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Degeneração
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Degeneração
E-book238 páginas3 horas

Degeneração

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Sobre este e-book

Com uma narrativa seca e dura, Degeneração é um romance sobre o atual momento do país, desde a ditudatura militar até seus reflexos na ascensão de Bolsonaro ao poder.
 
Fernando Bonassi, roteirista, dramaturgo e escritor, é uma das vozes contemporâneas mais importantes que temos. Seus textos — roteiros, peças, romances e contos — registram, sob o olhar privilegiado de quem conhece as mazelas da sociedade brasileira, os vários revezes pelos quais o Brasil passou. Degeneração, seu novo romance, narra a saga de um filho que precisa liberar o corpo do pai que acaba de morrer e está no necrotério de um hospital público de São Paulo, às vésperas da eleição que colocará Jair Bolsonaro e a extrema direita no poder.
A partir desse pano de fundo, o narrador-personagem se vê então diante de um confronto íntimo protagonizado pela figura do pai, o que o leva a fazer uma retrospectiva da história dos dois, de sua infância, remontando desde a um episódio traumático a que o pai o submeteu até a descoberta de que o mesmo, na ditadura, agiu como delator e assistente de torturadores, colaborando para um batalhão da PM.
Degeneração é o retrato dos subúrbios brasileiros, habitados por uma classe média baixa que luta, se defende e sobrevive com todas as armas que possui, flagelada pela violência e pela falta de perspectivas. É também uma leitura contundente sobre a história do Brasil, da ditadura ao momento atual, em que o país permitiu a ascensão de Bolsonaro, da extrema direita e das milícias ao poder.
IdiomaPortuguês
EditoraRecord
Data de lançamento14 de jun. de 2021
ISBN9786555873023
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    Degeneração - Fernando Bonassi

    Prólogo

    O dia que você me escolhe é justo esta sexta-feira: estamos todos encurralados dentro dos carros no congestionamento monstro. De súbito um alarido nervoso os precede e logo são dois que passam apressados, com os chinelos de dedo batendo no asfalto da avenida Radial Leste. Os chinelos são daqueles que não saem de moda, não arrebentam e não fedem nunca, mas também não servem para correr como queriam. Estão perdendo terreno para os inimigos – e nem é de hoje, a bem dizer. São vítimas das circunstâncias, até certo ponto. Estão cercados neste momento, eles sabem, mas avançam na direção do seu destino olhando assustados por cima dos ombros, tropeçando desembestados, dando mais trabalho a uma comunidade cansada de salário que vem logo atrás, animada com paus e pedras, uma história ultrajante para si e outra de azar para os fugitivos, culpados ou inocentes – não faz diferença –, que acabam levando rasteira e caindo no meio da pista, entre os carros entalados. A velha Radial Leste foi transformada em terra de ninguém outra vez, beco sem saída de tanta esperança neste dia que se repete e se fecha, enquanto homens e mulheres de todas as idades se aproximam e se aglomeram excitados com o primeiro golpe, que não tarda a vir e confirmar o seu desejo de justiça. Todos os presentes, democraticamente, acertam os dois homens com o que têm à mão e, à falta disso, com os punhos cerrados mesmo, puxam-lhes os cabelos, dão-lhes chutes na canela, pontapés no estômago, no nariz, no olho, nos lados da cabeça. Sai sangue das orelhas, da boca, da língua, de onde estou eu vejo. E me encolho no banco, atrás do vidro escuro. Os homens caídos não falam nada. Nem se defendem mais. As suas costas e as quatro pernas são vergastadas com ripas e cabos de vassoura até a carne viva lhes surgir por debaixo da pele. Um homem de bem desce do carro. Não eu. E intervém, pedindo calma, juízo, humanidade, que seja, mas só é ouvido depois que os homens linchados estão quase desacordados, à nossa frente.

    Por enquanto vocês são apenas linchadores, mas logo serão assassinos! – avisa, brandindo o telefone celular. E, por temerem mais a nossa justiça do que a própria violência, os atacantes, os linchadores, se dissipam. O tal homem de bem que acudiu os feridos, os linchados, ele quer chamar a polícia, uma ambulância que seja, mas os dois combalidos não permitem, se levantam com dificuldade, dizem que está tudo certo, que mereceram, e se afastam eles também, misturando-se ao tráfego de carros e de gente.

    1.

    Sexta-feira: quatrocentos quilômetros de congestionamento no horário de pico. Quatro quilômetros por hora na Radial Leste, sentido bairro. Quarenta e dois reais o período no estacionamento do pronto-socorro dos italianos (a descoberto, sem seguro e sem manobrista). Ficar parado estava custando mais caro do que se pôr em movimento e parece que todo o país tinha entendido esta mensagem: no próximo domingo elegeremos para o cargo de presidente da República um capitão reformado do exército que sente saudade da ditadura. Também por isso, aí onde você está, eu imagino que sorri. Você ainda deve estar sorrindo, a bem dizer, no estado em que se encontra.

    Temos muito o que andar para trás – posso ouvir você a dar risada. Eu rio com a devida tristeza, tristeza desta minha época que até me amarga a boca... Mas uma coisa é certa: o seu timing foi perfeito.

    Estamos irremediavelmente presos a esta cidade horrível, com artérias engorduradas de cimento e de fumaça, inacabada desde sempre e virada de costas para a própria paisagem. É também um bairro de gente estúpida, de outra época, e que está ficando velha, cada vez mais velha, caduca e desentendida a cada momento. Em cima do morro do Oratório, o hospital de um convênio moribundo, renegado pelos próprios médicos contratados, coisa que um delegado no Sapopemba tinha sugerido ao velho quando ele ainda frequentava a décima oitava delegacia para assistir às sessões de espancamento.

    Boa noite! – disse a moça-sorriso na recepção. Faço parte da equipe de atendimento – mais sorrisos de recepção: em que posso servi-lo?

    É que morreu um desgraçado, eu vou dizer logo. Morreu aqui, neste hospital, um ser humano desprezível, um espírito de porco miserável. Foi criado e desenvolveu-se neste mesmo bairro em que estamos, entre o fedor de parmesão e de cachaça, de vermute e de oficinas mecânicas, de molho de tomate e de sucata, antes que esses pombais ocupassem os últimos terrenos do Estado, amontoando os nordestinos esfolados por cima de tudo, todos eles, nacionais e estrangeiros nesses apartamentos a longo prazo que de tão pequenos se janta na varanda, contemplando a terra de ninguém de onde vieram e à qual poucos desejam voltar, em qualquer tempo...

    Eu mesmo vou dizer só vim aqui porque me mandaram. E, diante disso, por certo que a moça do sorriso postiço vai ficar com aquilo meio que pregado na cara, meio que se soltando, desorientada em sua etiqueta decorada, fingindo que não entende a minha língua, a nossa língua de casa, e, torcendo a cara num novo riso de programa de treinamento, vai pedir para eu repetir o que eu disse, e eu vou dizer...

    Morreu um cidadão miserável, um velho desprezível... eu vou dizer. Eu vim pela morte de um estelionatário, para identificar o corpo de um colaborador da polícia, liberar – ou liderar, acho – a cremação de um ganso, um X-9 de padaria, a bem dizer: vim para fazer retornar ao pó de onde veio um parente pervertido, um marido desertor, eu diria... Vou dizer que isso não é uma coisa para se comemorar, mas tinha morrido um maledetto naquele dia, um farabutto de primeira linha, sim senhora, naquele bairro de aparência inofensiva para quem chega, ou para quem, como ela, só vem trabalhar, mas que de verdade esconde uma longa história criminosa de agressões e tiroteios cometidos por limítrofes iletrados e puxa-sacos da polícia, caserna de torturadores de subdistrito, italianos sabujos, brasileiros de todos os tipos, perdoados pela lei do Estado e aposentados com salários integrais desde a época da democracia, com a qual nunca combinaram. Estes funcionários públicos... Somos funcionários públicos, sim – repetem com orgulho repugnante, na mão a carteirinha do convênio médico do governo, neste armazém de necessidades, mais um local de infelicidades, de tensão e de piores expectativas, a bem dizer, do que um lugar de cura e de alívio, este cemitério anunciado, eu diria... Vou afirmar que por mim mesmo eu nem viria, que eu preferia passar o final de semana em família, por mais repetitivo que isto fosse, mas é como eu disse, me mandaram vir, é responsabilidade minha a sua carcaça: estou obrigado a dar fim nela. Então eu vou falar: hoje, ou ontem, não sei, morreu aqui o filho da puta do meu pai...

    Olha o respeito, homem! – ouvi algo estranho ou o vulto de alguém resmungar por mim, contra mim, às minhas costas. Eu já estava acostumado com essas vozes do passado, assim como a não dizer o que devia ser dito em cada momento. Por isso e por aquilo eu fiquei calado, esperando resignado pelo que fosse a minha vez...

    (...)

    Esperei bastante, de fato. Esperei com gosto, até. Pensei: agora não faz mal, agora ele está morto! E ria da besteira óbvia a que se reduzia tudo aquilo, isso... Não tinha mesmo mais urgência para ele, pelo menos. Só para mim: embora as leis trabalhistas me assegurem o direito a um atestado médico e ao pagamento das horas ou dias parados que fossem empregados nessa perda de tempo...

    Onde estão esses malditos doutores? – perguntam os clientes, pacientes e acompanhantes, com estas e outras aspas e palavras. Eu observo esse aglomerado de gente estropiada e mal vivida, com a cara cheia de vincos e a barriga cheia de roncos, protestando diante dos sorrisos postiços que se multiplicam em novas bocas uniformizadas, novas moças convocadas e treinadas de emergência, postas em guarda, na recepção, sorrindo, armadas: mas são recepcionistas ou seguranças?

    Eu gozava de boa saúde até onde soubesse e via o quanto os doentes daquele bairro se contorciam, mas gostavam de reclamar. A energia que empregavam naquilo. Sofriam com moléstias, fraturas, anemia, falta de leitura e ressentimento. Reclamavam de esperar por lá havia muito tempo pela solução dos seus males; que hoje, como sempre, tinham levado até ali as suas velhas doenças, para serem mal ou bem cuidadas pelos profissionais de saúde daquela área, mas que ainda não havia aparecido ninguém capaz de ajudar, qualquer especialista para lidar com o inchaço, o vazio deles, nenhum daqueles miseráveis havia sido confortado. Entendi que era uma espera tediosa, dolorosa mesmo, e que ameaçavam explodir a qualquer instante, brandindo as folhinhas puídas com os seus números de senhas, há muito expiradas, como se fossem armas brancas, espadas...

    Mentira! Jogo de cena! – percebi logo em seguida. Eu vi sim é que tinham medo de criar confusão, porque enquanto protestavam com aquela aparente fúria, aquela aparente indignação, eles conferiam e reconferiam covardemente os números impressos nos papéis puídos de suor, diante de painéis eletrônicos cegos e mudos aos seus desejos. Não era de duvidar que rezassem para que algo acontecesse. Rezavam sempre, o tipo de gente que éramos, com vários trejeitos e diversos idiomas, mas para quem, meu Deus?

    O senhor também precisa de uma senha para ser atendido...

    Porra! – exclamei por dentro: não ouso dizer o que penso, ainda mais nestes termos, também. Em especial diante de estranhos. Ao contrário, sorri imitando o riso frouxo das seguranças de recepção e voltei pelo caminho em que tinha entrado, afetando serenidade, até encontrar a máquina que cuspia os papeizinhos com os números de senha. Respondi todas as perguntas da máquina com mentiras deslavadas. Disse que era mais velho, que estava sofrendo de algo incompreensível, mas que podia ser grave, que havia uma extrema urgência naquilo que me trazia ali, sim, emergência, no meu caso, do meu pai, não lembro: favor retirar a senha...

    Sei que eu ganhei um papel novo, vermelho vivo: senha preferencial.

    Sentei-me reconfortado. Havia muitos lugares para sentar-se, e cadeiras empilhadas num canto, para os horários de rush da espera. Contava esperar pouco, agora, e que a confusão na recepção do hospital se acalmasse; que os mais aflitos dentre os desesperados fossem logo atendidos, de qualquer jeito que fosse, mas não foi o que aconteceu. Alternavam-se na zanga os maiores impotentes, os piores dentre os pobres coitados, problemas físicos, doentes mentais, esfomeados e outros feridos nas feridas infecciosas desta cidade rabugenta, racista e xenófoba – todos numa triste, burra e única súplica coletiva no balcão daquele hospital de periferia... mas apenas água gelada em copos descartáveis, santinhos com a reza de Santo Expedito e sorrisos condicionados em cursinhos técnicos eram distribuídos para o consolo destes pacientes...

    Siamo tutti fottuti! – percebem, resignados.

    Sim, pois não! – respondem sorridentes os funcionários e funcionárias da recepção. Está claro que os médicos de verdade estão ocupados com casos muito mais graves, ou mais interessantes e lucrativos do que estes... os do tipo de gente que somos.

    2.

    Agora faz um ano da morte da sua mãe, lembra? Do coração, também, como de hábito na nossa família.

    É o maior cemitério da América Latina – você me assegura, proclama, a bem dizer, dentro do ônibus lotado, a caminho da Vila Formosa. Compreendo essa linguagem superlativa. Todos a usam. Desde o berço, na escola, nas igrejas. Nos cursos profissionalizantes e nas fábricas também, depois. É a época em que somos os maiores do mundo: o maior estádio, a maior hidrelétrica, os maiores cemitérios, as maiores injustiças, os maiores torturadores, violadores, desaparecimentos e estupros em escala criminal nos quartéis das forças armadas nacionais e nas delegacias de polícia dos estados. Vila Formosa – que não se percam vocês pela doçura desse nome –, em cujos muros sujos do cemitério ainda hoje é servida a prostituição mais barata da Zona Leste, acompanhada de drinques à base de groselha e metanol, populações fantasmas, mortos-vivos de uma cidade sitiada por dentro, gradeados que estamos todos, presos ao mundo em que vivemos: as grades servem para não entrar ou para não sair?

    Lá estou eu pendurado pela esquerda na sua mão direita muito alta, alçado de um lado para o outro como se eu estivesse num varal, o que me causa aquela, esta dor no ombro, ainda hoje, na ponta dos pés, os dedos suados e esmagados entre os seus, os tendões saltados como o barbante de um embrulho – é o que eu vejo ao olhar para o seu lado, sofro para acompanhar o passo, tropeço, eu lembro – mas nem então, nem agora que já não adianta mais, eu vou lhe confessar os meus incômodos antigos.

    Descemos do ônibus num ambiente gorduroso e encardido, de velas queimadas até os ossos. Flores velhas em caçambas de lixo adocicavam a dieta dos insetos. Urina de bêbados e de cachorros minavam riachos fedidos da parede à calçada. Imagens de santos lavradas em gesso e escapulários. Coroas grandes, médias e pequenas, bandeiras e brasões de times de futebol, fitas coloridas com lembranças de seu filho, seu marido, sua mãe – são muitos os meninos que morrem nessa região. Comida a quilo cozida e recozida em bacias de alumínio, cachaça, frituras e fermentação... Mas foi quando cruzamos os portões de entrada do cemitério que aquele novo mundo se revelou de uma vez. Fiquei maravilhado com a planura imensa. A face inteira da lua, oferecida aos meus olhos de criança. A terra quase nua, virgem de alicerces, de prédios, de fábricas. Eu nunca tinha visto tão longe, nem tanto infinito.

    Feito o mar aberto – é como eu digo, criado com os horizontes trancados em apartamentos minúsculos como túmulos. Você me guia, me arrasta, a bem dizer, por essas avenidas largas e vazias – proibidas ao tráfego de veículos (exceto oficiais e de agências funerárias), alamedas asfaltadas que se interligam por rotatórias das quais saltam oito patas, pernas desconjuntadas, ruas de terra batida, molhadas aqui e ali por carros-pipa, para a poeira não subir e cegar ou asfixiar os que sobrevivem, mas os flocos daquela terra suja, mesmo molhada para grudar no chão, teimavam em soprar na nossa cara, eu sinto como se fosse hoje, pedrinhas jogadas espetando a minha cara, e tudo isso numa rede de vielas que costuram, ou costuravam, terrenos que juntam São Mateus com São Caetano, Guarulhos com Parque São Lucas e Santos, e o mar, mais embaixo.

    Acontece que o maior cemitério da América Latina é um deserto também, faz calor e toda essa gente morta que habita estas casinhas deitadas, casamatas, estavam, estão, apodrecendo, eu pensava, penso, como você mesmo a partir de agora. Imagino os vermes em atividade frenética transportando pedacinhos de carne velha em túneis de vietcongues sob os nossos pés.

    Tudo se transforma – compreendo então, fora de hora, como se estivesse numa aula de ciências. É aí que você para. Estamos na quadra 53 do cemitério da Vila Formosa, onde já passam de 30 mil os cadáveres enterrados nesta época. Procuramos pela minha avó. É a parte nobre de um cemitério de pobres, com mortos identificados por fotografias impressas em cerâmica, lápides de cimento com citações de salmos, covas bem arrumadas, com grama a delimitar o espaço de cada uma delas, flores frescas em vasos de plástico – a velha comunidade católica praticante desta área, mais ligada à morte do que à vida, como sempre. Enfim você me larga. Como se tivesse encontrado alguém.

    Oi, mamãe, você está bem? – você diz olhando para baixo, para o centro da terra da Vila Formosa, para minha avó, como se ela fosse responder lá do inferno. Você reza, eu acho. Fecha os olhos, balbucia qualquer coisa. Eu deveria imitar, mas o que me chama atenção não é a sua mãe morta – ela que, ao morrer, ficou grudada em mim, atracada à minha mão, me lembro da dor nos dedos, no ombro, como se fosse hoje, me puxando, já morta na cama, esperando para ser velada e enterrada e ainda me puxando como se quisesse me levar junto para debaixo da terra: filha da puta!

    Não é para a tumba da minha vó que eu me viro em prece, mas para observar uma outra, nas proximidades. É sepultura descuidada, com montes de terra por cima, mas, como se fosse cova rasa, reproduzia o contorno do corpo ali jogado: cabeça, tronco, membros... Eu me afasto, atraído por esse caos onde as formigas fazem festa, entrando e saindo na terra de fora. A cruz de madeira tombou e tem a metade de um dos braços enterrada: gella, quella, ghella... Mexo na cruz para conseguir ler: Sepultura 1106 – Carlos Marighella, 5/12/1911 – 4/11/1969.

    Penso em berinjela com molho. É quando me surpreendem o desenho das letras, o som e o significado das palavras. Sorrio. A poeira que se desprende da lama faz redemoinhos. De súbito eu sinto

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