Armadilhas do coração
De Mari Nandes
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- Nota: 5 de 5 estrelas5/5Fantastico amei o emredo desta historia e ja estou a procura de mais publicações da autora.
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Armadilhas do coração - Mari Nandes
Copyright © 2016 Mari Nandes
Copyright © 2016 Editora PL
Capa: Denis Lenzi
Revisão: Bah Pinheiro
Diagramação Digital: Carla Santos
ISBN: 978-85-68292-42-6
Esta obra segue as regras do Novo Acordo Ortográfico.
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte dessa obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma, meio eletrônico ou mecânico sem a permissão do autor e/ou editor.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei n°. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.
Capa
Folha de Rosto
Créditos
Sumário
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Capítulo 42
Capítulo 43
Capítulo 44
Epílogo
Biografia
Saiba mais sobre a Editora PL
PARQUE BRIGADEIRO EDUARDO GOMES.
RIO DE JANEIRO — 07/01/2015 06:20am
Algumas pessoas dizem não acreditar em conto de fadas, e também não possuirem nenhum tipo de superstição, eu também era uma incrédula em todos os assuntos que ligassem a esse fato. Porém o destino muitas vezes nos prega peças que na maior parte do tempo não entendemos na hora, e só tomamos conhecimento depois de já estarmos totalmente encrencados. Isso é um fato verídico.
Meu nome é Manuela Sanchez e por mais absurda que possa ser, esta é minha história.
UM ANO ANTES...
Diz um ditado: Seria cômico se não fosse trágico
ou seria o contrário? Acho que me enquadro nas duas formas. Afinal, sinto que essa frase é tão eu
.
Tudo em minha vida poderia ser perfeito se aos meus vinte anos, com meu um metro e cinquenta e cinco de altura, ao invés de pesar oitenta e nove quilos, eu pesasse apenas sessenta, assim eu já poderia ser mais feliz, e tudo seria perfeito com minha saúde. Com isso, eu poderia estar neste exato momento em minha casa, em minha cama, embaixo do meu cobertor. Mas não, estou em pleno sábado, às seis e meia da manhã em um parque com um nome muito suspeito para ser designado à prática de atividades físicas. Só o nome dele já me deixa frustada. Que ironia um parque ter um primeiro nome de BRIGADEIRO. Um milhão e duzentos metros de área verde à beira mar, todos os dias frequentado por milhares de pessoas amantes da boa saúde.
Nunca me achei uma preguiçosa, muito pelo contrário. Trabalho de segunda a segunda com direito a apenas uma folga por semana em um barzinho, muito frequentado aqui no Rio, mas doutor Carrasco
— na verdade o nome dele é doutor Alex, porém, prefiro o apelido que coloquei nele, assim me sinto de certa forma um pouco vingada — é um verdadeiro carrasco com o tratamento que me impôs, e estar aqui a essa hora é uma das suas crueldades. Ele me deu o maior sermão da minha vida e me disse para deixar de ser preguiçosa e cuidar melhor de minha saúde. Conforme ele disse, todo meu desânimo e minha autoestima baixa é por causa de meu excesso de peso.
Estou caminhando há uma hora e meia e sinto todo meu corpo doer, já faz uma semana que comecei com essas longas e intermináveis caminhadas e ainda não consegui enxergar a vantagem que ele tanto frisou.
Caminhar é uma das mais vantajosas atividades físicas.
Muito pelo contrário, além de todo meu corpo estar moído, esta semana meu cardápio foi somente da cor verde, já me sinto parecida com o incrível Hulk. Ando cansada, estressada, com sono e de muito mau humor. Fala sério, quantas pessoas da minha idade estão a essa hora caminhando alegremente em um parque? Olhando ao redor me dou conta que são muitas. Que droga! Por que não posso ser magra e ter o corpo perfeito sem precisar fazer nenhum tipo de esforço? Doutor Carrasco me disse que os dados são preocupantes, e faço parte dessa estimativa e aqui estou eu.
A única coisa boa nisso tudo é que a paisagem
é cada vez mais linda e interessante, a cada passo vejo um estímulo
novo, se é que me entendem. Acreditem, nesta semana aprendi algo novo: os caras gatos acordam cedo e saem para correr. #fica a dica. Isso aqui parece o paraíso, e tem para todos os gostos. Olho no relógio e tento me animar dizendo a mim mesma que somente mais quinze minutos, quinze minutinhos.
Nunca pensei que em apenas quinze minutos minha vida pudesse mudar.
Mas após o ocorrido, mudou.
Estava completando minha última volta quando automaticamente viro o olhar para a direção das águas e sinto de repente me faltar ainda mais o ar ao ver saindo das águas o ser mais perfeito que meus olhos já puderam ver.
O cara era de tirar o fôlego até de uma cega. Continuei andando tentando voltar à terra e clarear os pensamentos.
Foco. Foco. Eu dizia a mim mesma.
Mas pensando em ter essa maravilhosa vista só mais um pouquinho, me viro para olhar novamente e acabo me perdendo em minhas pernas cansadas e caio o tombo mais esquisito do mundo.
De repente, ainda toda estatelada, vejo sobre mim um par de olhos negros e intensos.
— Você está bem?
— S-sim. — Mal consigo pensar tamanha a beleza à minha frente.
Caramba, todos os homens bonitos resolveram sair de casa hoje?
— O que aconteceu? Tropeçou?
— Ah não sei — falo tentando recuperar os últimos pensamentos. Que nem sei quais eram.
O cara era lindo e estava só de bermuda com seu abdômen sarado e suado bem à minha frente, devido a sua corrida.
— Você ralou o joelho, quer ajuda para se levantar?
— Ah, obrigada... — eu começo a responder, porém, sou interrompida pelo cara da praia.
— Terminou o percurso?
— Sim. — Ele se vira para responder o amigo.
Nesse instante o recém-chegado parece finalmente me enxergar, mas passa o olhar rapidamente por mim que fico completamente hipnotizada com sua beleza. Vejo as gotas de água descerem por seu peito definido e acompanho com o olhar uma gota descer e sumir no elástico de sua bermuda.
— O que aconteceu? — ele pergunta.
— Ela caiu.
— Você está bem mesmo? Mora aqui por perto? Quer uma carona?
— Não, não, obrigada. Eu moro aqui perto sim — eu respondo sem tirar os olhos do amigo. E ao me dar conta da gafe, tento disfarçar.
— Ela está ótima. Podemos ir? — Ele parece impaciente.
— Bom, desculpe os maus modos do meu amigo aqui. Meu nome é Caio e o seu?
Sem acreditar que aquele cara lindo estava perguntando meu nome, eu passo o olhar de um para o outro e vejo tédio no olhar do amigo. Não sei, mas ele não parece muito contente.
— Meu nome é Manuela, mas pode me chamar de Manu.
— Ok. Então, Manu, foi um prazer te conhecer, mas agora eu preciso ir.
— Prazer em conhecê-lo também, Caio. Eu também já estou indo embora. Obrigada por ter me ajudado — eu falo e percebo a falta de paciência do amigo. Que cara mais idiota! Bonito, gostoso, mas chato e inconveniente.
— Então tchau, Manu, até mais.
— Até — eu respondo para o Caio e fico chocada com a falta de educação do amigo dele, que simplesmente virou às costas e saiu andando sem nem ao menos falar nada.
Naquele primeiro momento eu ainda não tinha conhecimento do que o destino havia preparado para mim, mas se soubesse acho que faria tudo de novo.
Na semana seguinte repeti todos os dias o mesmo caminho na esperança de rever aquele deus grego, ou melhor, aqueles. Passei a semana tentando decidir qual era mais bonito, claro que em quesito gentil e atencioso o Caio ganha. Já o outro, o que frequentou meus sonhos e não sei nem mesmo o nome, mexeu com meus neurônios de uma forma que não me sai do pensamento. Aquele olhar frio que ele me lançou e o pouco caso que teve comigo deve ter feito eu ficar curiosa a seu respeito.
Não os vi depois disso, mas terminei mais uma semana de tortura, digo, de longas e intermináveis caminhadas.
Hoje é sábado e o barzinho onde eu trabalho costuma lotar, só de pensar nisso reviro os olhos, pois minhas pernas estão acabadas e a jornada do serviço é longa, normalmente saio após a meia-noite.
Conforme o esperado, o barzinho está cheio, a música alta de som batido, luzes coloridas e muita bebida é o lugar escolhido por uma legião de pessoas aos sábados à noite.
Estou servindo mesas desde às vinte horas, normalmente fico no caixa, mas hoje troquei de posto com Fabi que me pediu, por não estar passando muito bem, ela é uma amigona que sempre me ajuda, inclusive, este emprego foi ela que me ajudou a conquistar, afinal, quem seria louco de contratar uma gordinha para trabalhar em um barzinho super badalado? Claro que o Hugo só me contratou porque carrega um caminhão por causa dela.
Minhas pernas já estão dormentes e meu pé lateja, passo rapidamente o olhar pelo relógio na esperança de tudo isso terminar logo, nesse instante de desespero por ver que o relógio parece ter parado, sinto uma mão em meu ombro, me viro imediatamente para ver de quem se trata, só podem ter me confundido com alguém, mas ao ver quem é fico paralisada.
— Manu? É esse seu nome, não é?
— Caio? S-sim, esse é o meu nome. — Devo estar com cara de abobalhada.
— Você trabalha aqui? — Ele se aproxima para falar, pois o som está ensurdecedor.
E eu quase tenho um troço quando vejo esse gato debruçar sobre mim, sua voz grossa em meu ouvido me faz sentir tremores e eu vejo de perto que ele tem olhos incrivelmente azuis, e não negros como vi no parque. Acho que o sol e os intensos acontecimentos me fizeram enxergar mal.
Meu coração dá uma cambalhota e sinto um frio no estômago por ter um homem tão bonito olhando para mim. Percebo que se passou algum tempo entre a pergunta e eu estou apenas olhando para ele sem responder nada. Que ao perceber minha falta de jeito me dá o mais lindo sorriso, me sinto derreter.
— Sim, trabalho — eu quase grito para ele conseguir escutar.
— Legal! Hoje é a primeira vez que venho aqui, que surpresa boa te ver novamente. E seu joelho melhorou?
Acho que fiquei roxa, amarela ou talvez um arco-íris inteiro. Nunca um homem me falou algo assim ou demonstrou se preocupar comigo, ele só pode estar de gozação. Este pensamento me deixa um pouco chateada.
— Melhorou sim, foi só superficial.
— Que bom. E você caminha sempre no parque?
— Sim. Comecei há pouco tempo a pedido do meu médico — eu falo sorrindo meio que tirando sarro de mim mesma, é obvio que sendo gordinha não costumo praticar atividade física.
— Você está doente?
Nesse momento vejo Fabi me fazer um sinal de questionamento e me lembro que estou há algum tempo parada conversando com ele.
— Ahh, Caio, me dá licença, preciso servir o pessoal.
— Ah claro. Me desculpe, mas será que poderia me servir também?
Nossa senhora das gordinhas encalhadas, o jeito que ele falou isso bem próximo do meu rosto olhando dentro dos meus olhos. Eu suspiro! Acho que poderia servi-lo no que ele precisasse sem reclamar.
— Claro — consigo responder. Pego seu pedido e saio rapidamente, acho que hoje este lugar está muito abafado.
Circulei bastante e por várias vezes encontrei com seu olhar, tentava disfarçar e assim segui minha longa noite. Claro que ter um homem desses olhando para mim, mera mortal, estava me fazendo criar algumas fantasias em minha mente incrivelmente fértil.
Por um tempo ninguém pedia mais nada, então me encostei próxima ao balcão do caixa tirando uma das minhas sapatilhas para tentar massagear meu pé. Olho para a Fabi que está muito pálida.
— Fabi, vai embora, mulher, você está pálida.
— Dá para aguentar, Manu, meu estômago e minha cabeça estão meio revoltados hoje, mas não pense que mesmo estando doente não reparei no gato com quem você estava de papo, viu? — Ela tenta dar um sorriso.
— Nem me fale! Põe gato nisso, mas é que você não viu o amigo dele também. Jesus!
Conto rapidamente para ela como conheci a dupla de perfeição e ela fica curiosa em ver o outro também.
—Mas você não sabe o nome dele?
— Não. Só sei que ele é um grosso.
— Sei.. E pelo jeito, entre o educado e o grosso, você com certeza deve ter dedo podre e deve ter se interessado pelo grosso.
— Fabi, não viaja. Olha pra mim, quem sou eu para se interessar por qualquer um dos dois.
Nesse instante sinto mãos familiares novamente em meu ombro, e pela cara de espanto da Fabi o deus grego está atrás de mim. Sinto que devo estar ficando doente também.
— Manu, tem um tempinho para falar?
— Ehh... — Limpo a garganta e falo: — Sim, quer mais alguma bebida?
— Não. Quero conversar com você, pode ser?
Passo o olhar pela Fabi que está neste instante de boca aberta e digo:
— Se for rapidinho.
— Onde a gente consegue falar sem precisar gritar?
Aponto o corredor que leva aos banheiros e ele começa a caminhar até lá. Olho para a Fabi com olhos arregalados e muito nervosa.
— O que será que ele quer, Fabi? — eu pergunto já entrando em desespero.
— Larga a mão de ser POIA
e vai lá descobrir logo, senão vou eu no seu lugar.
Chego no corredor e ele está encostado com uma perna apoiada na parede e me olha chegar. O corredor está pouco iluminado e mais ao fundo tem várias mulheres em fila aguardando para entrar no banheiro. Uma que acabou de sair vem em nossa direção e parece bêbada, olha para ele e fala:
— E aí, gato, tá precisando de companhia? — ela fala com uma voz melosa e arrastada por causa da bebida e passa as mãos em seu peito.
Ele tira as mãos dela e fala sorrindo:
— Desculpe, mas já tenho companhia — ele fala e olha para mim que sinto minhas pernas virarem gelatina.
A desconhecida parece finalmente me ver, e com sua língua afiada junto com o excesso de alcool ri e pergunta:
— Ela? — E sai gargalhando. Eu me encosto na parede do outro lado do corredor, ele é bem estreito, me sinto desconfortável, ele me olha e fala:
— Desculpe atrapalhar seu trabalho, mas é que queria falar com você antes de ir embora.
— Pode falar — eu consigo dizer abaixando os olhos para olhar para meus próprios pés.
— Bom, eu queria te fazer um convite.
Isso me faz erguer o olhar para ele.
— Um convite? — Minha respiração se acelera.
— Sim. Como vi você caminhando no parque e você também comentou algo sobre ser a pedido do seu médico, gostaria de convidá-la para conhecer minha academia. Na verdade, minha e do meu sócio.
— Ah tá, vou ver um dia — falo meio desapontada.
Ele parece notar e se aproxima coloca a mão em meu queixo levantando meu rosto e diz:
— Você é um mistério, um lindo mistério que vou adorar desvendar.
Alguém escutou isso? Ou foi minha mente fértil de novo?
Fico olhando para aqueles olhos lindos sem saber o que falar e nem o que fazer, afinal, essas coisas não acontecem com muita frequência em minha vida.
Ele sorri, se aproxima lentamente e me dá um beijo no cantinho da minha boca, e me entrega um cartão.
— Aqui está. Espero vê-la o mais breve possível. — Me dá uma piscadinha e sai.
Mãe das pobres virgens gordinhas encrencadas, o que é isso, algum tipo de brincadeira de mau gosto?
Só pode ou então o cara deve ser lindo e cego. Tento devolver a paz de espírito e trazer forças para minhas pernas novamente. Passo a mão sobre o lugar onde ele depositou o beijo e meu estômago se retorce, esse foi a metade do meu primeiro beijo.
Depois de uma noite muito intensa, finalmente chega a minha hora de ir embora e descansar. Após a meia-noite Hugo chega e fica com o caixa, mas como hoje quem ficou no caixa foi a Fabi, quando ele chegou e ficou sabendo que ela não estava muito bem se ofereceu para levá-la embora e eu tive que continuar ao máximo com minhas forças.
Finalmente posso ir e praticamente me arrasto por duas quadras tentando chegar ao ponto de táxi, pois a uma hora dessas já não tem mais ônibus, olho no relógio: quinze para as duas da manhã.
Doutor Carrasco que vá se ferrar. Mas não caminho a semana que vem nem que ele me pague.
Olho para os lados para atravessar a rua, minhas pernas parecem pesar como chumbo, um passo após outro. Então escuto uma freada e sinto algo encostar em minhas pernas, tudo aconteceu muito rápido. De onde surgiu isso?
Foi meu pensamento ao me dar conta de que estava deitada no chão. Tento erguer a cabeça para ver o que acontecia e vejo um homem descer de sua imensa moto e tirar o capacete vindo em minha direção parecendo bem preocupado com meu estado.
Nesse momento penso duas coisas: não ando com muita sorte ultimamente e realmente isso só pode ser brincadeira.
— VOCÊ?! — falamos ao mesmo tempo.
— Você é cego, maluco ou o quê?
— E você está bêbada ou realmente não se aguenta sobre as pernas? Afinal, toda vez que te vejo está caída. Vem, eu te ajudo a se levantar.
— Não preciso da sua ajuda.
— Além de tudo é mal agradecida.
— E você sem educação e grosso — eu praticamente cuspo as palavras em cima dele, que me encara de olhos arregalados parecendo surpreso com minha reação.
Nossa, devo estar em meu limite de cansaço físico mesmo, não costumo tratar mal as pessoas, mas esse cara já teve sua cota de bons modos.
— Desculpe, eu sou assim mesmo. Você se machucou?
Eu fico sem graça por tê-lo agredido com palavras.
— Não. Estou bem, me desculpe também — eu falo me levantando e sentindo meus cotovelos arderem.
— Não acha que está muito tarde para alguém tão nova como você estar na rua a uma hora dessas? E ainda por cima cheirando a bebida?
Fico de boca aberta com tamanha falta de tato dele. Realmente devo ter dedo podre.
— Para sua informação não bebi uma gota de álcool.
Ele mal me deixa terminar e completa:
— Claro pela forma que estava andando deve ter bebido a garrafa toda.
Meu sangue mestiço parece se revoltar nas veias e vou ao seu encontro.
— Por que não cuida da sua vida? Vê se me erra, não te devo satisfação nenhuma. Você é que mal sabe pedalar uma bicicleta e que sair de casa com um monstro desses — falo me referindo a sua moto.
Ele parece ultrajado com minha língua afiada, me estende o capacete e com voz possessiva fala:
— Enfia isso que vou te levar embora.
— Nem pensar, está maluco? Nem te conheço.
— Para quem não me conhece já ficou bastante tempo batendo boca comigo.
— Quem manda você ser um imbecil — falo, e ele parece muito zangado.
— Então fique aí sozinha a uma hora dessas, depois não adianta colocar a culpa em mim se caso te acontecer alguma coisa.
— Pior do que ser atropelada por você? Não. Acho que para um dia a desgraça já está de bom tamanho.
Ele enfia o capacete muito irritado, senta em sua moto e saí acelerando feito um doido.
— Que cara mais arrogante, prepotente e imbecil! — eu falo para mim mesma bufando de raiva.
E me dou conta de que continuo sem saber seu nome.
Após as coincidências de encontrar aqueles dois no mesmo dia novamente, continuei com minhas caminhadas e hoje confesso que estou feliz e ansiosa. Hoje é minha consulta de retorno com o doutor Carrasco, quero passar pela sua avaliação após meu primeiro mês nessa rotina que ele me impôs e espero ter boas notícias, afinal, não é fácil sair de seu comodismo e ter que enfrentar a dura realidade.
Estou aguardando há vinte minutos em sua sala de espera cheia de mulheres magras e em forma, claro que não são todas pacientes dele, em sua clínica atendem mais dois médicos.
Escuto uma conversa entre duas mulheres que estão ao meu lado e falam sobre uma injeção milagrosa
, até me arrumei na cadeira para poder escutar melhor enquanto disfarço fingindo ler uma revista.
A pauta era sobre uma já estar fazendo uso dessa tal injeção mágica há três semanas e o resultado ter sido maravilhoso.
Discretamente passo os olhos sobre ela e tenho vontade de bufar, ela já é magra, como posso saber se realmente isso funciona? Escuto mais algum tempo os comentários da outra que fica encantada com os resultados adquiridos pela amiga e super ansiosa para usar também, quando escutei a parte em que ela diz que as injeções são aplicadas no local, até arregalei os olhos, imaginem tomar injeções pelo corpo todo? Deus que me livre, doutor Carrasco que não me venha com essas histórias, era só o que me faltava.
Nesse instante sou informada pela recepcionista que já posso entrar. Ele está sentado em sua cadeira e me olha entrar me pedindo para sentar.
— Boa tarde, Manuela. Como andam as coisas? Tem seguido tudo certinho?
— Boa tarde, doutor. Sim, fiz do jeito que o senhor me pediu, todos os dias durante este interminável mês.
—Não fale assim — ele me chama a atenção.
— Vamos lá, suba na balança para tirarmos a prova. — Ele ergue as sobrancelhas e continua com seu ar de riso. Alguém me lembre de dizer a ele depois de tudo isso, que eu odeio essa sua mania de ficar sorrindo enquanto nos avalia?
Subo na balança e chego até a cruzar os dedos fazendo uma oração em pensamento.
— Muito bom. Estou feliz com o resultado.
— Jura? E quantos quilos eu emagreci? — eu pergunto toda sorridente descendo da balança.
— Você eliminou dois quilos.
— O queeeeeee? — eu quase grito.
— Manuela, esse é um bom número.
— Que bom número, doutor, tá louco? Eu caminhei por duas horas todos os dias durante um longo mês e o senhor me diz que eliminei DOIS QUILOS? O senhor tá de gozação comigo, né?
— Manuela, você tem que entender que emagrecer engloba mudar antigos hábitos e um dos pontos é a alimentação. Se você não juntar todos os pontos não conseguirá ter um resultado rápido e satisfatório. Além do mais, o que você está fazendo ainda é pouco.
Juro que vou dar na cara dele. Pouco? Fecho minha cara imediatamente, carrasco. Viram só do que eu falo?
— Como pouco, doutor? — falo emburrada.
— Sim, pouco. Caminhar te fará muito bem para não ter problemas de pressão arterial. A caminhada te ajuda a criar ritmo e acelerar seu metabolismo, porém, só ela é pouco para alcançar o resultado que espera e precisa.
— O que mais quer que eu faça? Já comi aquele monte de verduras que me pediu e veja só, apenas dois míseros quilos. Estou inconformada.
— Não é só a salada que vai te trazer o resultado que espera, precisa seguir uma rigorosa dieta e aliá-la a exercícios, tipo hidroginástica ou frequentar uma academia.
— Mais essa ainda, doutor? Onde vou arrumar tempo?
— Quer mesmo que eu te responda isso?
— Não!
— Olha, pegue esse cartão, é de um amigo meu, ele tem uma academia com tudo o que você precisa no momento: orientação e acompanhamento com nutricionista. Tem vários tipos de modalidades de esporte, tenho certeza que encontrará um que te agrade.
— Doutor, com certeza deve ser caro, o senhor sabe... — Ele nem me deixa terminar.
— Diga que eu te indiquei, assim já terá um ótimo desconto.
Ele continua com a chatice da consulta e eu fico só ouvindo.
Saio da sala e ele me chama dizendo que esqueci o cartão em cima da mesa, volto meio sem graça para pegá-lo e enfio dentro da bolsa agradecendo.
Ao sair do consultório estou tão frustada com tudo e comigo mesma que paro em uma padaria e peço o maior pedaço de bolo. Tenho que descontar minha frustração em alguma coisa. Em meus livros hots a mocinha sempre desconta a frustração com sexo, algo que eu não posso, pois ainda não tive essa sorte. Estou me sentindo a Bridget Jones se afundando em seu pote de sorvete.
A cada garfada eu amaldiçoou doutor Carrasco. Mas, afinal, ele é culpado? Que se dane, para mim agora é. Alguém tem que ser culpado, então que seja ele.
Volto para casa me sentindo muito culpada por ter comido um pedaço tão grande de bolo, mas agora já foi, tomo um banho e me arrumo para o trabalho.
Em um certo momento tudo fica mais calmo então eu me lembro do cartão que o doutor me deu, o pego e leio.
Caio Santis de Luca
personal trainer.
Caio... caio... CAIO?
Acho muita coincidência. Procuro o cartão que ele mesmo me entregou, virgem santa! É o mesmo.
Será destino? Ou um empurrãozinho para realmente eu emagrecer?
Guardo os dois cartões e decido ir fazer uma visita na tal academia.
Acordo por volta das dez da manhã me recusando a me recriminar por não ter ido caminhar, se eu emagreci apenas dois quilos em um mês caminhando como uma besta, devo ter engordado uns oito só com o pedaço de bolo de ontem.
Tomo um banho e saio para conhecer a tal academia. Fico espantada ao ver o tamanho, com certeza deve ter até um hospital aí dentro. Sei que é exagero meu, mas realmente essa academia é grande e consequentemente deve ser cara e frequentada pelo povo de nariz em pé
, traduzindo, gente rica.
Entro e sou recepcionada por uma simpática morena que, obviamente, é magra, ela até que me oferece um bom atendimento não desfaz de mim por ser gordinha e não aparentar riqueza nenhuma.
Quando entrego o cartão e falo que foi o doutor que me indicou ela pega o interfone e fala baixinho e rapidamente com alguém, mas não consigo entender nada.
Ela me pede para aguardar uns minutinhos que irei fazer uma avaliação.
Aguardo sentada e vejo através do vidro uma linda jovem loira dando uma aula que aparentemente deve ser de dança.
— Manuela Sanchez.
Escuto meu nome e me viro e qual é minha surpresa ao ver o Caio segurando o cartão que o doutor me deu.
— Oi. — Eu tento dar um sorriso.
— Não veio com o cartão que eu te dei? — Ele parece chamar minha atenção.
— Por quê? O seu dava mais desconto? — falo tentando morder a minha própria língua grande.
Ele sorri e me estende a mão pedindo para o acompanhar.
Entramos em uma sala cheia de material de ginástica e há espelhos em todas as paredes.
— Manu, acho que posso continuar a te chamar assim, né?
— Claro! — Eu poderia ter colocado menos euforia na voz. Droga, estou nervosa.
Ele sorri, e que sorriso é esse, mãe de Deus?
— Bom, então vamos lá, vamos fazer sua avaliação.
— E o que seria isso?
— Vou tirar suas medidas, pesar e aí você irá fazer a avaliação dois que é com a nutricionista.
— Ok! — eu falo, mas, perai!!! Pesar?
— Ahh não, de novo?
— Sim preciso ter todos os seus dados para acompanharmos o seu desenvolvimento.
— E realmente preciso fazer isso? Não pode esperar e fazer depois?
— Não. Vem cá. — Ele pede para eu subir em um tipo de banquinho.
— Vou tirar suas medidas, ok?
E ele se agacha e coloca uma fita em volta das minhas pernas, faz algumas anotações e vai subindo medindo tudo. E eu estou quase morrendo de tanto embaraço por ter um homem tocando meu corpo.
Ele pede para eu descer, se ajoelha em minha frente e passa a fita em volta da minha cintura. Nesse momento ele segura com uma mão a fita e com a outra anota.
— Agora é o último, tá?!
— Ok — eu respondo.
Achando que o pior já tivesse passado, afinal, saber o tamanho da minha barriga é uma informação muito pessoal. Porém ele passa a fita por cima dos meus seios e nesse instante minha respiração congela. Ele está com os dois braços em volta de mim ajeitando a fita no melhor ponto, eu estou olhando em seu rosto que está tão próximo e sem querer mergulho naquele olhos azuis que me olha de forma tão profissional. Sinto sua colônia e é muito, muito gostosa. Fecho os olhos e peço para os anjos da guarda das gordinhas indefesas que me ajude, abro rapidamente os olhos ao ouvir abrirem a porta com tudo e vejo um par de olhos muito zangado sobre nós. Caio está segurando uma fita métrica sobre meus seios e isso é bem constrangedor.
Caio se vira e sorri para o recém-chegado.
— Augusto, precisa de algo?
AUGUSTO! Seu nome é Augusto.
— Não. Pode terminar, depois nos falamos. — Ele vira às costas e vai saindo, mas Caio o chama e pede para entrar.
Ele parece muito zangado. Passa o olhar por mim como se quisesse me xingar por estar ali.
— Augusto, queria te apresentar a nova aluna da academia, a Manu.
— Eu já conheço.
— Vocês já se conhecem?
— Sim.
— Não — falamos juntos.
— A vi no parque, esqueceu?
— É e depois disso me atropelou. — Por que eu tenho que ter uma língua tão grande? Eu penso ficando vermelha.
— Te atropelou? — pergunta Caio com olhos arregalados olhando de mim para ele, aguardando a resposta.
— É, não tenho culpa se ela anda bêbada por aí e não se aguentando sobre as pernas — ele fala querendo me enforcar com as próprias mãos.
— Bêbada é a sua..
— Bom, pelo que pude observar vocês já estão bem entrosados, então agora, Manu, é só fazer a avaliação com a nutricionista, ela vai tirar todas suas dúvidas e te orientar, ok? — Caio corta minha frase o que me faz olhar com olhos raivosos sobre o idiota presunçoso. Que sem perder