Atlas Linguístico do Brasil
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Atlas Linguístico do Brasil - Suzana Alice Marcelino da Silva Cardoso
ATLAS LINGUÍSTICO DO BRASIL - VOLUME 1 - INTRODUÇÃO
Reitora
Nádina Aparecida Moreno
Vice-Reitora
Berenice Quinzani Jordão
Editora da Universidade Estadual de Londrina
Diretora
Maria Helena de Moura Arias
Conselho Editorial
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Edison Archela
Efraim Rodrigues
José Fernando Mangili Júnior
Marcia Regina Gabardo Camara
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Maria Helena de Moura Arias (Presidente)
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Renata Grossi
Rosane F. Freitas Martins
A Eduel é afiliada à
Catalogação elaborada pela Divisão de Processos Técnicos da
Biblioteca Central da Universidade Estadual de Londrina
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
Bibliotecária: Solange Gara Portello – CRB-9/1520A881 Atlas linguístico do Brasil [livro eletrônico] : volume 1 / [organizadora: Vanderci de Andrade Aguilera]. – Londrina : Eduel, 2018.
1 Livro digital : il.
Vários autores.
Inclui bibliografia.
Disponível em: http://www.eduel.com.br
ISBN 978-85-7216-993-6
1. Língua portuguesa – Dialetos – Brasil. 2. Língua portuguesa – Dialetologia. 3. Geografia linguística. I. Aguilera, Vanderci de Andrade.
CDU 806.90(81)-087.9(084.4)
Direitos reservados à
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Caixa Postal 10.011
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www.eduel.com.br
Depósito Legal na Biblioteca Nacional
2018
Aos nossos 1.100 informantes,
espalhados pelos 8.515.767 km²
de terras brasílicas.
AGRADECIMENTOS
A construção do Atlas linguístico do Brasil no tocante ao português brasileiro, língua majoritariamente falada no território nacional, começa com a contribuição dos nossos maiores, pioneiros da Dialetologia no Brasil, Antenor Nascentes, Serafim da Silva Neto, Celso Cunha, Nelson Rossi, que implementaram a ideia e deram os primeiros passos, e para os quais se voltam os primeiros agradecimentos.
Empreender um projeto que demanda a investigação in loco, em um país de dimensões continentais como o Brasil, requer suporte financeiro para a sua sustentação que não só permita a efetivação da pesquisa, mas que assegure a continuidade da sua realização no período previsto, segundo a metodologia estabelecida e a ágil divulgação de resultados.
Para tanto, embora não tenha contado com um financiamento global, por diversas vezes reivindicado junto às instituições nacionais que dão suporte à pesquisa, vem-se mantendo com a concessão de auxílios e de apoios que, nada obstante os valores liberados, têm assegurado a concretização deste empreendimento nacional.
A rede de apoio e de colaboradores tem, como o próprio país, uma vasta amplitude. Nela se incluem instituições oficiais e privadas, personalidades de cada uma das cidades visitadas, igrejas, agremiações sociais, escolas, cidadãos comuns sediados em todos os lados. A visita a cada ponto da rede se fez preceder, sempre que possível, do contato com pessoas e instituições da localidade no sentido de indicarem caminhos para encontrar informantes e, de certo modo, endossar a validade e a seriedade das entrevistas a serem feitas junto à comunidade que, muitas vezes, sentia-se receosa e precisava de um aval de morador local de sua confiança. Todos eles são credores do nosso apreço e reconhecimento.
O Comitê Nacional, responsável pela execução deste atlas, sensibilizado pelos apoios recebidos, agradece:
Aos 1.100 informantes, personagens essenciais deste atlas e seus verdadeiros autores, pela paciência em atender os documentadores, pela compreensão do trabalho e pela sensibilidade demonstrada ao fornecerem as suas respostas.
Às Universidades a que se filiam os membros do Comitê Nacional e suas Equipes de Pesquisadores que entenderam a importância do trabalho e, na medida de suas disponibilidades, apoiaram-no materialmente:
Universidade Federal da Bahia
Universidade Estadual de Londrina
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
Universidade Federal do Pará
Universidade Federal do Ceará
Universidade Federal da Paraíba
Universidade Federal de Santa Catarina
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Universidade Federal de Juiz de Fora
Universidade Federal de Ouro Preto
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Universidade Federal do Maranhão
Universidade Estadual de Campinas
Universidade Estadual do Ceará
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte
União Metropolitana de Educação e Cultura
Às autoridades municipais e aos habitantes das localidades inquiridas, solícitos na informação e cordiais na hospitalidade.
A familiares, a começar pelos de casa e os demais espalhados por várias cidades, e aos amigos dos membros do Comitê Nacional, residentes nas localidades que integram a vasta rede de pontos, cujo apoio foi significativo na condução das equipes de pesquisa em suas áreas de investigação, na busca de informantes e na acolhida dos pesquisadores em suas casas, contribuindo, assim, para reduzir os custos e viabilizar o trabalho.
A organismos oficiais de fomento à pesquisa que, reconhecendo a relevância de um atlas linguístico do Brasil, têm sido constantes no seu apoio:
CNPq - Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento, que deu curso a muitas das solicitações formuladas, particularmente na concessão de Bolsas de Pesquisador-Pq a membros do Comitê Nacional, de Bolsas de Iniciação Científica-PIBIC e de Apoio Técnico, de auxílio para a realização de workshops, para a aquisição de equipamento, para a realização de trabalho de campo (diárias, passagens, material de expediente) e para a montagem do Banco de Dados.
CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, que concedeu auxílio para a realização de workshops, para publicações de análises preliminares e, por meio do convênio CAPES-COFECUB n° 651/09, para compra de material de consumo.
EDUEL - Editora da Universidade Estadual de Londrina, particularmente no momento de impressão dos Questionários 2001, na direção do Dr. Leonardo Prota, em 2001, e hoje, na publicação dos primeiros volumes acolhidos pela Drª Maria Helena de Moura Arias, atual Diretora.
Registra-se, ainda, o apoio significativo dos seguintes órgãos:
CADCT - Centro de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Estado da Bahia.
FAPESB - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia.
FUNDAÇÃO ARAUCÁRIA de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Paraná.
FAPEMA - Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão.
FAPEMIG - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais.
FAPERJ - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro.
FUNDECT - Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul.
Os agradecimentos se estendem a Universidades que, pontualmente, contribuíram, auxiliando na busca de informantes, na concessão de hospedagem para o período de visita à localidade, na liberação de veículo para facilitar o deslocamento dos inquiridores na cidade e no prestimoso acolhimento, listados a seguir:
Universidade Federal de Rondônia
Universidade Federal do Amazonas
Universidade Federal do Piauí
Universidade Potiguar
Universidade do Estado da Bahia, Campus de Seabra
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
Universidade Federal de Mato Grosso, Campus de Barra do Garças e Campus de Cuiabá
Universidade Estadual do Estado de Mato Grosso, Campus de Cáceres, Alto Araguaia e Pontes de Lacerda
Universidade Federal de Goiás
Universidade Estadual de Goiás
Particular reconhecimento é devido a todas as Secretarias de Educação do conjunto de municípios visitados pelos pesquisadores do atlas e aos quais se vinculam as localidades integrantes da rede de pontos.
Ao apoio institucional junta-se a efetiva colaboração dos membros das Equipes Regionais, cujo trabalho sustentou a construção dos caminhos, até o presente momento, percorridos: Ana Regina Ferreira Teles, Daniela Barreiro Claro, Marcela Moura Torres Paim, Silvana Soares Costa Ribeiro e Viviane Gomes de Deus Deiró (UFBA); Sandra Cerqueira Pereira Prudêncio e Sílvia Santos Gonçalves (UNIME); Ana Paula Antunes Rocha (UFOP); Cláudia de Souza Cunha (UFRJ); Mariana da Silva Cunha (UFAL) e dos ex-alunos: José Amarante Santos Sobrinho, Marian dos Santos Oliveira, Mércia Silva Abreu, Sinval Araújo de Medeiros Júnior, Uilton Santos Gonçalves da Equipe coordenada por Jacyra Mota; Alcides Fernandes de Lima, Arlon Francisco Carvalho Martins, Marilúcia Barros de Oliveira da Equipe coordenada por Abdelhak Razky; Ivone Tavares de Lucena, Maria Angélica Oliveira (UFPB); Maria das Neves Pereira (UFERSA, Campos de Angicos); Antonio Luciano Pontes (UECE/UERN), Maria Silvana Militão de Alencar (UFC), Aluiza Alves de Araújo (UECE), Jamyle dos Santos Monteiro (UFC), Glauber Lima Moreira (UFPI, Campus Ministro Reis Velloso); Conceição de Maria de Araújo Ramos, José de Ribamar Mendes Bezerra, Maria de Fátima Sopas Rocha, Cibelle Corrêa Béliche Alves, Marta Maria Portugal Ribeiro Parada, Georgiana Márcia Oliveira Santos (UFMA) da Equipe coordenada por Maria do Socorro Silva de Aragão; Auri Claudionei Matos Frubel (UFMS), Carla Regina de Souza Figueiredo e Regiane Coelho Pereira Reis (UEMS) da Equipe coordenada por Aparecida Isquerdo; Ariane Cardoso dos Santos-Ikeuchi, Daniele Silva Pastorelli, Dayse de Souza Lourenço, Dircel Aparecida Kailer, Fabiane Cristina Altino, Gabriela Landes Biolada, Greize Alves da Silva-Porelli, Hélen Cristina da Silva, Márcia Luciana da Rocha Dei Tós, Rosa Evangelina Belli de Santana Rodrigues, Rosana Gemima Amâncio, Valter Pereira Romano, Vandersi Sant’Ana Castro e Vanessa Yida, da Equipe coordenada por Vanderci de Andrade Aguilera; Antonio José de Pinho, Alessandra Bassi e Marcelo Jacó Krug, da Equipe coordenada por Felício Wessling Margotti (UFSC) e por Cléo Vilson Altenhofen (UFRGS).
Para a elaboração do Volume 2 - Cartas linguísticas 1, mister se faz destacar, na construção dos mapas, o trabalho criterioso da Comissão de Informatização e Cartografia (CIC), desenvolvido pelas professoras da Universidade Federal da Bahia, Ana Regina Ferreira Teles (Departamento de Transportes, Escola Politécnica), Silvana Soares da Costa Ribeiro (Departamento de Letras Vernáculas, Instituto de Letras) e Daniela Claro Barreiro (Departamento de Ciência da Computação, Instituto de Matemática), e, particularmente, o empenho da nossa engenheira cartógrafa, Ana Regina Ferreira Teles, responsável pela produção das cartas linguísticas. Na preparação dos dados linguísticos, ressalta-se a participação de Amanda dos Reis Silva, Cláudia Santos de Jesus e Élide Ellen Santana, mestrandas da UFBA; Fabiane Cristina Altino, Valter Pereira Romano, Hélen Cristina da Silva, da UEL; Aluiza Alves de Araújo, da UECE; Anna Carolina Chierotti dos Santos Ananias, Carla Regina de Souza Figueiredo, Daniela de Souza Silva Costa, Luciene Gomes Freitas-Marins, Regiane Coelho Pereira Reis e Vanessa Cristina Martins Benke, da UFMS; Regis José da Cunha Guedes, Eliane Oliveira da Costa, Alcides Fernandes de Lima e Marilúcia Barros de Oliveira, professores da UFPA.
Como apoio constante às Equipes Regionais, figura a contribuição efetiva de Bolsistas de Iniciação Científica, que vêm atuando desde 1997 e ultrapassam a casa da centena, vinculados ao CNPq, FAPESB, Fundação Araucária, FADCT, FAPESPA, FUNDECT, FAPEMA, FAPEMIG.
Não integrantes das Equipes do ALiB, mas no interior da Academia, manifesta-se agradecimento pelo apoio e colaboração, em diferentes momentos e em graus e circunstâncias diferenciados a: Antônia Torreão Herrera (UFBA), Carlota da Silveira Ferreira (UFBA), Célia Marques Telles (UFBA), Denise Scheyerl (UFBA), Dinah Maria Isensee Callou (UFRJ), Edmilson José de Sá (Autarquia de Ensino Superior de Arcoverde), Dercir Pedro de Oliveira (UFMS), Iracema Luíza de Sousa (UFBA), João Antônio de Moraes (UFRJ), Josane Moreira de Oliveira (UEFS), Judith Mendes de Aguiar Freitas (UFBA), Maria de Fátima Dias Costa (UFBA), Maria Denilda Moura (UFAL), Risonete Batista de Souza Batista (UFBA), Rosauta Fagundes Poggio (UFBA), Sílvia Figueiredo Brandão (UFRJ), Vera Pacheco (UESB), Vera Lúcia Sampaio Rollemberg (UFBA).
Graças aos apoios recebidos, ao reconhecimento da relevância de um atlas linguístico do Brasil e, muito particularmente, ao empenho e coragem dos nossos inquiridores foi possível cumprir a meta estabelecida: a documentação, in loco, de 1.100 informantes moradores de 250 localidades, distribuídas de Oiapoque (ponto 001) a Chuí (ponto 250).
Comitê Nacional do Atlas Linguístico do Brasil
Suzana Alice Marcelino da Silva Cardoso, Diretora-Presidente (Bahia, UFBA/CNPq)
Jacyra Andrade Mota, Diretora Executiva (Bahia, UFBA/CNPq)
Maria do Socorro Silva de Aragão, Diretora Científica (Paraíba/Ceará, UFPB/UFCE)
Vanderci de Andrade Aguilera, Diretora Científica (Paraná, UEL/CNPq)
Aparecida Negri Isquerdo, Diretora Científica (Mato Grosso do Sul, UFMS/CNPq)
Cléo Vilson Altenhofen, Diretor Científico (Rio Grande do Sul, UFRGS)
Abdelhak Razky, Diretor Científico (Pará, UFPA)
Felício Wessling Margotti, Diretor Científico (Santa Catarina, UFSC)
Mário Roberto Lobuglio Zágari, Diretor Científico (Minas Gerais, UFJF)
Walter Koch, Diretor Científico (Rio Grande do Sul, UFRGS)
Comissão de Informatização e Cartografia
Ana Regina Torres Ferreira Teles (UFBA)
Daniela Barreiro Claro (UFBA)
Silvana Soares da Costa Ribeiro (UFBA)
APRESENTAÇÃO
Com estes dois volumes — Volume 1 - Introdução e Volume 2 - Cartas linguísticas 1 —, dá-se início à publicação do Atlas linguístico do Brasil, cumprindo-se, assim, o compromisso firmado, em 1996, por ocasião do Simpósio Caminhos e Perspectivas para a Geolinguística no Brasil (Salvador, Universidade Federal da Bahia, novembro, 1996), e atendendo a desejo, de há muito manifesto, de que venha o nosso país a ter o seu atlas linguístico nacional, no tocante à língua portuguesa.
Relata-se, no Volume 1, parte significativa da história da construção do Atlas linguístico do Brasil, apresenta-se a metodologia seguida, com destaque para a rede de pontos, os questionários e os informantes, a que se junta a informação sobre a cartografia dos dados. O Volume 2, que a este se segue, traz resultados das 25 capitais brasileiras objeto da pesquisa — Palmas e Brasília, por razões metodológicas, não foram incluídas —, espelhados em mapas linguísticos com dados fonéticos, morfossintáticos e semântico-lexicais que exibem a realidade estudada. Um terceiro, previsto para posterior publicação, apresentará estudos circunstanciados sobre os diferentes temas refletidos nas cartas linguísticas. Na continuidade do trabalho, os demais volumes programados se ocuparão do perfil mais amplo ao conjugar a essas informações iniciais o que retrata toda a rede nacional, representativa das diferentes áreas geográfico-culturais do território nacional.
Em terras do Brasil, abril de 2014.
O Comitê Nacional do Atlas linguístico do Brasil
Suzana Alice Marcelino Cardoso, Diretora-Presidente
(Bahia, UFBA/CNPq)
Jacyra Andrade Mota, Diretora Executiva
(Bahia, UFBA/CNPq)
Vanderci de Andrade Aguilera, Diretora Científica
(Paraná, UEL/CNPq)
Maria do Socorro Silva de Aragão, Diretora Científica
(Paraíba/Ceará, UFPB/UFCE)
Aparecida Negri Isquerdo, Diretora Científica
(Mato Grosso do Sul, UFMS/CNPq)
Cléo Vilson Altenhofen, Diretor Científico
(Rio Grande do Sul, UFRGS)
Abdelhak Razky, Diretor Científico
(Pará, UFPA/CNPq)
Felício Wessling Margotti, Diretor Científico
(Santa Catarina, UFSC)
A HISTÓRIA DO ATLAS LINGUÍSTICO DO BRASIL
Suzana Alice Marcelino da Silva Cardoso
UFBA/CNPq
Antecedentes históricos
A história de um atlas linguístico do Brasil tem o seu começo na primeira metade do século XX e está vinculada a nomes como Antenor Nascentes, Serafim da Silva Neto, Celso Cunha e Nelson Rossi.
A primeira manifestação oficial, porém, em favor da elaboração de um atlas linguístico do Brasil remonta a 1952, quando, com o Decreto nº 30.643, de 20 de março, o governo brasileiro determinou, como se lê no parágrafo 3º do Art. 3º, como principal finalidade da Comissão de Filologia da Casa de Rui Barbosa a elaboração do atlas linguístico do Brasil
(BRASIL, 1952a):
§3º - A Comissão de Filologia promoverá pesquisas em todo o vasto campo de filologia portuguesa-fonologia, morfológicas, sintáticas, léxicas, etimológicas, métricas, onomatológicas, dialetológicas, bibliográficas, históricas, literárias, problemas de texto, de fontes, de autoria, de influências, sendo sua finalidade principal a elaboração do Atlas Lingüístico do Brasil
(grifo nosso).
Tal determinação foi regulamentada pela Portaria nº 536, de 26 de maio do mesmo ano, do Ministério da Educação e Saúde (BRASIL, 1952b), a qual, ao baixar instruções referentes à execução do Decreto de Criação do Centro de Pesquisas Casa de Rui Barbosa, estabeleceu como finalidade principal, entre as pesquisas a serem planejadas, a própria elaboração do atlas linguístico do Brasil.
Silva Neto, ao definir, com muita clareza, as tarefas que considerava urgentes para a concretização dos estudos dialetais no Brasil, estabeleceu, no seu Guia para estudos dialectológicos (1957, p. 11), um rol delas, dentre as quais se lê, no inciso f): inquérito nacional feito com questionário uniforme e distribuição geográfica dos materiais recolhidos, em mapas (Atlas Nacional)
.
Nascida a ideia, ganhou corpo nas proposições do próprio Serafim da Silva Neto, de Celso Cunha e Antenor Nascentes. Os dois primeiros, por ocasião do III Colóquio Internacional de Estudos Luso-Brasileiros, realizado em Lisboa, em 1957, defenderam a necessidade de elaboração de atlas linguísticos regionais, e, assim, se manifestaram:
§ 2. Embora não devamos perder de vista a possibilidade futura de um Atlas Nacional, as condições actuais aconselham-nos a fixar a atenção apenas em trabalhos de elaboração menos complexa e penosa, ou melhor dizendo, em programar uma série de atlas regionais. A realização destes nos permitirá cogitar, mais tarde, da obra gigantesca da recolha global do território brasileiro.
Uma dificuldade, porém, tem de ser prèviamente removida no planejamento de atlas regionais de um país como o Brasil, que, linguìsticamente, constitui enorme área de colonização. Referimo-nos à própria divisão em áreas regionais, ou, como nos parece preferível, em áreas culturais, já que desta forma podemos interpretar aquelas (CUNHA; SILVA NETO, 1960, p.406-407, grifos dos autores).
Dificuldades de ordem financeira, inexistência de equipes de pesquisadores preparadas para esse tipo de investigação que pudessem assumir a empreitada recobrindo todo o território nacional e a precariedade da rede de estradas que não favorecia a circulação sem grandes problemas constituíram-se, àquele momento, óbices de difícil superação para a realização de um atlas nacional. A esses dois filólogos, somou-se Antenor Nascentes, que, assumindo a mesma posição, deu passos iniciais concretos com a publicação das Bases para a elaboração do atlas lingüístico do Brasil, obra em dois volumes, saídos o primeiro em 1958 e o segundo em 1961, na qual estabelece, como o próprio nome sugere, passos fundamentais para o início do trabalho nesse campo. Discute, na pequena introdução, as vantagens de um atlas feito ao mesmo tempo para todo o país, mas reconhece a impossibilidade de sua concretização nesses termos entre nós, argumentando com a vastidão do nosso território e a dificuldade de acesso aos diferentes pontos, assim se manifestando:
Embora seja de toda vantagem um atlas feito ao mesmo tempo para todo o país, para que o fim não fique muito distanciado do princípio, os Estados Unidos, país vasto e rico e com excelentes estradas, entregou-se à elaboração de atlas regionais, para mais tarde juntá-los no atlas geral.
Assim também devemos fazer em nosso país, que é também vasto e, ainda mais, pobre e sem fáceis vias de comunicação (NASCENTES, 1958, p.7).
Reúne, nas suas Bases, informações fundamentais para o início de um trabalho no campo da Geolinguística, após recomendar que os atlas regionais sejam inicialmente feitos onde já se tenham realizado sondagens sobre quatro pontos fundamentais para a efetivação da pesquisa dialetal, que assim define: a anotação de dados sobre o informante, as notas sobre a localidade, o questionário e a escolha das localidades. Apresenta os instrumentos necessários para o desenvolvimento do trabalho: o questionário organizado em áreas semânticas e, em caráter provisório
, como indica, e uma rede de pontos distribuídos pelos diferentes estados, declarando estar sujeita ao parecer do técnico encarregado de dirigir os trabalhos em cada região, na qualidade de melhores conhecedores do terreno
(NASCENTES, 1958, p.19).
Destaca-se da obra a indicação da rede de pontos a ser considerada, pode-se dizer, obrigatoriamente, por todos os que se empenham em definir localidades para a constituição de uma pesquisa dialetal. Para o Projeto Atlas Linguístico do Brasil foram analisadas todas as indicações feitas por Nascentes e mantidas aquelas cuja pertinência se evidenciava.
Ao se explicitar, pela primeira vez, em 1952, o desejo de elaboração de um atlas linguístico brasileiro, a Europa já havia produzido alguns atlas, a Península Ibérica, em particular, tentava concluir o Atlas lingüístico de la Península Ibérica, e o Brasil apresentava condições bem diversas daquelas de que hoje se reveste. A população, segundo o censo de 1950, atingia a cifra de 51.944.397 habitantes, dos quais 33.161.506 se situavam na zona rural e apenas 18.782.891 estavam estabelecidos na zona urbana, ou seja, aproximadamente 63% da população se encontravam no campo e apenas 37% nas grandes cidades, o que revela uma maior concentração demográfica fora dos centros urbanos. Os meios de comunicação — telefone, rádio, televisão — tinham um perfil muito tímido, cujos dados não vêm registrados nas estatísticas para aquele ano. A extensão da rede de estradas de ferro em tráfego alcançava 36.681 km. As rodovias se estendiam por 341.035 km. As empresas aéreas civis atingiam um percurso de 96.600.775 km, e a navegação marítima e a fluvial apresentavam um movimento de 406 embarcações em tráfego.¹ Findo o século XX, e no alvorecer do século XXI, a situação que apresenta, hoje, o país, no tocante a esses mesmos itens, é — como não poderia deixar de sê-lo — bem diferente. Segundo o Censo de 2010, conta-se, atualmente, com 28.314 km de estradas de ferro,² com uma rede rodoviária de 1.691.215,900 km³ e, no que se refere à ocupação do país, registra-se uma população urbana de 160.925.792 e uma população rural de 29.830.007.⁴
Essa breve referência a momentos distintos da realidade deixa evidentes alguns aspectos da construção da história do país. Assim, os limites geográficos tornaram-se tênues, e mais tênues, ainda, considerando-se a invasão domiciliar de informações universais e simultâneas aos acontecimentos que facultam o rádio, a televisão e a informática; a mobilidade social, seja por obrigação de trabalho, seja pelo lazer, que faz de cada rincão uma miniatura do universo e de cada cidadão, cada vez mais, um homem sem fronteiras; a política econômica de fomento ao turismo que põe em contacto diuturnamente populações extremas, costumes díspares, usos linguageiros diferenciados; os avanços tecnológicos que encurtam as distâncias e aproximam os povos.
Uma conclusão se torna óbvia: o Brasil mudou muito nesses últimos sessenta anos. A modificação na configuração demográfica do país, com o aumento de concentração da população nos grandes centros urbanos, com o esvaziamento das áreas rurais e com a intensa migração interna, tem trazido não só uma nova dimensão social, mas também política, que, por certo, se fazem acompanhar de mudanças linguísticas cuja extensão ainda não se pode avaliar. Em decorrência, a língua sofre, ipso facto, mutações consideráveis e ágeis. Tudo isso se constitui razão maior para justificar a necessidade de descrever-se a realidade brasileira antes que se percam traços e usos, formas e estruturas ainda não formalmente identificadas, registradas e catalogadas.
Nesse quadro geral político, econômico, social e de desenvolvimento dos estudos dialetais, retomou-se a ideia de um atlas linguístico do Brasil no tocante à língua portuguesa. As dificuldades para implementação da investigação dialetal parecem amenizadas, a formação de pesquisadores, especificamente na área da Geolinguística, vem sendo ampliada de forma significativa, como se comprova com o crescente número de dissertações de Mestrado e teses de Doutorado voltadas para essa temática, e as formas de sustentação do trabalho, ainda que não sejam satisfatórias nem as desejadas, vêm assegurando a implementação das atividades.
A construção do Projeto Atlas Linguístico do Brasil
Entendendo-se que os obstáculos que se interpunham no caminho da realização de um atlas nacional se encontravam, de certo modo, vencidos, e reconhecendo-se que a nova configuração da realidade brasileira estava a exigir, de imediato, a construção de um atlas linguístico geral do Brasil no tocante à língua portuguesa, pesquisadores, na área, de várias partes do Brasil, contando com a participação do Prof. Michel Contini, Diretor do Centre de Dialectologie da Université Sthendal Grenoble 3, diretor do Atlas linguistique roman e membro do Comitê Diretor do Atlas linguarum Europae, reuniram-se no Instituto de Letras da Universidade Federal da Bahia, nos dias 4 a 6 de novembro de 1996, por ocasião do Seminário Caminhos e Perspectivas para a Dialectologia no Brasil. Realizou-se por iniciativa da Equipe de Dialetologia dessa Universidade e foi coordenado por Suzana Alice Marcelino Cardoso, que, na abertura, enfatizou a importância e a atualidade da retomada da construção de um atlas linguístico do Brasil. Esse seminário assinalou o renascimento da ideia que foi impulsionada com entusiasmo e afinco pela comunidade de geolinguistas brasileiros presentes e, posteriormente, pelos que vieram a associar-se ao projeto, e lançou as bases da nova investigação.
Temas diversos de fundamental importância para a definição de metas a serem atingidas foram tratados em duas conferências pronunciadas por Michel Contini — "L’Atlas linguarum Europae: le premier chantier de géolinguistique à l’echelle d’un continent e
l’Atlas linguistique roman: un projet de géo-linguistique du Centre de Dialectologie de Grenoble sur l’ensemble des parlers romans — e em duas mesas-redondas —
Quadro atual da geolinguística no Brasil: atlas publicados, com a participação de Carlota Ferreira, Mário Zágari, Maria do Socorro Aragão, Jacyra Mota e Vanderci Aguilera, e
Quadro atual da geolinguística no Brasil: atlas em andamento, com a participação de Sílvia Brandão, Walter Koch e Albana Nogueira. O traçado da linha metodológica a ser perseguida foi delineado a partir da mesa-redonda
Metodologia e técnica para a elaboração de um atlas geral do Brasil: localidades, informantes, questionário, sistema(s) de transcrição, elaboração de cartas", da qual participaram Sílvia Brandão, Carlota Ferreira, Walter Koch e Hilda Vieira.
Aprovada a ideia, foi produzida a Carta de Salvador, firmada, na ordem em que se apresentam as assinaturas, por Suzana Alice Marcelino da Silva Cardoso (Universidade Federal da Bahia), Michel Contini (Université de Grenoble), Maria do Socorro Silva de Aragão (Universidade Federal do Ceará, Universidade Federal da Paraíba, Universidade Estadual do Ceará), Jacyra Andrade Mota (Universidade Federal da Bahia), Abdelhak Razky (Universidade Federal do Pará), Mário Roberto Lobuglio Zágari (Universidade Federal de Juiz de Fora), Walter Koch (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), Dercir Pedro de Oliveira (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), Hilda Gomes Vieira (Universidade Federal de Santa Catarina), Vanderci de Andrade Aguilera (Universidade Estadual de Londrina), Sílvia Figueiredo Brandão (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Maria José de Toledo Gomes (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), Maria Emília Barcelos (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Albana Xavier Nogueira (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), Carlota da Silveira Ferreira (Universidade Federal da Bahia), Luíza Galvão Lessa (Universidade Federal do Acre), Vera Lúcia Sampaio Rollemberg (Universidade Federal da Bahia), Judith Mendes de Aguiar Freitas (Universidade Federal da Bahia).
Medidas imediatas para a consecução do objetivo foram definidas, iniciando-se pela criação de um Comitê Nacional que se encarregaria da estruturação do projeto e da implantação da pesquisa, formado por representantes dos atlas até então publicados e de um representante dos atlas em andamento. Constituiu-se esse Comitê, na sua primeira composição, dos professores Suzana Alice Marcelino Cardoso (UFBA, Diretora-Presidente), Jacyra Andrade Mota (UFBA, Diretora Executiva), Maria do Socorro Silva de Aragão (UFPB/UFC/UEC, Diretora Científica), Mário Roberto Lobuglio Zágari (UFJF, Diretor Científico), Vanderci de Andrade Aguilera (UEL, Diretora Científica) e Walter Koch (UFRGS, Diretor Científico).
Publicado, em 2002, o primeiro volume do Atlas lingüístico-etnográfico da Região Sul do Brasil (ALERS), Walter Koch deixou de figurar como representante dos atlas em andamento e Aparecida Negri Isquerdo passou, nessa condição, também a integrar o Comitê Nacional. Em 2004, após a publicação do Atlas lingüístico sonoro do Pará, Abdelhak Razky foi convidado a integrar o Comitê Nacional, representando mais um autor de atlas linguístico regional publicado.
Com o falecimento dos diretores científicos Walter Koch (2008) e Mário Roberto Lobuglio Zágari (2010), passaram a integrar o Comitê, como representantes da Região Sul e de parte da Sudeste, Cléo Vilson Altenhofen (UFRGS), Felício Wessling Margotti (UFSC) e Ana Paula Nunes Rocha (UFOP).
Quando se publicam os primeiros volumes, com o desligamento, em 2012, a pedido, da Diretora Científica Ana Paula Nunes Rocha, o Comitê Nacional conta com oito membros.
Considerando-se a grande extensão territorial a ser coberta pela investigação, o Comitê Nacional estruturou-se de modo a que cada Diretor Científico e a Diretora Executiva tivessem sob a sua responsabilidade uma área específica, mantendo sob o seu controle o planejamento e a execução da pesquisa, bem como a estruturação da equipe regional de pesquisadores. Foram, assim, estabelecidos sete Regionais que, inicialmente, tiveram a seguinte configuração: Regional Pará (Pará, Amazonas, Tocantins), Regional Nordeste (Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba), Regional Bahia (Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia, Rio de Janeiro), Regional Mato Grosso do Sul (Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Rondônia, Acre, Roraima), Regional Minas Gerais (Minas Gerais, Espírito Santo), Regional Paraná (Paraná, São Paulo, Amapá) e Regional Sul (Santa Catarina, Rio Grande do Sul). Posteriormente, essa divisão, para atender a necessidades que se apresentaram, foi redimensionada. Ao se concluir a constituição do corpus e em virtude da política de condução do trabalho adotada — que previa a possibilidade de uma equipe, tendo condição, atuar na área inicialmente atribuída a outra equipe —, a participação das Equipes Regionais no trabalho de campo se configura como mostrado no Quadro 1.
Quadro 1: Equipes Regionais: participação no trabalho de campo
Fonte: Dados do Projeto ALiB. Elaboração da autora.
Inicialmente, o Comitê Nacional elaborou um circunstanciado projeto que vem servindo de base à pesquisa e no qual se explicitam os objetivos gerais conforme, a seguir, vem enunciado:
1) Descrever, com base em dados empíricos, sistematicamente coletados, a realidade linguística do país, no que tange à língua portuguesa, fornecendo dados linguísticos atualizados não só da diversidade diatópica, mas também da variação diageracional, diastrática, diagenérica e diafásica.
2) Disponibilizar, via internet e/ou por meio de CD-ROM, o acesso aos dados coletados, possibilitando a audição das realizações de cada área linguística.
3) Analisar a variação linguística sob diversos pontos de vista, contemplando os níveis fonético-fonológico, morfossintático, léxico-semântico e pragmático-discursivo.
4) Estabelecer isoglossas com vistas a traçar a divisão dialetal do Brasil, tornando evidentes as diferenças regionais por meio de resultados cartografados em mapas linguísticos e de estudos interpretativos de fenômenos considerados.
5) Examinar os dados linguísticos na perspectiva de sua interface com outros ramos do conhecimento — história, sociologia, antropologia etc. —, de modo a poder contribuir para fundamentar e definir posições teóricas sobre a natureza da implantação e do desenvolvimento da língua portuguesa no Brasil.
6) Oferecer aos interessados em estudos linguísticos e, especialmente, aos estudiosos da língua portuguesa, um significativo volume de dados, ampliando consideravelmente as informações hoje disponíveis.
7) Fornecer subsídios para o aprimoramento do ensino/aprendizagem, com dados linguísticos que venham a possibilitar a adequação de material didático à realidade linguística de cada região e o entendimento do caráter multidialetal do Brasil.
8) Contribuir para o entendimento da língua portuguesa no Brasil como instrumento social de comunicação diversificado, possuidor de várias normas de uso, mas dotado de uma unidade sistêmica.
Constituído o Comitê Nacional, o trabalho estruturou-se em quatro etapas, enunciadas a seguir, as quais, em determinados momentos, desenvolveram-se simultaneamente:
1) Concepção do Projeto e definição da metodologia
Criado um Comitê Nacional para coordenar a pesquisa, o trabalho ganhou corpo com (i) a elaboração de um detalhado projeto, contendo um breve histórico da Geolinguística no Brasil e a justificativa para a empreitada, (ii) o estabelecimento dos princípios metodológicos, (iii) a definição dos instrumentos auxiliares da pesquisa e (iv) o estabelecimento de um cronograma de trabalho.
2) Constituição do corpus
A segunda etapa compreendeu o registro de dados de capitais brasileiras de estado e a constituição do corpus referente aos demais pontos da rede, atividade que se expandiu pelas etapas subsequentes.
3) Transcrição e a análise de dados
Etapa que, pela sua própria natureza, se superpôs à anterior, vem-se desenvolvendo numa tríplice direção: (i) a transcrição grafemática dos registros, cuja definição de princípios a serem observados demandou ampla e duradoura discussão; (ii) a transcrição fonética, e (iii) a continuada análise dos dados.
4) Editoração de dados e publicação de resultados
A quarta etapa tem por objetivo a divulgação dos resultados com a apresentação de um mapeamento linguístico do Brasil, acompanhado de comentários às cartas e da possibilidade de ouvirem-se os informantes.
Para o desenvolvimento das atividades do Comitê Nacional, vêm acontecendo, com regularidade, reuniões nacionais,⁵ em pontos diversos do país, ocasião em que se tem procedido à avaliação do andamento do trabalho e se têm definido etapas a serem cumpridas, em consonância com as grandes metas traçadas. Para a formação dos pesquisadores, particularmente dos inquiridores, e para o aprofundamento teórico e a discussão de questões metodológicas, vêm se realizando, periodicamente, workshops nacionais⁶ que congregam representação de todos os Regionais.
O desenvolvimento do Projeto Atlas Linguístico do Brasil
Definidos objetivos e metas, o Projeto Atlas Linguístico do Brasil tem avançado em consonância com as possibilidades.
Os passos iniciais
Cada Equipe Regional realizou os inquéritos linguísticos da responsabilidade de sua área, tendo os membros que o integram atuado também em outros Regionais. A Tabela 1 apresenta a distribuição de inquéritos pelas Equipes Regionais com indicação do ano de sua realização.
Tabela 1: Distribuição de inquéritos por Equipe Regional e por ano de realização
Fonte: Dados do Projeto ALiB. Elaboração da autora.
O Gráfico 1 mostra a dinâmica das gravações no curso do tempo, observando-se que o grande impulso na realização do trabalho de campo se situa no correr do ano de 2009.
Gráfico 1: Inquéritos efetivados e ano de realização
Fonte: Dados do Projeto ALiB. Elaboração da autora.
As gravações, pensou-se inicialmente, deveriam ser feitas com o mesmo tipo de equipamento. A dinâmica, porém, da moderna tecnologia e a rapidez com que os equipamentos saem de linha fizeram com que se abrisse mão dessa decisão inicial, mantendo-se, porém, a fiel observância da qualidade melhor possível de gravação e de reprodução, que, nada obstante o reforço generalizado, nem sempre resultou na otimização desejada.
A grande extensão territorial do Brasil fez com que, no que concerne à apresentação de resultados, se deliberasse pela apresentação em dois grandes blocos: inicialmente, seria fornecido o perfil nacional que se delinearia a partir dos registros das capitais de estados e, a seguir, se ofereceriam os dados das demais localidades que constituem a rede de pontos estabelecida. Duas vantagens advêm dessa decisão. Primeiramente, apresentar-se-ia um perfil nacional, fornecido pelas 25 capitais, o qual permitiria identificar áreas específicas, além de apresentar alguns aspectos de que a variação diastrática, diageracional e diassexual se revestem no português brasileiro. Em segundo lugar, dar-se-ia o tempo necessário a que se concluísse a pesquisa nas demais localidades, cuja distribuição geográfica implicaria distâncias monumentais a serem vencidas e que vão, efetivamente, de Oiapoque (ponto 1) a Chuí (ponto 250) da rede do atlas. Com a conclusão da pesquisa de campo, em 18 de setembro de 2013, finalizou-se a constituição do corpus.
À proporção que se realizavam os inquéritos, os registros eram enviados para o arquivo nacional, que se localiza na Universidade Federal da Bahia, Instituto de Letras, Departamento de Letras Vernáculas, onde eram submetidos a rigorosa catalogação. Fica, desse modo, o arquivo de dados regionais nas suas respectivas áreas, e dispõe o Projeto de um acervo comum, geral, acessível a todos por meio do Banco de Dados do Atlas Linguístico do Brasil.
Os registros dos inquéritos vêm sendo submetidos à transcrição grafemática e, nos casos específicos, à transcrição fonética e ao programa de análise fonética e de descrição e análise prosódicas, passando a constituir, assim, objeto próprio para a análise, a partir da qual vêm sendo produzidos os resultados cartográficos e os estudos referentes a cada tema.
O suporte financeiro
Empreender-se um projeto que demanda a investigação in loco em um país de dimensões continentais, como o Brasil, requer suporte financeiro para a sua sustentação que não só permita a efetivação da pesquisa, mas que assegure a continuidade da sua realização no período previsto, segundo a metodologia estabelecida, e a ágil divulgação de resultados.
O Projeto Atlas Linguístico do Brasil, para ter concluído o levantamento de dados na rede de pontos estabelecida, exigiu dos pesquisadores-inquiridores o esforço, e, por que não dizer, a generosidade para com a ciência geolinguística no Brasil, de percorrer longas distâncias. O trabalho conjunto de todas as equipes perfaz, no total, 277.851 km de caminhos trilhados por terra, por águas e pelo ar, o que significa quase sete voltas ou mais de seis voltas e meia ao redor da Terra, na sua parte mais extensa, o Equador, cujo perímetro é de 40.075 km.⁷ A Tabela 2 mostra os números atingidos por cada uma das Equipes Regionais cujos percentuais vêm descritos no Gráfico 2. A Figura 1 complementa a informação, exibindo