Educação, conhecimento e formação
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Sobre este e-book
acadêmica, sediados no Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Nove de Julho – Uninove, que atuam de forma independente e integrada. São eles: o Grupo de Pesquisa em Educação e Complexidade (Grupec), que desenvolve estudos e investigações tendo como ponto de partida o pensamento de Edgar Morin e suas relações com a educação e as inter-relações entre este autor e outros pensadores, realizando uma análise crítica do pensamento linear e da fragmentação do saber; e o Grupo de Pesquisa em Filosofia da Educação (Grupefe), cujas pesquisas se desenvolvem no âmbito de três relações entre educação e filosofia.
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Educação, conhecimento e formação - Cleide Rita Silvério de Almeida
Copyright © 2014 by Paco Editorial
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Coordenação Editorial: Kátia Ayache
Revisão: Stephanie Andreossi
Capa: Márcio Santana
Diagramação: Márcio Santana
Edição em Versão Impressa: 2014
Edição em Versão Digital: 2014
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Conselho Editorial
Profa. Dra. Andrea Domingues (UNIVAS/MG) (Lattes)
Prof. Dr. Antonio Cesar Galhardi (FATEC-SP) (Lattes)
Profa. Dra. Benedita Cássia Sant’anna (UNESP/ASSIS/SP) (Lattes)
Prof. Dr. Carlos Bauer (UNINOVE/SP) (Lattes)
Profa. Dra. Cristianne Famer Rocha (UFRGS/RS) (Lattes)
Prof. Dr. José Ricardo Caetano Costa (FURG/RS) (Lattes)
Prof. Dr. Luiz Fernando Gomes (UNISO/SP) (Lattes)
Profa. Dra. Milena Fernandes Oliveira (UNICAMP/SP) (Lattes)
Prof. Dr. Ricardo André Ferreira Martins (UNICENTRO-PR) (Lattes)
Prof. Dr. Romualdo Dias (UNESP/RIO CLARO/SP) (Lattes)
Profa. Dra. Thelma Lessa (UFSCAR/SP) (Lattes)
Prof. Dr. Victor Hugo Veppo Burgardt (UNIPAMPA/RS) (Lattes)
Prof. Dr. Eraldo Leme Batista (UNIOESTE-PR) (Lattes)
Prof. Dr. Antonio Carlos Giuliani (UNIMEP-Piracicaba-SP) (Lattes)
Paco Editorial
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Sumário
Folha de Rosto
Página de Créditos
Prefácio
PARTE 1: DESAFIOS
1. O desafio da formação docente frente à dialética entre identidade e alteridade no processo educativo
Introdução
Ensino e educação como mediações da formação humana
Da mediação como categoria filosófica
A contribuição dos componentes curriculares do campo psicológico
A contribuição dos componentes disciplinares do campo antropossocio-histórico
Três grandes armadilhas...
Conclusão
Referências
2. Desafios do humano na sociedade contemporânea
Introdução
Primeira parte: o que é comum ao humano
Segunda parte: a diversidade
Terceira parte: possibilidades de respostas educacionais aos desafios
Referências
3. Entrevista, escuta e compreensão: elementos metodológicos da história oral
O mundo globalizado e a escuta do sujeito
A história oral como método
Referências
PARTE 2: DIÁLOGOS
4. Educação e Literatura: a literatura regional no ensino médio: um estudo sobre a obra de Roberto Drummond na cidade de Ferros/MG
Introdução
1. O autor e a cidade: a obra e o imaginário
2. A cidade na obra e o autor na cidade: representações
3. Sobre o mito antidrummondiano
– à guisa de conclusão
Referências
5. Cinema e identificação: uma relação complexa
Um pouco de história
A sedução do cinema: algumas possibilidades
O fascínio do cinema
Referências
6. A educação da mulher nordestina no filme Vida Maria
Introdução
Bases teóricas: educação, linguagem, cultura e subjetividade
À guisa de análise do filme Vida Maria
Considerações finais
Referências
PARTE 3: PERSPECTIVAS
7. Noção de representação na perspectiva do pensamento complexo de Edgar Morin
Isolamento e continentalidade
Representação e pensamento complexo
Diferenças e semelhanças
Referências
8. Considerações e articulações a partir do pensamento complexo
Introdução
Os desafios ou entre o confinamento e a abertura
O acúmulo desorganizado ou a cabeça bem cheia
A condição humana
Referências
9. As faces da dialógica humana: sapiens e demens na autoformação
Introdução
O sapiens/demens
Prosaico e poético constituindo contextos da autoformação
Os múltiplos Homo
Algumas considerações
Referências
10. Compreender para Educar e Educar para Compreender
1. Começando a caminhada
2 A compreensão no pensamento complexo
3. Educar para o perdão
4. Educar para a solidariedade
Conclusão
Referências
PARTE 4: CAMINHOS
11. Sobre felicidade
Referências
12. Formando para a cidadania: a prática educativa tecida no diálogo da escola com a comunidade
Introdução
1. A vida cidadã numa sociedade democrática
2. A educação para a cidadania e para a democracia
3. A prática educativa como diálogo entre a escola e a comunidade: formar, conscientizar, motivar e mobilizar
Considerações Finais
Referências
13. O sentido da formação crítica na aprendizagem da filosofia e sua realidade no ensino médio
A realidade escolar
A Teoria crítica e sua contribuição para o ensino de Filosofia
Conclusão
Referências
Sobre os Autores
Paco Editorial
Prefácio
O maior empobrecimento provém da falta de ideias, da erosão da criatividade e da ausência de debate produtivo. Mais do que pobres, tornamo-nos inférteis.
¹
O pensamento de Mia Couto escolhido como epígrafe para este prefácio indica o espírito que nos mobiliza: a provocação do debate, a capacidade de manter as ideias em diálogo e a disponibilidade de troca.
A vida acadêmica nos torna itinerantes porque sempre estamos em contato com estudantes que ingressam a cada período, novas problematizações e propostas, olhares e abordagens diversas, fazendo-nos lembrar de Manoel de Barros, quando diz: Quem anda no trilho é trem de ferro. Sou água que corre entre pedras: – liberdade caça jeito
². E, do nosso ponto de vista, o bonito é isso, porque, de certa forma, andamos nos trilhos institucionais, nos trilhos das agências de fomento e dos órgãos que regulam nossa prática, mas, apesar de tudo, guardamos a itinerância.
Entendemos poder expressar tal condição dividindo os 13 capítulos do presente livro nos seguintes movimentos: Desafios, Diálogos, Perspectivas e Caminhos. Essas palavras expressam não só partes, mas fundamentalmente a dinâmica cotidiana de trabalho, pois a medida em que enfrentamos desafios e buscamos compreendê-los não nos furtamos ao diálogo com a Ciência, a Literatura e as Artes; estudamos e investigamos para traçar perspectivas para a educação e sabemos que nossos caminhos são construídos a cada dia, passo a passo.
Esta movimentação é marcada também pela presença ativa de dois grupos que atuam, ao mesmo tempo, de forma independente e integrada: o Grupo de Pesquisa em Educação e Complexidade (Grupec), que desenvolve estudos e investigações tendo como ponto de partida o pensamento de Edgar Morin e suas relações com a Educação e busca as fontes e as relações desse autor com outros pensadores, realizando análise crítica do pensamento linear e da fragmentação do saber; e o Grupo de Pesquisa em Filosofia da Educação (Grupefe), cujas pesquisas se desenvolvem no âmbito de três relações possíveis entre Educação e Filosofia. Em uma primeira perspectiva, tomando a Filosofia como processo de reflexão que pensa a Educação e que busca sentidos ou significados para a própria ação educativa no contexto da busca do significado da realidade e da própria existência humana; em uma segunda perspectiva, considerando a Filosofia como conteúdo necessário à formação dos educadores, uma vez que lhes cabe decidir quais caminhos pretendem oferecer aos sujeitos humanos de cuja formação são mediadores; uma terceira perspectiva, assumindo a Filosofia como componente fundamental na formação de crianças e jovens.
Os grupos são alimentados pelo seu programa de pesquisa com os respectivos projetos, com as disciplinas, seminários, atividades, missões acadêmicas, na participação e realização de eventos, e este exercício itinerante, como apontamos acima, é que carimba e renova nosso passaporte no território da reflexão e dos problemas que a realidade nos apresenta. Entendemos que a iniciativa deste livro é mais um passo na direção de captar e compreender os lugares e espaços em que a educação se desenrola ou, como diz Guimarães Rosa: Eu queria decifrar as coisas que são importantes. E estou contando não é uma vida de sertanejo, seja se for jagunço, mas a matéria vertente
³. Acreditamos que quando elaboramos uma publicação é para atingir a matéria vertente
.
Assim, esperamos trazer contribuições, ampliar indagações e propor novos entrelaçamentos.
As organizadoras
1. Couto, Mia. Pensatempos. Moçambique: Ndjira, 2005. p. 11.
2. Barros, Manoel de. Matéria de poesia. Rio de Janeiro: Record, 2007. p. 32.
3.Rosa, João Guimarães. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1970. p. 79.
PARTE 1: DESAFIOS
O filósofo Kierkegaard me ensinou que cultura é o caminho que o homem percorre para se conhecer. Sócrates fez o seu caminho de cultura e ao fim falou que só sabia que não sabia nada. Não tinha certezas científicas. Mas que aprendera coisas dimenor com a natureza. Aprendeu que as folhas das árvores servem para nos ensinar a cair sem alardes.
Manoel de Barros¹
1. O desafio da formação docente frente à dialética entre identidade e alteridade no processo educativo
Antônio Joaquim Severino
Uninove/Feusp
Introdução
Diante da tarefa da formação humana, da qual a Educação é via institucional privilegiada, mediações curriculares pluridisciplinares dos campos psicológico e histórico social se fazem imprescindíveis na preparação profissional dos educadores, dada a complexidade da condição constitutiva do sujeito humano a educar. É que estamos diante de um ente que precisa se realizar numa condição aparentemente contraditória: ao mesmo tempo em que sua realização supõe sua identidade como sujeito pessoal, afirmando sua autonomia, precisa igualmente, sob a mesma força de exigência, realizar-se como ser social, reconhecendo e acolhendo a presença da heteronomia.
Eis aí uma articulação radicalmente dialética em que os opostos têm que se unir numa dimensão unificante, a da realização de uma personalidade individual autônoma ao mesmo tempo que de um sujeito umbilicalmente inserido na tessitura dinâmica da vida social, de tal modo que, em princípio, cada um de nós deveria sempre dizer que eu sou eu mesmo mas também o outro de mim
. Trata-se de reafirmar, com marcação incisiva, que não há identidade sem a presença forte da alteridade. Estamos frente ao conflito estrutural da condição humana, pois autonomia quer dizer necessariamente capacidade de autodeterminação, de não submissão a forças externas, enquanto que reconhecer dependência em relação à alteridade é afirmar a presença da heteronomia.
Integrar a dinâmica da vida social, viver em sociedade, é necessidade insuperável da condição humana. É uma necessidade que vai muito além dos laços biológicos que definem a própria vida orgânica imposta pela corporeidade constitutiva de nosso ser². Os laços sociais que vinculam os integrantes da espécie humana não se tecem apenas no âmbito da vida natural, mas se colocam, com igual intensidade, no âmbito da vida cultural, o que gera uma dependência bem específica de nossa espécie.
O viver de forma interdependente, no seio da sociedade, nos coloca frente ao outro. Gera a posição de uma alteridade diante do eu. O eu é então colocado numa condição de ser si mesmo e de ser o outro de si mesmo. Só que o outro é também um si mesmo, em busca de sua própria autonomia. Daí a emergência constitutiva do conflito, pois a presença do outro, ao mesmo tempo que é constitutiva do eu, representa para ele uma ameaça permanente, assim como o eu é também ameaça para o outro de si. Vale dizer então que a inserção da pessoa no seio da sociedade não se dá de forma mecânica ou harmoniosa. É sempre muito conflituosa.
Essa ambiguidade da condição humana tem sido preocupação marcante da reflexão filosófica contemporânea. Não sem razão. Passada a fase da hegemonia da Metafísica e da Teologia, quando estava em pauta uma concepção da natureza humana como uma essência eterna, como fonte de referência segura para os modos de ser e de agir dos homens, eis que estes se encontram agora mais esclarecidos sobre sua própria condição que não se lastreia numa essencialidade segura e definitiva. O seu modo de ser vai se constituindo num devir contingente, na fluidez de uma temporalidade marcada por radical historicidade, donde seu maior desafio não é saber o que é, mas como agir, o que fazer... e muito intensamente a busca do como conviver com seus semelhantes, no seio da sociedade, já que seu agir se dá sempre na interface com o agir do outro de si.
Por isso mesmo, muitos pensadores contemporâneos tematizam a questão da relação inter-humana em suas elaborações filosóficas. Na verdade, é toda a Filosofia do século XX que é sensível à condição humana de compartilhamento de um destino comum, da exigência de um convívio solidário e mais equitativo entre todos os homens. Apenas à guisa de exemplos, faço uma breve referência a alguns deles que, ao sistematizarem suas reflexões, nos subsidiam na aproximação da questão da alteridade.
Buber (Eu e Tu, 1923) defende que o existir dos homens instaura-se sobre a comunicação, processo fundamental de intersubjetividade, que se expressa no relacionamento mutuamente implicativo entre o Eu e o Tu. A presença da alteridade é vista como constitutiva do ser da pessoa. Essa relação dialógica se tece pela presença, pela reciprocidade, pela imediatez e pela responsabilidade.
Para Lévinas (1988; 1989), ser humano é ser para o outro. É nessa relação de abertura e escuta em relação a outrem que ele funda toda a ética que, por isso mesmo, torna-se filosofia primeira, ontologia. Embora entre o eu e o outro exista uma separação radical, o que faz do outro um estranho, um desconhecido, o encontro com ele é possível e necessário. Ele pode ser acolhido. É que no rosto do outro toda a humanidade se manifesta, se apresenta, fazendo-nos todos iguais em dignidade. O rosto do outro nos interpela, compromissando-nos com uma responsabilidade solidária. Aí se funda toda ética. É esse compromisso que consolida nossa identidade.
Em consonância com Lévinas, Dussel igualmente prioriza a ética em relação à ontologia. E o fundamento da ética é a alteridade, pois é o outro, da sua exterioridade, da sua exclusão, que interpela a liberdade do eu. O outro é o pedagogo da justiça. Daí o compromisso fundamental ser com a libertação, pois só com a libertação de todos, o eu se libertará também. O outro se apresenta como mistério inesgotável. Ouvir o seu clamor, por posicionamento ético, é praticar um ato de justiça. Só assim ocorre a humanização.
Mounier (O Personalismo, 1950) insiste que a experiência fundamental da pessoa é a comunicação que é fundada na experiência da segunda pessoa. Por isso, chega a dizer que ser é amar, pois a pessoa só existe na medida em que existe para os outros. Descreve como originais e próprios dessa situação de recolhimento e ruptura os seguintes atos: saída de si mesmo, a compreensão como tentativa de abraçar a singularidade do outro a partir de nossa própria singularidade, a retomada sobre si da pena e do sofrimento do outro, a doação gratuita e generosa no compartilhamento dos dons e, finalmente, a fidelidade como continuidade criadora dessa relação.
Preocupado com a realidade do mal, também Ricoeur enfatiza a exigência ética, reafirmando a necessidade do acolhimento do outro, da alteridade frente ao eu, em função do que a ética sintetiza na diretriz de se viver bem com e para os outros em instituições justas. Na sua concepção, estão presentes todos os elementos fundamentais da vivência ética ou da eticidade da existência humana: a sensibilidade do sujeito pessoal aos valores fundados na dignidade da condição de pessoa autônoma; a presença e a interação com o outro, o dado da alteridade, em que o outro se coloca como igualmente sujeito pessoal dotado de igual dignidade; a objetividade das circunstâncias da vida e a necessidade das instâncias institucionais como região e garantia das normas da convivência com outros, numa relação de justiça, e, finalmente, a necessidade e a capacidade de todos de formularem um juízo moral situado.
Entre nós, Paulo Freire (1987), abordando o processo educativo, tematizou a relação docente, sustentando-a sobre a relação dialógica que deve prevalecer na relação entre o educador e o educando. Toda educação precisa realizar-se como processo mediador de emancipação, sem o que ela não se legitima.
Com toda razão, essa preocupação e afirmação da alteridade suscita o equacionamento ético, pois a ética, que recobre o agir humano desde o seu mais íntimo sentido, surge no exercício da ação interpessoal, ou seja, ela só se põe quando está em pauta o agir do eu em relação a um outro e aos outros. É a necessidade de se respeitar o outro, de não feri-lo em sua dignidade, de investir na sua emancipação que coloca o questionamento ético de nossas ações. Por sinal, é essa dignidade da pessoa humana que fundamenta todo valor ético.
A educação, sendo uma modalidade de ação, intrinsecamente vinculada à existência do outro, exercendo uma intervenção direta na vida do outro, traz, em seu proceder, um risco muito grande de atingir a identidade e de ferir a dignidade do outro, do educando, alvo da ação pedagógica. A exigência da eticidade assume dimensão radical na prática educativa. E, por consequência, a ética se torna igualmente exigência radical na formação do agente da educação, na formação do educador (Severino, 2001; 2011).
Ensino e educação como mediações da formação humana
E nessa dialética do eu e do outro, fica demandada uma sensibilidade que cabe ser desenvolvida no processo educativo do qual os componentes curriculares são mediações fundamentais³. Vale dizer que, enquanto mediações de natureza epistêmica, esses componentes precisam atuar conjuntamente, articulando suas contribuições específicas.
Da mediação como categoria filosófica
Mas antes de entrar no mérito desta questão, impõe-se esclarecer o sentido em que está sendo tomada aqui a categoria de mediação, categoria fundamental na argumentação filosófica. Por mediação deve-se entender todo processo, ação, cuja finalidade são se esgota em si mesma, quando essa finalidade está em outro processo ou ação. Trata-se assim de uma categoria simultaneamente lógica e ontológica que explica uma relação entre polos antinômicos ou prática vinculatória de estruturas diferentes. É o caso do ensino-aprendizagem: embora ele tenha finalidade própria [o professor transmitir ao aprendiz determinados elementos que se espera sejam apropriados por ele], sua finalidade maior é a educação, a formação do aprendiz. Trata-se de uma finalidade mediata que se sobrepõe à finalidade imediata do processo de ensinar. Por sua vez, o currículo, como conjunto de atividades didático-pedagógicas concretas atua como mediação dos processos de ensinar e aprender. A realização de atividades mediadoras é imprescindível para que ocorram os efeitos da atividade mediada.
No caso do existir humano marcado pelo envolvimento da dimensão simbólica, no seu modo de agir, mediações concretas, objetivas, imediatas se fazem necessárias, mas só se sustentam pelo sentido subjetivado de que são portadoras, pois só dessa maneira adquirem status especificamente humano. Se não referidas e vinculadas a essas finalidades, a significações subjetivadas, elas se tornam atos puramente mecânicos. Daí se dizer que o agir humano se guia por intencionalidades. Trata-se sempre de um agir intencional e não mecânico.
Desse modo, os componentes curriculares são importantes mediações do processo de ensino-aprendizagem. Mas esse processo só se efetiva se estiver atuando como mediação do processo formativo, não se legitimando apenas pela sua condição objetivada, ou seja, como mero repasse de informações. O elemento mediador é sempre portador de uma outra intencionalidade que se situa além de sua funcionalidade imediata.
Podemos generalizar essa perspectivação explicitando a relação entre os conteúdos informativos trabalhados no ensino como mediadores do conhecimento e o próprio processo do conhecer formativo. O que forma o aprendiz é o processo do conhecimento, mas esse processo não pode ocorrer sem a mediação de conteúdos conhecidos. Daí a necessidade e a relevância do currículo como conjunto sistematizado de componentes disciplinares, portadores de conteúdos informativos que se tornam então mediadores da formação.
É por isso mesmo que se faz correta e procedente a distinção que se estabelece entre informação e formação, entre instrução e educação, em que pese o costume do senso comum em tomar estes termos como sinônimos. Mas, por outro lado, é preciso atentar que essa distinção não é absoluta, pois a educação, a formação, depende de mediações concretas, objetivas, como é bem o caso do ensino. A instrução nunca é pura mecanicidade exatamente porque é mediadora da formação, portadora de intencionalidades formativas. A transcendência marcada pela intencionalidade da formação encarna-se integralmente na imanência das atividades do ensino. Isto posto, impõe-se insistir em que as atividades de ensino-aprendizagem, de aplicação das atividades e conteúdos curriculares, só se legitimam se direcionadas à formação do aprendiz, pois quando se tem em vista a educação, o que está em pauta é a formação do sujeito humano, a ser entendida como aquele processo mediante o qual ele passa da condição de indivíduo puramente natural para aquela de pessoa intensamente cultural. Em que pese todo o cuidado necessário quando nos referimos à natureza em contraponto à cultura, impondo-se uma cautelosa atitude crítica frente às ressonâncias metafísicas desse modo de falar, dessa transição da imanência no universo das determinações naturais para a transcendência cultural, é uma metáfora adequada para expressar esse processo típico do modo de ser mais especificamente humano.
Trata-se, fundamentalmente, do processo do devir humano como devir humanizador, mediante o qual o indivíduo natural vai se tornando um ser cultural, uma pessoa. É o que o verbo formar tenta expressar, em seus múltiplos sentidos: constituir, compor, ordenar, fundar, criar, instruir-se, colocar-se ao lado de, desenvolver-se, dar-se um ser.
Assim, por formação, cabe entender o alcance