerir leptospirose, dengue, hepatite viral, salmonelose, encefalite, malária ou pneumonia por Mycoplasma pneumoniae. Com o surgimento do exantema, pode ocorrer confusão com meningococcemia, sepsis por estafilococos e por gram-negativos, viroses exantemáticas (enteroviroses, mononucleose infecciosa, rubéola, sarampo), outras rickettsioses do grupo do tifo, ehrlichioses, borrelioses (doença de Lyme símile), febre purpúrica brasileira, farmacodermia e doenças reumatológicas como lupus, entre outras. Embora o exantema seja um importante e fundamental achado clínico, sua presença não deve ser considerada a única condição para fortalecer a suspeita diagnóstica. Diagnóstico laboratorial Exames inespecíficos Hemograma – são comuns a anemia e trombocitopenia. A redução do número de plaquetas é um achado comum e auxilia no diagnóstico. Os leucócitos podem estar normais, aumentados ou diminuídos, podendo apresentar desvio para a esquerda ou não. Enzimas – creatinoquinase (CK), desidrogenase lática (LDH), transaminases/aminotransferases (TGP/ALT e TGO/AST) e bilirrubinas estão geralmente aumentadas. Exames específicos Pesquisa indireta através de métodos imunológicos Reação de imunofluorescência indireta (IFI) – é o método sorológico mais utilizado para o esclarecimento diagnóstico das rickettsioses, sendo considerado padrão-ouro e o mais disponível na rotina laboratorial. A IFI é uma reação de alta sensibilidade e especificidade que pode ser utilizada para a pesquisa de imunoglobulinas específicas da classe IgM e da classe IgG. Em geral, os anticorpos são detectados entre o 7o e o 10o dia de doença. Títulos de anticorpos superiores ou iguais a 1:64, em uma única amostra, ou uma diferença de quatro vezes no título de anticorpos observada em duas amostras pareadas de soro, coletadas de 2 a 4 semanas entre elas, são os requisitos para confirmação diagnóstica através da sorologia. 332 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Maculosa Brasileira É pertinente lembrar que o resultado deve ser interpretado dentro de um contexto clínico e epidemiológico. Assim, a presença de um resultado sorológico positivo pela IFI, na ausência de um quadro clínico, não nos autoriza dizer que se trata de febre maculosa pois existem outras Rickettsiias não-patogênicas do grupo da febre maculosa que podem determinar reação cruzada. Pesquisa direta da Rickettsia através de histopatologia/imunohistoquímica – a partir de amostras de tecidos obtidas por meio de biópsia de pele e das petéquias de pacientes infectados, em especial os graves, ou material de necropsia como fragmentos de pele com lesões, pulmão, fígado, baço, coração, músculos e cérebro. Todos esses espécimes clínicos devem ser encaminhados ao laboratório de referência para rickettsioses. Técnicas de biologia molecular: reação de polimerase em cadeia (PCR) Isolamento – o isolamento do agente etiológico é feito a partir do sangue e/ou fragmentos de tecidos (pele, pulmão) obtidos por meio de biópsia, além do próprio carrapato retirado do paciente. As amostras de tecido deverão ser imersas, preferencialmente, em infusão cérebro-coração (Brain Hearth Infusion – BHI) e encaminhadas ao laboratório em baixas temperaturas, em recipiente estéril. Na impossibilidade de BHI, o material poderá ser acondicionado em solução fisiológica estéril. Em relação ao vetor eventualmente coletado do paciente, o mesmo deverá ser acondicionado em frasco seco estéril, sem BHI ou qualquer outra solução e encaminhado ao laboratório em baixas temperaturas. Este procedimento é limitado, pois além de ser realizado sob condições de biossegurança NB3 não permite o diagnóstico precoce. Todas as amostras deverão ser encaminhadas imediatamente em isopor com gelo comum ou em gelo seco ou balão de nitrogênio líquido. Quando não puder ser encaminhado, o material deverá ser armazenado a menos 70ºC. Os tubos deverão estar devidamente identificados (tipo de amostra, data da coleta de material). Nos recipientes contendo vetor artrópode, deverão constar informações sobre sua origem (nome do paciente) e data da coleta. Encaminhar ficha com informações clínico-epidemiológicas e laboratoriais correspondentes às amostras enviadas do paciente. 6 F Laboratórios credenciados para o envio de amostras clínicas Laboratório de Hantavírus e Rickettsioses da Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz/RJ Estados: Rio de Janeiro, Bahia, Distrito Federal e Goiás Laboratório Central de Saúde Pública de Minas Gerais – Lacen/MG Estados: Minas Gerais e Espírito Santo Laboratório Central de Saúde Pública de São Paulo – Lacen/SP Estados: São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Mato Grosso do Sul Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 333 Febre Maculosa Brasileira Os demais estados encaminharão suas amostras clínicas para o laboratório de referência nacional, localizado no Laboratório de Hantavírus e Rickettsioses da Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz/RJ. Normas para coleta, conservação e encaminhamento de espécimes clínicos Tipo de material Exames Fase de coleta 1ª amostra: a partir do 1º contato com o paciente Sorologia Sangue Cultura (isolamento) Cultura Tecidos (isolamento) Pele Amostras de fígado, pulmão, pele, rim, baço (colhidas em necropsia)* Imunohistoquímica 2ª amostra: de 2 a 4 semanas após a data da primeira coleta Início dos sintomas, antes da antibioticoterapia, ou se já iniciada, com até 48 horas de seu uso Quantidade e recipiente 10ml em tubo seco (sem anticoagulante) 2ml em tubo seco e transferir o coágulo para um flaconete com tampa de rosca com 1ml de meio de transporte (BHI) Início do aparecimento da lesão de pele (exantema, petéquias), preferencialmente antes do início da antibioticoterapia Colocar o fragmento de pele em flaconete com tampa de rosca com 1ml de meio de transporte BHI Necropsia efetuada idealmente antes de completar 24 horas após o óbito Blocos de parafina contendo quantidade representativa das amostras coletadas. Enviar, junto com laudo de necropsia, os achados macro e microscópicos Conservação e transporte Após retração do coágulo em temperatura ambiente, colocar em geladeira (4-8ºC) por no máximo 24 horas Encaminhar ao laboratório de referência em caixa de isopor com gelo Encaminhar ao laboratório de referência no prazo máximo de 8 horas, em isopor com gelo Caso não seja possível, congelar em freezer a menos 70ºC ou em nitrogênio líquido. Após o congelamento, transportar em isopor com gelo seco Acondicionar os blocos de parafina em embalagem que permita transporte sem danificá-los, em temperatura ambiente (no máximo até 40ºC). *As amostras colhidas em necropsia, preferencialmente, já devem ter sido submetidas a processamento histológico (bloco de parafina). Tratamento A droga de escolha para pacientes com sinais e sintomas clínicos da FMB é a doxiciclina, que deve ser utilizada em casos leves e moderados de manejo ambulatorial. Nos casos mais severos, que requerem internação e utilização de antibioticoterapia por via endovenosa, o cloranfenicol é a escolha. Quando da suspeita de FBM, o tratamento com antibióticos deve ser iniciado imediatamente, não se devendo esperar a confirmação laboratorial do caso. Se o paciente é tratado entre os primeiros 4-5 dias da doença, a febre geralmente regride dentro de 24-72 horas depois do uso apropriado de antibióticos. Não é recomendada a antibioticoterapia profilática para pessoas não doentes que tenham sido recentemente picadas por carrapatos, pois apenas contribui para atrasar o início dos primeiros sintomas, caso venham a desenvolver a doença. 334 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Maculosa Brasileira O esquema terapêutico indicado está apresentado no quadro a seguir. Quadro 1. Antibioticoterapia recomendada Adultos Doxiciclina 100mg de 12 em 12 horas, por via oral 500mg de 6/6 horas, por via oral mantendo-se por três dias após o término da febre Cloranfenicol Em casos graves, recomenda-se 1,0g (um grama) por via endovenosa, a cada 6 horas, até a recuperação da consciência e melhora do quadro clínico geral, mantendo-se o medicamento por mais de sete dias, por via oral, na dose de 500mg de 6/6 horas Crianças Cloranfenicol 50 a 100 mg/kg/dia, de 6/6 horas, até a recuperação da consciência e melhora do quadro clínico geral, nunca ultrapassando 2g por dia, por via oral ou venosa, dependendo das condições do paciente Doxiciclina Peso menor que 45kg: 4mg/kg/dia, divididos em duas doses 6 Aspectos epidemiológicos No Brasil, a ocorrência da febre maculosa tem sido registrada em Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e, mais recentemente, em Santa Catarina. No período de 1995-2003, foram registrados 263 casos da doença, com taxa de letalidade de 28%. Em Minas Gerais, neste período, temos o registro de 106 casos com freqüência maior no sexo masculino (76%), na faixa etária de 15 a 30 anos, letalidade média de 18% e maior incidência no mês de outubro. Esta sazonalidade parece ter relação com o ciclo evolutivo dos carrapatos, já que as formas infectantes (ninfa e adulta) são mais encontradas neste período. As regiões com maior número de casos no estado são os vales do Rio Doce, Mucuri e Jequitinhonha, localizados na região nordeste de Minas Gerais. Em São Paulo, neste mesmo período foram registrados 83 casos com maior freqüência no sexo masculino (73%), na faixa etária de 20-30 anos e letalidade média de 47%. As regiões de Campinas e Pedreira têm apresentado o maior número de casos no estado. No Rio de Janeiro, no período de 1980-2003, foram registrados 57 casos, com taxa de letalidade de 23%. No estado, os casos têm ocorrido com maior freqüência na região de Barra do Piraí. No Espírito Santo, tem ocorrido surtos nos municípios de Pancas, Barra de São Francisco e Nova Venécia. Em Santa Catarina, a partir de outubro de 2003 até abril/2004 foram notificados 11 casos da doença, ocorridos na região do médio Vale do Itajaí, sem registro de óbitos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS F 335 Febre Maculosa Brasileira Vigilância epidemiológica No Brasil, a febre maculosa brasileira foi incluída na lista de doenças de notificação compulsória em outubro de 2001, conforme Portaria MS nº 1.943, de 18/10/01. Objetivos A vigilância da FMB compreende a vigilância epidemiológica e ambiental dos vetores, reservatórios e hospedeiros e tem como objetivos: • detectar e tratar precocemente os casos suspeitos, visando a redução da letalidade; • investigar e controlar surtos, mediante adoção de medidas de controle; • conhecer a distribuição da doença segundo lugar, tempo e pessoa; • identificar e investigar os locais prováveis de infecção; • recomendar e adotar medidas de controle e prevenção. Definição de caso Suspeito Paciente com febre de início súbito, mialgia e/ou prostração intensa, podendo haver um ou mais dos seguintes sinais e sintomas: • cefaléia; • exantema maculopapular, que surge por volta do terceiro a quinto dia de evolução, atingindo, inclusive, palmas das mãos e plantas dos pés; • manifestações hemorrágicas. Deve ainda ser investigada e considerada a história de picada de carrapatos e/ou de contato com animais domésticos e/ou silvestres. Confirmado Paciente com quadro clínico compatível com a doença, com resultado positivo ao exame laboratorial, como se segue: • reação de imunofluorescência indireta positiva (em duas amostras, com diferença de títulos de, no mínimo, quatro vezes superior entre as mesmas); e/ou • reação de imunofluorescência indireta (em amostra única) com títulos de IgG igual ou maior a 1:64 ou com qualquer título de IgM; e/ou • imunohistoquímica de tecidos positiva para Rickettsias; e/ou • PCR positivo; e/ou • cultura (isolamento) bacteriana positiva. Descartado • Caso suspeito com diagnóstico laboratorial negativo; • Caso suspeito sem dados suficientes para a classificação como confirmado; • Caso suspeito com diagnóstico confirmado para outra doença. 336 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Maculosa Brasileira Notificação Todo caso suspeito de febre maculosa requer imediata notificação e investigação, por se tratar de doença grave. Um caso pode significar a existência de um surto, o que impõe a imediata adoção de medidas de controle. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente Os casos devem ser atendidos em unidade de saúde com capacidade para prestar atendimento adequado e oportuno. Na maioria das vezes, estes pacientes necessitam de cuidados permanentes e contínuos, demandando, eventualmente, internamento em unidades de saúde de maior complexidade, inclusive em unidade de terapia intensiva. Medidas universais para evitar a circulação bacteriana Os cuidados iniciais requeridos são os de qualquer enfermidade de caráter infeccioso sem causa definida. Entretanto, após o diagnóstico laboratorial não se requer a proteção individual, pois a doença não se transmite de pessoa a pessoa. 6 Coleta de amostras para o diagnóstico laboratorial As amostras devem ser coletadas, preferencialmente, antes do uso de antibióticos, exceto para sorologia, quando podem ser colhidas em qualquer tempo. A coleta deve ser realizada logo após a suspeita clínica de febre maculosa e de acordo com as normas técnicas, devendo ser encaminhada ao laboratório central de saúde pública – Lacen, devidamente identificada e acompanhada de solicitação e cópia da ficha de investigação epidemiológica preenchida para orientar o laboratório no processo de investigação e identificação do agente. F Investigação A investigação de casos de FMB deve ser iniciada imediatamente após a notificação, para permitir que as medidas de controle e prevenção de novos casos possam ser adotadas em tempo oportuno. Cabe à equipe de investigação confirmar a existência de amostras ou encaminhar providências quanto à coleta dos espécimes clínicos necessários para o diagnóstico laboratorial, de acordo com as normas estabelecidas. Roteiro da investigação epidemiológica O instrumento de coleta de dados é a ficha de investigação epidemiológica, padronizada para utilização em todo o país. Todos os seus campos deverão ser criteriosamente preenchidos, mesmo quando a informação for negativa, e alguns campos obrigatoriamente informados ao nível federal. Passos da investigação: • identificação completa do paciente, sua residência e local de atendimento; • coleta de dados clínicos e epidemiológicos – deve-se levantar dados junto ao paciente e familiares, consultar o prontuário e, se possível, entrevistar o médico assistente Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 337 Febre Maculosa Brasileira • • • • • • • • para completar as informações clínicas e definir se o quadro apresentado é compatível com a doença; identificação da área de transmissão – deve-se verificar se o local de residência, trabalho ou lazer correspondem às áreas de provável transmissão da febre maculosa, observando se existe: ❯ alta infestação de carrapatos na área; ❯ criação de animais domésticos, como cães, cavalos, e presença de animais silvestres (capivaras) na área; determinação da extensão da área de transmissão – na vigência de um número maior de casos, deverá ser feita uma investigação epidemiológica para tentar chegar aos mecanismos causais de transmissão da doença e extensão da área de transmissão; implementação, quando pertinente, de coleta de carrapatos em humanos, cães e nos eqüídeos, a fim de que se possa tentar uma caracterização das espécies de carrapatos existentes e, se possível, o isolamento de Rickettsias circulantes; encerramento de casos – o caso é considerado encerrado a partir do momento em que todos os dados epidemiológicos e clínicos levantados forem suficientes para o estabelecimento do critério diagnóstico utilizado; consolidação dos dados: considerar os aspectos relativos a pessoa, tempo e, principalmente, área geográfica envolvidos; análise de dados – é de fundamental importância que a análise dos dados da investigação permita uma avaliação da magnitude do problema, da adequação das medidas adotadas desde o início, visando impedir o aparecimento de novos casos, e das ações de prevenção que devem ser mantidas na área, a curto e médio prazos, incluindo o combate ao vetor, quando indicado. Esta análise deve ser orientada para identificação do local de transmissão, fonte de infecção e vetores envolvidos na transmissão; dimensionamento da real magnitude do episódio (incidência e letalidade); extensão da área de transmissão e populações sob risco; interpretação dos dados coletados – deve ser feita de modo a definir as medidas de controle imediatas, as atividades de continuidade das investigações e as alterações das medidas adotadas, de acordo com a evolução do evento e da investigação; relatório final – a qualidade do relatório final, contendo dados confiáveis, será relevante para melhor compreensão da doença e da situação epidemiológica da febre maculosa no Brasil, que exige uma vigilância ativa de casos visando identificar precocemente novas áreas de transmissão. Deverá analisar as condições de ocorrência dos casos e apresentar sugestões e orientações para a população e autoridades locais sobre o risco do aparecimento de novos casos. Inquérito sorológico humano A realização de inquérito sorológico está indicada apenas em alguns casos, como ocorrência de surtos e na tentativa de ajudar na detecção de anticorpos específicos contra a Rickettsia do grupo da febre maculosa em determinada área geográfica afetada. Porém, esse procedimento terá valor apenas epidemiológico. 338 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Maculosa Brasileira Fluxograma de investigação epidemiológica da febre maculosa Caso suspeito de febre maculosa brasileira Atenção médica / dados clínicos Notificar Investigar Busca ativa de casos Colher espécimes clínicos para exame laboratorial e iniciar coleta de dados Casos suspeitos 6 Iniciar tratamento Acompanhar evolução Investigar com detalhes o local provável de infecção Negativo Positivo Descartar o caso Avaliar necessidade de inquérito sorológico em humanos Investigar outros agravos Foco antigo Foco novo Transmissão em área rural/silvestre Provável transmissão no peri e/ou intradomicílio Educação em saúde Pesquisa entomológica e de possíveis reservatórios Cura clínica Óbito Positiva presença do vetor no peri e/ou intradomicílio Encerrar o caso Encerrar o caso Controle vetorial Medidas de proteção individual Medidas de proteção coletiva F Negativa ausência do vetor no peri e/ou intradomicílio Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 339 Febre Maculosa Brasileira Medidas de prevenção e controle Ações da vigilância epidemiológica e ambiental Ações específicas para a área rural (com foco ou fora do foco), localizadas em áreas de produção • Criar bovinos separados de eqüídeos; • Equipe de zoonoses – deve estar capacitada para atuar a contento e trabalhar a questão da educação e saúde. Deverá intervir junto aos proprietários de animais, fazendeiros, carroceiros, peões e clubes eqüestres, fornecendo informações e definindo ações preventivas quanto ao controle de carrapatos; • Os banhos, com carrapaticidas, deverão levar em conta a epidemiologia das fases parasitárias e não-parasitárias, o que permitirá diminuir o número de banhos/ano e a diminuição dessas fases; • Os carrapaticidas comercialmente encontrados no mercado possuem posologia para bovinos. Assim, em eqüinos, os banhos deverão ser realizados com intervalos de, no máximo, 10 dias, na época compreendida entre abril e outubro, período larval e de ninfas, estágios mais sensíveis aos produtos químicos. Ações a serem adotadas pela vigilância epidemiológica e ambiental em áreas urbanas de cidades com confirmação de casos de febre maculosa • Promover capacitações freqüentes para profissionais de saúde, alertando para a importância do diagnóstico precoce e diferencial com outras doenças. • Informar a população sobre a circulação sazonal do carrapato, como forma educativa e preventiva (respeitando o ano biológico do carrapato e, conseqüentemente, a ocorrência dos casos). O mês de março seria a época ideal para o início destas atividades, pois antecede ao período de alta incidência da população de carrapatos e, conseqüentemente, ao aparecimento dos casos da enfermidade. Assim, nesse período, toda a população deve ser informada da enfermidade e tudo que for pertinente ao controle do carrapato, para que, ao chegar o mês de abril, no qual a incidência da doença começa a aumentar, possa tomar medidas de prevenção. • Orientar a população como se proteger, adotando o uso de barreiras físicas quando for se expor a áreas com possibilidade de existir carrapatos, conforme descrito: ❯ usar roupas claras e com mangas compridas, para facilitar a visualização de carrapatos; ❯ usar calças compridas, inserindo a parte inferior por dentro de botas, preferencialmente de cano longo e vedadas com fita adesiva de dupla face; examinar o próprio corpo a cada três horas, a fim de verificar a presença de carrapatos. Quanto mais rápido os mesmos forem retirados, menor a chance de infecção; ❯ retirar os carrapatos (caso sejam encontrados no corpo) preferencialmente com o auxílio de uma pinça (de sobrancelhas ou pinça cirúrgica auxiliar); 340 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Maculosa Brasileira não esmagar o carrapato com as unhas, pois o mesmo pode liberar as bactérias e contaminar partes do corpo com lesões. • Locais públicos conhecidamente infestados por carrapatos devem ser obrigados (pela vigilância sanitária) a informar seus freqüentadores, por meio de placas, da presença de carrapatos e das formas de proteção. • A limpeza e capina de lotes não construídos, bem como a de áreas públicas com cobertura vegetal, devem adequadamente ser planejadas. ❯ Para o controle em áreas de ocorrência de foco, a equipe de zoonoses deve ser acionada para orientar as medidas específicas a serem implementadas, tais como informações quanto ao ciclo do carrapato, transmissão da doença e atividades que devem ser realizadas. Ações de educação em saúde Logo após a suspeição de um caso ou surto devem ser iniciadas as medidas de esclarecimento à população, mediante visitas domiciliares e palestras nas comunidades, visando repassar conhecimentos sobre o ciclo de transmissão da doença, gravidade e medidas de prevenção. A maioria das ações exige participação das populações expostas, sendo da maior importância o repasse de informações quanto ao risco de ocorrência de febre maculosa. Devem ser divulgadas mediante técnicas pedagógicas disponíveis e meios de comunicação de massa, alertando quanto à importância da doença e métodos de prevenção. Os hospitais e profissionais de saúde da região deverão ser alertados da ocorrência da doença, a fim de que possam estar atentos para o diagnóstico precoce e de outros possíveis casos do agravo. 6 F Controle vetorial Os relatos da transmissão da febre maculosa no Brasil apontam o Amblyomma cajennense como sendo o principal vetor. O ciclo biológico do Amblyomma cajennense exige três hospedeiros para completá-lo, como se segue: • inicia-se com a fêmea adulta ingurgitada (telógena) realizando a ovipostura de aproximadamente seis mil ovos, podendo chegar a oito mil ovos (destes 85% a 99% férteis); • esses ovos ficam incubados por 60 a 70 dias e transformam-se em larvas (“micuins”) que podem ficar no solo por até seis meses sem se alimentar; • a larva, após encontrar um hospedeiro definitivo, realiza a sucção (período de alimentação) durante cinco dias. Retorna ao solo e transforma-se em ninfa (“vermelhinho”), em torno de 25 dias. Pode permanecer por um período de até um ano à espera de um hospedeiro; • ao encontrar outro hospedeiro, realiza a sucção por cinco a sete dias. Cai novamente no solo e muda para o estágio adulto, diferenciando-se em machos e fêmeas (rodoleiros ou carrapatos-estrela), e aí permanece aguardando novos hospedeiros por um Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 341 Febre Maculosa Brasileira período de até 24 meses. Isto significa que o ciclo completo do Amblyomma cajennense pode se completar em um período de até três anos e meio. A importância do conhecimento do ciclo do carrapato deve-se à necessidade de se propor medidas de controle eficazes e no tempo adequado. Ações efetivas de controle não serão estabelecidas em prazo menor que três anos, uma vez que a dinâmica populacional dos carrapatos permite sua sobrevivência, por longos períodos, sem alimentação. O Amblyomma tem características próprias, a considerar: • a larva pode ficar até seis meses no campo, sem se alimentar; a ninfa, até um ano e a forma adulta, até dois anos, no meio ambiente; • esta alta resistência é responsável pela ocorrência de casos de febre maculosa no período de outubro de um ano a abril do ano seguinte, mesmo sendo período chuvoso, época na qual seria esperada baixa infestação pelas larvas e ninfas; • esta espécie não requer especificidade de hospedeiro. Portanto, pode alimentar-se em eqüídeos, bovinos, caprinos, homens, aves silvestres, cães, gatos, etc. De modo geral, à medida que os carrapatos evoluem nas fases de seu ciclo de vida a tendência é que seu hospedeiro aumente em porte. A transmissão da febre maculosa pela forma adulta do carrapato é menos comum, pois as pessoas o retiram rapidamente do corpo, devido à dor no momento da picada. Para que ocorra a transmissão da doença é necessária a permanência do mesmo por um período de pelo menos seis horas, fixado ao corpo do hospedeiro, o que normalmente ocorre nas formas de larva e ninfa, sem que o hospedeiro se dê conta de sua presença. Fato importante que normalmente explica o ressurgimento da febre maculosa em índices elevados nos últimos anos é o relativo aumento das fontes de alimentação do Amblyomma cajennense, principalmente eqüídeos, nas áreas rurais e periurbanas. Em função da crise econômica e social, tem-se observado grande aumento das populações de eqüídeos nas áreas periurbanas, decorrente da disponibilidade de mão-de-obra não especializada que busca na ocupação de carroceiro seu modo de sobrevivência. O aumento da densidade bovina nas propriedades rurais e a criação conjunta de bovinos e eqüídeos promovem a oferta de boa alimentação ao carrapato, com conseqüente expansão de suas populações. O grande desconhecimento do ciclo do carrapato, pela população em geral e pelos profissionais da saúde em particular, não lhe impõe o devido controle. O cavalo, apesar de ser a principal espécie de alimentação do Amblyomma cajennense, constitui apenas 1% do total de animais, enquanto o boi representa 95% a 98% dos animais, na maioria das propriedades rurais. Assim sendo, o carrapato do cavalo passa a se alimentar nos bovinos, pela maior disponibilidade dos mesmos, além de poder infestar outros animais. A partir da identificação das áreas de risco e ocorrência comprovada de casos, a vigilância epidemiológica deverá atuar enfaticamente. As áreas de risco relacionam-se, principalmente, com a presença e disponibilidade dos vetores e reservatórios. 342 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Maculosa Brasileira Fatores ambientais para risco • Meses do ano onde a população de vetores, em suas fases parasitárias jovens, estão no ambiente em maior proporção (abril a outubro). • Alterações no ambiente silvestre, principalmente sua invasão pelas populações humanas. • Influência climática, determinando a dinâmica das populações do carrapato. Fatores socioeconômicos, culturais e sanitários de risco • Proximidade do homem com animais no meio urbano, tais como cavalos e cachorros. • Desconhecimento da biologia do carrapato e da Rickettsia. • Presença de indivíduos sensíveis à infecção por Rickettsias. • Intensificação do uso da terra e dos sistemas de produção. • Hábitos ocupacionais da população, além do aumento do turismo rural. • Controle inadequado do vetor. • Aumento do número de carroceiros na zona urbana. 6 F Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 343 Febre Purpúrica Brasileira FEBRE PURPÚRICA BRASILEIRA CID 10: A48.4 Características clínicas e epidemiológicas Descrição É uma doença infecciosa emergente de caráter agudo e elevada letalidade. Em geral, apresenta-se sob forma de surtos, atingindo crianças. Tem largo espectro clínico: uma simples infecção conjuntival pode ou não evoluir, em uma ou duas semanas, para síndrome séptica, com aparecimento de petéquias e púrpuras. Agente etiológico Haemophilus influenzae, biogrupo aegyptius. Bactéria gram-negativa, sob a forma de bacilos finos e retos. Reservatório O homem, que também é a fonte de infecção (pessoas com conjuntivite causada pelo agente). Modo de transmissão Contato direto pessoa a pessoa, que esteja com conjuntivite; ou indireto, por intermediação mecânica (insetos, toalhas, mãos). Período de incubação O intervalo de tempo entre o início da conjuntivite e a febre é, em média, de 7 a 16 dias (variando de 1 a 60 dias). Período de transmissibilidade Possivelmente, enquanto durar a conjuntivite. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas Doença infecciosa aguda, com manifestações clínicas sistêmicas, que acomete crianças após conjuntivite, com sinais e sintomas que seguem uma certa cronologia em curto espaço de tempo: início com febre alta (acima de 38,5ºC), taquicardia, erupção cutânea macular difusa, tipo petéquias, púrpuras e outras sufusões hemorrágicas e hipotensão sistólica. Ocorrem, também manifestações digestivas tais como náuseas, vômitos, dor abdominal, enterorragias e diarréia, bem como mialgias, sinais de insuficiência renal (oligúria e anúria), 344 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Purpúrica Brasileira plaquetopenia, leucopenia com linfocitose ou leucocitose com linfocitopenia. Observa-se agitação, sonolência, cefaléia e convulsão. A cianose e taquidispnéia, conseqüente à acidose, faz parte da progressão da doença. Essa enfermidade, em geral, evolui de um a três dias, ou seja, é um quadro grave fulminante, com choque séptico e coagulação intravascular disseminada (CIVD), cuja letalidade varia de 40% a 90%. Quando o paciente sobrevive, pode vir a apresentar gangrenas, com ou sem mutilações. A natureza sistêmica e fulminante da febre purpúrica brasileira (FPB) deve estar associada à liberação de toxinas pela bactéria. A conjuntivite, que a precede, também é conhecida como conjuntivite bacteriana e olho roxo. Diagnóstico diferencial Meningococcemia, septicemias por gram-negativos, dengue hemorrágica, febre maculosa tifo exantemático, febre hemorrágica argentina e boliviana e outras febres hemorrágicas. 6 Diagnóstico laboratorial É feito através de exames: • específicos – cultura de sangue, material da conjuntiva, do líquor e de raspado de lesão de pele. Reação de contra-imunoeletroforese do soro e do líquor; • inespecíficos – hemograma, coagulograma, provas de função renal. F Tratamento Antibioticoterapia: ampicilina, 200mg/kg/dia, 6/6/hs, via intravenosa; ou amoxicilina 50mg/kg/dia, 8/8hs, via oral, por sete dias, associada ou não ao cloranfenicol, 100mg/kg/ dia, via intravenosa, 6/6 hs, por sete dias. O paciente deve ser internado com todos os cuidados de suporte e, se desenvolver CIVD, usar hidrocortisona. Em caso de choque séptico, internar em unidade de terapia intensiva e não usar hidrocortisona. Aspectos epidemiológicos Doença descrita pela primeira vez em 1984, no município de Promissão, em São Paulo, onde ocorreram 10 óbitos com quadro semelhante ao da meningococcemia. Concomitantemente, observou-se quadro semelhante em Londrina, com 13 casos e sete óbitos, e outros em cidades próximas a Promissão. Desse período até hoje, já se tem registro da enfermidade em mais de 15 municípios de São Paulo e em áreas do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Fora do Brasil, os únicos casos descritos ocorreram em novembro de 1986, na região Central da Austrália (Alice-Springs). O agente etiológico foi isolado do sangue de casos clínicos em 1986. Anteriormente, o Haemophilus influenzae, biogrupo aegyptius, nunca havia sido associado a doença invasiva até o aparecimento da FPB. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 345 Febre Purpúrica Brasileira Vigilância epidemiológica Objetivos • Detectar precocemente surtos de conjuntivite, causados por Haemophilus influenzae aegyptius, nas áreas de ocorrência da doença, visando a adoção das medidas de controle indicadas. • Diagnosticar e tratar os casos, visando reduzir a morbidade e letalidade. Definição de caso Suspeito Criança que teve ou está com conjuntivite e desenvolve quadro agudo de febre, acompanhado de algum outro sinal de toxemia (palidez perioral, vômitos, dor abdominal, alterações do estado de consciência). Confirmado Critério clínico-laboratorial – quadro febril agudo em criança, com isolamento, no sangue ou no líquor, de Haemophilus influenzae aegyptius; ou quadro febril agudo, com manifestações hemorrágicas, em pele ou mucosa digestiva, com antecedente de conjuntivite purulenta, contra-imunoeletroforese e culturas negativas para meningococo e outras bactérias, para as quais estes exames tenham sido realizados. Presença de Haemophilus influenzae aegyptius em conjuntiva, ou dados epidemiológicos da área, como ocorrência de surtos de conjuntivite (município, escolas, creches, grupamentos familiares) com identificação de Haemophilus aegyptius, cepa invasora. Critério clínico-epidemiológico – doença aguda em criança procedente de área de ocorrência da doença, caracterizada por febre igual ou superior a 38,5oC, dor abdominal e vômitos, petéquias e/ou púrpuras, sem evidência de meningite, com antecedente de conjuntivite (em familiares) e, ainda, sem antecedente de ocorrência de doença meningocócica na área de abrangência do caso. Descartado Caso suspeito que não se enquadre nas definições de caso confirmado ou que confirme diagnóstico de outra doença. Notificação Por se tratar de agravo inusitado, é doença de notificação compulsória e investigação obrigatória. A notificação deve ser feita pelo meio de comunicação mais rápido disponível (e-mail, fax, telefone) e também pelo Sinan (ficha de notificação). 346 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Purpúrica Brasileira Primeiras medidas a serem tomadas Assistência médica ao paciente Hospitalização imediata de todos os casos suspeitos de acometimento sistêmico. Qualidade da assistência Observar se os casos estão sendo atendidos em unidade de saúde com capacidade para prestar atendimento adequado e oportuno. Na maioria das vezes, estes pacientes necessitam de cuidados permanentes e contínuos, demandando internamento em serviços de saúde de maior complexidade, inclusive em unidade de terapia intensiva. Proteção individual para evitar circulação bacteriana Não há indicação para isolamento; entretanto, devem ser adotados cuidados com as secreções conjuntivais e sangue dos pacientes que contêm o agente. 6 Confirmação diagnóstica Antes do uso de antibióticos, a equipe de assistência deve fazer encaminhamento das amostras de sangue, da secreção conjuntival e do líquor para cultura, raspado de lesões petequiais em pele. As amostras devem ser encaminhadas ao laboratório, acompanhadas de solicitação médica e ficha epidemiológica devidamente preenchida, com informações sobre os dados clínicos e a suspeita diagnóstica para orientar o laboratório no processo de investigação e identificação do agente. F Proteção da população Logo após a suspeição do primeiro caso, deve-se iniciar as medidas de esclarecimento à população, mediante visitas domiciliares e palestras nas comunidades, visando repassar conhecimentos sobre o ciclo de transmissão da doença, gravidade e medidas de prevenção. Investigação A investigação de um ou mais casos de FPB deve ter início imediatamente após a notificação, para permitir que as medidas de controle possam ser adotadas em tempo oportuno. Esta investigação deve conter os elementos essenciais a serem coletados em uma investigação de rotina de doença transmissível. Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente Não se dispõe de ficha epidemiológica de investigação no Sinan, devendo-se elaborar uma específica para este fim, com campos que coletem os dados das principais características clínicas e epidemiológicas da doença. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 347 Febre Purpúrica Brasileira Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmar a suspeita diagnóstica – em geral, quando se suspeita de FPB os doentes são hospitalizados, devendo-se consultar o prontuário e entrevistar o médico assistente para completar as informações clínicas sobre o paciente. Essas informações servirão para ajudar a definir se o quadro apresentado é compatível com a doença. O encaminhamento de material para diagnóstico laboratorial, acompanhado de ficha contendo dados sobre o caso, é fundamental para auxiliar no resultado da investigação. Na vigência de óbito, tentar a realização de necropsia, coletando líquidos de fluidos corporais logo após o mesmo, para se tentar isolar o agente. Os hospitais, profissionais de saúde da região e comunidade deverão ser alertados da ocorrência da doença, a fim de que possam estar atentos para o diagnóstico precoce de possíveis outros casos. Para identificação e determinação da extensão da área de transmissão – fazer busca ativa casa a casa, creches e escolas, na área de procedência de casos de conjuntivites, com ou sem manifestações sistêmicas. Em situações de surtos de conjuntivite, solicitar à população a busca ativa das unidades de saúde, que deverão estar alertadas para a necessidade de notificação imediata, a cada caso suspeito, e articulação com o serviço de vigilância. Coleta e remessa de material para exames Logo após a suspeita clínica de FPB, coletar material de todos os casos, sendo da responsabilidade dos profissionais da vigilância epidemiológica e/ou dos laboratórios centrais viabilizar, orientar ou mesmo proceder a estas coletas. Encerramento de casos A partir da análise dos dados anotados na investigação e considerando-se a definição de caso, anota-se o critério utilizado para a confirmação do diagnóstico ou descarte do(s) mesmo(s). Análise de dados e relatório final É de fundamental importância que a análise dos dados da investigação permita uma avaliação da magnitude do problema e da adequação das medidas adotadas, logo de início, visando impedir o aparecimento de novos casos e indicar as ações de prevenção que devem ser mantidas a curto e médio prazos na área. Desde o início do processo, o investigador deve analisar os dados coletados para alimentar o processo de decisão das atividades de investigação e as ações de controle. Esta análise, como referido anteriormente, deve ser orientada para identificação do local e modo de transmissão, além de dimensionar a real magnitude do episódio (incidência e letalidade), a extensão da área de transmissão e as populações sob risco que devem ser alertadas para o problema. 348 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Purpúrica Brasileira Medidas de controle Nas áreas de ocorrência dessa doença, deve-se acompanhar os casos de conjuntivite e, em situações de surtos, notificar os casos suspeitos da FPB. Quando se observar número de casos de conjuntivite superior ao mês anterior, iniciar a coleta de secreção de conjuntivas de pacientes acometidos (pelo menos de 20) para diagnóstico do agente (laboratório de referência) por meio da realização dos exames laboratoriais específicos. Tratamento das conjuntivites – com colírio de cloranfenicol a 0,5% (1 gota em cada olho, de 3/3 horas, durante 7 dias). Quando constatada a ocorrência de conjuntivite pela cepa invasora do Haemophilus aegyptius, administrar rifampicina na dose de 20mg/kg/dia, durante 4 dias (tomada única), e repetir a cultura da secreção após o término do tratamento. Acompanhar o paciente até a negativação da cultura. Não há indicação para isolamento dos casos FPB. A aglomeração favorece a transmissão da conjuntivite. Medidas de higiene devem ser informadas, principalmente nas situações de risco de ocorrência tanto de conjuntivite como da FPB. 6 F Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 349 Febre Tifóide FEBRE TIFÓIDE CID 10: A01.0 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Doença bacteriana aguda, de distribuição mundial, associada a baixos níveis socioeconômicos, principalmente, com situações de precárias condições de saneamento, higiene pessoal e ambiental. Com tais características, praticamente encontra-se eliminada em países onde estes problemas foram superados. No Brasil, a febre tifóide ocorre sob a forma endêmica, com superposição de epidemias, especialmente nas regiões Norte e Nordeste, refletindo as condições de vida de suas populações. Agente etiológico A Salmonella typhi, bactéria gram-negativa da família Enterobacteriaceae. O tempo de sobrevida deste agente varia de acordo com o meio em que se encontra, e o conhecimento desta informação é importante para o controle da doença. Tempo de sobrevida do agente nos diferentes meios: • água – em condições ótimas, a sobrevida nunca ultrapassa 3 a 4 semanas. Entretanto, varia consideravelmente com a temperatura (temperaturas mais baixas levam a uma maior sobrevida), com a quantidade de oxigênio disponível (as salmonelas sobrevivem melhor em meio rico em oxigênio) e com o material orgânico (águas poluídas, mas não a ponto de consumir todo o oxigênio, são melhores para a sobrevida do agente); • esgoto – em condições experimentais, quase 40 dias; • água do mar – não é um bom meio, sendo necessária uma altíssima contaminação; • ostras, mariscos e outros moluscos – sobrevida demonstrada de até 4 semanas; • leite, creme e outros laticínios – constituem um excelente meio, chegando a perdurar até por dois meses na manteiga, por exemplo; • carnes e enlatados – são raros os casos adquiridos através destes alimentos, provavelmente porque o processo de preparo dos mesmos é suficiente para eliminar a Salmonella. Mas, uma vez preparada a carne ou aberta a lata, a sobrevida do agente é maior do que a vida útil destes alimentos. Ostras e outros moluscos, assim como leite e derivados, são os principais alimentos responsáveis pela transmissão da febre tifóide. Praticamente todos os alimentos, quando manipulados por portadores, podem veicular a Salmonella typhi. Reservatório O homem (doente ou portador). 350 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Tifóide Modo de transmissão Ocorre, principalmente, de forma indireta através da ingestão de água e alimentos, em especial o leite e derivados, contaminados com fezes ou urina de paciente ou portador. A contaminação de alimentos geralmente acontece pela manipulação por portadores ou oligossintomáticos, razão pela qual a febre tifóide é também conhecida como a doença das mãos sujas. Raramente as moscas participam da transmissão. O congelamento não destrói a bactéria, de modo que sorvetes, por exemplo, podem ser veículos de transmissão. Todavia, só uma grande concentração de bactérias – inoculo – torna possível a infecção. Por isso, não se costuma verificar com muita freqüência surtos de febre tifóide após enchentes, quando provavelmente há maior diluição do agente etiológico no meio ambiente e menor possibilidade de sua ingestão em número suficiente para causar a doença. A carga bacteriana infectante, experimentalmente estimada, é de 106 a 109 bactérias. Infecções subclínicas podem ocorrer com a ingestão de um número bem menor de bactérias. Em geral, a febre tifóide transmitida por alimentos ocorre quando nestes são encontradas bactérias em quantidade suficiente para sobreviver aos processos a que são submetidos quando de sua produção. A concentração de bactérias necessárias para causar a doença é denominada de dose infectante mínima (DIM). Nesse particular, a Salmonella typhi inclui-se no grupo das bactérias que necessitam de DIM. considerada baixa para produzir a doença, ou seja, 102/ml. Por outro lado, alguns alimentos possuem características específicas que influenciam de modo significativo na proliferação e sobrevivência do agente etiológico da febre tifóide. Por exemplo, sabe-se que o crescimento desta bactéria se dá em meios com pH entre 4,5 a 7,8, valores que também correspondem à faixa do pH de alguns alimentos, tais como leite (6,5-6,7), manteiga (6,1-6,4), queijo (4,9-5,9) e pescado (6,6-6,8). Fatores extrínsecos aos alimentos, com destaque para aqueles relacionados com o meio ambiente, tais como temperatura e umidade existentes nos sítios de conservação, armazenamento, produção, comercialização e forma de consumo, também interferem de modo significativo no crescimento e viabilidade das Salmonella typhi. 6 F Classificação de alguns alimentos, segundo risco de contaminação pela Salmonella typhi Alto risco – leite cru, moluscos, mexilhões, ostras, pescados crus, hortaliças, legumes e frutas não lavadas. Médio risco – alimentos intensamente manipulados logo após o cozimento ou requentados e massas. Baixo risco – alimentos cozidos ou assados que são consumidos imediatamente, verduras fervidas e alimentos secos. Período de incubação Freqüentemente, de 1 a 3 semanas (em média, 2 semanas), a depender da dose infectante. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 351 Febre Tifóide Período de transmissibilidade A transmissão ocorre enquanto os bacilos estiverem sendo eliminados nas fezes ou urina, o que geralmente se dá desde a primeira semana da doença até o fim da convalescença. Após essa fase o período varia, dependendo de cada situação. Sabe-se que cerca de 10% dos pacientes continuam eliminando bacilos até 3 meses após o início da doença e que 2% a 5% (geralmente mulheres adultas) transformam-se em portadores crônicos após a cura, o que os torna de extrema importância por seu potencial de disseminação da doença. Tanto entre os doentes quanto entre os portadores, a eliminação da Salmonella typhi costuma ser intermitente. Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade é geral e maior nos indivíduos com acloridria gástrica. A imunidade adquirida após a infecção ou vacinação não é definitiva. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas A sintomatologia clínica clássica consiste em febre alta, dores de cabeça, mal-estar geral, falta de apetite, bradicardia relativa (dissociação pulso-temperatura), esplenomegalia, manchas rosadas no tronco (roséola tífica – raramente observada), obstipação intestinal ou diarréia e tosse seca. Atualmente, o quadro clássico completo é de observação rara, sendo mais freqüente aquele em que a febre é a manifestação mais expressiva, acompanhada por alguns dos demais sinais e sintomas citados anteriormente. Nas crianças, a doença costuma ser mais benigna que nos adultos e a diarréia é mais freqüente. Como, apesar de ser aguda, a doença evolui gradualmente, a pessoa afetada muitas vezes é medicada com antimicrobianos simplesmente por estar apresentando uma febre de etiologia não conhecida. Dessa forma, o quadro clínico fica mascarado e a doença deixa de ser diagnosticada precocemente. A salmonelose septicêmica é uma síndrome em cuja etiologia está implicada a associação de salmonelose com espécies de Schistosoma (no Brasil, o Schistosoma mansoni). Nessa condição, o quadro clínico caracteriza-se por febre prolongada (vários meses), acompanhada de sudorese e calafrios. Observa-se ainda anorexia, perda de peso, palpitações, epistaxe, episódios freqüentes ou esporádicos de diarréia, aumento do volume abdominal, edema dos membros inferiores, palidez, manchas hemorrágicas e hepatoesplenomegalia. A Salmonella typhi não é o agente mais freqüentemente associado à salmonelose septicêmica prolongada. A bacteremia recorrente por Salmonella é uma das condições clínicas marcadora da síndrome da imunodeficiência adquirida (Aids). Em regiões onde a Salmonella typhi é endêmica, a incidência de febre tifóide pode ser de 25 a 60 vezes maior entre indivíduos HIV positivos que em soronegativos. Os HIV positivos assintomáticos podem apresentar doença semelhante ao imunocompetente e boa resposta ao tratamento usual. Doentes com aids (doença definida) podem apresentar febre tifóide particularmente grave e com tendência a recaídas. 352 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Tifóide A hemorragia intestinal, principal complicação da febre tifóide, é causada pela ulceração das placas de Peyer, que às vezes leva à perfuração intestinal. Todavia, quando a febre tifóide evolui com bacteremia, qualquer órgão pode ser afetado. Outras complicações menos freqüentes são retenção urinária, pneumonia e colecistite. Diagnóstico diferencial A febre tifóide tem manifestações clínicas semelhantes a de várias outras doenças entéricas como, por exemplo, a Salmonella paratyphi A, B, C, e mesmo de diversas etiologias como a Yersinia enterocolítica, que pode produzir uma enterite com febre, diarréia, vômito, dor abdominal e adenite mesentérica. Há também outras doenças que apresentam febre prolongada e devem ser consideradas, tais como pneumonias, tuberculoses (pulmonar, miliar, intestinal, meningoencefalite e peritonite), meningoencefalites, septicemia por agentes piogênicos, colecistite aguda, peritonite bacteriana, forma toxêmica de esquistossomose mansônica, mononucleose infecciosa, febre reumática, doença de Hodgkin, abscesso hepático, abscesso subfrênico, apendicite aguda, infecção do trato urinário, leptospirose, malária, toxoplasmose, doença de Chagas aguda e endocardite bacteriana. 6 Diagnóstico laboratorial Baseia-se, primordialmente, no isolamento e identificação do agente etiológico, nas diferentes fases clínicas, a partir do sangue (hemocultura), fezes (coprocultura), aspirado medular (mielocultura) e urina (urocultura). Hemocultura – apresenta maior positividade nas duas semanas iniciais da doença (75% aproximadamente), devendo o sangue ser colhido, de preferência, antes que o paciente tenha tomado antibiótico. Recomenda-se a coleta de 2 a 3 amostras, não havendo necessidade de intervalos maiores que 30 minutos entre as mesmas. Coprocultura – a pesquisa da Salmonella typhi nas fezes é indicada a partir da segunda até a quinta semanas da doença, bem como no estágio de convalescença e pesquisa de portadores. No estado de convalescença, é indicada a coleta de amostras do material com intervalos de 24 horas. No caso de portadores assintomáticos, particularmente aqueles envolvidos na manipulação de alimentos, recomenda-se a coleta de 7 amostras seqüenciadas. Mielocultura – trata-se do exame mais sensível (90% de sensibilidade). Tem também a vantagem de se apresentar positiva mesmo na vigência de antibioticoterapia prévia. As desvantagens são o desconforto para o doente e a necessidade de pessoal médico com treinamento específico para o procedimento de punção lombar. Urocultura – tem valor diagnóstico limitado e a positividade máxima ocorre na terceira semana de doença. F O método de reação de Widal: embora ainda muito utilizado em nosso meio, é passível de inúmeras críticas quanto à sua padronização, cepa de Salmonella envolvida e possível interferência de vacinação prévia. Atualmente, não é indicado para fins de vigilância epidemiológica, pois não é suficiente para confirmar ou descartar um caso. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 353 Febre Tifóide Tratamento O paciente deve ser tratado no nível ambulatorial, pois só excepcionalmente necessita de internação. Tratamento específico Drogas de primeira escolha • Cloranfenicol – dose Adultos: 50mg /kg/dia, dividida em 4 tomadas (6/6 horas) até a dose máxima de 4g/dia. Crianças: 50mg/kg/dia, dividida em 4 tomadas (6/6 horas) até a dose máxima de 3g/dia. A via de administração preferencial é a oral. Quando os doentes tornam-se afebris, o que em geral ocorre a partir do quinto dia de tratamento, as doses do cloranfenicol devem ser reduzidas para 2g/dia (adultos) e 30mg/kg/dia (crianças). O tratamento é mantido por 15 dias após o último dia de febre, perfazendo um máximo de 21 dias. Nos doentes com impossibilidade de administração por via oral, utilizar a via parenteral. Efeitos colaterais – há possibilidade de toxicidade medular que pode se manifestar sob a forma de anemia (dose-dependente) ou mesmo anemia aplástica (reação idiossincrásica) – a qual, felizmente, é rara. Quanto à resistência da Salmonella typhi ao cloranfenicol, apesar de amplamente discutida na literatura, não parece ser problema no Brasil até o momento. Os insucessos terapêuticos não devem ser atribuídos à resistência bacteriana, sem comprovação laboratorial e sem antes afastar outras causas. Drogas de segunda escolha • Ampicilina – dose Adultos: 1 mil a 1.500mg/dose, via oral, em 4 tomadas (6/6 horas) até a dose máxima de 6 g/dia. Crianças: 100mg/kg/dia, via oral, dividida em 4 tomadas (6/6 horas). A administração oral é preferível à parenteral. A duração do tratamento é de 14 dias. • Sulfametoxazol + trimetoprima – dose Adultos: 800 a 1.600mg de sulfametoxazol/trimetoprima, via oral, dividida em 2 tomadas (12/12 horas). Crianças: 30 a 50 mg/kg/dia de sulfametoxazol/trimetoprima, por via oral, dividida em 2 tomadas (12/12 horas). A duração do tratamento é de 14 dias. • Amoxicilina –dose Adultos: 3g/dia, via oral, dividida em 3 tomadas (8/8 horas) até a dose máxima de 4g. Crianças: 100mg/kg/dia, via oral, dividida em 3 tomadas (8/8 horas). 354 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Tifóide A duração do tratamento é de 14 dias. Com o uso deste antimicrobiano, pode haver maior freqüência de intolerância gastrointestinal. • Quinolonas – há pelo menos duas quinolonas com eficácia comprovada contra a Salmonella typhi: a ciprofloxacina e a ofloxacina. São drogas pouco tóxicas, mas têm como principal desvantagem a contra-indicação para uso em crianças e gestantes e, como fator limitante, o preço elevado. Em nosso país, estão particularmente indicadas para casos comprovados de resistência bacteriana aos antimicrobianos tradicionalmente utilizados. Provavelmente são as melhores opções para os portadores de HIV ou aids. ❯ Ciprofloxacina – dose: 500mg/dose, via oral, em duas tomadas (12/12 horas) durante 10 dias. Caso não seja possível a via oral, utilizar a endovenosa na dose de 200mg, de 12/12 horas. ❯ Ofloxacina – dose: 400mg/dose, via oral, em duas tomadas (12/12 horas) ou 200 a 400mg/dose, via oral, em 3 tomadas (8/8 horas). A duração do tratamento é de 10 a 14 dias. 6 • Ceftriaxona – trata-se de uma droga com boa atividade contra a Salmonella typhi, constituindo-se em outra alternativa ao tratamento. Os pacientes devem receber adequado tratamento de suporte. Atentar para o aparecimento de complicações graves como hemorragia e perfuração intestinal, pois, para a última, a indicação cirúrgica é imediata. F • Tratamento específico para o estado de portador – ampicilina ou amoxicilina nas mesmas doses e freqüência para tratamento do caso clínico. Sete dias após o término do tratamento, iniciar a coleta de três coproculturas, com intervalo de 30 dias entre cada uma. Caso uma delas seja positiva, essa série pode ser suspensa e o indivíduo deve ser novamente tratado, de preferência com quinolona (ciprofloxacina, 500mg, via oral, de 12/12 horas durante 4 semanas) e esclarecido quanto ao risco que representa para os seus comunicantes íntimos e para a comunidade em geral. O tempo ideal de tratamento para portadores crônicos ainda não está bem definido. Pacientes com litíase biliar ou anomalias biliares, que não respondem ao tratamento com antimicrobianos, devem ser colecistectomizados. Na salmonelose septicêmica prolongada, as salmonelas têm nos helmintos um local favorável para sua proliferação. De modo geral, o tratamento antiesquistossomótico, ao erradicar a helmintíase, faz cessar a septicemia e promove a cura da salmonelose. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 355 Febre Tifóide Aspectos epidemiológicos A febre tifóide não apresenta sazonalidade ou outras alterações cíclicas que tenham importância prática, bem como distribuição geográfica especial. Sua ocorrência está diretamente relacionada às condições de saneamento existentes e aos hábitos individuais. Em áreas endêmicas, acomete com maior freqüência indivíduos de 15 a 45 anos e sua taxa de ataque diminui com a idade. No Brasil, nas últimas décadas, constata-se uma tendência de declínio nos coeficientes de morbimortalidade por febre tifóide. Entretanto, estes dados devem ser vistos com cautela quanto à sua representatividade e fidedignidade, pelas seguintes razões: • 20% do total de óbitos têm causa básica ignorada; • dificuldades quanto ao diagnóstico laboratorial necessário para a identificação do agente etiológico; • precariedades do sistema de informação (comparando-se os dados de febre tifóide de fontes distintas, observam-se disparidades entre eles). Estes indicadores apresentam importantes variações quando analisados por regiões e unidades da Federação. As regiões Norte e Nordeste registram sempre números mais elevados devido à precariedade de suas condições sanitárias, onde menos de 50% de sua população dispõe de algum tipo de abastecimento de água. Vigilância epidemiológica Objetivos • Reduzir a incidência e a letalidade. • Impedir ou dificultar a propagação da doença. • Controlar surtos. Definição de caso Suspeito Indivíduo com febre persistente, acompanhada ou não de um ou mais dos seguintes sinais e sintomas: cefaléia, mal-estar geral, dor abdominal, anorexia, dissociação pulso-temperatura, constipação ou diarréia, tosse seca, roséolas tíficas (manchas rosadas no tronco – achado raro) e esplenomegalia. Confirmado Critério clínico-laboratorial – indivíduo que apresente achados clínicos compatíveis com a doença e houver isolamento da Salmonella typhi ou detecção pela técnica de PCR. Critério clínico-epidemiológico – indivíduo com quadro clinicamente compatível e epidemiologicamente associado com um caso confirmado por critério laboratorial. 356 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Tifóide Portador Indivíduo que, após ter a doença na forma clínica ou subclínica, continua eliminando bacilos por vários meses. Tem particular importância para a vigilância epidemiológica porque mantém a endemia, podendo dar origem a surtos epidêmicos. Descartado Caso que não preenche os requisitos postulados para a sua confirmação. Notificação A notificação é feita por meio de instrumentos padronizados: ficha individual de notificação e ficha de investigação da febre tifóide do Sistema de Informação Nacional de Agravos de Notificação (Sinan). Do completo preenchimento destes instrumentos depende a representatividade do sistema, ou seja, a sua capacidade de descrever com relativa exatidão a ocorrência do evento no tempo e no espaço e segundo atributos do indivíduo e da população. Da agilidade da execução da notificação depende a oportunidade da intervenção, que é o intervalo entre a ocorrência de um evento e o cumprimento das etapas previstas no sistema: notificação, identificação de tendências e desencadeamento das medidas de controle. Apesar da importância desta fonte de dados, a exemplo de outras doenças existe grande subnotificação da febre tifóide no país. As razões são várias e incluem: • inúmeros casos da doença não são diagnosticados; • dificuldades de acesso aos serviços de saúde; • não reconhecimento do caso suspeito; • uso precoce de antimicrobianos em situações clínicas indefinidas. 6 F Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente O tratamento é sempre ambulatorial. Só excepcionalmente, quando o estado do paciente está muito comprometido, indica-se a internação. Qualidade da assistência É importante que a rede assistencial esteja preparada para prestação de uma assistência adequada ao paciente, principalmente para uma pronta atuação em caso de aparecimento de complicações. Proteção individual • O isolamento do paciente não é necessário. • Orienta-se a adoção de medidas de precauções entéricas – nas unidades assistenciais, além das medidas básicas de higiene, recomenda-se a utilização de luvas para a manipulação de material contaminado e de batas, caso haja a possibilidade de contaminação. • Desinfecção dos objetos que tiveram contato com excretas. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 357 Febre Tifóide • Tratamento clínico adequado. • Autocuidado do paciente voltado para a sua higiene pessoal, especialmente a lavagem das mãos. • O paciente deve ser afastado das atividades habituais até a cura, quando oferecer risco de disseminação. • Orientação sobre a importância do saneamento (domiciliar e peridomiciliar) pela incorporação de hábitos saudáveis para a superação dos fatores de risco. Confirmação diagnóstica Coletar material para diagnóstico laboratorial. Proteção da população • Destino adequado dos dejetos e águas servidas. • Destino adequado dos resíduos sólidos. • Proteção dos mananciais de água para consumo humano e garantia de potabilização adequada. • Cuidados com os alimentos em todas as fases, da produção ao consumo, principalmente aqueles mais implicados com o agravo. • Orientar pacientes, portadores e convalescentes sobre os cuidados de higiene pessoal. • Realizar vigilância dos portadores e garantir o afastamento dos mesmos de atividades que envolvam a manipulação de alimentos. Investigação Tem por objetivo obter informações sobre as características epidemiológicas da doença, definir as tendências do seu comportamento e permitir a proposição de alternativas para sua prevenção e controle. Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente Preencher todos os campos relativos a dados gerais, notificação individual e residência constantes da ficha de investigação epidemiológica do Sinan. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmar a suspeita diagnóstica • Anotar na ficha de investigação os dados da história e manifestações clínicas. • Caracterizar clinicamente o caso. • Verificar se já foi coletado e encaminhado material para exame diagnóstico (fezes, sangue, urina), observando se houve uso prévio de antibiótico. • Hospitalizar o paciente, se necessário; sugere-se fazer uma cópia do prontuário com a anamnese, exame físico e evolução do doente, com vistas ao enriquecimento das 358 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Tifóide análises e também para que as informações possam servir como instrumento de aprendizagem dos profissionais do nível local. • Determinar as prováveis fontes de infecção. • Acompanhar a evolução dos pacientes e os resultados dos exames laboratoriais específicos. Para identificação da área de transmissão • Pesquisar a existência de casos semelhantes no domicílio, local de trabalho, de estudo, etc. • Proceder a busca ativa de casos na área. • Identificar os comunicantes e, entre esses, pesquisar portadores mediante realização de coprocultura. Muitas vezes, os portadores trabalham em condições adequadas de higiene, mas a contaminação ocorre por quebra acidental e momentânea das normas. A contaminação pode, também ocorrer através de portador que não é manipulador habitual de alimentos. Na evidência de um caso isolado será muito difícil estabelecer a fonte de contaminação, mas não se deve deixar de examinar e submeter a testes laboratoriais todos os comunicantes. 6 F Para determinação da extensão da área de transmissão – diante da ocorrência de um caso ou surto de febre tifóide, faz-se necessário estabelecer, criteriosamente, a cronologia e distribuição geográfica. Pela cronologia pode-se observar duas situações relativas à distribuição dos casos: muitas vezes, os portadores trabalham em condições adequadas de higiene, mas a contaminação ocorre por quebra acidental e momentânea das normas; a contaminação pode também ocorrer através de portador que não é manipulador habitual de alimentos. Na evidência de um caso isolado será muito difícil estabelecer a fonte de contaminação, mas não se deve deixar de examinar e submeter a testes laboratoriais todos os comunicantes. • Grande aglomeração de casos em um curto período de tempo, sugerindo intensa contaminação por fonte única, provavelmente circulação hídrica: dirigir a observação para as fontes de abastecimento de água ou locais disponíveis onde a população se abastece. • Pequenos aglomerados de casos distribuídos ao longo do tempo, sugerindo contaminação de alimentos por portadores: a atenção deve ser dirigida para alimentos e sua manipulação. No entanto, quando a contaminação através de alimentos manipulados por portadores se faz num único momento, fica difícil a distinção com a distribuição dos casos por contaminação hídrica. Pode-se esclarecer, com maior facilidade, a origem da contaminação a partir da distribuição geográfica dos casos, utilizando-se um mapa da localidade, considerando, a seguir, os atributos pessoais dos doentes. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 359 Febre Tifóide Coleta e remessa de material para exames Deve ser providenciada a coleta de amostras clínicas, de água e alimentos suspeitos o mais precocemente possível. É da responsabilidade dos profissionais da vigilância epidemiológica e/ou dos laboratórios centrais ou de referência viabilizar, orientar ou mesmo proceder estas coletas. Não se deve aguardar os resultados dos exames para o desencadeamento das medidas de controle e outras atividades da investigação, embora sejam imprescindíveis para a confirmação de casos e nortear o encerramento das investigações. Análise de dados Os dados deverão ser analisados de modo a permitir o acompanhamento da tendência da doença. Essa análise compreende os seguintes aspectos principais: • distribuição semanal e anual de casos e óbitos; • coeficiente de incidência por atributos pessoais (idade, sexo e outros) e área geográfica; • letalidade por grupos etários e área geográfica; • percentual de casos notificados que foram investigados; • percentual de casos de febre tifóide diagnosticados por laboratório. Encerramento de casos As fichas epidemiológicas de cada caso devem ser analisadas visando definir qual o critério utilizado para o diagnóstico, considerando as seguintes alternativas: • Confirmado por critério clínico-laboratorial – caso que preencha os requisitos postulados na definição de caso confirmado. • Confirmado por critério clínico-epidemiológico – caso que preencha os requisitos postulados na definição de caso confirmado. • Óbito – será considerado óbito por febre tifóide aquele em que os achados clínicos forem compatíveis com a doença e houver isolamento da Salmonella typhi ou detecção pela técnica de PCR; ou o caso clinicamente compatível e epidemiologicamente associado, ou seja, com forte vínculo com um caso confirmado por critério laboratorial. • Caso descartado – caso notificado como febre tifóide que, após investigação epidemiológica, não tenha preenchido os requisitos para a confirmação pelo critério laboratorial ou clínico-epidemiológico. Relatório final Deverá conter uma descrição das etapas da investigação e ações desenvolvidas, bem como apontar as conclusões e recomendações pertinentes para a prevenção de eventos futuros. 360 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Tifóide Instrumentos disponíveis para controle Imunização A vacina contra a febre tifóide não é a principal arma para seu controle. Esta doença exige a concentração de esforços nas medidas de higiene individual e na melhoria do saneamento. A vacina, portanto, não apresenta valor prático para o controle de surtos, não sendo também recomendada em situações de calamidade. A experiência tem demonstrado que quanto maior a diluição das salmonelas, menor o risco de adquirir a doença. Esse fato parece estar de acordo com a observação geral de que, embora temida pelas autoridades sanitárias durante as enchentes, a febre tifóide não costuma produzir surtos nessas ocasiões, provavelmente em razão da maior diluição de bactéria no meio hídrico. Além disso, sabe-se que a vacina atualmente disponível não possui um alto poder imunogênico e que esta imunidade é de curta duração, sendo indicada apenas para pessoas sujeitas a exposições excepcionais, como os trabalhadores que entram em contato com esgotos; para aqueles que ingressem em zonas de alta endemicidade, como por ocasião de viagem; e para quem vive em áreas onde a incidência é comprovadamente alta. Com a exceção de recrutas, não há recomendação atual da vacina contra a febre tifóide em massa ou rotineiramente, em populações circunscritas. 6 Atualmente, utilizam-se dois tipos de vacina contra a febre tifóide: • a vacina composta de bactéria viva atenuada, apresentada em frasco unidose contendo três cápsulas; • a vacina polissacarídica, apresentada em frasco de uma, 20 ou 50 doses (depende do laboratório produtor). F O esquema básico de vacinação, quando indicado, compreende: • vacina contra febre tifóide composta de bactéria viva atenuada – corresponde a uma dose, ou seja, três cápsulas, a partir dos cinco anos de idade. Cada cápsula é administrada via oral, sob supervisão, em dias alternados – no primeiro, terceiro e no quinto dias. A cada cinco anos é feita uma dose de reforço; • vacina polissacarídica – consiste de uma dose de 0,5 ml, subcutânea, a partir dos dois anos de idade. Nas situações de exposição contínua, revacinar a cada dois anos. Eventos adversos pós-vacinação: • vacina contra a febre tifóide composta de bactéria viva atenuada – desconforto abdominal, náuseas, vômitos, febre, dor de cabeça e erupções cutâneas; • vacina polissacarídica – febre, dor de cabeça e eritema no local da aplicação. Reações locais e sistêmicas são relativamente comuns, manifestando-se nas primeiras 24 horas e regredindo geralmente nas primeiras 48 horas depois da aplicação da vacina. As vacinas contra a febre tifóide são conservadas entre +2ºC e +8ºC. O congelamento provoca a perda de potência. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 361 Febre Tifóide Ações de educação em saúde Destacar os hábitos de higiene pessoal, principalmente a lavagem correta das mãos. Este aspecto é fundamental entre pessoas que manipulam alimentos e trabalham na atenção de pacientes e crianças. Observar cuidados na preparação, manipulação, armazenamento e distribuição de alimentos, bem como na pasteurização ou ebulição do leite e produtos lácteos. As moscas podem transportar mecanicamente para os alimentos as bactérias presentes nas dejeções dos doentes e portadores, embora não desempenhem papel importante na propagação da doença. Faz-se necessário proteger os alimentos do seu contato, adotar cuidados com relação ao lixo, telar portas e janelas, etc. Estratégias de prevenção Medidas de saneamento – sendo a febre tifóide uma doença de veiculação hídrica, seu controle está intimamente relacionado ao desenvolvimento de adequado sistema de saneamento básico, principalmente de fornecimento de água em quantidade suficiente, de boa qualidade, e à adequada manipulação dos alimentos. Não havendo rede pública de água e esgoto, a população deve ser orientada sobre como proceder em relação ao abastecimento de água e destino de dejetos. Sistema público de abastecimento de água • Caso não haja desinfecção do sistema, proceder sua imediata implantação mantendo a dosagem mínima de 0,2mg/l de cloro residual livre nas pontas da rede de distribuição. • Realizar a limpeza e desinfecção dos reservatórios de distribuição, sempre que necessário. • Manter pressão positiva na rede de distribuição de água. • Reparar possíveis pontos de contaminação (rachaduras, canalizações abertas, etc). • Realizar, periodicamente, análise bacteriológica da água. Sistema individual de abastecimento de água (poços, cisternas, minas, etc.) • Proceder a limpeza e desinfecção do sistema, fazendo a desinfecção da água. • Orientar sobre como realizar a proteção sanitária dessas fontes de abastecimento de água. Medidas gerais • Proceder a limpeza e desinfecção periódica das caixas de água de instituições públicas (escolas, creches, hospitais, centros de saúde, asilos, presídios, etc.), a cada seis meses ou com intervalo menor, se necessário. • Orientar a população para proceder a limpeza e desinfecção das caixas de água domiciliares, a cada seis meses ou com intervalo menor, se necessário. • Em locais onde a água for considerada suspeita, orientar a população para ferver ou clorar a água. 362 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Febre Tifóide Medidas referentes aos dejetos • Proceder a limpeza e reparo de fossas, se necessário. • Orientar a população quanto ao uso correto de fossas sépticas e poços absorventes, em locais providos de rede de água. Medidas referentes aos alimentos – alguns procedimentos devem ser adotados para evitar a transmissão da febre tifóide a partir da ingestão de alimentos contaminados. Dentre eles, destacam-se: • a origem da matéria-prima ou do produto alimentício (datas de produção e validade devem ser conhecidas); • o armazenamento do alimento deve ocorrer em condições que lhe confira proteção contra sua contaminação e reduza, ao mínimo, a incidência de danos e deteriorização; • a manipulação do alimento deve ocorrer em ambientes saudáveis e por indivíduos possuidores de bons hábitos de higiene e que não estejam com doença infectocontagiosa; • o preparo deverá envolver processos e condições que excluam toda e qualquer possibilidade da presença de Salmonella typhi no alimento pronto para consumo; • os utensílios e equipamentos que interagem com os alimentos devem estar cuidadosamente higienizados para evitar a contaminação do produto; • a conservação do produto alimentício acabado e pronto para consumo deve ocorrer em ambientes especiais (refrigeração), para que sejam mantidas as suas características e não seja facultada a proliferação de microrganismos; • o alimento pronto para consumo deverá ser armazenado e transportado em condições tais que excluam a possibilidade de sua contaminação. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 6 F 363 Hanseníase HANSENÍASE CID 10: A30 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Doença crônica granulamatosa, proveniente de infecção causada pelo Mycobacterium leprae. Este bacilo tem a capacidade de infectar grande número de indivíduos (alta infectividade), no entanto poucos adoecem (baixa patogenicidade), propriedades estas que não são função apenas de suas características intrínsecas, mas que dependem, sobretudo, de sua relação com o hospedeiro e grau de endemicidade do meio, entre outros. O domicílio é apontado como importante espaço de transmissão da doença, embora ainda existam lacunas de conhecimento quanto aos prováveis fatores de risco implicados, especialmente aqueles relacionados ao ambiente social. O alto potencial incapacitante da hanseníase está diretamente relacionado ao poder imunogênico do Mycobacterium leprae. A hanseníase parece ser uma das mais antigas doenças que acomete o homem. As referências mais remotas datam de 600 a.C. e procedem da Ásia, que, juntamente com a África, podem ser consideradas o berço da doença. A melhoria das condições de vida e o avanço do conhecimento científico modificaram significativamente esse quadro e, hoje, a hanseníase tem tratamento e cura. Agente etiológico Bacilo álcool-ácido resistente, Mycobacterium leprae. É um parasita intracelular obrigatório que apresenta afinidade por células cutâneas e por células dos nervos periféricos. Reservatório O homem é reconhecido como a única fonte de infecção, embora tenham sido identificados animais naturalmente infectados – o tatu, o macaco mangabei e o chimpanzé. Os doentes multibacilares sem tratamento – hanseníase virchowiana e hanseníase dimorfa – são capazes de eliminar grande quantidade de bacilos para o meio exterior (carga bacilar de cerca de 10 milhões de bacilos presentes na mucosa nasal). Modo de transmissão A principal via de eliminação dos bacilos é a aérea superior, sendo que o trato respiratório é a mais provável via de entrada do Mycobacterium leprae no corpo. O trato respiratório superior dos pacientes multibacilares (virchowianos e dimorfos) é a principal via de eliminação do Mycobacterium leprae encontrada no meio ambiente. Período de incubação A hanseníase apresenta longo período de incubação; em média, de dois a sete anos. Há referência a períodos mais curtos, de sete meses, como também de mais de dez anos. 364 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hanseníase Período de transmissibilidade Os doentes paucibacilares (indeterminados e tuberculóides) não são considerados importantes como fonte de transmissão da doença, devido à baixa carga bacilar. Os pacientes multibacilares, no entanto, constituem o grupo contagiante, assim se mantendo enquanto não se iniciar o tratamento específico. Susceptibilidade e imunidade Como em outras doenças infecciosas, a conversão de infecção em doença depende de interações entre fatores individuais do hospedeiro, ambientais e do próprio M. leprae. Devido ao longo período de incubação, é menos freqüente na infância. Contudo, em áreas mais endêmicas, a exposição precoce, em focos domiciliares, aumenta a incidência de casos nessa faixa etária. Embora acometa ambos os sexos, observa-se predominância do sexo masculino, em uma relação de dois para um. 6 Aspectos clínicos e laboratoriais Diagnóstico Clínico Os aspectos morfológicos das lesões cutâneas e classificação nas quatro formas clínicas podem ser utilizados nas áreas com profissionais especializados e em investigação científica. Entretanto, a ampliação da cobertura de diagnóstico e tratamento impõe a adoção da classificação operacional, baseada no número de lesões (Quadro 1). H Diferencial As seguintes dermatoses podem se assemelhar a algumas formas e reações de hanseníase e exigem segura diferenciação: eczemátides, nevo acrômico, pitiríase versicolor, vitiligo, pitiríase rósea de Gilbert, eritema solar, eritrodermias e eritemas difusos vários, psoríase, eritema polimorfo, eritema nodoso, eritemas anulares, granuloma anular, lúpus eritematoso, farmacodermias, fotodermatites polimorfas, pelagra, sífilis, alopécia areata (pelada), sarcoidose, tuberculose, xantomas, hemoblastoses, esclerodermias, neurofibromatose de Von Recklinghausen. Laboratorial Exame baciloscópico – pode ser utilizado como exame complementar para a classificação dos casos em MB e PB. Baciloscopia positiva indica hanseníase multibacilar, independentemente do número de lesões. Exame histopatológico – indicado como suporte na elucidação diagnóstica e em pesquisas. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 365 Hanseníase Quadro 1. Sinopse para classificação das formas clínicas da hanseníase Características Clínicas Baciloscópicas Formas clínicas Áreas de hipo ou anestesia, parestesias, manchas hipocrômicas e/ou eritemohipocrômicas, com ou sem diminuição da sudorese e rarefação de pêlos Negativa Indeterminada (HI) Placas eritematosas, eritemato-hipocrômicas, bem delimitadas, hipo ou anestésicas, com comprometimento de tronco nervoso Negativa Tuberculóide (HT) Lesões pré-foveolares (eritematosas planas com o centro claro). Lesões foveolares (eritematopigmentares de tonalidade ferruginosa ou pardacenta), apresentando alterações de sensibilidade Positiva (bacilos e globias ou com raros bacilos) ou negativa Dimorfa (HD) Eritema e infiltração difusos, placas eritematosas infiltradas e de bordas mal definidas, tubérculos e nódulos, madarose, lesões das mucosas, com alteração de sensibilidade Positiva (bacilos abundantes e globias) Virchowiana (HV) Classificação operacional vigente para a rede pública Paucibacilar (PB) até 5 lesões de pele Multibacilar (MB) mais de 5 lesões de pele Notas: • Na hanseníase virchowiana, afora as lesões dermatológicas e das mucosas, ocorrem também lesões viscerais. • As manifestações neurológicas são comuns a todas as formas clínicas. Na hanseníase indeterminada, não há comprometimento de troncos nervosos, não ocorrendo problemas motores. Na hanseníase tuberculóide, o comprometimento dos nervos é mais precoce e intenso. • Os casos não classificados quanto à forma clínica serão considerados para fins de tratamento como multibacilares. Tratamento O tratamento do paciente com hanseníase é indispensável para curá-lo e fechar a fonte de infecção, interrompendo assim a cadeia de transmissão da doença, sendo portanto estratégico no controle da endemia e para eliminar a hanseníase. O quantitativo dos medicamentos utilizados é calculado com base no número de casos, pela equipe técnica do Programa Nacional de Eliminação da Hanseníase, conjuntamente com a assistência farmacêutica, garantindo o tratamento de todos os pacientes. O tratamento é eminentemente ambulatorial. Nos serviços básicos de saúde, administra-se uma associação de medicamentos, a poliquimioterapia (PQT/OMS). A regularidade do tratamento é fundamental para a cura do paciente. A prevenção de incapacidades é atividade primordial durante o tratamento e, em alguns casos, até mesmo após a alta, sendo parte integrante do tratamento do paciente com hanseníase. Para o paciente, o aprendizado do auto-cuidado é arma valiosa para evitar seqüelas. Na tomada mensal de medicamentos é feita uma avaliação do paciente, para acompanhar a evolução de suas lesões de pele e comprometimento neural, verificando-se se há presença de neurites ou estados reacionais. Quando necessárias, são orientadas técnicas de prevenção de incapacidades e deformidades, bem como os auto-cuidados que devem diariamente ser realizados, para evitar as complicações da doença, sendo verificada sua correta realização. 366 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hanseníase O encaminhamento da pessoa com hanseníase para uma unidade de referência somente está indicado quando houver necessidade de cuidados especiais – no caso de intercorrências graves (efeitos colaterais e para qualquer alteração no esquema terapêutico padrão) ou para correção cirúrgica. Nestes casos, após a realização do procedimento indicado, ela deve retornar para o acompanhamento rotineiro em sua unidade básica. Não é eticamente recomendável tratar o paciente com hanseníase com um só medicamento. Tratamento quimioterápico A PQT/OMS mata o bacilo, tornando-o inviável e evita a evolução da doença, prevenindo as incapacidades e deformidades por ela causadas, levando à cura. O bacilo morto é incapaz de infectar outras pessoas, rompendo a cadeia epidemiológica da doença. Assim sendo, logo no início do tratamento a transmissão da doença é interrompida e, se realizado de forma completa e correta, garante a cura da doença. A PQT/OMS é constituída pelo conjunto dos seguintes medicamentos: rifampicina, dapsona e clofazimina, com administração associada. Essa associação evita a resistência medicamentosa do bacilo que ocorre, com freqüência, quando se utiliza apenas um medicamento, impossibilitando a cura da doença. É administrada através de esquema-padrão, de acordo com a classificação operacional do doente em paucibacilar e multibacilar. A informação sobre a classificação do doente é fundamental para se selecionar o esquema de tratamento adequado ao seu caso. Para crianças com hanseníase, a dose dos medicamentos do esquema-padrão é ajustada de acordo com a idade. Já no caso de pessoas com intolerância a um dos medicamentos do esquema-padrão, são indicados esquemas alternativos. A alta por cura é dada, após a administração do número de doses preconizado, pelo esquema terapêutico. 6 H Esquema paucibacilar (PB) – Pacientes com até 5 lesões de pele Neste caso, é utilizada uma combinação da rifampicina e dapsona, acondicionadas numa cartela, no seguinte esquema: • medicação: rifampicina – uma dose mensal de 600mg (2 cápsulas de 300mg) com administração supervisionada; dapsona – uma dose mensal de 100mg supervisionada e uma dose diária autoadministrada; • duração do tratamento – 6 doses mensais supervisionadas de rifampicina; • critério de alta – 6 doses supervisionadas em até 9 meses (Figura 1). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 367 Hanseníase Figura 1. Cartela (PB) Dose mensal supervisionada Dose diária auto-administrada Dapsona Rifampicina Dapsona Esquema multibacilar (MB) – Pacientes com mais de 5 lesões de pele Aqui é utilizada uma combinação da rifampicina, dapsona e clofazimina, acondicionadas numa cartela, no seguinte esquema: • medicação: rifampicina: uma dose mensal de 600mg (2 cápsulas de 300mg) com administração supervisionada; dapsona: uma dose mensal de 100mg supervisionada e uma dose diária autoadministrada; clofazimina: uma dose mensal de 300mg (3 cápsulas de 100mg) com administração supervisionada e uma dose diária de 50mg auto-administrada. • duração do tratamento: 12 doses mensais supervisionadas de rifampicina; • critério de alta: 12 doses supervisionadas em até 18 meses (Figura 2). Figura 2. Cartela (MB) Dose mensal supervisionada Dapsona Clofazimina Rifampicina Dose diária auto-administrada Dapsona Clofazimina Casos multibacilares que iniciam o tratamento, com numerosas lesões e/ou extensas áreas de infiltração cutânea, poderão apresentar regressão mais lenta das lesões de pele. A maioria desses doentes continuará melhorando após a conclusão do tratamento com 12 doses. É possível, no entanto, que alguns demonstrem pouca melhora e, por isso, poderão necessitar de até 12 doses adicionais de PQT. 368 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hanseníase Esquema de tratamento para crianças Para crianças com hanseníase, as doses de medicamentos dos esquemas paucibacilar e multibacilar são ajustadas de acordo com os seguintes quadros: Paucibacilar (Figura 3) Idade em anos Dapsona (DDS) diária auto-administrada DDS mensal supervisionada Rifampicina (RFM) mensal supervisionada 0-5 6-14 25mg 50-100mg 25mg 50-100mg 150-300mg 300-450mg Figura 3. Cartela (PB) para crianças Dose mensal supervisionada Dapsona (50mg) 6 Rifampicina (150mg) Medicação diária auto-administrada Rifampicina (300mg) Dapsona (50mg) H Multibacilar (Figura 4) Clofazimina Idade em anos Dapsona (DDS) diária autoadministrada Dapsona (DDS) supervisionada Rifampicina (RFM) mensal supervisionada Auto-administrada Supervisonada mensal 0-5 6-14 25mg 50-100mg 25mg 50-100mg 50-300mg 300-450mg 100mg/semana 150mg/semana 100mg 150-200mg Figura 4. Cartela (MB) para crianças Dapsona (50mg) Dose mensal supervisionada Clofazimina (50mg) Rifampicina (150mg) Medicação diária auto-administrada Rifampicina (300mg) Dapsona (50mg) Clofazimina (150mg) Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 369 Hanseníase Esquema alternativo Medicamento Classificação PB, lesão única sem envolvimento de tronco nervoso1 Rifampicina 600mg, em dose única, supervisionada Ofloxacina 400mg, em dose única, supervisionada Minociclina 100mg, em dose única, supervisionada 1 Este esquema é conhecido como ROM (rifampicina, ofloxacina e minociclina) e deve ser usado exclusivamente para tratar pacientes PB com lesão única, sem envolvimento de troncos nervosos. É recomendado somente para uso em centros de referência. Prevenção e tratamento de incapacidades físicas As atividades de prevenção e tratamento de incapacidades não devem ser dissociadas do tratamento PQT/OMS. Desenvolvidas durante o acompanhamento de cada caso, devem ser integradas na rotina dos serviços da unidade de saúde, de acordo com o seu grau de complexidade. A adoção de atividades de prevenção e tratamento de incapacidades será baseada nas informações obtidas através da avaliação neurológica, no diagnóstico da hanseníase. Estas informações referem-se ao comprometimento neural ou às incapacidades físicas identificadas, as quais merecem especial atenção tendo em vista suas conseqüências na vida econômica e social dos portadores de hanseníase, ou mesmo suas eventuais seqüelas naqueles já curados. Durante o tratamento PQT/OMS, e em alguns casos após a alta, o profissional de saúde deve ter uma atitude de vigilância em relação ao potencial incapacitante da doença, visando diagnosticar precocemente e tratar adequadamente as neurites e reações, a fim de prevenir incapacidades e evitar que as mesmas evoluam para deformidades. Duração do tratamento e critério de alta O esquema de administração da dose supervisionada deve ser o mais regular possível: de 28 em 28 dias. Porém, se o contato não ocorrer na unidade de saúde no dia agendado, a medicação precisa ser dada mesmo que no domicílio, pois a garantia da administração da dose supervisionada e da entrega dos medicamentos indicados para a automedicação é imprescindível para o tratamento adequado. A duração do tratamento PQT/OMS deve obedecer aos prazos estabelecidos: de 6 doses mensais supervisionadas de rifampicina, tomadas em até 9 meses, para os casos paucibacilares, e de 12 doses mensais supervisionadas de rifampicina, tomadas em até 18 meses, para os casos multibacilares. A assistência regular ao paciente paucibacilar, na unidade de saúde ou domicílio, é essencial para completar o tratamento em 6 meses. Se, por algum motivo, houver a interrupção da medicação, ela poderá ser retomada em até 3 meses, com vistas a completar o tratamento no prazo de até 9 meses. Já em relação ao portador da forma multibacilar, que mantiver regularidade no tratamento segundo o esquema preconizado, o mesmo completar-se-á em 12 meses. Havendo a interrupção da medicação está indicado o prazo de 6 meses para continuidade ao tratamento e para que o mesmo possa ser completado em até 18 meses. 370 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hanseníase Considera-se uma pessoa de alta, por cura, aquela que completa o esquema de tratamento PQT nos seguintes prazos: • esquema paucibacilar (PB) – 6 doses mensais supervisionadas de rifampicina, em até 9 meses; mais a sulfona auto-administrada; • esquema multibacilar (MB) – 12 doses mensais supervisionadas de rifampicina, em até 18 meses, mais a sulfona auto-administrada e a clofazimina auto-administrada e supervisionada. O paciente que tenha completado o tratamento PQT/OMS não deverá mais ser considerado como caso de hanseníase, mesmo que permaneça com alguma seqüela da doença. Deverá, porém, continuar a ser assistido pelos profissionais da unidade de saúde, especialmente nos casos de intercorrências pós-alta: reações e monitoramento neural. Em caso de reações pós-alta, o tratamento PQT/OMS não deverá ser reiniciado. Durante o tratamento quimioterápico deve haver preocupação com a prevenção de incapacidades e deformidades, bem como o atendimento às possíveis intercorrências. Nestes casos, se necessário, o paciente será encaminhado para unidades de referência, para receber o tratamento adequado. Sua internação somente está indicada em intercorrências graves, como efeitos colaterais graves dos medicamentos, estados reacionais graves ou necessidade de correção cirúrgica de deformidades físicas. A internação deve ser feita em hospitais gerais e, após a alta hospitalar, deverá ser dada continuidade ao tratamento na unidade de saúde a qual está vinculado. 6 H Efeitos colaterais dos medicamentos e condutas Como os medicamentos em geral, aqueles utilizados na poliquimioterapia e no tratamento dos estados reacionais também podem provocar efeitos colaterais. No entanto, os trabalhos bem controlados, publicados na literatura disponível, permitem afirmar que o tratamento PQT/OMS raramente precisa ser interrompido em virtude de efeitos colaterais. A equipe da unidade básica precisa estar sempre atenta para essas situações, devendo, na maioria das vezes, encaminhar a pessoa à unidade de referência para receber o tratamento adequado. A seguir, serão apresentados os possíveis efeitos colaterais dos medicamentos utilizados na PQT/OMS e no tratamento dos estados reacionais, bem como as principais condutas a serem adotadas para combatê-los. O diagnóstico desses efeitos colaterais é fundamentalmente baseado nos sinais e sintomas por eles provocados. Efeitos colaterais dos medicamentos utilizados na PQT Efeitos colaterais da rifampicina Cutâneos – rubor de face e pescoço, prurido e rash cutâneo generalizado; Gastrointestinais – diminuição do apetite e náuseas. Ocasionalmente, podem ocorrer vômitos, diarréias e dor abdominal leve; Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 371 Hanseníase Hepáticos – mal-estar, perda do apetite, náuseas, podendo ocorrer também icterícia. São descritos dois tipos de icterícias: a leve ou transitória e a grave, com danos hepáticos importantes. A medicação deve ser suspensa e o paciente encaminhado à unidade de referência se as transaminases e/ou bilirrubinas aumentarem mais de duas vezes o valor normal; Hematopoéticos – trombocitopenia, púrpuras ou sangramentos anormais, como epistaxes. Podem também ocorrer hemorragias gengivais e uterinas. Nestes casos, o paciente deve ser encaminhado ao hospital; Anemia hemolítica – tremores, febre, náuseas, cefaléia e às vezes, choque, podendo também ocorrer icterícia leve. Raramente ocorre uma síndrome “pseudogripal” quando o paciente apresenta: febre, calafrios, astenia, mialgias, cefaléia, dores ósseas. Este quadro pode evoluir com eosinofilia, nefrite intersticial, necrose tubular aguda, trombocitopenia, anemia hemolítica e choque. Esta síndrome muito rara se manifesta a partir da 2ª ou 4ª dose supervisionada, devido à hipersensibilidade por formação de anticorpos anti-rifampicina, quando o medicamento é utilizado em dose intermitente. A coloração avermelhada da urina não deve ser confundida com hematúria. A secreção pulmonar avermelhada não deve ser confundida com escarros hemoptóicos. A pigmentação conjuntival não deve ser confundida com icterícia. Efeitos colaterais da clofazimina Cutâneos – ressecamento da pele, que pode evoluir para ictiose, alteração na coloração da pele e suor. Nas pessoas de pele escura, a cor pode se acentuar; nas pessoas claras, a pele pode ficar com uma coloração avermelhada ou adquirir um tom acinzentado, devido à impregnação e ao ressecamento. Estes efeitos ocorrem mais acentuadamente nas lesões hansênicas e regridem, muito lentamente, após a suspensão do medicamento; Gastrointestinais – diminuição da peristalse e dor abdominal, devido ao depósito de cristais de clofazimina nas submucosas e linfonodos intestinais, resultando na inflamação da porção terminal do intestino delgado. Estes para-efeitos poderão ser encontrados com maior freqüência na utilização de doses de 300mg/dia por períodos prolongados, superiores a 90 dias. Efeitos colaterais da dapsona Cutâneos – síndrome de Stevens-Johnson, dermatite esfoliativa ou eritrodermia; Hepáticos – icterícias, náuseas e vômitos; Hemolíticos – tremores, febre, náuseas, cefaléia, às vezes choque, podendo também ocorrer icterícia leve, metaemoglobinemia, cianose, dispnéia, taquicardia, cefaléia, fadiga, desmaios, náuseas, anorexia e vômitos. Outros efeitos colaterais raros podem ocorrer, tais como insônia e neuropatia motora periférica. 372 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hanseníase Efeitos colaterais dos medicamentos utilizados nos episódios reacionais Efeitos colaterais da talidomida • teratogenicidade; • sonolência, edema unilateral de membros inferiores, constipação intestinal, secura de mucosas e, mais raramente, linfopenia; • neuropatia periférica, não comum entre nós, pode ocorrer em doses acumuladas acima de 40g, sendo mais freqüente em pacientes acima de 65 anos de idade. Efeitos colaterais dos corticosteróides • hipertensão arterial; • disseminação de infestação por Strongyloides stercoralis; • disseminação de tuberculose pulmonar; • distúrbios metabólicos: redução de sódio e potássio, aumento das taxas de glicose no sangue, alteração no metabolismo do cálcio, levando à osteoporose e à síndrome de Cushing; • gastrointestinais: gastrite e úlcera péptica; • outros efeitos: agravamento de infecções latentes, acne cortisônica e psicoses. 6 Condutas gerais em relação aos efeitos colaterais dos medicamentos A equipe de saúde deve estar sempre atenta para a possibilidade de ocorrência de efeitos colaterais dos medicamentos utilizados na PQT e no tratamento dos estados reacionais, devendo realizar imediatamente a conduta adequada. H Condutas no caso de náuseas e vômitos incontroláveis • suspender o tratamento; • encaminhar o paciente para a unidade de referência; • solicitar exames complementares, para realizar diagnóstico diferencial com outras causas; • investigar e informar à unidade de referência se estes efeitos ocorrem após a ingestão da dose supervisionada de rifampicina, ou após as doses auto-administradas de dapsona. Condutas no caso de icterícia • suspender o tratamento se houver alteração das provas de função hepática, com valores superiores a duas vezes os normais; • encaminhar o paciente à unidade de referência; • fazer a avaliação da história pregressa: alcoolismo, hepatite e outras doenças hepáticas; • solicitar exames complementares necessários para realizar diagnóstico diferencial; • investigar se a ocorrência deste efeito está relacionada com a dose supervisionada de rifampicina ou com as doses auto-administradas de dapsona. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 373 Hanseníase Condutas no caso de anemia hemolítica • suspender o tratamento; • encaminhar o paciente à unidade de referência ou ao hematologista para avaliação e conduta; • investigar se a ocorrência deste efeito está relacionada com a dose supervisionada de rifampicina ou com as doses auto-administradas de dapsona. Condutas no caso de metaemoglobinemia • leve – suspender o medicamento e encaminhar o paciente para unidade de referência; observar, pois geralmente ela desaparece, gradualmente, com a suspensão do medicamento; • grave – encaminhar para internação hospitalar. Condutas no caso de síndrome pseudogripal • suspender a rifampicina imediatamente, encaminhar o paciente para unidade de referência e avaliar a gravidade do quadro; • nos quadros leves, administrar anti-histamínico, antitérmico e deixar o paciente sob observação por, pelo menos, 6 horas; • nos casos moderados e graves, encaminhar o paciente à unidade de referência para administrar corticosteróides (hidrocortisona, 500mg/250ml de soro fisiológico – 30 gotas/minuto, via intravenosa) e, em seguida, (prednisona via oral, com redução progressiva da dose até a retirada completa. Condutas no caso de efeitos cutâneos provocados pela clofazimina – prescrever a aplicação diária de óleo mineral ou creme de uréia, após o banho, e orientar para evitar a exposição solar, a fim de minimizar esses efeitos. Condutas no caso de farmacodermia leve até síndrome de Stevens-Johnson, dermatite esfoliativa ou eritrodermia provocados pela dapsona – interromper definitivamente o tratamento com a dapsona e encaminhar o paciente à unidade de referência. Condutas no caso de efeitos colaterais provocados pelos corticosteróides • observar as precauções ao uso de corticosteróides; • encaminhar imediatamente à unidade de referência. Ao referenciar a pessoa em tratamento para outro serviço, envie, por escrito, todas as informações disponíveis: quadro clínico, tratamento PQT, resultados de exames laboratoriais (baciloscopia e outros) número de doses tomadas, se apresentou episódios reacionais, qual o tipo, se apresentou ou apresenta efeito colateral a alguma medicação, causa provável do quadro, etc. 374 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hanseníase Situações especiais Hanseníase e gravidez As alterações hormonais da gravidez causam diminuição da imunidade celular, fundamental na defesa contra o Mycobacterium leprae. Portanto, é comum que os primeiros sinais de hanseníase, em uma pessoa já infectada, apareçam durante a gravidez e no puerpério, quando também podem ocorrer os estados reacionais e os episódios de recidivas. A gestação, nas mulheres portadoras de hanseníase, tende a apresentar poucas complicações, exceto pela anemia, comum em doenças crônicas. A gravidez e o aleitamento materno não contra-indicam a administração dos esquemas de tratamento poliquimioterápico da hanseníase, que são seguros tanto para a mãe como para a criança. Algumas drogas são excretadas pelo leite, mas não causam efeitos adversos. Os recém-nascidos, porém, podem apresentar a pele hiperpigmentada pela clofazimina, ocorrendo a regressão gradual da pigmentação após a parada da PQT/OMS. 6 Hanseníase e tuberculose Em vista da alta incidência de tuberculose no país recomenda-se especial atenção aos seus sinais e sintomas, antes e durante o tratamento de hanseníase, a fim de evitar cepas de Mycobacterium tuberculosis resistentes à rifampicina. Na vigência de tuberculose e hanseníase, a rifampicina deve ser administrada na dose requerida para tratar tuberculose, ou seja, 600mg/dia. Os demais medicamentos (clofazimina e dapsona) permanecem em igual dose ao esquema padrão PQT/OMS. H Hanseníase e aids A rifampicina na dose utilizada para tratamento da hanseníase (600mg/mês) não interfere nos inibidores de protease utilizados no tratamento de pacientes com aids. Portanto, o esquema PQT/OMS padrão não deve ser alterado nesses doentes. Acompanhamento das intercorrências pós-alta O acompanhamento dos casos pós-alta consiste no atendimento às possíveis intercorrências que possam ocorrer com as pessoas que já concluiram o tratamento PQT/OMS. As pessoas que apresentarem intercorrências pós-alta deverão ser tratadas na unidade básica de saúde, por profissional de saúde capacitado, ou em uma unidade de referência ambulatorial, por médico treinado. Somente os casos graves, bem como os que apresentarem reações reversas graves, deverão ser encaminhados para hospitalização. É importante diferenciar um quadro de estado reacional de um caso de recidiva. No caso de estados reacionais, a pessoa deverá receber tratamento anti-reacional, sem reiniciar, porém, o tratamento PQT/OMS. No caso de recidiva, o tratamento PQT/OMS deve ser reiniciado. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 375 Hanseníase É considerado um caso de recidiva aquele que completar com êxito o tratamento PQT/ OMS e que depois venha, eventualmente, desenvolver novos sinais e sintomas da doença. A maior causa de recidivas é o tratamento PQT/OMS inadequado ou incorreto. O tratamento, portanto, deverá ser repetido integralmente, de acordo com a classificação paucibacilar ou multibacilar. Deve haver a administração regular dos medicamentos pelo tempo estipulado no esquema. Nos paucibacilares, muitas vezes é difícil distinguir a recidiva da reação reversa. No entanto, é fundamental que se faça a identificação correta da recidiva. Quando se confirmar uma recidiva, após exame clínico e baciloscópico, a classificação do doente deve ser criteriosamente reexaminada para que se possa reiniciar o tratamento PQT/OMS adequado. Nos multibacilares, a recidiva pode manifestar-se como uma exacerbação clínica das lesões existentes e com o aparecimento de lesões novas. Quando se confirmar a recidiva, o tratamento PQT/OMS deve ser reiniciado. No caso de recidiva, a suspensão da quimioterapia dar-se-á quando a pessoa em tratamento tiver completado as doses preconizadas, independente da situação clínica e baciloscópica, e significa, também, a saída do registro ativo, já que não mais será computada no coeficiente de prevalência. Características Reação adversa Intervalo de tempo Ocorre geralmente durante a quimioterapia ou dentro de seis meses após completado o tratamento Ocorre, normalmente, muito depois do término da quimioterapia, em geral depois de um intervalo de um ano Aparecimento Súbito e inesperado Lento e insidioso Distúrbios sistêmicos Podem vir acompanhados de febre e mal-estar Geralmente, não vêm acompanhados de febre e mal-estar Lesões antigas Algumas, ou todas, se tornam eritematosas, brilhantes e consideravelmente inchadas, com infiltração Algumas podem apresentar bordas eritematosas Lesões novas Em geral, várias Poucas, ex.: hansenomas, placas, etc. Ulceração Muitas vezes as lesões se agravam e ficam ulceradas Raramente há ulcerações Regressão Com descamação Não há descamação Envolvimento dos nervos Muitos nervos podem estar envolvidos rapidamente ocorrendo dor, alteração da sensibilidade e perturbações motoras Pode ocorrer em um único nervo. Perturbações motoras ocorrem muito lentamente Resposta aos corticosteróides Excelente Não pronunciada Fonte: Adaptação do Manual para o Controle da Lepra, OMS, 2ª ed. 376 Recidiva Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hanseníase Episódios reacionais ou estados reacionais ou reações hansênicas São reações do sistema imunológico do doente ao Mycobacterium leprae. Apresentamse através de episódios inflamatórios agudos e subagudos. Podem acometer tanto os casos paucibacilares como os multibacilares. Os estados reacionais ocorrem, principalmente, durante os primeiros meses do tratamento quimioterápico da hanseníase, mas também podem ocorrer antes ou depois do mesmo, nesse caso após a cura do paciente. Quando ocorrem antes do tratamento, podem induzir ao diagnóstico da doença. Os principais fatores potencialmente desencadeantes dos episódios reacionais são a gestação, as infecções concorrentes e o estresse físico ou psicológico. Os estados reacionais são a principal causa de lesões dos nervos e de incapacidades provocadas pela hanseníase. Portanto, é importante que o diagnóstico dos mesmos seja feito precocemente, para se dar início imediato ao tratamento, visando prevenir essas incapacidades. O diagnóstico dos estados reacionais é realizado através do exame físico, dermatoneurológico do paciente. A identificação dos mesmos não contra-indica o início do tratamento (PQT/OMS). Se os estados reacionais aparecerem durante o tratamento, este não deve ser interrompido, mesmo porque reduz significativamente a freqüência e a gravidade dos mesmos. Se forem observados após o tratamento, não é necessário reiniciá-lo. Deve-se ficar atento para que os estados reacionais pós-alta, comuns nos esquemas de tratamento quimioterápico de curta duração, não sejam confundidos com os casos de recidiva da doença. Os estados reacionais ou reações hansênicas podem ser de dois tipos: reação tipo 1 ou reação reversa e reação tipo 2. • Reação tipo 1 ou reação reversa – quadro clínico que se caracteriza por apresentar novas lesões dermatológicas (manchas ou placas), infiltração, alterações de cor e edema nas lesões antigas, bem como dor ou espessamento dos nervos (neurites). • Reação tipo 2 – sua manifestação clínica mais freqüente é o eritema nodoso hansênico (ENH), que se caracteriza por apresentar nódulos vermelhos e dolorosos, febre, dores articulares, dor e espessamento nos nervos e mal-estar generalizado. Geralmente, as lesões antigas permanecem sem alteração. 6 H A seguir, será apresentado um quadro síntese das reações hansênicas (tipos 1 e 2) em relação à classificação operacional da hanseníase: os casos paucibacilares e multibacilares. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 377 Hanseníase Episódios reacionais Tipo 1 – Reação reversa Tipo 2 – Eritema nodoso hansênico (ENH) Formas clínicas Paucibacilar Multibacilar Início Causa Manifestações clínicas Antes do tratamento PQT ou nos primeiros 6 meses do tratamento Pode ser a primeira manifestação da doença Pode ser a primeira manifestação da doença Pode ocorrer durante ou após o tratamento com PQT Processo de hiper-reatividade imunológica, em resposta ao antígeno (bacilo ou fragmento bacilar) Processo de hiper-reatividade imunológica, em resposta ao antígeno (bacilo ou fragmento bacilar) Aparecimento de novas lesões que podem ser eritemato-infiltradas (aspecto erisipelóide) As lesões preexistentes permanecem inalteradas Reagudização de lesões antigas Há aparecimento brusco de nódulos eritematosos, dolorosos à palpação ou até mesmo espontaneamente, que podem evoluir para vesículas, pústulas, bolhas ou úlceras Dor espontânea nos nervos periféricos. Aumento ou aparecimento de áreas hipo ou anestésicas É freqüente Comprometimento sistêmico Não é freqüente Edema de mãos e pés Fatores associados Aparecimento brusco de mão em garra e pé caído Hematologia Pode haver leucocitose Apresenta febre, astenia, mialgias, náuseas (estado toxêmico) e dor articular Edema de extremidades Irite, epistaxes, orquite, linfadenite Neurite. Comprometimento gradual dos troncos nervosos Leucocitose, com desvio à esquerda, e aumento de imunoglobulinas Anemia Lenta Evolução Podem ocorrer seqüelas neurológicas e complicações, como abcesso de nervo Rápida O aspecto necrótico pode ser contínuo, durar meses e apresentar complicações graves Se o estado reacional for identificado no diagnóstico da hanseníase, deve-se iniciar o tratamento PQT/OMS juntamente com o tratamento para a reação. Se o estado reacional for identificado durante o tratamento PQT/OMS, deve-se mantê-lo e iniciar o tratamento específico para a reação. Se o estado reacional for identificado no pós-alta, o tratamento PQT/OMS não deve ser reiniciado: deve-se fazer apenas o tratamento para a reação. O tratamento dos estados reacionais é geralmente ambulatorial, devendo ser prescrito e supervisionado por médico. Em casos de estados reacionais graves, avaliar a necessidade de internação hospitalar, principalmente na primeira semana do tratamento. 378 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hanseníase Medidas recomendadas para tratamento da reação Tipo 1 – reação reversa • Se o doente estiver sob tratamento quimioterápico, mantenha-o sem modificação, exceto se apresentar efeitos colaterais graves. • Prescrever corticosteróide: prednisona – 1 a 2mg/kg/dia, conforme avaliação clínica. • Manter a dose inicial da prednisona até a regressão clínica do quadro reacional. • Reduzir a dose do medicamento, em intervalos fixos e quantidade predeterminada, conforme avaliação clínica e tabela a seguir: Exemplo da utilização de prednisona para tratamento de estados reacionais, em doente com 60 kg e com episódio reacional: 60mg/dia até a regressão clínica 50mg/dia 40mg/dia 6 30mg/dia 25mg/dia 15 dias 20mg/dia 15mg/dia 10mg/dia 5mg/dia • Retornar à dose imediatamente anterior, em caso de agravamento do quadro clínico. H Devem ser tomadas algumas precauções na utilização da prednisona: registrar o peso, a pressão arterial e a taxa de glicose no sangue, para controle e observação dos efeitos colaterais do medicamento; fazer o tratamento antiparasitário, com medicamento específico para Strongyloides stercoralis, prevenindo a disseminação sistêmica desse parasita. Exemplo: tiabendazol na dose de 50mg/kg/dia, durante 2 dias, ou 1,5 g/dose única. Medidas recomendadas para tratamento da reação Tipo 2 – eritema nodoso hansênico (ENH) Como previsto na Lei nº 10.651, de 16/4/2003, para utilizar-se a talidomida no tratamento de hanseníase em mulheres em idade fértil faz-se necessário orientar sobre os efeitos teratogênicos da droga e assegurar a contracepção. • Se o doente estiver sob tratamento poliquimioterápico, mantenha-o sem modificação, exceto se estiver apresentando efeitos colaterais graves. • Prescrever talidomida: de 100 a 400mg/dia, conforme a intensidade do quadro. • Manter a dose inicial até a regressão clínica do quadro reacional. • Em casos com comprometimento neural, introduzir corticosteróides, segundo o esquema já referido, imobilizar o segmento afetado e programar ações de prevenção de incapacidades. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 379 Hanseníase • Deverá ser indicada a utilização da prednisona – no mesmo esquema estabelecido na reação Tipo 1 – quando ocorrer reação Tipo 2 nas seguintes situações: ❯ mulheres em idade fértil; ❯ comprometimento neural; ❯ irite ou iridociclite; ❯ orquiepididimite; ❯ mãos e pés reacionais; ❯ nefrite; ❯ eritema nodoso necrotizante; ❯ vasculite (fenômeno de Lúcio). Deve-se levar em consideração a gravidade intrínseca de cada quadro clínico e a necessidade de outras medidas terapêuticas, tal como encaminhamento para cirurgia. Casos de cronicidade da reação Tipo 2, subintrante ou com complicações graves, devem ser encaminhados para centro de referência. Aspectos epidemiológicos A hanseníase é doença de notificação compulsória em todo o território nacional, sendo objeto de atuação na saúde pública devido à sua magnitude, e potencial incapacitante e por acometer a faixa etária economicamente ativa. Seu potencial incapacitante deve ser combatido com PQT/OMS adequada e instituição de técnicas de prevenção de incapacidades. No Brasil, apesar da redução na taxa de prevalência observada, de 19 para 4,52 doentes em cada 10 mil habitantes, no período de 1985 a 2003, a hanseníase ainda constitui problema de saúde pública que exige uma vigilância resolutiva. Desde 1985, o país vem reestruturando suas ações voltadas para este problema. Em 1999, ratificou o compromisso de eliminar a hanseníase até 2005, quando se objetiva alcançar o índice nacional de menos de um doente em cada 10 mil habitantes e, até 2010, sustentar os níveis de eliminação nos estados e conquistá-los em cada município. O mapa e os gráficos a seguir ilustram o grau de endemicidade das diferentes unidades federadas e macrorregiões e a série histórica referente à prevalência e detecção de casos novos de hanseníase no período. Em que pesem todos os esforços realizados para se alcançar a eliminação da hanseníase ainda é necessário buscar impactar sua transmissão, observada na taxa de detecção anual de casos novos. 380 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hanseníase Prevalência de hanseníase segundo unidades da Federação. Brasil, 2005* Muito alto: 10 a 20 casos/10 mil hab. Alto: 5 a 10 casos/10 mil hab. Médio: 1 a 5 casos/10 mil hab. Baixo: < 1 caso/10 mil hab. *Dados até 31/3/2004 Fonte: Sinan/SUS/ATDS/SES/IBGE 6 Hanseníase – coeficientes anuais de detecção e prevalência (por 10 mil hab.). Brasil, 1985-2003 20 3 2,5 15 2 10 1,5 H 1 5 0,5 0 95 96 97 98 99 00 01 02 03 Prevalência 16,4 17,1 17,0 18,0 18,1 18,5 17,1 15,4 13,0 10,5 8,8 6,7 5,5 4,8 4,7 4,4 4,5 Detecção 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 5,1 4,3 0 1,42 1,34 1,42 1,84 1,89 1,89 2,05 2,31 2,17 2,15 2,30 2,54 2,82 2,60 2,52 2,47 2,73 2,69 2,77 Fonte: SVS/MS Coeficientes de prevalência e de detecção da hanseníase segundo macrorregião. Brasil, 2003* Macrorregião Prevalência Detecção Nº Coef./10 mil Nº Coef./10 mil Brasil 79.908 4,52 49.026 2,77 Norte 15.764 11,44 10.488 7,61 Nordeste 33.234 6,73 17.380 3,52 Sudeste 18.079 2,40 10.917 1,45 Centro-Oeste 10.783 8,75 8.057 6,54 Fonte: Sinan/ATDS/SES *Dados atualizados em 31/3/2004 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 381 Hanseníase Vigilância epidemiológica Objetivos • Detectar e tratar precocemente os casos novos, para interromper a cadeia de transmissão e prevenir as incapacidades físicas. • Realizar exames dermatoneurológicos de todos os contatos de casos de hanseníase com o objetivo de detectar novos casos e iniciar o tratamento o mais precocemente possível, evitando a ocorrência de novos casos. • Reduzir a morbidade da doença para menos de 1 doente por 10 mil habitantes – meta de eliminação proposta pela OMS. Os objetivos do Programa Nacional de Eliminação da Hanseníase são: • eliminar a hanseníase como problema de saúde pública até 2005, descentralizando os serviços de diagnóstico e tratamento para a rede básica de saúde, ampliando o acesso e promovendo a universalização da cura. • ampliar o acesso ao diagnóstico e tratamento nos municípios de maior endemicidade, para acelerar o processo de eliminação da hanseníase. • promover e apoiar o processo de educação permanente, habilitando os profissionais de saúde para as ações de diagnóstico, tratamento e acompanhamento da hanseníase. • mobilizar a sociedade civil para a promoção do conhecimento sobre os sinais iniciais da hanseníase e dos locais de acesso ao diagnóstico e tratamento. • assegurar, nas unidades de saúde, tratamento completo para as formas paucibacilares e multibacilares. • ampliar a oferta de procedimentos de reabilitação física aos pacientes portadores de incapacidades/deformidades decorrentes da doença. Definição de caso Uma pessoa que apresente uma ou mais de uma das seguintes características e que requer poliquimioterapia: • lesão(ões) de pele, com alteração de sensibilidade; • acometimento de nervo(s) com espessamento neural; • baciloscopia positiva. Notificação Concluído o diagnóstico da doença, o caso deve ser notificado ao órgão de vigilância epidemiológica hierarquicamente superior, através de uma ficha de notificação/investigação do Sistema de Informações de Agravos de Notificação (Sinan). Descoberta de casos A descoberta de casos de hanseníase pode ocorrer por detecção passiva ou ativa. 382 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hanseníase A detecção passiva acontece na própria unidade de saúde, durante as atividades gerais de atendimento à população. Nessas situações há uma busca sistemática de portadores da doença, pela equipe da unidade de saúde. Há duas situações onde pode ocorrer a detecção passiva: na demanda espontânea da população para os serviços da unidade de saúde, em que poderá haver casos com sinais e sintomas dermatológicos e/ou neurológicos, e nos encaminhamentos feitos por outras unidades de saúde, para confirmação diagnóstica da doença - casos com suspeita de hanseníase. Nestas situações é realizado o exame dermatoneurológico, para confirmar ou não o diagnóstico de hanseníase. Entende-se por detecção ativa de casos de hanseníase a busca sistemática de doentes, pela equipe da unidade de saúde, por meio das seguintes atividades: • investigação epidemiológica de um caso conhecido (exame de contatos); • exame das pessoas que demandam espontaneamente os serviços gerais de unidade de saúde por outros motivos que não sinais e sintomas dermatológicos ou neurológicos; • exame de grupos específicos – em prisões, quartéis, escolas, de pessoas que se submetem a exames periódicos, etc.; • mobilização da comunidade adstrita à unidade, principalmente em áreas de alta prevalência da doença, para que as pessoas demandem os serviços de saúde sempre que apresentarem sinais e sintomas suspeitos. 6 Em todas essas situações deve ser realizado o exame dermatoneurológico para o diagnóstico de hanseníase. Visando o diagnóstico precoce, deve-se intensificar a busca ativa de doentes através do exame de todos os contatos do caso diagnosticado e das outras formas de detecção ativa. Existem condições importantes para que o diagnóstico da hanseníase seja feito precocemente, referentes à população, às unidades de saúde e aos profissionais de saúde: • a população deve conhecer os sinais e sintomas da doença e deve estar informada de que a hanseníase tem cura. Deve estar informada, também, sobre o tratamento e estar motivada a buscá-lo nas unidades de saúde de seu município; • as unidades de saúde devem ter seus serviços organizados para desenvolver as atividades de controle da hanseníase, garantindo o acesso da população aos mesmos; • os profissionais de saúde devem estar capacitados para reconhecer os sinais e sintomas da doença, isto é, para diagnosticar e tratar os casos de hanseníase; • os profissionais de saúde devem estar capacitados para realizar ações de promoção de saúde. H A descoberta de casos novos implica o cumprimento dos seguintes passos: suspeição diagnóstica da hanseníase, confirmação diagnóstica, tratamento poliquimioterápico do caso e investigação epidemiológica (exame de contatos) do caso identificado. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 383 Hanseníase Primeiras medidas a serem adotadas Assistência ao paciente Tratamento específico – o tratamento da hanseníase é eminentemente ambulatorial. O esquema terapêutico utilizado é a PQT/OMS. Os medicamentos devem estar disponíveis em todas as unidades de saúde de municípios endêmicos. A alta por cura é dada após a administração do número de doses preconizadas, segundo o esquema terapêutico administrado. Prevenção e tratamento de incapacidades físicas – todos os casos de hanseníase, independentemente da forma clínica, deverão ser avaliados quanto ao grau de incapacidade no momento do diagnóstico e, no mínimo, uma vez por ano, inclusive na alta por cura. Toda atenção deve ser dada ao diagnóstico precoce do comprometimento neural. Para tanto, os profissionais de saúde e pacientes devem ser orientados para uma atitude de vigilância do potencial incapacitante da hanseníase. Tal procedimento deve ter em vista o tratamento adequado para cada caso e a prevenção de futuras deformidades. Essas atividades não devem ser dissociadas do tratamento quimioterápico, estando integradas na rotina dos serviços de acordo com o grau de complexidade dos mesmos. Roteiro para investigação epidemiológica A partir do diagnóstico de um caso de hanseníase deve ser feita, de imediato, a sua investigação epidemiológica. Algumas características de um caso suspeito: • uma ou mais lesões de pele com alteração de sensibilidade; • perda de sensibilidade nas mãos ou pés; • um ou mais nervos periféricos espessados; • nervos doloridos; • câimbra e/ou formigamento. Para a descoberta de casos é fundamental que se divulgue junto à população os sinais e sintomas da doença e a existência de tratamento e cura para a hanseníase. Os materiais educativos e os meios de comunicação devem utilizar linguagem compreensível à comunidade, considerando a sua realidade sociocultural. A investigação epidemiológica tem o objetivo de romper a cadeia epidemiológica da doença, procurando identificar a fonte de contágio do doente e descobrir novos casos de hanseníase entre as pessoas que com ele convivem no mesmo domicílio (contatos intradomiciliares do doente), bem como prevenir a contaminação de outras pessoas. As pessoas que vivem com o doente de hanseníase correm maior risco de serem contaminadas do que a população em geral. Por isso, a vigilância de contatos intradomiciliares é muito importante. Considera-se como contato intradomiciliar toda e qualquer pessoa que resida ou tenha residido com o doente nos últimos cinco anos. 384 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hanseníase A vigilância de contatos, portanto, compreende a busca sistemática de novos casos de hanseníase entre as pessoas que convivem com o doente, a fim de que sejam adotadas medidas de prevenção em relação às mesmas: o diagnóstico e o tratamento precoces. Uma vez identificados, os contatos do portador de hanseníase devem ser submetidos ao exame dermatoneurológico e se o diagnóstico de hanseníase for confirmado devem receber o tratamento específico. Os contatos devem receber informações sobre a doença e sobre a necessidade de ficarem atentos ao aparecimento de seus sinais e sintomas, devendo, neste caso, procurar a unidade de saúde. Vacinação BCG (bacilo de Calmette-Guërin) Recomendações • A aplicação de duas doses da vacina BCG-ID a todos os contatos intradomiciliares dos casos de hanseníase, independentemente de serem PB ou MB. • A aplicação da 1ª dose da vacina está condicionada à realização do exame dermatoneurológico; se já existir a cicatriz por BCG-ID, essa deve ser considerada como primeira dose, independente da época em que foi aplicada. • A vacina BCG será administrada na dose de 0,1ml, sem necessidade de prova tuberculínica prévia. • A aplicação da vacina será efetuada por via intradérmica, no braço direito, na altura da inserção inferior do músculo deltóide. Essa localização permite a fácil verificação da cicatriz e limita as reações ganglionares à região axilar. • A segunda dose deverá ser feita seis meses após a aplicação da primeira, próximo ao local da 1ª aplicação, para mais fácil reconhecimento. • Todo contato deve receber orientação no sentido de que não se trata de vacina específica para a hanseníase e que, prioritariamente, esta é destinada ao grupo de risco, contatos intradomiciliares. Em alguns casos, o aparecimento de sinais clínicos de hanseníase logo após a vacinação pode estar relacionado com o aumento da resposta imunológica, em indivíduo anteriormente infectado. 6 H Análise de dados Para a operacionalização e eficácia da vigilância epidemiológica da hanseníase na obtenção e fornecimento de informações fidedignas e atualizadas sobre a doença, seu comportamento epidemiológico e atividades de controle faz-se necessário um sistema de informação efetivo e ágil. O sistema de informação é componente fundamental da vigilância epidemiológica, subsidiando-a na tomada de decisão de planejamento das atividades de controle da doença, bem como na sua execução: informação – decisão – ação. Cada unidade de saúde deve manter um arquivo organizado com a definição do fluxo das informações, atribuição de responsabilidades, prazos e periodicidade. As informações geradas são úteis para o diagnóstico e análise da situação de saúde da população e para o processo de planejamento (identificação de prioridades, programação Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 385 Hanseníase de atividades, alocação de recursos, avaliação das ações). Portanto, é necessário que todos os profissionais de saúde, bem como a comunidade, tenham acesso a essas informações. Acompanhamento de casos Informações relativas ao acompanhamento dos casos são úteis para a avaliação da efetividade do tratamento e para o monitoramento da prevalência da doença. Essas informações devem ser registradas nas unidades de saúde (no prontuário do doente e na ficha de acompanhamento do caso) e enviadas ao órgão de vigilância epidemiológica hierarquicamente superior através de relatório de acompanhamento do caso. O fluxo e a periodicidade no envio dessas informações devem ser estabelecidos pela unidade federada, em conformidade com os procedimentos preconizados para o sistema de informação. A partir dessas informações, são construídos indicadores epidemiológicos e operacionais indispensáveis à análise epidemiológica da doença, acompanhamento, avaliação operacional do programa de controle da hanseníase e planejamento de suas ações. É importante atentar para uma organização específica que possibilite a verificação, no mínimo, semanal dos dados relativos ao seguimento das pessoas portadoras da doença e de seus contatos. Os faltosos devem ser precocemente identificados para os procedimentos de busca, bem como os contatos intradomiciliares para exames dermatoneurológicos. As pessoas que já completaram o tratamento, segundo as normas técnicas, devem ser retiradas do registro ativo através da alta por cura. Deve ser dada saída administrativa aos doentes paucibacilares que abandonaram o tratamento e que tenham permanecido no registro ativo por pelo menos 2 anos a contar da data do início do diagnóstico; e aos doentes multibacilares que abandonaram o tratamento, e tenham permanecido no registro ativo por pelo menos 4 anos a contar da data de início do diagnóstico. O setor de vigilância epidemiológica, no âmbito municipal, deve ser comunicado desses procedimentos. Outro aspecto importante é a busca de informações sobre os óbitos ocorridos dentre os portadores da hanseníase, que devem ser registrados no prontuário e retirados do registro ativo – alta por óbito. Além disso, devem ser pesquisados os múltiplos fichamentos para serem retirados do sistema (alta por múltiplo fichamento). Já aqueles cujo diagnóstico de hanseníase foi errôneo devem ser considerados como alta por erro diagnóstico. Os transferidos para acompanhamento em outra unidade devem ser registrados como transferência. As transferências não são consideradas como altas para o Sinan, uma vez que o paciente permanecerá em tratamento e continuará sendo computado dentro da prevalência nacional. 386 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hanseníase Indicadores Indicadores são aproximações quantificadoras de um determinado fenômeno. Podem ser usados para ajudar a descrever determinada situação e para acompanhar mudanças ou tendências em um período de tempo. Os indicadores de saúde permitem a comparabilidade entre diferentes áreas ou diferentes momentos e fornecem subsídios ao planejamento das ações de saúde. Os indicadores da endemia hansênica constam na Portaria GM nº 1.073 de 26 de setembro de 2000. Classificação dos indicadores Podem ser classificados em dois grandes grupos, de acordo com o tipo de avaliação a que se destinam: epidemiológicos e operacionais. Indicadores epidemiológicos Medem a magnitude ou transcendência do problema de saúde pública. Referem-se, portanto, à situação verificada na população ou no meio ambiente num dado momento ou determinado período. Ex: coeficiente de detecção de casos e proporção de casos com deformidades detectados no ano. 6 Indicadores operacionais Medem o trabalho realizado, seja em função da qualidade ou quantidade. Ex: proporção de casos multibacilares que completaram PQT, entre os que deveriam ter completado. H Notas • Todos os indicadores listados devem ser calculados utilizando-se dados de casos residentes na unidade federada, independente do local de detecção e/ou tratamento. • Além dos indicadores de nível nacional listados, outros devem ser utilizados segundo a necessidade de acompanhamento e avaliação do programa de controle e eliminação da hanseníase em nível local, regional, municipal e estadual, tais como: proporção de examinados, entre os contatos intradomiciliares, de casos novos detectados no ano; proporção de casos, detectados no ano, submetidos à baciloscopia; proporção de casos novos, detectados no ano, com baciloscopia positiva; proporção de casos novos, diagnosticados no ano, com grau de capacidade física variado. O planejamento das atividades de controle da hanseníase é um instrumento de sistematização de nível operativo que perpassa todas as ações, que vão do diagnóstico situacional, estratégia de intervenção e monitorização à avaliação dos resultados alcançados. O conhecimento de dados básicos é indispensável ao planejamento. Dentre outros, destacam-se: • população alvo (da unidade de saúde, município ou estado); • número de casos de hanseníase em registro ativo; • número de contatos intradomiciliares de casos novos; • casos de hanseníase com incapacidades físicas. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 387 Hanseníase Indicadores epidemiológicos Indicadores* Construção 1. Coeficiente de detecção anual de casos novos, por 10 mil hab. 2. Coeficiente de detecção anual de casos novos, na população de 0 a 14 anos, por 10 mil hab. Utilidade Casos novos residentes diagnosticados no ano X 10 mil População total residente em 1/7/ano X 10 mil População residente, com idade entre 0 e 14 anos, em 1/7/ano Alto: 2,0 – 1,0/10 mil hab. Médio: 1,0 – 0,2/10 mil hab. Baixo: < 0,2/10 mil hab. Determinar a tendência secular da endemia Muito alto: 1,0 – 0,5/10 mil hab. Alto: 0,5 – 0,25/10 mil hab. Médio: 0,25 – 0,05/10 mil hab. Hiperendêmico: > 20,0/10 mil hab. População total residente em 31/12/ano 5. Proporção de curados no ano, com incapacidades físicas*** Muito alto: 4,0 – 2,0/10 mil hab. Baixo: < 0,05/10 mil hab. X 10 mil 4. Proporção de casos com incapacidades físicas, entre os casos novos detectados e avaliados no ano** Hiperendêmico: > 4,0/10 mil hab. Hiperendêmico: > 1,0/10 mil hab. Casos novos residentes, com 0 a 14 anos de idade, diagnosticados no ano Casos existentes residentes (em registro ativo) em 31/12/ano 3. Coeficiente de prevalência por 10 mil hab. Determinar a tendência secular da endemia e medir a intensidade das atividades de detecção dos casos Parâmetros Muito alto: 20,0 – 0,0/10 mil hab. Alto: 10,0 – 5,0/10 mil hab. Médio: 5,0 – 1,0/10 mil hab. Baixo: < 1,0/10 mil hab. Casos novos residentes, diagnosticados no ano, com grau de incapacidade física II X 100 Casos novos residentes, diagnosticados no ano, com grau de incapacidade física avaliado Casos paucibacilares/multibacilares, curados no ano, com grau de incapacidade II X 100 Casos paucibacilares/multibacilares, curados no ano, com grau de incapacidade avaliado por ocasião da cura Medir a magnitude da doença Estimar a efetividade das atividades para a detecção precoce de casos; estimar a endemia oculta Avaliar a transcendência da doença. Subsidiar a política de ação para seqüelas Programar insumos para a prevenção e tratamento das incapacidades pós-alta Alto: > 10% Médio: 5-10% Baixo: < 5% Alto: > 10% Médio: 10-5% Baixo: < 5% Fonte: Sinan/SES *Todos os indicadores devem ser calculados utilizando-se dados de casos residentes, independentemente do local de detecção e tratamento. *Indicador utilizado somente quando o percentual de casos, com grau de incapacidade avaliado (ver indicadores operacionais), for maior ou igual a 75%. ***Esse indicador deve ser construído separadamente, para casos paucibacilares e multibacilares. Deve ser utilizado somente quando o percentual de casos, com grau de incapacidade avaliado, for maior ou igual a 75%. 388 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hanseníase Indicadores operacionais Indicadores* 1. Proporção de casos novos, diagnosticados no ano, que iniciaram poliquimioterapia padrão OMS Construção Utilidade Casos novos diagnosticados que iniciaram PQT no ano Parâmetros Total de casos novos diagnosticados no ano Medir a qualidade do atendimento dos serviços de saúde Bom: > 98% Regular: 90 – 98% Precário: < 90% 2. Proporção de casos Casos novos, diagnosticados no ano, novos, diagnosticados no com grau de incapacidade avaliado ano, com grau de incapacidade física avaliado Total de casos novos diagnosticados no ano Medir a qualidade do atendimento dos serviços de saúde Bom: > 90% Regular: 75 – 90% Precário: < 75% Avaliar a efetividade dos tratamentos Bom: > 90% Regular: 75 – 90% Precário: < 75% Medir a qualidade do atendimento dos serviços de saúde Bom: > 90% Regular: 75 – 90% Precário: < 75% Medir a capacidade dos serviços em assistir aos casos de hanseníase Bom: > 10% Regular: 10 – 25% Precário: > 25% X 100 3. Proporção de cura entre casos novos, diagnosticados nos anos das coortes** Casos novos diagnosticados nos anos das coortes e curados até 31/12/ano de avaliação 4. Proporção de casos curados no ano com grau de incapacidade físico avaliado Casos curados no ano com grau de incapacidade física avaliado por ocasião da cura 5. Proporção de abandono de tratamento entre os casos novos diagnosticados nos anos das coortes** 6. Percentagem de abandono do tratamento na prevalência do período 7. Percentagem de examinados entre os contatos intradomiciliares de casos novos diagnosticados no ano 8. Proporção de municípios com ações de controle implantadas 9. Proporção da população coberta pelas ações de controle** 10. Proporção de unidades de saúde da rede básica que desenvolvem ações e controle X 100 X 100 Total de casos diagnosticados nos anos das coortes X 100 Total de casos curados no ano Casos novos, diagnosticados nos anos das coortes que abandonaram o tratamento ou estão em situação ignorada em 31/12 do ano de avaliação X 100 Total de casos novos diagnosticados nos anos das coortes Casos existentes residentes (em registro ativo) não atendidos no ano de avaliação + saídas administrativas no ano de avaliação X 100 Medir a capacidade dos serviços em assistir aos casos de hanseníase X 100 Avaliar a execução da atividade de vigilância de contatos Bom: ≥ 75% Regular: 50 – 75% Precário: < 50% Medir a cobertura territorial das ações de controle Bom: ≥ 75% Regular: 75 – 60% Precário: < 60% Medir a cobertura populacional das ações de controle Bom: ≥ 90% Regular: 75 – 90% Precário: < 75% Total de casos existentes residentes (em registro ativo) em 31/12 do ano de avaliação + total de saídas do registro ativo no ano de avaliação Contatos intradomiciliares de casos novos diagnosticados no ano, que foram examinados Total de contatos intradomiciliares de casos novos diagnosticados no ano Número de municípios com ações de controle implantadas X 100 Número total de municípios População coberta pelas ações de controle X 100 População total residente Número de centros de saúde, postos de saúde e unidades de saúde da família, cadastrados no SUS, que desenvolvem ações de controle da hanseníase X 100 Número total de centros de saúde, postos de saúde e unidades de saúde da família cadastrados no SUS 6 Bom: < 10% Regular: 10 – 25% Precário: > 25% Medir a cobertura institucional das ações de controle H A definir Fonte: Sinan/SES *Todos os indicadores devem ser calculados para casos residentes, independentemente do local de detecção e tratamento. **Nos níveis municipal e estadual, esses indicadores devem ser calculados separadamente para casos paucibacilares e multibacilares. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 389 Hanseníase Ficha de Notificação Hanseníase Instruções de Preenchimento Ficha de Notificação/Investigação – Sinan Windows No - Anotar o número da notificação atribuído pela unidade de saúde para identificação do caso (Ex.: nº do registro na unidade de saúde, nº do prontuário). CAMPO DE PREENCHIMENTO OBRIGATÓRIO. 1 - Este campo identifica o tipo de notificação, informação necessária à digitação. Não é necessário preenchê-lo. 2 - Anotar a data da notificação: data de preenchimento da ficha de notificação/investigação. CAMPO DE PREENCHIMENTO OBRIGATÓRIO. 3 - Preencher com o nome completo do município, ou código correspondente segundo cadastro do IBGE, onde está localizada a unidade de saúde (ou outra fonte notificadora) que realizou a notificação. CAMPO DE PREENCHIMENTO OBRIGATÓRIO. 4 - Preencher com o nome completo da unidade de saúde (ou outra fonte notificadora), ou código correspondente segundo cadastro estabelecido pelo Sinan, que realizou a notificação do caso. CAMPO DE PREENCHIMENTO OBRIGATÓRIO. 5 - Nome do agravo/doença, ou código corespondente estabelecido pelo Sinan (CID 10), que está sendo notificado. 6 - Anotar a data em que foi realizado o diagnóstico do caso. CAMPO DE PREENCHIMENTO OBRIGATÓRIO. 7 - Preencher com o nome completo do paciente (sem abreviações). 8 - Preencher com a data de nascimento do paciente (dia/mês/ano), de forma completa. 9 - Anotar a idade do paciente somente se a data de nascimento for desconhecida (Ex. 20 dias = 20; 3 meses = 3 M; 26 anos = 26 A. OBS.: Se a data de nascimento não for preenchida, a idade será CAMPO DE PREENCHIMENTO OBRIGATÓRIO. 10 - Preencher segundo a categoria referente ao sexo do paciente (M = masculino; F = feminino e I = ignorado). 11 - Preencher com o código correspondente à cor ou raça declarada pela pessoa: 1) Branca; 2) Preta; 3) Amarela (compreendendo-se nesta categoria a pessoa que se declarou de raça amarela); 4) Parda (incluindo-se nesta categoria a pessoa que se 390 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hanseníase declarou mulata, cabocla, cafuza, mameluca ou mestiça de preto com pessoa de outra cor ou raça); 5) Indígena (considerando-se nesta categoria a pessoa que se declarou indígena ou índia). 12 - Preencher com o código correspondente ao número de anos de estudo concluídos. A classificação é obtida em função da série e do grau que a pessoa está freqüentando ou freqüentou, considerando a última série concluída com aprovação. A correspondência é feita de forma que cada série concluída com aprovação corresponda a um ano de estudo. (Ex.: paciente cursou 4 anos, porém não concluiu o último ano; portanto, deverá ser incluído na categoria de 1 a 3). Este campo não se aplica para paciente com idade inferior a 7 anos. 13 - Preencher com o nº do cartão único do Sistema Único de Saúde – SUS. 14 - Preencher com o nome completo da mãe do paciente (sem abreviações). 6 15 - Anotar o tipo (avenida, rua, travessa, etc.), nome completo ou código correspondente do logradouro da residência do paciente. Se o paciente for indígena, anotar o nome da aldeia. 16 - Anotar o nº do logradouro da residência do paciente (Ex.: nº 575). 17 - Anotar o complemento do logradouro (Ex.: Bloco B, Apto 402, Lote 25, Casa 14, etc.). 18 - Anotar o ponto de referência para localização da residência do paciente (perto da padaria do João, por exemplo). H 19 - Anotar a sigla da unidade federada da residência do paciente (Ex.: DF). 20 - Anotar o nome do município (ou código correspondente segundo cadastro do IBGE) da residência do paciente. - Anotar o nome do distrito de residência do paciente. 21 - Anotar o nome do bairro (ou código correspondente segundo cadastro do Sinan) de residência do paciente. 22 - Anotar o código de endereçamento postal do logradouro (avenida, rua, travessa) da residência do paciente (Ex.: CEP: 70.036-030). 23 - Anotar o número do telefone do paciente. 24 - Zona de residência do paciente por ocasião da notificação (Ex.: 1 = área com característica estritamente urbana; 2 = área com característica estritamente rural; 3 = área rural com aglomeração populacional que se assemelha a uma área urbana). 25 - Anotar o nome do país de residência quando o paciente notificado residir em outro país. 26 - Informar a atividade exercida pelo paciente no setor formal, informal ou autônomo ou sua última atividade exercida quando o paciente for desempregado. O ramo de atividade econômica do paciente refere-se às atividades econômicas desenvolvidas Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 391 Hanseníase nos processos de produção do setor primário (agricultura e extrativismo); secundário (indústria) ou terciário (serviços e comércio). 27 - Nº DE LESÕES CUTÂNEAS – Registrar o nº de lesões de pele com alteração de sensibilidade existentes no paciente por ocasião do diagnóstico. 28 - Nº DE TRONCOS NERVOSOS ACOMETIDOS – Registrar o nº de troncos nervosos espessados examinados por ocasião do diagnóstico. 29 - FORMA CLÍNICA – Anotar o nº correspondente à classificação clínica, segundo classificação de Madrid, do caso por ocasião do diagnóstico. 30 - AVALIAÇÃO DA INCAPACIDADE NO DIAGNÓSTICO – Anotar o nº correspondente ao grau de incapacidade física resultante da avaliação por ocasião do diagnóstico, segundo normas técnicas vigentes. 31 - CLASSIFICAÇÃO OPERACIONAL – Anotar o nº correspondente da classificação operacional do caso para fins de tratamento, atribuída por ocasião do diagnóstico, segundo normas técnicas vigentes. 32 - MODO DE ENTRADA – Anotar o nº correspondente ao modo de entrada do caso de hanseníase no registro ativo. 1) CASO NOVO – Indivíduo que apresenta uma ou mais das seguintes características, requerendo terapia e virgem de tratamento: • lesão(ões) de pele com alteração de sensibilidade; • acometimento de nervo(s) com espessamento neural; • baciloscopia positiva. 2) TRANSFERÊNCIA DO MESMO MUNICÍPIO – Paciente que transferiu tratamento de outra unidade de saúde do mesmo município. 3) TRANSFERÊNCIA DE OUTRO MUNICÍPIO (mesma UF) – Paciente que transferiu tratamento de outra unidade de saúde localizada em outro município da mesma unidade federada. 4) TRANSFERÊNCIA DE OUTRO ESTADO – Paciente que transferiu tratamento de outra unidade de saúde localizada em outra unidade federada. 5) TRANSFERÊNCIA DE OUTRO PAÍS – Paciente que transferiu tratamento de outra unidade de saúde localizada em outro país. 6) RECIDIVA – Indivíduo que apresenta sinais de atividade clínica da doença após alta por cura. 7) OUTROS REINGRESSOS – Situações em que o paciente recebeu algum tipo de alta e retorna requerendo tratamento específico, exceto recidiva. Ex.: casos que receberam alta estatística (saída administrativa) em anos anteriores e reapareceram com a doença em atividade; casos considerados equivocadamente como falecidos; casos multibacilares tratados erroneamente como paucibacilares, que receberam alta por cura no passado e se reapresentaram doentes à unidade de saúde. 392 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hanseníase 33 - MODO DE DETECÇÃO DO CASO NOVO – Anotar o número correspondente ao modo de detecção do caso novo (este campo deve ser preenchido somente quando o MODO DE ENTRADA for CASO NOVO): 1) ENCAMINHAMENTO – Caso encaminhado por outra unidade, instituições de saúde, consultório médico, agente de saúde, colaboradores voluntários, etc. para confirmação clínica do diagnóstico e/ou início de tratamento. 2) DEMANDA ESPONTÂNEA – Caso novo que se apresentou voluntariamente à unidade de saúde devido a sinais e/ou sintomas de hanseníase. 3) EXAME DE COLETIVIDADE – Caso novo diagnosticado a partir de exame clínico realizado para detecção de casos de hanseníase em pessoas pertencentes a grupos organizados ou não da comunidade, como escolas, fábricas, recrutas militares, empresas, campanhas, etc. 6 4) EXAME DE CONTATOS – Caso novo diagnosticado a partir de exame clínico dos contatos intradomiciliares de caso de hanseníase (vigilância de contatos). 5) OUTROS MODOS – Caso novo diagnosticado em outras situações, por exemplo, achado casual em consulta médica por outros motivos, exame para fins de atestado, exame admissional, check-up, etc. 34 - BACILOSCOPIA – Anotar o número correspondente ao resultado da baciloscopia ou a sua não realização, por ocasião do diagnóstico. 35 - DATA DO INÍCIO DO TRATAMENTO – Registrar o dia, mês e ano do início do tratamento específico (esquema terapêutico inicial). H 36 - ESQUEMA TERAPÊUTICO INICIAL – Anotar o número correspondente ao esquema terapêutico inicial instituído por ocasião do diagnóstico. 37 - Nº DE CONTATOS REGISTRADOS – Registrar o número de pessoas que residem com o paciente por ocasião do diagnóstico (ou residiram nos últimos 5 anos). 38 - DOENÇA RELACIONADA AO TRABALHO – Informar se o paciente adquiriu a doença em decorrência do processo de trabalho, determinada pelos ambientes e ou condições inadequadas de trabalho (contaminação acidental, exposição ou contato direto). Observações: informar as observações necessárias para complementar a investigação. 39 - Informar o nome do município/unidade de saúde responsável por esta investigação. 40 - Informar o código da unidade de saúde responsável por esta investigação. 41 - Informar o nome completo do responsável por esta investigação. Ex.: Mário José da Silva. 42 - Informar a função do responsável por esta investigação. Ex.: enfermeiro. 43 - Registrar a assinatura do responsável por esta investigação. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 393 Hanseníase Educação em saúde O processo educativo nas ações de controle da hanseníase deve contar com a participação do paciente (ou de seus representantes), familiares e comunidade nas decisões que lhes digam respeito, bem como na busca ativa de casos e no diagnóstico precoce, prevenção e tratamento de incapacidades físicas, combate ao eventual estigma e manutenção do paciente no meio social. Esse processo deve ter como referência as experiências municipais de controle social. Na assistência ao paciente com hanseníase, deve-se discutir, sempre que necessário, todas as questões inerentes à sua doença, que o seu tratamento regular levará a cura, estimulando-o sempre, na prática do auto-cuidado. No momento da cura, deve-se orientar o paciente sobre a possibilidade do surgimento de episódios reacionais, mesmo após essa alta, quando deve procurar imediatamente a atenção do serviço de saúde para evitar seqüelas. Orientar, sempre, o paciente na prática do auto-cuidado. O Ministério da Saúde coordenará, dando apoio às demais instituições, um programa nacional, sistematizado e contínuo, de divulgação de massa (extensiva e intensiva), garantindo informação e esclarecimentos à população sobre a hanseníase, dentro de um programa global de saúde, cabendo a cada unidade federada e municípios desenvolver o seu próprio processo de educação e comunicação. O Programa Nacional de Eliminação da Hanseníase e as secretarias estaduais e municipais da saúde encaminharão documentos informativos sobre a hanseníase, para as diversas entidades e meios de comunicação de massa, visando maximizar os conhecimentos científicos atuais sobre a doença, de modo a evitar o uso de informações equivocadas e/ou termos inadequados. Deve-se também estimular a produção de materiais de apoio no nível local, com a participação dos usuários e das organizações comunitárias, que subsidiem o processo educativo nas ações de controle da hanseníase. Sempre que se fizer necessário, visando à construção e reconstrução do conhecimento e devida compreensão do que é hanseníase, poderá ser feita sua relação com os termos existentes na terminologia popular, adequando-a à clientela. 394 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hantaviroses HANTAVIROSES CID 10: A98.5 Características clínicas e epidemiológicas Descrição A hantavirose é uma doença emergente que se manifesta sob diferentes formas, desde doença febril aguda, cuja suspeita diagnóstica é baseada fundamentalmente em informações epidemiológicas, até quadros pulmonares e cardiovasculares mais característicos ou, eventualmente, como uma febre hemorrágica com comprometimento renal. Inicialmente, a hantavirose do Novo Mundo foi descrita, apenas com o grande comprometimento pulmonar, recebendo o nome de síndrome pulmonar por hantavírus (SPH). Posteriormente, foi relatado um comprometimento cardíaco importante, a partir da publicação dos primeiros casos da América do Sul, passando a ser denominada síndrome cardiopulmonar por hantavírus (SCPH), a qual tem sido, até o momento, a única forma grave prevalente nas Américas. 6 Agente etiológico Vírus do gênero Hantavirus da família Bunyaviridae, sendo o único bunyavírus que não é um arbovírus. Estes vírus possuem envelope de dupla capa de lipídios, sendo, portanto, susceptíveis a muitos desinfetantes como lysol industrial, solução de hipoclorito de sódio a 2,5%, lisofórmio, detergentes e álcool etílico a 70%. Sua sobrevida, depois de eliminados no meio ambiente, ainda não é totalmente conhecida. Dentre os hantavírus identificados em infecções humanas, temos os que causam a febre hemorrágica com síndrome renal (FHSR) na Europa e na Ásia (Hantaan, Seoul, Dobrava, Puumala) e os que estão associados com a SCPH (Sin Nombre, Bayou, Black Creek Canal, Juquitiba, Castelo dos Sonhos, Araraquara, New York, Andes, Laguna Negra, Oran, Lechinguanas), além de outros identificados apenas em roedores silvestres. H Reservatório Os roedores silvestres são os reservatórios dos hantavírus. Cada tipo de vírus parece ter tropismo, por determinada espécie de roedor e somente a ela. Os hantavírus associados com os quadros de SCPH têm como reservatórios roedores da subfamília Sigmodontinae. Já os vírus responsáveis por quadros de febre hemorrágica com síndrome renal estão associados a roedores da subfamília Arvicolinae e Murinae. Provavelmente, os hantavírus evoluíram com os respectivos hospedeiros reservatórios, o que determinou esta especificidade. Dada a distribuição geográfica das espécies de roedores encontradas com hantavírus, percebe-se que Bolomys lasiurus mostra-se amplamente disseminado nos ambientes de cerrado e caatinga brasileiros. Nas áreas de Mata Atlântica as espécies Oligoryzomys nigripes Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 395 Hantaviroses ou Akodon cursor podem desempenhar importante papel na transmissão de hantavírus, enquanto que no estado do Maranhão foram identificados dois tipos específicos de reservatórios: Holochilus sciureus e Oligoryzomys fornesi. No roedor, a infecção pelo hantavírus não é letal, mantendo-o como reservatório por longo período, provavelmente por toda a vida. Os hantavírus são eliminados em grande quantidade, principalmente na urina, saliva e fezes. Modo de transmissão A infecção humana ocorre mais freqüentemente pela inalação de aerossóis, formados a partir da urina, fezes e saliva de roedores reservatórios. Outras formas de transmissão, para a espécie humana, foram também descritas: • percutânea, por meio de escoriações cutâneas ou mordeduras de roedores; • contato do vírus com mucosa (conjuntival, da boca ou do nariz), por meio de mãos contaminadas com excretas dos roedores. A transmissão pessoa a pessoa foi descrita na Argentina, tendo sido associada ao hantavírus Andes, tratando-se, porém, de relato isolado. Período de incubação Em média, de 2 a 3 semanas, com variação de 4 a 55 dias. Período de transmissibilidade Desconhecido até o momento. Aspectos clínicos, laboratoriais e terapêuticos Manifestações clínicas da SCPH Fase febril/prodrômica – observa-se febre, tosse seca, mialgia, principalmente na região dorso-lombar, dor abdominal, náusea, vômito, astenia e cefaléia. Essa fase dura em média de 3 a 5 dias, podendo evoluir para a fase cardiopulmonar. Fase cardiopulmonar – caracteriza-se por insuficiência respiratória aguda grave e choque circulatório, apresentando alta taxa de letalidade. As alterações laboratoriais mais relatadas nesta fase são: hemoconcentração (hematócrito > 45%), trombocitopenia (plaquetas < 150 mil cel/mm3), leucocitose (leucócitos > 12 mil cel/mm3) com neutrofilia acentuada e desvio à esquerda e linfopenia relativa com presença de linfócitos atípicos. Há redução da atividade protrombínica e aumento do tempo parcial de tromboplastina, elevação dos níveis séricos de alanina aminotransferases ou transaminase glutâmico-oxalacética (ALT-TGO) e desidrogenase lática (DHL). Observa-se hipoproteinemia e valores de fibrinogênio dentro da normalidade. Nos casos mais graves, pode ocorrer aumento nas concentrações da uréia e creatinina séricas, além de acentuada acidose metabólica. A hipoxemia é um achado importante, que pode indicar o grau de gra- 396 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hantaviroses vidade do caso; esta, desde o início do quadro, pode refletir-se na saturação de O2 inferior a 90%. Na radiografia de tórax há presença de infiltrado intersticial nos campos pulmonares, com ou sem a presença de derrame pleural que, quando presente, pode ser uni ou bilateral. Fase diurética – aumento da diurese espontânea define o início desta terceira fase, que se caracteriza por eliminação rápida de líquido acumulado no espaço extravascular, resolução da febre e do choque. Fase de convalescença – pode durar duas semanas ou mais, com melhora progressiva dos sinais e sintomas e lenta recuperação das alterações hemodinâmicas e da função respiratória. Febre hemorrágica com síndrome renal (FHSR) Esta síndrome apresenta, de modo geral, quadro clínico de início insidioso com febre, cefaléia, mialgia, dor abdominal, náuseas, vômitos, rubor facial, petéquias e hemorragia conjuntival. Seguem-se hipotensão, taquicardia, oligúria e hemorragias severas, com evolução para poliúria que, na maioria dos casos, antecipa o início da recuperação. Este quadro evolui, em média, por quatro semanas, do início até a convalescença. 6 Doença por hantavírus em crianças Sinais e sintomas – início abrupto, febre elevada (38oC a 40oC), mialgias frequentes, principalmente nas extremidades, e dor abdominal. Pode haver cefaléia e sintomas como náuseas e vômitos. Essa sintomatologia, apesar de similar à descrita na fase prodrômica de paciente adulto, deve ter alguns aspectos considerados como diferenciais, tais como febre alta constante, dor abdominal muito intensa que pode ser confundida como abdome agudo e mialgias mais comumente nas extremidades inferiores. Achados laboratoriais – os achados mais comuns encontrados têm sido linfócitos atípicos > 10%; plaquetas/mm3 < 130 mil e contagem de leucócitos com valores normais ou elevados com desvio à esquerda. H Diagnóstico diferencial Doenças de origem infecciosa – leptospirose influenza e parainfluenza, dengue, febre amarela e febre do Valle Rift, doenças por vírus Coxsackies, Adenovirus e Arenavirus (febre de Lassa), triquinelose, malária, pneumonias (virais, bacterianas, fúngicas e atípicas), septicemias, rickettsioses, histoplasmose, pneumocistose. Doenças não-infecciosas – abdome agudo de etiologia variada, síndrome de angústia respiratória (Sara), edema agudo de pulmão (cardiogênico), pneumonia intersticial por colagenopatias (lúpus eritematoso sistêmico, artrite reumatóide); doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). Diagnóstico laboratorial Elisa-IgM – método efetivo utilizado no diagnóstico de hantanvirose. Cerca de 95% dos pacientes com SCPH têm IgM demonstrável em amostra de soro coletada após o início dos sintomas. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 397 Hantaviroses Elisa-IgG – método utilizado para verificar conversão sorológica em amostras pareadas, utilizado em estudos de soroprevalência. RT-PCR – método de diagnóstico molecular, útil para definir o genotipo viral e identificação viral, utilizado nos estudos de epidemiologia molecular. É considerado diagnóstico complementar. Imunohistoquímica – técnica que identifica antígenos específicos para hantavírus em fragmentos de órgãos. Particularmente utilizado para o diagnóstico nos casos de óbito, em que não é possível a realização do diagnóstico sorológico, quando se dispõe de fragmentos de órgãos, ou em estudos retrospectivos, em que se usam espécimes conservados em formol ou blocos de parafina. Em caso de óbito, é possível fazer o diagnóstico através do exame sorológico – Elisa – IgM (sangue do coração ou venoso) ou exame imunohistoquímico. A coleta de amostra deve ser feita logo após a suspeita do diagnóstico, pois o aparecimento de anticorpos ocorre no início dos sintomas. Os anticorpos da classe IgM podem ser detectados até cerca de 60 dias após o início dos sintomas. Quando em amostra única, não for possível definir o diagnóstico, uma segunda amostra deverá ser coletada. Se mesmo assim, não houver diagnóstico conclusivo, colher uma terceira amostra duas a três semanas (14 a 21 dias) após a primeira. Tratamento SCPH – a eficácia do tratamento clínico depende da instituição precoce de medidas gerais de suporte clínico, pois até o momento não existe terapêutica antiviral comprovadamente eficaz contra a SCPH. São indicadas para manutenção das funções vitais, com ênfase na oxigenação e monitoramento rigoroso do paciente desde o início do quadro respiratório, inclusive com uso de ventilação assistida. A hipotensão deve ser controlada ministrando-se expansores plasmáticos, devendo-se ter extremo cuidado na sobrecarga hídrica, evitando-se o uso de drogas vasopressoras. Os distúrbios hidreletrolítico e ácido-básico devem ser corrigidos, inclusive com assistência em unidade de terapia intensiva-UTI, nos casos mais graves. Recomenda-se o isolamento do paciente em condições de proteção com barreiras (avental, luvas e máscara dotadas de filtros N95). Se houver necessidade de transferência de um paciente para UTI, o mesmo deve ser transportado em condições que assegurem estabilidade hemodinâmica; parâmetros ventilatórios adequados, com oxigenoterapia; acesso venoso, evitando-se a administração excessiva de líquidos por via endovenosa, e controle do estado cardiovascular. Estas medidas são recomendadas também para crianças. Condutas com gestantes com SCPH As gestantes devem ser seguidas durante o período de gravidez, parto e puerpério e a criança, após o nascimento. Todas as técnicas disponíveis (IgM, IgG, RT-PCR) devem ser feitas em diferentes momentos para que se possa obter o maior número possível de informações. No caso de óbito materno e/ou fetal, a realização de necrópsia completa é fundamental. 398 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hantaviroses No que se refere às mães com SCPH e em lactação, recomenda-se suspender a amamentação, controlar a criança com todo o suporte laboratorial e solicitar RT-PCR do leite materno. FHSR – recomenda-se as mesmas medidas adotadas para a SCPH, além de diálise peritoneal ou hemodiálise para o tratamento da insuficiência renal aguda. A ribavirina mostrou-se eficaz no tratamento da FHSR, contribuindo para a queda da mortalidade pela doença. Supõe-se que essa droga seja mais eficaz quando empregada no início da fase prodrômica. Aspectos epidemiológicos A SCPH foi detectada pela primeira vez no sudoeste americano, na primavera de 1993, causada pelo hantavírus Sin Nombre. Na América do Sul, os primeiros casos foram diagnosticados no estado de São Paulo, no município de Juquitiba, em novembro de 1993. A SCPH ocorre desde o Canadá até o sul da Argentina, país que mais tem notificado casos. A susceptibilidade é geral. Supõe-se que haja, em algumas regiões, um padrão de sazonalidade em função da biologia dos roedores silvestres. No Brasil, no período de novembro de 1993 a dezembro de 2003, foram confirmados 338 casos, dos quais 96,0%, confirmados laboratorialmente. As regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste registraram 173 (51,2%), 116 (34,3%) e 36 (10,7%) casos, respectivamente, enquanto que o Nordeste (9) e Norte (4), juntos, detectaram apenas, 3,8% dos casos. Apesar da ocorrência da doença em todas as regiões brasileiras, apenas onze estados registraram casos, dos quais 84,6% do total no Paraná (91/26,9%), Santa Catarina (49/14,5%), Rio Grande do Sul (33/9,8%), São Paulo (59/17,5%) e Minas Gerais (54/16,0%). O Mato Grosso detectou 33 casos (9,8%), enquanto que o Maranhão (7), Pará (4), Goiás (3), Rio Grande do Norte (1) e Bahia (1) notificaram, em conjunto, 4,8% das hantaviroses dos últimos dez anos. Metade dos indivíduos acometidos (51,0%) eram residentes na área rural; cerca de 65,0% exercia ocupação relacionada com atividades agrícolas e/ou de pecuária e 84,0% eram do sexo masculino. A faixa etária mais atingida foi a de 20-39 anos (intervalo de 8 meses-66 anos), com 58,3% das ocorrências. Em 139 casos, a infecção ocorreu em ambiente de trabalho. A taxa de letalidade no período foi de 44,7% e 95,7% dos pacientes foram internados. 6 H Vigilância epidemiológica Objetivos • Detectar precocemente casos e/ou surtos. • Conhecer a história natural da SCPH no Brasil. • Identificar fatores de risco associados à doença. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 399 Hantaviroses • Recomendar medidas de prevenção e controle. • Estudar a tendência da doença. Definição de caso de SCPH Suspeito • Paciente com doença febril, geralmente acima de 38°C, e mialgias, acompanhadas de um ou mais dos seguintes sinais e sintomas: calafrio, astenia, dor abdominal, alterações gastrointestinais, cefaléia, tosse seca, insuficiência respiratória aguda de etiologia não determinada ou edema pulmonar não-cardiogênico na primeira semana da doença, ou • Paciente com enfermidade aguda apresentando quadro de edema pulmonar nãocardiogênico com evolução para óbito, ou • Paciente com doença febril e história de exposição à mesma fonte de infecção de um ou mais casos de hantavirose, confirmado(s) laboratorialmente. Confirmado Critério laboratorial – caso suspeito com os seguintes resultados de exames laboratoriais: • sorologia reagente para anticorpos séricos específicos para hantavírus da classe IgM, ou • soroconversão para anticorpos séricos específicos da classe IgG (aumento de quatro vezes ou mais no título de IgG, entre a primeira e segunda amostra), ou • imunohistoquímica de tecidos positiva (identificação de antígenos específicos contra hantavírus), ou • PCR positivo. Critério clínico-epidemiológico – indivíduo que tenha freqüentado áreas conhecidas de transmissão de hantavírus ou exposição à mesma situação de risco de pacientes confirmados laboratorialmente, apresentando, obrigatoriamente, as seguintes alterações: • raios X de tórax com infiltrado intersticial bilateral nos campos pulmonares, com ou sem presença de derrame pleural que pode, quando presente, ser uni ou bilateral; • hemoconcentração (hematócrito > 45%); • trombocitopenia (plaquetas <130 mil plaquetas/mm3). Descartado Todo caso suspeito que durante a investigação tenha diagnóstico confirmado laboratorialmente de outra doença ou que não preencha os critérios de confirmação acima definidos. Notificação Doença de notificação compulsória e de investigação obrigatória, visando tratamento adequado e desencadeamento de medidas de controle. 400 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hantaviroses Medidas a serem adotadas Recomenda-se o isolamento do paciente em condições de proteção com barreiras (avental, luvas e máscaras dotadas de filtros N95). Assistência adequada ao paciente: por ser doença aguda de curso rápido, geralmente há necessidade de internação em unidades de saúde de maior complexidade, inclusive com unidade de terapia intensiva (UTI), pois a sobrevivência do paciente depende da instituição precoce de medidas gerais de suporte clínico. Material para diagnóstico laboratorial: certificar-se de que houve a coleta de material para o diagnóstico laboratorial, de acordo com as normas técnicas apresentadas no Anexo 1, bem como o devido encaminhamento para o Lacen ou para o laboratório público de referência. Investigação epidemiológica – iniciar o mais precocemente a possível investigação do caso suspeito com vistas à identificação do local provável de infecção (LPI) e os fatores determinantes para a ocorrência da doença. 6 Roteiro da investigação epidemiológica A hantavirose é uma doença emergente e ainda desconhecida para muitos profissionais da rede de serviços de saúde. Em vista de seu grande potencial de infecção, é imprescindível a adoção de medidas de segurança por parte dos profissionais responsáveis pela investigação, principalmente no que se refere à identificação dos locais prováveis de infecção. Coleta de dados gerais e de antecedentes epidemiológicos • Preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica do Sinan relativos aos dados gerais, dados do caso e de residência, além dos dados referentes às atividades ou situações de risco nos últimos 60 dias anteriores ao início da doença. • Na impossibilidade de o paciente fornecer os dados, buscar as informações junto aos familiares, vizinhos e colegas de serviço. H Coleta de dados clínicos, de tratamento e laboratoriais Em geral, quando é notificada a suspeita de hantavirose, os doentes já estão hospitalizados; assim, deve-se levantar as informações do prontuário e entrevistar os profissionais da área médica e de enfermagem para completar, na ficha epidemiológica, as informações clínicas e os achados laboratoriais e radiológicos do paciente. Levantar informações sobre atendimento anterior em outro serviço ou no mesmo hospital. Busca ativa de comunicantes Realizar busca ativa de comunicantes do paciente junto à residência e ao local de trabalho ou de lazer, incluindo todos os indivíduos com processo infeccioso inespecífico e com sintomas respiratórios nos últimos 60 dias antes do aparecimento dos sintomas do caso índice. Para cada caso suspeito encontrado, coletar material para sorologia e preencher uma nova ficha de investigação epidemiológica. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 401 Hantaviroses Identificação do local provável de infecção Define-se por local provável de infecção (LPI) o(s) local(is) que tenha(m) sido freqüentado(s) pelo caso suspeito ou confirmado, nas últimas oito semanas (60 dias) antes do início dos primeiros sintomas. Esses locais devem apresentar condições favoráveis à presença de roedores silvestres (água, abrigo ou alimento), aliadas a outros fatores, tais como: • desmatamento, corte de árvores, aragem, plantio ou colheita em campo; • transporte, armazenagem e moagem de grãos; • limpeza de celeiros ou outras construções (tulhas, paióis e silos); • adentramento e/ou limpeza de residências ou qualquer habitação, desabitadas ou não ocupadas por algum período, com a presença de roedores; • roças abandonadas, faixas de capim não ocupadas; • mudanças temporárias no perfil agrícola que alterem a disponibilidade de alimentos (grãos) ou outros fenômenos naturais periódicos que aumentem a disponibilidade de alimentos para os roedores silvestres, como a floração das taquaras; • fatores ambientais que provoquem o deslocamento de roedores para dentro ou arredores de habitações humanas, tais como desmatamentos, queimadas, enchentes, alagamentos e outras alterações climáticas. • exposição a ambiente silvestre em atividades profissionais ou de lazer. Recomenda-se aos profissionais de saúde que usem máscaras de pressão negativa com filtro N95 sempre que a investigação epidemiológica exigir que freqüentem locais com suspeita de contaminação por hantavírus, sejam ambientes fechados ou não, com sinais de infestação de roedores e seus excretas. Encerramento da investigação epidemiológica De acordo com as informações levantadas, o investigador deve definir o LPI, bem como os fatores determinantes da infecção e a conclusão do caso suspeito, com sua confirmação ou descarte. Investigação ambiental Com a definição do LPI de qualquer caso humano, há necessidade de se conhecer a fonte de infecção, ou seja, o roedor reservatório. Em áreas onde ele não é conhecido, deve-se realizar as atividades de investigação ambiental/ecológica com vistas a determinar a espécie de roedor que atua como reservatório do hantavírus. A vigilância ambiental tem por objetivos: identificar as espécies prevalentes de roedores silvestres, determinar as espécies de roedores que podem ser os reservatórios e identificar novas variantes virais, bem como a sua distribuição geográfica . A captura e manipulação de roedores silvestres e a coleta de amostras são atividades consideradas de alto risco, que requerem o uso de equipamentos de proteção individual 402 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hantaviroses NB3. Portanto, devem ser realizadas por técnicos especificamente capacitados e devidamente habilitados pelos serviços de referência da Secretaria de Vigilância em Saúde/MS. É importante ressaltar que as atividades que envolvam a captura de animais silvestres requerem autorização prévia do Ibama. Avaliação da extensão da área de transmissão Em se confirmando o caso, deve-se determinar a magnitude da situação epidemiológica, ou seja, se é um caso isolado ou se está ocorrendo um surto. Para tanto, deve-se realizar busca ativa de casos suspeitos no município ou, até mesmo, na região de procedência, em um período de até 60 dias anteriores ao caso índice, identificando-se pacientes com manifestações clínicas compatíveis com a doença. A busca deve atingir todas as unidades de saúde (hospitais, clínicas, laboratórios, serviço de notificação de óbito). Para cada caso suspeito encontrado, coletar material, para diagnóstico sorológico, preencher a ficha de investigação epidemiológica e pesquisar áreas que apresentam risco de infecção. 6 Análise dos dados e relatório final Os dados dos pacientes (faixa etária, sexo, ocupação, etc.), da doença, do tratamento (sinais e sintomas, achados laboratoriais, internação, evolução, etc.) e os fatores de risco devem ser organizados em tabelas, gráficos e mapas. Taxas e estimativas de incidência, letalidade, mortalidade, dentre outras, são importantes para se conhecer a enfermidade. Informações a respeito da data dos primeiros sintomas, freqüência e distribuição dos principais sinais e/ou sintomas, área geográfica, forma de infecção, ocupação e evolução do caso serão úteis nas análises que permitirão definir o perfil epidemiológico dos indivíduos acometidos e expostos, bem como o local ou locais de ocorrência da doença, para que se possa desenvolver as ações de prevenção e controle. Os relatórios parcial e final sobre casos de hantavirose, elaborados a partir dessas análises, são essenciais não só para o acompanhamento da tendência da doença mas também para se instruir os profissionais e serviços de saúde, bem como direcionar as medidas indicadas. H Medidas de prevenção e controle Em relação aos roedores A estratégia de controle será definida com base no conhecimento prévio da biologia e do comportamento dos roedores, de acordo com seus habitats em cada área (domiciliar, peridomiciliar ou silvestre). Desta forma, o controle pode abranger três linhas de ação: Anti-ratização • Eliminar todos os resíduos, entulhos e objetos inúteis que possam servir para abrigos, tocas e ninhos de roedores, bem como reduzir suas fontes de água e alimento. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 403 Hantaviroses • Armazenar insumos e produtos agrícolas (grãos, hortigranjeiros e frutas) em silos ou tulhas situados a uma distância mínima de 30 metros do domicílio. O silo ou tulha deverá estar suspenso a uma altura de 40 cm do solo, com escada removível e ratoeiras dispostas em cada suporte. • Os produtos armazenados no interior dos domicílios devem ser conservados em recipientes fechados e a 40 cm do solo. • Vedar fendas e quaisquer outras aberturas com tamanho superior a 0,5 cm, para evitar a entrada de roedores nos domicílios. • Remover diariamente, no período noturno, as sobras dos alimentos de animais domésticos. • Caso não exista coleta regular, os lixos orgânico e inorgânico devem ser enterrados separadamente, respeitando-se uma distância mínima de 30 metros do domicílio e de fontes de água. • Qualquer plantio deve sempre obedecer a uma distância mínima de 50 metros do domicílio. • O armazenamento em estabelecimentos comerciais deve seguir as mesmas orientações para o armazenamento em domicílio e em silos de maior porte. • Em locais onde haja coleta de lixo rotineira, os lixos orgânico e inorgânico devem ser acondicionados em latões com tampa ou em sacos plásticos e mantidos sobre suporte de aproximadamente 1,5 metro de altura do solo. Desratização Em áreas rurais não é rotineiramente recomendado o controle químico de roedores, tendo em vista que as medidas de anti-ratização geralmente são suficientes. Se necessário, frente a uma alta infestação, a mesma só poderá ser feita nas áreas limite entre o domicílio/ peridomicílio e peridomicílio/silvestre, sempre por profissionais especializados. Manejo ambiental As medidas de prevenção e controle devem ser fundamentadas em manejo ambiental através, principalmente, de práticas de higiene e medidas corretivas no meio ambiente, tais como saneamento e melhoria nas condições de moradia, tornando as habitações e os locais de trabalho impróprios à instalação e à proliferação de roedores (anti-ratização), associados às desratizações focais (no domicílio e/ou no peridomicílio), quando extremamente necessário. Em relação à população em geral Informar os moradores da região sobre a doença, os roedores envolvidos e as vias de transmissão. Orientá-los sobre as medidas de prevenção e controle da hantavirose e a importância de procederem as ações de combate aos reservatórios para manter a área livre da presença desses animais, como, por exemplo, roçar o terreno em volta da casa, dar destino adequado aos entulhos existentes, manter alimentos estocados em recipientes 404 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hantaviroses fechados e à prova de roedores, além de outras medidas de efeito imediato e necessárias à situação específica. Em relação aos locais prováveis de infecção (LPI) • Limpeza e descontaminação do interior de ambientes dos supostos LPI, onde tenham sido diagnosticados casos de hantavirose. Uma equipe especificamente treinada deverá orientar e realizar esta atividade, sempre munida de equipamentos de proteção individual de nível de biossegurança 3, seguindo as normas de biossegurança. • Abrir as portas e janelas das residências, habitações, silos paióis, etc. para serem arejadas por, no mínimo, 30 minutos antes de ingressar no ambiente para proceder a limpeza do local. • Umedecer pisos, paredes e utensílios no interior dos imóveis contaminados, bem como roedores mortos ou presença ou sinais de fezes e urina de ratos, com uma solução de água sanitária a 10% (1 litro de água sanitária + 9 litros de água) ou de detergente. Aguardar, pelo menos, meia hora antes de iniciar a limpeza, que deve ser sempre feita com o piso e locais bastante úmidos. • Os alimentos e outros materiais com evidências de contaminação devem ser eliminados em sacos plásticos resistentes, previamente molhados com desinfetante e enterrados a uma profundidade de 60 cm. • Utilizar luvas de borracha durante a manipulação de roedores mortos e objetos ou alimentos contaminados. Ao término do trabalho, as luvas devem ser lavadas com solução de desinfetante, antes de serem retiradas; e em seguida, lavar as mãos com água e sabão. 6 H Em relação aos laboratórios de pesquisa Todos os roedores silvestres devem ser manipulados como fontes potenciais de infecção. Roedores de laboratório inoculados ou expostos a sangue, componentes do sangue, tecidos e excretas de roedores silvestres também devem ser considerados potencialmente infectados por hantavírus. Tanto com animais silvestres como de laboratório, há risco de transmissão por aerossol de urina, fezes ou saliva, desde que estejam infectados com hantavírus. Em relação aos profissionais de vigilância As habitações que tenham permanecido fechadas por muito tempo deverão ser ventiladas por, pelo menos, meia hora antes que pessoas entrem nas mesmas. Os técnicos que ingressarem em locais fechados e passíveis de contaminação com excretas de roedores devem fazê-lo, preferencialmente, com proteção respiratória usando máscara ou respiradores com filtros de alta eficiência N95. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 405 Hantaviroses Em relação aos ecoturistas, pesquisadores de fauna e flora, caçadores e pescadores Os acampamentos devem ser montados longe de locais com presença de roedores. Ninhos, escombros, lixões, acúmulos de lenha ou produtos agrícolas, palha ou outros materiais são habitats preferenciais destes animais. Nesses acampamentos, os alimentos e resíduos devem ser mantidos em recipientes fechados e à prova de ratos. E, quando descartados, ser enterrados a uma distância maior que 30m do acampamento. A água deve estar contida em recipientes fechados e recomenda-se que seja fervida ou clorada (duas gotas de água sanitária para cada litro d’água. Aguardar meia hora antes de consumir). 406 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hantaviroses Anexo 1 Normas para procedimentos laboratoriais Tipo de diagnóstico Tipo de material Quantidade Uma amostra Sangue venoso (soro) Elisa IgM Elisa IgG OBS:coágulos de sangue são muito úteis para o diagnóstico. Sangue do coração (em caso de óbito) Soro, plasma, sangue, coágulo, ou biópsia de pulmão Em caso de óbito, colher fragmentos de pulmão, rim, baço e fígado Material de necropsia IHC Média de 5ml de sangue ou de soro (fragmentos de pulmão, baço, rim, linfonodo, coração, pâncreas, glândula pituitária, cérebro e fígado) Se não concluir o diagnóstico, colher até duas a três amostras do paciente vivo ou 2ª amostra: nos primeiros dias de internação. Tubo seco (sem anticoagulante) 3ª amostra: 2-3 semanas após o início dos sintomas Necropsia: realizar até 8 horas após o óbito Uma amostra Recipiente 1ª amostra: logo no primeiro atendimento médico. Uma amostra Mínimo 1,5 cm por tecido Fragmentos de 1cm2 fixado em formol tamponado a 10% ou em blocos de parafina Período da coleta Colher até o 7º dia após o início dos sintomas Média de 5ml fragmento de tecido PCR Nº de amostras Necropsia: realizar, preferencialmente, até 8 horas após o óbito Armazenamento/ conservação Preferencialmente em congeladores (freezers) a -20oC Em geladeira, por um tempo máximo de 24 horas Transporte Caixa de isopor, com gelo reciclável 6 Tubo criogênico: plástico resistente a baixíssimas temperaturas Imediatamente após a coleta, colocar em congeladores (freezers) a -70oC, ou em gelo seco ou nitrogênio líquido Frasco contendo solução de formol tamponado a 10%. Não refrigerar! Conservar em temperatura ambiente Caixa apropriada para transporte de materiais infectantes: recipiente de alumínio com tampa plástica de rosca, suporte para o recipiente de alumínio, algodão hidrófilo, caixa de isopor com gelo seco e caixa de papelão para proteção externa ao isopor H Não refrigerar! Transportar em temperatura ambiente Bloco parafinado Observações quanto ao encaminhamento das amostras • As amostras de sangue e/ou coágulo e/ou soro a serem analisadas deverão ser encaminhadas para o laboratório de referência em embalagens e condições apropriadas, constituídas basicamente de: amostra contida em tubo criogênico, com tampa de rosca, envolto em algodão hidrófilo e plástico com bolhas de proteção; recipiente de metal com tampa de rosca com fechamento hermético para conter os tubos com as amostras; caixa de isopor com gelo seco, contendo suporte para o recipiente metálico. Embalagens comercialmente disponíveis. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 407 Hantaviroses • Quando não for possível a utilização dessas embalagens, observar o mínimo de segurança. Utilizar frascos secos, de plástico resistente (de preferência criotubos; nunca utilizar frascos de vidro), com fechamento hermético, protegidos com papel toalha ou gaze. Cada frasco deve estar devidamente identificado com nome do paciente e data da coleta do material. Cada amostra deverá ser acompanhada de ficha de solicitação de exames, devidamente preenchida, contendo todas as informações relativas ao paciente (nome completo, idade, data do início dos sintomas, data da coleta da amostra, procedência, atividade ocupacional, contato com roedores silvestres ou seus excretas). • O transporte deverá ser feito em caixa de isopor contendo gelo seco em quantidade suficiente para que as amostras cheguem ao laboratório ainda congeladas. Não havendo disponibilidade de gelo seco ou nitrogênio líquido, o transporte de soro poderá ser feito em caixa de isopor contendo gelo reciclável, sempre se observando os cuidados para evitar acidentes com o material biológico e assegurando que a quantidade de gelo seja suficiente para manter o material refrigerado até a chegada no laboratório. Neste caso, a amostra possivelmente não será adequada para a realização de RT-PCR. • O envio de amostras para análise deverá ser comunicado, por telefone, ao laboratório, principalmente se a remessa for feita nos últimos dias da semana; é preciso planejar a chegada e recepção dos materiais no laboratório em finais de semana e/ou feriados, para não haver perda ou extravio de amostras. • O coágulo, retirado da amostra de sangue dos casos suspeitos de hantavirose (não de seus comunicantes), e que deve ser preservado para realização de RT-PCR, deverá ser encaminhado juntamente com a respectiva amostra de soro sempre em gelo seco ou botijão de nitrogênio líquido. 408 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hepatites Virais HEPATITES VIRAIS CID 10: B15 (Hepatite A); B16 (Hepatite B); B17.1 (Hepatite C); B17.8 (Hepatite D); B17.2 (Hepatite E) Características clínicas e epidemiológicas Descrição As hepatites virais são doenças provocadas por diferentes agentes etiológicos, com tropismo primário pelo fígado, que apresentam características epidemiológicas, clínicas e laboratoriais distintas. A distribuição das hepatites virais é universal, sendo que a magnitude varia de região para região, de acordo com os diferentes agentes etiológicos. No Brasil, esta variação também ocorre. As hepatites virais têm grande importância para a saúde pública e para o individuo, pelo número de indivíduos atingidos e pela possibilidade de complicações das formas agudas e crônicas. 6 Agente etiológico Os agentes etiológicos que causam hepatites virais mais relevantes do ponto de vista clínico e epidemiológico são designados por letras do alfabeto (vírus A, vírus B, vírus C, vírus D e vírus E). Estes vírus têm em comum a predileção para infectar os hepatócitos (células hepáticas). Entretanto, divergem quanto às formas de transmissão e conseqüências clínicas advindas da infecção. São designados rotineiramente pelas seguintes siglas: vírus da hepatite A (HAV), vírus da hepatite B (HBV), vírus da hepatite C (HCV), vírus da hepatite D (HDV) e vírus da hepatite E (HEV). Existem alguns outros vírus que também podem causar hepatite (ex: TTV, vírus G, SEV-V). Todavia, seu impacto clínico e epidemiológico é menor. No momento, a investigação destes vírus está basicamente concentrada em centros de pesquisa. H Reservatório O homem é o único reservatório com importância epidemiológica. Os outros reservatórios apresentam importância como modelos experimentais para a pesquisa básica em hepatites virais. O HAV tem reservatório também em primatas, como chimpanzés e sagüis. Experimentalmente, a marmota, o esquilo e o pato-de-pequim podem ser reservatórios para o HBV; já o chimpanzé, para o HBV, HCV e HEV. Relatos recentes de isolamento do HEV em suínos, bovinos, galinhas, cães e roedores levantam a possibilidade de que esta infecção seja uma zoonose. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 409 Hepatites Virais Modo de transmissão Quanto às formas de transmissão, as hepatites virais podem ser classificadas em dois grupos: o grupo de transmissão fecal-oral (HAV e HEV) tem seu mecanismo de transmissão ligado a condições de saneamento básico, higiene pessoal, qualidade da água e dos alimentos. A transmissão percutânea (inoculação acidental) ou parenteral (transfusão) dos vírus A e E é muito rara, devido ao curto período de viremia dos mesmos. O segundo grupo (HBV, HCV, e HDV) possui diversos mecanismos de transmissão, como o parenteral, sexual, compartilhamento de objetos contaminados (agulhas, seringas, lâminas de barbear, escovas de dente, alicates de manicure), utensílios para colocação de piercing e confecção de tatuagens e outros instrumentos usados para uso de drogas injetáveis e inaláveis. Há também o risco de transmissão através de acidentes perfurocortantes, procedimentos cirúrgicos e odontológicos e hemodiálises sem as adequadas normas de biossegurança. Hoje, após a triagem obrigatória nos bancos de sangue (desde 1978 para a hepatite B e 1993 para a hepatite C), a transmissão via transfusão de sangue e hemoderivados é relativamente rara. A transmissão por via sexual é mais comum para o HBV que para o HCV. Na hepatite C poderá ocorrer a transmissão principalmente em pessoa com múltiplos parceiros, coinfectada com o HIV, com alguma lesão genital (DST), alta carga viral do HCV e doença hepática avançada. Os vírus das hepatites B, C e D possuem também a via de transmissão vertical (da mãe para o bebê). Geralmente, a transmissão ocorre no momento do parto, sendo a via transplacentária incomum. A transmissão vertical do HBV ocorre em 70% a 90% dos casos de mães com replicação viral (HBeAg positivas); nos casos de mães sem replicação viral (HBeAg negativas) a probabilidade varia entre 30% a 50% – o que não altera a conduta a ser adotada para a criança (vacinação e imunoglobulina nas primeiras doze horas de vida). Na hepatite C, a transmissão vertical é bem menos freqüente, podendo ocorrer em aproximadamente 6% dos casos. Entretanto, se a mãe for co-infectada com o HIV, este percentual sobe para até 17%. A transmissão vertical não tem importância para os vírus A e E. Período de incubação Varia de acordo com o agente (Quadro 1). Período de transmissibilidade Varia de acordo com o agente (Quadro 1). Hepatite B – a presença do HBsAg (assim como o HBV-DNA), que determina a condição de portador do HBV (sintomático ou assintomático), indica a existência de risco de transmissão do vírus. Pacientes com HBeAg (marcador de replicação viral) reagente têm maior risco de transmissão do HBV do que pacientes HBeAg não-reagentes. Hepatite C – a presença do HCV-RNA, que determina a condição de viremia do HCV, indica o risco de transmissão da hepatite C. Alguns estudos indicam que a carga viral do HCV é diretamente proporcional ao risco de transmissão do vírus. Em gestantes co-infectadas pelo HCV e HIV, a chance de transmissão vertical é maior do que em gestantes infectadas apenas pelo HCV. 410 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hepatites Virais Quadro 1. Principais características dos vírus que causam a hepatite Agente etiológico Genoma Modo de transmissão Período de incubação Período de transmissibilidade HAV RNA Fecal-oral 15-45 dias (média de 30 dias) Desde duas semanas antes do início dos sintomas até o final da segunda semana da doença HBV DNA Sexual, parenteral, percutânea, vertical 30-180 dias (média de 60 a 90 dias) Duas a três semanas antes dos primeiros sintomas, se mantendo durante a evolução clínica da doença. O portador crônico pode transmitir o HBV durante anos HCV RNA Parenteral, percutânea, vertical, sexual 15-150 dias Uma semana antes do início dos sintomas e mantém-se enquanto o paciente apresentar HCV-RNA detectável HDV RNA Sexual, parenteral, percutânea, vertical 30-180 dias. Este período é menor na superinfecção Uma semana antes do início dos sintomas da infecção conjunta (HBV e HDV). Na superinfecção não se conhece este período HEV RNA Fecal-oral 14-60 dias (média de 42 dias) Duas semanas antes do início dos sintomas até o final da segunda semana da doença 6 Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade é universal. A infecção confere imunidade permanente e específica para cada tipo de vírus. A imunidade conferida pelas vacinas contra a hepatite A e hepatite B é duradoura e específica. Os filhos de mães imunes podem apresentar imunidade passiva e transitória durante os primeiros nove meses de vida. Detecção de imunidade adquirida naturalmente Para a hepatite A – a imunidade adquirida naturalmente é estabelecida pela presença do anti-HAV IgG (ou anti-HAV total positivo com anti-HAV IgM negativo). Este padrão sorológico é indistinguível da imunidade vacinal. Para a hepatite B – a imunidade adquirida naturalmente é estabelecida pela presença concomitante do anti-HBs e anti-HBc IgG ou total. Eventualmente, o anti-HBc pode ser o único indicador da imunidade natural detectável sorologicamente, pois com o tempo o nível de anti-HBs pode tornar-se indetectável. A ocorrência do anti-HBs como marcador isolado de imunidade contra o HBV adquirida naturalmente é possível, embora seja muito pouco freqüente. É aconselhável considerar a possibilidade de resultado falso-positivo nesta situação e repetir os marcadores para esclarecimento do caso. Para a hepatite C – a pessoa infectada pelo vírus C apresenta sorologia anti-HCV reagente por um período indefinido; porém, este padrão não distingue se houve resolução da infecção e conseqüente cura ou se a pessoa continua portadora do vírus. H Detecção de imunidade pós-vacinal Existem disponíveis, no momento, vacinas contra a hepatite A e contra a hepatite B. Para a hepatite A – são susceptíveis à infecção pelo HAV pessoas sorologicamente negativas para o anti-HAV IgG. A vacina contra a hepatite A induz à formação do antiHAV IgG. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 411 Hepatites Virais Para a hepatite B – são susceptíveis pessoas com perfil sorológico HBsAg, anti-HBc e anti-HBs negativos concomitantemente. A vacina contra a hepatite B tem como imunizante o HBsAg (produzido por técnica do DNA recombinante) induzindo, portanto, à formação do anti-HBs, isoladamente. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas Após entrar em contato com o vírus da hepatite o indivíduo pode desenvolver um quadro de hepatite aguda, podendo apresentar formas clínicas oligo/assintomática ou sintomática. No primeiro caso, as manifestações clínicas estão ausentes ou são bastante leves e atípicas, simulando um quadro gripal. No segundo, a apresentação é típica, com os sinais e sintomas característicos da hepatite como febre, icterícia e colúria. A fase aguda (hepatite aguda) tem seus aspectos clínicos e virológicos limitados aos primeiros seis meses da infecção e a persistência do vírus após este período caracteriza a cronificação da infecção. Apenas os vírus B, C e D têm potencial para desenvolver formas crônicas de hepatite. O potencial para cronificação varia em função de alguns fatores ligados aos vírus e outros ligados ao hospedeiro. De modo geral, a taxa de cronificação do HBV é de 5% a 10% dos casos em adultos. Todavia, esta taxa chega a 90% para menores de 1 ano e 20% a 50% para crianças de 1 a 5 anos. Pessoas com qualquer tipo de imunodeficiência também têm maior chance de cronificação após uma infecção pelo HBV. Para o vírus C, a taxa de cronificação varia entre 60% a 90% e é maior em função de alguns fatores do hospedeiro (sexo masculino, imunodeficiências, mais de 40 anos). A taxa de cronificação do vírus D varia em função de aspectos ligados ao tipo de infecção (co-infecção/ superinfecção) e de taxa de cronificação do HBV. Fase aguda (hepatite aguda) Os vírus hepatotrópicos apresentam uma fase aguda da infecção. No nosso meio, a maioria dos casos de hepatite aguda sintomática deve-se aos vírus A e B (na região Norte a co-infecção HBV/HDV também é importante causa de hepatite aguda sintomática). O vírus C costuma apresentar uma fase aguda oligo/assintomática, de modo que responde por apenas pequena parte das hepatites agudas sintomáticas. Período prodrômico ou pré-ictérico – é o período após a fase de incubação do agente etiológico e anterior ao aparecimento da icterícia. Os sintomas são inespecíficos como anorexia, náuseas, vômitos, diarréia (ou raramente constipação), febre baixa, cefaléia, malestar, astenia e fadiga, aversão ao paladar e/ou olfato, mialgia, fotofobia, desconforto no hipocôndrio direito, urticária, artralgia ou artrite e exantema papular ou maculopapular. Fase ictérica – com o aparecimento da icterícia, em geral há diminuição dos sintomas prodrômicos. Existe hepatomegalia dolorosa, com ocasional esplenomegalia. Ocorre hiperbilirrubinemia intensa e progressiva, com aumento da dosagem de bilirrubinas totais, principalmente à custa da fração direta. A fosfatase alcalina e a gama-glutamil-transferase 412 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hepatites Virais (GGT) permanecem normais ou discretamente elevadas. Há alteração das aminotransferases, podendo variar de 10 a 100 vezes o limite superior da normalidade. Este nível retorna ao normal no prazo de algumas semanas, porém se persistirem alterados por um período superior a seis meses, deve-se considerar a possibilidade de cronificação da infecção. Fase de convalescença – período que se segue ao desaparecimento da icterícia, quando retorna progressivamente a sensação de bem-estar. A recuperação completa ocorre após algumas semanas, mas a fraqueza e o cansaço podem persistir por vários meses. Fase crônica (hepatite crônica) Casos nos quais o agente etiológico permanece no hospedeiro após seis meses do início da infecção. Os vírus A e E não cronificam, embora o HAV possa produzir casos que se arrastam por vários meses. Os vírus B, C e D são aqueles que têm a possibilidade de cronificar. Os indivíduos com infecção crônica funcionam como reservatórios do respectivo vírus, tendo importância epidemiológica por serem os principais responsáveis pela perpetuação da transmissão. Portador assintomático – indivíduos com infecção crônica que não apresentam manifestações clínicas, que têm replicação viral baixa ou ausente e que não apresentam evidências de alterações graves à histologia hepática. Em tais situações, a evolução tende a ser benigna, sem maiores conseqüências para a saúde. Contudo, estes indivíduos são capazes de transmitir hepatite e têm importância epidemiológica na perpetuação da endemia. Hepatite crônica – indivíduos com infecção crônica que apresentam sinais histológicos de atividade da doença (inflamação, com ou sem deposição de fibrose) e que do ponto de vista virológico caracterizam-se pela presença de marcadores de replicação viral. Podem ou não apresentar sintomas na dependência do grau de dano hepático (deposição de fibrose) já estabelecido. Apresentam maior propensão para uma evolução desfavorável, com desenvolvimento de cirrose e suas complicações. Eventualmente, a infecção crônica só é diagnosticada quando a pessoa já apresenta sinais e sintomas de doença hepática avançada (cirrose e/ou hepatocarcinoma). 6 H Hepatite fulminante Este termo é utilizado para designar a insuficiência hepática no curso de uma hepatite aguda. É caracterizada por comprometimento agudo da função hepatocelular, manifestado por diminuição dos fatores da coagulação e presença de encefalopatia hepática no período de até 8 semanas após o início da icterícia. A mortalidade é elevada (40% e 80% dos casos). A etiologia da hepatite fulminante varia conforme as regiões geográficas. Nos países mediterrâneos, a maioria dos casos (45%) é de origem indeterminada e a hepatite A e B representam 15% e 10% dos casos. Em contraste, a hepatite por paracetamol é a principal causa na Inglaterra. Hepatite aguda C aparentemente não está associada a casos de hepatite fulminante. A co-infecção HBV/HDV pode ser uma causa em regiões endêmicas para os dois vírus. Na Índia, uma causa freqüente de hepatite fulminante entre mulheres grávidas é a hepatite por vírus E. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 413 Hepatites Virais Diagnóstico diferencial O perfil epidemiológico da macrorregião e a sazonalidade orientam a lista de enfermidades que devem ser consideradas no diagnóstico diferencial. No período prodrômico os principais diagnósticos diferenciais são: mononucleose infecciosa (causada pelo vírus Epstein Barr), toxoplasmose, citomegalovírus e outras viroses. Nestas patologias, quando há aumento de aminotransferases, geralmente são abaixo de 500UI. No período ictérico, temos algumas doenças infecciosas como leptospirose, febre amarela, malária e, mais incomum, dengue hemorrágica; para identificação do agente etiológico existem testes diagnósticos específicos para cada patologia citada. Temos também outras causas de hepatite como hepatite alcoólica, hepatite medicamentosa, hepatite auto-imune, hepatites reacionais ou transinfecciosas (acompanham infecções gerais, como sepse), icterícias hemolíticas (como anemia falciforme) e colestase extra-hepática por obstrução mecânica das vias biliares (tumores, cálculo de vias biliares, adenomegalias abdominais). Diagnóstico laboratorial Exames inespecíficos Aminotransferases (transaminases – a aspartato aminotransferase (AST/TGO) e a alanino aminotransferase (ALT/TGP) são marcadores de agressão hepatocelular. Nas formas agudas, chegam a atingir, habitualmente, valores até 25 a 100 vezes acima do normal, embora alguns pacientes apresentem níveis bem mais baixos, principalmente na hepatite C. Em geral, essas enzimas começam a elevar-se uma semana antes do início da icterícia e normalizam-se em cerca de três a seis semanas de curso clínico da doença. Nas formas crônicas, na maioria das vezes não ultrapassam 15 vezes o valor normal e, por vezes, em indivíduos assintomáticos, é o único exame laboratorial sugestivo de doença hepática. Bilirrubinas – elevam-se após o aumento das aminotransferases e, nas formas agudas, podem alcançar valores 20 a 25 vezes acima do normal. Apesar de haver aumento tanto da fração não-conjugada (indireta) quanto da conjugada (direta), esta última apresenta-se predominante. Na urina pode ser detectada precocemente, antes mesmo do surgimento da icterícia. Proteínas séricas – normalmente, não se alteram nas formas agudas. Nas hepatites crônicas e cirrose, a albumina apresenta diminuição acentuada e progressiva. Fosfatase alcalina – pouco se altera nas hepatites por vírus, exceto nas formas colestáticas, quando se apresenta em níveis elevados. Devido à presença normalmente aumentada da fração osteoblástica dessa enzima durante o período de crescimento, esse aspecto deve ser considerado no acompanhamento de crianças e adolescentes. Gama-glutamiltransferase (GGT) – é a enzima mais relacionada aos fenômenos colestáticos, sejam intra e/ou extra-hepáticos. Em geral, há aumento nos níveis da GGT em icterícias obstrutivas, hepatopatias alcoólicas, hepatites tóxico-medicamentosas, tumores hepáticos. Ocorre elevação discreta nas hepatites virais, exceto nas formas colestáticas. Atividade de protrombina – nas formas agudas benignas esta prova sofre pouca alteração, exceto nos quadros de hepatite fulminante. Nos casos de hepatite crônica, o alarga- 414 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hepatites Virais mento do tempo de protrombina indica a deterioração da função hepática e em associação com alguns outros fatores clínicos e laboratoriais (encefalopatia, ascite, aumento de bilirrubina, queda da albumina) compõe a classificação de Child (um importante e prático meio de avaliar o grau de deterioração da função hepática, além de um marcador prognóstico). Alfafetoproteína – não tem valor clínico na avaliação das hepatites agudas. A presença de valores elevados, ou progressivamente crescentes, em pacientes portadores de hepatite crônica, em geral indica o desenvolvimento de carcinoma hepatocelular, sendo por isto utilizada no screening deste tumor do fígado em pacientes cirróticos (Obs: pacientes com hepatite crônica pelo HBV podem desenvolver carcinoma hepatocelular mesmo sem a presença de cirrose hepática). Hemograma – a leucopenia é habitual nas formas agudas, entretanto muitos casos cursam sem alteração no leucograma. A presença de leucocitose sugere intensa necrose hepatocelular ou a associação com outras patologias. Não ocorrem alterações significativas na série vermelha. A plaquetopenia pode ocorrer na infecção crônica pelo HCV. 6 Provas específicas Marcadores sorológicos – em caso de hepatite aguda deve-se avaliar a faixa etária do paciente, a história pregressa de hepatites virais ou icterícia e a presença de fatores de risco, como o uso de drogas injetáveis, prática sexual não segura, contato com pacientes portadores de hepatite. Estas informações auxiliarão na investigação. Contudo, deve-se lembrar que não é possível determinar a etiologia de uma hepatite aguda apenas com base em dados clínicos e epidemiológicos (exceto em surtos de hepatite aguda pelo vírus A, que tenham vínculo epidemiológico com um caso confirmado laboratorialmente). Respeitando-se as ressalvas já feitas, recomenda-se em caso de suspeita de hepatite aguda a pesquisa inicial dos marcadores sorológicos: anti-HAV IgM, HBsAg , anti-HBc (total) e anti-HCV* (caso haja justificativa com base na história clínica). A necessidade da pesquisa de marcadores adicionais poderia ser orientada pelos resultados iniciais. Faz parte das boas práticas do laboratório manter acondicionados os espécimes já examinados por, pelo menos, duas semanas após a emissão do laudo, tempo necessário para elucidar eventuais dúvidas ou complementar algum exame referente à amostra. H Hepatite A Anti-HAV IgM – a presença deste marcador é compatível com infecção recente pelo HAV, confirmando o diagnóstico de hepatite aguda A. Este marcador surge precocemente na fase aguda da doença, começa a declinar após a segunda semana e desaparece após 3 meses. Anti-HAV IgG – os anticorpos desta classe não permitem identificar se a infecção é aguda ou trata-se de infecção pregressa. Este marcador está presente na fase de convalescença e persiste indefinidamente. É um importante marcador epidemiológico por demonstrar a circulação do vírus em determinada população. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 415 Hepatites Virais Quadro 2. Interpretação dos marcadores sorológicos da hepatite A Anti-HAV total Anti-HAV IgM Interpretação (+) (+) Infecção recente/hepatite aguda pelo HAV (+) (-) Infecção passada ou imunizado (ver história vacinal) (-) (-) Ausência de contato com o vírus, indivíduo não-imune (susceptível) Hepatite B São marcadores de triagem para a hepatite B: HBsAg e anti-HBc. HBsAg (antígeno de superfície do HBV) – primeiramente denominado como antígeno Austrália. É o primeiro marcador a surgir após a infecção pelo HBV, em torno de 30 a 45 dias, podendo permanecer detectável por até 120 dias. Está presente nas infecções agudas e crônicas. Anti-HBc (anticorpos IgG contra o antígeno do núcleo do HBV) – é um marcador que indica contato prévio com o vírus. Permanece detectável por toda a vida nos indivíduos que tiveram a infecção (mesmo naqueles que não cronificaram, ou seja, eliminaram o vírus). Representa importante marcador para estudos epidemiológicos. Quadro 3. Interpretação e conduta do screening sorológico para hepatite B HBsAg Anti-HBc Interpretação/conduta (+) (-) Início de fase aguda ou falso positivo/Repetir sorologia após 15 dias (+) (+) Hepatite aguda ou crônica/Solicitar anti-HBc IgM (-) (+) Janela imunológica ou falso-positivo ou cura/ Solicitar anti-HBs (-) (-) Não infectado Anti-HBc IgM (anticorpos da classe IgM contra o antígeno do núcleo do HBV) – é um marcador de infecção recente, portanto confirma o diagnóstico de hepatite B aguda. Pode persistir por até 6 meses após o início da infecção. Anti-HBs (anticorpos contra o antígeno de superfície do HBV) – indica imunidade contra o HBV. É detectado geralmente entre 1 a 10 semanas após o desaparecimento do HBsAg e indica bom prognóstico. É encontrado isoladamente em pacientes vacinados. HBeAg (antígeno “e” do HBV) – é indicativo de replicação viral e, portanto, de alta infectividade. Está presente na fase aguda, surge após o aparecimento do HBsAg e pode permanecer por até 10 semanas. Na hepatite crônica pelo HBV, a presença do HBeAg indica replicação viral e atividade da doença (maior probabilidade de evolução para cirrose). Anti-HBe (anticorpo contra o antígeno “e” do HBV) – marcador de bom prognóstico na hepatite aguda pelo HBV. A soroconversão HBeAg para anti-HBe indica alta pro- *A solicitação do anti-HCV segue o racional de que caso se trate de uma hepatite aguda pelo HCV o primeiro teste sorológico será negativo (janela imunológica) e o segundo, realizado 3 a 6 meses após, será positivo, o que caracteriza um quadro agudo com soroconversão. 416 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hepatites Virais babilidade de resolução da infecção nos casos agudos (ou seja, provavelmente o indivíduo não vai se tornar um portador crônico do vírus). Na hepatite crônica pelo HBV a presença do anti-HBe, de modo geral, indica ausência de replicação do vírus, ou seja, menor atividade da doença e, com isso, menor chance de desenvolvimento de cirrose. Quadro 4. Resumo das definições de caso de hepatite viral por vírus B, a partir dos resultados sorológicos Condição de caso HBsAg Anti-HBc Anti-HBc IgM HBeAg Anti-HBe Anti-HBs Susceptível (-) (-) (-) (-) (-) (-) Incubação (+/-) (-) (-) (-) (-) (-) Hepatite B aguda (+) (+) (+) (+/-) (+/-) (-) Final da fase aguda/ janela imunológica (-) (+) (-) (-) (+) Hepatite B fase crônica (+) (+) (-) (+/-) (+/-) (-) Hepatite B curada (-) (+) (-) (-) (+) (+)* Imunizado por vacinação (-) (-) (-) (-) (-) (+) (-) 6 Legenda: (+) positivo (-) negativo *Em alguns casos de hepatite B curada, o anti-HBs não é detectado por estar em baixos títulos. Nos casos de hepatite B (forma aguda, crônica ou fulminante) procedente de áreas conhecidas com circulação do HDV (região amazônica), será necessário investigar hepatite D (delta). H Hepatite C Anti-HCV (anticorpos contra o vírus HCV) – é o marcador de triagem para a hepatite C. Indica contato prévio com o vírus, mas não define se a infecção é aguda, crônica ou se já foi curada. O diagnóstico de infecção aguda só pode ser feito com a viragem sorológica documentada, isto é, paciente inicialmente anti-HCV negativo que converte, tornando-se anti-HCV positivo e HCV-RNA positivo, detectado por técnica de biologia molecular. A infecção crônica deve ser confirmada pela pesquisa de HCV-RNA. HCV-RNA (RNA do HCV) – é o primeiro marcador a aparecer entre uma a duas semanas após a infecção. É utilizado para confirmar a infecção em casos crônicos, monitorar a resposta ao tratamento e confirmar resultados sorológicos indeterminados, em especial em pacientes imunossuprimidos. Hepatite D O marcador sorológico mais usado é o anti-HDV (total). O vírus Delta é um vírus defectivo (incompleto) que não consegue, por si só, repro- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 417 Hepatites Virais duzir seu próprio antígeno de superfície, o qual seria indispensável para exercer sua ação patogênica e se replicar nas células hepáticas. Desta forma, necessita da presença do vírus B, havendo duas possibilidades para a ocorrência da infecção pelo HDV: • Superinfecção – infecção pelo vírus delta em um portador crônico do HBV; • Co-infecção – infecção simultânea pelo HBV e Delta em indivíduo susceptível. Quadro 5. Interpretação sorológica da hepatite D Formas HBsAg AntiHBc Anti-HBcIgM AntiHDV total AntiHBs Co-infecção (+) (+) (+) (+)* (-) Superinfecção (+) (+) (-) (+)* (-) Cura (-) (+) (-) (+)** (+) *O antiHDIgM e IgG em altos títulos **O antiHD-IgG positivo em baixos títulos Hepatite E A hepatite aguda E é sorologicamente caracterizada por eventual conversão sorológica para anti-HEV ou detecção de anti-HEV IgM. Quadro 6. Interpretação sorológica da hepatite E Anti-HEV total Anti-HEV IgM Interpretação (+) / (-) (+) Infecção recente pelo HEV (+) (-) Exposição prévia pelo HEV (-) (-) Nunca teve contato com HEV (susceptível) Observação: na hepatopatia crônica, deve ser considerada a possibilidade de associação das infecções pelo HBV e HCV, inclusive por apresentarem vias de infecção semelhantes. Detecção de portador do HBV e HCV em doadores de sangue e hemodialisados – os marcadores realizados em banco de sangue devem ser repetidos pois, apesar de utilizar o mesmo método dos exames para o diagnóstico clínico, o cut off empregado é mais baixo, com o objetivo de aumentar a sensibilidade, o que proporciona a possibilidade de testes falso-positivos. Esta estratégia visa garantir a segurança do receptor, pois objetiva evitar que bolsas de sangue provenientes de doadores positivos para os vírus B e/ou C, mas que tenham baixos títulos de seus marcadores sorológicos, sejam utilizadas. Contudo, propicia o aparecimento de um número maior de resultados falso-positivos. Torna-se necessário, por outro lado, que os indivíduos com resultados inicialmente positivos tenham investigação clínica e sorológica para definição de seu verdadeiro estado (positivo ou negativo). Indicação de provas diagnósticas para indivíduos sem sintomatologia – além das circunstâncias citadas, diversas outras levam à necessidade de solicitar sorologia para marcadores de infecção pelos vírus das hepatites, dentre as quais destacam-se: monitoramento de pacientes hemofílicos e demais usuários crônicos de hemoderivados; exames de profis- 418 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hepatites Virais sionais vítimas de acidente com material biológico; exames pré-natais (hepatite B); exame de população exposta e de contatos de casos e exames de doadores e receptores de órgãos. Tratamento Hepatite aguda Não existe tratamento específico para as formas agudas. Se necessário, apenas tratamento sintomático para náuseas, vômitos e prurido. Como norma geral, recomenda-se repouso relativo até a normalização das aminotransferases. Dieta pobre em gordura e rica em carboidratos é de uso popular, porém seu maior benefício é ser mais agradável ao paladar ao paciente anorético. De forma prática, deve ser recomendado que o próprio paciente defina sua dieta de acordo com seu apetite e aceitação alimentar. A única restrição está relacionada à ingestão de álcool, que deve ser suspensa por no mínimo seis meses. Medicamentos não devem ser administrados sem a recomendação médica para que não agravem o dano hepático. As drogas consideradas “hepatoprotetoras”, associadas ou não a complexos vitamínicos, não têm nenhum valor terapêutico. 6 Hepatite crônica É necessária a realização de biópsia hepática para avaliar a indicação de tratamento específico. A biópsia por agulha é a preferida, pois permite a retirada de fragmentos de áreas distantes da cápsula de Glisson (as áreas subcapsulares mostram muitas alterações inespecíficas). Além disso, a biópsia transcutânea é mais segura, dispensa anestesia geral e reduz o custo do procedimento. O procedimento deve ser realizado com agulhas descartáveis apropriadas. O exame anátomo-patológico avalia o grau de atividade necro-inflamatória e de fibrose do tecido hepático. As formas crônicas da hepatite B e C têm diretrizes clínico-terapêuticas definidas por meio de portarias do Ministério da Saúde. Devido à alta complexidade do tratamento, acompanhamento e manejo dos efeitos colaterais, deve ser realizado em serviços especializados (média ou alta complexidade do SUS). O tratamento da hepatite B crônica está indicado nas seguintes situações: • HBsAg (+) por mais de seis meses; • HBeAg (+) ou HBV-DNA > 30 mil cópias/ml (fase de replicação); • ALT/TGP > duas vezes o limite superior da normalidade; • biópsia hepática com atividade inflamatória moderada a intensa (> A2) e/ou fibrose moderada a intensa (> F1), segundo critério da Sociedade Brasileira de Patologia/Metavir. • ausência de contra-indicação ao tratamento. H O tratamento da hepatite C crônica está indicado nas seguintes situações: • anti-HCV (+) e HCV-RNA (+); • ALT/ TGP > 1,5 vez o limite superior da normalidade; Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 419 Hepatites Virais • biópsia hepática com atividade inflamatória moderada a intensa (> A2) e/ou fibrose moderada a intensa (> F1), segundo critério da Sociedade Brasileira de Patologia/ Metavir; • ausência de contra-indicação ao tratamento. Após a indicação do tratamento, deverá ser feito exame de genotipagem para definir o tipo de tratamento (interferon convencional ou peguilado) e duração (6 ou 12 meses). Quadro 7. Tratamento das hepatites B e C Situação Droga Dose Hepatite B crônica IFN ou LMV 5 MUI/dia ou 10MUI 3x/semana ou 100mg/dia Hepatite C crônica* (genótipo 1) INF peguilado + RBV Interferon peguilado α2a 180 μg/sem ou Interferon peguilado α2b 1,5μg/kg/sem + 11-15mg/kg/dia (1 mil-1.200mg, em duas tomadas) Hepatite C crônica (genótipo 2 ou 3) IFN + RBV Interferon α2a ou α2b 3 MUI 3x/semana + 11-15mg/kg/dia (800-1200mg em duas tomadas) Via Duração SC 4 meses VO 12 meses SC 12 meses VO 12 meses SC VO 6 meses 6 meses IFN: interferon; LMV-lamivudina; RBV: ribavirina; MUI: milhões de unidades internacionais. *Interferon pequilado indicado para pacientes com hepatite C – genótipo 1, virgens de tratamento e com fibrose ≥ 2. O tratamento da hepatite delta é complexo, com resultados insatisfatórios na maioria das vezes, e deve ser realizado por serviços de referência (alta complexidade do SUS). Prognóstico Hepatite A – geralmente após 3 meses o paciente já está recuperado. Apesar de não haver forma crônica da doença, há a possibilidade de formas prolongadas e recorrentes, com manutenção das aminotransferases em níveis elevados por vários meses. A forma fulminante, apesar de rara (menos que 1% dos casos), apresenta prognóstico ruim. O quadro clínico é mais intenso à medida que aumenta a idade do paciente. Hepatite B – a hepatite aguda B normalmente tem bom prognóstico: o indivíduo resolve a infecção e fica livre dos vírus em cerca de 90% a 95% dos casos. As exceções ocorrem nos casos de hepatite fulminante (<1% dos casos), hepatite B na criança (90% de chance de cronificação em menores de 1 ano e 20% a 50% para aquelas que se infectaram entre 1 e 5 anos de idade) e pacientes com algum tipo de imunodeficiência. Entre os pacientes que não se livram do vírus e tornam-se portadores crônicos, o prognóstico está ligado à presença de replicação do vírus (expressa pela presença do HBeAg e/ou HBV-DNA > 30 mil cópias/ml). A presença destes marcadores determina maior deposição de fibrose no fígado, o que pode resultar na formação de cirrose hepática. Hepatite C – a cronificação ocorre em 60% a 90% dos casos, dos quais, em média, um quarto a um terço evolui para formas histológicas graves num período de 20 anos. 420 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hepatites Virais Este quadro crônico pode ter evolução para cirrose e hepatocarcinoma, fazendo com que o HCV seja, hoje em dia, responsável pela maioria dos transplantes hepáticos no ocidente. O uso concomitante de bebida alcoólica, em pacientes portadores do HCV, determina maior propensão para desenvolver cirrose hepática. Hepatite D – na superinfecção o índice de cronicidade é significativamente maior (80%) se comparado ao que ocorre na co-infecção (3%). Na co-infecção pode haver uma taxa maior de casos de hepatite fulminante. Já a superinfecção determina, muitas vezes, uma evolução mais rápida para cirrose. Hepatite E – não há relato de evolução para a cronicidade ou viremia persistente. Em gestantes, porém, a hepatite é mais grave e pode apresentar formas fulminantes. A taxa de mortalidade em gestantes pode chegar a 25%, especialmente no terceiro trimestre, podendo ocorrer em qualquer período da gestação. Também há referências de abortos e mortes intra-uterinas. 6 Aspectos epidemiológicos As hepatites virais são um importante problema de saúde pública, apresentando distribuição universal e magnitude que varia de região para região. A hepatite A apresenta alta prevalência nos países com precárias condições sanitárias e socioeconômicas. Para o Brasil, a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) estima que ocorram 130 casos novos/ano por 100 mil habitantes e que mais de 90% da população maior de 20 anos tenha tido exposição ao vírus. Entretanto, em regiões que apresentam melhores condições de saneamento, estudos têm demonstrado um acúmulo de susceptíveis em adultos jovens acima desta idade. Em relação ao HBV, alguns estudos do final da década de 80 e início de 90 sugeriram uma tendência crescente do HBV em direção às regiões Sul/Norte, descrevendo três padrões de distribuição da hepatite B: alta endemicidade presente na região amazônica, alguns locais do Espírito Santo e oeste de Santa Catarina; endemicidade intermediária, nas regiões Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste e baixa endemicidade, na região Sul do país. No entanto, este padrão vem se modificando com a política de vacinação contra o HBV iniciada sob a forma de campanha em 1989, no estado do Amazonas, e de rotina a partir de 1991, em uma seqüência de inclusão crescente de estados e faixas etárias maiores em função da endemicidade local. Assim, trabalhos mais recentes mostram que na região de Lábrea, estado do Amazonas, a taxa de portadores do HBV passou de 15,3%, em 1988, para 3,7%, em 1998. Na região de Ipixuna, no mesmo estado, esta queda foi de 18 para 7%. No estado do Acre, estudo de base populacional em 12 de seus 24 municípios apresentou taxa de HBsAg de 3,4%. Outros trabalhos também classificam a região Norte como de baixa ou moderada endemicidade, permanecendo com alta endemicidade a região sudeste do Pará. Na região Sul, a região oeste de Santa Catarina apresenta prevalência moderada e o oeste do Paraná, alta endemicidade. A região Sudeste como um todo apresenta baixa endemicidade, com exceção do sul do Secretaria de Vigilância em Saúde / MS H 421 Hepatites Virais Espírito Santo e do nordeste de Minas Gerais, onde ainda são encontradas altas prevalências. A região Centro-Oeste é de baixa endemicidade, com exceção do norte do Mato-Grosso, com prevalência moderada. O Nordeste como um todo está em situação de baixa endemicidade. Quanto à hepatite C, ainda não existem estudos capazes de estabelecer sua real prevalência no país. Com base em dados da rede de hemocentros de pré-doadores de sangue, em 2002, a distribuição variou entre as regiões brasileiras: 0,62% no Norte; 0,55% no Nordeste; 0,28% no Centro-Oeste; 0,43% no Sudeste e 0,46% no Sul. Um dos poucos estudos de base populacional realizado na região Sudeste revelou 1,42% de portadores de anti-HCV na cidade de São Paulo. A hepatite delta concentra-se na Amazônia Ocidental, que apresenta uma das maiores incidências deste agente no mundo. No Acre, a prevalência de antidelta foi de 1,3% (Viana, 2003). Nas regiões Sudeste, Nordeste e na Amazônia Oriental a infecção está ausente. Em relação ao HEV, apesar de o país apresentar condições sanitárias deficientes em muitas regiões, ainda não foi descrita nenhuma epidemia pelo HEV. Alguns casos isolados têm sido notificados, demonstrando que há circulação deste vírus. Vigilância epidemiológica Objetivos Objetivo geral Controlar as hepatites virais no Brasil. Objetivos específicos • Conhecer o comportamento epidemiológico das hepatites virais quanto ao agente etiológico, pessoa, tempo e lugar. • Identificar os principais fatores de risco para as hepatites virais. • Ampliar estratégias de imunização contra as hepatites virais. • Detectar, prevenir e controlar os surtos de hepatites virais oportunamente. • Reduzir a prevalência de infecção das hepatites virais. • Avaliar o impacto das medidas de controle. Definição de caso Suspeito Suspeita clínica/bioquímica • Sintomático ictérico ❯ Indivíduo que desenvolveu icterícia subitamente (recente ou não), com ou sem sintomas como febre, mal-estar, náuseas, vômitos, mialgia, colúria e hipocolia fecal. ❯ Indivíduo que desenvolveu icterícia subitamente e evoluiu para óbito, sem outro diagnóstico etiológico confirmado. 422 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hepatites Virais • Sintomático anictérico ❯ Indivíduo sem icterícia, que apresente um ou mais sintomas como febre, malestar, náuseas, vômitos, mialgia e na investigação laboratorial apresente valor aumentado das aminotransferases. • Assintomático ❯ Indivíduo exposto a uma fonte de infecção bem documentada (na hemodiálise, em acidente ocupacional com exposição percutânea ou de mucosas, por transfusão de sangue ou hemoderivados, procedimentos cirúrgicos/odontológicos/colocação de “piercing”/tatuagem com material contaminado, por uso de drogas endovenosas com compartilhamento de seringa ou agulha). ❯ Comunicante de caso confirmado de hepatite, independente da forma clínica e evolutiva do caso índice. ❯ Indivíduo com alteração de aminotransferases no soro igual ou superior a três vezes o valor máximo normal destas enzimas, segundo o método utilizado. 6 Suspeito com marcador sorológico reagente • Doador de sangue ❯ Indivíduo assintomático doador de sangue, com um ou mais marcadores reagentes para hepatite. A,B, C, D ou E. • Indivíduo assintomático com marcador reagente para hepatite viral A, B, C, D ou E. Caso confirmado Hepatite A • Indivíduo que preenche as condições de caso suspeito, no qual detecta-se o anticorpo da classe IgM contra o vírus A (anti HAV–IgM) no soro. • Indivíduo que preenche as condições de caso suspeito e apresente vínculo epidemiológico com caso confirmado de hepatite A. H Hepatite B Indivíduo que preenche as condições de suspeito e que apresente os marcadores sorológicos reagentes a seguir listados e/ou exame de biologia molecular positivos para hepatite B: • HBsAg reagente; • HBeAg reagente; • Anti-HBc IgM reagente; • DNA do HBV positivo; • DNA polimerase do HBV positiva; • Óbito em que se detecte antígenos ou DNA do vírus B em tecido. Hepatite C • Indivíduo que preenche as condições de suspeito, no qual detecta-se anti-HCV reagente e PCR positivo para o HCV. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 423 Hepatites Virais • Óbito em que se detecte antígeno ou RNA do vírus C em tecido, quando não for possível a coleta de soro. Hepatite D • Detecção de anticorpos contra o vírus D em indivíduo portador crônico do vírus da hepatite B. Hepatite E • Detecção de anticorpos da classe IgM (anti-HEV IgM) contra o vírus da hepatite E, em pacientes não-reagentes a marcadores de hepatites A e B agudas. Descartado • Caso suspeito com diagnóstico laboratorial negativo (desde que amostras sejam coletadas e transportadas oportuna e adequadamente); • Caso suspeito com diagnóstico confirmado de outra doença; • Caso notificado como hepatite viral que não cumpre os critérios de caso suspeito; • Indivíduos com marcadores sorológicos de infecção passada, porém curados no momento da investigação: hepatite A – anti-HAV IgG reagente isoladamente hepatite B – anti-HBc (total) reagente + Anti-HBs reagentes hepatite C – anti-HCV reagente + RNA-HCV não detectável Embora indivíduos com marcador sorológico indicando cura no momento da investigação sejam descartados no sistema de notificação, os comunicantes dos mesmos devem ser investigados pois podem ter sido contaminados durante o curso da doença no passado. Casos inconclusos São aqueles que atendem aos critérios de suspeito, dos quais não foram coletadas e/ou transportadas amostras oportunas ou adequadas ou não foi possível a realização dos testes para os marcadores sorológicos específicos. Notificação É doença incluída na lista de notificação compulsória e, portanto, todos os casos suspeitos de hepatites virais devem ser notificados na ficha do Sinan e encaminhados ao nível hierarquicamente superior ou ao órgão responsável pela vigilância epidemiológica municipal, regional, estadual ou federal. As principais fontes notificadoras são a comunidade, serviços de assistência médica, hemocentros e bancos de sangue, clínicas de hemodiálise, laboratórios, escolas, creches e outras instituições. Além disso, casos podem ser capturados no SIM, SIA/SIH e nos sistemas de informação das vigilâncias sanitária e ambiental. 424 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hepatites Virais Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente O atendimento pode ser feito em nível ambulatorial, sendo indicados para internação, de preferência em unidade de referência, apenas casos graves ou com hepatite crônica descompensada. Qualidade da assistência Verificar se os pacientes estão sendo orientados convenientemente, de acordo com a via de transmissão e gravidade da doença. Proteção individual e coletiva Em situações de surtos de hepatite A ou E, que são de transmissão fecal-oral, logo no primeiro caso dar alerta para os familiares e a comunidade, visando cuidados com a água de consumo, manipulação de alimentos e vetores mecânicos. Em situações em que se verifique, desde o início, aglomerado de casos de pacientes atendidos em unidade de hemodiálise ou outra circunstância parecida, contatar a vigilância sanitária para inspecionar os locais suspeitos. 6 Confirmação diagnóstica Verificar se o médico assistente solicitou exames específicos e inespecíficos (aminotransferases); caso necessário, orientar de acordo o Anexo 1, adiante apresentado. H Investigação Imediatamente após a notificação de casos de hepatites virais deve-se iniciar a investigação epidemiológica para permitir que as medidas de controle possam ser adotadas em tempo oportuno. O instrumento de coleta de dados, a ficha epidemiológica do Sinan, contém os elementos essenciais a serem coletados em uma investigação de rotina. Todos seus campos devem ser criteriosamente preenchidos, mesmo quando a informação for negativa. Outros itens podem ser incluídos no campo “observações”, conforme as necessidades e peculiaridades de cada situação. Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente Preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica relativos aos dados gerais, notificação individual e dados de residência. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Antecedentes epidemiológicos – caso importado • Na investigação da hepatite D deve-se registrar no campo de observações da ficha de investigação se o paciente já esteve, principalmente, na região amazônica. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 425 Hepatites Virais • Na investigação da hepatite E deve-se investigar se o paciente esteve no exterior no período de dois meses antecedentes ao início dos sintomas. ❯ Para confirmar a suspeita diagnóstica – acompanhar os resultados dos exames laboratoriais, visando fortalecer ou descartar a suspeita diagnóstica. ❯ Para identificação e definição da extensão da área de transmissão das hepatites de transmissão oral-fecal – iniciar buscando história de contatos, comunicantes e outros casos suspeitos e/ou confirmados de hepatite, levantando hipóteses sobre como ocorreu a transmissão. ❯ Surtos de hepatites de transmissão pessoa a pessoa ou fecal-oral – investigar se os pacientes se expuseram a possíveis fontes de contaminação, particularmente de água de uso comum, refeições coletivas, uso de água de fonte não habitual por grupo de indivíduos, etc. Fazer busca ativa de casos na comunidade e/ou no grupo de participantes do evento coletivo, quando for o caso. Verificar deslocamentos visando estabelecer qual o provável local de aquisição da infecção. Alertar aos demais contatos e/ou seus responsáveis sobre a possibilidade de aparecimento de novos casos nas próximas semanas, recomendando-se o pronto acompanhamento clínico destes e a imediata (quando possível) tomada de decisões referentes às medidas de prevenção e controle. • Para investigação de casos de hepatite de transmissão parenteral/sexual – investigar uso de sangue, hemocomponentes e hemoderivados principalmente se ocorreu antes de 1993; uso de drogas injetáveis, hábito de compartilhar seringas, etc. Nas situações em que se suspeite de contaminação coletiva, em unidades de hemodiálise, serviços odontológicos, ambientes ambulatoriais e hospitalares que não estão adotando medidas de biossegurança, ou fornecedores de sangue ou hemocomponentes, avaliar a aplicação de medidas imediatas junto aos órgãos de vigilância sanitária. • Coleta e remessa de material para exame – verificar e/ou orientar os procedimentos de coleta e transporte de amostras para realização dos testes laboratoriais específicos, de acordo com as normas do Anexo 1. Análise dos dados A avaliação dos dados é necessária para compreender a situação epidemiológica e orientar as medidas de controle e deve ser realizada sistematicamente pela equipe de vigilância epidemiológica. Consiste em descrever os casos segundo as características de pessoa (sexo, idade, etc.), lugar (local de residência, local de exposição, etc.) e tempo (data do início dos sintomas, data da exposição, etc.). Encerramento de casos As fichas epidemiológicas de cada caso devem ser analisadas visando definir qual o critério utilizado para o diagnóstico (clínico-laboratorial, clínico-epidemiológico, labora- 426 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hepatites Virais torial), forma clínica, classificação etiológica e provável fonte ou mecanismo de infecção. Quando a exposição estiver relacionada a procedimentos de saúde, tais como transfusão de sangue, tratamento dentário, cirúrgico, etc., agregar as informações avaliadas pela vigilância sanitária. Instrumentos disponíveis para o controle Em relação à fonte de infecção Água para consumo humano – a disponibilidade de água potável, em quantidade suficiente nos domicílios, é a medida mais eficaz para o controle das doenças de veiculação hídrica, como as hepatites por vírus tipo A e E. Nos lugares onde não existe sistema público de abastecimento de água potável, deve-se procurar, inicialmente, soluções alternativas junto à comunidade para o uso e acondicionamento da água em depósitos limpos e tampados. Deve-se orientar a população quanto à utilização de produtos à base de cloro, fervura da água e higiene domiciliar, tais como a limpeza e desinfecção da caixa d´água, em intervalos de 6 meses ou de acordo com a necessidade. Outra importante medida preventiva, depende da existência de um sistema destinado ao escoamento e depósito de dejetos de origem humana, que pode ser por meio de fossas sépticas adequadamente construídas e localizadas, ou de enterramento, conforme as instruções contidas no Manual de Saneamento da Fundação Nacional de Saúde. É fundamental que se faça, concomitantemente, um trabalho educativo na comunidade, no sentido de valorizar o saneamento e o consumo de água de boa qualidade, para a prevenção de doenças de veiculação hídrica. Alimentos – o cuidado no preparo dos alimentos com boas práticas de higiene é essencial, adotando-se medidas como lavagem rigorosa das mãos antes do preparo de alimentos e antes de comer, além da desinfecção de objetos, bancada e chão. Para a ingestão de alimentos crus, como hortaliças e frutas, deve-se fazer a sanitização prévia. Pode-se utilizar a imersão em solução de hipoclorito de sódio a 0,02% (200ppm) por 15 minutos. Alimentos como frutos do mar, carne, aves e peixes devem ser submetidos ao cozimento adequado. Profissionais da área da saúde – ao manipular pacientes infectados, durante exame clínico, procedimentos invasivos, exames diversos de líquidos e secreções corporais, obedecer às normas universais de biossegurança: lavar as mãos após exame de cada paciente; estar vacinado contra o vírus da hepatite B; usar luvas de látex, óculos de proteção e avental descartável durante procedimentos em que haja contato com secreções e líquidos corporais de pacientes infectados; no caso de cirurgiões (médicos e odontólogos), não realizar procedimentos cirúrgicos quando tiverem solução de continuidade nas mãos, desinfectar/esterilizar, após uso em pacientes, todo instrumental e máquinas utilizadas. Manicures/pedicures e podólogos – devem utilizar alicates esterilizados (o ideal é que cada cliente tenha seu próprio material). Outros instrumentos, como palitos, devem ser descartáveis. Portadores – em hepatites com transmissão parenteral, sexual, vertical e percutânea (B C e D), os pacientes devem ser orientados em relação ao não compartilhamento de ob- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 6 H 427 Hepatites Virais jetos de uso pessoal como lâmina de barbear, escova de dente, alicates de unha. Deve-se utilizar “camisinha” nas relações sexuais e não compartilhar utensílios e materiais para colocação de piercing e tatuagem. Pessoas com passado de hepatite viral não são candidatos para doação de sangue. Comunicantes – em hepatites com transmissão fecal-oral (A e E) pode ser necessário o isolamento/afastamento do paciente de suas atividades normais (principalmente se forem crianças que freqüentam creches, pré-escolas ou escola) durante as primeiras duas semanas da doença, e não mais que um mês após início da icterícia. Esta situação deve ser reavaliada e prolongada em surtos em instituições que abriguem crianças sem o controle esfincteriano (uso de fraldas), onde a exposição entérica é maior. Nestes casos de hepatite também se faz necessária a disposição adequada de fezes, urina e sangue, com os devidos cuidados de desinfecção e máxima higiene. Os parceiros sexuais e comunicantes domiciliares susceptíveis devem ser investigados, através de marcadores sorológicos para o vírus da hepatite B, C ou D de acordo com o caso índice, e vacinados contra a hepatite B, se indicado. Iniciar imediatamente o esquema de vacinação contra a hepatite B nos não vacinados ou completar esquema dos que não completaram (não aguardar o resultado dos marcadores sorológicos). Indica-se utilizar preservativo de látex (camisinha) nas relações sexuais. Usuário de drogas injetáveis e inaláveis – pelo risco de transmissão de hepatites e outras doenças, é recomendável não compartilhar agulhas, seringas, canudos e cachimbos para uso de drogas, além de realizar vacinação contra a hepatite B e usar preservativos nas relações sexuais. Filhos de mães HBsAg positivas – é recomendável a administração em locais diferentes de imunoglobulina contra o HBV e vacina contra a hepatite (nas primeiras 12 horas de vida). A segunda e terceira doses da vacina devem seguir o calendário vacinal normal, isto é, aos trinta dias e aos seis meses de idade, respectivamente. Aleitamento materno – o HBsAg pode ser encontrado no leite materno de mães HBsAg positivas; no entanto, a amamentação não traz riscos adicionais para os seus recém-nascidos, desde que tenham recebido a primeira dose da vacina e imunoglobulina nas primeiras 12 horas de vida. Na hepatite C, embora o HCV tenha sido encontrado no colostro e no leite maduro, não há evidências conclusivas até o momento de que o aleitamento acrescente risco à transmissão do HCV, exceto na ocorrência de fissuras e sangramentos nos mamilos. Imunização Vacinação contra o vírus da hepatite A – está disponível nos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (Crie), estando indicada apenas para pessoas com hepatopatias crônicas susceptíveis para a hepatite A, receptores de transplantes alogênico ou autólogos, após transplante de medula óssea, candidatos a receber transplantes autólogos de medula óssea, antes da coleta, e doadores de transplante alogênico de medula óssea a patologias que indicam esplectomia. A vacina só deve ser utilizada por maiores de um ano, conforme o laboratório produtor. 428 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hepatites Virais A vacina da hepatite A é clinicamente bem tolerada e altamente imunogênica. Cerca de 30 dias após a primeira dose, mais de 95% dos adultos desenvolvem anticorpos anti-HAV. O título mínimo necessário para a prevenção é de 10UI/ml de anti-HAV, considerado como soroprotetor. A vacina contra a hepatite A é contra-indicada na ocorrência de hipersensibilidade imediata (reação anafilática) após o recebimento de qualquer dose anterior ou de história de hipersensibilidade aos componentes da vacina. Vacinação contra o vírus da hepatite B – a vacina disponível é constituída de antígenos de superfície do vírus B, obtidos por processo de DNA-recombinante, é eficaz, segura, e confere imunidade em cerca de 90% dos adultos e 95% das crianças e adolescentes. A imunogenicidade é reduzida em neonatos prematuros, indivíduos com mais de 40 anos, imunocomprometidos, obesos, fumantes, etilistas, pacientes em programas de hemodiálise ou portadores de cardiopatia, cirrose hepática ou doença pulmonar crônica. A vacina é administrada em três doses, com os seguintes intervalos 0, 1 e 6 meses, por via muscular, no músculo deltóide em adultos e na região anterolateral da coxa em menores de 2 anos. A revacinação é feita em caso de falha da imunização (títulos protetores < de 10UI/ml), que acontece em 5% a 10% dos casos. 6 O Programa Nacional de Imunizações normatiza a vacinação universal dos recémnascidos e adolescentes (população menor que 20 anos) e também grupos populacionais mais vulneráveis, tais como profissionais de saúde, bombeiros, policiais militares, civis e rodoviários envolvidos em atividade de resgate, carcereiros de delegacias e penitenciárias, usuários de drogas injetáveis e inaláveis, pessoas em regime carcerário, pacientes psiquiátricos, homens que fazem sexo com homens, profissionais do sexo, populações indígenas (todas as faixas etárias), comunicantes domiciliares de portadores de HBsAg positivos, pacientes em hemodiálise, politransfundidos, talassêmicos, portadores de anemia falciforme, portadores de neoplasias, portadores de HIV (sintomáticos e assintomáticos), portadores de hepatite C e coletadores de lixo hospitalar e domiciliar. Para pacientes imunocomprometidos, com insuficiência hepática (fazendo hemodiálise) ou transplantados o volume de cada dose deve ser dobrado. Não há contra-indicação à sua administração na gestação e nem trabalhos demonstrando danos ao feto de mulheres vacinadas na gestação. A vacinação não contra-indica o aleitamento materno, pois a vacina não contém partículas infecciosas do HBV. H Imunoglobulina humana anti-hepatite B A imunoglobulina humana anti-hepatite tipo B (IGHAHB) é indicada para pessoas não vacinadas após exposição ao vírus da hepatite B. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 429 Hepatites Virais Quadro 8. Conduta na exposição ao HBV Grupos Imunobiológicos Observações Vítimas de abuso sexual Aplicar o mais precocemente possível, no máximo 14 dias após exposição Comunicantes sexuais de caso agudo de hepatite B Aplicar o mais precocemente possível, no máximo 14 dias após exposição Recém-nascido de mãe sabidamente HBsAg+ IGHAHB + vacina Recém-nascido (com peso < 2000g ou < 34 semanas de gestação) de mãe sabidamente HBsAg positivo recémnascido de mãe simultaneamente HIV e HBsAg positivo Nas primeiras doze horas após o nascimento Nas primeiras doze horas após o nascimento. Esquema de quatro doses da vacina (0, 1, 2 e 6 meses) Quadro 9. Recomendações para profilaxia da hepatite B após exposição ocupacional a material biológico* (Recomendações conjuntas PNHV e PNI, pois inclui a necessidade de testagem para conhecimento do status sorológico dos profissionais que já foram vacinados, uma vez que até 10% dos vacinados podem não soroconverter para anti-HBs positivo após o esquema vacinal completo). Situações vacinal e sorológica do profissional de saúde exposto Paciente-fonte HBsAg positivo HBsAg negativo HBsAg desconhecido ou não testado Não vacinado IGHAHB + iniciar vacinação Iniciar vacinação Iniciar vacinação1 Com vacinação incompleta IGHAHB + completar vacinação Completar vacinação Completar vacinação1 • Com resposta vacinal conhecida e adequada (≥ 10mUI/ml) Nenhuma medida específica Nenhuma medida específica Nenhuma medida específica • Sem resposta vacinal após a 1a série (3 doses) IGHAHB + 1 dose da vacina contra hepatite B Iniciar nova série de vacina (3 doses) Iniciar nova série de vacina (3 doses)2 • Sem resposta vacinal após 2a série (6 doses) IGHAHB (2x) 2 Nenhuma medida específica IGHAHB (2x)2 • Resposta vacinal desconhecida Testar o profissional de saúde Previamente vacinado Testar o profissional de saúde Se resposta vacinal adequada: nenhuma medida específica Se resposta vacinal adequada: nenhuma medida específica Se resposta vacinal adequada: nenhuma medida específica Se resposta vacinal inadequada: IGHAHB + 1 dose da vacina contra hepatite Se resposta vacinal inadequada: fazer nova série de vacinação Se resposta vacinal inadequada: fazer nova série de vacinação *Profissionais que já tiveram hepatite B estão imunes à reinfecção e não necessitam de profilaxia pós-exposição. Tanto a vacina quanto a imunoglobulina devem ser aplicadas dentro do período de 7 dias após o acidente, idealmente, nas primeiras 24 horas. 430 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hepatites Virais 1- Uso associado de imunoglobulina hiperimune está indicado se o paciente-fonte tiver alto risco para infecção pelo HBV, como usuários de drogas injetáveis, pacientes em programas de diálise, contatos domiciliares e sexuais de portadores de HBsAg positivo, homens que fazem sexo com homens, heterossexuais com vários parceiros e relações sexuais desprotegidas, história prévia de doenças sexualmente transmissíveis, pacientes provenientes de áreas geográficas de alta endemicidade para hepatite B, pacientes provenientes de prisões e de instituições de atendimento a pacientes com deficiência mental. 2- IGHAHB (2x) = 2 doses de imunoglobulina hiperimune para hepatite B com intervalo de 1 mês entre as doses. Esta opção deve ser indicada para aqueles que já fizeram 2 séries de 3 doses da vacina mas não apresentaram resposta à vacina ou apresentem alergia grave à mesma. OBS.: na impossibilidade de saber o resultado do teste de imediato, iniciar a profilaxia como se o paciente apresentasse resposta vacinal inadequada. Ações de educação em saúde É importante ressaltar que, além das medidas de controle específicas, faz-se necessário o esclarecimento da comunidade quanto às formas de transmissão, tratamento e prevenção das hepatites virais. O desconhecimento, eventualmente, pode também levar à adoção de atitudes extremas e inadequadas, como queima de casas e objetos de uso pessoal, nos locais onde ocorreram casos de hepatites. Deve-se lembrar que o uso de bebida alcoólica e outras drogas pode tornar as pessoas mais vulneráveis em relação aos cuidados à sua saúde. O trabalho preventivo/educativo que foca o uso de preservativos em relações sexuais, o não compartilhamento de instrumentos para o consumo de drogas, etc. deve ser intenso. 6 H Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 431 Hepatites Virais Anexo 1 Normas para procedimentos laboratoriais Coleta de amostras clínicas (marcadores virais) O sangue (para a separação do soro ou plasma) deverá ser coletado assepticamente em tubo de coleta à vácuo (preferencialmente com gel separador) ou com o auxílio de seringas descartáveis; neste último caso, vertendo o conteúdo para um tubo seco e estéril para aguardar a coagulação. Em caso de utilização de plasma, o sangue deverá ser coletado com ACD ou EDTA. Nunca usar heparina como anticoagulante. Os tubos contendo o sangue deverão ser centrifugados a 2.500 rpm por 10 minutos, à temperatura ambiente. O soro ou plasma deve ser acondicionado em tubo de polipropileno, esterilizado e hermeticamente fechado, devidamente identificado. No rótulo, colocar o nome completo, número de registro laboratorial e data de coleta. A tampa deve ser vedada e fixada com filme de parafina ou esparadrapo. Pode ser acondicionado entre 2ºC e 8ºC por 72h. Para períodos maiores, conservar entre -20ºC e -70ºC. Para transporte, o material deve ser embalado dentro de saco plástico transparente bem vedado (por um nó ou por elástico), que por sua vez será colocado em um isopor ou caixa térmica contendo gelo reciclável ou gelo seco (a quantidade de gelo deverá corresponder a, no mínimo, 1/3 do volume da embalagem). Usar, preferencialmente, gelo seco. Se não for possível, utilizar gelo embalado em sacos plásticos bem vedados. Nunca congelar sangue total e não colocá-lo em contato direto com o gelo. Coleta para procedimentos de biologia molecular (HBV-DNA e HCV-RNA) O sangue (para a separação do soro ou plasma) deverá ser coletado assepticamente em tubo de coleta à vácuo (preferencialmente com gel separador) ou com auxílio de seringas descartáveis; neste último caso, vertendo o conteúdo para um tubo seco e estéril para aguardar a coagulação. Caso se pretenda separar o plasma, este pode ser coletado com ACD ou EDTA. Nunca usar heparina como anticoagulante. Os tubos contendo o sangue deverão ser centrifugados a 2.500 rpm por 10 minutos, à temperatura ambiente. A amostra deverá ser centrifugada e separada nas duas primeiras horas após a coleta. A amostra deve ser acondicionada em frasco novo e esterilizado (fechar hermeticamente e vedar a tampa com filme de parafina ou esparadrapo). No rótulo, colocar identificação completa e data de coleta. Conservar as amostras entre -20ºC e -70ºC. 432 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Hepatites Virais Evitar congelamentos e descongelamentos sucessivos. Para transporte, os frascos devem ser acondicionados em recipientes vedados (por exemplo, dentro de um saco plástico bem vedado por um nó ou elástico) e colocados dentro de caixa de isopor apropriada. Usar, preferencialmente, gelo seco. Coleta de material de necropsia ou de viscerotomia (hepatites fulminates) Coletar, preferencialmente, nas primeiras seis horas após o óbito (este prazo pode chegar até 12 horas, porém o risco de autólise é maior nesta circunstância). Identificar e datar adequadamente os recipientes. É indispensável o nome do paciente, a data da coleta, a identificação do órgão/tecido. Caso, além do fígado, outros órgãos sejam coletados, devem ser acondicionados em frascos individualizados. Acondicionar os fragmentos em formol (preferencialmente tamponado) a 10% (utilizar solução salina para diluir o formol). Manter a proporção aproximada de 1:10 entre os fragmentos e o volume de formol. Certificar-se de que o frasco está bem vedado. Manter a amostra sempre em temperatura ambiente. Em outro recipiente, rigorosamente estéril, acondicionar fragmentos para serem congelados em nitrogênio líquido (preferencialmente abaixo de -20ºC, caso não esteja disponível colocar em congelador de geladeira). 6 H Não colocar fixador ou outro conservante junto a essa amostra. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 433 Influenza (Gripe) INFLUENZA (gripe) CID 10: J10 a J11 Características clínicas e epidemiológicas Descrição A influenza ou gripe é uma infecção viral aguda do sistema respiratório que tem distribuição global e elevada transmissibilidade. Classicamente, apresenta-se com início abrupto de febre, mialgia e tosse seca. Em geral, tem evolução auto-limitada, de poucos dias. Sua importância deve-se ao seu caráter epidêmico, caracterizado por disseminação rápida e marcada morbidade nas populações atingidas. Sinonímia Gripe. Agente etiológico A doença é causada pelos vírus Influenza da família dos Ortomixovirus. São vírus RNA de hélice única e subdividem-se em três tipos: A, B e C, de acordo com sua diversidade antigênica. Os dois primeiros, principalmente os vírus influenza A, são altamente transmissíveis e mutáveis, causando maior morbidade e mortalidade e, por isto, merecem destaque em saúde pública. Os vírus da influenza A são classificados de acordo com os tipos de proteína que se localizam em sua superfície, chamadas de hemaglutinina (H) e neuraminidase (N). A proteína H está associada a infecção das células do trato respiratório superior, onde o vírus se multiplica, enquanto a proteína N facilita a saída das partículas virais do interior das células infectadas. Nos vírus influenza A humanos estão caracterizados três subtipos de hemaglutinina imunologicamente distintos (H1, H2 e H3) e duas neuraminidases (N1 e N2). A nomenclatura dos vírus influenza definida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) inclui o tipo de vírus influenza, a localização geográfica onde o vírus foi isolado pela primeira vez, o número de série que recebe no laboratório, o ano do isolamento e, entre parênteses, a descrição dos antígenos de superfície do vírus, ou seja, da hemaglutinina e da neuraminidase. Por exemplo, A/Sydney/5/97(H3N2). Reservatório Os vírus influenza do tipo B infectam exclusivamente os seres humanos e os do tipo C infectam humanos e suínos. Os vírus influenza do tipo A são encontrados em várias espécies de animais, além dos seres humanos, tais como suínos, cavalos, mamíferos marinhos e aves. As aves migratórias desempenham importante papel na disseminação natural da doença entre distintos pontos do globo terrestre. 434 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Influenza (Gripe) Modo de transmissão A influenza é uma doença respiratória transmitida por meio de gotículas (< 10μl) expelidas pelo indivíduo doente ao falar, espirrar e tossir. Em surtos, há evidências de disseminação aérea por gotículas em aerossol. A transmissão também pode ocorrer por contato direto ou indireto com secreções nasofaringeanas, destacando-se aqui a importância da lavagem adequada das mãos no controle desta doença. Apesar da transmissão inter-humana ser a mais comum, já foi documentada a transmissão direta do vírus para o homem, a partir de aves e suínos. Período de incubação Em geral, de um a quatro dias. Período de transmissibilidade Um indivíduo infectado pode transmitir o vírus desde dois dias antes até cinco dias após o início dos sintomas. 6 Susceptibilidade e imunidade Acomete pessoas de todas as faixas etárias. Nos adultos sadios a recuperação geralmente é rápida. Entretanto, complicações graves podem ocorrer nos idosos e nos muito jovens, determinando elevados níveis de morbimortalidade. A imunidade aos vírus da influenza resulta de infecção natural ou vacinação anterior com o vírus homólogo. Desta maneira, um hospedeiro que teve infecção com determinada cepa do vírus influenza terá pouca ou nenhuma resistência a uma nova infecção com a cepa variante do mesmo vírus. Isto explica, em parte, a grande capacidade deste vírus em causar freqüentes epidemias nas populações atingidas. I Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas Clinicamente, a doença inicia-se com a instalação abrupta de febre alta, em geral acima de 38ºC, seguida de mialgia, dor de garganta, prostração, calafrios, dor de cabeça e tosse seca. A febre é, sem dúvida, o sintoma mais importante e perdura em torno de três dias. Os sintomas sistêmicos são muito intensos nos primeiros dias da doença. Com a progressão desta, os sintomas respiratórios tornam-se mais evidentes e mantém-se em geral por três a quatro dias após o desaparecimento da febre. É comum a queixa de garganta seca, rouquidão, tosse seca e queimação retro-esternal ao tossir. Os pacientes apresentam a pele quente e úmida, olhos hiperemiados e lacrimejantes. Há hiperemia das mucosas, com aumento de secreção nasal hialina. O quadro clínico em adultos sadios pode variar de intensidade. Nas crianças, a temperatura pode atingir níveis mais altos, sendo comum o achado de aumento dos linfonodos cervicais. Quadros de bronquite ou bronquiolite, além de sintomas gastrointestinais, Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 435 Influenza (Gripe) também podem fazer parte da apresentação clínica em crianças. Os idosos quase sempre se apresentam febris, às vezes sem outros sintomas, mas em geral a temperatura não atinge níveis tão altos. As complicações são mais comuns em idosos e indivíduos debilitados. As situações sabidamente de risco incluem doença crônica pulmonar (asma e doença pulmonar obstrutiva crônica – DPOC), cardiopatias (insuficiência cardíaca crônica), doença metabólica crônica (diabetes, por exemplo), imunodeficiência ou imunodepressão, gravidez, doença crônica renal e hemoglobinopatias. As complicações pulmonares mais comuns são as pneumonias bacterianas secundárias, sendo mais freqüentes as provocadas pelos seguintes agentes infecciosos: Streptococcus pneumoniae, Staphylococcus e Haemophillus influenzae. Uma complicação incomum, e muito grave, é a pneumonia viral primária pelo vírus da influenza. Nos imunocomprometidos, o quadro clínico é geralmente mais arrastado e muitas vezes mais grave. Gestantes com quadro de influenza no segundo ou terceiro trimestres da gravidez estão mais propensas à internação hospitalar. Dentre as complicações não-pulmonares em crianças, destaca-se a síndrome de Reye, que também está associada aos quadros de varicela. Esta síndrome caracteriza-se por encefalopatia e degeneração gordurosa do fígado, após o uso do ácido acetilsalicílico, na vigência de um destes dois quadros virais. Recomenda-se, portanto, que não sejam utilizados medicamentos do tipo ácido acetilsalicílico em crianças com síndrome gripal ou varicela. Outras complicações incluem miosite, miocardite, pericardite, síndrome do choque tóxico, síndrome de Guillain-Barré e, mais raramente, encefalite e mielite transversa. Diagnóstico diferencial É importante destacar que as características clínicas da gripe não são específicas e podem ser similares àquelas causadas por outros vírus respiratórios que também ocorrem sob a forma de surtos e eventualmente circulam ao mesmo tempo, tais como rinovírus, vírus para influenza, vírus sincicial respiratório, coronavírus ou adenovírus. Apesar de os sintomas sistêmicos serem mais intensos na influenza que nas demais infecções que cursam com quadro clínico semelhante (daí a denominação de síndrome gripal para as infecções causadas por estes agentes), o diagnóstico definitivo dessas infecções apenas pela clínica torna-se difícil. Chama-se a atenção para o diagnóstico diferencial de casos de influenza grave (pneumonia primária) com possíveis casos de síndrome respiratória aguda grave (Sars). Diagnóstico laboratorial Os procedimentos apropriados de coleta, transporte, processamento e armazenamento de espécimes clínicos são fundamentais no diagnóstico da infecção viral. O espécime preferencial para o diagnóstico laboratorial são as secreções da nasofaringe (SNF) obtidas por meio de aspirado de nasofaringe com auxílio de um coletor descartável ou por meio de swab combinado (oral + nasal). Estas amostras devem ser coletadas até o quinto dia (preferencialmente até o terceiro) do início dos sintomas e transportadas em gelo reciclável (não congelar) até o laboratório, para o devido processamento. 436 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Influenza (Gripe) A detecção do vírus influenza é realizada pelas técnicas de imunofluorescência (IF), de isolamento do agente em cultivos celulares/ovos embrionados (considerado método padrão) e de detecção por reação em cadeia da polimerase (PCR). Adicionalmente, o diagnóstico pode ser estabelecido através do exame de inibição de hemaglutinação (HI). Para isso, coletar amostras pareadas de sangue durante a fase aguda e convalescente (15 dias de intervalo entre as duas colheitas). A IF é realizada nos laboratórios estaduais onde a vigilância da influenza está implantada, utilizando-se um painel de soros que detecta, além da influenza, outros vírus respiratórios de interesse (vírus respiratório sincicial, parainfluenza e adenovírus). A cultura e a PCR são realizadas nos três laboratórios de referência (Instituto Evandro Chagas/SVS/MS, Fiocruz/MS e Instituto Adolfo Lutz/SES/SP), que também procedem à caracterização antigênica e genômica dos vírus da influenza isolados. Uma caracterização complementar para influenza é realizada em um dos laboratórios de referência internacional da OMS. Para o vírus da influenza A, a tipagem completa é essencial para que o mesmo seja introduzido na composição anual da vacina do hemisfério sul. Para efeito da vigilância epidemiológica, esse diagnóstico é realizado apenas em alguns pacientes atendidos em unidades sentinelas. 6 Tratamento Recomenda-se repouso e hidratação adequada. Medicações antitérmicas podem ser utilizadas, lembrando-se de evitar o uso de ácido acetil salicílico nas crianças. No caso de complicações pulmonares graves, podem ser necessárias medidas de suporte intensivo. Em casos de internação por complicações secundárias ou por apresentações graves da infecção, devem ser instituídas precauções contra a transmissão do vírus influenza através de gotículas respiratórias. Uma prática adequada de lavagem de mãos parece ser suficiente para impedir a transmissão por contato. Precauções contra a transmissão por aerossóis devem ser adotadas em caso de internação próxima a pacientes gravemente imunodeprimidos ou em infecções por cepas emergentes de influenza A com potencial pandêmico. Atualmente, há duas classes de drogas utilizadas no tratamento específico da influenza. Licenciadas há alguns anos, a amantadina e a rimantadina são drogas similares, com 70% a 90% de eficácia na prevenção da doença pelo vírus da influenza A em adultos jovens e crianças, caso sejam administradas profilaticamente durante o período de exposição ao vírus. Também podem reduzir a intensidade e a duração do quadro, se administradas terapeuticamente. Ressalta-se, porém, que nenhuma destas drogas demonstrou ser eficaz na diminuição das complicações graves da influenza. Duas grandes limitações do uso dessa classe de drogas são a ocorrência de efeitos colaterais no sistema nervoso central e no trato gastrointestinal (principalmente com o uso da amantadina) e a indução de resistência viral. Já o oseltamivir e o zanamivir fazem parte de uma nova classe de drogas chamadas de inibidoras da neuraminidase e que podem ser utilizadas contra a infecção pelos vírus da influenza A e B. Estas drogas, se administradas até dois dias após o início dos sintomas, podem reduzir o tempo da doença não complicada. No entanto, como as do grupo anterior, nenhuma das duas drogas desta classe foi eficaz em prevenir as complicações da influenza, Secretaria de Vigilância em Saúde / MS I 437 Influenza (Gripe) havendo poucos dados sobre a efetividade do zanamivir em indivíduos de alto risco para complicações da doença. Uma limitação importante para o seu uso é o custo elevado do tratamento e a existência de restrições ainda existentes para seu uso profilático. Aspectos epidemiológicos A gripe ocorre em âmbito mundial, como surto localizado ou regional, em epidemias e, também, devastadoras pandemias. O potencial pandêmico da influenza reveste-se de grande importância. No século passado ocorreram três importantes pandemias de influenza (a Gripe Espanhola, entre 1918-20; a Gripe Asiática, entre 1957-60 e a de Hong Kong, entre 1968-72). Destaca-se ainda a ocorrência de uma pandemia em 1977/78 (Gripe Russa), que afetou primordialmente crianças e adolescentes. Com os modernos meios de transporte, a propagação do vírus da influenza tornouse muito rápida e hoje o mesmo vírus pode circular ao mesmo tempo em várias partes do mundo, causando epidemias quase simultâneas. Em anos epidêmicos, a taxa de ataque na comunidade atinge aproximadamente 15%, sendo ao redor de 2% em anos não-epidêmicos. Em comunidades fechadas, este número sobe para 40% a 70%, com taxa de ataque secundário em torno de 30%. Tanto a morbidade quanto a mortalidade, devido à influenza e suas complicações, podem variar ano a ano, dependendo de fatores como as cepas circulantes, o grau de imunidade da população geral e da população mais susceptível, entre outros. Destaca-se ainda a ocorrência de transmissão direta do vírus da influenza aviária de alta patogenicidade (H5N1) ao homem, gerando surtos de elevada mortalidade. Esse fenômeno foi detectado pela primeira vez em 1997, em Hong Kong, quando 18 pessoas foram afetadas, das quais 6 morreram (letalidade de 33,3%). Novos episódios ocorreram em períodos mais recentes, destacando-se os surtos verificados no Vietnã e na Tailândia entre dezembro de 2003 e abril de 2004, que afetaram um total de 33 pessoas. As taxas de letalidade observadas foram de, respectivamente, 45,4% e 70%. Este processo de transmissão se deu em meio a uma epizootia de influenza aviária de alta patogenicidade em países do sudeste asiático em proporções e extensão geográfica inusitadas. Também se verificaram, no período 2003/2004, episódios de transmissão direta de influenza aviária de baixa patogenicidade para o homem, com registro de surtos pela cepa H7 na Holanda, Canadá e Estados Unidos. No Brasil, os dados disponíveis no Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Influenza (Sivep-Gripe) demonstram, para o período 2000/2003, a ocorrência de casos de síndrome gripal predominantemente em crianças na faixa etária de 0-4 anos (48,2%), seguida da faixa de 5-14 anos (25,4%) e de 15-24 anos (10,2%). As demais faixas contribuíram com 16,2%. Os principais vírus respiratórios detectados pelo método de imunofluorescência neste período foram o vírus sincicial respiratório (31%), influenza A (30,7%), parainfluenza 1, 2 e 3 (18,5%), adenovírus (16,8%) e influenza B (3%). Em 2004, até a semana epidemiológica nº 36 foram coletadas 1.168 amostras na rede sentinela, das 438 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Influenza (Gripe) quais 366 (31,3%) foram positivas para vírus respiratórios pelo método da imunofluorescência. Destas, 152 foram positivas para influenza A, tendo sido possível fazer a caracterização antigênica inicial de 23 (15%) dessas amostras, assim identificadas: influenza A H3N2 (67%), influenza B (20%) e influenza A H1N1 (13%). No ano de 2002 foram detectados e investigados dois importantes surtos comunitários de influenza no país, nas cidades de Araraquara/SP e do extremo oeste de Santa Catarina, totalizando aproximadamente 3 mil casos confirmados (influenza B Hong Kong). Em 2003, novo surto comunitário foi detectado nas cidades de Pium e Araguacema/TO, com a confirmação de cerca de 500 casos (influenza A Tocantins H3N2). Em 2004, foram investigados surtos de influenza em comunidades fechadas (presídios e abatedouros de aves) nos municípios de Marília e Araçatuba/SP e Francisco Beltrão e Almirante Tamandaré/PR, devido à infecção por influenza A Fujian H3N2 e influenza A Korea H3N2. 6 Vigilância epidemiológica O Sistema de Vigilância da Influenza no Brasil é de implantação recente (a partir do ano 2000) e baseia-se em uma estratégia de vigilância sentinela que tem por função monitorar a circulação das cepas e a carga de morbidade por síndrome gripal* nas cinco regiões brasileiras. Objetivos • • • • • Monitorar as cepas dos vírus da influenza que circulam nas cinco regiões brasileiras. Avaliar o impacto da vacinação contra a doença. Acompanhar a tendência da morbidade e da mortalidade associadas à doença. Responder a situações inusitadas. Produzir e disseminar informações epidemiológicas. I Definição de caso suspeito Indivíduo com doença aguda (com duração máxima de 5 dias), apresentando febre (ainda que referida) e pelo menos um sintoma respiratório (tosse ou dor de garganta), na ausência de outros diagnósticos. Confirmado Caso suspeito com confirmação laboratorial e/ou caso suspeito com vínculo epidemiológico com casos laboratorialmente confirmados. Descartado Caso suspeito em que o resultado do exame foi negativo, em amostra adequadamente *Para definir síndrome gripal pode-se utilizar os seguintes códigos da 10ª Revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID 10): J00 (todos) – Nasofaringite aguda (resfriado comum); J02.9 – Faringite aguda não especificada; J03.9 – Amigdalite aguda não especificada; J04.0 – Laringite aguda; J04.1 – Traqueíte aguda; J04.2 – Laringotraqueíte aguda; J06 (todos) – Infecção aguda das vias aéreas superiores e não especificadas; J10 (todos) – Influenza devida a vírus influenza identificado; J11 (todos) - Influenza devida a vírus influenza não identificado. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 439 Influenza (Gripe) colhida e transportada, ou quando for identificado laboratorialmente outro agente etiológico que não o vírus da influenza. Notificação A influenza não é doença de notificação compulsória. Os dados da vigilância sentinela são informados em um sistema de informação específico, através da Web, chamado de Sivep-Gripe. No entanto, considerando o potencial epidêmico desta doença, qualquer suspeita de surto comunitário ou institucional (em particular os surtos com casos graves) deve ser comunicada (por telefone, fax, e/ou e-mail) à secretaria estadual de saúde e Coordenação de Vigilância de Doenças de Transmissão Respiratória e Imunopreveníveis da SVS/MS. Investigação Recomenda-se a investigação de surtos pelas secretarias municipais e estaduais de saúde, se necessário com apoio do nível federal, com os seguintes objetivos: • confirmar a ocorrência do surto de síndrome gripal; • descrever o surto por tempo, pessoa e lugar; • caracterizar o processo de transmissão; • identificar e caracterizar o vírus respiratório; • monitorar os grupos de maior risco para complicações da doença; • avaliar o impacto do surto na morbidade e na mortalidade; • avaliar a necessidade da adoção de medidas emergenciais de controle; • recomendar medidas de prevenção e controle de surtos. Sugere-se realizar busca ativa de pessoas com síndrome gripal, utilizando a definição de caso ou os códigos das CID descritos anteriormente. Os locais-alvo para a busca ativa são as unidades de saúde (centros de saúde, hospitais) do município, as unidades de ensino, creches, asilos, entre outras. Para padronizar as informações coletadas na busca ativa recomenda-se a utilização de um formulário que permita agregar os dados por semana epidemiológica e que contenha as seguintes variáveis: total de pessoas com síndrome gripal e total de pessoas, unidade de saúde por faixa etária (Anexo 1). Deve-se coletar amostras para análise laboratorial. Se o município onde estiver ocorrendo o surto de síndrome gripal não pertencer à rede de vigilância da influenza, a secretaria estadual de saúde deve entrar em contato imediatamente com a Coordenação de Vigilância de Doenças de Transmissão Respiratória e Imunopreveníveis (Cover) e com a Coordenação Geral de Laboratório (CGLAB) do Ministério da Saúde/SVS, com vistas a possibilitar a coleta, transporte e análise laboratorial das amostras. Sugere-se realizar estudo descritivo detalhado da população doente ou pelo menos em uma amostra desta. Para isso, é importante a aplicação de um questionário padronizado a todas as pessoas do estudo. Este instrumento deve conter, entre outras, as seguintes variáveis: • demográficas (idade, sexo, endereço, ocupação); 440 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Influenza (Gripe) • sinais e sintomas (febre, tosse, dor de garganta, dor no corpo, dor de ouvido, dor nas articulações, dor de cabeça, etc.); • uso da vacina contra a influenza; • participação em festas, shows (aglomerado), viagem recente; • contato com pessoas que adoeceram com síndrome gripal; • presença de doenças crônicas (diabetes, cardiopatas, renais crônicos, hipertensos, pneumopatas, etc.) e doenças imunosupressoras (aids, lúpus, etc.); • uso de medicamentos; • presença de alergia; • necessidade de hospitalização; • história de exposição a aves e suínos, principalmente criadouros de aves, bem como relato de contato com aves doentes ou mortas; • outras variáveis consideradas importante de acordo com as características do surto. 6 Em situações de surto, orientações específicas deverão ser buscadas junto à SVS/MS. Instrumentos disponíveis para controle Imunização Desde 1999, o Ministério da Saúde implantou a vacinação contra gripe no Brasil, com o objetivo de proteger os grupos de maior risco contra as complicações da influenza, ou seja, os idosos e os portadores de doenças crônicas (doenças pulmonares ou cardiovasculares, imunocomprometidos, transplantados, dentre outros). É também recomendável a vacinação de profissionais de saúde que atuam na assistência individual de casos de infecção respiratória e de trabalhadores de asilos e creches, como forma de reduzir o potencial de transmissão da doença em comunidades fechadas e grupos mais vulneráveis à infecção. Outro grupo de risco são os trabalhadores de avicultura, cuja vacinação visa protegê-los contra infecção cruzada com vírus da influenza aviária. A vacina é a melhor estratégia disponível para a prevenção da influenza e suas conseqüências, proporcionando redução da morbidade, diminuição do absenteísmo no trabalho e dos gastos com medicamentos para tratamento de infecções secundárias. A vacinação ocorre na forma de campanhas prolongadas, em geral duas semanas. O período para a realização dessas campanhas deve ser anterior ao período de maior circulação do vírus na população das diferentes regiões do país. Este imunógeno também encontra-se disponível nos Centros de Referência de Imunobiológicos Especiais (Cries) dos estados. A vacina é constituída por três tipos de cepas dos vírus influenza, cultivados em ovos embrionados de galinha e posteriormente inativados e purificados. Contém ainda neomicina, gentamicina e o timerosal como conservantes. É composta por dois tipos de vírus de influenza A e um vírus de influenza B. Para conferir proteção adequada a vacina deve ser administrada a cada ano, já que sua composição também varia anualmente, em função das cepas circulantes. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS I 441 Influenza (Gripe) O esquema vacinal preconizado pelo Ministério da Saúde varia conforme a faixa etária da pessoa a ser vacinada, demonstrado na tabela a seguir: Idade Dose (ml) Nº de doses 6-35 meses 0,25ml 1-2* 3-8 anos 0,5ml 1-2* > 9 anos e adultos 0,5ml 1 *A segunda dose com intervalo de 4 a 6 semanas. Após a vacinação em adultos saudáveis, a detecção de anticorpos protetores ocorre entre 1 a 2 semanas e seu pico máximo é após 4 a 6 semanas. A imunidade obtida com a vacinação pode variar: • em idosos, uma vez que a formação de anticorpos é modulada pela experiência cumulativa através dos anos de estimulação repetitiva do sistema imunológico com o vírus influenza; • em pacientes com câncer, pois a produção de anticorpos é menor do que em controles sadios. A soroconversão é de 24% a 71%, sendo a terapia antineoplásica o fator determinante da resposta mais baixa nesse grupo. As crianças que não estão em quimioterapia há mais de quatro semanas e com linfócitos >1000/mm3 possuem altas taxas de soroconversão com o uso da vacina; • em transplantados, a imunização deve ser feita previamente à realização do procedimento. No transplante de rim a soroconversão ocorre em cerca de 50% dos casos um mês após a vacinação; • em portadores do HIV/aids, a vacina contra influenza produz títulos protetores de anticorpos em pessoas infectadas por HIV pouco sintomáticas e com contagens adequadas de linfócitos CD4. No entanto, nos pacientes com a doença avançada e/ou contagem baixa de CD4 a vacina pode não induzir anticorpos protetores e uma segunda dose não melhora a resposta imunológica à mesma. A contra-indicação para esta vacina é a presença de reação de hipersensibilidade do tipo anafilática a proteínas do ovo de galinha e indivíduos com história pregressa de síndrome de Guillain-Barré. Os eventos adversos mais freqüentemente associados temporalmente à vacina são locais e resolvidos geralmente em 48 horas: dor leve no local da aplicação e eritema ocorrendo em 10% a 64% dos vacinados. Outras reações sistêmicas também podem estar presentes tais como febre, astenia, mialgia e cefaléia que, geralmente se apresentam entre 6 a 12 horas após a aplicação. Como a vacina é composta por vírus inativados, não tem o poder de provocar doença. “Casos de gripe” eventualmente diagnosticados em pessoas recentemente vacinadas podem ser devidos a infecção por outras cepas não presentes na vacina, a falhas de conversão sorológica ou a infecção por outros vírus respiratórios. 442 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Influenza (Gripe) Anexo 1 MINISTÉRIO DA SAÚDE SECRETARIA DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE Vigilância de Síndrome Gripal 6 Unidade: _______________________________________________________________ Município: ____________________________________________________ UF: ______ Responsável pela informação: _______________________________________________ Semana de ____/____/____ a ____/____/____ Faixa etária (em anos) Número de consultas Consultas de síndrome gripal Total de consultas da unidade I <4 5 a 14 15 a 24 25 a 59 60 a 64 > 65 Idade ignorada Total Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 443 Leishmaniose Tegumentar Americana LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA CID 10: B55.1 Características clínicas e epidemiológicas Descrição A leishmaniose tegumentar americana – LTA é uma doença infecciosa, não-contagiosa, causada por protozoário do gênero Leishmania, de transmissão vetorial, que acomete pele e mucosas; é primariamente uma infecção zoonótica, afetando outros animais que não o homem, o qual pode ser envolvido secundariamente. Agente etiológico Há diferentes subgêneros e espécies de Leishmania, sendo as mais importantes no Brasil: Leishmania (Leishmania) amazonensis – distribuída pelas florestas primárias e secundárias da Amazônia (Amazonas, Pará, Rondônia, Tocantins e sudoeste do Maranhão), particularmente em áreas de igapó e de floresta tipo “várzea”. Sua presença amplia-se para o Nordeste (Bahia), Sudeste (Minas Gerais e São Paulo) e Centro-Oeste (Goiás). Leishmania (Viannia) guyanensis – aparentemente limitada ao norte da Bacia Amazônica (Amapá, Roraima, Amazonas e Pará) e estendendo-se pelas Guianas, é encontrada principalmente em florestas de terra firme – áreas que não se alagam no período de chuvas. Leishmania (Viannia) braziliensis – tem ampla distribuição, do sul do Pará ao Nordeste, atingindo também o centro-sul do país e algumas áreas da Amazônia Oriental. Na Amazônia, a infecção é usualmente encontrada em áreas de terra firme. Quanto ao subgênero Viannia, existem outras espécies de Leishmania recentemente descritas: L.(V) lainsoni, L.(V) naiffi, com poucos casos humanos no Pará; L.(V) shawi com casos humanos encontrados no Pará e Maranhão. Reservatório Varia conforme a espécie da Leishmania: Leishmania (Leishmania) amazonensis – tem como hospedeiros naturais vários marsupiais e roedores, tais como “rato-soiá” (Proechymis), além do Oryzomys que, às vezes, apresenta o parasita na pele sem lesões cutâneas. Leishmania (Viannia) guyanensis – vários mamíferos silvestres foram identificados como hospedeiros naturais, tais como a preguiça (Choloepus didactilus), o tamanduá (Tamandua tetradactyla), marsupiais e roedores. A infecção animal é geralmente inaparente, com parasitas encontrados na pele e vísceras. Leishmania (Viannia) braziliensis – esta espécie de Leishmania foi identificada em roedores silvestres como Bolomys lasiurus e Nectomys squamipes, no estado de Pernambu- 444 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Tegumentar Americana co. É freqüente o encontro desta espécie em animais domésticos como o cão (CE, BA, ES, RJ e SP), eqüinos e mulas (CE, BA e RJ), albergando em proporção expressiva o parasita. Vetores O vetor transmissor da LTA pode pertencer a várias espécies de flebotomíneos (conhecido como palha, cangalhinha, tatuquira, mulambinho, catuqui, etc.), de diferentes gêneros (Psychodopigus, Lutzomyia), dependendo da localização geográfica. Assim como os reservatórios, os vetores também mudam de acordo com a espécie de Leishmania. Leishmania (Leishmania) amazonensis – seus principais vetores são Lutzomyia flaviscutellata, Lutzomyia reducta e Lutzomyia olmeca nociva (Amazonas e Rondônia), têm hábitos noturnos, vôo baixo e são pouco antropofílicos. Leishmania (Viannia) guyanensis – os vetores são Lutzomyia anduzei, Lutzomyia whitmani e Lutzomyia umbratilis, que é o principal vetor, tendo o hábito de pousar durante o dia em troncos de árvores e atacar o homem em grande quantidade, quando perturbado. Leishmania (Viannia) braziliensis – em área silvestre, o único vetor demonstrado transmissor foi o Psychodopigus wellcomei, encontrado na Serra dos Carajás, altamente antropofílico, picando o homem mesmo durante o dia e com grande atividade na estação das chuvas. Em ambientes modificados, rural e peridomiciliar, são mais freqüentemente implicadas a Lutzomyia whitmani, Lutzomyia intermedia e Lutzomyia migonei. 6 Modo de transmissão Picada de insetos transmissores infectados. Não há transmissão de pessoa a pessoa. Período de incubação No homem, em média de 2 meses, podendo apresentar períodos mais curtos (duas semanas) e mais longos (dois anos), após a picada do flebotomíneo infectado. L Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade é universal. A infecção e a doença não conferem imunidade ao paciente. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas Lesões cutâneas A apresentação cutânea da LTA, as lesões de pele, podem caracterizar a forma localizada (única ou múltipla), a forma disseminada (lesões muito numerosas em várias áreas do tegumento) e a forma difusa. Na maioria das vezes, a doença apresenta-se como uma lesão ulcerada única. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 445 Leishmaniose Tegumentar Americana Nas formas cutâneas localizadas e múltiplas, a lesão ulcerada franca é a mais comum e se caracteriza por úlcera com bordas elevadas, em moldura. O fundo é granuloso, com ou sem exsudação. Em geral, as úlceras são indolores. Observam-se também outros tipos de lesões como úlcero-crostosa, impetigóide, ectimatóide, úlcero-vegetante, verrucosa-crostosa, tuberosa, linquenóide e outras. Nestas formas, na fase inicial, é freqüente a linfangite e/ou adenopatia satélite que poderia preceder a lesão de pele. Às vezes, no cordão linfático podem se desenvolver nódulos que ulceram, lembrando a esporotricose. Podem ser observadas pápulas na periferia das lesões. A forma cutânea disseminada caracteriza-se por lesões ulceradas pequenas, às vezes acneiformes, distribuídas por todo o corpo (disseminação hematogênica). A leishmaniose cutânea disseminada é rara, as lesões são eritematosas, sob a forma de pápulas, tubérculos, nódulos e infiltrações difusas e, menos freqüentemente, sob a forma tumoral. A infiltração pode envolver extensas áreas do tegumento e, quando presente na face, confere ao paciente uma face típica conhecida como facieis leonina, confundindose, por isso e pela grande área de infiltração cutânea, com a hanseníase virchowiana. Seu prognóstico é ruim, por não responder adequadamente à terapêutica. Lesões mucosas A apresentação mucosa da LTA é, na maioria das vezes, secundária às lesões cutâneas, surgindo geralmente meses ou anos após a resolução das lesões de pele. Às vezes, porém, não se identifica a porta de entrada, supondo-se que as lesões sejam originadas de infecção subclínica. São mais freqüentemente acometidas as cavidades nasais, seguidas da faringe, laringe e cavidade oral. As queixas mais comuns no acometimento nasal são obstrução, epistaxes, rinorréia e crostas; da faringe, odinofagia; da laringe, rouquidão e tosse; da cavidade oral, ferida na boca. As lesões podem ser discretas, com poucos sintomas, daí a necessidade de sempre se buscar a identificação de doença em mucosas, incluindo o exame rotineiro dessas áreas. Ao exame clínico, pode-se observar infiltração, ulceração, perfuração do septo nasal, lesões úlcero-vegetantes, úlcero-crostosas ou úlcero-destrutivas. Poderá ocorrer destruição parcial ou total da pirâmide nasal e outras estruturas acometidas na boca. Outras mucosas, como língua e órgãos genitais, são raramente atingidas. A presença de uma ou várias cicatrizes atróficas em pele ou história de úlcera cutânea com evolução prolongada, ao lado das queixas acima referidas, reforça o diagnóstico clínico de leishmaniose mucosa. A ausência de cicatrizes não afasta a suspeita clínica de acometimento mucoso por leishmaniose, devendo ser investigadas outras doenças com o diagnóstico diferencial. A lesão mucosa associada ao comprometimento cutâneo da LTA pode ser concomitante (o acometimento mucoso a distância da lesão ativa de pele) ou contígua (o comprometimento mucoso ocorre por extensão da lesão de pele situada próxima de mucosas). O diagnóstico precoce, de qualquer lesão mucosa, é essencial para que a resposta terapêutica seja mais efetiva e evitem-se as seqüelas deformantes e/ou funcionais. 446 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Tegumentar Americana Comprometimento de linfonodos Pode ser primário (enfartamento de cadeia linfonodal precedendo a lesão de pele) ou secundário (enfartamento de cadeia de linfonodos na região da lesão de pele, após a identificação desta) e raramente pode apresentar-se generalizado. A classificação clínica da LTA, envolvendo as diferentes formas e apresentações da doença, e seus respectivos agentes etiológicos está esquematizada no Anexo 1. Diagnóstico diferencial Nas lesões cutâneas, devem ser excluídas as doenças que compõem o síndrome verrucoso conhecido como Plect, que são as iniciais de paracoccidioidomicose, leishmaniose, esporotricose, cromomicose, tuberculose cutânea. Devem ainda ser afastadas as úlceras traumáticas, úlceras de estase, úlceras tropicais, úlceras de membros inferiores por anemia falciforme, piodermites, neoplasias cutâneas, sífilis. A hanseníase virchowiana deverá ser incluída no diagnóstico diferencial, principalmente quando se tratar de suspeita de leishmaniose cutânea difusa. Nas lesões mucosas, o diagnóstico diferencial deve ser feito com a paracoccidioidomicose, hanseníase virchowiana, rinoscleroma, sarcoidose, bouba, sífilis terciária, granuloma médio facial e neoplasias. 6 Diagnóstico laboratorial O diagnóstico laboratorial, na rede de saúde, baseia-se principalmente em exames parasitológicos (exame direto) e imunológicos (intradermorreação de Montenegro/IRM), podendo-se proceder em laboratórios de referência outros exames de maior complexidade, conforme esquema abaixo (ver normas e procedimentos no Anexo 2). L Exames parasitológicos • Exame direto (esfregaço de lesão, imprint por aposição): diagnóstico de certeza pelo encontro do parasito na sua forma amastigota. • Histopatológico ❯ Hematoxilina eosina ❯ Imunoperoxidase • Cultura em meios artificiais • Inoculação em animais experimentais (hamsters) Exames imunológicos • Intradermorreação de Montenegro (IRM): em áreas endêmicas, a IRM deve ser avaliada de forma criteriosa considerando os achados clínicos. • Sorologia ❯ Imunofluorescência indireta (IFI): a imunofluorescência não deve ser utilizada como critério isolado para diagnóstico de LTA. Entretanto, pode ser considerada Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 447 Leishmaniose Tegumentar Americana ❯ como critério adicional no diagnóstico diferencial com outras doenças, especialmente nos casos sem demonstração de qualquer agente etiológico. Elisa: utilizado como pesquisa em centros de referência. Caracterização das espécies de Leishmania • Anticorpos monoclonais. • Testes moleculares: a reação em cadeia de polimerase – PCR representa nova perspectiva para o diagnóstico da LTA. Entretanto, os seus resultados dependem de algumas variáveis envolvidas, entre elas: área endêmica, tipo de amostra; alvo do DNA utilizado para amplificação; método de extração do DNA, cuidados de contaminação do material, etc. Tratamento A droga de primeira escolha é o antimonial pentavalente. Visando padronizar o esquema terapêutico, a Organização Mundial da Saúde recomenda que a dose deste antimonial seja calculada em mg/Sb+5/kg/dia (Sb+5 significando antimônio pentavalente). Há dois tipos de antimoniais pentavalentes que podem ser utilizados, o antimoniato N-metilglucamina e o stibogluconato de sódio (este último não comercializado no Brasil). O antimoniato N-metilglucamina apresenta-se comercialmente em frascos de 5ml que contém 1,5g do antimoniato bruto, correspondente a 405mg de Sb+5. Portanto, uma ampola com 5ml tem 405mg de Sb+5, e cada ml contém 81mg de Sb+5. Este antimonial é indicado para o tratamento de todas as formas de LTA, embora as formas mucosas exijam maior cuidado, podendo apresentar respostas mais lentas e maior possibilidade de recidivas. Não havendo resposta satisfatória com o tratamento pelo antimonial pentavalente, as drogas de segunda escolha são a anfotericina B e o isotionato de pentamidina. As lesões ulceradas podem sofrer contaminação secundária, razão pela qual devem ser prescritos cuidados locais, como limpeza com água e sabão e, se possível, compressas com permanganato de potássio (KMNO4), com diluição de 1/5 mil ml de água morna. Antimoniato-N-metil-glucamina Lesões cutâneas – nas formas cutânea localizada e disseminada, a dose recomendada varia entre 10 a 20mg Sb+5/kg/dia. Sugere-se 15mg Sb+5/kg/dia, tanto para o adulto quanto para crianças, durante 20 dias seguidos. Nunca deve ser utilizada dose superior a 3 ampolas/dia ou 15ml/dia para o adulto. Se não houver cicatrização completa no período de três meses (12 semanas) após o término do tratamento, ou se neste mesmo período houver reativação da lesão, o esquema deverá ser repetido, prolongando-se, desta vez, a duração da série para 30 dias. Em caso de falha terapêutica, utilizar uma das drogas de segunda escolha. Na forma difusa, a dose é de 20mg/Sb+5/kg/dia, durante 20 dias seguidos. Na fase inicial pode responder ao antimonial, porém são freqüentes as múltiplas recidivas, sendo necessário encaminhar o paciente para serviços especializados. 448 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Tegumentar Americana Lesões mucosas – em todas as formas de acometimento mucoso, a dose recomendada é de 20mg/Sb+5/kg/dia, durante 30 dias seguidos, de preferência em ambiente hospitalar. Se não houver cicatrização completa no período de três meses (12 semanas) após o término do tratamento, ou se neste mesmo período houver reativação da lesão, o esquema deverá ser repetido apenas uma vez. Em caso de não-resposta, utilizar uma das drogas de segunda escolha. Esquema terapêutico preconizado para as diversas formas clínicas de LTA, segundo OMS e Ministério da Saúde Forma clínica Leishmaniose cutânea Dose 10 - 20mg/Sb+5/kg/dia (recomenda-se 15mg/Sb+5/kg/dia) Tempo de duração 20 dias Leishmaniose difusa 20mg/Sb+5/kg/dia 20 dias Leishmaniose mucosa 20mg/Sb+5/kg/dia 30 dias 6 Modo de aplicação – as aplicações devem ser feitas por via parenteral, intramuscular ou intravenosa, com repouso após a aplicação. A via intramuscular apresenta grande inconveniente de dor local. Sugere-se, então, alternância dos locais de aplicação, preferindo-se a região glútea. Por via intravenosa, não há necessidade de diluição e a aplicação, com agulha fina (calibre 25x8) ou “scalp”, deve ser LENTA (duração de 5 minutos). Esta é a melhor via, pois permite a aplicação de doses mais adequadas e não tem o inconveniente da dor local. Contra-indicação – não deve ser administrado em gestantes, cujo tratamento consiste em cuidados locais, observação clínica e sorológica (se possível). Nas formas graves, cutâneas ou mucosas, discutir a possibilidade de tratamento a partir do sexto mês, com doses de antimônio mais baixas e controle laboratorial. Nos casos em que exista associação com outras doenças, tais como tuberculose, malária, esquistossomose, o tratamento das mesmas deve ser efetuado primeiramente. Há restrições para o tratamento de pacientes com idade acima de 50 anos, portadores de cardiopatias, nefropatias, hepatopatias e doença de Chagas. Quando for necessária a administração nos pacientes portadores de uma dessas doenças, deverá ser feita rigorosa avaliação clínica antes do tratamento e reavaliações clínicas periódicas, com acompanhamento eletrocardiográfico (ECG), duas vezes por semana, e exame bioquímico do sangue para avaliação das funções renal (dosagem de uréia e creatinina) e hepática (dosagem das transaminases, bilirrubinas e fosfatase alcalina) e leucograma. Todos esses exames deverão ser realizados semanalmente, para orientação da conduta quanto à redução da dose ou utilização de outra alternativa terapêutica. Efeitos colaterais – podem ocorrer um ou mais efeitos colaterais, na seguinte ordem de frequência: artralgia, mialgia, inapetência, náuseas, vômitos, plenitude gástrica, epigastralgia, pirose, dor abdominal, prurido, febre, fraqueza, cefaléia, tontura, palpitação, insônia, nervosismo, choque pirogênico, edema e insuficiência renal aguda (IRA). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS L 449 Leishmaniose Tegumentar Americana Essas queixas são, geralmente, discretas ou moderadas e raramente exigem a suspensão do tratamento. Porém, nas doses de 20mg/Sb+5/kg/dia, o antimonial pode atingir o limiar de toxicidade, podendo levar a alterações cardíacas ou renais que obriguem a suspensão do tratamento. Por isso, deve-se proceder ao acompanhamento eletrocardiográfico prévio e semanal e avaliação da função renal em todos os pacientes, especialmente naqueles acima de 50 anos. Algumas vezes, no início do tratamento, há uma exacerbação do quadro clínico com o aumento do infiltrado, eritema das lesões, aumento da secreção nasal e faríngea. Presume-se que isto decorra de uma resposta aos antígenos liberados com a morte do parasita (reação do tipo Jarich-Herxheimer). Este quadro pode ocorrer com qualquer tratamento específico. Em casos de lesões de laringe e faringe, podem ocorrer edema e insuficiência respiratória aguda. Assim, é aconselhável que a medicação seja administrada por equipe especializada, em paciente hospitalizado, e com possibilidade de realizar traqueostomia de urgência. Os corticosteróides por via sistêmica podem ser utilizados nos quadros de hipersensibilidade. Recomendações – é recomendável a abstinência de bebidas alcoólicas durante o período de tratamento, devido às alterações hepáticas. Também é recomendável o repouso físico durante o tratamento. Todas as reações adversas graves ou potencialmente graves abaixo descritas, devem ser notificadas às autoridades sanitárias: ❯ arritmias cardíacas e/ou outras manifestações de cardiotoxicidade; ❯ insuficiência renal aguda ou elevação dos níveis séricos de uréia e creatinina e/ou outras manifestações de nefrotoxicidade; ❯ icterícia e/ou elevação de enzimas hepáticas e/ou outras manifestações de hepatotoxicidade; ❯ pancreatite aguda e/ou hiperamilasemia; ❯ outras não citadas acima e que não tenham sido descritas anteriormente. Não há nenhum impedimento de que se notifiquem casos que não se encaixem na classificação acima, apenas não é imperativo que tais notificações sejam feitas. Na dúvida, notifique. Tratamento para crianças – emprega-se o mesmo esquema terapêutico utilizado para o tratamento de pacientes adultos. A via de administração (intramuscular ou intravenosa) deve ser decidida de acordo com a apresentação clínica, o estado geral das crianças e as condições operacionais dos serviços. Anfotericina B É a droga de segunda escolha, empregada quando não se obtém resposta ao tratamento com antimonial ou na impossibilidade de seu uso. A anfotericina B é também a droga de escolha para o tratamento de pacientes grávidas. 450 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Tegumentar Americana É importante esclarecer que a medicação deve ser feita sob vigilância, em serviços especializados, com o paciente hospitalizado. Dose – 1mg/kg/dia em dias alternados, sem contudo ultrapassar a dose total de 50mg em cada aplicação. Deve ser administrada até atingir as seguintes doses totais: ❯ na forma cutânea: 1 a 1,5g; ❯ na forma mucosa: 2,5 a 3g. Se necessário, esta dose total poderá ser elevada, desde que o paciente esteja sob vigilância clínica rigorosa, acompanhada das provas laboratoriais (uréia, creatinina e potássio) que permitam avaliar, principalmente, a função renal. O exame ECG também deverá ser realizado. Realizar avaliação clínica e laboratorial e ECG ao iniciar o tratamento, com exames bioquímicos do sangue para avaliação das funções renal (uréia e creatinina) e hepática (dosagem de bilirrubinas, transaminases e fosfatase alcalina) e hemograma, seguindo-se reavaliações semanais durante o tratamento. Em idosos, a reavaliação da função renal e cardíaca deve ser feita duas vezes por semana. Modo de aplicação – deve ser administrada por via intravenosa, gota a gota, lentamente (4 horas de infusão), utilizando-se equipo em “Y”, onde a anfotericina B é diluída em 250ml de soro glicosado a 5%, alternando sua administração com 250ml de soro glicosado a 5% contendo 50 a 100mg de hidrocortisona, para a prevenção de efeitos colaterais. Aplicase em dias alternados. Contra-indicação – é contra-indicada a administração da anfotericina B em cardiopatas, nefropatas e hepatopatas. Efeitos colaterais – são de ocorrência muito freqüente: febre, anorexia, náuseas, vômitos e flebite, que podem ser atenuados ou evitados usando-se antipiréticos, antieméticos ou 50 a 100mg de hidrocortisona, acrescentados ao soro. A presença dos sintomas descritos não contra-indica a administração do medicamento. Outros efeitos colaterais importantes que geralmente surgem no decorrer do tratamento são hipopotassemia, insuficiência renal, anemia, leucopenia e alterações cardíacas. Recomendações – ratifica-se a necessidade de se fazer monitoramento laboratorial semanal cardíaco (ECG), hepático (AST/ALT/FA) e renal (uréia/creatinina). Deve-se ainda proceder à dosagem de K+ sérico, fazendo a reposição via oral quando indicada. 6 L Isotionato de pentamidina É usada como medicamento alternativo, nos casos que não respondem aos antimoniais pentavalentes ou na impossibilidade de seu uso. Tem-se obtido bons resultados, com baixas doses, na LTA causada pela L.(V.) guyanensis. Dose e modo de aplicação – classicamente, a dose recomendada é de 4mg/kg/dia, por via intramuscular profunda, de 2 em 2 dias, recomendando-se não ultrapassar a dose total de 2g. Após 1g de aplicação o paciente deve ser monitorado com rigorosidade, destacando a necessidade de realizar exame de glicose (glicemia) semanalmente. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 451 Leishmaniose Tegumentar Americana Devido ao medicamento ter ação no metabolismo da glicose, pode haver hipoglicemia seguida de hiperglicemia, quando do seu uso. O paciente deve ser orientado a alimentar-se anteriormente e permanecer em repouso quinze minutos antes e após as injeções. Apresentação comercial – sob a forma de dois sais (isotionato de pentamidina e mesilato de pentamidina). No Brasil é comercializado apenas o isotionato de pentamidina, que se apresenta em frasco-ampola contendo 300mg/sal. O mesmo deve ser diluído em 3ml de água destilada para uso clínico em aplicações intramusculares profundas. Efeitos colaterais – as reações adversas mais freqüentes são dor, induração e abscessos estéreis no local da aplicação, além de náuseas, vômitos, tontura, adinamia, mialgias, cefaléia, hipotensão, lipotimias, síncope, hipoglicemia e hiperglicemia. O diabetes mellitus pode se manifestar a partir da administração da dose total de 1g. O efeito diabetogênico pode ser cumulativo e dose-dependente. Recomendações – recomenda-se o acompanhamento clínico e a reavaliação de exame bioquímico do sangue para avaliação das funções renal (dosagem de uréia e creatinina) e hepática (dosagem das transaminases, bilirrubinas e fosfatase alcalina), periodicamente, no curso do tratamento, bem como dosagem da glicemia e acompanhamento eletrocardiográfico antes, durante e no final do tratamento. A glicemia deve ser acompanhada mensalmente durante um período de seis meses, quando ultrapassar a dose total de 1g. Contra-indicações – para gestantes, portadores de diabetes, insuficiência renal, insuficiência hepática, doenças cardíacas e em crianças com peso inferior a 8kg. Critérios de cura O critério de cura é clínico e recomenda-se fazer o acompanhamento mensal nos três primeiros meses e, quando curado o paciente, bimensalmente, até completar 12 meses após o término do tratamento. Forma cutânea – definido pelo aspecto clínico das lesões: reepitelização das lesões ulceradas ou não, regressão total da infiltração e eritema, até 3 meses após a conclusão do esquema terapêutico. Forma mucosa – é também clínico, definido pela regressão de todos os sinais e comprovado pelo exame otorrinolaringológico, até 6 meses após a conclusão do esquema terapêutico. Na ausência do especialista, o clínico deve ser treinado para realizar, pelo menos, rinoscopia anterior. Nos locais onde não há clínico, o paciente deve ser encaminhado para serviço de referência, para avaliação de cura. Acompanhamento regular – o paciente deve retornar mensalmente à consulta, durante três meses consecutivos após o término do esquema terapêutico, para ser avaliada a cura clínica. Uma vez curado, o mesmo deverá ser acompanhado de 2 em 2 meses até completar 12 meses após o tratamento. Situações que podem ser observadas • Tratamento regular da forma cutânea – definido como aquele caso que utilizou 10 a 20mg Sb+5/kg/dia entre 20 a 30 dias, não ocorrendo intervalo superior a 72 horas entre as doses. 452 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Tegumentar Americana • Tratamento regular da forma mucosa – caso que utilizou 20mg Sb+5/kg/dia entre 30 a 40 dias, não ocorrendo intervalo superior a 72 horas entre as doses. • Tratamento irregular da forma cutânea e mucosa – caso que ultrapassou o tempo previsto para um tratamento regular ou que tenha ocorrido um intervalo superior a 72 horas entre as doses. • Falha terapêutica – caso que, mesmo tendo realizado dois esquemas terapêuticos regulares, não apresentou remissão clínica. • Recidiva  reaparecimento de lesão no período inferior a um ano, após a cura clínica. • Abandono  caso que não tendo recebido alta não compareceu até 30 dias após o terceiro agendamento para avaliação da cura. O terceiro agendamento se refere ao 3º mês após o término do esquema terapêutico, período destinado ao acompanhamento do caso e à avaliação de cura. Condutas frente às situações que podem ser observadas • Tratamento regular – paciente que retornar mensalmente à consulta, durante três meses após o término do esquema terapêutico, para ser avaliado. Poderá receber alta no transcorrer deste período ou reiniciar o tratamento, durante ou ao final dos três meses de observação. • Tratamento irregular – quando o paciente utilizou mais de 50% das doses preconizadas, observa-se as seguintes condutas: ❯ cura clínica: alta; ❯ melhora clínica: observação por até 3 meses, quando será reavaliado para alta; ou ao final deste período, persistindo os sinais clínicos, dar início a novo esquema terapêutico completo; ❯ sem melhora clínica: reiniciar de imediato o esquema terapêutico; ❯ caso o paciente tenha utilizado menos de 50% das doses prescritas, iniciar de imediato o esquema terapêutico completo, a não ser que se apresente clinicamente curado. • Abandono – início do esquema terapêutico com antimonial pentavalente, a não ser que se apresente clinicamente curado. 6 L Leishmaniose tegumentar e HIV/Aids As leishmanioses podem modificar a progressão da doença pelo HIV e a imunodepressão causada por este vírus facilita a progressão das leishmanioses. A avaliação do conjunto de manifestações clínicas das leishmanioses em pacientes portadores de HIV indica não existir definição de um perfil clínico que possa ser indiscutivelmente associado à co-infecção. Chamam a atenção os relatos de disseminação da doença cutânea com envolvimento de órgãos raramente acometidos em indivíduos imunocompetentes, em um processo conhecido como visceralização da leishmaniose tegumentar. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 453 Leishmaniose Tegumentar Americana Quadro 1. Condições em que deve ser oferecida a sorologia para o HIV em portadores de leishmaniose tegumentar Qualquer forma clínica sem exposição recente (durante o último ano) a uma área de transmissão de LTA Forma disseminada com ou sem acometimento mucoso concomitante Forma mucosa com acometimento fora da cavidade nasal Forma cutânea ou mucosa com achado de parasitas em vísceras Forma difusa Qualquer forma clínica associada à reação de Montenegro negativa Achado de amastigotas no exame direto de material obtido de lesões mucosas Isolamento em material de pele ou mucosas de espécies de leishmanias viscerotrópicas Leishmania (Leishmania) chagasi ou não descritas como causadoras de lesões tegumentares Falha terapêutica após o uso de antimonial pentavalente1 Recidiva tardia (mais de 6 meses após a cura clínica) Lesões cutâneas que aparecem após o diagnóstico de lesão mucosa em atividade 1 Ausência de cura clínica após duas tentativas de tratamento com antimoniato de meglumina (10 a 20mg SbV kg/dia por 20 a 30 dias), com período de observação de três meses após cada série de tratamento. Quadro 2. Condição em que portadores de HIV/aids devem ser investigados para leishmaniose tegumentar Qualquer tipo de lesão cutânea ou mucosa de mais de duas semanas de evolução em pacientes expostos à área de transmissão de leishmaniose tegumentar em qualquer época da vida.1 Deve ser considerado como área de transmissão, para fins de avaliação da exposição de risco, qualquer município que tenha notificado pelo menos um caso autóctone de leishmaniose tegumentar durante o período em que o paciente esteve exposto. 1 Aspectos terapêuticos e evolução – o critério de escolha das drogas utilizadas para a terapêutica das leishmanioses em pacientes portadores de HIV não difere do preconizado para os pacientes imunocompetentes. Considerando que os pacientes com LTA co-infectados com o HIV são indivíduos que podem apresentar outras doenças oportunistas que os debilitam, a sua vulnerabilidade às reações adversas ao tratamento pode ser maior pelo que se recomenda extremo cuidado no monitoramento adequado da toxicidade medicamentosa. Um dos aspectos mais marcantes na evolução da leishmaniose, na presença de infecção por HIV, é a tendência a recidivas. Por isso, o paciente deverá ser acompanhado mensalmente por 6 meses e, uma vez curado, bimensalmente, até completar 12 meses após o término do tratamento. 454 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Tegumentar Americana Aspectos epidemiológicos A leishmaniose tegumentar americana (LTA) apresenta-se em expansão geográfica. Nas últimas décadas, as análises de estudos epidemiológicos da LTA têm sugerido mudanças em seu comportamento epidemiológico. Inicialmente considerada zoonose de animais silvestres que acometia ocasionalmente pessoas em contato com florestas, a LTA começa a ocorrer em zonas rurais já praticamente desmatadas e em regiões periurbanas. Observase a coexistência de um duplo perfil epidemiológico, expresso pela manutenção de casos oriundos dos focos antigos ou de áreas próximas a eles, e pelo aparecimento de surtos epidêmicos associados a fatores decorrentes do surgimento de atividades econômicas como garimpos, expansão de fronteiras agrícolas e extrativismo, em condições ambientais altamente favoráveis à transmissão da doença. No período de 1985 a 2003, a LTA no Brasil vem apresentando coeficientes de detecção que oscilam entre 10,45 a 21,23 por 100 mil habitantes. Ao longo desse período, observouse tendência ao crescimento da endemia, registrando-se os coeficientes mais elevados nos anos de 1994 e 1995, quando atingiram níveis de 22,83 e 22,94 por 100 mil habitantes, respectivamente. O ano de 1998 apresentou queda significativa neste coeficiente (13,47 por 100 mil habitantes), fato que pode estar relacionado a problemas operacionais naquele ano. Ao analisar a evolução da LTA nesse período, observa-se uma expansão geográfica, sendo que no início da década de 1980 foram registrados casos autóctones em 19 unidades federadas. Nos últimos anos, todos os estados registraram autoctonia da doença. A região Nordeste vem contribuindo com o maior número de casos (cerca de 37,2% do total registrado no período) e a região Norte com os coeficientes mais elevados (93,84 por 100 mil habitantes), seguidas pelas regiões Centro-Oeste (42,70 por 100 mil habitantes) e Nordeste (26,50 por 100 mil habitantes). A distribuição das densidades médias de casos de LTA por município, para os períodos de 2000-2002, permitiu a identificação de regiões de influência da LTA, caracterizando os circuitos de produção da doença no país (Figura 1). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 6 L 455 Leishmaniose Tegumentar Americana Figura 1. Circuitos de produção de casos de LTA (2000-2002) e casos de LTA por municípios. Brasil, 2003 Circuitos de LTA, 2000-2002 Casos de LTA – 2003 (1 ponto = 5 casos) Fonte: Fiocruz/Ensp/Desp, SVS/MS Vigilância epidemiológica Objetivos • Diagnosticar e tratar precocemente os casos, com vistas a reduzir as deformidades provocadas pela doença. • Em áreas de transmissão domiciliar, reduzir a incidência da doença adotando medidas de controle pertinentes, após investigação dos casos. Definição de caso Suspeito Leishmaniose cutânea – todo indivíduo com presença de úlcera cutânea, com fundo granuloso e bordas infiltradas em moldura. Leishmaniose mucosa – todo indivíduo com presença de úlcera na mucosa nasal, com perfuração ou perda do septo nasal, podendo atingir lábios e boca (palato e nasofaringe). 456 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Tegumentar Americana Confirmado Critério clínico-laboratorial de leishmaniose cutânea e/ou mucosa – a confirmação dos casos clinicamente suspeitos deverá preencher, no mínimo, um dos seguintes critérios: • residência, procedência ou deslocamento em/para área com confirmação de transmissão e encontro do parasito nos exames parasitológicos diretos e/ou indireto; • residência, procedência ou deslocamento em/para área com confirmação de transmissão e intradermorreação de Montenegro (IRM) positiva; • residência, procedência ou deslocamento em/para área com confirmação de transmissão com outros métodos de diagnóstico positivo. Critério clínico-epidemiológico de leishmaniose cutânea e/ou mucosa – todo caso com suspeita clínica, sem acesso a métodos de diagnóstico laboratorial e com residência, procedência ou deslocamento em área com confirmação de transmissão. Nas formas mucosas, considerar a presença de cicatrizes cutâneas como critério complementar para confirmação do diagnóstico. 6 Descartado Caso suspeito com diagnóstico laboratorial negativo ou caso suspeito com diagnóstico confirmado de outra doença. Casos autóctones – são os casos confirmados de LTA com provável infecção no local de residência. Notificação É doença de notificação compulsória; portanto, todo caso confirmado deve ser notificado pelos serviços públicos, privados e filantrópicos, utilizando a ficha de investigação epidemiológica padronizada no Sinan. L Primeiras medidas a serem adotadas Assistência ao paciente Todo caso suspeito deve ser submetido às investigações clínica e epidemiológica e aos métodos auxiliares de diagnóstico. Caso seja confirmado, inicia-se o tratamento segundo normas técnicas e acompanha-se mensalmente (para avaliação da cura clínica) pelos três primeiros meses e, uma vez curado, bimensalmente, até completar 12 meses após o término do tratamento. Investigação Após a detecção de casos de LTA, a investigação epidemiológica faz-se necessária para identificar: • se a área é endêmica ou se é um novo foco; • se o caso é autóctone ou importado (no segundo, informar ao serviço de saúde do local de origem); Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 457 Leishmaniose Tegumentar Americana • as características do caso (forma clínica, idade e sexo); • novos casos e caracterizá-los clínica e laboratorialmente. O instrumento de coleta de dados e a ficha epidemiológica do Sinan, contém os elementos essenciais a serem coletados em uma investigação de rotina. Todos os seus campos devem ser criteriosamente preenchidos, mesmo quando a informação for negativa (9- ignorado). Outros itens e observações podem ser incluídos conforme as necessidades e peculiaridades de cada situação. Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente Preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica do Sinan, relativos aos dados gerais, notificação individual e dados de residência. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Preencher os campos da ficha de investigação epidemiológica do Sinan relativos aos antecedentes epidemiológicos, dados clínicos, laboratoriais e tratamento. Os dados entomológicos deverão ser preenchidos após estudo na provável área de transmissão. • Para identificação da área de transmissão ❯ Verificar se o local de residência corresponde a uma área de provável transmissão da leishmaniose. ❯ Investigar se houve deslocamento do caso, para áreas endêmicas, no período de 6 meses anterior ao início dos sintomas. ❯ Levantar se há conhecimento de outras pessoas com as mesmas manifestações clínicas no local onde reside, no trabalho e outros. Estes procedimentos devem ser feitos mediante entrevista com o paciente, familiares ou responsáveis. Tais dados, que serão anotados na ficha de investigação, permitirão identificar o provável local de transmissão da leishmaniose. A detecção de casos de LTA pode ocorrer por meio de: ❯ busca ativa de casos na área de foco; ❯ visitas domiciliares dos profissionais do Pacs e PSF; ❯ demanda espontânea à unidade de saúde; ❯ encaminhamento de suspeitos. Quando o paciente residir em área reconhecidamente endêmica, a caracterização do local de transmissão é facilitada. Entretanto, a história dos deslocamentos do paciente permitirá definir os locais prováveis de infecção. Se o local provável de transmissão é o intra ou peridomicílio, é recomendado solicitar a realização de estudo entomológico (captura e identificação de flebotomíneos) para ajudar na investigação e adoção de medidas de controle. 458 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Tegumentar Americana Lembrar que a identificação da área onde se deu a transmissão é de fundamental importância para o processo de investigação e as medidas de controle, se indicadas. Encerramento de caso A ficha epidemiológica de cada caso deve ser analisada visando definir qual o critério utilizado para o diagnóstico, considerando as seguintes alternativas: Confirmado por critério clínico-laboratorial – encontro do parasito nos exames parasitológicos diretos e/ou indiretos ou intradermorreação de Montenegro positiva ou outros métodos diagnósticos positivo. Confirmado por critério clínico-epidemiológico – verificar se a suspeita clínica está associada à residência, procedência ou ao deslocamento em área com confirmação de transmissão. 6 Evolução do caso Para a vigilância da leishmaniose tegumentar americana é de extrema importância tratar e acompanhar os casos confirmados e conhecer a evolução clínica dos mesmos, conforme normas técnicas, visando reduzir a forma grave da doença (forma mucosa) e evitar deformidades. Análise dos dados A análise dos dados da investigação deve permitir a avaliação da magnitude, transcendência e vulnerabilidade do problema e da indicação e/ou adequação das medidas de controle, para reduzir o número de casos em áreas com transmissão domiciliar. Estes dados são indispensáveis para a construção dos indicadores necessários à análise epidemiológica da doença e ao acompanhamento e avaliação operacional das atividades de controle, em cada nível de atuação. L Divulgação dos dados Após análise dos dados, os mesmos deverão ser amplamente divulgados. Instrumentos disponíveis para controle Atuação na cadeia de transmissão A diversidade de agentes, reservatórios, vetores e situações epidemiológicas, aliada ao conhecimento ainda insuficiente sobre vários desses aspectos, torna complexo o controle desta doença. O propósito das medidas de prevenção é a redução do contato homem-vetor, através de medidas de proteção individual, controle de reservatórios e aplicação do inseticida, quando indicados. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 459 Leishmaniose Tegumentar Americana Em virtude das características epidemiológicas peculiares da LTA, as estratégias de controle devem ser flexíveis e distintas, adequadas a cada região ou foco particular. Para a seleção de estratégias, adequadas a cada região geográfica, deverá ser considerada a análise epidemiológica dos dados referentes a: • registro dos casos humanos quanto à forma clínica, sexo, idade e procedência; • estudos entomológicos para definir as espécies vetoriais, sua dispersão, graus de antropofilia e exotilia, infecção natural; • estudos parasitológicos para definir a espécie do agente etiológico circulante no foco; • estudos ecológicos para determinação dos reservatórios animais envolvidos; e • caracterização de um surto epidêmico. Proteção individual Meios mecânicos, através do uso de mosquiteiros simples ou impregnados com deltametrina (em fase de experiência), telas finas em portas e janelas, uso de repelentes, uso de camisas de manga comprida, calças compridas, meias e sapatos (de difícil aplicação nas regiões de clima quente e úmido). Em áreas de risco para assentamento de populações humanas, tem sido sugerida uma faixa de segurança de 200 a 300 metros entre as residências e a floresta. Entretanto, uma faixa deste tipo teria que ser muito bem planejada para evitar erosão e outros problemas decorrentes do desequilíbrio ambiental, no caso de desmatamento. Controle de reservatórios Em pesquisas, a realização de inquéritos é necessária para melhor evidenciação do papel dos reservatórios no ambiente peri e intradomiciliar. Não se considera, atualmente, a possibilidade de controle dos reservatórios silvestres. A identificação de lesões nos prováveis reservatórios, quando domésticos (cães e eqüídeos), demanda a realização de exames. Caso positivo, quando autorizado pelo proprietário, realizar a eutanásia do animal após avaliação. Vale destacar que não é recomendada como rotina a realização de inquéritos sorológicos caninos em áreas com transmissão de LTA. É importante lembrar que a eutanásia em cães e eqüinos só é indicada em situações em que estes animais apresentem exames sorológicos positivos com presença de lesão cutânea e com autorização do seu proprietário. A geração, acondicionamento e destino inadequado do lixo orgânico pela população favorecem a proliferação de reservatórios silvestres importantes (marsupiais e roedores) da LTA. O lixo, portanto, deve ter destino adequado para evitar a atração dos mesmos. Controle vetorial O emprego de inseticidas contra os flebótomos é factível em situações de transmissão peridomiciliar, domiciliar (caracterizada pela notificação de um ou mais casos autóctones de LTA em menores de dez anos, residentes em áreas urbanas ou periurbanas). Ressalte-se que a investigação epidemiológica do caso e a pesquisa entomológica indicarão o seu uso. Nas áreas florestais, este método é impraticável. 460 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Tegumentar Americana A aplicação do inseticida, quando indicada pela vigilância entomológica, deve ser realizada com ação residual, sobre a superfície de paredes do domicílio e anexos domiciliares (abrigo de animais domésticos, paióis, etc.). A aplicação espacial de inseticida não apresenta relação custo/benefício satisfatória, motivo pelo qual não é indicada. A escolha do grupo de inseticidas que pode ser usado para tratamento residual deve obedecer a seguinte ordem de preferência: piretróides, carbamatos e organofosforados. A formulação do inseticida a ser utilizado e a época mais adequada para sua aplicação deverão ser orientadas pelos estudos entomológicos sugeridos anteriormente, considerando, ainda, fatores biológicos, ambientais e climáticos. Não é indicado o uso indiscriminado de controle químico. O serviço de entomologia é quem deverá indicar o seu uso, após estudo e confirmação de transmissão de LTA no peri e/ou intradomicílio. 6 As normas de biossegurança, bem como as de proteção individual, como uso de máscaras, luvas e roupas especiais, devem ser rigorosamente observadas quando da utilização de inseticidas. Medidas educativas As atividades de educação em saúde devem estar inseridas em todos os serviços que desenvolvem ações de controle da LTA, requerendo o envolvimento efetivo das equipes multiprofissionais e multiinstitucionais, com vistas ao trabalho articulado nas diferentes unidades de prestação de serviços através de: • capacitação das equipes, englobando conhecimento técnico, aspectos psicológicos e prática profissional em relação à doença e aos doentes; • adoção de medidas preventivas, considerando o conhecimento da doença, atitudes e práticas da população (clientela), relacionadas às condições de vida e trabalho das pessoas; • estabelecimento de relação dinâmica entre o conhecimento do profissional e a vivência dos diferentes estratos sociais, através da compreensão global do processo saúde/doença, no qual intervêm fatores sociais, econômicos, políticos e culturais. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS L 461 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Tegumentar Americana 462 Investigação epidemiológica da leishmaniose tegumentar americana Caso(s) suspeito(s) de leishmaniose cutânea Coleta de dados clínicos e epidemiológicos do paciente Atenção médica/dados clínicos Investigação Caso confirmado Exame laboratorial Diagnóstico parasitológico Negativo Avaliar: clínica, epidemiologia e IRM Incompatível Descartar o caso Investigar outros agravos Identificar local provável de infecção Aplicação da IRM Esfregaço da lesão Positivo Positivo Negativo Notificar Avaliação da clínica e epidemiologia Descartar o caso Compatível Tratar Compatível Incompatível Investigar outros agravos Reativação ou não fechamento da lesão Cura clínica Fazer 2º esquema Encerrar o caso Reativação ou não fechamento da lesão Foco novo Transmissão em área silvestre Educação em saúde Medidas de proteção individual Acompanhar – 1 a 3 meses Regressão e reepitelização da lesão Foco antigo Medidas de proteção coletiva Provável transmissão no peri e/ou intradomicílio Pesquisa entomológica Busca ativa de casos Casos suspeitos Encaminhar para unidade de saúde Positiva Negativa presença do vetor no peri e/ou intradomicílio ausência do vetor no peri e/ou intradomicílio Controle vetorial Encaminhar para centro de referência Avaliar e se necessário iniciar droga de 2ª escolha Controle de reservatório Leishmaniose Tegumentar Americana Anexo 1 Leishmaniose tegumentar americana no Brasil – classificação clínica e respectivos agentes etiológicos segundo Marzochi, M. Leishmaniose tegumentar americana Leishmaniose cutânea Leishmaniose mucosa (1) Forma cutânea única (6) Forma mucosa tardia (2) Forma cutânea múltipla (7) Forma mucosa concomitante (3) Forma cutânea disseminada (8) Forma mucosa contígua (4) Forma recidiva cútis (9) Forma mucosa primária (5) Forma cutânea difusa (10) Forma mucosa indeterminada Leishmania braziliensis (1, 2, 3, 4) Leishmania amazonensis (1, 2, 3, 4, 5) Leishmania guyanensis (1, 2, 3) 6 Leishmania braziliensis (6, 7, 8, 9, 10,) Leishmania amazonensis (8) Leishmania guyanensis (8) Secretaria de Vigilância em Saúde / MS L 463 Leishmaniose Tegumentar Americana Anexo 2 Normas para procedimentos laboratoriais O diagnóstico laboratorial do paciente com suspeita de leishmaniose tegumentar americana é da maior importância pois esta é uma doença que tem diagnóstico diferencial com numerosas outras dermatoses e o medicamento disponível para seu tratamento pode causar sérios efeitos colaterais. Embora a confirmação laboratorial seja imprescindível para o paciente, em determinadas áreas pode se proceder a confirmação pelo critério clínico-epidemiológico, de acordo com as orientações do tópico Definição de caso. A seguir, descrevem-se os exames laboratoriais disponíveis, sua interpretação e as normas de coleta dos espécimes. Destaca-se que o diagnóstico laboratorial baseia-se na evidenciação do parasito e em provas imunológicas. O material pode ser a pele, mucosa ou linfonodos acometidos. 1. Exame parasitológico A evidenciação do parasito é feita através de exames direto e indireto. Para a pesquisa direta, são utilizados os seguintes procedimentos: escarificação, biópsia com impressão por aposição e punção aspirativa. O exame parasitológico direto é o procedimento de primeira escolha, por ser mais rápido, de menor custo e fácil execução. O sucesso no achado do parasito é inversamente proporcional ao tempo de evolução da lesão cutânea, sendo rara após um ano. Lesões muito contaminadas também contribuem para diminuir a sensibilidade do método. Recomenda-se a coleta do material após assepsia local com água e sabão e, se possível, com água destilada ou soro fisiológico. Escarificação – Pode ser realizada na borda da lesão ulcerada mais recente, sem secreção purulenta, ou na superfície da lesão não-ulcerada utilizando-se um estilete descartável, lâmina de bisturi estéril ou palito de madeira, com extremidade em bisel, previamente esterilizado. Com o material coletado, realiza-se um esfregaço em lâmina. Na medida do possível, deve-se coletar material abundante para aumentar a possibilidade de positividade. Impressão por aposição – É realizada através da compressão do fragmento de tecido, obtido por biópsia, sobre uma lâmina microscópica, depois de retirada do sangue em uma superfície absorvente (papel de filtro). Tanto o esfregaço como a impressão devem ser realizados sobre lâmina de vidro previamente desengordurada e seca. O material coletado deve ser fixado em metanol, durante 3 minutos, e corado pelas técnicas de Giemsa ou Leishman. A punção aspirativa pode ser realizada utilizando-se uma seringa de 5ml e agulha 25x8, com 3ml de solução salina estéril. Em centros de referência, este procedimento pode ser realizado na investigação de comprometimento linfonodal primário. Histopatologia – A biópsia pode ser feita com “punch” de 4mm de diâmetro, ou em cunha, com o uso de bisturi. Nas lesões ulceradas, deve-se preferir a borda íntegra da lesão 464 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Tegumentar Americana que, em geral, mostra aspecto tumefeito e hiperêmico. O local a ser biopsiado deve ser limpo com água e sabão; a seguir, infiltra-se lidocaína ou xilocaína a 2%, para anestesiar o local. O material retirado por biópsia deve ser fixado em formol a 10%, em quantidade, aproximadamente, 20 vezes maior que o volume do fragmento. Cultivo – é um método de confirmação etiológica que permite a definição da espécie de Leishmania envolvida. O parasita cresce relativamente bem em meios de cultivo, como o NNN e o LIT entre 24°C e 26°C. Após o quinto dia, já podem ser encontradas formas promastigotas do parasito, devendo-se manter a cultura até um mês. Inoculação em animais de laboratório – o animal de escolha é o hamster (Mesocricetus auratus) e os locais de preferência são as extremidades, principalmente as patas posteriores. O inóculo deve ser obtido a partir de suspensão homogeneizada do material de biópsia em solução salina estéril. As lesões no hamster desenvolvem-se tardiamente (a partir de um mês), sendo este método reservado para pesquisas. 6 2. Diagnóstico imunológico Intradermorreação de Montenegro (IRM) – traduz a resposta de hipersensibilidade celular retardada. A reação de Montenegro é realizada através da inoculação intradérmica de 0,1ml do antígeno padronizado em 40mg N/ml, no antebraço esquerdo, a mais ou menos 2 a 3cm abaixo da dobra do cotovelo, de modo a formar pequena elevação ou pápula. A leitura deve ser feita após 48 a 72 horas. A reação é considerada positiva quando a induração resultante for maior ou igual a 5mm. É um teste de grande valor preditivo devido à sua sensibilidade, sendo positivo em mais de 90% dos casos de LTA. Nas áreas onde predomina a L.(L) amazonensis, a positividade pode ser mais baixa. Pode apresentar-se negativa nos seguintes casos: • nos primeiros 30 dias após o início das lesões, excepcionalmente se prolongando; • nos casos de leishmaniose disseminada, positivando-se no decorrer do tratamento; • na leishmaniose cutâneo-difusa; • na leishmaniose visceral; • em pacientes imunodeprimidos. L A reação de Montenegro geralmente permanece positiva após o tratamento ou cicatrização da lesão cutânea tratada ou curada espontaneamente, negativando nos indivíduos fraco-reatores e nos precocemente tratados. Em áreas endêmicas, deve-se considerar leishmaniose anterior ou exposição ao parasito (infecção) sem doença. Nas lesões mucosas, a resposta cutânea ao teste de Montenegro é mais intensa, podendo ocorrer até ulceração e necrose local. Imunofluorescência indireta (IFI) e teste imunoenzimático (Elisa) – os pacientes com LTA geralmente apresentam títulos de anticorpos baixos. Assim, não há indicação para Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 465 Leishmaniose Tegumentar Americana utilização dos testes que expressam os níveis de anticorpos circulantes na rotina como critério de diagnóstico, pois não representam boa ferramenta para esse fim. As reações sorológicas de imunofluorescência indireta (IFI) e o ensaio imunoenzimático (Elisa) podem ser utilizados em centros de referência, com fins de pesquisa, e são úteis principalmente nos casos com lesões extensas e múltiplas e nas lesões mucosas. Após o tratamento e cura em ambas as formas de doença, os títulos podem cair ou desaparecer em alguns meses. Coleta e conservação de material para diagnóstico laboratorial da leishmaniose tegumentar americana Tipo de diagnóstico Parasitológico IRM Tipo de material Secreção da lesão Aplicação no antebraço de antígeno de Montenegro Quantidade Período da coleta Recipiente O suficiente para o esfregaço e para colocar no meio de cultura Na presença de úlcera cutânea e/ou mucosa e/ou quadro clínico suspeito (forma mucosa metastásica) Lâmina ponta fosca ou meio de cultura apropriado para transporte Na presença de úlcera cutânea e/ou mucosa e/ou quadro clínico suspeito (forma mucosa metastásica) Não se aplica Na presença de úlcera cutânea e/ou mucosa e/ou quadro clínico suspeito (forma mucosa metastásica) Tubo estéril de plástico ou vidro com tampa de rosca com vácuo 0,1ml intradérmico (tipo tuberculina) Inocular em temperatura ambiente Leitura em 48 e 72 horas Sangue Sorologia Obtenção da amostra: punção venosa Crianças: 2-5ml Adultos: 10ml Armazenamento/ conservação Temperatura ambiente ou -4ºC Transporte Porta-lâminas ou em material que garanta a integridade da lâmina Gelo seco ou reciclável Nitrogênio líquido Não se aplica -4ºC Não se aplica Gelo seco ou reciclável Nitrogênio líquido Observações • Em situações em que a lesão cutânea e/ou mucosa apresente infecção secundária, a mesma deverá ser tratada antes de se proceder a coleta para exame laboratorial. • Lembrar que o antígeno de Montenegro deverá ser acondicionado em temperatura de 2ºC a 8ºC. • A necessidade de sorologia deve ser analisada criteriosamente, considerando a baixa resposta humoral que a doença provoca. Todo o material deverá ser enviado devidamente identificado e acompanhado de informações clínicas para orientar os técnicos do laboratório quanto aos exames. Lembrar que o perfeito acondicionamento das amostras para remessa é de fundamental importância para o êxito dos procedimentos laboratoriais. 466 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral LEISHMANIOSE VISCERAL CID 10: B55.0 Características clínicas e epidemiológicas Descrição A leishmaniose visceral (LV) foi primariamente uma zoonose, caracterizada como doença de caráter eminentemente rural. Mais recentemente, vem se expandindo para áreas urbanas de médio e grande porte e se tornou crescente problema de saúde pública no país e em outras áreas do continente americano, sendo uma endemia em franca expansão geográfica. É uma doença crônica, sistêmica, caracterizada por febre de longa duração, perda de peso, astenia, adinamia e anemia, dentre outras manifestações. Quando não tratada, pode evoluir para óbito em mais de 90% dos casos. 6 Sinonímia Calazar, esplenomegalia tropical, febre dundun, dentre outras denominações menos conhecidas. Reservatórios Na área urbana, o cão (Canis familiaris) é a principal fonte de infecção. A enzootia canina tem precedido a ocorrência de casos humanos e a infecção em cães tem sido mais prevalente que no homem. No ambiente silvestre os reservatórios são as raposas (Dusicyon vetulus e Cerdocyon thous) e os marsupiais (Didelphis albiventris). L Vetores No Brasil, duas espécies, até o momento, estão relacionadas com a transmissão da doença, Lutzomyia longipalpis e Lutzomyia cruzi. A primeira é considerada a principal espécie transmissora da L. (L.) chagasi mas a L. cruzi também foi incriminada como vetora no estado do Mato Grosso do Sul. São insetos denominados flebotomíneos, conhecidos popularmente como mosquito palha, tatuquiras, birigui, entre outros. Em nosso país, a distribuição geográfica de L. longipalpis é ampla e parece estar em expansão. Esta espécie é encontrada em quatro das cinco regiões geográficas: Nordeste, Norte, Sudeste e Centro-Oeste. A L. longipalpis adapta-se facilmente ao peridomicílio e a variadas temperaturas, podendo ser encontrada no interior dos domicílios e em abrigos de animais domésticos. Há indício de que o período de maior transmissão da leishmaniose visceral ocorra durante e logo após a estação chuvosa, quando há aumento da densidade populacional do inseto. A atividade dos flebotomíneos é crepuscular e noturna. No intra e peridomicílio, a L. longipalpis é encontrada, principalmente, próxima a uma fonte de alimento. Durante o dia, Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 467 Leishmaniose Visceral estes insetos ficam em repouso, em lugares sombreados e úmidos, protegidos do vento e de predadores naturais. Modo de transmissão No Brasil, a forma de transmissão é através da picada dos vetores – L. longipalpis ou L. cruzi – infectados pela Leishmania (L.) chagasi. A transmissão ocorre enquanto houver o parasitismo na pele ou no sangue periférico do hospedeiro. Alguns autores admitem a hipótese da transmissão entre a população canina através da ingestão de carrapatos infectados e, mesmo, através de mordeduras, cópula e ingestão de vísceras contaminadas, porém não existem evidências sobre a importância epidemiológica destes mecanismos de transmissão para humanos ou na manutenção da enzootia. Não ocorre transmissão direta da leishmaniose visceral de pessoa a pessoa. Período de incubação É bastante variável tanto para o homem como para o cão; no homem, é de 10 dias a 24 meses, com média entre 2 a 6 meses; no cão, varia de 3 meses a vários anos, com média de 3 a 7 meses. Susceptibilidade e imunidade Crianças e idosos são mais susceptíveis. Existe resposta humoral detectada através de anticorpos circulantes, que parecem ter pouca importância como defesa. A Leishmania é um parasito intracelular obrigatório de células do sistema fagocitário mononuclear e sua presença determina uma supressão reversível e específica da imunidade mediada por células, o que permite a disseminação e multiplicação incontrolada do parasito. Só uma pequena parcela de indivíduos infectados desenvolve sinais e sintomas da doença. Após a infecção, caso o indíviduo não desenvolva a doença, observa-se que os exames que pesquisam imunidade celular ou humoral permanecem reativos por longo período. Isso requer a presença de antígenos, podendo-se concluir que a Leishmania ou alguns de seus antígenos estão presentes no organismo infectado durante longo tempo, depois da infecção inicial. Esta hipótese apoia-se no fato de que indivíduos que desenvolvem alguma imunossupressão podem apresentar quadro de leishmaniose visceral muito além do período habitual de incubação. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas A infecção pela L.(L) chagasi caracteriza-se por um amplo espectro clínico, que pode variar desde manifestações clínicas discretas (oligossintomáticas) a moderadas e graves, que se não tratadas podem levar o paciente à morte. 468 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral Infecção As infecções inaparentes ou assintomáticas são aquelas em que não há evidência de manifestações clínicas. O diagnóstico, quando feito, é pela coleta de sangue para exames sorológicos (imunofluorescência indireta/IFI ou enzyme linked immmunosorbent assay/Elisa) ou através da intradermorreação de Montenegro reativa. Os títulos de anticorpos em geral são baixos e podem permanecer positivos por longo período. Vale a pena lembrar que os pacientes que apresentam cura clínica ou aqueles com leishmaniose tegumentar (formas cutânea e mucosa) podem apresentar reatividade nos exames sorológicos e na intradermorreação de Montenegro. É importante destacar que os pacientes com infecção inaparente não são notificados e não devem ser tratados. Leishmaniose visceral A suspeita clínica da leishmaniose visceral deve ser levantada quando o paciente apresentar febre e esplenomegalia associada ou não à hepatomegalia. Para facilitar sua compreensão e considerando a evolução clínica da doença, optou-se em dividi-la em períodos: período inicial, período de estado e período final. Período inicial – esta fase da doença, também chamada de “aguda” por alguns autores, caracteriza o início da sintomatologia que pode variar de paciente para paciente, mas na maioria dos casos inclui febre com duração inferior a quatro semanas, palidez cutâneo-mucosa e hepatoesplenomegalia. Em área endêmica, uma pequena proporção de indivíduos, geralmente crianças, pode apresentar quadro clínico discreto, de curta duração, aproximadamente 15 dias, que freqüentemente evolui para cura espontânea (forma oligossintomática). A combinação de manifestações clínicas e alterações laboratoriais que melhor parece caracterizar a forma oligossintomática é: febre, hepatomegalia, hiperglobulinemia e velocidade de hemossedimentação alta. Período de estado – caracteriza-se por febre irregular, geralmente associada a emagrecimento progressivo, palidez cutâneo-mucosa e aumento da hepatoesplenomegalia. Apresenta, no mais das vezes, um quadro clínico arrastado, geralmente com mais de dois meses de evolução, na maioria das vezes associado a comprometimento do estado geral. Período final – caso não seja feito o diagnóstico e tratamento, a doença evolui progressivamente para o período final, com febre contínua e comprometimento mais intenso do estado geral. Instala-se a desnutrição (cabelos quebradiços, cílios alongados e pele seca) e edema dos membros inferiores, que pode evoluir para anasarca. Outras manifestações importantes incluem hemorragias (epistaxe, gengivorragia e petéquias), icterícia e ascite. Nestes pacientes, o óbito geralmente é determinado por infecções bacterianas e/ou sangramentos. 6 L Complicações no curso evolutivo da doença As complicações mais freqüentes da leishmaniose visceral são de natureza infecciosa bacteriana. Dentre elas, destacam-se: otite média aguda, piodermites, infecções dos tratos urinário e respiratório. Caso estas infecções não sejam tratadas com antimicrobianos, o paciente poderá desenvolver um quadro séptico com evolução fatal. As hemorragias são geralmente secundárias à plaquetopenia, sendo a epistaxe e a gengivorragia as mais comu- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 469 Leishmaniose Visceral mente encontradas. A hemorragia digestiva e a icterícia, quando presentes, indicam gravidade do caso. Por ser uma doença de notificação compulsória e com características clínicas de evolução grave, o diagnóstico deve ser feito de forma precisa e o mais precocemente possível. As rotinas de diagnóstico, tratamento e acompanhamento dos pacientes necessitam ser implantadas e/ou implementadas obrigatoriamente em todas as áreas com transmissão ou em risco de transmissão. Os níveis de complexidade de atendimento dentro do Sistema Único de Saúde (SUS) contemplam os três níveis de atendimento ao paciente: atendimento primário (postos de saúde), secundário (centros de saúde) e terciário (hospitais gerais e/ou de referência). O diagnóstico e tratamento dos pacientes deve ser realizado precocemente e sempre que possível a confirmação parasitológica da doença deve preceder o tratamento. Em situações onde o diagnóstico sorológico e/ou parasitológico não estiver disponível ou na demora da liberação dos mesmos, o início do tratamento não deve ser postergado. Diagnóstico diferencial Muitas entidades clínicas podem ser confundidas com a leishmaniose visceral, destacando-se, entre elas, a enterobacteriose de curso prolongado (associação de esquistossomose com salmonela ou outra enterobactéria), cujas manifestações clínicas se superpõem perfeitamente ao quadro da leishmaniose visceral. Em muitas situações, esse diagnóstico diferencial só pode ser concluído por provas laboratoriais, já que as áreas endêmicas se superpõem em grandes faixas do território brasileiro. Somam-se a essa entidade outras patologias (malária, brucelose, febre tifóide, esquistossomose hepatoesplênica, forma aguda da doença de Chagas, linfoma, mieloma múltiplo, anemia falciforme, etc.). Diagnóstico laboratorial O diagnóstico laboratorial, na rede básica de saúde, baseia-se principalmente em exames imunológicos e parasitológicos: Diagnóstico imunológico – pesquisa de anticorpos contra leishmania Imunofluorescência indireta (Rifi) – o resultado da imunofluorescência indireta é normalmente expresso em diluições. Considera-se como positivas as amostras reagentes a partir da diluição de 1:80. Nos títulos iguais a 1:40, com clínica sugestiva de leishmaniose visceral, recomenda-se a solicitação de nova amostra em 30 dias. Ensaio imunoenzimático (Elisa) – o resultado desse teste é expresso em unidades de absorvância a um raio de luz, em uma reação com diluições fixas ou mais comumente, apenas como reagente ou não. IDRM – a intradermorreação de Montenegro, ou teste de leishmanina, ao contrário do que ocorre na leishmaniose tegumentar, é geralmente negativo durante o período de estado da doença, não sendo assim, utilizado para o diagnóstico. Na maioria dos pacientes, torna-se positivo após a cura clínica em um período de seis meses a três anos após o término do tratamento. 470 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral É importante observar que títulos variáveis dos exames sorológicos podem persistir positivos por longo período, mesmo após o tratamento. Assim, o resultado de um teste positivo, na ausência de manifestações clínicas, não autoriza a instituição de terapêutica. Diagnóstico parasitológico É o diagnóstico de certeza feito pelo encontro de formas amastigotas do parasito em material biológico obtido preferencialmente da medula óssea, por ser um procedimento mais seguro, do linfonodo ou do baço; no caso deste último, deve ser realizado em ambiente hospitalar e em condições cirúrgicas. A punção aspirativa esplênica é o método que oferece maior sensibilidade (90%-95%) para demonstração do parasito (porém apresenta restrições quanto ao procedimento), seguida pelo aspirado de medula óssea, biópsia hepática e aspiração de linfonodos. O material aspirado deverá ser examinado segundo a seguinte seqüência: Exame direto – formas amastigotas do parasito podem ser visualizadas pelas colorações de Giemsa ou Wright, Leishman, Panóptico. O encontro de parasitos no material examinado depende do número de campos observados (200 campos devem ser examinados antes de se considerar uma lâmina como negativa). Isolamento em meio de cultura (in vitro) – formas amastigotas do parasito, inoculadas em meios de cultura especiais contendo ágar e sangue de coelho, transformam-se em formas promastigotas. O clássico meio de NNN é o mais comumente empregado. A utilização de meio líquido sobre o NNN, como o meio LIT ou de Schneider, aumenta e acelera a positividade da cultura. As culturas devem ser mantidas entre 24ºC-26ºC e observadas em microscopia óptica comum ou invertida, semanalmente, até 4 semanas. Os tubos positivos devem ser encaminhados para laboratórios de referência, para identificação da espécie. Isolamento em animais susceptíveis (in vivo) – a inoculação experimental em hamsters (Mesocricetus spp), de amostras de tecidos de pacientes com suspeita de leishmaniose visceral, não tem valor prático no diagnóstico da doença devido ao seu tempo de positividade (1 a 3 meses). Novos métodos de diagnóstico – o método do PCR (amplificação do DNA do parasito) constitui uma nova perspectiva para o diagnóstico da leishmaniose visceral, pois apresenta 94% de sensibilidade. Entretanto, seus resultados dependem de algumas variáveis envolvidas, entre elas: área endêmica, tipo de amostra, alvo do DNA utilizado para amplificação, método de extração do DNA, etc. 6 L Tratamento Primeira escolha A droga de primeira escolha é o antimonial pentavalente. Visando padronizar o esquema terapêutico, a Organização Mundial da Saúde recomenda que a dose deste antimonial Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 471 Leishmaniose Visceral seja calculada em mg/Sb+5/kg/dia (Sb+5 significando antimônio pentavalente). Há dois tipos de antimoniais pentavalentes que podem ser utilizados, o antimoniato N-metilglucamina e o stibogluconato de sódio, porém este último não é comercializado no Brasil. O antimoniato de N-metil glucamina apresenta-se comercialmente em frascos de 5ml que contêm 1,5g do antimoniato bruto, correspondente a 405mg de Sb+5. Portanto, uma ampola com 5ml tem 405mg de Sb+5, e cada ml contém 81mg de Sb+5. A dose recomendada para o tratamento é de 20mg/kg/dia de Sb+5 durante 20 dias, podendo chegar a 30 dias e, no máximo, 40 dias, utilizando o limite máximo de 3 ampolas/dia. Modo de aplicação – as aplicações devem ser feitas por via parenteral, intramuscular ou endovenosa, com repouso após a aplicação. A via intramuscular apresenta o inconveniente da dor local. Sugere-se, então, alternância dos locais de aplicação, preferindo-se a região glútea. Por via endovenosa, não há necessidade de diluição e a aplicação, com agulha fina (calibre 25x8) ou “scalp” deve ser lenta (duração de 5 minutos). Esta é a melhor via, pois permite a aplicação de doses mais adequadas e não tem o inconveniente da dor local. Contra-indicação – não deve ser administrado em gestantes, cujo tratamento consiste em cuidados locais, observação clínica e sorológica, se possível. Nas formas graves, cutâneas ou mucosas, discutir a possibilidade de tratamento a partir do sexto mês, com doses mais baixas de antimônio e controle laboratorial. Nos casos em que exista associação com outras doenças, tais como tuberculose, malária, esquistossomose, deve ser efetuado o tratamento destas patologias primeiramente ou utilizar a droga de segunda escolha. Há restrições para o tratamento de pacientes com idade acima dos 50 anos, portadores de cardiopatias, nefropatias, hepatopatias e doença de Chagas. Quando for necessária a administração nos pacientes portadores de uma dessas doenças, deverá ser feita rigorosa avaliação clínica antes do tratamento e reavaliações clínicas periódicas, com acompanhamento eletrocardiográfico, duas vezes por semana, e exame bioquímico do sangue para avaliação das funções renal (dosagem de uréia e creatinina) e hepática (dosagem das transaminases, bilirrubinas e fosfatase alcalina) e leucograma. Todos esses exames deverão ser realizados semanalmente, para orientação da conduta quanto à redução da dose ou utilização de outra alternativa terapêutica. Efeitos colaterais – podem ocorrer um ou mais efeitos colaterais, na seguinte ordem de freqüência: artralgia, mialgia, inapetência, náuseas, vômitos, plenitude gástrica, epigastralgia, pirose, dor abdominal, prurido, febre, fraqueza, cefaléia, tontura, palpitação, insônia, nervosismo, choque pirogênico, edema e insuficiência renal aguda (IRA). Essas queixas são, geralmente, discretas ou moderadas e raramente exigem a suspensão do tratamento. Porém, nas doses de 20mg/Sb+5/kg/dia, o antimonial pode atingir o limiar de toxicidade, podendo levar a alterações cardíacas ou renais que obriguem a suspensão do tratamento. Por isso, deve-se proceder ao acompanhamento eletrocardiográfico prévio e semanal e avaliação da função renal, especialmente em pacientes acima de 50 anos. É aconselhável que a medicação seja administrada por equipe especializada pois há possibilidade de realizar procedimentos de urgência. Os corticóides por via sistêmica podem ser utilizados nos quadros de hipersensibilidade. 472 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral Recomendações – é recomendável a abstinência de bebidas alcoólicas durante o período de tratamento, devido às alterações hepáticas. Também é recomendável o repouso físico durante o tratamento. Tratamento para crianças – emprega-se o mesmo esquema terapêutico utilizado para o tratamento de pacientes adultos. Todas as reações adversas graves ou potencialmente graves abaixo descritas devem ser notificadas às autoridades sanitárias: • arritmias cardíacas e/ou outras manifestações de cardiotoxicidade; • insuficiência renal aguda ou elevação dos níveis séricos de uréia e creatinina e/ou outras manifestações de nefrotoxicidade; • icterícia e/ou elevação de enzimas hepáticas e/ou outras manifestações de hepatotoxicidade; • pancreatite aguda e/ou hiperamilasemia; • outras não citadas acima e que não tenham sido descritas anteriormente. 6 Não há nenhum impedimento de que se notifiquem casos que não se encaixem na classificação acima, apenas não é imperativo que tais notificações sejam feitas. Na dúvida, notifique. Critérios de cura – os critérios de cura são essencialmente clínicos. O desaparecimento da febre é precoce e acontece por volta do 5º dia de medicação; a redução da hepatoesplenomegalia ocorre nas primeiras semanas. Ao final do tratamento o baço geralmente apresenta redução de 40% ou mais em relação à medida inicial. A melhora dos parâmetros hematológicos (hemoglobina e leucócitos) surgem a partir da segunda semana. As alterações vistas na eletroforese de proteínas se normalizam lentamente, podendo levar meses. O ganho ponderal do paciente é visível, com retorno do apetite e melhora do estado geral. Nesta situação, o controle através de exame parasitológico ao término do tratamento é dispensável. O seguimento do paciente tratado deve ser feito aos 3, 6 e 12 meses após o tratamento e na última avaliação, se permanecer estável, é considerado curado. O aparecimento de eosinofilia ao final do tratamento ou ao longo dos seguimentos é sinal de bom prognóstico. As provas sorológicas não são indicadas para seguimento do paciente. L Conceitos adotados pelo Programa de Controle da Leishmaniose Visceral Tratamento regular – caso que utilizou 20 doses de 20mg/Sb+5 /kg/dia de antimonial pentavalente em, no máximo, 30 dias, não ocorrendo intervalos superiores a 72 horas entre as doses. Tratamento irregular – caso que ultrapassou o tempo previsto para o tratamento regular ou que tenha ocorrido intervalos superiores a 72 horas entre as doses. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 473 Leishmaniose Visceral Falha terapêutica – caso em que não ocorreu cura clínica após a segunda série regular de tratamento com antimonial pentavalente. Abandono de tratamento – caso que não completou 20 doses de tratamento com antimonial pentavalente no tempo preestabelecido, ou pacientes que não tendo recebido alta não compareceram até 30 dias após o agendamento, para avaliação clínica. Recidiva – recrudescimento da sintomatologia, em até 12 meses após cura clínica. É considerado caso novo o reaparecimento de sintomatologia após 12 meses de cura clínica, desde que não haja evidência de imunodeficiência. Condutas diante do abandono de tratamento Quando houver a interrupção no tratamento, deve ser considerado o número de doses, o estado clínico atual e o tempo decorrido da última dose. Caso o paciente retorne antes de sete dias de interrupção da droga, completar 20 doses; após sete dias, considerar o que se segue: Retorno após 7 dias Número de doses Clinicamente curado Clinicamente doente Menos de 10 Reiniciar tratamento Reiniciar tratamento 10 ou mais Observar Reiniciar tratamento Segunda escolha Estão incluídos nesta categoria o desoxicolato sódico de anfotericina B e suas formulações lipossomais (anfotericina-B-lipossomal e anfotericina-B-dispersão coloidal) , as pentamidinas (sulfato e mesilato) e os imunomoduladores (interferon gama e GM-CSF). Com exceção das duas primeiras drogas, as demais encontram-se ainda em fase de investigação. O desoxicolato sódico de anfotericina B está disponível na rede e só deve ser administrado em hospitais de referência. Anfotericina B É a droga leishmanicida mais potente disponível comercialmente, atuando nas formas promastigotas e amastigotas do parasito, tanto in vitro quanto in vivo. Seu mecanismo de ação se dá através da ligação preferencial com esteres (ergosterol ou episterol) presentes na membrana plasmática da Leishmania. Tem sido demonstrado que doses menores do medicamento podem ser utilizadas sem prejuízo da eficácia e com conseqüente diminuição de toxicidade. No Brasil, a dose de 1mg/kg/dia durante 14 dias consecutivos (dose total de 14mg/kg) foi utilizada em 80 pacientes, com idades variando de 6 meses a 19 anos, com índices de cura de 97%. Nos casos de resposta insatisfatória aos antimoniais, a anfotericina B deve ser utilizada na dose total de 15 a 25mg/kg de peso administrada em dias alternados. Doses acima das recomendadas podem ser usadas em casos especiais (máximo de 3g de dose total). Em decorrência de sua baixa solubilidade, a anfotericina B mesma deve ser reconstituída em 10ml de água destilada no momento do uso, podendo ser mantida em refrigeração (2ºC a 8ºC) por um período de até 7 dias. No momento da administração, a solução deverá 474 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral ser diluída em soro glicosado a 5% na proporção de 1mg para 10ml. Devido ao risco de precipitação, a anfotericina B não deve ser misturada a outros medicamentos ou soluções que contenham eletrólitos. Deve ser sempre administrada por via endovenosa, em infusão lenta (4-6 horas), com limite máximo de 50mg/dose/dia. Efeitos colaterais – são inúmeros e freqüentes, todos dose-dependentes, sendo altamente tóxica para as células do endotélio vascular, causando flebite, considerada um paraefeito comum. Durante a infusão poderá ocorrer cefaléia, febre, calafrios, astenia, dores musculares e articulares, vômitos e hipotensão. A infusão rápida (menos de 1 hora) é responsável pela instalação de hiperpotassemia, determinando alterações cardiovasculares, às vezes com parada cardíaca caso a infusão seja muito rápida. Ao longo do tratamento poderão surgir sobrecarga hídrica e hipopotassemia. Alterações pulmonares, como desconforto respiratório, dispnéia e cianose também são descritas. Em caso de efeitos colaterais com o uso da anfotericina B o paciente pode ser medicado com uma dessas drogas (por exemplo, o diclofenaco, que deve ser administrado 2 horas antes do início da infusão). As complicações renais com o uso da anfotericina B são as mais importantes - graus variados de comprometimento renal ocorrem em praticamente todos os pacientes ao longo do tratamento. As alterações renais são totalmente reversíveis quando a droga é usada nas doses recomendadas. Novas formulações – atualmente, outras formulações tornaram-se disponíveis comercialmente: anfotericina-B-lipossomal e anfotericina-B-dispersão coloidal. A experiência acumulada com o uso da anfotericina-B-lipossomal no tratamento do calazar é maior do que aquela com a dispersão coloidal, que parece ser mais tóxica que a anterior. A anfotericina B lipossomal é uma outra droga disponível, porém de custo elevado o que impossibilita o seu uso na rotina do serviço. Está sendo indicada aos pacientes graves de leishmaniose visceral, principalmente os que desenvolveram insuficiência renal ou toxicidade cardíaca durante o uso do antimoniato de N-metil-glucamina e de outras drogas de escolha não obtendo melhora ou cura clínica. Para o tratamento de leishmaniose visceral, a dose recomendada é de 3,0mg/kg/dia, durante 7 dias. 6 L Situações específicas que devem ser observadas Leishmaniose visceral em gestantes No Brasil, a ocorrência de leishmaniose visceral durante a gravidez é considerada rara. O tratamento em pacientes no período gestacional teria dupla indicação: tratar a gestante e prevenir uma possível transmissão transplacentária. Devem ser feitas considerações importantes em relação às drogas disponíveis na atualidade e às possibilidades de efeitos teratogênicos e toxicidade para o concepto. Os antimoniais pentavalentes atravessam a barreira placentária e podem impregnar tecidos nervosos no feto, levando a síndromes severas de retardo mental. Portanto, está contra-indicada a utilização do antimonial pentavalente durante os dois primeiros trimestres da gravidez. Não há contra-indicação de seu uso durante a amamentação. A anfotericina B é a droga de escolha para o tratamento da leishmaniose visceral em pacientes grávidas. Recomenda-se a dose de 1mg/kg/dia, durante 14 dias consecutivos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 475 Leishmaniose Visceral Leishmaniose visceral e HIV/Aids A tríade clássica da leishmaniose visceral é também a manifestação mais comum na co-infecção Leishmania/HIV: hepatoesplenomegalia, anemia, leucopenia (média de 2.300/ ml), plaquetopenia, febre, adenopatia, astenia, emagrecimento. Certamente, como conseqüência do maior número de casos de co-infecção ocorrer em pacientes com menos de 200 células CD4+/ml, outras infecções oportunistas são freqüentemente associadas. As mais relatadas são candidíase esofagiana, pneumonia por Pneumocystis carini; infecção por Mycobacterium tuberculosis, toxoplasmose do sistema nervoso central e criptococose do sistema nervoso central. A leishmaniose visceral deve ser incluída no diagnóstico diferencial com doenças oportunistas como tuberculose disseminada, linfomas, salmoneloses, citomegalovírus, Toxoplasma gondii, Pneumocystis carinii, histoplasmose e coccidiodomicose, entre outras. Diagnóstico da co-infecção Leishmania/HIV Os testes convencionais de diagnóstico sorológico da leishmaniose visceral que oferecem sensibilidade em torno de 90% a 100% em pacientes imunocompetentes apresentam sensibilidade de 50% a 60% em pacientes com HIV. Quando técnicas sorológicas foram associadas, 20% dos pacientes co-infectados apresentaram resultados negativos em todas as técnicas utilizadas (imunofluorescência indireta, Elisa, Western Blot e contra-imunoeletroforese). Devido ao grande número de parasitos em macrófagos circulantes observados nos pacientes co-infectados, os métodos para sua detecção têm se mostrado os mais sensíveis. A punção de medula óssea é considerado o procedimento mais simples e menos arriscado. Aspectos terapêuticos e evolução O critério de escolha das drogas utilizadas para a terapêutica das leishmanioses em pacientes portadores de HIV não difere do preconizado para os pacientes imunocompetentes. Considerando que os pacientes com leishmaniose visceral co-infectados com o HIV são indivíduos que podem apresentar outras doenças oportunistas que os debilitam, a sua vulnerabilidade às reações adversas ao tratamento pode ser maior, pelo que se recomenda extremo cuidado no monitoramento adequado da toxicidade medicamentosa. Um dos aspectos mais marcantes na evolução da leishmaniose na presença de infecção por HIV é a tendência a recidivas. Sessenta por cento dos pacientes tratados apresentam recidiva após seis a nove meses e 90%, após 12 meses. Leishmaniose visceral e outras doenças tropicais Com a expansão da leishmaniose visceral no Brasil, observa-se o aumento da freqüência de sua associação com outras doenças tropicais. Nas regiões Nordeste, Sudeste e Norte, poderá haver associação com quadros de esquistossomose mansônica. Recomenda-se o tratamento inicial da esquistossomose com oxanminiquine ou praziquentel, nas doses habituais. A seguir, procede-se o tratamento da leishmaniose visceral com a utilização de antimonial pentavalente nas doses recomendadas anteriormente. Porém, em pacientes com a forma grave da esquistossomose mansônica, onde há hipertensão porta e volumosa he- 476 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral patoesplenomegalia, a dose do antimonial deverá ser reduzida à metade, ou seja, 10mg/ Sb+5/kg/dia, por via intramuscular ou intravenosa, durante 30 a 40 dias consecutivos. Na região Norte, esta associação poderá ocorrer com a malária (causada pelo Plasmodium vivax ou P. falciparum). Nestas circunstâncias, procede-se da mesma maneira, iniciando-se o tratamento com os antimaláricos em suas doses habituais e, posteriormente, o antimonial pentavalente, também nas doses habituais. Nos casos de associação da leishmaniose visceral com tuberculose e leishmaniose visceral com hanseníase, os pacientes deverão ser referenciados para o serviço de atendimento terciário, para melhor seguimento. Quadro 1. Condições em que deve ser oferecida a sorologia para o HIV em portadores de leishmaniose visceral Qualquer forma clínica sem exposição recente (durante o último ano) a uma área de transmissão de leishmaniose visceral 6 Uso de drogas intravenosas Forma clássica associada a ausência de anticorpos antiLeishmania Achado de formas amastigotas no sangue periférico Envolvimento de órgãos raramente acometidos na leishmaniose visceral1 Falha terapêutica2 ou recidiva3 após o uso de antimonial pentavalente Desenvolvimento de infecções sugestivas de imunodeficiência após o uso de antimonial pentavalente4 Isolamento de espécies de leishmanias dermotrópicas ou leishmanias não descritas como causadoras de acometimento visceral 1- Acometimento de trato respiratório, esôfago, estômago, duodeno, pele, etc.; 2- Ausência de cura clínica após duas tentativas de tratamento com antimoniato de meglumina (20mg de SbV/kg/dia por 30 dias); 3- Recrudescimento da sintomatologia, em até 12 meses após cura clínica; 4- Herpes zoster, tuberculose miliar, etc. L Quadro 2. Condições em que portadores de HIV/Aids devem ser investigados para leishmaniose visceral Febre associada à hepatomegalia, esplenomegalia ou citopenias em pacientes expostos à área de transmissão em qualquer período Usuários de drogas intravenosas em qualquer período Aspectos epidemiológicos No Brasil, a leishmaniose visceral é uma doença endêmica com registro de surtos freqüentes. Inicialmente, sua ocorrência estava limitada a áreas rurais e a pequenas localidades urbanas mas atualmente encontra-se em franca expansão para grandes centros. A leishmaniose visceral está distribuída em 19 estados da Federação, atingindo quatro das cinco regiões brasileiras. Nos últimos dez anos, a média anual de casos de leishmaniose visceral foi de 3.383 casos; e a incidência, de 2,00 casos por 100 mil hab. (Figura 1). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 477 Leishmaniose Visceral Figura 1. Número de casos de leishmaniose visceral. Brasil, 1984-2003* 5.000 4.500 4.000 3.500 3.000 2.500 2.000 1.500 1.000 500 0 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 Casos Fonte: Covev/Devep/CGDT/SVS-MS *Dados sujeitos a revisão A doença é mais freqüente em menores de 10 anos (54,4%), sendo 41% dos casos registrados em menores de 5 anos. O sexo masculino é proporcionalmente o mais afetado (60%). A razão da maior susceptibilidade em crianças é explicada pelo estado de relativa imaturidade imunológica celular agravado pela desnutrição, tão comum nas áreas endêmicas, além de maior exposição ao vetor no peridomicílio. Por outro lado, o envolvimento do adulto tem repercussão significativa na epidemiologia da leishmaniose visceral, pelas formas frustras (oligossintomáticas) ou assintomáticas, além das formas com expressão clínica. No Brasil, em função de sua ampla distribuição geográfica, a leishmaniose visceral apresenta aspectos geográficos, climáticos e sociais diferenciados envolvendo as regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste. Na década de 90, aproximadamente 90% dos casos notificados ocorreram na região Nordeste. À medida que a doença se expande para as outras regiões e atinge áreas urbanas e periurbanas, esta situação vem se modificando: em 2003, a região Nordeste apresenta 65% dos casos do país. Os dados epidemiológicos dos últimos dez anos revelam a periurbanização e a urbanização da leishmaniose visceral, destacando-se os surtos ocorridos no Rio de Janeiro (RJ), Belo Horizonte (MG), Araçatuba (SP), Santarém (PA), Corumbá (MS), Teresina (PI), Natal (RN), São Luís (MA), Fortaleza (CE), Camaçari (BA) e, mais recentemente, as epidemias ocorridas nos municípios de Três Lagoas (MS), Campo Grande (MS) e Palmas (TO). As áreas de transmissão da doença no Brasil estão representadas na Figura 2. 478 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral Figura 2. Distribuição de casos autóctones de leishmaniose visceral, por período. Brasil, 1984-2001 1984-2001 1996-2001 1 ponto = 1 caso 1992-1995 6 Fonte: Covev/Devep/CGDT/SVS-MS Vigilância epidemiológica L Objetivos A vigilância epidemiológica da leishmaniose visceral é um dos componentes do Programa de Controle da Leishmaniose Visceral (PCLV), cujos objetivos são reduzir as taxas de letalidade e grau de morbidade através do diagnóstico e tratamento precoce dos casos, bem como diminuir os riscos de transmissão mediante controle da população de reservatórios e do agente transmissor. A vigilância da leishmaniose visceral compreende a vigilância entomológica de casos humanos e caninos. A análise da situação epidemiológica indicará as ações de prevenção e controle a serem adotadas. Dentre os objetivos da vigilância, destacam-se: • identificar as áreas vulneráveis e/ou receptivas para transmissão da leishmaniose visceral; • avaliar a autoctonia referente ao município de residência; • investigar o local provável de infecção-LPI; • conhecer a presença, a distribuição e monitorar a dispersão do vetor; • dar condições para que os profissionais da rede de saúde possam diagnosticar e tratar precocemente os casos; Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 479 Leishmaniose Visceral • dar condições para realização do diagnóstico e adoção de medidas preventivas, de controle e destino adequado do reservatório canino; • investigar todos os supostos óbitos de leishmaniose visceral; • monitorar a tendência da endemia, considerando a distribuição no tempo e no espaço; • indicar as ações de prevenção de acordo com a situação epidemiológica; • desencadear e avaliar o impacto das ações de controle; • monitorar os eventos adversos aos medicamentos. Critérios para classificação de áreas para a vigilância e controle da leishmaniose visceral A metodologia proposta pelo PCLV para a definição de recomendações de vigilância e controle da leishmaniose visceral partiu da classificação das áreas com transmissão e das áreas sem transmissão de leishmaniose visceral no Brasil. O novo enfoque é incorporar os estados e municípios silenciosos, ou seja, sem ocorrência de casos humanos ou caninos da doença, nas ações de vigilância e controle da mesma, visando, assim, evitar ou minimizar os problemas referentes a este agravo em novas áreas. Através da análise epidemiológica realizada em cada estado ou município, os profissionais de saúde poderão identificar e classificar as diferentes áreas aqui apresentadas e a partir delas adotar as recomendações propostas para a vigilância, monitoramento e controle da leishmaniose visceral. Para as áreas de transmissão foi utilizado um indicador (média de caso nos últimos 5 anos), tendo como base os dados de leishmaniose visceral enviados pelas secretarias estaduais de saúde referentes ao período de 1998 a 2002. Os pontos de cortes para estratificação das áreas foram: média de 2,4 casos de leishmaniose visceral em 5 anos e média de 4,4 casos de leishmaniose visceral em 5 anos. Os municípios foram divididos em três classes de transmissão de leishmaniose visceral: municípios com média de casos menor que 2,4 estão classificados como de transmissão esporádica; municípios com média de casos > 2,4 e < 4,4 estão classificados como de transmissão moderada; e municípios com média de casos > 4,4 estão classificados como de transmissão intensa. Os municípios com transmissão de leishmaniose visceral terão uma das classificações acima referidas, porém os municípios de médio e grande porte, utilizando o mesmo indicador acima referido, poderão estratificar subáreas ou setores dentro do próprio município, permitindo, assim, trabalhar as ações de vigilância e controle específicas para cada situação. Destacamos que anualmente deverá ser feita uma análise para a reclassificação dos municípios, lembrando que para a análise do número médio de casos deverão ser considerados os últimos 5 anos. É importante evidenciar que as medidas de controle são distintas para cada situação epidemiológica e adequadas a cada área a ser trabalhada, conforme detalhamento no Manual de Vigilância e Controle da Leishmaniose Visceral, 2003. 480 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral Conceitos básicos para definição das áreas de transmissão de leishmaniose visceral Áreas de transmissão – setor, conjunto de setores ou município onde esteja ocorrendo a transmissão de leishmaniose visceral. Entende-se por setor a estratificação realizada quando implementado o Programa de Controle de Aedes aegypti – PEAa. Área sem casos ou silenciosas – municípios sem registro de casos autóctones de leishmaniose visceral humana ou canina. Área com casos – municípios com registro de pelo menos um caso autóctone de leishmaniose visceral humana. Áreas em processo de investigação Os municípios com casos suspeitos humanos ou caninos deverão aguardar a conclusão da investigação para serem classificados em uma das definições acima. Nesta situação, será classificado como “área em investigação”. 6 Áreas vulneráveis – municípios sem casos autóctones de leishmaniose visceral humana mas que atendem um ou mais dos seguintes critérios estabelecidos: são contíguos àqueles com casos de leishmaniose visceral; possuem fluxo migratório intenso ou fazem parte do mesmo eixo rodoviário dos municípios com casos de leishmaniose visceral. Áreas não-vulneráveis – municípios que não atendem nenhum dos critérios para as áreas vulneráveis. Áreas receptivas – municípios classificados como vulneráveis, nos quais após a realização do inquérito entomológico foi verificada a presença do L. longipalpis ou L. cruzi. Áreas não-receptivas – municípios classificados como vulneráveis, nos quais após a realização do inquérito entomológico foi verificada a ausência do L. longipalpis ou L. cruzi. Áreas com registro do primeiro caso autóctone de leishmaniose visceral – municípios que registraram pela primeira vez a autoctonia da doença em humanos. Áreas com transmissão esporádica – municípios cuja média de casos de leishmaniose visceral nos últimos 5 anos é inferior ao Percentil 90, ou seja, <2,4. Áreas com transmissão moderada – municípios cuja média de casos de leishmaniose visceral nos últimos 5 anos constitui o Percentil 90, ou seja, > 2,4 e < 4,4. Áreas com transmissão intensa – municípios cuja média de casos de leishmaniose visceral nos últimos 5 anos está acima do Percentil 90, ou seja, > 4,4. Áreas em situação de surto – municípios com transmissão, independente de sua classificação, que apresentem um número de casos superior ao esperado ou municípios com transmissão recente que apresentem dois ou mais casos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS L 481 Leishmaniose Visceral Classificação de áreas para vigilância e controle da leishmaniose visceral Classificação de áreas de leishmaniose visceral Áreas com casos de LV Área com registro do primeiro caso confirmado de leishmaniose visceral humana Área silenciosa ou sem casos de LV Vulnerável Áreas com transmissão esporádica Áreas com transmissão moderada e intensa Áreas com surto Área receptiva Não vulnerável Área não receptiva Vigilância entomológica No PCLV, o objetivo das investigações entomológicas é levantar as informações de caráter quantitativo e qualitativo sobre os flebotomíneos transmissores da leishmaniose visceral. Várias são as metodologias que podem ser empregadas do ponto de vista operacional, tais como: a coleta manual com tubo de sucção tipo Castro, a coleta manual com capturador motorizado, a coleta com armadilha adesiva, a coleta com armadilhas luminosas (modelo CDC ou similar) e as armadilhas com animais ou com feromônios, que nada mais são que uma otimização das metodologias anteriores. Algumas considerações sobre as técnicas para coleta de flebotomíneos estão descritas no Manual de Vigilância e Controle da Leishmaniose Visceral. Caberá as secretarias estaduais de saúde, por meio do núcleo de entomologia ou setor afim, a responsabilidade pela capacitação de recursos humanos, assessoria técnica para definição de estratégias, definição das áreas a serem trabalhadas, acompanhamento e/ou execução das ações de investigação entomológica e avaliação do controle químico, entre outras. As secretarias municipais de saúde deverão colaborar com a secretaria estadual de saúde ou realizar integralmente as ações de vigilância entomológica, desde que tenham um serviço de entomologia organizado, buscando um trabalho integrado com o estado, a fim de otimizar os recursos e a efetividade das ações de controle do vetor. Levantamento entomológico O levantamento entomológico tem como objetivos: • verificar a presença de L. longipalpis e/ou L. cruzi em municípios sem casos humanos de leishmaniose visceral ou municípios silenciosos. • verificar a presença de L. longipalpis e/ou L. cruzi em municípios com transmissão esporádica, moderada ou intensa e nos quais não tenham sido realizadas investigações anteriores. 482 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral • conhecer a dispersão do vetor no município, a fim de apontar nos municípios sem casos autóctones de leishmaniose visceral as áreas receptivas para realização do inquérito amostral canino e, nos municípios com transmissão da leishmaniose visceral, orientar as ações de controle do vetor. Metodologia Utiliza-se armadilha de isca luminosa. A unidade de pesquisa para a zona rural será a localidade e para a zona urbana, os setores de zoneamento para o controle do Aedes aegypti. A coleta de flebótomos deverá ser realizada em todos os setores/localidade do município, utilizando-se de duas até dez armadilhas em cada setor/localidade. Cada armadilha deverá ser instalada no peridomicílio, preferencialmente em abrigos de animais. As armadilhas deverão ser expostas uma hora após o crepúsculo até o período matutino seguinte (de preferência, retirar antes das 7h), durante três noites consecutivas. Os domicílios selecionados deverão ser, preferencialmente, aqueles sugestivos para a presença do vetor, tais como residências com peridomicílio que possua presença de plantas (árvores, arbustos), acúmulo de matéria orgânica e presença de animais domésticos (cães, galinhas, porcos, cavalos, cabritos, aves em geral, entre outros). As condições socioeconômicas e o tipo de moradia são critérios que podem ser levados em consideração para a seleção da unidade domiciliar. 6 Padronizou-se que a armadilha adesiva é um conjunto de cinco folhas confeccionadas com folhas de papel sulfite, tamanho ofício II ou A4, impregnadas com óleo de rícino. L Investigação entomológica A investigação entomológica terá como objetivos: • verificar a presença de L. longipalpis e/ou L. cruzi em municípios com a ocorrência de primeiro caso de leishmaniose visceral ou em situações de surto. • confirmar a área como de transmissão autóctone. Metodologia Utilizam-se a coleta manual e a armadilha adesiva. A coleta manual deverá ser realizada com o auxílio de um tubo de sucção (tipo aspirador de Castro) ou aspiradores elétricos (6 volts) e uma fonte de luz (lanterna). Deverão ser pesquisadas as paredes do intradomicílio, especialmente dos dormitórios. No peridomicílio, deverão ser pesquisados, principalmente, os anexos e os abrigos de animais. As coletas deverão ser realizadas, no mínimo, em três noites consecutivas em cada domicílio. O período mínimo de pesquisa será estabelecido em 30 minutos/domicílio (15 minutos para a coleta no intradomicílio e 15 minutos para o peridomicílio), tempo que poderá ser aumentado em função do tipo de habitação. A coleta manual deverá ser iniciada uma hora após o crepúsculo e prosseguir, se possível, até as 22h. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 483 Leishmaniose Visceral As armadilhas adesivas para coleta deverão ser expostas de forma suspensa (tipo bandeirola) em um fio de náilon ou barbante. Deverão ser penduradas no intradomicílio, especialmente no dormitório; e no peridomicílio, preferencialmente em abrigos de animais, protegidos da chuva. Deverá ser exposta, no mínimo, uma armadilha em cada ambiente. O tempo de exposição deverá ser de quatro dias. O período de exposição deverá ser iniciado uma hora após o crepúsculo, do primeiro dia até a manhã do quinto. O monitoramento objetiva conhecer a distribuição sazonal e abundância relativa das espécies L. longipalpis e/ou L. cruzi, visando estabelecer o período mais favorável para a transmissão da leishmaniose visceral e direcionar as medidas de controle químico do vetor. O monitoramento é recomendado em municípios com transmissão moderada e/ou intensa. Deverão ser selecionados um ou mais municípios, de acordo com as regiões climáticas e/ou topográficas. Sabendo-se que a presença e a flutuação estacional das populações de flebotomíneos, em determinada região geográfica, está ligada aos fatores climáticos (temperatura, umidade relativa do ar e índice pluviométrico) e aos fatores fisiográficos (composição do solo, altitude, relevo e tipo de vegetação). O desenvolvimento desta atividade é de responsabilidade do nível estadual. Metodologia Utiliza-se a armadilha de isca luminosa. Deverão ser selecionados dez domicílios, que serão os pontos de coleta no município. Em cada peridomicílio será instalada uma armadilha, preferencialmente disposta em abrigos de animais. As armadilhas deverão ser expostas por 12 horas, iniciando-se uma hora a partir do crepúsculo, durante quatro noites consecutivas por mês. O domicílio escolhido deverá ser preferencialmente aquele sugestivo para a presença do vetor, tais como residências com peridomicílio, presença de plantas (árvores, arbustos), acúmulo de matéria orgânica e presença de animais domésticos (cães, galinhas, porcos, cavalos, cabritos, aves em geral, entre outros). As condições socioeconômicas e o tipo de moradia são critérios que podem ser levados em consideração para a seleção da unidade domiciliar. Embora as pesquisas no ambiente intradomiciliar não estejam priorizadas pelo PCLV, sabe-se que este monitoramento também permite verificar a relação da abundância relativa do vetor no peri e intradomicílio, com a finalidade de orientar medidas de controle nestes ambientes. Para tanto, as pesquisas no peri e intradomicílio deverão ser concomitantes. Vigilância no cão Definição de caso Caso canino suspeito – todo cão proveniente de área endêmica ou onde esteja ocorrendo surto, com manifestações clínicas compatíveis com a leishmaniose visceral canina (LVC) (febre irregular, apatia, emagrecimento, descamação furfurácea e úlceras na pele, em geral no focinho, orelhas e extremidades, conjuntivite, paresia do trem posterior, fezes sanguinolentas e crescimento exagerado das unhas). 484 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral Caso canino confirmado • Critério laboratorial – cão com manifestações clínicas compatíveis de LVC e que apresente teste sorológico reagente e/ou exame parasitológico positivo; • Critério clínico-epidemiológico – cão proveniente de áreas endêmicas ou onde esteja ocorrendo surto e que apresente quadro clínico compatível de LVC sem a confirmação do diagnóstico laboratorial. Cão infectado – todo cão assintomático com sorologia reagente e/ou parasitológico positivo em município com transmissão confirmada. Ações de vigilância • Alertar os serviços e a classe médica veterinária quanto ao risco da transmissão da leishmaniose visceral canina-LVC. • Divulgar à população informes sobre a ocorrência da LVC na região e alertar sobre os sinais clínicos e os serviços para o diagnóstico, bem como as medidas preventivas para eliminação dos prováveis criadouros do vetor. • Articular com o poder público responsável a implementação de ações de limpeza urbana em terrenos, praças públicas, jardins e logradouros, dentre outros, destinando de maneira adequada a matéria orgânica recolhida. • Na suspeita clínica de cão, delimitar a área para investigação do foco. Define-se como área para investigação aquela que a partir do primeiro caso canino (suspeito ou confirmado) estiver circunscrita em um raio de, no mínimo, 100 cães a serem examinados. Nesta área deverão ser desencadeadas a busca ativa de cães sintomáticos para coleta de exame parasitológico e confirmação da identificação da espécie de Leishmania. Uma vez confirmada a L. chagasi, coletar material sorológico em todos os cães da área, a fim de avaliar a prevalência canina e desencadear as demais medidas. 6 L Monitoramento Inquérito sorológico amostral – deverá ser realizado nas seguintes situações: • municípios silenciosos e receptivos, isto é, onde a L. longipalpis já foi detectada mas não tenha sido confirmada a transmissão da leishmaniose visceral humana ou canina, com a finalidade de verificar ausência de enzootia; • municípios com transmissão moderada e intensa, o que permitirá avaliar as taxas deprevalência em cada setor, a fim de identificar as áreas prioritárias a serem trabalhadas. O inquérito poderá ser realizado em todo ou em parte do município, dependendo do tamanho do mesmo e da distribuição do vetor. Deverá ser utilizada amostragem estratificada por conglomerados, onde o estrato é um setor do PEAa (setorização realizada quando for implementado o plano de erradicação do Aedes aegypti) e o conglomerado, o quarteirão. Para cada setor deverá ser calculada a amostra de cães, considerando-se a prevalência esperada e o número de cães do setor. Para aqueles municípios que já tenham uma estimativa de Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 485 Leishmaniose Visceral prevalência conhecida, utilizar este valor como parâmetro. Caso contrário, utilizar a prevalência de 2%. Setores com população canina inferior a 500 cães deverão ser agrupados com um ou mais setores contíguos, para o cálculo da amostra. Por outro lado, em municípios com população inferior a 500 cães, deverá ser realizado inquérito canino censitário. Ver informações mais detalhadas no Manual de Vigilância e Controle da Leishmaniose Visceral. Inquérito sorológico censitário – deverá ser realizado nas seguintes situações: • zona urbana de município classificado como silencioso e receptivo com população canina menor que 500 cães; • setores urbanos de municípios acima de 20 mil habitantes classificados como de transmissão moderada ou intensa; • zona rural de municípios em qualquer uma das situações de transmissão de leishmaniose visceral. Este tipo de inquérito objetiva o controle através da identificação de cães infectados para a realização da eutanásia, bem como avaliar a prevalência. Estes inquéritos deverão ser realizados anualmente, no período de agosto a novembro, por no mínimo 3 anos consecutivos, independente da notificação de novos casos humanos confirmados de leishmaniose visceral. A fim de não sobrecarregar os laboratórios de saúde pública de referência para a realização dos exames, o planejamento das ações deverá ser realizado em conjunto com as instituições que compõem o Programa de Controle da leishmaniose visceral no estado. Existem duas técnicas sorológicas recomendadas pelo Ministério da Saúde para avaliação da soroprevalência em inquéritos caninos amostrais ou censitários, o Elisa e a imunofluorescência indireta (IFI). Entretanto, por estar ainda em fase de implantação, o Elisa inicialmente está sendo recomendado para a triagem de cães sorologicamente negativos e a Rifi para a confirmação dos cães soro-reagentes ou indeterminados ao teste Elisa, ou como técnica diagnóstica de rotina. Os exames sorológicos poderão ser realizados nos laboratórios centrais estaduais (Lacens) ou nos laboratórios e centros de controle de zoonoses (CCZs) municipais. É importante realizar periodicamente o controle de qualidade dos exames efetuados. As amostras de soro, a serem analisadas na referência nacional, devem ser impreterivelmente encaminhadas pelo Lacen. É importante ressaltar que em situações nas quais o proprietário do animal exija uma contraprova, esta deverá ser uma prova sorológica, realizada por um laboratório da rede. O período estimado para liberação do resultado dependerá do tempo de deslocamento da amostra até as referências, sendo a média esperada de 15 dias. Os resultados liberados por este laboratório serão considerados oficiais para fins de diagnóstico da infecção e da doença. 486 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral Vigilância em humanos Definição de caso Caso humano suspeito – todo indivíduo proveniente de área com ocorrência de transmissão, com febre e esplenomegalia, ou todo indivíduo de área sem ocorrência de transmissão, com febre e esplenomegalia, desde que descartados os diagnósticos diferenciais mais freqüentes na região. Caso humano confirmado: • Critério clínico-laboratorial – a confirmação dos casos clinicamente suspeitos deverá preencher, no mínimo, um dos seguintes critérios: ❯ encontro do parasito nos exames parasitológicos direto e/ou cultura; ❯ imunofluorescência reativa com título de 1:80 ou mais, desde que excluídos outros diagnósticos diferenciais. • Critério clínico-epidemiológico – paciente de área com transmissão de leishmaniose visceral, com suspeita clínica sem confirmação laboratorial mas com resposta favorável ao teste terapêutico. 6 Infecção Todo indivíduo com exame sorológico reagente e/ou parasitológico positivo, sem manifestações clínicas. Estes casos não devem ser notificados e/ou tratados. Notificação A leishmaniose visceral humana é uma doença de notificação compulsória, portanto todo caso suspeito deve ser notificado e investigado pelos serviços de saúde através da ficha de investigação padronizada pelo Sinan. A detecção de casos de leishmaniose visceral pode ocorrer através de: • demanda espontânea à unidade de saúde; • busca ativa de casos no local de transmissão; • visitas domiciliares dos profissionais do Pacs e PSF; • encaminhamento de suspeitos, através da rede básica de saúde. L Investigação de casos humanos de leishmaniose visceral A investigação epidemiológica faz-se necessária para: • identificar se o caso é autóctone ou importado (caso seja importado, informar o serviço de vigilância epidemiológica estadual ou municipal do local provável de infecção); • verificar se a área é endêmica ou se é um novo local de transmissão; • conhecer as características epidemiológicas do caso (idade e sexo); • realizar busca ativa de casos novos e caracterizá-los clínica e laboratorialmente; • orientar medidas de controle, conforme a situação epidemiológica e a classificação da área. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 487 Leishmaniose Visceral O instrumento de coleta de dados, atualmente disponível no Sinan através da ficha de investigação epidemiológica, contém os elementos essenciais a serem coletados em uma investigação de rotina. Todos os campos desta ficha devem ser criteriosamente preenchidos, mesmo quando a informação for negativa. Outros itens e observações podem ser incluídos, conforme as necessidades e peculiaridades de cada situação. Pelo fato de a ficha de investigação de casos de leishmaniose visceral não conter dados referentes ao vetor e ao reservatório, os mesmos, quando indicados conforme critério de classificação da área, devem ser coletados e preenchidos nas planilhas específicas. Estes dados, após análise, irão orientar a adoção de medidas de vigilância e controle. Vale ressaltar que estas informações também devem fazer parte do relatório da investigação do caso. Roteiro de investigação epidemiológica Identificação do paciente – preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica do Sinan relativos aos dados gerais, notificação individual e dados de residência. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos – preencher os campos da ficha de investigação epidemiológica do Sinan relativos aos antecedentes epidemiológicos, dados clínicos, laboratoriais e tratamento. Caracterização do local provável de infecção - LPI – estabelecer o possível local de infecção do caso, de acordo com a história epidemiológica e conhecimento de ocorrência de outros casos em períodos anteriores. A caracterização da área de transmissão é de fundamental importância para o processo de investigação e adoção de medidas e controle. No processo de caracterização do LPI deve-se: • investigar se o paciente se deslocou para áreas endêmicas no período de até 6 meses anteriores ao início dos sintomas; • caracterizar a espécie de Leishmania, se for uma nova área de transmissão; • realizar busca ativa de casos humanos e caninos; • realizar levantamento entomológico, caso não tenha sido verificada a presença do vetor; • conhecer as características ambientais, sociais e econômicas. Classificação dos casos humanos Caso confirmado – caso suspeito que cumpriu um dos seguintes critérios de confirmação: critério clínico-laboratorial ou critério clínico-epidemiológico. Caso descartado – caso suspeito com exames sorológicos e/ou parasitológicos negativos, sem resposta favorável ao teste terapêutico ou caso suspeito que após investigação clínico-laboratorial confirma outro diagnóstico. Evolução do caso É de extrema importância para a vigilância da leishmaniose visceral tratar os casos confirmados e acompanhá-los durante toda a evolução clínica, conforme normas técnicas. Esta conduta visa reduzir a letalidade, recidiva, gravidade e outras complicações da doença e/ou toxicidade do medicamento. Ressalta-se a necessidade de estruturar o serviço de saúde 488 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral para acompanhar os pacientes até a cura clínica. Em situações de pacientes que não comparecem às consultas agendadas durante o tratamento, faz-se necessária a busca dos faltosos, utilizando estratégias locais. Investigação de óbitos As fontes de informações para a investigação e monitoramento dos óbitos podem ser o Sinan, o Sistema de Informações sobre Mortalidade − SIM e a notificação informal do serviço ou da comunidade. Todos os supostos óbitos de leishmaniose visceral devem ser investigados para que suas causas sejam determinadas. Ver informações mais detalhadas no Manual de Vigilância e Controle da Leishmaniose Visceral. Após a coleta de dados (junto à família, comunidade, prontuário hospitalar, prontuário da unidade de saúde, profissionais que atenderam o paciente, entre outras), as informações devem ser consolidadas e o caso discutido com todos os profissionais envolvidos, objetivando a adoção de medidas que possam corrigir as deficiências e, conseqüentemente, reduzir a letalidade da leishmaniose visceral. 6 Atenção Todos os supostos óbitos por leishmaniose visceral devem ser investigados. Encerramento de casos humanos Todos os casos devem ser encerrados no Sinan, no período máximo de 180 dias. Os serviços de vigilância epidemiológica municipal e estadual deverão estar atentos para o encerramento de todos os casos suspeitos de leishmaniose visceral. L Análise dos dados A análise dos dados da investigação deve permitir a avaliação da magnitude e transcendência do problema, distribuição segundo pessoa, tempo e espaço. Assim, os dados coletados no processo, além de permitir estabelecer a área e extensão da ocorrência do caso, devem indicar qual a possibilidade de continuidade da transmissão, probabilidade de continuidade de aparecimento de novos casos, população sob risco e qual a extensão que as medidas de controle devem assumir, dentre outras. Em áreas com transmissão, análises periódicas dos indicadores epidemiológicos, operacionais, entomológicos, entre outros, devem ser realizados para avaliar a efetividade das medidas de controle e a progressão da situação epidemiológica, tais como redução ou elevação da incidência, da letalidade; expansão ou limitação das áreas de transmissão, intervenções ambientais que possam estar contribuindo para o agravamento do problema, etc. (ver Manual de Vigilância e Controle da Leishmaniose Visceral). Em situações de surtos, os dados devem ser analisados criteriosamente, permitindo melhor orientação e aprimoramento tanto nas medidas de prevenção e controle quanto na necessidade de implementação das ações de diagnóstico e assistência. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 489 Leishmaniose Visceral Divulgação dos dados Após análise dos dados, os mesmos deverão ser amplamente divulgados através de boletins epidemiológicos ou informativos, reuniões de avaliação, oficinas de trabalho, seminários, congressos e publicações científicas, por exemplo. Medidas preventivas Dirigidas à população humana – medidas de proteção individual. Dirigidas ao vetor – saneamento ambiental. Dirigidas à população canina: • controle da população canina errante; • doação de animais: fazer exame sorológico prévio; • uso de telas em canis individuais ou coletivos; • coleiras impregnadas com deltametrina a 4%. Instrumentos disponíveis para controle Em virtude das características epidemiológicas e do conhecimento ainda insuficiente sobre os vários elementos que compõem a cadeia de transmissão da leishmaniose visceral, as estratégias de controle desta endemia ainda são pouco efetivas e estão centradas no diagnóstico e tratamento precoce dos casos, redução da população de flebotomíneos, eliminação dos reservatórios e atividades de educação em saúde. Vale destacar que as ações voltadas para o diagnóstico e tratamento dos casos e atividades educativas devem ocorrer em todas as situações priorizadas, lembrando que as demais medidas de controle devem estar sempre integradas para que possam ser efetivas. Orientações dirigidas para o diagnóstico precoce e tratamento adequado dos casos humanos De acordo com a política de saúde vigente em nosso país, o controle da leishmaniose visceral é de responsabilidade do SUS. Inicialmente, a execução das ações ficavam sob a responsabilidade do governo federal. Com o processo de descentralização das endemias, as ações passaram a ser executadas pelos níveis estadual e/ou municipal, e para cada uma de suas instâncias as atribuições estão estabelecidas na Portaria nº 1.399/GM, de 15/12/99, substituída recentemente pela Portaria/GM nº 172, de 15/6/04. As secretarias municipais de saúde, com o apoio das secretarias estaduais de saúde, têm a responsabilidade de organizar a rede básica de saúde para suspeitar, assistir, acompanhar e/ou encaminhar para referência hospitalar os pacientes com leishmaniose visceral. Para tanto, faz-se necessário estabelecer um fluxo de referência e contra-referência, bem 490 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral como oferecer as condições necessárias para diagnosticar e tratar precocemente os casos de leishmaniose visceral. Este atendimento pode ser realizado pela demanda passiva, registro e busca ativa de casos em áreas de maior risco ou quando indicadas pela vigilância epidemiológica, ou ainda onde o acesso da população à rede é dificultado por diversos fatores. É importante que na fase de organização dos serviços de saúde para atendimento precoce dos pacientes seja viabilizado: • identificar os profissionais e unidades de saúde de referência para o atendimento aos pacientes, bem como para a execução dos exames laboratoriais; • capacitar os recursos humanos que irão compor a equipe multiprofissional das unidades básicas e/ou hospitalar responsáveis pelo atendimento e realização dos exames laboratoriais; • sensibilizar todos os profissionais da rede para a suspeita clínica; • suprir as unidades de saúde com materiais e insumos necessários para o diagnóstico clínico, laboratorial e tratamento, visando melhorar a resolubilidade e contribuir para o diagnóstico e tratamento precoce e, conseqüentemente, para a redução da letalidade; • integrar as equipes do Pacs e PSF; • estabelecer um fluxo de atendimento para os pacientes, integrando as ações de vigilância e assistência; • oferecer condições necessárias para o acompanhamento dos pacientes em tratamento, evitando o abandono e as complicações da doença; • aprimorar o sistema de informação e estar sempre divulgando, informando e atualizando os profissionais de saúde sobre a situação epidemiológica da doença, bem como sensibilizando-os para a suspeita clínica; • realizar atividades de educação em saúde visando a participação-ativa da comunidade para buscar o atendimento precoce, bem como contribuir de forma participativa nas medidas de controle da doença (saneamento ambiental, controle vetorial, controle do reservatório, entre outras). 6 L Assistência ao paciente Todo caso suspeito deve ser submetido à investigação clínica, epidemiológica e aos métodos auxiliares de diagnóstico. Caso seja confirmado, inicia-se o tratamento segundo procedimentos terapêuticos padronizados e acompanha-se o paciente mensalmente (para avaliação da cura clínica). Os casos graves de leishmaniose visceral devem ser internados e tratados em hospitais de referência; e os leves ou intermediários devem ser assistidos no nível ambulatorial, em unidades de saúde com profissionais capacitados. Qualidade da assistência É comum o diagnóstico de pacientes com leishmaniose visceral em fase avançada, o que pode ser atribuído a demora com que procuram os serviços de saúde e, por outro lado, a baixa capacidade de detecção dos casos pelos profissionais da rede básica de saúde. Deste Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 491 Leishmaniose Visceral modo, o serviço de vigilância local deve estruturar as unidades de saúde promovendo a capacitação de profissionais para suspeitar, diagnosticar e tratar precocemente os casos, bem como organizar o serviço para agilizar o diagnóstico laboratorial e a assistência ao paciente. Deve ser definido, estabelecido e divulgado o fluxo das unidades de referência e contra-referência. Na área de transmissão intensa, bem como nas áreas cobertas pelo Pacs/PSF, é recomendada a realização de busca ativa de casos, encaminhando os suspeitos para atendimento médico. Neste momento, todos os profissionais de saúde devem ser alertados e sensibilizados para o problema e é importante que a população seja constantemente informada sobre os serviços disponíveis, bem como da necessidade de buscar atendimento precocemente. Atenção Esta é uma área com transmissão de leishmaniose visceral, portanto todo paciente com febre e esplenomegalia é um caso suspeito. Notifique, investigue e faça o diagnóstico e tratamento do paciente o mais precocemente possível ou o encaminhe para o serviço de referência. Atuação na cadeia de transmissão Orientações dirigidas ao controle do vetor A indicação das atividades voltadas para o controle vetorial dependerão das características epidemiológicas e entomológicas de cada localidade. As recomendações propostas para cada área estão descritas conforme a classificação epidemiológica, sendo importante salientar que as ações de controle deverão ser sempre realizadas de forma integrada. Controle químico O controle químico por meio da utilização de inseticidas de ação residual é a medida de controle vetorial recomendada no âmbito da proteção coletiva. Dirigida apenas para o inseto adulto tem como objetivo evitar e/ou reduzir o contato entre o inseto transmissor e a população humana, conseqüentemente, diminuir o risco de transmissão da doença. Quando é recomendado o controle químico? • Em áreas com registro de primeiro caso autóctone de leishmaniose visceral, imediatamente após a investigação entomológica. • Em áreas com transmissão moderada e intensa, se a curva de sazonalidade do vetor for conhecida, a aplicação do inseticida de ação residual deverá ser realizada no período do ano em que se verifica aumento da densidade vetorial. Caso contrário, o primeiro ciclo de tratamento deverá ser realizado após o início do período chuvoso e o segundo, 3 a 4 meses após o primeiro ciclo. 492 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral • Em áreas com surto de leishmaniose visceral, uma vez avaliada e delimitada a área para o controle químico, deverá ser imediatamente realizado um ciclo de tratamento com inseticida de ação residual. A programação de novo ciclo deverá estar de acordo com a curva de sazonalidade do vetor. Se conhecida, a aplicação do inseticida de ação residual deverá ser realizada no período do ano em que se verifica aumento da densidade vetorial. Caso contrário, o primeiro ciclo de tratamento deverá ser realizado ao final do período chuvoso e 3 a 4 meses após o primeiro ciclo. Ciclo de borrifação Entende-se por ciclo de borrifação o período necessário para cobrir a área delimitada a ser borrifada no menor espaço de tempo. Para efeito de organização da atividade, inicialmente deverá ser considerado o período de 4 meses, tempo que pode ser reduzido de acordo com a capacidade operacional do município. 6 Onde deve ser feita a borrifação? • Nas paredes internas e externas do domicílio, incluindo o teto, quando a altura deste for de até 3 metros. • Nos abrigos de animais ou anexos, quando os mesmos forem feitos com superfícies de proteção (parede) e possuam cobertura superior (teto). Qual produto deverá ser utilizado? • Os produtos mais empregados no controle a esses vetores são a cipermetrina, na formulação pó molhável (PM), e a deltametrina, em suspensão concentrada (SC), usados, respectivamente, nas doses de 125mg. i.a./m2 e de 25mg. i.a/m2. Atualmente, o Programa de Controle da Leishmaniose Visceral tem utilizado alfacipermetrina, na formulação suspensão concentrada (SC), na dose de 40mg.ia/m2. Como deverão ser os ciclos de tratamento? • Segundo indicações obtidas em pesquisas operacionais, o efeito residual dos piretróides em superfícies de parede tem duração aproximada de três meses (excetuando as superfícies de madeira onde esse efeito poderá ser mais duradouro). Sendo assim, é recomendado que nas áreas selecionadas para controle químico, de acordo com a classificação epidemiológica, deverão ser realizados dois ciclos de borrifação durante o ano, com intervalo de três a quatro meses. O início do ciclo deverá seguir as orientações já descritas. Que tipo de equipamento deve ser usado? • Para este tipo de aplicação são indicados os equipamentos de compressão variável, tipo Hudson-X-Pert ou Jacto com capacidade de 10 litros, devendo ser revisados para evitar vazamentos e outros inconvenientes durante a aplicação. • O bico indicado para uso em saúde pública é o Tee Jet 8002E, que proporciona uma vazão de 757ml e deposição uniforme nas laterais do leque de aplicação. Em decorrência da erosão, os bicos que apresentarem vazão maior que 900ml/minuto devem ser descartados. ® L ® Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 493 Leishmaniose Visceral Como delimitar a área para o controle químico? • Na zona rural, o controle químico será realizado em todos os domicílios da localidade onde ocorreu a transmissão. • Na zona urbana, para o controle deverá ser considerada a área de transmissão previamente delimitada. Quais são os procedimentos de segurança? • Os cuidados no manuseio, transporte e aplicação de praguicidas no controle de vetores, bem como os equipamentos de proteção individual-EPI, estão descritos no Manual de Controle de Vetores – Procedimentos de Segurança, 2001. • Os agentes, deverão usar os EPI indicados para cada tipo de atividade envolvendo aplicações de praguicidas. Avaliação do controle químico A avaliação das ações de operação de inseticidas para o controle do flebotomíneo é de fundamental importância, para verificar o impacto das ações realizadas, a persistência do inseticida nas superfícies tratadas e a efetividade do produto em relação a mortalidade do vetor. O método utilizado para este tipo de avaliação foi padronizado pela Organização Mundial da Saúde (WHO, 1970). No entanto, por se tratar de uma atividade específica, esta atribuição deve ser de competência do estado, quando este reunir as condições necessárias. Orientações dirigidas ao controle do reservatório canino Eutanásia de cães A prática da eutanásia canina é recomendada a todos os animais com sorologia positiva e/ou parasitológico positivo. Para a realização da eutanásia, deve-se ter como base a Resolução nº 714, de 20 de junho de 2002, do Conselho Federal de Medicina Veterinária, que dispõe sobre os procedimentos e métodos de eutanásia em animais e dá outras providências, dentre as quais merecem destaque: • Os procedimentos de eutanásia são de exclusiva responsabilidade do médico veterinário, que dependendo da necessidade pode delegar esta prática a terceiros, que a realizará sob sua supervisão. Na localidade ou município onde não existir médico veterinário, a responsabilidade será da autoridade sanitária local; • Os animais deverão ser submetidos à eutanásia em ambiente tranqüilo e adequado, longe de outros animais e do alojamento dos mesmos; • A eutanásia deverá ser realizada segundo a legislação municipal, estadual e federal no que se refere a compra e armazenamento de drogas, saúde ocupacional e eliminação de cadáveres e carcaças; • Para a realização da eutanásia são recomendados os barbitúricos, anestésicos inaláveis, dióxido de carbono – CO2, monóxido de carbono – CO e cloreto de potássio – KCl; para este último, será necessária anestesia geral prévia; 494 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral • Os procedimentos de eutanásia, se mal empregados, estão sujeitos à legislação federal de crimes ambientais. Destino de cadáveres Os cadáveres de animais submetidos à eutanásia ou que tiveram morte devido à leishmaniose deverão ser considerados como resíduos de serviços de saúde. Portanto, o destino de seus cadáveres deverá obedecer o previsto na Resolução RDC nº 33, de 25 de fevereiro de 2003, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, que dispõe sobre o Regulamento Técnico para o gerenciamento de resíduos de serviços de saúde. Segundo a resolução, os cadáveres de animais errantes ou domésticos são considerados do Grupo D (resíduos comuns), que são os gerados nos serviços de saúde e que, por suas características, não necessitam de procedimentos diferenciados. O destino do cadáver destes animais deverá ser valas comuns de aterros sanitários. 6 Orientações dirigidas às atividades de educação em saúde As atividades de educação em saúde devem estar inseridas em todos os serviços que desenvolvem ações de controle da leishmaniose visceral, requerendo o envolvimento efetivo das equipes multiprofissionais e multiinstitucionais com vistas ao trabalho articulado nas diferentes unidades de prestação de serviços, através de: • divulgação à população sobre a ocorrência da leishmaniose visceral na região, alertando sobre os sinais clínicos e os serviços para o diagnóstico e tratamento; • capacitação das equipes, englobando o conhecimento técnico, os aspectos psicológicos e a prática profissional em relação à doença e aos doentes; • adoção de medidas preventivas considerando o conhecimento da doença, atitudes e práticas da população (clientela) relacionadas às condições de vida e trabalho das pessoas; • estabelecimento de relação dinâmica entre o conhecimento do profissional e a vivência dos diferentes estratos sociais através da compreensão global do processo saúde/doença, no qual intervêm fatores sociais, ambientais, econômicos, políticos e culturais; • incorporação das atividades de educação em saúde voltadas à leishmaniose visceral dentro de um processo de educação continuada; • desenvolvimento de atividades de educação em saúde junto à comunidade; • estabelecimento de parcerias buscando a integração institucional. L Recomendações específicas para cada uma das classificações das áreas para vigilância e controle da leishmaniose visceral Serão apresentados fluxogramas relativos às recomendações específicas para cada uma das áreas, referentes as ações de vigilância e controle da leishmaniose visceral. Para maiores detalhamentos, ver Manual de Vigilância e Controle da Leishmaniose Visceral. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 495 Leishmaniose Visceral Áreas sem casos de leishmaniose visceral As áreas sem casos de leishmaniose visceral humana ou canina podem apresentar uma das seguintes situações: Áreas sem casos de LV Vulnerável Receptiva Não-vulnerável Não-receptiva A definição de cada uma das áreas acima está descrita no tópico Vigilância epidemiológica. Os municípios sem casos humano e canino de leishmaniose visceral são classificados em vulnerável ou não-vulnerável. Assim, deve-se considerar como vulnerável o que apresentar qualquer uma das seguintes situações: • municípios contíguos aos de casos humanos; • municípios que fazem parte do mesmo eixo rodoviário dos casos humanos; • municípios com fluxo migratório intenso. A confirmação do exame parasitológico é obrigatória apenas nas áreas sem casos humanos. 496 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral Vigilância e controle em áreas sem casos autóctones de leishmaniose visceral Área sem casos autóctones ou silenciosa Vulnerável Não-vulnerável Levantamento entomológico Não programada ação Ação não-receptiva Saneamento ambiental Controle da população canina errante Busca ativa de cães com suspeita clínica Repetir estudo entomológico no máximo a cada 2 anos Desenvolver atividades de educação e saúde Realizar inquérito amostral canino para verificar a presença de epizootia canina Inquérito canino positivo Inquérito canino negativo Confirmar parasitológico e espécie de leishmania circulando na área Treinar profissionais para diagnóstico precoce e tratamento Eutanásia nos cães positivos Vigilância e monitoramento Ação receptiva Vigilância e monitoramento Parasitológico com pelo menos uma amostra positiva Parasitológico negativo ou outra espécie de leishmania Investigar autoctonia Vigilância e monitoramento Cão autóctone Cão importado 6 Eutanásia nos cães positivos Vigilância e monitoramento Prevalência canina <2% Busca ativa de cães com suspeita clínica Prevalência canina >2% Implementação das ações de vigilância epidemiológica Realizar inquérito censitário Treinar profissionais para diagnóstico precoce e tratamento Desenvolver atividades de educação em saúde Eutanásia nos cães positivos L Seguir as recomendações conforme resultado do inquérito censitário Áreas com casos de leishmaniose visceral As áreas com casos de leishmaniose visceral humana podem apresentar uma das seguintes situações: • ser um município com registro de primeiro caso autóctone; • ser um município com transmissão esporádica; • ser um município com transmissão moderada; • Ser um município com transmissão intensa; • ser um município com surto. A definição de cada uma das áreas referidas está descrita no tópico Vigilância Epidemiológica. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 497 Leishmaniose Visceral Áreas com casos de LV Áreas com primeiro caso de LV Transmissão moderada e intensa Transmissão esporádica Áreas com surto A partir da classificação dos municípios, são recomendadas as seguintes ações: Áreas com registro do primeiro caso autóctone de leishmaniose visceral Vigilância e controle em áreas com registro do primeiro caso autóctone de leishmaniose visceral Registro do primeiro caso autóctone de leishmaniose visceral Ações referentes ao caso humano Notificação e investigação Implementar as ações para diagnóstico, tratamento e acompanhamento dos pacientes Busca ativa de casos suspeitos no local de transmissão Ações referentes ao reservatório canino Ações referentes ao vetor Realizar investigação entomológica no local de transmissão Saneamento ambiental Presença de vetor Ausência de vetor Busca ativa de cães com suspeita clínica Indicação imediata de controle químico no local de transmissão Avaliar mensalmente até o encontro do vetor Realizar sorologia Programar dois novos ciclos de borrifação Investigar a causa do óbito, se for o caso Desenvolver atividades de educação e saúde Sorologia positiva Sorologia negativa Eutanásia Vigilância e monitoramento Inquérito censitário canino anual no local de transmissão Controle da população canina errante Cães com sorologia positiva Cães com sorologia negativa Eutanásia Vigilância e monitoramento Observação: a confirmação do exame parasitológico canino é obrigatória apenas nas áreas sem casos humanos. Áreas com transmissão esporádica de leishmaniose visceral Ações específicas referentes ao vetor – nos municípios com transmissão esporádica, as ações referentes ao vetor estão restritas ao conhecimento da espécie e a dispersão da população do vetor no município, que orientará a delimitação da área para a realização do inquérito canino. Cabe salientar que nenhuma ação de controle químico deverá ser realizada. 498 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral Vigilância e controle em áreas com transmissão esporádica de leishmaniose visceral Áreas com transmissão esporádica Ações referentes a casos humanos Notificação e investigação Implementar as ações para diagnóstico, tratamento e acompanhamento dos pacientes Busca ativa de casos suspeitos Monitorar e investigar óbitos de LV Ações referentes ao reservatório canino Ações referentes ao vetor Realizar levantamento entomológico no local de transmissão Desenvolver atividades de educação em saúde Saneamento ambiental Busca ativa de cães com suspeita clínica Realizar sorologia Sorologia positiva Sorologia negativa Eutanásia Vigilância e monitoramento Inquérito censitário canino anual no local de transmissão Cães com sorologia positiva Cães com sorologia negativa Eutanásia Vigilância e monitoramento Controle da população canina errante 6 Observação: a confirmação do exame parasitológico canino não será obrigatória em áreas com transmissão esporádica, moderada ou intensa. Áreas com transmissão moderada/intensa de leishmaniose visceral Ações específicas referentes ao vetor – nos municípios com transmissão moderada/ intensa, a presença do vetor e a dispersão da população do vetor no município devem ser conhecidas, o que permite melhor direcionamento das ações de controle (vetor e reservatório). Caso estas informações não sejam possíveis, é indicado priorizar o levantamento entomológico. Destaque-se que o controle químico nestas áreas deverá ser programado para o período propício do aumento do vetor. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS L 499 Leishmaniose Visceral Vigilância e controle em áreas com transmissão moderada e intensa de leishmaniose visceral Áreas com transmissão moderada e intensa Ações referentes a casos humanos Notificação e investigação Implementar as ações para diagnóstico, tratamento e acompanhamento dos pacientes Busca ativa de casos suspeitos Ações referentes ao vetor Realizar levantamento entomológico no local de transmissão Ações referentes ao reservatório canino Indicação de controle químico na área de transmissão Saneamento ambiental Área sem casos humanos: realizar inquérito amostral canino anualmente Área com casos humanos: inquérito censitário anual Eutanásia de cães positivos Controle da população canina errante Vigilância e monitoramento Prevalência canina >2% Monitorar e investigar óbitos de leishmaniose visceral Desenvolver atividades de educação em saúde Eutanásia de cães positivos Prevalência canina <2% Vigilância e monitoramento Manter vigilância Inquérito canino censitário e anualmente Eutanásia de cães positivos Eutanásia de cães positivos Observação: a confirmação do exame parasitológico canino não será obrigatória em áreas com transmissão esporádica, moderada ou intensa. Áreas em situação de surto de leishmaniose visceral Vigilância e controle em áreas com surto de leishmaniose visceral Áreas em situação de surto Municípios com transmissão conhecida Seguir as orientações previstas para as áreas com transmissão moderada/intensa, acrescendo um ciclo de borrifação imediato na área do surto Municípios com transmissão recente Seguir as orientações previstas para as áreas com registro do primeiro caso de LV humana, acrescendo um ciclo de borrifação imediato na área do surto Observação: a confirmação do exame parasitológico canino não será obrigatória em áreas com transmissão esporádica, moderada ou intensa. 500 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leishmaniose Visceral Anexo 1 Coleta e conservação de material para diagnóstico da leishmaniose visceral humana e canina Tipo de diagnóstico Tipo de material Sorológico (humano ou canino) Parasitológico Quantidade 5-10ml Sangue (mínimo 2ml de soro) Aspirado de medula, linfonodo ou baço Método Recipiente Tubo de vidro ou Imunofluoresde plástico estéril cência indireta/ e com tampa (meIFI ou Elisa lhor se Ependorf®) Esfregaço fino - Transporte Sangue total 2ºC a 8ºC Gelo seco ou reciclável. Soro -20ºC Nitrogênio líquido Duas lâminas para esfregaço Lâminas fixadas e coradas pelos métodos de Giemsa ou Wright, Leishman, Panóptico Após a secagem, anexar e embrulhar a lâmina junto com o papel identificatório Tubo de vidro ou de plástico estéril e com tampa Meio de NNN a 24-26ºC Caixa para transporte de material biológico Aspirado de medula, linfonodo ou baço ou biópsia de fígado Armazenamento/ conservação 6 Observação: para inquéritos sorológicos caninos pode ainda ser utilizada, em situações excepcionais, a coleta de sangue em papel de filtro (eluato) desde que seja criteriosamente adotada a metodologia abaixo descrita. É fundamental que cada amostra seja identificada, para evitar sua troca acidental. Material • Microlanceta descartável • Papel de filtro tipo qualitativo, 80 gramas • Papel celofane hidrófobo • Algodão • Solução antisséptica (álcool a 70%, álcool iodado, etc.) L Método Colher a amostra de sangue através de punção da veia marginal auricular do cão, utilizando microlancetas descartáveis e transferindo o material obtido por capilaridade para lâminas de papel de filtro. A área embebida deve ser de aproximadamente 3×3 centímetros com distribuição homogênea no papel. Após secarem, cada folha de papel de filtro deve ser separada por lâminas de papel celofane, para evitar a contaminação das amostras de sangue que devem estar devidamente identificadas. Após a coleta do material descrito, o mesmo deve ser embalado em saco plástico e conservado à temperatura ambiente durante uma semana ou refrigerado a 4°C e enviado para o laboratório central do estado ou município. Todo material enviado para o laboratório deve estar devidamente identificado, constando os seguintes dados: identificação do animal (nome, idade e sexo), nome e endereço completo do proprietário e identificação do responsável pela colheita do material. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 501 Leptospirose LEPTOSPIROSE CID 10: A27 Características clínicas e epidemiológicas Descrição É uma doença infecciosa febril de início abrupto, cujo espectro pode variar desde um processo inaparente até formas graves. Trata-se de zoonose de grande importância social e econômica por apresentar elevada incidência em determinadas áreas, alto custo hospitalar e perdas de dias de trabalho, bem como por sua letalidade, que pode chegar a até 40% dos casos mais graves. Sua ocorrência está relacionada às precárias condições de infra-estrutura sanitária e alta infestação de roedores infectados. As inundações propiciam a disseminação e a persistência do agente causal no ambiente, facilitando a eclosão de surtos. Sinonímia Doença de Weil, síndrome de Weil, febre dos pântanos, febre dos arrozais, febre outonal, doença dos porqueiros, tifo canino e outras. Atualmente, evita-se a utilização desses termos, pois são potencialmente passíveis de confusão. Agente etiológico Bactéria helicoidal (espiroqueta) aeróbica obrigatória do gênero Leptospira, do qual se conhecem atualmente sete espécies patogênicas, sendo a mais importante a L. interrogans. A unidade taxonômica básica é o sorovar (sorotipo). Mais de 200 sorovares já foram identificados e cada um tem o(s) seu(s) hospedeiro(s) preferencial(ais), ainda que uma espécie animal possa albergar um ou mais sorovares. Qualquer sorovar pode determinar as diversas formas de apresentação clínica no homem; em nosso meio, os sorovares Icterohaemorrhagiae e Copenhagen freqüentemente estão relacionados aos casos mais graves. Dentre os fatores ligados ao agente etiológico, favorecendo a persistência dos focos de leptospirose, especial destaque deve ser dado ao elevado grau de variação antigênica, à capacidade de sobrevivência no meio ambiente (até 180 dias) e à ampla variedade de animais susceptíveis que podem hospedar o microrganismo. Reservatórios Os animais sinantrópicos, domésticos e selvagens são os reservatórios essenciais para a persistência dos focos da infecção. Os seres humanos são apenas hospedeiros acidentais e terminais dentro da cadeia de transmissão. O principal reservatório é constituído pelos roedores sinantrópicos (domésticos) das espécies Rattus norvegicus (ratazana ou rato de esgoto), Rattus rattus (rato de telhado ou rato preto) e Mus musculus (camundongo ou catita). Ao se infectarem, não desenvolvem a doença e tornam-se portadores, albergando a leptospira nos rins e eliminando-a viva no 502 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leptospirose meio ambiente, contaminando, desta forma, água, solo e alimentos. O Rattus norvegicus é o principal portador da Leptospira icterohaemorraghiae, uma das mais patogênicas para o homem. Outros reservatórios de importância são caninos, suínos, bovinos, eqüinos, ovinos e caprinos. Modo de transmissão A infecção humana resulta da exposição direta ou indireta à urina de animais infectados. A penetração do microrganismo dá-se através da pele lesada ou das mucosas da boca, narinas e olhos. Pode também ocorrer através da pele íntegra quando imersa em água por longo tempo. O contato com água e lama contaminadas demonstra a importância do elo hídrico na transmissão da doença ao homem. Outras modalidades de transmissão relatadas, porém com pouca freqüência: contato com sangue, tecidos e órgãos de animais infectados, transmissão acidental em laboratórios e ingestão de água ou alimentos contaminados. 6 Período de incubação Varia de 1 a 30 dias (média entre 7 e 14 dias). Período de transmissibilidade Os animais infectados podem eliminar a leptospira através da urina durante meses, anos ou por toda a vida, segundo a espécie animal e o sorovar envolvido. A transmissão inter-humana é muito rara, podendo ocorrer pelo contato com urina, sangue, secreções e tecidos de pessoas infectadas. Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade no homem é geral. A imunidade adquirida pós-infecção é sorovarespecífica, podendo um mesmo indivíduo apresentar a doença mais de uma vez, sendo que o agente causal de cada episódio pertencerá a um sorovar diferente do(s) anterior(es). L Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas A leptospirose humana apresenta manifestações clínicas muito variáveis, com diferentes graus de severidade. A infecção pode ser assintomática, subclínica ou ocasionar quadros clínicos leves, moderados ou graves com alta letalidade. Clinicamente, a leptospirose apresenta-se sob duas formas: Forma anictérica (leve, moderada ou grave) Responsável por 90% a 95% dos casos, mas devido às dificuldades inerentes à suspeita e à confirmação, não ultrapassam 45% nos registros oficiais. A doença pode ser discreta, de início súbito com febre, cefaléia, dores musculares, anorexia, náuseas e vômitos. Tende a ser autolimitada e cura em poucos dias sem deixar Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 503 Leptospirose seqüelas. É freqüentemente rotulada como “síndrome gripal”, “virose” ou outras doenças que ocorrem na mesma época, como dengue ou influenza. Uma história de exposição direta ou indireta a coleções hídricas (incluídas água ou lama de enchentes) ou a outros materiais passíveis de contaminação por leptospiras pode servir como alerta para o médico suspeitar desse diagnóstico. Infecção mais grave pode ocorrer, apresentando-se classicamente como uma doença febril bifásica. A primeira fase, “septicêmica” ou “leptospirêmica”, inicia-se abruptamente com febre alta, calafrios, cefaléia intensa, dores musculares e prostração. As mialgias envolvem caracteristicamente os músculos das panturrilhas, mas podem afetar também coxas, regiões paravertebrais e abdome, podendo até mesmo simular um abdome agudo cirúrgico. Podem ocorrer anorexia, náuseas, vômitos, obstipação ou diarréia, artralgias, hiperemia ou hemorragia conjuntival, fotofobia e dor ocular, bem como hepatomegalia e, mais raramente, hemorragia digestiva (melena, enterorragia), esplenomegalia e pancreatite. Podem ser também observados: epistaxe, dor torácica, tosse seca ou com expectoração hemoptóica, dispnéia e cianose. A hemoptise franca denota extrema gravidade e pode ocorrer de forma súbita, levando ao óbito por asfixia. Distúrbios neurológicos como confusão, delírio e alucinações, sinais de irritação meníngea e outros podem estar presentes. A “fase septicêmica” dura de 4 a 7 dias, após a qual o paciente pode curar-se ou evoluir com recrudescimento da febre e sintomas gerais, com ou sem agravamento. As manifestações clínicas da “fase imune” iniciam-se geralmente na segunda semana da doença e desaparecem em 1 a 3 semanas. Nesta fase, as manifestações neurológicas freqüentemente apresentam um quadro de meningite, com cefaléia intensa, vômitos e sinais de irritação meníngea. Menos freqüentemente ocorrem encefalite, paralisias focais, espasticidade, nistagmo, convulsões, distúrbios visuais de origem central, neurite periférica, paralisia de nervos cranianos, radiculite, síndrome de Guillain-Barré e mielite. Podem ocorrer acidentes vasculares cerebrais hemorrágicos ou meníngeos, com quadros graves de hipertensão intracraniana e coma. As manifestações mais comuns do envolvimento cardíaco (miocardite) são alterações eletrocardiográficas e arritmias. Pode ocorrer comprometimento ocular com hiperemia ou hemorragia das conjuntivas, hemorragia intra-ocular e, mais tardiamente, uveíte. Alguns pacientes apresentam alterações do volume e do sedimento urinário, porém a insuficiência renal aguda é rara na leptospirose anictérica. As lesões cutâneas são pouco freqüentes, ainda que bastante variadas: exantemas maculares, maculopapulares, eritematosos, urticariformes, petequiais ou hemorrágicos. Forma ictérica (moderada ou grave) Em alguns pacientes a “fase septicêmica” evolui como uma doença ictérica grave com disfunção renal, fenômenos hemorrágicos, alterações hemodinâmicas, cardíacas, pulmonares e de consciência (doença de Weil), com taxas de letalidade entre 10% e 40%. O curso bifásico é raro e os sintomas e sinais que precedem a icterícia são mais intensos, destacando-se as mialgias, sobretudo nas panturrilhas. A icterícia, de tonalidade alaranjada (icterí- 504 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leptospirose cia rubínica), bastante intensa e característica, tem início entre o 3º e 7º dia da doença. A disfunção hepática é associada a maior incidência de complicações e a maior mortalidade, embora a insuficiência hepática não constitua importante causa de morte, diferentemente do que ocorre com a febre amarela. A insuficiência renal aguda (IRA) e a desidratação acometem na maioria dos pacientes. A forma oligúrica é menos freqüente que a forma não-oligúrica, mas está associada a pior prognóstico. Diferentemente de outras formas de IRA, os níveis de potássio plasmático estão normais ou diminuídos, raramente elevados. Os fenômenos hemorrágicos são freqüentes, podendo ocorrer na pele, nas mucosas ou nos órgãos internos, sob a forma de petéquias, equimoses e sangramento nos locais de venopunção, e também em qualquer estrutura orgânica, inclusive no sistema nervoso central. As hemorragias gastrointestinais e pulmonares são os principais mecanismos implicados com o óbito dos pacientes. O envolvimento cardíaco mais comum é a miocardite, com alterações eletrocardiográficas, arritmias e insuficiência cardíaca ou choque cardiogênico. Ao exame do abdome, com freqüência há dor à palpação; constata-se hepatomegalia em aproximadamente 70% dos casos. A esplenomegalia é rara. 6 Nos últimos anos, têm sido descritos casos da forma pulmonar grave da leptospirose, com quadros respiratórios evoluindo para insuficiência respiratória aguda, com hemorragia pulmonar maciça ou síndrome de angústia respiratória do adulto. Muitas vezes precede o quadro de icterícia e insuficiência renal. O óbito pode ocorrer nas primeiras 24 horas de internação. L Convalescença e seqüelas Atrofia muscular e anemia são freqüentemente observadas por ocasião da alta do paciente. A convalescença dura de 1 a 2 meses, período no qual podem persistir a febre, a cefaléia, as mialgias e mal-estar geral por alguns dias. A leptospirúria pode continuar por uma semana ou eventualmente até vários meses após o desaparecimento dos sintomas. Os níveis de anticorpos, detectados pelos testes sorológicos, diminuem progressivamente mas em alguns casos podem permanecer elevados por vários meses, fato que não deve ser interpretado como uma infecção prolongada, situação não descrita para a leptospirose humana. Diagnóstico diferencial Forma anictérica – “virose”, dengue, influenza, hantavirose, arboviroses, apendicite aguda, sepse, febre tifóide, pneumonias da comunidade, malária, pielonefrite aguda, riquetsioses, toxoplasmose, meningites e outras. Forma ictérica – sepse com icterícia, hepatites virais agudas, febre tifóide com icterícia, febre amarela, malária grave (principalmente por P. falciparum), riquetsioses, colangite, colecistite aguda, coledocolitíase, síndrome hemolítico-urêmico grave com icterícia, síndrome hepatorrenal, esteatose aguda da gravidez e outras. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 505 Leptospirose Diagnóstico laboratorial Exames específicos O método laboratorial de escolha depende da fase evolutiva em que se encontra o paciente. Na fase aguda ou septicêmica, durante o período febril, as leptospiras podem ser visualizadas no sangue através de exame direto, de cultura em meios apropriados ou a partir de inoculação em animais de laboratório. A cultura somente se finaliza (positiva ou negativa) após algumas semanas, o que garante apenas um diagnóstico retrospectivo. Na fase imune, as leptospiras podem ser encontradas na urina, cultivadas ou inoculadas. Pelas dificuldades inerentes à realização dos exames anteriormente citados, os métodos sorológicos são consagradamente eleitos para o diagnóstico da leptospirose. Os mais utilizados em nosso meio são o teste Elisa-IgM, a macroaglutinação e a microaglutinação. Vide normas de coleta e interpretação dos resultados no Anexo I. Exames inespecíficos São relevantes para o diagnóstico e acompanhamento clínico da leptospirose: hemograma, coagulograma, transaminases, bilirrubinas, uréia, creatinina e eletrólitos, gasometria, elementos anormais e sedimentos no exame sumário de urina, raios X de tórax e eletrocardiograma. As alterações mais comuns são: • leucocitose, neutrofilia e desvio para a esquerda; • anemia hipocrômica; • aumento da velocidade de hemossedimentação (VHS); • plaquetopenia; • elevação das bilirrubinas, principalmente da fração direta que pode atingir com freqüência níveis elevados acima de 15mg/dl; • transaminases normais ou com aumentos de 3 a 5 vezes o valor da referência (geralmente não ultrapassam 500 UI/dl), estando a TGO (AST) usualmente mais elevada que a TGP (ALT); • fosfatase alcalina e gama glutamiltransferase (Gama GT) elevadas; • atividade de protrombina diminuída ou tempo de protrombina aumentado; • potássio sérico normal ou abaixo do normal, mesmo na vigência de insuficiência renal aguda; • uréia e creatinina elevadas; • baixa densidade urinária, proteinúria, hematúria microscópica e leucocitúria são achados freqüentes no exame sumário de urina; • líquor com xantocromia (nos casos ictéricos), pleocitose moderada (abaixo de 1 mil células/mm3) linfomonocitária ou neutrofílica, comum na segunda semana da doença, mesmo na ausência clínica da evidência de envolvimento meníngeo. Pode haver predomínio de neutrófilos, gerando confusão com meningite bacteriana inespecífica; • CK (creatinoquinase) e fração MB (CK-MB) poderão estar elevadas; • gasometria arterial mostrando acidose metabólica e hipoxemia. 506 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leptospirose Tratamento Antibioticoterapia Publicações anteriores têm enfatizado seu efeito benéfico quando iniciada até o 5º dia do início dos sintomas; porém, estudos mais recentes sugerem sua eficácia, mesmo quando iniciada mais tarde, no curso dos casos graves. A droga de escolha é a penicilina G cristalina (adultos: de 6 a 12 milhões de unidades/dia, divididas em 4 a 6 tomadas diárias, durante 7 a 10 dias; crianças: 50 mil a 100 mil unidades/kg/dia pelo mesmo período). Como alternativas podem ser utilizadas a ampicilina (4 g/dia para adultos e 50 a 100 mg/kg/dia para crianças), a tetraciclina (2 g/dia) ou a doxiciclina (100mg de 12/12horas) por igual período. Para os pacientes alérgicos à penicilina ou que apresentem lesão renal e icterícia, sugerese o uso do cloranfenicol (2g/dia para adultos e 50 a 100 mg/kg/dia para crianças). 6 Observação: a tetraciclina e a doxiciclina são contra-indicadas em gestantes, menores de 9 anos e pacientes com insuficiência renal aguda ou insuficiência hepática. Medidas terapêuticas de suporte Constituem aspectos da maior relevância no atendimento de casos moderados e graves e devem ser iniciadas precocemente na tentativa de evitar complicações da doença, principalmente as renais: reposição hidreletrolítica, assistência cardiorrespiratória, transfusões de sangue e derivados, nutrição enteral ou parenteral, proteção gástrica, etc. O acompanhamento do volume urinário e da função renal são fundamentais para se indicar a instalação de diálise peritoneal precoce, o que reduz o dano renal e a letalidade da doença. L Aspectos epidemiológicos A leptospirose apresenta distribuição universal. No Brasil, é uma doença endêmica, tornando-se epidêmica em períodos chuvosos, principalmente nas capitais e áreas metropolitanas, devido às enchentes associadas à aglomeração populacional de baixa renda em condições inadequadas de saneamento e à alta infestação de roedores infectados. Algumas profissões facilitam o contato com as leptospiras, como trabalhadores em limpeza e desentupimento de esgotos, garis, catadores de lixo, agricultores, veterinários, tratadores de animais, pescadores, magarefes, laboratoristas, militares e bombeiros, dentre outras. Contudo, em nosso meio, a maior parte dos casos ainda ocorre entre pessoas que habitam ou trabalham em locais com más condições de saneamento e expostos à urina de roedores. Em análise realizada para o período 2001 a 2003, no Brasil, o local provável de infecção (LPI) de 55% dos casos era o domicílio; de 32%, o ambiente de trabalho e de 13%, as situações de lazer. Ao se observar apenas o meio rural/silvestre como LPI, observou-se que 54% dos casos ocorreram no ambiente de trabalho, 28% no domicílio e 17% em situações de lazer. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 507 Leptospirose No período de 1999 a 2003, foram confirmados 14.334 casos de leptospirose, com uma média anual de 2.866 casos, variando entre 2.415 (2003) e 3.532 casos (2001). Nesse mesmo período foram informados 1.683 óbitos, numa média de 336 óbitos/ano. A taxa de letalidade foi de 12% e o coeficiente médio de incidência de 1,7/100 mil hab. Entre os casos notificados, as maiores freqüências têm sido encontradas entre indivíduos do sexo masculino (81%) e na faixa etária de 20 a 49 anos, ainda que não exista uma predisposição de gênero ou idade para contrair a infecção. Do total de casos confirmados, 77% foram hospitalizados, o que claramente demonstra que o sistema de vigilância sofre um importante grau de subnotificação, captando principalmente os casos moderados e graves. A média de permanência no hospital foi de 7,5 dias. Casos confirmados e coeficientes de incidência de leptospirose. Brasil, 1991-2003 4 6.000 Número de casos 3 4.000 2,5 3.000 2 1,5 2.000 CI p / 100 mil hab. 3,5 5.000 1 1.000 0,5 0 0 1991 Casos C.I. 3.014 2 1992 1993 1994 1995 1996 2.094 1.728 2.893 4.293 5.579 1,4 1,1 1,8 2,7 3,5 1997 1998 3.298 3.449 2 2,1 1999 2.436 2 2000 3.493 2 2001 3.532 2 2002 2003 2.455 2.415 1,4 1,4 Fonte: SVS/MS Os sintomas mais freqüentemente relatados foram febre (92%), mialgia (87%), cefaléia (82%), icterícia (73%), náusea ou vômitos (70%), alterações respiratórias (37%), diarréia (34%), conjuntivite (26%), insuficiência renal (27%), hemorragia (17%), alterações cardíacas (11%) e meningismo (8,5%). As situações mais freqüentes de exposição foram aquelas relacionadas à ocorrência de enchentes, seguidas por contato com córregos ou cursos d’água, lavoura, lixo, esgoto e, em menor escala, com limpeza de caixas d’água e outras situações. Vigilância epidemiológica Objetivos • Monitorar a ocorrência de casos e surtos e determinar a sua distribuição espacial e temporal. 508 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leptospirose • Reduzir a letalidade da doença, mediante a garantia de diagnóstico e tratamento precoce e adequado. • Identificar os sorovares circulantes em cada área. • Direcionar as medidas preventivas e de controle destinadas à população, ao meio ambiente e aos reservatórios animais. Definição de caso Suspeito • Indivíduo com febre de início súbito, mialgias, cefaléia, mal-estar e/ou prostração, associados a um ou mais dos seguintes sinais e/ou sintomas: sufusão conjuntival ou conjuntivite, náuseas e/ou vômitos, calafrios, alterações do volume urinário, icterícia, fenômeno hemorrágico e/ou alterações hepáticas, renais e vasculares compatíveis com leptospirose ictérica (síndrome de Weil) ou anictérica grave. • Indivíduo que apresente sinais e sintomas de processo infeccioso inespecífico com antecedentes epidemiológicos sugestivos nos últimos 30 dias anteriores à data de início dos primeiros sintomas. 6 São considerados como antecedentes epidemiológicos sugestivos: • exposição a enchentes, lama ou coleções hídricas potencialmente contaminadas; • exposição a esgoto e fossas; • atividades que envolvam risco ocupacional, como coleta de lixo, limpeza de córregos, trabalho em água ou esgoto, manejo de animais e agricultura em áreas alagadas, dentre outras; • presença de animais infectados (roedores, cães, bovinos, etc.) nos locais freqüentados pelo paciente. L Confirmado Critério clínico-laboratorial – presença de sinais e sintomas clínicos compatíveis, associados a um ou mais dos seguintes resultados de exames laboratoriais: • teste Elisa-IgM reagente (ou reação de macroaglutinação reagente, se disponível); • soroconversão na reação de microaglutinação, entendida como uma primeira amostra (fase aguda) não-reagente e uma segunda amostra (14-21 dias após, máximo até 60 dias) com título maior ou igual a 1:200; • aumento de 4 vezes ou mais nos títulos de microaglutinação entre duas amostras sangüíneas coletadas com um intervalo de 14 a 21 dias (máximo de 60 dias); • quando não houver disponibilidade de duas ou mais amostras, um título maior ou igual a 1:800 na microaglutinação confirma o diagnóstico; • isolamento da Leptospira (em sangue, líquor, urina ou tecidos) ou detecção de DNA de leptospira patogênica por PCR; • imunohistoquímica positiva para leptospirose em pacientes suspeitos que evoluíram para óbito. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 509 Leptospirose Critério clínico-epidemiológico – todo caso suspeito que apresente sinais e/ou sintomas inespecíficos associados com alterações nas funções hepáticas e/ou renais e/ou vasculares e antecedentes epidemiológicos (descritos nos critérios de definição de caso suspeito) que, por algum motivo, não tenha colhido material para exames laboratoriais específicos ou estes tenham resultado não-reagente com amostra única coletada antes do 7º dia de doença. O resultado negativo (não-reagente) de qualquer exame sorológico específico para a leptospirose (macroaglutinação, microaglutinação, Elisa-IgM, ou outros), com amostra sangüínea coletada antes do 7º dia do início dos sintomas, não descarta o caso suspeito. Outra amostra sangüínea deverá ser coletada a partir do 7º dia do início dos sintomas, para auxiliar na interpretação do diagnóstico, conforme referido anteriormente (lembrar que o pico de produção de anticorpos ocorre a partir do 14º dia do início dos sintomas). Todo caso suspeito com o mesmo vínculo epidemiológico (mesmos fatores de risco) de um caso já confirmado por critério clínico-laboratorial que, por algum motivo, não tenha colhido material para exames laboratoriais específicos ou estes tenham resultado nãoreagente com amostra única coletada antes do 7º dia de doença. Descartado • Teste Elisa-IgM não-reagente, em amostra sangüínea coletada a partir do 7º dia de início dos sintomas. • Reação de macroaglutinação não-reagente, em amostra sangüínea coletada a partir do 7º dia de início dos sintomas. • Duas reações de microaglutinação não-reagentes (ou reagentes sem apresentar soroconversão nem aumento de 4 vezes ou mais nos títulos), com amostras sangüíneas coletadas a partir do primeiro atendimento do paciente e com intervalo de 2 a 3 semanas entre elas. Notificação A leptospirose é uma doença de notificação compulsória no Brasil. Tanto a ocorrência de casos suspeitos isolados como a de surtos devem ser notificadas, o mais rapidamente possível, para o desencadeamento das ações de vigilância epidemiológica e controle. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente Hospitalização imediata dos casos graves, visando evitar complicações e diminuir a letalidade. Nos casos leves, o atendimento é ambulatorial. Qualidade da assistência Os casos deverão ser atendidos em unidade de saúde com capacidade para prestar atendimento adequado e oportuno. Aqueles que apresentarem complicações, principal- 510 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leptospirose mente metabólicas, renais, respiratórias e hemorrágicas, deverão ser encaminhados para internação em hospitais de maior complexidade, que disponham de capacidade para realizar procedimentos de diálise e cuidados de terapia intensiva, se necessários. Proteção individual A transmissão pessoa a pessoa é rara e sem importância epidemiológica. Em geral, adotam-se medidas de precaução universal no manejo dos casos suspeitos e confirmados. O destino adequado das excretas evitará o contato da urina de doentes com pessoas susceptíveis. Confirmação diagnóstica Coletar material para diagnóstico laboratorial específico de todos os casos suspeitos, sempre que possível, de acordo com as orientações do Anexo 1. Acompanhar os resultados dos exames inespecíficos que auxiliam no esclarecimento do diagnóstico. 6 Proteção da população Orientar e adotar as medidas de prevenção da doença, particularmente antes e durante o período das grandes chuvas. Alertar a população para que realize as medidas de desinfecção de domicílios após as enchentes e evite entrar ou permanecer desnecessariamente em áreas alagadas ou enlameadas sem a devida proteção individual. Descartar os alimentos que entraram em contato com águas contaminadas, bem como verificar se o tratamento da água de uso doméstico está adequado. Medidas de anti-ratização são indicadas, principalmente em áreas endêmicas sujeitas a inundações. Ações continuadas de informação, comunicação e educação em saúde deverão ser empreendidas no sentido de repassar à população informações relativas às formas de transmissão, reservatórios animais envolvidos e situações de risco. L Investigação A investigação epidemiológica de cada caso suspeito e/ou confirmado deverá ser realizada com base no preenchimento da ficha específica de investigação, visando determinar a forma e local provável de infecção (LPI), o que irá orientar a adoção de medidas adequadas de controle. Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente Preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica do Sinan relativos aos dados gerais, dados do caso e de residência do paciente. Coleta de dados epidemiológicos, clínicos e laboratoriais Coletar dados referentes aos antecedentes epidemiológicos, com especial atenção para a ocupação e situação de risco ocorrida nos 30 dias que antecederam os primeiros sintomas Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 511 Leptospirose do paciente, registrando a data e endereço do local provável de infecção (LPI) e a ocorrência de casos anteriores de leptospirose humana ou animal no mesmo. Registrar a data do atendimento e os sinais e sintomas apresentados pelo paciente desde o início do quadro clínico, a ocorrência de hospitalização, datas de internação e alta e o endereço do hospital. Levantar dados referentes à coleta e encaminhamento de amostra(s) para diagnóstico laboratorial, técnicas utilizadas (Elisa, microaglutinação, etc.), datas de coleta e respectivos resultados. Os exames inespecíficos (níveis de uréia, creatinina, bilirrubinas, transaminases, plaquetas e potássio) poderão ser sugestivos para confirmação ou descarte do caso, na dependência da evolução clínica e dos exames sorológicos específicos. Para confirmar a suspeita diagnóstica – seguir os critérios de definição e de confirmação de casos. Para identificação da área de risco – determinar forma e local provável de infecção (LPI), sendo importante pesquisar: • contato com água, solo ou alimentos que possam estar contaminados pela urina de roedores infectados; • contato direto com roedores ou outros reservatórios animais; • condições propícias à proliferação ou presença de roedores nos locais de trabalho ou moradia; • ocorrência de enchentes, níveis de precipitações pluviométricas, atividades de lazer em áreas potencialmente contaminadas, dentre outras. O mapeamento de todos os casos deverá ser feito para se conhecer a distribuição espacial da doença, possibilitando a identificação de áreas de aglomeração de casos humanos. Para determinação da extensão da área de risco – as áreas de risco são definidas após o mapeamento dos locais prováveis de infecção de cada caso, associando-as: • às áreas com antecedentes de ocorrência da doença em humanos e/ou animais; • aos fatores ambientais predisponentes: topografia, hidrografia, temperatura, umidade, precipitações pluviométricas, pontos críticos de enchente, pH do solo, condições de saneamento básico, disposição, coleta e destino do lixo; • aos fatores socioeconômicos e culturais: classes sociais predominantes, níveis de renda, aglomerações populacionais, condições de higiene e habitação, hábitos e costumes da população, proteção aos trabalhadores sob risco; • aos níveis de infestação de roedores na área em questão. Coleta e remessa de material para exames Verificar se a equipe de assistência adotou as providências para realizar o exame específico, cujo material deve ser coletado e conservado de acordo com as orientações do Anexo 1. Por tratar-se de patologia freqüentemente confundida com outras doenças febris, ictéricas ou não, e em algumas situações ocorrerem surtos concomitantes de hepatite, dengue e outras doenças, deve-se atentar para o fato de que os exames inespecíficos são valiosos para 512 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leptospirose Roteiro de investigação epidemiológica da leptospirose Caso suspeito Investigação epidemiológica Atenção médica/ dados clínicos Caso Ambiental Coleta de dados clínicos/ epidemiológicos do paciente Identificação do local provável de infecção (LPI) e áreas de transmissão 6 Acionar medidas de controle e manejo integrado de roedores Exame laboratorial Coleta e remessa de material Anti-ratização Não Sim Diagnóstico descartado Educação em saúde Diagnóstico confirmado L Acompanhar evolução Avaliar critérios clínicoepidemiológicos Cura Descarte Desratização Óbito Confirmação Acionar medidas de controle Manejo integrado de roedores fortalecer ou afastar a suspeita diagnóstica. A unidade de atendimento deverá estar orientada para solicitar os exames inespecíficos de rotina para os casos suspeitos, bem como exames específicos para outras doenças caso o diagnóstico diferencial assim o exija. Análise dos dados A distribuição dos casos notificados e confirmados deve ser apresentada em gráficos e tabelas agregados segundo faixa etária, sexo, ocupação, data dos primeiros sintomas, fre- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 513 Leptospirose qüência e distribuição dos sinais ou sintomas, área geográfica de ocorrência, etc. Também devem ser considerados os dados referentes a hospitalizações, estimativas de incidência e de mortalidade, taxa de letalidade, etc. Percentuais e critérios de confirmação de casos devem ser explicitados. Quando possível, relacionar os sorovares infectantes de acordo com os sinais e/ou sintomas dos pacientes (gravidade) e a respectiva distribuição geográfica. A forma de contágio da doença e a evolução do evento serão úteis na determinação do perfil epidemiológico dos indivíduos afetados. A construção do diagrama de controle permite a comparação da incidência atual da doença com a de anos anteriores, evidencia mais claramente o comportamento da doença em cada área – endêmico ou epidêmico – e permite melhor direcionar as medidas de controle, bem como avaliar sua efetividade. Encerramento de casos Seguir os critérios de confirmação e descarte de casos, descritos no tópico Definição de caso. Relatórios Por tratar-se de doença endêmica, a elaboração e a divulgação de relatórios periódicos será de essencial importância para se obter um perfil epidemiológico da doença no tempo e no espaço, de modo a direcionar as medidas de prevenção e controle a médio e longo prazos. Nas situações de surtos e/ou epidemias, deverão ser elaborados relatórios parciais e finais, visando orientar as medidas imediatas e mediatas para a redução da transmissão e da morbimortalidade. Instrumentos disponíveis para controle Vários fatores interagem na ocorrência de um caso de leptospirose; portanto, as medidas de prevenção e/ou controle deverão ser direcionadas não-somente aos reservatórios como também à melhoria das condições de proteção dos trabalhadores expostos, das condições higiênico-sanitárias da população e às medidas corretivas no meio ambiente. Imunização No Brasil, não existe uma vacina disponível para uso humano contra a leptospirose. A vacinação de animais domésticos (cães, bovinos e suínos) evita que adoeçam mas não impede que se infectem. Neste caso, podem apresentar leptospirúria, tornando-se fontes de infecção, ainda que em grau mais leve e por um período menor do que ocorre com a infecção em animais não-vacinados. Controle de reservatórios A efetividade das ações de prevenção e controle voltadas aos animais (sinantrópicos, domésticos ou de criação) e a conseqüente diminuição do nível de contaminação ambiental 514 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leptospirose levarão à redução do número de casos humanos de leptospirose. As principais medidas voltadas aos reservatórios são: • controle da população de roedores ❯ anti-ratização – visa modificar as características ambientais que favorecem a penetração, instalação e livre proliferação de roedores, por meio da eliminação dos fatores que propiciem o acesso desses animais a alimento, água e abrigo; ❯ desratização – visa a eliminação direta dos roedores através de métodos mecânicos (ratoeiras) e químicos (raticidas). Estas atividades devem ser planejadas e executadas por equipes devidamente capacitadas. Os métodos biológicos (predadores) não são aplicáveis na prática; • segregação e tratamento de animais domésticos infectados e/ou doentes e proteção das áreas humanas de moradia, trabalho e lazer contra a contaminação pela urina destes animais; • imunização de animais domésticos e de produção (caninos, bovinos e suínos) através do uso de vacinas preparadas com os sorovares prevalentes na região; • cuidados com a higiene, remoção e destino adequado de excretas de animais e desinfecção permanente dos canis ou locais de criação. 6 Ações de educação em saúde • Alertar a população sobre a distribuição da doença, formas de transmissão, manifestações clínicas e medidas de prevenção. • Esclarecer sobre o problema, visando a busca conjunta de soluções, as medidas que os órgãos de saúde estão desenvolvendo, os locais para encaminhamento dos casos suspeitos, etc. • Definir formas de participação da população nas ações de controle da doença, considerando as estratégias propostas a seguir. L Estratégias de prevenção Dentre as principais medidas de prevenção e/ou controle da leptospirose, destacam-se: Relativas às fontes de infecção • Controle da população de roedores (anti-ratização e desratização); • Segregação e tratamento de animais de produção e companhia; • Vigilância epidemiológica dos doadores de sêmen animal e dos comunicantes, controle sanitário da inseminação artificial; • Cuidados com a higiene animal: remoção e destino adequado de resíduos alimentares, excretas, cadáveres e restos de animais; limpeza e desinfecção permanente dos canis ou locais de criação; • Armazenamento apropriado dos alimentos em locais inacessíveis a roedores; • Coleta, condicionamento e destino adequado do lixo, principal fonte de alimento para roedores; • Manutenção de terrenos baldios, públicos ou privados, murados e livres de mato e Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 515 Leptospirose entulhos, evitando condições à instalação de roedores. • Eliminar entulho, materiais de construção ou objetos em desuso que possam oferecer abrigo a roedores. Observação: para a viabilização das medidas de anti-ratização faz-se necessário agilizar e conscientizar a população e os órgãos competentes sobre a importância dos serviços integrados de coleta de lixo, aprimoramento do uso de aterros sanitários e limpeza pública, aperfeiçoamento da legislação sanitária e promoção do envolvimento e participação da comunidade. Relativas às vias de transmissão Cuidados com a água para consumo humano direto Deve-se garantir a utilização de água potável, filtrada, fervida ou clorada para consumo humano. Se o domicílio for abastecido por sistema público e, no ponto de consumo (torneira, jarra, pote, etc.), não for verificada a presença de cloro na quantidade recomendada (maior que 0,5 mg/l) ou se a água utilizada for proveniente de poço, cacimba, fonte, rio, riacho, açude, barreira, etc., deve-se proceder à cloração no local utilizado para armazenamento (reservatório, tanque, tonel, jarra, etc.). Indica-se o uso de hipoclorito de sódio a 2,5% ou água sanitária, numa das seguintes diluições: Volume de água Hipoclorito de sódio a 2,5% (ou água sanitária) Dosagem Medida prática 1 mil litros 100ml 2 copinhos de café (descartáveis) 200 litros 15ml 1 colher de sopa 20 litros 2ml 1 colher de chá 1 litro 0,0045ml 2 gotas Tempo de contato 30 minutos Obs.: aguardar 30 minutos para consumir Limpeza da lama residual das enchentes A lama das enchentes tem alto poder infectante e nestas ocasiões fica aderida a móveis, paredes e chão. Recomenda-se retirar essa lama (sempre se protegendo com luvas e botas de borracha) e lavar o local, desinfetando-o a seguir com solução de água sanitária (hipoclorito de sódio a 2,5%) na seguinte proporção: Para um balde de 20 litros de água: adicionar 1 copo (200 ml) de água sanitária. Limpeza de reservatórios domésticos de água (caixa d’água) Nas enchentes, o sistema doméstico de armazenamento de água pode ser contaminado, mesmo quando não diretamente atingido pela água da enchente, pois a rede de distribuição pode apresentar vazamentos que permitem a entrada de água poluída. Para limpar e desinfetar o reservatório (caixa d’água), recomenda-se: 516 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leptospirose • esvaziar a caixa d’água completamente e lavá-la esfregando bem as paredes e o fundo, retirando toda a sujeira utilizando pá, balde e panos. Não esquecer de usar botas e luvas de borracha; • após concluída a limpeza, colocar 1 litro de água sanitária (hipoclorito de sódio a 2,5%) para cada 1 mil litros de água do reservatório; • abrir a entrada (registro ou torneira) para encher a caixa com água limpa; • após 30 minutos, abrir as torneiras da casa por alguns segundos, com vistas à entrada da água clorada na tubulação doméstica; • aguardar 1 hora e 30 minutos para que ocorra a desinfecção do reservatório e das canalizações; • abrir as torneiras, podendo aproveitar a água para limpeza em geral de chão e paredes. Cuidados com os alimentos É fundamental que as ações de vigilância sanitária relativas à produção, armazenamento, transporte e conservação dos alimentos sejam continuadas. Os alimentos que entraram em contato com as águas de enchentes deverão ser descartados, pois é perigosa qualquer tentativa de reaproveitamento. O ideal, como prevenção, é armazená-los em locais elevados, acima do nível das águas. 6 Alimentos enlatados Latas amassadas, enferrujadas ou semi-abertas deverão ser inutilizadas, porém as que permanecerem em bom estado e nas quais se tenha certeza de que não houve contato das águas com os alimentos nela contidos poderão ser lavadas com solução de água sanitária na proporção de 1/100, preparada do seguinte modo: 1 litro de água sanitária para 100 litros de água; ou 1/2 litro de água sanitária para 50 litros de água; ou 1/4 litro de água sanitária para 25 litros de água. L Águas superficiais e esgotos • desassoreamento, limpeza e canalização de córregos; • emprego de técnicas de drenagem de águas livres supostamente contaminadas; • construção e manutenção permanente das galerias de águas pluviais e esgoto em áreas urbanas. Relativas ao susceptível • Medidas de proteção individual para trabalhadores ou indivíduos expostos ao risco, através do uso de equipamentos de proteção individual como luvas e botas. • Redução do risco de exposição de ferimentos às águas/lama de enchentes ou outra situação de risco. • Imunização de animais domésticos (cães, bovinos e suínos) com vacinas preparadas com sorovares prevalentes na região. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 517 Leptospirose Anexo 1 Normas para procedimentos laboratoriais Coleta e conservação de material para diagnóstico de leptospirose Tipo de diagnóstico Tipo de material Quantidade Cultura Sangue 1, 2 e 3 gotas por tubo* (total=3 tubos por paciente) Microaglutinação Soro (sem hemólise) Elisa-IgM Soro (sem hemólise) Macroaglutinação Soro (sem hemólise) 3,0ml 3,0ml 3,0ml Nº de amostras Recipiente Transporte Estocagem longo prazo 1 Fase aguda, preferencialmente antes de tratamento antibiótico. Ideal até o 7º dia do início dos sintomas Meio de cultura EMJH ou Fletcher Temperatura ambiente Não se aplica 2 Amostras pareadas nas fases aguda e convalescente: a primeira, no primeiro atendimento; a segunda, após um intervalo de 14 a 21 dias (máx. 60) Frasco adequado para congelamento (tubo de ensaio) sem anticoagulante No gelo (4oC) Congelado (-20ºC a -70ºC) 1 ou 2 Fase aguda (no primeiro atendimento); se for negativo, coletar uma segunda amostra em 5-7 dias Frasco adequado para congelamento (tubo de ensaio) sem anticoagulante No gelo (4oC) Congelado (-20ºC a -70ºC) 1 ou 2 Fase aguda (no primeiro atendimento); se for negativo, repetir em 5-7 dias Frasco adequado para congelamento (tubo de ensaio) sem anticoagulante No gelo (4oC) Congelado (-20ºC a -70ºC) Período da coleta *O sangue para o isolamento das leptospiras deverá ser semeado em três tubos contendo o meio de cultura específico. No primeiro tubo, deverá ser colocada uma gota de sangue; no segundo, duas e no terceiro, três gotas. Volumes de sangue maiores que os recomendados podem acarretar o insucesso diagnóstico. Teste de Elisa-IgM O teste imunoenzimático Elisa-IgM é um método sensível e específico, implantado desde 2003 em todos os laboratórios centrais das unidades federadas, que permite a detecção de anticorpos a partir da primeira semana da doença até 1 ou 2 meses após. Para facilidade operacional, a coleta deve ser feita a partir do 7º dia do início dos sintomas: o resultado “reagente” confirma o caso e o resultado “não-reagente” descarta o caso. No entanto, em muitas ocasiões, este teste é solicitado no primeiro atendimento ao paciente, antes de decorrido o período referido; apresentará conseqüentemente, resultado não-reagente. Por isso, aconselha-se a coleta de uma segunda amostra, apenas nestes casos, uma semana depois (ver fluxograma em seguida). 518 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Leptospirose Fluxograma para Elisa ou macroaglutinação Caso suspeito Elisa ou macro Amostra de sangue antes do 7º dia de sintomas Não-reagente Repetir com outra amostra colhida após o 7º dia Amostra de sangue após o 7º dia de sintomas Reagente Reagente Confirma o caso Não-reagente Descarta o caso 6 Reação de macroaglutinação Trata-se de um exame acessível e de fácil execução, podendo ser realizado até por pequenos laboratórios em hospitais gerais e/ou unidades de saúde. Por detectar, principalmente, anticorpos antileptospira da classe IgM, é um exame bastante útil na fase aguda da doença. O período ideal de coleta de amostra sangüínea é a partir do 7º dia de início dos sintomas. No entanto, em muitas ocasiões este teste é solicitado no primeiro atendimento ao paciente, antes de decorrido este período, apresentando conseqüentemente resultado não-reagente. Por isso, aconselha-se a coleta de uma segunda amostra, apenas nestes casos, uma semana depois (ver fluxograma anterior). L Reação de microaglutinação • A prova de aglutinação microscópica (microaglutinação) realizada a partir de antígenos vivos é considerada como o exame laboratorial “padrão-ouro” para a confirmação do diagnóstico da leptospirose. Além de detectar anticorpos específicos, é usada na identificação e classificação dos sorovares isolados e deve ser realizada em laboratórios especializados ou de referência. • Geralmente, os anticorpos começam a surgir na primeira semana da doença e alcançam títulos máximos em torno da terceira e quarta semanas. Os títulos decaem progressivamente e persistem baixos durante meses e até anos. Este fato dificulta a avaliação, no sentido de se concluir, diante de um exame reagente, se estamos diante de uma infecção em atividade ou de uma infecção passada (cicatriz sorológica). Por esta razão, recomenda-se comparar duas amostras de soro, a primeira colhida na fase aguda da doença e a segunda, duas a três semanas após. O aumento de 4 vezes ou mais (2 ou mais diluições) no título de anticorpos da 1ª para a 2ª amostra confirma o diagnóstico de infecção aguda. Se houver um resultado não-reagente Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 519 Leptospirose na primeira amostra e um resultado reagente com título maior ou igual a 1:200 na segunda amostra, teremos o que se conhece como soroconversão, o que também confirma o caso. • Deve-se ressaltar que o uso precoce de antibióticos pode interferir na resposta imunológica, alterando os títulos de anticorpos. Por esta razão, muitos pacientes não chegam a apresentar soroconversão ou o aumento de 4 vezes ou mais nos títulos entre a primeira e a segunda amostra, o que impediria a sua confirmação se não fossem realizados outros exames laboratoriais confirmatórios (isolamento, PCR e outros). • Excepcionalmente, quando se conta apenas com uma amostra sangüínea com teste de microaglutinação reagente, com título igual ou maior que 1:800, confirma-se o caso. Exames laboratoriais em caso de óbito por síndrome febril • Em caso de óbito de pacientes com síndrome febril, febril-ictérica ou febril-hemorrágica, sem diagnóstico nosológico definitivo, recomenda-se colher imediatamente após o óbito uma amostra de 10ml de sangue para sorologia de leptospirose (pesquisa de anticorpos IgM), mesmo que tenham sido colhidas amostras anteriormente. • A amostra de soro deve ser identificada, mantida refrigerada e enviada ao Lacen juntamente com a ficha de notificação devidamente preenchida. A coleta para sorologia servirá para diagnóstico laboratorial de leptospirose e outras patologias que cursem com um quadro semelhante, como hepatite viral, febre amarela, dengue, hantavirose. • Para meningococcemia e septicemia, sugere-se também colher sangue para hemocultura. • Estes procedimentos são particularmente importantes em casos de óbito de pacientes internados (UTI ou enfermaria) cuja etiologia ainda não foi esclarecida. • Recomenda-se também a coleta de tecidos, conforme descrito a seguir. Amostras de tecidos para histopatologia e imunohistoquímica após o óbito • É importante coletar amostras de tecidos (fragmentos de aproximadamente 1 cm) de diversos órgãos, incluindo o cérebro, pulmão, rim, fígado, pâncreas, coração e músculo esquelético (panturrilha). As amostras devem ser coletadas o mais rápido possível, no máximo até 8 horas após a morte. Devem ser identificadas e conservadas em solução de formalina tamponada ou embebidas em parafina e transportadas em temperatura ambiente. A ficha de notificação e um resumo dos achados macroscópicos devem ser encaminhados juntamente com as amostras. • Cada Lacen deverá orientar os serviços de vigilância e assistência de sua unidade federada acerca da melhor maneira de proceder a coleta e encaminhamento de amostras nestes casos, bem como estabelecer os fluxos com os laboratórios de referência para a realização dos exames, se necessários. • Outros exames, como o PCR, cultura e isolamento de leptospiras, podem ser realizados por laboratórios de referência (amostras criopreservadas). 520 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Malária MALÁRIA CID 10: B50 a B54 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Doença infecciosa febril aguda, causada por protozoários transmitidos por vetores. Reveste-se de importância epidemiológica por sua gravidade clínica e elevado potencial de disseminação em áreas com densidade vetorial que favoreça a transmissão. Causa consideráveis perdas sociais e econômicas na população sob risco, concentrada na região amazônica. 6 Agente etiológico Protozoários do gênero Plasmodium. No Brasil, três espécies causam a malária em seres humanos: P. vivax, P. falciparum e P. malariae. Uma quarta espécie, o P. ovale, só é encontrado em áreas restritas do continente africano. Reservatório O homem é o único reservatório com importância epidemiológica para a malária. Vetor Mosquito pertencente à ordem dos dípteros, família Culicidae, gênero Anopheles. Este gênero compreende mais de 400 espécies. Em nosso país, as principais espécies transmissoras da malária, tanto na zona rural quanto na urbana, são: Anopheles darlingi, Anopheles aquasalis, Anopheles albitarsis s.l., Anopheles cruzii e Anopheles bellator. A espécie Anopheles darlingi é o principal vetor no Brasil, destacando-se na transmissão da doença pela distribuição geográfica, antropofilia e capacidade de ser infectado por diferentes espécies de plasmódios. Popularmente, os vetores da malária são conhecidos por “carapanã”, “muriçoca”, “sovela”, “mosquito-prego” e “bicuda”. M Modo de transmissão Através da picada da fêmea do mosquito Anopheles, infectada por Plasmodium. Os vetores são mais abundantes nos horários crepusculares, ao entardecer e ao amanhecer. Todavia, são encontrados picando durante todo o período noturno, porém em menor quantidade em algumas horas da noite. Não há transmissão direta da doença de pessoa a pessoa. Pode ocorrer a transmissão induzida, por meio de transfusão de sangue contaminado ou do uso compartilhado de seringas contaminadas. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 521 Malária Período de incubação O período de incubação da malária varia de acordo com a espécie de plasmódio. Para P. falciparum, de 8 a 12 dias; P. vivax, 13 a 17; e P. malariae, 18 a 30 dias. Período de transmissibilidade O mosquito é infectado ao sugar o sangue de uma pessoa com gametócitos circulantes. Os gametócitos surgem na corrente sangüínea, em período que varia de poucas horas para o P. vivax e de 7 a 12 dias para o P. falciparum. Para malária causada por P. falciparum, o indivíduo pode ser fonte de infecção por até 1 ano; P. vivax, até 3 anos; e P. malariae, por mais de 3 anos, desde que não seja adequadamente tratado. Susceptibilidade e imunidade Em geral, toda pessoa é susceptível à infecção por malária. Os indivíduos que desenvolvem atividades em assentamentos na região amazônica e outras, relacionadas ao desmatamento, exploração mineral, extrativismo vegetal, estão mais expostos à doença. Indivíduos que tiveram vários episódios de malária podem atingir um estado de imunidade parcial, apresentando quadro subclínico ou assintomático. Em regiões não-endêmicas, as áreas de risco são determinadas pelo potencial malarígeno, relacionado com a receptividade e vulnerabilidade da área. A receptividade se mantém pela presença, densidade e longevidade do mosquito Anopheles. A vulnerabilidade é causada pela chegada de portadores de malária, oriundos da região amazônica e de outros países. Com exceção do Rio Grande do Sul e Distrito Federal, todos os estados são ainda total ou parcialmente receptivos para a malária. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas O quadro clínico típico é caracterizado por febre alta, acompanhada de calafrios, sudorese profusa e cefaléia, que ocorrem em padrões cíclicos, dependendo da espécie de plasmódio infectante. Em alguns pacientes, aparecem sintomas prodrômicos, vários dias antes dos paroxismos da doença, a exemplo de náuseas, vômitos, astenia, fadiga, anorexia. Período de infecção – a fase sintomática inicial caracteriza-se por mal-estar, cansaço e mialgia. O ataque paroxístico inicia-se com calafrio, acompanhado de tremor generalizado, com duração de 15 minutos a 1 hora. Na fase febril, a temperatura pode atingir 41oC. Esta fase pode ser acompanhada de cefaléia, náuseas e vômitos. Remissão – caracteriza-se pelo declínio da temperatura (fase de apirexia). A diminuição dos sintomas causa sensação de melhora no paciente. Esta fase pode durar 48 horas para P. falciparum e P. vivax (febre terçã) e 72 horas para P. malariae (febre quartã). Período toxêmico – se o paciente não recebe terapêutica específica, adequada e oportuna os sinais e sintomas podem evoluir para formas graves e complicadas, relacionadas à resposta imunológica do organismo, aumento da parasitemia e espécie de plasmódio. 522 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Malária Hipoglicemia, convulsões, vômitos repetidos, hiperpirexia, icterícia e distúrbios da consciência são indicadores de mau prognóstico. Esses sintomas podem preceder as formas clínicas da malária grave e complicada, tais como malária cerebral, insuficiência renal aguda, edema pulmonar agudo, disfunção hepática e hemoglobinúria. Dignóstico diferencial O diagnóstico diferencial da malária é feito com a febre tifóide, febre amarela, leptospirose, hepatite infecciosa, calazar e outros processos febris. Na fase inicial, principalmente na criança, a malária confunde-se com outras doenças infecciosas dos tratos respiratório, urinário e digestivo, quer de etiologia viral ou bacteriana. No período de febre intermitente, as principais doenças que se confundem com a malária são as infecções urinárias, tuberculose miliar, salmoneloses septicêmicas, calazar, endocardite bacteriana e as leucoses. Todas apresentam febre e, em geral, esplenomegalia. Algumas delas apresentam anemia e hepatomegalia. 6 Diagnóstico laboratorial O diagnóstico laboratorial específico de rotina é realizado mediante demonstração de parasitos, através do método da gota espessa (usado preferencialmente) ou esfregaço ou testes imunocromatográficos (testes rápidos) em áreas de baixa endemicidade ou difícil acesso. Existem ainda os testes de imunodiagnóstico, como a imunofluorescência indireta (IFI), imunoabsorção enzimática (Elisa), aglutinação, precipitação e radiodiagnóstico, não utilizados na prática diária. Dentre os métodos de imunodiagnóstico, o IFI e o Elisa são mais factíveis operacionalmente. Gota espessa – sua técnica baseia-se na visualização das formas do parasito através de microscopia óptica, após coloração pelo método de Walker ou Giemsa. Permite a diferenciação específica dos parasitos a partir da análise de sua coloração, morfologia e estágios de desenvolvimento no sangue periférico, devido à sua alta concentração. Esfregaço – é o método mais utilizado para a identificação das espécies de plasmódios, porém a sensibilidade do diagnóstico é menor que o da gota espessa, em virtude da menor concentração do sangue. A preparação é corada pelos métodos de Giemsa ou Wright. Imunotestes rápidos – nova metodologia diagnóstica representada pelos testes imunocromatográficos de diagnóstico rápido da malária. Esses testes são realizados em fitas de nitrocelulose contendo anticorpo monoclonal contra antígenos específicos do parasito. Os testes hoje disponíveis discriminam especificamente o P. falciparum e as demais espécies simultaneamente, não sendo capazes, portanto, de diagnosticar a malária mista. Pela sua praticidade e facilidade de realização, esses métodos têm sido considerados úteis principalmente em situações onde é complicado processar o exame da gota espessa, como áreas de difícil acesso ao serviço de saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS M 523 Malária Tratamento A quimioterapia da malária tem como objetivos: interromper a esquizogonia sangüínea responsável pela patogenia e manifestações clínicas da infecção; proporcionar a erradicação de formas latentes do parasito (hipnozoítas) das espécies P. vivax e P. ovale no ciclo tecidual, evitando as recaídas; e reduzir as fontes de infecção para os mosquitos, eliminando as formas sexuadas dos parasitos. O tratamento adequado e oportuno da malária previne o sofrimento humano, a ocorrência do caso grave, o óbito e elimina a fonte de infecção. As principais drogas antimaláricas são assim classificadas: • pelo grupo químico – quinolinometanóis (quinina e mefloquina); 4-aminoquinolinas (cloroquina); 8-aminoquinolinas (primaquina); peróxido de lactona sesquiterpênica (derivados da artemisinina); antibióticos (tetraciclina, doxiciclina e clindamicina); • pelo alvo de ação no ciclo biológico do parasito – esquizonticidas teciduais ou hipnozoiticidas (cura radical do P. vivax e P. ovale); esquizonticidas sangüíneos (promovem a cura clínica); gametocitocidas (bloqueiam a transmissão). A decisão de como tratar o paciente com malária deve estar de acordo com o Manual de Terapêutica da Malária e ser precedida de informações sobre os seguintes aspectos: • gravidade da doença – pela necessidade de drogas injetáveis de ação mais rápida sobre os parasitos, visando reduzir a letalidade; • espécie de plasmódio – deve ser diferenciada, em face do perfil variado de resposta do P. falciparum aos antimaláricos. Caso não seja possível determinar a espécie do parasito, deve-se optar pelo tratamento do P. falciparum, pelo risco de evolução grave, devido à alta parasitemia; • idade do paciente – pelo pior prognóstico na criança e no idoso; • história de exposição anterior à infecção – indivíduos não-imunes (primoinfectados) tendem a apresentar formas clínicas mais graves. • susceptibilidade dos parasitos aos antimaláricos convencionais – para indicar tratamento com drogas sabidamente eficazes para área de ocorrência do caso, evitando atraso no efeito terapêutico e agravamento do quadro clínico; • gravidez – a gravidez aumenta o risco de gravidade da malária e de morte. As gestantes não-imunes correm risco de aborto, parto prematuro e natimortalidade. Estão mais propensas à malária cerebral, a hipoglicemia e edema agudo do pulmão. 524 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Malária Esquemas de tratamento para a malária recomendados pelo Ministério da Saúde Nas tabelas a seguir, encontram-se os tratamentos preconizados pelo Ministério da Saúde, relativos aos esquemas. Caso surjam dúvidas, recorrer ao texto do Manual de Terapêutica da Malária, editado pelo Ministério da Saúde. Quadro 1. Equivalência entre grupo etário e peso corporal aproximado Grupos etários Peso corporal Menor de 6 meses Menos de 5kg 6 a 11 meses 5 a 9kg 1 a 2 anos 10 a 14kg 3 a 6 anos 15 a 19kg 7 a 11 anos 20 a 29kg 12 a 14 anos 30 a 49kg 15 ou mais anos 50kg ou mais 6 Observação Todos os profissionais de saúde envolvidos no tratamento da malária, desde o auxiliar de saúde da comunidade até o médico, devem orientar adequadamente, com linguagem compreensível, os pacientes quanto ao tipo de medicamento que está sendo oferecido, a forma de ingeri-lo e os respectivos horários. Muitas vezes, os pacientes sequer dispõem de relógio para verificar as horas. M O uso de expressões locais para a indicação do momento da ingestão do remédio é recomendável. As expressões de 8 em 8 horas ou de 12 em 12 horas muitas vezes não ajudam os pacientes a saber quando devem ingerir os medicamentos. Por outro lado, sempre que possível, deve-se também orientar os acompanhantes ou responsáveis, além dos próprios pacientes, que, geralmente, além de humildes, encontram-se desatentos como conseqüência da febre, das dores e do mal-estar causados pela doença. O tratamento da malária, mesmo em nível periférico, é muito complexo. Dificilmente, apenas um medicamento é utilizado. Em geral, são duas ou três diferentes drogas associadas. É muito fácil haver confusão e troca de medicamentos. Em vários lugares, as pessoas que distribuem os remédios e orientam o seu uso utilizam envelopes de cores diferentes para cada medicamento. O importante é evitar a ingestão incorreta dos remédios, pois as conseqüências podem ser graves. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 525 Malária Esquemas de primeira escolha Tabela 1. Esquema recomendado para tratamento das infecções por Plasmodium vivax com cloroquina em 3 dias e primaquina em 7 dias Drogas e doses 1o dia Grupos etários Cloroquina (comp.) 2o e 3o dias Primaquina (comp.) Adulto Cloroquina (comp.) Infantil 4o ao 7o dias Primaquina (comp.) Adulto Primaquina (comp.) Infantil Adulto Infantil Menor de 6 meses 1/4 - - 1/4 - - - - 6 a 11 meses 1/2 - 1 1/2 - 1 - 1 1 a 2 anos 1 - 1 1/2 - 1 - 1 3 a 6 anos 1 - 2 1 - 2 - 2 7 a 11 anos 2 1 1 1 e 1/2 1 1 1 1 12 a 14 anos 3 1 e 1/2 - 2 1 e 1/2 - 1 e 1/2 - 15 ou mais anos 4 2 - 3 2 - 2 - Primaquina: comprimidos para adultos com 15mg da base e para crianças com 5mg da base. A cloroquina e a primaquina deverão ser ingeridas preferencialmente às refeições. Não administrar primaquina para gestantes e crianças até 6 meses de idade. Ver Tabela 10. Se surgir icterícia, suspender a primaquina. Tabela 2. Esquema recomendado para tratamento das infecções por Plasmodium falciparum com quinina em 3 dias + doxiciclina em cinco dias + primaquina no 6o dia Drogas e doses 1º, 2º e 3º dias Grupos etários Quinina (comp.) Doxiciclina (comp.) 4º e 5º dias 6º dia Doxiciclina (comp.) Primaquina (comp.) 8 a 11 anos 1 e 1/2 1 1 1 12 a 14 anos 2 e 1/2 1 e 1/2 1 e 1/2 2 4 2 2 3 15 ou mais anos As doses diárias de quinina e doxiciclina devem ser divididas em duas tomadas, de 12/12 horas. A doxiciclina e a primaquina não devem ser dadas a gestantes. Neste caso, ver Tabela 7. Para menores de 8 anos e maiores de 6 meses de idade, ver a Tabela 6. 526 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Malária Tabela 3. Esquema recomendado para tratamento das infecções mistas por Plasmodium vivax + Plasmodium falciparum com mefloquina em dose única e primaquina em 7 dias Drogas e doses 1 dia 2o ao 7o dias o Grupos etários Primaquina (comp.) Mefloquina (comp.) dose única Adulto Menor de 6 meses Primaquina (comp.) Infantil Adulto Infantil * - - - - 6 a 11 meses 1/4 - 1 - 1 1 a 2 anos 1/2 - 1 - 1 3 a 4 anos 1 - 2 - 2 5 a 6 anos 1 e 1/4 - 2 - 2 7 a 8 anos 1 e 1/2 1 1 1 1 9 a 10 anos 2 1 1 1 1 11 a 12 anos 2 e 1/2 1 e 1/2 - 1 e 1/2 - 13 a 14 anos 3 1 e 1/2 - 1 e 1/2 - 15 ou mais 4 2 - 2 - 6 *Calcular 15 a 20mg/kg de peso. A dose diária de mefloquina pode ser dividida em duas tomadas com intervalo de até 12 horas. Não usar primaquina em gestantes e menores de 6 meses. Ver Tabela 10. Tabela 4. Esquema recomendado para tratamento das infecções por Plasmodium malariae com cloroquina em 3 dias Drogas e doses Grupos etários Cloroquina (comp.) M 1o dia 2o dia 3o dia Menor de 6 meses 1/4 1/4 1/4 6 a 11 meses 1/2 1/2 1/2 1 a 2 anos 1 1/2 1/2 3 a 6 anos 1 1 1 7 a 11 anos 2 1 e 1/2 1 e 1/2 12 a 14 anos 3 2 2 15 ou mais anos 4 3 3 Obs. Diferentemente do P. vivax, não se usa primaquina para o P. malariae. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 527 Malária Esquemas alternativos Tabela 5. Esquema alternativo para tratamento das infecções por Plasmodium vivax em crianças apresentando vômitos, com cápsulas retais de artesunato em 4 dias e primaquina em 7 dias Drogas e doses 1 , 2 e 3 dias o o 4o dia o 5o ao 11o dias Grupos etários Artesunato cápsula retal Artesunato cápsula retal 1 a 2 anos 1 3 a 5 anos 2 (A) 6 a 9 anos 3 (B) 10 a 12 anos 3 (B) Primaquina (comp.) Adulto Infantil 1 - 1 1 1/2 - 1 - 2 3 (B) 1 - Cápsula retal com 50mg. A cápsula retal pode ser conservada em temperatura ambiente. Primaquina infantil e adulto com 5mg e 15mg de primaquina-base, respectivamente. A dose de primaquina é de 0,50mg/kg de peso e deve ser ingerida, preferencialmente, às refeições. (A) Administrar uma cápsula retal de 12 em 12 horas; (B) Administrar uma cápsula retal de 8 em 8 horas. Para menores de um ano e maiores de 12 anos, ver a Tabela 1. Obs.: não usar este esquema para crianças com diarréia. Tabela 6. Esquema alternativo para tratamento das infecções por Plasmodium falciparum com mefloquina em dose diária e primaquina no 2o dia Drogas e doses 1o dia 2o dia Grupos etários Primaquina (comp.) Mefloquina (comp.) Menor de 6 meses * Adulto Infantil - - 6 a 11 meses 1/4 - 1 1 a 2 anos 1/2 1/2 - 3 a 4 anos 1 1 - 5 a 6 anos 1 e 1/4 1 - 7 a 8 anos 1 e 1/2 1 e 1/2 - 9 a 10 anos 2 1 e 1/2 - 11 a 12 anos 2 e 1/2 1 e 1/2 - 13 a 14 anos 3 2 - 15 ou mais 4 3 - *Calcular 15 a 20mg/kg de peso. A dose diária de mefloquina pode ser dada em duas tomadas, com intervalo máximo de 12 horas. Não usar mefloquina se tiver usado quinina nas últimas 24 horas. Não usar mefloquina em gestantes no primeiro trimestre. Não usar primaquina em gestantes e menores de 6 meses. 528 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Malária Tabela 7. Tratamento alternativo das infecções por Plasmodium falciparum com quinina em 7 dias Drogas e doses Grupos etários Quinina (comp.) (dose diária durante 7 dias) Menor de 6 meses 1/4 6 a 11 meses 1/2 1 a 2 anos 3/4 3 a 6 anos 1 7 a 11 anos 1 e 1/2 12 a 14 anos 2 15 anos ou mais 3 A dose diária de quinina deve ser fracionada em 3 tomadas, de 8 em 8 horas. Tabela 8. Esquema alternativo para tratamento das infecções por Plasmodium falciparum de crianças, com cápsulas retais de artesunato em 4 dias e dose única de mefloquina no 3o dia e primaquina no 5o dia 6 Drogas e doses Grupos etários 1ºoe 2ºodias 3º dia Artesunato cápsula retal 4º dia 5º dia Artesunato cápsula retal Mefloquina (comp.) Artesunato cápsula retal Primaquina (adulto) 1/2 1 a 2 anos 1 1 1/2 1 3 a 5 anos 2 (A) 2 (A) 1 1 1 6 a 9 anos 3 (B) 3 (B) 1 e 1/2 1 1 e 1/2 10 a 12 anos 3 (B) 3 (B) 2 e 1/2 3 (B) 2 A cápsula retal pode ser conservada em temperatura ambiente. A mefloquina pode ser administrada na dose de 15-20mg/kg, dividida em duas tomadas, com intervalo de 12 horas. M (A) Administrar uma cápsula retal de 12 em 12 horas; (B) Administrar uma cápsula retal de 8 em 8 horas. Para menores de um ano, ver a Tabela 7; e maiores de 12 anos, as Tabelas 2 ou 6. Obs.: não usar este esquema para crianças com diarréia. Tabela 9. Esquema alternativo para tratamento das infecções mistas por Plasmodium vivax + Plasmodium falciparum com quinina em 3 dias, doxiciclina em 5 dias e primaquina em 7 dias Drogas e doses Grupos etários 1º, 2º e 3º dias Quinina (comp.) Doxiciclina (comp.) 4º dia Doxiciclina (comp.) 5º dia Doxiciclina (comp.) 6º ao 11º dias Primaquina (comp.) (adulto) Primaquina (comp.) (adulto) 8 a 11 anos 1 e 1/2 1 1 1 1 1 12 a 14 anos 2 e 1/2 1 e 1/2 1 e 1/2 1 e 1/2 1 e 1/2 1 e 1/2 4 2 2 2 2 2 15 ou mais anos A dose diária de quinina e de doxiciclina deve ser fracionada em duas tomadas, de 12 em 12 horas. Não usar doxiciclina e primaquina em gestantes. Nesses casos, ver as Tabelas 7 e 10. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 529 Malária Tabela 10. Esquema de prevenção de recaída da malária por Plasmodium vivax, com cloroquina em dose única semanal, durante 3 meses* Peso (Kg) Idade Número de comprimidos (150mg/base) por semana 5-6 < 4 meses 1/4 7 - 14 4 meses a 2 anos 1/2 15 - 18 3 - 4 anos 3/4 19 - 35 5 - 10 anos 1 36 e mais 11 e + anos 2 *Esquema recomendado para pacientes que apresentam recaídas após tratamento correto; e para gestantes e menores de 1 ano. Só deve ser iniciado após o término do tratamento com cloroquina em três dias. Tratamento da malária grave e complicada Quadro 2. Esquema recomendado para malária grave por P. falciparum Droga Observações importantes 1. Primeira escolha Derivados da artemisinina A. Artesunato endovenoso: 2,4mg/kg como dose de ataque e 1,2mg/kg nos momentos 4, 24 e 48 horas. Diluir cada dose em 50ml de solução isotônica (de preferência glicosada a 5% ou 10%), via endovenosa em uma hora ou, B. Artemeter intramuscular: aplicar 3,2mg/kg de peso em dose única no 1o dia. Após 24 horas, aplicar 1,6mg/kg de peso a cada 24 horas, por 4 dias, totalizando 5 dias de tratamento Completar o tratamento com clindamicina, 20mg/kg de peso/dia, por 5 dias, dividida em duas tomadas (12 em 12 horas), via oral; ou doxiciclina, 3,3mg/kg de peso/dia, dividida em duas tomadas (12 em 12 horas), por 5 dias, via oral; ou mefloquina, 15-20mg/kg de peso, em dose única, via oral. Estes medicamentos devem ser administrados ao final do tratamento com os derivados da artemisinina. A doxiciclina não deve ser administrada a gestantes e menores de 8 anos. A mefloquina não deve ser usada em gestantes do primeiro trimestre 2. Segunda escolha Quinina endovenosa Infusão de 20-30mg do sal de dicloridrato de quinina/kg/ dia, diluída em solução isotônica, de preferência glicosada, a 5% ou 10% (máximo de 500ml), a cada 8 horas. Importante: esta infusão deve ser administrada lentamente, durante 4 horas Quando o paciente estiver em condições de ingestão oral e a parasitemia em declínio, utiliza-se a apresentação oral de sulfato de quinina, na mesma dosagem, a cada 8 horas. Manter o tratamento até 48 horas após a negativação da gota espessa (em geral, 7 dias) 3. Terceira escolha Quinina endovenosa associada à clindamicina endovenosa A quinina na mesma dosagem da segunda escolha até 3 dias. Simultaneamente, administrar a clindamicina, 20mg/kg de peso, dividida em 2 doses, uma a cada 12 horas, diluída em solução glicosada a 5% ou 10% (15ml/kg de peso), infundida, gota-a-gota, em uma hora, por 7 dias Esquema indicado para gestantes Observação: os derivados da artemisinina têm se mostrado muito eficazes e de ação muito rápida na redução e eliminação da parasitemia. Assim, é necessário que estes medicamentos sejam protegidos de seu uso abusivo e indicados fundamentalmente para casos graves e complicados. Em gestantes, o esquema terapêutico específico preferencial é a associação quinina e clindamicina endovenosa, pela sua eficácia e inocuidade para a mãe e para o feto. 530 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Malária Aspectos epidemiológicos A malária é reconhecida como grave problema de saúde pública no mundo, ocorrendo em mais de 40% da população de mais de 100 países e territórios. Sua estimativa é de 300 a 500 milhões de novos casos e 1 milhão de mortes por ano. No Brasil, aproximadamente 99% dos casos de malária se concentram na região amazônica, composta pelos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins. A região é considerada a área endêmica do país para malária. A maioria dos casos ocorre em áreas rurais, mas há registro da doença também em áreas urbanas. Mesmo na área endêmica, o risco de contrair a doença não é uniforme. Este risco é medido pelo índice parasitário anual (IPA), que classifica as áreas de transmissão em alto, médio e baixo risco, de acordo com o número de casos por 1 mil habitantes (Figura 1). Figura 1. Classificação das áreas de risco para malária, segundo o índice parasitário anual (IPA). Amazônia Legal, 2003 6 M Índice parasitário anual (IPA) Por 1 mil habitantes Estados da Amazônia Legal, 2003 0 (227 municípios) > 0,1 a 9,9 (Baixo risco: 391 municípios) > 10 a 49,9 (Médio risco: 111 municípios) > 49,9 (Alto risco: 76 municípios) Fonte: CGPNCM/Diges/SVS/MS Na série temporal, a partir dos anos 60 pode ser observado que até 1976 foram registrados menos de 100 mil casos de malária por ano. A partir daquele ano, houve forte tendência na elevação da doença em função da ocupação desordenada da região amazônica. Este incremento deveu-se também à implantação, na região, de projetos de colonização e mineração. Em 1983, registrou-se 300 mil casos. No período de 1984 a 1986, a malária se manteve na faixa dos 400 mil casos. De 1987 a 1995, foram registrados 500 mil casos em média. Em 1996 e 1997 houve redução importante nos registros da doença, 21,3% e 28,1%, respecti- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 531 Malária vamente, se comparados a 1995. Nos anos de 1998 e 1999, a malária aumentou de forma preocupante, atingindo seu limite, em 1999, com 637.472 casos. Em 2000, a doença volta a apresentar nova queda, para 615.245 casos. Em 2001, foi observado o maior declínio na ocorrência da malária nos últimos 40 anos. Neste ano, registrou-se 389.775 casos, o que representou 38,5% de queda em relação a 2000. Em 2003 registrou-se um aumento de 15,8% em relação ao número de casos de 2002 (348.259 casos). Até a década de 80, houve relativa equivalência entre as espécies parasitárias (P. vivax e P. falciparum). A partir de então, nota-se um distanciamento no número de registro das duas espécies, que culminou com a predominância do P. vivax, responsável por cerca de 78% dos casos notificados em 2003 (Figura 2). Figura 2. Registro de casos de malária e espécies parasitárias (P.falciparum e P. vivax). Brasil, 1961-2003 700 600 500 400 300 200 100 0 61 63 65 67 69 71 73 75 77 79 81 P. falciparum 83 85 P. vivax 87 89 91 93 95 97 99 01 03 Casos Fonte: CGPNCM/Diges/SVS/MS Na região extra-amazônica, 92% dos casos registrados são importados dos estados pertencentes à área endêmica e da África. Casos autóctones esporádicos ocorrem em áreas focais restritas desta região. Destacam-se os municípios localizados às margens do lago da usina hidrelétrica de Itaipu, áreas cobertas pela Mata Atlântica nos estados do Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Bahia; a região Centro-Oeste, nos estados de Goiás e Mato Grosso do Sul, e a região Nordeste, nos estados do Piauí, Pernambuco e Ceará. 532 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Malária Vigilância epidemiológica Objetivos • • • • • Estimar a magnitude da morbidade e mortalidade da malária. Identificar tendências, grupos e fatores de risco. Detectar surtos e epidemias. Evitar o restabelecimento da endemia, nas áreas onde a transmissão foi interrompida; Recomendar as medidas necessárias para prevenir ou controlar a ocorrência da doença. • Avaliar o impacto das medidas de controle. Definição de caso Suspeito Área endêmica – toda pessoa que apresente quadro febril, seja residente ou tenha se deslocado para área onde haja transmissão de malária no período de 8 a 30 dias anteriores à data dos primeiros sintomas. Área não-endêmica – toda pessoa procedente de área onde haja transmissão de malária, no período de 8 a 30 dias anteriores à data dos primeiros sintomas, e apresente quadro de paroxismo febril com os seguintes sintomas: calafrios, tremores generalizados, cansaço, mialgia. 6 Confirmado Critério clínico-laboratorial – toda pessoa cuja presença de parasito no sangue, sua espécie e parasitemia tenham sido identificadas através de exame laboratorial. M Descartado Caso suspeito com diagnóstico laboratorial negativo para malária. Recaída (P. vivax, P. ovale) ou recrudescência (P. falciparum, P. malariae) Lâmina de verificação de cura (LVC) – classifica-se como LVC o exame de microscopia (gota espessa e esfregaço) realizado durante e após tratamento recente, em paciente previamente diagnosticado para malária, por busca ativa ou passiva. Objetivos da realização de LVC • No que diz respeito à atenção clínica (individual) – acompanhar o paciente para verificar se o tratamento foi eficaz. • No que diz respeito à vigilância epidemiológica (coletivo) – a LVC constitui importante indicador para a detecção de deficiências dos serviços de saúde na vigilância de fontes de infecção, atenção e tratamento do doente com malária. Além disso, é útil para diferenciar uma nova infecção (caso novo) de uma recidiva (recrudescência ou recaída). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 533 Malária Critérios para a aplicação de LVC Para a Amazônia Legal – não há obrigatoriedade na realização dos controles periódicos pela LVC durante o tratamento. Desta forma, todo paciente que demandar o diagnóstico de malária deverá ser assim classificado: • resultado do exame atual = P. vivax Se o paciente realizou tratamento para P. vivax dentro dos últimos 60 dias do diagnóstico atual, deverá ser classificado como LVC. • resultado do exame atual = P. falciparum Se o paciente realizou tratamento para P. falciparum dentro dos últimos 40 dias do diagnóstico atual, deverá ser classificado como LVC. • para a região extra-amazônica – a realização dos controles periódicos pela LVC durante os primeiros 40 (P. falciparum) e 60 dias (P. vivax) após o início do tratamento deve constituir-se na conduta regular na atenção a todos os pacientes maláricos nessa região. Desta forma, a LVC deverá ser realizada: ❯ nos dias 2, 4, 7, 14, 21, 28, 40 e 60 após o início do tratamento de pacientes com malária causada pelo P. vivax; ❯ nos dias 2, 4, 7, 14, 21, 28 e 40 após o início do tratamento de pacientes com malária causada pelo P. falciparum. Em caso de lâmina positiva após os limites máximos acima especificados, o paciente deverá ser classificado como caso novo e deve-se considerar a investigação epidemiológica para confirmar ou afastar autoctonia. Caso seja afastada a possibilidade de autoctonia, classificar o exame como LVC. Notificação Todo caso de malária deve ser notificado às autoridades de saúde, tanto na área endêmica quanto na área não-endêmica. A notificação deverá ser feita através da ficha de notificação de caso de malária, conforme fluxo e modelo adiante apresentados. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência ao paciente Atendimento ambulatorial ao paciente suspeito, para coleta da amostra de sangue e exame parasitoscópico. O caso confirmado recebe tratamento em regime ambulatorial. O caso grave deverá ser hospitalizado de imediato. No paciente com resultado negativo para malária, outras doenças deverão ser pesquisadas. Qualidade da assistência Um dos indicadores para se avaliar a qualidade da assistência é o tempo verificado entre a coleta da amostra de sangue para exame e o início do tratamento, que não deve ser superior a 24 horas. Outra forma de garantir boa assistência é o monitoramento do tratamento, por meio de visitas domiciliares ou de idas do paciente à unidade de saúde, para assegurar a cura. 534 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Malária Confirmação diagnóstica Coletar material para diagnóstico laboratorial, de acordo com as orientações técnicas. Proteção da população Como medidas utilizadas para o controle da malária na população, podemos destacar: • tratamento imediato dos casos diagnosticados; • busca de casos junto aos comunicantes; • investigação epidemiológica; • orientação à população quanto à doença, uso de repelentes, mosquiteiros impregnados, roupas protetoras, telas em portas e janelas; • investigação entomológica com determinação dos hábitos hematofágicos, infectividade natural nos vetores e paridade; • borrifação residual em todas as casas da localidade acometida, com periodicidade determinada por provas biológicas para residualidade, sazonalidade do vetor ou verificação do aumento da taxa de paridade; • aplicação espacial de inseticidas nos horários de maior densidade vetorial, com intervalos de, no máximo, sete dias; ❯ aplicação de larvicidas em criadouros do vetor; e pequenas obras de saneamento, para eliminação de criadouros do vetor. 6 Investigação Após a notificação de um ou mais casos de malária, deve-se iniciar a investigação epidemiológica para permitir que as medidas de controle possam ser adotadas. O instrumento de coleta de dados é a ficha de notificação de caso de malária, que contém os elementos essenciais a serem coletados em uma investigação de rotina. Todos os seus campos devem ser criteriosamente preenchidos. As informações sobre “dados preliminares da notificação”, “dados do paciente”, “local provável da infecção” e os campos, “sintomas”, “data dos primeiros sintomas” e “paciente é gestante?” devem ser preenchidos no primeiro atendimento ao paciente. M Roteiro de investigação epidemiológica Identificação do paciente Preencher todos os campos da ficha de notificação de casos de malária relativos aos “dados preliminares da notificação”, “dados do paciente” e “paciente é gestante?” Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Anotar na ficha de notificação de caso de malária • Se o paciente está com ou sem sintomas. • Data dos primeiros sintomas. • Coletar amostra de sangue, anotando a data da notificação e, posteriormente, verificar o resultado do exame laboratorial. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 535 Malária Para identificação da área de transmissão (local provável da infecção) • Identificar se o local de residência corresponde a uma área de transmissão da malária. • Verificar se o paciente esteve em área de transmissão de malária no período de 8 a 30 dias anteriores à data dos primeiros sintomas e se os mesmos ocorreram à noite. • Verificar a principal atividade exercida pelo paciente no período de 8 a 30 dias anteriores à data dos primeiros sintomas, e se os mesmos ocorreram em horários de hábitos alimentares dos vetores. Estes procedimentos devem ser feitos mediante entrevista com o paciente, familiares, responsáveis ou pessoas da comunidade. Os dados serão anotados na ficha de notificação, permitindo identificar o local de infecção da malária. Quando o paciente residir em área endêmica, a caracterização do local de transmissão é facilitada. Entretanto, a história dos deslocamentos de todos os casos suspeitos permitirá definir, com maior certeza, o local provável de infecção. Lembrar que a identificação da área onde se deu a transmissão é de fundamental importância para nortear a extensão das medidas de controle. Para determinação da extensão da área de transmissão Em áreas rurais e urbanas – após a identificação do local provável de infecção, faz-se a busca ativa de outros casos, delimitando a área de transmissão. Uma equipe treinada em pesquisa de vetores deve ser deslocada para esta área, para a captura dos prováveis mosquitos vetores. Os espécimes coletados devem ser enviados ao laboratório de entomologia, para identificação e verificação de infectividade e paridade. Coleta e remessa de material para exames A coleta e remessa da amostra de sangue para exame de malária devem ser feitas por técnicos devidamente preparados pelo serviço de saúde, de acordo com os procedimentos abaixo: • coleta da amostra de sangue e preparação da lâmina; • identificação da lâmina; • coloração da lâmina: gota espessa, pelo método de Walker; esfregaço, pelos métodos de Giemsa ou Wright; • exame da lâmina e registro do resultado. Em locais que somente coletam amostras de sangue, após preparação e identificação da lâmina, estas devem ser enviadas ao laboratório de referência, juntamente com a ficha de notificação de caso. O resultado do exame deverá ser enviado, posteriormente, ao local da coleta. 536 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Malária Fluxograma do Sistema de Vigilância da Malária Caso suspeito Unidade de saúde, agente de saúde (coleta de sangue, início da notificação) Laboratório (exame e registro de resultado) Resultado do exame (positivo) Resultado do exame (negativo) Unidade de saúde, agente de saúde (tratamento) Unidade de saúde (notificação) Análise de informações Secretaria municipal de saúde (digitação) Análise de informações Regional estadual de saúde (consolidação dos dados) Divulgação de informações Análise de informações Secretaria estadual de saúde (consolidação dos dados) Divulgação de informações 6 Unidade de saúde (pesquisar outros agravos) Divulgação de informações M Lacen (controle de qualidade) Análise de informações CGPNCM/SVS/MS (consolidação dos dados) Divulgação de informações Análise dos dados A análise dos dados da notificação deve permitir a avaliação da magnitude, segundo as características de pessoa, tempo e lugar. O nível local deverá fazer as primeiras avaliações, de forma que se possa adotar as ações adequadas e oportunas ao controle da malária. Estas ações serão constantemente reavaliadas para medição do impacto sobre a transmissão da doença e redirecionamento, caso necessário. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 537 Malária Encerramento de casos Confirmado o diagnóstico laboratorial e iniciado o tratamento, encerra-se o caso de malária. Caso descartado – caso suspeito notificado, cujo resultado do exame laboratorial foi negativo. Relatório final Os dados da investigação deverão ser sumarizados em um relatório com as principais conclusões, das quais destacam-se: • distribuição da doença, por sexo e faixa etária; • identificação do local provável da infecção e período da ocorrência; • descrição dos fatores de risco envolvidos na transmissão; • descrição das espécies de plasmódios causadoras da doença; • análise da situação da doença, segundo os indicadores de risco de transmissão e de gravidade (IPA, percentagem de falciparum, coeficiente de internação, mortalidade e letalidade); • descrição dos criadouros potenciais de Anopheles e respectivas espécies vetoras, responsáveis pela transmissão. Instrumentos disponíveis para coleta Imunização Vários antígenos plasmodiais foram identificados nas últimas décadas. Ensaios de campo foram realizados para avaliar a eficácia de algumas vacinas, porém os resultados destes estudos ainda não são satisfatórios para a implantação da vacinação. Controle vetorial O controle vetorial da malária deve ser desenvolvido, preferencialmente, ao nível municipal, com o objetivo de reduzir o risco de transmissão, prevenindo a ocorrência de epidemias, com a conseqüente diminuição da morbimortalidade. Os principais métodos empregados são o controle dos mosquitos adultos e, quando viável, de larvas. Para o controle larvário, o ordenamento do meio por drenagem, aterro, modificação do fluxo da água e controle da vegetação aquática e limpeza das margens é o método mais indicado. Larvicidas químicos não são indicados devido ao impacto ambiental que podem causar. O controle biológico, com utilização de biolarvicidas, peixes larvófagos e outros, é indicado para pequenas coleções de água, em criadouros limitados em número e com baixo fluxo de água. Para o controle de mosquitos adultos, utiliza-se o controle químico por meio da aplicação intradomiciliar de inseticida de efeito residual e pulverização espacial de inseticida. A partir de 1999, vem ocorrendo na região amazônica a implantação do controle seletivo de vetores. Esse novo direcionamento para as ações de controle origina-se da neces- 538 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Malária sidade de implantar estratégias criativas para o enfrentamento do problema. O controle seletivo pode ser entendido como a seleção de medidas de controle mais efetivas, seguras, de baixo custo, que causem menor impacto ambiental e sejam adaptadas à realidade local. Ações de educação em saúde A população deve ser informada sobre a doença, da necessidade de se procurar a unidade de saúde aos primeiros sintomas, a importância do tratamento, os cuidados com a proteção individual e coletiva. Várias técnicas pedagógicas podem ser utilizadas, tanto para educação em saúde coletiva (teatro, música, imprensa falada, escrita, entre outras) quanto individual (cartilhas, “folders” e outros). Tendo em vista que os determinantes da ocorrência de malária não são exclusivos do setor saúde, é necessário que a comunidade esteja mobilizada para se articular junto aos demais setores envolvidos com o controle da endemia. 6 Estratégia de prevenção Além de evitar freqüentar os locais de transmissão à noite, utilizam-se como medidas de prevenção individual: uso de mosquiteiros impregnados ou não com inseticidas, roupas que protejam pernas e braços, telas em portas e janelas, uso de repelentes. As medidas de prevenção coletiva utilizadas são: drenagem, pequenas obras de saneamento para eliminação de criadouros do vetor, aterro, limpeza das margens dos criadouros, modificação do fluxo da água, controle da vegetação aquática, melhoramento da moradia e das condições de trabalho, uso racional da terra. Programas coletivos de quimioprofilaxia não têm sido adotados devido à resistência do P. falciparum à cloroquina e outros antimaláricos, à toxicidade e custo mais elevado de novas drogas. Porém, em situações especiais, como missões militares, religiosas, diplomáticas e outras, em que haja deslocamento para áreas maláricas dos continentes africano e asiático, recomenda-se entrar em contato com os setores responsáveis pelo controle da malária nas secretarias municipais e estaduais de saúde, e do Ministério da Saúde. No Brasil, a política adotada atualmente centra-se no diagnóstico e tratamento oportuno e adequado, pois existe estrutura na rede pública de saúde para diagnóstico e tratamento da malária. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS M 539 Malária 540 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Meningites MENINGITES CID 10: A17.0 (M. tuberculosa); A39.0 (M. meningocócica); A87 (M. virais); G00.0 (M. haemophilus); G00.1 (M. pneumocócica) Características clínicas e epidemiológicas Descrição O termo meningite expressa a ocorrência de um processo inflamatório das meninges, membranas que envolvem o cérebro. Agente etiológico A meningite pode ser causada por diversos agentes infecciosos, como bactérias, vírus e fungos, dentre outros, e agentes não-infecciosos (ex: traumatismo). As meningites de origem infecciosa, principalmente as causadas por bactérias e vírus, são as mais importantes do ponto de vista da saúde pública, pela magnitude de sua ocorrência e potencial de produzir surtos. Dentre elas, destacam-se: 6 Meningites bacterianas Os principais agentes bacterianos causadores de meningite são: Neisseria meningitidis (meningococo) Bactéria gram-negativa em forma de coco. Possui diversos sorogrupos, de acordo com o antígeno polissacarídeo da cápsula. Os mais freqüentes são os sorogrupos A, B, C, W135 e Y. Podem também ser classificados em sorotipos e subtipos, de acordo com os antígenos protéicos da parede externa do meningococo. M Mycobacterium tuberculosis Bacilo não formador de esporos, sem flagelos e que não produz toxinas. É uma espécie aeróbica estrita, necessitando de oxigênio para crescer e se multiplicar. Tem a forma de bastonete, medindo de 1 a 4 micra. Quando corado pelo método de Ziehl-Neelsen, fixa a fucsina, não se descorando depois de tratado pelos álcoois (álcool-ácido resistente). Haemophilus influenzae Bactéria gram-negativa que pode ser classificada, atualmente, em 6 sorotipos (a, b, c, d, e, f), a partir da diferença antigênica da cápsula polissacarídica. O Haemophilus influenzae, desprovido de cápsula, se encontra nas vias respiratórias de forma saprófita, podendo causar infecções assintomáticas ou doenças não-invasivas tais como bronquite, sinusites e otites, tanto em crianças como em adultos. A forma capsulada do Haemophilus influenzae do tipo b, antes da introdução da vacina Hib, era responsável por 95% das doenças invasivas (meningite, septicemia, pneumonia, epiglotite, celulite, artrite séptica, osteomielite e pericardite). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 541 Meningites Streptococcus pneumoniae Bactéria gram-positiva com característica morfológica esférica (cocos), disposta aos pares. É alfa-hemolítico e não-agrupável, possuindo mais de 90 sorotipos capsulares. Meningites virais São representadas principalmente pelos enterovírus. Neste grupo estão incluídas as três cepas dos poliovírus, 28 cepas de echovírus, 23 cepas do vírus coxsackie A, 6 do vírus coxsackie B e 5 outros enterovírus. O Quadro 1 apresenta a lista com os principais agentes etiológicos de meningite: Quadro 1 Bactérias Vírus Outros Neisseria meningitidis RNA Vírus Fungos Haemophilus influenzae • Enterovírus • Cryptococcus neoformans Streptococcus pneumoniae • Arbovírus • Candida albicans e C. tropicalis Mycobacterium tuberculosis • Vírus do sarampo Staphylococcus aureus • Vírus da caxumba Protozoários Pseudomona aeruginosa • Arenavírus – coriomeningite linfocitária • Toxoplasma gondii Escherichia coli • HIV 1 • Trypanosoma cruzi Klebsiella sp DNA vírus • Plasmodium sp Enterobacter sp • Adenovírus Salmonella sp • Vírus do grupo Herpes Helmintos Proteus sp • Varicela zoster • Infecção larvária da Taenia solium Listeria monocytogenes • Epstein Barr • Cysticercus cellulosae (cisticercose) Leptospira sp • Citomegalovírus Reservatório O principal reservatório é o homem. No caso da meningite tuberculosa, outros animais, em especial o gado bovino, podem ser reservatórios da doença. No entanto, o homem com a forma pulmonar bacilífera é o reservatório de maior importância epidemiológica. Modo de transmissão Em geral, a transmissão é de pessoa a pessoa, através das vias respiratórias, por gotículas e secreções da nasofaringe, havendo necessidade de contato íntimo (residentes na mesma casa, colega de dormitório ou alojamento, namorado) ou contato direto com as secreções respiratórias do paciente. A transmissão fecal-oral é de grande importância em infecções por enterovírus. A meningite tuberculosa é uma complicação da infecção tuberculosa. Os casos de tuberculose pulmonar com escarro positivo à baciloscopia constituem a principal fonte de infecção, 542 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Meningites pois eliminam grande número de bacilos, podendo provocar uma infecção maciça dos contatos, com maior probabilidade de desenvolvimento de formas graves da doença, como a meningite. Período de incubação Em geral, de 2 a 10 dias; em média, 3 a 4 dias. Pode haver alguma variação em função do agente etiológico responsável. A meningite tuberculosa, em geral, ocorre nos primeiros seis meses após a infecção. Período de transmissibilidade É variável, dependendo do agente infeccioso e da instituição do diagnóstico e tratamento precoces. No caso da doença meningocócica, a transmissibilidade persiste até que o meningococo desapareça da nasofaringe. O que geralmente ocorre após 24 horas de antibioticoterapia. Aproximadamente, 10% da população pode apresentar-se como portador assintomático. 6 Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade é geral, mas o risco de adoecer declina com a idade. O grupo de menores de 5 anos é o mais vulnerável. Os neonatos raramente adoecem, em virtude da proteção conferida pelos anticorpos maternos. Esta imunidade vai declinando até os 3 meses de idade, com o conseqüente aumento da susceptibilidade. Em relação à meningite pneumocócica, idosos e indivíduos portadores de quadros crônicos ou de doenças imunossupressoras apresentam maior risco de adoecimento. São exemplos de doenças imunossupressoras: síndrome nefrótica, asplenia anatômica ou funcional, insuficiência renal crônica, diabetes mellitus, infecção pelo HIV. Nos primeiros meses de vida os lactentes estão protegidos por anticorpos específicos da classe IgG. M Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas A meningite é uma síndrome que se caracteriza por febre, cefaléia intensa, vômitos e sinais de irritação meníngea, acompanhadas de alterações do líquido cefalorraquidiano. A irritação meníngea associa-se aos sinais descritos a seguir: Sinal de Kernig – resposta em flexão da articulação do joelho, quando a coxa é colocada em certo grau de flexão, relativamente ao tronco. Há duas formas de se pesquisar esse sinal: • paciente em decúbito dorsal: eleva-se o tronco, fletindo-o sobre a bacia; há flexão da perna sobre a coxa e desta sobre a bacia; e Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 543 Meningites • paciente em decúbito dorsal: eleva-se o membro inferior em extensão, fletindo-o sobre a bacia; após pequena angulação, há flexão da perna sobre a coxa. Essa variante chama-se, também, manobra de Laségue. Sinal de Brudzinski – flexão involuntária da perna sobre a coxa e desta sobre a bacia, ao se tentar fletir a cabeça do paciente. Crianças de até nove meses poderão não apresentar os sinais clássicos de irritação meníngea. Outros sinais e sintomas permitem a suspeita diagnóstica, tais como febre, irritabilidade ou agitação, choro persistente, grito meníngeo (criança grita ao ser manipulada, principalmente quando se flete as pernas para trocar a fralda) e recusa alimentar, acompanhada ou não de vômitos, convulsões e abaulamento da fontanela. Meningites bacterianas As infecções causadas pelas bactérias Neisseria meningitidis, Haemophilus influenzae e Streptococcus pneumoniae podem limitar-se à nasofaringe ou evoluir para septicemia ou meningite. Em geral, o quadro clínico da meningite bacteriana é grave e caracteriza-se por febre, cefaléia intensa, náusea, vômito, rigidez de nuca, prostração e confusão mental. No curso da doença podem surgir delírio e coma. Dependendo do grau de comprometimento encefálico, o paciente poderá também apresentar convulsões, paralisias, tremores, transtornos pupilares, hipoacusia, ptose palpebral e nistagmo. Casos fulminantes com sinais de choque também podem ocorrer. As principais complicações das meningites bacterianas são perda da audição, distúrbio de linguagem, retardo mental, anormalidade motora e distúrbios visuais. A presença de alguns sinais clínicos pode sugerir a suspeita etiológica. É o caso da Neisseria meningitidis que, em alguns casos, é responsável pelos quadros de meningococcemia com ou sem meningite, caracterizada por um exantema (“rash”) principalmente nas extremidades do corpo. Este exantema apresenta-se tipicamente eritematoso e macular no início da doença, evoluindo rapidamente para exantema petequial. A infecção pela Neisseria meningitidis pode provocar meningite, meningococcemia e as duas formas clínicas associadas (meningite meningocócica com meningococcemia), ao que se denomina doença meningocócica. A vigilância da doença meningocócica é de grande importância para a saúde pública em virtude de sua magnitude e gravidade, bem como do potencial de causar epidemias. Diferentemente das demais meningites, as meningites tuberculosa e fúngica podem apresentar uma evolução mais lenta, de semanas ou meses, tornando difícil o diagnóstico de suspeição. Na meningite tuberculosa não tratada, classicamente o curso da doença é dividido em três estágios: Estágio I – em geral, tem duração de 1 a 2 semanas, caracterizando-se pela inespecificidade dos sintomas, podendo ocorrer febre, mialgias, sonolência, apatia, irritabilidade, cefaléia, anorexia, vômitos, dor abdominal e mudanças súbitas do humor, sintomas comuns 544 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Meningites a qualquer processo inespecífico. Nessa fase, o paciente pode encontrar-se lúcido e o diagnóstico geralmente é estabelecido pelos achados liquóricos. Estágio II – caracteriza-se pela persistência dos sintomas sistêmicos e pelo surgimento de evidências de dano cerebral (sinais de lesão de nervos cranianos, exteriorizando-se por paresias, plegias, estrabismo, ptose palpebral, irritação meníngea e hipertensão endocraniana). Nessa fase, alguns pacientes apresentam manifestações de encefalite, com tremores periféricos, distúrbios da fala, trejeitos e movimentos atetóides. Estágio III ou período terminal – ocorre quando surge o déficit neurológico focal, opistótono, rigidez de nuca, alterações do ritmo cardíaco e da respiração e graus variados de perturbação da consciência, incluindo o coma. Em qualquer estágio clínico da doença pode-se observar convulsões focais ou generalizadas. Na maioria dos casos de meningite tuberculosa observa-se alterações radiológicas pulmonares. O teste tuberculínico pode ou não ser reator. É importante lembrar que este teste somente tem valor nos pacientes não vacinados com BCG e que poderá apresentar resultados negativos nos indivíduos anérgicos, pacientes em fase terminal, pacientes com tuberculose disseminada, na desnutrição grave e nos pacientes com Aids (síndrome da imunodeficiência adquirida). 6 Meningites virais O quadro clínico é semelhante ao das demais meningites agudas. Entretanto, ao exame físico chama a atenção o bom estado geral associado à presença de sinais de irritação meníngea. Em geral, o restabelecimento do paciente é completo mas em alguns casos pode permanecer alguma debilidade, como espasmos musculares, insônia e mudanças de personalidade. A duração do quadro é geralmente inferior a uma semana. Em geral, as meningites virais não estão associadas a complicações, a não ser que o indivíduo seja portador de alguma imunodeficiência. Quando se trata de enterovírus, é importante destacar que os sinais e sintomas inespecíficos que mais antecedem e/ou acompanham o quadro da meningite são: manifestações gastrointestinais (vômitos, anorexia e diarréia), respiratórias (tosse, faringite), mialgia e erupção cutânea. M As características do líquor nas diferentes etiologias estão descritas no Quadro 1 do Anexo 1). Diagnóstico diferencial Deve ser feito com as doenças febris hemorrágicas, tais como septicemias, febre purpúrica brasileira e ricketsioses. Com relação à meningite viral, o diagnóstico diferencial deve ser feito também com outras encefalites. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 545 Meningites Diagnóstico laboratorial O diagnóstico laboratorial das meningites é realizado através do estudo do líquido cefalorraquidiano, podendo também ser utilizada a hemocultura, o raspado de lesões petequiais, urina e fezes. A punção liquórica é freqüentemente realizada na região lombar, entre as vértebras L1 e S1, sendo mais indicados os espaços L3-L4, L4-L5 ou L5-S1. Uma das contra-indicações para a punção lombar é a existência de infecção no local da punção (piodermite). No caso de haver hipertensão endocraniana grave, é aconselhável solicitar um especialista para a retirada mais cuidadosa do líquor, ou aguardar a melhora do quadro, priorizando-se a análise de outros espécimes clínicos. O líquor normal é límpido e incolor, como “água de rocha”. O volume normal é de 80 a 150ml. O aumento de elementos figurados (células) causa turvação, cuja intensidade varia de acordo com a quantidade e o tipo desses elementos. Os principais exames para o esclarecimento diagnóstico de casos suspeitos de meningite são: • exame quimiocitológico do líquor; • bacterioscopia direta (líquor ou soro); • cultura (líquor, sangue, petéquias ou fezes); • contra-imuneletroforese cruzada (CIE) (líquor ou soro); • aglutinação pelo látex (líquor ou soro). Obs.: ver rotina laboratorial para diagnóstico das meningites (Anexos 1 e 2). Tratamento Em se tratando de meningite bacteriana, o tratamento com antibiótico deve ser instituído tão logo seja possível, preferencialmente logo após a punção lombar e a coleta de sangue para hemocultura. O uso de antibiótico deve ser associado a outros tipos de tratamento de suporte, como reposição de líquidos e cuidadosa assistência. Observações: • Nos casos de concomitância entre tuberculose meningoencefálica e em qualquer outra localização, usar o esquema II. • Nos casos de tuberculose meningoencefálica em qualquer idade, recomenda-se o uso de corticosteróides (prednisona, dexametasona ou outros) por um período de 1 a 4 meses, no início do tratamento. • Na criança, a prednisona é administrada na dose de 1 a 2mg/kg de peso corporal, até a dose máxima de 30mg/dia. No caso de se utilizar outro corticosteróide, aplicar a tabela de equivalência entre eles. • A fisioterapia na tuberculose meningoencefálica deverá ser iniciada o mais cedo possível. 546 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Meningites Recomendação de antibioticoterapia nos casos de meningite bacteriana sem etiologia determinada Faixa etária Antibiótico (1ª escolha) Antibiótico (2ª escolha) Ampicilina + aminoglicosídeo Cefalosporina 3ª geração (gentamicina ou amicacina) (cefataxina ou ceftriaxone) + ampicilina 2 meses a 5 anos Ampicilina + cloranfenicol Ceftriaxone > 5 anos Penicilina G. cristalina + ampicilina Cloranfenicol ou ceftriaxone < 2 meses Recomendação de antibioticoterapia, segundo etiologia Agentes Antibióticos Dose (EV) 300 a 500 milUI/kg/dia Neisseria meningitidis Penicilina G. cristalina até Duração 24.000.000UI/dia 200 a 400mg/kg/dia até 15g/dia Cloranfenicol ou ceftriaxone 75 a 100mg/kg/dia até 6g/dia 100mg/kg/dia até 4g/dia 6 3/3h ou 4/4h 7 dias ou ampicilina Haemophilus influenzae Intervalo 4/4h ou 6/6h 6/6 h 12/12h ou 24/24h) 7 a 10 dias 300 a 500 milUI/kg/dia até Streptococcus pneumoniae Penicilina G. cristalina* 24.000.000UI/dia 200 a 400mg/kg/dia 3/3h ou 4/4h 10 - 14 dias M 4/4h ou 6/6h até 15g/dia Staphilococcus Oxacilina ou vancomicina Ceftriaxone ou Enterobactérias sulfametaxazol + trimetropim 200mg/kg/dia até 12g/dia 4/4hs ou 6/6h 300 a 400mg/kg/dia até 2g/dia 6/6h 100mg/kg/dia até 8g/dia 12/12h ou 24/24h 100mg/kg/dia 8/8h ou 12/12h 21 dias 14 a 21 dias 100mg/kg/dia até 8g/dia Pseudomonas Ceftaridima + amicacina ou carbenicilina + amicacina 20 a 30mg/kg/dia até 1,5g/dia 8/8h 3/3h 21 dias 400 a 600mg/kg/dia até 30g/dia O tratamento da meningite tuberculosa é feito com o esquema II, padronizado pelo Programa Nacional de Controle da Tuberculose. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 547 Meningites Esquema II: 2 RHZ/7RH* − Indicado na meningite tuberculosa Peso do doente Fases do tratamento Drogas Até 20kg Mais de 20kg e até 35kg Mais de 35kg e até 45kg Mais de 45kg mg/kg/dia mg/dia mg/dia mg/dia 600 R 10 300 450 H 10 200 300 400 Z 35 1 mil 1.500 2 mil 2ª fase R 10 300 450 600 (4 meses - RH) H 10 200 300 400 1ª fase (2 meses - RHZ) *2RHZ – 1ª fase (2 meses), 7RH (7 meses). Obs: R – Rifampicina; H – Isoniazida; Z – Pirazinamida. Siglas utilizadas pela Organização Mundial da Saúde De modo geral, a antibioticoterapia é administrada por via venosa por um período de 7 a 14 dias ou até mais, dependendo da evolução clínica e do agente etiológico. A adoção imediata do tratamento adequado não impede a coleta de material para o diagnóstico etiológico, seja líquor, sangue ou outros. O prognóstico está relacionado a vários fatores, tais como agente etiológico, condições clínicas e a faixa etária do paciente. Entretanto, apesar destes fatores o prognóstico será tanto melhor na medida em que for realizado o diagnóstico e o tratamento precoces. O uso de corticóide nas situações de choque é discutível, existindo controvérsias sobre a influência favorável ao prognóstico. Há evidências de que poderia agir favoravelmente na prevenção de seqüelas nos casos de meningite originada pelo Haemophilus influenzae tipo b. Contudo, sua eficácia para meningites por outras bactérias ainda permanece em fase de estudos. A emergência de cepas bacterianas com diferentes graus de resistência antimicrobiana é o aspecto mais alarmante na terapia das doenças infecciosas. O principal fator que leva a níveis elevados de resistência é o uso empírico abusivo dos antibióticos. Nos casos de meningite viral, o tratamento antiviral específico não tem sido amplamente utilizado. Em geral, utiliza-se o tratamento de suporte, com criteriosa avaliação e acompanhamento clínicos. Tratamentos específicos somente estão preconizados para a meningite herpética (HSV 1 e 2 e VZV) com acyclovir endovenoso. Na caxumba, a globulina específica hiperimune pode diminuir a incidência de orquite, porém não melhora a síndrome neurológica. Aspectos epidemiológicos As meningites têm distribuição mundial e sua expressão epidemiológica depende de fatores como o agente infeccioso, existência de aglomerados populacionais e características socioeconômicas dos grupos populacionais e do meio ambiente (clima). 548 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Meningites De modo geral, a sazonalidade da doença caracteriza-se pelo predomínio das meningites bacterianas no inverno e das meningites virais no verão. A Neisseria meningitidis é a principal bactéria causadora de meningite. Tem distribuição mundial e potencial de ocasionar epidemias. O “cinturão africano” – região ao norte da África – é freqüentemente acometido por epidemias causadas por este agente. No Brasil, na década de 70 e 80 ocorreram epidemias em várias cidades devido aos sorogrupos A e C e, posteriormente, o B. A partir da década de 90, houve diminuição proporcional do sorogrupo B e aumento progressivo do sorogrupo C. Desde então, surtos isolados do sorogrupo C têm sido identificados e controlados no país. Até 1999, as meningites causadas pelo Haemophilus influenzae do tipo b (Hib) representavam a 2ª causa de meningite bacteriana depois da doença meningocócica. A partir do ano 2000, após a introdução da vacina conjugada contra a Hib, houve uma queda de 90% na incidência de meningites por este agente e a 2ª maior causa de meningites bacterianas passou a ser representada pelo Streptococcus pneumoniae. A meningite tuberculosa não sofre variações sazonais e sua distribuição não é igual em todos os continentes. A doença guarda íntima relação com as características socioeconômicas, principalmente naqueles países onde a população está sujeita à desnutrição e condições precárias de habitação. Com relação à faixa etária, o risco de adoecimento é elevado nos primeiros anos de vida e muito baixo na idade escolar, voltando a se elevar na adolescência e início da idade adulta. Os indivíduos HIV (+) também têm maior risco de adoecimento. A meningite viral tem distribuição universal e potencial de ocasionar epidemias, principalmente relacionadas a enterovírus. O aumento de casos também pode estar relacionado a epidemias de varicela, sarampo, caxumba e também a eventos adversos pós-vacinais. A partir de 2004, foi desencadeada a implementação do diagnóstico laboratorial de meningite viral, com o intuito de conhecer melhor os agentes virais causadores desse tipo de meningite no país. A implementação da vigilância das meningites virais, juntamente com as ações de vigilância vetorial, permitirá a detecção precoce de casos da febre do Nilo Ocidental, doença em expansão no mundo a partir dos focos existentes nos Estados Unidos. 6 M Vigilância epidemiológica O Sistema de Vigilância das Meningites (SVE/Meningites) compreende todas as atividades e atores envolvidos desde a identificação de um caso suspeito até a adoção das medidas de prevenção e controle da doença na comunidade. Desta forma, a operação deste Sistema pressupõe uma boa integração técnica entre as atividades de assistência aos casos, de identificação e estudo das características do agente etiológico e de análise epidemiológica do comportamento da doença na população. O SVE/Meningites teve sua implantação em 1975, quando tinha como objetivo principal o controle da doença meningocócica, em virtude dos surtos então verificados no país. Ao longo dos anos, foi incorporada a este Sistema a vigilância de outras meningites de interesse para a saúde pública, como a meningite Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 549 Meningites tuberculosa, a meningite por Haemophilus influenzae, a meningite por Streptococcus pneumoniae e as meningites virais. Objetivos gerais • Monitorar a situação epidemiológica das meningites no país. • Orientar a utilização das medidas de prevenção e controle disponíveis e avaliar a efetividade do uso dessas tecnologias. • Avaliar o desempenho operacional do SVE/Meningites. • Produzir e disseminar informações epidemiológicas. Objetivos específicos • Detectar surtos de doença meningocócica e de meningite viral. • Monitorar a prevalência dos sorogrupos e sorotipos de Neisseria meningitidis, dos sorotipos de Haemophilus influenzae e Streptococcus pneumoniae circulantes no país. • Monitorar o perfil da resistência bacteriana das cepas de Neisseria meningitidis, Haemophilus influenzae e Streptococcus pneumoniae. Definição de caso Suspeito • Crianças acima de 1 ano e adultos com febre, cefaléia intensa, vômitos em jato, rigidez da nuca, sinais de irritação meníngea (Kernig, Brudzinski), convulsões e/ou manchas vermelhas no corpo. • Em crianças abaixo de um ano de idade, os sintomas clássicos acima referidos podem não ser tão evidentes. É importante considerar para a suspeita diagnóstica sinais de irritabilidade, como choro persistente, e verificar a existência de abaulamento de fontanela. Confirmado • Todo caso suspeito confirmado através dos seguintes exames laboratoriais específicos: cultura, CIE e látex, ou • Todo caso suspeito de meningite com história de vínculo epidemiológico com caso confirmado laboratorialmente por um dos exames especificados acima, ou • Todo caso suspeito com exames laboratoriais inespecíficos (bacterioscopia, quimiocitológico ou outro) ou com evolução clínica compatível, ou • Todo caso suspeito de meningite tuberculosa com história de vínculo epidemiológico com casos de tuberculose. Obs.: vide Anexo 3 ‒ Tabela de inconsistência entre etiologia e critério diagnóstico. Descartado Caso suspeito com diagnóstico confirmado de outra doença. 550 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Meningites Notificação A meningite faz parte da Lista Nacional de Doenças de Notificação Compulsória, de acordo com a Portaria GM nº 2.325, de 8 de dezembro de 2003. É de responsabilidade do serviço de saúde notificar todo caso suspeito às autoridades municipais de saúde, que deverão providenciar, de forma imediata, a investigação epidemiológica e avaliar a necessidade de adoção das medidas de controle pertinentes. Todos os profissionais de saúde de unidades de saúde públicas e privadas, bem como de laboratórios públicos e privados, são responsáveis pela notificação. O funcionamento de unidades de vigilância epidemiológica (UVE) nos hospitais é fundamental para a busca ativa de casos dentro dos mesmos. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente – hospitalização imediata dos casos suspeitos, coleta de líquor cefalorraquidiano e de sangue para o esclarecimento diagnóstico, medidas de suporte geral e instituição de terapêutica específica, conforme a suspeita clínica. Qualidade da assistência – o tratamento precoce e adequado dos casos reduz significativamente a letalidade da doença. Para o bom desempenho no atendimento ao paciente grave toda a equipe de assistência deve estar familiarizada com as técnicas de suporte cardiorrespiratório e contar com a infra-estrutura necessária. A abordagem inicial, o rápido reconhecimento da falência respiratória e do choque, a identificação e realização de drenagem de abcessos, dentre outros procedimentos de suporte ao paciente, são de fundamental importância na diminuição da morbimortalidade. O transporte dos casos para outra unidade de saúde, quando necessário, deve ser efetuado após a estabilização da ventilação, oxigenação e perfusão orgânica e com acesso venoso com antibioticoterapia. Proteção individual e da população – o isolamento do paciente está indicado apenas durante as primeiras 24 horas do tratamento com o antibiótico adequado. Deve-se proceder à desinfecção concorrente em relação às secreções nasofaríngeas e aos objetos contaminados por elas. Nos casos de doença meningocócica ou meningite por Haemophilus influenzae está indicada a quimioprofilaxia do caso e dos contatos íntimos (ver tópico Instrumentos disponíveis para prevenção e controle). É importante a vigilância destes contatos por um período mínimo de 10 dias, orientando a população sobre os sinais e sintomas da doença e indicando os serviços de saúde a que devem recorrer frente a uma suspeita diagnóstica de meningite. 6 M Contato íntimo: moradores do mesmo domicílio, indivíduos que compartilham o mesmo dormitório, comunicantes de creches e pessoas diretamente expostas às secreções do paciente. A quimioprofilaxia não está indicada para pessoal médico ou de enfermagem que tenha atendido pacientes com meningites bacterianas, a menos que tenha havido exposição às secreções respiratórias durante procedimentos como respiração boca a boca e/ou entubação. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 551 Meningites Confirmação diagnóstica – é imprescindível a coleta de espécimes clínicos do paciente para a confirmação do diagnóstico etiológico (Anexo 1). Investigação – deve-se proceder à investigação epidemiológica frente à notificação de qualquer caso suspeito de meningite, para que se obtenha informações quanto à caracterização clínica do caso (incluindo a análise dos exames laboratoriais) e as possíveis fontes de transmissão da doença. Além disso, verificar a necessidade de identificação de contatos e a implementação das medidas de controle cabíveis em cada situação. Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do caso Preencher todos os campos da ficha de investigação do Sinan referentes à notificação (dados gerais, do caso e de residência). Coleta de dados clínicos e epidemiológicos O instrumento de coleta de dados é a ficha de investigação do Sinan, que contém as informações essenciais a serem coletadas em uma investigação de rotina. Todos os seus campos devem ser criteriosamente preenchidos, mesmo que a informação seja negativa. Outras informações podem ser incluídas, conforme a necessidade. As fontes de coleta de dados são: entrevista com o médico ou outro profissional de saúde que atendeu ao caso, dados do prontuário e entrevista de familiares e pacientes (quando possível). Para confirmar a suspeita diagnóstica • Verificar se preenche a definição de caso. • Verificar a coleta e resultados de exames de líquor, sangue/soro e fezes encaminhados ao laboratório. • Verificar a evolução do(s) paciente(s). Para identificação e determinação da extensão da área de transmissão • Coletar informações na residência e nos locais usualmente freqüentados pelos indivíduos acometidos (creches, escolas, locais de trabalho, quartéis, discotecas, etc.), para identificar possíveis fontes de infecção. • Identificar todos os contatos íntimos. • Investigar a existência de casos secundários e co-primários. • Verificar histórico vacinal do paciente. Coleta e remessa de material para exames A punção lombar para coleta de líquor e a coleta de sangue e/ou fezes para o diagnóstico laboratorial devem ser realizadas logo após a suspeita clínica de meningite, preferencialmente antes do início do tratamento com antibiótico. O material coletado em meio estéril deve ser processado no laboratório local para orientação da conduta médica. Posteriormente, deve ser encaminhado para o laboratório central de saúde pública (Lacen), para os 552 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Meningites Roteiro de investigação epidemiológica das meningites (parte 1) Caso suspeito Notificação imediata Investigação imediata Coleta de dados clínico-epidemiológicos Suspeita clínica de viral Suspeita clínica de bacteriana 6 Caso isolado Surto Orientações individuais Coleta de material Medidas de controle DM MHi Identificar contatos íntimos Outras bacterianas Orientações gerais Busca ativa de casos Quimioprofilaxia Encerramento Surto Atualização do Sinan Medidas adicionais de controle Imunização se necessário Orientações gerais M Encerramento Atualização do Sinan Legenda DM – Doença meningocócica; MHi – Meningite por Haemophilus influenzae procedimentos de identificação etiológica, de acordo com as normas técnicas apresentadas nos Anexos 1 e 2. Análise de dados Esta é uma etapa fundamental da investigação epidemiológica e corresponde à interpretação dos dados coletados em seu conjunto. Esta análise deverá ser orientada por algumas perguntas, tais como: quais foram as fontes de infecção? O caso atual, sob investi- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 553 Meningites Roteiro de investigação epidemiológica das meningites (parte 2) Caso suspeito Notificação imediata Investigação imediata Coleta de dados clínico-epidemiológicos Suspeita clínica de viral Suspeita clínica de bacteriana Coleta Sangue Líquor Surto Até 20 amostras Caso isolado Laboratório local Bacterioscopia Citoquímica Coleta Sangue Líquor Fezes Laboratório local Citoquímica Lacen Cultura CIE Látex Lacen Preparo das amostras LRN IAL CGLAB LRN Fiocruz IEC Legenda CGLAB – Coordenação Geral de Laboratórios; Lacen – Laboratório de Saúde Pública; LRN – Laboratório de Referência Nacional; IAL – Instituto Adolfo Lutz; Fiocruz – Fundação Oswaldo Cruz; IEC – Instituto Evandro Chagas. gação, transmitiu a doença para outras pessoas? Trata-se de casos isolados ou de um surto? Existem medidas de controle a serem executadas? Isto significa que a investigação epidemiológica não se esgota no preenchimento da ficha de investigação do Sinan. A análise do prontuário, a realização de estudos adicionais e a pesquisa em diferentes fontes de dados (busca ativa de novos casos) são atividades inerentes 554 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Meningites para o alcance do objetivo final da vigilância epidemiológica: o controle das doenças. Para esta análise, é importante: • acompanhamento semanal do número de casos de doença meningocócica e meningite viral por município, para detectar surtos; • revisão dos dados da ficha de investigação de casos; • acompanhamento da situação epidemiológica das meningites (incidência e letalidade por etiologia, sazonalidade, sorogrupo predominante de Neisseria meningitidis, etc.); • análise de indicadores operacionais da vigilância (oportunidade de realização da quimioprofilaxia, oportunidade de encerramento dos casos, percentual de meningites bacterianas confirmadas por cultura e critério laboratorial, etc.), conforme descrito no Caderno de Análise do Sinan. Encerramento de caso Deve ser realizado após a verificação de todas as informações necessárias para a conclusão do caso. A ficha de investigação deve ter sido devidamente preenchida para possibilitar a revisão e discussão do caso para o encerramento. O encerramento deverá ser feito com base na tabela de inconsistência entre etiologia e critério diagnóstico (Anexo 3), no prazo máximo de 60 dias e posterior atualização dos dados no Sinan. 6 Instrumentos disponíveis para prevenção e controle A meningite é uma síndrome que pode ser causada por diferentes agentes infecciosos. Para alguns destes, é possível dispor de medidas de prevenção primária, tais como vacinas e quimioprofilaxia. O diagnóstico e o tratamento precoces são fundamentais para um bom prognóstico da doença. M Quimioprofilaxia A quimioprofilaxia, muito embora não assegure efeito protetor absoluto e prolongado, tem sido adotada como eficaz medida na prevenção de casos secundários. Está indicada para os contatos íntimos de casos de doença meningocócica e meningite por Haemophilus influenzae e também para o paciente, no momento da alta, no mesmo esquema preconizado para os contatos, exceto se o tratamento foi com ceftriaxona, pois há evidências de que esta droga é capaz de eliminar o meningococo da orofaringe. A droga de escolha para a quimioprofilaxia é a rifampicina, que deve ser administrada em dose adequada e simultaneamente a todos os contatos íntimos, no prazo de 48 horas da exposição à fonte de infecção. Considerar o período de transmissibilidade da doença. O uso restrito da droga visa evitar a seleção de estirpes resistentes de meningococos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 555 Meningites Esquema de rifampicina indicado por etiologia Agente etiológico Dose Adultos - 600mg/dose Intervalo Duração 12/12h 2 dias 12/12h (dose máxima de 600mg) 2 dias 12/12h (dose máxima de 600mg) 2 dias Crianças Neisseria meningitidis > 1 mês até 10 anos dose - 10mg/kg/dose < 1 mês Dose - 5mg/kg/dose Adultos - 600mg/dose Crianças Haemophilus influenzae > 1 mês até 10 anos dose - 20mg/kg/dose < 1 mês Dose - 10mg/kg/dose 4 dias 24/24h 24//24h (dose máxima de 600mg) 4 dias 24/24h (dose máxima de 600mg) 4 dias Observação: criança com o esquema vacinal completo contra Haemophilus influenzae tipo b não precisa receber quimioprofilaxia, exceto nos casos de ser imunocomprometida. Imunização As vacinas contra meningite são específicas para determinados agentes etiológicos. Algumas fazem parte do calendário básico de vacinação da criança e outras estão indicadas apenas em situações de surto. Vacina contra Haemophilus influenzae tipo b (Hib) ou tetravalente Esta vacina previne contra as infecções invasivas causadas pelo Haemophilus influenzae do tipo b, como meningite, pneumonia, septicemia, otite, etc. Faz parte do calendário básico de vacinação infantil e está recomendada para menores de um ano no esquema de três doses com intervalo de 60 dias entre as doses (esquema: 2, 4 e 6 meses de idade). É utilizada juntamente com a vacina DPT, compondo a vacina tetravalente. Suas contra-indicações são as gerais, relacionadas à hipersensibilidade. As reações adversas são raras e, quando ocorrem, são locais (dor, eritema e enduração) e surgem nas primeiras 24 a 48 horas após a administração. Esta vacina também está indicada em casos de: • crianças e adolescentes até 18 anos, com asplenia anatômica ou funcional ou com imunodeficiência congênita ou adquirida; • menores de cinco anos, com doença pulmonar ou cardiovascular crônica e grave; • transplantados de medula óssea de qualquer idade. Vacina contra o bacilo de Koch A vacina BCG (bacilo de Calmette-Guérin, estirpe Moreau Rio de Janeiro) previne contra as formas graves de tuberculose (miliar e meníngea). É uma vacina composta de 556 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Meningites cepas atenuadas do bacilo Mycobacterium bovis. O esquema recomendado é uma dose ao nascer, devendo ser administrada o mais precocemente possível, na própria maternidade ou na sala de vacinação da rede pública de saúde. A utilização de uma dose de reforço entre 6 e 10 anos de idade, já introduzida em alguns estados, é recomendada. Em criança que recebeu BCG há seis meses ou mais, na qual esteja ausente a cicatriz vacinal, indica-se a revacinação, sem necessidade de realização prévia do teste tuberculínico (PPD). A vacina é contra-indicada nas seguintes situações: • em portador HIV positivo, sintomático ou assintomático; • em menores de 13 anos infectados pelo HIV, considerar a Tabela 1 e avaliar os parâmetros clínicos e risco epidemiológico para a tomada de decisão; • nos trabalhadores de saúde reatores à prova tuberculínica (reator forte/acima de 10mm); • nos portadores de imunodeficiências congênitas. 6 Em recém-nascidos com peso inferior a 2kg, devido à escassez do tecido cutâneo e em presença de afecções dermatológicas extensas em atividade, doenças graves, ou nos casos de uso de drogas imunossupressoras, recomenda-se o adiamento até que a criança esteja clinicamente bem. Os eventos adversos mais comuns são: formação de abscesso subcutâneo frio ou quente, ulceração com diâmetro maior que 1cm no local da aplicação, linfadenite regional supurada, cicatriz quelóide, reação lupóide e outras lesões localizadas ou generalizadas (maiores detalhes, ver Manual de Vigilância Epidemiológica dos Eventos Adversos, disponível no site www.saude.gov.br/svs/publicações). Vacinas contra Neisseria meningitidis As vacinas antimeningocócicas podem ser polissacarídicas ou conjugadas. M Tabela 1. Categoria imunológica da classificação da infecção pelo HIV na criança (menores de 13 anos) Contagem de LT CD4+ em células/mm3 Idade Alteração imunológica <12 meses 1 a 5 anos 6 a 12 anos Ausente (1) ≥1.500 (≥25%) ≥1 mil (≥25%) ≥500 (≥25%) Moderada 750-1.499 (15-24%) 500-999 (15-24%) 200-499 (15-24%) Grave (3) <750 (<15%) <500 (<15%) <200 (<15%) Fonte: BRASIL. Fundação Nacional de Saúde. Recomendações para vacinação em pessoas infectadas pelo HIV. -Brasília: Ministério da saúde, 2002. As vacinas polissacarídicas têm por base a reação imunogênica do hospedeiro ao polissacarídeo capsular do meningococo e, portanto, são sorogrupo específicas (A, C, W135, Y) ou sorosubtipo específicas (B:4,7 P1, 15). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 557 Meningites Vacina polissacarídica contra o meningococo dos sorogrupos A e C – é constituída por polissacarídeos capsulares purificados de Neisseria meningitidis (isolados ou combinados) que foram quimicamente identificados, induzindo uma resposta imunológica de célula T independente. A eficácia em adultos é alta, mas no grupo de menores de 2 anos é baixa. Além disso, produzem imunidade de curta duração (12 a 24 meses). Os eventos adversos pós-vacinação são leves e pouco freqüentes, consistindo, principalmente, de manifestações locais como dor, edema e eritema local com duração de 1 a 2 dias. As manifestações sistêmicas são leves e pouco freqüentes, consistindo principalmente de febre baixa, com início até 48 horas após a aplicação da vacina e persistindo por 24 a 48 horas. No Brasil, estas vacinas estão indicadas no controle de surtos, não estando disponíveis na rotina dos serviços de saúde. Vacina polissacarídica contra o meningococo do sorogrupo B – existe uma vacina disponível cujos resultados dos estudos realizados no Brasil indicam baixa efetividade em menores de 2 anos. A vacina contra o meningococo B possui baixa eficácia porque o polissacarídeo da cápsula desse meningococo é fracamente imunogênico, devido à sua semelhança estrutural com tecidos corporais humanos. Os eventos adversos pós-vacinação mais observados são a dor no local da aplicação e tumefação. A febre é a mais comum das manifestações gerais, ocorrendo na maioria das vezes nas primeiras 48 horas após a vacinação. A síndrome de reação sistêmica precoce pode manifestar-se dentro de 3 horas após a aplicação da vacina com um ou mais dos seguintes sintomas: tremores, calafrios, febre, cefaléia intensa, vômitos, sonolência, prostração, cianose perioral ou de dedos. Vacina conjugada contra o meningococo do sorogrupo C – a vacina antimeningocócica conjugada do sorogrupo C é constituída por polissacarídeo meningocócico do grupo C, conjugado ao toxóide tetânico. Está indicada na prevenção da infecção invasiva pelo meningococo C em crianças acima de 2 meses de idade. Esta vacina está disponível nos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (Crie) sendo recomendada nas seguintes situações: • crianças e adolescentes com asplenia anatômica ou funcional ou com imunodeficiência congênita ou adquirida; • menores de cinco anos, com doença pulmonar ou cardiovascular crônica e grave; • transplantados de medula óssea. Os eventos adversos mais freqüentes são dor, vermelhidão e inchaço no local da aplicação. Em crianças que começam a andar e em bebês, observa-se choro, irritabilidade, sonolência, insônia. Febre, vômito, náusea, perda de apetite e diarréia ocorrem em menor freqüência. 558 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Meningites Vacina contra Streptococcus pneumoniae Esta vacina está disponível nos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (Crie) em duas apresentações, sendo indicada nas seguintes situações: 23 Valente • Adultos a partir de 60 anos de idade, quando hospitalizados, institucionalizados ou acamados; • Crianças com dois anos e mais, adolescentes e adultos com imunodeficiência adquirida ou congênita, síndrome nefrótica, disfunção anatômica e funcional do baço, doença pulmonar ou cardiovascular crônica e grave, insuficiência renal crônica, diabetes mellitus insulino-dependente, cirrose hepática, fístula liquórica e transplantados de medula óssea de qualquer idade. 7 Valente A partir dos dois meses de idade até 23 meses: menores de dois anos de idade imunocompetentes, com doença pulmonar ou cardiovascular crônicas graves, insuficiência renal crônica, síndrome nefrótica, diabetes mellitus, cirrose hepática, fístula liquórica, asplenia congênita ou adquirida, hemoglobinopatias, imunodeficiência congênita ou adquirida, crianças HIV positivo assintomáticas e com aids. 6 Observação: a vacina deve ser administrada 15 dias antes de esplenectomia eletiva e quimioterapia imunossupressora. Vacinação para bloqueio de surto Recomendações A vacinação para bloqueio está indicada nas situações em que haja a caracterização de um surto de doença meningocócica para o qual seja conhecido o sorogrupo responsável e exista vacina eficaz disponível. Estas vacinas somente serão utilizadas a partir de decisão conjunta das três esferas de gestão: secretaria municipal de saúde, secretaria estadual de saúde e a Secretaria de Vigilância em Saúde/MS, após comprovação do sorogrupo responsável pelo surto. A estratégia de vacinação (campanha indiscriminada ou discriminada) será definida considerando a análise epidemiológica, as características da população (faixa etária, etc.) e a área geográfica de ocorrência dos casos. Todos os procedimentos relacionados com o desencadeamento de campanha de vacinação deverão estar de acordo com as normas técnicas preconizadas pelo Programa Nacional de Imunização. Após a vacinação, são necessários 7 a 10 dias para a obtenção de títulos protetores de anticorpos. Casos ocorridos em pessoas, no período de até 10 dias após a vacinação não devem ser considerados falhas da vacinação. Estes casos são passíveis de ocorrência, haja vista que o indivíduo pode ainda não ter produzido imunidade ou estar em período de incubação da doença, que varia de 2 a 10 dias. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS M 559 Meningites As orientações técnicas para a administração de vacinas estão descritas no Manual de Procedimentos do Programa Nacional de Imunizações. Ações de educação em saúde A população deve ser orientada sobre os sinais e sintomas da doença, bem como os hábitos, condições de higiene e disponibilidade de outras medidas de controle e prevenção, tais como quimioprofilaxia e vacinas, alertando para a procura imediata do serviço de saúde frente a suspeita da doença. A divulgação de informações é fundamental para diminuir a ansiedade e evitar o pânico. Resumo das estratégias de prevenção e controle • Orientar a população sobre a importância da higiene corporal e ambiental, bem como a manutenção de ambientes domiciliares e ocupacionais ventilados, e evitar aglomerados em ambientes fechados. • Informar sobre os mecanismos de transmissão da doença. • Capacitar os profissionais de saúde para o diagnóstico e tratamento precoces. • Notificar todos os casos suspeitos às autoridades de saúde. • Investigar imediatamente todos os casos notificados como meningite. • Realizar, de forma adequada e em tempo hábil, a quimioprofilaxia dos contatos íntimos, quando indicada. • Manter alta cobertura vacinal contra BCG e Hib, observando a importância da cobertura homogênea nos municípios. • Detectar precocemente e investigar rapidamente os surtos. • Realizar a vacinação para bloqueio de surtos, quando indicada. 560 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Meningites Anexo 1 O diagnóstico etiológico dos casos suspeitos de meningite é de extrema importância para a vigilância epidemiológica, tanto na situação endêmica da doença quanto em situações de surto. Para todo caso suspeito de meningite bacteriana, utilizar o kit de coleta para o diagnóstico laboratorial, distribuído pelos Lacens em todo o território nacional, composto de: • 1 frasco para hemocultura (com caldo TSB ou BHI acrescido do anticoagulante SPS); • 1 frasco com meio de cultura ágar chocolate base Müller Hinton ou similar, para líquor; • 1 frasco estéril para coleta de soro, para realizar CIE e látex; • 1 frasco estéril para coleta de líquor, para citoquímica, CIE e látex; • 2 lâminas sem uso prévio, perfeitamente limpas e desengorduradas, para bacterioscopia (uma é corada e processada no laboratório do hospital; a outra, enviada para o Lacen). 6 Kit para colheita e transporte do líquido cefalorraquidiano/sangue/soro Ágar chocolate base Müeller Hinton Caldo TSB frasco hemocultura M 2 lâminas de microscopia Frasco vazio para LCR Frasco vazio para soro As culturas positivas devem ser sempre encaminhadas ao Lacen, que a seguir as enviará para o Instituto Adolfo Lutz (IAL/SP), que é o laboratório de referência nacional para as meningites bacterianas, onde serão realizados os seguintes estudos complementares: confirmação de espécie, sorogrupo, sorotipo e sorosubtipo, caracterização molecular e controle da resistência antimicrobiana da cepa. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 561 Meningites Quadro 1. Alteração do LCR em algumas patologias (exames laboratoriais) Exames laboratoriais Meningites Encefalites Bacteriana Tuberculosa Viral Neurocisticercose Meningoencefalia por fungos Normal Aspecto Turvo Límpido ou ligeiramente turvo (opalescente) Límpido Límpido Límpido ou ligeiramente turvo Límpido Límpido Cor Branca-leitosa ou ligeiramente xantocrômica Incolor ou xantocrômica Incolor ou opalescente Incolor Incolor Incolor Incolor, cristalino (“água de rocha”) Coágulo Presença ou ausência (fibrina delicada) ou ausência Ausente Ausente Ausente Ausente Ausente Cloretos Diminuídos Diminuídos Normal Normal Normal Normal Normal Glicose Diminuída Diminuída Normal Normal Normal Normal 45 a 100mg/dl Proteínas totais Aumentadas Aumentadas Levemente aumentadas Discretamente aumentadas Discretamente aumentadas Discretamente aumentadas 15 a 50mg/dl Globulinas Positiva (gama-globulina) Positiva (alta e gamaglobulinas) Negativa ou positiva Aumento discreto (gamaglobulina) Normal 200 a milhares 25 a 500 5 a 500 1 a 100 1 a 100 (neutrófilos) (linfócitos) (linfócitos) (linfócitos) (linfócitos) Presença Leucócitos VDRL - Aumento (gamaglobulina) - 1 a 100 (linfócitos ou eosinófilos) 0 a 5 mm3 - - - - - - Contraimunoeletroforese (CIE) Reagente (1) - - - - - - Látex Reagente (5) - - - - - - Microscopia Positiva para DGN, BGN, CGP, BGP (2) ou não Gramnegativa (4) Cultura Crescimento em ágar chocolate (3) Crescimento em meio LowesteinJansen Gramnegativa - Gramnegativa - Positiva (tinta nanquim p/ C. neoformans ou para Candida sp Crescimento em meio Sabouraud e ágar sangue Gramnegativa - - - Observação: (1) Contra-imunoeletroforese (CIE) reagente para N. meningitidis, H. influenzae tipo b. (2) DGN = Diplococo gram-negativo; BGN = Bacilo gram-negativo; CGP = Cocos gram-positivo; BGP = Bacilo gram-positivo. (3) Quando sem uso prévio de antibióticos e condições adequadas de coletas e semeadura do LCR. (4) Exame baciloscópico é de valor relativo porque a presença de BAAR é sempre pequena no LCR (paucibacilar). A baciloscopia é feita com coloração de Ziehl-Nielsen. (5) Látex = reagente para S. pneumoniae (grupos A e B), H. influenzae e N. meningitidis A, B, C, Y, W135 ou outros agentes, dependendo do produto disponível. 562 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Meningites Exames laboratoriais A seguir, descrevem-se os exames laboratoriais disponíveis, sua interpretação e as normas de coleta dos espécimes clínicos. Para isso, é necessário que a coleta seja realizada no ato da entrada do paciente na unidade de saúde, no primeiro atendimento, preferencialmente antes da utilização da primeira dose do antibiótico. • Cultura – exame de alto grau de especificidade, podendo ser realizado com diversos tipos de fluidos corporais, mais comumente líquor e sangue. O seu objetivo é identificar a espécie da bactéria. • Contra-imunoeletroforese cruzada (CIE) – os polissacarídeos de Neisseria meningitidis e Haemophilus influenzae tipo b apresentam carga negativa e, quando submetidos a um campo elétrico sob determinadas condições de pH e força iônica, migram em sentido contrário ao do anticorpo. Assim, tanto o antígeno quanto o anticorpo dirigem-se para um determinado ponto e, ao se encontrarem, formam uma linha de precipitação que indica a positividade da reação. A contra-imunoeletroforese fornece uma sensibilidade de aproximadamente 70% na identificação de Neisseria meningitidis e de 90% na identificação de H. influenzae, e uma especificidade da reação de 98%. O material indicado para o ensaio é o LCR, soro e outros fluidos. • Aglutinação pelo látex – partículas de látex, sensibilizadas com anti-soros específicos permitem, por técnica de aglutinação rápida (em lâmina ou placa), detectar o antígeno bacteriano em líquor, soro e outros fluidos biológicos. Pode ocorrer resultado falso-positivo em indivíduos portadores do fator reumático ou em reações cruzadas com outros agentes. A sensibilidade do teste de látex é da ordem de 90% para H. influenzae, 94,4% para S. pneumoniae e 80% para N. meningitidis. A especificidade da reação é de 97%. • Bacterioscopia – pela técnica de coloração de Gram, caracteriza-se morfológica e tintorialmente os agentes bacterianos, permitindo sua classificação com pequeno grau de especificidade. Pode ser realizada a partir do líquor e outros fluidos corpóreos normalmente estéreis. • Quimiocitológico – permite a leitura citológica do líquor e a dosagem de glicose, proteínas e cloretos. Traduz a intensidade do processo infeccioso e orienta a suspeita clínica, mas não deve ser utilizado para conclusão do diagnóstico final, por seu baixo grau de especificidade. • Outros exames – alguns métodos vêm sendo utilizados, principalmente nos laboratórios de pesquisa, como PCR, Elisa e imunofluorescência, cujos resultados ainda se encontram em avaliação e, portanto, não são preconizados na rotina diagnóstica. • Reação em cadeia pela polimerase (PCR) – a detecção do DNA bacteriano pode ser obtida por amplificação da cadeia de DNA pela enzima polimerase, que permite a identificação do agente utilizando oligonucleotídeos específicos. Possui alta sensibilidade e especificidade; entretanto, a técnica para o diagnóstico de meningite ainda não está validada, não sendo utilizada como rotina diagnóstica. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 6 M 563 Meningites • Método da imunofluorescência – este método consiste na marcação de anticorpos específicos com substâncias fluorescentes para a identificação de H. influenzae, S.pneumoniae e N. meningitidis, em esfregaços de materiais clínicos. A sensibilidade dos resultados foi comparável à dos métodos convencionais, como exame direto, através da coloração de Gram e cultura atingindo 70% a 93%. O material indicado para o ensaio é o LCR e o soro. • Método imunoenzimático (Elisa) – o método fundamenta-se na capacidade do anticorpo ou antígeno ligar-se a uma enzima, resultando em conjugado, com a atividade imunológica inalterada e, portanto, possível de detectar tanto antígeno como anticorpo. O material indicado é o LCR e o soro. Além dos métodos supracitados, há outros inespecíficos que são utilizados de forma complementar: tomografia computadorizada, raios X, ultra-sonografia, angiografia cerebral e ressonância magnética. • Os exames realizados pelos Lacens são cultura e antibiograma, CIE, látex e bacterioscopia. • Todo material deverá ser enviado ao Lacen devidamente identificado e acompanhado de cópia da ficha de investigação do Sinan, que servirá de orientação quanto aos exames indicados. • O perfeito acondicionamento, para remessa de amostras, é de fundamental importância para o êxito dos procedimentos laboratoriais. 564 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Meningites Quadro 2. Coleta e conservação de material para diagnóstico de meningite bacteriana Tipo de diagnóstico Cultura Cultura Tipo de material Sangue Líquor Quantidade 10% a 20% do volume total do frasco 5 a 10 gotas Armazenamento/ conservação Nº de amostras Período da coleta Recipiente 1 Preferencialmente no ato do 1º atendimento Frasco adequado para hemocultura (caldo BHI ou TSB acrescido de SPS) Colocar imediatamente em estufa entre 35o e 37oC, logo após a semeadura, até o envio ao laboratório. Fazer subculturas em ágar chocolate após 8 horas Frasco com meio de cultura ágar chocolate base Müller-Hinton ou similar Incubar a 35ºC-37ºC em atmosfera de CO2 (chama de vela), úmido após a semeadura, até o envio ao laboratório 1 Preferencialmente no ato do 1º atendimento. Semear imediatamente ou até 3h após a punção Transporte Nunca refrigerar. Manter o frasco em temperatura ambiente e encaminhar o mais rápido possível para o laboratório Nunca refrigerar. Manter o frasco em temperatura ambiente e encaminhar o mais rápido possível para o laboratório Em temperatura ambiente, em até 1 hora CIE Líquor ou soro 1ml 1 Preferencialmente no ato do 1º atendimento Frasco estéril Tempo superior a 1 hora, conservar a 4ºC Pode ser congelado, se o exame não for realizado nas primeiras 24 horas. Estocar o restante para a necessidade de realizar outros procedimentos Enviar imediatamente ao laboratório, conservado em gelo 6 Em temperatura ambiente, em até 1 hora Látex Soro 2ml 1 Preferencialmente no ato do 1º atendimento Frasco estéril Sangue colhido sem anticoagulante Tempo superior a 1 hora, conservar a 4ºC Pode ser congelado, se o exame não for realizado nas primeiras 24 horas Após separar o soro, enviar imediatamente ao laboratório ou conservar Estocar o restante para a necessidade de realizar outros procedimentos Em temperatura ambiente, em até 1 hora Látex Líquor 1 a 2ml 1 Preferencialmente no ato do 1º atendimento Frasco estéril Tempo superior a 1 hora, conservar a 4ºC Pode ser congelado, se o exame não for realizado nas primeiras 24 horas Enviar imediatamente ao laboratório, conservado em gelo Estocar o restante para a necessidade de realizar outros procedimentos Bacterioscopia Líquor 1 gota a partir do sedimento do material quimiocitológico Quimiocitológico Líquor 2ml 2 Preferencialmente no ato do 1º atendimento 2 lâminas de microcospia virgens 1 Preferencialmente no ato do 1º atendimento Frasco estéril Em temperatura ambiente, em até 3 horas Tempo superior a 3 horas, conservar a 4ºC M Enviar imediatamente ao laboratório Observações: • Nenhum dos exames citados substitui a cultura de líquor e/ou sangue. A recuperação do agente etiológico viável é de extrema importância para a sua caracterização e para o monitoramento da resistência bacteriana aos diferentes agentes microbianos. • Sempre colher o líquor em recipiente estéril, de preferência com tampa de borracha. Se o paciente for transferido de hospital, deve ser encaminhado juntamente com o líquor e com o resultado dos exames obtidos. • Os frascos contendo material biológico para exames devem ser rotulados e identificados com: material biológico, suspeita clínica, nome completo, idade, município de residência, data e hora da coleta. • Proceder a antissepsia no local da punção com solução de iodo a 2%. Após a punção, remover o resíduo de iodo com álcool a 70%, visando evitar queimadura ou reação alérgica. • Na suspeita de meningite por agente bacteriano anaeróbico, a eliminação do ar residual deve ser realizada após a coleta do material. Transportar na própria seringa da coleta, com agulha obstruída, em tubo seco e estéril ou inoculada direto nos meios de cultura. Em temperatura ambiente, o tempo ótimo para transporte de material ao laboratório é de 15 minutos para menos de 1ml e 30 minutos para volume superior. • O exame de látex deve ser processado com muito cuidado, para que não ocorram reações inespecíficas. Observar, portanto, as orientações do manual do kit, uma vez que a sensibilidade do teste varia de acordo com o produtor. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 565 Meningites Fluxo de encaminhamento de amostras (meningites virais) Hospital Punção lombar • Coletar em um tubo 1ml de LCR • Coletar em um tubo 1,5 a 2ml de LCR • Fazer o quimiocitológico do LCR utilizando a amostra de 1ml • Congelar imediatamente a amostra de 1,5 a 2ml de LCR Laboratório do hospital • Coletar de 4 a 8g de fezes em frasco coletor universal e acondicionar imediatamente sob refrigeração • Coletar duas amostras de 5ml de sangue sem anticoagulante, com intervalo de 15 a 20 dias. Separar o soro e acondicionar imediatamente a -20o • Caso o quimiocitológico seja sugestivo de MV, enviar ao Lacen as amostras de LCR, fezes e soro Lacen Laboratório de referência regional Laboratório de referência nacional • Acondicionar imediatamente as amostras de LCR, fezes e soro a -70o e enviar, o mais rápido possível, em gelo seco, ao LRR • Processar as amostras de LCR e fezes para isolamento viral • Processar a RT-PCR em caso de isolamento positivo • Enviar as amostras de soro ao LRN • Identificar o sorotipo viral por sequenciamento • Pesquisar anticorpos no soro Observação: os relatórios contendo os resultados devem ser encaminhados trimestralmente dos Lacen aos laboratórios hierarquicamente superiores, bem como à CGLAB. Da mesma forma, o laboratório de referência nacional (LRN) deverá encaminhar relatório trimestral dos exames realizados aos laboratórios de referência Regional (LRR), Lacen e CGLAB. 566 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Meningites Anexo 2 O diagnóstico laboratorial específico das meningites virais, em situações de surtos e em alguns casos isolados, é de extrema importância para a vigilância epidemiológica. A seguir, estão descritas as normas de coleta dos espécimes, os exames laboratoriais disponíveis e suas interpretações. Para isso, é necessário que a coleta seja realizada no ato da entrada do caso suspeito na unidade de saúde, no primeiro atendimento. Para casos suspeitos de meningite viral deve ser utilizado o kit completo de coleta, distribuído pelos Lacen em todo o território nacional, constituído de: • 1 frasco de polipropileno com tampa de rosca para líquor; • 2 frascos de polipropileno com tampa de rosca para soro; • 1 coletor universal para fezes. 6 Exames laboratoriais Isolamento viral em cultura celular – pode ser realizado com diversos tipos de fluidos corporais, mais comumente líquor e fezes. São utilizados cultivos celulares sensíveis para o isolamento da maioria dos vírus associados às meningites assépticas: RD (rabdomiosarcoma embrionário humano), Hep-2 (carcinoma epidermóide de laringe) e Vero (rim de macaco verde africano). Reação de soroneutralização e de imunofluorescência – técnicas imunológicas para identificação do vírus isolado; serão utilizados conjuntos de anti-soros específicos para a identificação dos sorotipos. Reação em cadeia pela polimerase (PCR e RT-PCR) – técnica baseada na amplificação de seqüências nucleotídicas definidas presentes no DNA ou RNA viral. Possui alto grau de especificidade quanto à identificação do agente etiológico, sendo utilizada para detecção direta ou identificação de diferentes grupos de vírus associados às meningites virais. Pesquisa de anticorpos no soro do paciente – serão utilizados testes de soroneutralização, em amostras pareadas de soro, para a pesquisa de anticorpos para enterovírus; para os demais vírus, serão utilizados ensaios imunoenzimáticos com a finalidade de se detectar anticorpos da classe IgG e IgM. M Observações: • Estes exames são realizados a partir de contato com a secretaria estadual de saúde e Lacen. No caso de ocorrência de surto, serão analisadas amostras clínicas coletadas de, no máximo, 20 pacientes. • As amostras devem ser encaminhadas ao laboratório com as seguintes informações: nome do paciente, estado e cidade de notificação, cidade, estado e país de residência do paciente, tipo de amostra (líquor e/ou fezes), data de início dos sintomas, data de coleta da amostra, data de envio da amostra para o laboratório, história de vacinação recente e história de viagem recente. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 567 Meningites • As amostras devem ser individualmente acondicionadas em sacos plásticos e enviadas ao laboratório, em condições adequadas de transporte (caixas isotérmicas com gelo reciclável e, preferencialmente, em gelo seco para o transporte de líquor). • O material deve chegar ao Lacen no prazo de 12 a 24 horas após a coleta. • O tempo de procedimento técnico para o isolamento de vírus e sua identificação é de 30 dias contados a partir da entrada da amostra no laboratório de referência para o diagnóstico de meningite viral. Todo material deverá ser enviado ao laboratório, devidamente identificado e acompanhado de cópia da ficha de investigação do Sinan, que servirá de orientação quanto aos exames indicados. O perfeito acondicionamento, para remessa de amostras, é de fundamental importância para o êxito dos procedimentos laboratoriais. Quadro 3. Coleta e conservação de material para diagnóstico de meningite viral Tipo de diagnóstico Isolamento e identificação Isolamento e identificação Detecção direta Pesquisa de anticorpos da classe IgG Pesquisa de anticorpos da classe IgM 568 Tipo de material Quantidade Líquor 1,5 a 2ml Fezes 4 a 8g, aproximadamente 1/3 do coletor Líquor 1,5 a 2ml Soro 5ml de sangue em frasco sem anticoagulante para obter o soro Soro 5ml de sangue em frasco sem anticoagulante para obter o soro Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Nº de amostras Período da coleta Recipiente Armazenamento/ conservação Transporte 1 No ato do atendimento ao paciente (fase aguda da doença) 1 frasco de polipropileno com tampa rosqueada Acondicionar imediatamente em banho de gelo e conservar a -70oC ou a -20oC até 24 horas Enviar imediatamente ao laboratório em banho de gelo ou em gelo seco em caixas isotérmicas 1 No ato do atendimento ao paciente (fase aguda da doença) 1 coletor universal Conservar em geladeira por até 72 horas Sob refrigeração, em caixas isotérmicas, com gelo reciclável 1 No ato do atendimento ao paciente (fase aguda da doença) 1 frasco de polipropileno com tampa rosqueada Acondicionar imediatamente em banho de gelo Enviar imediatamente ao laboratório em banho de gelo ou em gelo seco em caixas isotérmicas 2 frascos de polipropileno com tampa rosqueada Após a retração do coágulo, separar o soro e conservar a -20oC Sob refrigeração, em caixas isotérmicas, com gelo reciclável 1 frasco de polipropileno com tampa rosqueada Após a retração do coágulo, separar o soro e conservar a -20oC Sob refrigeração, em caixas isotérmicas, com gelo reciclável 2 (só serão processadas as amostras pareadas) 1 1ª amostra no ato do atendimento ao paciente (fase aguda da doença); 2ª amostra 15 a 20 dias após a 1ª (fase convalescente) 1 amostra no ato do atendimento ao paciente (fase aguda da doença) Anexo 3. Tabela de inconsistência entre etiologia e critério diagnóstico* Etiologia Critério diagnóstico 1 MM 2 MM+MCC 3 Meningite tuberculosa 4 Meningite por outras bactérias 5 Meningite não especificada 6 Meningite viral 7 Meningite por outra etiologia 8 Meningite por Haemophilus influenzae 9 Meningite pneumocócica 10 DOENÇA MENINGOCÓCICA MCC 1 2 3 4 CULTURA CIE LÁTEX CLÍNICO 5 7 6 VÍNC. BACTERIOSCOPIA QUIMIOCITOLÓGICO EPIDEMIOLÓGICO 8 9 ISOLAMENTO VIRAL OUTRA TÉCNICA LABORATORIAL *O critério de PCR ainda não está validado para confirmação de caso. 569 Meningites Secretaria de Vigilância em Saúde / MS DIAGNÓSTICO INCONSISTENTE COM CRITÉRIO 6 M Parotidite Infecciosa PAROTIDITE INFECCIOSA CID 10: B26 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Doença viral aguda, caracterizada por febre e aumento do volume de uma ou mais glândulas salivares, geralmente a parótida e, às vezes, glândulas sublinguais ou submandibulares. Antes da instituição da imunização em massa, esta virose era muito comum na infância, apresentando-se sob a forma de surtos sazonais. Sinonímia Papeira, caxumba. Agente etiológico Vírus da família Paramyxoviridae, gênero Paramyxovirus. Reservatório O homem. Modo de transmissão Vias aéreas, através da disseminação de gotículas ou por contato direto com saliva de pessoas infectadas. Período de incubação De 12 a 25 dias, sendo, em média, de 16 a 18 dias. Período de transmissibilidade Varia entre 6 e 7 dias antes das manifestações clínicas até 9 dias após o surgimento dos sintomas. O vírus pode ser encontrado na urina até 14 dias após o início da doença. Susceptibilidade e imunidade A imunidade é de caráter permanente, sendo adquirida após infecções inaparentes, aparentes ou após imunização ativa. 570 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Parotidite Infecciosa Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas A principal e mais comum manifestação desta doença é o aumento das glândulas salivares, principalmente a parótida, acometendo também as glândulas sublinguais e submaxilares, acompanhada de febre. Aproximadamente, 30% das infecções podem não apresentar hipertrofia aparente dessas glândulas. Cerca de 20% a 30% dos homens adultos acometidos apresentam orquite. Mulheres acima de 15 anos podem apresentar mastite (aproximadamente 15% dos casos). Em menores de 5 anos de idade, são comuns sintomas das vias respiratórias e perda neurossensorial da audição. O vírus também apresenta tropismo pelo sistema nervoso central, observando-se com certa freqüência meningite asséptica de curso benigno, que na maioria das vezes não deixa seqüelas. Outras complicações são encefalite e pancreatite. Não há relato de óbitos relacionados à parotidite. Sua ocorrência durante o primeiro trimestre da gestação pode ocasionar aborto espontâneo. 6 Diagnóstico diferencial Cálculo de dutos parotidianos, reação à iodetos, ingestão de amidos, sarcoidose, cirrose, diabetes, bulimia, parotidite de etiologia piogênica, inflamação de linfonodos. Diagnóstico laboratorial O diagnóstico da doença é eminentemente clínico-epidemiológico. Existem testes sorológicos (Elisa, inibição da hemaglutinação e fixação do complemento) ou de cultura para vírus, porém não utilizados como rotina. Tratamento Não existe tratamento específico, indicando-se apenas repouso, analgesia e observação cuidadosa quanto à possibilidade de aparecimento de complicações. Nos casos que cursam com meningite asséptica, o tratamento também é sintomático. Nas encefalites, tratar o edema cerebral e manter as funções vitais. P Tratamento de apoio para a orquite • Suspensão da bolsa escrotal, através de suspensório, aplicação de bolsas de gelo e analgesia, quando necessárias. • Redução da resposta inflamatória: prednisona, 1ml/kg/dia, via oral, com redução gradual, semanal. Aspectos epidemiológicos A parotidite infecciosa costuma apresentar-se sob a forma de surtos, que acometem mais as crianças. Estima-se que, na ausência de imunização, 85% dos adultos poderão ter a Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 571 Parotidite Infecciosa doença, sendo que 1/3 dos infectados não apresentarão sintomas. A doença é mais grave em adultos. As estações com maior ocorrência de casos são o inverno e a primavera. Vigilância epidemiológica Objetivos Investigar surtos para a adoção de medidas de controle. Definição de caso Suspeito Paciente com febre e aumento de glândulas salivares, principalmente parótidas. Confirmado Caso suspeito com história de contato com indivíduos doentes por caxumba nos 15 dias anteriores ao surgimento dos primeiros sintomas. Descartado Caso suspeito em que se confirma outra doença. Notificação Não é doença de notificação compulsória. A ocorrência de surtos deverá ser notificada. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente O atendimento é ambulatorial e o tratamento é feito no domicílio. A hospitalização dos pacientes só é indicada para os casos que apresentem complicações graves, como meningites e encefalites. Confirmação diagnóstica Em geral, não se indica a realização de exames laboratoriais. A grande maioria dos casos tem diagnóstico clínico-epidemiológico. Proteção da população A administração da vacina está indicada antes da exposição. Assim, diante da ocorrência de surtos, deve-se verificar a cobertura vacinal da área, para avaliar a indicação de vacinação dos indivíduos susceptíveis. 572 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Parotidite Infecciosa Investigação Não é doença de investigação obrigatória. Em situação de surto, avaliar a necessidade de bloqueio vacinal. Instrumentos disponíveis para controle Imunização Esquema vacinal básico Vacina tríplice viral (sarampo, rubéola, caxumba), aos 12 meses de idade. O reforço deve ser administrado entre 4 e 6 anos de idade. Para detalhes operacionais sobre a organização das atividades de vacinação de rotina, consultar o site www.saude.gov.br/svs/imunizacoes. 6 Eventos adversos Os eventos adversos são raros, consistindo predominantemente em manifestações locais. As reações sistêmicas mais associadas ao componente caxumba, são febre, parotidite, orquite, meningite e, mais raramente, meningoencefalite, encefalite, surdez e reação anafilática. Contra-indicações Uso recente de imunoglobulinas ou de transfusão sangüínea nos últimos 3 meses, pacientes com imunodeficiência (leucemia e linfoma), uso de corticosteróide e gravidez. Pacientes com infecção sintomática HIV mas que não estejam gravemente imunocomprometidos devem ser vacinados. P Ações de educação em saúde A população deve ser informada quanto às características da parotidite infecciosa e a possibilidade de complicações, devendo ser orientada quanto a busca de assistência médica adequada, quando necessária (orquites, mastites, meningite, encefalite), e a importância de vacinar as crianças. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 573 Peste PESTE CID 10: A20 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Doença infecciosa aguda, transmitida principalmente por picada de pulgas infectadas, que se manifesta sob três formas clínicas principais: bubônica, septicêmica e pneumônica. Constitui perigo potencial para as populações, devido a persistência da infecção em roedores silvestres e ao seu importante potencial epidêmico. Agente etiológico Yersinia pestis, bactéria que se apresenta sob a forma de bacilo gram-negativo, com coloração mais acentuada nos pólos (bipolar). Reservatório A peste é primordialmente uma zoonose de roedores que pode, em determinadas condições, infectar outros mamíferos (coelhos, camelos, cães, gatos), inclusive o homem. Os roedores mais freqüentemente encontrados infectados nos focos do Nordeste do Brasil são: Bolomys, Calomys, Oligoryzomys, Oryzomys, R. rattus, Galea, Trychomys. Alguns marsupiais (carnívoros) são também freqüentemente envolvidos durante epizootias em roedores, principalmente Monodelphis domestica. Vetores A Xenopsylla cheopis, X. brasiliensis e X. astia têm grande capacidade vetora; Nosopsyllus fasciatus e Leptosylla segnis são menos eficientes; Ctenocephalides canis e C. felis podem transmitir peste de animais domésticos para o homem; Pulex irritans também é um provável vetor; Polygenis bolhsi jordani e P. tripus são parasitos de roedores silvestres e têm grande importância na epizootização da peste entre os roedores nos campos e nas casas, bem como na gênese da peste humana no Nordeste do Brasil. Modo de transmissão O principal modo de transmissão da peste bubônica ao homem é a picada de pulgas infectadas. No caso da peste pneumônica, as gotículas transportadas pelo ar e os fômites de pacientes são a forma de transmissão mais freqüente de pessoa a pessoa. Tecidos de animais infectados, fezes de pulgas e culturas de laboratório também são fontes de contaminação para quem os manipula sem obedecer as regras de biossegurança. Período de incubação Dois a seis dias para a peste bubônica e um a três dias para a peste pneumônica. 574 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Peste Período de transmissibilidade A peste bubônica não é transmitida diretamente de uma pessoa a outra, exceto se existir contato com o pus de bubões supurados. No caso da peste pneumônica o período de transmissibilidade começa com o início da expectoração, permanecendo enquanto houver bacilos no trato respiratório. As pulgas podem permanecer infectadas durante meses, se existirem condições propícias de temperatura e umidade. Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade é geral e a imunidade temporária e relativa, não protegendo contra grandes inóculos. Aspectos clínicos e laboratoriais 6 Manifestações clínicas Peste bubônica É a mais comum no Brasil. O quadro clínico pode apresentar os seguintes sinais e sintomas, em intensidades variáveis: cefaléia, febre, dores generalizadas, mialgias, anorexia, náuseas, vômitos, confusão mental, congestão das conjuntivas, pulso rápido e irregular, taquicardia, hipotensão arterial, prostração e mal-estar geral. Os casos da forma bubônica podem, com certa freqüência, apresentar sintomatologia moderada ou mesmo benigna. No segundo ou terceiro dia de doença, aparecem as manifestações de inflamação aguda e dolorosa dos linfonodos da região, ponto de entrada da Y. pestis. Este é o chamado bubão pestoso, formado pela conglomeração de vários linfonodos inflamados. O tamanho varia de 1 a 10 cm. A pele do bubão é brilhante, distendida e de coloração vermelho-escura; é, de regra, extremamente doloroso e freqüentemente se fistuliza, com drenagem de material purulento. Podem ocorrer manifestações hemorrágicas e necróticas em virtude da ação da endotoxina bacteriana sobre os vasos. P Peste septicêmica primária É uma forma muito rara, na qual não há reações ganglionares visíveis. É caracterizada pela presença permanente do bacilo no sangue. O início é fulminante, com febre elevada, pulso rápido, hipotensão arterial, grande prostração, dispnéia, fácies de estupor, dificuldade de falar e hemorragias cutâneas, às vezes serosas e mucosas e até nos órgãos internos. De modo geral, a peste septicêmica aparece na fase terminal da peste bubônica não tratada. Peste pneumônica Pode ser secundária à peste bubônica ou septicêmica por disseminação hematógena. É a forma mais grave e perigosa da doença, por seu quadro clínico e alta contagiosidade, podendo provocar epidemias explosivas. Inicia-se com quadro infeccioso grave, de evolu- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 575 Peste ção rápida, com abrupta elevação térmica, calafrios, arritmia, hipotensão, náuseas, vômitos, astenia, obnubilação mental. A princípio, os sinais e sintomas pulmonares são discretos e ausentes. Depois, surge dor no tórax, respiração curta e rápida, cianose, expectoração sangüinolenta ou rósea, fluida, muito rica em germes. Surgem fenômenos de toxemia, delírio, coma e morte, se não houver instituição do tratamento precoce e adequado. • Período de infecção – cerca de 5 dias após, os microrganismos inoculados difundem-se pelos vasos linfáticos até os linfonodos regionais que passarão a apresentar inflamação, edema, trombose e necrose hemorrágica, constituindo os característicos bubões pestosos. Quando se institui tratamento correto, este período se reduz para 1 ou 2 dias. • Período toxêmico – dura de 3 a 5 dias, correspondendo ao período de bacteremia. A ação da toxina nas arteríolas e capilares determina hemorragias e necrose. Petéquias e equimose são encontradas quase sempre na pele e mucosas. Há hemorragias nas cavidades serosas, nos aparelhos respiratórios, digestivos e urinário. Nos casos graves, estas manifestações conferirão à pele um aspecto escuro. • Remissão – em geral, se inicia por volta do oitavo dia e caracteriza-se por uma regressão dos sintomas, com a febre caindo em lise e os bubões reabsorvidos ou fistulados. Quando o quadro é de peste bubônica, pode haver remissão mesmo sem tratamento em percentual considerável dos casos; entretanto, nos casos de peste pneumônica se não for instituída a terapia adequada o óbito ocorre em poucos dias. Diagnóstico diferencial A peste bubônica deve ser diferenciada de adenites regionais supurativas, linfogranuloma venéreo, cancro mole, tularemia e sífilis. Em alguns focos brasileiros, a peste bubônica pode, inclusive, ser confundida com a leishmaniose tegumentar americana, na sua forma bubônica. A forma septicêmica deve ser diferenciada de septicemias bacterianas das mais diversas naturezas e de doenças infecciosas de início agudo e de curso rápido e grave. Nas áreas endêmicas de tifo exantemático, tifo murino e febre maculosa, pode haver dificuldade diagnóstica com a septicemia pestosa. A peste pulmonar, pela sua gravidade, deve ser diferenciada de outras pneumonias, broncopneumonias e estados sépticos graves. A suspeita diagnóstica pode ser difícil no início de uma epidemia ou quando é ignorada a existência da doença em uma localidade, já que suas primeiras manifestações são semelhantes a muitas outras infecções bacterianas. A história epidemiológica compatível facilita a suspeição do caso. Diagnóstico laboratorial É realizado mediante o isolamento e a identificação da Y. pestis, em amostras de aspirado de bubão, escarro e sangue. Pode-se realizar imunofluorescência e também sorologia por meio das técnicas de hemaglutinação/inibição da hemaglutinação (PHA/PHI), Elisa, Dot-Elisa) e diagnóstico bacteriológico por meio de cultura e hemocultura. 576 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Peste Tratamento O tratamento com antibióticos ou quimioterápicos deve ser instituído precoce e intensivamente, não se devendo, em hipótese alguma, aguardar os resultados de exames laboratoriais, devido à gravidade e rapidez da instalação do quadro clínico. Amostras para exame devem ser colhidas antes do início do tratamento. O ideal é que se institua a terapêutica específica nas primeiras 15 horas após o início dos sintomas. Estreptomicina – é o antibiótico mais eficaz contra a Y. pestis, particularmente na forma pneumônica. Entretanto, atualmente, seu uso está bastante restrito devido às suas manifestações tóxicas. A dose pode ser de 30mg/kg/dia (não ultrapassando o total de 2g/dia), por via intramuscular, durante 10 dias ou até 3 dias depois da temperatura ter voltado ao normal. Cloranfenicol – é a droga de eleição para as complicações que envolvem espaços tissulares (peste meníngea), onde outros medicamentos penetram com dificuldade. A via de administração pode ser oral ou venosa. A dosagem é de 50mg/kg/dia, dividida em 4 tomadas diárias (6 em 6 horas), durante 10 dias. Tetraciclinas – este grupo de antibiótico é bastante efetivo no tratamento primário de pacientes com peste sem complicações. Aplicar uma dose inicial de15 mg/kg (não devendo exceder 1g total) e continuar com 25-50 mg/kg/dia (não ultrapassar 2g/dia) por 10 dias. As tetraciclinas podem também ser usadas combinadas com outros antibióticos. Sulfamidas – têm sido usadas extensivamente em prevenção e tratamento da peste. Entretanto, alguns estudos têm mostrado serem bem menos efetivas do que os antibióticos anteriormente referidos. A sulfadiazina é usada em doses de 2-4g, seguida de dose de 1g, de 4-6 horas, por um período de 10 dias. Em crianças, a dose oral é de 75mg/kg, seguida de 150 mg/kg/dia, dividida em 6 doses. A combinação das drogas sulfametoxazol + trimetoprima tem sido usada na prevenção e tratamento da peste. 6 Atenção: os antibióticos das classes das penicilinas, cefalosporinas e macrolídeos não são eficazes no tratamento da peste. P Tratamento da peste em grávidas e crianças – é importante atentar para a escolha do antibiótico durante a gravidez, devido aos efeitos adversos. Experiências têm mostrado que os aminoglicosídeos administrados de forma cuidadosa são eficazes e seguros para mãe, feto e crianças. A gentamicina é o antibiótico preferencial para tratamento da peste em mulheres grávidas. Tratamento de suporte – deve-se buscar controlar os sintomas à medida que forem aparecendo. Como medidas gerais e de tratamento sintomático, recomenda-se desde o princípio observar o estado da circulação, da pressão arterial e da função cardíaca. Se necessário, empregar analépticos cardiovasculares para contrabalançar os efeitos da toxina sobre o coração, sedativos para combater a agitação e o delírio e anti-hemorrágicos para as manifestações hemorrágicas. Fazer reidratação e reposição dos eventuais distúrbios hidreletrolíticos. Manter cuidados com as mucosas e a mobilização do paciente. O bubão tende à reabsorção sob a ação dos antibióticos, dispensando qualquer tratamento local, devendo-se fazer a drenagem unicamente nos casos de bubões supurados. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 577 Peste Aspectos epidemiológicos A peste continua sendo potencialmente perigosa em diversas partes do mundo, devido à persistência da infecção em roedores silvestres e ao seu contato com ratos comensais. Focos naturais de peste persistem na África, Ásia, sudeste da Europa, América do Norte e América do Sul. Na América do Norte, tem sido comprovada a existência da peste na região ocidental dos Estados Unidos. Na América do Sul, a peste tem sido notificada pelos seguintes países: Brasil, Bolívia, Equador e Peru. No Brasil, existem duas áreas principais de focos naturais: o Nordeste e Teresópolis. O foco do Nordeste está localizado na região semi-árida do Polígono das Secas, em vários estados (Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Bahia), e nordeste de Minas Gerais (Vale do Jequitinhonha), além de outra zona pestosa no estado de Minas Gerais fora do Polígono das Secas (Vale do Rio Doce). O foco de Teresópolis fica localizado na Serra dos Órgãos, nos limites dos municípios de Teresópolis, Sumidouro e Nova Friburgo (Figura 1). Figura 1. Regiões pestígenas. Brasil, 1983-2000 Fonte: SVS/MS De 1983 a 2000, foram notificados 487 casos humanos no país. Estes registros foram procedentes dos focos do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Bahia e Minas Gerais (Figura 2). Além do potencial epidêmico, outro aspecto epidemiológico que se destaca é o potencial letal da peste. A forma bubônica quando não tratada pode chegar a 50% e a pneumônica e septicêmica, próximas a 100% de letalidade. 578 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Peste Figura 2. Casos de peste humana por UF. Brasil, 1983-2000 350 300 250 200 150 100 50 0 CE 125 RN 1 PB 54 BA 302 MG 6 6 Unidade federada Fonte: SVS/MS Vigilância epidemiológica Objetivos • Impedir a transmissão para humanos mediante controle dos focos naturais (prevenção primária). • Realizar diagnóstico precoce de casos humanos (prevenção secundária) visando diminuir a letalidade da doença. • Impedir a reintrodução da peste urbana através de portos e aeroportos. P Definição de caso Suspeito • Paciente que apresentar quadro agudo de febre em área pertencente a um foco natural de peste, que evolua com adenite (“sintomático ganglionar”). • Paciente proveniente de área com ocorrências de peste pneumônica (de 1 a 10 dias) e que apresente febre e/ou outras manifestações clínicas da doença, especialmente sintomatologia respiratória. Confirmado Critério clínico-laboratorial Todo caso com quadro clínico de peste e diagnóstico laboratorial confirmado (positivo classe I). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 579 Peste Critério clínico-epidemiológico Todo caso com quadro clínico sugestivo de peste e história epidemiológica, em área onde tenha sido confirmada laboratorialmente a ocorrência de peste humana ou animal (positivo classe II). Descartado • Caso suspeito com diagnóstico laboratorial negativo. • Caso suspeito com história epidemiológica não compatível. • Caso com história epidemiológica porém sem nenhuma confirmação anterior de caso confirmado laboratorialmente. Notificação A peste é uma doença de notificação compulsória, sujeita ao Regulamento Sanitário Internacional. Todos os casos suspeitos devem ser imediatamente notificados por telefone, fax ou e-mail às autoridades sanitárias superiores. A rapidez nas notificações visa à prevenção de novos casos e até mesmo de um surto. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente Tratar precoce e adequadamente o paciente. Qualidade da assistência Verificar se os casos estão sendo atendidos de acordo com as orientações pertinentes. Proteção individual Manter em isolamento restrito os casos de peste pneumônica, com precauções contra a disseminação aérea até se tenha completado 48 horas de esquema de tratamento com antibiótico apropriado. Confirmação diagnóstica Coletar material para diagnóstico laboratorial de acordo com as orientações constantes do Anexo 1. Proteção da população Proteção de contatos – logo que se tenha conhecimento da suspeita de caso(s) de peste é indicada a quimioprofilaxia para contatos de pacientes com peste pneumônica e para indivíduos suspeitos de terem tido contato com pulgas infectadas. Devem ser intensificadas ações de esclarecimento à população sobre o ciclo de transmissão da doença, gravidade e situação de risco, utilizando-se os meios comunicação de massa, bem como visitas domiciliares e palestras. 580 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Peste Investigação Todos os casos de peste devem ser cuidadosamente investigados, não só para o correto diagnóstico dos pacientes como também para orientar as medidas de controle a serem adotadas. O instrumento de coleta de dados, a ficha epidemiológica disponível no Sinan, contém os elementos essenciais a serem coletados em uma investigação de rotina. Todos os seus campos devem ser criteriosamente preenchidos, mesmo quando a informação for negativa. Outros itens e observações podem ser incluídos, conforme as necessidades e peculiaridades de cada situação. Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente Preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica do Sinan relativos aos dados gerais, notificação individual e dados de residência. 6 Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmar a suspeita diagnóstica – anotar na ficha de investigação dados sobre critério de confirmação, classificação da forma clínica e gravidade. Para identificação da área de transmissão – verificar se o local de residência corresponde a uma área de provável transmissão da doença (focos naturais da doença). A identificação da área onde se deu a transmissão é de suma importância para a condução das medidas de controle. Para determinação da extensão da área de transmissão • Busca ativa de caso humano: após a identificação do possível local de transmissão iniciar imediatamente a busca ativa de outros casos humanos na localidade. • Captura, identificação e exames de reservatórios e vetores: a morte de roedores na área é sugestiva da circulação da Y. pestis, daí a importância de capturar roedores para identificação. Proceder também à captura, identificação e exame das pulgas existentes no local, para pesquisa da Y. pestis. Esse trabalho deve ser executado por equipes treinadas, com observância dos cuidados de biossegurança. P Coleta e remessa de material para exames Logo após a suspeita clínica de peste, coletar material para exame, antes de iniciar o tratamento (conforme o Anexo 1). Atenção Em vista da gravidade e rapidez da instalação do quadro clínico da doença, não se deve em hipótese alguma aguardar os resultados de exames laboratoriais para instituir o tratamento. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 581 Peste Roteiro de investigação epidemiológica da peste Ocorrência de caso suspeito de peste Atendimento clínico Avaliação criteriosa da história clínica e do exame físico 1a instância de investigação Interrogatório meticuloso sobre dados de caráter epidemiológico De acordo com dados clínico-epidemiológicos confirmar ou descartar a suspeita do(s) caso(s) 2a instância de investigação Nos casos em que se mantiver a suspeita diagnóstica coletar material para testes laboratoriais de acordo com procedimentos do Anexo 1 Realizar investigação epidemiológica de campo Busca ativa de outros casos suspeitos 3a instância de investigação Busca ativa de indícios de outros roedores Testagem laboratorial das amostras coletadas visando a identificação da Y. pestis Bacteriológico 4a instância de investigação Coleta de espécimes para testes laboratoriais tanto dos casos humanos como dos animais suspeitos Sorológico De posse de todos os dados, fazer uma reavaliação do(s) caso(s) classificando-os em conformidade com o resultado da investigação Observação: da mesma forma que os eventos envolvendo pessoas, as denúncias sobre epizootias de roedores devem ser objeto de investigação. 582 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Peste Análise dos dados O profissional deve interpretar passo a passo os dados coletados, englobando o surgimento de casos humanos de peste (confirmados e suspeitos); comprovação de peste animal em roedores, pulgas, carnívoros ou outros mamíferos e descoberta de roedores mortos na localidade com causa atribuível à peste, para orientar e desencadear as medidas de controle. Encerramento de casos A ficha epidemiológica de cada caso deve ser analisada visando definir qual o critério utilizado para o diagnóstico, considerando as seguintes alternativas: Confirmado por critério clínico-laboratorial Caso o objeto de investigação seja confirmado por um ou mais testes de laboratório (Classe I). 6 Confirmado por critério clínico-epidemiológico Caso não confirmado por teste laboratorial, mas que se enquadra em critérios clínicos e epidemiológicos bem estabelecidos, os quais caracterizam, com boa margem de segurança, a nosologia pestosa (Classe II). Situações abrangidas: • caso humano com quadro clínico compatível com nosologia pestosa, claramente associado com peste comprovada em roedores, pulgas ou carnívoros; • caso com quadro clínico sugestivo, bastante compatível com peste, de ocorrência em região pestígena reconhecida como tal e associado a indício de peste animal; • caso com quadro clínico não característico, porém ainda assim considerado compatível com peste, ocorrido em região pestígena conhecida e aliado a indícios seguros de peste animal. P Óbito Caso investigado, com evolução para óbito. Caso descartado Caso investigado, cujo resultado dos testes laboratoriais foram negativos, com isolamento de outro agente patogênico; caso não submetido a testes laboratoriais, com quadro clínico-epidemiológico considerado suficiente para excluir com segurança a hipótese de peste. Relatório final Os dados da investigação deverão ser sumarizados em um relatório com as principais conclusões, das quais destacam-se: • área de transmissão dos casos. Distribuição dos casos segundo espaço, pessoa e tempo; • situação atual do foco e medidas de controle adotadas para impedir a transmissão para humanos; Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 583 Peste • situação de risco para a ocorrência de novos casos ou surtos; • critérios de confirmação e descarte dos casos. Instrumentos disponíveis para controle Imunização A vacina disponível é muito pouco utilizada, pois é de baixa tolerabilidade e a proteção conferida é de curta duração (alguns meses), após a administração de duas ou três doses e mais uma de reforço. Controle vetorial O ambiente onde vivem os contatos deve ser desinfestado (despulizado) de pulgas através do uso de inseticidas. Caso se suspeite que outras habitações possam estar com pulgas contaminadas, deve-se estender essa medida. Se houver indicação de desratização ou anti-ratização, a eliminação das pulgas deve anteceder a eliminação dos roedores. Vários tipos de inseticidas podem ser empregados com sucesso para o controle das pulgas, destacando-se o grupo dos carbamatos e piretróides. Ações de educação em saúde A prática educativa nas ações de controle é tão mais efetiva quanto mais se contar com a compreensão e participação ativa da comunidade. Orientações devem ser dadas quanto a necessidade de se evitar que roedores disponham de abrigo e alimento próximos às habitações humanas e as formas de eliminá-los quando presentes – precedendo com o cuidado de eliminação das pulgas; caso contrário, sem seu alimento habitual, elas terão como alternativa invadir o ambiente doméstico. Evitar que os roedores entrem em contato com grãos armazenados pelo homem, mesmo em anexos fora do domicílio. Evitar contato com roedores silvestres em áreas de foco pestoso. Estratégias de prevenção • Monitoramento da atividade pestosa em roedores e pulgas. • Busca de outras situações que indiquem aumento do risco de contágio (índices de roedores e pulgas acima do usual, infestação murina domiciliar). • Identificação precoce de casos para pronta intervenção da vigilância epidemiológica. • Vigilância nas áreas portuárias e aeroportuárias (incluindo naves e aeronaves): estado de alerta para a possibilidade de importação da peste. Vigilância epidemiológica – de acordo com o período de incubação da peste, preconiza-se que todo indivíduo que tenha contato com paciente de peste pneumônica deva ficar sob vigilância durante sete dias, visando diagnóstico precoce e adoção de medidas de prevenção. Os contatos devem ser informados a respeito dos sinais, sintomas e gravidade da 584 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Peste doença, para buscar assistência médica imediata caso haja alteração no seu estado de saúde, informando ao médico o fato de ter tido contato com paciente de peste. Proteção de contatos Quimioprofilaxia Indicada para contatos de pacientes com peste pneumônica e para indivíduos suspeitos de terem tido contato com pulgas infectadas nos focos da doença. Drogas indicadas Sulfadiazina: 2 a 3 gramas por dia (divididas em 4 ou 6 tomadas, durante 6 dias) Sulfametoxazol + trimetoprima: 400mg e 80mg, respectivamente, de 12 em 12 horas, durante 6 dias. Tetraciclina: 1 grama ao dia, durante 6 dias. 6 Atenção É importante lembrar que os menores de 7 anos não podem fazer uso de tetraciclinas. P Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 585 Peste Anexo 1 Normas para procedimentos laboratoriais O diagnóstico específico da peste é de extrema importância para a vigilância epidemiológica. O diagnóstico laboratorial compreende o isolamento e identificação da Y. pestis, bem como a detecção de anticorpos em material coletado. Pode ser realizado por técnicas bacteriológicas e sorológicas. No quadro abaixo, consta o tipo de material que deve ser coletado dependendo da forma clínica da doença. Coleta e conservação de material para diagnóstico de peste Forma da doença Tipo de material Acondicionamento das amostras para transporte e diagnóstico bacteriológico Análises bacteriológicas Exame de esfregaço corado (azul de metileno ou gram) Bubônica Aspirado de bubão Cary-Blair Semeio em duas placas de gelose (Blood ágar base), colocar o fago antipestoso em 1 placa Exame de esfregaço corado (azul de metileno ou gram) Pneumônica Septicêmica Esputo Cary-Blair Hemocultura 2ml de sangue em 20ml de caldo (BHI) Digitotomia (falange) Óbito Morte recente: Sangue Aspirado de bubão 586 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS In natura (em frasco estanque) Cary-Blair Cary-Blair Semeio em duas placas de gelose (Blood ágar base), colocar o fago antipestoso em 1 placa Subcultivo em gelose e teste de bacteriófago Enquanto perdurar a ausência de crescimento, repetir os subcultivos a cada 48 horas, até 8 dias Aspirar a medula óssea, fazer esfregaços e semeio em duas placas de gelose (uma com fago) Exame de esfregaço corado (azul de metileno ou gram); semeio em duas placas de gelose (uma com o fago) Exame de esfregaço corado (azul de metileno ou gram); semeio em duas placas de gelose (um com o fago) Poliomielite POLIOMIELITE CID 10: A80 Características clínicas e epidemiológicas Descrição A poliomielite ou “paralisia infantil” é uma doença infecto-contagiosa viral aguda, caracterizada por quadro de paralisia flácida, de início súbito. O déficit motor instala-se subitamente e a evolução desta manifestação, freqüentemente, não ultrapassa três dias. Acomete em geral os membros inferiores, de forma assimétrica, tendo como principais características a flacidez muscular, com sensibilidade conservada e arreflexia no segmento atingido. Esta doença encontra-se erradicada no país desde o início dos anos 90, em virtude do êxito da política de prevenção, vigilância e controle desenvolvida pelos três níveis do Sistema Único de Saúde. 6 Agente etiológico Os poliovírus pertencem ao gênero enterovírus, da família Picornaviridae, e apresentam três sorotipos: I, II e III. Reservatório O homem. Modo de transmissão A transmissão ocorre principalmente por contato direto pessoa a pessoa, fazendo-se a transmissão pelas vias fecal-oral ou oral-oral, esta última através de gotículas de muco da orofaringe (ao falar, tossir ou espirrar). As más condições habitacionais, a higiene pessoal precária e o elevado número de crianças numa mesma habitação constituem fatores que favorecem a transmissão do poliovírus. P Período de incubação O período de incubação é, geralmente, de 7 a 12 dias, podendo variar de 2 a 30 dias. Período de transmissibilidade O período de transmissibilidade pode iniciar-se antes do surgimento das manifestações clínicas. Em indivíduos susceptíveis, a eliminação do vírus se faz pela orofaringe, por um período de cerca de uma semana, e pelas fezes, por cerca de seis semanas, enquanto nos indivíduos reinfectados a eliminação do vírus se faz por períodos mais reduzidos. Período de susceptibilidade e imunidade Todas as pessoas não imunizadas são susceptíveis de contrair a doença. A infecção natural ou a vacinação conferem imunidade duradoura, tipo-específica (ou seja, de acordo Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 587 Poliomielite com o poliovírus responsável pelo estímulo antigênico). Contudo, embora não desenvolvendo a doença, as pessoas imunes podem reinfectar-se e eliminar o poliovírus, ainda que em menor quantidade e por um período menor de tempo. Esta reinfecção é mais comum pelos tipos 1 e 3. O recém-nascido é provido de anticorpos séricos maternos da classe IgG transferidos, da mãe sensibilizada, para o feto por via placentária, que conferem proteção transitória à criança nos primeiros meses de vida extra-uterina. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas As manifestações clínicas devidas à infecção pelo poliovírus são, em sua maioria, infecções inaparentes (90% a 95%). No entanto, em 1%-1,6% dos casos a doença pode manifestar-se clinicamente por quadros de paralisia grave, levando à morte. Apenas as formas paralíticas possuem características clínicas típicas que permitem sugerir o diagnóstico de poliomielite, quais sejam: • instalação súbita da deficiência motora, acompanhada de febre; • assimetria, acometendo sobretudo a musculatura dos membros, com mais freqüência os inferiores; • flacidez muscular, com diminuição ou abolição de reflexos profundos na área paralisada; • sensibilidade conservada; • persistência de alguma paralisia residual (seqüela), após 60 dias do início da doença. Diagnóstico diferencial O diagnóstico diferencial da poliomielite deve ser feito com polineurite pós-infecciosa e outras infecções que causam paralisia flácida aguda. As principais doenças a serem consideradas no diagnóstico diferencial são: síndrome de Guillain-Barré (SGB), mielite transversa, meningite viral, meningoencefalite e outras enteroviroses (Echo tipo 71 e coxsackie, especialmente do grupo A tipo 7). Para o adequado esclarecimento diagnóstico, a investigação epidemiológica e a análise dos exames complementares são essenciais. Diagnóstico laboratorial Exames específicos Isolamento do vírus – é feito a partir de amostras de fezes do caso ou de seus contatos. O isolamento de poliovírus selvagem nessas amostras permite a confirmação diagnóstica. A identificação do agente viral isolado pode ser realizada através de testes de soroneutralização com o uso de soros imunes específicos ou através da técnica de PCR. Esta técnica, que amplifica seqüências nucleotídicas específicas presentes no genoma viral, permite reconhecer o vírus isolado como pertencente ao gênero dos enterovírus, além de propiciar 588 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Poliomielite Elementos para o diagnóstico diferencial entre Poliomielite, síndrome de Guillain-Barré e mielite transversa Especificação Poliomielite Síndrome de Guillain-Barré Mielite transversa Instalação da paralisia 24 a 28 horas Desde horas até 10 dias Desde horas até 4 dias Febre ao início Alta. Sempre presente no início da paralisia, desaparece no dia seguinte Não é freqüente Raramente presente Paralisia Aguda, assimétrica, principalmente proximal Geralmente aguda. Simétrica e distal Aguda, simétrica em membros inferiores Reflexos osteotendinosos profundos Diminuídos ou ausentes Globalmente ausentes Ausentes em membros inferiores Sinal de Babinsky Ausente Ausente Presente Sensibilidade Grave mialgia Parestesia, hipoestesia Anestesia de MMII com nível sensitivo Sinais de irritação meníngea Geralmente presentes Geralmente ausentes Ausentes Comprometimento de nervos cranianos Somente nas formas bulbares Pode estar presente Ausente Insuficiência respiratória Somente nas formas bulbares Em casos graves, exarcebada por pneumonia bacteriana Em geral torácica, com nível sensorial Líquido cefalorraquidiano Inflamatório Dissociação proteíno-citológica Células normais ou elevadas; aumento moderado ou acentuado de proteínas Disfunção vesical Ausente Às vezes transitória Presente Velocidade de condução nervosa Normal ou pode-se detectar apenas redução na amplitude do potencial da unidade motora Redução da velocidade de condução motora e sensitiva Dentro dos limites da normalidade Presença ou não de fibrilações e pontas positivas. Potencial da unidade motora pode ser normal ou neurogênico Dentro dos limites da normalidade Presença ou não de fibrilações Eletromiografia (EMG) Potencial da unidade motora com longa duração e aumento da amplitude 6 P identificação do sorotipo de poliovírus isolado, bem como a sua origem, se vacinal ou selvagem. O isolamento viral a partir do líquor, quando disponível, pode ser realizado pois a presença de vírus no líquor permite também a confirmação diagnóstica. O seqüenciamento nucleotídico identifica o número de mutações e as possíveis recombinações que possam ter ocorrido no genoma do poliovírus vacinal isolado, em relação à sequência do vírus Sabin padrão correspondente. O vírus é considerado como sendo semelhante ao vírus vacinal se o número de mutações for de até 0,9%. A partir de 1%, o vírus é considerado como poliovírus vacinal derivado. Os vírus derivados readquirem as características biológicas dos poliovírus selvagens, tais como neurovirulência e capacidade de circulação por tempo prolongado na comunidade. Para a vigilância epidemiológica, estes vírus devem ser considerados como selvagens. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 589 Poliomielite Os poliovírus, selvagem e vacinal, também podem ser isolados a partir de amostras de água de esgoto. As mesmas técnicas anteriormente descritas, podem ser utilizadas para a identificação do enterovírus detectado. Os laboratórios nacionais de referência para o diagnóstico laboratorial dos poliovírus e demais enterovírus de interesse em saúde pública são o Instituto Evandro Chagas/SVS/ MS, o Laboratório Central de Saúde Pública da secretaria de saúde do estado de Pernambuco e a Fundação Oswaldo Cruz/MS. Sorologia – no Brasil, a sorologia deixou de ser utilizada como apoio para o diagnóstico de poliomielite a partir de maio de 1990, devido à grande quantidade de vacina oral contra a poliomielite (VOP) administrada no país, que resultou em elevados títulos de anticorpos para os três tipos de poliovírus na população, dificultando a interpretação dos resultados. Exames complementares (inespecíficos) Líquor – permite o diagnóstico diferencial com a síndrome de Guillain-Barré e com as meningites que evoluem com deficiência motora. Na poliomielite, observa-se discreto aumento do número de células, podendo haver discreto aumento de proteínas. Na síndrome de Guillain-Barré observa-se uma dissociação proteíno-citológica (aumento acentuado de proteínas sem elevação da celularidade) e nas meningites observa-se aumento do número de células, com alterações bioquímicas. Eletromiografia – os achados e o padrão eletromiográfico da poliomielite são comuns a um determinado grupo de doenças que afetam o neurônio motor inferior. Este exame pode contribuir para descartar a hipótese diagnóstica de poliomielite quando seus achados são analisados conjuntamente com os resultados do isolamento viral e da evolução clínica. Anatomopatologia – o exame anatomopatológico do sistema nervoso não permite o diagnóstico de certeza, pois não há alterações patognomônicas. Entretanto, dada a predileção do parasitismo do poliovírus pelas células motoras do corno anterior da medula e de alguns núcleos motores dos nervos cranianos, as alterações histológicas podem ser extremamente sugestivas e possibilitam fechar o diagnóstico diante de um quadro clínico suspeito. As alterações consistem em atividade inflamatória, perivasculite linfocitária, nódulos ou atividade microglial difusa e figuras de neuronofagia (neurônios sendo fagocitados por células da microglia). Essas alterações são comuns a quaisquer encefalomielites virais, sendo que nos casos de poliomielite predominam nitidamente no corno anterior da medula e no tronco cerebral. Coleta, conservação e transporte de amostras clínicas Coleta de amostras de fezes dos casos A amostra de fezes constitui o material mais adequado para o isolamento do poliovírus. Embora os pacientes com poliomielite eliminem poliovírus durante semanas, os melhores resultados de isolamento são alcançados com amostras fecais coletadas na fase aguda da doença. • Todo caso conhecido tardiamente deverá ter uma amostra de fezes, coletada até 60 dias após o início da deficiência motora. 590 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Poliomielite • O swab retal somente é recomendado naqueles casos de paralisia flácida aguda (PFA) que foram a óbito antes da coleta adequada de fezes. Em crianças que apresentam obstipação intestinal, dificultando a coleta de amostras de fezes, pode-se utilizar supositório de glicerina. Coleta de amostras de fezes de contatos Deverão ser coletadas exclusivamente nas seguintes situações: • contatos de caso com clínica compatível com poliomielite, quando houver suspeita de reintrodução da circulação do poliovírus selvagem. • contato de caso em que haja confirmação do vírus derivado vacinal. Observações Outras situações que requeiram coleta de contatos, não previstas neste Guia, deverão ser previamente discutidas com a Coordenação Nacional da Vigilância das PFA/Pólio. Lembrar-se de que os contatos não são necessariamente intradomiciliares (embora, quando presentes, devam ser priorizados para coleta de amostras de fezes). Não coletar amostras de contato que recebeu a vacina contra a poliomielite (VOP) nos últimos 30 dias. 6 Conservação e transporte de amostras de fezes • Colocar cada amostra em um recipiente limpo e seco (de preferência nos coletores distribuídos para esse fim) e vedar bem. A quantidade de fezes recomendada deve equivaler ao tamanho de dois dedos polegares de adulto. • Os recipientes contendo amostras fecais devem ser conservados em freezer a -20°C, até o momento do envio. Na impossibilidade da utilização de freezer, colocar em geladeira comum (4º-8ºC) por até, no máximo, 3 dias, não devendo jamais ser colocados em congelador comum. • O transporte deve ser feito em caixa térmica com gelo seco. Os recipientes das amostras devem estar acondicionados em saco plástico bem vedado, para que, em caso de descongelamento, não haja risco de molhar o material. • A caixa térmica deve conter gelo suficiente para resistir ao transporte para entrega ao laboratório. Deve ser fechada por fora, com fita adesiva, e ser acondicionada em outra caixa de papelão de acordo com as especificações do Departamento de Aviação Civil ou Agência Nacional de Transporte Terrestre. • Deve ser enviada ao laboratório, acompanhando as amostras de fezes, uma cópia da ficha de envio de amostras devidamente preenchida e acondicionada em saco plástico para evitar que seja molhada, prejudicando as informações. P Líquor (LCR) – se disponível e coletado na fase aguda do quadro clínico, deve ser enviado ao laboratório de referência em tubo estéril, em volume de aproximadamente 2ml. O LCR deve ser conservado em freezer e transportado congelado em caixas térmicas contendo gelo seco ou gelo reciclável. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 591 Poliomielite Tratamento Não há tratamento específico. Todos os casos devem ser hospitalizados, fazendo-se o tratamento de suporte de acordo com o quadro clínico do paciente. Aspectos epidemiológicos Até a primeira metade da década de 80, a poliomielite foi de alta incidência no Brasil, contribuindo de forma significativa para a elevada prevalência anual de seqüelas físicas observada naquele período. Em 1994, a Organização Pan-Americana da Saúde/OMS certificou a erradicação da transmissão autóctone do poliovírus selvagem nas Américas, após 3 anos sem circulação deste vírus neste continente. Desde então, todos os países da região assumiram o compromisso de manter altas e homogêneas coberturas vacinais, bem como uma vigilância epidemiológica ativa e sensível para identificar imediatamente a reintrodução do poliovírus selvagem em cada território nacional e adotar medidas de controle capazes de impedir sua disseminação. No Brasil, o último caso de infecção pelo poliovírus selvagem ocorreu em 1989, na cidade de Souza/PB. A estratégia adotada para a erradicação no país foi centrada na realização de campanhas de vacinação em massa com a vacina oral contra a pólio (VOP), que, além de propiciar imunidade individual, aumenta a imunidade de grupo na população em geral através da disseminação do poliovírus vacinal no meio ambiente em curto espaço de tempo. O número de casos de paralisia flácida aguda e poliomielite, no período 1980-2003, encontram-se representados no gráfico a seguir. Dois fatores foram decisivos para a erradicação da poliomielite no Brasil: os elevados níveis de cobertura vacinal obtidos nas campanhas nacionais a partir de 1988 e o aumento do poder imunogênico da vacina utilizada no país, pela substituição do componente P3 até então utilizado. Observa-se que no período imediatamente após a certificação da erradicação do poliovírus selvagem das Américas houve redução na sensibilidade do Sistema de Vigilância Epidemiológica, que foi recuperada somente na década atual como resultado de intenso esforço institucional para aprimorar a vigilância da poliomielite junto às unidade da Federação. No momento atual, chama-se a atenção para um fenômeno já observado em algumas ocasiões em países com coberturas vacinais insuficientes e/ou heterogêneas: a emergência de cepas de vírus derivados da vacina, que passam a readquirir neurovirulência e patogenicidade, provocando surtos de poliomielite em países que já tinham a doença sob controle parcial ou total. O surto mais importante desta doença devido a vírus derivado vacinal (PVDV) ocorreu na ilha de Hispaniola (que pertence ao Haiti e à República Dominicana), em 2000/01, quando foram registrados 22 casos (50% na faixa de 1-4 anos). Outros surtos de menor magnitude, ocorridos no período 1988/2002, foram registrados no Egito, em Guizhou/China, nas Filipinas e em Madagascar. O fator chave para o controle do poliovírus derivado da vacina é o mesmo daquele necessário para controlar a circulação de poliovírus selvagem: alcançar e manter altas e homogêneas coberturas vacinais. 592 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Poliomielite Chama-se também a atenção para o risco de importações de casos de países onde ainda há circulação endêmica do poliovírus selvagem, o que demanda ações permanentes e efetivas de vigilância da doença e níveis adequados de proteção imunológica da população. Número de casos notificados de paralisia flácida aguda e confirmados de poliomielite. Brasil, 1980-2003 1.400 1.200 1.000 800 6 600 400 200 0 80 81 82 1.290 122 69 0 0 0 83 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 45 130 329 612 196 106 35 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 Poliomielite 84 85 0 86 0 0 87 0 88 0 0 517 538 419 453 432 369 437 528 678 637 654 PFA Fonte: Cover/CGDEP/Devep/SVS/MS P Vigilância epidemiológica Objetivos Geral Manter erradicada a poliomielite no Brasil. Específicos • Monitorar a ocorrência de casos de paralisia flácida aguda (PFA) em menores de 15 anos de idade. • Acompanhar e avaliar o desempenho operacional do Sistema de Vigilância Epidemiológica das PFAs no país. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 593 Poliomielite • Assessorar tecnicamente os demais níveis do Sistema Único de Saúde. • Produzir e disseminar informações epidemiológicas. A suspeita de poliomielite em indivíduos de qualquer idade e as PFAs em menores de 15 anos são de notificação e investigação obrigatórias. Para a detecção de casos de poliomielite em tempo hábil, o Sistema de Vigilância Epidemiológica deve ser suficientemente sensível e ágil para: • identificar, notificar e investigar imediatamente todo caso de deficiência motora flácida, de início súbito, em menores de 15 anos, independente da hipótese diagnóstica, e em pessoas de qualquer idade que apresentem suspeita diagnóstica de poliomielite; • analisar e detectar oportunamente os surtos de PFA/Pólio, para que as medidas de controle possam ser rapidamente reforçadas; • acompanhar e avaliar as tendências das paralisias flácidas agudas; • identificar e investigar todo caso de evento adverso da vacina oral contra a poliomielite; • estimular pesquisas de casos associados à vacina e ao comportamento de outras síndromes paralíticas. Definição de caso Suspeito • Todo caso de deficiência motora flácida, de início súbito, em menores de 15 anos, independente da hipótese diagnóstica de poliomielite. • Toda hipótese diagnóstica de poliomielite, em pessoas de qualquer idade. Nota: os casos de paralisia ocular isolada e paralisia facial periférica não devem ser investigados. Confirmado Caso de paralisia flácida aguda em que houve isolamento de poliovírus selvagem na(s) amostra(s) de fezes do caso ou de um de seus comunicantes, independente de haver ou não seqüela, após 60 dias do início da deficiência motora. Poliomielite compatível Caso de PFA que não teve coleta adequada de amostra de fezes e que apresentou seqüela aos 60 dias ou evoluiu para óbito ou teve evolução clínica ignorada. Descartado (não-poliomielite) Caso de paralisia flácida aguda no qual não houve isolamento de poliovírus selvagem em amostra(s) adequada(s) de fezes, ou seja, amostra (s) coletada(s) até 14 dias do início da deficiência motora. 594 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Poliomielite Poliomielite associada à vacina Casos de PFA em que há isolamento de vírus vacinal na(s) amostra(s) de fezes e presença de seqüela compatível com poliomielite, 60 dias após o início da deficiência motora. Há dois tipos de poliomielite relacionados com a vacina: • paralisia flácida aguda, que se inicia entre 4 e 45 dias após o recebimento da VOP e que apresenta seqüela neurológica, compatível com poliomielite, 60 dias após o início do déficit motor; • caso de poliomielite associado à vacina administrada em contatos: PFA que surge após contato com criança que tenha recebido VOP até 40 dias antes. A paralisia surge de 4 a 85 dias após a exposição ao contato vacinado e o indivíduo apresenta seqüela neurológica compatível com poliomielite 60 dias após o déficit motor. Em qualquer das situações acima, o isolamento de poliovírus vacinal nas fezes é condição imprescindível para que o caso seja considerado como associado à vacina. Insiste-se na necessidade de coletar as fezes adequadamente, nos primeiros 14 dias após o início do déficit motor. Caso a coleta seja tardia, entre 15 e 40 dias após o início do déficit motor, e haja isolamento de vírus vacinal, o caso será classificado como associado à vacina. 6 Poliovírus derivado vacinal (PVDV) Poliovírus que apresenta mais de 1% de diferença genética em relação ao vírus vacinal correspondente. Notificação Diante da definição adotada para caso suspeito, todas as afecções neurológicas agudas, em menores de 15 anos, que cursam com paralisia flácida devem entrar no sistema de vigilância, isto é, devem ser notificadas e investigadas para afastar possíveis associações com o poliovírus. P Primeiras medidas a serem adotadas Em virtude das características de transmissão do poliovírus, silenciosa e rápida, e da ocorrência de grande número de infecções sem manifestações clínicas, a vigilância deve ser intensificada com a finalidade de detectar a ocorrência de outros casos de PFA e de caracterizar o processo de transmissão. A manutenção dessa vigilância deve abranger, além do local de residência do doente, as localidades visitadas nos 30 dias anteriores ao início da paralisia, em caso de viagem, bem como os locais de residência das visitas recebidas no mesmo período, onde pode estar a provável fonte de infecção. Ao lado da intensificação da vigilância, também recomenda-se: avaliação da cobertura vacinal específica da área, visita às unidades de saúde, busca ativa de outros casos na área e contato com profissionais de saúde. Assistência médica ao paciente O repouso completo no leito e o tratamento sintomático são fundamentais. A internação em unidade de terapia intensiva é indicada nas formas graves da doença. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 595 Poliomielite Qualidade da assistência O atendimento dos casos de PFA deve ser realizado em unidade com adequado suporte, visando o monitoramento do paciente. Proteção individual para evitar circulação viral A proteção se dá através da vacina oral contra a poliomielite. Caso haja a suspeita de infecção por poliovírus selvagem em pacientes internados, orienta-se a adoção de precauções entéricas. Confirmação diagnóstica Utiliza-se a pesquisa de poliovírus nas fezes, coletadas nos primeiros 14 dias da deficiência motora. Proteção da população A principal proteção ocorre pela manutenção de elevadas coberturas vacinais na rotina e nas campanhas de vacinação em massa, com a vacina VOP. Quando houver casos notificados de PFA com hipótese diagnóstica de poliomielite, recomenda-se a vacinação com VOP indiscriminada para menores de 5 anos na área de abrangência do caso. Investigação epidemiológica Todo caso de paralisia flácida aguda deve ser investigado nas primeiras 48 horas após o conhecimento. Esta medida visa subsidiar o processo de tomada de decisão quanto ao desencadeamento, em tempo hábil, das medidas de controle indicadas em cada situação. A ficha de investigação epidemiológica de PFA é o instrumento de coleta de dados. Todos os seus campos devem ser rigorosamente preenchidos. Roteiro da investigação epidemiológica • Caracterizar clinicamente o caso, para determinar sua inclusão no sistema de investigação. • Colher uma amostra de fezes do caso, preferencialmente até o 14º dia do início da deficiência motora, para investigação etiológica. • Obter informações detalhadas e uniformes para todos os casos, através do preenchimento de todos os campos da ficha do Sinan para investigação epidemiológica de PFA, de modo a permitir a comparabilidade e análise dos dados. • Visitar imediatamente o domicílio para complementar dados da ficha de investigação (história vacinal, fonte de infecção, etc.) e buscar outros casos, quando necessário. • Orientar medidas de controle pertinentes. • Realizar a revisita do caso para avaliação de seqüela, 60 dias após o início da deficiência motora. • Classificar o caso conforme os critérios estabelecidos. • Retroalimentar a fonte notificadora. 596 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Poliomielite Identificação do paciente Preencher todos os itens da ficha de investigação epidemiológica do Sinan relativos aos dados gerais, notificação e residência. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Registrar na ficha de investigação dados clínicos, epidemiológicos e laboratoriais da doença. Os dados são coletados através das informações obtidas dos profissionais que prestaram assistência, das contidas no prontuário e das coletadas por ocasião da visita domiciliar. Coleta e remessa de material para exames Verificar o tópico Diagnóstico laboratorial. Análise dos dados Os dados devem ser analisados sistematicamente, visando produzir informações úteis ao processo de tomada de decisão sobre as ações de vigilância e controle da doença. 6 Encerramento de casos Os casos de PFA devem ser encerrados após 60 dias da notificação, quando se realiza a avaliação neurológica; faz-se necessário que todos os achados da investigação epidemiológica sejam minuciosamente avaliados. A classificação final dos casos deverá seguir as definições constantes do tópico Definição de casos. Relatório final A elaboração de relatório final não faz parte da rotina de investigação de caso de PFA; a ficha de notificação constitui o instrumento que fornece todas as informações necessárias para a inclusão, avaliação e descarte final dos casos. P Avaliação Indicadores e metas mínimas estabelecidas para acompanhamento e avaliação do sistema de vigilância epidemiológica da PFA/Pólio: • taxa de notificação de PFA: deve ser de, no mínimo, um caso para cada 100 mil habitantes menores de 15 anos de idade; • Proporção de casos investigados em 48 horas: pelo menos 80% dos casos notificados devem ser investigados dentro das 48 horas após a notificação; • Proporção de casos com coleta adequada de fezes: pelo menos 80% dos casos devem ter uma amostra de fezes, para cultivo do vírus, coletadas dentro das duas semanas seguintes do início da deficiência motora; • Notificação negativa: pelo menos 80% das unidades notificantes devem notificar a ocorrência ou não de casos de PFA, semanalmente. Este indicador é obtido a partir das informações produzidas nas fontes notificadoras de PFA existentes nos estados. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 597 Poliomielite Observação: o sistema de informação oficial para a vigilância das PFAs é o Sinan, e a alimentação e o fluxo de dados obedecerá normatização específica da Secretaria de Vigilância em Saúde/MS. Resumo da investigação epidemiológica da PFA/Poliomielite Caso suspeito Notificação Investigar em 48 horas Coletar dados clínicos e epidemiológicos Coletar uma amostra de fezes até o 14o dia do início do déficit motor Fazer a avaliação neurológica após 60 dias do déficit motor Verificar a ocorrência de outros casos na área Analisar a cobertura vacinal contra a poliomielite na área Reforçar, se necessário, as atividades de vacinação na área Complementar a investigação epidemiológica Encerrar o(s) caso(s), atualizar os sistemas de informações e retroalimentar as fontes notificadoras Instrumentos disponíveis para controle Juntamente com uma vigilância epidemiológica efetiva das PFAs, a vacinação constitui a principal medida para manter erradicada a circulação do poliovírus selvagem nas Américas. Portanto, deverão ser mantidas a vacinação de rotina nos serviços de saúde, além das campanhas nacionais de vacinação. Há dois tipos de vacinas: a vacina de vírus vivos atenuados para uso oral (VOP ou Sabin) e a vacina de vivos inativados (VIP ou Salk). 598 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Poliomielite Vacinação de rotina Compreende as atividades realizadas de forma contínua, através dos serviços permanentes de saúde, visando assegurar, o mais precocemente possível, a imunização adequada das crianças nascidas, para evitar a formação de bolsões populacionais susceptíveis à doença. O esquema vacinal preconizado consiste na administração de três doses de vacina antipólio oral (VOP), com intervalo de no mínimo 30 dias (iniciando-se aos dois meses de vida), com a administração de uma dose de reforço um ano após a 3ª dose. Esta vacina confere imunidade individual contra os três tipos de vírus, como também impede a multiplicação e eliminação do poliovírus selvagem no meio ambiente. Esta característica deve-se ao estímulo à produção de IgA secretória, que permite a competição dos vírus vacinais com o poliovírus selvagem nos sítios de acoplamento do mesmo na luz intestinal. Definição de criança adequadamente vacinada – é aquela que recebeu três ou mais doses de vacina oral contra poliomielite, com um intervalo mínimo de 30 dias entre cada dose. A VOP contém vírus atenuados nas seguintes concentrações de partículas antigênicas: • poliovírus tipo I – 1 milhão Dict 50 (dose infectante em cultura de tecido); • poliovírus tipo II – 100 mil Dict 50; • poliovírus tipo III – 600 mil Dict 50. 6 Outras substâncias estão presentes na vacina, como o cloreto de magnésio, a sacarose, a neomicina, a estreptomicina ou a eritromicina (estabilizantes) e o vermelho de amarante ou roxo de fenol (corante indicador de Ph). A vacina deve ser conservada entre +2ºC e +8ºC. Cada dose, em geral, corresponde a duas gotas, podendo variar conforme especificações do laboratório produtor. A eficácia situa-se em torno de 90% a 95% após a aplicação da 3ª dose. P Campanhas de vacinação As campanhas constituem ação complementar para a vacinação de rotina, quando a rede de serviços de saúde for insuficiente para assegurar satisfatória cobertura vacinal. É importante salientar que a vacina oral contra a poliomielite, aplicada em campanhas, produz extensa disseminação do vírus vacinal, capaz de competir com a circulação do vírus selvagem, interrompendo abruptamente a cadeia de transmissão da doença. Por ser de administração oral, apresenta facilidade operacional de aplicação e pelas características já descritas, aliadas às condições de saneamento básico, proporciona maior disseminação das partículas dos vírus vacinais, que podem, direta ou indiretamente, imunizar um maior número de crianças nas campanhas e bloqueios. As atividades de rotina e campanhas devem alcançar coberturas vacinais altas (95%) e uniformes em todos os municípios. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 599 Poliomielite Riscos de índices inadequados de cobertura vacinal Os baixos índices de coberturas vacinais e/ou sua heterogeneidade numa certa região geográfica favorecem a reintrodução do poliovírus, de duas maneiras: • através da importação do poliovírus, por intermédio de um indivíduo infectado que chegue ao país – o poliovírus é altamente infeccioso. Pelo menos 99% das infecções por poliovírus selvagem são assintomáticas, mas podem proporcionar a eliminação de grande quantidade do agente infeccioso através das fezes e secreções respiratórias; • através de mutações genéticas – a dispersão persistente de poliovírus derivado da vacina oral por imunodeficientes com insuficiência de linfócitos B pode conduzir a uma contínua circulação deste agente entre indivíduos mal vacinados numa comunidade e, conseqüentemente, a sua alteração genética, adquirindo neurovirulência e transmissibilidade, à semelhança do poliovírus selvagem. Observações demonstram que uma margem de diferenciação genética de 1% a 15% é característica das cepas responsáveis por surtos de poliovírus derivados vacinais compatíveis com uma transmissão extensa e capacidade de causar doença paralítica em uma comunidade. Utilização da vacina inativada de poliomielite (VIP) A VIP é utilizada no Brasil nas seguintes situações especiais: • em crianças imunodeprimidas ou que tenham contato freqüente ou familiar com crianças ou adultos imunocomprometidos; • em adultos e gestantes não-imunes, nos casos de epidemias. A vacina inativada estimula a presença de anticorpos protetores circulantes mas a proteção intestinal é transitória e de baixo nível. Desse modo, apesar de sua eficácia na proteção individual contra a doença, é incompleta contra a infecção pelo poliovírus selvagem, que mantém a capacidade de multiplicar-se nas células intestinais e de ser eliminado pelas fezes de pessoas vacinadas com a VIP. O seu emprego é eficaz em países com bons níveis de saneamento e altas e homogêneas coberturas vacinais. Ações de educação em saúde A educação em saúde compreende as atividades desenvolvidas pelas equipes de saúde e outras organizações governamentais e não-governamentais tendo em vista não apenas a difusão de informações para apoiar o trabalho específico – campanhas de vacinação, por exemplo – mas, também, a participação das pessoas nas ações de saúde, atuando, inclusive, em áreas tradicionalmente consideradas como exclusivas dos técnicos de saúde, tais como a vigilância e controle de doenças. Nas atividades de manutenção da erradicação da poliomielite devem ser levados em consideração os seguintes aspectos: • a necessidade de informar às pessoas a importância do seu papel no esforço de manter a erradicação da doença; 600 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Poliomielite • a necessidade de que as pessoas conheçam as causas e as conseqüências dessa doença, bem como as ações individuais e coletivas que podem contribuir para manter sua erradicação. Funções da educação em saúde • Identificação e análise de fatores inerentes à equipe de saúde e à população, que interfiram nos propósitos de manutenção da erradicação da poliomielite. • Articulação com as organizações existentes na comunidade (governamentais e nãogovernamentais), tendo em vista o engajamento de seus representantes no programa de manutenção da erradicação da poliomielite. • Capacitação de pessoas da comunidade, principalmente aquelas ligadas às organizações comunitárias, para atuarem junto às equipes de saúde na notificação, investigação e controle de casos de paralisia flácida aguda, tendo em vista a manutenção da erradicação da poliomielite. • Capacitação das equipes de saúde para atuarem, de forma conjunta, com pessoas, grupos e organizações da comunidade. • Divulgação de informações sobre poliomielite, vacina, notificação, investigação e medidas de controle adotadas. 6 P Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 601 Poliomielite Anexo 1 Fluxograma do envio de fezes para pesquisa de enterovírus e liberação de resultados Unidade de saúde Secretaria estadual de saúde Lacen/SES Laboratórios de referência Cover/CGDT/Devep/SVS/MS Resultados CGLAB/Devep/SVS/MS 602 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Fiocruz/RJ Evandro Chagas Lacen-PE Raiva RAIVA CID 10: A82 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Encefalite viral aguda, transmitida por mamíferos, que apresenta dois ciclos principais de transmissão: urbano e silvestre. Reveste-se da maior importância epidemiológica por apresentar letalidade de 100%, além de ser doença passível de eliminação no seu ciclo urbano, por se dispor de medidas eficientes de prevenção tanto em relação ao ser humano quanto à fonte de infecção. 6 Agente etiológico O vírus rábico pertence ao gênero Lyssavirus, da família Rhabdoviridae. Possui aspecto de um projétil e seu genoma é constituído por RNA. Apresenta dois antígenos principais: um de superfície, constituído por uma glicoproteína, responsável pela formação de anticorpos neutralizantes e adsorção vírus-célula, e outro interno, constituído por uma nucleoproteína, que é grupo específico. Reservatório No ciclo urbano, as principais fontes de infecção são o cão e o gato. No Brasil, o morcego é o principal responsável pela manutenção da cadeia silvestre. Outros reservatórios silvestres são: macaco, raposa, coiote, chacal, gato-do-mato, jaritataca, guaxinim e mangusto. Ciclos epidemiológicos de transmissão da raiva R Ciclo aéreo Ciclo silvestre Ciclo rural Ciclo urbano Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 603 Raiva Modo de transmissão A transmissão da raiva se dá pela penetração do vírus contido na saliva do animal infectado, principalmente pela mordedura e, mais raramente, pela arranhadura e lambedura de mucosas. O vírus penetra no organismo, multiplica-se no ponto de inoculação, atinge o sistema nervoso periférico e, posteriormente, o sistema nervoso central. A partir daí, dissemina-se para vários órgãos e glândulas salivares, onde também se replica e é eliminado pela saliva das pessoas ou animais enfermos. Existem relatos de casos de transmissão inter-humana na literatura, que ocorreram através de transplante de córnea. A via respiratória, transmissão sexual, via digestiva (em animais) e transmissão vertical também são aventadas, mas com possibilidade remota. Período de incubação É extremamente variável, desde dias até anos, com uma média de 45 dias no homem e de 10 dias a 2 meses no cão. Em crianças, existe tendência para um período de incubação menor que no indivíduo adulto. O período de incubação está diretamente ligado a: • localização, extensão e profundidade da mordedura, arranhadura, lambedura ou contato com a saliva de animais infectados; • distância entre o local do ferimento, o cérebro e troncos nervosos; • concentração de partículas virais inoculadas e cepa viral. Período de transmissibilidade Nos cães e gatos, a eliminação de vírus pela saliva ocorre de 2 a 5 dias antes do aparecimento dos sinais clínicos, persistindo durante toda a evolução da doença. A morte do animal acontece, em média, entre 5 a 7 dias após a apresentação dos sintomas. Em relação aos animais silvestres, há poucos estudos sobre o período de transmissão, sabendo-se que varia de espécie para espécie. Por exemplo, especificamente os quirópteros podem albergar o vírus por longo período, sem sintomatologia aparente. Susceptibilidade e imunidade Todos os mamíferos são susceptíveis à infecção pelo vírus da raiva. Não há relato de casos de imunidade natural no homem. A imunidade é conferida através de vacinação, acompanhada ou não por soro. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas Após um período variável de incubação, aparecem os pródromos que duram de 2 a 4 dias e são inespecíficos. O paciente apresenta mal-estar geral, pequeno aumento de temperatura, anorexia, cefaléia, náuseas, dor de garganta, entorpecimento, irritabilidade, inquietude e sensação de angústia. Podem ocorrer hiperestesia e parestesia no trajeto de nervos periféricos, próximos ao local da mordedura, e alterações de comportamento. A infecção 604 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Raiva progride, surgindo manifestações de ansiedade e hiperexcitabilidade crescentes, febre, delírios, espasmos musculares involuntários, generalizados e/ou convulsões. Espasmos dos músculos da laringe, faringe e língua ocorrem quando o paciente vê ou tenta ingerir líquido, apresentando sialorréia intensa. Os espasmos musculares evoluem para um quadro de paralisia, levando a alterações cardiorrespiratórias, retenção urinária e obstipação intestinal. O paciente se mantém consciente, com período de alucinações, até à instalação de quadro comatoso e evolução para óbito. Observa-se ainda a presença de disfagia, aerofobia, hiperacusia, fotofobia. O período de evolução do quadro clínico, após instalados os sinais e sintomas até o óbito, é em geral de 5 a 7 dias. Diagnóstico diferencial Não existem dificuldades para estabelecer o diagnóstico quando o quadro clínico vier acompanhado de sinais e sintomas característicos da raiva, precedidos por mordedura, arranhadura ou lambedura de mucosas provocadas por animal raivoso. Este quadro clínico típico ocorre em cerca de 80% dos pacientes. No caso da raiva humana transmitida por morcegos hematófagos, cuja forma é predominantemente paralítica, o diagnóstico é incerto e a suspeita recai em outros agravos que podem ser confundidos com raiva humana. Nestes casos, o diagnóstico diferencial deve ser realizado com: tétano; pasteurelose, por mordedura de gato e de cão; infecção por vírus B (Herpesvirus simiae), por mordedura de macaco; botulismo e febre por mordida de rato (Sodóku); febre por arranhadura de gato (linforreticulose benigna de inoculação); encefalite pós-vacinal; quadros psiquiátricos; outras encefalites virais, especialmente as causadas por outros rabdovírus; e tularemia. Cabe salientar a ocorrência de outras encefalites por arbovírus e intoxicações por mercúrio, principalmente na região amazônica, apresentando quadro de encefalite compatível com o da raiva. É importante ressaltar que a anamnese do paciente deve ser realizada junto ao acompanhante e ser bem documentada, com destaque para sintomas prodrômicos, antecedentes epidemiológicos e vacinais. No exame físico, frente à suspeita clínica, observar atentamente o fácies, presença de hiperacusia, hiperosmia, fotofobia, aerofobia, hidrofobia e alterações do comportamento. 6 R Diagnóstico laboratorial A confirmação laboratorial em vida, dos casos de raiva humana, pode ser realizada pelo método de imunofluorescência direta (IFD) em impressão de córnea, raspado de mucosa lingual (swab) ou tecido bulbar de folículos pilosos, obtidos por biópsia de pele da região cervical (procedimento que deve ser feito por profissional habilitado mediante o uso de equipamento de proteção individual/EPI). A sensibilidade dessas provas é limitada e, quando negativas, não se pode excluir a possibilidade de infecção. A realização da autópsia é de extrema importância para a confirmação diagnóstica. O sistema nervoso central (cérebro, cerebelo e medula) deverá ser encaminhado para o laboratório, conservado preferencialmente refrigerado em até 24 horas, e congelado após este prazo. Na falta de condições adequadas de refrigeração, conservar Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 605 Raiva em solução salina com glicerina a 50%, em recipientes de paredes rígidas, hermeticamente fechados, com identificação de material de risco biológico e cópia da ficha de notificação ou de investigação. Não usar formol. O diagnóstico laboratorial é realizado com fragmentos do sistema nervoso central através das técnicas de IFD e inoculação em camundongos recémnascidos ou de 21 dias. Tratamento Independente do ciclo, não existe tratamento específico para a doença. Por isso, a profilaxia pré ou pós-exposição ao vírus rábico deve ser adequadamente executada. O paciente deve ser atendido na unidade hospitalar de saúde mais próxima, sendo evitada sua remoção. Quando imprescindível, tem que ser cuidadosamente planejada. Manter o enfermo em isolamento, em quarto com pouca luminosidade, evitar ruídos e formação de correntes de ar, proibir visitas e somente permitir a entrada de pessoal da equipe de atendimento. As equipes de enfermagem, higiene e limpeza devem estar devidamente capacitadas para lidar com o paciente e com o seu ambiente e usar equipamentos de proteção individual, bem como estarem pré-imunizados. Recomenda-se como tratamento de suporte: dieta por sonda nasogástrica e hidratação para manutenção do balanço hídrico e eletrolítico; na medida do possível, usar sonda vesical para reduzir a manipulação do paciente; controle da febre e vômito; betabloqueadores na vigência de hiperatividade simpática; uso de antiácidos, para prevenção de úlcera de estresse; realizar os procedimentos para aferição da pressão venosa central (PVC) e correção da volemia na vigência de choque; tratamento das arritmias cardíacas. Sedação de acordo com o quadro clínico, não devendo ser contínua. Aspectos epidemiológicos A raiva é uma antropozoonose transmitida ao homem pela inoculação do vírus rábico contido na saliva do animal infectado, principalmente através da mordedura. Apesar de ser conhecida desde a antiguidade, continua sendo problema de saúde pública nos países em desenvolvimento, principalmente a transmitida por cães e gatos, em áreas urbanas, mantendo-se a cadeia de transmissão animal doméstico/homem. Esta doença ocorre em todos os continentes, com exceção da Oceania. Alguns países das Américas (Uruguai, Barbados, Jamaica e Ilhas do Caribe), da Europa (Portugal, Espanha, Irlanda, Grã-Bretanha, Países Baixos e Bulgária) e da Ásia (Japão) encontram-se livres da infecção no seu ciclo urbano. Entretanto, alguns países da Europa (França, Inglaterra) e da América do Norte (EUA e Canadá) ainda enfrentam problemas quanto ao ciclo silvestre da doença. A raiva apresenta dois ciclos básicos de transmissão: o urbano, que ocorre principalmente entre cães e gatos e é de grande importância nos países do terceiro mundo, e o silvestre, que ocorre principalmente entre morcegos, macacos e raposas. Na zona rural, a doença afeta animais de produção como bovinos, eqüinos e outros. 606 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Raiva A distribuição da raiva não é obrigatoriamente uniforme, podendo existir áreas livres e outras de baixa ou alta endemicidade, apresentando, em alguns momentos, formas epizoóticas. No Brasil, a raiva é endêmica, em grau diferenciado de acordo com a região geopolítica. A região Nordeste responde por 54,2% dos casos humanos registrados de 1980 a 2003; seguida da região Norte, com 17,5%; Sudeste, com 10,8%; Centro-Oeste, com 10,4% e Sul, com 0,4%. Desde 1987 não há registro de casos nos estados do Sul, sendo o último no Paraná, cuja fonte de infecção foi um morcego hematófago. No período de 1991 a 2003, cães e gatos foram responsáveis por transmitir 80% dos casos humanos de raiva; os morcegos, por 10,6% e outros animais (raposas, sagüis, gato selvagem, bovinos, eqüinos, caititus, gambás, suínos e caprinos), 4,8%. Casos cuja fonte de infecção foi desconhecida representaram 4,6%. O coeficiente de morbimortalidade de raiva humana nos últimos anos vem diminuindo de forma gradativa: de 0,05/100 mil habitantes, em 1990, para 0,01/100 mil habitantes, atualmente. A taxa de letalidade é de 100%. 6 Vigilância epidemiológica Há muitas interfaces entre a raiva humana e a animal. Na vigilância da raiva, os dados epidemiológicos são essenciais tanto para os médicos, para que seja tomada a decisão de tratamento pós-exposição, como para os veterinários, que devem adotar medidas relativas ao animal envolvido. Sem dúvida, um caso de raiva humana representa falência do sistema de saúde local, além de ser um indicador para avaliação da qualidade dos serviços. Objetivos • Detectar precocemente a circulação do vírus em animais (urbanos e silvestres), visando impedir a ocorrência de casos humanos. • Propor e avaliar as medidas de prevenção e controle. • Identificar a fonte de infecção de cada caso humano ou animal. • Determinar a magnitude da raiva humana e as áreas de risco, para intervenção. R Definição de caso Suspeito Todo paciente com quadro clínico sugestivo de encefalite rábica, com antecedentes ou não de exposição à infecção pelo vírus rábico. Confirmado Todo caso suspeito comprovado laboratorialmente ou todo indivíduo com quadro clínico compatível de encefalite rábica associado a antecedentes de agressão ou contato com animal suspeito (associação epidemiológica), com evolução para óbito. Critério clínico-laboratorial – detecção de anticorpos específicos, pela técnica de soroneutralização em cultura celular, em pacientes sem antecedentes de vacinação contra a Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 607 Raiva raiva; demonstração do antígeno pela técnica de imunofluorescência direta, e isolamento do vírus através da prova biológica (PB) em camundongos ou células, ou por meio da reação de cadeia pela polimerase (PCR). Atualmente, um importante instrumento de vigilância epidemiológica é a tipificação antigênica através da imunofluorescência indireta com anticorpos monoclonais, que é uma técnica específica e rápida, e da caracterização genética. É importante destacar que o uso das técnicas de biologia molecular deve estar sempre associado à investigação epidemiológica de campo, visto que somente assim se atingirá o maior poder discriminatório. Recomenda-se, também, a realização do estudo antigênico e genético em 100% das amostras isoladas de humanos, cães e gatos de áreas livres ou controladas, e de animais silvestres. Critério clínico-epidemiológico – paciente com quadro neurológico agudo (encefalite), que apresente formas de hiperatividade, seguido de síndrome paralítica com progressão para coma e morte, geralmente por insuficiência respiratória, sem possibilidade de diagnóstico laboratorial mas com antecedente de exposição a provável fonte de infecção em região com comprovada circulação de vírus rábico. Mesmo nos casos nos quais a suspeita foi aventada após o óbito, a possibilidade de exumação deve ser considerada, visto que atualmente se dispõe de técnicas laboratoriais que, no seu conjunto, apresentam grande sensibilidade e especificidade. Caso descartado Todo caso suspeito com IFD e PB negativa ou que durante a investigação teve seu diagnóstico confirmado laboratorialmente por outra etiologia, ou todo caso suspeito que não tenha evoluído para óbito. Notificação Todo caso humano suspeito de raiva é de notificação individual, compulsória e imediata aos níveis municipal, estadual e federal. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente Toda pessoa com histórico de exposição deve procurar assistência médica e, conforme avaliação, receber vacinação ou soro-vacinação ou, ainda, acompanhamento durante o período de observação animal. Qualidade da assistência Verificar se os casos estão sendo atendidos em unidade de saúde com capacidade para prestar atendimento adequado e oportuno. Deve-se ficar atento para evitar o abandono, garantindo o esquema de vacinação completo e a obrigatoriedade da busca ativa pelos profissionais da rede dos serviços de saúde. 608 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Raiva Confirmação diagnóstica Coletar material para diagnóstico laboratorial, de acordo com as orientações constantes no tópico Diagnóstico laboratorial dos diferentes animais. Proteção da população Logo que se tenha conhecimento da suspeita de caso de raiva, deve-se organizar um bloqueio vacinal em cães e gatos em até 72 horas após a notificação, em um raio de 5km ou mais, dependendo da zona de abrangência (zona urbana ou rural) onde o paciente foi agredido, não sendo necessário aguardar resultados de exames laboratoriais para confirmação do caso suspeito. É necessária, ainda, a captura e o envio de amostras de animais da área de atuação para o diagnóstico laboratorial e/ou comprovação da circulação viral. As informações sobre as coberturas vacinais dos animais da área endêmica, quando disponíveis, são importantes para o processo de decisão quanto à extensão inicial e seletividade do bloqueio. Devem ser organizadas ações de esclarecimento à população, utilizando-se meios de comunicação de massa, visitas domiciliares e palestras. É também importante a veiculação de conhecimentos sobre o ciclo de transmissão da doença, gravidade e esclarecimentos da situação de risco e ações envolvendo a participação efetiva da comunidade. 6 Investigação Imediatamente ou até 72 horas após a notificação de um caso de raiva, deve-se iniciar a investigação epidemiológica para permitir que as medidas de controle possam ser adotadas. O instrumento de coleta de dados, a ficha epidemiológica disponível no Sinan, contém os elementos essenciais a serem coletados em uma investigação de rotina. Todos os seus campos devem ser criteriosamente preenchidos, mesmo quando a informação for negativa. Outros itens e observações podem ser incluídos em relatório anexo, conforme as necessidades e peculiaridades de cada situação. Casos de raiva em animais de produção (bovinos, eqüinos e outros), notificar imediatamente às autoridades da agricultura para o desencadeamento das ações de controle: indicação de vacinação nos rebanhos, captura e combate aos morcegos hematófagos e educação sanitária. R Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente Preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica, relativos aos dados gerais, notificação individual e dados de residência. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmar a suspeita diagnóstica – anotar na ficha de investigação dados da história, manifestações clínicas e antecedentes de exposição às prováveis fontes de infecção. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 609 Raiva • Como, em geral, quando se suspeita de raiva humana os doentes são hospitalizados, impõe-se a consulta do prontuário e a entrevista ao médico assistente para completar as informações clínicas sobre o paciente. Estas informações servirão para definir se o quadro apresentado é compatível com a doença; • Sugere-se fazer uma cópia da anamnese, exame físico e evolução do doente, com vistas ao enriquecimento das análises e, também, para que possam servir como instrumento de aprendizagem dos profissionais do nível local; • Verificar data, local e modo de ocorrência da exposição, tipo e localização, história de tratamento profilático anterior e atual, data de início dos sintomas, coleta e envio de material para diagnóstico laboratorial, critério de confirmação de caso, observação do animal, espécie, história de vacinação e outras informações de acordo com a situação de cada caso. Se não houve tratamento atual, identificar as razões; • Acompanhar a evolução dos pacientes e os resultados dos exames laboratoriais específicos. Para identificação da área de transmissão – no local de ocorrência da exposição, identificar fatores de risco como baixa cobertura vacinal canina, presença de cães errantes, regime de criação de cães (com proprietário restrito, parcialmente restrito, com mais de um proprietário), presença de casos suspeitos ou confirmados de raiva animal e outros elementos que possam determinar o grau de risco de disseminação. Avaliar o acidente quanto às causas que o motivaram, métodos de manutenção para a observação do animal no domicílio, cuidados e prevenção de doenças com o animal e riscos de contaminação a que foi exposto em períodos de até 180 dias antes. Providências necessárias: • buscar, no provável local de infecção e em um raio de até 5km, pessoas e outros animais que foram expostos ao mesmo animal agressor ou a outros suspeitos; • verificar o acesso dos expostos aos serviços de saúde e realizar busca ativa dos faltosos e/ou abandonos de tratamento profilático anti-rábico humano; • notificar os casos positivos em animais ao serviço de controle de raiva (vigilância epidemiológica, centros de controle de zoonozes e agricultura), para controle de focos e outras ações pertinentes; • analisar a situação epidemiológica da área de abrangência, visando impedir a ocorrência de novos casos. Nos casos de suspeita de raiva humana transmitida por morcegos hematófagos, recomenda-se observar os seguintes fatores: • presença de mordeduras em animais e humanos; • existência de circulação viral; • aparecimento de casos humanos de encefalite; • existência de pequena população de animais de criação (bovinos, equídeos, etc.); • presença de áreas de desmatamento ou reflorestamento; • presença de moradias sem proteção adequada; 610 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Raiva • novos assentamentos urbanos e rurais, regiões de garimpo, áreas com projetos de exploração de madeira e outras culturas; • proximidade de povoados com matas florestais; • ocorrência de baixos indicadores socioeconômicos. Para determinação da extensão da área de risco • Em áreas silvestres – sendo a fonte de infecção da espécie quiróptera (morcegos), determinar a extensão da ação de bloqueio em um raio de até 12km. • Em áreas urbanas – para cães e gatos, determinar a extensão da ação de bloqueio em um raio de até 5km. Lembrar que a identificação da área onde se deu a transmissão é de fundamental importância para nortear a continuidade do processo de investigação e a extensão das medidas de controle imediatas. 6 Coleta e remessa de amostra para diagnóstico • Logo após a suspeita clínica de raiva, deve-se orientar sobre a coleta de amostra para laboratório. Quando do óbito, é imprescindível coletar e enviar amostras do cérebro, cerebelo, tronco encefálico e medula ao laboratório, para confirmação do caso, de acordo com as normas técnicas apresentadas no tópico Definição de caso, observando-se criteriosamente todas as recomendações. • É da responsabilidade dos profissionais da vigilância epidemiológica e/ou dos laboratórios centrais ou de referência viabilizar, orientar ou mesmo proceder a essas coletas. Não se deve aguardar os resultados dos testes laboratoriais para desencadear as medidas de controle e outras atividades da investigação, embora sejam imprescindíveis para a confirmação de casos e para nortear o encerramento das investigações. R Análise dos dados Identificar as falhas da vigilância epidemiológica, assistência e dos serviços de saúde que propiciaram a ocorrência de caso humano e em animais domésticos. Observar a distribuição temporal e geográfica dos casos, localização e data das ocorrências, sexo, idade, ocupação, zona urbana ou rural, natureza da agressão, espécie agressora, história de vacinação e outros dados de interesse para cada localidade. A análise destes dados deverá orientar o desencadeamento, duração e extensão das ações de controle desenvolvidas e posterior avaliação de sua adequação. Encerramento de casos Confirmado por critério clínico-laboratorial (isolamento viral, sorologia ou histopatologia) – pacientes com sintomatologia compatível, na qual a imunofluorescência ou exame histopatológico ou a inoculação em camundongos foi positiva para raiva. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 611 Raiva Confirmado por critério clínico-epidemiológico – paciente com sintomatologia compatível, cujo histórico permite realizar vínculo epidemiológico entre o caso suspeito e a região de ocorrência, com comprovada circulação do vírus rábico, que selaria o diagnóstico de raiva. Caso descartado – caso notificado cujos resultados de exames laboratoriais foram negativos, afastando a hipótese de raiva, ou pacientes com evolução incompatível com raiva. Relatório final Os dados da investigação deverão ser consolidados em um relatório com as principais conclusões, das quais destacam-se: • intervenção sobre a fonte de infecção: dados de cobertura vacinal animal, bloqueios de foco, número de animais capturados, animais submetidos à eutanásia, envio de amostras ao laboratório, ações educativas e mobilização comunitária; • dados pessoais: sexo, idade, ocupação, zona urbana ou rural; • antecedentes epidemiológicos: tipo da exposição (arranhadura, mordedura, lambedura, contato indireto), localização (mucosa, cabeça/pescoço, mãos/pés, tronco, membros superiores/inferiores), tipo de ferimento (único, múltiplo, superficial, profundo, dilacerante), espécie do animal agressor e data da exposição; • dados de atendimento: hospitalização (avaliação da qualidade do atendimento ao paciente), vacinação e/ou sorovacinação, número de doses aplicadas e data de início de tratamento; • exames laboratoriais: tipo de exame realizado e resultados; • encerramento de caso. Instrumentos disponíveis para controle A prevenção de raiva humana é direcionada para o tratamento profilático anti-rábico toda vez que houver suspeita de exposição ao vírus rábico. Após o início do quadro clínico não existe tratamento que forneça resultados satisfatórios. Conduta em caso de possível exposição ao vírus da raiva Em caso de possível exposição ao vírus da raiva é imprescindível a limpeza do ferimento com água corrente abundante e sabão, ou outro detergente, pois essa conduta diminui, comprovadamente, o risco de infecção. Deve ser realizada o mais rápido possível após a agressão e repetida na unidade de saúde, independentemente do tempo transcorrido. A limpeza deve ser cuidadosa, visando eliminar as sujidades sem agravar o ferimento e, em seguida, devem ser utilizados antissépticos que inativem o vírus da raiva (como o livinilpirrolidona-iodo, por exemplo, o polvidine ou gluconato de clorexidine ou álcool-iodado). Lembrar que essas substâncias deverão ser utilizadas uma única vez, na primeira consulta, e sempre que possível, posteriormente, a região deve ser lavada com solução fisiológica. 612 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Roteiro de investigação epidemiológica da raiva humana Notificação de Caso Humano Suspeito Investigação Após o óbito, coletar material Resultado dos exames Negativo Descartar o caso Outro caso Iniciar investigação Sem caso Antecedentes epidemiológicos Histórico de vacinação Urbano Clínicos Encerrar investigação Busca ativa de pessoas e animais agredidos Vacinação de cães e gatos casa a casa Silvestre Outras espécies Quirópteros Bloqueio (raio de até 5km) Positivo Confirma o caso Determinar ciclo de transmissão e local provável de infecção Coleta de dados Busca ativa de casos em outros animais Dados clínicos e epidemiológicos Captura e eutanásia de animais Encerrar o caso Notificar unidade local de DSA* Vigilância laboratorial (6 meses no mínimo) Educação sanitária, Vigilância laboratorial Busca ativa de pessoas expostas Mobilização comunitária Educação em saúde Atender em conjunto com a DSA Avaliar** Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Busca ativa de pessoas agredidas *DSA: Defesa Sanitária Animal. Vacinação do animal de bloqueio Identificação de abrigos e controle da população de morcegos Educação em saúde **Avaliar se as estratégias de prevenção, vigilância e controle adotadas são suficientes. Avaliar** Raiva 613 6 R Raiva Deve-se fazer anamnese completa, utilizando-se a ficha de atendimento anti-rábico humano, visando à indicação correta do tratamento profilático. Classificar o acidente de acordo com as seguintes características do ferimento e do animal envolvido no acidente: Características do ferimento Em relação à transmissão do vírus da raiva, os acidentes causados por animais devem ser avaliados quanto ao: Local do acidente – acidentes que ocorrem em regiões próximas ao sistema nervoso central (cabeça, face ou pescoço) ou em locais muito inervados (mãos, polpas digitais e planta dos pés) são graves porque facilitam a exposição do sistema nervoso ao vírus. A lambedura da pele íntegra não oferece risco, mas a lambedura de mucosas também é grave porque as mesmas são permeáveis ao vírus, mesmo quando intactas, e também porque as lambeduras, geralmente, abrangem áreas mais extensas. Profundidade do acidente – os acidentes devem ser classificados como superficiais (sem presença de sangramento) ou profundos (apresentam sangramento, ou seja, ultrapassam a derme). Os ferimentos profundos, além de aumentar o risco de exposição do sistema nervoso, oferecem dificuldades à assepsia. Mas vale ressaltar que os ferimentos puntiformes são considerados como profundos e algumas vezes não apresentam sangramento. Extensão e número de lesões – deve-se observar a extensão da lesão e se ocorreu apenas uma única lesão ou múltiplas, ou seja, uma porta de entrada ou várias. De acordo com os critérios acima estabelecidos, as exposições podem ser assim classificadas: Acidentes leves • ferimentos superficiais, pouco extensos, geralmente únicos, em tronco e membros (exceto mãos, polpas digitais e planta dos pés); podem acontecer em decorrência de mordeduras ou arranhaduras causadas por unha ou dente; • lambedura de pele com lesões superficiais. Acidentes graves • ferimentos na cabeça, face, pescoço, mão, polpa digital e/ou planta do pé; • ferimentos profundos, múltiplos ou extensos, em qualquer região do corpo; • lambeduras de mucosas; • lambeduras de pele onde já existe lesão grave; • ferimentos profundos causados por unha de gato; • quaisquer ferimentos causados por morcego. Atenção O contato indireto, como a manipulação de utensílios potencialmente contaminados, e a lambedura na pele íntegra não são considerados acidentes de risco e não exigem tratamento profilático. 614 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Raiva Características do animal envolvido no acidente Cão e gato – as características da doença em cães e gatos, como período de incubação, transmissão e quadro clínico, são bem conhecidas e semelhantes. Por esta razão estes animais são analisados em conjunto, nos seguintes elementos: • estado de saúde do animal no momento da agressão – avaliar se o animal estava sadio ou apresentava sinais sugestivos de raiva. A maneira como ocorreu o acidente pode fornecer informações sobre seu estado de saúde. O acidente provocado (por exemplo, o animal que reage em defesa própria, a estímulos dolorosos ou outras provocações) geralmente indica uma reação normal do animal, enquanto que a agressão espontânea (sem causa aparente) pode indicar alteração do comportamento e sugere que o animal pode estar acometido de raiva. Lembrar que o animal também pode agredir devido à sua índole ou adestramento; • possibilidade de observação do animal por 10 dias – mesmo se o animal estiver sadio no momento do acidente, é importante que seja mantido em observação por 10 dias. Nos cães e gatos, o período de incubação da doença pode variar de alguns dias a anos, mas em geral é de cerca de 60 dias. No entanto, a excreção de vírus pela saliva, ou seja, o período em que o animal pode transmitir a doença, só ocorre a partir do final do período de incubação, variando entre dois e cinco dias antes do aparecimento dos sinais clínicos, persistindo até sua morte, que pode ocorrer em até cinco dias após o início dos sintomas. Portanto, o animal deve ser observado por 10 dias; se em todo esse período permanecer vivo e saudável, não há risco de transmissão do vírus; • procedência do animal – é necessário saber se a região de procedência do animal é área de raiva controlada ou não controlada; • hábitos de vida do animal – o animal deve ser classificado como domiciliado ou não-domiciliado. Animal domiciliado é o que vive exclusivamente dentro do domicílio, não tem contato com outros animais desconhecidos e só sai à rua acompanhado do seu dono. Desse modo, esses animais podem ser classificados como de baixo risco em relação à transmissão da raiva. Ao contrário, aqueles animais que passam longos períodos fora do domicílio, sem controle, devem ser considerados como animais de risco, mesmo que tenham proprietário e recebam vacinas, o que geralmente só ocorre nas campanhas de vacinação. 6 R Animais silvestres – morcego de qualquer espécie, micos (sagüi e “soin”), macaco, raposa, guaxinim, quati, gambá, roedores silvestres, etc. devem ser classificados como animais de risco, mesmo que domiciliados e/ou domesticados, haja vista que nesses animais a patogenia da raiva não é bem conhecida. Relatos recentes mostram que o risco de transmissão do vírus pelo morcego é sempre elevado, independentemente da espécie e gravidade do ferimento. Por isso, toda agressão por morcego deve ser classificada como grave. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 615 Raiva Animais domésticos de interesse econômico ou de produção – bovinos, bubalinos, eqüídeos, caprinos, ovinos, suínos e outros também são animais de risco. É importante conhecer o tipo, freqüência e grau do contato ou exposição que os tratadores e outros profissionais têm com estes animais, e a incidência da raiva na região, para avaliar a indicação de tratamento pré ou pós-exposição. Animais de baixo risco – os seguintes roedores e lagomorfos (áreas urbanas ou de criação) são considerados como de baixo risco para a transmissão da raiva e, por isto, não é necessário indicar tratamento profilático da raiva em caso de acidentes causados pelos mesmos: • ratazana-de-esgoto (Rattus norvegicus); • rato-de-telhado (Rattus rattus); • camundongo (Mus musculus); • cobaia ou porquinho-da-índia (Cavea porcellus); • hamster (Mesocricetus auratus); • coelho (Oryetolagus cuniculus). Observação válida para todos os animais de risco: sempre que possível, coletar amostra de tecido cerebral e enviar para o laboratório de diagnóstico. O diagnóstico laboratorial é importante tanto para definir a conduta em relação ao paciente como para se conhecer o risco de transmissão da doença na área de procedência do animal. Se o resultado for negativo, o tratamento não precisa ser indicado ou, caso tenha sido iniciado, pode ser suspenso. Todas as características acima são fundamentais para determinar a indicação ou não da profilaxia anti-rábica de acordo com os esquema descrito no Quadro 1 da vacina de cultivo celular. Conduta em caso de possível reexposição ao vírus da raiva Pessoas com risco de reexposição ao vírus da raiva, que já tenham recebido tratamento pós-exposição anteriormente, devem ser tratadas novamente de acordo com as indicações do Quadro 2. Para estas pessoas, quando possível, também é recomendável a pesquisa de anticorpos. Observações: em caso de reexposição, com história de tratamento anterior completo, não é necessário administrar o soro anti-rábico (homólogo ou heterólogo). No entanto, o soro poderá ser indicado se houver dúvidas ou conforme a análise de cada caso, especialmente nos pacientes imunodeprimidos que devem receber sistematicamente soro e vacina. Recomenda-se que, ao final do tratamento, seja realizada a avaliação sorológica após o 14º dia da aplicação da última dose. Devem ser avaliados, individualmente, os pacientes que receberam muitas doses de vacina, como, por exemplo, os que receberam mais de uma vez o esquema completo de 616 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Raiva pós-exposição e vários esquemas de re-exposição. O risco de reações adversas às vacinas aumenta proporcionalmente ao número de doses aplicadas. Nestes casos, se possível, solicitar a avaliação sorológica do paciente. Se o título de anticorpos neutralizantes (AcN) for igual ou maior a 0,5UI/ml, não é necessário indicar tratamento ou, caso tenha sido iniciado, pode ser suspenso. Importante Em caso de reexposição com histórico de tratamento anterior completo e se o animal agressor, cão ou gato, for passível de observação, considerar a hipótese de somente observar o animal. Quando o paciente tiver o esquema de pré-exposição, em qualquer momento, adotar conduta conforme o Quadro 3. 6 Conduta em caso de possível exposição ao vírus da raiva em pacientes que receberam esquema de pré-exposição O Quadro 3 indica os procedimentos a serem adotados para pacientes que, acidentalmente, se expuseram ao risco de infecção pelo vírus da raiva e que tenham recebido tratamento pré-exposição anteriormente. Considerar as notas de rodapé do Quadro 2, caso o esquema recebido anteriormente tenha sido incompleto. Profilaxia pré-exposição É indicada para pessoas que, por força de suas atividades profissionais ou de lazer, estejam expostas permanentemente ao risco de infecção pelo vírus da raiva, tais como profissionais e estudantes das áreas de medicina veterinária e de biologia e profissionais e auxiliares de laboratórios de virologia e/ou anatomia patológica para raiva. É indicada, também, para aqueles que atuam no campo na captura, vacinação, identificação e classificação de mamíferos passíveis de portarem o vírus, bem como funcionários de zoológicos. R Com a vacina de cultivo celular Esquema: 3 doses. Dias de aplicação: 0, 7, 28. Via de administração e dose: intramuscular profunda, utilizando dose completa; ou havendo capacitação técnica, por via intradérmica, utilizando a dose de 0,1ml. Local de aplicação: músculo deltóide ou vasto lateral da coxa (não aplicar em glúteo). Controle sorológico: a partir do 14º dia após a última dose do esquema. Resultados: • insatisfatório – se o título de anticorpos for menor do que 0,5 UI/ml. Nesse caso, aplicar uma dose de reforço e reavaliar a partir do 14º dia após o reforço; • satisfatório – se o título de anticorpos for maior ou igual a 0,5 UI/ml. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 617 Raiva Quadro 1. Esquema para tratamento profilático anti-rábico humano com a vacina de cultivo celular Condições do animal agressor1 Cão ou gato sem suspeita de raiva no momento da agressão Cão ou gato clinicamente suspeito de raiva no momento da agressão Cão ou gato raivoso, desaparecido ou morto; Animais silvestres (inclusive os domiciliados)2 Animais domésticos de interesse econômico ou de produção Tipo de exposição Lavar com água e sabão Lavar com água e sabão Lavar com água e sabão Não tratar Não tratar Não tratar Acidentes leves Lavar com água e sabão Lavar com água e sabão. Lavar com água e sabão. Ferimentos superficiais, pouco extensos, geralmente únicos, em tronco e membros (exceto mãos, polpas digitais e planta dos pés); Observar o animal durante 10 dias após a exposição Iniciar tratamento com duas doses, uma no dia 0 e outra no dia 3 Iniciar imediatamente o tratamento com 5 (cinco) doses de vacina administradas nos dias 0, 3, 7, 14 e 28 Contato indireto Se o animal permanecer sadio no período de observação, encerrar o caso Observar o animal durante 10 dias após a exposição Se o animal morrer, desaparecer ou se tornar raivoso, administrar 5 doses de vacina (dias 0, 3, 7, 14 e 28) Se a suspeita de raiva for descartada após o 10º dia de observação, suspender o tratamento e encerrar o caso Acidentes graves Lavar com água e sabão Lavar com água e sabão. Lavar com água e sabão Ferimentos na cabeça, face, pescoço, mão, polpa digital e/ou planta do pé; Observar o animal durante 10 dias após exposição Iniciar o tratamento com soro3 e 5 doses de vacina nos dias 0, 3, 7, 14 e 28 Iniciar imediatamente o tratamento com soro3 e 5 doses de vacina nos dias 0, 3, 7, 14 e 28 Podem acontecer em decorrência de mordeduras ou arranhaduras causadas por unha ou dente; Lambedura de pele com lesões superficiais Ferimentos profundos, múltiplos ou extensos, em qualquer região do corpo; Lambedura de mucosas; Lambedura de pele onde já existe lesão grave; Ferimento profundo causado por unha de gato. Iniciar tratamento com duas doses: uma no dia 0 e outra no dia 3. Se o animal permanecer sadio no período de observação, encerrar o caso Se o animal morrer, desaparecer ou se tornar raivoso, dar continuidade ao tratamento, administrando o soro3 e completando o esquema até 5 (cinco) doses. Aplicar uma dose entre o 7º e o 10º dia e uma dose nos dias 14 e 28 Se o animal morrer, desaparecer ou se tornar raivoso, completar o esquema até 5 doses. Aplicar uma dose entre o 7º e o 10º dia e uma dose nos dias 14 e 28 Observar o animal durante 10 dias após a exposição Se a suspeita de raiva for descartada após o 10º dia de observação, suspender o tratamento e encerrar o caso 1. É preciso sempre avaliar os hábitos e cuidados recebidos pelo cão e gato. Podem ser dispensadas do tratamento as pessoas agredidas por cão ou gato que, com certeza, não têm risco de contrair a infecção rábica. Por exemplo, animais que vivem dentro do domicílio (exclusivamente), não têm contato com outros animais desconhecidos e que somente saem às ruas acompanhados de seus donos, que não circulem em área com a presença de morcegos hematófagos. Em caso de dúvida, iniciar o esquema de profilaxia indicado. Se o animal for procedente de área de raiva controlada, não é necessário iniciar o tratamento. Manter o animal sob observação e só indicar o tratamento (soro + vacina) se o animal morrer, desaparecer ou se tornar raivoso. 2. Nas agressões por morcegos, deve-se indicar a soro-vacinação independente da gravidade da lesão, ou indicar conduta de reexposição. 3. Aplicação do soro perifocal na(s) porta(s) de entrada. Quando não for possível infiltrar toda a dose, a quantidade restante deve ser aplicada pela via intramuscular, podendo ser utilizada a região glútea. Sempre aplicar em local anatômico diferente do que aplicou a vacina. 618 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Raiva Quadro 2. Esquemas de reexposição, conforme o esquema e vacina prévios e a vacina a ser utilizada por ocasião da reexposição Tipo de esquema Esquema de reexposição Vacina Completo Cultivo celular Incompleto2 Cultivo celular1 Cultivo celular a) até 90 dias: não tratar b) após 90 dias: duas doses, uma no dia 0 e outra no dia 3 a) até 90 dias: completar o número de doses b) após 90 dias: ver esquema de pós-exposição (conforme o caso) 1. Pelo menos duas doses de vacina de cultivo celular em dias alternados; 2. Não considerar o esquema anterior se o paciente recebeu número menor de doses do que aqueles referidos nas notas acima. Quadro 3. Conduta em caso de possível exposição ao vírus da raiva em pacientes que receberam esquema de pré-exposição Sorologia comprovada (titulação) 6 Vacina Cultivo celular Com comprovação sorológica (título maior ou igual a 0,5UI/ml). Duas doses: uma no dia 0 e outra no dia 3 Sem comprovação sorológica ou titulo inferior a 0,5UI/ml Verificar o Quadro 2, em caso de esquema vacinal incompleto Observação: o controle sorológico é exigência básica para a correta avaliação da pessoa vacinada. Importante Deve-se fazer o controle sorológico anual dos profissionais que se expõem permanentemente ao risco de infecção ao vírus da raiva, administrando-se uma dose de reforço sempre que os títulos forem inferiores a 0,5 UI/ml. Repetir a sorologia a partir do 14º dia, após a dose de reforço. R Vacina Vacina de cultivo celular São vacinas mais potentes, seguras e isentas de risco. São produzidas em cultura de células (diplóides humanas, células Vero, células de embrião de galinha, etc.) com cepas de vírus Pasteur (PV) ou Pittman-Moore (PM) inativados pela betapropiolactona. São apresentadas sob a forma liofilizada, acompanhadas de diluente; devem ser conservadas em geladeira, fora do congelador, na temperatura entre + 2ºC a + 8ºC, até o momento de sua aplicação, observando o prazo de validade do fabricante. A potência mínima destas vacinas é 2,5 UI/dose. Dose e via de aplicação – são apresentadas nas doses de 0,5ml e 1ml, dependendo do fabricante (verificar embalagem e/ou lote). A dose indicada pelo fabricante independe da Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 619 Raiva idade e do peso do paciente. A via de aplicação recomendada é a intramuscular, na região do deltóide ou vasto lateral da coxa. Em crianças até 2 anos de idade, está indicado o vasto lateral da coxa. A vacina não deve ser aplicada na região glútea. Contra-indicação – a vacina não tem contra-indicação (gravidez, mulheres lactantes, doença intercorrente ou outros tratamentos). Sempre que possível, recomenda-se a interrupção do tratamento com corticóides e/ou imunossupressores ao iniciar o esquema de vacinação. Não sendo possível, tratar a pessoa como imunodeprimida. Eventos adversos – as manifestações adversas relatadas com maior freqüência são reação local, febre, mal-estar, náuseas e cefaléia. Não há relato de ocorrência de óbito associado ao uso da vacina de cultivo celular. A freqüência de reações neurológicas associadas a esta vacina, citada na literatura científica, é baixa. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), até junho de 1996 haviam sido relatados seis casos de reações neurológicas temporalmente associadas à vacina. Em cinco foram registrados quadros de fraqueza ou parestesia, sendo que em um dos pacientes ocorreu déficit muscular permanente do músculo deltóide. O sexto paciente apresentou quadro neurológico semelhante ao de esclerose múltipla. A incidência de manifestações neurológicas, considerando-se todos estes casos como realmente provocados pela vacina, é de cerca de 1 para cada 500 mil pacientes tratados. Nos EUA, a incidência de reações alérgicas notificadas à vacina de células diplóides foi de 11 casos por 10 mil pacientes tratados (0,11%). As reações variam de urticária a anafilaxia e ocorrem principalmente após as doses de reforço; em 1/10 mil tratamentos é registrada reação anafilática do tipo I; a maioria das reações, 10/10 mil, é de hipersensibilidade do tipo III. A evolução é boa e a maioria dos pacientes não necessita internação hospitalar. Soros Soro heterólogo O soro heterólogo é uma solução concentrada e purificada de anticorpos, preparada em eqüídeos imunizados contra o vírus da raiva. Deve ser conservado em geladeira, entre +2º a +8ºC, observando o prazo de validade do fabricante. A dose indicada é de 40 UI/kg de peso do paciente. Deve-se infiltrar nas lesões a maior quantidade possível da dose do soro. Quando a lesão for extensa e múltipla, a dose pode ser diluída em soro fisiológico, para que todas as lesões sejam infiltradas. Caso a região anatômica não permita a infiltração de toda a dose, a quantidade restante, a menor possível, deve ser aplicada por via intramuscular, na região glútea. Quando não se dispuser do soro ou de sua dose total, aplicar inicialmente a parte disponível. Iniciar imediatamente a vacinação e administrar o restante da dose de soro recomendada antes da 3ª dose da vacina de cultivo celular. Após esse prazo, o soro não é mais necessário. O uso do soro não é necessário quando o paciente recebeu tratamento completo anteriormente. No entanto, em situações especiais, como pacientes imunodeprimidos ou dúvidas com relação ao tratamento anterior, se houver indicação o soro deve ser recomendado. 620 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Raiva Eventos adversos – os soros atualmente produzidos são seguros mas podem causar eventos adversos, como qualquer imunobiológico. As reações mais comuns são benignas, fáceis de tratar e apresentam boa evolução. A possibilidade de ocorrência destas reações nunca contra-indica a prescrição do soro. Eventos adversos que podem ocorrer após a administração do soro heterólogo: • manifestações locais – dor, edema e hiperemia e, mais raramente, presença de abscesso. São as manifestações mais comuns, normalmente de caráter benigno. Conduta: não é necessário notificar. Deve ser feito tratamento local, com o objetivo de diminuir a dor, a tumefação e a vermelhidão. • manifestações imediatas – choque anafilático. Manifestação rara que pode ocorrer nas primeiras duas horas após a aplicação. Os sintomas mais comuns são formigamento nos lábios, palidez, dispnéia, edemas, exantemas, hipotensão e perda de consciência. Conduta: notificar e investigar. Substituir o soro por imunoglobulina anti-rábica. Cuidado intensivo. 6 • manifestações tardias: ocorrem com mais freqüência até a segunda semana após a aplicação do soro. ❯ Doença do soro – caracterizada por edema e eritema no local de aplicação do soro, febre, mioartralgia (poliartrite serosa), astenia, cefaléia, sudorese, desidratação, exantema com máculas e pápulas pruriginosas, infartamento e inflamações ganglionar e, mais raramente, vasculite e nefrite. ❯ Reação de Arthus – caracterizada por vasculite local acompanhada de necrose, dor, tumefação, rubor e úlceras profundas. Também é um quadro muito raro. Conduta: notificar e investigar. Deve ser feito acompanhamento clínico por serviço especializado. R Com o conhecimento existente na literatura disponível e pela experiência acumulada, é possível inferir que o teste de sensibilidade ao soro heterólogo tem valor preditivo baixo e por isso não é indicado. A conduta mais importante antes de sua administração é rigoroso interrogatório sobre os antecedentes do paciente, avaliando: • ocorrência e gravidade de quadros anteriores de hipersensibilidade; • uso prévio de imunoglobulinas de origem eqüídea; • existência de contatos freqüentes com animais, principalmente com eqüídeos, por exemplo, nos casos de contato profissional (veterinário) ou por lazer. Em caso de resposta afirmativa a um dos itens anteriores, classificar o paciente como de risco e considerar a possibilidade de substituição do soro heterólogo pelo soro homólogo (imunoglobulina humana anti-rábica), se disponível. Caso não haja disponibilidade de Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 621 Raiva soro homólogo, aconselha-se a pré-medicação deste paciente antes da aplicação do soro heterólogo. Antes da administração do soro heterólogo, aconselha-se sempre a seguinte rotina, para qualquer paciente: • garantir bom acesso venoso, mantendo-o com soro fisiológico a 0,9% (gotejamento lento); • dentro das possibilidades, é conveniente deixar preparado: ❯ laringoscópio com lâminas e tubos traqueais adequados para o peso e idade; ❯ frasco de soro fisiológico e/ou solução de Ringer lactado; ❯ solução aquosa de adrenalina (preparada na diluição de 1:1 mil) e de aminofilina (10ml = 240mg). Após receber o soro heterólogo, o paciente deverá ser observado pelo prazo de duas horas. Pré-medicação – na tentativa de prevenir ou atenuar possíveis reações adversas imediatas em pacientes de risco, podem ser utilizadas drogas bloqueadoras dos receptores H1 e H2 da histamina (anti-histamínicos) e um corticosteróide em dose anti-inflamatória: Eventos adversos Manifestações locais – pode provocar reações de caráter benigno com dor, edema e hiperemia e, mais raramente, presença de abscesso. Conduta: não é necessário notificar. Deve ser feito tratamento local com o objetivo de diminuir a dor, a tumefação e a vermelhidão. Manifestações imediatas – choque anafilático. Raro, mas pode ocorrer na administração do soro anti-rábico heterólogo. Nas primeiras duas horas após a aplicação, podem ocorrer formigamento nos lábios, palidez, dispnéia, edemas, exantemas, hipotensão e perda da consciência. Conduta: notificar e investigar. Substituir o soro por imunoglobulina anti-rábica. Cuidado intensivo. Manifestações tardias • Doença do soro – febre, mioartralgia (poliartrite serosa), astenia, cefaléia, sudorese, desidratação, exantema com máculas e pápulas pruriginosas, infartamento e inflamações dos linfonodos, vasculite, nefrite. • Reação de Arthus – vasculite local acompanhada de necrose, dor, tumefação, rubor, necrose, úlceras profundas. Conduta: notificar e investigar. Deve ser feito acompanhamento clínico por serviço especializado. 622 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Raiva Opção 1. Via parenteral Crianças Adultos Maleato de dextroclorfeniramina ou 0,08mg/kg 5mg Prometazina 0,5mg/kg 50mg Cimetidina ou 10mg/kg 300mg Ranitidina 1,5mg/kg 50mg Corticosteróide 10mg/kg 500mg Antagonistas dos receptores H1 da histamina Antagonistas dos receptores H2 da histamina A aplicação do soro anti-rábico heterólogo deverá ser realizada 20 a 30 minutos após a aplicação da pré-medicação acima (esquema parenteral). 6 Opção 2. Via oral Posologia Dose máxima Antagonistas dos receptores H1 Maleato de dextroclorfeniramina oral (xarope) 0,2mg/kg 5mg Cimetidina ou 20 a 30mg/kg 400mg Ranitidina 1 a 2mg/kg 300mg Hidrocortisona (via venosa) ou 10mg/kg 1000mg Dexametasona (fosfato) intramuscular 2 ou 4mg 20mg Antagonistas dos receptores H2 Corticosteróide A aplicação do soro anti-rábico heterólogo deverá ser realizada aproximadamente 2 horas após a aplicação da pré-medicação acima (esquema oral). R Opção 3. Esquema misto Posologia Dose máxima 0,2mg/kg 5mg 10mg/kg 300mg 3mg/kg 100mg Hidrocortisona – intravenosa ou 10mg/kg 1000mg Dexametasona – intramuscular 2 ou 4mg 20mg Antagonistas dos receptores H1 - via oral Maleato de dextroclorfeniramina oral (xarope) Antagonistas dos receptores H2 – parenteral Cimetidina ou Ranitidina Corticosteróide Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 623 Raiva Imunoglobulina humana anti-rábica – Soro homólogo A imunoglobulina humana anti-rábica, uma solução concentrada e purificada de anticorpos, preparada a partir de hemoderivados de indivíduos imunizados com antígeno rábico, é um produto mais seguro que o soro anti-rábico porém de produção limitada e, por isso, de baixa disponibilidade e alto custo. Deve ser conservada entre + 2° e + 8° C, protegida da luz, observando-se o prazo de validade do fabricante. A dose indicada é de 20 UI/kg de peso. Deve-se infiltrar a maior quantidade possível na(s) lesão(ões). Quando a lesão for muito extensa e múltipla, a dose indicada pode ser diluída em soro fisiológico para que todas as lesões sejam infiltradas. Caso a região anatômica não permita a infiltração de toda a dose, a quantidade restante, a menor possível, deve ser aplicada por via intramuscular, na região glútea. Eventos adversos Manifestações locais – pode provocar reações de caráter benigno como dor, edema, eritema e, mais raramente, abscesso. Conduta: não é necessário notificar. Deve ser feito tratamento local com o objetivo de diminuir a dor, a tumefação e a vermelhidão. Manifestações sistêmicas – leve estado febril. Em presença de gama-globulinemia ou hipogamaglobulinemia pode ocorrer reação anafilática. Raramente, reação de hipersensibilidade. Conduta: notificar e investigar. Notas: • A imunoglobulina humana anti-rábica (soro homólogo) está disponível nos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (Cries) do Programa de Imunizações das secretarias de saúde dos estados e do Distrito Federal. • Os eventos adversos ao soro anti-rábico humano (heterólogo ou homólogo) devem ser investigados e notificados ao sistema de vigilância de eventos adversos do Programa Estadual de Imunizações da secretaria de saúde dos estados ou do Distrito Federal. Abandono de tratamento O tratamento profilático anti-rábico humano deve ser garantido todos os dias, inclusive nos finais de semana e feriados, até a última dose prescrita (esquema completo). É de responsabilidade do serviço de saúde que atende o paciente realizar busca ativa imediata daqueles que não comparecem nas datas agendadas para a aplicação de cada dose da vacina prescrita. As condutas indicadas para pacientes que não comparecem na data agendada estão a seguir descritas. 624 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Raiva Paciente em uso da vacina de cultivo celular • No esquema recomendado (dias 0, 3, 7, 14 e 28 ), as cinco doses devem ser administradas no período de 28 dias a partir do início do tratamento. • Quando o paciente faltar para a segunda dose: aplicar no dia que comparecer e agendar a terceira dose com intervalo mínimo de 2 dias. • Quando o paciente faltar para a terceira dose: aplicar no dia que comparecer e agendar a quarta dose com intervalo mínimo de 4 dias. • Quando o paciente faltar para a quarta dose: aplicar no dia que comparecer e agendar a quinta dose para 14 dias após. Bases gerais do tratamento 6 • A profilaxia contra a raiva deve ser iniciada o mais precocemente possível. • Sempre que houver indicação, tratar o paciente em qualquer momento, independentemente do tempo transcorrido entre a exposição e o acesso à unidade de saúde. • A história vacinal do animal agressor não constitui elemento suficiente para a dispensa da indicação do tratamento anti-rábico humano. • Havendo interrupção do tratamento, completar as doses da vacina prescritas anteriormente e não iniciar nova série. • Recomenda-se que o paciente evite esforços físicos excessivos e bebidas alcoólicas durante e logo após o tratamento. • Em caso de acidente por vacina anti-rábica de vírus vivo, o paciente deve receber esquema completo (soro + vacina). • Não se indica o uso de soro anti-rábico para os pacientes considerados imunizados por tratamento anterior, exceto nos casos de paciente imunodeprimido ou em caso de dúvidas sobre o tratamento anterior, quando deve-se indicar o soro. • Nos casos em que só tardiamente se conhece a necessidade do uso do soro antirábico ou quando há qualquer impedimento para o seu uso, aplicar a dose de soro recomendada antes da aplicação ou até a 3ª dose da vacina de cultivo celular. Após esse prazo o soro não é mais necessário. R Sobre o ferimento • Lavar imediatamente o ferimento com água corrente, sabão ou outro detergente. A seguir, devem ser utilizados antissépticos que inativem o vírus da raiva (como o polvidine, clorexidine e álcool-iodado). Essas substâncias deverão ser utilizadas uma única vez, na primeira consulta. Posteriormente, lavar a região com solução fisiológica. • A mucosa ocular deve ser lavada com solução fisiológica ou água corrente. • O contato indireto é aquele que ocorre por meio de objetos ou utensílios contaminados com secreções de animais suspeitos. Nestes casos, indica-se apenas lavar bem Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 625 Raiva o local com água corrente e sabão. • Em casos de lambedura na pele íntegra, por animal suspeito, recomenda-se lavar o local com água e sabão. • Não se recomenda a sutura dos ferimentos. Quando for absolutamente necessário, aproximar as bordas com pontos isolados. Havendo necessidade de aproximar as bordas, o soro anti-rábico, se indicado, deverá ser infiltrado uma hora antes da sutura. • Proceder à profilaxia do tétano segundo o esquema preconizado (caso não seja vacinado ou com esquema vacinal incompleto) e uso de antibióticos nos casos indicados, após avaliação médica. • Havendo contaminação da mucosa, seguir o tratamento indicado para lambedura na mucosa. Sobre o animal • O período de observação de 10 (dez) dias é restrito aos cães e gatos. • Considera-se suspeito todo cão ou gato que apresentar mudança brusca de comportamento e/ou sinais e sintomas compatíveis com a raiva, tais como salivação abundante, dificuldade para engolir, mudança nos hábitos alimentares e paralisia das patas traseiras. • Sempre que possível, o animal agressor, cão ou gato, deverá ser observado. Se durante o período de observação o animal morrer ou desenvolver sintomatologia compatível com raiva, amostras de seu sistema nervoso central (SNC) deverão ser enviadas para o laboratório de diagnóstico. Se necessário, o animal deverá ser sacrificado após o aparecimento de sintomas de paralisia. Cuidados deverão ser observados no manuseio do animal (EPIs), para evitar acidentes. • A agressão por outros animais domésticos (bovinos, ovinos, caprinos, eqüídeos e suínos) deverá ser avaliada e, se necessário, deverá ser indicado o tratamento profilático, lembrando que não se indica a observação desses animais com o objetivo de definir a conduta para o ser humano. Se o animal morrer, sempre que possível coletar amostra de tecido do SNC e enviar ao laboratório de diagnóstico. • Está indicado tratamento, sistematicamente, para todos os casos de agressão por animais silvestres, mesmo quando domiciliados e domesticados. • Não é indicado tratamento nas agressões causadas pelos seguintes roedores e lagomorfos (de áreas urbanas ou de criação): ❯ ratazana-de-esgoto (Rattus norvegicus); ❯ rato-de-telhado (Rattus rattus); ❯ camundongo (Mus musculus); ❯ cobaia ou porquinho-da-índia (Cavea porcellus); ❯ hamster (Mesocricetus auratus); ❯ coelho (Oryetolagus cuniculus). • Nas agressões por morcegos, deve-se proceder a sorovacinação, independentemente do tipo de morcego agressor, tempo decorrido e gravidade da lesão. Em caso de reexposição, seguir as orientações específicas para cada caso. 626 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Raiva Importante A imunofluorescência para raiva é um exame importante, de alta sensibilidade e especificidade. Quando o diagnóstico laboratorial do animal agressor for negativo pela técnica de imunofluorescência, o tratamento do paciente, a critério médico, pode ser suspenso aguardando-se o resultado da prova biológica. Isso não se aplica para eqüídeos (cavalo, burro, jumento), exceto nos casos em que os fragmentos encaminhados para o diagnóstico desses animais tenham sido o tronco encefálico e a medula. Medidas de controle para raiva animal Aspectos clínicos da raiva animal 6 Raiva no cão – os animais mais jovens são mais susceptíveis à infecção, cujo período de incubação varia de dez dias a dois meses, em média. A fase prodrômica dura, aproximadamente, 3 dias. O animal demonstra alterações sutis de comportamento, anorexia, esconde-se, parece desatento e, por vezes, nem atende ao próprio dono. Nessa fase ocorre um ligeiro aumento de temperatura, dilatação de pupilas e reflexos corneanos lentos. Há duas apresentações de raiva no cão: • furiosa – angústia, inquietude, excitação, tendência à agressão (morde objetos, outros animais e o próprio dono), alterações do latido (latido rouco), dificuldade de deglutição, sialorréia, tendência a fugir de casa, excitação das vias geniturinárias, irritação no local da agressão, incoordenação motora, crise convulsiva, paralisia, coma e morte; • muda ou paralítica – fase de excitação ausente, inaparente ou curta, busca de lugares escondidos ao abrigo da luz (fotofobia), sintomas predominantes paralíticos, que se iniciam pelos músculos da cabeça e pescoço, paralisia dos membros posteriores, estendendo-se por todo o corpo do animal, dificuldade de deglutição, sialorréia, coma e morte. Deve-se considerar que os sinais e sintomas das diferentes apresentações não seguem, necessariamente, seqüências obrigatórias ou apresentam-se em sua totalidade. O curso da doença dura em média dez dias e o animal pode estar eliminando vírus na saliva desde o 5° dia, antes de apresentar os primeiros sintomas. Em conseqüência das características da doença, o animal raivoso é facilmente atropelado em vias públicas, o que exige muito cuidado ao prestar socorro a um animal; • diagnóstico diferencial da raiva canina – cinomose, encefalites não especificadas, infestação por helmintos (migração de larvas para o cérebro), intoxicação por estricnina, atropina, doença de Aujeszky, eclâmpsia, ingestão de corpos estranhos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS R 627 Raiva Raiva no gato – geralmente, apresenta-se sob a forma furiosa, com sintomatologia similar à do cão. A mudança de comportamento, muitas vezes, não é observada, uma vez que os gatos são animais “semidomésticos”. Em conseqüência das próprias características dos felinos, o primeiro ataque é feito com as garras e depois com a mordida. Devido ao hábito de se lamberem constantemente, as arranhaduras são sempre graves. • diagnóstico diferencial da raiva felina – pode-se fazer o diagnóstico diferencial com encefalites, intoxicação e traumatismo cranioencefálico. Raiva em morcego – a patogenia da doença é pouco conhecida. O mais importante a considerar é o fato de que o morcego pode albergar o vírus rábico em sua saliva e ser infectante antes de adoecer, por períodos maiores que os de outras espécies. Algumas apresentações da doença em morcegos foram assim registradas: • raiva furiosa típica, com paralisia e morte; • raiva furiosa e morte sem paralisia; • raiva paralítica típica e morte. Obs.: Deve-se ressaltar que um morcego é considerado suspeito de estar infectado com o vírus da raiva quando for encontrado em horário e locais não habituais. Diagnóstico laboratorial dos diferentes animais O diagnóstico laboratorial é essencial tanto para a eleição de estratégias e definição de intervenção no paciente como para o conhecimento do risco da doença na região de procedência do animal. Os materiais de eleição para exame são cérebro, cerebelo e medula. Em se tratando de eqüídeos, enviar também o tronco encefálico e a medula. Caso não seja possível realizar a coleta do material, pode-se enviar a cabeça ou o animal inteiro, quando de pequeno porte. O material deverá ser coletado por profissional habilitado, de acordo com técnicas de biossegurança. Acondicionamento, conservação e transporte – o material para diagnóstico deve ser acondicionado em saco plástico duplo, vedado hermeticamente, identificado de forma clara e legível, não permitindo que a identificação se apague em contato com a água ou gelo. A amostra, devidamente embalada e identificada, deve ser colocada em caixa de isopor, com gelo suficiente para que chegue bem conservada ao seu destino. A caixa deve ser rotulada e bem fechada, não permitindo vazamentos que possam contaminar quem a transporte. O modo de conservação dependerá do tempo (estimado) decorrido entre a remessa ao laboratório e o processamento da amostra: • até 24 horas – refrigerado; • mais de 24 horas – congelado; • na falta de condições adequadas de refrigeração, conservar em solução com glicerina a 50%. 628 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Raiva A qualidade do resultado laboratorial dependerá do estado de conservação do material enviado. Materiais autolisados interferem nas técnicas laboratoriais, muitas vezes tornando impossível a emissão do laudo. Juntamente com o material, deve ser enviada a ficha epidemiológica completa, com o nome e endereço do solicitante, a espécie do animal e os possíveis contatos com humanos e animais; se houve observação do animal doente e qual o período; se o animal foi sacrificado ou morreu naturalmente, etc. Quando enviados dois ou mais fragmentos de tecidos, especificar no pedido e identificar os mesmos. Quadro 4. Espécie animal e fragmentos de eleição do SNC a ser coletado para diagnóstico laboratorial da raiva Espécie animal Fragmentos do SNC a serem coletados (preferencialmente) 6 Humana Cérebro, cerebelo e medula Canina/felina Corno de Amon e medula Bovino Cerebelo e medula Eqüídeo (cavalo, jumento, burro) Tronco encefálico e medula Ovino, caprino e suíno Cérebro, cerebelo e medula Animal silvestre Quando possível, enviar o animal inteiro, para identificação da espécie; se não for possível, enviar o cérebro, cerebelo e medula Observações: Todo indivíduo que executa ou auxilia necropsias de animais com suspeita de raiva deve se submeter ao esquema vacinal pré-exposição e ter seu soro dosado para anticorpos anti-rábicos duas vezes ao ano, como forma de verificar a manutenção do título protetor. Como a raiva acomete todas as espécies de mamíferos, recomenda-se que todo e qualquer animal suspeito de estar infectado com o vírus da raiva seja encaminhado para diagnóstico laboratorial. Ressalte-se o crescente número de morcegos positivos para a raiva e os inúmeros acidentes que vêm causando aos humanos. Morcegos e outros animais silvestres pequenos devem ser encaminhados inteiros, refrigerados ou congelados, para a identificação da espécie e orientação de ações de controle de foco em até 72 horas após a notificação, se possível. Os procedimentos de biossegurança devem ser rigorosamente seguidos, tanto no trato com os animais suspeitos quanto com os pacientes humanos. R Definição de caso suspeito e confirmado em cão e gato Caso suspeito – todo cão ou gato que apresente sintomatologia compatível com raiva e que possua história de agressão por outro animal suspeito ou raivoso. Todo cão ou gato que apresente sintomatologia compatível com a raiva, mesmo sem antecedentes de contato ou agressão conhecida por outro suspeito ou raivoso que resida ou provenha de áreas endêmicas. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 629 Raiva Caso confirmado – todo cão ou gato submetido a exame laboratorial e cujo material se revele positivo para raiva em laboratório de diagnóstico. Todo cão ou gato que tenha sido clinicamente diagnosticado como raivoso, por médico veterinário, e tenha evoluído para óbito, ainda que não se tenha enviado material para laboratório de diagnóstico. Como proceder diante de 1 ou mais casos de raiva canina: • notificar imediatamente o caso à vigilância epidemiológica municipal, centro de controle de zoonoses (quando existir) e coordenação estadual do Programa de Profilaxia da Raiva das secretarias estaduais de saúde; • se o animal estiver vivo, não matar; juntamente com a autoridade sanitária garantir que seja observado com segurança e alimentação adequadas, para o acompanhamento da evolução do quadro. Se o animal apresentar sintomatologia compatível com a raiva e não houver possibilidades de observação em local seguro, recomenda-se o sacrifício do mesmo, por profissional habilitado. Se o animal morrer, providenciar o envio do encéfalo ao laboratório, devidamente conservado em gelo, jamais em formol. Decisão/ação (agir até 72 horas após a notificação): • investigar o caso; • diagnosticar a situação; • definir as intervenções. Em caso de intervenção Cabe ao proprietário – entregar para sacrifício todo animal que tenha sido agredido por animal raivoso e contribuir para a execução do trabalho. Cabe aos serviços de saúde – diante da recusa do proprietário, os profissionais de saúde, legalmente baseados nos códigos sanitários (federal, estadual ou municipal), devem retirar o animal do domicílio ou via pública; os animais sem vacinação prévia devem ser sacrificados, podendo-se abrir exceção quando existir a segurança de que o animal agredido tenha sido vacinado e esteja dentro do período de imunidade previsto para esse imunobiológico (1 ano). Se não for realizado o sacrifício, o animal agredido deve ser mantido confinado e em observação por pelo menos 6 meses. Encaminhar à unidade de saúde todos os indivíduos que tenham sido agredidos ou tiveram contato com o animal. Prosseguir a investigação epidemiológica, a quantificação de casos em animais e a caracterização da área do foco, com vistas a: • informar e envolver a comunidade para participação efetiva nas ações de controle; • vacinar os animais susceptíveis, sob cadastramento. Essa vacinação dos susceptíveis dentro da área de foco deve ser do tipo “casa a casa”, com o objetivo de imunizar 100% da população canina estimada, devendo ser realizada nas primeiras 72 horas após a detecção do foco; • apreender cães errantes; • realizar em locais adequados a observação de animais (cães e gatos) agressores, por um período de 10 dias; • estimular e providenciar o envio de amostras para laboratório; 630 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Raiva • proceder a revacinação, em prazo não inferior a 90 dias; • delimitar o foco com base nos critérios estabelecidos pelo rastreamento da possível fonte de infecção, barreiras naturais e organização do espaço urbano; • estimular tanto a notificação negativa como a positiva. Aspectos específicos da epidemiologia e controle da raiva animal • Casos surgidos após 90 dias de intervenção caracterizam novos focos. • A concomitância de casos dispersos em um município, considerando a baixa notificação, pode caracterizar uma epizootia. • A persistência de casos animais, apesar da existência de intervenções, faz pensar na falta de qualidade e eficácia das medidas sanitárias ou, ainda, de que se trata de um problema crônico – endemia ou até mesmo, em uma exacerbação do comportamento da doença, epidemia. • Sobretudo em áreas endêmicas impõe-se a necessidade da constituição de serviço de apreensão rotineira de cães errantes. Calcula-se que se deva recolher anualmente 20% da população canina estimada aos canis públicos, onde devem permanecer por prazo não superior a 72 horas – para serem resgatados por seus donos. Passado esse prazo, serão doados às instituições de ensino biomédico ou submetidos à eutanásia. O sucesso no controle da raiva canina depende de uma cobertura vacinal acima de 80% (desde que a estimativa canina seja confiável). A estratégia a ser adotada nas campanhas de vacinação em massa pode ser do tipo casa a casa, postos fixos ou mistos (casa a casa + postos fixos), a critério de cada município. • O controle da raiva silvestre, sobretudo do morcego hematófago, exige uma intervenção específica. Em função da gravidade das agressões por morcegos, deve-se comunicar o caso imediatamente aos serviços de saúde e à agricultura, para o desencadeamento das ações de controle de competência de cada instituição, e reportar-se ao Manual sobre morcegos em áreas urbanas e rurais: manejo e controle, do Ministério da Saúde. 6 R Ações de educação em saúde Orientar o processo educativo no programa da raiva (urbana, rural e silvestre) tem como ferramentas básicas a participação e a comunicação social, devendo ser necessariamente envolvidos os serviços interinstitucionais, intersetoriais e multidisciplinares (profissionais de saúde, agricultura, escolas, universidades, meio ambiente, Ongs, associações de moradores, sindicatos rurais, proprietários de animais de estimação, proprietários de grandes animais e a população em geral). Estimular a posse responsável de animais. Desmistificar a castração dos animais de estimação. Adotar medidas de informação/comunicação que levem a população a reconhecer a gravidade de qualquer tipo de exposição a um animal; a necessidade de atendimento imediato; as medidas auxiliares que devem ser adotadas às pessoas que foram expostas e/ou agredidas; a identificar os sintomas de um animal suspeito. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 631 Raiva Divulgar os serviços existentes, desmistificando simultaneamente o tratamento profilático anti-rábico humano e estimulando a responsabilidade do paciente com o cumprimento do esquema indicado, visando à diminuição do abandono e risco de ocorrência de casos. Não valorizar a proteção do cão errante. Estimular a imunização anti-rábica animal. Desenvolver ações educativas especificamente voltadas para o ensino fundamental. Estratégias de prevenção O tratamento profilático de pessoas agredidas previne a ocorrência de novos casos. Assim, o tratamento adequado é de suma importância para a eliminação da raiva humana. Lembrar que pessoas sob risco devem tomar a vacina para evitar a doença. A vacinação periódica e rotineira de 80% dos cães (população real estimada) e gatos pode quebrar o elo da cadeia epidemiológica, impedindo que o vírus alcance a população, interrompendo, assim, o ciclo urbano da raiva. A captura de animais e o envio de amostras ao laboratório ajudam no monitoramento da circulação do vírus. Já que dificilmente se consegue vacinar os cães errantes, fundamentais para a persistência da cadeia de transmissão, recomenda-se a eliminação de 20% da população canina visando reduzir a circulação do vírus. Com relação a morcegos, a ocorrência crescente de casos de raiva humana transmitida pelos mesmos faz com que se conheça cada vez mais detalhadamente a raiva dos quirópteros (morcegos): seu comportamento, distribuição e maneiras de controle. Estimular a pesquisa, juntamente com os órgãos ambientais, da raiva no ciclo silvestre permitirá traçar o perfil epidemiológico e identificar a circulação viral. 632 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Rubéola RUBÉOLA CID 10: B06 Características clínicas e epidemiológicas Descrição É uma doença exantemática aguda, de etiologia viral, que apresenta alta contagiosidade, acometendo principalmente crianças. Doença de curso benigno, sua importância epidemiológica está relacionada ao risco de abortos, natimortos e malformações congênitas como cardiopatias, catarata e surdez, denominada síndrome da rubéola congênita (SRC) quando a infecção ocorre durante a gestação. 6 Agente etiológico O agente infeccioso da rubéola é um vírus pertencente ao gênero Rubivirus, família Togaviridae. Reservatório O homem. Modo de transmissão Através de contato com as secreções nasofaríngeas de pessoas infectadas. A infecção é produzida por disseminação de gotículas ou contato direto com os pacientes. A transmissão indireta, mesmo pouco freqüente, ocorre mediante contato com objetos contaminados com secreções nasofaringeanas, sangue e urina. Período de incubação R Em geral, varia de 14 a 21 dias, durando, em média, 17 dias. A variação máxima observada é de 12 a 23 dias. Período de transmissibilidade Aproximadamente, de 5 a 7 dias antes do início do exantema até 5 a 7 dias após. Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade é geral. A imunidade ativa é adquirida através da infecção natural ou por vacinação, permanecendo por quase toda a vida. Os filhos de mães imunes podem apresentar imunidade passiva e transitória durante 6 a 9 meses. Tem sido relatada a ocorrência de reinfecção em pessoas previamente imunes através de vacinação ou infecção natural, quando reexpostas ao vírus. Esta reinfecção é usualmente assintomática, detectável apenas por métodos sorológicos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 633 Rubéola Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas O quadro clínico é caracterizado por exantema máculo-papular e puntiforme difuso, iniciando-se na face, couro cabeludo e pescoço, espalhando-se posteriormente para o tronco e membros. Além disso, apresenta febre baixa e linfadenopatia retroauricular, occipital e cervical posterior, geralmente antecedendo ao exantema no período de 5 a 10 dias, podendo perdurar por algumas semanas. Formas inaparentes são freqüentes, principalmente em crianças. Adolescentes e adultos podem apresentar um período prodrômico com febre baixa, cefaléia, dores generalizadas (artralgias e mialgias), conjuntivite, coriza e tosse. A leucopenia é comum e raramente ocorrem manifestações hemorrágicas. Apesar de raras, complicações podem ocorrer com maior freqüência em adultos, destacando-se artrite ou artralgia, encefalites (1 para 5 mil casos) e manifestações hemorrágicas (1 para 3 mil casos). Diagnóstico diferencial O diagnóstico diferencial deve ser feito com sarampo, escarlatina, dengue, exantema súbito (crianças até 2 anos), eritema infeccioso, enteroviroses (coxsackie e echo) e, também, com outras doenças que podem causar síndromes congênitas, como mononucleose infecciosa, toxoplasmose e infecção por citomegalovírus. Diagnóstico laboratorial É realizado mediante detecção de anticorpos específicos no soro (IgM e IgG) e isolamento viral (ver normas e procedimentos no Anexo 1). Tratamento Não há tratamento específico para a rubéola. Os sinais e sintomas apresentados devem ser tratados de acordo com a sintomatologia e terapêutica adequada. Aspectos epidemiológicos A rubéola foi introduzida na lista de doenças de notificação compulsória no Brasil na segunda metade da década de 90. Em 1997, ano em que o país enfrentou a última epidemia de sarampo, foram notificados cerca de 30 mil casos de rubéola, sendo que no período compreendido entre 1999 a 2001 ocorreram surtos desta doença em vários estados. Neste período, observou-se aumento progressivo no número de casos suspeitos de SRC (de 200 para 600), o que reflete tanto o aumento da circulação do vírus (a taxa de incidência de rubéola na população feminina, em 2001, chegou a 5/100 mil mulheres na faixa etária de 15 a 19 anos e de 6,3/100 mil mulheres na faixa etária de 20 a 29 anos) como o incremento de estratégias de vigilância para a detecção de casos. A vigilância epidemiológica dessas doenças tem se mostrado sensível, oportuna e específica. 634 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Rubéola A implementação do Plano de Erradicação do Sarampo no país, a partir de 1999, impulsionou a vigilância e o controle da rubéola. Em 2002, ocorreram 1.480 casos de rubéola no Brasil, o que corresponde a um decréscimo de 95% quando comparados à incidência de 1997. As taxas de incidência no sexo feminino, em 2002, ficaram em 1/105 mulheres tanto na faixa etária de 15 a 19 como de 20 a 29 anos. Em 2003, foram confirmados 561 casos de rubéola entre os 16.036 casos suspeitos notificados, demonstrando a alta sensibilidade e especificidade do sistema de vigilância. Destaca-se a realização de uma campanha de vacinação em massa dirigida às mulheres em idade fértil (MIF) durante 2001 e 2002, ao tempo em que completou-se a introdução da vacina dupla ou tríplice viral no calendário básico de imunização, processo iniciado em 1992. O fortalecimento da vigilância do sarampo e da rubéola revelou a necessidade de controle e prevenção da SRC. Figura 1. Evolução da taxa de incidência de rubéola e estratégias de controle. Brasil, 1992-2003 6 Incidência /100 mil hab. 25 Notificação compulsória 20 MIF - RN MIF - PR 15 MIF - 13 UFs Implantação VTV 1 - 11 anos 10 11 UFs 5 0 92 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 Fonte: Cover/CGDT/Devep/SVS/MS Figura 2. Número de casos confirmados e taxa de incidência de rubéola por grupos etários. Brasil, 2000-2003 4.000 R 25 3.600 3.200 20 2.800 2.400 15 2.000 1.600 10 1.200 5 800 400 0 < 1a 1-4 Casos 00 Incid 00 5-9 10 - 14 Casos 01 Incid 01 15 - 19 Casos 02 Incid 02 20 - 29 30 + 0 Casos 03 Incid 03 Fonte: Cover/CGDT/Devep/SVS/MS Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 635 Rubéola Vigilância epidemiológica Objetivos Detectar a circulação do vírus em determinado tempo e área geográfica, identificar a população sob risco para SRC nessas áreas e proteger a população susceptível. Definição de caso Suspeito Todo paciente que apresente febre e exantema máculo-papular, acompanhada de linfoadenopatia retroauricular, occipital e cervical, independente da idade e situação vacinal. Confirmado Laboratorial – quando a interpretação dos resultados dos exames sorológicos for positivo para rubéola. Vínculo epidemiológico – quando o caso suspeito teve contato com um ou mais casos de rubéola, confirmados por laboratório, e apresentou os primeiros sintomas da doença entre 12 a 23 dias após a exposição ao(s) caso(s). Clínico – quando há suspeita clínica de rubéola, mas as investigações epidemiológica e laboratorial não foram realizadas ou concluídas. Como o diagnóstico de rubéola não pode ser confirmado nem descartado com segurança, este caso representa uma falha do sistema de vigilância epidemiológica. Descartado Laboratorial – quando o resultado do exame laboratorial: • for negativo para IgM específica para rubéola; • for positivo para outra doença; • em duas amostras pareadas, não detectar soroconversão dos anticorpos. Quando o resultado for IgM negativo em amostra tardia, o caso é descartado apenas se não for gestante. Vínculo epidemiológico – quando o caso tiver como fonte de infecção um ou mais casos descartados pelo critério laboratorial ou quando, na localidade, estiver ocorrendo outros casos, surtos ou epidemia de outra doença exantemática febril, confirmada por diagnóstico laboratorial. Clínico – caso suspeito de rubéola em que não houve coleta de amostra para exame laboratorial, mas a avaliação clínica e epidemiológica detectou sinais e sintomas compatíveis com outro diagnóstico diferente da rubéola. 636 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Rubéola Critérios para o descarte de casos suspeitos de rubéola com associação temporal à vacina A avaliação clínica e epidemiológica indica uma associação temporal entre a data do início dos sintomas e a data do recebimento da última dose da vacina com o componente contra a rubéola, mesmo que não tenha sido realizada coleta de amostra. Os critérios para descarte como associação temporal à vacina são os seguintes: • febre com temperatura que pode chegar a 39ºC ou mais, com início entre o 5º e 12º dias após a vacinação e duração média de um a dois dias, podendo chegar até cinco dias; • exantema, geralmente benigno, que dura de um a dois dias e que surge entre o 7º e 10º dias após a administração da vacina; • cefaléia ocasional, irritabilidade, conjuntivite ou manifestações catarrais observadas entre o 5º e 12º dias após a vacinação; • linfadenopatias que se instalam entre 7 a 21 dias após a data de vacinação; • resultado do exame laboratorial “reagente” ou “positivo para IgM” em amostra colhida no período de 8 a 56 dias após a data da última dose de vacina. 6 Notificação Todos os casos suspeitos devem ser imediatamente notificados pelo nível local à secretaria municipal de saúde, seguindo o fluxo definido pelo nível estadual. A ocorrência de um surto de rubéola deve ser notificado de imediato aos demais níveis do sistema. Caso suspeito de rubéola Toda pessoa com febre e exantema maculopapular acompanhada de linfoadenopatia retroauricular, occipital e cervical, independente da idade e situação vacinal Suspeitar de rubéola Notificar a secretaria municipal de saúde Investigar em até 48h Coletar sangue para sorologia no primeiro contato com o paciente R Vacinação de bloqueio. Vacinar os contatos susceptíveis Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente A assistência ocorre em unidades básicas de saúde e, quando gestantes, em serviços de pré-natal. A necessidade de hospitalização é muito rara. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 637 Rubéola Qualidade da assistência Verificar se os casos estão sendo atendidos de forma adequada nas unidades básicas de saúde, bem como se há orientação disponível sobre procedimentos frente a um caso de rubéola, principalmente relacionados ao cuidado com as gestantes. Proteção individual para evitar circulação viral As crianças e adultos acometidos de rubéola devem ser afastados da escola, creche ou local de trabalho durante o período de transmissibilidade (cinco a sete dias antes do início do exantema e pelo menos cinco a sete dias depois). Confirmação diagnóstica Coletar material para diagnóstico laboratorial, de acordo com as orientações constantes do Anexo 1. Proteção da população A principal medida de controle da rubéola é feita através da vacinação dos susceptíveis, que inclui: vacinação da rotina da rede básica de saúde, bloqueio vacinal, intensificação e/ou campanhas de vacinação. Ressalte-se que a cada caso suspeito notificado a ação de bloqueio vacinal deve ser desencadeada imediatamente. A faixa etária prioritária para a realização do bloqueio vacinal é a de 6 meses a 39 anos de idade. A redução ou aumento da idade para a realização do bloqueio vacinal deverá ser avaliada de acordo com a situação epidemiológica local. Extensa busca ativa de novos casos suspeitos e susceptíveis deve ser realizada para um controle mais eficiente da doença. As gestantes susceptíveis devem ser afastadas do contato com casos e comunicantes durante o período de transmissibilidade e incubação da doença. Se a gestante mantiver contato com um doente de rubéola deve ser avaliada sorologicamente, o mais precocemente possível, para posterior acompanhamento e orientação. Ações de esclarecimento à população mediante visitas domiciliares, palestras nas comunidades e por meio de veículos de comunicação de massa devem ser implementadas. O conteúdo dos esclarecimentos deve incluir conhecimentos sobre o ciclo de transmissão da doença, gravidade, situação de risco e imunização. Investigação Todo caso suspeito de rubéola deve ser investigado, objetivando coletar as informações necessárias para o correto diagnóstico final. Além disso, a possibilidade de detecção de novos casos deve ser considerada e, nesse momento, devem ser adotadas medidas de controle frente à ocorrência de um ou mais casos. 638 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Rubéola Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente Preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica do Sinan, relativos aos dados gerais, notificação individual e dados de residência. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmar a suspeita diagnóstica Todo caso suspeito de rubéola deve ser investigado até 48 horas após seu conhecimento, com os seguintes objetivos: • caracterizar clinicamente o caso para determinar sua classificação como suspeito. Preencher a ficha de investigação epidemiológica de doenças exantemáticas febris (sarampo/rubéola), nacionalmente padronizada pelo Sinan; • coletar amostra de sangue para exame sorológico, a fim de confirmar o diagnóstico. Desencadear as medidas de controle pertinentes; • a gestante assintomática (contato/exposta a casos suspeitos ou confirmados de rubéola) com resultado IgM positivo, que foi notificada à vigilância epidemiológica, deverá ser acompanhada da mesma forma que as gestantes sintomáticas para rubéola. 6 Para identificação da área de transmissão É importante registrar todas as informações referentes aos casos suspeitos, para identificar os grupos populacionais acometidos ou sob risco de doença, o período e a área de transmissão (Quem? Quando? Onde?). Essas informações orientam a tomada de decisões quanto às medidas de controle (por exemplo, quem, quando e onde vacinar?) e permitem acompanhar adequadamente e divulgar a situação de cada município alvo de surto. Um surto de rubéola caracteriza-se pela ocorrência de incidência acima do valor esperado, quando comparada aos anos anteriores. A ocorrência de um surto de rubéola é considerada situação de emergência epidemiológica pois, além de se tratar de doença infecciosa, há uma real possibilidade de ocorrência da SRC. Uma vez caracterizada a ocorrência de surto ou epidemia numa área determinada, não é necessário coletar amostra de todos os casos que surgirem, exceto nas gestantes, desde que a investigação comprove que estão relacionados entre si. Em uma situação de surto, as mulheres expostas durante a gravidez devem ser acompanhadas durante a gestação e no pós-parto; e o recém-nascido, durante o primeiro ano de vida. Na ocorrência de um surto, a possível fonte de infecção dos casos deve ser exaustivamente investigada para identificar novas áreas de circulação viral. Quando a investigação detecta que o caso de rubéola esteve viajando no período de 12 a 23 dias antes do início dos sintomas, a equipe de vigilância do município de origem do caso deve informar à equipe de vigilância do local onde o paciente esteve, a fim de que adote as medidas de investigação e controle. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS R 639 Rubéola Para determinação da extensão da área de transmissão Deve ser feito um detalhado estudo para caracterizar o perfil da ocorrência e os fatores que contribuíram para a circulação do vírus na população. Atenção especial deve ser dada à detecção da rubéola em mulheres em idade fértil, visando identificar os futuros casos suspeitos de SRC. A obtenção de informações detalhadas e uniformes, para todos os casos, possibilita a comparação dos dados e a análise adequada da situação epidemiológica da doença. Considerando que, com grande freqüência, se pode encontrar casos suspeitos de rubéola entre as pessoas que viajam, a identificação de um viajante nestas condições deve ser notificada, de imediato, às autoridades sanitárias. Além disso, o viajante-paciente ou seu acompanhante deve ser informado sobre a doença, complicações e transmissibilidade, bem como sobre a necessidade de manter-se recolhido ao local de hospedagem (hotel ou outro) até cinco dias após o aparecimento do exantema. Coleta e remessa de material para exames Todo caso suspeito de rubéola e toda gestante com história de contato com caso confirmado deverão ter uma amostra de sangue coletada para sorologia. Na ocorrência de surto, deve-se coletar também espécimes clínicas para isolamento viral, de acordo com as normas e procedimentos do Anexo 1. É da responsabilidade dos profissionais da vigilância epidemiológica e/ou dos laboratórios centrais ou de referência viabilizar, orientar ou mesmo realizar estas coletas. Os resultados laboratoriais devem ser interpretados com base nas datas de coleta, de aparecimento dos sintomas e da última dose de vacina. Análise dos dados A análise dos dados deve ser realizada rotineiramente, em todos os níveis do sistema (local, municipal, estadual e federal), para identificar duplicidade de casos e informações incorretas. Deve-se buscar responder, pelo menos, às três questões: quando? (distribuição temporal), onde? (distribuição geográfica), e quem? (distribuição segundo atributos pessoais). O cálculo do coeficiente de incidência é fundamental, principalmente para realizar comparações com períodos anteriores (análise de tendência). Essas informações, juntamente com a cobertura vacinal, permitem a avaliação das estratégias de vacinação adotadas e orientam novas medidas, como a intensificação da vacinação em locais de baixa cobertura. Encerramento de casos Após análise das fichas epidemiológicas, os casos deverão ser encerrados em até 30 dias e digitados no Sinan. Relatório final É realizado somente em situações de surto, onde deverão estar relatadas as ações realizadas para o controle do surto. 640 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Rubéola Roteiro de investigação epidemiológica da rubéola Notificação de caso suspeito Investigação Coletar dados clínicos e epidemiológicos Coletar material para sorologia Realizar medidas de controle Identificar novos casos suspeitos Enviar ao laboratório Bloqueio vacinal Identificar ocorrência de surtos Laboratório informa o resultado à secretaria estadual de saúde/ secretaria municipal de saúde Operação limpeza Realizar educação em saúde 6 Identificar área de transmissão Avaliar a cobertura vacinal da área Secretarias municipais e estaduais de saúde encerram o caso, conforme o algoritmo (Anexos 2 e 3) Instrumentos disponíveis para controle R Imunização Recomendações gerais para a vacinação A vacina é a única forma de prevenir a ocorrência da rubéola na população. O risco da doença para indivíduos susceptíveis permanece em função da circulação do vírus entre a população masculina não vacinada em campanhas ou bloqueios, e porque o vírus circula em várias regiões do mundo. É necessário, portanto, manter um alto nível de imunidade na população por meio de coberturas vacinais elevadas, iguais ou superiores a 95%, o que reduz a possibilidade da ocorrência da rubéola em coortes vacinadas. Vacinação na rotina É a atividade realizada de forma contínua na rede de serviços de saúde, em todo o território nacional. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 641 Rubéola No Brasil, atualmente, a vacinação de rotina contra a rubéola é realizada aos 12 meses de vida, utilizando-se a vacina tríplice viral (sarampo, rubéola e cachumba), com um reforço entre os 4-6 anos. Chama-se a atenção para o fato de que quando a vacinação é iniciada e as coberturas não são satisfatórias (<95%) pode haver deslocamento da faixa etária dos casos, com elevados níveis de incidência em adultos e conseqüente aumento do risco da ocorrência de casos de SRC. A vacina tríplice viral também deverá ser aplicada em adolescentes entre 11 e 19 anos, que não tiverem a comprovação de duas doses anteriores. Para a prevenção da SRC faz-se necessária a vacinação de 100% das mulheres em idade fértil. Desse modo, todas as mulheres na faixa de 12 a 39 ano,s ainda não vacinadas, deverão receber uma dose da tríplice dupla viral (sarampo/rubéola) ou nas distintas oportunidades de contato com os serviços de saúde (na rede básica de saúde, maternidades, pós-parto, pós-aborto). Estratégias de vacinação frente a casos suspeitos Diante de uma pessoa com sinais e sintomas, é realizado o bloqueio vacinal para os contatos sem esperar o resultado da sorologia. Na vacinação de bloqueio, utilizar a vacina tríplice viral para a faixa etária de 6 meses a 39 anos, de forma seletiva para homens e mulheres. A dose de vacina tríplice viral aplicada em menores de 1 ano não será considerada dose válida. Neste caso, aos 12 meses a criança deverá ser revacinada com a vacina tríplice viral. Não há garantia de que a vacinação dos comunicantes, após a exposição ao doente, proteja contra a infecção. No entanto, é importante aproveitar a oportunidade da detecção de um caso para vacinar os contatos susceptíveis, principalmente as mulheres em idade fértil. Medidas de controle para um surto de rubéola Após a identificação de um surto de rubéola, atenção especial deve ser dada à detecção da doença nas mulheres em idade fértil, para identificar casos potenciais de SRC. Quando as medidas de controle não são efetivas, o surto de rubéola pode ser prolongado pela incapacidade de conter a propagação da doença. A “operação limpeza”, que é a estratégia de vacinação a ser usada, terá maior ou menor abrangência de acordo com: • a situação epidemiológica; • a cobertura vacinal da área; • a estimativa do número de susceptíveis que possam residir na localidade. A cobertura vacinal da área deve ser cuidadosamente analisada com o objetivo de identificar as micro localidades que concentram as pessoas susceptíveis. Na “operação limpeza”, a vacinação é feita casa a casa (incluindo os estabelecimentos coletivos e as populações institucionalizadas), tanto na zona urbana quanto na rural, com prioridade para as áreas de risco. 642 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Rubéola Todos os profissionais de saúde, em especial os obstetras, neonatologistas e pediatras, devem receber informações sistemáticas sobre: • ocorrência de surtos; • implicações do surto em mulheres grávidas; • definição de casos suspeitos e condutas pertinentes a cada um; • importância da notificação imediata frente à suspeita de rubéola. Quando da ocorrência de um surto, a vigilância da SRC deve continuar por nove meses, no mínimo, desde a ocorrência do último caso notificado de rubéola. Ações de educação em saúde Esclarecer a população, principalmente da área de educação, sobre a doença e a importância de vacinação das crianças e mulheres, com vistas à prevenção da SRC. 6 Estratégias complementares de prevenção Intensificação da vacinação extramuros A intensificação da vacinação compreende, de maneira geral, o desenvolvimento de atividades fora dos serviços de saúde (extramuros). O principal objetivo é eliminar bolsões de susceptíveis, devendo ser realizada sempre que os índices de vacinação estiverem abaixo de 95%. Com isso, assegura-se que nenhum município tenha cobertura vacinal contra o sarampo/rubéola abaixo da meta. A intensificação das atividades consiste, sobretudo, na realização de vacinação casa a casa (incluindo residências e instituições em geral, como, por exemplo, escolas, creches, orfanatos, etc.), alcançando crianças de 12 meses até menores de 12 anos de idade que não foram vacinadas na rotina e nas campanhas de multivacinação e de seguimento, especialmente as que vivem nas áreas urbanas e rurais de difícil acesso e que, geralmente, não são trabalhadas pelos serviços de saúde. R Campanhas de multivacinação As campanhas de multivacinação (que acontecem duas vezes ao ano) são excelentes oportunidades para aumentar as coberturas vacinais. No entanto, quando a meta é controlar a rubéola e eliminar a SRC, não se devem esperar as campanhas para vacinar os susceptíveis. Por ocasião das campanhas de multivacinação são vacinadas as crianças de 12 meses até menores de 12 anos de idade que não foram atingidas pelas atividades de rotina e campanhas de seguimento. Vacinação de grupos de risco Mesmo considerando que as crianças são prioridade das estratégias voltadas à erradicação do sarampo e as mulheres em idade fértil para o controle da rubéola e eliminação Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 643 Rubéola da SRC, um percentual da população permanece susceptível à doença, pois escapou tanto da infecção natural como da vacinação. São os chamados grupos de risco, entre os quais destacam-se: • profissionais e estudantes da área de saúde e educação; • populações institucionalizadas de quartéis, prisões, centros de reclusão de menores, albergues, alojamentos, universidades, etc.; • populações que migram de localidades onde as coberturas vacinais, anteriores e/ou atuais, são baixas; • adolescentes e adultos jovens que viajam para países onde o sarampo é endêmico; • vendedores ambulantes, profissionais do sexo e trabalhadores dos setores hoteleiro e de turismo, bem como de portos, feiras, aeroportos e rodoviárias; Ressalte-se a importância de disponibilizar a vacina às pessoas que chegam ao país, oriundas de locais com ocorrência de rubéola e sarampo. Para prevenir a ocorrência de surtos de rubéola e sarampo entre os adolescentes e adultos jovens que compõem os grupos de risco, faz-se necessário um esforço adicional para vaciná-los. 644 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Rubéola Anexo 1 Normas para procedimentos laboratoriais Fazer o diagnóstico diferencial com base na clínica entre a rubéola e outras doenças exantemáticas é bastante difícil, daí a importância do exame laboratorial para a confirmação do diagnóstico. O diagnóstico laboratorial é realizado por meio do isolamento do vírus ou por métodos sorológicos para detecção de anticorpos específicos, sendo necessário assegurar a coleta da amostra de sangue logo no primeiro atendimento. No caso da gestante que teve contato com pessoa doente de rubéola, a primeira amostra também deve ser coletada no momento do primeiro atendimento. Os anticorpos específicos para o vírus da rubéola aparecem logo após o início da doença. A presença de IgM positivo significa que houve infecção recente, mas geralmente não são mais detectados após 4 a 6 semanas do início do exantema, quando predominam os anticorpos IgG, que usualmente persistem por toda a vida. 6 1. Tipos de exames Ensaio imunoenzimático (EIE) – na maioria dos casos, o ensaio imunoenzimático de captura para IgM anti-rubéola permite o diagnóstico através da realização do exame de uma amostra, coletada durante o comparecimento ao serviço de saúde. Inibição da hemaglutinação (HI) – mais utilizada por ser de baixo custo e simples execução, apresentando também boa sensibilidade e especificidade. Devem ser coletadas duas amostras: a primeira, durante o período exantemático, quando do comparecimento do doente ao serviço de saúde; a segunda, 14 dias a partir da data da coleta da primeira amostra. Outros métodos que podem ser utilizados – EIE para detecção de IgG, aglutinação passiva do látex, hemólise radial e detecção de IgM por hemoabsorção. R Procedimentos Sorologia Coleta – de acordo com o Plano de Controle da Rubéola deverá ser coletada uma amostra de sangue para realização de exame sorológico, visando-se a detecção de anticorpos específicos, na primeira visita do paciente ao serviço de saúde. As amostras deverão ser coletadas nos primeiros 28 dias após o início do exantema. Aquelas coletadas após o 28o dia são consideradas tardias mas mesmo assim devem ser aproveitadas e encaminhadas ao laboratório para realização da pesquisa de IgM. É importante ressaltar que resultados não-reagentes para IgM não descartam a possibilidade de infecção recente pelo vírus da rubéola. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 645 Rubéola Material – o material a ser colhido é o sangue venoso sem anticoagulante, na quantidade de 5 a 10ml. Quando se tratar de criança muito pequena e não for possível coletar o volume estabelecido, obter no mínimo 3ml. Conservação e envio ao Lacen – após a separação do soro, conservar o tubo com o soro sob refrigeração na temperatura de +4ºC a +8ºC, por no máximo 48 horas. Enviar ao laboratório no prazo de dois dias, no máximo, colocando o tubo em embalagem térmica ou caixa de isopor com gelo ou gelox. Caso o soro não possa ser encaminhado ao laboratório no prazo de dois dias (48h), conservá-lo no freezer em uma temperatura de -20ºC até o momento do transporte para o laboratório de referência. O prazo máximo para chegar ao Lacen é de até 5 dias. Interpretação do resultado Rubéola pós-natal (exceto gestantes) Coleta da amostra Até 28 dias Após 28 dias Resultado Classificação do caso IgM (+) Confirmar o caso IgM (-) Descartar o caso IgM (+) Confirmar o caso IgM (-) Embora não se possa afirmar que não houve infecção recente, des cartar o caso Rubéola em gestante sintomática Coleta da amostra Do 1º ao 4º dia Resultado IgM (+) Confirmar o caso IgM (-) Realizar pesquisa de IgG IgG (+) IgG (-) Do 5º ao 28º dia IgM (+) IgM (-) IgM (+) Após 28 dias 646 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Classificação do caso Descartar o caso Colher 2ª amostra após 7 a 21 dias da 1ª Confirmar o caso – acompanhar Descartar o caso Confirmar o caso IgM (-) Não se pode afirmar que não houve infecção, realizar IgG IgG (+) Confirmar o caso IgG (-) Descartar o caso Rubéola Gestante assintomática por contato de rubéola Coleta da amostra Resultado IgM (+) Até 27 dias Classificação do caso Acompanhar – recém-nascido suspeito de SRC IgM (-) Realizar pesquisa de IgG IgG (+) Gestante não-susceptível IgG (-) Colher 2ª amostra entre a 4ª e 6ª semanas (29 a 42 dias) após o contato 2ª amostra Entre 28 e 42 dias Após 42 dias IgM (+) Acompanhar – recém-nascido suspeito de SRC IgM (-) Vacinar após o parto IgM (+) Acompanhar – recém-nascido suspeito de SRC IgM (-) Realizar pesquisa de IgG IgM (+) Acompanhar – recém-nascido suspeito de SRC IgM (-) Realizar pesquisa de IgG IgG (+) IgG (-) 6 Não se pode afirmar que houve infecção Acompanhar – recém-nascido suspeito de SRC Vacinar após o parto Isolamento viral – o vírus da rubéola pode ser isolado a partir das secreções nasofaríngeas. Este procedimento é recomendado na ocorrência de surtos ou epidemias já confirmados por laboratório. Coletar de 5 a 10 espécimes por surto, numa determinada área geográfica, não necessitando realizar a coleta de todos os casos suspeitos de rubéola. Todo espécime clínico coletado deve ser encaminhado ao laboratório central do estado (Lacen), para o processamento inicial da amostra. Cabe a este Lacen o encaminhamento ao Centro de Referência Nacional para Sarampo/Rubéola, na Fiocruz/RJ. Quanto mais perto do início do exantema a amostra for coletada e quanto mais rápido chegar ao laboratório de referência nacional (Fiocruz/RJ), maiores serão as possibilidades de isolamento do vírus, que tem por objetivos: • identificar o padrão genético do vírus circulante no país; • diferenciar, dos casos importados, os casos autóctones de rubéola; • diferenciar o vírus selvagem do vírus vacinal. R Critérios para a coleta de espécimes para isolamento – a coleta dos espécimes clínicos para isolamento viral deve ser priorizada nas seguintes situações: • em todos os municípios com ocorrência de surtos de rubéola, independente da distância do laboratório central estadual; • obedecer ao critério de 5 a 10 casos suspeitos por área geográfica, em situações de surtos ou epidemias. Período para coleta dos espécimes clínicos – as amostras dos espécimes clínicos, ou seja, de secreções nasofaríngeas, devem ser coletadas até o 5° dia a partir do aparecimento Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 647 Rubéola do exantema (preferencialmente, nos primeiros três dias; em casos esporádicos, para que não se perca a oportunidade de recolher amostras clínicas para o isolamento viral, o período pode ser estendido em até 7 dias após o início do exantema). Quantidade, coleta, encaminhamento e processamento de secreção nasofaríngea (SNF) – deve ser coletado o máximo possível de SNF, por meio da técnica de swab ou aspiração. A SNF, o melhor material para o isolamento do vírus da rubéola, pode ser coletada: • Com uma sonda nasal conectada a uma seringa, instilar no nariz do paciente de 3 a 5ml de solução salina: ❯ aspirar a maior quantidade possível de material; ❯ colocar em tubo contendo meio DMEM específico fornecido pelo laboratório. ❯ caso não se disponha do meio, colocar o material aspirado com a salina em um tubo. • Coletar com uma sonda acoplada a um equipo de soro, com ajuda de um vácuo (hospitais têm vácuo na parede). Este material pode permanecer no próprio equipo. • Swabs: ❯ Coletar 3 amostras de swab, uma amostra de cada narina e uma da garganta, com o uso de fricção para obter as células de mucosa, uma vez que o vírus está estreitamente associado às células. Colocar os 3 swabs em um tubo contendo 3ml de meio (Earle, Dulbecco, Salina, etc., fornecido pelo laboratório). ❯ A SNF e os swabs no tubo com meio podem ser conservados em geladeira por 24 a 48 horas. Não devem ser congelados. ❯ Enviar em gelo reciclável ao Lacen. ❯ Para conservar e transportar a SNF devem ser adotados os seguintes cuidados: no Lacen, colocar a SNF em freezer a -70ºC; ❯ Encaminhar a amostra para o Centro de Referência Nacional para Sarampo/Rubéola, na Fiocruz/RJ, em isopor com gelo seco. 648 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Rubéola Anexo 2 Diagnóstico laboratorial – Rubéola pós-natal Amostra coletada entre o 1º e 28º dias após o início do exantema IgM negativa Caso descartado por laboratório IgM positiva Caso confirmado por laboratório IgM negativa Caso descartado por amostras tardias com IgM negativa IgM positiva Caso confirmado por laboratório Amostra coletada após o 28º dia do início do exantema 6 R Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 649 Rubéola Anexo 3 Diagnóstico laboratorial – Rubéola em gestante sintomática Amostra coletada entre o 1º e o 4º dias após o início do exantema Amostra coletada entre o 5º e o 28º dias após o início do exantema Amostra coletada após o 28º dia do exantema IgM negativa Secretaria de Vigilância em Saúde / MS IgG positiva Caso descartado IgG negativa Colher 2ª amostra Pesquisar IgG IgM positiva Caso confirmado IgM negativa Caso descartado IgM positiva Caso confirmado IgM negativa 650 Caso confirmado IgM positiva IgG positiva Caso confirmado por amostra tardia com IgM negativa IgG negativa Caso descartado Pesquisar IgG Rubéola Diagnóstico laboratorial – Gestante assintomática que teve contato com caso confirmado ou suspeito de rubéola 1a amostra Até 28 dias após a exposição Entre 29 e 42 dias após a exposição IgM negativa IgM positiva Após o 42o dia pós-exposição IgM negativa IgM positiva 6 Pesquisar IgG Pesquisar IgG IgG positiva IgG positiva IgG negativa IgG negativa** Coletar amostra de 28 a 42 dias após exposição para pesquisa de IgM IgM negativa** IgM positiva R Caso confirmado* Caso descartado *Se a gestante assintomática é classificada como caso confirmado, fazer a investigação do recém-nascido que é considerado caso suspeito de síndrome da rubéola congênita. **Se a gestante apresentar IgG negativo, sem outra evidência de infecção (IgM positiva na 2a amostra), será necessária a vacinação pós-parto. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 651 Sarampo SARAMPO CID 10: B05 Características clínicas e epidemiológicas Descrição O sarampo é uma doença infecciosa aguda, de natureza viral, grave, transmissível e extremamente contagiosa. A viremia causada pela infecção provoca uma vasculite generalizada, responsável pelo aparecimento das diversas manifestações clínicas, inclusive pelas perdas consideráveis de eletrólitos e proteínas, gerando o quadro espoliante característico da infecção. Além disso, as complicações infecciosas contribuem para a gravidade do sarampo, particularmente em crianças desnutridas e menores de 1 ano. Agente etiológico O vírus do sarampo pertence ao gênero Morbillivirus, família Paramyxoviridae. Reservatório e fonte de infecção O homem é o único hospedeiro natural conhecido. Modo de transmissão É transmitido diretamente de pessoa a pessoa, através das secreções nasofaríngeas expelidas ao tossir, espirrar, falar ou respirar. Essa forma de transmissão é responsável pela elevada contagiosidade da doença. Tem sido também descrito o contágio por dispersão de gotículas com partículas virais no ar, em ambientes fechados como escolas, creches e clínicas. Período de transmissibilidade Ocorre entre 4 a 6 dias antes do aparecimento do exantema, e até 4 dias após. O período de maior transmissibilidade é o de 2 dias antes e 2 dias após o início do exantema. O vírus vacinal não é transmissível. Período de incubação Geralmente, de 10 dias (variando de 7 a 18 dias), desde a data da exposição até o aparecimento da febre, e cerca de 14 dias até o início do exantema. Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade ao vírus do sarampo é geral. Os lactentes cujas mães já tiveram sarampo ou foram vacinadas possuem, temporariamente, anticorpos transmitidos por via placentária, conferindo imunidade provisória à doença, geralmente até os 9 meses de idade, o 652 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sarampo que interfere na resposta à vacina se administrada neste período. Chama a atenção o fato de que a queda dos níveis desses anticorpos já se faz de maneira acentuada aos 6 meses de vida, o que, em situação de bloqueio vacinal, justifica a vacinação de crianças a partir desta idade. A imunidade ativa é adquirida por meio da infecção natural ou pela vacinação. Após a infecção natural, a imunidade é duradoura. A imunidade “de grupo” é obtida com 95% de cobertura vacinal, no mínimo. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas Caracteriza-se por febre alta, acima de 38ºC, exantema maculopapular generalizado, tosse, coriza, conjuntivite e manchas de Koplik (pequenos pontos brancos que aparecem na mucosa bucal, antecedendo ao exantema). 6 Período de infecção – dura cerca de sete dias, iniciando com o período prodrômico, onde surge febre acompanhada de tosse produtiva, coriza, conjuntivite e fotofobia. Do 2° ao 4° dia desse período surge o exantema, quando acentuam-se os sintomas iniciais: o paciente fica prostrado e aparecem as lesões características do sarampo, como exantema cutâneo máculo-papular de coloração vermelha, iniciando na região retroauricular. Remissão – caracteriza-se pela diminuição dos sintomas, principalmente pelo declínio da febre. O exantema torna-se escurecido e, em alguns casos, surge descamação fina, lembrando farinha, daí o nome de furfurácea. Período toxêmico – o sarampo é uma doença que compromete a resistência do hospedeiro, facilitando a ocorrência de superinfecção viral ou bacteriana. Por isso são freqüentes as complicações, principalmente nas crianças até dois anos de idade, em especial as desnutridas, e adultos jovens. A ocorrência de febre por mais de três dias após o aparecimento do exantema é um sinal de alerta, indicando o aparecimento de complicações. As mais comuns são: • infecções respiratórias; • desnutrição; • doenças diarréicas; • doenças neurológicas. S Geralmente, as complicações sistêmicas se instalam durante o período exantemático, embora a encefalite possa aparecer após o 20º dia. Diagnóstico diferencial O diagnóstico diferencial do sarampo deve ser realizado com as doenças exantemáticas febris agudas. Dentre as quais destacam-se: rubéola, eritema infeccioso (parvovírus Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 653 Sarampo B19), exantema súbito (roséola infantum – herpes vírus 6), dengue, enteroviroses e ricketioses. Rubéola – doença de natureza viral que, em geral, apresenta-se com pródromos somente em crianças. O exantema é róseo, discreto e, excepcionalmente, confluente, com máxima intensidade no segundo dia, desaparecendo até o sexto dia, sem descamação. Há presença de linfadenopatia, principalmente retroauricular e occipital. Eritema infeccioso (parvovírus B19) – caracterizado por exantema, febre, adenopatia, artralgia e dores musculares, acometendo principalmente as crianças de 4 a 14 anos de idade, sendo moderadamente contagiosa. O exantema surge, em geral, sete dias após os primeiros sinais e sintomas, caracterizando-se por três estágios: estágio 1: face eritematosa, conhecida como “aparência de bochecha esbofeteada”; estágio 2: surge um a quatro dias após o estágio 1, caracterizado como exantema maculopapular, distribuído simetricamente no tronco e nas extremidades, podendo ser acompanhado de prurido; estágio 3: mudança de intensidade no rash, com duração de uma ou mais semanas, exarcebado por exposição ao sol ou fatores emocionais. Exantema súbito (roséola infantum) – doença de natureza viral provocada pelo herpes vírus 6, acometendo principalmente os menores de 5 anos. O paciente apresenta 3 a 4 dias de febre alta e irritabilidade, podendo ocorrer convulsões. O exantema é semelhante ao da rubéola e pode durar apenas horas. Inicia-se, caracteristicamente, no tronco, após o desaparecimento da febre, e não há descamação. Dengue – caracteriza-se por início súbito, com febre, cefaléia intensa, mialgias, artralgias, dor retroorbital e dor abdominal difusa. Alguns casos podem cursar também com erupção maculopapular generalizada, que aparece freqüentemente com o declínio da febre. É também uma doença de natureza viral. Enteroviroses (coxsackioses e echoviroses) e ricketioses – para o diagnóstico diferencial das enteroviroses considerar, no caso de infecção pelo vírus echo, que o período prodômico dura de três a quatro dias com a ocorrência de febre. Não existem pródromos quando se trata de vírus coxsackie. O exantema pode manifestar-se de várias formas, predominando o maculopapular discreto. São mais freqüentes em crianças de baixa idade, na maioria dos casos acometendo a região palmo-plantar e não provocando descamação. Diagnóstico laboratorial É realizado mediante detecção de anticorpos IgM no sangue na fase aguda da doença, desde os primeiros dias até quatro semanas após o aparecimento do exantema. Os anticorpos específicos da classe IgG podem eventualmente aparecer na fase aguda da doença e geralmente são detectados durante muitos anos após a infecção. Técnicas de diagnóstico laboratorial Para detecção de anticorpos podem ser utilizadas as seguintes técnicas: • ensaio imunoenzimático (EIE/Elisa) para dosagem de IgM e IgG; 654 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sarampo • inibição de hemaglutinação (HI) para dosagem de anticorpos totais; • imunofluorescência para dosagem de IgM e IgG; • neutralização em placas. Todos os testes têm sensibilidade e especificidade entre 85% a 98%. No Brasil, a rede laboratorial de saúde pública de referência para o sarampo utiliza a técnica de Elisa para a detecção de IgM e IgG. Número de amostras A amostra de sangue do caso suspeito deve ser colhida, sempre que possível, no primeiro atendimento ao paciente. São consideradas amostras oportunas (S1) as coletadas entre o 1º e o 28º dias do aparecimento do exantema. Mesmo que a coleta seja tardia (após o 28º dia) ainda assim deve ser enviada ao laboratório. Os resultados IgM positivo ou indeterminado, independente da suspeita clínica inicial, devem ser comunicados imediatamente à vigilância epidemiológica estadual, para a realização da reinvestigação e coleta da segunda amostra de sangue. A realização desta segunda coleta (S2) é obrigatória e imprescindível para a classificação final desses casos e deverá ser realizada entre 2 a 3 semanas após a data da primeira coleta. Os procedimentos laboratoriais estão descritos no Anexo 1. 6 Isolamento viral O vírus do sarampo pode ser isolado da urina, das secreções nasofaríngeas, do sangue, do liquor cérebro-espinhal ou de tecidos do corpo. Este isolamento objetiva identificar o genoma do vírus circulante no país, o que permite diferenciar os casos autóctones dos casos importados e o vírus selvagem do vírus vacinal. Período para coleta As amostras dos espécimes clínicos (urina, secreções nasofaríngeas ou sangue total) devem ser coletadas até o 5º dia a partir do início do exantema, preferencialmente nos 3 primeiros dias. Em casos esporádicos, para não se perder a oportunidade de colher amostra de urina para o isolamento viral, o período pode ser estendido em até 7 dias após a data de início do exantema. S Critérios para a coleta de espécimes para isolamento • Em presença de surto de sarampo, independente da distância do laboratório central. • Casos importados, independente do país de origem. • Em todos os casos com resultado laboratorial IgM positivo ou indeterminado para o sarampo, independente da suspeita clínica inicial, observando-se o período de coleta adequado. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 655 Sarampo Tratamento Não existe tratamento específico para a infecção por sarampo. O tratamento profilático com antibiótico é contra-indicado. É recomendável a administração da vitamina A em crianças acometidas pela doença, a fim de reduzir a ocorrência de casos graves e fatais. A OMS recomenda administrar a vitamina A para todas as crianças, no mesmo dia do diagnóstico do sarampo, nas seguintes dosagens: Menores de seis meses de idade – 50 mil UI (unidades internacionais): • uma dose, em aerossol, no dia do diagnóstico; • outra dose no dia seguinte. Entre 6 e 12 meses de idade – 100 mil UI: • uma dose, em aerossol, no dia do diagnóstico; • outra dose no dia seguinte. Maiores de 12 meses de idade – 200 mil UI: • uma dose, em aerossol ou cápsula, no dia do diagnóstico; • outra dose no dia seguinte. Para os casos não complicados, manter a hidratação, o suporte nutricional e diminuir a hipertermia. Muitas crianças necessitam de quatro a oito semanas para recuperar o estado nutricional que apresentavam antes da doença. Complicações como diarréia, pneumonia e otite média devem ser tratadas de acordo com normas e procedimentos estabelecidos pelo Ministério da Saúde. Aspectos epidemiológicos O sarampo é uma das principais causas de morbimortalidade entre menores de cinco anos, sobretudo os desnutridos e os que vivem nos países de menor desenvolvimento econômico. É uma doença de distribuição universal que apresenta variação sazonal. Nos climas temperados, observa-se aumento da incidência no período compreendido entre o final do inverno e o início da primavera; nos climas tropicais, a transmissão parece aumentar depois da estação chuvosa. O comportamento endêmico-epidêmico do sarampo varia de um local para outro e depende basicamente da relação entre o grau de imunidade e a susceptibilidade da população, bem como da circulação do vírus na área. Nos locais onde as coberturas vacinais não são homogêneas e estão abaixo de 95%, a doença tende a comportar-se de forma endêmica, com a ocorrência de epidemias a cada dois ou três anos, aproximadamente. Na zona rural, a doença apresenta-se com intervalos cíclicos mais longos. O sarampo afeta igualmente ambos os sexos. Sua incidência, evolução clínica e letalidade são influenciadas pelas condições socioeconômicas e estado nutricional e imunitário do doente. Elevadas densidades demográficas e condições que favorecem a aglomeração em lugares públicos e em habitações de tamanho inadequado para o grupo familiar são fatores 656 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sarampo que modulam o processo de transmissão da doença em situações de circulação viral e existência de grupos de susceptíveis. Atualmente, nos países que conseguem manter altos níveis de cobertura vacinal, a incidência da doença é reduzida, ocorrendo em períodos de cinco a sete anos. No entanto, quando os susceptíveis vão se acumulando e chegam a um quantitativo suficiente para sustentar uma transmissão ampla, podem ocorrer surtos explosivos que também afetam, escolares, adolescentes e adultos jovens. No Brasil, o sarampo é doença de notificação compulsória desde 1968. Até 1991, o país enfrentou nove epidemias, uma a cada dois anos, em média. O maior número de casos notificados foi registrado em 1986 (129.942), representando um coeficiente de incidência de 97,7 por 100 mil habitantes (Figura 1). Até o início da década de 90, a faixa etária mais atingida foi a de menores de 15 anos. Até o final dos anos 70 esta virose era uma das principais causas de óbito dentre as doenças infectocontagiosas, sobretudo em menores de cinco anos, em decorrência de complicações, especialmente a pneumonia. Na década de 80, ocorreu um declínio gradativo no registro de óbitos por esta doença, passando para 15.638 mortes. Essa redução foi atribuída ao aumento da cobertura vacinal e à melhoria da assistência médica ofertada às crianças com complicações pós-sarampo. Na década de 90 ocorreram 822 óbitos por sarampo, ou seja, uma redução de cerca de 95% dos registrados na década anterior (Figura 2). Em 1997, após um período de 4 anos de controle, o país experimentou o ressurgimento do sarampo com um surto iniciado na cidade de S. Paulo e propagado para outras unidades da Federação. Com a adoção do Plano de Ação Suplementar de Emergência contra o Sarampo, em 1999, foi criado um grupo tarefa para atuar junto à vigilância epidemiológica de cada estado, o que propiciou a implementação das ações de vigilância e controle da doença, viabilizando o alcance da meta de erradicação de sua transmissão autóctone. Em 1999, dos 10.007 casos suspeitos de sarampo notificados, 908 (8,9%) foram confirmados, sendo 378 (42%) por laboratório. Dos 8.358 casos suspeitos de sarampo notificados em 2000, 36 (0,4%) foram confirmados, dos quais 30 (83%) por laboratório. Neste mesmo ano, 92% dos casos descartados tiveram por base testes laboratoriais. O último surto de sarampo ocorreu em fevereiro de 2000, com 15 casos. Nos anos de 2001 a 2003 foram confirmados quatro casos de sarampo (dois casos importados do Japão e dois importados da Europa). Atualmente, não existe evidência de transmissão autóctone de sarampo no Brasil, sendo importante a manutenção da sensisibilidade e especificidade atual do sistema de vigilância epidemiológica desta doença, com vistas à detecção oportuna de casos importados e a adoção imediata de todas as medidas de controle pertinentes ao caso. Para que a população brasileira continue efetivamente livre do sarampo, é imprescindível a manutenção de coberturas vacinais minimamente adequadas para impedir a formação de um estoque de susceptíveis. Isto significa a obtenção de níveis de cobertura de 95% em todos os municípios do país, atentando-se para que esta homogeneidade de cobertura também seja alcançada em todas as localidades dos mesmos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 6 S 657 Sarampo Figura 1. Incidência de sarampo e cobertura vacinal em menores de 1 ano (até 2001) e de 1 ano (a partir de 2002), com a vacina tríplice viral. Brasil, 1980-2003 Incidência/100 mil Cobertura (%) 100 100 90 90 80 80 70 70 60 60 50 50 40 40 30 30 20 20 10 10 0 0 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 Incidência Cobertura Fonte: CGDT/CGPNI/Devep/SVS/MS Figura 2. Coeficiente de mortalidade e letalidade por sarampo. Brasil, 1977-2000 Letalidade (%) Óbitos/100 mil hab. 3 6 2,7 5,4 2,4 4,8 2,1 4,2 1,8 3,6 1,5 3 1,2 2,4 0,9 1,8 0,6 1,2 0,3 0,6 0 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 00 Coef. mortalidade Fonte: CGDT/Devep/SVS/MS 658 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Letalidade 0 Sarampo Vigilância epidemiológica Objetivos Consolidar a erradicação do sarampo através de uma vigilância epidemiológica sensível, ativa e oportuna, permitindo a identificação e notificação imediata de todo e qualquer caso suspeito na população, para a adoção das medidas de prevenção e controle pertinentes, bem como monitorar as demais condições de risco. Definição de caso Suspeito Todo paciente que, independente da idade e situação vacinal, apresentar febre e exantema maculopapular, acompanhados de um ou mais dos seguintes sinais e sintomas: tosse, coriza e conjuntivite. 6 Confirmado Todo caso suspeito comprovado como caso de sarampo a partir de, pelo menos, um dos critérios a seguir detalhados: Laboratorial – caso suspeito cujo exame laboratorial teve como resultado “reagente” ou “positivo para IgM”, e a análise clínica epidemiológica indica a confirmação do sarampo (Algoritmo, Anexo 2). Observação: tendo em vista o momento atual do processo de erradicação do sarampo, todos os casos com IgM positivo, reagente ou indeterminado para o sarampo devem ser analisados conjuntamente pela SES e pela Cover/CGDT/Devep/SVS/MS. Vínculo epidemiológico – caso suspeito, contato de um ou mais casos de sarampo confirmados pelo laboratório, que apresentou os primeiros sintomas da doença entre 7 a 18 dias da exposição ao caso confirmado. Observação: considera-se também confirmação por vínculo epidemiológico todo caso suspeito cujo exame laboratorial teve como resultado “não-reagente” ou “negativo para IgM” em amostra colhida entre o 1º e o 3º dia a partir do aparecimento do exantema, com história de exposição a um ou mais casos de sarampo confirmados pelo laboratório (esta exposição deve ter ocorrido dentro de um período de sete a 18 dias antes do aparecimento dos sinais e sintomas). S Clínico – caso suspeito de sarampo que: • pela avaliação clínica apresente sinais e sintomas compatíveis com a definição de caso suspeito, porém sem a obtenção de amostras de sangue para a realização de sorologia; • não foi investigado; • evoluiu para óbito sem a realização de qualquer exame laboratorial. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 659 Sarampo A confirmação de casos de sarampo pelo critério clínico representa falha do sistema de vigilância epidemiológica. Descartado Todo paciente considerado como caso suspeito e que não foi comprovado como caso de sarampo, de acordo com os critérios assim definidos: Laboratorial • Caso suspeito de sarampo cujo exame laboratorial teve como resultado “não-reao gente” ou “negativo para IgM”, em amostra oportuna, ou seja, colhida até o 28 dia do aparecimento do exantema. • Caso suspeito de sarampo cujo exame laboratorial teve como resultado outra doença (Anexo 2). • Caso suspeito de sarampo cuja análise dos resultados da sorologia em duas amostras pareadas não evidencia soroconversão dos anticorpos IgG. Vínculo epidemiológico • Caso suspeito de sarampo que tiver como fonte de infecção um ou mais casos descartados pelo critério laboratorial. • Quando na localidade estiver ocorrendo surto ou epidemia de outras doenças exantemáticas febris, comprovadas pelo diagnóstico laboratorial; nessa situação, os casos devem ser criteriosamente analisados antes de serem descartados e a provável fonte de infecção deve ser especificada. Clínico Caso suspeito de sarampo em que não houve coleta de amostra para exame laboratorial mas a avaliação clínica e epidemiológica detectou sinais e sintomas compatíveis com diagnóstico diferente do sarampo. O descarte clínico do sarampo representa falha do sistema de vigilância epidemiológica. Critérios para o descarte de casos suspeitos de sarampo associados temporalmente a eventos adversos à vacina Sem coleta de amostra – quando a avaliação clínica e epidemiológica indicou associação temporal entre a data do início dos sintomas e a data do recebimento da última dose da vacina com o componente contra o sarampo, que se enquadre nas especificações abaixo: • febre com temperatura que pode chegar a 39ºC ou mais, com início entre o 5º e 12º dias após a vacinação e duração média de um a dois dias, podendo chegar até cinco dias; • exantema – cerca de 5% das pessoas que recebem a vacina pela primeira vez poderão apresentar exantema com início no 7º ao 10º dia após a vacinação, que dura de dois a quatro dias; 660 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sarampo • cefaléia ocasional, irritabilidade, conjuntivite ou manifestações catarrais observadas entre o 5º e o 12º dia após a vacinação. Com coleta de amostra – IgM positivo associado temporalmente à vacina, cuja coleta de sangue ocorreu entre 8 a 56 dias após a vacinação. Classificação dos casos confirmados de sarampo, de acordo com a fonte de infecção Caso importado – caso cuja exposição ocorreu fora do continente americano durante os 14 a 23 dias prévios ao surgimento do exantema, de acordo com a análise dos dados epidemiológicos e/ou virológicos. A confirmação deve ser laboratorial e a coleta de espécimes clínicas (urina ou secreção de nasofaringe) para isolamento viral deve ser realizada no primeiro contato com o paciente. Caso relacionado com importação – infecção contraída localmente, que ocorre como parte de uma cadeia de transmissão originada por um caso importado, de acordo com a análise dos dados epidemiológicos e/ou virológicos. Caso com origem de infeçcção desconhecida – caso em que não foi possível estabelecer a origem da fonte de infecção, após investigação epidemiológica minuciosa. Caso índice – primeiro caso ocorrido entre os vários casos de natureza similar e epidemiologicamente relacionados, sendo a fonte de infecção no território nacional. A confirmação deve ser laboratorial e a coleta de espécimes clínicos (urina ou swab de nasofaringe) para isolamento viral deve ser realizada no primeiro contato com o paciente. Caso secundário – caso novo de sarampo surgido a partir do contato com o caso índice. A confirmação deve ser laboratorial e a coleta de espécimes clínicas (urina ou secreção de nasofaringe) para isolamento viral deve ser realizada no primeiro contato com o paciente. Caso autóctone – caso novo ou contato de um caso secundário de sarampo, após a introdução do vírus no país. A confirmação deve ser laboratorial e a coleta de espécimes clínicas (urina ou secreção de nasofaringe) para isolamento viral deve ser realizada no primeiro contato com o paciente. 6 S Notificação A notificação do sarampo é obrigatória e imediata. Deve ser realizada por telefone à secretaria municipal de saúde, dentro das primeiras 24 horas a partir do atendimento do paciente. O caso deve ser notificado à secretaria estadual de saúde por telefone, fax ou email, para acompanhamento junto ao município. Considerando a alta infectividade e contagiosidade da doença, todos os profissionais dos serviços públicos e privados, principalmente os médicos pediatras, clínicos, infectologistas, enfermeiros e laboratoristas, devem notificar, de imediato, todo caso suspeito de sarampo. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 661 Sarampo Observação: para efeito de acompanhamento pelo nível nacional, todos os casos suspeitos provenientes de áreas com circulação endêmica ou epidêmica do vírus do sarampo devem também ser imediatamente comunicados à Secretaria de Vigilância em Saúde/MS. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente Geralmente ocorre em unidades básicas de saúde. A hospitalização é necessária quando há infecção bacteriana (complicações) e em indivíduos imunocomprometidos, principalmente crianças desnutridas. Definição de caso suspeito Toda pessoa com febre e exantema, acompanhadas de tosse e/ou coriza e/ou conjuntivite, independemente da idade ou situação vacinal Suspeitar de sarampo Notificar à secretaria municipal de saúde Investigar em até 48 horas Coletar sangue para sorologia no primeiro contato com o paciente Notificar a Secretaria de Vigilância em Saúde se proveniente de área de circulação endêmica ou epidêmica do vírus Vacinação de bloqueio Vacinar os contatos susceptíveis Qualidade da assistência Os casos deverão ser atendidos na rede de serviços de saúde. Os profissionais devem ser orientados sobre os procedimentos frente a um caso de sarampo. A hospitalização só se faz necessária em situações graves. Proteção individual para evitar circulação viral No plano individual, o isolamento domiciliar ou hospitalar dos casos consegue diminuir a intensidade da transmissão. Deve-se evitar, principalmente, a freqüência às escolas ou creches, agrupamentos ou qualquer contato com pessoas susceptíveis, até 4 dias após o início do período exantemático. O impacto do isolamento dos doentes é relativo porque o período prodrômico da doença já apresenta elevada transmissibilidade do vírus e, em geral, não é possível isolar os doentes a não ser no período exantemático. Portanto, a vigilância dos contatos deve ser necessariamente realizada por um período de 21 dias. 662 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sarampo Como o risco de transmissão intra-hospitalar é muito alto, deve ser feita a vacinação seletiva de todos os pacientes e profissionais do setor de internação do caso suspeito de sarampo e, dependendo da situação, de todos os profissionais do hospital. Pacientes internados devem ser submetidos a isolamento respiratório, até 4 dias após o início do exantema. Confirmação diagnóstica De acordo com as orientações constantes do tópico Diagnóstico diferencial e dos Anexos 1 e 2. Proteção da população A principal medida de controle do sarampo é a vacinação dos susceptíveis, que inclui vacinação de rotina na rede básica de saúde, bloqueio vacinal, intensificação e campanhas de vacinação de seguimento. Ressalte-se que a cada caso suspeito notificado a ação de bloqueio vacinal deve ser desencadeada imediatamente e uma extensa busca ativa de novos casos suspeitos e susceptíveis deve ser realizada. A faixa etária prioritária para as ações de bloqueio vacinal é a de 6 meses a 39 anos, mas sua redução ou ampliação deve ser avaliada de acordo com a situação epidemiológica apresentada na localidade. A investigação epidemiológica, principalmente através da busca ativa de casos, leva a um melhor controle da doença. Devem ser organizadas ações de esclarecimento à população, utilizando os meios de comunicação de massa, visitas domiciliares e palestras nas comunidades, bem como conhecimentos sobre o ciclo de transmissão da doença, gravidade, vacinação e esclarecimentos da situação de risco veiculados. 6 Investigação A investigação do caso suspeito de sarampo deve ser realizada pela equipe municipal, objetivando de adotar medidas de controle frente a um ou mais casos, surtos e epidemias, e coleta dos dados que permitirão analisar a situação epidemiológica. As informações obtidas na investigação epidemiológica deverão responder às perguntas básicas da análise epidemiológica, ou seja: quem foi afetado, quando ocorreram os casos e onde se localizam. A partir dessas informações serão desencadeadas as condutas adequadas. Todos os casos suspeitos de sarampo devem ser investigados no prazo máximo de 48 horas após a notificação. S Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente Preencher todos os campos da ficha de notificação individual e investigação epidemiológica do Sinan relativos aos dados gerais, individuais e de residência. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 663 Sarampo Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmar a suspeita diagnóstica Na investigação, todas as informações necessárias à verificação do diagnóstico do caso devem ser coletadas, especialmente os dados sobre a situação clínica e epidemiológica do caso suspeito. A investigação, de forma geral, é iniciada no domicílio do caso suspeito de sarampo, por meio da visita domiciliar feita especialmente para: • completar as informações sobre o quadro clínico apresentado pelo caso suspeito; • confirmar a situação vacinal do caso suspeito e seus contatos familiares, sociais e profissionais, mediante verificação do cartão de vacinação; • estabelecer um prazo entre sete e 18 dias para realizar a revisita, a fim de detectar a ocorrência de complicações e/ou o surgimento de novos casos; • acompanhar a evolução do caso; • confirmar ou descartar o caso. Para identificar a área de transmissão A investigação na comunidade visa verificar a ocorrência de outros casos suspeitos não notificados. Essa investigação é realizada, principalmente, em torno da área de residência e convivência do caso suspeito, ou seja, na vizinhança, local de trabalho, escola, creche, igrejas, e outros locais também freqüentados pelo paciente, nos últimos sete a 18 dias. Na investigação deve-se: • coletar dados que permitam analisar a situação epidemiológica, respondendo às perguntas básicas: quem foi afetado? quando e como ocorreram os casos? onde se localizam?; • preencher a ficha de investigação individual específica para o sarampo e rubéola, registrando corretamente todos os dados e colocando o mesmo número da ficha de notificação individual; • colher uma amostra de sangue para o diagnóstico laboratorial. Caso a amostra não tenha sido colhida no serviço de saúde que fez a notificação, identificar a provável fonte de infecção; • avaliar a cobertura vacinal da área; • verificar se estão ocorrendo surtos em outras áreas; • tomar decisões quanto às medidas de controle da doença, ou seja, definir e orientar a equipe do serviço de saúde sobre a estratégia de vacinação a ser adotada; • orientar a comunidade sobre a necessidade de comunicar aos serviços de saúde o surgimento de pessoas com sinais e sintomas de sarampo. Para determinação da extensão da área de transmissão Busca ativa dos casos: a partir da notificação de um caso suspeito de sarampo, fazer a busca ativa durante a atividade de investigação do caso, numa determinada área geográfica, a fim de detectar outros possíveis casos, mediante: 664 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sarampo • visitas às residências, creches, colégios, centros de saúde, hospitais, farmácias, quartéis, etc.; • contatos com médicos, líderes comunitários e pessoas que exercem práticas alternativas de saúde (curandeiros, benzedeiras); • visitas periódicas aos serviços de saúde que atendam doenças exantemáticas febris na área, particularmente se os mesmos não vêm notificando casos suspeitos; • visitas a laboratórios da rede pública ou privada, objetivando verificar se foram realizados exames para a detecção de sarampo, rubéola ou outro quadro semelhante e que não tenham sido notificados. Coleta e remessa de material para exames Em todo caso suspeito de sarampo, deverão ser colhidos espécimes clínicos para sorologia, de acordo com o constante no tópico Diagnóstico diferencial e Anexo 2. 6 Análise de dados Em cada nível do SUS (municipal, estadual e federal) devem ser realizadas análises periódicas dos dados epidemiológicos coletados, da forma mais padronizada possível, abrangendo, conforme já referido, a distribuição temporal, a localização espacial e a distribuição segundo atributos pessoais. Distribuição temporal (quando?) – a análise temporal considera a distribuição do número de casos notificados e confirmados (segundo critério laboratorial, vínculo epidemiológico e clínico) de acordo com o intervalo de tempo como, por exemplo, semana epidemiológica, mês ou ano. Também devem ser calculados os coeficientes de incidência e mortalidade mensais e anuais, conforme a situação epidemiológica vigente, para verificação da tendência da doença na população. A distribuição no tempo é um dado essencial para o adequado acompanhamento do aumento ou redução da ocorrência de casos na população e para o estabelecimento da variação sazonal da doença. S Localização espacial (onde?) – a análise da situação, segundo a localização dos casos, permite o conhecimento da área geográfica de ocorrência que pode ser melhor visualizada, assinalando-os com cores diferentes em um mapa, destacando: • local de residência dos casos (rua, bairro, distrito, município, estado, país); • local onde o caso permaneceu por mais tempo (escola, creche, alojamento, canteiro de obra, quartéis, entre outros); • zona de residência/permanência (urbana, rural); • as áreas que concentram elevado número de susceptíveis. Distribuição segundo atributos pessoais (quem?) – a análise da distribuição segundo atributos pessoais permite conhecer o perfil da população que está sendo acometida e se o comportamento da doença apresenta fatores distintos que indicam mudanças em seu perfil, como, por exemplo, o deslocamento da faixa etária. Para isso, é importante considerar: Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 665 Sarampo • • • • a distribuição dos casos confirmados por faixa etária; a história vacinal dos casos confirmados, segundo número de doses recebidas; histórias de deslocamento; outros atributos, tais como: ocupação, escolaridade, etc. Encerramento de casos Por se tratar de doença em processo de erradicação, os casos deverão ser encerrados no Sinan, no prazo de até 30 dias após a notificação. Roteiro de investigação epidemiológica do sarampo Notificação de caso suspeito Investigação Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Coleta de material para sorologia Realiza medidas de controle Identificar novos casos suspeitos Enviar ao laboratório Bloqueio vacinal Identificar ocorrência de surtos Identificar área de transmissão Laboratório informa o resultado à secretaria estadual de saúde/secretaria municipal de saúde Ações de educação em saúde Operação limpeza Secretarias municipais e estaduais de saúde encerram o caso, conforme o algoritmo (Anexo 1) Avaliar a cobertura vacinal da área Relatório final Os dados das fichas de notificação individual e de investigação deverão estar adequadamente processados e digitados no Sinan, até 30 dias após a notificação. O encerramento oportuno dos casos possibilitará a análise epidemiológica necessária à tomada de decisão. Em situações de surtos, o relatório permite analisar a extensão e as medidas de controle adotadas, bem como caracterizar o perfil de ocorrência e os fatores que contribuíram para a circulação do vírus na população. 666 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sarampo Instrumentos disponíveis para controle Imunização Recomendações gerais para a vacinação A vacina é a única forma de prevenir a ocorrência do sarampo. O risco da doença para indivíduos susceptíveis permanece, em função da circulação do vírus do sarampo em várias regiões do mundo e de sua facilidade de propagação. É necessário, portanto, manter um alto nível de imunidade na população, por meio de coberturas vacinais elevadas (iguais ou superiores a 95%), o que reduz a possibilidade da ocorrência do sarampo, permitindo a erradicação da transmissão do vírus na população. Vacinação na rotina É a atividade realizada de forma contínua na rede de serviços de saúde, em todo o território nacional. O objetivo é vacinar todas as crianças aos 12 meses, a fim de manter alta imunidade de grupo, sendo necessário alcançar e manter coberturas vacinais iguais ou superiores a 95%, em todas as localidades e municípios. Recomenda-se, ainda, uma dose de reforço para as crianças entre 4 e 6 anos de idade, para corrigir possível falha vacinal primária e vacinar aqueles que porventura não tenham sido vacinados anteriormente. Para detalhes operacionais sobre a organização das atividades de vacinação de rotina, ver www.saude.gov.br/imunizações. Observação: a vacina contra o sarampo pode ser aplicada simultaneamente com qualquer outra vacina do calendário de imunizações. 6 Eventos adversos Esta vacina é pouco reatogênica. Os eventos adversos apresentam boa evolução, sendo que os mais observados são febre e cefaléia. As reações de hipersensibilidade são raras. Estratégia de vacinação frente a ocorrência de casos suspeitos S Vacinação de bloqueio limitada aos contatos – diante de uma pessoa com sinais e sintomas do sarampo, deve ser realizado o bloqueio vacinal dirigido aos contatos do caso suspeito. A vacinação de bloqueio fundamenta-se no fato de que a vacina consegue imunizar o susceptível em prazo menor que o período de incubação da doença. Em função disso, a vacina deve ser administrada, de preferência, dentro de 72 horas após a exposição. A vacinação de bloqueio deve abranger as pessoas do mesmo domicílio do caso suspeito, vizinhos próximos, creches ou, quando for o caso, pessoas da mesma sala de aula, mesmo quarto de alojamento, sala de trabalho, etc. Utilizar a vacina tríplice viral para a faixa etária de 6 meses a 39 anos, de forma seletiva. Se aplicada em crianças menores de 1 ano, esta vacina não será considerada como dose válida. Aos 12 meses, a criança deverá ser revacinada com a vacina tríplice viral. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 667 Sarampo A inclusão de pessoas acima de 40 anos na vacinação de bloqueio só será indicada com base na análise da situação epidemiológica. Estratégia de vacinação frente a um caso confirmado ou surto Operação limpeza – o objetivo desta estratégia é interromper a cadeia de transmissão do vírus do sarampo numa área geográfica determinada, através da busca exaustiva de todos os susceptíveis. A operação limpeza também é utilizada de forma seletiva, devendo abranger: • os locais habitualmente freqüentados pelo caso confirmado; • todo o quarteirão, área residencial ou bairro, se necessário; • a escola, creche, cursinhos, faculdade, alojamento, local de trabalho e outros estabelecimentos coletivos freqüentados pelo caso; • todo o município, quando indicado. A faixa etária a ser vacinada é a mesma referida para o bloqueio vacinal. Estratégias complementares de prevenção Vacinação indiscriminada em campanhas de seguimento – esta atividade é realizada periodicamente, em nível nacional, com o objetivo de alcançar crianças susceptíveis não vacinadas e revacinar as demais, principalmente as em idade pré-escolar. Esta estratégia é recomendada sempre que o número de susceptíveis, em nível nacional, se aproximar de uma coorte de nascimentos. O intervalo entre uma campanha de seguimento e outra depende da cobertura vacinal alcançada na rotina, nesse período. Intensificação da vacinação extramuros – o principal objetivo é eliminar bolsões de susceptíveis, devendo ser realizada sempre que os índices de vacinação estiverem abaixo de 95%. Com isso, fica assegurado que nenhum município tenha cobertura vacinal contra o sarampo/rubéola abaixo do mínimo necessário para obter um nível seguro de imunidade de grupo. A intensificação das atividades consiste, sobretudo, na realização de vacinação casa a casa (incluindo residências e instituições em geral, como, por exemplo, escolas, creches, orfanatos, etc.), alcançando crianças de 12 meses até menores de 12 anos, não vacinadas na rotina e nas campanhas de multivacinação e de seguimento, especialmente as que vivem nas áreas urbanas e rurais de difícil acesso e que, geralmente, não são trabalhadas pelos serviços de saúde. Campanhas de multivacinação – as campanhas de multivacinação, que acontecem duas vezes ao ano, são excelentes oportunidades para aumentar as coberturas vacinais. No entanto, quando a meta é erradicar o sarampo, não se deve esperar as campanhas para vacinar os susceptíveis. 668 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sarampo Por ocasião das campanhas de multivacinação são vacinadas as crianças na faixa de 12 meses a menores de 12 anos que não foram atingidas pelas atividades de rotina e campanhas de seguimento. Vacinação de grupos de risco – considera-se que um determinado percentual de adolescentes e adultos jovens permanece susceptível à doença, devido ao fato de não terem sido expostos nem à infecção natural e nem à vacinação. Devido às características das atividades que os indivíduos pertencentes a esse grupo etário desenvolvem, há um risco aumentado de contrair a infecção pelo vírus do sarampo. Dentre essas atividades, destacam-se: • profissionais e estudantes da área de saúde e educação; • populações institucionalizadas de quartéis, prisões, centros de reclusão de menores, albergues, alojamentos, universidades, etc.; • populações que migram de localidades onde as coberturas vacinais, anteriores e/ou atuais, são baixas; • adolescentes e adultos jovens que viajam para países onde o sarampo é endêmico; • trabalhadores dos setores hoteleiro, turismo e portuário, bem como de feiras, aeroportos, vendedores ambulantes, profissionais do sexo e rodoviárias; 6 Para prevenir a ocorrência de surtos de sarampo nesses grupos de risco faz-se necessário um esforço adicional de vacinação, mesmo em locais com elevadas coberturas vacinais. Ações de educação em saúde O melhor modo é desenvolver atividades de forma integrada com a área de educação. Na escola, deverão ser trabalhados a doença e os meios de prevenção. No momento da investigação deve-se orientar as pessoas sobre a importância da prevenção do sarampo e o dever de cada cidadão de informar ao serviço de saúde mais próximo de sua casa a existência de um caso suspeito. S Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 669 Sarampo Anexo 1 Classificação de caso suspeito de sarampo Coleta de sangue no primeiro contato com o paciente + investigação epidemiológica IgM negativo IgM positivo Considerar a última dose de vacina contra sarampo (mono ou polivalente) Data de início dos sintomas entre 5 e 12 dias após a aplicação da vacina ou Coleta de sangue entre 8 e 56 dias após a aplicação da vacina SIM NÃO Reinvestigação epidemiológica* Sem 2ª amostra para sorologia: avaliar IgG na 1ª amostra Colher urina para isolamento viral IgM positivo Com 2ª amostra para sorologia: há soroconversão IgG? IgM negativo SIM Vírus selvagem detectado? NÃO Até o 5o dia do início do exantema SIM Após o 5o dia do início do exantema Protocolo diagnóstico diferencial DESCARTAR CONFIRMAR *Ver roteiro de investigação epidemiológica 670 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS NÃO Sarampo Anexo 2 Na situação epidemiológica atual, em que não há circulação autóctone do vírus do sarampo no país e frente ao aumento da disseminação de vacinas contra a doença na população, espera-se que ocorram, com relativa frequência, “casos” que na verdade representam eventos adversos à vacina, bem como o aparecimento de resultados laboratoriais falso-positivos – o que significa que o diagnóstico etiológico e sua interpretação devem ser feitos de forma bastante criteriosa. O diagnóstico laboratorial de rotina é realizado por meio da sorologia para detecção de anticorpos específicos. Para tanto, é imprescindível assegurar a coleta de amostras de sangue para análise, no primeiro contato com o paciente. Na infecção primária, os anticorpos IgM e IgG anti-sarampo podem ser detectados no sangue nos primeiros dias após o início do exantema. O IgM pode permanecer elevado por 4 a 6 semanas após o aparecimento do exantema, enquanto o IgG pode ser detectado por toda a vida, após a infecção. Para a detecção desses anticorpos, nos indivíduos vacinados ou que tiveram a doença, utiliza-se a técnica de ensaio imunoenzimático (Elisa). Em situações específicas, será também necessária a coleta de espécimes clínicos para o isolamento viral, com o objetivo de se conhecer o genótipo do vírus que está circulando. A urina é o material clínico de escolha para o isolamento viral, por ser de mais fácil coleta nos ambulatórios. 6 Procedimentos Sorologia • Coleta oportuna – a amostra de sangue do caso suspeito deve ser colhida, sempre que possível, no primeiro atendimento do paciente ou, no máximo, em até 28 dias após o aparecimento do exantema. • Material – sangue venoso sem anticoagulante, na quantidade de 5 a 10ml. Quando tratar-se de criança muito pequena e não for possível coletar o volume estabelecido, colher pelo menos 3ml. A separação do soro pode ser feita por meio de centrifugação ou após retração do coágulo, em temperatura ambiente ou a 37ºC. • Conservação e envio ao Lacen – após a separação do soro, conservar o tubo com o soro sob refrigeração na temperatura de +4ºC a + 8ºC, por no máximo 48 horas. • Remessa – enviar ao laboratório no prazo máximo de dois dias, colocando o tubo em embalagem térmica ou caixa de isopor com gelo ou gelox. Caso o soro não possa ser encaminhado ao laboratório neste prazo, conservá-lo no freezer na temperatura de -20ºC até o momento do transporte para o laboratório de referência. S Observação: todas as amostras com resultado sorológico IgM+ ou inconclusivo deverão ser enviadas ao laboratório de referência nacional (Fiocruz/RJ) para reteste. É importante o envio dos soros da 1ª e 2ª amostras. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 671 Sarampo Diagnóstico diferencial A realização de testes diagnósticos para a detecção de outras doenças exantemáticas febris em amostras negativas de casos suspeitos de sarampo, bem como a realização de sorologia para o sarampo em amostras negativas de casos suspeitos de outras doenças exantemáticas febris, dependerá da situação epidemiológica que está sendo considerada (surtos, casos isolados, áreas de baixa cobertura vacinal, resultados sorológicos IgM+ para o sarampo, etc.). Como esta situação é dinâmica, a indicação e interpretação dos exames laboratoriais para o diagnóstico diferencial de doenças exantemáticas febris deverão ser discutidas conjuntamente pelos técnicos responsáveis das secretarias estaduais de saúde (vigilância epidemiológica e laboratório), ouvido o Ministério da Saúde (através do endereço exantematicas@saude.gov.br). Isolamento viral O isolamento viral tem por objetivos identificar o padrão genotípico do vírus circulante e diferenciar casos autóctones de casos importados e o vírus selvagem do vacinal. Espécimes clínicos – urina ou secreções nasofaríngeas. Devem ser coletadas até o 5° dia a partir do aparecimento do exantema, preferencialmente nos primeiros três dias. Excepcionalmente, em casos com IgM positivo para sarampo, este período poderá ser estendido para que não se perca a oportunidade de colher amostras de urina para o isolamento viral. Quantidade e cuidados com os espécimes clínicos: • coletar de 15 a 100ml de urina, em frasco estéril; • colher, de preferência, a primeira urina da manhã, após higiene íntima, desprezando o primeiro jato e coletando o jato médio; não sendo possível obter a primeira urina do dia, colher em outra hora; • logo após a coleta, colocar a urina em caixa de isopor com gelo reciclável e enviar ao Lacen, dentro de 24 a 48 horas, no máximo, para evitar que o crescimento de bactérias diminua a possibilidade de isolamento do vírus. A urina não deve ser congelada; • processar a amostra no Lacen ou no laboratório municipal, se houver, adotando os seguintes procedimentos: ❯ centrifugar a amostra de urina a 1.500 rpm, a +4ºC (se possível); ❯ ressuspender o sedimento em 2ml de meio de transporte de vírus ou em solução salina estéril com adição de antibióticos; ❯ congelar (preferencialmente) os espécimes centrifugados a -70ºC e enviá-los ao Centro de Referência Nacional para o Sarampo, na Fiocruz/RJ, em gelo seco, dentro de, no máximo, 72 horas. Para orientação geral e interpretação dos resultados dos exames laboratoriais frente a um caso suspeito de sarampo, ver Anexo 1. 672 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sífilis Congênita SÍFILIS CONGÊNITA CID 10: A50 Características clínicas e epidemiológicas Descrição A sífilis é uma doença infectocontagiosa sistêmica, de evolução crônica, sujeita a surtos de agudização e períodos de latência. A sífilis congênita é conseqüente à infecção do feto pelo Treponema pallidum, por via placentária, em qualquer momento da gestação. Sua ocorrência evidencia falhas dos serviços de saúde, particularmente da atenção ao pré-natal, pois o diagnóstico precoce e tratamento da gestante são medidas relativamente simples e bastante eficazes na prevenção desta forma da doença. A taxa de óbito (aborto, natimorto, óbito neonatal precoce) é elevada, estimada de 25% a 40% dos casos. 6 Agente etiológico O Treponema pallidum tem forma de espiral e motilidade em “saca-rolhas”. Não é cultivável, mas a inoculação em cobaia permite seu isolamento e confirmação laboratorial. Pode ser visualizado sob microscopia de campo escuro, coloração pela prata ou imunofluorescência direta. Reservatório O homem é o único reservatório. Infecções experimentais em cobaias não repetem a evolução humana, não contaminando outros animais e findando espontaneamente. Modo de transmissão A sífilis adquirida é uma doença de transmissão predominantemente sexual e aproximadamente um terço dos indivíduos expostos a um parceiro sexual com sífilis adquirirá a doença. O Treponema pallidum, quando presente na corrente sangüínea da gestante, atravessa a barreira placentária e penetra na corrente sangüínea do feto. A transmissão pode ocorrer em qualquer fase da gestação, estando, entretanto, na dependência do estado da infecção na gestante, ou seja, quanto mais recente a infecção, mais treponemas estarão circulantes e, portanto, mais gravemente o feto será atingido. Inversamente, infecção antiga leva à formação progressiva de anticorpos pela mãe, o que atenuará a infecção ao concepto, produzindo lesões mais tardias na criança. Sabe-se que a taxa de transmissão vertical da sífilis, em mulheres não tratadas, é superior a 70% quando estas encontram-se nas fases primária e secundária da doença, reduzindo-se para 10% a 30% nas fases latente ou terciária. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS S 673 Sífilis Congênita Período de incubação Na sífilis adquirida, é de cerca de 21 dias a partir do contato sexual infectante. A criança com sífilis congênita ao nascimento pode já se encontrar gravemente enferma ou com manifestações clínicas menos intensas, ou até aparentemente saudável, vindo a manifestar sinais da doença mais tardiamente, meses ou anos depois, quando seqüelas graves e irreversíveis ter-se-ão instalado. Período de transmissibilidade A transmissão vertical pode ocorrer por todo o período gestacional. Acreditava-se que a infecção fetal não ocorresse antes do 4º mês de gestação. Entretanto, já se constatou a presença de T. pallidum em fetos abortados, ainda no primeiro trimestre da gravidez. Susceptibilidade e imunidade A resposta imune, celular e humoral, que se desenvolve não impede a implantação do agente no local de inoculação nem previne sua disseminação, com o conseqüente aparecimento de manifestações determinadas pela reação do hospedeiro à presença de antígenos treponêmicos nos tecidos corporais. A susceptibilidade à doença é universal e infecções anteriores não determinam imunidade frente a novas exposições ao treponema. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas O quadro clínico da sífilis congênita é variável, de acordo com alguns fatores: o tempo de exposição fetal ao treponema (duração da gestação com sífilis sem tratamento), a carga treponêmica materna, a virulência do treponema, o tratamento da infecção materna, a coinfecção materna pelo HIV ou outra causa de imunodeficiência. Esses fatores poderão acarretar aborto, natimorto ou óbito neonatal, bem como sífilis congênita “sintomática” ou “assintomática” ao nascimento. Didaticamente, a sífilis congênita é classificada em recente e tardia. Sífilis congênita recente Sinais e sintomas surgem nos primeiros dois anos de vida mas tornam-se evidentes entre o nascimento e o terceiro mês (comumente, nas cinco primeiras semanas). Os principais sinais são baixo peso, rinite com coriza serossanguinolenta, obstrução nasal, prematuridade, osteocondrite, periostite ou osteíte, choro ao manuseio, hepatoesplenomegalia, alterações respiratórias ou pneumonia, hidropsia, pseudoparalisia dos membros, fissura orificial, condiloma plano, pênfigo palmoplantar e outras lesões cutâneas, icterícia e anemia. Quando ocorre invasão maciça de treponemas e/ou estes são muito virulentos, a evolução do quadro é grave e a letalidade, alta. A placenta encontra-se volumosa, com lesões e manchas amareladas ou esbranquiçadas. 674 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sífilis Congênita Sífilis congênita tardia Os sinais e sintomas são observados a partir do segundo ano de vida, geralmente devido à infecção por treponemas menos virulentos ou infecção de longa evolução materna: tíbia em lâmina de sabre, fronte olímpica, nariz em sela, dentes deformados (dentes de Hutchinson), mandíbula curta, arco palatino elevado, ceratite intersticial com cegueira, surdez neurológica, dificuldade no aprendizado, hidrocefalia e retardo mental. Período de infecção – o tempo de evolução é extremamente variável, geralmente interrompido com o tratamento. A remissão espontânea da doença é improvável. A evolução da infecção treponêmica determinará lesões deformantes, com destruição tecidual em tecido ósseo e cutâneo-mucoso, além das graves seqüelas neurológicas. Pode ocorrer contágio involuntário quando do manuseio inadequado/desprotegido das crianças com sífilis congênita, por parte dos familiares e profissionais de saúde, quando estão presentes lesões cutâneas e mucosas, ricas em treponemas. Período toxêmico – o quadro clínico é variável. Manifestações gerais e sinais de comprometimento simultâneo de múltiplos órgãos, como febre, icterícia, hepatoesplenomegalia, linfadenopatia generalizada, anemia, entre outros sinais, podem ser observadas isoladas ou simultaneamente. Manifestações graves ao nascimento, tais como pneumonia intersticial e insuficiência respiratória, com risco de vida, requerem especial atenção. O óbito perinatal pode chegar a taxas expressivas. Remissão – o tratamento adequado dos casos diagnosticados promove a remissão dos sintomas em poucos dias. As lesões tardias já instaladas, a despeito da interrupção da evolução da infecção, não serão revertidas com a antibioticoterapia. 6 Diagnóstico diferencial O múltiplo comprometimento de órgãos e sistemas impõe o diagnóstico diferencial com septicemia e outras infecções congênitas, tais como rubéola, toxoplasmose, citomegalovirose, infecção generalizada pelo vírus do herpes simples e malária. Lesões mais tardias poderão ser confundidas com sarampo, catapora, escarlatina e até escabiose. S Diagnóstico laboratorial Baseia-se na execução de um conjunto de exames, quais sejam: Microscopia – a pesquisa do T. pallidum em material coletado de lesão cutâneo-mucosa, de biópsia ou autópsia, assim como de placenta e cordão umbilical, é um procedimento que apresenta sensibilidade de 70% a 80% . A preparação e a observação em campo escuro imediatamente após a coleta do espécime permite visualizar os treponemas móveis; quando a observação não pode ser realizada logo após a coleta, a imunofluorescência direta está indicada. Os fatores que diminuem a sensibilidade do teste são: coleta inadequada dos espécimes, tratamento prévio e coleta nas fases finais da evolução das lesões, quando a população de T. pallidum estará muito reduzida; Sorologia não-treponêmica (VDRL) – indicada para o diagnóstico e seguimento terapêutico, devido à propriedade de ser passível de titulação. A sensibilidade do teste na Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 675 Sífilis Congênita fase primária é de 78%, elevando-se nas fases secundária (100%) e latente (cerca de 96%). Com mais de um ano de evolução, a sensibilidade cai progressivamente, fixando-se, em média, em 70%. A especificidade do teste é de 98%. O teste pode resultar reagente por longos períodos, mesmo após a cura da infecção (cicatriz sorológica), porém, após instituído o tratamento, apresenta queda progressiva nas titulações, até que se torna não reagente. Recém-nascidos de mães com sífilis, mesmo os não infectados, podem apresentar anticorpos maternos transferidos passivamente pela placenta. Nesses casos, em geral, o teste será reagente até o sexto mês de vida. A coleta de sangue de cordão umbilical para a realização do teste está contra-indicada pela baixa sensibilidade. Deve-se coletar sangue periférico do RN, cuja mãe apresentar resultado reagente no momento do parto; Sorologia treponêmica (FTA-abs, MHA-Tp) – são testes específicos, úteis na exclusão de resultados de VDRL falso-positivos em adultos mas de uso limitado quando para o diagnóstico de recém-nascidos, pois os anticorpos IgG maternos ultrapassam a barreira placentária. O FTA-abs/IgM, por sua baixa sensibilidade, também pode apresentar desempenho inadequado para a definição diagnóstica do recém-nascido. Assim, a realização de testes treponêmicos em recém-nascidos não auxiliam na confirmação do caso, recomendando-se, então, a análise clínico-epidemiológica de cada caso, especialmente o histórico da doença materna, para aplicação das condutas clínicas. Já em maiores de 18 meses, um resultado reagente de teste treponêmico confirma a infecção, pois os anticorpos maternos transferidos passivamente já terão desaparecido. A sensibilidade dos testes treponêmicos na sífilis adquirida é de 84% na fase primária, de 100% nas fases secundária e latente e de cerca de 96% na sífilis terciária; Raios X de ossos longos – o achado de anormalidades em radiografias de ossos longos é comum na sífilis congênita sintomática (70% a 90%). A sensibilidade das alterações radiológicas para diagnóstico de sífilis congênita, em crianças assintomáticas, é desconhecida – estima-se em 4% a 20% dos recém-nascidos assintomáticos infectados. A única alteração é o achado radiográfico, o que justifica a realização deste exame nos casos suspeitos de sífilis congênita; Exame do líquido cefalorraquidiano (LCR) – recomenda-se realizar a análise do LCR em todos os recém-nascidos que se enquadrem na definição de caso . A presença de leucocitose (>25 leucócitos/mm3) e o elevado conteúdo protéico (>150 mg/dl) no LCR de um recém-nascido (antes de 28 dias), suspeito de ser portador de sífilis congênita, devem ser considerados como evidências adicionais para o diagnóstico. Uma criança com VDRL positivo no LCR deve ser diagnosticada como portadora de neurossífilis, independente da existência de alterações na celularidade e/ou na proteinorraquia, porém um resultado negativo não afasta o diagnóstico da afecção do sistema nervoso central. A ocorrência de alterações no LCR é muito mais freqüente nas crianças com outras evidências clínicas de sífilis congênita do que nas crianças assintomáticas (86% versus 8%, respectivamente). Se a criança for identificada após o período neonatal (>28 dias de vida), as anormalidades liquóricas incluem teste VDRL positivo e/ou leucócitos >5/mm3 e/ou proteínas >40 mg/dl. 676 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sífilis Congênita Tratamento No período neonatal (antes de 28 dias) A penicilina é a droga de escolha para todas as apresentações da sífilis. Não há relatos consistentes na literatura de casos de resistência treponêmica à droga. A análise clínica do caso indicará o melhor esquema terapêutico. A. Nos recém-nascidos de mães com sífilis não tratada ou inadequadamente tratada, independentemente do resultado do VDRL do recém-nascido, realizar hemograma, radiografia de ossos longos, punção lombar e outros exames, quando clinicamente indicados. De acordo com a avaliação clínica e de exames complementares: • A1 – se houver alterações clínicas e/ou sorológicas e/ou radiológicas e/ou hematológicas, o tratamento deverá ser feito com penicilina G cristalina na dose de 50 mil UI/kg/dose, via intravenosa, a cada 12 horas (nos primeiros 7 dias de vida) e a cada 8 horas (após 7 dias de vida), durante 10 dias; ou penicilina G procaína 50 mil UI/kg, dose única diária, via intramuscular, durante 10 dias; • A2 – se houver alteração liquórica, o tratamento deverá ser feito com penicilina G cristalina1, na dose de 50 mil UI/kg/dose, via intravenosa, a cada 12 horas (nos primeiros 7 dias de vida) e a cada 8 horas (após 7 dias de vida), durante 10 dias; • A3 – se não houver alterações clínicas, radiológicas, hematológicas e/ou liquóricas, e a sorologia for negativa, proceder ao tratamento com penicilina G benzatina, via intramuscular, na dose única de 50 mil UI/kg. O acompanhamento é obrigatório, incluindo o seguimento com VDRL sérico após conclusão do tratamento (ver Seguimento, adiante). Sendo impossível garantir o acompanhamento, o recém-nascido deverá ser tratado com o esquema A1. 6 B. Nos recém-nascidos de mães adequadamente tratadas: realizar o VDRL em amostra de sangue periférico do recém-nascido; se for reagente com titulação maior do que a materna e/ou na presença de alterações clínicas, realizar hemograma, radiografia de ossos longos e análise do LCR: • B1 – se houver alterações clínicas e/ou radiológicas e/ou hematológica sem alterações liquóricas, o tratamento deverá ser feito como em A1; • B2 – se houver alteração liquórica, o tratamento deverá ser feito como em A2; S C. Nos recém-nascidos de mães adequadamente tratadas: realizar o VDRL em amostra de sangue periférico do recém-nascido: • C1 – se for assintomático e o VDRL não for reagente, proceder apenas ao seguimento clínico-laboratorial. Na impossibilidade de garantir o seguimento, realizar o tratamento com penicilina G benzatina, via intramuscular, na dose única de 50 mil UI/kg; O tratamento com penicilina G procaína por 10 dias em pacientes assintomáticos e com exames complementares normais não mostrou nenhum benefício adicional quando comparado ao esquema de penicilina G benzatina. 1 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 677 Sífilis Congênita • C2 – se for assintomático e tiver VDRL reagente com título igual ou menor que o materno, acompanhar clinicamente. Na impossibilidade do seguimento clínico, tratar como A1 e, se houver alterações no LCR, tratar como A2. No período pós-natal (após o 28º dia) Crianças com quadro clínico sugestivo de sífilis congênita devem ser cuidadosamente investigadas, obedecendo-se à rotina acima referida. Confirmando-se o diagnóstico, proceder ao tratamento conforme preconizado, observando-se o intervalo das aplicações que, para a penicilina G cristalina, deve ser de 4 em 4 horas, e para a penicilina G procaína, de 12 em 12 horas, mantendo-se os mesmos esquemas de doses anteriormente preconizados. Seguimento • Consultas ambulatoriais mensais no primeiro ano de vida. • Realizar VDRL com 1, 3, 6, 12 e 18 meses de idade, interrompendo o seguimento com dois exames de VDRL negativos consecutivos. • Diante de elevação do título sorológico ou da sua não-negativação até os 18 meses de idade, reinvestigar o paciente e proceder o tratamento. • Recomenda-se o acompanhamento oftalmológico, neurológico e audiológico semestral por dois anos. • Nos casos em que o LCR mostrou-se alterado, deve ser realizada uma reavaliação liquórica a cada 6 meses, até a normalização do mesmo; alterações persistentes indicam avaliação clínico-laboratorial completa e retratamento. • Nos casos de crianças tratadas de forma inadequada, na dose e/ou tempo do tratamento preconizado, deve-se convocar a mesma para reavaliação clínico-laboratorial e reiniciar o tratamento, obedecendo aos esquemas anteriormente descritos. Observações • No caso de interrupção do tratamento por mais de 1 dia, o mesmo deverá ser reiniciado. • Em relação à biossegurança hospitalar, são recomendadas precauções de contato para todos os casos de sífilis congênita até 24 horas do início do tratamento com penicilina. • O uso de outro antimicrobiano não é adequado. O curso de 10 dias de penicilina deve ser realizado mesmo quando a ampicilina é inicialmente prescrita para possível sepse neonatal. Atenção Na impossibilidade de realizar a punção lombar, considerar o caso, para efeito de tratamento, como neurossífilis. 678 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sífilis Congênita Tratamento inadequado para sífilis materna • tratamento realizado com qualquer medicamento que não seja a penicilina; ou • tratamento incompleto, mesmo tendo sido feito com penicilina; ou • tratamento inadequado para a fase clínica da doença; ou • instituição de tratamento dentro do prazo dos 30 dias anteriores ao parto; ou • ausência de documentação de tratamento anterior; ou • ausência de queda dos títulos (sorologia não-treponêmica) após tratamento adequado; ou • parceiro não tratado ou tratado inadequadamente ou quando não se tem a informação disponível sobre o seu tratamento. Obs.: realizar exames neurológico, oftalmológico (fundo de olho) e audiológico em todas as crianças incluídas como caso de sífilis congênita. 6 Aspectos epidemiológicos A sífilis congênita é doença de notificação compulsória, com compromisso internacional de eliminação enquanto problema de saúde pública. Estudo nacional realizado em 2000 mostra prevalência de 1,7%2 de sífilis em parturientes. O subdiagnóstico e a subnotificação da sífilis congênita ainda são elevados, porém observa-se um incremento de casos notificados nos últimos oito anos, passando de pouco mais de 200, em 1995, para mais de 3 mil, nos últimos 4 anos. Nos últimos 5 anos, foram registrados 16.119 internamentos. No período de 1998 a 2003, os dados nacionais de sífilis congênita mostram uma incidência média de 1,15/1 mil nascidos vivos. Maiores coeficientes são encontrados na região Sudeste, principalmente nos estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo, o que pode estar refletindo não uma realidade mais desfavorável que a de outros estados, mas a intensidade dos esforços para detectar e notificar a doença3. No que tange às características maternas, 74% estão na faixa etária de 20 a 39 anos; mais de 40% dos casos com escolaridade informada têm de 1 a 3 anos de estudo; aproximadamente 70% dos casos notificados fizeram pré-natal e cerca de 50% realizaram 4 ou mais consultas e tiveram diagnóstico de sífilis durante a gravidez. Os dados do Sinan mostram que mais de 54% dos parceiros não foram tratados. As crianças se apresentavam assintomáticas ao nascimento em 75% das notificações onde consta a informação. S Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de DST/Aids. Estudo Sentinela Parturiente Corte Nacional – outubro de 2000. 2 Fonte dos dados: Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan)/MS/SVS/PN-DST/Aids – casos notificados até 8/1/2004. 3 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 679 Sífilis Congênita Vigilância epidemiológica Objetivo • Identificar os casos de sífilis congênita para subsidiar as ações de prevenção e controle desse agravo, intensificando-as no pré-natal. • Conhecer o perfil epidemiológico da sífilis congênita no Brasil e suas tendências. Definição de caso Para fins de vigilância epidemiológica, será considerado caso de sífilis congênita e assim deverá ser notificado: • toda criança ou aborto4 ou natimorto5 de mãe com evidência clínica6 para sífilis e/ou com sorologia não-treponêmica reagente para sífilis com qualquer titulação, na ausência de teste confirmatório treponêmico, realizada no pré-natal ou no momento do parto ou curetagem que não tenha sido tratada ou recebido tratamento inadequado; • todo indivíduo com menos de 13 anos com as seguintes evidências sorológicas: ❯ titulações ascendentes (testes não-treponêmicos); e/ou ❯ testes não-treponêmicos reagentes após 6 meses de idade (exceto em situação de seguimento terapêutico); e/ou ❯ testes treponêmicos reagentes após 18 meses de idade; e/ou títulos em teste não-treponêmico maiores que os da mãe. Obs.: Em caso de evidência sorológica apenas, deve ser afastada a possibilidade de sífilis adquirida. • todo indivíduo com menos de 13 anos com teste não-treponêmico reagente e evidência clínica ou liquórica ou radiológica de sífilis congênita; • toda situação de evidência de T. pallidum em placenta ou cordão umbilical e/ou amostra de lesão, biópsia ou autópsia de criança, aborto ou natimorto. Notificação e investigação É doença de notificação compulsória e todo caso definido como sífilis congênita, segundo os critérios descritos na definição de caso, deve ser notificado à vigilância epidemiológica. A notificação é feita pelo preenchimento e envio da ficha de notificação e investigação epidemiológica de caso de sífilis congênita, que deve ser preenchida pelo médico ou outro profissional de saúde no exercício de sua função. A investigação de sífilis congênita será desencadeada nas seguintes situações: 4 Aborto é toda perda gestacional até 22 semanas de gestação ou com peso menor ou igual a 500g. 5 Natimorto é todo feto morto após 22 semanas de gestação ou com peso maior que 500g. Evidência clínica para sífilis na gestação: sífilis primária – cancro duro; sífilis secundária – lesões cutâneo-mucosas (roséolas sifilíticas, sifílides papulosas, condiloma plano sifilítico, alopecia e lesões palmoplantares); sífilis terciária – lesões cutâneo-mucosas (tubérculos ou gomas); alterações neurológicas (tabes dorsalis, demência); alterações cardiovasculares (aneurisma aórtico); alterações articulares (artropatia de Charcot). 6 680 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sífilis Congênita • todas as crianças nascidas de mãe com sífilis (evidência clínica e/ou laboratorial), diagnosticadas durante a gestação, parto ou puerpério; • todo indivíduo com menos de 13 anos com suspeita clínica e/ou epidemiológica de sífilis congênita. Primeiras medidas a serem adotadas frente a um caso identificado Assistência médica ao paciente Tendo em vista o projeto de eliminação da sífilis congênita, toda gestante deverá ser testada para sífilis na primeira consulta, no início do terceiro trimestre do pré-natal e na admissão para o parto. As mulheres reagentes serão tratadas segundo o esquema abaixo: • sífilis primária (cancro duro): penicilina benzatina 2.400.000 UI, via intramuscular, em dose única (administrar metade em cada glúteo); • sífilis secundária e sífilis latente recente (com menos de um ano de evolução): penicilina benzatina 2.400.000 UI, via intramuscular, repetindo a mesma dose uma semana depois; dose total: 4.800.000 UI; • sífilis terciária ou sífilis com mais de um ano de evolução ou duração ignorada: penicilina benzatina 2.400.000 UI, via intramuscular, em 3 aplicações, com intervalo de uma semana entre cada aplicação; dose total: 7.200.000 UI; 6 Atenção Na sífilis primária o parceiro deve também ser tratado, com a mesma dose, independentemente de apresentar manifestação clínica. Nas sífilis secundária e terciária o tratamento do parceiro só deve ser feito após avaliação clínica e laboratorial, e só deverão ser tratados aqueles com sífilis confirmada. • em caso de alergia referida, realizar testes cutâneos padronizados e dessensibilizar quando confirmada a atopia; • alternativamente, em caso de alergia comprovada à penicilina, pode ser utilizada a eritromicina (estearato) 500mg – 1 comp., 6/6 h, via oral, por 15 dias (sífilis recente) ou 30 dias (sífilis tardia). S Observações A eritromicina tem um perfil de eficácia menor, múltiplas doses diárias e maior incidência de efeitos colaterais (o que diminui a adesão). Assim, requer acompanhamento mais atento. Deve-se proporcionar a todos os portadores de DST a realização de testes anti-HIV, mediante aconselhamento. Fazer controle de cura trimestral com a realização do VDRL. Tratar novamente em caso de interrupção do tratamento ou quadruplicação dos títulos (ex.: de 1/2 para 1/8). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 681 Sífilis Congênita Assistência médica ao recém-nascido e criança com sífilis congênita Todas as crianças que se enquadrem na definição de caso devem ser submetidas ao tratamento e seguimento clínico e laboratorial preconizados. É fundamental evitar a perda de oportunidades de diagnóstico e tratamento, tanto da infecção materna quanto da criança, reduzindo-se, assim, as elevadas taxas de morbi-mortalidade determinadas pela infecção, incluindo-se as lesões do sistema nervoso central. Qualidade da assistência A sífilis congênita é uma doença prevenível, bastando que a gestante infectada seja detectada e prontamente tratada, assim como o(s) seu(s) parceiro(s) sexual(is). Portanto, a medida mais efetiva de controle da sífilis congênita consiste em oferecer, a toda gestante, uma assistência pré-natal adequada. No entanto, as medidas de controle devem abranger outros momentos: antes da gravidez e na admissão à maternidade, seja no momento do parto, seja na curetagem por abortamento ou durante qualquer outra intercorrência na gravidez. Mesmo o diagnóstico tardio da infecção materna, realizado na admissão para o parto, é valido, pois, a despeito de não se evitar a doença na criança, haverá condições de tratar a mulher e o concepto, reduzindo as complicações advindas da infecção. Confirmação diagnóstica O teste sorológico de imunofluorescência, o FTA-abs/IgM-19S, realizado em sangue periférico de recém-natos, pode definir a infecção; no entanto, sua disponibilidade é limitada aos centros laboratoriais de referência ou de pesquisa. Um teste não-treponêmico reagente após o sexto mês de vida, ou um teste treponêmico após o 18º mês, é definidor da infecção. A realização de exames microbiológicos em amostras de tecidos da criança ou de placenta ou cordão umbilical são definitivos para a confirmação do caso. Instrumentos disponíveis para controle Antes da gravidez • Diagnóstico precoce em mulheres em idade reprodutiva e seus parceiros. • Realização do teste VDRL em mulheres que manifestem a intenção de engravidar. • Tratamento imediato dos casos diagnosticados em mulheres e seus parceiros. Durante a gravidez Realizar o teste VDRL no primeiro trimestre da gravidez, ou na primeira consulta, e outro no início do terceiro trimestre. Na ausência de teste confirmatório, considerar para o diagnóstico as gestantes com VDRL reagente, em qualquer titulação, desde que não tratadas anteriormente de forma adequada ou que a documentação deste tratamento não esteja disponível. 682 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Sífilis Congênita Ações de educação em saúde A adoção de práticas sexuais seguras, associada ao bom desempenho na execução do pré-natal, são peças-chave para o controle do agravo. A população-alvo deverá receber informações sobre a prevenção das DST e o direito a uma assistência médica humanizada e de qualidade. Estratégias de prevenção As ações de prevenção da sífilis congênita baseiam-se em três pontos estratégicos, abaixo visualizados: Oportunidades estratégicas para o controle da sífilis congênita e suas complicações Período de atuação Anterior à gestação Gestação Parto ou curetagem Objetivos gerais Prevenir DST em mulheres em idade fértil Evitar a transmissão para o concepto Reduzir a morbimortalidade Grupos-alvo População geral Gestantes no pré-natal Recém-nascido Principais atividades Diagnóstico e tratamento precoce da sífilis adquirida; incentivo ao uso regular de preservativos VDRL no 1º e 3º trimestres da gestação. Tratamento da gestante e parceiro 6 VDRL em parturientes: se positivo, investigar récem-nascido S Tratamento Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 683 Síndrome da Rubéola Congênita SÍNDROME DA RUBÉOLA CONGÊNITA CID 10: P35.0 Características clínicas e epidemiológicas Descrição A síndrome da rubéola congênita (SRC) constitui importante complicação da infecção pelo vírus da rubéola durante a gestação, principalmente no primeiro trimestre, podendo comprometer o desenvolvimento do feto e causar aborto, morte fetal, natimorto e anomalias congênitas. Suas manifestações clínicas podem ser transitórias (púrpura, trombocitopenia, hepatoesplenomegalia, icterícia, meningoencefalite, osteopatia radioluscente), permanentes (deficiência auditiva, malformações cardíacas, catarata, glaucoma, retinopatia pigmentar) ou tardias (retardo do desenvolvimento, diabetes mellitus). As crianças com SRC freqüentemente apresentam mais de um sinal ou sintoma, mas podem ter apenas uma malformação, sendo a deficiência auditiva a mais comum. Agente etiológico O vírus da rubéola é um vírus RNA, pertencente ao gênero Rubivirus, família Togaviridae. Reservatório O homem é o único reservatório conhecido. Modo de transmissão A SRC é transmitida pela via transplacentária, após a viremia materna. Período de transmissibilidade Recém-nascidos com SRC podem excretar o vírus da rubéola nas secreções naso-faríngeas, sangue, urina e fezes por longos períodos. O vírus pode ser encontrado em 80% das crianças no primeiro mês de vida; 62% do primeiro ao quarto mês; 33% do quinto ao oitavo mês; 11% entre nove e doze meses e apenas 3% no segundo ano de vida. Susceptibilidade e imunidade A infecção natural pelo vírus da rubéola ou pela imunização confere, em geral, imunidade permanente. No entanto, o nível de imunidade coletiva atingido não é suficientemente alto para interromper a transmissão do vírus. Diferentes estratégias de vacinação contra a rubéola têm sido adotadas para a prevenção da SRC. A vacinação de mulheres em idade fértil (MIF) tem efeito direto na prevenção ao reduzir a susceptibilidade entre gestantes sem que ocorra a eliminação do vírus na comunidade. A longo prazo, a vacinação de rotina na infância tem impacto na prevenção da 684 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Síndrome da Rubéola Congênita SRC pois interrompe a transmissão do vírus entre as crianças, o que reduz o risco de exposição de gestantes susceptíveis. Além disso, reduz a susceptibilidade nas futuras coortes de mulheres em idade fértil. A incidência da SRC depende, portanto, do número de susceptíveis, da circulação do vírus na comunidade e do uso de vacina específica. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas A infecção pelo vírus da rubéola na fase intra-uterina pode resultar no nascimento de criança sem nenhuma anomalia, mas pode provocar abortamento espontâneo, natimortalidade ou nascimento de crianças com anomalias simples ou combinadas. As principais manifestações clínicas da SRC são catarata, glaucoma, microftalmia, retinopatia, cardiopatia congênita (persistência do canal arterial, estenose aórtica, estenose pulmonar), surdez, microcefalia e retardo mental. Outras manifestações clínicas podem ocorrer, mas são transitórias, como hepatoesplenomegalia, hepatite, icterícia, anemia hemolítica, purpura trombocitopênica, adenopatia, meningoencefalite, miocardite, osteopatia de ossos longos (rarefações lineares nas metáfises) e exantema crônico. A prematuridade e o baixo peso ao nascer estão também associados à rubéola congênita. 6 Diagnóstico diferencial Várias patologias congênitas ou adquiridas, que ocorrem após o nascimento, têm manifestações clínicas semelhantes entre si. O diagnóstico diferencial da SRC inclui: infecções congênitas por citomegalovírus, varicela-zoster, Coxsackievirus, Echovirus, herpes simples, HIV, hepatite B, parvovírus B19, Toxoplasma gondii, Treponema pallidum, malária e Tripanosoma cruzi. As principais manifestações clínicas dessas patologias são descritas no Quadro 1. Diagnóstico laboratorial S O feto infectado é capaz de produzir anticorpos específicos IgM e IgG para rubéola, antes mesmo do nascimento. A presença de anticorpos IgM específicos para rubéola, no sangue do recém-nascido, é evidência de infecção congênita, uma vez que os anticorpos IgM maternos não ultrapassam a barreira placentária. Os anticorpos IgM podem ser detectados em 100% das crianças com SRC até o 5º mês; em 60% de 6 a 12 meses e em 40% de 12 a 18 meses. Raramente são detectados após o 18º mês. Os anticorpos maternos, da classe IgG, podem ser transferidos passivamente ao feto através da placenta, sendo também encontrados nos recém-natos normais, nascidos de mães imunes à rubéola. Não é possível diferenciar os anticorpos IgG maternos daqueles produzidos pelo próprio feto, quando infectados na vida intra-uterina. Como a quantidade de anticorpos IgG maternos diminui com o tempo, desaparecendo por volta do 6º mês, a persistência dos níveis de anticorpos IgG no sangue do recém-nascido é altamente sugestiva de infecção intra-uterina. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 685 Síndrome da Rubéola Congênita Os exames laboratoriais são imprescindíveis para o estabelecimento do diagnóstico definitivo. Para a investigação de casos suspeitos de SRC, deve ser colhida uma amostra de sangue logo após o nascimento, quando há suspeita ou confirmação de infecção materna durante a gestação, ou logo após a suspeita diagnóstica, nos menores de um ano. Quadro 1. Principais manifestações clínicas de patologias congênita ou que ocorrem após o nascimento Patologia/patógeno Rubéola Feto Aborto Recém-nascido Malformação Seqüela Baixo peso, hepatoesplenomegalia, osteíte, purpura Cardiopatia, microcefalia, catarata Surdez, retardo mental, diabete, autismo, cegueira, degeneração do SNC Citomegalovírus - Anemia, trombocitopenia, hepatoesplenomegalia, icterícia, encefalite Microcefalia, microftalmia, retinopatia Surdez, retardo psicomotor, calcificação cerebral Varicela-zoster - Baixo peso, corioretinite, varicela congênita ou neonatal, encefalite Hipoplasia de membros, atrofia cortical, cicatrizes Evolução fatal por infecção secundária Picornavírus, Coxsackievírus, Echovírus Aborto Doença febril leve, exantema, doença sistêmica grave, enterite Possível cardiopatia, miocardite Déficit neurológico Herpes simples Aborto Doença sistêmica grave, lesões vesiculosas, retinopatia Microcefalia, retinopatia, calcificações cerebrais Déficit motor Vírus HIV - Aids (Sida) - Aids (Sida) Vírus da hepatite B - HbsAg assintomático, baixo peso, hepatite aguda - Hepatite crônica, HbsAg+ persistente - Parvovírus B19 Natimorto, hidropsia fetal Natimorto Toxoplasma gondii Aborto Baixo peso, hepatoesplenomegalia, icterícia, anemia Treponema pallidum Natimorto, hidropsia fetal Lesões de pele, rinite, hepatoesplenomegalia, icterícia, anemia - Malária Aborto Hepatoesplenomegalia, icterícia, anemia, vômitos - Tripanosoma cruzi (Chagas) Aborto Baixo peso, icterícia, anemia, petéquias, falha cardíaca, hepatoesplenomegalia, encefalite Hidrocefalia, microcefalia Catarata Corioretinite, retardo mental Ceratite intersticial, bossa frontal, tíbia em sabre, dentes de Hutchinson - Miocardite, acalasia Fonte: Gotoft/SP - Infections of newborn. In: Behrman RE, Kliegman RM: Nelson Textboook of Pediatrics, WB Saunders Co, Philadelphia, 1992, 14th. 496. 686 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Síndrome da Rubéola Congênita Quadro 2. Diagnóstico laboratorial de caso suspeito de SRC* Período da coleta Pesquisa Logo após o nascimento ou quando da suspeita de SRC IgM IgG Após 3 meses da 1ª coleta (realizar testes pareados) IgG Resultado Conduta Positivo Confirmar o caso Negativo Realizar pesquisa de IgG com o mesmo soro Positivo Coletar 2ª amostra após 3 meses Negativo Descartar o caso Se o IgG mantiver o título anterior ou for maior Confirmar o caso Se houver queda acentuada do título de IgG, comparado com o anterior Descartar o caso 6 *Recém-nascido cuja mãe teve diagnóstico confirmado de rubéola durante a gestação, ou lactente com suspeita de SRC. Observação: Quando a mãe não foi investigada anteriormente, realizar na mesma a pesquisa de IgM e IgG. Recomendação Isolamento viral – se a sorologia for IgM reagente (+), recomenda-se a coleta de espécime clínica (swab nasofaríngeo) para identificação do genótipo do vírus. Tratamento Não existe tratamento antiviral efetivo. Este será direcionado às malformações congênitas e deficiências observadas. Quanto mais precoces forem a detecção e a intervenção, quer o tratamento seja clínico, cirúrgico ou de reabilitação, melhor será o prognóstico da doença. Aspectos epidemiológicos S A rubéola e a SRC são doenças de notificação compulsória desde 1996. No entanto, só a partir de 1999, com a vigilância integrada do sarampo e rubéola como estratégia para atingir a meta de erradicação do sarampo, passou-se a documentar mais sensível e representativamente a circulação do vírus da rubéola no Brasil. Assim, surtos de rubéola foram detectados em diversos estados entre 1999 e 2001. Padrões diferenciados de ocorrência da rubéola por faixa etária foram observados, provavelmente como consequência da introdução gradual da vacina, o que acarretou deslocamento da ocorrência da doença para adultos jovens entre 1999 e 2000. Em 1999, a maioria dos surtos ocorreu em estados que ainda não haviam implantado a vacinação contra a rubéola, sendo a população mais atingida a de menores de 15 anos. Em 2000, os surtos atingiram estados que já vacinavam contra a rubéola. No período de 2000 e 2001, observou-se aumento no número de casos de SRC, como efeito do surto, mas também refletindo a estruturação da vigilância da SRC no país (Figura 1). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 687 Síndrome da Rubéola Congênita Os dados de vigilância da rubéola, nesses anos, possibilitaram não só a adoção de medidas de controle frente a surtos (vacinação de bloqueio) mas também a implantação da estratégia de controle acelerado da SRC, com a realização, em 2001 e 2002, de campanhas de vacinação de mulheres em idade fértil em todos os estados brasileiros. Como resultado desse intenso esforço de vacinação de grupos susceptíveis, observa-se substancial redução do número de casos de rubéola e de SRC a partir de 2002 (Figura1). A SRC é um evento relativamente raro, principalmente na ausência de surtos e com elevadas coberturas vacinais. Entretanto, possui grande magnitude pelo alto custo associado ao tratamento, intervenções e educação especial, sem contar o sofrimento humano. Estima-se que muitos casos não são diagnosticados ou permaneçam não notificados, contribuindo para o conhecimento apenas parcial do problema. Em 2003, foi estabelecida a meta de eliminação da rubéola e da SRC nas Américas até 2010. Para isso, é fundamental fortalecer a vigilância da SRC, em especial por meio de vigilância ativa em unidades de referência para o atendimento de crianças com infecções congênitas e outras malformações compatíveis com SRC. Assim, será possível detectar os casos suspeitos, realizar exames diagnósticos e intervenções mais precocemente, o que tende a aumentar a especificidade do sistema. 120 3,5 100 3 2,5 80 2 60 1,5 40 1 20 0 0,5 1997 1998 1999 2000 Casos de SRC 2001 2002 2003 Incidência por 100 mil* Número de casos Figura 1. Incidência* e nº de casos confirmados e compatíveis de SRC. Brasil, 1997-2003 0 Incidência Fonte: Sinan *Denominador: População <1ano, IBGE Vigilância epidemiológica Objetivos Conhecer a magnitude da SRC como problema de saúde pública, notificar e investigar todos os casos suspeitos de SRC, avaliar o impacto das estratégias de vacinação e divulgar informações para os profissionais e serviços de saúde. 688 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Síndrome da Rubéola Congênita Definição de caso Suspeito Todo recém-nascido cuja mãe foi caso suspeito ou confirmado de rubéola ou contato de caso confirmado de rubéola durante a gestação, ou toda criança, até 12 meses de idade, que apresente sinais clínicos compatíveis com infecção congênita pelo vírus da rubéola, independente da história materna. Confirmado Caso suspeito que apresenta malformações congênitas compatíveis com SRC e evidência laboratorial da infecção congênita pelo vírus da rubéola: presença de anticorpos IgM específicos ou elevação persistente dos títulos de anticorpos da classe IgG, detectados através de ensaio imunoenzimático (Elisa) em amostras pareadas, com intervalo de 3 meses. 6 Importado Caso cuja exposição ocorreu fora do continente americano durante os 14 a 23 dias prévios ao surgimento do exantema, de acordo com a análise dos dados epidemiológicos e/ou virológicos. Caso relacionado com importação – infecção contraída localmente que ocorre como parte de uma cadeia de transmissão originada por um caso importado, de acordo com a análise dos dados epidemiológicos e/ou virológicos. Caso com origem de infecção desconhecida – caso em que não foi possível estabelecer a origem da fonte de infecção, após investigação epidemiológica minuciosa. Compatível Caso suspeito que apresente pelo menos uma manifestação clínica do Grupo 1 (sinais maiores) associada a uma outra do Grupo 2 (sinais menores) ou à história de infecção materna comprovada por laboratório ou vínculo epidemiológico durante a gestação. Grupo 1 – catarata/glaucoma congênitos (interpretar como uma só manifestação), cardiopatia congênita, retinopatia pigmentar, surdez. Grupo 2 – hepatoesplenomegalia, icterícia, microcefalia, retardo mental, meningoencefalite, púrpura trombocitopênica, radiotransparência óssea nas metáfises (osteopatia de ossos longos). S Infecção congênita Caso suspeito que apresenta evidência laboratorial de infecção congênita pelo vírus da rubéola, sem nenhuma manifestação clínica compatível com SRC. Descartado O caso será classificado como descartado quando enquadrar-se em uma das seguintes condições: • títulos de IgM e IgG ausentes em crianças menores de 12 meses; Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 689 Síndrome da Rubéola Congênita • títulos de IgG diminuindo, em prazo compatível com a transferência de anticorpos maternos detectados por ensaio imunoenzimático a partir do nascimento; • quando, por qualquer motivo, os resultados do exame sorológico do recém-nascido não estiverem disponíveis e os dados clínicos forem insuficientes para confirmar o caso pela clínica; • títulos de IgG ausentes na mãe. Notificação A notificação deve ser feita, de imediato, para a Comissão de Infecção Hospitalar e Serviço de Vigilância Epidemiológica da unidade de saúde. O recém-nascido pode ser fonte de infecção dentro de uma unidade de saúde, sendo necessária a adoção de medidas de controle, como isolamento respiratório e vacinação de contactantes. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente Realizar exame clínico minucioso para detectar malformações e coletar sangue para sorologia. Todo caso que apresentar malformação deverá ser encaminhado para especialista (neurologista, cardiologista, otorrinolaringologista e/ou oftalmologista, etc.), para tratamento específico. Qualidade da assistência Verificar se os casos estão sendo atendidos em unidade de saúde com capacidade para prestar atendimento adequado e oportuno. Na maioria das vezes, estes pacientes necessitam de cuidados permanentes e contínuos, demandando avaliação especializada (déficit auditivo, cardiopatias, malformações oculares). Proteção individual para evitar circulação viral É necessário realizar o isolamento dos contatos do recém-nascido, uma vez que o vírus pode estar presente em fluidos corporais (secreção nasofaríngea e urina). A infecção pode ser transmitida aos susceptíveis, sendo importante a vacinação dos profissionais de saúde e contactantes. É importante evitar o contato de gestantes com a criança. Confirmação diagnóstica Coletar material para diagnóstico laboratorial, de acordo com as orientações do Anexo 1. Proteção da população Após o conhecimento de um surto de rubéola é importante avaliar a distribuição etária dos casos confirmados e a situação vacinal, além da cobertura vacinal na área. Se o surto ocorrer em um grupo não vacinado, realizar a vacinação visando, principalmente, interromper a circulação viral, reduzindo o risco de exposição de gestantes susceptíveis ao vírus. 690 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Síndrome da Rubéola Congênita Devem ser organizadas divulgação nos meios de comunicação de massa, visitas domiciliares e palestras nas comunidades para esclarecer a população sobre a doença, a gravidade da infecção intra-uterina e a importância da vacinação. Investigação Todo caso suspeito de SRC deve ser investigado em até 48 horas após a notificação, com o objetivo de: • caracterizar clinicamente o caso; • coletar dados epidemiológicos do caso; • coletar amostra de sangue para exame sorológico, a fim de confirmar o diagnóstico; • desencadear as medidas de controle pertinentes; • obter informações detalhadas e uniformes, para todos os casos, possibilitando a comparação dos dados e a análise adequada da situação epidemiológica da doença; • confirmar ou descartar o caso, conforme os critérios estabelecidos. 6 O instrumento de coleta de dados – ficha epidemiológica específica de SRC – disponível no Sinan contém os elementos essenciais a serem coletados em uma investigação de rotina. Todos os seus campos devem ser criteriosamente preenchidos, mesmo quando a informação for negativa. Outros itens e observações podem ser incluídos, conforme as necessidades e peculiaridades de cada situação. Toda gestante com resultado sorológico (IgM) positivo para rubéola ou que teve contato com casos confirmados ou suspeitos de rubéola deve ser acompanhada pelo serviço de vigilância epidemiológica, com o objetivo de verificar a ocorrência de abortos, natimortos ou o nascimento de crianças com ou sem malformações congênitas ou outras anomalias. Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente Preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica do Sinan, relativos aos dados gerais, notificação individual e dados de residência. S Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmar a suspeita diagnóstica Anotar na ficha de investigação os dados da história e manifestações clínicas: • deve-se consultar o prontuário e entrevistar o médico assistente, para completar as informações clínicas sobre o paciente. Estas informações servirão para definir se o quadro apresentado é compatível com a doença; • sugere-se fazer uma cópia da anamnese, exame físico e evolução do doente, com vistas ao enriquecimento das análises e, também, para que possam servir como instrumento de aprendizagem dos profissionais do nível local; acompanhar a evolução dos pacientes e os resultados dos exames laboratoriais específicos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 691 Síndrome da Rubéola Congênita Para identificação de novos casos de SRC • Realizar busca ativa nos livros de registros de internação e alta de pacientes e no Sistema de Informação Hospitalar (SIH) em maternidades, unidades neonatais e livros de registros de serviços pediátricos especializados, como cardiologia, oftalmologia, neurologia, otorrinolaringologia e fonoaudiologia. • Locais com ocorrência de surto: além do acompanhamento das gestantes que tiveram diagnóstico de rubéola confirmado, realizar vigilância ativa prospectiva nas maternidades, unidades neonatais e pediátricas, por um período de pelo menos 9 meses após o término do surto. Coleta e remessa de material para exames • Logo após a suspeita de SRC, coletar sangue de todos os casos. • É da responsabilidade dos profissionais da vigilância epidemiológica e/ou dos laboratórios centrais ou de referência viabilizar, orientar ou mesmo realizar estas coletas. Não se deve aguardar os resultados dos exames para o desencadeamento das medidas de controle e outras atividades da investigação, embora eles sejam imprescindíveis para a confirmação de casos e para nortear o encerramento das investigações. Se o teste de IgM for negativo, a criança pode ser retirada do isolamento. Análise dos dados A análise dos dados da investigação deve permitir a avaliação da magnitude do problema, a caracterização clínica da coorte, a identificação de oportunidades perdidas de vacinação, a adequação das medidas de controle adotadas e, finalmente, a avaliação do impacto das estratégias de vacinação atuais na prevenção da SRC. Encerramento de casos As fichas epidemiológicas de cada caso devem ser analisadas visando definir qual o critério utilizado para o diagnóstico. Espera-se que todos os casos sejam classificados pelo critério laboratorial. Relatório final Os dados da ficha de investigação deverão estar adequadamente encerrados e digitados no Sinan, no período de até 180 dias após a notificação do caso, para as análises epidemiológicas necessárias. Instrumentos disponíveis para controle A vacina tríplice viral (sarampo, rubéola e caxumba) foi implantada no Brasil, de forma gradativa, no período de 1992 a 2000. Atualmente, a vacinação contra a rubéola está inserida no calendário vacinal de rotina, devendo ser realizada aos 12 meses de vida. O 692 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Síndrome da Rubéola Congênita sistema de vigilância da SRC foi implantado em 2000, objetivando conhecer a magnitude da SRC como problema de saúde pública e avaliar as estratégias de vacinação. Roteiro de investigação epidemiológica da síndrome da rubéola congênita Notificação de caso(s) suspeito(s) Investigação Identificar ocorrência de surtos Atenção médica/ dados clínicos e epidemiológicos Sim Coleta de material para sorologia 6 Identificar área de transmissão Enviar ao laboratório Determinar a extensão da área de transmissão Resultado do exame Negativo Adotar medidas de prevenção e controle Positivo Monitoramento da área durante 9 meses Encerrar o caso Bloqueio Acompanhamento de mulheres grávidas expostas e recém-nascido Educação em saúde Imunização Recomendações para a vacinação – a vacinação é uma estratégia para o controle da rubéola e prevenção da SRC. A medida de controle, quando da detecção de um caso de SRC, é a vacinação de bloqueio, que deve ocorrer no hospital de atendimento do caso, no domicílio e na creche que a criança irá freqüentar, uma vez que o vírus pode ser excretado pelas secreções nasofaríngeas e urina, em até 1 ano de idade. Administrar a vacina tríplice viral (sarampo/rubéola/caxumba) no grupo etário de 1 a 39 anos de idade, na rotina, e nos bloqueios de 6 meses a 39 anos de idade. É necessário que as crianças de 6 a 11 meses sejam revacinadas aos 12 meses de idade na rotina, quando a vacina tem maior eficácia, sendo esta a dose considerada válida. S Ações de educação em saúde • Esclarecer a população, principalmente da área da educação e creches, sobre a doença, a importância de notificar a secretaria municipal de saúde e a vacinação de crianças e mulheres para a prevenção da SRC. • Orientar os profissionais de creches quanto aos cuidados com a criança portadora de SRC. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 693 Síndrome da Rubéola Congênita Anexo 1 Normas para procedimentos laboratoriais O diagnóstico específico de cada paciente com suspeita de síndrome da rubéola congênita é da maior importância para a vigilância epidemiológica. A seguir, são descritos os exames laboratoriais disponíveis, suas interpretações e as normas de coleta dos espécimes. Testes sorológicos • MAC-Elisa – é bastante sensível e detecta anticorpos específicos da classe IgM, que indica infecção ativa. Esses anticorpos, na infecção congênita, aparecem desde o nascimento e perduram, em geral, até os 180 dias de vida. É um teste sensível, de eleição para a triagem de casos. • PCR – detecta material genético do vírus em amostra clínica (urina e secreção nasofaríngea). • Isolamento viral em cultura de células – útil para identificar o genótipo do vírus, possibilitando conhecer a origem do vírus, em casos importados, e também diferenciar o vírus selvagem do vacinal. • Diagnóstico histopatológico – realizado a partir de coleta de material post-mortem. Coleta e conservação de material para diagnóstico da síndrome da rubéola congênita Tipo de diagnóstico Tipo de material Quantidade Nº de amostras 1ª ao nascer; Sangue Sorológico Isolamento viral Obtenção da amostra: punção venosa Crianças: Secreções nasofaringeas através de swab Uma amostra de cada narina e uma da garganta Urina 2-5ml 2-5ml Até 3* Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 2ª no terceiro mês de vida; 3ª no sexto mês de vida 1 1 *Conforme resultado da primeira amostra. 694 Período da coleta Após o resultado de IgM positivo na 1ª amostra, até 12 meses de vida Recipiente Tubo plástico ou vidro, com tampa de rosca ou frasco com vácuo Frasco estéril de plástico com meio específico Após o resultado de IgM positivo Frasco estéril na 1ª amostra, de plástico até 12 meses de vida Armazenamento/ conservação Geladeira local: 4ºC a 8ºC até 48 horas Lacen: -20ºC Em geladeira até 48 horas (sem congelar) Lacen: freezer a -70ºC Em geladeira até 48 horas (sem congelar) Lacen: freezer a -70ºC Transporte Gelo reciclável em até 48 horas após a coleta Gelo reciclável em até 48 horas após a coleta Gelo reciclável em até 48 horas após a coleta Síndrome da Rubéola Congênita Todo material deverá ser enviado devidamente identificado e acompanhado de cópia da ficha de acompanhamento sorológico, que servirá para orientar os técnicos do laboratório quanto aos exames indicados, de acordo com o período que antecedeu a suspeita da infecção. A informação sobre a história vacinal dos casos suspeitos é muito importante para subsidiar a análise adequada dos resultados de testes sorológicos. Conduta frente a um caso suspeito Recém-nascido cuja mãe foi caso suspeito ou confirmado de rubéola durante a gestação, ou criança de até 12 meses que apresente sinais clínicos compatíveis com infecção congênita pelo vírus da rubéola, independente da história materna 6 Suspeito de síndrome da rubéola congênita Notificar Colher amostra de sangue para sorologia logo após o nascimento ou suspeita de SRC Vacinação de bloqueio IgM + IgM IgG - IgM IgG + Confirmar o caso Descartar o caso Coletar 2ª amostra após 3 meses da coleta da 1ª amostra Se o IgG mantiver o título anterior ou for maior Se houver queda acentuada do título de IgG, comparado ao anterior Confirmar o caso Descartar o caso S Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 695 Tétano Acidental TÉTANO ACIDENTAL CID 10: A35 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Doença infecciosa aguda não-contagiosa, causada pela ação de exotoxinas produzidas pelo Clostridium tetani, que provocam um estado de hiperexcitabilidade do sistema nervoso central. Clinicamente, a doença manifesta-se por febre baixa ou ausente, hipertonia muscular mantida, hiperreflexia e espasmos ou contraturas paroxísticas espontâneas ou ocasionados por vários estímulos, tais como sons, luminosidade, injeções, toque ou manuseio. Em geral, o paciente mantém-se consciente e lúcido. Agente etiológico O Clostridium tetani, bacilo gram-positivo esporulado, anaeróbico, morfologicamente semelhante a um alfinete de cabeça, com 4 a 10μ de comprimento. Produz esporos que lhe permitem sobreviver no meio ambiente por vários anos. Reservatório O Clostridium tetani é comumente encontrado na natureza, sob a forma de esporo, nos seguintes meios: pele, trato intestinal dos animais (especialmente do cavalo e do homem, sem causar doença), fezes, terra, reino vegetal, águas putrefatas, instrumentos perfurocortantes enferrujados, poeira das ruas, etc. Modo de transmissão Não há transmissão direta ou indireta. A infecção ocorre pela introdução dos esporos em solução de continuidade da pele ou mucosas (ferimentos superficiais ou profundos de qualquer natureza). Em meio a condições favoráveis de anaerobiose, os esporos transformam-se em formas vegetativas, que são as responsáveis pela produção de tetanospasminas. A presença de tecidos desvitalizados, corpos estranhos, isquemia e infecção contribuem para diminuir o potencial de oxirredução. Período de incubação É o período requerido pelo esporo para germinar, elaborar as toxinas e permitir que estas atinjam o sistema nervoso central, gerando alterações funcionais com aumento da excitabilidade. Varia de um dia a alguns meses, mas comumente é de três a 21 dias. Período de transmissibilidade Não há. 696 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tétano Acidental Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade é universal, independente de sexo ou idade. A imunidade permanente é conferida pela vacina com 3 doses e reforço a cada 5 ou 10 anos A doença não confere imunidade. Os filhos de mães imunes apresentam imunidade passiva e transitória até 4 meses. Recomenda-se um reforço em caso de nova gravidez, se esta distar mais de 5 anos da última dose. A imunidade através do soro antitetânico (SAT) dura até 14 dias, em média 1 semana, e a conferida pela imunoglobulina humana antitetânica dura de 2 a 4 semanas, em média 14 dias. Aspectos clínicos Manifestações clínicas O tétano é uma toxiinfecção causada pela toxina do bacilo tetânico, introduzido no organismo através de ferimentos ou lesões de pele ou mucosa. Clinicamente, o tétano acidental se manifesta por: Hipertonia dos músculos – masseteres (trismo e riso sardônico), pescoço (rigidez de nuca), faringe (ocasionando dificuldade de deglutição-disfagia), contratura muscular progressiva e generalizada dos membros superiores e inferiores (hiperextensão de membros), reto-abdominais (abdome em tábua), paravertebrais (opistótono) e diafragma, levando à insuficiência respiratória; os espasmos são desencadeados ao menor estímulo (luminoso, sonoro ou manipulação do paciente) ou surgem espontaneamente; Período de infecção – em média, de dois a cinco dias; Remissão – não apresenta período de remissão; Período toxêmico – ocorre sudorese pronunciada e pode haver retenção urinária por bexiga neurogênica. Inicialmente, as contrações tônico-clônicas ocorrem sob estímulos externos. Com a evolução da doença, passam a ocorrer espontaneamente. É característica da doença o enfermo manter-se lúcido e apirético ou com febre baixa. A presença de febre acima de 38°C é indicativa de infecção secundária ou de maior gravidade do tétano. 6 T Diagnóstico diferencial Em relação às formas generalizadas do tétano, incluem-se os seguintes diagnósticos diferenciais: • intoxicação pela estricnina – há ausência de trismos e de hipertonia generalizada durante os intervalos dos espasmos; • meningites – há febre alta desde o início, ausência de trismos, presença dos sinais de Kerning e Brudzinsky, cefaléia e vômito; • tetania – os espasmos são principalmente nas extremidades, com sinais de Trousseau e Chvostek presentes, hipocalcemia e relaxamento muscular entre os paroxismos; • raiva – história de mordedura, arranhadura ou lambedura por animais, convulsão, ausência de trismos, hipersensibilidade cutânea e alterações de comportamento; Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 697 Tétano Acidental • histeria – ausência de ferimentos e de espasmos intensos. Quando o paciente se distrai, desaparecem os sintomas; • intoxicação pela metoclopramida e por neurolépticos – podem levar ao trismo e hipertonia muscular; • processos inflamatórios da boca e faringe, acompanhados de trismo – dentre os principais, citam-se: abscesso dentário, periodontite alvéolo-dentária, erupção viciosa do dente do siso, fratura e/ou osteomielite de mandíbula, abscesso amigdaliano e/ou retrofaríngeo; • doença do soro – pode cursar com trismo, que é decorrente da artrite têmporomandibular que se instala após uso do soro heterólogo. Ficam evidenciadas lesões maculopapulares cutâneas, hipertrofia ganglionar, comprometimento renal e outras artrites. É importante chamar a atenção para as condições que, mesmo excepcionalmente, podem figurar no diagnóstico diferencial do tétano, tais como: ❯ osteoartrite cervical aguda com rigidez de nuca; ❯ espondilite septicêmica; ❯ hemorragia retroperitonial; ❯ úlcera péptica perfurada; ❯ outras causas de abdome agudo; ❯ epilepsia; ❯ outras causas de convulsões. Diagnóstico laboratorial e exames complementares O diagnóstico do tétano é eminentemente clínico-epidemiológico, não dependendo de confirmação laboratorial. O laboratório auxilia no controle das complicações e tratamento do paciente. O hemograma habitualmente é normal, exceto quando há infecção inespecífica associada. As transaminases e uréia sangüíneas podem elevar-se nas formas graves. A dosagem de gases e eletrólitos é importante nos casos de insuficiência respiratória. As radiografias de tórax e da coluna vertebral devem ser realizadas para o diagnóstico de infecções pneumônicas e de fraturas de vértebras, respectivamente. Hemoculturas, culturas de secreções e de urina são indicadas nos casos de infecção secundária. Tratamento O doente deve ser internado em unidade apropriada com temperatura estável e agradável e o mínimo de ruído e luminosidade. Casos graves têm indicação de terapia intensiva, onde haja suporte necessário para o manejo de complicações e conseqüente redução das seqüelas e letalidade. São de fundamental importância os cuidados dispensados por equipes médica e de enfermagem, experientes no atendimento a esse tipo de enfermidade. Os princípios básicos do tratamento são: • sedação do paciente – através do uso de benzodiazepínicos e miorrelaxantes; • neutralização da toxina tetânica – utiliza-se o soro antitetânico (SAT), cuja indi- 698 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tétano Acidental cação terapêutica é de 10 mil a 20 mil UI para crianças e adultos, via intramuscular, distribuída em duas massas musculares, ou via endovenosa, diluído para 100 ml de soro fisiológico e infundido em uma hora. Atentar para a possibilidade do surgimento de reação anafilática. A realização prévia de testes oculares e intradérmicos é de grande importância para avaliar a existência de hipersensibilidade, porém não são inteiramente seguros. Desse modo, tanto a avaliação de hipersensibilidade quanto a administração do SAT devem ser feitas em ambiente hospitalar, garantindo-se medidas imediatas de suporte de vida frente a ocorrência de reação anafilática. A imunoglobulina humana antitetânica (IGHAT ou TIG) é disponível no Brasil apenas para uso intramuscular, em duas ou mais massas musculares, na dosagem, a critério médico, de 1 mil a 3 mil UI. A administração da TIG pela via intratecal, ainda é controversa na literatura e, no Brasil, seu uso está limitado a protocolos de pesquisas; • debridamento do foco – limpar o ferimento suspeito com soro fisiológico ou água e sabão e retirar o tecido desvitalizado e corpos estranhos. Após a remoção de todas as áreas suspeitas, fazer limpeza com água oxigenada ou solução de permanganato de potássio a 1:5000. Ferimentos puntiformes e profundos devem ser abertos em cruz e lavados com soluções oxidantes. Não há comprovação de eficácia do uso de penicilina benzatina como profilático do tétano acidental, nas infecções cutâneas. Além de tratamento sintomático, caso haja indicação para o uso de antibióticos proceder de acordo com os esquemas terapêuticos indicados pela situação clínica. 6 Aspectos epidemiológicos O tétano ainda constitui problema de saúde pública nas áreas onde os níveis de desenvolvimento humano e de cobertura vacinal são inadequados. No Brasil, verifica-se tendência de declínio das taxas médias de incidência no período de 1982 a 2003 (vide gráfico a seguir), com uma redução de 72% no número absoluto de casos confirmados. A região Sudeste apresentou a maior redução no coeficiente de incidência deste período, decrescendo de 1,00 para 0,01 por 100 mil habitantes. Esta situação pode ser atribuída ao maior desenvolvimento socioeconômico e educacional e ao maior acesso a serviços de saúde, inclusive da população que migrou da zona rural para a urbana como conseqüência da mecanização da agricultura. A doença tem acometido todas as faixas etárias mas, atualmente, 46,2% dos casos estão concentrados no grupo de 20 a 49 anos de idade, seguido do de 50 anos e mais, que acumula um percentual de 35,3%. A faixa etária predominante varia conforme a região: as regiões Centro-Oeste, Sul e Sudeste têm apresentado baixas incidências no grupo dos menores de 15 anos de idade, ao contrário das regiões Norte e Nordeste. Outras características da situação epidemiológica do tétano acidental, para o país como um todo: tem acometido com mais freqüência o sexo masculino; a partir dos anos 90, a zona urbana passou a responder pelo maior número de casos (62,2%); a letalidade está acima de 30%, afetando principalmente os menores de cinco anos e os idosos, sendo con- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS T 699 Tétano Acidental siderada elevada quando comparada com os países de maior desenvolvimento econômico, que apresentam taxas entre 10% a 17%. Tétano acidental: distribuição dos coeficientes de incidência. Brasil, 1982-2003 2,0 Coeficiente de incidência /100 mil hab. 1,8 1,6 1,4 1,2 1,0 0,8 0,6 0,4 0,2 0 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 Ano Fonte: Devep/CGVEP/SVS/MS *Dados sujeitos a revisão Vigilância epidemiológica Objetivos • • • • • • Monitorar o comportamento epidemiológico da doença. Avaliar a efetividade das medidas de prevenção e controle. Investigar, com qualidade, 100% dos casos suspeitos. Identificar grupos de risco. Analisar dados e adotar medidas de controle pertinentes. Produzir e disseminar informações epidemiológicas Definição de caso Suspeito Todo paciente com dificuldade para deglutir, trismo, contraturas musculares localizadas ou generalizadas progressivas, com ou sem espasmos, apresentando ou não solução de continuidade de pele ou mucosa, independente de história vacinal e doença prévia de tétano. 700 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tétano Acidental Confirmado Todo caso suspeito cujos sinais/sintomas não se justifiquem por outras etiologias e apresente hipertonia dos masseteres (trismo), disfagia, contratura dos músculos da mímica facial (riso sardônico, acentuação dos sulcos naturais da face, pregueamento frontal, diminuição da fenda palpebral), rigidez abdominal (abdome em tábua), contraturas da musculatura paravertebral (opistótono), da região cervical (rigidez de nuca), de membros (dificuldade para deambular), independente da situação vacinal, história prévia de tétano e de detecção de solução de continuidade da pele ou mucosa. A lucidez do paciente reforça o diagnóstico. Descartado Todo caso suspeito que, após investigação clínica e epidemiológica, não preencha os critérios de confirmação. 6 Notificação A notificação de casos suspeitos de tétano acidental deverá ser feita às autoridades e instâncias superiores por profissionais da saúde ou por qualquer pessoa da comunidade. Após a notificação, deve-se proceder a investigação epidemiológica. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente Hospitalização imediata. Qualidade da assistência A internação deve ser imediata, em unidades específicas ou de terapia intensiva de maior complexidade; os pacientes devem ser assistidos por profissionais médicos e de enfermagem qualificados e com experiência com esta doença, visando diminuir a letalidade e as seqüelas. Alguns cuidados são necessários com relação à internação (unidades especiais com pouca iluminação, diminuição de ruídos, temperaturas estáveis e mais baixas que a temperatura corporal e manipulação restrita apenas ao necessário), devido a possibilidade do desencadeamento das crises de contraturas. O isolamento é feito em virtude da necessidade de cuidados especiais e não pela infecção, pois a doença não é transmissível. T Proteção individual Não é necessária, já que não há transmissão de pessoa a pessoa. Confirmação diagnóstica Mediante dados clínicos e epidemiológicos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 701 Tétano Acidental Proteção da população O tétano acidental é uma doença para a qual há um meio eficaz de proteção. Portanto, frente ao conhecimento da ocorrência de caso(s), deve-se avaliar a situação das ações de prevenção do tétano na área e implementar medidas que as reforcem. Além da vacinação de rotina, de acordo com os calendários de vacinação da criança, do adolescente e do adulto e do idoso, destaca-se, em particular, a identificação e vacinação de grupos de risco, como trabalhadores da construção civil e da agricultura, catadores de lixo, trabalhadores de oficinas mecânicas, etc. Destaca-se, ainda, a importância da atualização dos profissionais de saúde quanto ao tratamento adequado de ferimentos e esquemas de prevenção da doença. Investigação Imediatamente após a notificação de um caso suspeito, iniciar a investigação epidemiológica para permitir que as medidas de controle possam ser adotadas em tempo oportuno. O instrumento de coleta de dados é a ficha de investigação epidemiológica do Sinan, que contém as variáveis de interesse a serem analisadas em uma investigação de rotina. Todos os seus campos devem ser criteriosamente preenchidos, mesmo quando a informação for negativa. É importantíssima a revisão do preenchimento, ou seja, verificar a completude e consistência das informações antes da digitação no Sinan. Outros itens e observações podem ser incluídos, conforme as necessidades e peculiaridades de cada situação. Observar o prazo máximo para o encerramento dos casos. Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente Preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica do Sinan relativos aos dados gerais, notificação individual e dados de residência. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmar a suspeita diagnóstica • Anotar na ficha de investigação os dados da história clínica. • Consultar a ficha de atendimento e/ou prontuário, entrevistar o médico assistente ou alguém da família ou acompanhante e realizar visita domiciliar e/ou no local de trabalho para completar as informações sobre a manifestação da doença e possíveis fatores de exposição no meio ambiente. • Acompanhar a evolução do caso, as medidas implementadas e encerrar a investigação epidemiológica no sistema de informação. Para identificar as áreas ou grupos de risco • Verificar a ocorrência de outros casos no município, levantar os possíveis fatores determinantes, identificar a população de risco e traçar estratégias para a implementação das ações de prevenção para o tétano. 702 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tétano Acidental Observação: casos de tétano em conseqüência de aborto podem às vezes ser mascarados quanto ao diagnóstico final. Análise da situação A qualidade da investigação é fundamental para uma análise adequada dos dados coletados, permitindo a caracterização do problema segundo pessoa, tempo e lugar e o levantamento de hipóteses e/ou explicações que vão subsidiar o planejamento das ações para solucionar ou minimizar os problemas detectados. Permite também melhor conhecimento acerca da magnitude do problema e adoção oportuna das medidas de prevenção e controle. Encerramento de casos Após a coleta e análise de todas as informações necessárias à investigação do caso, definir o diagnóstico final e atualizar, se necessário, os sistemas de informação (Sinan, SIHSUS e SIM). 6 Relatório final Após análise, os dados deverão ser sumarizados em um relatório com as principais conclusões, das quais destacam-se: • se o caso foi decorrente de falhas de vacinação ou devido a baixa cobertura vacinal na área ou em grupos de risco, ou ainda se houve conservação inadequada da vacina, o que implica a adoção de medidas de aprimoramento desses serviços; • se a ocorrência dos casos pode estar atribuída à falta de conhecimento quanto às formas de prevenção, desconhecimento da existência da vacina eficaz e gratuita nos serviços de saúde ou problemas de acesso a estes serviços; • importância do uso de equipamentos de proteção individual em atividades de risco para esta doença. Algumas estratégias recomendadas • Garantir a vacina em estoque suficiente para a demanda nas unidades de saúde. • Garantir o funcionamento das salas de vacina nos horários comerciais. • Sensibilizar a população em geral acerca da importância da vacina e de manter o esquema vacinal atualizado. • Reforçar a importância das parcerias, principalmente com outros órgãos, como Ministério do Trabalho, sociedades de infectologia, CRM, Coren, serviços de atenção básica, serviços de atuação à saúde do trabalhador, ONGs, saúde indígena, educação, etc. • Divulgar, na mídia, a importância e a necessidade da prevenção. • No âmbito da atenção à saúde, aplicar as medidas terapêuticas e profiláticas indicadas de acordo com a classificação do ferimento, assegurando as doses subseqüentes após a alta hospitalar, se necessário. • implementar todas as ações em parceria com os diversos atores envolvidos, atentando para as questões político-gerenciais pertinentes à situação. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS T 703 Tétano Acidental Roteiro de investigação do tétano acidental Caso suspeito Notificação Investigação Coletar dados clínicos e epidemiológicos Identificação preliminar da (s) área (s) e/ou grupos de risco Verificar a existência de outros casos através de busca ativa Analisar a cobertura vacinal contra o tétano em crianças, adolescentes e adultos Complementar a investigação epidemiológica Reforçar as atividades de vacinação, com ênfase nos grupos de maior risco para a doença Encerrar o (s) caso (s) e atualizar os sistemas de informação Meios disponíveis para prevenção Vacinação Atualmente, a vacinação contra o tétano é realizada concomitantemente à vacinação contra a difteria, coqueluche e contra a meningite pelo Haemophilus influenza tipo b ou associada somente ao componente antidiftérico, infantil ou do adulto (ver quadro abaixo). Os eventos adversos são raros, comumente apresentando-se sob a forma de dor local, hiperemia, edema e induração e febrícula com sensação de mal-estar de intensidade variável e passageira. Recomendações para a vacinação Recomenda-se o esquema vacinal completo contra o tétano a todas as pessoas ainda não vacinadas ou àquelas com esquema incompleto, independente da idade e sexo. Deve- 704 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tétano Acidental se considerar como dose válida apenas as que podem ser comprovadas por caderneta de vacinação. Como o bacilo encontra-se no meio ambiente, a exposição acidental ao mesmo através de um ferimento é universal. A manutenção de altas taxas de cobertura vacinal torna-se prioritária, tendo em vista a gravidade do quadro clínico, a elevada taxa de letalidade e as seqüelas decorrentes das complicações. A prevenção do tétano poderá ser iniciada com as vacinas abaixo indicadas: Esquemas e orientações para vacinação Vacina Tetravalente (DTP + Hib) Protege contra Eficácia Difteria, tétano, coqueluche e doença invasiva por Haemohilus influenzae tipo b Difteria: 80% Tétano: 99% Coqueluche: 75% a 80% Início da vacinação (idade) 2 meses de idade Dose/dosagem/via de administração/intervalo entre as doses Aos 15 meses (1o reforço) e entre 4-6 anos (2o reforço) 3 doses/0,5ml/IM/ 30-60 dias Difteria e tétano (adolescente e adulto) Difteria: 80% Tétano: 99% 6 Ambos devem ser feitos com a vacina DTP Sete anos de idade e MIF. dT Reforços Para pessoas que não tenham recebido o esquema básico completo e os dois reforços Três doses/0,5ml/IM/ 60 dias entre as doses, mínimo de 30 dias Uma dose a cada 10 anos, exceto em caso de gravidez e ferimento grave. Antecipar o reforço se a última dose foi há mais de cinco anos A vacina deve ser conservada entre +2°C e +8°C. O seu congelamento provoca a desnaturação protéica e a desagregação do adjuvante, com perda de potência e aumento dos eventos adversos. Recomendações para a soroterapia O soro antitetânico (SAT) é indicado para a prevenção e o tratamento do tétano. A sua indicação depende do tipo e das condições do ferimento, bem como das informações relativas ao uso do próprio SAT e do número de doses da vacina contra o tétano recebido anteriormente. O SAT é composto a partir do soro de eqüinos hiperimunizados com toxóide tetânico e apresenta-se sob forma líquida, em ampolas de 5 ml (5000 UI). A dose e o volume do SAT dependem do motivo que justificou sua indicação. A dose profilática é de 5000 UI (para crianças e adultos) e a dose terapêutica de 20 mil UI. A administração do SAT é por via intramuscular, podendo ser na região deltóide, na face externa superior do braço, no vasto lateral da coxa ou no quadrante superior do glúteo. Quando o volume a ser administrado for grande, a dose deve ser dividida entre os membros superiores e a região glútea. Ao administrar o SAT juntamente com a vacina contra o tétano, utilizar regiões musculares diferentes. A pessoa que fez uso do SAT deve ser alertada para procurar o serviço de saúde caso apresente febre, urticária, dores musculares e aumento de gânglios, dentre outros sintomas. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS T 705 Tétano Acidental A imunoglobulina humana hiperimune antitetânica (IGHAT) é indicada para o tratamento de casos de tétano, em substituição ao SAT, nas seguintes situações: hipersensibilidade ao soro heterólogo, história pregressa de alergia ou hipersensibilidade ao uso de outros soros heterólogos. A IGHAT é constituída por imunoglobulinas da classe IgG que neutralizam a toxina produzida pelo Clostridium tetani, obtida do plasma humano. Apresenta-se sob forma líquida ou liofilizada em frasco-ampola de 1ml ou 2ml contendo 250 UI e sua conservação deverá ser feita entre +2ºC e +8ºC, não podendo ser congelada. Sua administração é por via intramuscular, podendo ser aplicada na região deltóide, na face externa superior do braço. Em menores de dois anos, utilizar o vastolateral da coxa. A dose e volume dependem da justificativa utilizada para seu uso (profilático ou terapêutico). Conduta frente a ferimentos suspeitos Esquema de condutas profiláticas de acordo com o tipo de ferimento e situação vacinal História de vacinação prévia contra tétano Ferimentos com risco mínimo de tétano* Vacina Incerta ou menos de 3 doses Sim* SAT/IGHAT Não Outras condutas Limpeza e desinfecção, lavar com soro fisiológico e substâncias oxidantes ou antissépticas e debridar o foco de infecção 3 doses ou mais, sendo a última dose há menos de 5 anos Não Não - 3 ou mais doses, sendo a última dose há mais de 5 anos e menos de 10 anos Não Não - 3 ou mais doses, sendo a última dose há 10 ou mais anos Sim Não - Ferimentos com alto risco de tétano** Vacina Sim*** SAT/IGHAT sim Outras condutas Desinfecção, lavar com soro fisiológico e substâncias oxidantes ou antissépticas e remover corpos estranhos e tecidos desvitalizados. Debridar o ferimento e lavar com água oxigenada Não Sim (1 reforço) Sim (1 reforço) Não - Não**** - Não**** - *Ferimentos superficiais, limpos, sem corpos estranhos ou tecidos desvitalizados. **Ferimentos profundos ou superficiais sujos, com corpos estranhos ou tecidos desvitalizados; queimaduras; feridas puntiformes ou por armas brancas e de fogo; mordeduras; politraumatismos e fraturas expostas. ***Vacinar e aprazar as próximas doses, para complementar o esquema básico. Esta vacinação visa proteger contra o risco de tétano por outros ferimentos futuros. Se o profissional que presta o atendimento suspeita que os cuidados posteriores com o ferimento não serão adequados, deve considerar a indicação de imunização passiva com SAT ou IGHAT. Quando indicado o uso de vacina e SAT ou IGHAT, concomitantemente, devem ser aplicados em locais diferentes. ****Para paciente imunodeprimido, desnutrido grave ou idoso, além do reforço com a vacina está também indicada IGHAT ou SAT. 706 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tétano Acidental Ações de educação em saúde A educação em saúde é uma prática social que tem por objetivo promover a consciência sanitária dos cidadãos. Estimula a luta pela melhoria da qualidade de vida, conquista à saúde, responsabilidade comunitária, aquisição, apreensão, socialização de conhecimentos e opção por um estilo de vida saudável. Preconiza a utilização de métodos pedagógicos participativos (criatividade, problematização e criticidade) e dialógicos, respeitando as especificidades locais, o universo cultural da comunidade e suas formas de organização. As ações de educação em saúde devem envolver os empresários, gestores, gerentes, professores, etc., articulando-os em torno de um pacto com seus empregados, funcionários e alunos para manter o esquema vacinal em dia. Um importante grupo para a conscientização quanto à necessidade de vacinação são as gestantes, pela sua importância na prevenção do tétano neonatal. Os processos de educação continuada dos profissionais de saúde devem ser estimulados para que os mesmos se mantenham atualizados quanto aos esquemas de prevenção e tratamento. 6 Ações de comunicação Atentar para a adequação dos meios de divulgação e comunicação aos cenários socioculturais e de organização dos serviços em que são produzidos os casos de tétano acidental. Lembrar que a vacinação e conservação do cartão não é só para crianças. T Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 707 Tétano Neonatal TÉTANO NEONATAL CID 10: A33 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Doença infecciosa aguda, grave, não-contagiosa, que acomete o recém-nascido nos primeiros dias de vida, tendo como manifestação clínica inicial a dificuldade de sucção do seio, mamadeira ou chupetas. Sinonímia Tétano umbilical e “mal de sete dias”, como é popularmente conhecido. Agente etiológico Clostridium tetani, bacilo gram-positivo esporulado anaeróbico, morfologicamente semelhante a um alfinete de cabeça, com 4 a 10μ de comprimento. Produz esporos que lhe permitem sobreviver no meio ambiente. Reservatório O Clostridium tetani é comumente encontrado na natureza, sob a forma de esporo, nos seguintes meios: pele, trato intestinal dos animais (especialmente do cavalo e do homem, sem causar doença), fezes, terra, reino vegetal, águas putrefatas, instrumentos perfurocortantes, poeira das ruas, etc. Modo de transmissão Não há transmissão de pessoa a pessoa. A infecção ocorre por contaminação, quando são utilizados instrumentos cortantes contaminados para secção do cordão umbilical, ou através do uso de substâncias contaminadas na ferida umbilical, como teia de aranha, pó de café, esterco, etc. Período de incubação Em média, sete dias, podendo variar de 2 a 28 dias. Período de transmissibilidade Como não é doença contagiosa, não existe transmissão de pessoa a pessoa. Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade é universal, afetando recém-nascidos de ambos os sexos e todas as raças. A doença não confere imunidade, a qual só é conferida pela vacinação adequada da mãe, com três doses (mínimo de duas). Os filhos de mães adequadamente vacinadas nos 708 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tétano Neonatal últimos 5 anos apresentam imunidade passiva e transitória até os 4 meses de vida extrauterina. A imunidade ativa obtida através da vacina dura em torno de 10 anos. No entanto, recomenda-se um reforço em caso de nova gravidez, se esta ocorrer há mais de 5 anos da última dose; a imunidade passiva através do soro antitetânico (SAT) e da imunoglobulina humana antitetânica (IGHAT) dura em média uma semana e 14 dias, respectivamente. Aspectos clínicos Manifestações clínicas Recém-nascido normal que passa a apresentar: • irritação; • choro constante, sem motivo; • recusa à amamentação; • contraturas paroxísticas, geralmente confundidas com cólica intestinal. 6 Clinicamente, o recém-nascido apresenta-se com choro constante, irritabilidade, dificuldade em abrir a boca decorrente de trismo (contratura dolorosa da musculatura da mandíbula), seguida de rigidez de nuca, tronco e abdome, sudorese e taquicardia. Evolui com hipertonia generalizada, hiperextensão dos membros inferiores e hiperflexão dos membros superiores, com as mãos em flexão, chamada de “atitude de boxeador”. Crises de contraturas e rigidez da musculatura dorsal (opistótono) e intercostal, causando problemas respiratórios. A contração da musculatura da mímica facial leva ao cerramento dos olhos, fronte pregueada e contratura da musculatura dos lábios, como se o recém-nascido fosse pronunciar a letra U. Quando há presença de febre, ela é baixa, exceto se houver infecção secundária. Os espasmos são desencadeados ao menor estímulo (toque, luminosidade, ruídos) ou surgem espontaneamente. Com a piora do quadro clínico, o recém-nascido deixa de chorar, respira com dificuldade e passam a ser constantes as crises de apnéia, que podem levar a óbito. Período de infecção – em média, de dois a cinco dias; o coto umbilical pode apresentar características de infecção ou encontrar-se normal. Período toxêmico – ocorre taquicardia com pulso filiforme, taquipnéia e presença de febre nos casos com infecção secundária. T Diagnóstico diferencial Septicemia – nas sepses do recém-nascido pode haver hipertonia muscular, porém o estado geral da criança é grave, com hipertermia ou hipotermia, alterações do sensório e evidências do foco séptico (diarréia, onfalite). O trismo não é freqüente, nem ocorrem os paroxismos; Encefalopatias – podem cursar com hipertonia e o quadro clínico geralmente é evidente logo após o nascimento, havendo alterações do sensório e crises convulsivas. O trismo não é manifestação freqüente; Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 709 Tétano Neonatal Distúrbios metabólicos – como a hipoglicemia, hipocalcemia e alcalose; Outros diagnósticos diferenciais – principalmente com a epilepsia, lesão intracraniana secundária ao parto, peritonites, onfalites e meningites bacterianas. Diagnóstico laboratorial A confirmação dos casos é eminentemente clínica e/ou a partir de vínculo clínico-epidemiológico. Os exames laboratoriais são realizados apenas para controle das complicações, orientando o tratamento do recém-nascido. O hemograma apresenta-se normal, podendo evidenciar discreta leucocitose ou linfopenia. As transaminases e a uréia sangüíneas podem elevar-se nas formas graves. A dosagem de gases e eletrólitos é importante na ocorrência de insuficiência respiratória. As radiografias de tórax e coluna vertebral torácica devem ser realizadas para o diagnóstico de infecções pneumônicas e possíveis fraturas de vértebras. Culturas de secreções, urina e sangue são indicadas nos casos de infecção secundária. Tratamento O paciente deve ser internado em unidade de terapia intensiva ou enfermaria apropriada, o que reduz as complicações e a letalidade, devendo ser acompanhado por equipe médica e de enfermagem experiente no atendimento a esse tipo de enfermidade. A unidade ou enfermaria deve dispor de isolamento acústico, com redução da luminosidade e temperatura ambiente. A atenção da enfermagem deve ser contínua, vigilante quanto às emergências respiratórias decorrentes dos espasmos, realizando pronto-atendimento com assistência ventilatória nos casos de dispnéia ou apnéia. Os princípios básicos do tratamento são: Sedação do paciente – usar sedativos e miorrelaxantes de ação central ou periférica: • diazepan – 0,3 a 2mg/kg/dose, repetidas até o controle das contraturas (monitorar a função pulmonar, devido ao risco de depressão respiratória); • clorpromazina – 0,5mg/kg/dose, de 6/6 horas, alternado com o diazepan; • fenobarbital – 10mg/kg/dia, de 12/12 horas, via intramuscular; • mefenesina – miorrelaxante metabolizado em 5 minutos, podendo ser feito em infusão contínua. Dose máxima: 1 ampola com 50ml (10ml/kg). Curare – utilizado como último recurso para os casos muito graves que não responderam ao tratamento anterior (reduz a letalidade de 100% para 30%). O paciente deve estar sedado e em ventilação mecânica, sob vigilância rigorosa. O nível sérico do curare dura 1 hora. Efeitos colaterais: taquicardia e liberação de histamina. Dose: 0,1mg/kg/dose, podendo fazer até 1/1 hora, se necessário. Apresentação: 1 ampola contém 2ml com 2mg/ml. Diluir 1 ampola em 8ml de água destilada (1ml da diluição contém 0,4mg). Hidrato de cloral a 10% – 50mg/kg/dose em 5ml de soro fisiológico, com seringa adaptada em sonda retal, injetando pequenas e repetidas frações, de 4 em 4 horas, até a cessação dos espasmos (1ml de hidrato de cloral a 10% = 100mg). 710 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tétano Neonatal Observação: só usar o hidrato de cloral quando não houver cessação dos espasmos com a administração de diazepan ou com outras medidas. Cuidados com o coto umbilical – realizar limpeza com água oxigenada a 10% ou com permanganato de potássio a 1/5.000 (1 comprimido diluído em meio litro de água). A indicação de debridamento no coto umbilical deve ser cuidadosamente avaliada pela equipe médica. Hidratação intravenosa adequada Antibioticoterapia – o uso de substâncias antimicrobianas visa o combate ao Clostridium tetani presente no foco de infecção. Emprega-se a penicilina G cristalina ou o metronidazol por 7 a 10 dias. A penicilina G cristalina é utilizada por via intravenosa na dose de 50 mil a 100 mil UI/kg/dia, fracionada de 6/6 horas. O metronidazol pode ser utilizado em dose única de 30mg/kg/dia ou fracionada de 8/8 horas, por via intravenosa. Alternativamente, poderá ser utilizada a cefalexina por sonda nasogástrica, na dose de 25 a 30mg/kg/dia, fracionada de 6/6 horas. Outros antimicrobianos poderão ser necessários nos casos de infecção secundária (onfalites, pneumonia, infecção urinária e sepse). Neutralização da toxina, realizada através do: • soro antitetânico heterólogo (SAT) – realizar previamente teste intradérmico para verificar a hipersensibilidade. Caso seja negativo, administrar dose de 10 mil a 20 mil Unidades Internacionais (UI), por via endovenosa diluída em soro glicosado a 5%, em gotejamento lento. Sua vida média é inferior a duas semanas; • imunoglobulina humana antitetânica (IGHAT ou TIG) – disponível no Brasil apenas para uso intramuscular, poderá ser utilizada em substituição ao SAT, nas situações em que houver risco de apresentar reações de hipersensibilidade. A dose é de 1 mil UI a 3 mil UI, distribuída em duas massas musculares. A vida média é em torno de duas semanas. 6 T Como a administração da TIG pela via intratecal ainda é controversa, seu uso no Brasil está limitado a protocolos de pesquisas. Tratamento sintomático • Utilizar analgésicos, se necessário. Evitar a obstipação intestinal com o uso de laxativo suave e administrar antiespasmódico para prevenir cólicas. • Evitar sondagem vesical e manter coletor urinário para medir a diurese. • Manter o equilíbrio hidreletrolítico. • Manter hidratação venosa contínua. • Manter o aporte de glicose e aminoácidos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 711 Tétano Neonatal Aspectos epidemiológicos No final dos anos 90 registraram-se 289.250 casos de tétano neonatal em todo o mundo, dos quais 215 mil foram a óbito (taxa de letalidade de 74,3%), assim distribuídos: 124 mil na África; 91 mil no sudeste da Ásia; 55 mil no Oriente Médio; 18 mil no oeste do Pacífico; 1 mil nas Américas e 250 na Europa. Atualmente, esta doença continua existindo como problema de saúde pública apenas nos países de menor desenvolvimento econômico e social, principalmente no continente africano e sudeste asiático. Com a implementação de uma política de eliminação do tétano neonatal como problema de saúde pública no mundo, sua incidência tem sido reduzida sensivelmente, principalmente nas Américas. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), esta meta equivale a alcançar uma taxa de incidência máxima de 1 caso/1 mil nascidos vivos (NV), por distrito ou município, internamente a cada país. No Brasil, em 2002 ocorreram 33 casos de tétano neonatal, sendo nove na região Norte (27,3%), 18 na região Nordeste (54,5%), 3 na região Sudeste (9,1%), 1 na região Sul (3,0%) e 2 casos na região Centro-Oeste (6,1%). Em 2003, ocorreu uma redução de 54,6% no número de casos em relação ao ano anterior, chamando-se a atenção para o surgimento de casos em municípios até então considerados fora das áreas geográficas definidas como prioritárias para a implementação das ações de vigilância e controle. Para o país como um todo, os níveis de incidência estão abaixo do preconizado pela OMS, porém há municípios que ainda estão aquém desta meta. Casos confirmados de tétano neonatal. Brasil, 1982-2003 800 Número de casos 700 600 500 400 300 200 100 0 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 Ano Fonte: Cover/CGDT/Devep/SVS/MS 712 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 Tétano Neonatal Fatores de risco para o tétano neonatal • Baixas coberturas vacinais com a vacina dT em mulheres em idade fértil. • Partos domiciliares assistidos por parteiras tradicionais sem capacitação e sem instrumentos de trabalho adequados. • Não realização do pré-natal ou realização de pré-natal sem qualidade. • Alta hospitalar precoce e sem conhecimento adequado quanto aos cuidados com o coto umbilical. • Baixo nível de escolaridade das mães. • Baixo nível socioeconômico. • Dificuldades de acesso geográfico a serviços de saúde. • Partos ocorridos em condições sépticas, em mulheres sem esquema vacinal atualizado contra o tétano. 6 Vigilância epidemiológica Objetivos • Conhecer todos os casos suspeitos de tétano neonatal. • Investigar, com qualidade, 100% dos casos suspeitos. • Mapear as áreas de risco. • Analisar os dados e adotar as medidas de controle pertinentes. • Implementar ações para atingir a meta de eliminação da doença. • Avaliar a efetividade das medidas de prevenção e controle. • Produzir e disseminar informações epidemiológicas. Definição de caso Suspeito • Todo recém-nascido que nasceu bem e sugou normalmente nas primeiras 24 ou 48 horas e passe a apresentar, entre o segundo e o 28º dia de vida extra-uterina, dificuldade de mamar, independente do estado vacinal da mãe, do local e das condições do parto. • Todo recém-nascido que nasceu bem e sugou normalmente mas foi a óbito no período de 2 a 28 dias de vida extra-uterina, cujo diagnóstico foi constatado como indefinido ou caracterizado como quadro de tétano por seus familiares. T Confirmado • Todo caso suspeito que apresentou um ou mais dos seguintes sinais e sintomas: trismo, crises de contraturas musculares, contração permanente dos músculos da mímica facial e lábios contraídos (como se fosse pronunciar a letra U), olhos cerrados, pele da região frontal pregueada, hiperflexão dos membros superiores junto ao tórax Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 713 Tétano Neonatal (mão fechada em posição de boxeador) e membros inferiores em hiperextensão, com ou sem inflamação do coto umbilical. • Todo caso de óbito neonatal cuja investigação evidencia características clínicas e epidemiológicas da doença. Descartado Todo caso suspeito de tétano neonatal em que a investigação evidencia características clínicas e epidemiológicas de outra doença. Notificação A ocorrência de casos suspeitos de tétano neonatal requer notificação imediata às autoridades sanitárias superiores, por se tratar de um evento para o qual se dispõe de medidas de prevenção altamente eficazes. Esta notificação pode ser feita através de telefone, fax ou e-mail, de acordo com as normas definidas pelos níveis federal e estadual do SUS. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente Hospitalização imediata do recém-nato. Qualidade da assistência Praticamente, todos os casos necessitam de internação em unidades de terapia intensiva, de maior complexidade ou unidades especiais com atendimento por profissionais médicos e de enfermagem qualificados. Alguns cuidados são necessários com relação à internação (unidades com pouca iluminação, diminuição de ruídos, temperaturas estáveis e mais baixas que a temperatura corporal e manipulação restrita apenas ao necessário), devido a possibilidade do desencadeamento das crises de contraturas. Proteção individual Não é necessária, já que a infecção não se transmite de pessoa a pessoa. Confirmação diagnóstica Mediante dados clínicos e epidemiológicos. Proteção da população Apesar de não ser doença transmissível, logo que se tenha conhecimento da suspeita ou confirmação de caso(s) de tétano neonatal deve-se intensificar as ações de vigilância, prevenção e controle da doença, com o objetivo de detectar casos ainda não notificados e prevenir a ocorrência de novos. Destaca-se em particular a avaliação da cobertura vacinal com a vacina dT das mulheres em idade fértil na área de ocorrência do(s) caso(s) e a avaliação da assistência ao pré-natal, parto e puerpério. Ou seja, a suspeita ou confirmação de 714 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tétano Neonatal casos deve ser tomada, no nível local, como um evento sentinela, implicando na adoção imediata de medidas para verificar a existência e a correção de possíveis falhas nos serviços de saúde. É importante garantir à população um pré-natal e um parto seguros, bem como uma assistência perinatal minimamente qualificada, onde se inclui o tratamento adequado do coto umbilical e o acompanhamento dos primeiros 28 dias de vida extra-uterina. Investigação Deve ser feita imediatamente após a notificação de um caso suspeito. Lembrar que a investigação não deve restringir-se ao âmbito hospitalar, buscando-se informações complementares no domicílio, com familiares, especialmente a mãe do recém-nascido. Roteiro da investigação epidemiológica 6 Identificação do paciente Preencher todos os campos da ficha de investigação epidemiológica do Sinan relativos aos dados gerais, notificação individual e dados de residência. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Para confirmar a suspeita diagnóstica Anotar na ficha de investigação os dados da história e as manifestações clínicas • Em geral, deve-se consultar o prontuário e entrevistar o médico assistente para completar as informações clínicas sobre o paciente. Estas informações são importantes para análise e para definir se o quadro apresentado é compatível com a doença. • Se necessário, fazer uma cópia da anamnese, exame físico e evolução do doente, com vistas ao enriquecimento das análises e recomendações a serem feitas para a melhoria dos serviços de saúde. • Verificar a história vacinal da mãe contra o tétano e registrar a(s) data(s) da vacinação, caso haja comprovante. Lembrar de pesquisar a vacinação na infância, principalmente no caso de mulheres mais jovens. • Acompanhar a evolução dos casos e as medidas implementadas para a resolução dos problemas identificados durante a investigação epidemiológica. T Roteiro de notificação e investigação do tétano neonatal Para identificação das áreas de risco Considerar que existem duas situações a ser avaliadas • O local onde ocorreu a contaminação do coto umbilical, seja devido a parto séptico e/ou ao tratamento inadequado do coto umbilical; Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 715 Tétano Neonatal • O local onde a gestante passou a maior parte da gravidez, ou seja, onde deveria lhe ter sido provido um pré-natal de qualidade, particularmente no que se refere às ações de prevenção primária e secundária de doenças transmissíveis e/ou infecciosas, como no caso do tétano neonatal. Obviamente, essas áreas podem se superpor. Portanto, deve-se verificar a existência de fatores ou situações de risco que possam estar associados à ocorrência de casos, tais como: baixas coberturas vacinais em mulheres em idade fértil, ocorrência de partos domiciliares, cobertura e qualidade do pré-natal, dificuldades de acesso aos serviços de saúde, capacitação técnica específica dos profissionais de saúde, etc. Investigar minuciosamente • História de migração da família, de forma a identificar os possíveis locais em que houve falhas na oferta dos serviços de saúde. • Relatos ou rumores de óbitos de recém-nascidos até 28 dias de vida, cuja suspeita foi “mal de sete dias” ou causa ignorada. Existência de outros casos não notificados, através da realização de busca ativa em localidades onde existem casos e fatores ou situações de risco para a ocorrência da doença. Várias estratégias podem ser utilizadas com este objetivo, dependendo do tamanho da localidade: casa a casa, em unidades de saúde, cartórios (verificar as declarações de óbito emitidas), registros de cemitérios, entrevistas com líderes comunitários, benzedeiras, parteiras, agentes comunitários de saúde, serviços de verificação de óbito, serviço social da prefeitura, entre outras. Confrontar as informações levantadas sobre a morbimortalidade por tétano neonatal com os dados disponíveis no SIM e no SIH-SUS, tomando como base as doenças que figuram como diagnóstico diferencial para a doença. • A situação da organização dos serviços e do processo de trabalho: infra-estrutura mínima para a atenção materno-infantil, capacitação dos recursos humanos existentes, funcionamento das salas de vacina e da rede de frio, oportunidades perdidas de vacinação, atividades extramuros, nível de integração de trabalho intra-setorial, etc. Encerramento da investigação de casos Após a coleta e análise de todas as informações necessárias ao esclarecimento do caso, definir o diagnóstico final e atualizar, se necessário, os sistemas de informação (Sinan, SIM e SIH-SUS). Análise da situação A qualidade da investigação é fundamental para uma análise adequada dos dados coletados, permitindo a caracterização do problema segundo pessoa, tempo e lugar e o levantamento de hipóteses e/ou explicações que vão subsidiar o planejamento das ações para solucionar ou minimizar os problemas detectados. 716 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tétano Neonatal Roteiro de investigação do tétano neonatal Caso suspeito Notificação Investigação Coletar dados clínicos e epidemiológicos Identificação preliminar da (s) área (s) de risco: local de ocorrência do caso de tétano neonatal e local de realização do pré-natal Verificar a existência de outros casos através de busca ativa Complementar a investigação epidemiológica Analisar a cobertura vacinal de mulheres em idade fértil Reforçar as atividades de vacinação contra o tétano em mulheres em idade fértil Encerrar o (s) caso (s) e atualizar os sistemas de informação 6 Analisar a situação da oferta e da organização dos serviços de saúde Identificar os principais problemas da atenção à saúde da mulher e da criança, da imunização e da vigilância epidemiológica Relatório com resumo dos problemas identificados e das proposições acordadas, com os respectivos prazos e responsáveis Relatório final Após análise dos dados da investigação, estes deverão ser sumarizados em um relatório com as principais conclusões, encaminhamento e recomendações, bem como os respectivos prazos e responsáveis. T Conclusões • A ocorrência do caso foi decorrente da falta de conhecimento da gestante sobre a importância do pré-natal ou por problema de acesso ao serviço de saúde? • Havia desconhecimento, por parte da mulher, da existência de uma vacina eficaz e gratuita nos serviços de saúde? • Havia desconhecimento da necessidade de prevenção, através de um esquema de vacinação adequado, e da importância do parto asséptico ou limpo? • Havia problemas de gerenciamento das unidades de saúde que resultaram em desa- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 717 Tétano Neonatal bastecimento de vacinas ou em seu armazenamento de forma inadequada ou outra ordem de problemas que prejudicou o funcionamento normal da unidade de saúde? • Houve oportunidades perdidas de vacinação: quando a mulher compareceu aos serviços de saúde, por qualquer motivo, seja para consulta, quando conduziu seu filho para receber a vacina, quando foi como acompanhante ou outra causa? Encaminhamentos Minimamente, pode-se elencar os seguintes pontos que merecem maior atenção nesta discussão, ressalvando-se, obviamente, que variarão de acordo com cada situação concreta: • capacitar e/ou atualizar os profissionais de saúde quanto à orientação e acompanhamento das mulheres em idade fértil; • implementar processos de acompanhamento e avaliação dos serviços de saúde; • manter as parteiras atuantes capacitadas e integrá-las aos serviços de saúde para reposição ou substituição de materiais usados por esterilizados. Mantê-las como parceiras e aliadas, em decorrência do poder de liderança e confiabilidade que usufruem entre as mulheres. É necessário supervisionar o serviço dessas parteiras, verificando, na prática, a aplicação dos conhecimentos adquiridos; • fazer parcerias com todos os que trabalham com a saúde da mulher e da criança, Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia, infectologia; atenção básica; órgãos internacionais; ONGs; saúde indígena; educação em saúde; todos os profissionais da área da saúde, conselho tutelar e promotoria pública, quando necessário, lideranças comunitárias e comunidade em geral, etc.; • divulgação, na mídia, sobre a importância e necessidade da prevenção; • organização do trabalho em parceria com as unidades assistenciais; • sensibilização dos gestores e comunidade em geral. Instrumentos disponíveis para prevenção Pré-natal A realização do pré-natal é extremamente importante não só para acompanhar o desenvolvimento do feto como também para prevenir muitas doenças factíveis de serem evitadas, como o tétano neonatal. Destaca-se aqui, além dos processos de estabelecimento ou reforço dos vínculos da usuária com a unidade de saúde, a importância da atualização do esquema vacinal, do parto asséptico, da amamentação, do planejamento familiar e dos cuidados de higiene do recém-nascido, em especial do coto umbilical. Vacinação A principal forma de prevenção do tétano neonatal é a vacinação de todas as mulheres em idade fértil (entre 12 e 49 anos) com o esquema completo da vacina dupla tipo adulto (dT). Mulheres grávidas que ainda não iniciaram este esquema devem fazê-lo o mais pre- 718 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tétano Neonatal cocemente possível. Caso o façam tardiamente, a 2ª dose da vacina dT deverá ser administrada até 20 dias antes da data provável do parto, para que haja tempo suficiente para a formação de anticorpos que possibilitem a imunização passiva do feto. Nesta situação, a 3ª dose deverá ser agendada após o parto (ver Quadro 1). O reforço é preconizado a cada 10 anos, exceto em casos de lesões graves (ver o capítulo Tétano acidental) e quando há nova gravidez num período superior a cinco anos da exposição à última dose de reforço, para possibilitar a reativação da produção de anticorpos e potencialização da passagem de anticorpos protetores ao recém-nascido. A vacina é composta de associações de toxóides diftérico e tetânico, tendo o hidróxido ou fosfato de alumínio como adjuvante e o timerosal como preservativo, sendo apresentada sob forma líquida e em frasco multidoses. Quanto à dose e volume, aplica-se 0,5ml por via intramuscular profunda. Atualmente, a vacina utilizada no Brasil é a dupla adulto – dT (contra a difteria e o tétano). Esta vacina é indicada a partir dos sete anos de idade, para pessoas que não tenham recebido as vacinas tetravalente, DPTa e DT ou que tenham esquema incompleto ou por ocasião dos reforços do esquema básico. 6 Quadro 1. Esquema de vacinação contra o tétano neonatal para as mulheres em idade fértil História de vacinação contra o tétano Mulheres em idade fértil Gestante Não-gestante Negativa (nenhuma dose comprovada) 3 doses, com intervalo entre 30-60 dias. Se iniciar o esquema tardiamente, garantir pelo menos 2 doses (programar a 2a dose para no máximo 20 dias antes do parto e completar o esquema no puerpério) Esquema vacinal com 3 doses, intervalo de 30-60 dias + reforços Menos de 3 doses registradas Completar o esquema Completar o esquema 3 doses ou mais + 1 reforço há menos de 5 anos da última dose Não é necessário vacinar Não é necessário vacinar 3 doses ou mais + 1 reforço entre 5 a 10 anos da última dose 1 dose de reforço Não é necessário vacinar 3 doses ou mais + 1 reforço há mais de 10 anos da última dose 1 dose de reforço 1 dose de reforço T Observação: ao indicar a vacinação, considerar as doses administradas anteriormente da tríplice bacteriana (DTP) ou do toxóide tetânico (TT). A vacina é conservada entre +2°C e +8°C, não podendo ser congelada pois isto poderá provocar a desnaturação protéica, desagregação do adjuvante e perda de potência. Os eventos adversos comumente observados se restringem ao local da aplicação sob a forma de dor, hiperemia, edema, induração e febre alta. Em nível sistêmico, pode ocorrer reação anafilática, neuropatia periférica e síndrome de Guillan-Barré. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 719 Tétano Neonatal O monitoramento rápido da cobertura vacinal é uma estratégia que objetiva subsidiar as ações desenvolvidas na população-alvo. Através dele pode-se avaliar se as coberturas vacinais administrativas da área onde está sendo aplicada são reais, visando subsidiar a tomada de decisão sobre a implementação das atividades de imunização. Ações de educação em saúde A educação em saúde é uma prática social que objetiva promover o aumento da consciência sanitária da população e dos profissionais de saúde. Estimula a luta pela melhoria da qualidade de vida, conquista à saúde, responsabilidade comunitária, aquisição, apreensão, socialização de conhecimentos e opção por um estilo de vida saudável. Preconiza a utilização de métodos pedagógicos participativos (criatividade, problematização e criticidade) e dialógicos, respeitando as especificidades locais, o universo cultural da comunidade e suas formas de organização. Processos de educação continuada, atualização e/ou aperfeiçoamento devem ser estimulados no sentido de melhorar a prática das ações dos profissionais das áreas de saúde e educação. Ações de comunicação A informação sobre a doença e suas formas de prevenção e controle é um dos aspectos importantes das ações de vigilância epidemiológica. Deve-se atentar para a adequação dos meios de divulgação e comunicação aos cenários socioculturais e de organização dos serviços em que são produzidos os casos de tétano neonatal. Nas ações de educação e informação pode-se utilizar os vários meios de comunicação de massa, as visitas domiciliares e palestras (nas escolas, nos locais de trabalho, nas igrejas, etc.) sobre a doença e suas formas de prevenção e controle. É importante que as parteiras sejam consideradas como aliadas nesse processo. Conduta frente a ocorrência de um caso de tétano neonatal • Atualizar o esquema vacinal da mãe. • Informar aos profissionais de saúde e líderes comunitários a ocorrência do caso e envolvê-los na vigilância e prevenção permanente da doença. • Analisar a cobertura vacinal e, se for baixa, promover vacinação discriminada em mulheres em idade fértil, visando a atualização do esquema vacinal. • Cadastrar e treinar as parteiras tradicionais. • Fazer busca ativa de outros casos, incluindo a investigação de todos os óbitos ocorridos em recém-nascidos menores de 28 dias de vida sem causa básica definida. • Informar e discutir os resultados da investigação com as autoridades sanitárias dos locais de ocorrência do caso (onde se deu a contaminação do coto umbilical) e do local de residência da mãe (onde se deu a falha da prevenção), com o objetivo de tomar as medidas cabíveis visando evitar a ocorrência de novos casos. 720 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tracoma TRACOMA CID 10: A71 Características clínicas e epidemiológicas Descrição É uma afecção inflamatória ocular, uma ceratoconjuntivite crônica recidivante que, em decorrência de infecções repetidas, produz cicatrizes na conjuntiva palpebral superior, podendo levar à formação de entrópio (pálpebra com a margem virada para dentro do olho) e triquíase (cílios em posição defeituosa nas bordas da pálpebra, tocando o globo ocular). O atrito poderá ocasionar alterações da córnea, provocando graus variados de opacificação, que podem evoluir para a redução da acuidade visual, até a cegueira. A Organização Mundial da Saúde estima, mundialmente, a existência de 150 milhões de pessoas com tracoma, das quais cerca de 6 milhões estão cegas. 6 Agente etiológico A Chlamydia trachomatis, bactéria gram-negativa, dos sorotipos A, B, Ba e C. Reservatório O homem, com infecção ativa na conjuntiva ou outras mucosas. Crianças com até 10 anos de idade, com infecção ativa, são o principal reservatório do agente etiológico nas populações onde o tracoma é endêmico. Vetores Alguns insetos, como a mosca doméstica (Musca domestica) e/ou a lambe-olhos (Hippelates sp.), podem atuar como vetores mecânicos. Modo de transmissão T A principal forma de transmissão é a direta, de pessoa a pessoa, ou indireta, através de objetos contaminados (toalhas, lenços, fronhas). As moscas podem contribuir para a disseminação da doença, por transmissão mecânica. A transmissão só é possível na presença de lesões ativas. Período de incubação De cinco a doze dias, após contato direto ou indireto. Período de transmissibilidade A transmissão ocorre enquanto houver lesões ativas nas conjuntivas, o que pode durar anos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 721 Tracoma Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade é universal, sendo as crianças as mais susceptíveis, inclusive às reinfecções. Embora a clamídia seja de baixa infectividade, sua distribuição no mundo é ampla. Não se observa imunidade natural ou adquirida à infecção pela Chlamydia trachomatis. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas O tracoma inicia-se sob a forma de uma conjuntivite folicular, com hipertrofia papilar e infiltrado inflamatório difuso que se estende por toda a conjuntiva, especialmente na tarsal superior. Nos casos mais brandos, os folículos podem regredir espontaneamente. Nos casos mais severos, eles crescem, evoluindo para necrose, com formação de pequenos pontos cicatriciais na conjuntiva. Após repetidas reinfecções, forma-se um número cada vez maior de pontos cicatriciais, levando à formação de cicatrizes mais extensas. Essas cicatrizes podem tracionar, principalmente, a pálpebra superior, levando à sua distorção, o entrópio, fazendo com que os cílios invertidos toquem no globo ocular. Esta alteração pode provocar ulcerações corneanas, com conseqüente opacificação, que pode levar a graus variados de diminuição da acuidade visual e cegueira. A sintomatologia associada ao tracoma inflamatório inclui lacrimejamento, sensação de corpo estranho, fotofobia discreta e prurido. Uma grande proporção de casos de tracoma, principalmente entre as crianças mais jovens, é assintomática. Os doentes que apresentam entrópio, triquíase e aqueles com ulcerações corneanas, referem dor constante e intensa fotofobia. Infecções bacterianas secundárias podem estar associadas ao quadro, contribuindo para a disseminação da doença. Diagnóstico diferencial O diagnóstico diferencial do tracoma deve ser realizado com as outras conjuntivites foliculares (como foliculoses, conjuntivite folicular tóxica), e conjuntivites foliculares agudas e crônicas de qualquer etiologia (ex.: herpes simples, adenovírus, molusco contagioso, conjuntivite de inclusão do adulto). Diagnóstico laboratorial O diagnóstico do tracoma é essencialmente clínico e, geralmente, realizado por meio de exame ocular externo, utilizando lupa binocular de 2,5 vezes de aumento. O diagnóstico laboratorial do tracoma deve ser utilizado para a constatação da circulação do agente etiológico na comunidade e não para a confirmação de cada caso, individualmente. A cultura é uma técnica laboratorial com alta sensibilidade e especificidade para a Chlamydia trachomatis. A clamídia é um microrganismo de vida obrigatoriamente intracelular, portanto só cresce em cultura de células. Por tratar-se de procedimento complexo e caro, não está disponível para uso na rotina das ações de vigilância epidemiológica do tracoma. 722 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tracoma A partir da segunda metade da década de 80 vem sendo utilizada uma outra técnica para o diagnóstico laboratorial das infecções por Chlamydia trachomatis: a imunofluorescência direta, com anticorpos monoclonais. Consiste na observação, ao microscópio, de campo escuro, de lâminas contendo raspado de células da conjuntiva tarsal superior, coradas com anticorpos monoclonais antiChlamydia trachomatis fluorescentes. Esta técnica é mais simples e está disponível nos laboratórios da rede pública. Apesar de sua alta especificidade, sua sensibilidade é baixa para o tracoma, sendo mais adequada para o estabelecimento de focos endêmicos. Ultimamente, as técnicas de amplificação do ácido nucléico – reação da polimerase em cadeia (PCR) – apresentam maior sensibilidade para a detecção da clamídia, mas também não se encontram disponíveis para uso na rotina das ações de vigilância epidemiológica do tracoma. Tratamento 6 O objetivo do tratamento é a cura da infecção e a conseqüente interrupção da cadeia de transmissão da doença. As condutas a seguir relacionadas são recomendadas pela Organização Mundial da Saúde e utilizadas no Brasil. Tratamento tópico • Tetraciclina a 1% – pomada oftálmica usada duas vezes ao dia, durante seis semanas; • Sulfa – colírio usado quatro vezes ao dia, durante seis semanas, na ausência de tetraciclina ou por hipersensibilidade à mesma. Tratamento sistêmico Tratamento seletivo, com antibiótico sistêmico via oral, indicado para pacientes com tracoma intenso (TI) ou casos de tracoma folicular (TF) e/ou associação das duas formas (TF/TI) que não responda bem ao medicamento tópico. Deve ser usado com critério e acompanhamento médico, devido às possíveis reações adversas. • Azitromicina – 20mg/kg de peso, para menores de 14 anos de idade, e 1g para adultos, em dose única oral. Este medicamento vem sendo testado com bons resultados em termos de efetividade para o tratamento e sua utilização vem sendo ampliada para o controle desta endemia no mundo; • Eritromicina – 250mg quatro vezes ao dia, durante três semanas (50mg/kg de peso ao dia); • Tetraciclina – 250mg quatro vezes ao dia, durante três semanas (somente para maiores de 10 anos); • Doxaciclina – 100mg/dia duas vezes ao dia, durante três semanas (somente para maiores de 10 anos); • Sulfa – dois tabletes ao dia, durante três semanas. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS T 723 Tracoma Todos os casos de entrópio palpebral e triquíase tracomatosa (TT) devem ser encaminhados para avaliação e cirurgia corretiva das pálpebras. Todos os casos de opacidade corneana (CO) devem ser encaminhados a um serviço de referência oftalmológica, que medirá a acuidade visual. Em áreas onde a proporção de crianças com tracoma folicular (TF) seja maior ou igual a 20% e/ou a proporção de tracoma intenso (TI) seja maior ou igual a 5%, recomenda-se o tratamento em massa de toda a população, utilizando-se a tetraciclina 1% tópica. Além do tratamento medicamentoso, são fundamentais as medidas de promoção da higiene pessoal e familiar, tais como a limpeza do rosto, o destino adequado do lixo e a disponibilidade de água e saneamento. Estratégia de tratamento indicada segundo a proporção de crianças (de 1 a 10 anos) com tracoma inflamatório na comunidade a ser trabalhada Proporção de crianças com tracoma Tratamento tópico com tetraciclina >20% de tracoma folicular (TF) ou >5% de tracoma intenso (TI) Em massa 5% a 20% de tracoma folicular (TF) Individual, familiar ou em massa* <5% de tracoma folicular (TF) Individual *Se a proporção de crianças com tracoma inflamatório (TF e/ou TI) estiver mais próxima dos 5%, optar pelo tratamento individual. Quando esta proporção aproximar-se dos 20%, optar pelo tratamento em massa. Controle do tratamento Todos os casos de tracoma inflamatório (TF ou TI) devem ser examinados depois de 3 meses do início do tratamento e revistos a cada três meses, para o controle da cura, por um período total de 9 meses. Critérios de alta • A alta clínica será dada após 3 meses do início do tratamento, desde que não existam mais sinais de tracoma inflamatório ativo (TF ou TI), ou seja, folículos, edema, hiperemia da conjuntiva, mesmo havendo cicatrizes (TS). • A alta por cura sem cicatrizes será dada após o terceiro retorno, aproximadamente nove meses após o início do tratamento, sem que tenha havido reinfecção ou presença de cicatrizes tracomatosas na conjuntiva. • A alta por cura com cicatrizes será dada após o terceiro retorno, aproximadamente nove meses após o início do tratamento, quando não houver mais manifestação de tracoma ativo (TF e/ou TI), nem reinfecção, porém com a presença de cicatrizes tracomatosas na conjuntiva. • O critério para encerramento de caso é o da alta por cura sem cicatrizes, devendo o paciente sair do sistema de controle. No caso de alta por cura com cicatrizes, deverá ser feito controle anual, sem que o indivíduo seja retirado do registro de controle, a fim de detectar precocemente possíveis alterações palpebrais (entrópio e/ou tri- 724 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tracoma quíase). Em caso de entrópio e/ou triquíase, o paciente deve ser encaminhado para correção cirúrgica. Após um ano do diagnóstico confirmado de tracoma, nova busca ativa deve ser realizada em toda a comunidade, garantindo a cobertura e adesão adequadas ao tratamento, iniciando-se novo registro dos pacientes diagnosticados. Aspectos epidemiológicos O tracoma não existia entre as populações nativas do continente americano. A doença foi trazida pela colonização e imigração européias. Relata-se que teria sido introduzida no Brasil a partir do século XVIII, no Nordeste, com a deportação dos ciganos, estabelecendose o “foco do Cariri” e, a partir da segunda metade do século XIX, os “focos de São Paulo e Rio Grande do Sul”, que teriam se iniciado com a intensificação da imigração européia para esses dois estados. Com a expansão da fronteira agrícola para o oeste, o tracoma disseminou-se e tornou-se endêmico em praticamente todo o Brasil, sendo hoje encontrado em todo o território nacional, onde são desenvolvidas ações de busca ativa de casos. Apesar da diminuição acentuada na prevalência do tracoma, a doença continua a existir, acometendo as populações mais carentes e desassistidas, inclusive na periferia das grandes metrópoles. 6 Vigilância epidemiológica Objetivos • Controlar a ocorrência de tracoma mediante a realização regular de busca ativa de casos e visita domiciliar dos contatos. • Acompanhar os focos da doença, para verificar a tendência de expansão da infecção. • Realizar diagnóstico e tratar os casos com infecção ativa, adotando as medidas de controle pertinentes. T Definição de caso Suspeito Indíviduos que apresentam história de “conjuntivite prolongada” ou referem sintomatologia ocular de longa duração (ardor, prurido, sensação de corpo estranho, fotofobia, lacrimejamento e secreção ocular), especialmente na faixa etária de 1 a 10 anos. Os comunicantes de casos confirmados de tracoma também devem ser considerados casos suspeitos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 725 Tracoma Confirmado Considera-se caso confirmado de tracoma qualquer indivíduo que, por meio de exame ocular externo, apresentar um ou mais dos seguintes sinais: • inflamação tracomatosa folicular (TF) – quando se verifica a presença de folículos de, no mínimo, 0,5mm de diâmetro na conjuntiva tarsal superior; • inflamação tracomatosa intensa (TI) – quando se verifica a presença de espessamento da conjuntiva tarsal superior com mais de 50% dos vasos tarsais profundos não visualizados; • cicatrização conjuntival tracomatosa (TS) – presença de cicatrizes na conjuntiva tarsal superior com aparência esbranquiçada, fibrosa, com bordas retas, angulares ou estreladas; • triquíase tracomatosa (TT) – quando pelo menos um dos cílios atrita o globo ocular ou há evidência de recente remoção de cílios, associado à presença de cicatrizes na conjuntiva tarsal superior (TS) sugestivas de tracoma; • opacificação corneana (CO) – caracteriza-se por sua nítida visualização sobre a pupila com intensidade suficiente para obscurecer pelo menos uma parte da margem pupilar. A confirmação do caso é essencialmente clínica, através da verificação dos sinais-chave, ao exame ocular externo. O caso inicial confirmado deve ser tomado como caso índice, a partir do qual serão desencadeadas medidas de investigação epidemiológica para a detecção de casos a ele associados. Só após a investigação epidemiológica, com a detecção de outros casos, é que se terá a confirmação clínico-epidemiológica definitiva do caso índice, pois não existem casos isolados de tracoma. Mesmo que o caso índice tenha confirmação laboratorial de C. trachomatis, se não houver caso associado a ele o seu diagnóstico é de conjuntivite de inclusão. A exceção é feita aos casos de tracoma cicatricial, que indicariam uma infecção no passado, ou cicatrizes tracomatosas associadas a formas inflamatórias (TF e/ou TI) que indicariam que o caso índice tem a doença há muito tempo. Descartado Considera-se caso descartado de tracoma qualquer indivíduo que, por meio de exame ocular externo, não apresente sinais clínicos de tracoma. Notificação O tracoma não é doença de notificação compulsória nacional, sendo de notificação obrigatória em algumas unidades federadas. No entanto, é uma doença sob vigilância epidemiológica, sendo recomendável fazer registros sistemáticos dos casos detectados e tratados, de forma a proporcionar informações sobre a situação epidemiológica do agravo na região, permitindo avaliar tanto a sua evolução como o impacto das ações de controle desenvolvidas. 726 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tracoma Medidas a serem adotadas Qualidade da assistência Verificar se os casos estão sendo atendidos por profissionais capacitados para realizar o diagnóstico clínico e se estão sendo seguidas as recomendações quanto ao diagnóstico, tratamento e controle. Confirmação diagnóstica Quando houver indicação de coleta de material para diagnóstico laboratorial, deverá ser colhido o raspado conjuntival da pálpebra superior, de acordo com as orientações do Anexo. O material colhido deve ser examinado pelo método de imunofluorescência direta com anticorpos monoclonais. Investigação A investigação epidemiológica deve dirigir-se, prioritariamente, às instituições educacionais e/ou assistenciais e domicílios dos casos que constituem locais com maior probabilidade de transmissão da doença. Desde que haja a confirmação da existência de um ou vários casos na comunidade (escola, creche, bairro, povoado, etc.), deverão ser desencadeadas medidas visando a detecção de casos associados. A investigação epidemiológica dos casos é importante não só para elucidar a situação epidemiológica do caso índice como para fornecer subsídios para o conhecimento do quadro epidemiológico da doença no país, possibilitando o desenho de estratégias de intervenção mais amplas e adequadas às realidades regionais. 6 Investigação em instituições educacionais A busca ativa em escolas e creches deve ser sistemática nos locais onde haja suspeita da ocorrência de casos de tracoma. Deve ser ressaltada a importância das medidas de educação em saúde envolvendo pais, professores, funcionários e crianças, para o sucesso das medidas de controle do tracoma. Por tratar-se de doença crônica e endêmica, não há necessidade de isolamento dos casos. Os indivíduos com tracoma devem receber tratamento e continuar a freqüentar a instituição, pois a doença está ocorrendo no local onde as pessoas já foram expostas ao agente etiológico e o contágio, se houve, já ocorreu. E, certamente, haverá casos no período de incubação, sem sinais e sintomas, que não serão detectados na visita inicial. Daí a importância do trabalho permanente nessas instituições. T Investigação domiciliar Deve ser realizada para todos os casos novos de tracoma inflamatório, de forma a identificar casos associados ao caso índice. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 727 Tracoma Investigação na comunidade O sistema de informações poderá revelar grupos populacionais com maior concentração de casos. Deve-se realizar inquéritos epidemiológicos populacionais, visando melhor conhecimento da situação nas localidades identificadas. Roteiro de investigação epidemiológica Identificação do paciente A partir da busca ativa de casos realizados em escolas e locais com suspeita de ocorrência de tracoma, todos os dados de identificação dos casos diagnosticados devem ser preenchidos em formulário padrão do Ministério da Saúde (ficha de acompanhamento e controle dos casos). Deve ser realizada busca de casos domiciliares dos comunicantes dos casos índices verificados. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos • Para orientar o diagnóstico e tratamento e demais medidas de prevenção. • Para caracterizar a existência do foco: o tracoma é uma situação clínico-epidemiológica na qual o agente etiológico encontra-se amplamente disseminado na população, de forma a propiciar a contínua reinfecção da conjuntiva. É incomum a existência de casos de tracoma isolados. A constatação de um caso isolado na comunidade requer investigação epidemiológica de seus comunicantes. Caso não se identifique relação com os comunicantes, provavelmente é um caso importado, que contraiu a doença em outro local. A constatação de uma criança com diagnóstico de conjuntivite por C. trachomatis deve ser acompanhada pela investigação epidemiológica dos seus comunicantes. Em áreas onde não existe registro da ocorrência, ao ser detectado um caso novo de tracoma ativo (TF e/ou TI) em uma comunidade, escola, creche, povoado ou áreas periféricas das metrópoles recomenda-se colher raspado conjuntival da pálpebra superior de alguns indivíduos, do mesmo local, que apresentem sinais de tracoma, para confirmação do foco. O material colhido deve ser examinado pelo método de imunofluorescência direta com anticorpos monoclonais (Anexo). Se o resultado do exame de uma das lâminas for positivo, fica estabelecido o foco. A partir da caracterização do foco, deve-se proceder as ações de vigilância epidemiológica e controle do agravo. Análise dos dados A análise dos dados obtidos através da investigação deve permitir a avaliação da magnitude do problema, distribuição e ocorrência do agravo e conhecimento das populações sob risco, que devem ser incluídas nas medidas de controle, objetivando a adequação das medidas adotadas e a priorização das ações de prevenção e controle que devem ser mantidas na área. 728 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tracoma Deverá ser estabelecido um fluxo de informações por meio de formulários específicos, que deverão ser coletados, consolidados e analisados em nível municipal, devendo ser transmitidos para o nível estadual que, por sua vez, deverá analisar a situação epidemiológica no estado e repassar as informações para o nível federal. A periodicidade deste fluxo deverá ser estabelecida pelas condições regionais e regulamentada pelo Ministério da Saúde. Os relatórios devem conter o número de pessoas examinadas e de casos detectados de tracoma, bem como sua distribuição por idade, sexo e forma clínica. Propõe-se a realização de fluxo trimestral, do município para o estado, e semestral, do estado para o nível federal. Os municípios devem realizar avaliações das atividades de vigilância epidemiológica e controle do tracoma, com as seguintes sugestões de acompanhamento: • número de instituições (escolas, creches, etc.) e locais onde foi feita a busca ativa; • número de casos de tracoma inflamatório que recebeu visitar domiciliar para exame de comunicantes; • prevalência de tracoma no município, por faixa etária, forma clínica e localidade (bairros); • taxa de detecção de tracoma por instituições; • taxa de tracoma por formas clínicas; • ações educativas desenvolvidas. 6 Instrumentos disponíveis para controle Medidas de controle Medidas relativas à fonte de infecção • Tratamento individual: todo caso de tracoma inflamatório (TF e/ou TI) deve ser tratado de acordo com as orientações descritas. • Tratamento em massa: havendo indicação epidemiológica, indicada anteriormente, o tratamento em massa deverá ser adotado. • Busca ativa: a busca ativa de novos casos deverá ser procedida, visando o tratamento e conscientização da população. T Medidas referentes às vias de transmissão As áreas endêmicas do tracoma, em sua maioria, apresentam precárias condições de saneamento e higiene, fatores determinantes na manutenção de elevados níveis endêmicos. Assim, a melhoria sanitária domiciliar, o destino adequado do lixo e o acesso ao abastecimento de água representam importantes ações no controle da doença. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 729 Tracoma Ações de educação em saúde O desenvolvimento de ações educativas em saúde tem importante impacto no trabalho de prevenção e controle da doença, mobilizando a comunidade para criar recursos e participar ativamente do processo. Recomenda-se: • planejar as ações educativas antes do início do projeto: organizando a equipe de saúde com profissionais aptos não só para detectar e tratar casos de tracoma como assumir a responsabilidade de transmissão do conhecimento, envolvendo professores e toda a comunidade; • contar com material de apoio suficiente para o desenvolvimento das ações educativas, organizando, junto com o grupo envolvido, dramatizações, histórias, criação de cartazes e folhetos; • buscar apoio dos meios de comunicação de massa, para divulgação e prevenção da doença, como reforço às práticas propostas. A ação educativa constitui importante estratégia para o controle do tracoma, buscando a conscientização da população sobre a necessidade e adoção de hábitos de higiene, como a necessidade de lavar regularmente o rosto das crianças, além de enfatizar a importância do uso individual de objetos pessoais como toalhas, fronhas, lençóis, entre outros. A abordagem da população quanto aos aspectos relacionados à higiene deverá ser tratada com cuidado, para que não ocorra entendimento errôneo quanto à transmissão da doença ou discriminação do paciente quanto a maus hábitos de higiene. Ainda em relação ao tratamento, compete à equipe de saúde orientar o uso correto da medicação, a observação dos prazos do tratamento e comparecimento aos retornos de avaliação clínica, para garantir a efetividade do tratamento. 730 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tracoma Anexo Procedimentos para a coleta de material para exame laboratorial Para a realização de exame laboratorial pela técnica de imunofluorescência direta com anticorpos monoclonais deve-se colher raspado da conjuntiva tarsal superior dos indivíduos. Material necessário • Livro de registro dos indivíduos a serem submetidos à coleta. • Kits de coleta de exames – lâminas apropriadas e swabs. • Frasco com metanol. • Lápis e caneta para identificação. • Isopor com gelo reciclável. • Saco de lixo. • Gaze. • Solução salina isotônica. 6 Orientações para a coleta • Anotar, com lápis, na lâmina, o nome do indivíduo de quem foi feita a coleta e a data. • Anotar o mesmo nome no livro apropriado. • Remover, com gaze, as lágrimas e secreções; se necessário, limpar com soro fisiológico. Após o uso, a gaze deve ser jogada no lixo apropriado. • Everter a pálpebra superior. • Para assegurar a adequada coleta, esfregar o swab firmemente sobre a placa tarsal superior do canto externo para o interno e vice-versa (por dez vezes), rolando o swab. • Colocar o swab sobre a metade inferior do círculo da lâmina rolando-o numa direção. • Levantar o swab em relação à lâmina sem mudar sua posição na mão; girar a lâmina por 180º. Rolar o swab na mesma direção anterior, usando, agora, a metade restante do círculo. • Atentar para que toda a superfície do swab tenha estado em contato com o círculo. • Esperar secar o raspado por cinco minutos e, então, fixar a lâmina com duas gotas do metanol. Usar como suporte superfícies que não sejam danificadas pelo metanol. • Após a lâmina estar seca, colocá-la na caixa de lâminas, que, por sua vez, deve ser acondicionada no isopor com gelo. Ao final de cada dia de trabalho, as caixas com as lâminas devem ser guardadas dentro de um freezer a -20ºC. • Retirar todo o material utilizado e jogar o material contaminado no lixo que deve ser descartado em local apropriado. T Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 731 Tuberculose TUBERCULOSE CID 10: A15 a A19 Características clínicas e epidemiológicas Descrição A tuberculose é um problema de saúde prioritário no Brasil que, juntamente com outros 21 países em desenvolvimento, alberga 80% dos casos mundiais da doença. Estima-se que cerca de um terço da população mundial está infectada com o Mycobacterium tuberculosis, sob risco, portanto, de desenvolver a enfermidade. Anualmente, ocorrem em torno de oito milhões de casos novos e quase 3 milhões de mortes por tuberculose. Nos países desenvolvidos é mais freqüente entre as pessoas idosas, nas minorias étnicas e imigrantes estrangeiros. Nos países em desenvolvimento, estima-se que ocorram 95% dos casos e 98% das mortes causadas pela doença, ou seja, mais de 2,8 milhões de mortes por tuberculose e 7,5 milhões de casos novos, atingindo a todos os grupos etários, com maior predomínio nos indivíduos economicamente ativos (15-54 anos). Os homens adoecem duas vezes mais que as mulheres. O Brasil apresenta aproximadamente 85 mil casos novos por ano e cerca de 5-6 mil mortes pela doença. Com o surgimento, em 1981, da síndrome de imunodeficiência adquirida (Sida/Aids), vem-se observando, tanto em países desenvolvidos como nos em desenvolvimento, crescente número de casos notificados de tuberculose em pessoas infectadas pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV). Esta associação (HIV/TB) constitui, nos dias atuais, um sério problema de saúde pública, podendo levar ao aumento da morbidade e mortalidade pela tuberculose em muitos países. Agente etiológico Mycobacterium tuberculosis, também conhecido como bacilo de Koch. O complexo Mycobacterium tuberculosis é constituído de várias espécies: M. tuberculosis, M. bovis, M. africanum e M. microti. Outras espécies de micobactérias podem produzir quadro clínico semelhante ao da tuberculose, sendo necessárias para o diagnóstico diferencial a cultura e a identificação das mesmas, pelos laboratórios de referência. Reservatório O reservatório principal é o homem. Em algumas regiões, o gado bovino doente. Em raras ocasiões, os primatas, aves e outros mamíferos. Em geral, a fonte de infecção é o indivíduo com a forma pulmonar da doença, que elimina bacilos para o exterior (bacilífero). Calcula-se que durante um ano, numa comunidade, um indivíduo bacilífero poderá infectar, em média, de 10 a 15 pessoas. 732 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tuberculose Não existem estimativas da proporção de pacientes com tuberculose causada pelo M. Bovis, no entanto é importante que o sistema de saúde esteja atento à possibilidade de ocorrência deste agente. Em alguns locais, ele assume o papel de principal agente etiológico causador da doença, apresentando-se de forma idêntica ao M. tuberculosis mas com maior incidência da forma ganglionar e outras extrapulmonares. Sua ocorrência é mais freqüente em comunidades que consomem leite e produtos derivados (não pasteurizados ou fervidos) de rebanho bovino infectado, em pacientes provenientes de áreas rurais e em profissionais (veterinários, ordenhadores, funcionários de matadouros, entre outros). Uma vez confirmada a contaminação humana, os serviços sanitários devem ser informados para atuar na imediata identificação das fontes de infecção e tomar as medidas de controle adequadas, prevenindo, assim, a ocorrência de novos casos. Modo de transmissão A tuberculose é transmitida de pessoa a pessoa, principalmente através do ar. A fala, o espirro e, principalmente, a tosse de um doente de tuberculose pulmonar bacilífera lança no ar gotículas, de tamanhos variados, contendo no seu interior o bacilo. As gotículas mais pesadas depositam-se rapidamente no solo, enquanto que as mais leves podem permanecer em suspensão por diversas horas. Somente os núcleos secos das gotículas (núcleo de Wells), com diâmetro de até 5µ e com 1 a 2 bacilos em suspensão, podem atingir os bronquíolos e alvéolos e aí iniciar sua multiplicação. Em sua maioria, as gotículas médias são retidas pela mucosa do trato respiratório superior e removidas dos brônquios através do mecanismo mucociliar. Os bacilos assim removidos são deglutidos, inativados pelo suco gástrico e eliminados nas fezes. Os bacilos que se depositam nas roupas, lençóis, copos e outros objetos dificilmente se dispersarão em aerossóis e, por isso, não desempenham papel importante na transmissão da doença. 6 Período de incubação Após a infecção pelo M. tuberculosis, transcorrem, em média, 4 a 12 semanas para a detecção das lesões primárias. A maioria dos novos casos de doença pulmonar ocorre em torno de 12 meses após a infecção inicial. A probabilidade de o indivíduo vir a ser infectado, e de que essa infecção evolua para a doença, depende de múltiplas causas, destacando-se, dentre estas, as condições socioeconômicas e algumas condições médicas (diabetes mellitus, silicose, uso prolongado de corticosteróide ou outros imunossupressores, neoplasias, uso de drogas e infecção pelo HIV). A evolução do quadro clínico dependerá de o indivíduo estar sendo infectado pela primeira vez (primo-infecção) ou reinfectado (reinfecção exógena). A primo-infecção pode causar a doença dependendo da virulência do bacilo, da fonte infectante e das características genéticas dos indivíduos infectados. Em novo contato, após uma infecção natural ou induzida pela BCG, a resistência dependerá da resposta imunológica. T Período de transmissibilidade A transmissão é plena enquanto o doente com a forma clínica de tuberculose pulmonar bacilífera eliminar bacilos e não tiver iniciado o tratamento. Com o esquema terapêu- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 733 Tuberculose tico recomendado, a transmissão é reduzida, gradativamente, a níveis insignificantes, ao fim de poucos dias ou semanas. As crianças com tuberculose pulmonar geralmente não são infectantes. Susceptibilidade e imunidade A infecção pelo bacilo da tuberculose pode ocorrer em qualquer idade, mas no Brasil geralmente acontece na infância. Nem todas as pessoas expostas ao bacilo da tuberculose se tornam infectadas. A infecção tuberculosa, sem doença, significa que os bacilos estão presentes no organismo mas o sistema imune está mantendo-os sob controle. Entre os infectados, a probabilidade de adoecer aumenta na presença de infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) e outras formas de imunodepressão, na presença de desnutrição, silicose, diabetes e em usuários de drogas endovenosas. As reativações de infecções antigas e latentes explicam grande parte dos casos de doença em idosos. A imunidade natural pode ser explicada por diferenças fisiológicas que existem nas várias espécies. No entanto, não existem diferenças fisiológicas que expliquem os diversos graus de imunidade, aparentemente natural, observados em uma mesma espécie animal. A maior ou menor imunidade natural parece estar relacionada com a maior ou menor velocidade com que o hospedeiro é capaz de adquirir imunidade. Assim, não haveria propriamente uma imunidade “natural”, mas uma imunidade adquirida mais rápida e eficaz e, portanto, capaz de propiciar o controle da infecção, em uma fase precoce. Essa competência imunológica é controlada geneticamente, embora fatores como a desnutrição, possam suprimi-la. Na imunidade adquirida, a resposta imunológica humoral não tem importância, já que a imunidade para a tuberculose é, fundamentalmente, mediada pelo sistema imunológico celular, timodependente, através da interação entre linfócitos T ativados e macrófagos. Aspectos clínicos e laboratorias Manifestações clínicas Período de infecção – um indivíduo que receba uma carga infecciosa de bacilos da tuberculose, pela primeira vez (primo-infecção), da qual um ou mais bacilos alcancem o pulmão, vencendo as defesas da árvore respiratória e localizando-se nos alvéolos da periferia pulmonar, apresentará reação inflamatória e exsudativa de tipo inespecífica. Aproximadamente, em 15 dias os bacilos podem multiplicar-se livremente, porque ainda não existe imunidade adquirida. Nesse período, os bacilos podem, a partir da lesão pulmonar, atingir a via linfo-hematogênica, comprometendo os linfonodos e órgãos dos diversos sistemas e aparelhos, principalmente o fígado, o baço, a medula óssea, os rins e o sistema nervoso. Essa disseminação, de poucos bacilos, é considerada “benigna”: os bacilos ficarão latentes ou serão destruídos pela ação da imunidade que se instalará. No início da 3ª semana, o organismo normal, reconhecendo a presença de elemento estranho, é capaz de mobilizar seu sistema de defesa imunológico específico visando a destruição ou inativação do agente 734 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tuberculose agressor. Passa a haver, então, no pulmão, no local da inoculação inicial, um foco pequeno, arredondado, de 1 a 2 mm, esbranquiçado, de consistência amolecida e constituído, principalmente, por material caseoso. Esse foco é circundado por afluxo celular de linfócitos, células epitelióides (macrófagos ativados e modificados) e macrófagos (foco primário), localizado principalmente no terço médio, compreendendo a parte inferior do lobo superior, lobo médio e, particularmente, o ápice do lobo inferior. Normalmente, esse nódulo é único e com as dimensões mencionadas, mas há relatos da existência de múltiplos focos primários e de focos de maiores dimensões. À associação do foco primário aos gânglios satélites da sua região dá-se o nome de complexo primário de Ranke. O foco pulmonar regressivo, que pode ser visto nas radiografias, chama-se foco de Gohn. Cerca de 90% da população infectada consegue bloquear o avanço do processo, a partir da formação do complexo primário de Ranke, permanecendo apenas como infectados. Tuberculose primária – ocorre durante uma primo-infecção, pode evoluir tanto a partir do foco pulmonar quanto do foco ganglionar ou, então, em conseqüência da disseminação hematogênica. Isso acontece em 5% dos primo-infectados. 6 Tuberculose pós-primária – ocorre no organismo que tem sua imunidade desenvolvida tanto pela infecção natural quanto pela BCG. Dos primo-infectados, 5% adoecerão tardiamente em conseqüência do recrudescimento de algum foco já existente em seu organismo (reativação endógena). Também pode ocorrer a reinfecção exógena, ou seja, o paciente adoecer por receber nova carga bacilar do exterior. O quadro clínico não apresenta nenhum sinal ou sintoma característico. Observa-se, normalmente, comprometimento do estado geral, febre baixa vespertina com sudorese, inapetência e emagrecimento. Quando a doença atinge os pulmões, o indivíduo pode apresentar dor torácica e tosse produtiva, acompanhada ou não de escarros hemoptóicos. A tosse produtiva é o sintoma mais freqüente da forma pulmonar. Nas crianças, também é comum o comprometimento ganglionar mediastínico e cervical (forma primária), que se caracteriza por lesões bipolares: parênquima e gânglios. Nos pacientes adultos, maiores de 15 anos, a tuberculose atinge os pulmões em cerca de 90% dos casos. Nos menores de 15 anos, este percentual é de 75%, podendo, entretanto, localizar-se em outras partes do organismo: rins, ossos e meninges, dentre outras, em função das quais se expressará clinicamente. Uma das formas clínicas mais graves é a tuberculose miliar, decorrente de disseminação hematogênica com acometimento sistêmico, quadro tóxico infeccioso importante e grande risco de meningite. Os pulmões se apresentam difusamente ocupados por pequenas lesões. Os demais órgãos também podem ser acometidos por lesões idênticas. T Na criança e no adolescente com suspeita de tuberculose as manifestações clínicas podem ser variadas. A maioria dos casos apresenta febre, habitualmente moderada, persistente por mais de 15 dias e freqüentemente vespertina. São comuns irritabilidade, tosse, perda de peso e sudorese noturna, às vezes profusa. Muitas vezes, a suspeita de tuberculose é feita em casos de pneumonia de evolução lenta, que não vem apresentando melhora com o uso Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 735 Tuberculose de antimicrobianos para bactérias comuns. Em crianças e adolescentes, há predomínio da localização pulmonar sobre as formas de tuberculose extrapulmonares. A suspeita deve ser realizada na presença de linfadenopatia cervical ou axilar, após excluir adenite infecciosa aguda, com evidentes sinais flogísticos. Na presença de reação forte ao PPD, está indicado o tratamento. Os achados radiográficos mais sugestivos de tuberculose, nessa faixa etária, são: adenomegalias hilares e/ou paratraqueais (gânglios mediastínicos aumentados de volume), pneumonias com qualquer aspecto radiológico (de evolução lenta, às vezes associadas a adenomegalias mediastínicas, ou que cavitam durante a evolução) e o infiltrado nodular difuso (padrão miliar). Deve-se sempre investigar se houve contato prolongado com adulto doente de tuberculose pulmonar bacilífera ou com história de tosse por três semanas ou mais. Os casos suspeitos de tuberculose em crianças e adolescentes devem ser encaminhados para a unidade de referência, para investigação e confirmação do diagnóstico. Após definição do diagnóstico e estabelecido o tratamento, a criança deverá voltar para acompanhamento na unidade básica de saúde. Remissão – apesar de ocorrer a cura espontânea, em alguns casos, a remissão dos sintomas e a respectiva cura do paciente só ocorre após o tratamento apropriado. Devido à remissão dos sintomas, alguns pacientes abandonam o tratamento no início. O agente então persiste no organismo, que fica exposto a recidivas e a resistência a drogas. Dependendo da extensão das lesões pulmonares, várias seqüelas podem permanecer, apesar da cura bacteriológica, resultantes da destruição do parênquima pulmonar e da arquitetura brônquica. As mais importantes complicações, clinicamente, são: • distúrbio ventilatório obstrutivo e/ou restritivo; • infecções respiratórias de repetição; • formação de bronquiectasias; • atelectasias; • hemoptise; • empiemas. Diagnóstico diferencial Pneumonias, micoses pulmonares (paracoccidioidomicose, histoplasmose), sarcoidose e carcinoma brônquico, dentre outras enfermidades. Diagnóstico laboratorial É fundamentado nos seguintes métodos: • bacterioscópico: baciloscopia e cultura; • radiológico; tomografia computadorizada do tórax; • broncoscopia; • outros: prova tuberculínica cutânea (PPD); anátomo-patológico (histológico e citológico); • sorológico, bioquímico, biologia molecular. 736 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tuberculose Exames bacteriológicos Baciloscopia direta do escarro – é o método prioritário, porque permite descobrir a fonte mais importante de infecção: o doente bacilífero. Executado corretamente permite detectar de 70% a 80% dos casos de tuberculose pulmonar em uma comunidade. O método de coloração adotado no Brasil e de custo mais barato é o Ziehl-Neelsen), que, por simples e seguro, pode ser realizado por todos os laboratórios. A baciloscopia direta é indicada para todos os sintomáticos respiratórios (indivíduos com tosse e expectoração por três semanas e mais). Deverá ser dada ênfase para a realização deste exame nos pacientes que apresentem alterações pulmonares na radiografia de tórax e nos contatos de tuberculose pulmonar bacilíferos. Também é utilizada para acompanhar, mensalmente, a evolução bacteriológica do paciente pulmonar, inicialmente positivo, durante o tratamento. Recomenda-se, para o diagnóstico, a coleta de duas amostras de escarro: uma por ocasião da primeira consulta e a segunda na manhã do dia seguinte, em jejum, ao despertar. 6 Cultura de escarro ou de outras secreções – é indicada para suspeitos de tuberculose pulmonar e negativos ao exame direto do escarro, bem como para o diagnóstico de formas extrapulmonares (como meníngea, renal, pleural, óssea e ganglionar) e diagnóstico de tuberculose em paciente soropositivo para o HIV/Aids. Este exame está indicado nos casos de retratamento após falência bacteriológica ao esquema de tratamento padrão – RHZ ou recidiva da doença ou reinício após abandono, com teste de sensibilidade. A cultura é também indicada nos casos de suspeita de resistência bacteriana às drogas, acompanhada do teste de sensibilidade. Nos casos de suspeita de infecção por micobactérias não-tuberculosas, notadamente nos doentes HIV positivos ou com aids, além da cultura deverá ser realizada a tipificação do bacilo. Exame radiológico A evolução da tuberculose é acompanhada de anormalidades radiográficas na maioria dos casos. Por isso, a radiografia do tórax é importante auxiliar no diagnóstico, justificandose sua utilização, quando possível, nos casos suspeitos. É sempre importante realizar o exame radiológico para um diagnóstico correto. Este exame permite a identificação de pessoas portadoras de imagens sugestivas de tuberculose devendo ser consideradas duas situações distintas: a tuberculose primária e a tuberculose secundária – que se manifestam clínica e radiologicamente de forma distinta. O exame radiológico, em pacientes com baciloscopia positiva, tem como função principal a exclusão de outra doença pulmonar associada, que necessite de tratamento concomitante, além de permitir avaliação da evolução radiológica dos pacientes, sobretudo daqueles que não responderam à quimioterapia. O exame radiológico não substitui a realização da investigação bacterioscópica, sendo sugerida uma padronização para a descrição dos resultados: • normal – ausência de imagens patológicas nos campos pulmonares; • seqüela – apresentam imagens sugestivas de lesões cicatriciais; • suspeito – apresentam imagens sugestivas de processo tuberculoso ativo; Secretaria de Vigilância em Saúde / MS T 737 Tuberculose • outras doenças – apresentam imagens sugestivas de pneumopatias não-tuberculosas (infecções bacterianas, micoses, abcessos ou neoplasias). A abreugrafia indiscriminada, em pessoas aparentemente sadias, não está indicada por ter baixo rendimento e por expor, de forma desnecessária, a população à radiação. Tomografia computadorizada do tórax – método diagnóstico útil, notadamente a tomografia computadorizada de alta resolução, em alguns casos em que a radiografia do tórax apresenta resultados imprecisos, por alterações parenquimatosas mínimas ou por não permitir distinguir lesões antigas das lesões da tuberculose ativa. No entanto, é método de maior custo e menor oferta, restrito aos centros de referência. Deve ser usado de forma individualizada, levando em consideração os recursos disponíveis e o custo-benefício, especialmente nos casos com baciloscopia negativa que exigem melhor diagnóstico diferencial com outras doenças. Broncoscopia A broncoscopia e os procedimentos a ela associados, a exemplo de lavado brônquico, lavado broncoalveolar, escovado brônquico, biópsia brônquica, biópsia transbrônquica e punção aspirativa com agulha podem ser úteis no diagnóstico da tuberculose nas seguintes situações: formas negativas à baciloscopia, suspeita de outra doença pulmonar que não a tuberculose, presença de doença que acomete difusamente o parênquima pulmonar, suspeita de tuberculose endobrônquica ou em pacientes imunodeprimidos, particularmente os infectados pelo HIV. Prova tuberculínica A prova tuberculínica cutânea está indicada como método auxiliar, no diagnóstico da tuberculose, em pessoas não vacinadas com BCG. A prova tem por base a reação celular desenvolvida após a inoculação intradérmica de um derivado protéico do M. tuberculosis. O resultado positivo evidencia apenas a infecção por micobactérias, não caracterizando a presença de doença. No Brasil, a tuberculina usada é o PPD RT23, aplicada por via intradérmica, no terço médio da face anterior do antebraço esquerdo, na dose de 0,1ml, equivalente a 2UT (unidades de tuberculina). Quando conservada em temperatura entre 4ºC e 8°C, a tuberculina mantém-se ativa por seis meses. Não deve, entretanto, ser congelada, nem exposta à luz solar direta. A técnica de aplicação (a mais empregada é a de Mantoux) e o material utilizado são padronizados pela Organização Mundial da Saúde e têm especificações semelhantes às usadas para a vacinação BCG. A injeção do líquido faz aparecer uma pequena área de limites precisos, pálida e de aspecto pontilhado, como casca de laranja. A leitura da prova tuberculínica é realizada de 72 a 96 horas após a aplicação, medindo-se com régua milimetrada o maior diâmetro transverso da área de endurecimento palpável. O resultado, registrado em milímetros, define a classificação e interpretação clínica: 738 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tuberculose • 0 a 4mm – não-reator: indivíduo não infectado pelo M. tuberculosis ou por outra micobactéria; ou infectado pelo M. tuberculosis há menos de duas semanas (em fase de viragem tuberculínica) ou, ainda e excepcionalmente, em infectados ou doentes imunodeprimidos; • 5 a 9mm – reator fraco: indivíduo vacinado com BCG ou infectado pelo M. tuberculosis ou por outras micobactérias; • 10mm ou mais – reator forte: indivíduo infectado pelo M. tuberculosis, que pode estar doente ou não, e indivíduos recentemente vacinados com BCG. Observações em relação à prova tuberculínica: • algumas circunstâncias podem interferir no resultado da prova tuberculínica como, por exemplo, desnutrição, aids, sarcoidose, neoplasias, doenças linfoproliferativas, tratamentos com corticosteróide e outras drogas imunodepressoras, gravidez, etc.; • todos os indivíduos infectados pelo HIV devem ser submetidos ao teste tuberculínico. Nesses casos, considera-se reator aquele que apresenta endurecimento de 5mm ou mais e não reator aquele com endurecimento entre 0 e 4mm. Para pacientes não reatores, e em uso de terapia anti-retroviral, recomenda-se fazer o teste seis meses após o início da terapia, devido à possibilidade de restauração da resposta tuberculínica; • nos indivíduos vacinados com BCG, sobretudo entre aqueles imunizados há até dois anos, a prova tuberculínica deve ser interpretada com cautela porque, em geral, apresenta reações de tamanho médio, podendo alcançar 10mm ou mais; • recomenda-se realizar o teste tuberculínico em todos os profissionais dos serviços de saúde, por ocasião de sua admissão. 6 Em áreas de elevada prevalência de infecção tuberculosa, a taxa de positividade para a prova tuberculínica pode oscilar entre 25% e 55% da população geral. Nos locais onde há incidências significativas de HIV aumenta a probabilidade de resultados falso-negativos. A prova tuberculínica deve, portanto, ser utilizada com cautela, tendo em vista suas limitações na decisão diagnóstica e sempre levando em consideração os indicadores epidemiológicos regionais. T Outros exames Anátomo-patológico (histológico e citológico) – sempre que possível, deve-se realizar a biópsia nas formas extrapulmonares. No material colhido será feito o exame direto, a cultura e o exame anátomo-patológico, para identificar o M. tuberculosis ou o processo inflamatório granulomatoso compatível com a tuberculose. Bioquímico – são mais utilizados em casos de tuberculose extrapulmonar, principalmente no derrame pleural, derrame pericárdico e meningoencefalite tuberculosa. Sorológico e de biologia molecular – são métodos diagnósticos recentes, de custo elevado e valores preditivos variáveis, muitos ainda não definitivamente testados ou aprovados. Apesar das perspectivas futuras quanto à sua utilidade no diagnóstico precoce, não são Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 739 Tuberculose recomendados para a rotina diagnóstica de tuberculose no Brasil, ficando seu uso restrito a alguns centros de referência e pesquisa onde podem ser utilizados para casos que demandem diagnóstico rápido. Observação O exame sorológico anti-HIV deve ser oferecido a todos aqueles com diagnóstico de tuberculose confirmado. O profissional de saúde deve conversar com o doente sobre a possibilidade de associação das duas infecções e os benefícios do diagnóstico precoce e tratamento da infecção pelo HIV. O doente deve assinar o termo de consentimento, para realização do exame. Caso o exame seja positivo, deve ser encaminhado para a unidade de referência para Aids mais próxima de sua residência, capacitada a tratar das duas infecções. Tratamento A tuberculose é uma doença grave, porém curável em praticamente 100% dos casos novos, desde que os princípios da quimioterapia sejam seguidos. O tratamento dos bacilíferos é a atividade prioritária de controle da tuberculose, uma vez que permite anular rapidamente as maiores fontes de infecção. Poucos dias após o início da quimioterapia, os bacilos da tuberculose praticamente perdem seu poder infectante. Assim, os doentes “pulmonares positivos” não precisam, nem devem, ser segregados do convívio familiar e comunitário. A associação medicamentosa adequada, doses corretas, uso por tempo suficiente, com supervisão da tomada dos medicamentos, são os meios utilizados para evitar a persistência bacteriana e o desenvolvimento de resistência às drogas, assegurando a cura do paciente. O tratamento da tuberculose deve ser feito em regime ambulatorial, supervisionado, no serviço de saúde mais próximo, na residência ou no trabalho do doente. Antes de iniciar a quimioterapia, faz-se necessário orientar o paciente quanto ao tratamento. Para isso, deve-se explicar, na entrevista inicial e em linguagem acessível, as características da doença e o esquema de tratamento que será seguido – drogas, duração, benefícios do uso regular da medicação, conseqüências advindas do abandono do tratamento e possíveis efeitos adversos dos medicamentos. O tratamento diretamente observado de curta duração (DOTS) é fator essencial para se promover o real e efetivo controle da tuberculose. Define-se como uma estratégia*, re- *Os cinco elementos da estratégia DOTS são: • Compromisso político com a implementação e sustentabilidade do programa de controle da tuberculose; • Detecção de casos, por meio de baciloscopia de escarro, entre sintomáticos respiratórios da demanda dos serviços gerais de saúde; • Tratamento padronizado, de curta duração, diretamente observado e monitorado quanto à sua evolução, para todos os casos com baciloscopia de escarro positiva; • Provisão regular de medicamentos tuberculostáticos; • Sistema de informação que permita avaliar a detecção de casos, o resultado do tratamento de casos individuais e o desempenho do programa. 740 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tuberculose comendada pela Organização Mundial da Saúde, que tem como principal sustentáculo a observação direta da tomada de medicamento para tuberculose em pelo menos três observações semanais, nos primeiros dois meses, e uma observação por semana, até o seu final. Além disso, o DOTS visa ao aumento da adesão dos pacientes, a maior descoberta das fontes de infecção (pacientes pulmonares bacilíferos) e ao aumento da cura, reduzindo-se o risco de transmissão da doença na comunidade. Esta estratégia contínua é uma das prioridades para que o Programa Nacional de Controle da Tuberculose (PNCT), do Ministério da Saúde, atinja a meta de curar pelo menos 85% dos doentes, diminua a taxa de abandono do tratamento, evite o surgimento de bacilo resistentes e possibilite um efetivo controle da tuberculose no país. Além da adoção da estratégia DOTS, o PNCT reconhece a importância de horizontalizar o combate à tuberculose, estendendo-o para todos os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde (SUS). Portanto, visa a efetiva descentralização do controle da tuberculose e sua integração no processo de trabalho da atenção básica, incluindo o Programa Saúde da Família (PSF) para garantir a efetiva ampliação do acesso ao diagnóstico e tratamento. O tratamento supervisionado deve ser priorizado para todos os casos de tuberculose bacilífera. A supervisão da ingestão dos medicamentos deve ser realizada em local de escolha do paciente (unidade de saúde, residência), podendo ser administrada por um trabalhador de saúde (agente comunitário de saúde, membro da equipe do PSF ou da unidade básica de saúde) ou familiar devidamente orientado para essa atividade. 6 Tratamento supervisionado Atenção especial deve ser dada para os doentes que se enquadrem nas seguintes situações: etilistas, casos de retratamento após abandono, mendigos, presidiários e doentes institucionalizados (asilos, manicômios). Compete aos serviços de saúde prover os meios necessários para garantir que todo indivíduo com diagnóstico de tuberculose possa, sem atraso, ser adequadamente tratado. A hospitalização é indicada apenas para as seguintes circunstâncias: meningite tuberculosa, indicações cirúrgicas em decorrência da doença, complicações graves, intolerância medicamentosa incontrolável em ambulatório, intercorrências clínicas e/ou cirúrgicas graves, estado geral que não permita tratamento em ambulatório, em casos sociais, como ausência de residência fixa, ou grupos especiais, com maior possibilidade de abandono, especialmente se for caso de retratamento ou falência. O período de internação deve ser reduzido ao mínimo necessário, independentemente do resultado do exame bacteriológico. T Importante • Instituir tratamento supervisionado para todos os casos com baciloscopia positiva • Realizar baciloscopia de controle • Realizar consultas de acompanhamento • Realizar visita domiciliar Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 741 Tuberculose As drogas utilizadas nos esquemas padronizados pelo Ministério de Saúde são: Isoniazida – H; Rifampicina – R; Pirazinamida – Z; Estreptomicina – S; Etambutol – E; Etionamida – Et. Em menores de cinco anos, que apresentem dificuldade para ingerir os comprimidos, recomenda-se o uso das drogas na forma de xarope ou suspensão. Esquema I (esquema básico) – 2RHZ/4RH Casos novos* de todas as formas de tuberculose pulmonar e extrapulmonar** Peso do doente Fases do tratamento Drogas Até 20kg Mais de 20kg e até 35 kg Mais de 35 kg e até 45 kg Mais de 45 kg Mg/kg/dia Mg/dia Mg/dia Mg/dia R 10 300 450 600 H 10 200 300 400 Z 35 1.000 1.500 2.000 2ª fase R 10 300 450 600 (4 meses – RH) H 10 200 300 400 1ª fase (2 meses – RHZ) R = Rifampicina; H = Isoniazida; Z = Pirazinamida *Sem tratamento anterior, tratamento por menos de 30 dias ou tratamento anterior há mais de 5 anos. **Exceto meningite A eficácia deste esquema de tratamento no Brasil é elevada (98%). Considerando-se a ocorrência de óbitos e taxa de abandono de 12%, a efetividade cai para 83% mas continua adequada. De acordo com o inquérito nacional de resistência realizado pelo Ministérioi da Saúde (1997), a resistência primária aos medicamentos antituberculose é baixa, definindo que este esquema deve ser mantido sem a necessidade de acréscimo de um quarto medicamento na fase de ataque, como adotado em outros países. Ressalte-se que o abandono do tratamento é o principal problema para melhor efetividade do tratamento demonstrando a importância da estratégia proposta pelo PNCT para o controle da tuberculose no país. Observações a) As drogas deverão ser administradas preferencialmente em jejum, em uma única tomada, ou, em caso de intolerância digestiva, junto com uma refeição. b) Em casos individualizados, cuja evolução clínica inicial não tenha sido satisfatória, ou ainda nos casos de tuberculose extrapulmonar, com a orientação de especialistas, o tempo de tratamento poderá ser prolongado, na sua 2ª fase, por mais três meses (2RHZ/7RH). c) Os casos de tuberculose associados ao HIV devem ser encaminhados para unidades de referência, em seu município ou em municípios vizinhos, para serem tratados para os dois agravos (TB/HIV). 742 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tuberculose Esquema I IR (esquema básico + etambutol) – 2RHZE/4RHE Casos de recidiva após cura* ou retorno após abandono do esquema I Peso do doente Fases do tratamento Drogas Até 20kg Mais de 20kg e até 35 Kg Mais de 35 kg e até 45 kg Mais de 45 kg Mg/kg/dia Mg/dia Mg/dia Mg/dia 600 R 10 300 450 1ª fase H 10 200 300 400 (2 meses – RHZE) Z 35 1.000 1.500 2.000 E 25 600 800 1.200 600 2ª fase (4 meses – RHE) R 10 300 450 H 10 200 300 400 E 25 600 800 1.200 Siglas: Rifampicina = R; Isoniazida = H; Pirazinamida = Z; Etambutol = E 6 *Considera-se retratamento a prescrição de um esquema de drogas para o doente já tratado por mais de 30 dias, que venha a necessitar de nova terapia por recidiva após cura,retorno após abandono ou falência do esquema I ou esquema IR (esquema básico + etambutol). Esquema II (esquema para tuberculose meningoencefálica) – 2RHZ/(7RH) Peso do doente Fases do tratamento Drogas Até 20Kg Mais de 20kg e até 35kg Mais de 35kg e até 45kg Mais de 45kg Mg/kg/dia Mg/dia Mg/dia Mg/dia 600 R 10 300 450 H 10 200 300 400 Z 35 1.000 1.500 2.000 2ª fase R 10 300 450 600 (7 meses – RH) H 10 200 300 400 1ª fase (2 meses – RHZ) Siglas: Rifampicina = R; Isoniazida = H; Pirazinamida = Z Observações • Levar em consideração as indicações de retratamento, discutidas anteriormente. • Os casos de recidiva de esquemas alternativos, por toxicidade ao esquema I, devem ser avaliados em unidades de referência, para prescrição de esquema individualizado. • O paciente que apresentar alteração da visão deverá ser encaminhado para unidade de referência, com o objetivo de avaliar o uso do etambutol. • Nos casos de concomitância entre tuberculose meningoencefálica e qualquer outra localização, usar o esquema II. • A internação é mandatória, sempre que se suspeitar do diagnóstico de tuberculose meningoencefálica. • Nos casos de tuberculose meningoencefálica, em qualquer idade, recomenda-se o uso de corticosteróide (prednisona, dexametasona ou outros), por um período de 1 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS T 743 Tuberculose a 4 meses, no início do tratamento. • Na criança, a prednisona é administrada na dose de 1 a 2mg/kg de peso corporal, até a dose máxima de 30mg/dia. No caso de se utilizar outro corticosteróide, aplicar a tabela de equivalência entre eles. • Na tuberculose meningoencefálica, a fisioterapia deverá ser iniciada o mais cedo possível. Esquema III (esquema para falência) – 3SZEEt/9Eet Casos de falência de tratamento do E-I e E-IR (esquema I reforçado) Peso do doente Fases do tratamento Drogas Até 20Kg Mais de 20kg e até 35kg Mais de 35kg e até 45kg Mais de 45kg Mg/kg/dia Mg/dia Mg/dia Mg/dia S 20 500 1.000 1.000 1ª fase Z 35 1.000 1.500 2.000 (3 meses – SZEEt) E 25 600 800 1.200 Et 12 250 500 750 E 25 Et 12 600 800 1.200 250 500 750 2ª fase (9 meses – EEt) Siglas: Estreptomicina = S; Pirazinamida = Z; Etambutol = E; Etionamida = Et A falência ao esquema I (E-I) ou ao E-IR define a obrigatoriedade da realização de cultura com identificação e teste de sensibilidade, no início do tratamento, para definir claramente a possibilidade de sucesso desse esquema ou sua modificação. Portanto, recomenda-se que o esquema III deva ser acompanhado por uma unidade de maior resolubilidade, sempre que possível. Observações • Os casos de suspeita de falência aos esquemas E-I ou E-IR devem ser encaminhados à unidade de referência para avaliação e acompanhamento. • A estreptomicina deve ser usada por via intramuscular. Em situações especiais, pode ser aplicada por via endovenosa, diluída a 50 ou 100ml de soro fisiológico, correndo por um mínimo de 1/2 hora. • Em casos especiais, com dificuldades de aceitação de droga injetável ou para facilitar seu uso supervisionado na unidade de saúde, o regime de uso da estreptomicina pode ser alterado para aplicações de 2ª a 6ª feira, por dois meses, e duas vezes semanais, por mais 4 meses. • Em maiores de 60 anos, a estreptomicina deve ser administrada na dose de 500mg/ dia. 744 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tuberculose • Havendo alteração visual durante o tratamento, o paciente deverá ser encaminhado para serviço de referência, com o objetivo de avaliar o uso do etambutol. • É importante que o paciente tratado com o esquema III realize seu tratamento de forma supervisionada. O paciente deverá ser encaminhado para tratamento em uma unidade de referência de tuberculose quando houver antecedentes ou evidências clínicas de hepatopatia aguda (hepatite) ou crônica (cirrose, hepatopatia alcoólica); ser portador de aids ou soro positivo para o HIV; tiver antecedentes ou evidências clínicas de nefropatias (insuficiência renal crônica, pacientes em regime de diálise). Em todos os esquemas, a medicação é de uso diário e deverá ser administrada, de preferência, em uma única tomada em jejum ou, em caso de intolerância digestiva, junto com uma refeição. Atenção especial deve ser dada ao tratamento dos grupos considerados de alto risco de intoxicação, como pessoas com mais de 60 anos, em mau estado geral e etilistas. A rifampicina interfere na ação dos contraceptivos orais, devendo as mulheres, em uso desse medicamento, receber orientação para utilizar outros métodos anticoncepcionais. 6 O esquema E-I (básico) e o esquema E-IR (básico + etambutol) podem ser usados pelas gestantes em qualquer período da gestação. Tratamento da tuberculose multirresistente – se o teste de sensibilidade às drogas, quando realizado, apresentar resistência a apenas um dos medicamentos em uso, com o paciente apresentando boa evolução clínica e laboratorial, isto indica que o regime não deve ser alterado. A associação medicamentosa de três drogas é proposta, entre outras razões, justamente para contemplar essa possibilidade. Os pacientes que não se curam após tratamento com os esquemas padronizados pelo Ministério da Saúde, portadores de bacilos resistentes a mais de duas drogas, dentre as quais a rifampicina e a isoniazida, constituem um grupo de doentes classificados no Consenso Brasileiro de Tuberculose (de 1997/2004) como portadores de tuberculose multirresistente. A este grupo, são agregados os pacientes que apresentam resistência primária à rifampicina, isoniazida e a outras drogas utilizadas, geralmente a estreptomicina e/ou etambutol. Estes pacientes e seus familiares serão atendidos por equipe multiprofissional especializada, em centros de referência que cumpram as normas de biossegurança e estejam credenciados pelas coordenadorias municipais e estaduais do programa de tuberculose. T Reações adversas ao uso de drogas antituberculose A maioria dos pacientes submetidos ao tratamento de tuberculose consegue completar o tempo recomendado sem sentir qualquer efeito colateral relevante. Os fatores relacionados às reações são diversos. Todavia, os maiores determinantes dessas reações se referem à dose, horários de administração da medicação, idade do doente, seu estado nutricional, alcoolismo, condições da função hepática e renal e co-infecção pelo HIV. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 745 Tuberculose A conduta adequada está apresentada, de forma esquemática, nos quadros a seguir, conforme a classificação: efeitos menores e efeitos maiores. Os efeitos menores ocorrem entre 5% a 20% dos casos e são assim classificados porque não implicam em modificação imediata do esquema padronizado; os efeitos maiores são aqueles que implicam interrupção ou alteração do tratamento e são menos freqüentes, ocorrendo em torno de 2% dos casos, podendo chegar a 8% em serviços especializados. Efeitos menores Efeito Droga Conduta Irritação gástrica (náusea, vômito), epigastralgia e dor abdominal Rifampicina, Isoniazida Pirazinamida Reformular os horários de administração da medicação e avaliar a função hepática Artralgia ou artrite Pirazinamida, Isoniazida Medicar com ácido acetilsalicílico Neuropatia periférica (queimação das extremidades) Isoniazida, Etambutol Medicar com piridoxina (vit. B6) Cefaléia e mudança de comportamento (euforia, insônia, ansiedade e sonolência) Isoniazida Orientar Suor e urina cor de laranja Rifampicina Orientar Prurido cutâneo Isoniazida, Rifampicina Medicar com anti-histamínico Hiperuricemia (com ou sem sintomas) Pirazinamida, Etambutol Orientação dietética (dieta hipopurínica) Febre Rifampicina, Isoniazida Orientar Efeitos maiores Efeito Exantemas 746 Droga Estreptomicina Rifampicina Conduta Suspender o tratamento Reintroduzir o tratamento droga a droga após resolução Substituir o esquema nos casos graves ou reincidentes Hipoacusia Estreptomicina Suspender a droga e substituí-la pela melhor opção Vertigem e nistagmo Estreptomicina Suspender a droga e substituí-la pela melhor opção Psicose, crise convulsiva, encefalopatia tóxica e coma Isoniazida Substituir por estreptomicina + etambutol Neurite ótica Etambutol, Isoniazida Substituir Hepatotoxicidade (vômitos, hepatite, alteração das provas de função hepática) Todas as drogas Suspender o tratamento temporariamente até resolução Trombocitopenia, leucopenia, eosinofilia, anemia hemolítica, agranulocitose, vasculite Rifampicina Isoniazida Dependendo da gravidade, suspender o tratamento e reavaliar o esquema de tratamento Nefrite intersticial Rifampicina, principalmente intermitente Suspender o tratamento Rabdomiólise com mioglobinúria e insuficiência renal Pirazinamida Suspender o tratamento Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tuberculose Aspectos epidemiológicos A tuberculose não apresenta variações cíclicas ou sazonais de importância prática. A prevalência observada é maior em áreas de grande concentração populacional e precárias condições socioeconômicas e sanitárias. A distribuição da doença é mundial, com tendência decrescente da morbidade e mortalidade nos países desenvolvidos. Nas áreas com elevada prevalência de infecção pelo HIV vem ocorrendo estabilização ou aumento do número de casos e óbitos por tuberculose. Estão mais sujeitos à doença os indivíduos que convivam (contatos) com doente bacilífero, determinados grupos com redução da imunidade, como os diabéticos ou silicóticos, e pessoas em uso de corticosteróides ou infectados pelo HIV. No Brasil, no ano de 2001 foram notificados 81.432 casos novos, correspondendo ao coeficiente de incidência de 47,2/100 mil habitantes, dos quais 43.085 foram formas pulmonares bacilíferas (coeficiente de incidência de 24,9/100 mil habitantes). Com pertinência ao encerramento do tratamento, 72,2% receberam alta por cura, 11,7% abandonaram o tratamento, 7,0% representam os óbitos e 9,1% referem-se à transferência de serviços e domicílios. Com a tuberculose é uma doença com profundas raízes sociais, relacionada a má distribuição de renda e à pobreza, estas taxas variam de acordo com as regiões e, inclusive, dentro das mesmas regiões. Antes do advento da moderna quimioterapia, a mortalidade era o indicador utilizado tanto para avaliar a tendência da endemia como para fazer estimativas de morbidade – a prevalência era o dobro da incidência, que por sua vez era o dobro da mortalidade. Na era quimioterápica essas equivalências romperam-se: atualmente, a mortalidade representa o desempenho do programa, uma vez que praticamente todos teriam a chance de se curar, mediante diagnóstico precoce e tratamento corretamente administrado. A análise da mortalidade deve considerar a distribuição geográfica, os grupos etários e a associação com o HIV. 6 Vigilância epidemiológica O propósito do Programa Nacional de Controle da Tuberculose é reduzir a transmissão do bacilo da tuberculose na população, através das ações de diagnóstico precoce e tratamento adequado dos casos. As metas internacionais estabelecidas pela Organização Mundial da Saúde e pactuadas pelo governo brasileiros são a descoberta de 70% dos casos de tuberculose estimados e o tratamento e a cura de 85% dos mesmos. T Objetivos O principal objetivo da vigilância epidemiológica é identificar as possíveis fontes de infecção. Para tanto, deve ser realizada investigação epidemiológica entre os contatos de todo caso novo de tuberculose e, prioritariamente, nos que convivam com doentes bacilíferos, devido ao maior risco de infecção e adoecimento que esse grupo apresenta. No caso de uma criança doente, a provável fonte de infecção será o adulto que com ela convive. No caso deste não comparecer à unidade de saúde para exame, torna-se obrigatória a visita domiciliar. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 747 Tuberculose O PNCT se propõe ainda a intensificar a identificação de sintomáticos respiratórios, examiná-los com a baciloscopia e implementar o registro dos mesmos na rede laboratorial do SUS. Definição de caso Suspeito • Todo indivíduo com sintomatologia clínica sugestiva de tuberculose pulmonar: tosse com expectoração por três ou mais semanas, febre, perda de peso e apetite – o chamado sintomático respiratório. • Paciente com imagem radiológica compatível com tuberculose. Confirmado Critério clínico-laboratorial Tuberculose pulmonar bacilífera – paciente com duas baciloscopias diretas positivas ou uma baciloscopia direta positiva e cultura positiva ou uma baciloscopia direta positiva e imagem radiológica sugestiva de tuberculose. Tuberculose pulmonar escarro negativo (BK-) – paciente com duas baciloscopias negativas, com imagem radiológica sugestiva e achados clínicos ou outros exames complementares que permitam ao médico efetuar um diagnóstico de tuberculose. Tuberculose extrapulmonar – paciente com evidências clínicas e achados laboratoriais, inclusive histopatológicos, compatíveis com tuberculose extrapulmonar ativa, em que o médico toma a decisão de tratar com esquema específico; ou paciente com, pelo menos, uma cultura positiva para M.tuberculosis, de material proveniente de uma localização extrapulmonar. Critério clínico-epidemiológico O raciocínio diagnóstico deve desenvolver-se a partir do exame clínico, dos dados epidemiológicos e da interpretação dos resultados dos exames solicitados. Apesar de indispensável, em situações em que o diagnóstico laboratorial não pode ser realizado o clínico pode confirmar o caso pelo critério clínico-epidemiológico, principalmente quando de história de contato com doentes de tuberculose, fator de importância primordial para a suspeição diagnóstica. Descartado Casos suspeitos que, apesar de sintomatologia compatível, apresentaram resultados negativos nos exames laboratoriais, principalmente quando, na busca de diagnóstico diferencial, se confirma outra patologia. Notificação A unidade de saúde que descobre e inicia o tratamento dos casos novos torna-se responsável pela notificação compulsória dos mesmos. Outras fontes de notificação são os 748 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tuberculose hospitais, os laboratórios e outros serviços de assistência médica, quer governamental ou particular. A base do sistema de informação da tuberculose é o prontuário do doente, a partir do qual são colhidos os dados necessários para o preenchimento da ficha individual de investigação do Sistema de Informações de Agravos de Notificação (Sinan). As unidades assistenciais enviarão às secretarias estaduais de saúde, através dos níveis intermediários (municípios e regionais de saúde, entre outros), os dados de descoberta de casos e resultados do tratamento, que após consolidação serão enviados ao nível central nacional. Devem ser notificados todos os casos, independente do tipo de entrada: Caso novo ou sem tratamento anterior – são os pacientes que nunca se submeteram à quimioterapia antituberculosa ou fizeram-na por menos de 30 dias ou há mais de cinco anos. Verificar insistentemente com o paciente e seus familiares se não houve tratamento antituberculoso prévio, superior a 30 dias. Retratamento – prescrição de um esquema de drogas para o doente já tratado por mais de 30 dias e que venha a necessitar de nova terapia por recidiva após cura (RC), retorno após abandono (RA) ou por falência do esquema básico. Abandono – o doente que, após iniciado o tratamento para tuberculose, deixou de comparecer à unidade de saúde por mais de 30 dias consecutivos, a partir da data aprazada para seu retorno. Recidiva – o doente com tuberculose em atividade, que já se tratou anteriormente e recebeu alta por cura, desde que a data da cura e a data do diagnóstico de recidiva não ultrapassem cinco anos. Se esse intervalo exceder cinco anos, o caso é considerado como “caso novo” e o tratamento preconizado é o esquema básico. Falência – a persistência da positividade do escarro ao final do 4º ou 5º meses de tratamento, tendo havido ou não negativação anterior do exame. São aqueles doentes que, no início do tratamento, são fortemente positivos (++ ou +++) e mantêm essa situação até o 4º mês, ou aqueles com positividade inicial seguida de negativação e nova positividade por dois meses consecutivos, a partir do 4º mês de tratamento com comprovação através de cultura de escarro. O aparecimento de poucos bacilos no exame direto do escarro, na altura do 5º ou 6º meses, isoladamente, não significa, necessariamente, falência do esquema, em especial se acompanhado de melhora clínico-radiológica. Nesse caso, o paciente será seguido com exames bacteriológicos. Transferência – refere-se àquele paciente que comparece à unidade de saúde para dar continuidade ao tratamento iniciado em outra unidade de saúde, desde que não tenha havido interrupção do uso da medicação por mais de 30 dias. Neste último caso, o tipo de entrada deve ser “reingresso após abandono”. 6 T Medidas a serem adotadas Conduta frente a um caso suspeito de tuberculose pulmonar: • identificação e confirmação do caso; • baciloscopia direta do escarro no momento da consulta e solicitação de outra amostra a ser colhida no dia seguinte; Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 749 Tuberculose • raios X de tórax e realização de prova tuberculínica, nos casos negativos à baciloscopia; • cultura do escarro nos casos negativos à baciloscopia. Roteiro para investigação epidemiológica Identificação do paciente Diversas informações referentes ao paciente, ao lugar, ao caso e ao tempo são fornecidas durante o preenchimento da ficha de notificação. Por meio delas pode-se avaliar a situação e tendência da doença: • referentes ao lugar – unidade de saúde (ou outra fonte notificadora), logradouro, bairro, distrito, zona (urbana ou rural), município de notificação e residência, unidade federada e país; • referentes ao paciente – nome, sexo, idade, escolaridade, etnia (no caso de população indígena), critério diagnóstico, raça/cor, número do cartão SUS, nome da mãe, telefone, ocupação; • referentes ao tempo – data de notificação, data do diagnóstico, data de nascimento, data de início do tratamento atual; • referentes ao caso – número do prontuário, tipo de entrada, raios X (tórax), teste tuberculínico, forma clínica, agravos associados, baciloscopia de escarro, baciloscopia de outro material, cultura de escarro, cultura de outro material, teste HIV (soropositividade), histopatologia, drogas (esquema terapêutico utilizado), tratamento supervisionado, doença relacionada ao trabalho. Coleta e análise de dados clínicos e epidemiológicos Os dados deverão ser registrados, consolidados e analisados pela unidade de saúde e pelas esferas municipal, estadual e federal do sistema de saúde. A análise dos dados permite a tomada de decisões nas diferentes instâncias do sistema de vigilância. A distribuição esperada dos casos, por grupos etários e formas clínicas, pode ser observada na Figura 1. Deve ser investigado, junto à fonte notificadora, aumento importante de determinada forma clínica, para avaliação da qualidade do diagnóstico. A alteração do perfil epidemiológico esperado precisa ser analisada quanto à possível variação da história natural da doença. As unidades de saúde que têm ações de controle de diagnóstico e tratamento devem inscrever o paciente no Livro de Registro e Controle de Tratamento dos Casos de Tuberculose, para possibilitar a análise por coortes da distribuição dos casos por grupo etário, forma clínica, qualidade diagnóstica e resultado do tratamento. O registro de óbitos por tuberculose também deve ser analisado, comparando-se com os dados de morbidade. Acompanhamento do caso Por ser enfermidade de características crônicas, a evolução do caso de tuberculose deve ser acompanhada e registrada em notificação, para que possa ser encerrado de acordo com os seguintes critérios: 750 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tuberculose Alta por cura – pulmonares inicialmente positivos: a alta por cura será dada quando, ao completar o tratamento, o paciente apresentar duas baciloscopias negativas: uma na fase de acompanhamento e outra no final do tratamento (cura); Alta por completar o tratamento – será dada com base em critérios clínicos e radiológicos quando o paciente não tiver realizado o exame de escarro por ausência de expectoração e tiver alta com base em dados clínicos e exames complementares; e nos casos de tuberculose pulmonar inicialmente negativos e casos de tuberculose extrapulmonar; Alta por abandono de tratamento – será dada ao doente que deixou de comparecer à unidade por mais de 30 dias consecutivos, após a data prevista para seu retorno. Nos casos de tratamento supervisionado, o prazo de 30 dias é contado a partir da data da última tomada da droga. A visita domiciliar, realizada pela equipe de saúde, tem como um dos objetivos evitar que o doente abandone o tratamento; Alta por mudança de diagnóstico – será dada quando for constatado erro no diagnóstico; Alta por óbito – será dada por ocasião do conhecimento da morte do paciente, durante o tratamento e independentemente da causa; Alta por falência – será dada quando houver persistência da positividade do escarro ao final do 4º ou 5º meses de tratamento. Os doentes que no início do tratamento são fortemente positivos (+ + ou + + +) e mantêm essa situação até o 4º mês ou os que apresentam positividade inicial seguida de negativação e nova positividade por dois meses consecutivos, a partir do 4º mês de tratamento, são classificados como caso de falência. O aparecimento de poucos bacilos no exame direto do escarro, por volta do 5º ou 6º meses de tratamento, isoladamente, não necessariamente significa a falência do tratamento. O paciente deverá ser acompanhado com exames bacteriológicos para melhor definição. Observação: quando o caso for encerrado por falência e o paciente iniciar novo tratamento, deverá ser registrado como caso de retratamento no Livro de Registro e Controle de Tratamento dos Casos de Tuberculose; Alta por transferência – será dada quando o doente for transferido para outro serviço de saúde. A transferência deve ser processada através de documento que informará o diagnóstico e o tratamento realizado até o momento. Deve-se, no momento da avaliação da coorte, buscar a confirmação de que o paciente compareceu à unidade para a qual foi transferido, bem como o resultado do tratamento. Só serão considerados transferidos aqueles pacientes cujo resultado do tratamento for desconhecido. 6 T Controle pós-cura A maioria dos casos curados não necessita de controle pós-tratamento, devendo-se orientar o paciente a retornar à unidade apenas se surgirem sintomas semelhantes aos do início da doença. Após alta do tratamento por tuberculose multirresistente, o paciente deve ser acompanhado pelo menos a cada semestre, por três anos subseqüentes. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 751 Tuberculose Figura 1. Distribuição da tuberculose no Brasil, segundo grupos etários e formas clínicas 70% Baciloscopia positiva 90% Formas pulmonares 30% 85% Sem confirmação baciloscópica Maiores de 15 anos Formas extrapulmonares 10% Doentes 20% 75% Formas pulmonares 80% 15% Baciloscopia positiva Sem confirmação baciloscócpica Menores de 15 anos 25% Formas extrapulmonares Instrumentos disponíveis para controle Diagnóstico e tratamento Prioritariamente, a procura de casos de tuberculose deve ser efetuada nos sintomáticos respiratórios (indivíduos com tosse e expectoração por três ou mais semanas), que deverão submeter-se à rotina prevista para o diagnóstico de tuberculose. Os sintomáticos respiratórios deverão realizar radiografia de tórax, quando houver disponibilidade desse recurso. A anulação das fontes de infecção, através do tratamento dos doentes, é um dos aspectos mais importantes no controle da tuberculose. Deve-se avaliar mensalmente o doente e a evolução do tratamento, realizando-se, nos casos novos pulmonares com baciloscopia positiva (BK +), o controle bacteriológico, de preferência mensal e, obrigatoriamente, ao término do segundo, quarto e sexto meses de tratamento. Quando houver indicação de internação de pacientes com tuberculose, deve-se procurar adotar medidas de isolamento respiratório, especialmente tratando-se de pacientes bacilíferos e crônicos com multirresistência. Deve-se internar o doente em hospitais que tenham poder de resolução para os motivos que determinaram sua internação, não sendo obrigatória a especialização em pneumologia. O controle de contatos é prioritariamente indicado para os contatos que 752 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tuberculose convivam com doentes bacilíferos, especialmente os intradomiciliares, por apresentarem maior probabilidade de adoecimento, e nos adultos que convivam com doentes menores de 5 anos, para identificação da possível fonte de infecção. O fluxograma abaixo traz as condutas a serem adotadas com relação aos contatos, de acordo com o resultado dos exames. Avaliação dos contatos de casos de tuberculose pulmonar com baciloscopia positiva Adultos Adultos Assintomáticos Sintomáticos Orientação Exames de escarro 6 Positivo Negativo Tratamento Orientação/ encaminhamento Adultos Crianças até 15 anos Não vacinadas Vacinadas PPD Não-reator BCG Reator Raios X de tórax Sugestivo de TB + sintomas clínicos Normal e sem sintomas clínicos Assintomáticos Sintomáticos (II) Orientação Raios X de tórax Sugestivo de TB + sintomas clínicos Normal e sem sintomas clínicos Tratamento Tratamento T Medicação sintomática Tratamento Quimioprofilaxia Acompanhamento Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 753 Tuberculose Imunização A vacina BCG, sigla decorrente da expressão bacilo de Calmette-Guérin, é preparada a partir de uma cepa derivada do Mycobacterium bovis, atenuada por sucessivas passagens através de meio de cultura. Confere poder protetor às formas graves de tuberculose, decorrentes da primo-infecção. No Brasil, é prioritariamente indicada para as crianças de 0 a 4 anos de idade, sendo obrigatória para menores de um ano, como dispõe a Portaria nº 452, de 6/12/76, do Ministério da Saúde. Recomenda-se a revacinação com BCG nas crianças com 10 anos de idade, dose que pode ser antecipada para os seis anos, independente de ter ou não cicatriz vacinal. Não há necessidade de revacinação caso a primeira vacinação por BCG tenha ocorrido aos seis anos de idade ou mais. Há contra-indicação relativa ou temporária definindo o adiamento da aplicação da vacina, nos seguintes casos: peso ao nascer inferior a 2kg; reações dermatológicas na área de aplicação; doenças graves e uso de drogas imunossupressoras. Há contra-indicação absoluta para aplicar a vacina BCG nos portadores de imunodeficiências congênitas ou adquiridas. Os recém-nascidos e crianças soropositivas para HIV, ou filhos de mães com aids, desde que não apresentem os sintomas da doença, deverão ser vacinados. Pacientes adultos sintomáticos ou assintomáticos não deverão ser vacinados. Quimioprofilaxia A quimioprofilaxia da tuberculose consiste na administração de isoniazida em pessoas infectadas pelo bacilo (quimioprofilaxia secundária) ou não (quimioprofilaxia primária), na dosagem de 10mg/kg/dia (até 300mg), diariamente, por um período de 6 meses. Está recomendada nas seguintes situações: Contactantes de bacilífero, menores de 15 anos, não vacinados com BCG, reatores à prova tuberculínica, com 10mm ou mais, com exame radiológico normal e sem sintomatologia clínica compatível com tuberculose. Na eventualidade de contágio recente, a sensibilidade à tuberculina pode não estar exteriorizada, sendo negativa a resposta. Neste caso, deve-se repetir a prova em 40 a 60 dias. Se a resposta for positiva, indica-se a quimioprofilaxia; se negativa, vacina-se com BCG; Recém-nascidos coabitantes de foco bacilífero – administra-se a quimioprofilaxia por três meses e, após esse período, faz-se a prova tuberculínica na criança. Se reatora, mantém-se a isoniazida até completar 6 meses; se não reatora, suspende-se a droga e aplica-se a vacina BCG; Indivíduos com viragem tuberculínica recente (até 12 meses), isto é, que tiveram um aumento na resposta tuberculínica de, no mínimo, 10mm; População indígena – neste grupo, a quimioprofilaxia está indicada em todo o contato de tuberculose bacilífera, reator forte ao PPD, independente da idade e estado vacinal, após avaliação e, através de baciloscopia e exame radiológico, afastada a possibilidade de tuberculose; Imunodeprimidos por uso de drogas ou por doenças imunodepressoras e contatos intradomiciliares de tuberculosos, sob criteriosa decisão médica; 754 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Tuberculose Reatores fortes à tuberculina, sem sinais de tuberculose ativa mas com condições clínicas associadas a alto risco de desenvolvê-la, como: alcoolismo, diabetes insulinodependente, silicose, nefropatias graves, sarcoidose, linfomas, uso prolongado de corticosteróides em dose de imunossupressão, pacientes submetidos à quimioterapia antineoplásica ou a tratamento com imunossupressores, portadores de imagens radiológicas compatíveis com tuberculose ativa, sem história de quimioterapia prévia. Estes casos deverão ser encaminhados a uma unidade de referência para a tuberculose; Coinfectados HIV e M. tuberculosis – este grupo deve ser submetido à prova tuberculínica. Para considerar-se uma pessoa infectada pelo M. tuberculosis, o limite da reação ao PPD será de 5mm, ao invés de 10mm. A quimioprofilaxia para tuberculose em pacientes HIV+ será aplicada segundo as seguintes indicações: Indivíduo sem sinais ou sintomas sugestivos de tuberculose Indicações 1, 2 A. Com radiografia de tórax normal e reação ao PPD maior ou igual a 5mm3 ou contatos intradomiciliares ou institucionais de tuberculose bacilífera ou PPD não-reator ou com enduração entre 0-4mm, com registro documental de ter sido reator ao teste tuberculínico e não submetido a tratamento ou quimioprofilaxia na ocasião 6 B. Com radiografia de tórax anormal: presença de cicatriz radiológica de tuberculose sem tratamento anterior (afastada a possibilidade de tuberculose ativa, através de exames de escarro e radiografias anteriores), independentemente do resultado do teste tuberculínico Esquema4 Isoniazida, VO, 5 – 10 mg/kg/dia (dose máxima: 300mg/dia) por seis meses consecutivos 1. O teste tuberculínico deve ser sempre realizado na avaliação inicial do paciente HIV+, independentemente do seu estado clínico ou laboratorial (contagem de células CD4+ e carga viral), devendo ser repetido anualmente nos indivíduos não-reatores. Nos pacientes não-reatores e em uso de terapia anti-retroviral, recomenda-se fazer o teste a cada seis meses no primeiro ano de tratamento, devido à possibilidade de restauração da resposta tuberculínica. 2. A quimioprofilaxia com isoniazida reduz o risco de adoecimento a partir da reativação endógena do bacilo, mas não protege contra exposição exógena após sua suspensão. Portanto, em situações de possível reexposição ao bacilo da tuberculose, o paciente deverá ser reavaliado quanto à necessidade de prolongamento da quimioprofilaxia (caso esteja em uso de isoniazida) ou de instauração de nova quimioprofilaxia (caso esta já tenha sido suspensa). 3. Para pacientes com imunodeficiência moderada/grave e reação ao PPD >10mm, sugere-se investigar cuidadosamente tuberculose ativa (pulmonar ou extrapulmonar), antes de iniciar a quimioprofilaxia. 4. Indivíduos HIV+, contatos de pacientes bacilíferos com tuberculose isoniazida-resistente documentada, deverão ser encaminhados a uma unidade de referência para realizar quimioprofilaxia com rifampicina. Observações • Não se recomenda a quimioprofilaxia nos HIV positivos, não-reatores à tuberculina, com ou sem evidências de imunodeficiência avançada. Deve-se repetir a prova tuberculínica a cada seis meses. • Em pacientes com raios X normal, reatores à tuberculina, deve-se investigar outras patologias ligadas à infecção pelo HIV antes de iniciar a quimioprofilaxia, devido à concomitância de agentes oportunistas/manifestações atípicas de tuberculose freqüentes nessas coortes. • Nos indivíduos HIV positivos e tuberculino-positivos com raios X normal, sem sinais e sintomas de tuberculose, devem-se destacar (investigar) os contatos institucionais (casas de apoio, presídios, abrigos, asilos, etc.). Secretaria de Vigilância em Saúde / MS T 755 Tuberculose • Recomenda-se suspender imediatamente a quimioprofilaxia no surgimento de qualquer sinal de tuberculose ativa, monitorá-la nos casos de hepatotoxidade e administrá-la com cautela nos alcoólicos. Controle de infecção em unidades de saúde Um efetivo programa de controle de infecção da tuberculose, qualquer que seja a unidade de saúde, tem início com a detecção precoce, isolamento e tratamento de pessoas com tuberculose infectante (principalmente pacientes bacilíferos). Atenção especial deve ser dada àqueles que apresentam alguma forma de resistência às drogas. Pessoas com tuberculose extrapulmonar são usualmente não-infectantes; no entanto, a doença pode ser transmitida por contato com tecidos contendo o bacilo. Pacientes imunodeprimidos e, principalmente, com HIV positivo são os que apresentam maior susceptibilidade, exigindo medidas mais severas para o controle da infecção. O controle de infecção deve ser realizado com ênfase em três aspectos: • diminuição do risco de exposição dos pacientes a pessoas com tuberculose infectante; • controle da expansão e redução da concentração de partículas infectantes em suspensão (por exemplo: sistemas de ventilação, salas de isolamento de pacientes com maior risco de infecção); • uso de proteção respiratória individual (máscaras) em áreas com maior risco de exposição ao M. tuberculosis. Ações de educação em saúde Além das medidas descritas acima, faz-se necessário esclarecer a comunidade quanto aos aspectos importantes da doença, sua transmissão, prevenção e tratamento. O desconhecimento leva à discriminação do doente nos âmbitos familiar e profissional. O afastamento compulsório do trabalho contribui para o agravamento do sofrimento do paciente. 756 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Varicela/Herpes Zoster VARICELA/HERPES ZOSTER CID 10: B01 a B02 Características clínicas e epidemiológicas Descrição Varicela É uma infecção viral primária, aguda, caracterizada por surgimento de exantema de aspecto máculo-papular, de distribuição centrípeta, que, após algumas horas, adquire aspecto vesicular, evoluindo rapidamente para pústulas e, posteriormente, formando crostas em 3 a 4 dias. Pode ocorrer febre moderada e sintomas sistêmicos. A principal característica clínica é o polimorfismo das lesões cutâneas que se apresentam nas diversas formas evolutivas, acompanhadas de prurido. Em crianças, geralmente, é doença benigna e autolimitada. 6 Herpes zoster Geralmente, é decorrente da reativação do vírus da varicela que permanece em latência após a infecção primária. Ocorre principalmente em adultos e pacientes imunocomprometidos, como portadores de doenças crônicas, neoplasias, aids e outras. O herpes zoster tem quadro pleomórfico, causando desde doença benigna até outras formas graves, com êxito letal. Após a fase de disseminação hematogênica do vírus v-z, em que atinge a pele, difunde-se centripetamente pelos nervos periféricos até os gânglios nervosos, onde poderá permanecer, em latência, por toda a vida. Diversos fatores podem levar a uma reativação do vírus, causando a característica erupção do herpes zoster. Excepcionalmente, há pacientes que desenvolvem herpes zoster após contato com doentes de varicela e, até mesmo, com outro doente de zoster, o que indica a possibilidade de uma reinfecção em paciente já previamente imunizado. É também possível uma criança adquirir varicela por contato com doente de zoster. O quadro clínico do herpes zoster é, quase sempre, típico. A maioria dos doentes refere, antecedendo às lesões cutâneas, dores nevrálgicas, além de parestesias, ardor e prurido locais, acompanhados de febre, cefaléia e mal-estar. A lesão elementar é uma vesícula sobre base eritematosa. A erupção é unilateral, raramente ultrapassando a linha mediana, seguindo o trajeto de um nervo. Surgem de modo gradual, levando de 2 a 4 dias para se estabelecerem. Quando não ocorre infecção secundária, as vesículas evoluem para crostas e o quadro regride para a cura em 2 a 4 semanas. As regiões mais comprometidas são a torácica (53% dos casos), cervical (20%), trigêmeo (15%) e lombossacra (11%). Em pacientes imunossuprimidos, as lesões surgem em localizações atípicas e, geralmente, disseminadas. O envolvimento do VII par craniano leva a uma combinação de paralisia facial periférica e rash no pavilhão auditivo, denominado síndrome de Hawsay-Hurt, com prognóstico de recuperação pouco provável. O acometimento do nervo facial (paralisia de Bell) apresenta Secretaria de Vigilância em Saúde / MS V 757 Varicela/Herpes Zoster a característica de distorção da face. Lesões na ponta e asa do nariz sugerem envolvimento do ramo oftálmico do trigêmio com possível comprometimento ocular. Nos pacientes com herpes zoster disseminado e/ou recidivante, é aconselhável fazer sorologia para HIV, além de pesquisar neoplasias malignas. Sinonímia Catapora, “tatapora”, fogo que salta (varicela); cobreiro (herpes zoster). Agente etiológico É um vírus RNA. Vírus Varicella-zoster, da família Herpesviridae. Reservatório O homem. Modo de transmissão Pessoa a pessoa, através de contato direto ou secreções respiratórias e, raramente, através de contato com lesões. Transmitida indiretamente através de objetos contaminados com secreções de vesículas e membranas mucosas de pacientes infectados. Período de incubação Entre 14 a 16 dias, podendo variar entre 10 a 20 dias após o contato. Pode ser mais curto em pacientes imunodeprimidos e mais longo após imunização passiva. Período de transmissibilidade Varia de 1 a 2 dias antes da erupção até 5 dias após o surgimento do primeiro grupo de vesículas. Enquanto houver vesículas, a infecção é possível. Susceptibilidade e imunidade A susceptibilidade é universal. A infecção confere imunidade permanente, embora, raramente, possa ocorrer um segundo episódio de varicela. Infecções subclínicas são raras. A imunidade passiva transferida para o feto pela mãe que já teve varicela assegura, na maioria das vezes, proteção até 4 a 6 meses de vida extra-uterina. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas Período prodrômico – tem início com febre baixa, cefaléia, anorexia e vômito, podendo durar de horas até três dias. Na infância, esses pródromos não costumam ocorrer, sendo o exantema o primeiro sinal da doença. Em crianças imunocompetentes a varicela é geralmente benigna, com início repentino, apresentando febre moderada de 2 a 3 dias, 758 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Varicela/Herpes Zoster sintomas generalizados inespecíficos e uma erupção cutânea pápulo-vesicular que se inicia na face, couro cabeludo ou tronco (distribuição centrípeta). Período exantemático – as lesões comumente aparecem em surtos sucessivos de máculas que evoluem para pápulas, vesículas, pústulas e crostas. Tendem a surgir mais nas partes cobertas do corpo, podendo aparecer no couro cabeludo, na parte superior das axilas e nas membranas mucosas da boca e vias aéreas superiores. O aparecimento das lesões em surtos e a rápida evolução conferem à doença o polimorfismo regional característico da varicela: lesões em diversos estágios (máculas, pápulas, vesículas, pústulas e crostas) em uma mesma região do corpo. Nos adultos imunocompetentes a doença cursa de modo mais grave do que nas crianças, apesar de ser bem menos freqüente (cerca de 3% dos casos). A febre é mais elevada e prolongada, o estado geral é mais comprometido, o exantema mais pronunciado e as complicações mais freqüentes, podendo levar a óbito, principalmente devido a pneumonia primária. A varicela está associada à síndrome de Reye, que ocorre especialmente em crianças e adolescentes que fazem uso do ácido acetilsalicílico durante a fase aguda e caracteriza-se por um quadro de vômitos após o pródromo viral, seguido de irritabilidade, inquietude e diminuição progressiva do nível da consciência, com edema cerebral progressivo. A síndrome de Reye é o resultado de um comprometimento hepático agudo, seguido de comprometimento cerebral. Portanto, está contra-indicado o uso de ácido acetilsalicílico por pacientes com varicela. 6 Varicela e gravidez A infecção materna no primeiro ou segundo trimestre da gestação pode resultar em embriopatia. Nas primeiras 16 semanas de gestação há maior risco de lesões graves ao feto, resultando em baixo peso ao nascer, cicatrizes cutâneas, microftalmia, catarata e retardo mental. Gestantes que tiverem contato com casos de varicela e herpes-zoster devem receber a imunoglobulina humana contra este vírus. V Diagnóstico Principalmente através do quadro clínico-epidemiológico. O vírus pode ser isolado das lesões vesiculares durante os primeiros 3 a 4 dias de erupção. Diagnóstico laboratorial Os exames laboratoriais não são utilizados para confirmação ou descarte dos casos de varicela mas podem ser utilizados para o diagnóstico diferencial em casos graves. Os testes mais utilizados são o ensaio imunoenzimático (EIE), aglutinação pelo látex (AL) e a imunofluorescência indireta (IFI). A identificação do vírus Varicella-zoster pode ser realizada através da cultura do líquido vesicular. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 759 Varicela/Herpes Zoster Diagnóstico diferencial Varíola (erradicada), coxsackioses, infecções cutâneas, dermatite herpetiforme de During Brocq, impetigo, erupção variceliforme de Kaposi, riquetsioses, etc. Em caso de dúvida, encaminhar o paciente para uma unidade de referência. Complicações Infecção bacteriana secundária de pele: impetigo, abcesso, celulite e erisipela, causadas por S. aureus, Streptococcus pyogenes, que podem levar a quadros sistêmicos de sepse, com artrite, pneumonia, endocardite. Encefalite ou meningite e glomerulonefrite. Pode ocorrer síndrome de Reye, caracterizada por quadro neurológico de rápida progressão e disfunção hepática, associado ao uso de ácido acetilsalicílico principalmente em crianças. Infecção fetal, durante a gestação, pode levar à embriopatia, com síndrome da varicela congênita (varicela neonatal, em recém-nascidos expostos, com microoftalmia, catarata, atrofia óptica e do sistema nervoso central). Imunodeprimidos podem ter a forma de varicela disseminada ou varicela hemorrágica. Nevralgia pós-herpética: definida como dor persistente por 4 a 6 semanas após a erupção cutânea. Sua incidência é claramente associada à idade, atingindo cerca de 40% dos indivíduos acima de 50 anos. É mais freqüente em mulheres e após comprometimento do trigêmeo. Tratamento Sintomático – anti-histamínicos sistêmicos para atenuar o prurido e banhos de permanganato de potássio na diluição de 1:40 mil. Havendo infecção secundária, recomendase o uso de antibióticos sistêmicos. Varicela em crianças é uma doença benigna, não sendo necessário, em geral, tratamento específico. Tópico – compressas de permanganato de potássio (1:40 mil) ou água boricada a 2%, várias vezes ao dia. Específico – antivirais: aciclovir – em crianças, quando indicado, 20mg/kg/dose, via oral, 4 vezes ao dia, dose máxima 800mg/dia, durante 5 dias. Adultos: aciclovir, em altas doses, 800mg, via oral, 5 vezes ao dia, durante 7 dias. Seu uso está indicado apenas para casos de varicela de evolução moderada ou grave em maiores de 12 anos, com doença cutânea ou pulmonar crônica. Não está indicado seu uso em casos de varicela não complicada, sendo discutível a utilização em gestantes. Crianças imunocomprometidas não devem fazer uso de aciclovir oral. Aciclovir intravenoso é recomendado em pacientes imunocomprometidos ou em casos graves, na dosagem de 10mg/kg, a cada 8 horas, infundido durante uma hora, durante 7 a 14 dias. Seu uso está indicado, com restrições, em gestantes com complicações graves de varicela. Outros antivirais têm sido indicados. A nevralgia pós-herpética (NPH) é uma complicação freqüente (até 20% dos casos) da infecção pelo herpes zoster, que se caracteriza pela refratariedade ao tratamento. A terapia antiviral específica, iniciada dentro de 72 horas após o surgimento do rash, reduz a ocorrência da NPH. O uso de corticosteróides, na fase aguda da doença, não altera a incidência e a gravidade da NPH, porém reduz a neurite 760 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Varicela/Herpes Zoster aguda, devendo ser adotada em pacientes sem imunocomprometimento. Uma vez instalada a NPH, o arsenal terapêutico é enorme, porém não há uma droga eficaz para seu controle. São utilizados: creme de capsaicina, 0,025% a 0,075%; lidocaína gel, a 5%; amitriplina, em doses de 25 a 75mg, via oral; carbamazepina, em doses de 100 a 400mg, via oral; benzodiazepínicos; rizotomia, termocoagulação e simpatectomia. Aspectos epidemiológicos A varicela é uma doença benigna mas altamente contagiosa, que ocorre principalmente em menores de 15 anos. É mais freqüente no final do inverno e início da primavera. Indivíduos imunocomprometidos, quando adquirem varicela primária ou recorrente, possuem maior risco de doença grave. Em recém-nascidos de mães com varicela no primeiro semestre de gravidez, a taxa de ataque para síndrome de varicela congênita é 1,2%; quando a infecção ocorreu entre a 13ª e 20ª semanas de gestação, de 2%. Recém-nascidos que adquirem varicela entre 5 e 10 dias de vida, cujas mães infectaram-se no período situado entre cinco dias antes do parto e dois dias após o mesmo, estão mais expostos à varicela grave, cuja letalidade pode atingir 30%. Herpes zoster e aids – a partir de 1981, o herpes zoster passou a ser reconhecido como uma infecção freqüente em pacientes portadores de HIV. Posteriormente, observações epidemiológicas demonstraram tratar-se de uma manifestação inicial de infecção pelo HIV, cuja ocorrência é preditiva de soropositividade para HIV em populações de risco. A incidência de herpes zoster é significativamente maior entre indivíduos HIV positivos que entre os soro negativos (15 vezes mais freqüente nos primeiros). A incidência cumulativa de zoster por 12 anos após a infecção pelo HIV foi de 30%, ocorrendo segundo uma taxa relativamente constante, podendo ser manifestação precoce ou tardia da infecção pelo HIV. Complicações, como retinite, necrose aguda de retina e encefalite progressiva fatal, têm sido relatadas com mais freqüência em pacientes HIV positivos. 6 Situação epidemiológica da varicela no Brasil No Brasil, a varicela não é uma doença de notificação compulsória, embora os surtos devam ser notificados às secretarias municipais e estaduais de saúde. A seguir, são apresentados os principais achados de dois estudos de soroprevalência da varicela, bem como uma análise preliminar dos dados de morbidade e mortalidade a partir dos dados do Sistema de Informações Hospitalares (SIH-SUS) e do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM). Um estudo realizado em 1997 avaliou a prevalência da infecção pelo vírus Varicellazoster em 975 amostras de soro de adultos jovens de 20-29 anos, doadores de sangue de cinco capitais brasileiras (Fortaleza, Salvador, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre). A soroprevalência global de anticorpos antivaricela zoster foi de 94% e a soroprevalência nas regiões de clima tropical (Fortaleza e Salvador, 89%) foi significativamente menor que nas regiões de clima temperado (97%). Outro estudo, conduzido no período de 1992 a 1994 em escolas públicas do município de São Paulo, indica que o contato com o vírus Varicella-zoster Secretaria de Vigilância em Saúde / MS V 761 Varicela/Herpes Zoster ocorre nos primeiros anos da infância. Cerca de 40% das crianças com 1 ano apresentaram anticorpos antivaricela zoster, proporção que aumentou rapidamente até o 3º ano, mantevese ascendente e alcançou 90% aos 10 anos. No período de 1998 a 2002, foram registradas no SIH-SUS 6.558 internações por varicela, com média anual de 1.312 casos (desvio padrão=546) (Figura 1). O maior número de hospitalizações concentra-se na faixa etária de 1 a 4 anos, seguido dos menores de 1 ano e de 5-9 anos. Embora o maior número absoluto de hospitalizações seja observado entre crianças, grupo em que se espera o maior número de casos da doença, proporcionalmente os adultos apresentam maior risco de evoluir com complicações, hospitalização e óbito, como demonstrado na Figura 2, na qual vê-se que a taxa de letalidade entre os casos hospitalizados aumenta com a idade, chegando a 5% na faixa etária de 50 anos ou mais e 3% na faixa etária de 15 a 49 anos. De 1998 a 2002, ocorreram 1.464 óbitos cuja causa básica foi varicela, de acordo com o SIM (Figura 1). Excetuando 1999, ano em que foi registrado o maior número de óbitos por varicela nesse período (n=212), a média anual foi de 104 óbitos (desvio padrão=25). Os óbitos concentram-se nas faixas etárias de 1 a 4 anos, seguidos de menores de 1 ano e maiores de 30 anos. Figura 1. Hospitalizações, óbitos e taxa de letalidade por ano de ocorrência de varicela. Brasil, 1998-2002 250 10.000 200 1.000 150 100 100 10 50 0 1 1998 Hospitalizações Fonte: SIH-SUS e SIM 762 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 1999 2000 Óbitos SIH 2001 Letalidade 2002 Óbitos SIM Varicela/Herpes Zoster Figura 2. Hospitalizações por varicela e taxa de letalidade acumuladas por faixa etária. Brasil, 1998-2002 3.500 6 3.000 5 2.500 4 2.000 3 1.500 2 1.000 1 500 0 0 <1 5 - 14 1-4 15 - 49 6 > 50 Faixa etária Hospitalizações Letalidade Fonte: SIH-SUS e SIM Vigilância epidemiológica Objetivos Conhecer os padrões de ocorrência da doença (sazonalidade e distribuição por faixa etária) e detectar surtos em sua fase inicial. A vigilância de casos graves de varicela visa monitorar a intensidade da circulação viral e fatores associados à gravidade e óbito, que possam, inclusive, reorientar as atuais recomendações de vacinação. Definição de caso V Suspeito Varicela – paciente com quadro de febre moderada, de início súbito, que dura de 2 a 3 dias, e sintomas generalizados inespecíficos (mal-estar, adinamia, anorexia, cefaléia e outros) e erupção cutânea pápulo-vesicular que se inicia na face, couro cabeludo ou tronco (distribuição centrípeta: cabeça e tronco). Surtos de varicela – considerar como surto de varicela a ocorrência de um número de casos acima do limite esperado, com base nos anos anteriores, ou casos agregados em instituições, como creches, escolas e hospitais pediátricos. Varicela grave – paciente com febre alta (>38ºC) e lesões cutâneas polimorfas (pápulas, vesículas, pústulas, crostas) que tenha sido hospitalizado ou evoluiu com complicações Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 763 Varicela/Herpes Zoster ou óbito e pertença a um dos seguintes grupos: recém-nascidos, adolescentes, adultos, pacientes imunodeprimidos, gestantes. Confirmado Critério clínico – manifestações clínicas características da varicela. Paciente com febre moderada de 2 a 3 dias, de início repentino, sintomas generalizados inespecíficos (mal-estar, adinamia, anorexia, cefaléia e outros) e erupção cutânea pápulo-vesicular. Critério clínico-epidemiológico – todo caso suspeito de varicela que teve contato com caso de varicela até 8 dias antes do início do exantema. Descartado Caso suspeito de varicela não grave cuja avaliação clínico-epidemiológica conclua ser outra doença. Caso suspeito de varicela grave com diagnóstico laboratorial negativo para varicela ou confirmado como outra doença. Notificação Não é doença de notificação compulsória. Portanto, a ocorrência de casos suspeitos de varicela não requer imediata notificação e investigação. Na situação de surto, a notificação deve ser realizada através do módulo de notificação de surtos do Sinan-W. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente Tratamento sintomático em nível ambulatorial. Hospitalização imediata dos pacientes com varicela grave ou zoster disseminado, em regime de isolamento. Proteção da população Afastar os acometidos das atividades desenvolvidas na escola, creche, trabalho, etc., por um período de 10 dias, contados a partir da data de aparecimento do exantema. Vacinar os indivíduos sob risco de desenvolver formas graves, de acordo com as orientações pertinentes à imunização. Investigação Recomenda-se investigar os casos graves. Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente Preencher todos os campos da ficha de notificação. 764 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Varicela/Herpes Zoster Coleta de dados clínicos e epidemiológicos • É necessário consultar o prontuário e entrevistar o médico assistente para completar as informações clínicas sobre o paciente. Estas informações servirão para definir se o quadro apresentado é compatível com a varicela grave. • Sugere-se fazer uma cópia da anamnese, exame físico e evolução do doente, com vistas ao enriquecimento da análise. • Verificar se o paciente foi vacinado previamente contra a varicela, se entrou em contato com casos de varicela ou herpes zoster ou se já teve varicela em algum momento de sua vida. Registrar a data da vacinação para saber se o mesmo encontrava-se protegido. Esta informação é também utilizada como subsídio para a escolha dos exames laboratoriais. • Acompanhar a evolução dos pacientes e os resultados dos exames laboratoriais específicos. • Verificar, na residência, se estão ocorrendo outros casos. Investigar minuciosamente: deslocamentos do caso, de familiares e/ou de amigos (considerar todos os deslocamentos que antecederam 10 dias do início do exantema, inclusive os de curta duração), para identificar a ocorrência de outros casos. 6 Análise dos dados A análise dos dados da investigação deve permitir a avaliação da magnitude do problema e a adequação das medidas adotadas. Esta análise deve ser orientada para a identificação do local de transmissão, fonte de infecção, dimensionamento da real magnitude do episódio, extensão do surto, etc. Consolidar os dados considerando as características de pessoa, tempo e área geográfica. Encerramento de casos Os casos notificados serão classificados de acordo com os critérios mencionados na definição de caso. Relatório final Os dados da investigação deverão ser sumarizados em um relatório com as principais conclusões. V Instrumentos disponíveis para controle Imunização As vacinas contra a varicela, administradas por via subcutânea a partir dos 12 meses de idade, são de vírus vivo atenuado provenientes da cepa OKA. Cada dose deve conter, no mínimo, 1.350 unidades formadoras de placa UFP de vírus Varicella-zoster em cultura de células contendo traços de neomicina e gelatina. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 765 Varicela/Herpes Zoster Até o momento, a vacinação universal contra a varicela não é realizada no Brasil, exceto nas populações indígenas. A vacina é recomendada em caso de surto nas populações indígenas a partir dos 6 meses e para a prevenção da doença em indivíduo susceptível de qualquer idade, até 96 horas após a exposição a uma fonte de infecção, desde que seja integrante de grupo de risco para as formas graves da doença. Situações especiais em que deve ser indicada a vacina contra a varicela, de acordo com as orientações dos Centros de Referências de Imunobiológicos Especiais (CRIEs): • pacientes com leucemia linfocítica aguda e com tumores sólidos em remissão (há pelo menos 12 meses), desde que apresentem 1.200 linfócitos/mm3 ou mais, sem radioterapia; caso estejam em quimioterapia, suspendê-la por sete dias antes e sete dias após a vacinação; • pessoas susceptíveis à doença, candidatos a transplante de órgãos (fígado, rim, coração, pulmão e outros orgãos sólidos), pelo menos três semanas antes do ato cirúrgico; • profissionais de saúde susceptíveis à doença; • familiares de pacientes imunodeprimidos, susceptíveis à doença; • demais pessoas susceptíveis, além dos profissionais de saúde e familiares, que estejam em convívio hospitalar ou domiciliar com pacientes imunodeprimidos; • HIV positivo, assintomático e oligossintomático. Contra-indicações da vacina • Gestantes (mulheres em idade fértil devem evitar a gravidez durante 30 dias após a administração). • Imunodeprimidos, exceto os casos previstos nas indicações acima (pacientes em uso de terapia imunossupressora só deverão fazer uso da vacina após três meses de suspensão da medicação). • Anafilaxia à dose anterior da vacina ou a qualquer um dos seus componentes. Eventos adversos – dor transitória, hiperestesia, rubor no local da aplicação. Um mês após a vacinação, pode ocorrer exantema maculopapular ou variceliforme, de pequena intensidade, em cerca de 7% a 8% dos indivíduos. O risco de herpes zoster é mais baixo após a vacinação do que após a doença natural. Imunoglobulina humana antivaricela–zoster – é obtida de plasma humano contendo títulos altos de IgG contra o vírus da varicela. Contém de 10% a 18% de globulina e timerosol como preservativo. É administrada por via intramuscular em qualquer idade. Indicação – indivíduo imunodeprimido que tenha tido contato com doente de varicela em fase contagiosa. 766 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Varicela/Herpes Zoster Ações de educação em saúde Em situações de surto, desenvolver atividades de educação em saúde, principalmente em escolas e creches, visando orientar os professores e pais para que os indivíduos com suspeita da doença permaneçam em casa. Alertar para a necessidade de vacinar os indivíduos conforme as situações apontadas no tópico Imunização e evitar que mantenham contato com pessoas que tenham a doença. 6 V Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 767 Varíola VARÍOLA CID 10: B03 Características clínicas e epidemiológicas Descrição A varíola é uma doença viral, exclusiva de humanos. Desde seu último caso registrado, em 26 de outubro de 1977, na Somália, encontra-se erradicada no mundo. Contudo, apresenta-se como potencial ameaça contra todos os países, principalmente pela possibilidade de seu uso em atos terroristas. É considerada uma das mais sérias de todas as doenças infecciosas, matando de 25% a 30% das pessoas infectadas não imunizadas. Em 1980, após a interrupção de sua circulação viral, a vacinação foi interrompida, exceto em trabalhadores de laboratório que manipulavam o agente em pesquisas. Oficialmente, apenas dois laboratórios conservam estoques do vírus: um nos Estados Unidos da América e outro na Rússia. Entretanto, após o atentado de 11 de setembro de 2001, cogitou-se a possibilidade de que outros estoques estejam conservados em locais desconhecidos. Sinonímia Bexiga, alastrim. Agente etiológico Vírus DNA, do gênero Orthopoxvirus, da subfamília Chordopoxvirinae da família Poxviridae. É um dos vírus mais resistentes, em particular, aos agentes físicos. Reservatório Não há reservatório animal e os seres humanos não são portadores. Desta forma, presume-se que o vírus tenha emergido de um reservatório animal, no passado, após o primeiro assentamento de agricultores, cerca de 10 mil anos a.C., quando os aglomerados populacionais tornaram-se grandes o suficiente para manter a transmissão de pessoa a pessoa. Modo de transmissão De pessoa a pessoa, através de gotículas de saliva e aerossóis. Período de incubação De 10 a 14 dias (variando de 7 a 19 dias) após a exposição. Período de transmissibilidade Em média, três semanas, prazo que vai desde o momento em que aparecem as primeiras lesões até o desprendimento de todas as crostas. A fase de maior contaminação é o 768 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Varíola período anterior ao surgimento das erupções, por meio de gotículas de aerossóis que levam o vírus às lesões orofaríngeas. Susceptibilidade e imunidade Aspectos como idade, sexo, raça e clima não evitam nem favorecem a transmissão da varíola. Aspectos clínicos e laboratoriais Manifestações clínicas Paciente com doença sistêmica, que apresenta pródromos com duração média de dois a quatro dias, iniciada com sintomas inespecíficos, tais como febre alta, mal-estar intenso, cefaléia, dores musculares, náuseas e prostração, podendo apresentar dores abdominais intensas e delírio. A doença progride com o aparecimento de lesões cutâneas (mácula, pápula, vesícula, pústula e formação de crostas) em surto único, de duração média entre um e dois dias, com distribuição centrífuga, atingindo mais a face e membros. Observa-se o mesmo estágio evolutivo das lesões em determinada área. 6 Diagnóstico diferencial O principal diagnóstico diferencial é com a varicela, sendo quase impossível distinguilas clinicamente nos primeiros 2 a 3 dias de aparecimento das máculas. Varíola Varicela Alastrim – Bexiga Catapora Início entre 7 e 17 dias após contato com doente de varíola Início de 14 a 21 dias após contato com doente de varicela O paciente apresenta febre e mal-estar, 2 a 4 dias antes de aparecerem as lesões O paciente não apresenta sintomas até o aparecimento das lesões As lesões duram de 1 a 2 dias. Não aparecem lesões novas após este período As lesões aparecem em diversas fases, durante vários dias até uma semana As lesões são mais numerosas na face, braços e pernas, inclusive nas palmas das mãos e plantas dos pés As lesões são mais numerosas no tronco, sendo raras nas palmas das mãos ou planta dos pés Em um mesmo segmento do corpo, as lesões encontram-se em um mesmo estágio de evolução (Ex.: não são observadas crostas e vesículas ao mesmo tempo) As lesões apresentam estágios diferentes de evolução, em um mesmo segmento do corpo. Máculas, vesículas, pústulas e crostas podem ser encontradas simultaneamente As crostas se formam de 10 a 14 dias após o início da erupção, e caem entre o 14° ao 28° dia após o início das lesões As crostas se formam de 4 a 7 dias após o início da erupção, e caem dentro dos 14 dias após o aparecimento das lesões Secretaria de Vigilância em Saúde / MS V 769 Varíola Outros diagnósticos diferenciais – impetigo, eczema infectado, sífilis secundária, escabiose, picadas de insetos, erupções medicamentosas, eritema multiforme. Quando se apresenta sob a forma hemorrágica, a varíola pode ser confundida com a leucemia aguda, meningococcemia e púrpura trombocitopênica idiopática. Diagnóstico laboratorial Existem vários métodos para a confirmação diagnóstica da varíola; alguns são específicos na identificação do vírus da varíola; outros, para identificação de Orthopoxvirus em geral. Podem ser submetidos a exame, raspado de lesões de pele (pápulas, vesículas, pústulas e crostas) e amostras de sangue, colhidos por profissional de saúde vacinado contra a varíola e devidamente protegido com equipamentos de proteção individual (avental, máscara, óculos e luvas) e manipulados em ambiente de contenção de risco biológico. As amostras podem ser examinadas diretamente por microscopia eletrônica, para a identificação de vírions, e o antígeno viral pode ser identificado por imunohistoquímica. A reação em cadeia da polimerase (PCR) para o gênero Orthopoxvirus pode detectar o vírus variólico antes do início dos sintomas. As provas sorológicas (Elisa, IFA) não identificaram a espécie do vírus e o pareamento das amostras está indicado para diferenciar uma infecção recente de uma vacinação no passado. Os métodos sorológicos, com detecção de IgM específica, estão sendo aprimorados de forma a aumentar a sensibilidade e especificidade. O isolamento viral em cultivo celular ou em membranas corioalantóicas são considerados padrão-ouro na identificação do vírus. Tratamento Não há tratamento específico para a varíola. A terapia é de suporte, mantendo-se o balanço hidroeletrolítico e cuidados de enfermagem. A antibioticoterapia é indicada para o tratamento de infecções bacterianas secundárias, que são freqüentes. Aspectos epidemiológicos A varíola foi uma doença de grande impacto na saúde pública mundial. Em 1967, 33 países ainda eram considerados endêmicos, com cerca de 10-15 milhões de casos notificados por ano. Como a mortalidade média atingia a casa dos 30% em pessoas não vacinadas, cerca de 3 milhões de mortes ocorriam anualmente. Estudos demonstraram que no hemisfério norte a varíola era mais freqüente no inverno e na primavera, estações coincidentes, no hemisfério sul, com o verão e outono, onde parecia também aumentar a incidência da varíola, quando esta era endêmica. A introdução da varíola no território brasileiro ocorreu com os primeiros colonizadores e escravos no século XVI e a primeira epidemia registrada data de 1563, na ilha de Itaparica na Bahia, de onde se disseminou para o resto do país. Em 1804, foi introduzida a vacina jeneriana no país, dando-se início às campanhas de combate à virose. Em 1962, o Ministério da Saúde criou a Campanha Nacional Contra a Va- 770 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Varíola ríola, com resultados inexpressivos, e a média anual de casos mantinha-se elevada, em torno de 3 mil, atingindo principalmente a faixa etária de menores de 15 anos (80% dos casos). Em agosto de 1966, foi instituída a Campanha de Erradicação da Varíola e só durante a fase de ataque, encerrada em 16 de outubro de 1971, cerca de 88% da população brasileira havia sido vacinada. A notificação mensal de casos diminuiu e a vigilância ativa da doença permitiu reduzir a ocorrência de casos e notificação, o que aumentava a efetividade dos bloqueios vacinais. Em 1971, com o prosseguimento dos trabalhos de vacinação, foi-se interrompendo a transmissão no país, registrando-se apenas 19 casos de varíola, todos no estado do Rio de Janeiro. A última notificação da doença foi em abril daquele ano e desde então não há registro de casos de varíola no Brasil. Atualmente, considera-se importante estar preparado para responder a um possível ataque com o vírus da varíola como arma biológica, por se saber que este agente é relativamente estável, de fácil disseminação (aerossolização) e alta transmissibilidade. 6 Vigilância epidemiológica Objetivos Manter erradicada a varíola, mediante a detecção precoce de casos suspeitos e adoção das medidas de controle pertinentes. Definição de caso Suspeito Todos os pacientes provenientes de países ou regiões com suspeita de disseminação acidental ou intencional do vírus da varíola, com sinais clínicos inespecíficos e que, até 4 dias do início dos sintomas, apresentem lesões cutâneas. Confirmado Critério clínico-laboratorial – todo caso suspeito que apresente isolamento do vírus da varíola. Critério clínico-epidemiológico – todo caso suspeito de varíola, proveniente de países ou regiões em que outros casos tenham sido confirmados laboratorialmente, ou casos que tenham relato de manifestação clínica característica de varíola e que tenham evoluído para óbito. V Descartado Caso suspeito com diagnóstico laboratorial negativo, desde que se comprove que as amostras foram coletadas e transportadas adequadamente; ou caso suspeito com diagnóstico confirmado de outra doença. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 771 Varíola Notificação A ocorrência de casos suspeitos de varíola requer imediata notificação e investigação, por se tratar de doença grave. Um caso pode significar a existência de um surto, o que impõe a adoção imediata de medidas de controle. Por ser doença de notificação compulsória internacional, todo caso suspeito deve ser prontamente comunicado por telefone, fax ou e-mail às autoridades sanitárias superiores. Primeiras medidas a serem adotadas Assistência médica ao paciente Hospitalização imediata dos pacientes em hospitais de referência, para isolamento e tratamento, tendo-se o cuidado de verificar se todos os profissionais foram imunizados previamente (interrogar sobre história vacinal e inspecionar a marca da vacina “pega”). Qualidade da assistência Verificar se os casos estão sendo atendidos em unidade de saúde de referência com atendimento adequado e oportuno. Proteção individual para evitar a circulação viral Todos os profissionais do hospital de referência deverão estar previamente imunizados e devem utilizar equipamento de proteção padrão e máscara tipo N-95. Roupas íntimas e de cama deverão ser acondicionadas em sacos para transporte de material biológico e, posteriormente, autoclavados e incinerados. O local deverá ser descontaminado, de acordo com as normas do programa de infecção hospitalar. Proteção da população Logo que se tenha conhecimento da suspeita de caso(s) de varíola, deve-se organizar um bloqueio vacinal nas áreas onde o paciente esteve no período de viremia, privilegiando as populações expostas ao risco de transmissão, não sendo necessário aguardar os resultados dos exames laboratoriais para confirmação dos casos suspeitos. Utilizar os meios de comunicação de massa para esclarecimentos à população. Organizar visitas domiciliares e palestras nas comunidades. Veicular informações sobre o ciclo de transmissão da doença, sua gravidade e esclarecimentos sobre a situação de risco. Investigação Imediatamente após a notificação de um ou mais casos de varíola, deve-se iniciar a investigação epidemiológica para permitir que as medidas de controle possam ser adotadas em tempo oportuno. É imprescindível que os profissionais que irão participar das investigações tenham sido vacinados previamente, antes de se deslocarem para a provável área de transmissão. 772 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Varíola Roteiro da investigação epidemiológica Identificação do paciente Deverão ser preenchidos todos os itens da ficha de notificação do Sinan relativos aos dados gerais, notificação individual e dados de residência. Não se dispõe de ficha epidemiológica de investigação no Sinan, devendo-se elaborar uma específica para este fim, que contenha campos que coletem os dados das principais características clínicas e epidemiológicas da doença. Coleta de dados clínicos e epidemiológicos Por se tratar de doença erradicada, com pouca probabilidade de ocorrência, a história epidemiológica é importantíssima para fundamentar a suspeita diagnóstica de varíola. Assim, torna-se da maior importância entrevistar o médico que atendeu o paciente e pesquisar se existe alguma evidência (nacional ou internacional) de transmissão intencional e se o paciente é procedente de alguma região com reativação de “foco da doença”. Como, em geral, quando da suspeita de varíola os doentes são hospitalizados, devese consultar o prontuário, além da entrevista ao médico assistente, visando completar as informações clínicas e epidemiológicas sobre o paciente – as quais servirão para definir se o quadro apresentado é compatível com a doença. Cuidar para que a identificação e o endereço do paciente sejam preservados. Sugere-se fazer uma cópia da anamnese, exame físico e evolução do doente, com vistas ao enriquecimento das análises e, também, para que possam servir como instrumento de aprendizagem dos profissionais do nível local. Acompanhar a evolução dos pacientes e os resultados dos exames laboratoriais específicos. 6 Para identificação da área de transmissão Investigar minuciosamente • Procedência e deslocamentos do caso, de familiares e/ou amigos (considerar todos os deslocamentos anteriores aos dias do início dos sintomas, inclusive os de curta duração), para caracterizar se houve permanência em local de provável circulação viral; • Notícias de casos de varicela naquele período, para estabelecer o diagnóstico diferencial, bem como averiguar esta ocorrência em anos anteriores. V Estes procedimentos devem ser feitos mediante entrevista com o paciente, familiares ou responsáveis e líderes da comunidade. Tais dados, que serão anotados na ficha de investigação e folhas anexas, permitirão identificar o provável local de transmissão do vírus. Por se tratar de doença com alto poder de disseminação, caso se fundamente a suspeita diagnóstica cabe verificar, rápida e imediatamente a história dos deslocamentos de todos os casos suspeitos. Deste modo, serão definidos com maior grau de certeza o(s) local(is) provável(eis) de infecção, bem como a abrangência da circulação do vírus. Importante ob- Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 773 Varíola servar que mesmo a permanência de poucas horas com pacientes com suspeita de varíola ou em locais com fômites de doentes podem resultar em infecção. Lembrar que a identificação da área onde ocorreu a transmissão é de fundamental importância para nortear a continuidade do processo de investigação e a extensão das medidas de controle imediatas. Para determinação da extensão da área de transmissão Busca ativa de casos humanos • Após a identificação do possível local de transmissão, iniciar imediatamente a busca ativa de outros casos humanos, casa a casa, e em unidades de saúde. Além daqueles com sinais e sintomas evidentes de varíola/varicela, deve-se considerar os óbitos com quadro sugestivo da doença, ocorridos nos dias anteriores na comunidade, e os oligossintomáticos, inclusive todos os indivíduos, na área, que apresentarem febre (vigilância de casos exantemáticos), com ou sem outras manifestações clínicas, pois os resultados dos exames laboratoriais irão esclarecer o diagnóstico. • Tanto em área urbana como rural, o procedimento é o mesmo e a delimitação da busca baseia-se nos resultados da busca ativa e história epidemiológica dos primeiros casos. Coleta e remessa de material para exames Logo após a suspeita clínica de varíola, coletar material de todos os casos (óbitos, formas graves ou oligossintomáticas), de acordo com as normas técnicas, observando-se criteriosamente todas as recomendações. É da responsabilidade dos profissionais da vigilância epidemiológica e/ou dos laboratórios centrais ou de referência viabilizar, orientar ou mesmo realizar as coletas. Caso haja forte suspeita clínica e vínculo epidemiológico claramente estabelecido, não se deve aguardar os resultados dos exames para o desencadeamento das medidas de controle e outras atividades da investigação, embora sejam imprescindíveis para confirmar e nortear o encerramento dos casos. Atentar para a interpretação dos resultados de sorologias quando não se utilizar exame de detecção de IgM, considerando as datas de coleta e dias de aparecimento dos sintomas, necessidade de amostras pareadas e o estado vacinal do paciente, que pode levar a resultados falso-positivos. Análise dos dados A análise dos dados da investigação deve permitir a avaliação da magnitude do problema e a adequação das medidas adotadas, visando impedir a propagação da doença e indicar se as ações de prevenção e alerta às autoridades e comunidades devem ser mantidas a curto e médio prazos. Desde o início, o investigador deve analisar os dados coletados para alimentar o processo de decisão das atividades de investigação e ações de controle. Esta análise, como referido 774 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Varíola anteriormente, deve ser orientada para identificação da procedência do vírus, se este permanece circulando ou se foi exportado para outras áreas por meio de migração ou fluxo turístico; dimensionamento da real magnitude do episódio (incidência e letalidade); extensão da área onde o vírus circulou e se outras áreas estão sob risco de introdução do vírus, etc. Para isso, o profissional deve interpretar, passo a passo, os dados coletados, de modo a definir a extensão do bloqueio vacinal, as atividades para continuidade da investigação e a ampliação, redução ou interrupção das medidas adotadas, de acordo com as evoluções do evento e da investigação. A consolidação dos dados, considerando as características de pessoa, tempo e, principalmente, área geográfica, permitirá uma caracterização detalhada do episódio. Encerramento de caso Os dados de cada caso devem ser analisados visando definir qual o critério utilizado para o diagnóstico, considerando as seguintes alternativas: • confirmado por critério clínico-laboratorial – isolamento viral, sorologia e histopatologia; • confirmado por critério clínico-epidemiológico – verificar se existe vínculo epidemiológico entre o caso suspeito e outros casos confirmados de varíola; • óbitos – também serão considerados confirmados os óbitos de paciente com vínculo epidemiológico e manifestações clínicas de varíola; • caso descartado – caso notificado cujos resultados de exames laboratoriais adequadamente coletados e transportados foram negativos ou tiveram como diagnóstico outra doença. 6 Observar se todos os dados necessários ao encerramento dos casos e do evento (epidemia ou caso isolado) foram coletados durante a investigação, devendo estar criteriosamente registrados e analisados. Relatório final Os dados da investigação deverão ser sumarizados em um relatório com as principais conclusões. V Instrumentos disponíveis para controle Imunização O Brasil recebeu o Certificado Internacional de Erradicação da Varíola em 1973. Com a erradicação da doença, a vacinação foi excluída da rotina dos serviços de saúde pública. As pessoas vacinadas no passado não estão necessariamente protegidas, pois o nível de imunidade é incerto, portanto, são consideradas susceptíveis. A maioria dos estudos sugere que a imunidade permanece por três a cinco anos, mas pode ser estimulada em uma simples revacinação. A infecção prévia pelo vírus selvagem confere imunidade permanente. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 775 Varíola A vacina é constituída por vírus vivo atenuado (vaccinia), que se multiplica nas camadas superficiais da pele. A administração da vacina é realizada com a técnica de múltipla punção, com agulha bifurcada de uso único, acondicionada com a vacina reconstituída.O sucesso da vacinação é considerado quando acontece a “pega”. Recomendações para a vacinação Estratégia a primária A vacinação dos contatos deve ser baseada na identificação de um caso de varíola e na vacinação das pessoas que tiveram contato com um caso de varíola, ou muito provavelmente tiveram este contato, pois são as que apresentam grande chance de desenvolver a doença. Se os contatos forem vacinados em até quatro dias após o contato com o caso de varíola, poderão estar protegidos contra o desenvolvimento da doença ou desenvolver uma doença menos severa. À medida que ocorre a transmissão da varíola, usualmente através do contato íntimo, exceto em circunstâncias especiais, as pessoas que mantêm contato íntimo domiciliar com um doente são as que apresentam maior risco de desenvolver a doença. Por isso, a vacinação das mesmas deve ser priorizada. Indivíduos que, muito provavelmente, entraram em contato com um contato assintomático de um caso de varíola (membros do mesmo domicílio) também devem ser vacinados para prevenir a infecção, pois podem desenvolver a doença posteriormente. Some-se a isso a possibilidade de isolamento dos indivíduos contagiosos (aqueles que apresentam exantema), para prevenir o contato com os não-vacinados, ou indivíduos susceptíveis, durante o período de infecciosidade (do início do rash até que todas as crostas tenham caído), limitando a posterior oportunidade de transmissão da doença. A vigilância intensiva dos outros contatos e casos potenciais na área ajudará a identificar outros grupos para a vacinação focal e o isolamento. As estratégias de vacinação contra a varíola em um surto devem estar baseadas em: • identificação e vacinação dos contatos íntimos dos casos; • monitoramento dos contatos vacinados e isolamento daqueles que desenvolverem febre; • vacinação dos membros do domicílio que não tiverem contra-indicação para a vacinação, a fim de protegê-los, se o contato desenvolver varíola. Os membros do domicílio de um contato que não podem ser vacinados, devido a contra-indicações, devem ficar fora da casa para evitar o contato até o final do período de incubação (18 dias) ou até 14 dias após a vacinação do contato; • vacinação dos trabalhadores da assistência e da saúde pública (médicos e enfermeiros, dentre outros profissionais) que estarão diretamente envolvidos na avaliação, tratamento, transporte ou entrevistas com casos potenciais de varíola; • vacinação de outros recursos humanos que apresentem probabilidade razoável de ter contato com pacientes de varíola ou materiais infectados (ex.: pessoal militar, emergência, grupos especiais de secretarias de segurança pública, entre outros). 776 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Varíola No momento da vacinação deve ser fornecida uma caderneta de vacinação a todos os vacinados – que servirá para registrar os procedimentos de seguimento da vacinação, ou seja, a confirmação de que a vacina foi recebida e o reconhecimento das reações locais. Se os recursos humanos forem suficientes a “pega” vacinal, deve ser confirmada e registrada sete dias após a vacinação. Se o quantitativo de recursos humanos não permitirem seguimento direto, deve-se instruir os profissionais dos serviços de saúde locais, onde foi realizada a vacinação, para realizar este seguimento. Contra-indicações da vacina: • gravidez; • imunodeficiência; • doenças de pele extensas (ex. acne, queimadura, incisão recente, impetigo, dermatite de contato); • terapia imunossupressora (ex. radioterapia, transplantes, quimioterapia); • doenças inflamatórias oftalmológicas; • eczemas, dermatite atópica (presente ou “curada”); • alergia aos componentes da vacina. 6 No caso de epidemia, a vacina deve ser oferecida às pessoas que, apesar de terem alguma contra-indicação, estejam sob risco. Eventos adversos pós-vacinação Em geral, reações cutâneas leves. Raramente, encefalite fatal. Existem estimativas, da ordem de 25%, para o total de eventos adversos (leves e graves), sendo que a ocorrência da encefalite pós-vacinal foi estimada em 3 casos para 1 milhão de doses aplicadas. Para a vacinação primária, estimou-se um óbito para 1 milhão de doses aplicadas. Para a revacinação, estimou-se um óbito para 4 milhões de doses aplicadas. V Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 777 Bibliografia consultada Accelerated control of rubella and prevention of congenital rubella syndrome, Brazil. Wkly Epidemiol Rec 2002; 77(21):169-175. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Curso básico de controle de infecção hospitalar. Brasília: Anvisa; 2000. Albert LA. Repercusiones del uso de plaguicidas sobre ambiente y salud. In: Centro Panamericano de Ecologia Humana y Salud. Plaguicidas, salud y ambiente. México: Inireb; 1982. p.49-59. Alcala H, Olive JM, De Quadros C. Síndrome de Guillain-Barré: o diagnóstico da pólio e outras paralisias flácidas agudas. Enfoque Neurológico nº EPI/TAG/91-10. Algranti E, Capitani EM, Bagatin E. Sistema respiratório. In: Mendes R. Patologia do trabalho. Rio de Janeiro: Atheneu; 1995. p. 89-137. Algranti E, Filho AJS, Mendonça EMC e colaboradores. Pneumoconiose de mineiros de carvão: dados epidemiológicos de minas da bacia carbonífera brasileira. J Pneumol 1995;21(1):9-12. Almeida Filho N, Rouquayrol MZ. Introdução à epidemiologia moderna. Rio de Janeiro: Abrasco; 1990. Almeida WF. Fundamentos toxicológicos de los plaguicidas. In: Centro Panamericano de Ecologia Humana y Salud. Plaguicidas, salud y ambiente. México: Inreb; 1982. p. 65. Amandus HE, Pendergrass EP, Dennis JM et al. Pneumoconiosis inter-reader variability in the classification of the type of small opacities in the chest roentgenogram. Am J Roentgenol 1974;122:740-743. Amato Neto V, Baldy JLS e colaboradores. Doenças transmissíveis. 3ª ed. São Paulo: Sarvier; 2001. Amato Neto V, Magaldi C, Correa MDA. Leptospirose canícola: verificações em torno de um surto ocorrido em localidade próxima a São Paulo. Rev Inst Med Trop. São Paulo; 1965. American Academy of Pediatrics. Salmonella infections. In: Peter G, editor. Red Book: report of the committee on infections diseases. 23rd ed. Grove Village: American Academy of Pediatrics; 1994. p. 412-417. Andrade ZA. Pathology of human Schistosomiasis. Mem Inst Osvaldo Cruz 1987;82 (Suppl 4):17. Antuñano FJL. Diagnóstico microscópico de los parasitos de la malária em la sangue. In: Organización Panamericana de la Salud. Diagnóstico de malária. Washington: OPS; 1988. Publicación Científica n. 512. Atkinson W, Furphy L, Humiston SG, et al. Epidemiology and prevention of vaccine-preventable diseases. 4th ed. Atlanta: Department of Health and Human Services; 1997. Ávila SLM. Diagnóstico microscópico da malária pelo método QBC. Documento apresentado em reunião na FNS, em 10/6/94. Não publicado. Ayrosa PAAG, Scheinberg MA, Pereira JRW. Leptospirose na infância. Pediatria Prática 1968;39(3):45-50. Bagatin E, Jardim JRB, Nery LE e colaboradores. Ocorrência de silicose pulmonar na região de Campinas-SP. J Pneumol 1995; 21(1):17-26. 778 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Bibliografia consultada Bagatin E, Nery LE, Jardim JRB. Considerações críticas da concessão do benefício previdenciário. Estudo retrospectivo de trabalhadores expostos à sílica. Rev Bras Saúde Ocup 1989;17:14-17. Barata RB, organizador. Condições de vida e situação de saúde. Rio de Janeiro: Abrasco; 1997. Barreto ML, Hage EC. Determinantes das condições de saúde e problemas prioritários no país. Cadernos da 11a Conferência Nacional de Saúde. Brasília: Conselho Nacional de Saúde; 2000. Bean B, Moore BM, Peterson LR et al. Survival of influenza viruses on environmental surfaces. J Infect Dis 1982; 146:47-51. Benenson AS, editor. Controle das doenças transmissíveis no homem. 13ª ed. Washington: OPAS, 1993. Publicação Científica nº 442. Benenson AS, editor. El control de las enfermedades transmisibles en el hombre. 16ª ed. Washington: OPS; 1997. Berman SJ. Sporadic anicteric leptospirosis. South Viet Intern Med 1973;79:167-173. Boulos M. Clínica de la infeccion malarica. In: Organización Panamericana de la Salud. Diagnóstico de malária. Washington: OPS; 1988. Publicación Científica nº 512. Boulos MIC, Baldy JLS. Coqueluche. In: Amato Neto V, Baldy JLS, editores. Doenças transmissíveis. São Paulo: Sarvier; 2002. BRASIL. Decreto nº 98.816, de 11 janeiro de 1990, art. 2, inciso I. Regulamenta a Lei nº 7.802 de 11/7/89, que dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, v.128, nº 9, p. 876, 12 jan. 1990. Seção I. BRASIL. Lei nº 7.802, de 11 julho de 1989. Dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a propaganda comercial, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 12 jul. 1989. Seção I. BRASIL. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, p. 18055, 20 set. 1990. Seção I. BRASIL. Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990. Dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, v.128, nº 249, p. 25694, 31 dez. 1990. Seção I. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 597, de 8 de abril de 2004. Institui, em todo o território nacional, o Calendário de Vacinação. Diário Oficial da União, Brasília, nº 69, p. 46, 12 abr. 2004. Seção I. Brener Z, Andrade Z. Trypanosoma cruzy e doença de Chagas. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1979. Briscoe JF, Richard G, Rahaman M. Evaluating health impact. Geneve: Unicef; 1986. Britton WJ, Lockwood DNJ. Leprosy. Lancet 2004; 363. Buss PM. Promoção da saúde e a saúde pública: contribuição para o debate entre escolas de saúde pública da América Latina. Rio de Janeiro: Abrasco; 1998. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 779 Bibliografia consultada Caldas EM, Costa E, Sampaio MB. Leptospirose na cidade de Salvador: alguns aspectos clínicos e laboratoriais. Rev Inst Med Trop. São Paulo: 1978; 20:164-176. Caldas EM, Sampaio MB. Estudo epidemiológico de surto de leptospirose ocorrido na cidade de Salvador, maio/julho 1978. Revista do Instituto Adolpho Lutz 1979; 39(1):35-94. Caldas EM. Leptospirose na cidade de Salvador: estudo epidemiológico com alguns aspectos sorológicos, clínicos e laboratoriais [Dissertação de mestrado]. Salvador (BA): UFBA; 1976. Cantoni G, Lázaro M, Resa A et al. Hantavírus pulmonary syndrome in the province of Rio Negro, Argentina, 1993-1996. Rev Inst Med Trop. São Paulo 1997;39:191-196. Cardenas HA. Malária: documento interno. Brasília: OPAS; 1994. Cardoso JLC, França FOS, Fan HW, Malaque CMS, Haddad Jr V. Animais peçonhentos no Brasil. Biologia, clínica e tratamento dos acidentes. São Paulo: Sarvier; 2003. Carvalho LHFR. Coqueluche. In: Farhat CK, Carvalho ES, Carvalho LHFR, Succi RCM. Infectologia pediátrica. Rio de Janeiro: Atheneu; 1993. p. 181-192. Carvalho MD. Sistemas de informação e alocação de recursos: um estudo sobre as possibilidades de uso das grandes bases de dados nacionais para uma alocação orientada de recursos [Dissertação de mestrado]. Rio de Janeiro (RJ): Instituto de Medicina Social; 1998. Castellanos PL. Epidemiologia, saúde pública, situação de saúde e condições de vida: considerações conceituais. Madri; 199-. Castro HA, Bethem EP. Comissão Técnica Estadual de Pneumopatias Ocupacionais do Estado do Rio de Janeiro: a silicose na indústria naval do Estado do Rio de Janeiro: análise parcial. J Pneumol 1995;21(1):13-16. Centers for Disease Control and Prevention. A fact sheets for candidate diseases for elimination or erradication. Congenital syphilis. MMWR 1999 Dec. 31;48(SU01):1554-15203. Centers for Disease Control and Prevention. Case definitions for public health surveillance. MMWR 1990;39( RR-13):17. Centers for Disease Control and Prevention. Control and prevention of meningococcal disease and control and prevention of serogroup C meningococcal disease: evaluation and management of suspect outbreaks. Atlanta: CDC; Fev 1994. Centers for Disease Control and Prevention. Diretrizes para avaliação de sistemas de vigilância. MMWR 1988;37(5-supll). [Tradução para o português pela Divisão Nacional de Doenças Sexualmente Transmissíveis/Sida-Aids,1989]. Centers for Disease Control and Prevention. Epidemiology self-study programme. Atlanta: CDC; 1989. Centers for Disease Control and Prevention. From the CDC and prevention update. Hantavírus pulmonary syndrome. JAMA 1993;270(19):287-288. Centers for Disease Control and Prevention. Guidelines for prevention of transmission of human immunoficiency virus and hepatitis B virus to health-care and public-safety workers. MMWR 1989;38(S-6):1-37. Centers for Disease Control and Prevention. Guidelines for the prevention and control of congenital syphilis. MMWR 1988 Jan. 15;37(S-1):1-13. Centers for Disease Control and Prevention. Health topics. Diphtheria. Atlanta: CDC; 2002. p. 39-48. Centers for Disease Control and Prevention. Health topics. Pertussis. Atlanta: CDC; 2002. p. 58-70. 780 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Bibliografia consultada Centers for Disease Control and Prevention. Lab-based surveillance for meningococcal diseases. Atlanta: CDC; 1991. Centers for Disease Control and Prevention. Meningococcal disease – general information. Atlanta: CDC; Jun 2001. Centers for Disease Control and Prevention. Meningococcal disease among college students, press release. Atlanta: CDC; Oct 1999. Centers for Disease Control and Prevention. MMWR 1993 July 9;42(26). Centers for Disease Control and Prevention. Protection against viral hepatitis: recommendations of the immunization practices advisory commitee (Acip). MMWR 1990;39 (S-2):1-26. Centers for Disease Control and Prevention. Recommendations for preventing transmission of human immunodeficiency virus and hepatitis B virus to patients during exposure-prone invasive procedures. MMWR 1991;40(RR-8):1-9. Centers for Disease Control and Prevention. Rubella and congenital rubella syndrome, US, 1985-1988. MMWR 1989;38(11). Centers for Disease Control and Prevention. Rubella vaccine: recommendation of the Public Health Service Advisory Committee on Immunization Practices. MMWR 1978 Nov; 27(46):451459. Centers for Disease Control and Prevention. Sexually transmited diseases – Treatment guidelines. Atlanta: CDC; 2002. Centers for Disease Control and Prevention. What’s new? Case update: hantavirus pulmonary syndrome case count and descriptive statistics. Hantavirus Consumer Information/ What’s new. Atlanta: CDC; Aug 1997. Central de Medicamentos. Memento terapêutico Ceme – 89/90. 2ª ed. Brasília: Ministério da Saúde; 1989. Centro Nacional de Epidemiologia. Objetivos, estrutura e atribuições do Centro Nacional de Epidemiologia – Cenepi. In: Fundação Nacional de Epidemiologia. Anais do Seminário Nacional de Vigilância Epidemiológica; 1992 dez. 10-14; Brasília, Brasil. Brasília: Fundação Nacional de Saúde; 1993. p. 71-91. Chen RT, Hibbs B. Vaccine safety. Current and Future Challenges Pediatric Annals July 1998;27(7):445-455. Chin J. El control de las enfermedades transmisibles. 17th ed. Washington: OPS, 2001. Publicación Científica y Técnica nº 58. Chur J, editor. El control de las enfermedades transmisibles en el hombre. 17ª ed. Washington: OPS; 1992. Clemenhagen C, Champagne F. Quality assurance as part of program evaluation. Guidelines for managers and clinical department heads. Quality Review Bulletin 1986;12(11): 383-387. Corrêa MA, Natale V, Sadatsune T et. al. Diagnóstico das leptospiroses humanas. Rev Inst Med Trop. São Paulo 1970;12(4):284-287. Correa MOA et al. Leptospiroses. In: Veronesi R. Doenças infecciosas e parasitárias. 7ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1982. p. 573-592. Costa e Silva VL, Goldfarb LMCS. A epidemiologia do tabagismo no Brasil; S.l; 1995. Costa E. O laboratório clínico em leptospirose humana. In: Anais do 1º Encontro Nacional em Leptospirose; 1986 ago. 26-28; Salvador, Brasil. Brasília; 1986. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 781 Bibliografia consultada Costa NR. Lutas urbanas e controle sanitário: origens das políticas de saúde no Brasil. Petropólis: Vozes; 1985. Cuba CAC, Marsden PD, Barreto AC et al. Parasitologic and imunologic diagnosis of american (mucocutaneous) leishmaniosis. Bull Pan Amer Health Organ 1981; v.15. Cuba CC, Llanos-Cuentas EA, Barreto AC. Human mucocutaneous Leishmaniosis in Três Braços. Bahia-Brazil. Area of Leishmania braziliensis, transmission. 1. Laboratory diagnosis. Rev Soc Bras Med Trop. São Paulo 1984; v.17. Daher RR. Hepatite por outros vírus hepatotróficos. In: Dani R, Castro LP. Gastroenterologia clínica. 3ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1993. Dégallier N et al. A comparative study of yellow fever in Africa and South América. Ciência e Cultura 1992 mar/jun;44(2/3):143-151. Degallier N et al. New entomological and virological data on the vectors of sylvatic yellow fever in Brazil. Ciência e Cultura 1992 mar./jun;44(2/3):136-142. Deinhardt F, Gust ID. Viral hepatitis. Bull World Health Organ 1982;60(5):661-691. Departamento de Informática do SUS. Informações em saúde. [monografia na internet]. Brasília: Datasus. Disponível em: www.datasus.gov.br. Diniz EMA, Ramos JLA, Vaz FA. Rubéola congênita. In: Infecções congênitas e perinatais. São Paulo: Atheneu; 1991. Doll R, Peto R. The causes of cancer. Oxford: University Press; 1981. Duchin JS, Koster FT, Peters CJ et al. Hantavirus pulmonary syndrome a clinical description of 17 patientes with a newly recognized disease. New Engl J Med 1994; 330(4):994-995. Faculdade de Saúde Pública. Projeto-piloto sífilis congênita. São Paulo: USP; 1992. Fagundes LJ. Contribuição ao estudo da sífilis congênita recente [Dissertação de mestrado]. São Paulo (SP): USP; 199-. Faine S. Guidelines for the control of leptospirosis. Geneva: WHO; 1982. Publication Offset nº 67. Fenner F, Henderson DA et al. Smallpox and its eradication. Geneva: WHO; 1988. Ferreira AW. Imunodiagnóstico de la malária. In: Organización PanAmericana de la Salud. Diagnóstico de malária. Washington: OPS, 1988. p. 512. Fischman A. Vigilância epidemiológica. In: Rouquayrol MZ. Epidemiologia e saúde. 4ª ed. Medsi; 1994. p. 21-441. Foratini OP. Ecologia, epidemiologia e sociedade. São Paulo: Edusp; 1992. p. 464-509. Foratini OP. Epidemiologia geral. São Paulo: Edusp; 1976. Fossaert DH, Lopis A, Tigre CH. Sistemas de vigilância epidemiológica. Bol Ofic Sanit Panamer 1974;76:512-525. Franke D, Llanos Cuentas A, Echevarria J. Efficacy of 28 day and 40 day regimens of socium stibogluconate (Pentostan) in the treatment of mucosal leishmaniasis. Am J Trop Med Hyg 1994;51(1):77-82. Fundação Nacional de Saúde. Anais do Seminário Nacional de Vigilância Epidemiológica; 1992 dez. 10-14; Brasília, Brasil. Brasília: Funasa; 1993. Fundação Nacional de Saúde. Capacitação de pessoal em sala de vacinação: manual do monitor. Brasília: Funasa; 2001. Fundação Nacional de Saúde. Controle da esquistossomose: diretrizes técnicas. Brasília: Funasa; 1998. 782 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Bibliografia consultada Fundação Nacional de Saúde. Guia de controle da hanseníase. 2ª ed. Brasília: Funasa; 1994. Fundação Nacional de Saúde. Guia de vigilância epidemiológica. 3ª ed. rev. ampl. Brasília: Funasa; 1994. Fundação Nacional de Saúde. Guia de vigilância epidemiológica. Brasília: Funasa; 2002. Fundação Nacional de Saúde. Guia de vigilância epidemiológica. Brasília: FNS; 1998. Fundação Nacional de Saúde. Informe técnico – Introdução da vacina tetravalente. Brasília: Funasa; 2002. Fundação Nacional de Saúde. Inquérito sorológico para avaliação do programa de controle da doença de Chagas. Brasília: Funasa; 1994. Fundação Nacional de Saúde. Legislação sobre o controle de doenças na área de dermatologia sanitária. Brasília: Funasa; 1991. Fundação Nacional de Saúde. Manual de cólera: subsídios para a vigilância epidemiológica. 2a ed. Brasília: Funasa; 1993. Fundação Nacional de Saúde. Manual de diagnóstico e tratamento dos acidentes por animais peçonhentos. Brasília: Funasa; 1998. Fundação Nacional de Saúde. Manual de normas de vacinação. Brasília: Funasa; 1994. Fundação Nacional de Saúde. Manual de procedimentos para vacinação. Brasília: Funasa; 2001. Fundação Nacional de Saúde. Manual de terapêutica da malária. 3a ed. Brasília: Funasa; 1993. Fundação Nacional de Saúde. Manual de vigilância epidemiológica dos eventos adversos pósvacinação. Brasília: Funasa; 1998. Fundação Nacional de Saúde. Manual dos centros de referência de imunobiológicos especiais. Brasília: Funasa; 2000. Fundação Nacional de Saúde. Manual integrado de prevenção e controle da cólera. Brasília: Funasa; 1994. Fundação Nacional de Saúde. Manual integrado de prevenção e controle da febre tifóide. Brasília: Funasa; 1998. Fundação Nacional de Saúde. Norma técnica de tratamento profilático anti-rábico humano. Brasília: Funasa; 2002. Fundação Nacional de Saúde. Normas técnicas para controle da peste. Brasília: Funasa; 1994. Fundação Nacional de Saúde. Relatório final do Seminário nacional de epidemiologia das doenças crônicas não transmissíveis. Informe Epidemiológico do SUS 1993; II(4):21-32. Fundação Nacional de Saúde. Sinan: manual de procedimentos. versão 4.3. Brasília, Funasa; 1998. Documento não publicado. Fundação Nacional de Saúde. Surto de influenza no extremo oeste de Santa Catarina. Setembro 2003. Boletim eletrônico da Funasa 2002 dez;13;2(4). Furtado T. Critérios para diagnóstico da leishmaniose tegumentar americana. Arq Bras Dermatol 1980; v.65. Galizzi Filho J, Paz MOA. Hepatites crônicas. In: Dani R, Castro LP. Gastroenterologia clínica. 3a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1993. Gershon AA. Rubella virus (german measles). In: Principles and practice of infectious diseases. 3rd ed. New York: Churchill Livingstone; 1990. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 783 Bibliografia consultada Gilman RW et al. Relative efficacy of blood, urine retal swab, bone-marrow, and rose-spot cultures for recovery of salmonella typhi in typhord fever. Lancet 1975;1:1211-1213. Glass RI. New prospects for epidemiologic investigation. Science 1986. Glezen WP. Emerging infections: pandemic influenza. Epidemiol Rev 1996;18(1). Godoy AMM. Análise epidemiológica da febre tifóide no Brasil. Informe Epidemiológico do SUS 1992 out;1(5):73-88. Goldsmith RS. Trematode (fluke) infections, schistosomiasis. In: Current medical diagnosis & treatment. 30th ed. Prentice Hall International Inc; 1991. Gomez JS, Focaccia R. Febre tifóide e paratifóide. In: Veronesi R, organizador. Doenças infecciosas e parasitárias. 8a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1991. p. 401-411. Goodman RA, Buehler JW, Koplan JP. The epidemiologic field investigation: science and judgment in public health practice. Am J Epidemiol 1990; v.132. Gregg, MB. Field epidemiology. 2nd ed. New York: University Oxford; 1996. Grimaldi JRG, Jaff CL, Macmahon-Pratt DB et al. A simples predure for the isolation of leishmanial parasites for the recovery of parasite virulence in avirulent stocks. Trans Rev Soc Trop Med Hyg 1984; v.78. Guimarães MDC e colaboradores. Estudo nacional de soroprevalência de sífilis entre puérperas. In: Anais do IV Congresso Brasileiro de Prevenção em DST e AIDS; 2001; Cuiabá, MT. Brasília; 2001. Hagiwara MK. Aspectos clínicos e terapêuticos da leptospirose animal. In: Anais do 1º Encontro Nacional em Leptospirose; 1986 ago. 26-28; Salvador, Bahia. Brasília; 1986. Hall WC et al. Demonstration of yellow fever and dengue antigens in formalin-fixed paraffinembedded human liver by immunohistochemical analysis. Am J Trop Med Hyg 1991;45(4). Halperini SA. Interpretation of pertussis serologic tests. Pediatr Infect Dis J 1991;10: 791-792. Hantavirus illness in the United States. Hantavirus Report March 9, 1995. Hewllet EL. Bordetella species. In: Mandell DB. Principles and practice to infectious diseases. 4th ed. New York: Churchill Livingstone; 1995. p.1865-1872. Hijjar MA. Epidemiologia da tuberculose no Brasil. Informe Epidemiológico do SUS 1992;1(6):51-69. Hirschman SZ. Chronic hepatitis. In: Mandell GL, Douglas RG, Bennett JE. Principles and practice of infections diseases. 3rd ed. New York: Churchill Livingstone Inc; 1990. Hospital das Clínicas de Porto Alegre. Projeto-piloto sífilis congênita. Porto Alegre: HCPA; 1991. Hospital Lauro de Souza Lima. Reabilitação em hanseníase. Bauru, SP: HLSL; 1992. Hughes JM, Peters CM, Cohen ML et al. Hantavírus pulmonary syndrome in emerging infectious disease. Science 1993;262(850). Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa nacional sobre saúde e nutrição. Rio de Janeiro: IBGE; 1991. Instituto Nacional de Salud de Peru. Centro Nacional de Laboratórios en Salud Publica. Enfermedades emergentes y reemergentes. Lima: INSP; 1997. p.10-26. Documento técnico CNLS/ INS. 784 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Bibliografia consultada Instituto Nacional do Câncer. Falando sobre tabagismo. 2ª ed. Rio de Janeiro: Inca; 1996. International Labour Office. Guidelines for use of ILO International Classification of Radiographs. of Pneumoconiosis. Geneva: ILO; 1980. Occupational Safety and Health Series n. 22. International Task Force on Hepatitis B Immunization. Notes on hepatitis B and its control. International Task Force on Hepatitis B Immunization. April, 1988. Isada CM, Kasten BL, Goldman MP et al. Infectious diseases handbook. 2nd ed. Hudson (Cleveland): Lexi-Comp; 1997/1998. p.333-336. Jilg WJ, Deinhardt F, Hilleman MR. Hepatitis A vaccines. 2nd ed. Philadelphia: WB Saunders; 1994. Jopling WH et al. Manual de hanseníase. 4a ed. São Paulo: Atheneu; 1991. Jumaan A, Hughes H, Schmid S, Galil K, Plott K, Zimmerman L, Seward J. VPD surveillance manual. 3rd ed. 2002. Chapter 14 – Varicella. p. 14-1. Kelsey JL, Thompson WD, Evans AS. Methods in observational epidemiology. New York: Oxford University Press; 1986. Keusch GT. Typhoid fever. In: Braule AI, Davis CE, Fierer J. Infections diseases and medical microbiology. 2nd ed. Philadelphia: W B Saunders; 1986. Krugman S, Stevens CE. Hepatitis B vaccine. In: Plotkin SA, Mortimer EA. Vaccines. 2nd ed. Philadelphia: WB Saunders; 1994. Kucheruk VV, Rosicky B. Diseases whith natural foci: basic terms and concepts. Praha J Hyg Epidem 1983;27(4). Laguardia J, Penna ML. Definição de caso e vigilância epidemiológica. Informe Epidemiológico do SUS 1999;8 (4):63-66. Laison R. The american leishmanioses: some observation on their ecology and epidemiology. Trans R Soc Trop Med Hyg 1983;77(5). Langmuir AD. The surveillance of communicable diseases of national importance. New England Journal of Medicine 1963;268:182-192. Lanzieri T, Parise MS, Siqueira MM, Fortaleza BM, Segatto TC, Prevots DR. Incidence, clinical features and estimated costs of congenital rubella syndrome following a large rubella outbreak in Recife, Brazil, 1999-2000. Lanzieri T, Segatto TC, Parise MS, Pereira MC, Prevots DR. Estratégias para controle de rubéola e SRC no Brasil após surtos em 1999-2000. In: Livro de resumos da II Conferência Pan-Americana de Epidemiologia de Campo; 2001; Cusco, Peru. Lanzieri TM, Segatto TC, Siqueira MM, de Oliviera Santos EC, Jin L, Prevots DR. Burden of congenital rubella syndrome after a community-wide rubella outbreak, Rio Branco, Acre, Brazil, 2000 to 2001. Pediatr Infect Dis J 2003;22(4):323-329. Last JM. A dictionary of epidemiology. 2nd ed. New York: Oxford University Press; 1988. Leavell A, Clark EG. Medicina preventiva. São Paulo: McGraw Hill; 1976. Leduc JM, Smith GR, Pinheiro FP. Isolation of a hantan-related virus from Brazilian rats and serologic evidence of widspread distribution South of America. Am J Trop Med Hyg 1985;34:810815. Lehman LF et al. Avaliação neurológica simplificada. Belo Horizonte: ALM Internacional; 1997. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 785 Bibliografia consultada Lemos APS et al. Genetic relationships among serogroup B: serotype 4 Neisseria meningitidis strains. Rev Inst Med Trop São Paulo 2001;43(3):119-124. Levine MM. Typhoid fever vacines. In: Plotkin SA, Mortimer Jr, EA. Vaccines. Philadelphia: WB Saunders; 1988. Levis S, Morzunov S, Rowe JS. Genetic diversity and epidemiologgy of hantaviroses in Argentina. J Infect Dis 1998; 177:529-538. Levy H, Simpson SQ. Hantavírus pulmonary syndrome. Am J Respir Dis 1994; 149:1710-1713. Llanos-Cuentas EA. Estudo clínico evolutivo da leishmaniose em área endêmica de Leishmania braziliensis braziliensis. Três Braços (BA) [Dissertação de mestrado]. Brasília (DF): UnB; 1984. Lomar AV. Aspectos clínicos e terapêuticos da leptospirose humana. In: Anais do 1o Encontro Nacional em Leptospirose; 1986 ago. 26-28, Salvador, Brasil. Brasília, 1986. Lombardi C et al. Hansenologia: epidemiologia e controle. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo; 1990. Lopes-Martins RAB, Antunes E, Oliva MLV. Pharmacological characterization of rabbit corpus cavernosum relaxation mediated by the tissue kallikrein-kinin system. Br J Pharmacol 1994;113:81-86. Lourenço WR, Knox M, Yoshizawa AC. L’invasion d’une communauté au stade initial d’une succession secondaire par une espèce parthénogénétique de scorpion. Biogeographica 1994;70(2):77-91. Lucciola GV, Passos VMOA, Patrus OA. Mudança no padrão epidemiológico da leishmaniose tegumentar americana. An Bras Dermatol 1996 mar/abr;71(2):99-105. Lyra LGC. Hepatites a vírus A, B, C, D, E. In: Dani R, Castro LP. Gastroenterologia clínica. 3ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1993. p.1251-1287. Machado R, Costa E. Leptospirose em Salvador (1975-1979): alguns aspectos clínicos e epidemiológicos. Rev Med Bahia 1977;23(3). Machado R. Estudos clínicos e laboratoriais da leptospirose ictero-hemorrágica (doença de Weil) [Tese]. Salvador (BA): UFBA; 1966. Magalhães AV, Moraes MAP, Raick AN et al. Histopatologia da leishmaniose tegumentar americana por Leishmania braziliensis braziliensis. 2. Resposta humoral tissular. Rev Inst Med Trop. São Paulo 1986;28(5):300-311. Magalhães AV, Moraes MAP, Raick AN et al. Histopatologia da leishmaniose tegumentar americana por Leishmania braziliensis braziliensis. 4ª Classificação Histopatológica. Rev Inst Med Trop. São Paulo 1986;28(4):253-262. Magalhães AV, Moraes MAP, Raick AN et al. Histopatologia da leishmaniose tegumentar americana por Leishmania braziliensis braziliensis. 1. Padrões histopatológicos e estudo evolutivo das lesões. São Paulo. Rev Inst Med Trop. São Paulo 1986;28(6):421-430. Magalhães AV, Moraes MAP, Raick AN et al. Programa de mudança do componente cognitivo da atividade de uma população de região endêmica do sul da Bahia diante da leishmaniose tegumentar. Rev Soc Bras Med Trop. São Paulo 1990;23(1):49-52. Mahmoud AAF. Schistosomiasis. In: Cecil textbook of medicine. 18th ed. New York: WB Saunders; 1988. Mandell GL, Bennett JE, Dolin R. Salmonella (including Salmonella tiphy). In: Principles and practice of infectious diseases. 4th ed. New York: Churchill Livingstone; 1995. p. 2013-2032. 786 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Bibliografia consultada Mantegazza E et al. Manual de atividades para controle dos vetores de dengue e febre amarela. Controle mecânico e químico. São Paulo: Sucen; 1993. Maranhão AGK. Situação das doenças diarréicas no Brasil. Brasília: Ministério da Saúde; 1993. Marques AC, Cardenas H. Situação atual da malária no Brasil: Relatório GT-Malária. Brasília: FNS/Opas; 1991. Marsden PD. Mucosal leishmaniasis (“espundia” Escomel, 1911). Trans Rev Soc Trop Med Hyg 1985;80:859-876. Marzochi MCA, Coutinho SG, Sabroza PC. Reação de imunofluorescência indireta e intradermorreação para leishamaniose tegumentar americana em moradores na área de Jacarepaguá (Rio de Janeiro). Estudo comparativo dos resultados observados em 1976 e 1987. São Paulo. Rev Inst Med Trop. São Paulo 1980; 22:149-155. Marzochi MCA, Marzochi KBF. Tegumentar and visceral leishmaniases in Brazil – emerging anthropozoonosis and possibilities for their control. Cad Saúde Publ 1994;10(Supl 2): 359-375. Marzochi MCA, Souza WJS, Coutinho SG et al. Evoluation of diagnostic criteria in human and canice mucocutaneous Leishmania braziliensis braziliensis occurs. In: Anais da IX Reunião Anual de Pesquisa Básica em Doenças de Chagas; 1982; Caxambu, Brasil. Mendes TF, Pitella AM. Recentes avanços em hepatites. São Paulo: Fundo Editorial BYK; 1993. Mendonça SCF, Souza WJS, Nunes MP et al. Indirect immunofluorescence test in new world leishmaniasis: sorological and clinical relationship. Mem Inst Oswaldo Cruz 1988;83:347-355. Menelau GS, Pinheiro EA. Foco de malária na região metropolitana de Recife. R Bras Malariol Doenças Tropicais 1961; v.33. Merck. Manual de medicina. 15a ed. São Paulo: Merck; 1987. Milagres LG et al. Antibory response of brazilian children with serogroup C meningococcal polysaccharide noncovalently complexed with outer membrane proteins. Braz J Med Biol Res 1995;28:981-989. Miller BR et al. Replication tissue tropism and transmission of yellow fever in Aedes albopictus. Trans Soc Trop Med Hyg 1989;83:252-255. Minayo MCS, organizadora. Os muitos brasis: saúde e população na década de 80. São Paulo/Rio de Janeiro: Hucitec/Abrasco; 1995. Ministério da Saúde. Ações de informação, educação e comunicação: perspectiva para uma avaliação. Brasília: MS; 1998. Ministério da Saúde. Aids e infecção pelo HIV na infância. Brasília: MS; 2001. Ministério da Saúde. Aspectos sociais nas ações de controle e eliminação de hanseníase – proposta para o plano de eliminação da hanseníase. Período 1995 a 2000. Brasília: MS; Julho/1994. Documento não publicado. Ministério da Saúde. Assistência e controle das doenças diarréicas. 3ª ed. rev. Brasília: MS; 1993. Ministério da Saúde. Assistência pré-natal. Brasília: MS; 1988. Ministério da Saúde. Ata da reunião do Comitê Técnico Assessor de Dermatologia Sanitária, 25 de maio de 1996. Documento não publicado. Ministério da Saúde. Bases técnicas para eliminação da sífilis congênita no Brasil. Brasília: MS; 1993. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 787 Bibliografia consultada Ministério da Saúde. Boletim Epidemiológico 1993;5(2):6-9. Ministério da Saúde. Caderno de atenção básica às DST e a infecção pelo HIV/Aids – Série Programa Saúde da Família. Brasília: MS; (no prelo). Ministério da Saúde. Capacitação de pessoal para vigilância epidemiológica do sarampo. Módulo instrucional I. Brasília: MS; 1992. Ministério da Saúde. Co-infecção TB/HIV/Aids. Boletim Informativo do PN-DST/Aids 1993; 5(9). Ministério da Saúde. Controle de hanseníase. Uma proposta de integração ensino-serviço. Brasília: MS; 1989. Ministério da Saúde. Dermatologia na atenção básica. Brasília: MS; 2002. Caderno de Atenção Básica nº 9. Ministério da Saúde. Endemias rurais. Rio de Janeiro: DNERu; 1968. Ministério da Saúde. Guia de referência para o controle social: manual do conselheiro. Brasília: MS; 1994. Ministério da Saúde. Guia de vigilância epidemiológica. 2ª ed. Brasília: MS; 1986. Ministério da Saúde. Guia de vigilância epidemiológica. Brasília: MS; 1985. Ministério da Saúde. Guia para implantar/implementar as atividades de controle da hanseníase nos planos estaduais e municipais de saúde. Brasília: MS; 1999. Ministério da Saúde. Guia para o controle da hanseníase. Brasília: MS; 2002. Caderno de Atenção Básica nº 10. Ministério da Saúde. Informe técnico da Campanha Nacional do Idoso. Brasília: Ministério da Saúde; 2004. Ministério da Saúde. Instrumento de avaliação do Programa Nacional de Controle e Eliminação da Hanseníase. Brasília: MS; dezembro 1995. Documento não publicado. Ministério da Saúde. Manual de bacteriologia da tuberculose. Rio de Janeiro: MS; 1980. Ministério da Saúde. Manual de controle das doenças sexualmente transmissíveis. 3ª ed. Brasília: MS; 1999. Ministério da Saúde. Manual de controle de leptospirose: aspectos epidemiológicos e de controle. Brasília: MS; 1989. Ministério da Saúde. Manual de normas para o controle da tuberculose. 2ª ed. rev. Brasília: MS; 1984. Ministério da Saúde. Manual de prevenção de incapacidades. Brasília: MS; 2001. Ministério da Saúde. Manual de procedimentos para atendimento ao paciente de hanseníase. Brasília: MS; 1998. Ministério da Saúde. Manual de vigilância epidemiológica e imunizações: normas e instruções. Brasília: Ministério da Saúde; 1977. Ministério da Saúde. Manual do investigador para a erradicação da transmissão da poliomielite no Brasil. Brasília: MS; 1988. Ministério da Saúde. Manual técnico para o controle da tuberculose. 6ª ed. rev. e ampl. Brasília: MS; 2002. Caderno de Atenção Básica nº 6. Ministério da Saúde. Norma operacional básica do Sistema Único de Saúde – NOB-SUS-96. Brasília: MS; 1997. 788 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Bibliografia consultada Ministério da Saúde. Normas técnicas para prevenção da transmissão do HIV nos serviços de saúde. Brasília: MS; 1989. Ministério da Saúde. Programa Nacional de Controle e Eliminação da Hanseníase. Informações epidemiológicas e operacionais 1995. Brasília: MS; junho 1996. Documento não publicado. Ministério da Saúde. Recomendações para prevenção e controle da infecção pelo vírus HIV (Sida/Aids). Brasília: MS; 1987. Ministério da Saúde. Relatório da reunião nacional do Programa de Controle da Leishmaniose Tegumentar Americana no Brasil – julho/1996. Documento não publicado. Ministério da Saúde. Relatório da X reunião de avaliação nacional de ações de dermatologia sanitária; 1996 maio 22-24. Brasília; MS. Ministério da Saúde. Revisão da definição nacional dos casos de AIDS em adultos. Projeto Sentinela: ações laboratoriais do PN-DST/Aids. Brasília: MS; julho 1993. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Manual de vigilância epidemiológica das doenças exantemáticas – sarampo, rubéola e síndrome da rubéola congênita. Brasília: MS; 2003. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. O desafio da influenza: epidemiologia e organização da vigilância no Brasil. Boletim Eletrônico da SVS 2004 fev. 2;4(1). Ministério da Saúde. Sífilis na gravidez: trate com carinho: cartilha. Brasília: MS; 2000. Ministério da Saúde. Situação da febre amarela e do dengue no Brasil. Brasília: MS; 1992. Ministério da Saúde. Terminologia básica em saúde. Brasília: MS; 1985. Textos Básicos de Saúde nº 8. Ministério da Saúde. Testes de sensibilidade à penicilina: manual. Brasília: MS; 1999. Ministério da Saúde. Vigilância epidemiológica e imunizações – legislação básica. 4ª ed. Brasília: Ministério da Saúde; 1978. Ministério da Saúde. Vigilância epidemiológica: abordagem de conceitos básicos e aspectos relativos à vigilância de AIDS. Brasília: MS; 1988. Ministério de Salud y Acción Social de la Nacion. Conclusiones y recomendaciones del primer taller interdisciplinario sobre hantavirus. Buenos Aires: 1997. Monath TP et al. Limitations of the complement-fixation test for distinguish naturally acquired from vaccine-induced yellow fever infection in flavivirus-hyperendemic areas. Am J Trop Med Hyg 1980;29(4):624-634. Monattii TP. Yellow fever: a medically negleeted disease. Report on a seminar. Rev Inf Dis;9(1):165-175. Mootrey G, Chen R, Lloyd J. VPD surveillance manual. Chapter 18. p. 18-1. Moreira MBR. Enfermagem em hanseníase. Brasília: Fundação Hospitalar do Distrito Federal/ Hospital Regional de Sobradinho; 1983. Moser MR, Bender TR, Margolis HS. An outbreak of influenza aboard a commercial airliner. Am J Epidemiol 1979;110:1-6. National Childhood Vaccine Injury Act of 1986, at Section 2125 of the Public Health Service Act as codified at 42 U.S.C. § 300aa-(Supp.1987). Naud P et al. Doenças sexualmente transmissíveis. Porto Alegre: Artes Médicas; 1993. Neves J, Lambertucci JR. Febre tifóide e paratifóide. In: Amato Neto V, Baldy JLS. Doenças transmissíveis. São Paulo: Sarvier; 1989. Cap.35. p.439. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 789 Bibliografia consultada Nossal GJV. A engenharia genética. Lisboa: Editorial Presença; 1987. Ockner RK. Acute viral hepatitis. In: Cecil textbook of medicine. 19th ed. Philadelphia: WB Saunders; 1992. Oliveira MLW et al. Hanseníase: cuidados para evitar complicações. 2a ed. Brasília: Fundação Nacional de Saúde; 1998. Onorato IM, Wassilak SGF. Laboratory diagnosis of pertussis: the state of the art. Pediat Inf Dis J 1987;6(2):154-157. Opromolla DVA. As incapacidades na hanseníase. In: Noções de hansenologia. Bauru, SP: Hospital Lauro de Souza Lima; 1981. Organização Mundial da Saúde. Avaliação de programas de controle do tabagismo. Brasília: OMS; 1996. Organização Mundial da Saúde. Guia para eliminação da hanseníase como problema de saúde pública. Genebra: OMS; 2000. WHO/CDS/CPE/CEE/2000.14. Organização Pan-Americana da Saúde. Malária grave e complicada. Brasília: Opas; 1994. Organización Mundial de la Salud. Comité de Expertos de la OMS sobre Rabia. 7º Informe. Ginebra: OMS; 1984. Série de Informes Técnicos n. 709. Organización Mundial de la Salud. Reglamento Sanitario Internacional (1969). Tercera edición anotada. Ginebra: OMS; 1983. Organización Panamericana de la Salud. Comunicado de Prensa. Conselho directivo de la OPS resuelve intensificar lucha contra hantavirus. Washington: OPS; 26 de septiembre 1997. Organización Panamericana de la Salud. Epidemiologia y control de la leptospirose. In: Reunión interamericana sobre el control de la fiebre aftosa y otras zoonosis. Washington: OPS; 1976. Publicación Científica n. 316. Organización Panamericana de la Salud. Flebótomos: vetores de Leishmaniasis en las Americas, 33. Washington: OPS; 1992. Organización Panamericana de la Salud. Guia practica para la eliminación del tétano neonatal. Washington: OPS; 1992. Cuaderno Técnico n. 33. Organización Panamericana de la Salud. Guia practica para la erradicación da poliomelite. Washington: OPS; 1987. Organización Panamericana de la Salud. Hepatitis viricas. In: Organización Panamericana de la Salud. Las condiciones de la salud en las Américas. Ginebra: OPS; 1990. p.177-180. Publicación Científica n. 542. Paim SJ, Teixeira MG. Reorganização do sistema de vigilância epidemiológica na perspectiva do Sistema Único de Saúde. In: Fundação Nacional de Saúde. Anais do Seminário Nacional de Vigilância Epidemiológica; 1992 dez. 1-4; Brasília, Brasil. Brasília: FNS; 1993. p.93-144. Pan American Health Organization. Elimination of congenital syphilis in the Americas. Meeting of Consultants. Washington: PAHO; 1995. Pan American Health Organization. Final Report of the 44th Directing Council. Resolution CD44.R1: Sustaining Immunization Programs – Elimination of rubella and congenital rubella syndrome. 2003. [monograph on the Internet]. Washington: PAHO; 2003 [updated 2004 Jan 5]. Available from: http://www.paho.org/English/GOV/CD/cd44-fr-e.pdf. Pena PGL. Trabalho apresentado no II Congresso Latinoamericano de Salud Ocupacional e VII Congresso Nacional da Anamt. Campos do Jordão, 1991. (comunicação pessoal). 790 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Bibliografia consultada Penna GO et al. Doenças infecciosas e parasitárias: aspectos clínicos, de vigilância epidemiológica e de controle. Brasília: Fundação Nacional de Saúde; 1998. Penna GO, Pinheiro AMC, Hajjar LA. Talidomida: mecanismo de ação, efeitos colaterais e uso terapêutico. An Bras Dermatol 1998;73(6):501-504. Pereira GFM. Características da hanseníase no Brasil: situações e tendências no período de 1985 a 1996 [Dissertação de mestrado]. São Paulo (SP): USP; 1999. Peter G, Halsey MA, Marcuse EK, Pickering IK, editors. Red Book – Enfermedades infecciosas en pediatría. 23ª ed. Buenos Aires: Editorial Médica Panamericana; 1996. Pinheiro FP, Morais MAP. Febre amarela. In: Diagnóstico e tratamento das doenças infecciosas e parasitárias. 3ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1983. p.303-314. Pinto JCD. Doença de Chagas no Brasil – situação atual e perspectivas. Informe Epidemiológico do SUS 1992 set;1(4):17-25. Prado AN, Sousa DS, Mendes LM et al. Sistema de vigilância epidemiológica da violência no distrito sanitário Barra – Rio Vermelho: capacitação dos profissionais de saúde da vigilância epidemiológica e monitoramento das visitas domiciliares. Relatório final das atividades práticas dos alunos da disciplina Políticas de Saúde do Instituto de Saúde Coletiva/UFBA, orientado pelos professores Cristiane Abdon Nunes e Jairnilson Silva Paim, 1998. Prata A. Esquistossomose mansoni. In: Veronesi R. Doenças infecciosas e parasitárias. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1987. p.838-855. Present status of yellow fever: memorandum from a PAHO meeting. Bull Wrld Hlth Org 1986;64(4):511-524. Prevots DR, Parise MS, Segatto TC, Siqueira MM, dos Santos ED, Ganter B et al. Interruption of measles transmission in Brazil, 2000-2001. J Infect Dis 2003;187 Suppl 1:S111-S120. Raska K. National and international surveillance of comunicable diseases. WHO Chronicle 1966;20:31-121. Rede Intergerencial de Informações para a Saúde. Indicadores e dados básicos (IDB – 2001). [monografia na internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2001. Disponível em www.datasus.gov.br. Reef SE, Plotkin S, Cordero JF, Katz M, Cooper L, Schwartz B et al. Preparing for elimination of congenital rubella syndrome (CRS): summary of a workshop on CRS elimination in the United States. Clin Infect Dis 2000;31(1):85-95. Reis AD, Panutti CS, de Souza VA. Prevalência de anticorpos para o vírus da varicela-zoster em adultos jovens de diferentes regiões climáticas brasileiras. Rev Soc Bras Med Trop. 2003; 36(3):317-320. Rey L. Dicionário de termos técnicos de medicina e saúde. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1999. Rey L. Parasitologia. 2ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1991. Ridley DS, Magalhães AV, Marsden PD. Histological analysis and the pathogenesis of mucocutaneous leishmaniasis. J Path 1989;159:293-299. Risi Junior JB. Considerações sobre a publicação de dados epidemiológicos pelo Ministério da Saúde. Informe Epidemiológico do SUS 1992;I(4):27-32. Rizzeto M et al. Transmission of the hepatitis B virus – associated delta antigen to chipanzees. J Infect Dis 1980;141:590-602. Robinson WS. Hepatitis B virus and hepatitis delta virus. In: Mandell GL, Douglas RG, Bennet Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 791 Bibliografia consultada JE. Principles and practice of infections diseases. 3rd ed. New York: Churchill Livingstone Inc; 1990. p.1204-1231. Rojas AR. Epidemiologia. Buenos Aires: Intermédica; 1974. Rutstein DD, Mullan RJ, Frazier JM et al. Sentinel health events (occupational): a basis for physician recognition and public health surveillance. Am Journal Health 1983;73:1054-1062. Ryan MA, Christian RS, Wohlrabe J. Handwashing and respiratory illness among young adults in military training. Am J Prev Med 2001;21:79-83. Sacchi CT et al. The use of oligonucleotide probes for meningococcal serotype characterization. Rev Inst Med Trop São Paulo 1998;40(2):113-117. Sakane PT. Difteria. In: Amato Neto V, Baldy JLS, editores. Doenças transmissíveis. São Paulo: Sarvier; 2002. Samaja J. Muestras y representatividad e vigilancia epidemiológica mediante sitios centinelas. Cadernos de Saúde Pública 1966; 12(3):309-319. Sampaio RN, Rocha RAA, Marsden PD. Leishmaniose tegumentar americana – casuística do Hospital Escola da UnB. An Bras Dermatol 1980;55:69-70. Sampaio RNR, Soares SKT, Rosa AC. Tratamento com Pentamidina de seis casos de forma mucosa de leishmaniose tegumentar. An Bras Dermatol 1988;63(6):439-442. Sampaio RNR. Tratamento hospitalar da leishmaniose cutâneo-mucosa [Dissertação de mestrado]. Belo Horizonte (MG): UFMG; 1984. Sanford JP, Gilbert DN, Sande A. The Sanford guide to antimicrobial therapy. 26th ed. Dallas: Editorial Office; 1996. Santos AR. A rede laboratorial de saúde pública e o SUS. Informe Epidemiológico do SUS 1997;VI(2):7-14. Sayers BMcA. Knowledge-based indicators: a note on progress, n.4. Apresented in the meeting of ACHR sub-committee on health measurement. Geneva: WHO; 20 october 1997. Schmaljohn C, Hjelle B. Hantaviruses: a global disease problem. Emerg Inf Dis 1997;3(2):95103. Schmid AW. Glossário de epidemiologia. Arq Fac Hig São Paulo 1956;10(Supl):1-20. Scriven M. Evaluation consulting. Evaluat Pract 1995;16(1). Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Centro de Informações de Saúde. Manual de vigilância epidemiológica. São Paulo: Centro de Informações de Saúde; 1978. Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Centro de Vigilância Epidemiológica. Normas e instruções: difteria. São Paulo: Centro de Vigilância Epidemiológica; 2001. Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Centro de Vigilância Epidemiológica. Normas e instruções: coqueluche. São Paulo: Centro de Vigilância Epidemiológica; 2001. Secretaria de Saúde do Distrito Federal. Hospital Regional da Asa Sul. Estudo de placentas. Brasília: SES; 1989. Secretaria de Saúde do Estado da Bahia. Departamento de Vigilância da Saúde. Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador. Manual de normas e procedimentos técnicos para a vigilância da saúde do trabalhador. Salvador: SES; 1995. Documento não publicado. Secretaria de Saúde do Estado da Bahia. Manual de normas e procedimentos técnicos para vigilância epidemiológica. 4ª ed. rev. amp. Salvador: SES; 1991. 792 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Bibliografia consultada Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo. Centro de Vigilância Epidemiológica Professor Alexandre Vranjac. Cólera, normas e instruções. São Paulo: Centro de Vigilância Epidemiológica Professor Alexandre Vranjac; 1992. Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo. Centro de Vigilância Epidemiológica Professor Alexandre Vranjac. Manual de vigilância epidemiológica: febre tifóide, normas e instruções. São Paulo: Centro de Vigilância Epidemiológica Professor Alexandre Vranjac; 1992. Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo. Centro de Vigilância Epidemiológica Professor Alexandre Vranjac. Manual de vigilância epidemiológica. São Paulo: Centro de Vigilância Epidemiológica Professor Alexandre Vranjac; 1991. Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo. Centro de Vigilância Epidemiológica Professor Alexandre Vranjac. Manual de vigilância epidemiológica: leishmaniose tegumentar americana. São Paulo: Centro de Vigilância Epidemiológica Professor Alexandre Vranjac; 1995. Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo. Centro de Vigilância Epidemiológica Professor Alexandre Vranjac. Normas e instruções: coqueluche. São Paulo: Centro de Vigilância Epidemiológica Professor Alexandre Vranjac; 2001. Seminário sobre usos y perspectivas de la epidemiologia; 1983 nov. 7-10; Buenos Aires, Argentina. Washington: OPS; 1984. Shaw JJ. Taxonomia do gênese Leishmania: conceito tradicionalista x conceito moderno. An Bras Dermat 1985;60(2):67-72. Sheffer AL, Pennoyer DS. Management of adverse drug reactions. J. Allergy Clin Immunol 1984;74:580-588. Sherlock DS. Chapters virus hepatitis and chronic hepatitis. In: Diseases of the liver and biliary system. Blackwell Scientific Publications. 7th ed. Great Britain; 1985. Shever MW. Tétano neonatal: aspectos sobre a epidemiologia no Estado do Rio de Janeiro. Arq Bras Med 1991;65(2):111-113. Silva LC. Hepatites agudas e crônicas. São Paulo: Sarvier; 1986. Silva LP, Chequer PJ. Sistemas de informação em saúde e a vigilância epidemiológica. In: Fundação Nacional de Saúde. Guia de vigilância epidemiológica. Brasília: FNS; 1994. p.43-49; Silva LR, Mota E, Santana C. Diarréia aguda na criança. Rio de Janeiro: Medsi; 1988. Silva MV, Vasconcelos MJ, Hidalgo NTR. Hantavirus pulmonary syndrome. Report of first three cases in São Paulo, Brazil. Rev Inst Med Trop São Paulo 1997;39(4):231-234. Simões ML, Teixeira MG, Araújo FA. Hantavírus. Informe Epidemiológico do SUS 1994; 3(3/4):43-47. Simões MLN. Investigacão epidemiológica de campo de leptospirose e modelos de transmissão da doença. In: Anais do Encontro Nacional em Leptospirose. 1988; Recife, Brasil. Souza WJS, Coutinho SG, Marzochi MCA. Utilização da reação de imunofluorescência indireta no acompanhamento da terapêutica de leishmaniose tegumentar americana. Mem Inst Oswaldo Cruz 1982;77:247-253. Superintendência de Campanhas de Saúde Pública. Esquistossomose mansônica: guia texto. Brasília: Sucam; 1988. Superintendência de Campanhas de Saúde Pública. Manual para diagnóstico de febre amarela e dengue. Brasília: Sucam; 1988. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 793 Bibliografia consultada Tablan OC, Anderson LJ, Arden NH. Guideline for prevention of nosocomial pneumonia. The hospital infection control practices advisory committee, CDC. Infect Control Hosp Epidemiol 1994;15: 587-627. Talhari S, Neves RG. Hanseníase. 3ª ed. Manaus: Instituto Superior de Estudo da Amazônia; 199-. Teixeira MG, Barreto Ml, Costa MCN, Strina A, Marins Júnior, D Prado M. Sentinel areas: a monitoring strategy in public health. Cadernos de Saúde Pública 2002;18(5):1189-1195. Teixeira MG, Costa MCN, Carmo EH, Cerqueira VL, Santos M. Epidemia de gastroenterite em área de influência da barragem de Itaparica, Bahia, 1988. B Ofic Sanit Panam 1993; 114(6):502512. Teixeira MG, Costa MCN. Vigilância epidemiológica. In: Secretaria de Saúde do Estado da Bahia. Superintendência de Saúde. Manual de normas e procedimentos técnicos em vigilância epidemiológica. Salvador: Superintendência de Saúde; 1990. Teixeira MG, Penna GO, Risi Junior JB et al. Seleção das doenças de notificação compulsória: critérios e recomendações para as três esferas de governo. Informe Epidemiológico do SUS 1998; VII(1):7-28. Teixeira MG, Risi Junior JB. Vigilância epidemiológica. In: Fundação Nacional de Saúde. Guia de vigilância epidemiológica. Brasília: FNS; 1994. p.11-24; Terracciano G, Chen RT, Lloyd J. Surveillance for adverse events following vaccination. In: Manual for the surveillance of vaccine-preventable diseases. Atlanta: Centers for Disease Control and Prevention; 1996. Ch. 17. Teutsch SM. Considerations in planning a surveillance system. In: Principles and practice of public health surveillance. New York: Oxford University Press; 1994. p.18-30. Thomas I, Charlotte G. Choosing an appropriate measure of diarrhoea occurence: examples from a community – Based study in rural Kenya. Int J Epidemiol 1992;21:589-593. Timbury MC. Medical virology. 11th ed. New York: Churchill Livingstone; 1997. Towards the elimination of hepatitis B: a guide to the implementation of National Immunization Programms in the Developing World. Newsletter of the International Task Force on Hepatitis B Immunization and the Program for Appropriate Technology in Health. PATH 1994;5(1):1-18. Travassos da Rosa APA et al. A febre amarela silvestre no estado do Pará. Boletim Epidemiológico (MS) 1984; 16(15):97-104. Vasconcelos PFC et al. Febre amarela. In: Leão RNQ, coordenador. Doenças infecciosas e parasitárias: enfoque amazônico. Belém: CEJUP/Uepa/IEC; 1997. p. 265-284. Veronesi R, Focaccia R. Tratado de infectologia. São Paulo: Atheneu, 1996. Veronesi R. Doenças infecciosas e parasitárias. 5ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1972. Walce-Sordrager S. Leptospirosis. Bull Health Organ 1939;8:143. Waldman EA. Vigilância epidemiológica como prática de saúde pública [tese de doutorado]. São Paulo (SP): USP; 1991. Waldman RH, Kluge RM, editors. Textbook of infectious diseases. New Hyde Park (NY): Medical Examination Publishing; 1984. Waldman, EA. Saúde & cidadania – Vigilância em saúde pública. Volume 7. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública de São Paulo; 1998. Warning guide one. How to diagnose and heat leprosy. London: ILEP; 2001. 794 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Bibliografia consultada Weekly Epidemiological Record; 14 may 1993 68 ter year n. 20. World Health Organization. Assessment of risk to human health associated with outbreaks of highly pathogenic H5N1 avian influenza in poultry [monograph on the Internet]. Geneva: WHO. [updated 2004 May 14]. Available from: www.who.int. World Health Organization. Avian influenza in the Netherlands. [monograph on the Internet]. Geneva: WHO. [updated 2003 Apr. 3]. Available from: www.who.int. World Health Organization. Confirmed human cases of avian influenza A (H5N1). [monograph on the Internet]. Geneva: WHO. [updated 2004 Apr 5]. Available from: www.who.int. World Health Organization. Hepatitis B immunization strategies. Expanded Programme on Immunization. WHO/EPI/GEN/88.5. World Health Organization. Hepatitis B vaccine attacking a pandemic. UPDATE Expanded Programme on Immunization. Geneva: WHO; Nov 1989. World Health Organization. Influenza pandemic preparedness plan. The role of WHO and guidelines for national and regional planing. Geneva: WHO; April 1999. World Health Organization. Influenza. Report by the Secretariat. Executive Board, 111th session, november 2002. World Health Organization. Prevention and control of yellow fever in Africa. Geneva: WHO; 1986. World Health Organization. Public health impact of pesticides used in agriculture. In: Jeyaratnam J. Occupational health issues in developing countries. Environm Res 1993;60:207-212. World Health Organization. Recommended surveillance standards. Rationale for surveillance. Diphtheria. Geneva: WHO; 2002. World Health Organization. Recommended surveillance standards. Rationale for surveillance. Pertussis. Geneva: WHO; 2002. World Health Organization. Report of consultation on priority public health interventions before and during an influenza pandemic. Geneve: WHO; 16-18 March 2004. World Health Organization. The control of schistosomiasis. Second report of the WHO Expert Committee. Geneva: WHO; 1993. World Health Organization. Treatment of tuberculosis. Guidelines for national programmes. Geneva: WHO; 1993. World Health Organization. WHO Expert Committee on Rabies: Eight Report. Geneva: WHO; 1992. WHO Technical Report Series n. 824. Yager RH. Epidemiology of the leptospirosis. Bull New York Academy Medicine 1953;29(8):650651. Yin RK. Sage publications - Chapter 5: case study designs for evaluating. Yu AL, Costa JM, Amaku M, Pannuti CS, Souza VA, Zanetta DM, Burattini MN, Massad E, Azevedo RS. Três anos de estudo soroepidemiológico do vírus varicela-zoster em São Paulo, Brasil. Rev Inst Med Trop São Paulo 2000;42(3):125-128. Zajtchuk JT, Casler JD, Netto EM. Mucosal leishmaniasis in Brazil. Laryngoscope 1989; 99(9):925-939. Zarife MAS. Prevalência da infecção pelo vírus C da hepatite (VHC) em Salvador – Bahia [Dissertação de mestrado]. Salvador (BA): UFBA; 2002. Ziskin M, Jones RM, Weill H. Silicosis. Am Rev Respir Dis 1976;113:643-665. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 795 Glossário Este glossário visa esclarecer a terminologia utilizada nesta publicação. Vale salientar que, embora alguns termos aqui incluídos possam ser encontrados com significados diferentes, as definições apresentadas são as mais freqüentemente aplicadas no contexto da vigilância e controle de doenças transmissíveis. ABATE: marca comercial do inseticida organofosforado Temefós. AGENTE: entidade biológica, física ou química capaz de causar doença. AGENTE INFECCIOSO: agente biológico, capaz de produzir infecção ou doença infecciosa. ALADO: fase adulta do vetor, presença de asas. ANATOXINA (toxóide): toxina tratada pelo formol ou outras substâncias, que perde sua capacidade toxigênica mas conserva sua imunogenicidade. Os toxóides são usados para induzir imunidade ativa e específica contra doenças. ANTICORPO: globulina encontrada em fluidos teciduais e no soro, produzida em resposta ao estímulo de antígenos específicos, sendo capaz de se combinar com os mesmos, neutralizandoos ou destruindo-os. ANTICORPO MONOCLONAL: anticorpo produzido pela progênie de uma única célula, fato que o torna extremamente puro, preciso e homogêneo. ANTIGENICIDADE: capacidade de um agente, ou de fração do mesmo, estimular a formação de anticorpos. ANTÍGENO: porção ou produto de um agente biológico, capaz de estimular a formação de anticorpos específicos. ANTISSEPSIA: conjunto de medidas empregadas para impedir a proliferação microbiana. ANTITOXINA: anticorpos protetores que inativam proteínas solúveis tóxicas de bactérias. ANTRÓPICO: tudo o que possa ser atribuído à atividade humana. ANTROPONOSE: infecção com transmissão restrita aos seres humanos. ANTROPOZOONOSE: infecção transmitida ao homem, por reservatório animal. ARBOVIROSES: viroses transmitidas, de um hospedeiro para outro, por meio de um ou mais tipos de artrópodes. ÁREA ENDÊMICA: aqui considerada como área reconhecidamente de transmissão para esquistossomose, de grande extensão, contínua, dentro de um município. ÁREA DE FOCO: área de transmissão para esquistossomose, com localização bem definida, limitada a uma localidade ou pequeno número desta, em um município. ÁREA INDENE VULNERÁVEL: área reconhecidamente sem transmissão para esquistossomose, mas cujas condições ambientais (presença de hospedeiros intermediários nas condições hídricas), associadas a precárias condições socioeconômicas e de saneamento, na presença de migrantes portadores da esquistossomose, oriundos de áreas de transmissão, tornam a área sob risco. ASCITE: acúmulo de líquido seroso na cavidade peritonial, causado pelo aumento da pressão venosa ou queda da albumina no plasma. O exame revela aumento indolor do abdome, macicez 796 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Glossário líquida que muda com a postura. É responsável pelo termo “barriga d’água” para a esquistossomose. ASSEPSIA: conjunto de medidas utilizadas para impedir a penetração de microrganismos (contaminação) em local que não os contenha. ASSOCIAÇÃO MEDICAMENTOSA: administração simultânea de dois ou mais medicamentos, seja em preparação separada, seja em uma mesma preparação. BACTERIÓFAGO: vírus que lisa a bactéria. Capaz de infectar e destruir bactérias. É freqüentemente utilizado como vetor pela engenharia genética. BIOCENOSE: comunidade resultante da associação de populações confinadas em determinados ambientes, no interior de um ecossistema. BIOGEOCENOSE (ecossistema): sistema dinâmico que inclui todas as interações entre o ambiente e as populações ali existentes. BIOSFERA: conjunto de todos os ecossistemas. BIOTA: reunião de várias comunidades. CAPACIDADE VETORIAL: propriedade do vetor, mensurada por parâmetros como abundância, sobrevivência e grau de domiciliação. Relaciona-se à transmissão do agente infeccioso em condições naturais. CARACTERES EPIDEMIOLÓGICOS: modos de ocorrência natural das doenças em uma comunidade, em função da estrutura epidemiológica da mesma. CARÁTER ANTIGÊNICO: combinação química dos componentes antigênicos de um agente, cuja combinação e componentes são únicos, para cada espécie ou cepa do agente, sendo responsável pela especificidade da imunidade resultante da infecção. CASO: pessoa ou animal infectado ou doente, apresentando características clínicas, laboratoriais e/ou epidemiológicas específicas. CASO AUTÓCTONE: caso contraído pelo enfermo na zona de sua residência. CASO CONFIRMADO: pessoa de quem foi isolado e identificado o agente etiológico, ou de quem foram obtidas outras evidências epidemiológicas e/ou laboratoriais da presença do agente etiológico, como, por exemplo, a conversão sorológica em amostras de sangue colhidas nas fases aguda e de convalescência. Esse indivíduo pode ou não apresentar a síndrome indicativa da doença causada pelo agente. A confirmação do caso está sempre condicionada à observação dos critérios estabelecidos pela definição de caso, a qual, por sua vez, está relacionada ao objetivo do programa de controle da doença e/ou do sistema de vigilância. CASO ESPORÁDICO: caso que, segundo informações disponíveis, não se apresenta epidemiologicamente relacionado a outros já conhecidos. CASO ÍNDICE: primeiro, entre vários casos, de natureza similar e epidemiologicamente relacionados. O caso índice é muitas vezes identificado como fonte de contaminação ou infecção. CASO IMPORTADO: caso contraído fora da zona onde se fez o diagnóstico. O emprego dessa expressão dá a idéia de que é possível situar, com certeza, a origem da infecção numa zona conhecida. CASO INDUZIDO: caso de malária que pode ser atribuído a uma transfusão de sangue ou a outra forma de inoculação parenteral, porém não à transmissão natural pelo mosquito. A inoculação pode ser acidental ou deliberada e, neste caso, pode ter objetivos terapêuticos ou de pesquisa. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 797 Glossário CASO INTRODUZIDO: na terminologia comum, esse nome é dado aos casos sintomáticos diretos, quando se pode provar que os mesmos constituem o primeiro elo da transmissão local após um caso importado conhecido. CASO PRESUNTIVO: pessoa com síndrome clínica compatível com a doença, porém sem confirmação laboratorial do agente etiológico. A classificação como caso presuntivo está condicionada à definição de caso. CASO SUSPEITO: pessoa cuja história clínica, sintomas e possível exposição a uma fonte de infecção sugerem que possa estar ou vir a desenvolver alguma doença infecciosa. CEPA: população de uma mesma espécie, descendente de um único antepassado ou que tenha espécie descendente de um único antepassado ou mesma origem, conservada mediante uma série de passagens por hospedeiros ou subculturas adequadas. As cepas de comportamento semelhante são chamadas “homólogas” e as de comportamento diferente, “heterólogas”. Anteriormente, empregava-se o termo “cepa” de maneira imprecisa, para aludir a um grupo de organismos estreitamente relacionados entre si e que perpetuavam suas características em gerações sucessivas. Ver também CULTURA ISOLADA. CERCÁRIA: forma do Schistossoma mansoni, infectante para o homem (hospedeiro definitivo). CIRCULAÇÃO COLATERAL: circulação que se instala em órgãos, ou parte deles, através de anastomose (comunicação) dos vasos, quando o suprimento sangüíneo original está obstruído ou abolido. CLONE: população de organismos geneticamente idênticos, descendente de uma única célula por reprodução assexuada. Nos parasitas da malária obtém-se o clone, em geral, a partir de formas eritrocíticas, por meio de uma técnica de diluição e cultura in vitro. COORTE: grupo de indivíduos que têm um atributo em comum. Designa também um tipo de estudo epidemiológico. COLONIZAÇÃO: propagação de um microrganismo na superfície ou no organismo de um hospedeiro, sem causar agressão celular. Um hospedeiro colonizador pode atuar como fonte de infecção. CONGÊNERE: na terminologia química, qualquer substância de um grupo químico cujos componentes sejam derivados da mesma substância-mãe, por exemplo, as 4-aminoquinaleínas são congêneres uma das outras. CONTÁGIO: sinônimo de transmissão direta. CONTAMINAÇÃO: ato ou momento em que uma pessoa ou objeto se converte em veículo mecânico de disseminação de determinado agente patogênico. CONTATO: pessoa ou animal que teve contato com pessoa ou animal infectado, ou com ambiente contaminado, criando a oportunidade de adquirir o agente etiológico. CONTATO EFICIENTE: contato entre um susceptível e uma fonte primária de infecção, em que o agente etiológico é realmente transferido dessa para o primeiro. CONTROLE: quando aplicado a doenças transmissíveis e não transmissíveis, significa operações ou programas desenvolvidos com o objetivo de reduzir sua incidência e/ou prevalência a níveis muito baixos. COPROSCOPIA: diagnóstico realizado mediante exame parasitológico de fezes. COR-PULMONALE: comprometimento cardíaco decorrente do efeito de hipertensão pulmonar sobre o ventrículo direito. CULTURA ISOLADA: amostra de parasitas não necessariamente homogêneos, sob a perspectiva 798 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Glossário genética, obtidos de um hospedeiro natural e conservados em laboratório mediante passagens por outros hospedeiros ou cultura in vitro. Dá-se preferência a esse termo, em lugar de “cepa”, de uso freqüente, mas um tanto impreciso. Ver também CLONE, LINHAGEM e CEPA. CURA RADICAL: eliminação completa de parasitas que se encontram no organismo, excluída qualquer possibilidade de recidivas. DENSIDADE LARVÁRIA: quantidade de larvas para determinado denominador (recipiente, concha, área, imóvel). DENOMINAÇÕES INTERNACIONAIS COMUNS (DIC): nomes comuns de medicamentos aceitos pela Organização Mundial da Saúde e incluídos na lista oficial rubricada por esse organismo. DESINFECÇÃO: destruição de agentes infecciosos que se encontram fora do corpo, por meio de exposição direta a agentes químicos ou físicos. DESINFECÇÃO CONCORRENTE: aplicação de medidas desinfetantes o mais rápido possível, após a expulsão de material infeccioso do organismo de uma pessoa infectada ou depois que a mesma tenha se contaminado com o referido material. Reduz ao mínimo o contato de outros indivíduos com esse material ou objetos. DESINFECÇÃO TERMINAL: desinfecção feita no local em que esteve um caso clínico ou portador, ocorrendo, portanto, depois que a fonte primária de infecção deixou de existir (por morte ou por ter se curado) ou depois que abandonou o local. A desinfecção terminal, aplicada raramente, é indicada no caso de doenças transmitidas por contato indireto. DESINFESTAÇÃO: destruição de metazoários, especialmente artrópodes e roedores, com finalidades profiláticas. DISPONIBILIDADE BIOLÓGICA: velocidade e grau de absorção de um medicamento, a partir de um preparado farmacêutico, determinados por sua curva de concentração/tempo na circulação geral ou por sua excreção na urina. DISSEMINAÇÃO POR FONTE COMUM: disseminação do agente de uma doença, a partir da exposição de um determinado número de pessoas, num certo espaço de tempo, a um veículo comum. Exemplo: água, alimentos, ar, seringas contaminadas. DIMORFISMO: propriedade de existir em duas diferentes formas estruturais. DOENÇA TRANSMISSÍVEL (doença infecciosa): doença causada por um agente infeccioso específico ou pela toxina por ele produzida, por meio da transmissão desse agente ou de seu produto, tóxico a partir de uma pessoa ou animal infectado, ou ainda de um reservatório para um hospedeiro susceptível, quer direta ou indiretamente intermediado por vetor ou ambiente. DOENÇAS QUARENTENÁRIAS: doenças de grande transmissibilidade, em geral graves, que requerem notificação internacional imediata à Organização Mundial da Saúde, isolamento rigoroso de casos clínicos e quarentena dos comunicantes, além de outras medidas de profilaxia com o intuito de evitar sua introdução em regiões até então indenes. Entre as doenças quarentenárias encontram-se a cólera, febre amarela e tifo exantemático. DOSE DE REFORÇO: quantidade de antígeno administrada com o fim de manter ou reavivar a resistência conferida pela imunização. ECOLOGIA: estudo das relações entre seres vivos e seu ambiente. “Ecologia humana” diz respeito ao estudo de grupos humanos, em face da influência de fatores ambientais, incluindo muitas vezes fatores sociais e do comportamento. ECOSSISTEMA: conjunto constituído pela biota e o ambiente não vivo, que interagem em determinada região. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 799 Glossário EFEITOS DELETÉRIOS DOS MEDICAMENTOS: inclui todos os efeitos não desejados apresentados nos seres humanos como resultado da administração de um medicamento. Segundo Rasenhein (1958), em geral pode-se classificar esses efeitos em: a) efeitos tóxicos: introduzidos por doses excessivas, quer seja por única dose grande ou pela acumulação de várias doses do medicamento; b) efeitos colaterais: terapeuticamente inconvenientes, mas conseqüência inevitável da medicação (por exemplo, náuseas e vômitos, após ingerir cloroquina em jejum, ou queda de pressão, após injeção endovenosa de quinina); c) efeitos secundários: surgem indiretamente como resultado da ação de um medicamento (por exemplo, a monilíase em pacientes submetidos a tratamento prolongado com a tetraciclina); d) intolerância: diminuição do limite de sensibilidade à ação fisiológica normal de um medicamento (por exemplo, enjôo, surdez, visão embaraçada que alguns pacientes sofrem ao receber uma dose normal de quinina); e) idiossincrasia: reação qualitativamente anormal de um medicamento (por exemplo, a hemólise que ocorre em alguns pacientes após a administração de primaquina); f) hipersensibilidade por reação alérgica: resposta imunológica anormal após sensibilização provocada por um medicamento (por exemplo, alergia à penicilina). ELIMINAÇÃO: vide ERRADICAÇÃO. ENDEMIA: presença contínua de uma enfermidade, ou agente infeccioso, em uma zona geográfica determinada; pode também expressar a prevalência usual de uma doença particular numa zona geográfica. O termo hiperendemia significa a transmissão intensa e persistente, atingindo todas as faixas etárias; e holoendemia, um nível elevado de infecção que começa a partir de uma idade precoce e afeta a maior parte da população jovem, como, por exemplo, a malária em algumas regiões do globo. ENDOTOXINA: toxina encontrada no interior da célula bacteriana, mas não em filtrados livres de células de bactéria. As endotoxinas são liberadas pela bactéria quando sua célula se rompe. ENZOOTIA: presença constante, ou prevalência usual da doença ou agente infeccioso, na população animal de dada área geográfica. EPIDEMIA: manifestação, em uma coletividade ou região, de um corpo de casos de alguma enfermidade que excede claramente a incidência prevista. O número de casos, que indica a existência de uma epidemia, varia com o agente infeccioso, o tamanho e as características da população exposta, sua experiência prévia ou falta de exposição à enfermidade e local e época do ano em que ocorre. Por decorrência, a epidemia guarda relação com a freqüência comum da enfermidade na mesma região, na população especificada e na mesma estação do ano. O aparecimento de um único caso de doença transmissível, que durante um lapso de tempo prolongado não havia afetado uma população ou que invade pela primeira vez uma região, requer notificação imediata e uma completa investigação de campo; dois casos dessa doença, associados no tempo ou espaço, podem ser evidência suficiente de uma epidemia. EPIDEMIA POR FONTE COMUM (epidemia maciça ou epidemia por veículo comum): epidemia em que aparecem muitos casos clínicos, dentro de um intervalo igual ao período de incubação clínica da doença, o que sugere a exposição simultânea (ou quase simultânea) de muitas pessoas ao agente etiológico. O exemplo típico é o das epidemias de origem hídrica. EPIDEMIA PROGRESSIVA (epidemia por fonte propagada): epidemia na qual as infecções são transmitidas de pessoa a pessoa ou de animal, de modo que os casos identificados não podem ser atribuídos a agentes transmitidos a partir de uma única fonte. EPIGASTRALGIA: dor na região do epigástrio (abdome), que corresponde à localização do estômago. EPIZOOTIA: ocorrência de casos, de natureza similar, em população animal de uma área geográfica particular, que se apresenta claramente em excesso em relação à incidência normal. 800 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Glossário EQUIVALÊNCIA TERAPÊUTICA: característica de diferentes produtos farmacêuticos que, quando administrados em um mesmo regime, apresentam resultados com o mesmo grau de eficácia e/ou toxicidade. ERRADICAÇÃO: cessação de toda a transmissão da infecção, pela extinção artificial da espécie do agente em questão. A erradicação pressupõe a ausência completa de risco de reintrodução da doença, de forma a permitir a suspensão de toda e qualquer medida de prevenção ou controle. A erradicação regional ou eliminação é a cessação da transmissão de determinada infecção, em ampla região geográfica ou jurisdição política. ESPLENOMEGALIA: aumento do volume do baço. ESTRUTURA EPIDEMIOLÓGICA: conjunto de fatores relativos ao agente etiológico, hospedeiro e meio ambiente, que influi sobre a ocorrência natural de uma doença em uma comunidade. EXOTOXINA: toxina produzida por uma bactéria, e por ela liberada, no meio de cultura ou no hospedeiro, conseqüentemente encontrada em filtrados livres de célula e em culturas de bactéria intacta. FAGÓCITO: célula que engloba e destrói partículas estranhas ou microrganismos, por digestão. FAGOTIPAGEM: caracterização de uma bactéria, pela identificação de sua susceptibilidade a determinados bacteriófagos. É uma técnica de caracterização de uma cepa. FALÊNCIA: persistência da positividade do escarro ao final do tratamento. Os doentes que, no início do tratamento, são fortemente positivos (++ ou +++) e mantêm essa situação até o 4º mês são também classificados como caso de falência. FARMACODINÂMICA: estudo da variação individual e coletiva, isto é, étnica, relacionada com fatores genéticos, da absorção e metabolismo dos medicamentos e resposta do organismo aos mesmos. FARMACOTÉCNICA: ramo da ciência que estuda a absorção, distribuição, metabolismo e excreção dos medicamentos. FEBRE HEMOGLOBINÚRICA: síndrome caracterizada por hemólise intravascular aguda e hemoglobinúrica, muitas vezes acompanhada de insuficiência renal. A febre é uma das características do processo relacionado à infecção por Plasmodium falciparum. FENÔMENO DE INTERFERÊNCIA: estado de resistência temporária a infecções por vírus. Resistência induzida por uma infecção viral existente atribuída, em parte, ao Interferon. FIBROSE HEPÁTICA: crescimento do tecido conjuntivo em nível hepático, decorrente de lesões ocasionadas pela presença de ovos ou outros antígenos do Schistosoma, na vascularização do fígado. É a lesão hepática característica da forma crônica de esquistossomose. FITONOSE: infecção transmissível ao homem, cujo agente tem vegetais como reservatórios. FOCO NATURAL: pequeno território, compreendendo uma ou várias paisagens, onde a circulação do agente causal estabeleceu-se numa biogecenose, por um tempo indefinidamente longo, sem sua importação de outra região. O foco natural é uma entidade natural, cujos limites podem ser demarcados em um mapa. FOCO ARTIFICIAL: doença transmissível que se instala em condições propiciadas pela atividade antrópica. FÔMITES: objetos de uso pessoal do caso clínico ou portador, que podem estar contaminados e transmitir agentes infecciosos e cujo controle é feito por meio da desinfecção. FONTE DE INFECÇÃO: pessoa, animal, objeto ou substância a partir do qual o agente é transmitido para o hospedeiro. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 801 Glossário FONTE PRIMÁRIA DE INFECÇÃO (reservatório): homem ou animal e, raramente, o solo ou vegetais, responsável pela sobrevivência de determinada espécie de agente etiológico na natureza. No caso dos parasitas heteroxenos, o hospedeiro mais evoluído (que geralmente é também o definitivo) é denominado fonte primária de infecção; e o hospedeiro menos evoluído (em geral hospedeiro intermediário) é chamado vetor biológico. FONTE SECUNDÁRIA DE INFECÇÃO: ser animado ou inanimado que transporta determinado agente etiológico, não sendo o principal responsável pela sobrevivência desse como espécie. Esta expressão é substituída, com vantagem, pelo termo “veículo”. FREQÜÊNCIA (ocorrência): termo genérico, utilizado em epidemiologia para descrever a freqüência de uma doença ou de outro atributo ou evento identificado na população, sem fazer distinção entre incidência ou prevalência. FUMIGAÇÃO: aplicação de substâncias gasosas capazes de destruir a vida animal, especialmente insetos e roedores. GAMETÓFARO: refere-se ao indivíduo portador das formas sexuadas do parasita (gametas). GOTÍCULAS DE FLÜGGE: secreções oronasais de mais de 100 micras de diâmetro, que transmitem agentes infecciosos de maneira direta mediata. HEMATÊMESE: vômito no sangue. HEPATOMEGALIA: aumento de volume do fígado. HISTÓRIA NATURAL DA DOENÇA: descrição que inclui as características das funções de infecção, distribuição da doença segundo os atributos de pessoas, tempo e espaço, distribuição e características ecológicas do(s) reservatório(s) do agente; mecanismos de transmissão e efeitos da doença sobre o homem. HOLOMETABÓLICO: animais que apresentam metamorfose completa (ex: ovo, larva, pulpa, adulto). HOSPEDEIRO: organismo simples ou complexo, incluindo o homem, capaz de ser infectado por um agente específico. HOSPEDEIRO DEFINITIVO: apresenta o parasita em fase de maturidade ou de atividade sexual. HOSPEDEIRO INTERMEDIÁRIO: apresenta o parasita em fase larvária ou assexuada. IMUNIDADE: resistência, usualmente associada à presença de anticorpos que têm o efeito de inibir microrganismos específicos ou suas toxinas, responsáveis por doenças infecciosas particulares. IMUNIDADE ATIVA: imunidade adquirida naturalmente pela infecção, com ou sem manifestações clínicas, ou artificialmente pela inoculação de frações ou produtos de agentes infecciosos, ou do próprio agente morto, modificado ou de forma variante. IMUNIDADE DE REBANHO: resistência de um grupo ou população à introdução e disseminação de um agente infeccioso. Essa resistência é baseada na elevada proporção de indivíduos imunes, entre os membros desse grupo ou população, e na uniforme distribuição desses indivíduos imunes. IMUNIDADE PASSIVA: imunidade adquirida naturalmente da mãe, ou artificialmente pela inoculação de anticorpos protetores específicos (soro imune de convalescentes ou imunoglobulina sérica). A imunidade passiva é pouco duradoura. IMUNODEFICIÊNCIA: ausência de capacidade para produzir anticorpos em resposta a um antígeno. 802 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Glossário IMUNOGLOBULINA: solução estéril de globulinas que contêm aqueles anticorpos normalmente presentes no sangue do adulto. IMUNOPROFILAXIA: prevenção da doença através da imunidade conferida pela administração de vacinas ou soros a uma pessoa ou animal. INCIDÊNCIA: número de casos novos de uma doença, ocorridos em uma população particular, durante um período específico de tempo. ÍNDICE DE BRETEAU: número de recipientes, habitados por formas imaturas de mosquitos, em relação ao número de casas examinadas para o encontro de criadouros. INFECÇÃO: penetração, alojamento e, em geral, multiplicação de um agente etiológico animado no organismo de um hospedeiro, produzindo-lhe danos, com ou sem aparecimento de sintomas clinicamente reconhecíveis. Em essência, a infecção é uma competição vital entre um agente etiológico animado (parasita “sensu latu”) e um hospedeiro; é, portanto, uma luta pela sobrevivência entre dois seres vivos, que visam a manutenção de sua espécie. INFECÇÃO APARENTE (doença): desenvolve-se acompanhada de sinais e sintomas clínicos. INFECÇÃO HOSPITALAR: desenvolve-se em paciente hospitalizado ou atendido em outro serviço de assistência, que não padecia nem estava incubando a doença no momento da hospitalização. Pode manifestar-se, também, como efeito residual de infecção adquirida durante hospitalização anterior, ou ainda manifestar-se somente após a alta hospitalar. Abrange igualmente as infecções adquiridas no ambiente hospitalar, acometendo visitantes ou sua própria equipe. INFECÇÃO INAPARENTE: cursa na ausência de sinais e sintomas clínicos perceptíveis. INFECTANTE: aquele que pode causar uma infecção; aplica-se, geralmente, ao parasita (por exemplo, o gametócito, o esporozoíto). INFECTIVIDADE: capacidade do agente etiológico se alojar e multiplicar-se no corpo do hospedeiro. INFESTAÇÃO: entende-se por infestação de pessoas ou animais o alojamento, desenvolvimento e reprodução de artrópodes na superfície do corpo ou nas roupas. Os objetos ou locais infestados são os que albergam ou servem de alojamento a animais, especialmente artrópodes e roedores. INFLAMAÇÃO: resposta normal do tecido à agressão celular por material estranho; caracteriza-se pela dilatação de capilares e mobilização de defesas celulares (leucócitos e fagócitos). INQUÉRITO EPIDEMIOLÓGICO: levantamento epidemiológico feito por coleta ocasional de dados, quase sempre por amostragem, que fornece dados sobre a prevalência de casos clínicos ou portadores em determinada comunidade. INTERAÇÃO FARMACOLÓGICA: alteração do efeito farmacológico de um medicamento administrado simultaneamente com outro. INTERFERON: proteína de baixo peso molecular, produzida por células infectadas por vírus. Tem a propriedade de bloquear as células sadias da infecção viral, suprimindo a multiplicação viral nas células já infectadas; é ativo contra amplo espectro de vírus. INVASIBILIDADE: capacidade de um microrganismo entrar no corpo e se disseminar através dos tecidos. Essa disseminação pode ou não resultar em infecção ou doença. INVESTIGAÇÃO EPIDEMIOLÓGICA DE CAMPO (classicamente conhecida por investigação epidemiológica): estudos efetuados a partir de casos clínicos, ou de portadores, para a identificação das fontes de infecção e modos de transmissão do agente. Pode ser realizada quando de casos esporádicos ou surtos. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 803 Glossário ISOLAMENTO: segregação de um caso clínico do convívio das outras pessoas, durante o período de transmissibilidade, visando evitar que os susceptíveis sejam infectados. Em certos casos, o isolamento pode ser domiciliar ou hospitalar; em geral, é preferível esse último, por ser mais eficiente. ISOMETRIA: fenômeno presente nos compostos químicos de idêntica fórmula molecular, mas de estrutura molecular diferente. As substâncias que compartilham essas características chamam-se isômeros. Nos derivados do núcleo benzênico, a isomeria geométrica e a isomeria ótica dependem da distribuição espacial das quatro ligações do átomo de carbono. JANELA IMUNOLÓGICA: intervalo entre o início da infecção e a possibilidade de detecção de anticorpos, por meio de técnicas laboratoriais. LATÊNCIA: período, na evolução clínica de uma doença parasitária, no qual os sintomas desaparecem, apesar de o hospedeiro estar ainda infectado, e de já ter sofrido o ataque primário, ou uma ou várias recaídas. Terminologia freqüentemente utilizada em relação à malária. LARVITRAMPAS: recipiente com água, onde se observam as larvas dos mosquitos após a eclosão. LINHAGEM: população de parasitas, submetida a determinadas passagens no laboratório, em geral de uma seleção especial (seja natural ou experimental), de acordo com uma característica específica (por exemplo, farmacorresistência). Ver também CEPA. MALACOLOGIA: estudo do caramujo. MIRACÍDIO: forma do Schistosoma mansoni, infectante para o caramujo. MONITORAMENTO ENTOMOLÓGICO: acompanhar, analisar e avaliar a condição entomológica de determinada área. MONITORIZAÇÃO: abrange, segundo John M. Last, três campos de atividade: a) elaboração e análise de mensurações rotineiras, visando detectar mudanças no ambiente ou estado de saúde da comunidade. Não deve ser confundida com vigilância. Para alguns estudiosos, monitorização implica em intervenção à luz das mensurações observadas; b) contínua mensuração do desempenho do serviço de saúde ou de profissionais de saúde, ou do grau com que os pacientes concordam com ou aderem às suas recomendações; c) na ótica da administração, a contínua supervisão da implementação de uma atividade com o objetivo de assegurar que a liberação dos recursos, esquemas de trabalho, objetivos a serem atingidos e outras ações necessárias estejam sendo processados de acordo com o planejado. NICHO OU FOCO NATURAL: quando o agente patogênico, o vetor específico e o animal hospedeiro existirem sob condições naturais, durante muitas gerações, num tempo indefinido, independente da existência do homem. NÚCLEO DE WELLS: secreções oronasais de menos de 100 micra de diâmetro, que transmitem agentes infecciosos de maneira indireta, por meio do ar, onde flutuam durante intervalo de tempo mais ou menos longo. OPORTUNISTA: organismo que, vivendo normalmente como comensal ou de vida livre, passa a atuar como parasita, geralmente em decorrência da redução da resistência natural do hospedeiro. ORGANOFOSFORADO: grupo de produtos químicos utilizados como inseticida. OVIPOSIÇÃO: ato do inseto fêmea por ovos. OVITRAMPAS: recipiente onde as fêmeas de mosquitos fazem oviposição e onde se pode observar os ovos. 804 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Glossário OVOS VIÁVEIS: ovos que contém o miracídio capaz de viver. PANDEMIA: epidemia de uma doença que afeta pessoas em muitos países e continentes. PARASITA: organismo, geralmente microrganismo, cuja existência ocorre à expensa de um hospedeiro. Entretanto, não é obrigatoriamente nocivo a seu hospedeiro. Existem parasitas obrigatórios e facultativos; os primeiros sobrevivem somente na forma parasitária e os últimos podem ter uma existência independente. PARASITAS HETEROXENOS: necessitam de dois tipos diferentes de hospedeiros para sua completa evolução: o hospedeiro definitivo e o intermediário. PARASITAS MONOXENOS: necessitam de um só hospedeiro para a sua completa evolução. PASTEURIZAÇÃO: desinfecção do leite, feita pelo aquecimento a 63º-65ºC, durante 30 minutos (ou a 73º-75ºC, durante 15 minutos), baixando a temperatura imediatamente para 20º a 50ºC. PATOGENICIDADE: capacidade de um agente biológico causar doença em um hospedeiro susceptível. PATÓGENO: agente biológico capaz de causar doenças. PERÍODO DE INCUBAÇÃO: intervalo entre a exposição efetiva do hospedeiro susceptível a um agente biológico e o início dos sinais e sintomas clínicos da doença no mesmo. PERÍODO DE TRANSMISSIBILIDADE: intervalo de tempo durante o qual uma pessoa ou animal infectado elimina um agente biológico para o meio ambiente ou para o organismo de um vetor hematófago, sendo possível, portanto, a sua transmissão a outro hospedeiro. PERÍODO DE LATÊNCIA: intervalo entre a exposição a agentes patológicos e início dos sinais e sintomas da doença. PERÍODO PRODRÔMICO: lapso de tempo entre os primeiros sintomas da doença e o início dos sinais ou sintomas, que baseia o estabelecimento do diagnóstico. PESCA LARVA: coador confeccionado em tecido de filó, usado para retirar larva dos depósitos. PIRETRÍODE: grupo de produtos químicos utilizado como inseticida. PODER IMUNOGÊNICO (imunogenicidade): capacidade de o agente biológico estimular a resposta imune no hospedeiro; conforme as características desse agente, a imunidade obtida pode ser de curta ou longa duração e de grau elevado ou baixo. PORTADOR: pessoa ou animal que não apresenta sintomas clinicamente reconhecíveis de determinada doença transmissível ao ser examinado, mas que está albergando o agente etiológico respectivo. Em saúde pública, têm mais importância os portadores que os casos clínicos, porque, muito freqüentemente, a infecção passa despercebida nos primeiros. Os que apresentam realmente importância são os portadores eficientes, assim, na prática, o termo “portador” quase sempre se refere aos portadores eficientes. PORTADOR ATIVO: portador que teve sintomas, mas que, em determinado momento, não os apresenta. PORTADOR ATIVO CONVALESCENTE: portador durante e após a convalescença. Tipo comum na febre tifóide e na difteria. PORTADOR ATIVO CRÔNICO: pessoa ou animal que continua a albergar o agente etiológico, muito tempo após ter tido a doença. O momento em que o portador ativo convalescente passa a crônico é estabelecido arbitrariamente para cada doença. No caso da febre tifóide, por exemplo, o portador é considerado como ativo crônico quando alberga a Salmonella typhi por mais de um ano após ter estado doente. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 805 Glossário PORTADOR ATIVO INCUBADO OU PRECOCE: portador durante o período de incubação clínica de uma doença. PORTADOR EFICIENTE: portador que elimina o agente etiológico para o meio exterior ou para o organismo de um vetor hematófago, ou que possibilita a infecção de novos hospedeiros. Essa eliminação pode ser feita de maneira contínua ou de modo intermitente. PORTADOR INEFICIENTE: portador que não elimina o agente etiológico para o meio exterior, não representando, portanto, perigo para a comunidade no sentido de disseminar esse microrganismo. PORTADOR PASSIVO (portador aparentemente são): portador que nunca apresentou sintomas de determinada doença transmissível, não os está apresentando e não os apresentará no futuro; somente pode ser descoberto por meio de exames laboratoriais adequados. PORTADOR PASSIVO CRÔNICO: portador passivo que alberga um agente etiológico por longo período de tempo. PORTADOR PASSIVO TEMPORÁRIO: portador passivo que alberga um agente etiológico durante pouco tempo; a distinção entre o portador passivo crônico e o temporário é estabelecida arbitrariamente para cada agente etiológico. POSTULADOS DE EVANS: a expansão do conhecimento biomédico levou à revisão dos postulados de Koch. Em 1976, Alfred Evans elaborou os seguintes postulados, com base naqueles idealizados por Koch: • A prevalência da doença deve ser significativamente mais alta entre os expostos à causa suspeita do que entre os controles não expostos; • A exposição à causa suspeita deve ser mais freqüente entre os atingidos pela doença do que o grupo de controle que não a apresenta, mantendo-se constantes os demais fatores de risco; • A incidência da doença deve ser significantemente mais elevada entre os expostos à causa suspeita do que entre aqueles não expostos. Tal fato deve ser demonstrado em estudos prospectivos; • A exposição ao agente causal suspeito deve ser seguida de doença, enquanto a distribuição do período de incubação deve apresentar uma curva normal; • Um espectro da resposta do hospedeiro deve seguir a exposição ao provável agente, num gradiente biológico que vai do benigno ao grave; • Uma resposta mensurável do hospedeiro, até então inexistente, tem alta probabilidade de aparecer após a exposição ao provável agente, ou aumentar em magnitude se presente anteriormente. Esse padrão de resposta deve ocorrer infreqüentemente em pessoas pouco expostas; • A reprodução experimental da doença deve ocorrer mais freqüentemente em animais ou no homem, adequadamente exposta à provável causa do que naqueles não expostos. Essa exposição pode ser deliberada em voluntários; experimentalmente induzida em laboratório, ou pode representar um parâmetro da exposição natural; • A eliminação ou modificação da causa provável deve diminuir a incidência da doença; • A prevenção ou modificação da resposta do hospedeiro em face da exposição à causa provável, deve diminuir a incidência ou eliminar a doença; • Todas as associações ou achados devem apresentar consistência com os conhecimentos nos campos da biologia e da epidemiologia. POSTULADOS DE KOCH: originalmente formulados por Henle e adaptados por Robert Koch, em 1877. Koch afirmava que quatro postulados deveriam ser previamente observados para que se pudesse aceitar uma relação causal entre um particular microrganismo ou parasita e uma doença, a saber: 806 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Glossário • O agente biológico deve ser demonstrado em todos os casos da doença, por meio de seu isolamento em cultura pura; • O agente biológico não deve ser encontrado em outras doenças; • Uma vez isolado, o agente deve ser capaz de reproduzir a doença em animais de experimento; • O agente biológico deve ser recuperado da doença experimentalmente produzida. PREVALÊNCIA: número de casos clínicos ou de portadores existentes em um determinado momento, em uma comunidade, dando uma idéia estática da ocorrência do fenômeno. Pode ser expressa em números absolutos ou em coeficientes. PRÓDROMOS: sintomas indicativos do início de uma doença. PROFILAXIA: conjunto de medidas que têm por finalidade prevenir ou atenuar as doenças, suas complicações e conseqüências. Quando a profilaxia basear-se no emprego de medicamentos, trata-se da quimioprofilaxia. PUÇÁ DE FILÓ: instrumento, na forma de grande coador, utilizado para a captura de mosquito adulto. QUARENTENA: isolamento de indivíduos ou animais sadios pelo período máximo de incubação da doença, contado a partir da data do último contato com um caso clínico ou portador ou da data em que esse comunicante sadio abandonou o local em que se encontrava a fonte de infecção. Na prática, a quarentena é aplicada no caso das doenças quarentenárias. QUIMIOPROFILAXIA: administração de uma droga, incluindo antibióticos, para prevenir uma infecção ou a progressão de uma infecção com manifestações da doença. QUIMIOTERAPIA: uso de uma droga com o objetivo de tratar uma doença clinicamente reconhecível ou de eliminar seu progresso. RECAÍDA: reaparecimento ou recrudescimento dos sintomas de uma doença, antes do doente apresentar-se completamente curado. No caso da malária, recaída significa nova aparição de sintomas depois do ataque primário. RECIDIVA: reaparecimento do processo mórbido após sua cura aparente. No caso da malária, recidiva significa recaída na infecção malárica entre a 8ª e a 24ª semanas posteriores ao ataque primário. Na tuberculose, significa o aparecimento de positividade no escarro, em dois exames sucessivos, após a cura. RECORRENTE: estado patológico que evolui através de recaídas sucessivas. No caso da malária, recorrência significa recaída na infecção malárica depois de 24 semanas posteriores ao ataque primário. RECRUDESCÊNCIA: exacerbação das manifestações clínicas ou anatômicas de um processo mórbido. No caso da malária, recrudescência é a recaída na infecção malárica nas primeiras 8 semanas posteriores ao ataque primário. REPASTO: ato do inseto alimentar-se diretamente do animal. RESERVATÓRIO DE AGENTES INFECCIOSOS (fonte primária de infecção): qualquer ser humano, animal, artrópode, planta, solo, matéria ou uma combinação deles, no qual normalmente vive e se multiplica um agente infeccioso, que depende desse meio para sua sobrevivência, reproduzindo-se de modo tal que pode ser transmitido a um hospedeiro susceptível. RESISTÊNCIA: conjunto de mecanismos específicos e inespecíficos do organismo que serve de defesa contra a invasão ou multiplicação de agentes infecciosos ou contra os efeitos nocivos de seus produtos tóxicos. Os mecanismos específicos constituem a imunidade; os inespecíficos, a resistência inerente ou natural. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 807 Glossário RESISTÊNCIA INERENTE (resistência natural): capacidade de resistir a uma enfermidade, independente de anticorpos ou da resposta específica dos tecidos. Geralmente, depende das características anatômicas ou fisiológicas do hospedeiro, podendo ser genética ou adquirida, permanente ou temporária. SANEAMENTO DOMICILIAR: conjunto de ações que visa à melhoria do abastecimento d’água, esgotamento sanitário, manejo e destino adequado dos resíduos sólidos no domicílio. SEPTICEMIA: presença de microrganismo patogênico, ou de suas toxinas, no sangue ou em outros tecidos. SINAL: evidência objetiva de doença. SÍNDROME: conjunto de sintomas e sinais que tipificam uma determinada doença. SINERGISMO: ação combinada de dois ou mais medicamentos que produzem um efeito biológico, cujo resultado pode ser simplesmente a soma dos efeitos de cada composto ou um efeito total superior a essa soma. Quando um medicamento aumenta a ação de outro, diz-se que existe potencialização. Esse termo é muitas vezes utilizado de forma pouco precisa para descrever o fenômeno de sinergismo, quando dois compostos atuam sobre diferentes locais receptores do agente patogênico. O caso oposto é representado pelo antagonismo, fenômeno pelo qual as ações conjuntas de dois ou mais compostos resultam em diminuição do efeito farmacológico. SINTOMA: evidência subjetiva de doença. SOROEPIDEMIOLOGIA: estudo epidemiológico ou atividade baseada na identificação, com base em testes sorológicos, de mudanças nos níveis de anticorpos específicos de uma população. Esse método permite não só a identificação de casos clínicos mas também os estados de portador e as infecções latentes ou subclínicas. SOROTIPO: caracterização de um microrganismo pela identificação de seus antígenos. SURTO EPIDÊMICO: ocorrência de dois ou mais casos epidemiologicamente relacionados. SUSCEPTÍVEL: qualquer pessoa ou animal que supostamente não possui resistência suficiente contra um determinado agente patogênico, que o proteja da enfermidade caso venha a entrar em contato com o agente. TAXA DE ATAQUE: taxa de incidência acumulada, usada freqüentemente para grupos particulares, observados por períodos limitados de tempo e em condições especiais, como em uma epidemia. As taxas de ataque são usualmente expressas em porcentagem. TAXA DE ATAQUE SECUNDÁRIO: medida de freqüência de casos novos de uma doença, entre contatos próximos de casos conhecidos, ocorrendo dentro de um período de incubação aceito, após exposição ao caso índice. Essa taxa é freqüentemente calculada para contatos domiciliares. TAXA (OU COEFICIENTE) DE LETALIDADE: medida de freqüência de óbitos por determinada causa, entre membros de uma população atingida pela doença. TAXA DE MORBIDADE: medida de freqüência de doença em uma população. Existem dois grupos importantes de taxa de morbidade: os de incidência e os de prevalência. TAXA (OU COEFICIENTE) DE MORTALIDADE: medida de freqüência de óbitos em uma determinada população, durante um intervalo de tempo específico. Ao serem incluídos os óbitos por todas as causas, tem-se a taxa de mortalidade geral. Caso se inclua somente óbitos por determinada causa, tem-se a taxa de mortalidade específica. TAXA (OU COEFICIENTE) DE NATALIDADE: medida de freqüência de nascimentos, em uma determinada população, durante um período de tempo especificado. 808 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Glossário TEMEFÓS: inseticida organofosforado, adequadamente formulado para manter larvas em recipientes com água, potável ou não. TEMPO DE SUPRESSÃO: tempo transcorrido entre a primeira porção tomada de um medicamento até o desaparecimento da parasitemia observável. TENDÊNCIA SECULAR: comportamento da incidência de uma doença, em um longo intervalo de tempo, geralmente anos ou décadas. TOXINA: proteínas ou substâncias protéicas conjugadas, letais para certos organismos. As toxinas são produzidas por algumas plantas superiores, por determinados animais e por bactérias patogênicas. O alto peso molecular e a antigenicidade das toxinas diferenciam-nas de alguns venenos químicos e alcalóides de origem vegetal. TRANSMISSÃO: transferência de um agente etiológico animado de uma fonte primária de infecção para um novo hospedeiro. Pode ocorrer de forma direta ou indireta. TRANSMISSÃO DIRETA (contágio): transferência do agente etiológico, sem a interferência de veículos. TRANSMISSÃO DIRETA IMEDIATA: transmissão direta, em que há um contato físico entre a fonte primária de infecção e o novo hospedeiro. TRANSMISSÃO DIRETA MEDIATA: transmissão direta, em que não há contato físico entre a fonte primária de infecção e o novo hospedeiro; a transmissão ocorre por meio das secreções oronasais (gotículas de Flügge). TRANSMISSÃO INDIRETA: transferência do agente etiológico por meio de veículos animados ou inanimados. A fim de que a transmissão indireta possa ocorrer, torna-se essencial que os germes sejam capazes de sobreviver fora do organismo, durante um certo tempo, e que haja um veículo que os leve de um lugar a outro. TRATAMENTO ANTI-RECIDIVANTE: tratamento destinado a prevenir as recidivas, particularmente as que incidem a longo prazo. Sinônimo de tratamento radical. TRATAMENTO PROFILÁTICO: tratamento de um caso clínico ou de um portador, com a finalidade de reduzir o período de transmissibilidade. TUBITO: pequeno tubo usado para acondicionamento de larvas, quando da remessa ao laboratório. VACINA: preparação contendo microrganismos vivos ou mortos ou suas frações, possuidora de propriedades antigênicas. São empregadas para induzir, em um indivíduo, a imunidade ativa e específica contra um microrganismo. VEÍCULO: ser animado ou inanimado que transporta um agente etiológico. Não são consideradas, como veículos, as secreções e excreções da fonte primária de infecção, que são, na realidade, um substrato no qual os microrganismos são eliminados. VEÍCULO ANIMADO (vetor): artrópode que transfere um agente infeccioso da fonte de infecção para um hospedeiro susceptível. VEÍCULO INANIMADO: ser inanimado que transporta um agente etiológico. Os veículos inanimados são: água, ar, alimentos, solo e fômites. VETOR BIOLÓGICO: vetor no qual se passa, obrigatoriamente, uma fase do desenvolvimento de determinado agente etiológico. Erradicando-se o vetor biológico, desaparece a doença que transmite. VETOR MECÂNICO: vetor acidental que constitui somente uma das modalidades da transmissão de um agente etiológico. Sua erradicação retira apenas um dos componentes da transmissão da doença. Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 809 Glossário VIGILÂNCIA DE DOENÇA: levantamento contínuo de todos os aspectos relacionados com a manifestação e propagação de uma doença, importantes para o seu controle eficaz. Inclui a coleta e avaliação sistemática de : • dados de morbidade e mortalidade; • dados especiais de investigações de campo sobre epidemias e casos individuais; • dados relativos a isolamento e notificação de agentes infecciosos em laboratório; • dados relativos à disponibilidade, uso e efeitos adversos de vacinas, toxóides, imunoglobulinas, inseticidas e outras substâncias empregadas no controle de doenças; • dados sobre níveis de imunidade em certos grupos da população. Todos esses dados devem ser reunidos, analisados e apresentados na forma de informes que serão distribuídos a todas as pessoas que colaboraram na sua obtenção e a outras que necessitem conhecer os resultados das atividades da vigilância, para fins de prevenção e controle de agravos relevantes à saúde pública. Esses procedimentos aplicam-se a todos os níveis dos serviços de saúde pública, desde o local até o internacional. VIGILÂNCIA DE PESSOA: observação médica rigorosa, ou outro tipo de supervisão de contatos de pacientes com doença infecciosa, que visa permitir a identificação rápida da infecção ou doença, porém sem restringir liberdade de movimentos. VIGILÂNCIA SANITÁRIA: observação dos comunicantes durante o período máximo de incubação da doença, a partir da data do último contato com um caso clínico ou portador, ou da data em que o comunicante abandonou o local em que se encontrava a fonte primária de infecção. Não implica restrição da liberdade de movimentos. VIRULÊNCIA: grau de patogenicidade de um agente infeccioso. ZOOANTROPONOSE: infecção transmitida aos animais, a partir de reservatório humano. ZOONOSES: infecção ou doença infecciosa transmissível, sob condições naturais, de homens a animais e vice-versa. 810 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Relação de endereços Secretaria de Vigilância em Saúde – Ministério da Saúde Esplanada dos Ministérios, Bloco G, Edifício-Sede do Ministério da Saúde 1º andar. CEP 70.058-900. Brasília/DF. Tel.: (61) 3315 3777 E-mail: svs@saude.gov.br Endereço eletrônico: www.saude.gov.br/svs Vigilância epidemiológica das secretarias estaduais de saúde Secretaria Estadual de Saúde do Acre Av. Antônio da Rocha Viana, 1.294 - Vila Ivonete Rio Branco/AC. CEP 69.910-610 Tels.: (68) 3223 2320/3223 8007 Fax: (68) 224 7019 Secretaria Estadual de Saúde de Alagoas Rua da Paz, 1.068 - Jaraguá. Maceió/AL. CEP 57.025-050 Tels.: (82) 315 1671/315 1151 Fax: (82) 315 3774/315 1481 Secretaria Estadual de Saúde do Amapá Av. Mendonça Furtado - Centro Macapá/AP. CEP 68.906-350 Tels.: (96) 212 6217/6216/6218/6258 Fax: (96) 212 6216 Superintendência de Saúde do Amazonas Av. André Araújo, 701 - Aleixo. Manaus/AM. CEP 69.060-001 Tels.: (92) 643 6320/643 6384/643 6300 ramal: 6331 Fax: (92) 611 4566 Secretaria Estadual de Saúde da Bahia 4a. Av. Centro Adm. da Bahia, Plataforma 6, Lado B 2º andar, Sala 209. Salvador/BA. CEP 41.750-300 Tels.: (71) 3115 4341/4343/4373 Fax: (71) 3115 4341 Secretaria Estadual de Saúde do Ceará Av. Almirante Barroso, 600 - Praia de Iracema Fortaleza/CE. CEP 60.060-440 Tels.: (85) 3101 5212/5214/5215 Fax: (85) 3101 5197 Secretaria Estadual de Saúde do Distrito Federal SIA trecho 1, lotes 1.730/1.760, Bloco E, 3º andar Brasília/DF. CEP 71.200-010 Tels.: (61) 3403 2833/2498/2400/2393 Fax: 3403 2425/2397 Secretaria Estadual de Saúde do Espírito Santo Av. Marechal Mascarenhas de Morais, 2.025 - Bento Ferreira Vitória/ES. CEP 29052-120 Tels.: (27) 3137 2310/2396 Fax: (27) 3137 2310/2367 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 811 Relação de Endereços Secretaria Estadual de Saúde de Goiás Av. Anhanguera, 5195 - Setor Coimbra. Goiânia/GO. CEP 74.043-011 Tels.: (62) 293 6524/6481 Fax: (62) 291 7611/5140 Secretaria Estadual de Saúde do Maranhão Av. Carlos Cunha, s/nº - Retorno do Calhau São Luís/MA. CEP 65.076-0820 Tels.: (98) 218 8733/8706 Fax: (98) 218 8701 Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais Rua Rio Grande do Norte, 613, 4º andar - Funcionários Belo Horizonte/MG. CEP 30.130-130 Tels.: (31) 3274 3470/4705/4258 Fax: (31) 3213 8503/3965 Secretaria Estadual de Saúde do Mato Grosso do Sul Parque dos Poderes, Bloco 7 Campo Grande/MS. CEP 79.031-902 Tels.: (67) 318 1690/1683/326 4071 Fax: (67) 318 1690/1683 Secretaria Estadual de Saúde de Mato Grosso Centro Político Administrativo, Bloco 3, 2º andar Cuiabá/MT. CEP 78.050-970 Tels.: (65) 613 5379/5380/5381/5368 Fax: (65) 613 5384/5369 Secretaria Estadual de Saúde do Pará Rua Presidente Pernambuco, 489 - Batista Campo Belém/PA. CEP 66.015-200 Tels.: (91) 224 9195/230 3099 Fax: (91) 242 0048 Secretaria Estadual de Saúde da Paraíba Av. Dom Pedro II, 1.826 - Torre João Pessoa/PB. CEP 58.040-440 Tels.: (83) 218 7329/7330 Fax: (83) 218 7331/0330 Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco Praça oswaldo Cruz, s/nº - Boa Vista. Recife/PE. CEP 50.050-210 Tels.: (81) 3412 6412/6413 Fax: (81) 3412 6366 Secretaria Estadual de Saúde do Piauí Av. Pedro Freitas, s/nº, Centro Administrativo, Bloco A - São Pedro Teresina/PI. CEP 64.018-200 Tels.: (86) 3216 3596/3605/3686/3683/3589 Fax: (86) 3216 3596/3505 Secretaria Estadual de Saúde do Paraná Rua Piquiri, 170 - Rebouças. Curitiba/PR. CEP 80.230-140 Tels.: (41) 330 4570/4566 Fax: (41) 330 4571/330 4535 Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro Rua México, 128, 4º andar, Sala 410 - Centro Rio de Janeiro/RJ. CEP 20.031-140 Tel.: (21) 2215 2531 Fax: (21) 2240 0611 812 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Relação de Endereços Secretaria Estadual de Saúde do Rio Grande do Norte Av. Câmara Cascudo, 488 - Cidade Alta, Centro Natal/RN. CEP 59.025-280 Tel.: (84) 232 2598 Fax: (84) 232 2598 Secretaria Estadual de Saúde de Rondônia Rua Padre Angelo Cerri, s/nº, Esplanada das Sec. - Pedrinhas Porto Velho/RO. CEP 78.900-000 Tels.: (69) 216 5275/5294 Fax: (69) 216 5275 Secretaria Estadual de Saúde de Roraima Rua Madri, s/nº - Aeroporto. Boa Vista/RR. CEP 69.304-650 Tels.: (95) 623 2771/0967/1714 Fax: (95) 623 1714 Secretaria Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul Av. Borges de Medeiros, 1.501, 3º andar, Ala Norte, sala 308 Porto Alegre/RS. CEP 90.650-090 Tels.: (51) 3901 1157/1166 Fax: (51) 3901 1054 Secretaria Estadual de Saúde de Santa Catarina Rua Felipe Smidt, 774 - Centro. Florianópolis/SC. CEP 88.010-002 Tel.: (48) 221 8445 Fax: (48) 221 8445 Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo Av. Dr. Arnaldo, 351, 1º andar - Cerqueira César São Paulo/SP. CEP 01.246-902 Tels.: (11) 3066 8798/8604 Fax: (11) 3082 9359/3082 9395 Secretaria Estadual de Saúde de Sergipe Praça General Valadão, 32, Palácio Serigy - Centro Aracaju/SE. CEP 49.010-520 Telefax: (79) 234 9577/234 9578 Secretaria Estadual de Saúde de Tocantins Praça dos Girassóis - Espl. das Secretarias s/nº Palmas/TO. CEP 70.7015-007 Tels.: (63) 3218 3094/3245/1762/1735 Fax: (63) 3218 1791/1778 Vigilância epidemiológica das secretarias municipais de saúde Secretaria Municipal de Saúde do Acre Rua Floriano Peixoto, 1.092 - Centro Rio Branco/AC. CEP 69.908-030 Tels.: (68) 3211 2101/2114 Fax: (68) 3211 2110 Secretaria Municipal de Saúde de Alagoas Rua Dias Cabral, 569 - Centro Maceió/AL. CEP 57.020-250 Tels.: (82) 3315 5180/5181 Fax: (82) 3315 5183 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 813 Relação de Endereços Secretaria Municipal de Saúde do Amapá Av. Procópio Rola, 166 - Centro. Macapá/AP. CEP 68.906-030 Tels.: (96) 3213 1009/1109/1295 Fax: (96) 3213 1009 Secretaria Municipal de Saúde do Amazonas Rua Recife, 1.695 - Parque 10. Manaus/AM. CEP 69.057-001 Tels.: (92) 3642 6723/3236 7363 Fax: (92) 3642 5875 Secretaria Municipal de Saúde da Bahia Av. Sete de Setembro, 2.019 - Corredor da Vitória Salvador/BA. CEP 40.080-002 Tels.: (71) 3611 1000/1014/1023/1043/338 1010 Fax: (71) 336 5303 Secretaria Municipal de Saúde do Ceará Rua do Rosário, 283, 3º andar - Centro. Fortaleza/CE. CEP 60.055-090 Tels.: (85) 3452 6605/6604 Fax: (85) 3452 6992 Secretaria Municipal de Saúde do Espírito Santo Av. Marechal Mascarenhas de Moraes, 1.185 - Forte São João Vitória/ES. CEP 29.010-331 Tels.: (27) 3132 5058/5059/5053 Fax: (27) 3132 5061 Secretaria Municipal de Saúde de Goiás Av. 5ª Radial, quadra 216 A, lote 6 - Setor Pedro Ludovico Goiânia/GO. CEP 74.823-030 Tels.: (62) 3524 1554/1507/1506/1500 Fax: (62) 3524 1503/1509 Secretaria Municipal de Saúde do Maranhão Av. dos Franceses, 113 - Alemanha. São Luís/MA. CEP 65.036-280 Tels.: (98) 3243 2321 Fax: (98) 3249 2906 Secretaria Municipal de Saúde de Minas Gerais Av. Afonso Pena, 2.336 - 13º andar. Belo Horizonte/MG. CEP 30.130-006 Tels.: (31) 3277 7753/7767 Fax: (31) 3277 7789 Secretaria Municipal de Saúde de Mato Grosso do Sul Rua 13 de Maio, 1.090 - Monte Líbano. Campo Grande/MS. CEP 79.004-423 Tels.: (67) 314 3346 Fax: (67) 314 3097 Secretaria Municipal de Saúde de Mato Grosso Rua São Joaquim, 315 - Porto. Cuiabá/MT. CEP 78.020-700 Tels.: (65) 3617 1212/1213/1228 Fax: 3051 9512/9500 Secretaria Municipal de Saúde do Pará Trav. Padre Eutíquio, 543 - Campina. Belém/PA. CEP 66.020-240 Tels.: (91) 3241 1969/3212 0506 Fax: 3241 1969 Secretaria Municipal de Saúde da Paraíba Av. Presidente Epitácio Pessoa, 1.324 - Expedicionários João Pessoa/PB. CEP 58.043-000 Tels.: (83) 3214 7952/7947 Fax: (83) 3214 7947 814 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS Relação de Endereços Secretaria Municipal de Saúde de Pernambuco Av. Cais do Apolo, 925, 13º andar. Recife/PE. CEP 50.030-903 Tels.: (81) 3232 8113 Fax: (81) 3425 8640 Secretaria Municipal de Saúde do Piauí Rua Gov. Artur de Vasconcelos, 3.015 - Aeroporto Teresina/PI. CEP 64.006-080 Tels.: (86) 3215 7710 Fax: (86) 3221 0181/3222 0409 Secretaria Municipal de Saúde do Paraná Av. João Gouberto, 623 - 3º andar, Sala 301/307. Curitiba/PR. CEP 80.030-000 Tels.: (41) 3350 9303/9333 Fax: (41) 3350 9339/9458 Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro Rua Afonso Cavalcante, 455, Sala 701, Bloco 1 Rio de Janeiro/RJ. CEP 20.211-901 Tels.: (21) 2503 2024/2273/7844/2247 Fax: (21) 2293 4826 Secretaria Municipal de Saúde do Rio Grande do Norte Rua João Pessoa, 634, Edifício Call Center - Centro Natal/RN. CEP 59.025-500 Tels.: (84) 3232 8487/8488 Fax: (84) 232 8487 Secretaria Municipal de Saúde de Rondônia Av. Calama, 4.008 - Embratel. Porto Velho/RO. CEP 78.908-010 Tels.: (69) 222 8035 Fax: (69) 212 0411 Secretaria Municipal de Saúde de Roraima Av. Getulio Vargas, 678 - Centro. Boa Vista/RR. CEP 69.301-031 Tels.: (95) 623 1673 Fax: (95) 623 2005 Secretaria Municipal de Saúde do Rio Grande do Sul Av. João Pessoa, 325, 4º andar - Cidade Baixa Porto Alegre/RS. CEP 90.040-100 Tels.: (51) 3289 2701/2800/2406/3212 6492 Fax: (51) 3216 8827/3289 2827 Secretaria Municipal de Saúde de Santa Catarina Av. Prof. Henrique da Silva Fontes, 6.100 - Trindade Florianópolis/SC. CEP 88.036-710 Tels.: (48) 3239 1505/1507 Fax: (48) 3239 1506 Secretaria Municipal de Saúde de Sergipe Rua Sergipe, 1.310 - Siqueira Campos. Aracaju/SE. CEP 49.075-540 Tels.: (79) 3179 1023/ 1060 Fax: (79) 3179 1023 Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo Rua General Jardim, 36 - Vila Buarque. São Paulo/SP. CEP 01.223-010 Tels.: (11) 3218 4001/4002/4003/4004/4005 Fax: (11) 3257 5321 Secretaria Municipal de Saúde de Tocantins 103 Sul, Rua SO 7, Lote 3 - Centro. Palmas/TO. CEP 77.185-030 Tels.: (63) 3218 5640/5098/5097/5107 Fax: (63) 3218 5332/5098 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS 815