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SP - F.S.E.E - 2004-05 PDF

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UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA

INSTITUTO SUPERIOR TÉCNICO


Departamento de Engenharia Electrotécnica
e de Computadores / Secção de Energia

FUNDAMENTOS DOS SISTEMAS

DE ENERGIA ELÉCTRICA

José Pedro Sucena Paiva


Prof. Catedrático
ÍNDICE
1 Conceitos Básicos 5
1.1 Energia e Potência. Diagrama de Carga. 5
1.2 Potência em Sistemas de Energia Eléctrica 7
1.2.1 Potência Activa e Reactiva 7
1.2.2 Potência Complexa e Aparente 10
1.3 Sistema Eléctrico Trifásico 12
1.3.1 Tensão e Corrente 12
1.3.2 Potência Activa e Reactiva 15
1.3.3 Carga Ligada em Triângulo 16
1.4 Representação do Sistema de Energia 17
1.5 Valores por Unidade 17
1.5.1 Sistemas Monofásicos 18
1.5.2 Sistemas Trifásicos 19
1.6 Transmissão de Energia 20
1.6.1 Em Corrente Alternada 20
1.6.2 Em Corrente Contínua 23
1.7 Caracterização das Cargas 24
1.7.1 Tipologia 24
1.7.2 Elasticidades 25
1.7.3 Elasticidade em Relação à Tensão 26
1.7.4 Elasticidade em Relação à Frequência 29

2 Máquinas Rotativas e Transformador 31


2.1 Máquina Síncrona 31
2.1.1 Introdução 31
2.1.2 Princípio de Funcionamento 32
2.1.3 Modelo Matemático 36
2.1.4 Características em Vazio e em Curto-Circuito 39
2.1.5 Características em Carga 41
2.1.6 Potência Activa e Reactiva 41
2.1.7 Efeito da Saliência 43
2.1.8 Modos de Operação 46
2.1.9 Estabilidade da Marcha Síncrona 49
2.2 Transformador 52
2.2.1 Introdução 52
ii Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

2.2.2 Princípio de Funcionamento 52


2.2.3 Corrente de Magnetização 54
2.2.4 Esquema Equivalente 56
2.2.5 Transformador com Três Enrolamentos 59
2.2.6 Autotransformador 60
2.2.7 Transformador Trifásico 61
2.2.8 Transformador com Regulação de Tensão 66
2.3 Máquina Assíncrona 68
2.3.1 Introdução 68
2.3.2 Princípio de Funcionamento 69
2.3.3 Modelo Matemático 70
2.3.4 Potência e Binário 71
2.3.5 Funcionamento como Gerador 74

3 Linha Eléctrica de Energia 77


3.1 Introdução 77
3.2 Resistência e Condutância Transversal 78
3.3 Reactância 80
3.3.1 Linha Monofásica 80
3.3.2 Linha com n Condutores 84
3.3.3 Linha Trifásica 87
3.3.4 Linha Trifásica com Dois Condutores em Feixe 90
3.4 Admitância Transversal 91
3.4.1 Linha Monofásica 92
3.4.2 Linha com n Condutores 93
3.4.3 Influência da Terra 94
3.4.4 Linha Trifásica 97
3.4.5 Linha Trifásica com Dois Condutores em Feixe 99
3.4.6 Cabo Subterrâneo 100
3.5 Modelo da Linha em Regime Estacionário 101
3.5.1 Modelo Exacto 101
3.5.2 Esquema Equivalente em π 105
3.5.3 Esquema Equivalente em π Nominal 106
3.5.4 Modelo da Linha Curta 107
3.6 Linha Terminada pela Impedância de Onda 109
3.7 Capacidade de Transporte 112
3.7.1 Limite Térmico 112
3.7.2 Limite de Estabilidade Estática 113
J. Sucena Paiva Índice iii

3.7.3 Limite de Estabilidade de Tensão 116

4 Correntes de Curto-Circuito 121


4.1 Introdução 121
4.2 Corrente e Potência de Curto-Circuito 122
4.2.1 Teorema da Sobreposição 123
4.2.2 Teorema de Thévenin 124
4.3 Curto-Circuito de um Gerador Síncrono 125
4.4 Modelos dos Elementos da Rede 129
4.4.1 Gerador 129
4.4.2 Transformador e Linha 129
4.4.3 Cargas 130
4.5 Cálculo das Correntes de Curto-Circuito Simétrico 130
4.5.1 Redução da Rede 130
4.5.2 Impedância Equivalente a Montante 131
4.5.3 Matriz das Impedâncias Nodais 132
CAPÍTULO 1

CONCEITOS BÁSICOS

Neste capítulo apresentam-se alguns conceitos básicos necessários à modelação e aná-


lise de Sistemas de Energia Eléctrica (SEE), admitindo-se que o leitor já está familiariza-
do com os fundamentos da teoria dos circuitos e das redes eléctricas.

Os conceitos fundamentais de energia e potência são ilustrados com recurso a um dia-


grama de carga do sistema eléctrico português. Em sistemas de corrente alternada, a
potência tem de ser qualificada, definido-se as diversas modalidades: activa, reactiva,
complexa e aparente.

Dado que a energia eléctrica é produzida, transportada e distribuída em corrente alternada


trifásica, este tipo de sistema eléctrico é abordado de seguida.

Refere-se o uso do esquema monofásico equivalente e do esquema unifilar para repre-


sentar o sistema trifásico simétrico, e classificam-se as redes eléctricas segundo a ten-
são, a função e a estrutura topológica.

O uso do sistema por unidade para exprimir as grandezas eléctricas de forma adimensio-
nal é hoje universal, pelas vantagens que a prática evidenciou. Trata-se assim de um tópi-
co que o engenheiro de sistemas de energia deve dominar perfeitamente, e que será
utilizado ao longo de todo este livro.

Numa rede síncrona em corrente alternada, a transmissão de energia é condicionada por


diversos factores, os quais são identificados e analisados. A título comparativo, aborda-se
também a transferência de energia em corrente contínua.

São ainda tipificadas as cargas ligadas à rede, e formulados os modelos matemáticos


pertinentes.

1.1 Energia e Potência. Diagrama de Carga.

Um Sistema de Energia Eléctrica fornece energia aos consumidores que a utilizam, as-
segurando o nível de potência que estes requerem para alimentar o conjunto dos equipa-
6 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

mentos ligados – a carga do sistema. A energia e a potência são contabilizados separa-


damente na factura de electricidade, já que os custos associados a uma e outra são dife-
rentes.

A relação básica entre energia e potência exprime-se matematicamente por:

dE
P= (1.1)
dt

onde E denota a energia, P a potência e t o tempo.

Sendo a potência a derivada da energia em ordem ao tempo, tem-se inversamente:


E = P dt (1.2)

Em unidades do Sistema Internacional, a energia exprime-se em Joule (J) e a potência


em Watt (W). Estas unidades correspondem a quantidades muito pequenas, face às que
estão em jogo nos sistemas de energia eléctrica, pelo que se usam de preferência os
respectivos múltiplos.

Assim, para a potência usam-se Kilowatt (1kW=103 W), Megawatt (1 MW=106 W), Gi-
gawatt (1 GW=109 W) e Terawatt (1 TW=1012 W).

Para a energia, a unidade utilizada na prática é Watt.hora (1 Wh=3 600 J) e os seus múl-
tiplos: kWh, MWh, GWh e TWh.

A carga de um SEE varia significativamente ao longo do dia, acompanhando a actividade


humana. Na Figura 1.1 apresenta-se o diagrama de carga do Sistema Eléctrico nacional
visto de rede de transporte, no dia 5/1/2000, em que se verificou uma potência máxima
(ponta) de 6287 MW, às 19.00 horas, e um consumo de energia de 117 GWh (área som-
breada).

Para um diagrama de carga, define-se utilização diária da ponta como a relação entre a
energia e a potência máxima; e factor de carga diário como a relação entre a potência
média e a potência máxima. Estas grandezas também podem ser definidas para outros
períodos de tempo, por exemplo, o ano: utilização anual da ponta e factor de carga anual.
J. Sucena Paiva Conceitos Básicos 7

4ªfeira 5/1/2000

7000
Pmax=6287 MW
6000

5000

4000
MW

3000
E=117 GWh
2000

1000

0
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24
Horas

Figura 1.1 – Diagrama de carga visto da rede de transporte, 5/1/2000.

1.2 Potência em Sistemas de Energia Eléctrica

Os sistemas de energia eléctrica actualmente existentes funcionam, na sua quase totali-


dade, em corrente alternada – com uma frequência de 50 Hz na Europa de 60 Hz nos
EUA1 – existindo contudo casos especiais em que se utiliza a corrente contínua.

1.2.1 Potência Activa e Reactiva

Considere-se um sistema monofásico de corrente alternada representado na Figura 1.2,


constituído por um gerador e uma carga. Admite-se que o gerador aplica uma tensão v à
carga, representada por uma impedância constante Z.

+
e ~ v Z
-

Figura 1.2 – Sistema monofásico em corrente alternada.

1
Em alguns países – nomeadamente o Japão – coexistem as duas frequências.
8 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

Admita-se que os valores instantâneos da tensão v e da corrente i são sinusoidais, com


valores eficazes V e I, respectivamente, e frequência angular ω:

v = 2 V sen ω t (1.3)

i = 2 I sen (ω t − φ ) (1.4)

ω = 2π f (1.5)

onde f é a frequência, e φ o ângulo de desfasagem entre a tensão e a corrente, conside-


rado positivo quando a carga é indutiva.

A potência instantânea p transferida do gerador para a carga é o produto da tensão v pela


corrente i:

p = v i = 2 V I sen ω t sen (ω t − φ )
(1.6)
= V I cos φ − V I cos (2ω t − φ )

Estas grandezas estão representadas na Figura 1.3a.

A equação anterior pode ser transformada em:

p = V I cos φ (1 − cos 2ω t ) − V I sen φ sen 2 ω t (1.7)


1444 424444 3 14442444 3
p1 p2

A representação gráfica de p e das componentes p1 e p2 consta da Figura 1.3b.


J. Sucena Paiva Conceitos Básicos 9

Figura 1.3 – Tensão, corrente e potência num circuito monofásico.

A componente p1 oscila em torno do valor médio V I cos φ com frequência angular 2ω,

nunca mudando de sinal. A componente p2 oscila com idêntica frequência, possui um va-
lor médio nulo e um valor máximo V I sen φ .

Definam-se agora as grandezas:

• Potência activa

P = V I cos φ (1.8)

• Potência reactiva

Q = V I sen φ (1.9)

Então, a equação (2.7) escreve-se:

p = P (1 − cos 2ω t ) − Q sen 2ω t (1.10)

A grandeza cos φ designa-se por factor de potência.

A potência activa P é o valor médio da potência instantânea e corresponde por conseguin-


te à potência que é efectivamente transferida. A potência reactiva Q é o valor máximo da
componente da potência que oscila entre o gerador e carga, cujo valor médio é nulo, re-
sultante da variação da energia magnética ou eléctrica armazenada nos elementos induti-
vos ou capacitivos, respectivamente, da impedância de carga.

A unidade de potência é, como já referido, o Watt=Volt.Ampere. Na prática dos SEE, no


entanto, distinguem-se as unidades de potência activa e de potência reactiva. Para a pri-
meira, reserva-se o Watt (W) e seus múltiplos (kW, MW, GW, TW); para a segunda usa-
se o Volt.Ampere reactivo (VAr) e seus múltiplos (kVAr, MVAr, GVAr, TVAr).

Regressando às equações (1.8) e (1.9) e notando que φ pode variar de +π/2 (carga induti-
va pura) a – π/2 (carga capacitiva pura) verifica-se que, enquanto P é sempre positivo, Q
pode ser positivo ou negativo. Será positivo se a carga for indutiva (φ>0), negativo se a
carga for capacitiva (φ<0) e nulo se a carga for resistiva (φ=0). Na prática dos SEE diz-se,
convencionalmente, que uma carga indutiva absorve potência reactiva e uma carga capa-
citiva gera potência reactiva.
10 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

1.2.2 Potência Complexa e Aparente

Usando a notação simbólica, a tensão e a corrente escrevem-se (admitindo argumentos


arbitrário δ e β para a tensão e corrente, respectivamente)2:

V =V ejδ (1.11)

I = I e jβ (1.12)

O diagrama de fasores correspondente está representado na Figura 1.4.

Im

I
φ
δ
β
Re

Figura 1.4 – Diagrama de fasores para a tensão e a corrente.

A potência complexa S é definida pelo produto do fasor tensão pelo conjugado do fasor
corrente

S = V I∗ (1.13)

Substituindo as equações (1.11) e (1.12) em (1.13) obtém-se:

S = V e j δ I e − j β = V I e j ( δ −β ) = V I e j φ
(1.14)
= V I cos φ + j V I sen φ

Atendendo à definição de potência activa e reactiva, tem-se:

S = P + jQ (1.15)

A potência complexa S é, assim, uma grandeza complexa cuja parte real é a potência ac-
tiva P e cuja parte imaginária é a potência reactiva Q.

2
Os fasores (grandezas complexas) são representados em tipo carregado; os respectivos módulos (bem
como outras grandezas reais) em tipo normal.
J. Sucena Paiva Conceitos Básicos 11

O módulo da potência complexa é a potência aparente, ou seja, o produto dos módulos da


tensão e da corrente:

S = P 2 +Q2 = V I (1.16)

A potência aparente exprime-se em VA (Volt.Ampere) e nos seus múltiplos kVA, MVA,


GVA e TVA.

O factor de potência já atrás referido corresponde ao quociente entre a potência activa e a


potência aparente.

Se relacionarmos a tensão e a corrente por meio da impedância de carga Z (ou admitân-


cia Y=1/Z), obtemos expressões alternativas para a potência complexa.

Com efeito:

V =Z I (1.17)

I =Y V (1.18)

Substituindo na equação (1.13):

S =V Y ∗ V ∗ =Y ∗V 2 (1.19)

S = Z I I∗ = Z I2 (1.20)

Admitindo que a carga é constituída por uma resistência R em paralelo com uma reactân-
cia X, por aplicação da equação (1.19) os valores das potências activa e reactiva consu-
midas são:

V2
P= (1.21)
R

V2
Q= (1.22)
X

Admitindo que a carga é um condensador com capacidade C, usando a equação (2.19)


obtemos:

Q = −ω C V 2 (1.23)

Se a carga for constituída por uma resistência R em série com uma reactância X, a apli-
cação da equação (1.120) conduz aos valores das potência activa e reactiva consumidas:
12 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

P = R I2 (1.24)

Q = X I2 (1.25)

Se, ao invés, forem conhecidas as potência activa e reactiva de carga para um dado valor
da tensão ou da corrente, as equações (1.19) e 1.20) permitem calcular o valor da admi-
tância ou impedância correspondente, respectivamente:

S∗ P − j Q
Y = = (1.26)
V2 V2

S P + jQ
Z= = (1.27)
I2 I2

1.3 Sistema Eléctrico Trifásico

1.3.1 Tensão e Corrente

A energia eléctrica é produzida, transportada e distribuída em sistemas eléctricos trifási-


cos. As máquinas trifásicas – geradores e transformadores – fazem um melhor uso dos
materiais – cobre e ferro – o que reduz as dimensões e o peso, conduzindo a uma rela-
ção custo/potência menor. As linhas eléctricas trifásicas de alta ou média tensão são
constituídas apenas por três condutores, não sendo necessário o neutro, uma vez que o
retorno da corrente numa fase é assegurado pelas outras. Daqui resulta uma economia
significativa, se compararmos uma linha trifásica com três linhas monofásicas, transferin-
do a mesma potência.

Como vimos na secção anterior, a potência eléctrica num sistema monofásico tem natu-
reza oscilante, o que não sucede em sistemas trifásicos, como se mostrará à frente. Esta
característica, se não tem inconvenientes em muitas aplicações, como sejam aquecedo-
res, aparelhos de iluminação ou equipamento electrónico, é indesejável em motores eléc-
tricos – que constituem a parcela mais significativa da carga ligada à rede – por conduzir
a um binário motor também oscilante.

Um gerador trifásico com os enrolamentos ligados em estrela – Figura 1.5a – produz três
forças electromotrizes (tensões em vazio) com frequência angular ω = 2π f , iguais em

módulo e desfasadas de 2π/3 (=120º) – Figura 1.5b – na qual as três fases são designa-
J. Sucena Paiva Conceitos Básicos 13

das por a, b e c (a fase a, dita de referência, possui argumento nulo). O diagrama de faso-
res correspondente está representado na Figura 1.5c.

ea
- + a
~ ea eb ec Ec

eb o
- + b 120
~ 120
o
Ea
2π ωt 120
o
ec
c ωt
- +
~
Eb
n
a b c

Figura 1.5 – Gerador trifásico:


a) Esquema equivalente;
b) Variação no tempo das f.e.m.;
c) Diagrama de fasores.

A sequência de fases é tal que a fase b está em atraso em relação à fase a e a fase c em
atraso em relação à fase b. Esta sequência é importante em algumas aplicações: num
motor eléctrico, ela determina o sentido de rotação.

Na Figura 1.6 representa-se um sistema de corrente alternada trifásica constituído por um


gerador e uma carga simétrica, representada por uma impedância igual em cada uma
das fases. Admitiu-se que, como é normal, o ponto neutro n está ligado à terra.

ea Z
- + a ia
~
eb Z
- + b ib
~
ec ic Z
- + c
~
v c vb va
n

Figura 1.6 – Sistema trifásico simétrico.

As três tensões simples ou fase-neutro são:


14 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

v a = 2 V sen ω t
v b = 2 V sen (ω t − 2π 3 ) (1.28)
v c = 2 V sen ( ω t + 2π 3 )

onde V é o valor eficaz . Em notação simbólica:

Va = V e j 0
Vb = V e − j 2π 3
(1.29)
Vc = V e j 2π 3

Num sistema trifásico, o valor nominal é definido para as tensões fase-fase (ou tensões
entre fases ou tensões compostas,) representadas na Figura 1.7:

Vab = Va − V b
Vbc = Vb − Vc (1.30)
Vca = Vc − Va

Vca

Vc Ic
φ

Va
φ o
30 Vab
Ia
φ
Ib
Vb
Vbc

Figura 1.7 – Fasores de tensão (simples e composta) num sistema trifásico simétrico.

O valor eficaz VL das tensões fase-fase é:

VL = Vab = Vbc = Vca = 2V cos π 6


(1.31)
= 3V

Sendo a carga simétrica, as correntes nas três fases escrevem-se:

i a = 2 I sen (ω t − φ )
i b = 2 I sen (ω t − 2π 3 − φ ) (1.32)
i c = 2 I sen (ω t + 2π 3 − φ )
J. Sucena Paiva Conceitos Básicos 15

A soma das correntes nas três fases é nula, logo não é necessário um condutor ligando o
neutro do gerador com o da carga. Os dois neutros estão ao potencial da terra, quer no
gerador quer na carga, ainda que porventura não estejam fisicamente ligados a ela.

Num sistema trifásico simétrico, todas as tensões simples podem ser medidas em rela-
ção a um neutro, que tem o mesmo potencial – zero – ao longo de todo o sistema.

1.3.2 Potência Activa e Reactiva

A potência transferida do gerador para a carga será:

p = va ia +vb ib +vc ic (1.33)

Substituindo as equações (1.28) e (1.32) na equação (1.33), após alguma manipulação,


vem:

p = 3 V I cos φ (1.34)

A potência trifásica instantânea é portanto constante e igual a três vezes a potência activa
por fase. Em termos da tensão entre fases – equação (1.31) – a potência activa trifásica
escreve-se:

P= 3 VL I cos φ (1.35)

Em face deste resultado poder-se-ia supor que a potência reactiva é irrelevante num sis-
tema trifásico, o que não é o caso. Em cada uma das fases, a potência é do tipo descrito
pela equação (1.10) sendo nula a soma das respectivas componentes oscilatórias, tal
como se verifica para as correntes.

A potência reactiva trifásica é definida como a soma algébrica das potências reactivas em
cada fase, ou seja:

Q = 3 V I sen φ
(1.36)
= 3 VL I sen φ

As potências complexa e aparente para sistemas trifásicos são calculadas, respectiva-


mente, por:

S = 3V I ∗
= 3 Vc I cos φ + j 3 Vc I sen φ (1.37)
=P + jQ
16 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

S = 3 VL I = P 2 + Q 2 (1.38)

1.3.3 Carga Ligada em Triângulo

A carga trifásica representada na Figura 1.6 está ligada em estrela, ou seja, a tensão apli-
cada a cada impedância de carga Z é a tensão fase-neutro. Outra forma de ligar a carga é
em triângulo, como se mostra na Figura 1.8 (o gerador não está representado), situação
em que cada impedância de carga Z∆ está sujeita à tensão entre fases.

ia
a
vab Z∆ Iab
ib
vca b
Z∆
Ibc Z∆
vbc Ica
ic
c

Figura 1.8 – Carga ligada em triângulo.

As correntes Iab e Ica são:

Vab
I ab = (1.39)
Z∆

Vca
I ca = (1.40)
Z∆

A corrente na linha Ia é, por conseguinte:

Vab − Vca 3Va


Ia = = (1.41)
Z∆ Z∆

Admitindo Z∆=Z, a amplitude da corrente Ia é três vezes maior que na ligação da carga em
estrela, e o ângulo de desfasagem é idêntico.

A potência absorvida pela carga ligada em triângulo é então três vezes maior que a cor-
respondente à ligação em estrela, para o mesmo valor da impedância de carga.
J. Sucena Paiva Conceitos Básicos 17

1.4 Representação do Sistema de Energia

Devido à simetria existente nas três fases num sistema trifásico equilibrado, é suficiente
determinar a tensão, a corrente e a potência na fase de referência. Nas outras duas fases
afectam-se as grandezas eléctricas (tensões e correntes) por uma desfasagem de ±120º.
É assim suficiente o uso de um esquema monofásico equivalente – no qual se representa
uma fase e o neutro – para analisar o sistema.

O esquema (ou diagrama) unifilar constitui uma representação ainda mais simples do sis-
tema de energia eléctrica. Ainda que a rede seja trifásica (excepto nos troços finais em
baixa tensão, que podem ser monofásicos ou trifásicos), usa-se apenas um traço para
representar os respectivos elementos – donde a designação de esquema unifilar. Omite-
se a representação do neutro por não conter informação relevante, pelo menos para o
cálculo em regime estacionário.

No esquema unifilar usam-se símbolos normalizados: o gerador é representado por um


círculo contendo um til (que indica corrente alternada3); o símbolo do transformador é
constituído por dois círculos parcialmente sobrepostos, que correspondem aos dois enro-
lamentos; uma linha é representada simplesmente por uma recta entre dois barramentos;
o símbolo de carga é uma seta que indicia o fornecimento de energia aos consumidores
ligados a um barramento.

1.5 Valores por Unidade

Na análise dos SEE, em vez de quantificar as grandezas eléctricas (impedâncias, admi-


tâncias, correntes, tensões e potências) nas respectivas unidades, é preferível exprimi-las
como fracções (designadas valores p.u.) de valores de referência (designados valores de
base), tais como valores nominais ou de plena carga.

O uso de valores p.u. possui vantagens significativas, nomeadamente:

• Os SEE contêm numerosos transformadores, que complicam apreciavelmente a aná-


lise. Os valores p.u. permitem eliminar do modelo do transformador a parte referente à
relação de transformação (ou seja, o transformador ideal);

3
Para corrente contínua, usa-se o sinal de igual (=).
18 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

• A existência de transformadores implica a partição do SEE em áreas com diferentes


níveis de tensão. Uma tensão expressa em por unidade – por exemplo 0,95 p.u. ou
1,08 p.u. – indica imediatamente que ela está 5% abaixo ou 8% acima do valor nomi-
nal (tomado como referência), que é 1,0 p.u.;

• Os parâmetros característicos dos componentes do SEE, que variam substancial-


mente em dimensão, expressos em p.u., caem dentro de determinadas gamas de va-
lores, que se podem identificar como normais, o que facilita a detecção de erros;

• O uso do factor 3 em sistemas trifásicos é consideravelmente reduzido;

• Os valores p.u. situam-se frequentemente em torno da unidade, valor próximo do óp-


timo para o cálculo digital e para a apresentação de dados.

O valor p.u. de uma grandeza obtém-se pela fórmula básica:

valor da grandeza
valor p.u. = (1.42)
valor de base

O valor da grandeza pode ser uma quantidade expressa em unidades do Sistema Inter-
nacional, um fasor ou número complexo referente a um circuito de corrente alternada ou
um valor instantâneo.

O valor de base é um número real, escolhido de forma a obter as vantagens do sistema


p.u.. O valor p.u. é uma quantidade adimensional, um fasor ou número complexo, ou um
valor instantâneo.

O valor de base pode ser de dois tipos:

• Base postulada;
• Base derivada.

1.5.1 Sistemas Monofásicos

Num sistema monofásico, postula-se:

• Base de tensão (kV) Vb

• Base de potência (MVA) Sb

Os valores de base derivados são:

• Base de corrente (kA)


J. Sucena Paiva Conceitos Básicos 19

Sb
Ib = (1.43)
Vb

• Base de impedância (Ω)

Vb Vb2
Zb = = (1.44)
Ib Sb

• Base de admitância (S)

Ib S
Yb = = b2 (1.45)
Vb Vb

Em valores p.u., obtém-se então:

V
V pu = (1.46)
Vb

I
I pu = (1.47)
Ib

S VI* ∗
Spu = = = V pu I pu (1.48)
Sb Vb I b

Z S
Z pu = = Z b2 (1.49)
Zb Vb

Y V2
Y pu = =Y b (1.50)
Yb Sb

Por vezes é necessário converter uma impedância ou uma admitância expressa em p.u.
numa dada base (designada por ‘) para outra base (designada por ‘’). Atendendo às equa-
ções (1.49) e (1.50), é fácil verificar que:

S′b′ Vb′2
Z ′pu
′ = Z ′pu (1.51)
S′b Vb′′2

S′b Vb′′2
′ = Y pu
Y pu ′ (1.52)
S′b′ Vb′ 2
20 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

1.5.2 Sistemas Trifásicos

Para sistemas trifásicos, toma-se para base a potência aparente trifásica Sb e a tensão
entre fases Vb. A relação entre a potência aparente, a tensão e a corrente de base é:

Sb = 3 Vb I b (1.53)

Donde resulta para a corrente de base:

Sb
Ib = (1.54)
3 Vb

A impedância de base é dada pela equação:

Vb Vb Vb2
Zb = = = (1.55)
3 Ib Sb Sb
3
3 Vb

que é idêntica à equação (1.41).

A tensão e corrente em p.u. exprimem-se por:

3V
Vpu = (1.56)
Vb

I
I pu = (1.57)
Ib

Note-se que a tensão Vpu tem o mesmo ângulo de fase que a tensão fase-neutro V.

A potência complexa é, por seu lado:

S 3V I ∗ 3 3 V I∗ ∗
Spu = = = = V pu I pu (1.58)
Sb 3 Vb I b 3 Vb I b

Note-se que, usando valores p.u. esta equação coincide com a que se aplica a um siste-
ma monofásico. Quanto à impedância e admitância também se mantêm as equações
(1.49) e (1.50).
J. Sucena Paiva Conceitos Básicos 21

1.6 Transmissão de Energia

1.6.1 Em Corrente Alternada

Considere-se o circuito da Figura 1.9, que representa o esquema monofásico equivalente


de uma linha de transmissão de energia ligada entre os nós 1 e 2 – a qual numa primeira
aproximação se modela por um elemento indutivo com reactância X.

I jX
1 2
S12 S21
V1 V2

Figura 1.9 – Transmissão de energia através de um elemento indutivo.

Pretende-se estabelecer a relação entre as potências activa e reactiva que transitam na


linha e as tensões nos nós entre os quais ela está ligada.

A corrente que percorre a linha, definida como positiva quando flui do barramento 1 para o
2, é dada por:

V1 − V2
I = (1.59)
jX

A potência complexa na emissão S12, convencionalmente positiva no sentido 1→2, será:

V1∗ − V 2∗ V12 − V1V2*


S12 = V1 I ∗ = V1 = (1.60)
− jX − jX

Uma vez que:

V1 = V1 e j δ1 (1.61)

V2 = V2 e j δ2 (1.62)

resulta:

V1 V2* = V1 V2 e j (δ1 −δ2 )


(1.63)
= V1 V2 e j δ
22 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

onde δ = δ 1 − δ 2 é o ângulo de desfasagem entre as tensões no nó 1 (emissor) e no nó 2

(receptor).

Substituindo a equação (1.63) na equação (1.60), obtém-se:

V12 − V1 V2 (cos δ + j sen δ )


S12 = j
X (1.64)
V V sen δ V 2 − V1 V2 cos δ
= 1 2 +j 1
X X

As potências activa e reactiva na emissão são então dadas por:

V1 V2
P12 = sen δ (1.65)
X

V12 − V1 V2 cos δ
Q12 = (1.66)
X

De forma análoga se deduzem as potências activa e reactiva na recepção, convencio-


nalmente positivas no sentido 2→1, obtendo-se:

V1 V2
P21 = − sen δ (1.67)
X

V22 − V1 V2 cos δ
Q 21 = (1.68)
X

Somando as equações (1.65) e (1.66) com (1.67) e (1.68), respectivamente, obtém-se:

PL = P12 + P21 = 0 (1.69)

V12 + V22 − 2 V1 V2 cos δ


Q L = Q12 + Q21 = (1.70)
X

PL e QL são respectivamente as perdas de potência activa e reactiva na linha. Dado que


desprezamos a resistência, as perdas de potência activa são nulas. As perdas de potên-
cia reactiva não correspondem na realidade a perdas energéticas, dada a natureza deste
tipo de potência. Contudo, o balanço de potência reactiva tem de ser fechado, tal como o
de activa.

A equação (1.65) indica que o sentido do trânsito de potência activa é essencialmente de-
terminado pelo ângulo de desfasagem δ entre as tensões nos barramentos de emissão e
J. Sucena Paiva Conceitos Básicos 23

de recepção: se δ>0, ou seja, se a tensão na emissão estiver em avanço em relação à


tensão na recepção, o trânsito é no sentido 1→2; se δ<0, o trânsito é no sentido 2→1.

As amplitudes das tensões V1 e V2 não determinam o sentido do trânsito de potência acti-


va. Em contrapartida, influenciam o sentido do trânsito de potência reactiva, cujo valor
médio, usando as equações (1.66) e (1.68) é:

Q12 − Q 21 V12 − V22


Q med = = (1.71)
2 2X

Verifica-se assim que, se V1>V2, o trânsito de potência reactiva é no sentido 1→2; se


V1<V2, o trânsito é no sentido 2→1. Se as tensões forem iguais em amplitude nos dois
extremos , V1=V2=Vn, então:

Q med = 0 (1.72)

Embora a potência média seja nula, o mesmo não se passa com a potência reactiva nos
extremos, que as equações (1.66) e (1.68) mostram ser iguais:

Vn2 (1 − cos δ )
Q12 = Q 21 = (1.73)
X

Então, a respectiva soma corresponde às perdas de potência reactiva, que é consumida


na reactância da linha:

2Vn2 (1 − cos δ )
QL = (1.74)
X

O valor das perdas de potência reactiva pode em alternativa ser calculado pela equação
(1.25). Sendo a amplitude da corrente no circuito dado por:

V1 − V2
e jδ1 − e jδ2 = n [2 (1 − cos δ )]1/ 2
Vn V
I= = (1.75)
X X X
obtém-se:

2 Vn2 (1 − cos δ )
QL = I 2 X = (1.76)
X
24 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

1.6.2 Em Corrente Contínua

A corrente contínua tem aplicação em casos específicos, nomeadamente, o transporte a


longa distância e a interligação assíncrona de redes (que podem mesmo ter frequências
diferentes).

Uma linha em corrente contínua, em regime estacionário, é simplesmente caracterizada


pela sua resistência R não tendo aplicação os conceitos de reactância e de potência re-
activa. Então, se as tensões nos extremos emissor e receptor forem V1 e V2, respectiva-
mente, a corrente na linha é dada por:

V1 − V2
I= (1.77)
R

As potências nos dois extremos são:

V12 − V1V2
P12 = V1 I = (1.78)
R

V22 − V1V2
P21 = −V2 I = (1.79)
R

Somando P12 e P21, obtêm-se as perdas:

(V1 − V2 ) 2
PL = P12 + P21 = = R I2 (1.80)
R

O valor médio da potência transitada é dado por:

P12 − P21 V12 − V22


Pmed = = (1.81)
2 2R

Constata-se desta equação que o trânsito de potência (activa) é regulável através da ten-
são nos extremos da linha, ao invés do que sucede em corrente alternada. Assim, se
V1>V2, o trânsito de potência é no sentido 1→2; se V1<V2, o trânsito é no sentido 2→1.
J. Sucena Paiva Conceitos Básicos 25

1.7 Caracterização das Cargas

1.7.1 Tipologia

Denomina-se carga um equipamento ou conjunto de equipamentos ligado á rede, que ab-


sorve energia eléctrica.

As cargas típicas têm carácter indutivo, e são especificadas pelas potências activa PC e
reactiva QC ou pela potência activa PC e factor de potência cos φ (em alternativa, pode
usar-se a tan φ):

PC
cos φ = (1.82)
PC2 + QC2

QC
tan φ = (1.83)
PC

As cargas agrupam-se em quatro grandes tipos:

• Motores;

• Iluminação;

• Aquecimento e refrigeração;

• Aparelhos electrónicos.

A carga servida por um SEE é influenciada por um grande número de factores, que se
podem classificar em dois grandes grupos: factores temporais e factores climáticos.

Os primeiros relacionam-se com a periodicidade diária, semanal e sazonal, períodos de


férias e ainda com as tendências de crescimento (ou diminuição) anual. Os segundos
incluem a temperatura, a humidade, a visibilidade e a velocidade do vento. Para além des-
tes, existem factores aleatórios, devidos à própria natureza estatística das cargas, a
acontecimentos especiais e avarias inesperadas.

São correntemente utilizados modelos para a previsão do valor da carga em cada barra-
mento da rede, bem como da carga total, quer num horizonte de curto quer de médio ou
longo prazo.
26 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

1.7.2 Elasticidades

Um aspecto importante, que caracteriza as cargas, é a sua dependência em relação à


tensão e à frequência:

PC = f (V , f )
(1.84)
QC = g (V , f )

Para pequenas variações da tensão e da frequência em torno de um valor de referência:

V = V o + ∆V
(1.85)
f = f o + ∆f

resulta:

PC = PCo + ∆PC
(1.86)
QC = QCo + ∆QC

onde:

∂ PC ∂ PC
∆PC ≈ ∆V + ∆f
∂V ∂f
(1.87)
∂ QC ∂ QC
∆QC ≈ ∆V + ∆f
∂V ∂f

ou ainda:

∆PC ∂ PC V o ∆V ∂ PC f o ∆f
≈ +
PCo ∂ V PCo V o ∂ f PCo f o
(1.88)
∆QC ∂ QC V o ∆V ∂ QC f o ∆f
≈ +
QCo ∂ V QCo V o ∂ f QCo f o

Definem-se as elasticidades das potências activa e reactiva em relação à tensão e à fre-


quência (grandezas adimensionais):

• Elasticidade da potência activa em relação à tensão

∂ PC V o
εv = (1.89)
∂ V PCo

• Elasticidade da potência reactiva em relação à tensão


J. Sucena Paiva Conceitos Básicos 27

∂ QC V o
ηv = (1.90)
∂V QCo

• Elasticidade da potência activa em relação à frequência

∂ PC f o
εf = (1.91)
∂ f PCo

• Elasticidade da potência reactiva em relação à frequência

∂ QC f o
ηf = (1.92)
∂ f QCo

Fazendo uso destas grandezas e tomando para valores de referência da tensão e da cor-
rente os valores nominais as equações (1.88) transformam-se em:

∆PC
≈ ε v ∆Vpu + ε f ∆f pu
PCo
(1.93)
∆QC
≈ ηv ∆Vpu + ηf ∆f pu
QCo

1.7.3 Elasticidade em Relação à Tensão

Esta é a grandeza mais importante, uma vez que em redes interligadas com elevada po-
tência girante, a frequência é regulada dentro de limites muito estreitos.

Um modelo frequentemente adoptado exprime as potências activa e reactiva como uma


potência da tensão:

PC = CP V kP (1.94)

QC = CQ V
kQ
(1.95)

Da equação (1.94), derivando em ordem a V:

kP
 ∂ PC  k −1 C Vo
  = k P CP V o P = k P P o
 ∂V  Vo V
(1.96)
Po
= k P Co
V

donde, por substituição na equação (1.89):


28 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

εv = kP (1.97)

Para a potência reactiva, podemos deduzir uma expressão análoga:

ηv = k Q (1.98)

• Carga Modelada por Impedância Constante

Para uma carga passiva, modelada por uma admitância constante, ligada a um barra-
mento com tensão V, a potência absorvida calcula-se por:

SC = PC + j QC = V I C∗ = V YC∗ V ∗ = YC∗ V 2 (1.99)

As potências activa e reactiva de carga são especificadas para o valor da tensão nominal
(igual a 1,0 p.u.). Então, a admitância equivalente, em valores p.u. calcula-se por:

YC = SC∗ = PC − j QC (1.100)

Da equação (1.99), atendendo a que YC = GC + j BC , retira-se:

PC = GCV 2 (1.101)

QC = − BCV 2 (1.102)

Estas equações revelam que PC e QC variam com o quadrado da tensão. Das equações
(1.97) e (1.98) conclui-se então que:

εv = 2
(1.103)
ηv = 2

Para uma carga modelada por impedância constante, as elasticidades em relação à ten-
são são iguais a 2.

• Carga Modelada por Corrente Constante

Para uma carga modelada por uma corrente com amplitude IC e desfasagem em relação
à tensão φ C constantes, retirada de um barramento com tensão V, a potência absorvida
calcula-se por:

SC = PC + j QC = V I C e j φC (1.104)
J. Sucena Paiva Conceitos Básicos 29

O ângulo φ C considera-se positivo quando a corrente está em atraso relativamente à ten-


são.

Admitindo, como é normal, que as potências activa e reactiva são especificadas para o
valor nominal da tensão (V=1,0 p.u.), os valores de IC e φ C são calculados por:

IC = PC2 + QC2 (1.105)

Q 
φC = a tan  C  (1.106)
 PC 

Para valores variáveis da tensão, as potências activa e reactiva de carga são então dadas
por:

PC = V I C cos φC (1.107)

QC = V I C sen φ C (1.108)

Estas equações revelam que PC e QC variam linearmente com a amplitude da tensão,


uma vez que IC e φ C são constantes. Das equações (1.97) e (1.98) conclui-se então que:

εv = 1
(1.109)
ηv = 1

Para uma carga modelada por corrente constante, as elasticidades em relação à tensão
são unitárias.

• Carga Modelada por Potência Constante

Nesta hipótese, as potências são constantes, não variando com a tensão, logo:

εv = 0
(1.110)
ηv = 0

Para uma carga modelada por potência constante, as elasticidades em relação à tensão
são nulas.

• Carga Composta

A carga ligada a cada barramento do sistema eléctrico é composta por parcelas com
elasticidades diferentes, podendo com generalidade ser descrita pela equações:
30 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

PC = ∑C Pi V ε vi (1.111)
i

QC = ∑C Qi V ηvi (1.112)
i

O número de termos do somatório e o valor das constantes podem ser determinados a


partir de modelos físicos das cargas ou por dados experimentais.

Na prática, usam-se muitas vezes valores médios aproximados, obtidos empiricamente


para uma carga típica4, considerando-se unitário o número de termos do somatório:

ε v = 1 ,0
(1.113)
ηv = 1,3

1.7.4 Elasticidade em Relação à Frequência

Para uma carga modelada por uma impedância constante, é possível calcular analitica-
mente a elasticidade em relação à frequência. Das equações (1.101) e (1.102), tendo
presente que:

Rc
GC = (1.114)
RC2 + X C2

Xc
BC = − (1.115)
RC2 + X C2

XC = ω L = 2π f L (1.116)

e usando as equações (1.91) e (1.92), obtém-se:

X C2
ε f = −2 = −2 sen 2φC (1.117)
RC + X C
2 2

RC2 − X C2
ηf = = 1 − 2 sen 2φC (1.118)
RC + X C
2 2

Note-se que a elasticidade da potência activa em relação à frequência tem sempre um


valor negativo para cargas deste tipo. Contudo, para uma carga típica, devido ao peso dos

4
Para uma carga típica é determinante o peso dos motores de indução, cuja elasticidade da potência acti-
va em relação à tensão é praticamente nula.
J. Sucena Paiva Conceitos Básicos 31

motores de indução, a elasticidade em relação à frequência é positiva, uma vez que a sua
velocidade e, por conseguinte, a potência fornecida, é proporcional àquela. Um valor empí-
rico habitualmente utilizado é:

ε f = 1,0 (1.119)

A elasticidade da potência reactiva em relação à frequência não tem interesse prático, não
se indicando, por conseguinte, um valor típico.
CAPÍTULO 2

MÁQUINAS ROTATIVAS E
TRANSFORMADOR

Neste capítulo trataremos da máquina síncrona, universalmente utilizada como gerador


(podendo também ser usada como motor), do transformador, que permite alterar o nível
de tensão ao longo da rede, e ainda da máquina assíncrona, de uso generalizado como
motor (e limitado como gerador).

Estabeleceremos os princípios de funcionamento e os modelos matemáticos simplifica-


dos destes componentes, aplicáveis à análise do sistema eléctrico em regime estacioná-
rio.

2.1 Máquina Síncrona

2.1.1 Introdução

A quase totalidade da energia eléctrica é produzida por geradores síncronos ou alternado-


res trifásicos, que assim se constituem como os elementos–matriz dos Sistemas de
Energia Eléctrica.

A máquina síncrona é um equipamento complexo e versátil, baseado na lei da indução


electromagnética, devida a Faraday. A designação síncrona resulta de este tipo de máqui-
na rotativa, em regime estacionário, funcionar com velocidade e frequência constantes,
em sincronismo com todas as outras ligadas à mesma rede.

Um gerador recebe energia mecânica da máquina motriz – turbina hidráulica, de vapor ou


de gás para potências elevadas, motor térmico alternativo, turbina de gás ou turbina eólica
para potências mais baixas – e entrega energia eléctrica à rede à qual está ligado, com
um rendimento energético muito elevado. A máquina síncrona pode no entanto também
funcionar como motor – absorvendo energia eléctrica da rede e fornecendo energia me-
34 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

cânica a uma carga ligada ao seu veio. Neste modo de funcionamento, a máquina recebe
a designação de motor síncrono.

Numa instalação eléctrica de produção – designada usualmente por central eléctrica –


existem um ou mais geradores síncronos em paralelo, cuja potência unitária pode atingir
as centenas – ou mesmo o milhar – de MVA. A designação usual radica na filosofia de
produção centralizada, de grande escala, que tradicionalmente caracteriza o SEE. Note-
se contudo que em anos recentes se tem expandido a produção em escala mais reduzi-
da, e próxima dos centros de consumo, usando a cogeração – produção combinada de
energia eléctrica e térmica – e as energias renováveis.

2.1.2 Princípio de Funcionamento

Uma máquina síncrona é constituída por uma massa metálica fixa – estator – na qual está
instalado o enrolamento induzido e por uma massa metálica rotativa – rotor – no qual está
bobinado o enrolamento indutor ou de excitação. Na Figura 2.1 representa-se esquemati-
camente uma secção transversal de uma máquina trifásica com um par de pólos.

c
b’

a a’

c’ b

Figura 2.1 – Máquina síncrona trifásica elementar.

O enrolamento indutor é percorrido por uma corrente contínua, fornecida por uma fonte
auxiliar a qual dá origem a um fluxo magnético, que se fecha através do entreferro e do
estator. Devido à forma construtiva da máquina, a distribuição espacial da indução mag-
nética é aproximadamente sinusoidal, como se mostra na Figura 2.2a. Uma vez que o
rotor, accionado pela máquina motriz, roda com velocidade constante, cria-se no entrefer-
ro um fluxo magnético girante.
J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 35

B e

0 π 2π θ t

a b

Figura 2.2 – a) Distribuição espacial do fluxo magnético; b) Tensão induzida.

O enrolamento do estator é constituído por bobinas, alojadas em cavas, que cobrem toda
a sua superfície interior. A bobina pertencente a uma fase é colocada em cavas diame-
tralmente opostas, sendo os condutores longitudinais paralelos ao veio da máquina. De
acordo com a lei de Faraday, o fluxo magnético girante induz uma tensão nessa bobina,
representada na Figura 2.2b, a qual dará origem a uma corrente num circuito exterior liga-
do entre os respectivos terminais. Dado que está sujeito a um fluxo magnético variável, o
estator é constituído por lâminas de ferro, por forma a reduzir as perdas por correntes de
Foucault.

Os enrolamentos das três fases estão espacialmente desfasados de 120º para que, com
a rotação uniforme do rotor, sejam produzidas tensões induzidas desfasadas de 120º no
tempo, constituindo um sistema trifásico simétrico.

Para uma máquina com um par de pólos, a frequência da tensão induzida em ciclos por
segundo (Hz) iguala a velocidade do rotor em rotações por segundo. Assim para a fre-
quência de 50 Hz, a velocidade de rotação será 3000 r.p.m. (rotações por minuto)5.

A máquina síncrona pode ter um número mais elevado de pares de pólos. Na Figura 2.3
mostra-se uma máquina com 4 pólos, na qual cada fase consiste de um par de enrola-
mentos ocupando quatro cavas na superfície do estator – a1 a1′ e a2 a′2 .

5
Para 60 Hz, seria de 3600 r.p.m.
36 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

a2

N
a'2 S a1'
S
N
b1
c1
a1

Figura 2.3 – Máquina síncrona com 4 pólos.

Em cada instante, são induzidas tensões iguais nos dois enrolamentos de cada fase, as
quais se somam, uma vez que aqueles estão ligados em série.

Nesta situação, a distribuição espacial da indução magnética é a que se representa na


Figura 2.4, havendo dois ciclos completos ao longo da periferia do estator. Em conse-
quência, a frequência da tensão induzida é duas vezes a velocidade em rotações por se-
gundo.

a1 a’1 a2 a’2
π 2π θm
0 2π 4π θ

Figura 2.4 – Distribuição espacial da indução magnética para uma máquina de 4 pólos.
(θm – rad. mecânicos;θ – rad. eléctricos).

Em máquinas com mais de um par de pólos, exprimem-se os ângulos em graus eléctri-


cos em vez de graus mecânicos. Um par de pólos corresponde a 2π radianos eléctricos,
donde:

θ = pθ m (2.1)

onde θ é o ângulo eléctrico, θm o ângulo mecânico e p o número de pares de pólos.

A frequência da tensão induzida é então, no caso geral, dada por:

n
f=p (2.2)
60

onde f é a frequência em Hz e n a velocidade em r.p.m.


J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 37

A frequência angular ω da tensão relaciona-se por seu lado com a velocidade angular do
rotor ωr – ambas expressas em rad/s – pela expressão:

ω = pω r (2.3)

Os rotores representados nas Figura 2.1 e Figura 2.3 são de pólos salientes, sendo o en-
rolamento de excitação constituído por bobinas enroladas em torno das peças polares.
Esta forma construtiva é usada para velocidade de rotação relativamente baixas, que é o
caso de geradores movidos por turbinas hidráulicas. Estas máquinas rodam com uma
velocidade baixa – 150 a 300 r.p.m. – o que torna necessário um número de pares de pó-
los elevado – 20 a 10, respectivamente.

Sendo a máquina motriz uma turbina de vapor ou de gás, rodando a velocidades elevadas
– 3000 ou 1500 r.p.m. – a força centrífuga resultante exclui o uso de pólos salientes. Usa-
se então um rotor cilíndrico, de aço maciço, com dois ou quatro pólos, com um enrola-
mento semelhante ao do estator, instalado em cavas talhadas na respectiva superfície,
como se mostra na Figura 2.5.

c
b’

a a’

c’ b

Figura 2.5 – Máquina síncrona de rotor cilíndrico com 2 pólos.

Enquanto os geradores de rotor cilíndrico – turbogeradores – são máquinas de eixo hori-


zontal, esbeltas e longilíneas, os geradores de pólos salientes são em geral máquinas de
eixo vertical, com maior diâmetro e menor comprimento axial. Neste último caso, a turbina
está colocada por baixo do gerador, sendo o peso descarregado numa chumaceira de
impulso.

Além dos enrolamentos já referidos a máquina síncrona ainda possui – excepto para po-
tências muito baixas – um enrolamento amortecedor que consiste numa gaiola em curto-
circuito, semelhante ao enrolamento do rotor da máquina assíncrona. Num gerador de
pólos salientes, o amortecedor está embebido nas faces das peças polares; num turbo-
gerador instala-se nas cavas que albergam o enrolamento de excitação.
38 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

Em regime estacionário, o amortecedor não desempenha qualquer função, uma vez que
não é percorrido por corrente. Em regime transitório, no qual a velocidade do rotor difere
da de sincronismo, as correntes que nele são induzidas dão lugar a um amortecimento
que contribui para a estabilidade da marcha síncrona.

2.1.3 Modelo Matemático

Sendo sinusoidal a distribuição espacial da indução magnética B ao longo do entreferro,


tem-se, com referência à Figura 2.6:

B = B max cos α (2.4)

onde Bmax é o valor máximo medido no centro da cabeça do pólo e α o ângulo medido em
radianos eléctricos a partir do eixo magnético do rotor.

α eixo magnético
do rotor
a
θ=ωt
r N

eixo magnético da
S fase a do estator

a’

Figura 2.6 – Máquina síncrona bipolar com bobina estatórica de N espiras.

O fluxo magnético por pólo é o integral da indução magnética ao longo da área polar:

π 2
Φ =

−π 2
Bmax cos α l r d α = 2 B max l r (2.5)

onde l é o comprimento axial do estator e r o seu raio no entreferro.

Para uma máquina com p pares de pólos:

2B max l r
Φ = (2.6)
p

porque a área polar é 1/p vezes a de uma máquina bipolar com o mesmo diâmetro e
comprimento.
J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 39

O fluxo ligado com a fase a do estator λ, admitindo que o enrolamento do estator tem N
espiras, é dado por:

λ = N Φ cos θ (2.7)

onde θ é o ângulo do eixo magnético do rotor, medido a partir do eixo magnético do enro-
lamento da fase a do estator.

Quando o rotor roda com a velocidade angular ωr, tem-se:

θ = p ωr t = ω t (2.8)

logo:

λ = NΦ cos ω t (2.9)

Pela lei de Faraday, a tensão induzida na fase a é o simétrico da derivada do fluxo ligado
em ordem ao tempo:


e=− = ω NΦ senω t
dt (2.10)
= ω NΦ cos (ω t − π 2 )

A tensão induzida – designada força electromotriz (f.e.m.) – é sinusoidal com frequência


angular ω e valor eficaz:

ω NΦ
E= (2.11)
2

Trata-se da f.e.m. fase-neutro. O correspondente valor entre fases obtém-se multiplican-

do por 3 . Sendo tanto o fluxo como a f.e.m. grandezas sinusoidais, podemos represen-
tá-las por fasores, como se pode observar na Figura 2.7, na qual se definiram os eixos
directo d e de quadratura q, desfasados de 90º eléctricos.

eixo d

E
eixo q
40 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

Figura 2.7 – Representação por fasores do fluxo e da f.e.m.

Estando o gerador em carga, alimentando um circuito exterior trifásico simétrico, o enro-


lamento estatórico é percorrido por um sistema de correntes trifásicas simétricas. Ora,
um sistema de correntes iguais em módulo e desfasadas temporalmente de ±120º, circu-
lando em três enrolamentos desfasados espacialmente de ±120º, dão lugar a um campo
magnético girante no entreferro à velocidade de sincronismo, o qual se adiciona ao campo
devido à corrente de excitação. Este fenómeno é designado reacção do induzido.

O fluxo resultante da reacção do induzido, visto do enrolamento aa’, é uma combinação


dos três fluxos individuais devidos às correntes no estator ia, ib e ic, podendo exprimir-se
por:

λ r = L i a + M ab i b + M ac i c
(2.12)
= L ia + M i b + M ic

onde L e M=Mab=Mac são respectivamente, as indutâncias própria e mútua (iguais devido


à simetria da máquina). Em regime trifásico simétrico a soma das três correntes no esta-
tor é nula:

i a + i b + ic = 0 (2.13)

donde resulta:

λ r = (L − M ) i a (2.14)

A tensão induzida devida a este fluxo magnético é:

dλr di
er = − = −(L − M ) a (2.15)
dt dt

A tensão aos terminais do gerador em carga obtém-se somando a f.e.m. devida ao indu-
tor com a queda de tensão devida à reacção do induzido:

d ia
v = e + er = e − (L − M ) (2.16)
dt

Dado que se trata de grandezas sinusoidais, podemos representá-las por fasores (para
simplificar a notação, deixou-se cair o índice a da corrente na fase de referência):

V = E − jω (L − M )I
(2.17)
= E − j XsI
J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 41

A grandeza Xs recebe o nome de reactância síncrona. Note-se que nesta grandeza está
incluída a reactância de dispersão do enrolamento do estator, a qual não foi considerada
na análise anterior.

A máquina síncrona em regime estacionário (trifásico simétrico) pode então ser represen-
tada pelo esquema monofásico equivalente da Figura 2.8a – uma f.e.m. em série com a
reactância síncrona – ao qual corresponde o diagrama de fasores da Figura 2.8b.

jXs
I
E
δ
+ φ jXs I
V V
E ~
- I

a b

Figura 2.8 – Gerador síncrono:


a) Esquema monofásico equivalente;
b) Diagrama de fasores.

A reactância síncrona é normalmente expressa em p.u., referida aos valores nominais da


potência aparente Sn (MVA) e da tensão Vn (kV) da máquina. O respectivo valor expresso
em Ω pode obter-se por:

Vn2
X s = X s pu (2.18)
Sn

Desprezou-se a resistência dos enrolamentos – cujo valor é pequeno face à reactância –


e admitiu-se que a corrente I está desfasada em atraso do ângulo φ relativamente à ten-
são aos terminais V. O ângulo δ entre a tensão V e a f.e.m. E designa-se por ângulo de
potência.

2.1.4 Características em Vazio e em Curto-Circuito

A característica em vazio é a curva da f.e.m. (tensão em vazio) em função da corrente de


excitação, estando a máquina a rodar à velocidade nominal (de sincronismo), movida pela
máquina de accionamento.
42 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

A característica em curto-circuito, por seu lado, é a curva da corrente no estator em fun-


ção da corrente de excitação, com a máquina rodando à velocidade síncrona e os enro-
lamentos do estator em curto-circuito.

Na Figura 2.9 apresentam-se formas típicas destas características, que se podem deter-
minar experimentalmente. A característica em vazio exibe uma zona linear (cuja tangente
é a recta de entreferro), para valores relativamente baixos da corrente de excitação. Após
esta zona, quando o fluxo magnético excede um determinado valor limite, manifesta-se a
não-linearidade resultante da saturação do ferro.

A característica em curto-circuito é linear, uma vez que, tendo o fluxo magnético um valor
muito baixo nesta situação, não se manifesta o fenómeno da saturação.

Para a operação próxima da tensão nominal – em que se manifesta a saturação – assu-


me-se que a máquina é equivalente a uma outra sem saturação, caracterizada por uma
recta de magnetização, passando pelo origem e pelo ponto correspondente à tensão no-
minal (1,0 p.u.), tal como se mostra na Figura 2.9.

Da equação (2.17), sendo nula a tensão aos terminais V, obtém-se para a reactância sín-
crona saturada (em p.u.):

E 1
Xs = = (2.19)
Icc Icc

O valor da reactância síncrona não saturada, superior ao da reactância não saturada pode
calcular-se pelo inverso da corrente de curto-circuito correspondente à corrente de exci-
tação que conduz à tensão nominal em vazio, usando a recta de entreferro:

1
X sns = (2.20)

I cc
J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 43

F.e.m.(pu) Corrente de
curto circuito (p.u.)
Recta do Característica
entreferro em vazio

1,0

Característica em
curto-circuito
Ic c

I’ cc

Corrente de
excitação (p.u.)

Figura 2.9 – Características em vazio e em curto-circuito de uma máquina síncrona.

2.1.5 Características em Carga

Estando a máquina síncrona a rodar à velocidade de sincronismo (que se mantém cons-


tante) e excitada de forma a apresentar em vazio a sua tensão nominal, admita-se que a
corrente de carga vai aumentando a partir de zero até atingir o seu valor nominal, com um
factor de potência constante.

Do diagrama de fasores da Figura 2.8, podemos retirar as equações:

E sen δ = X s I cos φ (2.21)

E cos δ = V + X s I sen φ (2.22)

Resolvendo em ordem a V e eliminando o ângulo δ, obtém-se:

V = E 2 − X s2 I 2 cos 2 φ − X s I sen φ (2.23)

Supondo constante a corrente de excitação, a f.e.m. E também o é, logo a tensão aos


terminais V vai experimentar uma variação. Se se pretender manter constante a tensão
aos terminais, então há que actuar sobre a corrente de excitação.

2.1.6 Potência Activa e Reactiva

Tomando a tensão aos terminais V como referência, podemos calcular a potência com-
plexa fornecida pelo gerador por:
44 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

SG = PG + j QG = V I ∗ = V e j 0 I e jφ = V I e jφ (2.24)

donde se retiram os valores das potência activa e reactiva:

PG = V I cos φ (2.25)

Q G = V I sen φ (2.26)

Substituindo as equações (2.21) e (2.22) nas equações (2.25) e (2.26) respectivamente,


obtém-se:

EV
PG = sen δ (2.27)
Xs

QG =
V
(E cos δ − V ) (2.28)
Xs

As duas equações acima revelam importantes características do gerador síncrono. A pri-


meira diz-nos que o valor máximo teórico (na prática limitado a cerca de metade) da po-
tência activa que a máquina pode fornecer ocorre para δ=π/2 e é dado pela expressão:

EV
Pmax = (2.29)
Xs

Sendo o gerador um conversor mecano-eléctrico, a potência activa fornecida é (aparte as


perdas) igual à potência mecânica entregue pela máquina motriz: o ângulo de potência δ é
o que resulta da aplicação da equação (2.27).

A potência reactiva depende da diferença:

∆ = E cos δ − V (2.30)

Admitindo constante a tensão aos terminais V, a potência reactiva é controlável através da


corrente de excitação, que determina a f.e.m. E. A excitação normal é definida para ∆ = 0 ,
ou seja:

E cos δ = V (2.31)

Se a corrente de excitação for aumentada, resulta:

E cos δ > V (2.32)


J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 45

Nesta condições, a máquina fica sobreexcitada e fornece potência reactiva. Em


contrapartida, se a máquina estiver subexcitada, absorve potência reactiva, uma vez que:

E cos δ < V (2.33)

Na Figura 2.10 mostra-se a curva limite de funcionamento de um gerador síncrono. A cur-


va é constituída por três zonas, respectivamente (a), (b) e (c). A primeira corresponde à
corrente de excitação máxima, limitada pelo aquecimento do enrolamento de excitação. A
segunda é o lugar geométrico de corrente do estator (ou potência aparente) máxima, limi-
tada pelo aquecimento deste enrolamento. Na terceira, na qual a máquina se encontra
fortemente subexcitada, o limite resulta da exigência de manutenção da estabilidade da
marcha síncrona (ver adiante Secção 2.1.9).

Q (p.u.)

(a)

(b)

1,0 P(p.u.)

(c)

Figura 2.10 – Diagrama P-Q de um gerador síncrono (curva limite).

2.1.7 Efeito da Saliência

O modelo desenvolvido não tem em conta a diferença entre a relutância do circuito mag-
nético segundo os eixos directo d e de quadratura q, que assumem particular importância
nas máquinas de pólos salientes. Esta diferença resulta de que o corpo do rotor tem uma
permeabilidade magnética muito mais elevada que a do ar. Mesmo para máquinas de ro-
tor cilíndrico, a relutância do circuito magnético não é rigorosamente igual segundo os
dois eixos, devido às cavas que albergam o enrolamento de excitação.
46 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

A desfasagem da corrente em relação à f.e.m. (φ+δ na Figura 2.8b) afecta por conseguin-
te o fluxo magnético devido à reacção do induzido, o qual pode ser decomposto em duas
componentes, conforme é aparente na Figura 2.11.

eixo d eixo q

B1 Bq

a B2 a’
Bd

Figura 2.11 – Decomposição do fluxo magnético em duas componentes.

Definem-se assim duas reactâncias síncronas Xd e Xq, segundo os eixos d e q, respecti-


vamente. Decompondo igualmente a corrente I em duas componentes Id e Iq:

I = I d +I q (2.34)

A tensão aos terminais V é igual à f.e.m. E, adicionada das quedas de tensão − jX d I d e

− jX q I q :

V = E − j X d Id − j X qIq (2.35)

Esta equação está traduzida graficamente no diagrama de fasores da Figura 2.12.

j(Xd-X q)Id

Iq Vq E qd E
δ q
φ
jX qI jXqI q
Id
I
Vd
V jX dId

Referência

Figura 2.12 – Diagrama de fasores para uma máquina de pólos salientes.

A equação (2.35) pode rescrever-se:


J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 47

V = E − j X d I d − j X q (I - I d ) =
= E − jX q I − j (X d − X q )I d
(2.36)

Definindo o fasor E qd por:

E qd = V + j X q I (2.37)

obtém-se:

E = E qd + j(X d − X q ) I d (2.38)

Uma vez que j(X d − X q ) I d é colinear com E, o mesmo sucede a E qd . Então, em módu-

lo:

E = E qd + (X d − X q ) I d (2.39)

Tomando a tensão aos terminais V como referência, o argumento δ da f.e.m. E coincide


com o de E qd .

Da Figura 2.12 obtém-se:

E − X d I d = V cos δ (2.40)

X q I q = V sen δ (2.41)

e também:

I q = I cos (φ + δ ) (2.42)

I d = I sen (φ + δ ) (2.43)

Multiplicando a equação (2.42) por cos δ e a equação (2.43) por sen δ , e somando-as;
multiplicando a equação (2.42) por sen δ e a equação (2.43) por cos δ , e subtraindo-as,
obtém-se:

I cos φ = I q cos δ + I d sen δ (2.44)

I sen φ = Id cos δ −I q sen δ (2.45)

Substituindo estas últimas equações nas equações (2.25) e (2.26) e fazendo uso das
equações (2.40) e (2.41) obtêm-se as potências activa e reactiva geradas:
48 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

VE V 2  1 1 
PG = sen δ + − sen 2δ (2.46)
Xd 2  X q X d 

VE  cos 2 δ sen 2 δ 
QG = cos δ − V 2  + 
 (2.47)
Xd  Xd Xq 

O primeiro termo destas equações é dominante; o segundo é devido ao efeito da saliên-


cia. Se se desprezar o efeito desta, obtém-se:

VE
PG = sen δ (2.48)
Xs

QG =
V
(E cos δ − V ) (2.49)
Xs

onde X s é a reactância síncrona (que se pode tomar aproximadamente como a média

aritmética de X d e X q ). Estas equações coincidem com as derivadas anteriormente na

Secção 2.1.6.

No Quadro 2.1 apresentam-se valores típicos de X d e X q para diversos tipos de máqui-

nas síncronas, expressos em p.u. na base da potência aparente nominal das mesmas.

Quadro 2.1 – Valores Típicos das Reactâncias das Máquinas Síncronas (p.u.).

Rotor Cilíndrico Rotor Cilíndrico Pólos Salientes


2 pólos 4 pólos
X 0,85 – 1,45 1,00 – 1,45 0,6 – 1,5
d
X 0,92 – 1,42 0,92 – 1,42 0,4 – 0,8
q

2.1.8 Modos de Operação

O gerador síncrono pode alimentar uma carga isolada ou, mais usualmente, estar inte-
grado numa rede à qual estão ligados outros geradores, rodando em sincronismo.

Na primeira situação – que ocorre raramente6 – o gerador tem, por si só, que manter
aproximadamente constante a frequência e a tensão aos terminais, por meio da acção de
reguladores de velocidade e de tensão, respectivamente.

6
É o caso, por exemplo, de um gerador de socorro, quando falta a alimentação da rede.
J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 49

Quando uma carga é ligada ao gerador – suposto em vazio, rodando à velocidade nominal
e apresentando a tensão nominal aos seus terminais – a corrente no estator dá lugar a
um binário resistente T (negativo), o qual impõe uma desaceleração do rotor, de acordo
com a equação:

dω r
T =I (2.50)
dt

onde I é o momento de inércia do grupo gerador (incluindo a máquina de accionamento) e


ωr a velocidade angular do rotor.

Uma vez que a frequência é proporcional à velocidade do rotor, a frequência vai baixar,
efeito que tem de ser corrigido através do aumento do binário fornecido pela máquina mo-
triz, ou seja da potência mecânica PM, que está relacionada com aquele pela equação:

PM = Tω r (2.51)

A ligação da carga origina também uma queda de tensão apreciável, devida à reactância
síncrona da máquina, a qual tem de ser compensada por um aumento da corrente de ex-
citação, que eleva o valor da f.e.m.

A potência activa e reactiva fornecida pelo gerador deverá ser igual à pedida pela carga,
adicionada das perdas nos circuitos de ligação.

No caso de o gerador estar integrado numa rede síncrona, antes de ser ligado pelo res-
pectivo disjuntor, tem de ser sincronizado – por meio de um dispositivo designado sincro-
nizador – o qual assegura as seguintes condições:

• A frequência do gerador e da rede são iguais;

• A sequência de fases do gerador coincide com a da tensão da rede;

• A f.e.m. do gerador e a tensão da rede têm a mesma amplitude e fase.

Uma vez o gerador ligado à rede, há que colocá-lo em carga, isto é, a fornecer potência.
Para tal, actua-se sobre a válvula de admissão da máquina de accionamento, manobra
que requer um servomotor hidráulico devido à elevada força necessária.

Se a potência do gerador for muito menor que a potência girante da rede – potência total
das máquinas em serviço – como é habitualmente o caso, a frequência do conjunto não
será significativamente afectada pelo facto de aquele ser colocado em carga. Na verdade,
a regulação de frequência é uma tarefa executada pelo conjunto dos geradores em para-
lelo, podendo contudo ser atribuída prioritariamente a alguns dentre eles.
50 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

Note-se que a máquina síncrona pode também funcionar como motor, recebendo energia
eléctrica da rede e fornecendo energia mecânica a uma carga, como é, por exemplo o
caso das centrais hidroeléctricas com bombagem. Neste tipo de centrais, a água pode
ser bombada de uma cota mais baixa para outra mais elevada nos períodos de vazio,
para ser turbinada nos períodos de ponta. Esta operação tem interesse técnico e econó-
mico, pois a energia tem um valor consideravelmente superior nas horas de ponta. Nos
períodos em que se procede à bombagem, o gerador funciona como motor.

Usada especificamente como motor, a máquina síncrona tem uma limitação importante:
necessita de uma máquina auxiliar para a levar do repouso até à sincronização com a
rede que a alimenta.

No que respeita à potência reactiva, a máquina síncrona pode fornecê-la ou consumi-la,


tal como já foi analisado na Secção 2.1.5. A tensão no barramento da central pode ser
regulada automaticamente por meio do regulador de tensão, situação em que a potência
reactiva a fornecer ou consumir se torna uma variável dependente. Em alternativa, o ge-
rador pode ser operado com potência reactiva (ou factor de potência) constante, o que
não assegura uma tensão constante. Em qualquer dos casos, o regulador de tensão –
que é de facto um regulador de tensão-potência reactiva – actua sobre a corrente de exci-
tação.

Das equações (2.27) e (2.46) resulta que, se δ = 0 , a potência activa é nula. Tal não si-
gnifica contudo que o mesmo suceda quanto à potência reactiva, a qual pode ser positiva
ou negativa (ou nula). Este é um modo de funcionamento possível para uma máquina sín-
crona, que então recebe a designação de compensador síncrono.

Um compensador síncrono permite uma variação contínua da potência reactiva fornecida


à (ou absorvida7 da) rede, através da actuação sobre a corrente de excitação – a qual
pouco afecta a potência activa. Este é um poderoso meio de regulação de tensão, que
pode ser implementado com recurso a grupos geradores que, para o efeito, funcionam
como motores em vazio, consumindo apenas uma potência activa igual às perdas. Em-
bora de uso muito limitado, a máquina síncrona também pode ser instalada para funcionar
exclusivamente como compensador síncrono.

Na Figura 2.13 apresentam-se os diagramas de fasores correspondentes aos seis modos


de funcionamento de uma máquina síncrona: gerador ou motor sobre ou subexcitado,
compensador síncrono ou reactância síncrona, respectivamente.

7
Neste caso, pode designar-se por reactância síncrona.
J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 51

Gerador sobreexcitado Gerador subexcitado


PG >0 Q G >0 PG >0 QG <0

E I
E
δ δ
φ
φ V
V
I
0< δ < π/2 0< δ < π/2
0< φ < π/2 - π/2< φ < 0

Motor sobreexcitado Motor subexcitado


PG <0 QG >0 PG <0 Q G <0
I
V
δ V
φ δ
I φ
E
E
-π/2< δ < 0
-π/2< δ < 0
π/2< φ < π π < φ < 3 π/2

Condensador síncrono Reactância síncrona


PG=0 QG >0 PG=0 Q G<0

E
I
φ V

φ E
I
V
δ=0 δ= 0
φ = π/2 φ = -π/2

Figura 2.13 – Modos de funcionamento de uma máquina síncrona.

2.1.9 Estabilidade da Marcha Síncrona

Considere-se o gerador ligado a uma rede infinita – rede de grande potência, cuja fre-
quência e tensão não são afectadas por variações das potências activa e reactiva gera-
das, respectivamente – através de um circuito com reactância XL, como se representa na
Figura 2.14.
52 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

jxs jxL

+
E ~ V

Figura 2.14 – Máquina síncrona ligada a uma rede infinita.

Sendo a reactância total Xs+XL, a potência activa gerada, desprezando a saliência, é dada
por (ver equação (2.27)):

EV
PG = sen δ (2.52)
Xs + XL

onde V é a amplitude da tensão da rede (suposta constante) e δ o argumento da f.e.m. E,


definido em relação àquela tensão.

Na Figura 2.15 representa-se a variação da potência gerada com o argumento δ. Quando


este é positivo, a potência é positiva e a máquina funciona como gerador; quando é nega-
tivo, a potência é negativa e a máquina funciona como motor. O valor máximo da potência
ocorre para δ = π 2 (funcionamento como gerador) ou para δ = − π 2 (funcionamento

como motor).

PG

Pmax

-π /2
π /2 δ

-Pmax

Motor Gerador

Figura 2.15 – Potência activa em função do argumento δ .


J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 53

A ligação eléctrica do gerador com a rede assemelha-se a uma ligação mecânica elásti-
ca. Define-se a rigidez eléctrica ou coeficiente de sincronismo pela derivada da potência
gerada em ordem ao ângulo de potência:

∂ PG EV
Cs = = cos δ (2.53)
∂δ Xs + XL

Este coeficiente é máximo quando a máquina está em vazio (δ=0), diminuindo à medida
que vai sendo carregada, em virtude do aumento de δ. O valor máximo teórico de δ é π/2
– ponto em que a máquina perde o sincronismo com a rede – não devendo na prática
exceder 30-40º.

Par uma máquina de pólos salientes, considerando a saliência, a potência activa é dada
por (ver equação (2.46)):

VE V 2  1 1 
 sen 2δ
PG = sen δ + − (2.54)
Xd + XL 2  X q + X L X d + X L 
1442443 144444424444443
a b

A curva correspondente a esta equação está representada na Figura 2.16. O valor do ar-
gumento δ lim, que corresponde à perda de sincronismo, pode obter-se por solução da
equação:

∂PG
=0 (2.55)
∂δ

Verifica-se que δ lim<π/2 e que o valor da potência correspondente é superior ao que se


obtém ignorando a saliência.

PG

-π 0 δlim π δ

Figura 2.16 – Potência activa em função do argumento δ , considerando a saliência.


54 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

Da equação (2.52) constata-se que, para a mesma potência activa produzida, quanto
maior for a f.e.m. E, tanto menor é o ângulo de potência δ. Da equação (2.53), conclui-se
que o coeficiente de sincronismo aumenta, o que significa que a estabilidade da marcha
síncrona vem aumentada. Quando a máquina está sobreexcitada, o funcionamento é por
conseguinte mais estável, e inversamente: uma máquina subexcitada é menos estável.

2.2 Transformador

2.2.1 Introdução

O transformador é um dos componentes mais úteis dos Sistemas de Energia Eléctrica,


permitindo alterar a tensão de uma rede para o nível mais adequado à função que desem-
penha.

A tensão produzida pelos geradores situa-se na gama da média tensão – salvo os de po-
tência muito baixa, que podem operar em baixa tensão – porque esta é a tensão que op-
timiza técnica e economicamente o projecto destes equipamentos.

Assim, é usual a instalação de transformadores à saída das centrais, os quais elevam a


tensão para o nível adequado ao transporte – ou à distribuição para a produção de baixa
potência. Acresce que estes transformadores protegem os geradores contra as sobre-
tensões atmosféricas com origem na rede aos quais estão ligados.

A rede de transporte opera em muito alta tensão, conforme já anteriormente assinalado.


Esta tensão tem de ser reduzida para média tensão para efeitos de distribuição e para
baixa tensão a nível da utilização. O transformador pode ainda ser dotado de um comuta-
dor de tomadas, o que lhe permite ser utilizado como regulador de tensão.

O transformador é uma máquina estática, constituído essencialmente por dois (ou três)
enrolamentos de cobre, montados em torno de um núcleo de ferro. Este é construído em
chapa laminada, a fim de reduzir as perdas por histeresis e correntes de Foucault. O fluxo
de energia eléctrica é bidireccional, sendo designado por primário o enrolamento que re-
cebe energia e secundário o que a entrega.
J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 55

2.2.2 Princípio de Funcionamento

Considere-se um transformador monofásico ideal (sem perdas nem dispersão), repre-


sentado esquematicamente na Figura 2.17 (observe-se o sentido convencional das cor-
rentes correspondentes aos enrolamentos primário e secundário).

i1 i2
1 Φ 2

v1 N1 N2 v2

primário secundário

Figura 2.17 – Transformador ideal.

A aplicação de uma tensão alternada v 1 ao enrolamento primário dá lugar a um fluxo liga-


do λ1, que com ela se relaciona pela lei de Faraday:

d λ1
v1 = (2.56)
dt

O fluxo ligado λ1 é igual ao produto do número de espiras do enrolamento N1 pelo fluxo φ


que circula no núcleo:

λ1 = N 1Φ (2.57)

donde:


v 1 = N1 (2.58)
dt

O fluxo Φ é o mesmo para os dois enrolamentos, uma vez que não há dispersão. A f.e.m.
induzida no enrolamento secundário (tensão em vazio) v 2 é então:

d λ2 dΦ
v2 = = N2 (2.59)
dt dt

onde N2 é o número de espiras do enrolamento secundário.

Em regime alternado sinusoidal, o fluxo Φ e as tensões v 1 e v 2 têm a mesma frequência


angular ω . Usando a notação simbólica:
56 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

V1 = jω N1F (2.60)

V2 = jω N 2F (2.61)

Dividindo as duas últimas equações:

V1 V1 N1
= = (2.62)
V 2 V2 N 2

Uma vez que desprezámos as perdas, a potência complexa é igual nos dois lados do
transformador:

V1 I 1∗ = V2 I 2∗ (2.63)

donde:

I1∗ V2
= (2.64)
I 2∗ V1

ou seja:

I1 I1 N2
= = (2.65)
I 2 I 2 N1

A relação de transformação m é o quociente entre o número de espiras N1 do primário


(enrolamento que recebe energia) e do secundário N2 (enrolamento que cede energia):

N1 Vn1
m= = kV/kV (2.66)
N 2 Vn 2

onde Vn1 é a tensão nominal primária e Vn2 a tensão nominal secundária.

Tomando para tensões de base dos lados primário e do secundário, as respectivas ten-
sões nominais:

Vb1 = V n1
(2.67)
Vb 2 =V n 2

a relação de transformação em p.u. é:

Vn 1pu Vn1 Vb 2
m= = = 1,0 p.u. (2.68)
Vn 2 pu Vb1 Vn 2

Uma vez que a relação de transformação é unitária, o transformador ideal pode ser igno-
rado no esquema equivalente da rede em que esteja integrado.
J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 57

2.2.3 Corrente de Magnetização

Para assegurar um boa ligação magnética entre os dois enrolamentos do transformador,


o fluxo magnético é estabelecido num núcleo de ferro (circuito magnético), cuja permeabi-
lidade é muito superior à do ar. Na Figura 2.18 mostram-se dois tipos construtivos de
transformadores (monofásicos): o tipo core (a) e o tipo shell (b). No primeiro, o núcleo é
um anel fechado, em torno do qual são montados os enrolamentos; no segundo, o núcleo
envolve os enrolamentos.

Núcleo
Núcleo

Enrolamentos
Enrolamentos

a b

Figura 2.18 – Tipos construtivos do transformador:


a) Tipo core
b) Tipo shell

O núcleo de ferro possui uma característica B–H não-linear (B e H são a indução ou den-
sidade de fluxo e o campo magnéticos, respectivamente): a partir de um certo valor do
campo, manifesta-se a saturação. Acresce o fenómeno da histeresis, que resulta em que
as trajectórias B–H são distintas para valores crescentes ou decrescentes do campo
magnético, conforme se representa na Figura 2.19.

Figura 2.19 – Característica magnética do núcleo do transformador.


58 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

O fluxo magnético alternado dá lugar a perdas de energia no núcleo de ferro, devidas: (a)
à histeresis e (b) a correntes de Foucault. As primeiras resultam da dissipação de energia
usada para orientar os domínios magnéticos do material na direcção do campo; as se-
gundas são devidas a perdas de Joule provocadas pelas correntes induzidas no ferro.
Para reduzir estas, o circuito magnético é construído em chapa de ferro laminada.

Devido à não-linearidade acima referida a corrente em vazio do transformador não é uma


sinusóide perfeita, antes contém algumas harmónicas. A componente fundamental à fre-
quência nominal – designada corrente de magnetização – representa-se na Figura 2.20,
na qual se observa que pode ser decomposta numa componente em fase com a tensão,
que resulta das perdas, e numa componente em quadratura.

V
im

+
v ~
-
Im

Figura 2.20 – Transformador em vazio.

A corrente de magnetização – da ordem de 2 a 5% da corrente nominal – e as perdas em


vazio (perdas no ferro) – da ordem de 0,1 a 0,5% da potência nominal – podem obter-se
por meio de um ensaio em vazio do transformador.

2.2.4 Esquema Equivalente

Um primeiro esquema equivalente do transformador é o que se representa na Figura


2.21.

I1 R1 jX1 I’2 R2 jX2 I2


1 2
N1 N2

V1 Gm jBm E1 E2 V2
J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 59

Figura 2.21 – Esquema equivalente do transformador.

À tensão V1 aplicada ao enrolamento primário é subtraída a queda de tensão R1 I1 devida


à resistência R1 dos condutores bem como a queda de tensão devida à reactância de
dispersão X1, resultando a f.e.m. E1. A corrente I1 é a soma da corrente de magnetização
Im com a corrente I 2′ que é transformada pela relação de transformação resultando na

corrente I2 no secundário. As componentes em fase e em quadratura da corrente de


magnetização circulam através da condutância Gm e da susceptância Bm, respectivamen-
te.

A f.e.m. no secundário do transformador ideal é E2=E1/m onde m = N1 N 2 é a relação de

transformação. A tensão aos terminais do secundário V2 obtém-se a partir de E2 sub-


traindo as quedas de tensão R2I2 e jX2I2 devidas à resistência e à reactância de dispersão
do respectivo enrolamento.

Usando valores p.u., o transformador ideal desaparece, uma vez que a relação de trans-
formação m é unitária. Chegamos assim ao esquema equivalente em T, representado na
Figura 2.22.

R1 jX 1 R2 jX 2
I1 I2
1 I1 2
Im

V1 Gm jB m V2

Figura 2.22 – Esquema equivalente em T do transformador.

No funcionamento normal, o fluxo no núcleo mantém-se substancialmente constante, pelo


que as admitâncias do ramo transversal que modela a corrente de magnetização se po-
dem considerar igualmente constantes.

Dado que a corrente de magnetização é pequena, o ramo transversal pode ser levado
para um dos extremos do esquema, conforme se representa na Figura 2.23, onde
R t = R1 + R 2 e X t = X 1 + X 2 .
60 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

I1 Rt jXt I2
1 2
Im

V1 Gm jBm V2

Figura 2.23 – Esquema equivalente em L do transformador.

Na maioria das aplicações em sistemas de energia, pode desprezar-se a corrente de


magnetização, o que permite simplificar o modelo para o representado na Figura 2.24.

Rt jX t
I1 I2
1 2
2

V1 V2

Figura 2.24 – Esquema equivalente aproximado do transformador.

Recorde-se que as grandezas eléctricas estão expressas em p.u., referidas à potência


aparente nominal do transformador e às tensões nominais do primário e do secundário,
consoante se refiram àquele ou este enrolamento.

Uma vez que as correntes expressas em p.u. nos dois enrolamentos são iguais,
I1 = I 2 = I , a relação entre as tensões primária e secundária exprime-se pela equação:

V1 = V2 + Z t I (2.69)

onde Z t = R t + j X t .

Através de um ensaio em curto-circuito do transformador pode medir-se a impedância Zt.


– razão pela qual é normalmente designada impedância de curto-circuito do transforma-
dor. Neste ensaio, representado na Figura 2.25, aplica-se um curto-circuito a um dos en-
rolamentos e alimenta-se o outro com uma tensão reduzida – designada tensão de curto-
circuito – que faz circular a corrente nominal em ambos os enrolamentos.
J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 61

In Zt =Zcc

Vcc

Figura 2.25 – Transformador em curto-circuito.

A tensão de curto-circuito Vcc é dada por:

Vcc = Zcc I n (2.70)

Uma vez que I n = 1,0 , tem-se:

Vcc = Zcc (2.71)

Em valores p.u., com a base postulada, a tensão e a impedância de curto-circuito do


transformador exprimem-se pelo mesmo valor.

Para decompor a impedância de curto-circuito nas suas componentes resistiva e reacti-


va, há que medir a potência consumida, a partir da qual se calcula a resistência. Uma vez
que se conhece já o módulo da impedância, o cálculo da reactância é trivial. As perdas
em curto-circuito do transformador (perdas no cobre) situam-se tipicamente na gama 0,5
a 2,5% da potência nominal.

2.2.5 Transformador com Três Enrolamentos

Tratando-se de um transformador com três enrolamentos instalados em torno do mesmo


núcleo, representa-se na Figura 2.26 o respectivo esquema equivalente, o qual inclui um
nó fictício interno ao transformador. No caso de se pretender representar a impedância de
magnetização, ela ligar-se-ia entre o nó fictício e o neutro.
62 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

I2
2
Z2
I1 Z1
1
N2 V2 V2
V1 N1
Z3 I3
V3 V1
N3 3
V3

Figura 2.26 – Transformador com três enrolamentos.

Neste caso, definem-se três impedâncias (ou tensões) de curto-circuito, relativas a igual
número de combinações dois a dois, dos três enrolamentos. Dado que a potência aparen-
te nominal dos três enrolamentos não é a mesma (ainda que, em geral, dois deles te-
nham potências nominais idênticas), a impedância de curto-circuito referente a um par de
enrolamentos vem referida à menor das potências nominais. Há assim que convertê-las a
uma base de potência comum.

As impedâncias do esquema monofásico equivalente, admitindo uma relação X/R idêntica


para os três enrolamentos 8, podem ser obtidas a partir dos três ensaios de curto-circuito
– primário-secundário, primário-terciário e secundário-terciário – nos quais se medem
Z12 , Z13 e Z 23 , respectivamente, sendo:

 Z12 = Z1 + Z 2

 Z13 = Z1 + Z 3 (2.72)
Z = Z + Z
 23 2 3

Daqui resulta:

Z12 + Z13 − Z23


Z1 =
2
Z + Z 23 − Z13
Z 2 = 12 (2.73)
2
Z13 + Z 23 − Z12
Z3 =
2

Dado que a resistência dos enrolamentos é em geral muito menor que a reactância, pode
modelar-se aproximadamente o transformador apenas pelas reactâncias de curto-
circuito.
J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 63

2.2.6 Autotransformador

Num autotransformador a ligação entre os dois enrolamentos é eléctrica e magnética. As-


sim, os enrolamentos não estão isolados electricamente – conforme se ilustra na Figura
2.27.

I1

V1 N1 I′2
V′1
I2
V2 N2 V2

Figura 2.27 – Autotransformador.

Sendo válidas as relações:

V1 N1
= =m (2.74)
V2 N 2

I1 N2 1
= = (2.75)
I 2 N1 m

a potência aparente fornecida ao autotransformador é:

m +1
S1′ = V1′I1 = (V1 + V2 )I1 = V1 I1
m (2.76)
m +1
= S1
m

e a potência cedida por este é:

m +1
S2′ = V2 I 2′ = V2 (I1 + I 2 ) = V2 I 2
m (2.77)
m +1
= S2
m

Observa-se que a potência nominal do autotransformador é mais elevada que a corres-


pondente à configuração com dois enrolamentos separados (S1 = S2 ). Uma vez que a

8
Em geral, despreza-se a resistência.
64 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

corrente em cada enrolamento é a mesma nas duas configurações, as perdas são iguais,
donde resulta um aumento do rendimento energético.

Esta vantagem, que resulta numa apreciável redução de custo, é tanto maior quanto mais
próxima da unidade for a relação de transformação. Por esta razão, em geral usam-se
autotransformadores quando a relação de transformação é inferior a 3:1.

Duas desvantagens do autotransformador são a ausência de isolamento galvânico entre


os enrolamentos e uma corrente de curto-circuito mais elevada, uma vez que a impedân-
cia de curto-circuito é menor. Para o auto transformador representado na Figura 2.27,
pode verificar-se que a impedância de curto-circuito se reduz para 1 (1 + m ) Z cc .

2.2.7 Transformador Trifásico

Em sistemas trifásicos, pode usar-se um conjunto de três transformadores monofásicos


(muitas vezes designado banco de transformadores) ou um transformador trifásico, que
se representa na Figura 2.28.

φa φc
b

Figura 2.28 – Transformador trifásico (tipo core).

Uma vez que as tensões fase-neutro têm simetria trifásica, o mesmo sucede aos fluxos
magnéticos no núcleo, cuja soma é nula em qualquer instante. Não é por conseguinte ne-
cessário um circuito magnético de retorno, à semelhança do que sucede para a corrente
em sistemas trifásicos simétricos.

Comparando os dois arranjos, verifica-se que o transformador trifásico é mais compacto


e requer menos ferro que o banco de três transformadores sendo, por conseguinte, mais
barato. Em contrapartida, do ponto de vista da fiabilidade, o segundo esquema é mais
económico, uma vez que é suficiente uma reserva de um transformador monofásico.

Já vimos anteriormente que duas configurações são possíveis em sistemas trifásicos:


estrela (Y) e triângulo (∆). Daqui resultam os quatro tipos de ligações para os transforma-
J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 65

dores trifásicos que se mostram na Figura 2.29: Y/Y, Y/∆ ,∆/Y e ∆/∆9. Nos enrolamentos
ligados em estrela o neutro pode ou não estar ligado à terra; nos enrolamentos ligados em
triângulo, não existe um ponto neutro.

A relação de transformação de um transformador Y/Y ou ∆/∆ é sempre um número real,


uma vez que as tensões primárias e secundárias em vazio estão em fase, tal como su-
cede num transformador monofásico. Note-se que os enrolamentos têm polaridade, assi-
nalada na Figura 2.29 com uma pequena bola preta, aspecto da maior importância em
transformadores trifásicos.

9
Os enrolamentos podem ainda ser ligados em zig-zag, o que por vezes se usa em transformadores de
distribuição..
66 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

a
a

n n

c
b
b c
a

a
a

b
n

b
c
c b

a
a

c
n

b
b c
c
a
a

c b
b c

Figura 2.29 – Tipos de ligações de transformadores trifásicos.


J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 67

Em transformadores Y/∆ ou ∆/Y, contudo, existe uma desfasagem entre as tensões pri-
mária e secundária, razão pela qual a relação de transformação é complexa. Considere-
se o transformador Y/∆ representado na Figura 2.30a, ao qual corresponde o diagrama de
fasores da Figura 2.30b.

Do diagrama de fasores observa-se que :

V2ac = V2a − V2c (2.78)

Tomando V2a como referência e a sequência de fases normal a-b-c, temos:

V2c = V2a e120 º (2.79)

Substituindo esta equação na equação (2.78):

(
V2ac = V2a 1 − e j 120 º ) (2.80)
= 3 V 2a e − j 30 º

Sendo N1 e N2 o número de espiras dos enrolamentos primário e secundário, respecti-


vamente, tem-se:

N1 ac
V1a = V2
N2
(2.81)
N
= 3 1 V 2a e − j 30 º
N2

Concluímos assim que a tensão fase-neutro secundária está desfasada de 30º em avan-
ço, em relação à correspondente tensão primária.

Definindo a relação de transformação complexa por:

N1 − j 30 º
m= 3 e (2.82)
N2

a equação (2.81) pode escrever-se:

V1a = m V2a (2.83)

Se porventura fossem trocadas as polaridades das três fases de um dos enrolamentos, o


argumento da relação de transformação passaria a ser de +30º.
68 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

a I1a
Ia2 a
V1a
V2a
Iac
2
Iba
2
c n Ib2 b
V2ac
V1c V2b
I1c Icb
2

Ib1 Ic2 c
b
V2c
V1b a

V2c

V2a

30º
60º

− V2c V1a V2ac


V2b
b

Figura 2.30 – Transformador Y/∆: a) Esquema de ligações; b) Diagrama de fasores.

A relação entre a corrente na fase a do enrolamento primário e a corrente na fase corres-


pondente do enrolamento secundário é:

N1 a
I 2ac = I1 (2.84)
N2

Por analogia:

N1 b N1 a − j 120 º
I 2ba = I1 = I1 e (2.85)
N2 N2

A corrente na linha a do lado secundário é:


J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 69

I 2a = I 2ac − I 2ba =
N1 a
N2
(
I 1 1 − e − j 120 º )
(2.86)
N
= 3 1 I 1a e j 30 º
N2

ou seja:

I 2a = m ∗ I1a (2.87)

Combinando as equações (2.83) e (2.87) obtém-se:

∗ ∗
3 V1a I 1a = 3 V2a I 2a (2.88)

Esta equação traduz a igualdade entre as potências complexas trifásicas fornecida ao


primário e cedida pelo secundário, respectivamente, válida para um transformador ideal.

2.2.8 Transformador com Regulação de Tensão

A regulação de tensão por meio de transformadores consegue-se fazendo variar a rela-


ção de transformação, por meio de um comutador de tomadas instaladas num dos enro-
lamentos, em geral, no de tensão mais elevada – o qual é percorrido pela corrente mais
baixa.

A comutação das tomadas faz variar a relação de transformação, uma vez que altera o
número de espiras do enrolamento. Admitindo que o comutador está instalado no enrola-
mento primário, tem-se:

V1n ± ∆V1
m= (2.89)
V2n

Em valores p.u.:

m = 1 ± ∆V1 (2.90)

A margem de regulação ∆V está em geral limitada a 10–15% (0,10–0,15 p.u.), tipicamente


em escalões de 1%.
70 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

A comutação de tomadas pode ser em vazio ou em carga. Neste último caso, o comuta-
dor, accionado por um motor, pode estar integrado num sistema de controlo que automa-
ticamente mantém a tensão num barramento especificado dentro de limites estreitos 10.

Na Figura 2.31a representa-se um transformador com um comutador de tomadas instala-


do no enrolamento ligado ao nó 1. O transformador pode ser modelado por um transfor-
mador ideal com relação de transformação m em série com a impedância de curto-
circuito Zcc , conforme se representa na Figura 2.31b.

m = 1 ± ∆V1

1 2

I1 m:1
I1′ Zcc I2
1 2

V1 V1′ V2

Figura 2.31 – Transformador com regulação de tensão:


a) Esquema unifilar;
b) Esquema monofásico equivalente ;

Da Figura 2.31b obtêm-se as equações:

V1
=m (2.91)
V1′

I1 1
= (2.92)
I1′ m

V1′ =V 2+Z cc I 2 (2.93)

Combinando as equações (2.91) e (2.93), obtém-se:

V1 = m (V 2+ Z cc I 2 ) (2.94)

Da equação (2.92), atendendo a que I1′ = I2 , vem:

10
Uma vez que a variação da relação de transformação não é contínua, não é possível regular a tensão
J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 71

I2
I1 = (2.95)
m

O transformador com regulação de tensão pode ainda ser modelado por um esquema
equivalente em π, conforme se representa na Figura 2.32.

I1 m Zcc I2
1 2

1 1  1  1  1
V1  −1  1 −  V2
mm  Z cc  m  Z cc

Figura 2.32 – Esquema equivalente em π do transformador com regulação de tensão.

Do esquema em π retiram-se as equações:

  1 1 
V1 = V2 1 −  + I 2  m Z cc + V2 (2.96)
  m  Z cc 

1 1  1  1 1
I1 = V1  − 1 + V2 1 −  + I2 (2.97)
m m  Z cc  m  Z cc

A equação (2.96), após manipulação, devem:

V1 = m (V 2+ Z cc I 2 ) (2.98)

Substituindo na equação (2.97) obtém-se:

I2
I1 = (2.99)
m

As últimas duas equações são idênticas às equações (2.94) e (2.95), o que comprova a
validade do esquema equivalente em π.

para um valor exacto.


72 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

2.3 Máquina Assíncrona

2.3.1 Introdução

Os motores eléctricos representam uma parcela muito significativa da carga servida pelo
Sistema de Energia Eléctrica. O motor de uso corrente nas mais variadas aplicações in-
dustriais, comerciais e domésticas é o motor assíncrono – também designado motor de
indução – devido à sua simplicidade, robustez, fiabilidade e baixo custo.

Um motor assíncrono recebe energia da rede eléctrica e fornece energia mecânica a uma
carga: é um conversor electromecânico. A velocidade de rotação em vazio é próxima da
de sincronismo – velocidade do campo magnético girante no entreferro – diminuindo à
medida que aumenta a potência cedida à carga mecânica – daqui resulta a designação de
assíncrono.

Em motores trifásicos, o sentido de rotação depende da sequência de fases, que deter-


mina o sentido do campo girante: se aquela for invertida – o que se consegue trocando
duas fases – o motor passa a rodar em sentido contrário. O motor de indução pode ser
trifásico ou monofásico, sendo o último utilizado em aplicações de baixa potência.

Tal como a máquina síncrona, a máquina assíncrona é reversível, podendo funcionar


como motor ou como gerador. No funcionamento como gerador, a máquina recebe ener-
gia mecânica de uma máquina de accionamento e converte-a em energia eléctrica, que é
entregue à rede à qual está ligada. A máquina roda com uma velocidade superior à de
sincronismo, que aumenta com a potência eléctrica fornecida.

2.3.2 Princípio de Funcionamento

A máquina assíncrona é constituída por um estator, no qual está instalado um enrolamen-


to semelhante ao da máquina síncrona, e um rotor que pode ser de dois tipos. O rotor bo-
binado possui um enrolamento semelhante ao do estator, cujos terminais estão ligados a
anéis metálicos isolados, montados sobre o veio, sendo a corrente conduzida ao exterior
através de escovas de carbono que deslizam sobre os anéis. No rotor em gaiola de esqui-
lo – de uso muito mais generalizado, o enrolamento é composto por barras condutoras
embebidas em cavas e ligadas em curto-circuito em cada extremo por anéis condutores.

Da aplicação de um sistema trifásico de tensões ao enrolamento do estator, resulta no


entreferro um fluxo magnético girante à velocidade de sincronismo, o qual induz no enro-
J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 73

lamento do rotor uma f.e.m., à semelhança do que se passa num transformador. Uma
vez que o rotor está em curto-circuito (rotor em gaiola) ou fechado através de circuito ex-
terior (rotor bobinado), esta f.e.m. dá origem a correntes que circulam no rotor, produzindo
um binário motor.

Estando o motor em repouso, as correntes no rotor têm uma frequência igual à da tensão
de alimentação; à medida que o rotor acelera, por acção do binário motor, aquela fre-
quência vai diminuindo. Se o motor estiver em vazio, a frequência e a amplitude das cor-
rentes no rotor são muito próximas de zero, só atingindo este valor devido às inevitáveis
perdas mecânica por atrito. Estando o motor a accionar um carga mecânica – que ofere-
ce um binário resistente – a frequência e a resultante amplitude das correntes rotóricas
terão um valor correspondente ao binário motor necessário para estabilizar a marcha da
máquina, a uma velocidade inferior à de sincronismo.

Em termos de balanço energético, a energia recebida da rede eléctrica é transferida para


o rotor por efeito indutivo, deduzida das perdas no ferro do estator e no cobre do enrola-
mento respectivo. Subtraindo as perdas no rotor e as perdas mecânicas, obtém-se a po-
tência mecânica final fornecida à carga.

2.3.3 Modelo Matemático

Sendo o estator alimentado por uma tensão trifásica com frequência f e p o número de
pares de pólos do enrolamento do estator, a velocidade de sincronismo ns expressa em
r.p.m. é:

60 f
ns = (2.100)
p

A diferença entre a velocidade de rotação do rotor e a velocidade de sincronismo – que é


muito pequena quando o motor está em vazio e vai subindo à medida que a carga aumen-
ta – designa-se por escorregamento s, grandeza que é expressa em p.u. (ou em percen-
tagem):

n s − nr
s= (2.101)
ns

Devido à diferença entre a velocidade do campo girante e a do rotor, são induzidas neste
tensões com a frequência de escorregamento fr:

fr = s fs (2.102)
74 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

A máquina assíncrona apresenta semelhanças com o transformador (o enrolamento se-


cundário é rotativo), podendo ser modelada pelo esquema equivalente em T, que se re-
presenta na Figura 2.33 (as grandezas estão expressas em unidades do Sistema Interna-
cional).

Rs jXs jXr
Is Ir

Im
Rr
s

Vs Es
Gm jBm

Figura 2.33 – Esquema equivalente em T da máquina assíncrona.

Aplicando a tensão Vs ao enrolamento estatórico e subtraindo as quedas de tensão Rs Is


devida à resistência dos condutores e jXs Is devida à reactância de dispersão, resulta a
f.e.m. Es. A corrente de magnetização, tal como no transformador, tem duas componen-
tes – uma em fase e a outra em quadratura – que são tomadas em consideração através
da condutância Gm e da susceptância Bm.

A f.e.m. induzida no rotor é:

Er = s Es (2.103)

Sendo Rr e Xr a resistência e a reactância do rotor (a última referida à frequência do esta-


tor), respectivamente, podemos estabelecer a equação:

E r = s E s = I r R r + j (sX r ) I r (2.104)

ou ainda:

R 
E s =  r + j X r  Ir (2.105)
 s 

Esta equação justifica a modelação do rotor no esquema equivalente da Figura 2.33.


J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 75

2.3.4 Potência e Binário

A potência consumida na resistência fictícia Rr/s corresponde à potência transferida para


o rotor Pr – igual à potência fornecida pela rede menos as perdas no estator e no circuito
magnético:

Rr 2
Pr = 3 Ir (2.106)
s

A potência mecânica (desprezando as perdas por atrito) é, por seu lado, igual a Pr dedu-
zida das perdas no rotor:

1 −s
PM = Pr − 3 Rr I r2 = 3 Rr I r2 (2.107)
s

Face a este resultado, o esquema equivalente pode ser modificado conforme se mostra
na Figura 2.34, no qual a resistência Rr(1-s)/s modela a carga mecânica. Tal como no es-
quema equivalente do transformador, deslocou-se o ramo transversal para o lado da fonte
de tensão, obtendo-se um esquema em L. Note-se que a corrente de magnetização da
máquina assíncrona é substancialmente maior que a do transformador, face à corrente de
carga, pelo que esta aproximação é aqui mais grosseira. O valor daquela corrente calcu-
la-se por:

I m = (Gm + jB m )Vs (2.108)

Rs+Rr j(Xs +Xr)


Is Ir

Im
1− s
Rr
s

Vs
Gm jB m

Figura 2.34 – Esquema equivalente em L da máquina assíncrona.

A corrente no rotor Ir pode calcular-se por:

Vs
Ir = (2.109)
R
Rs + r + j ( X s + X r )
s
76 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

A corrente no estator Is é a soma desta com a corrente de magnetização Im:

I s = Im + Ir (2.110)

Note-se que o motor assíncrono representa uma carga indutiva para a rede de alimenta-
ção, consumindo potência reactiva dada por:

Q r = −3 BmVs2 + 3 ( X s + X r )I r2 (2.111)

Para além da potência, interessa calcular o binário fornecido pelo motor assíncrono:

PM PM
T = = (2.112)
ω r ω s (1 − s )

Substituindo a equação (2.106), vem:

3 R r I r2
T = (2.113)
sωs

donde:

Vs2
I r2 = 2
(2.114)
 R 
 R s + r  + (X s + X r )2
 s 

Substituindo na equação (2.113), vem finalmente para o binário:

Rr
3 Vs2 s
T = (2.115)
ωs  R 
2

 R s + r  + ( X s + X r )2
 s 

A forma geral da característica binário – velocidade para uma máquina assíncrona está
traçada na Figura 2.35. A região de funcionamento como motor corresponde a s>0 ou
seja, a velocidade de rotação é inferior à de sincronismo; o funcionamento como gerador
é caracterizado por s<0, uma vez que a velocidade de rotação é superior à de sincronis-
mo.
J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 77

Motor

1 0 -1 s
0 ωs ωs ω

Gerador

Figura 2.35 – Característica binário – velocidade da uma máquina assíncrona.

O binário de arranque corresponde a s=1:

3 Vs2 Rr
Tarr = (2.116)
ω s (R s + Rr )2
+ (X s + X r )
2

Quanto ao binário máximo, pode calcular-se analiticamente derivando em ordem a s, ob-


tendo-se:

Rr
sT max = (2.117)
R s2 + ( X s + X r )2

3 Vs2 1
Tmax = (2.118)
2 ω s R + R 2 + (X + X )2
s s s r

Tem ainda interesse conhecer a corrente de arranque do motor, que pode atingir valores
da ordem de seis a sete vezes a corrente nominal. Nesta situação ω r = 0 , logo s = 1 . Do

esquema equivalente, desprezando a corrente de magnetização, obtém-se:

Vs
I sarr = (2.119)
R s + R r + j (X s + X r )

Para reduzir a corrente de arranque, o que é especialmente importante para motores de


potência elevada, pode usar-se um arrancador estrela-triângulo, um autotransformador ou
ainda um dispositivo electrónico. Em todos os casos, a intenção é reduzir a tensão e, por
conseguinte, a corrente, no instante de arranque, em que o motor está parado. Reduz-se
78 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

contudo também o binário de arranque, o que pode ser um inconveniente para alguns ti-
pos de carga mecânica.

Estando o enrolamento do motor normalmente ligado em triângulo, o arrancador estrela-


triângulo liga-o inicialmente em estrela, pelo que a tensão aplicada a cada fase vem redu-

zida do factor 3 . O binário vem por consequência reduzido a um terço – ver equação
(2.115). Após o motor atingir uma velocidade suficiente, o enrolamento é automaticamente
ligado em triângulo.

Tanto o autotransformador como os dispositivos electrónicos permitem controlar de forma


mais gradual e precisa a tensão aplicada ao motor, sendo o seu custo contudo mais ele-
vado.

2.3.5 Funcionamento como Gerador

Conforme já referido, a máquina assíncrona também pode funcionar como gerador, sendo
usada em alguns tipos de centrais de baixa potência, alimentadas por fontes renováveis
(em particular, centrais eólicas). A corrente de magnetização necessária ao estabeleci-
mento do campo magnético no entreferro é fornecida pela rede eléctrica, contrariamente
ao que se passa na máquina síncrona que possui um sistema de excitação próprio.

O funcionamento como gerador é caracterizado por s<0, a resistência equivalente


R r (1 − s ) s devém negativa, e o mesmo sucede à potência mecânica – equação (2.107)

e à potência activa. A máquina assíncrona recebe por conseguinte energia mecânica (de
uma máquina motriz) e fornece energia eléctrica à rede.

Do esquema equivalente da Figura 2.34 verifica-se que, embora a potência activa absor-
vida da rede se torne negativa, a potência reactiva se mantém positiva. O gerador assín-
crono é por conseguinte, um consumidor de energia reactiva, a qual deve ser compensa-
da por meio de uma bateria de condensadores. Esta pode ser dimensionada para tornar o
gerador um fornecedor líquido de potência reactiva, se as condições de funcionamento da
rede o exigirem.

Um gerador assíncrono rodando em vazio com um condensador ligado aos seus termi-
nais pode autoexcitar-se, dependendo do valor da respectiva capacidade. Na Figura 2.36
mostra-se a característica em vazio da máquina (f.e.m. em função da corrente de excita-
ção) – na qual é visível o efeito da saturação do ferro – bem como a recta V = I ω C que

caracteriza o condensador. O cruzamento das duas linhas define o ponto de funciona-


mento da máquina, caracterizado pela f.e.m. E e pela corrente de magnetização Im.
J. Sucena Paiva Máquinas Rotativas e Transformador 79

V Característica
em vazio

Condensador

Im I

Figura 2.36 – Autoexcitação da máquina assíncrona.

A ligação do gerador assíncrono à rede pode ser levada a cabo, quer directamente com a
máquina rodando a uma velocidade próxima da nominal – que dá lugar a um pico de cor-
rente resultante de o campo magnético no entreferro ser nulo – quer autoexcitando-a por
meio de uma bateria de condensadores de valor adequado e fazendo o paralelo de forma
semelhante ao de uma máquina síncrona – que não dá origem a qualquer sobrecorrente.
CAPÍTULO 3

LINHA ELÉCTRICA DE ENERGIA

3.1 Introdução

As linhas asseguram o transporte e distribuição da energia eléctrica desde as centrais


produtoras até aos consumidores finais. A transmissão de energia é realizada pelo campo
electromagnético criado pela tensão entre os condutores e pela corrente que neles flui.

Na maioria dos casos, as linhas são aéreas, constituídas por condutores – de alumínio ou
de cobre – apoiados em ou suspensos de isoladores em postes de madeira, de betão ou
metálicos. Sujeitos ao seu próprio peso e a uma força longitudinal, os condutores descre-
vem uma linha designada catenária – a qual para vãos (distância entre postes) relativa-
mente curtos se aproxima de uma parábola.

Em zonas urbanas as linhas podem ser enterradas, sendo designadas por cabos subter-
râneos; quando atravessam troços de mar são referidas por cabos submarinos. Note-se
que a distância máxima a que é possível transportar energia eléctrica em corrente alter-
nada por meio de cabos subterrâneos ou submarinos é limitada a poucas dezenas de qui-
lómetros 11.

A tensão nominal de uma linha condiciona a sua capacidade de transporte: quanto mais
elevada for aquela, maior é a potência transportável. As tensões mais altas exigem natu-
ralmente níveis de isolamento mais elevados, bem como (para as linhas aéreas) maiores
distâncias entre condutores e entre estes e a terra; as estruturas de suporte são corres-
pondentemente de maiores dimensões.

Embora o cobre tenha uma condutividade quase dupla do alumínio, este material prevale-
ce na construção de linhas por razões de custo e de peso mais baixos. Acresce que um
condutor de alumínio tem um diâmetro superior ao do equivalente em cobre, o que reduz

11
Por este motivo, usa-se a corrente contínua, quando a distância a vencer é demasiado grande para o
transporte em corrente alternada.
82 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

o campo eléctrico na respectiva superfície. Quando este campo excede um dado valor
(da ordem dos 3 000 kV/m), manifesta-se o fenómeno da disrupção e ionização do ar en-
volvente, designado efeito de coroa – que provoca perdas adicionais e interferências nas
comunicações.

Para tensões acima de 220 kV, é de regra usar condutores em feixe – ou seja dois a qua-
tro condutores por fase – o que reduz consideravelmente o campo eléctrico à superfície
dos condutores bem como a reactância da linha, aumentando a sua capacidade de trans-
porte.

A forma construtiva dos condutores para linhas aéreas mais usual consiste de um núcleo
central de fios de aço entrançados, que proporcionam resistência mecânica, envolvidos
por várias camadas de fios de alumínio igualmente entrançados, que asseguram a con-
dução da corrente eléctrica – designado condutor de alumínio-aço.

Para os cabos subterrâneos – que podem ser monofásicos ou trifásicos – usa-se o alu-
mínio ou o cobre, sendo o isolamento assegurado modernamente por plásticos da família
dos polietilenos (no passado usava-se o papel impregnado de óleo). Envolvendo os con-
dutores isolados, existe em geral uma bainha de chumbo, para protecção contra a humi-
dade.

Os parâmetros que caracterizam as linhas eléctricas são a impedância longitudinal e a


admitância transversal. A resistência e a reactância longitudinais são utilizados na genera-
lidade dos modelos; a susceptância transversal quando o comprimento da linha excede
determinados limites; a condutância transversal é em geral ignorada.

Estes parâmetros são distribuídos ao longo da linha, exprimindo-se em Ω/km ou S/km,


consoante se trate de impedância ou admitância, respectivamente. A circunstância de ser
caracterizada por parâmetros distribuídos, distingue a linha de um circuito de parâmetros
concentrados: o tempo de propagação do campo electromagnético – que viaja à velocida-
de da luz – é não nulo.

3.2 Resistência e Condutância Transversal

A resistência de uma linha é o parâmetro que condiciona as perdas (por efeito de Joule),
donde a sua importância.

Em corrente contínua, a resistência R, expressa em Ω/m é dada pela expressão:


J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 83

ρ
R= (3.1)
S

onde ρ é a resistividade do material (Ω.m) e S a secção do condutor (m2).

A resistência varia com a temperatura, sendo em geral especificada para 20º C. A qual-
quer outra temperatura, pode obter-se pela expressão:

R 2 = R1 [1 + α (T2 − T1 )] (3.2)

R1 e R2 são as resistências às temperaturas T1 e T2, respectivamente e α o coeficiente


de temperatura. No Quadro 3.1 indicam-se os valores da resistividade a 20º C e o coefici-
ente de temperatura para vários materiais condutores.

Quadro 3.1 – Resistividade e Coeficiente de Temperatura para vários Materiais Condutores

Material Resistividade Coef. Temperatura


(µΩ.cm)

Aço 12-88 0,001-0,005

Alumínio 2,83 0,0039

Bronze 13-18 0,0005

Cobre 1,77 0,00382

Prata 1,59 0,0050

As variações da resistência com a temperatura não são muito significativas. Por exemplo,
para o cobre uma variação de temperatura de 0º para 40º C resulta numa variação de re-
sistência de 17%.

O cálculo da resistência pela equação (3.1) tem algumas limitações, nomeadamente:

• Sendo habitualmente os condutores entrançados e não sólidos, o comprimento de


cada fio é ligeiramente superior ao do próprio condutor.

• A corrente alternada não se distribui uniformemente pela secção do condutor, fenó-


meno conhecido por efeito pelicular, que resulta da distribuição não uniforme do fluxo
magnético no interior do condutor. A resistência em corrente alternada é por este mo-
tivo superior à resistência em corrente contínua, devido à redução efectiva da secção.
84 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

• Além deste, existe ainda um efeito de proximidade, que reforça a distribuição não uni-
forme do fluxo dentro do condutor, devido à indução mútua entre os condutores de
uma linha. Este efeito é em geral desprezável à frequência nominal de 50 Hz.

• A resistência de condutores magnéticos (como seja o aço em condutores de alumí-


nio-aço), varia com a intensidade da corrente, uma vez que o fluxo e as perdas mag-
néticas dependem daquela.

Na prática, a resistência dos variados tipos de condutores usados é obtida com recurso
às tabelas fornecidas pelo fabricantes.

Para a condutância transversal G não existe uma fórmula utilizável na prática. Esta con-
dutância é devida à corrente de fuga entre os condutores e a terra, a qual flui essencial-
mente pela superfície das cadeias de isoladores. Ela depende fortemente das condições
atmosféricas, em particular da humidade, da poluição e da sujidade em geral, que condi-
cionam igualmente o efeito de coroa.

Em condições normais de operação, a condutância transversal das linhas é desprezada,


em parte devido ao seu reduzido valor e em parte devido à deficiente caracterização da
física do fenómeno.

3.3 Reactância

A reactância longitudinal (ou simplesmente reactância) X = ω L – onde L é o coeficiente

de auto-indução (ou indução própria) e ω = 2πf é a frequência angular – é o parâmetro

mais importante de uma linha eléctrica de energia. A reactância tem a maior influência na
capacidade de transporte e na queda de tensão na linha.

O coeficiente de auto-indução L de um circuito é a relação entre o fluxo magnético λ liga-


do e a corrente I que percorre o circuito:

λ
L= (3.3)
I

Recorde-se que o fluxo se exprime em Weber (Wb), e que a unidade do coeficiente de


indução é o Henry (H). Em linhas eléctricas, devido ao seu carácter de circuitos com pa-
râmetros distribuídos, o coeficiente de auto-indução calcula-se por metro de comprimen-
to, exprimindo-se por conseguinte em H/m.
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 85

3.3.1 Linha Monofásica

Vamos em primeiro lugar calcular o coeficiente de indução de uma linha monofásica com
dois condutores, representada na Figura 3.1. Consideram-se por razões de generalidade
que os dois condutores têm raios diferentes, ainda que na prática eles sejam normalmen-
te iguais.

2r1 2r2

1 2

Figura 3.1 – Linha monofásica com dois condutores.

O coeficiente de auto-indução do circuito correspondente ao condutor 1 é soma de duas


componentes: uma devida ao fluxo interno ao condutor; a outra devida ao fluxo que se fe-
cha no exterior do condutor. Para o cálculo da primeira componente, considere-se o con-
dutor de raio r, representado na Figura 3.2.

x dx

Figura 3.2 – Fluxo no interior de um condutor maciço de raio r.

Sendo I a corrente total no condutor e admitindo uma densidade de corrente uniforme (o


que equivale a ignorar o efeito pelicular), a corrente dentro do cilindro de raio x é dada por:

x2
I( x ) = I (3.4)
r2
86 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

As linhas de densidade de fluxo são concêntricas com o eixo do condutor. Aplicando a lei
de Ampere, obtém-se o campo magnético H:

1 x
H( x ) = I( x ) = I (3.5)
2π x 2π r 2

Sendo µ a permeabilidade relativa do material do condutor e µ0 a permeabilidade do ar, a


indução magnética, expressa em Tesla (T = Wb/m 2), é:

µµ 0 x
B( x ) = I (3.6)
2π r 2

O fluxo ligado dλ devido à corrente I(x), circulando num elemento tubular de espessura
dx, por unidade de comprimento da linha, é:

µµ 0 x x 2 µµ 0 x 3
dλ = I dx = I dx (3.7)
2π r 2 r 2 2π r 4

Integrando entre x=0 e x=r, obtém-se o fluxo total, expresso em Wb/m:

r µµ 0 x 3 µµ 0
λ= ∫0 2π r 4
I dx =

I (3.8)

Usando a equação (3.3), substituindo o valor de µ 0 = 4π x 10 − 7 H/m e admitindo que a

permeabilidade relativa µ do condutor é unitária, obtém-se finalmente para o coeficiente de


auto-indução devido ao fluxo interno, expresso em H/m:

1
Lint = x 10 −7 (3.9)
2

Note-se que este coeficiente não depende da secção do condutor.

Quanto ao coeficiente de auto-indução devida ao fluxo exterior ao condutor, calcule-se em


primeiro lugar o campo magnético à distância x do eixo respectivo (x>r):

1
H( x ) = I (3.10)
2π x

O fluxo dλ ligado com a corrente total I, circulando num elemento tubular de espessura
dx, por unidade de comprimento da linha, é:

µµ 0
dλ = I dx (3.11)
2π x
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 87

O fluxo total entre dois pontos à distância D1 e D2, respectivamente, conforme represen-
tado na Figura 3.3, calcula-se por integração:

µµ 0 µµ 0 D2

D2
λ= I dx = ln I (3.12)
D1 2π x 2π D1

B1 B2

r
D1

D2

Figura 3.3 – Fluxo exterior ao condutor.

Fazendo uso da equação (3.3) e substituindo os valores de µ=1 e µ 0 = 4π x 10 −7 H/m,

vem finalmente:

(
Lext = 2 x 10 −7 ln ) D2
D1
(3.13)

Reconsiderando a linha monofásica de dois condutores da Figura 3.1, fazendo D1 = r e

D 2 = D , o coeficiente de auto-indução correspondente ao fluxo exterior ao condutor 1 é

dada por:

(
L1 ext = 2 x 10 −7 ln ) D
r1
(3.14)

O coeficiente de auto-indução total é então a soma das duas componentes:

1 D
(
L1 = 2 x 10 −7  + ln  ) (3.15)
4 r1 

Quanto ao condutor 2, tem-se:

1 D
(
L2 = 2 x 10 −7  + ln  ) (3.16)
4 r2 
88 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

O coeficiente de auto-indução total da linha L = L1 + L2 , admitindo que os dois condutores

são iguais ( r1 = r2 ), é dada pela expressão:

( 1 D
L = 4 x 10 −7  + ln ) (3.17)
 4 r 

Definindo o raio equivalente12 do condutor r’ por

r ′ = r e −1 4 (3.18)

vem finalmente:

(
L = 4 x 10 −7 ln ) D
r′
(3.19)

Note-se que, devido à função logaritmo, o coeficiente de auto-indução varia relativamente


pouco com o distância entre condutores e o respectivo raio. Também, o contributo do flu-
xo interno do condutor representa em geral menos de 5% do valor total.

3.3.2 Linha com n Condutores

Para alargar a análise a linhas com n condutores, é útil considerar que os dois condutores
da linha equivalem a dois circuitos eléctricos magneticamente acoplados, conforme se
representa na Figura 3.4.

∆v1

1 i
2r1
L11
D M12
2 i
2r2
L22

∆v 2

Figura 3.4 – Linha monofásica considerada como dois circuitos magneticamente acoplados.

12
Também designado raio médio geométrico.
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 89

Ignorando a resistência, e sendo i a corrente que percorre a linha, a queda de tensão por
unidade de comprimento ∆v em cada condutor pode escrever-se:

di di
∆v 1 = L11 − M12 (3.20)
dt dt

di di
∆v 2 = M 12 − L 22 (3.21)
dt dt

onde L11 e L22 são os coeficientes de indução própria de cada condutor e M 12 o coeficien-
te de indução mútua entre eles:

1 
(
L11 = 2 x10 −7  + ln )
1
 (3.22)
 4 r1 

1 
(
L22 = 2 x10 −7  + ln )
1
 (3.23)
4 r2 

(
M12 = 2 x10 −7 ln ) 1
D
(3.24)

Em regime alternado sinusoidal, usando a notação simbólica, as quedas de tensão em


cada condutor são:

∆V1 = jω (L11 − M12 ) I =

( 1
)1 1
= jω 2 x10 −7  + ln − ln  I = (3.25)
4 r1 D
1 D
( )
= jω 2 x10 −7  + ln  I
4 r1 

∆V 2 = jω (L22 − M12 ) I =

( 1
)1 1
= jω 2 x10 −7  + ln − ln  I = (3.26)
4 r2 D
1 D
( )
= jω 2 x10 −7  + ln  I
4 r2 

Usando as equações (3.15) e (3.16), vem:

∆V1 = jω L1 I (3.27)

∆V 2 = jω L2 I (3.28)
90 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

L1 e L2 são os coeficientes de auto-indução dos condutores 1 e 2, respectivamente, que já


têm em conta a influência da indução mútua entre eles:

L1 = L11 − M12 (3.29)

L2 = L22 − M12 (3.30)

A queda de tensão total na linha é:

∆V = ∆V1 + ∆V2 = jω (L11 + L22 − 2 M12 ) I (3.31)

Substituindo os valores de L11, L22 e M 12:

( 1
)
1 1 1 1
∆V = jω 2 x10 −7  + ln + + ln − 2 ln  I =
4 r1 4 r2 D
(3.32)
1 
(
= jω 4 x10 −7
)  + ln D
4
I

 r1 r2 

Admitindo que os dois condutores são iguais ( r1 = r2 ) vem:

( 1
)
D
∆V = j ω 4 x10 −7  + ln  I =
4 r 
(3.33)
( D
= j ω 4 x10 −7 ln I
r′
)
onde r’ é o raio equivalente do condutor, dado pela equação (3.18).

Esta equação confirma – confronte-se com a equação (3.19) – que o coeficiente de auto-
indução total da linha é:

(
L = 4 x10 −7 ln ) D
r′
(3.34)

Generalizando ao caso de uma linha com n condutores, que se representa esquematica-


mente na Figura 3.5, os coeficientes de indução própria e mútuas são:

( 1
) 1
Lii = 2 x10 −7  + ln  = 2 x10 −7 ln
1
ri′
(3.35)
4 ri 

(
M ij = 2 x10 −7 ln ) 1
Dij
(3.36)
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 91

L11
1
1
Lii
Dij
ii Mij
i
2r i
L jj
j
j

Lnn
n

Figura 3.5 – Linha com n condutores.

A queda de tensão ∆Vi por metro de condutor escreve-se, por analogia com as equações

(3.25) ou (3.26), e considerando o mesmo sentido positivo das correntes nos n conduto-
res:

n
∆V i = jω Lii I i + ∑ jω M
j =1
ij Ij (3.37)
j ≠i

3.3.3 Linha Trifásica

Vamos agora aplicar ao caso de uma linha trifásica, com os condutores colocados nos
vértices de um triângulo equilátero, conforme ilustrado na Figura 3.6a.

ia
D ib
ic ib ic
D

D D D

Figura 3.6 – Linha trifásica: a) Condutores equidistantes; b) Condutores em esteira.

A queda de tensão por unidade de comprimento do condutor da fase a é:

∆V a = jω L aa I a + jω M ab I b + jω M ac I c

(  1
) 1 1 
= jω 2 x10 −7  ln I a + ln I b + ln I c 
(3.38)
 r′ D D 
92 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

Admitindo simetria das correntes:

I a + Ib + Ic = 0 (3.39)

vem:

(  1
) 1 
∆V a = jω 2 x10 −7  ln I a − ln I a  =
 r′ D 
(3.40)
( D
= jω 2 x10 −7 ln I a
r′
)
Expressões análogas se podem escrever para as fases b e c:

(
∆Vb = jω 2 x10 −7 ln ) D
r′
Ib (3.41)

(
∆Vc = jω 2 x10 −7 ln ) D
r′
Ic (3.42)

A queda de tensão em cada fase só depende da corrente nessa fase, o que permite a
análise por fase usando o esquema monofásico equivalente:

(
L = 2 x 10 −7 ln ) D
r′
(3.43)

Note-se que este coeficiente de indução própria é metade da correspondente a uma linha
monofásica – veja-se a equação (3.34).

Se os condutores não forem equidistantes e sendo Dab, Dbc e Dac as distâncias entre os
três condutores tomados dois a dois, as quedas de tensão nas três fases escrevem-se:

∆V a = jω Laa I a + jω M ab I b + jω M ac I c
 1 
( )
= jω 2 x10 −7  ln I a + ln
1
I b + ln
1
I c 
(3.44)
 r′ Dab Dac 

∆V b = j ω L bb I b + jω M bc I c + jω M ac I a
 1 
( )
= j ω 2 x10 −7  ln I b + ln
1
I c + ln
1
I a 
(3.45)
 r′ D bc D ac 

∆Vc = jω Lcc I c + jω M ac I a + jω M bc I b
 1 
( )
= jω 2 x10 −7  ln I c + ln
1
I a + ln
1
I b 
(3.46)
 r′ D ac D bc 
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 93

Neste caso existe acoplamento entre fases, resultante de a linha não ser um elemento
simétrico, o que em princípio impossibilita a análise monofásica equivalente. Contudo, a
transposição dos condutores da linha – que se representa na Figura 3.7 – permite torná-la
aproximadamente simétrica. Com esta técnica, os condutores vão sendo permutados cir-
cularmente, em troços equidistantes, de forma que cada um ocupa sequencialmente as
três posições possíveis.

a c b

b a c

c b a

∆Va′ ∆Va′′ ∆Va′′

Figura 3.7 – Linha trifásica transposta.

Para cada troço da linha transposta aplicam-se as equações (3.44), (3.45), e (3.46). A
queda de tensão na fase a é então a média das quedas de tensão em cada troço:

∆Va′ + ∆Va′′ + ∆Va′′


∆V a = =
3
(3.47)
 
1
( 1
)
= jω 2 x10 −7  3 ln I a + ln
r′
1
I b + ln
1
I c 
3  Dab Dbc Dac Dab Dbc Dac 

Atendendo à equação (3.39), vem:

∆V a =
1
(
jω 2 x10 −7 )  3 ln r1′ − ln D 1 
 I a =
3  ab D bc D ac  (3.48)
( )
3
Dab Dbc Dac
= jω 2 x10 −7 ln Ia
r′

Concluímos que, para a linha transposta, é válida a análise monofásica equivalente, uma
vez que a queda de tensão em cada fase depende apenas da corrente nessa fase. O
coeficiente de auto-indução por fase (H/m) calcula-se então por:

( )
3
DabDbc Dac
L = 2 x10 −7 ln (3.49)
r′

Confrontando com a equação (3.43), verifica-se que se usa a média geométrica das dis-
tâncias entre os três condutores, tomados dois a dois.
94 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

Para uma linha com configuração em esteira – Figura 3.6b – a média geométrica das dis-
tâncias entre condutores é 3 2 D D D = 3 2 D , pelo que a equação anterior devém:

( )
3
2D
L = 2 x10 −7 ln (3.50)
r′

3.3.4 Linha Trifásica com Dois Condutores em Feixe

Consideremos por último uma linha trifásica com dois condutores em feixe – Figura 3.8 –
que é usual para o nível de tensão de 400 kV. Vamos calcular o coeficiente de auto-
indução para uma configuração em esteira, transposta, sendo d a distância entre os con-
dutores da mesma fase e D a distância entre fases.

1 2 3 4 5 6

a b c

d
D D

Figura 3.8 – Linha trifásica com dois condutores em feixe.

Admitindo que a corrente por fase se reparte igualmente pelos dois condutores, a queda
de tensão por unidade de comprimento no condutor 113 (fase a) no primeiro troço é:

(
∆V a′ = jω 2 x10 −7 ln

)
 1 Ia
+ ln
1 Ia
+ ln
1 Ib
+ ln
1 Ib
D +d 2
+ ln
1 Ic
+ ln
1 Ic 
2 D + d 2 
(3.51)
 r 2 d 2 D 2 2D 2

Dado que d<<D, podemos simplificar:

(  1
) 1 I 1
∆V a′ = jω 2 x10 −7  ln + ln  a + ln I b + ln
1 
Ic  (3.52)
 r ′ d 2 D 2D 

No segundo troço da linha transposta, a queda de tensão para os condutores ocupando


as posições 3 ou 4 é:

13
O mesmo valor se obteria para o condutor 2.
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 95

(
∆V a′′ = jω 2 x10 −7 ln ) 1
Ia (3.53)
r ′d

No terceiro troço, a queda de tensão para os condutores ocupando as posições 5 ou 6 é:

( )  1 1 I
∆V a′′′ = jω 2 x10 −7  ln + ln  a + ln

1 1 
I b + ln I c  (3.54)
 r d 2 2D D 

Tomando a média destes três equações, vem para a queda de tensão na fase a:

 3 2D 
(
∆V a = jω 2 x10 −7  ln

)
I a

(3.55)
 r ′d 

O coeficiente de auto-indução por fase é, por conseguinte;

( )
3
2D
L = 2 x10 −7 ln (3.56)
r ′d

O cálculo numérico do coeficiente de auto-indução de uma linha com dois condutores em


feixe revela um valor da ordem de 30% inferior ao de uma linha com um condutor por
fase.

No caso geral de uma linha trifásica com m condutores em feixe por fase, sendo Dab, Dbc
e Dac as distâncias entre os centros dos feixes e R o respectivo raio, o coeficiente de
auto-indução por fase é dada por:

( )
3 Dab D bc D ca
L = 2 x10 −7 ln (3.57)
m
m r ′ R m−1

A relação entre o raio do feixe R e a distância d entre os condutores é:

π
d = 2R sen (3.58)
m

3.4 Admitância Transversal

A admitância transversal de uma linha reduz-se na generalidade dos casos à respectiva


susceptância B = ω C , onde C denota a capacidade electrostática entre os condutores,

uma vez que se despreza a condutância.


96 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

A capacidade define-se como o quociente entre a carga electrostática Q e a tensão (dife-


rença de potencial) V entre dois objectos metálicos separados por um dieléctrico:

Q
C= (3.59)
V

A carga exprime-se em Coulomb (C) e a capacidade em Farad (F), que corresponde ao


Coulomb/Volt. Em linhas eléctricas, devido ao seu carácter de circuitos com parâmetros
distribuídos, a capacidade calcula-se por metro de comprimento, exprimindo-se por con-
seguinte em F/m (em geral, em µF/m).

3.4.1 Linha Monofásica

Consideremos uma linha monofásica de comprimento infinito, com dois condutores de


raios r1 e r2 separados pela distância D, conforme se representa na Figura 3.1.

A teoria do campo electromagnético diz-nos que o potencial V à distância x de uma carga


eléctrica pontual Q é:

Q
V = (3.60)
4πε 0 x

1
onde ε 0 = x 10 −9 (F/m) é a constante dieléctrica do vácuo.
36π

Numa linha a carga eléctrica q (expressa em C/m) está distribuída ao longo dos conduto-
res, considerando-se positiva no condutor 1 e negativa no condutor 2. Pode demonstrar-
se que o potencial num ponto P, situado à distância d1 do condutor 1 e d2 do condutor 2
se exprime pela equação:

q d
VP = ln 2 (3.61)
2π ε 0 d1

O potencial é constante ao longo de linhas para as quais a relação d2/d1 é constante, de-
signadas círculos harmónicos, que se representam na Figura 3.9. As superfícies equipo-
tenciais são então cilíndricas e as linhas de força do campo eléctrico são círculos, ortogo-
nais àquelas.

O potencial V1 à superfície do condutor 1 obtém-se fazendo d1 = r1 e d 2 = D (r1 << D ) :

q D
V1 = ln (3.62)
2π ε 0 r1
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 97

De igual modo o potencial V2 à superfície do condutor 2 obtém-se fazendo d 2 = r 2 e

d1 = D (r2 << D ) :

q r −q D
V2 = ln 2 = ln (3.63)
2π ε 0 D 2π ε 0 r2

Equipotencial
Linha do campo
eléctrico

2r1 2r2

d1 d2

P V>0 V<0

V=0

Figura 3.9 – Linhas de força e equipotenciais.

A diferença de potencial (tensão) entre os dois condutores é, por conseguinte:

q D
V12 = V1 − V2 = ln (3.64)
πε0 r1r 2

A capacidade entre os dois condutores – quociente entre a carga por unidade de compri-
mento e a tensão entre eles – vem então:

π ε0
C 12 = (3.65)
D
ln
r1 r 2

Sendo os dois condutores iguais ( r1 = r2 ), a capacidade (expressa em F/m) é:

π ε0 1 1
C12 = = x10 − 9 (3.66)
D 36 D
ln ln
r r

O cálculo apresentado não considera a presença da terra, que altera as superfícies equi-
potenciais e as linhas do campo eléctrico e, por conseguinte, a capacidade entre os con-
dutores.
98 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

3.4.2 Linha com n Condutores

Vamos agora generalizar os resultados obtidos para uma linha com n condutores. A
equação (3.61) pode reescrever-se:

q 1 −q 1
VP = ln + ln (3.67)
2πε 0 d1 2πε 0 d 2

Para n condutores com cargas q1, q2, …,qn respectivamente, o potencial num ponto P às
distâncias d1, d2, …,dn dos condutores – Figura 3.10 – é dado por:

q1 1 q 1 q 1
VP = ln + 2 ln + L + n ln (3.68)
2πε 0 d1 2πε 0 d 2 2πε 0 d n

A soma de todas as cargas tem necessariamente de ser nula. Se assim não fosse, dado
que os condutores têm comprimento infinito, teríamos um excesso (ou defeito) infinito de
carga eléctrica, o que é fisicamente impossível. Então:

q1 + q 2 + L + q n = 0 (3.69)

q1

d1

q2
d2

P dn
qn

Figura 3.10 – Linha com n condutores.

3.4.3 Influência da Terra

A terra constitui uma superfície ao potencial zero, podendo o seu efeito ser considerado
usando a teoria das imagens das cargas. Estas imagens são da mesma grandeza que as
cargas físicas, mas de sinal contrário, estando colocadas a idêntica distância relativamen-
te à terra que aquelas, como está representado na Figura 3.11.

O campo eléctrico resultante das cargas reais residentes nos condutores, na presença
da terra, é equivalente ao que teria origem naquelas e nas respectivas imagens, ignorando
a terra.
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 99

-q

Figura 3.11 – Imagem de uma carga.

Considerando uma linha de n condutores na presença da terra, representada na Figura


3.12, o potencial do ponto P será:

q1 1 q 1 q 1
VP = ln + 2 ln + L + n ln
2πε 0 d1 2πε 0 d 2 2πε 0 d n
(3.70)
− q1 1 − q2 1 −qn 1
+ ln + ln +L+ ln
2πε 0 d1′ 2πε 0 d 2′ 2πε 0 d ′n

ou seja:

q1 d′ q d′ q d′
VP = ln 1 + 2 ln 2 + L + n ln n (3.71)
2πε 0 d1 2πε 0 d 2 2πε 0 d n

q1

d1

d2 q2

P dn
qn
d′n

d′2
-qn

d′1 -q2

-q1
100 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

Figura 3.12 – Linha com n condutores na presença da terra.

Para uma linha monofásica com dois condutores – Figura 3.13 – o potencial do condutor
1 é:

q 2H −q D′
V1 = ln + ln =
2πε 0 r 2πε 0 D
(3.72)
q 2H D
= ln
2πε 0 r D′

Analogamente, o potencial do condutor 2 é:

q D′ −q 2H
V2 = ln + ln =
2πε 0 D 2πε 0 r
(3.73)
q D′ r
= ln
2πε 0 D 2H

q -q
1 2

D’

-q q
1’ 2’

Figura 3.13 – Linha com dois condutores na presença da terra.

A diferença de potencial entre os dois condutores vem:

q  2H D 
V12 = V1 − V2 = ln   (3.74)
πε 0  r D′ 

A capacidade entre os dois condutores será:

q
C12 = (3.75)
V12
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 101

Substituindo V12 da equação (3.74), vem:

πε 0 1 1
C12 = = x10 −9 (3.76)
 D 2 H  36  2H 
D
ln   ln  
 r D′   r D′ 

Confrontando com a equação (3.66), constata-se que a diferença reside no factor 2H/D’
no argumento da função logaritmo. Para valores normais dos parâmetros de configuração
da linha, verifica-se que a influência da terra no valor da capacidade é diminuta (inferior a
1%).

A capacidade em relação ao neutro (terra) obtém-se por:

q
C= (3.77)
V1

Substituindo V1 da equação (3.72), vem:

2πε 0 1 1
C= = x10 −9 (3.78)
 D 2 H  18  D 2H 
ln   ln  
 r D ′   r D′ 

A capacidade em relação ao neutro é dupla da capacidade entre os dois condutores.

3.4.4 Linha Trifásica

Considere-se agora uma linha trifásica não simétrica e transposta, com um condutor por
fase, com a configuração apresentada na Figura 3.14.

Dab
Dac

b Dbc c

Figura 3.14 – Linha trifásica com espaçamento entre condutores não simétrico.

Ignorando a presença da terra, o potencial do condutor a no primeiro troço de linha é:


102 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

1  1 1 1 
Va′ = q a ln + q b ln + q c ln  (3.79)
2πε 0  r Dab D ac 

No segundo troço,

1  1 1 1 
Va′′ = q a ln + q b ln + q c ln  (3.80)
2πε 0  r D bc D ab 

No terceiro troço,

1  1 1 1 
Va′′ = q a ln + q b ln + q c ln  (3.81)
2πε 0  r Dac Dbc 

Tomando a média aritmética:

Va′ + Va′ + Va′′


Va = (3.82)
3

e tendo presente que:

qa + qb + qc = 0 (3.83)

resulta:

3 D D D
qa
Va = ln ab bc ac
(3.84)
2πε 0 r

A capacidade ao neutro (terra) é por conseguinte:

2πε 0
C = (3.85)
3 Dab Dbc Dac
ln
r

Tratando-se de uma linha com condutores em esteira à distância D, vem:

2πε 0 1 1
C = 3
= x10 − 9 3
(3.86)
2D 18 2D
ln ln
r r

Se se considerar o efeito da terra – Figura 3.15 – pode demonstrar-se que:

2 πε 0
C = (3.87)
 2D
3
2H 
ln  
 r 3 ′ D bc
Dab ′ D ′ac 
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 103

ou, substituindo os valores de D ′ab , D ′bc e D ′ac :

2πε 0 1 1
C = = x10 − 9 (3.88)
  18  
D 2H D 2H
ln   ln  
r

6
(D 2
+ 4H ) (D
2 2 2
+H2 ) 

r

6
(D 2
+ 4H 2 ) (D
2 2
+H2 ) 


D D

a b c

H
D′ab D′ac D′bc

a’ b’ c’

Figura 3.15 – Linha trifásica em esteira na presença da terra.

3.4.5 Linha Trifásica com Dois Condutores em Feixe

Consideremos agora a linha trifásica transposta com dois condutores em feixe da Figura
3.8. Admitindo que a carga na fase a é qa, distribuída uniformemente pelos dois conduto-
res, e que d << D , o potencial de qualquer um dos condutores desta fase, no primeiro
troço, ignorando a presença da terra, é:

1  qa 1 qa 1 1 1 
Va′ =  ln + ln + q b ln + q c ln  (3.89)
2πε 0  2 r 2 d D 2D 

No segundo troço:

1  qa 1 qa 1 1 1
Va′′ =  ln + ln + q b ln + q c ln  (3.90)
2πε 0  2 r 2 d D D

e no terceiro troço:
104 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

1  qa 1 qa 1 1 1
Va′′′ =  ln + ln + q b ln + q c ln  (3.91)
2πε 0  2 r 2 d 2D D

Tomando a média e usando a equação (3.83), vem:

3
qa 2D
Va = ln (3.92)
2πε 0 rd

A capacidade por fase é por conseguinte:

2πε 0 1 1
C= 3
= x10 −9 3
(3.93)
2D 18 2D
ln ln
rd rd

No caso geral de uma linha trifásica com m condutores em feixe por fase, sendo Dab, Dbc
e Dca as distâncias entre os centros dos feixes e R o respectivo raio, a capacidade por
fase é dada por:

2πε0 1 1
C= = x10 −9 (3.94)
3 Dab Dbc Dca 18 3 D D D
ab bc ca
ln ln
m
m r R m−1 m
m r R m−1

3.4.6 Cabo Subterrâneo

Os cabos subterrâneos podem ser trifásicos ou monofásicos, também designados tripo-


lares ou monopolares. Em qualquer dos casos, os condutores são isolados por meio de
papel impregnado de óleo ou polietileno cruzado e envolvidos por uma bainha metálica (de
chumbo ou alumínio), para protecção contra a humidade e os choques mecânicos. Para
tensões acima dos 10 kV, usam-se quase exclusivamente cabos monopolares; contudo,
para as muito altas tensões, os cabos são instalados dentro de um tubo metálico, não
possuindo bainhas individuais.

Para cabos monopolares com bainhas individuais, a capacidade calcula-se pela expres-
são:

2πε 0 ε r 1 ε
C= = x10 −9 r (3.95)
R 18 R
ln ln
r r

onde ε r = 3 − 3 ,5 é a constante dieléctrica relativa do material isolante, r o raio do condu-

tor e R o raio da bainha.


J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 105

Para cabos tripolares com bainha ou cabos instalados em tubos, pode-se recorrer a da-
dos empíricos.

A capacidade dos cabos subterrâneos é consideravelmente superior à das linhas aéreas


devido à maior proximidade dos condutores.

3.5 Modelo da Linha em Regime Estacionário

3.5.1 Modelo Exacto

O modelo de uma linha arbitrariamente longa – também designado modelo exacto – pode
ser deduzido por aplicação das leis de Kirchoff a um troço incremental da mesma, consi-
derando a natureza distribuída dos parâmetros R, L, C e G (valores por unidade de com-
primento).

Considere-se então o troço de uma fase de uma linha trifásica com comprimento infinite-
simal dx, representado na Figura 3.16a, ao qual corresponde o esquema monofásico
equivalente da Figura 3.16b, onde v é a tensão fase-neutro e i a corrente por fase, as
quais são função da distância x medida a partir do extremo emissor

Usando a segunda lei de Kirchoff (lei das malhas) obtém-se a equação14:

∂ i (x )
v (x ) − v (x + dx ) = R dx i + L dx (3.96)
∂t

A aplicação da primeira lei (lei dos nós), por seu lado, resulta em:

∂ v (x )
i (x ) − i (x + dx ) = G dx v + C dx (3.97)
∂t

14
A menos de infinitésimos de 2ª ordem.
106 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

i (x) i (x+dx) Rdx Ldx


i (x) i (x+dx)

v (x) v (x+dx) v (x) v (x+dx)


Gdx Cdx

x dx x dx

a b

Figura 3.16 – Representação de uma linha monofásica com parâmetros distribuídos:


a) Troço de linha com comprimento dx;
b) Esquema monofásico equivalente.

Sendo a tensão e a corrente funções da distância x, pode escrever-se:

∂ v (x )
v (x + dx ) − v (x ) = dx (3.98)
∂x

∂ i (x )
i (x + dx ) − i (x ) = dx (3.99)
∂x

Substituindo nas equações (3.96) e (3.97) e aligeirando a notação, obtêm-se as clássicas


equações diferenciais da linha:

∂v ∂i
− = Ri +L (3.100)
∂x ∂t

∂i ∂v
− = Gv +C (3.101)
∂x ∂t

Em regime estacionário, a tensão e corrente são sinusoidais, podendo ser representadas


por fasores. As equações (3.100) e (3.101) escrevem-se neste caso:

= (R + jω L ) I
dV
− (3.102)
dx

= (G + jω C )V
dI
− (3.103)
dx

Uma vez que se trata de um regime estacionário, a variável t não consta destas equa-
ções, pelo que as equações às derivadas parciais se transformaram em ordinárias.
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 107

Derivando a equação (3.102) em ordem a x e substituindo na equação (3.103); derivando


a equação (3.103) em ordem a x e substituindo na equação (3.102), obtém-se:

d2 V
= (R + jω L )(G + j ω C )V (3.104)
d x2

d 2I
= (R + j ω L )(G + j ω C ) I (3.105)
d x2

ou ainda:

d2V
= zyV (3.106)
d x2

d 2I
= zyI (3.107)
d x2

onde z = R + jω L e y = G + jω C .

Definindo agora a impedância de onda15 Z0 (Ω)e a constante de propagação γ (m-1) por:

z
Z0 = (3.108)
y

γ = zy (3.109)

as equações (3.106) e (3.107) rescrevem-se:

d 2V
2
= γ2V (3.110)
dx

d 2I
2
=γ 2 I (3.111)
dx

As soluções destas equações diferenciais ordinárias são:

V = C1 e -γ x
+ C2 e γ x
(3.112)

15
Também designada impedância característica de onda.
108 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

C1 e -γ x
− C2 e γ x
I= (3.113)
Z0

As constantes C1 e C2 podem ser calculadas a partir das condições iniciais, para x=0 (ex-
tremo emissor, designado pelo índice e):

Ve = C 1 + C 2 (3.114)

C1 − C2
Ie = (3.115)
Z0

donde:

Ve + Z 0 I e
C1 = (3.116)
2

Ve − Z 0 I e
C2 = (3.117)
2

Torna-se mais conveniente o uso de funções hiperbólicas:

e θ + e −θ
coshθ = (3.118)
2

eθ − e −θ
senhθ = (3.119)
2

As equações (3.112) e (3.113), após substituição de C1 e C2 e subsequente rearranjo,


devêm:

V = Ve cosh γ x − Z 0 I e senh γ x (3.120)

Ve
I=− senh γ x + I e coshγ x (3.121)
Z0

V e I são as tensões à distância x da emissão. No extremo receptor, x=l, designado pelo


índice r, tem-se:

Vr = Ve cosh γ l − Z 0 I e senh γ l (3.122)

Ve
Ir = − senh γ l + I e cosh γ l (3.123)
Z0
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 109

Sob forma matricial:

Vr   coshγ l − Z 0 senhγ l Ve 


 =    (3.124)
     
 I r  − 1 Z 0 senhγ l coshγ l   Ie 

Por inversão da matriz, obtém-se:

Ve   coshγ l Z 0 senhγ l Vr 


 =   (3.125)
    
 I e  1 Z 0 senh γ l coshγ l   I r 

Esta equação pode apresentar-se sob a forma:

Ve   A B Vr 
  =   (3.126)
 I e  C D  Ir 

Os parâmetros A, B, C e D são dados pelas expressões:

A = D = cosh γ l = cosh ZY (3.127)

Z senh ZY
B = Z 0 senh γ l = (3.128)
ZY

senh γ l Y senh Z Y
C= = (3.129)
Z0 ZY

onde Z = z l e Y = y l denotam a impedância longitudinal e a admitância transversal to-

tais, respectivamente.

3.5.2 Esquema Equivalente em π

Para a modelação da linha numa rede interligada é conveniente usar um esquema equiva-
lente em π, que se representa na Figura 3.17. O ramo longitudinal possui uma impedância
B e os dois ramos transversais uma admitância (A-1)/B. Da aplicação da lei dos nós a
este esquema, obtém-se:

A −1 V − Vr AVe − V r
Ie = Ve + e = (3.130)
B B B

Ve − V r A − 1 V − AVr
Ir = − Vr = e (3.131)
B B B
110 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

Ie B Ir

Ve A −1 A −1 Vr
B B

Figura 3.17 – Esquema equivalente em π de uma linha.

Da equação (3.131) retira-se:

Ve = AV r + B I r (3.132)

Da equação (3.130), substituindo Ve dado pela equação anterior e tendo presente que
A = D e que (A 2 − 1 ) / B = C , vem:

I e = CV r + D I r (3.133)

As duas últimas equações são equivalentes à equação matricial (3.126), o que valida o
esquema da Figura 3.17.

As funções hiperbólicas podem expandir-se em série, obtendo-se:

Z Y Z2 Y 2 Z3 Y 3
A = D =1 + + + +L (3.134)
2 24 720

 ZY Z 2 Y 2 Z 3 Y 3 
B = Z 1 + + + + L (3.135)
 6 120 5040 

 ZY Z2 Y 2 Z3 Y 3 
C = Y 1 + + + + L (3.136)
 6 120 5040 

O número de termos da série a considerar depende do comprimento da linha e da preci-


são requerida. Para linhas até 500 km basta tomar dois termos da série:

ZY
A = D =1 + (3.137)
2

 ZY 
B = Z 1 +  (3.138)
 6 
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 111

 ZY 
C = Y 1 +  (3.139)
 6 

3.5.3 Esquema Equivalente em π Nominal

Para linhas até 250 km, é suficiente usar os dois primeiros termos da série para o parâ-
metro A e o primeiro termo para o parâmetro B. A impedância do ramo longitudinal e as
admitâncias das ramos transversais do esquema equivalente em π devêm, respectiva-
mente:

B=Z (3.140)

A −1 Y
= (3.141)
B 2

O esquema da Figura 3.17 reduz-se ao esquema equivalente em π nominal, representado


na Figura 3.18.

Ie Z Ir

Y Y
Ve Vr
2 2

Figura 3.18 – Esquema equivalente em π nominal de uma linha.

Este esquema poderia estabelecer-se quase intuitivamente, assumindo que a impedância


longitudinal é concentrada e que metade da admitância transversal é colocada em cada
extremo da linha.

As equações do esquema em π nominal escrevem-se:

Ve   1 + ZY 2 Z  Vr 
  =   (3.142)
    
 I e  Y (1 + ZY 4 ) 1 + ZY 2   I r 
112 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

3.5.4 Modelo da Linha Curta

Para linhas aéreas curtas (até 80–100 km) pode em geral desprezar-se a admitância
transversal, sendo a linha modelada unicamente pela sua impedância longitudinal, con-
forme se representa na Figura 3.1916.

Z Ir
Ie

Ve Vr

Figura 3.19 – Esquema equivalente de uma linha curta.

Supondo que a linha entrega na recepção uma potência complexa Sr=Pr+jQ r e conside-
rando fixa a tensão na recepção Vr, torna-se relativamente simples calcular a tensão na
emissão Ve e a queda de tensão na linha.

Por definição de potência complexa tem-se:

Pr + j Q r = Vr I ∗ (3.143)

onde I = I r = I e é a corrente que percorre a linha.

Tomando a tensão na recepção para referência (argumento nulo), o valor da corrente é:

Pr − j Qr
I= (3.144)
Vr

A tensão na emissão é dada por:

P r − j Qr
Ve = Vr + (R + j X ) =
Vr
(3.145)
R Pr + X Qr X Pr − R Qr
= Vr + + j
Vr Vr

onde R e X são a resistência e reactância totais da linha, respectivamente.

Esta equação está traduzida graficamente no diagrama de fasores da Figura 3.20.

16
Nos cabos subterrâneos a capacidade é substancialmente mais elevada que nas linhas aéreas, não
sendo legítimo desprezar a admitância transversal no esquema equivalente.
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 113

Ve
X Pr − R Q r
j
Vr

R Pr + X Qr
Vr
Vr

Figura 3.20 – Diagrama de fasores das tensões nos extremos de uma linha curta.

Para valores baixos do ângulo δ – situação normal para linhas curtas e médias – a queda
de tensão ∆V, definida como a diferença entre as amplitudes das tensões Ve e Vr, obtém-
se por:

R Pr + X Q r
∆V = Ve −V r ≈ (3.146)
Vr

Esta equação é válida usando valores por unidade. Usando unidades do sistema interna-
cional, tem-se para um sistema trifásico:

R Pr + X Q r
∆V ≈ (3.147)
3 Vr

obtendo-se o resultado em kV se a potência estiver expressa em MW (MVAr) e as impe-


dâncias em Ω.

Em alternativa, a última equação pode escrever-se:

∆V ≈ R I cos φ + X I senφ (3.148)

onde cosφ é o factor de potência da carga. Esta equação mostra que a queda de tensão
depende fortemente da potência reactiva transmitida pela linha, uma vez que (salvo para
linhas de baixa tensão) a reactância é dominante face à resistência. Por este motivo, a
potência reactiva deve ser gerada localmente, por meio de baterias de condensadores. A
nível da distribuição, esta técnica é designada por compensação do factor de potência.

Em linhas de muito alta tensão, em que X>>R, tem-se aproximadamente:

X Qr
∆V ≈ (3.149)
Vr

pelo que a queda de tensão depende essencialmente do trânsito de potência reactiva.


114 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

Em circuitos de baixa tensão, a resistência é dominante, pelo que se pode calcular a que-
da de tensão aproximadamente por:

R Pr
∆V ≈ = R I cos φ 17 (3.150)
Vr

3.6 Linha Terminada pela Impedância de Onda

Se a linha for terminada pela impedância de onda Z0, a relação entre as tensões e corren-
tes ao longo da linha simplifica-se consideravelmente. Tem-se neste caso:

V r = Z0 Ir (3.151)

Substituindo nas equações (3.125), obtém-se:

Ve = (cosh γ l + senh γ l )Vr = eγ l V r (3.152)

I e = (senh γ l + cosh γ l ) I r = eγ l I r (3.153)

Dividindo as duas equações anteriores e atendendo à equação (3.151), vem:

Ve Vr
= = Z0 (3.154)
Ie Ir

Este resultado mostra que na emissão a linha oferece, tal como na recepção, a impedân-
cia de onda, o mesmo se verificando em qualquer ponto da linha.

Das equações (3.152) e (3.153) pode também obter-se:

Vr Ir
= = e -γ l (3.155)
Ve I e

A constante de propagação é um número complexo γ = α + j β . Substituindo, vem:

Vr I r
= = e -αl (3.156)
Ve I e

17
Deixa-se ao cuidado do leitor verificar que as perdas em por unidade da potência de carga PL são dadas
∆V Vr
por PL = .
cos 2 φ
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 115

arg (V e ) − arg (V r ) = arg (I e ) − arg (I r ) = β l (3.157)

Destas últimas equações conclui-se que a tensão e a corrente ao longo da linha se vão
atenuando da emissão para a recepção com o factor de atenuação α, ao mesmo tempo
que vão sofrendo uma rotação no sentido negativo, com o factor de desfasagem β conso-
ante se representa na Figura 3.21. Note-se que a impedância de onda é tipicamente ca-
pacitiva (argumento entre 0º e – 15º), pelo que a corrente está avançada em relação à
tensão.

φ Ie

Ve
βl
φ
E
Ir

Vr

Figura 3.21 – Tensão e corrente numa linha terminada pela impedância de onda.

Admitindo uma linha sem perdas, a impedância de onda devém resistiva pura:

L
Z0 = (3.158)
C

e a constante de propagação imaginária pura:

γ = jβ = j ω LC (3.159)

Pode demonstrar-se que o parâmetro ν , dado por:

1
ν = (3.160)
LC

é a velocidade de propagação das ondas electromagnéticas ao longo da linha (ver Capítu-


lo 8). Para linhas aéreas, esta velocidade é muito aproximadamente igual à velocidade da
luz no ar (3x108 m.s -1).
116 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

Da equação (3.159), substituindo a equação (3.160) resulta:

ω
β= (3.161)
ν

Uma vez que a atenuação é nula, a tensão e a corrente ao longo da linha – que estão em
fase – mantêm-se constantes em módulo. Diz-se neste caso que a linha transporta a sua
potência natural Pn:

Vn2
Pn = (3.162)
Z0

Nestas condições, a potência reactiva gerada pela capacidade da linha iguala a absorvida
pela respectiva reactância:

ω C lV 2 = ω L l I 2 (3.163)

donde:

V L
= = Z0 (3.164)
I C

Se a impedância de carga for superior a Z0 – potência entregue inferior à potência natural


– a corrente diminui, o mesmo sucedendo à potência reactiva absorvida; uma vez que a
tensão se mantém sensivelmente constante, a potência reactiva gerada pouco varia. A
linha comporta-se então como um gerador líquido de potência reactiva e a tensão sobe ao
longo da linha, sendo na recepção superior à emissão.

No caso de a potência ser superior à natural – impedância de carga inferior a Z0 – a linha


é um consumidor líquido de potência reactiva e a tensão baixa ao longo da linha, sendo na
recepção inferior à emissão.

As linha aéreas são normalmente operadas com uma potência superior à potência natural
(salvo eventualmente em períodos de vazio). Os cabos subterrâneos, cuja impedância de
onda é da ordem de um décimo da das linhas aéreas – uma vez que os respectivos coe-
ficiente de auto-indução e capacidade são substancialmente menor e maior, respectiva-
mente – funcionam com potências inferiores à natural.
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 117

3.7 Capacidade de Transporte

A potência transitada numa linha deve ser compatível com a capacidade de transporte da
mesma, a qual tem necessariamente um limite, que importa estabelecer.

Este limite é determinado pela temperatura máxima admissível dos condutores, pela es-
tabilidade da marcha síncrona, quando existem geradores ligados nos dois extremos da
linha e ainda pela estabilidade de tensão, quando não existe suporte de potência reactiva
na recepção.

3.7.1 Limite Térmico

Uma linha eléctrica possui uma capacidade de transporte condicionada pela elevação de
temperatura resultante das perdas por efeito de Joule, provocadas pela passagem da cor-
rente eléctrica. A temperatura aumenta até que a taxa de dissipação de calor equilibre a
potência de perdas, tendo o seu valor máximo de ser limitado.

O limite térmico determina a capacidade de transporte nos cabos subterrâneos e nas li-
nhas curtas ou médias (menos de 150-200 km), que constituem a grande maioria das
existentes.

Os cabos subterrâneos são isolados, sendo o isolamento danificado se a temperatura


exceder determinado valor máximo (por exemplo, 120º C).

Os condutores das linhas aéreas dilatam por efeito da elevação da temperatura, o que
aumenta a sua flecha, reduzindo a distância a objectos vizinhos, que tem de obedecer a
mínimos regulamentares.

Note-se que o limite térmico das linhas aéreas depende da temperatura exterior, sendo a
35º C cerca de 2/3 do respectivo valor a 15º C.

A constante de tempo térmica é da ordem de vários minutos, razão pela qual se definem
limites térmicos da capacidade de transporte de curta duração e de longa duração, sendo
o último superior ao primeiro.

3.7.2 Limite de Estabilidade Estática

Considere-se o diagrama da Figura 3.22, que representa um sistema com dois barramen-
tos, ambos com geração e carga, ligados por uma linha.
118 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

Figura 3.22 – Sistema com dois barramentos com geração e carga.

Admita-se que os geradores são dotados de reguladores de tensão que mantêm constan-
tes as amplitudes das tensões nos barramentos V1 e V2. Ignorando a admitância trans-
versal da linha (a qual influencia apenas o trânsito de potência reactiva), a corrente na li-
nha, convencionalmente positiva no sentido 1→2 é:

V1 − V2
I= (3.165)
R+ jX

onde R e X são a resistência e a reactância da linha, respectivamente.

A potência complexa na emissão calcula-se por:

V12 − V1V2 e jδ
S12 = V1 I ∗ = (3.166)
R − jX

onde δ é o ângulo de desfasagem entre as tensões nos extremos da linha, convencional-


mente positivo quando V1 está em avanço em relação em relação a V2.

As partes real e imaginária desta equação, após alguma manipulação, fornecem as po-
tências activa e reactiva, respectivamente:

R X sen δ − Rcos δ
P12 = V12 + V1V2 (3.167)
R +X
2 2
R2 + X 2

X X cos δ + Rsen δ
Q12 = V12 − V1V2 (3.168)
R +X
2 2
R2 + X 2

Para a recepção tem-se:

V22 − V1V2 e − jδ
S21 = −V2 I ∗ = (3.169)
R− jX

donde:
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 119

R X sen δ + Rcos δ
P21 = V22 − V1V2 (3.170)
R +X
2 2
R2 + X 2

X X cos δ − Rsen δ
Q 21 = V22 − V1V2 (3.171)
R +X
2 2
R2 + X 2

As perdas de potência activa e reactiva na linha calculam-se pela soma de P12 e P21 e de
Q12 e Q21, respectivamente:

PL = P12 + P21 =
R +X 2
R
2
(V
1
2
+ V22 − 2 V1V2 cos δ ) (3.172)

Q L = Q12 + Q 21 =
X
R + X2
2
(V 1
2
+ V22 − 2V1V2 cos δ ) (3.173)

A potência activa média transmitida pela linha, convencionalmente positiva no sentido


1→2, é:

P12 − P21 R V12 − V22 X


Pmed = = 2 + 2 V1V2 sen δ (3.174)
2 R +X 2
2 R + X2

Admitindo que os reguladores de tensão dos geradores mantêm as tensões nos extremos
no seu valor nominal V1 = V2 = Vn , resulta:

X
Pmed = V 2 sen δ
2 n
R +X2
(3.175)
= Pmax sen δ

onde:

X Vn2
Pmax = Vn
2
≈ (3.176)
R2 + X 2 X

Para uma relação X R > 5 , o erro na aproximação é inferior a 4%.

Esta equação revela que a tensão desempenha um papel determinante na capacidade de


transporte de uma linha, que aumenta de forma quadrática com aquela grandeza.

Por outro lado, a capacidade de transporte é inversamente proporcional à reactância X – o


produto da reactância por km pelo comprimento da linha. Este último parâmetro não é na-
turalmente susceptível de manipulação, pelo que, para aumentar a capacidade de trans-
porte, há que reduzir a reactância por km. Este desiderato, que assume especial impor-
120 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

tância no transporte a longa distância, pode conseguir-se usando circuitos em paralelo,


condutores em feixe (dois a quatro condutores por fase) ou compensando a linha por in-
serção de condensadores em série.

Na Figura 3.23 representa-se graficamente a relação entre a potência activa média


transmitida e o ângulo de desfasagem entre as tensões nos extremos da linha.

Figura 3.23 – Potência transmitida em função do ângulo de desfasagem.

Para uma dada linha, o valor máximo do trânsito de potência activa ocorre para δ = ± π 2 ,

que corresponde ao limite de estabilidade estática da marcha síncrona dos dois gerado-
res. O coeficiente de sincronismo, já definido no Capítulo 3 (Secção 3.1.9), é definido por:

∂P
Cs = = Pmax cos δ (3.177)
∂δ

Quando δ = ± π 2 o coeficiente anula-se, perdendo-se o sincronismo entre os geradores.

Na prática, prevalece o limite de estabilidade transitória, na determinação do qual se con-


sideram grandes variações da potência transmitida devidas a perturbações na rede, o
qual é consideravelmente mais baixo (veja-se o Capítulo 7). Assim não é recomendável
operar uma linha com ângulos de desfasagem entre as tensões nos dois extremos supe-
riores a 30–40º, a fim de garantir uma margem de estabilidade suficiente.

Este limite da potência máxima transportável determinado pela estabilidade da marcha


síncrona dos geradores só intervém em linhas longas, transportando potências elevadas
de centrais afastadas para centros de consumo com geração local, ou em linhas de inter-
ligação entre sistemas vizinhos com uma capacidade de transporte reduzida, face à po-
tência girante desses sistemas.
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 121

3.7.3 Limite de Estabilidade de Tensão

Considere-se um sistema com dois barramentos ligados por uma linha curta com resis-
tência R e reactância X, no qual um gerador ligado a um barramento alimenta uma carga
ligada ao outro – conforme se representa na Figura 3.24.

Figura 3.24 – Rede com dois barramentos e um gerador.

Considerando fixa a tensão no barramento 1, pretende-se calcular a variação da tensão


no barramento 2 quando a carga aumenta progressivamente, mantendo constante a rela-
ção QC /PC = tan φ . Desprezando a admitância transversal da linha, tem-se:

V1 = V2 + (R + j X ) I (3.178)

onde I é a corrente definida como positiva no sentido 1→2.

Sendo V1 = V1 e j 0 e V2 = V2 e − j δ :

SC∗ PC − j QC
I= = (3.179)
V 2∗ V2 e

Substituindo na equação (3.178) obtém-se:

PC − j QC
V1 = V2 e − jδ + (R + j X ) jδ
(3.180)
V2 e

ou ainda:


V1V2 e = V22 + (R + j X )(PC − j QC ) (3.181)

Decompondo em parte real e imaginária, vem:

V1V2 cos δ = V22 + R PC + X QC (3.182)

V1V2 sen δ = X PC − R QC (3.183)


122 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

Quadrando e somando estas equações, obtém-se:

[ ] ( )( )
V24 + 2 (R PC + X QC ) − V12 V22 + R 2 + X 2 PC2 + QC2 = 0
1444 424444 3 144424443
(3.184)
b c

Trata-se de uma equação bi-quadrada, cuja solução é:

− b ± b 2 − 4c
V 2= (3.185)
2

Existem duas soluções para a tensão V2 (não considerando as soluções negativas, que
não têm significado físico). O argumento δ pode obter-se da equação (3.183):

 X PC − R QC 
δ = asen   (3.186)
 V1V2 

Para valores crescentes da potência de carga PC, mantendo-se constante o factor de po-
tência, a tensão V2 varia como se representa na Figura 3.25. Observa-se o fenómeno do
colapso de tensão, quando a potência activa de carga atinge um valor limite, a partir do
qual o sistema se torna instável. O limite de instabilidade de tensão resulta da falta de su-
porte de potência reactiva na recepção da linha.

V2

PC

Figura 3.25 – Colapso de tensão.

Na situação de carga activa pura (QD=0), e desprezando a resistência da linha, é possível


calcular analiticamente o valor da potência activa que a linha pode transportar, correspon-
dente ao limite de estabilidade de tensão. A Figura 3.26 representa o diagrama de fasores
da corrente na linha e das tensões na emissão e recepção, observando-se que:

V2 = V1 cos δ (3.187)
J. Sucena Paiva Linha Eléctrica de Energia 123

Figura 3.26 – Diagrama de fasores das tensões na emissão e recepção.

Da equação (3.167), desprezando a resistência, obtém-se:

V12
P12 = sen δ cos δ
X
V2
= 1 sen 2 δ (3.188)
2X

O valor máximo da potência transitada na linha ocorre para δ = π 4 ; admitindo que V1=Vn,

tem-se:

Vn2
Pmax = (3.189)
2X

Este valor é metade do que prevalece quando a tensão é mantida no valor nominal em
ambos os extremos da linha, conforme a equação (3.176).
CAPÍTULO 4

CORRENTES DE CURTO-CIRCUITO

4.1 Introdução

Curto-circuito designa um percurso de baixa impedância, resultante de um defeito, atra-


vés do qual se fecha uma corrente, em geral, muito elevada. Trata-se de uma situação
anormal em Sistemas de Energia Eléctrica, que requer acção imediata, face aos danos
que dela podem resultar.

A grande maioria dos curto-circuitos num SEE ocorrem nas linhas aéreas, devido à sua
grande exposição aos fenómenos físicos naturais. Em particular, as descargas atmosfé-
ricas provocam sobretensões elevadas, as quais podem resultar em contornamentos dos
isoladores. Também embates de aves e de ramos de árvores podem dar lugar a curto-
circuitos nas linhas. Em cabos subterrâneos, transformadores e máquinas rotativas, os
curto-circuitos resultam de defeitos no isolamento dos condutores, devidos à deterioração
das suas propriedades físicas, causada por temperaturas excessivas ou campos eléctri-
cos demasiado intensos.

Os curto-circuitos trifásicos afectam simultaneamente as três fases do sistema, sendo


simétricos no caso de a impedância do defeito ser igual em todas as fases. Se esta im-
pedância for nula, o curto circuito designa-se franco (ou sólido).

Os curto-circuitos assimétricos podem envolver uma fase e a terra – curto-circuito fase-


terra ou monofásico – que é o mais habitual, ou duas fases – curto-circuito fase-fase – ou
ainda duas fases e a terra – curto-circuito fase-fase-terra.

Conforme já se frisou, as correntes de curto-circuito podem atingir valores muito superio-


res às correntes em regime não perturbado, pelo que, se persistirem, causam fadigas
térmicas que danificam os equipamentos por elas percorridos. Também os esforços elec-
trodinâmicos causados pelas correntes elevadas podem ser prejudiciais, em especial
para máquinas e barramentos.
126 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

Torna-se, por conseguinte, importante desligar no mais curto tempo possível a secção da
rede onde se deu o defeito. Esta manobra exige a utilização de interruptores capazes de
cortar as correntes de curto-circuito, o que é tanto mais difícil quanto mais elevada for a
tensão. Estes interruptores com poder de corte elevado, designados disjuntores, são ac-
cionados por dispositivos chamados relés, que constituem, em sentido figurado, o cére-
bro de um sistema em que os disjuntores são o músculo.

Note-se que os defeitos causados por descargas atmosféricas são maioritariamente fugi-
tivos, isto é, desaparecem quando a corrente de curto circuito é interrompida. A razão
para esta característica, reside na desionização e consequente recuperação das proprie-
dades isolantes do ar envolvente, após a interrupção da corrente.

Por este motivo utilizam-se em geral para as linhas aéreas disjuntores com religação au-
tomática, ou seja, disjuntores que, após cortarem a corrente de defeito, fecham novamen-
te após um curto intervalo de tempo, por actuação dos respectivos relés. Caso o defeito
persista, o disjuntor abre definitivamente após duas ou três tentativas de religação.

O cálculo das correntes de curto-circuito é necessário para dimensionar os relés de pro-


tecção e o poder de corte dos disjuntores, bem como os esforços electrodinâmicos nas
máquinas e barramentos. Interessa ainda conhecer o perfil das tensões na vizinhança do
defeito, uma vez que elas vão variar significativamente, perturbando o funcionamento dos
aparelhos ligados à rede.

O cálculo deve ser efectuado sequencialmente para curto-circuitos em todos os barra-


mentos da rede, o que requer o uso de um programa de cálculo digital. Note-se, contudo,
que para casos simples, é possível um cálculo rápido simplificado, usando meios rudi-
mentares.

4.2 Corrente e Potência de Curto-Circuito

Um curto-circuito representa uma mudança estrutural na rede, causada pela ligação de


uma impedância de baixo (ou nulo) valor no ponto de defeito. Considere-se um defeito tri-
fásico simétrico no barramento i – Figura 4.1 – com uma impedância Zdef, do qual resulta
uma corrente de curto-circuito igual em módulo nas três fases e desfasada de ±120º. Ain-
da que o defeito envolva a terra, não existe corrente de neutro uma vez que a soma das
três correntes nas fases é nula.
J. Sucena Paiva Correntes de Curto-Circuito 127

Barramento i
a

I acci I bcci I ccci

Zdef Zdef Zdef

In = 0

Figura 4.1 – Curto-circuito trifásico simétrico no barramento i.

Uma vez que a corrente de curto-circuito é simétrica, podemos usar o esquema monofá-
sico equivalente que se representa na Figura 4.2a. Este esquema é equivalente ao da
Figura 4.2b, no qual se inseriram em série no percurso de defeito dois geradores fictícios,
ligados em série, com a mesma f.e.m. Vi0 – a tensão no barramento i antes da ocorrên-

cia do defeito – e polaridades opostas.

i i
Iicc Iicc
+
Vicc
Zdef ~ Vi0
-
-
~ Vi 0
Vi cc
+
Zdef

a b

Figura 4.2 – Esquema monofásico equivalente para o defeito no barramento i.

4.2.1 Teorema da Sobreposição

Usando o Teorema da Sobreposição é possível considerar o estado da rede após o defei-


to como a sobreposição dos dois estados representados na Figura 4.3. O estado 1 cor-
responde à situação pré-defeito e inclui todos os geradores reais ligados à rede (não re-
presentados); uma vez que a f.e.m. do gerador fictício é igual à tensão no barramento, a
corrente que o percorre é nula – pelo que pode ser retirado. O estado 2 corresponde à
128 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

ligação do gerador fictício com a polaridade invertida (o pólo positivo está ligado ao neu-
tro); os geradores reais são representados unicamente pelas respectivas impedância in-
ternas.

i + i
I =0 I cc
i
+ –
~ Vi0 ~ Vi0
0
Vi – Vi T +
Zdef Zdef

Estado 1 Estado 2

Figura 4.3 – Aplicação do Teorema da Sobreposição.

As tensões nodais e as correntes nos ramos pós-defeito obtêm-se pela soma das corren-
tes e tensões obtidas nos dois estados. A corrente no ramo que simula o defeito é a que
se obtém do estado 2, uma vez que no estado 1 tal ramo não existe.

4.2.2 Teorema de Thévenin

O estado 2 corresponde à aplicação do Teorema de Thévenin, o qual permite estabelecer


para uma rede eléctrica, vista de um qualquer nó i, o esquema equivalente representado
na Figura 4.4.

Vi 0
– ~ + i
cc
i

ZT Zdef

Figura 4.4 – Esquema equivalente de Thévenin.

A impedância ZT é a impedância equivalente (de Thévenin) da rede vista do nó i quando se


anulam as fontes de tensão e/ou de corrente.

Se no nó i ocorrer um defeito com impedância Zdef (representado a traço interrompido na


Figura 4.4), a corrente de curto-circuito I icc obtém-se por:
J. Sucena Paiva Correntes de Curto-Circuito 129

Vi 0
I cc = (4.1)
Z def + ZT
i

Para um sistema trifásico será:

V i0
I cc = (4.2)
3 (Z def + Z T )
i

Sendo nula a impedância de defeito Z def (curto circuito franco):

Vi0
I cc
i = (4.3)
3 ZT

Define-se a potência de curto circuito Sicc no nó i por:

2
Vi 0
Sicc = 3 Vi 0 I icc = (4.4)
ZT

Se se tomar para Vi 0 a tensão nominal Vn :

Vn 2
Sicc = (4.5)
ZT

Em valores p.u.:

1
Sicc = I icc = (4.6)
ZT

isto é, a potência de curto-circuito é o inverso da impedância equivalente da rede vista do


ponto de defeito.

4.3 Curto-Circuito de um Gerador Síncrono

Considere-se um gerador síncrono rodando à velocidade nominal em vazio, excitado com


uma corrente constante de forma a apresentar aos seus terminais a f.e.m. E, e admita-se
que no instante t = 0 a se dá um curto-circuito trifásico franco. Desprezando a resistência,
pode demonstrar-se que a corrente na fase de referência a é dada por:

E E 1 1 E 1 1
i cc = 2 '
cos ( ωt + α o ) − ( ' + ) cos α o − ( ' − ) cos ( 2ωt + α o ) (4.7)
Xd 2 Xd X q 2 Xd Xq
130 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

onde:

X′d – reactância transitória segundo o eixo d

X q – reactância síncrona segundo o eixo q

E – f.e.m. da máquina (tensão em vazio)

ω – frequência angular nominal

α o – ângulo do rotor com o eixo da fase de referência no instante de curto-circuito

Da equação (4.7) verifica-se que:

1. A corrente de curto-circuito tem três componentes: uma componente à frequência


fundamental; uma componente unidireccional (continua); uma componente com fre-
quência dupla da fundamental;

2. A componente contínua varia com α o isto é, com a posição do rotor no instante em

que se dá o defeito.

3. Dado que desprezámos as resistências dos enrolamentos, as componentes da cor-


rente de curto-circuito são constantes (veremos adiante a influência das resistências);

4. O valor eficaz da componente à frequência fundamental é E / X d′ . Em regime estaci-

onário a corrente terá um valor E / X d onde X d é a reactância síncrona segundo o

eixo d. Dado que X d′ < X d a corrente de curto-circuito transitória é maior (de três a

dez vezes) que a corrente de curto-circuito estacionária;

Oferece-se de seguida uma explicação qualitativa do fenómeno em apreço, uma vez que
a análise quantitativa está fora do âmbito deste texto.

Quando o gerador está excitado, rodando em vazio, existe no seu entreferro um fluxo
magnético girante, ao qual está associada energia magnética. Quando se dá o curto-
circuito, a tensão aos terminais da máquina cai bruscamente para zero. Dado que a ener-
gia magnética não pode anular-se instantaneamente, o fluxo magnético no entreferro
manter-se-á após o curto-circuito no seu valor inicial, o mesmo sucedendo à f.e.m.. Re-
sulta assim uma corrente de curto-circuito no estator limitada apenas pela reactância de
dispersão dos enrolamentos, substancialmente inferior à reactância síncrona, que corres-
ponde ao fluxo ligado.

O efeito desmagnetizante desta corrente, que tende a enfraquecer o fluxo, é compensado


por um aumento da corrente do enrolamento de excitação, que tem efeito magnetizante.
J. Sucena Paiva Correntes de Curto-Circuito 131

Dado que este enrolamento tem uma resistência não nula, esta corrente vai diminuindo
com uma constante de tempo Td′ ≈ X d′ / X d .Tr (Tr é a constante de tempo do enrolamento

de excitação, da ordem de vários segundos), originando um enfraquecimento do fluxo no


entreferro e portanto da tensão do gerador. A corrente no estator vai por consequência
diminuindo também até atingir o seu valor em regime estacionário com a constante de
tempo Td′ (cerca de 1 a 2 s para máquinas de potência elevada). Na Figura 4.5 represen-

ta-se a variação no tempo do fluxo ligado, da corrente no rotor e da corrente no estator,


tendo-se admitido que a componente contínua é nula (α o = π / 2 ) .

Figura 4.5 – Corrente de curto-circuito de um gerador síncrono.

No que ficou dito até aqui ignorou-se a presença do enrolamento amortecedor, constituído
por um conjunto de barras de cobre, localizadas na superfície do rotor e curto-circuitadas
por anéis.

Em regime estacionário este enrolamento não é percorrido por corrente, contudo, quando
a máquina experimenta oscilações resultantes de desequilíbrios de potência, induzem-se
nele correntes que têm um efeito amortecedor.

Durante um curto-circuito, para além da corrente induzida no enrolamento de excitação já


referida, estabelecem-se também correntes no enrolamento amortecedor, com o resulta-
do que a corrente no estator sofre um aumento substancial, ainda que limitado aos primei-
132 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

ros dois a três ciclos, uma vez que a constante de tempo deste enrolamento é bastante
inferior à do enrolamento de excitação. Define-se assim uma reactância subtransitória
X d′′ , inferior à reactância transitória X d′ , que permite calcular o valor eficaz do primeiro

ciclo da corrente pelo quociente E / X d′′ .

A componente contínua da corrente de curto-circuito tem importância para a definição do


poder de corte dos disjuntores, dado que estes têm de interromper a corrente total. Na
Figura 4.6 representam-se as correntes no rotor e no estator no caso de o curto-circuito
se dar para α o = 0 (componente contínua máxima), observando-se uma assimetria impor-

tante nos primeiros ciclos da corrente estatórica, que contudo se desaparece muito rapi-
damente (alguns ciclos). Por outro lado a componente contínua que circula no estator
comporta-se como alternada em relação ao rotor. Gera-se assim no circuito de excitação
uma f.e.m. alternada enquanto dura a componente contínua no estator, que dá origem a
uma ondulação na corrente de excitação.

A presença da componente contínua acarreta um aumento significativo do valor de pico


das primeiras alternâncias da corrente de curto-circuito, o qual pode atingir na primeira
1,8 2 = 2,55 vezes o valor eficaz da componente alternada ( I max na Figura 4.6).

Figura 4.6 – Corrente de curto-circuito com componente contínua máxima.


J. Sucena Paiva Correntes de Curto-Circuito 133

4.4 Modelos dos Elementos da Rede

4.4.1 Gerador

Em face das considerações feitas na secção anterior, o modelo da máquina síncrona


para o cálculo de correntes de curto-circuito simétrico é o que se representa na Figura
4.7.

j X d′ (ou j X d′′ )

+
E’ ~
-

Figura 4.7 – Modelo do gerador síncrono.

Em relação a este modelo, fazemos as seguintes observações:

1. Desprezou-se a resistência dos enrolamentos;

2. Desprezaram-se todas as componentes da corrente de curto-circuito, para além da


componente à frequência fundamental;

3. Embora a componente à frequência fundamental decresça exponencialmente, dado


que a constante de tempo é da ordem do segundo (50 ciclos), considera-se o regime
como quase-estacionário;

4. Para disjuntores rápidos, tipicamente usados na rede de transporte (1,5 a 2 ciclos),


deve usar-se a reactância subtransitória, que conduz a um valor mais elevado da cor-
rente de curto-circuito. Para disjuntores mais lentos (4 a 5 ciclos), usados na distribui-
ção, é suficiente utilizar a reactância transitória;

5. Para o cálculo dos esforços electrodinâmicos provocados pela corrente de curto-


circuito, usa-se a reactância subtransitória, uma vez que interessa determinar o res-
pectivo valor máximo.
134 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

4.4.2 Transformador e Linha

O modelo do transformador não difere do que se utiliza no trânsito de energia. Despreza-


se o ramo transversal correspondente à impedância de magnetização e retém-se o ramo
longitudinal com a impedância de curto-circuito (ignorando-se muitas vezes a resistência).
Se se considerar a rede em vazio no estado pré-defeito, toma-se uma relação de trans-
formação unitária, ainda que o transformador possua um comutador de tomadas.

O modelo da linha também é idêntico ao usado no trânsito de energia, ou seja, o esquema


equivalente em π. Note-se que a admitância transversal tem uma influência reduzida, pelo
que se pode desprezar sem cometer um erro significativo. Quanto à resistência, pode
também desprezar-se em linhas de muito alta tensão, mas não em linhas de média e bai-
xa tensão.

4.4.3 Cargas

No cálculo da corrente de curto-circuito, muitas vezes desprezam-se as cargas, que


afectam o valor daquela corrente de forma pouco significativa. Nesta hipótese, considera-
se a rede em vazio, com um perfil de tensão uniforme, desprezando-se igualmente todos
os elementos transversais (capacidades das linhas e baterias de condensadores ou reac-
tâncias indutivas).

Quando se modelam as cargas, consideram-se em geral como sendo passivas (ou seja,
de elasticidade igual a 2), o que permite representá-las por impedâncias constantes. Natu-
ralmente, uma carga passiva não contribui para a corrente de curto-circuito.

Note-se que as impedâncias equivalentes das cargas possuem valores elevados quando
comparadas com as impedâncias dos elementos da rede, e apresentam forte componen-
te resistiva, ao invés destas, que exibem carácter reactivo dominante.

Em casos especiais, por exemplo, instalações industriais com motores (síncronos ou as-
síncronos) com potências elevadas, devem modelar-se estes de modo mais rigoroso – o
que significa usar um modelo semelhante ao da máquina síncrona (f.e.m. em série com a
reactância transitória). Com efeito, nos instantes que se seguem ao defeito, os motores
funcionam como geradores usando a energia cinética armazenada nas respectivas mas-
sas girantes, contribuindo para a corrente de curto-circuito.
J. Sucena Paiva Correntes de Curto-Circuito 135

4.5 Cálculo das Correntes de Curto-Circuito Simétrico

4.5.1 Redução da Rede

Em sistemas de reduzida dimensão, é possível determinar as correntes e potências de


curto-circuito, usando meios de cálculo rudimentares, por meio da redução da rede em
etapas sucessivas. Ao invés do que sucede no trânsito de energia, o modelo matemático
do sistema é representado por equações algébricas lineares, cuja solução não requer o
uso de métodos iterativos.

Neste cálculo, considera-se a rede em vazio antes da ocorrência do defeito, com um perfil
de tensão uniforme (igual à tensão nominal ou, por segurança, 5% acima deste valor), o
que corresponde ao desprezo de todas as cargas. Retêm-se apenas as impedâncias dos
geradores, transformadores e linhas aéreas (ou cabos subterrâneos).

A fim de evitar o uso de álgebra de números complexos, desprezam-se as resistências


dos geradores, transformadores e linhas ou, considerando-as, somam-se algebricamente
os módulos das impedâncias. Note-se que, se a parcela resistiva não exceder 33% da
parcela reactiva, o erro no valor da impedância é inferior a 5%.

Uma vez determinadas as impedâncias dos elementos do sistema numa base comum,
compõem-se de acordo com a respectiva topologia, procedendo-se de seguida à redução
da rede até à obtenção da impedância equivalente de Thévenin vista do ponto de defeito.
Obtido o valor desta impedância, calcula-se a corrente de curto-circuito.

A potência de curto-circuito num dado ponto depende da potência girante dos geradores
em serviço e da configuração topológica da rede. Quanto maior for a primeira e mais den-
sa for a segunda, maior a potência de curto-circuito. Definem-se assim as potências de
curto-circuito máxima e mínima, as quais correspondem grosso modo aos períodos de
ponta e de vazio, respectivamente.

A potência de curto-circuito máxima tem interesse para o dimensionamento do poder de


corte dos disjuntores e esforços electrodinâmicos; a mínima para o cálculo das perturba-
ções resultantes da ligação de geradores e/ou cargas e da sensibilidade das protecções
contra curto-circuitos. Quanto maior for a potência de curto-circuito (menor a impedância
a montante) mais “forte” é a rede – maior é a sua capacidade de absorção de variações
no perfil de geração ou de carga.
136 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

4.5.2 Impedância Equivalente a Montante

Em redes com uma estrutura radial, pode substituir-se a rede a montante de um barra-
mento pela sua impedância equivalente de Thévenin (também designada por impedância
de curto-circuito). Esta impedância Zcc calcula-se a partir da potência de curto-circuito Scc
imposta pela rede a montante no barramento em questão. Em valores p.u.:

1
Z cc = (4.8)
S cc

Se a potência de curto-circuito no barramento for muito maior que as potências em jogo


na rede a jusante (ou se for desconhecida, presumindo-se que seja elevada), por vezes
admite-se que ela é infinita, o que corresponde a uma impedância a montante nula. Diz-se
neste caso que o barramento (ou a rede a montante) é infinito(a).

Nesta hipótese, cometemos um erro no cálculo da corrente de curto-circuito, mas porque


esse erro é por excesso, estamos do lado da segurança.

4.5.3 Matriz das Impedâncias Nodais

O cálculo das correntes de curto-circuito em redes de grande dimensão em computador


digital utiliza um modelo da rede baseado nas equações nodais.

Para uma rede com n nós, ilustra-se na Figura 4.8 um barramento genérico i, ligado a ou-
tros, mostrando-se o esquema equivalente em π da linha i-j. O gerador é modelado por
uma fonte de corrente Ii em paralelo com a admitância transitória (ou subtransitória) YGi . A
carga ligada ao barramento, considerada passiva (elasticidade 2) está representada pela
admitância YCi .

YGi Ii

i Ysij
j

Ypij Ypij
Vj
YCi Vi
2 2

Figura 4.8 – Barramento genérico i, com geração, carga e linha ligada ao barramento j.
J. Sucena Paiva Correntes de Curto-Circuito 137

Aplicando a primeira lei de Kirchoff (lei dos nós) ao barramento i, obtém-se:

Y pij
∑ Y (V −Vj )
n n
I i = YG i V i + YC i Vi + ∑ j =1 2
Vi +
j =1
sij i

j≠i j ≠i
(4.9)
∑( )
n  Y  n
= ∑ YG i + YC i + pij + Ys
 2 ij
V i +

− Y sij V j
j =1
j ≠i
  j =1
j ≠i

Se o ramo i-j for um transformador, a admitância Y sij é a respectiva admitância de curto-

circuito e a admitância Y pij é nula. Caso o barramento i não esteja ligado ao barramento j,

ambas as admitâncias Y sij e Y pij são nulas.

Definindo:

n  Y pij 
y ii = ∑  Y Gi + YC i +
2
+ Ys ij 

(4.10)
j =1
j ≠i
 

y ij = y ji = −Y sij (4.11)

a equação (4.9) escreve-se:

n
I i = y ii Vi + ∑y ij Vj
j =1
j ≠i
(4.12)
n
= ∑y
j =1
ij Vj

Os parâmetros yij são os elementos da matriz de admitâncias nodais representativa da


rede:

 y 11 L y 1n 
[Y ] =  M M  (4.13)
y n1 L y nn 

Trata-se de uma matriz simétrica, com dimensão nxn. O elemento diagonal yii é a soma
das admitâncias de todos os ramos ligados ao nó i (o seu valor é sempre diferente de
zero); o elemento não diagonal yij (i≠j) é o simétrico da admitância do ramo que liga os
nós i e j (o seu valor é nulo se estes nós não estiverem ligados por um ramo).

Definindo o vector das correntes injectadas:


138 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

I1 
[I ] =  M  (4.14)
I n 

e o vector das tensões nodais:

V1 
[V ] =  M  (4.15)
V n 

as equações nodais (4.12) podem escrever-se sob forma matricial:

[I ] = [Y ][V ] (4.16)

Uma formulação alternativa usa a matriz [Z ] = [Y ]−1 , designada matriz das impedâncias

nodais:

[V ] = [Z ][I ] (4.17)

Por aplicação do Teorema da Sobreposição, o vector das tensões nodais após o curto-
circuito [Vcc] é dado pela soma do vector das tensões pré-existentes [V0] com o vector
das variações de tensão [VT] resultantes da ligação do gerador equivalente de Thévenin
no nó i, no qual se dá o defeito18:

[V ] = [V ] + [V ]
cc 0 T
(4.18)

O vector [VT] pode obter-se a partir da equação:

[I ] = [Y ][V ]
cc T
(4.19)

ou:

[V ] = [Z ][I ]
T cc
(4.20)

A matriz [Z] é simétrica, sendo contudo muito menos esparsa19 que a matriz [Y], pois a
inversão afecta negativamente a esparsidade.

18
Não se considera a ocorrência de defeitos simultâneos.
19
Uma matriz diz-se esparsa quando o número de elementos nulos é muito elevado em face do número
total de elementos.
J. Sucena Paiva Correntes de Curto-Circuito 139

[Icc] é o vector das correntes de curto-circuito injectadas, cujos elementos são nulos à ex-
cepção do que corresponde ao nó de defeito i:

 0 
 M 
 
[I ]cc
= − I icc 
 
(4.21)
 M 
 0 

Note-se o sinal negativo para a corrente injectada, resultante da polaridade do gerador


equivalente de Thévenin.

Substituindo a equação (4.20) na equação (4.18) obtém-se:

[V ] = [V ] + [Z ][I ]
cc 0 cc
(4.22)

Expandindo esta equação matricial nas suas componentes:

V1cc = V10 − z1i I icc



 LLLLLLL
 cc
 Vi = Vi − z ii I i
0 cc
(4.23)
 LLLLLLL

Vncc = Vn0 − z ni I icc

Nesta fase, a corrente de curto-circuito I icc é desconhecida. Contudo, podemos relacioná-

la com a tensão Vi cc através da equação:

Vi cc = Z def I icc (4.24)

na qual Z def é a impedância do defeito.

Combinando a i-ésima das equações (4.23) com a equação (4.24) obtém-se o valor da
corrente de curto-circuito:

V i0
I icc = (4.25)
z ii + Zdef

Sendo o curto-circuito franco ( Z def = 0 ) é Vi cc = 0 , e a equação anterior reduz-se a:

Vi 0
I icc = (4.26)
z ii
140 Fundamentos dos Sistemas de Energia Eléctrica J. Sucena Paiva

z ii , o elemento diagonal da matriz de impedâncias nodais correspondente ao barramento

i, coincide com a impedância equivalente de Thévenin da rede vista desse barramento.

Conhecida a corrente de curto-circuito no barramento i, as tensões nos outros barramen-


tos obtêm-se a partir das equações (4.23):

z ji
V jcc = V j0 − Vi 0 (4.27)
z ii

Conhecidas as tensões nos barramentos, podem calcular-se as correntes nos ramos da


rede, interessando em geral, conhecer apenas as que circulam nos que convergem no nó
de defeito i. Sendo este franco, a corrente no ramo i-j junto ao nó i, considerada positiva
no sentido j→i, é dada por (ver Figura 4.9):

ji = Ys ij V j
I cc cc

 z ji 0  (4.28)
= Ys ij V j0 − Vi 
 z ii 

j Ysij I cc
ji i

V icc Ypij Ypij

Figura 4.9 – Corrente no ramo que converge no nó de defeito.

Note-se, a finalizar, que para o curto-circuito no barramento i é necessário conhecer ape-


nas os elementos da coluna [Z i ] = [z1 i L z ii L z ni ]T da matriz de impedâncias no-

dais – como se observa na equação (4.23) – a qual pode ser obtida sem recurso à inver-
são completa da matriz [Y ] , operação computacionalmente pesada para redes de grande

dimensão. As diversas colunas podem calcular-se uma a uma, à medida que se percor-
rem sequencialmente os barramentos da rede, nos quais se pretende calcular a corrente
de curto-circuito.

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