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Formação universitária de professores para o ensino da linguagem escrita na infância: um estudo a partir dos discursos didático-formadores: da aprendizagem ao ensino
Formação universitária de professores para o ensino da linguagem escrita na infância: um estudo a partir dos discursos didático-formadores: da aprendizagem ao ensino
Formação universitária de professores para o ensino da linguagem escrita na infância: um estudo a partir dos discursos didático-formadores: da aprendizagem ao ensino
E-book392 páginas4 horas

Formação universitária de professores para o ensino da linguagem escrita na infância: um estudo a partir dos discursos didático-formadores: da aprendizagem ao ensino

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Sobre este e-book

A obra "Formação universitária de professores para o ensino da linguagem escrita na infância: um estudo a partir dos discursos didático-formadores" tem um valor enorme para repensarmos a alfabetização na atualidade. Corajosamente, a pesquisadora se posiciona sobre diferentes aspectos do ensino da linguagem escrita na escola, problematizando os processos de formação de professores no ensino superior. Em sua discussão, sublinha que "... a criança é um intérprete ativo no mundo. Na condição de ser-de-discurso, mais do que "representar a fala", (cf. Ferreiro), ela busca sentido para si-no-mundo com os outros com quem vive: vê, ouve, sente, lê, traduz, imita, escreve, pensa e interpreta oralmente e por escrito. Segundo a autora, ao escrever, (...) a criança age, tentando incluir-se no processo discursivo de sua sociedade e cultura". (Fiorot-Costalonga, 2022). Em sua análise, observa uma ênfase na "psicogênese da língua da escrita" (Ferreiro e Teberosky) para explicar como as crianças aprendem a linguagem escrita. Diante dessa conclusão, propõe aos leitores pensar sobre a insuficiência do pensamento unidimensional para explicar processos multidimensionais. Da aprendizagem ao ensino da linguagem escrita, da formação à práxis de alfabetização, seria importante ampliar o diálogo entre as universidades e as escolas. Sendo assim, estudantes, professoras e professores da Educação Básica e do Ensino Superior, assim como os gestores públicos, são convidados a ler a obra...
IdiomaPortuguês
Data de lançamento25 de jul. de 2022
ISBN9786525241609
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    Pré-visualização do livro

    Formação universitária de professores para o ensino da linguagem escrita na infância - Elida Maria Fiorot Costalonga

    CAPÍTULO I - DE ONDE FALAMOS: QUADRO TEÓRICO-CONCEITUAL

    "... podemos pensar o mundo como sendo indubitavelmente o mundo

    sob uma certa descrição e um mundo visto dentro de uma certa perspectiva"

    Umberto Eco

    "Da minha aldeia vejo quando da terra se pode ver no Universo...

    Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer.

    Porque eu sou do tamanho do que eu vejo

    E não do tamanho da minha altura"

    Fernando Pessoa

    Este capítulo tem como finalidade apresentar o quadro teórico conceitual que tomamos como referência para a realização desta nossa pesquisa. Em grande parte, nosso problema de pesquisa foi delineado, inspirando-nos no pensamento dos pesquisadores Vygotski, Bakhtin e outros que serão explicitados mais adiante. Inspiramo-nos, na verdade, em três fontes principais, postas em relações recíprocas, a saber: (1) nas leituras que fazíamos (2) na autocrítica à nossa prática docente na formação inicial de professores em cursos de Pedagogia, e também na formação continuada de professores, quando de nossa atuação nas Secretarias de Educação: SEDU-ES e SEME-PMV-ES. (3) às observações das práticas de ensino de leitura e escrita, no papel de pedagoga ou no papel de assessora pedagógica das escolas do Ensino Fundamental, rede pública e privada.

    Vygotski (1995) psicólogo soviético, do início do século XX conceituava Escrita como um "sistema complexo de símbolos e signos". Tomamos este conceito como fundamento para as reflexões desenvolvidas na nossa pesquisa e análise dos dados. Refletimos, então, sobre quais mudanças poderiam ser promovidas num processo de ensino e formação de professores-alfabetizadores orientado por uma concepção de escrita assim enunciada. Aos nossos olhos, parece-nos evidente a exigência de aprofundamento sobre esse objeto cultural chamado Escrita. Tratar didaticamente a Escrita como uma criação sociocultural dos humanos implica em compreender a natureza histórica desse objeto, que por sua vez significa rever, simultaneamente, conceitos como escrita como sistema, sistema de signos, o próprio conceito de signo, escrita e cópia, escrita como representação da fala (Ferreiro & Teberoski, 1987), etc.

    Sabemos que um mesmo fenômeno ou processo pode ser observado e nunca esgotado, do ponto de vista de várias teorias, complementares e não mutuamente excludentes. Sendo assim, buscamos aprofundar a nossa compreensão sobre a escrita como um sistema complexo de símbolos e signos retomando algumas leituras do próprio Vygotski (1993, 1995, 1996), relemos também Umberto Eco ([1932-1989]; (1962, 2002) Bakhtin ([1895-1975], Foucault ([1926-1984], 2002), e outros. Disso temos certeza: colocarmo-nos em diferentes lugares exotópicos muda o nosso ponto de observação e assim temos algumas possibilidades de ampliar nossa interpretação sobre a criança, o desenvolvimento do ser humano e sua ação no mundo, onde se inscreve a criação histórica da Escrita – como Linguagem, Conhecimento, Cultura.

    1. DE ONDE FALAMOS: NOSSA ENUNCIAÇÃO – NOSSA COMPREENSÃO RESPONSIVA¹²

    Construir um modelo de linguagem sem qualquer relação com o locutor e o ouvinte, e assim hipostatizar um tipo de código separado da comunicação efetiva, corre-se o risco de reduzir a linguagem a uma ficção escolástica.

    Jakobson

    Tornar visíveis as condições de nossa interlocução social, a partir da qual nos constituímos como autores/enunciadores poderá ajudar aos nossos leitores na interpretação do nosso texto/discurso, que não é outra coisa senão o que podemos ver/dizer do lugar que assumimos nas condições concretas da nossa existência. Compreendemos como Bakhtin(1995) que a situação e os participantes mais imediatos determinam a forma e o estilo de qualquer enunciação.Neste sentido, a nossa condição de doutoramento em Psicologia da Educação em uma universidade privada já significa,ou seja, já imprime um certo sentido e não outro, ao conteúdo que dá forma a este discurso/texto. Na contingência deste trabalho, tentaremos exercer o rigor que assumimos como critério de cientificidade, mesmo sabendo que a verdade" é e será sempre provisória e parcial, e que ser superada é o seu devir.

    Conforme Amorim (2003, p.4) exotopia é um conceito bakhtiano que pode nos ajudar no entendimento do papel do pesquisador.

    [...] o uso desse conceito pelo pesquisador vai lhe ajudar a regular o trabalho da pesquisa e da atividade crítica: meu olhar sobre o outro não coincide nunca com o olhar que ele tem de si mesmo. Enquanto pesquisador, minha tarefa é tentar captar algo do modo como ele se vê, para depois assumir plenamente meu lugar exterior e dali configurar o que vejo do que ele vê.

    Parafraseando Bakhtin, vamos dizer que exotopia significa desdobramento de olhares a partir de um lugar exterior, singular para cada sujeito no mundo. Esse lugar exotópico, no caso, do pesquisador (e também do professor) tem algo semelhante ao lugar que assume o fotógrafo frente a uma determinada paisagem,¹³ isto é, o fotógrafo tenta mostrar ao fotografado um sentido novo acerca da paisagem, da qual ambos são intérpretes.

    Nesse sentido, o nosso texto/discurso é a expressão objetiva do que nos é possível fotografar/mostrar, entendendo esta como uma fotocomposição, na medida em que ao focarmos, incluímos/excluímos elementos da paisagem para compormos a nossa fotocriação. Nesse sentido, ao dar a conhecer a realidade em foco, dá-se a conhecer, um pouco de si e do outro, o que pode permitir a todos, quer no papel de alunos, de alunos-professores ou formadores, frequentes reconceitualizações.

    Nas condutas dos sujeitos, nos diversos tempos e espaços culturais existem certas fases já estruturadas no seu desenvolvimento e outras em formação, por meio das quais podemos nos aproximar da história do desenvolvimento biológico e cultural dos humanos. Evidentemente, uma abordagem histórica permite uma interpretação mais ampla e profunda acerca da participação destes processos na formação de professores e no ensino e aprendizagem da linguagem escrita na Educação Básica.

    2. O HUMANO NA HISTÓRIA: NATUREZA, CULTURA E LINGUAGEM

    Nos múltiplos planos genéticos do indivíduo, que incluem camadas distintas da antiguidade de sua espécie, lhe conferem uma estrutura sumamente complexa, [...] que une, através de uma série de formas de transações e transformações, as funções superiores do indivíduo com a conduta primitiva na onto e na filogênese. (Vygotski, 1995)

    Há Histórias e histórias, mitos, contos e lendas nas narrativas sobre a ontogênese e da filogênese da natureza dos seres humanos, suas culturas e sociedades. Para nós, a humanização é um processo sócio-histórico, no qual, as linguagens, de modo particular a Escrita desenvolve um papel fundante na história da humanidade, Os humanos criaram a linguagem Escrita. Reciprocamente, a linguagem escrita recriou os humanos e passou a integrar as suas culturas. O Homem faz e se faz nas linguagens que cria ou inventa e, dessa forma impulsiona a evolução do gênero humano com todas as contradições, que tendem a ficar cada vez mais complexas com as ininterruptas linguagens da tecnologia invadindo o mundo público e doméstico no interior das famílias.

    Parece-nos vir se confirmando uma das premissas defendidas no século XIX por Marx e Engels¹⁴ segundo a qual não apenas a natureza atua sobre o homem determinando o seu desenvolvimento histórico. Também o homem age sobre a natureza, voluntariamente a modifica, criando para si mesmo novas condiçõesde existência. Segundo essa perspectiva, o humano ao agir e intervir na realidade do mundo natural, deixa nela suas marcas na forma de Conhecimento, Cultura, Linguagens e História.

    Em razão disso, parece-nos quase-impossível estabelecermos uma fronteira rígida entre a natureza e a cultura. Em vários casos examinados por Vygotski (1995, p.47 - 83) a conduta humana não está determinada tão só pelos estímulos presentes no contexto observado, mas sobretudo pela mudança da situação criada pelo próprio homem. O que nos leva a pensar o desenvolvimento humano como um processo dinâmico, realizando-se a partir da existência simultânea de estímulos dados e outros sendo criados e que tem essencial importância na transformação ativa da natureza do homem, pelo próprio homem. Esta premissa constitui a base para a compreensão de grande parte da história do ser humano no mundo, a qual encontra-se expressa por Marx nos seguintes termos ao agir sobre a sua natureza o homem desperta forças que nela se encontram adormecidas e as submetem ao próprio poder.

    A.R. Lúria, pesquisador soviético (1990, p.217), por sua vez, nos lembra um fato que parece ter a. sido desconsiderado pela psicologia durante muito tempo: as mudanças sócio-históricas não se limitam a introduzir novo conteúdo no mundo mental dos seres humanos; elas também criam novas formas de atividade e novas estruturas de funcionamento cognitivo.Estrutura, no quadro conceitual do presente trabalho, aplica-se a todas as formas de conduta da psique, em que o cultural e o biológico, em inter-relação, se configuram e se reconfiguram ao longo de todo processo histórico da conduta humana. Gradualmente, como observara Vygotski (1995, p.23), na fisiologia da atividade nervosa adentram profundamente as determinações históricas, instaurando assim uma certa indissociabilidade entre o natural e social. Por meio desse processo, a consciência humana pode encontrar/criar as condições psicofisiológicas e socioculturais de que necessita para se desenvolver. A consciência, por sua vez, encontra nessa atividade, razões para evoluir e se reconfigurar em outros estágios mais elevados em relação aos precedentes.

    Como expressão dessa mudança interna/externa o humano muda a sua conduta no mundo em relação ao outro e a si mesmo. Esse evento, segundo Vygotski (idem), revela que a biologia perde sua força, e o humano na esfera do pensamento diferencia-se dos outros animais mediante a sua possibilidade de criar linguagens" e se exprimir através dessa ação. Algo semelhante ocorre quando a criança começa a compreender este sentido histórico da linguagem no mundo, notadamente da Escrita.

    Para L. Levy-Bruhl¹⁵ uma característica fundamental do pensamento do homem primitivo era a tendência em fazer uso de mecanismos de lembrança minimizando a reflexão. Contrapondo-se a essa concepção, (Vygotski, 1987, 1995) reconhece no ser humano capacidades psicológicas superiores dentre as quais, a memorização desempenha uma função importante dentro de um complexo sociopsicobiológico. Desde a antiguidade, diz ele, diversos estudos nos mostram que o humano além de criar novas formas de memorizar, o homem cria estímulos artificiais com os quais domina o próprio processo de memorização (Vygotski 1995, p.79 - tradução nossa). O intelecto humano cria novas formas de memória ao criar instrumentos recordatórios que coloca à serviço da própria memória, por exemplo, a criação dos signos. Uma operação psicológica semelhante é inconcebível e impossível no animal.

    O ser humano ao criar signos confere um novo significado à sua própria conduta em relação ao meio natural/social. Nessa capacidade psicológica criadora evidencia-se no humano, um processo psicológico de adaptação ativa, que o diferencia da adaptação passiva que diz respeito aos animais. Segundo Vygotski, só uma análise desse processo histórico em que o humano cria ferramentas artificiais¹⁶- instrumentos de trabalho e de comunicação¹⁷, possibilita compreender o princípio regulador da conduta humana e sua significação. O ser humano transforma o natural em cultural, o biológico em biossocial, imprimindo mudanças estruturais na formação de novas conexões cerebrais. Mediante este fenômeno, o ser humano passa então a se autogovernar, isto é, passa de certa maneira a dirigir o seu cérebro de fora", socialmente ele governa o próprio corpo.

    Por essa razão, o princípio do reflexo condicionado (Pavlov) é insuficiente para explicar a conduta do indivíduo na vida social. Este princípio nos ajuda a compreender a formação de conexões apenas no plano natural, porém no plano histórico, apresenta-se insustentável. Como esclarece Vygotski (op. cit. p. 84), se a atividade fundamental e mais geral dos grandes hemisférios cerebrais nos animais e no humano é a sinalização, superando esta condição biológica, a atividade mais geral e fundamental do ser humano, e que o diferencia em primeiro lugar dos animais, do ponto de vista psicológico é a significação, isto é, a criação e o emprego de signos, enquanto sinais artificiais (tradução nossa).

    Tanto para Lúria quanto para Vygotski o homem não está restrito a simples reflexos do tipo estímulo-resposta"; ele consegue estabelecer conexões indiretas entre a estimulação que recebe e as respostas que emite através de vários elos de mediação. Quando o homem introduz uma modificação no ambiente através do seu próprio comportamento, essa mesma modificação vai influenciar seu comportamento futuro. Essa modificação pode ser observável no comportamento infantil quando a criança faz cópia de algo solicitado pela professora ou mesmo nas brincadeiras de imitar pessoas ou animais.

    O conceito de mediação foi usado nas pesquisas dos referidos pesquisadores quase que exclusivamente aos processos de desenvolvimento mental da criança, principalmente ao discutir o papel da linguagem no desenvolvimento infantil, entendido como um processo sócio-histórico, o que equivale dizer que o significado das palavras fornece à criança os resultados refinados da história de sua sociedade.

    Tudo nos leva a pensar que é a descoberta do outro, como distinto de si, faz nascer a necessidade de comunicação, no sentido amplo do termo. Diríamos que na descoberta do outro se instaura aquilo que se tem chamado de subjetividade social. Parafraseando Bakhtin, diríamos, ainda, que o outro percebido jamais será abandonado nos processos de comunicação subsequentes, tanto como, aquele para quem dirigimos nossa palavra (oral ou escrita), como de quem esperamos uma compreensão responsiva em relação a nossa enunciação. A criação das linguagens, particularmente da Escrita, nosso objeto privilegiado de estudo, se inscreve na tríade discursiva-social que coloca em relação Homem/Homens/Mundo ao longo da história, cujas inter-relações ainda representam um campo vasto de estudos por serem

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