Direito Penal STF
Direito Penal STF
Direito Penal STF
DIREITO PENAL
1. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO
1.1. Um crime não pode ser absorvido por uma contravenção penal – (Info 743) –
IMPORTANTE!!!
2. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
2.1. STF reconheceu que o valor econômico do bem furtado era muito pequeno,
mas, como o réu era reincidente, em vez de absolvê-lo aplicando o princípio da
insignificância, o Tribunal utilizou esse reconhecimento para conceder a pena
restritiva de direitos – (Info 913) – IMPORTANTE!!!
Caso concreto julgado pelo STF: Antônio foi denunciado por tentar furtar quatro
frascos de xampu de um supermercado, bens avaliados em R$ 31,20. O réu foi
condenado pelo art. 155 c/c art. 14, II, do CP a uma pena de 8 meses de reclusão. Foi
aplicado o regime inicial semiaberto e negada a substituição por pena restritiva de
direitos. A defesa impetrou habeas corpus pedindo a absolvição do condenado com
base na aplicação do princípio da insignificância. O “problema” é que Antônio é
reincidente (já possuía uma condenação anterior por furto).
Primeira pergunta: por que o juiz negou a substituição da pena privativa de liberdade
por restritiva de direitos? Porque o réu era reincidente em crime doloso, nos termos
do art. 44, II, do CP:
Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e
substituem as privativas de liberdade, quando:
(...)
II – o réu não for reincidente em crime doloso;
Segunda pergunta: o STF concordou com o pedido da defesa e absolveu o réu com base
no princípio da insignificância? NÃO. A 1ª Turma do STF adotou uma posição
“intermediária”. Como o réu era reincidente em crimes patrimoniais, o STF decidiu
que não se poderia aplicar o princípio da insignificância para absolver o agente. No
entanto, apesar disso, o STF concedeu habeas corpus de ofício para que a pena
privativa de liberdade imposta ao condenado seja substituída por restritiva de
direitos, com base no art. 44, § 3º do CP:
§ 3º Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a
substituição, desde que, em face de condenação anterior, a
medida seja socialmente recomendável e a reincidência não
se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime.
Desse modo, o princípio da insignificância pode ser utilizado em alguns casos para
não absolver o agente, mas conceder a ele benefício penal, como por exemplo, a
substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, mesmo
havendo óbice legal. Situação parecida já havia sido reconhecida pelo STF no
julgamento do HC 123533. Veja:
(...) Por maioria, foram também acolhidas as seguintes teses:
(i) a reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa
reconheça a insignificância penal da conduta, à luz dos
elementos do caso concreto; e
(ii) na hipótese de o juiz da causa considerar penal ou
socialmente indesejável a aplicação do princípio da
insignificância por furto, em situações em que tal
enquadramento seja cogitável, eventual sanção privativa de
liberdade deverá ser fixada, como regra geral, em regime
inicial aberto, paralisando-se a incidência do art. 33, § 2º, c, do
CP no caso concreto, com base no princípio da
proporcionalidade. (...)
STF. Plenário. HC 123533, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado
em 03/08/2015.
Obs: apesar de a redação utilizada no informativo original ter sido bem incisiva
(“O princípio da bagatela não se aplica ao crime previsto no art. 34, caput c/c
parágrafo único, II, da Lei 9.605/98”), existem julgados tanto do STF como do STJ
aplicando, excepcionalmente, o princípio da insignificância para o delito de pesca
ilegal. Deve-se ficar atenta(o) para como isso será cobrado no enunciado da prova.
OBS:
Imagine a seguinte situação adaptada: João foi encontrado pescando camarões pelo
método de arrasto motorizado no período de defeso. Esse método não é permitido no
período de defeso. Em seu barco foram localizados 7kg de camarão-rosa. Diante desse
fato, João foi denunciado pela suposta prática do delito previsto no art. 34, caput e
parágrafo único, II, da Lei nº 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais):
Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em
lugares interditados por órgão competente:
Pena - detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as
penas cumulativamente.
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem:
II - pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante
a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não
permitidos;
STJ. 3ª Seção. REsp 1688878-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 28/2/18 (recurso
repetitivo).
STF. 1ª Turma. HC 137595 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 07/05/2018.
STF. 1ª Turma. HC 127173, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão: Min. Roberto
Barroso, j. 21/03/2017.
STF. 2ª Turma. HC 155347/PR, Rel. Min. Dias Tóffoli, j. 17/4/2018 (Info 898).
STF. 1ª Turma. HC 121717/PR, Rel. Min. Rosa Weber, j. 3/6/14 (Info 749).
OBS:
Incide o princípio da insignificância aos crimes tributários
federais e de descaminho quando o débito tributário
verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil
reais), a teor do disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, com
as atualizações efetivadas pelas Portarias n. 75 e 130, ambas
do Ministério da Fazenda.
STJ. 3ª Seção. REsp 1.709.029/MG, Rel. Min. Sebastião Reis
Júnior, julgado em 28/02/2018 (recurso repetitivo).
O réu que disponibiliza provedor de internet sem fio pratica atividade clandestina
de telecomunicação (art. 183 da Lei 9.472/97), de modo que a tipicidade da conduta
está presente, devendo ser afastada a aplicação do princípio da insignificância
mesmo que, no caso concreto, a potência fosse inferior a 25 watts, o que é
considerado baixa potência, nos termos do art. 1º, § 1º, da Lei nº 9.612/98.
STF. 1ª Turma. HC 118400/RO, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 04/10/2016 (Info 842).
OBS:
A conduta de transmitir sinal de internet, via rádio, como se fosse um provedor de
internet, sem autorização da ANATEL, configura algum crime? SIM. A conduta de
transmitir sinal de internet, via rádio, de forma clandestina, caracteriza, em princípio,
o delito descrito no art. 183 da Lei 9.472/97 (STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp
1483107/RN, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 01/12/2015).
Veja o que diz este dispositivo legal:
Art. 183. Desenvolver clandestinamente atividades de
telecomunicação:
Pena - detenção de dois a quatro anos, aumentada da metade
se houver dano a terceiro, e multa de R$ 10.000,00 (dez mil
reais).
Dessa forma, a chamada “internet via rádio” pode ser considerada também um serviço
de telecomunicação.
O acusado argumentou também que não deveria ser condenado, considerando que não
ficou provado que ele causou prejuízo, seja para os clientes, seja para os serviços de
telecomunicações. Essa alegação é acolhida pelos Tribunais? NÃO. O delito do art.
183 da Lei 9.427/97 é crime de perigo abstrato. Isso significa que, para a sua
consumação, basta que alguém desenvolva de forma clandestina as atividades de
telecomunicações, sem necessidade de demonstrar prejuízo concreto para o sistema
de telecomunicações (STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1560335/MG, Rel. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, julgado em 21/06/2016).
4. DOSIMETRIA DA PENA
4.1. MULTA: MP é quem deve executar a pena de multa e, apenas se ficar inerte
por mais de 90 dias, essa legitimidade é transferida para a Fazenda Pública – (Info 927)
– IMPORTANTE!!! Mudança de Entendimento!!!
Obs: A Súmula 521-STJ fica superada e deverá ser cancelada. Súmula 521-STJ: A
legitimidade para a execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta em
sentença condenatória é exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública.
OBS:
Multa: é uma espécie de pena, por meio da qual o condenado fica obrigado a pagar
uma quantia em dinheiro que será revertida em favor do Fundo Penitenciário.
O que acontece caso o condenado não pague nem parcele a multa no prazo de 10 dias?
1) Antes da Lei 9.268/96: se o condenado, deliberadamente, deixasse de pagar a pena
de multa, ela deveria ser convertida em pena de detenção. Em outras palavras, a multa
era transformada em pena privativa de liberdade.
2) Atualmente: a Lei 9.268/96 alterou o art. 51 do CP e previu que, se a multa não for
paga, ela será considerada dívida de valor e deverá ser exigida por meio de execução
(não se permite mais a conversão da pena de multa em detenção).
Multa permaneceu com caráter penal: Importante esclarecer que, mesmo com essa
mudança trazida pela Lei 9.268/96, a multa continua tendo caráter de sanção
criminal, ou seja, permanece sendo uma pena, por força do art. 5º, XLVI, “c”, da
CF/88:
Art. 5º (...)
XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará,
entre outras, as seguintes:
c) multa;
Assim, a única coisa que a Lei 9.268/96 fez foi mudar a forma de cobrança da multa
não paga: antes, ela virava pena de detenção; agora, deve ser cobrada por meio de
execução.
Exemplo: João foi sentenciado por roubo e o juiz de direito (Justiça Estadual) o
condenou a 4 anos de reclusão e mais 10 dias-multa no valor de meio salário mínimo
cada. Depois do trânsito em julgado, o condenado foi intimado para pagar a pena de
multa no prazo de 10 dias, mas não o fez. Diante disso, o escrivão da vara irá fazer
uma certidão na qual constarão as informações sobre a condenação e o valor da multa.
O argumento invocado pela defesa foi aceito pelo STF? Houve bis in idem neste caso?
A decisão do magistrado foi equivocada? NÃO.
O delito previsto no art. 316 do CP realmente só pode ser praticado por funcionário
público. No entanto, é possível que o magistrado, ao fazer a dosimetria da pena,
analisando as circunstâncias do art. 59 do CP, aumente a pena invocando a qualidade
específica ou a qualificação do funcionário público.
4.5. Condenações anteriores transitadas em julgado não podem ser utilizadas como
conduta social desfavorável – (Info 825)
A tese da defesa foi aceita pelo STF? Houve erro na dosimetria da pena? SIM. Teori
explicou que, antes da reforma da Parte Geral do CP (1984), a análise dos antecedentes
abrangia todo o passado do agente, incluindo, além dos registros criminais, o seu
comportamento na sociedade. Após a aprovação da Lei 7.209/84, a conduta social
passou a ter significado próprio. A conduta social passou a ser utilizada apenas para
avaliar o comportamento do condenado no meio familiar, no ambiente de trabalho
e no relacionamento com outros indivíduos. Ou seja, os antecedentes sociais do réu
não mais se confundem com os seus antecedentes criminais. Trata-se de
circunstâncias diversas. Assim, a análise da circunstância judicial da conduta social
não tem relação com a vida criminal do acusado. O histórico criminal já é utilizado
para aferir os antecedentes (primeira fase de aplicação da pena) ou a reincidência
(segunda fase de aplicação da pena). A conduta social está relacionada com aspectos
extrapenais.
5. MAUS ANTECEDENTES
5.1. Cinco anos após o cumprimento ou extinção da pena, a condenação pretérita
ainda poderá ser utilizada como maus antecedentes? – (Info 799) – IMPORTANTE!!!
6. AGRAVANTES
6.1. As agravantes (tirando a reincidência) não se aplicam aos crimes culposos –
(Info 735)
7. PRESCRIÇÃO
7.1. Interpretação do art. 112 do CP – (Info 890) – IMPORTANTE!!! TEMA
POLÊMICO!
Termo inicial: Como vimos, o Estado tem um prazo máximo para fazer com que o réu
condenado inicie o cumprimento da pena. Caso não o faça, ocorre a prescrição
executória.
A pergunta é: a partir de que dia começa a correr esse prazo que o Estado tem para
fazer com que o condenado inicie o cumprimento da pena? Dito de outra forma: qual
é o termo inicial do prazo da prescrição da pretensão executória? A resposta encontra-
se no art. 112, I do CP:
Termo inicial da prescrição após a sentença condenatória
irrecorrível
Art. 112. No caso do art. 110 deste Código [que trata da
prescrição executória], a prescrição começa a correr:
I - do dia em que transita em julgado a sentença
condenatória, para a acusação, ou a que revoga a suspensão
condicional da pena ou o livramento condicional;
Desse modo, segundo o art. 112, I do CP, o termo inicial da prescrição executória é a
data do trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação.
Veja o seguinte exemplo hipotético: João foi condenado a 4 anos de reclusão pelo
Tribunal de Justiça. O Ministério Público concorda com o acórdão e não recorre, razão
pela qual ocorre trânsito em julgado para a acusação no dia 18/02/2010. O advogado
do réu apresenta recurso extraordinário, de forma que, para a defesa, não houve
trânsito em julgado.
Crítica à regra do art. 112, I do CP: A CF/88 prevê que ninguém poderá ser
considerado culpado até que haja o trânsito em jugado da sentença penal condenatória
(art. 5º, LVII). Por força desse princípio, durante os anos de 2009 até 2016 prevaleceu
no STF o entendimento de que não existia no Brasil a execução provisória (antecipada)
da pena.
Assim, de 2009 até 2016 o STF entendia que, enquanto não tivesse havido trânsito em
julgado para a acusação e para a defesa, o réu não poderia ser obrigado a iniciar o
cumprimento da pena.
Desse modo, perceba a seguinte situação estranha que o art. 112, I, ocasionava (entre
2009 a 2016):
Se o réu fosse condenado, a defesa recorresse e o MP não, esse condenado não
podia iniciar o cumprimento da pena enquanto estivesse pendente o recurso;
Apesar disso, pela redação literal do art. 112, I, do CP, já começava a correr o
prazo da prescrição executória.
Diante desse paradoxo que podia ser ocasionado pela regra do art. 112, I, do CP,
alguns doutrinadores e membros do Ministério Público idealizaram a seguinte tese:
O início do prazo da prescrição executória devia ser o momento em que ocorre o
trânsito em julgado para ambas as partes, ou seja, tanto para a acusação como para a
defesa. Não se pode dizer que o prazo prescricional começa com o trânsito em julgado
apenas para a acusação, uma vez que, se a defesa recorreu, o Estado não pode dar
início à execução da pena, já que ainda não haveria uma condenação definitiva. Se há
recurso da defesa, o Estado não inicia o cumprimento da pena não por desinteresse
dele, mas sim porque há uma vedação de ordem constitucional decorrente do
princípio da presunção de inocência. Ora, se não há desídia do Estado, não se pode
falar em prescrição. Desse modo, foi uma tese que surgiu para desconsiderar a
interpretação literal do art. 112, I, do CP.
Essa tese que desconsidera a regra do art. 112, I, do CP foi aceita pela jurisprudência?
STJ: NÃO. Para o STJ, conforme determina o art. 112, I do CP, o termo inicial
da prescrição da pretensão executória é a data do trânsito em julgado da
sentença condenatória para a acusação, ainda que a defesa tenha recorrido e
que se esteja aguardando o julgamento desse recurso. Nesse sentido: STJ. 6ª
Turma. AgRg no RHC 74.996/PB, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em
12/09/2017.
O argumento de que se deveria aguardar o trânsito em julgado para ambas as
partes não tem previsão legal e contraria o texto do Código Penal.
Além disso, não se pode querer “corrigir” a redação do art. 112, I, do CP
invocando-se o art. 5º, LVII da CF/88, porque, nesse caso, se estaria utilizando
um dispositivo da Constituição Federal para respaldar uma “interpretação”
totalmente desfavorável ao réu e contra expressa disposição legal.
Exigir o trânsito em julgado para ambas as partes como termo inicial da
contagem do lapso da prescrição da pretensão executória, ao contrário do texto
expresso da lei, seria inaugurar novo marco interruptivo da prescrição não
previsto no rol taxativo do art. 117 do CP, situação que também afrontaria o
princípio da reserva legal.
Assim, somente com a devida alteração legislativa é que seria possível
modificar o termo inicial da prescrição da pretensão executória, e não por meio
de "adequação hermenêutica".
A prescrição virtual possui previsão na lei? NÃO. Apesar de ser comum na prática, a
prescrição virtual não tem previsão na lei, sendo considerada uma “criação” dos juízes
e Tribunais.
A prescrição virtual é admitida pelo STF e pelo STJ? NÃO. O STF e o STJ afirmam que
é inadmissível a prescrição virtual por dois motivos principais:
em virtude da ausência de previsão legal;
porque representaria uma afronta ao princípio da presunção de não-
culpabilidade.
Para que incida a redução do prazo prescricional prevista no art. 115 do CP, é
necessário que, no momento da sentença, o condenado possua mais de 70 anos. Se
ele só completou a idade após a sentença, não terá direito ao benefício, mesmo que
isso tenha ocorrido antes do julgamento de apelação interposta contra a sentença.
Existe, no entanto, uma situação em que o condenado será beneficiado pela redução
do art. 115 do CP mesmo tendo completado 70 anos após a sentença: isso ocorre
quando o condenado opõe embargos de declaração contra o acórdão condenatório
e esses embargos são conhecidos. Nesse caso, o prazo prescricional será reduzido
pela metade se o réu completar 70 anos até a data do julgamento dos embargos.
Nesse sentido: STF. Plenário. AP 516 ED/DF, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/ o
acórdão Min. Luiz Fux, julgado em 5/12/2013 (Info 731).
STF. 2ª Turma. HC 129696/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 19/4/2016 (Info
822).
OBS:
Redução do prazo prescricional para condenados maiores de 70 anos: O art. 115 do
CP preconiza:
O réu terá direito ao art. 115 do CP? NÃO. Isso porque, na data da sentença, ele tinha
menos de 70 anos.
Situação 2. Imagine agora o exemplo um pouco diferente: João, com 69 anos, foi
condenado, em 1ª instância, no dia 02/02/2010. O condenado opôs embargos de
declaração. O juiz conheceu dos embargos, mas os julgou improvidos em 05/05/2010,
mantendo a sentença. Nesta data, o condenado já tinha mais de 70 anos.
O réu terá direito ao art. 115 do CP? SIM. O STF admite a redução do prazo
prescricional pela metade quando o réu completa 70 anos após a sentença
condenatória, mas antes de terem sido julgados os embargos de declaração opostos
contra a decisão (se conhecidos). Isso porque se entende que a decisão dos embargos
integra a sentença.
7.6. O § 1º do art. 110 do CP, alterado pela Lei 12.234/2010, é constitucional – (Info
771) – IMPORTANTE!!!
O que o juiz deve observar na fixação do regime inicial? O juiz, quando vai fixar o
regime inicial do cumprimento da pena privativa de liberdade, deve observar quatro
fatores:
1) o tipo de pena aplicada: se reclusão ou detenção;
2) o quantum da pena definitiva;
3) se o condenado é reincidente ou não;
4) as circunstâncias judiciais (art. 59 do CP).
É possível que seja imposto ao condenado primário um regime inicial mais rigoroso
do que o previsto para a quantidade de pena aplicada? Ex.: se uma pessoa pode ser
condenada a 6 anos de reclusão e o juiz fixar o regime inicial fechado? SIM, é possível,
desde que o juiz apresente motivação idônea na sentença.
O juiz pode fundamentar a imposição do regime mais severo devido ao fato do crime
praticado ser, abstratamente, um delito grave? Ex.: o juiz afirma que, em sua opinião,
no caso de tráfico de drogas o regime deve ser o fechado em razão da gravidade desse
delito. NÃO. A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime NÃO
constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o
permitido segundo a pena aplicada (Súmula 718-STF).
O que é considerado, então, motivação idônea para impor ao condenado regime mais
gravoso? Exige-se que o juiz aponte circunstâncias que demonstrem que o fato
criminoso, concretamente, foi grave. Se as circunstâncias judiciais do art. 59 forem
desfavoráveis, é possível que o juiz se fundamente nesses dados para impor ao
condenado regime inicial mais gravoso que o previsto para a quantidade de pena
aplicada. Nesse sentido:
8.5. Regime inicial de cumprimento de pena para o condenado por crime hediondo
ou equiparado
Qual é o regime inicial de cumprimento de pena do réu que for condenado por
crime hediondo ou equiparado?
O regime inicial nas condenações por crimes hediondos ou equiparados (como é o
caso do tráfico de drogas) não tem que ser obrigatoriamente o fechado, podendo
ser também o regime semiaberto ou aberto, desde que presentes os requisitos do
art. 33, § 2º, alíneas “b” e “c”, do Código Penal.
STF. Plenário. HC 111840/ES, rel. Min. Dias Toffoli, 27/6/2012.
STJ. 3ª Seção. EREsp 1.285.631-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Junior, j. 24/10/2012.
9. CRIME DE HOMICÍDIO
9.1. Dirigir alcoolizado na contramão: reconhecimento de dolo eventual – (Info 904)
O pedido foi acolhido pelo STF? NÃO. O STF entende que, em casos de homicídio
causado por motorista embriagado, se o Tribunal do Júri entender que houve dolo
eventual, não cabe ao Supremo alterar esta tipificação, sendo uma decisão legítima
do júri popular.
Vale ressaltar, no entanto, que o simples fato do condutor do veículo estar
embriagado não gera a presunção de que tenha havido dolo eventual:
A embriaguez do agente condutor do automóvel, por si só,
não pode servir de premissa bastante para a afirmação do dolo
eventual em acidente de trânsito com resultado morte.
STJ. 6ª Turma. REsp 1.689.173-SC, Rel. Min. Rogério Schietti
Cruz, julgado em 21/11/2017 (Info 623).
Dessa forma, haverá assunção do risco – apta a caracterizar o dolo eventual –, "quando
o agente tenha tomado como séria a possibilidade de lesar ou colocar em perigo o bem
jurídico e não se importa com isso, demonstrando, pois, que o resultado lhe era
indiferente”( TAVARES, Juarez apud PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal
Brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 332).
Nesse sentido:
STJ. 6ª Turma. AgRg-AREsp 1.226.580-DF, Rel. Min. Rogério
Schietti Cruz, julgado em 05/06/2018.
STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 965.57-/RS, Rel. Ministro
Jorge Mussi, julgado em 19/5/2017.
Por que o dolo eventual é incompatível com a qualificadora da surpresa? Para que
incida a qualificadora da surpresa é indispensável que fique provado que o agente
teve a vontade de surpreender a vítima, impedindo ou dificultando que ela se
defendesse. Ora, no caso do dolo eventual, o agente não tem essa intenção,
considerando que não quer matar a vítima, mas apenas assume o risco de produzir
esse resultado. Como o agente não deseja a produção do resultado, ele não direcionou
sua vontade para causar surpresa à vítima. Logo, não pode responder por essa
circunstância (surpresa).
OBS:
Exceções em que o aborto não é crime: O Código Penal, em seu art. 128, traz duas
hipóteses em que o aborto é permitido:
1ª) se não há outro meio de salvar a vida da gestante. É o chamado aborto
“necessário” ou “terapêutico”, previsto no inciso I.
2ª) no caso de gravidez resultante de estupro. Trata-se do aborto
“humanitário”, “sentimental”, “ético” ou “piedoso”, elencado no inciso II.
Segundo o texto expresso do CP, essas são as duas únicas hipóteses em que o
aborto é permitido no Brasil.
3ª) Interrupção da gravidez de feto anencéfalo: O STF, no julgamento da ADPF
54/DF, criou uma nova exceção e decidiu que a interrupção da gravidez de
feto anencéfalo é conduta atípica (Plenário. ADPF 54/DF, rel. Min. Marco
Aurélio, 11 e 12/4/2012). Assim, por força de interpretação jurisprudencial,
realizar aborto de feto anencéfalo também não é crime.
4ª) Interrupção da gravidez no primeiro trimestre da gestação: A 1ª Turma do
STF, no julgamento do HC 124306, mencionou a possibilidade de se admitir
uma quarta exceção: a interrupção da gravidez no primeiro trimestre da
gestação provocado pela própria gestante (art. 124) ou com o seu
consentimento (art. 126) também não seria crime (HC 124306/RJ, rel. orig. Min.
Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 29/11/2016.
Info 849).
Em outras palavras, se determinada conduta for prevista como crime, mas não atender
a algum desses três requisitos, este tipo penal deverá ser considerado inconstitucional.
Verifique abaixo os argumentos invocados pelo Min. Relator Roberto Barroso:
Primeiro trimestre da gravidez: Ressalta-se que, pela decisão do STF, só não será
punido o aborto consentido (realizado pela mulher ou por terceiro com sua
concordância) e desde que feito nos três primeiros meses da gravidez. Se for realizado
após o primeiro trimestre, continua sendo crime.
Por que este critério de três meses? Existe uma intensa e polêmica discussão sobre
quando se inicia a vida e qual é o status jurídico do embrião durante a fase inicial da
gestação. Dentre outras, há duas posições principais e antagônicas em relação a isso:
1ª) de um lado, os que sustentam que existe vida desde a concepção, desde que o
espermatozoide fecundou o óvulo, dando origem à multiplicação das células.
2ª) de outro lado, estão os que sustentam que antes da formação do sistema nervoso
central e da presença de rudimentos de consciência (o que geralmente se dá após o
terceiro mês da gestação) não é possível ainda falar-se em vida em sentido pleno.
Segundo o Ministro, não havia motivo para a prisão preventiva, considerando o fato
de que a gravidez da mulher estava ainda no primeiro trimestre, razão pela qual a
punição prevista nos arts. 124 e 126 do CP não seria compatível com a CF/88, ou seja,
não teria sido recepcionada pela atual Carta Magna. Por conta disso, o Ministro
concedeu a ordem de habeas corpus para afastar a prisão preventiva dos pacientes,
concedendo-lhes liberdade provisória.
Atenção: Obviamente, esta decisão representa um indicativo muito claro do que o STF
poderá decidir caso seja provocado de forma específica sobre o tema, tendo o Min.
Roberto Barroso proferido um substancioso voto que foi acompanhado pelos
Ministros Edson Fachin e Rosa Weber. Os demais Ministros da 1ª Turma (Marco
Aurélio e Luiz Fux) não se comprometeram expressamente com a tese da
descriminalização e discutiram apenas a legalidade da prisão preventiva. Dessa
forma, existem três votos a favor da tese, não se podendo afirmar que o tema esteja
resolvido no STF. Ao contrário, ainda haverá muita discussão a respeito.
11.3. INJÚRIA: Não deve ser punido Deputado Federal que profere palavras
injuriosas contra adversário político que também o ofendeu imediatamente antes –
(Info 838)
Determinado Governador afirmou, em rede social, que certo Deputado Federal
estava financiando, com a utilização de “dinheiro sujo”, a produção de injúrias
contra ele e que o parlamentar estava sendo processado pelos crimes de tortura,
corrupção e estupro.
No dia seguinte, o Deputado, em resposta, afirmou, também em uma rede social,
que o Governador era acusado de corrupção eleitoral, que tinha como costume fazer
acusações falsas para tentar incriminar seus desafetos políticos, que costumava
espancar seu pai e que era desequilibrado mental.
O STF entendeu que o Deputado Federal praticou fato típico, antijurídico e
culpável, mas que não deveria ser punido, com base no art. 140, § 1º, II, do CP.
O Deputado postou as mensagens ofensivas menos de 24 horas depois de o
Governador publicar a manifestação também injuriosa. Dessa forma, as mensagens
do parlamentar foram imediatamente posteriores às veiculadas pelo ofendido e
elaboradas em resposta a elas. Ao publicá-las, o acusado citou parte do conteúdo
da mensagem postada pelo ofendido, comprovando o nexo de pertinência entre as
condutas. Dessa maneira, o ofendido não só, de forma reprovável, provocou a
injúria, como também, em tese, praticou o mesmo delito, o que gerou a retorsão
imediata do acusado. Logo, o STF entendeu que não havia razão moral para o
Estado punir o Deputado.
STF. 1ª Turma. AP 926/AC, Rel. Min. Rosa Weber, j. 6/9/2016 (Info 838).
OBS:
O motivo para isso foi a imunidade parlamentar? Ao proferir estas palavras o
Deputado estava sob o abrigo da imunidade material? NÃO. O STF entendeu que não
deveria se falar em imunidade parlamentar no presente caso. Isso por conta de dois
motivos:
1) As declarações foram proferidas fora do recinto
parlamentar e em ambiente virtual.
2) Não havia relação entre as declarações e o exercício do
mandato. As postagens atacaram a dignidade e o decoro do
Governador, sem qualquer relação com o exercício do
mandato. Mesmo sendo adversários políticos, o que se contata
é que nas declarações proferidas pelo Deputado não há um
propósito de crítica ou de debate. O seu intuito é apenas o de
atribuir condutas negativas ao Governador.
Qual foi o motivo, então, para o Deputado não ser condenado? Perdão judicial.
Retorsão imediata (inciso II): O STF deixou de aplicar a pena ao Deputado com base
no inciso II do § 1º do art. 140 (retorsão imediata). Conforme explica Cleber Masson:
"A retorsão é a injúria proferida pelo ofendido contra quem
antes o injuriou. É o revide: tão logo ofendida, a vítima
também ataca a honra de seu agressor. Deve ser imediata, ou
seja, efetuada tão logo o injuriado tiver conhecimento da
ofensa. Assim, tratando-se de injúrias verbais, a retorsão deve
se verificar na mesma ocasião em que o ofendido suportar a
ofensa.
Admite-se também o perdão judicial no tocante a injúrias
escritas. Nessa hipótese, a relação de imediatidade impõe o
revide quando o injuriado conhecer a sua existência, pois
somente a partir de então surge a possibilidade de retorsão
imediata." (Direito Penal esquematizado. São Paulo: Método,
2014, p. 199).
12.2. Causa de aumento do § 1º pode ser aplicada tanto para furto simples como
qualificado – (Info 851) – IMPORTANTE!!!
PREVISÃO LEGAL:
Art. 71. Quando o agente, mediante mais de uma ação ou
omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e,
pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras
semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como
continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos
crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada,
em qualquer caso, de um sexto a dois terços.
NATUREZA JURÍDICA: Existem três teorias que foram desenvolvidas para tentar
explicar a natureza jurídica da continuidade delitiva.
a) Teoria da unidade real: afirma que todas as condutas praticadas que, por si sós, já
se constituiriam em infrações penais, são um único crime. Segundo essa teoria,
para todos os efeitos, Carlos praticou apenas um único furto.
b) Teoria da ficção jurídica: sustenta que cada uma das condutas praticadas
constitui-se em uma infração penal diferente. No entanto, por ficção jurídica, esses
diversos crimes são considerados, pela lei, como crime único. Segundo essa
teoria, Carlos praticou dez furtos, entretanto, considera-se, ficticiamente, para fins
de pena, que ele cometeu apenas um.
c) Teoria mista: defende que, se houver crime continuado, surge um terceiro crime,
resultado do próprio concurso. Segundo essa teoria, Carlos praticou uma nova
categoria de crime, chamada de furto por continuidade delitiva.
4) Unidade de desígnio.
1) Pluralidade de condutas
O agente deve praticar duas ou mais condutas, ou seja, mais de uma ação ou omissão.
4) Unidade de desígnio
Esse quarto requisito não está previsto expressamente no art. 71 do CP. Por isso,
alguns doutrinadores afirmam que ele não é necessário. Sobre o tema, surgiram duas
teorias:
É necessário que a arma utilizada no roubo seja apreendida e periciada para que
incida a majorante do art. 157, § 2º, I, do Código Penal?
NÃO. O reconhecimento da referida causa de aumento prescinde (dispensa) da
apreensão e da realização de perícia na arma, desde que o seu uso no roubo seja
provado por outros meios de prova, tais como a palavra da vítima ou mesmo de
testemunhas.
STF. 1ª Turma. HC 108034/MG, rel. Min. Rosa Weber, 7/8/2012.
14. LATROCÍNIO
14.1. O que fazer se foi atingido um único patrimônio, mas houve pluralidade de
mortes? – (Info 855) – IMPORTANTE!!!
Carlos e Luiza estão entrando no carro quando são rendidos por João, assaltante
armado, que deseja subtrair o veículo. Carlos acaba reagindo e João atira contra ele
e Luiza, matando o casal. João foge levando o carro. Haverá dois crimes de
latrocínio em concurso formal de ou um único crime de latrocínio?
STJ: concurso formal impróprio.
STF e doutrina majoritária: um único crime de latrocínio.
STJ. 5ª Turma. HC 336.680/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 17/11/2015.
STF. 1ª Turma. RHC 133575/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 21/2/17 (Info 855).
14.2. Agente que participou do roubo pode responder por latrocínio ainda que o
disparo que matou a vítima tenha sido efetuado pelo corréu – (Info 855) –
IMPORTANTE!!! – (TJMG-2018)
Qual foi o crime praticado por Pedro? Latrocínio (art. 157, § 3º, 2ª parte) em concurso
com sequestro e cárcere privado (art. 148 do CP):
Art. 157 (...)
§ 3º Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de
reclusão, de sete a quinze anos, além da multa; se resulta
morte, a reclusão é de vinte a trinta anos, sem prejuízo da
multa.
Art. 148. Privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro
ou cárcere privado:
Pena - reclusão, de um a três anos.
João também foi denunciado por latrocínio, mas alegou em sua defesa que deveria
responder apenas por roubo majorado (art. 157, § 2º, I e II), considerando que não
participou nem queria a morte das vítimas, devendo, portanto, ser aplicado o art. 29,
§ 2º do CP. A tese de João foi aceita pelo STF? NÃO. O art. 29, § 2º prevê:
§ 2º - Se algum dos concorrentes quis participar de crime
menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será
aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o
resultado mais grave.
No caso concreto, o juiz sentenciante julgou que o réu contribuiu ativamente para a
realização do delito, em unidade de desígnios e mediante divisão de tarefas, com
pleno domínio do fato. O STF entendeu que a decisão do magistrado foi correta.
Segundo decidiu a Corte:
Aquele que se associa a comparsa para a prática de roubo,
sobrevindo a morte da vítima, responde pelo crime de
latrocínio, ainda que não tenha sido o autor do disparo fatal
ou que sua participação se revele de menor importância. O
agente assumiu o risco de produzir resultado mais grave,
ciente de que atuava em crime de roubo, no qual as vítimas
foram mantidas em cárcere sob a mira de arma de fogo. STF.
1ª Turma. RHC 133575/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado
em 21/2/2017 (Info 855).
Assim, João tinha domínio do fato e sua conduta não pode ser considerada meramente
acessória ou de menor importância, estando ciente de que atuava em um roubo, no
qual as vítimas era mantidas em cárcere sob a mira de uma arma de fogo, tendo anuído
e aderido à conduta violenta do corréu, sendo a sua ação fundamental para a
concretização da subtração do patrimônio visado.
Não tendo havido rompimento do liame subjetivo entre os agentes, não há que se falar
em participação de menor importância, tampouco em responsabilização por crime
menos grave, pois em se tratando de roubo, respondem pelo resultado morte todos
aqueles que, mesmo não tendo de mão própria realizado o ato letal, planejaram e
executaram o tipo básico, assumindo o risco do resultado mais grave durante a ação
criminosa.
15. DANO
15.1. Destruição de acessões feitas em terras indígenas pode configurar dano
qualificado – (Info 760)
Se um indivíduo que tinha uma fazenda em uma terra indígena, ao receber ordem
para desocupar o local, destrói as acessões (construções e plantações) que havia
feito no local, ele pratica, em tese, o delito de dano qualificado (art. 163, parágrafo
único, III, do CP). Isso porque essas terras pertencem à União (art. 20, XI, da CF/88),
de forma que, consequentemente, as acessões também são patrimônio público
federal.
STF. 2ª Turma. Inq 3670/RR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 23/9/2014 (Info
760).
16. ESTELIONATO
16.1. Estelionato e devolução da vantagem indevida antes do recebimento da
denúncia – (Info 796) – IMPORTANTE!!!
O art. 9º, § 2º da Lei 10.684/2003 prevê que o pagamento integral do débito fiscal
realizado pelo réu é causa de extinção de sua punibilidade.
Imagine que determinado indivíduo tenha praticado estelionato causando prejuízo
aos cofres públicos. Antes do recebimento da denúncia, o agente paga integralmente
os danos produzidos. Isso poderá extinguir sua punibilidade, com base no art. 9º, § 2º
da Lei 10.684/2003?
NÃO. A causa especial de extinção de punibilidade prevista no § 2º do art. 9º da
Lei nº 10.684/2003, relativamente ao pagamento integral do crédito tributário, não
se aplica ao delito de estelionato (CP, art. 171).
O art. 9º da Lei 10.684/2003 menciona os crimes aos quais são aplicadas suas regras:
a) arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137/90; b) art. 168-A do CP (apropriação indébita
previdenciária); c) Art. 337-A do CP (sonegação de contribuição previdenciária).
Repare, portanto, que o estelionato (art. 171 do CP) não está listado nessa lei.
Mesmo sem o estelionato previdenciário estar previsto, não é possível aplicar essas
regras por analogia em favor do réu?
NÃO. O art. 9º da Lei 10.684/2003 somente abrange crimes tributários materiais,
delitos que são ontologicamente distintos do estelionato previdenciário e que
protegem bens jurídicos diferentes. Dessa forma, não há lacuna involuntária na lei
penal a demandar analogia.
O fato de o agente ter pago integralmente o prejuízo trará algum benefício penal?
SIM. O agente poderá ter direito de receber o benefício do arrependimento
posterior, tendo sua pena reduzida de 1/3 a 2/3 (art. 18 do CP).
STF. 2ª Turma. RHC 126917/SP, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 25/8/2015
(Info 796).
STJ. 6ª Turma. REsp 1.380.672-SC, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em
24/3/2015 (Info 559).
18. RECEPTAÇÃO
18.1. Constitucionalidade do §1º do art. 180 do Código Penal
A Súmula 608 do STF prevê que “no crime de estupro, praticado mediante violência
real, a ação penal é pública incondicionada.”
O entendimento dessa súmula pode ser aplicado independentemente da existência
da ocorrência de lesões corporais nas vítimas de estupro. A violência real se
caracteriza não apenas nas situações em que se verificam lesões corporais, mas
sempre que é empregada força física contra a vítima, cerceando-lhe a liberdade de
agir segundo a sua vontade.
Assim, se os atos foram praticados sob grave ameaça, com imobilização de vítimas,
uso de força física e, em alguns casos, com mulheres sedadas, trata-se de crime de
estupro que se enquadra na Súmula 608 do STF e que, portanto, a ação é pública
incondicionada.
STF. 2ª Turma. RHC 117978, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 05/06/2018 (Info 905).
O STF acatou esta tese? Depois da Lei nº 12.015/2009, o estupro praticado mediante
violência real passou a ser de ação pública condicionada? Com a Lei nº 12.015/2009, a
Súmula 608 do STF perdeu validade? NÃO. O tema ainda não está pacificado, mas a
1ª Turma do STF decidiu que:
A Súmula 608 do STF permanece válida mesmo após o
advento da Lei nº 12.015/2009. Assim, em caso de estupro
praticado mediante violência real, a ação penal é pública
incondicionada. STF. 1ª Turma. HC 125360/RJ, rel. Min.
Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes,
julgado em 27/2/2018 (Info 892).
E no caso de estupro que resulta lesão corporal grave ou morte (art. 213, §§ 1º e 2º)?
Qual será a ação penal nestas hipóteses? A doutrina também defende que neste caso
a ação penal seria pública condicionada. A Procuradoria-Geral da República ajuizou
até mesmo uma ADI contra a nova redação do art. 225 do Código Penal, dada pela Lei
nº 12.015/09. Na ação, a PGR pede que o caput do art. 225 seja declarado parcialmente
inconstitucional, sem redução de texto, apenas “para excluir do seu âmbito de
incidência os crimes de estupro qualificado por lesão corporal grave ou morte, de
modo a restaurar, em relação a tais modalidades delituosas, a regra geral da ação penal
pública incondicionada (artigo 100 do Código Penal e artigo 24 do Código de Processo
Penal)”. Em outras palavras, a PGR pediu que o STF interprete o art. 225 do CP
dizendo que o estupro que resulte lesão corporal grave ou morte será crime de ação
pública incondicionada. O processo é a ADI 4301, que deve ser julgada ainda este
ano. Vale ressaltar que, com a decisão acima explicada (HC 125360/RJ), ganha força
essa ADI proposta pela PGR e a tendência é que ela seja julgada procedente.
A Súmula 608 do STF permanece válida mesmo após o advento da Lei 12.015/2009.
Assim, em caso de estupro praticado mediante violência real, a ação penal é pública
incondicionada mesmo após a Lei nº 12.015/2009.
STF. 1ª Turma. HC 125360/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre
de Moraes, j. 27/2/2018 (Info 892).
OBS:
Ação penal no crime de estupro: A ação penal no crime de estupro deve ser analisada
antes e depois da Lei 12.015/09. Veja como essa Lei alterou o art. 225 do Código Penal:
CÓDIGO PENAL
Antes da Lei nº 12.015/2009 Depois da Lei nº 12.015/2009
Art. 225. Nos crimes definidos nos Art. 225. Nos crimes definidos nos
capítulos anteriores, somente se Capítulos I e II deste Título, procede-se
procede mediante queixa. mediante ação penal pública
§ 1º Procede-se, entretanto, mediante condicionada à representação.
ação pública: Parágrafo único. Procede-se, entretanto,
I - se a vítima ou seus pais não podem mediante ação penal pública
prover às despesas do processo, sem incondicionada se a vítima é menor de 18
privar-se de recursos indispensáveis à (dezoito) anos ou pessoa vulnerável.
manutenção própria ou da família;
II - se o crime é cometido com abuso do
pátrio poder, ou da qualidade de
padrasto, tutor ou curador.
§ 2º - No caso do nº I do parágrafo
anterior, a ação do Ministério Público
depende de representação.
O STF acatou esta tese? Depois da Lei nº 12.015/2009, o estupro praticado mediante
violência real passou a ser de ação pública condicionada? Com a Lei nº 12.015/2009, a
Súmula 608 do STF perdeu validade? NÃO. O tema ainda não está pacificado, mas a
1ª Turma do STF decidiu que:
A Súmula 608 do STF permanece válida mesmo após o
advento da Lei nº 12.015/2009. Assim, em caso de estupro
praticado mediante violência real, a ação penal é pública
incondicionada. STF. 1ª Turma. HC 125360/RJ, rel. Min.
Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes,
julgado em 27/2/2018 (Info 892).
E no caso de estupro que resulta lesão corporal grave ou morte (art. 213, §§ 1º e 2º)?
Qual será a ação penal nestas hipóteses? A doutrina também defende que neste caso
a ação penal seria pública condicionada. A Procuradoria-Geral da República ajuizou
até mesmo uma ADI contra a nova redação do art. 225 do Código Penal, dada pela Lei
nº 12.015/2009. Na ação, a PGR pede que o caput do art. 225 seja declarado
parcialmente inconstitucional, sem redução de texto, apenas “para excluir do seu
âmbito de incidência os crimes de estupro qualificado por lesão corporal grave ou
morte, de modo a restaurar, em relação a tais modalidades delituosas, a regra geral da
ação penal pública incondicionada (artigo 100 do Código Penal e artigo 24 do Código
de Processo Penal)”. Em outras palavras, a PGR pediu que o STF interprete o art. 225
do CP dizendo que o estupro que resulte lesão corporal grave ou morte será crime
de ação pública incondicionada. O processo é a ADI 4301, que deve ser julgada ainda
este ano. Vale ressaltar que, com a decisão acima explicada (HC 125360/RJ), ganha
força essa ADI proposta pela PGR e a tendência é que ela seja julgada procedente.
O agente que passa as mãos nas coxas e seios da vítima menor de 14 anos, por
dentro de sua roupa, pratica, em tese, o crime de estupro de vulnerável (art. 217-A
do CP).
Não importa que não tenha havido penetração vaginal (conjunção carnal).
STF. 1ª Turma. RHC 133121/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/o acórdão Min.
Edson Fachin j. 30/8/2016 (Info 837).
Prefeito que, ao sancionar lei aprovada pela Câmara dos Vereadores, inclui artigo
que não constava originalmente no projeto votado pratica o crime de falsificação
de documento público (art. 297, § 1º do CP).
No momento da dosimetria, o fato de o réu ser Prefeito não pode ser utilizado como
circunstância desfavorável para aumentar a pena-base na primeira fase e, em
seguida, ser empregado como causa de aumento do § 1º do art. 297 do CP. Se ele for
utilizado duas vezes, haverá bis in idem.
Assim, essa circunstância (condição de Prefeito) deve ser considerada apenas uma
vez, na terceira fase da pena, como majorante (causa de aumento).
STF. 1ª Turma. AP 971/RJ, Rel. Min. Edson Fachin, j. 28/6/2016 (Info 832).
OBS:
Imagine a seguinte situação adaptada: A Câmara dos Vereadores aprovou
determinada lei municipal. João, Prefeito, quando foi sancionar a lei, incluiu um artigo
que não constava originalmente no projeto aprovado pelo Parlamento. O objetivo foi
possibilitar a prorrogação da dotação orçamentária sem a necessidade de nova
aprovação legislativa.
Qual foi o delito praticado pelo Prefeito? Falsificação de documento público, previsto
no art. 297, § 1º do CP:
Art. 297. Falsificar, no todo ou em parte, documento público,
ou alterar documento público verdadeiro:
Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.
§ 1º - Se o agente é funcionário público, e comete o crime
prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de sexta parte.
23.2. Pratica falsidade ideológica (art. 299 do CP) o candidato que deixa de
contabilizar despesas em sua prestação de contas no TER – (Info 765)
Determinado Parlamentar federal, quando foi candidato ao Senado, ao entregar a
prestação de contas ao TRE, deixou de contabilizar despesas com banners e cartazes
no valor de 15 mil reais.
O STF considerou que havia indícios suficientes para receber a denúncia contra ele
formulada e iniciar um processo penal para apurar a prática do crime de falsidade
ideológica (art. 299 do CP).
STF. 1ª Turma. Inq 3767/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 28/10/2014 (Info
765).
25. PECULATO
25.1. STF recebeu denúncia contra o Senador Renan Calheiros em razão de ter
desviado recursos públicos da verba parlamentar para pagamento de pensão
alimentícia à filha – (Info 849)
E quanto ao crime de corrupção passiva, o que decidiu o STF? O STF entendeu que a
conduta descrita se enquadra no crime de corrupção passiva (art. 317 do CP):
Art. 317. Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou
indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-
la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar
promessa de tal vantagem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
Provas: No caso concreto, o réu foi delatado por Paulo Roberto Costa. No entanto, o
STF afirmou que não estava condenando o réu apenas com base nas declarações do
colaborador. Isso porque tais declarações, de forma isolada, não servem para
fundamentar um decreto condenatório (art. 4º, § 16, da Lei nº 12.850/2013). O STF
afirmou que os fatos retratados encontram consistente suporte em outros elementos
de prova (cruzamento de dados de companhias aéreas; afastamento de sigilo bancário;
perícias em sistemas de contabilidade de pagamentos de propina; depoimentos de
testemunhas; e quebra e disponibilização de dados telefônicos), produzidos sob o
crivo do contraditório. Esse conjunto de provas atesta e reforça a veracidade das
declarações prestadas no âmbito de colaboração premiada e autoriza a sua utilização
como fundamento à resolução do mérito da causa penal.
Inicialmente, o STF afirmou que o réu não cometeu o crime quando recebeu o
pagamento das propinas em espécie (em “dinheiro vivo”). O mero recebimento de
valores em dinheiro não tipifica o delito de lavagem, seja quando recebido pelo
próprio agente público, seja quando recebido por interposta pessoa.
Por outro lado, o STF entendeu que o Deputado praticou a lavagem pelo fato de ter
recebido a propina em depósitos bancários fracionados, em valores que não
atingem os limites estabelecidos pelas autoridades monetárias à comunicação
compulsória dessas operações. Ex: suponhamos que, na época, a autoridade bancária
dizia que todo depósito acima de R$ 20 mil deveria ser comunicado ao COAF; diante
disso, o Deputado recebia depósitos periódicos de R$ 19 mil para burlar essa regra.
Para o STF, isso configura o crime de lavagem. Trata-se de uma forma de ocultação da
origem e da localização da vantagem pecuniária recebida pela prática do crime
anterior.
28. DESCAMINHO
28.1. Descaminho é crime formal
O descaminho é crime tributário FORMAL. Logo, para que seja proposta ação penal
por descaminho não é necessária a prévia constituição definitiva do crédito
tributário.
Não se aplica a Súmula Vinculante 24 do STF.
O crime se consuma com a simples conduta de iludir o Estado quanto ao pagamento
dos tributos devidos quando da importação ou exportação de mercadorias.
STJ. 6ª Turma. REsp 1.343.463-BA, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, j.
20/3/14 (Info 548).
STF. 2ª Turma. HC 122325, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 27/05/2014.
29. DESACATO
29.1. Desacato continua sendo crime – (Info 894)
Código Penal Militar: O Código Penal Militar tipifica o desacato em três artigos:
Art. 298: pune o desacato cometido por militar contra outro militar de
hierarquia superior;
Art. 299: pune o desacato cometido por qualquer pessoa contra militar no
exercício de função de natureza militar ou em razão dela;
Art. 300: pune o desacato cometido contra funcionário civil no exercício de
função ou em razão dela, em lugar sujeito à administração militar.
Corte IDH admite que excessos na liberdade de expressão sejam punidos: Apesar de a
posição da Comissão Interamericana de Direitos Humanos ser contrária à
criminalização do desacato, a Corte Interamericana de Direitos Humanos, órgão que
efetivamente julga os casos envolvendo indivíduos e estados, já deixou claro em mais
de um julgamento que o Direito Penal pode punir as condutas que representem
excessos no exercício da liberdade de expressão. Assim, o Poder Judiciário brasileiro
deve continuar a repudiar reações arbitrárias eventualmente adotadas por agentes
públicos, punindo pelo crime de abuso de autoridade quem, no exercício de sua
função, reagir de modo autoritário a críticas e opiniões que não constituam excesso
intolerável do direito de livre manifestação do pensamento.
E o STF? O STF, ao julgar uma situação envolvendo civil acusado de desacato contra
militar (art. 299 do CPM), também entendeu no mesmo sentido do STJ e decidiu que:
O crime de desacato é compatível com a Constituição Federal
e com o Pacto de São José da Costa Rica.
A figura penal do desacato não tolhe o direito à liberdade de
expressão, não retirando da cidadania o direito à livre
manifestação, desde que exercida nos limites de marcos
civilizatórios bem definidos, punindo-se os excessos.
STF. 2ª Turma. HC 141949/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes,
julgado em 13/3/2018 (Info 894).
Natureza do Pacto de São José da Costa Rica: Os tratados de direitos humanos podem
ser:
a) equivalentes às emendas constitucionais, se aprovados
após a EC 45/2004 e conforme os requisitos do § 3º do art. 5º
da CF/88; ou
b) supralegais, se aprovados antes da EC 45/2004 e sem os
requisitos do § 3º do art. 5º da CF/88.
Desacato não é incompatível com o Pacto de São José da Costa Rica: Ao se ler o Pacto
de São José da Costa Rica não se identifica uma incompatibilidade do crime de
desacato em relação a esse tratado. Assim, o tratado não revogou a norma penal,
tendo havido a recepção do crime de desacato pela regra supralegal (Pacto de São
José). O texto do Pacto dispõe que o exercício do direito à liberdade de pensamento
e de expressão, embora não sujeito a censura prévia, deve assumir
responsabilidades ulteriores, expressamente fixadas em lei, para assegurar o
respeito aos direitos ou à reputação das demais pessoas. Portanto, o Pacto impõe sim
limites à liberdade de expressão, não tendo havido descriminalização do crime de
desacato ou “abolitio criminis”. A forma como a liberdade de expressão foi tratada
no Pacto de São José é parecida com a disciplina dada pela Constituição Federal ao
tema, sendo que esse direito não possui caráter absoluto. Vale ressaltar que a
Constituição, ao tutelar a honra, a intimidade e a dignidade da pessoa humana,
também recepcionou o crime de desacato na forma como prevista em nossa legislação
penal.
Desacato não tolhe a liberdade de expressão: A figura penal do desacato não tolhe o
direito à liberdade de expressão, não retirando da cidadania o direito à livre
manifestação, desde que exercida nos limites de marcos civilizatórios bem
definidos, punindo-se os excessos. A Constituição impõe à Administração a
observância dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência, podendo-se dessumir daí a compatibilidade entre a defesa da honra e
intimidade do funcionário público e a liberdade de expressão.
Não se aplica a teoria da adequação social: Não se pode aplicar ao caso o princípio
da adequação social. O princípio da adequação social, desenvolvido por Hanz Welzel,
afasta a tipicidade dos comportamentos que são aceitos e considerados adequados ao
convívio social. De acordo com o referido princípio, os costumes aceitos por toda a
sociedade afastam a tipicidade material de determinados fatos que, embora possam
se subsumir a algum tipo penal, não caracterizam crime justamente por estarem de
acordo com a ordem social em um determinado momento histórico. Havendo lei,
ainda que deficitária, punindo o abuso de autoridade, pode-se afirmar que a
criminalização do desacato se mostra ainda compatível com o Estado democrático.
O simples fato de o réu exercer um mandato popular não é suficiente para fazer
incidir a causa de aumento do art. 327, § 2º, do CP. É necessário que ele ocupe uma
posição de superior hierárquico (o STF chamou de "imposição hierárquica").
STF. Plenário. Inq 3983/DF, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 02 e 03/03/2016
(Info 816).
Obs.1: apesar de a lei dizer que esse ajuste é um “contrato”, a doutrina critica a
nomenclatura e afirma que, na verdade, o melhor seria chamá-lo de convênio, termo
de colaboração ou termo de fomento. Isso porque no contrato existem interesses
opostos e, nessa relação da OS com o Poder Público, os objetivos são os mesmos, são
convergentes.
Quais são os incentivos que uma OS recebe do Poder Público? As organizações sociais
poderão receber os seguintes incentivos para cumprir o contrato de gestão:
a) Recursos orçamentários: podem receber “dinheiro
público”;
b) Cessão de bens públicos, mediante permissão de uso,
dispensada licitação: podem receber, sem licitação, bens
públicos para serem usados em suas atividades;
c) Cessão especial de servidor, com ônus para o órgão de
origem do servidor cedido: servidores públicos podem ser
colocados à disposição das organizações sociais para lá
trabalharem, continuando recebendo sua remuneração dos
cofres públicos;
d) Contratadas sem licitação: as organizações sociais podem
ser contratadas, com dispensa de licitação, para prestarem
serviço a órgãos e entidades da Administração Pública,
recebendo por isso (art. 24, XXIV, da Lei nº 8.666/93). Desse
modo, quando a Administração contratar serviços a serem
prestados pelas organizações sociais, está dispensada de
realizar licitação, desde que aquela atividade esteja prevista
no contrato de gestão.
Qual das duas argumentações foi acolhida pelo STF? João pode ser considerado
funcionário público por equiparação, nos termos do art. 327, § 1º do CP? SIM. O STF
acolheu a tese do MP.
Mas e o art. 84, § 1º, da Lei nº 8.666/93...? Não importa para nada aqui. O art. 84, § 1º,
da Lei nº 8.666/93 tem influência, ou seja, repercute no âmbito administrativo, mas
não constitui parâmetro interpretativo para os crimes definidos no Código Penal.
Para os crimes funcionais, o Código Penal traz uma regra específica no art. 327. Vale
ressaltar que o legislador fez questão de fornecer, no Código Penal, um conceito mais
amplo do que o utilizado no Direito Administrativo. Assim, o conceito de funcionário
público previsto no art. 327 do CP não se confunde com as definições próprias do
direito administrativo. O caput do dispositivo, que serve como referencial
interpretativo dos parágrafos, estabelece que o conceito de funcionário público
agasalhado pelo estatuto é “para os efeitos penais”. Além disso, o título é mais
abrangente do que o geralmente adotado no âmbito do direito administrativo, pois
abarca funções temporárias e não remuneradas. Trata-se, portanto, de um conceito
instrumental concebido pelo legislador unicamente para fins de aplicação da lei
penal. A figura equiparada do § 1º é ainda mais ampla. Considera-se funcionário
público, para fins penais, quem exerce cargo, emprego ou função em entidade
parestatal. Recebe igualmente essa qualificação “quem trabalha para empresa
prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica
da Administração Pública”. Os requisitos não são cumulativos, e sim, disjuntivos.
Isso quer dizer que a acusação não precisa comprovar que a entidade paraestatal
executa atividade típica da Administração Pública.
O art. 327, § 1º, é exemplo de norma penal em branco? NÃO. O art. 327, tanto no caput
como no § 1º, não pode ser considerado como norma penal em branco. Não é
necessário buscar seu complemento em outro ato normativo. Na verdade, o art. 327
do CP é uma norma interpretativa.
Advogados dativos: O advogado que, por força de convênio celebrado com o Poder
Público, atua de forma remunerada em defesa dos hipossuficientes agraciados com o
benefício da assistência judiciária gratuita, enquadra-se no conceito de funcionário
público para fins penais. Sendo equiparado a funcionário público, é possível que
responda por corrupção passiva (art. 317 do CP). STJ. 5ª Turma. HC 264.459-SP, Rel.
Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 10/3/2016 (Info 579).
Médico de hospital particular credenciado/conveniado ao SUS (após a Lei 9.983/2000):
Depois da Lei nº 9.983/2000, que alterou o § 1º do art. 327 do CP, o médico credenciado
ao SUS pode ser equiparado a funcionário público para efeitos penais. Vale ressaltar,
no entanto, que a Lei nº 9.983/2000 não pode retroceder alcançar situações praticadas
antes de sua vigência. STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1101423/RS, Rel. Min. Marco
Aurélio Bellizze, julgado em 06/11/2012.
31.2. Receber propina sob o disfarce de doações eleitorais oficiais e tipificação penal
– (Info 856)
Secretária de Estado que desvia verbas de convênio federal que tinha destinação
específica e as utiliza para pagamento da folha de servidores não pratica o crime de
peculato (art. 312 do CP), mas sim o delito de emprego irregular de verbas ou rendas
públicas (art. 315).
STF. 2ª Turma. Inq 3731/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 2/2/2016 (Info
813).
OBS: A 2ª Turma do STF rejeitou a alegação de prática de peculato, uma vez que os
recursos desviados foram incorporados ao Tesouro estadual, não havendo utilização
em proveito próprio ou alheio. O STF reconheceu que a conduta da Secretária amolda-
se, em tese, ao crime do art. 315 do CP. No caso concreto, contudo, já havia ocorrido a
prescrição quanto ao delito do art. 315 do CP.
O art. 359-D do CP prevê, como crime, ordenar despesa não autorizada por lei. Não
comete esse delito o Governador do Estado que faz o remanejamento das verbas
destinadas aos precatórios para outras despesas do Poder Judiciário se a legislação
estadual dava margem para intepretações de que isso seria permitido.
STF. 1ª Turma. Inq 3393/PB, Rel. Min. Luiz Fux, j. 23/9/2014 (Info 760).
A questão chegou até o STF. Houve crime? NÃO. O STF entende que não há crime na
importação de sementes de maconha. Vamos entender com calma.
O que é considerado “droga” para fins penais? O parágrafo único do art. 1º da Lei
11.343/06 prevê que, para uma substância ser considerada como "droga", é necessário
que possa causar dependência, sendo isso definido em uma lista a ser elencada em
lei ou ato do Poder Executivo federal. Veja:
Art. 1º (...) Parágrafo único. Para fins desta Lei, consideram-
se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de
causar dependência, assim especificados em lei ou
relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder
Executivo da União.
Assim, o conceito é técnico-jurídico e só será considerada droga o que a lei (em sentido
amplo) assim reconhecer como tal. Mesmo que determinada substância cause
dependência física ou psíquica, se ela não estiver prevista no rol das substâncias
legalmente proibidas, ela não será tratada como droga para fins de incidência da Lei
nº 11.343/2006 (ex: álcool).
Este rol existe? Onde ele está previsto? O rol das substâncias que são consideradas
como “droga”, para fins penais, continua previsto na Portaria SVS/MS nº 344/1998,
considerando que ainda não foi editada uma nova lista. Perceba, portanto, que
estamos diante de uma norma penal em branco heterogênea (em sentido estrito ou
heteróloga). Isso porque o complemento do que é considerado droga é fornecido por
um ato normativo elaborado por órgão diverso daquele que editou a Lei. A Lei
11.343/06 foi editada pelo Congresso Nacional e o seu complemento é dado por uma
portaria, editada pela ANVISA, autarquia ligada ao Poder Executivo.
Desse modo, a semente da cannabis sativa não é, em si, droga (não está listada na
Portaria) e também não pode ser considerada matéria-prima ou insumo destinado à
preparação de droga ilícita.
Mas é possível que o indivíduo plante a semente de maconha e que daí nasça a planta
da cannabis sativa linneu... A planta tem THC (substância psicoativa proibida)...: É
verdade. Pode ser que o indivíduo germine a semente, que isso vire uma muda, que
ele cultive a muda e que se torne a planta da maconha. No entanto, a mera importação
da semente não é crime algum porque configuraria, no máximo, mero ato
preparatório da figura típica prevista no § 1º do art. 28 da Lei nº 11.343/2006:
Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito,
transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas
sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou
regulamentar será submetido às seguintes penas:
I - advertência sobre os efeitos das drogas;
II - prestação de serviços à comunidade;
III - medida educativa de comparecimento a programa ou
curso educativo.
§ 1º Às mesmas medidas submete-se quem, para seu consumo
pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à
preparação de pequena quantidade de substância ou produto
capaz de causar dependência física ou psíquica. (...)
Nem chega a ser, portanto, ato executório do § 1º do art. 28 porque o agente não iniciou
a semeadura ou o cultivo.
Logo, como não é prevista pena privativa de liberdade para esta conduta, é inviável a
aplicação da regra da tentativa do art. 14, II, do CP.
A conduta pode ser considerada contrabando (art. 334-A do CP)? Existe divergência
sobre o tema. O contrabando consiste na importação de mercadoria proibida (art. 334-
A do CP). A importação de sementes desprovidas de inscrição no Registro Nacional
de Cultivares é proibida pelo art. 34 da Lei nº 10.711/2003:
Art. 34. Somente poderão ser importadas sementes ou mudas
de cultivares inscritas no Registro Nacional de Cultivares.
Qual é a posição do STJ sobre o tema? O STJ está dividido, por enquanto:
A importação de pequenas quantidade de sementes de maconha configura
tráfico de drogas?
5ª Turma: SIM 6ª Turma: NÃO
A importação clandestina de sementes Tratando-se de pequena quantidade de
de cannabis sativa linneu (maconha) sementes e inexistindo expressa previsão
configura o tipo penal descrito no art. normativa que criminaliza, entre as
33, § 1º, I, da Lei nº 11.343/2006. Não é condutas do art. 28 da Lei de Drogas, a
possível aplicar o princípio da importação de pequena quantidade de
insignificância. matéria prima ou insumo destinado à
STJ. 5ª Turma. REsp 1723739/SP, Rel. preparação de droga para consumo
Min. Jorge Mussi, julgado em pessoal, forçoso reconhecer a atipicidade
23/10/2018. do fato.
STJ. 6ª Turma. AgRg no AgInt no REsp
1616707/CE, Rel. Min. Antonio Saldanha
Palheiro, julgado em 26/06/2018.
Se o réu é primário e possui bons antecedentes, o juiz pode, mesmo assim, negar o
benefício do art. 33, § 4º da LD argumentando que a quantidade de drogas
encontrada com ele foi muito elevada?
O tema é polêmico.
A Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006) também traz uma previsão nesse sentido:
Art. 62. Os veículos, embarcações, aeronaves e quaisquer
outros meios de transporte, os maquinários, utensílios,
instrumentos e objetos de qualquer natureza, utilizados para
a prática dos crimes definidos nesta Lei, após a sua regular
apreensão, ficarão sob custódia da autoridade de polícia
judiciária, excetuadas as armas, que serão recolhidas na forma
de legislação específica.
(...)
33.4. Se o réu, não reincidente, for condenado a pena superior a 4 anos e que não
exceda a 8 anos, e se as circunstâncias judiciais forem favoráveis, o juiz deverá fixar o
regime semiaberto – (Info 859)
O condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 anos e não exceda a 8
anos, tem o direito de cumprir a pena corporal em regime semiaberto (art. 33, § 2°,
b, do CP), caso as circunstâncias judiciais do art. 59 lhe forem favoráveis.
Obs: não importa que a condenação tenha sido por tráfico de drogas.
Mas o § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90 afirma que o regime inicial no caso de crimes
hediondos e equiparados deverá ser o fechado... O STF decidiu que o § 1º do art. 2º da
Lei nº 8.072/90, ao impor o regime inicial fechado, é inconstitucional. HC 111.840/ES,
Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 27/6/2012 (Info 672).
Assim, o regime inicial nas condenações por crimes hediondos ou equiparados (ex:
tráfico de drogas) não tem que ser obrigatoriamente o fechado, podendo ser também
o regime semiaberto ou aberto, desde que presentes os requisitos do art. 33, § 2º,
alíneas “b” e “c”, do Código Penal.
Logo, o juiz poderá condenar o réu por crime hediondo ou equiparado e fixar o regime
semiaberto ou aberto, desde que cumpridos os requisitos do Código Penal.
Se o réu é primário e possui bons antecedentes, o juiz pode, mesmo assim, negar o
benefício do art. 33, § 4º da LD argumentando que a quantidade de drogas encontrada
com ele foi muito elevada? O tema é polêmico.
1ª Turma do STF: encontramos precedentes afirmando que a grande quantidade de
droga pode ser utilizada como circunstância para afastar o benefício. Nesse sentido:
não é crível que o réu, surpreendido com mais de 500 kg de maconha, não esteja
integrado, de alguma forma, a organização criminosa, circunstância que justifica o
afastamento da causa de diminuição prevista no art. 33, §4º, da Lei de Drogas (HC
130981/MS, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 18/10/2016. Info 844).
2ª Turma do STF: a quantidade de drogas encontrada não constitui, isoladamente,
fundamento idôneo para negar o benefício da redução da pena previsto no art. 33,
§ 4º, da Lei 11.343/06 (HC 138138/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 29/11/16.
Info 849). (TRF5-2017)
STF. 2ª Turma. HC 138138/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 29/11/16 (Info
849).
Não é crível que o réu, surpreendido com mais de 500 kg de maconha, não esteja
integrado, de alguma forma, a organização criminosa, circunstância que justifica o
afastamento da causa de diminuição prevista no art. 33, §4º, da Lei de Drogas.
STF. 1ª Turma. HC 130981/MS, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 18/10/16 (Info 844).
OBS:
Imagine a seguinte situação hipotética: João foi preso enquanto transportava 500kg
de maconha, tendo sido denunciado pela prática de tráfico de drogas (art. 33, caput,
da Lei 11.343/06). A defesa alegou que o réu é primário, possui bons antecedentes e
que agiu na condição de “mula”, de forma que merece ser beneficiado com a
minorante prevista no § 4º do art. 33:
Requisitos para aplicação da causa de diminuição: Para que o juiz deixe de aplicar a
minorante prevista no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06 é necessário que demonstre na
sentença a existência de conjunto probatório que possa afastar ao menos um dos
seguintes critérios, que são autônomos:
a) primariedade;
b) bons antecedentes;
c) não dedicação a atividades criminosas; e
d) não integração à organização criminosa.
Em suma, se o réu não preencher algum desses requisitos, não terá direito à
minorante.
STJ: NÃO. O STJ possui vários precedentes afirmando que, em regra, a "mula"
integra a organização criminosa e, portanto, não faz jus ao benefício:
(...) O atual entendimento jurisprudencial do Pretório Excelso
e desta Corte Superior é no sentido de que, regra geral, o
agente que transporta drogas, na qualidade de 'mula' do
tráfico, integra organização criminosa. Na hipótese, a
concessão da minorante em sua fração mínima configura ato
benéfico, já que, considerando o entendimento ora firmado, o
recorrente sequer faria jus à tal redução. (...)
STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1407115/SP, Rel. Min. Felix
Fischer, j. 18/08/16.
E no caso concreto acima relatado, o STF concordou com a tese da defesa? Deverá ser
concedido o benefício a João? NÃO. É o que foi decidido no Info 844 do STF. Desse
modo, o Tribunal entendeu que, embora primário, o agente transportava grande
quantidade de entorpecente o que demonstra envolvimento com a organização
criminosa. Existe outro precedente do STF no mesmo caminho:
(...) In casu, a paciente, na condição de “mula”, foi
surpreendida transportando expressiva quantidade de droga
ao exterior. Tal fato afasta o preenchimento dos requisitos do
art. 33, § 4°, da Lei de Drogas (...)
STF. 1ª Turma. HC 123430, Rel. Min. Luiz Fux, j. 14/10/14.
33.8. Regime inicial para condenado não reincidente a pena de até 4 anos com
circunstâncias judiciais favoráveis – (Infos 821 e 843) – (MPAM-2016) (TJRS-2016)
Se o réu, não reincidente, for condenado, por tráfico de drogas, a pena de até 4 anos,
e se as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP forem positivas (favoráveis), o juiz
deverá fixar o regime aberto e deverá conceder a substituição da pena privativa de
liberdade por restritiva de direitos, preenchidos os requisitos do art. 44 do CP.
A gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para justificar a
fixação do regime mais gravoso.
STF. 1ª Turma. HC 129714/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 11/10/16 (Info 843).
STF. 1ª Turma. HC 130411/SP, red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin, j. 12/4/16 (Info
821). STF. 2ª Turma. HC 133028/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 12/4/16 (Info 821).
(MPAM-2016): Segundo o entendimento do STF, o crime de tráfico de drogas,
conforme o caso concreto, enseja a possibilidade de fixação de regime inicial
diferente do fechado, devendo o magistrado atentar à regra do artigo 33 do Código
Penal.
Imagine que o réu foi condenado a 1 ano e 8 meses de reclusão por tráfico de drogas
(art. 33 da LD). O juiz fixou o regime inicial semiaberto. Vale ressaltar que o
condenado era primário e as circunstâncias judiciais favoráveis a ele. Como
argumento para fixar o regime semiaberto, o juiz alegou que o crime de tráfico de
drogas é muito grave, sendo extremamente nocivo para a sociedade. Agiu
corretamente o magistrado? NÃO.
A situação em tela se amolda ao art. 33, § 2º, "c", do Código Penal, que é aplicável
também aos condenados por tráfico de drogas:
Art. 33 (...)
§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas
em forma progressiva, segundo o mérito do condenado,
observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de
transferência a regime mais rigoroso:
c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou
inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em
regime aberto.
Mas o § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 afirma que o regime inicial no caso de crimes
hediondos e equiparados deverá ser o fechado... O STF decidiu que o § 1º do art. 2º da
Lei 8.072/90, ao impor o regime inicial fechado, é inconstitucional. STF. Plenário. HC
111.840/ES, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 27/6/2012 (Info 672).
Assim, o regime inicial nas condenações por crimes hediondos ou equiparados (ex:
tráfico de drogas) não tem que ser obrigatoriamente o fechado, podendo ser também
o regime semiaberto ou aberto, desde que presentes os requisitos do art. 33, § 2º,
alíneas “b” e “c”, do Código Penal.
Logo, o juiz poderá condenar o réu por crime hediondo ou equiparado e fixar o regime
semiaberto ou aberto, desde que cumpridos os requisitos do Código Penal acima
explicados.
Obs: no caso do exemplo dado, o réu não foi condenado por crime hediondo ou
equiparado considerando que o STF entende que o chamado "tráfico privilegiado",
previsto no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06 não deve ser considerado crime equiparado
a hediondo (HC 118533, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 23/06/2016. Info 831).
33.9. O crime de tráfico privilegiado de drogas não tem natureza hedionda – (Info
831) – IMPORTANTE!!! ATUALIZAR LIVROS!!! – (TRF5-2017)
Art. 33 (...)
§ 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as
penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços,
vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde
que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se
dedique às atividades criminosas nem integre organização
criminosa.
Qual é a natureza jurídica deste § 4º? Trata-se de uma causa de diminuição de pena.
Surgiu uma tese defensiva sustentando que o art. 33, § 4º da Lei 11.343/06 não seria
tão grave e, por isso, não poderia ser equiparado a hediondo. A jurisprudência atual
do STF acolhe esta posição? SIM. O principal argumento invocado pelo STF foi o de
que não seria proporcional tratar o tráfico privilegiado como equiparado a hediondo,
sendo esta conduta incompatível com a natureza hedionda. Além disso, foram feitas
considerações sobre política criminal, aumento da população carcerária etc.
O que acontece agora com a Súmula 512 do STJ? Fica SUPERADA e, certamente, será
cancelada em breve. A decisão do STF foi tomada em um HC e, por isso, não possui
eficácia erga omnes e efeitos vinculantes. Apesar disso, como foi proferida pelo
Plenário, na prática, tem uma força de persuasão enorme e, por isso, é extremamente
provável que o STJ acompanhe o novo entendimento do STF e cancele a súmula
passando a também decidir que o § 4º do art. 33 não é equiparado a hediondo.
Na prática, o que muda para o réu condenado por tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da
LD)? Podemos apontar três mudanças principais:
Vale ressaltar, por fim, que a tese defensiva acolhida pelo STF e acima explicada foi
sustentada levada à Corte pela DPU.
33.10. Valoração negativa da natureza e quantidade da droga autoriza a fixação de
regime inicial de pena mais gravoso – (Info 819)
Segundo entendeu o STF, a decisão respeitou o disposto no art. 33, § 2º, “b”, e § 3º, do
CP c/c o art. 42 da Lei nº 11.343/2006:
CP/Art. 33 (...)
§ 2º As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em
forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os
seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a
regime mais rigoroso:
b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro)
anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la
em regime semi-aberto;
(...)
§ 3º A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-
se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código.
Algumas drogas são mais nocivas e têm maior potencial viciante do que outras. Ex: a
maconha é considerada uma substância entorpecente mais "leve"; por outro lado, a
heroína é altamente viciante. Assim, o juiz pode aumentar a pena-base (1ª fase da
dosimetria) sob o argumento de que a heroína possui alto potencial destrutivo. De
igual forma, se a quantidade da droga for muito grande, isso também poderá ser
utilizado como fundamento para se aumentar a pena-base.
E o grau de pureza da droga? Pode ser utilizado como argumento para aumentar ou
diminuir a reprimenda? NÃO. No caso concreto julgado, a defesa pediu ao juiz que
realizasse exame pericial para aferir o grau de pureza da droga, tendo sido indeferido
pelo magistrado. Diante da negativa, a defesa alegou que houve nulidade, pedido que
foi rejeitado pelo STF, que entendeu ser desnecessário determinar a pureza do
entorpecente.
O art. 40, V, da Lei de Drogas prevê que a pena do tráfico e de outros delitos deverá
ser aumentada se ficar "caracterizado o tráfico entre Estados da Federação ou entre
estes e o Distrito Federal".
Para que incida essa causa de aumento não se exige a efetiva transposição da
fronteira interestadual pelo agente, sendo suficiente a comprovação de que a
substância tinha como destino localidade em outro Estado da Federação.
Ex: João pegou um ônibus em Campo Grande (MS) com destino a São Paulo (SP);
algumas horas depois, antes que o ônibus cruzasse a fronteira entre os dois Estados,
houve uma blitz da polícia no interior do coletivo, tendo sido encontrados 10kg de
cocaína na mochila de João, que confessou que iria levá-la para um traficante de
São Paulo.
STF. 1ª Turma. HC 122791/MS, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 17/11/2015 (Info
808).
33.14. Natureza e quantidade da droga: o mesmo fato só pode ser utilizado para
aumentar a pena base ou para analisar o benefício do tráfico privilegiado – (Info 759)
– IMPORTANTE!!! – (PCMT-2017)
Explicação:
STF: Natureza e quantidade da droga: o mesmo fato só pode ser utilizado para
aumentar a pena base ou para analisar o benefício do tráfico privilegiado - A
natureza e a quantidade da droga NÃO podem ser utilizadas para aumentar a
pena-base do réu e também para afastar o tráfico privilegiado (art. 33, § 4º) ou
para, reconhecendo-se o direito ao benefício, conceder ao réu uma menor redução
de pena. Haveria, nesse caso, bis in idem. STF. 2ª Turma. RHC 122684/MG, Rel.
Min. Cármen Lúcia, julgado em 16/9/2014 (Info 759).
Na dosimetria da pena de tráfico, o juiz não pode aumentar a pena base utilizando
como argumento o fato de terem sido encontradas muitas trouxinhas com o réu, se
o peso delas era pequeno (7,1 gramas), sendo esse fato preponderante.
De igual modo, o magistrado não pode aumentar a pena pelo simples fato de a
venda da droga ocorrer dentro da própria casa do condenado. Isso porque esse fato,
por si só, não enseja uma maior reprovabilidade da conduta delituosa.
Por fim, o julgador não pode aumentar a pena do réu porque este declarou, em seu
interrogatório, que era usuário frequente de droga. O uso contumaz de drogas não
pode ser empregado como indicativo de necessidade de agravamento da
reprimenda, visto que a conduta do réu que vende drogas para sustentar o próprio
vício é menos reprovável do que a daquele que pratica esse crime apenas com
intuito de lucro.
STF. 2ª Turma. RHC 122469/MS, rel. orig. Min. Cármen Lúcia, red. p/ o acórdão Min.
Celso de Mello, julgado em 16/9/2014 (Info 759).
33.19. Dever ou não de demonstrar que a droga encontrada consigo seria utilizada
apenas para consumo próprio
O réu não tem o dever de demonstrar que a droga encontrada consigo seria
utilizada apenas para consumo próprio.
Cabe à acusação comprovar os elementos do tipo penal, ou seja, que a droga
apreendida era destinada ao tráfico. Ao Estado-acusador incumbe demonstrar a
configuração do tráfico, que não ocorre pelo simples fato dos réus terem comprado
e estarem na posse de entorpecente.
Em suma, se a pessoa é encontrada com drogas, cabe ao Ministério Público
comprovar que o entorpecente era destinado ao tráfico. Não fazendo esta prova,
prevalece a versão do réu de que a droga era para consumo próprio.
STF. 1ª Turma. HC 107448/MG, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 18.6.2013.
Resumindo:
É possível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos nos
casos de crimes ou contravenções praticadas contra a mulher com violência ou grave
ameaça no ambiente doméstico?
1) Crime: NÃO. Posição tanto do STJ como do STF.
2) Contravenção penal:
• 2ª Turma do STF: entende que é possível a substituição.
• 1ª Turma do STF e STJ: afirmam que também não é permitida a substituição.
34.6. Crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher e a Lei
dos Juizados Especiais
Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher não se
aplica a Lei dos Juizados Especiais (Lei n. 9.099/95), mesmo que a pena seja menor
que 2 anos.
STF. Plenário. ADI 4424/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 9/2/2012.
A posse (art. 12 da Lei 10.826/03) ou o porte (art. 14) de arma de fogo configura crime
mesmo que ela esteja desmuniciada. Da mesma forma, a posse ou o porte apenas
da munição (ou seja, desacompanhada da arma) configura crime. Isso porque tal
conduta consiste em crime de perigo abstrato, para cuja caracterização não importa
o resultado concreto da ação.
STF. 1ª Turma. HC 131771/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 18/10/16 (Info 844).
OBS:
A posse ou o porte de arma de fogo desmuniciada configura crime? SIM. A posse (art.
12 da Lei 10.826/03) ou o porte (art. 14) de arma de fogo configura crime mesmo que
ela esteja desmuniciada. Trata-se, atualmente, de posição pacífica tanto no STF como
no STJ. Para a jurisprudência, a simples posse ou porte de arma, munição ou acessório
de uso permitido — sem autorização e em desacordo com determinação legal ou
regulamentar — configura os crimes previstos nos arts. 12 ou 14 da Lei 10.826/03. Isso
porque, por serem delitos de perigo abstrato, é irrelevante o fato de a arma apreendida
estar desacompanhada de munição, já que o bem jurídico tutelado é a segurança
pública e a paz social.
STJ. 3ª Seção. AgRg nos EAREsp 260.556/SC, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j.
26/03/14.
STF. 2ª Turma. HC 95073/MS, red. p/ o acórdão Min. Teori Zavascki, 19/3/13 (Info
699).
A posse ou porte apenas da munição configura crime? SIM. A posse ou o porte apenas
da munição (ou seja, desacompanhada da arma) configura crime. Isso porque tal
conduta consiste em crime de perigo abstrato, para cuja caracterização não importa o
resultado concreto da ação. O objetivo do legislador foi o de antecipar a punição de
fatos que apresentam potencial lesivo à população, prevenindo a prática de crimes.
STF. 2ª Turma. HC 119154, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 26/11/13.
STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1442152/MG, Min. Maria Thereza de Assis Moura, j.
07/08/14.
35.3. O porte ilegal de arma de fogo deve ser absorvido pelo crime de homicídio? –
(Info 775) – IMPORTANTE!!!
Se o agente, utilizando arma de fogo, atira e mata alguém, haverá homicídio e porte
de arma de fogo ou apenas homicídio? Se uma pessoa pratica homicídio com arma de
fogo, a acusação por porte deverá ser absorvida? Aplica-se o princípio da consunção?
Depende da situação:
Situação 1: NÃO. O crime de porte não será absorvido se ficar provado nos
autos que o agente portava ilegalmente a arma de fogo em outras
oportunidades antes ou depois do homicídio e que ele não se utilizou da
arma tão somente para praticar o assassinato. Ex: a instrução demonstrou
que João adquiriu a arma de fogo três meses antes de matar Pedro e não a
comprou com a exclusiva finalidade de ceifar a vida da vítima.
Situação 2: SIM. Se não houver provas de que o réu já portava a arma antes
do homicídio ou se ficar provado que ele a utilizou somente para matar a
vítima. Ex: o agente compra a arma de fogo e, em seguida, dirige-se até a
casa da vítima, e contra ela desfere dois tiros, matando-a.
No caso concreto julgado pelo STF, ficou provado que o réu havia comprado a arma
3 meses antes da morte da vítima. Além disso, também se demonstrou pelas
testemunhas que o acusado, várias vezes antes do crime, passou na frente da casa
da vítima, mostrando ostensivamente o revólver utilizado no crime. Desse modo,
restou provado que os tipos penais consumaram-se em momentos distintos e que
tinham desígnios autônomos, razão pela qual não se pode reconhecer o princípio
da consunção entre o homicídio e o porte ilegal de arma de fogo.
STF. 1ª Turma. HC 120678/PR, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o acórdão Min. Marco
Aurélio, j. 24/2/15 (Info 775).
36. RACISMO
36.1. Palestra proferida por Bolsonaro com críticas aos quilombolas e estrangeiros
não configurou racismo – (Info 915)
36.2. A incitação de ódio público feita por líder religioso contra outras religiões pode
configurar o crime de racismo – (Info 893) – IMPORTANTE!!! – (MPRR-2017) (PGERS-
2015)
A defesa de Tiago interpôs uma série de recursos até que o caso chegou ao STF. No
Supremo, alegou a atipicidade da conduta. Segundo a defesa, a condenação ideológica
de outras crenças é inerente à prática religiosa, e se trataria de exercício de uma
garantia constitucionalmente assegurada.
A tese da defesa foi acolhida pelo STF? NÃO. O STF manteve a condenação e afirmou
que:
A incitação ao ódio público contra quaisquer denominações
religiosas e seus seguidores não está protegida pela cláusula
constitucional que assegura a liberdade de expressão.
STF. 2ª Turma. RHC 146303/RJ, rel. Min. Edson Fachin, red.
p/ o ac. Min. Dias Toffoli, julgado em 6/3/2018 (Info 893).
Os abusos, quando praticados, legitimam a atuação estatal. “Se assim não fosse,
caluniar, injuriar, difamar ou fazer apologia de fatos criminosos não seriam suscetíveis
de punições”, explicou o Min. Celso de Mello.
Questão de concurso:
(PGEPA-2011): No HC 82424-2 – “Caso Ellwanger” –, o STF julgou pedido de “habeas
corpus” em favor de editor de obras que veiculavam ideias supostamente antissemitas.
Analise as proposições abaixo e assinale a alternativa correta: A ordem de “habeas
corpus” foi indeferida com fundamento, entre outros, de que o direito à liberdade de
expressão não pode abrigar, em sua abrangência, manifestações de conteúdo imoral
que implicam em ilicitude penal. (CERTA)
Hate speech (discurso de ódio): O tema acima exposto está ligado ao que a doutrina
chama de hate speech (discurso de ódio). Discurso de ódio (hate speech) são
“manifestações de pensamento que ofendam, ameacem ou insultem determinado
grupo de pessoas com base na raça, cor, religião, nacionalidade, orientação sexual,
ancestralidade, deficiência ou outras características próprias. (...) No direito norte-
americano, prevalece o entendimento de que até o discurso de ódio (hate speech)
inclui-se no âmbito de proteção da liberdade de expressão.” (BERNARDES, Juliano
Taveira; FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves. Direito Constitucional. Tomo II. 7ª
ed. Salvador: Juspodivm, 2017, p. 128).
No Brasil, ao contrário dos EUA, prevalece que o hate speech não é protegido pela
ordem constitucional. Isso porque o direito à liberdade de expressão não é absoluto,
podendo a pessoa que proferiu o discurso de ódio ser punida, inclusive
criminalmente, em caso de abuso. Esse tem sido, por exemplo, o entendimento das
bancas examinadoras:
Situação deve ser analisada com base no caso concreto: Assim, podemos concluir que
é possível a condenação de um líder religioso pelo crime de racismo (art. 20, §2º, da
Lei nº 7.716/81) em caso de discursos de ódio público contra outras denominações
religiosas e seus seguidores. Vale ressaltar, no entanto, que essa condenação
dependerá do caso concreto, ou seja, das palavras que foram proferidas e da intenção
do líder religioso de suprimir ou reduzir a dignidade daquele que é diferente de si.
Desse modo, não é qualquer crítica de um líder religioso a outras religiões que
configurará o crime de racismo. Nesse sentido, recentemente o STF absolveu um líder
religioso dessa imputação por falta de dolo. Relembre:
Determinado padre escreveu um livro, voltado ao público da
Igreja Católica, no qual ele faz críticas ao espiritismo e a
religiões de matriz africana, como a umbanda e o candomblé.
O Ministério Público da Bahia ofereceu denúncia contra ele
pela prática do art. 20, § 2º da Lei nº 7.716/89 (Lei do racismo).
No caso concreto, o STF entendeu que não houve o crime.
A CF/88 garante o direito à liberdade religiosa. Um dos
aspectos da liberdade religiosa é o direito que o indivíduo
possui de não apenas escolher qual religião irá seguir, mas
também o de fazer proselitismo religioso.
Proselitismo religioso significa empreender esforços para
convencer outras pessoas a também se converterem à sua
religião.
Desse modo, a prática do proselitismo, ainda que feita por
meio de comparações entre as religiões (dizendo que uma é
melhor que a outra) não configura, por si só, crime de
racismo.
Só haverá racismo se o discurso dessa religião supostamente
superior for de dominação, opressão, restrição de direitos ou
violação da dignidade humana das pessoas integrantes dos
demais grupos. Por outro lado, se essa religião supostamente
superior pregar que tem o dever de ajudar os "inferiores" para
que estes alcancem um nível mais alto de bem-estar e de
salvação espiritual e, neste caso não haverá conduta
criminosa.
Na situação concreta, o STF entendeu que o réu apenas fez
comparações entre as religiões, procurando demonstrar que
a sua deveria prevalecer e que não houve tentativa de
subjugar os adeptos do espiritismo.
Pregar um discurso de que as religiões são desiguais e de
que uma é inferior à outra não configura, por si, o elemento
típico do art. 20 da Lei nº 7.716/89. Para haver o crime, seria
indispensável que tivesse ficado demonstrado o especial fim
de supressão ou redução da dignidade do diferente, elemento
que confere sentido à discriminação que atua como verbo
núcleo do tipo. STF. 1ª Turma. RHC 134682/BA, Rel. Min.
Edson Fachin, julgado em 29/11/2016 (Info 849).
Desse modo, em concursos públicos deve-se ficar atento para a redação do enunciado.
A regra que prevê o crime do art. 305 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) é
constitucional, posto não infirmar o princípio da não incriminação, garantido o
direito ao silêncio e ressalvadas as hipóteses de exclusão da tipicidade e da
antijuridicidade.
STF. Plenário. RE 971959/RS, Rel. Min. Luiz Fux, j. 14/11/18 (repercussão geral)
(Info 923).
OBS:
Evasão do local do acidente para evitar responsabilidade penal ou civil: O Código de
Trânsito Brasileiro (CTB) prevê o seguinte delito em seu art. 305:
Art. 305. Afastar-se o condutor do veículo do local do acidente,
para fugir à responsabilidade penal ou civil que lhe possa ser
atribuída:
Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa.
Sujeitos do crime: Tanto o sujeito ativo como o sujeito passivo podem ser qualquer
pessoa. Trata-se, portanto, de crime bicomum.
Elemento subjetivo: É o dolo. Vale ressaltar que se exige especial fim de agir (dolo
específico), considerando que o agente deve ter saído do local “para fugir à
responsabilidade penal ou civil que lhe possa ser atribuída”. Não admite
modalidade culposa.
Outras informações:
• a ação penal é pública incondicionada;
• trata-se de infração de menor potencial ofensiva, de forma que o rito é
sumaríssimo (Lei 9.099/95), cabendo transação penal e suspensão condicional do
processo.
Essa discussão chegou finalmente ao STF. O que decidiu o STF? O art. 305 do CTB é
constitucional ou não? O art. 305 do CTB é constitucional. O STF, em repercussão geral,
fixou a seguinte tese: A regra que prevê o crime do art. 305 do Código de Trânsito
Brasileiro (CTB) é constitucional, posto não infirmar o princípio da não
incriminação, garantido o direito ao silêncio e ressalvadas as hipóteses de exclusão
da tipicidade e da antijuridicidade. STF. Plenário. RE 971.959/RS, Rel. Min. Luiz Fux,
julgado em 14/11/2018 (repercussão geral) (Info 923).
Precedente do STF na análise do art. 307 do CP: Vale ressaltar que o STF já tem um
precedente análogo. Isso porque o STF reconheceu que o art. 307 do CP é
constitucional e não viola o princípio que veda a autoincriminação. Relembre o que
diz o art. 307 do CP:
Falsa identidade
Art. 307. Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade
para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para
causar dano a outrem:
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa, se o fato
não constitui elemento de crime mais grave.
O STF entende que há crime quando o agente, para não se incriminar, atribui a si uma
identidade que não é sua. Essa questão já foi, inclusive, analisada pelo Pleno do STF
em regime de repercussão geral:
O princípio constitucional da autodefesa (art. 5º, inciso LXIII,
da CF/88) não alcança aquele que atribui falsa identidade
perante autoridade policial com o intento de ocultar maus
antecedentes, sendo, portanto, típica a conduta praticada pelo
agente (art. 307 do CP). STF. Plenário. RE 640139 RG, Rel. Min.
Dias Toffoli, julgado em 22/09/2011.
No mesmo sentido:
Súmula 522-STJ: A conduta de atribuir-se falsa identidade
perante autoridade policial é típica, ainda que em situação de
alegada autodefesa.
Votos vencidos: Ficaram vencidos os Ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso
de Mello e Dias Toffoli, que entendiam que o tipo penal do art. 305 do CTB viola o
princípio da não autoincriminação.
37.2. Crime de dirigir sem habilitação é absorvido pela lesão corporal culposa na
direção de veículo – (Info 796)
Se um indivíduo, que não possui habilitação para dirigir (art. 309 do CTB), conduz
seu veículo de forma imprudente, negligente ou imperita e causa lesão corporal em
alguém, ele responderá pelo crime do art. 303, parágrafo único, do CTB, ficando o
delito do art. 309 do CTB absorvido por força do princípio da consunção.
O delito de dirigir veículo sem habilitação é crime de ação penal pública
incondicionada. Por outro lado, a lesão corporal culposa (art. 303 do CTB) é crime
de ação pública condicionada à representação. Imagine que a vítima não exerça seu
direito de representação no prazo legal.
Diante disso, o Ministério Público poderá denunciar o agente pelo delito do art.
309?
NÃO. O delito do art. 309 já foi absorvido pela conduta de praticar lesão corporal
culposa na direção de veículo automotor, tipificada no art. 303 do CTB, crime de
ação pública condicionada à representação. Como a representação não foi
formalizada pela vítima, houve extinção da punibilidade, que abrange tanto a lesão
corporal como a conduta de dirigir sem habilitação.
STF. 2ª Turma. HC 128921/RJ, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 25/8/15 (Info 796).
Também é a redação do art. 83 da Lei 9.430/96, com redação dada pela Lei 12.382/11:
Art. 83. A representação fiscal para fins penais relativa aos
crimes contra a ordem tributária previstos nos arts. 1º e 2º da
Lei n.° 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e aos crimes contra
a Previdência Social, previstos nos arts. 168-A e 337-A do
Decreto-Lei n.° 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código
Penal), será encaminhada ao Ministério Público depois de
proferida a decisão final, na esfera administrativa, sobre a
exigência fiscal do crédito tributário correspondente. (Redação
dada pela Lei nº 12.350/2010)
(...)
§ 2º É suspensa a pretensão punitiva do Estado referente aos
crimes previstos no caput, durante o período em que a pessoa
física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente dos
aludidos crimes estiver incluída no parcelamento, desde que
o pedido de parcelamento tenha sido formalizado antes do
recebimento da denúncia criminal. (Incluído pela Lei
12.382/2011)
(...)
§ 4º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no caput
quando a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o
agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de
tributos, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de
concessão de parcelamento. (Incluído pela Lei 12.382/2011)
Lei nº 9.430/96
Art. 83. (...)
§ 3º A prescrição criminal não corre durante o período de
suspensão da pretensão punitiva. (Incluído pela Lei
12.382/2011)
38.3. Não se pode invocar a teoria do domínio do fato, pura e simplesmente, sem
nenhuma outra prova – (Info 866)
Pela teoria tradicional, o autor é aquela pessoa que pratica o verbo nuclear do tipo.
Logo, o empregado, gerente ou contador seriam os autores do delito.
A teoria do domínio do fato, criada na Alemanha, em 1939, por Hans Welzel, teve a
finalidade de ampliar o conceito de autor. Por força dessa teoria, pode também ser
considerado autor aquele que, mesmo não realizando o núcleo do tipo, domina
finalisticamente todo o seu desenrolar. Welzel dizia que autor é o “senhor do fato”.
Dessa forma, pela teoria do domínio do fato, o autor seria o sócio-administrador que
decidiu e determinou que fossem praticados os atos necessários à supressão ou
redução do tributo.
Os crimes dos incisos I a IV do art. 1º da Lei nº 8.137/90 são materiais. Assim, para
que se configurem, é indispensável a constituição definitiva do crédito tributário, nos
termos da SV 24-STF:
O argumento utilizado pelo STF foi o de que, mesmo antes da constituição definitiva,
já teria havido o início da execução e, portanto, seria possível a investigação.
Determinado réu foi condenado por sonegação fiscal (art. 1º, I, da Lei 8.137/90).
O STF considerou correta a sentença do juiz que, na 1ª fase da dosimetria da pena,
aumentou a pena-base com fundamento em dois argumentos:
1) Na análise das circunstâncias, o magistrado aumentou a pena sob a alegação de
que o réu omitiu seu nome do quadro societário da empresa com o objetivo de
esconder que era ele quem realmente administrava a empresa.
O STF afirmou que o ardil utilizado pelo réu (omissão do seu nome do quadro
societário da empresa) teve como objetivo acobertar sua real condição de
administrador da empresa investigada e, com isso, furtar-se de possível aplicação
da lei penal. Essa omissão do nome do réu no quadro societário não é a mesma
omissão de que trata o inciso I do art. 1º.
A omissão que é elementar do tipo é a omissão para suprimir ou reduzir tributo. A
omissão do nome do réu foi para evitar que ele fosse descoberto. Logo, punir a
omissão do nome do réu não significa punir o condenado duas vezes pelo mesmo
fato.
2) No exame das consequências do crime, o juiz também majorou a pena
argumentando que o crime praticado gerou um grande prejuízo ao erário (mais de
2 milhões de reais), o que autorizaria a elevação da pena-base. Segundo entende o
STF, em se tratando de infrações penais contra a ordem tributária, a extensão do
dano causado pode ser invocada na 1ª fase da dosimetria como critério para
exasperação da pena-base, sem que tanto implique bis in idem.
STF. 2ª Turma. HC 128446/PE, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 15/9/2015 (Info
799).
Caso o contribuinte/réu seja condenado por esse fato, haverá violação ao princípio
da presunção de inocência?
NÃO. Não ofende o princípio constitucional da presunção de inocência a exigência
de comprovação da origem de valores estabelecida no art. 42 da Lei n. 9.430/96.
Para o STF, o contribuinte, ao não comprovar a origem dos recursos depositados
em sua conta bancária, cria, contra si, uma presunção relativa de que houve omissão
de rendimentos, ensejando a condenação criminal.
Não há ofensa ao princípio da presunção de inocência porque se trata de um
procedimento legalmente estabelecido e disciplinado, sendo certo que ao
contribuinte é garantido o contraditório e a ampla defesa.
STF. 2ª Turma. HC 121125/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 10/6/2014 (Info
750).
Pratica lavagem de dinheiro o sujeito que recebe propina por meio de depósitos
bancários fracionados, em valores que não atingem os limites estabelecidos pelas
autoridades monetárias à comunicação compulsória dessas operações.
Ex: suponhamos que, na época, a autoridade bancária dizia que todo depósito
acima de R$ 20 mil deveria ser comunicado ao COAF; diante disso, um Deputado
recebia depósitos periódicos de R$ 19 mil para burlar essa regra. Para o STF, isso
configura o crime de lavagem. Trata-se de uma forma de ocultação da origem e da
localização da vantagem pecuniária recebida pela prática do crime antecedente.
STF. 2ª Turma. AP 996/DF, Rel. Min. Edson Fachin, j. 29/5/2018 (Info 904).
OBS:
A situação concreta foi a seguinte: O Deputado Federal Nelson Meurer (PP/PR)
integrava a cúpula do Partido Progressista (PP). Como importante figura partidária,
ele exercia pressão política junto à Presidência da República a fim de que Paulo
Roberto Costa fosse mantido como Diretor de Abastecimento da Petrobrás. Como
“contraprestação” por esse apoio, o Deputado recebia dinheiro do referido Diretor,
quantia essa oriunda de contratos ilegais celebrados pela Petrobrás. Essa prática foi
revelada pelo próprio Paulo Roberto Costa em declaração prestada no bojo de acordo
de colaboração premiada. O Deputado foi denunciado pela prática de corrupção
passiva (art. 317 do CP) e também por lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei nº 9.613/98).
O que o STF decidiu? O STF condenou o réu pela prática dos delitos. O crime de
lavagem de dinheiro é tipificado nos seguintes termos:
Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização,
disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos
ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração
penal.
Pena: reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa.
O Ministério Público apontava uma série de condutas que configurariam o crime de
lavagem de dinheiro. Inicialmente, o STF afirmou que o réu não cometeu o crime
quando recebeu o pagamento das propinas em espécie (em “dinheiro vivo”).
O mero recebimento de valores em dinheiro não tipifica o
delito de lavagem, seja quando recebido pelo próprio agente
público, seja quando recebido por interposta pessoa.
STF. 2ª Turma. AP 996/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado
em 29/5/2018(Info 904).
Assim, se uma pessoa recebe propina em dinheiro, isso não significa, necessariamente,
a prática de lavagem de dinheiro.
Ex: suponhamos que, na época, a autoridade bancária dizia que todo depósito acima
de R$ 20 mil deveria ser comunicado ao COAF; diante disso, o Deputado recebia
depósitos periódicos de R$ 19 mil para burlar essa regra. Para o STF, isso configura o
crime de lavagem. Trata-se de uma forma de ocultação da origem e da localização da
vantagem pecuniária recebida pela prática do crime anterior.
41.5. Reprovabilidade do crime cometido por “homem público” é maior – (Info 866)
41.6. Pena pode ser aumentada se o crime de lavagem envolveu grandes somas de
valores – (Info 866)
41.7. Pena pode ser aumentada se a lavagem de dinheiro ocorreu por meio de várias
transações financeiras envolvendo diversos países – (Info 866)
O agente que é preso com duas granadas de uso exclusivo do Exército que seriam
utilizadas para roubar um banco não pratica crime do art. 12 da Lei 7.170/83. Isso
porque não há, no presente caso, a motivação política, que consiste no "dolo
específico" (elemento subjetivo especial do tipo) exigido para a configuração dos
crimes de que trata a Lei de Segurança Nacional.
Se o sujeito praticar uma conduta semelhante a esta, em tese, ele deverá responder
pelo crime do art. 16 do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/03).
STF. Plenário. RC 1472/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 25/5/16 (Info 827).
OBS:
O agente não responderá por tentativa de roubo? NÃO. Isso porque ele não chegou a
praticar nenhum ato executório do crime de roubo. Não houve início de execução. O
agente percorreu apenas as fases de cogitação e de preparação, tendo sido
interrompido nos atos preparatórios. Como regra, os atos preparatórios não são
punidos.
45. TORTURA
45.1. Regime inicial de cumprimento de pena – (Info 789)
O STF já decidiu que é inconstitucional a Lei que impõe o regime inicial fechado
para os crimes hediondos e equiparados (STF. HC 111.840-ES).
Para o STJ, isso se aplica também ao delito de tortura, por ser este equiparado a
crime hediondo. Logo, o juiz deve desconsiderar a regra disposta no art. 1º, § 7º, da
Lei nº 9.455/1997, por ser esta norma também inconstitucional. Assim, não é
obrigatório que o condenado por crime de tortura inicie o cumprimento da pena no
regime prisional fechado. O juiz, no momento da dosimetria da pena, deverá seguir
as regras do art. 33 do CP.
No julgado noticiado neste Informativo, o Min. Marco Aurélio manifesta posição
pessoal de que o art. 1º, § 7º, da Lei nº 9.455/1997 seria constitucional, ou seja, seria
legítima a regra que impõe o regime inicial fechado para o crime de tortura. O
inteiro teor do julgado ainda não foi divulgado, mas penso que se trata de uma
posição minoritária e isolada do Min. Marco Aurélio. Os demais Ministros
acompanharam o Relator mais por uma questão de praticidade do que de tese
jurídica. Isso porque os demais Ministros entendiam que, no caso concreto, nem
caberia habeas corpus considerando que já havia trânsito em julgado. No entanto,
eles não aderiram expressamente à tese do Relator.
STF. 1ª Turma. HC 123316/SE, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 9/6/15 (Info 789).
Não comete o crime do art. 89 da Lei nº 8.666/93 Secretária de Educação que faz
contratação direta, com base em inexigibilidade de licitação (art. 25, I), de livros
didáticos para a rede pública de ensino, livros esses que foram escolhidos por
equipe técnica formada por pedagogos, sem a sua interferência. Vale ressaltar que
havia comprovação, por meio de carta de exclusividade emitida por entidade do
setor, de que a empresa contratada era a única fornecedora dos livros na região.
Além disso, não houve demonstração de sobrepreço.
Diante dessas circunstâncias, o STF absolveu a ré por ausência de “dolo específico”
(elemento subjetivo especial).
STF. Plenário. AP 946/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 30/8/18 (Info 913).
OBS:
Administrador inábil ≠ administrador ímprobo: Para a responsabilização penal do
administrador público com base no art. 89 da Lei de Licitações (norma penal em
branco), cumpre analisar se foram violados os pressupostos de dispensa ou
inexigibilidade de licitação previstos nos arts. 24 e 25 da Lei, bem como se houve
vontade livre e consciente de violar a competição e de produzir resultado lesivo ao
patrimônio público. Tal compreensão busca distinguir o administrador probo que,
sem má-fé, agindo com culpa, aplica equivocadamente a norma de dispensa ou
inexigibilidade de licitação, daquele que afasta a concorrência de forma deliberada,
sabendo-a imperiosa, com finalidade ilícita.
Acusada não interferiu na escolha dos livros: Segundo observou o Min. Relator dos
embargos, a acusada não interferiu na escolha dos livros que foram adquiridos,
tendo eles sido selecionados por uma equipe técnica formada por pedagogos. Não
há também qualquer prova de que a ré tenha manifestado preferência por qualquer
uma das obras, editoras ou distribuidoras específicas. Não há qualquer vínculo entre
a Deputada e os sócios das empresas contratadas nem qualquer indício de acerto
prévio entre eles. Ademais, a escolha dos livros ideais para alcançar os objetivos do
programa governamental em questão é matéria circunscrita ao mérito do ato
administrativo. Desse modo, a seleção do melhor material didático não está vinculada
a critérios estritamente objetivos sobre os quais o Poder Judiciário possa exercer
controle jurisdicional.
Vale ressaltar que essa prática (“carta de exclusividade”) é reconhecida como lícita
pelo Tribunal de Contas da União desde que emitida por entidade idônea vinculada
ao setor de mercado respectivo. No caso concreto, a carta de exclusividade foi emitida
pela Câmara Brasileira do Livro.
Compatibilidade dos preços: Outro ponto ressaltado é que os preços contratados são
compatíveis com aqueles praticados no mercado, não havendo provas de que tenha
havido sobrepreço (superfaturamento).
Faltou dolo: Assim, no caso concreto, o STF entendeu que não restou demonstrado
o “dolo específico” (elemento subjetivo especial) na conduta da ré. Em outras
palavras, não ficou provado que ela agiu com o intuito de beneficiar as empresas
contratadas nem que tenha agido com o objetivo de lesar o erário.
46.2. Aspectos importantes sobre o crime do art. 89 da Lei de Licitações – (Info 891)
– IMPORTANTE!!!
Elemento subjetivo
Para a configuração da tipicidade subjetiva do crime previsto no art. 89 da Lei
8.666/93, exige-se o especial fim de agir, consistente na intenção específica de lesar
o erário ou obter vantagem indevida.
OBRIGATORIEDADE DE LICITAÇÃO
Regra: obrigatoriedade de licitação: Como regra, a CF/88 impõe que a Administração
Pública somente pode contratar obras, serviços, compras e alienações se realizar uma
licitação prévia para escolher o contratante (art. 37, XXI).
Exceção: contratação direta nos casos especificados na legislação: O inciso XXI afirma
que a lei poderá especificar casos em que os contratos administrativos poderão ser
celebrados sem esta prévia licitação. A isso, a doutrina denomina “contratação
direta”.
CONTRATAÇÃO DIRETA
A Lei de Licitações e Contratos prevê três grupos de situações em que a contratação
ocorrerá sem licitação prévia. Trata-se das chamadas licitações dispensadas,
dispensáveis e inexigíveis. Vejamos o quadro comparativo abaixo:
Dispensada Dispensável Inexigível
Art. 17 Art. 24 Art. 25
Rol taxativo Rol taxativo Rol exemplificativo
A lei determina a não A lei autoriza a não Como a licitação é uma
realização da licitação, realização da licitação. disputa, é indispensável
obrigando a contratação Mesmo sendo dispensável, que haja pluralidade de
direta. a Administração pode objetos e pluralidade de
decidir realizar a licitação ofertantes para que ela
(discricionariedade). possa ocorrer. Assim, a lei
prevê alguns casos em que
a inexigibilidade se verifica
porque há impossibilidade
jurídica de competição.
Ex.: quando a Ex.: compras de até R$ 8 Ex.: contratação de artista
Administração Pública mil. consagrado pela crítica
possui uma dívida com especializada ou pela
o particular e, em vez de opinião pública para fazer
pagá-la em espécie,
transfere a ele um bem o show do aniversário da
público desafetado, cidade.
como forma de quitação
do débito. A isso
chamamos de dação em
pagamento (art. 17, I,
"a").
CRIME DO ART. 89
Tipo objetivo: O crime do art. 89 da Lei 8.666/93 ocorre se o administrador público...
• dispensar a licitação fora das hipóteses previstas em lei;
• inexigir (deixar de exigir) licitação fora das hipóteses previstas em lei; ou
• deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade (as
formalidades estão previstas especialmente no art. 26 da Lei).
Desse modo, haverá o crime tanto na hipótese em que a licitação é dispensada mesmo
sem lei autorizando ou determinando a dispensa, como na situação em que a lei até
autoriza ou determina, mas o administrador não observa os requisitos formais para
tanto.
46.3. Se o software adquirido sem licitação tinha mais especificações do que os das
concorrentes e era mais adequado ao seu objeto, não há o crime do art. 89 – (Info 861)
46.4. Administrador que contrata empresa para reforma de ginásio sem situação de
emergência e que depois faz aditivo para ampliar o objeto pratica, em tese, os delitos
dos arts. 89 e 92 – (Info 859)
Art. 65, §1º (vedação à ampliação contratual acima de 50% do valor original do
contrato)
Art. 65 (...)
§ 1º O contratado fica obrigado a aceitar, nas mesmas
condições contratuais, os acréscimos ou supressões que se
fizerem nas obras, serviços ou compras, até 25% (vinte e cinco
por cento) do valor inicial atualizado do contrato, e, no caso
particular de reforma de edifício ou de equipamento, até o
limite de 50% (cinquenta por cento) para os seus acréscimos.
46.5. O crime do art. 89 da Lei 8.666/93 exige dano ao erário? Critérios para
verificação judicial da viabilidade da denúncia pelo art. 89 – (Info 856)
O crime do art. 89 da Lei 8.666/93 exige resultado danoso (dano ao erário) para se
consumar?
1ª corrente: SIM. Posição do STJ e da 2ª Turma do STF.
Para que haja a condenação pelo crime do art. 89 da Lei nº 8.666/93, exige-se a
demonstração de que houve prejuízo ao erário e de que o agente tinha a finalidade
específica de favorecimento indevido.
Assim, mesmo que a decisão de dispensa ou inexigibilidade da licitação tenha sido
incorreta, isso não significa necessariamente que tenha havido crime, sendo
necessário analisar o prejuízo e o dolo do agente.
Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar
de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.
STF. 2ª Turma. Inq 3731/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 2/2/2016 (Info
813).
OBS:
A jurisprudência do STF, ao interpretar o art. 89 da Lei 8666/93, exige a demonstração
do prejuízo ao erário e a finalidade específica de favorecimento indevido para
reconhecer a adequação típica.
O objetivo desse entendimento é separar os casos em que ocorre interpretação
equivocada das normas, ou mesmo puro e simples erro do administrador daqueles
em que a dispensa buscara efetivo favorecimento dos agentes envolvidos.
As provas constantes dos autos não demonstram que a denunciada tenha agido com
intenção de causar prejuízo ao erário ou favorecer a empresa contratada. Não há
elementos que indiquem que a denunciada tenha pessoalmente exercido influência na
escolha.
Em princípio, a denunciada agiu com a crença de que a contratação seria conveniente
e adequada e de que a licitação seria inexigível de acordo com os critérios jurídicos.
Por fim, não se vislumbrou elementos suficientes a indicar vontade de causar prejuízo
ao erário ou favorecer a contratada.
O STF julgou denúncia contra ex-prefeito pela prática do delito previsto no art. 89
da Lei n. 8.666/93.
Para ser válida, a contratação direta de escritório de advocacia por inexigibilidade
de licitação precisa atender aos seguintes requisitos:
a) é necessário que se instaure um procedimento administrativo formal;
b) deverá ser demonstrada a notória especialização do profissional a ser contratado;
c) deverá ser demonstrada a natureza singular do serviço;
d) deverá ser demonstrado que é inadequado que o serviço a ser contratado seja
prestado pelos integrantes do Poder Público (no caso, pela PGM); e
e) o preço cobrado pelo profissional contratado deve ser compatível com o
praticado pelo mercado.
Sendo cumpridos esses requisitos, não há que se falar em crime do art. 89 da Lei n.
8.666/93.
STF. 1ª Turma. Inq 3074/SC, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 26/8/14 (Info 756).
47. CRIMES ELEITORAIS
47.1. Para configurar o delito de calúnia eleitoral, é necessária a comprovação da
lesividade da conduta e, se o suposto atingido afirma não ter se ofendido, não há prova
da materialidade – (Info 920)
Por que a denúncia foi oferecida pelo Ministério Público (e não pelo suposto
ofendido)? Porque os crimes eleitorais (inclusive os delitos eleitorais contra a honra)
são de ação penal pública incondicionada, conforme prevê o art. 355 do CE, sendo
desnecessária representação do ofendido para que o Ministério Público ofereça a
denúncia. Veja a redação legal:
Art. 355. As infrações penais definidas neste Código são de
ação pública.
Suposto ofendido não se sentiu ofendido: O Min. Rel. Luiz Fux afirmou que o suposto
ofendido, Teotônio Vilela Filho, na qualidade de assistente da acusação, juntou
petição aos autos pedindo a absolvição de Lessa alegando que “as afirmações do réu
não lhe foram pessoalmente ofensivas”. A suposta vítima afirmou que o episódio
“não passou de querela, inerente ao calor da campanha; que seus efeitos se exauriram
naquele contexto, sem que tenha soçobrado ofensa alguma à sua honra pessoal”.
49. PEDERASTIA
49.1. Inconstitucionalidade das expressões que mencionem homossexualismo (Info
805)
O tipo penal do art. 235 do CPM continua sendo crime mesmo com a CF/88. No
entanto, devem ser consideradas incompatíveis com a CF/88 as expressões
empregadas que falem em homossexualismo. Isso porque o crime em tela se
configura tanto quando o militar pratica relação sexual com alguém do mesmo sexo,
como também de sexo diferente, não devendo haver distinção de tratamento.
Assim, as expressões “pederastia ou outro” — mencionada na rubrica enunciativa
referente ao art. 235 do CPM — e “homossexual ou não” — contida no aludido
dispositivo — não foram recepcionadas pela CF/88.
STF. Plenário. ADPF 291/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 28/10/2015
(Info 805).
50. HOMOFOBIA
50.1. Manifestação homofóbica é conduta ATÍPICA – (Info 754) – IMPORTANTE!!!
– (MPBA-2015)
NÃO. RHC 125566/PR e HC 127926/SC, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 26/10/16 (Info 845).
STF. 2ª Turma. RHC 125566/PR e HC 127926/SC, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 26/10/16
(Info 845).
O fato de o paciente não mais integrar as fileiras das Forças Armadas não tem
qualquer relevância sobre o prosseguimento da ação penal pelo delito tipicamente
militar de abandono do posto, visto que ele, no tempo do crime, era militar da ativa.
STF. 2ª Turma. HC 130793, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 02/08/2016.