Arquivototal
Arquivototal
Arquivototal
JOO PESSOA
2012
JOO PESSOA
2012
AGRADECIMENTOS
RESUMO
ABSTRACT
This thesis seeks to understand the formation of a specific sphere within the fight
against AIDS: the field of NGO / AIDS. For this we investigated the relationship
between social activism and strategic arrangements involving NGO / AIDS. To
analyze this relationship is of vital importance for understanding the genesis of the
socio - political NGO, which involves features and modes of action related to the
particular situation and the historical context in Brazil and in Joao Pessoa. We use
three theoretical concepts - analytical: activism, field and habitus. Using them could
verify a variety of conditions which would be the profile of an NGO and activism, as
legitimate or not taken in the construction of non-governmental responses to HIV /
AIDS. We observed the forms of institutionalization of the field and the disputes it.
Still we glimpse aspects of training of institutional and individual actors. The
relationship between NGOs in the field of intersectoral / AIDS was observed from two
perspectives: NGOs / NGOs and NGO / state. With this work we intend to contribute
to knowledge on the current NGO movement / AIDS in Brazil from the presentation of
a case: the field of NGOs / AIDS in Joao Pessoa. The methodology used and made
by participant observation as a means of experiencing the meanings in the search
field, and semi - structured interviews conducted individually with the activists in order
to map the discussions and conflicts present in the scene, enabling us to better
understand widely in the environment in formed the profiles of activism in the field of
NGO/AIDS.
KEYWORDS: NGOs / AIDS; activist; field, habitus; AIDS
LISTA DE SIGLAS
SUMRIO
INTRODUO .............................................................................................................................10
1 CAPTULO O fazer da pesquisa ...................................................................................14
1.1 Entrando no campo e reconfigurando a pesquisa ....................................18
1.2 A pesquisa: Questes e aspectos metodolgicos. ...................................23
1.3 Ativismo e Campo: Conceitos metodolgicos e analticos. ..................26
1.4 O objeto de estudo: delimitaes....................................................................31
1.5 Observao participante ou participao observante? ...........................34
1.6 Fazendo entrevistas .............................................................................................36
2 Captulo - O Campo das ONG/AIDS. ..............................................................................44
2.1 Articulando coletivos:
arranjo de ao .............................................................................................................52
2.2 A Institucionalizao e as demandas polticas ..........................................54
2.3 Movimento AIDS ou Campo de ONGs/AIDS: Analisando um dilema.
............................................................................................................................................65
10
INTRODUO
(2000)
observa
que
surgimento
da
Sndrome
da
construindo
um cenrio
marcado
pela
morte
social,
discriminao e culpa das pessoas com HIV/AIDS. Um cenrio social marcado por
uma epidemia incontrolvel, que segregava pessoas e grupos a partir das suas
experincias de vida e sexualidade. No havia respostas governamentais doena.
http://www.aids.gov.br/sites/default/files/anexos/publicacao/2011/50652/resumo_anal_tico_dos_dados_do_
boletim_epidemiol__92824.pdf
2
Sigla utilizada pelos movimentos e na literatura oficial, que significa Pessoas Vivendo com HIV/AIDS.
11
12
13
causa tornada pblica, sobre a qual se constri certo consenso vindo da pluralidade,
a partir de uma pretensa unidade em torno da referida causa. Outro elemento
importante na definio do ativismo a urgncia do cenrio como delineador da
interveno. Os ativismos estabelecem um tipo de ethos que, no caso do campo
das ONG/AIDS em Joo Pessoa, se expressava numa oposio discursiva com
outros setores: ns, a sociedade civil frente ao Estado, academia, sociedade
no organizada.
Nesse sentido, este trabalho considera o ativismo social na luta conta a
AIDS, tendo em vista as disputas, significaes e diferenas que se constituem no
atual cenrio da epidemia, no campo das ONG/AIDS no Brasil e, particularmente,
em Joo Pessoa, lcus desta pesquisa.
O trabalho organizado em trs partes. No primeiro momento,
apresentamos o modo como o objeto da pesquisa foi se delineando, incluindo os
elementos da observao participante que nos trouxeram um novo olhar sobre o
objeto. Refletimos sobre os desafios da pesquisa de campo e a operacionalidade
dos conceitos de ativismo, campo e habitus em relao ao objeto. O segundo
captulo versa sobre as caractersticas do cenrio das ONG/AIDS e a maneira como
o ativismo vai se constituindo enquanto estrutura estruturante de um campo de
ONGs/AIDS no Brasil. Nele, observamos as relaes e a densidade do capital social
que vai se formado. Por fim, no terceiro e ltimo captulo, apresentamos os dados da
nossa pesquisa e analisamos de que maneira se institui o campo das ONG/AIDS em
Joo Pessoa, tendo em vista cinco ativistas ligados a quatro atores institucionais:
Cordel Vida, AMAZONA, MEL e Misso Nova Esperana. Destacamos, igualmente,
as duas redes existentes na cidade: O Frum de ONG/AIDS da Paraba e a
Articulao AIDS. A dissertao se encerra com breves consideraes finais, que
apontam possveis caminhos futuros para a pesquisa sobre essa temtica.
14
O Grupo de Pesquisa em Sade, Sociedade e Cultura GRUPESSC foi criado em 2008 na Universidade Federal
da Paraba. ligado ao NESC Ncleo de Estudo em Sade Coletiva e Formado por docentes e discentes da
UFPB
na
rea
das
cincias
sociais
e
da
sade.
Mais
informaes
ver
link:
http://dgp.cnpq.br/buscaoperacional/detalhegrupo.jsp?grupo=008340619IU3BK
4
Estudo scio-antropolgico sobre a sexualidade de pessoas vivendo com HIV/AIDS e sobre as estratgias de
promoo, preveno e ateno sade em DST/HIV/AIDS nas Unidades Federadas da Regio Nordeste. Este
projeto tem como objeto de pesquisa casais sorodiscordantes que moram no Estado da Paraba, mais
precisamente na Grande Joo Pessoa. De acordo com a literatura sobre o assunto, entende-se por casal
sorodiscordante toda dade em relacionamento afetivo-sexual relativamente estvel (namoro ou casamento),
no caso especfico, heterossexual, em que um dos membros reconhecidamente HIV+ e o outro, no (Maksud,
2006, Reis, 2004, Polejack, 2001). No Brasil, o nmero de casais que se encontram nessa situao tem crescido
bastante em decorrncia do advento da terapia anti-retroviral que, ao aumentar a sobrevida dos portadores de
HIV/AIDS, facultou a existncia de novas situaes, entre elas a sorodiscordncia (Reis, 2004). Entretanto, os
dados disponveis no permitem estimar quantos casais se encontram nessa situao na Paraba, uma vez que
a sorodiscordncia permanece como uma questo no suficientemente investigada pelos servios pblicos de
sade e invisvel nas estatsticas sobre a doena (RELATRIO TCNICO PARCIAL PROJETO DE PESQUISA: Casais
sorodiscordantes no Estado da Paraba: Subjetividade, Prticas sexuais e negociao de risco. GRUPESSC
UFPB. Data de Abrangncia 30/07/2008 a 31/03/2009).
5
Mais dados sobre a instituio sero apresentados no prximo captulo (2.II O Campo das ONGs/AIDS em Joo
Pessoa).
15
Os nomes utilizados no presente trabalho so fictcios e tem a funo de proteger a identidade das pessoas
envolvidas na pesquisa.
7
O hospital universitrio foi fundado em 1978 e est ligado Universidade Federal da Paraba. Conta com um
Servio de Atendimento especializado (SAE) de carter materno-infantil Mais informaes consultar:
http://www.hulw.ufpb.br/node/4
8
O hospital Clementino Fraga foi fundado na dcada de 1950. Atualmente ligado a Secretria Estadual de
Sade. Funciona como complexo hospitalar especializado em doenas Infecto Contagiosas. atualmente o
hospital de referncia no tratamento do HIV/AIDS na Paraba. Com um SAE que atende a adultos e crianas.
Mais informaes ver: http://www.saude.pb.gov.br/web_data/historico.shtml
16
Com a perspectiva de que havia algo na luta contra a AIDS, que ia alm
das questes sobre o acolhimento e o cuidado com o bem - estar dos soropositivos,
tomava parte em ns uma nova viso sobre o que seria atuar no campo da AIDS,
como lugar que transformava uma condio de sade em luta por cidadania e
direitos.
Assim, ao trmino da graduao, com uma nova questo em mente sobre
a atuao de sujeitos e instituies, enveredamos por uma nova pesquisa.
Comeamos querendo observar questes sobre a sociabilidade dos soropositivos e
o tipo de relao que eles mantinham com as organizaes no governamentais,
destacando questes relacionadas ao segredo e ao estigma. Visava observar o
modo como a relao soropositivo/ONG influenciava na concepo da doena frente
sociedade. Pretendia observar o tipo de impacto desta relao a partir da pesquisa
emprica dos modelos de interveno de instituies escolhidas pelo seu histrico de
atuao na luta contra o HIV/AIDS em Joo Pessoa. Compararamos a viso de
pessoas soropositivas ou no, mas que tivessem algum tipo de vnculo formal ou
voluntrio junto das instituies escolhidas para a pesquisa, com a percepo de
soropositivos e seus parentes que no mantivessem nenhum vnculo formal ou
voluntrio com essas instituies, querendo analisar quais os significados que a
doena adquire na sua terceira dcada. Assim, pretendamos analisar o tipo de
impacto na concepo do HIV/AIDS em grupos de pessoas vivendo com HIV/AIDS 9,
tendo em vista a maneira como a doena era visibilizada nas aes das ONG/AIDS,
fazendo um comparativo com o tipo de visibilidade, ou no, que era dada condio
de ser soropositivo nessas aes, tendo como norte: o que era importante, enfatizar
a doena, demonstrando que a AIDS seria uma questo de todos os cidados, ou
enfatizar a experincia das PVHA, demonstrando os desafios que esses sujeitos
viviam? Na resposta contra a AIDS, o que deveria ser visvel? A doena? Ou as
PVHA? Seria possvel fazer um movimento AIDS que no mostrasse a cara
daqueles diretamente afetados lembrando que mostrar a cara tem sido uma
9
Herbert Daniel criou a expresso viver com Aids que se tornou mais comum como pessoa vivendo com
HIV/Aids. Num ou noutro caso a expresso funciona como um dispositivo identitrio que possibilita a
definio de diversas modalidades de engajamento na luta contra a Aids, seja a partir de um
reposicionamento das pessoas soropositivas nas relaes sociais que estabelecem, seja a partir de um
compromisso tico-solidrio entre atores sociais soropositivos e soronegativos. Herbert Daniel caracteriza esse
viver em contraposio equao Aids=morte e elabora um conceito poltico. Esse conceito considera que as
pessoas atingidas pelos efeitos sociais da epidemia, no so somente as pessoas soropositivas, mas tambm
aquelas que as rodeiam (SPINELLI JUNIOR, 2006, p. 96)
17
10
Mais dados sobre a instituio sero apresentados no prximo captulo (2.II O Campo das ONGs/AIDS em
Joo Pessoa).
11
I Seminrio sobre Casais Sorodiscordantes, realizado nos dias 30/06/2010 e 01/07/2010, no Hotel Caiara,
em Joo Pessoa.
18
19
12
20
21
22
ainda, que algumas instituies faam isso por ter uma proximidade com os exativistas na gesto. E, tambm, por algum tipo de medo em sofrer alguma retaliao
com relao aos editais e financiamentos, por parte da gesto. E, ainda, coloca-se
que a atualmente alguns gestores programam sozinhos a poltica de enfretamento
as DSTs/HIV/AIDS e s depois pactuam algo com as instituies, relegando, por
vezes, para as instituies para o papel de apoiadores da poltica de enfretamento.
Isso desagrada a maioria dos ativistas, independente da articulao ou instituio a
que pertencem.
Esse um fato presente no cenrio atual. Para isso, aponto alguns
elementos: O primeiro, que as ONG/AIDS desejam maior poder de formulao e
interveno nas aes pblicas e tambm nas polticas pblicas, exercendo um tipo
de controle social que responde no s por fiscalizar, mas por colocar suas
demandas na agenda pblica. Segundo, que o fato de os atuais gestores da
coordenao municipal e estadual serem ex-ativistas, esses deveriam ter maior
articulao com as instituies.
E, por ltimo, uma questo primordial para a nossa pesquisa se centrar
no ativismo o modo como se organiza o campo das ONG/AIDS em Joo
Pessoa/PB.
Nas seguidas reunies do GT de Adeso e do Frum, bem como em
conversas com o articulador da Articulao, o tema Casa de Apoio em Joo Pessoa
ganhou um destaque muito forte, pois o Governo Federal, via Estado da Paraba,
havia acenado com a implementao da Casa de modo pactuado com as
organizaes no governamentais. Nas reunies, ficaram claras as divergncias de
entendimentos sobre o modelo de implantao da casa e sua gerncia. Em vrios
momentos, em conversas informais e nas entrevistas que tivemos com as diversas
partes, surgiram contestaes de ambos os lados sobre quem deveria gerir a casa,
mas, principalmente, da forma de atuao poltica e do ativismo feito pelos atores. O
que notamos como pano de fundo que no h um entendimento do que seria uma
atuao poltica e o que seria o ativismo no campo das ONG/AIDS em Joo Pessoa.
Assim, o cenrio da nossa pesquisa formou-se dessas experincias no
campo relacionadas ao ativismo em Joo Pessoa. A diversidade de atores que
compem o cenrio atual na luta contra a AIDS e as disputas de sentido que os
acompanham so caractersticas exploradas por outras vias na literatura
23
13
A partir daqui, em alguns momentos, adotarei siglas. AAP Articulao AIDS da Paraba e FOAP Frum de
ONGs/AIDS da Paraba.
24
25
26
Os pontos anteriormente elencados so os que do a densidade scioantropolgica a nossa arena de pesquisa, constituindo, assim, o nosso fundamento
heurstico.
A partir dos pontos at aqui elencados, destacaremos os motes da nossa
pesquisa. Primeiro, propusemo-nos observar se h a proeminncia de um ativismo
particular entre as ONG/AIDS em Joo Pessoa. A partir da, indagamo-nos sobre
quais so as divergncias e confluncias entre os atores/instituies e tambm entre
os atores/sujeitos.
Spinelli Junior (2006), ao escrever sobre um Movimento AIDS em Joo
Pessoa, coloca que h diferentes posies no cenrio local. Diferenas expressas
no s no modo de atuao dos atores/sujeitos, mas tambm dos modelos
interveno operados pelas instituies nas suas prticas particulares. H, ainda, a
construo das aes, tendo em vista a mobilizao coletiva a partir da AAP e da
FOAP.
Assim, surge um cenrio em que destaca o Ativismo enquanto forma de
conduta nativa no combate ao HIV/AIDS. Mas o que seria esse Ativismo? E ainda: o
que seria um Campo das ONG/AIDS em Joo Pessoa? Faz-se necessrio
colocarmos algumas consideraes sobre as ideias de Ativismo e Campo, enquanto
conceitos.
27
28
29
30
a literatura das cincias sociais um tipo de anlise que vai alm de uma organizao
coletiva de instituies. Implica desafios.
31
16
17
32
proveniente de esfera, focando nos capitais sociais em jogo, nas posies que os
sujeitos ocupam no campo e as disputas que nele surgem.
A pesquisa de campo iniciou-se em outubro de 2010 e finalizou em
outubro de 2011. Nesse perodo, nos meses de novembro e dezembro de 2010,
havia reunio do GT de Adeso que acabou no acontecendo por falta de qurum.
Com relao a reunies do FOAP e da AAP, no me foi comunicado nada. Em
janeiro de 2011 houve um recesso. Em agosto e setembro de 2011 no pude
participar das reunies, pois me encontrava em atividades acadmicas no perodo
em que elas aconteceriam. Assim, a pesquisa aconteceu nos meses de outubro e
dezembro de 2010 e de janeiro a julho de 2011. E ainda mais dois encontros em
setembro e em outubro de 2011, porm foram atividades do FOAP, pois o GT de
Adeso encontrava-se desativado aps os impasses nas discusses sobre a Casa
de Apoio.
Participamos de cerca de onze reunies, entre GT de Adeso e FOAP, e
ainda do dia luta contra a AIDS - 1 de dezembro de 2010.
Participamos nos dias 22, 23 e 24 de agosto da Macro-Nordeste, que
um encontro anual em que participam profissionais de sade os gestores municipais
e estaduais da regio nordeste, no qual discutem proposta e apresentam
experincias de polticas pblicas na rea do DST/AIDS.
Escolhemos quatro atores como representativos na luta contra AIDS em
Joo Pessoa, na atualidade, no que tange s ONGs. So elas: o Cordel Vida, a
Misso Nova esperana, A Amazona e o Movimento do Esprito Lils (MEL). As trs
primeiras desenvolvem trabalhos com foco na AIDS, a partir de condies de
atuao diferentes. Elas so denominadas de ONG/AIDS. O MEL uma ONG ligada
ao Movimento LGBT, que tem um longo histrico no cenrio do HIV/AIDS em Joo
Pessoa. uma das instituies que fundou o Frum de ONG/AIDS da Paraba e tem
participao no trabalho da ESSOR/Brasil, que resultou na criao da Amazona na
cidade de Joo Pessoa. Participa desde a dcada de 1990 da luta contra a AIDS em
Joo Pessoa. Desenvolve trabalho de preveno junto a homossexuais e
atualmente tem como foco o apoio a pessoas vivendo e a participao em espaos
pblicos de controle social.
33
34
35
36
Pessoa.
Resumindo,
pesquisa
de
campo
carrega
tenso,
37
atitudes e falas como aes naturalizadas que velam uma verdade (BOURDIEU,
1999). Devemos ter em mente que a fala advm de um lcus, que, neste estudo, foi
o ativismo e o movimento em rede, carregada de lgicas simblicas, onde, aps as
participaes nas reunies, visita as entidades e conversas informais com os
diferentes atores, tomamos parte e colocamo-nos enquanto sujeito e pesquisador.
Tornou-se uma relao de troca. Uma espcie de dar, receber e retribuir, como
atenta Mauss (2003), como uma relao entre sujeitos que, dialogicamente,
relacionam sentidos e constituem laos sociais.
Escolhemos a entrevista semiestruturada, pois havia a necessidade de
relacionar elementos exploratrios com informaes de carter fechado, a exemplo
de perguntas sobre ano de fundao da entidade e sua temtica principal; o que a
entidade seria,se uma casa de apoio, uma entidade de assistncia jurdica, de
direitos civis e, ainda, com relao personalidade jurdica, se uma fundao,
ONG ou outros. Juntamente com perguntas de carter mais descritivo sobre o que
AIDS para o entrevistado ou na viso da organizao, o tipo de envolvimento da
ONG ou entidade com o tema da AIDS, a descrio do papel da ONG ou entidade e
qual seria a agenda da entidade em relao ao HIV/AIDS .
O uso de entrevistas visa captar aspectos referentes atuao das
instituies e dos atores escolhidos. Autores como Manzini (2004), Boni e Quaresma
(2005) colocam essa captao de relatos a partir de uma ideia de adequao que
versa sobre problemas como alto grau de generalidade das perguntas e a da
tomada destes como fatos em si. Ento, aqui, vislumbramos os relatos das
entrevistas como vises sobre os fatos, e que nos do uma verso sobre as
situaes e a histria dos sujeitos (sejam indivduos ou atores coletivos), tendo em
conta o contexto. Nesse sentido, quando partamos para entrevista tnhamos
expectativas sobre os atores e na capacidade do nosso fazer.
Com relao a entrevistas, h questes pontuais que descreveremos para
termos a noo dos entraves que acometeram o presente processo.
O roteiro de entrevista foi estruturado em trs eixos voltados s
percepes dos ativistas sobre os tipos de aes desenvolvidos pelas entidades e a
rede que faziam parte, bem como a militncia. Ainda aborda questes pontuais
38
39
primeira delas era com relao existncia de somente uma instituio atuante na
cidade, at aquele momento, a Misso Nova Esperana, e a falta de reunies
mensais daquela rede. Confessamos que no nos dispusemos a construir outra
estratgia para buscarmos uma comparao mais fidedigna entre elas, porem ficaria
um tanto difcil para somente um pesquisador acompanhar tantas instituies. Na
Articulao eram cerca de seis instituies e no Frum aproximadamente 20
organizaes, lembrando que elas se distribuem por cidades como Cajazeiras,
Bayeux, Campina Grande, Mari, Solnea e outros. Assim, um trabalho hercleo
para o tempo de dois anos em Mestrado, que se divide entre aulas, pesquisa,
participao em eventos e a confeco de material para a publicao e discusso
das suas interpretaes.
Assim, no que diz respeito Articulao, analisaremos uma entrevista
realizada com o Informante da Misso no perodo da pesquisa realizada pelo
GRUPESSC, j citada aqui, e outra realizada por nos com foco especfico nesta
pesquisa. Em defesa dessa escolha metodolgica, bom ressaltar que a viso
desse nico informante fora representativa, pois ele parte da dissidncia que
saiu do Frum e formou a Articulao em 2005, constituindo-se no contradiscurso
com maior expresso devido ao tipo de relao entre as duas redes. Seu relato
coloca em cena dissonncias do campo do HIV/AIDS na cidade.
Uma questo posterior delimitao de diretivas bsicas das escolhas
dos entrevistados seria a adequao do tempo de pesquisa ao tempo dos sujeitos.
Uma coisa que devemos ter em mente, quando se pesquisam movimentos sociais e
aes coletivas a agenda de lutas como algo malevel s necessidades
momentneas que possam surgir, no nosso caso, em especfico, soma-se com a
perspectiva do controle social, como a participao em conferncias, reunies com
gestores, participao em outras redes e apoio a causas paralelas. Assim, era
necessrio entrar no ritmo dos sujeitos, instituies e das redes para que
pudssemos realizar as entrevistas.
Refletindo a partir de Tornquist (2007), vemos a entrevista no enquanto
ato, mas como um tipo de processo, que deve incorporar a precariedade do tempo,
a mobilidade dos sujeitos e as escolhas dos entrevistados. Nesse sentido, Geertz
(2008) nos mostra que a convivncia nos espaos permitiu que o pesquisador
40
41
42
junto
com
nossas
escolhas
de
anlise
reflexo
cientfica,
verossimilhana acerca dos sujeitos e temas que estudamos. Sujeitos esses que, de
diferentes modos, contribuem para o processo de entrevistar. Seja mostrando algo
pertinente a se explorar por meio de bate papos descontrados ou crticos com
relao atuao do outro, a exemplo do poder Estatal. Seja essa crtica
veladamente, seja sobre a atuao do gestor, que um ex participante da rede ou
que culpa o poder pblico, apontando para a burocracia de modo a preservar os
gestores. Ou ainda elogiando e criticando o modo como as instituies e os ativistas
fazem uso da rede.
O fazer a qual pretendemos no uma forma mimtica da realidade, nem
tampouco uma forma mstica. antes um tipo de saber que reorganiza a realidade,
sendo assim parte dela, de um ponto de vista socioantropolgico de modo que
possamos observar o cenrio social e assim construir um tipo de conhecimento
vlido no s para as cincias sociais, mas tambm que dialoga com qualquer
sujeito a que possa interessar.
Assim, a
43
44
45
46
18
Nas anlises contidas no livro Sopa de Letrinhas? Movimento homossexual e produo de identidades
coletivas nos anos 90, Autoria de Regina Facchini (1997) pode se observar com maior profundidade na relao
entre o movimento LGBT e a luta contra a AIDS no Brasil.
47
48
49
50
(Fonte: http://rnpvha.org.br/site/modules/news/article.php?storyid=2196)
51
52
53
54
Esse novo tipo de organizao dos atores no campo das ONG/AIDS tinha
como desafios: [...] a dificuldade de conciliao das temticas prioritrias; o
encontro e o desencontro de agendas e de interesses; o dilogo intercultural (ou sua
falta) (SCHERER WARREN, 2007, p.20).
O arranjo coletivo de instituies e movimentos em forma de Fruns e
articulaes estaduais e regionais reorganizou o campo das ONG/AIDS, pois trouxe
ao cotidiano o elemento multidentitrio das demandas para as relaes contextuais
e conjunturais cotidianas das instituies. Isso implica que o arranjo poltico e prtico
das regies de atuao das ONG/AIDS pode conter arranjos especficos ao
ativismo, a exemplo da cidade de Joo Pessoa, porm resguardando aspectos do
cenrio brasileiro de luta contra a AIDS. Seria, assim, um campo unificado e
diversificado (BOURDIEU, 1999).
55
20
56
57
distines
entre
ONGs
como:
grandes/pequenas,
A luta por garantia dos direitos dos soropositivos passou pela presso para
que o Estado reconhecesse a necessidade de um investimento maior na
rede pblica de assistncia s pessoas portadoras do vrus, bem como no
58
59
60
61
22
23
62
Joo Biehl (2007) aponta que o advento das polticas neoliberais marca o
modo de institucionalizao das ONG/AIDS. Para se fazer ver, torna-se necessrio
organizar suas demandas de maneira que sejam reconhecidas por um modelo
estatal orientado para o mercado. A estruturao do campo das ONG/AIDS, nas
duas ltimas dcadas, implica participao em instncias deliberativa e a prestao
de servios a populaes localizadas. As demandas polticas para a proteo e
reivindicao de direitos sade, a incorporao dos direitos humanos e a agenda
dos ativistas vm acompanhada de uma nova faceta: a fomentao de projetos.
Segundo Campos (2008), a fomentao de projetos enquanto forma de
interveno (atuao) encontrou nos programas AIDS I e II a base de sustentao
principal. No programa AIDS I, foram financiados 634 projetos, enquanto no AIDS II
foram 2.163 projetos de 745 ONGs (THE WORLD BANK, 2004, p. 8 apud CAMPOS,
2008). Esse tipo de fomento interveno direta das ONGs/AIDS em populaes
especficas que possibilitou um Boom de organizaes.
A lgica da interveno sistematizada pelas ONGs tem como premissa o
conhecimento dos cdigos culturais das populaes, que sero abordadas nos
projetos, tendo em vista influenciarem o comportamento das populaes ou grupos
trabalhados de modo a reduzir a exposio ao vrus (GALVO, 1997). As aes das
ONGs/AIDS ganham um componente, que so as respostas localizadas a partir de
grupos especficos. Esse tipo ao tem consequncias diretas para a afirmao das
ONGs/AIDS enquanto fora legitima na chamada resposta brasileira AIDS.
63
.
Colocamos que esse um aspecto de atuao das ONG/AIDS, que tende
a sair de intervenes especficas e localizadas. A atuao nas Comisses enquanto
esferas ligadas ao poder federal permitem a articulao de demandas com carter
universal.
A institucionalizao implica uma remodelao do ativismo. Se nos
primeiros anos da epidemia no Brasil era a atuao voluntria dos atores, agindo de
uma lgica de solidariedade que enfatizava o combate discriminao e falta de
polticas para rea, como relata Galvo (1997, 2000), em meados da segunda
dcada at o presente momento, somam-se, ao aspecto ressaltado anteriormente, a
atuao dos atores institucionais e sujeitos, a articulao entre Estado e Sociedade,
controle e intervenes nas polticas pblicas e a participao em instncias
deliberativas.
64
24
A luta contra a AIDS era vista pelo banco mundial, no como uma questo de sade, mas de
desenvolvimento social
65
66
67
processo
de institucionalizao
68
69
historicamente e
25
Ver BERMUDEZ, Ximena Pamela Daz e SEFFNER, Fernando. Liderana brasileira luz da Declarao de
Compromisso sobre HIV/Aids da UNGASS. Rev. Sade Pblica [online]. 2006, vol.40, suppl., pp. 101-108. ISSN
0034-8910. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102006000800014.
70
71
A instituio conta somente com um Voluntrio atualmente, Segundo ativistas do FOAP. Porm esse nico
voluntrio faz parte do MEL, atualmente. Como difcil encontrar algum registro sobre essa entidade no foi
possvel falar sobre a importncia da atuao dessa instituio, pois no encontrei nenhum registro formal da
mesma. Ela no tem nem mesmo sede no momento.
27
72
73
74
75
28
Ver documento: DIRETRIZES PARA O FORTALECIMENTO DAS AES DE ADESO AO TRATAMENTO PARA
PESSOAS
QUE
VIVEM
COM
HIV
E
AIDS.
Disponvel
em
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_tratamento_aids.pdf
76
trabalham com programas sociais junto a pessoas que vivem com HIV/AIDS. Ainda
coloca como eixos de atuao a questo do controle social e o ativismo no
movimento nacional de luta contra a AIDS. As organizaes que fazem parte da
rede tm como eixo central o HIV/AIDS. As reunies so realizadas de acordo com
as demandas apresentadas pelas entidades e pela agenda de aes que
acompanha a agenda governamental. Vitor Buriti relatou que havia uma reunio
ordinria por ms, porm, como h dificuldade das ONGs se reunirem por questo
de deslocamento e dinheiro, passou a ser de acordo com as demandas. A
articulao no existe juridicamente ento quando a qualquer tipo de demanda
jurdica uma instituio empresta o CNPJ, para a realizao de projetos em
conjunto. Isso feito mediante a escolha interna na AAP.
A misso utiliza de veculos virtuais de comunicao para dar visibilidade
a suas aes: Facebook e Orkut.
Estrutura Fsica.
A misso tem sede em um imvel alugado com recurso prprio. Uma casa
com quatro quartos, sala e cozinha. Dois quartos servem para estada das pessoas
em trnsito; para isso cada quarto conta com beliches e mveis, para que os
usurios possam guardar ali seus pertences. Um utilizado como escritrio e outro
como almoxarifado. Atrs da casa, h um amplo espao, onde so realizadas
comemoraes e outros eventos. H, ainda, uma parte coberta onde so realizadas
reunies e sesses de aconselhamento. Na sala, h uma brinquedoteca. Na
varanda em frente casa, h alguns brinquedos.
Estrutura Administrativa.
77
Entrevistado Bart.
78
79
realizado com
recursos prprios.
O Cordel ainda ligado ao Movimento das Cidads Posithivas. Este
ltimo utiliza a estrutura fsica e administrativa da instituio para realizar reunies e
para ter acesso a recursos.
29
80
Estrutura Fsica.
Estrutura Administrativa.
81
Entrevistada Maria.
82
Entrevistado Fry
83
84
85
Estrutura Fsica.
31
86
Estrutura Administrativa.
Entrevistada Lisa.
87
Entrevistada Janes.
88
89
Estrutura Fsica.
Estrutura Administrativa.
90
Entrevistado
O grupo Beira de esquina foi um dos primeiros grupos LGBT em Joo Pessoa, na dcada de 1980.
O Ns Tambm um dos primeiros grupos LGBT em Joo Pessoa, na dcada de 1980.
91
Entrevista Rosa
92
fugiria do foco que damos na nossa pesquisa. Entendendo que esses atores
emergiram como os mais relevantes na observao realizada, isso no implica que
sejam mais importantes que os demais ativistas e instituies envolvidas no campo
do HIV/Aids.
Faremos algumas observaes sobre esses atores relacionando ao tipo
de Campo ONGs/AIDS que h, ou no, na cidade de Joo Pessoa tentando elencar
algumas caractersticas que estruturam a realidade e as possibilidades quanto ao
ativismo que o cenrio apresenta.
93
[...] no momento que a Amazonas se insere naquele contexto era muito forte
o trabalho com HIV/AIDS. Existia a CARITAS, CUNH e o MEL. Elas
trabalhavam na linha da preveno. No contexto local as ONGs eram
fortalecidas at porque o Ministrio da Sade colocava recursos nas
entidades. Era fortalecido no aspecto financeiro e poltico (Lisa)
94
95
96
No foi possvel colher dados sobre a RNP+/PB, UVAS, CRITAS DIOCESENA, ACORDA MULHER e GAV, por
algumas dessas no existirem mais outras terem redirecionando seu foco atuao.
97
sendo dirigida por membros cujo trabalho nas suas organizaes era um aspecto
menor
na
agenda institucional.
Ambas
98
99
100
101
102
Nesse sentido,
Uma questo que est relacionada a ser ativista diz respeito ao modo de
atuao voluntria. Das instituies aqui relacionadas, apenas a AMAZONA tem
uma estrutura administrativa com atuao profissional remunerada. As outras
colocam o trabalho voluntrio como base de atuao. No entanto as condies da
insero no Campo das ONG/AIDS demonstram caractersticas diferentes do
voluntariado. O MEL, O Grupo de Mulheres Lsbicas Maria Quitria e a Casa de
Convivncia, por no terem projetos financiados no campo da AIDS, realizam o
ativismo com base no apoio PVHA. Atuam na rede Atravs de discusses sobre
garantia de direitos e participao em esferas pblicas, como a realizao do 1 de
dezembro, participao no GT de adeso, ENONG, ERONG e nas reunies do
FOAP.
103
Elas reivindicam para si acesso aos fundos pblicos, pois consideram que
esto executando atividades que so de interesse pblico. Questo
essencial, pois, por um lado, h a falta de recursos antes vindos da
cooperao internacional, e por outro, o entendimento de que as funes
pblicas exercidas por elas legitimamente deveriam ser contempladas com
financiamento pblico. O problema que elas na prtica so entidades
privadas e a todo momento questiona-se a capacidade a capacidade delas
em traduzir o que seria esse interesse pblico (Teixeira, 2003, p.66)
104
105
se ela tivesse lido 90% das besteiras que ela tinha falado e no tinha dito. E
eu disse na reunio a Misso um modelo forte fora da Paraba, mas aqui
ns ainda encontramos resistncia. E eu sei que no pelo trabalho da
Misso. E assim se eu no tenho nada eu invento. (Bart MNE )
instituies
pela
falta
de
uma
sustentabilidade
financeira.
Outras
106
rede,
enquanto
esfera
intersetorial
(TEIXEIRA,
2003),
so
107
108
109
110
111
112
113
114
CONSIDERAES FINAIS
115
116
117
118
Referncias Bibliogrficas
AIDS.
http://www.amazona.org.br/. Acesso em: 9 de janeiro de 2012.
Disponvel
em:
ARTICULAO
AIDS
PERNABUCO.
Disponvel
em:
http://www.gestospe.org.br/Web/articulacaopolitica/conteudo1/?secao=11&autentica
cao=0,66. . Acesso em: 21 de janeiro de 2012.
BAMIDEL. Organizao de Mulheres Negras da Paraba. Disponvel em:
http://www.bamidele.org.br/site/?p=157. Acesso em: 19 de janeiro de 2012.
BARBAR, Andra, SACHETTI, Virginia Azevedo Reis, CREPALDI, Maria
Aparecida. Contribuies das Represewntaes sociais ao estudo da aids.
Curitiba. Interao em Psicologia, V.9, n.2, p.331-339. Jul/Dez. 2005.
BIAGINI G. Sociedad civil y VIH-sida. De la accin colectiva a la fragmentacin
de intereses?. Paids. Ed. Tramas Sociales 54. Buenos Aires. 2009
BIEHL, J. Will to Live: AIDS Therapies and the Politics of Survival. Princeton,
Princeton University Press. 2007
BRASIL. Sistema nacional de vigilncia em sade: relatrio de situao:
Paraba / Ministrio da Sade, Secretaria de Vigilncia em Sade. 5. Ed. Braslia:
Ministrio da Sade, 2011. 36p.
BONI, Valdete; QUARESMA, Slvia Jurema. Aprendendo a entrevistar: como
fazer entrevistas em Cincias Sociais. Revista Eletrnica dos PsGraduandos em Sociologia Poltica da UFSC. Florianpolis: Universidade
Federal de Santa Catarina, Vol 2, 2005
BOURDIEU, Pierre. O Poder Simblico. 2. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
1999.
_________, Pierre. Meditaes pascalinas/Pierre Bourdieu; traduo: Sergio
Micelli. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.
_________, Pierre. Questes de Sociologia/Pierre Bourdieu: traduo: Miguel
Serras Pereira. Lisboa: Fim de Sculo, 2003.
BERMUDEZ, Ximena Pamela Daz e SEFFNER, Fernando. Liderana brasileira
luz da Declarao de Compromisso sobre HIV/Aids da UNGASS. Rev. Sade
Pblica [online]. 2006, vol.40, suppl., pp. 101-108. ISSN 0034-8910.
119
em:
em:
120
121
_______________________.
Direitos
Fundamentais.
Disponvel
em:
http://www.aids.gov.br/pagina/direitos-fundamentais. Acesso em: 19 de janeiro de
2012.
_______________________.
Legislao.
Disponvel
http://www.aids.gov.br/pagina/legislacao. Acesso em: 19 de janeiro de 2012.
em:
122
123