TRABALHO ESCRAVO E FAST FASHION: O FLERTE DA
INDÚSTRIA DA MODA COM A SERVIDÃO
SLAVE LABOR AND FAST FASHION: THE FLIRT OF THE FASHION
INDUSTRY WITH SERVANTHOOD
Osmar VeroneseI
Andressa LasteII
Resumo: Os elementos estruturantes da atualidade, que
não apenas ordenam relações econômicas e de produção,
mas também sociais e culturais, moldam a vida de forma
transitória e fugaz como líquido, era nominada por Bauman
de “modernidade líquida”. Esse modelo, seguido por boa
II
Universidade Regional Integrada do Alto parte do mundo ocidental, ancora-se no discurso econômico
Uruguai e das Missões, Santo Ângelo, RS, neoliberal, propõe a redução do papel do Estado na
economia e, como efeito colateral, produz o consumismo,
Brasil. E-mail: andressalaste@hotmail.
em que as necessidades e desejos são direcionadas para o
com
consumo em excesso, especialmente de produtos descartáveis
e/ou supérfluos. Poucos setores da economia se adaptaram
tão bem a esse modelo como a indústria da moda, que
embora também atue como slow fashion, tem na fast
fashion uma dinâmica em larga escala, envolvendo empresas
varejistas nacionais e internacionais, cuja engrenagem é
líquida e consumista. Nesse contexto, seguindo o método de
abordagem dedutivo aliado ao procedimento bibliográfico, a
pesquisa visou responder se a indústria da moda estimula o
trabalho escravo contemporâneo, a partir da correlação entre
neoliberalismo e consumismo? E a resposta foi afirmativa
pois, no afã de atender os excessos, parcela dessas empresas
têm utilizado e/ou encoberto a exploração de mão de obra,
fomentando o trabalho escravo contemporâneo.
Universidade Regional Integrada
do Alto Uruguai e das Missões,
Santo Ângelo, RS, Brasil. E-mail:
osmarveronese@san.uri.br
I
Palavras-chave: Consumismo. Fast Fashion. Indústria da
Moda. Neoliberalismo. Trabalho Escravo.
DOI: http://dx.doi.org/10.31512/rdj.v22i43.1009
Recebido em: 21.09.2022
Aceito em: 05.11.2022
Abstract: The structuring elements of the present, which
not only order economic and production relations, but also
social and cultural ones, shape life in a transitory and fleeting
way as liquid, was named by Bauman as “liquid modernity”.
This model, followed by much of the western world, is
anchored in the neoliberal economic discourse, proposes
the reduction of the role of the State in the economy and,
as a side effect, produces consumerism, in which needs and
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desires are directed towards consumption in excess, especially
of disposable and/or superfluous products. Few sectors of the
economy have adapted as well to this model as the fashion
industry, which, although it also acts as a slow fashion, has
large-scale dynamics in fast fashion, involving national and
international retailers, whose gear is liquid and consumerist.
In this context, following the deductive approach method
combined with the bibliographic procedure, the research
aimed to answer whether the fashion industry encourages
contemporary slave labor, based on the correlation between
neoliberalism and consumerism? And the answer was
affirmative because, in an effort to meet the excesses, a
portion of these companies have used and/or covered up the
exploitation of labor, promoting contemporary slave labor.
Keywords: Consumerism. Fast Fashion. Fashion Industry.
Neoliberalism. Slavery.
1 Considerações iniciais
Com o intuito de compreender o modelo de produção fast fashion na indústria da
moda e uma possível relação com o trabalho escravo contemporâneo é necessário contextualizar,
primeiramente, a ideologia neoliberal e sua correlação com o consumismo.
É nesse contexto que esta pesquisa, por meio do método de abordagem dedutivo e
método de procedimento bibliográfico, visa responder ao seguinte questionamento: a indústria
da moda fomenta o trabalho escravo contemporâneo a partir da correlação entre neoliberalismo
e consumismo?
Para alicerçar o estudo e responder ao problema de pesquisa, o texto será dividido em três
momentos: o primeiro com considerações sobre o neoliberalismo, o segundo sobre a indústria da
moda e o modelo de produção fast fashion e o terceiro relacionando esse modelo de produção
com o trabalho escravo contemporâneo.
Nesse sentido, a pesquisa objetiva verificar como a indústria da moda se relaciona com o
trabalho escravo contemporâneo a partir da conexão entre a ideologia neoliberal e o consumismo.
A abordagem do tema se justificativa pelo viés informativo à sociedade, na medida em
que relaciona neoliberalismo, consumismo, modelo de produção fast fashion na indústria da
moda e o trabalho escravo contemporâneo.
2 Apontamentos sobre as relações de produção na modernidade
O Estado, no absolutismo, teve como base a doutrina da monarquia divina, a qual
explicava que o poder do soberano era divino. Posteriormente, a luta (embebida nos ideais
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iluministas) entre a liberdade do indivíduo e a soberania do monarca deu origem a primeira
noção de Estado de Direito, cujo marco fincado pela Revolução Francesa trouxe importantes
renovações institucionais e possibilitou o surgimento do Estado Jurídico guardião das liberdades
individuais.
Com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789, e com as
Constituições que se sucederam, o Estado muda a sua forma, sendo a divisão dos poderes, o
princípio da legalidade e os direitos fundamentais algumas de tantas outras limitações impostas
o Estado pelo liberalismo. Essa ideologia objetivava a separação do Estado e da sociedade, bem
como a distinção do público e privado, reduzindo a intervenção estatal no setor privado, ou seja,
pregava um Estado mínimo. (Marmelstein, 2011).
No início do séc. XX essa concepção passa a ser discutida, uma vez que o crescente
aumento da pobreza e extremas desigualdades sociais são problemas sem soluções de ordem
economia e social, como subproduto do modelo liberal clássico. Assim, contrapondo-se
ao discurso liberal, emergem na sociedade movimentos defensores da intervenção estatal na
regulação da ordem econômica e implementação da ordem social, garantia dos direitos coletivos
e fortalecimento da classe operária. (Marmelstein, 2011).
Nesse cenário, ao lado das iniciativas socialistas, o capitalismo revê o discurso liberal
clássico, revisando o papel do Estado na economia. Logo, o Estado passa a intervir, de forma
direta, na economia, com a finalidade de garantir a regulação econômica, além de investir em
empresas objetivando garantir o pleno emprego. (Hobsbawn, 2002).
Contudo, a partir de uma crise global do capitalismo, em meados de 1970, que travou
o ritmo de crescimento nos países industrializados, o Estado Social passa a ser questionado em
razão de algumas dificuldades, entre as quais, a de responder plena e efetivamente pelas políticas
sociais, o aumento da dívida pública, a inflação e a crise fiscal.
Em razão dessa crise, em países da Europa e da América do Norte, retomou-se a proposta
de um Estado minimalista, sob a justificativa da defesa da liberdade econômica e política das
empresas e dos cidadãos, resgatando-se os ideais liberais e os inserindo em uma nova roupagem
discursa, o neoliberalismo.
O neoliberalismo, portanto, surgiu em razão da crise do Estado Social, pregando a
eliminação de limites aos mercados, defendendo a livre iniciativa, a livre concorrência e a nãointervenção do Estado na economia. Em um primeiro olhar, o novo discurso defende as velhas
bandeiras liberais, conforme descrevem os autores a seguir:
A partir do fim dos anos 1970 e do início dos anos 1980, o neoliberalismo foi
interpretado em geral como se fosse ao mesmo tempo uma ideologia e uma política
econômica diretamente inspirada nessa ideologia. O núcleo duro dessa ideologia seria
constituído por uma identificação do mercado com uma realidade natural. Segundo
essa ontologia naturalista, bastaria deixar essa realidade por sua própria conta para ela
alcançar equilíbrio, estabilidade e crescimento. Qualquer intervenção do governo só
poderia desregular e perturbar esse curso espontâneo, logo convinha estimular uma
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atitude abstencionista. O neoliberalismo compreendido dessa forma apresenta-se como
reabilitação pura e simples do laissez-faire. (Dardot; Laval, 2016, p. 14).
Contudo, o neoliberalismo não se apresenta como uma reabilitação pura e simples do
laissez-faire1 (Dardot; Laval, 2016, p. 14), mas como “projeto político de restabelecimento das
condições da acumulação do capital e restauração do poder das elites econômicas” (Harvey,
2012, p. 27), podendo também ser referido como “a articulação das teorias econômicas e sociais
do liberalismo clássico, em um período histórico diferente”. (O’ Connel, 2008, p. 187-188).
Nesse diapasão, antes de ser uma ideologia ou uma política econômica, o neoliberalismo
é uma racionalidade.
[...] antes de ser uma ideologia ou uma política econômica, é em primeiro lugar e
fundamentalmente uma racionalidade e, como tal, tende a estruturar e organizar não
apenas a ação dos governantes, mas até a própria conduta dos governados. A racionalidade
neoliberal tem como característica principal a generalização da concorrência como
norma de conduta e da empresa como modelo de subjetivação. O termo racionalidade
não é empregado aqui como eufemismo que nos permite evitar a palavra ‘capitalismo’. O
neoliberalismo é a razão do capitalismo contemporâneo, de um capitalismo desimpedido
de suas referências arcaizantes e plenamente assumido como construção histórica e
norma geral de vida. (Dardot; Laval, 2016, p.17).
Essa racionalidade organiza a atividade humana em uma norma de concorrencialismo, a
qual “[...] impõe a cada um de nós que vivamos num universo de competição generalizada [...]
ordena as relações sociais segundo o modelo do mercado, obriga a justificar desigualdades cada
vez mais profundas, muda até o indivíduo, que é instado a conceber a si mesmo e a comportar-se
como uma empresa. (Laval; Dardot, 2016, p. 18).
Outrossim, o Estado, no neoliberalismo, tem como ponto essencial a proteção da
propriedade e dos negócios e corporações, sendo valorizados os livres mercados e comércios.
(Harvey, 2012). Conforme os filósofos Pierre Dardot e Christian Laval (2016, p. 30) o
neoliberalismo é um sistema de normas que estão inscritas nas práticas governamentais, políticas
institucionais e estilos de gerência.
O neoliberalismo é um sistema de normas que hoje estão profundamente inscritas
nas práticas governamentais, nas políticas institucionais, nos estilos gerenciais. Além
disso, devemos deixar claro que esse sistema é tanto mais “resiliente” quanto excede
em muito a esfera mercantil e financeira em que reina o capital. Ele estende a lógica do
mercado muito além das fronteiras estritas do mercado, em especial produzindo uma
subjetividade “contábil” pela criação de concorrência sistemática entre os indivíduos.
Pode, portanto, o neoliberalismo ser definido “[...] como o conjunto de discursos, práticas
e dispositivos que determinam um novo modo de governo dos homens segundo o princípio da
concorrência.” (Dardot; Laval, 2016, p. 17). Por meio de seus princípios norteadores, a saber:
1 Expressão francesa que significa deixa fazer ou deixa passar, adotada como símbolo do liberalismo econômico
capitalista, segundo a qual o mercado deve funcionar de forma livre, sem interferências estatais, sem taxas e
subsídios.
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produtividade, eficiência e concorrência, o neoliberalismo exerce uma coerção internalizada,
uma vez que o sistema econômico de produção se torna um valor antropológico de produção em
que o Estado se mostra como “coprodutor voluntário”. (Dardot; Laval, 2016, p. 17).
Assim, para essa ideologia, o mercado assume o papel central e reduz a ação do Estado
ao mínimo, haja vista que ele assume uma função meramente fiscalizatória, além de pressionar a
população ao consumo de suas necessidades, pois é entendido como o melhor meio de satisfazer
os desejos das pessoas, começando a ser visto como a única forma efetiva dessa satisfação.
Nesse cenário, segundo Zygmunt Bauman (2011) o ato de consumir por si só não
caracteriza uma sociedade de consumo. Logo, consumo e consumismo devem ser distinguidos,
sendo este último o resultado de uma revolução ocorrida durante a passagem da modernidade
sólida2 para a modernidade líquida3.
Pode-se dizer que o “consumismo” é um tipo de arranjo social resultante da reciclagem
de vontades, desejos e anseios humanos rotineiros, permanentes e, por assim dizer,
“neutros quando ao regime”, transformando-os na principal força propulsora e operativa da
sociedade, uma força que coordena a reprodução sistêmica, a integração e a estratificação
sociais, além da formação de indivíduos humanos, desempenhando ao mesmo tempo
um papel importante nos processos de auto-identificação individual e de grupo, assim
como na seleção e execução de políticas de vida individuais. O “consumismo” chega
quando o consumo assume o papel-chave que na sociedade de produtores era exercido
pelo trabalho. [...] De maneira distinta do consumo, que é basicamente uma característica
e uma ocupação dos seres humanos como indivíduos, o consumismo é um atributo da
sociedade. (Bauman, 2008, p. 41). (grifo do autor).
Ante o exposto, denota-se que na ideologia neoliberal, assumindo o mercado o papel
central e reduzindo a ação do Estado ao mínimo, o seu fim volta-se para o consumo. Todavia,
o consumismo é o núcleo e a forma de conduta individual e coletiva que está presente na
modernidade líquida descrita por Zygmunt Bauman.
Com a modernidade sólida dando espaço para a modernidade líquida em que o consumo
é o elemento central, e não mais o trabalho, as necessidades dos sujeitos4 são trocadas pelo
estímulo aos seus desejos subjetivos (Bauman, 2008), sendo esse ponto fomentado pelo mercado
no modelo neoliberal, correlacionando-se.
Logo, a modernidade líquida objetiva “satisfazer os desejos humanos de uma forma que
nenhuma sociedade do passado pôde realizar ou sonhar.”. (Bauman, 2009, p. 105).
2 A modernidade sólida é caracteriza como aquela em que a produção era voltada para a segurança e a
durabilidade daquilo que se era produzido, pois nesse momento histórico o trabalho era o elemento central.
(Bauman, 2001).
3 Na modernidade líquida ou fluída o ato de consumir não é mais voltado para a durabilidade e estabilidade dos
produtos, mas sim para a sua constante substituição por outros produtos mais novos. Logo, a modernidade
líquida passa a ter o consumismo como elemento central. (Bauman, 2001).
4 Conforme Alain Touraine (2005, p. 123) “o sujeito se configura como parte íntima de cada ser que possui como
movimento o conforto, o debate e a resistência, sendo que nos tornamos plenamente sujeitos quando aceitamos
como nosso ideal reconhecer-nos e fazer-nos reconhecer enquanto indivíduos – como seres individuados, que
defendem e constroem sua singularidade, e dando, através de nossos atos de resistência, um sentido a nossa
existência.”.
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Nesse viés, a sociedade de consumo líquido-moderna apenas consegue alcançar seu
objetivo enquanto mantiver os sujeitos insatisfeitos e em busca constante por satisfação. (Bauman,
2008). Portanto, “a sociedade de consumo prospera conquanto consiga tornar permanente a
insatisfação (e, em seus próprios termos, a infelicidade).”. (Bauman, 2021, p. 174).
Na contínua busca pelo sentimento de satisfação e consequente felicidade, os sujeitos
serão levados a consumir, correlacionando-se o consumismo com o mercado na ideologia
neoliberal. Nessa fenda, entra e merece reflexão aspectos relacionados à indústria da moda.
3 A indústria da moda e o modelo de produção fast fashion
Conforme mencionado no tópico supra, a sociedade de consumo na modernidade
líquida, descrita por Zygmunt Bauman, alcança o seu objetivo ao manter os sujeitos insatisfeitos
e na busca constante por satisfação e felicidade, desempenhando o mercado grande papel
fomentador do consumo no Estado neoliberal.
Nesse cenário, o sujeito, ao adquirir um produto, prontamente deixa-o de desejar, eis
que se sente satisfeito, todavia, ao mesmo tempo em que foi adquirido o produto perde o seu
valor e se torna obsoleto, uma vez que o mercado de consumo quase que de maneira instantânea
já lança um novo, prometendo ser esse mais inovador e melhor que o anterior. Assim, o sujeito
sente o desejo de adquirir esse novo produto e descartar o velho. (Bauman, 2021).
Uma das formas de consumismo que possui alta fluidez de novos produtos e descarte
de velhos é a indústria da moda5, haja vista possuir diversas vertentes, pois consegue abranger
inúmeras identidades ao ser lançada como expressão artística das mudanças sociais.
Igualmente, a indústria da moda também pode ter como fator estimulante a aprovação
e aceitação dos consumidores perante a sociedade, uma vez que a promessa de pertencimento
social reforça o chamativo para o consumo.
Em primeiro lugar, a promessa quer dizer estar e ficar à frente (do “júri do estilo”, ou
seja, dos “outros significativos”, os outros que contam, e cuja aprovação ou rejeição
traça a linha entre sucesso e fracasso). Estar à frente é a única receita confiável para a
aceitação do júri do estilo, enquanto ficar à frente é o único modo de ter certeza de
que a provisão de respeito é confortavelmente ampla e contínua. Aquela oferta, então,
promete uma garantia de segurança que repousa na autoconfiança, uma garantia de
certeza ou quase certeza de que se “está do lado certo” – o tipo de sensação que a vida de
consumo evidente e dolorosamente não consegue obter, apesar de ser guiada pelo desejo
de fazê-lo. A referência a estar e ficar à frente desse júri do estilo promete pertencimento
– promete que se será aprovado e incluído. (Bauman, 2021, p. 150).
Em razão de uma ampla variedade e para que seja possível atender ao maior número de
identidades, o mercado da moda divide-se em slow fashion e fast fashion.
5 Considerando que a indústria da moda possui várias vertentes, a pesquisa se aterá à moda quanto a produção de
roupas.
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O modelo slow fashion abarca peças duradouras e atemporais, ao passo que o modelo
fast fashion atende a uma demanda de consumidores inquietos por produtos que sigam uma
tendência universal de maneira rápida e que também seja de baixo custo e pouco durabilidade.
(Cietta, 2010).
O modelo fast fashion ou “moda rápida” é um modelo que surgiu na Europa, na década
de 90, concomitantemente com as lojas de departamento e que atualmente abarca o nascimento
contínuo das tendências e consequente resposta às demandas solicitadas, eis que o seu baixo
preço no mercado pode levar a um consumo de grande quantidade de peças. (Cietta, 2010).
Essa inovação no setor do vestuário, o fast fashion, combina capacidade de produção rápida
(mínimo lead time) com a intensa capacidade de criação de design para o desenvolvimento
de produtos que estejam adequados às últimas tendências da moda. De certa forma,
podemos dizer que seu surgimento se deve a necessidade de se adequar as pressões do
setor varejista, tais como o avanço das tecnologias, processo de internacionalização das
empresas e, consequentemente, uma mudança no comportamento do consumidor.
(Cidreira, 2019, p. 7).
O alto investimento na política de rápida e contínua produção de peças colabora para
que as coleções e tendências sejam criadas e trocadas com uma frequência alarmante. Em que
pese recente, o modelo fast fashion já alcançou marcas tradicionais e consolidadas na indústria da
moda, além de pequenas empresas e grandes marcas de varejo em diversos países.
Assim, lojas como Zara, GAP, Forever 21 e H&M iniciaram a produção de roupas que
lembram a alta costura, porém com baixo custo e menor tempo de durabilidade. Essa forma de
produção, por fim, chegou ao Brasil atingindo marcas conhecidas como Renner, Riachuelo e
C&A.
O sucesso dessas empresas foi, por vezes, interpretado como uma maior capacidade de
oferecer, em prazos muito curtos, aquilo que o mercado premia, ou seja, a velocidade
de resposta (o tempo para produzir uma nova coleção caiu de 24 meses para poucas
semanas), em confronto a empresas que aplicam modelos mais tradicionais. (Cietta,
2010, p. 23).
Ainda que facilitado pela terceirização, o modelo de produção fast fashion não possui
a sua essência centralizada na qualidade e durabilidade das peças de roupas, mas sim no
acompanhamento das tendências e no rápido atendimento à demanda de consumidores. (Cietta,
2010). Nesse viés, percebe-se que além de um modelo de produção, o fast fashion também é
um modelo de negócios, pois move em larga escala a economia de diversas empresas varejistas
nacionais e internacionais.
Todavia, a produção de roupas a um baixo custo somada a alta demanda e ao rápido
consumo implica em uma cadeia produtiva têxtil cada vez mais complexa, pois incide em aspectos
ambientais e sociais que a fabricação desenfreada pode impactar. (Cietta, 2010).
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Isso porque, o consumismo indisciplinado aliado a obsolescência das peças de roupas
implica em problemas envolvendo o pós-uso e o descarte indevido de roupas e resíduos, gerando
impactos ao meio ambiente.
No processo de descarte, grande parte dos resíduos não vai para o destino correto,
ou seja, são descartados no meio ambiente, sem que passem por qualquer triagem ou
separação de partes para reciclagem. Isso gera trilhões de quilos de lixo. Em relação ao
meio ambiente, alguns impactos são observados, como mudanças climáticas, poluição
química, enorme geração de resíduos, prejuízos à saúde humana, desequilíbrio ambiental.
(Silvia e Troncoso, 2013, p.3).
Nesse segmento, a deterioração ambiental passa a ser uma das consequências dos padrões
de industrialização, dentre eles, do modelo de produção fast fashion.
A deterioração ambiental, a devastação dos recursos naturais e seus efeitos nos problemas
ambientais globais (perdas de biodiversidade, desmatamento, contaminação da
água e do solo, erosão, desertificação e, inclusive, a contribuição da América Latina
são aquecimento global e diminuição da camada de ozônio), são em grande parte
consequência dos padrões de industrialização, centralização econômica, concentração
urbana, capitalização do campo, homogeneização do uso do solo e uso de fontes não
renováveis de energia (Leff, 2009, p. 42).
Nessa vertente, grande parte das questões envolvendo os impactos ambientais segue
sendo uma realidade, uma vez que o seu tratamento demanda alteração nos meios de produção
e consumo, além de nossa organização social. (Castells, 1999). Especialmente por ser lucrativo
para muitas empresas da indústria modista, esse modelo de produção é difundido como estratégia
de desenvolvimento pelas economias neoliberais.
Entretanto, além de impactos ambientais, o modelo de produção fast fashion na indústria
da moda apresenta problemas sociais, uma vez que oculta a exploração de mão de obra em
suas produções de vestuários. Assim, além de o modelo ter sido associado à insustentabilidade
ambiental, também o foi à insustentabilidade social, principalmente após o desabamento de um
prédio de três andares, no ano de 2013, em Bangladesh, onde funcionava uma fábrica de tecidos,
culminando na morte de mais de mil pessoas.
Nesse cenário, importa examinar esse efeito negativo do modelo de produção fast
fashion, aquele que impacta os trabalhadores, haja vista que por detrás de todo o glamour que a
indústria da moda aparenta, oculta-se uma forte presença de exploração de mão de obra em suas
produções.
4 O modelo fast fashion como fomento ao trabalho escravo contemporâneo
De acordo com a Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecções – ABIT
o mercado da moda é o segundo maior gerador de empregos no Brasil. Contudo, o setor da
indústria da moda também tem outra realidade que não a grande possibilidade na geração de
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empregos, a da exploração de mão de obra de trabalho por marcas e grupos varejistas do ramo.
(Contino, 2019).
Considerando que o modelo de produção fast fashion visa o atendimento ininterrupto
das tendências e consequente resposta às demandas solicitadas pelo consumidor, em razão de seu
baixo preço no mercado, as empresas da indústria têxtil tendem a buscar soluções de produção
de baixo custo.
Expedientes como a precarização, subcontratação, terceirização são instrumentos
das empresas para lidar com a sazonalidade e volatilidade do mercado e aumentar a
lucratividade através da diminuição de custos com força de trabalho. Além disso, a
necessidade de diversificação dos produtos (uma das principais características do fast
fashion) impõe uma flexibilidade na produção que muitas vezes só pode ser alcançada a
preços competitivos através desses recursos. (Contino, 2016, p. 33).
Ocorre que essa procura implica, não raras vezes, na má remuneração da mão de obra e
reflete em condições impróprias e indignas de trabalho, podendo essas serem consideradas como
trabalho em condições análogas à de escravo, tal qual foi o caso mencionado em Bangladesh, no
ano de 2013.
No Brasil, em que pese a escravidão ter sido abolida em 1888 e o Estado brasileiro não
admitir, desde então, a possibilidade jurídica de uma pessoa ser proprietária de outra, essa prática
continua sendo corriqueira, e a realidade mostra que sua abolição não a extinguiu no mundo
dos fatos.
Desde 1995, quando o Estado brasileiro reconheceu, perante a comunidade internacional,
a existência da escravidão contemporânea em seu território, mais de cinquenta mil pessoas foram
encontradas em regime de escravidão até o ano de 2019.
Entre 1995 e setembro de 2019, mais de 54 mil pessoas foram encontradas em regime
de escravidão em fazendas de gado, soja, algodão, café, laranja, batata e cana-de-açúcar,
mas também em carvoarias, canteiros de obras, oficinas de costuras, bordéis, entre outras
unidades produtivas no Brasil. Ao longo desse período, o trabalho escravo contemporâneo
deixou de ser encarado como um problema restrito a regiões de fronteira agropecuária,
como Amazônia, Cerrado e Pantanal. Hoje também é combatido nos grandes centros
urbanos. (Sakamoto, 2020, p. 7).
Consoante descrito no art. 149 do Código Penal brasileiro, na redação dada pela Lei nº
10.803, de 2003, quatro são os elementos que definem o trabalho escravo na contemporaneidade,
sendo considerados de maneira isolada ou combinada.
a. Cerceamento de liberdade – a impossibilidade de quebrar o vínculo com o empregador,
que pode se valer de retenção de documentos ou de salários, isolamento geográfico,
ameaças, agressões físicas, espancamentos e tortura; b. Servidão por dívida – o cativeiro
mantido pela imposição de dívidas fraudulentas, relacionadas a transporte, alimentação,
hospedagem, adiantamentos, dentre outras; c. Condições degradantes de trabalho – o
meio ambiente de trabalho que nega a dignidade humana, colocando em risco à saúde,
a segurança e a vida da pessoa; d. Jornada exaustiva – o cotidiano de trabalho que leva o
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trabalhador ao completo esgotamento físico e psicológico e à impossibilidade de ter uma
vida social, dada a intensidade e a duração da exploração, colocando em risco sua saúde
e vida. (Sakamoto, 2020, p. 9).
Conforme a Organização Internacional do Trabalho, no ano de 2013, o Brasil teve a
maioria dos resgates de trabalhadores em condições análogas à de escravo nos centros urbanos
em setores como a construção civil e a indústria têxtil. Isso porque o país vem passando por
mudanças de paradigmas, haja vista que o número de flagrantes de trabalhadores submetidos a
condições análogas à de escravo na zona urbana ser maior do que na zona rural.
Apesar de, atualmente, o modelo de trabalho se diferenciar de suas antigas origens
escravistas, seja no termo dado aos sujeitos enquanto bem de posse e propriedade, antes
escravo e agora operário, peão, etc.; seja na aplicabilidade de sua força de trabalho, antes
na lavoura, no trabalho doméstico, etc. e hoje na indústria, na construção civil, nas
indústrias têxteis, etc., seja ainda nas qualidades de (sobre)vida que lhes são oferecidas.
[...] cabe repensar as verdadeiras condições de trabalho que são exercidas no Brasil, em
especial no ramo da indústria da moda. (Batista, 2017, p. 88-89).
O que chamou atenção para essa percepção de aumento de casos de trabalho escravo
contemporâneo nas zonas urbanas foi o “caso Zara”, em 2011, que trouxe à baila a realidade das
oficinas clandestinas no país, que até então eram invisibilizadas, cuja repercussão ultrapassou as
fronteiras do país.
Em 2011, a Zara Brasil foi implicada num flagrante de escravidão envolvendo 15
bolivianos e peruanos, libertados pelo governo federal em oficinas de costura na capital
paulista. Após o escândalo, a empresa assinou um acordo com o Ministério Público do
Trabalho (MPT) e com o MTE. Nele se comprometeu a realizar auditorias privadas
em sua rede de fabricantes para sanar irregularidades trabalhistas impostas a brasileiros
e, principalmente, a estrangeiros como bolivianos e peruanos – as principais vítimas
de trabalho escravo no setor. Mas, na avaliação do Ministério do Trabalho, a empresa
descumpriu reiteradamente essas obrigações. A Zara não detectou ou corrigiu problemas
graves que continuaram ocorrendo na sua rede, como trabalho infantil e jornadas
excessivas. Além disso, a empresa teria desviado a finalidade das auditorias internas:
ao invés de aperfeiçoar as condições dos fornecedores, valeu-se delas para mapear e
excluir as oficinas de costura que empregam imigrantes – independentemente de elas
estarem ou não descumprindo a lei. A auditoria aponta que a multinacional usou o
novo controle interno prioritariamente para a eliminação de riscos à sua imagem. Após
o caso de trabalho escravo que atingiu a marca em 2011, a Zara Brasil – que pertence ao
grupo espanhol Inditex, maior varejista global de moda em número de lojas – anunciou
diversos investimentos para beneficiar a comunidade de latino-americanos em São
Paulo. Entre eles, a doação de R$ 6 milhões para a criação do Centro de Integração
da Cidadania do Imigrante (CIC), um projeto do governo estadual para facilitar a
regularização migratória de estrangeiros residentes no estado. Ainda segundo a auditoria,
em 2013, quando a exclusão de oficinas de imigrantes ainda não estava completa, 8 mil
peças da Zara foram manufaturadas em uma rede de oficinas posteriormente flagradas
com trabalho escravo. O caso veio à tona em novembro de 2014, quando auditores do
trabalho resgataram 37 pessoas submetidas à escravidão em duas oficinas gerenciadas
por uma empresária também de origem boliviana. Na ocasião, a Zara já não mantinha
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mais relações comerciais com os empreendimentos do grupo. A produção era destinada
à varejista Renner, que foi responsabilizada pela situação. (Campos, 2015).
Nessa fenda, a rede varejista de roupas Renner, que possui várias redes espalhadas pelo
Brasil, foi responsabilizada pela exploração de trinta e sete costureiros bolivianos em uma oficina
de costura terceirizada na periferia de São Paulo, em 2014.
Os trabalhadores viviam sob condições degradantes em alojamentos, cumpriam jornadas
exaustivas e parte deles estava submetida à servidão por dívidas. Tais condições constam
no artigo 149 do Código Penal Brasileiro como suficientes – mesmo que isoladas –
para se configurar o crime de utilização de trabalho escravo. [...]. Os auditores fiscais
à frente do caso consideraram a Renner responsável pela redução dos trabalhadores a
condições análogas a de escravos por entenderem que a empresa detém o controle total
sobre a produção de roupas na oficina fiscalizada, cujo serviço era intermediado por duas
empresas fornecedoras da rede varejista. (OJeda, 2014).
Igualmente, no ano de 2015, outra empresa do ramo varejista, o Grupo Riachuelo,
foi condenada a pagar pensão vitalícia a uma ex-funcionária devido a doença contraída pelas
atividades desempenhadas.
A condenação evidencia o modelo de produção fast fashion, haja vista a exigência de
metas de produção de seus funcionários pelo grupo, mediante abusos físicos e psicológicos, para
cumprir com o ritmo e demandas exigidas pela fábrica onde eram confeccionadas as peças de
roupas vendidas pelas lojas do grupo econômico.
O grupo Riachuelo foi condenado a pagar pensão vitalícia a uma de suas ex-funcionárias
em mais uma ação que revela as precárias condições de trabalho impostas às costureiras
que produzem para as grandes marcas da moda. A condenação descreve um ambiente
de trabalho em que a exigência de metas de produção ocorria mediante abusos físicos
e psicológicos. Segundo seu relato, a costureira era pressionada a produzir cerca de mil
peças de bainha por jornada. A meta, por hora, era colocar elástico em 500 calças ou
costurar 300 bolsos. Na ação, a funcionária diz que muitas vezes evitava beber água
para diminuir suas idas ao banheiro. Idas que, segundo ela, seriam controladas pelo
encarregado mediante o uso de fichas. A ação foi contra a Guararapes Confecções,
indústria de roupas do grupo Riachuelo, condenada a pagar uma pensão vitalícia
à costureira lesionada devido às atividades exercidas na empresa. A ex-funcionária
desenvolveu Síndrome do Túnel do Carpo, que provoca dores e inchaços nos braços. A
ação aponta que a trabalhadora teve a sua capacidade laboral diminuída devido ao ritmo
de trabalho exaustivo demandado pela fábrica potiguar, onde são confeccionadas peças
de roupa vendidas pelas lojas da Riachuelo. (Campos; Aranha, 2016).
No ano de 2020, um resgate de trabalhadores em regime de escravidão contemporânea
foi realizado em uma oficina de costura da Program Moda, empresa que se intitula a maior rede
plus size do Brasil. Dentre os resgatados estava uma mulher no sétimo mês de gestação, impedida
de acessar serviços básicos de saúde.
Enquanto os estilistas da Program, que diz ser a “maior rede plus size do Brasil”,
viajavam para os maiores centros de moda mundiais “em busca de inspiração e novas
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ideias”, os costureiros bolivianos que produziam peças para a marca eram submetidos a
tratamento desumano. A empresa foi condenada pela Justiça em março do ano passado,
mas o cativeiro dos trabalhadores resgatados não acabou: vítimas de possível servidão
por dívidas, jornadas diárias de 16 horas de trabalho e até privação de alimentos, eles
ainda não receberam nenhuma indenização. O resgate aconteceu em setembro de
2020, em uma oficina de costura no bairro Casa Verde Alta, em São Paulo, quando
fiscais encontraram três trabalhadores em condições análogas à escravidão. Entre eles
estava uma mulher, no sétimo mês de gestação, impedida de acessar serviços de saúde.
“Quando os patrões descobriram que ela estava grávida, não queriam deixar ela parar
de trabalhar”, revelou à Repórter Brasil um dos bolivianos resgatados, que é o pai da
criança. Segundo o relatório de fiscalização, a família precisava compensar aos finais de
semana as horas em que a grávida saía da oficina para fazer o pré-natal. Em uma ocasião
em que precisou ser atendida na emergência de uma maternidade e, com dores, não
pôde trabalhar, a mulher foi penalizada com restrição de alimentação: ela e suas três
filhas receberam apenas chá como jantar em uma noite, somente o café da manhã no dia
seguinte e, no terceiro dia, o jejum foi total. (Júnior, 2022).
Conforme mencionado, a indústria da moda no modelo fast fashion tem por base a
política da rápida e contínua produção de peças que colabora para que as coleções e tendências
sejam criadas e trocadas com frequência pelos consumidores. Ocorre que essa urgência no
consumismo faz com que os consumidores não se atentem ao fato de “quem faz as suas roupas”6.
Segundo uma pesquisa realizada pela Fundação Procon – SP, no ano de 2019, mais de
90% dos entrevistados afirmaram não serem capazes de identificar se o produto que adquiriam
foi produzido ou não com mão de obra escrava. Outros 89,52% afirmaram que não sabem onde
encontrar a informação das empresas que se utilizam de trabalho escravo e mais de 80% afirmaram
que não adquiriram produtos se soubessem que foram produzidos com mão de obra escrava e
quase a totalidade dos consumidores entrevistados afirmou considerar útil saber quais empresas
exploram mão de obra escrava.
Quanto a divulgação de informações, está estabelecido no Código de Defesa do
Consumidor, como direito fundamental, o conhecimento de dados indispensáveis sobre produtos
ou serviços e o direito à educação para o consumo que consiste em meios para o cidadão exercitar,
de forma consciente, sua função no mercado. Isso porque, o consumidor que adquire um bem
ou serviço fruto de trabalho escravo acaba, ainda que involuntariamente, contribuindo para o seu
fomento.
Nesse contexto, a ONG Repórter Brasil desenvolveu, em 2013, um aplicativo chamado
Moda Livre, o qual avalia grandes grupos varejistas de moda e relaciona aqueles cuja produção
têxtil foi flagrada em casos de trabalho escravo. A proposta do aplicativo é que o consumidor
conheça a conduta das marcas antes de consumir o produto ofertado e, dessa maneira, se torne
um consumidor consciente e também um ator social no combate ao trabalho escravo em uma
sociedade de consumo atiçada por ideologias neoliberais.
6 O Fashion Revolution é um movimento que surgiu com a seguinte pergunta “quem fez minhas roupas?”. Em
busca das respostas, o movimento atua objetivando o engajamento da sociedade na busca por uma moda mais
justa, digna e transparente.
Trabalho Escravo e Fast Fashion: o Flerte da Indústria da Moda com a Servidão
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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa concluiu, portanto, que a indústria da moda, impulsionada pelo modelo
de produção fast fashion, fomenta o trabalho escravo contemporâneo e é uma realidade social a
partir da correlação entre o neoliberalismo e o consumismo.
Não custa sublinhar novamente que, no modelo de Estado Neoliberal, o mercado assume
o papel central, reduzindo a ação do Estado e potencializando o consumismo. Assim sendo, o
consumismo constitui-se como o núcleo e a forma de conduta individual e coletiva presente na
modernidade líquida, descrita pelo sociólogo Zygmunt Bauman.
A indústria da moda, com o modelo de produção fast fashion, é apontada como uma das
formas de consumismo que possui elevada fluidez de novos produtos e descarte de velhos. É nesse
cenário que a exploração de mão de obra emerge, haja vista que uma sociedade que consume de
forma desenfreada, acaba exigindo que o mercado da moda atenda às suas demandas.
Logo, a indústria da moda, por esse consumo imediato, além de apresentar problemas
ambientais, também apresenta problemas sociais, pois, em muitos casos, submete seus
trabalhadores a condições análogas à de escravo.
Isso porque, o modelo de produção fast fashion na indústria da moda, ainda que lucrativo
para muitas empresas da indústria modista, é difundido como estratégia de desenvolvimento pelas
economias neoliberais, tornando-se exemplo da dimensão sociopolítica da doutrina neoliberal.
O discurso que sustenta esse modelo defende a desregulamentação da força de trabalho e o
enfraquecimento das forças sindicais, erosionando direitos trabalhistas e abrindo caminhos para
a precarização dos vínculos e da vida dos trabalhadores, vistos como peças na engrenagem da
máquina do mercado “livre”.
Nesse contexto, cabe, primeiro, às próprias empresas cuidarem da sua cadeia de produção,
tendo em vista que a imagem socioambiental tem cada vez mais valor no mercado mundial e,
segundo, ao Estado e à sociedade brasileira compreenderem seus fluxos, impedindo que sistemas
de produção fragilizem o bem mais importante do processo, que é o ser humano. Com isso,
nosso país estará alinhado às melhores práticas globais de sustentabilidade e apto a galgar avanços
civilizatórios imprescindíveis no atual estágio da humanidade
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