ARTIGO ORIGINAL
ORIGINAL ARTICLE
J Bras Patol Med Lab • v. 45 • n. 2 • p. 155-160 • abril 2009
Análises histopatológica e morfométrica no diagnóstico da
“nova” displasia broncopulmonar e comparação
clinicopatológica com a forma clássica da doença
Primeira submissão em 11/02/07
Última submissão em 02/04/09
Aceito para publicação em 20/04/09
Publicado em 20/04/09
Histopathological and morphometric analysis in the diagnosis of “new” broncopulmonar dysplasia and clinical
and pathological comparison with the classic form of the disease
Cristina Terumy Okamoto1, João Augusto Bahr2, Larissa Luvison Gomes da Silva3, Lúcia de Noronha4
unitermos
Displasia broncopulmonar
Análise morfométrica
resumo
Introdução: A displasia broncopulmonar (DBP) continua sendo a principal complicação nos recém-nascidos (RN)
prematuros. Com o uso de surfactante exógeno e da prevenção de doenças respiratórias no período neonatal a
incidência de DBP clássica vem diminuindo, porém uma nova forma de DBP tem surgido, mais branda e associada aos
desenvolvimentos pulmonar alveolar e vascular incompletos. Do ponto de vista anatomopatológico a DBP clássica é
caracterizada por processos de lesão e reparação, e os achados da “nova” DBP são de hipoplasia alveolar com nenhuma
fibrose. Objetivos: Demonstrar as alterações histopatológicas e morfométricas em pulmões de prematuros que foram
a óbito, com quadro clínico compatível com “nova” DBP, comparando-as com um grupo controle (sem DBP) e com a
forma clássica da doença, além de correlacionar os três grupos com o tempo de uso de oxigênio entre outros fatores de
risco da DBP. Material e métodos: A população foi composta por 59 amostras de pulmões de prematuros com idade
gestacional (IG) menor que 34 semanas e submetidos à oxigenioterapia. Fatores de risco para DBP foram coletados por
meio da revisão de prontuários. Amostras pulmonares foram separadas em dois grupos, o com DBP clássica e o sem DBP
clássica. O segundo grupo foi então submetido à análise morfométrica para contagem do número de alvéolos, medidas
as áreas e os perímetros dos alvéolos. Após esta análise a população estudada ficou dividida em grupo com DBP clássica;
com “nova” DBP (casos com mais de sete dias de oxigenioterapia); e grupo controle ou sem DBP clássica ou “nova”
(casos com menos de sete dias de oxigenioterapia). Resultados: o primeiro grupo apresentava inflamação e fibrose septal
evidentes. Já os segundo e terceiro grupos apresentavam alterações histopatológicas mínimas, sendo então necessária a
análise morfométrica para separá-los. O grupo com “nova” DBP apresentou número de alvéolos, sua área e perímetro
diminuídos (p < 0,005) quando comparados ao grupo controle. Não houve diferença estatisticamente significativa entre
os três grupos com relação aos fatores de risco para desenvolvimento de DBP. Conclusão: As formas de DBP clássica
e “nova” são de etiologia multifatorial, porém distintas entre si. Para diagnóstico anatomopatológico da “nova” DBP
pode ser necessária a análise morfométrica. As alterações histopatológias e morfométricas deste estudo antecederam a
necessidade de oxigenioterapia por mais de 28 dias. Portanto, instituir terapêutica para DBP antes do 28º dia de vida em
RN prematuro em oxigenioterapia estaria justificado pelos nossos achados histopatológicos e morfométricos.
abstract
Introduction: The Bronchopulmonary dysplasia (BPD) remains as a major complication in premature infants. The incidence of classic
BPD has decreased due to the use of exogenous surfactant and prevention of respiratory diseases in the neonatal period. However,
a new and milder form of BPD has appeared, which is associated with incomplete vascular and pulmonary alveolar development.
Anatomopathologically, classic BPD is characterized by lesion and repair processeses and “new” BPD findings are alveolar hypoplasia
with no fibrosis. Objectives: To demonstrate the morphometric and histopathological alterations in the lungs of deceased premature
infants with clinical course consistent with the new BPD by comparing these changes with a control group (without BPD) and with
its classic form. Furthermore, to correlate the three groups with the duration of oxygen therapy and other risk factors. Methods: The
population comprised 59 lungs samples from premature infants of gestational age lower than 34 weeks and that had undergone
oxygen therapy. The risk factors for BPD were collected from the review of clinical records. The lungs samples were separated into
2 groups: 1 – with classic BPD and 2 – without classic BPD. Group 2 underwent morphometric analysis for alveoli counting and
measurement of alveolar area and perimeter. Subsequently, the studied population was divided into: 1 – with classic BPD, 2 – with
new BPD (cases with more than 7 days of oxygen therapy) and 3 – control group or without classic or new BPD (cases with less
than 7 days of oxygen therapy). Results: Group 1 (classic BPD) had inflammation and evident septal fibrosis. Groups 2 and 3 (new
BPD and control) showed minimal histopathological alterations requiring morphometric analysis to separate them. Group 2 (new
BPD) showed reduced number of alveoli, area and perimeter when compared with group 3 (control), p < 0,005. There was no
statistically significant difference among the 3 groups regarding the risk factors for the development of BPD. Conclusion: Both forms
of classic and new BPD have a multifactorial etiology, but they are different among themselves. The anatomopathological diagnosis
of new BPD may require morphometric analysis. Histopathological and morphometric alterations in this study preceded the need
for oxygen for more than 28 days. Accordingly, our histopathological and morphometric findings would justify the establishment
of treatment for BPD before the 28th day of life in premature neonates.
key words
Bronchopulmonary dysplasia
Morphometric analysis
1. Médica pediatra; especialista em Neonatologia; mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).
2. Acadêmico de Medicina da PUCPR.
3. Médico residente de Anatomia Patologia.
4. Patologista pediátrica do Serviço de Anatomia Patológica do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (HC/UFPR); professora do Setor de Ciências Biológicas e da Saúde da PUCPR;
doutora em Patologia Pediátrica.
Laboratório de patologia experimental da pontifícia universidade católica do Paraná
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OKAMOTO, C. T. et al. Análises histopatológica e morfométrica no diagnóstico da “nova” displasia broncopulmonar e comparação clinicopatológica com a forma clássica da doença
• J Bras Patol Med Lab • v. 45 • n. 2 • p. 155-160 • abril 2009
Introdução
A respeito dos avanços tecnológicos e da prevenção
de doenças respiratórias no período neonatal, a displasia
broncopulmonar (DBP) continua sendo a principal complicação nos recém-nascidos (RN) prematuros que necessitam
de suporte ventilatório e/ou oxigenioterapia prolongados.
Ela foi primeiramente descrita por Northway(11) como uma
lesão pulmonar crônica em consequência de doença da
membrana hialina (DMH), ventilação mecânica prolongada
e agressiva com altas concentrações de oxigênio. Esta forma
de DBP severa que leva a insuficiência respiratória grave,
hipertensão pulmonar e alterações radiológicas características, como enfisema, atelectasia e fibrose, é classificada
atualmente como DBP clássica.
Com o aumento crescente da sobrevida dos prematuros
de muito baixo peso (menos de um quilo), em parte pelo
uso obstétrico de corticoide antenatal e pela aplicação de
surfactante exógeno, a DBP na sua forma mais branda tem
sido motivo de discussões. Inúmeras pesquisas estão sendo
realizadas para sua definição e diagnóstico. Uma vez que a
necessidade de suporte ventilatório e a falência respiratória
são menores, os achados radiológicos desta forma de DBP
também são inespecíficos(3), sendo que esta última seria
decorrente de uma alteração do desenvolvimento pulmonar normal em um RN prematuro, como modificações na
alveolização e no amadurecimento dos pulmões(2). Estes
fatos levaram muitos autores a classificar esta forma da
doença de “nova” DBP.
Enquanto a DBP clássica é correlacionada com os efeitos deletérios do barotrauma, volutrauma, atelectrauma
e a toxicidade do oxigênio ou biotrauma, a “nova” DBP
associa-se a desenvolvimentos pulmonar alveolar e vascular
incompleto, processos inflamatórios ante ou pós-natais,
persistência do canal arterial, enterocolites necrosante e
corioamnionite, entre outros. Segundo Deutsch et al. a
nova displasia é uma desordem do crescimento pulmonar
refletida na deficiência de alveolização(5).
Do ponto de vista anatomopatológico a DBP clássica é
caracterizada por um processo de lesão e reparação, com
edemas alveolar e intersticial precoces, inflamação e fibrose(9).
Coalson et al. evidenciaram em pulmões de macacos achados
histopatológicos da “nova” DBP, como hipoplasia alveolar,
fibrose variável da parede sacular e doença mínima das vias
aéreas. Estes autores demonstraram também diminuição da
alveolização e da medida da superfície interna da área alveolar.
Estes achados também foram confirmados por outros autores
em pulmões de ovelhas, carneiros e coelhos(3, 4, 7).
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O objetivo deste trabalho é demonstrar as alterações
histopatológicas e morfométricas em amostras de pulmões
de RN prematuros que foram a óbito com evidencia clínica
de “nova” DBP comparando-as com grupo controle e forma
clássica da DBP e correlacionar estas formas com o tempo
de uso de oxigênio e fatores de risco da DBP.
Materiais e métodos
A amostra foi coletada no período compreendido entre
janeiro de 1994 e janeiro de 2005 e consistiu em revisão de
sete mil necropsias de RN do banco de dados do Serviço
de Anatomia Patológica da Universidade Federal do Paraná
(UFPR), Unidade de Patologia Pediátrica e Perinatal. A população do estudo foi composta por 59 amostras de tecidos
pulmonares de RN prematuros com idade gestacional (IG)
menor de 34 semanas, submetidos à oxigenioterapia.
Foram excluídos os que apresentaram malformações e/ou
broncoaspiração de mecônio. Foi realizada revisão dos
prontuários e coletados dados quanto a gênero, IG, peso de
nascimento, Apgar de 1º e 5º minutos, tempo de ventilação
mecânica e oxigenioterapia, fatores de risco para DBP, tais
como sepse (clínica e laboratorial com confirmação da
detecção do patógeno), enterocolite necrosante (dados
clínicos e radiológicos), persistência do canal arterial (dados
clínicos e ecocardiográficos) e corioamnionite (clínica e/ou
confirmada pelo anátomo-patológico das placentas).
Todas as lâminas das amostras pulmonares (em média
quatro) de todas as 59 necropsias foram reavaliadas em
hematoxilina-eosina, sendo que após esta fase os casos
foram divididos em dois grupos, aqueles que apresentavam
alterações histopatológicas características da DBP clássica
e aqueles casos sem DBP clássica. Este segundo grupo foi
dividido quanto ao tempo de uso de oxigênio: entre zero
e sete dias e mais de sete dias. O grupo sem DBP clássica
foi submetido à análise morfométrica para confirmação ou
não da presença de alterações características da “nova” DBP,
tais como diminuição do número de alvéolos e diminuição
do perímetro e área dos alvéolos.
Imagens digitais de 10 campos não justapostos do
parênquima pulmonar foram capturadas das amostras dos
prematuros do segundo grupo, utilizando o software Image
Pro Plus®. Por meio do aplicativo denominado “morfometria
de linhas”, este software, pelo desenho livre do contorno
alveolar, fornece medidas de perímetro e área dos alvéolos
e número dos mesmos por campo(11). Foram medidos todos
os alvéolos presentes em cada um dos 10 campos digita-
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lizados na objetiva de 20 vezes. Por fim, foram calculados
médias e desvios padrões de cada caso. Esta análise foi
realizada por um único observador, sem o conhecimento
prévio dos dados de oxigenioterapia.
Após esta análise morfométrica, a população em estudo
ficou dividida em grupos com DBP clássica; com “nova”
DBP (casos com mais de sete dias de oxigenioterapia); e
grupo controle ou sem DBP clássica ou “nova” (casos com
menos de sete dias de oxigenioterapia).
Análise estatística dos dados coletados foi examinada
pelos métodos de Mann-Whitney, ANCOVA, Levène, Bonferroni, Kruskall-Wallis Spearmann e Shapiro-Wilks, com
valores de p < 0,05 indicando significância estatística.
Resultados
Dos 59 casos, 11 foram classificados como DBP clássica
e 48 casos restantes divididos em dois grupos, de acordo
com as alterações morfométricas encontradas e correspondendo também ao tempo de uso de oxigênio, sendo
que 43 casos com menos de sete dias de oxigenioterapia
caracterizaram o grupo controle com número e tamanho
de alvéolos próximo do normal e 5 casos com mais de sete
dias de oxigenioterapia caracterizaram o com “nova” DBP
com diminuição tanto no número quanto no tamanho
dos alvéolos.
Análise histomorfométrica
- Análise histopatológica:
Na análise histopatológica inicial de revisão de casos,
o grupo com DBP clássica (n = 11) foi facilmente evidenciado nas lâminas coradas em hematoxilina-eosina com as
seguintes características predominantes:
• fase aguda: membranas hialinas, necrose brônquica,
bronquiolite obliterante, bronquiectasias e fibrose precoce
de septo;
• fase crônica: fibrose intersticial, espessamento da
parede vascular e ácinos colapsados e hiperdistendidos.
Os casos sem DBP clássica (n = 48) apresentavam
alterações histopatológicas mínimas (Figuras 1 e 2), tais
como leve edema de septo, alteração de insuflação alveolar
e quase nenhum ou nenhum processo inflamatório, não
sendo possível diferenciar, do ponto de vista histopatológico, o grupo controle do com “nova” DBP, sendo necessária
análise morfométrica.
- Análise morfométrica:
O número de alvéolos está diminuído no grupo que
utilizou oxigenioterapia por mais de sete dias, bem como
o seu perímetro e sua área, e tem uma diferença estatisticamente significativa, comparada com o grupo com menor
tempo de terapia (Tabelas 1 e 2).
Tabela 1 Número de alvéolos
Alvéolos
Nº
Média
DP
“Nova” DBP
Sem DBP
5
37
40,94
57,65
15,13
16,20
Valor
de p
0,033*
Teste não-paramétrico de Mann-Whitney, p < 0,05*
*Seis casos retirados do grupo controle por falta de dados clínicos
completos.
DP: desvio padrão; DBP: displasia broncopulmonar.
Tabela 2 Área e perímetro médio dos alvéolos
Área dos
Valor
Média
DP
Nº
alvéolos
de p
“Nova”
DBP
Sem DBP
Perímetro
dos alvéolos
“Nova”
DBP
Sem DBP
5
14549,67
9486,06
43 19083,02 11491,11
Nº
Média
DP
5
481,52
182,42
43
611,33
206,19
0,054*
Valor
de p
0,018*
Analysis of covariance (ANCOVA) (ajustada para idade gestacional), p < 0,05*.
*Seis casos retirados do grupo controle por falta de dados clínicos completos.
DP: desvio padrão; DBP: displasia broncopulmonar.
- Análise clínico patológica:
Com relação ao gênero, não há predomínio nos três grupos. Os neomortos do grupo da “nova” DBP mostraram-se
mais pesados e mais maduros com relação aos outros dois,
não tendo diferença quanto à idade materna. (Tabela 3)
Com relação aos fatores de risco antenatais, como paridade, realização de pré-natal, gemelaridade, amniorrexe
prematura, via de parto (vaginal ou cesárea), corioamnionite
clínica e/ou alteração anatomopatológica da placenta e
diabetes gestacional, podem estar correlacionados com o
desenvolvimento da forma mais branda da DBP, segundo
a literatura internacional(10). Porém, os dados deste estudo
não demonstraram diferença estatisticamente significativa
para estas variáveis (Tabela 4). Apenas a doença hipertensiva específica da gravidez (DHEG) demonstrou uma
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Tabela 3 Idade gestacional, peso de nascimento
e idade materna
Valor
IG
Nº
Média
DP
de p
DBP
clássica
“Nova”
DBP
Sem DBP
Peso de
nascimento
DBP
clássica
“Nova”
DBP
Sem DBP
Idade
materna
DBP
clássica
“Nova”
DBP
Sem DBP
11
29,05
2,71
Fatores de risco antenatais
Nº
Média
DP
DBP clássica
“Nova” DBP
Sem DBP
11
5
37
2,36
3,8
2,39
1,5
3,7
1,5
Pré-natal
Nº
sim
não
DBP clássica
“Nova” DBP
11
5
Sem DBP
37
63,64% (7) 36,36% (4)
80% (4)
20% (1)
48,64%
51,36% (19)
(18)
5
32,10
2,92
37
28,61
2,45
0,05
Nº
Média
DP
Valor
de p
11
1021,36
288,90
Amniorrexe
prematura
Nº
sim
não
DBP clássica
“Nova” DBP
10
5
10% (1)
20% (1)
Sem DBP
32
90% (9)
80% (4)
68,75%
(22)
Corioamnionite
clínica
Nº
DBP clássica
“Nova” DBP
Sem DBP
11
5
37
Diabetes
gestacional
Nº
sim
não
DBP clássica
“Nova” DBP
Sem DBP
11
5
37
0%
20% (1)
0%
100% (11)
80% (4)
100% (37)
DHEG
Nº
sim
não
DBP clássica
“Nova” DBP
Sem DBP
11
5
37
5
1340
397,54
37
927,14
354,02
0,044
Nº
Média
DP
Valor
de p
11
26,18
7,95
5
29,75
8,1
37
23,89
5,39
0,282
Teste não-paramétrico de Mann-Whitney, p < 0,05.
*Seis casos retirados do grupo controle por falta de dados clínicos completos.
IG: idade gestacional; DP: desvio padrão; DBP: displasia broncopulmonar
tendência do ponto de vista estatístico ao se correlacionar
com o desenvolvimento da nova DBP.
Dados pós-natais referentes à necessidade de reanimação neonatal cardiorrespiratória, Apgar de 1º e 5º minutos, administração de surfactante exógeno, enterocolite
necrosante, broncopneumonia, hemorragia pulmonar,
hipertensão pulmonar, hemorragia intracraniana, asfixia
perinatal, sepse neonatal, pneumotórax e persistência do
canal arterial não tiveram diferença estatística significativa
(Tabela 5).
Discussão
Foram identificados vários fatores desencadeantes para o
desenvolvimento da DBP, tais como imaturidade pulmonar,
lesão pulmonar aguda com respostas inflamatória e reparativa. Estes fatores ainda servem de base para os estudos
que buscam o entendimento da DBP atualmente. Por ser
158
Tabela 4
Paridade
31,25% (10)
sim
não
9,09% (1) 90,91% (10)
0%
100% (5)
13,51% (5) 86,49% (32)
21,27% (3) 72,73% (8)
60% (3)
40% (2)
13,89% (5) 86,11% (31)
Teste exato de Fischer, p < 0.017 (corrigido por Bonferroni).
Dados sem significância estatística (p > 0.017).
DP: desvio padrão; DBP: displasia broncopulmonar;
DHEG: doença hipertensiva específica da gravidez.
de etiologia multifatorial seu estudo tem desencadeado
diversas discussões em definição, diagnóstico, fisiopatologia
e possíveis tratamentos. Atualmente, a instabilidade cardiovascular, a acidose metabólica, a oligúria e a hipotensão,
além da nutrição enteral inadequada, da propensão a infecções hospitalares, do desenvolvimento de colestase, sepse,
enterocolite necrosante e da persistência do canal arterial
também são fatores que isolados ou associados podem
contribuir para o desenvolvimento de DBP(6).
Desde a descrição inicial da DBP há 40 anos, avanços no
cuidado perinatal permitiram a sobrevivência de crianças
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Tabela 5
Reanimação
Fatores de risco pós-natais
Nº
Sim
Não
DBP clássica
“Nova” DBP
Sem DBP
11
5
37
91,91%(10)
100% (5)
81,08% (30)
9,09% (1)
0%
18,92% (7)
Pneumonia
Nº
Sim
Não
DBP clássica
“Nova” DBP
Sem DBP
11
5
37
54,55% (6)
0%
18,92% (7)
45,45% (5)
100% (5)
81,08% (30)
PCA
Nº
Sim
Não
DBP clássica
“Nova” DBP
Sem DBP
11
5
37
91,91% (10)
40% (2)
8,11%(3)
9,09% (1)
60% (3)
91,89%(34)
Sepse clínica
Nº
Sim
Não
DBP clássica
“Nova” DBP
Sem DBP
11
5
37
9,09%(1)
0%
13,51%(5)
90,91%(10)
100%(5)
86,49%(32)
Asfixia
perinatal
Nº
Sim
Não
DBP clássica
“Nova” DBP
Sem DBP
11
5
37
54,55% (6)
20% (1)
63,89% (23)
45,45% (5)
80% (4)
36,11% (13)
Pneumotórax
Nº
Sim
Não
DBP clássica
“Nova” DBP
Sem DBP
11
5
37
9,09% (1)
0%
5,41% (2)
91,91% (10)
100% (5)
94,59% (35)
Hemorragia
pulmonar
Nº
Sim
Não
DBP clássica
“Nova” DBP
Sem DBP
11
5
37
27,27% (3)
20% (1)
13,51% (5)
72,73% (8)
80% (4)
86,49% (32)
Hipertensão
pulmonar
Nº
Sim
Não
DBP clássica
“Nova” DBP
Sem DBP
11
5
37
18,18% (2)
20% (1)
10,81% (4)
81,82% (9)
80% (4)
81,19% (32)
Teste exato de Fischer, p < 0,017 (corrigido por Bonferroni).
Dados sem significância estatística (p > 0,017).
DP: desvio padrão; DBP: displasia broncopulmonar;
PCA: persistência do canal arterial.
cada vez mais imaturas. A doença não desapareceu, mas
os padrões clínico, histopatológico e morfométrico mudaram, como o hipodesenvolvimento dos espaços aéreos
distais. Enquanto a DBP clássica é relacionada claramente
com ventilação mecânica, oxigenioterapia e volutrauma, a
“nova” DBP ainda tem suscitado muito estudo e pesquisa
para reconhecer os mecanismos que interrompem a sequência normal de desenvolvimento pulmonar, resultando
no padrão de simplificação alveolar.
Em 1989 Chambers descreveu os achados patológicos
do pulmão com DBP clássica como metaplasia escamosa,
fibrose peribronquial e do septo alveolares com alterações
hipertensivas vasculares, como foi observado neste estudo.
Posteriormente, Pierce, Albertine e Bland (2001)(1) descreveram achados anátomopatológicos da forma mais branda
da DBP, como o bloqueio do desenvolvimento pulmonar
com consequente redução do número de alvéolos e da
área alveolar, insuflação não-uniforme dos espaços aéreos,
presença de edema intersticial, escassa reação inflamatória
e pouca ou nenhuma fibrose. Estes dados também foram
encontrados no presente estudo.
Coalson demonstrou que pulmões de macacos prematuros, com sete dias de vida, submetidos à ventilação
mecânica e oxigenoterapia a 100% já apresentavam acentuada redução do número de alvéolos. Este dado confirma
que alterações histopatológicas e morfométricas a DBP
precedem a confirmação clínica da necessidade de oxigenioterapia por mais de 28 dias de vida e/ou 36 semanas
de IG corrigida pós-conceptual. Por esse motivo o conceito
para a confirmação clínica da “nova” DBP descrita não
parece estar de acordo com a evolução fisiopatológica da
doença; assim, poderíamos pensar em iniciar terapêuticas
preventivas, em grandes prematuros, já a partir de sete dias
de uso de oxigênio, acompanhando o aparecimento das
lesões na anatomia patológica.
Os fatores de risco que podem estar relacionados com
a interrupção do desenvolvimento alveolar mais encontrados na literatura são corioamnionite, persistência do canal
arterial, sepse e DHEG, sendo que neste estudo não foram
encontrados fatores de risco antenatais e pós-natais com
significância estatística, apenas uma tendência da DHEG, a
se correlacionar com o desenvolvimento de “nova” DBP.
Conclusão
As formas “nova” e clássica de DBP são de etiologia
multifatorial, porém distintas entre si. Estas diferenças tanto
clínicas quanto anatomopatológicas foram identificadas
neste estudo. A DBP clássica apresentou após 21 dias de
oxigenioterapia, em média, alterações anatomopatológicas
características, já amplamente descritas na literatura.
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A alteração anatomopatológica da “nova” DBP é facilmente detectada pela análise morfométrica dos pulmões,
com menor número de alvéolos, menor área e perímetro
alveolar, naqueles casos que utilizaram oxigenioterapia
e ventilação mecânica por mais de sete dias. Para este
tipo de análise, seria necessária a biópsia pulmonar a céu
aberto, a qual é inviável e altamente invasivo nesta faixa
etária. Diante disso, a instituição precoce de medidas
terapêuticas, na tentativa de minimizar as alterações descritas na “nova” DBP, estaria justificada pelo aparecimento
também precoce das alterações anatomopatológicas, fato
este já descrito por diversos autores e corroborado por
este trabalho.
Neste estudo, quando correlacionamos os dados clínicos
com os dados anatomopatológicos observamos que apenas
o fato de ser prematuro e utilizar oxigênio por mais de sete
dias são fatores de risco na gênese da “nova” DBP.
Além disso, a DHEG apresentou tendência estatística
para influenciar a gênese da “nova” DBP, talvez por contribuir na angiogênese pulmonar e assim levar à interrupção do desenvolvimento do pulmão e ao surgimento da
doença.
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Endereço para correspondência
Lucia de Noronha
Laboratório de Patologia Experimental do Setor de
Ciências Biológicas e da Saúde da PUCPR
Rua Imaculada Conceição, 1155 – Prado Velho
CEP 80215-901 – Curitiba-PR
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Fax: (41) 3271-1624
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