Educação Geográfica do Agir Comunicativo: Geografia Escolar do Mundo da Vida
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Educação Geográfica do Agir Comunicativo - Rosalvo Nobre Carneiro
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO EDUCAÇÃO, TECNOLOGIAS E TRANSDISCIPLINARIDADE
A meus alunos e alunas da escola, da graduação e da pós-graduação, com os quais tanto aprendi em duas décadas de docência completadas em fevereiro de 2021!
AGRADECIMENTOS
A escrita pessoal deste livro não significa, em tempo, que foi feita sem a presença ou a colaboração de muitas pessoas. Há muita gente envolvida, de modo direto ou indireto.
Ao Prof. Fábio Rodrigo Fernandes Nascimento, mestre em Ciências Humanas, pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Espaço, Ensino e Geografia da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte no campus de Pau dos Ferros. E ao Prof. José Erimar dos Santos, doutor em Geografia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte e professor da Universidade Federal Rural do Semiárido em Mossoró, meu agradecimento pelas leituras críticas do original que certamente contribuíram para esclarecer temas importantes, ideias não desenvolvidas e conceitos utilizados, além de apresentarem uma visão de conjunto que me permite entregar ao público uma obra melhor.
Nesse particular, toda pessoa é importante, ainda mais quando se pensa a educação como fenômeno social. Logo, orientandos e orientandas do mestrado do Programa de Pós-Graduação em Ensino da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte muito contribuíram para as minhas reflexões e proposições. Foram eles: Andrei Gomes de Azevedo, Francisca Adriana da Silva Bezerra, Francisco Ringostar Pinto, Maria Aparecida Monteiro da Silva, Maria Silmara Cruz Sousa, Miqueias Vírginio da Silva e Mônica Sebastiana Brito de Sá. A cada leitura dos trabalhos sobre ensino de Geografia de cada um, pude ir percebendo os déficits das Geografias críticas escolares presentes nas realidades pesquisadas e que se verificavam em outras escolas do Brasil como regularidades.
Alguns orientandos, ao aceitarem o desafio de pesquisar e escrever com base na teoria habermasiana, deram-me as condições para afirmar a necessidade de uma educação geográfica nos moldes aqui apresentados. Nomeio, notadamente, a pedagoga Amanda Santos de Queiroz Oliveira Paiva, a geógrafa Joyce de Sena Lima, a pedagoga e geógrafa Marizete Batista do Nascimento e a advogada Paloma Breckenfeld Alexandre de Oliveira.
Aos graduandos, pois as interações, especialmente nas disciplinas de Orientação e Estágio Curricular Supervisionado, me possibilitaram por em prática muitas das ideias aqui expostas.
Ao prefaciador, o professor Francisco Kennedy Silva dos Santos, doutor em Educação pela Universidade Federal do Ceará e docente do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Pernambuco, meus sinceros agradecimentos pelas palavras que prefaciam a obra.
Como de praxe, não pude nomear todas as pessoas: a lista é extensa. Muitas mais poderiam estar contidas nestas linhas. Deixo meu agradecimento, portanto, a todas indistintamente.
APRESENTAÇÃO
Em 9 de fevereiro de 2001, iniciara a docência na educação básica. Ainda hoje essa experiência é basilar para minha prática na universidade, iniciada em 2008. Por isso, esta obra que apresento ao público é simbólica. É a expressão de minha compreensão de mundo, da Geografia e da educação geográfica, ou meu modo de descrevê-lo, explicá-lo e entendê-lo.
Parto de início da pré-compreensão de que o mundo é o espaço por excelência, constituído por materialidade e por vida. Diante disso, desenvolve-se um Discurso em torno do que estou chamando de os fundamentos
e as bases
. Nesse sentido, permitem-nos pensar sobre as teorias sociais, pedagógicas e da aprendizagem para a proposição da educação geográfica do agir comunicativo.
Esse é também um modo de ser e agir no mundo e com o mundo! Logo, ser geógrafo ou geógrafa é sonhar com uma realidade aparentemente irrealizável, mas nunca impensável ou desesperançada. É assim que descolonizar o mundo da vida é uma utopia realista, pois não importa o regime político-social, a forma de governo, haverá sempre dominação, repressão, assim como possibilidade de libertação, de autonomização, de emancipação.
Essas questões são apoiadas no pensamento habermasiano. Esclarece-se, desde já, que essa perspectiva implica dificuldades de emprego no espaço escolar e na sala de aula, se não incorporarmos um sentido manifestamente esclarecido e condizente com a trajetória do saber escolar. Esperamos, com esta obra, contribuir para a educação geográfica a partir das pedagogias do agir comunicativo e já vigente em outros campos.
Organizamos o livro em três partes. A parte I, Fundamentos teóricos para uma educação geográfica do agir comunicativo
, compõe-se de três argumentos. O capítulo 1, O fundamento social: a sociedade e o espaço como mundo da vida e mundo do sistema
, apresenta uma compreensão ampliada de sociedade, e está sintetizada na interação entre grupos sociais, mercado e Estado – ou, de outro modo, em linguagem, dinheiro e poder. O capítulo 2, O fundamento espaçotemporal: a dialética do espaço-mundo da vida
, apresenta uma contribuição ao debate espacial pela teoria habermasiana, pois, desde sempre, mundo da vida pode ser tomado como espaço. O capítulo 3, O fundamento político: o espaço público comunicativo, a democracia e a cidadania deliberativas
, situa a dimensão política no campo do espaço público comunicativo, deliberativo, sem o qual nem sequer poderíamos falar em educação.
A parte II, As bases pedagógicas para uma educação geográfica do agir comunicativo
, é constituída em torno de três argumentos. O capítulo 4, Aprendizagem, formação da identidade do Eu e os estágios de desenvolvimento moral
, parte da aprendizagem preferencialmente ao ensino, buscando-se compreender a formação no sentido da construção da identidade do eu autônomo mediante a consideração dos estágios do desenvolvimento do julgar moral e a prática comunicativa. O capítulo 5, Crítica e reconstrução da Geografia crítica escolar
, demonstra que a reprodutiva discussão entre Geografia escolar crítica versus Geografia escolar tradicional encaminhou a história da disciplina para déficits interpretativos. O capítulo 6, Educação geográfica do agir comunicativo ou Geografia escolar do mundo da vida
, parte da demonstração da grande ausência dos estudos geográficos e da Geografia escolar, a comunicação linguística, para propor uma virada linguística no campo da Educação e da escola.
Na parte III, Ações educacionais, ensino-aprendizagem e descolonização geográfica
, realizo dois argumentos em defesa de um propósito emancipado da educação geográfica pela via da descolonização do mundo da vida. Inicialmente, no capítulo 7, Ações didático-pedagógicas, mundo da vida e a educação geográfica
, pensa-se acerca das ações que professores, professoras, alunos e alunas deverão executar em diálogo, em interação social. Ações instrumentais, ações estratégicas e ações comunicativas são pensadas no contexto da sala de aula e da escola nos termos da didática. Por fim, no capítulo 8, Descolonização do mundo da vida e a emancipação como papel social da educação geográfica do agir comunicativo
, compreende-se a emancipação humana e social como interesses da educação crítico-comunicativa diante de condicionantes físico-materiais, normativo-sociais e subjetivos-pessoais.
Esclarecimentos metodológicos: evitou-se, no caso das ilhas de citação, a numeração da página; optou-se, por sua vez, por verter a expressão Homem ou homem, presente em vários autores, quando nas paráfrases, por expressões ligadas ao referencial adotado. Assim, pode aparecer em seu lugar pessoa, geral, ou indivíduo, particular. Essas duas palavras denotam nossa preocupação com o paradoxo da identidade, o qual revela sermos ao mesmo tempo pessoas, iguais a toda outra pessoa, e indivíduos, diferentes de todo outro indivíduo.
Por outro lado, Geografia com G é sempre a ciência ou a disciplina escolar, e geografia, com g, é sempre os outros usos correntes. Há exceções apenas nos casos de citação literal, em que se mantém o original, e nos casos de citação indireta, nos quais se mantém também a correspondência com a fonte.
O autor
PREFÁCIO
Escrever o prefácio de um livro remete-nos a um olhar reflexivo sobre um objeto, uma materialização de um conjunto indissociável do saber-fazer, do saber-construir, do saber-existir, daí nos leva para uma dimensão de existência.
Pensando nessa dimensão, da existência, coloco-me diante do desafio do encontro. O encontro dos sentidos e do agir comunicativo, algo tão explorado e entrelaçado na obra Educação geográfica do agir comunicativo: Geografia escolar do mundo da vida de meu amigo, permita-me suprimir as formalidades, Rosalvo.
No intuito de encontrar elementos que possibilitem uma tessitura teórica para o estudo sobre os saberes construídos no âmbito da Educação geográfica, situados em redes ou espaços de aprendizagem colaborativa
, encontro-me com a teoria da ação comunicativa, de Habermas, voltada para o entendimento de grupos humanos. Inicialmente, entendo que a capacidade dialógica do mundo da vida − o ato de fala – apresenta-se como possibilidade para a elaboração de uma racionalidade ampla, capaz de suprir a incompletude da crítica à razão moderna, razão essa que negou os ensejos de liberdade. Questões centrais que são discutidas no decorrer dos capítulos tecidos por Rosalvo.
Habermas (1989) procura superar a análise negativa da razão, vislumbrando esperanças de emancipação humana nas redes espontâneas de comunicação, nas quais o conhecimento sobre o mundo não é determinado a priori. Boufleuer (2001, p. 35) entende que o esforço não consistirá em saber como o sujeito pode conhecer e dominar objetos ou situações, mas como ele pode chegar a um entendimento com outros sujeitos sobre algo no mundo
.
Habermas entende que as intersubjetividades do mundo vivido, das condições realmente existentes possam ser reformuladas em vista do entendimento, originando redes de cooperação. Sem desconhecer os interstícios do poder no mundo estratégico das políticas educacionais e, portanto, da formatação do currículo escolar, compreende-se que a ação educativa nas práticas cotidianas não está de todo colonizada por ações estratégicas de controle e manipulação de uns sobre os outros (BOUFLEUER, 2001).
Estudos realizados por Damasceno e Therrien (2000) mostraram o predomínio do agir comunicativo na cultura escolar que nem sempre encontra espaço para permear a ação estratégica, reduzindo as chances de responder aos desafios de modo a efetivar as mudanças desejadas. Para Habermas, entretanto, não se pode mais dizer que as condições de valorização do capital se mantenham determinantes de ações políticas próprias da ação comunicativa. Avritzer (1996) compreende a complexidade tecnológica contemporânea como palco para ações autônomas em diferentes esferas sociais, mesmo se a força estratégica mantenha sua identidade manipuladora.
Nessa direção, o pensamento de Habermas permite um entendimento multifacetado do que venham a ser o entendimento e os modos de saberes compartilhados, advindos da argumentação voltada para o consenso e estes articulados, a meu ver, pela Educação ceográfica, como mecanismos estratégicos para compreensão do real, de uma espacialidade subjacente ao Ser. Ademais, questiono nesse contexto a complexidade da Educação geográfica com o fim de apreender as incongruências da proposta habermasiana para a compreensão das possibilidades de constituição de saberes compartilhados entre professores de Geografia em redes de aprendizagem, dentro da qual defendo a colaborativa
.
Convidando a sociedade a repensar os modos de lidar com o conhecimento e de comunicação entre os sujeitos, Habermas propõe a racionalidade comunicativa como forma de compreensão do mundo. Cabe à escola, como instituição social que, ao longo dos tempos, teve a proeminente missão de transmitir às diferentes gerações a cultura da humanidade, rever os modelos de racionalidade que guiaram os motivos e as justificativas de suas práticas. O parâmetro da ação comunicativa exige uma mudança de paradigma: não é o sujeito que conhece o objeto, mas é a relação intersubjetiva estabelecida no coletivo que valida ou não o conhecimento.
O mundo da vida, onde a competência comunicativa se encontra em potencialidade, equivale a um saber de fundo
, que é elaborado na interação com o ambiente cultural em que vivemos. Compartilha-se de elementos comuns que possibilitam o entendimento e, consequentemente, sobrepõem-se aos possíveis dissensos.
Em Habermas, a fé no ser humano se apresenta nas possibilidades do consenso. Nesse sentido, constituir redes de aprendizagem colaborativa
, pautadas no agir comunicativo, em contextos de Educação geográfica, requer um esforço para não reduzir reflexões teóricas a respeito de situações concretas em discursos monológicos. E seguindo essas pistas, encontro-me com as trilhas de possibilidades que compõem as tessituras da obra Educação geográfica do agir comunicativo: Geografia escolar do mundo da vida.
Referências
AVRITZER, Leonardo. A moralidade da democracia: ensaios em teoria habermasiana e teoria democrática. São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: Editora da UFMG, 1996. 168 p.
BOUFLEUER, José Pedro. Pedagogia da ação comunicativa: uma leitura de Habermas. 3. ed. Ijuí: Editora Unijuí, 2001.
DAMASCENO, Maria Nobre; THERRIEN, Jacques. Escola e cultura: uma compreensão teórico-metodológica da reprodução e da produção cultural no contexto escolar. In: DAMASCENO, Maria Nobre; THERRIEN, Jacques. Artesãos de outro ofício: múltiplos saberes e práticas no cotidiano escolar. São Paulo: Editora Annablume, 2000, p. 11-25.
HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa: complementos y estudios previos. Madrid: Ediciones Cátedra, 1989.
Professor doutor Francisco Kennedy Silva dos Santos
Docente do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Pernambuco. Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPQ − Nível ٢
Sumário
PARTE I
FUNDAMENTOS TEÓRICOS PARA UMA EDUCAÇÃO GEOGRÁFICA
DO AGIR COMUNICATIVO
19
Capítulo 1
O fundamento social: a sociedade e o espaço como mundo da vida e mundo do sistema 21
1.1 As estruturas do mundo da vida e a produção simbólica do espaço 27
1.2 As estruturas do mundo do sistema e a produção material do espaço 31
1.3 Os mundos formais e o espaço como totalidade 37
Capítulo 2
O fundamento espaçotemporal: a dialética do espaço-mundo da vida 43
2.1 Os ordenamentos espaciais e temporais do mundo da vida 44
2.2 O espaço como mundo da vida e o mundo da vida como espaço 52
Capítulo 3
O fundamento político: o espaço público comunicativo,
a democracia e a cidadania deliberativas 59
3.1 Fundamentação política do espaço 59
3.2 O espaço público comunicativo 62
3.3 Democracia e cidadania deliberativas 71
PARTE II
AS BASES PEDAGÓGICAS PARA UMA EDUCAÇÃO GEOGRÁFICA
DO AGIR COMUNICATIVO
79
Capítulo 4
Aprendizagem, formação da identidade do Eu e os estágios de desenvolvimento moral 81
4.1 Aprendizagem em Habermas e a centralidade da interação social 84
4.2 Os estágios de desenvolvimento do julgar moral: Piaget, Kohlberg e Habermas 86
4.3 Prática comunicativa, discurso argumentativo e aprendizagem 94
Capítulo 5
Crítica e reconstrução da Geografia crítica escolar 101
Capítulo 6
Educação geográfica do agir comunicativo ou Geografia escolar do mundo da vida 111
PARTE III
AÇÕES EDUCACIONAIS, ENSINO-APRENDIZAGEM E DESCOLONIZAÇÃO GEOGRÁFICAS
127
Capítulo 7
Ações didático-pedagógicas, mundo da vida e a educação geográfica 129
7.1 Ações educativas instrumentais, produção material do mundo da vida e o espaço objetivo 134
7.2 Ações educativas estratégicas e ações