O manual para a vida (Encheiridion de Epicteto)
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Sobre este e-book
'Este é um livro de autoajuda?'
Sabemos do costumeiro preconceito e descrédito do meio literário para com os livros de autoajuda. Porém isto também se deve, em grande parte, aos próprios escritores de autoajuda, que em sua maioria optam em seguir por “caminhos fáceis”, evitando tocar no cerne da questão – o autoconhecimento.
Se analisarmos os livros de autoajuda produzidos hoje no mundo, encontraremos basicamente duas categorias. Uma delas nos diz assim: “Tudo é possível! Basta desejar profundamente que irá conseguir!”; Já a outra se ocupa de nos consolar quando não temos sucesso em “conseguir tudo”, e nos sentimos um lixo.
Há, portanto, uma clara correlação entre uma sociedade que nos anuncia por todos os cantos da cidade que podemos conseguir tudo o que quisermos, e a existência da chamada baixa autoestima.
Antigamente uma pessoa pobre era chamada desafortunada. Hoje, criamos uma alcunha um tanto mais cruel: perdedora. Hoje os anúncios nos dizem que somos nós quem estamos no comando, e não os deuses. Se não temos sucesso, a culpa é nossa – perdemos.
Mas é aqui que entra a filosofia. A filosofia é a verdadeira autoajuda, o verdadeiro autoconhecimento, o verdadeiro amor ao saber.
Segundo Epicteto e os estoicos, devemos ter sempre em mente os infortúnios da vida, e o conhecimento de que há coisas que estão sob nosso controle, e outras que não estão. Somente assim saberemos que podemos sim perder, mas que não somos perdedores. E, da mesma forma, também saberemos que podemos sim ganhar, mas que não somos ganhadores.
Somente com este desapego aos anúncios da cidade grande é que teremos enfim o tempo e a disposição de olhar para dentro, e nos conhecer. Se isto é autoajuda? Certamente – autoajuda da melhor espécie!
Com vocês, o manual para a vida, o Enchiridion de Epicteto...
O editor.
***
Número de páginas
Equivalente a aproximadamente 60 págs. de um livro impresso (tamanho A5).
Sumário (com índice ativo)
- Prefácio
- Enchiridion de Epicteto
- Apêndice (inclui trechos do Diatribes de Epicteto)
***
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Epicteto de Hierápolis
Epicteto de Hierápolis (55 - 135) foi um filósofo grego estoico que viveu a maior parte de sua vida em Roma, como escravo. Apesar de sua condição, conseguiu assistir as preleções do famoso estoico Caio Musônio Rufo. De sua obra se conservam o 'Encheiridion de Epicteto' (também conhecido como 'Manual de Epicteto') e as 'Diatribes' (ou 'Discursos'), ambos editados por seu discípulo Lúcio Flávio Arriano.
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O manual para a vida (Encheiridion de Epicteto) - Epicteto de Hierápolis
Prefácio
O SENHOR DO DESTINO
Tudo o que temos de decidir é o que fazer com o tempo que nos é dado (Gandalf em O Senhor dos Anéis, de J. R. R. Tolkien)
Um dos maiores sábios da Antiguidade nasceu escravo, mas isso não o impediu de ter sido uma das almas mais livres do mundo. Epicteto nasceu em Hierápolis – na atual Turquia – em cerca de 55 d.C., e provavelmente foi levado ainda jovem para Roma, onde teve como mestre Epafródito, que por sua vez servia ao então imperador Nero. Tendo reconhecido a sabedoria e o potencial de seu escravo, Epafródito o declarou homem livre para seguir os ensinamentos de Musônio Rufo, filósofo estoico que o tomou como discípulo.
Epicteto foi manco desde a juventude, provavelmente devido ao reumatismo, mas foi com a razão e as ideias que caminhou muito além de seu professor no estoicismo, uma escola de filosofia helenística fundada em Atenas por Zenão de Cítio, no início do século III a.C. Os estoicos ensinavam que as emoções destrutivas resultavam de erros de julgamento, e que um sábio não deveria se deixar abalar
por tais emoções.
Os estoicos se debruçavam na relação dinâmica entre o determinismo cósmico e a liberdade humana, defendendo a crença de que é virtuoso manter uma vontade que esteja de acordo com a natureza. Por causa disso, os estoicos apresentaram a sua filosofia como um modo de vida, e pensavam que a melhor indicação da filosofia de uma pessoa não era o que teria dito, mas sim como teria se comportado em vida.
Epicteto foi, junto com Sêneca, um dos estoicos tardios que defendiam que a virtude é suficiente para a felicidade. O sábio que nasceu escravo, entretanto, teve uma existência muito mais dura do que Sêneca, um intelectual nascido entre uma família nobre romana [1] Sua fama, no entanto, se deveu sobretudo ao seu exemplo de vida. Como Sócrates e outros sábios antigos, jamais deixou nada escrito. Foi graças a Flávio Arriano, um de seus discípulos, que nos chegou a modernidade as anotações de seus cursos: os Discursos (Diatribes) e o Manual (Enchiridion) de Epicteto, sendo o último apenas um resumo do primeiro.
Ao longo do tempo, a despeito de terem influenciado inúmeros grandes filósofos e religiosos posteriores, os estoicos também foram alvo de muitas críticas, usualmente por quem mal conheceu sua obra, ou a interpretou de forma apressada; ou ainda, como no caso de Nietzsche, que a transportou para um contexto inadequado, dentro do cristianismo...
Quando Epicteto falava em Zeus, o deus dos deuses, ou nos deuses como um todo, um conjunto divino
, não se referia a Divindade da mesma forma que muitos religiosos de sua época, nem da mesma forma que a grande maioria dos cristãos que lhe foram posteriores. Sim, de fato Epicteto compreendia na Divindade uma substância, uma força única, mas daí a imaginar que ele via a Divindade como os cristãos veem a Deus é um passo muito grande, que talvez não se sustente:
Este mundo é uma única cidade, a substância da qual ele é feito é una e, necessariamente, existe uma revolução periódica, os seres cedem lugar uns aos outros, uns se dissolvem enquanto outros aparecem, uns estão fixos e outros em movimento. Tudo está repleto de amigos, antes de tudo os deuses, em seguida os homens que a natureza uniu intimamente uns aos outros. Uns são dados a viver juntos, outros a se separar; é preciso regozijar-se por estar juntos, e não se afligir por dever se separar. O homem, além de sua grandeza natural e de sua faculdade de desprezar o que não depende da sua escolha, possui ainda esta propriedade de não criar raízes e de não estar amarrado à terra, mas de ir de um lugar a outro, seja pressionado pelas necessidades, seja simplesmente para poder contemplar.
(Diatribes, III, 24)
O sábio estoico defendia o uso da razão acima das emoções destrutivas, que poderiam levar ao desespero e a angústia permanentes, mas não se deve imaginar que ele era contrário às emoções em geral, tanto