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O Reordenamento Urbano

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O reordenamento urbano

Na manhã de primeiro de novembro de 1755, dia de todos os Santos, a população de Lisboa


formigava nas ruas, agitando-se no bulício quotidiano da vida das grandes cidades. Com
descuidada tranquilidade, muitos se dirigiam para as igrejas para cumprir o religioso preceito
da missa. Pelas nove horas da manhã a cidade de Lisboa estremeceu, abalada profundamente,
e começou a desabar. As pessoas fugiram para a margem do Tejo procurando evitar o perigo
dos desmoronamentos, mas pararam quando avistaram uma onde gigante vinda do mar que
invadiu o rio, galgando as ruas e inundando o que restava das casas já destruídas.

Casas, palácios, conventos, mosteiro, hospitais, igrejas, campanários, teatros, óperas,


fortalezas, pórticos, tudo, tudo caiu. Logo depois dos três primeiros abalos que foram os mais
intensos e funestos começa-se a ver arder o Palácio do Marquês de Louriçal, a Igreja de S.
Domingos, o recolhimento do Castelo e muitos outros edifícios onde haviam luzes e fogões
acesos que atiçaram o fogo á madeira caída. O terror já não tinha limites! O incêndio
propagava-se rapidamente em grande extensão, as pessoas fugiam, deixando de apagar o
incêndio, com medo de morrerem.

Calcula-se terem morrido dez a quinze mil pessoas nesse dia em Lisboa. O terramoto também
se fez sentir em outras zonas do país, em Espanha e no Norte de África, mas para agentes do
tempo Lisboa fora o único palco da tragédia, e assim ficou conhecida pelos correios
diplomáticos e comercias que levaram a notícia para as cortes europeias, fazendo com que
estas prestassem ajudas materiais.

El rei e a família que estavam numa casa de campo em Belém quando se deu o terramoto.
Saíram logo para o campo onde viveram alguns meses em barracas de campanha. Ali
compareceram em breve os ministros e as pessoas da Corte. D. José, aflito e aterrado não
sabia o que fazer, já naquele tempo havia pronunciada má vontade contra Sebastião José de
Carvalho, porém D. José estimava-o cada vez mais. Assim Pombal sobe impor-se aos
acontecimentos, sendo que desta hecatombe nasceu o poder do Marquês de Pombal. Lisboa
era um acampamento e tudo havia a refazer, tudo se podia executar, nesse momento único da
destruição total do passado, o terramoto era o fim de um Mundo. Nos primeiros dez dias de
novembro, o Marquês de Pombal preveniu as consequências da desgraça funesta. Denunciava-
se uma fome temerosa, já se comiam os cães, os gatos, os ratos e pássaros vivos; já se
devoravam as raízes, as ervas e as cascas das árvores, não havia alimentos nem casas. Umas
das mais urgentes necessidades era sepultar os mortos tão numerosos. Abriram-se valas muito
fundas para nelas se lançar os cadáveres. Como havia falta de gente obrigaram muitos dos que
tinham fugido da cidade a regressarem a ela para auxiliarem estes e outros serviços.

Pombal construi albergues para os dispersos; organizou a tropa em companhias de coveiros;


recolheu todos os salvados, restos de coisas preciosas de Lisboa, da Índia e do Brasil; comprou
trigos; tarifou os géneros; impediu os conluios; proibiu a saída de viveres; defendeu as praias
contra os argelinos, corvos que decerto viriam explorar o campo de batalha; prendeu os
mendigos e os vadios; enforcou sumariamente, sem processo, em altos paus erguidos pelas
esquinas das ruas, os ladrões e incendiários, deixando-lhes as cabeças pregadas no patíbulo,
para exemplo. Tamanha força aturdia o povo simples, tanto ou mais do que a fúria do
cataclismo.

No ano de 1756, começou o ministro o seu terramoto. Queria principiar corrigindo os


costumes e por isso mandou abrir devassa contra os combinados públicos: os nobres seriam
desterrados, os plebeus teriam prisão. Houve a sombra de uma conspiração que Pombal
castigou, prendendo, por suspeitos, frades e fidalgos e prometendo 20 mil cruzados ao
delator. No fim de agosto foi degredado Diogo Mendonça de Corte Real que ainda lhe fazia

sombra. Em setembro fundou-se a companhia dos vinhos e em dezembro a Junta do


Comércio.

Pombal chamou a si a tarefa de reerguer a cidade incumbindo o brigadeiro Manuel da Maia de


uma série de projetos a submeter á consideração do monarca. Aproveitou-se a dolorosa
ocasião para se reconstruir a cidade que foi incumbindo por Sebastião José de Carvalho o
capitão de engenharia Eugénio dos Santos, que por sua morte em 1760, foi substituído pelo
major Carlos Mardel autor da remodelação da Praça do Rossio. As obras foram continuadas
depois de 1763 por Reinaldo Manuel dos Santos que a coroa incumbia de traçar o passeio
público.

Lisboa foi reconstruída segundo um plano regular estabelecido com toda a ponderação. As
ruas tornaram-se mais largas e desafrontadas e os alinhamentos mais perfeitos em vez da
confusão de ruas, ruelas e becos que anteriormente constituíam o centro da cidade. A
construção dos prédios fez-se com uma fachada de 4 andares sendo proibidos todos os
projetos particulares de forma a preservar a unidade do conjunto, bem como qualquer
elemento exterior que sugerisse a condição social dos proprietários, tudo se processou a partir
de dois centros internos, o Rossio e a Praça da Figueira, por meio de três grandes artérias que
vinham confluir no Terreiro do Paço ( Praça do Comércio ). O centro vivo de Lisboa passava a
ser o Terreiro do Paço expressão da cidade burguesa voltada para o Tejo, porta condigna da
grande capital. Os melhoramentos que recebeu a capital, com os novos arruamentos e
construções, tornaram-na uma das mais belas cidades do mundo.

Dominados pelo sentido prático das Luzes e pelas novas ideias de felicidade humana e de
harmonia com a Natureza, os projetistas adotaram soluções originais para a distribuição de
água ( ás habitações ) e para a drenagem dos esgotos, concebendo, até, um engenhoso
sistema de construção antissísmica. Este conhecido por “gaiola”, era constituído por uma
armação de estacas de madeira que, penetrando até aos alicerces, evitava a derrocada dos
vários andares, em caso de ruína das paredes.

Embora nada possa compensar, como pretendeu Pombal, o imenso património que o
terramoto destruiu, a Lisboa que se ergueu dos escombros constitui um do mais notáveis
conjuntos urbanísticos da Europa e, talvez, o maior legado que os 27 anos de governação
pombalina transmitiram ás gerações vindouras.

Em tão difícil conjuntura enviou o governo inglês consideráveis socorros a Portugal, em


dinheiro, géneros alimentícios, calçado e ferramentas. Vieram trezentos mil cruzados em
moeda portuguesa e duzentos mil em moeda espanhola; seis mil barris de carne, quatro mil de
manteiga, mil e duzentas sacas de arroz e mil de biscoito; dez mil quintais de farinha e três mil
trezentos e trinta e três moios de trigo; picaretas, enxadas, alavancas, parafusos etc.

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