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Bio Tecnologia

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Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

Entrevista

Novas Aplicaes para


a Engenharia Gentica
Entrevista concedida a
Maria Fernanda Diniz

Engenharia gentica pode ajudar a prevenir e curar o cncer de mama

cncer de mama um dos males que mais


aflige a populao feminina em todo o
mundo. A cada ano, 182 mil mulheres so
diagnosticadas com cncer de mama e,
dessas, 43 mil morrem. Apesar de ser uma
enfermidade com grandes chances de cura,
quando detectada no incio, ainda a pior ameaa para as
mulheres brasileiras, pois o tumor maligno feminino de
maior incidncia e mortalidade no pas. Nos ltimos 20
anos, segundo dados do INCA (Instituto Nacional do
Cncer), a mortalidade por cncer de mama cresceu cerca
de 60%. A taxa de incidncia desse cncer no Brasil foi
estimada em 40,7 casos para cada 100 mil mulheres e a de
mortalidade em 10,3 para o mesmo nmero de mulheres.
As causas para o aumento da incidncia dessa doena nas
ltimas dcadas esto associadas aos estresses da vida
moderna e mudana de comportamento das mulheres,
que hoje ocupam grande parte do mercado de trabalho e consomem em muito
maior quantidade substncias nocivas, como cigarros e bebidas alcolicas.
A engenharia gentica pode ser um caminho promissor para a preveno
e a cura de muitas enfermidades, inclusive do cncer de mama. Diante disso,
a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria - Embrapa, atravs da
Embrapa Recursos Genticos e Biotecnologia, uma de suas 40 unidades de
pesquisa, localizada em Braslia, DF; a Universidade de Campinas (Unicamp);
a Universidade de Braslia (UnB) e a Universidade de Montevidu, no
Uruguai, se uniram para desenvolver variedades de soja transgnica com
anticorpos anticncer contra o cncer de mama. Essas variedades sero
utilizadas para produo de frmacos que atuaro na preveno e diagnstico
da doena e tero tambm potencial teraputico, mesmo com o cncer em
estgio avanado.. importante ressaltar que elas no sero usadas na cadeia
alimentar, mas apenas como medicamentos
Os anticorpos monoclonais para uso clnico movimentam mais de US$
1 bilho nos EUA. No Brasil, a utilizao desses anticorpos na rea mdica
ainda pequena. O principal anticorpo monoclonal usado clinicamente o
anti-CD3, que atua na preveno da rejeio decorrente de transplantes de
rgos. O Instituto Butant, de So Paulo, produz e distribui esse medicamento no Brasil. Os mtodos e estratgias para produo de novos anticorpos
evoluram, incorporando a manipulao gentica, e a flexibilidade nessa
manipulao fez desses anticorpos produtos de alto valor econmico e com
grandes perspectivas de utilizao, especialmente para a preveno e
tratamento de algumas enfermidades.
Para falar sobre essa pesquisa e outras questes relacionadas ao
desenvolvimento de produtos transgnicos no Brasil, a revista BIOTECNO2

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

LOGIA, CINCIA & DESENVOLVIMENTO entrevistou o pesquisador


da Embrapa Recursos Genticos e
Biotecnologia, Elbio Rech. Durante
a entrevista, ele ressaltou os benefcios que a tecnologia do DNA recombinante pode trazer para as reas de sade e de alimentao, atravs da expresso de protenas de
interesse em plantas e animais, que
passaro a atuar como biofbricas, o
que certamente baratear os custos
de produo, alm de possibilitar a
produo em larga escala. Elbio
enfocou ainda questes polmicas e
atuais, como a rotulagem dos produtos transgnicos, entre outras. Vejam agora a entrevista:
BC&D Em que ponto de
desenvolvimento est a pesquisa
para produo da soja transgnica com o anticorpo anticncer
de mama?
Elbio Rech - A pesquisa est
em estgio avanado. J temos sementes de soja em nossos laboratrios produzindo 25 mg de anticorpos
em uma semente, o que um ndice
muito bom. A estimativa produzir
alguns quilos do anticorpo em apenas um hectare. O prximo passo
purificar as sementes (fazer um extrato a partir da semente, no qual s
o anticorpo isolado) e envi-las ao
Instituto Pasteur para avaliao sobre o potencial dessas sementes contra o cncer de mama. Eu acredito
que essa etapa esteja pronta at o
segundo semestre de 2004.
BC&D - Como foi feito o processo de transformao gentica
dessa soja?
Elbio Rech - Os anticorpos
inseridos nas plantas de soja foram
isolados na Universidade de Montevidu a partir de camundongos. Depois, eles passaram por um processo conhecido como humanizao,
ou seja, fazer com que sejam aceitos
por seres humanos [A utilizao de
frmacos base de anticorpos recombinantes vem se tornando uma
realidade em todo o mundo]. Os
produtos humanizados tambm j
ganham volume no mercado. Nos

EUA, vrios anticorpos humanizados j foram liberados pelo FDA


(Food and Drug Administration) e
um grande nmero se encontra em
fase de testes clnicos, o que indica
que nos prximos dez anos, o mercado dever estar repleto desses
anticorpos de ltima gerao. A pers-

O objetivo desenvolver plantas e


animais que atuem como biofbricas,
ou seja, que expressem caractersticas de interesse para os seres humanos e os animais.
pectiva de que a tecnologia de
anticorpos recombinantes venha a
fornecer insumos para diversas reas da medicina, que incluem desde
agentes imunomoduladores at vacinas recombinantes. Essa tecnologia
tem sido utilizada no tratamento de
doenas graves como o cncer e a
AIDS, alm da preveno de doenas bacterianas. importante ressaltar que o domnio de tcnicas de
manipulao gentica foi fundamental para a seleo, redefinio e
humanizao desses anticorpos.

... esses fragmentos, conhecidos como


anticorpos modernos, conseguem penetrar os tumores slidos e praticamente
no causam efeitos colaterais.
A insero dos genes nas plantas de soja foi feita pela nossa equipe da Embrapa Recursos Genticos
e Biotecnologia, que j domina as
tecnologias de transgenia. Alm de
agregar valor soja, uma das nossas maiores preocupaes baratear os custos de produo dos
frmacos a base de anticorpos. A
produo de anticorpos recombinantes em plantas apresenta um
grande potencial biotecnolgico
devido ao baixo custo de produo
e facilidade de introduo do
transgene.
BC&D De que maneira a
engenharia gentica pode intensificar a utilizao de anticorpos
no Brasil, j que apresentam bom
potencial para cura de muitas enfermidades?

Elbio Rech - A utilizao de


anticorpos sempre mostrou bom potencial para o diagnstico e tratamento de muitas doenas, mas antigamente eles tinham que ser utilizados em sua forma integral, o que
onerava e dificultava o processo. A
engenharia gentica tornou possvel a gerao de anticorpos recombinantes, desenvolvidos em laboratrio, que se constituem em pequenos fragmentos capazes de expressar suas caractersticas de interesse
nas plantas. Alm de diminurem os
custos do processo, esses fragmentos, conhecidos como anticorpos modernos, conseguem penetrar os tumores slidos e praticamente no
causam efeitos colaterais. Por isso,
eu acredito que esse um dos caminhos mais promissores da medicina
no futuro. A tecnologia de desenvolvimento dos anticorpos monoclonais recombinantes e sua eficincia
j esto mais do que comprovados,
mas preciso desenvolver a sua
produo em larga escala a custos
menores. Os produtos base de
anticorpos existentes hoje no mercado brasileiro, como o Zenapax e a
Herceptina tm custos muito altos e
so inacessveis para a maior parte
da populao.
BC&D Existem outras pesquisas nessa linha sendo desenvolvidas no Brasil?
Elbio Rech - A manipulao
gentica pode ser uma boa opo
para reduzir os custos e otimizar a
produo de medicamentos. E, por
isso, o desenvolvimento das plantas
de soja com os anticorpos anticncer
no so a nica pesquisa da Embrapa
nessa linha. Na verdade, a Empresa,
atravs de trs de suas unidades de
pesquisa Embrapa Recursos Genticos e Biotecnologia, Embrapa
Instrumentao Agropecuria (So
Carlos, SP), e Embrapa Soja (Londrina, PR) a Unicamp, a Universidade
de Braslia (UnB), a Universidade de
So Paulo (USP), a Universidade de
Montevidu e o Instituto Butant formaram uma rede para produo de
biomolculas voltadas para a sade
humana e animal. O objetivo desenvolver plantas e animais que atu-

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho

em como biofbricas, ou seja, que


expressem caractersticas de interesse para os seres humanos e os animais. Atualmente, alm das plantas
de soja com os anticorpos anticncer,
esto sendo desenvolvidas tambm
plantas de soja com o hormnio do
crescimento humano; dois outros anticorpos com a UnB; alface e tomate
transgnicos com uma protena antidiarrica; alm de animais transgnicos com caractersticas de interesse
no leite. Dessas pesquisas, a que est
em fase mais adiantada a soja
transgnica com os anticorpos contra
o cncer de mama.
muito importante ressaltar que
nenhuma dessas plantas vai fazer
parte da cadeia alimentar. Todas
elas sero utilizadas para a produo de frmacos.
BC&D Recentemente, a
mdia divulgou amplamente uma
pesquisa baseada na utilizao de
protenas da teia de aranha e que
pode beneficiar vrios setores da
indstria. Em que estgio se encontra essa pesquisa?
Elbio Rech Essa pesquisa
muito interessante e est sendo
conduzida em parceria com o Instituto Butant, Universidade de So
Paulo (USP), Unicamp e com a
Embrapa Instrumentao Agropecuria, em So Carlos, SP. Trata-se do
estudo das protenas que compem
as teias de aranhas e que pode ser a
chave para incrementar diversos
setores da indstria, alm da rea
mdica. A pesquisa na Embrapa
Recursos Genticos e Biotecnologia
est sendo conduzida por mim e
pelo pesquisador Francisco Arago,
alm dos tcnicos e estudantes que
compem a nossa equipe. A manipulao das protenas encontradas
nas teias de algumas aranhas brasileiras permitiu entender o funcionamento das folhas alfa e beta, que so
as responsveis pela rigidez e elasticidade dos fios. Esse estudo vai
gerar benefcios para a indstria de
vesturio, atravs da fabricao de
novos tipos de tecidos, sem falar na
rea mdica, que vai poder contar
com fios mais finos e resistentes,
muito teis para a sutura. A pesquisa
4

ainda est em fase inicial. No momento, estamos empenhados na


busca de genes que so expressos
nas glndulas das aranhas brasileiras, com o objetivo de formar um
banco gentico na Unidade. Algu-

O que eu acho que existe uma certa


inrcia da indstria para a criao de
novas fbricas, que hoje so muito necessrias em funo da descoberta cada
vez mais gil de novas molculas, oriundas da biodiversidade, e em alguns casos at a partir de fitoterpicos.
mas espcies potencialmente interessantes j foram coletadas e encontram-se no Butant.
BC&D O grande avano da
indstria farmacutica, que se encontra em poder das multinacionais, tem feito com que as pessoas se esqueam do grande potencial dos remdios fitoterpicos.
Na sua avaliao, os produtos geneticamente modificados com
propriedades medicinais podem

... essa tecnologia de plantas transgnicas vai exatamente ao encontro de


uma demanda da sociedade, que a
reduo da utilizao de defensivos qumicos com a conseqente reduo de
seus efeitos para o meio ambiente. No
existe nenhum antagonismo entre os
transgnicos e o meio ambiente, muito
pelo contrrio.
vir a sofrer algum tipo de boicote
por parte dessas grandes empresas que, potencialmente, perderiam mercados?
Elbio Rech Essa questo tem
dois pontos importantes, que devem ser enfatizados. Um se refere
aos medicamentos fitoterpicos, que
tm sido utilizados principalmente
por comunidades locais e indgenas
com sucesso porque os povos dessas comunidades detm o conhecimento tradicional e conhecem os
efeitos e formas de utilizao das
plantas medicinais. Mas, do ponto

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

de vista da medicina, o ideal que


esses produtos passem por testes
cientficos para que se conheam a
fundo as suas propriedades medicinais. Muitos deles no apresentam
nenhum efeito do ponto de vista da
cincia e os seus resultados so
puramente de carter somtico. Os
fitoterpicos e seus efeitos precisam
ser estudados. Da a importncia da
cincia e da tecnologia, que
disponibilizam as ferramentas necessrias para estudar e conhecer as
aplicaes de diferentes produtos
oriundos de plantas.
O segundo ponto est relacionado indstria farmacutica. Eu,
particularmente, no acredito em
boicote. O que eu acho que existe
uma certa inrcia da indstria para a
criao de novas fbricas, que hoje
so muito necessrias em funo da
descoberta cada vez mais gil de
novas molculas, oriundas da biodiversidade, e em alguns casos at a
partir de fitoterpicos. As empresas
teriam que mudar toda a sua estrutura e at que ponto ser que elas
esto interessadas nessa vantagem
comercial e vo estimular o estabelecimento de novas fbricas? Na verdade, o cenrio mundial hoje se
constitui de sistemas j estabelecidos para produo de protenas recombinantes, como por exemplo, a
vacina da hepatite B, a insulina e o
hormnio do crescimento humano,
entre outros. Essas protenas so
vendidas na farmcia, mediante prescrio mdica. Elas j existem no
mercado, so fabricadas por diversas empresas e esto disposio
dos consumidores.
A tecnologia do DNA recombinante permite a gerao de novas
molculas oriundas da biodiversidade em ritmo cada vez mais acelerado. Por exemplo, ns estamos
testando, em parceria com a USP,
uma nova molcula chamada
gomesina, um peptdeo isolado de
uma aranha, e que tem potencial
contra bactrias e, por isso, pode
ser usado para a fabricao de antibiticos, e eficiente tambm contra alguns fungos. O nosso objetivo
desenvolver um sistema para
express-la porque at hoje ela nunca foi expressa em nada, a no ser

na aranha. Estamos buscando formas para express-la em plantas ou


no leite de animais. Mas esse
apenas um exemplo de um mercado que est em expanso porque
novas molculas potencialmente interessantes esto sendo constantemente descobertas e precisam ser
produzidas. Existem algumas fbricas de produo j estabelecidas,
mas so muito caras e j esto
atingindo o seu limite de produo.
Ento tm que ser criadas novas
fbricas, o que pressupe grande
investimento, j que a montagem
de cada uma delas envolve milhes
de dlares. A possibilidade de
produz-las em biofbricas -plantas
ou animais reduz os custos de
produo e, conseqentemente, do
produto final. Pelo que eu sei, j
existe em nvel internacional um
reconhecimento por parte das indstrias de que muitas molculas
esto chegando e que as fbricas j
estabelecidas no sero capazes de
produz-las. Os sistemas de expresso alternativos, como as biofbricas, tambm j so reconhecidos
pela indstria como uma potencial
soluo para suprir a demanda a
custos mais baixos, mas como eu
disse anteriormente, ainda existe
uma certa inrcia em mudar toda a
estrutura j existente.
BC&D As vacinas transgnicas podem ajudar a controlar outras doenas que afligem a populao mundial, como a gripe e a
tuberculose?
Elbio Rech Sem dvida.
importante lembrar que cada caso
um caso, mas existem duas aplicaes bsicas. A primeira a produo de medicamentos em larga escala. A grande vantagem da produo
em planta que no h o perigo de
contaminao, como aconteceu com
a doena da vaca louca, por exemplo. Se o hormnio do crescimento
humano for produzido em planta,
depois de purificado, o ser humano
pode ter segurana total de que no
ser contaminado por nenhum vrus. Mas quando produzido em
animais, o controle na purificao
tem que ser muito mais rgido, j que

normalmente o processo feito com


mamferos e ns tambm somos mamferos, ento h mais chance de
que microrganismos passem para as
molculas. Logo, a produo dessas
molculas em plantas uma segu-

Hoje existe a noo errada de que tudo


que natural bom. Nem sempre
assim. Enquanto a ateno da sociedade est desviada para os produtos transgnicos, que hoje so os viles de planto, os produtos orgnicos so aceitos
sem restries, quando deveriam ser
muito mais questionados.
rana adicional para o consumidor.
Mas, se todas as regras de segurana
forem seguidas risca, o processo
pode ser feito tambm com animais
e bactrias sem riscos para os seres
humanos. No caso de vacinas, a
situao um pouco diferente, j
que so feitas na maior parte em
plantas. Mas h um ponto que eu
gostaria de enfatizar novamente: nenhum desses produtos vai entrar na
cadeia alimentar. Sero utilizados

... a rotulagem vai enfrentar algumas


dificuldades, como controlar alimentos
que so vendidos em lugares alternativos. Como saber, por exemplo, se a
pamonha vendida na beira da estrada
feita a partir de milho transgnico?
somente como frmacos. Eles vo
integrar a cadeia de medicamentos,
o que implica alguns cuidados especiais, como por exemplo, no transporte, que tem que ser feito em
caminho fechado para no correr o
risco de que alguma planta de soja
caia na estrada e possa ser plantada.
Quanto s plantas-vacinas transgnicas, h ainda outra questo importante a ser ressaltada: elas nunca
sero vendidas em feiras ou como
fitoterpicos. Sero vendidas na farmcia, como medicamentos, sob
prescrio mdica. claro que por
exemplo o alface transgnico para
combater a leishmaniose no ser
vendido em folha na farmcia. As
folhas sero liofilizadas (processo

em laboratrio pelo qual se transforma a folha em p), quantificadas,


padronizadas e colocadas dentro de
cpsulas para serem vendidas.
BC&D Enquanto se fala muito das plantas transgnicas, desvia-se a discusso dos males causados pelos agrotxicos tanto
para o meio ambiente quanto para
a sade da populao. Voc concorda?
Elbio Rech Sem dvida, concordo, claro. A questo a seguinte:
essa tecnologia de plantas transgnicas vai exatamente ao encontro de
uma demanda da sociedade, que a
reduo da utilizao de defensivos
qumicos com a conseqente reduo de seus efeitos para o meio
ambiente. No existe nenhum antagonismo entre os transgnicos e o
meio ambiente, muito pelo contrrio. Uma questo, entretanto, que
deve ser amplamente debatida pela
sociedade, e no tem sido, com
relao aos produtos orgnicos. Por
que? A base desses produtos o
esterco. E o esterco, tanto de galinha, quanto de bovinos normalmente apresenta grande quantidade de
antibiticos, principalmente no caso
das aves, que ficam depositados no
solo. Os produtos orgnicos, como
qualquer outra tecnologia, tm que
ser devidamente regulamentados, o
que no tem acontecido no Brasil,
onde so vendidos livremente em
feiras, sem nenhum tipo de selo. Em
alguns lugares, como supermercados e em grande parte das feiras de
So Paulo, esses produtos j so
regulamentados, mas na maior parte
dos estados brasileiros, isso no
acontece. Ento,eu acho que a populao se engana redondamente
com relao aos alimentos orgnicos, por exemplo, que podem ser de
alto risco se no forem fiscalizados.
Hoje existe a noo errada de que
tudo que natural bom. Nem
sempre assim. Enquanto a ateno
da sociedade est desviada para os
produtos transgnicos, que hoje so
os viles de planto, os produtos
orgnicos so aceitos sem restries, quando deveriam ser muito
mais questionados.

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BC&D Na sua avaliao,


quais as vantagens prticas e potenciais que as plantas transgnicas tm em relao s convencionais?
Elbio Rech Depende, a situao deve ser avaliada caso a caso.
Mas no contexto atual podem ser
ressaltadas as seguintes caractersticas: tolerncia a herbicidas, resistncia a insetos e vrus, e modificao da qualidade protica. A qualidade nutricional beneficia diretamente o consumidor. As outras no,
beneficiam o produtor atravs da
reduo de custos de produo;
melhor competitividade no mercado externo e a reduo no uso de
defensivos agrcolas. Sem falar nos
benefcios para o meio ambiente. O
agronegcio que tem impulsionado esse pas. Ento, fundamental
integrar tecnologia ao sistema de
produo de alimentos.
BC&D As sementes devem
ser consideradas patrimnio da
humanidade. No seu ponto de
vista, esses mesmos princpios podem ser empregados tambm no
caso das sementes transgnicas?
Elbio Rech Veja bem, s
para fazer uma comparao. A nossa
Lei de Proteo de Cultivares d
prerrogativa ao produtor especialmente para o pequeno, que s usa
aquela semente para o seu sustento
de comprar a semente, plantar,
colher e utiliz-la no ano seguinte
novamente. Ento, ele no precisa
comprar. Nos EUA, a legislao no
oferece essa prerrogativa e, por isso,
as sementes tm que ser compradas
todos os anos. claro que as situaes dos dois pases so completamente diferentes. Nos EUA, a agricultura extremamente subsidiada,
alm de outras vantagens. Mas o
ideal seria que o agricultor brasileiro
tambm pudesse comprar as sementes todos os anos porque a qualidade da semente se torna bem melhor.
Ento, respondendo a pergunta,
claro que qualquer tipo de semente
representa uma agregao de valor
e soberania para os pases. No sei
como essa situao vai ficar no futu6

ro, mas hoje, com a Lei de Proteo


de Cultivares, possvel fazer um
mapeamento da planta, de forma
que se algum utiliz-la no futuro, a
pessoa que a desenvolveu tem como
localiz-la e cobrar o que devido.

Os transgnicos no Brasil foram colocados no banco do rus, sem nenhuma


acusao concreta. Ou seja, esto seguindo o caminho inverso ao aceitvel:
so culpados at que se prove sua inocncia. Como que uma sociedade pode
evoluir nesse sentido?
Ento, eu acho que sim, tanto faz se
a semente for transgnica ou no.
BC&D A SBPC (Sociedade
Brasileira para o Progresso da Cincia), em texto publicado a respeito de OGMs diz que: a introduo de OGMs na cadeia de produo de alimentos para uso humano requer a divulgao atravs
da rotulagem de cada produto,
dando informaes detalhadas e
compreensveis. Como voc analisa essa questo?
Elbio Rech A rotulagem
um direito do consumidor. E uma
questo que o pas deve decidir. Se
o Brasil decidir rotular, tudo bem.
Mas para mim essa no a questo
principal. O fato de o produto ser
rotulado no diz se ele seguro. E
isso o que o consumidor deve
saber de fato: se os produtos que
chegam s prateleiras dos supermercados so seguros. Alm disso,
importante que as pessoas saibam que a rotulagem vai enfrentar
algumas dificuldades, como controlar alimentos que so vendidos
em lugares alternativos. Como saber, por exemplo, se a pamonha
vendida na beira da estrada feita
a partir de milho transgnico? Nos
EUA, onde a populao confia nos
rgos de fiscalizao e regulamentao, os produtos no so rotulados. A sociedade no exigiu isso.
Ento, o que eu acho que a sociedade tem que confiar em duas
instncias: primeiro, nos cientistas.
Segundo, nas instituies de regu-

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lamentao e fiscalizao federais


e estaduais. A sociedade deve exigir segurana. Eu participei recentemente de um seminrio internacional em So Paulo, no qual foi
levantada uma questo muito interessante: nos EUA, todo produto
seguro at que se prove o contrrio;
na Frana, o contrrio. J no
Brasil, a situao indita, pois
aqui os produtos transgnicos so
seguros e inseguros, ao mesmo tempo. Isso porque a polarizao a
favor e contra esses produtos faz
com que sejam taxados de seguros
por um grupo e de inseguros por
outro. E o consumidor fica perdido
no meio, sem saber o que fazer. Os
transgnicos no Brasil foram colocados no banco do rus, sem nenhuma acusao concreta. Ou seja,
esto seguindo o caminho inverso
ao aceitvel: so culpados at que
se prove sua inocncia. Como que
uma sociedade pode evoluir nesse
sentido? A sociedade brasileira tem
que confiar mais nas suas instituies. Se no existe essa confiana,
ento o problema mais srio e
transcende os produtos transgnicos. Nesse caso tem que haver cobrana, presso para que as autoridades melhorem o sistema, como
por exemplo, com a contratao de
mais fiscais. Por outro lado, eu acho
que essa discusso sobre os produtos transgnicos muito importante para a nossa sociedade porque
um exerccio de avaliao crtica.
Esses produtos abriram o caminho
para que qualquer nova tecnologia
que venha a bater nossa porta
daqui pra frente seja questionada.
Eu toro para que a sociedade
direcione brevemente esse questionamento para os produtos orgnicos, como eu j disse no incio
dessa entrevista. Ser que so to
naturais assim? O aprimoramento
do senso crtico em uma sociedade
s traz benefcios. A discusso social sempre muito saudvel, mas a
populao deve ficar atenta porque
o que no nada saudvel excluir
o Brasil da tecnologia de desenvolvimento de produtos transgnicos,
que fundamental para o seu desenvolvimento e competitividade
internacional.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho

Carta ao Leitor
Prezados Leitores,
Como j informamos, a revista Biotecnologia foi
reestruturada desde a edio anterior e est sendo editada
apenas em sua verso on line, disponvel no site
www.biotecnologia.com.br, toda comunidade cientfica,
com duas edies anuais, tanto em formato html como
tambm em pdf, e obedecendo os mesmos critrios e
objetivos que nortearam nosso trabalho desde sua fundao, em 1997, como a indexao e a divulgao da
pesquisa no pas.
BIOTECNOLOGIA Cincia & Desenvolvimento
KL3 Publicaes
Fundador
Dr. Henrique da Silva Castro
Direo Geral e Edio
Ana Lcia de Almeida
E-mail
biotecnologia@biotecnologia.com.br
Home-Page
www.biotecnologia.com.br

Nesta edio, contamos com a prestigiosa colaborao do


Dr. Elbio Rech, pesquisador da Embrapa Cenargen, que
em nossas pginas verdes nos conta a respeito no apenas
sobre novas aplicaes dentro das mltiplas possibilidades da engenharia gentica, como d sua opinio sobre
temas to polmicos, como a rotulagem dos produtos
transgnicos, e at mesmo sobre os alimentos orgnicos,
to em moda em nossos dias.
Esperamos que nossos leitores continuem tambm
interagindo conosco, para que possamos aperfeioar cada
vez mais.
Dr. Henrique da Silva Castro

Projeto Grfico
KL3 Publicaes LTDA
SHIN CA 05 Conjunto J
Bloco B Sala 105
Lago Norte - Braslia - DF
Tel.: (061) 468-6099
Fax: (061) 468-3214
Os artigos assinados so de
inteira responsabilidade
de seus autores.
ISSN 1414-4522

Nota: Todas as edies da Revista Biotecnologia Cincia &


Desenvolvimento esto sendo indexadas para o AGRIS
(International Information System for the Agricultural Sciences
and Technology) da FAOepara aAGROBASE (Base deDados da
AgriculturaBrasileira).

Conselho Cientfico
Dr.
Dr.
Dr.
Dr.
Dr.
Dr.
Dr.
Dr.
Dr.

Aluzio Borm - Gentica e Melhoramento Vegetal


Henrique da Silva Castro - Sade;
Ivan Rud de Moraes - Sade - Toxicologia;
Joo de Deus Medeiros - Embriologia Vegetal;
Naftale Katz - Sade;
Pedro Jurberg - Cincias;
Srgio Costa Oliveira - Imunologia e Vacinas;
Vasco Ariston de Carvalho Azevedo - Gentica de Microorganismos;
William Gerson Matias - Toxicologia Ambiental.

Conselho Brasileiro de Fitossanidade - Cobrafi


Dr. Lus Carlos Bhering Nasser - Fitopatologia
Fundao Dalmo Catauli Giacometti
Dr. Eugen Silvano Gander - Engenharia Gentica;
Dr. Jos Manuel Cabral de Sousa Dias - Controle Biolgico;
Dra. Marisa de Goes - Recursos Genticos
Instituto de Pesquisas Energticas e Nucleares - IPEN
Dr. Jos Roberto Rogero
Sociedade Brasileira de Biotecnologia - SBBiotec
Dr. Luiz Antonio Barreto de Castro - EMBRAPA
Dr. Digenes Santiago Santos - UFRGS
Dr. Jos Luiz Lima Filho - UFPE
Dra. Elba P. S. Bon - UFRJ

Colaboraram nesta edio:


Alexander Machado Cardoso, Anderson Brito da Silva ,
Andr Vitor Chaves de Andrade, Aneli de Melo Barbosa,
Ariadne Cristiane Cabral da Cruz, Ariane Maria Leoni,
Carlos de Oliveira Paiva Santos, Celso Omoto, Christiane
Philippini Ferreira Borges, Cludio Lcio, Fernandes
Amaral, Cosme Damio Cruz, Danielle Patrice Alexandre
Lima, Elias da Costa, Elbio Rech, Ellen Cristine Giese,
Elza Fernandes de Arajo, Ester Ribeiro Gouveia, Fbio
Andr dos Santos, Glucia Manoella de Souza Lima, Hui
I Tsai, Humberto Miguel Garay, Iracema M Castro Coimbra
Cordeiro, Iulla Naiff Rabelo de Souza Reis, Janete Magali
de Arajo, Joo de Deus Medeiros, Joo Marcelo Ochiucci,
Joel Majerowicz, Jorge Fernando Pereira, Jos Caetano
Zurita da Silva, Jos Ernesto Belizrio, Juliano Alves, Lara
Tschopoko Pedroso Pereira, Lexandra Novaki, Loiva Maria
Karnopp, M Fernanda Diniz, Manoel Teixeira Souza
Jnior, Marcelo Poletti, Maria de Lourdes Corradi da Silva,
Maria do Carmo Bittencourt-Oliveira, Maria do Socorro
Duarte, Marisa Vieira de Queiroz, Mariza Boscacci Marques,
Natlia Florncio Martins, Naysa B. Mandetta Clementino,
Odlio B. G. Assis, Orlando Bonifcio Martins, Osmar Alves
Lameira, Renato Molica, Ricardo Pilz Vieira, Rodrigo Barros
Rocha, Rodrigo Volcan Almeida, Sylvia M. Campbell
Alqueres, Welington Incio de Almeida

Entrevista

Novas Aplicaes para a Engenharia Gentica

Pesquisa

Predio do Potencial de Alergenicidade em OGMs - estudo de caso


Resistncia de Inimigos Naturais a Pesticidas
O Mapeamento Gentico no Melhoramento de Plantas
Filmes Comestveis de Quitosana
Bactrias Produtoras de Biossurfactantes
Marcadores Microssatlites em Espcies Vegetais
Biovidros
Melhoramento Biotecnolgico de Plantas Medicinais
Degradao Seletiva de Protenas e suas Implicaes no Cncer
Archaea: Potencial Biotecnolgico
Otimizao da Propagao In vitro de Curau (Ananas erectifolius L. B. SMITH)
Cianobactria Invasora
Marcadores Moleculares e Geminivrus
Glucanases Fngicas
Biossegurana em Biotrios
A Biotecnologia e a Extino de Espcies

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Pesquisa

Predio do Potencial
de Alergenicidade em
OGMs - estudo de caso
Gene da capa protica de Papaya ringspot virus em mamoeiro transgnico

Manoel Teixeira Souza Jnior, Ph.D.


Pesquisador em Biotecnologia/Genmica da
Embrapa Recursos Genticos e Biotecnologia
msouza@cenargen.embrapa.br

Natlia Florncio Martins, Ph.D.

Pesquisadora em Bioinformtica da Embrapa


Recursos Genticos e Biotecnologia
natalia@cenargen.embrapa.br
Ilustraes cedidas pelos autores

Alergia, biossegurana de
OGMs e uso de
Bioinformtica na
predio de protenas
alergnicas
Um dos pontos principais para a
garantia de biossegurana de alimentos
geneticamente modificados (OGMs), tambm conhecidos como transgnicos, a
avaliao do potencial de alergenicidade
das protenas codificadas pelos genes
inseridos. Modificaes genticas podem afetar a alergenicidade dos OGMs
de duas formas principais: pela introduo de alrgenos ou pela modificao do
nvel ou da natureza de alrgenos intrnsecos. Os alrgenos podem ser introduzidos pela expresso de protenas transgnicas, uma vez que as protenas tm
sido apontadas como agentes causadores de diversas alergias (alimentar,
esporos, plen, etc.) (Kleter et al., 2002).
O potencial de alergenicidade de
uma protena no um parmetro facilmente previsvel, sendo dependente da
diversidade gentica e da variabilidade
da resposta de IgEs 1 especficas. Dada a
falta de previsibilidade da alergenicidade, faz-se necessrio obter evidncias
que minimizem as dvidas quanto ao
potencial alergnico da protena em
questo, o que feito mediante um
processo de acessar riscos compostos de
diversos passos (European Comission,
2003).

Em 2001, a FAO e a OMS definiram como rvore de deciso para


alergenicidade (Ver anexo) uma srie
de condies que definem o potencial alergnico de uma nova protena
introduzida em alimentos geneticamente modificados. Esse enfoque utiliza estratgias que investigam a fonte
do gene, a homologia da seqncia
com alrgenos conhecidos, as reaes de associao com IgEs de fonte
sorolgica de indivduos alrgicos e
investiga algumas propriedades fsico-qumicas da protena codificada
pelo gene introduzido.
A anlise bioinformtica das seqncias fundamental para detectar
e prever propriedades estruturais, reaes adversas e o potencial de alergenicidade dessas protenas. A FAO e
a OMS recomendam uma padronizao nas metodologias utilizadas para
a rvore de deciso.
A comparao das seqncias de
interesse com bancos de dados de
alergnicos como o Structural Database
of Allergenic Proteins - SDAP (http://
fermi.utmb.edu/SDAP/index.html), e
outros servidores disponiveis na
internet, usando algoritmos de buscas
comparativas como o FASTA e BLAST,
o mtodo internacionalmente reconhecido para tal deteco. O mtodo
atual permite encontrar medidas de
similaridade e/ou identidade com protenas conhecidas como alergnicas.

________________________________________
1
A principal barreira imunolgica a protenas estranhas a secreo de molculas IgA, no
interior do intestino, a qual se complexa com as protenas estranhas e bloqueia a sua absoro.
As protenas estranhas que conseguem chegar circulao so recebidas por anticorpos da
classe IgA e IgG, os quais so eliminados do organismo pelo sistema retculo endotelial. Pessoas
normais geram anticorpos da classe IgA, IgM e IgG em minsculas quantidades em reao a
antgenos alimentares. Reaes mediadas por IgE liberam histamina, prostaglandinas e
leucotrienos, produzindo uma reao alrgica tpica imediata, com sintomas que aparecem em
minutos.

Reaes no mediadas por IgE produzem os sintomas em horas ou dias. Reaes no mediadas
por IgE e de mecanismo desconhecido causam um aumento da reatividade a um determinado
alimento sem o envolvimento do sistema imune, as quais chamamos de intolerncia alimentar.
(Theron G. Randolph: An Alternative Approach to Allergies - The New Field of Clinical Unravels
the Environmental Causes of Mental and Physical Ills. Harper & Row, Publishers, New York,1989).
10

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

Figura 1 .Alinhamento de seqncias de aminocidos das protenas capsdicas dos


isolados brasileiro (BR) e havaiano (HA5-1) de Papaya ringspot vrus (PRSV) utilizados
como doadores de gene cp para a produo dos mamoeiros transgnicos do Brasil e
dos EUA, respectivamente. Tarja vermelha mostra localizao do epitopo EKQKEK na
protena capsdica do isolado havaiano.

Similaridades em seqncias primrias podem sugerir reaes alrgicas


decorrentes do aparecimento de regies especficas de apresentao s
imuno-globulinas epitopos2.
Quanto anlise de homologia
em seqncias de protenas introduzidas, recomenda-se o uso de bancos
de dados internacionalmente conhecidos como o SwissProt, TrEMBL,
que contm seqncias de aminocidos da grande maioria dos alrgenos dos quais se conhecem as reaes alrgicas.

A avaliao das seqncias atravs


das ferramentas da bioinformtica auxiliam na predio de reaes cruzadas e
de eventuais reconhecimentos pelas
imunoglobulinas do tipo IgE. O CODEX
alimentarius considera como potencialmente alergnica a protena que possuir
35% de identidade com uma extenso
(janela) de 80 aminocidos ao longo de
toda a seqncia protica; contudo, esse
parmetro ainda est sendo discutido
pela comunidade internacional (Hileman
et al., 2002). J organizaes internacionais como a FAO e a OMS sugerem oito

aminocidos contguos como o nmero


ideal, enquanto que o ILSI/IFBC determina seis aminocidos contguos. O
segmento idntico deve ser considerado
com base na similaridade qumica dos
aminocidos, cientificamente justificada
de modo que evite resultados falsopositivos (European Comission, 2003).
Recentemente, Hileman e colaboradores, que buscavam identidades em
segmentos contguos de 6, 7 e 8 aminocidos idnticos, compararam, usando
o algoritmo FASTA, seqncias de seis
endotoxinas de Bacillus thuringiensis
(inseticidas), trs seqncias de protenas alimentares no alergnicas e 50
protenas de milho selecionadas aleatoriamente. Os autores concluram que o
algoritmo usado o mais eficiente e o
que melhor prediz para reaes cruzadas entre protenas alergnicas, e sugere que o segmento de oito aminocidos
estabelea uma margem maior de segurana para a predio de alergenicidade. Alm disso, os autores apontaram
que o segmento de seis aminocidos
idnticos foi o que produziu um maior
nmero de falsos positivos.

Epitopo potencialmente
alergnico na capa
protica do Papaya
ringspot virus (PRSV)
Recentemente,
Kleter
e
Peijnenburg publicaram um trabalho
na revista BMC Structural Biology
(Kleter et al., 2002). Nessa publicao
os autores propem uma metodologia

Tab ela 1 P o pu la es d e mamo eiro s tran sgn ico s tran sferid o s para a E mb rapa Man d io ca e Fru ticu ltu ra.
P o pu lao
Embrapa PTP01
Embrapa PTP02
Embrapa PTP03
Embrapa PTP04
Embrapa PTP05
Embrapa PTP06
Embrapa PTP07
Embrapa PTP08
Embrapa PTP09
Embrapa PTP10
Embrapa PTP17

Gerao
R1
R1
R1
R1
R1
R1
R1
R1
R1
R1
R1

Embrapa PTP18

R2

Embrapa PTP28

R1

Descrio
Populao originria de autofecundao controlada da linha Ro UM1a
Populao originria de cruzamento controlado entre linhas Ro UM7d e Ro UM1a
Populao originria de autofecundao controlada da linha Ro UM1g
Populao originria de cruzamento controlado entre linhas Ro UM7d e Ro UM11d
Populao originria de autofecundao controlada da linha Ro UM11d
Populao originria de autofecundao controlada da linha Ro UM15b
Populao originria de autofecundao controlada da linha Ro UM18e
Populao originria de autofecundao controlada da linha Ro TS1j
Populao originria de autofecundao controlada da linha Ro TS7f
Populao originria de autofecundao controlada da linha Ro TS8b
Populao originria de autofecundao controlada da linha Ro TL6b
Populao obtida por autofecundao controlada de planta R1 resultante de
cruzamento entre linhas Ro UM7c e UM1g
Populao originria de autofecundao controlada da linha Ro UM6h

________________________________________
2
Epitopos O epitopo constitudo por um grupo de tomos, que formam configuraes especficas tridimensionais, esterioespecficas de tamanho
limitado (em mdia na ordem de um tri a um hexassacardeo, ou de um tri a um decapeptdeo), na superfcie da molcula imunognica. So as
estruturas que induzem a imunogenicidade de uma molcula (regies ditas imunopotentes) e seus determinantes especficos antignicos (epitopos
ou locais conformacionais ou seqenciais) relacionam-se mais com zonas distintas da molculas. Atualmente, somente algumas moleculas de plantas
so conhecidas como epitopos - que tm afinidade por IgEs. Uma coleo dessas molculas foi organizada na forma de uma base de dados disponvel
no endereco: http://www.csl.gov.uk/allergen/Index.htm.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

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de avaliao de casos potencialmente


alergnicos e estendem as buscas comparativas a bancos de dados, includo
o pipeline, a predio de alergenicidade
pelo mtodo de Hoop & Woods (1981)
e testes sorolgicos para protenas cuja
identidade com alergnicos fosse de
seis ou sete aminocidos.
Naquele artigo, a metodologia proposta foi aplicada em 33 protenas transgnicas e suas predies de alergenicidade foram discutidas. O procedimento
foi dividido em duas partes: primeiramente, foi extrada da literatura internacional uma busca de epitopos lineares,
em particular, de protenas alergnicas;
em seguida, a lista de protenas
alergnicas foi comparada com o conjunto de protenas transgnicas.
O segundo passo da anlise foi a
predio de alergenicidade atravs do
algoritmo computacional descrito em
Hoops & Woods (1981). Subseqentemente, foi verificado se a regio
predita como antignica da protena
coincidia com a seqncia de protena alergnica. Esse passo foi particularmente til para os casos onde os
dados da literatura eram escassos.
Como resultado da metodologia
aplicada, 22 protenas apresentaram
resultados positivos com segmentos de
seis ou sete aminocidos. Trs dessas
foram identificadas como potencialmente alergnicas [PRSV CP - protena
capsdica do Papaya ringspot vrus
(PRSV) (gi593497), acetolactato sintase
GH50 e glicofosfato oxidoredutase. Os
demais casos foram claramente negativos, como a Cry1Ac.
A anlise da capa protica (CP)
do vrus causador da doena denominada Mancha Anelar ou Mosaico, o PRSV, em especial o isolado do
papaya havaiano HA 5-1, doador do
gene de resistncia nas variedades
transgnicas Rainbow e SunUp, cultivadas no Hava desde 1998, apresentou o segmento EKQKEK idntico a uma protena alergnica de nematide, sendo assim classificado
como potencialmente alergnico
pelo mtodo de predio. Para a
seqncia EKQKEK, no foram encontrados dados na literatura que
descrevam a potencial associao a
IgEs. Portanto, os autores sugeriram
que o potencial alergnico da protena transgnica presente nos mamoeiros havaianos fosse confirmado por
testes clnicos e/ou sorolgicos.
12

Anexo I
rvore de Deciso FAO

Figura 2. Estrutura secundria das protenas capsdicas dos isolados brasileiro (BR) e
havaiano (HA5-1) de Papaya ringspot vrus (PRSV) utilizados como doadores de gene
cp para a produo dos mamoeiros transgnicos do Brasil e dos EUA, respectivamente.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

Avaliando a presena do
epitopo EKQKEK na capa
protica dos isolados
brasileiros de PRSV, e nos
mamoeiros transgnicos
produzidos pela Embrapa

Figura 3. Hidrofobicidade das protenas capsdicas codificadas pelos genes cp de Papaya


ringspot vrus presente nos mamoeiros transgnicos brasileiros e havaianos. O quadro
superior mostra a hidrofobicidade da protena do isolado PRSV BR (Souza Jr., 1999), e o
quadro inferior mostra a hidrofobicidade da protena do isolado PRSV HA 5-1 (Acesso
gi593497 no http://www.ncbi.nlm.nih.gov ).

Figura 4. Grfico de antigenicidade gerado pelo mtodo Hopp e Woods (1981) da seqncia
das protenas capsdicas codificadas pelos genes cp de Papaya ringspot vrus presente nos
mamoeiros transgnicos brasileiros e havaianos. O quadro superior mostra a antigenicidade
da protena do isolado PRSV BR (Souza Jr., 1999), e o quadro inferior mostra a antigenicidade
da protena do isolado PRSV HA 5-1 (Acesso gi593497 no http://www.ncbi.nlm.nih.gov).

H pouco mais de dez anos, a


Embrapa, por intermdio de suas unidades de Cruz das Almas (Embrapa
Mandioca e Fruticultura) e Braslia
(Embrapa Recursos Genticos e Biotecnologia), realiza um trabalho de
cooperao tcnica com a New York
State Agriculture Experiment Station,
Cornell University, na cidade de
Geneva, no estado de New York, nos
EUA, com vistas a desenvolver mamoeiros (C. papaya) transgnicos resistentes Mancha Anelar, que um dos
principais fatores limitantes dessa cultura no Brasil.
Em abril de 2001, foram incorporadas pela Embrapa Recursos Genticos e
Biotecnologia, no programa de melhoramento gentico de mamoeiro, desenvolvido na Embrapa Mandioca e Fruticultura, treze populaes de mamoeiros transgnicos (Tabela 1). Os trabalhos de pesquisa da ltima fase de
desenvolvimento de mamoeiro transgnico resistente PRSV feitos pela
Embrapa compem um dos projetos
que fazem parte [Avaliao de segurana alimentar e ambiental de mamoeiro geneticamente modificado para resistncia ao vrus da mancha anelar
(PRSV)] da rede de Biossegurana de
Organismos Geneticamente Modificados, aprovada em 2002, no Macroprograma 1 da Embrapa.
O gene cp utilizado nas construes gnicas aplicadas na transformao gentica de mamoeiros das variedades Sunrise e Sunset Solo, que
visam resistncia a isolados brasileiros de PRSV, foi obtido a partir de um
isolado de PRSV coletado na regio de
Nova Viosa, no Estado da Bahia. As
populaes transferidas para a
Embrapa Mandioca e Fruticultura foram originadas de plantas que continham uma das trs verses do gene
cp, e so elas: UM (untranslatable
medium), TS (translatable short) e TL
(translatable large) (Souza Jr., 1999).
Untranslatable significa no-traduzido, isto , o gene transcrito, mas o
mRNA produzido a partir dele no
gera protena devido presena de
cdon terminador inserido a alguns

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

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Anexo II
O que alergia alimentar?
Nosso corpo se protege de infeces atravs do sistema imunolgico. Ns produzimos molculas, chamadas
anticorpos, que reconhecem o agente causador da infeco. Existem diferentes tipos de anticorpos: aqueles que
esto envolvidos em reaes alrgicas chamam-se IgE. Ns sabemos que as molculas de IgE so normalmente
produzidas em resposta a infeces causadas por parasitas, como o agente causador da malria, por exemplo. Ainda
no conhecemos a causa, mas algumas pessoas produzem IgE para outros agentes no parasitas, como o poln e
alguns alimentos. Nessas reaes de reconhecimento so deflagrados os sintomas de alergia, como febre, tontura,
dores de cabea e outros.
As molculas de IgE agem como etiquetas que se aderem s molculas advindas do alimento ou do plen,
chamadas alrgenos. Quando algum tem uma alergia alimentar e ingere o alrgeno, as IgEs atacam as molculas
invasoras e disparam as reaes em cascata as quais caracterizam o processo alrgico. Um dos efeitos comuns
das IgEs associadas s clulas basfilas a liberao de grnulos de histamina, que, por sua vez, causam as reaes
inflamatrias que so percebidas pelos sintomas alrgicos.

Alergia ou Intolerncia?
A tolerncia imunolgica definida como a incapacidade especfica adquirida, total ou parcial, por um
indivduo que desenvolve uma resposta imune humoral
normal ou a mediao celular a um antgeno ou a diversos
epitopos de um certo antgeno contra o qual ele normalmente no desenvolveria. Um indivduo dito tolerante
possui a capacidade de responder a outros antgenos
administrados ao mesmo tempo que o primeiro, que
pode ou no bloquear seu potencial de resposta imune.
Em outras palavras, a tolerncia imunologica tambm
especfica a um antgeno.
Uma outra coleo de sintomas so relatados em
pessoas que so sensibilizadas por alimentos, como
dores de cabea, dores musculares e nas juntas e fadiga.
Esse conjunto comumente conhecido como intolerncia alimentar. Ainda assim, conhece-se muito pouco das
reaes que causam a intolerncia e que podem se
agravar para o diagnstico de alergia.
Existem excees : conhece-se bem a doena
Celaca (http://www.concordia.psi.br/~celiaco/
doenca.htm) e a intolerncia lactose. Na doena
Celaca, as reaes alrgicas so deflagradas pela ingesto
de glten (derivado de trigo, aveia e outros cereais). A
intolerncia lactose no se caracteriza como alergia,
mas causa alguns sintomas como a alergia ao leite com
dores abdominais e diarria. (http://www.celiac.org).
cdons aps o cdon iniciador.
Translatable significa que h a traduo completa desse gene.
A verso do gene cp do isolado
PRSV HA 5-1 utilizado para a produo do mamoeiro transgnico havaiano
(Fitch et al., 1992) uma verso curta
do gene cp (Ling et al., 1991) e no
apresenta a seqncia de nucleotdeos necessria para traduzir a sua extremidade N. Essa a razo para a falta
dos dezenove primeiros aminocidos
que esto presentes na protena
capsdica do isolado Brasil. Bahia - ou
PRSV BR (Figura 1).
14

Sob a tica do mtodo de predio


descrito por Kleter et al. (2002), analisamos a presena do epitopo EKQKEK e
do potencial alergnico deste na protena expressa pelo gene da capa protica
(cp) encontrado nos mamoeiros transgnicos desenvolvidos por Souza Jr.
(1999) e liberados para o programa de
melhoramento gentico de C. papaya
desenvolvido na Embrapa Mandioca e
Fruticultura. Quanto presena do
epitopo, observamos que o alinhamento das seqncias de aminocidos das
protenas do capsdeo dos isolados BR
e HA 5-1 mostra que o epitopo EKQKEK

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

no est presente no isolado brasileiro


(Figura 1). No lugar dele, encontrado
o epitopo EKQKKK. O grfico do
alinhamento mostra que as regies variveis da protena so pontuais e distribudas ao longo da seqncia. Algumas
mutaes observadas entre os residuos
33, 38, 44 e 54 so mais significativas
para a estrutura da protena.
A predio da estrutura secundria
das protenas do isolado do Hava indica que os resduos do epitopo exibem
uma tendncia a construrem uma estrutura em forma de ala (loop). Enquanto a anlise da protena do isolado

Figura 5. Alinhamento de seqncias de aminocidos 60 primeiros aminocidos do terminal N - das protenas capsdicas de 13 isolados
brasileiros de Papaya ringspot vrus (PRSV). O isolado Brasil o doador do gene cp utilizado para produzir os mamoeiros transgnicos
brasileiros. Denominao dos isolados: DF P (Braslia, bitipo P), DF W (Braslia, bitipo W), CE P (Guaiba, Cear, bitipo P), CE W
(Aracoiaba, Cear, bitipo W), BA-CA (Cruz das Almas, Bahia), BA-IT1 (Itabela, Bahia isolado 1), BA-IT2 (Itabela, Bahia isolado 2),
ES (Linhares, Esprito Santo), PB (Alhandra, Paraba), PE (Camaragibe, Pernambuco), SP (Piracicaba, So Paulo), PR (Paranava, Paran).
A tarja vermelha mostra a posio do primeiro epitopo, enquanto a tarja azul mostra a posio do segundo epitopo.

Figura 6. Estrutura tridimensional prevista pelo mtodo de modelagem molecular por


homologia dos peptdeos das protenas capsdicas codificadas pelos genes cp de Papaya
ringspot vrus presente nos mamoeiros transgnicos brasileiros e havaianos.

do Brasil, doador do gene cp presente


nas plantas transgnicas, mostra uma
tendncia a formar uma estrutura em
forma de hlice (Figura 2).
A predio de hidrofobicidade e
antigenicidade para a protena do
capsdeo do isolado brasileiro e do
isolado havaiano (gi 593497) de PRSV
foi realizada usando o algoritmo de
Hoop & Woods (1981) e o resultado
do clculo apresentado nas figuras
de 3 a 5.
Uma anlise da presena desse
epitopo2 EKQKEK na protena do
capsdeo de 13 isolados brasileiros de
PRSV, cuja seqncia conhecida e se
encontra disponvel na literatura (Souza
Jr., 1999; Lima et al., 2002) ou na internet
(http://www.ncbi.nlm.nih.gov), revelou
que esses isolados podem ser agrupados em trs classes: os que no apresentam o epitopo (Brasil.Bahia, BA-CA e
PR), os que apresentam uma cpia do

epitopo (PE, ES e CE-P), e os que


apresentam duas cpias deste (DF-P,
DF-W, CE-W, BA-IT1, BA-IT2, PB e SP)
(Figura 5).
A predio da estrutura tridimensional do segmento em questo corroborou a predio da estrutura secundria, onde ocorre uma ala na
seqncia EKQKEK e forma uma estrutura secundria estvel em forma
de alfa-hlice para a seqncia do
mamo brasileiro (Figura 6).

Referncias Bibliogrficas
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Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

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Resistncia de Inimigos
Naturais a Pesticidas

Pesquisa

Explorao de Inimigos Naturais Resistentes a Pesticidas em Programas de Manejo Integrado de Pragas

Marcelo Poletti

Doutorando em Entomologia, Departamento de


Entomologia, Fitopatologia e Zoologia Agrcola,
Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz
(ESALQ - USP).
mpoletti@esalq.usp.br

Celso Omoto

Professor Doutor, Departamento de Entomologia,


Fitopatologia e Zoologia Agrcola, Escola Superior
de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ - USP).
celomoto@esalq.usp.br
Ilustraes cedidas pelos autores

16

Introduo
A utilizao de pesticidas como
estratgia de controle de pragas na
agricultura moderna tem se contraposto teoria preconizada pelo Manejo Integrado de Pragas (MIP) (Kogan,
1998) devido maneira e intensidade
sob as quais tem sido empregada. O
freqente uso de produtos de largo
espectro de ao, alm de afetar o
desenvolvimento da dinmica populacional de inimigos naturais em campo, interferindo sobre o equilbrio dos
mais variados organismos, no
agroecossistema, tambm est associado a outros problemas entre os quais
a evoluo da resistncia de insetos e
caros a pesticidas.
A resistncia, por definio, o
desenvolvimento de uma habilidade
em uma determinada linhagem de um
organismo em tolerar doses de txicos
que seriam letais para a maioria da
populao suscetvel da mesma espcie. Trata-se de uma caracterstica hereditria sendo um termo que se aplica
intraespecificamente. O processo
determinante no desenvolvimento da
resistncia a presso de seleo,
dada pelo uso freqente de um mesmo
pesticida ou de pesticidas pertencentes a um mesmo grupo qumico. De
acordo com Roush & Mckenzie (1987),
no incio da evoluo da resistncia,
estima-se que a freqncia dos alelos
que conferem essa caracterstica a uma
populao bastante baixa (10-2 a 1013
). No entanto, devido ao uso contnuo
de um mesmo pesticida, a freqncia
de resistncia poder aumentar em
nveis em que a eficcia do produto
afetada devido a esse fato (freqncia
crtica de resistncia).

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At o final da dcada de 80, o


nmero de casos de resistncia documentados era de 504 espcies de insetos e caros, sendo considerado muito
baixa a porcentagem de deteces
associadas aos inimigos naturais
(Georghiou & Lagunes-Tejeda, 1991)
(Figura 1). Dados mais recentes mostraram que os casos de resistncia tm
aumentado para 540 (Whalon et al.,
2003). As hipteses da pr-adaptao
diferencial e da limitao do alimento
tm sido apresentadas com o intuito de
justificar essa baixa taxa de deteco
da resistncia para os agentes do controle biolgico (Croft & Morse, 1979).
A hiptese da pr-adaptao diferencial baseia-se no fato de que as
pragas esto melhor pr-adaptadas a
sobreviver aplicao de produtos
qumicos do que seus inimigos naturais, sendo que este fato est associado
capacidade intrnseca das mesmas
em lidar com estresses bioqumicos
associados a suas fontes de alimento.
Uma possvel explicao que essa
habilidade tenha sido desenvolvida
durante o processo de co-evoluo
planta-hospedeira inseto-praga, podendo ocorrer diferenas nos processos de
destoxificaes hidroltica e oxidativa
entre o grupo das pragas e dos inimigos naturais (Plapp & Bull, 1978).
Quanto hiptese da limitao do
alimento, sustenta-se no fato de que os
inimigos naturais que sobreviveram
aplicao de um determinado produto
poderiam sofrer falta de alimento devido baixa disponibilidade da presa.
Dessa forma, os indivduos sobreviventes no se reproduziriam com eficincia, ou, ento, poderiam emigrar
para reas no tratadas ocorrendo conseqentemente diluio da resistncia

Figura 1. Porcentagem relativa dos casos detectados de resistncia de artrpodes a


pesticidas de acordo com a importncia econmica (Georghiou & Lagunes-Tejeda, 1991).

devido introgresso com populaes


suscetveis. Nesse caso, o princpio
dessa hiptese que a evoluo da
resistncia nas espcies fitfagas deve
preceder a evoluo nos inimigos naturais (Baker & Arbogast, 1995).
A resistncia entre os artrpodes
fitfagos e seus inimigos naturais apresenta efeitos contrastantes, sendo que
para os fitfagos a resistncia intensifica sua condio de praga reduzindo as
possibilidades de manejo. Por outro
lado, a evoluo da resistncia em
populaes de inimigos naturais pode
contribuir de maneira significativa com
o MIP pela conservao desses organismos mesmo aps aplicaes de
produtos considerados nocivos a eles
(Croft, 1990). Sendo assim, o presente
trabalho tem como objetivo relacionar
alguns casos de deteco da resistncia a pesticidas em artrpodes inimigos naturais, e sua utilizao no MIP,
bem como enfatizar a possibilidade do
emprego da biotecnologia para a obteno de linhagens resistentes.

Resistncia de caros
Fitosedeos a Pesticidas
Os caros fitosedeos (Acari:
Phytoseiidae) tm constitudo o grupo
de inimigos naturais mais explorado
em estudos dirigidos resistncia. Esses predadores apresentam parmetros intrnsecos que favorecem a evoluo dessa caracterstica, destacandose o alto potencial reprodutivo e o
rpido ciclo de vida, alm do fato de
algumas espcies reproduzirem-se por
parahaploidia ou pseudo-arrenotoquia.
Neste tipo de reproduo, machos e
fmeas so originados de ovos diplides
(2n) fecundados. No entanto, durante
o processo embrionrio, ocorre a perda de um conjunto de cromossomos de
origem paterna nos ovos que daro
origem aos machos haplides (n) (Hoy,

1985a). Anlises genticas realizadas


com Galendromus (=Metaseiulus)
occidentalis, espcie que se reproduz
por parahaploidia, demonstraram que
os machos herdaram de suas mes a
resistncia a inseticidas carbamatos
(Roush & Hoy, 1981a; Roush & Plapp,
1982). Um outro fator que se relaciona
com o aumento na freqncia de caros
fitosedeos resistentes a pesticidas a
ocorrncia de espcies generalistas
quanto ao hbito alimentar. Neste caso,
essas espcies so capazes de sobreviver e reproduzir-se com eficincia,
alimentando-se de plen e exudatos
de plantas, alm de fungos e pequenos
insetos (McMurtry, 1997). Esse fato
neutraliza a possibilidade da limitao
do alimento aps a aplicao de um
pesticida, ocorrendo dessa forma a
preservao da populao resistente
em campo.
O primeiro relato de sobrevivncia
em populaes de caros fitosedeos
aps pulverizaes com inseticidas de
largo espectro de ao em campo foi
efetuado no incio dos anos 50 para G.
occidentalis (Huffaker & Kennett, 1953).
No entanto, esse fato foi associado
resistncia somente no final da dcada
de 60, quando trabalhos realizados em
laboratrio confirmaram a ocorrncia
da variabilidade intraespecfica na suscetibilidade de populaes de G.
occidentalis e Neoseiulus (=Amblyseius)
fallacis a inseticidas organofosforados
(Motoyama et al., 1970; Croft & Jeppson,
1970). Posteriormente, resistncia a
paration foi detectada em populaes
de Amblyseius hibisci coletadas em
pomares de citros na Califrnia/EUA
(Kennett, 1970). A partir disso, inmeros trabalhos de deteco e seleo
para a resistncia a pesticidas em populaes de caros fitosedeos foram
efetuados em todo mundo (Quadro 1).
Quanto aos pesticidas, nfase tem sido
dada aos inseticidas carbamatos, orga-

nofosforados e piretrides, pelo fato


de apresentarem elevada toxicidade
para a maioria das espcies de caros
predadores em campo.
Durante a dcada de 70 foram
realizadas vrias deteces de resistncia aos inseticidas organofosforados:
azinfosmetil, diazinon, fosmet, paration,
TEPP e fosalone em diferentes populaes de G. occidentalis coletadas nas
regies produtoras de frutas nos Estados Unidos (Croft, 1990). Em laboratrio, aps processo de presso de seleo com carbaril (carbamato), Roush &
Hoy (1980) obtiveram linhagens de G.
occidentalis resistentes a esse produto. Posteriormente, realizando estudos
em condies de laboratrio, casa de
vegetao e campo esses autores verificaram que essa linhagem apresentou
um aumento na razo sexual (maior
nmero de fmeas) quando comparado com a linhagem suscetvel de referncia No entanto, esse fato no afetou
o desempenho da mesma no controle
biolgico de caros fitfagos nas condies avaliadas (Roush & Hoy, 1981b).
O monitoramento da resistncia
de G. occidentalis a metomil e
dimetoato tambm foi efetuado pelos
mesmos autores (Roush & Hoy,
1981b). Neste caso foram avaliadas as
respostas de vrias populaes
coletadas em pomares de ma, pra,
amora e uva, sendo que todas apresentaram baixa razo de resistncia a
esses dois produtos. De acordo com
Roush & Plapp (1982) a linhagem de
G. occidentalis resistente a carbaril
tambm apresentou elevada resistncia a propoxur. Hoy & Knop (1981)
tambm selecionaram para resistncia a permetrina populaes de G.
occidentalis coletadas em pomares de
ma situados em Washington/EUA.
Resistncia mltipla a organofosforados, cabamatos, piretrides, enxofre e ao acaricida abamectin foi detectada em diversas populaes dessa
espcie em campo. Esse fato tem sido
intensivamente explorado dentro do
manejo integrado em vrias culturas
nos Estados Unidos (Croft, 1990). Em
outros pases, tal como a Rssia, linhagens resistentes de G. occidentalis a
inseticidas como os organofosforados
e piretrides tambm tm sido exploradas em estudos visando o manejo de
caros-praga (Petrushov, 1991).

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

17

Assim como G. occidentalis, o


caro N. fallacis um dos fitosedeos
mais explorados em estudos de resistncia a pesticidas, sendo uma espcie muito empregada para o controle
biolgico de caros tetraniqudeos,
especialmente T. urticae (Croft, 1990).
Resistncia mltipla ou cruzada a vrias classes de produtos como DDT e
alguns de seus derivados, carbamatos,
organofosforados e piretrides, tambm foi detectada em muitas populaes desse caro (Croft, 1983). Devido ocorrncia generalizada de populaes resistentes dessa espcie a
vrios pesticidas em campo, alguns
pesquisadores tm encontrado alguma dificuldade no estabelecimento de
populaes suscetveis de referncia
para estudos de laboratrio (Croft et
al., 1976a).
Quanto resistncia aos inseticidas piretrides, Fitzgerald & Solomon
(1992) realizando bioensaios para determinar a resposta de populaes de N.
fallacis a deltametrina, relataram a ocorrncia de uma linhagem, cuja razo de
resistncia obtida foi de aproximadamente quatro vezes. De acordo com
Thistlewood et al. (1992), esse fato
pode ser atribudo intensa presso de

seleo com inseticidas piretrides nas


reas onde foi realizada a coleta dessa
populao. Ainda, para essa mesma
espcie, Thistlewood et al. (1995) verificaram que aps 55 presses de seleo com permetrina sobre uma determinada populao, pde-se evidenciar
um aumento de 964 vezes na resistncia
da mesma a esse produto em condies
de laboratrio.
Uma outra espcie de caro
fitosedeo que se destaca no nmero
de trabalhos relacionados resistncia Phytoseiulus persimilis, sendo
comumente utilizado para o controle
de T. urticae em cultivos protegidos
de ornamentais em pases da Europa.
A resistncia de P. persimilis a inseticidas organofosforados foi relatada
por Schulten et al. (1976). Esses autores observaram que populaes liberadas em cultivos protegidos na
Holanda apresentaram elevada resistncia a paration. Quanto resistncia
mltipla, tem sido detectada com freqncia em populaes coletadas em
campo em alguns pases da Europa
(Croft, 1990). A introduo de uma
linhagem de P. persimilis resistente a
organofosforados foi realizada no Egito para o controle de T. urticae na

cultura do pepino, evidenciando-se


uma elevada efetividade desse predador quando foram realizadas liberaes de dez indivduos por planta
(Rasmy & Ellaithy, 1988).
Casos de resistncia a pesticidas
tambm tm sido relacionado com
freqncia Typhlodromus pyri, sendo essa espcie considerada de grande importncia para o controle de
Panonychus ulmi e T. urticae em
macieira na Europa (Vidal & Kreiter,
1995). A primeira deteco de populaes resistentes a organofosforados
foi realizada na Nova Zelndia, verificando-se que inicialmente a intensidade de resistncia detectada foi baixa (Hoyt, 1972). No entanto, observou-se que aps sucessivas presses
de seleo com azinfosmetil, em um
mesmo pomar, houve um incremento
progressivo na freqncia de resistncia in loco. Desde ento, essas populaes resistentes a pesticidas tm
sido freqentemente empregadas em
programas de manejo de P. ulmi em
pomares de ma na Nova Zelndia
(Collyer, 1980). No Canad, estudos
dirigidos a linhagens de T. pyri, que
apresentavam resistncia mltipla a
organofosforados e piretrides, mos-

Quadro 1 - Alguns exemplos de casos de caros fitosedeos (Acari: Phytoseiidae) resistentes a pesticidas no mundo.
Espcie
Amblyseius fin lan dicus

I. A.1
azinfosmetil

Pesticida
Classe2
I

Grupo Qumico3
O

Local

Referncia

Finlndia

Kostiainen & Hoy (1994)


Kennett (1970)

A. hibisci

paration

EUA

A. lon gispin osus

carbaril

Taiwan

fenvalerate
deltametrina

I
I

P
P

China
China

Zhu et al.(1996)
Ding et al. (1983)

pentoato

Itlia

Caccia et al. (1985)

permetrina

Japo

Mochizuki(1994)

deltametrina

Brasil

carbaril

EUA

Poletti (2002)
Grafton-Cardwell &
Ouyang (1993)

carbaril

EUA

Roush & Hoy (1981 a,b)

deltametrina
mancozebe

I
F

P
A

Brasil
Frana

Poletti (2002)
Auger et al. (2001)

fosmet

Uruguai

Croft et al. (1976)

permetrina
deltametrina
azinfosmetil
cipermetrina

I
I
I
I

P
P
O
P

EUA
Frana
EUA
Canad

Navajas et al (2001)
Fournier et al. (1987)
Croft & AliNiazee (1983)
Marshall et al. (2001)

A. pseudolon gispin osus


A. n icholsi
A. poten tiallae
(=an derson i)
A. (=Neoseiulus)
womersleyi
Euseius con cordis
E. tularen sis
Galen dromus
(=Metaseiulus) occiden talis
Iphiseiodes zuluagai
Kampimodromus aberran s.
Neoseiulus californ icus
(=Amblyseius chilen en sis)
Neoseiulus fallacis
Phytoseiulus persimilis
T. arboreus
T. pyri
1

Lo et al. (1984)

I. A. = ingrediente ativo, 2A = acaricida, F = fungicida, I = inseticida; 3C= carbamatos, P= piretrides,, O= organofosfosrados; A=


alquilenobis (ditiocarbamato).

18

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

Figura 2 - Neoseiulus californicus


foto: Heraldo Negri

Figura 3 - Euseius concordis


foto: Heraldo Negri

Figura 4 - Iphiseiodes zuluagai


foto: Heraldo Negri

traram uma possibilidade vivel no


emprego do manejo integrado de P.
ulmi em ma (Hardman et al., 2000).
Kostiainen & Hoy (1994a) detectaram variabilidade intraespecfica a
inseticidas organofosforados em
Amblyseius finlandicus (Oudemans),
importante predador de P. ulmi e
caros eriofdeos em ma na Finlndia. Os autores evidenciaram que os
valores estimados para CL50 (concentrao que mata 50% dos indivduos
em uma determinada populao) na
maioria das populaes coletadas em
pomares comerciais apresentaram-se
cinco vezes superior ao valor obtido
para linhagem suscetvel de referncia. Tambm verificaram que a resistncia detectada em algumas populaes avaliadas permaneceu estvel
mesmo na ausncia de presso de
seleo (Konstiainen & Hoy, 1994b).
No Japo, Mochizuki (1994) avaliando a ocorrncia da variabilidade
intraespecfica a cipermetrina,
permetrina, fenvalerate e fluvalinate

em populaes de Amblyseius
womersleyi (importante predador de
Tetranychus kanzawai na cultura do
ch nesse pas) coletadas em diferentes reas, concluiu que a resistncia
observada em uma dessas populaes relacionou-se diretamente com
o nmero de aplicaes desses produtos realizadas em campo. Sato et
al. (2000) realizando quatro presses
de seleo em laboratrio com
metidation obtiveram um aumento
de aproximadamente 21 vezes na
razo de resistncia de uma populao de A. womersleyi a esse produto.
No Brasil, Sato et al. (2002) realizaram coleta de uma populao de
Neoseiulus californicus (Figura 2) em
cultivo de morango na regio de
Atibaia/SP e observaram que ela apresentou elevada tolerncia a diversos
pesticidas como o acaricida propargite
e o inseticida dimetoato. Neste caso, os
autores sugerem que tal fato pode
estar associado s presses de seleo
exercidas pelas aplicaes desses produtos em campo, o que pode ter contribudo para a evoluo da resistncia
na populao avaliada. Poletti et al.
(2003) avaliaram a suscetibilidade
deltametrina nessa mesma populao
de N. californicus, coletada em morango (Atibaia/SP) e mantida na Estao
Experimental do Instituto Biolgico
(Campinas/SP) desde 1999, e em uma
populao dessa mesma espcie, oriunda de um pomar comercial de ma em
Fraiburgo/SC. Evidenciou-se que a
populao proveniente de Atibaia/SP
(morango) foi aproximadamente 24
mais tolerante deltametrina do que a
populao coletada em ma. De acordo com Monteiro (2001), o inseticida
deltametrina foi extremamente txico
para uma populao de N. californicus
coletada em pomar de ma situado
em Vacaria/RS. Dessa forma, pode-se
sugerir que a explorao de linhagens
resistentes de N. californicus a deltametrina ou outros inseticidas nocivos
pode ser uma ferramenta importante
dentro do manejo integrado em ma
na regio sul do Brasil.
Em citros, Poletti (2002) detectou
resistncia a deltametrina em populaes de Euseius concordis (Figura 3) e
Iphiseioides zuluagai (Figura 4)
coletadas em diferentes pomares situados no Estado de So Paulo, fato que

tambm esteve associado ao histrico


de pulverizaes com deltametrina em
cada local onde foram efetuadas as
coletas. De acordo com Moraes & S
(1995) os caros fitosedeos so os
principais inimigos naturais do caro
da leprose dos citros, Brevipalpus
phoenicis, praga-chave nesta cultura.
Sendo assim a preservao desses predadores por ocasio da realizao de
pulverizaes com produtos nocivos
extremamente conveniente. Tambm
foi possvel detectar variabilidade
interespecfica na suscetibilidade a deltametrina entre essas duas espcies,
verificando-se que E. concordis apresentou-se 50 vezes mais tolerante a
esse produto do que I. zuluagai (Poletti,
2002). Variabilidade interespecfica na
suscetibilidade de caros fitosedeos a
inseticidas piretrides tambm foi relatada por Marwick (1986), o qual verificou que P. persimilis apresentou-se
menos tolerante a cipermetrina, deltametrina e fenvalerate do que T. pyri.
Com relao deltametrina, a razo de
tolerncia observada para essas duas
espcies atingiu valores de aproximadamente 314 vezes.

Liberao e
Estabelecimento de
Linhagens de Fitosedeos
Resistentes a Inseticidas
Em 1972, uma linhagem de G.
occidentalis resistente a organofosforados foi enviada da Amrica do Norte
para a Austrlia. Segundo Readshaw
(1975) citado por Gerson et al. (2003)
este foi o primeiro relato de transferncia intercontinental de inimigos naturais resistentes no mundo. Linhagem
de G. occidentalis resistente a organofosforados, tambm foi introduzida na
antiga Unio Sovitica (URSS) no incio
dos anos 80 para o controle biolgico
de Tetranychus pruni obtendo-se um
grande sucesso no estabelecimento da
mesma (Petrushov, 1987). Hoy et al.
(1983) tambm obtiveram sucesso na
liberao e estabelecimento de linhagens resistentes de G. occidentalis a
organofosforados e piretrides em pomares de ma e pra nos Estados
Unidos, sugerindo uma relao entre a
densidade populacional da praga em
campo e o estabelecimento das populaes de fitosedeos liberadas.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

19

Strickler & Croft (1981, 1982) estudando a variabilidade intraespecfica


de doze populaes de N. fallacis
observaram que duas dessas apresentaram resistncia a elevadas concentraes de permetrina, e que aps 12
presses de seleo com esse produto
em casa de vegetao, a razo de
resistncia atingiu valores de 64 vezes.
Quando essas populaes resistentes
permetrina foram liberadas em pomares comerciais de ma, pde-se
evidenciar o sucesso no estabelecimento delas. Whalon et al. (1982) aps
selecionarem duas populaes de N.
fallacis para resistncia a inseticidas
piretrides em condies de casa de
vegetao, verificaram que essas sobreviveram a aplicaes de permetrina
quando liberadas em um pomar comercial de ma, porm s uma delas
resistiu aplicao de fenvalerate.
Falhas no estabelecimento de uma
populao de N. fallacis resistente
permetrina em campo foi relatado por
Croft & Whalon (1983). Segundo esses
autores, tal fato pode ter ocorrido devido a um grande fluxo de indivduos
suscetveis para dentro das reas onde
foram realizadas essas liberaes. Assim, devido a esse fato, poderia ter
ocorrido hibridao, o que fatalmente
ocasionou reduo na freqncia de
resistncia. Por outro lado, esses autores observaram que em laboratrio a
resistncia permaneceu estvel at a
25a gerao nessa populao, mesmo
na ausncia de presso de seleo.
Com relao a T. pyri linhagens
resistentes a organofoforados foram
introduzidas com sucesso na Inglaterra
no final da dcada de 70 (Kapetanakis
& Cranhnam, 1983). Em experimentos
realizados em pomares comerciais de
ma com diferentes regimes de pulverizaes no Canad, Hardman et al.
(1997, 2000) tambm puderam evidenciar sucesso na liberao de uma linhagem de T. pyri resistente a piretrides
e organofosforados introduzida da Nova
Zelndia. Dessa forma, os autores concluram que esses organismos apresentaram potencial para serem utilizados em programas de manejo de caros
nessa cultura. Em muitos pases da
Europa, o manejo do caro vermelho
europeu, Panonychus ulmi, e do
eriofiideo Aculus schelechtendali em
pomares de ma e uva, tm-se base20

ado em liberaes constantes de linhagens resistentes a inseticidas organofosforados e carbamatos, sendo essa
uma condio primordial para o controle desses caros-praga (Blommers,
1994). Na Holanda, por exemplo, brotos de plantas de ma contendo T.
pyri so transportados de um pomar a
outro por ocasio da poda realizada no
vero (Blommers, 1994). De forma
sinttica, a introduo de linhagens de
caros predadores fitosedeos resistentes a pesticidas, tm sido muitas vezes
efetiva, sendo essa ttica uma forma
anloga ao controle biolgico clssico,
utilizando-se, porm, um bitipo diferenciado de inimigo natural (Dunley el
al., 1991).
Em termos prticos, Hoy (1985b)
props um programa de manejo de
caros na cultura da amndoa
(Califrnia/EUA) baseando-se na liberao de linhagens de G. occidentalis
resistentes a inseticidas, associados
utilizao de acaricidas seletivos. Uma
economia de aproximadamente 60-110
dlares/ha/ano foi estimada para cada
produtor de amndoa, que aderiu ao
programa de liberaes de linhagens
resistentes, observando-se que a maior
economia foi devido reduo nos
gastos com acaricidas (Headley & Hoy,
1987). A estimativa mais recente feita
por Hoy (2000) associou os resultados
deste projeto a um benefcio, desde o
incio do programa, de aproximadamente 20 milhes de dlares.

Avaliao do
Estabelecimento de
Linhagens Resistentes de
Fitosedeos Introduzidas
em Campo
O monitoramento da freqncia
de resistncia considerado uma importante ferramenta para avaliar o
estabelecimento de linhagens de
fitosedeos selecionadas em laboratrio e introduzidas em condies em
campo. Para isso, a tcnica mais empregada tem-se baseado na realizao
de bioensaios toxicolgicos para as
estimativas da CL50 e intensidade de
resistncia (CL50 da populao em estudo / CL50 da linhagem suscetvel de
referncia). No entanto, para a realizao destes bioensaios algumas etapas como a coleta de um grande

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

nmero de indivduos em campo,


para preservar a variabilidade gentica dentro da populao em estudo, e
a necessidade do estabelecimento da
mesma em laboratrio (atravs de
criaes) pode afetar o dinamismo
deste trabalho. Um fator que importante e deve estar associado ao monitoramento aps a liberao de inimigos naturais em campo a possibilidade de ocorrer diluio da resistncia na linhagem selecionada devido
ao fluxo gnico com populaes nativas, suscetveis, presentes em campo
por ocasio da liberao.
A utilizao de anlise de
eletroforese de isoenzimas, apesar de
ser um mtodo menos acurado do que
outros testes moleculares, em alguns
estudos tm mostrado certa viabilidade para avaliao da liberao de linhagens resistentes de fitosedeos em
campo. Whalon et al. (1982) foram os
primeiros pesquisadores a testarem
essa ferramenta como mtodo de monitoramento de liberaes de linhagens de N. fallacis resistentes a
pesticidas em campo. A utilizao dessa tcnica permite que sejam examinadas amostras coletadas diretamente
em campo, eliminando os problemas
relacionados manuteno de criaes em laboratrio. Outra vantagem
relacionada eletroforese de isoenzimas tem sido a possibilidade de explorar a anlise da estrutura gentica das
populaes presentes em campo antes
da liberao da linhagem resistente e,
aps esse processo, podendo-se inferir
a respeito de parmetros importantes
com relao estabilidade da resistncia em campo.
Recentemente, Navajas et al.
(2001) realizaram trabalho de monitoramento do estabelecimento de linhagens de N. fallacis resistentes a
piretrides em pomares de ma no
Canad, empregando bioensaios
toxicolgicos e eletroforese de isoenzimas. Atravs dos resultados obtidos
nesse estudo foi comprovado que esta
tcnica molecular bastante adequada. Ressalta-se que tentativas da utilizao de outras tcnicas moleculares
para o monitoramento em fitosedeos,
tal como marcadores de RAPD e anlise de seqncias de microssatlites,
no tm alcanado xito (Perrot-Minnot
& Navajas, 1995; Navajas et al., 1998).

Resistncia de Insetos
Parasitides e Predadores a
Pesticidas
Apesar do nmero de casos de
resistncia a pesticidas em insetos
parasitides e predadores no ser to
expressivo quanto para os caros
fitosedeos, alguns trabalhos tm mostrado que h possibilidade de populaes desses organismos responderem presso de seleo com alguns
produtos tanto em laboratrio como
em campo (Quadros 2 e 3).
Strawn (1978) citado por Hoy
(1990) realizou estudos com intuito
de avaliar a variabilidade na suscetibilidade a inseticidas organofosforados

em diferentes populaes do parasitide Aphytis melinus, inimigo natural


da cochonilha vermelha, Aonidiella
aurantii, importante praga em pomares de citros nos Estados Unidos. Apesar das populaes avaliadas terem se
apresentado distintas com relao s
respostas aos inseticidas testados, nenhuma delas mostrou-se resistente s
concentraes utilizadas em campo.
Rosenhein & Hoy (1986) realizaram
monitoramento da resistncia a
carbaril, clorpirifs, dimetoato,
malation e metidation, em 13 populaes de A. melinus coletadas em pomares de citros na Califrnia. Os resultados obtidos indicaram a ocorrncia de diferentes nveis de resistncia

entre as populaes avaliadas, sendo


que os dados corroboraram com o
regime de pulverizaes (presso de
seleo) adotado em cada propriedade onde efetuaram as coletas. Posteriormente foi realizada a seleo de
uma linhagem de A. melinus resistente a carbaril (Rosenheinberg & Hoy,
1988). Neste caso foi proposta a liberao desta linhagem inserindo essa
ttica dentro de um programa integrado, o qual foi amplamente adotado
por vrios citricultores na Califrnia
(Hoy, 1990).
No incio da dcada de 80, GraftonCardwell & Hoy (1985) realizaram
monitoramento da suscetibilidade de
diferentes populaes de Chrysoperla

Quadro 2 - Alguns exemplos de casos de insetos inimigos naturais (parasitides) resistentes a pesticidas no mundo.
Espcie

I. A.1
malation

Pesticida
Classe2
I

Grupo Qumico3
O

Local

Referncia

Baker & Throne (1995)


Schoones & Gilionee
Aphytis african us
metidation
I
O
(1982)
A. cohen i
azinfosmetil
I
O
Havron & Rosen (1988)
A. holoxan thus
azinfosmetil
I
O
Havron et al. (1991a)
A. lin gn an en sis
azinfosmetil
I
C
Havron et al. (1991b)
A. melin us
carbaril
I
C
Spollen & Hoy (1993)
Bracon mellitor
carbaril
I
C
Adams & Cross (1967)
Schoones & Gilionee
Comperiella bifasciata
metidation
I
O
1982)
Diglyphus begin i
fenvalerate
I
P
Spollen et al. (1995)
Walker & Thurling
En carsia formosa
permetrina
I
P
Reino Unido
(1984)
Perez-Mendonza et al.
Habrobracon hebetor
malation
I
O
EUA
(2000)
Macrocen trus an cylivorus
DDT
I
OC
Canad
Robertson (1957)
Pholetesor orn igis
metomil
I
O
Canad
Trimble et al. (1990)
Trioxys pallidus
azinfosmetil
I
O
EUA
Hoy & Cave (1988)
1
I. A. = ingrediente ativo, 2I = inseticida; 3C= carbamatos, P= piretrides,, O= organofosfosrados; C= organoclorado
An isopteromalus calan drae

EUA
frica do
Sul
Israel
Israel
Israel
EUA
EUA
frica do
Sul
Hawaii

Quadro 3 - Alguns exemplos de casos de insetos inimigos naturais (predadores) resistentes a pesticidas no mundo.
Espcie

I. A.1

Pesticida
Classe2

Grupo Qumico3

Local

azinfosmetil

EUA

triclorfon

EUA

fosmet

Canad

Coleomegilla maculata

parationmetil

EUA

Stethorus pun ctum

azinfosmetil

EUA

DDT

OC

Austrlia

Nabis sp.

triclorfon

EUA

Xylocoris flavipes

malation

EUA

Aphidoletes aphidimyza
Geocoris pallen s
Chrysoperla carn ea

Labidura riparia

Referncia
Warner & Croft (1982)
Johansen & Eves (1973)
Pree et al. (1989)
Chambers (1973)
Hull & Staner (1983)
Bishop & Blood (1980)
Johansen & Eves (1973)
Baker & Arbocast (1995)

I. A. = ingrediente ativo, 2I = inseticida; 3O= organofosfosrados; OC= organoclorado


Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

21

carnea, crisopdeo, coletadas em diferentes reas produtoras de alfafa situadas na Califrnia, a seis inseticidas
comumente utilizados nesta cultura
(carbaril, metomil, permetrina,
fenvalerate, diazinon e fosmet). As
populaes avaliadas responderam de
modo distinto a todos produtos testados, sendo que esta variabilidade foi
considerada suficientemente promissora para seleo artificial de populaes de C. carnea para resistncia a
alguns produtos, fato que incentivou a
continuidade deste projeto. No entanto, liberaes efetivas de linhagens
resistentes de C. carnea em campo no
tm sido relatadas, apesar da realizao de seleo de linhagens resistentes
a alguns produtos como carbaril
(Grafton-Cardwell & Hoy, 1986).

Desvantagem Adaptativa
Associada Resistncia
A desvantagem ou custo adaptativo uma caracterstica que pode estar
associada resistncia em populaes
de artrpodes pragas ou inimigos naturais (caros ou insetos). Devido possibilidade do menor valor adaptativo
dos indivduos resistentes estar associado a uma menor viabilidade total,
menor fecundidade, menor tempo para
desenvolvimento, menor competitividade para o acasalamento, entre outros parmetros biolgicos importantes, no caso das pragas essa uma
condio favorvel adoo de estratgias de manejo.
No entanto, com relao aos
inimigos naturais, o fato da linhagem
selecionada apresentar alteraes em
alguns de seus parmetros biolgicos pode afetar diretamente o desempenho dela como agente de controle biolgico. Duso et al. (1992)
observaram uma reduo na fecundidade em linhagens dos fitosedeos T.
pyri e Amblyseius andersoni resistentes a inseticidas organofosforados. No entanto, Fitzgerald & Solomon
(2000) evidenciaram que uma populao de T. pyri resistente a organofosforados, coletada em um pomar na
Inglaterra, apresentou uma maior fecundidade do que a populao tomada como suscetvel de referncia.
Fournier et al. (1988) comparando
parmetros relacionados tabela de
22

vida e a capacidade de predao,


dentre outros, entre linhagens do caro
predador P. persimilis resistente e suscetvel ao inseticida metidation, no
observaram custo adaptativo associado linhagem selecionada. GraftonCardwell & Hoy (1986) tambm no
observaram ocorrncia de custo adaptativo associado a linhagens de C.
carnea resistentes a carbaril. Apesar
de vrios relatos estarem associados
ausncia de custo adaptativo em inimigos naturais resistentes a pesticidas,
a realizao de estudos prvios relacionados aos parmetros biolgicos,
bem como a capacidade de predao
ou de parasitismo na linhagem selecionada de primordial importncia,
pois este fato pode comprometer diretamente a implementao de programas baseados na introduo desses organismos (Hoy, 1990).

Mecanismos de Resistncia
em Inimigos Naturais
Os principais mecanismos pelos
quais os artrpodes podem expressar
resistncia so a reduo na penetrao cuticular do produto, aumento na
destoxificao metablica e reduo
na sensibilidade do stio de ao.
Os indivduos resistentes devido
reduo na penetrao cuticular
recebem uma menor quantidade de
txico no stio de ao do produto. J
a resistncia conferida devido ao aumento na destoxificao metablica
ocorre quando os indivduos so capazes de degradar a molcula qumica
em compostos inertes com maior eficcia do que os indivduos suscetveis. Vrios grupos enzimticos
(monooxigenases dependentes do
citocromo P-450, esterases, GSHtrnasferase, etc.) esto envolvidos no
metabolimos de pesticidas e tm sido
identificados como mecanismo de resistncia em vrias espcies de
artrpodes. Com relao aos indivduos resistentes devido reduo na
sensibilidade do stio de ao, eles
apresentam uma alterao deste, mostrando uma menor sensibilidade ao
produto qumico.
De acordo com Motoyama et al.
(1971) o mecanismo de resistncia de
N. fallacis a azinfosmetil foi relacionado
enzima glutation S-transferase. No

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

caso de A.womersleyi a degradao


oxidativa foi o mecanismo primrio da
resistncia a metidation, detectadas em
populaes desse caro (Sato et al.,
2001). Uma ampla discusso dos mecanismos de resistncia associados aos
caros fitosedeos pode ser evidenciada
em Croft (1990). De um modo geral,
deve-se enfatizar que os mecanismos
relacionados resistncia de inimigos
naturais a pesticidas so os mesmos que
tm sido estudados para os artrpodespraga, destacando-se o aumento na
destoxificao metablica.

Biotecnologia na Obteno
de Linhagens de Inimigos
Naturais Resistentes a
Pesticidas
A seleo artificial de linhagens
de inimigos naturais resistentes a
pesticidas nem sempre tem sido efetivada com sucesso. De acordo com
Hoy (1990) algumas tcnicas como a
induo artificial de mutagnese ou a
tcnica do DNA recombinante poderiam ser ferramentas exploradas no
melhoramento de inimigos naturais
resistentes a pesticidas.
Com relao induo de
mutagnese visando resistncia, pode
ser realizada utilizando-se substncias
qumicas ou irradiao-X (Hoy, 1990).
Sabendo-se que as mutaes ocorrem
ao acaso, e podem resultar na produo de linhagens com genes deletrios, com relao induo de inimigos
naturais mutantes, esse fato pode ser
indesejvel, principalmente quando o
intuito da seleo dessa linhagem a
produo massal desses organismos
para a introduo em campo.
A utilizao da tcnica do DNA
recombinante tem sido considerada a
mais vivel para a implementao da
resistncia em inimigos naturais. Vrias etapas envolvem esse processo,
sendo necessrio inicialmente realizar a identificao dos genes que
governam a resistncia, posteriormente devem ser clonados e inseridos no
organismo (inimigo natural) geralmente atravs de microinjeo. Aps a
incorporao no genoma esse gene
deve estabilizar, se expressar apropriadamente e ser transmitido s prognies. G. occidentalis foi o primeiro
inimigo natural melhorado atravs

desta tcnica (Presnail & Hoy, 1994).


Uma srie de critrios foram listados
por Hoy (1992) visando minimizar os
riscos de introduo de inimigos naturais geneticamente modificados em
campo. Um dos fatores que visou
segurana da introduo desse organismo transgnico em campo foi a
realizao de estudo em reas midas
da Flrida/EUA, local onde essa espcie no sobrevive devido sua especializao a climas secos. Hoy (2000)
enfatiza que os riscos devido liberao da linhagem transgnica de G.
occidentalis em campo, para fins experimentais, foram nfimos. Todo o
processo para a liberao deste estudo foi monitorado pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos
(USDA). Rigorosas precaues devem
ser tomadas com relao criao de
manuteno de inimigos naturais transgnicos, incluindo a utilizao de instalaes adequadas e pessoal treinado (Hoy, 2000).

Perspectivas para
Explorao de Inimigos
Naturais Resistentes em
MIP no Brasil
Apesar do elevado nmero de
casos de implementao de programas de manejo de pragas baseados na
liberao de linhagens resistentes de
inimigos naturais (destacando-se os
caros fitosedeos) em vrios pases,
no Brasil esse assunto ainda
incipiente. No entanto, as possibilidades de explorao desta ferramenta,
que agrega harmoniosamente o controle qumico ao biolgico, parecem
promissoras. No caso do emprego de
N. californicus para o controle de P.
ulmi em pomares de ma no Rio
Grande do Sul (Monteiro, 2002), a
utilizao de linhagens resistentes
desse predador poderia contribuir para
a preservao contnua dessa espcie
nos pomares, inclusive durante as
pulverizaes para o controle de insetos comumente associados a essa cultura como Grapholita molesta.
A implementao de programas
de manejo de caros-praga em cultivo
protegido tambm emerge como uma
possibilidade para a explorao de
linhagens resistentes de inimigos naturais no Brasil, podendo reduzir o n-

mero de pulverizao com acaricidas,


e conseqentemente os custos de produo e quantidade de resduos no
produto final, acompanhando desse
modo as exigncias de um mercado
que vem se tornando a cada dia mais
exigente. Em citros, estudos revelaram
que a evoluo para a resistncia ao
inseticida deltametrina em algumas populaes de caros fitosedeos pode
estar sendo responsvel pela permanncia deles em algumas reas, contribuindo dessa forma para o controle
biolgico efetivo de caros-praga como
B. phoenicis (Poletti, 2002).

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Pesquisa

O Mapeamento Gentico no
Melhoramento de Plantas
Teoria e aplicaes inseridas em um programa de melhoramento de plantas

Rodrigo Barros Rocha

Bilogo, Mestrando em Gentica e Melhoramento, UFV.


rbrgenetica@yahoo.com.br

Jorge Fernando Pereira

Bilogo, MS em Microbiologia Agrcola;


Doutorando em Microbiologia Agrcola; UFV.
dgfernando@yahoo.com

Cosme Damio Cruz

Engenheiro Agrnomo, DS em Gentica e


Melhoramento na ESALQ - USP; Professor Titular do
Departamento de Biologia Geral da UFV.
cdcruz@ufv.br

Marisa Vieira de Queiroz

Biloga, DS em Gentica e Melhoramento ESALQ USP; Professora Adjunta do Departamento de


Microbiologia da UFV.
mvqueiro@ufv.br

Elza Fernandes de Arajo

Biloga, DS em Gentica, UFRGS; Professora Titular


do Departamento de Microbiologia da UFV.
ezfa@ufv.br
Ilustraes cedidas pelos autores

Resumo
Os mapas genticos idealizados
h quase um sculo, tiveram sua
importncia aumentada para programas de melhoramento de plantas
com a utilizao dos marcadores
moleculares, que, entre outras inovaes, podem ser obtidos em nmero
praticamente ilimitado. Inmeros
mapas de ligao que foram construdos com a utilizao de diferentes
populaes e estratgias esto disponveis na literatura para todas as
grandes culturas vegetais. Detectar
loci que afetem a expresso de caractersticas quantitativas tem sido considerado por vrios autores como
uma das aplicaes de maior retorno
da utilizao de mapas genticos no
melhoramento de plantas.

1 - Histrico
Prticas que visam o melhoramento de plantas no so recentes e
tm sido realizadas desde os
primrdios da civilizao (BORM,
1999). O avano gentico resultado
dessas prticas depende de duas caractersticas populacionais principais;
primeiro: da existncia de variabilidade gentica na populao; e segunda: da herdabilidade das caractersticas desejadas (CRUZ & CARNEIRO, 2003).
Historicamente, foram pouco utilizados os mapas de ligao no auxlio
seleo em programas de melhoramento, at mesmo em espcies bem
estudadas como milho, Zea Mays, e

tomate, Lycopersicum spp. (ROCHA et


al., 2003a, LEE, 1995). O tipo de
marcador utilizado para o mapeamento (alteraes citolgicas estruturais) e
a falta de mapas integrados que relacionem vrios tipos de marcas so, segundo MOREAU et al. (2000), LANDER
& BOTSTEIN, (1989), as principais
dificuldades para a utilizao de mapas
genticos no auxlio seleo.
O desenvolvimento da metodologia de construo de mapas genticos remonta do incio do sculo passado. Aps a redescoberta do trabalho
de Mendel (MENDEL, 1866) em 1900,
trinta e quatro anos depois de sua
publicao, vrias pesquisas foram
realizadas com vistas a ampliar e validar suas concluses a respeito do
mecanismo de herana de caractersticas qualitativas. BATESON e PUNNET
(1905), citados por STUTERVANT
(1965), trabalhando com as caractersticas cor da flor e formato do gro de
plen, em ervilha, publicaram um dos
primeiros relatos de ligao gnica
(linkage). No entanto, o primeiro
trabalho a sugerir que a distribuio
gnica no independente devida
localizao dos genes nos cromossomos e a eventos de trocas de segmentos entre essas molculas foi publicado por MORGAN (1910). Ao analisar
o padro de herana de um gene
mutante ligado ao sexo, para a cor dos
olhos em Drosophila melanogaster,
MORGAN fornece a primeira evidncia de que os genes esto localizados
em posies definidas nos cromossomos e que podem ser manipulados e
avaliados experimentalmente.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

27

O mapeamento gentico baseado na anlise da freqncia dos


fentipos recombinantes foi idealizado e desenvolvido por STUTERVANT
(1913), que publicou o primeiro mapa
gentico. Alfred H. Stutervant trabalhou com seis genes ligados ao sexo
em Drosophila melanogaster e ele
no apenas produziu o primeiro mapa
gentico com todos os genes na sua
posio correta, como tambm props o princpio bsico do mapeamento gentico, da utilizao da freqncia de recombinantes para estimar a
distncia entre dois genes e, em homenagem a seu orientador THOMAS
H. MORGAN, denominou a unidade
de mapa de CENTI-MORGAN. Embora a teoria cromossmica da herana
tenha sido confirmada por BRIDGES
(1914), somente no ano seguinte,
STUTERVANT observou que deveriam ocorrer eventos de permutas duplas entre dois genes e que a ocorrncia de permuta em uma regio do
cromossomo deve afetar a ocorrncia de permuta em uma regio adjacente, fenmeno este chamado de
interferncia.
O mapa de ligao de uma espcie pode ser definido com um arranjo
linear de um grupo de genes ou marcadores adjacentes. Dois genes marcadores so ditos ligados sempre que
menos de 50% dos gametas produzidos apresentarem gentipos recombinantes para esses dois genes
(STUTERVANT, 1913). O uso de marcadores na gentica e no melhoramento de plantas remonta ao incio do
sculo, quando BATESON e PUNNET
(1905), citados por STUTERVANT
(1965), perceberam que a herana da
cor da flor e do formato do gro de
plen em ervilha no so independentes. At a dcada de 80, a seleo em
programas de melhoramento gentico
dependeu unicamente da avaliao de
caractersticas fenotpicas para identificao dos indivduos superiores
(GRATAPAGLIA & SEDEROFF, 1994).

2 - Etapas da construo de
um mapa gentico.
Em geral, o primeiro passo na
construo de um mapa de ligao
28

est relacionado com a escolha dos


genitores a serem cruzados, de forma
que maximize o polimorfismo gentico (GRATAPAGLIA & SEDEROFF,
1994, VERHAEGEN et al., 1997). Uma
vez selecionados os genitores, necessrio o desenvolvimento de uma
prognie segregante, composta de
pouco mais do que uma centena de
indivduos.
A escolha dos genitores e da
populao de mapeamento uma
das etapas mais importantes do processo. O nmero de marcadores polimrficos depende do polimorfismo
gentico entre os genitores e a preciso das estimativas de recombinao
e aspectos prticos do processo, como
nmero de indivduos a serem analisados, estratgias de recombinao e
cuidados em campo, entre outras,
dependem da escolha da populao.
Nesse contexto, a diversidade
dos sistemas reprodutivos das espcies vegetais permite o desenvolvimento de vrios tipos de populaes de mapeamento (BOREM,
1999). Cada prognie apresenta caractersticas prprias, que devem
ser consideradas pelo pesquisador
no momento da escolha de sua
populao. Geralmente, as populaes segregantes analisadas na construo de mapas de ligao so as
populaes F2 derivadas de F1 por
autofecundao; as populaes de
R.I.L. (Recombinant Inbreed
Lines); as obtidas por retrocruzamento; e as populaes duplos
haplides, resultado da duplicao
artificial do genoma haplide (ROCHA et al., 2003b). Estratgias que
envolvam a necessidade de poucas
geraes resultam em significativos ganhos de tempo para espcies
de ciclo de vida longo, como, por
exemplo, as espcies florestais.
GRATAPAGLIA
& SEDEROFF
(1994) sugerem a utilizao de populaes F1 derivadas do cruzamento entre genitores geneticamente contrastantes.
Aps a escolha dos genitores
e o desenvolvimento da populao
segregante, a etapa seguinte envolve a obteno de marcas contrastantes entre os genitores que apre-

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

sentem segregao mendeliana na


populao de mapeamento. A estratgia de busca pelas marcas
polimrficas depende, principalmente, do tipo de marcadores utilizados e da diversidade gentica da
espcie estudada.
Dentre os tipos de marcadores
disponveis se destacam aqueles
baseadas na reao de PCR
(Polymerase Chain Reaction). A
reao de PCR permite a replicao
in vitro de fragmentos de DNA, o
que resulta em grandes quantidades desses fragmentos a partir de
poucas molculas iniciais de DNA.
A tcnica de PCR, conforme idealizada e desenvolvida por Kary
Mullis, envolve a amplificao de
uma regio especfica do DNA, de
seqncia conhecida, que utiliza
oligonucleotdeos complementares
que flanqueiam a regio alvo
(MULLIS & FALOONA, 1987). O
PCR ocorre em trs ciclos de temperatura, onde oligonucleotdeos
de seqncia especfica so utilizados como iniciadores para a sntese de uma fita de DNA complementar da regio alvo. O conhecimento prvio da regio a ser
amplificada uma das principais
limitaes da tcnica, pois impossibilita o estudo simultneo de muitos loci.
Por sua praticidade e capacidade de discriminao simultnea de
vrios loci, os marcadores RAPD
(Random Amplified Polimorphic
DNA), baseados na reao de PCR
(WILLIAMS et al., 1990), esto entre
os mais utilizados para o mapeamento
gentico vegetal. Esses so marcadores dominantes (no permitem a discriminao do gentipo heterozigoto), de seqncia desconhecida, amplificados aleatoriamente no genoma.
A Figura 1 mostra o padro de amplificao de genitores Eucalyptus
grandis e Eucalyptus urophylla e seis
indivduos de uma prognie de 110
indivduos. A amplificao conjunta
do DNA total dos dois genitores e de
seis indivduos da populao F1 faz
com que a probabilidade de deteco
da segregao de um marcador polimrfico seja superior a 98%.

Aps a escolha dos marcadores


polimrficos necessria anlise
do padro de amplificao dos indivduos do restante da populao de
mapeamento e a obteno das estimativas de recombinao. Para construir um mapa gentico, todos os
marcadores devem ser analisados dois
a dois, verificando a independncia
ou a existncia de ligao entre eles
(LIU, 1998). Com base no princpio
de que os gentipos recombinantes
alterados por permuta simples ou
por permuta dupla so gerados em
freqncias diferentes, utiliza-se o
teste de aderncia 2 (qui-quadrado)
para confirmar a ligao entre os
marcadores. O teste de 2 qualitativo, pois apenas comprova a existncia ou no de ligao gnica. Esse
teste permite calcular o desvio entre
os resultados esperados, sem a ocorrncia de permutas, com os resultado
observados, sendo sensvel magnitude do desvio e ao nmero de
gentipos amostrados (FALCONER,
1987). A Figura 2 mostra o padro de
segregao de alguns marcadores
teis para o mapeamento em 28 indivduos da prognie F1.
Uma vez confirmada a existncia da ligao entre duas marcas,
indispensvel adotar mtodos quantitativos para estudar o grau de
associao entre essas marcas. A
metodologia de Mxima Verossimilhana utilizada no mapeamento
gentico para a obteno de vrias
estimativas, inclusive as da freqncia de recombinao (LIU, 1998). O
mtodo da Mxima Verossimilhana permite a obteno de estimadores consistentes, de distribuio
normal, eficincia assinttica e
varincia mnima. A confiabilidade
do posicionamento das marcas ao
longo do grupo de ligao pode ser
avaliada considerando as varincias
associadas s estimativas de recombinao (LIU, 1998).
Como proposto por STUTERVANT,
a freqncia de recombinao (r) pode
ser utilizada para estimar a distncia
entre pontos do cromossomo; no entanto, a ocorrncia de permutas duplas faz com que essa unidade no
seja aditiva. As permutas duplas ten-

Figura 1 - Eletroforese em gel de agarose 1,5% da reao de amplificao utilizando


os oligonucleotdeos OPB01, OPB02, OPB03. P1 e P2 indicam os genitores E. grandis
e E. urophylla e os nmeros de 1 a 6, indivduos da F1 escolhidos aleatoriamente. O
marcador utilizado o DNA do fago clivado com as enzimas EcoRI, BamHI, HindIII.
As setas em vermelho indicam alguns marcadores polimrficos entre os genitores e
em segregao 1:1 na prognie.

Figura 2 - Eletroforese em gel de agarose 1,5% da reao de amplificao utilizando o


oligonucleotdeo OPAB-05. P1 e P2 indicam os genitores E. grandis e E. urophylla,
respectivamente, e os nmeros de 1 a 28, indivduos da prognie F1. As setas vermelhas
indicam marcas polimrficas entre os genitores de segregao 1:1, e a seta amarela indica
marcas no polimrficas entre os genitores de segregao 3:1. O teste de aderncia do
2 deve ser utilizado para confirmar a segregao mendeliana das marcas.

dem a recompor a fase de ligao


presente no gentipo parental; nesse
contexto, somente alguns tipos de
permutas geram gametas recombinantes, resultando em uma tendncia
de subestimar a freqncia de recombinao quando so considerados maiores valores de distncia (GARDNER
& SNUSTAD, 1996). O problema da
no aditividade da unidade r contornado com a utilizao de funes
de mapeamento, que, semelhante a
uma transformao de dados, resulta
em uma alterao de escala. Existem
diferentes funes de mapeamento,
sendo que as mais utilizadas so aque-

las propostas por Haldane e por


Kosambi. A funo de Kosambi
considerada mais completa porque
leva em considerao o fenmeno da
interferncia entre os eventos de permuta adjacentes (LIU, 1998).
Finalmente, para compor um
grupo de ligao, conhecendo-se
as freqncias de recombinao
entre diversos loci, possvel estimar, com um certo grau de preciso, a ordem desses loci no grupo
de ligao. Por exemplo, em seu
trabalho, STUTERVANT (1913) estimou a freqncia de recombinao
entre seis genes determinantes de

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

29

caractersticas qualitativas ligadas


ao sexo. A freqncia de recombinao (r) entre os loci B (Black
factor, gene que define a cor do
corpo), C (gene que define a pigmentao dos olhos) e P (olhos
vermilion) foram respectivamente
(r BC = 1 u.m; r CP = 30.7 u.m.; r BP =
31.7 u.m.). Tais ndices permitem
determinar um nico ordenamento
para os trs loci: B-C-P. A estimao de trs pontos, como conhecida, de fcil aplicao, porm
limitada quando muitos loci so
considerados simultaneamente.
Normalmente, o ordenamento dos
loci feito determinando-se a ordem de maior verossimilhana ou
utilizando-se a metodologia de
delineao rpida de cadeia. A ordem de mxima verossimilhana
o critrio preferido, pois o que
gera a ordem de mxima probabilidade de ocorrncia para o conjunto
de dados analisados, porm uma
metodologia computacional demorada, uma vez que o crescimento no
nmero de ordens possveis
exponencial em funo do aumento no nmero de loci (BEARZOTI,
2000).
Uma alternativa para esses dois
mtodos a metodologia de
delineao rpida em cadeia. Esse
procedimento bastante simples e
consiste na obteno de uma ordem
preliminar a partir de uma matriz
que contenha os valores de recombinao entre os pares de marcas,
seguido de tentativas de inverses
mltiplas entre conjuntos de trs
marcas. Para ilustrar o que foi dito,
vamos considerar a matriz que contm valores de r entre os marcadores
A, B, C, D (TABELA 01). A primeira
etapa consiste em identificar o menor valor de r.
A seguir, toma-se um locos
esquerda de B ou direita de D,
escolhendo aquele com o menor valor de freqncia de recombinao
r. Nesse caso, o menor valor de r
entre as marcas est entre B e C.

30

TA BE LA 01- Tab ela co n ten d o valo res d e reco mb in ao en tre as


marcas A , B, C e D.
A
B
C
D
0
0,34
0,49
0,25
A
0
0,15
0,09
B
0
0,24
C
0
D
Posicionando a nica marca que
falta:
O prximo passo consiste em
fazer permutaes de marcas adjacentes. Se o somatrio dos valores de
r diminuir, dever ser feita uma
troca entre as ordens.

Para ilustrar a preciso associada


s metodologias de construo de
mapas genticos, foi simulado um
pequeno genoma, utilizando-se o programa GQMOL, em desenvolvimento
na Universidade Federal de Viosa
(disponvel em http://www.ufv.br/
dbg/gqmol/gqmol.htm). Genoma esse
constitudo por apenas dois grupos de
ligao, cada um com 200 unidades
de mapa de tamanho; e 27 e 20 marcas
dominantes, respectivamente, em cada
grupo de ligao. A partir desse
genoma artificial, foram gerados dois
genitores contrastantes e uma prognie F2, constituda de 100 indivduos.
A Figura 3 mostra o genoma simulado
ao lado das estimativas de recombinao e das ordens dos marcadores
estimadas; utilizando a metodologia
de Mxima Verossimilhana para a
obteno das estimativas de recombinao e a metodologia da delineao
rpida em cadeia para obter a ordem
das marcas. Boas aproximaes em
relao aos valores paramtricos foram obtidas para esse tipo de populao, considerando as metodologias
utilizadas e o nmero de indivduos
analisados, com destaque para a ordem estimada dos marcadores ao longo do grupo de ligao idntica
ordem simulada.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

3 - Aplicaes dos mapas


genticos inseridos em
programas de
melhoramento vegetal.
Mapas de ligao integrados,
construdos com marcas morfolgicas, bioqumicas e moleculares j
esto disponveis na literatura para
vrias espcies vegetais, com destaque para as espcies tipicamente
agronmicas. Embora de fcil identificao, o nmero reduzido dos
marcadores morfolgicos faz com
que a probabilidade de evidenciar
correlaes entre esses marcadores
e caractersticas de importncia econmica seja reduzida (FERREIRA &
GRATAPAGLIA, 1998). O advento
das tcnicas de marcadores moleculares, em meados da dcada de 80,
resultou em aumento significativo
da importncia dos mapas genticos no auxlio seleo em programas de melhoramento (LEE, 1995).
Atualmente, diversas tcnicas permitem a obteno de um nmero
praticamente ilimitado de marcadores genticos neutros, cuja herana
pode ser acompanhada sem influncia do ambiente e avaliados em
qualquer fase do desenvolvimento.
O desenvolvimento de mapas
genticos permite a predio de descendncias de cruzamentos controlados, localizao das regies do
genoma responsveis pela expresso das caractersticas e quantificao
da sua importncia para a expresso
do fentipo. Tais informaes podem ser utilizadas na decomposio
da herana complexa das caractersticas quantitativas. A identificao de
marcas relacionadas com regies-chave do genoma para a expresso de
caractersticas quantitativas (QTLs
Quantitative Traits Loci) um dos
principais objetivos da utilizao de
mapas genticos inseridos em pro-

Genoma simulado, constitudo de dois


grupos de ligao com 200 unidades de
mapa de tamanho, que apresenta, respectivamente, 27 e 20 marcadores dominantes.

Estimativas de mxima verossimilhana


dos grupos de ligao obtidas a partir de
prognie F2, constituda de 100 indivduos, originada do cruzamento de genitores de gentipo contratantes.

Figura 3 - Grupos de ligao 1 e 2 paramtricos ( direita) e estimados ( esquerda), utilizando a metodologia de Mxima
Verossimilhana para a obteno das estimativas da freqncia de recombinao r e a metodologia da delineao rpida em cadeia
para o ordenamento dos locos. Para isso, foi gerada uma populao F2, constituda de 100 indivduos, com 47 marcas dominantes.

gramas de melhoramento. De acordo


com DUDLEY (1993), a seleo assistida para caractersticas quantitativas
por marcadores consiste de dois passos: identificao de associaes entre marcadores e QTLs e o uso dessas
associaes para desenvolvimento de
populaes melhoradas.
A utilizao de marcadores moleculares para auxiliar procedimentos de seleo baseia-se na premissa de ligao gnica entre o locos
marcador e as regies do genoma
relacionadas com a expresso de
caractersticas de interesse econmico (LANDE & THOMPSON, 1990).
A identificao e a caracterizao de
marcas moleculares prximas s regies do genoma determinantes da

expresso de caractersticas de interesse esto diretamente relacionadas com a eficincia da seleo assistida por marcadores moleculares.
Nesse contexto, a conduo de experimentos que possibilitem o isolamento do efeito ambiental, juntamente com a anlise exaustiva de
algumas centenas de gentipos, permite o desenvolvimento de marcadores com alta eficincia de seleo.
A possibilidade de monitoramento da incorporao de genes de
interesse por retrocruzamento, a seleo precoce baseada no ndice de
heterose entre os indivduos e a
presena das marcas moleculares
para as caractersticas desejadas so
utilizaes que, potencialmente, po-

dem acelerar e aumentar a eficincia


da seleo em programas de melhoramento. (MURO_ABAD, 2000 ,
LANDE & THOMPSON, 1990). A
construo de mapas de ligao visando seleo assistida por marcadores moleculares considerada por
alguns autores como uma das aplicaes de maior impacto: o resultado da utilizao da tecnologia de
marcadores moleculares associado
a programas de melhoramento gentico (FERREIRA & GRATAPAGLIA,
1998, MURO_ABAD, 2000).
Alm do estudo e da localizao
dos QTLs e da determinao de seus
efeitos, interessante considerar que
o desenvolvimento de um mapa gentico permite estudos em vrias

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

31

outras reas como, por exemplo, o


esclarecimento da estrutura do
genoma, a clonagem de blocos de
genes de interesse, e os estudos de
sintenia (relativo localizao de
dois ou mais genes em um mesmo
cromossomo) em espcies relacionadas (LIU, 1998).
O cruzamento das informaes
obtidas com o mapeamento gentico
tradicional e com o mapeamento fsico do genoma deve facilitar a caracterizao de genes e de regies do
genoma crticas para a expresso
fenotpica, dando subsdios para a
clonagem de blocos de genes desejveis. A relao entre as unidades de
mapa e a distncia em pares de base
no uma constante entre as espcies e depende, principalmente, da
saturao do mapa e do tamanho do
genoma da espcie considerada. Tais
estudos associados a sintenia entre
as espcies podem facilitar o entendimento de muitos processos fisiolgicos e de diferenas entre espcies,
fornecendo a base terica para a
seleo e manipulao gentica de
espcies relacionadas.

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Pesquisa

Filmes Comestveis
de Quitosana
Ao biofungicida sobre frutas fatiadas

Odilio B. G. Assis, Dr.

Embrapa Instrumentao Agropecuria


odilio@cnpdia.embrapa.br

Ariane Maria Leoni

Biloga - Estagiria,
Embrapa Instrumentao Agropecuria
ariane@cnpdia.embrapa.br
Ilustraes: Embrapa Instrumentao Agropecuria

Introduo
sar revestimentos e coberturas em frutas e vegetais com o objetivo de
aumentar seu perodo de
preservao no consiste em prtica recente. Segundo
Hardenburg (1967), emulses derivadas de leos minerais tm sido
empregadas desde o sculo 13 na
China, na conservao de frutos ctricos e em outros produtos que
eram transportados por longas distncias por via martima. Na dcada
de 1950, a cera de carnaba foi
introduzida para esse fim, mas, devido aparncia fosca resultante de
sua aplicao, foram misturados com
polietileno e parafina. Nos anos de
1960, ceras e vernizes processados a
partir de gomas solveis em gua se
tornam populares no revestimento
de ctricos e frutas em geral.
As coberturas denominadas comestveis como hoje conhecemos
so mais recentes, e datam das dcadas finais do sculo passado , quando os produtores tiveram seu interesse p elas aumentado devido
expanso da oferta de produtos processados. A indstria dos chamados
alimentos minimamente processados foi inicialmente desenvolvida
com o objetivo de suprir restaurantes, hotis e instituies similares.
Nas ltimas dcadas, contudo, em
funo das convenincias da vida
moderna, os produtos processados
experimentaram uma significativa
expanso, com oferta de opes no
varejo e facilidade de escolha para o
consumo direto.

As mudanas nos padres


nutricionais e os benefcios creditados a uma alimentao saudvel formaram a grande fora impulsionadora
desses produtos e tm refletido, desde ento, em mbito mundial, uma
ateno para as pesquisas de novos
materiais e agentes com propriedades preservativas e bactericidas naturais que possam ser convenientemente empregados em alimentos.
Em particular os seguimentos de
fresh-cut e ready-to-eat so os que
requerem uma tecnologia especfica
para a manuteno apropriada de suas
qualidades nutricionais (Wiley, 1997).
De acordo com Clemente (1999),
frutas e vegetais minimamente processados foram timidamente introduzidos no Brasil no incio da dcada
de 1990 em So Paulo. Estima-se hoje
um crescimento na taxa de, pelo
menos, 20% ao ano, tendo movimentado, em 1998, cerca de R$ 450 milhes, s no mercado nacional de
vegetais minimamente processados
(Fares & Nantes, 2001).
Os revestimentos comestveis
sobre alimentos devem apresentar
certas peculiaridades como serem
invisveis, terem aderncia suficiente
para no serem facilmente removidos no manuseio e no introduzirem
alteraes no gosto.
Embora atributos de qualidade
sejam os objetivos principais de um
revestimento, d-se uma nfase natural s caractersticas visuais. Como
dados apresentados nos trabalhos
de Ahvenainen (1996) e de Nassu et
al., (2001), a principal preocupao
dos consumidores est em adquirir
produtos com aparncia de frescos,

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

33

cor aceitvel e razoavelmente livres


de defeitos.
O principal papel de uma cobertura comestvel, no entanto, atuar
como uma barreira perda de umidade, controlar a respirao do fruto e
evitar contaminaes microbiolgicas
e qumicas. Durante a respirao,
glucose metabolizada em dixido
de carbono (CO2) por meio da interao do cido tricarboxlico, o que gera
o amadurecimento e deteriorao natural do fruto. A atmosfera modificada
criada pelo revestimento gera um aprisionamento fsico do CO2 dentro do
fruto. Se a permeao de oxignio
(O2) para seu interior reduzida,
ocorrer um prolongamento do tempo de maturao. Alm disso, os revestimentos comestveis tm a vantagem da biodegradabilidade que os
torna ambientalmente corretos.
Lipdios, polissacardos e protenas so os produtos comumente empregados na formao das coberturas
comestveis sobre frutas, com vantagens e desvantagens especficas de
cada material (Baldwin et al., 1995).
Tm sido tentativas recorrentes na
pesquisa de superfcies ativas a deposio de multicamadas ou de estruturas compsitas e combinaes destes
ou adio de demais materiais.

Respirao em Frutos
Sob condies ideais, a maioria
das plantas, incluidos seus frutos,
respira aerobicamente. A respirao
aerbica envolve a quebra de molculas de carboidratos obtidos durante a fotossntese. A queima lenta
desses compostos ricos em energia,
dos quais um dos mais simples a
glicose, constitui atividades metablicas bem conhecidas e so usadas na
formao de adenosina trifosfatada
(ATP). Durante o processo respiratrio normal, a planta usa o oxignio da
atmosfera como um aceptor de eltrons no processo de fosforilao e
libera dixido de carbono.
Quando o fruto colhido, h
uma interrupo no balano gasoso,
ocorrendo um alto influxo do oxignio com proporcional perda do CO2.
Nessa nova condio (alta concentrao de O2 com baixa de CO2), as
clulas internas no so mais reno34

vadas e a respirao aumenta, o que


provoca uma queda metablica levando o fruto a um gradual amadurecimento e eventual senescncia.
Com o revestimento ocorre entupimento parcial dos poros, reduzindo,
dessa forma, a troca gasosa, ou seja,
reduzindo a taxa de respirao, o
que permite um prolongamento da
vida do fruto.

Revestimentos
Hidrocolides
Um dos materiais de interesse
no processamento de coberturas so
os hidrocolides. Hidrocolides so
polmeros solveis em meios aquosos, estabilizados em gis que normalmente, solidificam e formam filme por evaporao direta do
solvente. Os revestimentos de
hidrocolides constituem excelente
barreira aos gases, mas oferecem
fraca proteo migrao do vapor
de gua, dada a sua natureza
hidroflica.
Os hidrocolides utilizados na
preparao de filmes comestveis podem ser classificados segundo a sua
composio, massa molecular e solubilidade. De acordo com Donhwe e
Fennema (1994), os filmes hidrocoloidais mais utilizados so os
glucdicos e os proticos. Os glcidos
mais utilizados so os derivados de
celulose, os alginatos, as pectinas, a
goma-arbica e o amido ou amido
modificado. A protena de soja, o
glten, a zena e o soro de leite so
algumas das protenas freqentemente utilizadas na preparao de revestimentos comestveis.
Polissacardeos de origem animal tm sido avaliados como uma
alternativa consideravelmente econmica e eficiente para esse fim,
sendo a quitosana o composto mais
estudado (Coma et al., 2002).

A quitosana
A quitosana um polmero natural derivado do processo de desacetilao da quitina, que tido como o
segundo polissacardeo mais abundante da natureza, atrs apenas da
celulose. Sua estrutura formada pela
repetio de unidades beta (1-4) 2amino-2-deoxi-D-glucose (ou Dglucosamina) e apresenta uma cadeia
polimrica quimicamente similar da
celulose, conforme expressa na Figura 1. Devido a suas caractersticas
atxicas e de fcil formao de gis, a
quitosana tem sido considerada h
dcadas como um composto de interesse industrial e especialmente de
uso farmacutico (Campana-Filho &
Desbrires, 2000). Recentemente, contudo, uma srie de estudos tem sido
publicada caracterizando o uso da
quitosana como cobertura de alimentos ou revestimentos protetores em
frutas e legumes processados (Shahidi
et al., 1999; Coma et al., 2002). Esses
trabalhos enfocam, essencialmente,
as propriedades antifngicas e
antibacterianas da quitosana, conforme demonstrado por No et al., (2002),
indicando por conseguinte o seu uso
potencial sobre superfcies cortadas
ou sobre frutos com alta taxa de
maturao ps-colheita. Como a
quitosana constitui-se de fibras no
digerveis, no apresenta, portanto,
valor calrico, independentemente da
quantidade ingerida, o que mais um
atrativo para a indstria alimentar.
As diferentes caractersticas do
produto comercial tornam-se um dos
aspectos que tm dificultado seu pleno uso na industria alimentcia. As
quitosanas disponveis, principalmente no Brasil, so de procedncias
diversas e apresentam diferentes
graus de pureza e densidade molar,
alm de no seguirem industrialmente um procedimento comum de desa-

Figura 1. Representao esquemtica da estrutura primria da quitosana, sendo n o


grau de polimerizao.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

cetilao, o que torna os materiais


comerciais consideravelmente diferentes entre si. Esse fato dificulta o
estabelecimento de um processamento padro de gis e a obteno de
filmes e revestimentos com caractersticas reprodutveis (Assis & Alves,
2002). Outro aspecto importante
que as quitosanas comerciais so
solveis somente em pHs cidos, o
que pode gerar reaes com a superfcie a ser revestida, alterando o aspecto e o sabor da polpa. Alteraes
na seqncia de desacetilao ou
mudanas estruturais introduzidas na
cadeia da quitosana j processada,
como o derivado N-carboximetilquitosana, podem gerar produtos solveis em pH neutro. De um modo
geral, contudo, a quitosana tem sido
internacionalmente aceita como material promissor para revestimento
de frutas e de alimentos diversos.

Figura 2 Procedimentos de revestimento adotados.

Metodologia para
Formao de Gis e
Revestimento
A quitosana empregada nesta
avaliao foi obtida em farmcias de
manipulao, sendo, segundo informao inscrita, procedente da purificao de quitinas extradas de cascas
de camaro. Esse material apresenta
aspecto granular, ligeiramente amarelado e pode ser classificado como
de mdia massa molar (Signini &
Campana-Filho, 1998).
Os gis foram preparados por
dissoluo sob agitao moderada em
cido actico 0,5 M at equilbrio em
pH prximo a 3. Estudos preliminares
indicaram que os melhores resultados
na formao de filmes so conseguidos com solues com concentraes
de quitosana prximos a 20 g/L (Assis
& Pessoa, 2003). So necessrios perodos superiores a 12 horas de agitao para obter uma total homogeneizao da soluo. Para simplificar o
processo, todo o procedimento foi
realizado sob temperatura ambiente.
Frutos comerciais de mas da cv.
Gala, foram secionadas ao meio, dois
procedimentos de revestimento
adotados: i) as amostras foram imersas
com a ajuda de um suporte metlico na
soluo filmognica e ii) as amostras
foram revestidas por nebulizao, com

Figura 3. Seqncia empregada para processamento de gel e depsito.


Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

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sistema de presso manual (spray). A


consecuo de uma nebulizao perfeita e a de forma manual so dependentes, evidentemente, da viscosidade
da soluo empregada.
Aps o escoamento do excesso
de gel, foram deixadas secar em condio ambiente. A cura (polimerizao)
do filme d-se espontaneamente como
conseqncia da evaporao do
solvente. A Figura 2 ilustra os procedimentos adotados, cuja seqncia est
esquematizada na Figura 3.
Como resultado da aplicao,
observada uma ligeira mudana na
colorao da superfcie cortada, em
ambos os processos, com tendncia a
um tom tirante a amarelo ou a verde
suave. Aps a secagem, os filmes

resultantes apresentam boa aderncia, sendo totalmente transparentes.


As mas naturalmente apresentam um escurecimento superficial sob
as faces cortadas, em funo da ao
enzimtica da polifenoloxidase
(PPO), em diferentes intensidades,
como medido por Sapers e Douglas
em 1987. Contudo, em meio cido,
que necessrio para que a quitosana
se dissolva em condio no-alterada, essa reao potencializada. No
entanto, foi observado que o tempo
de imerso das amostras (de 3 a 8
segundos) aparentemente no afeta
a colorao final resultante. A extenso dos danos provocados pela ao
cida pode ser, em princpio, atenuada pelo uso de agentes alcalinos

Figura 4. Imagens tpicas de filmes de quitosana, obtido por microscopia de fora


atmica. O aspecto microscpico dos filmes formados indica estrutura descontnua com
porosidade residual, mais acentuado para os revestimentos obtidos por nebulizao.

que, misturados ao gel, ajustam o pH


em nveis menos agressivos ou que,
por alteraes estruturais prvias da
quitosana, que a torna solvel em
pHs mais alcalinos. Um revestimento
polimrico ideal para uso em alimentos, evidentemente deve ser completamente inerte, com ausncia de impacto sobre a polpa ou introduo e
alterao de cores na casca ou nas
demais partes do fruto.
Tm sido conduzidas anlises
detalhadas dos filmes, tanto por microscopia eletrnica de varredura
(MEV) como por microscopia de fora atmica (AFM), (Assis, et al., 1999;
Assis, et al, 2002) indicando estruturas descontnuas, que caracterizam
certa porosidade residual no filme
formado, conforme imagens tpicas
apresentadas na Figura 4, obtidas por
AFM (sistema TopoMetrix Discover imagens geradas por programa SPIP
2.1 - Scanning Probe Image Processor). Os filmes apresentam espessuras variveis, dependente da posio
no fruto, mas de uma forma geral, so
extremamente finos, no superiores
a 1,5 mm. Como citado, coberturas
totalmente densas e impermeveis
so indesejveis para coberturas de
frutos, pois necessrio que haja nos
revestimentos a manuteno de uma
respirao mnima.
A literatura tem mostrado que
polmeros hidroflicos, especialmente os altamente polares como a
quitosana, podem, em funo da
umidade relativa do ar, mudar significativamente sua permeabilidade a
gases. Resultados apresentados por
McHugh & Krochta, em 1994, mostraram que, para uma porosidade
especfica, a permeao sensivelmente reduzida com o abaixamento
da concentrao de gua adsorvida
pela pelcula. Na realidade, a permeabilidade do filme pode ser alterada devido, no somente umidade ambiental, mas, principalmente,
pela incorporao de elementos
aquosos celulares oriundos da polpa da fruta (Baldwin et al, 1996).
Caractersticas Protetoras

Figura 5. Perda relativa de massa em funo do tempo de armazenamento em


condies no controladas. Amostras fatiadas e revestidas por imerso.
36

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

Com respeito ao protetora


dos revestimentos de quitosana,
observada pouca diferena como re-

Figura 6. Aspecto genrico das faces cortadas (revestidas e no-revestidas) aps o


oitavo dia de armazenamento.

sultado dos processos de deposio.


A Figura 5 apresenta a perda de massa
relativa, obtidas em amostras cobertas
por imerso, para 10 dias de armazenamento em condies no controladas (temperaturas entre 25oC -30oC
em ambiente com iluminao natural). Ao final desse perodo, temos
uma preservao mdia de massa superior a 10% para as amostras
recobertas. Os dados referem-se a
medidas realizadas diariamente para
valores estimados pela mdia de 8
amostras.

Worrell at al., (2002) demonstram que uma das principais caractersticas de um filme protetor na reduo de perda de massa o estabelecimento de uma boa diferena nos
valores de presso de vapor entre o
fruto e sua vizinhana. Apesar da
quitosana ser um material hidroflico
com significativa taxa de absoro de
gua (Assis & Silva, 2003) o efeito
redutor da perda de massa efetivo
e claramente observado. Resultados
similares foram coletados para as
amostras revestidas por spray.

O carter antifngico da
quitosana foi avaliado qualitativamente atravs do acompanhamento fotogrfico de colnias espontaneamente crescidas sobre as superfcies cortadas. Embora no tenha
sido realizado um acompanhamento rigoroso das culturas e das espcies de fungos, de modo geral, os
filmes apresentaram boa ao
antifngica. Fica visualmente clara
essa ao na comparao das mas revestidas com as no revestidas.
Faces no recobertas apresentam
proliferao de fungos a partir do
quinto dia, com progresso significativa nos perodos seguintes. A
Figura 6 apresenta exemplo da aparncia das faces aps o oitavo dia
de estocagem.
O efeito fungicida da quitosana
atribudo ao de enzimas
quitonolticas, como a quitinase,
que degradam as paredes celulares dos fungos e provocam a extrao de agentes antimicrobianos
como a fitoalexina e a pisatina
(Hirano & Nagao, 1989, Coma et
al., 2002). A quitinase pertence a
uma famlia de protenas denominada protenas relacionadas com a
patognese (conhecidas como protenas de defesa) ou protenas PR
(Pathogenesis Related proteins).
Essas protenas formam um grupo
estrutural e funcionalmente heterogneo que so capazes de inibir
o crescimento da hifa.
Essas atividades antifngicas
so freqentemente influenciadas
pelo pH local. Estudos conduzidos
por Sudarshan e colaboradores
(1992) indicaram que a interao
entre quitosana positivamente carregada (o que ocorre em meio cido) e resduos ou superfcies
microbianas negativamente carregadas so fundamentais para uma
efetiva ao inibitria do crescimento de microorganismos. Feng
et al., 1994, tambm mostraram que
a atividade microbiana da quitosana
aumenta com o porcentual de desacetilao, que, normalmente, se encontra entre 65% a 85%. Jung, et al.,
(1999) resumem as atividades
antimicrobianas da quitosana em
dois principais mecanismos: i) A
natureza catinica da quitosana, que

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

37

favorece ligaes com o cido silico


nos fosfolipdios, e conseqentemente, restringe o movimento de
substncias microbiolgicas; e ii) A
penetrao atravs da parede celular que impede a transformao do
DNA em RNA. Ou seja, a atividade
antimicrobiana se d por interao
dos grupos amino livres da cadeia
polimrica da quitosana.
O uso de substncias polissacardeas abundantes e bioativas como a
quitosana, que, alm de atxicas,
reduzem a maturao e atuam ou
induzem defesas a microorganismos,
so potencialmente interessantes para
aplicaes em biotecnologia e merecem ser mais bem avaliadas como
potencial material para revestimentos comestveis de uso genrico.

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Pesquisa

Bactrias Produtoras
de Biossurfactantes
Produo de biossurfactantes por bactrias isoladas de poos de petrleo

Ester Ribeiro Gouveia

Departamento de Antibiticos UFPE


Doutora em Engenharia Qumica.
ester.gouveia@bol.com.br

Danielle Patrice Alexandre Lima


Departamento de Antibiticos UFPE
Bacharel em Cincias Biolgicas.
daniellepatrice3@hotmail.com

Maria do Socorro Duarte

Departamento de Antibiticos UFPE


Mestre em Biotecnologia de Produtos Bioativos
msocorrodna@bol.com.br

Glucia Manoella de Souza Lima

Departamento de Antibiticos UFPE


Mestre em Biotecnologia de Produtos Bioativos.
gmslima@yahoo.com.br

Janete Magali de Arajo

Departamento de Antibiticos UFPE


Dr Prof adjunta da UFPE.
janetemagali@yahoo.com.br
Ilustraes cedidas pelos autores

Resumo
Os biossurfactantes so molculas produzidas por bactrias, fungos ou leveduras, que apresentam
propriedades biolgicas aplicveis
a vrias indstrias, tais como, a indstria farmacutica, de cosmticos,
de petrleo e de alimentos. Estes
compostos, nos ltimos anos, tm
recebido ateno especial devido
sua biodegradabilidade, baixa
toxicidade e conseqente aceitabilidade ecolgica. Os biossurfactantes
so classificados em glicolipdeos,
lipopeptdeos e lipoprotenas,
biossurfactantes polimricos, fosfolipdeos e cidos graxos. Dentre os
glicolipdeos, os mais estudados so
os raminolipdeos, produzidos por
Pseudomonas aeruginosa. Este trabalho teve como objetivo a produo de biossurfactantes raminolipdico por bactrias isoladas de poos
de petrleo. Inicialmente, 40 bactrias isoladas de poos de petrleo
no Canto do Amaro/RN foram isoladas e caracterizadas como produtoras ou no de raminolipdeos, utilizando-se um ensaio primrio
semiquantitativo. Destas bactrias,
13 deram resultado positivo e foram
identificadas como Pseudomonas
aeruginosa, com exceo de duas
bactrias, que foram identificadas
apenas como Pseudomonas. Na segunda etapa foram realizados cultivos em frascos agitados com meio
de cultura contendo glicose ou
glicerol como fontes de carbono. O
glicerol foi uma fonte mais apropriada, com produtividade de raminose
maior que aquela encontrada na literatura utilizando o mesmo meio e
outra linhagem isolada de outro local. Na etapa seguinte, foram realiza-

dos experimentos de degradao de


petrleo bruto pelas 13 bactrias.
Estes resultados mostraram o potencial destas linhagens em produzir
biossurfactantes raminolipdico, utilizando petrleo bruto como fonte de
carbono o que apresenta ser de grande importncia para a biorremediao de reas contaminadas por derramamento de petrleo.

1. Introduo
Os surfactantes compreendem
uma classe importante de compostos
qumicos muito utilizados em diversos
setores industriais, uma vez que atuam
como dispersantes e/ou solubilizantes
de compostos orgnicos, apresentando baixa solubilidade em gua. A importncia comercial dos surfactantes
torna-se evidente a partir da tendncia
do mercado que vem aumentando sua
produo em decorrncia da diversidade de aplicaes industriais.
Os surfactantes possuem estrutura molecular com grupos hidroflicos
e hidrofbicos que exibem propriedades como adsoro, formao de
micelas, formao de macro e micro
emulses, ao espumante ou
antiespumante, solubilidade e detergncia. Um dos ndices mais utilizados para avaliao desta atividade
surfactante a concentrao de micelas
crticas (CMC) que a solubilidade de
um surfactante dentro da fase aquosa
ou a concentrao mnima requerida
para atingir a mais baixa tenso superficial ou interfacial (Lin, 1996). A eficincia e a efetividade so caractersticas bsicas essenciais que determinam um bom surfactante. A eficincia
medida atravs da CMC que varia de
1 a 2000 mg/l, enquanto que a
efetividade est relacionada com as

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

39

Figura 1. Dimetro dos halos azuis das bactrias caracterizadas como produtoras de
raminolipdeo.

tenses superficiais e interfaciais as


quais devem atingir valores menores
que 30 e 1 mN/m, respectivamente
(Muligan, 1993).
Um outro parmetro muito utilizado para avaliar o comportamento
do surfactante o valor do balano
hidroflico - lipoflico (HLB). Segundo Parkinsom (1985) surfactantes com
HLB menor que 6 so mais solveis
na fase oleosa, enquanto valores entre 10 e 18 exibem caractersticas
opostas (Desai e Banat, 1997). A
adio de um bom surfactante na
gua pode diminuir a tenso superficial e interfacial a 200C de 72 para 30
mN/m (Kosaric, 1996).
Os surfactantes so aplicados em
reas como agricultura para a formulao de herbicidas e pesticidas, na
indstria alimentcia como aditivo em
condimentos, nas indstrias farmacuticas, txtil e cosmtica (Yamane,
1987; Lin et al., 1993; Shephord et al.,
1995). Entretanto, o maior mercado
para os surfactantes na indstria
petrolfera, onde so amplamente utilizados para a recuperao terciria
do petrleo (MEOR - Microbial
Enhanced Oil Recovery), como na

remoo e mobilizao de resduos


de leo e biorremediao (Desai e
Banat, 1997; Ron e Rosenberg, 2002).
Surfactantes microbianos ou biossurfactantes so metablitos microbianos de superfcie ativa, que apresentam molculas com pores hidroflicas
e hidrofbicas que tendem a se distribuir nas interfaces entre fases fludas
com diferentes graus de polaridade
(leo/gua e gua/leo). Estas propriedades promovem a reduo da tenso superficial e interfacial, conferindo
a capacidade de detergncia, emulsificao, lubrificao, solubilizao e disperso de fases (Desai e Banat, 1997).
A poro hidroflica constituda por
grupamentos aninicos, catinicos,
no-aninicos ou anfteros, enquanto
que, a parte hidrofbica, geralmente
um hidrocarboneto linear ou ramificado apresentando ou no duplas ligaes e/ou grupos aromticos (Georgiou
et al., 1992). Os surfactantes microbianos so produzidos principalmente por
bactrias, embora fungos e leveduras
tambm os produzam (Fiechter, 1992).
A maioria dos surfactantes utilizados comercialmente sintetizada
a partir de derivados do petrleo.

Tabela 1- Diversidade de surfactantes de origem microbiana


(Mulligan et a., 2001).
Microrganismos
Biossurfactantes
Bacillus lichen iformis
Lipopeptdeo
Bacillus subtilis
Surfactina
Bacillus sp.
Raminolipdeo
Can dida bombicol
Soforolipdeo
Can dida lipolytica Y-917
Soforolipdeo
Coryn ebacterium in sidiosum
Fosfolipdeo
Pseudomon as aerugin osa
Raminolipdeo
Pseudomon as fluorecen s
Lipopeptdeo
Rhodococcus sp.
Glicolipdeo
40

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

Entretanto, nos ltimos anos o interesse por surfactantes de origem


microbiana tem aumentado significativamente em decorrncia de serem naturalmente biodegradveis
diminuindo assim o impacto ambiental (Makkar e Cameotra, 2002).
Os biossurfactantes apresentam inmeras vantagens sobre os surfactantes de origem qumica, tais como,
baixa toxicidade, tolerncia temperatura, pH e fora inica, alm de
serem biodegradveis na gua e no
solo (Lin, 1996).
Segundo Georgiou et al. (1992),
uma grande variedade de microrganismos produz biossurfactantes, sendo que o tipo, a quantidade e a
qualidade do biossurfactante so influenciados pela natureza do substrato, concentrao de ons como P, N,
Mg, O2, e Fe- no meio de cultura,
alm das condies de cultivo.
Os surfactantes sintticos so
classificados pela natureza do seu
grupo polar, enquanto que os biossurfactantes so diferenciados por
sua natureza bioqumica e pela espcie microbiana produtora (Desai &
Desai, 1993). As principais classes
incluem os glicolipdeos, lipopeptdeos e lipoprotenas, biossurfactantes polimricos, fosfolipdeos e cidos graxos (Georgiou et al., 1992;
Desai e Banat, 1997).
Uma ampla diversidade de biossurfactantes de origem microbiana
pode ser observada na Tabela 1.
A classe dos glicolipdeos compreende um grupo dos mais conhecidos e estudados, apresentando longas cadeias de cidos alifticos ou
cidos hidroxialifticos. Nesta classe
destacam-se os raminolipdeos,
trealolipdeos e soforolipdeos (Reis,
1998).
Os raminolipdeos so formados
por uma ou duas molculas de
raminose, ligadas a uma ou duas molculas de cido b-hidroxidecanico
(Desai e Banat, 1997). Foram isolados
pela primeira vez por Bergstrom et al.
(1946) de Pseudomonas pyocyanea.
Posteriormente, Jarvis e Johnson em
1949 mostraram uma ligao glicosdica
de b-hidroxidecanoil-b-hidroxidecanoato com duas molculas de raminose
em cultivo de P. aeruginosa com 3%
(v/v) de glicerol.
Os raminolipdeos produzidos
por Pseudomonas spp. tm a capacidade de diminuir a tenso interfacial

Figura 2. Tenso superficial obtida durante cultivo em frascos agitados em meio MLR
contendo glicose como fonte de carbono.

contra n-hexadecano para 1 mN/m e


a tenso superficial para 25 a 30
mN/m (Lang e Wagner, 1987). Alm
de reduzirem a tenso superficial,
estabilizam emulses e so geralmente atxicos e biodegradveis
(Banat et al., 2000). Estes biossurfactantes tambm so uma fonte de
L-raminose, usada na produo de
condimentos de alta qualidade e
tambm como matria-prima para a
sntese de alguns compostos orgnicos (Linhardt et al., 1989).
Embora o potencial de produo seja determinado pela gentica
do microrganismo, outros fatores
como as condies ambientais e a
natureza do substrato tambm influenciam no nvel de expresso
(Rahman et al., 2002). P. aeruginosa
pode utilizar substratos como
alcanos, piruvato, glicerol, succinato,
frutose, leo de oliva, glicose e
manitol para produzir raminolipdeos (Mulligan et al., 2001).
Em decorrncia da importncia
dos biossurfactantes, este trabalho
teve como objetivo investigar a produo destes compostos por bactrias isoladas de poos de petrleo.

2. Materiais e Mtodos
Figura 3. Tenso superficial obtida durante cultivo em frascos agitados em meio MG
contendo glicerol como fonte de carbono.

Microrganismos
Foram utilizadas 40 bactrias, 20
Gram-positivas e 20 Gram-negativas,
pertencentes coleo de culturas de
microrganismos do Departamento de
Antibiticos da UFPE (DAUFPE), isoladas de poos de petrleo de Canto
do Amaro/Mossor/RN (Tabela 2).
Meios de Cultura

Figura 4. Produtividade em raminose obtidas durante as fermentaes com as 13


bactrias produtoras de raminolipdeos.

A manuteno das bactrias


Gram-negativas foi realizada em meio
de cultura MPK (King et al., 1954) e
das bactrias Gram-positivas em meio
Triptona de Soja gar - TSA, que
contm (em g/l): Tripticase - 15; NaCl
- 5; Peptona de soja - 5; gar 15 e
pH 7,0.
Na seleo primria de bactrias
como produtoras de raminolipdeos
foi utilizado o meio MMR como proposto por Siegmund e Wagner (1991).
A investigao sobre a biodegradao de hidrocarbonetos foi realizada utilizando-se o meio mineral
Buchnell e Haas (BH), adicionado de
petrleo como fonte de carbono.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

41

Tabela 2. Relao das bactrias Gram-negativas e Gram-positivas isoladas de poos de petrleo do


Canto do Amaro (RN) e utilizadas neste trabalho.
Bactrias Gram-negativas
Bactrias Gram-positivas
N. da Coleo
Poos de
N. da Coleo
Poos de
Cdigo
Cdigo
DAUFPE*
Origem
DAUFPE*
Origem
509
AP-29
G4
511
AP-29
H2
568
AP-44
DB1
522
AP-29
1B
569
AP-44
D1A1
523
AP-29
1C
570
AP-44
BA2
529
AP-29
21
571
AP-44
D1A2
530
AP-29
6
572
AP-44
BB2
532
AP-29
18
573
AP-44
DA1
534
AP-29
9B
574
AP-44
D1B1
535
AP-29
24A
575
AP-44
D1B2
539
AP-29
13A
592
AP-44
17C
540
AP-29
13B
602
AP-44
25B
544
AP-29
14
610
AP-194
A5
545
AP-29
25
611
AP-194
B4
580
AP-44
23B
612
AP-194
C1
588
AP-44
6B
613
AP-194
C2
589
AP-44
6C
614
AP-194
D2
596
AP-44
24
615
AP-194
E2
598
AP-44
29B
618
AP-194
A5 (SAB)
599
AP-44
14A
621
AP-194
D4
601
AP-44
25A
528
AP-29
5C
603
AP-44
25C
* DAUFPE: Coleo de Culturas do Departamento de Antibiticos da UFPE.
Para a produo de raminolipdeos tendo glicerol como fonte de
carbono foi utilizado o meio descrito
por Santa Anna et al. (2002). O meio
descrito por Abu-Ruwaida et al. (1991)
foi utilizado quando glicose foi a
fonte de carbono.
Seleo Primria para
Caracterizao das Bactrias
como Produtoras de
Biossurfactante Raminolipdico
Neste ensaio semiquantitativo,
segundo a metodologia descrita por
Sigmund e Wagner (1991), o
raminolipdeo aninico forma um par
inico insolvel com o brometo de
cetiltrimetilamnio (CTAB), na presena de azul de metileno, formando
um halo azul escuro em volta da
colnia.
Um volume de 3 l de suspenso
de bactria a 109 Unidades Formadoras de Colnias por ml (UFC/ml), de
cada linhagem, foi inoculada em meio
slido contendo CTAB e azul de
metileno. Em seguida as placas foram
cultivadas a 300C por 120 horas.
Identificao das Bactrias
As bactrias Gram-negativas, inicialmente selecionadas como produtoras de raminolipdeos, foram iden42

tificadas atravs das caractersticas


bioqumicas, com a utilizao do Kit
Bac Tray III especfico para bactrias
Gram-negativas (Difco).
Cultivos em Frascos Agitados
A investigao da produo de
biossurfactantes raminolipdicos foi
realizada atravs de cultivos em mesa
incubadora rotativa. Inicialmente as
bactrias foram cultivadas em meio
slido MPK a 300C. Aps 24 horas,
foram inoculadas em frascos Erlenmeyers de 250 ml contendo 50 ml do
meio de produo e incubadas sob
agitao, a 300C, 250 rpm durante 24
horas. Aps este perodo, 2 ml de
cada bactria foi inoculado em 48 ml
do meio de produo, contidos em
frascos Erlenmeyer de 250 ml a incubao foi realizada nas mesmas condies da etapa anterior. Durante os
cultivos foram retiradas amostras em
intervalos de 24 horas, as quais foram
centrifugadas a 11.000 rpm durante 5
minutos e submetidas s seguintes
anlises:
a) Tenso superficial - a tenso
superficial do caldo livre de
clulas foi medida usando um
tensimetro CSC-Du Nouy (705)
temperatura ambiente;
b) Concentrao de raminose - a

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

quantificao de raminolipdeos
expressa em raminose, foi avaliada pelo mtodo colorimtrico
do fenol cido sulfrico (Dubois
et al., 1956);
c) Concentrao de biomassa
um volume conhecido da amostra foi centrifugado em tubos de
eppendorfs (pesados previamente P1) a 11000 rpm, durante 5
minutos. O sobrenadante foi recolhido para anlises posteriores e os tubos de eppendorfs
contendo a biomassa foram colocados em estufa a 800C. Aps
24 horas, os tubos foram pesados (P2). A concentrao de
biomassa expressa em g.l-1 foi
obtida pela equao: (P2-P1)/
V(L), onde V foi o volume
centrifugado em litro.
Degradao de Petrleo
No ensaio de degradao de petrleo foi utilizada a metodologia de
Brown e Braddock (1990) modificada,
uma vez que no presente trabalho o
ensaio foi realizado em tubos e a
concentrao de raminose foi determinada. Os tubos de ensaio continham o
meio BH, o inculo e o petrleo bruto.
O tubo controle negativo no continha
inculo. Todos os tubos foram incubados a 30C por 20 dias.

Tabela 3. Produtividade em raminose e reduo da tenso superficial obtida durante as fermentaes


com as 13 bactrias caracterizadas como produtoras de raminolipdeos.
Bactrias selecionadas na Produtividade em Tenso Superficial Tenso Superficial Reduo da Tenso
seleo primria
Raminose(g/l)
Inicial(mN/m)
Final (mN/m)
Superficial (%)
Pseudomon as sp. 615-E2
0,0099
40,00
29,00
27,50
P. aerugin osa-572-BB2
0,0092
35,50
30,00
15,50
P. aerugin osa-571-D1A2
0,0083
33,55
29,80
11,18
Pseudomon as sp. 570-BA2
0,0079
37,00
29,45
20,41
P. aerugin osa-613-C2
0,0078
37,50
30,00
20,00
P. aerugin osa-611-B4
0,0071
36,25
28,20
22,21
P. aerugin osa-612-C1
0,0068
44,65
34,05
23,74
P. aerugin osa-575-D1B2
0,0066
33,2
28,7
13,55
P. aerugin osa 610-A5
0,0056
40,00
38,50
3,75
P. aerugin osa-614-D2
0,0055
45,30
28,30
37,53
P. aerugin osa-569-D1A1
0,0035
41,00
40,00
2,45
P. aerugin osa-573-DA1
0,0025
39,50
35,00
11,40
Bacillus sp.-511-H2
0,00015
35,00
30,00
14,29
Tab ela 4. R esu ltad o s d o s en saio s d e d egrad ao d e petr leo pelas
13 b actrias selecio n ad as in icialmen te co mo pro d u to ras d e
b io ssu rfactan tes ramin o lipd ico .
N d a
Degrad ao d e
C d igo
co leo DA UFP E
petr leo b ru to
610
A5
++
611
B4
+++
570
BA2
++
572
BB2
++
612
C1
+++
613
C2
+++
614
D2
+++
573
DA1
+++
569
D1A1
++
571
D1A2
+++
575
D1B2
+++
615
E2
+++
511
H2
++
++ Degradao parcial; +++ Degradao total

3. Resultados e Discusso
Caracterizao das Bactrias
Isoladas de Poos de Petrleo
Na seleo primria das bactrias
para a caracterizao como produtoras
de biossurfactantes raminolipdicos,
27,5% (11) das bactrias Gram-negativas deram resultados positivos aps 72
horas de cultivo (Figura 1).
Das 20 bactrias Gram-positivas
utilizadas, apenas a linhagem DAUFPE511 (H2) foi caracterizada como produtora de biossurfactante raminolipdico.
Por outro lado, das 20 linhagens Gramnegativas, 12 (60%) exibiram a formao de halo azul nessa seleo primria.
A identificao bioqumica das
12 bactrias Gram-negativas permitiu o conhecimento da espcie. Com
exceo das bactrias Pseudomonas
sp. 570-BA2, e Pseudomonas sp. 615E2, todas foram identificadas como
Pseudomonas aeruginosa.
Produo de Biossurfactantes
Raminolipdico em Frascos
Agitados

Figura 5. Biomassa obtida durante os cultivos em frascos agitados em meio MG


contendo glicerol como fonte de carbono.

A partir da seleo primria, as 13


linhagens positivas para raminolipdeo
foram utilizadas para a investigao
da produo deste biossurfactante em
meios lquidos contendo glicose ou
glicerol como fontes de carbono.
Uma vez que os biossurfactantes
podem ser produzidos em substratos
solveis em gua, inicialmente, as 13
bactrias foram cultivadas em meio

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

43

MLR, contendo glicose como fonte de


carbono e tenso superficial de 58mN/
m. Nos resultados apresentados na
Figura 2, a tenso superficial alcanou
o valor mnimo de 30mN/m para as
bactrias BB2, D1A1 e H2.
Na Figura 3 podem ser observadas
as tenses superficiais obtidas durante
o cultivo em frascos agitados em meio
MG contendo glicerol como fonte de
carbono. Estes resultados comparados
com aqueles obtidos com o meio MRL
(Figura 2) indicam o glicerol como uma
fonte de carbono mais apropriada para
a produo de raminolipdeo do que a
glicose. A anlise destes resultados indica que estas linhagens se destacam
como boas produtoras de raminolipdeo
quando a fonte de carbono glicerol,
corroborando com os resultados obtidos por Mulligan e Gibbs (1989), os
quais comprovaram que a composio
do meio de cultura influencia diretamente na produo do biossurfactante.
Com relao quantificao da
raminose, apenas as amostras dos
ensaios com o meio MG foram utilizadas. A Figura 4 apresenta os valores
de produtividade em raminose obtidos durante as fermentaes com as
13 bactrias produtoras de raminolipdeo em meio MG. A produtividade em
raminose foi calculada considerando
o maior valor de concentrao dividido pelo respectivo tempo, sendo o
tempo de produo mxima entre 72
e 96 horas de cultivo.
Os maiores valores foram observados para as bactrias Pseudomonas
sp. 615-E2, P. aeruginosa-572-BB2,
Pseudomonas sp. 570-BA2, P.
aeruginosa-613-C2 e P. aeruginosa571-D1A2. Todas estas bactrias produziram valores superiores a 0,007g/
l.h. A produtividade obtida por Santa
Anna et al. (2002) utilizando o mesmo
meio de cultura e Pseudomonas
aeruginosa PA1 foi de 0,0069g/l.h.
Valores superiores de produtividade
so geralmente obtidos em cultivos em
batelada alimentada. Rahman et al.
(2002) obtiveram produtividade maior
que 0,03g/l.h quando foram adicionados leo de soja ou glicerol aps 46,
144 e 192 horas, em cultivos com
Pseudomonas aeruginosa DS10-129.
A Tabela 3 apresenta os valores
de tenso superficial e de produtividade em raminose obtidos nos ensaios com o meio MG. Observa-se nesta
Tabela que nem sempre os maiores
valores de concentrao de raminose
44

Figura 6. Aspecto macroscpico de degradao do petrleo pelas bactrias P.


aeruginosa 573-DA1 e Pseudomonas sp. 615-E2.

correspondem aos menores valores


de tenso superficial, indicando a
importncia de quantificar a produo de raminolipdeo. A medida da
tenso superficial serve apenas como
uma medida indireta da produo de
biossurfactantes.
Santa Anna et al. (2002) tambm
observaram que quando utilizaram
leo parafnico como fonte de carbono para a produo de raminolipdeos
por Pseudomonas aeruginosa PA1, a
reduo da tenso superficial foi de
apenas 4,4%, sendo produzido 260
mg/l; por outro lado, quando a fonte
de carbono foi n-hexadecano, a reduo da tenso foi de 47,4% e a concentrao de raminose igual a 130 mg/l.

Conforme a Tabela 3, as linhagens 611-B4, 575-D1B2 e 614-D2 apresentaram os menores valores de tenso superficial, 28,2; 28,7 e 28,3 mN/
m, respectivamente. Segundo Desai e
Banat (1997), a tenso superficial durante a produo de raminolipdeos
por P. aeruginosa pode chegar a 29
mN/m, de forma que os valores mnimos de tenso superficial encontrados no presente trabalho so similares
aos relatados na literatura.
A maioria das bactrias apresentou crescimento mximo com 48 horas de cultivo, sendo a maior concentrao de biomassa observada (Figura
5) para a linhagem P. aeruginosa-575D1B2, que alcanou 2,53 g/l . Con-

Figura 7. Produo de biossurfactante raminolipdico produzido pelas 13 bactrias em


meio mineral BH contendo petrleo.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

centrao de biomassa maior que 5g/


l foi encontrado na literatura apenas
quando glicerol foi adicionado aps a
fase exponencial de crescimento durante fermentao com P. aeruginosa
em meio contendo glicose como fonte de carbono (Rahman et al., 2002).
A produo de biossurfactante raminolipdico foi no associada ao crescimento, tendo em vista que sua concentrao mxima foi obtida durante a
fase estacionria de crescimento, tpico
de um metablito secundrio. Outros
autores tambm observaram produo
de raminolipdeos na fase estacionria
(Ron e Rosemberg, 2002; Santa Anna et
al., 2002; Rahman et al., 2002).
Experimentos para a
Degradao de Petrleo
As 13 linhagens caracterizadas
como produtoras de biossurfactantes raminolipdico foram utilizadas
nos ensaios de degradao de petrleo. O petrleo foi totalmente ou
parcialmente degradado como podem ser observados na Figura 6 e na
Tabela 4, pelo desaparecimento e
emulsificao do leo.
Para confirmar se durante a degradao do petrleo ocorreu a produo do biossurfactante raminolipdico foi determinada a concentrao de raminose. De acordo com os
resultados apresentados na Figura
7, as bactrias produziram biossurfactante raminolipdico. Nestes resultados v-se o potencial destas
linhagens em produzir biossurfactantes raminolipdico, utilizando petrleo bruto como fonte de carbono,
o que apresenta ser de grande importncia para a biorremediao de
reas contaminadas por derramamento de petrleo. Segundo Rahman
et al. (2003), bactrias Gram-negativas como Pseudomonas aeruginosa,
produzem raminolipdeo pela utilizando hidrocarbonetos.
A importncia de determinar a
concentrao de raminose consistiu
no fato de que a anlise visual apresentada na Tabela 4 no concorda
com os resultados apresentados na
Figura 7, para todas as bactrias
investigadas. A bactria P. aeruginosa
610-A5, por exemplo, apresentou resultado visual parcial e um dos maiores valores de concentrao de
raminose. Brown e Braddock (1990)
no determinaram a concentrao de

raminose, apresentando apenas o resultado visual.


Das 40 bactrias isoladas de diferentes poos de petrleo, 13, sendo 12
Gram-negativas e 1 Gram-positiva, foram caracterizadas como produtoras
de biossurfactantes raminolipdico tanto
utilizando glicerol, como petrleo bruto, como fonte de carbono.

Agradecimentos
Os autores agradecem ao CNPq
(Conselho Nacional de
Desenvolvimento e Pesquisa) pelo
apoio financeiro recebido.

4. Referncias
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Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

45

Pesquisa

Marcadores Microssatlites
em Espcies Vegetais
Desenvolvimento e caracterizao de marcadores microssatlites em espcies vegetais tropicais

Glaucia Salles Cortopassi Buso, Dra.

Pesquisadora do Laboratrio de Gentica Vegetal


da Embrapa Recursos Genticos e Biotecnologia,
Braslia-DF
buso@cenargen.embrapa.br

Ana Yamaguishi Ciampi, Dra.

Pesquisadora do Laboratrio de Gentica Vegetal


da Embrapa Recursos Genticos e Biotecnologia,
Braslia-DF
aciampi@cenargen.embrapa.br

Marcio de Carvalho Moretzsohn, M.Sc.

Pesquisador do Laboratrio de Gentica Vegetal


da Embrapa Recursos Genticos e Biotecnologia,
Braslia-DF
marciocm@cenargen.embrapa.br

Zilneide Pedrosa de Souza Amaral

Laboratrio de Gentica Vegetal da Embrapa


Recursos Genticos e Biotecnologia, Braslia-DF
zilneide@cenargen.embrapa.br

Rosana Vianello Brondani, Dra.

Pesquisadora da Embrapa Arroz e Feijo, Goinia-GO


rosanavc@cnpaf.embrapa.br
Ilustraes cedidas pelos autores

46

Introduo
Marcadores moleculares podem
ser derivados de qualquer tipo de
dado molecular que fornea um polimorfismo detectvel entre os organismos a serem comparados. Os marcadores moleculares tm sido utilizados
em anlise gentica com as mais diversas finalidades, tais como identificao de clones, linhagens, hbridos,
cultivares, paternidade, estimativas de
diversidade, fluxo gnico, taxa de
cruzamento, parentesco e na construo de mapas genticos. Devido ao
desenvolvimento nos campos da biologia molecular e gentica, uma grande variedade de tcnicas para analisar
polimorfismos genticos tem sido
disponibilizada. Esses marcadores
podem diferir com respeito a caractersticas importantes como abundncia
genmica, nvel de polimorfismo detectado e informao gentica, especificidade dos locos, reprodutibilidade, requerimentos tcnicos e investimento financeiro.
Uma das tcnicas mais indicadas
para estudar polimorfismos entre seqncias de DNA SSR (Simple
Sequence Repeats) ou microssatlites (Litt e Luty, 1989; Weber e May,
1989). Essa tcnica baseia-se no uso
de pares de primers na reao de PCR
para detectar variaes em locos de
seqncias repetitivas. Estas so constitudas de 1 a 6 nucleotdeos que se
repetem lado a lado no genoma de
eucariotos. A tcnica de SSR revela
polimorfismo em um loco devido a
diferenas no nmero de vezes (n)
em que, por exemplo, um dinucleotdeo (AG)n se repete naquele loco.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

Essas variaes no nmero de repeties constituem-se, em ltima anlise, em variaes no comprimento


do segmento detectado pela reao
de polimerase em cadeia e na separao de fragmentos amplificados em
gel de eletroforese.
Os marcadores SSR caracterizam-se por serem codominantes, baseados em PCR, abundantes, aparentemente distribudos por todo o
genoma, multiallicos e dependentes de pequena quantidade de DNA
dos indivduos analisados. O contedo gentico informativo de um
loco SSR bastante alto, por se
tratarem de seqncias de alta taxa
evolutiva. Mesmo em comparaes
de germoplasma com estreita base
gentica, geralmente detecta-se um
alto nmero de alelos em um loco
SSR. A grande limitao do uso em
larga escala de marcadores SSR a
obteno dos primers que sero usados na PCR para amplificar alelos
em cada loco. Trata-se de uma tcnica de elevado custo e intensiva em
mo-de-obra, considerando-se todas
as etapas de seu desenvolvimento
(incluindo construo de biblioteca
genmica, seleo de clones positivos, desenho e teste de primers). Em
geral, somente cerca de 10% a 20 %
dos primers so informativos, o que
torna SSR uma tcnica de custo elevado e intensiva em trabalho. O uso
de bibliotecas enriquecidas e do
conceito de primers ancorados tem
facilitado o trabalho envolvido, e
reduzido o custo de obteno de
primers informativos em, pelo menos, 5 vezes (Scott Tingey, informao pessoal).

No entanto, uma vez obtidos os


primers informativos para uma espcie, os custos e a demanda de mo-deobra so reduzidos drasticamente, e os
ensaios laboratoriais so rpidos, aumentando a acessibilidade da tcnica.
SSR constitui uma ferramenta extremamente eficiente na identificao e na
diferenciao de indivduos. Os marcadores SSR apresentam diversas vantagens em relao aos RFLPs, entre
essas: so baseados em PCR, menos
laboriosos, de menor custo, no demandam o uso de radioatividade, alm
de serem geralmente mais polimrficos. SSRs podem ser trocados entre
laboratrios, uma vez que cada loco
definido pelas seqncias dos primers
que flanqueiam a regio repetitiva. Os
ensaios com SSRs so mais robustos do
que com RAPD e mais versteis do que
com AFLP. A natureza codominante
dos microssatlites uma vantagem
sobre os marcadores RAPD e AFLP
(dominantes), principalmente para
mapeamento gentico.
Powell et al (1996) examinaram a utilidade dos marcadores
RFLP, RAPD, AFLP e SSR para anlise de germoplasma de soja, avaliando o contedo de informao
(heterozigosidade esperada), o nmero de locos analisados simultaneamente por experimento (taxa
de multiplex) e a efetividade na
anlise de relao entre acessos. Os
marcadores SSR tiveram a maior
heterozigosidade esperada, enquanto os marcadores AFLP tiveram a
maior taxa de multiplex.
O Laboratrio de Gentica Vegetal da Embrapa Recursos Genticos e
Biotecnologia tem desenvolvido marcadores SSR para vrias espcies, atravs de um protocolo otimizado pela
Dupont (Rafalski et al., 1996), que
utiliza bibliotecas enriquecidas, e que
foi adaptado para nossas condies.
J foram desenvolvidos primers para
eucalipto (Brondani, et al., 1998),
pequi (Collevatti et al., 1999), palmito (Gaiotto, et al., 2000), mogno (Lemes, et al., 2002), arroz (Brondani, et
al., 2001), Magnaporthe grisea (Garrido, 2001), melo (Ritschel, et al.,
2002), amendoim, sumama, cedro,
pau-brasil, pupunha, cerejeira,
cumaru, parapar, tatajuba, andiroba,
anani e maaranduba (ainda no pu-

blicados). O objetivo do presente


trabalho foi desenvolver marcadores
microssatlites para 5 espcies de
plantas tropicais, a saber: pimento,
feijo, coco, copaba e jatob. Os
locos microssatlites identificados e
caracterizados serviro, entre outras
aplicaes, para: (a) analisar a diversidade de colees de germoplasma;
(b) identificar acessos duplicados;
(c) estudar a estrutura gentica de
populaes; (d) estudar paternidade;
(e) desenvolver mapas genticos; (f)
utilizar em experimentos de seleo
assistida por marcadores e analisar
pedigrees.

Material e Mtodos
Material experimental
O desenvolvimento de marcadores SSR requer uma quantidade
mnima de 50 g de DNA de boa
qualidade. Para a extrao de DNA
na grande maioria das espcies vegetais, tem sido utilizado o protocolo
com o detergente CTAB (cationic
hexadecyl trimethyl ammonium
bromide), como descrito por Ferreira
& Grattapaglia (1998). O DNA foi
extrado de folhas jovens de um acesso de cada uma das cinco espcies:
pimento (Capsicum annuum), feijo (Phaseolus vulgaris), coco (Cocos
nucifera), copaba (Copaifera
langsdorffii) e jatob (Hymenaea
courbaril).
Construo de biblioteca
genmica enriquecida para SSR
Na construo de biblioteca
genmica enriquecida para SSR, foi
utilizado o protocolo desenvolvido
por Rafalski et al. (1996), com algumas adaptaes. Foram testadas digestes do DNA genmico com trs
enzimas de restrio, MseI, Sau3AI e
Tsp509I para se obterem fragmentos
entre 300 e 800 pares de bases. Para
pimento, feijo e coco, o DNA
genmico foi digerido com Tsp509I,
para copaba e jatob, com Sau3AI e
os fragmentos de tamanho entre 300
e 800 bp foram recuperados em membrana de celulose (DEAE-celulose
NA-45), via eletroforese em gel de
agarose. Aproximadamente 30 g dos

fragmentos foram recuperados e ligados com T4 DNA ligase (a 12 oC,


durante a noite) a adaptadores que
continham o stio de restrio das
respectivas enzimas (Figura 1). Um
total de 200 pmol de oligonucleotdeos biotinilizados (TC)13 foi ligado a
1 mg de contas magnticas ligadas a
estreptavidina em 400 l de tampo
BW 2x (Tris HCl 10 mM pH 7,5, EDTA
1 mM, NaCl 2 mM) em temperatura
ambiente, sob agitao por uma hora.
O excesso de sonda foi removido por
lavagem com 400 l de BW 1x e 400
l de SSPE 5x contendo SDS a 0,1 %.
O DNA ligado foi ento hibridizado
ao complexo sonda-contas magnticas a 65 oC por 90 min, em um
volume total de 300 l (150 l de
SSPE 10x, SDS 0,2% e 150 l de DNA
mais adaptador). As contas magnticas foram repetidamente sedimentadas por aplicao de um campo magntico e lavadas duas vezes por 5 min
em SSPE 2x, SDS 0,1% a temperatura
ambiente, uma vez por 15 min em
SSPE 2x, SDS 0,1% a 65 oC. As contas
magnticas foram ento ressuspensas
em 200 l de H2O estril.
Seleo de clones positivos
O DNA ligado s contas magnticas foi amplificado com a utilizao de primers complementares s
seqncias dos adaptadores via PCR
e os produtos da amplificao foram
purificados utilizando-se o kit de
purificao de PCR Qia-quick
(QIAGEN). O DNA purificado foi
clonado em plasmdeo pGEMT. Clulas de E. coli (XL1-Blue) foram
transformadas por eletroporao ou
choque trmico, plaqueadas em meio
LB + ampicilina e crescidas durante
a noite a 37 oC. As placas foram
transferidas para membranas de
nitrocelulose e processadas por 5
min nas seguintes solues: desnaturante (NaOH 0,5 M e NaCl 1,5 M),
neutralizante (Tris-HCl 0,5 M e NaCl
1,5 M). Em seguida, o DNA foi fixado s membranas atravs de luz
ultra violeta e pr-hibridizadas (3h a
65 oC, em SSC 5x, N-laurylsarcosine
0,1%, SDS 0,02%, blocking 1%).
Sondas poli AG/CT marcadas com
digoxigenina foram ento desnaturadas e hibridizadas s membranas

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

47

por 12 horas. Aps lavagens de alta


estringncia (2 vezes por 5 min com
SSC 2x, SDS 0,1% em temperatura
ambiente; 2 vezes por 15 min com
SSC 0,1M, SDS 0,1% a 65 oC), as
membranas foram lavadas e preparadas para deteco quimioluminescente e, ento, expostas a filmes de
raio X. As placas que continham
clones positivos para SSRs foram
identificadas por autoradiografia. Os
clones positivos foram submetidos a
reaes de PCR-ancorado (Taylor et
al., 1992; Rafalski et al., 1996) para
verificao da presena, da orientao e do tamanho do inserto de SSR
(Figura 1).
Seqenciamento dos clones
positivos e desenho de primers
Os clones selecionados cresceram em meio Lb + ampicilina e tiveram
os respectivos DNAs isolados por lise
alcalina (Sambrook et al, 1989). Os
insertos foram ento amplificados via
PCR usando-se primers complementares s seqncias dos vetores. O produto da amplificao foi purificado e
foram executadas reaes de seqenciamento com kits de Dye-terminator
(Applied Biosystems/ABI). Foram,
ento, desenhados primers especficos
para cada regio flanqueadora das seqncias SSR utilizando-se para isso os
programas Primer (Lincoln et al., 1991)
e Primer 3 (Whitehead Institute of
Biomedical Research) (Figura 2). No
desenho dos primers, foram utilizados
os seguintes critrios: temperatura mdia de anelamento de 52 oC a 58 oC
(diferena mxima de 3 oC na temperatura de anelamento entre cada primer
do par) e contedo de GC entre 40% e
60% e ausncia de complementaridade
entre os pares de primers.
Otimizao dos primers
desenvolvidos
As PCRs para testes dos primers
sintetizados foram realizadas em
volumes totais de 13 ul, contendo:
0,3 uM de cada primer, 1 unidade
de Taq DNA polimerase, 0,2 mM de
cada dNTP, 10 mM Tris-HCl pH 8,3,
1,5 mM MgCl 2, DMSO 50% (1,3 ul)
e 7,5 ng do DNA. A reao de
amplificao seguiu os seguintes
48

Figura 1 . Etapas do desenvolvimento de primers microsatlites (Cortesia de Andr Bel)

passos: 94 oC por 5 min, seguido de


30 ciclos de 94 oC por 1 min, 54-62
o
C por 1 min, 72 oC por 1 min; e uma
extenso final a 72 oC por 7 minutos. A temperatura de anelamento
foi otimizada para cada par de
primers. Os fragmentos amplificados foram visualizados em gis de
agarose a 3,5% de concentrao,
corados com brometo de etdio (Figura 1).
Caracterizao dos locos
Aps a definio das temperaturas de anelamento, foram analisadas amostras de pimento, feijo e
coco em gel de poliacrilamida a 4%,
corado com nitrato de prata (Bassam
et al., 1991). Para copaba e jatob,
os primers foram marcados com
fluorescncia e as anlises realizadas em seqenciador automtico
(ABI 377). Os programas GeneScan
e Genotyper foram utilizados para
essas anlises. Para cada loco foram observados o nmero de alelos
(A) e a diversidade allica ou hete-

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

rozigosidade h = 1- pi2 (onde pi


a freqncia do isimo alelo). Os
tamanhos dos fragmentos foram estimados por comparao com padres obtidos com DNA ladder 10bp (Gibco BRL).

Resultados e Discusso
A eficincia do enriquecimento,
da seleo por hibridizao e da
seleo de clones que continham
seqncias hipervariveis por PCRancorado resultou na obteno de
um grande nmero de clones positivos a serem seqenciados, evidenciando-se a abundncia de elementos
repetitivos no genoma das espcies
analisadas (Tabela 2). As bibliotecas
enriquecidas foram hibridizadas com
a sonda AG/TC, para deteco de
microssatlites e foram selecionados
575 clones para pimento, 286 para
feijo, 115 para coco, 270 para copaba
e 235 para jatob. Aps seleo por
PCR-ancorado, 475 clones da biblioteca de pimento, 100 de feijo, 76 de
coco, 156 de copaba e 86 de jatob

mostraram-se adequados ao seqenciamento. Destes, 259 para pimento, 28 para feijo, 43 para coco, 156
para copaba e 86 para jatob mostraram-se adequados para o desenho de
primers (Tabela 1). Em vrios casos,
a limitada distncia entre a seqncia
flanqueadora e a regio SSR mostrouse insuficiente para o desenho dos
primers. A maioria dos SSRs detectados continha repeties AG e TC,
apesar de tambm terem sido detectados SSRs com repeties TA e CA.
Os microssatlites variaram em comprimento, alguns tendo 40 repeties
perfeitas. Microssatlites que contm
repeties AG/TC so comuns em
vrias espcies de plantas (Gupta &
Varshney, 2000), o que parece tambm ser o caso das espcies trabalhadas neste estudo.
Para a determinao da temperatura tima para cada par de primers,
foram utilizadas amostras das espcies em estudo. Inicialmente, todos
os primers foram testados com a
temperatura de anelamento a 56oC.
Essa temperatura foi ento aumentada ou diminuda de acordo com o
produto gerado na PCR. A no amplificao ou amplificao de bandas fracas indicou a necessidade de
reduzir a temperatura de anelamento
do primer. Por outro lado, a presena de vrias bandas indicou a amplificao de produtos inespecficos,
tornando necessrio o aumento da
temperatura de anelamento.

Figura 2. Seqenciamento. A determinao da seqncia foi realizada a partir de fita


simples usando o kit dye-terminator em ABI Prism 377. Esta seqncia apresenta um
SSR, com repetio (AAC)17 ao lado de uma repetio (AGC)8.

Para pimento, at o momento,


118 tiveram as condies de PCR
otimizadas e geraram produtos com
boa resoluo. Para feijo foram
otimizados 25, para coco, 16, para
copaba, 36 e para jatob, 26 pares de
primers.
Aps otimizao, para cada loco
foi determinado o nmero de alelos
(A) e a diversidade allica (D) ou
heterozigosidade (h). Essas estimativas foram calculadas utilizando-

se 48 indivduos de pimento, 85 de
feijo e 96 de coco, jatob e copaba
(Tabela 2).
Para pimento, at o momento,
foram caracterizados 51 locos, sendo 3 monomrficos e 48 polimrficos. A diversidade allica foi de 0,3
a 0,83 e o nmero de alelos variou
entre 2 e 11, com uma mdia de,
aproximadamente, 6 alelos por loco.
Cerca de 48 % dos locos possuem 6
ou mais alelos, o que os torna pro-

Tabela 1 - Nmeros de clones hibridizados com a sonda AG/TC, clones positivos (com SSRs), clones
seqnciados e de primers desenhados para cada uma das 5 espcies.
Clones
Clones
Primers
Espcie
Clones positivos
hibridizados
seqenciados
desenhados
Capsicum an n uum
575
475
259
118
Phaseolus vulgaris
286
100
28
25
Cocos n ucifera
115
76
43
16
Copaifera lon gsdorffii
270
156
156
45
Hymen aea courbaril
235
86
86
51

Tab ela 2. N mero d e ind ivd u o s analisad o s po r espcie (n), n mero d e primers po lim rfico s, n mero s
mximo s, mnimo s e md io s d e alelo s amplificad o s po r lo co (A) e d e d iversid ad e allica (h).
E spcie
Capscicu m annu u m
Phaseolu s vu lgaris

n
48
85

P rimers
48
11

A
2 - 11 (5,60)
3 - 10 (7,01)

Cocos nu cifera

96

10

2 - 14 (8,25)

Copaifera longsdor ffii


Hymenaea cou rbaril

96
96

8
8

19 - 27 (24,52)
8 - 13 (9,25)

a
b

h
0,30 - 0,83 (0,60)
0,21 - 0,83 (0,63)
0,47 - 0,87 (0,68)a
0,00 - 0,77 (0,37)b
0,81 - 0,91 (0,88)
0,72 - 0,82 (0,76)

Valores obtidos para os ectipos gigantes (algamos).


Valores obtidos para os ectipos anes (autgamos).
Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

49

missores para estudos de caracterizao de germoplasma e mapeamento gentico.


Para feijo, 25 locos foram caracterizados e 8 mostraram-se monomrficos. Os outros 17 locos foram caracterizados e amplificaram
de 3 a 10 alelos por loco. A diversidade allica variou de 0,21 a 0,83,
com mdia de 0,63. Esses resultados so um bom indicativo do alto
nvel de polimorfismo dos locos
SSR para essa espcie autgama e
do potencial desses marcadores para
estudos genticos de espcies cultivadas e silvestres de Phaseolus.
Para coco, dos 16 primers
SSR testados, 3 mostraram-se monomrficos e 3 no apresentaram
resolues de bandas satisfatrias.
Para os demais 10 primers, foram
detectados de 2 a 14 alelos por
loco, com uma mdia de 8,25. A
heterozigosidade variou de 0,47 a
0,86, com uma mdia de 0,68, entre
os ectipos de gigante (algamos),
enquanto a diversidade gnica (h)
variou de 0,00 a 0,77, com uma
mdia de 0,37 entre os ectipos de
anes (autgamos).
Para jatob, foram escolhidos
os 8 primers mais polimrficos para
caracterizao dos locos SSRs. Foi
detectada uma mdia de 9,25 alelos
por loco e uma heterozigosidade
mdia de 0,76.
Para copaba, utilizando-se os 8
primers mais polimrficos com tima resoluo, foram observados de
19 a 27 alelos por loco e heterozigosidade mdia de 0,88 (espcie preferencialmente algama). Esses marcadores permitiram a anlise detalhada de parentesco, cuja magnitude da probabilidade de identidade
combinada foi de 1,1 x 1015 e o
poder de excluso combinado de
99,9999%, evidenciando que esses
marcadores permitem estimar relaes precisas de parentesco em populaes naturais de copaba.
Esses microssatlites, desenvolvidos para as espcies tropicais estudadas, so de extrema importncia
na obteno de informaes genticas para dar suporte aos programas
de melhoramento gentico, coleta,
conservao e manejo de recursos
genticos vegetais.
50

Agradecimentos
Este trabalho teve o apoio
financeiro do PRODETAB,
Programa Avana Brasil (MAPA) e
PROBIO (MMA)

Referncias Bibliogrficas
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Pesquisa

Biovidros
Sinterizao de biovidros na forma de partculas e do tipo espuma

Elias da Costa

Centro Interdisciplinar de Pesquisa e


Ps-Graduao CIPP-UEPG

Lexandra Novaki

Departamento de Qumica DEQUIM-UEPG

Hui I Tsai

Centro Interdisciplinar de Pesquisa e


Ps-Graduao CIPP-UEPG

Lara Tschopoko Pedroso Pereira

Depto. de Engenharia de Alimentos, DEA-UEPG

Andr Vitor Chaves de Andrade


Depto. de Fsica DEFIS-UEPG

Carlos de Oliveira Paiva Santos


Instituto de Qumica de Araraquara
UNESP , Fsico-Qumica

Christiane Philippini Ferreira Borges


Depto. de Qumica DEQUIM-UEPG

Mariza Boscacci Marques

Depto. de Qumica DEQUIM-UEPG

Aridne Cristiane Cabral da Cruz

Centro Interdisciplinar de Pesquisa e PsGraduao CIPP-UEPG

Fbio Andr dos Santos

Centro Interdisciplinar de Pesquisa e


Ps-Graduao CIPP-UEPG

Jos Caetano Zurita da Silva

Departamento de Qumica DEQUIM-UEPG


jzurita@uepg.br
Ilustraes cedidas pelos autores

Resumo

Introduo

Vitrocermicas do sistema
Na 2O - CaO - P 2 O 5 - SiO 2 tm bom
desempenho e biocompatibilidade como material de implantes.
Preparou-se um biovidro com composio 12% Na 2 O - 28% CaO 10% P 2O 5 - 50% SiO 2 a partir de
xidos puros via fuso, obtendose material no-cristalino com caractersticas fsicas e qumicas adequadas. Amostras de biovidro foram preparadas na forma de vidro-espuma (Foam-Glass) combinando a matriz vtrea com o
aditivo de B 4C. Essas amostras
sinterizadas no intervalo de temperaturas de 600 e 840C apresentaram baixa densidade e indicaram evoluo na fase cristalina
com presena de SiO 2, Ca 2P 2O 7,
Na 2Ca 3 Si 6 O 16 , CaSiO 3 e uma quantidade de material no cristalino.
Ensaios in-vitro em meio de SBF
foram realizados com blocos de
biovidro puro e levados a estufa a
37C. Posteriormente ao ensaio,
observou-se por microscopia eletrnica de varredura (MEV) pequenos cristais na superfcie dos
blocos e dos ps, indicando homogeneidade na superfcie da
amostra. A anlise de MEV do
Foam-Glass em SBF tambm
apresentou camada de cristais na
sua superfcie indicando que o
material tem caracterstica de bioatividade.

Dentre os diversos biomateriais


desenvolvidos, atualmente, existem
os biovidros sintetizados para ter
comportamento fisiolgico especfico como material constituinte de
aparelhos protticos ou como material de preenchimento para reparao de defeitos sseos.
Diversas composies de biovidros foram preparadas por
Hench e colaboradores (1,2) base
de SiO 2 - Na 2O - CaO - P 2 O 5 , em
diferentes composies, e so conhecidas por serem particulados
altamente bioativos, e tm sido
usados em clnicas como preenchedor sseo de cavidades e como
substituto de massa ssea perdida
em determinados traumas. Esses
biovidros so indutores de formao de trabculas, no osso em
algumas regies, num perodo de
2 a 7 dias, e de partes de osso que
so formados num maior perodo
de tempo (3). Entretanto, anlises
qualitativa e quantitativa de ensaios in-vivo na gerao de ossos
so importantes para se estabelecer a propriedade aloplstica do
material de implante (4). Os biovidros base de 45% SiO 2 -24,5%
Na 2O -24,5% CaO - 6% P 2 O 5 apresentam bioatividade quando inseridos em meio aquoso, nos ensaios in-vitro em fluido de corpo
simulado. Esses biovidros perdem
ons sdio para o meio e formam

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

51

um filme superficial rico em SiO 2,


o que provoca a formao de uma
camada de gel de fosfato de clcio, inicialmente amorfo e que
gradualmente evolui para uma camada policristalina de aglomerados de apatita, os quais podem ser
incorporados a compostos orgnicos, por exemplo, no colgeno.
Essa camada formada importante para que o processo de dissoluo do vidro se estabilize, e possibilite que processos fsico-qumicos ocorram e formem ligaes
qumicas entre a superfcie vtrea
e o tecido sseo recm-formado
na regio de interveno cirrgica (5). O fenmeno de osteognese
direcionada por partculas de biovidros ativos com uma larga distribuio granulomtrica tem sido
explicado por Scheppers et al (6). A
troca inica interfacial entre as
partculas de biovidros e os fluidos dos tecidos vizinhos resultam
na formao de uma slica gel, a
qual coberta rapidamente por
uma camada rica em clcio-fsforo (7).
Recentemente, a cadeia de
silicatos minerais como wollastonita
(CaSiO3) (8), e diopsida (CaMgSi2O6)
(9)
, tm sido preparados sinteticamente para uso como materiais
cermicos bioativos. Inicialmente,
a superfcie cermica reage com o
fluido fisiolgico das vizinhanas,
portanto, a natureza do slido formado na superfcie determinada
pela qumica da cermica e os constituintes do fluido de corpo simulado (10). Um novo processo de preparao in-situ de cermicas bioativas
porosas com porosidade interconectada em cermicas densas foi
desenvolvido usando uma solidificao lenta da composio euttica
do sistema CaSiO 3-Ca 3(PO4)2 que
so as chamadas cermicas bioeutticas, e possuem a habilidade de
reestruturar sua morfologia quando
imersos em meio de fluido de corpo
simulado(11). O trabalho em estudo
tem aplicao na rea de implantes
dentais, onde biovidros e cermicas do sistema Na 2O-CaO-SiO2-P2O5
52

apresentam uma boa bioatividade e


uma biocompatibilidade para uso
como material de preenchimento
sseo. O objetivo foi a preparao
de um biovidro do tipo vidro-espuma, com a caracterstica de
osteoconduo no interior dos poros do biovidro possibilitando, portanto, um crescimento sseo e levando a uma melhor fixao do
material na matriz ssea.

Materiais e Mtodos
Preparao do p do biovidro
e moagem
Preparou-se uma mistura de
p, com composio 12% Na 2O,
28% CaO, 10% P2O 5 e 50% SiO 2 em
peso, partiu-se de reagentes puros
e anidros: Na 2CO3, CaO, Na 2HPO 4,
SiO 2. Colocou-se o p dentro de
um cadinho de platina e levou-se
para fuso em um forno eltrico a
1450C por um perodo de 4 horas.
Retirou-se rapidamente o fundido
do forno e colocou-se dentro de
um recipiente contendo gua destilada, assim formaram-se grnulos de vidro no cristalino. Em
seguida os grnulos foram triturados em um jarro de polietileno
contendo cilindros de zircnia durante 6 horas.
Caracterizao dos ps puros e
sinterizados
Os ps de biovidros foram caracterizados por fluorescncia de
raios X (FRX), difratometria de raios X (DRX), picnmetro de hlio,
anlise termogravimtrica (TG/
DTA) e microscopia eletrnica de
varredura (MEV-EDX).
Preparao do vidro-espuma
(Foam-Glass)
A matriz vtrea foi misturada com
diferentes percentagens de aditivo
de B4C, em moinhos de bolas de
zircnia por 6 horas, e em seguida o
material foi peneirado e caracterizado fsica e quimicamente.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

Compactao e sinterizao
A sinterizao de amostras de
biovidro (BV) puro e biovidro +
carbeto de boro (B 4C) foi realizada
em forno eltrico, no intervalo de
600 oC a 840C por 2 horas para
cada amostra.
Preparao de Soluo de
Fluido de Corpo Simulado
(SBF)
A preparao de soluo fisiolgica bioativa foi realizada contendo os seguintes componentes:
0,2 g KCl, 8,0 g NaCl, 0,2 g CaCl2.2
H2O, 0,05 g NaH2PO4, 1,0 g NaHCO3,
0,1 g MgCl2.6H2O e 1,0 g de glicose
para 1000 mL de gua.
Ensaios in-vitro em meio de
SBF
Os blocos ou ps sinterizados
foram limpos e desengordurados
em ultra-som e lavados com gua
deionizada, secos em estufa a 120oC,
e tratados em autoclave. Os experimentos foram realizados em tubos
de polipropileno de 15 mL cuidadosamente limpos, com tampa de rosca contendo 10 mL de soluo e
mantidos a uma temperatura constante de 37 oC em estufa eltrica. A
superfcie das amostras foi analisada em um microscpio eletrnico
de varredura aps os perodos de 3
e 10 semanas de imerso no SBF.

Resultados e Discusso
A caracterizao qumica por
fluorescncia de raios X mostra a
composio de: 26,1%CaO, 55,5%
SiO2, 13,1%Na 2O, 10,1%P2O5, indicando que as partculas de biovidro
em estudo esto situadas na faixa
de bioatividade, segundo o diagrama de fases(5).
Inicialmente o biovidro puro
foi caracterizado por uma anlise
termogravimtrica (TG/DTA) e
pode-se observar que temperatura
de transio vtrea assim como as
temperaturas de nucleao e de

Figura 3 - MEV de uma amostra de


Biovidro + 3 % de B4C.

Figura 1 - Difratograma de raios X de amostras de biovidro (BV) do tipo


espuma, sinterizados a 750C: A - BV + 7% de B4C; B - BV + 5% de B4C;
C - BV + 3% de B4C.

Figura 2 EDX obtido de uma amostra de biovidro + 3 % de B4C.

cristalizao apresentam-se na faixa de 680-800C, a partir destes


dados pode-se arbitrar uma temperatura para a sinterizao dos biovidros tipo espuma em 750C. Porm,
em anlises realizadas em biovidros com outros tipos de aditivos
verifica-se outras temperaturas de
nucleao e de cristalizao. Portanto, a temperatura de sinterizao
para a obteno do biovidro tipo
espuma depende da natureza do
aditivo a ser misturado.
As amostras sinterizadas foram
caracterizadas por DRX, os resultados obtidos so apresentados na
Figura 1. A anlise de DRX

(SHIMADZU-XRD-6000) indica pouca evoluo de fases cristalinas, ou


seja apresenta uma extensa faixa
de material no-cristalino, isto
devido ao curto perodo de
sinterizao. Os picos mostram fases cristalinas bem distintas e ntidas de slica em sua forma de
Cristobalita (SiO2), fosfato de clcio
(Ca2P2O7), silicato de clcio (CaSiO3)
e devitrita ( Na 2 Ca 3 Si 6 O 16 ). O
difratograma mostra tambm picos
de boro em sua fase nica, indicando que nem todo boro reagiu com
a massa do biovidro, porm a intensidade desse pico aumenta em
amostras com maior teor de B4C.

Figura 4 - MEV de uma amostra de


Biovidro + 5 % de B4C.

Figura 5 - MEV de uma amostra de


Biovidro + 7 % de B4C.

A composio elementar dos


biovidros sinterizados foi analisada
atravs de MEV-EDX como pode ser
observado na Figura 2. Verifica-se
que o biovidro no apresenta impurezas, sendo visualizados somente
os elementos formadores da composio do material em estudo. Nesta
mesma anlise o elemento Boro no
pode ser identificado, pois o aparelho utilizado no possui detector
especfico para esse elemento.
As micrografias obtidas por
microscopia eletrnica de varredura
(MEV) mostram as microestruturas
porosas das amostras. Esses poros
podem ser observados nas figuras 3,

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

53

4 e 5, e so interconectados e de
vrios tamanhos. Esse fato no descarta a hiptese destes biovidros possurem poros fechados em sua estrutura. O mecanismo de formao de
poros na estrutura do biovidro pode
ser explicado pela evoluo de gases, os quais levam formao de
bolhas deixando o material poroso.
Como encontrado na literatura, algumas solues aquosas de carbonatos
de metais polivalentes so utilizados
para a produo destes materiais
porosos devido sua fcil descarbonizao(4), esse um dos motivos do
estudo do aditivo carbeto de boro no
biovidro. Outro mecanismo que pode
tambm ser responsvel pela diminuio da densidade do biovidro, a
entrada do elemento boro nas redes
cristalinas de silicatos e fosfatos fazendo com que essas estruturas se
deformem ocasionando aumento do
volume no material.
Outra caracterstica que pode
ser analisada nas micrografias destas amostras a alta densificao
observada nas regies em volta dos
poros que, provavelmente, so devidas a regies onde houve uma
maior reao qumica com o boro, e
o gs que se difundiu provocou um
maior empacotamento da matriz vtrea e ao mesmo tempo expandindo
com a formao de microporos.
Ensaios in-vitro de amostras
sinterizadas indicam que o biovidro
puro e biovidro contendo carbeto de
boro apresentam uma camada superficial pouco cristalina, na forma
de fosfato de clcio, a qual com o
passar do tempo (envelhecimento)
se tornam cristalinas. Anlise por
MEV-EDX da pelcula indica a presena de clcio e fsforo na superfcie e verifica-se que est fortemente
aderido em sua superficie.
Os biovidros produzidos foram
tambm caracterizados quanto sua
densidade aparente usando picnmetro de hlio, considerando-se
somente o volume do slido e dos
poros abertos, desconsiderando o
volume relativo aos poros fechados.
Os dados obtidos esto relacionados na tabela a seguir, Tabela 1:
54

Tabela 1 - Valores de densidade aparente das amostras de biovidro


obtidas em picnmetro de hlio.
Amostra
Densidade(g/cm3)
Biovidro+ 7% carbeto de boro
1,43
Biovidro+ 5% carbeto de boro
1,38
Biovidro +3% carbeto de boro
1,26
Biovidro puro
3,16

Os dados da Tabela 1 so muito significativos, pois os valores de


densidade mdia obtidos variam
em funo da percentagem de
carbeto de boro, indicando uma
menor densidade para amostra com
3% de carbeto de boro.

Concluso
Aps a anlise dos resultados
obtidos, conclui-se que o biovidro
produzido do tipo espuma apresentou pouca evoluo de fases e podese constatar que a mistura de
aditivos ao biovidro provoca a formao de poros de tamanhos variados e interconectados. Portanto, o
objetivo de se obter um biovidro
tipo espuma foi alcanado obtendo
estrutura microporosa pouco densa. Ensaios in-vitro das amostras
mostram que ocorre formao de
uma pelcula base de fosfato de
clcio na sua superfcie indicando
que o material bioativo.

Agradecimentos
Ao CNPq-PIBIC, Fundao
Araucria e IQAr-UNESP.
Palavras-chave: Biovidros,
vidro-espuma, bioatividade

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Pesquisa

Melhoramento Biotecnolgico
de Plantas Medicinais
Produo de alcalides e leos essenciais

Introduo

Cludio Lcio Fernandes Amaral

Doutor em Gentica e Melhoramento pela


Universidade Federal de Viosa.
Professor do Departamento de Cincias Biolgicas
da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.
Lder do Grupo de Pesquisa Biotecnologia, Gentica
Vegetal e Melhoramento de Plantas. Membro do
Instituto Baiano de Biotecnologia. Coordenador de
Pesquisa da Universidade Estadual do Sudoeste da
Bahia. Coordenador da rea de Gentica da
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.
geneticamaralclfuesb@bol.com.br

Anderson Brito da Silva

Especialista em Gentica pela Universidade Estadual


do Sudoeste da Bahia. Professor do Departamento
de Cincias Biolgicas da Universidade Estadual do
Sudoeste da Bahia. Membro do Grupo de Pesquisa
Biotecnologia, Gentica Vegetal e Melhoramento de
Plantas, Membro da rea de Gentica da
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
anderbs@uol.com.br
Ilustraes cedidas pelos autores

A converso das plantas e de


suas partes, cujo valor medicinal tenha sido confirmado pelas pesquisas, em frmacos para a populao
esbarra na dificuldade de se obter
matria-prima na quantidade e qualidade necessria para suprir a demanda requerida pelo mercado nacional
e internacional. Porm, no se cogita
fazer uma incurso na j to devastada natureza, pois, alm dos danos
ecolgicos que essas coletas poderiam provocar, sem deixar de mencionar que diversas plantas j se extinguiram e que vrias outras se encontram ameaadas de extino, o controle qualitativo e quantitativo dos
seus princpios ativos, seria muito
difcil, uma vez que existem variaes nos tipos e nos teores de substncias ativas, devido interao do
gentipo com o meio ambiente. Deste modo, recomenda-se o cultivo de
plantas medicinais.
Para se ter uma produo
confivel de drogas teraputicas como
uma espcie recentemente adaptada
s prticas de cultivo, faz-se necessrio acompanhar esse cultivo; sendo
que, se se tratar de plantas anuais, o
tempo para o seu cultivo leva de 3 a
5 anos, enquanto que se tratar de
plantas perenes, de 10 a 12 anos. Em
geral, dos princpios ativos aos medicamentos so gastos cerca de 10 a 15
anos, com o custo entre 100 a 500
milhes de dlares na elucidao
qumica, testes pr-clnicos e clnicos. Reconhecendo-se que uma planta
produza 10g de massa seca e que
nessas 10g se obtenha 0,3g da droga

isolada e que sejam necessrios, para


atender ao mercado, 30kg dessa substncia, ento ser preciso 100.000
plantas s nesse primeiro momento,
o que se torna extremamente
dispendioso. Uma possvel soluo
para esse problema o fitomelhoramento, que pode ser clssico ou
moderno.
O melhoramento gentico de
plantas medicinais, apesar de estar
em sua fase embrionria, tem conseguido avanos; principalmente no
que refere-se s plantas produtoras
de alcalides e leos essenciais. Esses compostos so amplamente distribudos no reino vegetal. As famlias Apocynaceae, Euphorbiaceae e
Solanaceae destacam-se como produtoras de alcalides; j as famlias
Compositae, Lamiaceae e Umbelliferae apresentam-se como produtoras
de leos.

Melhoramento Gentico
Clssico e Moderno
Os trabalhos que envolvem seleo de gentipos superiores, com
subsequentes cruzamentos, com vistas
a obter hbridos ou cultivares, so
incipientes. Com relao a composio e contedo de molculas teraputicas, encontraram-se altas herdabilidades para essas substncias, o que
facilita o melhoramento por seleo.
Por esse meio, tm, freqentemente,
sido desenvolvidas e produzidas em
larga escala cultivares de Achillea,
Chamomilla, Lavandula, Melissa,
Mentha e Thymus. Com vistas produo qualitativa e quantitativa de princpios ativos tem-se conseguido xito

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

55

com a seleo de clones superiores


(ex.: Artemisia annua - Artemisia) ou
com a introduo de novos acessos
(ex.: Chamomilla recutita - Camomila),
seguidos de seleo e hibridao (ex.:
Catharanthus roseus x Catharanthus
trichophyllus). Entretanto, com relao
a diversificao estrutural e funcional
dos fitofrmacos, pode ser que os
hbridos apresentem caractersticas inditas s dos parentais (ex.: Mentha
aquatica x Mentha longifolia).
A biotecnologia compe-se basicamente das seguintes tecnologias:
biologia molecular, engenharia gentica, transformao gentica e cultura de tecidos. A biologia molecular
permite identificar, isolar e caracterizar o gene de interesse. A engenharia
gentica possibilita clivar, por meio
de enzimas de restrio, seqncias
nucleotdicas especficas de cidos
nuclicos pela gerao de extremidades aderentes de fitas simples da
molcula de DNA de uma espcie
que se associam a fragmentos de
DNA de outra espcie clivados por
essas mesmas enzimas. O gene selecionado inserido enzimaticamente
em um plasmdeo em particular de
uma bactria especfica e, subseqentemente, introduzido por transformao gentica em uma clula vegetal. Entretanto, torna-se necessrio
regenerar a planta a partir da clula
que foi geneticamente modificada, o
que pode ser feito por cultura de
tecidos. Assim, espera-se que o gene
para o carter almejado seja passado,
atravs da reproduo sexuada e
assexuada, dos parentais transformados para as prognies que expressaro tambm esse gene, significando
que tal habilidade constitui valiosa
contribuio para a obteno rpida,
segura e eficiente de frmacos.

Cultura de Tecidos e
Transformao Gentica
Cultura de tecidos um processo, por meio do qual fragmentos
vegetais ou suas partes denominadas
explantes so isolados dos organismos ou obtidos a partir destes, sendo
assepticamente cultivados em meio
de cultura apropriado sob condies
adequadas. Esse termo genrico,
referindo-se a cultura de clulas, te56

cidos, rgos, embries e plntulas.


Essas tcnicas consistem em selecionar explantes, desinfest-los e cultivlos em meio nutritivo mantido sob
condies asspticas, sendo a multiplicao dos propgulos feita atravs
de sucessivos subcultivos em meio
prprio. Os brotos desenvolvidos em
um meio so transferidos a outro
meio para formao das razes, obtendo-se, assim, plantas inteiras. Essas so cultivadas no laboratrio em
substrato de aclimatao e, conseqentemente, levadas casa de vegetao antes de serem transferidas
para o campo definitivamente.
Entre as principais funes da
tcnica de cultura de tecidos cabe dar
nfase produo de (a) clones (ex.:
Aloe vera - Babosa), ou seja, material
homogneo e uniforme, em larga escala, de rpida propagao, livre de
patgenos, vigoroso e produtivo; (b)
hbridos, por hibridao somtica, atravs de fuso de protoplastos (ex.:
Nicotiana tabacum - Tabaco); (c)
haplides (ex.: Hyosciamus niger Meimendro negro); (d) mutantes portadores de caracteres desejveis, por
meio do uso de agentes mutagnicos
ou por variao somaclonal (ex.:
Datura innoxia - Datura); (e) plantasbiorreatoras (ex.: Atropa belladonna Beladona); (f) plantas geradoras de
vacinas (ex.: Solanum tuberosum Batata); bem como (g) conservao
de germoplasma vegetal por criopreservao ou por manuteno do material vegetal, durante perodos prolongados, sob condies limitantes de
crescimento e desenvolvimento (ex.:
Hyosciamus muticulus - Hiosciamus)
e, finalmente, (h) biotransformao
de compostos pouco interessantes em
compostos muito interessantes sob o
aspecto econmico [ex.: Digitalis
lanata (Digitalis) e Digitalis purpurea
(Dedaleira)].
A cultura de tecidos permite interferir nas rotas metablicas vegetais
mediante o cultivo de plantas em meio
preparado com agentes estressantes,
elicitores e mutagnicos, que afetam
qualitativa e quantitativamente os princpios ativos produzidos, e altera a
composio e/ou o teor, como foi
observado em Atropa belladonna
(Beladona), Catharanthus roseus (Vinca) e Digitalis lanata (Digitalis) ou

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

Quadro 1 - Subs tncias de rivadas


de cultura de c lulas ve ge tais
Produtos Indus triais
leos
Perfumes
Aromatizantes
Pigmentos
Antioxidantes
Frmacos
Gomas
Inseticidas
Vitaminas
Font e: Amaral (1999)
Quadro 2 - Compos tos frmacoativos produzidos normalme nte
pe las plantas
Subs tncias
Alcalides

Famlias
Apocinaceae,
Solanaceae

Flavonides

Rutaceae

Glicosdeos
Cardiotnicos

Scrophulariaceae

Taninos

Lauraceae

Terpenides

Asteraceae,
Lamiaceae

Font e: Amaral (1999)


Quadro 3 - Compos tos frmacoativos no produzidos
normalme nte pe las plantas
Subs tncias
Voafrina
Picracina
Rutacultina
Tarenosdeo
Epicrosina

Es p cie s
Catharanthus
roseus
Picralimia nitida
Ruta graveolens
Gardenia
jasminoides
Ochrosia eliptica

Font e: Amaral (1999)

Rosmarinus officinalis (Alecrim), Ruta


graveolens (Arruda).
A cultura de clulas vegetais constitui uma fonte potencial de sntese de
molculas altamente valiosas s indstrias de alimentos, comsticos,
frmacos e txteis, as quais tm utilizado as plantas como matria-prima
bsica para seus produtos (Quadro 1).
Em cultura de clulas, podem-se
produzir metablitos especiais com
propriedades teraputicas (Quadro 2).
Alm disso, verificou-se que substncias que no so, usualmente, encontradas em plantas foram identifi-

cadas, isoladas e caracterizadas nesse


tipo de cultura in vitro. Soma-se a isso
o fato de que foram obtidos, em
cultura de clulas, compostos inteiramente novos (Quadro 3).
Alm de sintetizarem e acumularem metablitos secundrios de
significncia comercial, as clulas vegetais podem ser usadas devido a
apresentarem capacidade de realizar
certas alteraes estruturais nesses compostos. A biotransformao envolve
processos bioqumicos de epoxidao,
esterificao, glicosilao, hidroxilao,
isomerizao, oxidao, reduo,
saponificao, etc (Quadro 4).
Em geral, a produtividade de
compostos fitoteraputicos menor
em cultura de clulas se comparada a
de tecidos sintetizadores nas plantas,
o que provavelmente pode ser explicado pela perda da diferenciao de
tecidos e de rgos das culturas de
suspenso de clulas e de calos em
meio lquido. Acredita-se que isso
seja devido distribuio insuficiente de enzimas necessrias para a
sntese e ao acmulo de metablitos
secundrios ou, simplesmente, seria
reflexo do estado de no totipotncia
das clulas desenvolvidas em tais
culturas. Desse modo, os calos em
fase de diferenciao de razes de
Atropa belladonna so capazes de
produzir atropina, enquanto os calos
no diferenciados no produzem. Por
outro lado, plantas inteiras de Coptis
japonica produzem 5% de berberina
em 5 ou 6 anos de cultivo, enquanto
suspenso celular de linhagens noselecionadas e selecionadas produzem, respectivamente, 5% e 13% dessa substncia em apenas 3 semanas,
o que reflete em produo rpida e
econmica. Esse um entre vrios
outros exemplos (Quadro 5).
A cultura de clulas mostra-se
bastante promissora para a produo
de princpios ativos, apresentando,
porm, alguns inconvenientes que
limitam seu uso, pois h compostos
frmaco-ativos que s so produzidos em plantas intactas ou em tecidos e rgos, mas no em clulas
isoladas. Tem-se, como exemplo,
vimblastina e vincristina, obtidos de
Catharanthus roseus. Nesse caso,
pode-se induzir, a partir das clulas
em cultura, a organognese ou a

Quadro 4 - Cultura de c lulas de plantas come rcialme nte vive is pe la


biotrans formao
Es p cie s
Cannabis sat iv a
Dat ura spp.
Digit alis spp.
Digit alis spp.
Ment ha spp.
Rut a grav eolens

Re ae s
Oxidao
Esterificao
Hidroxilao
Glicosilao
Reduo
Epoxidao

Subs tratos
Geraniol
Tropina
Digitoxina
Gitoxigenina
Mentona
Hidroxicumarinas

Produtos
Nerol
Acetiltropina
Digoxina
Gitoxina
Neomentona
Furanocumarinas

Font e: Amaral (1999)

embriognese somtica de forma que


a capacidade biosinttica do vegetal
seja restaurada.
A produo em larga escala de
metablitos secundrios em cultura de
clulas depende de algumas estratgias que tenham chance de se viabilizarem
economicamente, e, entre elas, esto:
Melhorar a estabilidade e a
viabilidade da linhagem celular, selecionando plantas com
alta produtividade;
Selecionar meio de cultura
mais adequado para o mximo
crescimento;
Minimizar a contaminao
microbial;
Identificar rotas bioqumicas
que levem as clulas da planta
produo dos metablitos desejveis;
Estabelecer mtodos para aumentar a produo de metablitos
secundrios;
Determinar meios para aumentar a excreo de metablitos
secundrios;
Estudar os mecanismos
regulatrios associados;
Obteno de produtos das
clulas em suspenso, via
excreo natural ou induzida;

Otimizao da produo mdia;


Obteno de extratos das clulas organizadas quando elas
mesmas forem utilizadas.
Diante do exposto, sugere-se um
esquema bsico que permita produzir
princpios ativos por meio de cultura
de clulas, para contornar alguns problemas peculiares a esse sistema de
produo, o qual, em suma, segue os
seguintes passos: seleo do material
vegetal, introduo in vitro de plantas altamente produtivas, induo de
calos com separao de linhas celulares estveis, otimizao das condies
de cultivo, re-seleo de linhas celulares superiores, cultura em massa em
biorreatores, isolamento e purificao
dos metablitos desejveis e, finalmente, comercializao (Figura 1).
A produo de metablitos especiais com propriedades fitoterpicas
em cultura de clulas diferenciadas
(tecidos e rgos) mais previsvel do
que em clulas indiferenciadas (clulas em suspenso e calos). A diferenciao associa-se, usualmente, a uma
melhor produo qualitativa e quantitativa. O teor e a composio de
fitofrmacos em rgos, tais como
razes, so comparveis queles das
plantas intactas. Generalizando-se, tem-

Quadro 5 - Comparao da produo de compostos bioativos in vivo e in vitro


Esp cie s
Substncias Produo in vivo (%) Produo in vitro (%)
Talictrum minus
Berberina
0,80
1,00
Galium aparine Antraquinona
0,43
20,00
Morinda citrifolia Antraquinona
2,50
8,00
cido
Coleus blumei
3,60
5,00
Rosmarnico
Lithospermum
Xiconina
2,75
14,00
erythrorhizon
Rauwolfia
Vomileina
0,06
51,00
serpentina
Font e: Amaral (1999)
Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

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se que razes no transformadas apresentam crescimento lento, desenvolvimento retardado e menor produtividade de fitoterpicos, ao passo que razes
transformadas possuem crescimento
rpido, desenvolvimento acelerado e
maior produtividade de fitoterpicos
(Quadro 6). As razes no-transgnicas, ao contrrio das transgnicas, necessitam ser cultivadas em meio preparado com substncias reguladoras de
crescimento. Cabe enfatizar que o uso
de razes, transformadas ou no,
limitado queles biofrmacos sintetizados somente em razes. Entretanto,
plantas inteiras podem ser regeneradas a partir dessas razes.
A tecnologia transgnica oferece
enormes oportunidades para o melhoramento de plantas. Para manipular o metabolismo produtor de princpios ativos nas plantas, tm sido feitos
muitos esforos. No fcil controlar
a produo dessas substncias, at
mesmo por meio de mtodos moleculares sofisticados; devido a esses compostos serem sintetizados em diversos passos enzimticos que ocorrem
em vrios tipos celulares.
A manipulao desse metabolismo pode-se dar por estmulo
anablico por meio da incluso de
rotas metablicas feita pela tecnologia super-expressora, ou por
desestmulo catablico por meio da
excluso de vias feita pela tecnologia
supressora-senso ou supressora antisenso. Um dos pr-requisitos para o
sucesso da manipulao gentica
identificar, isolar e caracterizar os
genes envolvidos na biossntese de
princpios ativos e o outro pr-requisito compreender os mecanismos
de regulao espao-temporal desses genes em fases distintas de crescimento e desenvolvimento vegetal.
Concomitantemente, faz-se necessrio desenvolver protocolo de regenerao e de transformao. Embora,
isso nem sempre seja possvel, algum progresso tem sido, recentemente, alcanado. Esse avano envolve duas categorias: cultura de rgos transformados e plantas transgnicas.
Em cultura de clulas, suspenses celulares podem passar por crescimento em larga escala em biorreatores, usando-se, para tal fim, linhas
58

celulares superiores,
isto , estveis e com
alta produo em detrimento de linhas celulares inferiores, ou
seja, instveis e com
baixa produo. Esse
tipo de cultura pode
ser manipulado suplementando-se o
seu meio com elicitores, tais como: preparaes fngicas; o que
exemplificado por
Tagetes patula, cuja
cultura de clulas produziu, ao ser submetida a extratos de
Phytophthora sp., nveis significativos de
polienos. Contudo,
em cultura de clulas, instabilidade e
baixa produtividade regra e estabilidade e alta produtividade exceo. Alm disto, verificou-se, nesse
tipo de cultura, compostos que no
so, usualmente, encontrados em
plantas, como os tarenosdeos em
Gardenia jasminoides.
H substncias teraputicas que
no so produzidas em cultura de
clulas, mas s em rgos e em
cultura destes, ou em plantas inteiras, a exemplo dos alcalides
vimblastina e vincristina, encontrados em Catharanthus roseus.
A cultura de rgos no transformados apresenta produo estvel e
mdia, com crescimento lento, menor
ramificao lateral e meio acrescido
com reguladores de crescimento; ao
passo que a cultura de rgos transformados possui produo estvel e alta,
com crescimento rpido, maior ramificao lateral e meio no acrescido com
reguladores de crescimento.

Brotos tumorados como os de


Mentha citrata so menos usados que
as razes em cabeleira como as de
Scopolia japonica, pois mais fcil
estabelecer razes do que brotos em
cultura em meio lquido. A cultura de
rgos no manipulada como a
cultura de clulas, ao se alterarem as
condies do meio. Entretanto, a adio de chitosan elevou a produo de
hiosciamina em Hyosciamus multicus.
Cabe enfatizar que, em se tratando de viabilidade comercial da
produo de princpios ativos, devese considerar no apenas a produtividade, mas tambm a liberao dos
princpios ativos no meio de cultivo,
no sentido de se colherem os compostos fitoterpicos sem danificar ou
destruir o material biolgico que os
produz. Em Duboisia leichhardtii,
75% de escopolamina liberado no
meio em 4 semanas. Todavia, h
produtos, como os fitocomplexos,

Quadro 6 - Produo e xce de nte de me tablitos s e cundrios e m cultura de


raze s trans formadas comparada com a de raze s no-trans formadas
Es p cie s
At ropa belladonna
Dat ura st ramonium
Scopalia j aponica
Font e: Amaral (1999)

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

M e tablitos
Escopolamina
Hiosciamina
Escopolamina
Hiosciamina
Escopolamina
Hiosciamina

Conte do
0,37%
0,95%
0,56%
0,30%
0,50%
1,30%

que no so obtidos em rgos, porm s em plantas intactas.


Estudos que envolvam plantas
transgnicas regeneradas a partir de
rgos transformados so escassos.
Em plantas medicinais transformadas
por Agrobacterium spp. tem-se, preferencialmente, usado a Agrobacterium
rhizogenes para transformar aquelas
cujos princpios ativos se encontram
em suas partes subterrneas, como a
hiosciamina nas razes de Ajuga reptans
e a Agrobacterium tumefaciens para
transformar aquelas cujos princpios
ativos se encontram em suas partes
areas, como a artemisinina nas folhas
de Artemisia annua. Entretanto, essa
condio no constitui uma regra, o
que significa que esses sistemas podem ser usados independentemente
do local de sntese dos compostos
farmacoativos nos vegetais, o que tem
sido verificado em Catharanthus
roseus. No que tange aos princpios
ativos, a transformao pode levar
produo acentuada ou atenuada.
Em plantas medicinais, h exemplos de ganhos obtidos pela
tecnologia transgnica, quais sejam:
no que se refere a plantas produtoras
de alcalides, tem-se em Atropa
belladonna a converso de hiosciamina, pela enzima hiosciamina 6
hidroxilase, cujo gene oriundo de
Hyosciamus niger, em escopolamina.
J no tocante s plantas produtoras
de isoprenides, tem-se em Mentha
spicata a converso de limoneno,
pela enzima limoneno 3 hidroxilase,
cujo gene oriundo de Mentha
piperita, em Mentol.
H, tambm, exemplos de perdas
obtidas pela tecnologia transgnica, as
quais se tem, no que diz respeito s
plantas produtoras de isoprenides, a
reduo dos teores de glicirrizina, tanto em Glycyrrhiza glabra quanto em
Glycyrrhiza uralensis.
Atualmente, vem-se tentando
transformar outros caracteres de plantas medicinais que no a produtividade, como o caso da resistncia.
Transferiu-se para Atropa belladonna
o gene bar, que codifica para enzima
fosfinotricina acetil transferase, a qual
confere resistncia ao herbicida
fosfinotricina. O problema que, ao
invs de uma correlao positiva, obteve-se uma correlao negativa entre a

produtividade e a resistncia; resultando em plantas resistentes com menos


princpios ativos e em plantas susceptveis, com mais princpios ativos.

Concluses
As possibilidades de obterem-se
novas molculas teraputicas destinadas produo de frmacos tornam a
biotecnologia imprescindvel ao desenvolvimento tcnico-cientfico dos
programas de melhoramento gentico
do pas, e tem como conseqncia a
melhoria na qualidade de vida, principalmente na rea da sade da populao brasileira. Portanto, diversos avanos foram alcanados e vrios desafios
tm sido subjulgados; mas, decerto, h
ainda bastante para se fazer em se
tratando de biotecnologia no melhoramento de medicinais.

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Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

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Pesquisa

Degradao Seletiva
de Protenas e suas
Implicaes no Cncer
Papel do sistema ubiquitina-proteasoma e enzimas caspases

Humberto Miguel Garay

Aluno de Doutorado do Programa de Farmacologia


do Instituto de Cincias Biomdicas - USP

Juliano Alves

Aluno de Doutorado do Programa de Farmacologia


do Instituto de Cincias Biomdicas - USP

Joo Marcelo Ochiucci

Aluno de Iniciao Cientfica do Depto. de


Farmacologia do Instituto de Cincias Biomdicas - USP

Jos Ernesto Belizrio

Professor Assistente do Depto. de Farmacologia


do Instituto de Cincias Biomdicas - USP
jebeliza@usp.br
Ilustraes cedidas pelos autores

60

As protenas so responsveis
pela forma e pela funo das clulas.
Elas so sintetizadas e destrudas por
mecanismos distintos em resposta a
uma diversidade de sinais externos e
internos, que incluem a secreo de
hormnios e a restrio alimentar. A
degradao de protenas determina o
incio ou o trmino de eventos bioqumicos que controlam a proliferao, a diferenciao e a morte celular
por apoptose. Por esse motivo, o
aumento de suscetibilidade ou de
resistncia degradao pode levar
ao ganho ou perda de atividade
biolgica de protenas, influenciando diretamente nos processos que
elas esto envolvidas. Os cientistas j
identificaram dezenas de protenas
que se tornaram oncognicas (isto :
provocaram a transformao celular)
aps sofrerem modificaes em seqncias, domnios e regies que
controlam a sua estabilidade ou destruio. Elucidar os mecanismos
moleculares pelos quais as protenas
aumentam sua suscetibilidade ou sua
resistncia degradao o grande
desafio da biologia contempornea
ps-genoma. As pesquisas nessa rea
tm por objetivo no apenas entender como as protenas so destrudas,
mas quando falhas nesse processo
do origem a clulas imortais, isto ,
ao cncer. Neste artigo sero revisados, primeiramente, os recentes avanos na elucidao das bases bioqumicas e genticas que so envolvidas
na transformao de uma clula normal em clula tumoral. Em seguida,
sero revisadas as recentes descobertas sobre os mecanismos bioqumicos de reconhecimento e de degradao de protenas intracelulares
pela via ubiquitina-proteasoma e a

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

importncia dos aminocidos prolina,


cido glutmico, serina e treonina
(regio PEST) como sinais para degradao rpida de certas protenas.
Finalmente, ser discutida a utilizao de bancos de dados de genoma
humano e de proteoma - em construo, e como os programas de computador para armazenamento, manipulao e minerao de seqncia de
genes provenientes de amostras de
tecido tumoral, podero ajudar os
cientistas, principalmente os bioinformatas, na descoberta de novos
oncogenes e mtodos de preveno
e tratamento do cncer.

1. Biologia da Clula
Tumoral
Nas ltimas dcadas, com a introduo de novas tecnologias de
seqenciamento do DNA, expresso
e anlise computacional de genes, foi
possvel que se vislumbrassem vrias
pistas que podero levar a um melhor entendimento da biologia da
clula tumoral. O cncer considerado uma doena gentica - isto , ele
pode ser transmitido para uma clula
normal atravs da transferncia de
genes tumorais ou oncogenes (Hahn
& Weinberg, 2002). Oncogenes so
cpias de genes normais que sofreram mutaes, e dessa forma, quando transcritos, provocam a sntese de
protenas que apresentam perda ou
ganho de funo biolgica. Mutaes
so causadas por modificaes nas
bases de DNA, em particular, nas
posies O6 e N7 da guanina. A
carcinognese um processo que
pode ser dividido em trs fases: iniciao, promoo e progresso, e pode
durar de 1 a 30 anos. Durante esse

tempo, ocorre um acmulo de mutaes no genoma celular, em especial,


em genes que garantem a ordem dos
eventos do ciclo celular e a mitose,
ou executam reparo de eventuais
erros na replicao do DNA, ou ainda, que promovem e mantm o estado de diferenciao celular (Hanaham
& Weinberg, 2000, Hahn & Weinberg,
2002).
Na maioria dos casos, os
oncogenes capazes de induzir a transformao celular funcionam aos pares, e seus produtos so fatores de
crescimento, receptores da membrana plasmtica, fatores de transcrio e enzimas quinases de vias de
sinalizao intracelular implicadas
no controle positivo ou negativo do
ciclo celular (Hanaham & Weinberg,
2000, Evan & Vousden, 2001). Em
geral, as mutaes encontradas em
oncogenes alteram os nucleotdeos,
os quais codificam os aminocidos
de importncia crtica para sua ativao ou o arranjo tridimensional
da sua estrutura molecular. A deformao de elementos estruturais impede que a protena estabelea
interaes protena-protena e protena-DNA e, conseqentemente,
exera adequadamente a sua funo
biolgica. Por exemplo, formas
mutantes da protena RAS permanecem constantemente ativadas devido substituio de um aminocido
indispensvel na interao RAS-GAP.
GAP uma protena que estimula a
hidrlise de GTP, uma molcula que
ativa RAS. A estimulao contnua
da cascata de enzimas serinatreonina-quinases: Raf-MEK-ERKMAPK, induzida pela forma mutante
de RAS, faz com que os eventos
bioqumicos de controle positivo do
ciclo celular tornem-se constantes e
a proliferao celular ininterrupta
(Hahn & Weinberg, 2002).
Por outro lado, as delees de
xons em genes, ou ainda, o seu
silenciamento (metilao das bases
nitrogenadas), so ocorrncias comuns em genes que codificam os
fatores supressores de tumor que
atuam no controle negativo do ciclo
celular. Nesse caso, a desregulao
de crescimento e diviso celular
acontece porque a clula deixa de
checar os erros e as falhas que provocariam bloqueio no ciclo celular,
reparo no DNA e induo de morte

celular por apoptose. O exemplo


mais estudado o gene que codifica
o fator supressor de tumores chamado p53, cuja funo principal a
transcrio de genes de reparo e da
apoptose (Hanahan & Weinberg,
2000, Evan & Vousden, 2001).
Recentemente houve uma exploso de trabalhos que mostraram
vias alternativas de estimulao da
proliferao celular e induo de cncer. Os novos oncogenes identificados tm papel no reparo do DNA,
apoptose, reconhecimento clula-clula, mecanismo de adeso clulamatriz extracelular, angiognese,
metstase e degradao de protenas. O que chamou maior ateno
dos investigadores foi a descoberta
que para a tranformao de clulas
humanas necessrio ativao de
telomerase, o que causa a sua
imortalilzao, e a inativao das vias
do p53 e RB (Hahn & Weinberg,
2002).

2. O Ciclo Celular
O crescimento e a diviso celular de clulas somticas dependem
de uma srie complexa de reaes
bioqumicas que ocorrem em um
perodo de 24 a 48 horas, denominado ciclo celular. O ciclo celular compreende os processos de duplicao
do DNA e diviso nuclear (mitose), e
dele resulta a produo de uma nova
clula. Para iniciar um ciclo, a clula
em repouso (fase Go) precisa ser
estimulada por fatores de crescimento (exemplos, PDGF, EGF, insulina),
hormnios esterides e citocinas produzidas por elas mesmas ou clulas
ao seu redor. Esses fatores ligam-se
aos seus receptores de membrana,
deflagrando uma srie de reaes
qumicas que causam, em ltima instncia, a ativao de fatores de transcrio (exemplos: c-myc, c-jun, cfos), os quais promovem a sntese de
RNA, mensageiros de dezenas de
enzimas que promovem a sntese do
cido deoxiribonuclico (DNA), tais
como diidrofolato redutase, DNA
polimerases e topoisomerases. Essa
cascata de eventos qumicos e morfolgicos ocorre de uma maneira ordenada e sucessiva, fazendo com que a
clula avance da fase Go para as
fases G1-S-G2 e para a mitose
(Malumbres & Barbacid, 2001).

A execuo das reaes e dos


eventos de cada fase do ciclo celular
mediada por dezenas de fatores,
cuja sntese e destruio ocorrem em
momentos determinados. Os principais so os seguintes: ciclinas A, B e
D, enzimas quinases dependentes de
ciclinas: CDK-1, 2, 4 e 6, fosfatases:
cdc-25 A, B e C, protenas inibidoras
de CDKs: p21, p27, p57, p16, p18, e
fatores de transcrio: c-myc, E2F, Rb
e p53. Os complexos formados por
CDK/ciclina/inibidor de CDK so inativos e a sua ativao requer eliminao, por degradao, do inibidor de
CDK associado a ele (por exemplo:
p21, p27), um evento que ocorre
durante as transies de fases. A
ativao dos complexos CDK-4/
ciclina D, CDK-4/ciclina-6, CDK-2/
ciclina A, CDK-2/ciclina E aumenta a
atividade quinase dessas enzimas e
provoca a fosforilao progressiva de
RB. Isto causa a dissociao do complexo E2F/RB, permitindo que E2F
inicie a transcrio de genes da fase
S. Mais tarde, a ativao do complexo
CDK-1/ciclina B promove a fosforilao de vrias protenas nucleares, a
condensao dos cromossomas, a
formao do fuso e o incio da mitose.
A atividade enzimtica do complexo
cessa aps a degradao da ciclina B,
e esse evento marca o fim do ciclo
celular (Malumbres & Barbacid, 2001).
(Figura 1)
As reaes e eventos do ciclo
celular so interrompidos em momentos especficos nas transies das
fases Go/G1 (ponto de restrio R1),
fases G1/S e G2/mitose. Durante esses perodos crticos denominados
pontos de checagem, a clula decide se inicia o ciclo (ponto de restrio R1) ou se avana para a fase
seguinte, continuando o processo de
proliferao, ou se sai do ciclo, iniciando o processo de diferenciao
celular, se estiver passando pela
mitose, ou ainda, entra em apoptose.
Esse mecanismo de checagem
dependente de reaes em cascatas
mediada por enzimas quinases e
fosfatases. Os exemplos mais estudados de vias de checagem e de reparo
so: a via ATM, a via Chk1/Chk2 e a
via cdc-25/14-3-3. Em resposta
ativao de uma dessas vias, so
sintetizadas as enzimas que fazem
reparo, recombinao, juno ou permutao de nucleotdeos e que esto

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Figura 1 - Esquema representativo mostrando as interaes entre as protenas das vias


de sinalizao de controle positivo e negativo do ciclo celular. Notar no esquema que
durante as transies (pontos de checagem) das fases Go, G1, S, G2 e Mitose, a ativao
destas protenas reguladoras dependente da fosforilao/defosforilao mediada por
enzimas quinases e fosfatases, enquanto a inativao mediada pelo sistema
proteasoma que degradada seletivamente protenas marcadas com ubiquitina.

envolvidas nos processos de reconhecimento e de correo de erros e


falhas no DNA em sntese. So exemplos importantes a GADD45, poli(ADP-ribose) polimerase (PARP),
MSH2 e MLH1. Na maioria das vezes,
a ativao das vias de checagem
iniciada pelo fator supressor de tumores p53, que atua na transcrio
de dezenas de genes, inclundo o
gene da protena p21. A p21 bloqueia
o ciclo celular e inibe a atividade de
enzimas CDKs, que so responsveis
pelo controle positivo do ciclo celular. O bloqueio do ciclo celular
transiente e precisamente regulado
(Malumbres & Barbacid, 2001,
Hoeijmakers, 2001, Hahn & Weinberg,
2002).
Estudos recentes mostraram que
a degradao de vrias protenas reguladoras do ciclo celular, em especial as protenas p21, p27, ciclinas A
e B, Rb, E2F, MDM2 e p53, mediada
pelo sistema ubiquitina-proteasoma,
caso a deciso seja a proliferao
celular; e pela famlia caspase de
62

enzimas proteases, caso a deciso


seja a apoptose. Como era lgico
pressupor, esse mecanismo de
regulao mostrou tambm que pode
ser alterado em clulas neoplsicas
para impedir a deflagrao dos sinais
que ativam a apoptose. Vrios exemplos sero apresentados nesse texto
em favor dessa hiptese.

3. A morte celular por


apoptose
A morte celular programada ou
apoptose um processo fisiolgico
de morte celular pelos quais as clulas que perderam suas funes ou
apresentam defeitos so eliminadas
do organismo. Durante a embriognese, a morte por apoptose de clulas embrionrias precursoras essencial para o acabamento final de
rgos e membros. Alm disso, a
apoptose atua na seleo e depleo
de clones de clulas do sistema
imunolgico e de clulas em excesso, deixando em perfeito equilbrio

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as populaes de clulas dos tecidos


durante a vida adulta dos mamferos
(Earnshaw et al., 1999). Desta forma,
esto implicadas em muitas doenas
aberraes genticas que alteram o
processo da apoptose, incluindo-se
a o cncer, as doenas auto-imunes,
doenas cardiovasculares e neurodegenerativas.
Vrios oncogenes que causam,
em clulas malignas, desregulao
no seu ciclo celular atuam ora estimulando, ora inibindo a apoptose,
dependendo do estgio de desenvolvimento do tumor (Evan & Vousden,
2001). Mutaes oncognicas, que
levam ao aumento da expresso dos
genes c-myc, E2F, E1A (protena viral)
e Ras, ou perda da expresso do
gene Rb, desencadeiam a apoptose.
Mas esse fenmeno no aparente
em populaes de clulas malignas
porque elas contm mutaes que
inativam os oncogenes p53 e MDM2,
ou mutaes que aumentem a expresso de genes Bcl-2, ou ainda,
mutaes que acarretem a produo
excessiva dos fatores de crescimento: IGF-1, PDGF, NGF e IL-3. A ligao desses fatores de crescimento
aos seus receptores provoca a ativao da cascata de enzimas, quinases,
entre elas, a fosfoinositol-3-quinase
(IP3), Ras, Raf e a protena serinatreonina quinase B/Akt, como tambm a do fator de transcrio NF-kB.
Esses fatores atuam em reaes ou
vias de sobrevivncia e resistncia
apoptose (Evan & Vousden, 2001).
Em vrios estudos ficou evidenciado que as clulas, quando enfrentam situaes fisiolgicas e patolgicas adversas, tais como, infeco por
microorganismos, estresse oxidativo
e outras formas moderadas de injria, somente permanecem vivas se os
efeitos pr-apoptticos gerados nessas situaes forem contrabalanceados pelos efeitos anti-apoptticos,
mediados pelas vias de sobrevivncia. Esse mecanismo de sinalizao
dual exerce um papel chave no controle da proliferao e morte celular
(Evan & Littlewood, 1998). Assim,
para o processo de proliferao ter
sucesso, preciso que a clula ative
as duas vias de sinalizao: a de
sobrevivncia, que atua suprimindo
a maquinaria da apoptose, e a de
proliferao, que desencadeia o crescimento celular. Esta intercomunica-

o entre ciclo celular e a apoptose


sem dvida o fator determinante nas
variaes de sensibilidade apoptose entre as clulas tumorais. Este
suposto sistema regulador tem servido como base estrutural para unir a
gentica e a terapia do cncer.
A apoptose caracterizada por
eventos morfolgicos e bioqumicos
que ocorrem de uma forma ordenada
na clula em degenerao. Esses eventos so regulados por genes preservados em vrios organismos, includas leveduras, parasitas, plantas e
insetos. Mais de 200 genes j foram
identificados e classificados com base
em domnios especficos, como exemplos: DED, DD e CARD (Aravind &
Koonin, 2001). Essas seqncias conservadas de aminocidos esto relacionadas com a funo especfica
que a protena exerce no processo,
como, por exemplo: ligante, receptor, adaptador, inibidor, protease,
quinase, etc. Os estudos de cristalografia, ressonncia magntica nuclear e difrao de raios X tm mostrado
em detalhe como os complexos padres de interao entre essas protenas, atravs de seus diferentes domnios, atuam nas vias de sinalizao
positiva e negativa da apoptose (Fesik,
2000).
A apoptose desencadeada por
duas vias principais. Na primeira via,
o sinal vem do lado externo e por isso
denominada via extrnseca. Na segunda, o sinal vem de dentro da
clula, e por isso denominada via
intrnseca. A via extrnseca iniciada
atravs da ativao de receptores de
membrana, denominados receptores
de morte celular. A via intrnseca
iniciada pela liberao de fatores
mitocondriais. Em ambos os casos, o
resultado imediato a ativao de
enzimas proteases da famlia caspase
(Figura 2).
As caspases so expressas na
forma de pr-enzimas (ou zimgeno)
e podem ter uma massa molecular
entre 30-60 kDa. A clivagem desse
precursor ocorre pela ao de uma
caspase iniciadora, que cliva a protena em duas regies especficas, para
gerar uma subunidade grande de 20
kDa (cadeia externa) e uma pequena de 10 kDa (cadeia interna). A
forma ativa da enzima possui duas
subunidades grandes e duas pequenas, i.e., um tetrmero 1122, en-

Figura 2 - Esquema representativo das vias de sinalizao da apoptose e a ativao em


cascata das caspases iniciadoras (2, 8, 9, 10) e efetoras (3, 6, 7) que causam a degradao
de protenas intracelulares. A via extrnseca de ativao da apoptose ocorre com a
interao de citocinas aos seus receptores de membrana e conseqente ativao da
caspase-8, 2 ou 10. Na via intrnseca, os eventos qumicos e fsicos mediados pela
protenas da famlia BCL-2/BAX provoca a liberao do citocromo c, que provoca a
ativao da caspase-9. Na quadra da direita so apresentados os smbolos que
representam os principais domnios ou motifs das protenas envolvidas na apoptose.

tre as quais formam-se os dois stios


ativos da enzima (Earnshaw et al.,
1999).
As caspases foram divididas em
trs grupos com base na funo que
elas exercem no processo. No grupo
I, esto includas as caspases prinflamatrias: caspases -1, -4, -5 e 13, envolvidas no processamento e
na gerao das citocinas IL-1 e IL-18.
No grupo II, as caspases iniciadoras:
-2, -8, -9 e -10, atuam na iniciao da
cascata de ativao das caspases executoras -3, -6 e -7. Essas caspases
fazem parte do grupo III e so responsveis pela clivagem de dezenas
de protenas vitais ao metabolismo e
estrutura da clula (Earnshaw et al.,
1999).
As caspases tambm foram classificadas em relao especificidade

na clivagem de peptdeos sintticos


em testes in vitro (Thornberry et al.,
1997, Garcia-Calvo et al., 1998). Segundo esses estudos, o grupo I
formado pelas caspases -1, -4 e -5,
que so as enzimas que tm preferncia pela seqncia WEHD. O
peptdeo DExD reconhecido pelas
caspases -3, -7 e -2, os principais
membros do grupo II. O grupo III
formado pelas caspases -6, -8 e -9,
enzimas que clivam preferencialmente peptdeos que contenham a seqncia (LV)ExD. Hoje sabemos que
seqncias adjacentes ao stio de
caspases, tanto direita como esquerda, tambm influenciam na
clivagem do substrato, como ser
discutido abaixo.
A ativao das caspases iniciadoras -8, -2 e -10 inicia-se com a

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ligao das citocinas da famlia TNF,


Fas ou TRAIL aos seus receptores de
membrana, identificados pelas siglas: TNFR1, Fas, DR-3, DR-4 ou DR5 (Ashkenazi & Dixit, 1998). Esses
receptores contm, em sua estrutura
polipeptdica, o domnio DD (death
domain), que permite sua associao s protenas adaptoras FADD e
TRADD, que tambm possuem domnio DD. Esse complexo, por sua
vez, interage com a pr-caspase-8
atravs do domnio DED (death
effector domain), para juntos formarem um complexo supramolecular
denominado apoptosoma. Dentro
desta estrutura multimrica, ocorre
a aproximao e a oligomerizao
de molculas de pr-caspase-8, as
quais promovem sua clivagem e ativao. Uma vez ativa, a caspase-8
inicia a cascata de ativao das prcaspases executoras; caspases -3, -6
e -7.
A ativao de caspases pela via
intrnseca requer a liberao do
citocromo c armazenado nas mitocndrias (Adams & Cory, 2001). A
sada de citocromo c dependente
de uma srie de eventos eltricos e
qumicos, sendo os mais estudados:
a queda do potencial de transio de
permeabilidade inica, abertura de
megaporos e a ruptura pontual de
uma regio da membrana externa.
Esses eventos so modulados pela
interao de protenas inibidoras de
apoptose da famlia Bcl-2 (principais
membros: Bcl-2-W, Bcl-xl, MCL-1) e
por protenas indutoras de apoptose
da famlia Bax (principais membros:
Bad, Bid e Bak), capazes de interagir
com elementos estruturais da membrana externa das mitocndrias,
como, por exemplo, as porinas que
so poros de transio de permeabilidade para vrias molculas, includas a H20 e Ca2+. Essa classificao
em indutoras ou supressoras tem
como base a presena do domnio
BH, que dividido em BH-1, -2, -3 e
-4. Esses domnios provocam a homodimerizao de molculas similares e a formao de poros que
permeiam a passagem do citocromo
c da mitocndria para o citosol. Por
outro lado, a formao de heterodmeros do tipo Bcl-2/Bax evita a formao dessa estrutura e, conseqentemente, a morte celular (Adams &
Cory, 2001).
64

No citoplasma, as molculas de
citocromo c interagem, via domnio
CARD, com os complexos formados
pela pr-caspase-9 e Apaf-1
(apoptotic protease activating factor1). A unio dessas protenas forma
um apoptosoma de aproximadamente
700 kDa, permitindo a aproximao
e a oligomerizao de molculas de
pr-caspase-9 e sua auto-clivagem e
ativao. A caspase-9 livre pode
recrutar e ativar as caspases
executoras -3, -6 e -7 e as caspases
iniciadoras -8,-2 e -10.
Encontradas nos diversos compartimentos celulares, as caspases
executoras podem atuar sobre as protenas estruturais, protenas de sinalizao, fatores de transcrio e vrias enzimas envolvidas na sntese e
reparo do RNA e DNA. Na tabela I,
esto apresentadas algumas das dezenas de protenas-substrato de
caspases. Segundo uma reviso recente, o nmero de protenas
substratos de caspases de aproximadamente 280 protenas (Fischer et
al., 2003). A funo e os efeitos
causados clula aps a clivagem
foram tambm sumarizados no artigo. Em vrios casos, a clivagem resulta na inativao das protenas, mas
h tambm outros casos em que a
protena clivada ativada. Um exemplo em que a clivagem resulta na
ativao o da ativao da prpria
caspase. Um outro exemplo o da
protena ICAD/DFF45 (Enari et al.,
1998), um inibidor da nuclease CAD
(caspase activated deoxyribonuclease), a enzima responsvel pela fragmentao do DNA durante a apoptose. Em clulas no apoptticas, CAD
est presente como um complexo
inativo com ICAD (inhibitor of caspase
activated deoxyribonuclease). Aps
a induo da apoptose, ICAD
inativada pelas caspases -3 e -7, deixando CAD livre para funcionar como
uma nuclease.
As caspases clivam vrias protenas envolvidas na regulao do
citoesqueleto, incluindo gelsolina,
fodrina, Gas-2, protena quinase de
adeso focal (FAK), protena quinase
p21, isoformas da protena quinase C
e MEKK-1. A destruio da rede de
microtbulos provoca o arredondamento e o deslocamento da clula do
tecido. Vrias alteraes tpicas na
morfologia do ncleo apopttico so

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dependentes da ao da caspase-6, a
caspase que degrada as lminas A, B
e C do envoltrio nuclear. O rompimento dessa estrutura parece facilitar
o acesso e degradao das fitas de
DNA na regio internucleosomal pela
nuclease CAD.
A clivagem de substratos de
caspases ocorre de uma maneira tempo- dependente e pode anteceder ou
proceder morte por apoptose. Contudo, ainda no se sabe ao certo se a
clivagem de uma protena-chave poderia servir de catalisador do processo, i.e., o processo no se desencadearia sem a sua degradao. Vrias
linhas de evidncias mostraram que
a apoptose de clulas que encontraram defeitos ou erros na replicao
do DNA durante a proliferao
dependente da degradao da Rb,
fatores inibidores de CDK, p21 e p27
e da protena MDM2, um inibidor da
atividade de p53 (Levkau et al., 1998,
Belizrio et al., 1991, Belizrio et al.,
1999, Hiesh et al., 1999). Este postulado foi confirmado em alguns estudos com mutantes das protenas
MDM2 e Rb, nos quais os aminocidos DEVD - o stio preferencial de
clivagem pela caspase-3 - foram substitudos por aminocidos neutros.
Como era esperado, na ausncia de
degradao dessas protenas, as clulas resistiram apoptose induzida
por vrios agentes fisiolgicos e farmacolgicos (Tan et al., 1997, Fattman
et al., 2001). No h, entretanto,
evidncias de que uma presso seletiva na populao de clulas malignas de um tecido tumoral produza
clulas cujas protenas apresentem
mutaes em stios de clivagem de
enzimas caspases como um fenmeno geral de resistncia apoptose.

4. O sistema ubiquitinaproteasoma
O sistema ubiquitina-proteasoma responsvel pela degradao
de protenas intracelulares, cuja organizao gentica e funcional est
preservada em certas bactrias, leveduras e organismos multicelulares. Na clula, a protelise essencial no apenas para a eliminao
seletiva de protenas defeituosas,
como tambm de protenas que atuam como reguladores de processos
bioqumicos, tais como a prolifera-

o, diferenciao, biognese de
organelas, resposta imunolgica e
inflamatria (Ciechanover, 1998,
Weissman, 1997, Goldberg et al.,
2001). Doenas genticas, neurodegenerativas e tumores malignos so
induzidos quando certos componentes desse sistema de degradao
esto ausentes ou desregulados
(Ciechanover, 1998).
Diferentemente do processo de
degradao mediado por proteases
presentes nos lisossomas, a degradao de protenas por esse sistema
requer a energia de ATP e envolve
dois passos distintos e sucessivos.
No primeiro passo, uma protena
chamada ubiquitina, de peso molecular de 8.5 kDa, covalentemente
adicionada protena-alvo. No segundo, a protena-alvo degradada
aps ser desenovelada e fragmentada ao atravessar uma estrutura em
forma cilndrica oca denominada
proteasoma (Figura 3).
O proteasoma constitudo de
uma parte central que contm 4
unidades que formam um anel, sendo que cada anel formado por 7
cadeias e 7 cadeias distintas.
Essa estrutura pode ser representada pela frmula 17171717. O
coeficiente de sedimentao do
proteasoma igual a 20S. As subunidades possuem atividade proteoltica e, dessa forma, atuam diretamente na degradao de protenas.
Essas proteases tm especificidade
distintas; a primeira possui atividade similar tripsina, a segunda similar quimiotripsina e a terceira,
similar glutamil peptidil hidrolases.
Durante a resposta imunolgica, o
sistema ubiquitina-proteasoma ativado pelo interferon-. Essa citocina
induz a sntese de trs subunidade
, LMP2, LMP7 and MECL-1, que
favorecem a gerao de peptdeos
da classe I do sistema histocompatibilidade humana (MHS).
Nas extremidades inferior e superior dessa estrutura de 20S, esto
acopladas duas estruturas reguladoras de massa molecular igual a 19S.
Essas unidades contm enzimas
ATPases, que promovem o desnovelamento das protenas que sofreram
a degradao. A unio dessas trs
estruturas 19S-20S-19S d origem a
um complexo supramolecular de coeficiente de sedimentao 26S e,

aproximadamente, 1500-2000 kDa


(Weissman, 1997, Ciechanover,
1998).
A conjugao da ubiquitina ao
substrato feita em um mecanismo
de trs etapas e requer a participao de trs classes de enzimas denominadas E1, E2 e E3. Primeiro, a
molcula de glicina da poro Cterminal da ubiquitina forma uma
ligao tio-ster com o resduo de
cistena da enzima ativadora de ubiquitina E1. Essa reao requer a
hidrlise de ATP. At o momento,
apenas uma enzima E1 de 117 kDa
foi identificada no genoma humano.
Em seguida, a ubiquitina ativada
transferida para uma enzima conjugadora de ubiquitina ou E2, tambm
conhecidas por UBCs (ubiquitinconjugating enzymes). Mais de 25
genes de E2 esto presentes no
genoma humano. Em seguida, a E2
transfere a ubiquitina para uma
enzima ubiquitina ligase ou E3
(Ubiquitin-protein ligases). As E3
ligam-se ao substrato de uma maneira especfica e promovem a transferncia da ubiquitina da E2 para o
grupamento -amino de uma lisina
na protena-susbtrato. Reaes su-

cessivas podem ocorrer, levando


formao de substrato com cadeias
lineares ou de mltiplas seqncias
de ubiquitina (Weissman, 1997,
Ciechanover, 1998).
A famlia de enzimas E3 ligases
a mais abundante na clula humana; so mais de 600 genes preditos;
entretanto, at o momento, somente cinco classes principais foram
descritas (Ciechanover, 1998,
Joazeiro & Weissman 2000). Em
geral, as E3s so identificadas pela
presena dos domnios Ringer Finger
(RF), F-box e WD40, que atuam no
recrutamento e na apresentao de
protenas-substrato ao proteasoma
(Ciechanover, 1998, Vodermaier,
2001). Ao contrrio do que se pensava, as E3 ligases podem reconhecer mais de uma protena, inclusive
protenas no ubiquitinadas.
No primeiro grupo, esto as
enzimas da famlia E3/E3. Essas
E3 reconhecem protenas que contenham na poro N-terminal um
aminocido bsico (exemplo: Arg,
Lys, His) ou um aminocido
hidrofbico volumoso (exemplo:
Phe, Leu, Trp, Tyr, Ile). Essa regra de
reconhecimento denominada N-

Figura 3 - Esquema representativo mostrando as etapas de ubiquitinao e reconhecimento de uma protena-substrato pelas enzimas E1, E2 e E3. As protenas ubiquitinadas so degradadas ao passarem por dentro do proteasoma por enzimas proteolticas
especficas, gerando peptdeos entre 7-12 aminocidos.
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end rule ou regra do aminocido Nterminal (Varshavky, 1992).


O segundo grupo de enzimas
E3 tem como membro principal a
protena E6-AP (E6 associated
oncoprotein), que foi identificada
em um complexo formado com a
protena E6 do papiloma vrus. O
complexo recruta e promove a degradao da protena p53. A degradao de p53 tambm promovida
pela E3 denominada MDM2 (ver
adiante). Essas protenas, embora
de tamanho variados, apresentam
um domnio comum na poro
carboxi-terminal denominado HECT
(homology to the E6-AP carboxyl
terminus). Um grande nmero de
protenas com o domnio HECT j
foi identificado.
O terceiro grupo de E3 ligases
atuam na degradao de protenas
envolvidas no controle da entrada e
sada da mitose. Alguns exemplos de
substratos dessas E3 ligases so as
ciclinas A e B, securina, cdc5, cdc6,
entre outras. A E3 mais estudada
nesse grupo o complexo denominado ciclosoma (C) ou APC (anaphase
promoting complex). O complexo
pode ter at 10 subunidades (exemplos: cdc16, 20, 26, 27, Apc4, 5, 6)
cuja sntese e degradao ocorre de
uma maneira dependente dos eventos do ciclo celular (Zacharia &
Nasmyth, 1999).
O grupo quatro tem como exemplo mais estudado o complexo Skp1-cullin-F-Box ou SCF (Pray et al.,
2002). A parte central do complexo
formado pelas protenas Cul1
(culina 1) e Roc1 (protena Ringer
finger) e Skp1. A Skp1 um dos
membros da famlia de protenas FBox. Essas protenas ligam-se especificamente s protenas-substratos
de E3 ligase. As E3 ligases da famlia
SCF atuam na degradao de componentes do ciclo celular que controlam a transio G1/S. Entre eles
esto os inibidores de enzimas CDKs,
p21 e p27, e as ciclinas A e E. Em
geral, essas protenas so fosforiladas
pelos complexos CDK/ciclina antes
de serem reconhecidas pelas protenas F-Box do complexo E3 (King et
al., 1996). Recentemente foi demonstrado que o complexo SCF tambm
pode participar na ubiquitinao das
protenas -catenina e IkB (Winston
et al., 1999).
66

O quinto grupo de E3 possui


vrios membros cuja caracterstica
principal a presena do domno
Ring Finger (RF). O domnio RF,
definido como uma seqncia linear
de extenso e estrutura varivel,
que pode ser representada pela seguinte frmula: Cx2Cx(9-39)Cx(13)Hx(2-3)C/Hx2Cx(4-48)Cx2C, onde
C corresponde aos resduos de
cistena e H aos resduos de histina,
e X a qualquer outro aminocido. A
principal propriedade qumica da
regio RF a captura de duas molculas de zinco. No obstante, a maioria das protenas com domnio RF
apresenta atividade E3 e auxilia na
transferncia de ubiquitina de uma
molcula E2 para a protenasubstrato (Joazeiro & Weissman,
2000; Freemont, 2000). Exemplos de
molculas E3 com domnio RF so as
protenas MDM2, BRCA e Siah-1.
Um outro exemplo de protena com
domnio RF e atividade E3 a protena VHL, responsvel pela sndrome
von Hippel Lindau (pVHL). A protena VHL pode se associar s
elonginas B, C e culina2, dando
origem ao complexo VBC, que tem
as mesmas caractersticas dos complexos APC e SCF.
Survivin, XIAP-1, IAP-1 e c-IAP2 fazem parte da famlia IAPs
(inhibitor-of-apoptosis), que atuam
como inibidores da ativao das
enzimas caspases, e que tambm
apresentam, na poro C-terminal, o
domnio RF (Deveraux & Reed, 1999).
Alm disso, essas protenas so identificadas por apresentarem, na poro
N-terminal, uma seqncia de aminocidos chamada de domnio BIR. O
domnio BIR representado pela expresso: Cx2Cx6Wx3Dx5Hx6C. A presena de resduos de cistena e
histidina pressupe uma possvel
estrutura ligadora de zinco, mas no
se sabe ao certo se outras propriedades do domnio BIR seriam responsveis pela inibio da atividade enzimtica das caspases. Por outro lado,
est bem estabelecido que o domnio
RF tem papel no processo de
ubiquitinao de vrias caspases
(Huang et al., 2000; Joazeiro &
Weissman, 2000). A ubiquitinao
uma evidncia experimental que sugere a degradao de caspases via
ubquitina-proteasoma, mas isto ainda no foi amplamente estudado.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

5. A degradao seletica de
protenas e suas
implicaes no cncer
A falha na ubiquitinao e conseqente ausncia de degradao
pelo sistema ubiquitina-proteasoma
pode modificar a atividade de prooncogenes e facilitar o desenvolvimento de tumores malignos. Mutaes e delees que interferem na
degradao foram encontrados nos
seguintes pro-oncogenes: -catenina,
p53, c-Jun, E2F, ciclinas A, B, D e E e
p27 (Loda et al., 1997, Rubinfeld et
al., 1997, Gstaiger et al., 2001).
A protena -catenina um dos
componentes de uma via de sinalizao que promove a ativao dos
fatores de transcrio LEF e TCF.
Esses fatores atuam na proliferao
de linfcitos T, e, em particular, na
induo da sntese dos genes da
ciclina D e c-myc. Foi verificado que
certas mutaes na -catenina aumenta sua estabilidade e o tempo de
sinalizao de proliferao celular na
clula mutante. A estabilidade da
protena -catenina tambm modificada por mutaes encontradas em
um outro gene que participa dessa
via de sinalizao, o gene APC
(adenomatous polyposis coli). O APC
um fator supressor de tumores e
tem papel chave na induo de
polipose e adenoma do clon
instestinal (Fodde et al., 2001). Alm
disso, a mutao de -catenina tambm interrompe a via de sinalizao
da proliferao mediada pela Ecaderina da membrana celular e das
protenas da matriz extracelular
(Rubinfeld et al., 1997).
Recentemente descobriu-se que
a agressidade de carcinoma do clon
retal, carcinoma da mama e carcinoma da prstata est associada ao aumento da degradao da p27, o inibidor
de CDKs que controla o ciclo celular
(Loda et al., 1997). O mecanismo pelo
qual isto acontece ainda no est bem
definido, mas estudos recentes mostraram que a protena Skp2, uma Fbox protena, envolvida no reconhecimento da protena p27, parece ter
um papel chave na oncognese
(Gstaiger et al., 2001). GSTAIGER e
colaboradores mostraram que o gene
dessa protena superexpressado em
displasias da epiderme e no carcinoma epitelial da boca. Mais importante

ainda, eles mostraram que fibroblastos


normais, que expressam os genes HRas mutados, e o Skp2, adquiriram as
propriedades biolgicas de uma clula tumoral nos testes in vitro e in vivo.
Quando essas clulas eram injetadas
em camundongos nude, observou-se
tambm a rpida formao de tumores malignos (Gstaiger et al., 2001).
Em aproximadamente 90% dos
cnceres da cervix detectada a
expresso das protenas E6 e E7 de
papiloma vrus tipos 16 e 18 (Evan &
Voudsden, 2001). Como discutido,
as protenas E6 so homlogas a uma
classe de protenas E3, denominada
E6-AP, as quais atuam no recrutamento e ubiquitinao da p53. A
produo excessiva de protena E6
em clulas infectadas pelo papiloma
e a subseqente degradao de p53,
via ubiquitina-proteasoma, so eventos iniciais na transformao tumoral
mediada por esses vrus (Huibregtse
et al., 1995).
Vrias protenas E3, incluindo
MDM2, BRCA, Siah-1, Cb1 e PML,
foram envolvidas direta ou indiretamente na transformao celular
(Freemont, 2000). Foi observado que
uma mutao pontual no domnio RF
da BRCA1 uma protena envolvida
no reparo do DNA, predispe as mulheres portadoras desta mutao ao
cncer de mama e de ovrio (Baer &
Ludwig, 2002). Outro exemplo a
protena VHL, responsvel pela
sndrome von Hippel Lindau. Mutaes no gene da VHL bloqueiam sua
ao E3, responsvel pela inativao
do fator HIP (hipoxia inducing factor).
Com o aumento de estabilidade do
HIP, possvel o desenvolvimento de
certos tumores malignos em indivduos portadores dessa sndrome (Tyers
& Jorgensen, 2000).
Survivina, uma E3 da famlia IAP
de inibidores de caspases, parece ter
um papel relevante na induo de
cncer. Foi observado que sua expresso aumentada na transio
G2/M do ciclo celular quando ela se
liga aos fusos de microtbulos do
aparato mittico. Esta associao previne a apoptose induzida pelo taxol.
Sabe-se tambm que a superexpresso de IAP um marcador de prognstico ruim de evoluo da doenas
em pacientes portadores de neuroblastoma, cnceres do colo uterino e
gstrico (Deveraux & Reed, 1998).

6. A regio PEST como um


sinal que promove a
degradao rpida de
protenas
Alm da ubiquitinao, a presena de certas regies e seqncias
na estrutura primria das protenas
pode funcionar como um sinal que
define o seu tempo de meia-vida
dentro da clula. Vrias seqncias
de aminocidos foram identificadas
como sinais proteolticos para a
degradao por enzimas lisosomais
(exemplo, catepsina), calpainas e sistema ubiquitina-proteasoma (Dice,
1990, Rechsteiner & Rogers, 1996).
Correlacionando as taxas de degradao de dezenas de protenas e
as suas seqncias de aminocidos,
ROGERS, WELLS e RECHSTEINER
(1986) mostraram que as protenas,
com um tempo mdio de degradao
inferior a 2 horas, apresentam um
grupo conservado de aminocidos.
Essa regio, que pode ter de 10 a 50
aminocidos, rica em prolina (P),
cido glutmico (E), serina (S) e
treonina (T), e flanqueada na extremidade N e C-terminal, por um
aminocido positivo, como a arginina,

lisina ou histidina. A regio PEST,


como foi chamada, tem um nmero e
a ordem de aminocidos varivel,
bem como a sua extenso (Figura 4).
Ela pode estar presente 5 vezes em
uma protena de 300 aminocidos.
Devido s caractersticas qumicas
desses aminocidos de carga negativa, a regio PEST aumenta a reteno
de molculas de H20 e ons Ca2+
(Rechsteiner & Rogers, 1996). Alm
disso, os aminocidos serina e
treonina das protenas contendo a
regio PEST so alvos de fosforilao
por vrias enzimas quinases. Como
as regies PEST nunca so seqncias repetitivas e idnticas, acredita-se
que a estrutura secundria, em forma
de lao (loop), sirva como local de
ligao de outras protenas ou
enzimas, em particular, E3 ligases,
mas isto ainda no foi definido.
Aps essa descoberta, vrios
grupos mostraram que a deleo ou
a substituio de aminocidos da
regio PEST aumenta a estabilidade
da protena, isto , impede a sua
rpida degradao. Em geral, a
funo biolgica da protena sem o
PEST dramaticamente aumentada
(Rechsteiner & Rogers, 1996).

Figura 4 - Diagrama representativo de uma regio PEST. Nesta seqncia aleatria de


aminocidos esto intercalados os aminocidos designados pelos seus smbolos alfabticos citados ou figuras representativas ( , + , ). As protenas MCL1, caspase-9 e IF116B
so exemplos de protenas que apresentam regies PEST com um ndice PEST indicado.
Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

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A regio PEST est presente em


vrias protenas diretamente envolvidas na etiologia do cncer. Exemplos mais relevantes so MYC, RAS,
FOS, JUN, PTEN, p53, EIA, ciclinas A,
B, inibidores de CDKs, p21 e p27, catenina e NF-kB (Rechsteiner &
Rogers, 1996).
A PTEN um fator supressor de
tumores, cujo gene aparece deletado
ou mutado em gliomas e cnceres do
endomtrio. A protena PTEN atua
como enzima fosfatase e, sob sua
ao, o fosfolpideo PIP3 (fosfoinositol-3-fosfato) desfosforilado, tornando-se inativo. O PIP3 atua na ativao
da enzima quinase B (PKB), mais
conhecida por Akt. A Akt exerce uma
funo anti-apopttica, promovendo
a fosforilao e inativao da caspase9 e BAD, um dos membros da famlia
BAX de protenas pr-apoptticas
(Cardone et al., 1998). Mutaes no
gene PTEN, que causam gliomas e
cncer do endomtrio, geralmente
ocorrem na regio PEST. A oncognese, nesse caso, , em parte, produzida
pela produo excessiva de PIP3 (fosfoinositol) e a ativao contnua da via

Akt de sobrevivncia celular. De fato,


estudos de mutaes stio-dirigidas
mostram que a ausncia da regio
PEST provoca a desestabilizao da
estrutura secundria da protena e
compromete sua atividade enzimtica
(Georgescu et al., 1999).

7. A regio PEST e o stio


de clivagem de enzimas
caspases
Atravs da consulta de vrios bancos de dados do genoma humano
(exemplo: National Center For
Biotecnology Information, NCBI) e o
uso do programa PESTFind (Rechsteiner
& Rogers, 1996) e um programa similar
desenvolvido em nosso laboratrio realizamos um estudo para identificar a
presena da regio PEST dentro do
stio de clivagem em uma amostragem
de protenas-substrato de enzimas
caspases. A motivao para este estudo veio de uma descoberta inicial feita
durante a anlise da presena de regio PEST na famlia de enzimas
caspases. Nesse grupo particular de
protenas notou-se que o stio de

clivagem (exemplo; DEVD) encontrava-se dentro da regio PEST em 10 de


um total de 12 enzimas caspases analisadas. Desta forma, a hiptese que
o stio de reconhecimento de caspase
no seja de apenas 4 aminocidos, mas
uma regio estendida de 20 a 30 aminocidos, i.e., a regio PEST.
Em seguida, foram analisadas
todas as protenas-substrato de
caspases descritas na literatura. Nesse grupo de 144 protenas, a presena do stio de clivagem dentro da
regio de PEST foi detectada em 63%
(90/144) da amostragem de protenas. No restante, 37% (54/144) das
protenas-substrato de caspases, o
stio de clivagem foi encontrado em
um local distante da regio PEST
(Tabela 1). Estas protenas foram
agrupadas em 8 categorias, de acordo com as funes que exercem em
diferentes processos biolgicos como
apoptose, ciclo celular, doenas neurodegenerativas, ou localizao celular (Tabela 1). Algumas dessas protenas foram identificadas no quadro.
Elas podem atuar como citocinas,
receptores de membrana, fatores de

Tabe la 1 - Re lao de prote nas-substratos de caspase s conte ndo o stio de clivage m da re gio PEST
Stio de cas pas e
Cate goria
de ntro do PEST
Exe mplos
Sim
N o
Total
Prote nas Es truturais e do citoe s que le to
Gelsolina, citoqueratina, catenina, actina, filamina, Gas- 2, Foldrina, Plectina, Tau, Vimentina,
14
5
19
Rabaptina
Prote nas Nucle are s
Laminas A, B, C, NuMa, HnRNPs, MDM2, SAF- A, RNA helicase, SATB- 1 LAP2a, Nup153
6
4
13
Protenas do Metabolismo de DNA
PARP, RFC140, DNA topoisomerase, MCM3, PKcs- DNA, DNA helicase, RAD51, BRCA1,
6
8
15
acinus
Prote nas Quinas e s
PKC ( , , ), PKC- related quinase, CaMK IV, Mst1, Fyn, FAK, MEKK1, Raf1, Akt, Wee1,
15
9
26
Src, RIP quinase, P58FYN
Prote nas da traduo de s inais e trans crio g nica
Pro- interleucinas 1, 16, 18, D4- GDI, PP2A, cPLA2, STAT1, NF- kB, SREBP- 1 3 2,
17
13
32
calpastatina, PLC- , Cb- 1, ErB- 2, NRF2, PDE 6, 5A e 10A, MAX, Calcineurina A, Fatores de
Transcrio AP- 2A, ROCK1, GATA- 1, TIAM
Prote nas Re guladore s do Ciclo Ce lular e Apoptos e
p21, p27, pRB, CDC27, nedd4, ciclina A, Bcl- xL, FLIP, Bid, Bax, BAD, ICAD, XIAP, hIAP,
20
9
29
HSP90, Caspases 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 13, 14, TRAF
Prote nas e nvolvidas e m doe nas Ne urode ge ne rativas
Huntingtina, Atrofina- 1, Presenilina- 1, 2, APLP2, ataxina- 3, Calsenilina, APP, LEDGF, Receptor
9
1
10
Andrognio
Outras cate gorias
PA28 , O- Glicosidade, receptor AMPA, GRASP65, Clcio- ATPase, GRASP- 1
3
5
9
Totais
90
54
144
Porce ntage ns 63%
37% 100%
68

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

transcrio, enzimas quinases, proteases, protenas do citoesqueleto,


citoplasmticas, nucleares, e vrias
outras funes no especificadas.
A presena do stio de clivagem
de caspases dentro da regio PEST
deve ter uma finalidade biolgica que
ainda no se conhece. Uma hiptese
que essa regio determinaria a degradao rpida da protena pela via ubiquitina-proteasoma. De fato, estudos
j mostraram que as IAP funcionam
como E3 ligases, promovendo a ubiquitinao de caspases (Huang et al.,
2000). Estudos em andamento no nosso laboratrio mostraram que a substituio de certos aminocidos (S199A,
T201A) da regio PEST da caspase-7
impedem a sua autoativao. possvel, portanto, que a regio PEST funcione como um stio de regulao de
ativao de caspase. Possivelmente, o
PEST funcionaria como um elemento
estrutural de reconhecimento que induz a ativao intra ou intermolecular
da proforma da enzima.
Em resumo, os dados apresentados nesse estudo revelaram vrias
pistas ou hipteses a serem confirmadas atravs de trabalhos de bancada
que envolvem a mutao stio-dirigida
de genes e a produo de protenas
modificadas para realizao de ensaios funcionais. Acredita-se que esses
ensaios possam revelar fatos importantes sobre o potencial oncognico

das protenas que contenham regies


PEST ainda no reveladas em estudos
convencionais de investigao cientfica (Figura 5). Ressalte-se que existe
uma predio de que, pelo menos,
um tero das protenas codificadas
pelo genoma humano, isto , 10 mil
protenas de um universo de 30 mil
protenas possuam regies PEST
(Rechsteiner & Rogers, 1996).

8. Perspectivas
Os bancos de dados gerados por
seqenciamento de genes provenientes de tecido normal e tumoral so
exelentes provedores de informaes
para os estudos que visem anlise de
possveis alteraes funcionais de protenas devido a defeitos nos mecanismos que levam sua destruio. Esta
anlise tem sido facilitada pelo conhecimento de stios, regies e seqncias
de reconhecimento de degradao de
protenas, bem como pela identificao de dezenas de famlias de protenas e enzimas envolvidas nos diferentes processos de protelise via ubiquitina-proteasoma e a protelise mediada por enzimas caspases. A identificao destas modificaes poderia ajudar a predizer falhas nas interaes
com os elementos da maquinaria de
degradao celular; desenvolver estratgias de inibio ou de ativao dos
processos; e, finalmente, propor novas

Figura 5. O esquema mostra possveis etapas na regulao da proliferao e morte celular


que quando alteradas por degradao seletiva e inapropriada, ou, a ausncia de
degradao, pode levar a produo de protenas oncognicas. Uma condio especfica
que pode levar as estas disfunes a alterao por mutaes ou deleo de aminocidos
da regio PEST, um elemento chave para o reconhecimento e eliminao de protenas
oncognicas pelas enzimas caspases e sistema ubiquitina-proteasoma.

alternativas profilticas e teraputicas.


Entender a origem e a progresso do cncer atravs da anlise de
seqncias, regies e domnios na
estrutura das protenas que servem
de sinalizao e reconhecimento para
sua degradao o grande desafio do
momento. Para vencer esse desafio
preciso ter a cooperao de vrios
grupos de cientistas especializados
em seqenciamento e clonagem de
genes, expresso de protenas recombinantes e, em especial, a cooperao de uma nova classe de pesquisador, o bioinformata, cuja principal ferramenta o computador. Cabe
a esse profissional a anlise de conjuntos de dados em grande escala e a
formulao de hipteses que sero
executadas por seus colegas. Essa
forma inovadora de pesquisa decisiva para entender a biologia da clula em toda a sua complexidade.

9. Referncias
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Pesquisa

Archaea:
Potencial Biotecnolgico
Utilizao e aplicao de arqueas na biotecnologia

Alexander Machado Cardoso

Departamento de Bioqumica Mdica,


Instituto de Cincias Biomdicas, UFRJ.
amcardoso@bioqmed.ufrj.br

Maysa B. Mandetta Clementino

Departamento de Microbiologia, Instituto Nacional


de Controle de Qualidade em Sade, FIOCRUZ.
maysa@incqs.fiocruz.br

Orlando Bonifcio Martins

Departamento de Bioqumica Mdica,


Instituto de Cincias Biomdicas, UFRJ.
omartins@bioqmed.ufrj.br

Ricardo Pilz Vieira

Departamento de Biologia Marinha,


Instituto de Biologia, UFRJ.
pilz@bioqmed.ufrj.br

Rodrigo Volcan Almeida

Programa de Engenharia Qumica,


COPPE, UFRJ.
volcan@peq.coppe.ufrj.br

Sylvia M. Campbell Alqueres

Departamento de Bioqumica Mdica, Instituto de


Cincias Biomdicas, UFRJ.
alqueres@bioqmed.ufrj.br

Welington Incio de Almeida

Departamento de Bioqumica Mdica,


Instituto de Cincias Biomdicas, UFRJ.
welington@bioqmed.ufrj.br
Ilustraes cedidas pelos autores

1. Introduo
O domnio Archaea formado
principalmente por organismos
extremoflicos, isto , microrganismos
que no apenas toleram, mas crescem
otimamente em ambientes normalmente considerados inspitos para a vida,
como fontes termais, guas extremamente salgadas, temperaturas baixas e
condies extremas de pH. Pode-se
dizer que certas espcies de arqueas
definem claramente os limites de tolerncia biolgica nos extremos fsicos e
qumicos da vida. O estudo dos microrganismos provenientes desses ambientes extremos pode nos fornecer informaes valiosas acerca da origem
da vida na Terra, bem como das estratgias adaptativas aos ambientes onde
esta prosperou (Woese, 1998).
A adaptao de organismos a
esses ambientes obrigou-os a desenvolver componentes celulares e estratgias bioqumicas para sua sobrevivncia. Por outro lado, devido s
caractersticas exticas que tm, e
s suas propriedades nicas, esses
microrganismos geram bioprodutos
que podem ser empregados em condies drsticas, que freqentemente
ocorrem em processos industriais. Os
componentes moleculares deles retirados possuem muitas vezes propriedades que os tornam especialmente
adequados para serem utilizados nesses processos. Nesse contexto, hoje
geralmente aceito que esses microrganismos constituem um precioso
repositrio de molculas de interesse
industrial e um excelente recurso para
o desenvolvimento de novas aplicaes biotecnolgicas.

Os benefcios cientficos esperados de um conhecimento maior da


biologia das arqueas incluem, entre
outros, a compreenso das funes
exercidas por esses organismos nos
ambientes aquticos e terrestres, bem
como suas interaes com outros componentes da biodiversidade. Os benefcios econmicos e estratgicos esto
relacionados com a descoberta de microrganismos potencialmente explorveis nos processos biotecnolgicos
para obteno de agentes teraputicos, probiticos, produtos qumicos,
enzimas e polmeros para aplicaes
industriais e tecnolgicas, biorremediao e biolixiviao de poluentes e
recuperao de minrios. Outros benefcios incluem a otimizao da capacidade microbiana para processamento de alimentos, tratamento e/ou
remediao de resduos (esgoto domstico e lixo). Embora ainda no
sejam totalmente conhecidas as estratgias moleculares para sua sobrevivncia em tais ambientes inspitos,
sabe-se que esses organismos possuem enzimas adaptadas a tais ambientes, e isso desperta o interesse tanto
acadmico quanto industrial.

2. Filogenia e Fisiologia
H cerca de vinte anos, Carl
Woese e colaboradores sugeriram
que os organismos vivos fossem
classificados em trs grupos principais: Archaea, Bacteria e Eukarya,
com base no estudo das seqncias
das molculas do gene 16S do RNA
ribossomal (16S rRNA). Esses grupos so chamados de domnios e
acredita-se que surgiram atravs de

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

71

C aractersticas
Membrana nuclear
Nmero de
cromossomos
Parede Celular

Tab ela 1: Diferen as fu n d amen tais en tre o s trs d o mn io s.


Bacteria
A rch aea
Ausente
Ausente
1

>1

Peptideoglicano

Pseudo-peptideoglicano,
glicoprotenas e outros

Celulose em plantas,
quitina em fungos e
nenhuma em animais

Sim

No

No

Glicerdeos ligados a ster,


no ramificado; saturado
ou mono-insaturado

Isoprenide; glicerol diter


ou di-glicerol tetrater

Glicerdeos ligados a ster;


no ramificado; poliinsaturado

Ausente

Ausente

Presente

70S

70S

80S

Sim

No

No

No

Sim

Sim

Murena na parede
celular
Lipdeos da membrana
celular
Organelas (mitocndria
e cloroplastos)
Ribossomo
Sntese de protenas
inibida por
cloranfenicol e
estreptomicina
Sntese de protenas
inibida pela toxina da
difteria
vias evolutivas distintas a partir de
um ancestral comum. A noo de
dicotomia da vida entre eucariontes
e procariontes, que ainda domina a
biologia e influencia, em particular,
a percepo sobre o domnio
Archaea, est sendo lentamente revista por grupos atuantes em
microbiologia. A diversidade e a
biologia das arqueas representam
uma enorme contribuio compreenso da Ecologia Microbiana
(Woese et al., 1990).
O domnio Archaea consiste de
trs divises: Crenarchaeota, que
contm as arqueas hipertermoflicas
redutoras de enxofre; Euryarchaeota,
que compreende uma grande diversidade de organismos, includas as
espcies metanognicas, as haloflicas
extremas e algumas espcies
hipertermoflicas; e Korarchaeota,
uma diviso descrita mais recentemente, que engloba organismos hipertermoflicos pouco conhecidos,
identificados a partir de seqncias
do gene 16S do rRNA isolados de
fontes termais terrestres, porm ainda no cultivados em laboratrio.
Aps serem divididos os trs
grandes domnios a partir do seqenciamento do 16S rRNA, estudos subseqentes mostraram que cada domnio est associado a uma srie de
fentipos. Alguns desses fentipos
72

E u carya
Presente

so nicos de cada domnio, enquanto outros so compartilhados entre


dois ou at entre todos os trs domnios, como pode ser observado na
Tabela 1.

3. Ambientes extremos
Os primeiros organismos identificados pertencentes ao domnio
Archaea viviam em ambientes extremos de temperatura, salinidade ou
acidez, sugerindo que a preferncia
por tais hbitats, era um trao caracterstico do grupo. Estudos mais recentes mostraram vrias eubactrias
e organismos eucariticos que sobrevivem tambm em ambientes extremos, como observaram igualmente a
presena de arqueas em ambientes
mais amenos, demonstrando, dessa
forma, a contribuio desse grupo na
biomassa global (Forterre, 1997). Entretanto, as arqueas parecem ser os
nicos organismos descobertos at o
presente momento que podem sobreviver a temperaturas acima de
95C, e o fentipo hipertermoflico
s encontrado nesse domnio da
vida. Uma outra caracterstica exclusiva de Archaea o metabolismo
metanognico: no se conhecem
eubactrias nem eucariotos capazes
de produzir metano como resduo de
seu metabolismo.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

O hbitat das arqueas haloflicas


extremas hipersalino e as espcies
em cultivo laboratorial requerem para
o crescimento, entre 1,5 a 4 M de
NaCl, o que significa um ambiente
com cerca de 10 vezes a salinidade
encontrada na gua do mar. As
metanognicas so organismos obrigatoriamente anaerbios e liberam
gs metano (CH4) como resduo metablico. So encontradas em ambientes com ausncia de oxignio e
abundncia de matria orgnica,
como pntanos, audes, lagos, sedimentos marinhos e rmen de bovinos. Elas retiram hidrognio e gs
carbnico desses ambientes e os utilizam em seu metabolismo. Vivem
como simbiontes de uma grande variedade de protozorios tambm
anaerbicos, convertendo produtos
finais de fermentao em gs metano.
So de grande importncia ao ambiente em que vivem pela alta eficincia de sua enzima hidrogenase que,
mantendo uma baixa presso parcial
de H2 para que a metanognese ocorra, permite que os demais organismos fermentadores faam reoxidao do NADH, o que corresponde a
um maior rendimento de ATP e um
aumento da biomassa (Brock et al.,
1994).
As arqueas termoacidfilas compem um grupo heterogneo, defini-

Tab ela 2: E stratgias d e ad aptao d as arq u eas ao s amb ien tes extremo s.
A mb ien te

P ro b lemas

Mecan ismo s d e ad aptao


Mantm altas concentraes de K+ intracelularmente

Lise celular por diferena de


presso osmtica
Hipersalin o

Desnaturao das protenas


Lise celular
Desnaturao do DNA
A ltas temperatu ras
Desnaturao das protenas

Baixas temperatu ras Inativao das protenas

do pela capacidade dos organismos


de crescerem em altas temperaturas
que vo de 55C a 85oC, com pH que
varia de 1,0 at 6,0. O gnero Sulfolobus
apresenta parede celular composta
principalmente por lipoprotena e
carboidratos; oxidam H2S, mas o princpio para essa oxidao ainda no foi
esclarecido. Os principais substratos
de crescimento parecem ser fontes
quentes e tambm solos quentes que
contenham enxofre, e que, ento,
oxidam tal elemento em cido sulfrico, responsvel pela acidez desses
hbitats. O grupo dos termoplasmas
caracterizado pela ausncia de parede celular e encontrado em minas de
carvo, com quantidades substanciais
de sulfeto ferroso.
Uma das perguntas que mais
intrigam os pesquisadores como
esses incrveis organismos conseguem viver em tais ambientes? Deixam constantemente uma interrogao sobre qual ser o limite para o
desenvolvimento da vida. Embora
muitas dvidas ainda pairem sobre
os mecanismos de adaptao a tais
ambientes hostis, muitos fatores j
so apontados como os responsveis pela resistncia desses organismos. A Tabela 2 rene os principais
mecanismos de adaptao aos problemas causados pelos ambientes
extremos.

A parede celular composta por glicoprotenas que tem


uma maior porcentagem de aminocidos cidos que
atraem os ons Na+ para o redor da clula. A ligao dos
ons com a parede celular estabiliza esta, impedindo a lise
Essas protenas expem aminocidos de carga negativa,
de maneira que, quando os ons positivos entram em
contato com a protena, esta estabilizada
Maior rigidez da parede celular
Maior quantidade de histonas
Maior empacotamento do DNA
Aumento do nmero de pontes de hidrognio
Aumento das interaes hidrofbicas
Menor porcentagem de aminocidos termolbeis
Menor quantidade de pontes de hidrognio, dissulfeto e
interaes hidrofbicas, o que aumenta a flexibilidade da
protena

Meios de Cultivo para Arqueas Termoflicas

A pesquisa envolvendo esses organismos tem sido intensificada nas


duas ltimas dcadas por duas razes
principais: pelo conhecimento das condies sob as quais a vida pode existir
atravs do estudo de muitos hbitats
nunca antes explorados e pelo atual
reconhecimento do potencial biotecnolgico desses organismos, bem
como de seus produtos.

4. Aplicaes
Biotecnolgicas
A tecnologia enzimtica experimentou um grande avano quando as
enzimas microbianas passaram a ser
utilizadas, principalmente por causa
da grande variedade de reaes que
essas enzimas so capazes de catalisar.
Com o descobrimento dos microrganismos extremoflicos (em sua maioria
arqueas), o que ampliou ainda mais a

diversidade microbiana, a potencial


faixa de processos para utilizao de
enzimas tambm se ampliou, principalmente porque as extremozimas
(enzimas provenientes de microrganismos extremfilos) sendo naturalmente estveis em ambientes extremos, vieram suprir a demanda industrial, para a qual, de certa forma, sempre
estiveram em desvantagem as enzimas
tradicionais. Um problema inerente s
extremozimas a dificuldade de produzi-las utilizando microrganismos selvagens, j que estes, em geral, necessitam de condies especiais para se
reproduzirem, como ambientes
anaerbios estritos, altas temperaturas, meios definidos, etc. Contudo esse
problema pode ser contornado expressando essas enzimas em outros
organismos de mais fcil manipulao,
j que existem vrios exemplos em
que essas enzimas, quando expressas
em microrganismos heterlogos, mantm suas caractersticas originais
(Eichler, 2001).
Dentre as enzimas de arqueas de
grande potencial para a aplicao
biotecnolgica, destacam-se as
hipertermoflicas, psicroflicas,
alcaloflicas, haloflicas e baroflicas.
Entre as enzimas de arqueas
que tm recebido maior ateno, esto
as termozimas, sendo que os principais processos de potencial utilizao

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

73

dessas enzimas so o beneficiamento


do amido, a manufatura e o branqueamento da polpa para produo de
papel e a bem estabelecida prtica
laboratorial da reao em cadeia da
polimerase (PCR), entre outras.

4.1. Processamento do
Amido
O amido um dos polmeros mais
abundantes na natureza, estando presente principalmente nos vegetais, onde
ele utilizado para o armazenamento
de energia na forma de grnulos insolveis, compostos basicamente de
amilose e amilopectina, que so diferentes polmeros de glicose. Alm de
servir diretamente como alimento na
dieta animal, o amido presente nos
vegetais pode ser hidrolisado, gerando
glicose, maltose e xarope de oligossacardeos, que, por sua vez, so utilizados para produo de outros qumicos
ou como substratos em fermentaes
(Bentley e Willians, 1996; Vieille e
Zeikus, 2001).
De uma forma geral, o processo
de hidrlise do amido envolve a
liquefao e a sacarificao, as quais
ocorrem em altas temperaturas. Durante a liquefao, os gros de amido
so gelatinizados em solues aquosas entre 105C e 110C, num pH
entre 5,8 a 6,5 , quando ento, so
utilizadas a-amilases termoestveis a
95C, que hidrolisam parcialmente
as ligaes a-1,4. Nesse processo, o
controle de temperatura e pH muito importante pois, se a temperatura
estiver abaixo de 105C, a gelatinizao ocorre parcialmente, e se aumentar muito, h a inativao das aamilases; se o pH estiver mais cido
que 5,5 tambm ocorre a inativao
dessas enzimas, mas, se vai acima de
6,5 so gerados muitos subprodutos.
Aps a liquefao, o produto con-

vertido a sacardeos de baixo peso


molecular e, posteriormente, em
glicose, utilizando-se pululanase e
glicoamilase, e em maltose, utilizando-se pululanase e -amilase.
Nesse processo, potencialmente
poderiam ser feitas duas melhorias
com a utilizao de extremozimas: a
primeira seria a utilizao de a-amilases
hipertermoflicas com maior tempo
de resistncia, de forma que no se
necessitasse gastar energia com o
resfriamento de 105C para 95oC, da
gelatinizao para a liquefao. A segunda seria a em que o pH natural de
solues de amidos gelatinizados, que
de, aproximadamente, 4,5 e que
fora o ajuste para 5,8 na liquefao,
e, posteriormente, reduo para 4,2;
na sacarificao, de maneira que uma
a-amilase apta a trabalhar em pHs
mais baixos reduziria, em muito, os
custos do processo.
A Tabela 3 mostra algumas
enzimas isoladas de arqueas com grande potencial de aplicao na indstria
de processamento de amido. Embora
nenhuma dessas rena todas as caractersticas necessrias apontadas acima, elas indicam, no entanto, que
com tcnicas de engenharia de protenas, esses catalisadores poderiam ser
aperfeioados.

4.2. Manufatura do Papel


O processo de manufatura do
papel envolve, de uma maneira geral,
dois estgios: o polpeamento e o branqueamento. O polpeamento o estgio no qual a estrutura macroscpica
da fibra da madeira quebrada, removendo-se dela a lignina, gerando da
uma fibra mais malevel e com caractersticas prprias para a produo do
papel (Tolan, 1996; Vieille e Zeikus,
2001). Esse processo conduzido mecnica ou quimicamente por adio de

cidos (processo Sulfite) ou bases (processo Kraft) em altas temperaturas. Os


processos de polpeamento, por envolverem condies muito drsticas
(160C-190oC em concentraes elevadas de lcalis ou cidos), so potencialmente prprios para utilizao de
enzimas extremoflicas. Embora as
celulases sejam bem distribudas entre
os domnios Eukarya e Bacteria, somente uma celulase de Archaea
relatada, a endoglicanase de Pyrococcus
furiosus, que capaz de hidrolisar
ligaes b,1-4 com uma atividade tima ocorrendo em 100oC e pH 6,0
(Bauer e Kelly, 1998). Contudo, segundo Eichler (2001), vrias arqueas termo
e hipertermoflicas possuem enzimas
-glicosdicas.
A polpa resultante de um dos
processos acima levada ao branqueamento, que ocorrer em menor ou
maior grau dependendo da utilizao
do papel. Nesse processo, a quantidade remanescente de lignina do
polpeamento retirada com a utilizao, dependendo do processo, de:
cloro, dixido de cloro, oznio,
perxido de hidrognio e altas temperaturas. A utilizao desses agentes
oxidantes acaba gerando uma quantidade muito grande de poluentes, e,
por isso, vem sofrendo sanes das
agncias ambientais. Uma das alternativas pesquisadas para reduzir esses
compostos, principalmente os derivados de cloro, a utilizao de enzimas.
Entre as enzimas pesquisadas, as xilanases, segundo Tolan (1996), so as
que possuem uma boa aceitao industrial e tm sido utilizadas em indstrias onde est havendo um decrscimo na utilizao dos oxidantes, da
ordem de 10% a 15%. Ainda segundo
esse autor, as caractersticas timas
para uma xilanase seriam sua ao em
temperaturas por volta de 70C e pH
entre 10-12, o que abre uma excelente

Tabela 3. Enzimas com potencial de aplicao na indstria de processamento do amido.


Enzima
Origem
Temperatura
pH
Referncia
Pyrococcus furiosus
100C
5,5-6,0
Dong et al., 1997
-amilase
Pyrococcus woesei
100C
5,5
Koch et al., 1997
Pyrodictium abyssi
100C
5,0
Niehaus et al., 1999
Pululanase
Thermus caldophilus
75C
5,5
Kim et al., 1996
Thermoan aerobacterium
Ganghofner et al.,
Glicoamilase
50 a 60C
4,0-5,5
thermosaccharolycticum
1998
Amilopululanases
Pyrococcus furiosus
105C
6,0
Dong et al., 1997
74

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

oportunidade para a explorao de


xilanases de arqueas extremoflicas
como as de Pyrococcus furiosus,
Thermococcus sp. e Thermococcus
zilligii (Eichler, 2001).
Um outro problema na fabricao
de papel, principalmente pelo
polpeamento mecnico, a deposio
do pitch, denominao atribuda ao
conjunto de substncias hidrofbicas
da madeira, principalmente triglicerdeos e graxas, que causam muitos
problemas na manufatura da polpa e
do papel (Jaeger e Reetz, 1998). As
lipases j vm sendo utilizadas na
remoo dessas substncias. Gutierrez
et al. (2001) comentam que muitos
estudos esto sendo realizados, por
meio de tcnicas de engenharia de
protenas, no intuito de aumentar a
amplitude de substratos hidrolisveis,
atividade e estabilidade em pH e temperatura elevados, sendo importante
que a enzima esteja ativa a altas temperaturas, uma vez que para um desempenho timo, a lipase deveria ser adicionada polpa a uma temperatura de,
aproximadamente, 85oC. Nosso laboratrio vem trabalhando no isolamento, clonagem, expresso e caracterizao de uma enzima lipoltica de arquea
cuja atividade j foi testada a 80oC
(manuscrito em preparao).

4.3. Utilizao de
Polimerases
A reao em cadeia da polimerase (PCR) revolucionou a prtica da
biologia molecular, ou seja, a surpreendente replicao in vitro de seqncias especficas de DNA possibilitou que o isolamento de genes,
seu seqenciamento e mutaes especficas, antes uma prtica laboriosa, se tornasse uma atividade cotidiana de qualquer laboratrio de engenharia gentica. O mtodo da reao
em cadeia da polimerase, por sua
vez, foi extremamente simplificado
com a utilizao de enzimas
hipertermoflicas. Embora a principal DNA polimerase termoflica utilizada seja a de uma bactria (Thermus
aquaticus), as DNA polimerases de
arqueas, como as de Pyrococcus
furiosus, Pyrococcus woesei e outras,
apresentam uma vantagem sobre a
Taq polimerase, pois elas possuem

de vacinas, proporciona captao 3 a


50 vezes maior pelas clulas fagocticas
do sistema imune quando comparadas com formulaes de lipossomos
convencionais, alm de gerao de
resposta imune prolongada (Tolson et
al., 1996; Sprott et al., 1997; Krishnan
et al., 2000). Todos os estudos realizados in vitro e in vivo indicam que os
arqueossomos so molculas seguras
e no invocam nenhuma toxicidade
em ratos. Em geral, os arqueossomos
demonstram alta estabilidade ao
estresse oxidativo, alta temperatura,
ao pH alcalino, ao de fosfolipases,
de sais biliares e de protenas do soro.
Algumas formulaes podem ser esterilizadas em autoclave, sem problemas como fuso ou agregao das
vesculas (Patel e Sprott, 1999).

5. Genmica

Pyrodictium abyssi

uma maior capacidade de correo


de pareamentos errneos, diminuindo a freqncia de erros na replicao
in vitro (Lundberg et al., 1991).
No somente as enzimas adaptadas s altas temperaturas tm potencialidades biotecnolgicas. As enzimas de
organismos que crescem entre 5C e
25oC (Psicroflicos) podem ser empregadas em vrios processos e produtos,
como proteases, lipases, amilases, bglicanases em detergentes, pectinases
em sucos de frutas, b-galactosidases
para produo de leite deslactosado,
lipases para maturao de queijos
(Herbert, 1992; Eichler, 2001).

4.4. Arqueossomos
As aplicaes biotecnolgicas das
arqueas no se restringem a produo, expresso heterloga e purificao de extremozimas. Pelo menos
uma outra potencialidade biotecnolgica deve ser ressaltada. A utilizao
dos arqueossomos (preparao de
lipdeos de membrana arqueana),
como coadjuvantes em formulaes

Uma nova era sobre o conhecimento das arqueas comeou em 1996


em decorrncia do seqenciamento
completo do primeiro genoma de
arquea (Bult et al., 1996). Com o subseqente desenvolvimento de novos
projetos de seqenciamento de outros
organismos pertencentes ao domnio
Archaea, foi produzida uma rica
amostragem de genomas desse grupo
taxonomicamente bastante diversos.
Esse repertrio de genomas completamente seqenciados inclui mltiplos
representantes das duas maiores divises de arqueas estabelecidas pela
anlise filogentica dos genes de rRNA:
a Euryarchaeota e Crenarchaeota, bem
como as principais variantes ecolgicas de arquea: os hipertermoflicos,
termoflicos moderados e mesoflicos,
assim como haloflicos e metanognicos, formas autotrficas e heterotrficas, e mltiplas espcies que representam organismos anaerbios e aerbios.
Infelizmente os bancos de dados ainda
no contam com seqncias genmicas de alguns organismos pertencentes a ramos de arquea potencialmente
importantes, como as misteriosas
Korarchaeota, que devem ter divergido das demais arqueas nos primrdios
da evoluo, e a igualmente intrigante
nanoarchaea, que parece ter o menor
genoma entre todos os organismos de
vida livre j descritos (Huber et al.,
2002)

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

75

Mtodos de Preservao de Arqueas

A comparao dos genomas j


seqenciados de arqueas e bactrias
permite concluir que a diferena
mais marcante entre os domnios
Archaea e Bacteria est na organizao de seus sistemas de processamento de informaes. A estrutura
dos ribossomas e da cromatina, a
presena de histonas, assim como a
similaridade entre seqncias das
protenas envolvidas na traduo,
transcrio, replicao e reparo do
DNA; todos esses pontos apontam
para uma maior proximidade entre
arqueas e eucariotos. Por outro lado,
alguns componentes chaves da maquinaria de replicao de DNA no
so homlogos nos eucariotos nem
nas bactrias. Essa observao permite sugerir a hiptese de que a
replicao da dupla fita de DNA
como principal forma de replicao
do material gentico dos seres vivos
pode ter, na sua evoluo, surgido,
independentemente, duas vezes:
uma nas bactrias e uma outra no
ancestral de arqueas e eucariotos.
No entanto, muitas, mas no todas
as rotas metablicas de Archaea,
so mais parecidas com as de bactrias que as de eucariotos. Esses
estudos so concordes quanto ao
posicionamento das arqueas como
um domnio distinto da vida, com
coneces especficas com os
eucariotos, e enfatizam a natureza
misteriosa e nica dos genomas das
arqueas (Gaasterland, 1999).
Quando analisamos os 18 genomas de arqueas seqenciados totalmente at hoje, podemos concluir
que 16 protenas so exclusivas de
arqueas, enquanto 61 so exclusivas
de arquea-eucariotos. Interessantemente, desses 61 genes, apenas 2
no pertencem maquinaria do processamento de informao. Portanto,
a anlise genmica das arqueas j
76

seqenciadas corrobora a identificao destas como um grupo de organismos que tm uma base slida e
estvel de genes, os quais, primariamente, codificam protenas envolvidas na replicao e expresso do
genoma. Alm desses, existe um segundo grupo de genes que compartilhado pelas arqueas e eucariotos,
genes que so claramente associados
ao processamento da informao. O
fato da afinidade arquea-eucaritica
ser quantitativamente pequena, demonstra, no entanto, que o processo
de evoluo tem sido mais complexo que a simples herana vertical, e
tem envolvido uma extensiva transferncia lateral de genes entre
Archaea e Bacteria. Aps a divergncia evolutiva entre as linhagens
de arqueas e bactrias, vem ocorrendo uma grande mistura de genes
codificantes para enzimas metablicas, componentes estruturais da clula e outras protenas que no participam da maquinaria central de
processamento da informao (Nelson et al., 1999).
Alm dos estudos funcionais, a
genmica de Archaea fundamental para o conhecimento que temos
de duas transies cruciais na evoluo da vida: a primeira a divergncia entre as linhagens de bactrias e
as de arquea-eucariticas, que pode
ter envolvido a origem da maquinaria de replicao de DNA. A segunda
a origem dos eucariotos. Em relao a esse ponto, a arquea uma
fonte fantstica de informao, particularmente porque, em muitas situaes, ela tem retido as caractersticas primitivas, enquanto os
eucariotos tm sofrido modificaes
muito maiores. Um exemplo caracterstico a subunidade menor da
DNA polimerase, que possui todas
as marcas de uma fosfatase ativa em
arqueas, mas no em eucariotos,
onde a atividade fosfatsica est
provavelmente inativada. Sem sombra de dvidas, arquea representa
um ancestral comum das linhagens
arquea-eucariticas descendentes.
Portanto, a genmica de arquea a
nossa melhor oportunidade de reconstruir essa fase intermediria crtica da evoluo da vida (Makarova
e Koonin, 2003) .

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

6. Consideraes Finais
Estudos que envolvem o domnio Archaea vm confirmando as duas
hipteses iniciais de Woese e Fox
(1977), isto , que as arqueas exibem
uma diversidade fenotpica no mnimo comparavl quela apresentada
pelo domnio Bacteria e que os organismos do domnio Archaea sero
caracterizados por aspectos nicos
em mbito molecular. Outrossim, o
fato de Archaea exibir um mosaico
contendo caractersticas dos dois outros domnios continua a estimular
discusses entre os evolucionistas
(Forterre et al, 2002).
No contexto de extremofilia, a
descoberta contempornea mais surpreendente foi, sem dvida, a dos
organismos hipertermfilos, que
extendeu a sobrevivncia desse organismo para cerca de 121C de temperatura em que clulas vivas proliferam eficientemente. Essa caracterstica notvel implica na estabilizao de todos os componentes celulares, de modo que a sua funcionalidade seja mantida em condies de
temperatura que seriam danosas para
a maioria das biomolculas dos organismos mesfilos. A elucidao das
estratgias usadas na estabilizao
de componentes celulares e, em especial, de protenas, representa um
desafio fascinante para a biologia
atual (Kashe e Lovley, 2003).
Os microrganismos apresentam
uma imensa diversidade gentica e
desempenham funes nicas e decisivas na manuteno de ecossistemas,
como componentes fundamentais de
cadeias alimentares e ciclos biogeoqumicos. importante ressaltar que
grande parte dos avanos da biotecnologia moderna e da agricultura
derivada das descobertas recentes nas
reas de gentica, fisiologia e metabolismo de microrganismos.
Considerando que o Brasil possui uma grande extenso territorial
com inmeros e variados ambientes
extremos, como: guas termais, salinas, inmeras estaes de tratamento
de esgoto, rejeitos industriais, entre
outros. A biodiversidade microbiana
brasileira, ainda no explorada, podese tornar uma fonte para o desenvolvimento biotecnolgico do pas.

Estamos em plena era biotecnolgica, quando os processos bioqumicos so cada vez mais utilizados para a
produo de agentes teraputicos, produtos qumicos e biocatalisadores. O
grande desafio ser incorporar a informao decorrente do estudo desses
organismos extremoflicos em novas
tecnologias, utilizando o enorme potencial de suas enzimas e biomolculas.

7. Referncias
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Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

77

Otimizao da Propagao
Pesquisa

In vitro de Curau

(Ananas erectifolius L. B. SMITH)

Propagao massal de plantas atravs da cultura de tecidos

Osmar Alves Lameira

Eng Agronmo/Pesquisador Dr.


Embrapa Amaznia Oriental
osmar@cpatu.embrapa.br

Iulla Naiff Rabelo de Souza Reis


Graduanda/Bolsista PIBIC/CNPq/UFRA

Iracema M Castro Coimbra Cordeiro


Eng Florestal, MSc Bolsista/CNPq
Ilustraes cedidas pelos autores

Resumo
A propagao vegetativa utilizando tcnicas de cultura de tecido pode
ser um valioso instrumento na propagao clonal rpida de mudas de curau,
em larga escala. O trabalho teve como
objetivo otimizar a propagagao in
vitro do curau. Foram realizados dois
experimentos: No primeiro, os explantes
foram inoculados em frascos contendo
5,0; 7,5; 10,0 e 15,0 ml do meio lquido
MS, suplementados com 2,5 mg.L-1 de
BAP (6-Benzilaminopurina). No segundo, os explantes foram inoculados em
frascos contendo 15ml do meio lquido
MS, suplementado com 0; 1,5; 2,5; 3,0;
3,5 e 4,5 mg.L-1 de BAP. Nos dois
experimentos a condio de incubao
foi realizada sob fotoperodo de 16h luz
branca fria e irradincia de 25 mol.m2 -1
.s . Os tratamentos contendo 10 e 15
ml do meio lquido de cultura MS,
suplementado com 2,5 mg.L-1 de BAP,
foram mais eficientes na proliferao de
brotos de curau.

1. Introduo
Na Amaznia vrias so as espcies de plantas fibrosas com utilizao
atual. Dentre elas destaca-se o curau
(Ananas erectifolius L. B. Smith), planta nativa da regio do Lago Grande de
Curuai no Municpio de Santarm (PA)
sendo cultivada principalmente por
pequenos produtores e utilizada na
fabricao de cordas, sacos e utenslios
domsticos (Medina, 1959).
O curau planta pertencente a
famlia bromeliacea distribuda nos Estados do Par, Acre, Mato Grosso,
Gois, Amap e Amazonas. H duas
variedades distintas do curau, uma de
folha roxa-avermelhada, chamada de
78

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

curau roxo e outra de folha verdeclaro, denominada de curau branco


(Ledo, 1967), ambas so relativamente
pouco exigentes, no necessitando de
solos frteis para o seu cultivo. Podendo ser plantada em solos arenosos, em
plantios solteiros ou em consrcio com
culturas anuais ou perenes e no aproveitamento de reas degradadas (Oliveira et al 1991).
Estudos recentes tm demonstrado o grande potencial desta planta
como produtora de fibra de excelente
qualidade, podendo ser utilizada na
indstria automobilstica, por apresentar boa resistncia, maciez e peso reduzido (Ledo, 1967). Alm dessas razes e
principalmente pela exigncia do mercado consumidor, grupos empresariais
esto preocupados na utilizao de produtos naturais biodegradveis. Ademais,
o cultivo dessa espcie impulsionar o
desenvolvimento do Estado e ao mesmo tempo cria uma perspectiva de
melhoria da qualidade de vida dos
pequenos produtores.
Atualmente a demanda por fibras de curau para industria
automotiva e txtil superior a 500
ton/ms, entretanto, no momento o
Estado consegue produzir at 8 ton/
ms. Um dos problemas para a formao de reas de cultivo dessa planta
est na dificuldade de formao de
mudas pelo mtodo convencional.
Nesse sentido, a propagao vegetativa, atravs da cultura de tecidos, apresenta-se como alternativa na propagao clonal rpida de mudas de curau.
Visando equacionar este problema, a Embrapa Amaznia Oriental atravs do Laboratrio de Biotecnologia de
Plantas, realizou coletas da espcie nos
municpios paraense de Santarm e
Bragana, para formao de um banco

de germoplasma visando trabalhos de


propagao in vitro, caracterizao
molecular e melhoramento gentico da
cultura. A utilizao da tcnica de cultura de tecidos possibilita a produo em
larga escala e manuteno das caractersticas fenotpicas e genotpicas das
plantas doadoras (Giacometti, 1990).
O processo de micropropagao
de plantas envolve etapas definidas
como, estabelecimento de explantes,
multiplicao, subcultivos e enraizamento in vitro. Entretanto, aps definido um protocolo de micropropagao
de qualquer espcie, este pode ser
otimizado com reduo e at mesmo
substituio de substncias utilizadas
no processo, como o caso da fonte de
carbono, e tambm pela supresso da
fase de enraizamento in vitro, o que
diminui sobremaneira os custos de produo de mudas por esta tcnica. Assim
sendo, o trabalho teve como objetivo
otimizar a propagao in vitro de curau.

Figura 1 - Banco de Germoplasma de Curau Roxo e Verde. Embrapa Amaznia


Oriental. Belm, PA, 2003.

2. Metodologia
O trabalho foi desenvolvido no
laboratrio de Recursos Genticos e
Biotecnologia da Embrapa Amaznia
Oriental utilizando-se inicialmente plantas do curau oriundas do banco de
germoplasma da referida Instituio
(Figura 1). Aps a retirada das folhas,
o caule foi lavado com gua corrente e
sabo neutro. As gemas axilares foram
excisadas e passaram pelo processo de
desinfestao com lavagem em gua
corrente e imerso em soluo de
hipoclorito de sdio (NaOCl) a 2 % por
quinze minutos, sendo cinco minutos
em agitao. Aps o desenvolvimento,
as plntulas obtidas in vitro serviram
como fonte de explantes primrio,
para os experimentos (Figura 2).
Das plntulas obtidas in vitro foram retiradas o excesso de folhas e
cortadas em segmentos de 2 cm de
comprimento ficando com pelo menos
uma gema lateral. Para o estabelecimento da cultura, os explantes utilizados nos experimentos foram inoculados em frascos contendo meio lquido
MS (Murashige e Skoog, 1962). O meio
de cultura foi ajustado a um pH de 5,8
utilizando-se NaOH (hidrxido de
sdio) e/ou HCl (cido clordrico) em
soluo 0,5 N e autoclavado a 121C
durante 15 minutos.
Foram realizados dois experimentos em delineamento inteiramente

Figura 2 - Plntulas de Curau obtidas in vitro. Embrapa Amaznia Oriental. Belm,


PA, 2003.

casualizado. O primeiro foi composto


de 4 tratamentos com 6 repeties onde
foram testadas as quantidades 5,0; 7,5;
10,0 e 15,0 ml do meio de cultura,
suplementado com 2,5 mg.L-1 de BAP (6
- Benzilaminopurina). O segundo experimento foi composto de 6 tratamentos com 5 repeties onde se testou as
concentraes 0; 1,5; 2,5; 3,0; 3,5 e 4,5
mg.L-1 de BAP. Nos dois casos as condies de incubao foram realizadas sob
fotoperodo de 16h luz branca fria e
irradincia de 25 mol.m-2.s-1 e temperatura de 26 1C. Trinta dias aps a
inoculao foi realizada a avaliao. A
varivel nmero de brotos foi transformada em 0,5 + x e avaliada atravs
da anlise de varincia e comparao de

mdias pelo teste de Duncan ao nvel


de 5% de probabilidade.
As plntulas micropropagadas foram transferidas para bandejas de plstico de 24 clulas contendo substrato
organo-vegetal e colocadas em ambiente de telado com sombrite a 70% sob
irrigao intermitente at a completa
formao de mudas. Aps 30 dias as
mudas foram cultivadas no campo.

3-Resultados e Discusso
O efeito da quantidade de meio
de cultura sobre a produo de brotos de curau pode ser observado na
Figura 3. Aos trinta dias de cultivo, foi
observado que houve formao de

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

79

brotos em todos os tratamentos, e


diferenas significativas entre os mesmos. Os tratamentos mais eficientes
foram os que continham 10 e 15 ml
do meio de cultura MS, produzindo
em mdia 1,21 e 1,54 brotos/explante,
respectivamente. Os tratamentos contendo 5 e 7,5 ml do meio de cultura
MS, foram os menos eficiente, no
diferindo estatisticamente entre si.
Na Figura 3, possvel observar
que a produo de brotos foi diretamente proporcional a quantidade de meio
de cultura, ou seja, quanto maior a
quantidade de meio de cultura maior foi
o nmero de brotos obtidos por explante.
Este fato, muito provavelmente pode
ser decorrente da maior disponibilidade
de nutrientes s plantas.
importante ressaltar que o aumento na quantidade de meio talvez
possa tornar possvel a reduo na
concentrao de regulador de crescimento. Este fato foi evidenciado por
Preece (1995) em trabalho sobre a
composio de meio de cultura, no
qual observou que com a otimizao
de nutrientes salinos possvel reduzir
a concentrao ou at mesmo eliminar
a suplementao de reguladores de
crescimento. Segundo Ammiranto
(1983), meios de cultura contendo alta
concentrao salina, como o meio MS,
pode otimizar o crescimento e desenvolvimento de plantas, principalmente
pela presena do nitrognio sob a
forma de nitrato de amnia.
Estudos sobre a quantidade ideal de meio de cultura para o cultivo
de curau inexistem, encontrando-se
na literatura apenas informaes sobre concentraes e tipos de reguladores de crescimento. Embora no se
possam oferecer explicaes satisfatrias a respeito do assunto, os resultados obtidos evidenciaram o efeito
positivo na proliferao de brotos de
curau com o aumento da quantidade do meio lquido de cultura MS.
Na Tabela 1, so apresentados
os resultados obtidos com as diferentes concentraes de BAP na proliferao de brotos de curau a partir de
explantes obtidos de plntulas in
vitro. Houve diferenas significativas
entre as concentraes utilizadas.
O tratamento mais eficiente foi o
que continha o meio de cultura MS
suplementado com 2,5 mgL-1 de BAP,
produzindo em media 4,15 brotos/
explante, no diferindo porm do que
80

Tabela 1. Efeito de diferentes concentraes de BAP no nmero de


brotos de curau. Embrapa Amaznia Oriental. Belm, PA, 2003
Nmero mdio de
BAP (mg.L-1)
brotos/explante
0,0
0,71 d
1,5
1,33cd
2,5
4,15 a
3,0
2,25 bc
3,5
3,34 ab
4,5
2,15 bc
Mdias seguidas da mesma letra no diferem entre si pelo Teste de
Duncan ao nvel de 5% de probabilidade

Figura 3 - Efeito da quantidade de meio de cultura na formao de brotos de curau


aos 30 dias de cultivo. Embrapa Amaznia Oriental. Belm, PA, 2003.

continha 3,5 mgL-1 de BAP, que produziu em mdia 3,34 brotos/explante. O


tratamento menos eficiente foi aquele
na ausncia de BAP, produzindo em
mdia 0,71 brotos/explante. Resultados similares foram obtidos por Rios
(2002) em seu trabalho sobre a eficincia do BAP na proliferao de brotos
de curau.
Conforme a Figura 4, alm da
proliferao de brotos maior que 1cm
de comprimento, houve a proliferao
em grande nmero de brotos na forma
de rosetas na presena do meio de
cultura MS, suplementado com 2,5
mgL-1 de BAP. Marciani-Benzedeu et al
(1990) quando utilizaram a cultivar de
abacaxizeiro Smooth Cayenne obteveram maior nmero de brotos quando a
concentrao de BAP foi aumentada.
Estudos realizados por Lemos et al
(1998) revelaram que o BAP adicionado ao meio de cultura foi eficiente na
proliferao in vtro de brotos de
abacaxizeiro, cultivar Cabea-de-ona,
ocorrendo maior taxa de multiplicao
a medida que a concentrao do regulador de crescimento foi aumentada.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

Por outro lado, Menezes et al (1999)


em resultados preliminares sobre micropropagao de curau observaram
que houve intensa proliferao de brotos com a concentrao de 3mg.L-1 de
BAP, porm, ocorreu intensa oxidao
nos explantes. Bonilla (2002) estudou
o efeito do BAP adicionado aos meios
MS e WPM sobre a induo de brotaes
em segmentos nodais de Rudgea
viburnoides, observando maior taxa
de brotaes em ambos os meios de
cultura na presena de 2mg.L-1 de BAP.
Tem sido reportado que o efeito
benfico do BAP na multiplicao de
brotaes relaciona-se com a influencia deste regulador de crescimento na
diviso celular e na liberao das gemas auxiliares imitidas pela dominncia apical. Nesse sentido, supe-se
que, plantas que no apresentam uma
diviso celular eficiente, o uso de altas
dosagens de BAP em diferentes meio
de cultura proporcionaria aumento na
multiplicao de brotos. Entretanto,
algumas espcies so sensveis a altas
concentraes de reguladores de crescimento, sendo necessrio estudos para

Figura 4 - Proliferao de brotos de curau cultivado em meio MS na presena de 2,5


mgL-1 de BAP. Embrapa Amaznia Oriental, Belm, PA, 2003.

4. Concluso

Figura 5 - Vista parcial de mudas de


curau em fase de aclimatao. Embrapa
Amaznia Oriental. Belm, PA, 2003.

As quantidades de 10 e 15 ml do
meio lquido de cultura MS, suplementado com 2,5 mg.L-1 de BAP so
mais eficientes para proliferao de
brotos de curau;
Mudas de curau provenientes
da micropropagao podem ser cultivadas no campo com 100% de sobrevivncia.
Palavras-chave: Cultura de tecidos, reguladores de crescimento,
Ananas erectifolius.

5. Referncias
Bibliogrficas
Figura 6 - Mudas de curau cultivadas no
campo. Embrapa Amaznia Oriental.
Belm, PA, 2003.

determinar qual o meio de cultura e o


regulador de crescimento adequado
para cada espcie.
As plntulas formadas foram levadas para aclimatao e apresentaram
crescimento e desenvolvimento uniforme, conforme pode ser observado
na Figura 5. Aps, 30 dias de cultivo as
mudas foram cultivadas no campo. O
ndice de sobrevivncia no campo aos
6 meses de cultivo foi de 100%, no
sendo observada deficincia ou deformidade nas plantas (Figura 6).

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PREECE, J.E. Can nutrient salts
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1, p. 26-37, 1995.
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tecidos. Belm: UFPA, 12p, 2002
(Trabalho de Concluso de Curso
TCC).

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

81

Pesquisa

Cianobactria
Invasora
Aspectos moleculares e toxicolgicos de Cylindropermopsis raciborskii no Brasil

Maria do Carmo Bittencourt-Oliveira

Profa. Dra. do Departamento de Cincias Biolgicas


Laboratrio de Cianobactria, ESALQ - USP.
mbitt@esalq.usp.br

Renato Molica

Coord. do Lab. de Ecofisiologia de Microalgas (LEMI),


Instituto de Tecnologia de Pernambuco (ITEP).
renato@itep.br
Ilustraes cedidas pelos autores

A poluio presente nas bacias


hidrogrficas decorrente de fontes
antropognicas tem restringido a qualidade e, conseqentemente, a utilizao das guas para o abastecimento das populaes humanas, ocasionando srios problemas sade pblica e ao meio ambiente. Um dos
eventos ocorrentes nos ecossistemas
aquticos mais comumente associados a estas cargas poluidoras formadas, principalmente, por compostos
polifosfatados e nitrogenados, so as
floraes de cianobactrias (Figura
1). Floraes so crescimentos populacionais massivos e descontrolados
destes microorganismos em ecossistemas aquticos ocasionados por alteraes ambientais.
As floraes de cianobactrias
podem causar gosto e odor desagradveis na gua, alm de alterar o
equilbrio ecolgico do ecossistema
aqutico. O maior problema, entretanto, est no fato de produzirem
toxinas (cianotoxinas) extremamente potentes atingindo um conjunto
de organismos muito alm daqueles
presentes nas comunidades aquticas. As cianotoxinas podem ser acumuladas na rede trfica, ocasionando diferentes sintomas de intoxicao e efeitos crnicos, muitas vezes,
difceis de serem diagnosticados.
Mortandades de peixes e animais
silvestres e domsticos j foram
registrados em diversas partes do
mundo (Carmichael 1992).

Toxinas de cianobactrias
As cianobactrias produzem diferentes metablitos secundrios, sendo
alguns deles possuidores de ao
txica sobre diferentes organismos e
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Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

tipos celulares. As neurotoxinas e


hepatotoxinas, entretanto, podem ser
consideradas os principais agentes txicos produzidos pelas cianobactrias,
pois causam srios danos vida animal e sade humana, podendo at
mesmo levar a morte.
As neurotoxinas conhecidas at
hoje so: anatoxina-a, anatoxina-a
(s), saxitoxina e neosaxitoxina (Figura 2). Apesar de agirem de modo
distinto, tm como ao final a paralisao da atividade muscular, levando o animal morte por parada
respiratria aps poucos minutos de
exposio. As saxitoxinas foram inicialmente caracterizadas em espcies
de dinofceas marinhas e foram responsveis por diversos casos de intoxicao humana atravs do consumo
de mariscos contaminados.
As hepatotoxinas so as toxinas
produzidas por cianobactrias mais
comumente relacionadas com casos
de envenenamento animal e humano
em todo o mundo. As principais
hepatotoxinas so as microcistinas,
nodularinas - de natureza peptdica
e cilindrospermopsina (Figura 3), um
alcalide que tambm inibe a sntese
de protenas (Tabela 1).
O Brasil possui um recente histrico de relatos de contaminaes por
cianotoxinas, porm, muitos no foram comprovados. Um dos eventos
ocorridos, mas no comprovadamente associado s cianotoxinas, aconteceu na Bahia, onde oitenta e oito
pessoas morreram devido ao consumo de gua proveniente do reservatrio de Itaparica (Teixeira et al. 1993).
Contudo, o caso mais grave envolvendo a populao humana foi a
chamada Sndrome de Caruaru ocorrida na cidade de Caruaru, nordeste

do Brasil em 1996, quando 761 pacientes de uma clnica de hemodilise


foram a bito (Jochimsen et al. 1998;
Carmichael et al. 2001). Este incidente
levou a Fundao Nacional da Sade,
em colaborao com a Organizao
Panamericana da Sade, reviso da
portaria 36/MS/90, que definia as normas e os padres de potabilidade da
gua para consumo humano no Brasil. Atravs da homologao da Portaria n 1469/00/MS de 29/12/2000, a
Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria passou a exigir dos rgos competentes e responsveis pelo tratamento e fornecimento de gua o monitoramento da ocorrncia de
cianobactrias e algumas cianotoxinas, tanto na gua bruta do manancial
utilizado para a captao de gua,
como na gua tratada para consumo
(Brasil 2001).
A Portaria no 1469/00 tornou
obrigatria a anlise de microcistina
e recomenda a anlise de saxitoxinas
e cilindrospermopsina na gua tratada quando for comprovada a
toxicidade da florao no manancial
de abastecimento atravs de bioensaios com camundongos. Os valores
mximos permitidos (VMP) dessas
toxinas na gua tratada so de 1,0,
3,0 e 15,0 g.L-1 de microcistina,
equivalentes de saxitoxina e cilindrospermopsina, respectivamente.
Esses valores, que resultaram de estudos anteriores, levam em considerao a toxicidade dessas molculas
em testes com animais, alm de fato-

O que so cianobactrias?
Cianobactrias so microrganismos procariotos, de origem extremamente remota, geralmente aquticos, que realizam fotossntese
com liberao de oxignio, diferente de outras bactrias fotoautotrficas.
Devido ao fato de serem fotossintetizantes, aquticas e possurem um
pigmento azulado (ficocianina), so tradicionalmente chamadas de
algas azuis, apesar da distante relao filogentica com outros
grupos de organismos tambm denominados de algas. Acredita-se
que elas foram as responsveis pelo incio da formao da atmosfera
atual, rica em oxignio, e pela evoluo de todos os organismos
fotossintetizantes, visto que formas relacionadas s atuais cianobactrias,
provavelmente, originaram os cloroplastos atravs de um evento
endossimbitico.
As cianobactrias so predominantes no fitoplncton de guas
continentais, alcanando uma ampla diversidade de formas, devido s
adaptaes morfolgicas, bioqumicas e fisiolgicas adquiridas durante sua longa estria evolutiva. Algumas cianobactrias, tais como os
gneros Microcystis, Cylindrospermopsis, Anabaena, Aphanizomenon
e Planktothrix formam floraes onde h a liberao de toxina atravs
da lise celular.

Figura 1. Amostra de florao da cianobactria Microcystis aeruginosa (Ktz.) Ktz.


coletada no reservatrio de Carpina em 2002. b) Banhistas no reservatrio de Ingazeira,
em 1998, com florao neurotxica (presena de saxitoxinas) de Cylindrospermopsis
raciborskii . Ambos no estado de Pernambuco nordeste do Brasil. Fotos dos autores.

Tab ela 1. C aractersticas gerais d as to xin as pro d u zid as po r cian o b actrias e o s gn ero s em q u e fo ram
en co n trad as.
To xin a

C o mo e o n d e age
Gnero
I
n
i
b
i
d
o
r
a
d
a
s
e
n
z
i
m
a
s
f
o
s
f
a
t
a
s
e
s
1
e
M
i
c
r
o
c
y
s
t
i
s
,
A
n
a
b
a
e
n
a, Planktothrix (Oscillatoria),
a
Microcistina
2A - Fgado (hepatcitos)
Nostoc, Hapalosiphon e Anabaenopsis
Inibidora das enzimas fosfatases 1 e
a
Nodularina
Nodu laria
2A - Fgado (hepatcitos)
Cylindrosper mopsis, Umezakia, Aphanizomenon
a
Cilindrospermopsina IFngibaiddoo.ra de sntese proteica e Raphidiopsis
L
i
g
a
s
e
a
o
s
c
a
n
a
i
s
d
e
s

d
i
o
A
n
a
b
a
e
n
a
,
A
phanizomenon, L yngbya e
a
Saxitoxina
Membrana do axnio
Cylindrosper mopsis
Liga-se ao receptor da acetilcolina Anabaena, Plankt ot hrix (Oscillat oria),
a
Anatoxina-a
sinapse nervosa
Aphanizomenon, Raphidiopsis
I
n
i
b
i
d
o
r
a
d
e
a
c
e
t
i
l
c
o
l
i
n
e
s
t
e
r
a
s
e
Anatoxina-a(s)
Anabaena
Sinapse nervosa
a
Existem variantes estruturais com diferentes toxicidades
Fonte: Sivonen & Jones (1999), Li et al. ( 2001), Namikoshi et al. (2003).
___________________________________________________________

Dos 131 pacientes da clnica, 116 apresentaram sintomas de intoxicao. Destes, 100 desenvolveram problemas hepticos e 76
faleceram ao longo do estudo, que durou at outubro 1997. Destes 76, foram analisadas 52 amostras de fgado de 39 pacientes (todas
positivas para microcistina) (Carmichael et al. 2001).

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

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res de risco, que so aplicados no


clculo da dose mxima, entre eles,
a variabilidade inter e intra-espcie
e, no caso da microcistina, seu potencial carcinognico. Em relao
cilindrospermopsina, alguns autores,
baseados em resultados recentes que
mostram um potencial genotxico,
vm sugerindo que o VMP deva ser
menor, em torno de 2 g/L.
Figura 2. Estrutura das neurotoxinas produzidas pelas cianobactrias. a) anatoxina-a,
b) anatoxina-a(s) e c) saxitoxinas. Alteraes em R1, R2, R3, R4, R5 geram mais de 20
variantes conhecidas com diferentes toxicidades.

Figura 3. Estrutura geral das microcistinas, nodularinas e cilindrospermopsina. a)


Microcistina um heptapeptdeo cclico. X e Z representam os dois L-aminocidos que
podem variar e R1 e R2 so H ou CH3. b) Nodularina um pentapeptdeo cclico. Z
representa um L-aminocido que pode variar e R1 e R2 so H ou CH3. c) Cilindropsermopsina um alcalide.
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Cepas brasileiras de
Cylindrospermopsis
raciborskii produzem
saxitoxinas
A espcie Cylindrospermopsis
raciborskii (ordem Nostocales) um
componente importante entre as espcies formadoras de floraes, pois
pode produzir hepatotoxinas,
neurotoxinas e citotoxinas (Chorus &
Bartram 1999).
O primeiro caso de intoxicao
humana provocada por esta espcie
ocorreu em 1979, na Austrlia, quando 141 pessoas, sendo a maioria crianas, aps consumirem gua de um
reservatrio que havia sido tratado
com algicida para eliminar uma
florao, apresentaram sintomas de
hepatoenterite (Hawkins et al 1985).
At ento, essa espcie era considerada como no-txica. Anlises posteriores demonstraram que o composto
responsvel pela intoxicao havia
sido a cilindrospermopsina (Ohtani
et al 1992). Tambm na Austrlia, em
1992, uma florao de C. raciborskii
produtora de cilindrospermopsina
causou a morte de bovinos. Apenas as
cepas australianas e uma tailandesa
de C. raciborskii, at hoje, demonstraram produzir cilindrospermopsina
e um anlogo no txico, denominado deoxicilindrospermopsina.
Em anlises realizadas pelo Laboratrio de Ecofisiologia de
Microalgas, do Instituto Tecnolgico
do Estado de Pernambuco, com amostras de floraes de C. raciborskii
que ocorreram entre 10 de abril e 24
de maio de 2002 no reservatrio
Tapacur (So Loureno da Mata,
PE) que abastece cerca de 1,3 milho
de habitantes na Regio Metropolitana de Recife, foi demonstrado efeitos
neurotxicos em bioensaios com camundongos. Anlises realizadas por
cromatografia lquida de alta eficincia (CLAE) indicaram a presena de

Figura 4. Anlise de saxitoxinas por cromatofrafia lquida de alta eficincia (CLAE) com detector
de fluorescncia e derivatizao ps-coluna de acordo com mtodo descrito por Oshima (1995).
Amostra de 8 de maio de 2002 da florao de C. raciborskii do reservatrio Tapacur (a). Foram
identificados trs picos, cujos tempos de reteno coincidem com os tempos de reteno dos
padres (b e c). Neosaxitoxina (NeoStx), saxitoxina (Stx) e dc-saxitoxina (dc-Stx).

saxitoxinas em amostra de gua bruta (Figura 4).


Cepas brasileiras de C. raciborskii
isoladas de diferentes regies do pas
demonstraram produzir saxitoxinas
(Lagos et al. 1999, Molica et al. 2002,
Bernard et al. 2003, Pomati et al. 2003).
As variantes de saxitoxinas caracterizadas a partir de amostras de cepas
brasileiras de C. raciborskii at o momento foram: saxitoxina, neosaxitoxina, dc-saxitoxina, dc-neosaxitoxina,
GTX-2, GTX-3, GTX-6 e uma nova
variante ainda no descrita.
Cepas europias de C. raciborskii
(alems, francesa, hngaras e portuguesas) demonstraram ter efeitos txicos quando testadas em bioensaios
com camundongos. Dependendo da
cepa, observou-se danos causados ao
fgado ou efeitos neurotxicos em
neurnios de moluscos (Bernard et al
2003, Saker et al 2003, Kiss et al 2002).
Em todos esses casos, entretanto, no
se identificou a produo de cilindrospermopsina, nem tampouco de saxitoxinas por essas cepas. Provavelmente
trata-se de um novo composto, cuja
estrutura qumica e atividade toxicolgica ainda precisam ser determinadas.

Figura 5: Ocorrncia de C. raciborskii no mundo segundo Padisk (1997). 1. Indonsia. 2. Filipinas. 3. Bruma. 4. China. 5. ndia. 6. Sri Lanka. 7. Austrlia.
8. Repblica Democrtica do Congo, Malaui, Qunia, Ruanda, Zambia, Zimbabue, Uganda. 9. frica do Sul. 10. Nigria. 11. Rio Nilo. 12. Moldvia,
Turquimenisto, Afeganisto, Cazaquisto, Rssia, Usbequisto, Mar Cspio. 13. Alemanha, ustria, Frana. 14. Espanha. 15. Grcia. 16. Hungria. 17.
Minenesota, EUA. 18. Kansas, Estados Unidos 19. Texas, Estados Unidos. 20. Flrida, Estados Unidos. 21. Mxico. 22. Nicargua. 23. Cuba. 24. Venezuela.
25. Brasil. a. Lago Parano, DF; b. Lago da Pampulha, MG; c. Reservatrio de Itaip, PR; d. Lagoa dos Patos, Lago Chins e Lago Gacho, RS.
Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

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Tabela 2 -Ocorrncia da espcie Cylindrospermopsis raciborskii


em reservatrios de diversos Estados do pas e no Distrito Federal.
Localizao
Distrito Federal
Esprito Santo
Gois
Minas Gerais
Paraba
Paran
Pernambuco
Rio de Janeiro
Rio Grande do Norte
Rio Grande do Sul
Santa Catarina
So Paulo
Tocantins

Referncia*
Branco & Senna (1991)
Fernandes (2003)
Bazza et al. (1999)
Jardim et al. (2001)
Mendes et al. (2003)
Borges et al. (2003)
Bouvy et al. (2000)
Huszar et al. (2000)
Panosso et al. (2003)
Proena et al. (2002)
Komkov et al. (1999)
Souza et al. (1998)
Silva et al. (2003)

* Citou-se apenas uma referncia por estado, porm a maioria possui mais
de um registro.

Figura 6. Filamentos retos e espiralados de C. raciborskii. a-d) Cepa espiralada Recife/


PE-Brasil com heterocitos (clula especializada na fixao do N2 atmosfrico) terminais.
a e c. contraste de fase evidenciando os aertopos que so responsveis pela flutuao
e migrao do filamento na coluna dgua. e) Cepa reta Arcoverde/PE-Brasil com
heterocitos terminais. f) Material da natureza no cultivado coletado no reservatrio de
Jucazinho-PE. Fotos dos autores.
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Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

A invaso de
Cylindrospermopsis
raciborskii
A espcie Cylindrospermopsis
raciborskii (Woloszynska) Seenayya et
Subba Raju foi descrita pela primeira
vez em Java e adjacncias e tornou-se
extremamente invasiva, ocorrendo tanto em guas de regies tropicais e
subtropicais como temperadas (Padisk
1997, Bouvy et al. 2000) (Figura 5).
Apesar de poderem ser dominantes
durante o ano todo, so mais comumente
encontrados em perodos restritos, geralmente secos e de baixa pluviosidade.
Esta cianobactria possui mltiplas estratgias adaptativas, tais como resistncia herbivoria, tolerncia s baixas
irradiaes, possibilidade de migrao
na coluna dgua buscando estratos
ricos em nutrientes e luz, tolerncia s
altas concentraes inicas, armazenamento e utilizao de reservas
intracelulares de fsforo, alta afinidade
ao NH4+ que a forma energeticamente
mais acessvel de nitrognio, ou na sua
falta, podem fixar o N2 atmosfrico e
flexibilidade s grandes variaes de
condutividade eltrica.
Nas duas ltimas dcadas documenta-se a freqente ocorrncia de C.
raciborskii nas guas dos reservatrios
e audes em diversos estados do Brasil
(Tabela 2). Uma das regies com intensos registros de sua presena a
Nordeste, mais especificamente o estado de Pernambuco (Bouvy et al. 1999,
2000; Huszar et al. 2000). Os reservatrios desta regio possuem excelentes
condies para o desenvolvimento
desta espcie, tais como, corpos dgua
rasos, estabilidade na coluna dgua
devido pluviosidade baixa, longo
tempo de reteno da gua (ou ausncia de renovao), irradiaes e temperatura altas alm de valores de pH
acima de 8,0 (Bouvy et al. 2000).
Segundo Bouvy et al. (2000), dos 39
reservatrios amostrados por todo estado de Pernambuco, entre setembro e
novembro de 1998, 31 apresentaram
floraes de C. raciborskii e, em 17
destes, esta cianobactria representou
50% da densidade do fitoplncton total. No mesmo perodo, situao semelhante foi relatada na Austrlia no
estado de Queensland entre outubro
de 1997 e junho de 1999. Dos 47
reservatrios de gua amostrados, 35
apresentaram populaes de C.

raciborskii (McGregor & Fabbro 2000),


sendo que em 15 esta espcie foi
dominante sazonalmente e em 1 durante o ano inteiro.

Morfologia de
Cylindrospermopsis
raciborskii
Segundo os critrios morfolgicos tradicionais, a forma do filamento
um carter taxonmico que distingue espcies diferentes. Segundo
Komarkov (1998), as formas retas
so identificadas como C. raciborskii
e as espiraladas C. philippinensis
(Taylor) Komrek e C. catemaco
Komarkov-Legnerov et Tavera. No
entanto, admite-se atualmente que
prprio de C. raciborskii apresentar
uma extensa plasticidade fenotpica
refletindo-se em filamentos retos,
sigmides ou espiralados que podem
ocorrer simultaneamente (Figura 6).
Filamentos espiralados de C.
raciborskii, apesar de distribuio mais
restrita no mundo, so freqentemente relatados para o norte da Austrlia,
em Queensland (Fabbro et al 1996,
McGregor & Fabbro 2000, Saker et al.
1999, Dyble et al. 2002) e sudeste da
Amrica do Norte, na Flrida. No Brasil, do nosso conhecimento, populaes de C. raciborskii com filamentos
espiralados apenas foram registrados
para a regio Nordeste (Bouvy et al.
1999, 2000) (Figura 6).
Populaes com filamentos retos
e espiralados de um lago na Austrlia
foram caracterizadas geneticamente
atravs das anlises de seqncias do
16SrRNA (Saker et al. 1999). Formas
retas e espiraladas apresentaram-se
com alta similaridade gentica (99,8%)
indicando que se tratava de uma nica
espcie, apesar dos seus comportamentos levemente diferenciados em
testes ecofisiolgicos (Saker et al. 1999,
Saker & Neilan 2001). Wilson et al.
(2000), utilizando uma tcnica mais
discriminatria do que a anterior, encontraram resultados semelhantes atravs de seqncias do rpoC1, que codifica para a subunidade da RNA
polimerase, obtidas por iniciadores
desenhados especificamente para
Cylindrospermopsis. Entretanto, as cepas com morfologia espiralada foram
agrupadas utilizando-se RAPD (random
amplified polymorphic DNA) e STRR
(short-sequence tandem repeat region)

(Wilson et al. 2000, Neilan et al. 2003).


Apesar de esta espcie ter sido
descrita como um txon de interesse
apenas em reas tropicais, floraes
tm sido freqentemente registradas
em regies temperadas da Austrlia,
Europa e nas Amricas do Norte e Sul
levando pesquisadores de diversas
partes do mundo a se dedicarem ao
estudo da espcie.

O uso de seqncias de
DNA como ferramenta
bsica no entendimento da
disperso e produo de
toxinas
Genes que codificam para a cficocianina como o cpcB e cpcA esto
presentes em todas as cianobactrias
e ausentes em outras bactrias e
microalgas. As regies espaadoras
entre estes genes tm se tornado uma
alternativa para a utilizao daquelas
altamente conservadas. A regio do
locus da ficocianina possui seqncias com taxas de substituies mais
altas do que aquelas do 16S rDNA
(Nelissen et al 1996, Ishida et al. 1997,
Lyra et al. 2001).
Neste estudo foram utilizadas seqncias inditas obtidas do espaador
intergnico do operon da ficocianina
(cpcBA-IGS) de cepas C. raciborskii
com morfologias reta e espiralada de
dois corpos dgua do nordeste do
Brasil. Alm destas, foram utilizadas
seqncias de cepas australianas, europias e americanas disponveis no
GenBank. Nmero de acesso s seqncias esto na Figura 7.
As 19 cepas analisadas apresentaram-se com alta similaridade gentica
mostrando tratar-se de uma nica espcie (Figura 7). Porm, foram claramente distribudas em dois grupos:
Grupo 1) com cepas australianas,
produtoras de cilindrospermopsina, e
europias (Alemanha, Hungria e Portugal), no-produtoras de cilindrospermopsina, mas sim de um composto
txico ainda no caracterizado (Neilan
et al. 2003); e Grupo 2) com cepas
americanas (EUA e Brasil). No grupo 1
no foram evidenciadas distines entre
regies geogrficas, toxinas produzidas e morfologias reta e espiralada.
O grupo 2 apresentou cepas distribudas segundo a regio geogrfica
(Flrida e Brasil) e morfologia do
filamento (espiralado ou reto). Con-

tudo, a nica exceo foi a cepa


Arcoverde/PE-Brasil que no se agrupou segundo os critrios acima. Das
cepas americanas, apenas as de
Billings/SP-Brasil e Amparo/SP-Brasil (Lagos et al. 1999) tiveram suas
toxinas analisadas atravs de CLAE e
constatou-se a presena de saxitoxinas. At o momento, em nenhuma
linhagem analisada de C. raciborskii
foi constatada a presena de cilindrospermopsina (Proena et al. 2000;
Molica et al. 2002). Em bioensaios
com camundongos a cepa Arcoverde/
PE-Brasil produziu efeitos neurotxicos, enquanto a Recife/PE-Brasil foi
txica, porm no foi possvel determinar a natureza da toxina. Todas as
cepas brasileiras de C. raciborskii
txicas analisadas at hoje foram produtoras de saxitoxinas.

Consideraes finais
As seqncias do cpcBA-IGS possibilitaram, de uma forma geral, a distino entre regies geogrficas e
morfologias espiralada e reta entre as
cepas americanas, mas no entre as
australianas e europias. Isto poderia
indicar que h outros fatores refletidos
nas informaes moleculares que estariam influenciando na topologia do
cladograma. Apesar da necessidade de
maior detalhamento e nmero de isolados de C. raciborskii analisados em
relao aos seus aspectos moleculares,
toxicolgicos e ecofisiolgicos, h indcios que haja uma ligao entre o
composto txico produzido e sua distribuio geogrfica. Baseado nisto,
pode-se propor que populaes australianas, europias e americanas evoluram separadamente aps a separao dos continentes, contrariando as
especulaes de Padisk (1997), segundo as quais, a Austrlia e frica
seriam os centros de radiao de C.
raciborskii para Europa e Amrica por
possurem ambientais mais favorveis
ao desenvolvimento destas populaes.
Segundo um modelo evolutivo
proposto para eucariotos com reproduo sexuada (Brussard 1984), populaes geneticamente diversas esto no
centro da variao de uma espcie,
enquanto que aquelas s margens apresentam-se mais homogneas. Para Dyble
et al. (2002), a grande diversidade gentica encontrada entre as cepas americanas quando comparadas com as austra-

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Figura 7. Cladograma obtido atravs do mtodo de Neighbor-joining utilizando 576


a 600 pares de base do cpcBA-IGS de cepas de C. raciborskii de diferentes regies
geogrficas.
CYL: presena de cilindrospermopsina. ND: presena de um composto novo no
descrito e ausncia de cilindrospermopsina. SXT: presena de saxitoxinas. Todas as
toxinas confirmadas atravs de CLAE (segundo Neilan et al. 2003).
* Produziu efeitos neurotxicos atravs de bioensaios com camundongos
**
Txica. Toxina no avaliada.
_________________________________________________________________________

lianas e europias, pode indicar introduo recente da espcie ou evoluo


molecular acelerada. A diversidade gentica de cianobactrias no Brasil ainda
pouca estudada, mas h dados que
evidenciaram a alta variabilidade em
cepas de Microcystis nas quais gentipos
diferentes coexistem em diversos corpos dgua do Brasil, utilizando o
cpcBA-IGS (Bittencourt-Oliveira et al
2001) e o gene mcyB, que codifica para
a sintetase de microcistina (BittencourtOliveira 2003).
88

C. raciborskii foi registrada pela


primeira vez na Amrica do Norte em
1955 (Prescott & Andrews 1955) e, no
Brasil, iniciaram-se os relatos de floraes
aps o enchimento do lago Parano-DF
em 1960 (Palmer 1969). Comparando-se
com os primeiros registros de C.
raciborskii no mundo (Padisk 1997) a
presena desta cianobactria na Amrica no um evento recente, porm o
aumento das floraes parece estar relacionado ao favorecimento das condies ambientais.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

As populaes presentes em corpos dgua americanos podem ser


resultados de uma evoluo molecular acelerada favorecida pelas condies ambientais altamente propcias
introduo de novas linhagens e o
constante intercmbio gentico promovido por aves migratrias entre
Amrica do Norte e Sul. Diversas
espcies de maaricos (Scolopacidae)
tais como Tringa solitaria, T. flavipes,
T. melanoleuca etc., vindo da Amrica do Norte cruzam o Brasil em
direo ao sul com diversas paradas
para descanso e alimentao em guas
calmas o que possibilitaria agirem
como vetores na disperso de esporos.
A diversidade gentica encontrada em determinadas regies pode ser
o resultado de estresse ambiental
(Dvornyk & Nevo 2003) causado por
diversos fatores naturais (por ex.: El
Nio) ou antropognicos (por ex.:
poluio). Alm disso, mutaes neutras, eventos de recombinao e elementos mveis podem favorecer o
estabelecimento de populaes geneticamente polimrficas.
A invaso crescente de C.
raciborskii, produtora de diversos compostos txicos em corpos dgua por
todo o mundo, principalmente em regies onde no havia qualquer registro
de sua ocorrncia, alerta para a premente necessidade de investigaes
genticas em populaes de diferentes
regies geogrficas para subsidiar o
entendimento atual em relao produo de toxinas, limites ecofisiolgicos
e disperso, visando o manejo destas
populaes na natureza.

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Pesquisa

Marcadores Moleculares e
Geminivrus
Identificao de marcadores moleculares em populaes de tomateiro resistentes a geminivrus

Loiva Maria Karnopp, Dra.

Engenheira Agrnoma,
Doutora em Cincias Biolgicas.
Laboratrio de Gentica Molecular - UFPE.
loivamaria@bol.com.br; loiva@pop.com.br
Ilustraes cedidas pela autora

Introduo
O processamento do tomate
um dos segmentos mais importantes
da indstria agroalimentar brasileira
e vem ganhando mais adeptos, j que
a rea plantada com tomate rasteiro
cresceu bastante na dcada de 90.
Dos 60 mil hectares de tomateiro
cultivados, cerca de 40% so destinados indstria. O valor global de
mercado foi de US$800 milhes na
virada do milnio (Filgueira, 2000).
As principais reas de produo encontram-se nas Regies Nordeste,
Centro-Oeste e Sudeste (Faria et al.,
2000). O tomate a hortalia com
maior volume de comercializao no
Brasil 3 milhes de toneladas por
ano (IBGE, 2000).
No incio da dcada de 90, a
agroindstria de tomate expandiu-se
para novas regies, especialmente no
Cerrado, compreendendo reas dos
Estados de Gois e de Minas Gerais.
Em 2000, o Cerrado tornou-se a mais
importante zona de produo de tomate industrial do pas, com 77% da
rea plantada, seguido de So Paulo,
com 14%, e da Regio Nordeste, com
apenas 9% (Melo, 2001). Naquele perodo, tambm houve um incremento
extraordinrio da produtividade, que,
de cerca de 34,6 t/ha, em 1990, foi
para 67 t/ha, na safra de 2000.
Um fator limitante no cultivo do
tomateiro so as doenas virticas,
principalmente, devido dificuldade
de seu controle. No submdio So
Francisco (PE e BA), os principais
problemas esto relacionados com a
estrutura produtiva, embora as condi-

es agroecolgicas locais sejam favorveis obteno de matria-prima


de elevado padro de qualidade e a
custo mais baixo que nas demais
reas de produo do pas, como So
Paulo, Minas Gerais e Gois. Nessa
regio, a produo de tomate para
indstria est concentrada nas mos
de pequenos e mdios produtores
que, por utilizarem um sistema de
manejo tecnologicamente ineficiente,
obtm uma produtividade muito baixa, em torno de 30 t/ha nas ltimas
safras; enquanto, no interior de So
Paulo, esse ndice de 65 t/ha sob
condies climticas favorveis.
A produo mundial de tomate
para processamento industrial nos ltimos dez anos oscilou entre 22,6 e 29,6
milhes de toneladas anuais. Entre os
maiores produtores esto os Estados
Unidos, a Itlia, a Turquia, a Espanha,
a Grcia e o Brasil (Silva & Giordano,
2000). A previso de safra do tomate
para consumo e para a indstria, para
janeiro de 2003, foi de 3.567,080 toneladas, com um rendimento mdio de
58.422 kg/ha e uma rea plantada de
61.057 hectares (IBGE, 2003).
A famlia Geminiviridae possui
alguns dos fitovrus de maior importncia econmica no Brasil e no mundo. Juntamente com os Tospovirus,
os Geminivirus so considerados vrus emergentes, pois a incidncia e a
severidade das doenas causadas por
eles tm aumentado consideravelmente nas ltimas dcadas, o que
parece estar mais relacionado com a
exploso populacional de seus respectivos insetos vetores do que com
o vrus propriamente dito.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

91

Fig. 1. Padres de bandas de RAPD produzidos pelos primers OPP02, OPP03, OPP04, OPP05, OPP06 e OPP19. LA: linhagem
LA3473, resistente a geminivrus, VIRA: cultivar Viradoro, suscetvel a geminivrus, 1:10 e 1:50: diluies do DNA.

Os geminivrus, assim chamados por estar o seu DNA fita simples


disposto em dois componentes circulares, so vrus transmitidos por
moscas-brancas do complexo Bemisia
spp. que infectam dicotiledneas, e
que tm .causado severos danos em
diversas culturas pelo mundo, principalmente nas regies tropicais e
subtropicais. Em muitas reas, constituem-se o mais grave entrave para a
produo de mandioca, feijo, pimenta, tomate e algodo. No Brasil,
como em toda a Amrica Latina, os
geminivrus causam enormes prejuzos produo de feijo, infectandoo com a doena conhecida como
BGMV ou Mosaico Dourado do
Feijoeiro (Hanson & Maxwell, 1999).
A sintomatologia no parmetro suficiente para identificar e diferenciar os geminivrus porque os sintomas dependem da poca de infeco da planta, do hospedeiro (cultivar), de fatores ambientais, como altas temperaturas e pouca chuva, que
92

favorecem o aparecimento do vetor e


da ocorrncia de infeco viral mltipla. As tcnicas moleculares tm permitido o desenvolvimento de mtodos de deteco universal para toda
uma famlia ou ordem, ou especficos
para uma determinada espcie, de
forma eficiente, rpida, acurada e de
forma otimizada para vrus. A reao
em cadeia da polimerase (PCR) uma
tcnica especfica e extremamente
sensvel e tem sido utilizada para a
deteco e o estudo da variabilidade
gentica de geminivrus, tanto a partir
de tecidos de plantas como de DNA
extrado de insetos vetores (Mehta et
al., 1994, entre outros).
Os insetos do gnero Bemisia
so polfagos, com, pelo menos, 506
espcies de plantas hospedeiras distribudas em 74 famlias, entre monocotiledneas e dicotiledneas. Como
hospedeiros preferenciais desse inseto, esto as brssicas (brcolis, couveflor, repolho), as cucurbitceas (abobrinha, melo, chuchu, melancia, pe-

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

pino), as leguminosas (feijo, feijode-vagem, soja), as solanceas (berinjela, fumo, pimenta, tomate, pimento), o algodo, a uva e algumas
ornamentais, como o bico-de-papagaio (Euphorbia pulcherrima Willd.)
e o crisntemo (Chrysantemum
morifolium Ramat.). Tem sido tambm relatada a sua ocorrncia em
plantas daninhas, como, entre outras,
o pico (Bidens pilosa L.), jo-decapote (Nicandra physaloides (L.)
Gaertn.), datura (Datura stramonium
L.) guanxuma (Sida rhombifolia L.),
pinho manso (Jatropha gossypifolia
L.) e Macroptilium lathyroides (L.)
Urb. (Frana et al., 2000).
No Nordeste do Brasil, notadamente no Estado do Piau, o gnero
Bemisia ocorre em vrios hospedeiros. No entanto, na cultura do caupi
(Vigna unguiculata (L.) Walp) que
esse gnero tem maior importncia,
pois a espcie B. tabaci citada
como vetora do Mosaico Amarelo do
Caupi (Santos, 1982).

Os danos causados por B.


argentifolii podem ser de dois tipos:
direto, pela suco de seiva e ao
toxicognica, alm de liberao de
secrees aucaradas que favorecem
o desenvolvimento da fumagina, e
indireto, pela transmisso de vrus,
geralmente, pertencentes ao grupo
geminivrus. Com a introduo do
estilete no tecido vegetal, os insetos
(adultos e ninfas) provocam alteraes no desenvolvimento vegetativo
e reprodutivo da planta, debilitandoa e reduzindo, conseqentemente, a
produtividade e a qualidade dos frutos. Em altas densidades populacionais, as perdas podem chegar a 50%
na produo. As manchas clorticas
nas folhas so causadas pela injeo
de saliva das ninfas e adultos durante
a suco. Infestaes muito intensas
ocasionam murcha, queda de folhas e
perda de frutos (Frana et al., 2000).
Na cultura do tomate, os danos
diretos causados pela mosca branca
podem ser visualizados externamente
atravs de anomalias ou desordens
fitotxicas caracterizadas pelo amadurecimento irregular dos frutos, causado pela injeo de toxinas durante
a alimentao do inseto. Ao mesmo
tempo, as excrees aucaradas produzidas pela mosca favorecem o desenvolvimento da fumagina sobre os
frutos e folhas, reduzindo a capacidade fotossinttica da planta, e afetando
a qualidade e a produo dos frutos.
A desuniformidade na maturao dos
frutos dificulta o reconhecimento do
ponto de colheita e reduz, no caso de
tomate para indstria, a qualidade da
polpa (Haji et al., 1997).
De maneira geral, a ao dos vrus
apresenta como sintomas caractersticos o amarelecimento total da planta,
nanismo acentuado e severo enrugamento das folhas terminais das plantas,
podendo ocasionar perda total da produo (Haji et al., 1997). Quando o
vrus infecta plantas ainda jovens, essas tm o crescimento paralisado e as
perdas na produo podem variar de
40% a 70%. Para o tomate industrial,
tambm so relatados sintomas como
clorose, nanismo e encrespamento das
folhas, pouca florao e amadurecimento irregular dos frutos, causado,
provavelmente, por toxinas injetadas

pelo inseto, o que dificulta o reconhecimento do ponto de colheita desses


frutos e reduz a produo e a qualidade
da pasta, alm de reduzir o grau brix.
Internamente os frutos so esbranquiados, com aspecto esponjoso ou
isoporizados (Frana et al., 2000).

Geminivrus no Brasil
O primeiro relato de geminivrus em tomateiro, no Brasil, da
dcada de 70 (Maytis et al., 1975).
Seis diferentes vrus transmitidos pela
mosca-branca foram observados, sem,
entretanto, causarem danos de importncia econmica.
Em 1994, no Distrito Federal, foi
observada a ocorrncia de nova espcie de geminivrus no relatada em
outras regies do mundo (Ribeiro et
al., 1994). Em 1995, a virose expandiu-se por toda a Regio CentroOeste, causando perdas mdias de
40% a 100% (Bezerra et al., 1996).
Nos ltimos anos, foram observados em tomateiros, em vrias regies do Brasil, danos significativos
causados por geminivrus associados
ocorrncia de B. argentifolii (Frana
et al., 1996). Em Minas Gerais, Rezende
et al. (1996) e Zerbini et al. (1996)
observaram perdas superiores a 50%
da produo no cinturo verde de
Belo Horizonte e no Tringulo Mineiro. A clonagem e o seqenciamento
de fragmentos de DNA dos componentes A e B de geminivrus isolados
dessas duas regies indicaram tratarse de dois geminivrus distintos (Ribeiro et al., 1998b). Em So Paulo, um
novo geminivrus em tomateiro foi
descrito por Faria et al. (1997). O
surgimento quase simultneo de novos geminivrus que infectaram tomateiros na Regio Sudeste sugere uma
mudana nas populaes da moscabranca, com maior predominncia de
B. argentifolii sobre B. tabaci. Esse
fato criaria condies para que vrus
que infectam plantas selvagens invadam o tomateiro e, uma vez adaptados ao novo hospedeiro, dem origem a um novo vrus atravs de
recombinao ou reagrupamento de
componentes. Ressalte-se que os geminivrus vm sendo relatados em
plantas daninhas amplamente disse-

minadas naquela regio (Krause et al.,


1998, entre outros).
Na Regio Nordeste, o primeiro
relato de geminivrus foi em 1996, no
municpio de Seabra, na Bahia. Sintomas de mosaico amarelo foram observados em uma plantao de tomateiro
com incidncia da doena em 100% da
cultura. A anlise de tecido de plantas
sintomticas revelou a presena de
geminivrus com genoma bipartido
(Ribeiro et al., 1996). Naquelas reas,
100% das plantas com menos de dois
meses aps o transplante apresentavam-se infectadas (Bezerra et al., 1997).
Semelhantemente ao relatado para
outras regies, o aparecimento de
geminiviroses naquela rea ocorreu
aps o surgimento e a exploso da
populao de B. argentifolii em 1995 e
em 1996, em culturas de importncia
econmica para a regio, como melo,
melancia e tomate.
Em 1997, a doena foi relatada
no submdio So Francisco, a maior
regio produtora de tomate para processamento industrial do Brasil (Bezerra et al., 1997). At o momento, a
caracterizao molecular de geminivrus coletados no submdio So Francisco mostra a presena de trs novas
espcies no relatadas em outras regies do mundo. Foram encontradas
infeces mistas em uma planta, sugerindo que a situao mais complexa que a relatada at o momento em
outras regies (Ribeiro et al., 1998a).
De acordo com Faria et al., 1997,
ainda naquele ano foi detectada uma
nova espcie de geminivrus, denominada risca amarela da nervura do
tomateiro (tomato yellow vein streak
vrus, TYVSV). No Estado do Rio de
janeiro, foi tambm observada a presena de geminivrus em amostras
coletadas no municpio de Campos.
No ano de 1998, foi detectada a
presena de geminiviroses em material coletado no Cear (Bezerra et al.,
1998). Considerando-se o alto grau
de severidade de doenas causadas
por esses vrus, a relativa inexistncia
de fontes naturais de resistncia no
Brasil, a ampla gama de hospedeiros
(plantas daninhas, silvestres e plantas ornamentais) e a pouca informao referente s espcies encontradas no pas, essa , atualmente, a

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

93

principal doena de tomate nas regies produtoras dessa hortalia para


processamento industrial.

Tcnicas diagnsticas de
fitovrus
Os vrus de plantas so conhecidos por sua extraordinria diversidade gentica, tanto dentro da mesma
espcie como entre espcies diferentes. Para o diagnstico correto de
uma doena viral, muitas vezes fazse necessria a aplicao de dois ou
mais mtodos para o diagnstico
correto do vrus em estudo. A escolha deve ser funo da sensibilidade,
exatido e reprodutibilidade do mtodo, quantidade de amostras processadas em um determinado perodo de tempo, custo do material utilizado, sofisticao dos aparelhos e
adaptabilidade s condies de tempo (Zambolim, 1999). Diversos mtodos tm sido empregados para detectar geminivrus em tomate, incluindo tcnicas sorolgicas e PCR.

O RAPD
O RAPD (Random Amplified
Polymorphic DNA) uma tcnica
derivada da PCR. Uma das limitaes
da PCR a necessidade do conhecimento prvio das seqncias de nucleotdeos que flanqueiam a seqncia do DNA de interesse. Para que se
conheam essas seqncias, so necessrios a clonagem e o seqenciamento da regio. Por isso, com exceo de alguns genes de seqncia
conhecida, a PCR apresentou, inicialmente, uso limitado como tcnica
para a obteno de marcadores moleculares. O grande avano na rea de
marcadores moleculares baseados em
PCR ocorreu em 1990, com a idia de
se utilizar primers mais curtos e de
seqncia arbitrria na reao de amplificao, eliminando assim a necessidade do conhecimento prvio da
seqncia. Essa tcnica foi desenvolvida, independentemente, por dois
grupos nos Estados Unidos. Williams
et al., em 1990, patentearam a tecnologia com o nome mais comumente
utilizado, RAPD, ou seja, DNA polimrfico amplificado ao acaso.
94

Objetivo

Semeadura do material

Atravs da tcnica de RAPD,


possvel distinguir cultivares resistentes de cultivares suscetveis a
geminiviroses, gerando um padro
de bandas especfico para cada grupo. Folhas jovens de plantas da linhagem LA3473 e da cultivar Viradoro
foram submetidas anlise por RAPD
na tentativa de encontrar marcadores
que identificassem resistncia ou suscetibilidade.

Sementes da linhagem LA3473


e da cultivar Viradoro foram
semeadas em bandejas de isopor
prprias para este fim e colocadas
em casa de vegetao. A percentagem de germinao foi geralmente
superior a 85%. A coleta do material
foi efetuada aps emisso da terceira folha do tomateiro, em mdia,
com 29 a 35 dias de idade, guardando-se em sacos plsticos individuais, etiquetados e armazenados em
freezer a temperatura de 80C negativos at o momento da extrao
do DNA.

Material e mtodos
Viradoro uma cultivar destinada ao processamento industrial,
resistente ao Viracabea do tomateiro (Tospovrus), mancha-deestenflio (Stemphylium solani
Weber), murcha-de-fusarium
(Fusarium oxysporum (Schlecht.)
f. sp. Lycopersici (Fol) (Sacc.) raa
1) e ao nematide das galhas
(Meloidogyne spp.), porm suscetvel a geminivrus. Como caractersticas principais dessa cultivar podem ser citados: hbito de crescimento determinado, excelente cobertura dos frutos, sendo estes firmes e de formato quadrado-oblongo, maturao uniforme, com colorao externa vermelho-escuro
brilhante. O brix varia de 4,4% a
4,7% e o peso mdio dos frutos de
70 a 80 gramas. Em condies experimentais, Viradoro tem alcanado a
produtividade de 90 toneladas por
hectare. Essa cultivar foi selecionada a partir de cinco ciclos de autofecundao desenvolvidos aps o quarto retrocruzamento sucessivo para a
cultivar IPA-5, tendo como progenitor no recorrente a linhagem TSW10, com resistncia a Tospovrus.
A linhagem LA3473, resistente a
geminivrus, possui hbito de crescimento determinado mdio, porte mdio, frutos alongados de tamanho
mdio, produz aproximadamente 15
frutos por quilo e sua provvel origem Israel. Essa linhagem possui o
gene wilt, cujos sintomas so muito
semelhantes aos sintomas apresentados pelas plantas infectadas com geminivrus (Ednardo Ferraz, comunicao pessoal).

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

Extrao de DNA total


Para a extrao de DNA total,
utilizou-se o protocolo de Dellaporta
et al. (1983), com modificaes. Uma
pequena amostra de tecido foliar jovem (dois discos foliares) foi
macerada em nitrognio lquido e
colocada em um tubo eppendorf de
1,5 ml com 700 l do tampo de
extrao (100 M de EDTA, 2,5 M de
NH4Ac, 100 mM de tampo Tris, pH
8,0), sendo incubada em banho-maria
a 65C. Aps o resfriamento, adicionaram-se-lhe 600l de clorofil
(clorofrmio:lcool isoamlico 24:1)
e a mistura foi centrifugada por 5
minutos a 14.000 rpm. A fase aquosa
foi transferida para novos microtubos
e 1/10 do volume de SDS 20% + NaCl
1,4M foi-lhe adicionado. Aps a homogeneizao da soluo, repetiu-se
a extrao com 600 l de clorofil. A
fase aquosa foi transferida para novos microtubos. Adicionou-se 2/3 do
volume da soluo aquosa de
isopropanol gelado (-20C). A seguir, os microtubos foram centrifugados a 7.000 rpm por 4 minutos. O
sobrenadante foi descartado cuidadosamente. O pellet foi lavado duas
vezes em 1 ml de etanol 70% e uma
vez em etanol 95%. O etanol foi
descartado e o precipitado ficou a
temperatura ambiente para secar e,
posteriormente, foi ressuspenso em
100 l de tampo TE. Diversas diluies do DNA foram testadas, entre
elas: 1:10; 1:50; 1:100; 1:200; 1:500 e
1:1000.

RAPD
Foram empregados 20 primers da
srie OPP (Operon Technologies Inc.)
para a amplificao do material, cuja
mistura bsica continha: 10 ng de DNA/
ml, 2.5 l do tampo de PCR (Amersham
Pharmacia) (10X); 1.7 l de MgCl2 (25
mM); 1.25 l da soluo de dNTPs
(2mM cada); 2.5 l do primer (4M) e
0.4 l de Taq polimerase (5 U/ml); gua
q.s.p. 25 l. O material foi submetido s
seguintes etapas de amplificao: um
ciclo de desnaturao a 94oC por 3 min.
seguido por 94oC por 15 seg., 42oC por
30 seg. e 72oC por 1 minuto. As trs
ltimas etapas foram repetidas quarenta e trs vezes. A amplificao foi concluda a 72oC por 7 minutos.

Visualizao do produto de
amplificao
Os amplicons foram separados
em gel de poliacrilamida 6%. Os gis
foram fixados e digitalizados diretamente em scanner de mesa ou fotografados sob transiluminao com
luz branca e pelcula em cores.

Estimativa da quantidade
de DNA
A estimativa da quantidade de
DNA foi efetuada em gel de agarose
0,8% corado com brometo de etdeo,
utilizando-se um volume conhecido
de soluo de DNA (marcador de 100
pares de bases, Gibco) como padro
para inferir a concentrao de DNA
nas amostras.

Resultados e Discusso
A tcnica do RAPD muito utilizada para o estudo da diversidade gentica, construo de mapas genticos,
identificao de marcadores ligados a
resistncia a bactrias, fungos, vrus,
determinao da pureza e identificao de hbridos, entre outros (WeikertOliveira et al., 2002; Carvalho et al.,
2002). A velocidade, eficincia e
confiabilidade da metodologia RAPD
em conjunto com a anlise numrica,
torna essa tcnica particularmente apropriada na formulao de estratgias
para um manejo efetivo de colees de

germoplasma em termos de identificao de duplicatas, estimativa da diversidade, monitoramento da eroso gentica e aumento do uso das colees.
O mtodo de extrao usado para
obter DNA a partir de discos foliares de
tomateiros permitiu a obteno de DNA
com grau de pureza elevado, que pode
ser empregado em reaes de RAPD,
sem inibio da Taq polimerase por
componentes vegetais contaminantes.
O rendimento do mtodo permitiu
obter uma quantidade bastante varivel de DNA, tipicamente entre 2 e 20
g de DNA, para cada 2 discos foliares.
Dos 20 primers constantes do kit
OPP empregado, apenas 8 produziram
produtos de amplificao com DNA de
tomateiro. Ao se compararem os padres de bandas obtidos pela separao em eletroforese em SDS poliacrilamida dos produtos de amplificao
gerados no RAPD (Figura 1), 6 primers
mostraram ser discriminativos, produzindo um padro de bandas para a
cultivar Viradoro muito distinto daquele obtido para a linhagem LA3473. Para
todos esses primers, no foram obtidas
bandas para a linhagem LA3473 quando se empregou 1 l de DNA de tomate
previamente diludo 104 vezes em TE.
Ao contrrio, um padro composto
por, pelo menos, 3 bandas ntidas foi
obtido para a cultivar Viradoro nessas
condies. A reduo da quantidade
de DNA alvo na reao, pela diluio
prvia do DNA extrado das plantas em
5 x 104 vezes, resultou no aparecimento de uma a trs bandas de pouca
intensidade na amplificao do DNA
obtido da linhagem LA3473 para 4
primers, conservando o padro complexo de bandas para a outra cultivar,
para os 6 primers selecionados.
Os padres de bandas obtidos
para a cultivar Viradoro no foram idnticos quando foram empregadas duas
diluies distintas de DNA alvo: exceto
para o primer OPP5, os padres obtidos
tendiam a apresentar bandas de peso
molecular mais alto para a quantidade
maior de DNA alvo. Fontes e concentraes de primers diferentes influenciam
o padro de bandas e certos primers
produzem padres de bandas mais
confiveis quando usados em concentraes mais altas do que o usual,
provavelmente porque o DNA genmico

usado possui uma freqncia muito


rara de stios de anelamento para esses
primers, de modo que sua concentrao efetiva para amplificao diminuda no tubo da reao. Esse efeito
tambm foi observado no mesmo laboratrio quando se utilizou DNA de Musa
com os mesmos primers. No presente
trabalho, foi observado efeito semelhante no padro de bandas, com diferentes concentraes de DNA genmico,
como, por exemplo, para a cultivar
Viradoro, medida que havia um aumento da concentrao de DNA
genmico, bandas de maior peso molecular podiam ser visualizadas, com qualquer um dos cinco primers empregados, exceto o OPP5. A intensidade do
marcador RAPD est associada ao grau
de homologia entre o primer e a amostra ou amplificao de outros fragmentos da amostra, o que pode explicar
o aparecimento de bandas de menor
intensidade no presente trabalho. O
poder discriminatrio dos primers aleatrios no depende somente do nmero de padres gerados, mas tambm da
freqncia dos diferentes padres.

Concluso
Pode-se inferir deste trabalho que
a metodologia utilizada mostrou-se
satisfatria para a discriminao de
plantas de tomate resistentes e suscetveis a geminivrus, visto que foi
obtido um padro reproduzvel de
bandas para o material suscetvel.

Apoio Financeiro:
CAPES ( Coordenao de
Aperfeioamento de Pessoal de
Nvel Superior)

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Glucanases Fngicas
Pesquisa

Produo e aplicaes das -1,3 e -1,6 glucanases

Ellen Cristine Giese

Bacharel em Qumica, Mestranda em Biotecnologia


do Programa de Biotecnologia do Departamento de
Bioqumica, Universidade Estadual de Londrina - PR
ellengiese@bol.com.br

Aneli de Melo Barbosa

Farmacutica-Bioqumica, Dra em Bioqumica


(UFPR), Ps-doutora em Biotecnologia (Murdoch
University, Perth- WA, Austrlia), Profa. Associado C
do Departamento de Bioqumica - CCE, Universidade
Estadual de Londrina - PR
aneli@uel.br

Maria de Lourdes Corradi da Silva

Farmacutica-Bioqumica, Dra. em Bioqumica


(UFPR), Ps-doutora em Bioqumica (Ohio State
University, Columbus-OH,USA), Professora Assistente
Doutora do Departamento de Fsica, Qumica e
Biologia, Faculdade de Cincias e Tecnologia UNESP/Presidente Prudente - SP
corradi@prudente.unesp.br
Ilustraes cedidas pelos autores

Introduo
Exopolissacardeos so gomas
solveis em gua, produzidos por
uma ampla variedade de microrganismos e possuem propriedades fsicas peculiares, que favorecem o emprego nas indstrias alimentcias, farmacuticas, petrolferas, entre outras
(Margaritis & Pace, 1985). Estes
biopolmeros podem ser degradados
por hidrolases especficas denominadas polissacaridases (Sutherland,
1999). Estas enzimas, amplamente
distribudas em fungos, so classificadas como -glucanases quando
hidrolisam ligaes -D-glicosdicas
(Manners et al., 1976).
O crescente interesse no estudo
das -glucanases concentra-se no seu
potencial de aplicao industrial, considerando a sua ao hidroltica sobre diversas substncias naturais
(Warren, 1996; Kirk et al., 2002).
A atividade das glucanases ocorre em todos os estgios do ciclo de
vida fngico, incluindo a autlise. A
resistncia das hifas lise celular tem
sido atribuda ao equilbrio entre a
sntese e a hidrlise de uma variedade de ligaes -glicosdicas (White
et al., 2002). As -glucanases esto
localizadas tanto no citoplasma das
clulas fngicas, como tambm ligadas parede celular (Santos et al.,
1979).
O papel das -1,3-glucanases
fngicas na natureza parece estar
associado morfognese (Rapp,
1992). Em leveduras, estas hidrolases tm sido estudadas devido ao seu
papel na germinao, esporulao e
crescimento celular, sendo expres-

sas de diferentes maneiras durante o


crescimento vegetativo (McLeod et
al., 2003).
As -glucanases fngicas esto
associadas aos processos de sobrevivncia, degradao de polissacardeos (Noronha et al., 2000), patogenicidade (Vzquez-Garcidueas et al.,
1998), sendo que durante muito tempo se acreditou que a funo original
destas enzimas estaria relacionada
promoo do crescimento e diviso
celular (McLeod et al., 2003).
Alguns fungos, tais como
Aspergillus, Fusarium, Rhizomucor
e Absidia, so patognicos para humanos. Algumas drogas antifngicas
agem sobre estes microrganismos,
estimulando a ao de enzimas envolvidas no metabolismo de glucanas,
como as exo--1,3-glucanases, que
esto associadas com a diminuio
da resistncia fagocitose (Lupetti et
al., 2003).
Em 1957, Stone descreveu a complexidade das -glucanases de
Aspergillus niger, relatando a presena de -1,3-glucanases nas preparaes de celulases provenientes deste
fungo. Reese e Mandels (1959) selecionaram 140 fungos produtores
constitutivos de -1,3-glucanases e,
atravs da anlise por cromatografia
em camada delgada (TLC) dos produtos resultantes da hidrlise enzimtica
de laminarina (-(13)-glucana), propuseram dois mecanismos de ao
para estas enzimas: (a) Endo-, constituindo uma ao randmica no substrato, resultando em oligossacardeos
de maior peso molecular e (b) Exo-,
produzindo glucose como nico produto de hidrlise.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

97

A cromatografia em camada delgada ainda utilizada para determinar o


modo de ao das -glucanases.
Campbell e colaboradores (2003) analisaram os produtos de hidrlise dos
filtrados de meio de cultivo de
Aureobasidium pullulans incubados
com laminarina, escleroglucana e
epiglucana e verificaram molculas de
glucose como os maiores produtos de
hidrlise. Esta observao sugere que a
hidrolase produzida por Aureobasidium
pullulans uma exo--1,3-glucanase.
Reese e colaboradores (1961)
foram os primeiros pesquisadores a
estudar as -1,6-glucanases fngicas,
cuja atividade parece estar associada
atividade de -1,3-glucanase, em
alguns microrganismos (Pitson et al.,
1991). Estes pesquisadores observaram que a hidrlise da pustulana ((16)-glucana) atravs de -1,6-glucanases resultou em molculas de
gentiotetraose, gentiotriose, gentiobiose e glucose, constatando que
estas enzimas so do tipo endo e
atuam randomicamente.
A ocorrncia de glucanas do
tipo -(16) na natureza rara,
sendo que geralmente as ligaes
glicosdicas deste tipo ocorrem em
conjunto com ligaes do tipo (13) em polmeros produzidos por
algas, leveduras, fungos e bactrias.

Em 1975, Villa e colaboradores


elaboraram uma hiptese sobre a existncia de uma exo--glucanase no
especfica, que apresentaria tanto atividade hidroltica nas ligaes do tipo
-(13) quanto -(16), em filtrados da levedura Pichia polymorpha.
Vrios estudos foram desenvolvidos
sobre polissacaridases fngicas com
atividade de -glucanases. A classificao destas enzimas est apresentada na Tabela 1.

Produo e regulao da
sntese de -1,3 e -1,6glucanases
A relao entre a atividade das
-glucanases e a sntese e degradao das -glucanas por seus respectivos fungos produtores ainda no foi
estabelecida (Pitson et al., 1991).
O fungo Sclerotium glucanicum
produtor de uma -(13)(16)glucana extracelular denominada escleroglucana. Rapp (1989) analisou a
produo desta -glucana e as respectivas hidrolases deste fungo utilizando
glucose 1% (p/v) como nica fonte de
carbono; observou um decrscimo do
EPS e da biomassa no meio de cultivo,
acompanhado do aumento da atividade das glucanases no perodo em que
a concentrao do substrato diminuiu.

A ocorrncia de atividade de 1,3 e -1,6-glucanase tambm foi


relatada no fungo Acremonium.
persicinum, o qual produtor de
uma -(13)-glucana extracelular.
Pitson e colaboradores (1991) verificaram a presena destas polissacaridases nos sobrenadantes do
meio de cultivo, assim como no
citoplasma e na parede celular
fngica.
O fungo Acremonium sp. tambm produtor de trs -1,3-glucanases e uma -1,6-glucanase extracelular somente na presena de
indutores como a laminarina,
pustulana ou escleroglucana. Jayus e
colaboradores (2002) analisaram a
produo de -1,3 e -1,6-glucanases por Acremonium sp.; sugeriram
que a atividade de -1,3-glucanase
encontra-se associada ao crescimento fngico, ao contrrio da atividade
da -1,6-glucanase.
Pitson e colaboradores (1997)
constataram que existe uma ao
sinrgica entre -glucanases e glucosidases em Acremonium.
persicinum, ou seja, os produtos de
hidrlise das -1,3 e -1,6-glucanases foram facilmente degradados
pelas -glucosidases, gerando principalmente glucose e tambm alguns
oligossacardeos.

Tabela 1. Classificao das polissacaridases e exemplos de fungos produtores de enzimas capazes de


hidrolisar -(1 3)- e -(1 6)-glucanas
Polissacaridases
Microrganismos
Referncias
Sclerotin a libertian a
Manners et al. (1976)
Pen icillium italicum
Santos et al. (1977)
Neurospora crassa
Del Rey et al. (1979)
Aspergillus n iger
Kry et al. (1989)
exo- -1,3-glucanases
Pen icillium oxalicum
Pitson et al. (1991)
Sclerotium glucan icum
Rapp (1992)
(EC 3.2.1.58)
Trichoderma harzian um
Noronha et al. (2000)
Acremon ium sp.
Jayus et al. (2002)
Aureobasidium pullulan s
Campbell et al. (2003)
Trichoderma asperellum
Bara et al. (2003)
Rhizopus arrhizu
Reese & Mendels (1959)
endo- -1,3-glucanases
Trichoderma harzian um
Vsquez-Garcidueas et al. (1988)
(EC 3.2.1.39)
Sclerotium glucan icum
Rapp (1992)
Pen icillium italicum
Santos et al. (1977)
Neurospora crassa
Del Rey et al. (1979)
endo- -1,6-glucanases
Sclerotium glucan icum
Rapp (1989)
Trichoderma harzian um
de la Cruz et al. (1993)
(EC 3.2.1.75)
Acremon ium sp.
Jayus et al. (2001)
Verticillium fun gicola
Amey et al. (2003)
Sclerotium glucan icum
Rapp (1989)
-glucosidases
Acremon ium persicin um
Pitson et al. (1997)
(EC 3.2.1.21)
Trichoderma atroviride
Donzelli et al. (2001)
98

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

A produo de -1,3-glucanases
por fungos que no produzem polissacardeos geralmente estimulada
pela presena de paredes celulares
purificadas de outros microrganismos.
Noronha e colaboradores (2000) verificaram um aumento significativo destas enzimas pelo Trichoderma
harzianum quando utilizaram paredes celulares fngicas purificadas de
Pythium sp., Rhizoctonia solani e
Sclerotium rolfsii como nica fonte de
carbono, o que tambm foi verificado
por Bara e colaboradores (2003) para
o fungo Trichoderma asperellum. Estes resultados sugerem que a regulao
da expresso de -1,3-glucanase nestes fungos pode ser influenciada pela
quantidade de -glucana presente no
meio de cultivo, que atua como agente indutor.
O excesso de glucose ou outra
fonte de carbono facilmente fermentvel reprime a produo de -glucanases
em alguns microrganismos. Rapp (1989)
observou que durante o crescimento do
Sclerotium glucanicum, em excesso de
glucose ou xilose, a atividade de glucanase no foi detectada. A presena
de glucose no meio de cultivo tambm
reprimiu a produo de -glucanases
em Acremonium persicinum (Pitson et
al., 1991) e em Trichoderna harzianum
(Noronha et al., 2000). A sntese de glucanases nestes microrganismos
regulada por represso catablica, sendo que esta forma de controle tem sido
observada em outros fungos, incluindo
Neurospora crassa, Penicillium italicum,
Sclerotium rolfsii e Schizophyllum
commune (Rapp, 1989).
A desrepresso da formao de glucanases em Sclerotium glucanicum
durante o crescimento em concentraes limitadas de glucose envolve extensiva autlise dos miclios fngicos

e a degradao da -glucana produzida (Rapp, 1992). Durante a desrepresso, os oligmeros gerados da parede
celular, durante a autlise, aumentam
a atividade das -glucanases, devido a
seu curto tempo de permanncia no
meio de cultivo (White et al., 2002).
A regulao exercida pela
glucose envolve a represso da expresso dos genes que codificam
estas enzimas. Uma vez consumida a
fonte de carbono, ocorre a desrepresso, resultando na sntese das 1,3-glucanases (Noronha et al., 2000).
A regulao e a sntese das glucanases esto sujeitas a diferentes
mecanismos de controle, sendo que
estas diferenas podem ser explicadas pelo papel metablico exercido
de acordo com cada microrganismo.
No fungo Trichoderma viride, a sntese de -1,3-glucanase acompanha
seu desenvolvimento celular (Del Rey
et al., 1979), enquanto que em
Neurospora crassa e Penicillium
italicum a produo destas enzimas
ocorre paralelamente reduo do
seu crescimento (Santos et al., 1977).
A glucose no reprime a produo
de -glucanases pelo fungo filamentoso
Trichoderma viride e as enzimas so
produzidas durante o crescimento na
presena deste monossacardeo. Neste
fungo, as -glucanases podem estar
envolvidas nos processos de formao
da parede celular, j que a atividade
especfica destas enzimas aumenta durante o crescimento exponencial deste
microrganismo (Del Rey et al., 1979). A
glucose tambm no exerce represso
na produo de -1,3-glucanases por
leveduras, podendo atuar at como
agente indutor em alguns casos
(Saligkarias et al., 2002).
Estudos sobre a regulao da
sntese de -1,3-glucanases pela fonte

de nitrognio tambm tm sido realizados (Pitson et al.,1996). O conhecimento dos mecanismos controladores
da atividade destas polissacaridases
fundamental para se exercer o controle sobre a autlise dos fungos
filamentosos, seja para induo, nos
casos de controle biolgico, como na
preveno, para aumentar a produo
de metablitos de interesse em
bioprocessos (White et al., 2002).

Beta glucanases:
propriedades, atividade e
inibio
Laminarina e pustulana so geralmente usadas como substratos nos
ensaios enzimticos utilizados na determinao das atividades de -1,3 e
-1,6-glucanases, respectivamente
(Rapp, 1989). Os parmetros cinticos
destas polissacaridases variam de acordo com o microrganismo estudado.
A atividade das -glucanases
pode ser inibida pela presena de
compostos como clorofrmio,
benzenides, organofosfatos, quelantes, entre outros, podendo ocorrer
inibio devido a concentraes elevadas de substrato e tambm dos
produtos reacionais (Rana et al.,
2003). Certos ctions e nions assim
como compostos quelantes e detergentes tambm podem inibir as glucanases em diferentes nveis. A
Tabela 2 mostra o efeito de diferentes metais e compostos inibidores de
-glucanases fngicas.
Notario e colaboradores (1976)
verificaram que as -glucanases so
protenas cidas, carregadas negativamente. A composio em aminocidos revelou alta porcentagem em
aminocidos cidos alm de glicina e
alanina em grandes propores.

Tabela 2. Efeito de diferentes metais e compostos sobre a atividade de -glucanases fngicas.


Compostos
Microrganismo
Referncias
Dubordieu et al.(1985)
T. harzian um
Singh et al.(1990)
Cu2+, NH4+,EDTA,
Alta Inibio
S. glucan icum
Rapp (1992)
+
2+
Hg , Pb , SDS
A. n iger
Noronha & Ulhoa (2000)
Rana et al (2003)
Inibio
T. harzian um
Singh et al.(1990)
2+
2+
+
Mn , Fe , Na
Moderada
A. n iger
Rana et al. (2003)
Dubordieu et al.(1985)
T. harzian um
CN-, PO43-, Co2+,
No Inibitria
Singh et al.(1990)
2+
2+
A. n iger
Ca , Zn
Noronha & Ulhoa (2000)
Ao

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

99

Atravs da purificao das -1,3glucanases fngicas, foi verificado que


os microrganismos no produzem uma
protena especfica, e, sim, um conjunto de protenas com diferentes
massas moleculares, pH e temperatura timos, porm, com a mesma especificidade, ou seja, estes fungos produzem -1,3-glucanases diversas.
Os possveis motivos da existncia desta multiplicidade enzimtica inclui a expresso de genes diferentes e as possveis modificaes
ps-traducional (Jayus et al., 2001).
O Trichoderma harzianum, por
exemplo, descrito na literatura como
produtor de um complexo enzimtico
que contm pelo menos sete -1,3glucanases induzidas (VzquezGarcidueas et al.,1998). Noronha e
Ulhoa (2000) purificaram uma -1,3glucanase de 29kDa produzida por
Trichoderma harzianum; compararam os parmetros cinticos e de
inibio enzimtica desta hidrolase
com outras previamente purificadas
e concluram que cada enzima produzida por este microrganismo diferente, e provavelmente, seja codificada por genes diferentes. Bara e
colaboradores (2003) tambm purificaram as -1,3-glucanases produzidas por Trichoderma asperellum e
verificaram que este microrganismo
produtor de duas protenas com
esta atividade.
Jayus e colaboradores (2001)
purificaram uma -1,6-glucanase
produzida por Acremonium sp.;
verificaram que o peso molecular,

Aplicao
Controle
Biolgico

Dieta Animal

Obteno de
Protoplastos
Extrato de
levedura
Melhoramento
do vinho
100

o pH e temperatura timos, eram


similares a outras -1,6-glucanases
microbianas estudadas, como as
de Trichoderma harzianum e
Acremonium persicinum.

Aplicaes biotecnolgicas
das polissacaridases
As aplicaes biotecnolgicas
dos polissacardeos so limitadas,
devido aos problemas relacionados
com as modificaes fsicas, qumicas e enzimticas, que so necessrias para o desenvolvimento de novos
produtos (Ramesh & Tharanathan,
2003).
Tcnicas de fermentao e biotecnologia tm sido desenvolvidas
com o objetivo de sintetizar e modificar carboidratos, sendo baseadas
essencialmente no uso de polissacardeos. No entanto, h dificuldades
em tornar alguns processos economicamente viveis e tambm de se
obter enzimas especficas para a converso de determinados substratos
(Vandamme & Soetaert, 1995).
A Tabela 3 apresenta algumas
das aplicaes biotecnolgicas das
-glucanases de origem fngica.
O uso de enzimas pode representar uma via alternativa, devido
sua alta especificidade, na identificao qumica das -glucanas fngicas
(Sutherland, 1984).
As -1,3-glucanases so especficas para substratos contendo seqncias lineares de trs ou mais unidades
de glucose unidas atravs por liga-

es glicosdicas do tipo -(13) contendo uma extremidade terminal noredutora. No entanto, um grau de
substituio moderado de resduos de
glucose pode ser tolerado, e as -1,3glucanases podem atuar sobre (13)(16)-glucanas, por exemplo
(Manners et al., 1976). Rapp (1992)
analisou os produtos de hidrlise de
laminarina e escleroglucana, utilizando a enzima parcialmente purificada
produzida por Sclerotium glucanicum.
Sob as condies da anlise, a glucose
foi o nico produto resultante da
hidrlise da laminarina, enquanto que
glucose e gentiobiose foram os produtos formados na hidrlise da escleroglucana.
Kry e colaboradores (1991) utilizaram uma preparao enzimtica
contendo -1,3-glucanases produzidas pelo fungo Aspergillus niger,
para degradar uma glucana insolvel de levedura, em fragmentos menores e solveis em gua. A hidrlise
da parede celular de Saccharomyces
cerevisiae foi realizada no pH timo
de ao da -1,3-glucanase utilizada. Os fragmentos obtidos foram
separados por cromatografia de excluso molecular em Sephadex G50, sendo que mudanas no peso
molecular dos fragmentos de glucana
foram observadas de acordo com o
tempo de hidrlise.
As -(13)-glucanas tm sido
investigadas por apresentarem uma
variedade de respostas biolgicas
de defesa. Estas molculas de cadeia linear e elevada massa molecu-

Tabela 3. Aplicaes biotecnolgicas das -glucanases de origem fngica.


Origem
Referncias
T. harzian um
Benhamou & Chet (1997)
Vsquez-Garcidueas et al. (1998),
T. atroviride
Donzelli et al. (2001)
T. asperellum
Bara et al. (2003)
Verticillium fun gicola
Amey et al. (2003)
T. lon gibrachiatum
Bedford (1995), Yin et al. (2001)
T. reesei
Coenem et al. (1995)
Complexo Enzimtico (Kyowa Hakko Co.)
Li et al. (1996)
Complexo Enzimtico ( -amilase, -glucanase,
Medel et al. (2002)
xilanase)
-glucanase (BDH), Novozym 234 (Novo)
Hamlym et al. (1981)
T. harzian um
Muralidhar et al. (2003)
-1,3-glucan ases fn gicas
Zverlov et al. (1997)
T. harzian um

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

Elving & Pedersen (2003)

lar so insolveis em solues aquosas neutras, enquanto seus oligmeros de baixo peso molecular so
altamente solveis (Ramesh &
Tharanathan, 2003). A solubilidade
exerce influncia significativa na
eficincia da ligao do polissacardeo com o receptor, afetando o seu
efeito imunolgico (Tokunaka et al.,
2002). Muitas -glucanas fngicas
possuem ao imunomoduladora
quando administradas de maneira
intravenosa ou intraperitonial. A utilizao de -glucanas insolveis
pode resultar na formao de
granulomas, inflamaes e dor, quando administradas atravs da via
parental (Sandula et al. 1999).
Segundo Colleoni-Sirghie e colaboradores (2003) propriedades fsicas das -glucanas, como a viscosidade e a solubilidade, dependem
no somente do grau de polimerizao, como tambm das pequenas
diferenas estruturais de cada polissacardeo. A substituio de resduos
-(16)-glicosdicos na cadeia polissacardica favorece a solubilizao
de -(13)-glucanas em solues
aquosas. Estudos por RMN e difrao
de raio-x tm demonstrado que estas
substituies conferem s -glucanas
uma conformao em tripla hlice
(Ramesh & Tharanathan, 2003).
A aplicao teraputica dos
exopolissacardeos tambm depende da conformao espacial e das
propriedades reolgicas especficas
de cada macromolcula. A lentinana,
uma -(13)-glucana produzida por
Lentinus edodes, aumenta a resistncia do organismo contra infeces por parasitas e sua forma
sulfatada est sendo estudada por
exibir potente ao anti-HIV. A
laminarina, produzida pela alga
Laminaria digitata, tambm uma
-(13)-glucana, porm, no exibe
atividade biolgica significativa
(Ramesh & Tharanathan, 2003).
O mecanismo de ao das glucanas ainda no conhecido, mas
acredita-se que seja dependente da
massa molecular do exopolissacardeo, dos tipos de ligaes glicosdicas
e resduos presentes, alm da sua
conformao espacial (Freimunda et
al., 2003). A atividade antitumoral
tem sido atribuda capacidade de

formao de gel de algumas glucanas,


sendo que derivados sulfatados de
alguns polissacardeos possuem aplicao oftalmolgica (Ramesh &
Tharanathan, 2003).
Estudos sobre sua estrutura e
conformao utilizando -glucanases podem auxiliar no entendimento
sobre o seu modo de atuao (Pitson
et al., 1993) e tambm na obteno
de oligossacardeos que apresentem
maior atividade biolgica (Miyanishi
et al., 2003), visto que algumas
glucanas fngicas apresentam baixa
atividade biolgica devido sua baixa solubilidade (Sutherland, 1998).
O basidiomiceto Schizophyllum
commune produtor de uma (13)(16)-glucana extracelular
que, especialmente na forma degradada, pode ser aplicada como agente
antitumoral, anti-hepatite, anti-HIV e
antiviral (Mnzberg et al., 1995).
Diferentes mtodos, como
hidrlise cida e alcalina, digesto
enzimtica e irradiao de ultra-som
, tm sido aplicados na despolimerizao de biopolmeros, resultando
em fragmentos de menor massa molecular (Sandula et al., 1999). Alteraes estruturais envolvendo oxidao qumica das cadeias com
periodato e reduo com boroidreto
podem aumentar a atividade imunomoduladora e antitumoral de algumas glucanas por proporcionarem o
aumento da solubilidade das mesmas (Sutherland, 1998).
Os carboidratos so usualmente
classificados de acordo com o grau
de polimerizao em acares, oligossacardeos e polissacardeos. Do
ponto de vista fisiolgico, a classificao feita de acordo com a
digestibilidade no intestino delgado,
sendo que os carboidratos que apresentam menor digesto pelo organismo so divididos em amido resistente, polissacardeos diferentes de amido e oligossacardeos no fermentveis (Voragen, 1998).
Alguns oligossacardeos no
fermentescveis so denominados de
pr-biticos e podem ser definidos
como substncias no digerveis que
afetam beneficamente o organismo,
estimulando seletivamente o crescimento de um nmero limitado de
bactrias do trato intestinal, benefici-

ando a sade. Estas substncias, incluindo oligofrutoses, poliis e alguns


oligossacardeos, so fontes de energia para a microflora benfica do
organismo (Przemyslaw & Piotr, 2003).
Estudos tm sido realizados sobre a ao destes compostos na preveno de infeces intestinais e cncer de clon, na resposta imunolgica e na reduo dos nveis de
colesterol no soro (Holzapfel &
Schillinger, 2002).
Frutooligossacardeos retardam
a homeostase das clulas da parede
intestinal, enquanto oligossacardeos constitudos por manose podem
impedir a adeso de E. coli nas
paredes do intestino (Przemyslaw &
Piotr, 2003).
As inmeras aplicaes dos oligossacardeos na agroindstria, na
cosmetologia e na indstria alimentcia, e, particularmente, suas aplicaes na rea de sade, tornam necessrio o desenvolvimento de mtodos
eficientes para a produo destas
molculas em escala industrial
(Monsan & Paul, 1995).
Com o advento da glicotecnologia, novas aplicaes dos oligossacardeos tm sido desenvolvidas nas reas
de alimentos, raes animais, frmacos,
cosmticos e tambm como agentes
imunomoduladores e pr-biticos, que
requerem a sntese especfica de oligossacardeos atravs de processos tcnica e economicamente viveis
(Remaud-Simeon et al., 2000).
Estudos investigativos sobre a
ao cataltica de algumas glicosidases na condensao de monossacardeos em oligossacardeos e na transferncia de resduos glicosdicos tm
sido relatados (Pitson et al., 1993).
Os oligossacardeos podem ser obtidos atravs de sntese enzimtica por
reaes de polimerizao, policondensao e alongamento da cadeia;
atravs da ao de glicosidases, glicosiltransferases, fosforilases e
glicosintases artificiais. O maior problema deste tipo de sntese a disponibilidade limitada de enzimas especficas (Kobayashi et al., 2001). A
incubao de -glucanases com altas
concentraes de glucose podem resultar na produo de trealose, gentiobiose, isomaltose, celobiose e laminaribiose. Heterooligossacardeos

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

101

podem ser obtidos pela incubao de


glucose com outros aceptores
glucosdicos (Pitson et al., 1993).
Ning e colaboradores (2003) propuseram que a atividade biolgica da
lentinana, uma -(13)-glucana produzida por Lentinus edotes, depende
de sua estrutura em oligossacardeos.
Estudos anteriores relataram que somente fraes de alta massa molecular (>16kDa) obtidos atravs de
hidrlise parcial com cido frmico,
apresentaram atividade antitumoral
(Sasaki appud Ning et al., 2003). Oligossacardeos com ligaes do tipo (13) e -(16) foram sintetizados a
partir de 1,2,5,6-di-O-isopropilideno-D-glucofuranose como aceptor glicosdico inicial, sendo que alguns oligossacardeos sintetizados inibiram tumores em ratos, efetivamente. Sharp e
colaboradores (appud Ning et al.,
2003) relataram que hexa- e heptassacardeos derivados de -(13)(16)glucanas apresentaram maior atividade biolgica do que o prprio
exopolissacardeo.
A converso enzimtica dos
polissacardeos em seus respectivos
monmeros e/ou oligmeros pode
ser realizada pelo uso de hidrolases e
transferases de origem microbiana.
Enzimas como xilanases, inulinases,
alginases, levanases e glucanases
hidrolisam seus respectivos polmeros
de maneira especfica (Vandamme &
Soetaert, 1995).
Myanishi e colaboradores (2003)
compararam o efeito de polmeros
de -(13)-glucana de Laminaria
digitata e de seus oligmeros obtidos pela ao de -1,3-glucanases
de Bacillus clausii NM-1, em
mielomas humanos. Os resultados
sugeriram que a atividade citotxica
detectada foi derivada dos moncitos
estimulados pelos oligossacardeos,
uma vez que a despolimerizao
enzimtica parece ter sido essencial
para a estimulao dos moncitos
pela -(13)-glucana.
De acordo com esta reviso da
literatura, foi possvel constatar que
este campo da biotecnologia tem
futuro promissor, considerando que
o desenvolvimento das pesquisas sobre as polissacaridases iro vencer as
barreiras determinadas pela insolubilidade dos polmeros que apresen102

tam atividade biolgica, gerando molculas de pequena massa molecular,


solveis, mas que preservam esta
atividade.
Portanto, alm dos estudos para
compreender a atividade das glucanases, que so de extrema importncia
em todos os estgios do ciclo da vida
fngica, novos conhecimentos sobre
a produo, sntese e regulao, por
via fermentativa dos microrganismos
produtores, so tambm de interesse
biotecnolgico, visto que estes podero gerar novas tecnologias para a
obteno de frmacos, alimentos nutracuticos e produtos que favoream
o bem-estar da populao.

Agradecimentos
Os autores agradecem CAPES
pelo auxlio financeiro ao
Programa de Mestrado em
Biotecnologia do Departamento de
Bioqumica-CCE, da Universidade
Estadual de Londrina. Ellen
Cristine Giese tambm agradece
ao CNPq pela bolsa de mestrado
concedida.

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Pesquisa

Biossegurana
em Biotrios
Alergia: um risco sempre presente

Joel Majerowicz

Mdico Veterinrio; Chefe do Laboratrio de


Experimentao Animal do Instituto de Tecnologia
em Imunobiolgicos (Bio-Manguinhos) da
Fundao Oswaldo Cruz; Vice-Presidente do
Colgio Brasileiro de Experimentao Animal /
Cobea.
joel@bio.fiocruz.br
Ilustraes cedidas pelo autor

As respostas alrgicas vo desde


espirros at anafilaxia sistmica e morte. Aproximadamente 33% das pessoas que desenvolvem alguma atividade
em biotrios apresentam reaes de
hipersensibilidade e isto constitui um
srio problema de sade ocupacional
(Chan-Yeung & Malo, 1994). Esse percentual trs vezes maior que em
qualquer outra atividade.
Descamao da pele, plo, saliva, soro, urina e tecidos animais so
as principais fontes produtoras de
alrgenos. O contato ocorre durante
as atividades de alimentao, limpeza de ambientes e de materiais,
inoculao, sacrifcio, cirurgia, coleta de tecidos e fludos corpreos e no
transporte de animais (Harries &
Cromwell, 1982). Roedores possuem
proteinria persistente e a urina a
maior fonte de produo de alrgenos das espcies desta Ordem.
Os alrgenos so protenas especficas e, em sua maioria, j esto
identificadas e caracterizadas.
No camundongo (Mus musculus)
foram identificados trs alrgenos relevantes:
Mus m1, uma pr-albumina
encontrada na urina, folculos
pilosos e descamao da pele.
Essa protena produzida nas
clulas do fgado e sua concentrao no sangue e na urina
em torno de quatro vezes maior
nos machos que nas fmeas,
devido ao gene responsvel pela

sua produo ser testosterona


dependente.
Mus m2, uma glicoprotena
originada nos folculos pilosos
e na descamao da pele, porm no encontrada na urina.
Mus m3, uma albumina que
tem sido demonstrada em 30%
dos pacientes alrgicos a camundongo.
No rato (Rattus norvegicus), dois
alrgenos foram identificados na urina, saliva e pele:
Rat n 1A, uma pr-albumina
produzida no fgado;
Rat n 1B, uma globulina tambm produzida no fgado.
Alrgenos da cobaia (Cavia
porcellus) no esto bem caracterizados, embora tenham sido identificados dois fragmentos antignicos Cav
p 1 e Cav p 2. Ambos so encontrados
na urina, no plo e na descamao da
pele. No coelho (Oryctolagus
cuniculus), dois alrgenos esto bem
identificados, Ory c 1 encontrado
no plo, na descamao da pele e na
saliva; e o Ory c 2, que encontrado
no plo, na descamao da pele e na
urina (Bush et al., 1998).
Em geral, os alrgenos so
carreados por pequenas partculas,
que podem permanecer em suspenso no ar por extensos perodos e
serem facilmente respirveis. A inalao o meio mais comum de

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

105

sensibilizao. O contato com membranas, mucosas e pele tambm so


vias de sensibilizao, porm menos
comuns. Aps um perodo de tempo,
que pode ser de meses a anos, ou
quando se inalam quantidades suficientes de alrgeno, desenvolve-se a
sensibilizao do organismo. Quando exposto novamente a um alrgeno
especfico, os sintomas da alergia
aparecem (Bardana, 1992). Os sintomas variam de brandos, como coriza
e espirro (rinite alrgica); irritao
ocular e lacrimejamento (conjuntivite
alrgica); vermelhido, prurido e
erupo na pele (dermatite de contato); congesto nasal; resfriado prolongado e repetitivo, a graves, que
caracterizam a asma alrgica, cujos
sintomas podem ser distinguidos por
dificuldade respiratria, tosse e
estertores pulmonares. Os sintomas,
muitas vezes, aparecem rapidamente
aps a exposio ao alrgeno, mas,
normalmente, ocorrem de duas a oito
horas aps essa exposio.
Todas as pessoas que manuseiam animais esto propensas a desenvolverem sintomas alrgicos, porm
aquelas que j demonstravam sinais
ou sintomas alrgicos, antes de atividades com animais, esto mais propensas a desenvolverem alergias ou
mesmo a asma. Pessoas que desenvolvem sintomas de asma, proveniente de alrgeno animal, freqentemente melhoram ou se recuperam
completamente se param de se expor ao contaminante.
Os fatores de risco esto relacionados com a susceptibilidade individual e exposio aos alrgenos no
ambiente de trabalho. A susceptibilidade basicamente gentica. A exposio aos alrgenos no ambiente de
trabalho est diretamente relacionada
com o tipo de atividade desenvolvida
e com o tempo de contato direto com
o animal ou com seus subprodutos.
No s as pessoas diretamente envolvidas com os animais esto propensas
a esse risco. Secretrias e pessoal da
administrao, que trabalham em ambientes no mesmo prdio do biotrio,
esto sujeitos ao contato com alrgenos carreados por diversos meios.
106

A preveno se baseia em evitar


o contato com os alrgenos, uma vez
que eles so constantemente produzidos pelos animais e esto sempre
presentes no ambiente de trabalho.
No entanto, j esto definidos e
disponveis, procedimentos e equipamentos que podem reduzir, ou
mesmo eliminar, a exposio ao risco de sensibilizao. So eles:
Uso de roupa apropriada e de
uso exclusivo no biotrio, as quais
no devem ser utilizadas fora dessas
instalaes, com vistas a no carrear
alrgenos para outras reas. No
devem ser lavadas em casa para
evitar a exposio dos familiares a
esse risco. O ideal que sejam
higienizadas por firmas especializadas, as quais possuem mtodos apropriados para manuseio e higienizao de uniformes.
A superfcie do corpo deve ser
protegida para que se evite o contato
de alrgenos com a pele; recomenda-se, portanto, alm do uniforme, o
uso de luvas, mscara e gorro sempre
que houver manipulao de animais
ou de seus subprodutos.

Higienizao de ambiente
Bio-Manguinhos / Fiocruz

Na manipulao de animais e de
seus derivados, fazer uso, sempre que
possvel, de cabines de conteno
biolgica ou de cabines de fluxo
laminar. A cabine de conteno biolgica garante a segurana do operador
pela conteno de partculas e microorganismos na rea interna de trabalho e filtra o ar de exausto atravs de
filtros de alto desempenho, o mesmo
acontecendo com modelos de cabine

Manejo animal sob cabine de conteno


biolgica - IPEN/CNEN/SP

Vestimenta
Bio-Manguinhos / Fiocruz

Manter sempre limpo ambientes,


mveis e gaiolas de animais: O p da
rao e da forrao das gaiolas so
veculos transportadores de alrgenos. Manter o ambiente limpo diminuir a concentrao de alrgenos,
minimizando, conseqentemente, o
risco. Durante a limpeza, devem ser
tomados cuidados especiais para evitar a exposio aos alrgenos.

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

de fluxo laminar. Esses equipamentos


devem ser certificados a cada 12 meses se o propsito somente a conteno de particulados.
Adequar, se necessrio, o sistema de ventilao e exausto mecnica. A exposio aos alrgenos em
suspenso no ar afetada pelo modelo de fluxo de ar, filtrao, tipo de
material usado na forrao das gaiolas (cama) e umidade relativa. O
recomendado para se manter um nvel aceitvel de alrgenos no ambiente de 15 a 20 trocas de ar (volume
do ambiente por hora). A elevao da

Microisolador Centro de Biologia


Molecular IPEN/CNEN/SP

Cabine para descarte de rejeitos

Bio-Manguinhos / Fiocruz

umidade relativa diminui o nvel de


alrgenos em suspenso no ar, porm, para a adoo dessa medida,
deve-se considerar que a faixa de
umidade relativa recomendada para
roedores de 55% +/- 5%. O sistema
de ventilao e exausto das reas de
animais deve ser independente de
outras reas do biotrio.
O direcionamento do ar deve
ser, sempre que possvel, do operador para a gaiola de animais.
O uso de microisolador (gaiola
com filtro), estante ventilada ou sistema de mdulos para microisolador
diminui substancialmente a presena
de alrgenos no ambiente. O princpio sobre o qual se baseia o
microisolador muito similar placa
de Petri usada em bacteriologia. Mtodos fsicos e/ou qumicos so utilizados para a esterilizao da superfcie interna da gaiola, as quais so
manipuladas posteriormente em sistemas asspticos. Da mesma forma
que o filtro impede a entrada de
contaminantes na gaiola, tambm impede a sada, para o ambiente, de
partculas que carreiam alrgenos. A
utilizao de cabine de fluxo laminar
ou de cabine de contenso biolgica
na manipulao dos microisoladores
deve garantir que a contaminao
no ocorra nesse momento, ou seja,
esses equipamentos devem estar certificados e com seus instrumentos
calibrados. A utilizao de estante

ventilada com sistema de filtrao de


ar permite o uso de gaiolas abertas.
Existem vrios modelos de estantes para alojamento de animais e
algumas com portas. Esses equipamentos promovem um fluxo de ar
filtrado nos compartimentos internos que renovam o ar do interior das
gaiolas e possuem filtros de exausto,
garantindo a contenso dos alrgenos. Esse sistema no garante a
conteno de partculas para o ambiente quando as portas so abertas.
O uso de microisoladores em conjunto com estantes ventiladas permite um controle mais efetivo da
contaminao do ambiente por alrgenos, bem como propiciam um
microambiente mais favorvel aos
animais, uma vez que a ventilao
forada favorece a troca de ar, diminui a umidade relativa e os odores
no interior da gaiola. Sistemas para
microisoladores baseiam-se em injetar e exaurir o ar diretamente dos
microisoladores e de forma individual. Dessa forma, o microambiente
individualizado, sendo que o sistema fechado garante a condio microbiolgica interna da gaiola e no
permite a exteriorizao dos
contaminantes no ambiente. Tanto
as estantes ventiladas como o sistema para microisoladores se torna
mais efetivos no controle de alrgenos quando o sistema de exausto
direcionado para fora da edificao.

Estantes ventiladas
Bio-Manguinhos/Fiocruz

Microisoladores dentro de Estantes


Ventiladas - IPEN/CNEN/SP

Outras prticas ou procedimentos que auxiliam no controle de alrgenos so:


Diminuir a densidade animal
(animal/m3).
Fazer uso de material absorvente e no gerador de partculas na forrao das gaiolas a fim
de diminuir consideravelmente
a concentrao de alrgenos em
suspenso no ar. O sabugo de
milho prefervel maravalha

Revista Biotecnologia Cincia e Desenvolvimento - Edio n 30 - janeiro/junho 2003

107

Sistema de microisoladores (Racks ventilados)


IPEN/CNEN/SP

de madeira devido a sua maior


capacidade de absoro e seu
menor percentual de p.
Trabalhar, se possvel, com
espcies animais que produzam menos alrgenos, incluindo os de sexo que tambm
produzam menos alrgenos.
Providenciar e colocar disposio todos os equipamentos de
proteo individual. O uso de
protetores respiratrios pode ser
uma soluo para certas situaes, porm no substitui as recomendaes anteriormente citadas.
Treinar e educar todos os
envolvidos com animais ou com
derivados de animais, bem como
com atividades correlacionadas
para esse tipo de risco.
Providenciar monitoramento de
sade de forma regular para todos
e apropriado aconselhamento
mdico para os que desenvolve108

rem sintomas alrgicos. Essas duas


aes auxiliam na reduo de
efeitos adversos sade.
Finalmente, h casos em que
somente a mudana de atividade a
soluo para o problema de sade.

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Joo de Deus Medeiros, Dr

Bilogo, Doutor em Botnica,


Professor do Depto. de Botnica,
Diretor do Centro de Cincias Biolgicas da UFSC
jdeus@ccb.ufsc.br
Ilustraes cedidas pelo autor

O fantasma da extino de espcies biolgicas torna-se cada vez mais


presente e ameaador. A drstica
reduo das florestas tropicais elevou as taxas estimadas de extino
de espcies biolgicas a cifras significativamente altas. Ainda que esses
nmeros sejam imprecisos e mesmo
considerando os processos naturais
de extino de espcies, aventa-se
que o homem tenha elevado essa
taxa de extino para algo em torno
de 100 a 1.000 vezes. Tomando-se
por base uma taxa anual da ordem de
uma espcie para cada milho de
espcies, valor mdio para todos os
grupos, cuja taxa de extino esteja
bem documentada pelo registro fssil (WILSON, 1997; WILSON, 2002),
SANDES e DI BLASI (2000), estimamse que mil espcies sejam extintas
por ano no planeta, o correspondente a 3 espcies por dia. Afirmam
ainda que, se a destruio continuar
no ritmo atual, at o ano 2015, de 4%
e 8% de todas as espcies vivas
presentes nas florestas tropicais podem desaparecer; algumas sem nem
mesmo terem sido descritas, catalogadas ou estudadas.
Os danos acumulados pela onda
crescente de extino de espcies e
de ecossistemas no podem ser reparados dentro de uma escala de tempo
tangvel. A paleontologia revela que
novas faunas e floras levam milhes
de anos para atingir a diversidade que
possuam na poca em que o homem
apareceu no planeta. Quanto mais
permitirmos que as perdas se acumulem, maiores sero os prejuzos das
futuras geraes, tanto os j conhecidos quanto daqueles que sero certamente descobertos mais tarde.

Portanto, no restam dvidas


quanto gravidade do quadro imposto pelas interferncias perpetradas pelo homem nos ambientes naturais. A hecatombe de extines de
espcies da fauna e da flora, fenmeno sem precedente histrico, atinge
hoje entre 70.000 a 240.000 espcies.
O impacto maior, sem dvida, sentido nas florestas tropicais, que, cobrindo cerca de 7% da superfcie
terrestre do planeta, abrigam, pelo
menos, 50% de todas as espcies.
Dados da FAO Organizao das
Naes Unidas para a Alimentao e
Agricultura, e o PNUMA Programa
das Naes Unidas para o Meio Ambiente, j indicavam, no inicio da
dcada de 80, que, a cada ano, entre
76.000 e 92.000 quilmetros quadrados de florestas tropicais eram
destrudos. Outros 100.000 quilmetros quadrados grandemente perturbados. O mais inquietante constatar que nas dcadas seguintes essas
mdias continuaram aumentando.
As Listas Vermelhas da Unio
Mundial para a Conservao da Natureza (IUCN), atualizadas ano a
ano, mostram a progressividade do
problema. A lista da Fauna Brasileira Ameaada de Extino, editada
em 1989, relacionava 218 espcies.
A lista atual, concluda em 2002,
revela que 627 espcies esto ameaadas, 2 extintas na natureza e 9
definitivamente extintas. Na lista
atual, encontramos 69 mamferos,
153 aves, 20 rpteis, 15 anfbios, 165
peixes, 93 insetos, 21 invertebrados
terrestres e 91 invertebrados aquticos. Considerando a grandiosidade
da biodiversidade brasileira e os
escassos investimentos aplicados no

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seu estudo, fica evidente que os


nmeros apresentados mostram apenas uma dbil aproximao do problema. A lista oficial das espcies da
flora brasileira ameaada de extino,
editada em 1992 (Portaria IBAMA
037-N), por sua vez, relaciona um
total de 107 espcies. O grau de
preciso dessas listas freqentemente questionado, o que ilustra
mais uma vez a carncia de conhecimento sobre a nossa biodiversidade. Por exemplo, no incio da dcada de 90, perodo em que se editou
a lista oficial da flora, foi relacionado um nmero superior a 1.000 espcies raras e/ou ameaadas de
extino, somente no Estado de Santa
Catarina (KLEIN, 1990).
O Brasil considerado o pas
que apresenta a maior diversidade
gentica vegetal do mundo, com cerca de 55.000 espcies catalogadas de
um total estimado entre 350.000 e
550.000 espcies (SANDES e DI
BLASI, 2000). interessante salientar
que, como em outras partes do planeta, no Brasil tambm, a expanso
agrcola e a urbanizao, com a conseqente eliminao dos hbitats,
so as principais causas da elevao
nas taxas de extino das espcies.
Ainda que parea paradoxal,
uma das crticas que se fazem ao
atual modelo de proteo das espcies da fauna ameaada a falta de
uma poltica de regulamentao da
caa amadora e esportiva. Os argumentos utilizados em defesa da tese
de que a caa amadora possa ser
uma estratgia de proteo s espcies ameaadas de extino baseiam-se no fato de os Estados Unidos
da Amrica manterem estvel, h
mais de duas dcadas, o nmero de
espcies de aves e mamferos ameaados, com o uso de um modelo de
proteo baseado na caa amadora.
Segundo seus defensores, esse modelo funciona porque a caa amadora
exige grandes investimentos e somente se sustenta com abundncia
de caa durante dcadas seguidas;
ou seja, os investidores do setor
passam a ser os principais interessados em que se mantenham populaes viveis, a fim de garantir o
sucesso de seus empreendimentos.
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O mesmo modelo empregado na


pesca esportiva, mesmo no Brasil,
onde regies como a do Mdio Amazonas e a do Pantanal j vm se
destacando como plos de atrao
de turistas provenientes das mais
variadas partes do mundo. No podemos esquecer, contudo, que essa
estratgia normalmente direciona
seus esforos apenas para a proteo de algumas poucas espcies,
no contemplando uma abordagem
ecossistmica. Novamente o modelo norte-americano pode ser resgatado a titulo de exemplo. O prprio
U.S. Fish and Wildlife Service, rgo do Departamento do Interior
responsvel pela proteo das espcies ameaadas, j em 1995 conclua
que menos de 10% das espcies
legalmente protegidas estavam aumentando, 40% estavam diminuindo e as espcies restantes permaneciam na mesma ou sua situao era
desconhecida.
inquestionvel que o problema da extino crescente de espcies biolgicas esteja ainda muito longe de uma soluo adequada e satisfatria. certo tambm que, considerando os danos j perpetrados,
nunca teremos uma forma efetiva de
remediao desse impasse criado
pela espcie humana. Essa constatao, ainda que verdadeira, jamais
dever constituir um libi para a
acomodao e o descaso, notadamente dos responsveis pela formulao e operao de polticas pblicas setoriais.
O Brasil ainda considerado
um pas ecologicamente vulnervel.
No balano de 2002, o pas mostrou
recordes nada invejveis. Naquele
ano registrou-se a maior apreenso
de madeira de toda a histria, na sua
maior parte mogno (Swietenia
macrophylla), uma das espcies madeireiras mais visadas e ameaadas.
As queimadas tambm cresceram
vertiginosamente naquele ano, algo
em torno de 136% , considerando-se
a mdia dos ltimos cinco anos. Por
causa dos desmatamentos e das queimadas na Amaznia, o Brasil est
rapidamente se aproximando dos
lderes na emisso dos gases de
efeito estufa, como nos mostram os

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dados revelados no Inventrio Brasileiro de Emisses, elaborado pelo


IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica.
Na Mata Atlntica, um dos biomas
mais ameaados do planeta, as presses no cessaram, mesmo depois de
cinco sculos seguidos de explorao predatria e irracional, conforme
relata detalhadamente DEAN (1998).
Ainda que o ritmo de desmatamento
nas reas de florestas originais tenha
diminudo nos ltimos anos, considerando-se os pequenos fragmentos
de florestas e as reas mais alteradas,
esse ritmo ainda o mesmo registrado h 15 anos atrs. Segundo dados
do Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlntica, publicao da
Fundao SOS Mata Atlntica e do
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), no perodo de 1995 a
2000, a extenso da Mata Atlntica,
nos seus remanescentes florestais
bem conservados, foi reduzida para
7,1% da sua rea original. Esse quadro bastante grave e nos mostra
que, a despeito da propalada
conscientizao pblica frente fragilidade desse bioma, o desmatamento se mantm; ou seja, nossas
prticas aparentemente pouco se alteraram.
Como prenncio de novos tempos, o sculo XXI saudado com o
CONAMA - Conselho Nacional do
Meio Ambiente- estabelecendo, com
a Resoluo n 278/2001, regras e
diretrizes para o trato com espcies
da flora brasileira ameaada de
extino. Posteriormente, com a Resoluo n 317/2002, o CONAMA
complementou essas diretrizes, determinando a realizao de Planos
Estaduais de Conservao e Uso das
Espcies da Flora Ameaada de
Extino na Mata Atlntica. importante lembrar que essa interveno
do CONAMA numa questo, a rigor
to preocupante, somente se deu
aps inmeras e insistentes provocaes do movimento ambientalista.
A absurda situao criada com a
explorao florestal indiscriminada
no sul da Bahia e em Santa Catarina,
principalmente, foi a indutora dessa
postura do CONAMA. A prvia interferncia do judicirio, com uma de-

Foto 1: Regenerao in vitro de plntulas de


cedro (Cedrela fissilis) a partir da cultura de
segmentos nodais.

Foto 2: Tronco de rvore antiga de pinheirobrasileiro (Araucaria angustifolia). Exemplares


como esse, encontrado nas florestas de Campos Novos (SC), so cada vez mais raros.

ciso favorvel ao pleito dos ambientalistas no caso da explorao


madeireira das espcies ameaadas
de extino no Estado de Santa
Catarina, teve um efeito bastante
decisivo, forando objetivamente o
CONAMA a se posicionar com a
agilidade que o caso exigia. A legalizao do processo de explorao
madeireira de espcies ameaadas
de extino, dentro dos escassos
remanescentes de Mata Atlntica,
concedida pelo prprio IBAMA
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis, rgo executivo do SISNAMA
Sistema Nacional do Meio Ambiente, conferiu conotao verdadeiramente escandalosa ao processo.

Em Santa Catarina, um dos ltimos Estados a promover a instalao


do Comit da Reserva da Biosfera da
Mata Atlntica, as apreenses de carregamento de madeira e as notificaes de desmatamentos, infelizmente so ainda quase rotineiras. Basta
uma rpida consulta aos jornais locais para se constatar a preocupante
freqncia com que so apreendidos
carregamentos de pinheiro-brasileiro (Araucaria angustifolia), canelapreta (Ocotea catharinensis), imbuia
(Ocotea porosa), sassafrs (Ocotea
odorifera), entre outras. So recorrentes tambm os casos de desmatamentos sem qualquer autorizao,
em geral para limpar reas que
sero usadas para receber o plantio
de Pinus elliottis.
A extensiva progresso dos plantios de essncias florestais exticas
tem sido um dos fatores de maior
presso sobre os remanescentes florestais nativos. Por um lado, argumenta-se que o mercado de madeira
fora uma ampliao da rea plantada com espcies de rpido crescimento; por outro, sem qualquer base
tcnica ou cientifica consistente, apregoa-se a viabilidade de um pretenso
manejo florestal sustentvel nas reas de remanescentes naturais. Tanto
de um lado quanto de outro, a ampliao das reas de risco das espcies
ameaadas torna-se a nica garantia.
DOUROJEANNI (1987) relata,
com base em uma reviso da situao
do manejo florestal no continente
latino-americano at 1986, que no
existia nenhum exemplo de manejo
florestal tecnicamente consistente.
Mesmo que em alguns casos o sucesso inicial se mostrasse animador, normalmente isso no perdurava. Quase
todos os ensaios falharam ou foram
abortados depois de uma ou duas
dcadas, no mximo. Em geral, essas
florestas manejadas foram convertidas em pastagens ou destinadas
agricultura migratria.
Tambm no Estado de Santa
Catarina, recentemente se explicitou
uma situao que bem retrata a insuficincia de informaes sobre a biodiversidade, a precria divulgao
dessas informaes e o completo
descompasso entre os discursos e a

prtica. No processo de licenciamento


para a construo de uma pequena
hidreltrica no Rio Itaja-au, foi negligenciada a citao de ocorrncia ali
de uma espcie endmica, no caso
uma planta arbustiva que explora as
margens pedregosas do rio, descrita
em 1961 e denominada Raulinoa
echinata (COWAN e SMITH, 1973).
No fosse a mobilizao dos ambientalistas locais, a espcie poderia estar
hoje engrossando a lista daquelas definitivamente extintas. O episdio mostra a amplitude do problema, quando
no se inclui na anlise as chamadas
espcies endmicas. Isso porque
muitos desses endemismos so ilustrados por populaes extremamente
restritas e, portanto, altamente susceptveis. Registra-se que a Amrica
Latina a regio com a maior diversidade biolgica e tambm com o maior
nmero de endemismos do planeta,
ficando o Brasil com o quarto lugar na
lista dos pases detentores dos maiores nmeros de espcies endmicas.
necessrio entender que o conhecimento por si s nada garante.
Desde 1990, o Estado de Santa
Catarina dispe de uma listagem bastante abrangente de espcies raras
ou ameaadas de extino (KLEIN,
1990; KLEIN, 1996; KLEIN, 1997),
onde se constata, com certa dose de
indignao e surpresa, no item medidas conservacionistas tomadas,
uma avassaladora repetio do termo Nenhuma.
Num cenrio to inquietante,
com certa freqncia nos questionamos: Como prever o valor que uma
espcie de animal, planta ou
microorganismo ter no futuro? As
possibilidades esto distribudas por
um largo espectro de necessidades
humanas, algumas j conhecidas e
muitas outras ainda desconhecidas.
Nosso conhecimento com relao s
prprias espcies ainda por demais
insatisfatrio. Menos de dois milhes
esto catalogadas nos registros cientficos, com um nome formal, enquanto um nmero estimado entre
cinco a cem milhes de espcies ou
mais esperam para ser descobertas.
Das espcies conhecidas, menos de
1% foi submetido a no mais que um
exame sumrio. No tocante s flores-

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Foto 3: Fruto de canela-preta (Ocotea


catharinensis)

tas tropicais, segundo KAGEYAMA e


LEPSCH-CUNHA (2001), os estudos
genticos em populaes de espcies arbreas tropicais so recentes e
foram realizados com amostragem
de espcies pouco representativas
das comunidades, servindo mais para
orientar os futuros trabalhos na rea
do que para concluses e orientaes de como utilizar esses dados,
por exemplo, para programas de
conservao.
Confirmada a manuteno da
presso antrpica sobre as espcies e
os ecossistemas, pode parecer ilgica a pretenso de se justificar esforos na busca de alternativas tecnolgicas inovadoras para se conterem as
taxas atuais de extino. No entanto,
assumindo-se o valor intrnseco que
cada ser vivo possui, essa lgica
torna-se aceitvel. No , contudo,
generalizada a aceitao e o reconhecimento desse valor pela sociedade moderna. Por essa razo, na
maioria dos casos, os estudos
biotecnolgicos, mesmo quando tm
112

por objeto espcies ameaadas de


extino, procuram agregar justificativas adicionais de ordem econmica, buscando, assim, tanto maior facilidade de financiamento quanto de
aceitao, e, por conseguinte, maior
disseminao de seus resultados e
potencialidades. Trabalhos com
Swietenia macrophylla (LEE e RAO,
1988), Cedrela odorata (MARUYAMA
et. al., 1989; MARUYAMA et. al.,
1997), e C. fissilis (foto 1)(NUNES et.
al., 2002), mostram-nos alguns exemplos, largamente enfatizados, com
potencial para implantar reflorestamentos comerciais, dinamizar programas de melhoramento gentico,
desenvolver tcnicas de controle
silvicultural ou de obteno de
insumos fitoqumicos e/ou farmacolgicos. KAGEYAMA e LEPSCH-CUNHA (2001) afirmam que o fator
econmico determinante no interesse pelas florestas tropicais, notadamente pelo uso potencial da biodiversidade pela indstria farmacutica e qumica, atravs da biotecnologia.
A rigor, a valorizao da biodiversidade, por si s, pouca melhoria
tem trazido para as espcies ameaadas de extino. Mesmo para espcies emblemticas, como o caso do
pinheiro-brasileiro (Araucaria
angustifolia) (foto 2), a ampliao
do seu valor econmico, que foi
impulsionado exatamente pela sua
escassez crescente, s fez com que
suas derradeiras reservas naturais
fossem ainda mais dizimadas. KLEIN
(1990), j alertava que o valor econmico, industrial, alimentar ou medicinal, de um nmero considervel de
espcies pode condicionar o seu desaparecimento. Entre essas espcies
KLEIN destaca o prprio pinheirobrasileiro (Araucaria angustifolia),
a imbuia (Ocotea porosa), a canelapreta (Ocotea catharinensis) (foto
3), a canela sassafrs (Ocotea
odorifera), o palmiteiro (Euterpe
edulis) e a erva-mate (Ilex
paraguariensis). Mesmo com a concorrncia de uma legislao protetora, a presso econmica, aliando-se a
uma fiscalizao deficitria e inerte,
complementada com uma intrincada
rede de corrupo, tm sido geradas
poucas perspectivas positivas para

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as espcies ameaadas de extino,


mesmo para aquelas oficialmente reconhecidas nessa condio. LIMA
(2001), numa avaliao minuciosa da
tutela jurdica das espcies da flora
ameaada de extino na Mata Atlntica, afirma que, ao continuar com a
explorao econmica de tais espcies, sem qualquer estudo de viabilidade ecolgica e gentica, certamente estaremos, todos ns, inclusive o
prprio IBAMA, assistindo excluso dessas espcies da lista oficial,
pois estaro extintas em breve.
Mesmo considerando que os
avanos tecnolgicos possam melhorar o problema da crise de
extino, ou ainda que tecnologias
inovadoras venham suprir servios
ambientais outrora fornecidos por
ecossistemas, seria um erro de clculo, na viso de WILSON (1997), acreditar que a resposta esteja na
tecnologia.
Na preservao da biodiversidade, o uso da tecnologia o ltimo
recurso. Em situaes cada vez mais
freqentes, passa a ser o nico. A
fragmentao e o isolamento dos remanescentes florestais podem determinar a inviabilidade da manuteno
de populaes inteiras de plantas e de
animais. Em casos assim, tecnologias
de interveno so indispensveis para
que se restabelea um fluxo gnico
minimamente satisfatrio. O problema maior que grande parte das
perdas de biodiversidade e de servios ambientais que j provocamos,
esto muito alm da capacidade humana de recuper-las. Adicionalmente, no podemos negligenciar o custo
da utilizao da alta tecnologia e o
fato de que os recursos hoje disponveis se encontram quase sempre nos
pases ricos do norte, enquanto as
grandes perdas de biodiversidade
ocorrem majoritariamente nos pases
pobres dos trpicos. Assim, notadamente para esses pases megadiversos e pobres, a preservao de hbitat
vista como a estratgia vivel e
realstica.
A clonagem de espcies criticamente ameaadas, quando os demais
mtodos falharem, por exemplo, tem
sido indicada como estratgia de conservao. Da mesma forma, a expan-

so de bancos de sementes e esporos,


a manuteno de estoques de tecidos
e de embries congelados em nitrognio lquido (-196 C) ou em seu
vapor (-150 a -180 C). Pode-se
tambm criopreservar pices, embries somticos encapsulados em
alginato de sdio, tcnica conhecida
como encapsulao (VIEIRA, 2000).
Esses mtodos, contudo, so dispendiosos e de eficcia relativa, notadamente para bactrias, arqueanos,
protistas, fungos, insetos e outros
invertebrados que formam a base da
biosfera. A nica forma segura de
salvar espcies, alm de ser a mais
barata e sensata, preservar os
ecossistemas naturais em que vivem
atualmente essas espcies. Como afirmam DOUROJEANNI e PDUA
(2001), lamentavelmente, at agora, o
gnio humano no descobriu outra
forma mais eficiente que as Unidades
de Conservao para preservar a biodiversidade.
Dizer que a conservao in situ
hoje a melhor estratgia para a proteo de espcies ameaadas, no significa dizer que outros esforos no
sejam tcnica e eticamente defensveis e necessrios. Precisamos
implementar e reforar uma tica
conservacionista, calcada em o homem admitir sua responsabilidade na
criao de uma crise planetria e de
perceber inequivocamente que a moral vigente no a tem admitido. Frente
a esses pressupostos, torna-se absolutamente necessrio rever nossos modos de produo e consumo, fazendo
com que, com esse novo paradigma
humano, se reflitam sobre as demais
espcies biolgicas, e que, paralelamente, se eliminem os antropocntricos
questionamentos referentes aos investimentos direcionados para a proteo
das espcies. O fato concreto que, at
o momento, muito pouco se fez para
frear essa onda de extines que a
modernidade humana promoveu. Investimentos feitos, tanto pelos pases
ricos quanto pelos pobres, empresas
pblicas ou privadas, so limitados e
instveis. Quase sempre insuficientes
e mal aplicados.
A tecnologia no deve ser entendida e propagada como uma panacia para o mal da extino. Ainda

que como paliativo, deve ser perseguida e aprimorada. Mesmo que,


como ferramenta, se desenvolva a
partir de nossos interesses de base
econmica, suas possibilidades de
uso na minimizao do impacto da
extino de espcies biolgicas precisa ser cada vez mais considerado.
Por outro lado, direcionar nossos
esforos unicamente em torno dos
interesses econmicos da biodiversidade seria um grande equvoco. Primeiramente, porque nosso escasso
conhecimento acerca da biodiversidade, fez, na prtica, com que a
sociedade no identifique qualquer
valor na imensa maioria das espcies
de plantas e animais viventes, e,
adicionalmente, porque a lgica econmica essencialmente excludente,
no mostrando a menor habilidade
sequer de repartir seus benefcios
entre diferentes ncleos de populaes humanas.

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