Dez Poemas de Esman Dias
Dez Poemas de Esman Dias
Dez Poemas de Esman Dias
Esman Dias
Graças
I
Por esta areia,
pelo rumor da chuva
e o silêncio sem nódoa
Esman Dias
Poética
A aranha esquiva
do teu poema
se indociliza
na tua mão
Morna e lasciva
pétala, flanco,
sabem teus dedos
tangê-la, mansos?
Sossegue imóvel
tua ciência;
hiberne lento
teu coração
Esman Dias
ACTA EST FABULA
para Domingos Alexandre
Morre o poeta.
Morre, com ele, toda a luz do mundo:
o espaço do seu rosto, o mar profundo,
a aurora e um pôr-do-sol escandaloso.
Morre o poeta.
Morre a alegria.
Morre tudo o que flui: morre a poesia.
Morre o poeta.
E morre o mundo inteiro.
Esman Dias
l´école des beaux-arts
I celebrate myself, and sing myself...
(Walt Whitman)
Eu, o Pensador
Eu, o Discóbolo,
Eu, Moisés.
Eu, exangue em teus braços, minha Mãe
A teus pés me ajoelho, Pai, Perdoa!
Eu, Perseu,
decepo-te, cabeça de Medusa!
Esman Dias
Evocação
para Marco Polo Guimarães
O sol do Recife
de arame e silêncio
eis, se imobiliza
no seu claro ciclo.
o sol do Recife,
transparência avara,
lambe os seus tentáculos.
E suspende o assalto,
mangue sobre o mangue,
à cidade anfíbia.
Esman Dias
Os Retratos Marinhos
(fragmento)
Esman Dias
Poema do Amigo Morto
I Para que nesse rosto
Como és forte esta noite este sono sofrido,
respirando sem pressa! esta flor mineral
Um flor dramatiza presa ao lábio do amigo
essa boca entreaberta
se voltando, precisa, se, cadáver que pousa
à lapela vazia em lençóis alvejados,
desse negro casaco, saberias tão claro
tão exato em teu corpo. às narinas da noite?
IV
Em viagem, que sonho Poderia trazer-te
levarias ao porto? à criança que fostes
Que palavra estrangeira os brinquedos mais raros
ou segredo difícil se ainda os amasses:
levarias ainda
em teu ar esquecido? este ursinho de lã
II de voz doce e ferida,
Este vinho noturno, o soldado de chumbo,
em silêncio ofertado, tal imensa tristeza.
durma agora contigo
mesmo inútil ao teu lábio. Tua clara alegria
quando, longos, à tarde
Mesmo inútil ao teu sonho girassóis estivais
durmam agora contigo te dourassem a cabeça.
tua carne e semblante V
aventura e perigo. Esta luz ambiente
que, amarela, nos beija
Tua amada distante soleniza o teu rosto
tua amada impossível dantes tão sem mistério.
tua amada improvável
durmam agora contigo. durma agora o meu verso
III qual um bicho aos teus pés:
Em viagem, que esperam
os teus claros sentidos Meu irmão, és eterno
nesse beijo ora inábil e prossegues teu sonho
que segregas à boca? hoje, em mim, que te sofro
e teu ser recomponho
Esman Dias