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Ciência - Marco A. Stanojev Pereira
Agradecimentos
Aos meus irmãos de sangue e das Ciências.
Ao Prof. Dr. Reynaldo Pugliesi, meu pai na Ciência.
Ao Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares – IPEN-CNEN/SP, por proporcionar-me a vivência na Ciência desde 1995.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pelo atual suporte financeiro com a Bolsa de Estudos de Pós-Doutorado.
Ao sr. José A. L. de Araújo, sra. Maria de L. S. Araújo e srta. Julie A. S. Araújo, pela rede de amizade.
Sagitarius Editora
© 2020, Dr. Marco Antonio Stanojev Pereira, PhD.
Impresso no Brasil/Printed in Brazil
Impressão e distribuição por Clube de Autores.
Título: Ciência: o prazer de descobrir
E-mail: sagitariuseditora@gmail.com
1ª Edição – São Paulo – Julho, 2020
Epígrafe
Há verdadeiramente duas coisas diferentes: saber e crer que se sabe. A ciência consiste em saber; em crer que se sabe reside a ignorância.
Hipócrates
Exordium
Saudações científicas!
Este livro foi pensado para o jovem que apresenta, já desde a infância, pendores científicos, ou seja, o desejo de querer saber, conhecer, descobrir.
Também foi pensado para ajudar os pais que, na maioria das vezes, são surpreendidos pelos filhos quando estes lhes respondem a velha pergunta sobre o que o pequeno quer ser quando crescer. Os pais também precisam aprender sempre, para ensinar seus filhos.
Igualmente foi pensado para auxiliar o colega Professor de Ciências, pois sabemos, por conhecimento de causa, que precisa superar grandes obstáculos diários para fazer acender em seus pupilos a chama da curiosidade, de que o aprender não está somente circunscrito no modelo de que todos reunidos em uma sala de aula, com a lição passada na lousa pelo professor ou aluno, onde este último passivamente sentado em sua cadeira, aprende as operações matemáticas, os verbos ou o sistema solar. O processo de aprendizado onde o professor é o instrumento de geração de informação e o aluno é corpo que apenas absorve, passivamente sentado, não se encaixa mais em nosso mundo, no dinâmico processo que é o ciclo do ensino-aprendizagem.
Por experiência própria, ao ser questionado sobre o que eu queria ser quando crescesse, na altura dos meus nove anos de idade, respondia simplesmente: cientista! Contudo, a pergunta de meus pais se desdobrava para outra, mais difícil: Cientista de quê?
E não adiantava consultar o velho e fiel pai dos burros
, o dicionário Aurélio, pois no verbete se encontra apenas: O que se dedica à ciência; especialista numa ciência
.
Não sabia responder esta questão! Sabia apenas que queria ser cientista. Desta forma foram importantes as experiências que comecei a ter contato, primeiramente em casa com meus pais, e posteriormente no ginásio (antiga 5ª a 8ª séries), com as professoras de Ciências e História, principalmente.
Com a professora de Ciências descobri a Biologia e as Ciências Naturais e, com a professora de História, a sra. Dora Entler, descobri a Arqueologia, minhas disciplinas preferidas até hoje.
Aos doze anos ganhei de presente um microscópio óptico com aumento de 300 vezes, e pude descobrir um mundo invisível aos olhos nus, o microcosmo, com todo o seu universo de vida e cores. Colocava uma gota de água de uma poça em uma lâmina de vidro, e observava na ocular várias formas de vida vivendo, respirando, reproduzindo-se naquele universo, indiferentes e ignorantes de que estavam sendo observadas.
Em uma certa aula de Ciências, minha professora desenvolveu conosco um projeto de plantas medicinais. Devíamos primeiro pesquisar em livros e publicações a descrição das espécies que eram empregadas em terapias, em seguida, entrevistar os mais velhos - de nossa família e da redondeza -, para saber a cultura popular acerca do conhecimento de ervas medicinais e doenças, e depois ir a campo colher amostras in natura. Foi assim que eu tive meu primeiro contato com a Metodologia Científica, sem o saber.
Figura 1Figura - Microscópio óptico da Olympus Tokyo.
Com as amostras na mão, aprendemos a desidratá-las colocando as folhas entre papéis de jornal ou entre as folhas da lista telefônica até secá-las.
Uma vez secas, colávamos as amostras em pranchas de papel cartão, classificando-as com seu nome científico e popular, descrevendo sua utilização como fitoterápicos e, finalmente, organizávamos as pranchas em ficheiros. A professora também nos ensinou que quem descobre batiza, e cada um de nós poderia escolher uma espécie e rebatizar com nosso nome. Escolhi a famigerada Quebra-Pedra
, ou Phyllanthus niruri, na qual rebatizada passou a ser conhecida como Phyllanthus stanoievius.
Como no grupo havia um colega que desenhava muito bem, ele ficou incumbido de apresentar um desenho da planta com suas flores feito com lápis de cor e giz de cera, que ficou junto da prancha com a planta desidratada. Ganhamos um A
com louvor.
Após, devíamos apresentar nossas conclusões em uma espécie de palestra na semana de ciências da escola, e era o momento áureo do trabalho, pois tínhamos que vencer a natural inibição da idade adolescente e falar em público.
Esta foi minha primeira atividade científica, propriamente dita, desenvolvendo todo um processo metodológico científico, do princípio ao fim, ou seja, começando por traçar o objetivo; depois consultar a bibliografia específica; definir uma metodologia; organizar os resultados; explanar as conclusões e, finalmente, a divulgação da pesquisa.
Este procedimento de pesquisa, coleta e descrição de material da flora e fauna é muito, muito antigo, e quando o Brasil foi descoberto uma legião de naturalistas europeus vieram para o Brasil para estudar sua grande biodiversidade, na qual deixavam os estudiosos fascinados pela sua exuberância. Um deles foi o alemão George Marcgrave, estudioso que veio para o Brasil com Maurício de Nassau, e que deixou em sua obra Historia naturalis brasilieae[1], o primeiro estudo científico publicado sobre a geografia e natureza do Brasil.
As Figuras a seguir correspondem a capa do livro e uma página com a descrição de uma planta muito comum - o Cará -, também conhecido por Inhãme dependendo da região brasileira. Se tiver interesse do conteúdo, pode utilizar um programa de tradução online para entender a descrição.
Uma curiosidade digna de ser relatada é que somente uma pequena parte da flora brasileira foi estudada e catalogada. Milhares de princípios ativos que podem ser utilizadas pelas indústrias química e farmacêutica continuam guardadas neste grande repositório, dádiva da natureza, prontos para serem estudadas e empregadas pela civilização, e nossos índios, que são os guardiães deste manancial, com seu conhecimento milenar das matas, dotados da sabedoria do emprego que cada pedra, folha, flôr, raiz, casca, tronco e animal tem na manutenção da alimentação e saúde de sua coletividade, é a verdadeira riqueza de nosso país, pois é renovável, vital e única, daí a preocupação em se preservar as florestas e garantir a identidade dos índios como nações, pois suas existências estão diretamente ligadas à existência de nossa civilização, como a conhecemos hoje. Entre os milhares de exemplos destes princípios ativos encontrados na natureza e transformados em remédios e produtos gerais, podemos citar: Espécies Alimentícias: Acca sellowiana, Annona crassiflora, Araucaria angustifolia, Butia catarinensis. Espécies Aromáticas: Capsicum flexuosum, Pimenta pseudocaryophyllus, Schinus terebinthifolius, Tropaeolum pentaphyllum. Espécies Medicinais: Achyrocline satureioides, Baccharis articulata, Baccharis crispa, Baccharis dracunculifolia, Bauhinia forficata, Bromelia antiacantha, Casearia sylvestris, Cecropia glaziovii, Copaifera trapezifolia.[2]
Figura 2Figura – Fac-simile da Capa do Livro Historia naturalis brasilieae de George Marcgrave.
Figura 3Figura – Fac-simile da página 19 do livro de Marcgrave com a descrição do tubérculo Cará.
Aos treze anos, ganhei de meu irmão mais velho um kit de química, com várias vidrarias, reagentes e um roteiro com experiências. Quando sumia das vistas de todos, a resposta de meus pais e irmãos era: Está fazendo as químicas dele!
.
Nesta época, existia no Brasil a Fundação brasileira para o ensino das ciências, a Funbec, situada dentro da Universidade de São Paulo, e que tinha por objetivo a construção de kits com experimentos que contemplavam diversas áreas das Ciências, e que eram vendidos em bancas de jornais. Posso afirmar com toda a segurança que estes kits são muito úteis para o primeiro contato da criança com as Ciências, e seria de grande valia didática e pedagógica que retornassem ao mercado, seja pela iniciativa pública ou privada. Em minha estada em Lisboa, como professor e pesquisador durante cinco anos, pude ver com alegria que a Universidade de Lisboa possui até hoje esta política de divulgação das Ciências. O Projeto chama-se "Science4you[3]", onde os kits são vendidos em quiosques montados em shoppings centers e hipermercados. Comprei um kit de energia solar para mim e um de arqueologia para minhas sobrinhas. Este consistia de uma placa de barro com um esqueleto de dinossauro feito com resina em seu interior. Acompanhava o kit uma espátula, um buril com martelinho e uma escova. Minhas sobrinhas adoraram, mas minha irmã e cunhada não, pois fez uma sujeira danada. Contudo, Ciência é Ciência!
Figura 4Figura - Capa do impresso que acompanhava o kit de química contendo algumas experiências.
Meus pais proporcionavam para nós acesso à educação e cultura, fator importantíssimo para o crescimento da criança em seu desenvolvimento intelectual, pois, citando o grande Monteiro Lobato: um país se faz com homens e livros
. Homens, no sentido de humanidade desenvolvida em seu significado e aspecto mais amplo, em intelecto e moral, em cidadania, em respeito a si e ao próximo e, Livros, como sendo a fonte e propagação do conhecimento, do desenvolvimento do sentido crítico do ser humano, ou seja, ler um texto e traçar conclusões, ser livre para interpretações, por exemplo: Dom Casmurro[4] foi traído ou não?
Pais leitores influenciam os filhos, parentela e agregados a serem leitores. Lendo, seja em livro físico ou digital, um mundo se descortina aos olhos, e naturalmente a criatividade brota, assim meus amigos, leiam para uma criança e estarão contribuindo para o futuro.
Em um destes acessos à educação e cultura patrocinado pelos meus pais, tive contato com o macrocosmo, quando estes nos levaram à uma exposição do céu com os planetas, estrelas e galáxias através das projeções do Planetário do Ibirapuera, em São Paulo. Foi um acontecimento que jamais esqueci, e hoje a cidade de São Paulo tem dois planetários, o do Parque do Ibirapuera e, mais recentemente o do Parque do Carmo, em Itaquera, bairro do subúrbio da capital paulista. Ambos com ampla programação para o público em geral e para as escolas, onde pode-se agendar uma visita para grupo por telefone ou em sua página na internet.
Em casa e na biblioteca da escola[5] contava com acesso a livros variados, e nas aulas de Ciências e História antiga e medieval - a fase da história que mais gosto -, desfrutava da explanação de professores que realmente sabiam como prender nossa atenção - e que eram mais valorizados que hoje -, que extraiam dos livros didáticos a essência necessária para que o processo de ensino/aprendizagem se completasse conosco, alunos, que por nossa vez tínhamos o direito de frequentar a escola e o dever de respeitar nossos mestres e a direção. Nosso dever era estudar e passar de ano por mérito, esforço e dedicação, fato comemorado com entusiasmo no final do ano por nós e pela família toda.
No caso das aulas de História, a civilização Egípcia e Grega nas aulas da Professora Dora na sétima e oitava série, tomavam uma dimensão que seduzia-me fortemente. As descrições e imagens dos livros ganhavam vida, e via-me fortemente inclinado à ser um cientista na arqueologia, contudo as outras ciências não me davam descanso, e a força de atração era igualmente forte, principalmente a química com suas transformações da matéria que eu realizava em casa com o kit que ganhei do meu irmão, em meu laboratório erguido em nosso quintal por meu pai, local que também funcionava como nosso clubinho e barracão das ferramentas dele.
Meu pai assinava uma revista chamada Seleções
, e sempre trazia em seus textos curiosidades científicas. Em uma das edições eu, então no oitavo ano, vi o anúncio de um prêmio científico: o Rolex Awards for Enterprise. Pesquisando hoje na internet enquanto escrevia este parágrafo, vi que ainda existe, com premiações de dois em dois anos.
Com a ajuda de um dicionário inglês/português, pois ainda não existia os aplicativos de tradução, traduzi o texto palavra por palavra, e decidi escrever pedindo o formulário para enviar uma experiência que bolei para participar. A ideia era saber qual cor do arco-íris influenciava mais no crescimento das plantas, pois já havia aprendido nas aulas de ciências que a cor branca da luz é uma composição de sete cores. Depois de um tempo, recebi em casa minha primeira correspondência internacional. Novamente com a ajuda do dicionário, preenchi o formulário e enviei o projeto escrito em português, contudo me devolveram e pediram para traduzir para o inglês. Naturalmente não reenviei, mas fiquei radiante com a correspondência trocada.
Passaram-se os anos e entrei no ensino médio, e ainda não sabia responder a pergunta básica: Cientista de quê?
Então, no fim do segundo ano do colegial, a sra. Izildinha e sra. Maria Lúcia, professoras de química da Escola Estadual de Segundo Grau Profa. Emília de Paiva Meira, resolveram organizar um curso de Técnico em Química e foram de classe em classe perguntando quem queria compor a nova turma.
Eu e mais onze alunos formamos a primeira turma do curso de Técnico em Química com duração de quatro anos. Parece que a resposta estava finalmente tomando forma? Não! Mas já era o início.
Terminei o Técnico e, para colar grau, era necessário um estágio na área. Consegui uma posição no Instituto Adofo Lutz como técnico de laboratório de análises clínicas. Uma vez terminado o estágio, prestei concurso e passei no Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), na Cidade Universitária. Nesta instituição foi onde tive minha primeira grande experiência nas Ciências exatas e da terra, em pesquisas de petróleo. Mas estágio é estágio, e em órgão público não há efetivações, assim, depois de maravilhosos seis meses, terminou minha experiência gratificante.
No ano seguinte ingressei na Universidade, no curso de Licenciatura em Química, e hoje eu vejo como éramos - e ainda somos -, mal preparados no Brasil para as carreiras científicas, pois as universidades particulares sequer fazem a divulgação das Ciências, das atividades científicas, da vida acadêmica. Durante os quatro anos da graduação jamais tive um professor que mostrasse ou abordasse o que era uma metodologia da pesquisa científica, ou o que era um mestrado ou doutorado. As universidades particulares em especial se mostravam, e ainda se mostram, como uma simples instituição formadora de profissão, na verdade pior que isso, em sua maioria são empresas emissoras de certificados, sem compromisso nenhum com a verdadeira educação superior, cuja grade de ensino é composta em sua maioria por cansativas revisões dos tópicos que deveriam ter sido estudados no ensino médio, e devido a falência e inexistência de uma sólida e atual política educacional à nível estadual e federal, cada vez mais os alunos concluem o ensino médio com profundas deficiências de aprendizado, e chegam na universidade sem o básico necessário para o prosseguimento dos estudos superiores, fazendo com que os professores, por pressão dos coordenadores, diretores de áreas e reitores, marquem passo, e o resultado disso tudo é nossa posição atual junto aos órgãos de avaliação de cursos nacional e internacional. Uma decepção!
Assim como no ensino técnico, também no ensino superior o estágio era exigência para colar grau, assim formalizei meu cadastro no CIEE – Centro de Integração Empresa-Escola -, instituição que existe ainda hoje, e foi para mim uma grande e confiável ferramenta de ingresso no mercado de trabalho. Por este caminho consegui um estágio de um ano na multinacional alemã Hoechst, na área de química básica, e lá tive contato com pesquisadores e equipamentos de última geração. Conheci e tive meu primeiro contato com Doutores e doutorandos debruçados em seus projetos de pesquisas, cujo objetivo era investigar novos produtos e processos químicos, e eu como estagiário em química trabalhava no laboratório de um jovem pesquisador vinculado à Universidade de São Paulo, que desenvolvia seu projeto de doutorado na Hoechst, um projeto muito interessante e ainda atual, a síntese de biopolímeros a partir do exoesqueleto de crustáceos, mais exatamente da casca de camarão.
Aprendi muito e gostava de todos, contudo ainda faltava-me algo. O trabalho que eu realizava obedecia uma rotina, e isso não me satisfazia, pelo contrário. Em termos financeiros era satisfatório, mas em termos de realização profissional era um desastre.
Terminado o estágio, passei dois anos perdido
, e atuava na rede pública como professor de Ciências no