Seminario Arte Publico Actas 2011 T1-Libre
Seminario Arte Publico Actas 2011 T1-Libre
Seminario Arte Publico Actas 2011 T1-Libre
S471a
Seminrio Internacional sobre Arte Pblico en Latinoamrcia (2.
2011 : Vitria, ES).
[Anais do] II Seminrio Internacional sobre Arte Pblico en
Latinoamrcia, Vitria, 9 a 12 de novembro de 2011 : mesas e
comunicaes. Belo Horizonte: C/Arte, 2011.
600 p. ; 22 cm.
ISBN.: 978-85-7654-118-9
1. Arte. 2. Planejamento urbano. 3. Arte Pblica. 4. Arte Congressos. I. Seminrio Internacional sobre Arte Pblico en Latinoamrica (2.
: 2011 : Vitria, ES).
CDU: 711
SUMARIO
ARTE PBLICA EM FLORIANPOLIS: ..........................................................................................................................................19
A Praa XV como um microterritrio
ARTE PUBLICA E ESPAO POLTICO: ........................................................................................................................................... 32
Coniguraes e similaridades na construo do espao urbano de Braslia (DF)e de Palmas (TO).
A ESCULTURA CINTICA NO ESPAO PBLICO: ................................................................................................................. 39
Dois estudos de caso
ARTE, POLTICA E COMUNICAO NO BRASIL DOS ANOS 1960 ....................................................................................50
Os outdoors realizados por Nelson Leirner
A DISCRETA PARTICIPAO DO PBLICO: .............................................................................................................................62
Dan Graham, Antoni Muntadas e Ana Tavares
AMPLOS CIRCUITOS: .......................................................................................................................................................................... 75
A obra fora do museu
ARTE EXTRAMUROS NO BRASIL. .................................................................................................................................................. 83
A conluncia entre espao urbano e instituio cultural na formao da vertente artstica Extramuros no Brasil
ARTE URBANO Y RECHAZO SOCIAL............................................................................................................................................ 93
La escultura pblica La Figura Obscena en Colima, Mxico
ARTE PBLICA NO ESPAO URBANO NA CIDADE DE NITERI ................................................................................... 104
A Arte Pblica na rea Urbana da Cidade de Niteri Dentro do Percurso Litornea
PRTICAS POLTICAS DE VISIBILIDADES NA AMRICA LATINA: TRADIO, RUPTURAS E RELAES ENTRE ALTERIDADES: ...................................................................................................................................................................................................... 109
Goinia/Gois e La Victoria, centro do Setor Sul da cidade de Santiago do Chile
ARTE PBLICO Y COMUNIDAD LATINA ................................................................................................................................... 119
La produccin artstica del Centro Cvico en Este de Los Angeles, Ca.
ARTE PBLICA E OS NO-LUGARES ...........................................................................................................................................130
O caso de Mosqueiro: uma ilha de Belm-PA
ARTE PBLICA E ARTE DE RUA.....................................................................................................................................................138
Grafiti versus graite
Comit de organizao
Jos Cirillo (Presidente UFES/GEAP
Angela Grando (UFES)
Carolina Vanegas Carrasco (GEAP /UBA)
Teresa Espantoso Rodriguez (GEAP/UBA)
Comit de Cientico
Adriana Laura; Ana Longoni; Angela Grando; Aparecido Jos Cirillo;
Carolina Vanegas Carrasco; Catalina Valds; Ceclia de Almeida Salles;
Cesr Floriano; Clara Luiza Miranda; Diana I. Ribas ; Gisele Ribeiro; Gloria
Cortes; Jos Francisco Alves; Juan Ricardo Rey Mrquez; Laura Malosetti
Costa; Marcelo Magadn ; Mara Amalia Garca; Mara de las Nieves Agesta ;
Mara Florencia Battiti; Maria Regina Rodrigues; Martha Penhos; Miguel
Angel Muoz ; Nelly Sigaut; Pablo Brugnoli; Patricia Hakim; Patricia S.
Favre; Ral Enrique Piccioni; Ricardo Maurcio Gonzaga; Rita Eder; Samira
Margotto; Silvia Dolinko; Teresa Espantoso Rodrguez; Viviana Usubiaga.
19
2
[...] um dispositivo espacial destinado ao espetculo de conjuntos musicais ou pequenas orquestras [...]
embora sem conigurar um verdadeiro coreto, designa uma rea que ica quase sempre vazia ou ocupada pelos indivduos
sem-teto [...] (Vaz, 2003).
21
Essa estratgia de criar um espao de favorecimento contemplao da igura do poltico uma forma de luta pelo poder simblico, de fazer ver e fazer crer, de predizer
e de prescrever, de dar a conhecer e de fazer reconhecer, que ao mesmo tempo uma
luta pelo poder sobre os poderes pblicos (Bourdieu, 2007, p. 174).
Em entrevista, um engraxate que trabalha na praa respondeu coniante de que era
uma medida comum a todos os bustos, que seria s uma questo de tempo. No entanto,
em uma investigao junto ao IPUF, nada constava em relao aos outros bustos. Nova
pesquisa junto Fundao Municipal do Meio Ambiente (Floran), rgo responsvel pelas praas da cidade, somente constava uma solicitao3 de plantio de lores em
torno do monumento restaurado, para antes da solenidade de entrega novamente
sociedade. Esse episdio denota a estratgia de manuteno do espao poltico.
Saneamento bsico4, obra desta autora, foi uma interveno estratgica no monumento
3
A solicitao Floran partiu de Salomo Mattos Sobrinho, atualmente Secretrio da Secretaria Municipal
de Urbanismo e Servios Pblicos (SUSP). Na ocasio da solicitao, o Sr. Salomo ocupava um cargo na Secretaria da
Habitao. Informado pela Floran, outubro de 2009.
4
Srie Saneamento bsico, Giovana Zimermann, 2008.
22
que busca repaginar a imagem de Jernimo Coelho. O procedimento foi muito rpido
e simples, tratou-se da colocao de um adesivo, que simula uma tampa de um bueiro
com a frase conhecer a cidade contemplar seu incessante devir. A frase escolhida
conserva uma neutralidade, mas ao mesmo tempo abre para amplas relexes. Remete
a toda e qualquer mudana a que est sujeita a cidade, inclusive a mudana estratgica
do memorial em questo. A tampa de um bueiro uma maneira limpa de tapar (ou
revelar?) as imundcies da cidade (Figura 1C).
Mas at onde vai a Praa XV? Quando entra no simblico, a praa desdobra-se em outros lugares nos quais a cidade praticada em situaes, revelando que no s espao
geogrico, sobretudo, demonstrando que esse exerccio pode ser feito com qualquer
espao, segundo o qual se distribuem elementos nas relaes de coexistncia para que
ele se torne lugar, como previu De Certeau.
Um lugar a ordem (seja qual for) segundo a qual se distribuem elementos
nas relaes de coexistncia. [...] uma conigurao instantnea de posies.
Implica uma indicao de estabilidade. [...] O espao um cruzamento de
mveis. de certo modo animado pelo conjunto dos movimentos que a se
desdobram. [...] Em suma, o espao um lugar praticado. (Certeau, 1994: 201-201).
24
Cada componente do grupo escolheu um personagem de Cascaes para realizar a animao a partir de inmeras possibilidades tcnicas de mdias digitais, tais como: animao em Flash, MAX3D, efeitos com fotograia animada, Stop Motion, (tambm conhecido como animao de massinha).
Outra questo pertinente a este processo criativo desencadeado pela proposta
foi o compartilhamento do conhecimento em softwares, noes bsicas de
roteiro e tcnicas de captao de imagens entre os membros do grupo. Foram
organizados workshops, ministrados pelos integrantes a im de instrumentalizar
o grupo e possibilitar participao efetiva de todos em cada etapa do processo
criativo das animaes (Idem).
Por meio de um projetor adaptado em uma combi, seus personagens, iguras aladas,
foram animadas e projetadas pelo grupo a partir do trajeto que Franklin Cascaes fazia
diariamente: do Centro Federal de Educao Tecnolgica (CEFET), onde ele trabalhava, at o Bairro Itaguau, onde ele morava. As animaes foram projetadas diretamente nas paredes da cidade, inclusive em torno da Praa XV, mais precisamente nas
paredes do Palcio Cruz e Souza, o Museu da Escola, Museu Victor Meireles. Estas
projees, ao estarem no limite entre a realidade virtual e o tempo real vivenciado,
reconiguravam o espao real provocando descontinuidade para os envolvidos no processo e naqueles que estavam no caminho por mrito do acaso (Idem).
O espao, nos diria Michael De Certeau foi vivenciado como lugar praticado (De Certau,
1996). O produto inal desta prtica coletiva resultou num vdeo experimental reunindo as animaes de cada integrante articulado com o material registrado durante
as projees pela cidade. O carter experimental e o curto prazo para realizar este
projeto mostraram-nos uma possibilidade de adquirir uma experincia7 real dentro
de um processo colaborativo e de explorar os recursos que a vdeo-animao oferece
como dispositivo artstico capaz de gerar convvio, contaminao e empoderamento
(Bondia, 2002: 3).
Foram dois meses intensos de trabalho em que os conhecimentos foram sociabilizados, e o resultado foi uma inusitada obra coletiva, informa Kinceler. Assombraes da
Ilha foram projees que possibilitaram uma dinmica interativa da obra de Cascaes
com o centro da cidade, atualizando-as no cenrio contemporneo. Alm dessa projeo feita diretamente no espao urbano, o inverso tambm foi realizado, para a pro7
Entendo experincia aqui como airma Jorge Larrosa Bonda: Experincia o que nos passa, o que nos
acontece, o que nos toca. No o que se passa, no o que acontece, ou o que toca. A cada dia se passam muitas coisas,
porm, ao mesmo tempo, quase nada acontece. Dir-se-ia que tudo o que se passa est organizado para que nada nos
acontea [...] Em primeiro lugar pelo excesso de informao. A informao no experincia. E mais, a informao no
deixa lugar para a experincia, ela quase o contrrio da experincia, quase uma antiexperincia (Bondia, 2002: 3).
25
duo de um vdeo. Foram captadas imagens da cidade e virtualmente os desenhos foram inseridos, de modo que esses personagens alados de Cascaes passaram a interagir
sobrevoando pontos tursticos, mas tambm entrando e saindo dos bueiros da capital.
8
Texto retirado das conferncias ministradas em parceria pelos professores citados: Ana Arnaiz e Javier
Moreno. Especiicidades e Alteraes nos modos de fazer e pensar o Escultrico: o ensino da Escultura hoje 2005 2007.
CEART UDESC - Florianpolis - Brasil.
26
Fernando Machado9 e Memorial Miramar10, ambos situados na Praa Fernando Machado, junto Praa XV de Novembro.
Ostracismo foi a proposta de interveno no monumento Miramar. Consistiu em
reproduzir centenas de ostras em gesso com a palavra ostracismo, escrita na base, e
que eram coladas nas colunas do monumento Miramar.
Sobre a palavra, no processo criativo:
OSTRA + ZISMO
OSTRAZISMO
EXLIO = ... lugar afastado, solitrio ou desagradvel de habitar.
OSTRACISTA = partidrio do ostracismo.
OSTRA + SISMO
OSTRASISMO
SISMO = movimento do interior da Terra, o qual, conforme a localizao de
sua origem, pode produzir ondas mais ou menos intensas e capazes de se
propagarem pelo globo. Tremor de terra11.
Essa proposta de trabalho foi uma maneira potente de intervir sobre um memorial
extremamente polmico. O Memorial foi criticado por sua distncia do principal atributo que era estar dentro da gua.
Em 1925, o Miramar era apenas um trapiche usado para embarque e desembarque de
passageiros do trajeto ilha-continente. Ele adentrava o mar cerca de vinte metros; apenas em 1928 foi inaugurado o bar junto ao espao. Assim como a Ponte Herclio Luz,
Bar Miramar era percebido como um smbolo de modernidade de Florianpolis, seu
desaparecimento mencionado como uma perda irreparvel para a identidade local.
Todas as manifestaes inlamadas lamentando o desaparecimento do lugar das convivncias sociais serviram de estmulos para propagar-se a ideia de um memorial para
o Miramar. Em 14 de junho de 1988, quatorze anos depois do desaparecimento do Miramar, Edison Andrino, que era prefeito de Florianpolis na poca, lanou a proposta
de reconstruo do trapiche - como forma de restituio da memria de to importante obra arquitetnica para a populao - criando o projeto Revivendo o Miramar.
A propsta Ostracismo, reconsiderando a noo de persistncias simblicas, com
a imagem das ostras, teve o intuito de trazer memria da populao a condio na9
A esttua era uma homenagem ao Cel. Fernando Machado que liderou as tropas na Guerra do Paraguai.
Inicialmente a estatua icaria sobre a coluna comemorativa no centro da praa, posteriormente ela foi colocada, na parte
inferior da praa, prximo ao mar, hoje conhecida como Praa Fernando Machado, junto a Praa XV. (Zimermann, ,
2009: 101).
10
Memorial Miramar - A estratgia do memorial: Revivendo o Miramar- memorial ao Restaurante que
funcionava sobre um trapiche em 1928, e foi demolido por ocasio do aterro da beira mar na dcada de 1970. Idem ibd, p.
105.
11
Informaes concedidas autora por e-mail pela artista Sandra Fvero.
27
tural dos pilares do trapiche, dentro da gua. A esttica relacional da obra ocorre no
sentido colaborativo do trabalho entre os trs artistas, no sentido participativo das
pessoas que interagem com o trabalho, conferindo-lhes uma ideia de participar ativamente de um processo que anteriormente lhes foi negado. As ostras foram coladas
com ita adesiva, de forma que pudessem ser retiradas e levadas como recordao pelas pessoas que por ali passavam.
12
28
O Jogo aqui colocado, conforme alerta Bourdieu, como a posse de um capital simblico (Bourdieu, 2007: 172-173).
13
Integrantes do Erro Grupo: Luana Raiter, Michel Marques, Pedro Diniz Bennaton e Priscila Zaccaron.
14
Pedro Bennaton integrante do Erro Grupo roteirista e diretor, maiores informaes no site http://www.
errogrupo.com.br.
15
http://www.errogrupo.com.br/port/index.html.
16
Meyer ilho, desenhista, pintor e tapeceiro. Foi fundador e presidente do Grupo de Artistas Plsticos de
Florianpolis (GAPF) e organizou em 1958/59 os dois primeiros sales de arte moderna de Santa Catarina, fora do Estado.
29
A Praa XV de Novembro funcionou como cenrio, mas tambm como uma zona explicitando as possibilidades, impossibilidades, sociabilidades e conlitos da cidade
contempornea. A proposta suscitou relexes mediante a simulao de situaes
cotidianas ou raras para a cidade contempornea. Os artistas questionaram a abusiva
adoo de palavras estrangeiras que so colocadas em espaos pblicos, colocando
placas de WC e Lounge. Fitas de isolamento foram colocadas no decorrer da festa,
incensos foram acesos ao longo do percurso. Apareceram alguns personagens com atitudes ldicas e at surreais, como um chapeleiro ambulante oferecendo doces (cubos
de acar) aos participantes.
Na contemporaneidade, a Arte Pblica pode funcionar como mquina de guerra, pelo seu carter transgressor, funcionando como um corte nas estratgias de
poder que se impem no espao pblico. Sobre o conceito de mquinas, declaram
Deleuze e Guatari:
Sim, ns damos maquina uma grande extenso: em relao com o luxo.
Deinimos a mquina como qualquer sistema de cortes de luxo. Assim tanto
falamos de mquina tcnica no sentido usual da palavra, como de mquina
social, ou de mquina desejante. que, para ns, mquina no se ope de modo
algum nem ao homem nem a natureza ( preciso boa vontade para nos objetar
que as formas e as relaes de produo [306] no so mquinas. (Deleuze e
Guattari, 2006: 281).
30
Informaes concedidas autora por Pedro Bennaton por e-mail no dia 17 agosto de 2009.
Referncias
Benjamin, Walter, O lneur, in: Lima, L. C., Obras escolhidas III, So Paulo, Brasiliense, 1989.
______________________, Sobre o conceito de histria, in: Magia e tcnica, arte e poltica, Trad. Sergio Paulo R., 7.
Ed, So Paulo, Brasiliense,1969.
Bernardo, Aglair, Sujeitos suspeitos, imagens suspeitas: Cultura miditica e cmeras de vigilncia, 2007. 252 f. Tese
(Doutorado em Teoria Literria) - Centro de Comunicao e Expresso, Universidade Federal de Santa
Catarina, Florianpolis, 2007.
Bourdieu, Pierre, O poder simblico, Rio de Janeiro, Editora Bertrand Brasil, 2007.
Canclini, Nestor Garcia, Culturas hbridas: Estratgias para entrar e sair da modernidade, So Paulo, Editora da
Universidade de So Paulo, 1997.
Certeau, Michel, A inveno do cotidiano: arte de fazer, Petrpolis, Vozes, 1994.
______________________, Luce Girard e Pierre Mayol, A Inveno do cotidiano 2: morar, cozinhar, Petrpolis,Vozes,
1996.
______________________, De las prticas cotidianas de oposicin. Blanco, Paloma, Modos de Hacer: arte crtico, esfera
pblica y accin direta. Salamanca, A.V.V. Ediciones Universidad de Salamanca, 2001.
Coradini, Lisabete, Redes de Sociabilidade e Apropriao do Espao Em Uma rea Central de Florianpolis, 1992.
Dissertao (Mestrado em Antropologia) - Centro de Filosoia e Cincias Humanas, Universidade Federal
de Santa Catarina, Florianpolis, 1992.
Correa, Carlos Humberto P., Histria de Florianpolis Ilustrada, Florianpolis, Editora Insular, 2005.
Deleuze, Gilles y Flix Guattari, A ilha deserta, Edio preparada por David Lampujade, So Paulo, Editora
Iluminuras, 2006.
Huyssen, Andras, Seduzidos pela memria: arquitetura, monumentos, mdia, Rio de Janeiro, Aeroplano, 2000.
Kinceler, Jos, Leonardo Lima da Silva e Francis Albrecht Pedemonte, Arte Coletiva: O Coletivo LAAVA
como uma plataforma de desejos compartilhados, 2009. Trecho retirado do artigo Arte Colaborativa: O
Coletivo LAAVA, ainda no publicado, fornecido por Kinceler.
Lima, L. C. (org.), Teoria da cultura de massa, 3. ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1982.
Pechman, R. M., Cidades estreitamente vigiadas: o detetive e o urbanista, Rio de Janeiro, Casa da Palavra, 2002.
Vaz, Nelson Popini, La Place Publique comme Espace de Communication, 2003. Tese (Doutorado em Arquitetura
e Urbanismo) - Instituto de Urbanismo de Paris, Universidade de Paris XII, 2003.
Zimermann, Giovana A., Arte Pblica em Florianpolis: a praa XV como Lugar Praticado. Dissertao (Mestrado
em Arquitetura e Urbanismo e Histria da Cidade) PGAU- Cidade. Universidade Federal de Santa
Catarina UFSC, 2009.
31
Essa comunicao amplia ainda mais o sentido da arte pblica, considerando-a como
representao urbana, tornando a cidade, no s como contedo e continente da arte,
mas sendo ela mesma a prpria arte um conjunto de signos que coniguram o espao
urbano em espao poltico e que transforma a cidade em um campo de batalha, onde
se rene os mais diversos conlitos entre grupos sociais e ideologias que solicitam
ao mesmo tempo os mais diversos interesses. Assim, arte pblica e espao poltico
se completam em uma ao individual ou coletiva, especiica de cada grupo uma
resposta esttica e de signiicado aos habitantes da cidade que muitas vezes surge a
partir de idias de polticos que associam o seu nome ao prestgio da arte (Maderuelo, 2001: 31).
Com efeito, Braslia e Palmas apresentam coniguraes e similaridades no processo
de construo e na Histria da cidade a partir de ideologias dos seus governantes, materializando as suas intenes polticas no prprio espao da cidade e nos seus usos.
Essas duas cidades guardam o nome dos seus idealizadores Juscelino Kubitschek e
Siqueira Campos como representao de um ideal poltico e luta por um espao especico para as suas realizaes.
Em 1956, o Presidente JK anunciou a sua deciso de transferir a Capital Federal do
Rio de Janeiro para Braslia, que diferente das capitais estaduais, foi concebida com
espessura simblica para reletir os valores da nao. Esse fato antecedeu a construo de Palmas e foi referncia para o modelo urbano implantado na Capital tocantinense. A proximidade geogrica, o contexto social e poltico em que essas cidades
emergiram, marca um elo de familiaridade entre elas.
No contexto brasileiro, Braslia corresponde referncia mxima da Cidade Ideal do
sculo XX, pois o seu projeto alcanou fama internacional, projetando o Brasil no quadro da arquitetura moderna mundial, a ponto de ser reconhecida pela UNESCO como
Patrimnio Cultural da Humanidade. A cidade distingue-se pelo urbanismo de Lcio
Costa e pela singularidade que a arquitetura de Oscar Niemeyer expressa no cerrado
do Cetro-Oeste. O seu plano piloto desenha a forma de um avio, indicando a imagem
de progresso que, na poca, o pas queria expressar.
Repleta de simbologia e de significados prprios para ser Capital Federal, Braslia fez valer a utopia do plano e o sonho de Juscelino Kubitscheck em construir
uma cidade que, alm de ser o emblema de seu governo, apagasse os vestgios da
colonizao portuguesa e criasse um sentimento de identidade nacional no povo
brasileiro (Farret, 1985: 18).
Juscelino Kubitschek levou a cabo a construo de Braslia como ideal da sua campanha presidencial, aproveitando-se do mito de um novo mundo gerado pela construo
de uma capital na regio central do pas como propulsora de uma grande civilizao.
Mito que desde o sculo XVIII j era cogitado por muitos visionrios que pensavam
em transferir a capital brasileira para o interior desabitado (Holston, 1993: 23). O seu
33
argumento para erguer tal epopia era a integrao nacional que essa capital traria em
funo da sua centralidade e o conseqente desenvolvimento da nao, reletido em
um modelo avanado de arquitetura e urbanismo de vanguarda.
Segundo Mrio Pedrosa, Braslia transformou-se em uma utopia; o que moveu a sua
construo no foi o desejo tenaz do lucro (Pedrosa, 1998: 46), mas uma idia poltica. Esse crtico entende Braslia como uma obra de arte em construo, e o seu
resultado inal, um produto coletivo. Pedrosa comenta:
A tarefa das novas geraes brasileiras est, pois, ixada: ediicar do nada a
capital, que tem o plano piloto mais belo e mais audacioso, e, simultaneamente
e de maneira to artiicial, criar, da terra bruta e pobre, a sua regio; o objetivo
do plano deinir a forma verncula complexa da regio. necessrio, pois, seja
ele concebido sob um alto critrio cientico e esttico, o mesmo que inspirou
a obra de arte coletiva que o conjunto urbanstico e arquitetural de Braslia
(Idem: 420).
A idia que move o pensamento de Pedrosa sobre a nova capital a noo de sntese
das artes entendidas como uma tarefa de integrar o artista a uma misso social. Ele
argumenta que: em nossa poca, no se trata apenas da arte, mas de reconstituir o
esprito de comunidade que se perdeu (Idem: 425).
O pensamento de Pedrosa sobre Braslia traz consigo a noo de Arte pblica entendida como uma obra que se completa no coletivo, onde os seus habitantes so atores
que vo deinir os usos e valores da cidade, criando conlitos que nem sempre so
considerados no plano.
Passados trinta anos da epopia que Juscelino Kubitschek empreendeu para construir em apenas cinco anos a nova capital do Brasil, o Governador Siqueira Campos
resgata o iderio kubitschekiano dando continuidade utopia de construir cidades
ideais, dando origem a Capital do Estado que ele prprio se empenhara em criar.
Na perspectiva em que o ideal de Siqueira Campos se aproxima do de Kubitschek , as
tramas que se pode traar entre as representaes da Capital Federal e de Palmas so
tanto simblicas, quanto fsicas. A primeira relao traada relaciona-se a um aspecto
histrico: assim como h o mito que cogita, desde o sculo XVIII, a construo da
Capital Federal para a regio central do pas, a construo de Palmas foi sugestionada
pelo desejo separatista manifesto desde o sculo XIX. Nesse sentido, podemos perceber o ideal de construo de um novo mundo, onde assim como Braslia est para o
Brasil, Palmas est para o Tocantins.
Outra aproximao possvel, desta vez relacionada memria urbana de quem
esteve presente nos primeiros anos da construo de Braslia e de Palmas, corresponde tanto cidade provisria que existiu na poca da construo dessas duas
cidades, quanto lembrana de quem pode conhec-las com a mesma aparncia
de um canteiro de obras.
A Capital tocantinense nos primeiros anos da dcada de 90 faz recordar o que acon34
mas por meio de Oscar Niemeyer, para coroar o Memorial Coluna Prestes, com a escultura o Cavaleiro da Luz E acabou construindo outras obras como: o Monumento
aos 18 do Forte e o Monumento Splica.
36
As esculturas que fazem parte desse trabalho formam o conjunto mais expressivo da
praa. Integrado ao contexto da obra de Niemeyer, faz do espao um lugar de aconchego e contemplao, possvel de ser observado nos jovens que se renem no local
durante a noite para conversar e namorar na escadaria que liga os dois monumentos.
Ainda nesse esprito de comemorao Siqueira Campos inaugurou o Monumento Splica tambm de Maurcio Bentes, representa uma famlia de pioneiros em ato de contrio, de suplica, pedindo a Deus paz para os tocantinenses. Essa obra, homenagem
de empresrios s famlias pioneiras no Estado, composta por nove esculturas em
bronze que brilham como ouro, na parte norte da praa, em frente ao cruzeiro. Conforme comentrio popular esse monumento uma representao da prpria famlia
do governador, segundo ele uma forma de homenagear a todos que j morreram, os
que ainda vivem e que deram sua vida ao Tocantins (Machado, 2002: 8).
No contexto da arte pblica contempornea esses trabalhos so esculturas permanentes de homenagem e celebrao, sem ter uma relao direta com a paisagem que
lhe cerca, pois em funo da grandiosidade do espao da Praa dos Girassis, muitas
37
vezes essas obras acabam por no ter uma relao de escala adequada, sendo instaladas na praa sem formar um lugar, um ponto de referncia. Esse um risco que
o artista corre ao realizar trabalhos desse gnero, que no trazem nenhum questionamento sobre o espao e nem propem transformao na estrutura do lugar. Tudo
isso faz com que essas obras paream uma moblia que pode ser removvel a qualquer
momento, a qualquer mudana poltica, sem deixar rastros signiicativos.
De uma outra maneira, essas obras institucionalizam a praa como espao poltico e
do poder, por abrigar representaes que reletem, por meio da arte pblica, o interesse de tornar esse espao memria de seu governo, inserindo na cidade tanto o registro
de uma Palmas idealizada por Siqueira, quanto a Palmas gerada pelos seus habitantes,
que constroem em seu solo outras estrias, outros usos, ressigniicando espaos e at
mesmo a prpria cidade, como obra coletiva, verdadeira arte pblica.
Portanto, o espao poltico corresponde tanto ao fato da praa abrigar essas obras,
quanto por entender toda cidade como arte pblica, processo coletivo onde governo
e cidados constroem as diferentes cidades que se superpem a matriz Palmas, antevendo coniguraes e similaridades que se desdobram no espao urbano de Palmas e
Braslia, unidas pelos mesmos desejos e utopias que construram essas cidades.
Referncias
Cerqueira, Humberto, O plano e a prtica na construo de Palmas, Universidade Federal do Rio de Janeiro,
Instituto de pesquisa de Planejamento Urbano e Regional, 1998.
Farret, Ricardo, O estado, a questo territorial e as bases da implantao de Braslia, in: Braslia, Ideologia e
realidade/espao urbano em questo, So Paulo, Projeto, 1985.
Gois, Antonio, Memorial para Prestes divide a famlia, in: Folha de So Paulo, So Paulo, 05 de outubro de
2001.
Holston, J., A cidade modernista uma crtica de Braslia e a sua utopia. So Paulo, Companhia das Letras, 1993.
Maderuelo, Javier, Poeticas Del lugar: Arte pblica en Espaa, Madrid, Fundacin Cezar Manrinque, 2001.
----------------------, La idea de espacio, Madrid, Ediciones Akal, 2008.
Pedrosa, Mario, Acadmicos e Modernos: Textos Escolhidos III, Otlia Arantes (org), So Paulo, Editora da
Universidade de So Paulo, 1998.
Segawa, Hugo, Palmas, cidade Nova ou apenas uma nova cidade?, in: Revista Projeto, 146, So Paulo,
outubro de 1981.
18 do Forte, in: Almanaque do Tocantins, nmero 10, 09/2000, p.10.
38
39
A perspectiva de oferecer aos seus habitantes melhores condies de vida fez com
que aquelas cidades fossem equipadas com energia eltrica, gua encanada, rede de
esgoto, gs e telefone, embora no se possa ignorar que esse propsito empanava outros objetivos19, que no sero aprofundados. No iderio de reforma urbanstica citada
tambm se exaltava a transformao dos espaos pblicos em locais agradveis, atraentes e funcionais. Essas necessidades eram decorrentes das mudanas culturais e
sociais do pas, que almejava inserir-se na era industrial, entre as quais, o alargamento
de ruas e construo de caladas, para facilitar a luncia do trfego de veculos e a
circulao segura da multido; destruio de morros, para abertura de novas artrias
urbanas de traado retilneo, construo de parques, jardins e aterros; demolio do
casario degradado. Antigos cortios cederiam lugar a residncias confortveis para
as elites, dotadas de condies de salubridade e higiene. Ao longo das novas avenidas surgiam edifcios pblicos suntuosos e equipamentos culturais diversos (museus,
bibliotecas, teatros e cinemas), cafs, restaurantes e casas comerciais com fachadas
eclticas e elegantes vitrinas, exibindo produtos atraentes, que aguariam o desejo de
consumo e a lnerie.
Deve-se considerar, no entanto, a assimetria entre o arrojo na concepo da cidade
moderna e os estilos arquitetnicos e artsticos ento adotados. Estes, salvo raras excees seguiram uma formulao passadista ou clssica (neorrenascentista, neobarroca, ecltica) que perdurou at a dcada de 1940, em assimetria com os princpios e o
despojamento da arquitetura moderna. Praas, parques e jardins, alm de exuberante
vegetao, tornaram-se locais privilegiados para a instalao de chafarizes e monumentos escultricos de temtica histrica ou alegrica, preconizados como espaos
destinados tanto ao cio, quanto interao social, educao cvica, estimulao
sensorial e intelectual.
Franoise Choay (2004: 67) denomina a cidade antiga submetida a reformulao e a
modernizao de Cidade Radiante, higinica e ordenada, orquestrada sob o signo
do funcionalismo e na qual a vida urbana se reduz a quatro atividades: o habitat, o
trabalho, a circulao e o cio.
Se o hbito de instalar monumentos escultricos de grande porte em locais pblicos
no era novo, considerando que na Europa essa prtica era adotada desde a antiguidade, a construo de parques, jardins e praas pblicas ampliicou-se e se difundiu
entre ns, no inal do sculo XIX, como peas integrantes da moderna cidade industrial20. Todavia, pelo menos at o inal da dcada de 1940 prevaleceria tambm na
concepo esttica das esculturas o gosto de nossos homens pblicos - principais
comanditrios dessas obras. A preferncia recaa em obras de carter honorico e
formulao acadmica: bustos de vultos polticos, em bronze, inseridos no topo de
19
O discurso de higienizao e organizao rapidamente se difundiu pelo nosso pas, embora empanasse uma
viso ideolgica e de segregao social, pois afastava das reas centrais a populao pobre e as classes trabalhadoras,
forando-as a residir na proximidade das indstrias que seriam instaladas nas reas perifricas.
20
No Brasil, at o sculo XIX, os locais destinados ao congraamento pblico eram os adros ou outeiros em
frente s igrejas, onde eram realizadas as festas religiosas.
40
41
42
43
44
To logo a doao foi anunciada, a imprensa capixaba passou a publicar notas especulando sobre a natureza da obra. Entretanto, em um meio ainda fortemente apegado
aos valores plsticos tradicionais e representativos, a gramtica da obra no seria bem
digerida pelos cronistas. Alm disso, o processo de insero da escultura vanguardista em um espao pblico no ocorreria de forma tranqila ou natural, pois alm da
inevitvel burocracia, seria necessrio o convencimento dos governantes municipais,
considerando que as negociaes tiveram incio em uma administrao e a instalao
da obra s se concretizou no governo seguinte.
Na formulao da escultura, Salgueiro utilizou correntes de ncora de navio e fragmentos geometrizados de ferro, soldados entre si. Construiu uma estrutura em cpula ou cpsula entreaberta, que faz lembrar um prato de balana/bero/ninho, na
qual as texturas rugosas da solda corporiicam a ao ou os gestos pulsantes da mo
do artista. Tal formulao contrasta com outros elementos abstratos, acondicionados
nessa cpula/ninho: duas esferas de ferro, de superfcie lisa e brilhante e volumes diferentes, unidas por uma linha sinuosa, que representa o cordo umbilical, elementos
esses que simbolizam a fecundao no tero materno ou a gnese da criao suprema
de um novo ser.
A cpsula/ninho aconchega e embala esse ser em formao, iada por trs correntes
de ferro, unidas na extremidade superior por um gancho/ncora, o que sugere que a
pesada obra poderia se movimentar, de maneira similar aos mbiles de Calder. Desse
gancho parte uma corrente mais extensa, que se prende interseco superior de uma
haste tubular de ferro deinidora de um oval. Dependendo do ngulo de visualizao
45
percebe-se que essa estrutura tubular, que ixada ao solo, envolve, protege e mantm o conjunto descrito em suspenso, e submergia, originalmente, do fundo de um
pequeno lago, cujo espelho de gua remetia ao lquido amnitico27.
A escultura, de aspecto pesado e rude, reletia-se nesse espelho de gua assumindo,
assim, uma dimenso difana e reverberante, tornava-se leve e parecia mover-se, como
que embalada pelo sopro do vento ou pela ao interativa do pblico. Entretanto, alegando precauo e segurana, a Prefeitura de Vitria optou por ampliar as dimenses
originais do lago, impedindo que o pblico se aproximasse e tocasse a obra, modiicando a proposta interativa do artista e fazendo com que a escultura deixasse de ser
cintica, tornando-se inerte e esttica.
A incompreenso e o impacto exercidos pela inslita criao salgueirana transparecem no teor das matrias jornalsticas publicadas por ocasio da inaugurao do
monumento, em maio de 1972. Revelando-se incapazes de discorrer sobre a especiicidade da iconograia da escultura, os cronistas destacaram a presena do artista,
do Prefeito Municipal Chrisgono Teixeira da Cruz e de outras autoridades, ao ato e
apenas supericial e equivocadamente se referiram obra. Airmavam tratar-se uma
representao de uma me com o ilho nos braos, em completa assimetria com o
lxico da escultura.
Ao contrrio do que seria de esperar, a obra no provocou reaes adversas do pblico, o que intrigou a imprensa, que, nos dias subseqentes inaugurao iria, de
maneira provocativa, entrevistar in loco, os usurios da praa solicitando-lhes impresses sobre o monumento. Diante da diiculdade de leitura dos cdigos formais e
de formulao de um signiicado que se aproximasse da proposio do artista, os entrevistadores disparavam: sabia que esse um monumento em homenagem s mes?
A reao era imediata: s se for a me do artista!
Decorrido mais de um ano da inaugurao da primeira obra pblica de sintaxe abstrata e cintica em Vitria ela continuou no sendo digerida at mesmo pelos articulistas da imprensa, que emitiam uma percepo equivocada dos cdigos formais
do Monumento Me, como atesta esta nota publicada no jornal O Dirio (10 e 11 de
agosto 1973): Salgueiro vem de fazer uma importante dedicao a Vitria. Trata-se
de um trabalho de sua autoria, uma bela escultura j exposta e premiada. O trabalho
representa a maternidade (me e ilho), naturalmente em formas correspondestes ao
gnio criativo do artista.
O Monumento Me seria submetido posteriormente a constantes deslocamentos de
um extremo a outro da Praa, alm de sofrer descaracterizaes, sendo a mais drstica delas a eliminao do espelho dgua, alterando a concepo visual e potica da
escultura. A justiicativa usada inicialmente era que o lago vinha sendo usado como
banheira por moradores de rua. O discurso passou a empanar, posteriormente, um
vis proiltico ou sanitrio, sob alegao de que a gua parada ao redor da escultura
poderia se transformar em criadouro do mosquito causador da dengue. Nesse sentido
27
Dimenses da escultura 310 x 162 cm (estrutura tubular); c.55x60x70 cm (forma em cpsula); 18 e 30 cm
(dimetros das esferas); 80 e 150 cm comprimento das correntes de navio, que suspendem a obra.
46
28
Construda em alumnio, pesa 230 quilos e mede 600 cm de altura, por cerca de 80 cm de dimetro, foi
instalada no Parque do Ibirapuera, na juno das Avenidas 23 de Maio e Pedro lvares Cabral, na capital paulista.
47
Mary Vieira. Polivolume: Conexo Livre 1953/1979 (pormenor). Escultura Cintica em alumnio. Fotograia: Almerinda
Lopes.
paos inseguros e perigosos, o que tornou os monumentos ali instalados ainda mais
invisveis, desprezados e esquecidos, o que contribuiu para que iquem expostos a
mutilaes, pichaes e descaracterizaes, sejam eles originrios de tempos recentes
ou remotos, possuam formas igurativas ou abstratas, sejam esculturas honoricas ou
interativas. Para conirmar tais assertivas, basta observar a apropriao que os frequentadores do Parque do Ibirapuera fazem atualmente do supracitado Monumento
s Bandeiras, de Vitor Brecheret, em especial nos inais de semana. Apesar da altura
considervel da obra, o pblico escala, transita e desliza sobre as iguras escultricas,
transformando o monumento em trampolim ou carrossel de um parque de diverses,
indiferente ao signiicado da obra, epopeia nela representada, ou ao fato de tratar-se
de um dos principais cones da escultura moderna e do patrimnio artstico do pas.
Flix Duque oferece-nos uma explicao que parece plausvel para entender, em alguma acepo, o descaso e o abandono dos monumentos pblicos. Segundo o autor,
os indivduos aos quais os monumentos tradicionais e modernos eram destinados e
poderiam ter algum signiicado - elites abastadas, intelectuais e iniciados -, no habitam mais nas proximidades deles, pois se transferiram para localidades distantes.
Em contraposio ao cenrio descrito, ele chama ateno para outro fenmeno surgido nas
ltimas dcadas, que no deixa de parecer paradoxal: o aumento vertiginoso de eventos
e proposies artsticas em espaos pblicos nas reas centrais das cidades, como jamais
se viu antes. Duque pondera que se esse fator no pde ser prenunciado pelos artistas do
passado ou pelos modernistas, no passaria indiferente aos jovens contemporneos. Estes
perceberam que se no seu tempo prevalece a atitude nmade e o carter efmero, as experincias artsticas no poderiam prescindir dessa mesma lgica. Foi com tal conscincia
que passaram a investir em aes experimentais, transitrias e participativas, realizadas em
todo e qualquer espao urbano de aluncia de pblico. Os artistas/propositores priorizam
a instigao, a relexo, a mudana de comportamento dos transeuntes, em detrimento do
reconhecimento e da perenidade dessas proposies, cientes de que no dia seguinte ao se
passar pelo mesmo local j ser outro o evento ou proposio artstica que vamos encontrar
ali, o que faz desaparecer todo o sentido de lugar especico (Duque, 2001: 115).
Referncias
Benjamin, W., Charles Baudelaire um lrico no auge do Capitalismo, Trad. Jos M. Barbosa, Hermerson A. Baptista,
So Paulo, Brasiliense, 1989, Obras Escolhidas II, p. 31-65.
Choay, F., El Reino de lo urbano y la muerte de la ciudade, in Ramos, M (Ed.), Lo Urbano, Barcelona,
Edicions UPC, 2004, p. 61-72.
Cocchiarale, F. e A. B. Geiger, Abstracionismo Geomtrico e Informal: a vanguarda brasileira nos anos cinqenta. Rio
de Janeiro, Funarte, Inap, 1987.
Duque, F., Arte Pblico y Espacio Poltico, Madrid, Ediciones Akal, 2001.
Pontual, R., Mary Vieira: o nascer da forma, in Jornal do Brasil (Rio de Janeiro), 27 ago. 1976, s.p.
Gndara, N., Mary Vieira. Mas podem cham-la de Juscelina, in O Estado de So Paulo, 02 ago. 1978, s.p.
Monumento Me, in O Dirio (Vitria), 10 e 11 de agosto de 1973, s.p.
Teixeira Leite, J. R., A Semana de Arte Moderna, in. Bardi, P. (Int.), Arte no Brasil, So Paulo, Abril Cultural,
1973, v. 2, p.648-711.
Zanini, I., 230 Kg de alumnio para um heri, Folha de So Paulo, 08 julho 1979, s.p.
49
Bruno Sayo
Universidade Estadual de Campinas
50
O artista nota que a empresa no havia seguido o contrato e grande parte dos locais
escolhidos para a instalao das imagens no foram respeitados. Ele ento negocia
com a empresa e consegue a aplicao de mais 100 peas na cidade. J que Leirner no
havia recebido retorno nem da imprensa nem dos transeuntes sobre as 100 primeiras
aplicaes, decide fazer algumas pequenas alteraes na imagem a ser aplicada nesse
segundo momento. O segundo modelo de outdoor criado pelo artista vem acompanhado dos dizeres Aprenda colorir gozando gozar colorindo Aparentemente essa
segunda verso tambm no gerou nenhum retorno que relevante.
pblicos, desta vez utilizando um novo suporte que atinge um novo pblico: motoristas e passageiros de automveis.
A concepo da imagem a ser divulgada nos outdoors baseada em manuais de desenho acadmico. O artista encontra no manual uma imagem de uma mulher que aparenta estar em xtase sexual e ento faz uma cpia iel desse desenho apenas alterando a cor29. Como resultado tem-se o rosto de uma mulher indicando prazer sexual
repetido trs vezes uma na cor branca, uma na cor ocre e uma na cor magenta. Ao lado
desses elementos gricos est a frase Aprenda colorindo gozar a cor ou Aprenda
colorir gozando gozar colorindo. O texto presente nos outdoors prope uma relao
inusitada e dbia entre o sexo e o fazer artstico. Abaixo desse texto esta a indicao
da autoria, o nome do artista: Nelson Leirner.
52
como um nico trabalho, uma vez que fazem parte de uma mesma concepo e apresentam somente pequenas diferenas entre si. Quanto a classiicao e o ttulo opta-se por seguir os utilizados no site do artista, que classiica o trabalho como happening e utilizam o ttulo Outdoor nas ruas de So Paulo30.
Muitas so as questes que o uso de outdoors como suporte de arte suscita. A mais
imediata e apontada por Baravelli que ao transportar as artes visuais para a rua,
ainda que em suporte bidimensional, surgem novos fatores que demandam uma outra
lgica do trabalho. O pblico modiica-se, tempo de percepo diminui, impem-se
um carter efmero, as dimenses se ampliam e perde-se a legitimidade dada pelo
espao expositivo.
J Aracy Amaral, ento diretora do MAC/USP, comenta no catlogo da exposio
Arte na Rua 2 tambm comenta o uso de outdoors na arte:
E mesmo que no frigir dos ovos, os artistas promovendo o sistema de
outdoors cartazes em via pblica o evento possa acabar se convertendo
30
No site do artista Nelson Leirner os outdoors esto classiicados no menu happening e so referidos pelo
ttulo Outdoors nas ruas de So Paulo. Site oicial do artista Nelson Leirner. Disponvel em http://www.nelsonleirner.
com.br. Acessado em 09 de maio de 2011.
53
Amaral ressalta a validade e a legitimidade do uso deste suporte na arte fundamentalmente por subverter um instrumento publicitrio. a ressigniicao de um meio
tradicionalmente percebido como de comunicao, de incentivo ao consumo, de alienao e principalmente de apreenso passiva da realidade. O espectador antes mesmo
de ter contato com o trabalho j tem um repertrio de para que e a quem serve um
outdoor. A arte ento frustra essa expectativa e na medida em que prope outras possibilidades, tambm prope um olhar crtico sobre o meio.
Essas questes indicam que no uso do outdoor como suporte de arte no basta
somente ampliar a escala de um trabalho concebido nos moldes do sistema de
arte tradicional. J em 1968 Leirner compreende tais pontos, e utiliza a linguagem
do outdoor com uma imagem sinttica e de rpida percepo, mas que de fato
suscita uma relexo muito mais profunda que aquela usualmente aplicada pelo
meio publicitrio. Leirner apropria-se de formas utilizadas pela publicidade para
realizar um trabalho de arte que ao mesmo tempo em que comunica em segundos
sua mensagem, permite ao espectador uma relexo e estranhamento extremamente
signiicativos. a desconstruo do outdoor.
Em Outdoors nas ruas de So Paulo, o artista vale-se de elementos da indstria
cultural, sob a inluncia da Arte Pop, mas com uma inalidade radicalmente oposta
a usualmente utilizada em outdoors. Leirner transmite uma mensagem ruidosa,
instrsecamente marcada por ambigidade e que no tum um resultado especico
esperado. O trabalho no visa o convencimento do espectador, mas sim provoc-lo
para o novo.
54
Fim de festa
1995
Imagem a ser aplicada no outdoor
Embora esse trabalho possua relaes plsticas evidentes com os outdoors de 1968
e at mesmo o sexo como tema em comum, o contexto e a inalidade diferenciadas
no permitem a ligao direta entre esses projetos. Nessa segunda experincia com
outdoors, Leirner est dentro de um evento com inalidade bastante deinida, e responde a isso com um trabalho em que a funo de comunicao priorizada em detrimento da pesquisa artstica. J na primeira experincia central a experimentao
do suporte, realizada sem a parceria com nenhuma instituio nem com temtica pr-estabelecida.
Contexto Social
Como foi apresentado acima, Outdoors nas ruas de So Paulo est intimamente ligado a
questes exteriores ao sistema de arte. Sendo assim, para a compreenso mais qualiicada desse projeto cabe ressaltar alguns aspectos do contexto social em que ele
foi realizado. Vale a ressalva de que o presente artigo no objetiva fazer um estudo
focado na sociedade brasileira na dcada de 1960. Entretanto, alguns aspectos dessa
sociedade sero apontados em funo da contribuio que oferecem para a anlise dos
outdoors realizados por Leirner em 1968.
Ditadura Militar
A dcada de 1960 inicia-se herdando parte do otimismo e euforia da dcada anterior.
Sob a situao poltica turbulenta com a renncia do ento presidente Jnio Quadros e com as diiculdades colocadas para que Joo Goulart se tornasse seu sucessor,
vive-se um perodo de efervescncia cultural e intenso debate poltico. Essa situao
modiica-se radicalmente com o golpe militar.
Em 1964, os militares, apoiados por setores empresariais e da classe mdia, do um
golpe de Estado e assumem o comando do Brasil. O regime que aparenta ter um carter provisrio se enrijece cada vez mais. Em 1968, como fruto de disputas internas do
governo, setor mais autoritrio dos militares assume o poder.
O ano de 1968 merece destaque na Histria Brasileira no somente pelos relexos das
55
agitaes polticas que ocorriam em todo o mundo, mas principalmente pelos fatos
polticos ocorridos no pas. Trata-se de um ano marcado por conlitos entre movimentos sociais e o governo golpista. De um lado o governo militar que cada vez mais
revela seu carter autoritrio e suas pretenses de passar um longo perodo no poder.
Do outro lado o movimento estudantil que o primeiro movimento social a conseguir
se organizar nacionalmente para combater a Ditadura. O movimento estudantil oferece especial interesse para esta pesquisa por ser um elemento aglutinador de intelectuais e artistas. O primeiro semestre do ano de 1968 marcado por manifestaes e
confrontos com a polcia em So Paulo e Rio de Janeiro, dentre os quais se destacam
o assassinato do estudante secundarista Edson Lus pela Polcia Militar, a Sexta-feira
Sangrenta e a Passeata dos Cem Mil. No segundo semestre deste mesmo ano podemos
destacar a violenta invaso da Universidade de Braslia pela polcia, a Guerra da Maria Antnia e a priso de centenas de estudantes durante o XXX Congresso da UNE,
organizao j na clandestinidade (Valle et all., 1999).
Essa srie de conlitos culmina ento no grande marco do enrijecimento do governo
militar: o Ato Institucional nmero 5. No dia 13 de dezembro de 1968 promulgado o
AI-5 que amplia os poderes do presidente a nveis inimaginveis ao mesmo tempo que
cerceia os direitos civis. O Poder Executivo pode ento cassar mandatos, suspender
direitos polticos, demitir ou aposentar funcionrios pblicos, intervir nos estados
e municpios e fechar provisoriamente o congresso nacional. Os ltimos anos dessa
dcadas so marcados ento dura represso exercida pelo governo, que amplia seu
carter autoritrio.
56
Ortiz utiliza-se ento dessa noo de indstria cultural para analisar o desenvolvimento da comunicao e da arte no Brasil, identiicando as dcadas de 1960 e 1970
como o perodo de consolidao da indstria cultural brasileira. O autor ainda aponta
que o governo militar imps ao pas uma censura que cerceou a produo cultural, ao
mesmo em que tempo foi grande incentivador e inanciador dessa indstria cultural.
Junto do o veloz desenvolvimento dos meios de comunicao tambm ocorre o aumento dos investimentos em publicidade. Se em 1964 eram investidos Cr$ 152.000.000,00
em propaganda no Brasil, em 1968 esse nmero cresce para Cr$ 960.000.000,00 e chega a Cr$ 3.460.000.000,00 em 197231.
Esse acelerado crescimento da publicidade e a consolidao da indstria cultural so
elementos signiicativos na anlise dos outdoors de Leirner. O artista se apropria de
meios publicitrios em meio a um contexto em que a publicidade cresce desenfreadamente e exerce cada vez mais poder sobre a populao.
Contracultura/sexualidade
Outro elemento presente no contexto brasileiro no qual o trabalho de Leirner foi elaborado a contracultura, que se inicia no inal dos anos 1960 e tem seu auge no comeo dos anos 1970. Inluenciado por movimentos de contracultura nos Estados Unidos
e na Europa, surge no Brasil um grupo composto principalmente por jovens da classe
mdia que negam a racionalidade da modernizao autoritria e buscam subjetivar as
relaes humanas. Nessa busca trazem dois elementos marcantes para a contracultura: o uso de drogas e a libertao sexual. Outro fator ligado a esse contexto foi o incio
da difuso da plula anticoncepcional.
Se uma parcela dos jovens optam pela militncia poltica como reao ditadura militar, especialmente organizando-se em torno do estudantil, outra parcela v no movimento hippie uma alternativa ao modelo de conduta imposto pela Ditadura. O primeiro grupo acusado pelo Estado e por parte dos meios comunicao de subversivo,
traidor e terrorista, o segundo grupo taxado de perdido, doente e drogado. O desejo
do governo militar por controle e padronizao das condutas individuais chegaram a
atribuir carter patolgico a ambos os grupos. As intenes polticas so maquiadas
por argumentos mdicos, ento Desqualiicam-se e patologizam-se, assim, aqueles
que fazem oposio ao regime militar, que resistem ao terrorismo do Estado: so doentes e preciso trat-los (Coimbra, 1997: 434) .
O Estado condena a libertao sexual utilizando-se de argumentos moralistas, mas ao
mesmo tempo, de maneira contraditria, decisivo na consolidao da indstria cultural
que cada vez mais se utiliza da sexualidade como produto, substituindo a moral catlica
pela moral do mercado.
Mesmo com esse processo iniciado, ao exibir imagens de uma mulher em orgasmo
num outdoor, o trabalho de Leirner ainda mostra-se ousado se levarmos em considerao, por exemplo, que o primeiro orgasmo da teledramaturgia brasileira apresentado somente em 1979, por meio da analogia proposta na ilmagem de um punho
31
A Televiso Brasileira. Mercado Global. Nmeros 31/32. ano 3. 1976. p. 20. (apud Ortiz, 1991: 130).
57
O fato da censura ser menor nas artes visuais no deve levar concluso de que ela no
existiu, pois ela de fato ocorreu. Sua repercusso aparece tanto na produo artstica
quanto nos depoimentos de artistas atuantes no perodo. Alguns desses eventos foram registrados e indicam a grande relevncia da censura neste meio. Em 1965, uma
obra vetada na exposio Proposta 65. Em 1967, a comisso julgadora tem que
intervir para evitar a retirada de alguns trabalhos do IV Salo de Arte do Distrito
Federal e ainda no mesmo ano algumas obras so retiradas do I Salo de Ouro Preto
antes mesmo de serem julgadas. Em 1968, fechada a II Bienal Nacional de Artes Plsticas (MAM/Bahia). Em 1969, fechada a exposio no MAM/RJ dos artistas que iam
representar o Brasil na Bienal de Paris. Nesse mesmo ano, Mrio Pedrosa, ento Presidente da Associao Brasileira de Crticos de Arte, publica em um jornal um texto
criticando e denunciando a censura. O texto foi assinado com um pseudnimo. Ainda
em 1969 inicia-se um boicote internacional a Bienal de So Paulo que contou com a
participao de artistas brasileiros e estrangeiros. (Reis, 2006: 58-59)
59
Concluses
Outdoors nas ruas de So Paulo, um trabalho que oferece uma viso privilegiada das
transformaes sociais que ocorrem no Brasil de 1968. Subverso, publicidade e sexualidade esto presentes no trabalho e ligam-se a aspectos caractersticos desse
perodo: controle social exercido pelo Estado, a consolidao da indstria cultural
brasileira e revoluo sexual.
O contexto do campo artstico tambm aparece de forma evidente no trabalho: um
novo olhar sobre a igurao, a experimentao de novos suportes e interao da
arte com o luxo urbano so algumas dessas caractersticas. Alm dessas, a inluncia da Arte Pop tambm latente, essencialmente em aspectos formais. J na sua
dimenso poltica o trabalho de Leirner difere-se do niilismo da Arte Pop por sua
postura propositiva.
A relao arte e poltica, to debatida nesse perodo, tambm est presente no happening de Leirner. Embora os outdoors no tematizem uma denncia ou bandeira
poltica, a atitude de utilizar um suporte da indstria cultural para gerar um rudo
que efetivamente atinja a populao j suiciente para evidenciar o tom poltico do
trabalho. Leirner airma ento a subjetividade e a individualidade em contraposio a
um regime homogenizador e massiicador.
importante aqui diferenciar a noo de uma arte politizada ou subversiva de arte
com aspiraes socialistas ou comunistas, correntes ideolgicas muito latentes nos
anos 1960. As formas e origens da oposio a ditadura so diversas. To variadas
quanto as origens dessa oposio so as ideologias que a guiam, sendo que somente
uma parcela desse grupo critica o sistema capitalista. Dessa forma, essencial para
a compreenso desse perodo histrico o entendimento de que nem toda produo
artstica que se opunha quele regime poltico se opunha tambm ao regime econmico vigente. Sem dvida os outdoors de 1968 so politizados e subversivos, mas no
tratam diretamente do sistema econmico vigente.
Nelson Leirner no realiza um trabalho que tenciona o modo de produo nem que
denuncia a ditadura militar, mas politizado na medida em que promove uma postura contrria a hegemnica, propondo uma nova relao com a publicidade, com a
sexualidade e com a arte. Para tal, o artista utiliza tanto recursos temticos quanto
recursos formais que no projeto apresentam-se indissociveis. Outdoors nas ruas de So
Paulo depe contra a noo de oposio entre arte de valor esttico e arte poltica.
Nesses trabalho o ndice poltico extrapola a temtica e manifesta-se tambm na experimentao de linguagem.
60
Referncias
Amaral, Antonio Henrique, Antonio Henrique Amaral: depoimento, 10 de janeiro de 2011, Portal Digestivo
Cultural. Disponvel em http://www.digestivocultural.com/
entrevistas/entrevista.asp?codigo=41&titulo=Antonio_Henrique_Amaral>. Acessado em 09 de maio de 2011.
Entrevista concedida a Jardel Dias Cavalcanti, Marcos Ribeiro, Dcia Foster e Sergio Niculitcheff.
Amaral, Aracy, Qual o lugar da arte? in Nador, Mnica e Luciana Brito, Arte na Rua 2, Catlogo do projeto,
So Paulo, Museu de Arte Contempornea da Universidade de So Paulo. Novembro de 1984, pp. 3 a 6.
Coimbra, Ceclia Maria B., Algumas prticas Psi no Brasil do Milagre in Freire, Alpio, Izaas Almada e J.
A. de Granville Ponce (orgs), Tiradentes: um presdio da ditadura: memria de presos polticos, So Paulo, Scipione,
1997, pp.423 a 430.
Baravelli, Luiz Paulo, Carta ao Museu de Arte Contempornea da Universidade de So Paulo in Arte em
Revista, So Paulo, n 8, 1984, p.55.
Ferro, Srgio, Os limites da denncia in Rex Time, So Paulo, Nmero 4, 10 de maro de 1967, p. 3.
Hamburguer, Esther, Teleico nos anos 70: interpretao da nao in: Anos 70: trajetrias, So Paulo,
Iluminuras, 2005, pp. 47 a 52.
Leirner, Nelson, A volta do po e circo: depoimento, Julho de 2002, Jornal do Museu de Arte do Rio Grande
do Sul , Nmero 18. Disponvel em <http://www.margs.rs.gov.br/ndpa_sele_nelson.php>. Acessado em 09 de maio de
2011. Entrevista concedida a Ana Maria Brambilla e a Flavio Gil.
Ortiz, Renato, A moderna tradio brasileira, So Paulo, Brasiliense, 1991.
Reis, Paulo R. O., Arte de vanguarda no Brasil: os anos 60, Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 2006.
Site oicial do artista Nelson Leirner. Disponvel em <http://www.nelsonleirner.com.br>. Acessado em 09
de maio de 2011.
Valle, Maria Ribeiro do, 1968, o dilogo a violncia: movimento estudantil e ditadura militar no Brasil, Campinas,
Editora da Unicamp, 1999.
61
Introduo
As prticas artsticas dos anos 1960 demandavam uma nova relao entre artista, obra
e pblico. A recepo, elevada categoria de participao, ganhou o status de ato
criativo, formulao que expressa o projeto de transferir para o pblico a percepo
e o poder criador, antes exclusivos do artista. Grosso modo, induzir o pblico a rever
sua experincia existencial era o horizonte destas prticas artsticas participativas.
Decorridas algumas dcadas, vivemos uma poca em que as propostas de interao
so onipresentes: a cultura exige uma postura ativa permanente do pblico, no
sentido da promoo de experincias (termo que absorveu um claro deslizamento
semntico). Neste novo universo interativo, o sentido original da proposta de participao esmaeceu-se e proposies participativas daqueles anos parecem perder
muito de sua efetuao, passando a igurar como aes de representao.
No entanto, houve nas dcadas recentes uma signiicativa continuidade na experimentao artstica que desenvolve ambientes e pesquisa o comportamento, conluindo em propostas nas quais o pblico convidado a percorrer espaos, a agir e reletir.
Notam-se, porm, mudanas fundamentais em suas estratgias, objetivos, e mesmo
em sua potica. Observamos o abandono das expectativas utpicas de seus predecessores da dcada de 1960, em favor de uma postura desencantada, mas mais relexiva.
Tendo este contexto como pano de fundo, o presente artigo pretende reletir sobre projetos de Dan Graham, Ana Tavares e Antoni Muntadas, e a renovada vontade da arte
de trabalhar a experincia do espao, dirigida, nestes casos, para o exame de aspectos
funcionais e/ou simblicos, locais e globais, que compem a cidade contempornea.
Neo-vanguarda e utopia
A caracterstica que pode alinhavar boa parte das tendncias artsticas emergentes
nos longos anos 1960-70 a procura por outra inscrio social da arte, conduzida pela
aposta na superao da experincia da obra de arte, reduzida pelo alto-modernismo
ao ato de contemplao dentro do espao do cubo branco. A re-insero da arte passava necessariamente pela re-avaliao da igura do artista, da produo da arte e especialmente da recepo do pblico. Cada termo desta trade - artista, obra e pblico
foi, ento, problematizado (em maior ou menor medida) na produo experimental
do perodo, e sua articulao cuidadosamente re-avaliada. Um dos rumos mais frteis
62
que tomou esta corrente de experimentao foi a busca por uma arte que concedesse
importncia recepo, originando a solicitao da recepo ativa do pblico.
Caracterstica deste cenrio foi a aceitao das idias do livro de Umberto Eco,
Obra Aberta (Opera Aperta, 1962). Para o autor, se o signo artstico por natureza
aberto, o signiicado s se realiza na interpretao do receptor. este ltimo que,
de fato, inaliza a obra. O mesmo horizonte reaparece nas formulaes de Roland
Barthes em O prazer do texto (Le plaisir du texte, 1973) que, pela oposio entre
texto de prazer e texto de gozo, realizavam a crtica ao texto meramente legvel em favor do texto escritvel, trazendo as marcas de um projeto semelhante,
transferir o ato da criao para o pblico. Pensando a partir do clssico sistema geral de comunicao de C. Shannon, emisso/meio-mensagem/recepo, estas novas
prticas artsticas propunham um deslocamento do foco da criao, antes voltada
para a relao emissor-meio (artista/obra), para a relao meio-recepo (obra/pblico) tornando o receptor o ator do processo.
Estava claro que o ponto desta prtica artstica era gerar transformaes no comportamento do pblico, vrias experincias procuraram tirar partido da ativao do ato
da recepo: desde as derivas situacionistas, objetos manipulveis (Blides) e proposies ambientais de Hlio Oiticica, os objetos e ambientes sensibilizadores de Lygia
Clark, os happenings de Allan Kaprow, as aes e construes, registradas em vdeos
por Matta-Clark, ou ainda as reinvenes Fluxus das mais banais atividades cotidianas. Nestas experimentaes artsticas das neovanguardas utpicas orientadas crtica e a reinveno dos comportamentos, o espao em suas mais diversas acepes,
ambiental, arquitetural, comunal, pblico - surge como materia-prima decisiva, pela qual as opes estticas da obra pretendiam catalizar aes micropolticas
nos sujeitos experienciadores.
64
No entanto, em paralelo a esta inlexo econmica das experincias, o campo artstico no abriu mo da continuidade da experimentao artstica que lana mo
tanto da criao de ambientes, quanto do envolvimento da participao do pblico
e seu comportamento, em direo a outras formas de ativao do pblico ainda no
cooptadas. Tratou-se de, por contrrio, deste dentro deste campo cultural menos
polarizado, tomar como o prprio objeto da arte este campo cultural e as instncias
espaciais que lhe do suporte. neste ponto que se pode notar, desde duas dcadas,
estar em engrendamento uma importante inlexo: nas propostas de artistas como
Dan Graham, Antoni Muntadas e Ana Tavares, as estratgias empregadas, objetivos
e mesmo poticas apontam para um importante redirecionamento, o qual procura
responder s novas demandas da cultura sobre o indivduo.
Nos trabalhos destes artistas, ao mesmo tempo em que se pode observar o abandono
das expectativas utpicas anteriores, v-se a determinao de trabalhar a partir da
experincia proporcionada por espaos presentes no cotidiano contemporneo. Neles, cabe ao pblico, ao invs de agir criativamente, percorrer, experimentar, reletir
sobre espaos que recriam outros, presentes na contemporaneidade.
No sentido de delinear gradientes deste ponto de inlexo entre utopia e distopia e
entre experincia e suspenso, iremos retomar questes trabalhadas por estes artistas, visitando alguns de seus ambientes.
Primeiramente, visitaremos a sala criada por Dan Graham para a Bienal de Veneza
(1976), que, embora ainda carregada de certa carga utpica, j se implantava como um
instituio, para, a seguir, examinar sua casa do subrbio (1978), que se conigura
como interveno em plena cidade. Passaremos para o ambiente montado por Antoni
Muntadas na 51.Bienal de Veneza (2005). Por ltimo, analisaremos Visiones Sedantes
(2000 e 2002), lounges recriados por Ana Tavares, em duas ocasies: na VII Bienal Internacional de Havana, em Cuba, e no Espao Fiesp, na Avenida Paulista, em So Paulo.
Graham parece estar tambm dialogando com os tericos da ciberntica tema em voga
naquele perodo, como tem sido retomado contemporaneamente - pela possibilidade da
incluso em um determinado sistema de uma relexividade sujeito-objeto, como a de
observadores observando observadores observando-se. (Heylighen; Joslyn, 2001: 4)
Aesta aparatos, proto-arquitetnicos, seguiram-se propostas urbanas, redimensionamento
de preocupaes anteriores. Como encarava espao, arquitetura e cidade como estruturas
de informao e instncias decisivas na constituio da subjetividade, Graham logo se deu
conta da permeabilidade entre espaos da cidade e da arte:
Depois de ter feito Public Space/Two Audiences, percebi que a pea era
demasiadamente perfeita. Ela funcionava porque l havia uma parede
branca, e oposta a ela, uma parede espelhada. Eu iquei imaginando sobre o
que aconteceria se eu retirasse a parede branca. Ela viraria uma arquitetura
(Graham in Colomina, 2001: 19).
66
econmica da cidade pode ser conferido como imagem, desde um local confortvel
privilegiado, ao som de bossa nova instrumental.
O lounge, dentre outros dispositivos espaciais utilizados por Ana Tavares, diz respeito diretamente aos modos de percepo contemporneos. Para ela, o sujeito contemporneo
igura nos espaos pblicos desconectado (Tavares, 2000: 29). Este estado de desconexo seria uma forma do indivduo se resguardar de condies ameaadoras da vida na
atualidade. Imerso no contexto urbano, o sujeito permanece em constante estado de alerta
em funo da sua conscincia dos riscos que corre, passando a sofrer um esgotamento
fsico e emocional. Em determinado grau, este estado se reverte em outro tipo de manifestao, de anestesiamento, indiferena e distrao:
[] a distrao no entendida aqui como uma desateno ou uma ao
descuidada. Ela deve ser vista como um alheamento ou desvio, um estado de
esprito que possibilita a abstrao do contexto e, conseqentemente, um
deslocamento mental no espao e no tempo. Mas a distrao no congela a
ao competente e o usurio permanece potencialmente ativo (Idem).
Pode-se considerar que, para esta artista que re-elabora constantemente questes
sobre o espelhamento, o lounge converte-se em um tipo de espelho ampliado. Referenciando-se em Foucault, Ana Tavares toma o espelhamento como uma experincia
mista e intermediria entre utopia e heterotopia:
As utopias so fundamentalmente espaos irreais; so sites que no se
constituem a partir de um lugar concreto, que se caracterizam por estabelecer
com a sociedade uma analogia direta ou inversa, a apresentar a realidade de
forma perfeita, ou mesmo a sociedade ao revs. As heterotopias podem ser
deinidas como contra-sites, ou seja, lugares reais que caracterizam pela
excluso do conjunto de todos os demais sites reais de uma dada cultura e tm
a caracterstica de, simultaneamente, represent-los, contest-los ou invertlos. So utopias efetivamente atuadas (Idem: 54).
As experimentaes da neo-vanguarda, com as quais comeamos este texto, condensavam as mais altas expectativas utpicas daquela poca: mudanas comportamentais, na sociabilidade, nos sentidos dados ao espao/tempo. A arte, como canal para
70
a expresso de anseios, materializava novas possibilidades. Hoje, em contraste, vivemos um momento de esvaziamento das energias utpicas.
Terry Smith (2009) enxerga nisto uma oportunidade, uma vez que agora caberia
arte a tarefa de lanar o que chama de, tomando a expresso emprestada de Fredric
Jameson, uma interrogao sobre a ontologia da contemporaneidade: abrir-se indagao sobre o momento presente. Procurando deini-la, Smith lembra primeiro que
a contemporaneidade, em parte, emerge do descrdito em que foram lanadas as grandes narrativas que deram fundamento arte moderna. No vazio resultante, resta
assumir que, as produes artsticas contemporneas
podem ser no mais que provisrias, como suas expectativas sobre as respostas.
Testadoras provocativas, gestos de preenchimento de dvidas, tentativas
de projeo de objetos ambguos, propostas hesitantes ou antecipaes
esperanosas: estas so as formas mais comuns de arte hoje (Smith, 2009: 2)33.
Vale destacar que o aparecimento de tal condio ocorre par-e-passo com a mudana
recente e fundamental, grifada pelo prprio autor, na forma de acumulao capitalista
globalizada e as mltiplas reverberaes que teve no territrio, na cultura e na sociedade. Como tambm no sistema da arte: nova insero social da arte (cada vez mais
permeada pela lgica da mercadoria), reconigurao dos circuitos, apagamento de
fronteiras entre campos do conhecimento e entre os agentes da cultura, dentre outros.
entre tais tticas, nesta nova condio da arte, frente conjuntura da incorporao da cultura produo material - situao analisada criticamente por Jameson em
Ps-modernismo: a lgica cultural do capitalismo tardio (1996) -, que as prticas
artsticas re-encontram o espao, disposto em outra condio, de progressivo abandono das solues vinculadas ao modernismo, em favor de toda uma gama de projetos
de espacialidades comunicativas, interativas, experienciais. Aqui parece ocorrer,
no ato de escalavrar as condies prprias s espacialidades contemporneas, a inlexo apontada anteriormente neste texto em direo s distopias suspensas.
As espacialidades hoje construdas esto atravessadas por toda sorte de informao.
Fazem-se cada vez mais onipresentes ambientes (os concretos, tridimensionais, os
virtuais, e ainda, hbridos resultantes) carregados de mensagens. Espacialidades altamente desenhadas, prenhes de signiicados, com diferentes discursos inscritos em
sua conformao, desde discursos funcionais, passando pelos formais at os de seduo explcita ou discreta induo.
Como se sabe, as teses de Sociedade do Espetculo j apontavam para uma situao
que pode ser descrita como a da colonizao da vida cotidiana por imagens. A
metfora implcita poderosa - uma sociedade saturada por imagens prenhes de
discursos. Hoje, espao e imagem conluem at se confundirem.
33
can be no more than provisional as to its expectations about answers. Provocative testers, doubt-illed
gestures, equivocal objects tentative projections, difident propositions or hopeful anticipations: these are the most
common forms of art today.
71
Os trabalhos destes trs artistas interrogam a ontologia da contemporaneidade a partir da apropriao destas novas espacialidades na atual situao de grandes metamorfoses nos espaos sociais. Uma situao de crescente reconigurao dos espaos pblicos em espaos mediados e controlados por aparatos tcnicos. Dan Graham procurou evidenciar o peso dos discursos naturalizados no sonho de morar nos subrbios,
ou em dispositivos como a cortina de vidro, espelhos, cmeras de vdeo, a televiso,
cuja inluncia sobre o comportamento no pode ser menosprezada.
Este mundo, cada vez mais construdo, guarda ainda outra dimenso, apontada por
Marc Aug (1994), a das transformaes aceleradas pelo que chama de iguras de
excesso que determina novos modos de apreenso e interpretao do mundo: excesso de tempo (multiplicao de acontecimentos, superabundncia factual), excesso
de espao (encurtamento de distncias, visualizaes instantneas e simultneas) e
excesso de individualismo (produo individual de sentido em meio mundializao
da cultura). Este universo de excessos se traduz em concretas modiicaes das concentraes urbanas e das transferncias de populao e, principalmente, na multiplicao daquilo a que Aug nomeia como no lugares:
Os no lugares so tanto as instalaes necessrias circulao acelerada
de pessoas e bens (vias expressas, trevos rodovirios, aeroportos) quanto os
prprios meios de transporte ou os grandes centros comerciais, ou ainda os
campos de trnsito prolongado onde so alojados os refugiados do planeta. (...)
V-se bem que por no lugar designamos duas realidades complementares,
porm, distintas: espaos construdos em relao a certos ins (transporte,
trnsito, comrcio, lazer) e a relao que os indivduos mantm com esses
espaos. Se as duas relaes se correspondem de maneira bastante ampla e,
em todo caso oicialmente (os indivduos viajam, compram, repousam), no
se confundem, no entanto, pois os no lugares medeiam todo um conjunto de
relaes consigo e com os outros que s dizem respeito indiretamente a seus
ins: assim como os lugares antropolgicos criam um social orgnico, os no
lugares criam tenso solitria (Aug, 1994: 36-87).
O trabalho de Ana Tavares se planta nesta nova paisagem urbana de ambientes re-estetizados, seus lounges - ocupados por convidativas poltronas, imagens e som ambiente, so destinados ao relaxamento, sonho e ao torpor. Suas instalaes explicitam os
objetivos dos espaos destinados espera, pausas essenciais para o bom andamento
da produo material, encontrando neles uma paradoxal potica. Aludem crescente
participao do design na conformao formal nas mais nimas parcelas da vida cotidiana, mas lanam luz o fenmeno da inlao contempornea do esttico. Mas no
desde uma posio exterior, e sim do ponto de vista de algum cuja vida transcorre
no interior destes espaos: o prprio nmade globalizado que passa a se reconhecer
nestes espaos genricos e ao mesmo tempo aconchegantes e protetores.
Enquanto seria possvel pensar em traos comuns a Graham e Muntadas com a
chamada institutional critique dos anos 1970 e arte apropriacionista americana dos
anos 1980 - entre eles, Cindy Sherman, Barbara Kruger, Krzysztof Wodiczko34 distingue-os o interesse pelos discursos implcitos nos mais variados dispositivos
espaciais. Mais especiicamente, como demonstram as obras, pela estratgia de rplica do real, complementada pela adio de rudos (traos que podem ser estendidos tambm Ana Tavares).
Segundo Boltansky e Chiappello (2002), uma das caractersticas mais distintivas da
ltima metamorfose dos modos de produo do capitalismo foi a incorporao da
crtica social e artstica originrias de anseios presentes nos anos 1960 e 70: a conigurao de equipes colaborativas, a liberdade de conigurao de relaes entre
trabalho e vida, a participao nas tomadas de decises, a incorporao das criatividades, entre outras. Dentro destas circunstncias, que estratgias esto sendo pensadas para dar continuidade pesquisa artstica, que incorporem a relexo e a crtica,
inclusive prpria posio da arte, quando os mesmos dispositivos esto em disputa?
A resposta destes artistas a esta incorporao perversa foi sutil e complexa. Manteve-se a participao do pblico como elemento estruturador da obra, mas foi rebaixada a emotividade/euforia da resposta esperada, redescobrindo uma paradoxal
forma de contemplao: em seus espaos, o pblico se auto-observa, percorrendo,
utilizando, consumindo os ambientes, visitando uma exposio (atividade imaginativa, relexiva, se no crtica).
Esta fatia da arte contempornea foi produzida a partir da emergncia de novas coniguraes espaciais, comportamentos e percepes, cuja extrema estetizao contrasta com o rebaixamento da experincia (no sentido benjaminiano) no cotidiano.
Dentro deste quadro, o interesse passa a residir na indagao sobre a capacidade da
34
Krzysztof Wodiczko, em Strategies of Public Adress: Which Media, Which Publics? (1987), elaborou o programa:
Ao crtico-airmativa sobre a arte e suas instituies; manipulao de crtica e auto-crtica do seu sistema cultural. Ataque artstico
sobre a arte como um mito da cultura burguesa, a exposio crtica dos elos estruturais ideolgicos entre as instituies da cultura burguesa
- poltica, tica, ilosoia, etc. (...) Ao crtico-airmativa na vida cotidiana e em as suas instituies (educao, design, meio ambiente,
espetculo e os mass media, etc), a transformao crtica da cultura a partir de dentro. Colaborao crtica com instituies de massa
e meios de comunicao pblicos, design e educao, a im de elevar a conscincia (ou o inconsciente crtico) sobre a experincia urbana:
ganhar espao e espao em informao, publicidade, outdoors, luminosos, metrs, monumentos e prdios pblicos, de televiso por cabo
e canais pblicos, etc, pensando no espectador passivo, no habitante urbano alienado. Inluncia dos estudos culturais, reforada
pela crtica feminista da representao (Wodiczko, 2009: 124-127).
73
Referncias
Art & Engineering: The Legacy of Billy Klver and E.A.T. http://www.zakros.com/kluver/artengineer.html
Acesso em 12 de agosto de 2007.
Boltansky, Luc e Eve Chiapello, El nuevo espritu del Capitalismo, Madrid, Akal, 2002.
Colomina, Beatriz, Mark Francis e Birgit Pelzer, Dan Graham, New York, Phaydon Press 2001.
Foster, Hal, El retorno de lo real. La Vanguardia a inales de siglo, Madrid, Akal, 2001.
Graham, Dan, Dan Graham, Flash Art, no. 152, p. 143, May/Jun 1990, Entrevista concedida a Daniela
Salvioni.
Heylighen, Francis e Cliff Joslyn, Cybernetics and Second-Order Cybernetics in R.A. Jameson, Fredric,
Ps-modernismo: a lgica cultural do capitalismo tardio, So Paulo, tica, 1996.
Klingmann, Anna, Brandscapes: Architecture in the Experience Economy, Cambridge, MIT Press, 2007.
Meyers (ed.), Encyclopedia of Physical Science & Technology (3rd ed.), New York, Academic Press, 2001.
Pine II, Josep e James Gilmore, The experience economy: Work is theatre and every business a stage,
Cambridge, Harvard Business School Press, 1999.
Tavares, Ana Maria, Armadilhas para os Sentidos: Uma Experincia no Espao-Tempo da Arte. Tese de doutorado.
So Paulo, ECA-USP, 2000.
Santos, F.L.S. e G. R. Almeida, Dan Graham: Olhar/ corpo, vidro/ espao, percepo, cotidiano e cidade in
Encontro de Histria da Arte, Unicamp, Campinas, 2010.
Schmitt, Bernd, Marketing Experimental, So Paulo, Nobel, 2002.
Shedroff, N, Experience Design, Indianpolis, New Riders, 2001.
Smith, Terry, What is Contemporary Art, Chicago, London, The University of Chicago Press, 2009.
Sperling, David M., Experiencie! in Agnaldo Farias e Fernandes Fernanda (org.), Arte e Arquitetura. Balano
e Novas Direes, Braslia, Fundao Athos Bulco, Editora Universidade de Braslia, 2010, v. 01, p. 107-117.
Sperling, David M. e Santos, Fbio. L. S., Ateno: A percepo requer empenho. Entrevista com
Antoni Muntadas in Risco, 2006, v. 4, p. 124-148.
Wodiczko, Krzysztof, Strategies of Public Adress: Which Media, Which Publics? in Doherty, Claire (ed.), Situation.
Documents of Contemporary Art, The MIT Press, Cambridge, 2009, pg. 124-127.
74
AMPLOS CIRCUITOS:
A obra fora do museu
Michel Masson35*
UFRJ/FAU
Ivvy Pessa Quintella
UFRJ/FAU
75
AMPLOS CIRCUITOS
Caracterizada notadamente por sua dinmica experimental e por sua diversidade potica, a produo artstica na dcada de 1970 parece ter tido como trao comum o entendimento da arte como um campo de exerccio crtico e de liberdade40. Cada proposta
exigia um modo de expresso adequado, o que se reletiu numa ausncia de padres e
numa averso ao estilo. Isso signiicou, dentre outras coisas, uma nfase no processo de
produo, tornado agora estratgico, mvel e dinmico. Da, por exemplo, a utilizao/
interpenetrao de diversas mdias fotograia, vdeo, objetos, instalao, livros e cadernos, bem como a introduo de um vasto repertrio de materiais ordinrios retirados
do mundo urbano contemporneo, muitas vezes evocando toda uma dimenso simblica vinculada ao imaginrio urbano.
Por outro lado, os locais de atuao tambm se diversiicam, indo dos espaos institucionais da arte cidade. Diversos trabalhos passaram a ser realizados no contexto
urbano, em esquinas, terrenos baldios, matas, dentro dgua, nas geograias do apartamento, e em museus, salas de concerto (Ferreira, 2000: 8) ou na paisagem natural,
num movimento de expanso para fora dos limites institucionais, o que consequentemente se reletiu em trabalhos que passaram a assumir estratgias alternativas de
veiculao, a partir da identiicao/apropriao dos meios de circulao disponveis.
Nesse sentido, so exemplares os trabalhos: os Flans (1968-1975) de Antnio Manuel,
os Outdoors de Nelson Leirner, DEFL....... - Situao - + S + .......Ruas ...... (1970) de Artur Bairro e as Inseres em circutos ideolgicos (1970) de Cildo Meireles. Mas antes de
analisarmos mais detalhadamente alguns desses exemplos, proponho nos determos
em alguns trabalhos realizados por Helio Oiticica e Lygia Clark que, atravs do seu
experimentalismo, fornecem antecedentes a esse deslocamento da obra para fora do
espao institucional da arte.
elas, o apoio s poticas artsticas experimentais crticas. Eram alternativas presso exercida pelo mercado de arte hegemonicamente
conservador e s instituies oiciais de arte atreladas de alguma maneira ao regime militar, como a Bienal de So Paulo, o Salo de Arte
Moderna e o Salo Nacional (Idem).
40
Essa produo no deixa de ter levado s ltimas consequncias a ideia do crtico de arte Mrio Pedrosa
lanada mo no incio da dcada de 1960, em referncia a todo um conjunto de artistas que levara ao limite o projeto
construtivo brasileiro, da arte como exerccio experimental da liberdade.
41
Guardadas as devidas diferenas, ambos procuraram explorar um conceito de arte prximo vivncia,
criando propostas de contextos comportamentais. O artista no ento o que deslancha os tipos acabados, mesmo que
altamente universais, mas sim prope estruturas abertas diretamente ao comportamento, inclusive propor propor, o que
importante como consequncia (Oiticica, 1986).
76
lio em frente ao MAM-RJ, durante a mostra Opinio 6542. A partir de ento, outros
exemplos se seguiram: em 1968, a manifestao, junto a outros artistas, com o estandarte Seja Marginal, Seja Heri na Praa General Osrio em Ipanema e, no mesmo
ano, a manifestao coletiva Apocalipoptese no Aterro do Flamengo (MAM-RJ). Tais
investidas claramente procuraram extravasar as molduras institucionais e tiveram
como outra face da moeda a investigao das possibilidades de integrao da arte na
coletividade, um campo que veio a ser explorado por uma nova gerao de artistas
durante a dcada de 197043.
A relao de Hlio com o campo institucional da arte por demais complexa e no
deve ser reduzida a uma simples busca por espaos alternativos, no apenas porque o
artista sempre procurou controlar a recepo de seus trabalhos, determinando cuidadosamente o modo como deveriam ser exibidos, mas tambm porque usou o contexto
institucional de modo a transgredir o modelo de exibio vigente. Isso se torna claro
no Experimento Withechapel (1969), realizado na galeria de nome homnimo em Londres.
Mais do que uma retrospectiva, era um ambiente completamente integrado (Brett,
2005: 42), uma abrangente manifestao na qual os trabalhos realizados ao longo de sua
carreira podiam ser vistos uns em relao aos outros e como parte de uma totalidade que
abraou o visitante como um de seus componentes centrais (Serrota, 2007: 8).
A explorao do aspecto comportamental do observador transformado em participante levou Hlio a criar os Babylonests durante seu autoexlio em Nova York (197078), uma srie de ninhos executados no interior de seu prprio apartamento que
funcionava como uma espcie de modelo de reestrutura de convvio. Indissociveis
desse projeto e de outros desenvolvidos posteriores (como as Cosmococas) so a escrita
e as gravaes (heliotapes) que realiza no perodo, reunidas no projeto Conglomerado,
o que signiica que seu trabalho vai cada ver mais se articular num intrincamento
disciplinar, num entre plstico discursivo.
Por outro lado, a investigao de novos (e mais diretos) modos de relacionamento entre o observador e a obra empreendida por Lygia, inaugurada pela srie Bichos (1960),
tomou um caminho radical a partir do redirecionamento de seu trabalho para uma
prtica cada vez mais prxima da psicoterapia, que j se anunciava no trabalho-processo Caminhando (1963). A partir de ento, o interesse de Lygia se desloca da pintura
e escultura para a explorao de experincias multissensoriais, de modo a trabalhar a
partir de uma potica situada na fronteira da terapia com a arte, criando propostas
que dependiam do processos que mobilizavam no corpo de seus participantes como
condio de realizao (Rolnik, 2008: 17). Essa mudana do conceito de arte para
42
Hlio foi impedido de entrar com os passistas da Mangueira vestidos com os seus parangols. Em 1967,
durante a mostra Nova Objetividade Brasileira no MAM-RJ, realizou uma manifestao coletiva com parangols, capas,
poemas de Lygia Pape, com a presena dos passistas da Mangueira, de alguns artistas e do pblico. Nesse mesmo
sentido de extravasamento dos limites institucionais esto as pioneiras experincias de Flvio de Carvalho nos anos
30, prticas interdisciplinares experimentais de alto teor poltico, que buscavam a intercesso entre arte e vida a partir
do uso do corpo inserido no ambiente social. No entanto, esse um momento singular; at os anos 60, praticamente no
houve penetrao no Brasil do experimentalismo associado antiarte (Osorio, 2000: 8).
43
H um precedente na iniciativa do Grupo Rex de So Paulo que, diante da precariedade do sistema de
arte brasileiro na dcada de 60, publicou a revista Rex Time e fundou a Rex Gallery & Sons, tomando parte no sistema
institucional da arte e estabelecendo desse modo uma relao direta entre o artista e a sociedade.
77
AMPLOS CIRCUITOS
a arte como vida signiicou uma espcie de diluio da arte na vida, aproximando
a experincia da arte (ou no-arte) do cotidiano mesmo, fazendo com que a arte se
transformasse numa atividade que prescindia do circuito artstico.
Lygia e Hlio empreenderam dois modos radicais de arte, ocupando posies singulares no mbito daquilo que Brian Holmes denominou de primeira gerao da crtica
institucional, que se desenvolveu ao longo dos anos 60 e 70 em diferentes pases.44
Mas at que ponto o tipo de experincia artstica por eles proposta alcana uma dimenso pblica, mesmo que realizada no espao urbano, fora do museu, na rua, num
apartamento transformado quase em pblico a partir de uma coletividade, ou uma
instituio pblica como a Sourbonne? Mesmo em seus anseios em diluir a arte na
vida (dissoluo no indivduo, Lygia; dissoluo no coletivo, Helio), em deix-la se
contaminar pelo ordinrio e pelo cotidiano, ambos parecem ter mantido o fenmeno
artstico ao nvel de uma experincia circunscrita a esfera privada, ntima do indivduo. Tal carter eventualmente pblico da arte, portanto, no estaria garantido com a
simples realizao de trabalhos em espaos pblicos ou numa coletividade.
Tomemos o exemplo de Barrio, mais especiicamente 4 Dias/4 Noites Trabalho processo
(1970), onde, segundo Basbaum h um radical mergulho ao avesso, um lanar-se para
fora de si numa aventura temporal pela cidade (Basbaum, 2000). Se por um lado
Barrio se coloca a deambular durante quatro dia e quatro noites incessantemente,
sem dormir, fazendo-se disponvel sensorialmente para todas as situaes encontradas e procurando intervir no entorno atravs da produo de criaes ambientais,
por outro, ica claro o carter solipsista do trabalho, j que tudo se passa ao nvel da
conscincia-corpo do artista. O trabalho uma ao na cidade, e o suporte, o prprio corpo do artista. Lida com a percepo, a partir da experincia deliberada de um
caminhar catico onde existe uma sria inteno de reconstruir-se e deixar marcas
no ambiente, sinais de uma ultrapassagem de si. No entanto, em ltima instncia,
um trabalho limite, no sentido de sua quase impossvel comunicabilidade ao outro,
leitor-espectador-fruidor (Idem).
78
DEFL ........... -SITUAO- +S+ .............. RUAS .............. (1970) de Ronald Duarte.
AMPLOS CIRCUITOS
outro lado, Cildo, que assume um postura semelhante, parece operar a partir de uma
estratgia conceitual que apela mais ao inteligvel. O artista conta que durante uma
rodada de chopp num bar carioca, um amigo comentou que se um caroo de azeitona
fosse inserido no interior de uma garrafa de Coca-cola, ele jamais sairia, a no ser que
o processo mecnico de lavagem fosse alterado. Especulando a partir dessa imagem,
Cildo escreveu no mesmo dia um novo texto com as premissas do conceito de Inseres
em circuitos ideolgicos (1970): Projeto Coca-cola e Projeto cdula.45 Esses projetos se desdobraram nas Inseres em circuitos antropolgicos: Projeto black pente (1971-1973)46 e Projeto
Token (1971). Mais tarde surgiram Zero cruzeiro (1974-1978) e Zero dollar (1978-1984).
As Inseres em circuitos ideolgicos consistiam em encontrar uma falha no sistema existente e utiliz-la para fazer circular uma contra-informao (Meireles, 2009: 171):
gravar nas garrafas de refrigerantes e nas cdulas de dinheiro informaes e opinies
crticas e depois devolv-las circulao.
Perguntas como Quem matou Herzog eram carimbadas nas notas de dinheiro, do
mesmo modo que instrues sobre como fazer Inseres, de como fazer um coquetel molotov e eventualmente escritos relacionados arte questionando sobre qual o lugar do
trabalho de arte eram gravadas nas garrafas de Coca-cola, com a mesma tinta vitriicada
45
Havia tambm as Inseres em Jornais (1970). A primeira se chama Clareira, e foi um projeto de 1969 realizado
no ano seguinte. A ideia consistia em abrir uma clareira na pgina de Classiicados escrevendo com letras de tamanho
quase ilegvel rea 1. Cildo Meireles 70 numa rea proporcionalmente grande, criando uma espcie de posse territorial.
A segunda Insero em jornal se referia Amaznia, e tinha o seguinte texto: reas extensas. Selvagens. Longnquas.
Cartas para Cildo Meireles. Rua Gal. Glicrio 445 apt. 1003. Laranjeiras. GB. No entanto, entre uma e outra Insero em
Jornais, Cildo realizou o Projeto Coca-cola, icando claro para ele as limitao do jornal, pois embora tivesse uma grande
circulao, possua um circuito de controle centralizado, estando inclusive sob controle da censura.
46
Black pente nunca chegou a ser realizado, permanecendo apenas como prottipo.
80
Segundo Cildo, no se tinha mais aquele culto do objeto puramente; as coisas existiam em funo do que elas poderiam provocar nesse corpo social. Era exatamente o
que se tinha na cabea: trabalhar com a ideia de pblico, noo esta substituda pela
noo de mercado (Idem: 59). O compromisso, portanto, com o pblico, no com o
comprador, com esse rosto indeterminado, o elemento mais importante dessa estrutura. Em ltima instncia, h uma espcie de personalizao do receptor, convertido
num emissor. Justamente porque o trabalho pressupe a sua reprodutibilidade: inclui
em si mesmo, a possibilidade de sua recriao (Idem: 67), j que so estruturas lgicas
o suiciente para serem refeitas por qualquer pessoa. O interesse est em deinir um
mecanismo de troca de informaes, ao qual qualquer pessoa pode ter acesso, e que
o maior nmero de pessoas o operem (Idem: 62). A fora do trabalho , portanto, proporcional sua disseminao, a quantidade de pessoas que o reproduzem.
A escala da ao ampla. uma prtica individual frente hegemonia do poder numa
escala industrial. Um mecanismo de expresso do sujeito frente sociedade (Idem:
106) criado: uma simples garrafa de Coca-cola possibilita que um indivduo isolado qualquer atinja a macroestrutura (Idem: 171). A ao termina por demonstrar a
existncia de um espao que estava incluso, escondido e que parece mais imaterial e
abstrato ao mesmo tempo que real e palpvel. Concreto, altamente concreto (Idem:
84-85). Cildo conclui: Enquanto o museu, a galeria e a tela forem um espao sagrado da representao, tornam-se um tringulo das bermudas: qualquer ideia que voc
81
Referncias
Basbaum, Ricardo. (org.), Arte Contempornea Brasileira, Rio de Janeiro, Contra Capa, 2001.
-----------, Dentro dgua, in: Regist(R)os: Artur Barrio, Fundao Serralves, 2000.
Brett, Guy. Brasil Experimental. Arte/Vida: proposies e paradoxos, (org. Katia Maciel), Rio de Janeiro, Contra Capa, 2005.
Brito, Ronaldo, Experincia Crtica: Textos Selecionados, So Paulo, Cosac Naify, 2005.
Jaremtchuk, Daria, Espaos de Resistncia: MAM/RJ, MAC/USP e Pinacoteca do Estado de So Paulo, in http://www.iar.
unicamp.br/dap/vanguarda/artigos.html
Deutsche, Rosalyn, Evictions: art and spacial politics, Massachusetts, The Mit Press, 1996.
Duarte, Paulo Srgio, Anos 60: Transformaes da Arte Brasileira, Rio de Janeiro, Campos Gerais, 1998.
Escovino, Felipe (org.), Arquivo Contemporneo, Rio de Janeiro, 7 Letras, 2009.
Escovino, Felipe (org.), Encontros: Cildo Meireles, Rio de Janeiro, Beco do Azougue, 2009.
Ferreira, Glria e Paula TERRA, Situaes: Arte Brasileira: Anos 70, Rio de Janeiro, Fundao casa Brasil, 2000.
Ferreira, Glria e Ceclia COTRIM (orgs), Escritos de Artistas Anos 60/70, So Paulo, Jorge Zahar Editor, 2006.
Ferreira, Glria, Crtica de Arte no Brasil: Temticas Contemporneas, Rio de Janeiro, Funarte, 2006.
Herkenhoff, Paulo e Dan Cameron (orgs.), Cildo Meireles, So Paulo, Cosac Naify, 2000.
Holmes, Brian, Investigaes extradisciplinares: Para uma nova crtica das instituies, in Concinnitas, Rio
de Janeiro, UERJ, ano 9, vol. 1, nmero 12, jul, 2008.
Naves, Rodrigo, Cildo Meireles: preto sobre preto, in: O Vento e o Moinho: Ensaios sobre Arte Moderna e
Contempornea, So Paulo, Companhia das Letras, 2007, p. 476.
Oiticica, Hlio, Aspiro ao Grande Labirinto, Rio de Janeiro, Rocco, 1986.
Osorio, Luiz Camillo, Potica em Trnsito: Flvio de Carvalho, So Paulo, Cosac Naify, 2000.
Rolnik, Suely, Memria do Corpo contamina o Museu, in Concinnitas, Rio de Janeiro, UERJ, ano 9, vol. 1, nmero
12, jul, 2008.
Serrota, Nicholas, Introduo. in Brett, Guy e Luciano Figueiredo (Ed.), Oiticica in London, London, Tate Publishing, 2007.
82
A formao das vertentes artsticas instauradas no espao aberto e urbano contemporneo nos conduz investigao das frestas de passagem geradoras de seus elementos
de fundao, j dispostas pelo Modernismo. O encontro recproco entre artista-obra,
espectador e ambiente iniciados nesse momento histrico e esttico cria uma trade
dinmica que se revela como chave de compreenso da organizao da arte extramuros intensiicada pela produo artstica, a partir da dcada de 1960.
Permeada pela questo espacial, essa trade sugere forte conexo com os valores da
expresso artstica tridimensional. A primeira metade do sculo XX traz os primeiros exemplos internacionais conhecidos tais como Corner Relieve de Tatlin (1915);
Merzbau de Kurt Schwitters (1933-1943); dentre outros que, guardam em comum
a condio tridimensional pautada pela investigao de seu espao de apresentao
bem como a relao fsica do trabalho conduzida pelo encontro direto com o espectador.
Nesse sentido, a fresta apresentada encontra termo prximo num trecho de Passages
of Modern Sculpture de Rosalind Krauss no qual a autora nos apresenta uma noo
espao-temporal que colabora com a ateno dispensada aos conceitos da passagem
e da fresta como vetores das formas de arte construdas a partir do espao aberto e
urbano. No captulo que dedica escultura Surrealista, Krauss disserta sobre a idia
da fenda no espao real do mundo por meio de uma pea de Giacometti47. A fenda na realidade contnua do espao descrita por ela age como indagao sobre sua condio como
arte e sobre sua pertena ao espao museolgico. Serve-nos, assim, como elemento
para as formulaes trabalhadas nesse artigo para as novas posturas adotadas pelo
eixo da combinao estreita de: artista_obra/instituio/espao_entorno.
Na dcada de 1960, a idia da Passagem que permeia as movimentaes do encontro entre Arte Moderna e Contempornea, revela uma nova dinmica para o objeto da arte
solicitando ao artista, espectador e instituio que assumam novas posturas investigativas. Orientada pela condio da passagem, a expresso artstica tridimensional
encontra nos corredores, alm das salas de exposio, seu novo interesse. Visto como
47
Ao fazerem parte do espao real e, no entanto, estarem de alguma forma alijados deste, a bola suspensa e
a meia-lua [elementos presentes na escultura de Giacometti de 1930 intitulada Bola Suspensa] buscam abrir uma issura
na superfcie contnua da realidade. Assim, a escultura ensaia uma experincia que as vezes temos na vida acordada, uma
experincia de descontinuidade entre diferentes fragmentos do mundo (Krauss, 1988: 138).
83
um intervalo ludo e veloz entre dois espaos, o corredor simboliza uma seqncia
de escapes, iniciada pelo Modernismo, de todas as convencionalidades para a Arte. A
importncia da reordenao desses papis tambm questo formulada por Krauss
nas anlises que faz sobre as variantes formas simblicas e estruturais dos espaos na
produo escultrica desse perodo artstico48.
A presena intensiicada do corredor como forma, estrutura e simbologia nas manifestaes contemporneas de meados dos anos 1960/1970, interessa-nos como primeiro nvel espacial e temporal que reformula o contexto da apresentao e da participao dos espectadores no trabalho artstico. Entende-se que esses novos espaos de
construo da experincia artstica agem como vetores da conduo dos projetos que
deixam o espao interno dos museus e, continuando seu sentido de luxo e movimento, avanam para o espao aberto e urbano.
Voltando-nos para a produo brasileira do perodo observamos a mesma ateno
dispensada s espacialidades encontradas nas proposies artsticas estrangeiras. O
espao condio dada. Assim, o pressuposto traz os mesmos elementos para qualquer canto do globo: artista, museu, espao e espectador. Porm, encontramos nas
proposies artsticas nacionais especiicidades importantes que revelam uma condio de proximidade da instituio museolgica ao invs de seu afastamento, tal qual
ocorre no caso internacional. Essa proximidade promove um transbordamento para
a arte elaborada no campo aberto e urbano contemporneo brasileiro, possvel de ser
compreendido pelo termo extramuros.
A produo de Helio Oiticica, Cildo Meireles e Arthur Barrio nesse perodo apresenta
em suas idias construtivas e de ambincia elementos propulsores para sua relao
com o espao aberto e urbano. Meireles anuncia sua vocao pela indagao do espao logo em seus primeiros trabalhos tais como: Espaos Virtuais: Cantos (1967-68)
e Ocupaes (1968-69). Nessas estruturas a racionalidade minimalista encontra-se
claramente orientada pelos Corredores de Bruce Nauman a quem Cildo cita diretamente. Recm chegado de um perodo em Nova York, Meireles explora imagens derivadas da Geometria Euclidiana na produo em Desenho. Logo se volta para a forma
tridimensional na busca da viabilidade desses espaos dada por elementos mnimos
que intitula de ambientes escultricos tridimensionais (Mosquera et al., 1999: 10).
Ele constri uma estrutura que replica os cantos de um ambiente domstico e a sobriedade retratada pela fotograia do trabalho subvertida pela passagem de um espectador que o atravessa por um estreito corredor que nasce do encontro das paredes.
Ali, Cildo estabelece uma fresta indicativa de seu interesse pela questo espacial a se
igurar no meio urbano, em futuros trabalhos.
Helio Oiticica por sua vez, no se detm no elemento do corredor, mas permite-nos
reconhec-lo a partir de sua condio de sistema de circulao dentro dos ambientes que formam seus Ncleos e Penetrveis. Elaborados para o espao interno do
48
Dois ttulos seminais de Krauss abordam essa questo: Caminhos da escultura moderna, SP, Martins Fontes,
1998, (particularmente caps 6 e 7) e A escultura em Campo Ampliado, in: Revista Gavea, n. 6, PUC, RJ, 1988, pp.87-93.
84
Museu, esses trabalhos tem como projeto, desenhos tcnicos feitos a mo, em papel
milimetrado, nos quais as seces dos mdulos que os constri evidenciam vetores de
deslocamento do espectador dentro de ambientes ordenados por placas de cor, vasos
de plantas, pedregulhos e tecidos. Os Ncleos e os Penetrveis so compreendidos
como campos de ao nos quais o artista efetiva sua pesquisa experimental da cor, da
ambincia, da participao do espectador que os ativa como obra artstica quando deles participa. Celso Favetto faz importante distino entre esses trabalhos, ressaltando que os Ncleos restringem-se percepo da cor enquanto que os Penetrveis
permitem a explorao total da sensorialidade que se irma como uma das principais
marcas do trabalho de Oiticica (Favaretto, 2000: 65). Movimento e envolvimento so
chaves para o trabalho de Oiticica e seu direcionamento para novas esferas espaciais.
Assim tambm, Movimento e envolvimento pressupem a requaliicao do estatuto
da arte exposta dentro do museu e o prprio alcance que pode tomar o projeto artstico a partir de ento.
certo que Helio elege o labirinto e no o corredor. Contudo, ambos so indicativos
da camada de localizao espacial que invoca e implode o espao do Museu como promotor exclusivo do trabalho contemporneo. Oiticica realiza essa imploso seguidas
vezes: de dentro da Pintura para fora, no ambiente da instalao artstica ou de dentro
do Museu para fora, na condio democrtica da rua.
De dentro para fora, certamente. Mas, no para longe. Os arredores dos museus brasileiros do eixo Rio-So Paulo guardam essa premissa de proximidade das aes
inaugurais desses artistas. Ser nos arredores da instituio museolgica, o lcus que
encontra o prximo anel espacializado das intervenes contemporneas no Brasil.
Contudo, a avaliao dessas frestas abertas do Museu para a rua nos sugere sua anlise a partir da condio transitiva. Distinto da viso panormica mais usual preciso
empregar um ngulo do sobrevo, que permita mapear as novas proposies artsticas
a partir do Museu como seu ndulo originrio.
Posicionados como se diante de um painel de radar de vo, formado por mltiplas
linhas cruzadas e crculos concntricos que avanam do centro para as margens a
identificar o objeto em trnsito; sua relao de distncia e localizao dentro do
terreno mapeado, encontramos a condio de transbordamento promovida pela
combinao de foras entre artista, museu e espao urbano no Brasil, vivenciada
nas dcadas de 1960 e 1970.
A figura dos anis concntricos desse radar inscreve nova referncia visual para o
grupo atuante a partir do trabalho de Arthur Barrio. Nem corredor, nem labirinto,
a figura descrita por Barrio apresenta uma trajetria orbital ao Museu de Arte e
suas convenes.
As proposies iniciais de Barrio apresentam os trabalhos: Situao......ORHHHHH...ou....5.000...T.E....em....N.Y....CITY.......(1969) e Situao T/T,1 iniciados no
MAM RJ, no ano de 1969, para o Salo da Bussola.
Nesse perodo, o artista elabora o conceito de T/E Trouxas Ensangentadas
materializadas numa srie de Situaes tridimensionais e rene a participao
pblica, o espao interno e externo do Museu, alm de forte crtica ao sistema
85
artstico. Tal qual ocorre no contexto internacional, a conscincia sobre os elementos desse sistema absorvida por vrios artistas brasileiros a partir de um
contexto poltico-cultural mais amplo que permeia a criao de muitos trabalhos
para o espao interno e externo das instituies.
A trade anunciada est completa no trabalho de Barrio. Contando com a colaborao dos visitantes, o artista acumula lixo e materiais diversos em determinado espao do Museu. Interessa a ele intervir sobre os regulamentos correntes nos Sales de
Arte do perodo dessacralizando o objeto da arte. Assim, constri seu trabalho ao
longo do perodo expositivo no espao interno e no o encerra no prazo do evento.
Terminada a exposio as T/E so levadas para a rea externa numa nova Fase de
Trabalho. A primeira a Fase Interna que, por si, j representa intensa renovao
dos modelos da operao artstica vigente. A segunda, chamada de Fase Externa
apresenta o volume daquela T/E numa base de concreto pr-existente no Museu,
destinada originalmente s esculturas. Est no espao externo, mas ainda dialoga
com a lgica do sistema que pretende criticar.
A Fase Externa do primeiro trabalho descrito ocorre nos jardins do MAM-RJ, em
circunstncias ainda conectadas aos cdigos do Museu. Apesar disso, ndice para
as frestas que o conjunto expositivo e curatorial constroem no perodo. Ser nos prximos projetos, realizados em reas do entorno sem a imediata conexo com a lgica
museogrica, que as experimentaes de Barrio ganham, de fato, o contorno inquisitivo ampliado para os novos luxos das intervenes urbanas.
Nessa etapa preliminar do encontro com o meio urbano, os registros dos cadernos e
documentos prprios dos projetos destacam a reao de outros organismos e pessoas
do cotidiano externo ao Museu. Para essa Situao Barrio descreve sua viglia ao
trabalho abandonado do lado de fora e inclui nesse texto a reao dos policiais, do
Museu e da Municipalidade, que igualmente reagem ao objeto49.
Na direo da fenda e da fresta anunciadas anteriormente, Adolfo Montejo Navas observa a idia da fissura na postura criativa de Barrio. Navas coloca que o
artista representa uma espcie de falha geolgico-artstica na territorialidade daquela
poca e ressalta o carter de profundidade da obra de Barrio como circunstncia
que lhe confere uma atuao sempre incisiva, na qual o contexto entra como energia
de trabalho50. A fissura provocada por Barrio invoca, dessa forma, o antifetiche caracterstico das propostas contemporneas que se abrem para o dado da cultura ao
invs de encerrarem-se no subjetivismo do artista. O contexto a ser vencido, das
49
ESTE TRABALHO POSSUI DUAS FASES: 1) FASE INTERNA: realizao no Salo da Bussola, Museu de
Arte Moderna do Rio de Janeiro, interferncia no regulamento do salo por obstruir meus trabalhos [], transformandoos em lixo e automaticamente em uma obra []. A atuao na noite de 5.11.69 transformou os conceitos petriicados, que
comumente acompanham as obras expostas em sales, em evoluo. Aps um ms de exposio, em que os visitantes
participaram ativamente neste trabalho, [] todo o material oi transportado para a parte externa do museu e colocado
sobre uma base de concreto (nos jardins), reservada s esculturas consagradas. 2)FASE EXTERNA: transporte do lixo
(meu trabalho), de 1) para 2) []. Abandono desse trabalho no local s 18hs. No dia seguinte, fui informado, ao voltar ao
MAM que os guardas do MAM tinham icado no maior rebolio, devido s T.E. terem provocado a ateno de uma radiopatrulha que periodicamente passava pelo local, [] s no dia seguinte, s 13hs, que o trabalho foi retirado [] Ver em:
(Canongia, 2002: 16 e18).
50
Navas, A. M., A constelao Arthur Barrio, in (Idem: 207-217).
86
51
Ver, em particular, o item 06 do atual cdigo de tica do ICOM - Conselho Internacional de Museus.
Cdigo de tica Lusfono III, pag. 23. Site oicial do ICOM Brasil. Disponvel em:
http://www.icom.org.br/codigo_de_etica_lusofono_iii_2009.pdf Acesso: 10.03.2011.
87
lidade nacional. O tom experimentador irrompe em So Paulo com os projetos expositivos curados por Walter Zanini no MAC-USP, que levam, contudo, maior tempo
para ocorrer do lado de fora. O destaque est na JAC Jovem Arte Contempornea,
criada por Zanini para o MAC-USP, ao longo das dcadas de 1970 e 1980. Apesar de limitada ao espao expositivo interno, em suas vrias edies, o redobrado esforo pela
atualizao e consonncia com a experimentao contempornea, no apenas projeta
artistas importantes para a esfera da Arte Pblica e Urbana no pas como sinaliza
para outras instituies os caminhos efmeros e conceitualistas que se anunciavam
no escopo da Arte dali em diante. O transbordamento das aes do MAC-USP ocorre
na dcada de 1980, a partir dos outdoors elaborados para o Projeto Arte na Rua,
coordenado por Monica Nador e Luciana Brito52. Esses eventos apontados exigem de
seus artistas-proponentes postura de produo que avana suas investigaes poticas do trabalho em ateli para o contexto urbano e o encontro direto com o pblico
transeunte urbano.
Nesse perodo, Frederico Morais produz vrios textos relexivos nos quais demonstra
postura convicta de que a arte que interessa hoje a que est fora dos museus, das galerias,
das colees particulares, arte selvagem, marginal, nmade, annima53. frente do MAM-RJ,
Morais o responsvel por uma srie de inovaes crticas e curatoriais que efetivam
a construo da prxis artstica nesse novo contorno espacial e urbano. Para o projeto Do Corpo a Terra, Morais ressalta que aquela era a primeira vez que artistas
brasileiros eram convidados a trabalhar em consonncia com o lugar, construindo
obras e proposies ao invs de selecionarem trabalhos prontos. Tal como ocorrera
no projeto Arte no Aterro, a divulgao desse evento de Belo Horizonte feita com
prospectos distribudos nas ruas, nos estdios de futebol, em teatros, etc.
Tanto no evento Do Corpo a Terra, quanto na Semana de Arte do Aterro, organizados por Morais, evidencia-se uma preocupao democratizante com o acesso Arte
pela populao. Os projetos validam a importncia do artista, do curador e do museu
como agentes ajustados ao corpo social vigente. Para tanto, no Rio, alm das aes
artsticas espacializadas que se seguiram, a Semana de Arte do Aterro contava com
oicinas artsticas oferecidas populao por Helio Oiticica, Lygia Pape, Moriconi,
dentre outros.
Essas idias alinham-se s trocas que os curadores brasileiros travavam quele momento com Pierre Restany, crtico francs, claramente posicionado contra a vida fechada
dos museus e galerias54. Entre idas e vindas ao Brasil, bem como publicaes de artigos
52
Na entrevista concedida por Aracy Amaral, a crtica evidencia o papel curatorial de Mnica Nador e
Luciana Brito nesse trabalho, bem como o interesse do MAC naquela categoria de projeto. Tambm d importante
depoimento sobre a constante atualizao dos artistas atuantes nas dcadas de 1970 e 1980 com relao s revistas
estrangeiras assinadas pelo Museu. Classiica os artistas como page turner, e faz uma aluso ao comportamento usual
mantido por eles, frente aos aspectos positivos de atualizao da informao artstica garantida pelos Museus com o
acesso a tais publicaes. Amaral, Aracy. Entrevista (24/outubro/2007) Entrevistadora: Sylvia Furegatti. Goinia, Hotel
Confort Sutes Flamboyant.
53
Trecho da entrevista feita por Helio Silva a Frederico Morais. In: Silva, H., GAM pesquisa arte no Brasil,
Revista GAM, N 22, Rio de Janeiro, 1970, p. 17.
54
Mas, na Europa, um crtico se insurge contra a vida fechada de museus e galerias. Pierre Restany procurou
sistematizar na revista Domus seu pensamento a respeito. Restany proclama a falncia das estruturas e dos usos que
88
89
lhores pertinncias para esse campo apresenta-nos o termo Extramuros. Sua ligao
ao contexto artstico brasileiro constri o raciocnio particularizado por dois pontos
potenciais: a noo de transbordamento dos trabalhos artsticos de dentro do museu
para o seu entorno; e o carter marginal, alm das margens, amplamente investigativo,
presente nas primeiras experimentaes nesse terreno.
A noo de transbordamento, tanto quanto o termo extramuros, indica que o muro ainda est
l. elemento instigador necessrio e no oferece as amarras, nem o peso reclamado pelos
representantes estrangeiros dessa vertente, posto que, em nossa paisagem, tem outra velocidade de formao.
No Brasil, o trabalho artstico extramuros qualiicado pelos textos e depoimentos
de artistas, crticos e curadores que partem dos elementos da trade j destacada: espacialidade, sensorialidade dos trabalhos e ativao do projeto pela participao do
espectador. Sua apresentao do lado de fora, na rua, em espao urbano convida o
outro percepo das proposies do artista num terreno intermedirio, quer interno
ou externo, de carter extra-museal. O encontro com esse interlocutor evita o isolamento e ativa o dilogo com o mundo real, num dos feixes buscados pelo trabalho
artstico contemporneo.
Dos muitos elementos que dispem em comum, a Arte Contempornea e as vertentes
atuais da Arte Pblica e Urbana, encontramos a busca por um ainamento prtico e discursivo, que nesse territrio tem como uma de suas principais premissas a reorganizao
das nomenclaturas que evitem equvocos ou generalizaes trazidas pelos termos pblico
e urbano frente ao mundo Contemporneo. Assim, as inmeras nervuras que estabelecem
essa complexa relao com a urbanidade, sugerem que o termo extramuros bem responde
polissemia desse campo. De modo conjugado, o espao e a esttica extramuros indicam
o interesse da arte por uma gama ampliada de elementos alheios, at ento, ao seu ncleo
principal, tornados mais visveis pela prtica do olhar perifrico, algo marginal e inquisidor, que potencializado nessa atualidade das propostas artsticas.
Como ordenador do discurso, indica sua grande ainidade com o contexto urbano,
uma vez que atenta para a questo da transposio de limites, para o encontro entre
as linguagens artsticas e culturais, praticadas por boa parcela da arte ao longo dos
sculos XX e XXI. Aberto, o termo extramuros d flego para compreender as distncias a que se lana a arte nesse vetor urbano, confrontada com um conjunto complexo
jamais experimentado nas ordens das cidades anteriores. Paralelo, mantm sua validade perante todos os seus demais antecessores, superpondo-se justeza do discurso
mais pontual e especializado que investiga os dados: pblico, urbano e interventor
desses projetos de arte. Plural, aponta para a lexibilidade necessria na percepo
dos mltiplos discursos preocupados com o equilbrio (ou a falta dele) nas apresentaes artsticas que tm construdo o histrico dessa vertente esttica at o momento.
Do mesmo modo, a idia do transbordamento, presente no conceito extramuros, provoca o contrrio do isolamento pressuposto no espao cerrado do Museu e revela o
entendimento algo pacico, garantido pela jovialidade e trabalho experimental do
artista contemporneo e museu de arte em nosso territrio. Externo ou interno ao
espao museolgico, o trabalho de arte contempornea consciente da dependncia
90
de sua conirmao como Arte por meio da visibilidade e autoridade conferida por
esse agente do circuito com quem negocia. Assim, ao invs de rompimento, prega
a negociao. O zigue-zague se completa; a circularidade, oportuna ou oportunista,
constitui-se por todos os elementos do sistema, reconigurando as relaes da Arte
e seus mltiplos lugares na atualidade. Enquanto o contexto intramuros valoriza a
idia do centro e da unicidade, o extramuros dinamiza essa idia trazendo tona o
valor da concomitncia.
Esse termo no empregado nos discursos iniciais da contemporaneidade. Ganha espao somente nas ltimas dcadas, por meio de contedos advindos da Arquitetura,
Urbanismo e Artes Visuais. Dentre os artistas que bem o representam, logo de incio,
encontramos em Oiticica a consolidao de termos como ambientao, arte ambiental e
suprasensorialidade. Escosteguy usa o termo Arte Pblica para validar o encontro com
valores que possam evitar o divrcio da realidade e garantir a autonomia crtica do artista.
Frederico Morais, que tambm o emprega no sub-ttulo do projeto Arte no Aterro,
faz uso enftico desse lcus scio-poltico, clamando o termo Arte na Rua como anti-meio desalienador. A ampliao do discurso das vertentes da Nova Arte Pblica, da Arte
Urbana e das Intervenes Artsticas no Meio Urbano toma lugar, somente nos anos 1990,
efetivando-se em paralelo s edies do projeto Arte Cidade de So Paulo.
Dentre as fontes pesquisadas, destacam-se, como referncias diretas ao termo extramuros, a apresentao da 7 Bienal de Cuba, que aplica o termo para determinado setor
de projetos alternativos composto por aes e performances. Alm disso, a pesquisadora Priscila Arantes o emprega num texto em que disserta sobre o trabalho de
Fred Forest, artista que contribui em suas passagens pelo Brasil para a formao da
sensibilidade desse campo. Com Celso Favaretto e Nelson Brissac, encontramos composies prximas. Nos estudos sobre o trabalho de Oiticica, Favaretto aplica o termo
extra-espao quando discute a idia de totalidade-obra elaborada pelo artista. Nelson
Brissac aplica o termo extra-campo para burilar os sentidos da indiscernibilidade da
paisagem contempornea dada pelos atuais aparelhos de captao da imagem, como
a mquina fotogrica e a ilmadora de vdeo. Tudo est perto. Este mundo no tem
extra-campo, escreve ele, ao estudar a ainidade entre o muro e a paisagem. Lisette
Lagnado aplica o termo extramuros, com a intensidade inquisitiva que bem o qualiica, num texto publicado pela revista eletrnica Trpico on line, no qual avalia a
condio explorada pela 25 Bienal de So Paulo em sua seo dedicada s Iconograias Metropolitanas.
O incio da experincia ambiental brasileira demonstra que, apesar da vastido de
nosso territrio, no a referncia das desmesuras que se comprova por aqui, mas sim
a experimentao inerente construo do trabalho contemporneo.
Ao atribumos aos centros urbanos capitais a localizao das aes mais importantes e constantes da arte extramuros encontramos outro dos elementos indicativos do
transbordamento anunciado. A proximidade desses projetos aos ncleos museolgicos, pode ser lida como resultado caracterstico de sociedades pouco uniformes e oscilantes na continuidade de seu projeto cultural, como a brasileira. A no consolidada
eiccia dos anis desse circuito, aliada instabilidade na rede de comunicao por
91
Referncias
Livros e Teses:
Canongia, Ligia (org), Arthur Barrio, RJ, Modo, 2002.
Favaretto, Celso, A inveno de Hlio Oiticica, SP, Edusp, 2000.
Ferreira, G., Crtica de Arte no Brasil, RJ, Funarte, 2006.
Furegatti, Sylvia, Arte e Meio Urbano. Elementos de formao da esttica extramuros no Brasil, Fac. de Arquitetura e
Urbanismo, Tese de Doutorado, SP, FAU - USP, 2007.
Krauss, R, Caminhos da escultura moderna, SP, Martins Fontes, 1998.
Mosquera, Gerardo et al. (apres). Cildo Meireles, Londres, Phaidon Press, 1999.
Artigos:
Cdigo de tica Lusfono III, Site oicial ICOM Brasil. Disponvel em: http://www.icom.org.br/codigo_de_
etica_lusofono_iii_2009.pdf Acesso: 10.03.2011.
Krauss, R., A escultura em Campo Ampliado, Revista Gavea, n.06, PUC, RJ, 1988, pp. 87-93.
Silva, H., GAM pesquisa arte no Brasil, Revista GAM, n. 22, RJ, 1970, p.13-17.
92
turas, pinturas murales, instalaciones) y por otro, de la sociedad a travs de expresiones propias, creativas, espontneas en las bardas pblicas, calles, avenidas o ediicios,
el grafiti por ejemplo es una de las ms claras expresiones de este tipo de arte.
Las ciudades, no slo son espacios que facilitan el lujo de personas, carros, comercios
y comunicaciones, tambin permiten la libre expresin y manifestacin del arte. Entre las funciones del arte urbano se encuentra el fomento a la cultura de apreciacin
cultural, incremento del patrimonio artstico, hasta la modiicacin del ritmo de vida
y estado de nimo de los ciudadanos.
Estimar o caliicar el valor de una obra de arte urbano, no es tarea fcil, va ms all
de la calidad esttica de los objetos, incluso de la interpretacin terica de lo que es
considerado arte. De acuerdo con su punto de vista el blog de Santsima Rivero (2011):
En la valoracin de la obra de arte urbano se encuentran a la par la importancia
o relevancia del artista ejecutor, de la calidad de la pieza realizada, del paisaje
como receptor o de la ciudad como soporte; el ciudadano como espectador
y la colectividad que se identiica con la obra apropindose de la misma,
reconocindola como parte de su cotidiano, construyendo con sus paisajes la
memoria urbana.
Aunque arte urbano y arte pblico pueden usarse de manera similar en trminos de
expresin y manifestacin creativa en la esfera pblica. El arte pblico, como dice
la historiadora de Arte, Guillermina Guadarrama (2011), se identiica ms cuando le
corresponda al estado (o a instituciones legitimadoras de la cultura) deinir en qu
lugar pudiera ubicarse un mural o una expresin social, se trata aqu de un criterio
que tiene que ver con el estado y su control del espacio pblico, sobre todo en los
formatos de muralismo y escultura, o monumentos de carcter histrico. En cambio,
cuando sean manifestaciones espontneas, donde el artista o artistas, deciden en qu
lugar van a expresarse, estamos pensando ms en el concepto de arte urbano como es
conocido hoy en da, aqu entran hasta expresiones de gneros como performance, el
teatro callejero, el uso de materiales tecnolgicos y audiovisuales, entre otros.
El arte urbano en el occidente mexicano: Colima
Colima es uno de los estados ms pequeos que componen la Repblica Mexicana (31
estados y un Distrito Federal), se encuentra ubicado al suroeste del Pacico y en el occidente de Mxico. La caracterstica principal de la productividad en el estado de Colima
es la agricultura y la ganadera. De acuerdo al Censo General de Poblacin y Vivienda
(INEGI, 2010: 16), Colima, es un estado que cuenta con 650,129 habitantes, los municipios de mayor poblacin son Manzanillo, 161,293 y la ciudad capital con 148,731.
En las dos ltimas dcadas, la infraestructura cultural en el estado Colima se ha
fortalecido. Entre la oferta artstica se encuentran museos, galeras, espacios para el
teatro, la danza, el cine, institucionales e independientes, adems de obras artsticas como murales y esculturas que ocupan espacios importantes en la urbanidad y
en la oferta pblica del estado.
95
Encontramos una diversidad de autores contemporneos como Jos Luis Cuevas, Sebastin, Vicente Rojo, Juan Soriano, Adolfo Mexiac, as como artistas emergentes de
joven trayectoria que se formaron fuera del estado o en el extranjero y han regresado
a Colima a producir arte y a trabajar en la enseanza en los recintos acadmicos como
la Universidad. Desde una perspectiva muy bsica, la temtica general de muchas de
las obras pblicas en la ciudad se puede caracterizar por el toque regionalista, ya que
rescatan elementos representativos de la historia de la regin reconocida y legitimada
por todos los colimenses, por ejemplo la escultura del Rey Colimn, que se ubica al
sur de la ciudad de Colima, es un monumento que releja el mito de un rey que apareci en la poca de La Conquista, aunque no se tiene certeza de su existencia, pero es
el mximo cono de identidad colimense.
Tambin hay otras esculturas con un estilo ms moderno y con menos elementos tradicionales como es El Toro y La Paloma del escultor Juan Soriano, existen unos murales
del maestro Adolfo Mexiac ubicados en la Universidad de Colima. Destaca tambin
un jardn escultrico en la carretera Colima-Comala y variadas esculturas del maestro
Zamarripa. En general, podemos decir que el estado de Colima, por ser uno de los ms
pequeos del pas, goza de una oferta de obra pblica de gran valor, eso se refuerza
tambin con la oferta de museos, como el Museo de Sebastin con obra propia y obra
donada, con otra oferta ms de la Universidad de Colima y del Gobierno del Estado.
La escultura de la Figura Obscena
En el perodo del gobernador colimense Fernando Moreno Pea (1997-2003) se dio
gran impulso al arte pblico con nfasis en el contexto urbano, as como a diversas
propuestas que enriquecieran el patrimonio artstico y todas las propuestas de arte
pblico en el estado de Colima. Datos al respecto, fueron publicados en Cuarto Informe de labores del gobernador (2001), sobre todo en trminos de apertura a posibilidades en infraestructura cultural.
En el periodo que se informa, abrieron sus puertas el Museo Tecnolgico de
El Remate, en Comala, y el Museo de la Grica Jos Luis Cuevas. A pesar de su
reciente creacin, este museo tiene un acervo cercano a las 500 obras, gracias
al generoso donativo de prestigiados artistas internacionales como Toledo, Jan
Hendrix y el propio Jos Luis Cuevas. Colima es el segundo estado en el pas
con mayor nmero de museos por cada diez mil habitantes (Moreno, Pea;
Cuarto Informe de Labores: 2001: 76).
De hecho en este gobierno estatal, fue inaugurada la escultura Figura Obscena del maestro Jos Luis Cuevas. De acuerdo con datos oiciales: los derechos de la obra fueron
donados por el autor y el costo de realizacin e instalacin fue de un milln 137 mil
pesos (Moreno Pea, Cuarto Informe de Gobierno, 2001: 76). Segn cuenta el propio
autor que la propuesta de esta escultura viene de la exposicin de sus obras titulada:
Libertad en Bronce, realizada en los municipios principales del estado, de acuerdo a una
encuesta entre los visitantes, se eligi esta obra para su ampliacin: que la escultura
96
de Cuevas era la mejor de todas, por lo que el gobierno de esta entidad le pidi que
la agrandara para situarla en un lugar muy transitado por automviles y peatones
(Cuevas, El Universal, 2006).
Es una de las esculturas de mayor tamao en relacin a la otras esculturas pblicas urbanas ubicadas dentro de la ciudad de Colima y en el estado. La Figura Obscena, representa a un animal parado en cuatro patas, la cual levanta una semejando la posicin en
la que orinan los animales cuadrpedos, dejando ver parte del oriicio por el que orina
dirigindose hacia la ciudad de Colima, misma direccin hacia la que dirige la mirada.
Arte, estigma y rechazo social
En el campo acadmico del arte en Mxico, no existe mucha investigacin en trminos de las percepciones y valoraciones del arte en general y tampoco del arte pblico.
Adems, no existe una cultura de investigacin que explore todos los procesos sociales de apreciacin artstica y el patrimonio nacional, ni tampoco la relacin del arte
con la poltica y en el caso de este objeto de estudio es importante esta vertiente.
Cuando aludimos a la idea de rechazo social de la obra pblica, nos estamos reiriendo
a la actitud de aprobacin o desaprobacin ante el arte, que toman los ciudadanos o
residentes, de una poblacin especica. El rechazo implica no slo el punto de vista
en torno de la obra, sino tambin su expresin social (individual o colectiva) travs
de la esfera pblica por ejemplo: medios de comunicacin, espacios de convivencia
social, reuniones masivas, reuniones familiares. Es decir, no se trata de pensar en rechazarla, sino de una manifestacin colectiva que tenga amplia visibilidad.
El rechazo social implica tambin una forma de estigmatizar la escultura pblica. Es
decir, el arte sufre tambin una interpretacin estigmatizada de su funcin esttica. El
concepto de estigma, analizado en los aos sesenta por el socilogo Goffman (2006) es
una identidad deteriorada, se deine como una marca, atributo o seal que contribuye
a que personas consideradas normales se conviertan en sealadas por otros grupos
numricamente mayoritarios porque consideran que tienen un atributo que no es aceptado socialmente. Dice Goffman que el concepto fue creado por los griegos
para referirse a signos corporales con los cuales se intentaba exhibir algo
malo y poco habitual en el estatus moral de quien los presentaba, en tiempos
actuales la palabra es ampliamente utilizada con un sentido bastante parecido
al original, pero con ella se designa preferentemente al mal en s mismo y no a
sus manifestaciones corporales (2006:11).
tiene varias perspectivas, una de ellas, est relacionada, de acuerdo con Goffman, con
los atributos o signos corporales anormales que se evidencian en su propia imagen.
En el caso de la Figura Obscena, ese rechazo social fue bastante claro y tuvo impacto
pblico en escala local, regional y nacional. A cuatro aos de distancia de la colocacin, se gener una polmica en el estado porque una parte de la sociedad colimense
se mostr inquieta con la obra y solicit se quitara de ese lugar. El argumento fue y
an es (para algunos ciudadanos) que la escultura no cumple con la funcin social y
no releja la identidad social de los colimenses. Eso ocasion divisiones en puntos de
vista entre sociedad, funcionarios pblicos y partidos polticos.
El asunto lleg hasta la Cmara de Diputados, la Secretara de Gobernacin y la Secretara de Educacin Pblica. Hay manifestaciones en las redes sociales que relejan
mucho de esta polmica, por ejemplo dos pginas en Facebook, una titulada 1000000
para que quiten la igura obscena con cerca de 300 seguidores, otra con el nombre de
yo tambin quiero que quiten la igura obscena con cerca de 40 seguidores, as como
el blog de Irak Garca titulada La vergenza de la igura obscena.
Esa controversia ya vena gestndose en diversos diarios locales en medio de conlictos partidarios, pero fue en el mes de enero de 2006 cuando surgi un conlicto donde
el entonces presidente municipal de Colima, Lionso Morn, apoyado en una encuesta
que segn sus datos, realiz con los colimenses, hizo un llamado oicial para solicitar
la remocin de la obra. l incluso instal una casa de campaa a unos metros de donde se encuentra la escultura, y en plan de protesta pblica, dijo a la opinin pblica
y a los medios de comunicacin, que l no se quitara de ah si no removan la obra.
Lleg incluso al grado de l mismo removerla. Sin conocimiento en las implicaciones
que poda ocasionar y los daos a la obra, llev una gra e intent quitar la obra. Esto
ocasion adems que la obra se daara un poco (Diario de Colima y Ecos de la Costa de
Colima en los meses de enero y febrero 2006).
La polmica alcanz dimensiones nacionales, el propio autor de la obra, Jos Luis Cuevas,
inconforme por la situacin estuvo en Colima e hizo un llamado a la sociedad y a las fuerzas polticas locales para que la obra se respetara y se quedara donde est. En su columna
de El Universal, publicada en marzo del 2006, manifest su desencanto por la situacin:
no puedo evitar la molestia que me ha ocasionado la reaccin de los colimenses, sobre
todo porque es bien sabido que por Colima siempre he manifestado un enorme cario. En
Colima existe un museo que lleva mi nombre y las obras que ah se exponen de manera
permanente fueron por m donadas. Cuevas tambin manifest que demandara al edil
capitalino por las acciones tomadas y sobre todo porque la obra haba sido afectada por
los intentos de remocin. Incluso el hecho de haber trado maquinaria inadecuada para
removerla, ocasion un costo econmico alto para su restauracin.
Las mltiples miradas de la escultura obscena
Parte de nuestro argumento para airmar que la obra es estigmatizada y rechazada,
tiene que ver, desde luego, con la falta de una cultura de apreciacin artstica por
parte de los ciudadanos, con el capital cultural suiciente para valorar y caliicar el
98
arte pblico. Aunque son varios los motivos, por ahora retomamos esta perspectiva.
Adems, la mala ubicacin de la obra, impide que sea apreciada en su justo valor, se
encuentra en una glorieta pblica al norte de la ciudad, lugar de continua circulacin
vehicular, donde la gente no puede detenerse, ni caminar para observar sus detalles.
Adems, una de las caractersticas que tienen las glorietas en la ciudad, es la presencia
de esculturas que aluden a personajes histricos de Colima y del pas; en ese sentido,
esta obra no representa un lugar comn y referencia identitaria para los ciudadanos
(aun cuando la obra muestra rasgos relacionados con los perritos de ceramica precolombina). Si la obra estuviera ubicada en otro lugar, quizs un lugar ms amplio
donde la gente pudiera interactuar ms con la escultura, seguramente se ganara en la
apreciacin desde diversos ngulos, habra una sensibilidad hacia las formas, sus contornos, textura y en general su propuesta esttica. En consecuencia, se disminuira su
rechazo. Al menos esa es nuestra apuesta.
Considerando los inconvenientes tanto de su ubicacin como de la falta de la cultura
de apreciacin de los pblicos, hemos seleccionado cuatro fotografas de la Escultura
Obscena como un intento de percepcin desde diferentes ngulos, que contribuyan al
enriquecimiento de las miradas y apropiacin cultural del arte. Es importante mencionar que la difusin de la obra en los medios electrnicos, impresos y tecnolgicos,
se ha dado a partir de fotografas tomadas de un solo ngulo que no siempre se aprecian las caractersticas y detalles, y en consecuencia, no se contribuye a la complejidad de su interpretacin. Una obra de arte, particularmente una escultura pblica,
debe leerse desde diversos ngulos y entender sus contornos y movilidad.
Las fotografas que presentamos a continuacin (seleccionadas de una serie de una
treintena de fotos) fueron tomadas desde un plano cercano a la obra, que permiten
apreciar las formas reales de la escultura y facilitar su descripcin.
Alerta y en movimiento
Desde esta posicin y apreciacin fotogrica, la Figura Obscena parece una especie de
animal extrao, casi como un extraterrestre (con un caparazn), mantiene una po99
Juego infantil
En esta foto la igura es completamente diferente a la anterior, la imagen es otra. Desde aqu la igura nos muestra una imagen de un nio con rasgos indgenas que se deja
ver en posicin de juego, de aquellos juegos ancestrales donde participan ms de dos,
y en los que uno se agacha y otro salta, y as hasta sugerir un juego infantil que asemeja
una lnea de humanos saltarines.
Desde aqu, podemos mirar las proporciones del cuerpo de la igura muy parecidas a
las de un nio con cabeza redondita, ojos redondos y sumidos, nariz chatita y boca
chica. Podemos observar cmo las palmas de las manos se apoyan el piso levantando
el pie izquierdo, como una seal de danza o juego infantil. Desde esta perspectiva
fotogrica, que adems sugiere rasgos masculinos, tampoco se muestra una igura
obscena. Ms bien evoca la candidez infantil.
100
Marcando territorio
Esta foto es la ms publicitada en el estado en los medios informativos, esta foto no
le hace justicia a la complejidad de sus formas y a su propuesta artstica. Desde esta
posicin la obra se muestra con rasgos masculinos, al menos es lo que simula, apoyado
en tres patas evoca un levantamiento a posicin obscena, como la sugerida por los
animales cuadrpedos en posicin de orinar para marcar territorio. En esta perspectiva visual no se aprecia sus senos pequeos, porque la pierna levantada los tapa. En
esta foto la igura no se presenta completamente de frente a la ciudad.
101
A diferencia de lo que pueda sugerir la ltima fotografa, consideramos que la Figura Obscena es una escultura bella, con fuerte propuesta esttica que por varios motivos no ha
logrado ser interpretada y sobre todo gozada en toda su complejidad. Incluso las cuatro
fotografas mostradas no logran develar toda la riqueza de sus formas y mensajes interpretativos. Desde el ngulo que sugiere la ltima imagen, la obra de arte da una bienvenida
(de espaldas) a las personas que llegan a Colima y despide de frente a los que se van.
Comentarios inales
A lo largo de este trabajo, hemos mostrado algunos rasgos que muestran el impacto
que puede tener en la sociedad el llamado arte urbano o arte pblico. El rechazo social
que muestra la gente hacia una obra por considerar que no se sienten identiicados
con ella, es un pretexto para pensar en las complejidades que entreteje la cultura de
apreciacin artstica donde entran en juego la funcin social del arte, la construccin
social de las identidades, los intereses profesionales del artista creador, los conlictos
polticos de quienes toman decisiones para quitar o poner una obra en un espacio
pblico, las ideologas de los ciudadanos, por citar algunos.
El arte colocado en espacios pblicos no es una decisin simple. Las autoridades gestoras de la cultura estatal y federal en el caso de Colima, no siempre tienen la razn
en los criterios presupuestales para la produccin del arte pblico. El argumento que
queremos retomar en este trabajo en torno del rechazo social de la Figura Obscena,
tiene que ver con la falta de la cultura de apreciacin artstica, que inicia con los responsables de la cultura estatal que han decidido una mala ubicacin de la obra y en
consecuencia han generado no slo que no se comprenda la obra en su totalidad, sino
que no haya elementos funcionales (espacio fsico, por ejemplo) en torno de la escultura para contemplarla y aprender de ella.
Por otro lado, existe una desinformacin en torno de la manera de comprender el arte
en general y el arte pblico en particular, es importante formar pblicos para apropiarse del conocimiento especializado en la disciplina artstica, para ello se requiere
una estrategia mltiple que incluye desde capacitacin en las aulas escolares en todos
los niveles, hasta los mensajes en los medios de comunicacin pblica, la capacitacin
en el marco de las instituciones pblicas y los propios lderes polticos, hasta las polticas pblicas que deciden qu tipo de arte debe incluirse o no en un determinado
contexto. No hay que dejar de lado que la Figura Obscena, quiso ser removida tambin
por un asunto poltico que envuelve tintes e intereses partidarios, un presidente municipal de Colima, tom la decisin arbitraria de quitarla sin medir las consecuencias
sociales y los daos a la obra.
En pases como Estados Unidos, por ejemplo, existe una poltica pblica que dicta
que el 1% de los presupuestos federales deben considerarse para el arte pblico, para
generar convocatorias donde los artistas hagan propuestas. En Mxico, an no tenemos esas decisiones culturales, menos an en los estados. Ojal que podamos en un
futuro contribuir a la investigacin acadmica y sistemtica en torno de las implicaciones sociales, culturales y polticas que tiene el arte pblico.
102
Referencias
103
Este marco, nas festividades mais importantes como o Natal e eventos esportivos em
que o Brasil participa, se veste no sentido de cada comemorao.
Seguindo o caminho do centro da cidade via litoral, passamos pelo Caminho Niemeyer,
marco da cidade, chegando estao das barcas que liga o Rio do Janeiro cidade. L,
encontramos um marco escultrico igurativo ligado ao chefe da tribo indgena Araribia considerado fundador da cidade, de autoria de Dante Crocce datada de 1965.
Hoje, considerando que esta obra apresenta pouca representatividade em termos de signo
identitrio da cidade, recorremos a Argan sobre o valor da obra de arte: [] a obra de arte
no tem para ns o mesmo valor que tinha para o artista que a fez e para os homens da sua
poca. A obra sempre a mesma, mas a conscincias mudam (Argan, 1998: 25).
Uma curiosidade quanto a colocao da esttua frente cidade que ela se posiciona
de costas para a cidade, posicionando como sentinela, na guarda de seu territrio.
105
Continuando o percurso pela orla da Baia de Guanabara, encontramos dentro do contexto de um espao urbano que d continuidade ao Caminho Niemayer, uma dupla
escultura j no sentido de Niemeyer com Juscelino Kubistchek de Oliveira conversando sentados num banco .
Essas imagens embora faam parte do imaginrio coletivo no mais somente da cidade, uma vez que a relao Niemayer x Juscelino est sempre presente no imaginrio
coletivo brasileiro.
Seguindo o percurso litorneo encontramos na Praa do Cais da Avenida do Gragoat
uma placa comemorativa de sua inaugurao, num pedestal com uma leitura orgnica,
datada de 1908 de autoria de Leon Clerot, com traos que se assemelham a Gaudi.
Esta placa se encontra meio perdida dentro do espao urbano em que se encontra e
em dissonncia com um busto de Duque de Caxias localizado no mesmo espao prximo a ela, mas, sem se identiicarem um com outro, nem mesmo concorrerem ou se
destacarem em termos de importncia para o local ou enquanto escultura.
Passando agora pelo MAC- Museu de Arte Contempornea obra do arquiteto Niemeyer, no mirante da praia da Boa Viagem a caminho da Praia das Flexas e Praia de
Icara, encontramos a Pedra do ndio, e a Pedra de Itapuca. A Pedra do ndio, assim
denominada atravs do imaginrio popular, que atribua sua semelhana a um ndio.
Quanto Pedra de Itapuca, h uma lenda de que a ndia Jurema que manteve uma
aventura amorosa com o guerreiro auby, e cujo amor foi abenoado por Tup e Jacy
, ambos pagando com suas vidas por essa aventura. Estes monumentos artsticos
naturais, feito pelas ondas do mar nas pedras existentes prximo das praias, foram
tombados pelo INEPAC Instituto Estadual do Patrimnio Cultural.
Na Praia de Icara, havia um trampolim, que pelo aterramento para alargamento da praia,
e para a construo de mais uma pista de rolamento foi demolido. Certamente hoje sua
demolio seria impossvel uma vez que ele era parte da memria artstica e cultural no
s de Niteri, mas principalmente relacionado identidade da Praia de Icara.
106
Saindo agora da orla martima no im da Praia de Icara tomando o caminho pelo interior pela Av. Ary Parreiras, rua de faixa dupla com um canal entre as mos da rua,
depara-se com um espao urbano ampliado por uma quadra, na medida em que o
canal foi fechado e ali se construiu uma rea de lazer com bancos, guarda-sis e dois
mdulos de arcos formando assim uma escultura aleatria, mas que permite o uso da
comunidade que dela se apropriou, interagindo velhos moos e crianas neste espao
plural, fazendo parte da interao cotidiana.
Mais frente dobrando esquerda para a Av. Roberto Silveira, no encontro com Rua
Cinco de Julho, podemos encontrar mais um espao arte que neste caso envolve um
muro pintado, uma escultura de tubos dgua e bancos. Todo o conjunto incluindo a
escultura revela no s um espao urbano de arte, caracterizados por um frescor no
s ttil como espacial numa avenida e, cujo percurso se interrompe pela arte pblica
atravs de seus elementos gua e ar.
No prximo quarteiro encontra-se o maior parque urbano da cidade o Campo de So
Bento, com extensa rea de lazer, coreto, rvores, lagos, chafariz, etc. Nele se acham traos dos jardins de Glaziou, como ponte, banco e carramancho. No lago, podemos destacar duas esculturas intituladas: domadores de golinhos, datados de 1913, de autoria
de Modestino Kanto, transferido para este local em 1980 (Macedo Soares, 1992: 78).
Continuando o percurso pela Av. Roberto Silveira at encontrar a Rua Marquez do
Paran e dobrando esquerda para a Av. Amaral Peixoto, novo espao pblico de arte
se apresenta como um osis, num espao urbano que pode tambm ser entendido
como lazer, estando ali a convidar qualquer transeunte que ali queira dele se utilizar.
Sua implantao numa rea densa de trfego e altamente rida, aproxima o pblico
deste espao, visto que nele se insere uma queda dgua, que traduz um frescor ao espao, convidando os transeuntes a permanecerem pelo menos por um tempo no local.
Como lazer, descanso ou apenas refrescante, este espao urbano se destaca pelo alvio
espacial, no sentido visual e ttil, devendo ser entendido como uma arte pblica.
Neste percurso que se encerra pela Av.Amaral Peixoto, encontramos esquerda a
Praa da Republica onde se encontra localizado ao centro o monumento Triunfo da
Repblica, de autoria de Correia Lima.
Este monumento havia sido removido do centro desta praa para ocupar um espao
prximo a Biblioteca Municipal, que tambm ica na mesma praa.
Na praa foi ento construdo em 1978, um edifcio para abrigar o Tribunal de Justia
do Estado, que aps um clamor da populao pela volta do Monumento e da Praa, a
ediicao foi, ainda em esqueleto, implodida em 28 de maio de 1989. Em setembro do
mesmo ano a praa com o monumento foi tombada pelo INEPAC.
107
Referncias
Argan, Giulio Carlo, Histria da Arte Como Histria da Cidade, So Paulo, Martins Fontes,1998.
Brando, Pedro, A identidade dos lugares e a sua representao coletiva, Lisboa, Editora DGOTDU, 2008.
Lynch, Kevin, A imagem da Cidade, Lisboa, Edies 70, LDA, 2008.
Macedo Soares, Emmanuel de, Monumentos de Niteri, Secretaria de Cultura da Fundao Niteroiense de
Artes. Ed. e Distribuidora xitu, Niteri, 1992.
Vras, Maura Pardini Bicudo, Trocando Olhares- uma introduo construo sociolgica da cidade, So Paulo,
Studio Nobel EDUC, 2000.
108
PRTICAS POLTICAS DE VISIBILIDADES NA AMRICA LATINA: TRADIO, RUPTURAS E RELAES ENTRE ALTERIDADES
prticas polticas de visibilidade as aes que expem o modo de ser e viver, de determinados grupos sociais, dimensionadas no jogo de poderes. Ora elas permanecem na
invisibilidade, ora so visveis por meio das aes cotidianas dos cidados ou grupos.
De fato, estamos falando da construo de identidades ps-modernas. Segundo Stuart
Hall (2006), trata-se de identidades fraturadas por identiicaes rivais e deslocantes,
advindas, especialmente, da ruptura de um modelo maior, ixo, de identidade hegemnica e da emergncia de novas identidades, que pertencem a outra base poltica,
como o feminismo, as lutas negras, os movimentos homossexuais, os grupos de contracultura, entre outros. Se a identidade assim o , ela se tornou politizada, pois a
forma como o sujeito interpelado ou representado pode ser auferida ou perdida. O
que era antes uma mudana de poltica de identidade de classe se reconstri para
uma poltica de diferena.
Desse modo, a arena poltica, aqui dimensionada nas prticas de visibilidades das
duas cidades, no delimitada por contornos pr-deinidos, e sim pelos lugares onde
os atores do mundo da arte agem conforme e sobre os demais, de forma a conseguir
que as representaes de mundo e as interpelaes se ratiiquem mutuamente nas negociaes cotidianas. Igualmente, h uma mediao entre as prticas de visibilidades
e suas polticas entre aes simblicas, abstratas, e o lado prtico de uma mesma ao
(Geertz, 1997 [1983]: 271).
110
Neddermeyer faleceu em 1951, encerrando prematuramente sua contribuio para a cultura goiana.
juntou-se ao seu colega, o alemo Gustav Ritter57, escultor e marceneiro, para formar
um movimento em prol da fundao de uma escola de artes.
Luiz Curado convidou, ento, o missionrio dominicano Nazareno Confaloni para
tomar parte do movimento. Confaloni, em 1950, fazia estudos para os afrescos da Igreja do Rosrio na Cidade de Gois. O anseio dos trs artistas Luiz Curado, Ritter e
Confaloni veio ao encontro da necessidade de novos cursos para a recm-criada
Universidade Catlica de Gois, em 1952. Nesse mesmo ano, incorporada Universidade, foi fundada a Escola Goiana de Belas Artes. Os professores dessa escola lutaram
pela formao de um movimento artstico em Goinia, no se limitando apenas ao
ensino. Sua inluncia foi decisiva para a inaugurao do Museu de Arte Moderna de
Goinia, em 1959. O Museu funcionou em prdio prprio no Lago das Rosas at 1961,
ano em que foi desativado. Em 1960, foi implantada a Universidade Federal de Gois.
Em 1963, outra escola de artes foi anexada a ela. Essa nova escola foi formada por dissidentes da Escola Goiana de Belas Artes. Apesar da falta de parte de seus professores,
em 1961 a Escola Goiana de Belas Artes58 ganhou novo flego com a contratao de D. J.
Oliveira, pintor paulista formado pela Fundao Armando lvares Penteado. Oliveira
montou seu ateli na prpria escola, colocando-se disposio dos alunos. Formou-se, assim, uma espcie de ateli livre, aberto a alunos regularmente matriculados ou
no. A rea das artes plsticas, em particular, sobressaiu-se em relao s outras reas
da cultura, em Goinia. No incio dos anos 1960, a cidade contava com duas escolas
de artes plsticas e com vrios artistas atuantes, muitos deles com grande aceitao
local. Alguns atingiram, mais tarde, reconhecimento nacional e internacional como
Siron Franco e Ana Maria Pacheco.
O desenrolar das artes plsticas em Goinia, ao longo dos anos 50, deu margem para
a organizao de eventos, como o Salo de Artes Plsticas da Universidade Federal de
Gois, em 1963. Tambm nesse ano a cidade j contava com sua primeira Galeria de
Artes, inaugurada por iniciativa da escultora Maria Guilhermina. Mas foi ainda nos
anos 50, no ano de 1954, que Goinia teve o seu evento mais ousado: o I Congresso Nacional de Intelectuais, realizado entre 14 e 21 de fevereiro. O Congresso foi organizado
por Xavier Jnior, presidente da Academia Goiana de Letras, e teve apoio da Associao Brasileira de Escritores. O Congresso contou com a presena de expresses nacionais e internacionais de relevncia. A repercusso do evento, em Gois, equivaleu-se
ressonncia da Semana de 22 no Brasil. Nacionalmente, o impacto pde ser comparado ao das primeiras Bienais de So Paulo. A exposio de artes plsticas contou com
317 obras. Entre os participantes encontravam-se: Osvaldo Teixeira, Quirino Campoiorito, Loio Prsio, Orlando Teruz, Glauco Rodrigues, Inim de Paula, Osvaldo
Goeldi, Carlos Scliar, Clovis Graciano, Vasco Prado, Mrio Gruber, Mrio Zanini,
Rebolo, Volpi, Djanira, Mestre Vitalino, entre outros59. Tambm expuseram valores
locais como Frei Confaloni, Ritter, Pclat, em coletiva organizada pela Escola Goiana
57
Ritter radicou-se em Goinia em 1949.
58
Em 1968 a Escola Goiana de Belas Artes voltou-se para o ensino de arquitetura, transformando-se na
Faculdade de Arquitetura da Universidade Catlica de Gois.
59
Ver Figueredo (1979: 95).
111
PRTICAS POLTICAS DE VISIBILIDADES NA AMRICA LATINA: TRADIO, RUPTURAS E RELAES ENTRE ALTERIDADES
de Belas Artes. De Veiga Valle foram expostos dezessete trabalhos. A arte popular
tambm teve o seu espao, apresentaram-se obras em madeira e cermica, tpicas de
Gois, e cermicas dos ndios carajs.
Percebemos que o incio do modernismo60 nas artes em Goinia contou com o
esforo de muitas pessoas. No era fcil implant-lo em uma regio ainda rida de
cultura e arraigada aos valores do passado. Mais difcil ainda foi fazer do modernismo uma expresso dos valores goianos, uma linguagem plstica disposio
tambm dos sentimentos e percepes regionais, capaz de atingir o imaginrio
local e, ao mesmo tempo, tomar para si valores universais. Esse salto foi dado por
Siron Franco, Gessiron Alves Franco, nascido em 1947 em Gois Velho, e herdeiro
de D.J. Oliveira e Cleber Gouveia. A partir da dcada de 1970, ele desponta no
cenrio nacional, depois de ganhar o prmio Viagem ao Exterior no Salo de Arte
Moderna em 1975. Hoje artista reconhecido em todo mundo, participando de
sales e bienais.
Na dcada de 1980, a produo artstica de Gois toma novo impulso com o crescimento
das cidades e o aumento do trnsito, principalmente em sua capital. Outros fatores tambm contriburam para a revigoralizao das artes em Goinia, como a grande quantidade
de informaes em circulao, em consequncia do processo de globalizao. Sob o rtulo
de Gerao 80, os artistas voltaram suas investigaes para a vida cotidiana. Nomes como
Edney Antunes, Z Cesar, Selma Parreira so referncias na cidade. Na dcada de 1990,
outros nomes vieram acrescer esse movimento como Pitgoras, Rodrigo God, Marcelo
Sol, entre outros. Esses artistas transitam entre categorias diferentes: desenho, pintura,
fotograia, gravura, assemblagem, instalao, interveno, escultura. Hoje, jovens nomes
emergem trabalhando com a fotograia, a arte digital, como Ludmila Steckelberg, Helga
Stein e Sandro Gomide, entre outros (Passos, 2008).
Em se tratando da cultura local, conigurada sob a forma de goianidade (Freitas,
1993: 183), podemos falar de diferentes dimenses, pois goianidade signiica reportar-se a vrias formas de se contar a histria do Estado. Ela se caracteriza na simplicidade como opo de vida, no senso de humor e na cordialidade simples, ao lado de certa
altivez e ufanismo em relao aos vastos horizontes, imensido dos cus, abundncia de guas e matas (Freitas, 1993: 183). Fato que a cultura goiana mestia por
excelncia, com forte acento na ruralidade. Nas artes visuais, no obstante existirem
hoje artistas estranheiros no goianos na cidade e dilogos com curadores de
outras cidades brasileiras, essa histria oicial continua sendo criada e sustentada por
um grupo de crticos e curadores goianos. Com isso, reairmam suas representaes,
seus poderes e lugares na trama social, cultural e artstica, na condio de estabelecidos na cidade, de maneira ainda regional.
60
O modernismo no Brasil tem como marco simblico a Semana de Arte Moderna, realizada em So Paulo, no
ano de 1922. O evento organizado por um grupo de intelectuais e artistas por ocasio do Centenrio da Independncia
declara o rompimento com o tradicionalismo cultural associado s correntes literrias e artsticas anteriores: o
parnasianismo, o simbolismo e a arte acadmica. O movimento representa um esforo de redeinio da linguagem
artstica e se articula a um forte interesse pelas questes nacionais, acentuadas a partir da dcada de 1930, quando os
ideais de 1922 se difundem e se normalizam. Apesar da fora literria do grupo modernista, as artes plsticas esto na
base do movimento.
112
113
PRTICAS POLTICAS DE VISIBILIDADES NA AMRICA LATINA: TRADIO, RUPTURAS E RELAES ENTRE ALTERIDADES
criaes. Em menos de trs anos em So Paulo, Kboco trocou a rua pela galeria e transgrediu, tambm, a regra imposta pelos prprios graiteiros, quando largou a Choque
Cultural, em direo Marlia Razuk, tradicional casa do Itaim Bibi, bairro nobre de
So Paulo, que representa e comercializa alguns dos mais importantes artistas contemporneos brasileiros. Com isso, enfrentou alguns desafetos da turma street art.
Kboco airma: foi em Goinia que decidi ter um trabalho na rua e tambm na galeria.
Estaria dentro e fora do circuito, sem limitaes ou regras. No quero saber de regras
de graite nem de artes plsticas. Vejo os artistas da arte muito fechados nos seus
conceitos.
Ele exps em 2009, na Bienal de Valencia, na maior feira de arte do mundo, a Art
Basel, na Sua, e na 9 Bienal Femsa Monterrey no Mxico, marcando, assim, sua
entrada deinitiva no mercado internacional. Autodidata, Kboco desenha desde a
infncia e hoje se pergunta: Sou um graiteiro que foi para a galeria ou um cara de
galeria que foi para a rua?
Essas caractersticas ainda permanecem e so algumas vezes reforadas pelas tradies. As transformaes ocorrem na mistura com o diferente, nos seus dilogos com a
114
alteridade, bem como com as rupturas radicais tanto de artistas como de grupos que
reagiram diante das imposies de modelos artisticos e representaes sociais, como
Siron Franco e Kboco.
La Victoria
La Victoria um bairro de Santiago do Chile encravado na populosa comunidade
de Pedro Aguirre Cerda. A ocupao de sua rea ocorreu em 1957, pelos sem-teto.
Foi uma conquista do espao geogrico e realizao do sonho da casa prpria em
meio rudeza e precariedade de uma situao de moradores de rua. Inicialmente,
apoiaram-se uns nos outros, construindo valores solidrios permanentes, ideia central de qualquer projeto comunitrio. Uma proposta poltica e social de autogesto
dos desabrigados. O nome sugestivo de La Victoria representa a vitria popular dos
desabrigados e um modelo seguido por milhes de chilenos nos anos posteriores. O
bairro no s famoso por ser a primeira invaso organizada das terras no Chile, na
Amrica Latina, mas tambm pelo esprito de luta e resistncia ao golpe militar e
ditadura de August Pinochet.
A cidade de Santiago a capital e maior cidade do Chile. Est localizada na Regio
Metropolitana de Santiago, no vale central chileno, ao lado da Cordilheira dos Andes. o centro cultural, administrativo, industrial e inanceiro do pas. Chamada de
Grande Santiago ou simplesmente Santiago, uma aglomerao que possui vinte e
seis comunas de maneira ntegra e onze comunas de forma parcial. A maior parte
de Santiago est na provncia de Santiago, com alguns setores perifricos dentro das
provncias de Maipo, Cordillera e Talagante. Ela a stima cidade mais habitada da
Amrica Latina e uma das quarenta e cinco maiores reas metropolitanas do mundo.
A comuna de La Victoria um foco importante de esquerda na Grande Santiago e embates com a polcia. No imaginrio coletivo o bairro marcado pela vitria de uma populao
invisvel como tambm pelo perigo que esse bairro representa. Nesse ltimo imaginrio,
pobreza vinculada marginalidade, perigo. H muitos que s veem nela a residncia
de gente que prefere viver s bordas da legalidade com motivos polticos mais ou menos
inquietantes. Para outros, ele representa o lado pitoresco e diferente da cidade. Poucos
veem os mritos de sua gente e como exemplo de superao de um grupo de pessoas, que,
unidas, lutaram para sair da marginalidade e, hoje, assumem com orgulho a condio de
smbolo das primeiras ocupaes de terrenos com ins habitacionais da Amrica do Sul.
La Victoria de Todos
No Chile, na dcada de 1960, Antonio Quintana props o projeto intitulado Rosto de
Chile, para registro documental de mulheres, crianas, homens, enim indivduos que
compunham a identidade chilena. Nessa tradio, nos anos de 1970 e 1980, beberam os
projetos autorais do Foto Cine Club, do Chile, e a Asociacion de Fotgrafos Independientes AFI.
Atualmente, cinco fotgrafos Samuel Shats, Teodoro Schmidt, Oliver Hartley, Arthur
Conning , advindos de contextos socioculturais distintos, se uniram a Lincoyn Parada,
ex-morador de La Vitria, para realizarem o registro fotogrico desse bairro. Eles capturam a memria histrica viva daqueles que so invisibilizados social e historicamente.
115
PRTICAS POLTICAS DE VISIBILIDADES NA AMRICA LATINA: TRADIO, RUPTURAS E RELAES ENTRE ALTERIDADES
Durante mais de trs anos, toda semana, eles adentraram por ruas, comrcio, igrejas, casas
e centros comunitrios, e forjaram com a comunidade um pacto invisvel de carinho e respeito. Buscaram por meio da fotograia (re)construir a identidade popular de La Victoria,
no s abarcando lugares, como tambm gerando forte sentido de pertencimento e identidade. La Victoria possui muitos modos de vida social, poltico e cultural.
Por meio das fotograias da exposio La Victoria de Todos, no Museu Nacional de
Bellas Artes MNBA, de Santiago do Chile, na ala norte do primeiro piso, realizada de 1 de dezembro a 20 de maro de 2011, conheci mais uma particularidade do Chile: neste pas subsistem
fortes barreiras culturais e sociais, as quais so, muitas vezes, obstculos para a comunicao com o outro e a alteridade. Assim, as diferenas no so valorizadas.
Nas fotograias dos artistas em questo visvel uma visualidade exuberante, com
muitos muros transformados em murais com contedos sociolgicos, culturais e polticos, renovados constantemente, os quais formam parte da vida diria de seus habitantes. possvel ver nessas imagens a vida pulsante em suas ruas, pela presena
constante de crianas, jovens e adultos, animais domsticos vivendo em liberdade.
Por eles circulam feirantes em sua lida diria, carregando verduras e frutas em todo o
tipo de veculo, vendedores ambulantes e, algumas vezes, um habitante transnoitado.
Para Gonzalo Leiva Quijada63,
La percepcin autoral fotogrica apunta a reconocer marcas anudadas y
tensiones estticas que dan cuenta de la historia de la poblacin. De forma
personal, cada fotgrafo va reconociendo por medio de retratos, calles, muros,
lneas de construccin, ferias libres, carros de letes, fachadas, etc, los smbolos
de realidades ms que simples instrumentos de accin.
63
exposio.
64
116
O que os artistas fazem com seus olhares e fotograias exercitarem uma linguagem
relexiva e perene, todavia, forte em seu aprofundamento, envolvendo-nos para que as
questes de um sejam tambm as de outros.
117
Referncias
Alves, Jos Francisco (org.), Experincias em arte pblica: memria e atualidade, Porto Alegre, Artfolio e Editora
da Cidade, 2008.
Arroyo, Julio, Bordas e espao pblico: fronteiras internas na cidade contempornea, in Arquitextos,
So Paulo, 07.081, Vitruvius, fev. 2007. Disponvel em: < <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/
arquitextos/07.081/269>.
Arroyo, Julio, Espacio pblico: fenomenologas complejas y diicultades epistemolgicas, in: Schutz, Alfred, El problema de
la realidad social, Bueno Aires, Amorrortu, 1995.
Bourdieu, Pierre, O poder simblico, Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 1989.
Chartier, Roger, A histria cultural: entre prticas e representaes, Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 1990.
Geertz, Clifford, A interpretao das culturas, Petrpolis, Vozes, 1997.
Hall, Stuart, Identidade cultural na ps-modernidade, So Paulo, DP&A, 2006.
Enciclopdia ita cultural: Artes Visuais, Modernismo no Brasil, Disponvel em: <http://www.itaucultural.
org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbete=359.> Acesso em:
04/05/2011.
Figueredo, Aline, Artes plsticas no Centro-Oeste, Cuiab, UFMT, MACP, 1979.
Freitas, Lena Castello Branco Ferreira de, Gois e a goianidade, in: Revista da Alag, Academia Feminina
de Letras e Artes de Gois, Goinia, n. 1, pp. 183-191, 1993.
Marc, Aug, No-lugares: introduo a uma antropologia da supermodernidade, So Paulo, Papirus, 1994.
Marinello, Juan D. K., Catalogo La Victoria de Todos, Santiago, Chile, MNBA, 2010.
Passos, Carlos Sena, Arte contempornea de Gois: experincias com a vida cotidiana, in: Revista UFG, Goinia, Ano
IX, n. 4, jun. 2008.
Palacn, Luis Gomez, Linhas estruturais da histria de Gois no sculo XX, in: Estudos Goianienses, revista
da Universidade Catlica de Gois, Goinia, Ano II, n. 2, pp. 45-53, 1. sem. 1974.
Queiros, Renato, O vale-tudo de Kboco, in O Popular, Goinia, p. 7, 17 abr. 2010. Caderno Magazine.
118
Introduccin
Los Angeles es una ventana que nos permite mirar la riqueza y diversidad de arte
pblico mostrada en sus murales, ediicios pblicos, calles, avenidas, bardas, vecindades, puentes, jardines, centros comerciales y en general en todos los escenarios que
proyectan las imgenes en movimiento, de ese espacio posmoderno. La inluencia de
los muralistas mexicanos posrevolucionarios mezclada con la formacin acadmica
anglosajona, se hace presente en las grandes paredes de las vecindades de East-L.A.,
una regin poblada por habitantes de ascendencia mexicana en su mayora. La migracin hacia Estados Unidos, ha acentuado la oferta de arte pblico producida por
artistas de ascendencia latina, mexicana y chicana en esta zona del este. El llamado
arte chicano iniciado en los aos sesenta, ha sido una corriente de creacin artstica y
de posicin poltica e identitaria ante la cultura dominante, donde el arte pblico ha
jugado un papel central, sobre todo en el formato mural. Actualmente el arte pblico producido por artistas de ascendencia latinoamericana en Los Angeles, muestran
algunos puntos de coincidencia en los procesos de produccin, en las inluencias acadmicas y en el uso de los materiales, donde el elemento de la cultura precolombina y
los rasgos de mexicanidad son centrales.
El objetivo de este trabajo es relexionar en torno del impacto del arte pblico producido por latinos en Los Angeles, particularmente con la oferta artstica diseada y
producida en el Centro Cvico del Este de Los Angeles. Esta ponencia se estructura
en cinco apartados, en un primer momento exponemos algunos datos relacionados
con el crecimiento poblacional de la cultura latina, particularmente la mexicana en
medio de la multiculturalidad angelina. En un segundo apartado, retomamos algunos
elementos y rasgos distintivos del arte chicano que impactaron la cultura y en consecuencia el arte pblico en Los Angeles. En un tercero y cuarto apartado compartimos
las propuestas de arte pblico ubicadas en Centro Cvico del Este de Los Angeles, enfatizando en particular en una propuesta escultrica (piedra travertina) de dos peces
que simbolizan la continuidad y esperanza ante la vida. Por ltimos incluimos unos
comentarios inales a manera de conclusiones.
119
Adems de los muralistas, la obra de Guadalupe Posada y Frida Kahlo tambin ejercieron inluencia en el arte chicano.
Muchos artistas chicanos, optaron por el arte pblico materializado en los muros y
paredes de las comunidades porque constituan los nicos espacios directos de expresin social donde la comunidad pudiera proyectarse a s mismo. Como dice el
artista chicano Rupert Garca, Los artistas transformaron estos muros vacos en espacios para hablar en pblico, con vibrantes colores, periles y iguras que relacionaban imgenes y transmitan al transente informacin sobre el movimiento chicano
(Garca, Rupert 1996: 468).
121
As como hubo inluencia mexicana en el arte pblico chicano, tambin hubo inluencia internacional aunque no en igual forma, del arte socialista de principios del siglo
XX, as como el arte realista sovitico y el arte revolucionario chino (Nieto, 1989).
El arte pblico chicano, jug pues un papel importante en los aspectos de concientizacin social y poltica, de resistencia ante la desigualdad vivida por un grupo tnico
que haba sido negado por muchos aos; el arte pblico se convierte as en una cierta
forma de esttica de la poltica. Este arte surge de la experiencia de la lucha y vislumbra una manera distinta de vivir, de organizar una sociedad, de crear relaciones ms
justas entre los hombres y vnculos ms inteligentes con la naturaleza y sus recursos;
de disminuir los conlictos y de utilizar la inteligencia del hombre en el bien de la
libertad (Garca Rupert, 1996: 462).
En ese mismo sentido, Margarita Nieto, se reiere al arte pblico materializado en las
paredes de la ciudad y al arte grico, ella dice:
La pared como una manifestacin de estticas sociales realistas, un sitio para
el arte que se comunica directamente con las masas, se transform en un punto
de encuentro entre el artista y la sociedad a inales de los sesentas y setentas,
aunque los murales chicanos eran los ms prominentes de ese periodo, fue un
movimiento que se desarroll por la comunidad artstica de Los Angeles en
general (Nieto,1989: 219).
Para los aos ochenta, el arte pblico urbano tuvo como referente simblico el asunto
de la frontera y la migracin. Es precisamente en esta dcada cuando la migracin
mexicana a Estados Unidos alcanz un crecimiento casi al doble de la dcada de los
setenta y de ah vino una especie de bola de nieve que no par ms. Actualmente, una
de las caractersticas de la migracin mexicana al vecino pas del norte, es su carcter
cclico, progresivo y expansivo.
Uno de los conos culturales de la migracin es la religin, particularmente el culto a la
Virgen de Guadalupe y a diversos santos apoyados en la igura de Cristo, que ha estado
presente por muchos aos en la vida cotidiana de la dispora de inmigrantes en Estados
Unidos. Particularmente en Los ngeles, son bastante referidos los murales callejeros
donde la igura de la Virgen de Guadalupe es un referente central. En el barrio del Este
de Los ngeles, donde la mayora de los pobladores hablan espaol, se han contado ms
de 250 murales alusivos a esta imagen (Durand J. y Arias, 2005: 359 y 360).
Otro tipo de murales signiicativos y representativos de la urbanidad contempornea,
se encuentra por ejemplo en la Plaza de los Mariachis, para representar la cultura de
los mariachis en Boyle Heights (Davis, M. 2000).
Tanto la frontera como la migracin, temticas retomadas en trminos de arte pblico, fueron llevadas al espacio privado: las galeras y museos. Los chicanos empezaron
a hacer exposiciones en galeras privadas durante los primeros aos ochenta a medida
que el movimiento que haba sido radical una vez en contra de lo establecido se iba
institucionalizando cada vez ms (Nieto, 1989:222). Aqu hay que destacar eventos
internacionales que dieron impulso al arte pblico chicano y latino, tanto el Bicente122
nario de Los Angeles en 1981 y Los Juegos Olmpicos de Los Angeles en 1984, llevaron
el reconocimiento institucional al movimiento muralista angelino.
Uno de los murales caractersticos de la cultura chicana en el Este de Los Angeles,
que incluso fue de los primeros de impacto social e ideolgico, es el mural de Willlie
Heron, titulado The Wall the Cracked Open (La Pared Agrietada) que marc una fase
nueva en el crecimiento de esa comunidad artstica y marc una nueva era de temas y
estilos integrando muralismo mexicano y tendencias europeas pero en un contexto de
inequidad, violencia y pobreza urbana. De acuerdo con Max Benavidez, el muralista
utiliz imgenes tpicas de la cultura chicana y mexicana, e integrando el grafiti que
se encontraba en las paredes, este mural se convirti en testamento a la violencia
social, econmica, poltica y psquica que permanece en los barrios pobres de Los
Angeles (Cheech, Marin, 2002: 11-12).
Una expresin cotidiana, espontnea y popular del arte pblico, particularmente en
Los Angeles fue y es el grafiti. Como manifestacin pblica, el grafiti ha fortalecido
la identidad de los migrantes con el entorno urbano y cultural que los rodea. Como
especialista y practicante del grafiti en esa ciudad angelina, Said Dokins (en Milenio
Online, 2010), argumenta que: La migracin ha favorecido la propagacin y el desarrollo del grafiti en el mundo como una forma de expresin en contra de la represin
y la injusticia, y por ende se ha convertido en el principal medio de identidad y unin
de este sector.
En trminos de arte pblico moderno, particularmente arte chicano, de acuerdo con
Benavides, se trata de una mezcla de la cultura mexicana, la ideologa estadounidense
y el modelo cultural europeo (vanguardista) orientado al consumo y a los medios de
comunicacin (Cheech Marin, 2002: 13).
Arte Pblico en el Este de Los Angeles: propuestas del Civic Center
En la ciudad de los Angeles, hay barrios con bastante trayectoria y cohesin social
como el Este de Los Angeles, que aglutina una gran cantidad de poblacin hispano
hablante en California (ms del 80%), donde la mayora son mexicanos o de ascendencia mexicana65. El este de los Angeles (East-LA), es una regin caliicada por el
censo norteamericano como census-designated place (CDP), se reiere a un cierto lugar
(ciudad, pueblo o villa) con una concentracin especica de la poblacin caliicada e
identiicada por el censo para ines estadsticos.
El Centro Cvico, se ubica en el Este de Los Angeles (entre avenida Mednik y Calle
tercera). Este lugar es un complejo arquitectnico que cuenta con biblioteca pblica,
centro de salud, estacin de tren, ministerio pblico y un parque, todos estos lugares con atencin bilinge (espaol e ingls). Adems de los residentes del este de
Los Angeles, este centro apoya servicios de las ciudades prximas como Montebello,
Monterrey Park, Commerce y la ciudad de Los Angeles.
En el ao de 2004, la Junta de Supervisores del Condado de los Angeles (Los Angeles
65
De acuerdo al censo del 2000, este barrio registr un total de 124.283 habitantes, de ellos, el 120.307
identiicados como hispanos. Es decir, el 96.8% de la poblacin. En el Censo del 2010, registr 134. 222.
123
County Board of Supervisors), adopt una poltica institucional que consiste en destinar
el 1% de su presupuesto para el arte cvico. Con esta decisin, se busca integrar de
manera formal, las propuestas artsticas dentro de los programas institucionales de
construccin cvico-urbana. A partir de esta iniciativa, se apoyaron ms de cuarenta
proyectos con un presupuesto aproximado 30 mil a ms de 300 mil dlares cada uno
(LA County Arts 2011).
En el ao 2002, se realiz una convocatoria abierta, para exponer obras pblicas en el
Centro Cvico del Este de Los Angeles, de esa convocatoria, resultaron inalistas seis
artistas, todos con ascendencia latina, mexicana y chicana; se formaron profesionalmente en el rea de Los Angeles, han articulado y fortalecido grupos de trabajo en esta
regin californiana.
La obra pblica de estos artistas ubicada en el Centro Cvico, tiene como perspectiva
comn el uso de referentes de la cultura precolombina mexicana, as como inluencias
acadmicas de autores contemporneos americanos (arte pop americano) y mexicanos. Se destaca uso de colores brillantes y contrastantes en sus obras; trabajan con
materiales tradicionales como mosaico, piedra, azulejo, metal; son materiales duraderos y de bajo costo en el mantenimiento que facilita el uso en el arte pblico.
A continuacin vamos a presentar rasgos generales de cada uno de los seis artistas y
sobretodo, sus propuestas de arte pblico diseadas y construidas con especial atencin a las necesidades del Centro Cvico del Este de Los Angeles66.
Michael Amezcua, es un escultor especializado en metal con estudios acadmicos
de antropologa. Sus obras pblicas estn situadas en diversos sitios de Los Angeles
como vas de transporte pblico. En particular las obras instaladas en Centro Cvico,
se localizan en el la entrada principal del lugar, su propuesta consiste en dos torres
de metal y concreto (6 metros de alto) que representan las actividades comunitarias
y gubernamentales. Estas incluyen educacin, recreacin, leyes, medicina, msica y
actividades recreativas; el estilo de estas obras representa la idea del papel picado, un
estilo tradicional mexicano, que viene de la poca precolombina.
Linda Arreola: es una artista plstica especializada en pintura, escultura e instalacin,
con maestras en escultura y arquitectura. Su obra en el Centro Cvico muestra doce
pirmides compuestas por dos colores de piedra travertina (con una medida de 91.5
centmetros de alto por 1 metro, 52 centmetros de largo). El estilo de esas pirmides alude a las culturas precolombinas de las pirmides mexicanas localizadas por
ejemplo en Chichen Itz (estado deYucatn en Mxico). Las obras estn colocadas en
funcin de los cuatro puntos cardinales, estas esculturas estn talladas con diseos
simblicos que representan los elementos naturales y los principios de la vida. Las
esculturas de Arreola, son espacios funcionales como sillas de descanso, lugares de
lectura y recreacin para que los nios puedan jugar alrededor de ellas.
Roberto Delgado: un artista plstico con bastante produccin de arte pblico, realiz
66
La informacin bsica y general sobre cada uno de los seis artistas, fue construida con base en el
conocimiento particular de su trabajo y tomando como referente tambin datos aparecidos en La County Arts Civic
Center (2011).
124
El concepto de la obra es de naturaleza lrica y hace una relexin a los ciclos perpetuos de la vida, se usa el pez como una metfora del renacimiento y renovacin. En ese
sentido, el lago es un smbolo de la matriz de la naturaleza, donde sale un pez y otro
regresa, como un ciclo constante de continuidad.
A travs de una caminata alrededor del lago, podemos percibir la riqueza de sentido
que evoca esta escultura pblica, Entrando por el lado sur, como direccin principal
de la calle hacia el lago, podemos percibir como el primer pez (pez joven), va emergiendo del agua, con su movimiento evoca una imagen de renacimiento, la brillantez
de su tallado llama a los espectadores a enfrentar una vida con fortaleza y un futuro
con esperanza. Al dar la vuelta al lago, el primer pez se aleja de nuestra vista y aparece
entonces el segundo pez que evoca una forma de acercamiento a la fase inal de la vida.
Lo que muestra esta escultura es un proceso de renovacin constante. Con esta escultura publica, su autor, tuvo oportunidad de expresar una idea espiritual, ilosica y
mstica, de hecho, son estos los elementos bsicos en la construccin de su propuesta
general de arte y el uso de la escultura en piedra a lo largo de los aos como artista.
En sntesis, para Rude Caldern, se trata de una caminata simblica alrededor de la
rueda de la existencia y del andar perpetuo por la vida. El pez ha sido un smbolo de
vida y de renovacin natural en muchas culturas a lo largo de la historia, simboliza
ciclos de inicio y in de la vida. Por otra parte, en el arte pblico se requiere materiales
duraderos y que requieran poco mantenimiento, en el caso de la escultura de los peces, el uso de la piedra, ha sido elegido tambin por razones del uso universal en toda
126
disporas migrantes, sino tambin (sin excluir esas propuestas), se crea arte pblico
con ideas que rescatan la historia, tradiciones, valores y cultura de las comunidades
de origen y destino de los migrantes.
En el caso del arte pblico del Centro Cvico, que hemos referido en este escrito, pudimos observar cmo la creatividad y las ideas propuestas por los artistas tienen puntos
de coincidencia y armona en trminos de rescate de la identidad mexicana y la historia de la comunidad, a travs de referentes precolombinos tanto en los materiales
como en los diseos. Por ejemplo las pirmides de Linda Arreola, los azulejos de Tito
Delgado, los mosaicos de Antonio Aguirre, el travertino de Rude Caldern, la cermica de Ricardo Doffy.
La propuesta del Centro Cvico en particular, nos habla de las posibilidades de recuperacin identitaria que tienen los artistas pblicos latinos y chicanos, que crean arte
dirigido para su propia comunidad y para sus propias races culturales. Por otro lado,
es importante reconocer tambin que no todo el arte pblico que realizan los artistas de ascendencia latina, releja necesariamente rasgos culturales y temticas de su
comunidad, pero su presencia por ejemplo en zonas y barrios anglosajones, afroamericanos o asiticos en Los Angeles, es importante en trminos de impacto cultural.
El arte pblico producido por latinos a inicios de este siglo, o por estadounidenses de
ascendencia latina, se est integrando cada vez ms al mainstream americano, ya no es lo
mismo que en la poca de los sesenta, con la emergencia del movimiento chicano donde los latinos o los artistas de ascendencia mxico americana producan obras como
una posicin poltica ante la cultura dominante, ahora el arte pblico est presente en
trminos de la urbanidad y posmodernidad de una ciudad como Los Angeles, donde la
misma naturaleza hbrida de la ciudad lo permite.
128
Referencias
Aug, Marc. De los lugares a los no lugares, en Los no lugares. Espacios del anonimato. Una antropologa de la
sobremodernidad, Gedisa, 1992: 81-118 pp.
California, Department of Finance, County of Los Angeles, California, January, 2010.
Consultado el 9 de mayo de 2011.
http://ceo.lacounty.gov/forms/Population%20Pg_Color.pdf
http://www.inah.gob.mx/index.php/boletines/2-actividades-academicas/4410-graffiti-identidad-demigrantes
County of Los Angeles, California. Civic Art Policy, Los Angeles County Arts Commission, December 15, 2009.
Consultado el 8 de mayo de 2011, en:
http://www.lacountyarts.org/UserFiles/File/Civic%20Art%20Policy%20APPROVED%2012-15-09.pdf
Davis, Mike (2000), Magical Urbanismo. Latinos Reinvent the US City, Verso, London, NY.
Dear, Michael and Flusty Steven (2002), Los Angeles as postmodern urbanism, en Dear Michael (editor).
Making Sense of Urban Theory, Sage Publications, London. Pp 61-84.
Durand, Jorge y Arias, Patricia (2005). La vida en el Norte, Historia e iconografa de la migracin Mxico-Estados
Unidos, El Colegio de San Luis y la Universidad de Guadalajara.
East Los Angeles (2011). Consultado el 12 de mayo de 2011
http://www.bestplaces.net/city/california/east_los_angeles
Garca Rupert (1996) Arte mural del movimiento chicano, en Maciel, David (1996), El Mxico olvidado,
Tomo II. La historia del pueblo chicano. Universidad Autnoma de Ciudad Jurez y Universidad de Texas
el Paso, Mxico. Pp 463-472.
Gonzales, Manuel G. (1999), Mexicanos. A history of mexicans in the United States, Indiana University Press,
United States of America.
Humes, Karen, Nicholas A. Jones, and Roberto R. Ramire (2010). Overview of Race and Hispanic. Origin:
2010, en Census Government. United States, Census 2010, Brief, 23 pags.
http://www.census.gov/prod/cen2010/briefs/c2010br-02.pdf
Los Angeles Countys Civic Art Collection. Discovery, Revitalization, and Growth,
April 2009. Consultado el 11 de mayo de 2011, en:
http://www.lacountyarts.org/UserFiles/File/CivicArt/LA%20County%20Collection%20Report%20PDF.pdf
La County Arts, 2011. Consultado el 10 de mayo de 2011, en http://www.lacountyarts.org/civicart_about.
htm).
Maciel, David (1996b). Mxico y el arte chicano, en Maciel, David (1996), El Mxico olvidado Tomo II. La
historia del pueblo chicano. Universidad Autnoma de Ciudad Jurez y Universidad de Texas el Paso,
Mxico, pp 129-166.
Marn, Cheech (2002), Chicano visions. American paintings on the verge, A Bulinch Press book, Little Brown and
Company, Boston.
Milenio Online (2010). El grafiti, medio de identidad en migrantes, 14 de junio de 2010.
Nieto, Margarita (1989). Le Dmon des Anges: A brief history of the chicano-latino artist of Los Angeles,
en Le Demon Des Anges. 16 Artistes Chicanos al Voltant de Los Angeles, Centre DArt Santa Mnica Barcelona,
Generalitat de Catalunya, Departament de Cultura., pp 217-223
The history of Los Angeles, Graffy Art. Consultado el 2 de mayo de 2011
http://www.thehistoryolosangelesgrafitiart.com/main.htm
Uribe, Ana B (2009). Mi Mxico imaginado. Telenovelas, Televisin y Migrantes, Miguel Angel Porra, Colegio de la
Frontera Norte, Universidad de Colima, Mxico.
129
130
das pelos crticos de arte. Os trabalhos de artistas que expem questes polmicas
como as temticas sociais enriquecem esse discurso.
Lacy responsvel pela terminologia novo gnero de arte pblica como um contraponto ao termo arte pblica que bastante usual e desprovido de signiicado
uma vez que pblico tem diversas conotaes dependendo do referencial. O trabalho desta autora acaba inluenciando decisivamente Rosalyn Deutsche, que tem uma
posio comum a Lacy em sua crtica. Ela contra o discurso democrtico inserido
na Nova Arte Pblica 68 e denuncia a indiferena a tenses no espao urbano como os
conlitos sociais e raciais, o descaso do poder pblico e a emancipao do crime organizado. Deutsche defende uma arte que supra relaes concretas e que interrompa
a poltica de excluso hegemnica (Deutsche, 1996). A arte pblica no deve necessariamente estar no espao urbano e nem nos locais de acesso restrito. Pode no ser
permanente e pode ser efmera. Desta forma o novo gnero de arte publica no restrito a alguns lugares. A arte est presente onde o artista estiver e for necessrio se
comunicar. A obra pode transitar tanto nas grandes metrpoles quanto nas pequenas
vilas onde esse contato com o pblico foi outrora restrito.
Nelson Peixoto um autor que tambm critica o posicionamento da nova arte pblica e denuncia a privatizao do espao pblico com anuncia governamental. Locais
subjugados pelo funcionalismo da metrpole so mencionados como no lugares
(Peixoto, 1996: 400). Os exemplos so casas e fbricas abandonadas em detrimento
da modernidade traduzida nos empreendimentos corporativos metropolitanos. Peixoto sugere que a arte deve ser crtica em relao a esses antagonismos e que salutar
interferir criativamente promovendo relexo dos indivduos. Ele tambm coloca as
condies informais de vida como substratos que se confrontam inevitavelmente com
as coniguraes urbanas existentes. Os projetos de desenvolvimento viabilizados nas
cidades objetivam as classes abastadas ignorando quem realmente necessita de projetos
de incluso. Diante desta realidade, Peixoto defende intervenes crticas a partir dos
prprios excludos produzindo relexo por parte dos atores urbanos.
A cidade um espao compartimentalizado pelo capital e pelo
trabalho. Mas movimentos colocam continuamente em xeque essas reparties
rgidas. Processos luidos que vazam atravs dos limites, reconigurando de
outro modo as situaes. As populaes sem moradia, os que se dedicam ao
comrcio informal e os catadores de papel so os agentes desses luxos que
corroem as estruturas urbanas estabelecidas [...]. Os nmades metropolitanos
operam contra as polticas urbanas e os empreendimentos imobilirios que
determinam a estruturao excludente da cidade (Peixoto, 1996: 424).
Apesar das crticas macias elaboradas por Peixoto onde se circunscreve a privatizao do espao pblico, no se pode deixar de reconhecer a legitimao da contribui68
Nova Arte Pblica o termo proposto por tericos contemporneos aos quais Lacy e Deutsche se opem em
seus trabalhos.
131
o privada no que tange ao acesso indiscriminado obra de arte. Este foi o caso nos
trabalhos de Beardsley e qualiica o modelo de arte pblica institucional como vlido,
pois socializa as aes dentro de um conceito de arte comum aos grandes centros. A
cidadania empresarial um projeto desenvolvido por instituies como o Banco do
Brasil e o Ita com vistas a patrocinar projetos, sejam eles arte perene ou efmera,
individual ou coletiva, de domnio pblico ou privado (Moraes, 2001). Por outro lado,
a arte pblica no-institucional possui vida prpria e, provavelmente, a mais democrtica de todas as manifestaes, presente no apenas nas grandes cidades. Dentro
do que Suzanne Lacy deine conceitualmente como novo gnero de arte pblica
possvel reunir ambas as dimenses institucional e no institucional ignorando o
preconceito hegemnico com linguagens de domnio popular e autnomo.
Na referncia a Aug, a autora apresenta os no-lugares como recintos de passagem, sub-utilizados, pragmticos e no-antropolgicos que abrem oportunidade a que o indivduo
volte-se sobre si prprio e conigure subjetividades. No decorrer desse artigo percebe-se
que essa descrio se aplica a uma localidade que, no compe um grande centro urbano
e que serve de exemplo de muitas realidades latino-americanas. nessa perspectiva que
o no-lugar compreendido na relao arte pblica e moradores da Ilha de Mosqueiro.
Mosqueiro uma ilha situada s margens da Baa do Maraj, distante 60 quilmetros
do centro de Belm. Faz parte de um arquiplago famoso por suas praias de gua
132
doce e com sol o ano inteiro. Apesar de ser um local com forte potencial turstico, a
populao renegada pelo poder pblico e as condies de vida so modestas para a
maior parte dos moradores. O problema social tem produzido fenmenos tpicos das
grandes cidades como o trico de drogas e a violncia urbana mesmo num universo
reduzido a vinte e sete mil habitantes69. A ao artstica local mais latente no-institucional, representada pelo graitti de rua. A baixa qualidade tcnica, com esboos
rudimentares e a ausncia de traos estilsticos caractersticos dessa manifestao
urbana so ocasionados pela falta de interao dos graiteiros com o universo atual. As praas dispem de manuteno peridica devido estao das frias de julho
quando a ilha recebe milhares de visitantes. Ainda assim, no se pode considerar a
conservao dos jardins das praas como um processo de interveno urbana, embora
os agentes distritais persistam em dar a entender isso.
Obras Perenes
Em Mosqueiro no se percebem manifestaes de arte pblica institucional alm da
modalidade tradicional. como se a localidade tivesse realmente parado no tempo.
Aqui no se pretende fazer uma anlise estilstica e formal das obras. Apenas situ-las
dentro da apreenso tradicional que se colocou anteriormente com base nos autores.
Na conigurao de arte pblica onde se tem destaque o pragmatismo monumental,
pode-se destacar duas obras:
A primeira est localizada na Praa de Carananduba, o centro de um dos bairros mais
populosos do balnerio. A obra uma singela homenagem ao fundador da praa, o
comendador Arthur Pires Teixeira e composta de uma foto de seu busto em bronze.
69
As informaes contidas nesta seo constam em uma pesquisa realizada em Mosqueiro no ano de 2003 por
uma equipe tcnica da Secretaria Municipal de Educao de Belm.
133
134
tar do escultor pernambucano Bibiano Silva que foi diretor e professor da Escola de
Belas Artes do Recife na dcada de 1940. provvel que a obra seja uma encomenda
da Prefeitura de Belm ao escultor que naquela dcada tinha certo nmero de trabalhos erguidos em Recife e outras cidades brasileiras71. Embora seja reconhecido como
um mestre da escultura pelas geraes posteriores de artistas pernambucanos, no se
tem dados biogricos do autor e nem informaes detalhadas sobre o acervo de suas
obras. Para muitos em Mosqueiro, a obra no tem qualquer signiicado ou relao com
o lugar. Mesmo que seja uma homenagem a um cone popular centenrio a princesa
Isabel no h correlaes atuais alm do apelo ao congraamento tnico.
Ambas as obras mencionadas retratam uma concepo milenar de arte pblica e distante do que se costumou elaborar na vanguarda artstica dos ltimos trinta anos nas
grandes metrpoles. Tambm serve para entender at que momento da histria o distrito de Mosqueiro respirou desenvolvimento cultural com anuncia governamental.
Em outras palavras, e parafraseando Aug, isso mostra at que momento a ilha no foi
um no-lugar. Daquela poca at hoje, a localidade passou por mudanas importantes
como a construo da Ponte Sebastio de Oliveira, inaugurada em 1976 interligando
a ilha ao continente e possibilitando o acesso de um maior nmero de visitantes e
provocando grande especulao imobiliria (Alves et al., 2003). Mas no que tange
produo intelectual e criao de trabalhos institucionais que valorizem a memria
local, nada se produziu nos ltimos sessenta anos, mesmo porque no h sequer um
projeto srio para a ilha. Desta forma, as praias so preparadas para privilegiar os
veranistas que ocupam suas casas na alta temporada e os moradores da ilha tm que
se contentar com os servios prestados a estes visitantes no intuito de obter lucro ao
menos uma vez no ano.
A questo como j foi dito antes remete aos autores contemporneos Nelson
Peixoto e Rosalyn Deutsche que, ao escreverem sobre as contradies das grandes
cidades, criticam o posicionamento do poder pblico diante das mazelas sociais.
Mosqueiro, apesar de ser apenas um distrito da metrpole paraense, est plenamente
representada enquanto entropia urbana 72.Outro fator gerado pela excluso social
o descaso com os recursos naturais. Os novos moradores, que vm de outras cidades
e at de estados vizinhos em maior nmero a partir da dcada de 80, so responsveis
pelo colapso da estrutura socioeconmica local (Alves et al., 2003). O resultado a
invaso de terras nativas, a princpio, em busca de madeira e, posteriormente, para
ixar moradia.
Como facilmente se conclui, os temas relacionados do subsdios favorveis a qualquer trabalho de arte pblica que se proponha a uma abordagem crtica desse lugar.
A ausncia da esfera pblica no sentido de promover incluso e de uma populao
culturalmente desconectada com as possibilidades contemporneas. Neste caso, no
se refere apenas aos socialmente excludos, mas, alm do que rotineiramente vem se
71
Informaes obtidas na secretaria da Agncia Distrital de Mosqueiro em Junho/2009.
72
Nelson Peixoto utiliza o termo entropia urbana para se referir ao congestionamento estrutural causado pelos
empreendimentos urbanos destinados a uma classe privilegiada.
135
contestando no mbito poltico e social, se inclui o tema ambiental que historicamente foi a principal marca da localidade e que vem se deteriorando rapidamente com o
passar dos anos.
Obra efmera
Apesar da falta de exemplos de arte pblica na ilha, ao menos um trabalho importante ser destacado. Danielle Fonseca uma artista que se inspira na obra do escritor
Max Martins para dar asas a uma interveno compondo poesia visual no percurso
entre a casa do artista em Belm e sua cabana na praia do Marah. Ela se baseia no movimento neoconcreto brasileiro da dcada de 60 para que a poesia ative a relao do
sujeito com a obra (Fonseca, 2005). Danielle tem como objetivo criar um itinerrio
real entre a poesia de Max e a realidade concreta. Para isso so confeccionadas esculturas em ferro jateado com tinta industrial. O material durvel da obra serve como
metfora aplicada poesia j que esta tem o poder de permanncia. Estas esculturas
representam indicaes do caminho cabana do poeta.
(1998) o que no ocorre na poesia visual de Danielle, que no faz referncia temtica
ambiental. Por outro lado, sem o bucolismo do lugar, no haveria elementos visuais
que inspirassem a obra de Max Martins e, conseqentemente, no existiria a proposta de Danielle. Entender a importncia da ecologia para o trabalho artstico nesse caso
especico no deixa de ser uma inovao.
As aes artsticas representam oportunidade no s para os artistas locais, mas tambm para a populao que tem em Mosqueiro o seu maior ambiente de expectativas.
A interveno de arte pblica com suporte institucional como foi o caso de Danielle Fonseca talvez seja um sonho longnquo para quem vive em Mosqueiro, mas as
intervenes autnomas no. Neste caso vale o incentivo da comunidade artstica s
aes no-institucionais que podem signiicar uma alternativa para que artistas representantes das minorias se manifestem. H um apelo no sentido de criticar o descaso
com a questo ambiental na ilha, por isso atividades arte-educativas so bem-vindas e
urgentes. De tal modo compreende-se que a arte crtica de Lacy tambm reproduzida
por Deutsche teria eco entre os amantes do balnerio causando desconforto por parte
daqueles que encontram comodidade na excluso social.
Referncias
Alves, Maria Duarte et al., Pesquisa da cartograia sociocultural de Mosqueiro, Belm, Secretaria Municipal de
Educao SEMEC. 2003.
Beardsley, John., Art in public places: a survey of community sponsored art projects supported by the National Endowment
for the Arts, Washington, D.C. Partners for livrable places, 1981, pp. 9-90.
Bueno, Maria Lucina Busato, Vivncias do fazer pictrico com tintas naturais, Passo Fundo, Ed. Universidade de
Passo Fundo, 2005.
Deutsche, Rosalyn, Evictions: art and spatial politics, London, The MIT Press, 1996, pp. 49-107.
Fonseca, Danielle, Caminho de Marahu: itinerrio potico e real at a cabana de Max Martins Relatrio inal, Belm,
Instituto de Artes do Par IAP, 2005.
----------------------, O tao caminho, Belm, Disponvel em www.otaocaminho.zip.net. Acesso em 29 Jul. 2009.
Lacy, Suzanne, Mapping the terrain, new genre public art, USA, Bay Press, 1996, pp. 11-36.
Maderuelo, Javier, La perdida del pedestal, Madrid, Crculo de Belas Artes, 1994, pp. 15-105.
Moraes, Anglica, Pblico e privado: A atuao do CCBB e do Ita Cultural, in Caderno T, n. 03, jan. 2001,
p. 5-11.
Peixoto, Nelson Brissac, Paisagens Urbanas, So Paulo, Editora Marca Dgua, 1996, pp. 393-436.
Werneck, Maria Helena, Espao teatral: a literatura e as imagens em cena, in Margato, Izabel e Renato Cordeiro
Gomes (orgs.), Espcies de espao: territorialidades, literatura, mdia, Belo Horizonte, UFMG, 2008, pp. 7-17, 289303.
137
Waldemar Zaidler
USP
138
ravelmente inserida no campo da cultura, pode preservar caractersticas contemporneas, e ser conservadora no sentido de registro crtico , produtora, ou ainda
questionadora da memria social e poltica, assim como de referncias estticas.
Segundo Vera Pallamin,
A cultura socialmente situada e espacialmente vivida. Suas signiicaes
so espacialmente encarnadas, sendo o valor cultural dos objetos e obras
no imanentes a estes, mas sim do tecido e nervurado nas relaes sociais
que lhes do sentido. A manifestao artstica no espao pblico como uma
modulao nesta trama (Pallamin, 1999: 29).
Mas a estas concepes contemporneas das relaes arte/cidade opem-se aquelas que, insistindo em ignorar a complexidade do binmio, so ainda regidas pelos
pensamentos cujas razes remontam ao sculo XVIII, que mitiica as artes e os artistas; vises que ainda se submetem s concepes acadmicas e arte enquanto
instrumento de distino social e dominao cultural. Concepes estas presentes
ainda hoje, e que tm formidvel peso nas negociaes que permeiam as diversas
instncias do processo de produo de arte para a cidade. Ideias como enfeitar a
cidade, museu a cu aberto ou ainda transformar a cidade numa grande galeria
continuam surpreendentemente soberanas em meios como imprensa, universidades, poder pblico e em boa parte do prprio meio artstico. Para muitos, ainda,
a arte na cidade tem funo comemorativa, mantenedora de efemrides. Como em
qualquer campo, o confronto entre essas concepes revela interesses determinados, de ordem ideolgica, poltica e socioeconmica.
No se pretende aqui discutir a legitimidade dessa ou daquela postura. A multiplicidade de opinies, sejam quais forem, sempre bem-vinda. H, entretanto, manipulaes antiticas de determinados aspectos desse universo que nublam e obstruem
o encaminhamento das discusses e dos processos de produo, sempre tentando
desvirtu-los de maneira a favorecer interesses particulares, sejam estes polticos
ou econmicos, desta ou daquela instncia que atua no campo da produo de bens
simblicos. Um dos expedientes utilizados nessa manipulao tirar partido da
ausncia de uma nomenclatura diacrtica, precisa, que caracterize os diversos processos de encomenda, criao, produo, insero e manuteno de uma obra de
arte no espao pblico. Qual , ainal, a diferena entre os termos arte urbana,
arte pblica e arte de rua? E a qual destas categorias, se pudermos assim nome-las, pertenceriam manifestaes como o mural, a escultura, o monumento, a arquitetura, a performance, a instalao, o grafiti, o photobomb, o tag, o lambe-lambe etc.?
No se trata de uma tentativa de se estabelecer categorias estticas, tampouco de
questo meramente semntica. Trata-se de identiicar e discutir diferentes mtodos
de produo, sistemas de mercado, possibilidades de sustento e remunerao adequada dos artistas, enim, de um esforo para colaborar na objetivao da discusso
sobre teorias, polticas pblicas e procedimentos prticos, no sentido de incrementar a produo de arte para a cidade, assim como promover equilbrio e diversidade
139
Polariza-se aqui a discusso nos processos de encomenda e deciso pelo poder pblico e pelos artistas e suas comunidades, lembrando o objetivo de examinar os processos pelos quais se d o contgio entre ambos, com a consequente busca de legitimao
em campos imprprios, o que resulta em perdas para todos, como veremos adiante.
O monumento pichado
Interessante exemplo de embate entre encomendador e artista, ocorrido no Rio de
Janeiro em 1942, veriica-se na correspondncia entre o ento ministro da Educao
e Sade, Gustavo Capanema, importante personagem na construo da identidade
visual nacional da era Vargas, e Cndido Portinari, a quem encomendou a confeco
de murais para a nova sede de seu ministrio. (Fabris, 1996: 66). curioso comparar o
resultado inal do trabalho de Portinari com as orientaes e determinaes temticas
e de representao explicitadas nas cartas do ministro. delicioso o drible que Portinari aplicou em Capanema. Mas importante notar que da somatria de processos
dialticos como o deste exemplo que surge a identidade oicial de uma nao. Ou seja,
a arte pblica, encomendada pelo poder pblico, participa diretamente da criao e
da manuteno da identidade do pas, da metrpole, da cidade ou da comunidade e,
por mais democrtico que sejam os mecanismos de seleo do(s) artista(s) e escolhas
temticas, haver sempre um comprometimento ideolgico e poltico, cujo grau poder variar em funo da capacidade e atuao crtica e esttica do artista.
Tanto que a obra resultante da negociao acima exempliicada, mostra que ambos
concordaram em um importante ponto: a monumentalidade.
O monumento representa sempre a manuteno ou a criao do iderio das classes
dominantes, inclusive no que se refere formao do bom gosto que, segundo Stevens, o mais eiciente mecanismo de excluso social. (Stevens, 2003: 87).
Historicamente, segundo Nicolau Sevcenko74, a grande arte monumental de Roma
antiga no foi produzida na participativa Repblica, mas no repressivo e totalitrio
Imprio, gerando os arcos do triunfo de Stimo Severo e Constantino, no por acaso
referncias para o Arco do Triunfo de Bonaparte e tantos outros; so do mesmo perodo as colunas triunfais de Trajano, e tambm a estaturia equestre, que em Roma
homenageou Csar e, em So Paulo, Duque de Caxias; este mereceu a honraria por
ter afogado em sangue revoltas populares contra o poder do Imprio. Os monumentos so signos do poder, e deles os dominados, sempre que tm oportunidade,
arrancam uma casquinha. No foi por no saber o valor das obras que o invasor
brbaro destruiu os monumentos romanos, ou que o terrorismo atacou as Torres
Gmeas nos EUA, assim como no foi por mero vandalismo que graitaram o Cristo
Redentor no Rio de Janeiro.
Mas h aqui outro interessante ngulo de abordagem do monumento: a perenidade da
obra em si e os sucessivos dilogos que esta estabelece com os diferentes contextos e
momentos histricos, e sua consequente ressigniicao simblica e esttica. Harriet
74
In Arte pblica, 1998: 136. Nicolau Sevcenko professor de Histria da Falculdade de Filosoia, Letras e
Cincias Humanas da Universidade de So Paulo.
141
Senie75 ilustra esta abordagem comentando um episdio em que o Papa Paulo III, em
1537, por ocasio da criao de um novo centro cvico, encomenda a Michelangelo
a construo de um novo edifcio em torno da praa frontal ao centro religioso da
cidade, e que para l deslocasse a esttua equestre do imperador romano Marco Aurlio. Nessas circunstncias, a escultura incorporou um novo signiicado simblico
[...] sendo vista como elo direto com Roma Antiga, incorporando a histria da cidade
em seu centro cvico atual, derivando seu novo signiicado do contedo atual. Tal elo,
nesse contexto, pode tambm ser visto como uma ddiva para que a histria possa se
reinventar, alimentando relexes e sentimentos das mais diversas naturezas.
Outro interessante exemplo de manuteno da identidade oicial via interveno
no imaginrio da populao foi a criao, em So Paulo, do mito do Bandeirante. O
personagem foi alado condio de heri no incio do sculo XX e exaustivamente
retratado segundo determinaes da imaginao de Affonso de Taunay, ento diretor
do Museu Paulista, que encomendou a vrios artistas obras, nelas interferindo como
faria atualmente um diretor de arte na produo de um anncio publicitrio. Ainda
hoje a esttua do bandeirante Borba Gato, obra do escultor Jlio Guerra inaugurada
em 1963 em comemorao ao IV Centenrio de Santo Amaro (bairro paulistano),
a mais importante referncia visual da regio e a ideia do bandeirante como emrito
benfeitor continua presente no imaginrio de milhes de mentes ingnuas.
Mas se a encomenda da esttua de Borba Gato indica a necessidade de as elites se
airmarem como legtimas herdeiras do passado, a encomenda do Monumento s Bandeiras ao modernista Brecheret tem como possvel leitura a necessidade de as mesmas
elites se airmarem como progressistas, morgados do futuro.
75
In Arte pblica, 1998: 35. Harriet Senie autora de Contemporary public sculpture (Oxford University Press,
1992) e co-editora de Critical Issues in public art (Charper Collins, 1992).
76
Fonte: Site oicial da Virada Cultural. Disponvel em http://www.viradacultural.org. Acesso em 15/04/2011.
142
da paisagem, transformao esta a ser percebida pelos prprios agentes transformadores. Cada participante, seja ele artista ou pblico, em si um elemento ativo e passivo fundamental da interveno.
No deixa de ser um formidvel avano em relao aos arcos do triunfo e s colunas de
Trajano. Em certo sentido, pode-se considerar este evento como uma monumental interveno artstica com a marcante presena de ingredientes da arte contempornea,
fruto de criao coletiva, de autoria indeinida mas de forte autoridade que no se
deixa escorregar para o autoritarismo. Proporciona ao pblico uma fruio que vai
muito alm do mero consumo das atividades artsticas apresentadas, e lhe apresenta
a oportunidade de ele prprio ser o artista e o ator da arte de rua.
A arte de rua
No se pretende aqui deinir o termo arte de rua, mas sim nele identiicar nuances
e particularidades que possam posicion-lo e colaborar na preservao de sua autenticidade e de seu espao no amplo campo da arte pblica, reforando as trincheiras
contra as inevitveis tentativas de cooptao ideolgica e comercial.
No sentido que vem sendo utilizado, arte de rua a traduo literal de street art, termo j
comprometido, j cooptado no prprio idioma de origem. O ingls Cedar Lewisohn, por
exemplo, por muitos considerado um importante street art curator, um headhunter
das artes estabelecidas, encarregado de decidir o que o joio e o que o trigo na produo artstica de rua. Autor do livro Street Art: the grafiti revolution (2008), utiliza o termo
com a mesma funo da palavra graite que, no se sabe por qual equvoco semntico,
tornou-se a traduo brasileira para grafiti. Mas esse assunto ser tratado mais adiante.
Se o termo arte de rua aqui utilizado, menos por consider-lo ideal e mais pelo receio
de propor um substituto e aumentar a confuso antes de pelo menos tentar esclarec-lo. Talvez o termo cultura de rua fosse mais apropriado, utilizando a palavra arte para
indicar produto gerado por artistas, com inteno esttica, crtica, analtica etc. Mas
esta discusso ica para um outro artigo.
Segundo Johannes Stahl, j em 1933 o fotgrafo e ensasta Brassa utiliza o termo em
seu ensaio Du mur des cavernes au mur dusine, publicado em Paris no n. 3/4 da
revista Minotaure (importante veculo do movimento surrealista), ao se referir arte
bastarda das ruas de m fama como
...to menosprezada que mal capaz de despertar a nossa curiosidade, to
incerta que as inclemncias do tempo a podem apagar [], pe de pernas para
o ar todos aqueles sistemas estticos que tanto tempo levaram a introduzir. A
beleza no , na verdade, o objetivo de sua criao, mas a sua recompensa.
Brassa v na arte bastarda, nos grafiti que fotografa com requintada poesia, o fetiche primitivista tribal, inclusive como elemento de referncia para a arte contempornea daquele momento (Stahl, 2009: 7), problematizando a noo Ocidental de primitivismo ao questionar se no haveria algo de sagrado incrustado nos mais comuns
e familiares objetos de nosso dia a dia.
143
Esta peculiaridade talvez seja uma das principais caractersticas da autntica arte de rua: o
fato de ela participar de nosso cotidiano sem aviso prvio, alis, sem aviso de qualquer espcie, sem pedir licena, sem pedestais ou no-me-toques, sem crach de obra de arte, singela
e despretensiosamente, anunciando sua efemeridade como algo quase que humano, casustico, errtico; ao mesmo tempo, sempre crtica e diretamente relacionada com sua poca,
e eventualmente com uma esttica crua, agressiva, contestatria, reivindicatria, s vezes
nada agradvel, mas ainda assim admirvel. Trata de questes, sentimentos e aspiraes que
pairam suspensos em planos intermedirios entre as malhas das redes deinveis, e que com
estas s podem se conectar via a capacidade de inveno do cidado. Por isso instiga esta
capacidade, e por isso torna-se essencial. AMAR IMPORTANTE, PORRA!77
Michel de Certeau, em sua obra A inveno do cotidiano, tece oportunas consideraes
acerca de algumas maneiras de pensar as prticas cotidianas. Habitar, circular, falar,
ler, ir s compras ou cozinhar so gestos hbeis do fraco na ordem estabelecida pelo
forte, correspondentes s caractersticas das astcias e das surpresas tticas. Certeau chama de arte do fraco a ttica
que no tem por lugar seno o lugar do outro. [] No tem meios para manter
a si mesma, distncia, numa posio recuada, de previso e de convocao
prpria: a ttica movimento dentro do campo de viso do inimigo, [] e
no espao por ele controlado []. Ela opera golpe por golpe, lance por lance.
Aproveita as ocasies e delas depende, sem base para estocar benefcios,
aumentar a propriedade e prever sadas. [] Tem que utilizar, vigilante, as
falhas que as conjunturas particulares vo abrindo na vigilncia do poder
proprietrio. A vai a caa. Cria ali surpresas. Consegue estar onde ningum
espera. astcia (Certeau, 1994: 100-101).
Grafiti x graite
Para o campo da cultura, trs entidades compem a vanguarda estratgica de defesa
do sistema dominante, e so por ele enviadas ao menor sinal de ameaa. Estas entidades desempenham na contemporaneidade o papel de mitos, cujas representaes
alegricas bem poderiam ser A Sedutora Prostituta, que encarna na publicidade a
sua persuaso, O Co de Guarda Devorador, que articula as vrias reas da indstria
cultural, e O Mago Hipnotizador, que empresta seus poderes retricos imprensa
e suas mdias. Certamente devem ser aqui explicitamente salvaguardados os jornalistas ticos e sensveis, os industriais da cultura progressistas e esclarecidos, e aqueles
publicitrios bem-intencionados. Mas, de modo geral, no h como negar o comprometimento desses segmentos com a defesa dos interesses das elites dominantes, ou
das que disputam os privilgios do poder.
77
144
fenmeno que se manifestou foi a pichao realizada primeiro por poetas, e logo em
seguida por artistas plsticos. Foi tambm a poca em que a relativa facilitao do
acesso tecnologia possibilitou a reformulao das ideias na utilizao do vdeo
como linguagem, e a arte de rua se apresentou como excelente tema para experimentaes videogricas, o que em muito ajudou na popularizao de ambas. Tal
aproximao foi profcua, e em grande parte forneceu o DNA para o desenvolvimento das ramiicaes que hoje destacam a arte de rua no mbito das redes sociais
mundiais que povoam a internet.
Outros fatos importantes e raramente apontados acompanharam a passagem das
pichaes dos anos 70 para os 80. Em primeiro lugar, o Brasil iniciara, ainda que
gradualmente, o processo de capitulao da ditadura militar vigente desde 1964,
transio poltica que repercutiu intensamente na rea cultural. A pichao, valendo-se sempre de sua ttica e astcia, no deixou a oportunidade passar em branco. Por um lado, a polcia, natural repressora da pichao, se via confusa diante da
explicao apresentada por jovens pichadores de classe mdia, universitrios, que
realizavam suas incurses noturnas em automveis do ano. Os policiais, assumindo
postura tpica e inevitvel de uma corporao submetida e reprodutora de desmandos das mais variadas naturezas durante longos quinze anos, titubeavam diante
da eventualidade de estarem interpelando ilhos de algum coronel. O argumento
utilizado para confundir os policiais que desgraadamente lagravam algum pichador era, basicamente, de que aquela pichao embelezava a cidade, que era arte,
que era lio de casa da universidade, enim, conversa mole pra boi dormir que
deveria convencer apenas os policiais, mas que produziu um surpreendente efeito
colateral: a mesma lenga-lenga comeou a ser reproduzida pelo Co Devorador,
pela Prostituta e pelo Mago, sobretudo quando a pichao passou a se valer, com
mais frequncia, de imagens mais elaboradas e complexas.
Esta distino entre imagens e palavras na pichao, que uma das justiicativas mais
apresentadas para o emprego da palavra graite em detrimento de grafiti, vem sendo
utilizada por muitos como ponto de partida para argumentos de ordem esttica. Claro est que os que assim pensam no analisaram com o devido vagar os versos ento
pichados, assim como os atuais tags, letterings, bombs, pixos, assinaturas etc., a ponto de perceb-los tambm imagticos. As letras desempenham as mesmas funes
que qualquer imagem no que se refere revelao do valor ontolgico do espao e da
paisagem do meio urbano, sobretudo aquelas assinaturas codiicadas que surgem em
locais absolutamente inacessveis a qualquer cidado comum. Inscritas por obra de
acrobacias inimaginveis, cumprem atrair o olhar para pontos que, no fossem elas,
jamais seriam percebidos, e tm a virtude de desencadear relexes das mais diversas
ordens. Estabelecer distino entre grafiti e graite revela, inequivocamente, um esforo na manuteno da excluso social.
Outro episdio que teve expressiva participao na construo dessa histria foram
as eleies de 1980, ocasio em que So Paulo foi literalmente coberta por pichaes de propaganda poltico-partidria. A exploso sem precedentes trouxe tona
o assunto, que se incorporou s conversas de boteco de milhes de consumidores...
146
147
Referncias
Arte Pblica, Trabalhos apresentados nos Seminrios de Arte Pblica realizados pelo SESC e pelo USIS, de
17 a 19 de outubro de 1995 e de 19 a 21 de novembro de 1996, So Paulo, Sesc, 1998.
Besse, Jean-Marc, Ver a terra, So Paulo, Perspectiva, 2006.
Bonomi, Maria, Arte urbana: sistema expressivo/anterioridade, So Paulo, Escola de Comunicao e Artes - USP,
1999. Tese de doutorado.
Bourdier, Pierre, A economia das trocas simblicas, So Paulo, Perspectiva, 2005.
Brassa, Grafiti, Paris, Flammarion, 2002.
Canevacci, Massimo, A Cidade Polifnica: ensaio sobre a antropologia da comunicao urbana, 2 ed. So Paulo,
Studio Nobel, 2004.
Certeau, Michel de, A inveno do cotidiano: artes de fazer, Petrpolis, RJ, Vozes, 1994.
Fabris, Annatereza, Cndido Portinari, in Artistas Brasileiros, vol. 4, So Paulo, EdUSP, 1996.
Flusser, Vilm, O mundo codiicado: por uma ilosoia do design e da comunicao, Organizao Rafael Cardoso, So
Paulo, Cosac Naify, 2007.
Gitahy, Celso, O que grafiti, So Paulo, Brasiliense, 1999.
Havey, David, Condio ps-moderna, So Paulo, Edies Loyola, 1992.
Pallamin, Vera M., Arte Urbana, So Paulo, regio central (1945-1998) - Obras de carter temporrio e
permanente. So Paulo, Annablume/Fapesp, 1999.
_______________________(org.), Cidade e cultura: esfera pblica e transformao urbana, So Paulo, Estao Liberdade,
2002.
Stahl, Johannes, Street art, Kln, H.F. Ullmann, 2009.
Stevens, Garry, O crculo privilegiado: fundamentos sociais da distino arquitetnica, Braslia, Editora UnB, 2003.
148
GRAFITE E URBANIDADE:
insurgncias em Vitria ES
GRAFITE E URBANIDADE
tveis camadas sobrepostas no tempo, as quais Holston (1996: 243) as distingue como
narrativas. Nessas camadas, culturas e processos escrevem o texto humano mais eloqente, a cidade. Com o desenvolvimento das tecnologias e das dinmicas processuais e econmicas a paisagem da urbe contempornea se atualiza cada vez mais rpido,
assim como as formas de utilizao e expresso do habitante citadino em seu meio.
Dentre as diversas camadas constituintes da paisagem urbana destacamos a da arte
urbana. Porm, no a arte oicial dos monumentos comemorativos, smbolos do poder, da cultura dominante, mas sim a arte dos dominados, da cultura subdomintante ou alternativa (Cosgrove, 1998). A arte que insurge dos que reagem, de certo
modo, rigidez da lgica capitalista de produo do espao, dos que cotidianamente
reinventam a cidade e praticam o seu lado avesso, a sua margem.
Alguns praticantes das cidades conseguem alcanar maior liberdade vivendo sua urbanidade e subvertendo a lgica de uso oicial previsto, por exemplo, pela urbanizao. Para relacionar alguns exemplos temos, moradores de rua, skatistas, patinadores,
praticantes do parkour, pichadores, graiteiros, crianas...
A urbaninade outra dos praticantes supracitados se desenvolve parte dos mecanismos
impostos pela urbanizao oicial, ou seja, as relaes e prticas sociais se desviam do
que foi planejado, ou o que foi planejado no abarca estas outras possibilidades. Com o
graite, os seres que vivem o avesso das cidades encontram visibilidade em seus muros.
Disputam a ateno dos citadinos com as placas de sinalizao e anncios publicitrios,
que cada vez se encontram em maior nmero e dimenso, enfrentando ainda a distrao
do olhar fugaz e apressado da urbanidade contempornea.
Do graite, podemos ressaltar o carter efmero, espontneo, dinmico, acelerado,
efeito contaminador rizomtico, para citar algumas caractersticas. Algumas destas
marcam a sociedade contempornea, baseada em imagens e valores que tendem a curta durao por serem consumidos rapidamente, tais como os bens de consumo que
alimentam a lgica do mercado capitalista.
Seu (do graite) carter esttico pictrico nos expe dialtica intrnseca ao fenmeno: produto de consumo ou fenmeno subversivo. Por um lado passvel de ser
capturado e transmutado pelo capital, saindo das ruas e adentrando em galerias
e museus, sendo utilizado em meios de publicidade ou estampando mercadorias. Por
outro lado, no se pode ignorar a subverso que habita a sua gnese, onde o prprio
sistema capitalista um dos alvos de questionamento.
Como expresso cultural/artstica e fenmeno que se transformou e se adaptou a contnuas mudanas da sociedade em que se insere. O graite, seja ele o primitivo ou o
contemporneo, possui a capacidade de fazer emergir na paisagem urbana algumas
problemticas e caractersticas da urbanidade da sociedade na qual foi produzido.
O graite se manifesta de diferentes formas, nos diferentes lugares, e aqui estudado
em uma poro territorial especica, a cidade de Vitria, capital do estado brasileiro
do Esprito Santo, na qual ser apreendida sua insero na paisagem.
Vitria uma cidade de caractersticas paisagsticas particulares marcadas por uma
condio geogrica fsica privilegiada, sendo uma ilha, intensamente urbanizada
e guardando tambm extensa rea de manguezal ao norte e mata atlntica em sua
150
insurgncias em Vitria ES
regio montanhosa central. Ao mesmo tempo em que, exerce sua funo de capital,
concentra ateno e tenses advindas de todo estado; bem como mantm conexes
globais como portos, aeroporto, universidades, ferrovias, rodovias.
Apesar de na atualidade os meios de comunicao se dedicarem ao tema, ainda observa-se que a discusso acerca do graite se mantm controversa e polmica. Mesmo
com as investidas miditicas e as inseres pelo mundo das artes oiciais, pode-se
observar preliminarmente que a empatia com o fenmeno no unnime.
O senso comum considera tal fenmeno como manifestao da baderna, baguna,
sujeira, desordem, provavelmente por escapar da ordem imposta pelos mecanismos
oiciais de regulao do espao.
Outro fato que refora a rechaa do senso comum ao graite a proximidade com a
pichao. No Brasil faz-se distino entre graite e pichao, porm, essa diferenciao no ocorre em outros pases, como nos Estados Unidos e na Europa. Talvez por
que no haja em outros pases tamanha voracidade e alcance das pichaes como no
Brasil, sobretudo em So Paulo.
Basicamente pode-se considerar que o graite da ordem pictrica e o picho da ordem
da escrita; o primeiro privilegia a imagem, as formas e a policromia, o segundo a palavra, a rapidez e monocromtico. No graite, as palavras ganham espessura, peso,
forma, e em algumas vezes chegam a adquirir volume. No picho, o peso da palavra
adquirido com a quantidade. Em ambos as palavras, muitas vezes, no fazem sentido
ou mal podem ser lidas pelos que apenas as observam de fora, conformando assim
um territrio restrito.
A esttica do graite parece sobressair sobre a do picho, e consegue ser mais bem aceita pelo senso comum, mdias e circuitos da arte.
Nesse estudo ser abordado apenas o graite. Deste modo, o estudo realizado buscou
o entendimento da relao do fenmeno urbano graite com a cidade contempornea,
emergindo esse universo a partir da cidade de Vitria, enquanto elemento constituinte da paisagem e fenmeno produtor de subjetividades.
A metodologia se desenvolve a partir de um aprofundamento terico balizador das
discusses suscitadas pela temtica, pelo objeto de estudo e pelo territrio analisado.
Foi realizado um levantamento cartogrico do fenmeno na cidade de Vitria seguido de classiicao e anlise. Visando complementar tanto o aporte bibliogrico
quanto a anlise do fenmeno no territrio escolhido, foram desenvolvidas entrevistas semi-estruturadas na pesquisa qualitativa de carter exploratrio dirigidas aos
agentes diretamente ligados ao movimento do graite, como grupos e pessoas que produzem e divulgam o graite na cidade de Vitria.
O aprofundamento terico buscou alicerces com o intuito de colaborar na problematizao da temtica principal: a presena/relao do homem na paisagem urbana
pelo vis do graite como um fenmeno insurgente manifesto no cotidiano da cidade
e produtor de subjetividades.
O levantamento cartogrico foi desenvolvido com o objetivo de perceber como o
fenmeno se apresenta na cidade de Vitria.
A cartograia de localizao dos graites em Vitria tem o intuito de buscar o entendi151
GRAFITE E URBANIDADE
mento acerca de como o fenmeno se apropria e se plasma no territrio analisado. Outra possibilidade investigativa a percepo de suas caractersticas e potncias na cidade de Vitria. Foi elaborada juntamente com um levantamento fotogrico no qual
foram registrados os graites mapeados. A partir dos registros fotogricos foi possvel
analisar e classiicar o tipo de apropriao do territrio e insero na paisagem.
Devido extenso e falta de homogeneidade do fenmeno na cidade, algumas regies
foram designadas para serem levantadas e analisadas a partir de uma anlise prvia. O
levantamento no foi efetuado de maneira a cobrir todo o territrio da cidade de Vitria.
Para selecionar quais seriam tais regies a serem analisadas, foram realizadas visitas
de reconhecimento do territrio para destacar as reas onde o fenmeno aparece com
mais freqncia e que consequentemente ofereceriam maior contribuio investigao. Nesse primeiro momento de reconhecimento foi observado que h uma tendncia
do aparecimento do fenmeno nas vias de maior trfego, principalmente nas regies sul
e sudeste da cidade. Com base neste diagnstico preliminar foi determinado ento, que
um levantamento mais detalhado deveria ser efetuado nestas regies.
Este levantamento, que consistiu em mapeamento e registros fotogricos, foi organizado a partir de 3 setores: Centro [C], Enseada do Su [E] e Jardim da Penha [JP], nos
quais se concentram as maiores quantidades de exemplares de graite encontradas.
Durante o perodo de investigao emprica, aproximadamente 8 meses de registros
entre agosto de 2010 e maro de 2011 -, muitas mudanas foram observadas, de modo
que o levantamento efetuado tornou-se, muito rapidamente, desatualizado. O carter
dinmico de mudanas na paisagem diiculta a apreenso e a simulao numa cartograia esttica. No entanto, considerando-se relevante este aspecto dinmico, buscou-se registrar tambm, em que localizao estas alteraes foram constatadas.
Para a anlise dos exemplares de graite encontrados no territrio analisado foi necessrio construir uma classiicao com o apoio das referncias histricas e tericas
estudadas, mas tambm com o apoio dos prprios praticantes do graite em Vitria.
Assim, uma pesquisa qualitativa de carter exploratrio foi desenvolvida de modo a
obter maior aproximao com o agente que transforma a paisagem utilizando o graite: o graiteiro. Tal aproximao auxiliou no entendimento das subjetividades a partir
da identiicao dos mecanismos e motivaes da prtica do graite em Vitria. Foram
realizadas dez entrevistas, nas quais, procurou-se abordar graiteiros de diferentes
peris e inseres no desenvolvimento da atividade do graite. Alm da pesquisa, outra
insero foi a participao, mesmo em carter de observao, de alguns eventos relacionados ao movimento do graite na regio.
Com base nas referncias a partir da extradas, foi realizada uma caracterizao inicial de
cada elemento de graite registrado, quanto ao fato de ter sido realizado com permisso ou
no. A necessidade de classiicar nessas duas caractersticas antagnicas veio a partir da
gnese do fenmeno analisado, a subverso, a qual guarda um sentido libertrio de uso da
cidade e a percepo de que este aspecto no mais a condio essencial para desenvolvimento da atividade referente ao graite. Com a recorrente apropriao do fenmeno, ou
pelo menos de suas estticas, por diversos meios como a mdia e a moda, parecia importante enxergar se a caracterstica subversiva da gnese se mantinha ativa na cidade de Vitria.
152
insurgncias em Vitria ES
Aspectos histricos
As inscries humanas aparecem de modo signiicante em vrios marcos histricos,
como no antigo Egito, onde so encontradas inscries no tmulos dos faras; as pinturas murais descobertas em Pompia; e os smbolos cristos gravados nas catatumbas onde se reuniam secretamente.
De acordo com Stahl (2008) a palavra grafiti apareceu pela primeira vez em meados
do sculo XIX, coincidindo com a descoberta das inscries nas paredes de Pompia.
O autor airma que desde o incio o fenmeno tinha como caracterstica um carter
extra-oicial. A outra caracterstica ressaltada determinante, e que se manteve ao longo do tempo, a estreita relao com o dia-a-dia da rua.
Voz do povo
O graite adquire forte conotao subversiva de ordem poltica em todo o mundo na
segunda metade do sculo XX, principalmente na Frana. Era nos muros que a populao deixava registrada seu descontentamento; os muros faziam a vez da voz do
povo. Riout (1985: 16) destaca essa, como uma das funes sociais do graite. O autor
airma que um meio de comunicao privilegiado de todas as contestaes; como
se fosse um regulador da vida social.
Em meio s tenses do maio de 1968 na Frana, e as revoltas estudantis espalhadas pelo
mundo da dcada de 1960, as paredes das grandes cidades recebiam tanto idias polticas
quanto poesias, fazendo valer-se do slogan: As paredes tem palavras (Stahl, 2008:8).
153
GRAFITE E URBANIDADE
Tal insurreio acontece em meio a uma metrpole que se expandiu horizontal e verticalmente imagem do prprio sistema econmico, no qual diferenas de classes e
raas so acirradas gerando a destruio simblica das relaes sociais. A cidade, o
urbano, ao mesmo tempo um espao neutralizado, homogeneizado, o da indiferena,
e da segregao crescente dos guetos, dos bairros, das raas (Baudrillard, 1996: 100).
Aos moldes das classes hegemnicas e seus poderes econmicos, o meio urbano faz
com que os habitantes dos guetos e bairros de raas ou de faixas etrias especicos
passem de cidados para consumidores.
Os jovens, em sua maioria negros ou ilhos de imigrantes, territorializam o espao urbano (1996: 102) e a urbe volta a ser territrio coletivo. Eles se apoderam da cidade numa
espcie de rebelio dos signos, que como airma Baudrillard (1996: 103), com os graites,
o gueto lingustico que irrompe a cidade, saem do submundo e ganham visibilidade.
Tentaram deter a invaso do graite na cidade, prenderam os graiteiros, proibiu-se a venda dos sprays, porm, nada os detinha; no dia seguinte estava tudo graitado novamente.
Com essa fora de ao e seus nomes e suas marcas espalhados por Nova Iorque, tentavam dizer a princpio: Existo, sou fulano, moro na rua tal, vivo aqui e agora. Baudrillard
(1996:101) airma que pela primeira vez, em Nova Iorque, as artrias urbanas e os suportes
mveis foram empregados com tamanha envergadura, com tal liberdade ofensiva.
Um dos precursores desse movimento foi TAKI 183, o primeiro novaiorquino a icar
famoso por meio do graite, tendo sido matria do New York Times em 1971. Taki foi aclamado como o pai do graite contemporneo; e tudo comeou como uma brincadeira de
criana, inspirada ao ver num muro a escrita: JULIO 204, marca que pertencia a outro
menino de um bairro vizinho.
Assinatura do TAKI 183. Fonte: www.
streetartscene.wordpress.com, acessado em
dezembro de 2010.
154
insurgncias em Vitria ES
Jlio s atuava na sua vizinhana, TAKI, no entanto, ao conseguir um emprego de delivery boy comeou a espalhar seu nome por onde passava, conquistando e demarcando
um amplo territrio na cidade.
A apario de TAKI na mdia da dcada de 1970 e sua notoriedade no meio urbano,
provavelmente foi um impulso imediata absoro do graite pela arte oicial e pelo
mercado. Em meio difuso da Pop Art, onde os 15 minutos de fama (Andy Warhol)
passam a ser um desejo da massa, graiteiros ou pessoas que se expressavam nos suportes da cidade ganharam reconhecimento e fama.
Desde os anos de 1970 o graite comeou a freqentar galerias de arte e museus. De
acordo com Gitahy (1999), a primeira grande exposio relacionada ao graite aconteceu em 1975, em Nova Iorque no ArtistSpace. Porm, a consagrao da nova forma
de arte exibida nas galerias aconteceu em 1981 com a mostra New York/New Wave, organizada por Diego Cortez no PS1.
Gitahy ainda aponta Keith Haring, graiteiro do metr nova-iorquino, como um dos
artistas mais conhecidos dos anos de 1980 por ter levado o graite, ou melhor, a esttica do graite, um fnomeno exclusivo das ruas, guetos e becos, para galeria, museus
e bienais de arte.
Outra tendncia presente nos trabalhos de Haring a comercializao de produtos a
partir da esttica de seus desenhos murais. Seus produtos eram vendidos na sua loja
chamada Pop-Shop, localizada no bairro do Soho em Nova Iorque.
Keith Harring em sua loja Pop Shop. Fonte: www. prusquinttus.blogspot.com, acessado em outubro de 2010.
Brasilian Style
A street art no Brasil possui atualmente uma grande visibilidade mundial. Em diversas publicaes sobre o gnero, o pas conquistou um captulo parte. Sobre tudo a
cidade de So Paulo.
155
GRAFITE E URBANIDADE
A cena atual do graite brasileiro caracterizada por Manco (2005) como nica e
particular, o Brasil tem sido destino procurado para inspirao artstica.
No passado, as inluncias vinham da Europa e principalmente dos Estados Unidos,
porm, a diiculdade de troca de informao gerou novos estilos e tcnicas, e restries econmicas foraram os artistas a se adaptar e improvisar (Manco, 2005). Tais
aspectos somados diversidade cultural assimilada de diversas raas e nacionalidades, originou um estilo brasileiro, o qual So Paulo o seu maior expoente.
Hoje, Manco airma que So Paulo o novo santurio do graite, suplantando Nova
Iorque. Daze, uma das lendas no graite novaiorquino, relete sobre o cenrio brasileiro, em especial, So Paulo:
Vim pela primeira vez ao Brasil para colaborar com Os Gmeos em murais
para um ilme. Eu conhecia vagamente sobre a cena em So Paulo. O que eu
sabia era na maioria das vezes publicaes em revistas e imagens na Internet,
mas o que eu vi foi o suiciente para acender minha curiosidade.
Nada, no entanto, poderia me preparar completamente para o impacto acerca
da minha chegada em So Paulo [] (Manco, 2005:9).
No Brasil como j indicado, faz-se distino entre graite e pixao, porm, essa
diferenciao no ocorre em outros pases, como nos Estados Unidos e na Europa.
Em So Paulo, (Manco, 2005; Gitahy, 1999), Alex Vallauri foi um dos precursores do
graite. Costumava desenhar mulheres de trajes ntimos nas ruas. Criou uma personagem clebre, que se reproduziu pela cidade e icou conhecida como Rainha do Frango Assado. Vallauri faleceu em decorrncia da AIDS em 28 de maro de 1987; esse dia
se tornou o dia Nacional do Graite.
Nos anos de 1980, o Brasil recebeu inluncia do estilo americano, que invadiu o pais
juntamente com o estilo musical Hip-Hop e a moda de rua (streetwaer). A tcnica do
uso do spray foi sendo aprimorada e a criatividade dos artistas os fez encontrar solues para a limitao do nico trao de spray existente no momento, que era grosso.
O estilo americano alcanou grande escala em 1989 com destaque para OsGmeos,
hoje mundialmente famosos.
A histria do graite no Brasil no para nesse momento. De acordo com Celso Gitahy, em
seu livro: O que Graite, escrito em 1999, trs estilos foram criados a partir da produo
dos artistas por ele destacados: estilo das mscaras: da escola vallauriana; estilo americano: ligado ao movimento do Hip-Hop e o estilo a mo livre: inluenciado por Keith Haring.
O graite brasileiro, como o novaiorquino, to logo comeou a ganhar notoriedade, foi
capturado por meios miditicos e inclusive disseminados em oicinas, que levaram
muitos jovens pichadores a graitar.
A partir dos esforos dos prprios artistas e as possibilidades atuais de intercmbios
somados aos esforos das galerias e coletivos, o graite brasileiro e seus representantes conquistam um territrio ampliado. A questo territorial do grafiti extrapola, a
vizinhana, a cidade, o pas, como o caso de Os Gmeos.
Os Gmeos j expuseram na Deitch Gallery em Nova Iorque, na Tate Modern em
156
insurgncias em Vitria ES
Londres, Museu de Arte Moderna em Tquio, no Louvre em Paris, e desde 1994 levam
cenas onricas com suas criaturas de tons de pele amarelada diversos paises. Tais
criaturas representam os que vivem margem de nossa sociedade, que como num
sonho, ganharam fora e tamanho no mundo.
As prprias intervenes ultrapassam no s as fronteiras, mas tambm a escala do
pedestre e se moldam escala urbana das construes. Uma nova urbanidade insurge,
diferente do TAKI 183 e do Haring, uma nova escala se irma nessa prtica: a inexistncia das fronteiras e a grande escala.
Atualmente, So Paulo continua exercendo forte inluncia, e mantendo sua posio
de capital do graite brasileiro. Entretanto, o graite se desenvolveu em outras tantas cidades como Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador. Em
Vitria, o desenvolvimento tem sido lento, mas aos poucos, os muros da capital do
Esprito Santo vo ganhando voz.
Como pode ser constatado, o graite no uma expresso da cidade contempornea.
uma experincia antiga nos centros urbanos, e, como uma expresso direta de seus
habitantes relete-se em sua urbanidade. A partir das ltimas dcadas do sculo XX,
no entanto, apresenta-se como uma possibilidade concreta para promover o contato
dos cidados com o universo das artes visuais.
A Vitria do graite
Dentre as inmeras narrativas (ou camadas) que coniguram a paisagem urbana, a do
graite insurge deixando seus rastros e vestgios. Mesmo escolhendo uma das ininitas
narrativas da cidade, seu registro est longe de ser totalmente legvel. Como airma
Holston (1996: 243), so registradas como parte da multiplicidade e simultaneidade
dos processos que convertem as cidades em uma ininita geometria de sobreposies.
No entanto, cada narrativa, ou camada, apresenta caractersticas, formas, peculiaridades e particularidades fazendo com que tais narrativas sejam tanto evidentes como
enigmticas. Conhece-las sempre experimental (Holston, 1996: 243).
A partir dos vestgios das narrativas cotidianas dos graites da cidade de Vitria, foram levantados os traos evidentes do fenmeno, por meio de cartograias e registros
fotogricos, com o intuito de apresentar um panorama fsico relacional entre os graites e Vitria. Para tanto se fez necessria tambm, a proximidade com os praticantes
do graite e com a relao destes com a cidade.
Vitria est localizada no litoral da regio sudeste brasileira. Possui uma peculiar situao geogrica, sendo parte continental, parte insular. Em uma rea de 93,38 km2
constituda por 34 ilhas, a maior delas a de Vitria, localizada bem prxima ao continente na baa de mesmo nome, que a protege. A cidade conta com cerca de 400.000
habitantes, sendo alm da capital do Estado do Esprito Santo, o ncleo urbano principal de uma regio metropolitana, composta de sete municpios, que abriga aproximadamente 1.600.000 habitantes, a metade da populao do estado.
Por ser protegida pela baa, as guas que cercam a ilha de Vitria so tranqilas e oferecem condies porturias favorveis, o porto situado no centro histrico da cidade
se conigura como um elemento marcante na paisagem.
157
GRAFITE E URBANIDADE
insurgncias em Vitria ES
Quanto ao tipo de suporte constatou-se que os muros (45%) e as fachadas (45%) corresponderam maior parte do suporte utilizado no setor [C], e somente os muros dominaram nos setores seguintes, em [E] somou 67% e em [JP] 66%. O grande ndice da utilizao das fachadas no Centro deve-se ao grande nmero de ediicaes abandonadas.
Quanto ao uso, observa-se que no setor [C] a insero dos graites predominantemente no servio e comrcio com 25 inseres (49%), seguido por estruturas virias
com 09 (17,64%) e terrenos vazios com 08 (15,68%). Nos outros dois setores predominam os terrenos vazios seguidos por servios e comrcios, em [E] ocorre 10 (32,25%) e
07 (22,58%) e em [JP] ocorre 13 (43,33%) e 05 (16,66%), respectivamente.
Ainda com relao ao uso, foram destacadas as inseres em elementos abandonados
com 20 (39,21%) ocorrncias no setor [C], 14 (45,16%) no setor [E] e 12 (30%) no [JP],
os ndices indicam a grande incidncia de graites em lugares abandonados. Como a
prtica do graite proibida por lei, fcil correlacionar a escolha de uma estrutura
abandonada com o instinto do graiteiro. O abandono denota menos viglia, e para
eles (os graiteiros) menos repreenso.
159
GRAFITE E URBANIDADE
Ainda que Vitria no exiba em seus muros uma carga pictrica to exuberante
quanto So Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, a pesquisa indica um momento de
dinamismo e crescimento na prtica do graite, conseqentemente na mudana da
paisagem da cidade. O graite se mostra tambm como elemento revelador de abandonos, privilegiando espaos em desuso os graiteiros mantm o germe da subverso,
caracterstica importante de sua gnese.
Referncias
Baudrillard, Jean, Kool Killer ou a insurreio pelos signos, in A troca simblica e a morte, So Paulo, Edies
Loyola, 1996.
Cosgrove, Denis E., A Geograia est em Toda Parte: Cultura e Simbolismo nas Paisagens Humanas, in
Corra, Roberto Lobato y Zeny Rosendahl (org.), Paisagem, tempo e cultura, Rio de Janeiro, EdUERJ, 1998,
p. 12-74.
Cuatrecasas, Alfonso, Erotismo no Imprio Romano, Traduo: Graziela Rodriguez, Rio de Janeiro, Record,
Rosa dos Tempos, [1993] 1997.
Gitahy, Celso, O que Grafiti, So Paulo, Brasiliense, 1999.
Guattari, Flix y Suely Rolnik, Micropoltica: cartograia do desejo, 7. ed. rev.,Petrpolis, RJ, Vozes, 2005.
Holston, James, Espaos de cidadania insurgente in: Revista do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional, n 24,
Rio de Janeiro, IPHAN, 1996.
Manco, Trista y Caleb Neelon, Lost Art. Grafiti Brasil, Thames & Hudson, Nova Iorque, 2005.
Riout, Denys, Dominique Gurdjian y Jean-Pierre Leroux, Le Livre du Grafiti, Paris, Alternatives,1985.
Stahl, Johannes, Street Art, China, H. F. Ullmann, 2009.
160
Comit de organizao
Jos Cirillo (Presidente UFES/GEAP
Angela Grando (UFES)
Carolina Vanegas Carrasco (GEAP /UBA)
Teresa Espantoso Rodriguez (GEAP/UBA)
Comit de Cientico
Adriana Laura; Ana Longoni; Angela Grando; Aparecido Jos Cirillo; Carolina Vanegas Carrasco; Catalina Valds; Ceclia de Almeida Salles; Cesr
Floriano; Clara Luiza Miranda; Diana I. Ribas ; Gisele Ribeiro; Gloria Cortes; Jos Francisco Alves; Juan Ricardo Rey Mrquez; Laura Malosetti Costa; Marcelo Magadn ; Mara Amalia Garca; Mara de las Nieves Agesta ;
Mara Florencia Battiti; Maria Regina Rodrigues; Martha Penhos; Miguel
Angel Muoz ; Nelly Sigaut; Pablo Brugnoli; Patricia Hakim; Patricia S. Favre; Ral Enrique Piccioni; Ricardo Maurcio Gonzaga; Rita Eder; Samira
Margotto; Silvia Dolinko; Teresa Espantoso Rodrguez; Viviana Usubiaga.
162
Claudia Garrocini
Centro Universitrio Belas Artes SP
163
para ser instalada no gramado perto do espelho dgua no gramado reservado leitura
e ao banho de sol gerando a sensao de que a obra surgisse da terra, evocando uma
aproximao com a natureza e no icou satisfeito com o destaque dado obra, j que
a composio visual que se formou foi de que a obra nasce do concreto.
Ao verificarmos a vista area do Parque Buenos Aires atravs de mapeamento areo do Google, podemos identificar o parque como uma quadra arborizada no
meio de muitos edifcios, e neste espao visto do alto podemos notar duas clareiras em meio s rvores: uma logo na entrada do parque destinada ao espelho
dgua com a escultura do lago composta por um casal de seres marinhos da
mitologia: Anfitrite e Trito escultura chafariz, de autos desconhecido, de fundio francesa datada de 1912, e outra mais ao fundo, no ponto alto do terreno,
onde est instalada a escultura de Fraccaroli.
Do ponto de vista videogrico so as duas obras com melhores condies de releientrada principal do Parque na Avenida Anglica.
164
turas, pois esto instaladas em locais que preservam o passeio do entorno da obra
permitindo assim um recuo de cmera adequado captao da imagem da obra respeitando o pensamento artstico tridimensional.
A proposta de trabalho parte do estudo referente s questes de catalogao videogrica do patrimnio histrico atravs de mapeamento do estudo paisagstico traduzidos em imagens n-dimensionais de carter metalingstico, onde se reconhece
o carter histrico do documento audiovisual do conjunto de obras do parque, sem
perder as caractersticas artsticas do fazer videogrico que se apropria da obra de
arte pblica e que se permite transformar em outra obra. A escultura ou o tridimensional deixam de existir s no lugar, e passam a compor outra obra, audiovisual e
porttil, que para existir precisam do aparato tecnolgico. A ferramenta de fruio
da obra deixa de ser apenas o espao pblico e ganha caractersticas de mobilidade
do espao virtual.
Esta leitura audiovisual das obras de arte pblica, se catalogadas de forma organizada, com padronizao de elementos informativos podem servir como dispositivos de
memria de um lugar, e contribuir para estudos nessa rea.
Se pensarmos uma sistematizao das informaes sobre o acervo de esculturas
de determinados espaos e da produo de texto e audiovisual destinados educao e preservao, podemos pensar em um aprendizado que conscientize o cidado sobre o carter pblico da obra de arte no espao urbano que contribua no
s para melhor fruio deste pensamento artstico democrtico, mas que tenha
em si elementos histricos que possam ser referencia na construo da histria de
um lugar, de uma cidade.
A escolha do estudo do Parque Buenos Aires levou em considerao a viabilidade
prtica da experincia da produo de documento audiovisual suas caractersticas
e funcionalidade, seja pela rea do parque de 22.200 metros quadrados, ou pelo numero de obras que compe o seu acervo que alm das obras anteriormente citadas,
conta com outras sete:
Duas esculturas, alm da Escultura da Fonte, so de autores desconhecidos e tm
apenas o crdito da casa de fundio francesa como o Leo Atacado, assinada pela
Fonderies Dart Du val Dcane, a pea foi executada na Frana em 1912, esta provavelmente foi executada a partir da obra original de O Leo e a Serpente, de 1833, do
escultor Barye; e a obra: Veado Atacado tambm datada de 1912 e assinada pela mesma Fonderies Dart Du val Dcane, encomenda do paisagista Bouvard, que concebeu
a Praa Higienpolis, hoje Parque Buenos Aires. Possui ainda dois bustos: o primeiro
de J.C. Oliva Navarro, datado de 1945, em homenagem ao estadista Bernardino Rivadavia, considerado um dos maiores generais na revoluo da independncia argentina
e outro de Luiz Morrone de 1947 que homenageia o ex-prefeito Firminiano de Morais
Pinto, por sua atuao nos difceis dias da Revoluo de 1924.
Para completar o acervo do parque podemos destacar a obra Nascer, de Dayse Nasser
executada em alumnio na cor branca e com formato em C, propondo uma relao
com o ventre materno e tambm ao semicrculo lunar, smbolos relacionados essncia feminina, instalada em 2007 e por im a obra que melhor simboliza o parque
165
representam, quando foram instaladas e sua relao com a percepo dos usurios do
parque. Mas o projeto de mapeamento no prope apenas isso.
Ao iniciar os estudos do parque, propusemos um projeto de iniciao cientica a um
trio de alunas do quinto semestre de Radio e TV do Centro Universitrio Belas Artes
de So Paulo: Carolina Cintra, Joziane Alves e Fabiana Reis. Na ocasio chegamos ao
parque e nos deparamos com o projeto de transmisso via bluetooh com informaes
sobre as obras. A proposta era muito parecida com as alunas gostariam de fazer. O
diferencial estava no desejo de distribuir um sinal que no continha apenas informaes sobre as obras, mas uma releitura videogrica com imagens em movimento
e que podem conduzir o olhar do espectador a detalhes especicos da obra, como na
construo de uma narrativa visual.
Num segundo momento, a aluna do sexto semestre do curso de Design Camila Marques, tambm no Centro Universitrio Belas Artes, props uma releitura da obra Tango com um tango eletrnico na trilha sonora e onde os movimentos de cmera tinham
uma relao direta com a obra e o ritmo. O trabalho resulta em uma meta obra, pois
possui caractersticas inerentes a vdeo digital e traduz o olhar e a compreenso que
a aluna teve da obra. Essa apropriao pelo vdeo permite no s que sejam levantados outros questionamentos sobre a obra, criando assim outras relexes, como ainda
permite que a imagem desta obra seja transportada para outros lugares criando uma
relao perceptiva com a obra mesmo entre pessoas que nunca freqentaram o local.
A arte digital a partir do registro videogrico nos dias de hoje, permite que a imagem
da obra seja no apenas transportadas em aparelhos de DVD, entretanto, as novas
tecnologias de manipulao de imagem permite que o vdeo seja redecodiicado em
outros formatos de exibio, que podem trafegar inclusive pela internet, ou distribudos por celulares.
A tecnologia digital, cuja ferramenta bsica o computador, abrange todas as
reas da arte contempornea tecnologicamente envolvida, de ilmes a fotograia,
musica sintetizada, CD-ROMs e muito mais. O novo poder que a tecnologia
digital confere imagem a torna ininitamente malevel. Antigamente, a
informao visual era esttica no sentido de que a imagem, embora passvel de
edio em ilme ou capaz de ser incorporada a outras em uma montagem, era
ixa. Uma vez transferida para linguagem digital no computador, a imagem se
transforma em informao, e todas as informaes podem ser manipuladas
(Rush, 2006: 164).
O estudo audiovisual, por conseguinte, transforma a imagem das obras em informao que pode circular atravs da internet para todos os lugares do mundo.
O texto de Barthes sobre a obra de arte na era da reprodutibilidade tcnica instiga
a relexo sobre o vdeo digital que usa a obra de arte pblica como base para sua
produo, parte do estudo visual da obra, mas se transforma em imagem da obra e,
portanto, no uma simples reproduo mas o tratamento destas imagens pode tambm ser considerado arte.
167
Tanto o documentrio das obras de arte do Parque Buenos Aires, como a proposta de
produo de vdeos de curta durao para distribuio via internet ou celular, so leituras audiovisuais compostas no apenas pela imagem das obras de arte pblica, mas
de planos de imagem em movimento cortadas, selecionadas, montadas e sonorizadas.
Essa sucesso de tratamentos e escolhas inerentes pratica do vdeo faz com que a
imagem da obra sirva no apenas como documento visual, mas como obra audiovisual
capaz tambm de emocionar o espectador numa outra modalidade de contemplao.
obvio que, nesse sentido, constituem-se modelos dos quais no fcil de
se separar, porque prprio do monumento comunicar um contedo ou um
signiicado de valor []. assim que tambm a arquitetura provada se torna
comunicao de valores reais ou atribudos: ela denuncia, no s com o luxo
ou grandeza, a condio social ou apenas econmica dos proprietrios, mas
tambm com a repetio de smbolos de prestigio tomados de emprstimo
aos monumentos-modelos e com sua prpria situao no contexto urbano
(Argan, 2005: 235-236).
Referncias
Alex, Sun, Projeto da Praa convvio e excluso no espao pblico, So Paulo, Editora Senac, 2008.
Argan, Giulio Carlo, Histria da arte como histria da cidade, So Paulo, Martins Fontes, 2005.
Rush, Michael, Novas mdias na arte contempornea, So Paulo, Martins Fontes, 2006.
168
Atualmente algumas das consideraes sobre a paisagem dos lugares tm inluenciado nas concepes dos projetos, tanto nas intervenes urbanas quanto na arquitetura, onde a criao do partido formal pensada em conjunto com o paisagismo da
rea, priorizando a valorizao do entorno, seus potenciais pontos de viso e os enquadramentos possveis a partir destes pontos especicos. Neste sentido, a busca da
observao para a compreenso das relaes espaciais e sobre o referencial dos aspectos morfolgicos da paisagem sem excluir os demais sentidos da percepo, deve se
estabelecer noes de limites e qualiicao potencial que podem vir a ser proporcionadas por um determinado lugar. Alm do potencial de estudo atravs da observao,
podemos considerar o vdeo como ferramenta de registro ainda mais completa que a
foto, pois possibilita ao pesquisador a portabilidade da imagem do lugar. No apenas
uma imagem esttica bidimensional, mas um conjunto de imagens em movimento
capaz de agregar os vrios enquadramentos e pontos de viso presentes no lugar.
169
As percepes do espao e da paisagem em suas evolues criam referncias no sentido de esclarecer as relaes entre os elementos dos lugares atravs da observao dos
fenmenos da natureza e de suas possibilidades de interveno criativa.
[] o espao da Land Art era um local materialmente mais especico. []
explicitando uma estreita relao com a arquitetura (anloga sobretudo ao
racionalismo orgnico de Wrigth), seus artistas concebiam sua obra como lugar
e de tal maneira, que seria impossvel separ-los. Assim criando esculturas de
monumentalidade arquitetural, a forma da Land Art correspondia a topograia
do lugar, especiicidade de seu site, sendo portanto, indissocivel do prprio
terreno (Castillo, 2008: 166).
Como elemento estruturador da paisagem da cidade, em conexo com as demais dimenses do projeto urbano que leve a paisagem como premissa de sua elaborao, os
mirantes so locais articuladores do espao da cidade que podem atender as demandas sociais e ambientais de maneira crescente.
Os mirantes so espaos pblico-urbanos que tem fundamental importncia na referncia e intervenes de arte pblica j que proporcionam a criao de um referencial
paisagstico e evidenciam as caractersticas dos lugares, alem de facilitar o uso do
local e demonstrar sua relevante importncia na relao espao-memria.
interessante a aplicao desse recurso para captura em vdeo de obras de arte pblica, pois, nesse caso, a obra tridimensional ganha fora ao ser registrada de baixo
para cima. Quando olhamos uma paisagem do alto temos a sensao de que podemos
80
81
171
controlar o que vemos. Ao mesmo tempo o plano de cmera mais aberto esconde os
detalhes e a cena passa a ser referencia espacial para o vdeo. A imensido da paisagem
se estende abaixo do olhar e propicia a observao com maior plenitude do desenho
do horizonte. Esta sensao de domnio e poder que se estabelece principalmente na
percepo visual que intrnseca ao uso do Mirante.
Outro aspecto igualmente interessante o esprito da poesia; da construo da narrativa visual atravs do estudo da paisagem. A paisagem considerada um conceito importante na geograia, na arquitetura, e tambm nas artes visuais. Apesar de a paisagem representar um conjunto de sensaes que podem ser percebidas e interpretadas
por todos os nossos sentidos, a viso um meio eicaz no estudo e na anlise da paisagem e, por conseguinte o vdeo uma ferramenta de apoio importante nesse processo.
Se considerarmos que a paisagem carregada de signiicados e que estabelece relaes, expresses de valores, crenas na percepo e apreenso do mundo; ns podemos estabelecer uma relao entre a contemplao do que se v do alto da montanha
e a imagem fabricada dessa viso privilegiada que contribui para que outras pessoas
tenham acesso a essa informao visual e que de alguma maneira possa tambm contribuir para o estudo, relexo e anlise do lugar e da paisagem. No sentido de que a
paisagem pode ser considerada como um produto e como um sistema. Como um produto porque resulta de um processo social de ocupao e de gesto de determinado
territrio. Como um sistema, na medida em que a partir de qualquer ao sobre ela
impressa, com certeza haver reao correspondente, que equivale ao surgimento de
uma alterao morfolgica parcial ou total (Macedo, 2009: 11).
O vdeo documental, inspirado no desejo de memria e preservao no pode alterar a paisagem nem como produto nem como sistema, mas pode facilitar o estudo
e a anlise das alteraes morfolgicas. Se considerarmos que a imagem de uma
paisagem representada em um carto postal pode atravessar o mundo e consegue
atingir a outro olhar, distante daquele local, como um fragmento de memria do
lugar, que atravessa outro espao e simboliza o olhar do recorte visual impresso
no carto. Esse processo em vdeo multiplicado quase trinta vezes por segundo,
na sobreposio dos frames que permite que haja uma narrativa inserida na iluso
de movimento.
O cinegraista pode no registro videogrico da paisagem, utilizar principalmente do
movimento de cmera conhecido como panormica e do movimento das lentes da
cmera conhecido como zoom. O movimento de panormica proporciona uma varredura visual do que se v. Considerando a cmera como extenso do olhar como sugere
McLuhan82, o movimento de zoom ainda mais eicaz no sentido de que o uso de lentes
teleobjetivas pode aproximar a paisagem do campo de viso no sentido em que os detalhes possam ser ressaltados em planos de cmera mais fechados. Nesse caso o estudo
82
Uma das mais curiosas idias de Marshall McLuhan no livro: Os meios de comunicao como extenso
do homem a de que assim como os culos, por exemplo, so extenses do olho, a roupa uma extenso da pele, a roda
do carro uma extenso do p, os meios de comunicao podem ser a extenso da percepo audiovisual e ilosica do
homem moderno.
172
pode conter imagens tcnicas mais claras do que a viso a olho nu. Ento possvel se
trabalhar detalhes na paisagem e entender os processos morfolgicos de ocupao.
Alm de suporte documental de estudo e anlise da paisagem e da arte pblica, o
vdeo pode ser tambm considerado um instrumento do fazer artstico, na medida em
que o autor videogrico registra imagens da obra ou da paisagem e depois as manipula em processo de edio e montagem, com possibilidade de alteraes de velocidade,
tratamento de cor, textura, transies e o uso do udio na montagem, seja com trilha
sonora, que impe ritmo a escolha dos planos de seqncia, ou ainda com uma voz
over, como narrador que consegue ser ainda mais eicaz no exerccio de guiar o olhar
do espectador, pois o texto narrado pode ressaltar detalhes da paisagem ou da obra
gravada. O vdeo, por conseguinte expresso de cada uma dessas possibilidades de
escolha do autor. A linguagem audiovisual estabelece a importncia da preparao do
cenrio, da escolha do ngulo de viso, do enquadramento da cena e do movimento da
cmera na composio videogrica.
A experincia visual e eletrnica nos abre ao devir, metamorfose que nos faz
luxos, informao, mensagem, hibridando os nossos sentidos, ampliicandoos e modiicando nossa viso, nossos ouvidos e nossas percepes. []
Alm das estruturas impostas pela arquitetura, os circuitos comunicativos
quebram barreiras impostas pela arquitetura, os circuitos comunicativos
quebram barreiras e re-signiicam formas e apropriaes de lugares, fazendo
de skatistas, videomakers e de passageiros comuns de quaisquer meio de
transporte e de comunicao os experimentadores de ps-subjetividades e de
uma metageograia eletronicamente mediadas (Di Felice, 2009: 168-169).
No ilme O cu de Lisboa Wim Wenders discute as imagens capturadas da cidade e a contaminao dessas imagens pelo olhar. O documentarista personagem
do ilme comea a fazer imagens sem nenhum cuidado de enquadramento ou movimento de cmera para que essas imagens sejam puras, sem a interferncia do seu
olhar. interessante o modo como seu amigo responsvel pela sonoplastia discute
que imagens registradas sem nenhuma relexo podem ser consideradas documento
histrico, mas no passam a emoo do pensamento videogrico ou audiovisual do
autor. Assim as imagens capturadas a partir de uma relexo audiovisual podem se
transformar em subprodutos da paisagem, mas ao mesmo tempo podem estar carregadas da emoo e da poesia do autor, e dessa forma podem cumprir o papel de
seduzir o espectador pela emoo.
Esta discusso se aproxima muito do pensamento de Marc Aug e sua teoria da supermodernidade quando discorre sobre o fato da paisagem no ser o vdeo, mas o vdeo
o registro da paisagem, a imagem da paisagem numa proposta de verossimilhana
de recorte do real atravs dos olhos do vdeo artista no momento da captura da imagem e posteriormente no procedimento de seleo das imagens e na sua seqencia de
exibio na montagem do vdeo.
173
Marc Aug separa o lugar da memria, do lugar. Se o vdeo serve como instrumento de
captura de imagens para estudo do lugar, o resultado imagtico no o lugar, mas a representao videogrica deste lugar. A produo dessas imagens, deste no-lugar est
impregnada de elementos da tecnologia em relao qualidade do vdeo ou a sua gama
de possibilidades de manipulao, mas principalmente est impregnada do repertrio
videogrico do autor do vdeo. No s na escolha do plano de seqncia que se deseja
retratar, mas tambm na escolha do movimento de cmera na captura das imagens, ou
nos detalhes revelados na paisagem a partir da seduo do olhar do cinegraista.
Assim, os elementos audiovisuais descritos acima podem ser aliados interessantes no
estudo da paisagem no s como suporte para a documentao de lugares capaz de
portabiliz-los de forma mais ampla que o meio grico e com propostas variadas de
composio no sentido de facilitar o estudo e a relexo das alteraes espaciais ou
sociais no sentido de preservao e por outro lado pode ainda contribuir na educao
ambiental e geopoltica do lugar atravs da disseminao artemiditica do conhecimento contido nesse recorte videogrico da paisagem.
Referncias
Aug, Marc, No-lugares: introduo a uma antropologia da supermodernidade, Campinas, Papirus, 1994.
Cullen, Gordon, Paisagem urbana, Lisboa, Edies 70, 1971.
Di Felice, Massimo, Paisagens ps-urbanas: o im da experincia urbana e as formas comunicativas do habitar, So
Paulo, Annablume, 2009.
Macedo, Silvio S., Quadro do paisagismo no Brasil, So Paulo, Quap, 1999.
McLuhan, M., Os meios de comunicao como extenses do homem, So Paulo, Cultrix, 5. Ed, 1964.
Schlee, Mnica Bahia, et al., Arquitetura paisagstica contempornea no Brasil, So Paulo, Editora Senac, 2010.
udiovisual
Wenders, Wim, O cu de Lisboa, Alemanha- Portugal, 100 min cor 1995.
175
DISCIPLINAMIENTO, INDIVIDUACIN:
la escena social como nuevo territorio para el arte
Nadinne Canto Novoa
Universidad de Chile
I
La escena artstica chilena de la dcada de 1980 utiliz estratgicamente la retrica del
margen (Richard, 2007: 17) para trabajar una reapropiacin crtica del cdigo social,
burlando el autoritarismo imperante: por tanto, la opacidad de su retrica respondera a un necesario camulaje de las prcticas de carcter rebelde, prohibidas por la
ideologa dictatorial. Algunas de estas prcticas de corte crtico-experimental, realizan una puesta en escena de la iniltracin en el espacio urbano. Tal es el caso de la
intervencin Estudios sobre la felicidad de Alfredo Jaar, proyecto iniciado en 1979 extendindose hasta el ao 1981, periodo caracterizado por recomposiciones simblicas y
transiciones econmicas.
Estudios sobre la felicidad delinea una particular narrativa del anonimato, examinando
los modos de convivencia en una ciudad tan gris como Santiago de los ochenta con un
frreo diagrama de control de los cuerpos y los discursos. En su cartografa sobre los
modos de administracin de lo cotidiano, Jaar utiliza procedimientos comnmente
asociados a la cultura de masas como la fotografa, el video y la encuesta de opinin,
medios que tornan posible la integracin de la masa a la experiencia esttica (ya nos
lo deca Benjamin en su ensayo sobre la reproductibilidad) y que por su extensin cultural - especialmente la fotografa y la imagen en movimiento - condicionan nuestra
percepcin, en tanto ya hemos sido tramados por su gramtica.
En la escena posgolpe, la gramtica medial es socializada a travs de la prensa y la televisin, instancias autorizadas para la manifestacin del cada vez menos denso pueblo y cada
vez ms pblico. Coartados, los medios de comunicacin se resguardan en la imparcialidad usando una retrica de orden documental a ratos ingenua, en la que Jaar enmarca su
aproximacin neutral hacia los transentes, para consultarlos en su calidad de expertos83.
En 1979, seis aos despus de la instalacin del gobierno militar, Jaar intenta realizar
un retrato del chile de esa poca (Jaar, 1999) para lo que disea un proyecto de obra
articulado en cuatro etapas. En la primera, un precario dispositivo mvil de votacin
popular es instalado por el artista en la va pblica (paneles de votacin), invitando a los
transentes a participar en una breve encuesta sobre el porcentaje de gente feliz en el
mundo y, como contrapunto, en Chile. Todo el proceso es registrado fotogricamente, dejndonos ver el espesor de poca, su moda, presente coagulado.
83
Esta extraa capacidad de la prensa para volver a cualquiera un experto, fue consignada por Benjamin ya en
el ao 1934, en su texto El autor como productor.
176
Ese mismo ao Jaar desarrolla la segunda etapa de su proyecto, realizando encuestas a felices e infelices, superando el recurso totalizador de la estadstica
al ingresar a explicaciones de orden individual. Un compendio de cada entrevista
(cuya extensin oscil entre 45 y 90 minutos, dependiendo del interlocutor) fue
presentado en modalidad texto, acompaando una serie de retratos tipo carnet con
el entrevistado en pose de felicidad, tristeza o melancola. El recurso fotogrico
toma aqu otro cariz, ya no como registro de una situacin de orden indeterminada,
sino, busca captar la interioridad subjetiva del entrevistado, individualidad que es
desprendida de los grandes bloques de infelices y felices, es taxonimizada a la par
que rescatada del anonimato.
Del material de registro causa inters comprobar cmo frente a preguntas del orden:
Es Ud. feliz?, Qu signiica para Ud. ser feliz?, Es fcil ser feliz? Depende
solamente de Ud.?, las respuestas se circunscriben puramente al mbito individual. Esta airmacin indica los lindes de una paradoja que pone en entredicho cualquier teora de la mordaza, o de la represin como pura coercin; pues podramos
suponer que frente a la condicin genrica, casi ontolgica, de estas interrogantes
-tambin a esa amplitud anodina, que debi facilitar el enganche-, el entrevistado
podra arrogarse cierta soltura o franqueza en el desarrollo de sus respuestas. En
otras palabras, esperaramos del entrevistado la exposicin de su cotidiano cruzado
por la violencia del contexto poltico -de dolor y desaparicin- exteriorizndolo en
clave declamativa.
La tercera etapa del proyecto considera la presentacin pblica de personas felices e
infelices en una galera de Santiago84. Los individuos son instalados en un pequeo
set de grabacin, acompaados de un televisor que transmite en vivo sus diferentes
gestos y disposiciones corporales, armndose una particular comunin entre los
hablantes/obras y los espectadores convertidos en pblico, reproduciendo la gramtica televisiva y la disponibilidad de los cuerpos por ella capturados, dentro de la
galera, es decir, al interior del campo protegido del arte.
84
177
DISCIPLINAMIENTO, INDIVIDUACIN
II
Llevando a su lmite la herencia realista, la matriz conceptual interviene la produccin
de relaciones sociales sobrepasando la esfera del arte (sus procedimientos, reglas de recepcin, etc.) hasta expandirse en la esfera de las relaciones humanas en general, codiicadas por, e incorporadas a, la relexin esttica. De esta operacin ejecutada autorelexivamente por el arte, proviene sin duda el inters culturalista o contextual que
caracteriza a gran parte del arte contemporneo (al ms sugestivo, podramos agregar).
Convenido este inters, cmo interpretar el giro cultural que caracteriza la produccin contempornea? y, qu estatuto podra tener esta produccin (no slo
para el presente sino en dilogo con el pasado y el porvenir)? Frente a este horizonte de cuestiones, la voluntad materialista que determina al arte moderno atiza un
sitio donde acodar el anlisis: se trata del campo de la representacin con su sinfn
de dispositivos para el agenciamiento de la mirada, campo de reconocido privilegio para operar la subjetivacin. Tras desmontar y conquistar ese territorio, slo le
queda al arte la progresiva tarea de imaginar nuevos modos de convergencias entre
la esfera del arte y la esfera social, hacindolo desde su terruo autnomo es decir,
desde el espacio del arte.
Este procedimiento, que hace estallar cualquier comprensin monoltica o hegemnica sobre la tarea del arte -pues habremos de reconocer que el gran triunfo del arte
moderno fue sin duda agenciar para s una prctica movil, capaz de integrar cualquier
cosa a su relexin- nos lleva a considerar el valor de las multiplicidades contextuales
de cada prctica artstica, en especial las que dan cuerpo a la dispora conceptual
latinoamericana, con el objetivo de cartograiar las distintas territorializaciones que
un mismo problema suscita.
178
La instalacin de gobiernos dictatoriales es un proceso comn a las zonas tercermundistas, en un periodo de avance del neoliberalismo que frena los mpetus socialistas
que aoran como objetivo fundamental la modiicacin de la infraestructura econmica para alcanzar una modernizacin de las naciones latinoamericanas. Sin embargo
las escenas artisticas produjeron un cuerpo de obra local, privilegiando ciertos puntos por sobre otros, aludiendo de extraas maneras el pasado glorioso, la estrepitosa
cada y silenciamiento que sobrevino con la trabazn republicana. La neovanguardia
chilena territorializa de manera particular el problema de la represin y la catastrofe,
es decir, de la ruptura de cierta unidad simblica que hasta ese momento le daba soporte, un cierto marco de entendimiento al cuerpo social.
En el caso chileno, se trata de un tipo de conceptualismo caracterizado por generar
una aceleracin de los procesos artsticos en relacin a su escena antecesora, y lo
hace obrando una tensin de carcter experimental entre lo visible y lo enunciable
que, como sabemos, impuls tambin una modernizacin de conceptos y categorias necesarias para la aprehensin de estos fenmenos (por lo menos, en su acotado
espacio de recepcin). Se trata de un conceptualismo deinido por la condicin de
orfandad que lo enmarca: sin galeras, sin infraestructura artstica o institucional
(y con la existente desmantelada por la dictadura) ni vnculos internacionales, la
avanzada alumbra un tipo de conceptualismo perifrico abocado a levantar pequeas trincheras, espacios para una enunciacin posible tras la catstrofe de sentido
producida tras el golpe.
Esta tensin entre ambos regmenes aparece en Estudios sobre la felicidad: entre
lo que se dice y lo que aparece, sin verbalizarse; en ese desfase se cuelan signos
imposibles de codificar sin inventar un sistema de nuevos signos, de nuevas imbricaciones entre signos. Si aceptamos esta hiptesis, podremos comprender los
alcances de esta apertura dialgica que la pregunta Es usted feliz? pretende
generar en su contexto de enunciacin, al mostrarnos cmo el arte, en su condicin moderna de crtica y desmantelamiento de la representacin, trabaja por
hacer visible el funcionamiento de las mquinas sociales, dejando entrever el
imbricado proceso mediante el cual las mquinas sociales acoplan la produccin
deseante y de cuyos puntos de interseccin resultan subjetividades mviles85. Hiptesis de lectura que no resulta insensata, pues habremos de conceder que esta
obra tensa paradigmticamente la esfera pblica y la esfera privada haciendo
aparecer, como en sordina, un proceso mayor que se sobrepone a cualquier personalismo, al unsono que los congrega a todos en tanto separacin: el oximorn
de una comunidad de individuos.
85
Esta hiptesis de lectura bebe del recurso metodolgico desplegado por Deleuze y Guattari en su libro El
antiedipo, donde se busca establecer una economa general que supere la distincin entre produccin social y produccin
individual, al proponer que solo existe produccin deseante: se tratara, inalmente, de mquinas deseantes que toman
distinto rgimen, mquinas sobre mquinas, de cuyo proceso acoplamiento surge el sujeto, como resto. Este proceso se da
mediante la represin del socius sobre el CsO, del conjunto molar sobre el molecular.
179
DISCIPLINAMIENTO, INDIVIDUACIN
III
A mi parecer la obra de Jaar Estudios sobre la felicidad, logra dar con el ncleo del procedimiento rector de este nuevo rgimen comunitario, inaugurado tras el golpe: se trata
de un proceso de individuacin, que entre otras cosas desata el imperativo de la administracin de la presencia y la identidad (Le bretn), considerando la subjetividad ya
no como territorio para la emancipacin, sino como patrimonio, es decir un territorio
ininitamente re-apropiable en su excedente (Deleuze y Guattari).
La ruptura del sistema de referencias sociales y culturales que hasta 1973 garantizaba
ciertas claves de entendimiento colectivo (Richard, 2007) como apunt una de las
intelectuales de la poca, di como resultado un diagrama simblico desvencijado, un
imaginario cado, carente de herosmo, impotente, de-contenido. De inmediato, y acorde
al protocolo de neoliberalizacin que hegemoniz los lineamientos socio-econmicos
del gobierno militar, el mercado inicia su proceso ascendente que lo consumar como
la esfera privilegiada para el intercambio colectivo.
Es en el territorio de la subjetivacin donde Jaar aspira a instalar su relexin, y es en
este territorio, tan inasible, difcilmente pensable a travs de imgenes, donde se termina esceniicando, tal vez sin pretenderlo, una operativa de individuacin que, producida mediante la instalacin de una micropoltica de la represin en tanto mquina
social, acta produciendo sujetos individualizados. Me parece que el funcionamiento
de sta mquina social, es lo que logra visibilizar la obra Estudios para la felicidad y esa
visibilizacin sera un ejemplo del arte conceptual, en su versin crtica.
Esta obra utiliza recursos propios de un acercamiento sociolgico (la encuesta, la insercin en la infraestructura publicitaria de la ciudad, etc.), pero lo hace con ines estticos: se trata de ampliar los recursos formales, entendiendo que el carcter esttico
de esta intervencin urbana est dado no por las frmulas propiamente artsticas,
sino por el objeto de intervencin o estudio: el sujeto, individual, colectivo.
Es precisamente en el imaginario colectivo (hegemonizado por las marcas comerciales: Teletn, un extrao ejemplo) donde esta obra de Jaar se siente llamada a operar,
crticamente, auto-relexivamente. Lo anterior supone desde ya el encuentro entre
dos gramticas especicas, la gramtica del arte y la gramtica publicitaria, que se ha
vuelto hegemnica de la esfera social en el contexto contemporneo, consumndose
como la esfera privilegiada para el intercambio colectivo. Ante esta situacin, el arte
trata por todos los medios de oponer una distancia respecto la gramtica publicitaria
(no en vano la simpleza formal, casi precariedad de esta obra) estableciendo un dilogo con ella desde una exterioridad posible: la exterioridad del arte.
180
IV
El inters por la relacin entre la esfera del arte y la esfera social, tensin que caracteriza una parte importante del arte contemporneo, podra responder ya sea a un
proceso interno del propio arte, o, por otro lado, podra responder a un proceso de radicalizacin de lo social que conllevara el repliegue del arte a la urgencia de este proceso, entendiendo la radicalizacin como un cambio en el estatuto de la comunidad
que afecta, entre otros aspectos, la experiencia intersubjetiva y la esceniicacin del
cuerpo, instancias que terminan por estetizarse tal como lo sintomatiza la proliferacin
de las tribus urbanas, las llamadas redes sociales a travs de internet, etc., fenmenos
que responderan a la imperiosa necesidad de crear nuevos vnculos y espacios de
sociabilidad (Le bretn).
Si relexionamos esta situacin desde la esfera del arte surge de inmediato una pregunta que remite al desarrollo interno del arte mismo. La pregunta sera: por qu al
arte le compete este proceso sociolgico, este orden cultural? Por qu el arte desplaza
su objeto, tensando an ms el proceso de autoconciencia de sus recursos formales
hasta volcarse a las relaciones sociales, imitando y reformulando este modelo en pos
de una ininita promesa de re-codiicacin crtica?
Podramos entender que el arte conceptual surge como una respuesta o intento de
impugnar la sociabilidad disciplinada, presentando al arte como el territorio de una
sociabilidad especica, auto-consciente, crtica, todo esto bajo el cdigo de una utopa de integracin, de proximidad. De ah que el llamado giro cultural en el arte
contemporneo deba comprenderse en vista a un horizonte mayor: se tratara de un
intento de relocalizacin de la prctica artstica en el contexto de la cada (o abandono) de la utopa moderna de emancipacin. Pero, se trata de comprender el arte en el
horizonte contemporneo como ruptura, incluso con el arte mismo si fuese necesario
en pos de la emancipacin, o, de modo diametralmente opuesto, se trata de comprender el arte como una potencia que se actualiza, administrando incluso su propia agona, es decir, desterritorializndose y reterritorializndose?.
181
Referencias
Althusser, L. Ideologa y Aparatos Ideolgicos de Estado, en Ideologa, un mapa de la cuestin, Buenos Aires,
FCE, 2008.
Benjamin, W. El autor como productor, La obra de arte en la poca de su reproductividad tcnica en
Conceptos de ilosofa de la historia, Buenos Aires, Terramar ediciones, 2007.
Canto, N. Cultura y hegemona. Notas sobre la construccin del hombre nuevo en la Unidad Popular. Tesis para optar al
grado de Licenciada en Teora e Historia del Arte, Facultad de Artes, Universidad de Chile, 2010.
Deleuze, G., Guattari, F. El antiedipo. Capitalismo y esquizofrenia, Buenos Aires, Paids, 2005.
Jaar, A., Estudios sobre la felicidad, 1979-1981. Barcelona, Actar, 1999.
Richard, N. Mrgenes e Instituciones. Santiago, Metales Pesados, 2007
Soulages, Franoise, Esttica de la fotografa, Buenos Aires, La Marca editores, 2005.
182
PUENTE DE LA MEMORIA*
Viviana Ponieman
Artista- Posgrado IUNA
Con mi trabajo de creacin -produccin e investigacin artstica pretendo dar un espacio fsico a los relatos, a los recuerdos, a la Memoria.
Extender un puente, un lenguaje comn, entendiendo el lenguaje, como un territorio
de conocimiento compartido, de expresin, de comunicacin y de encuentro.
Convocar y provocar a la memoria en una ceremonia colectiva.
La propuesta:
El rescate de la memoria a travs de recuerdos colectivos, un rompecabezas coral donde cada uno aporta una pieza, un recuerdo.
Instalar la obra en la calle, escenario de la historia y lograr reconstruir un Mapa de
la Memoria. Una cartografa de imgenes, de lugares y de sonidos superpuestos, del
pasado que emerge en el presente. Para marcar y sealar el espacio.
El territorio, como un cuerpo tatuado por sus heridas.
Confrontar LO DESAPARECIDO, ese silencio, esa ausencia, con las imgenes y sonidos de la memoria.
86
PUENTE DE LA MEMORIA* Es el proyecto de Arte Memoria y Derechos Humanos, que llevo adelante
desde 1996, creando espacios de participacin, exposiciones y talleres, en el pas y en el exterior. Con el apoyo de:
Secretara de Derechos Humanos del Ministerio de Justicia y Derechos Humanos de la Nacin, Cancillera Argentina y
Consulado Argentino en Nueva York, Secretara de Cultura Presidencia de la Nacin, Secretara de Derechos Humanos
de la Ciudad de Buenos Aires, Fondo CulturaBA, Madres de Plaza de Mayo, Memoria Abierta, IDEP-CTA.
*Registro de la propiedad intelectual exp. N: 403856 / 3 de Junio 2005/2010. PUENTE DE LA MEMORIA, Registro de
marca N 1.867.225 /1996. Copyright 1996 by Viviana Ponieman.
183
PUENTE DE LA MEMORIA
Con este trabajo, no slo pregunto dnde, cmo y cundo, para poder reconstruir un
mapa de la memoria, sino tambin interrogo acerca del alma nuestra, sobre el imaginario cultural de los aos 70 que nos fue sustrado, secuestrado, que desapareci junto
al cuerpo de los desaparecidos.
Podemos decir que este proyecto es una especie de construccin colectiva-artstica
post traumtica. Una propuesta dinmica, que tiene varias fases simultneas que se
entrecruzan; y tiene riqueza y validez no slo como obra terminada, sino por todo el
proceso de su gestacin, creacin, investigacin, produccin e intercambio con los
grupos que intervienen y con el pblico que se convierte en participante, a travs de
los distintos dispositivos de retroalimentacin.
Desarrollo
Comenc a darle forma al proyecto antes de 1996 cuando se acercaba el XX aniversario del Golpe cvico militar en la Argentina.
Me propuse relexionar acerca de lo que nos sucedi y nos sucede, intentar sacar a la
luz las vivencias de una sociedad que cambi y olvid su pasado; las secuelas que la
dictadura dej en el cuerpo social: LOS DESAPARECIDOS Y LO DESAPARECIDO
en el lenguaje, en la cultura, en las relaciones, los valores y los deseos. En las creencias y la esperanza. Los mecanismos de adaptacin y negacin. La imposibilidad de
enterrar a los muertos. Cmo es vivir con miedo, vivir como rehenes, convivir con los
campos de concentracin y con los torturadores.
Los exilios internos y externos. La vida suspendida. La espera...
Generar un PUENTE DE LA MEMORIA que provoque una toma de conciencia acerca de nuestra historia reciente.
Construir un puente sobre tanta destruccin, transformar el no lugar, la ausencia en
algo tangible, darle cuerpo, forma, entidad, transformar el paisaje - el espacio urbano,
el pensamiento, la historia. Ocupar un lugar en el mundo.
Un Puente que une, un nexo entre: el pasado, el presente y el futuro, entre distintas
generaciones y los protagonistas de la historia reciente.
Un puente que d testimonio de las imgenes de la memoria.
Un puente de comunicacin, visual, conceptual y real.
Arte y poltica
A 20 aos del golpe recin pude como artista producir atravesando las heridas del
terror, el miedo y el dolor por nuestros desaparecidos. Era un tema del que no se hablaba fuera de los mbitos de los organismos de Derechos Humanos. Y como parte de
esa comunidad, tomada por el silencio y el dolor no haba podido crear dispositivos
hasta ese momento. Seguramente ya tena una madurez en los lenguajes artsticos
como para meter las manos en ese lodo, a conciencia. Necesitaba trabajar el tema no
slo como una denuncia, menos como un panleto, sino en una alta calidad plstica y
conceptual. Pude empezar a pintar y hablar de las cosas que no se nombran de nuestra
historia.
En pleno menemismo, cuando te tildaban de que te quedaste en el 45 o en el 73, no
184
PUENTE DE LA MEMORIA
sin determin el recorrido por Av. de Mayo desde el Congreso, ese sera el escenario
donde se montaran las pinturas y los pasacalles que encargu, quin iba a colgar todo
a 7 m de altura?, las pinturas en los postes de luz y atravesando la Avenida de Mayo los
pasacalles: donde iba el ttulo y la irma: 1976. Un Puente para Iluminar la Memoria.
1996 Artistas Plsticos87.
UN PUENTE PARA ILUMINAR LA MEMORIA p94
La obra y el acontecimiento88
Telones de 4 x 2 metros pintados por artistas o grupos de artistas, instalados sobre
los postes de luz, a lo largo de la Avenida de Mayo, para acompaar la marcha del 24
de marzo de 1996, para el XX aniversario del golpe militar.
Esta manifestacin convocada por 70 ONG de derechos humanos fue la primer marcha grande, despus de 1983 (advenimiento de la democracia), donde participaron
ms de 100.000 almas.
Fue un fin de semana inolvidable, la Av. de Mayo estaba cortada para la ocasin,
se convirti en peatonal, hubo gran circulacin de gente que propiciaba el encuentro con compaeros como un territorio liberado para la memoria, un verdadero espacio de Encuentro.
Fue la primera vez que las Madres de Plaza de Mayo hicieron un acto separadas, y
fue el momento en que aparecen pblicamente los H.I.J.O.S como agrupacin (Hijos
e Hijas por la Identidad y la Justicia contra el Olvido y el Silencio) por una cuestin
generacional. Esto tambin es una prueba, un sntoma de las diicultades de saber,
de conocer la verdad y de encontrarse, que se extendi mucho tiempo despus del
in de la Dictadura, comprobndose que las secuelas en el cuerpo social, los estragos sufridos por el aparato represivo, se mantienen mucho tiempo despus, hecho
palpable hasta ahora en la bsqueda de los hijos apropiados que an no conocen su
propia identidad.
Esa noche se hizo una marcha de antorchas y una vigilia frente a los Tribunales.
(Tngase en consideracin que los juicios a los represores estaban suspendidos, por
las leyes de Obediencia debida y Punto inal, y por los Indultos).
Tiempo despus empezaran los escraches impulsados por la agrupacin HIJOS que
utilizaran recursos artsticos para apoyar su accin poltica89.
87
Len Ferrari, Yuyo No, Carlos Gorriarena, Anbal Cedrn, entre otros. Legisladores, polticos y
personalidades de la Cultura: Enrique Oteiza, Horacio Gonzlez, Eduardo Jozami, Abel Fatala, (Concejal comisin de
Cultura de la Legislatura), Vctor de Genaro, Claudio Lozano, IDEP_CTA, entre otros. Bloques de diputados, familiares
de desaparecidos y presos polticos, etc.
Pintando las telas: Julio Flores, Guillermo Kexel (gestores del Siluetazo), Munu Actis, Cristina Terzaghi, Daniel Santoro,
Juan Doffo, Ral Ponce, Osvaldo Jalil, Felipe Pino, Jorge Pietra , Jorge Gonzles Perrin, Eduardo Iglesias Brickles,
Graciela Henriquez, Jorge Meijide, Pedro Roth, Juan Carlos Lasser, Ariel Mlynarcewicz, Juan Carlos Diotti, Hilda Paz,
Elsa Soibelman, Sofa Althabe, Viviana Ponieman.
88
As fue como de la primera intervencin Urbana para el XX aniversario del Golpe. PUENTE DE LA
MEMORIA, se transform en el proyecto de Arte Memoria y Derechos Humanos, que llevo adelante desde 1996. Un
proyecto vivo que produce intervenciones y dispositivos, espacios de participacin, exposiciones y talleres, en el pas y
en el exterior.
89
Cabe sealar que con la aparicin de H.I.J.O.S, en 1996 comienzan los escraches como forma de accin
directa y los primeros grupos de arte callejero. Y ms adelante sobre todo a partir de la crisis del 2001, lorecen una
186
Un punto de inlexin, en el imaginario colectivo y en el pensamiento social fue cuando en 1995 aparece el libro de Horacio Verbitzky Los vuelos de la muerte, con las confesiones de Scilingo. La verdad lagrante revoluciona los medios. La sociedad se sorprende (?), al ver y escuchar el testimonio de alguien que participa de dichos vuelos
confesando haber tirado gente viva al mar, en el programa de TV de Mariano Grondona (programa poltico de gran audiencia).
La sociedad negadora con sus voces de: _ por algo habr sido! ya no puede mirar para
otro lado.
En el video Puente de la Memoria90 de 1996 puede verse parte del Noticiero Telenoche donde aparece la noticia: La obra de los artistas fue secuestrada y destruida, por
empleados Municipales, tirada y compactada con la basura de la ciudad, en la madrugada del 25 de marzo. Este atropello represivo, que esta vez no fue ejercido sobre
nuestros cuerpos sino sobre el cuerpo de la obra, vulnerando la produccin artstica
y otra vez la memoria, los derechos humanos y nuestra cultura, tom estado pblico
y mucha repercusin en la prensa, hubo un rebote in crescendo en todas las radios, y
por suerte result un escndalo. Quince das de alta exposicin, entrevistas cruzadas
con el intendente Domnguez en el programa de Lanata, etc. En todos los medios se
hablaba de lo que pas. La gente llamaba a las radios para protestar, se empezaban a
rebelar contra una naturalizacin de la represin, tal vez de comenzaba a ejercer un
derecho, a levantar la voz, en una parbola referenciada en el cuerpo de las pinturas,
una metfora de una tragedia mucho mayor, y que hasta ese momento, sobre todo en
los tiempos de dictadura en que no se poda ni hablar, era peligroso, se corra riesgo
de vida, el dolor fue clandestino.
A causa de estos hechos, tuvimos que llamar a una conferencia de prensa en el Caf
Tortoni, para la cual se edit este video de cuatro minutos a las apuradas.
Recibimos el apoyo con dictmenes de protesta de varios Diputados Senadores y
Concejales y de muchos ciudadanos. Las obras nunca aparecieron, quedaron sepultadas bajo 4.000 toneladas de basura. El nico registro visual que queda de la intervencin en Av. de Mayo es este video de cuatro minutos editado al calor de los hechos y
la bronca para dicha conferencia de prensa, las notas de los diarios y el testimonio del
Noticiero Telenoche.
Otra metfora de la cultura del Olvido...
Los caminos de la basura... ese fue el derrotero que acompaada por el Legislador de la
ciudad Abel Fatala a cargo de la comisin de Cultura, los artistas Osvaldo Jalil y Guillermo Kexel, emprendimos terminando en el basural del CEAMSE91, creado por los
gran cantidad de grupos de artistas, videastas , fotgrafos, teatristas, periodistas alternativos y activistas sociales que
inventaron nuevas formas de intervencin, o reciclaron las experiencias de los 70, en deinitiva salieron a la calle y
pusieron el cuerpo. Y pertenecen la mayora a la generacin de HIJOS. (ver Bibliografa) ***
90
(www.puentedelamemoria.blogspot.com). El video en mp4 alojado en la Web tiene dos partes, la primera
es la que se describe en esta ponencia.
91
Cruzando la Autopista del Buen Ayre est uno de los basurales ms grandes del Cinturn Ecolgico del
Partido de San Martn. Todos los das, miles de toneladas de desperdicios del rea metropolitana se suman a esta gran
montaa de basura.
187
PUENTE DE LA MEMORIA
militares y donde no nos dejaron entrar con las cmaras, para conirmar que haban
compactado y sepultado las obras originales bajo 4000 toneladas de basura.
Ms adelante en momentos de la crisis del 2001 millares de compatriotas expulsados
del sistema emprendan ese camino para buscar comida, hasta lleg a desaparecer un
chico bajo la montaa de basura asustado por la presin policial92.
Ms atrs en 1956 tenemos los fusilamientos de los basurales de Jos Len Surez,
historia que relata Rodolfo Walsh en Operacin Masacre, de 195793.
...sin que nadie vigile la historia prisionera en la basura cortada
por la falsa marea de metales muertos que brillan relexivamente.
188
El estado de la cuestin:
Es cierto que en los ltimos aos se ha estudiado y escrito acerca de experiencias
como Tucumn Arde (1968), y El Siluetazo (1983). La primera cuando todo pareca posible, la segunda cuando empezamos a recoger los pedazos. Pero creo que nos
debemos largas relexiones acerca del arte y los artistas en la escena contempornea.
As como tambin el esfuerzo de recordar y trasmitir cmo fue el verdadero movimiento de millones de jvenes militantes y activistas de los aos 70, comprometidos
con LA REVOLUCIN o las revoluciones. El extraordinario nivel de participacin
popular para un cambio social, que en ese entonces no se llamaba UTOPA. Slo as
se podrn comprender estas experiencias artsticas colectivas, impulsadas por ese espritu social, por esa cultura de poca, que se insertaron para ser parte de ese gran
momento - acontecimiento histrico poltico de transformacin.
Como dice Pilar Calveiro: [] son los protagonistas de entonces quienes tienen el
deber de pasar a los que vienen detrs algo ms que jirones de una historia.
Y es con ese espritu que en su momento encar la intervencin urbana, como manifestacin de Arte pblico en una accin poltica, y que fue la primera despus del
advenimiento de la democracia en la Argentina, retomando el espacio pblico, con
la consiguiente represin y destruccin de las obras. Al tomar estado pblico ya que
sali en todos los medios, fue un parte aguas donde arte y poltica volvieron a andar
juntos por la calle.
Este acontecimiento despierta el inters de tesistas e investigadores en especial del
exterior y es citado en varios libros96, as como tambin las acciones posteriores del
Puente de la Memoria como el primer acto por los desaparecidos en el Colegio Nacional
de Buenos Aires en 1996. Es difcil saber porqu se vuelve invisible para los distintos
actores y circuitos en la Argentina, sobre todo si hablamos de arte, memoria y derechos humanos, o arte y poltica.
Habra que ver si estos olvidos tienen que ver con los compartimentos estancos de las
disciplinas, o si tal vez revelan los rastros dejados en los sistemas y circuitos artsticos por la ruptura de las cadenas de trasmisin cultural y social provocado por las
Facultad de Ciencias Sociales, Universidad de Buenos Aires, 1999. Registro de la intervencin en Av. de mayo 1996, y de
Telenoche + Exposicin en Recoleta 1998. Presentado en:
Muestra Coloquio de Buenos Aires, La desaparicin: Memoria, arte y poltica en el Centro Cultural Recoleta, 1999.
Centro Cultural Recoleta 2000, Barcelona 2002. Puente de la memoria y otros puentes. New York 2004 del Puente de
la memoria al carrito de los sueos, exhibicin y charla en Columbia University. 7 Aniversario, Casa de la Memoria y la
Vida, ex mansin Ser. Municipio de Morn, etc.
96
Han escrito sobre su obra y su proyecto: PUENTE DE LA MEMORIA:Marguerite Feitlowitz, en
Lexicon of the terror en la Argentina , Oxford University Press Inc. 1998; Angela Carlson-Lombardi, (Thesis University of
Minnesota), Mapping Memory: Cultural representations of The PROCESO in the Work of Viviana Ponieman. 2000; Marisa Lerer,
Becaria Fullbright, para su tesis de doctorado. PhD program in Art History, The Graduate School and University Center/
CUNY, New York. La poltica fundamental de la memoria: estrategias artsticas de memorizar (sic) los desaparecidos de la Argentina
2009/2010, (en preparacin); publicaciones, medios gricos, radios y TV del pas y del exterior. (Marzo 1996); Jos Emilio
Buruca, catlogo para Exposicin, Viviana Ponieman en Museo Evita 2008; Ana van Raap, presentacin catlogo
Muestra Autorretratos Centro Cultural Borges 1998 y catlogo exposicin de Viviana Ponieman en New York; Alberto
Giudice, diario Clarn, 30/12/2000: Cicatrices de la memoria; Luis Eduardo Aute, Madrid, para sus exposiciones en
Espaa, Barcelona; Luis Felipe No, Julio Sapollnik, Guillermo Roux, Carlos Gorriarena; Manuel Pantigoso, Per; Carlos
Illescas, Mxico; Jorge de la Fuente UNEAC (Cuba- Mxico).
189
PUENTE DE LA MEMORIA
dictaduras y consecuentes regmenes excluyentes. Denota tal vez el vaco de una generacin, y la diicultad para escuchar a protagonistas y sobrevivientes. Hecho que se
iniere a partir de un dilogo trunco entre la experiencia los creadores y los investigadores, que sustentan as la visibilidad de una propuesta esttica haciendo desaparecer
otras. Reproduciendo de ese modo algunos sistemas de circulacin y representacin
vinculados a un discurso hegemnico.
Se puede hacer acaso un paralelo y salvando las distancias, con lo que sucede con Operacin Masacre (1957) de Rodolfo Walsh que es en realidad la primer obra de iccin
periodstica o novela testimonial, el relato novelado de un hecho real que se adelanta
nueve aos al trabajo de Truman Capote A sangre fra (In Cold Blood), y sin embargo,
este ltimo es generalmente citado como iniciador de este gnero literario.
El mismo Walsh en 1976 bajo el golpe de Estado encabezado por Jorge Rafael Videla,
crea la Agencia Clandestina de Noticias (ANCLA). Y airmaba: [...] El terror se basa
en la incomunicacin. Rompa el aislamiento. Vuelva a sentir la satisfaccin moral de
un acto de libertad. Derrote el terror. Haga circular esta informacin.
Es a raz de esa necesidad de esa ausencia y de ese vaco que surge a partir de esta
primer intervencin urbana en 1996, mi proyecto de Puente de la Memoria que sigue
desarrollando acciones desde el arte, la memoria y los derechos humanos, a travs de
dispositivos que atraviesan arte y poltica.
Interpelando a los artistas a la relexin a travs de sus obras para dirimirlas en el
espacio pblico cuestionando las mismas polticas del arte y sus circuitos.
Con el objetivo de:
Sacar a la luz las vivencias de una sociedad que cambi y olvid su pasado.
Reconocer las secuelas que la dictadura dej en el cuerpo social.
Retomar la calle, donde habamos vivido la historia.
Transformar el no lugar, esa ausencia, en algo tangible.
Volver a poner el cuerpo y ocupar la escena para transformarla.
Crear un Puente entre: el pasado el presente y el futuro.
Referencias
Libros
Andersen Hans Christian , El traje nuevo del emperador, Cuentos de Andersen, Anaya, 2005; Ctedra, 2005,
Everest y otras.
Calveiro, Pilar, Poltica y/o violencia, Buenos Aires, Grupo Editorial Norma, 2005.
Capote, Truman, A sangre fra, In Cold Blood, Buenos Aires, 1966.
Longoni, Ana y Mestman, Mariano, Del Di Tella a Tucumn Arde/ Vanguardia artstica y poltica en el 68 argentino,
Buenos Aires, El cielo por asalto, 2000.
------------------, en Arte activista, Del Di Tella a Tucumn Arde, Buenos Aires, Eudeba, 2008. ***
Longoni, Ana y Gustavo Bruzzone (comps), El Siluetazo, Buenos Aires, Adriana Hidalgo, 2008.
Walsh, Rodolfo, Operacin masacre, Buenos Aires, Ediciones de la Flor, 1972, [Buenos Aires, 1957-1964]
Ediciones Continente.
Artculos:
Arcusn, Pablo, Artistas plsticos contra la comuna, en Clarn, Buenos Aires, 28 de marzo 1996.
190
191
Gisela Villarroel
Prof. y Maestrando en Arte Latinoamericano
Universidad Nacional de San Juan. UNCuyo
Introduccin
En la ciudad de San Juan, Argentina, el pasado ao 2010 con la intencin de generar
en la sociedad relexin sobre el signiicado del bicentenario de la independencia, de
nuestra historia y de nuestros espacios pblicos, el Museo Provincial de Bellas Artes
Franklin Rawson, en el marco del PROYECTO DEL BICENTENARIO: Encuentro
de Arte Pblico -Identidad Provincial. Relexiones sobre el concepto de ciudadana
en el ao del Bicentenario, convoc a artistas visuales provenientes de distintas disciplinas a proyectar a travs de una propuesta artstica diferente una Intervencin de
Espacios Pblicos para Volver Visible la Historia.
La comisin evaluadora del Museo seleccion a 12 artistas o colectivos de arte, provenientes de distintas partes del pas y del extranjero, los cuales realizaron sus intervenciones en los puntos estratgicamente seleccionados de acuerdo a su signiicacin histrica.
En este trabajo se pretende mostrar parte de las intervenciones realizadas, tomndolas
como discursos, y en base a las teoras de anlisis del mismo, hacer una relexin en
torno a los mensajes trasmitidos, los medios utilizados, el contexto histrico y la participacin del pblico como receptor y/o creador del mensaje.
Para esto se cuenta con informacin recabada en el momento de la ejecucin de las
intervenciones y con entrevistas a los autores de las obras.
La eleccin de cuatro de las intervenciones se debe al lmite de la extensin impuesta por los organizadores, de esta manera podr profundizar en cada una de las obras
seleccionadas.
Desarrollo
Las obras realizadas en este evento estuvieron relacionadas cada una de ellas con un
lugar signiicativo histrica y culturalmente. Los espacios sealados o intervenidos
han dejado de funcionar en su mayora como lo hicieran antao, de manera que las
obras vienen a recuperar parte de nuestra identidad ciudadana. No hay que olvidar
que en el caso de la ciudad de San Juan estamos hablando de una sociedad que vivi
un terremoto devastador hace escasamente 7 dcadas que oblig a rehacer prcticamente toda la ciudad, con los trazados de calles inclusive, por lo que es especialmente
signiicativa esta accin de recuperacin de la memoria.
192
LUGARES SEALADOS:
ESTACIN SAN MARTN
DUILLO TAPIA
La historia cuenta que el primer tren lleg a San Juan un domingo 12 de
abril, del ao 1885. Se trataba del ferrocarril Andino, que uni la ciudad
cordobesa de Villa Mara con San Luis, luego Mendoza para tocar despus
suelo sanjuanino. Esa fecha tan importante para los sanjuaninos no pas
desapercibida ya que 3 das antes y 4 despus, fueron declarados asueto para
toda la provincia. Slo trabaj la polica para garantizar la seguridad97.
Desde los ltimos aos del siglo XIX fue para San Juan la puerta de acceso ms rpida y eiciente para el ingreso y partida tanto de personas como de productos y mercancas. En torno a ella se tejieron muchas historias, se vivieron alegras, tristezas,
desengaos, esperanzas. Nuestra ciudad de San Juan se pobl con los inmigrantes
que llegaban con el tren Cuyano desde diversos lugares del mundo, sobre todo de
Espaa, pases de medio oriente e Italia.
El tren de pasajeros comunic a San Juan con Mendoza, San Luis, Crdoba y Buenos Aires durante
varios aos, hasta que el 10 de marzo de 1993, un tren de pasajeros sali desde San Juan, con destino a
San Luis y su conductor y tripulantes volvieron a dedo a la provincia. Ese fue su ltimo viaje.
Estacin San Martn. Duillo Tapia. Imagen cedida por Museo Provincial de Bellas Artes Franklin Rawson (MPBA)
Todo lo que suceda aqu pasaba por la estacin. La intervencin de Duillo Tapia all
intent ser una rememoracin de la vida que se generaba en torno a ella, en la llamada
Zona Roja. A pesar de que el tren dej de circular por nuestras vas la accin comenz en el andamio, proyectando imgenes sobre una estructura metlica envuelta en
telas, sobre las que se plasmaron palabras, escritas por los invitados y participantes
97
Diario de Cuyo, el tren cada vez ms cerca 12/04/2008, ver: http://www.diariodecuyo.com.ar/home/new_
noticia.php?noticia_id=276089
193
del evento; ellas relataban sucesos de los aos 90, recuerdos entraables, que hablaban de las vivencias de esos tiempos.
La participacin del pblico fue aqu imprescindible por su aporte a la memoria, aparecieron relatos que fueron plasmados con palabras sobre vidrios y luego proyectados
en una pantalla a la orilla del andn, reconstruyendo as una etapa de la sociedad
sanjuanina muy relevante.
Con la intervencin de Tapia se produjo en torno a este sitio una ceremonia que implicaba una tarea de excavacin.
[] los verdaderos recuerdos no deben dar cuenta del pasado como
describir precisamente el lugar en que el buscador tom posesin de l []
puesto que el acto de desenterrar un torso modiica la tierra misma, el suelo
sedimentado- no neutro, portador en si mismo de la historia de su propia
sedimentacin, donde yacan todos los vestigios (Didi-Huberman, 1997: 16).
La accin de invitar a permanecer en el andn, habiendo instalado all una infraestructura que facilitaba la rememoracin, signiic una invitacin simblica a desenterrar
recuerdos, mediante luces, transparencias, colores y algunas frases que fueron surgiendo a partir de los estmulos, dentro de los cuales uno de gran importancia fue un
personaje que apareci con maleta e indumentaria de poca, relatando sucesos de sus
viajes en tren a San Juan.
Despus de estas acciones, cruzando la calle, fueron al Hotel El Mendocino, donde
pidieron Pareja con papas, un plato tpico de la poca, que consta de dos salchichas
acompaadas de papas. Y con la participacin de msicos locales se intent revivir los
momentos que se generaban en torno a esta puerta de entrada a San Juan. Este sitio
se encontraba dentro del circuito obligado para los viajantes, que como el personaje
aparecido en el andn, llegaban a San Juan, y buscaban alojamiento en las cercanas
de la estacin. Encontraban all en El Mendocino, cobijo, alimento, diversin, y hasta
alguna dama de compaa.
Como muchas otras ciudades o pueblos argentinos, San Juan tuvo una vida que lata
al ritmo del tren, esta intervencin abri la puerta a los recuerdos, muchas veces dolorosos, de lo que fue en un momento una forma de vida, una organizacin social, una
fuente de trabajo, una posibilidad de comercializar productos y de recibir mercancas
escasas en la zona, una oportunidad de viajar ms econmica y segura, un lazo con
otras ciudades del pas, y con la capital.
El problema es que estos sucesos ya no pueden ser aprehendidos de manera inmediata
por el sistema sensorial humano, por lo cual hay que desarrollar mtodos que cubran
las distancias que en el tiempo y en el espacio han surgido por los cambios llevados a
cabo por nuestros gobiernos. Abstradas y ocultadas por el neoliberalismo, estas relaciones distanciadas deben volver a hacerse sensoriales e inmediatas. En este sentido
esta intervencin es, adems de una apuesta a la toma de conciencia, una posibilidad
de cambio desde las bases, desde cada uno de los habitantes de esta ciudad, para la
recuperacin de una importante va de comunicacin (ver Fore, 2010: 45 - 77).
194
Debido a que en esta obra en particular tiene mucho peso el proceso previo a la puesta en escena
de la misma es que me ha interesado desnudarlo.
En las acciones previas, en el planteo del proyecto
y en todo el proceso llevado a cabo para la instalacin del cantero de lpices puede leerse un discurso, puede determinarse una ideologa, lo cual
potencia el mensaje de la obra, instalndolo en
tres etapas: 1 previa a la instalacin, 2 durante la
instalacin y 3 posterior a ella.
Para mostrar estas tres etapas y todos los movimientos que generan en el interior de la sociedad
a partir del tallado de un lpiz es que inserto aqu
el proyecto de la artista:
Jardn de Infantes de la Escuela Paula Albarracn
de Sarmiento. Un almcigo de lpices. Mariela
Limerutti. Imagen de mi autora.
195
todas las tareas previstas por la organizacin del evento. Luego la obra quedar
expuesta al pblico y dispuesta a lo que ste desee hacer con ella. Debido a que el
elemento usado es un objeto de consumo cotidiano con un valor econmico, y a
muchas otras razones de ndole socio cultural; es muy probable que el pblico se
apropie los lpices logrando que la obra desparezca rpidamente.
Como nos informa el proyecto de la artista sta obra, que const de 6000 lpices,
plantados en un cantero fue instalada en el centro del Boulevard Leandro N. Alem,
frente a la Escuela Normal Sarmiento, en la capital sanjuanina.
Una vez instalada la obra la gente que circulaba por el lugar fue llevndose lpices, de
esta manera el nombre o mensaje escrito en cada uno de ellos lleg a otra persona, y la
obra fue de a poco desarmndose, o tomando una nueva forma.
En esta instalacin se hace referencia a los espacios que dejaron de existir despus
del terremoto de 1944 en San Juan, a partir del nuevo trazado de las calles que cambi
drsticamente la isonoma y la esttica de la ciudad, modiicando as mismo la cultura y la sociedad sanjuaninas.
El trabajo de Mariela Limerutti acude a un elemento bsico de la educacin inicial para
instalar en el presente la memoria del pasado, nuevamente de una manera potica, dialctica y crtica. La pregunta aqu es: hasta qu punto el progreso no rompe con la
cultura? Podra hacerse aqu un paralelo con el trazado de las grandes diagonales en
Pars del siglo XIX, con las que Haussmann99 logr los objetivos de mejoras sanitarias y
99
Georges-Eugne Barn Haussmann (Pars, 27 de marzo de 1809 Pars, 11 de enero de 1891) fue un
funcionario pblico, diputado y senador francs. Recibi el ttulo de Barn del emperador Napolen III, con quien
197
de comunicacin, aplaudidos por las clases enriquecidas, mientras que parte del pueblo
parisino senta que estas obras destruan sus races y conexiones sociales.
La artista hace hincapi en el proceso de construccin de la obra, considerando que
sta comienza con la propuesta a sus alumnos de intervenir los lpices con alguna
marca personal, ya sea el nombre, una palabra o dibujo. En este momento empieza a
cobrar sentido el producto inal, comienza a generarse una comunicacin, que simblicamente puede traducirse como un mensaje de los nios que iniciaron su educacin
escolar en el sitio sealado por el cantero de lpices antes del ao 1944, a los nios o
personas que los das del evento transitaron por el boulevard Alem. Este mensaje es
posible gracias a la mediacin de los nios que tallaron los lpices, accin que los llev
a conocer la historia de un lugar que ya no existe, al igual que a muchos de los que
observaron el cantero y se preguntaron de qu se trataba.
Otra accin relevante de todo este proceso fue la de instalar la temtica del Arte pblico en la escuela primaria, hacindolo conocer y posibilitando la relexin en torno a
la accin realizada, todo un proceso ntimamente relacionado con la educacin y con
nuestra historia ciudadana.
PLAZA DESAMPARADOS, BARRIO PUYUTA
DE QUE LAS HAY LAS HAY COLECTIVO MALDITA COSTUMBRE
El proyecto del colectivo Maldita Costumbre consisti en la creacin de un rumor
sobre ritos de brujera para traer a la memoria acontecimientos histricos propios del
barrio Puyuta, ubicado en el departamento Rivadavia, en la zona oeste de la capital
sanjuanina.
Para esto se realizaron sistemticamente acciones en la plaza de los Desamparados y
sus alrededores como colocacin de velas, sal, iguras, etc.; todas acciones que se asemejan a los rituales segn el imaginario colectivo. Para reforzar el rumor se emplearon
las redes sociales y aiches callejeros que informaban sobre lo acontecido en la plaza.
Sin embargo la obra no es todo lo anteriormente referido sino que ella se hace presente en los dilogos, en las conversaciones a media voz, en el rumor. Es ste algo que surge
desde abajo, y que por su carcter colectivo es transgrupal, atraviesa los diferentes grupos sociales
y los entremezcla. En el anonimato del se dice, dicen, me dijeron no prima una voz sobre otra,
se igualan en poder comunicativo desvinculndose de la centralidad de los sistemas comunicativos
oiciales. De hecho el rumor no tiene centro es policntrico y centrfugo; es la fuerza que la identidad
de un pueblo puede oponer al poder.
198
Segn Peter Osborne (Osborne, 2010: 231234) existe una forma de explicar la relacin
entre la memoria y la conciencia histrica (que
es interesante cotejar con las implicancias de
esta obra): la historia tiene su fundamento ontolgico y su origen histrico en la unidad de la memoria colectiva e individual, tal y como queda
registrada en la estructura de la tradicin como
mecanismo que garantiza la continuidad entre
generaciones. Sin embargo, la historiografa
propiamente dicha, en su sentido moderno y disciplinar comienza cuando sta unidad (entre la
memoria individual y la colectiva) se fractura,
con la multiplicacin de recuerdos que llama a la
necesidad de construir una memoria colectiva en
base a estrategias metodolgicas que implican la
necesidad de recurrir a fuentes documentales. La
historiografa, por tanto, depende del registro, de
la escritura. Y, al sustentarse en bases tangibles
Plaza desamparados, Barrio Puyuta. De que las hay
las hay.... Colectivo Maldita Costumbre. Imagen de
y documentales, aspira al objetivismo. En este
mi autora.
camino, la construccin de narrativas objetivistas, se aleja deinitivamente de las memorias vivas que estn presentes en las prcticas cotidianas de los grupos sociales. En este marco conceptual
podra decirse que el trabajo de Maldita Costumbre aspira a la construccin o al resurgimiento de
memorias vivas, que toquen las ibras ms ntimas y subjetivas de los individuos que comparten el
territorio donde suceden estos hechos sobrenaturales, y que por serlo, justamente, pueden generar una
narrativa popular mas que objetivista.
Lo impactante de esta obra, que a su vez viene a demostrar la importancia que tiene la construccin
de esta memoria colectiva, es la gran resonancia que tuvo, ecos en las calles, una pgina en Facebook,
una nota en el Diario de Cuyo, comentarios por parte del cura prroco de la Iglesia de Desamparados
en la misa, y quin sabe cuntas palabras ms y cuantas bocas hablaron sobre esta intervencin. Esto
nos hace pensar que a veces slo es necesaria una pequea chispa para encender un gran fuego.
He visto personalmente al artista pintando los rboles en el parque, con la misma apariencia que debiera haber pintado
Paul Czanne cuando sala con su caballete a pintar en la naturaleza. Esto me
hace pensar en el arte pblico como el taller saliendo a la calle, lo cual, en el caso
de Alberto Snchez es una estrategia que
l como profesor del Taller de Artes Plsticas, de la carrera universitaria Licenciatura en Artes Visuales, implement a
partir del ao 1999.
Al respecto su accin como profesor y
tambin como artista est ntimamente
relacionada con la educacin, con la puesta en valor del arte y con la democratizacin del mismo, al abrirlo al pblico libreSombras del parque. Alberto Snchez. Imagen de mi
mente, tanto para ver lo realizado, como
autoria.
para observar el proceso su ejecucin.
La temtica abordada en esta intervencin a los rboles del parque est adems relacionada con la recuperacin de la memoria, de una ciudad que ya no es la misma, sobre
todo a partir del terremoto del 44.
El nuevo trazado de las calles y la modernizacin urbana trajo consigo muchos cambios en las costumbres sanjuaninas, acelerados en las ltimas dcadas por las nuevas
y ms rpidas formas de comunicacin masivas.
Pese a que San Juan es una provincia perifrica, en el sentido de situarse a mucha
distancia de lo que puede considerarse el centro poltico y comercial del pas, el ritmo
de la vida aqu ya no es el que era hace cien aos, poca de la cual Snchez rescata los
personajes puestos en escena, el progreso en nuestra provincia trajo consigo la aceleracin del ritmo de vida.
Las imgenes plasmadas en los rboles pertenecen a personas que podan tomarse dos
o tres das para venir al cementerio (cercano al parque) en la noche previa al da de los
muertos y permanecer, pernoctar, comer, beber, cantar, amar en los alrededores de los
rboles que hoy son un eco de sus imgenes.
Por otro lado al transitar hoy por ese sitio, en horas de la noche, las imgenes devienen
como fantasmagricas, esto acentuado por el color blanco amarillento de la pintura
utilizada y por las ropas y las posturas, que nos hablan de personas que ya no estn,
no pertenecen al mundo actual.
200
Referencias
Diario de Cuyo, El tren cada vez ms cerca, 12 de abril de 2008, en: http://www.diariodecuyo.com.ar/
home/new_noticia.php?noticia_id=276089
Didi-Huberman, Georges, Lo que vemos, lo que nos mira, Buenos Aires, Ed. Manantial, 1997.
Fore, Devin, Arbeit sans phrase, en Los nuevos productivismos, Barcelona, Museu dArt Contemporani de
Barcelona, 2010.
Osborne, Peter, El Arte ms all de la esttica, Murcia, CENDEAC, 2010.
201
202
La obra Torso femenino, conocida popularmente como La Gorda, de Fernando Botero, evidencia la caracterstica que cumple el arte de asociar imgenes a lugares
organizados mediante unas disposiciones jerrquicas de la visualidad. Su emplazamiento en el Parque Berro le ha llevado a ser considerada como referente urbano y punto de encuentro.
Ante el grado de monumentalizacin que contiene gran parte de las obras denominadas como arte pblico, W. J .T. Mitchell arguye que la violencia que rodea al arte
pblico es ms que la omnipresente posibilidad de un accidente, el desastre natural
o el acto arbitrario de vandalismo. Gran parte del arte pblico mundial memoriales,
monumentales, arcos del triunfo, obeliscos, columnas y estatuas posee una referencia directa a la violencia en forma de guerra o conquista (Mitchell, 2009: 325).
203
204
te la imposicin de una memoria. De ah que Ricoeur advierta que [] toda sociedad tiene la responsabilidad de la transmisin transgeneracional de lo que considera
como sus logros culturales (Ricoeur, 2008: 86).
En un primer plano se observa la Iglesia del Sagrado Corazn de Jess, al fondo se ubica
el Ediicio inteligente, ediicacin que desde la dcada del noventa se considera como el
nuevo icono urbano, como aconteci en la dcada del setenta con el Ediicio Coltejer.
No obstante, desde el inicio de su ejecucin el proyecto present conlictos entre la
Administracin Municipal y los habitantes del barrio Boston. Para su construccin se
necesitaron aproximadamente unos 141 predios de este sector para poder comenzar
con la obra que requiri de unos 23.000 metros cuadrados. Los residentes de la zona
bloquearon las viviendas que se tenan proyectadas para su demolicin, ya que para
inales del 2009 la Administracin Municipal no haba negociado todava [] una
tercera parte de las 141 casas que se deben demoler y aseguraron que temen que de
proceder con la accin, las ruinas y espacios baldos sern aprovechados por habitantes de calle y se convertirn en nidos de plagas (Redaccin, 2009: 4).
Igualmente, se presentaron denuncias por parte de la comunidad ante los avalos
concedidos por la empresa Corporacin Avalos a las familias propietarias de las viviendas, ya que se logr demostrar por expertos que varios de los inmuebles a demoler
[] reportaban un valor superior en 20 30 millones de pesos (Snchez, 2010: 4).
Pero, el simulacro de una verdad urbana se ediica mediante la ocultacin de la conlictividad generada entre ciudadanos y planiicadores urbanos con respecto al uso
y apropiacin que se hace del espacio pblico para la constitucin de un lugar memorial. Factores como la expropiacin de terrenos por parte de la Administracin y
el uso de la fuerza pblica por parte del ESMAD contra la misma ciudadana son un
relejo de los abusos de la memoria ante lo problemtico y ambiguo que result ser
para la ciudad la imposicin de este lugar.
Efectivamente, esta localizacin de la memoria queda instituida mediante la concrecin de nuevos dispositivos visoespaciales que terminan siendo ubicados dentro un
205
Aunque an es muy prematuro analizar este factor en el contexto de Medelln, partiendo del hecho de que an no se ha entregado a la comunidad la Casa de la memoria,
es importante tener en cuenta este precedente para evitar la concatenacin de hechos
particulares dentro de una nica postura ideolgica que podra terminar equiparando, organizando y manipulando las memorias particulares. Las vctimas no pueden
ser tratadas simplemente como hechos estadsticos y deshumanizantes, como ocurre
con el tratamiento de la informacin en la mayora de medios masivos de comunicacin de Colombia. Igualmente, estos espacios deben incluir y desarrollar procesos
pedaggicos y de sensibilizacin que permitan hacer la correspondiente reparacin a
cada una de las vctimas.
Esta necesidad conmemorativa de preservar en la memoria de los ciudadanos episodios de la violencia termina siendo un ejemplo de lo que Pierre Nora deine con
respecto al archivo como [] la obsesin que caracteriza a lo contemporneo y que
implica a la vez la conservacin ntegra de todo el presente y la preservacin ntegra
de todo el pasado (Nora, 2008: 26).
A su vez, dentro de los lugares histricos y memoriales de la ciudad opera una constitucin de la mirada que se ediica a partir de visibilidades e invisibilidades; las estrategias tursticas se encargan de mostrar ciertas caractersticas de los espacios, mientras otras son vedadas. Si bien la ciudad ha sufrido importantes transformaciones en
diversos espacios mediante la rehabilitacin de zonas que por mucho tiempo fueron
marginales y reprimidas, factores como la pobreza, la indigencia, la inseguridad, la
violencia y el conlicto urbano siguen presentes.
Por consiguiente, se crean unas estrategias publicitarias y conmemorativas que buscan potencializar la imagen memoria de la ciudad a partir de la teatralizacin del espacio
pblico; las tarjetas portales, por citar un caso especico, ilustran los lugares simulados de la urbe producto de los juegos y sabotajes que el presente le hace al pasado. De
ah que los actuales planes tursticos citen dentro de un mismo recorrido los lugares
histricos junto con aquellos destinados al ocio y el entretenimiento.
207
Monumento a Francisco Antonio Zea. Autor: Marco Tobn Meja. Mrmol. Plazuela de Zea. 1952.
208
cin de sensaciones; segn Vicente Verd, se trata de una lgica del bienestar psquico.
Al estar la ciudad suscrita dentro de un presente comercial y ftil como resultado
del ritmo vertiginoso propio de los fenmenos urbanos actuales, no se conigura una
memoria colectiva slida como resultado de las constantes borraduras y tachaduras
que la ciudad moderna ha generado sobre la ciudad del pasado.
En consecuencia, ante la necesidad de proteger los lugares histricos y patrimoniales
de la ciudad se aprob el Proyecto de Acuerdo Municipal Nro. 23 de 2009 el 29 de
abril del mismo ao, en el cual se decret el Plan Especial de Proteccin del Patrimonio Cultural Inmueble del Municipio de Medelln. Afortunadamente, algunas ediicaciones histricas de la ciudad han sido restauradas y preservadas como lo fue el caso
de la Estacin Medelln107.
En realidad, el problema de la escultura y el monumento emplazados en el espacio
pblico adquiere una intencin ornamental desde el primer momento en que en la
ciudad se cuestiona el problema de su embellecimiento y su inscripcin en proyectos
de urbanismo cada vez ms modernos. El ornato se concibe como [] el lugar lmite
de la constitucin social (Moraza, 2007: 14), en vista de que conserva una funcin
identitaria y de apropiacin mediante la constitucin de un rgimen escpico que
privilegia ciertas visualidades urbanas con respecto a otras.
Como estrategia esttica para ser implementada en el espacio pblico, el ornamento
cumple desde la legalidad la funcin de representar la grandilocuencia de las instituciones gubernamentales, eclesisticas, culturales, econmicas, entre otros, por lo cual
se desencadena una [] colonizacin del espacio social, tanto desde el punto de vista
legal como urbanstico (Moraza, 2007: 18).
Sin olvidar el sentido provinciano y parroquial que caracteriza a la ciudad, mediante un acto inaugural conmemorativo con motivo del da del periodista en Colombia,
precedido de una oracin y una bendicin ejecutada por parte del presbtero Carlos
Yepes, capelln de la Gobernacin de Antioquia, el pasado 9 de febrero de 2011 fue
inaugurada la Plaza de la Libertad en el sector administrativo de La Alpujarra.
Como un lugar de la memoria que busca evocar la libertad de informacin y el ejercicio periodstico, durante la ceremonia se rindi homenaje a 146 periodistas de Antioquia fallecidos, cuyo tributo fue dispuesto mediante la instalacin de una placa conmemorativa entregada oicialmente por el Gobernador, Luis Alfredo Ramos Botero y
el Presidente del Club de la Prensa, Douglas Balvn.
Adems, dicho lugar fue adecuado para la localizacin de espacios comerciales, un
hotel y un centro cultural, por lo que se busca potencializarlo tambin tursticamente. En un afn por constituir lugares de la memoria, en tanto que Medelln deviene en
una especie de ciudad vida de eventos memorables, y ante la misma amnesia que la
107
Construida entre 1907 y 1937 por Enrique Olarte, actualmente funciona como la sede de la Fundacin
Ferrocarril de Antioquia, siendo restaurada entre 1986 y 1992. Este dispositivo arquitectnico conserva el legado
de lo que fue el crecimiento ferroviario, industrial y de las comunicaciones de Antioquia con el resto del pas.
Infortunadamente, durante la dcada del sesenta se produce la decadencia del sistema ferroviario, por lo que el lugar
entra en un estado de decadencia. Slo hasta 1985 inician los estudios para la preservacin del patrimonio inmueble de
la ciudad, siendo sta la primera obra de restauracin que se ejecuta en Antioquia. Como espacio funcional, luego de su
restauracin pasa a ser concebido como un lugar de la memoria transformado tambin en centro cvico y musestico.
209
Lo mismo ocurre con la Catedral Baslica Metropolitana de Medelln108, cuya infraestructura se est deteriorando debido a que algunas personas orinan sobre las fachadas de
este inmueble. Aunque su construccin sobresale por ser elaborada a base de ladrillo
cocido, en la actualidad afronta otro problema grave. Al igual que ocurre con varios
monumentos arquitectnicos de la ciudad, la fachada est siendo consumida por parte de los adictos al basuco, quienes para hacer rendir ms la droga la mezclan con los
residuos de los ladrillos de los templos que son raspados, atentando contra el estado
de las ediicaciones.
A su vez, el grave estado de deterioro de varias esculturas de la ciudad condujo a que
la Secretara de Cultura Ciudadana invirtiera un presupuesto de 223 millones de
pesos durante este ao para el mantenimiento de varias obras ubicadas en la Plaza
Botero y el Cerro Nutibara. Lo ms paradjico del asunto es el hecho de llegarse a
hurtar hasta las mismas esculturas, como ocurri con el busto de Jos Manuel Restrepo, localizado en la Avenida La Playa, el cual desapareci misteriosamente de su
pedestal. La placa, cuya inscripcin enuncia para conmemorar al Insigne historiador, escritor y hombre de Estado 1781 1863, se encuentra adherida a un pedestal
que no resguarda ninguna obra esculpida.
Por ello, el monumento en Medelln deviene en una especie de dispositivo tanto memorial como amnsico. En el momento en que la memoria produce un lugar mediante su emplazamiento, al mismo tiempo se le permite al ciudadano olvidar. Se trata
de un olvido discontinuo ante la posibilidad de exteriorizar una memoria a la cual
se puede regresar y alejar cuantas veces sea necesario. El monumento termina dilu108
Construida entre 1875 y 1931, es considerada como la obra arquitectnica ms grande del siglo XIX en
Colombia, en conjunto con el Capitolio Nacional en Santa Fe de Bogot.
210
212
Referencias
Amuchstegui, Rodrigo Hugo, Michel Foucault y la visoespacialidad. Anlisis y derivaciones, Argentina, Facultad
de Filosofa y Letras de la Universidad de Buenos Aires, 2008.
Bourriaud, Nicolas, Esttica relacional, Buenos Aires, Adriana Hidalgo Editora. 2006.
Deleuze, Gilles y Guattari, Flix, Mil mesetas, Valencia, Pre Textos, 2008.
Duque, Flix, Arte pblico y espacio poltico, Espaa, Akal Ediciones, 2001.
Guilbaut, Serge, Los espejismos de la imagen en los lindes del siglo XXI, Espaa, Akal, 2009.
Halbwachs, Maurice, La memoria colectiva, Zaragoza, Prensas Universitarias de Zaragoza, 2004.
Mitchell, W. J. T., Teora de la imagen, Espaa, Akal, 2009.
Montoya, Jairo, Paroxismos de las identidades, amnesias de las memorias, Bogot, Universidad Nacional de
Colombia, 2010.
Moraza, Juan Luis, Ornamento y ley. Procesos de contemporizacin y normatividad en el arte contemporneo, Murcia,
Cendeac, 2007.
Nora, Pierre, Pierre Nora en Les lieux de mmoire, Santiago de Chile, LOM Ediciones; Trilce, 2008.
Ospina, Juan Fernando. Y no nos vamos! en: Peridico Universo Centro. Medelln, Nmero 6, Octubre de 2009,
p. 3.
Parreo, Jos Mara, Un arte descontento, Murcia, Cendeac, 2006.
Torre, Susana. Ciudad, memoria y espacio pblico: el caso de los monumentos a los detenidos y
desaparecidos, en: Revista Memoria y sociedad, Bogot, Departamento de Historia y Geografa de la Facultad
de Ciencias Sociales de la Pontiicia Universidad Javeriana, Vol. 10, # 20, enero junio de 2006.
Redaccin, Hay problemas para Bicentenario, en: Peridico ADN, Medelln, 3, dic., 2009, p. 4.
Ricoeur, Paul, La memoria, la historia, el olvido, Buenos Aires, Fondo de Cultura Econmica, 2008.
Snchez, Oscar Andrs, Critican avalos de la EDU. El Concejo rechaz el uso desmedido de la fuerza pblica en los
desalojos, en Peridico ADN, Medelln, 30, abr., 2010, p. 4.
Vsquez Rocca, Adolfo, El vrtigo de la sobremodernidad: no lugares, espacio pblico y iguras
del anonimato, en: Revista Nmadas. Revista Crtica de Ciencias Sociales y Jurdicas, Madrid, Universidad
Complutense de Madrid. Vol. 16, 2007. Publicacin electrnica.
213
Recuerdo y memoria
Entre las manifestaciones de arte pblico los monumentos conmemorativos tuvieron
un lugar de privilegio desde el Antiguo Rgimen, cuando surgieron como demostracin del poder regio. En la era republicana se refrend su importancia en el proceso de
construccin de los nacientes estados. En consecuencia fueron monumentalizados los
mrtires de la fundacin de la repblica, las fechas patrias, sus hroes y posteriormente
las glorias de las elites locales. No obstante, en la transicin entre el Antiguo Rgimen
y la Repblica no hubo monumentos permanentes. Esto se evidencia en el caso neogranadino, analizado en esta ponencia, donde ni el poder regio ni el republicano fueron
consagrados de tal forma. A inales de la Guerra de Independencia en 1819, se pens en
la realizacin de monumentos en los que se instalara desde la mirada oicial la memoria
de la guerra, sus hechos sobresalientes, hroes y mrtires lo cual llev a la inclusin del
Decreto sobre memoria de los muertos por la patria y consideracin y recompensas a que son acreedores
sus viudas, hurfanos y padres en la Constitucin de Ccuta de 1821 (Repblica de Colombia, 1822: 216). Pero esta iniciativa corri la misma suerte que el proyecto nacional conocido en la historiografa como la Gran Colombia. Esta repblica se desmembr luego de
mltiples factores entre los que se destacan la polmica presidencia vitalicia propuesta
por Bolvar en la Constitucin Boliviana de 1826; las acusaciones de rebelin de Toms
Cipriano de Mosquera contra el Ministro de Guerra y hroe de la Campaa libertadora
del sur Jos Mara Cordova (por lo cual muri en combate en 1829109), y inalmente
los alzamientos de Jos Antonio Pez en Venezuela y Juan Jos Flores en Quito contra
el gobierno centralizado en Bogot (Palacios y Safford, 2002: 268). Dos aos despus
Francisco de Paula Santander, vicepresidente de Colombia, encabez un fallido atentado contra Bolvar, que termin debilitando an ms a la joven repblica. En 1830 el que
sera presidente de las provincias del sur, Antonio Jos de Sucre, fue asesinado meses
antes de que el Libertador muriera en Santa Marta, cuando marchaba al exilio; entonces
109
Cabe aclarar que Bolvar no orden la muerte de Crdova, sino su detencin. No obstante el legionario
britnico Rupert Hand, por orden de Daniel Florencio OLeary, asesin a Crdova con su sable luego de haberlo vencido
en combate.
215
el tercer interrogante se reiere a la forma misma, el aspecto que tenan estas estructuras artsticas que se instalaban en las plazas de las villas principales. Y inalmente, el
cuestionamiento ms pertinente para el asunto que ocupa a esta ponencia es: existe
alguna relacin entre estas formas efmeras y los monumentos que vendran despus
del establecimiento de la Repblica? Estos cuatro aspectos se trabajarn a continuacin, a partir del caso de la jura de Fernando VII, realizada en la villa de San Bartolom
de Honda en diciembre de 1808. En primer lugar se tratar la celebracin de la jura, en
segundo se hablar del lugar que ocuparon las construcciones efmeras en la ceremonia y inalmente se presentar una conclusin sobre la relacin entre la celebracin de
la jura y los monumentos republicanos.
La Jura Real, recordatio de idelidad a la corona
En primer lugar es necesario deinir el uso de la palabra latina recordatio. Este concepto no surge de la retrica, tan importante para la creacin de imgenes durante la
colonia. Su uso remite al diccionario de autoridades (RAE, 1726: 74), donde aparece
para deinir una de las acepciones de la palabra acuerdo; la recordatio remite a eventos
pasados, a recuerdos que se traen a la memoria. Pero tambin mantiene un sentido
legal, pues acuerdo designaba tanto una decisin con peso jurdico, como al cuerpo de
magistrados de una audiencia, con su regente, es decir El Real Acuerdo (RAE, 1726: 74).
La recordatio, por su vnculo con un acuerdo, remite al pasado. Se funda en un suceso
anterior que toma como precedente, al igual que la memoria, pero acta en el presente
en la medida que mantiene la vigencia de lo acordado. Ese es precisamente el caso de
la celebracin de la Jura Real, pues se buscaba establecer el antecedente en el que
se fundaba la monarqua: el pacto del rey con sus vasallos. En el caso de los festejos
celebrados en San Bartolom de Honda tal relacin se pona a prueba, pues entonces
Fernando VII era rehn de Napolen Bonaparte. Por ese motivo el alfrez real Josep
Diago dirigi una relacin del festejo a la majestad cautiva110:
Reciba Seor S. M. ste omenage [] afectuoso que nombre de sta leal
Villa ofrece los pies del Trono de S. M. el mas obediente y iel Vasllo, que
queda rogando Dios por que llegue quanto antes aquel felz momento que
tiene determindo en sus eternos Decretos para dicha de toda la Nacin, de
ver S[u] M[ajestad] sentdo bjo del Solio que ocuparon sus progenitores.
(Honda, 1809, nm. 122: folio 3)
Diago, alcalde de segundo voto que asumi el puesto de Alfrez Real, alude en su
carta al restablecimiento de un orden natural que une a la religin y la monarqua:
es designio divino que el monarca ocupe el lugar de sus padres. Al mismo tiempo se
restableca la unin entre el Deseado monarca y sus vasallos, quienes reconocan a su
110
Cabildo de San Bartolom de Honda, 1809 La jura de Fernando VII en la Villa de San Bartolom de Honda
en Amrica. Impresos de Amrica, en Archivo Histrico Nacional de Espaa, ESTADO, 54, I, nm. 122. Aunque se trata de
un manuscrito, en el archivo espaol se encuentra dentro de un legajo titulado Impresos de Amrica. Se citar como
Honda, 1809, nm. 122.
217
Nmero tercero. Vista del balcn de la casa del Alfrez Real Josep Diago
Cabildo de Honda, 1809, M.P.D. 315
El alfrez real, o mayor, era el encargado de portar el pendn real en las proclamaciones
de un nuevo monarca (RAE, 1726: 74) y tambin tena la atribucin de disear y costear los festejos (Honda, 1809, nm. 122, folio 13). En esa medida el alfrez mediaba la
representacin real, al ser el encargado de hacer presente la pompa de su majestad ante
el vasallaje. Por ello era el encargado de refrendar el acuerdo celebrado en la ceremonia.
Despus de mostrar el retrato de Fernando VII, la comitiva que reuna al real acuerdo,
218
es decir a las mximas autoridades civiles y eclesisticas, baj del balcn para realizar un paseo a caballo (Honda, 1809, nm. 122, folio 7) que pas por un recorrido
sealado por emblemas y un arco triunfal, del que no se conocen descripciones; la comitiva lleg inalmente al tablado construido en la Plaza de san Francisco, donde fue
proclamado el rey al tiempo que se reg de plata, es decir que se lanzaron monedas
de plata al pueblo. Aunque se acostumbraba acuar una medalla especial, conocida
como jura, en este caso no alcanzaron a llegar las que se encargaron a la capital y se
regalaron monedas de cuatro reales (Honda, 1809, nm. 122: folios 7-8). No obstante
se conoce el diseo de las juras de Honda, en las que se muestran las armas de la ciudad y una inscripcin fundamental para probar la apelacin al pasado que se relaciona
con la recordatio: en el anverso de la medalla deca Magno in ortu / maior in imperio
/ mximo in se ipso, inscripcin latina que podra traducirse como grande por su
nacimiento, mayor por su poder, ms grande en s mismo. Esta exaltacin a la monarqua fue tomada de unos versos usados para la entrada de Felipe V de Borbn a la
ciudad de Npoles, donde estaban inscritos en un arco triunfal con su retrato (Ubilla
y Medina, 1704: 490). Entonces tambin se us la alusin al monarca como Duplicis
Mundi Regi, que tambin aparece en Honda en variadas representaciones visuales.
De vuelta a la celebracin neogranadina, luego del paso por el tablado de san Francisco, la comitiva se fue hasta la antigua plaza mayor donde haba otro tablado frente al
cual se repiti la ceremonia, con la diferencia de que se dispararon salvas con obuses;
luego la comitiva regres por el mismo camino a la casa del alfrez, quien ofreci un
refresco (comida ligera) a ms de cien invitados, luego sali al balcn para ijar el Pendn Real junto al retrato de Fernando VII y regalar monedas de plata y dulces secos
a los concurrentes (Honda, 1809, nm. 122: folio 8). Para culminar los festejos, por la
noche se hizo una iluminacin general de la villa con velas de cera de 1, 2, y 3 libras, de
las que se utilizaron ciento y veinte luces slo en el balcn de la casa de Josep Diago,
sin contar los tablados (Honda, 1809, nm. 122: folio 29).
Ceca de Santaf. Anverso de la Jura de Fernando VII en la Villa de San Bartolom de Honda. Acuacin, Santaf
(hoy Bogot), 1808.
219
En este punto hay que aclarar que la representacin visual diiere del relato escrito,
pues en este se mencionan versos que no se ven en la acuarela que lo acompaa; igualmente en el relato se dice que el medalln del rey tena encima una corona imperial
que no aparece en el dibujo y inalmente- la diosa Belona est representada en el
dibujo, mientras que en el relato se habla del dios Marte. Quiz este hecho refuerce la
tensin entre lo dibujado y lo escrito que aunque se reieren a un mismo acto, diieren
en varios puntos que sera largo enumerar habra entonces que darle ms peso al
testimonio del relator o al del dibujante? Si se tiene en cuenta que la fecha en la que se
irma el relato del regidor Morales y las actas del cabildo de Honda es 14 de junio de
1809 (Honda, 1809, nm. 122: folio 19), es decir ms de seis meses y medio despus de
la jura, realizada el 24 de diciembre del ao anterior, se puede concluir que el carcter
efmero de la iesta no permiti la uniformidad de los testimonios escritos y dibujados.
Sobre el tablado de la Plaza Mayor cabe resaltar que se trata de una representacin
poltica del poder hispnico que remite a la empresa de Carlos V: las columnas de
Hrcules con el mote: Non plus ultra Ultra plus inquam, [Nada ms all - Ms all digo]
rodeadas de las alegoras de las cuatro esquinas del mundo y entre los fustes el retrato
de aparato de Fernando VII, con textos alusivos a su injusto cautiverio y la justicia
de la causa contra Napolen. Aunque este retrato y el de la casa del alfrez parecieran iguales, hay que tener en cuenta que ste ltimo revesta un carcter especial. Se
trataba de una forma sustitutiva (Gombrich, [1963] 1998: 4) del monarca cautivo o la
presencia de su ausencia, es decir, la imagen cuya fuerza era instrumentalizada por lo que
221
ella misma representaba que no era otra cosa que a la propia cabeza de la monarqua
hispnica (Marin, 1993: 12-14). El hecho de que se tratara de un retrato en majestad,
rodeado de las personas fsicas que integraban el Real Acuerdo, diferenciaba el retrato del balcn de otras imgenes en las que apareciera la eigie del monarca. Slo as
se entiende que el acto central de la proclamacin haya sido congregarse para estar en
presencia del retrato real, que no es lo mismo que situarse frente a una alegora sobre
el poder del rey, como la que se encontraba en la Plaza Mayor.
En la carta citada, aparece la idea del paraje pblico junto con un atributo que le es
propio: el buen orden y la tranquilidad. De ah que durante la Jura de San Bartolom
de Honda, la clave de la celebracin pasara por la recordacin de un acuerdo, que deba refrendarse ante la coyuntura presente de la guerra con Napolen. Era un llamado
al orden y la tranquilidad que resida solamente en la alteza serensima. No poda
haber permanencia en el paraje pblico de ninguna obra que compitiera con la permanencia eterna del rey y su poder sobre los vasallos americanos.
Pero el espacio pblico haba empezado a hacer su irrupcin en 1781 y 1794 con el uso
de los lugares que slo el rey poda ocupar, tanto en sentido fsico como simblico.
Por ello es interesante que se ensayara una pedagoga cvica en la calle y la plaza. Al
pegar un pasqun en un muro, o al hacer circular de mano en mano un impreso, no se
lograba el contacto popular con el que s contaban los festejos pblicos. En medio de
la diversin y la pompa, as como una vez apareci el monarca, ahora aparecan iguras
como la Libertad, ingeniosamente disfrazada: Antonio Nario, juzgado por traducir
los Derechos del hombre, en los inicios de la era republicana ocup la presidencia de la
Repblica de Cundinamarca, y como tal encabez la procesin del 19 de julio de 1813
para llevar a Santa Librada desde la iglesia de San Juan de Dios hasta la Catedral.
Se trataba de la preparacin a la iesta del 20 de julio, da de la Independencia. Slo
que la aparente festividad religiosa haba sido re-signiicada, pues se publicaron unos
sonetos annimos en los que Librada se transforma en santa libertad al hacer votos
por ver la patria libertada o que logre una slida existencia / La santa libertad
e independencia (Groot, 1869: t. II, 336). De forma semejante se convirti la imagen
de Jess Nazareno de la iglesia de San Agustn en smbolo republicano. En 1813 el
Nazareno fue condecorado como Generalsimo de los ejrcitos de Cundinamarca y as
apareci tanto en procesiones y festejos religiosos (Groot, 1869, t. II, 309), como en la
prdica sobre la injusticia de los espaoles y la justicia nuestra el 25 de enero de 1814
(Caballero [S. XIX] 1986, 151, 155-156).
En los casos mencionados las iguras religiosas sirvieron para la divulgacin de ideas
polticas contrarias al concepto de vasallaje, aunque el ceremonial de Antiguo Rgi111
Carta del virrey Jos de Ezpeleta a Manuel Godoy, duque de Alcudia. Santaf, 19 de 1794.
223
men se mantuviera en apariencia- sin modiicaciones, salvo por la ausencia del retrato del rey. Cabe destacar que despus de inalizada la Guerra de Independencia, en el
Nuevo Reino de Granada se mantuvo el ceremonial descrito, en trminos generales.
La eigie del monarca fue remplazada por la de los hroes, y el Pendn Real cedi su
lugar a la bandera y el escudo como representaciones nacionales. Si no se conservan
imgenes de los hroes de la primera etapa republicana, probablemente se deba a que
fueron destruidas en el curso de la guerra. Esta hiptesis se basa en lo sucedido el 25
de octubre de 1816, cuando por orden del paciicador Pablo Morillo fue quemado el
retrato del patriota Frutos Joaqun Gutirrez, junto a otros documentos de la primera repblica en la plaza de Santaf (Caballero [S. XIX] 1986, 230). En el transcurso del
siglo XIX los retratos de los hroes de la campaa libertadora (1815-1819) usados en
los festejos patrios, fueron siendo remplazados por el emplazamiento de monumentos. En el retrato pintado en 1819 por orden de la Asamblea de Notables de Cundinamarca, Bolvar sustituy a Fernando VII como Padre de la Patria (Rey-Mrquez, 2011:
90-94); pero el uso de retratos del Libertador en el espacio pblico, fue perdiendo
presencia desde la instalacin de su estatua en 1846. De esta forma se instaur el recuerdo del momento fundacional de la nacin a travs del festejo heredado de la monarqua, hasta que paulatinamente con la llegada del monumento conmemorativose condens en una imagen permanente la simbologa que nutra el festejo efmero.
De esta forma se estableci el debate poltico en la plaza pblica, con las celebraciones efmeras del Antiguo Rgimen. Por este motivo pueden considerarse antecedentes del monumento en el espacio pblico, en la medida que transformaron el paraje
pblico destinado al recuerdo del pacto monrquico colonial en un lugar de congregacin consagrado a la memoria de la leyenda patria. El recuerdo y la memoria implican
dos movimientos: el primero hace que se mire hacia atrs a un hecho que se mantiene
vigente, mientras que el segundo implica una proyeccin hacia el futuro con el in de
conferirle a un hecho memorable un valor alto para un colectivo. La recordatio implica
el uso de las representaciones efmeras como parte de un dispositivo de actualizacin,
en cambio con la memoria se busca inmortalizar un hecho cumplido a travs de representaciones permanentes. Pero en ambos palpita el sentido de lo pblico en la medida
que son dirigidos a un grupo amplio, a un colectivo que es interpelado a travs del
poder que tienen las representaciones visuales.
224
Referencias
Caballero, Jos Mara, Diario de la patria boba, Bogot, Editorial Incunables, [s. XIX] 1986.
Finestrad, Joaqun de, El vasallo instruido en el estado del nuevo Reino de Granada y en sus respectivas obligaciones,
Bogot, Universidad Nacional de Colombia, [1789], 2001.
Gombrich, Ernst Hans. Meditaciones sobre un caballo de juguete. Madrid: Debate, [1963], 1998.
Groot, Jos Manuel, Historia eclesistica y civil de Nueva Granada, Tomos I y II. Bogot: Imprenta y Estereotipia
de Medrano Rivas, 1869.
Hernndez de Alba, Guillermo, Proceso de Nario. Dos tomos, Bogot, Presidencia de la Repblica, 1980.
Halbwachs, Maurice, La memoria colectiva, Trad. de Ins Sancho-Arroyo, Zaragoza, Prensas Universitarias
de Zaragoza, [1950], 2004.
Majluf, Natalia, Escultura y espacio pblico, Lima 1850-1879, Documento de trabajo N 67, Lima, IEP Instituto de
Estudios Peruanos, en http://www.iep.org.pe Documento de trabajo N67 Serie: Historia del Arte N2,
1994
Marin, Louis, Des pouvoirs de limage. Glos,. Paris, ditions du Seuil, 1993.
Ortega Ricaurte, Enrique, Herldica nacional. Estudio documental, Bogot, Imprenta del Banco de la Repblica,
1954.
Palacios, Marco y Frank Safford, Colombia: pas fragmentado, sociedad dividida, Bogot, Editorial Norma, 2002.
Real Academia Espaola (RAE), 1726, Diccionario de la lengua castellana, en que se explica el verdadero sentido de las
voces, su naturaleza y calidad, con las phrases o modos de hablar, los proverbios o refranes, y otras cosas convenientes al uso
de la lengua [...] Tomo primero. Que contiene las letras A.B. Madrid: Imprenta de Francisco del Hierro, en http://
buscon.rae.es/.
Repblica de Colmbia, Leyes de la Repblica de Colombia Tomo 1 Comprende la Constitucin y leyes sancionadas por
el primer congreso general en las sesiones que celebr desde el 6 de mayo hasta el 14 de octubre de 1821, Bogot, Bruno
Espinosa, impresor del Gobierno General, 1822.
Rey-Mrquez, Juan Ricardo, Emblemas del Nuevo Reino de Granada, alegoras de la Repblica de Colombia (17941830) De la retrica del vasallo, al smbolo patrio. Buenos Aires, Tesis de maestra (indito), 2011.
Ubilla y Medina, Antonio, Succession del rey Don Felipe V. Nuestro seor en la Corona de Espaa; diario de sus viages
desde Versalles a Madrid el que executo para su feliz casamiento; jornada a Npoles, a Miln, y a su exercito; successos de la
campaa y su vuelta a Madrid, Madrid, por Juan Garca Infanzn, 1704.
225
226
torno alla statua di Bolivar escrito por Filippo Gerardi119. En este libro, adems de un
breve contexto y una detallada descripcin de la obra, se incluyeron seis grabados en
acero de la estatua y sus bajorrelieves. Al arribar la obra a Bogot en 1845 su comitente
decidi donarla al Congreso de la Nueva Granada y por la Ley 6 del 12 de mayo de 1846
se estableci su instalacin en la Plaza Mayor de la capital120, que desde entonces
fue nombrada Plaza de Bolvar (Plaza, 1850: 7). Fue inaugurada el 20 de julio de 1846.
Una de las particularidades de la estatua,
si se piensa en el contexto latinoamericano, es su temprano surgimiento. De
acuerdo con la periodizacin propuesta
por Buruca y Campagne respecto a los
conjuntos simblicos asociados al surgimiento y consolidacin de las naciones
americanas121 (1994: 351-352) las dcadas
entre 1860 y 1920 marcan una etapa monumental en la que se realizaron, en su
mayora, panteones y monumentos conmemorativos, as como textos de literatura e historia patria y la ritualizacin de
las iestas patriticas. Es una poca que
marca la consolidacin de los discursos
nacionales que estuvieron en juego a lo
largo del siglo desde las Independencias.
Es decir que la estatua de Bolvar de Tenerani surgi en un momento anterior a
Pietro Tenerani/G. Marcucci (grab.) Simn Bolvar. 1846.
Grabado en cobre. Museo Nacional de Colombia, reg. 1823.
este auge, durante la etapa que los autores denominan crtica e historiogrica (1830-1850), en la que si bien no se abandon la creacin emblemtica producida
entre 1810 y 1830, la funcin de las representaciones simblicas estaba entre el auto
reconocimiento y las disputas ideolgicas generadas por las diferencias partidarias.
En este contexto, la extemporaneidad de la estatua se explica en gran parte por haber
sido concebida para un lugar privado. Este destino original tambin ayuda a esclarecer la razn por la que el primer monumento al hroe americano fuese pedestre y no
ecuestre que, de acuerdo con la tradicin romana, tendran las estatuas que se realizaran a partir de la dcada de 1860 en otras partes de Latinoamrica122.
119
Crtico de arte, autor de varias biografas de artistas como Bartolomeo Pinelli (1835), Vincenzo Bellini
(1835) y Matthias Kessels (1837).
120
No se ha ubicado documentacin concluyente frente a la denominacin que hasta 1846 tuvo esta plaza,
algunos autores le llaman Plaza de la Constitucin y otros Plaza Mayor. De acuerdo con Germn Meja es posible que se
utilizaran los dos nombres simultneamente (Meja, 2000: 201-202).
121
Si bien los autores se circunscriben al Cono Sur, consideramos que esta periodizacin es viable para pensar
los procesos desarrollados en la mayor parte de pases de Latinoamrica, y particularmente en Colombia.
122
Por ejemplo las estatuas de Simn Bolvar en Lima (1859) y Caracas (1874) y las de Jos de San Martn en
Buenos Aires (1862) y Santiago de Chile (1863).
227
En trminos generales, durante la primera mitad del siglo XIX, los monumentos -proyectados y realizados- para espacios pblicos eran de tipo alegrico (vg. Pirmide de
Mayo, Buenos Aires, Argentina; Monumento a la Libertad Americana, Santiago de Chile) y
estaban ms relacionados con hechos e ideas relativas al reciente proceso independentista que con personajes especicos, si bien se haba desplegado una importante creacin de panteones en pintura, grabado as como algunos bustos para espacios privados.
Una destacable excepcin fue la estatua auto celebratoria de Antonio Lpez de Santa
Anna (1795-1877) inaugurada en Ciudad de Mxico en 1844, derribada a los seis meses
por sus detractores, reinstaurada y vuelta a derribar en 1855 (Zrate, 2003: 420-421). A
diferencia de la de Santa Anna, la estatua de Bolvar de Tenerani no fue hecha en vida
sino diecisis aos despus de su muerte. Teniendo en cuenta los indicadores que hasta el momento nos permiten analizar su recepcin podemos airmar que su instalacin
gener animosidad entre sus contemporneos. Varios autores comentaron con suspicacia que la ley por la cual se recibi la donacin de la obra fue irmada por Mariano
Ospina Rodrguez, por entonces presidente del Congreso, y uno de los que encabez el
intento de asesinato a Bolvar en 1828. Borda escribi a este respecto:
Es una satisfaccin dada la memoria del Libertador, el sincero arrepentimiento
que manifestaron todos aquellos conspiradores del 25 de septiembre que,
no por ruines pasiones de inters particular, sino por exaltacin de ideas en
una edad de poca relexin y en que con facilidad se engaa, entraron en esa
conspiracin. El lector notar que uno de stos es el Presidente de la Cmara
de Representantes que suscribe la ley que antecede. Pudiramos sealar otros,
como el doctor Florentino Gonzlez, General Briceo, etc., desengaados como
el doctor Ospina y que hoy pertenecen al partido del orden (Borda, 1892: 2).
Esta paradjica situacin tambin fue sealada por el diplomtico francs Auguste
Le Moyne:
Muchas personas, aun aplaudiendo como yo, el triunfo de la justicia en los
honores que se rinden a la memoria de Bolvar [...] no se extraarn de ver su
estatua levantada tan poco tiempo despus de ocurrida su muerte, en el centro
de una ciudad cuya poblacin o por lo menos una parte de ella fue abierta o
tcitamente cmplice del atentado que el 25 de septiembre de 1828 se hizo
contra la vida de ese gran ciudadano y cuando todava algunas de las personas
que tomaron parte activa en el mismo, no slo viven, sino que han seguido
desempeando altas funciones de Estado? (Le Moyne, [1880] 1945: 133).
10) y su primer efecto sera presentificar lo ausente, como si aquello fuera lo mismo y tal vez mejor, ms intenso, ms fuerte que si fuera l mismo (Marin, 1993:
11). Esto contribuye a comprender que en la recepcin de la obra se produjera un
proceso de suplantacin en el que la presencia del hroe era su representacin.
As las diferencias ideolgicas vigentes entre bolivarianos y santanderistas123
explicaran que hasta mucho tiempo despus fuera necesario custodiar el monumento para impedir que lo derribaran los frenticos antibolivarianos (Cordovz, [1899] 1997: 852). El regreso de Simn Bolvar, adicionalmente, aviv entre
sus seguidores y opositores una conflictividad derivada de las particularidades
de la construccin de esta presencia (aspecto que explica la formacin de mitos
respecto de su creacin) la cual se analizar en clave poltica a partir de tres variables: su comitencia, su iconografa y su ubicacin geogrfica.
I.
Desde ines del siglo XIX, especialmente de la Esjematoloja ensayo iconogrico
de Bolvar publicado por el artista y editor Alberto Urdaneta (1845-1887) con motivo del centenario del nacimiento de Bolvar en 1883, hasta hoy, se reiteran algunas
referencias que no han sido suicientemente documentadas pero que permiten hacer un seguimiento de la mitopoiesis de la estatua. Una de ellas es la predestinacin
del artista como artice de la obra. Segn el relato de Cordovz Moure cuando Jos
Ignacio Pars le pidi a Tenerani que hiciera una estatua para la entrada de su casa,
el autor le mostr un estudio sobre Bolvar, una estatuilla de cera y una nota de su
maestro, Antonio Canova, en la cual le vaticinaba que l modelara la estatua de Bolvar (Cordovz, [1899] 1997: 852). Existe un artculo fechado en 1826 del crtico de
arte romano Pietro Giordani, en donde maniiesta que as como el nombre de Antonio
Canova (1757-1822) haba quedado unido al de Washington por haber hecho su estatua, deseaba que el de Tenerani estuviera en el futuro unido al de Bolvar (Giordani,
[1826] 1860: 208). Es decir que no fue Canova sino Giordani el autor de la mencionada profeca. En efecto, dicho texto fue publicado cinco aos antes de que Toms
Cipriano de Mosquera124 encargara a Tenerani el primer busto de Bolvar en 1831, un
ao despus de la muerte del hroe. Este busto (militar) fue seguido de otro encargo
de un busto de civil en 1836. Antecedentes que llevan a pensar que no slo la fama
que pudiera tener Tenerani a comienzos de la dcada de 1840, sino la existencia de
dos obras anteriores, explicara que el artista tuviera algn conocimiento previo de
la iconografa de Bolvar. A su vez, es posible que Jos Ignacio Pars, motivado por el
123
Despus de la declaracin deinitiva de la Independencia de la Nueva Granada en 1819, Bolvar continu
en las campaas de liberacin de los territorios del sur y el vicepresidente, Francisco de Paula Santander, qued a
cargo de la presidencia. Sin embargo las diferencias entre los dos dirigentes llegaron al punto de que Santander hizo
parte del intento de asesinato de Bolvar en 1828, por lo cual fue enviado al exilio. Con la muerte de Bolvar en 1830 y
la consiguiente separacin de la Nueva Granada de Venezuela y Ecuador, Santander fue nombrado presidente, cargo
que ejerci entre 1832 y 1837. Muri en 1840. La muerte de los dos lderes agudiz los mltiples conlictos entre los
partidarios de uno y otro. A partir de dichas diferencias se formaron dos partidos polticos (liberales y conservadores)
que dominaron la escena poltica colombiana hasta el siglo XX. (Cfr. Gonzlez, 2010: 11).
124
(1798 - 1878) Fue presidente de la Nueva Granada en cuatro periodos (1845-1849, 1861-1863, 1863-1864,
1866-1867). El primer busto de Bolvar lo encarg en 1831 cuando se desempeaba como diplomtico en Europa.
229
resultado de aquellos bustos decidiera encargar la obra al mismo artista. En este sentido es interesante constatar que tanto las caractersticas iconogricas de la estatua,
como la seleccin de las escenas y leyendas del pedestal han sido histricamente atribuidas exclusivamente a Tenerani como un profundo conocedor del pensamiento del
hroe125. Sin embargo consideramos que no debe desdearse la inluencia que tanto
Toms Cipriano de Mosquera como primer comitente de los bustos del Libertador,
as como Jos Ignacio Pars, tuvieron sobre Tenerani. Por otra parte, Gerardi, el autor
del libro que acompa la estatua, rese que Pars solicit a otras personas que le
ofrecieran testimonios sobre el Libertador al artista126:
[El comitente] no repar [en] esmero de cualquier tipo para que el escultor
fuera esclarecido sobre todo lo que pudiera tener una relacin inmediata con
las costumbres y con el sentimiento de los americanos del medioda. Para esto,
suplicados por el mismsimo Paris, se prestaban con todo tipo de noticias
oportunas, su excelencia el seor marqus Fernando Lorenzana, monseor
Lavinio de Medici Spada, [...] y D. Lorenzo abogado Valenzi, auditor de la
nunciatura apostlica en la repblica de la Nueva Granada (Gerardi, 1845: 11-12).
Los tres ostentaban altos cargos diplomticos en la Iglesia Catlica y estaban relacionados de una manera u otra con la Nueva Granada127. La inclusin de sus nombres en
el libro de Gerardi (fuente de primera mano con respecto a las intenciones de Pars
respecto al monumento y al propio libro) permite juzgar la importancia este le dio
a sus testimonios que, si bien no conllevaban necesariamente el establecimiento de
una cercana particular de dichos representantes con el Libertador, si posibilitaban
una vinculacin simblica de Bolvar (y de Pars) con las altas esferas de la Iglesia
Catlica. Sin duda la eleccin de Tenerani tambin est vinculada con su cercana con
la Iglesia Catlica, pues fue un declarado partidario del neoguelismo que defenda la
supremaca de la iglesia en la vida poltica italiana y de las propuestas de gobierno de
Po IX, por lo cual sera nombrado escultor oicial (Grandesso, 2003: 111-116).
En este sentido y volviendo al contexto de la Nueva Granada, resulta fundamental
tener en cuenta que muy pocos aos antes, entre 1839 y 1841, la Nueva Granada haba
estado sumergida en una guerra civil (llamada de los Supremos) iniciada por la su125
Esta idea qued ijada, entre otros, en uno de los versos de la Oda a la estatua de Bolvar que Miguel Antonio
Caro escribi en 1886: Mgico par de Dante / Teneranni (sic) tu vasto pensamiento / renov, concentr, y tu
semblante / dio majestad cambiante, / y tu austero callar mltiple acento. (Caro (1886), 1993: 5).
126
No se puede soslayar la posible inluencia de los dems acompaantes de Pars en Roma su hijo don
Enrique, su sobrino don Pedro Mara Pars, don Mariano Tanco, el joven Jos Escalln, protegido de don Jos Ignacio, y
don Pedro Mara Moure, encargado de negocios del Ecuador ante la Santa Sede (Cordovz, [1899] 1997: 852).
127
El marqus de Lorenzana fue un diplomtico mexicano que se desempe como representante de Mxico,
Nueva Granada, Ecuador, Bolivia, Costa Rica, Guatemala, Nicaragua y El Salvador, ante la Santa Sede; como tal, irm
concordatos entre el Vaticano y los ltimos cuatro pases citados. (Saranyana, 2008: 172-173). Lavinio de Medici Spada
(1801-1864) fue un oicial del Vaticano, mineralogista, naturalista y poeta que identiic un nuevo tipo de esmeralda de la mina
de Muzo en Boyac, Colombia (de donde provena la fortuna de Jos Ignacio Pars) que nombr parisita en su honor.
(Sureda, 2008: 65-66). Monseor Lorenzo Valenzi (1809-1856) fue profesor de derecho cannico y pblico, delegado
apostlico ante la Nueva Granada y al retornar a Roma, fue nombrado por Pio IX como Juez del Tribunal Supremo de la
Santa Sede y luego Juez de la Signatura de Justicia. (Valenzi, 2010: 19).
230
artista alguna copia de dicho dibujo, consideramos la obra no slo tiene por lo menos
otras dos fuentes, sino que su eleccin evidencia unos intereses particulares de su comitente. En primer lugar, consideramos que Tenerani se bas en la litografa realizada
a partir de un dibujo de Jos Mara Espinosa (1796-1883) -sobrino de Jos Ignacio
Pars- impresa por la Casa Lemercier hacia 1840. No slo por su cercana isionmica
sino porque en ella se adicion un medalln de George Washington que tambin fue
incluido en la estatua. La utilizacin de esta fuente litogrica se conirma por la presencia de una versin de la misma, irmada por W. de la Guardia, en la portadilla del
libro de Gerardi.
La inclusin en la estatua del medalln
de Washington en cambio de las medallas de las batallas, presentes en muchos
de sus retratos del natural, daba una mayor relevancia al carcter republicano
de Bolvar y aluda a una gloria militar y
civil equiparable a la del hroe de la Revolucin de las trece colonias del norte128,
e incluso mayor, considerando -como
airma Gerardi- que se pensara en la
disparidad de los medios utilizados para
alcanzar un mismo in (Gerardi, 1845:
13). Por otra parte, es posible que Tenerani tuviera como referencia la mezzotinta
realizada por Charles Turner (1773-1857)
en Londres en 1827 basada en el retrato
de Bolvar que Jos Gil de Castro (1785 Mara Espinosa (dib)/Leveill (lit). Simn Bolvar. Ca.
ca.1837) realiz en 1825, en donde apare- Jos
1840. Litografa sobre papel. Museo Nacional de Colombia,
ce el hroe de pie, de cuerpo entero y em- reg. 1813.
puando una espada, de donde Tenerani
pudo haber tomado la contextura fsica y
dems detalles del atuendo militar del Libertador.
Iconogricamente es fundamental la adicin de la capa sobre el uniforme del hroe
-por su evocacin a una toga romana- que otorgaba al hroe una vinculacin republicana y marcaba una distancia con su iconografa precedente que haba sido predominantemente militar. A nivel artstico adems, la adicin de este atributo, implicaba superar esas diicultades gravsimas que oponen a todo escultor las formas
128
La medalla mencionada fue un regalo de Williamsburg, antigua capital de Virginia, ofrecida originalmente
a George Washington (Parte no oicial: un presente para Bolvar, 1825: s.p.). En 1825 la familia de Washington le envi
esta medalla a Bolvar, por intermedio del general Lafayette, junto con una miniatura del hroe norteamericano con un
bucle de su cabello. En la carta de remisin se airma que la familia haba conservado estas prendas hasta que ha venido
un segundo Washington que debe ser su dueo (Coleccin de documentos relativos a la vida pblica del Libertador de Colombia y
del Per Simn Bolvar, para servir a la historia de la Independencia de Suramrica, 1827-17: 9).
232
233
El bajorrelieve est acompaado de la frase Preiero el ttulo de Ciudadano al de Libertador, porque ste emana de la guerra: aquel emana de las leyes. Cambiadme, seor,
todos mis dictados por el de buen ciudadano. Esta reivindicacin de Bolvar como
defensor de la constitucin iba en contra de la construccin que para ese momento se
haca del hroe, en la que sus principales detractores lo relacionaban con la arbitrariedad, el militarismo y el autoritarismo; frente a lo cual se reivindicaba la igura de
Francisco de Paula Santander132 defensor de la libertad, la legalidad y la constitucin
132
Cuatro aos despus, el 6 de mayo de 1850, se irm un decreto legislativo que orden levantar una
estatua de Francisco de Paula Santander en una plaza cercana a la Plaza de Bolvar. Sin embargo slo hasta 1878 se
dio cumplimiento a dicha ley. (Torres et. al., 2008: 26). La obra, realizada por el escultor italiano Pietro Costa, es muy
semejante iconogricamente a la de Tenerani. La diferencia radica en que Santander lleva el folio de la constitucin
medio abierto en la mano derecha y la izquierda est apoyada sobre la espada que lleva colgada al cinto.
234
Carl Friedrich Voigt (grab.). Verso y anverso de la medalla conmemorativa de la estatua de Simn Bolvar.
Los triunfos militares de Bolvar fueron evocados, aparte del uniforme militar y la espada, slo en uno de los bajorrelieves y con un particular matiz, ya que dicha imagen
lejos de representar su habilidad militar, se concentraba en resaltar su magnanimidad, por ello fue acompaada por una frase tomada de la carta que Bolvar envi al
133
La obra se perdi en un naufragio en la costa venezolana poco antes de llegar a Colombia. La maqueta se
conserva en la gipsoteca de Tenerani en el Museo de Roma (Grandesso, 2003: 218)
235
236
237
238
239
Viviana G. Isola
Museo Histrico Nacional-Argentina
240
da patritica que se tena con ellos, inalmente el poder ejecutivo y el congreso nacional
establecieron un desmesurado programa conmemorativo, acompaado por exposiciones internacionales, congresos, publicacin de documentos histricos y otras actividades que permitieran mostrar el esplendor y el crecimiento en que se encontraba el pas.
Dicho programa se plasm en el proyecto de ley que el Poder Ejecutivo enva el 10 de
agosto de 1908142 al Congreso Nacional para su consideracin y las modiicaciones introducidas por este ltimo en la versin inal de la ley que deinitivamente y de manera
tarda estableca cmo seran los festejos de tan importante efemrides en 1910143. Entre
las modiicaciones que plantea la Cmara de Diputados al proyecto del Ejecutivo, se encontraba establecer una colaboracin econmica para la ereccin del monumento a San
Martn en la ciudad francesa de Boulogne sur Mer, apoyando la propuesta que ya haba
sido planteada por un grupo de ciudadanos argentinos residentes en Francia, en 1908.
Presentamos aqu un avance de la investigacin que se lleva adelante sobre la gnesis
y el posterior derrotero que tuvo dicho monumento, obra del escultor francs Henri
Allouard144, inaugurado el 24 de octubre de 1909. Se anticipaba con ese acto los festejos
que se realizaran en 1910 en el pas, ya que estaba en el nimo de los organizadores que
el monumento a San Martn en suelo galo los anunciara, dada la certeza que tenan de
no contar con la presencia de compatriotas para la inauguracin, de coincidir esta con
los festejos del Centenario.
En la primera dcada del siglo XX, se destacaron las actuaciones de diversas personalidades del mbito cultural en la concrecin de homenajes conmemorativos, entre las
que ocup un lugar singular Adolfo Pedro Carranza (1875-1914), director del Museo
Histrico Nacional desde su fundacin, quien particip activamente en el proceso
que se produjo respecto de los homenajes dedicados a los prohombres de la historia
nacional145. En 1906, desde el mbito municipal, form parte de la comisin que propuso erigir estatuas de los miembros de aquella Primera Junta de Gobierno en Buenos
Aires, as como tambin en distintos momentos asumi el rol de ferviente consejero a
la hora de responder a inquietudes de las comisiones pro-monumentos con respecto a
que las obras guardaran una estricta relacin con la veracidad histrica.
La valiosa documentacin an indita- que guarda el Archivo histrico del Museo
Histrico Nacional, as como la publicada por la comisin pro-monumento luego de
la inauguracin en Boulogne sur Mer, son las fuentes a partir de las cuales estudiamos
la estrecha relacin establecida entre los miembros de la comisin del monumento
boulognais, Adolfo P. Carranza en tanto permanente consultor y las iniciativas locales.
142
Congreso Nacional, Diario de Sesiones de la Cmara de Diputados, Ao 1908, T. III. Sesiones de Prrroga, octubre
23-febrero 8, Buenos Aires, 1909.
143
Ley N 6286: fue inalmente sancionada el 8 de febrero de 1908 y promulgada el da 13 del mismo mes. Anales
de Legislacin Argentina: (1954: 758). Un anlisis de esta ley en: (Favre, 2009) e (Idem, 2011: 157-161).
144
Escultor y pintor francs, nacido en Pars (1844-1929), Oicial de la Legin de Honor y la Instruccin
Pblica, miembro de diversas instituciones de artistas franceses y de diversos jurados, fue tambin secretario de la
Commission Consultative de la Proprit Artistique. Realiz obras en ediicios pblicos y privados, bustos y monumentos.
(Gomez Carrillo, 1909: 98) y (Kjellberg, 1994: 39).
145
La actividad de Adolfo P. Carranza como promotor de proyectos de monumentos ha sido estudiado en
Ruffo y Rodrguez Aguilar, (2009) y Espantoso Rodrguez, (2010 en prensa).
241
El monumento boulognais
En 1908 la colonia argentina en Francia, como dijimos, que desde principios del siglo
XX se interesaba por la vivienda que habitara el General Jos de San Martn en Boulogne Sur Mer hasta su muerte146, decidi sumarse a los festejos que se avecinaban
en suelo patrio, erigiendo un monumento en homenaje al Libertador en la localidad
donde residi en sus ltimos aos.
En octubre de 1908, la comisin impulsora de la conmemoracin, integrada por el Dr.
Lorenzo Inurrigarro, el Dr. Tomas B. Viera y Dr. Enrique B. Demara, y como miembro
honorario el Dr. Roger Fighiera147, enva a una larga lista de personas de la sociedad
argentina, residentes tanto en Francia como en nuestro pas, un impreso con el objeto
de explicar sus intenciones y obtener el soporte econmico necesario para llevar adelante la empresa, sin dejar de lado una serie de instituciones con el objeto de recibir
las adhesiones suicientes para llegar a cubrir el alto costo del monumento, calculado
en aproximadamente 150.000 francos. En l se expresaban de la siguiente manera:
[] Es naturalmente intil mencionar los mritos del General San Martn,
principal y descollante igura de la emancipacin Sud Americana. A pedido del
Ministro Root148, que le ha llamado el Washington Sud Americano, se levanta
actualmente en la Ciudad de Washington, un Monumento a San Martn,
idntico al que se encuentra en Buenos Aires.
La conveniencia de la ereccin de un monumento a San Martn en el ltimo sitio
por l habitado era generalmente sentida, tanto ms cuanto que su igura se
destac all como la de un gran patricio, amante de la justicia y de la libertad []
El momento elegido es oportuno, pues dado el entusiasmo que la idea ha
despertado y las valiosas adhesiones ya recibidas, podemos asegurar que
el monumento estar concluido para el ao 1910. Su entrega a la ciudad de
Boulogne sur Mer contribuir a conmemorar dignamente las iestas de nuestro
centenario, y tambin a estrechar los lazos de vinculacin, cada vez mas
estrechos entre nuestro pas y Francia, tierra clsica de la libertad. []149
Ya por esos aos se haban levantado tanto en las capitales de provincia como en el
extranjero copias del monumento a San Martn erigido en 1862 en la actual Plaza homnima de Buenos Aires, obra de Louis Joseph Daumas150, autor de la versin chilena
146
Nace el 25 de febrero de 1778 en Yapey, Provincia de Corrientes, Argentina, y muere el 17 de agosto de 1850
en Boulogne sur Mer, Francia.
147
La comisin denominada Comisin Central del Monumento al General Jos de San Martn, formada el 12
de octubre de 1908, tena adems de sus integrantes residentes en Francia, su representacin en Buenos Aires a cargo del
Dr. Gregorio Araoz Alfaro, y los seores Gregorio Viera, hermano del mencionado anteriormente, y Enrique C. Crotto.
El Dr. Fighera, alto funcionario del Ministerio de Comercio y de Industria francs, fue nombrado miembro honorario en
agradecimiento a todas las gestiones que realiz en apoyo del proyecto. Carta del 17 de febrero de 1909 de Toms B. Viera
a Adolfo P. Carranza, Museo Histrico Nacional [MHN], Archivo histrico, Fondo Carranza. En esta extensa nota, sobre
la que volveremos, Viera informa a Carranza sobre todo lo actuado hasta ese momento.
148
Elihu Root (Clinton, 1845-Nueva York, 1937). Destacado jurista y poltico norteamericano. Fue Secretario
de Guerra durante la presidencia MacKinley y Secretario de Estado durante la presidencia Roosevelt. En 1912 fue
galardonado con el Premio Nobel de la Paz y tuvo una activa participacin en cuestiones de arbitraje entre pases.
149
Impreso enviado por la Comisin. MHN, Archivo histrico, Fondo Carranza.
150
Nacido en Toulon en 1801 y muerto en Pars en 1887. El gobierno chileno le encarga en 1859 una estatua
242
Corran los primeros das del ao 1909 y an no se haba decidido quin sera el escultor al que se le encargara la obra que deba estar lista para ser inaugurada el 24
de octubre del mismo ao. Las entrevistas comenzaron en 1908 con un total fracaso
para la comisin en lo que a la convocatoria de artistas se reiere, a excepcin de quien
inalmente realiza el monumento, que ya en diciembre de ese ao estaba dispuesto
a encarar la obra152. Pese a ello la comisin sigui insistiendo con otros escultores
renombrados de la poca, algunos de los cuales ya se haban negado. Fueron entrevistados varios: Rodin, por intermedio de su secretario les recomienda a E. Antoine
Bourdelle, Jules Desbois y Lucien Schneqq153; Antonin Mercie en enero de 1909 les
reitera lo manifestado en una reunin anterior: es imposible cumplir con los tiempos154; Jules Coutan por su parte, que estaba realizando el monumento al Dr. Carlos
Pellegrini para Buenos Aires, mantiene lo expresado anteriormente: que era imposible
ecuestre de San Martn, de la que el gobierno argentino le solicitar luego una rplica con algunas modiicaciones: en
la versin chilena San Martn porta un asta con bandera y la cola del caballo se airma sobre la base de la escultura,
solucin dispuesta por Daumas por cuestiones tcnicas por ser Chile lugar de movimientos telricos. En la versin
argentina se pide que elimine la bandera pues esta es el atributo del General Manuel Belgrano, creador de la ensea
patria, y que ubique el brazo derecho en alto sealando el horizonte; el escultor eleva la cola del animal que parece
movida por el viento, dado que no eran necesarias las previsiones tcnicas mencionadas en el caso chileno.
151
Carta del 17 de febrero de 1909 de Toms B. Viera a Adolfo P. Carranza, op cit.
152
Carta del 21 de diciembre de Henri Allouard a la Comisin, en: Gmez Carrillo, op. cit.: pp. 104-105.
153
Carta del 23 de diciembre de Auguste Rodin a la Comisin, en: Idem, p. 105.
154
Carta del 7 de enero de Antonin Mercie a la Comisin, en: Idem, p. 108.
243
para cualquier artista serio y conciente realizar el monumento en tan poco tiempo155.
Tampoco se poda realizar un concurso dado el lapso de pocos meses que mediaba
entre el encargo y la inauguracin. Es interesante analizar las vicisitudes del encargo
a partir de las palabras de uno de sus protagonistas; en la ya mencionada carta del 17
de febrero Toms Viera le relata a su permanente consultor Adolfo P. Carranza, las
decisiones tomadas y las razones que las justiicaban:
Para obtener la ereccin del monumento en el corriente ao, deba pues, que
el artista elegido, a ms de sus aptitudes, disponerse a abandonar todo otro
trabajo para dedicarse exclusivamente a nuestra obra. Por otra parte, y dado el
escaso tiempo con que disponamos, no era posible abrir un concurso, el que
nos tomara tres meses por lo menos y empleado unos miles de francos que
tanto nos hacan falta. Adems, se trataba de un general cuyos rasgos salientes
e inconfundibles son, la faz militar y la abnegacin. Cualquier otro rasgo no
hubiera sido su caracterstica y no lo representara (no estoy equivocado
Doctor?), luego, planteado as el caso a los distintos artistas de renombre
universal, todos coincidieron, en que era tipo clsico del monumento, la
estatua ecuestre. []
Adems, para la comprensin de nuestros deseos a los artistas, les facilitbamos
su juicio pidindoles algo como para un Washington sud americano y hasta el
discurso del ministro Root cuya copia la reproduje, nos facilitaba la tarea, pues
a no haber sido as, cada uno de ellos nos hubiera exigido un estudio de su vida
como es natural y lgico y ninguno de ellos conoce el espaol, para que pudiera
deleitarse en la gran obra de nuestro querido contemporneo, el ilustre general
Mitre, el ms autorizado bigrafo.
Por estos motivos pues, desechamos el concurso y aceptamos la estatua
ecuestre de bronce, lo dems era cuestin de detalle, y aceptamos dicha estatua
ecuestre sobre zcalo de granito, llevando al frente la estatua de la Repblica y
a los costados dos bajorrelieves representando las dos fases de su vida el Paso de
los Andes, como faz militar y la Abnegacin.
Semejante a lo que suceda en el pas con la organizacin de los festejos del Centenario, en Pars se resolva el encargo del monumento en medio de apremios tanto econmicos como de tiempo y de una improvisacin de la cual podan obtenerse buenos
resultados a fuerza de buenas intenciones y un indiscutible entusiasmo patritico
que permitieron a la Comisin poder concluir la empresa.
La premura, entonces, no permiti que el artista estudiara al personaje desde ningn
punto de vista, por lo que estos aspectos fueron salvados por la documentacin escrita y visual del libro publicado por Carranza en 1905, titulado San Martn, del cual el
autor haba hecho llegar un ejemplar a Viera y, quizs inluidos por los comentarios
del ministro Root, por el modelo tipolgico y plstico que representaban la estatua
155
244
245
Un prrafo del discurso del Maire de Boulogne sur Mer, Charles Perou, resume el carcter de fraternidad franco-argentina que se quiso dar a la celebracin, al hacer referencia al origen racial comn y al activo comercio entre ambos pases, ya que los puertos
franceses, el de Boulogne sur Mer entre ellos, desarrollaban una intensa actividad como
puntos de entrada y salida de productos para y desde Europa: importacin de materias
primas argentinas y exportacin de productos manufacturados de distintos pases de
Europa, hacia Argentina. De igual manera eran de donde se embarcaban miles de emigrantes del viejo continente que buscaban nuevos horizontes en nuestro pas157:
Cette uvre admirable, due au grand artiste quest Henri Allouard, est en
effet un symbole et un enseignement. Le symbole, il est dans une forme plus
troite, plus intime de lunion entre les reprsentants de la race latine que son
les Amricains du Sud, en particulier les Argentins, et les descendants du mme
tronc que sont les citoyens franais. A Boulogne mme, le lien de fraternit est
devenu plus troit et plus ferme, cause des relations suivies que notre port
157
Ministerio de Relaciones Exteriores de la Repblica Argentina, Archivo histrico, Seccin Diplomtica y
Consular, Informes comerciales aos 1908-1914.
246
158
[MHN], Legajo 1575. Fecha de ingreso al Museo: 22/10/1909. H.: 102 cm.
159
Carta del 9 de septiembre de 1909, de Toms Viera a Antonio P. Carranza, (MHN), Archivo histrico,
Fondo Carranza.
160
Carta del 20 de octubre de 1909, de Gregorio Viera a Antonio Carranza, Idem.
161
Cartas de Toms Viera a Adolfo P. Carranza del 20 de octubre de 1910 , (MHN) Libro XI de Donaciones,
aos 1910-1911, f. 25; Carta del 18 de enero de 1911; Nota de la irma Adresse Telegraphique a Antonio P. Carranza, Paris.
[MHN] Archivo histrico, Fondo Carranza.
247
de esta nueva empresa, al menos respecto del monumento que se levant en la ciudad
de La Plata. En el verso de una tarjeta personal de Aldao se lee: Mi amigo. Siento no
encontrarlo. Recib su carta y acepto con entusiasmo su idea. Lo pondremos en La
Plata [] en su representacin de Boulogne. Avseme cuando llega la maquette en yeso.
26/11/1910162.
Aldao participa de ambas comisiones pro-monumento y seguramente fue quien impuls la idea de levantar la copia de Rosario luego de que fuera decidido por las
autoridades de la ciudad en mayo de 1911 erigir un monumento a San Martn, en la
plaza homnima163.
En el caso de la ciudad de La Plata, la Legislatura Provincial sanciona la ley 3353, del
21 de julio de 1911, que dispuso la realizacin del Monumento a San Martn en
esa, en un lugar a convenir, disponindose [] a tal efecto, de los moldes164 originales de la estatua que fuera erigida en
Boulogne sur Mer, obtenidos con ese in
de la comisin de ese monumento y ms
tarde del Superior gobierno de la Nacin
[] y que el basamento fuera realizado
con granito de Sierra Chica (Gonzlez:
108)165.
Al mismo tiempo, Toms Viera166 se comunicaba con Carranza para informarle que
haba recibido una nota de Henri Allouard
en el que le expresaba su malestar por la
decisin del gobierno argentino de reproMonumento al General Jos de San Martn, Plaza San
ducir su obra sin darle participacin en
Martn, Rosario, Argentina. La estatua ecuestre es copia de
la obra de Henri E. Allouard.
162
Tarjeta personal. [MHN], Archivo histrico, Fondo Carranza.
163
En la placa ubicada en el frente del monumento se menciona la sancin de la Ordenanza Municipal el 23 de
mayo de 1911. Esto fue autorizado en 1912 por el Congreso de la Nacin. La Nacin, 1 de julio de 1912.
164
La bastardilla es nuestra. Tanto aqu como en noticias periodsticas y en cartas de Carranza relacionadas
con el problema generado por los monumentos levantados en nuestro pas, respecto de los derechos de autor de
Allouard, se utiliza el trmino moldes cuando en todos los documentos mencionados anteriormente y en el contrato se
habla de modelos. Dado que el contrato estipulaba la entrega de los modelos y no de los moldes, suponemos que es un
error respecto del vocabulario propio del arte escultrico.
165
En marzo de 1912 ya haba sido fundida la estatua ecuestre en arsenal de la Capital Federal, con los moldes
que sirvieron en Boulogne sur Mer [] El Da, 22 de marzo de 1912, p. 3, c. 2, en: (Gonzlez: 109) Por ley 3469 sancionada
el 16 de abril de 1913 en la Legislatura de la Provincia de Buenos Aires se decide la ubicacin del monumento a San Martn
en la plaza Primera Junta (Gonzlez: p. 108), en reemplazo de la columna existente que conformaba junto con diversas
esculturas el monumento a los Miembros de la Primera Junta de Gobierno. El proyecto de ley presentado a la Legislatura
en enero de 1913, estipulaba el cambio de nombre de la plaza Primera Junta por el de plaza San Martn. Las esculturas del
monumento existente se guardaran hasta tanto se pudiera dar cumplimiento a la ley del 1 de septiembre de 1909 que
aprobaba la ereccin del monumento a los miembros de la Primera Junta. 5ta. Sesin Extraordinaria del 14 de enero de
1913. (Diario Sesiones: 1913: p. 588-589).
166
Carta de Toms B. Viera a Adolfo P. Carranza del 13 de julio de 1911. (MHN), Archivo histrico. Fondo
Carranza.
248
Lo cierto es que amparndose en los trminos del contrato, Aldao solicita al gobierno argentino autorizacin, que le fue concedida, para utilizar los modelos, cuyas versiones en
bronce segn la documentacin- fueron realizadas por el ingeniero Jos F. M. Garzia168.
En su respuesta a Viera169, Carranza le aclar que l apoy la idea, pero accediendo a que
solamente se reprodujera la estatua pero no el pedestal; cuestin esta que fue respetada
en el caso de Rosario pero no as en La Plata en el que se reproduce el monumento de
Boulogne en todos sus detalles.
167
Carta de Carlos A. Aldao a Adolfo P. Carranza, Idem.
168
Carta de Adolfo P. Carranza al Ministro de Justicia e Instruccin Pblica, Dr. Juan M. Garro, de fecha 15 de
mayo de 1913. (MHN) Fondo Carranza. Libro copiador, aos 1910-1914. No hemos podido corroborar esta informacin
de manera fehaciente pues si bien el monumento rosarino presenta la marca de fundidor: Ingro Jos F. M. Garzia,
el platense no tiene irma alguna. Adems plantea dudas el que en la prensa, como se ha mencionado se atribuya la
fundicin de esta ltima al Arsenal de Guerra de la Capital.
169
Carta de Adolfo P. Carranza a Toms B. Viera del 19 de julio de 1911. (MHN) Archivo histrico. Fondo Carranza.
249
Y un da despus:
[] La provincia va a pagar de nuevo la estatua del General San Martn erigida
en la plaza del mismo nombre (ex Primera Junta) porque no le queda remedio
sin duda, pero nos parece que es deber de todos, averiguar cuanto antes estos
misterios quin es el personaje que representa la estatua y a quin fue pagada por
primera vez? Tantos miles de pesos despilfarrados malamente en una poca de
tanta crisis, justiican cualquier curiosidad. Qu los personeros del Sr. Ugarte
hiciesen demoler a toda prisa un monumento malo, para erigir otro peor173.
Las cuestiones resaltadas en estos prrafos nos presentan distintas cuestiones que se
debatan en las primeras dcadas del siglo XX en nuestro medio quin es el personaje representado? qu grado de verosimilitud tiene el rostro del hroe en relacin a
las eigies conservadas de l? debe el monumento conmemorativo a un hroe repre170
Carta de Adolfo P. Carranza al Ministro de Justicia e Instruccin Pblica, Dr. Juan M. Garro, op. cit.
171
Se posterg la inauguracin del monumento que deba realizarse el 4 de febrero para incorporar este acto
en el contexto de los tardos festejos del Centenario de la Batalla de San Lorenzo (13 de febrero de 1813) librada por el
entonces Coronel Jos de San Martn y el primer cuerpo formado de Granaderos a Caballo, en las cercanas del Convento
de San Carlos, ubicado en esa localidad de la Provincia de Santa Fe.
172
El Da, 18/06/1914, en (Gonzlez: 110).
173
El Da, 19/06/1914, en (Idem). La bastardilla es nuestra.
250
251
HROES DE ALPARGATAS.
De la reivindicacin poltica al monumento pblico
Patricia Favre
Archivo Monumenta / GEAP-Latinoamrica
Universidad de Buenos Aires
Universidad Nacional de Cuyo
252
El trmino de los gobiernos conservadores coincidi con una etapa en que se haban
consagrado monumentos a los principales hechos y hroes de la Independencia, ejemplos de valores cvicos y militares, particularmente en torno a los festejos de los centenarios de la Revolucin de Mayo en 1910, de la Independencia en 1916 y del Paso de los
Andes en 1917. Dichos monumentos, emplazados en los paseos ms importantes de
la ciudad y departamentos aledaos conformaron verdaderos escenarios conmemorativos y celebrativos: la estatua ecuestre a San Martn en la plaza homnima (1904),
la estatua a San Martn en el departamento de San Martn (1910), el monumento al
Ejrcito de los Andes en el Cerro de la Gloria (1914) y la estatua de Fray Luis Beltrn
en la Alameda (1917), entre otros (Favre, 2010).
Lencinas, en cambio, propona consagrar un nuevo modelo de hroe, annimo y genrico, que tena por objeto personiicar al trabajador comn. La propuesta tuvo una
inmediata repercusin en la prensa, que se ocup de difundir textualmente el decreto.
Los fundamentos relejan los alcances del mismo:
Que los esfuerzos del pueblo obrero, sobre cuyas espaldas gravita todo el
ediicio de la sociabilidad humana, no importan socialmente aplicacin material
de las fuerzas fsicas o de la naturaleza, sino tambin el empleo constante de la
inteligencia, lo cual se debe el inmenso progreso en los mtodos de trabajo y
en la produccin de la riqueza colectiva que es su consecuencia;
Que por esta capitalsima circunstancia la personalidad del obrero debe
ser reivindicada contra los prejuicios sociales y difundida dentro de un
alto concepto de justicia para que su obra sea comprendida y respetada
sirviendo la vez de estimulo las nuevas y mayores actividades en las
presentes y futuras generaciones;
Que el gobierno no slo debe ser intrprete sino tambin inspirador y
propulsor de toda clase de iniciativas o de movimientos que tengan por
objeto una reparacin reclamada por los sentimientos de la sociedad de la
que es legtimo representante178.
Predominan los sentimientos de deuda y reparacin propios de los homenajes estatuarios, pero con un claro mandato oicial: la reparacin como deber y tarea del gobierno, legtimo representante del pueblo, destinada a reivindicar la igura del obrero
177
178
3/5/1918.
253
HROES DE ALPARGATAS
y el rol que sta desempe en la riqueza y progreso de la sociedad. Con esto, tocaba
uno de los puntos fundamentales de su programa poltico: la marginalidad sufrida por
el obrero hasta ese momento.
A principios del siglo XX, la sociedad mendocina se divida en: gente bien, representada por iguras de poder poltico, econmico y social; la clase media formada por
obreros y trabajadores asalariados; de medio pelo que eran aquellos que aspiraban a
llegar a la clase ms acomodada; y el grupo pobre, que era el ms desposedo, entre
quienes se ubicaban los peones y sirvientes, formado fundamentalmente por criollos,
al cual se incorporaron inmigrantes empobrecidos (Micale, 1992: 9-10, 22). En el proyecto civilizador del conservadurismo liberal, orientado por la ideologa de orden y
progreso, los sectores ms pobres de la sociedad constituan los elementos indeseables, la barbarie, la chusma, que no tenan derecho a manifestar sus opiniones, y eran
sometidos y explotados.
Para el lencinismo, la clase obrera, era fundamentalmente el grupo ms pobre de
la sociedad, que haba sido sistemticamente relegado en lo poltico, econmico y
social durante los gobiernos conservadores (1862-1918). Cabe destacar, que Mendoza tena por aquellos aos un carcter fundamentalmente agrcola, que marcaba
una profunda diferencia entre el obrero fabril caracterstico de otros mbitos,
y el rural de la provincia (De Larrea y Benzoni, op. cit.), y en consecuencia, como
ha sealado Olgun, entre el fenmeno ciudadano que represent el radicalismo
metropolitano y el campesino del radicalismo a nivel local. De hecho, Lencinas
sinti especial preferencia por la gente de campo (labradores, puesteros, peones,
etc.), ya que durante los comienzos de su carrera como abogado, fue testigo de las
difciles condiciones laborales del campesinado, actuando como abogado de los
pobres, donde se afirm su popularidad y prestigio (Olgun, 1956: 73-95). Esto
explica que la oposicin tildaba despectivamente a los elementos que aglutinaba el lder radical como el paisanaje, la peonada o el criollaje. Por ello, nada
ms oportuno para el lencinismo que honrarlos con un monumento, que pudiera
convertirse en un mbito celebrativo y que desempeara un importante papel pedaggico.
Tambin hay que considerar la aicin que el lencinismo tuvo por los smbolos, que
usaba profusamente (fotos del gobernador, consignas tales como ocho horas, etc.).
Los movimientos obreros y socialistas en Francia, como ha demostrado Agulhon,
utilizaron ampliamente el simbolismo en la vida cotidiana (nombres de calles, fotos,
pequeos bustos, etc.) para reforzar y dar presencia a iguras o recuerdos, e incorporaron tambin la estatuaria pblica, objeto que hasta ese momento era propio de la
lite y burguesa, segn un pensamiento que puede resumirse en: hagamos estatuas
para quienes realmente las merecen, y que, en el caso mendocino, parece cumplirse
acabadamente (Agulhon, 1984: 162-166).
Es razonable, segn Lacoste, que la avalancha de smbolos obreros irrumpiera justamente en Mendoza, donde todas las plazas, calles y escuelas honraban la memoria de
los miembros de las familias de ms rancio abolengo (Lacoste, 1992: 8). Hasta las crticas de la oposicin se convirtieron en divisas partidarias. El apodo de gaucho Len254
cinas usado por sus enemigos para menospreciarlo como paisano rudo y criollo
ignorante, fue adoptado por el pueblo para exaltar sus virtudes vernculas: sencillez,
modestia, coraje, lealtad y sentido de la libertad (Olgun, 1956: 75-80). La alpargata, apelativo con que el conservadurismo satirizaba al grupo liderado por Lencinas
chusma de alpargatas, fue reivindicado por el oicialismo como emblema de lucha
del proletariado contra el patrn: Alpargatas s, bordelesas no!179.
Por el mismo decreto, se llamaba a concurso a todos los artistas de la Repblica para
presentar sus proyectos en el trmino de seis meses y se ijaba la suma de diez mil
pesos al que obtuviera el primer premio; se dispona costear la obra por suscripcin
pblica y por contribucin del gobierno; y se nombr una comisin formada por el
vicegobernador Delfn lvarez, el Intendente Municipal Ricardo Baez, el Director de
Escuelas Enrique Julio y el Secretario de la Federacin Obrera local para realizar todas las gestiones conducentes a concretar el monumento180.
El proyecto de monumento: elogios y rechazos
El proyecto de monumento gener una profunda reaccin en la sociedad, que iba
desde la ms franca aceptacin al ms profundo rechazo y que se aprecia con especial vigor en la prensa que, fuertemente politizada, tomaba partido abiertamente. No
deja de asombrar la intensidad con que diversos temas eran difundidos, analizados
y debatidos. Los diarios oicialistas La Montaa y La Palabra expresaban su irme
adhesin, mientras que en la prensa opositora, de peril conservador Los Andes y La
Tarde y socialista El Socialista, las notas alcanzaban matices que iban de un contenido contestatario hasta la crtica corrosiva, la irona o un sarcasmo exacerbado.
El diario La Palabra aplauda la iniciativa oicial considerando el papel que desempeaban los monumentos para exaltar valores y como guardianes de la memoria:
Es una acertada disposicin gubernativa la que nos ocupa, que viene a
llenar un vaco entre los monumentos pblicos de la Provincia, ya que los
monumentos no slo deben perpetuar la memoria de los hroes, y los grandes
acontecimientos histricos, sino tambin las ideas populares y las que
encarnan el carcter de un pueblo, simbolizar su accin, traducir sus vigores,
sus energas, y el desenvolvimiento de su raza, con la exclusividad y el sello de
su propia entidad social181.
Los progresos alcanzados en Mendoza, producto de la riqueza agrcola, industrial y comercial, a pesar del terremoto sufrido en 1861, permitan fundamentar el rol que haba
desempeado el trabajo obrero. Tambin se estableca que la poblacin mendocina haba
dado a la guerra de la Independencia Sudamericana la ms poderosa y fecunda contribucin de sangre. De este modo, se ponan en escena dos aspectos fundamentales del
179
La bordelesa, barrica o tonel para almacenar el vino, es tomada como smbolo de la principal actividad
econmica de la oligarqua mendocina.
180
Monumento al obrero, Los Andes, Mendoza, 3/5/1918.
181
Monumento obrero, La Palabra, Mendoza, 3/5/1918.
255
HROES DE ALPARGATAS
discurso lencinista: la contribucin del pueblo en las guerras de la Independencia y la marginalidad en que lo haban sumido los gobiernos conservadores desde 1862.
Durante los aos que haban transcurrido entre 1910-1917, las celebraciones de los
centenarios haban permitido establecer profusamente el papel que el pueblo mendocino haba desempeado en la campaa del ejrcito de los Andes, haciendo hincapi
en los grandes sacriicios humanos y materiales. Pero en aqul momento la idea de
pueblo era amplia, mientras que ahora el lencinismo aprovechaba la va abierta para
enfatizar los sacriicios del pueblo, con un sentido muy determinado, en relacin a
las clases sociales que l amparaba. Inmediatamente, surgieron las nociones de patriotismo y herosmo que reclamaban hacer justicia. El diario La Montaa, principal rgano de prensa oicial, destacaba:
Honrar al obrero es honrar a la patria.
Es hacer justicia al mrito, al mrito grande de los humildes, de los que supieron
levantar a la nacin libre y triunfante en sus brazos, ayer como soldados, hoy
como obreros, siempre como ciudadanos. []
Y es justo que ese pueblo grande por sus tradiciones, legendario, heroico,
bravo, culto y sereno, sea magniicado tambin a la par de los grandes
capitanes, de los grandes mentores, de los grandes cerebros, y tenga su
monumento, que ensee a nuestros hijos y a los viajeros que la actual
generacin supo ser agradecida a la fuerza annima y modesta, pero poderosa
e indestructible, del obrero mendocino182.
Numerosas notas elogiaron la decisin del gobernador, considerada como demostracin de una autntica democracia, dispuesta a conseguir y mantener la libertad,
la fraternidad y la igualdad civil del proletariado, en oposicin a los privilegios y
mezquindades del rgimen o la autocracia que haba gobernado la provincia.
De hecho, se mencionaba el entusiasmo que haba recibido de la clase trabajadora,
se anunciaba la intencin de realizar una manifestacin (acto o mitin) de agradecimiento y solidaridad al gobernador, y el aplauso general de otras provincias y de la
Capital de la Nacin183.
En este contexto, la propia igura del obrero adquiri la categora de hroe: el obrero
nuestro, hroe en las grandes empresas libertadoras, no menos hroe en las prolicas
jornadas del trabajo184. Asimismo, se formulaban aspectos de la iconografa que deba
contener el monumento, cuyo bronce deba representar los rasgos generales de nuestros hombres de msculo de acero, que gobiernan manos rudas, fuertes, seguros en el
manejo del arado, formidables en el del pesado martillo185.
Pero inmediatamente, tambin llegaron las crticas. En principio, estuvieron dirigidas
182
El monumento del pueblo, La montaa, Mendoza, 3/5/1918.
183
Cf. en diario La Montaa las notas: La digniicacin del pueblo, 4/5/1918; Democracia obrera, 5/5/1918;
El monumento al obrero, 5/5/1918; Monumento al obrero, 15/5/1918.
184
El monumento al obrero, La montaa, Mendoza, 4/5/1918.
185
El monumento del pueblo, La montaa, Mendoza, 3/5/1918.
256
Con ello, atacaba el monumento considerndolo como una herramienta ineicaz para
el cambio social, y al oicialismo por su inclinacin a la propaganda poltica y a las
promesas. As, desde el inicio mismo de su mandato los grupos opositores comenzaban a exigir resultados concretos. El mrmol o bronce del monumento, segn este
rgano de prensa, no servira para saciar el hambre del pueblo, que no tardara en
llegar. El monumento traa a colacin otra preocupacin de la alta sociedad: que los
beneicios de la clase obrera y el proselitismo del gobierno gravaban sobre ella, por lo
que se reclamaba para el pueblo menos bombo y ms puchero y reducir las contribuciones e impuestos187.
Al mismo tiempo, los homenajes al obrero, en que Mendoza ocupaba un lugar de
avanzada dentro de las provincias de la Repblica, daban lugar a satirizar, tal como
haca Los Andes, que los nombres de Lencinas, Kerensky e Irigoyen pasarn la historia enlazados en una ntima comunidad de ideas ultrasocialistas, solo comprensibles
para las grandes almas y los grandes talentos, se ironizaba sobre el progreso intelectual de las masas proletarias y de los polticos que la dirigan, y la crtica recaa
sobre el monumento destinado a inmortalizar los mritos del proletariado, cosa que
nadie se le haba ocurrido, quizs por existir una profunda ignorancia respecto de
sos mritos. Los cuestionamientos se dirigieron al problema propiamente simblico, esttico y de emplazamiento del monumento:
poco que algn artista risueo se pusiera espigar formas, en el vasto campo
de las ideas caricaturescas, habran de surgir proyectos que seguramente no
ha sospechado nuestro gobierno. Por ejemplo, aplicando la personiicacin
del obrero con arreglo las modalidades de nuestro ambiente en la vida
electoral y en el comit, saldra una igura que no sera para ser puesta en un
paseo pblico. Y si se aadiera el atributo electoral de la alpargata, consagrada
como smbolo de la chusma triunfante sobre el rgimen oprobioso, segn la
expresin radical, tendramos apenas un monumento de vestbulo. Claro est
que imaginar monumentos as sera una irreverencia insanable, inmerecida por
186
187
257
HROES DE ALPARGATAS
Era lgico que, en momentos donde los monumentos respondan a una tradicin en
que se consagraban las grandes iguras y hechos histricos, el proyecto generara profundas dudas, ms all de las diatribas polticas, dado que no exista en el pas ningn
modelo de monumento en este sentido189. Entonces: Cmo personiicar al obrero?,
Qu atributos simblicos o alegricos eran adecuados?, Qu lugar era conveniente
para erigirlo? Podemos imaginar el estupor que debi causar para la alta sociedad
imaginar un monumento al obrero en una de sus principales plazas o parques, focos
sociales, recreativos y culturales de la oligarqua mendocina. Y ms an, concebir la
idea del monumento como un espacio conmemorativo y celebrativo, en el cual se reuniran las masas populares la chusma de alpargatas a festejar.
En realidad, podemos tambin percibir la enorme preocupacin por los cambios sociales que se veriicaban. Durante los aos anteriores se haba incorporado una importante
masa inmigratoria190, a lo que se sumaba la fuerza del proletariado. Un testimonio de
un terrateniente de la poca es elocuente del malestar que provocaban los peoncitos
insolentes que exigan aumento de salario y disminucin de horas de trabajo, o las sirvientas irrespetuosas que hablaban de sus derechos y amenazaban con denuncias al
Departamento de Trabajo recin creado. Adnde iran a parar en manos de aquella
chusma de alpargata que haba perdido el respeto a las personas de bien? [] Esto era
el acabse191.
El discurso obrerista del lencinismo, como ha sealado Pablo Lacoste, no era pura
retrica, sino un instrumento de cambio social. De a poco los trabajadores alcanzaban
la conviccin de que tenan derechos y que contaban con los medios necesarios para
ejercerlos. El mismo ao de su ascenso al poder Lencinas cre la Secretara de Trabajo,
para atender al cumplimiento de las normas laborales (Ley 731), y sancion la Ley de
salario mnimo y jornada laboral mxima de ocho horas (Ley 732), normativa que fue
implementada por primera vez en el pas192.
Otra forma de crtica al monumento estuvo dada por la caricatura, arma de combate
que fue ampliamente utilizada por los grupos opositores para abordar diversos temas:
la intolerancia hacia otros partidos, las huelgas obreras, el atraso en los sueldos de
maestros, etc. La revista La Semana parodiaba el monumento con la igura de un paisano con alpargatas sosteniendo una maza, sobre un alto pedestal, mientras una enorme
masa proletaria se congregaba a sus pies, invocando a travs de carteles TENEMOS
HAMBRE y QUEREMOS MAS TRABAJO193. El diario La Tarde, en un artculo titulado El monumento al obrero. Amor con amor se paga, atribua con sarcasmo al
gremio ferroviario, en ese momento en conlicto con el radicalismo provincial y nacio188
El monumento al obrero, Los Andes, Mendoza, 4/5/1918.
189
La paradigmtica obra Canto al trabajo de Rogelio Yrurtia fue inaugurada en 1927.
190
Segn el censo nacional de 1914, el 30 % de la poblacin mendocina estaba conformada por inmigrantes.
191
Lacoste toma de Ramos dicho testimonio (Cfr. Lacoste, 1992: 8).
192
Tambin implement el sistema de jubilaciones y pensiones a empleados estatales y la Caja Obrera de
pensin a la vejez e invalidez.
193
La Semana, Mendoza, Ao 1, N 21, 22/5/1918.
258
259
HROES DE ALPARGATAS
197
El monumento al obrero, Los Andes, Mendoza, 21/11/1918.
198
La Gauchocracia, La Tarde, Mendoza, 11/11/1918.
199
Lamentablemente no se encuentran los ejemplares de la primera mitad del ao, momento en que se anunci
el monumento. Pero las notas posteriores relejan acabadamente el rechazo que provocaba. Cfr. El gobierno de los
monumentos, El Socialista, Mendoza, 3/11/1918; Una contestacin merecida, El Socialista, Mendoza, 24/11/1918.
200
El monumento al obrero, Los Andes, Mendoza, 30/12/1918.
260
A medida que pasaba el tiempo el monumento reciba el rechazo de los distintos sectores sociales, desde la lite hasta de los propios grupos obreros.
El monumento: entre el triunfo y el ocaso
A ines de 1918 el tema del monumento parece quedar desterrado de la prensa, testimonios y documentos oiciales. La situacin poltica del lencinismo, a menos de un
ao de gobierno, veriicaba un profundo quiebre, a nivel provincial y con el radicalismo nacional. Mendoza sufri numerosas intervenciones (noviembre 1918 a abril 1919;
abril a junio 1919; setiembre 1920 a febrero 1922), en enero de 1920 se produjo la muerte del gobernador Jos N. Lencinas, y en febrero de 1922 asume la gobernacin su hijo,
Carlos W. Lencinas, culminando su mandato con una nueva intervencin (octubre
1924 a marzo 1926), y es asesinado en noviembre de 1929.
Pocos monumentos hay en que las bsquedas en reservorios documentales, lbumes, fotografas, y la propia historiografa resulta tan infructuosa201. Sin embargo,
el monumento est, para testimoniar con su presencia que fue erigido. Cmo
lleg a concretarse? Qu pas con el concurso? Cundo fue erigido? Hubo
inauguracin oficial? Aunque muchas preguntas quedan sin respuesta, algunas
pesquisas y ciertas conjeturas nos permiten trazar aproximaciones, factibles de
ser corroboradas o refutadas a medida que nuevas investigaciones aporten otros
datos y descubrimientos.
Una nota periodstica de 1971 resulta reveladora de algunos aspectos. En ella, se
resea el decreto dispuesto por Lencinas, y se establece que tiempo despus, se
construy el monumento al Obrero. A pesar de la ausencia de datos histricos, el
articulista seala:
Los avatares del quehacer poltico y vital de la sociedad mendocina
determinaron que poco a poco se perdiera la nocin de la existencia del bronce.
Pero la estatua continu, vaya a saberse si en el mismo lugar, afrontando la
soledad que brinda el olvido. Quizs varias veces fue trasladada de sus bases,
quizs mucha gente se pregunt a quin representaba esa imagen tmida del
paisano, smbolo del trabajo. Quizs naci all, a la entrada del zoolgico, y
estuvo olvidada por ms de medio siglo202.
261
HROES DE ALPARGATAS
262
263
264
en 1926 por el Diputado Nacional por la Unin Cvica Radical Enrique Gonzlez211.
A las demoras burocrticas se sum la ausencia de funcionarios al acto de colocacin
de la piedra fundamental previsto como una de las actividades organizadas por la
Comisin Pro Centenario de Baha Blanca212, que fue inalmente realizada durante la
siguiente primavera.
Asimismo, tambin fue muy cuestionada otra de las iniciativas de esta ltima. La
prensa opositora denunci que era un fraude el cuadro que pretenda homenajear al
coronel Ramn Estomba213, jefe de la expedicin militar, considerado como el hroe
fundador a partir del rastreo documental efectuado por el militar conservador Luis
Caronti con motivo de la conmemoracin del centenario nacional.
Como contrapartida a esa Comisin impulsada desde el poder ejecutivo municipal
en manos de la UCR llamado burlonamente la Logia por el peridico satrico conservador El Rgimen-, se form el 3 de septiembre de 1926 una comisin paralela autodenominada Hijos de Baha Blanca, que remarc no tener relaciones de ninguna
especie con la anterior, a la que no reconoca tampoco como oicial. Si bien es cierto
que en la primera se encontraban extranjeros como Arthur Coleman214 y argentinos
procedentes de otras provincias el masn radical Enrique Julio, propietario y director de La Nueva Provincia, por ejemplo-, es signiicativo que los nativos que convocaron la formacin y la dirigieron estuvieran muy relacionados con la Iglesia Catlica y varios de ellos fueran militantes del Partido Conservador. Una subcomisin
destinada a estudiar la mejor forma de rendir un homenaje perdurable, propuso tres
dictmenes distintos -un monumento estatuario, un arco conmemorativo alegrico
y una obra arquitectnica o pabelln de arte y audiciones-, optndose despus de
211
Con motivo del centenario de la primera presidencia constitucional argentina, La Nueva Provincia dedic dos
extensas notas a la igura y obra de Rivadavia retomando la que se consideraba una deuda con el esclarecido ciudadano
de parte de Baha Blanca. El legislador Enrique Gonzlez present en septiembre de 1926 un proyecto de ley en virtud
del cual el Poder Ejecutivo se encargara de la ereccin del monumento, desplazando la carga econmica a la Nacin, en
congruencia con la postura de Alvear con respecto al mausoleo que se deseaba erigir en la Capital Federal (Espantoso
Rodrguez y Serventi, 1991). Sancionado el 4 de agosto de 1927 (Ley N 11390) recin en julio de 1928 el Ministerio
de Obras Pblicas de la Nacin aprob las bases del concurso para la obra formuladas por la Direccin General de
Arquitectura con el asesoramiento de la Comisin Nacional de Bellas Artes (Ribas e Ivars, 2004).
212
La foto de la Comisin muestra sentado en el lugar central al Presidente, el lder radical Eduardo Gonzlez
(cuado de Valentn Vergara y hermano del legislador Enrique G.), lanqueado a su derecha por tres representantes
de las FFAA (Contraalmirante Carlos Daireaux, Coronel Juan Estivil y Capitn Tulio Guzmn) y a su izquierda por el
secretario Carlos Cisneros (Intendente por la UCR desde el 11-6-1928 hasta el 1-1-1929) y por Arthur Coleman. De pie se
pueden ver, entre otros, al Vicepresidente E. Julio, al tesorero Adrin Pillado, los radicales Carabelli, Geddes, Perlender
y el conservador Francisco Cervini. Se proyectaron en el desarrollo de sus actividades, las tensiones producidas por las
divisiones internas dentro de la UCR.
213
Se reprodujeron las imgenes del cuadro encargado al artista platense Jos Fonrouge y el del mariscal
napolenico douard Mortier existente en el museo de Versalles, con el ttulo La prueba del fraude iconogrico en El
Siglo; diario regional del sur. Baha Blanca, ao 12, n 5587, 6 abril 1928, p. 4, que retom el tema los das 18 y 22 de abril. Ver
tambin el peridico conservador El Rgimen; bisemanario poltico, satrico y de actualidad. Baha Blanca, ao 11, n 926, 7 abril
1928, p. 2 y El Censor. Baha Blanca, ao 22, n.5871, 7 abril 1928, p. 1, El retrato de Estomba. Es copia de una pintura de
Larrivire?
214
Superintendente divisional de trico del Ferrocarril Sud Representante oicial de la gerencia en Baha
Blanca Presidente de la Comisin local y apoderado general de la Compaa de Aguas Corrientes de Baha Blanca
Director local y apoderado general de The South American Light and Power Co. Apoderado general de The Baha
Blanca Gas Company Director local de The Baha Blanca Tramway Co. Director local del Mercado Victoria de
Productos del Pas Presidente del Baha Blanca Golf Club Presidente de la Comisin The British Comunity ProCentenary Committee. (Ver: Boletn Municipal de Baha Blanca, 1926, p. 1433).
266
267
Como contrapartida, la Comisin busc el apoyo popular. Para obtener los fondos
necesarios para la construccin del monumento emiti bonos de distintos valores que
fueron distribuidos por los comercios en forma proporcional a las compras de sus
clientes y que eran canjeables por nmeros de una rifa de objetos de valor. Despus
de unos pocos meses, la promulgacin de una ley provincial prohibitiva de los juegos
de azar impidi este sistema de recaudacin, por lo que el 18 de julio de 1927 se inici
una colecta, acompaada por una intensa propaganda escrita, oral, radiotelefnica y
personal llevada adelante por numerosas brigadas con el objeto de recorrer la ciudad,
visitando todos los hogares desde el ms encumbrado hasta el ms modesto219. Un
termmetro colocado en uno de los balcones de un hotel,220 indicaba lo recaudado
hasta que la columna baromtrica revent con un monto de $100.000.-, superior a lo
esperado. A este dinero se sum un subsidio municipal equivalente a la mitad de ese
valor, tambin destinado a la construccin del monumento.
Los tres aos que mediaron entre la colocacin de la piedra fundamental y la inauguracin estuvieron signados, adems, por el primer golpe de estado ocurrido el 6 de
septiembre de 1930. Si bien esto no signiic una alteracin en el gobierno municipal
en manos del conservador Florentino Ayestarn, las elecciones provinciales del 5 de
abril de 1931 evidenciaron que el radicalismo uniicado poda obtener el triunfo.
En esa trama poltica, la inauguracin del monumento fue alineada a la de los cuarteles del Regimiento 5 de Infantera. No slo el ministro de guerra, general de divisin
Francisco Medina, particip en ambos actos, sino que regres acompaado por las
autoridades de la Comisin Hijos de Baha Blanca que fueron presentadas al Presidente Gral. Justo.
La prensa local y portea afn al gobierno de facto tambin hizo esa fusin. En el caso
de Crtica anunci que Baha Blanca celebrara su ciento tres aniversario mediante un
artculo (sin texto) con tres fotografas con sus respectivos epgrafes, en las que segn
el orden de lectura se mostraba una vista area de los cuarteles del Regimiento 5 de
Infantera junto a otras frontales del monumento a los Fundadores y del cine Grand
Splendid, que seran inaugurados para la ocasin221. Asimismo, en El Diario, que contaba con una seccin Noticias catlicas y desplegaba informacin especializada sobre
los movimientos en las FFAA, las dos primeras inauguraciones fueron cubiertas por
legislatura provincial sancion la ley 3932, conocida como ley Vergara que estableca que sera Intendente el Concejal
que encabezara la lista que obtuviera ms votos y que, en caso de acefala, sera reemplazado por el siguiente y as
sucesivamente. En las elecciones de diciembre de ese ao result electo Eduardo Gonzlez, que ocho meses ms tarde
renunci ante la falta de apoyo del Concejo Deliberante. Los festejos del Centenario estuvieron a cargo, entonces, de
Ramn Ayala Torales (25-8-1927/11-6-1928), quien renunci para ocupar la banca del Diputado Provincial Ventura
Picado, fallecido en junio de 1928. Lo sucedi como Intendente, Carlos Cisneros (11-6-1928/1-1-1929). En las elecciones
municipales del 25-11-1928 la UCR se present dividida en tres fracciones, por lo que el conservador Florentino
Ayestarn estuvo a cargo del municipio desde el 1-1-1929 hasta el 9-6-1931, puesto que el gobierno de facto lo conirm en
el cargo el 8-9-1930.
219
Arte y Trabajo. Baha Blanca, ao 16, n 188-189, marzo-abril 1931. La cursiva es nuestra.
220
http://www.argentinaparamirar.com.ar/verNota.php?n=121 (consulta 22-4-2011)
221
Crtica. Buenos Aires, ao 18, n. 6379, 10 abril 1931, p. 5.
268
notas222.
Por el contrario, la prensa socialista portea La Vanguardia y Libertad- no tuvo en
cuenta ninguno de estos acontecimientos y slo el primero de estos peridicos se reiri a la localidad durante esos das para informar sobre los partidos de ftbol que
jug el club porteo Racing en la ciudad surea223. El bisemanario bahiense Nuevos
Tiempos, sin embargo, destac la inauguracin del monumento en el marco de los festejos organizados por la Comisin Hijos de Baha Blanca como la nota ms emotiva y
que sin duda atraer una enorme concurrencia de pueblo al parque de Mayo, con la
asistencia de autoridades nacionales, provinciales y municipales, al mismo tiempo
que desliz que el da haba sido declarado feriado en todo el partido por el interventor nacional224.
En el medio se ubicaron los peridicos de iliacin radical, pero con distintas actitudes ante lo visual. Para Democracia225, este acontecimiento no amerit ser mencionado,
al tiempo que concentr el poder de la imagen en chistes gricos de actualidad poltica. En cambio, La Nueva Provincia y El Atlntico dieron mucho espacio a la inauguracin
del monumento, con reproduccin de los discursos, fotos e incluso el mismo esquema
acerca del emplazamiento.
Cabe recordar adems -si bien razones de espacio impiden un desarrollo en este
trabajo-, que se sumaron en ese entonces las repercusiones en el mbito local de la
situacin poltica italiana y espaola, puesto que los inmigrantes de ambas naciones eran los grupos mayoritarios en esa sociedad cosmopolita conigurada a partir
222
El Diario no se public el da 12 de abril, as que el tema fue cubierto en las tres ediciones sucesivas. En el
primer caso, se seal: Hoy partir para Baha Blanca el General Medina (El Diario. Buenos Aires, ao 50, n 15253,
10 abril 1931, p. 5, col. 1). En el segundo nmero: Ser inaugurado hoy en Baha Blanca el monumento a los fundadores
de dicha ciudad (El Diario. Buenos Aires, ao 50, n 15255, 11 abril 1931, p. 4, col. 1) En el tercero: Con todo brillo se
realizaron los festejos por el aniversario de la fundacin de la Ciudad de B. Blanca (El Diario. Buenos Aires, ao 50, n
15256, 13 abril 1931, p. 5, col. 2).
223
La Vanguardia. Buenos Aires, ao 38, n 8591, 11 abril 1931, p. 4.
224
Nuevos Tiempos. Baha Blanca, ao 18, n 1415, 11 abril 1931, p.1. El mismo peridico haba destacado la gran
concentracin socialista de 6000 personas el viernes 3 de abril, previo a las elecciones.
225
La aparicin de Democracia. Semanario defensor de los ideales de la UCR el 2-6-1930, con la consigna La unin
hace la fuerza, haca pblica la evidente reorganizacin partidaria.
269
Por otra parte, la tipografa de las letras que indican la fecha y el comitente del monumento as como los volmenes escalonados de piedra de la base remiten al art dec,
estilo tambin presente en el Gran Cine Splendid, construido por la empresa de Cabr
Mor e inaugurado simultneamente en el espacioso y cntrico terreno donde an-
226
270
271
272
Conclusiones
El monumento a los Fundadores de Baha Blanca fue erigido como un nudo complejo
en el que se entrelazaron desde lo espacial y lo formal hilos que excedieron lo estrictamente conmemorativo. Puede ser pensado como una especie de anclaje a cielo abierto
que daba cuenta de la continuidad de un sistema econmico, de una nueva realidad
poltica y de una mayor densidad visual. Con su emplazamiento cercano a los cuarteles del Regimiento V y sus referencias al modelo agropecuario se erigi como una
moderna sntesis dialctica que actualizaba en s mismo la presencia militar de la
232
Nuevos Tiempos. Baha Blanca, ao 18, n 1416, 15 abril 1928, p. 3. Es interesante observar que esta nota Arte
local- fue ubicada en la misma pgina que La mquina sonora del Gran Splendid y que en la pgina 1 fue anunciada la
formacin de una Agrupacin Artstica Socialista.
233
Nuevos Tiempos. Baha Blanca, ao 18, n 1415, 11 abril 1931, p.1.
273
Referncias
Espantoso Rodrguez, Teresa y Cristina Serventi, Mausoleo a Bernardino Rivadavia, en Estudios e
Investigaciones - Instituto de Teora e Historia del Arte Julio E. Payr N 4, Buenos Aires, Facultad de Filosofa y
Letras de la U.B.A., 1991.
Ribas, Diana I. ,El nacimiento de la representacin de Baha Blanca como ciudad fenicia, en Cernadas,
Mabel y Jos Marcilese (ed.), Poltica, sociedad y cultura en el Sudoeste Bonaerense. Actas de las
V Jornadas Interdisciplinarias del Sudoeste realizadas en Baha Blanca, 20-21 y 22 agosto 2008,
Baha Blanca, EdiUNS, 2009, pp. 219-229.
Ribas, Diana I. y Mara Jorgelina Ivars, La inauguracin del monumento a Rivadavia en la construccin de
la cultura poltica bahiense (1945-1946), en Cernadas de Bulnes, Mabel N. y Roberto Bustos Cara (edit.),
La cultura en cuestin; Estudios interdisciplinarios del Sudoeste Bonaerense, Baha Blanca, 2004, pp.107-118.
Williams, Raymond, Marxismo y literatura, Barcelona, Pennsula, 1980,
274
275
235
Fonseca, Homero Corbiniano. Revista Continente Multicultural Online, Recife, no. 70, out.2006. Disponvel em:
<http://www.continentemulticultural.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=2308>. Acesso em 10
mai. 2010.
236
Vandalismo ! Tribuna do Cear, Fortaleza, p. 04, 1 out. 1965.
276
237
277
238
Um projeto que esperou 30 anos. Dirio do Nordeste, Fortaleza, p. 07, 06 set. 1992. Na poca dessa matria, a
direo da Funcet manifestara o interesse em executar o projeto de Zenon, porm, por razes desconhecidas a ideia no
foi levada adiante.
239
Alencar, Jos. Iracema. Disponvel em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000136.pdf.
Acesso em: 09 mai. 2010.
278
Nesta obra, os jovens tem as pernas deformadas, grossas demais, uma alegoria fora e
vitalidade da juventude. Na inteno de apresentar jovens vigorosos, o artista eliminou
qualquer possibilidade de delicadeza, principalmente na igura feminina. O mesmo
expediente foi utilizado por Corbiniano com o objetivo de apresentar ao pblico os
valores modernos. Contudo, estilizar signiica simpliicar as formas, excluir os detalhes,
pior, deformar; trs tarefas ingratas ante a beleza de Iracema. O pblico em geral ainda
desconhecia as questes inerentes ao modernismo e a visualidade artstica da maioria
estava arraigada a um modelo de representao realstico das formas. Somada a esta
resistncia natural novidade, temos o agravante de que o que estava em jogo era a imagem
idealizada h cem anos de um dos principais cones da cultura cearense.
Em 1996, no aniversrio de vinte e cinco anos da Praia de Iracema, a Prefeitura de
Fortaleza decidiu presente-la com um monumento ndia que empresta o nome praia.
Para a empreitada, propuseram a Zenon Barreto a execuo do projeto apresentando
para o centenrio do romance Iracema, na dcada de 1960. A escultura foi feita de ferro
e revestida de ibra de vidro, material resistente maresia, que acelera a formao da
ferrugem. Provavelmente, a utilizao da ibra de vidro foi uma alterao no projeto
original tendo em vista que este material era pouco conhecido e utilizado no Brasil
em meados do sculo 20, e revela a preocupao e o cuidado que o artista dispensava
aos materiais de seus trabalhos. Ao contrrio das demais esculturas pblicas de Zenon,
a Iracema Guardi tem uma forte relao com o bairro em que foi instalada. Alm
de compartilharem o mesmo nome, a obra foi encomendada como marco celebrativo
pelo aniversrio do bairro, correspondendo assim lgica do monumento, pois uma
escultura uma representao comemorativa se situa em determinado local e fala
de forma simblica sobre o signiicado ou uso deste local (Krauss, 1984: 88).
sua terra dos inimigos alm mar, porm esta interpretao, que concedeu a Iracema a
alcunha de Guardi, est longe de corresponder s intenes de seu criador. Segundo
Zenon Barreto, ele imaginou a ndia contrita, na praia, logo aps a partida de seu
amor 240 e no se mostrou contrariado com a leitura que a populao fez da obra:
Tentei transmitir a emoo da personagem. s vezes, a interpretao das pessoas comuns mais completa do que a inteno do artista ou mesmo totalmente diferente241.
Nesta obra, Zenon atingiu o seu nvel mximo de simpliicao das formas; os poucos
detalhes existentes, como os seios, o quadril e um discreto cabelo, so elementos que
revelam o gnero da igura. O arco no apenas o anteparo que apia Iracema aps a
partida de Martim; ele tem um papel importante na sustentao e harmonia da escultura, como explicou o prprio artista: O arco fundamental na composio daquela
obra, dando-lhe equilbrio e sensao de movimento. Obrigatoriamente, deve ser um
semicrculo perfeito e de material no perecvel242.
Consideraes Finais
A relao monumento/ memria coletiva nos remete conceituao de Alois Riegl: no senso mais antigo e verdadeiramente original do termo, monumento uma
obra criada pela mo do homem com o intuito preciso de conservar para sempre
presente e viva na conscincia das geraes futuras a lembrana de uma ao ou
destino243. A definio de Riegl se encaixa no contexto do nacionalismo europeu
do sculo 19, perodo em que naes como Alemanha, Itlia e Frana legitimavam
alguns fatos e mitos de suas respectivas histrias atravs da construo, conservao e culto de monumentos. Em geral, os monumentos eram de carter naturalista
em virtude da representao do homenageado e clssicos por conta do uso de
alegorias de inspirao greco-romana.
Vale ressaltar que a ediicao de monumentos cvicos e histricos foi uma
constante a partir da segunda metade do sculo XIX e durante todo o sculo
passado, na medida em que a construo da identidade nacional exigia a
evocao do passado histrico; pautada nos feitos e fatos protagonizados pelos
ilhos ilustres da nao (polticos, militares, intelectuais) em sua maioria
ligados aos setores dominantes da sociedade244.
280
longevidade a dois fatores: os cnones neoclssicos atendiam s expectativas pedaggicas e cvicas de seus proponentes e, ao contrrio do que aconteceu com os pintores,
os escultores mostraram-se mais conservadores em relao s vanguardas modernistas. Esse descompasso entre as duas linguagens no foi uma exclusividade europeia.
De acordo com Quirino Campoiorito, a tridimensionalidade brasileira s apresentou
trabalhos com uma linguagem moderna em meados do sculo 20:
A escultura brasileira na dcada de 1950 chega s formas mais avanadas do
movimento internacional. Os escultores, em proporo considervel, passam
a interessar-se por novos materiais, pela conjugao audaciosa de matrias
diversas oferecendo outras oportunidades de expresso aos materiais clssicos,
adotando para tanto tcnicas originais ou cuidando de rigores artesanais
at ento esquecidos ou desprezados pela rotina acadmica. Igualmente, a
concepo escultrica extravasa os moldes comuns, para atingir um terreno
muito mais amplo na compreenso plstica que no apenas a do volume
compacto, e das imagens dos seres da natureza, conforme o conservadorismo
esttico arrastava desde a Grcia245.
No caso da arte cearense esse descompasso foi ainda maior uma vez que a centralizao do movimento modernista no eixo Rio de Janeiro So Paulo e as diiculdades
inerentes s outras capitais brasileiras contriburam para as discrepncias na difuso
da esttica modernista pelo resto do pas. A partir da dcada de 60 veriicamos dois
fenmenos distintos que, juntos, resultaram em uma nova orientao na arte em espaos pblicos da capital cearense, o que fez surgir os primeiros trabalhos artsticos
de iniciativa governamental. Ao invs de monumentos que eternizassem personagens
histricos, o poder pblico passou a encomendar obras que celebrassem os tipos e
temas populares, os quais, alm de habitarem as praas, passaram tambm a decorar
prdios pblicos. Essa mudana no selou o im dos bustos, esttuas e monumentos a
personagens histricos, pois eles no somente continuaram, como continuam sendo
produzidos. O que veriicamos foi o encerramento do ciclo produtivo de objetos urbanos, inspirados numa tradio europeia relacionada ao neoclassicismo, e a ascenso
de objetos de temtica e estilos nacionais.
No caso dos dois monumentos a Iracema, a despeito das questes estticas, o que veriicamos a continuidade da Arte Pblica Tradicional, que com a noo de escultura
como monumento celebrativo atravs de seus bustos, relevos, esttuas equestres, que
por sua vez, tm uma misso didtica de ser um exemplo a ser seguido.
O sentido original da Arte Pblica propicia uma certa desacelerao do
seu entorno, convidando o habitante observao narrativa daquele ponto
245
Campoiorito, Quirino, Escultura Moderna no Brasil, Crtica de Arte, Rio de Janeiro, dez. 1961-mar, 1962 apud
Zimmermann, Silvana, A crtica de arte e a escultura na modernidade brasileira, in: Fabris, Annatereza (org.), Crtica e
Modernidade, So Paulo, ABCA, Imprensa Oicial do Estado de So Paulo, 2006, p. 86.
281
No existe uma preocupao com o espectador, que visto como uma massa homognea, coesa e passiva. O sentido realstico das formas um elemento da composio
que contribui para o carter narrativo dessas obras, nas quais, muitas vezes, as qualidades histricas so mais valorizadas que as artsticas, ou seja, o que est em jogo
a memria histrica em detrimento de uma esttica inovadora. Acredita-se que essa
prtica desempenha e assume junto sociedade uma funo pedaggica, mesmo ao
homem comum, passivo ou indiferente, estimulando-o a se lanar perfeio moral e
sabedoria dos seus heris culturais (Zimmermann, 2000).
Referncias
Livros:
Barreto, Zenon, Figuras do Nordeste, Fortaleza, Imprensa Universitria, 2 edio, 2000.
Capelo, Jos e Ldia Sarmiento, Fortaleza Centro Antigo: Praas, Parques e Monumentos, Fortaleza, Fundao de
Cultura, Esporte e Turismo (Funcet), 2000.
Couto, Maria de Ftima Morethy, Por uma vanguarda nacional. A crtica brasileira em busca de uma identidade
artstica, Campinas, Editora Unicamp, 2004.
Estrigas (Nilo de Brito Firmeza), Artecrtica, Fortaleza, Edies Universidade Federal do Cear, 2009.
_______, A arte na dimenso do momento, Fortaleza, Imprensa Universitria UFC, 1997, v. 1 e 2.
_______, A fase renovadora na arte cearense, Fortaleza, Edies Universidade Federal do Cear, 1983.
_______, Artes Plsticas no Cear, Fortaleza, Edies Universidade Federal do Cear, 1992.
_______, Bandeira, a permanncia do pintor, Fortaleza, Imprensa Universitria UFC, 2001.
Fabris, Annatereza (Org.). Crtica e Modernidade. So Paulo: ABCA: Imprensa Oicial do Estado de So Paulo,
2006
Freire, Cristina, Alm dos mapas: os monumentos no imaginrio urbano contemporneo, So Paulo, Anna Blume, 1997.
Loureno, Maria Ceclia Frana, Operrios da Modernidade, So Paulo, HUCITEC/ EDUSP, 1995.
Knauss, Paulo, Cidade Vaidosa: imagens urbanas do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Sette Letras, 1999.
Krauss, Rosalind, Caminhos da Escultura Moderna, So Paulo, Martins Fontes, 1998.
Pallamin, Vera, Arte Urbana: So Paulo: Regio Central (1945-1998) obras de carter temporrio e permanente, So
Paulo, Annablume, Fapesp, 2000.
Vasconcelos, Tnia, A arte pblica em Fortaleza, Fortaleza, Editora e Distribuidora Livro Tcnico, 2002.
Veloso, Mariza, Arte Pblica e Cidade, in Medeiros, Maria Beatriz de (org.) Arte em Pesquisa: especiicidades,
Braslia, DF, Editora da Ps-Graduao em Arte da Universidade de Braslia, 2004, v.1.
Dissertaes e Teses:
Chagas, Gesilda, O Guarani: a mitologia da nacionalidade brasileira, 2008. Dissertao de Mestrado - Centro de
Ensino Superior de Juiz de Fora, Juiz de Fora, 2008.
Escobar, Miriam, A escultura no espao pblico em So Paulo, So Paulo, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo.
Dissertao de Mestrado em Arquitetura e Urbanismo Estruturas Ambientais Urbanas, FAU USP, 1994
Furegatti, Sylvia, Arte no espao urbano: contribuies de Richard Serra e Christo Javacheff na formao do discurso
da Arte Pblica Atual, So Paulo, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Dissertao de Mestrado em
Arquitetura e Urbanismo Estruturas Ambientais Urbanas, FAU USP, 2002
Zimmermann, Silvana, A obra escultrica de Galileo Emendabili: uma contribuio para o meio artstico paulistano,
So Paulo, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Dissertao de Mestrado em Arquitetura e Urbanismo
Estruturas Ambientais Urbanas, FAU USP, 2000
282
Peridicos/ Revistas:
Fabris, Annateresa, Portinari e a arte social, in Estudos Ibero-Americanos, PUCRS, vol. 31, no 2, dezembro
2005.
Krauss, Rosalind, A escultura no campo ampliado, Traduo Elizabeth Carbone Baez, in Revista Gvea, no.
01. Rio de Janeiro, PUC RJ, s/d.
Pallamin, Vera, Arte Urbana, aspectos preliminares, in Revista Caramelo, So Paulo, FAU USP, 1992, p.
156/ 159
------------------, Arte Urbana, aspectos contemporneos, Revista Sinopses, So Paulo, FAU USP, no. 21,
junho/ 1994, p.24-32.
Peridicos/ Jornais:
Barreto, Zenon, Arco de Iracema, Jornal O Povo, Fortaleza, 1 ago. 2001, Seo de Cartas, p. 4.
Estrigas, Depredaes no municpio, Tribuna do Cear, Fortaleza, p. 5, 22 out. 1965.
Monteiro, Claudia, Novo carto postal, Jornal O Povo, Fortaleza, 6 mai. 1996. Caderno Vida & Arte.
Na sombra com Rachel de Queiroz, Jornal O Povo, Fortaleza, 14 jul. 2007, Editoria Fortaleza.
Um projeto que esperou 30 anos, Dirio do Nordeste, Fortaleza, p. 7, 6 set. 1992.
Paula, Janana de, Arcos do Passado, Jornal O Povo, Fortaleza, 11 jan. 1999, Caderno Vida & Arte.
Textos eletrnicos:
http://www.continentemulticultural.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=1094:arestauracao-dos-murais-na-secretaria-da-fazenda&catid=85:homenagem>. Acesso em: 11 mai. 2010.
http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000136.pdf>. Acesso em: 09 mai. 2010.
http://www.historia.uff.br/primeirosescritos/sites/www.historia.uff.br.primeirosescritos/iles/pe07-3.
pdf>. Acesso em: 29 abr. 2010.
http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000135.pdf>. Acesso em: 10 mai. 2011.
283
Carolina Montero
UNS
Introduccin
El 12 de octubre de 1992 se conmemoraron los quinientos aos del llamado descubrimiento de Amrica. Los festejos en ese entonces estuvieron proyectados desde una
visin hispanista, se festejaba literalmente la llegada del Almirante Cristbal Coln
y su tripulacin a las tierras americanas, la evangelizacin y el arribo de la aclamada
civilizacin. La mirada estuvo puesta en la presencia de los europeos y no en las consecuencias que eso trajo para los que ya habitaban estas tierras.
En Baha Blanca246 particularmente se erigieron dos monumentos, se inaugur una
plaza247, se realiz un desile en el centro de la ciudad y una recreacin del desembarco
usando como escenario las costas de la localidad de Ingeniero White248. Los dos monumentos fueron propuestos por colectividades extranjeras: la italiana y la espaola.
Primera ocupacin: la mujer.
El monumento a la reina de Espaa Isabel la Catlica, donado por la Federacin
Regional de Sociedades Espaolas y el gobierno espaol fue entregado a la
municipalidad para que dispusiera de l.
246
Ciudad que se encuentra al sudoeste de la provincia de Buenos Aires. Tiene aproximadamente 250.000
habitantes y 2.300 km de supericie.
247
Plaza Cristoforo Colombo, ubicada en el macrocentro de la ciudad, a 800 metros de la plaza central. La
propuesta estuvo a cargo de colectividades italianas.
248
Localidad portuaria ubicada en el partido de Baha Blanca, a 10 kilmetros de la ciudad de Baha Blanca.
El puerto de la localidad es uno de los principales puertos de ultramar de la Argentina, y el movimiento econmico
alrededor de l, fue el factor ms importante en el crecimiento de la ciudad de Baha Blanca.
284
La obra fue realizada por el escultor espaol Toms Bauelos quien se desempea
como profesor en la facultad Bellas Artes, de la Universidad Complutense de Madrid.
Al consultarle sobre la obra enviada a Baha Blanca hizo estos comentarios:
[] Yo tampoco comparto mucho el ideario que ostent la conmemoracin del
quinto centenario, y tengo que decir que si estaba de acuerdo, que en la medida
de lo posible estas guindas de la tarta (las esculturas) estaban acompaadas de
otros proyectos de cooperacin, seguro que como siempre, en todos los sitios
estos temas, no siempre se administran bien y casi siempre a las personas a las
que se les encarga la tarea de organizar los eventos y la colocacin de la estatua
estn en el extremo de la derecha ms conservadora. [...] no me gust mucho el
basamento que se le puso, pero la escultura es sobria y digna, alude a los valores
que representa y adems fue hecha con rigor y cario 249.
La escultura lleva las Leyes de Indias en su mano derecha. Mide 2,05 metros de altura
y se encuentra sobre una plataforma rectangular de 25 metros cuadrados, escalonada
en tres niveles y revestida de granito gris pulido que fue diseada por el arquitecto
Vicente Servarollo. La gestin para traer la escultura a Baha Blanca dur varios aos,
inalmente se logr cuando en ocasin de fundirse una estatua para emplazar en la
ciudad de Quito, Ecuador, el gobierno espaol accedi a construir otra gemela para
nuestra ciudad250.
Un paramento de idntica terminacin, en forma envolvente, cierra particularmente
el recinto.
249
250
285
251
La Nueva Provincia, ao XCV, n 32388, lunes 12 de octubre de 1992, p. 9
252
Carta de la Federacin de Sociedades Espaolas al Presidente del Honorable Concejo Deliberante (HDC)
de Baha Blanca, Cdor. Nstor Alberto Prez. 26 de junio de 1987. Expediente HCD 271-87.
253
Desde el punto de vista tcnico no se recomienda colocar elementos rgidos sobre canalizaciones o
rotondas no slo por motivos de visibilidad sino principalmente porque se trata de zonas de cambios de direccin de
circulacin y variaciones de velocidad que exigen condiciones ptimas de vehculo, y en caso de prdida de control por
parte del conductor hay mayor posibilidad de agravar las consecuencias de la colisin al embestir elementos slidos
emplazados en el sector de maniobras. Carta de la Jefa de la Direccin de Trnsito, Ing. Silvia Fernndez al Secretario de
Gobierno Alberto Arnaudo. Baha Blanca, 9 de septiembre de 1987. Expediente HCD 271-87.
254
Carta de la Direccin de Vialidad de la Pcia. de Buenos Aires al Secretario de Obras y Servicios Pblicos Ing.
Pablo Goldaracena. 17 de marzo de 1988. Expediente HCD 271-87.
286
255
Inaugurado en marzo de 1991, imparta enseanzas a nivel secundario.
256
La totalidad de las placas que se encontraban en los laterales del monumento fueron hurtadas. Hoy slo
podemos ver la placa principal ubicada debajo de la igura de Isabel.
257
La Nueva Provincia, ao XCV, n 32388, lunes 12 de octubre de 1992, p. 9.
258
La Nueva Provincia, ao XCV, n 32388, lunes 12 de octubre de 1992, p. 9.
287
El profesor universitario, por su parte, hizo el recorrido inverso. Fue hacia la fecha
homenajeada y enfatiz la presencia de la reina, sin analizar que se trataba de una
posicin privilegiada y excepcional.
En sntesis, si el funcionario hizo hincapi en una mirada populista y construy una
representacin nacional argentina que historiogricamente podra ser considerada
desde abajo, el acadmico reforz la representacin jerrquica hispanista desde otro
aspecto, la historia de gnero, solapando las estructuras de poder que favorecieron esa
presencia de Isabel en relacin al continente americano.
Segunda ocupacin: el hombre
El mismo 11 de octubre de 1992, se inaugur en otro sector perifrico de la ciudad, el
monumento a Cristbal Coln situado en la Plaza de las Amricas. La obra fue ubicada en la interseccin de la Avenida Coln, Avenida Circunvalacin, calle O Higgins
y calle Nueva Provincia259.
288
289
En su discurso, este dirigente construy una otredad resistente que haba cuestionado en un primer momento la idea de gran conquista civilizatoria, al mismo tiempo
que enfatiz la imagen de Coln como un genio, sustentado sobre el saber, la fe y
la valenta. Frente a la mayora social que representaba y que diluy en el genrico
pueblo de Baha Blanca, hizo hincapi en una perspectiva historiogrica idealista e
individualista sustentada sobre la igura de hroe -Coln- y la presencia del intendente, omitiendo a los concejales presentes. Al mismo tiempo, remarc las jerarquas
institucionales, subordinando a la mxima autoridad civil local a las Fuerzas Armadas de la Patria y poniendo sobre esta ltima el acompaamiento soberano de la
representacin eclesistica.
A lo cualitativo de esa pirmide en cuya cspide estaba la Iglesia y luego las Fuerzas Armadas, agreg lo cuantitativo al expresar su orgullo por pertenecer a la nica ciudad que
inaugur tres monumentos en homenaje al V Centenario del descubrimiento de Amrica.
Linares, por su parte, inaliz la ceremonia declarando que el monumento se asuma
como smbolo del comienzo de una nueva civilizacin262. Es decir, en este caso, recurri a lo temporal para argumentar desde una proyeccin hacia el futuro la posibilidad
de un cambio.
El espacio pblico: soporte de tensiones.
La conformacin de la comisin Quinto Centenario del Encuentro de Culturas a
mediados de 1991 con el in de organizar el cronograma de los actos oiciales no supuso el acercamiento intercontinental sino el de las colectividades espaola e italiana.
El anlisis del posicionamiento poltico de sus miembros evidencia que el evento fue
utilizado como un nudo en el que se proyectaron los sectores ms conservadores en
cuanto al poder efectivo y simblico de la ciudad.
Si bien el presidente era el entonces intendente Juan Carlos Cabirn263 acompaado por el Presidente del Honorable Concejo Deliberante, Jaime Linares, ambos de
iliacin radical264, completaban la nmina los sectores ms reaccionarios de la localidad que ocupaban puestos signiicativos en otros mbitos de poder. Por un lado, el
presidente de la Cmara Civil de Apelaciones -el antiguo militante conservador, Dr.
Francisco Cervini- y el Arzobispo de Baha Blanca. Como representantes acadmicos
estaban el decano de la Facultad Regional de la Universidad Tecnolgica Nacional y
el Rector de la Universidad Nacional del Sur, Dr. Carlos Mayer.
A los cnsules de Espaa, ngel Cappa, y de Italia, Michele Fassolari, se sum el presidente de la Federacin Regional de Sociedades Espaolas, Ramn Arestizbal, socio
fundador de la Asociacin Cristiana de Dirigentes de Empresa en 1959, es decir, un reforzamiento de la presencia eclesistica ligada en este caso a la jerarqua econmica.
262
La Nueva Provincia, ao XCV, n 32388, lunes 12 de octubre de 1992, p. 10.
263
Asumi como intendente de Baha Blanca en 1983. Fue reelecto en 1987 y inaliz su mandato en 1991.
264
La Unin Cvica Radical es el partido poltico que gan las elecciones a nivel nacional y municipal en 1983,
ao en que se recuper la democracia luego de siete aos de dictadura militar. El 10 de diciembre de 1991 asumi como
Intendente electo Jaime Linares, quien se desempeaba como Presidente del Honorable Concejo Deliberante.
290
manera, instaurar las medidas neoliberales comandadas desde los Estados Unidos,
en las que la ley de libre mercado y el ingreso irrestricto de las importaciones fueron
lo ms sobresaliente. En nuestro pas la impronta social del neoliberalismo llevado
adelante por las polticas neoliberales del entonces Presidente, Carlos Menem265, fue
fuerte y las consecuencias muy graves: altos ndices de desocupacin, aumento de la
exclusin social y econmica, crecimiento de las villas de emergencia, retirada del
Estado de mbitos como la salud, la educacin, etc.
Por otra parte, mediante los monumentos emplazados para conmemorar la llegada
de los europeos al continente americano, ciertos grupos que propulsaban el pensamiento hegemnico lograron dar visibilidad material a cierto relato histrico. En este
sentido, cabe recordar los trminos de Raymond Williams al referirse a la tradicin
selectiva como una versin intencionalmente selectiva de un pasado conigurativo
y de un presente preconigurado, que resulta entonces poderosamente operativo
dentro del proceso de deinicin e identiicacin cultural y social (Williams, 1980:
137). Se impuso, entonces, un recorte fuertemente ideolgico respecto de quines
eran los merecedores del homenaje.
Memoria e identidad se conjugaron en un entramado complejo: los espaoles y los
italianos apelaron a una igura que los identiicara, que reinterpretara su identidad,
que los presentara diferentes a esos Otros que eran los pueblos originarios. Por un
lado, las cermicas de Domingo Cerella marcaron ielmente esa diferenciacin y, por
el otro, la representacin de Isabel destac sus caractersticas bien marcadas de mujer
europea. Adems, cada colectividad funcion a su vez como un Otro complementario
en la empresa de la conquista, en la que a la inteligencia varonil italiana representada
por Coln se sum el aporte material de la igura femenina de la reina.
Marina Aguerre airma que
[] la escultura pblica es un instrumento ideal: introduce un impacto
instantneo y duradero. Se trata no slo de sealar determinados valores
importantes para el observador contemporneo, sino adems, instruir en
ellos a las generaciones venideras. Esto implica que, para que el mensaje que
pretende transmitir resulte eicaz, los elementos constitutivos de la obra deben
ser fcilmente decodiicables por el receptor (Aguerre, 2009: 326).
No resulta un dato menor en este caso la presencia de estudiantes en los actos inaugurales. El mensaje pedaggico derivado de ambos monumentos fue claro: la civilizacin
europea conquist a la barbarie americana. Al haber optado por lenguajes altamente igurativos y, en el caso italiano a conos fcilmente reconocibles en los libros escolares,
como lo son las carabelas y el rostro de Cristbal Coln, fue y es fcilmente transmisible captar que el mensaje sugerido es la superioridad de la civilizacin cristiana y
occidental por sobre las culturas originarias.
265
La dcada del noventa suele denominarse como menemista ya que el citado Presidente fue electo en 1989
y reelecto en 1995, inalizando su mandato en 1999.
292
Quinientos aos despus, se continu silenciando totalmente las voces de los pueblos
originarios, reducidos a un elemento pasivo y slo mencionados de manera efmera,
casi como un elemento ms del paisaje que sirvi de escenario para la recreacin del
desembarco en la localidad de Ing. White. En nuestra ciudad, no se hizo visible un
debate sobre el ahora reconocido genocidio en Amrica, sino que se mantuvo la visin
hegemnica y oicial conmemorando la ocupacin de las tierras americanas por parte
del Estado espaol, como un hecho de notables caractersticas positivas. Si pensamos
en los emprendedores de estas marcas en el espacio pblico, queda claro que su visin
conservadora de la historia logr emplazarse en el espacio que transitamos a diario.
Como dira Walter Benjamin: Jams se da un documento de cultura sin que lo sea a
la vez de barbarie (Benjamin, 1973: 182).
Referencias
Aguerre, Marina, Crnica de una muerte anunciada...Relexiones acerca del rol del monumento
conmemorativo en Balances, perspectivas y renovaciones disciplinares de la Historia del Arte, V Congreso
Internacional de Teora de Historia de las Artes. XIII Jornadas CAIA, Buenos Aires, 2009.
Benjamin, Walter, Tesis de ilosofa de la historia, en Discursos interrumpidos I, Madrid, Taurus, 1973.
Briante, Miguel, Desde este mundo. Antologa periodstica 1968 -1995, Buenos Aires, Sudamericana, 2004,
Gorelik, Adrin, La grilla y el parque. Espacio pblico y cultura urbana en Buenos Aires, 1887 1936, Buenos Aires,
Universidad Nacional de Quilmes Editorial, 2004.
Guardiola Plubins, Jos, Historia de los espaoles en Baha Blanca, Baha Blanca, Encestando, 1992.
Margulis, Mario, Sociologa de la cultura. Conceptos y problemas, Buenos Aires, Biblos, 2009.
Viuales, Graciela M. y Jos M. Zingoni, Patrimonio urbano y arquitectnico de Baha Blanca, Baha Blanca, La
Nueva Provincia, 1990.
Williams, Raymond, Marxismo y literatura, Barcelona, Ediciones Pennsula, 1980.
293