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Proteção à mulher: evolução e efetividade das garantias constitucionais
Proteção à mulher: evolução e efetividade das garantias constitucionais
Proteção à mulher: evolução e efetividade das garantias constitucionais
E-book167 páginas2 horas

Proteção à mulher: evolução e efetividade das garantias constitucionais

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Sobre este e-book

Esse livro tem por objetivo o estudo acerca da efetividade da legislação nacional quanto à igualdade de todos perante a lei, especialmente das mulheres, e sua real aplicação, analisando que a difícil obtenção da igualdade desejada esbarra mais em questões culturais do que na legislação.

O compromisso com o regime democrático, na promoção da igualdade entre homens e mulheres, harmoniza com o princípio da dignidade humana e repúdio à intolerância aos diferentes.

Importante provocar a reflexão sobre o papel da interpretação como instrumento de efetividade das normas constitucionais, tanto na criação das leis proibitivas da discriminação e de proteção da mulher pelos diversos entes da federação quanto na interpretação dessas leis, quando questionadas, no Judiciário.

Não obstante o amplo leque de direitos e garantias às mulheres para que tenham sua dignidade valorizada no ambiente doméstico e de trabalho, as pesquisas revelam uma realidade onde impera a discriminação e o desrespeito às normas constitucionais.

Não podemos deixar de destacar o aspecto extremamente absurdo do descompasso existente entre as leis e as medidas oficiais e a realidade social na qual vivemos e para tentarmos entender o porquê de tantas injustiças, negligências, violações de direitos e descaso diário pelos direitos humanos.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento27 de fev. de 2023
ISBN9786525259574
Proteção à mulher: evolução e efetividade das garantias constitucionais

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    Proteção à mulher - Ana Carla Criscione dos Santos

    1 INTRODUÇÃO

    O presente trabalho tem por finalidade elaborar um estudo acerca da efetividade da legislação nacional que assegura a igualdade de todos perante a lei, especialmente das mulheres, e sua real aplicação, analisando que a difícil obtenção da igualdade desejada encontra óbice maior em questões culturais do que na legislação.

    Considerando que o compromisso estabelecido constitucionalmente com o regime democrático, na promoção da igualdade entre homens e mulheres, harmoniza- se com o princípio da dignidade humana e repúdio à intolerância aos diferentes, procurei investigar por qual razão a Constituição Federal, tendo consignado em seu texto vários dispositivos garantidores da igualdade, não reflete as transformações que propugna. Com esse objetivo, pretendi trazer à reflexão o papel da interpretação como instrumento de efetividade das normas constitucionais, tanto na criação das leis proibitivas da discriminação e de proteção da mulher pelos diversos entes da federação, quanto na interpretação dessas leis, quando questionadas, no Judiciário.

    A pesquisa se deu de maneira exploratória, mediante pesquisa bibliográfica sobre os institutos jurídicos relevantes ao tema, com abordagem quantitativa e análise de conteúdo. Além disso, o presente estudo adotou o método dedutivo, decorrente da revisão de literatura em publicações doutrinárias, acadêmicas, jurisprudenciais e legislativa.

    Inicialmente é importante resgatar o papel da legislação na sociedade.

    A legislação, principalmente a federal, nos diz sobre os acordos de uma sociedade consigo mesma, regulando as relações, as instituições e os processos sociais. Por um lado, resguarda os direitos individuais e coletivos frente ao Estado e aos demais indivíduos e instituições; por outro, compromete o Estado com a garantia de direitos, estipulando suas obrigações e responsabilidades.

    Nesse sentido, a Constituição Federal evoluiu no Estado Democrático de Direito para consignar a igualdade meramente formal, perante a lei, e a igualdade material, mediante previsão de medidas punitivas e ações afirmativas de incentivos específicos de compensação, visando a redução das desigualdades sociais por gênero. Com essa finalidade, a Constituição discrimina positivamente a mulher como será visto no decorrer deste trabalho.

    Não obstante o amplo leque de direitos e garantias às mulheres para que tenham sua dignidade valorizada no ambiente doméstico e de trabalho, as pesquisas revelam uma realidade onde impera a discriminação e o desrespeito às normas constitucionais. Como exemplo, o acesso ao mercado de trabalho é limitado pelas exigências discriminatórias; a contratação é vista com reserva; exigências são feitas em relação à procriação e estado civil, são diferentes os salários e o exercício de funções. Por isso, a erradicação da discriminação por sexo e a materialização do princípio da igualdade faz-se mais exigente no Estado Democrático de Direito em que o princípio da dignidade humana foi erigido à condição de princípio fundamental da República, cujo status impede qualquer transigência seja na esfera pública ou privada. O grande paradoxo existente nessa questão é que, com a Lei 11.340/2006, Lei

    Maria da Penha, o Brasil é considerado teoricamente avançado no que diz respeito à violência doméstica e familiar contra as mulheres (OLIVEIRA, 2016, p. 94) na garantia dos direitos fundamentais e de exercício da cidadania e, no entanto, apresenta uma realidade desigual e injusta, o que causa sentimento de descrédito e desalento em relação às conquistas legais, como se a letra da lei não se refletisse no cotidiano do brasileiro e ainda persiste uma grande lacuna entre os direitos formais e os direitos de fato, excluindo da cidadania largas parcelas da população feminina. (PASINATO, 2015, p. 408).

    Maria Amélia Almeida de Teles enfatiza que:

    Não podemos deixar de destacar o aspecto extremamente absurdo do descompasso existente entre as leis e as medidas oficiais e a realidade social na qual vivemos e para tentarmos entender o porquê de tantas injustiças, negligências, violações de direitos e descaso diário pelos direitos humanos. (TELES, 2017, p. 8/9).

    Ante esse quadro de aparente contraste entre a Constituição e a realidade, é possível observar a importância da interpretação constitucional na criação de normas de combate à discriminação da mulher e a chancela do intérprete máximo da Constituição na aplicação dessas leis como forma de efetivação do princípio da igualdade entre homens e mulheres.

    Esses processos subjetivos são compreensíveis, mas, no entanto, não se pode esquecer, que o avanço legislativo é resultado de luta dos agentes políticos para consolidar a cidadania e os direitos fundamentais como alicerce da democracia brasileira.

    A legislação expressa os desejos e a intenção de redirecionar as realidades ao garantir direitos ou impor deveres, seja no âmbito individual quanto social ou coletivo.

    Assim, quando a legislação não é efetivada pelo Poder Executivo e devidamente resguardada pelo Poder Judiciário passa a inspirar movimentos sociais para que os direitos na lei se transformem em direitos na vida.

    Outro aspecto também importante a ser destacado é o de que a legislação merece ser considerada em sua dimensão dinâmica e processual. Nesse sentido, os direitos, no caso os direitos das mulheres, foram sendo conquistados e ampliados ao longo dos anos, especialmente no período pós-Constituinte. No entanto, o passar do tempo não aponta necessariamente para a garantia de direitos, pois, que as raízes da violência e desigualdade são mais profundas e estão no machismo que está arraigado na cultura centro americana. Para o machismo, a violência constitui um valor positivo, um componente central na construção da identidade masculina, cujos atributos são a dureza, a força, a agressividade. O conceito de amor romântico legitima os elos e as exigências de fidelidade, estimulando comportamentos de controle e posse, fatores de risco para o exercício da violência doméstica contra mulheres, conforme comumente se percebe em letras de músicas, textos literários ou ditos populares. A impossibilidade de estabelecer relações equitativas dentro da relação afetiva, entre pais e filhos, entre mães e filhos, entre irmãos e irmãs faz com que a violência seja um mecanismo de solução dos conflitos e a desigualdade um fator de dominação.

    Em virtude deste componente cultural, que não pode ser ignorado, é que se faz igualmente fundamental a ação educativa dos mais diversos núcleos sociais brasileiros, incluindo-se as instituições, caso de fato se pretenda combater de modo eficaz a violência e a desigualdade no país, dando assistência e orientação, até mesmo tratamento, aos homens, a fim de desconstruir os estereótipos a respeito de gênero (JACINTO, 2018, p. 30)¹² e masculinidade e embasar uma nova fase de respeito às diferenças em prol da tal almejada igualdade no espaço público, assim como no lar.


    1 O termo gênero passou a ser utilizado, na década de 1980, por feministas norte-americanas e inglesas, no lugar do termo sexo, a fim de distanciar o feminino e masculino do determinismo biológico usado como justificativa para as desigualdades sociais entre homens e mulheres. O desafio era se contrapor à ideia de que as diferenças entre homens e mulheres eram naturais, assim como a invisibilidade e desvalorização social das características femininas. (JACINTO, 2018, p. 30).

    2 Joan Scott, define o termo gênero no artigo Gênero: uma categoria útil de análise histórica [...] tem duas partes e diversas subpartes. Elas são ligadas entre si, mas deveriam ser distinguidas na análise. O núcleo essencial da definição repousa sobre a relação fundamental entre duas proposições: o gênero é um elemento constitutivo de relações sociais fundadas sobre as diferenças percebidas entre os sexos e o gênero é um primeiro modo de dar significado às relações de poder.

    2 PRINCÍPIOS E REGRAS

    Para iniciar o estudo do tema deste trabalho, reputei necessária a análise de conceitos doutrinários a respeito de princípios, diferenças entre princípios e regras, a fim de melhor discorrer sobre os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da igualdade, com a posterior análise das ações afirmativas e posteriores avanços da legislação nacional na proteção das mulheres, tanto na Constituição quanto na legislação infraconstitucional.

    Conquanto o vocábulo princípio seja altamente polissêmico mesmo no discurso jurídico, parece ser unânime a inclusão do direito à igualdade na categoria de princípios jurídicos. A razão mais importante para a unanimidade consiste no fato de que, qualquer que seja a definição de princípio adotada, o direito à igualdade estará incluído entre os princípios. Como exemplo, a partir da definição de princípio mais utilizada no Brasil – que seriam as normas jurídicas mais importantes de um ordenamento jurídico (SILVA, V., 2010, p. 44)³ – não haveria nenhum problema em se enquadrar o direto à igualdade na categoria, já que se trata de uma normal de suam importância que dirige a aplicação de outras normas. É curioso notar que, enquanto a inclusão do direito de igualdade na categoria de princípios não é problemática, o que é problemática e a própria definição da categoria.

    Desse modo, levando-se em conta o uso indiscriminado de palavras polissêmicas ou palavras camaleônicas (ALEXY, 2008b, p. 45), pode prejudicar o rigor metodológico das investigações científicas (SILVA, V., 2008, p. 35), em especial quanto a sua fundamentação, deve-se tratar do conceito de princípio que será utilizado no decorrer deste trabalho.

    Inicialmente, deve-se ter em mente que uma norma jurídica, qualquer que seja sua hierarquia, ou é uma regra ou é um princípio (ALEXY, 2008b, p. 91). Regra e princípio são espécies do gênero norma (SILVA, V., 2003, p. 607) e uma norma nunca poderá ser uma regra e um princípio ao mesmo tempo (BOROWSKI, 2003, p. 48). Cabe analisar quais são os critérios utilizados para essa diferenciação, configurando uma tese da separação rigorosa entre regras e princípios.

    Várias são as propostas de critérios para diferenciar as regras dos princípios. No Brasil, prevalece a ideia segundo a qual os princípios são as normas mais importantes do ordenamento jurídico (SILVA, V., 2010, p. 44), são normas que, segundo P. Carvalho, portam [...] núcleos significativos de grande magnitude influenciando visivelmente a orientação de cadeias normativas [...] (CARVALHO, P., 2009, p. 268). Na Alemanha, por sua vez, alguns autores procuram diferenciar as regras dos princípios a partir do grau de generalização e de abstração da norma ou de seu fundamento de validade (J. Esser, E. Forsthoff, K. Larenz, H. Wolff E O. Bachof). Outros, a partir da explicitude de seu conteúdo axiológico (C. Canaris). Por fim, muitos autores de inspiração anglo-saxônica entendem que a diferença entre regras e princípios deriva do modo de aplicação da norma: as regras se aplicam no tudo-ou-nada e o eventual conflito entre regras é resolvido na dimensão da validade; já os princípios consistem em fundamentos que devem ser conjugados com outros (R. Dworkin) ou em mandamentos de otimização (R. Alexy) (ALEXY apud AVILA, 2001, p. 5-10) e a eventual colisão entre princípios é resolvida na dimensão do peso, mediante sopesamento.

    A escolha do critério

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